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INCLUSÃO ESCOLAR
Apresentação
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A autora se alinha ao DEFNET na opção das grafias dEficiência e dEficiente emprestadas da
poesia concreta, em uma opção que indica “para a possibilidade de que todos os que foram um dia
considerados "incapacitados" ou "inválidos" possam passar a ser respeitados e tratados como
qualquer outro cidadão de nossa sociedade”. A forma como a palavra é grafada ressalta a eficiência
ao invés da perspectiva da falta da negação que é aparte do significado do termo.
http://www.defnet.org.br/
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Sem dúvida o grande desafio do processo histórico da inclusão educacional
é passar do plano de princípios ou das declarações para a implementação de uma
prática, no plano da ação.
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Como instituição social, a escola apresenta um forte apelo à seletividade. Na
tentativa de homogeneizar os sujeitos em torno de um padrão referencial, exclui
aqueles que por diferentes razões resistem a essa homogeneização. Para
mascarar o processo de exclusão, criam-se diferentes mecanismos de oferta de
serviços educacionais ou mesmo terapêuticos para esses sujeitos. Nessa
perspectiva, cria-se uma pedagogia “especial” destinada às pessoas com
desenvolvimento atípico, que organiza um jogo contraditório em que esses sujeitos
são aprisionados. Ao mesmo tempo normalizados e anormalizados, posto que, “em
determinadas circunstâncias, lhes são atribuídas características especiais para
dirigir-lhes tratamento, proteção e assistência, (mas ao mesmo tempo), criar ao seu
redor uma rede de relações de dominação e de poder, na qual o indivíduo tratado,
protegido e assistido é inferiorizado e normalizado por conta de sua anormalização
que justifica a criação desta estrutura.” (ROSS, 2000, p. 255).
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torna-se ainda mais complexo, pois, no mesmo período, fomos incapazes de
garantir à grande maioria dos cidadãos brasileiros o acesso a bens e meios básicos
e mínimos de sobrevivência e qualidade de vida. Este tipo extremo de exclusão
social não tem preconceito de raça, cor ou gênero, e, assim, atinge igualmente a
todos os grupos.
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A CONAE ocorreu em Brasília entre os dias 28 de março a 1º de abril de 2010, e foi organizada para
tematizar a educação escolar, da Educação Infantil à Pós Graduação. Para outras informações, inclusive a
sistematização do documento final, consulte http://conae.mec.gov.br/
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Documentos
• Declaração de Salamanca, 1994;
• LEI Nº 9.394/96 – de Diretrizes e Bases da Educação Nacional;
• Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei nº 10 172/01;
• Resolução CNE/CEB nº 2/2001, diretrizes de educação especial na
educação básica;
• Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, 2007;
• Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva (2008);
• Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2008).
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o movimento dos veteranos da guerra do Vietnã. De modo geral, pode-se afirmar
que ambos ocorrem em contraponto às injustiças sociais geradas pelo preconceito,
em favor do movimento pela inclusão das minorias e pelo acolhimento aos variados
matizes que caracterizam as diferenças humanas.
Desde então, nos mais diferentes grupos e de forma cada vez mais
abrangente, o princípio da inclusão tem sido a tendência nos diversos contextos da
organização social, na proposição de políticas públicas, nos documentos
legislativos e jurídicos, na mídia em geral e em especial na mídia televisiva, nos
esportes, nas definições no âmbito do atendimento à saúde e à educação.
Por outro lado, a ideologia marca a linguagem que utilizamos para nomear
esse grupo de pessoas. Rótulos como excepcionais, deficientes, portadores de
necessidades especiais são generalizantes e passam a ter força explicativa em
relação a todo e qualquer comportamento de cada um desses sujeitos tomados
individualmente. Tais usos linguísticos abrigam a despersonalização dos sujeitos,
pois a relação fixa-se em apenas um aspecto ou atributo das pessoas e essa
diferença reificada desumaniza o todo já que, reconhecido pelo rótulo, o
relacionamento passa a ser com este e não com a pessoa. Esses sujeitos são,
portanto, reduzidos a uma representação social, a uma tipificação que lhes nega a
própria condição de sujeitos, com história de vida própria e pessoal.
