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LITERATURA E ENSINO:
REFLEXÕES E PROPOSTAS
Organizadores
Lucrécio Araújo de Sá Júnior
Andrey Pereira de Oliveira
LITERATURA E ENSINO:
REFLEXÕES E PROPOSTAS
Organizadores
Lucrécio Araújo de Sá Júnior
Andrey Pereira de Oliveira
Natal, 2013
REITORA REVISORA
Ângela Maria Paiva Cruz Nara Juscely Minervino de
Carvalho Marcelino
VICE-REITORA
Maria de Fátima Freire Melo Ximenes CAPA
Ismênio Souza
DIRETORA DA EDUFRN
Margarida Maria Dias de Oliveira EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
Quatro Z Dois
EDITOR
Helton Rubiano de Macedo PRÉ-IMPRESSÃO
Jimmy Free
SUPERVISÃO EDITORIAL
Alva Medeiros da Costa SUPERVISÃO EDITORIAL
Alva Medeiros da Costa
CONSELHO EDITORIAL
Cipriano Maia de Vasconcelos (Presidente) SUPERVISÃO GRÁFICA
Ana Luiza Medeiros Francisco Guilherme de Santana
Humberto Hermenegildo de Araújo
Herculano Ricardo Campos
Mônica Maria Fernandes Oliveira
Tânia Cristina Meira Garcia
Técia Maria de Oliveira Maranhão
Virgínia Maria Dantas de Araújo
Willian Eufrásio Nunes Pereira
315 p.
ISBN 978-85-425-0033-2
Apresentação ................................................................................................9
LITERATURA AFRO-BRASILEIRAS
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REFERÊNCIAS
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1.
“O que faz um professor de literatura?” Eis uma pergunta cap-
ciosa que envolve o sujeito já na ambiguidade de sua formulação, pois
contém, em si, não uma, mas duas indagações. Primeiramente, ao se
fazer tal questionamento, pode-se estar querendo saber o que o profes-
sor de literatura (enquanto ser ativo) faz; ou seja, pergunta-se sobre o
resultado de sua prática, de sua ação. Nesse primeiro sentido, a inda-
gação: “O que faz um professor de literatura?” é sinônima desta outra:
“Um professor de literatura faz o quê?”. Por outro lado, invertendo-se
a lógica, ao se fazer tal questionamento inicial, pode-se estar querendo
saber como – ou de que – é feito um professor de literatura; ou seja, o
professor (enquanto ser passivo) é um produto, um resultado de algo e
é sobre esse algo que se pergunta. Nesse segundo sentido, a indagação:
“O que faz um professor de literatura?” é sinônima desta outra: “O que
torna alguém um professor de literatura?”.
Em síntese, em nossa pergunta inicial: “O que faz um professor
de literatura?”, estão contidas estas outras: “Um professor de literatura
faz o quê?” e “O que torna alguém um professor de literatura?”. Não
é difícil percebermos que refletir sobre estas duas questões significa,
respectivamente, uma reflexão sobre a prática docente e sobre a forma-
ção do professor, e estas não podem se dar, senão conjuntamente, pois
uma boa prática profissional pressupõe uma boa formação, ao mesmo
tempo em que não se pode planejar uma formação sem que se saiba,
de antemão, qual deverá realmente ser a prática profissional. Pedindo
desculpas pela analogia mais do que grosseira, poderíamos dizer que
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1
Utilizo os termos “emancipação” e “embrutecimento” com a mesma concepção que os
expõe Jacques Rancière (2005).
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2.
Vez por outra, circulam uns ditos populares chistosos que ferem
fundo alguns professores: “Quem sabe faz, quem não sabe ensina (e
quem não sabe nem ensina, ensina Educação Física)”. Há, ainda, outra
versão, mais desenvolvida:
Quem ‘não dá pra’ engenheiro, ensina Matemática; quem ‘não
dá pra’ médico, ensina Biologia; quem ‘não dá pra’ advogado
ou político, ensina História; quem ‘não dá pra’ latifundiário (ou
sem-terra), ensina Geografia; quem ‘não dá pra’ pra jornalis-
ta ou escritor, ensina Português; e quem ‘não dá pra’ pra mais
nada, ufa, faz Pedagogia (citado em BERNARDO, 2007, p. 46).
Tal espécie de piada retrata bem a imagem geralmente asso-
ciada aos professores em nosso país. Na base desses chistes, há a ideia
de que o indivíduo torna-se professor não por vocação ou escolha, mas,
sim, por incompetência, por inabilidade prática. Se sou incapaz de ser
um escritor, tenho que me conformar em ensinar Literatura. Há, junto
a essa perspectiva, uma inversão da lógica mais tradicional, que reza
que o professor é, justamente, aquele indivíduo que, pelo grau elevado
do seu saber, adquire a autoridade de ensinar. Já, na lógica invertida
dos chistes, ensinar é função não do sábio, mas do ignorante e incom-
petente, cuja figura máxima associa-se ao pedagogo, justamente aquele
que, depois de se dar conta de que não sabe fazer nada, passa a ensi-
nar a ensinar! Eis um retrato melancólico, porém verdadeiro, do modo
como a educação é encarada no Brasil.
Podemos nos indignar e não dar crédito a essas anedotas.
Podemos dizer que são coisas de ignorantes, que não merecem atenção!
Mas, essa atitude é mais uma recusa à reflexão; é mais uma oportuni-
dade perdida para a emancipação, pois negar-se ao debate é alimen-
tar o embrutecimento. Há outro ditado popular que afirma que “Em
toda brincadeira há um fundo de verdade!”. Se pensarmos um pouco
sobre os chistes, realmente podemos nos indagar: “Por que será mesmo
que alguém escolheria ser um professor de Literatura em vez de ser
um escritor?”. A essa questão há uma resposta possível: “No Brasil, o
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REFERÊNCIAS
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1
Entre as campanhas empreendidas em prol da leitura, cito: campanha Doe um livro
[http://doeumlivro.galeon.com/]; concurso Ler é 10 [http://www.itabuna.ba.gov.br/edu-
cacao/v1/archives/doc/10_concurso_regulamento.pdf]; campanha Leitura, a melhor
viagem [http://www.emdec.com.br/eficiente/repositorio/Trabalhos_ANTP_17/1021.
pdf]; campanha Ler para crescer [http://lerparacrescer.folhadaregiao.com.br/2012/01/
populacao-pode-ajudar-na-biblioteca.html]; campanha Por um Brasil literário [http://
www.brasilliterario.org.br/envie_depoimento.php]; projeto Leitura: a melhor viagem
[http://www.acampinas.com.br/nossa-cidade/noticia/emdec-pede-doacoes-para-pro-
jeto-de-leitura-20111017]; Campanha doe um Livro [http://www.lotufoengenharia.com.
br/imprensa/?CategoriaCod=1&NoticiaCod=90].
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inquietações diante desta matéria que não é exata, mas sim subjetiva,
não se apaziguam. Para amenizar nossas dúvidas e aflições há de se ter
muita paciência e persistência, pois trabalhar com Literatura consiste,
deveras, num caso de sedução e amor e, por conseguinte, há de se ter
esmerada dedicação. Desta forma, a primeira parte deste texto expõe
algumas discussões de especialistas da área acerca da questão mais
pungente: o conceito de Literatura.
Inúmeros estudiosos já se debruçaram sobre o assunto2 e, hoje,
entender e classificar um texto como literário parece mais simples, sim-
ples mesmo. Ainda diante de toda subjetividade que cerca nossa área,
identificar uma obra como literária tornou-se quase exato. Mas deve-
mos ter cuidado, pois, ao discorrer sobre Literatura, há de ter pondera-
ção, indispensável concentração, muita cautela e seriedade.
O conceito de Literatura, assim como outros não é estático, pois
se altera e se modifica e evoluiu com o passar dos séculos. No século
XVIII Raphael Bluteau considerava que o termo literatura deveria ter
os seguintes significados: erudição, “sciencia”, noticia das boas letras
(BLUTEAU, 1727). Já no século XIX, de acordo com o Diccionario da
Língua Portugueza de Antonio de Moraes Silva, Literatura era consi-
derada como o conjunto das produções literárias d’uma nação, d’um
paiz, d’uma epocha: “Os Lusiadas são a obra capital da literatura
Portuguesa.” (SILVA, 1878).
Nos tempos atuais, o dicionário Houaiss define Literatura
como: “Ensino das primeiras letras, uso estético da linguagem escrita;
arte literária, conjunto de obras literárias de reconhecido valor estético,
pertencentes a um país, época, gênero etc.; conjunto de escritores, poe-
tas etc. que atuam no mundo das letras, numa determinada sociedade;
disciplina escolar composta de estudos literários”3.
