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Nísia Floresta Brasileira Augusta

FEMINISTA, ABOLICIONISTA, INDIANISTA, REPUBLICANA, UMA MULHER ALEM DO SEU TEMPO


Natal, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006

DN Educação/Projeto Ler do DIÁRIO DE NATAL resgata, nesta DN EDUCAÇÃO

O edição, a Vida e a Obra de Nísia Floresta, reconhecida pelo


historiador Oliveira Lima como a mais notável mulher de letras do
Diretor Presidente:
Gladstone Vieira Belo
Diretor Geral:
Albimar Furtado
Diretor de Redação:
Brasil. Colhemos artigos, depoim entos e reportagens com Osair Vasconcelos
Promoções e Projetos Especiais:
Afonso Laurentino Ramos
estudiosos do tem a e construímos um trabalho que esperamos Editor do Suplemento:
Francisco Francerle
contribuir para o acervo de pesquisa sobre essa conterrânea que Reportagens:
Adriana Amorim, Sérgio Villar,Valéria Credídio e
um dia ousou em combater as injustiças sociais contra a mulher, o Francisco Francerle
Fotografia:
índio e o negro, através da educação e da sua produção literária. O D ’Luca e arquivo Escola Doméstica
Diagramação:
mais surpreendente é que o tempo parece não ter passado e que o Paulo Moreira e Silvana Belkiss
Produção e pesquisa:
Francerle,Valéria, A d ria n a e Sérgio Villar: a equipe de
‘pensamento nisiano’ nunca esteve tão atual. Francisco Francerle / Adriana Amorim
reportag em desta edição do D N Educação. Telefone: 4009.0192 - francerk@diariodenatal.com.br

ARTIGO B rasília Carlos F erreira* OPINIÃO Hudsqn Brandão*


Nísia Floresta são muitas Uma visão sobre Nísia
Nísia Floresta: indianista, abol­ direito das mulheres à instrução e Fui apresentado Floresta não são
icionista, republicana, feminista, ao trabalho como cam inho para à N ísia Floresta encontradas sim ­
jornalista, poetisa, educadora. que fossem respeitadas. Tinha um a através de um dos ples rem iniscên-
Uma m ulher à frente de seu tempo. visão igualitária do m undo, um seus livros: "Três cias. Nele está o re­
Ultrapassando as interdições de senso de justiça e de liberdade que anos na Itália se­ lato que expressa o
sua época, fez de sua vida um destoava da sociedade de sinhazin- guidos de um a via­ interior de um a
manifesto em favor da liberdade. has e sinhozões em que viveu. gem à Grécia". Este mulher, que a cada
Nísia, antena da raça, O m undo fo i pequeno para livro m efo i presen­ momento revela o
escreveu, falou e agiu em prol da Nísia: Pernam buco, Rio Grande do teado por um am i­ seu extraordinário
em ancipação fem in ina , anteci­ Sul e Rio de Janeiro, depois go e traduzido por conhecim ento de
pando em quase dois séculos, Portugal, Itália e França: A s um ex-colega de história e da arte,
questões que hoje o fem inism o se Catedrais de Rouen, terra de sem inário, Francis­ da política e das
põe. Fem inista avant la lettre, aos Flaubert e de M onet, são teste­ co das Chagas Pe­ artimanhas da vi­
21 anos já escrevia sobre a m unhas de sua presença, lá onde reira. da. Uma m ulher
condição fem inina. A palavra fa l­ em 1431, outra m ulher, Joana Assim, lendo a sua obra desco­ que questiona o momento político
ada, em Conferências e a escrita, D A rc fo i queim ada num a bri um a m ulher d e um a interiori- vivido pela Itália e pela Igreja Cató­
na produção alentada, foram uti­ fogueira, por ter ousado desafiar as dade profunda, culta, sensível, li­ lica; analisa criticamente a educa­
lizadas para evidenciar a opressão regras de seu tempo. bertária e patriótica. ção dos jovens franceses oferecido
e o preconceito em relação aos Nísia deve ser enaltecida por Surpreende-m e a grandeza do por escolas de renome dentro de um
índios, escravos, m ulheres, objetos nista inglesa Mary Wollstonecraft, todas as m ulheres pela coragem de "espírito hum ano" manifestado a padrão tradicional; ressalta o co-
de sua atenção e de sua vontade de contraponto à Declaração Universal ousar agir sobre a sociedade de sua nós pelo surgim ento dos gênios, quetismo das m ulheres da socieda­
m udar um m undo injusto, m oral­ dos Direitos do Homem, em que crit­ época. Ela não fez apenas a crítica dos artistas e dos santos. E, diante de européia.
ista e excludente. ica a idéia dom inante da superiori­ teórica, mas também a crítica práti­ daquela obra, pude constatar a ge­ Portanto, encontram os um a
Indianista, escreveu A Lágrim a dade masculina. ca, ao buscar átuar na sociedade, nialidade e grande capacidade ar- m ulher que presta atenção nos
de um Caeté, transm utando em Educadora, fo i m ilitante na quebrando costumes e norm as que tístico-literária de Nísia Floresta. acontecimentos corriqueiros, capaz
poesia sofrim entos e destratos à defesa de um a educação sólida e privilegiavam o patriarcado. Tenho a certeza de que há genes de fazer amigos onde chega sobre­
população indígena, selvagemente libertária. Um ensino sem a peda­ Através da atividade literária, que possuem as características de tudo no meio intelectual e artístico
arrancada de sua terra e de sua cul­ gogia de castigos corporais, sem a em penhou-se na luta concreta para raça considerada superior, como e, ao m esm o tempo, dotada de
tura. Abolicionista, pregava em tortura dos açoites, q u e hu m il­ m udar o status quo. Sua produção é os judeus e alemães, artistas que grande am or a fam ília e a sua terra.
conferências a em ancipação dos havam m eninos e das palmatórias extensa e plural: mais de 20 publi­ se desenvolveram no seio da fa m í­ Isto é possível, também, verificar a
escravos, contrariando um Brasil de que castigavam as m eninas, com a cações escritas em português, lia e, santos que floresceram em partir do seu próprio pseudônimo:
Sinhás e um a sociedade em que am pla concordância dos pais. francês e italiano, sob a form a de am biente religioso. Nísia Floresta Brasileira Augusta.
hom ens eram avaliados e vendidos Com bateu métodos baseados na artigos, ensaios, poemas e crônicas. Diante de tudo isto, o que mais Concluindo, após a leitura do
com o cavalos. Espírito aberto, tortura com a sua pedagogia da Pelos seus feitos Nísia Floresta nos adm ira são as exceções que seu diário de viagem, m e senti or­
defendeu a liberdade de cultos, cre­ liberdade, num a proposta de edu­ atingiu a excelência, através da aparecem com o fenôm enos que gulhoso de já no século XIX ter
dos. Republicana, em um país que cação visionária, voltada para a qual, segundo os gregos, se garante estão além das causas e circun­ um a conterrânea d e tão alta gran­
ainda hoje hesita em abandonar o form ação de hom ens e mulheres, a imortalidade. O ineditismo e a stâncias que evidenciam um a ul- deza e profundidade hum ana.
jugo do patriarcalismo e do patri- capazes de atuar não apenas na ousadia de suas idéias, bem como o trapassagem das leis da evolução.
m onialism o denunciou um sis­ vida privada, m as tam bém de testemunho de sua vida, fazem de No roteiro de viagem de Nísia * Secretário Estadual de Educação
tema que reserva a alguns o que tornarem -se cidadãos e cidadãs Nísia um a m ulher a ser hom e­
deveria ser com um a todos: o dire­ aptos a atuarem no espaço público. nageada e reverenciada por todos e
ito a ter direitos. Na condição de diretora-propri- todas nós. Como? Não apenas com
Escritora, jornalista e poetisa, etária de educandários para moças, elogios e rapapés, mas levando adi­
expressou idéias em espaços onde Nísia definiu um projeto educa­ ante sua luta pela igualdade de
pontificavam os homens. Culta, seus
textos buscavam na tradição das
cional no qual o ensino das prendas
domésticas era acom panhado de
gêneros, hoje atualizada na equal-
ização salarial entre hom ens e m ul­
Agradecimentos
sociedades antigas, referências sobre form ação sólida em línguas e con­ heres e na presença igualitária de
a cultura e modos de vida das m ul­ hecimentos gerais, o que respondia à hom ens e m ulheres em todos os
heres. Tradutora, publicou Direitos sua preocupação com a form ação espaços de poder na sociedade.
■ Constância Lima Duarte (professora da UFMG)
das M ulheres e Injustiça dos das m ulheres para que pudessem ■ Noiide Ramalho (diretora da Escola Doméstica de Natal)
Homens, versão livre d e Vindication conquistar um lugar digno na * Professora do Depto de Ciências ■ Profa Diva Cunha (professora da UFRN)
o f the Rights o f Womam, da fem i­ sociedade. Foi pioneira na defesa do Sociais da UFRN ■ Enélio Petrovich (Instituto Histórico e Geográfico do RN)
■ Arisnete Câmara (Base de Pesquisa Gênero e Práticas Culturais - UFRN)
Natal, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006 DNCPEDUCAÇÃO

E ntrevista Constância L ima Duarte


ia Floresta é a principal escreveuvários títulos e verbetes ffiffite«oindoacadàiHco,e<Mende

B
ágina de luta contra a sobre Nísia nos principais livros e ações maiseficazesdopodwpúUko
iscriminação no Brasil e dicionários da mulher brasileira. paraa promoçãodefetos e eventos
icia Duarte o seu mais Agora mesmo descobriu um novo quevisemapopularizaçãodafigura
atebaluarte.Hámaisde20 romance da escritora: “Dedicação deNísiaFlorestaarávelnacionaleaté
udando avida e a obra de deumaamiga”,puhlicâdoeat 1850, mesmona cidade onde elanasceu,
ssaprofessora da Univer- eiiiNiteróLNaentraista,da&lados dissipando os resquícios de
tederal de Minas Gerais já avanços tias pesquisas, prindpal- preconceitos.

Uma página de luta


contra a discriminação
Francisco Francerle Que setores da sociedade mais têm Já foi lançado o Concurso de redação
Editor do D N Educação estimulado a pesquisa sobre Nísia? e de ensáos sobre a autora, e logo serão
Creio que é o setor acadêmico, isto divulgadas outras iniciativas.
A pesquisa sobre Nísia Floresta, de­ é, a universidade. Nos últimos anos
senvolvida ao longo dos anos, tem tiveoportunidade de participar de ban­ Apesar de já existir uma grande pro­
conseguido avanços significativos? cas de tese que tratam dela e de sua dução inteíectuá de Nísia, você ainda
Ainda existe muito a ser descoberto? obra, e há diversos estudos que a colo­ acredita existir livros dela a serem de­
cam em destaque. Nos últimos anos, scobertos e publicados?
Bem, como vocês sabem, meu en­ a universidade brasileira tem passado Creio que sim. Há poucos meses
volvimento com a figura de Nísia Flo­ por um especial e profícuo momento locáizei um de seus romances que
resta data de 1985, quando ainda era de revisão da literatura, o que tem per­ continuava desaparecido, e que nen­
professora do Departamento de Le­ mitido o resgate de antigos autores e hum dos pesquisadores que me ante­
tras da UFRN, e me preparava para o a reedição de obras inéditas. Mas, com cederam haviam conhecido. Seu títu­
doutorado na USE Tentei, na ocasião, certeza, outros setores também estão lo e Dedicação de uma amiga, e havia sores e os estudantes para a pesquisa enfrentar para que se tornassem
percorrer os passos de Nísia, ou seja, trabalhando com Nísia, pelos mais sido publicado em Niterói em 1850. e para a realização de trabalhos cul­ cidadãs, pudessem votar, serem
ir a cada cidade em que ela havia resi­ diferentes enfoques e interesses. O m ás Ouso afirmar que este romance é o turais, muita coisa ia mudar nas votadas, terem direito ao trabalho, a
dido, mesmo por pouco tempo, à recente que tenho notícia, e do quá primeiro publicado por um escritor - cidades. No mínimo, aumentaria o uma remuneração, ou mesmo pâra
procura de indícios de sua presença. participo, é a escolha do nome de Nísia no caso, escritora - do Rio Grande do conhecimento acerca da região, da terem direitos ainda m ás elementares,
Assim, fui a Recife, Olinda, Porto Ale­ Floresta para tema do Projeto Norte. Cascudo considerava Mistérios história e dos nomes que contribuíram como aprender a ler, dirigir a própria
gre, Rio de Janeiro, Lisboa, Coimbra, Memória, da Fundação Banco do de um homem rico, de Luiz Carlos Lins para a cultura locá. Mas hoje está vida, etc. etc., ninguém sabe nada. Fica
Londres, Roma, Florença, Nápoles, Brasil. Veja que fato mais importante: Wanderley, como o primeiro romance muito melhor que águns anos atrás, parecendo, para as novas gerações, que
Paris, Cannes e Rouen, e em cada uma o Projeto Memória 200 „ vai home­ norte-rio-grandense, e ele surgiu em quando predominava, junto com o de­ o mundo sempre foi assim, como é
encontrei alguma coisa, como livros, nagear justo a escritora potiguar! Nas tomo de 1880. Mas Nísia Floresta tam­ sconhecimento, até um certo despre- hoje, e que não houve uma história de
documentos, quadros, cartas, ou in­ versões anteriores as personalidades bém deve ser considerada uma das so, fruto da desinformação. Muita gente lutas e conquistas por trás de tudo.
formações as mais diversas pelos jor­ escolhidas foram Monteiro Lobato, primeiras romancistas do pás, o que não gosta quando se fáa disso, mas é Não se sabe nada, muito menos os
nais. Também pesquisei em inúmeros Josué de Castro, Oswádo Cruz, Rui não é pouco, convenhamos. verdade. Mas também é preciso não nomes das que lideraram estes mo­
arquivos e bibliotecas do país, tanto Barbosa e Juscelino Kubitschek. No generalizar. Sei de pessóas da cidade mentos e enfrentaram os preconceitos
públicos como particulares, na tenta­ raiar do n^vo milênio, Nísia será a O que os poderes públicos poderíam que sempre tentaram fazer águm a e as resistências que vinham de todo
tiva de reunir o maior número possív­ primeira mulher homenageada pelo fazer para tomar a figura de Nísia mais coisa. Lembro-me agora de Socorro lado. E Nísia é página desta história.
el de obras e dados bibliográficos. projeto. Com certeza, esta iniciativa conheddaepreservarsuamemóriana Trindad, que escreveu alguns livros, e Aliás, uma importante página. Voltan­
Sabia-se que ela havia publicado cerca v á contribuir muito para promovê-la cidade que herdou seu nome de um professor de Nísia Floresta, de do à sua questão, digo que pouca gente
de 15 títulos, dentre poemas, romances, a nível nacioná, principalmente junto Creio que há muito a ser feito, não nome Luiz Carlos, que trabalhava com sabe do papel de Nísia em tudo isso, e
novelas e ensaios, e que havia deixa­ aos estudantes do ensino fundamen- apenas para divulgar Nísia como in­ teatro e encenou uma peça sobre a que não conhece o que ela escreveu
do diversos textos na imprensa de seu tá, médio e universitáio. úmeros outros escritores que per­ vida da autora. para afirmar a identidade sociá da
tempo. Ao final da pesquisa, e da tese, manecem esquecidos até no lugar em mulher, do negro e do indígena
localizei 12 livros, e recolhi parte sig­ Está trabalhando em águm projeto que nasceram. Toda cidade, eu acho, A sociedade brasileira em g erá re­ brasileiro.
nificativa de sua colaboração em jor­ específico sobre o tema? deveria ter sua "casa de cultura", ou conhece a figura de Nísia Floresta
nais do Rio, Lisboa, Paris e Florença. No momento termino a revisão de algo semelhante, que funcionasse como uma mulher que lutou pelos di­ E as próprias entidades de defesa das
Além disso, outros pesquisadores meu hvro Nísia Floresta: vida e obra como um espaço de aglutinação para reitos sociais de minorias, como a mul­ minorias entendem essa importância?
estudaram Nísia Floresta, e fizeram para a Editora da UFRN fazer a se­ literatos, artistas e intelectuás, e pro­ her, o negro e o índio? Creio que não. Távez umas pou­
pesquisas e reflexões em torno dela. gunda edição, pois está esgotado, e movesse encontros com estudantes, Uma parte desta sociedade, a m ás cas. Ainda há muito a ser feito pela di­
Respondendo então à sua pergunta, preparo um volume com os escritos lançamentos de livros, projeção de intelectualizada e bem informada, vulgação de Nísia Floresta. Por isso
sem dúvida nenhuma hoje conhece­ esparsos e inéditos de Nísia Floresta, filmes, exibição de peças teatrais, penso que sim. Mas creio que pre­ precisamos de muito m ás teses, dis­
mos muito m ás sobre Nísia que há dez que encontrei em jom ás e revistas e enfim, que propiciasse a reflexão e o domina ánda entre nós um grande e sertações, livros, filmes, DVDs, vídeos,
ou vinte anos atrás. O conjunto de livros que ainda não foram reunidos em livro. debate sobre tudo que fosse de inter­ absurdo desconhecimento de nossa peças de teatro, enfim, de projetos que
dela, e sobre ela, que está hoje: o mer­ Além disso, faço parte da equipe do esse do grupo. Se os órgãos públicos história. Se pensamos nas mulheres, fáem de seu trabalho e da figura hu­
cado contribui decisivamente para isso. Projeto Memória 2006, que mencionei. reám ente incentivassem os profes­ por exemplo, e na luta que foi preciso mana incrível que ela foi.
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DNCDEDUCAÇAO Natal, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006

TRAJETÓRIA RECONHECIDA COM O A MAIS NOTÁVEL M ULHER D E LETRAS D O BRASIL, N ÍSIA FLORESTA
TEM U M A HISTÓ RIA DE RESISTÊNCIA N A LUTA PELOS DIREITOS DAS M INORIAS

O resgate de uma mulher


além do seu tempo
Num tempo em que a maioria das ração de autoras e obras do passado,
mulheres restringia sua atuação à altu­ que vem sendo feito em nossas uni­
ra das chamas do fogão, nascia no Rio versidades, por inúmeras pesquisado­
Grande do Norte aquela que seria a ras. Alguns de seus livros estão sendo
primeira feminista do Brasil, que tam­ reeditados e suas idéias voltam para
bém foi escritora, poetisa, educadora, nos lembrar um pouco da sofrida his­
jornalista, socióloga, abolicionista, in- tória das mulheres pelo reconhecimen­
dianista e republicana. Nascida em 12 to de seus direitos e de sua capacida­
de outubro de 1810, em Papary, Rio de intelectual.
Grande do Norte, filha do advogado
português Dionísio Gonçalves Pinto A H IS T Ó R IA
com uma brasileira, Antônia Clara Frei­
re, foi batizada como Dionísia Gonçal­ Com a Revolução de 1817, cresceu
ves Pinto, mas ficou conhecida pelo o sentimento antilusitano em todo o
pseudônimo de Nísia Floresta Brasi­ Nordeste, levando sua família a deixar
leira Augusta. o Rio Grande do Norte para residir em
Nísia é o final de seu nome de ba­ Goiana, em Pernambuco, centro de­
tismo. Floresta, o nome do sítio onde senvolvido econômica e intelectual­
nasceu. Brasileira é o símbolo de seu mente. Nessa cidade, no Convento das
ufanismo, uma necessidade de afir­ Carmelitas, que possuía uma rica bibli­
mativa para quem viveu quase três oteca, Diomsia foi iniciada nos estu­
décadas na Europa. Augusta é uma dos clássicos, no trabalho manual e no
recordação de seu segundo marido, canto. Sob influência do pai, um ho­
Manuel Augusto de Faria Rocha. mem culto e liberal que chegara ao
Aguerrida defensora dos direitos da Brasil nos primeiros anos do século
mulher, escreveu 15 livros ao longo XIX, ela tomou contato com a cultura
de seus 74 anos de vida, a maioria fa­ européia. Anos após, passou a dominar
lando sobre questões referentes à mu­ os idiomas francês e italiano.
lher, como reflexões sobre direitos, de­ Nascida e criada em uma família
veres e educação. tradicional - sua mãe era proprietária
Essa é a figura de uma das mais ilus­ de vastas extensões de terras -, Nísia
tres mulheres do século XIX, reconhe­ se casou pela primeira vez aos 13 anos,
cida, sobretudo, hoje em dia por ter em Papary. Ela nem mesmo conhecia
rompido barreiras e preconceitos no o rapaz. Seu nome, Manuel Seabra de
que se referiam e ainda se referem às Melo, jovem pouco culto e dono de
chamadas minorias, e a quem o Proje­ grandes extensões de terra. Alegando
to Ler/DN Educação do DIÁRIO DE não amá-lo, a moça abandonou o ma­
NATAL presta uma justa homenagem rido alguns meses depois, voltando a
através deste rico material de pesqui­ residir com os pais, em Goiana, tendo
sa sobre sua vida e obra. sido essa sua primeira iniciativa na ten­
Para o resgate da obra dessa impor­ tativa de quebrar os limites impostos
tante figura, vários pesquisadores per­ pela sociedade plenamente patriarcal,
correram arquivos e bibliotecas do Nor­ que recriminou penosamente sua ou­
deste ao Sul do país, assim como no sada atitude.
exterior - Portugal, França e Itália -, re­ Posteriormente, a família mudou-
colhendo marcas e informações que se para Olinda, onde seu pai exerceu a
lhe permitissem reconstruir a trajetó­ advocacia. As revoltas e os antagonis­
ria da personagem em foco. mos entre Dionísio e membros da eli­
Se agora ela começa a se tornar um te local resultaram na depredação e sa­
pouco mais conhecida é justamente que do sítio da família em Papary e no
por esse trabalho de resgate e recupe­ seu trágico assassinato por um opo-
Nadvl, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006 DNOEDUCACÃO

