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Palavra da Direção

A mística da página em branco cria diferentes reações nos indivíduos. A arte de


escrever encontra entusiastas, simpatizantes ou resistentes, dependendo de como
lidam com a possibilidade de criar mundos, descortinar horizontes, conciliar
criatividade e fundamento, imaginário e racional. Desenhar palavras que
multiplicam ideias está longe de ser consenso entre seus produtores.

Muitos praticam a escrita como uma necessidade ou desejo cotidianos e assimilam


muito bem o tanto de transpiração que ela exige. Outros dispõem-se a aprender a
vivenciá-la, buscam caminhos para o aprimoramento e resistem à lei do menor
esforço. Terceiros só escrevem movidos por obrigação ou funcionalidade. À Escola
compete saber canalizar potencialidades para que as duas primeiras perspectivas
se sobreponham à última.

Se ler é apropriar-se dos pensamentos dos outros, escrever é dar vazão às próprias
ideias. É fazer escolhas e selecionar focos; estabelecer conexões, ampliações e
extrapolações; é firmar-se como sujeito histórico e atribuir funções sociais às
linguagens. É buscar o fio da meada para aquilo que está dispersivo ou só ensaiado
em nossa mente. É esforçar-se para alcançar o outro e fazê-lo exercitar a escuta, a
partir dos ecos que emanam de nós.

Sem tirar o mérito da produção de texto como atividade transversal nos diferentes
componentes do currículo e campos do conhecimento, é necessário que as escolas
invistam na expressão diferenciada: concursos de redação ou trabalhos de autoria;
exercícios criativos ou ensaios de pensamento. É preciso criar escritores autônomos
e ousados, capazes de andar com as próprias letras. Escritores de verdade que não
se limitem aos muros da escola ou à escrita pragmática; que exercitem e
reinventem gêneros ou estilos.

A presente coletânea reúne os textos vencedores do concurso de redação aplicado no


âmbito do Fundamental II e Médio, o que demandou um trabalho extraclasse de
planejamento, consecução, realinhamento e que valeu a pena pelos frutos colhidos.
Com vocês, as vozes de jovens talentos que potencializam a escrita nossa de cada
dia e ampliam as suas/nossas percepções de mundo. Eis uma contribuição que
pretende inspirar outros estudantes a praticarem a escrita voluntária: aquela que
brota da soma dos desejos, intenções e ideais de cada produtor. Que o ciclo não se
feche por aqui.

Maria Helena Salviato Biasutti Pignaton


Diretora Pedagógica
Índice

NÍVEL I
DESCOBRINDO A BRASILEIRATURA (Francisco Moreira Cardoso Mori Vieira). 10
A AVENTURA NO SERTÃO DE GUIMARÃES ROSA (Victoria Brumatti Neri)...... 12
ENCONTRO INESPERADO (Lais Coutinho Passamani )....................................... 14

NÍVEL II
O TRIUNFO DO SOL (Isabella Dias Torezani)......................................................... 17
PESADELOS REAIS (Malu Trés de Carvalho Abaurre)................................................. 19
NÃO PRECISA SER FÍSICO (Enzo Rafael Gonçalves Premoli).................................. 21

NÍVEL III
ESCOLA DA VIDA (João Paulo Bravo Colonnese).................................................. 23
A DESCOBERTA DO VERDADEIRO AMOR (Isabela Cavatte De Nadai)............. 24
A RESILIÊNCIA DE UMA FAMÍLIA (Victoria Bressan)........................................... 25

NÍVEL IV
A EXPOSIÇÃO DE UM NOVO MUNDO (Juliana Faria Littig).................................. 28
XEQUE-MATE (Catarina Barros Bastos Santos)..................................................... 30
QUANDO O CAFÉ ESFRIA (Ludmila Yamaguti Rios Barreto)..................................... 32

NÍVEL V
EDOM (Larah Lethícia Dias Pastro).......................................................................... 35
O VERDADEIRO MOTIVO DA GUERRA É A PAZ? (Regina Zocolotti Dórea)....... 36
DIÁRIO (Alex Marinho Cardoso)................................................................................... 37

CENTRO EDUCACIONAL
LEONARDO DA VINCI

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Diretora
Maria Helena Salviato Biasutti Pignaton

Edição/Diagramação/Impressão
Setor de Eventos e Edição & Gráfica Da Vinci
Tiragem: 80 exemplares
Nível I Comentários

“Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão
sempre iguais, ainda não foram terminadas — mas que elas vão sempre mudando.”

A frase acima foi escrita por Guimarães Rosa, um dos maiores escritores da literatura
brasileira, em sua belíssima obra “Grande Sertão: Veredas”.

Foi por acreditar que os textos, assim como as pessoas, estão sempre em construção
que os alunos dos sextos anos de 2019 aceitaram o convite de participar do Concurso
de Redação. Neste ano, o desafio deles era produzir narrativas que refletissem a vida e
a obra (com toda a sua complexidade) desse importante escritor brasileiro de Minas
Gerais.

Após muitos estudos realizados nas aulas de Português e de Literatura, os alunos


foram estimulados a produzir narrativas que tivessem como cenário a pequena cidade
mineira de Cordisburgo, terra natal do escritor. Além disso, deveriam inserir em seus
textos importantes personagens de suas obras, bem como a linguagem característica
do sertão e os seus famosos neologismos.

Nossos vencedores embarcaram nessa tarefa com muita alegria e empolgação e


produziram narrativas divertidas e emocionantes. Em todas elas, aparece um dos
maiores personagens criados por Guimarães Rosa, o garoto Miguilim.

Francisco, nosso primeiro colocado, escreveu sua narrativa de forma muito


espontânea e bem-humorada, refletindo o falar mineiro e criando neologismos assim
como nosso famoso autor. Em sua narrativa, feita em 1ª pessoa, o personagem
Francisco se encontra com Miguilim e, mais tarde, é o próprio autor, ainda menino,
que também aparece nessa emocionante história.

Victória, nossa segunda colocada, também elaborou seu texto de forma bem-
humorada e nos contou a divertida aventura de Miguilim indo para a escola.

Laís, nossa terceira colocada, produziu uma narrativa em que o personagem principal
não conhecia a obra de Guimarães Rosa, mas teve a bela oportunidade de aprender
muitas coisas ao lado de uma grande pessoa: o garoto Miguilim.

Dialogando com Rosa em sua mais importante obra, podemos dizer que a vida é uma
travessia e que, muitas vezes, sentimos medo nesse caminho. Queremos dar nossos
parabéns a todos os alunos que, apesar do medo, entenderam que é no caminho que a
vida se constrói, perceberam que é no processo que as aprendizagens acontecem e, por
isso, aceitaram participar dessa travessia pelo mundo da escrita.

Luciana de Andrade Padilha


Professora orientadora dos alunos do Nível I

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1º lugar - Francisco Moreira Cardoso Mori Vieira - 6º ano I1

DESCOBRINDO A BRASILEIRATURA

Prezado João Guimarães Rosa,


Olá, me chamo Francisco, tenho 11 anos e moro com minha família em Beagá.
Nas últimas férias, fui visitar minha maternília, que vive em Cordisburgo. Eu não gostei
nem um pouquinho de ir àquele findimundo, pois lá só existem coisas velhas que os
turistas vão visitar, construídas quando meu voím sequer havia nascido.
Recebi dos meus pais informações de que o senhor havia nascido lá e que fora uma
pessoa muito importante para a brasileiratura. Como não gostava de ler, nem liguei. Até
ali, não sabia nada sobre sua história.
Na minha casa, brinco que vivemos sob o regime de Priscilocracia, em que minha mãe,
Priscila, nos obriga a fazer diversas atividades. Uma delas foi ir logo cedo à Biblioteca
Pública Riobaldo e Diadorim que, como o senhor obviamente sabe, fica perto da casa
onde viveu durante parte da sua infância. Hoje em dia é um museu e parecia um
pessoeiro de tão cheio.
Quando cheguei à tal biblioteca, encontrei um serumaninho com dificuldade em pegar um
livro, devido à sua altura. Conversamos e ele me disse que seu nome era Miguilim e que
era um personagem criado por Rosa.
Fiquei confuso, perguntei quem era essa tal Rosa e ele deu uma testada na própria mão,
dizendo pausadamente: Jo-ão Gui-ma-rães Ro-sa. Foi aí que eu lembrei do senhor e fiz
outras tantas perguntas – menos lamentáveis.
– Inventado?!
E ele se explicou:
– Eu ganhei vida quando meu criador morreu.
Ainda mais confuso, indaguei:
– ESTOU CONVERSANDO COM UM PERSONAGEM DE UM LIVRO QUE GANHOU
VIDA?!?!?
Minha expressão de surpresa devia ser bem nítida e Miguilim pediu que eu sentasse e me
acalmasse.
Já melhor, decidi ignorar o recente choque de estar conversando com o personagem de
um livro e decidi permanecer com ele, que parecia bem gentil.
Logo o susto foi dando lugar à curiosidade.
– Como é ser um personagem de uma história?
– Não é tão bom, porque a história não sou eu que crio e, assim, já está tudo definido e eu
não posso mudar o desfecho. Não há aquele suspense gostoso, aquela vontade de
querer descobrir o que ocorrerá – disse ele.
E continuou, agora me questionando:
– Você gosta de ler quais tipos de livros?