Ao avaliarmos as três definições, verificamos que as mudan-
ças mais substanciais no conceito de literatura são aquelas que con-
sideram o valor estético do texto e a referência à disciplina escolar
2
Sobre o conceito de Literatura, convém consultar os seguintes autores, textos e obras:
ABREU, Márcia. Cultura Letrada – literatura e leitura. São Paulo: UNESP, 2006;
BARBOSA, João Alexandre. Literatura Nunca é Apenas Literatura. In: www.crmario-
covas.sp.gov.br/pdf/ideias_17_p021-026_c.pdf; LAJOLO, Marisa. Literatura:leitores &
leitura. SP: Ed. Moderna, 2011; ZAPPONE, Mirian Hisae. “Afinal, o que é literatura?”
In: BONNICO, Thomas & ZOLIN, Lúcia Osana. Teoria Literária: abordagens históricas
e tendências contemporâneas. Maringá: Ed. da Universidade de Maringá. 2009.
3
Este conceito foi retirado do dicionário virtual http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm?ver
bete=literatura&x=8&y=11&stype=k, consultado em 02/09/2011.
36
***
“Há mulheres que dizem: Meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto, ajudo a escamar,
abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha, de vez em quando
os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como “este foi difícil”
“prateou no ar dando rabanadas” e faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez atravessa a
cozinha
como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa, vamos dormir.
Coisas prateadas espocam: somos noivo e noiva”.
***
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4
Camilo Castelo Branco foi um dos escritores mais marcantes da Literatura Portuguesa,
quer pela sua biografia atribulada e tempestuosa, quer pela vasta obra que registrou
inegavelmente sua passagem pelo mundo das letras românticas da literatura ocidental.
A lista das obras de Camilo, encontram-se no Anexo I.
5
Os três autores referidos, Manuel Pinheiro Chagas, Ramalho Ortigão e Teófilo Braga,
foram importantes figuras da intelectualidade portuguesa e destacaram-se como escri-
tores, jornalistas e até atividades políticas. Ramalho Ortigão, por exemplo, foi uma das
principais figuras da Geração de 70 e fez parte da constituição do grupo “Os Vencidos
da Vida”, do qual fizeram parte, além de Ramalho Ortigão, o Conde de Arnoso, Antero
de Quental, Oliveira Martins e Guerra Junqueiro.
6
Pintores portugueses que se dedicaram à pintura histórica, com importantes exposições
na época.
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A plataforma Lattes do CNPq registra 385 trabalhos sobre Camilo Castelo Brancos,
7
desses, 174 são trabalhos realizados por Doutores da área, mas observa-se que o número
de trabalhos elencado na plataforma, informa somente trabalhos finais, pois um dos
pesquisadores que se debruça sobre Camilo Castelo Branco e sua obra, lista, além da
sua Tese de Livre docência O romance de Camilo: uma introdução, USP 2006, com-
põem seu currículo os artigos: Aspectos do amor em Camilo: da heroína romântica à
mulher comum. Revista Letras, 1997; A Imagem de Camilo Castelo Branco Na Cultura
Portuguesa: O Gênio Amoroso e Sofredor. Com Textos, 1997;
A Coleção Saraiva: Um rosto brasileiro para Camilo Castelo Branco. Convergência
Lusíada, 2005; Camilo Castelo Branco. Convergência Lusíada, 2006. Camilo Castelo
Branco: de personas e emplastos. Tempo Brasileiro, 2007. Os capítulos de livros:
“Camilo Castelo Branco e o Naturalismo: pistas para um novo olhar”. In: Dialogia na
Literatura Portuguesa, 2006; “Machado, Faustino e Camilo: a literatura lusófona no
oitocentos, um mapa em construção”. In: Machado de Assis e suas múltiplas vozes,
2008; “Oralidade, memória e ficção na obra de Camilo Castelo Branco”. In: Narrativas
em metamorfose, 2009; “Camilo: limites do desejo no mundo do capital”. In: Leituras
do desejo em Camilo Castelo Branco, 2010; “De Amores, Cartas e Memórias: Camilo na
Lente Prismática de Manoel de Oliveira”. In: Manoel de Oliveira: Uma Presença, 2010.
O romance foi adaptado paro cinema, inclusive no cinema mudo, em 1921, e em outras
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versões, nos anos de 1943, 1979 e 2008. Também teve sua versão para a teledramaturgia,
no ano de 1965.
Adélia Prado publicou 07 (sete) livros de poemas, 08 (oito) obras em prosa e 06 (seis)
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antologias, além da participação em parceria com Lázaro Barreto, Lya Luft e Marcos
Mendonça. (a relação das obras de Adélia Prado, encontram-se no Anexo II).
40
Ellen Watson. Suplemento do The American Poetry Review, jan/fev 1984; The headlong
heart (Poesias de Terra de Santa Cruz, O coração disparado e Bagagem). Tradução de
Ellen Watson, New York, 1988, Livingston University Press; The alphabet in the park
(O alfabeto no parque). Tradução de Ellen Watson, Middletown, Wesleyan University
Press, 1990; El corazón disparado (O coração disparado). Tradução de Cláudia
Schwartez e Fernando Roy, Buenos Aires, Leviantan, 1994; Bagaje. Tradução de José
Francisco Navarro Huamán. México, Universidade Ibero-Americana no México; Poesie.
Antologia em italiano, precedida de estudo do tradutor Goffredo Feretto. Publicada pela
Fratelli Frilli Editori, Gênova.
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Há 519 referências a trabalhos acadêmicos que tomam a poesia de Adélia Prado como
tema, entre Trabalhos de conclusão de curso, Monografias de Cursos de Especialização,
Dissertações de Mestrado e Teses de Doutorados, na plataforma do CNPq. Desses, 264
são trabalhos de Doutores da área. Além dos mais de 500 trabalhos, a produção da
autora, também foi matéria para artigos publicados em revistas especializadas e traba-
lhos apresentados em eventos, que resultaram na publicação em anais. Algumas referên-
cias dos trabalhos realizados e publicados encontram-se no Anexo III.
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A obra Amor de Perdição, do romancista português, Camilo Castelo Branco, foi uma
das obras mais lidas durante o século XIX, em Portugal, contando onze edições, só
neste século: Com a 1ª. edição no ano de 1862, publicado pela editora Porto. No ano de
1864, vem a público a 2ª. edição, “melhorada, e revista pelo autor”, também, editada
pela Porto. A 3ª. edição do romance surge três anos depois da 2ª. Em 1869, pela mesma
editora. Já na década de 1870, do século XIX, em 1876, é publicada a 4ª edição da obra,
que contaria sua 5ª. edição já em 1879. A 6ª edição do romance é divulgada no ano de
1887 e no ano de 1891, a editora Porto lança uma Edição monumental. Dois anos depois
deste lançamento, em 1893, vem à lume a 7ª edição e em 1895, a 8ª. edição. A 9ª. e a 10ª.
edição encerram o século XIX, confirmando o numero expressivo de edições de um
mesmo romance, o que nos faz inferir, que correspondia ao anseio do público.
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Ao citar a tradição como uma referência para o reconhecimento do texto como literário,
João Alexandre Barbosa cita Fernando Pessoa, que, em 1916, escrevendo sobre a moder-
nidade da literatura, que: “No mais pequeno poema de um poeta deve haver sempre
alguma coisa por onde se note que existiu Homero.”
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postura que não temos, pois o caminho é de mão dupla e, quando afir-
mamos que temos muitos problemas para ministrar boas aulas, dentre
eles, que nossos alunos não leem, esquecemos-nos de reconhecer que
nosso déficit com a leitura existe e deve ser extinto.
Para refletir sobre o ensino de literatura devemos avaliar todos
os componentes dessa agremiação, composta além dos professores das
Instituições de ensino superior, dos outros atores que somam este sis-
tema: os professores da escola básica e seus alunos. E, por esta razão,
não esqueçamos que a responsabilidade maior cabe a nós, professores,
seja das universidades, seja do ensino médio, pois cabe a nós cumprir
o ofício de leitores profissionais e, portanto, capazes de identificar e
escolher um bom texto, reconhecendo não somente seu valor estético,
mas avaliando o lugar que esta produção ocupa perante os grupos capa-
zes de legitimar seu valor.
Entretanto, todas essas atribuições não são suficientes para
sustentar que a literatura tenha seu lugar garantido como disciplina
importante e valorizada, seja por professores ou alunos. Para conti-
nuar nossa reflexão, há ainda outros fatores aos quais devemos remeter,
como a necessidade de uma metodologia, a presença dos livros numa
sociedade díspar e a determinação dos interesses pela leitura.
