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1ª parte

JOSÉ ROBERTO V.
COSTA
O Universo é tudo para nós

Tudo começou há mais de quinhentos anos. Enquanto Colombo e Vasco da Gama


tinham feito suas viagens com apenas três caravelas, Cabral recebeu treze embarcações
e 1500 homens, a maior expedição jamais vista em
terras portuguesas.

Entre seus subordinados estavam os melhores


navegadores, pilotos e exploradores de seu tempo.
Inclusive um fidalgo de origem espanhola chamado
João Emeneslau ou simplesmente Mestre João, “físico e
cirurgião”, principal investigador da expedição.

Partiram dia 9 de Março, pelo calendário usado na


época, antes da reforma Gregoriana de 1582. Após
cruzarem as ilhas Canárias, uma embarcação se perde e
dela nunca mais se ouviu falar. Dia 2 de maio a expedição
ruma para a Índias e uma
Em 23 de Abril, o dia seguinte ao avistamento das caravela retorna à Portugal
novas terras, a expedição desembarcou e no local hoje com as cartas que
conhecido como Baía de Cabrália o Mestre João oficializaram a descoberta.
realizou os primeiros trabalhos para determinação da
latitude.

Foi ali que ele vislumbrou um conhecido asterismo da constelação do Centauro, cuja
extraordinária beleza se destacou em forma de cruz.

Sua carta ao Rei de Portugal é o mais antigo documento a mencionar a designação Crux,
pelo qual mais tarde seria conhecida a constelação do Cruzeiro do Sul, uma das mais
belas e significativas constelações do firmamento.

As sucessivas viagens de exploração à costa trouxeram muitos dados importantes,


principalmente com relação à determinação de latitudes. O primeiro estudo sistemático
de Astronomia no Brasil foi iniciado por Jorge Marcgrave, da comitiva de Maurício de
Nassau, durante o domínio holandês.

Um observatório foi instalado numa das torres do Palácio de Friburgo, na Ilha de


Antônio Vaz, Recife. Marcgrave observou ocultações, conjunções e uma série de

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eclipses, como o da Lua de Abril de 1642, visto do Forte dos Reis Magos, na foz do rio
Potengi, em Natal (ilustração abaixo).

Astrônomos ilustres
DESDE O FINAL DO SÉCULO XVII e durante o século XVIII vários astrônomos
ilustres visitaram o Brasil. Edmund Halley, o descobridor do famoso cometa que leva
seu nome, esteve em diversas cidades do litoral. Foi ele quem determinou a declinação
magnética do Rio de Janeiro, em 1699.

Para a correta demarcação do Tratado de Madrid, de 1750, em substituição ao Tratado


de Tordesilhas (1494), muitos geógrafos e astrônomos foram enviados pelas cortes
espanhola e portuguesa ao continente sul-americano. Mais tarde, em 1777, foi assinado
o Tratado de Santo Ildefonso, dando origem a novas expedições científicas para a região
Sul do Brasil. O mesmo aconteceu a partir de 1781, com a demarcação da região Norte.

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2ª Parte
JOSÉ ROBERTO V.
COSTA
O Universo é tudo para nós

D. PEDRO II DIZIA QUE SE NÃO FOSSE O IMPERADOR DO BRASIL seria um


professor. E que professor ele seria! D. Pedro de Alcântara era um intelectual de
verdade e grande entusiasta das ciências.

Mantinha contato estreito com muitos nomes ilustres da época, como Camille
Flamarion e Victor Hugo, com os quais dividia a paixão pela Astronomia. Fundou
bibliotecas, museus, observatórios astronômicos e meteorológicos em várias partes do
país, algumas vezes mantendo-os com recursos pessoais. Ainda jovem, com apenas 22
anos, era um Imperador dedicado, simples e tranqüilo.

O Imperial Observatório do Brasil havia sido criado por decreto em 1827, no Rio de
Janeiro, mas só começara a funcionar quase vinte anos depois. D. Pedro II deu forma e
alma a instituição, cedendo os próprios instrumentos que utilizava em seu observatório
particular na Quinta da Boa Vista, para que o Imperial Observatório pudesse iniciar suas
atividades.

Infelizmente, o gosto pessoal do Imperador pelas ciências não


contagiou seus frios auxiliares de governo. Naquela época,
países como o Chile e a Argentina já possuíam observatórios
superiores, dirigidos por profissionais eminentes.

D. Pedro II sempre se queixou disso. Sonhava com um


observatório astronômico moldado nos mais modernos
estabelecimentos existentes na época.

Pensava no famoso observatório de Nice, onde foi descoberto o


asteróide 293, chamado Brasília, em homenagem ao
D. Pedro II é o Imperador, quando do seu exílio, em Paris.
Patrono da Astronomia
no Brasil Assim mesmo o Imperial Observatório trouxe-lhe muitas
alegrias. Um dos trabalhos mais importantes lá realizados
foram as observações do trânsito de Vênus, um raro evento que ocorre quando esse
planeta passa na frente do disco solar.

Em Janeiro de 1887 o próprio Imperador faria estimativas do comprimento da cauda de


um cometa, como ficou registrado na revista francesa "L'Astronomie", publicada até
hoje. D Pedro II estava sempre em contato com os astrônomos do Imperial Observatório
e discorria com rara competência sobre diversas questões científicas.

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Imperial Observatório, no Morro do Castelo,
Rio de Janeiro, como era em 1881.
Adaptação de uma gravura de Rubens de
Azevedo.

O mal da República
A REPÚBLICA PRATICAMENTE DESTRUIU o Imperial Observatório. Aliás fez
bem mais que isso: retardou o desenvolvimento do espírito científico no país, tão
valorizado nos tempos do Segundo Reinado.

E a cada novo presidente que se sucedia no poder correspondia um degrau abaixo no


conceito internacional da Astronomia brasileira. Alguns órgãos da imprensa ajudavam,
confundindo a manipulável opinião pública, na medida em que fazia humor dos
edifícios erguidos em São Cristóvão, no Rio, e no Parque do Estado, em São Paulo,
onde então quase nada se fazia.

Foi preciso esperar um longo tempo. O primeiro presidente republicano a iniciar os


trabalhos de reconstrução dos observatórios brasileiros foi Emílio Garrastazu Médici.
Começou aí, ainda que timidamente, a recuperação do tempo perdido.

O Observatório Nacional, em São Cristóvão, o Observatório de Valongo, na


Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Observatório do Instituto Tecnológico da
Aeronáutica, em São José dos Campos e o Observatório Abraão de Morais em
Valinhos, São Paulo, entre outros, começaram a organizar importantes programas de
cooperação internacional.

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Final
JOSÉ ROBERTO V.
COSTA
O Universo é tudo para nós

QUAL É INSTRUMENTO DE TRABALHO DE UM ASTRÔNOMO? Não permita


que em sua mente venha apenas a imagem de uma luneta ou telescópio. A Astronomia
precisa, é claro, de bons instrumentos óticos para ser praticada. Mas se você observar o
Universo apenas com os olhos vai ver muito pouca coisa.

A natureza reserva o seu melhor para quem têm olhos de super-homem... e os


astrônomos têm! Porém, ainda não basta esquadrinhar uma estrela através da sua
emissão de raios X. Além de boas observações, é necessário raciocínio. Horas, dias e
semanas de trabalho dedicado e minucioso.

É desse esforço, em qualquer área do conhecimento humano, que surge o nosso super-
homem. Tem sido assim com um número cada vez maior de brasileiros, profissionais ou
não, que levam muito a sério sua paixão pelo firmamento. Nesta última parte da série
Astronomia no Brasil vamos conhecer uma pequena amostra de seus feitos mais
recentes.

Uma não, duas!


ETA CARINA É APENAS A SÉTIMA ESTRELA mais
brilhante da constelação de Carina, ou Quilha, perto do
Cruzeiro do Sul. Temos sorte de estar bem longe dela,
pois ela pode brilhar tanto quanto cinco milhões de sois.

Pode porque seu brilho não é constante, como o Sol.


Passados pouco mais de dois mil dias na Terra, Eta
Carina perde luz equivalente a três mil sois. O que não
seria novidade, pois existem muitas estrelas variáveis no Eta Carina brilha ao centro:
Universo. o fascínio das estrelas
gigantes.
Mas para um astrofísico brasileiro ela não estava
variando só por si mesma e sim porque tinha uma companheira. O par de astros,
envolvido numa nuvem de gás e poeira, não podia ser revelado facilmente por
telescópios.

Na época não foi fácil convencer a incrédula comunidade científica. Afinal, ciência se
faz com argumentações convincentes. Mas ele provou que estava certo. Hoje é
conhecido como o descobridor de um sistema estelar duplo.

