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Caboré, a ópera da moça feia

Primeiro Ato.
<CENA I>
- Com Zé e Candinha -

Zé: (Entra chamando) Candinha! Candinha! Onde é que tu ta?


Candinha: (Fora de cena) Eu tô na cozinha, morrendo de trabalhar.
Zé: Pois deixe essa porcaria e vem logo aqui na sala.
Candinha: (Surgindo) Ai, meu Deus, Vichi Maria! O que foi que houve, sujeito?
Zé: Deixe de coisa e me trate com respeito.
Candinha: Você está com uma cara!
Zé: Estou é atrás de um jeito pra ver se essa raiva sara.
Candinha: Mas finalmente, o que foi?
Zé: O mesmo que tivessem roubado um garrote, um boi... - ou mesmo um cavalo bom, qualquer um bicho que
fosse!
Candinha: Desculpe, mas o seu jeito é de quem levou um coice.
Zé: É porque nossa filhinha, essa besta, essa cadela! Tá namorando um matuto bem debaixo da janela.
Candinha: (Vendo da janela) Isso é verdade, meu Zé, o que estais proferindo?!
Zé: Deus que me aleije no pé, se eu tiver mentindo.
Candinha: (Na janela) Mas que vergonha, meu Deus! Que namoro escandaloso!
Zé: (Olhando por trás) Pelo jeito do safado, vê-se logo que é guloso.
Candinha: Segura os peitos dela...
Zé: Passa a mãoziinha nas coxa...
Candinha: E Maria geme tanto...
Zé: Chega vai ficando roxa!
Candinha: (Excitada) Ai-ai-ai, que eu morro disso!
Zé: O quê que tu disso morre?
Candinha: Eu vou ter um trimilique se um homem não me socorre!
Zé: (Grita) Deixa de ser tão safada e vai cuidar da tua louça.
Candinha: (Suspira) Eu sinto coisas que nunca senti quando era moça...
Zé: Pois tu tá muito velha pra pensar em putaria... Respeite este seu marido e arrespeite Maria!
Candinha: Ela tá é no bem bom.
Zé: Safada é o que ela é!
Candinha: Tu não sabe é o que se passa no corpo de uma mulher, quando está vivendo em preces, como se
tivesse em luto, pra ver se um dia aparece alguém como esse maturo... Ai, meu Deus, muito obrigado, minha
filha conseguiu!
Zé: Conseguiu foi uma surra que eu vou lhe dar nesta sala,
Candinha: Não grite assim, baixe o pio, que ela ouve sua fala.
Ficam olhando pela janela o namoro que acontece lá embaixo. Candinha esfrega os peitos e se deleita
com o que vê. Zé tem raiva e fica rosnando.