Esses três itens são fundamentais para conduzir nosso papel de
professores, pois de nada adianta o conhecimento vasto de textos literá-
rios se o professor não fizer uso de um método. Todavia, tais experiên-
cias metodológicas e práticas docentes de caráter inovador incluindo a
inserção de tecnologias nos processos de ensino e aprendizagem dos
alunos não serão suficientes para conduzir o andamento das aulas, se
os docentes apenas tangenciarem o conhecimento das obras literárias
e ignorarem as realidades sociais dos discentes, sejam eles de clas-
ses privilegiadas ou menos favorecidas e, se pertencem a este último
grupo, aumenta a responsabilidade do docente em incentivar o acesso
à leitura, pois “é importante que as classes menos favorecidas tenham
acesso à cultura letrada, sob pena de manterem as diferenças sociais”.
(BORDINI & AGUIAR, 1993. p. 12).
É imperativo reconhecer, nesse contexto, que os jovens
leitores não assumem, também, as leituras que nós gostaríamos que
constituíssem sua prática. Grande parte do que escolhem para ler não
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Para a capacitação de docentes são relevantes as iniciativas como o PARFOR (Plano
Nacional de Formação de Professores da Educação Básica), que tem como objetivo
formar professores que atuam na educação básica e ainda não são graduados. Para a
realização da ação, há 90 instituições de educação superior, entre as quais estão refe-
ridas as universidades federais, as universidades estaduais e os institutos federais, que
gerenciam a oferta dos cursos. O plano concretiza a Política Nacional de Formação
de Professores, estabelecida pelo Decreto 6755/2009, que prevê um regime de coope-
ração entre União, estados e municípios, para a elaboração de um plano para a for-
mação de professores que atuam nas escolas públicas. A ação faz parte do Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE), em vigor desde abril de 2007. Outra iniciativa
de promover a melhoria dos professores é EAD (Educação a Distância) é a modalidade
educacional na qual a intervenção didático-pedagógica nos processos de ensino e apren-
dizagem acontece com o uso de meios e tecnologias de informação e comunicação, entre
estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares e/ou tempos
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REFERÊNCIAS
distintos. Esta definição está presente no Decreto 5.622, de 19.12.2005, que regulamenta
o Art. 80 da Lei 9.394/96 (LDB). Essas informações constam no site
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13583&Ite
mid=970.
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ANEXO I.
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ANEXO II
POESIA:
- Bagagem, Imago – 1976;
- O coração disparado, Nova Fronteira – 1978;
- Terra de Santa Cruz, Nova Fronteira – 1981;
- O pelicano, Record – 1987;
- A faca no peito, Rocco – 1988;
- Oráculos de maio, Siciliano – 1999;
- A duração do dia, Record – 2010.
PROSA:
- Solte os cachorros, Nova Fronteira – 1979;
- Cacos para um vitral, Nova Fronteira – 1980;
- Os componentes da banda, Nova Fronteira – 1984;
- O homem da mão seca, Siciliano – 1994;
- Manuscritos de Felipa, Siciliano – 1999;
- Filandras, Record – 2001;
- Quero minha mãe, Record – 2005;
- Quando eu era pequena, Record – 2006.
ANTOLOGIAS:
Mulheres & Mulheres, Nova Fronteira – 1978;
Palavra de Mulher, Fontana – 1979;
Contos Mineiros, Ática – 1984;
Poesia Reunida, Siciliano – 1991 (Bagagem, O Coração Disparado, Terra
de Santa Cruz, O pelicano e A faca no peito);
Antologia da poesia brasileira, Embaixada do Brasil em Pequim – 1994;
Prosa Reunida, Siciliano – 1999.
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EM PARCERIA
A lapinha de Jesus (com Lázaro Barreto) - Vozes – 1969;
Caminhos de solidariedade (com Lya Luft, Marcos Mendonça, et al.) - Gente- 2001.
PARTICIPAÇÃO EM ANTOLOGIAS
- Assis Brasil (Org.). A poesia mineira no século XX. Imago, 1998;
- Hortas, Maria de Lurdes (Org.). Palavra de mulher, Fontoura, 1989;
- “Sem enfeite nenhum”. In Prado Adélia et ali. Contos mineiros. Ática,
1984.
ANEXO III
Os trabalhos aqui listados estão elencados em ordem cronológica:
Fundamentos filosóficos da poética de Adelia Prado: subsídios antropológi-
cos para uma filosofia da educação. USP, 1996. (Dissertação de Mestrado) por
Cecilia Canalle; Lendo Bíblias em Adélia Prado, UFRJ, 1998. (Dissertação de
Mestrado) por Vania Cristina Alexandrino Bernardo;
Dialogismo e Polifonia em Adélia Prado. GEL - Grupo de Estudos Lingüísticos
do Estado de São Paulo, 2000. (Anais) por Mariza Norico Kitazono de
Carvalho;
Seis mulheres em verso. Cadernos Pagu, 2000. (Artigo) por Maria Lúcia Dal Farra;
A poesia e o sagrado: traços do estilo de Adélia Prado. USP, 2002. (Dissertação
de Mestrado) por Isabel de Andrade Moliterno;
Erotismo e Religiosidade na Obra de Adélia Prado. UEL, 2002. (Monografia)
por Viviane Maria Moraes Pinto;
O sagrado e o profano nas poéticas de Hilda Hilst e Adélia Prado.
Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2003. (Dissertação de Mestrado) por
Goimar Dantas de Souza;
A Comunicação na Prosa poético-jornalística de Adélia Prado. PUC/SP,
2003. (Tese de Doutorado) por Janne Marcia Augusto Paiva;
Epifanias do real: o olhar lírico de Adélia Prado. UEFS, 2004. (Dissertação
de Mestrado) por Claudilis da Silva Oliveira;
O verbo divino de Adélia prado: poesia. Vértices, 2004. (Artigo) por Vania
Cristina Alexandrino Bernardo;
A poesia de Adélia Prado: um poder infernal. PUC/SP, 2005. (Dissertação de
Mestrado) por Neusa Cursino dos Santos Steiner;
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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1
“Como não se trata de, face ao texto literário, determinar o imaginário como faculdade
humana, mas de circunscrever as maneiras como ele se manifesta e opera, com a escolha
desta designação aponta-se antes para um programa do que para uma determinação.
Trata-se de descobrir como o imaginário funciona, para que, a partir dos efeitos descri-
tíveis, abram-se vias para o imaginário – proposta que, no presente ensaio, é trabalhada
pela conexão entre o fictício e o imaginário” (ISER, 1983, p. 413).
2
Cf. notas no final do texto de Iser (1983a).
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Por que nós queremos pensar o impensável[?] [...] [ou por que
queremos] a extraordinária dualidade de pensar o impensável,
descrever o inacessível, unir o que não pode ser unido[?] – tudo
isto tem suas raízes na posição descentrada do homem; ele é,
mas não tem a si mesmo. Querer ter a si mesmo como ele é,
significa necessitar saber o que ele é.
Seria impossível aos seres humanos, portanto, a presentifica-
ção plena (todas as possibilidades) de si próprios, já que a cada momento
é alcançável apenas a possibilidade (realizada) daquela contingência (e
o ser humano é mais que isso, “mais que uma possibilidade limitada de
si mesmo”). À encenação, por conseguinte, caberia o papel de transpor
esta impossibilidade, permitindo-lhes a abertura do leque de suas pos-
sibilidades no constante autodesdobramento (“composição e decom-
posição de mundos fabricados”). A alternância de mundos fabricados,
não podendo ser apreendida, só pode ser encenada, por conseguinte,
também em suas “potencialmente inúmeras variações” (ISER, 1999a,
p. 77). Daí Iser atribuir à encenação um caráter transcendental.
Ao extrapolar o conceito de interpretação para tradução
e incluir os objetos não textuais, como a relação entre culturas ou a
inserção de alguém numa cultura estrangeira, Iser propõe, como estra-
tégia operacional, os movimentos recorrentes (recursive) extraídos do
modelo cibernético de compreensão cultural baseado no looping recor-
rente (recursive looping).
Assim, o looping recorrente seria a estratégia adequada para
operar com a tradução entre as culturas, uma vez que ele mesmo cor-
responde ao mecanismo através do qual uma cultura é configurada.
Em outros termos, para Iser (1994) “uma cultura é um sistema autopo-
ético que continuamente gera suas organizações, assim bem como as
[...] Why we should want to think the unthinkable[?] […] The extraordinary duality of
4
thinking the unthinkable, picturing the inaccessible, bridging the unbridgeable — all
this has its roots in the decentered position of man: he is, but he does not have himself.
Wanting to have oneself as one is, means needing to know what one is.
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5
[…] a culture is an autopoetic system that continually generates its organizations as well
as the shifts occuring in such a self-generated organization.
6
Disponível em: < http://www.anthropoetics.ucla.edu/ap0102/mimesis.htm>.