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Nível I

– Ah, eu tenho leiturofobia! E antes que você me pergunte o que estou fazendo aqui, em
uma biblioteca, sem gostar de ler – respondi – fui obrigado pela minha mãe.
Após discutirmos os (des)prazeres da leitura, Miguilim me convenceu a levar um livro
escrito pelo senhor e combinou de me encontrar no Stones Zoo, no dia seguinte. Disse
também que levaria consigo João, Joãozinho, Joãozito.
Cheguei ao local muito empolgado, cadiquê eu havia gostado muito do que li e estava
ansioso para conhecer os outros três novos amigos que Miguilim me apresentaria
naquela cidade.
Entrei no parque, avistei Miguilim e acenei. Ele veio em minha direção e me apresentou
um menino como sendo “João: o menino encantado”. Ainda entusiasmado, perguntei:
– Legal! Vamos encontrar os outros?!
– Que outros? – Indagou João.
– Joãozinho e Joãozito, uai!
Os dois começaram uma risaiada sem fim e eu ali, panguando, sem entender a graça.
– João, Joãozinho e Joãozito são uma pessoa só, hahaahhaha. Também personagem de
Guimarães Rosa.
Só me restou rir junto! E seguimos pelo passeio conversando sobre os livros que lemos e
um pouco sobre música. João adorava música! Foi uma tarde inesquecível.
É, “seu Rosa”, o senhor adoraria ter conhecido aquele tal João. Na despedida, eu
agradeci ao Miguilim por ter mudado minha visão sobre a leitura e João disse uma frase
que guardarei comigo para sempre:
“O importante e bonito do mundo é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda
não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam.”
Uma boniteza, não?
Rosa, o objetivo desta carta é te agradecer por mudar minha vida, meu futuro e minhas
opiniões através do seu livro. Sinto que foi escrito por um ícone da Brasileiratura, o
senhor. E agradeço, além desta experiência que tive, por poder conhecer novas pessoas.
Obrigado por tornar a nossa literatura brasileira diferente, específica. E tenho certeza de
que o meu coração não foi o único que o senhor tocou. Sinto que, naquele dia, eu o
conheci.
Obrigado,
Francisco

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2º lugar - Victoria Brumatti Neri - 6º ano I2

A AVENTURA NO SERTÃO DE GUIMARÃES ROSA

Querido Guimarães Rosa,


Você provavelmente deve estar se perguntando: “o que
essa menina quer falar comigo?” Então, eu vou te
explicar... Meu nome é Victoria e eu queria compartilhar
uma aventura minha que, creio, possa te interessar.
Eu estava a migué nas minhas férias de julho e a minha
família já estava planejando o que iríamos fazer e para
onde viajar. Até que minha mãe, inteligente que só e que
ama ler, cismou que queria ir para uma cidadezinha láaaaa
no interior de Minas, onde o senhor nasceu... qual é o nome
mesmo...ah! Lembrei! CORDISBURGO! Ô nome difícil,
hein? Mas voltando ao assunto, ela queria ir para lá porque
é uma grande fã da sua forma de escrever e de suas
malucas palavras. Além de que, ela me fez ler a maioria de
seus livros, mas eu até que gostei! E depois meu pai me
deixou abirobada das ideias falando que ia ser maravilhosa
a experiência, que ia me deixar mais conectada com a
natureza e com o sertão e etc... Então, como perdi de dois a um, tive que ir à viagem. Eu
pensei que fosse ser a mais chata e entediante de toda a minha vida, mas foi a mais
emocionante e divertida dela!
Meus pais estavam muito animados e logo compraram as passagens, fizeram a reserva
em uma pousada chamada Pousada Sol Nascente, que fica a 17,5 km de Cordisburgo.
Partimos no dia 10 de julho de 2018 bem cedinho e chegamos lá por volta de 12h30min.
Então, como estávamos com muita fome, fomos comer em um restaurante mineiro
perto do aeroporto e, logo após isso, demos uma volta pela cidade de Cordisburgo para
conhecer. Depois, fomos para o hotel, jantamos e dormimos. Foi no outro dia que a
aventura começou. O céu estava nublado e parecia que ia começar a chover, mas nada
estragaria os nossos planos. Nós fomos ao Museu Casa Guimarães Rosa e, como eu
tinha acordado cedo, estava com muito sono. Quando chegamos lá, meus pais ficaram
tão entretidos e fascinados com o museu que, um dia, fora sua casa, que nem
perceberam que eu havia saído para explorar. Vi muita coisa!!! Trezentas toneladas de
livros, sua antiga máquina de escrever, quartos, roupas, cozinha e etc. Depois de um
tempão rodando o local, com a chuva só aumentando, fiquei cansada e dormi com o
barulho da chuva em meus ouvidos totalmente relaxados. Meus pais nem se deram
conta de que eu havia ficado lá e foram embora.
Enquanto dormia, a chuva engrossou e começaram raios e trovões, até que um
ATINGIU SUA CASA e fez uma barulheira que me acordou... Quando olhei em volta de
mim, pensei que estivesse delirando, vi com esses meus dois olhinhos QUE TODOS
OS SEUS PERSONAGENS QUE ESTAVAM NO MUSEU TINHAM GANHADO VIDA!!!
Eu fiquei perplexa e sem palavras, só observando quem estava ao meu redor: Fita
Verde, Manuelzão, Riobaldo, entre outros. Até que um garoto surgiu da multidão e
disse:

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Nível I

– Oi. Quem é você, de onde você veio e o que você quer aqui?
– Oi! Eu estava passeando pelo museu e adormeci, então meus pais me esqueceram
aqui! Garoto... eu acho que te conheço de algum lugar...
– Claro que sim! Sou Miguilim, o personagem mais famoso de Guimaraes Rosa. Eu sou
muito parecido com meu criador quando criança, tenho uma família grande, amo a
natureza, animais e ler!
– Ah! Obrigada pela biografia à parte! Mas de tudo isso, você, por um acaso, já
aventurou-se fora dos livros? Veio para o mundo real?
– Nunca! Meu lugar é nos livros! Mas eu sempre quis!
– Então, você gostaria de vir comigo para a cidade grande? Isso só funcionaria se você
conseguisse, com a energia do raio, entrar de novo no livro e aí depois você poderia
voltar para cá pelo correio! Que tal?
– Sim, Sim, Simmmmmmm!!!!! Vamos logo!
Depois de alguns dias, voltei para casa com Miguilim escondido, ainda bem que meus
pais não suspeitaram de nada! As aulas voltaram e eu levei-o à escola, mas descobri
que só crianças conseguiam vê-lo e, então, apresentei ele aos meus amigos como um
primo mágico que viera passar um tempo comigo, porém eles não acreditaram. Quando
meus amigos falaram do MIguelim para a professora, ela achou que eles estavam
ficando loucos e que não tinha nenhum aluno novo!! Foi uma bagunça e todos ficaram
assombrados e eles realmente acharam que ele era um mágico que ficava invisível!!
Levei ele também ao shopping, ao parque, ao cinema, e etc.!! Foi muito top!! Nunca me
diverti tanto! Até que tive que mandar o livro de volta para o museu porque ele estava
com saudade de seus amigos.
Essa foi a minha aventura! Gostou? Espero que sim! Mas, Guimarães, gostaria de te
agradecer por ser esse esplêndido e enigmático escritor que criou esse maravilhoso
personagem chamado Miguilim (como todos os outros). Além disso, eu e Fita Verde
ficamos muito amigas! Obrigada por tudo!
Com carinho,
Victoria Neri.

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3º lugar - Lais Coutinho Passamani - 6º ano A

ENCONTRO INESPERADO

Vitória, 3 de abril de 2019


Caro João Guimarães Rosa,
Meu nome é Laís e tenho 13 anos. Sou uma menina que não conhecia suas obras, mas
isso mudou após minha viagem a Cordisburgo.
Há algumas semanas, meus pais decidiram fazer uma viagem para o interior de Minas
Gerais, para essa cidadezinha chamada Cordisburgo.
Quando cheguei ao lugar, fui visitar uma biblioteca que se chamava Guimarães Rosa,
um nome que nunca havia escutado na vida. No momento em que entrei no local, fiquei
fascinada quando vi tantos livros. E, no meio de tanta livrada, no fundo de uma
prateleira, encontrei um livro. Um tal chamado Miguilin. Eu, que sempre amei ler, me
sentei em um banco e, quando abri o livro, algo bizarro aconteceu: um menininho, que
parecia ter a metade do meu tamanho, saiu de uma das ilustrações e foi parar do meu
lado, como um menino de verdade. Eu pulei da cadeira! Como isso poderia ter
acontecido? Essa é uma pergunta que ainda não sei responder. A única coisa que sei foi
que o menino começou a falar, falar e falar. E ele não parava. Quando eu finalmente
consegui interromper o garoto, perguntei o que estava acontecendo. Ele explicou tudo o
que já havia falado com mais calma:
– Meu nome é Miguilin. Sou um personagem muito famoso de um escritor mais famoso
ainda, chamado João Guimarães Rosa. E o seu nome, qual é?
– Meu nome é Laís – respondi.
Depois de longa conversa, ele me chamou para fazer um passeio pela cidade, e eu, que
sou muito curiosa, aceitei. Visitamos vários lugares, mas o do que eu mais gostei foi o
seu museu. Nele, pude conhecer um pouco mais sobre você, pois, na verdade, quem
me contou a maioria das coisas foi o Miguilin. Foi muito divertido fazer um passeio em
seu museu e mergulhar em sua vida por alguns minutos. Miguilin, para me dar algo para
guardar de recordação, tirou uma pena do bolso e me deu. Perguntei para ele o que era
aquilo e ele me respondeu que tinha sido com aquela pena que João Guimarães Rosa
escreveu o livro Miguilin. Fiquei muito feliz, pois nunca imaginava que ganharia um
presente como este. Eu amei esse passeio.