A antiga estação de
trem de Papary, hoje
cidade deJjfcjaFloresta

nente na causa jurídica, no dia 17 de irmãs, Clara e Izabel, para Porto Alegre- dico, após semanas de tratamento, Deixando a filha Lívia na Europa, Nísia Floresta, no Rio de Janeiro.
agosto de 1828, quando Nísia ia com­ RS, onde nasceu em janeiro de 1833, aconselha mudança de ares. Nísia Flo­ esteve no Brasil novamente em 1872, Em 1889, aos 60 anos de idade,
pletar 18 anos. no mesmo dia em que Lívia havia nas­ resta resolve, então, ir para a Europa dezesseis anos depois, tempo este em morre o filho Augusto Américo, no Rio
Depois, Nísia passou a residir com cido três anos antes, o filho Augusto com os dois filhos, em 2 de novembro. que permaneceu longe do filho. O pe­ de Janeiro. Seu nome é lembrado co­
Manuel Augusto de Faria Rocha, aca­ Américo de Faria Rocha. Para muitos, a saúde da filha foi ape­ ríodo era de plena campanha aboli­ mo o de um educador afável e o dire­
dêmico da Faculdade de Direito de Manuel Augusto morre repentina­ nas um pretexto para ela se ausentar cionista liderada por Joaquim Nabuco. tor dos colégios Santo Agostinho e Au­
Olinda. Sua atitude foi extremamente mente com 25 anos, em 29 de agosto de do país. Com efeito, a campanha difa­ Retorna para a Europa em 1875. gusto, este último, de nome igual ao
corajosa para a época, pois seu pri­ 1833, deixando-a com os dois filhos pe­ matória nos jornais e o sucesso do li­ Nesse mesmo ano, Nísia recebe, se­ que sua mãe dirigiu. E em 1912, mor­
meiro marido, inconformado com a quenos. A dor por esta morte prematu­ vro elogiando os liberais eram moti­ manas depois, a notícia de que seu ir­ re Lívia Augusta Gade, que é enterra­
separação, ameaçava-a constantemen­ ra e as saudades da mulher apaixona­ vos suficientes para a escritora se sen­ mão Joaquim Pinto Brasil havia faleci­ da junto à mãe no Cemitério de Bon­
te, acusando-a de adultério. Em de­ da pontuarão seus escritos, como a tes­ tir pouco à vontade na Corte. do, em 9 de novembro. Três anos depois, secours. Desde 1855, Lívia residiu em
corrência de tais fatos, foi vítima de temunhar a fidelidade ao companhei­ Em 27 de janeiro de 1852, embar­ ela transfere a residência de Paris para vários países além da França, como
campanha caluniosa, especialmente ro morto. Ela decide permanecer na ca­ ca em Lisboa, rumo ao Brasil, no na­ Rouen, cidade medieval do interior da Alemanha, Inglaterra, Itália e Portugal,
por parte de seus conterrâneos. Em 12 pital gaúcha até 1837, chegando até vio inglês Treviot, permanecendo no França, e, em seguida, para Bonsecours. e não retornou m ás ao Brasil.
de janeiro de 1830, nasce a filha Lívia mesmo a dirigir um colégio para meni­ país até 1856, quase um ano após a Dez anos depois, em 24 de abril de Quase setenta anos depois de sua
Augusta de Faria Rocha, companhei­ nas, quando o clima da cidade fica ten­ morte de sua mãe, quando realizou 1885, numa quarta-feira de muita chu­ morte, os restos mortás de Nísia Flo­
ra das viagens pela Europa e sua futu­ so e difícil com a Revolução Farroupi­ sua segunda viagem à Europa, dessa va, às nove horas da noite, Nísia Flores­ resta foram trazidos da França, che­
ra tradutora. No ano seguinte, nasce lha, principalmente para uma mulher vez acompanhada apenas de sua filha ta Brasileira Augusta morre vitimada gando, em 12 de setembro de 1954, em
um segundo filho do casal que não so­ chefe de uma família composta por cri­ Lívia, enquanto Augusto Américo per­ por uma pneumonia. Dias depois, é Papary, que, aliás, já se chamava Nísia
breviveu. anças e outras mulheres, levando Nísia manece no Rio, estudando. Só após enterrada num jazigo perpétuo no Ce­ Floresta. Desde então, Nísia repousa
Concluindo o curso de Direito, em a transferir-se para o Rio de Janeiro. dezesseis anos tomará a ver a paisagem mitério de Bonsecours. Em 1888, o Cen­ no mausoléu construído em sua ho­
agosto de 1832, ManoelAugusto trans­ Em 1849, sua filha Lívia sofie um carioca de que tanto gostava, bem co­ tro do Apostolado do Brasil publica Se­ menagem, próximo do locá da antiga
fere-se com Nísia, sua filha, sua mãe e acidente ao cair de um cavalo, e o mé­ mo dos parentes que ficavam no cais. te Cartas Inéditas de Auguste Comte a residência do sítio Floresta.

Além da luta pelos


direitos da mulher,
a trajetória de
Nísia Floresta é
marcada pelo
combate ao
escravagismo e
pela defesa da
terra para os índios
DN OEDUCAÇAO Natal, Sbch-feira, 31 de Marçode 2006

METODOLOGIA ASCENSAO E Q U E D A DE U M PROJETO IN O V A !'

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uma Educadora
A educação feminina no Brasil do século XIX revela o mesma. Adotou métodos que honravam os seus
descaso quanto às capacidades e potencialidades das conhecimentos pedagógicos, lutou contra a rotina,
mulheres, parecendo, a rigor, desconhecer a produção desvelou-se pela formação moral das meninas e
literáriafemininado período. Não consideravam o esforço anunciou, no Rio, a inauguração do Colégio Augusto no
de muitas delas para transpor os obstáculos e vencer os Jom á do Comércio de 31 de janeiro de 1838, onde dizia
preconceitos e a ridicularização pública por ousarem que "áém de ler, escrever, contar, coser, bordar, marcar
penetrar em um espaço considerado de exclusividade e tudo m ás que toca a educação doméstica de uma
masculina menina, ensinar-se-á a gramática da língua nacioná
Com Nísia foi diferente, pois, com o pá, ainda no sítio por um método fácil, o francês, o italiano e os princípios
Floresta, desenvolveu seus primeiros estudos, tendo gerás da geografia. Flaverá igualmente neste colégio
aprendido noções de aritmética, doutrina cristã, história, mestres de m úsica e dança". Nísia respondeu à
desenho, música, trabalhos de agulha, caligrafia, noções de diversidade dos métodos adotados e ao caráter
português, francês, geografia e até mesmo latim. Mas foi explicitamente comercial da maioria das escolas,
em Goiana, primeiro grande centro morá e intelectuá de oferecendo um projeto educativo voltado para meninas,
Pernambuco, onde Nísia abriu a inteligência maravilhada que combinava o tradicional ensino de trabalhos
às surpresas da ciência e das letras, que havia de cultivar manuás com sólidos conhecimentos.
com esmero por toda a vida. Em Recife e Olinda, onde Iniciando suas atividades em 15 de fevereiro, o Colégio
residiu até fins de 1832, passou a dar m áor amplitude aos Augusto funcionou ativamente durante 17 anos, na capitá
seus conhecimentos. carioca. O nome da instituição é uma homenagem ao
A paixão das letras e das ciências foi notável nesta companheiro e grande amor de sua vida. Lá, ensinava-se
mulher. Durante cinco anos, Nísia Floresta esteve em Porto também latim, caligrafia, religião cristã, aritmética, história
Alegre, onde ficou viúva e se iniciou no magistério e onde e gramática inglesa, áém de desenho e trabalhos de agulha
se aprofundara no estudo das humanidades. Chegou ao Rio Em 1846, no dia 18 de dezembro, o Jom á do Comércio
de Janeiro em 1837, onde encontrou uma cidadezinha de publica a lista das áunas com menção honrosa do Colégio
137 mil habitantes, suja eassolada pelas endemias. Apesar Augusto e a relação dos examinadores em diversas
de tudo, era a primeira cidade do Império e havia um disciplinas. O nome de LíviaAugusto de Faria aparece como
extraordinário interesse pela instrução. uma das premiadas em latinidade. O mesmo jom á,
O Rio de Janeiro vivia uma verdadeira febre de escolas, posteriormente, publica diversas críticas anônimas e de
elas surgiam na cidade às dezenas, dirigidas principalmente •> educadores concorrentes por considerar as propostas
por estrangeiros, nuiitas vezes visando apenas o lucro e a educacionás avançadas e inadequadas às meninas, bem
beleza arquitetônica dos prédios. Mesmo assim, os como críticas ao ensino de latim. Um mês depois, o jom á
educadores brasileiros encontravam grandes dificuldades O Mercantil também criticou o fato de o Colégio Augusto
para competir com os estrangeiros, portadores, águmas enfatizar o ensino de línguas e ciências, em detrimento
vezes, de títulos intelectuais que os habilitavam dos trabalhos manuás.
superiormente para a profissão. Em 1849, Nísia seguiu para a Europa antes mesmo de
Assim mesmo, sabendo dos obstáculos que iria encerrar o ano letivo, deixando, dessa forma, a direção da
encontrar, Nísia fundou o seu colégio ajudada só de si instituição.
Na kl , Sexta-feira, 31 de Março de 2006 DNCPEPPCAÇÃO
REPERCUSSÃO LOGONOS PRIMEIROS ANOS DE ATUAÇÃO, N ÍSIA GANHOU O TÍTULO DE PRECURSORA
DOS IDEAIS DE IGUALDADE E INDEPENDÊNCIA DA MULHER EM NOSSO PAÍS

A militância na imprensa e
i a defesa das minorias
Nísia Floresta foi uma das primeiras mulheres a publicar contos, índio brasileiro, ela foi precursora. Em um longo poema de 712 versos
poesias, novelas e ensaios na chamada grande imprensa da época, já - intitulado Alágrima de um Caeté, de 1849 - estão dispostos interessantes
a partir de 1830, ano em que seu pai fora assassinado em Recife-PE, para posicionamentos da autora a respeito do indígena. Uma rápida leitura
onde sua família havia se mudado. Em 1831, ela dá seus primeiros do texto permite a identificação de inúmeros elementos marcantes do
passos nas letras, publicando em um jornal pernambucano, “Espelho romantismo como a lusofobia, o elogio da natureza e a exaltação de
das Brasileiras”, dedicado às senhoras pernambucanas, do tipógrafo valores indígenas.
francês Adolphe Emille de Bois Garin. Durante 30 números do jornal A novidade é que o poema traz não a visão do índio-herói que luta,
(de fevereiro a abril), Nísia colabora com artigos que tratam da condição presente na maioria dos textos indianistas conhecidos e.sirn.oponto
feminina em diversas culturas. de vista dos derrotados, do índio vencido consciente e inconformado
Em 1832, Nísia publicou a obra “Direitos das Mulheres e Injustiças dos com a opressão de sua raça pelo branco invasor. Não cabem, pois, em
Homens", assinando como o nome que adotou definitivamente: NísiaFloresta seu índio,os epítetos de inocente, de puro e de portador daquela
BrasileiraAugusta. Estapublicação deu-lhe o título incontestável de “precursora "bondade natural", idealizados nas teorias filosóficas européias e
dos ideais de igualdade e independência da mulher em nosso país. adotadas pelos demais escritores brasileiros. O contato com o homem
Envolveu-se plenamente com as questões culturais de seu tempo, branco revelou-se pernicioso demais para ele (e a história confirma) com
manifestando-as em sua müitância que se abria em diversas vertentes. conseqüências irreversíveis.
Tal fato, porém, não se expressaria de forma compartimentada, mas como A dor do indígena vem precisamente da consciência dessa
peças complementares de um mesmo plano de ação no conjunto de irreversibilidade e do meio-lugar (ou lugar nenhum) em que se encontra.
sua obra, sempre imbuída do propósito de formar e modificar O discurso da narradora, absolutamente preso ao do índio e às vezes até
consciências. As atividades jornalísticas exercidas por mulheres durante se confundindo com o dele, acrescenta um dado fundamental: o da perda
esse século e princípios do XX não se restringem ao âmbito doméstico de identidade por parte do silvícola, que os escritores românticos do
ou feminino. período tentavam escamotear. Conforme anúncios do Jornal do Comércio,
Recém-chegada da Europa, em 22 de fevereiro de 1852, o Jornal das foram tiradas pelo menos duas edições do poema em 1849.0 motivo do
Senhoras, do Rio de Janeiro, saúda a chegada da escritora e descreve sucesso deveu-se ao fato de tratar também da Revolução Praieira.
sua experiência na Europa, a partir de informações da própria Nísia.
Em 1853, publicou "Opúsculo Humanitário", uma coleção de 62 capítulos
sobre a educação da mulher, dos quais os vinte primeiros tinham sido
publicados anonimamente no Diário do Rio de Janeiro, durante
aproximadamente três meses. Meses depois, com o livro já circulando,
o texto aparece na íntegra em O Liberal, periódico político e noticioso,
no período de julho de 1853 a maio de 1854.

P ELA IG U A L D A D E D E D IR E IT O S

Nísia Floresta questiona em 1832 o porquê de não haver mulheres


ocupando cargos de comando, tais como de general, almirante, ministro
de estado e outras chefias. Ou ainda, porque não estão elas nas cátedras
universitárias, exercendo a medicina, a magistratura ou a advocacia, uma
vez que têm a mesma capacidade que os homens.
Como se vê, ela vai fundo em suas intenções de acender o debate e
de abalar as eternas verdades de nossas elites patriarcais. No cenário
nacional coube a Nísia Floresta o privilégio de praticamente deflagrar
a formação de uma consciência feminista.
No período de março a junho de 1855,0 Brasil Ilustrado publica em
oito capítulos a crônica "Páginas de uma Vida Obscura", assinada B A
O texto traz a história de vida de um negro escravo e o que a autora
pensava, na época, acerca da escravidão.
No Opúsculo Humanitário manifestou-se contra a escravidão, falando
como educadora que pressentia as graves repercussões que os costumes
degradados de uma sociedade escravagista teriam sobre a formação das
gerações jovens.
Também na abordagem de outras questões, como quando trata do
Natal, Sexla-feika, 31 de Marçode 2006

VISIONÁRIA N U M A É P O C A EM Q U E A M U L H E R E R A S IM P L E S M E N T E
S IN H A Z IN H A , N ÍS IA FLO R ESTA QUESTIONOU A ORDEM VIGENTE

Nísia Floresta publicou em vida quinze obras, em


português, francês e italiano. No entanto, embora seus
livros fossem bem acolhidos inclusive na Europa, não
obteve sequer menção de nenhum dos críticos e
historiadores daqui Gilberto Reyreéum dos raros escritores
brasileiros que tomou conhecimento da existência e da
importância deNfeiaFloresta. Em "SobradoseMocambos"
apresenta-a como "uma exceção escandalosa".
Seu primeiro trabalho foi, a princípio, inspirado
no livro da feminista inglesa Mary Wollstonecraft,
"Vindications of the Rights of Woman", onde Nísia
teria dito na apresentação que seria uma tradução
livre. No entanto, pesquisadores da escritora
descobriram que o trabalho não se referia somente à
obra da feminista inglesa, nem tampouco se tratava
de uma tradução. Segundo Constância Lima Duarte,
o termo "tradução livre" significa, na verdade, "criação
livre", e era bastante usado no século XIX com este
significado. "Considero este trabalho como sendo um
novo livro, de autoria de Nísia Floresta. Nele, podemos
perceber ecos de pensamentos de outros autores,
como a edição francesa de Mrs. Godwin, entre outros".
Na época de sua publicação, no ano de 1832, em
Recife, sob o título de "Direitos das mulheres e injustiça
dos homens", Nísia tinha apenas 22 anos, mas rodeada
por preconceitos, assim como a grande maioria das
mulheres brasileiras, sem qualquer direito que não
fosse o de ceder sempre à vontade masculina. Esta
obra foi, inclusive, o primeiro de que se tem notícia no

“ Cintilações de uma
alma brasileira” ,
livro de Nísia
Floresta com
edição bilíngüe,
publicado no Brasil,
em 1997, com apre­
sentação e biografia
de Constância Lima
Duarte

■ Direitos das mulheres e injustiça dos homens. Recife:Typographia ■ A lágrima de um Caeté. 2 ed., Rio de Janeiro:Typographia de L A F. a Le lagrime d'un CaetéTradotto da Ettore Marcucci. Firenze: Le Monnier, 1860.
Fidedigma, 1832. Menezes, 1849. a Trois ans en Italie, suivis d'un voyage en Grèce. 1o vol. Paris: Libraire E
a Direitos das mulheres e injustiça dos homens. 2 ed. Porto Alegre: a Dedicação de uma amiga. {Romance histórico). 2 vol. NiterókTypographia Dentu, 1864.
Reimpresso na Typographia deV. F de Andrade, 1833. Fluminense de Lopes & Cia, 1850. a Woman.Translatêd from the italian, by Livia A. de Faria. London: Printed by
■ Direitos das mulheres e injustiça dos homens. 3 ed. Rio de Janeiro: 1839. a Opúsculo humanitário. Rio de Janeiro:Typographia de M. A. da Silva Lima, 1853, G.Parker,Little StAndrew StreetUpper.St. Martins Lane, 1865.
■ Conselhos à minha filha. Rio de Janeiro:Typographia de J. S. Cabral, 1842. a Páginas de uma vida obscura; Um Passeio ao Aqueduto da Carioca; O a Parsis. Paris: [s/éd.J, 1867.
■ Conselhos à minha filha, com 40 Pensamentos em versos. 2 ed. Rio de pranto filial. Rio de Janeiro:Typ. de N.Lobo Vianna, 1854. a Le Brésil. Paris: Libraire André Sagnier, 1871.
Janeiro:Typographia de F. de Paula Brito, 1845. a Itineraire d'un voyage en Allemagne. Paris: Firmin Diderot Frères et Cie, 1857, a Trois ans en Italie, Suivis d'un voyage en Grèce. 2o vol., Paris: E. Dentu
■ Fany ou o Modelo das donzelas. Rio de Janeiro: Colégio Augusto, 1847. a Consigli a mia figlia. Firenze: Stamperia Sulle Logge dei Grano, 1858. Libraire-Éditeur et Jeffes, Libraire A. Londres, 1871 (ou 1872).
■ Daciz ou a jovem completa. Historieta oferecida a suas educandas. Rio de a Consigli a mia figlia. 2.ed. Mandovi: 1859. a Fragments d'un ouvrage inédit notes biographiques. Paris: A.Chérié,
Janeiro:Typographia de F. de Paula Brito, 1847. a Scintille dW anim a brasiliana. Firenze:Tipografia Barbera, Bianchi & Editeur, 1878.
■ Discurso que às suas educandas dirigiu Nísia Floresta, em 18 de dezembro C. 1859. a Colaboração em jornais
de 1847. Rio de Janeiro:Typographia Imparcial de F. de Paula Brito, 1847. a Conseils a ma fille.Traduit de fitalien par B.D.B.. Florence: Impr. du a "Passeio ao Aqueduto da Carioca", O Brasil Ilustrado, Rio de Janeiro, em
■ A lágrima de um Caeté. Rio de janeiro:Typog"aphia de L A F Menezes, 1849. Monnier, 1859. 15\07\ 1855, pp. 68,69 e 70.
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Natal, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006 DN© EDUCAÇÃO
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Brasil, e trata dos direitos das mulheres à instrução E 1849, Nísia publica a primeira edição de "A preconceito e condena os erros seculares da Um outro trabalho, dos mais importantes, é
e ao trabalho, defendendo que as mulheres sejam Lágrima de um Caeté", no Rio de Janeiro, mas sob formação educacional da mulher, não só no Brasil "Scintille d' un'anima brasiliana", publicado em
consideradas como seres inteligentes e o pseudônimo de Telesilla, sendo traduzido para como em diversos países. Florença, na Itália, no ano de 1859. Este livro
merecedoras de respeito pela sociedade. o idioma italiano, por Ettore Marcucci, em 1860, Em 30 de abril de 1855, em "O Brasil Ilustrado", contém cinco ensaios que tratam da educação de
A autora brasileira aponta os principais em Florença. Ao final do poema, quarenta e uma há um poema assinado por B. Augusta, cujo título é jovens, da mulher européia, da pátria distante e
preconceitos existentes no Brasil contra seu sexo, notas explicam o vocabulário e relacionam o "Um improviso - na manhã do Io do corrente, ao das saudades que ela sentia de seu país, após
identifica as causas desse preconceito, ao mesmo poema de Nísia com Damte, Ariosto e a Bíblia. distincto literato e grande poeta Antonio Feliciano tantos anos ausente. Um dos textos, intitulado "A
tempo em que desmistifica a idéia dominante Em 1850, já residindo em Paris, é publicado de Castilho". Um ano depois, é publicado um livro Mulher", trata da mulher francesa de meados do
da superioridade masculina. No ano seguinte, em Niterói o romance histórico "Dedicação de de versos "Pensamentos". século XIX, que a autora critica pelo
saiu uma segunda edição, quando Nísia morava uma amiga", trazendo apenas as iniciais BA como "Itinerário de uma viagem àAlemanha", de 1857, comportamento superficial e mundano.
em Porto Alegre e, em 1839, ainda uma terceira, assinatura. Segundo Constância, este livro deve e "Três anos na Itália, seguidos de uma Viagem à Em 1867, é publicado em Paris o romance
no Rio de Janeiro. ser considerado o primeiro romance escrito por Grécia" (em dois volumes, de 1864 e 1872) são os "Parsis". Apesar de incluído entre os títulos da
Seu segundo livro veio a ser publicado em um norte-rio-grandense, segundo historiadores. títulos desses livros escritos e publicados em língua autora. Nesse ano, é publicada em Londres a
1842, e foi dedicado à filha Iivia como presente Das muitas viagens que realizou pela Europa, francesa O primeiro, sob a forma de cartas dirigidas tradução inglesa de um dos ensaios de Scintille:
de aniversário de 12 anos, sob o título de resultaram alguns livros que, bem ao gosto da ao filho e aos irmãos, foi traduz ido do francês para "La Donna". Trata-se deWoman, por F. Brasileira
"Conselhos à Minha Filha", assinando F. Augusta época, contêm suas impressões dos lugares que o português, em 1982, por Francisco das Chagas, Augusta, traduzido do italiano por Livia A. de
Brasileira. O livro teve uma grande repercussão ia conhecendo. Só que Nísia Floresta não realiza depois de mais de cem anos em língua estrangeira Faria, filha da escritora. Já em 1871, é publicado
e foi a sua obra de mais edições e traduções. A simples relatos de viagem. Ela descreve com O segundo, apesar de considerado uma obra- "Le Brésil", de Mme Brasileira Augusta, também
segunda edição saiu em 1845, tendo sido riqueza de detalhes as cidades, as igrejas, os prima, onde ela teria alcançado a culminância de traduzido por Livia Augusta Gade. O sobrenome
acrescentada de quarenta pensamentos em museus, os parques, as bibliotecas e seu esplendor intelectual, permaneceu inédito em Gade veio do alemão com quem se casou, tendo
versos. A primeira tradução foi para o idioma monumentos, detendo-se nos tipos humanos e língua francesa até pouco tempo, quando teve a ficado viúva após quatro meses de casada.
italiano da própria autora, em 1858. A publicação comentando tudo que observava sempre com sua primeira edição traduzida, também por Em 1878, três anos depois de ter passado uma
de "Consigli a mia Figlia" se dá em Florença, e os muita sensibilidade e erudição. Francisco das Chagas. O livro é interessante temporada no Brasil e já de volta a Paris, publica
quarenta pensamentos em verso da edição Em 1853, no Rio de Janeiro, um ano após ter porque contém anotações do ano anterior à seu último trabalho, "Fragments d'un ouvrage
brasileira aparecem agora em prosa. Um ano retornado da Europa, publicou "Opúsculo unificação italiana, a descrição da luta, dos inédit: Notes biographiques", em Paris, assinando
depois, sai uma segunda edição da versão italiana. Humanitário", uma coleção de artigos sobre sentimentos populares, do clima revolucionário Mme BrasileiraAugusta Este livro, apesar de conter
No mesmo ano, o livro é publicado em francês, emancipação feminina, que foi merecedor de e ainda nos revela a admiração da autora pelos principalmente informações a respeito do irmão,
em Florença, sob título de "Conseils à ma Filie", uma apreciação favorável de Auguste Comte, pai líderes, Garibaldi e Azeglio, com quem se Joaquim Pinto Brasil, traz também dados
dessa vez traduzido por Braye Debuysé. do positivismo. Neste livro, a autora combate o correspondeu durante algum tempo. biográficos da autora, até então desconhecidos.