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mesmo modo a ZDP pode ajudar a abrir ou fechar esta porta. Por mais
que Iser se arme de conceitos totalizantes (umbrella concepts) para evi-
tar a armadilha da reificação, não podemos esquecer, mais uma vez,
que quem se “autodesdobra” na “busca de ser e ter a si mesmo”, em se
tratando de literatura, é sempre um leitor real.
Consideramos possível que a literatura forneça o ponto de
partida. Contudo, temos dúvidas se é possível realizar este tipo de
investigação sem reificações, pelo menos do modo como Iser parece
ter pensado. Até o momento, temos visto o teórico alemão utilizar-se
muito mais de outras disciplinas, dentre elas, a psicologia, para com-
preender a interação texto-leitor (a fenomenologia da leitura) do que o
seu contrário.
A relação do homem com o mundo, para Vygotsky, é sempre
mediada. Os elementos mediadores podem ser de dois tipos: os ins-
trumentos e os signos. A importância dos instrumentos na atividade
humana está intimamente influenciada pelas noções marxistas. Para
ele,
a invenção e o uso de signos como meios
auxiliares para solucionar um dado problema
psicológico [...] é análoga à invenção
e uso de instrumentos, só que agora no
campo psicológico. O signo age como um
instrumento da atividade psicológica de
maneira análoga ao papel de um instrumento
no trabalho (VYGOTSKY, 1998, p. 70).
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9
Alguns estudiosos utilizam também a nomenclatura NDA (Nível de Desenvolvimento
Atual), como por exemplo, Alvarez e Del Rio (1996).
10
Alguns estudiosos utilizam a nomenclatura Zona de Desenvolvimento Próximo.
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
86
11
Disponível em: <http://www.anthropoetics.ucla.edu/ap0302/narrative.htm>.
12
As we frequently hear, we spend our lives telling stories; narrative is our source of
meaning.
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REFERÊNCIAS
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Diferentemente da editora Martins Fontes, a editora Moraes optou pela grafia Vygotsky.
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REFERÊNCIAS
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1. PRIMEIRAS PALAVRAS
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2. LETRAMENTO E LITERATURA
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Figura 3: Capa do livro Abdias, de Cyro dos Anjos, Editora Globo, 1979.
Dessa forma, é possível que o personagem de Ciro dos Anjos
tenha dado ensejo a uma mudança na forma como o professor era
caracterizado na/pela literatura, porque percebemos que, a partir do
esboço da prática de Abdias, as narrativas produzidas passaram a tra-
zer exemplos explícitos de professores com condutas “construtivas” e/
ou “destrutivas” no plano da educação brasileira.
Por essa razão, acreditamos que os exemplos de performances
desenvolvidas pelos profissionais do ensino da leitura e da literatura,
desenhados na/pela literatura, foram determinantes e apontaram para
a necessidade de se repensar a figura do professor e de suas práticas
de letramento, no que diz respeito ao ensino da leitura e da literatura.
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seja a literatura. Presume-se, ainda hoje, que a literatura seja algo que
está além do real e, por isso, distante do homem. Por sua fascinação e
encanto, a literatura foi encarada como objeto fantasioso, próprio para
crianças, produto de artistas em prol do entretenimento, não cabendo
na vida pós-escolar do indivíduo adulto, conceito estéril de verdade
sociocultural e histórica. O mais agravante foi o fato de ter-se esquecido
que o homem de hoje carrega dentro de si a criança que foi no passado,
que como demonstrado anteriormente, tem presente em sua mente as
lembras de infância que o revigoram em práticas contemporâneas.
A quarta censura é a linguagem. Segundo Barthes (2004), a
linguagem é um objeto de censura muito mais importante do que todos
os outros. Ela é uma censura manifesta, “aquela que os manuais asses-
tam contra os estados de língua afastados da norma clássica” (p. 47).
Esse puritanismo da língua gerou o preciosismo do século XVII, “uma
espécie de inferno clássico”.
Barthes (2004, p. 48) explica que, com essa censura, “não per-
demos apenas meios de expressão, como se diz, mas também, certa-
mente, uma estrutura mental, pois a língua é uma estrutura mental,
[...] segundo Lacan”. Para o autor, deveríamos evidentemente “partir
de uma condenação daquilo que se deve chamar de clássico-centrismo
(posição ou tendência daqueles que se colocam politicamente ao cen-
tro), que [...] marca ainda hoje toda nossa literatura, particularmente no
que concerne à língua”.
É preciso abolir a ideia de uma forma única de linguagem, que,
sendo a padrão, é o modelo universal de língua. Não cabe mais pensar
a língua como algo uniforme, pois a língua se deixa representar no
homem, e este não é uniforme. Cada povo possui uma forma de lingua-
gem própria, não sendo nem a certa nem a errada, porque não é de bom
senso fazer oposições em linguagem, o que é escrito em uma língua é
válido para aquela língua e não serve de modelo para outra. A língua
traz como marca a cara do povo que a fala.
Segundo Barthes (2004):
Há, por trás da ideia clássica de língua, uma ideia política: o
ser da língua, quer dizer, a sua perfeição e até o seu nome, está
ligado a uma culminância do poder: o clássico latino é o poder
latino ou romano; o clássico francês é o poder monárquico.
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5. ÚLTIMAS PALAVRAS
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124
REFERÊNCIAS
ALENCAR, José de. Til. 4. Ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1957.
ALMEIRA, Manoel Antônio de. Memória de um sargento de milícias.
Brasília: Editora da Universidade Nacional de Brasília, 1963.
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1959.
BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro:
Zahar, 1998.
_________________. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar , 2001.
_________________. Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Zahar , 2007.
BARTHES, Roland. O rumor da língua. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,
2004.
_______________. O prazer do texto. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2006.
_______________. Aula. 13ª ed. São Paulo: Cultrix, 2007.
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pectiva sobre a prática social da escrita. São Paulo: Mercado de Letras, 2001.
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LOBATO, José B. Monteiro. A menina do narizinho arrebitado. São Paulo:
Edição da “Revista do Brasil”/Monteiro Lobato & Cia., 1921.
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de Letras, 2001.
WASH, Robert. Notícias do Brasil. São Paulo: Edusp, 1985.
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REFERÊNCIAS
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Parábola Editorial, 2009.
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Ensino Médio. Brasília, DF: MEC/SEB/DPEM, 2004.
OLIVEIRA, Luciano Amaral. Coisas que todo professor de português pre-
cisa saber: a teoria na prática. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
PEREIRA, Cilene da Cunha & NEVES, Janete dos Santos Bessa. Ler/Falar/
Escrever: práticas discursivas no ensino médio – uma proposta teórico-meto-
dológica. Rio de Janeiro: Lexikon, 2012.
ROJO, Roxane. Letramentos Múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo:
Parábola Editorial, 2009.
136
INTRODUÇÃO
A reflexão sobre questões metodológicas relativas ao ensino de
literatura, no meio acadêmico de Letras, tende, ainda, a ser considerada
coisa menor, assunto para pedagogo. A concepção que perdura é a de
que o professor de literatura ou o crítico literário não deve se preo-
cupar com este tipo de questão, uma vez que está investido por uma
função mais sublime: vivenciar a grande literatura e comunicar a seus
alunos as suas descobertas, as suas reflexões e pesquisas. Chega-se,
inclusive, a denominar de pedagorreia qualquer tentativa de refletir
sobre questões relativas à formação do leitor literário. Esta visão pre-
conceituosa vem lentamente mudando. Certamente, ela está ligada à
tradição bacharelesca que esteve na origem de nossos cursos de Letras,
entre outras razões.
Sabemos hoje – bem antes que Todorov nos trouxesse o seu
belíssimo A literatura em perigo – que o estudante de Letras precisa de
uma formação metodológica mínima que o habilite a realizar um traba-
lho sério de formação do leitor no ensino básico. Para tanto, não é sufi-
ciente o conhecimento de teorias literárias, de leituras críticas. Digo
não é suficiente – o que não quer dizer que estas leituras não sejam
necessárias1. Aliar um conhecimento metodológico a um conhecimento
1
Discuto uma possibilidade de articulação entre teoria literária, crítica literária e ensino
em Pinheiro (2006). Trata-se de uma perspectiva que parte do texto para chegar a uma
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crítico das obras é o melhor caminho para formação dos jovens profes-
sores de literatura. Trata-se de uma discussão em andamento, mas já
com uma tradição.
Neste artigo, discutiremos mais especificamente uma possi-
bilidade de trabalho com o poema no nível médio. Trata-se de uma
escolha nascida de uma constatação, como se verá mais abaixo. Nossa
abordagem terá três momentos: primeiro discutimos rapidamente
algumas pesquisas e reflexões sobre o ensino da literatura a partir da
década de 80 do século passado; a seguir elencaremos alguns proble-
mas – bem antigos – relativos ao ensino desta disciplina e, por último,
trazemos uma sugestão de abordagem em sala de aula de poemas de
duas poetisas contemporâneas.