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Nível I

Ah!, já ia me esquecendo de te contar como nossas aventuras acabaram. No último dia


de minha viagem, Miguilin me contou uma notícia tristemente triste: ele iria voltar para
seu livro. Quando ele me contou isso, eu me decepcionei. Queria levá-lo comigo para
minha cidade, mas ele me disse que precisava ficar lá para que outras pessoas como eu
pudessem ler seu livro. Eu concordei, mesmo me sentindo triste, e disse para ele que eu
iria levá-lo para a biblioteca. Quando encontrei o livro, deixei ele aberto em cima de uma
mesa e fiz um sinal dizendo que Miguilin já podia ir, mas fui surpreendida com um forte
abraço. Logo depois, o personagem me disse que iria sentir muita saudade e, quando
eu voltasse para Cordisburgo, eu deveria visitar novamente a biblioteca, pegar o livro
Miguilin e dar três toques na capa dura. Desse modo, ele poderia me identificar e sair do
livro para vivermos muitas outras aventuras inesquecíveis.
Após a leitura desta bela obra, passei a admirar muito seu trabalho e sua contribuição
para a literatura brasileira.

Com muito carinho,


Laís Coutinho Passamani.

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Nível II Comentários

Inspirados pelas reflexões provocadas pela leitura do livro Frankenstein, os alunos


vencedores do concurso de redação de 2019 também deram, tal qual faz Vitor
Frankenstein na obra citada, vida a um monstro. Assumindo um lugar autoral
semelhante a de um cientista, em textos metaforicamente ricos, os alunos-escritores
trouxeram à luz criaturas de tinta e papel que se sobrepõem ao texto e nos evocam,
enquanto leitores, a questionar que espécie de monstros temos alimentado em nossas
vidas. Em tons filosóficos, nos colocaram diante de personagens que poderiam, com
muita facilidade, ser alguém com quem convivemos (ou inclusive nós mesmos), como
um estudante em busca de um tema para sua redação escolar, uma garota que não se
encaixa nos padrões estéticos socialmente estabelecidos ou uma mulher atordoada por
seus próprios pensamentos e pesadelos. Narram, a partir deles, situações tão
cotidianas e comuns que não nos permitem ver suas monstruosidades: é assim que
vem à tona a violência que rodeia nossas vidas, o bullying que praticamos (ou do qual
somos cúmplices) com nossos pares e o vício provocado por aparelhos celulares.

É inevitável não notar a mistura que se dá, nos textos selecionados, entre criador e
criatura. Ao trazerem fatos tão próximos de suas rotinas, cada um dos discentes
evidenciou, através da escrita literária, o papel que a leitura e a literatura têm
assumido em sua vida: o de possibilitar uma reflexão sobre si mesmo, sobre o outro e
sobre o mundo.

Rafaela Skarlaty Lócio Dantas


Professora orientadora dos alunos dos Nível II

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1º lugar - Isabella Dias Torezani - 7º ano I2

O TRIUNFO DO SOL

O relógio marcava 02:02. Mais uma madrugada em que Jonnhy, por mais que tentasse,
não conseguia dormir. Em outro bairro, disparadamente mais rico, Sam, outra
adolescente da mesma idade também se virava na cama, incapaz de pegar no sono. Os
dois pelo mesmo motivo: pela culpa, choque, arrependimento.
Tudo começou quando Dora passou a faltar a escola por dias. Não haviam notícias e Sam
e Jonnhy sentiam falta de sua vítima favorita. A gorda, feia e esquisita jovem deixava em
aberto significantes momentos dos intervalos, pois as humilhações dos colegas atingiam
seu auge. Mesmo assim, não perguntavam por ela, não se davam ao trabalho de se
importar.
Até que o coordenador pedagógico entrou na sala de Dora e relatou para a turma o que
estava acontecendo. A garota estava internada. Corações saltitaram, esperando pelo
motivo, ansiosos pelo desfecho da novidade. Coisa boa não era. Tentativa de suicídio, e
Dora precisava ficar sobre vigilância constante. Disseram que sua depressão era
extremamente grave. O problema era que ninguém desconfiara de seu estado, até
descobrirem o que ela tentara fazer...
Tudo bem, Sam, por exemplo, após machucá-la falando sobre sua condição física,
pensava um pouco sobre como estaria seu real psicológico. Dora nunca rebatia ou se
defendia, parecia não se importar muito, e isso irritava furtivamente a Sam, que só piorava
as humilhações. Já Jonnhy nunca parava para pensar sobre como ela se sentia quando a
xingava ou mesmo jogava comida nela, um ato que provocava risadas e o fazia se sentir
superior.
E agora, os dois monstros, que carregavam em si corações podres e pesados, eram
sufocados pela culpa e sentiam cada parte dos seus corpos “perfeitos” doerem de
preocupação. Deixaram a colega chegar àquele estado deprimente, desejando a própria
morte, forçando seus órgãos a pararem de funcionar para que tudo, por favor, acabasse
logo, para que o sofrimento cessasse e a vida chegasse ao fim.
Enquanto tinham esses pensamentos insanos, uma terceira pessoa também não
conseguia dormir. Em uma clínica psiquiátrica, sendo discretamente vigiada por
enfermeiras, estava Dora, a própria, pensando nos últimos anos. Difíceis últimos anos,
rodeados por dor, lágrimas e fingimentos. “Está tudo bem”, falava para a mãe. “Não tem
problema, eu não me importo”, repetia para os professores. Todos inocentes do
sofrimento interno da garota.
As horas se passaram, a madrugava andava sem pressa, e Dora continuava pensando,
refletindo. Agora estava ali, em uma cama de hospital, sendo vigiada. Continuava
deprimida, mas agora, outro sentimento a invadia: confusão. Tentara tirar a própria vida,
alguns dias atrás, mas a tentativa fora falha. “Por quê?” Ela se perguntava. Seria isso um
sinal? Uma segunda chance? Uma nova oportunidade de seguir em frente, de uma
maneira melhor, mais feliz, esperançosa?
Dora passou a noite acordada, ainda pensando no rumo que sua vida levaria dali a diante.
Finalmente, o sol começou a raiar, e um breve facho de luz iluminou o quarto escuro. Os
últimos dias passaram abundantes de chuva, com gotas violentas, fortes e barulhentas.
Por isso, a improvável presença do sol surpreendeu Dora, que encarou aquilo como algo
parecido com sua derrota na tentativa de suicídio. O sol ganhara uma outra chance de
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NÍVEL II

brilhar, pois as nuvens cinzas carregadas de água entenderam que já bastava, que era
hora de parar, que aquelas gotas maldosas causavam destruição e traziam coisas ruins
se lançadas daquela forma. Com aquele pensamento, Dora finalmente caiu no sono.
E um mês se passou.

Em uma manhã ensolarada de segunda-feira, em uma escola onde muitos adolescentes


resmungavam de sono, ela estava de volta. O peso corporal não mudara, e não havia
nada em sua aparência que apontava diferenças do visual que a fazia ser tratada mal
anteriormente. Mas havia, sim, mudanças.
Enquanto Dora andava na direção de sua sala de aula, a mesma antiga e má turma, ela
não hesitava. A cabeça estava erguida, a potência de confiança, reabastecida. Nada mais
poderia atingi-la, nem mesmo os olhares, comentários, brincadeiras. Não aprendera a
conviver com, aprendera a vencer aquele tipo de pessoa e de comportamento. Era uma
nova Dora, mais resistente, forte, que não se deixava abalar por nada mais.
Porque era do jeito que era. Era mesmo gorda, mas se sentia bem com isso, não existiam
mais problemas.
De repente, chegaram Sam e Jonnhy, ainda com feições sombrias, que logo se
surpreenderam ao encarar a garota. Sem relutância, foram ao encontro dela e vomitaram
pedidos de desculpa enormes, jogando todo o orgulho fora.
Dora se manteve intacta, quase com vontade de lançar uma gargalhada divertida e dizer
que estava tudo bem. Só não era bem assim...
“Eu não preciso de seus pedidos de desculpa”, disse ela, tentando não soar arrogante.
“Agora, o mínimo que os dois podem fazer é manterem os comentários negativos em
relação a alguém para si mesmos. Com eles, apenas se machuca, se destrói, causa
problemas. Agora, se me dão licença...”
Dora passou pelos dois, e sentou-se em sua cadeira, pronta para o dia, pronta para a nova
vida que estava começando. Pois ela, enfim, aprendera que, por mais que ele parecesse
maior, mais forte, e muitas vezes indestrutível, o monstro pode ser derrotado, os maus
momentos esquecidos e o bullying, vencido.