ADAUTQDACÁMAJí A

HISTttülA DE “Itinerário de
n ís ia uma viagem à
Alemanha, livro
“Três anos na Publicação em
FLO R EST A “História de Nísia de Nísia Floresta
Itália seguidos de francês da obra Floresta”, de com introdução
uma viagem à
“Três anos na Adauto da de Constância
Grécia”, livro de
Itália, seguidos de Câmara, em 1941. Lima Duarte e
Nísia Floresta,
uma viagem à Foi a primeira tradução de
com apresen­
tação de Grécia”, escrita biografia de Nísia Francisco das
Constância Lima em dois Floresta, escrita Chagas Pereira.
Duarte. Editora volumes(1864 e no Rio Grande Editora Mulheres
da UFR N,1999. 1872 do N orte e EDUNISC

■ "Páginas de uma vida obscura", O Brasil Ilustrado, Rio de Janeiro, em ■ Itinérário de uma viagem à Alemanha.Trad. Francisco das Chagas Pereira. ■ Três anos na Itália. Trad. Francisco das Chagas Pereira. Apresentação de
14\03,31\01,15\04,30\04,15\05,31\05,15\06 e 30\06 de 1855. Natal: Editora Universitária, 1982. Constância Lima Duarte. Prefácio de Franco M.Jasiello. Natal: Editora da
■ "Um Improviso, na manhã de 1o do corrente, ao disdncto literato e grande ■ Opúsculo humanitário. Introdução e notas de Peggy Sharpe-Valadares. UFRN, 1999.
poeta Antonio Feliciano de Castilho”, O Brasil Ilustrado, 30\04\1855, p. 157. Posfácio de Constância Lima Duarte. São Paulo: Cortez Editora, 1989. ■ Fragmentos de uma obra inédita. Notas biográficas.Trad. Nathalie
■ "O prarto filial", O Brasil Ilustrado, em 31\03YI856, pp. 141 e 142. ■ Direitos das mulheres e injustiça dos homens. Apresentação, notas e pos­ Bernardo da Câmara. Prólogo Maria Lúcia Garcia Palhares-Burke.
fácio de Constância Lima Duarte. São Paulo: Cortez Editora, 1989. Apresentação Constância Lima Duarte. Brasília: Editora UnB, 2001.
■ A lágrima de um Caeté. Estudo e Notas de Constância Lima Duarte.
Edições Póstumas Natal: Fundação José Augusto, 1997. O utras publicações
■ Auguste Comte et Mme. Nísia Brasileira (Correspondance). Paris: Libraire a Cintilações de uma alma brasileira. Edição bilíngüe Trad. Michelle Vartulli/ ■ Cartas: Nísia Floresta & Auguste Comte.Trad. Miguel Lemos e Paula
Albert Blanchard, 1929. Zahidé Muzart e Suzana Funck. Apresentação e biografia de Constância Uma Berinson. Pesquisa, organização, notas e artigo introdutório de Constância
■ Fanny ou o modelo das donzelas. In OSÓRIO, Fernando. Mulheres Duarte. Florianópolis: Editora Mulheres, EDUNISC, 1997. Lima Duarte. Florianópolis: Editora Mulheres, EDUNISC, 2002.
Farroup has. porto Alegre: Editora Globo, 1935. ■ Itinerário de uma viagem àAlemanha. 2 ed.Trad. Francisco das Chagas ■ Nísia Floresta: a primeira feminista do Brasil. Estudo introdutório, notas
■ A lágrima de um Caeté. In Revista das Academias de Letras. Apresentação Pereira. Estudo e notas biográficas de Constância Lima Duarte. Florianópolis: biográficas, seleção dos textos de Constância Lima Duarte. Florianópolis:
de Modesto de A t" . Rio de Janeiro: Janeiro de 1938. Editora Mulheres, EDUNISC, 1998. Editora Mulheres, EDUNISC, 2005.
Bibliografia organizada p or Constância Uma

f
Natal, Sexbv-feira, 31 de Marçode 2006

v ia g e m DURANTE 28 ANOS, NÍSIA PERMANECEU NA EUROPA, ONDE RELACIONOU-SE COM INTELECTUAIS

Deixando para trás familiares, o Co­ Comte, na divulgação de suas teorias.


légio Augusto, que havia fundado em Em Portugal ela residiu durante seis
1838 e que já se destacava entre os me­ meses do ano de 1851, quando teve
lhores da Corte na instrução para me­ oportunidade de viajar pelo país e for­
ninas, além de um nome que começa­ talecer os laços de amizade com Ale­
va a se tomar conhecido e vários li­ xandre Herculano e Antonio Feliciano
vros publicados, Nísia Floresta parte de Castilho. No Instituto Histórico e
do Brasil no dia 7 de setembro de 1849 Geográfico do Rio de Janeiro, aliás,
com seus dois filhos, a bordo da gale­ existe um exemplar de Opúsculo Hu­
ra francesa Ville de Paris. Exatos cin- manitário dedicado a Herculano.
qüenta e dois dias depois, chega ao Em 27 de janeiro de 1852, retoma
conturbado clima parisiense, ainda ao Brasil, onde permanece até 1856,
não de todo refeito das revoluções do quando segue para a segunda viagem
ano anterior. à Europa no vapor francês "Cadix", em
Ao todo, permaneceu vinte e oito direção ao Havre, acompanhada ape­
anos de sua vida na Europa. Nessa épo­ nas por Lívia. Nesse mesmo ano, Nísia
ca, no auge da maturidade intelectu­ se aproxima do filósofo e inicia uma
al, relacionou-se com grandes escri­ amizade cordial e respeitosa, pontua­
tores, cientistas e aristocratas, como da de visitas, cartas e mútua admira­
Alexandre Herculano, Antônio Felici- ção, que vai durar até a morte de Com­
ano de Castilho, Luis Filipe Leite, Maz- te, no ano seguinte. Na Duodécima
zoni, Lamartine, Duvemoy, Victor Hu­ Confissão Anual, de outubro desse ano,
go, George Sand, Azeglio e Auguste Comte anotou o primeiro contato com
Comte, viajando durante anos segui­ a brasileira:
dos pela Itália, Portugal, Alemanha,
Bélgica, Grécia, França e Inglaterra. “Em agosto, devo inicialmente re­
Mas, dentre todos estes importan­ gistrarmeuprimeiro contato direto com
tes relacionamentos, o que se tomou a nobre viúva brasileira que me ofere­
mais conhecido foi o que manteve com ce, de coração, de espírito e de caráter,
Auguste Comte, iniciado ainda nesta todos os indícios de uma preciosa dis­
primeira viagem. Primeiro, ela tomou cípula, se eu puder transformar um
contato com a filosofia comtiana, pois, pouco seus hábitos metafísicos’’.
em 1851, era uma das poucas pessoas
interessadas que afluíam no Auditó­ Um ano depois, em 5 de setembro
rio do Palais Cardinal, para assistir às de 1857, Auguste Comte morre, e, de
conferências do Curso de História Ge­ acordo com informações passadas pe­
ral da Humanidade ministradas por la imprensa, poucos seguidores acom-

A escritora O livro “Cartas ■


percorreu boa parte Nísia Floresta &
da Europa, Auguste Com te”, de
acumulando Constância Lima
experiências que Duarte, resgata a
serviram de base correspondência
para outras entre o filósofo e a
publicações escritora
Nakl, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006 DN<PEDUCAÇÃO ;
panharam o cortejo fúnebre ao Père Lachaise, mas, dentre as quatro escrito pode ser avaliada quando se sabe que foi guardado separada­
mulheres que lá estavam, Nísia Floresta era uma delas, ao lado de Sop- mente, junto com os documentos mais íntimos e prezados por Com- /
hie Bliaux, a filha adotiva de Comte, a irmã mais velha de Sophie, Mme te. x
Laveyssière e Mme Maria Robinet. Na penúltima carta de Comte, por exemplo, de 24 de agosto de
No ano seguinte, Nísia decide realizar algumas viagens, visitando 1857, a mais longa e em resposta a Nísia, Constância diz que existem
cidades como Roma, Nápoles, Florença, Veneza, Verona, Milão, Tori- várias referências à amizade que devotava à "nobre viúva brasileira", / .
no, Iivomo, Pádua, Mântua, Pisa, Mombasilio e Mandovi. Em 1859, ela à doença que logo o vitimaria, assim como à sua descrença pelos mé- /
parte para a Grécia e visita Eleusis, Esparta, Atenas, Argos. Depois, vi­ dicos e pela medicina. Nela, Comte rebate enfaticamente os conselhos
aja pela Sicília e conhece Palermo, Siracusa, Catânia, Messina. de Nísia Floresta para que procurasse médicos. O filósofo interpreta 'pri­
Em 1860, ao completar 50 anos, Nísia Floresta instala-se em Floren­ meiros médicos' como 'os mais ricos1, e, portanto, indignos de sua
ça. Nesta cidade tem oportunidade de acompanhar cursos de Botâni­ confiança. Poucos dias depois, em 5 de setembro, Comte morre, resul­
ca ministrados por Parlatore, antigo colaborador de Humboldt. Em tado de uma gripe mal curada, após muita agonia, conforme relatos
Paris ela já havia assistido aulas desta matéria no Collège de France e de amigos que o assistiam. Confira alguns trechos da carta de Nísia a
no Musée d' Histoire Naturale. Em 1861, Nísia Floresta regressa a Pa­ Auguste, e, logo em seguida, a resposta de Comte, que costumava datar
ris e mais uma vez prepara-se para residir nesta cidade, após três anos suas mensagens baseando-se no calendário positivista:
ausente.
Porém, dez anos depois, pressionada pela família e desgostosa com Paris, 22 de agosto de 1857
os conflitos da Comuna em Paris, Nísia vende seus pertences e deixa [Recebido no domingo, 11 de Gutemberg de 69]
definitivamente a cidade. Segue primeiro para Londres com a filha e
depois para Lisboa, onde embarca, mais uma vez, para o Rio de Janei­ Senhor,
ro. Lívia não a acompanha e permanece na Europa.
Nísia permanece no Brasfl no período de 1871 e 1875, retomando Desde há um mês, todos os corações que o amam e que depositaram no senhor
para o Velho Mundo. O primeiro destino é a Inglaterra, onde a filha a todas as suas esperanças vindouras sofrem profundamente com o estado em que o
A casa onde morou aguarda, e, após alguns meses, segue para Lisboa. Em 1878, Nísia trans­ senhor se depaupera, sem querer recorrer à ciência dos primeiros médicos, subme-
Nísia Floresta, em fere a residência para Rouen, cidade medieval do interior da França e, tendo-se a uma consulta. Permita que em nome desses corações que lhe estão sin­
Rouen, na França em seguida, para Bonsecours, na Grande Route, onde vem a falecer se­ ceramente ligados, em nome da humanidade de que o senhor é o ministro e o mais
te anos depois. zeloso servidor, minha fraca voz se eleve junto a seu leito para suplicar-lhe que re­
corra à arte enquanto ainda é tempo. (...)
CORRESPONDÊNCIAS
Veneração e simpatia profundas.
Foram os positivistas os responsáveis pela preservação da corres­ Bmsileira
pondência trocada entre Nísia e Comte. Na Igreja da Humanidade - ou
Apostolado Positivista do Brasil -, no Rio de Janeiro, encontram-se se­ Paris, segunda-feira, 12 de Gutemberg de 69
te cartas que Comte dirigiu a Nísia Floresta. Elas foram traduzidas pe­ [2 4 de agosto de 1857]
lo positivista Miguel Lemos e publicadas em 1903 e republicadas 77 anos
depois pelo jornal A República, de Natal. Elas foram, também, divul­ Minha Senhora,
gadas em 1936 pela Igreja Positivista do Brasil, num folheto, sendo que
em francês. Em resposta à sua carta, muito afetuosa, porém pouco judiciosa, posso limitar-
Diferentemente disso, as cartas da escritora Nísia Floresta perma­ me a desenvolver a minha profunda convicção de que, se me tivesse infelizmente
neciam, até agora, absol’ -lamente inéditas, ainda manuscritas, integran­ submetido às precipitações vãs emanadas da ciência falaz das notabilidades médi­
Na França,Nísia do o acervo da Maison d'Auguste Comte, em Paris. Pela primeira vez, cas, estaria atualmente morto. Sr.Audiffrent, que veio generosamente de Marselha
Floresta teve sua essas correspondências dão origem a um livro, "Cartas - Nísia Flores­ para certificar-se sobre o meu estado, admitiu por completo esta opinião; (...) Os dou­
obra reconhecida e ta & Auguste Comte" (Editora Mulheres, 2002). tores Robinet e Foley, fortuitamente reunidos sexta-feira em minha casa, confirma­
pôde compartilhar A autora, Constância Lima Duarte, reúne um conjunto de mensa­ ram o acerto das minhas previsões sobre o resultado natural e próximo de cada um
suas idéias com gens trocadas por Nísia e Comte e faz uma análise minuciosa, onde re­ dos dois tumores nos quais residem os únicos resquícios importunos da moléstia. (...)
filósofos e intelectuais vela, principalmente, uma rara oportunidade de conhecê-los um pou­ no final de contas, por mais assustados que os outros estejam, não conseguirão ja ­
co mais e de vislumbrar as particularidades da amizade que os unia, mais assustar-me num caso em que, melhor que ninguém, sinto que somente olhos
feita da admiração e respeito intelectual. vulgares puderam prever a minha morte. A sua invocação de uma vítima Angélica
Segundo Constância, à medida que as cartas se tomam freqüentes, em apoio de um conselho perigoso, é tanto mais cega, quanto a minha Beatriz su­
elas vão deixando transparecer uma valiosa dimensão confessional e cumbiu, não pela moléstia, porém pelos seus dois médicos: é certo que eles não fi­
também inúmeros pormenores, tanto biográficos como relacionados guravam entre as notabilidades, isto é, os mais ricos, que são precisamente os que
ao pensamento positivista. Os emissores vão se expondo com natura­ mais desprezo, intelectual e moralmente. (...)
lidade, e as opiniões parecem surgir espontâneas, sem maiores cuida­
dos intelectuais. Respeito e simpatia
A pesquisadora ressalta no livro que o fato de os escritores irem se Auguste Comte
expondo faz com que sua correspondência se tome, também, um pre­
cioso documento da biografia de Auguste Comte. Muitas informações,
segundo descreve, "podem iluminar aspectos obscuros ou pouco co­
nhecidos da história intelectual e pessoal do escritor e, mesmo, da his­
tória de sua época".
Em sua pesquisa, Constância observou que, nos arquivos da Mai­
son d'Auguste Comte, existem cartas de apenas duas mulheres dirigi­
das ao filósofo, precisamente de Nísia Floresta e de Clotilde de Vaux,
sua mulher e grande musa inspiradora. Ela, inclusive, numa época em
que se viu abandonada e sem recursos para saldar as dívidas de jogo
do marido, defendeu a mudança da lei que instituía ser o casamento
uma instituição indissolúvel. Além disso, Clotilde pregou inutilmente
a introdução do divórcio na França.
Através desta correspondência de Nísia Floresta e Comte, como re­
lata Constância, é possível saber, por exemplo, que, em 5 de abril de Filósofo
1857, Nísia fez uma visita ao túmulo de Clotilde de Vaux e que lhe de­ Auguste
dicou um texto emocionado e elogioso que muito comoveu o filóso­ Comte, o pai
fo, conforme ele mesmo confessa em uma carta. A importância deste do positivismo
DNOEDUCAÇÃO NaHL, SEXIA-FBmA, 31 de MarçoDE 2006

RECONHECIMENTO APÓS 69 ANOSDE SUA


MORTE, NÍSIA FLORESTA RECEBE AS
HOMENAGENS DO SEU POVO

Restos
mortais
chegam
ao Rio
Grande
do Norte
Após voltar à Europa em 1875, Nísia Floresta só retomaria da República, atende aos apelos de órgãos e pessoas como
/ ao Brasil em 1954, quando seus restos mortais foram o próprio Orlando Ribeiro, além de Marciano Freire e o
trasladados de Bonsecours, região portuária da França, escritor e educador Henrique Castriciano, para transportar
onde morreu, até sua terra natal. A foima como foi enterrada, os despojos da escritora ao Brasil. E somente três anos
embalsamada com produtos químicos, preservou as depois fica autorizada a trasladação de seus restos mortais
características fisionômicas da escritora por mais de meio para o Brasil, através da lei n° 1892, de 23 de junho de 1953.
século após sua morte. Outra causa favorável foi o clima No ano seguinte, em 1954, Marciano Freire vai a
gelado da cidade, com apenas dois meses de verão, que Bonsecours acompanhar o traslado dos despojos da escritora
contribuiu para o estado de mumificação do corpo. que saem de Marselha pelo navio "Loide-Brasil" em 9 de
Pesquisadores acreditam, amparados na forma como agosto, e chegam finalmente no dia 5 de setembro em
foi enterrada, na hipótese de que Nísia Floresta desejava ser Recife. Os restos mortais de Nísia Floresta foram
trazida de volta ao Brasil logo após sua morte. Mas os restos recepcionados por uma grande multidão em sua terra natal,
mortais de Nísia só voltariam 69 anos depois. E isso foi em 11 de setembro de 1954, e, nesse mesmo dia, os jornais
graças ao jornalista Orlando Ribeiro Dantas, fundador do de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Rio Grande do
Diário de Notícias do Rio de Janeiro, quando, em 1950, vai Norte registram a chegada dos despojos da escritora em
à França tentar encontrar o túmulo de Nísia. Após semanas Natal. Há homenagens da Base Naval, bandas de música e
de investigação, o jornalista finalmente descobre seu túmulo. exposição do caixão perante a população e autoridades^
Quando o potiguar João Café Filho assume a presidência locais. O Departamento dos Correios e Telégrafos lança um
Natal, Sexia-fhka, 31 de Marçode 2006 DNOEDUCAÇÃO

t ú mu l o
0 4 ' i ■o f k
K ÍS t A FiméstA:

Grande cortejo de carros,


acompanhado de
selo comemorativo do retomo de Nísia Floresta ao Brasil. O nome da cidade, antes chamada Vila de Papary, foi estudantes, autoridades
O professor Jorge Carvalho, então com cinco anos na modificado em 23 de dezembro de 1948, para homenagear civis e militares, além da
época, lembra que aviões cobriam os céus a jogar folhetos, sua grande representante. apresentação de uma
escritos pelo folclorista e historiador Câmara Cascudo com O ataúde onde foi depositado os despojos de Nísia banda de música e
a foto da escritora e sua biografia no verso. Um cortejo grande Floresta era feito de zinco, com um outro caixão de ébano celebração de missa
de carros acompanhou a chegada do caixão. Alunos de diversas o envolvendo. O tamanho do ataúde surpreendeu as marcaram a chegada dos
escolas públicas e privadas, inclusive da escola doméstica autoridades locais, que esperavam um caixote a ser colocado despojos de Nísia, que
estavam presentes. O prefeito de Nísia Floresta, José Ramires, no túmulo que já existia na cidade, em forma de pirâmide, ainda recebeu
fez o pré-discurso, sob olhares de populares e autoridades construído como marco religioso, em 1909, para homenagear homenagens da Base
políticas do Estado. Militares da Marinha e Aeronáutica levaram o centenário da escritora. O ataúde era grande para o Naval e dos Correios e
o ataúde até a igreja matriz de Nossa Senhora do Ó. tamanho do túmulo, que precisou ser quebrado. As Telégrafos com a criação
O historiador Adauto da Câmara, autor do primeiro livro autoridades requereram verba para construção de um de selo comemorativo
sobre Nísia Floresta, escrito em 1941, relata que o caixão com mausoléu digno da representatividade e importância de
os restos mortais da escritora foi aberto na Academia Nísia Floresta. Mas foi em vão.
Pernambucana de Letras, onde foi constatada a conservação O ataúde com os restos mortais de Nísia Floresta
das expressões fisionômicas do corpo. De Pernambuco, o permanece na igreja matriz durante meses, até o dia em que Panfleto distribuído por ocasião
caixão foi levado à Nísia Floresta, litoral agreste do Rio o novo mausoléu foi construído, ainda no sítio Floresta, da chegada dos restos mortais de
Grande do Norte, a 43km de Natal, onde nasceu a escritora. onde Nísia morou. Nísia, em 1954
Nahl, Sexta-feira, 31 de Mabçode 2006