< CENA II>


- Maria e Matuto namoram no terreiro de casa -
Maria: (Abanando-se) Não me abrace mais assim porque senão vão maldar.
Matuto: E eu tou lhe desrespeitando?
Maria: Não, não, de jeito nenhum! Isso é uma forma de amar.
Matuto: (Ávido) Pois pare com esse zum-zum. Deixe eu ir continuando.
Maria: (Tímida) Só falei, porque seu braço me agarrando desse jeito, pode dar a impressão de tá pegando em
meus peito.
Matuto: Oxente, e não tou pegando? Pegar nos peito é besteira, eu tô pouco me lixando!
Maria: Você, também, nunca cheira, só sabe tá me apertando. E esse povo daqui leva a vida fuxicando.
Matuto: Mas vão fuxicar o quê? Que foi que eu lhe fiz demais?
Maria: Todo mundo sempre malda duma moça e dum rapaz.
Matuto: Eu apenas lhe abracei num abraço bem demorado, e desde que estou aqui eu tenho lhe respeitado.
Maria: Apois eu vou explicar para que você entenda: papai é muito maldoso e talvez nem compreenda... Ele
viu nós dois aqui, nesse amor roxo da gota... Vai dizer que tu foi longe, vai pensar que sou afoita... Talvez
pegue o cinturão pra me dar uma chavascada...
Matuto: (Sem entender) Mas por quê? Se tu não lhe fez nada?
Maria: Que não fiz nada, eu sei e tu também sabes disso...
Matuto: (Rápido) Não quero seu sacrifício pelo que não pratiquei.
Maria: Mas papai pensa que eu errei. Pensa que tu me pegou.
Matuto: Só peguei na tua coxa.
Maria: Porém disso não passou.
Matuto: Mesmo assim, se eu tivesse passado um pouquinho a mais, não acho que isso seria alguma coisa
demais.
Maria: Tudo bem, tá explicado. Carece falar mais não. Deixe essas coisas de lado e pegue minha mão.
Matuto: (Obedecendo) Foi só o que tenho feito desde que a gente namora. Se antes não lhe ofendi, por que
ofender agora?
Maria: Eu sei que tu não é disso. Pois deixe papai pensar.
Matuto: Pense a sua mãe também. Qualquer um deste lugar.
Maria: Mas o que mamãe, ora o quê! Você se esqueceu que ela sempre protegeu nós dois debaixo desta janela?
Matuto: Mas... já que tu falou dela...me diz então em que anda a nossa combinação...
Maria: É papai que ainda manda nesta casa e neste chão... E quando mamãe pedir permissão pro casamento,
ele vai ter um chilique! Vai sofrer um passamento!
Matuto: Afinal por que será que seu pai, com aquela idade, ainda quer impedir nossa felicidade?
Maria: É uma coisa que eu não sei. Ele prefere a cadeia. E alega que eu não caso só porque sou muito feia.
Matuto: Mas será que ele pensa que eu estou interessado...?
Maria: ...Interessado no quê?
Matuto: Na fortuna? No roçado?
Maria: Que tá pensando, ele tá. Mas deixa isso pra lá.
Matuto: Como é que se pensa isso de uma pobre criatura?
Maria: Não fique magoado assim. Eu sei da sua estrutura.
Matuto: Mas estrutura de quê?
Maria: De assumir um casamento!
Matuto: Quem dera, neste momento, eu ganhar muito dinheiro... para mostrar ao seu pai que não sou
interesseiro!
Maria: Pra mim, o que interessa é saber se tu me ama.
Matuto: Esfrego a cara na lama e assino até contrato! Para provar que lhe amo, como até bosta no prato!
Maria: (Radiante) Então é verdade mesmo? Você me ama, de fato?
Matuto: E tu ainda duvida?
Maria: Não sei nem o que seria sem tu na minha vida!
Matuto: (Determinado) Pois quer saber duma coisa? Eu vou falar com seu paii!
Maria: (Agarra-o) Ave Maria, não-não... Não vai, por favor, não vai!
Matuto: (Tentando ir) Ele precisa saber que sou macho pra valer.
Maria: Mas um “macho” também morre. É bom seguir meu conselho. Ele vai quebrar-lhe a cara, tua perna, teu
joelho... Ele pode até capar e te arrancar os pentelho...
Matuto: Homem nenhum deste mundo ousou bater no Matuto! Eu vou enfrentar seu pai porque já estou
resoluto!
Maria: Por favor, não faça isso... Eu conheço aquele homem!
Matuto: Ele é mais brabo que onça? Mais feio que um lobisomem?
Maria: Vai te achatar os “testícus”, os pulmão e os abdome...
Matuto: Com essa tua choradeira você até me desgosta.
Maria: Melhor esperar mamãe, ela vai ter uma resposta.
Matuto: E se ela não tiver?
Maria: Aí eu lhe deixo livre para fazer o que quiser.
Matuto: (Examina o relógio) Apois então eu vou dar um prazo de dez minuto... E se ela não chegar será a vez
do Matuto!
O Matuto fica rondando de lá para cá, impaciente observando sempre o relógio. Maria, afastada num
canto, está tensa, nervosa, esperando a sua mãe sair de dentro da casa.