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2º lugar - Malu Trés de Carvalho Abaurre - 7º ano I2

PESADELOS REAIS

Era uma noite sombria, raios e trovões davam vida a ela. Chuva e mais chuva. Dormir
estava sendo um desafio para mim, o medo me atacava, não sabia por que nunca, em
vinte anos de minha existência, tive medo desse horrível fenômeno. Aquele dia em
especial, meus pensamentos estavam diferentes, só vinham lembranças ruins em
minha cabeça, como a morte de meu pai e minha cirurgia.
Quando me dei conta, já estava há horas deitada em minha cama. Pensamentos e
mais pensamentos. O que seria aquilo? Naquele momento não me preocupei, mesmo
parecendo que um monstro me atacava, lembrei que tinha tido um longo e cansativo
dia na faculdade, e ainda aquela horrenda chuva. Devia ser isso que estava me
deixando desse jeito, totalmente pessimista em relação à vida.
Minutos e mais minutos. O tempo estava passando e eu não conseguia dormir. Estava
cansada. No meio de meus pensamentos o sono foi aparecendo, cada vez mais forte,
até que fechei meus olhos. Estava dormindo.
De repente, pesadelos e mais pesadelos. Eu saía na rua e, quando olhava para as
pessoas, as via segurando objetos que eu não sabia o que eram. Vários diferentes,
mas todos pareciam ter a mesma função. As pessoas não conversavam, nem sequer
olhavam uma para a cara da outra. E quando eu olhava bem lá no fundo, via uma
espécie de monstro. Era gigante. Era feio. Dava medo.
Meus olhos se abriram. Fiquei feliz, pois estava apenas em um pesadelo. Tomei um
pouco de água e imediatamente voltei a dormir.
Pesadelos e mais pesadelos. Aquele monstro não saía da minha visão. Parecia que
era dele que saíam todos aqueles objetos. Eu fiquei curiosa, por isso cheguei mais
perto para ver, tive a sensação de que o monstro me puxava e me estimulava a ir em
sua direção.
TRIM! TRIM! O despertador tocou. Eu acordei. Já estava na hora de me arrumar para a
faculdade.
Depois de todos aqueles pesadelos, não parava de pensar naquilo, me incomodava,
me deixava intrigada. Dias foram passando. Aquilo saiu um pouco da minha cabeça.
Eu ainda me sentia um pouco estranha, mas não me atrapalhava tanto como antes.
Para falar bem a verdade, eu nem estava ligando tanto para isso.
Dias, meses, anos. O tempo estava passando, minha vida estava acabando. Quando
completei quarenta anos, descobri que estava doente e, a partir daquele momento, eu
não poderia mais sair de casa até que me curasse.
Depois de quinze anos, finalmente me curei. Foram os piores anos da minha vida, tudo
o que eu mais queria era sair, conversar e me sentir livre, mas a única coisa que eu
fazia era dormir, ler e ficar deitada em minha cama, me levantando apenas para ir ao
banheiro ou à cozinha.

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NÍVEL II

Não aguentava mais ficar em casa e, quando o doutor me liberou, saí imediatamente.
Quando coloquei meu pé para fora daquela casa, me deparei com aquilo que tinha
visto décadas atrás em meus pesadelos, que ainda não saíam completamente da
minha cabeça. Perguntei a algumas pessoas o nome daqueles objetos e cada uma me
respondeu um nome. Depois, descobri que tudo aquilo pertencia à tecnologia atual,
que tinha transformado o mundo.
Computadores, celulares, televisão... tudo aquilo, aparelhos eletrônicos que nos
instigam e viciam. Descobri muita coisa sobre tecnologia e percebi que ela pode ter um
lado bom, mas, por outro lado, é um monstro, horrível e assustador...

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3º lugar - Enzo Rafael Gonçalves Premoli - 7º ano I2

NÃO PRECISA SER FÍSICO

Quando somos crianças, pensamos em monstros como seres horrendos, peludos e cheios
de dentes. Apenas sendo agentes do caos e destruição, talvez esta última parte esteja
correta, mas o resto não.
Meu nome é Gabriel Angelo, nasci no interior do Maranhão, em um lugar extremamente
católico. Por isso meu segundo nome é anjo em italiano. Na escola, nunca fui um dos
melhores alunos, todo ano sempre escolhia o lugar mais longe da vista do professor para
poder dormir sem atrapalhar a aula.
Mas eu tinha um problema, quando criança eu era alienado em relação ao mundo, foi
apenas no ensino médio que fui saber o que acontecia ao meu redor. Comecei a ler jornais,
sempre no meu velho quarto quente e abafado. Muitas vezes as notícias falavam sobre um
monstro, que parecia quase com uma infecção, ''monstro faz mais vítimas'', ''monstro ataca
novamente''. Era fácil fazer redações sobre ele, pois aparecia em todo lugar, jornais,
revistas, internet, e principalmente, nas televisões que davam informações de bandeja para
nós.
Ele não tinha corpo físico, ele ''infectava'' as pessoas, sempre irei me lembrar de alguns de
meus colegas infectados pelo monstro e seus derivados, agredindo meus professores.
Meus pais não me deixavam sair de casa por medo, então era obrigado a ficar dentro de
minha pequena casa, éramos de classe média, mas não tínhamos dinheiro para comprar
uma maior.
Aquele dia era como qualquer outro, mais uma redação a fazer, mas não consegui comprar
jornal por causa de uma chuva, não consegui usar a televisão, pois ela havia quebrado e por
causa da chuva não conseguimos levar para o conserto. A internet também estava fraca
também por causada chuva. Fiquei pensando, sentado no meu quarto, olhando para a rua,
tentando achar algo para escrever, até que me questionei: “Por que ele faz isso”? “Por que
gera a morte e isolamento na própria casa das pessoas”? A resposta disso é que nós somos
animais, somos apenas mais inteligentes que nossos ancestrais, mas o resto é igual.
Com isso, consegui fazer a redação, mas esses pensamentos não saíram de minha
cabeça. Comecei a perceber que ele não afetava um grupo especifico, que toda a
população do planeta poderia sofrer em suas mãos, e não havia como se proteger, pois ele
entrava nas próprias casas das pessoas.
Conforme iam se passando os anos, os casos apenas pioravam. Percebi que estava com
medo de simplesmente sair de casa, pois estava ficando extremamente perigoso, todas as
pessoas que saíam de casa eram abordadas por ele. Além
de deixar as pessoas muito feridas fisicamente, também as
deixava mentalmente, em ambos os casos, sempre
acabam gerando medo, sentimento que havia se espalhado
em mim, mesmo sem ter sofrido qualquer abordagem dele.
Provavelmente irá sumir quando nós sumirmos, pois
apenas se esconde para depois voltar aproveitando uma
situação difícil, nunca é definitivo. Pode ser um monstro,
mas na verdade é pior do que um, porém tem uma coisa em
comum, ele tem um único nome: o seu nome é violência.

21
Nível III Comentários

A literatura é um espaço privilegiado de humanização porque é sobretudo um exercício


de colocar-se no lugar do outro, assumir outros pontos de vistas e, quem sabe,
compreender suas dores, angústias, felicidades e desejos. O trabalho de escrita de um
autor começa, portanto, muito antes da ação de criar frases, períodos e parágrafos, é
preciso ser observador atento e sensível. Para produzir esses textos premiados,
Victória, João Paulo e Isabela assumiram a voz de mães que narram a aventura doce e
desafiadora da maternidade.

Cada um, a seu modo, recriou ficcionalmente situações difíceis, singulares e


definitivas na vida de uma mãe. Em seu texto, Victoria, na voz de uma mãe na
iminência de perder seu bem mais valioso, afirma: “Essa é a pior situação que uma
mãe pode enfrentar, sentir que a qualquer momento sua filha pode morrer e você não é
capaz de fazer nada, apenas dar apoio e ser forte, ou pelo menos demonstrar ser”. No
conto de João Paulo, lemos a história cíclica em que a jovialidade encontra a
experiência da velhice e os papéis se alteram: “Meu filho me carrega no colo como
quando eu o carregava. Hoje, me ajuda a assinar meu nome assim como eu o ajudei a
escrever quando pequeno”. Isabela, por sua vez, encenou as ambivalências humanas
que tecem a maternidade: “Foram noites passadas em claro cuidando do meu filho, ele
me levava ao limite, mas mesmo assim morria de amor por ele.”

Apesar da pouca idade dos nossos alunos-autores, os textos mostraram grande


habilidade literária porque, mais do que tecnicamente bons, são sensíveis e pujantes.
Esperamos que seja uma boa leitura.

Marcos Ramos
Professor orientador dos alunos dos Nível II

22
1º lugar - João Paulo Bravo Colonnese - 8º ano I1

ESCOLA DA VIDA

Quando criança, nunca valorizei minha família o tanto quanto deveria, principalmente
minha mãe. Pensava que o fato de os meus pais pagarem uma excelente escola e me
cuidarem com imensurável carinho, além de me presentarem com as melhores regalias
que o dinheiro poderia comprar, era dever deles. Também não percebia o sacrifício
realizado por minha mãe para que eu nascesse: a dor do parto e as injeções que
precisava tomar para impedir minha morte. Enfim, eu era uma criança muito enganada e,
de certa forma, ingênua, que somente pensava nas dificuldades e esforços inerentes ao
alcance do tão sonhado curso de medicina. E dessa forma se sucedeu toda a minha vida
até atingir tal sonho. Nesse momento, me sentia realizada, algo comprovado pelo latente
orgulho de minha família. Então, com toda essa felicidade, me dediquei ao máximo a
meus estudos e, quando completei o curso, me apaixonei por um, também, estudante de
medicina, sendo tal amor recíproco. Logo viramos médicos e nos casamos.
Assim, após determinado período de tempo, com a realização dos devidos exames,
soubemos que eu estava grávida. Depois de tal notícia, rapidamente preparamos tudo
em casa para que atendesse às necessidades de nosso filho e, claro, a de nós mesmos,
providos de tantas responsabilidades. Além disso, como era de se esperar, os “sintomas”
da gravidez, doença benigna, como o anormal tamanho da barriga e as dolorosas
contrações, começaram a se manifestar. Então, é nesse período que percebi quão forte e
valorosa minha mãe era. Ela lutou por uma vida cuja inimiga maior era a dor. Com isso, ao
me tornar agradecida por ela, pude derrotar tal inimiga, juntamente com meu marido, e,
assim, ter meu amado filho em mãos. E foi esse o momento (parto) mais feliz de toda
minha vida. Após isso, cuidei com todo o meu carinho do meu filho, ficando noites sem
dormir para tratar suas doenças e, posteriormente, pagando a melhor escola e
presenteando-lhe com caras regalias, como minha família fazia comigo com todo o seu
amor. Além disso, ensinei-lhe todos os valores dela e como uma mãe ama seu filho.
Infelizmente, cedo ou tarde, as grandes perdas acometem as vidas das pessoas e a que
ocorreu foi a de minha mãe (morte), sendo tal momento e os dias seguintes os mais
angustiantes de minha existência. Porém, conseguimos nos recuperar e meu filho
seguiu, assim como eu, a carreira médica. Atualmente, é um renomado médico em todo o
mundo, casado e com filhos, transmitindo a eles meus ensinamentos. Entretanto, agora o
cuidado trocou de mãos. Meu filho me carrega no colo como quando eu o carregava.
Hoje, me ajuda a assinar meu nome assim como eu o ajudei a escrever quando pequeno.
Girou a roda da vida. Agora, na velhice, me vejo dependente. Quero que ele me pergunte
algo como eu o perguntava antes, mas já não ouço direito e pergunto a ele a todo
instante. Quem ensina quem? Ambos ensinam e aprendem nesta dinâmica infinita. Este
é o legado desta missão bendita chamada maternidade.