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Sob o céu que tem mais estrelas
SANTOS DUMONT É HOMENAGEADO com uma cratera na
Lua. O romancista José de Alencar também tem uma, em Mercúrio.

E uma pesquisadora brasileira que trabalhou na análise dos dados


enviados pela missão Pathfinder, que enviou um jipe-robô para
Marte, obteve o reconhecimento de seu valioso trabalho ao ter
aceita a sua proposta de batizar vulcões em Io, um satélite de Io tem mais
Júpiter, com nomes de divindades tupis. vulcões ativos que
a Terra.
Em Tritão, maior das luas de Netuno, está Viana, cratera com o
mesmo nome de uma pequena cidade do Espírito Santo. Há muito mais exemplos como
esses.

No Rio de Janeiro, onde funciona o único curso de graduação em


Astronomia do país, uma revolução silenciosa, onde as mulheres estão
assumindo funções importantes em observatórios, está melhorando e
fortalecendo a formação científica da Astronomia brasileira.

Muitos dos que escolheram outras profissões também fazem parte desse
time. Um astrônomo amador de verdade não se contenta em reconhecer
os objetos celestes. Ele domina métodos científicos e realiza observações que podem ser
transmitidas para outros estudiosos. E tem muito valor.

Conhecimento que transforma


AINDA HÁ MUITO PARA SE FAZER pela Astronomia no Brasil. Em alguns países
ela é como uma paixão nacional. Em outros, faz parte dos currículos escolares e ajuda
sobremaneira ao entendimento de diversas outras ciências, como matemática, física,
química, geografia e ainda ecologia e história. Houve até um tempo em que era ensinada
no Brasil. Mas foi justamente um Ministro da Educação que prestou o desserviço de
retirá-la das escolas.

Hoje, há pessoas que julgam esse tipo de conhecimento como cultura inútil. Saber que a
Terra gira em torno do Sol pode não ter serventia no cotidiano da maioria absoluta dos
brasileiros. O que muitos ignoram é que as implicações na obtenção do maravilhoso
conjunto de novos conhecimentos trazidos pela Astronomia são capazes de transformar
o Homem e sua relação com o mundo.

O dia dos 500 anos


QUANDO AQUELA HISTÓRICA EXPEDIÇÃO portuguesa, contando 1500 homens
em 13 caravelas, aportou na Baía de Cabrália, a 12 km de Porto Seguro, não podiam
imaginar que as novas terras eram na verdade parte de um continente e não apenas uma
ilha.

Mas eles tinham certeza da data da chegada: 22 de abril de 1500, uma quarta-feira. Só
que para Cabral e seus conterrâneos os anos começavam em 25 de dezembro: o
calendário utilizado era o Juliano - não era como nos dias atuais, em que usamos o
Gregoriano.

A diferença? 10 dias. Dez dias que foram esquecidos pela maioria dos historiadores na

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contagem de muitos eventos anteriores a 1582, ano em que o Papa Gregório XIII
reformou o então calendário Juliano, que por acumular erros, já não mais coincidia com
eventos da natureza, como o início das estações.

E quando desejamos contar o tempo até uma data anterior ao ano da reforma do
calendário, devemos nos preocupar em adicionar os 10 dias que foram retirados do ano
de 1582 para que o calendário voltasse a se adequar aos eventos naturais. Feito isto, o
quinto centenário da chegada dos portugueses ao Brasil completou-se somente em 2 de
maio do ano 2000.

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Uma série de pequenas biografias dos principais nomes que ajudaram a construir a
ciência dos astros. Todos eles já nos deixaram, mas suas vidas e obras serão lembradas
enquanto existirem olhos humanos a contemplar o firmamento.

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Charles Messier
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

O Universo é tudo para nós


Charles Messier nasceu na França em 26 de junho de
1730. Décimo entre doze irmãos, não tinha grandes
possibilidades de seguir carreira acadêmica e a morte de seu
pai, quando ainda era criança, piorou ainda mais as
condições econômicas de sua família.

Possuidor de uma bela grafia e grande habilidade para o


desenho, teve afinal sua oportunidade aos 21 anos, quando
foi contratado pelo astrônomo da marinha francesa Joseph
Nicolas I'Isle para trabalhar como copista.

Introduzido aos poucos na prática da Astronomia, Messier


se tornaria um hábil observador e redigia reportes
cuidadosos de suas observações, medindo com precisão a
posição dos corpos celestes. Charles Messier (1730-
1817)
Na sua época, a moda era “caçar cometas” e a história de
seu famoso catálogo de objetos começou justamente quando
seu chefe calculou a posição esperada do retorno do cometa de Halley, em 1757. I`Isle
errara nas contas e isso fez com que o jovem Messier passasse noites inteiras
procurando o famoso cometa na direção errada do céu.

Messier anotou com cuidado a posição de uma nebulosa que até lembrava um cometa
difuso, na constelação de Touro. Era o dia 28 de agosto de 1758 e aquele seria o objeto
número um de seu catálogo.

Por fim Messier localizou o verdadeiro cometa, mas já estava entusiasmado com a idéia
de catalogar outros objetos nebulosos, para que ele e outros observadores não se
confundissem de novo em futuras observações.

Messier descobriu 21 cometas ao longo de toda sua vida, 13 dos quais nunca haviam
sido observados antes. Mas nem só de cometas era a fama de Messier. Ele foi um
ardente observador de ocultações, trânsitos e eclipses. Seus cadernos eram repletos de
anotações sobre manchas solares e observações meteorológicas também.

Catálogo Messier
CONTUDO, O QUE TORNOU MESSIER de fato conhecido para a Astronomia até os
dias atuais foi seu catálogo de objetos difusos, publicado em sua versão final no ano de
1784 e contendo 103 objetos.

Nos anos seguintes outros objetos foram descobertos por Messier, mas acabaram não
sendo incluídos em seu catálogo. Razão pela qual, um século mais tarde, alguns
astrônomos decidiram eles próprios inserir tais objetos na lista de Messier, chegando
assim aos 110 objetos conhecidos atualmente.

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De aglomerados estelares a galáxias: os 110 objetos do catálogo de Messier.

Os objetos do catálogo de Messier são precedidos pela letra M, sempre maiúscula, e


alguns deles têm denominações próprias. É o caso de M1, o primeiro objeto de sua lista,
também chamado “nebulosa do Caranguejo”. Mas Messier não descobriu essa nebulosa.
Outros já haviam percebido aquela mancha esbranquiçada sobre o corno meridional do
Touro, sem estrelas e com uma luz alongada como a chama de uma vela.

Com seus 110 OBJETOS, o catálogo de A nebulosa do Caranguejo é, na verdade, os


Messier é uma fonte INESGOTÁVEL de restos de uma supernova, uma estrela de
grande massa que ao fim de seu ciclo de
novas DESCOBERTAS
brilho explode, num estouro colossal capaz de
sobrepujar em brilho a soma de todas as

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estrelas de uma galáxia. No centro da nebulosa ainda jaz a velha estrela que se desfez,
agora uma esfera de altíssima densidade, girando em torno de si mesma 30 vezes por
segundo: um pulsar.

Com seus 110 objetos, entre nebulosas, galáxias e aglomerados estelares, o catálogo de
Messier é uma fonte inesgotável de novas descobertas, tanto para astrônomos
profissionais quanto para jovens amadores, que ainda gastam suas noites no puro prazer
de redescobrir as jóias celestes classificadas por Messier no século XVIII.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Charles Messier. Tribuna de Santos, Santos, 26 jan. 2004.
Caderno de Ciência e Meio Ambiente, p. D-4.

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Percival Lowell
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Percival Lowell nasceu em 1855 em uma família nobre


da Nova Inglaterra, nos Estados Unidos. Seu irmão mais
novo foi diretor da Universidade de Havard e sua irmã era
uma escritora muito conhecida. Lowell se graduou em
Matemática com distinção no ano de 1876.

Ele viajou durante anos pelo país e seu interesse por


Astronomia surgiu por causa do planeta Marte, naquela
época considerado lar de uma civilização muito mais
avançada que a nossa, lutando bravamente pela sua
sobrevivência num planeta com severas mudanças
climáticas e escassez de água.

Tudo isso começou com as observações do astrônomo


italiano Giovanni Schiaparelli (1835-1910). Ele percebeu, Percival Lowell (1855-1916)
com um telescópio, uma série de linhas finas que uniam
áreas escuras na superfície do planeta, como canais naturais
que unem regiões alagadas.