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São, porém, inegáveis os avanços que, cada vez mais, desmascaram
preconceitos e desconstroem estigmas. Como exemplo, as proposições para
mudanças na terminologia que organiza realidades, e que, têm sido presididas pela
reflexão que busca termos não marcados, que não definam nem condenem
irreversivelmente a pessoa, mas que alertem para situações ou estados especiais
de evolução, carregados tanto por luzes quanto por sombras. Termos que tenham
a dualidade especial para limitar problemas e potencializar capacidades. Faz parte
dessa orientação, falar de ‘Trissomia do 21’ em vez de ‘síndrome de Down’; de
‘desenvolvimento atípico’ em vez de ‘atraso de desenvolvimento’; de ‘Déficit
Intelectual’ em vez de ‘Retardo Mental’; de ‘surdo’ ao invés de ‘dEficiente auditivo’.
• A relação linguagem/fala/pensamento
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pensamento em direção a formas adultas de conceituação e controle
comportamental. A importância da linguagem como meio de comunicação e de
instrumento do pensamento é apresentada por Luria (1987), quando advoga que o
significado de uma palavra passa por uma complexa evolução que permite realizar
o salto do mundo sensorial para o mundo racional, codificando a experiência e,
assim, influenciando decisivamente a formação da consciência:
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articulam dialeticamente e, portanto, a diferença se torna garantia de que a criança
possa fazer do diferente o mesmo.
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A conseqüência direta do defeito é o rebaixamento da posição
social da criança; o defeito se realiza como desvio social. Vão-se
estruturando todos os vínculos com as pessoas, todos os
momentos que determinam o lugar do homem no meio social, seu
papel e seu destino como participante da vida, todas as funções da
existência social. ... Tudo o que é herdado e biológico deve, então,
ser interpretado psicologicamente para que seja possível ter em
conta seu verdadeiro papel no desenvolvimento da criança.
(VYGOTSKY, 1997, p.18).
Ao assumir a
... importância primordial da reação da personalidade ao defeito, os
processos compensatórios no desenvolvimento, quer dizer, esse
quadro sumamente complexo de influências positivas do defeito, os
desvios do desenvolvimento, seus complicados zigue-zagues,
quadro que observamos em cada criança com um defeito.
(VYGOTSKY, 1997; p. 15)
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A ideia do movimento compensatório é originalmente desenvolvida por Adler, que lhe confere
caráter universal, concepção veementemente combatida por Vygotsky. Ver páginas 14-20 da obra
Defectologia, 1995.
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E, assim, confirma-se a relação da unidade indivíduo/sociedade:
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psicológicas superiores, já indicada no item anterior, a unidade entre intelecto e
afeto. Ao comentar criticamente a teoria dinâmica de K. Lewin, pelo
desconhecimento desta sobre a relação dialética entre causa e efeito, Vygotsky
ainda assim considera que essa teoria propõe uma das pedras fundamentais na
compreensão do desenvolvimento atípico e conclui que “tudo reside no fato de que
o pensamento e o afeto representam partes de um todo único – a consciência
humana.” (VYGOTSKY, 1997, p. 268).
Assim como nossas ações não nascem sem causa, se não que são
movidas por determinados processos dinâmicos, necessidades e
estímulos afetivos, também nosso pensamento sempre é motivado,
sempre está psicologicamente condicionado, sempre deriva de
algum estímulo afetivo através do qual é posto em movimento e
orientado. De maneira que o condicionamento dinâmico é por igual
inerente ao pensamento e à ação. (VYGOTSKY, 1997, p. 266).
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em representações que respondem a necessidades de sua
personalidade e que, portanto, não estão somente comprometidas
com a ação imediata e unidirecional do real sobre o sujeito, mas
com sua própria ação sobre o real. O sujeito não é essencialmente
um produtor de respostas, mas um criador em cuja produção ativa
está implícita sua própria adaptação. O pensamento, como
processo do sujeito que o conduz, está comprometido
simultaneamente com a realidade para a qual se expressa seu
esforço construtivo e com as motivações do próprio sujeito que
estão na base de sua expressão intencional, pelo qual vão se
produzir concomitantemente, na atividade pensante, conceitos,
reflexões e emoções, que formam verdadeiras unidades complexas
de natureza cognitivo-afetiva que estão na base do
desenvolvimento da personalidade e das diferentes funções do
sujeito. Assim, mesmo que Vygotsky não tenha organizado sua
construção teórica em termos de personalidade e sujeito, a
expressão mais complexa e acabada de seu pensamento constitui
um inestimável antecedente do desenvolvimento atual dessa
direção no pensamento da Psicologia. (GONZÁLEZ REY, 1996, p.
77-78).