O viés escolhido para a abordagem dos poemas é o que tenta
aliar conhecimento crítico dos textos a procedimentos metodológicos
que privilegiam o diálogo do leitor com o texto e não a mera reprodu-
ção e imposição, por parte do professor, de sua leitura. Essa perspectiva
foge, portanto, da tradicional aula expositiva e investe no estímulo à
fala do aluno, e, consequentemente, à exposição de suas percepções.
Trata-se de um trabalho mais difícil, que exige, inicialmente, paciência
por parte do professor. No entanto, os resultados, quase sempre, são
mais expressivos do que se imagina ou espera. Dando suporte a este
procedimento está a ideia de uma pedagogia da pergunta, formulada
por Paulo Freire há algum tempo.
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primeiramente o que for mais fácil para ele, para depois, paula-
tinamente, chegar ao mais difícil (JOBIM, 2009, p. 116)2.
A seguir, Jobim discute a relatividade entre fácil e difícil, a
partir da comparação entre dificuldades de recepção de O cortiço, de
Aluísio Azevedo, e Serafim Ponte Grande, de Oswald de Andrade. A
discussão proposta pelo pesquisador, por outro lado, volta-se para a
narrativa, deixando de lado a poesia.
Voltadas especificamente para o trabalho com o poema no
ensino médio, temos a tese de doutorado de Diva Sueli Silva Tavares,
defendida na UFRN em 1977. Centrada num experimento realizado
com alunos do ensino médio de uma escola pública, a pesquisa mostra
que, quando se investe numa metodologia que privilegie a aproxima-
ção do texto com a realidade do leitor e se efetiva uma postura mais
dialógica – quer com os textos, quer com os leitores –, é possível esti-
mular o jovem para uma experiência de leitura significativa. Os tex-
tos escolhidos, por outro lado, não se prendem ao cânone que perdura
nos livros didáticos, abrindo espaço para outras experiências de lei-
tura – como defendem as OCEM3-2006. Está claro para a pesquisadora
que o problema do ensino da literatura não está ligado apenas à sele-
ção de conteúdos. Para ela o professor deve desempenhar “o papel de
Rocco (1981), indagado sobre as escolhas das obras para a escola básica, faz pondera-
ções importantes e bastante atuais. Primeiro sugere “Começar por textos de linguagem
acessível que é afinal o que se tem feito.” A seguir, afirma: “Quanto ao tipo de aborda-
gem crítica a ser seguido, temos que separar bem o ensino da literatura no secundário
e o ensino da literatura na Universidade. Acho que a abordagem no secundário deverá
ser, segundo minha experiência, muito mais flexível e aberta. É preciso verificar se o
texto motiva, de alguma forma, os adolescentes. Ao passo que na Universidade, a gente
pode submeter os alunos a textos para os quais não estão motivados diretamente.” (p.
102/103) Bem antes, numa introdução da famosa Antologia Nacional, de Carlos Laert
e Fausto Barreto, organizada no final do século XIX, o critério de iniciar o ensino de
literatura com obras contemporâneas já aparece. Neste sentido, na parte de poesia, os
autores iniciam com “Poetas – fase contemporânea”, composta basicamente pelo que
denominamos hoje de “românticos e parnasianos”; a seguir vai para os portugueses da
mesma época e depois para “Fase acadêmica” (século XVIII e parte do XIX), “Fase
seiscentista” (século XVII) e “Fase medieval”. O critério dos organizadores é explici-
tado no prefácio da primeira edição: “Acertado julgamos principiar pela fase contem-
porânea e desta remontar às nascentes da língua, pois que tal é o caminho natural do
estudioso, que primeiro sabe como fala, para depois aprender como se falava.” (LAERT
& BARRETO, 1960, p. 7)
Orientações Curriculares para o Ensino Médio
3
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4
Dentre as pesquisas mais recentes a que tivemos acesso, voltadas para o trabalho com a
poesia ou/e sua interseção com outros gêneros, apontamos: Farias (2010), Martins (2010)
e Silva (2009).
5
No âmbito da literatura infantil, os livros de Resende (1993), Aguiar (2001), Paiva et al
(2004), Souza (2004) etc. são alguns dos livros que apontam para um trabalho significa-
tivo com os diferentes gêneros da literatura infantil em sala de aula. Numa perspectiva
mais geral, que tanto pode ser útil para o ensino médio quanto para o fundamental,
destacamos a contribuição de Aguiar & Bordini (1988), com destaque para o método
recepcional. Dantas (1982) escreveu uma didática da literatura que, em linhas gerais,
não vai muito além do que está posto nos livros didáticos, com a exceção de que traz a
possibilidade de se trabalhar a literatura de cordel.
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7
Discutimos um pouco esta questão no artigo denominado “Caminhos da abordagem do
poema em sala de aula, In; Graphos: Revista de Pós-Graduação em Letras – UFPB. Vol
10, nº 1, 2008.
Para quem possa ter dúvida sobre a importância do mediador ou do professor-mediador,
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9
Sobre as possibilidades de trabalho entre poesia e canção, há várias pesquisas. Destaco
a tese de Verônica de Fátima Gomes de Moura (2009) que estuda as possibilidades de
abordagem das letras de canção, no ensino médio, de uma perspectiva que aproxima
esta modalidade artística da poesia. Veja-se também o trabalho de Juliana Amaral Pinto
(2000), que traz sugestões de abordagem da canção na sala de aula a partir de seus ele-
mentos poéticos.
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CONFIDÊNCIAS
Hoje o dia nasceu pobre
e continua sem nada.
A fartura é lembrança vaga
que mais e mais se evapora
e o resto da noite encobre.
Já retornaram aos seus reinos
as estrelas perfumadas
- hóspede de poucas horas –
Padece o mundo em seu leito
Não é fácil rir agora
(Poema de Desvios)
AS PALAVRAS
10
A poetisa Lenilde Freiras nasceu em Campina Grande, mas vive em Recife há muitos
anos. É mestre em Teoria da Literatura pela UFPE, poeta e tradutora. Publicou Desvios
e Esboço de Eva (1987), Cercanias (1989), Espaço neutro (1991), Grãos na eira (2001),
A casa encantada (2009). Em 2010 publicou A corça no campo, antologia com poe-
mas de toda sua obra. Lenilde já ganhou alguns prêmios o Nestlê de Poesia e Prêmio
Pasárgada, ambos em São Paulo. Os poemas de Lenilde citados neste artigo são do livro
Grãos na eira (2001), mas também podem ser encontrados em A corsa no campo.
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A palavra
essa rédia
me governa.
A palavra
essa lâmina
me reparte.
Ai de mim
que sou tantas
e tão sem arte
é a que em chão de silabas
se prosterna.
Ai de mim
que sou tantas
a procurar-te
palavra
que não és
e és eterna
(p. 9)
MOMENTO
A poesia se aproxima
marca sua presença
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11
Alice Ruiz S é poetisa, letrista, tradutora e professora de hai kai, forma lírica que cultiva
com grande habilidade. Publicou Navalhanaliga(1980), Paixão, xama, paixãoi(1983),
Hai Tropikai(com Paulo Leminski -1985). Ganhou o Prêmio Jabuti com o livro Vice
Versos (1988). Publicou ainda Desorientais (1996) e Jardim de Haijin( 2010), ambos de
hai kais. Os poemas citados neste artigo são do livro Dois em um (2008)
155
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Que condições sociais são estas que interferem no destino desta Maria?
Também atentar para o modo como a poetisa utiliza a expressão popu-
lar “Maria vai com as outras”, para conferir-lhe um sentido mais grave.
Trazer o poema de Drummond e estimular a análise comparativa é,
mais uma vez, um procedimento que pode render uma significativa
vivência com os dois poemas. Apontar as peculiaridades da vivência
feminina postas no poema de Alice Ruiz e, retomar, se já tiver discu-
tido, o conceito de intertextualidade. Por certo, se o aluno não conhece
o poema de Drummond, compreenderá que os sentidos dos textos se
constroem a partir das mais complexas relações.
Quantas aulas levaríamos para trabalharmos estes poemas?
Para responder a esta pergunta, é preciso atentar para uma questão
metodológica central: cada turma tem seu ritmo, sua experiência espe-
cífica de leitura. Se se tratar de uma turma que tenha uma experiência
de partilhamento de leitura, talvez possamos fazer em pouco tempo:
duas aulas, por exemplo. Por outro lado, se se está iniciando a vivência
com o poema, talvez seja necessário um tanto de paciência, uma vez
que os alunos tendem a ficar calados, a não arriscar seus palpites ou,
melhor dizendo, a expor suas hipóteses de leitura. Quando se pensa
em formar leitores, a preocupação não deve ser apenas quantitativa –
dar a conhecer o maior número de autores, cumprir um planejamento,
um cronograma, como se faz constantemente. Se lermos os poemas de
forma mais detida – qualquer que seja o poeta ou poetisa –, teremos
mais chances de fixar imagens, de guardar na memória alguns versos,
de estabelecer pontes com nossas vivências e, até, de estabelecermos
comparações entre autores. Portanto, parece-nos que quando o objetivo
de nosso trabalho é a formação de leitores, demorar-se um pouco mais
sobre os poemas poderá ter um resultado mais significativo.