Schiaparelli as chamou de canali, mas o termo foi traduzido para o inglês channel, que
significa canal artificial. E aquela era uma época de grandes marcos na engenharia
mundial, como o canal de Suez (1869), o de Corinto (1893) e o do Panamá (1914).

Mapa de Marte compilado por Giovanni Schiaparelli entre 1877 e 1886. A maioria
dos nomes do relevo (Mare australe, por exemplo) ainda estão em uso hoje.

Percival Lowell decidiu então construir um observatório com recursos próprios, em


Flagstaff, no Estado do Arizona, a 1.500 m de altitude e sob um clima desértico não

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perturbado por nuvens nem pelas luzes das cidades, excelente para observações
astronômicas.

Ele estava disposto a concentrar recursos e esforços para Sua VISÃO era quase tão
entender melhor o misterioso Planeta Vermelho – mas MÍSTICA quanto o próprio
estava também fascinado pela “habilidade dos engenheiros Gênesis
marcianos".

Obsessão
POR 15 ANOS, SUAS ANOTAÇÕES foram repletas de áreas escuras e brilhantes,
sugestões de calotas polares e um planeta inteiramente enfeitado por canais. Dezenas
deles, cruzando Marte em todas as direções, uma rede complexa e sofisticada que
buscava trazer água dos pólos para irrigar as regiões equatoriais.

Lowell acreditou que os marcianos teriam construído tudo aquilo, num esforço
desesperado de uma raça mais antiga e mais sábia que nós, ainda assim a mercê de
graves alterações sazonais em seu mundo – que pedia socorro.

Lowell observou que Marte era seco e árido, assim mesmo muito parecido com a Terra.
Os marcianos eram bons e esperançosos. A visão de Lowell ganhou aceitação popular,
quase tão mística quanto o próprio Gênesis. Até hoje queremos ver vida em Marte.

Desse modo, os canais marcianos foram uma "realidade" por muitos anos, até que o
aperfeiçoamento dos instrumentos óticos e o envio de sondas espaciais ao Planeta
Vermelho mostrou que eles simplesmente nunca existiram.

Os canais de Marte, do modo como via Lowell, são resultado de uma disfunção óptica,
sob condições de visibilidade difíceis – aliadas ao profundo desejo de ver alguma coisa.
Foi a interpretação errônea de dados observacionais que havia criado os canais e os seus
construtores.

Lowell faleceu em 1916, mas deixou grandes contribuições para o nosso conhecimento
da natureza e da evolução dos planetas. Foi também decisivo na descoberta de Plutão,
que recebeu este nome em sua lembrança: as duas primeiras letras desse planeta são
também as iniciais de Percival Lowell. E seu símbolo é P, um monograma planetário.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Percival Lowell. Tribuna de Santos, Santos, 23 fev. 2004.
Caderno de Ciência e Meio Ambiente, p. D-4.

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Edmond Halley
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

O Universo é tudo para nós


Quando pensamos em Edmond Halley lembramos
imediatamente do seu homônimo: o cometa preferido da
humanidade. A cada 76 anos ele passa próximo do Sol e
podemos vê-lo, em geral por alguns meses.

Um cometa sempre nos lembra Halley. E no entanto ele fez


muito mais que descobrir cometas.

Sua data de nascimento é incerta. O próprio Halley supunha


29 de outubro de 1656. Em sua adolescência foram vistos
dois cometas, um em 1664, que foi ligado aos horrores da
peste bubônica que se abateu em Londres, e outro em 1665,
responsabilizado por um grande incêndio que acorreu no
ano seguinte naquela cidade.
Edmond Halley (1656-
O pai de Halley era um próspero negociante londrino. 1742)
Possuidor de diversas propriedades e muito rico, usaria sua
riqueza para dar uma educação primorosa ao filho,
mandando-o estudar em St. Paul, um dos melhores colégios da Inglaterra.

Halley não faria por menos. Em 1671 foi escolhido Captain (melhor aluno) de sua
escola. Distinção que indicava que além de ótimo estudante era também popular entre
os colegas.

Halley publicou o seu primeiro trabalho científico na revista da Real Sociedade de


Londres em 1676, com o apoio de John Flamsteed, o Primeiro Astrônomo Real da
Inglaterra, de quem se tornou amigo. Um dos feitos desse jovem notável foi determinar
que os cometas se movem em trajetórias elípticas (em forma de elipse) e ainda a
excentricidade dessas órbitas.

A excentricidade é a medida de alongamento das elipses. Uma elipse com


excentricidade zero nem é uma elipse, mas um círculo perfeito. Se for maior ou igual a
1 a elipse não é mais uma curva fechada, mas uma parábola ou hipérbole. As elipses
têm, portanto, excentricidades entre 0 e 1, e todos os corpos celestes se movem em
trajetórias elípticas.

Vida bem vivida


HALLEY MAL COMPLETARA 21 ANOS e em 1676 embarcaria numa expedição de
três meses e dez mil quilômetros na qual mapearia quase a metade do firmamento. Fez o
primeiro mapa do céu austral, descobriu estrelas e nebulosas que os astrônomos
europeus desconheciam. Na ilha de Santa Helena acompanhou o trânsito de Mercúrio
pelo disco solar (um fenômeno relativamente raro que abordamos neste Caderno de
Ciência e Meio Ambiente em 2003).

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Mais tarde, em 1684, Halley teve Somente um GÊNIO COMO HALLEY poderia se
um encontro com Isaac Newton aprofundar nas COMPLEXIDADES do UNIVERSO sem
que foi um divisor de águas tanto pagar o preço da alienação
para ele, quanto para Newton e
para a própria ciência. Basta dizer
que desse encontro Newton viveria uma espécie de transe que o levou a trabalhar
incessantemente pelos anos seguintes na investigação da gravidade e dos movimentos
planetários.

Halley, por outro lado, voltaria a Londres para desempenhar um papel transformador na
Real Sociedade e acabou ele próprio custeando a publicação da mais famosa obra de
Newton, os Principia.

Por essa época os interesses de Halley se tornariam mais ecléticos do que nunca. Ele
tentou determinar o tamanho do átomo, fez observações importantes sobre o
magnetismo, a propagação do calor, a luz, a
aerodinâmica, entre muitos outros.

Foi somente aos 39 anos que Halley começaria a


trabalhar na obra em que é mais lembrado. Ele
conseguiu reconstituir o paradeiro de um cometa
durante sua fase de invisibilidade, quando está muito
distante do Sol.

Por milênios os cometas haviam sido assunto preferido


dos místicos, até que Halley os destroçou em seu
próprio território: a profecia.

Halley previu que o cometa de 1531, 1607 e 1682 era o


mesmo e voltaria no Natal de 1758. Jamais um místico Edmond Halley também
chegou à tamanha precisão. publicou um trabalho sobre um
meio de determinar a distância
Somente um gênio científico apaixonado como Halley, da Terra ao Sol através da
o maior astrônomo de seu tempo, aprofundou-se tanto observação do trânsito de
nas complexidades do Universo sem pagar o preço da Vênus.
alienação. Halley faleceu em 14 de janeiro de 1742, aos
86 anos de uma vida bem vivida.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Edmond Halley. Tribuna de Santos, Santos, 29 mar. 2004.
Caderno de Ciência e Meio Ambiente, p. D-3.

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Christian Huygens
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Christian Huygens nasceu em Haia, na Holanda, em


14 de abril de 1629. Filho de Constantin Huygens, uma
das figuras mais importantes do renascimento na Holanda,
foi também um grande amigo do filósofo René Descartes.

Naquela época, pouco depois que Galileu usou pela


primeira vez uma luneta para observar os astros, ele
percebeu que a melhoria na qualidade dos instrumentos
ópticos faria grande diferença na Astronomia, e por isso
passou a fazer seus próprios telescópios.

Foi assim que por volta de 1655, usando uma dos


telescópios mais poderosos de seu tempo, Christian
Huygens demonstrou que as estruturas estranhas
observadas por Galileu ao redor de Saturno quase Christian Huygens (1629-
cinqüenta anos antes eram, na verdade, anéis! 1695)

A observação sistemática dos anéis de Saturno conduziu a


uma das maiores descobertas desse astrônomo: a lua Titã, uma dos maiores satélites
naturais de todo o Sistema Solar.

E como Huygens afirmou quando os viu pela primeira vez, os anéis de Saturno
realmente não são sólidos, mas sim formados por uma infinidade de fragmentos
brilhantes girando em volta do planeta.

SEU NOME, e o de Cassini, estão numa das Quanto a Titã, tem um diâmetro
MISSÕES ESPACIAIS mais bem sucedidas de superior a 5.000 km (maior que nossa
TODOS OS TEMPOS Lua) e uma densa atmosfera (50% mais
densa que a terrestre), com prováveis
lagos de metano na superfície – o que,
naturalmente, Huygens não fazia idéia naquela época.