< CENA III>


- Zé e Candinha dentro de casa -
Zé: (Furioso, num grito) o que foi que tu disse? Repete, se for mulher.
Candinha: Eu repito se quiser. E falei para que ouvisse.
Zé: Agora deu a mulesta essa sua meninice! Então é verdade mesmo? Tu já sabia?
Candinha: Ela tem que se casar antes de virar titia.
Zé: Tu merece é uma pisa por tá me tratando assim... (Corre para pegar Maria) Mas eu vou bater é nela. Eu
bato porque eu sou ruim.
Candinha: (De frente ) Pra tu dar na nossa filha, vai ter que dar logo em mim.
Zé: E desde quando tu me impede de dar uma surra.
Candinha: O problema é que Maria berra, chora, peida e urra... (Chorosa) Não bate nela, meu Zé, por amor de
Jesus Cristo...
Zé: Não vem botar Jesus Cristo nisto, que não é dEle a culpa.
Candinha: Matuto traz um cavalo, leva ela na garupa... É nisso que vai findar se tu der nessa coitada, ela vai
fugir de nós no meio da madrugada.
Zé: Eu sei que ela não tá doida para disso ser capaz, sabendo que vou buscá-la, sabendo que vou atrás...
Candinha: Você tá é sendo injusto com nossa pobre Maria.
Zé: Injusto?? Injusto não, sou pai, sou protetor e sou guia.
Candinha: Pois eu volto a lhe dizer que você ta sendo injusto. Tá tentando a todo custo fazê-la mais infeliz.
Zé: Isso é você quem me diz, porque só fala besteira. O que eu já fiz por Maria, me custou a vida inteira!
Candinha: A vida inteira pra quê? Pra trazer desesperar? Maria tá feia e velha, só vive triste, com as “ânsia”...
Zé: Feiura ela sempre teve! Ou tu já esqueceu?
Candinha: Que seja feia, ta certo, porém mais feia sou eu e mesmo assim tu me quis e ainda casou comigo.
Zé: Mas isso foi um castigo que a natureza me deu, se eu me casei com você foi por querença de Deus.
Candinha: Querença de Deus o que! Ele mesmo é testemunha, se tu não tivesse eu, não tinha moça
nenhuma...Era mais feio que eu, de mim ganhava de dez...Era tão feio, mas tão, que vivia nos meus pés! Tu me
imploravas, pedia que nunca te abandonasse.
Zé: (Cínico) O que eu tava era querendo que tu se apaixonasse.
Candinha: E tudo isso pra quê? Pra que a gente se casasse?
Zé: (Mantendo o cinismo) Do jeito que sucedeu...
Candinha: Mas taí, no que deu: casou-se um feio e uma feia, só pra nascer uma menina que foi mais feia
ainda!
Zé: E tu ainda esperava que ela nascesse linda?
Candinha: (Insinuando...) Tu parece que gosta da feiura que ela tem...
Zé: Só pode! Porque assim nenhum malandro não vem pra dar golpe no meu dinheiro.
Candinha: O que eu sei é que o Matuto é um grande cavalheiro!
Zé: Um ladrãozinho dos grandes, isso é o que ele é!
Candinha: Pode pensar o que quiser, que essa é sua mania. Mas por mim, eu já aprovo que ele case com
Maria.
Zé: Tu ficou doida, Candinha? Aprovar essa desgraça! Seria o fim dos meus dias. Seria até uma trapaça que ela
me aprontaria.
Candinha: Pensar desse jeito assim só aumenta os seus pecados. Por isso que ela perdeu vinte e cinco
namorados.
Zé: Com esse, são vinte e seis.
Candinha: E certamente, talvez, vai ter casamento certo.
Zé: (Firme) Enquanto eu estiver aqui por perto não vai haver casamento! E ele nem ouse vir pedir meu
consentimento.