5. REFLEXÕES FINAIS
157
REFERÊNCIAS
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do leitor – alternativas metodológicas. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1988.
__________. Teixeira (Coord.) Era uma vez... na escola – formando educa-
dores para formar leitores. Belo Horizonte: Formato, 2001.
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Novas Tecnologias, Políticas de ensino. São Paulo: Cortez, 2005.
COLOMER, Teresa. Andar entre livros. Trad. Laura Sandroni. São Paulo:
Global, 2007.
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1. FUNDAMENTO TEÓRICO-METODOLÓGICO
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A tecnologia é incrível
E está dando patente
A quem antes era ausente
Da cintilância da fama,
A internet é a cama
Pra o poeta deleitar
Conhecer e publicar
Essa arte que o Brasil ama.
(Raul Poeta – Juazeiro do Norte/CE)
*
Com a chegada da Internet
O cordel ganhou mais vida.
Agora não tem saída
Nós vamos pintar o sete
Na TV, rádio, manchete
No teatro, no cinema…
Em qualquer lugar fecundo
Nosso versejar profundo
Estará mais que presente
Alegrando a toda gente
No Brasil e além mundo.
(Antonio Barreto – BA)
*
Gostaria de opinar sobre o tema
A respeito do cordel na Internet
Acho que a cada cordelista compete
Divulgar beira-mar, mourão poema
Afinal, dos versos, todo o sistema
Entendo que o cordel é soberano
Mostremos para o mundo novo plano
Se se afastar muito do passado
Lembremos cada vate renomado
Nos dez pés do martelo alagoano.
(Zé Walter [José Walter Pires] – Campina Grande/PB)
*
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O livreto pendurado
Em cordão numa barraca
Já é visão meio fraca
Que faz lembrar o passado.
Hoje muito divulgado
Em diferentes canais,
Nos saraus, em recitais
Recebe aplausos, confete
O cordel na internet
Cresce cada dia mais.
(Creusa Meira – BA)
*
A inclusão do ciberespaço no espaço escolar substitui um
ambiente passivo e possibilita ao aluno perceber as mudanças na con-
cepção de leitor, que passa a ser um coautor do texto. A leitura, por sua
vez, passa, simultaneamente, a escritura. O leitor, escolhendo o cami-
nho da leitura e o conteúdo a ser lido, transforma-se numa espécie do
editor do hipertexto em construção, enquanto o texto passa a ser móvel,
um caleidoscópio que apresenta diversas faces, desterritorializado, sem
fronteiras próprias, porque “a partir do hipertexto, toda leitura é uma
escritura em potencial” (LÉVY, 2000, p. 02).
A Internet oferece novas dinâmicas, um retorno dialético à
oralidade, possibilitando um (re) encontro entre as sociedades orais e a
sociedade eletrônica digital ciberespacial, prática esta já utilizada por
vários poetas de cordel que veem o ciberespaço como o reencontro da
comunicação viva, interativa, direta e contextualizada, em que tudo
e todos podem se interagir mutuamente: com pessoas, textos, sites,
home-pages, mídia, etc, em qualquer parte do mundo, criando um novo
texto, “um estilo on line” em que as discussões podem se aprofundar,
conforme se pode conferir nos poemas que se seguem:
Antes do computador
Tínhamos fragilidades,
Hoje nas comunidades
O cordel tem mais valor.
Cordelista ou cantador
175
176
REFERÊNCIAS
FOLHETOS DE CORDEL
ALBUQUERQUE, Ivambeiro. Cordel e internet.
BASTINHA, JOB. Cordel de Hoje
PACHECO, José. A Festa dos Cachorros. [s.ed]. [s.d]
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INTRODUÇÃO
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1
O termo ‘performance’ aqui é utilizado segundo os pressupostos teóricos de Paul
Zumthor (1997), que considera o dizer integrado ao escutar. A afirmativa do autor:
“Performance implica competência”, bem se aplica ao uso da parlenda, uma vez que
a multiplicidade de textos desse gênero aponta para a necessidade de memorizá-las e
conhecer as formas de uso e interação utilizando-as.
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C – Cantar em literatura
colega eu mesmo me ufano
e pode seguir na frente
tenho fé no soberano
que aonde você for
eu irei no mesmo plano.
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(...)
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dos poetas que merecem ser assim denominados pelo domínio do verso
e do seu cantar.
Quando eu entro num sufoco
canto o coco pra sair
e você que canta coco
faz favor de me ouvir
Observem-se as estrofes de um ‘coco de embolada’, divulgados
por Caju e Castanha – “emboladores de coco” pernambucanos, já con-
sagrados pela mídia, tendo a dupla se desfeito pela morte de um deles
– que divulgavam um repertório bem variado de textos populares no
ritmo da batida do ganzá, alguns deles inspirados nas dificuldades de
articulação das palavras propostas pelos trava-línguas.
Gulugulu gulugulá gulugulê
gulugulê gulugula gulugulê
gulugulu gulugulê gulugulá
tome cuidado que é pra língua não travar.
É produto produtivo produção
prazeroso produtor produzido proponéia
praticamente preparado pra prever
precavido precaver propina prosopopéia.
É picada picardia, é picadeiro
papagaio presepeiro promessa prometedor
prometeu pro povo preferência
prometido previdência pereceu papai votou.
Com uma proposta de crítica social, as palavras se misturam
com aquelas que mascaram essa intenção, multiplicando as formas de
brincar, camuflando a intenção de denunciar a corrupção que reina no
campo político conhecido pelo embolador.
Os textos populares não são estanques. Estabelecem-se entre
eles canais de interação que lhes garantem permanência e amplas pos-
sibilidades de transformação. Nas brincadeiras com a palavra, entre
crianças e mesmo adultos, têm espaço os trava-línguas, que por exi-
gir uma agilidade na fala, na articulação dos sons integrados das pala-
vras que compõem o texto, têm ‘feito a festa’ na busca crescente de
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO
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1. O HIP HOP
212
3
SÁ, Xico. Recife prepara coletânea de poemas de Solano Trindade. Folha de São Paulo on
line, 17 set. 2001. Disponível em: www.folha.com.br/ilustrada. Acesso em: 05/out/2001.
213
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2. CANTORIA
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4
CAJU e CASTANHA. Fragmento de Pra criticar. Faces do Subúrbio. Recife:
Independente, 1997, digital, stereo, CD.
218
5
CAJU e CASTANHA e MELO, Albiratan. Embolando na embolada. Vindo lá da
lagoa. São Paulo: Trama, T500/153-2, 2000, digital, stereo, CD.
6 Idem.
219
7
PINTO e ROUXINOL. Coco do C. Recife: gravação independente, 1996. (Fita-cassete).
220
Idem.
8
Idem.
9
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Preso portando pó
passou pelos piores pesadelos [...]
Político privilegiado preso, parecia piada
Pagou propina pro plantão policial
Passou pela porta principal.10
O estudo das confluências entre o Hip Hop e a cantoria nor-
destina no ambiente urbano exige um inventário de suas trajetórias
individuais rumo às fusões interculturais que resultaram, por exem-
plo, no rap-embolada. No caso da cantoria de pandeiro, já na segunda
década do século XX, os emboladores haviam chegado ao rádio com o
cantador pernambucano Minona Carneiro e seu grupo Voz do Sertão.
Em seguida, a partir dos anos 30, ganharia seus primeiros registros
fonográficos em vinil e uma consequente divulgação nacional com o
conterrâneo Manezinho Araújo, discípulo de Minona. Com isto, não
tardaria a aparecer no cinema e, mais tarde, já em meados da década de
50, chegar à televisão.
Fui convidado
Pra uma festa de rigor
Onde gente de valor
Ia toda encasacada
A minha sogra
Pra bancar a saliente
Levou roupa só na frente
Mas atrás não tinha nada11
Performer ao vivo, no rádio e no cinema, Manezinho Araújo
exerceria uma grande influência sobre muitos cantadores de pandeiro,
como Castanha, destacando-se não apenas na arte de embolar, mas
também em outras atividades exercidas paralelamente: ator, jornalista,
compositor, garoto-propaganda e pintor. Divulgado nacionalmente por
nomes como Jararaca, Ratinho, Jacinto Silva e Almira Castilho, entre
tantos outros, o coco em geral encontraria na figura de Jackson do
10
GOG. História do rap nacional. São Paulo: RB-1051, s.d., digital, stereo, CD.