Huygens também se interessou pela medição do tempo. Foi ele quem inventou o
pêndulo como regulador de relógios, em 1657. Seu interesse por óptica levou-o também
a especializar-se no polimento e na montagem de associação de lentes. E na Mecânica,
enunciou o princípio da força centrífuga e a lei do pêndulo.

Em sua pesquisa sobre o comportamento do pêndulo Huygens fez uma descoberta


matemática notável, publicada em seu célebre tratado "Horologium oscillatorium", de
1673, um clássico da literatura científica sobre movimentos circulares e pendulares e
sobre a conservação da energia, além de diversos outros estudos fundamentais da
Mecânica.

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Detalhe dos anéis de Saturno obtido durante a missão Cassini-Huygens.
Estrutura é formada por uma miríade de pedaços de rocha e gelo.

Polêmica
MAS SEM DÚVIDA uma das grandes polêmicas na vida desse brilhante cientista foi a
que envolveu a forma como a luz interage com a matéria. Isaac Newton (1642-1727)
acreditava que a luz era composta por partículas, e assim, como uma bola de bilhar,
recuava após se chocar com um objeto. Huygens nunca concordou com isso e descreveu
a teoria ondulatória da luz.

Quem estava com a razão? De certo modo, os dois. Hoje, a teoria quântica da luz admite
essa dualidade. A luz é, ao mesmo tempo, onda e partícula. A mesma luz que emergiu
das distantes estrelas imensas na nebulosa de Órion – mais uma das descobertas de
Huygens através dos telescópios que ele mesmo fazia.

Mais de três séculos depois, um dos mais bem sucedidos projetos espaciais de todos os
tempos levou seu nome e o de outro grande apaixonado pelo Universo. A missão
Cassini-Huygens foi uma realização conjunta das agências espaciais dos Estados
Unidos e Europa (Nasa e ESA).

Cassini é a nave-mãe. Dela escapuliu uma pequena sonda que mergulhou na atmosfera
da lua Titã em janeiro de 2005 – o primeiro pouso (automático) em uma lua além da
nossa. Já a sonda Huygens tem esse nome em homenagem ao importante astrônomo,
falecido em 1695 na mesma cidade em que nasceu.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Christian Huygens. Tribuna de Santos, Santos, 26 abr. 2004.
Caderno de Ciência e Meio Ambiente, p. D-3.

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Edwin Hubble
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Edwin Powell Hubble era advogado de formação, mas


sua dedicação à Astronomia acabou lhe roubando mais
tempo que a carreira legal.

Foi também onde Hubble foi mais bem sucedido, tornando-


se um do mais importantes astrônomos do século XX, a
ponto de seu nome hoje estar associado ao mais famoso
telescópio espacial – o segundo projeto mais caro de toda a
história da ciência.

Hubble nasceu em 20 de novembro de 1889 numa pequena


cidade do interior do Missouri, nos Estados Unidos. Com o
avô aprendeu a gostar de Astronomia e viveu a ascensão de
seu país à condição de potência mundial, durante a década
de 1910. Edwin Hubble (1889-1953)

Aos 21 anos, Hubble ganhou uma bolsa para estudar Direito


em Londres, voltando aos Estados Unidos após se tornar bacharel. Ele jamais fez o
exame da Ordem dos Advogados, necessário para exercer a profissão. Hubble gostava
mesmo era de Astronomia, e sua formação em Direito fora apenas para agradar o pai.

Aos 24 anos mudou-se para Chicago e foi trabalhar no Observatório de Yerkes, que
possuía um telescópio refrator (luneta) de um metro de diâmetro, o maior já construído.
Sua persistência e dedicação o fizeram ser convidado, mais tarde, para um cargo no
Observatório de Monte Wilson, perto de Los Angeles, na Califórnia. Ali Hubble
terminou seu doutorado em Astronomia.

Em 1917, com a Primeira Guerra Mundial, Hubble alistou-se no Exército e graças a sua
excelente forma física e igual pontaria, serviu junto as tropas aliadas na França, no posto
de major, mas sem nunca ter ído ao campo de batalha.

Ao voltar para o Monte Wilson, Hubble dedicou-se a HUBBLE jamais definiu uma teoria
observação das galáxias, propondo um sistema de sobre a EXPANSÃO DO UNIVERSO
classificação que as subdivide em quatro grupos
principais, segundo sua forma. Foi ele quem
confirmou, incontestavelmente, que a Via Láctea é apenas uma entre bilhões de outras
galáxias, que são como verdadeiros “universos-ilha” – centenas de bilhões de estrelas
unidas gravitacionalmente.

Lei de Hubble
HUBBLE ESTUDOU A LUZ emitida pelas galáxias distantes, observando que o
comprimento de onda em alguns casos era maior que aquele obtido em laboratório. Esse
fenômeno, uma conseqüência do chamado Efeito Doppler, ocorre quando a fonte e o

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observador se movem. Quando se afastam um do outro, o comprimento de onda visto
pelo observador aumenta, diminuindo quando fonte e observador se aproximam.

Em outras palavras, se uma


galáxia estiver se aproximando,
sua luz se desloca para o azul.
Se estiver se afastando, para o
vermelho. Em qualquer caso, a
Animação produzida pela Nasa mostra o desvio para o variação relativa do
vermelho (e para o azul) conforme um objeto se afasta comprimento de onda é
(ou se aproxima) de nós a grandes velocidades. proporcional à velocidade da
fonte.

Hubble deduziu que as galáxias se afastam umas das outras (desvio para o vermelho) e
que a velocidade de distanciamento é tanto maior quanto maior a distância entre elas.
Ele usou métodos precisos para determinar uma relação entre o deslocamento do
comprimento de onda e a distância de uma galáxia. Essa relação que entrou para a
história da ciência como a Lei de Hubble.

À sua revelia, a Lei de Hubble foi usada por aqueles que defendiam a expansão do
Universo (Hubble jamais definiu uma teoria sobre isso). Hoje sabemos que o Efeito
Doppler é apenas uma aproximação – é o próprio espaço quem cresce, aumentando o
comprimento de onda e arrastando as galáxias. Muitos dos estudos quantitativos sobre a
origem do Universo nasceram das idéias de Hubble aliadas as equações de Einstein.
Edwin Hubble faleceu no ano de 1953.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Edwin Hubble. Tribuna de Santos, Santos, 31 mai. 2004.
Caderno de Ciência e Meio Ambiente, p. D-4.

19
Hiparco
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Hiparco, ou Hipparkhos, em grego, foi um astrônomo e


matemático que nasceu em Nicéia, na Bitínia, no século II
a.C. Ele também viveu na cidade de Alexandria, mas
trabalhou sobretudo em Rodes, onde construiu um
observatório através do qual compilou um catálogo com a
posição e o brilho de 850 estrelas do firmamento.

Aliás, foi Hiparco quem introduziu o conceito de grandeza,


associado ao brilho (e não as dimensões) das estrelas. Ele
chamou as estrelas mais luminosas de “primeira grandeza”,
assim prosseguindo até as menos brilhantes, no limite da
visibilidade humana, as estrelas de “sexta grandeza”,
segundo Hiparco.

Hoje em dia esse conceito foi substituído por “magnitude”, Hiparco (sec. II a.C.)
uma escala logarítmica obtida através de instrumentos muito
sensíveis, e que permite expressar valores com algumas
casas decimais de precisão. Nada que diminua o valor do trabalho de Hiparco,
considerado por muito estudiosos o maior astrônomo da era pré-cristã, o Pai da
Astronomia – e também da Trigonometria.

Grandes feitos
ASSIM COMO A MAIORIA DOS MATEMÁTICOS de sua época, Hiparco foi
influenciado pela matemática dos Babilônios. Por isso também acreditava que a melhor
base numérica para realizar contagens era a base 60. Os babilônios não haviam
escolhido essa base por acaso. O número 60 pode ser facilmente decomposto em um
produto de fatores, o que facilita em muito os cálculos, especialmente as divisões.

Foi por isso que ao dividir a circunferência, Hiparco escolheu um múltiplo do número
60. Para Hiparco, cada uma das 360 partes iguais em que dividiu a circunferência foi
chamada “arco de 1 grau”. E cada “arco de 1 grau” foi dividido em mais 60 partes
iguais chamadas “arco de 1 minuto”. Finalmente, cada “arco de 1 minuto” foi dividido
em outras 60 partes iguais os “arcos de 1
segundo”. Até hoje fazemos assim.
Para Hiparco a TERRA não GIRAVA
Naturalmente, na época em que viveu
Hiparco não havia telescópios. Seu
observatório era apenas um local de onde podia passar horas estudando o céu a olho nu,
embora usasse instrumentos tecnicamente muito bem feitos (mas não ópticos) que ele
mesmo construía, e que o fez se destacar também pelo método e rigor de suas
observações.