23
2º lugar - Isabela Cavatte De Nadai - 8º ano A

A DESCOBERTA DO VERDADEIRO AMOR

Quando recebi a notícia que estava grávida, não poderia nem imaginar que minha vida
mudaria completamente. Eu era jovem, tinha apenas vinte e dois anos e não era casada.
Fiquei com medo de contar aos meus pais sobre isso, mas eles levaram na boa essa
notícia, apenas não gostaram do fato de eu estar solteira, achavam que eu deveria
esperar para me casar, mas me deram todo o apoio possível.
Para falar a verdade, pensei em abortar, pois era a única de minhas amigas que estava
grávida. Porém, meus amigos e familiares me convenceram a não fazer isso, disseram
que eu adoraria ter um filho, já eu pensava o contrário.
Durante a maternidade, as emoções tomaram conta de mim, sentia medo de qualquer
coisa, não podia dormir sem andar pela casa toda para ver se tinha alguém lá, ficava tão
feliz quando sentia ele chutar na minha barriga. Mas me sentia insegura, pois achava que
não estava pronta para lidar com o fato de ser mãe, porém minha família e meus amigos
me passavam confiança, dizendo que seria incrível e que eu estava pronta para isso,
então comecei a ver a vida de um jeito melhor, mais alegre e com muito amor.
Eu queria muito que nascesse uma menina, mas, independente do gênero, daria muito
amor e carinho. Quando descobri que seria um menino, também fiquei muito feliz, pois
seria um desafio cuidar de um, uma vez que eu não tinha um marido que poderia me
ajudar a criar um menino e teria que, aos poucos, descobrir o que eles gostam de fazer.
Os meses foram passando e cada vez chegava mais perto. Um dia comecei a sentir
muitas dores, então fui ao hospital com os meus pais e lá o médico disse que já estava na
hora de parir. Durante o parto, eu senti muita dor, mas foi questão de minutos para que
acabasse, pois quando vi aquele rostinho, comecei a chorar de felicidade. Já no dia
seguinte, fui liberada para ir embora.
Foram noites passadas em claro cuidando do meu filho, ele me levava ao limite, mas
mesmo assim morria de amor por ele, e fazia de tudo para agradá-lo. Ele cresceu jogando
futebol, sempre que podia, treinava, sonhava em ser um jogador profissional, mesmo
com muitos dizendo que ele nunca conseguiria, eu estava lá apoiando e o levantando
quando ele caía, fazendo-o acreditar em si mesmo.
Hoje, ele é um grande jogador de futebol profissional, já conquistou vários títulos
importantes e está sempre lutando para melhorar. Sou muito grata por tê-lo em minha
vida e todas aquelas incertezas que eu tinha
quando estava grávida já foram embora.
Uma das melhores partes de ser mãe é ver o seu
filho crescendo e se desenvolvendo com saúde
e descobrir que existe um amor tão grande
dentro de nós que só descobrimos quando
viramos mãe.
A maior parte das coisas que eu aprendi na vida
foi através dele, aprendi a cuidar, a amar sem
receber nada em troca, abrir mão de certas
coisas para cuidar dele e nada tem mais valor do
que ser MÃE.
24
3º lugar - Victoria Bressan - 8º ano I2

A RESILIÊNCIA DE UMA FAMÍLIA

Eu estava cansada, meus olhos mal se mantinham abertos e minha cabeça latejava.
Havia dormido mais uma vez no hospital, ao lado de Alicia.
Os últimos meses haviam sido intensos, depois da descoberta do câncer, seguido de
muitas cirurgias, exames e tratamentos. Meus pensamentos eram sempre sobre ela,
me preocupando com o que poderia acontecer, ou se seu estado pioraria... eu
desejava passar por aquilo em seu lugar.
Essa é a pior situação que uma mãe pode enfrentar, sentir que a qualquer momento
sua filha pode morrer e você não é capaz de fazer nada, apenas dar apoio e ser forte,
ou pelo menos demonstrar ser. Mostrar para ela que você está à sua disposição, que
não irá abandoná-la. Por isso, eu e Carlos revezamos todos os dias para acompanhá-
la e passamos todas as noites com ela, demonstrando que nunca a abandonaremos e
sempre estaremos ao seu lado. Olhar nos olhos de seu filho e enxergar os seus
próprios, reviver sua infância, é algo eterno, inexplicável e único.
Ao longo do tratamento, Alicia demonstrou ser uma menina forte, corajosa, madura e
confiante. Já apresentava um estado muito melhor e vinha se recuperando há
algumas semanas. Estava sempre sorridente e nunca permitia que sua situação a
impedisse de sonhar. Fez-nos ter fé. Fé de que tudo ficaria bem. E minha missão como
mãe, meu dever, é proteger e cuidar, mesmo não me sentindo capaz.
Estava tão exausta naquele dia que dormi pelo resto da manhã, sonhando com ela e
Carlos, as duas pessoas que eu mais amo no mundo. Isso me trouxe paz e calma,
senti que tudo ficaria bem.
Meu celular tocou, achei que era o alarme programado para lembrar-me de tomar os
remédios, então ignorei, estava muito cansada para tomá-los naquele momento. O
barulho continuou, fui ver o que estava acontecendo e vi que Carlos estava tentando
me ligar. Havia deixado várias mensagens, dizendo que o médico precisava falar
conosco.
Fiquei preocupada, meu coração estava acelerado. O que ele diria? Será que o estado
de Alicia piorara? Fui correndo para o hospital, evitando pensar no pior. Senti-me
enjoada, talvez pelas noites mal dormidas. Tive fé de que, naquele momento, algo
bom iria acontecer, eu queria acreditar nisso.
Ao chegar ao hospital, encontrei Carlos à minha espera. Percebi que também estava
preocupado, então abracei-o forte, tínhamos fé de que tudo ficaria bem. Aguardamos
por alguns minutos até o médico nos chamar, foram os minutos mais longos da minha
vida, estávamos ansiosos demais para o que ele falaria. Ao entrar em sua sala, o
cumprimentamos e aguardamos sua fala.
Já o conhecíamos bem, por ser o responsável pelo tratamento e a recuperação de
Alicia. Naquele momento, meu coração batia forte cada vez mais, senti uma imensa
preocupação. Sua expressão era calma, fazendo-nos ficar calmos também. Ele
finalmente disse:

25
Comentários Nível IV
Os textos vencedores do concurso de redação de 2019, escritos pelos estudantes do 9º
ano, são um convite à apreciação de dois belos gêneros artísticos: a fotografia e a
crônica. Partindo de um projeto que ocorre no Leonardo Da Vinci há 6 anos, o Artista
Capixaba, os alunos tiveram como ponto de partida a escolha de uma das obras de dois
grandes nomes da fotografia capixaba, Tadeu Bianconi e Gabriel Lordêllo. Imersos em
suas escolhas, deram luz a narrativas que traduziam as leituras que fizeram das
fotografias escolhidas, refletindo, nessa esteira, a sensibilidade de seus olhares para a
arte fotográfica e para aquilo que ela é capaz de despertar naquele que com ela entra
em contato: uma busca por aquilo-além-da foto, pela situação em que ela pode ter sido
produzida, pelo contexto que a circunda.

Instrumentalizados por palavras e não por câmeras, deram vida às suas fotografias:
imprimiram, tal qual os artistas capixabas que estudaram, seus olhares às situações
episódicas, circunstanciais e cotidianas de nossos dias (e, junto a elas, às questões
existenciais daqueles que são seus protagonistas, os sujeitos humanos). Os alunos
assinam, com isso, instigantes textos que, embora ficcionais, nos fazem voltar para as
fotos que lhes deram origem e assumir como quase-verdades as histórias literárias que
nasceram das mãos daqueles que olharam para as obras fotográficas com olhos de
quem vê a foto e de quem vê a vida com toda a simplicidade e a beleza que as
compõem.

Rafaela Skarlaty Lócio Dantas


Professora orientadora dos alunos do Nível IV

27
Nível III

– Sua filha está curada. O câncer se foi!


Não sabia o que sentir naquele momento, sabia apenas que poderíamos voltar a
nossas vidas como eram antes, poderíamos ter Alicia em casa. Comecei a chorar
interminavelmente. Carlos me abraçou. Foi o melhor dia de nossas vidas. Senti tanta
alegria que fomos correndo para o quarto de Alicia para abraçá-la.
Minha filha é tudo para mim, dou minha vida por ela. Todo aquele esforço, dedicação e
preocupação valeram a pena. Ela estava curada e nós poderíamos voltar a viver os
três juntos. A determinação de uma família com muita fé pode vencer os mais difíceis
obstáculos da vida.