RESGATE HENRIQUE CASTRICIANO FOI O PRIMEIRO A VALORIZAR A OBRA DE NÍSIA FLORESTA

O primeiro reconhecimento no RN
Elegendo Nísia Floresta para sua madrinha na poltrona de n° 2, estão já há mrntos anos com a professora Noilde. Eles foram doados
fundada por ele na Academia Norte-rio-grandense de Letras(ANL), por Clóris Cardoso, ex-áuna da ED e enteada do senador Elóy de
Henrique Castriciano prestou importante homenagem à escritora Souza, irmão de Henrique Castriciano. O caderno está entre as relíqmas
conterrânea. No dizer de Hélio Galvão, em discurso realizado na do Espaço C átu rá Nísia Floresta, uma homenagem prestada pela
Academia Norte-rio-grandense de Letras, em maio de 1970, ele não Escola Doméstica àquela que foi uma verdadeira musa inspiradora
fez essa homenagem em forma de livro porque papel as traças poderíam para a visão de educador de Henrique Castriciano, que águns anos
destruir ou o vento podería levar. Mas fez em granito e bronze, em forma após essa viagem, fundou a Escola Doméstica de Natá. Os escritos
m ás duradoura e eloqüente. "Quem foi, senão ele, o inspirador das de Castriciano foram feitos durante sua viagem à Europa, em suas visitas
grandes homenagens prestadas a Nísia em 1909? Que m áor e m ás à Biblioteca Nacioná de Paris e a todos os locais que serviam de
formoso e m ás durável elogio não constituem os dois monumentos referência à sua pesquisa Mátas páginas estão inteiramente dedicadas
erigidos em honra da escritora no sítio do seu nascimento e nesta a Nísia Floresta e seus parentes, em letra muito pequena, ora em
capitá?", argumentava Hélio Gávão ao se referir aos monumentos na português, ora em francês. O caderno de anotações pode ainda revelar
cidade de Nísia Floresta e o monumento de granito com medalhão, imiitos episódios da viagem de HC e particularidades da vida de Nísia
ergádo por Henrique Castriciano, na Praça Augusto Severo, na Ribeira, Floresta, mas para isso precisa ser examinado por especialistas.
em Natal.
Henrique Castriciano nutria grande admiração por Nísia Floresta.
Foi a primeira personáidade do estado a se preocupar em preservar
a memória da escritora. Seu carinho pela memória de Nísia chegou
a extremos. Pesqmsou endereços, revirou livrarias, correspondeu-se
com Lívia Augusta, filha de Nísia, adquiriu fotografias, comprou livros,
tomou apontamentos e, por ocasião do centenáio de nascimento
da escritora, visitou em Rouen o túmulo onde repousavam os restos
mortás. O resátado das investigações de Castriciano é que Nísia ficou
conhecida e ele tornou acessíveis os seus livros. E, além dos
monumentos, deu o nome de Nísia à cadeira n° 2 que fundou na
Academia Norte-rio-grandense de Letras.
H. Castriciano, como costumava assinar, nasceu em 15 de março
de 1874, em Macaíba. O irmão Irineu Leão morreu queimado numa
O escritor Henrique Castriciano explosão de um candieiro de querosene, em 1887. Também tinha
viajou à Europa para pesquisar a m ás dois irmãos, um m ás velho, Eloy Castriciano de Souza, senador
vida e a obra de Nísia Floresta, por (1873-1959), e um m ás novo, João Câncio (1877-1933). Henrique
quem tinha grande admiração Castriciano, bacharel em Direito, muito viajado, e possuidor de uma
grande cultura, chegou a ser vice-govemador do Estado. Foi "jornalista,
escritor, crítico, impões-se aos seus contemporâneos pelo táento, pela
cultura e pela inspiração poética".
Em meados de 1909 viaja para a Europa. Queria descobrir a vida
e obra de Nísia Floresta, áém de colher informações para implantação
em Natá de uma escola doméstica. Viajou através da Suíça, Itália,
Portugá, Espanha, França, Grécia, Egito e Páestina. E em uma segunda
viagem, em 27 de agosto de 1913, visitou a Bélgica e a Alemanha. Em
26 de julho de 1947, às 7h da manhã, H. Castriciano morre. A liga de informações que, generosamente, nos
Escritor Hélio Galvão foi ministrou. Podemos assegurar que o
Ensino, o Escotismo no RN para educação masculina, a Escola
ocupante da cadeira de n° 02 e Brasil não esqueceu Nisia Floresta
Doméstica de Natá (01-09-1914) para a educação feminina, a Academia
grande conhecedor da vida de por obra e graça de Henrique, que
de Letras do RN, de onde foi o primeiro presidente, foram suas grandes
Henrique Castriciano e Nísia tão fervorosamente tem cultuado a
realizações.
memória, procurando tornar
A N O T A Ç Õ E S D E U M A V IA G E M À E UR O PA conhecidos, por toda a parte, os seus
talentos... Ele esteve em contato com
"Onde estarão as notas que ele (Henrique Castriciano) coligiu pessoas que conheceram Nisia; travou
sobre sua patrona? As cartas da filha da escritora, quem as guardara? relações com sobrinhas residentes no
Os livros, raros e caros, onde foram parar? Por que o desvelo do escritor Rio; correspondeu-se com a filha de
pela escritora não lhe permitiu doar à Academia tudo o que possuísse Nísia; pesquisou, pessoalmente, na
a seu respeito? Por que Castriciano não escreveu uma biografia, Europa, sobre esta grande vida.
conforme se anunciou ou se esperou?" Alguns desses questionamentos Ninguém melhor que ele para tratar a
feitos por Hélio Gávão ainda não têm resposta, mas a reportagem do biografia definitiva de Nisia Floresta; e
DN EDUCAÇÃO conseguiu locáizar uma verdadeira raridade, o o órgão mais autorizado, o estudioso
caderno de anotações de Henrique Castriciano, escrito com seu próprio mais bem infottn&É, a última
punho, durante sua viagem à Europa para estudar a vida e a obra de instancia neste ãssun^m io de Janeiro,
Nísia Floresta, com data de 1909. mafço d £ l9 4 1 .
O caderno ainda continua em bom estado e está sob a guarda de Adauto Miranda Raposo da Câmara
(autor do prim eiro livro biográfico sobre
uma de suas máores admiradoras, a educadora Noilde Ramalho, Nísia Floresta)
diretora da Escola Doméstica de Natá, que nunca havia aberto, nem
lido sequer um parágráo. Os escritos inéditos de Henrique Castriciano
Natal, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006

A professora
Noilde Ramaiho
revela ao repórter
HINO EM H O M E N A G EM A
Francisco Francerle ESC R ITO R A N ÍSIA FLO R E S TA
os escritos inéditos
do caderno de (Autor desconhecido)

anotações da
viagem de I
SALVE OH! FILHA IMORTAL DESTA TERRA
TERRA ARDEN TE DE RÍSPIDO SOi.
Henrique QUE SOMENTE EM BELEZA ENCERRA
Castriciano à MAE FECUNDA DE BRAVOS HERÓIS

Europa, em 1909, REFRÃO

em busca de SURGE, RESURGE. BRILHA


OH! NÍSIA. SUBUMADA
informações sobre OH! SEMPRE TERNA
FILHA DA TERRA BEM AMADA
Nísia Floresta. DA TERRA. BEM AMADA

0
TU QUE ÀS PLAGAS ESTRANHAS LEVASTE
O TEU NOME. O TEU NOME ÊTERNAI.
O TEU NOME OBSCURO ENCERRASTE
NO ESPLENDOR DE UMA GLÓRIA IMORT AL

iil
ESSA GLÓRIA É TUA ESSA GLÓRIA
OS VINDOUROS MELHOR GUARDARÃO
HOJE EMERGE NO FUNDO DA HISTÓRIA
SOBRE AURÉOLA DE EXCELSO CLARÃO

As homenagens no Brasil as m

Segundo apesquisadoraejomalistaNathalie Câmara, aprimeira naAcademiaNorte-rio-grandense de Letras, em 15 março de 1951, em sua carta,já me havia mandado notícias a respeito da inauguração
das homenagens a Nísia Floresta que se tem notícia foi a publicação, homenagem à memória de Henrique Castriciano diz o seguinte:: do referido Monumento".
pelo Centro do Apostolado do Brasil, em 1888, de Sept Lettres
Inédits d'Auguste Comte a Mme Nízia Brazileira - é notória a "Recebído Sr. Dr. Henrique Castriciano quinhentosfrancos para Contudo, este medalhão foi roubado e nunca mais houve
amizade entre Nísia Floresta e o filósofo francês, que, falecido em completar o pagamento do monumento em execução que vai ser prefeito nenhum que o fizesse voltar ao lugar. Já o lugar que ela
1857, não realizou o seu desejo de confiar a norte-rio-grandense erigido na cidade do Natalem memória da mãe de Mme. Gade, nisto nasceu deixou de se chamar Papary para se chamar Nísia Floresta
um salão positivista em Paris. Já no Monumento de Benjamin não entra o custo do medalhão de bronze que fica a meu cargo". em sua homenagem (decreto-lei de 23 de dezembro de 1948), e
Constant, na Praça da República, no Rio de Janeiro, foi incluído Paris, 3 de agosto de 1910 (a) Bernardo Alves Pinheiro. onde, inclusive, foi construído um mausoléu para receber
um busto de Nísia Floresta entre os demais abolicionistas, como exclusivamente os seus restos mortais, quando do traslado destes
José Bonifácio e Castro Alves. A lápis, Castriciano acrescentou a seguinte nota: da França para o Brasil, em 1954. Na oportunidade, foi lançado um
Enquanto isso, na Galeria de Honra do Instituto Joaquim panfleto comemorativo pelos Correios do Brasil, no qual foi
Nabuco, em Recife, pode ser encontrado um retrato da escritora, "OSnr. Bernardo Pinheiro refere-se à herma inaugurada em cunhado o seu retrato e impresso um texto do folclorista Luís da
feito por Balthasar da Câmara, introduzindo-a no seleto "clube" 1910 na praça "Augusto Severo" desta cidade. Foi orador, a meu Câmara Cascudo, enaltecendo a sua conterrânea. Desde 1990, a
freqüentado apenas por figuras masculinas, entre as quais Duque pedido, Geraldo Lima. Prefeitura Municipal de Natal, através do Conselho Municipal dos
de Caxias, José de Alencar e Santos Dumont. H. Castriciano -Natal". Direitos da Mulher e Medalha do Mérito Nísia Floresta às mulheres
que contribuíram para o desenvolvimento do RN.
O M E D A L H Ã O N A R IB EIR A Numacartade 23 defevereirode 1912,oSc Bernardo Pinheiroindagava: Nísia Floresta, nome de escolas e ruas, sejam de Natal, Recife,
O medalhão foi feito em Paris contendo a esfigie de Nísia, aposto a "Eujá devia ter-lhe escrito há mais tempo, mas esperava receber Porto Alegre e Rio de Janeiro, além de ser patrona em diversas
uma stella de granito, com ilustrações de bronze e as datas de seu suas novas e apreciadas notícias a respeito da inauguração do academias literárias do país: Rio Grande do Sul, Ceará, Rio Grande
nascimento e morte, inaugurado em 1910, na PraçaAugusto Severo, em monumento "Nísia Floresta" e os jornais da ocasião falando a do Norte e Rio de Janeiro. Sempre à frente do seu tempo, continua
NataL Um trecho daconferênda de Hélio Galvão-queocupavaacadeira respeito para eu mandar a Mme. Gade (LíviaAugusto) quejá me sendo, sob o majestoso pseudônimo que a consagrou, uma das
que foide Henrique Castriciano, cujo patrono era NísiaHoresta - realizada tem escrito várias vezesperguntando se VExcia. conforme dizia em mais fascinantes mulheres já nascidas em solo brasileiro.

A Escola
Nísia
O medalhão Floresta é o
com a esfigie único prédio
de Nísia, a público que
primeira faz menção à
homenagem escritora em
em solo sua cidade
potiguar natal
i * . » * .u ) 4i 4 4.4 f 4 ■■ i 4 4 »i I
Natal, Sexta-ram , 31 de Makço ne2006 Naem, Sexta-fhiía) 31 DEMAaçope2006 DN<P EDUCAÇÃO

legado A
DESINFORMAÇÃO A IN D A É
A PRINCIPAL CAUSA DO
PRECONCEITO NA PRÓPRIA CIDADE NÍSÍü Floresta ainda é vista com preconceito
Sérgio Villar escritora de livros e artigos reconhe­ quisas sobre a escritora. tar sua memória", lamenta Luís Carlos. Silva Tavares, ressalta que durante a Objetos pessoais ou mesmo des­ arquitetura original, de estilo neodás- Ana Angélica Timbó, então presiden­
Especial para o DN Educação cidos no mundo. Um dos beneficiados com o movi­ E um exemplo prático da prova do semana da cultura são realizadas pes­ cendência familiar não existem. Ní­ sico. Elementos clássicos como fron- te da Fundação Teodora Oliveira, ela­
Sul-matogrossense, o professor foi mento foi o próprio professor Luís Car­ "repúdio" ou da falta de incentivo a quisas sobre Nísia Floresta. Ainda as­ sia Floresta teve dois filhos (Lívia Au­ tão, arcos de envassaduras em estilo borou Projeto de Lei solicitando a
Os 20 mil habitantes de Nísia Flo­ convidado a dar aulas em Nísia Flo­ los. Ele passou a contatar os mentores iniciativas em prol do resgate positivo sim, a biblioteca da escola não possui gusta de Faria Rocha e Augusto Amé­ gótico e detalhes que lembram castelos criação de um museu para Nísia Flo­
resta, cidade onde nasceu e leva o no­ resta, em 1992. Ele já conhecia o livro do movimento para orientar suas pes­ da memória de Nísia Floresta, foi a um livro sequèr da escritora. rico de Faria Rocha), e nerihum ne­ medievais ainda podem ser vistos. resta. O Projeto foi entregue em mãos
me da revolucionária da educação bra­ raro de Adauto da Câmara, sobre a es­ quisas e conseguir material. "A partir descoberta de um hino à escritora. A própria biblioteca pública de to. Vista com preconceito na época, O prédio foi tombado pelo patrimô­ ao ministro da Cultura Francisco
sileira, pouco sabem sobre a história critora e quis aprofundar mais a pes­ daí iniciei uma odisséia", comenta. To­ Uma professora, chamada Edite Car­ Nísia Floresta, localizada no conjun­ longe do reconhecimento merecido nio histórico estadual, em 6 de dezem­ Welffort, quando ele esteve em Na­
verdadeira e documental da escritora quisa. Luís Carlos afirma que nada, ou dos os estudos e material adquirido foi neiro Torres ensinava o hino aos seus to Clóvis Carvalho e que tem o nome de hoje, nada do que possuiu foi bro de 1984. Ainda assim encontrava- tal naquela data para participar do
Nísia Floresta. Algumas lendas conta­ quase nada encontrou na cidade que sendo documentado pelo professor. alunos, numa das escolas do municí­ de Duque de Caxias, guarda apenas guardado ou preservado. O túmulo, se abandonado quando a empresária Encontro Regional dos Institutos His­
das a seu respeito já duram décadas e pudesse enriquecer seus estudos, ta­ Trabalhos começaram a ser escritos por pio. Não se sabe ainda a autoria do um exemplar da obra de Nísia Flo­ localizado no sítio Floresta, onde Graça Bezerril comprou o local, restau­ tóricos e Geográficos. É que ela, ao
continuam a ser perpetuadas. São estó­ manha a falta de memória da popula­ ele. Aos poucos, foram sendo organi­ texto. Pela linguagem rebuscada, o pro­ resta (Opúsculo Humanitário) entre nasceu a escritora, tem formato im­ rou e instalou seu restaurante, já com chegar em Nísia Floresta, foi informa­
rias que deturpam a imagem e a obra de ção e seus governantes para com seu zados seminários, simpósios, palestras, fessor acredita que o hino seja cente­ a coleção de seis mil livros. As admi­ ponente. Está cercado por um pe­ 9 anos. Com a reestruturação muita coi­ da da existência de um museu, on­
Nísia, fruto do machismo e da cultura nome maior. Todo o legado educacio­ não só em Nísia Floresta, mas principal­ nário. "Descobri esse hino e vi que pes­ nistradoras justificam que o livro não queno milharal e casas simples. Es­ sa foi modificada. A estrutura e a pin­ de constatou abrigar um restauran­
da época. Era uma "figura invulgar pa­ nal e cultural de Nísia Floresta, o pro­ mente fora do Brasil, onde Luís Carlos soas conheciam a melodia. Talvez se­ é procurado pelos alunos que visi­ tá mal cuidado. A calçada em volta tura permanecem. A bilheteria é origi­ te. O museu nunca chegou a existir,
ra o mundo em que viveu, forte sensí­ fessor colheu através da obra da escri­ encontrava condições favoráveis para a ja a única lembrança que guardo de tam a biblioteca. tem rachaduras. nal. E em frente é feita uma exposição mas foi aprovado pelos vereadores
vel, enérgica, heróica na defesa e divul­ tora ou de pesquisas constantes por idéia. Luís Carlos participou de vários ouvirem falar de Nísia por aqui. Quis Muitos florestenses sequer sabem de imagens de utensílios de vaqueiro. na gestão do ex-prefeito George Nei
Professor Luís Carlos é um dos gação de suas idéias, nenhum outro no­ onde Nísia passou, como as cidades encontros da Sociedade Brasileira Pa­ aproveitar isso e apresentei aos prefei­ L E M B R A N Ç A S D E N ÍS IA FLORES­ o nome do sítio ou da rua onde está Guarda-peito, gibão, pemeira, chapéu Ferreira. Segundo a jornalista, o Pro­
poucos incentivadores à me se pode comparar com a sua ativi­ de Olinda e Goiana, em Pernambuco, ra o Progresso da Ciência (SBPC), on­ tos para gravar essa melodia e distri­ TA SÃO POUCAS próximo o mausoléu. Uma placa in­ de couro, ferramentas de couro com jeto foi aprovado pelo Mine, mas os
preservação da m em ória da dade mental e acompanhar-lhe o traço e Porto Alegre, ou em bibliotecas em de pôde comentar e mostrar o legado buir nas escolas. Mas não adiantou; dica que ali é o túmulo de Nísia Flores­ bancada, paisagens do Seridó, estribos recursos enviados à nova gestão tive­
escritora no município impressionante de sua mentalidade no- diferentes regiões brasileiras. da escritora Nísia Floresta. nunca adiantou". O município de Nísia Floresta guar- ta. É inútil. Afora a data comemorati- de couro. A exposição é desde 2000. ram outra destinação.