Hiparco deduziu o valor correto para a razão entre o tamanho da sombra que a Terra
projeta no espaço e o diâmetro da Lua. Ele também calculou que a Lua está distante

20
entre 62 e 74 vezes o raio da Terra (o resultado real fica entre 57 e 64), e determinou a
duração do ano (e a duração das estações) com uma excelente margem de erro.
Infelizmente, porém, Hiparco não deixou muitos escritos e as citações ao grande
astrônomo aparecem principalmente em Ptolomeu, na sua obra Almagesto.

Terra imóvel
A HIPARCO ATRIBUI-SE A DESCOBERTA da “precessão dos equinócios”, seu
maior feito científico. Equinócios (da primavera e do outono) são como são chamados
os dois únicos dias do ano nos quais o dia e a noite têm a mesma duração.

Eles ocorrem em março e em setembro quando o Sol, em seu aparente movimento em


torno da Terra, cruza o equador celeste – que é simplesmente a projeção do equador
terrestre numa esfera imaginária de estrelas fixas.

Nosso planeta gira em torno de seu próprio eixo inclinado em cerca de


23,5º. Mas a Terra não é exatamente esférica, por isso a atração
gravitacional do Sol no equador tende a endireitá-la. Por causa da
rotação, o efetio resultante é uma lenta mudança de direção do eixo
axial no espaço, mudando também os pólos celestes. O movimento é
similar ao de um peão, qua banboleia enquanto gira. No caso da Terra,
um ciclo completo leva 26 mil anos.

Hiparco descobriu que o Sol não está sempre na mesma posição do zodíaco quando
ocorrem os equinócios. Em outras palavras, os pontos em que a trajetória aparente do
Sol cruza o equador celeste mudam (na verdade se antecipam, ou precedem – daí o
termo) com o tempo.

Mas Hiparco não interpretou esse fenômeno como sendo causado pela precessão do
eixo da Terra. Para Hiparco, a Terra não girava, e portanto não possuía pólos ou eixo de
rotação. Era a esfera das estrelas que girava em torno de nós. Ela possuía um eixo (e
pólos e equador).

Dessa maneira, a precessão dos equinócios era interpretada como devido a um


deslocamento do eixo da esfera das estrelas (ou do eixo da esfera que transportava o

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Sol, mas nunca do eixo da Terra). Além disso, naquela época, nada permitia concluir
que esses eixos executavam um movimento semelhante ao de um pião.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Hiparco. Tribuna de Santos, Santos, 28 jun. 2004. Caderno de
Ciência e Meio Ambiente, p. D-3.

22
Giovanni Cassini
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Giovanni Domenico Cassini nasceu no dia 8 de junho de


1625 em Gênova, na Itália, e faleceu em Paris em 14 de
setembro de 1712. Ele foi contemporâneo de Christian
Huygens (1629-1695), que descobriu que o planeta Saturno
tinha anéis ao seu redor.

Quando jovem, Cassini estudou Matemática e Astronomia


num colégio jesuíta e com apenas 25 anos tornou-se
professor de Astronomia na famosa Universidade de
Bolonha.

Cassini fez parte de suas observações astronômicas no


Observatório de Panzano, na Itália, mas a convite do rei
Luís XIV mudou-se para a França em 1669, onde ingressou
na recém fundada Royal Academia de Ciências, e foi Giovanni Cassini (1625-
nomeado o primeiro diretor do Observatório de Paris. 1712)

Ele jamais regressou à Itália, e foi através dos poderosos


telescópios franceses que realizou trabalhos conjuntos com Huygens, naturalizando-se
francês em 1673.

Divisão de Cassini
ENTRE SUAS MUITAS FAÇANHAS científicas, Cassini elaborou um grande mapa da
superfície da Lua em 1680, onde as montanhas aparecem de uma maneira quase
tridimensional, bem parecido com as fotografias modernas. Esse trabalho cartógrafo de
notável valor estético manteve-se com um dos melhores já compilados por mais de cem
anos.

Cassini também mediu a distância de Marte por triangulação. Esse planeta apresenta
uma pronunciada excentricidade orbital, de modo que sua distância ao Sol varia muito
(entre 206 e 249 milhões de quilômetros). O que também ocasiona uma sensível
variação da distância de Marte à Terra (entre 57 e quase 100 milhões de quilômetros).

A duração da rotação de Marte também foi determinada com precisão por Cassini, em
1666. Mas foi observando Júpiter um ano antes que Cassini descobriu uma enorme
mancha oval na região tropical sul do maior planeta do Sistema Solar. Era a Grande
Mancha Vermelha, um redemoinho ciclônico capaz de engolfar com facilidade o nosso
próprio planeta, e que até hoje não parou de girar na densa atmosfera do gigante gasoso.

SEU NOME, e o de Huygens, estão numa das A observação dessa tempestade


MISSÕES ESPACIAIS mais bem sucedidas de colossal, vista até mesmo com
TODOS OS TEMPOS instrumentos amadores, permitiu ao
astrônomo determinar o período de
rotação de Júpiter: apenas 9 horas e 51

23
minutos. Um dia tão pequeno naturalmente implica numa elevada velocidade de
rotação. Tanto que Júpiter se achata, sendo mais abaulado no equador que nos pólos.
Cassini também determinou o achatamento polar do planeta como sendo 1/15 do seu
diâmetro.

Observando Saturno em 1675, Cassini fez a descoberta que o tornaria mais conhecido.
Os anéis do planeta não pareciam uma superfície contínua, ao contrário, achava-se
dividido em duas partes por uma estreita falha. Cassini estava absolutamente certo, e é
por isso que o maior espaço vazio observado nos anéis de Saturno é chamado até hoje
de “divisão de Cassini”.

Homenagens
CASSINI AINDA DESCOBRIU os quatro maiores satélites de Saturno depois de Titã:
Jápeto (1671), Rea (1672), Tétis e Dione (1684). E percebeu que um dos hemisférios de
Jápeto é cinco vezes mais brilhante que o outro (imagina-se que um material escuro
esteja sempre “chovendo” sobre o hemisfério mais escuro, já que essa lua mantém
sempre sua face mais luminosa voltada para Saturno).

Ele também elaborou efemérides melhoradas das principais luas de Júpiter e descobriu
atrasos nas ocultações periódicas entre elas e o planeta gigante. Seu colaborador, Ole
Roemer, usou os resultados de Cassini para
determinar a velocidade da luz.

Um valor mais acurado para a distância média


Terra-Sol (a chamada Unidade Astronômica),
uma nebulosa e a natureza de fenômenos como
a luz zodiacal foram outras realizações desse
incansável astrônomo, homenageado em
crateras na Lua, em Marte, num asteróide e no
satélite Jápeto.

Além, é claro, da mais sofisticada nave espacial


de todos os tempos, o orbitador Cassini e a
sonda Huygens, que estão nesse exato instante Cassini em órbita de Saturno
continuando o trabalho de Cassini ao explorar ©Nasa/ESA.
Saturno – só que em órbita desse planeta.

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• Última atualização em 29/04/2008 às 22h13min.

24
Johannes Kepler
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Johannes Kepler teve origem humilde. Nasceu na


Alemanha em 1571 e ainda muito jovem foi enviado a um
seminário protestante cujo objetivo era criar barreiras
teológicas contra o avanço da poderosa Igreja Católica
Romana.

Sua curiosidade, contudo, foi sempre maior que o temor a


Deus que se inspira em lugares assim. O Deus de Kepler era
o poder criador do Universo. Kepler ajudaria a Europa a
livrar-se da reclusão do pensamento medieval. Ele teria um
vislumbre da mente de Deus.

Na verdade a perigosa visão de Kepler tornou-se uma


obsessão que perdurou por toda sua vida. Estudando a
matemática de Euclides, ele imaginou contemplar a Johannes Kepler (1571-
perfeição cósmica: “A Geometria existiu antes da Criação... 1628)
[ela] forneceu a Deus um modelo para a Criação... A
Geometria é Deus.”

Kepler foi estudar na universidade de Tübingen em 1589, deixando para trás uma vida
de clérigo, mas não as superstições. Para a maioria das pessoas, ricas ou pobres,
impotentes diante das doenças ou da fome, as estrelas pareciam uma verdade eterna. A
astrologia prosperaria na Europa ainda por muitos anos – e o próprio Kelper manteria
por toda sua vida uma atitude ambígua.