26
1º lugar - Juliana Faria Littig - 9° ano I1

A EXPOSIÇÃO DE UM NOVO MUNDO

Acordei cedo numa segunda-feira e precisava me arrumar rápido para não chegar
atrasado ao trabalho. Descobri que minha esposa não havia preparado o café da manhã,
então desci apressadamente do prédio e fui para o café em frente. Naquela manhã, tudo
me irritava: a camisa social que não estava bem passada e faltava um botão; a falta de
compromisso de minha esposa; o elevador lotado de vizinhos que insistiam em
conversar; a fila da cafeteria que estava enorme e a atendente lerda que não conseguia
atender a todos. Com a cara fechada, pedi um café puro e um sanduíche. Não lhe
agradeci nem pedi por favor: não tinha tempo para essas banalidades, pois ia
definitivamente me atrasar.
Como um bom vigilante sanitário, examinei o local e encontrei pelo menos três
irregularidades. Pequenas, que passariam despercebidas por todos, mas não por mim.
Quando a moça retornou com meu pedido, dei-lhe uma multa. Ela implorou para que eu
deixasse esses detalhes passarem, afirmou que iria resolvê-los e que não era necessária
uma multa tão alta. Quando eu disse que não adiantava, entre lágrimas começou a
explicar que seria demitida e que tinha dois filhos para cuidar. Foi aí que me lembrei de
que estávamos na véspera do dia das mães. Não fiquei tocado pela história da moça,
afirmei que não mudaria de ideia e deixei a cafeteria. Chequei o relógio. Ótimo! Com
certeza ia chegar atrasado.
Enquanto estava praticamente correndo, recebi um telefonema: era minha mãe. Mas que
péssima hora! Atendi zangado enquanto ela, com a voz doce de sempre, me convidava
para almoçar em sua casa, mas eu disse que estava muito ocupado e não conseguiria ir.
Ela evidentemente ficou muito triste, mas não me importei e desliguei o telefone. Sei que
ela se sente sozinha, eu não tenho irmãos e ela se separou de meu pai quando eu tinha
oito anos. Duas semanas depois, ele morreu em um acidente de carro: estava bêbado (o
que não era uma novidade). Acho que foi por esse problema com o álcool que eles se
separaram. Apesar disso, não tenho tempo de lhe dar atenção, estou sempre muito
ocupado com o trabalho. Para piorar, minha esposa também reclama que eu não lhe dou
atenção. Será que ninguém enxerga o meu lado da história? Cheguei ao escritório e, para
minha surpresa, não estava atrasado, ainda sobravam dois minutos. Mas foi por pouco.
Após um longo dia, em que me estressei e recebi muita papelada, passei em frente a uma
banca de jornal e comprei um exemplar. Examinei-o e enquanto lia a manchete “Os Filhos
da Guerra – Entenda as consequências da guerra civil na Nicarágua que deixou uma
geração de órfãos.”, uma ventania o levou das minhas mãos. Eu corri atrás dele e
consegui alcançá-lo em frente a uma exposição de fotografias. Não sei muito bem por
que, senti vontade de entrar. Nunca me interessei por esse tipo de exibição, mas achei
tudo muito interessante. Uma foto, porém, chamou minha atenção. Ela era intitulada
“Crianças” e foi feita por um fotógrafo que não conhecia, chamava-se Tadeu Bianconi. A
fotografia mostrava crianças sorrindo em cima de um velho carrinho de rolimã sobre uma
rua enlameada.
Quando me aproximei do quadro, a coisa mais inesperada aconteceu: tropecei e não me
choquei contra a parede; eu atravessei o quadro como se fosse um portal. Atordoado,
comecei a andar por uma rua enlameada e fiquei zangado ao perceber que estava
sujando meus sapatos. Não entendo como sabia que estava em Manágua, na Nicarágua,

28
Nível IV

sendo que nunca estive lá antes. De repente ouvi o doce


riso de crianças, olhei para o lado e lá estava o carrinho de
rolimã da foto. Não entendia como isso era possível. Desviei
do caminho, mas percebi que elas não conseguiam me ver;
pensei estar em um sonho. Eu as observei brincar na lama
por algumas horas. Me lembrava de minha infância e
percebi que fazia muitas décadas que não ria assim.
Quando estava quase anoitecendo, uma mulher da humilde
casa que até agora não havia notado chamou as crianças
para jantar. Não entendi por que seus respectivos pais não
foram buscá-las e levá-las para casa, mas quando as segui
para dentro e elas se juntaram a dezenas de outras que se
sentavam à mesa e eram servidas de sopa, minha ficha
caiu: elas eram os “filhos da guerra”. Crianças cujos pais
foram mortos pela brutalidade da guerra, abandonadas no
mundo, abrigadas em uma casa que, dizendo como um
vigilante sanitário, era uma atrocidade em relação a qualquer higiene, saúde e conforto.
Apesar de tudo, elas se divertiam como se fossem as mais afortunadas do mundo. Essa
experiência me fez repensar e ser grato por tanta coisa: o carinho de minha mãe, minha
boa condição financeira, a dedicação de minha esposa e tanto mais. Percebi que deveria
ver a vida com mais leveza e otimismo, e praticar empatia e gentileza.
No momento em que completei esse pensamento, senti a mesma força misteriosa que me
empurrou para dentro da fotografia me puxando para fora e, num piscar de olhos, estava
de volta à exposição. Ninguém pareceu ter percebido o acontecimento de um fenômeno
naquela mesma sala e o tempo não havia passado. Tudo era o mesmo, exceto eu.
Levei alguns segundos para registrar tudo o que vivenciara e senti um grande
arrependimento. Saí do museu e comprei um presente e flores para minha mãe.
Completamente transformado, escrevi-lhe uma carta agradecendo-lhe por tudo e me
desculpando pela minha frieza. Não pude nem esperar o Dia das Mães para lhe ver, a
surpreendi visitando-a na hora do jantar e confesso que nunca me senti tão emocionado.
Mais emocionada estava ela ao ler minha carta. Durante longas horas, jantamos,
conversamos e fortalecemos os laços entre mãe e filho.
Voltei para casa me sentindo infinitamente mais leve, beijei minha esposa, me ofereci para
fazer o jantar para que ela pudesse descansar e lhe agradeci pelos seus anos de trabalho
duro e por toda sua paciência. Se ela estranhou meu novo comportamento, não comentou
nada. Enquanto jantávamos, ela me deu a melhor notícia que eu poderia receber: estava
grávida. Me enganei mais cedo, agora eu nunca estive tão emocionado. Confesso que se
ficasse sabendo das boas novas algumas horas antes, minha reação teria sido
completamente diferente: pensaria que não teria tempo de me dedicar a uma criança. Mas
algo que essa experiência me ensinou foi: você faz tempo para o que realmente importa.
Agora, estou certo de que vou ser um ótimo pai, presente e carinhoso. Minha percepção
do mundo estava mudada, e quem diria que isso finalmente aconteceria por causa de uma
exposição de fotografias.

29
2º lugar - Catarina Barros Bastos Santos - 9° ano I1

XEQUE-MATE

Sentei-me em um banco na praça e pus-me a observar o movimento; as crianças


brincando, os pássaros, a correria diária... Afinal, tenho todo o tempo do mundo:
aposentado e sozinho, o que tenho a perder? Com meu jogo de xadrez ao lado, apenas
fiquei esperando o tempo passar.
De repente, um rapaz sentou-se ao meu lado. Era jovem, vestia uniforme e tinha uma
prancheta, caneta e celular em mãos. Cumprimentou-me, se apresentou e explicou que
estava fazendo um trabalho para a escola, no qual precisava conversar com idosos
sobre suas vivências e as lições resultantes destas. Disse que eu aparentava ser gentil
e talvez não o rejeitasse de cara como outros que ele havia abordado mais cedo. Depois
disso não havia como negar. Satisfeito, aceitei participar. Perguntei se poderia usar as
peças do xadrez e o próprio jogo para dinamizar, ele rapidamente concordou e se pôs a
ouvir o que aqui escrevo.
Nasci em uma cidade de montanha, bem no interior. O caçula entre meus quatro
irmãos. Tínhamos uma pequena propriedade e minha família vivia do cultivo de
morango. Sempre reparei que meus irmãos e irmãs, com o passar do tempo,
estudavam cada vez menos, se dedicando a ajudar no plantio, na colheita, no
transporte e na venda. Um por um, sacrificavam sonhos, aspirações e talentos para
garantir nosso sustento e manter o negócio da família. Eram como peões em um jogo de
xadrez: trabalhadores leais que cumprem seus deveres, mas que desde o início já têm
seus destinos selados em troca de um bem maior. Prometia a mim mesmo que não seria
como eles. A cada fim de ano convencia meus pais a me manterem na escola. Sucedeu-
se assim até os meus 14 anos, quando meu pai faleceu. Foi um momento muito difícil
para nossa família: os negócios desestabilizaram e minha mãe adoeceu. Eu me sentia
impotente. Por isso, decidi que começaria a trabalhar junto aos meus familiares. Certas
coisas valem o sacrifício.
Quando fui comunicar minha decisão, tive uma surpresa: meus irmãos me falaram que
eu iria para a cidade grande morar com um de nossos tios e fazer o ensino médio. Achei
que estavam ficando loucos. Precisávamos de mais gente trabalhando, não menos.
Disseram-me que eu deveria seguir meu sonho, estudar, e assim garantir um futuro
para eles e principalmente para a minha mãe. Eu era sua única esperança, deveria ser
protegido a qualquer custo, tamanha era a minha importância. Como se fosse o Rei do
xadrez que era a nossa vida: a razão do jogo.
Cheguei à cidade e tudo era muito novo para mim, mas com o tempo e com a ajuda de
meu tio consegui me adaptar. Tirando os empecilhos causados pela minha timidez, o
ensino médio foi tranquilo. Decidi que faria Letras. Um pouco ousado para alguém cuja
família havia arriscado tudo na esperança de que lhes garantisse um futuro digno.
O período da faculdade mostrou-se enriquecedor. Consegui administrar trabalho,
estudo e vida social habilmente. Foi lá, inclusive, que conheci a mulher que futuramente
chamaria de esposa. Depois de formado, trabalhei por um tempo como assistente de
uma grande empresária do ramo editorial da cidade. Era extremamente prestigiada,
não havia barreiras para sua influência e ninguém ousava se meter com ela,
assemelhava-se a uma poderosa Rainha do tabuleiro. Eu me sentia seu bispo. Sempre
ao lado da realeza, só saía do posto para afazeres em seu nome. Apenas mantive