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Em seguida, a compreensão de que a dEficiência na sua construção está
carregada de tendências que ressaltam características individuais relacionadas à
falta, ao que marca e estigmatiza o indivíduo, sem que se perceba que a marca, a
falta e o estigma só podem ser tomados em relação a um conjunto social, ao que é
possível ou ao que ocorre com maior frequência em relação a uma maioria. A
tendência dominante de individualizar a dEficiência, além de eximir o homem da
participação social na constituição de outros homens, orienta uma rede de sentidos
na configuração da subjetividade social, em relação ao que a dEficiência
representa, que se relaciona a vivências emocionais associadas ao pessimismo, ao
medo, à adversidade, à insegurança, etc.
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aprendizagem. Nesse processo, a aprendizagem é concebida como função de um
sujeito ativo, interacional, atual, consciente e emocional (GONZÁLEZ REY, 1995;
p.61) que, conscientemente, gera um conjunto de projetos, reflexões e
representações que são fontes de significados e sentidos, muito embora seja
constituído de forma permanente por configurações subjetivas que não são
construídas conscientemente. (GONZÁLEZ REY, 2002)
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3. Recursos e estratégias para a inclusão
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toda e qualquer ação desenvolvida neste contexto uma compreensão
compartilhada pelos parceiros de que todos são sujeitos de seus processos. E, que
nessa mutualidade, os parceiros possam encontrar espaços para suas demandas e
motivações, inseguranças e medos, voz e criatividade. Pois, somente assim
escutados e apoiados em uma ética para o outro podem ser exigidos em seus
deveres para com a coletividade. Para as situações de conflito tão recorrentes em
contextos educacionais, esse princípio se desdobra em indicações mais pontuais,
como:
• que todos possam estar sendo parceiros na construção das mudanças que
os atingem - professores, funcionários, pais e estudantes devem ser
avisados com antecedência de quaisquer decisões ou mudanças do
programa educacional, pois isso dá tempo para que as pessoas afetadas
reajam e respondam a essas questões.
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que devem ser atendidas no planejamento do trabalho da educação especial nos
contextos inclusivos. É importante ressaltar que sem princípios bem estabelecidos
uma listagem de estratégias como essa se torna, apenas, mais uma lista entre
tantas outras. Assim, o consenso de princípios possibilita que estratégias se
tornem ações coletivas na organização dos processos educacionais. É somente
dessa forma que uma lista de estratégias adquire sentido.
• Identificar e localizar crianças que têm algum tipo de dEficiência;
• Avaliar suas necessidades educacionais e determinar quais programas
podem ser de ajuda;
• Descrever como serão os critérios pelos quais as crianças serão avaliadas,
identificadas e referidas em função de um diagnóstico.
• Ter atenção aos aspectos preconceituosos dos usos linguísticos cotidianos.
• Ter atenção às características histórico-culturais da população a ser
atendida.
• Proteger os direitos da criança dEficiente e de seus pais garantindo esses
direitos, por meio da confidencialidade de dados e o envolvimento familiar
nos planejamento e decisões educacionais.
• Prover um sistema de desenvolvimento pessoal, que inclua programas de
formação continuada para os professores, administradores escolares e
pessoal de suporte.
• Desenvolver processos de ensino-aprendizagem e de avaliação mais
individualizados, planejamentos que possam ser (re)construídos e que
sejam resultado de um trabalho conjunto do professor regente, do professor
de apoio, de profissionais da equipe diagnóstica e dos pais, tendo em vista:
a definição de estratégias em que o processo vai ser individualizado, a
forma de lidar com a organização de comportamentos favoráveis ao
processo de ensino-aprendizagem e as potencialidades/necessidades dos
alunos para organizar um planejamento cooperativo das estratégias
educacionais.
4. Considerações finais
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Na parte final, três perguntas-guia servem de roteiro para a indicação de
recursos e estratégias para o enfrentamento de questões do cotidiano educacional
inclusivo. Nessa parte final do texto, argumenta-se sobre a necessidade de que as
experiências educacionais inclusivas não decorram de receitas, listagens ou ainda
recomendações, mas que se orientem por uma ética para o outro, estabelecida na
relação entre os parceiros do contexto compreendidos como sujeitos de seus
processos de aprendizagem e desenvolvimento.
REFERÊNCIAS
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LIER, M. F. A. Constituição do Interlocutor Vocal, Dissertação de Mestrado em
Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, do Programa de Linguística Aplicada
e Estudos da Linguagem da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São
Paulo: 1983.
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TUNES E.; BARTHOLO. O trabalho pedagógico na escola inclusiva, In: M. C.
TACCA (Org.). Aprendizagem e Trabalho Pedagógico. pp.129-148, Campinas, São
Paulo: Alínea, 2006.
____________. Pensamento e Linguagem, São Paulo: Martins Fontes, 1998 (1ª ed.
russa de 1934).
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