O imponente m ausoléu,
erguido em homenagem
a Nísia quase não recebe
visitação, é esquecido no
meio de um milharal no
sítio onde ela nasceu

Vista parcial da cidade de Nísia Floresta, situada a 35 km da ca|ital do RN

Professor Luis
Carlos mostra
O professor e
o figurino da O batistério vereador Jorge
peça teatral e a Pia Carvalho
que dirigiu batismal, mostrando o
sobre a feita de lavatório esculpido
chegada dos pedra sabão, pelo pai da
restos mortais onde Nísia escritora, Sr.
da escritora foi batizada Dionísio Gonçalves
O prédio da Estação
de Papary, um dos va, generosa, idealista", como escreveu "Percebi a genialidade de uma fi­ As palestras sobre Nísia Floresta, o A secretária de Educação, Cultura da poucas lembranças de sua filha m ás va de seu nascimento, em 12 de outu­ O restaurante recebe turistas os
mais antigos da Luís da Câmara Cascudo em A Repú­ gura que a própria cidade onde nas­ professor nunca deixou de ministrar e Desportos de Nísia Floresta, Ana Ma­ ilustre: a menina Dionísia Pinto Lisboa, bro, o túmulo fica esquecido. Nem m ás variados. No verso do cardápio,
cidade, que deveria blica, em 5 de junho de 1977. ceu e leva seu nome, ainda desconhe­ no município homônimo. E foi mais ria de Carvalho Varela, afirmou que os que perambulou por aquelas terras ver­ mesmo as grades de ferro que rodea­ a história do município e da escritora
abrir um museu de O professor e pesquisador da obra ce", lamenta o professor. Ele reconhe­ além. Ainda em 1992, Luís Carlos en­ recursos do município são poucos e a des, de lagoas e milharás no início do vam o túmulo, retiradas a pedido da Nísia Floresta. Também movimenta a
Nísia Floresta, de Nísia Floresta, Luís Carlos Freire ce que o trabalho de resgate da memó- cenou sua primeira peça de teatro. Em prioridade são as restaurações das es­ século 19, até seus 14 anos de idade. Fundação José Augusto no finá da dé­ economia de Nísia Floresta e fomen­ 4'
funciona um realiza um trabalho de resgate da pes­ ria perdida da cidade em relação à Ní­ uma única tomada, a peça mostrou a colas e a qualidade de ensino. "Não há Além do túmulo, construído em 1909, cada de 80 facilitou as visitas ou cha­ ta o turismo na região, com ofertas pa­ A foto foi encontrada
restaurante. E soa de Nísia há 14 anos. Segundo ele, sia Floresta teve início em 1989, quan­ chegada dos restos mortais de Nísia projetos nem verba para construção apenas um lavabo, ainda localizado na mou atenção dos curiosos. ra o caminho das águas, com percur­ em uma lixeira e
parada obrigatória a escritora ainda é vista, em sua ter­ do um movimento organizado pelo no município. Para confeccionar o fi­ de memorial. O que fazemos é um sacristia da igreja matriz de Nossa Se­ O que podería funcionar como um sos por lagoas e práas do município, transformada em
para turistas em ra natal, como prostituta ou mulher Conselho Estadual da Mulher, em par­ gurino, o professor consultou um li­ . evento para lembrar o nascimento de nhora do Ó, construído pelo p á de Ní­ memoriá para Nísia Floresta é hoje um como tabatinga e pirangi. Além do mé­ quadro por uma
busca do litoral. de vida degenerada. Nunca é menci­ ceria com a prefeitura do Natal e o Nú­ vro sobre a história do vestuário no Nísia Floresta, em 12 de outubro", dis­ sia, advogado e escultor Dionísio Gon- belo restaurante, dos m ás freqüentados rito de restaurar um locá que se encon­ diretora da Escola Est.
onada como educadora, reforffiado- cleo de Estudos e Pesquisas de Assun­ Brasil, e tomou como base as fotos das se a secretária. Das 27 escolas do mu­ çáves Pinto Lisboa Naimagem, afigura do município. Ele fica na antiga estação trava abandonado. Mas o prédio da Nísia Floresta. O
ra da educação, abolicionista, india- tos da Mulher, da Universidade Fede­ vestes usadas por Nísia. Tudo com nicípio, sendo 15 municipais, apenas de um índio segurando a peça. Tam­ da cidade, construída pelos ingleses em Estação está ou foi previsto para abri­ estado da foto não é
nista que procurou demarcar as ter­ ral do Rio Grande do Norte (UFRN) se apoio da UFRN. "Ainda existe precon­ a Escola Estadual Nísia Floresta, a m ás bém na igreja, à esquerda da entrada, 1881. A antiga Estação de Papari divide gar o mpseu da cidade, onde figuraria bom, mas é o único
ras dos índios, republicana, conferen- mobilizou em um grande movimento ceito contra Nísia. A prova é o repúdio antiga do município, leva o nome da no batistério, a pia onde Nísia Floresta ôs municípios de Nísia Floresta e São Jo­ o acervo sobre Nísia Floresta. prédio que possui
cista, fundadora de colégios e exímia pró-memória e contribuiu para pes- a pessoas como eu que tentam resga- escritora. A diretora da escola, Cidéria foi batizada, feita de pedra sabão. Só. sé àe Mipibu. E preserva muito de sua Em agosto de 2001, a jornáista imagem dela na cidade
Natal, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006

DESBRAVADORA A LUTA PELOS DIREITOS DA MULHER LHE CUSTOU O NAO RECONHECIMENTO

A pioneira
do feminismo brasileiro
Constância Lim a Duarte* história, um nome logo se destaca e se impõe:
ESPECIAL PARA O DN EDUCAÇÃO Nísia Floresta Brasileira Augusta A esta mulher
devemos as primeiras e mais importantes páginas
Quando pensamos na históriada luta feminina dessaluta, pela coragemreveladaemseus escritos
em busca de seus direitos no Brasil, vários são os e pelo ineditismo e ousadia de suas idéias.
nomes de mulheres que nos ocorrem. Josefina Este nome, melhor, pseudônimo, pertenceu
Álvares de Azevedo, Luciana de Abreu, Francisca à norte-rio-grandense Dionísia Gonçalves
Senhorinha da Mota Diniz, Presciliana Duarte de Pinto, nascida em Papari em 1810, e que, após
Almeida, Joana PaulaManso de Noronha e Bertha residir em diversos Estados brasileiros, como
Lutz, por exemplo, são apenas alguns nomes que Pernambuco, Rio Grande do Sul e Rio de
poderíam ser citados. Mas se recuamos aindamais Janeiro, mudou-se para a Europa. Nísia Floresta
e tentamos alcançar as primeiras páginas dessa morreu em 1885, em Rouen, cidade do interior

da França, e foi enterrada em Bonsecours, na época, mulheres no Brasil a romper os limites do espaço
um pequeno distrito de Rouen. privado e a publicar textos em jornais da chamada
Num tempo em que a grande maioria das grande imprensa. E foram muitas as colaborações
mulheres brasileiras vivia trancafiada em casa sem que a cada dia surgiam sob a forma de crônicas,
nenhum direito; quando o ditado popular dizia contos, poesias e ensaios. Aliás, esse é um traço
que "o melhor livro é a almofada e o bastidor" e da modernidade de Nísia Floresta: sua constante
tinha foros de verdade para muitos, justo nesse presença na imprensa nacional desde 1830,
tempo Nísia Floresta dirigia um colégio para moças sempre comentando as questões mais polêmicas
no Rio de Janeiro e escrevia livros e mais livros da época. Se lembramos que apenas em 1816 a
para defender os direitos das mulheres, dos índios imprensa chegou ao país, mais se destaca o papel
e dos escravos. pioneiro que esta brasileira desempenhou no
Nísia Floresta deve ter sido uma das primeiras cenário nacional.
Nato, Sexta-feiba, 31 de Makçode 2006 DiVO EDUCAÇÃO
contra a mulher, identifica as causas desse preconceito na colonização
portuguesa, e ainda desmistifica a idéia dominante da superioridade
masculina.
O texto revolucionário de MaryWollstonecraft havia sido publicado
em Londres em 1792, como resposta à Declaração Universal dos
Direitos do Homem. Neste mesmo ano surgiu a tradução francesa e
nos anos seguintes diversas outras edições. O livro rapidamente se
tornou conhecido e repercutiu pela Europa e Estados Unidos
consagrando o nome de sua autora como a pioneira na defesa dos
direitos da mulher.
Quatro décadas mais tarde seria a vez de Nísia Floresta inscrever
seu nome nesta história. E aí está a grande questão, insisto. Nísia não
realiza uma tradução no sentido convencional, mas escreve um outro
texto, que será o seu texto sobre os direitos das mulheres brasileiras.
MaryWollstonecraft e demais autores lhe deram a motivação ao
colocar em letra impressa questões pertinentes às mulheres européias,
e voltadas para o público de seu país. Nísia empreende então uma
verdadeira 'antropofagia libertária1, ao que ainda acrescento: não
como opção, mas por fatalidade histórica. Na deglutição geral das
idéias estrangeiras aqui chegadas, era comum promover-se uma
acomodação das mesmas ao cenário nacional. E é o que ela faz.
Assimila as concepções apreendidas nos livros que lia, e devolve um
outro produto, pessoal, em que cada palavra é vivida e os conceitos
surgem como algo visceral, extraídos da experiência e mediatizadas
pelo intelecto.
Por isso costumo afirmar que, nesta 'tradução livre' de Nísia Floresta
temos o texto fundante do feminismo brasileiro, pois trata-se de uma
nova escritura, ainda que inspirado na leitura de outros. E m ás: vejo-
o como uma resposta brasileira aos textos estrangeiros; nossa autora
se colocando em pé de iguádade com o pensamento europeu, e
cumprindo o importante papel de elo entre as idéias européias e a
realidade nacioná.
Em sua essência, os Direitos das mulheres de Nísia Floresta se
Mas houve um preço por tal pioneirismo. Seu nome foi envolvido encontram com os Rights ofwoman de MaryWollstonecraft, e também
pelo manto do esquecimento e durante algumas décadas não se ouviu com os demás textos aqm citados, tanto na denúncia da mulher como
falar dela. O pouco que se ouvia estava marcado pelo preconceito, ou 'classe oprimida' como na reivindicação de uma sociedade m ás justa,
impregnado da surpresa dos que se deparavam com uma história de em que ela fosse respeitada e tivesse os mesmos direitos. Também são
vida como a sua, e a novidade de suas reflexões. Viver à frente de seu pontos comuns a denúncia da superioridade masculina apoiada na força
tempo vai custar lhe o não-reconhecimento do talento: por isso seu física, a váorização da função materna, a educação como o meio eficaz
nome não costuma ser citado na história da Literatura Brasileira, de promoção feminina e o aparato filosófico de feição iluminista. No
como escritora romântica, ou na História da Educação feminina, más, os textos se distanciam tomando cada quá o seu rumo, segundo
como educadora. as motivações das autoras, o público a que se destinavam e as
E se agora ela começa a se tomar um pouco mais conhecida é peculiaridades da condição feminina num e noutro lugar.
justamente por um trabalho de recuperação de autoras e obras do Por exemplo: enquanto a feminista inglesa dedica seu livro ao
passado que vem sendo feito em nossas universidades desde a década senhor Talleyrand-Périgord - o antigo bispo de Autun e líder moderado
de oitenta. Alguns de seus livros foram reeditados e suas idéias retomam da Revolução Francesa - não para homenageá-lo, mas como forma
para nos lembrar um pouco da sofrida história das mulheres na luta de lhe responder e contestar suas idéias sobre a educação feminina,
pelo reconhecimento de seus direitos e de sua capacidade intelectual. Nísia Floresta dedica seus "direitos" às mulheres brasileiras e aos
Faço, em seguida, uma rápida apresentação de seus escritos e das jovens acadêmicos de seu tempo. E é fácil entender porquê. Às mulheres
diferentes vertentes de sua militância. O interessante, numa leitura de porque é delas que trata e por elas escreve. E aos acadêmicos porque,
sua obra, é observar como os textos dialogam entre si, um iluminando afinal de contas, eram os representantes legítimos da elite pensante

Um o outro, como peças complementares de um mesmo plano de ação


prática: formar e modificar consciências. Seu propósito toma-se nítido:
alterar o quadro ideológico vigente no que diz respeito ao
comportamento das mulheres e, naturalmente, o dos homens seus
do país, os que poderíam, se quisessem, mudar os rumos dos
-'acontecimentos. Foi desta geração, sabemos bem, que sáram os
abolicionistas, os republicanos e também uns poucos - bem poucos
- defensores dos direitos da mulher.
contemporâneos. Tás reflexões, que não vão encontrar eco entre os contemporâneos,

fem in ism o Senão, vejamos: o primeiro livro escrito por Nísia Floresta é também
o primeiro que se tem notícia no Brasil que trata dos direitos das mulheres
à instrução e ao trabalho, e exige que elas sejam consideradas como
são o testemunho do quanto Nísia Floresta representava de exceção
em meio à massa de mulheres submissas, analfabetas e anônimas.
Também são elas que vão dar à autora o título de precursora do
seres inteligentes e merecedores de respeito pela sociedade. Este livro, feminismo no Brasil, e távez até mesmo da América Latina, pois não

feito com publicado em 1832 em Recife (PE), tem o sugestivo título de Direitos das
mulheres e injustiça dos homens, e, quando surgiu, há 174 anos atrás,
Nísia tinha apenas 22 anos e a grande maioria das brasileiras vivia
enclausurada em preconceitos, sem qualquer direito que não fosse o de
existem registros de textos anteriores realizados com estas intenções.
Assim, à medida que nos deixamos envolver pelo discurso nisiano,
m áor se toma nossa admiração por esta figura inovadora e audaciosa.
Se MaryWollstonecraft foi a primeira na Grã-Bretanha a defender os
ceder e aquiescer sempre à vontade masculina No ano seguinte saiu uma direitos da mulher; e Olympe de Gouges a primeira no solo francês;

instrução e segunda edição e, em 1839, ainda uma terceira, no Rio de Janeiro.


Os Direitos das mulheres de Nísia Floresta foi inspirado no livro
de MaryWollstonecraft - Vindications of the rights ofwoman - conforme
no cenário nacioná coube a Nísia Floresta o privilégio de praticamente
deflagrar a formação de uma consciência feminista. Se considerarmos
a contribmção nisiana a esse processo, seu papel de fundadora e sua
ela mesma declara, mas também na Declaração dos direitos da mulher trajetória militante, num momento histórico de verdadeiro

trabalho e da cidadã, de Olympe de Gouges, e em outras obras de autores


europeus, como Poulain de La Barre e Sophie. Só que, ao invés de
simplesmente traduzir um deles, a autora brasileira escreve um novo
texto em que aponta para os principais preconceitos existentes no Brasil
obscurantismo em relação aos direitos femininos, seus vacilos,
contradições e certas posturas que hoje interpretaríamos como
ingênuas e pueris, afiguram-se menores diante do aspecto pioneiro
de sua obra.
DNOEDUCAÇÃO Nmi, SExa-FEmA, 31 de Makçode 2006

O objetivo da
educação da mulher,
através dos tempos, é
torná-la consciente dos
seus direitos e deveres

mais, os textos se distanciam tomando cada qual o seu ramo, Em Opúsculo humanitário, por exemplo, que reúne sessen­ que é hora de dar a Nísia Floresta o lugar de destaque que ela
segundo as motivações das autoras, o público a que se destinavam ta e dois artigos sobre a educação já publicados nos principais merece na história intelectual da mulher brasileira. A autora foi
e as peculiaridades da condição feminina num e noutro lugar. jornais da corte, Nísia Floresta tece comentários sobre a Ásia, a sim uma mulher 'educada' do Brasil patriarcal e uma das raras
Por exemplo: enquanto a feminista inglesa dedica seu livro ao África, a Oceania, a Europa e a América do Norte, antes de tra­ mulheres de letras de seu tempo. Mas foi mais ainda. Nísia Flo­
senhor Talleyrand-Périgord - o antigo bispo de Autun e líder tar do Brasil e da mulher brasileira, sempre observando a rela­ resta foi também uma brasileira erudita e 'ilustrada' como bem
moderado da Revolução Francesa - não para homenageá-lo, mas ção existente entre o desenvolvimento intelectual e material do poucas de nossa história.
como forma de lhe responder e contestar suas idéias sobre a país (ou o seu atraso), com o lugar ocupado pela mulher. Nísia,
educação feminina, Nísia Floresta dedica seus "direitos" às mulheres em consonância com intelectuais da época, defende a tese de que
brasileiras e aos jovens acadêmicos de seu tempo. E é fácil entender o progresso de uma sociedade depende da educação que era *Professora aposentada da UFRN, atualmente ensina na Faculdade de Letras da
UFMG.Após anos de pesquisa, defendeu na USP.em 1991,
porquê. Às mulheres porque é delas que trata e por elas escreve. oferecida à mulher; e que só a instrução, aliada à educação mo­ a Tese de Doutorado intitulada "Nísia Floresta: vida e obra”.
Eaos acadêmicos porque, afinal de contas, eram os representantes ral, dariam maior dignidade e fariam da mulher uma melhor es­
legítimos da elite pensante do país, os que poderíam, se quisessem, posa e melhor mãe. Esses, aliás, seriam precisamente os objeti­
mudar os rumos dos acontecimentos. Foi desta geração, sabemos vos da educação das meninas: torná-las conscientes de seus de­
bem, que saíram os abolicionistas, os republicanos e também uns veres e papéis sociais.
poucos - bem poucos - defensores dos direitos da mulher. Hoje, preocupações como estas de Nísia Floresta, podem so­
Tais reflexões, que não vão encontrar eco entre os ar, a ouvidos menos atentos, como algo ultrapassado e até reaci­ REFEREN CIA S
contemporâneos, são o testemunho do quanto Nísia Floresta onário. Mas isso não é correto. Basta que nos lembremos da va­ BIBLIOGRÁFICAS:
representava de exceção em meio à massa de mulheres submissas, lorização da mulher ocorrida em meados do século XIX, quando
analfabetas e anônimas. Também são elas que vão dar à autora o se redimensiona a maternidade enquanto papel social. Se em da­ DUARTE, Constância Lima. Nísia Floresta: vida e obra.
título de precursora do feminismo no Brasil, e talvez até mesmo do momento a presença da mulher era inexpressiva em conseqüên- Natal: EDUFRN, 1995.
da América Latina, pois não existem registros de textos anteriores cia da rígida estratificação social que privilegiava o masculino; em _____ . Nísia Floresta e Mary WoUstonecraft: diálogo ou
realizados com estas intenções. outro a figura feminina transforma-se em centro das atenções pe­ apropriação? In O Eixo e a Roda. Revista de Literatura
Assim, à medida que nos deixamos envolver pelo discurso la valorização de sua função biológica exclusiva: a maternidade. Brasileira da Faculdade de Letras da U FM G ,vol.7,2001.
nisiano, maior se torna nossa admiração por esta figura inovadora Tais alterações tiveram, naturalmente, uma grande repercussão em p. 153-164.
e audaciosa. Se MaryWoUstonecraft foi a primeira na Grã-Bretanha meio às intelectuais que vislumbraram, aí, a possibilidade de as FLORESTA, Nísia. Direitos das mulheres e injustiça dos
a defender os direitos da mulher; e Olympe de Gouges a primeira mulheres adquirirem status e poder diante da opinião pública. homens. 4 ed. Introdução, Posfàcio e Notas de Constância
no solo francês; no cenário nacional coube a Nísia Floresta o Um outro trabalho, também dos mais importantes, é Cintilações
LD uarte. São Paulo: Cortez, 1989.
privilégio de praticamente deflagrar a formação de uma consciência de uma alma brasileira, publicado em Florença em 1859.0 livro con­
_____ . Opúsculo humanitário. Introdução e notas de
feminista. Se considerarmos a contribuição nisiana a esse processo, tém cinco ensaios que tratam da educação de jovens, da mulher eu­
Peggy Sharpe-Valadares. Posfàcio de Constância L Duarte.
seu papel de fundadora e sua trajetória militante, num momento ropéia, da pátria e das saudades que ela sentia de seu país, após tan­
São Paulo: C ortez Editora, 1989.
histórico de verdadeiro obscurantismo em relação aos direitos tos anos ausente. Um dos textos, intitulado A mulher, trata da mu­
femininos, seus vacilos, contradições e certas posturas que hoje lher francesa de meados do século XIX, que a autora critica pelo com­ ______. A lágrima de um Caeté. Estudo e Notas de
interpretaríamos como ingênuas e pueris, afiguram-se menores portamento superficial e mundano. Nísia se antecipa aos gover­ Constância Lima Duarte. Natal: Fundação José Augusto,
diante do aspecto pioneiro de sua obra. nantes e pensadores franceses e condena - nesse ensaio - o costu­ 1997.
Em outros livros ela continuará a tratar da temática destacan­ me das mulheres de abandonar os filhos recém-nascidos para se­ _____ . Cintilações de uma alma brasileira. Edição bilíngüe
do a importância da educação feminina para a mulher e a socie­ rem amamentados e criados distantes, no interior do país, por mu­ Trad. Michelle Vartulli, Zahidé Muzart e Suzana Funck.
dade. São eles: Conselhos à minha filha, de 1842; Opúsculo huma­ lheres camponesas. Em outro ensaio, O Brasil, também publicado Apresentação e biografia de Constância Lima Duarte.
nitário, de 1853; A mulher, de 1859; além de novelas dedicadas às em Paris em 1871, ela resume a história da nação brasileira, fala dos Florianópolis: Editora Mulheres, EDUNISC, 1997.
jovens estudantes de seu colégio. Nesses escritos encontramos des­ recursos econômicos, das riquezas conhecidas e latentes, dos sábi­ _____ . Três anos na Itália, seguidos de uma viagem à
de conselhos de como as meninas deviam se comportar, os deve­ os e escritores mais conhecidos. Sua intenção era, além de fazer Grécia. Vol. I.Trad. Francisco das Chagas Pereira. Natal:
res esperados de uma filha e histórias de cunho didático-moralis- propaganda da pátria no estrangeiro, desfazer os preconceitos e Editora da UFRN, 1998.
ta, até minuciosas e ricas explanações acerca da história da con­ mentiras que predominavam na Europa, acerca do Brasil.
dição feminina em diversas civilizações e em diferentes épocas. Assim, por tudo o que foi dito - e por muito mais - reafirmo
Nmal, Ssaa-FEiRA, 31 de Marçode 2006 DNQEDUCAÇÃO
FRAGMENTOS JORNALISTA TRADUZ LIVRO PARA O PORTUGUÊS, PUBLICADO NA FRANÇA EM 1878

As últimas impressões literárias

"... lembro com nostalgia carinhosa aquela manhã na biblioteca quando, num discreto farfalho, as fol­
has do livro, bem como as folhas das árvores, vertentes de um mesmo saber, caíram em minhas mãos
e p o r toda a cidade, num desafio e numa sedução literária em contínua fragmentação, na busca, sem­
pre incessante, p o r um todo".