30
Nível IV

minha sanidade através de muita leitura e escrita. A situação chegou a um ponto crítico
e desisti. Eu queria mais. A ambição sempre esteve muito presente em meu caráter, um
defeito, talvez, mas possivelmente uma qualidade. Afinal, foi por conta dela que obtive
êxito.
Depois dessa decisão, minha carreira decolou. Passei a publicar livros e textos de
sucesso, me casei, tive filhos, viajei, amei, fui amado... Infelizmente nem tudo são
flores. Foi ficando cada vez mais difícil ter tempo para minha família do interior, eu ficava
meses sem notícias. Confesso que, nas vezes em que podia visitá-los, preferia sair em
viagens de luxo ou ficar em casa, com a desculpa de que a viagem era difícil ou de que
algum de meus filhos estava doente. Mandava dinheiro todos os meses para ajudar nas
contas, mas na realidade era um estranho. A última vez que vi meus irmãos foi no velório
de minha mãe, que faleceu após um infarto.
Há cinco anos também perdi minha esposa e, desde então, tudo em minha vida mudou.
Meus filhos se afastaram muito de mim, tanto que hoje sou totalmente só. Entretanto
não os culpo, sou velho e maduro o suficiente para perceber que errei. Constantemente
os deixava sozinhos em casa com a mãe ou algum funcionário. Raramente os buscava
nas atividades, duvido até mesmo que já tenha sequer participado de suas vidas
escolares. Hoje percebo que como um extravagante cavalo enxadrista, saltei na vida.
Entretanto, me precipitei. Criei meus filhos como torres: discretos, tímidos e distantes, e
fiz com que, em um movimento fulminante, me eliminassem de suas vidas. Todas
essas perdas foram um baque, era alguém que vivia cercado de amigos e admiradores,
e, de repente, me vi sozinho no mundo. Quando percebi todos os meus erros, era tarde
demais: já havia sofrido o xeque-mate.
Ao terminar de contar resumidamente minha história ao garoto, não consegui decifrar
sua expressão. Parecia ao mesmo tempo surpreso e consternado. Imediatamente o
alertei de que não deveria sentir pena de mim. Afinal, colhemos os frutos do que
plantamos. Segui meus sonhos, atingi meu maior objetivo, o de ajudar minha família
financeiramente, acertei, falhei..., mas, acima de tudo, vivi. Pedi ao menino que não
cometesse o mesmo erro que eu: o aconselhei a aproveitar cada momento e valorizar
cada amigo, paixão e familiar como se fosse o último encontro, sem se afligir com o
futuro e acabar perdendo o controle. Apenas viva. Ele me agradeceu e eu o desejei boa
sorte no trabalho escolar. O rapaz se foi e eu... continuei vivendo.
31
3º lugar - Ludmila Yamaguti Rios Barreto - 9º ano I2

QUANDO O CAFÉ ESFRIA

Observei de meu cubículo o sol se pondo e as luzes apagadas dos escritórios ao meu
redor. Já estava tarde. Apanhei minha desgastada maleta de couro marrom e me
direcionei à porta. O céu possuía um tom acinzentado e nebuloso, quase melancólico,
entretanto não sabia se este era devido à intensa umidade do mês de outubro ou se era
fruto da poluição das diversas fábricas de São Paulo. Enquanto aguardava por um táxi,
sentei-me sobre um banco e aceitei um jornal de uma jornaleira. Em alguns minutos, um
veículo branco estacionou em minha frente, entrei nele e, depois de horas em um típico
e intenso tráfego paulista, consegui retornar ao meu pequeno apartamento localizado
no Bairro Paraíso. Ao entrar em minha solitária casa, dei um suspiro denso e agoniante
e pensei: “Lá se vai mais um dia”. Em meio a pensamentos angustiantes, decidi fazer
um café, como esperança de recuperar minhas energias.
O cheiro daquela bebida milenar se expandiu pelo meu lar e, em minha alma, senti
surgir uma única gota de esperança ainda viva. Entretanto, esta mesma desvaneceu-se
rapidamente quando me direcionei ao meu quarto, sentei-me sobre minha cama de
casal, cujo um lado sempre permanecia vazio, dispus minha sagrada bebida em uma
cômoda ao lado e encarei a figura de um homem. Ele possuía um olhar cansado e
desamparado, cabelo grisalho e seco, olheiras que quase atingiam a região da
bochecha e face repleta de rugas, penetras e intrometidas que entram em nossas vidas
de forma mais rápida que o vento. Aquele homem era eu. Continuei a encarar a minha
própria imagem no espelho que estava à minha frente e iniciei a recordação de uma
série de acontecimentos que me levaram a esse infeliz presente.
Lembro-me de que, quando era jovem, libertino, indômito e auspicioso, sonhava em ser
fotógrafo. Costumava sair pela ruas, fotografando tudo que me convinha. Quando
completei 18 anos, disse a papai que desejava cursar faculdade de fotografia,
entretanto, o meu velho, receoso e conservador como sempre, não aprovou esse
desejo e me restringiu a ser contador, assim como ele era. Acabei não me rechaçando
às suas ordens, pensei que, no futuro, quando tivesse uma casa e situação financeira
estável, poderia seguir meu sonho. Ah! Mas que tolo e ingênuo eu fui! Realmente
pensava que não seria condenado pela monotonia, pela euforia impostora, pela
constante necessidade de lucro e pela complacência quanto à opressão do trabalho do
mundo capitalista moderno.
Mesmo imerso nesse regime, que se assimila a uma caixa de pandora, ainda não
consigo concordar completamente com uma das frases que lhe define: “O trabalho
dignifica o homem”. Afinal, princípios e estados como moralidade, felicidade, religião e
vivência familiar, intelectual e amorosa não tornam um homem digno? Não é como se
de fato fôssemos ninguém sem o trabalho, todavia assim acontece na nossa sociedade,
assim pensamos porque assim fomos construídos. Admito que, se tivesse seguido
minha profissão dos sonhos e dedicado mais tempo da minha vida a esses valores,
seria um homem mais eminente. Mas do que adianta refletir sobre tudo isso agora.... Já
é tarde demais... já estou confinado na figura de um adulto quadrado e moralista...

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Nível IV

Enquanto cortava a minha dolorosa linha de pensamento, beberiquei um pouco do meu


café, entretanto, para minha surpresa, ele não estava com aquele reconfortante sabor
usual, pelo contrário, estava frio e amargo, fazendo com que eu emitisse um grunhido
incomum. Foi então que conclui a minha reflexão: O meu único erro foi ter deixado para
depois, porque depois o encanto, a motivação e a juventude se perdem, depois o cedo
fica tarde. Na espera do depois, se perdem as melhores experiências e os mais
sinceros sentimentos, porque depois o café esfria...

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Nível V Comentários

Contrário ao senso comum, Clarice Lispector certa vez advertiu que criar é correr o
grande risco de se ter a realidade. A afirmação parece controversa; pois, ao falarmos
em literatura, não tratamos de ficção? A verdade é que subestimamos isso que
chamamos, sem grande discernimento ou necessidade de definição, “ficção”. Na
literatura, nos deparamos com o suspeito, o desconfortante, o escondido e, ao mesmo
tempo, com o que há de mais familiar em nós mesmos. A literatura, nesse sentido, não
é apenas um “faz de conta”; ela é possibilidade de expansão da experiência do real e
dos sentidos da realidade. Por isso, quanto mais a vida nos limita à objetividade, à
superficialidade do efêmero, ao distanciamento e à intolerância, mais necessitamos da
literatura. Como exercício dessa invenção de mundos possíveis, Larah, Regina e Alex
nos oferecem três contos sobre distopias.

Lembramos que a distopia é caracterizada pela temática de regimes totalitários,


autoritários e pelo opressivo controle da sociedade que desumaniza as relações
sociais. Na esteira das populares obras de George Orwell ou Aldous Huxley, em suas
criações ficcionais, nossos alunos-autores retrataram o futuro de uma maneira
negativa, com um desenlace catastrófico para a humanidade, isto é, uma sociedade
oposta à utópica. E se a literatura, como queria Clarice Lispector, é realmente um risco
de tocar a realidade, que os contos, além de nos deleitar, sensibilize-nos para a
necessidade cada vez mais urgente da humanização.