11
ARAÚJO, Manezinho. Fragmento de Cuma é o nome dele? O Rei da Embolada.
Curitiba: Revivendo, RVCD-109, s.d., digital, stereo, CD.
222
12
CAVALCANTI, Rosil. Fragmento do Coco Social. Sua Majestade, o rei do ritmo. Rio de
Janeiro: Copacabana, 99.300, s.d., digital, stereo, CD.
Idem.
13
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226
“no extremo limite em que o verso é quase música” de que nos falou
Bandeira. Uma literatura da voz que também é quase dança, quase tea-
tro, e cuja forma se assemelha àquela praticada pela “imaginação audi-
tiva” da poesia verbal de Joaquim Cardozo em seus autos14, bem como
às características já descritas na poesia dos rappers da contemporanei-
dade. Neste sentido, também a produção de Ascenço remete-nos, uma
vez mais, à ideia zumthoriana de performance, descrita pela professora
paraibana Idelette Muzart (1995, p. 33) como “um ato concreto total de
participação que permite à voz existir e dizer, bem como às relações
entre voz e escritura, recusando qualquer exclusão recíproca”, argu-
mento que, além de não mais permitir a confusão entre oralidade e tra-
dição, também viabiliza “a inclusão, no campo da oralidade, de práticas
modernas e não tradicionais”.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
227
228
15
BELOCCHIO, Claúdia Ribeiro. A educação musical no ensino fundamental. Refletindo
e discutindo práticas nas séries iniciais do ensino fundamental: olhando e construindo
junto às práticas cotidianas dos professores. Porto Alegre: UFRGS/FACED, 2000.
229
230
REFERÊNCIAS
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233
INTRODUÇÃO
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vários deuses faz parte dessa cultura. Assim, apesar de essa sociedade
manter a sua identidade original, ela também mantém sujeitos que não
concordam com determinadas tradições, nascendo a partir daí o que
Hall (2003) caracteriza como “multiculturalismo”.
O autor refere-se às estratégias e políticas que são adotadas, a
fim de se governar ou administrar problemas relacionados à diversidade
e multiplicidade, resultantes de sociedades consideradas multiculturais
(HALL, 2003, p. 52). Tal sociedade é vista como mantenedora de um
multiculturalismo pluralista, considerada, assim, a partir das diferen-
ças percebidas, não entre um grupo e outro, mas dentro de um mesmo
grupo, concedendo direitos distintos a diferentes comunidades (HALL,
2003, p. 53). Esse paradoxo fica claro com o retorno de Mwando à tribo
de Mambone, após ter sido abandonado por Sumbi.
Ao retornar a sua tribo, ele cumprimenta Sarnau com deferên-
cia, tratando-a por “mãe”, pois agora ela é a sua rainha. Ao que lembra
Sarnau:
Examinei de alto a baixo o que traz a contradição do encontro,
pois antes ela havia sido desprezada por Mwando, e agora ele
foi abandonado. Mesmo com tudo isso, Mwando ainda desperta
desejo em Sarnau, que entrega-se a esse amor, mesmo preven-
do que a sua ação prenuncia uma tragédia. Ela renega tudo o
que representa seu casamento poligâmico, desde o marido que
a despreza, ‘as filhas gêmeas inocentes que me impedem o ca-
minho da felicidade. Não suporto mais estes braceletes de ouro
que me prendem indissoluvelmente a um homem que não diz
nada ao meu coração (CHIZIANE, 2003, p. 84).
Com a rejeição a tudo que representa sua família e com a
culpa por ter cometido adultério, Sarnau consegue pensar no passado,
e se interroga por que esse homem que diz amá-la agora, a abandonou
antes? Ela tem fortuna, mas não tem amor: “Amor e fortuna nunca se
casam. Emparelham-se apenas nos contos de fantasia” (CHIZIANE,
2003, p. 84).
Com os encontros constantes com Mwando, Sarnau engra-
vida, mas desconhece a forma de alguém acreditar que ela engravidou
do rei, uma vez que ele nunca mais a tocou. Por sorte, o rei a procura
em uma noite, e a partir desse encontro, e ela decide que esse filho é
do rei. Quer livrar-se da culpa, pois acredita na consciência quando
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imprime que não foi ela a criar o amor e a poligamia. A quinta esposa
do rei, Phati, quer vingança pelo fato de o rei estar apenas com Sarnau.
Inconformada, ordena ao feiticeiro da tribo que mate as seis esposas,
para que possa reinar absoluta. Ordem negada pelo feiticeiro.
O rei de Mambone faz uma espécie de escolhas por noite com
as mulheres, menos com Pathi, porque descobriu em sonho sobre o fei-
tiço que ela fizera para a sua primeira esposa morrer no parto. Apenas
esse sonho foi o responsável pelo espancamento da esposa, que tomou
veneno, mas causou uma reação contrária.
Nasce o filho de Sarnau, com a cor clara do verdadeiro pai. O
rei negro de Mambone e todos da tribo concordam que o menino nasceu
com essa cor porque Phati, que também é clara, passou muito tempo
desejando a morte de Sarnau. Esta incubou de tal forma a criança no
ventre que nasceu com a cor da mulher que a odiava.
Após o nascimento, tudo volta ao que era antes: o rei despreza
novamente todas as suas mulheres, inclusive Sarnau, e volta a ter rela-
ções matrimoniais apenas com a esposa branca, Phati.
Ao ser descoberta a traição de Sarnau, a partir de Phati, o
rei Mambone obriga as suas mulheres a beberem o sangue de wanga,
ocasião que se embriagam e dizem a verdade. Por isso, Sarnau resolve
ir embora, e abandona seus filhos. Foge com Mwando em busca desse
amor. Após a fuga, Mwando arrepende-se, pois ele foi o culpado de tan-
tas desgraças ocorridas com sua família, que foi expulsa de Mambone.
Todos acreditavam que Mwando era uma espécie de espião da tribo em
guerra com o povo Mambone. Mais uma vez, a covardia e a fraqueza de
Mwando são vistas por Sarnau, em momento de situação crítica:
Grande rainha que tu eras. Pobre de mim que me deixei apaixo-
nar pelos teus títulos de nobreza. Sarnau, és a mais miserável
das criaturas. Agora olho para ti com os olhos desanuviados.
Não encontro em ti beleza nem encantos. O que vi em ti?
(CHIZIANE, 2003, p. 113).
Para Sarnau, somente restou-lhe o vazio, a solidão. Fica em
Lourenço Marques, abandonada, pela segunda vez, por Mwando.
O período colonial é retomado nessa passagem, através
das consequências provocadas pelo colonialismo. A viagem dos
degredados no navio para Angola possui essa simbologia: expõe a
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REFERÊNCIAS
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*1 O presente texto apresenta uma pequena parte da tese de doutoramento, ainda inédita, com
alguns ajustes e alterações, cujo título é: Personagens negros na literatura infanto juvenil
brasileira e moçambicana (2000 – 2007): entrelaçadas vozes tecendo negritudes (defen-
dida em 2010), na qual fizemos a análise de dez narrativas infantojuvenis, sendo: quatro
brasileiras, uma traduzida/editada no Brasil (As tranças de Bintou), e cinco moçambica-
nas, através da concessão da bolsa sanduiche CAPES, que possibilitou a permanência em
Maputo por cinco meses, a fim de realizarmos o levantamento bibliográfico e as res-
pectivas análises. Tal tese se encontra disponível no seguinte site: http://bdtd.biblioteca.
ufpb.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1609 (parte 1) e http://bdtd.biblioteca.ufpb.
br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1610 (parte 2).
INTRODUÇÃO
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5
Consideramos importante conhecermos os seguintes documentos que legitimaram a
demanda atual na área das relações étnico-raciais. São eles: 1) a LDB 9.394/96 alte-
rada pela Lei Federal 10.639/03, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino da
História e Cultura Africana e Afro-Brasileira, disponível no site:
http://www.uel.br/projetos/leafro/pages/arquivos/DCN-s%20-%20Educacao%20
das%20Relacoes%20Etnico-Raciais.pdf;
2) o Plano Nacional para Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Africana
e Afro-Brasileira, site: http://www.seppir.gov.br/.arquivos/leiafrica.pdf;
3) o Estatuto da Igualdade Racial, acessível no seguinte site:
http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/4303/estatuto_igualdade_
racial.pdf?sequence=1
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Nilma Lino Gomes (2006), que se debruça sobre cabelos crespos no livro intitulado
Sem perder a raiz: corpo e cabelo, símbolos da identidade negra. A palavra “tran-
çar” também emerge das ideias desenvolvidas por Souza (2005, p. 196), no livro Afro-
descendência em Cadernos Negros e Jornal do MNU. A pesquisadora analisa textos
dos Cadernos Negros e pontua que “O trançado dos cabelos será apresentado também
como ponto de partida para o traçado de um discurso de inserção do grupo na constru-
ção de uma identidade nacional heterogênea”. Quer dizer, há, aqui, um jogo de palavras
no uso do sentido trançar/traçar. Assim, o “trançado” dos cabelos tem uma conotação
poética e artesanal, o “ponto de partida para o traçado”, dando margem ao desenlace de
“traçar”, delinear e nos transportar aos fios ancestrais, cuja raiz africana é o elo a ser
vislumbrado, retomado, ressignificado na tessitura literária dos mentores da Literatura
Negra.