Desta forma a jornalista e pesqui­ sa importante e enigmática figura corpo da escritora, vindo da França tância Lima Duarte, com quem com­ diversos aspectos do trabalho reali­
sadora Nathalie Bernardo Câmara, nacional do século XIX", como afir­ para a sua cidade natal - Papary (atu­ partilhou sua vontade de conhecer zado por Nísia Floresta e a diversi­
descreve seu contato com o livro mou a também pesquisadora Maria al Município de Nísia Floresta), on­ mais sobre a escritora e feminista po­ dade de temas com que a autora tra­
Fragments d'um ouvrage inédit - no­ Lúcia Garcia Pallares-Burke. A obra de está enterrado em um mausoléu, tiguar. Em uma prova de total des­ balha. Um exemplo é a questão do
tes biographiques, escrito por Nísia original foi escrita pela autora poti­ em uma ação da Academia Norte- prendimento, professora Constân­ índio no Brasil, onde Nísia Floresta
Floresta Brasileira Augusta. 0 livro guar em 1878 e publicada com o rio-grandense de Letras, na então cia, importante pesquisadora de Ní­ escreve em A Lágrima de um Caeté
traz, de acordo com a pesquisado­ pseudônimo de Brasileira Augusta. gestão do escritor Manoel Rodrigues sia Floresta, cedeu grande parte de "Indígenas do Brasil, o que sois vós?
ra, as últimas impressões literárias O livro lançado pela UnB, no en­ de Melo. seu material para Nathalie, que po­ Selvagens? Os seus bens já não go­
de Nísia Floresta, transformadas em tanto, é apenas mais um passo na O selo de Nísia lhe despertou o in­ de aprofundar e transformar seu de­ zais... Civilizados? N ão... vosso tira­
livro quando morava na França, sua trajetória de pesquisa que Nathalie teresse quase que imediatamente. sejo em uma total investigação. nos Cuidosos vos conservam bem
segunda pátria. Bernardo vem desenvolvendo, há 10 "Ele se transformou em um amule­ Como resultado já surgiu o livre- distantes..."
A tradução feita pela jornalista foi anos, sobre a vida e a obra de Nísia to que guardo até hoje comigo, mes­ to "Da Aurora ao Crepúsculo", edita­ Seu próximo projeto é um docu­
editada com o título em português - Floresta. Francesa de nascimento e mo tendo passado a coleção de se­ do pela Fundação José Augusto em mentário, já em fase de captação de
"Fragmentos de uma obra inédita" natalense por opção, Nathalie "des­ los para meu irmão", contou a pes­ 1997, em comemoração aos 187 anos apoio cultural para iniciar a produ­
pela UnB - Universidade de Brasília cobriu" Nísia Floresta ainda crian­ quisadora. de nascimento da escritora norte- ção. " Não sei o que me prende a Ní­
- no ano de 2001. Foi muito bem ça, quando ganhou uma coleção de Mesmo estando morando fora do rio-grandense. A publicação contou sia. Nunca parei para pensar. Mas
aceita pela comunidade acadêmica, selos de um de seus tios. Entre os se­ país, em uma de suas passagens por com a participação de Edmar Viana, acredito que seja pelo caráter deste­
"representando mais uma contribui­ los da coleção, havia um de Nísia Flo­ Natal, Nathalie teve oportunidade de responsável pelas ilustrações. mido, sempre desafiando os padrões
ção para o estudo da vida e obra des­ resta, comemorativo ao traslado do conversar com a professora Cons­ Na publicação, Nathalie ressalta da sociedade", ressaltou Nathalie.
NAHL, SEm-FEIRA, 31 de MarçoDE2006

DOCUMENTÁRIO CURTA-METRAGEM DE CATORZE MINUTOS CAUSA POLÊMICA ENTRE PESQUISADORES

Nísia Floresta*
uma grande brasileira
A primeira - e até então única - produção au­ Floresta, publicada pela Editora Universidade
diovisual sobre a vida e obra de Nísia Floresta de Brasília, em 2001. Sobre esta obra, Nathalie
foi lançada em 2005, pela Interfilmes, sob di­ ainda observou um descuido de Izabela ao in­
reção e produção da publicitária e produtora titulá-la de Fragmentos de uma viagem inédita
cultural Izabela Camilo de Souza. Tendo como -Notas biográficas.
título "Nísia Floresta, uma grande brasileira", Um outro equívoco secular e grave, como
trata-se de um documentário de catorze minu­ disse Nathalie, foi o de a documentarista susten­
tos que conta, de maneira simples e cronoló­ tar no filme a falsa versão considerada oficial de
gica, a história de Dionísia Gonçalves Pinto Lis­ que Nísia Floresta teria morrido em Rouen e
boa, abordando elementos desde seu nasci­ não em Bonsecours, "como atestam os docu­
mento até a sua morte. No entanto, o curta- mentos que encontrei ao longo da minha pes­
metragem tem dividido opiniões, especialmen­ quisa". Concluindo sua opinião, Nathalie Bernar­
te entre estudiosos da obra de Nísia Floresta, do disse que a autora de "Nísia Floresta, uma
em particular de duas grandes pesquisadoras grande brasileira" não atentou para a evidência
no assunto: Nathalie Bernardo da Câmara e de certos fatos históricos nem para o rigor da éti­
Constância lim a Duarte. ca que a missão informativa que todo e qualquer
Em artigo publicado n '0 POTI de 26 de fe­ documentário requer. "Ao invés de informar, o
vereiro deste ano, nomeado de Telhado de vidro, filme pecou por perpetuar mitos e enganos. Não
a jornalista Nathalie Bernardo explicita sua in­ cumpriu o seu papel".
dignação ao ver no filme algumas informações
consideradas enganosas e "transmitidas como
verdades indiscutíveis ao espectador de boa fé". TELHADO DE VIDRO?
Segundo ela, vários aspectos da biografia de Ní­
sia Floresta foram divulgados de maneira de­ Em resposta à jornalista Nathalie Bernardo
turpada, sem o embasamento histórico que re­ da Câmara, a diretora do vídeo-documentário
quer um documentário. sobre Nísia Floresta, Izabela Camilo, em artigo
Um deles diz respeito a um suposto casa­ intitulado "Telhado de Vidro?", publicado em O
mento de Nísia aos treze anos de idade. "Digo POTI do dia 2 de abril, ressalta que sua pesqui­
suposto porque não existem provas de que, de sa sobre a escritora Nísia Floresta não é recen­
fato, tal união tenha ocorrido. Assim, se não exis­ te, tem início em 1995. Em seguida, a produto­
tem provas, a informação até podería ser divul­ ra cultural fez comentários sobre as críticas de
gada no filme, mas sem a ênfase dada", disse, Nathalie Câmara a seu documentário.
acrescentando ainda que o documentário afir­ A primeira questão foi com relação ao fato
ma que o casamento, além de ter acontecido, de Nísia Floresta ter se casado aos treze anos.
deu-se por imposição do pai de Nísia Floresta Ela explicou que os fatos foram deturpados,
Para Nathalie, tal afiímação não é provada, já que porque em momento algum, o vídeo informa
"para quem leu os escritos de Nísia, bem como que o pai de Nísia Floresta tenha imposto o ca­
a presumida atitude de Diomsio (seu pai), ho­ samento. "Refiro-me à família patriarcal e à so­
mem sensível, de idéias liberais que, caso a fi­ ciedade da época, de um modo geral", comple­
lha tivesse realmente se casado, limitar-se-ia a mentou. Com relação à tradução livre de "Di­
adverti-la da sua precipitação". reito das Mulheres e Injustiça dos Homens” ter
Dentre outros aspectos, sobre a afirmação sido feita a partir da obra de Mary Wollstone-
pela autora de que “Direitos das mulheres e in­ craft, Izabela disse que o livro é conhecido co­
justiça dos homens” seria uma 'tradução livre' mo "travessura literária" de Nísia Floresta, "pois
do livro da feminista inglesa Mary Wollstone- é a própria Nísia quem afirma ter se baseado na
craft, intitulado Vindication of rights of woman, autora inglesa citada, apesar de sabermos que
Nathalie disse que, a respeito do assunto, já fo­ ela se inspirou em várias fontes". Num outro
ram publicadas as descobertas de alguns pesqui­ tópico, a publicitária explicou que a troca de
sadores, inclusive as suas, de que, "na verdade, uma palavra, como foi o caso da citação do li­
Nísia Floreta traduziu o tratado feminino “Wo­ vro Fragmentos de uma obra inédita - Notas
man not inferior to man”, publicado na Inglater­ biográficas, onde "obra" foi substituída por "vi­
ra, em 1739, por autor ou autora de pseudôni­ agem", às vezes acontece e isso não altera em
mo Shophia, A Person of Quality". nada o teor da obra.
Assim, a jornalista diz que os prováveis erros Em seguida, Izabela disse não ver descaso
publicados foram decorrentes de a autora do nem equívoco ao afirmar em seu documentá­
documentário não ter tido o cuidado de consul­ rio que Nísia Floresta foi sepultada em Rouen.
tar as publicações que abordam o tema, inclu­ "Ela foi sepultada em Bonsecours, na época, um
indo a tradução de sua autoria, Fragmentos de distrito de Rouen", disse, complementando que
uma obra inédita - Notas biográficas, de Nísia o ponto de vista de Nathalie Câmara sobre o
Nmal, Sexta-feira, 31 de Março de 2006 DNCDEDUCACAO
curta-metragem não interfere no conjunto da obra. vulgaram que Nísia havia se casado aos treze anos,
"Apesar dos poucos recursos, consegui mostrar, de se separado logo em seguida, espfrido a persegui­
forma clara, objetiva e harmoniosa, quem foi Nísia ção desse marido em Recife e até em Porto Alegre.
Floresta". Tendo em vista a idoneidade dos informantes, tam­
Segundo Izabela, sua intenção era produzir um bém repeti t á notícia em textos que escrevi sobre
vídeo compreensível a todas as faixas etárias possí­ a autora. Se Castriciano visitou a filha de Nísia em
veis. "Fiz uma singela homenagem a uma grande sua residência na França, justamente para recolher
brasileira e esse é o mérito da questão", ressaltou, e dados biográficos; e se Cascudo reiteradamente fez
disse, logo em seguida, que "o pior de tudo é a pre­ referências ao casamento precoce em suas Actas,
tensão e o descabimento de Nathalie Câmara ao di­ não há porque não considerá-lo, por m ás contra­
vulgar, publicamente, que eu quis 'comprar' a pes­ ditório que hoje nos pareça.
quisa dela. Afinal, por que eu compraria uma pes­ O vídeo cumpre, assim, o seu papel de dissemi-
quisa se já estava realizando a minha?", questionou. nador da imagem de Nísia Floresta. Porque este - a
meu ver - deve ser o grande compromisso de quem
N ÍS IA EM D V D estuda a autora potiguar: divulgar sempre seu nome
para que ele não c á a no esquecimento, e aprovei­
Outra escritora que também fez questão de dar tar toda oportunidade para apresentá-lo às novas
sua opinião sobre o vídeo foi a professora Constân­ gerações.
cia de Lima Duarte, considerada a maior autorida­ Estou convencida de que é
Jornalista e escritora de na pesquisa sobre Nísia Floresta. Sobre o assun­ ftmdamentá que conheçamos
Nathalie Câm ara faz to ela encaminhou para o DN Educação sua opini­ sempre m ás e m ás Nísia Flo­ A R T IG O IZABELA CAMILO4
críticas ao documentário ão que transcrevemos os principais trechos: resta, pois acredito que sua im­
"Em fins do ano passado conheci o vídeo. Na
ocasião, manifestei por telefone meu apreço ao tra­
portância ultrapassa em mui­
to a sua pessoa. À medida que
Telhado devidro?
balho e louvei, principalmente, o fato de terem 'ti­ pesquisamos sua trajetória de ünrespom ao aitig) deNathalieBer- tonecraft, é conhecido com "travessura nificada. UmamulherdaestirpedeNísia

rado leite de pedra', pois haviam encontrado solu­ vida e lemos seus livros, esta­
ções interessantes para falar da vida e da obra da mos também adentrando na dizer que também iniciei minha pesqui-
sasobreNísiaFlorestaem 1995, o quepode t-seem i
e valorizar nossos vultos históricos.
Mas o pior de tudo é a pretensão eo
escritora. Os empecilhos, que eram muitos e pare­ desconhecida e m á contada lAtrocadeum apcdauraoudeum a descabimento de Nathalie Câmara ao
biicadmnaTriinmdoNorte(03JlUI996, letra, nas legendas ou i divulgar, publicam ente, que eu quis
ciam quase intransponíveis, não foram suficientes história da mulher brasileira. E 13/11/2004,10/09/2005e 25/09/2005)e no 'comprar1'a pesquisa dela. Das vezesque
para impedir que as jornalistas realizassem seu pro­ a obra que Nísia nos legou DiáriodeNatal(15/03/2003e01/03/2005).
inscrever meus projetos em leis de in-
jeto, tal como haviam planejado. A quase ausência contribui decisivamente para lie Câmarajulga terem sido divulgados descuido dela?; centivoà cultura,
de maneira deturpada, no video-docu- S. N ísia Floresta fo i sepultada em Afinal, por que eu compraria u m
de fotos da autora, a inexistência de imagens dos fi­ desvendar os bastidores da mentárioNímFloresta. umagrandebra- Bonsecours, na época, um distrito de pesquisasejáestavareabzando a minha?
sileira', a firm o seguinte:
lhos, do colégio, e até das casas em que ela residiu - submissão, do autoritarismo l.Em relaçãoaofato de NísiaFlores­ çòessobreNísia Floresta,procuraria Gons-
em Papary, Goiana, Recife, Porto Alegre e Rio de Ja­ e do preconceito. ta ter se casado aos 13 anos de idade,
basta conferir os livros reeditados por
Afirmações e criticas com estas são tância Uma Duarte.

neiro, por exemplo - foi habilmente contornada com Como todo trabalho inte- ConstânciaU m Duarte (m aiorautori­ que valores pelos quais Nísia Floresta
dade em Nísia Floresta), entre eles: 'Cin-
imaginação e uma cuidadosa pesquisa do momen­ lectuá e científico, cada texto tilações de uma a lm brasileira" e ‘Itine­
tanto lutou comoDIGNIDADE,RESPEI­
TOe VERDADEnão façam parte doca-
to histórico. que se escreve, cada reflexão rário de uma Viagem à Alemnha', ed.
Mulheres; ‘A Lágrima de um C aetf.ed.
Também as lacunas em termos de dados biográ­ que é feita, ou cada imagem Fund.JoséAugustoe ‘Optisculo Humani- Ó ponto de vista de Nathalie sobre o " Masalém das criúàis de pessoas que
tário] ed. Cortez. fíá ainda 'Dicionário
ficos, que ainda são muitas, foram enfrentadas com que é criada em tomo de um Mulheres do Brasil] Jorge Zahar Editor, fere no conjunto da obra. No vídeo ‘N ísia
naturalidade diante do telespectador. E o resultado tema, necessariamente v á se RJ,2000, p. 451; ‘C arias - Nísia Floresta & Floresta, u
Auguste Com tep. 47,48, ed. Mulheres,
foi um trabalho honesto, acessível a um público am­ somar aos demás, e acrescen­ Florianópolis,2002;‘AMulherPongitarú forma ciam, objetivae harmomsa, quem Quemquiser tiraradúvidaassistaao
Cinco Séculosde Presença', Ed Fund.José foi Nísia Floresta (escritora, educadora, videoNísiaFloresta,umGmndeBrasí-
plo, que reúne as informações mais fundamentais e tar novas informações. Por is­ fem inista,abolidonista,republicana,in- leirdesejaojuiz.
dá notícia de suas idéias, de seus livros, chamando so, é preciso somar nossos es­ 2 Em momento algum o vídeo infor- dianista etc.). Minha intenção era pro-
m que o pai de Nísia Floresta impôs o I Izabela Camilo é publicitária, produtora
atenção para certos aspectos mais revolucionários forços em tomo de Nísia Flo­ casam entodela.Refiro-m eàfam íliapa- faixas etárias possíveis e não apenas a cultural diretora e roterista. É autora dos
triarcal e à sociedade da época, de um roteiros "Nísia Floresta, a Brasileira
de seu pensamento. resta para que consigamos, modo geral; Augusta",“As laces de Nísia Floresta” e

Naturalmente, aqui e ali, percebi pequenos pro­ um dia, colocá-la no cenáio das Mulheres e Injustiça dos Homens ter
“Nísia Floresta”. Rotdrizou e dirigiu;
‘'Cuscuz e lápioca", "Pobre menina rica", “A
blemas, mas tão pequenos que, a meu ver, não nacioná como ela bem o me­ sidofeita à partirda obra de Mary Wolls- Nísia Hoiestafoidemgrida, mas,sim,dig- encomenda”, entre outros.

comprometiam o trabalho final, nem impediam rece, e tomá-la cada vez m ás


que o vídeo fosse utilizado em salas de aula, cum­ conhecida de todos. Que ve­
prindo o papel de divulgador de Nísia Floresta. O nham outros vídeos, filmes e NATHALIE BERNARDO DACÁMAKA*
fato, por exemplo, de se dizer que ela foi enterrada livros sobre Nísia Floresta!
em Rouen, em nada compromete a veracidade do
acontecimento, até porque, naquela época, Bonse-
cours era um pequeno distrito de Rouen, e só tem­
Telhado devidro
Professora e escritora NA CONDIÇÃOBE ESTUDIOSA da escritora,

Constância Lima Duarte pos depois se emancipou enquanto cidade. Da mes­ educadora e fem inista N ísia Floresta B rasileira
Augusta (Papary 1810 -Bonsecours 1885), h á mais
caso pam com evidências históricassobre Nísia Fio-
la pode ser igualm ente observado também no
d e dez anos pesquisando a sua vida e obra, sinto-
ma forma, a afirmação que “Direitos das mulheres m e no d ireito e, sobretudo, no dever de tecer a l­ caso, Fragmentos de uma obra inédita ú Notas bio­
pesquisadora de Nísia Floresta guns com entários sobre o docum entário N ísia gráficas, que aparece no documentário com o Frag­
e injustiça dos homens” seria uma 'tradução livre' Floresta ã Uma grande brasileira, de izabela Ca­
m ilo, em DVD, produzido pela Interfilm s e ian-
mentosde uma viagem inédita...
Um outro equivoco secular e grave com etido
do livro da feminista inglesa, Mary Wollstonecraft, reçentem ente tive a oportunidade d e assistí-lo.
pela doaim entaristafoio d eria sustentar nofilm e
a falsa versão considerada oficialde queN isia Flo­

intitulado “Vindication of rights of woman”. Afinal, Escrevo este, portanto, em Junção da m inha in­
dignação ao ver totabnente desconsideradas pela
resta feria m orrido em Rouen e não em Bonse­
cours. com o atestam os documentos que encon­
docum entarista verdades históricas trazidas á lia trei ao longp da m inha pesquisa ú tal descoberta,
foi assim que a própria Nísia deixou registrado na nos últim os an ose am plam ente registradas sobre
alguns aspectos da vida d e N ísia Floresta.
aliás,fo i divulgada na m atéria Na trilha de Nisia
Floresta, publicada pelo jorn alO Poli. do d ia 24 de
capa de seu primeiro livro. O preciosismo da in­ Sob o m anto d a respeitabilidade e veracida­
de que o título confere ao docum entário, suposi­
novembro de 1996, no Rio Grande do Norx. e em
trabalhos publicados posteriorm ente. Enfim, gos-
formação de que, na verdade, o trabalho nisiano ções e inform ações enganosas são transm itidas
com o verdades indiscutíveis ao espectador de boa bela Cam ilo não tenha se preparado devidam en­

conteria inúmeros vestígios de outras obras euro­ fé. Três aspectos, em especial, da biografia deN ísia
Floresta, foram divulgados d e m aneira deturpa­
uvman.deMüiy\\bUsionecrafi,publicado no Ingla­
terra, em 1792.
te para ivalizar o docum entário de alto nível que
N ísia Floresta B rasileira Augusta m erece.
da, sem o em basam ento histórico quer requer um $6 que. sobre o assunto,já foram publicadas as A final em 1996, quando m e procurou em Bra-
péias, ainda mais antigas e raras, vai interessar prin­ docum entário. Bom , o prim eiro dos aspectos diz
respeito a um suposto casam ento de N ísia Flo­
descoberias dos pesquisadores M aria Lúáa Garcia
Palkm -Biirke,asáefíerteB azbieasm inhas,deque: i sobre Nísia Fioresta, ela parecia ternoçâodeque
cipalmente a um público acadêmico e restrito, e resta com apenas trezeanos de idade. Digo supos­
to porque não existem provas d e que. d e fa to , tal
na verdade. Nísia Floresta traduziu o tratadofem i­
nista Woman not inferior to man, publicado na In­
um documentário que seprezeexige muito trabalho
prévio. Porém, não aceiteia sua proposta,já que eu
não a jovens estudantes ou a quem apenas ensaia Recortes dos união tenha ocorrido. Assim, se não existem pro­
vas. a inform ação até poderia ter sulo divulgada
glaterra. em 1739, por autor ou autora de pseudô­
nim o Shophia, .4Person o fQuality. Ocurioso équ e
mesma estava envolvida num projeto para realizar
um documentário sobte a vida e a obra de Nísia.

uma aproximação da escritora. De mais a m ás, não artigos


nofilm e, m as sem a ên fase dada.
Izabela Camilo afirm a, ainda,que o casamento,
essas informaçõesestão no livro Nisia Floresta,o Ca-
mpuceiro e outros, ensaios de tradução cultural, de
.Assim, o fa to équ e a diretora de N ísia Floresta ú
Uma graiule brasileira não atentou para a evidên­
além de teracontecido, deu-sepor im posição do pai M aria Lúcia, publicado pela Editora H udtec em cia de certos fatos históricos nem para o rigor da
custa lembrar, 'tradução livre' é um termo que per­ publicados na de Nísia Floresta, o advogado e escultor português,
radicado no Brasil Dionisio GonçalvesPinto ú afir­
1996, e nas notas da tradução, de minha, autoria,
dos Fragmentosde wnaobrn inédita ü Notasbiográ­
ética quea missão inform ativaque todo e qualquer
documentário requer. Dessemodo,ao ira és de 'infor­
mite variações e inserções intelectuás diversas. imprensa de m ação. aliás, im provável para quem leuosescritos
de Nísia, bem com o a presumida atitude de Dioni-
ficas, de Nísia Floresta,publicada pela Editora Uni­
versidade de Brasúia, em 2001.
mar, o film e pecou por perpetuai mitos e enganos.
Não cumpriu o seu papel.
E não só estas, mas as demais informações que Natal sobre a
sio, hom em sensiveldeidéiasiibeniis,que. casoafilha
tiiiesse m im ente se casado, lim itar-se-ia a adverti-
Isso significa dizer que a pesquisadora, roteiris­
ta e diretorado documentário Nísia Floresta ú Uma raó jornalista,
fotógrafa, escritora, tiadiuorae autora doroteiro
ali estão veiculadas encontram-se disseminadas polêmica do v èléa afirm oção da diretora de qu ea tradução Di­
grande brasileira, não deve terconsultado o livro de
M aria Lúcia G arcia Pallares-Burke nem a minha parao documentárioDaauroraao crepúsculo,
reitos das m ulherese injustiça doshom ens, deN ísia tradução, m uito menos outras publicações que nu- longa•metragemsobre NísiaFloresta,a ser
em documentos. Foram Henrique Castriciano e vídeo- Floresta, publicada em 1832, em Pernambuco,fo i
feita a partir do livre Vindication o f lh e rights o f
caindo assumo. Seela leu, não deu a devida impor­
tância às inform ações que ceveacesso, o que depõe
narradopor GiuliaGam,comparticipação
especial detVakletezde Barros.
Câmara Cascudo, por exemplo, os que primeiro di- documentário
DNCDEDUCAÇÃO Nmal, Sexta-feira, 31 de Marçode 2006