<CENA IV>
- Com Maria e o Matuto -

Matuto: (Olha o relógio) Dez minutos se passaram, o tempo já danou. E tua mãe com a resposta té agora num
chegou.
Maria: (Tranquila) Eu sei que ela vai chegar. É só ter mais paciência.
Matuto: Deixa da tua demência. Ta vendo que ela num vem!
Maria: Você quer tudo nas pressa. Pensa que mamãe é trem.
Matuto: Que é que tu tás pensando? Que eu vou furar a palavra? Eu jácontei dez minutos!
Maria: Ta certo. Eu não me alembrava.
Matuto: (Com nervosismo) Pois então eu vou agora e seja o que Deus quiser.
Maria: Tá se cagando de medo. A merda desce no pé.
Matuto: (Trêmulo) Ô mentira da mulesta! Está pensando que é festa?
Maria: (Zombeteira) Festa eu sei que não é. Só sei que cagas no pé.
Matuto: (Grita) Quer parar de me irritar e dizer que tou com medo?
Maria: Também tive um namorado que tinha o nome Alfredo... Era tão frouxo, mas tão, que tinha medo de
anão! E mesmo assim, feito tu, ficava um vai-mas-não-vai se cagando as pernas todas só pra falar com meu
pai...
Matuto: Pois vou mostrar a você e a esse Alfredo também, como é que se enfrenta um homem sem se sujar no
sedém
Maria: Dez minutos já está passado dos limite, até demais...
Matuto: Então não diz que sou frouxo, que sou mole ou incapaz...
Maria: Dez minutos se passaram. Mamãe não veio afinal. E tu, o que vai fazer pra enfrentar esse animal?
Matuto: Agora é tu quem já quer? Essa eu não compreendo.
Maria: Na verdade, eu já queira... Mas porém, eu não pretendo ver você falar com ele com essa merda
derretendo.
Matuto: (Irritadíssimo) O diabo que me carregue se eu tiver me cagando!
Maria: Ave Maria, se assossegue que tu já tá se afobando!
Matuto: Mas então, o que tu ta querendo que eu faça?
Maria: Que vá falar com meu pai sem querer fazer desgraça.
Matuto: (Entregando-se) Não! Não e não e não e não!!! O que importa é a limpeza que eu levo no coração!
Maria: (No mesmo ritmo) Oba! Oba e oba e oba e oba!!! Com essa valentia eu sinto um cio de loba!
Matuto: (Agarra-a) Vamos entrar abraçados e mostrar nossa independência.
Maria: (Rapidamente) É melhor que eu vá na frente: questão de conveniência.
Matuto: Pois seja o que Deus quiser. Vá logo na frente, mulher!
Maria: (Para na porta) Mas tem ainda uma coisa que é preciso combinar: tu fica aqui escutando e quando eu
espirrar...
Matuto: (Cortando) ...Eu fico esperando o espirro?
Maria: É bom porque nesse tempo tu perde o cheiro do “birro”...
Maria ri e sai, mangando dele. O Matuto fica só, examina o traseiro com as mãos, depois cheira uma das
mãos e abana-a no ar, fazendo careta.

<CENA V>
- Com Zé e Candinha -

Zé: ( Com um estouro) Candinha, tu é uma peste!


Candinha: Peste é você, meu José!
Zé: Não vê que nossa filhinha é moça que ninguém quer?
Candinha: Só porque ela é tão feia?
Zé: Mais feia que uma coruja, mais feia que um caboré. Qualé o homem que é doido? Qualé o homem, qualé?
Candinha: Ela cansou de sofrer. Já cansou de estar solteira.
Zé: Engano seu, ela tem uma juventude inteira.
Candinha: E o que tu vai fazer pra me tirar esse engano?
Zé: Vou matar esse matuto com o apoio dos meus manos.
Candinha: E enquanto isso, Maria atinge os quarenta anos.
Zé: Se ela não se casou é porque é muito feia.
Candinha: (Insinuante) É por causa de um mistério que não se desencandeia...
Zé: (Fica fulo de repente) Para de falar besteira! Que diabos tu quer dizer?
Candinha: Que feiura não empata, pois quem empata é você.
Zé: Pois então você me aponte alguém que engraçou-se dela... porque se eu não fosse esperto a gente se
desmantela!
Candinha: Se desmantela no que?
Zé: Nas garras desses bandidos que já passaram: esses vinte e cinco homens que com ela namoraram
Candinha: Não importa os vinte cinco, isso é coisa do passado. Importa é o que o Matuto está muito
apaixonado.
Zé: Apaixonado uma ova! Eu não acredito nisso enquanto não tiver prova.
Candinha: (Lamentando) Fazer uma desgraça dessa com uma solteira sofrida...que por causa de um pai ruim
já se apodrece na vida.
Zé: Sabe o que me dá mais raiva? É ver você dando o pé. É saber que eu nem posso contar com minha mulher.
(Com lamento) E é saber que essa besta que tá aqui na sua frente era o único inocente desse namoro
escondido...
Candinha: (Cínica): Há tempos eu já sabia. Você quem tava perdido.
Zé: (Fulo) Ai, que traição pai-dégua que vocês me aprontaram!
Candinha: Mas então, no que vai dar o casamento dos dois?
Zé: Só se for para roubarem meu feijão e meu arroz. (Com as mãos na cabeça) Ai, meu Deus! Estão querendo
acabar com meu roçado.
Candinha: Matuto não quer dinheiro. Ele está apaixonado.
Zé: Mas que apaixonado o que! Tu parece que não pensa...