Seguiu para a Áustria, onde foi nomeado professor de matemática em uma escola
secundária, compilando tanto almanaques astronômicos quanto horóscopos. Costumava
dizer: "Deus provê a cada animal seu meio de sustentação. Para o astrônomo, Ele
proveu a astrologia". Depois de Kepler astronomia e astrologia se separariam
definitivamente.

A perfeição da geometria
NAQUELA ÉPOCA SE CONHECIAM APENAS seis planetas (Mercúrio, Vênus,
Terra, Marte, Júpiter e Saturno), e Kepler se indagava qual a razão desse número. Por
que não quatro, três ou vinte? Ele então imaginou que eram seis porque suas órbitas em
volta do Sol (circulares, como no modelo proposto por Copérnico) estavam
circunscritas em esferas que envolviam os 5 sólidos perfeitos de Pitágoras e Platão.

25
Existem apenas cinco sólidos regulares, figuras
tridimensionais cujas faces são polígonos que se
encaixam perfeitamente, sem qualquer falha. Para
Kepler, a órbita de Saturno, o mais distante dos
planetas até então conhecidos, estava inscrita em
um cubo.

Neste cubo se inseria outra esfera, contendo a


órbita de Júpiter, ao qual se inscreveria um
tetraedro, e sobre este uma esfera com a órbita de
Marte. O dodecaedro se encaixaria perfeitamente
entre Marte e a Terra; um icosaedro entre a Terra
e Vênus, e finalmente entre este e Mercúrio um
octaedro.
O complexo modelo de Kepler não
refeletia os movimentos dos Kepler trabalharia arduamente, com incansáveis
refinamentos matemáticos, porém jamais os
planetas.
sólidos e as órbitas planetárias se encaixaram.
Ainda assim concluiu que as suas observações é
que não eram precisas o suficiente. Seu talento como matemático rendeu-lhe um convite
para trabalhar ao lado de um nobre dinamarquês exilado em Praga, Matemático Imperial
na corte de Rudolf II, chamado Tycho Brahe.

De fato, Tycho possuía as observações astronômicas mais precisas do mundo. Resultado


de 35 anos devotados à observação do céu antes da invenção do telescópio. Mas era um
homem desleixado com sua saúde e suas pesquisas também. Extremamente rico, mas
displicente com seus recursos. Acabou se arrependendo em seu leito de morte, quando
doou suas observações a Kepler.

Mas nem mesmo assim a suposição de que as órbitas dos planetas estavam circunscritas
nos 5 sólidos pitagóricos se manteve (a descoberta posterior dos planetas Urano, Netuno
e Plutão também o desaprovaria, pois afinal não havia mais sólidos regulares para eles).

No modelo de Kepler não havia espaço para a lua terrestre, nem para as quatro luas de
Júpiter descobertas por Galileu. Mas Kepler não ficou triste. Ao contrário, se perguntou
quantas luas teriam cada planeta? Será que havia duas em volta de Marte? Seis em volta
de Saturno e talvez uma em Mercúrio ou Vênus?

A dura verdade
TYCHO HAVIA FEITO OBSERVAÇÕES INTRIGANTES do movimento orbital de
Marte. No céu, Marte vagarosamente executa um notável vai-e-vem contra o fundo das
constelações. Uma órbita circular não se encaixava de jeito nenhum, embora desde o
século VI a.C. filósofos como Platão e Pitágoras haviam assumido que os planetas, no
seu ambiente puro, longe da corrupção terrena, só poderiam se mover seguindo a mais
perfeita das formas: o círculo.

Mas se a Terra era um lugar imperfeito, porque não seriam imperfeitos também os
outros planetas – juntamente com suas órbitas? Foi pensando dessa forma que Kepler
acabou aceitando o inevitável: o círculo se esticará em uma estranha oval. A

26
regularidade e a perfeição de uma órbita circular eram afinal tão raras no Universo
quanto a perfeição na índole humana.

As três leis do céu


QUASE EM DESESPERO, KEPLER TENTOU A ELIPSE, figura explicada pela
primeira vez em manuscritos de Apolônio de Perga, na famosa Biblioteca de
Alexandria. “Ah, que bobo tenho
sido!” Exclamou Kepler em suas
anotações. Seu TRABALHO assinala o nascimento da
ASTRONOMIA moderna
A elipse, afinal, se ajustou
maravilhosamente as observações de
Tycho. Kepler descobriu que a órbita de Marte em volta do Sol era uma elipse e não um
círculo. Assim como a dos outros planetas – embora a maioria elipses bem menos
esticadas, isto é, quase círculos aos olhos de um observador desatento.

Kepler foi mais longe. Percebeu que numa órbita elíptica um planeta aumenta a sua
velocidade quando se aproxima do Sol, diminuindo quando se afasta, algo que também
está de acordo com as observações práticas e se tornaria a Primeira Lei do Movimento
Planetário – ou a Primeira Lei de Kepler: os planetas se movem em torno do Sol em
órbitas elípticas, com o Sol num dos focos da elipse.

Se os planetas transitassem em uma trajetória circular e uniforme, um certo arco de seu


círculo orbital seria percorrido sempre num mesmo intervalo de tempo. Mas com as
órbitas elípticas era diferente. Quando está mais perto do Sol um planeta traça um
grande arco em sua órbita num determinado tempo. Quando está mais longe, porém,
leva esse mesmo tempo para percorrer um arco muito menor.

Kepler descobriu que para um mesmo intervalo de tempo as áreas desses arcos são
idênticas, não importando a excentricidade da órbita. Essa é a Segunda Lei, os planetas
percorrem áreas iguais em tempos iguais.

Alguns anos depois Kepler conseguira formular sua Terceira Lei, aquela que relaciona o
movimento dos planetas uns com os outros. E a que mais se aproxima de sua intenção
original de compreender a “harmonia dos mundos”. Aliás, foi esse o título do livro onde
Kepler descreveu suas leis.

Os planetas cujas órbitas estão mais próximas do Sol se movem mais rapidamente do
que aquelas cujas órbitas são maiores e mais afastadas. Assim o ano de Mercúrio é mais
curto que o ano de Vênus, que é menor que o da Terra, etc.

Esta é a Terceira Lei do Movimento Planetário, que Kepler enunciou mais ou menos
dessa forma: o quadrado dos períodos orbitais dos planetas (o tempo que eles levam
para completar uma volta em torno do Sol) é proporcional ao cubo de suas distâncias
médias até o Sol.

O espírito sonhador de Kepler finalmente havia encontrado um alento. Mas ele não
descansou. Kepler também percebeu a incompatibilidade entre um hipotético Universo
infinito – repleto de estrelas brilhantes – com a escuridão do céu noturno.

27
Um paradoxo que só seria resolvido anos mais tarde, por Heinrich Olbers (1758-1840).
Kepler também observou a extraordinária explosão de uma supernova, a última ocorrida
em nossa galáxia, e ainda escreveu livros de ficção científica.

Johannes Kepler acreditava que um dia “naves celestiais” navegariam adaptadas aos
“ventos dos céus” e explorariam corajosamente a vastidão do Universo. Ele acreditava
que “em um sonho devemos ter a liberdade de imaginar pelo menos uma vez algo que
nunca existiu no mundo da percepção sensitiva”.

Sua família foi perseguida por bruxaria e Kepler faleceu em 1628, durante a Guerra dos
Trinta Anos. Sua vida e trabalho assinalam o nascimento da astronomia moderna.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Johannes Kepler. Tribuna de Santos, Santos, 30 ago. 2004.
Caderno de Ciência e Meio Ambiente, p. D-2.

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Tycho Brahe
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Tycho Brahe nasceu em 14 de dezembro de 1546 na


cidade de Skane, Dinamarca. Primogênito de uma família
nobre, foi criado pelo tio, do qual também herdaria grande
fortuna. Ainda muito jovem foi estudar Direito e Filosofia
na Universidade de Copenhague. Foi quando presenciou um
eclipse parcial do Sol e ficou impressionado com a precisão
da previsão matemática do fenômeno.

O fato de que o movimento dos astros poderia ser tão bem


determinado, a ponto de sabermos suas posições relativas
num dado momento, entusiasmou Tycho. Com apenas 16
anos seu tio o mandou para Leipzig, na Alemanha, para
continuar seus estudos de direito. Mas já era tarde. Tycho
estava maravilhado pela Astronomia. Comprava livros,
instrumentos e passava a noite observando o céu. Tycho Brahe (1546-1601)

Supernova!
UMA NOITE, EM 17 DE AGOSTO DE 1563, descobriu que as efemérides de sua
época estavam erradas em vários dias na previsão de uma aproximação aparente entre
Júpiter e Saturno. Assim, decidiu ele mesmo compilar tabelas mais acuradas a partir de
observações sistemáticas e mais precisas das posições dos planetas por um longo
período de tempo.