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Apesar de Coelho (1993) se referir à escravização humana como “um processo de
Injustiça Humana e Social que até os nossos tempos não pode ser totalmente extirpada”,
antes, porém, sendo a “raça branca a vencedora”, ao que, diríamos, beneficiada social e
economicamente até a atualidade (MOORE, 2007), ela, por outro lado, a entende como a
“força indispensável ao progresso de qualquer grupo social”. Essa afirmação mereceria
maiores explanações ou, no mínimo, a problematização do sistema atroz que ceifou a
vida de um contingente incalculável de pessoas negras e ameríndias ao longo de quase
quatro séculos, desencadeando uma série de complexidades e desigualdades até os dias
de hoje. O racismo é um deles. Tanto é que no limiar do século XXI discutimos, ainda,
a urgência da reparação social para com os grupos sociais vilipendiados e usurpados de
suas terras: os descendentes de africanos e os ameríndios.
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O termo “negro” e “branco” refere-se às caracterizações dos seres ficcionais repre-
sentados a partir das ilustrações e/ou do texto verbal, tendo em vista a associação dos
mesmos aos respectivos segmentos étnico-raciais (considerando-se a cor da tez, cabelos,
enfim, os traços fenotípicos) delineados nas narrativas.
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Áfricas, aqui, para expressar a diversidade do continente africano, prescindindo a redu-
cionista ideia de unidade para a sua amplitude.
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Referimo-nos aos doze livros publicados entre 1979 e 1989. A esse respeito, ver Oliveira
(2003).
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Dentre os estudos acerca dos personagens negros na produção literária citamos, ainda:
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Brookshaw (1983), Proença Filho (1997), França (1998), Piza (1998), Gomes (1998),
Brazilli (1999), Cuti (2002; 2009), Dalcastagnè (2004), Venâncio (2009) e Oliveira
(2010).
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“em forma de cruz usados pelos Iuba”, por meio dos quais se “refletia
o status social de certas princesas15”.
Seguindo a linha de pensamento de Gomes, pontuamos que,
ainda na primeira página do livro, no momento que Bintou confidencia
o conflito existencial, seu cabelo aparece dividido em forma de cruz.
Mas a analogia, ali, não é dessa ordem, por não haver associação a
nenhuma princesa. Tal associação, no universo de Bintou, só tem tal
conotação no tocante às tranças.
Tranças simbolizam beleza e iluminação, sob o prisma de
Bintou. E na cena em que ela realiza o sonho, a vibração é descrita com
bastante colorido. A cor amarela é intensificada e abrange grande parte
da página, como uma extensão do reflexo do sol, que dá mais vida à
cena em foco. As tranças, então, sugerem movimento, luz, ação e sen-
sação de bem estar. Ao balançar “a cabeça”, o “sol” “segue” a jovem
Bintou que, assim, brilha “como uma rainha”. Ter tranças, para ela,
expressa a projeção máxima em termos do ideal de beleza.
Baseada ainda em Neyt, Gomes (2006, p. 346) aborda a diver-
sificação em termos estéticos e simbólicos dos penteados para alguns
povos africanos. Em meados do século XIX, por exemplo, no antigo
Zaire, atual República Democrática do Congo, apesar dos problemas
de ordem socioculturais locais, afligindo o poderio “dos uruá”, muitos
viajantes estrangeiros ficavam impressionados com os “exuberantes
penteados desses africanos e de suas princesas”. Ou seja, uma das nos-
sas raízes africanas recriadas na diáspora tem a ver com a estética dos
penteados, entre tantas outras recriações culturais. Gomes (op. cit., p.
348) salienta ainda que
Os diversos povos africanos reproduziam nos seus penteados
formas encontradas no seu meio natural. Além disso, usavam
elementos da natureza para compor os adornos dos penteados,
tais como búzios, plantas e sementes coloridas. Também nas
estampas das roupas eles reproduziam as cores presentes no seu
habitat (GOMES, 2006, p. 348).
“As tranças de Bintou”, através das ilustrações, delineia diver-
sos tipos de penteados, quando em um ato de iniciação, principalmente
(um batizado): “adornos”, turbantes, além de “estampas” diversificadas
15
Ver Gomes (2006, p. 343-344).
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Não estamos afirmando que o destaque aos cabelos trançados, crespos, com penteados
afros seja uma realidade dos países do continente africano. Não temos estudos sobre
isso, mas Munanga (1988) evidencia em seu livro a influência dos produtos de alisa-
mento em alguns países, implicando até na proibição de tais produtos pelos respectivos
governos. Em Maputo, por exemplo, salvo as exceções, notamos a grande influência
desses produtos além das perucas e fibras, utilizadas pelas mulheres. Por outro lado, as
cabeleiras das crianças chamaram nossa atenção pelos diversos modelos de penteados
afros; se associavam, nesse aspecto, à protagonista com suas miçangas, tranças finas,
coloridas.
17
O avô, a avó, enquanto os mais velhos são, ainda, na hierarquia familiar, os guardiães
de princípios fundadores de saberes, deveres e responsabilidades a serem cumpridas.
Um exemplo disso no Brasil pode ser visto através da simbologia das Yalorixás e/ou
Babalorixás, guardiãs de sagrados segredos. São, portanto, as lideranças reverenciadas
nas comunidades religiosas de matrizes africanas.
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Ressaltamos que não estamos homogeneizando as tradições africanas, como se todas
elas estivessem representadas na obra. Inclusive, salientamos, de início, que na narra-
tiva não há a identificação do espaço social narrado. Sabemos, por outro lado, que tais
tradições são diversas, mesmo em um país; um exemplo disso consiste na variedade
linguística, nas maneiras diferentes de celebrar o casamento, entre outros tantos modos
de ser e celebrar a vida em comunidade.
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5. CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS
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REFERÊNCIAS
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Já que “Negro ou afro não tanto faz”, conforme salienta o escritor e estudioso da área,
Cuti (2010).
310
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COELHO, Betty. Contar história: uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 1990.
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DIOUF, S. A. As tranças de Bintou. São Paulo: Cosac & Naif, 2004.
EVARISTO, Conceição. Literatura negra. Rio de Janeiro: CEAP, 2007.
FRANÇA, Jean M. C. Imagens do negro na literatura brasileira (1584-1890).
São Paulo: Brasiliense, 1998.
GOMES, Heloísa T. O negro e o Romantismo brasileiro. São Paulo: Atual, 1988.
GOMES, Nilma L. Sem perder a raiz: corpo e cabelo como símbolos da iden-
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Disponível: <http://wwww.educacaoonline.pro.br>. Acesso em: 15 jun.2001.
GRIMM, L; GRIMM, W. Contos e lendas dos Irmãos Grimm. São Paulo:
Edigraf, [19 --], vol. 2
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JOVINO, Ione da S. “Literatura infantojuvenil com personagens negros no
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Cultural Palmares, 2006.,p.179-217.
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ANEXO
24
Essa relação encontra-se ampliada e se encontra acessível no seguinte site:
ht t p:// bdtd.biblioteca.uf pb.br/tde_busca /arquivo.php?cod A rquivo=1610.
Sugerimos, ainda, os seguintes sites:
1) www.quilombhoje.com.br ;
2) http://www.letras.ufmg.br/literafro/;
3) http://kitabulivraria.wordpress.com/
314
MANJATE, Rogério. O coelho que fugiu da história. São Paulo: Ática, 2009.
MARQUES, Francisco. Ilê Aiê: um diário imaginário. Belo Horizonte: MG,
Formato, 1994.
MARTINS, Georgina. Fica comigo. São Paulo: DCL, 2001.
OLIVEIRA, Kiusam de. Omo-Oba: Histórias de princesas. Belo Horizonte:
Mazza , 2009.
PESSOA, R. Contos Afro-Brasileiros. Recife: Prefeitura Municipal/Secretaria
de Educação: 2006.
PESTANA, Maurício. Lendas de orixás para crianças. Ministério da Cultura,
Fundação Cultural Palmares, 1996.
RIBEIRO, Jonas. 7 aventureiros e a guerra de travesseiros. São Paulo:
Salesiana, 2005.
SANTANA, Patrícia. Entremeio sem babado. Belo Horizonte: Mazza, 2007.
315