“A o prepararmos o projeto do
livro Literatura do Rio Grande do
Norte: antologia, eu e a
professora Constância Lima
Duarte refletimos bastante sobre
os critérios de inclusão dos
autores no corpus dessa
literatura. Nísia Floresta foi um
nome chave das nossas
discussões, porque embora
"Nísia Floresta foi uma personalidade nascida aqui viveu muitos anos lá
ímpar: feminista, jornalista, poetisa, fora (em outros estados
abolicionista, republicana e, sobretudo, brasileiros e na Europa) e nunca
educadora. Uma mulher à frente de voltou. Consideramos, também, a
seu tempo. Numa época de interdições possibilidade de ser a escritora
se mostrou livre e fez da liberdade a reivindicada por outro estado e
linha mestra de sua vida. Uma outra literatura. Resolvemos, por
excepcional educadora que em tempo isso, adotar o critério mais amplo
de inquisições se contrapôs às práticas "Nísia Floresta lutou pela possibilidade de contribuição para a formação
de castigos corporais: torturas como de acesso das mulheres à educação e e a evolução cultural, abrindo a
métodos de aprendizado, palmatórias e isso conseqüentemente nos trouxe série literária norte-rio-grandense
açoites como agentes educacionais das cidadania; por isso sinto tamanha admi­ com o nome dessa escritora.
crianças. Ela fez prevalecer sua ração por ela. Nísia é um exemplo a Nísia homenageia seu lugar de
pedagogia da liberdade na crítica ser seguido por todas nós mulheres. origem desde a escolha do
severa aos métodos educacionais da Não posso deixar de dizer que uma pseudônimo literário - Floresta -
época, como pode ser comprovado mulher que em um tempo de pri­ até as inúmeras referências aos
nos seus escritos. Hoje sabemos que a vações de liberdade quebrou barreiras costumes, a paisagem e a infância
liberdade é fundamental para uma me inspira para a minha luta diária na vivida em terras potiguares.
educação que não se limite a empilhar Assembléia Legislativa". Decidimos, enfim, abrir pela mão
conhecimentos mas que prepare a de Nísia Floresta nossa História
criança, o jovem, para pensar e agir Larissa Rosado Literária seguras de que é uma
com liberdade e responsabilidade, em (Deputada Estadual - PMDB)
honra ter em nossa fundação uma
todos os níveis: um cidadão. Em Nísia, a intelectual que refletiu em prosa e
liberdade atravessou todas as verso sobre as questões mais
dimensões de seu ser. Ela foi pioneira "A escritora Nísia Floresta lutou con­ candentes, não só do tempo em
ao pensar em profundidade a natureza tra diversos tipos de discriminação, que viveu, mas do nosso tempo”.
da relação entre educação e quer seja de raça ou de gênero. Pautou
liberdade". "O que marca a trajetória de luta de sua vida reivindicando educação em Diva Maria Cunha Pereira de Macedo
Nísia Floresta é seu comprometimento igual nível para homens e mulheres, (Professora da UFRN)
Fátima Bezerra com a sociedade em que viveu, sua além de brigar contra os escravagistas.
(Professora e Deputada Federal PT-RN)
vontade de mudar, seu posicionamento Por isso, ela é um exemplo para todas
quanto a discriminação contra as mul­ nós. Eu que tenho minhas origens em
heres, negros e índios. Nísia foi aboli­ Canguaretama, mesma região Agreste
cionista, republicana e, sem dúvidas, onde fica a cidade onde Nísia viveu, me
uma revolucionária. Foi ela quem nos orgulho da bravura desta mulher. Mas é
mostrou que a luta das mulheres e de como sempre digo, a mulher precisa
todos os cidadãos em busca de dire­ ser lutadora sem perder a delicadeza e
itos não deve ser isolada". delicada, sem perder a capacidade de
se indignar e combater as injustiças".
Vera Lúcia Barreto
(Presidente do Conselho Municipal
da Mulheres e Minorias) Gesane Marinho
(Deputada Estadual - PDT)
Natal, S exta- feira, 31 de Marçode 2006 DNÕEDUCAÇÃO
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"O Rio Grande do N o rte sempre


se destacou pela bravura e
-Vfaggggfòjliél pioneirismo de suas mulheres.
Nísia Floresta Brasileira Augusta,
sem dúvida, foi uma dessas
mulheres, e das mais notáveis.
Uma das primeiras em todo o
país, e mesmo na América Latina, "Estamos em divida atrasada para
a ocupar os espaços públicos e a esse grande vulto feminino. Nisia
levantar a bandeira dos direitos Floresta é um dos mais notáveis
femininos. da nossa vida intelectual"
Numa época em que as mulheres
viviam reféns de autoritarismos e João Ribeiro
arbitrariedades, mergulhadas (Historiador)
"Jornal do Brasil" de 25/10/1933
numa atmosfera de opressão e
medo, Nísia Floresta conseguiu
fazer com que o brilho do seu
talento e a grandeza dos seus
ideais se impusesse diante de
todos, abrindo espaço para que
outras mulheres pudessem seguir
o seu exemplo e sua caminhada. “Figura invulgar para o mundo em
Hoje, ao passo em que que viveu, forte, sensível, enérgica,
constatamos que as mulheres heróica na defesa e divulgação de
estão conseguindo avanços suas idéias, nenhum outro nome
"Nísia Floresta foi, e continua sendo, significativos na sua luta para se se pode comparar com a sua
uma mulher que nos inspira pelo van- libertar daquela velha realidade, atividade mental e acompanhar-
guardismo e pioneirismo que mar­ percebemos que ainda resta lhe o traço impressionante de sua "Nas letras, nos fins do século
caram profundamente a sua brilhante muito a ser feito e que o exemplo mentalidade nova, generosa, X IX , aparecería uma Carmen
trajetória. Quando já em sua primeira de grandes guerreiras como Nísia idealista.” Dolores, depois umajúlia Lopes
obra, publicada em 1832, mostrando Floresta é fundamental para que de Almeida. Antes delas, quase que
estar bem à frente do seu tempo, Nísia continuemos a lutar e a vencer". Luís da Câmara Cascudo só houve bacharelas medíocres,
escreve sobre os “ Direitos das mul­ (Historiador e Foldorista) solteironas pedantes ou
heres e injustiça dos homens". E assim Márcia Maia simplórias, colaboradores do
seguiu Nísia Floresta, tratando e con­ (Deputada Estadual - PSB)
"Almanaque de Lembranças Luso-
denando a formação educacional da Brasileiro". E assim mesmo foram
mulher, numa época em que não tín­ raras. Nísia Floresta surgiu como
hamos o direito de contestar. Graças a uma exceção escandalosa.
mulheres com biografias como a da "Poucos brasileiros conhecem Verdadeira machona entre
escritora Nísia Floresta, temos con­ este nome. Entretanto, ele é de sinhazinhas dengosas do meado
seguido ocupar o nosso espaço na uma das mais fortes mentalidades do século X IX . N o meio dos
sociedade, na política. E, inspiradas em femininas deste pais". homens dominando sozinhos
figuras como Nísia, haveremos de con­ "Prestará inestimável serviço às todas as atividades
tinuar firmes nessa luta objetivando letras pátrias quem estudar extradomésticas, e as mal sabendo
ampliar a nossa participação na busca criteriosa e demoradamente essa escrever; dos senhores os
por uma sociedade mais justa e igual. por tantos títulos excepcional devotos e novelas que eram
Numa sociedade, não dominada pelas figura feminina, uma das primeiras quase de ver uma figura como a
mulheres, mas onde possamos camin­ da fase romântica entre nos" de Nísia".
har lado a lado com os homens".
Henrique Castriciano Gilberto Freire
Ruth Ciarlini (Escritor e Ex-vice-governador do RN) (Sociólogo e escritor)
(Deputada Estadual -PFL) Almanaque Garnier -1908 “ Sobrados e Mucambos” , pág. 134.
D N O EDUCAÇÃO Natal, Sexk-feira, 31 de Marçode 2006

COLETÂNEAS A ATUAÇÃO DE N ÍSIA N O MAGISTÉRIO NA VISÃO DE IMPORTANTES PUBLICAÇÕES DO PAÍS

ferramenta para a emancipação

A sala de aula sempre


será um instrumento de
transformação social,
tanto para homens
quanto para mulheres.
Coube a Nísia dizer isso a
toda a sociedade

À educação formal, elas tiveram acesso há a educação feminina como ferramenta princi­ versos campos sociais, da religião, artes, política, analisa a condição da educação feminina no sé­
aproximadamente 120 anos, já o direito ao voto pal. Sem educação, não haveria a conquista dos educação e literatura. O livro conta a vida e obra culo XIX, a partir da experiência da educadora
foi há quase 70 anos e a igualdade plena só veio direitos básicos da mulher. de Nísia Floresta, desde a sua infância em Pa- Nísia Floresta. A autora cita o livro "Opúsculo hu­
através da constituição de 1988. Mas a história das A primeira coletânea a ser pubbcada nacio­ pary até a morte na França. manitário, "um dos vários escritos com que es­
mulheres brasileiras cojneça muito antes dessas nalmente sobre a mulher, abordando a militân­ sa professora autodidata iria perturbar a socie­
datas, desde o Brasil Colonial, com as senhoras cia nisiana foi "Mulheres Illustres do Brazil", de A MULHER EM SALA DE AULA dade brasileira. Afinal, o que pretendia essa "mu­
brancas e sinhazinhas, ou a negra na senzala e a Ignez Sabino, publicada em 1899, sendo reedita­ lher metida a homem"? Nísia Floresta, uma voz
índia na tribo. Com a instauração da República, do em 1996.0 nome de Ignez merece ser lem­ "Enquanto pelo velho e novo mundo vai res­ feminina revolucionária, denunciava a condição
a participação das mulheres se tomou comum na brado não tanto por seus contos e poesias, mas soando o brado - emancipação da mulher-, nos­ de submetimento em que viviam as mulheres
luta pela emancipação política, através da con­ principalmente pela luta em defesa dos direitos sa débil voz se levanta na capital do Império de no Brasil e reivindicava sua emancipação, ele­
quista do voto e dos direitos civis básicos como da mulher. Daí a sua identificação com Nísia Flo­ Santa Cruz, clamando: educai as mulheres! Po­ gendo a educação como o instrumento através
à educação. resta, que mereceu importantes referências na sua vos do Brasil, que vos dizeis civilizados! Gover­ do qual essa meta seria alcançada".
A história de participação da mulher brasi­ coletânea. no vos dizeis liberal! Onde está a doação mais O discurso sobre a importância da educação
leira nos aspectos de transformações sociais, des­ Outra publicação é o "Dicionário das Mulhe­ importante dessa civilização, desse liberalismo?" na modernização dos pais era recorrente. As crí­
de os tempos do Brasil Colonial até o Século XX, res do Brasil", editado por Jorge Zahar Editor. O (Nísia Floresta, em 1835). ticas ao abandono educacional em que se en­
é resgatada por diversas publicações literárias, livro é uma abrangente radiografia biográfica das "História das Mulheres no Brasil" é outra im­ contrava a maioria das províncias estavam pre­
abordando temas e personagens que contribuí­ mulheres que participaram da construção da his­ portante publicação organizada por Mary dei sentes nos debates do Parlamento, dos jornais e
ram significativamente para mudanças, princi­ tória da nação. Das 1.500 personagens investiga­ Priori, Ed. Contexto(SP)/Ed. Fundação Unesp. até mesmo dos saraus. Os anos se passavam e o
palmente através da educação. Um dos persona­ das pelos doze pesquisadores que percorreram Escrito por duas dezenas de pesquisadores, o li­ Brasil caminhava para o século XX com grande
gens muito citados por essas coletâneas é a es­ vários estados brasileiros, 900 foram transforma­ vro se propõe a contar a história da mulher bra­ parte da população ainda analfabeta. Aqui e ali,
critora, feminista e educadora potiguar Nísia Flo­ das em verbetes, sendo 15 potiguares e o maior sileira, através da sua infância, do seu corpo, da no entanto, havia escolas - certamente em mai­
resta Brasileira Augusta. E, em praticamente to­ destaque é dado para Nísia Floresta Brasileira sua sexualidade, do trabalho, da mídia, da litera­ or número para meninos, mas também para me­
dos verbetes sobre a escritora potiguar, há uma Augusta. O objetivo foi dar visibilidade à atua­ tura e de suas imagens frente à sociedade. ninas; escolas mantidas por leigos -professores
idéia em comum: as transformações sociais têm ção feminina, desde 1500 até 1975, nos mais di­ No Livro, um texto de Guacira Lopes Louro para as classes de meninos e professoras para as
Enquanto pelo velho e novo mundo vai
ressoando o brado - emancipação da
mulher-, nossa débil voz se levanta na
capital do Império de Santa Cruz,
clamando: educai as mulheres! Povos do
Brasil, que vos dizeis civilizados! Governo
vos dizeis liberal! Onde está a doação
mais im portante dessa civilização, desse
liberalismo? (Nísia Floresta, em 1835),

O progresso de uma
de meninas. Deveríam ser, eles e elas, pessoas de go da produção intelectual de Nísia Floresta, veicu­ co mantenedor da família. Ela, a "rainha do lar"; ele, sociedade depende da
moral inatacável; suas casas ambientes decentes e lada tanto em discurso e novela, como em ensaios e o cabeça, o chefe, o juiz. educação que é oferecida
saudáveis, uma vez que as famílias lhes confiavam colaborações jornalísticas. As idéias que ela expressou a mulher, só a instrução
seus filhos e filhas. nas obras, sem dúvida fundamentaram seu exercício D IC IO N Á R IO D O S E D U C A D O R E S aliada à educação morai
As tarefas desses mestres e mestras não eram, do magistério, a que se dedicou durante vários anos. dão maior dignidade e
contudo, exatamente as mesmas. Ler, escrever e con­ Durante o período colonial não havia quase es­ A última publicação a merecer destaque é "Dicio­ fazem da mulher uma
tar, saber as quatro operações, mais a doutrina cris­ colas no Brasil. Apenas os conventos e os seminários nário de Educadores no Brasil, organizado ppr Maria de boa esposa,mãe e uma
tã, nisso consistiam os primeiros ensinamentos pa­ se ocupavam em fornecer uma instrução àqueles Lourdes de Albuquerque Fáveroejader de Medeiros Brít- excelente profissional
ra ambos os sexos; mas logo algumas distinções apa­ que os procurassem, mas seu número era insufici­ to, Ed. UFRJ -2a Edição - 2002. Nessa obra, novamente
reciam: para os meninos, noções de geometria; pa­ ente. Se aos homens ensinava-se a ler e a contar, as a escritora Constância Duarte, baseando-se na obra de
ra as meninas, bordado e costura. mulheres bastavam os trabalhos manuais, pois o Nísia Floresta, prega a valorização da mulher através
androcentrismo da família patriarcal se encarrega­ da educação. Ela defende a tese de que o progresso de
A F IC Ç Ã O D ID Á T IC A DE N ÍS IA FLO R ESTA va de excluí-las, reservando aos homens os benefí­ uma sociedade depende da educação que era ofereci­
cios que a cultura pudesse trazer. da à mulher; e que só a instrução, aliada à educação mo­
A obra "500 anos de Educação no Brasil", ed. Au­ Desde seu início, a educação feminina foi conce­ ral, dariam maior dignidade e fariam da mulher uma
têntica, também retrata a figura de Nísia Floresta co­ bida a partir de uma visão romântica: precisava ser melhor esposa e melhor mãe. Esses, aliás, seriam pre­
mo educadora. É uma coletânea de textos sobre a his­ uma educação calcada na religião e na moral, neces­ cisamente os objetivos da educação das meninas: tor­
tória da educação no país, escritos por importantes sária apenas para estimular a dignidade e preparar ná-las conscientes de seus deveres e papéis sociais.
autores da área, entre eles, a professora Constância a futura mulher para assumir as funções de mãe e Na crítica às escolas e ao ensino, a autora utili­
Lima Duarte, autora do texto "A Ficção Didática de esposa junto à familia. Tal projeto ficava bem distan­ zou dados oficiais do ano de 1852, e expõe um Pla­
Nísia Floresta": te, portanto, de um projeto de formação intelectu­ no de Educação para a mulher brasileira concebido
"Quando observamos o percurso realizado pe­ alizada, reservada ao segmento masculino da po­ por Nísia Floresta. É o momento em que melhor sé
las mulheres na conquista de seus direitos mais ele­ pulação. A elas bastavam o ensino primário e o de­ percebe o jogo de formas e de influências a que a au­
mentares, como o de ser alfabetizada, poder fre- senvolvimento das habilidades manuais, e os cursos tora estava presa. Por um lado, próxima do pensa­
qüentar escolas, ou simplesmente ser considera­ secundário e superior lhes eram vedados. mento liberal mais progressista; por outro, limitada
da um ser dotado de inteligência, verificamos o Por tudo isso, a bandeira de luta pela educação por sua formação religiosa aos ditames conserva­
quanto esse percurso foi tortuoso. É possível vis­ das mulheres foi fortemente abraçada por aquelas dores do catolicismo. No primeiro caso, defendia a
lumbrar em parte esse trajeto se examinarmos as que haviam conseguido romper o preconceito e des- difusão em massa de escolas de primeiras letras pa­
trilhas deixadas por algumas escritoras em seus tex­ tacar-se, de algum modo, na sociedade, como era o ra meninas em igual número das que eram criadas
tos, conscientes de que faziam parte de uma re­ caso de Nisia Floresta". O redimensionamento do pa­ para meninos, exigia uma fiscalização severa do Go­
duzida elite de mulheres letradas e que a educa­ pel da mulher consistira, basicamente, na superva- verno na qualidade do ensino ministrado, lamenta­
ção era importante para a mulher ser valorizada lorização das figuras da esposa e da mãe alçadas à va o baixo rendimento intelectual da maioria das
socialmente. categoria de "santas", uma vez que lhes cabe a "di­ professoras. A autora endossava as modernas teori­
A questão da educação é, precisamente, um dos vina" missão de serem as guardiãs privilegiadas da as higienistas na defesa da necessária educação pa­ Importantes
temas que com mais freqüência encontramos ao lon­ família. E ao pai a última palavra, por ser ele o úni­ ra mulheres e crianças. produções
literárias sobre a
mulher no país

D . IG N E Z S A B IN O II I 8 T ( ) R 1 A
1)A> '
MULHERES ILLUSTRES M l i. 11 I. R ! >
DO BRAZIL
Natal, S exta- feira, 31 de Março de 2006 DNOEDUCAÇÃO
3- Maria da Conceição Flores M A R IA C A R O L IN A W A N D E R L E Y C A L D A S (1876-1954)
Uma mulher e um livro: Teresa Margarida da Silva Orta e as aventuras Conhecida como Sinhazinha Wanderley a professora autodidata
de Diófanes/2004 trabalhou no grupo escolar Tenente Coronel José Correia, em Assu.
4- Manoel Pereira da Rocha Neto Fazia parte de uma geração de intelectuais que, em sua grande maioria,
A Educação da mulher norte-rio-grandense segundo Júlia Medeiros descendia de famílias representantes das oligarquias rurais. Ela conseguiu
(1920-19301/2005 o certificado profissional após os 40 anos de idade.
5- Lígia Pereira dos Santos
Histórias do corpo negado: uma reflexão educacional sobre o gênero J U D IT H B EZE R R A D E M E L O (1 893-1984)
e violência feminina/2005 Diplomada em 1910 pela Escola Norma de Natal, Judith sabia música
6- Maria Lúcia da Silva Nunes e francês. Tocava bem piano e bandolim. Casada com o também
Sociedade, Mulher e Educação nos rom ances de Graciliano professor Severino Bezerra de Melo, ambos estiveram à frente do Grupo
Ramos/2005 Escolar Barão de Mipibu durante muitos anos.

C R IS A N S IM IN É A (1927-1995)
LIVR O S SOBRE A M U L H E R Atuando a partir dos anos 60, a professora Crisan Siminéa trabalhou
“ Leituras de Mulheres no Século
P U B L IC A D O S P O R M A R IA A R IS N E T E em várias escolas locais entre elas, a ETFRN, Padre Miguelinho, Atheneu,
X IX ” é um dos livros de Arisnete
Marista, Apec, entre outras. Autora da obra Ler e Reler, Crisan já defendia,
A M U L H E R EM N O V E V E R S 0 E S .O R G . (2001) em sua época, que o aprendizado do aluno seria mais consistente se
Trata-se da publicação de nove ensaios, redigidos por professores, ele estivesse imerso nos estudos de sua própria realidade.
alunos de pós-graduação e graduandos da UFRN. Entre a coleta de
material, pesquisa, redação de textos e impressão da obra consumiu- P A LM IR A W A N D E R L E Y (1894-1978)
se cerca de dois anos para que o trabalho ficasse pronto. Este é o Uma das primeiras mulheres com atuação no jornalismo potiguar,
primeiro registro coletivo da Base de Pesquisa que existe desde 1998. Palmira fundou - junto com outras colegas - a revista Via Lactea, primeira
publicação do Estado editada só por mulheres, que circulou entre 1914
L E IT U R A S DE M U LH E R E S N O S É C U L O X IX (2002) e 1915. Ela colaborou nos jornais do RN e nos periódicos de outros
A pesquisa realizada por Maria Arisnete permite compreender de outra estados. Autora de dois livros de poesia, ela chegou a ganhar uma
forma o passado e como foram criadas e tratadas as mulheres. Pelo menção honrosa da ABL.
menos, no Rio de Janeiro, na corte imperial, não só as mulheres liam,
como também escreviam. “O resultado de muita vigilância se não Os trabalhos podem ser consultados na Base de Pesquisa Gênero e
provoca o assujeitamento, causa a explosão do sol, que continua Práticas Culturais: abordagens históricas, educativas e literárias, da
espalhando faíscas que ainda cintilam em livros e jornais e nas herdeiras UFRN. Coordenadora: Maria Arisnete Câmara de Morais. E-maiE
que são todas as mulheres”. arisnete@terra.com.br. Tel.: 36421373.