Marcos Ramos
Professor orientador dos alunos do Nível V

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1º lugar - Larah Lethícia Dias Pastro - 2ª série I3

EDOM

Contou mais uma vez as costelas, que expandiam a cada suspiro, prontas para irromper
da pele e expor sua brancura seca. Desafiavam-na, todas as doze.
A mulher se levantou. Não tinha nem cores, nem cheiro. Lembrava-se apenas do
fantasma de um nome, recebido de sua mãe sob alguma expectativa de identidade.
Talvez fosse bonito, exótico ou forte. Símbolo máximo do ser. Seu nome lhe fora tirado,
um pouco mais a cada dia de silêncio, a cada noite de fome; todas as vezes que abdicou
de si por um salário de medo e morte. Mais uma vez, como fizera nos 364 dias anteriores,
deixou suas paredes de ferro para respirar o ar cinza e morno que circundava o reduto.
Nos portões, a inveterada bandeira verde dispensava a massa de condenados, certa de
uma recepção menos numerosa que a despedida. Ao lado de outra dezena de pernas
cansadas, a mulher caminhou sem ver.
Acontecera aos poucos, ela recordava. Primeiro vieram os tanques, “provisoriamente,
até as resoluções serem aprovadas”. O povo se queixou, mas era compreensível.
Depois reivindicaram todos os recursos para que pudessem “redistribuí-los de forma
justa”. O povo se inquietou, mas era necessário. Quando veio, enfim, a Nova Lei, o povo
ansiou por revolta; mas como combateriam um espectro, quando tinham que lutar contra
o próprio corpo moribundo? Os países fora do raio da morte fecharam as fronteiras. A
mídia foi tolhida em nome da paz. Era, então, o Pandemônio e quão concebível se fez a
crença nos Enviados.
O renque se formava, passeando em direção à caixa. A mulher sentia a marca de seu
pecado cortando seu abdômen. Proclamaram em vão a sentença. O fim de todos era o
mesmo. Tiraram as roupas e sentiram a água varrendo seu desasseio para o ralo. Sob
os pés, o metal frio tilintava. Era um coral, reverberando as rezas e o choro. À frente, os
ganchos da sangria. Ninguém fizera questão de escondê-los, todos os conheciam. Nos
anos sombrios, consagraram seu serviço. A mulher sentiu a lâmina sobre seu pescoço.
Tudo já lhe fora tirado. Restava o corpo e o fôlego e, desses, em apenas um encontrava
préstimo. Através da carne, outra geração veria o sol amanhecer sobre seu rosto.
Portanto, resignou-se. De que valeria a vida, quando todo o resto se fora?

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2º lugar - Regina Zocolotti Dórea - 2ª série I2

O VERDADEIRO MOTIVO DA GUERRA É A PAZ?

Barulho de tiros. Pessoas morrendo. Crianças chorando. Rios de sangue. Dor, morte,
tristeza, a humanidade pedindo socorro. De repente, acordo. Parece que tudo foi
ontem. O pesadelo acaba quando abro os olhos, mas a realidade em que vivo não é tão
diferente do que era naquela época. Ainda me lembro da minha família, a única coisa
que me fazia sobreviver. Éramos eu, meu pai e minha mãe. Nós três contra o mundo.
Mas com a Grande Guerra, os dois foram assassinados. Tenho tanta saudade.
Saudade dos poucos momentos de felicidade que vivi com eles. Os dois eram humildes
trabalhadores e estavam passando por grande dificuldade financeira, mas mesmo
assim nunca deixaram que faltasse a coisa mais importante: o amor. Eles foram vítimas
da brutalidade de ambos os lados da Guerra, os vermelhos e os azuis. Naquela época,
meu país estava passando por uma tremenda crise de identidade e de respeito para
com o outro. Os dois lados lutavam pelos próprios ideais, mas no final, pelo extremismo,
eram todos iguais. Vivíamos com essa fragilidade e violência por um tempo, a disputa
entre os azuis e vermelhos crescia cada vez mais. Mas o estopim da Grande Guerra foi
quando o líder dos azuis foi morto. Meu país entrou em um conflito sangrento e meu
mundo tornou-se o verdadeiro inferno na terra. Eu sobrevivi aos 13 anos da guerra, mas
gostaria que isso não tivesse acontecido. Preferia morrer junto a meus pais. Lembro-me
de como as duas pessoas que eu amava e com as quais me importava morreram.
Naquele dia, nossa cidade estava sendo bombardeada pelo exército vermelho e
fugimos para o pequeno abrigo subterrâneo que tínhamos. Estava correndo na frente
até que olhei para trás e vi meus pais no meio dos escombros jogados no chão afogados
em sangue: balas perdidas os acertaram. Hoje em dia as pessoas se importam apenas
com os próprios interesses e desejos e esquecem que vivem em sociedade e que nada
os fazem melhor que o outro. A Guerra Civil em meu país acabou. Nem os vermelhos,
nem os azuis ganharam porque isso é a guerra: todos perdem, a humanidade perde. O
meu mundo torna-se cada vez pior, mas ainda existe um resquício de esperança em
meu coração: que o amor, respeito e empatia poderão fazer que minhas futuras
gerações vivam, e não sobrevivam como eu.

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3º lugar - Alex Marinho Cardoso - 1ª série I3

DIÁRIO

Dia1 – O Começo
Meu nome é Philip Rodgers e eu sou major das forças armadas americanas. Moro em
Washington D.C. e tenho dois filhos lindos. Recentemente, o mundo entrou em guerra.
Infelizmente, o Bloco Leste-europeu se uniu à Coreia do Norte e juntos iniciaram uma
guerra nuclear contra nós. Fui alertado com antecedência e aloquei minha família em um
bunker em casa em caso de uma bomba atingir os arredores ou propriamente minha
cidade. Dito e feito, o ditador Kim Jong-un lançou vários misseis nucleares diretamente
no Pentágono. Eu e os meus filhos estamos seguros aqui, temos mantimentos para um
mês, o sinal de wifi e o de 20g não estão mais funcionando, lá fora deve estar um caos.
Espero ter uma noite boa, pois agora os meus filhos não param de chorar. Oro todas as
noites, pois eu sei que meu Senhor nos salvará, medito todas as noites sobre os Salmos
121:1-2.
Dia 2 - Problemas!
Nossa jornada mal começou e já tivemos várias surpresas. Eu e a minha família estamos
muito mais unidos, estamos fazendo tudo juntos a todo o momento. Ensinei o George a
jogar Poker e Black-Jack; já com a Isa, aprendi a fazer tranças no cabelo e até a pintar
unha. Mas nem tudo é um mar de rosas e ainda no segundo dia eles começaram a
reclamar horrores por conta da falta de wifi. Eu comemorei até não poder mais, porque
de forma quase que pré-histórica consegui sinal de um rádio de 2014, o sinal vinha do
governo e dizia palavras de esperança. Segundo eles, depois que a radiação baixar,
após 40 dias, todos os sobreviventes deverão ir para a base militar mais próxima, não
sou injusto e reconheço o esforço dos soldados em tempos de atribulações, mas nós
temos comida para 31 dias, contados. Teremos que racioná-la da forma mais eficiente
possível.
Mais tarde:
O impacto das bombas causou um pequeno terremoto, os rebites da divisória da quina
do bunker foram comprometidos e cederam um pouco, foi o bastante para contaminar o
nosso estoque por inteiro, pois os enlatados e as águas ficavam nessa parte da sala,
alguns enlatados não estão tão ruins, creio que terei que comê-los por alguns dias, ou
será que não é melhor arriscar? Desespero. Percebi só agora à noite, esse buraco

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Nível V

estava provavelmente aberto desde o primeiro thunderstrike.


Consertei o parafuso e creio que voltamos à segurança.
Dia 3 - A única maneira
Terceira manhã que não vejo o sol ao amanhecer e já não sei mais o que fazer. Resolvi
contar aos meus filhos sobre o ocorrido e apresentar a nossa verdadeira situação.
Primeiro conversei com o George, o mais velho, ele compreendeu e logo quis ajudar; já
Isa, a caçula, com muito medo e assustada, começou a chorar. Eu a consolei e com o
seu versículo favorito acalentei o seu coração. Não sei se a decisão foi certa ou não, mas
foi a que tomei e de uma coisa eu tinha certeza: não tinha como continuarmos comendo
aquele alimento infectado, a única chance que tínhamos era o meu filho sair do bunker
para tentar achar comida ou sinal de internet para tentar localizar a base militar à qual o
governo se referia. Meu coração está em completo desespero, mas espero em Deus a
volta de meu filho com mantimentos e resposta, decidi que ele iria só, pois alguém tinha
que cuidar da Isa e, se eu morresse, o George não o faria. Ele parte amanhã pela manhã,
passaremos dias difíceis, mas agora é a hora da provação, ela sairá com uma pistola,
um mapa e uma máscara de gás.
Dia 6 – Loucura
Não sei mais o que fazer, meu filho ainda não voltou e não mandou sinal, combinei com
ele de voltar hoje. Desespero. Creio que minha sanidade esteja deveras comprometida,
visto que ouço a voz dele a todo momento em minha cabeça, George, George, George,
George, Georgeee, volta pra casa por favor, oh Deus! por que fizera isso comigo? Esse
fardo tão grande! Não poderia ser pior a situação, a Isa começou a passar mal no quarto
dia por causa dos mantimentos radioativos e os medicamentos não estão ajudando, ela
não consegue dormir de tanta dor, só quando faço carinho em seus cabelos.
Dia 7 – Fim?
Creio que hoje será nosso último dia no bunker, tenho que sair daqui, eu estou ficando
louco. Estamos com muita fome e minha filha está passando muito mal, temos que sair
para achar o meu filho. Talvez lá fora tenhamos mais chances, quem sabe acharemos os
militares ou mais sobreviventes. Acho que isso é um adeus.

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