No dia 11 de novembro de 1572 Tyhco teria o privilégio de contemplar um evento


celeste que o deixaria ainda mais maravilhado: a explosão de uma supernova, uma
estrela de grande massa que ao morrer emite um pulso de luz de curta duração (em
comparação com seu tempo de brilho), porém de grande intensidade . Maior que o
brilho de todas as estrelas da galáxia juntas.

A nova estrela que Tycho viu estava na constelação de Cassiopéia e era mais brilhante
que o planeta Vênus. Na verdade ela pôde ser observada em plena luz do dia, por longos
18 meses. Na época desconhecia-se a natureza do fenômeno, e para Tycho a pergunta
era se a nova estrela estava na alta atmosfera da Terra, mais perto que a Lua, ou se ainda
mais longe, e assim contradizendo o dogma do grego Aristóteles, largamente aceito
pelos cristãos, de que a esfera celeste era imutável.

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Castelo do Céu
SEMPRE OBCECADO PELA
PRECISÃO em suas observações,
nessa altura da vida Tycho já estava
construindo muitos de seus próprios
instrumentos, entre eles um sextante
com braços de quase dois metros cada,
muito mais preciso do que qualquer
outro já construído.

Com ele Tycho demonstraria que a


nova estrela se movia menos que a Lua
ou os planetas em relação às “estrelas
fixas”, estando, portanto, na esfera das
estrelas. O observatório da ilha de Hven, onde Tycho
Brahe fez as observações que posteriormente
A fama de Tycho se espalharia por toda Kepler usou para formular as leis que descrevem
a Europa, a ponto do rei Frederico II,
o movimento dos planetas em torno do Sol.
oferecer-lhe uma ilha de presente, perto
do castelo de Hamlet, em Elsinore.

A própria Dinamarca pagaria pela construção de um observatório para Tycho, e as cerca


de 40 famílias, habitantes da ilha, se tornariam seus súditos. Ali Tycho construiu o seu
“Castelo dos Céu”, com um aparato de observação simplesmente incomparável e seu
tempo.

Tycho media o tempo utilizando diversos tipos de relógios, como clepsidras, (baseadas
no escorrimento da água), ampulhetas de areia, velas graduadas e semelhantes. Um
observador e um marcador de tempo trabalhavam juntos. Contando sempre com
assistentes, ele conseguiu reduzir a imprecisão das medidas de 10 minutos de arco
(desde o tempo de Ptolomeu) para apenas um minuto de arco.

Para Tycho todos os planetas, MENOS Tycho foi o primeiro astrônomo a calibrar e checar
A TERRA, giravam em torno do Sol a precisão de seus instrumentos periodicamente,
corrigindo as observações por refração
atmosférica. Suas observações eram diárias, e não
somente quando os astros estavam em configurações mais atraentes. Com isso
descobriu anomalias orbitais dos planetas até então desconhecidas.

Observou minuciosamente a aparição de um cometa em 1577, e posteriormente


demonstrou que o objeto se movia entre as “esferas dos planetas” e não dentro da
atmosfera da Terra, como se pensava na época. Mais uma vez Tycho percebia que o céu
não era imutável, como na concepção greco-cristã. Graças a ele os cometas passariam a
categoria de objetos celestes.

O amigo Kepler
EM 1588 O REI FREDERICO II FALECEU. Tycho foi desatencioso com o novo rei,
Christian IV, e com os nobres da corte. Isso lhe custou uma drástica redução em seus
rendimento até que, em 1597, Tycho deixou a Dinamarca com todos seus equipamentos,
mudando-se para Praga. Ali, no ano de 1599, o Imperador Rudolph II o nomeou

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matemático imperial e em 1600 Tycho contratou o alemão Johannes Kepler (1571-
1630) para ajudá-lo.

Para Tycho todos os planetas, menos a Terra, giravam em torno do Sol – e o Sol e a Lua
giravam em torno da Terra. Com tal sistema, o astrônomo dinamarquês imaginou ser
possível formular um modelo melhor que o de Nicolau Copérnico (1473-1543). Mas ele
morreria antes de tentar comprovar sua teoria.

Copérnico não baseou suas conclusões em sólidos argumentos científicos, mas em


considerações de cunho filosófico. Não obstante, suas idéias surgiram no momento
certo, pois em pouco tempo três personagens, com base em estudos cuidadosos sobre os
corpos celestes, selaram o triunfo do sistema heliocêntrico.

Eram eles: Tycho Brahe, Johannes Kepler e Galileu Galilei. O papel do astrônomo
dinamarquês Tycho Brahe foi de fundamental importância, embora o sistema por ele
elaborado, uma espécie de híbrido entre os sistemas ptolomaico e copernicano, estivesse
destinado ao fracasso.

Tycho era um magnífico observador e em sua ilha dinamarquesa de Hven dispunha de


instrumentos de excepcional precisão para a época. Graças a essa refinada aparelhagem,
obteve uma enorme quantidade de dados sobre os movimentos planetários.

Assim mesmo, as medições que Tycho Brahe deixou eram tantas e tão precisas que
Kepler usou-as para formular as Leis do Movimento Planetário. Kepler conseguiu
interpretar corretamente o movimento orbital de Marte, e daí conseguiu deduzir que
todos os planetas (inclusive a Terra) giravam em torno do Sol e que suas órbitas não
eram circulares, mas elípticas.

Tycho faleceu no dia 24 de outubro de 1601. Seus restos mortais estão na Igreja Tyn,
em Praga.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Tycho Brahe. Tribuna de Santos, Santos, 27 set. 2004. Caderno
de Ciência e Meio Ambiente, p. D-2.

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Nicolau Copérnico
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Nicolau Copérnico (Nikolas Kopperlingk) é


considerado o pai da Astronomia moderna. Nascido em
Thorn, na Polônia, em 19 de fevereiro de 1473, era filho de
um próspero comerciante também chamado Nicolau e de
Bárbara, irmã do cônego e depois bispo polonês Lucas
Wacsenrode.

Seu pai morre quando tinha somente 10 anos de idade, e


Copérnico vai morar com o tio. Aos 19 anos ingressa na
Universidade de Cracóvia, famosa na época pelos
currículos de Astronomia, Matemática e Filosofia.

Em 1496 se recusa a ser nomeado cônego de Frauemburg,


onde seu tio era bispo, e viaja para a Itália, onde ingressa
nas Universidades de Bolonha e Ferrara para cursar Direito Nicolau Copérnico (1473-
e Medicina. 1543)

Costumava trabalhar sozinho, observando o céu a olho nu


(a luneta astronômica só seria inventada um século mais tarde). Em 1530, já se
dedicando inteiramente a Astronomia, termina sua grande obra, De revolutionibus
orbium coelestium (Sobre as revoluções das esferas celestes), onde afirma que a Terra
gira em torno de seu próprio eixo uma vez por dia e viaja ao redor do Sol uma vez por
ano.

Nascia assim o sistema heliocêntrico, uma idéia fantástica para a época. No tempo de
Copérnico, papas, imperadores e o povo em geral tinham como certo que a Terra estava
absolutamente parada no centro do Universo, e ao nosso redor desfilavam todos os
corpos celestes. Também não eram poucos os que acreditavam que a Terra era chata. E
desafiar tais crenças poderia ser considerado heresia.

Sobre as esferas
De revolutionibus orbium coelestium foi publicada somente 30 anos após ser escrita, no
ano da morte do próprio Copérnico, que nunca tomou conhecimento da grande
controvérsia que havia ajudado a criar. Conta a história que ele faleceu uma hora depois
de por as mãos no primeiro exemplar
de seu livro, em 24 de maio de 1543.
O ORGULHO humano sofreu um DURO GOLPE com
O sistema de Copérnico, embora o sistema de Copérnico
revolucionário para a época, também
sofria sérias imperfeições. Uma delas
era supor as órbitas dos planetas rigorosamente circulares. Sem dúvida, seu grande
mérito foi a defesa e desenvolvimento do heliocêntrismo durante boa parte da vida.
Entre os ferozes opositores estavam tanto os doutores da Igreja Católica quanto
ardorosos reformadores protestantes, como Lutero e Calvino.