<CENA VI>
- Com Zé, Candinha e Maria -

Maria: (Entrando): Estou chegando, meu pai, se o senhor me der licença.


Zé: (Pegando o cinturão) Dou licença, sim senhora. Você chegou bem na hora.
Maria: (Correndo) Ai, ai ai, mamãe me acuda que o meu pai está uma fera!
Candinha: (Tentando segurá-lo) Que pecado que ela fez para merecer seu desrepeito?
Zé: Abriu os botões da blusa pra ele pegar nos peito...
Maria: É mentira! É mentira! Pra isso eu não tenho espírito!
Zé: ...E depois abriu as pernas para mostrar o priquito...
Maria: (Com um grito) Aí, mamãe, tá vendo isso? Ô que vergonha profunda!
Zé: E ainda queres negar que ele pegou na bunda?
Maria: (Foge gritando) Ai, meu Deus, que eu não aguento!
Zé: E ainda foge correndo...com todo esse fingimento...
Zé corre para segui-la, mas Candinha impede.

<CENA VII>
- Com Zé, Candinha -
Candinha: (Impedindo-o) pra onde você quer ir?
Zé : Se essa nojenta fugir vai ser você quem eu mato.
Candinha: Ela apenas foi para o quarto de certo não vai embora.
Zé: Saia da frente, Candinha senão você me estopora!
Candinha: Daqui eu não saio não. Não tenho medo de ti e nem do teu cinturão.
Zé: Ai ai ai...mas que tragédia! O que foi que me fizeram? Nem faço contas da média das pragas que me
trouxeram.
Candinha: Acho melhor se acalmar para a gente conversar.
Zé; (Sinistro) Arreda... Contudo não quero conversa você já fez muita merda, e a morte chama depressa.
Candinha: (Desconfiada) O que foi que você disse? Que história é essa de... morte?
Zé: É tudo o que há de forte... e ela está na própria vida...
Candinha: O que? O que é que está na vida, o que que está?
Zé: (Discretamente sofrendo) Você além de ser feia é tão burro de amargar...
Candinha: (Com desdém) Você está com história!
Zé: (Atormentado) Querem fuzilar meu peito, apagar minha memória... Pois se fuzilo meu peotp e acabo com
a consciência, eu deixarei de sentir aquilo que é imprudência.
Candinha: Mas que consciência o que! Isso é coisa que você nunca teve, nunca tem.
Zé: (Acordando) Que foi que você disse? Que diabos tu disse, hein?
Candinha: (estranhando) Mas afinal, o que há? Onde era que tu tava?
Zé: (Volta a ficar valente) Cadê essa vagabunda? Cadê Maria essa escrava?
Candinha (Toma a frente) Nesse quarto não entra...
Zé: Se tu entrares no quarto...
Zé: Maria vai se lascar!
Candinha: Quero ver quem pode mais de nós dois, quem é que pode.
Zé: Candinha, tu é mais braba que um rebanho de bode.
Candinha: Pois está com medo agora? Já percebeu que eu sou quente?
Zé: Eu percebi sim senhora: mas tu vai sair da frente.
Candinha: Com que autoridade tu toma essa decisão?
Zé: É porque eu estou armado aqui com meu cinturão.
Candinha: (Com advertência) Mas não se esqueça que eu tenho a minha arma também...
Zé: (Debochado) Mas que arma, que eu não vejo? Pois nem arma você tem.
Candinha: (Séria, grave) Aquela, com que uma vez eu te transformei num caco...
Zé: (Lembra e se afasta) Ai, meu Deus mas é verdade! É a cantiga do sovaco!
Candinha: (Ergue o braço) Se lembra agora, macaco?
Zé: (Tapando o nariz) Abaixa essa porcaria que eu já sinto uma coisa ruim... Com esse teu cheiro maldito eu
espirro... eu faço... aaaatchim...
Zé espirra alto ocasional entrada do matuto.