C A R R O SS EL D E L E IT U R A S , E N S A IO S D E V ID A . O R G . (2003)
O prazer da leitura, enquanto fruição, que nos ensina Roland Bathes, M A R C O S N A E D U C A Ç Ã O F E M IN IN A
leva-nos a refletir sobre a pergunta que ele faz: escrever no prazer me
assegura o prazer de meu leitor? De modo algum, responde Barthes. ■ As ordens religiosas, sobretudo a dos jesuítas, são as instituições que
O que se pretende mesmo é a possibilidade de uma dialética do desejo, primeiro se dedicam ao ensino no Brasil. No Rio Grande do Norte,
do jogo de sedução entre o escritor e o leitor do outro lado da ponte o processo educativo começa quando são instaladas as vilas. Cabe
dialógica. São momentos de enlevo e transporte grátis a mundos e aos missionários, inclusive, a tarefa da instrução civil e religiosa. As
perspectivas para além do cotidiano. O leitor é, assim, convidado a meninas são excluídas do ensino.
participar desse espaço, cuja senha denomomina-se desejo. ■ Em 1827 surge, no Brasil, a primeira lei sobre educação das mulheres,
permitindo que freqüentem as escolas elementares. As instituições
Isabel Gondim, educadora e escritora ISA BEL G O N D IM , U M A N O B R E F IG U R A D E M U L H E R (2003) de ensino mais adiantado são proibidas a elas.
Neste livro, Arisnete dá início à Coleção Educação e Educadores do ■ Dois anos depois, em 1929, Natal recebe a primeira aula feminina,
RN, em parceria com o Projeto Ler/DN Educação do DIÁRIO DE da professora Josefa Francisca Soares da Câmara.
NATAL, evidenciando a atuação de uma das mais ilustres ■ Somente 52 anos depois, as mulheres conseguem autorização do
personalidades femininas do Rio Grande do Norte, a educadora e governo federal para estudar em instituições de ensino superior, no
escritora Isabel Gondim, tratando, sobretudo, o seu papel na construção entanto, as que seguem este caminho são criticadas pela sociedade.
da sociedade letrada norte-rio-grandense em fins do século XIX e
O estudo biográfico sobre a início do século XX.
professora Chicuta Nolasco será
publicado brevemente, numa C H IC U T A N O L A S C O FE R N A N D E S ,
parceria do Diário de Natal, IN T E L E C T U A L D E M É R IT O (2006)
através do Projeto Ler/DN
Este trabalho, ainda a ser publicado, é o segundo número da Coleção
Educação, e Governo do Estado
Educação e Educadores do RN. Nele, Arisnete tem a oportunidade de
resgatar a história de uma das mulheres que mais admira, ainda mais
por tê-la conhecido, na década de 1970, quando era normalista, e
Chicuta Nolasco passou de professora à primeira diretora da escola
normal. O trabalho aborda, dentre tantos outros aspectos da professora,
a história da intelectual, laços de amizade com Noilde Ramalho, além
do empenho que ela dedicava a enaltecer a figura da normalista.

N O M E S DE D E S TA Q U E

ISA BEL G O N D IM (1839-1933)


Defensora do ensino público para as mulheres, Isabel foi a mais antiga
escritora norte-rio-grandense residente no Estado. Em 1866 instalou
sua primeira sala de aula no bairro da Ribeira. Colaborou nas revistas
e jornais locais e lançou vários livros, dentre eles Reflexões às minhas
alunas.
DN €G)EDUCAÇÃO NAm, Sboa-feira, 31 de Marçode 2006

COMO EXPLICAR UM
IRREVERÊNCIA
COMPORTAMENTO TÃ O ALÉM DO SEU
TEMPO?
Perguntam ainda hoje os historiadores e os críticos como ou educar meninas. Casada com Félix Ferreira da Silva, que

Ofenômeno
explicar o fenômeno Nísia Floresta. Seria facilmente explicado a deixou viúva logo cedo, sendo que as largas transações
se Nísia vivesse em nossos dias atuais, aliás, nem havería comerciais não o acompanharam na sepultura. A viúva
necessidade dessa pergunta, pois seu comportamento não comandava seus negócios como um verdadeiro homem,
seria tão extraordinário assim. Mas acontece que Nísia apesar dos três filhos para criar. Continuou a gerir os
Floresta viveu no Século XIX e desde Constâncio Alves a negócios com sucesso. "O anedotário criado por dona
Roberto Seidl, passando pelo escritor Adauto da Câmara, Francisca Freire é maravilhoso de graça e de bom humor,

se explica na Câmara Cascudo, sem esquecer o próprio Henrique


Castriciano, é geral a surpresa. Gilberto Freire espanta-se
com essa mulher vigorosa, "exceção escandalosa". Ao
sociólogo de formação patriarcal surpreende o aparecimento
de tão impressionante figura feminina, sobrepondo-se ao
revelando uma inteligência soberbamente dotada".
Não menos coincidente com a vivacidade de Nísia, o gesto
de uma prima sua, que ao experimentar as inesperadas
revelações da maternidade e as surpresas do primeiro parto,
promete perante à parteira e o bebê em gritos solenes não mais

genealogia seu tempo de sinhazinhas dengosas.


À parte a singularidade do seu autodidatismo, Hélio
Galvão, imortal da Academia Norte-rio-grandense de Letras,
dizia não ser surpresa para seu "temperamento impetuoso
e ardente, seu sangue quente e sua vontade caprichosa,
voltar àquela situação vexatória, separando-se do marido...
Na opinião de Hélio Galvão, as condições temperamentais
de Nísia Floresta, enfrentando os princípios vigentes na
educação doméstica do seu tempo, rompendo uma série de
obstáculos contrários à satisfação de suas tendências,
sua inteligência pronta e ágil, suas tendências de correspondem justamente às de sua família. Entram num
indisciplinada liberdade, tudo isso encontra explicação encadeamento natural, e gestos e atitudes por ela assumidos
razoável e legítima se recolocarmos o estudo de sua não são mais que legítimas hereditárias no inventário das
empolgante figura no conjunto da parentela vasta e qualidades e defeitos da sua gente.
incontável". À luz dessa experiência Nísia está explicada.
Vendo uma explicação na geanologia, Hélio Galvão Compreendemos agora porque se fez precursora do
explica: o avô materno de Nísia era o capitão-mor Bento feminismo. E alcançamos as razões e o sentido de suas
Freire do Revoredo, um homem patriarcalmente influente viagens, idas e vindas, num nomadismo que tão bem a
e dominador, barão feudal de água-doce, às matgens do Jacu, define e caracteriza. Nísia, portanto, feminista, preceptora,
fecundando a dinastia dos Jundiás. O tio da escritora era enfermeira, poetisa, conferencista, escritora, abolicionista,
Bento José Freire do Revoredo, revolucionário de 17, político memorialista e moralista, é fenômeno para ser explicado
vivo e habilidoso, propulsor da criação do município de no complexo da sua genealogia, na trama psicológica de sua
Goianinha, sabendo vir a palácio e falando cara a cara ao família, onde refervem três sangues borbulhantes. "Isto
presidente... não diminui nossa grande conterrânea. Antes, agiganta-a,
Uma tia, dona Francisca Freire, é outra Nísia Floresta em aumenta-a, cresce-lhe a sedutora personalidade", conclui
primeira edição, comprando gado em vez de escrever livros Hélio Galvão.

E qu al a religião de Nísia?
Qual a religião de Nísia? Os historia­ que sente desejos de ajoelhar-se "peran­ de da pregação cristã, em prol do amor nante cheiro, que se deve admirar de violação à lei da natureza e condena o
dores mais antigos não ousaram negar te essas virgens modelos, e adorá-las". entre os homens: longe, sendo que o seu contacto infec- poder temporal dos papas como a prin­
que foi católica Nas cidades por onde Para o escritor Adauto da Câmara, "Não será a espada, mas o amor, ciona o ar que respiramos. É a religião cipal razão da adulteração da doutrina
passa tem predileção especial pela visi­ o catolicismo de Nísia era de Lammen- que regenerará o homem, o cristianis­ quefortifica e realça as qualidadesfe­ cristã. Para pesquisadores mais jovens,
ta às igrejas. Entra na catedral de Eix-la- nais, tolerante e condescendente, mo o prega em vão há perto de 1900 mininas; é ela ainda que sustenta e con­ como é o caso da jornalista Nathalie
Chapelle, onde esteve diante do túmulo aquele catolicismo liberal que Pio IX anos. Aguardamos que a religião da sola todo indivíduo nas circunstâncias Câmara, Nísia demonstra misticismo
de Carlos Magno. Em Iiége, reza na igre­ enfrentou e venceu, repondó-o na dis­ humanidade o realize um dia". mais difíceis da vida, a biíssola invari­ ao relatar em um dos seus livros a ex­
ja de São Tiago pela alma do marido. Edi- ciplina do dogma. "A religião de Nísia Noutro sentido, são também suas ável que lhe indicaseus deveres, e o con­ periência onírica que teve ao sonhar
fica-se com apiedade dos católicos ingles­ era aquela muito em moda no seu tem­ estas palavras, pregando um deísmo duz ao exato cumprimento deles". com Cincinnatus (V519 a. C), glorioso
es: "Custa-nos a confessar que antes de po, sem consistência doutrinária, va­ vago e inconseqüente: soldado e general romano de origens
irmos à Inglaterra, não havíamos senti­ zia de conteúdo, despida de convic­ "Osentimento religioso é, sem con­ Adianta uma censura aos pais e sa­ camponesas, que, após as várias bata­
do, ao entrar em um templo do Senhor, ções. Religião sem fé interior, sem ade­ testação, a mais bela e mais santa ex­ cerdotes: lhas que travou, decidiu voltar ao cam­
esse profimdo recolhimento que inspi­ são total do ser, que nos faz crer pro­ pressão da alma para o Criador. Sob "Entretanto, nada em nossa terra po, recluso, na labuta diária da terra,
ram à alma religiosa os lugares consa­ fundamente e transforma em suaves qualquerforma por que se traduza, es­ mais desprezado pelos pais e pelos pá­ recusando as honras da guerra.
grados ao seu divino culto". claridades as sombras dos mistérios e ta expressão é sempre solene, quando rocos que o ensino da religião. Onde, "O sonho, parábola sobre a histó­
Censura o costume, ainda hoje vivo em consoladoras certezas as verdades parte de uma crença sincera". no Brasil, o assíduo cuidado de uns e de ria da humanidade - uma volta no tem­
e reprovável, dos grupos às portas dos sobrenaturais. outros, de inspirarem à mocidade os po -, a catarse que nos revela as aspi­
templos, durante as cerimônias religio­ Já para o escritor Hélio Galvão, su­ Esobreaeducação religiosadamulher: salutares princípios da fé de Cristo"? rações holísticas de Nísia e a profecia
sas. Freqüenta o bispo de Mondovi, na as idéias religiosas variam sem seguran­ "Areligião é a cadeia indestrutível que se desdobra aos seus olhos, du­
Itália, esse prelado adotava nas escolas ça de orientação, mescladas ao natu­ que liga a mulher aos seus deveres, a Defensora da liberdade de culto, Ní­ rante a caminhada com Cincinnatus,
paroquiais os "Conselhos àminha filha”. ralismo de Rousseau ou ao positivismo coroa mais preciosa que lhe cinge a sia faz veementes críticas à moral ca­ quando, perscrutando o universo al­
Faz a apologia das Irmãs de São Vicen­ de Comte. Chega a condenar o celiba­ fronte. A mulher sem religião asseme- tólica conservadora, reprova enfatica­ heio, mergulha na floresta do seu pró­
te de Paula e tem por elas tal respeito to eclesiástico. E proclama a inutilida­ Iha-se àquelas lindas flores de nause- mente o celibato eclesiástico como uma prio imaginário".
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Naevl, S exta- feira, 31 de Março de 2006 PNG) EDUCAÇÃO
pesquisa ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL, MÉDIO E SUPERIOR CONCORREM A R$ 35 MIL EM PRÊMIOS

Concurso de redação
vai prestar homenagem à educadora Nísia Floresta
gear não apenas a uma personalidade
histórica, mas, sobretudo, a uma mu­ SOU U M HOMEM INTERESSADO
lher que foi pioneira na defesa do aces­ NO ESPETÁCULO 0 0 MUNDO” P R E M IA Ç Ã O
so da mulher à educação. "A propos­
JÔSUÉUS CASTRO
m m tsim ii m vevzti
NACIONAL
ta do concurso é mobilizar uma gran­ 10» PRÊMIO NACIONAL
Ensino Fundamental
de quantidade de alunos sobre temas A S S IS CHATEAUBRIAND DE REDAÇÃO/
1* a 4* séries:
de interesse nacional. Agora, Nísia Flo­ PROJETO MEM ÓRIA
1° lugar -R$2.000,00
resta terá sua memória resgatada den­ 2° lugar -R $ 1.000,00
tro das salas de aula de todo o País", 3° luga r-R $ 500,00
disse. Ensino Fundamental
A comissão julgadora do Prêmio 5“ a 81 séries:
Nacional Assis Chateaubriand de Re­ 1° lugar -R$4.000,00
dação, considerado o mais importan­ 2° lugar-R$2.000,00
3° luga r-R $ 1000,00
te evento do gênero no Brasil, é com-
porsta por professores, escritores e lí­ Ensino Médio
deres culturais de Brasília, cidade se­ 1° lugar-R$6.000,00
2° lugar - R$ 3.000,00
de da Fundação, onde irão analisar e 3° luga r-R $ 1.500,00
Márcio Cotrim , Diretor-Executivo da Fundação Assis Chateaubriand julgar cada texto inscrito, "chegando a
um resultado neutro e justo", enfatizou Ensino Superior

Cotrim. 1° lugar-R$8.000,00
2° lugar-R$4.000,00
Os trabalhos devem ter no máxi­ 3° lugar-R $1000,00
Após homenagear personalidades var os estudantes para a pesquisa e, mo 150 linhas manuscritas, datilogra­
que tiveram atuação marcante nà área1 em seguida, escrever um texto sobre o fadas ou digitadas em computador
social, como Juscelino Kubitschek, assunto, dentro do projeto de incenti­ (corpo 12 - fonte Arial com espaça­ contendo as seguintes informações: Premiação
Oswaldo Cruz, Paulo Freire e Josué d e, vo à educação e à cultura da Fundação. mento simples) e ser apresentado em título do trabalho, categoria a que con­ Estadual
Castro, o Prêmio Nacional de Redação Podem participar alunos de esco­ duas vias. Cada concorrente pode apre­ corre, nome e endereço completo do
Assis Chateaubriand, em parceria com las e universidades púbbcas e priva­ sentar, no máximo, três trabalhos, que estudante, nome do estabelecimento Ensino Fundamental

a Fundação Banco do Brasil, homena­ das do País. A premiação, no entanto, 1* a 4“ séries:


devem ser realizados individualmen­ em que estuda e nome do(s) profes­ 1° lugar- Um DVD
geia agora a educadora e poetisa bra­ será dividida por categorias - Ensino te, e serem inéditos, originais e criati­ sores), caso a redação tenha sido ta­
sileira do século XIX. Este ano na sua Fundamental (Ia a 4a séries e 5a a 8a sé­ vos. Trabalhos em forma de poesia não refa recomendada em sala de aula. Ensino Fundamental
12a edição, o concurso traz como tema ries), Ensino Médio e Ensino Superior. serão aceitos. Existem duas formas de envio. Ao 12° 5“ a 8* séries:
1° lugar - Um aparelho de som
"Nísia Floresta: uma brasileira à fren­ Além de diplomas, serão oferecidos Os trabalhos devem ser enviados Prêmio Nacional Assis Chateaubriand
te do seu tempo". O objetivo é moti- prêmios em dinheiro aos três primei­ junto com uma ficha de identificação, de Redação / Projeto Memória - Fun­ Ensino Médio
ros colocados de cada nível de ensino, dação Assis Chateaubriand, SIG, Qua­ 1° lugar - Um computador
num total de R$ 35 mil. As redações dra 2, Lote 340 CEP: 70610-901 - Bra-
Ensino Superior
serão recebidas até o dia 31 de agosto süia/DF; ou para o endereço eletrôni­
OSWALDO CRUZ de 2006. 11° Prêmio Nacional co: fac@correioweb.com.br.
1° lugar - Um computador com impressora

Ele inovou a saúde O Prêmio Nacional Assis Chateau­ Assis Chateaubriand


pública no País briand de Redação é uma iniciativa da de Redação
Fundação Assis Chateaubriand, enti­ Projeto Memória
dade corporativa dos Associados, em O D IÁ R IO DE NATAL, por pertencer ao grupo dos Associados, está
parceria com a Fundação Banco do sendo um grande parceiro 12° Prêm io Nacional de Redação Assis
Brasil. O tema do concurso é escolhi­ Chateaubriand, tendo em vista que Nísia Floresta nasceu no Kio Grande do
do de acordo com a temática do Pro­ N o rte. Por isso, além de contribuir para a divulgação de estudos sobre a
jeto Memória, programa da Fundação educadora para todo o Brasil, o Projeto Ler/D N Educação irá premiar alunos
Banco do Brasil que, desde 2002 - ano do Estado inscritos no concurso de uma forma diferenciada. A o invés de
em que as duas fundações se toma­ premiar em dinheiro as três colocações por categoria, apenas o estudante
ram parceiras -, homenageia persona­ que obtiver o primeiro lugar será contemplado, independenté do resultado
lidades que fizeram diferença na luta nacional.Aos alunos de Ensino Fundamental de 1a a 4a séries será sorteado
para inclusão social. Nísia Floresta, no um aparelho de DVD. Àqueles de 5a a 8a séries, um aparelho de som com
entanto, é a quinta contemplada. CD. O primeiro lugar do Ensino Médio receberá um computador, e para o
PRÊMIO NACIONAL De acordo com Márcio Cotrim, Di­ Ensino Superior será sorteado um computador com impressora.A organização
ASSIS CHATEAUBRIAND retor-Executivo da Fundação Assis não-governamental Companhia TerrAm ar é parceira do projeto no Rio

DE REDAÇÃO 2 0 0 3 / Chateaubriand, a escolha de Nísia Flo­ Grande do N orte e vai ser responsável pela divulgação do concurso nas escolas

PROJETO MEMÓRIA resta para ser tema desta edição par­


tiu da idéia de prestar uma homena­ I .
REGULAMENTO de todo o Estado.
Natal, S exia - feira, 31 de M arço de 2006

ARTIGO WILMAMARIADE FARIA*

AMP. Eloy Ribeiro / Instituto Histórico e Geográfico do RN


O nome de Nísia Floresta é sinônimo de pioneirismo resta tão atuais porque têm a ousadia de falar para o formação social. Por isso, essa edição do DN Educação se
na luta pela emancipação da mulher no Brasil e pela mundo inteiro que a mulher tem seus direitos. reveste de grande importância para o estudo da cultura
garantia dos direitos das minorias. Falar de Nísia é sinôn­ O pioneirismo que marcou a sua vida também foi uma e das letras no nosso Estado. O DIÁRIO DE NAIAL, através
imo também de orgulho de todo povo potiguar, espe­ marca que sempre tive o prazer de estar ao meu lado. Eu Projeto Ler, está de parabéns.
cialmente, para nós mulheres. O seu pioneirismo nos co­ tive o privilégjo de ser a primeira deputada federal do Rio Nísia Floresta pregou a cidadania ostentando as ban­
move e nos dá sustentação, mostrando a todas a força Grande do Norte, a primeira prefeita de Natal e a primeira deiras de valorização do ser humano, independente de
que temos em comum, independente do que temos e do mulher a governar o Estado. Mas em todas essas atribuições sexo, raça, idade ou posição social. Ela defendeu os índios,
que somos, para a transformação da sociedade. que a sociedade norte-rio-grandense me confiou, sempre combateu a escravidão, pregou a emancipação feminina
A força de Nísia como feminista numa sociedade essen­ estavam presentes as três missões sagradas que compro­ através da educação. E hoje, tanto tempo depois, a luta
cialmente patriarcal, em pleno século XIX, é para nós um vam a força feminina: as funções de mulher, mãe e pro­ ainda é a mesma. Somente a educação pode transformar
exemplo de que precisamos conquistar, a cada dia, mais fessora, tão bem traçadas e descritas por Nísia Floresta. a nossa sociedade. Por isso, Nísia Floresta é um símbolo
espaços porque a experiência tem mostrado que a atuação A mulher professora é o símbolo da educação como vivo entre nós, educadoras, em cada sala de aula, em cada
da mulher é essencial para a solução de questões sociais, direito constitucional pleno e inegociável. Hoje, as mul­ escola, em cada mente progressista e continuada do nosso
como a educação, o trabalho, a assistência à saúde e a heres representam a maioria absoluta dos trabalhadores professor, combatendo as desigualdades e anunciando
administração pública. O fato é que a luta pelos direitos em educação. É com dignidade e sacerdócio que se cumpre que dias melhores virão.
da mulher e igualdade entre os sexos é tão antiga que a tarefa de formar gerações, levar o conhecimento e fazer,
parece não terminar, tomando os escritos de Nísia Flo­ na prática, a educação um instrumento efetivo de trans­ * Professora e G overnadora do Estado do RN

Trabalhando pra valer

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