<CENA VIII>
- Com Zé e Candinha e Matuto –

Matuto: (Entra num salto) Eu estava ali na porta e ouvi Maria espirrar isso é sinal que já era a minha hora de
entrar.
Zé: (Grita) Mas afinal o que é que você faz aqui dentro?
Candinha: Cale essa boca, José. Matuto vem para o centro
Zé: Mas para o centro de quê?

Matuto: Onde é que está a Maria?


Candinha: Está deitada lá no quarto pois sofreu uma agonia.
Matuto: (Preocupado) Maria está doente?
Zé: (Brusco) Está sofrendo de hemorroia menopausa e dor de dente.
Candinha: Não seja maleducado! Mentira. Ele está mentindo.
Matuto: Ufa. Não sabe a preocupação que eu já estava sentindo.
Zé: Quem mandou tu entrar para me causar esse... “acirro”r ?
Matuto: Me desculpe eu só entrei porque houve um espirro. Agora, se me permite mostrar-lhe um erro que fez,
dizendo palavra errada o senhor é meu freguês.
Zé: Essa agora é muito boa: ele querer corrigir meu erro de português!
Matuto: O senhor falou “acirro” e o certo é acirramento... (A Candinha, num sopro) com esta, será que ele já
permite o casamento??
Zé: Alto lá, que eu não errei! Essa é boa, ora é essa! O erro de português é culpa do autor da peça.
Candinha: Alto lá, que essa agora, Candinha é quem não consente: Não culpe o autor da peça, que ele agora
está ausente.
Zé: Mas ele me fez errar. Me fez dizer esse “acirro” só por falta de palavra para rimar com “espirro”.
Candinha: Eu acho que o momento não é para falar disto...
Zé: Ai meu Deus, meu Santo Cristo, lá vem Candinha de novo... se falar em casamento, eu vou te dar um
esporro!
Candinha: (Forte) Pois se cuide para falar. Se cuide, se não cuidou.
Matuto: (Impaciente) Afinal, cadê Maria? Afinal, quem espirrou?
Zé: Isso aqui não lhe interessa. Não importa saber quem. Se Candinha erguer o braço tu vais espirrar também.
Candinha: (Tapando o nariz) Pois nem erguendo eu estou e sinto um cheiro bem ruim... um cheiro desses que
a gente não resiste e faz a aaaatchim!
Fica espirrando, tapando o nariz.
Matuto: (Sem entender) O que foi, dona Candinha? Que espirro feio foi este?
Candinha: (Enxotando-o) Saia de perto de mim... ô catinga do cacete!
Matuto: Mas finalmente, o que foi?
Candinha: Não foi nada Não tão sério... É só um peido de “piôi”.
Zé: Peido de “piôi” Que nada! Quem já viu o piôi peidar? É cheiro de bosta mesmo, e pior do que um gambá.
Candinha: (Sufocada) Vá pra lá, Matuto, vai... não vem para perto de mim! Esse teu cheiro é tão podre que eu
faço de novo aaatchim!
(E espirra, espirra)
Matuto: (Não entende nada) Mas que tanto espirro é esse? Será que é festival?
Candinha: O que eu acho, é que alguém está com intestino mal...
Espirros... O Matuto olha perplexo.
Matuto: Cês vão é se sufocar de tanto tapar o nariz.
Candinha: (Voz nasalada) Corre lá fora, Matuto: se lave no chafariz.
Zé: Eu acho é bem empregado, que é para você aprender que esses noivos de Maria só servem para feder.
Matuto: (Confuso) Ô meu Deus, me digam logo que está acontecendo.
Candinha: O problema é que você está fedido, está fedendo.
Matuto: (Lembrando) Ai meu Deus, Oh que vergonha! Minha vergonha redobra.
Candinha: Fede mais do que gambá.
Zé: Mais do que peido de sogra.
Matuto: Pois eu vou me retirar. Desculpem pelo vexame.
Zé: Vá correndo para um médico. Aproveite e faça exame.
Matuto: Para que, se eu não estou doente?
Candinha: Tudo o que você precisa é de um banho muito quente. (Aponta uma porta) Entre ali no meu
banheiro e se banhe e volte feliz.
Zé: Mas que intimidade é essa? Lá fora tem chafariz.
Candinha: Ele vai é para o banheiro. Sou eu quem estou mandando... anda depressa, Matuto. Que diabos está
esperando?
Matuto vai.

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