32
O orgulho humano sofreu um duro golpe com o sistema
de Copérnico, e mesmo anos após sua morte, durante o
processo de condenação a Galileu em 1616, a Igreja
colocou a obra de Copérnico na lista dos escritos
proibidos, condição a qual permaneceu até o ano de 1835,
ainda que cento e cinqüenta anos antes já tivesse sido
reconhecida como verdadeira.

Pelos dogmas religiosos da época, se Deus havia criado a


Terra e o Homem para povoá-la, sendo a criatura imagem
do Criador, seríamos portanto superior as demais
criaturas. O Universo existia apenas para que o
contemplássemos. O Filho de Deus estava no centro do
cosmos, no centro de todas as coisas.

Alicerce do pensamento
NA VERDADE NOSSO PLANETA SE MOVE em torno
de uma estrela anã que está na periferia da galáxia – uma Capa de De revolutionibus...
entre bilhões de outras ilhas de estrelas do cosmos. A
Terra surgiu há 4,6 bilhões de anos e nossa espécie começou a evoluir há menos de 2
milhões de anos, tendo sido sendo precedida de muitas outras. A grande sabedoria está
em conceber nosso íntimo parentesco com todos os outros seres deste mundo e na
humildade de aceitar que Universo vai continuar depois de nós.

A obra de Copérnico foi o alicerce no qual se apoiaram outros grandes pensadores da


humanidade, como Galileu, Kepler, Newton e mais recentemente Albert Einstein.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Nicolau Copérnico. Tribuna de Santos, Santos, 1 nov. 2004.
Caderno de Ciência e Meio Ambiente, p. D-2.

33
Galileu Galilei
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Galileu nasceu em 15 de fevereiro do ano de 1564 na


cidade de Pisa, Itália, no mesmo século em que morreu o
monge polonês Copérnico (1473-1543) e nasceu o
excêntrico dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601) e o
alemão Johannes Kepler (1571-1628), que por ter
arquitetado as três leis mais importantes do movimento
planetário ficou conhecido como o “legislador dos céus”.

Porém, diferentemente destes, que sempre mantiveram


fortes laços com a mística da Idade Média, Galileu ousou
romper com a filosofia do grego Aristóteles (384-322 a.C),
tão em voga entre os intelectuais da Europa de 400 anos
atrás, quando a maioria das pessoas trabalhava na
agricultura ou eram artesãos, e pouquíssimas crianças iam à
escola. Galileu Galilei (1564-1642)

Contrariando a vontade de seu pai, Galileu não se tornou


comerciante nem muito menos religioso. Matriculou-se aos 17 anos da Universidade de
Pisa, onde se revelou um brilhante aluno de medicina. Esse interesse, no entanto,
sucumbiria quando Galileu descobriu o grande candelabro dependurado no teto da
catedral de Pisa. Usando as batidas de seu próprio coração para medir o tempo, ele
observou que o movimento do candelabro se completava sempre no mesmo período,
não importando a amplitude da oscilação.

Cientista experimental
NAQUELA MESMA ÉPOCA, uma aula de geometria na universidade fez com que seu
interesse migrasse para a Física. Galileu abandona a universidade em 1585 sem se
tornar médico e começa a estudar matemática. De suas meditações sobre lâmpadas
suspensas e oscilantes surgiram as leis do pêndulo – e destas, mais tarde, a invenção do
relógio de pêndulo, pelo holandês Christiaan Huygens (1629-1695).

34
Ocupando a cátedra de matemática no “Studio de Pádua”,
Galileu realizou várias experiências sobre o problema de
queda dos corpos. Para demonstrar que Aristóteles estava
errado quando afirmou que “a velocidade de um corpo em
queda é razão direta de seu peso”, realizou experiências
com bolas de ferro rolando sobre um plano inclinado.

Galileu aperfeiçoou a luneta, inventada pelo holandês


Hans Lippershey (1570-1619) e em 1610 observou
montanhas e crateras na Lua, manchas no Sol e quatro
satélites em volta de Júpiter. Suas descobertas tiraram a
importância do Homem como centro do Universo,
maculando a perfeição dos céus.

Ao criticar abertamente a física aristotélica e o sistema


A luneta de Galileu. geocêntrico de Ptolomeu (127-145 d.C.), o sábio italiano
acabou recebendo sua primeira advertência formal da
Inquisição, que condenava as teorias sobre o movimento da Terra e proibia o ensino do
sistema heliocêntrico de Copérnico. Quando em 1632 Galileu publicou seu polêmico
“Diálogo sobre os dois maiores sistemas do mundo”, logo recebeu uma ordem para se
apresentar em Roma.

A condenação
APÓS TRÊS MESES de exaustivas sessões de interrogatório, Galileu foi acusado pelo
Tribunal do Santo Ofício e, em 22 de junho de 1633, obrigado a renegar sua certeza de
que a Terra não estava imóvel no espaço, utilizando a frase “abjuro, maldigo e detesto
os citados erros e heresias”. Galileu teve sua obra proibida e foi condenado à prisão
domiciliar perpétua.

Assim mesmo considera-se que o Não foi preso nem torturado. Seu PIOR INIMIGO
tratamento dispensado a Galileu foi foi seu próprio TEMPERAMENTO
notadamente brando considerando os
padrões da Inquisição. Galileu já estava
velho e não ficou preso um único dia, nem foi torturado. Seu processo não se compara
ao de outro italiano, o jovem Giordano Bruno (1548-1600), primeiro filósofo a afirmar
que deveria haver vida em outros lugares do Universo – brutalmente torturado e
queimado vivo em praça pública.

A condenação de Galileu foi uma tentativa de salvar o geocêntrismo, chave da


escolástica, a grande síntese entre a filosofia de Aristóteles (século IV a.C.) e a doutrina
cristã que dominou o pensamento europeu durante a Baixa Idade Média (séculos XI a
XIV). Seu processo permaneceu arquivado por longos 350 anos. Somente em 1983 o
papa João Paulo II admitiu os erros da Igreja e o absorveu.

Pai da Física
GALILEU FALECEU COM QUASE 78 ANOS, em 6 de janeiro de 1642. Sua
importância vai muito além do histórico confronto com a Inquisição. Em torno dele
criaram-se muitas lendas e equívocos.

Amigo pessoal do Papa que o condenou, seu pior inimigo, na verdade, foi seu próprio

35
temperamento. Galileu muitas vezes se mostrava alegre e comunicativo. Nunca se
casou, mas teve quatro filhos. Porém, quando discutia suas idéias era sarcástico, cínico e
orgulhoso. Desgastou-se em demasia apenas atacando supostos rivais.

Hoje, muitos o admiram por coisas que jamais fez, como inventar o telescópio, o
termômetro ou o relógio de pêndulo. Também nunca atirou pesos do alto da torre de
Pisa para demonstrar que corpos de massas diferentes caem com a mesma velocidade.

Sua maior contribuição à ciência está no estabelecimento das bases do pensamento


científico moderno, o método experimental, ressuscitado dos tempos do velho
Arquimedes. É por isso que Galileu Galilei é considerado o pai da Física.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Buracos Negros. Tribuna de Santos, Santos, 15 nov. 2004. Caderno de Ciência e
Meio Ambiente, p. D-2.

36
Carl Sagan
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Carl Edward Sagan nasceu no coração do Brooklyn, o


famoso bairro de Nova York, no dia 11 de novembro de
1934. Seus pais não eram cientistas. Na verdade quase nada
sabiam sobre ciência.

Sua mãe, americana, e seu pai, um imigrante russo que


trabalhava como cortador numa indústria de confecções,
estavam a somente um passo da pobreza. Assim mesmo
souberam ensinar ceticismo e admiração ao jovem Sagan.
Duas formas de pensar que apesar da difícil convivência,
são fundamentais no método científico.

Sagan sempre quis ser um cientista. Aos doze anos, quando


anunciou aos pais que queria ser astrônomo, recebeu apoio
incondicional. Apenas seu avô o questionou: “Muito bem”, Carl Sagan (1934-1996)
disse o velho, "mas como é que você vai ganhar a vida?"

E se dependesse apenas das escolas primária e secundária, Sagan provavelmente não


teria ido longe. Embora não fossem incompetentes, seus professores não o inspiraram
ou encorajaram a seguir seus interesses. Naquela época, o próprio Sagan diria que seu
gosto por ciência fora mantido apenas pela leitura de livros e os gibis da série Classic
Comics.

Boas recordações
MAS A ESCOLA SUPERIOR FOI A REALIZAÇÃO dos sonhos de Sagan. Lá ele
encontrou professores que não apenas compreendiam ciência, mas eram realmente
capazes de explicá-la. Sagan estudou na Universidade de Chicago, num departamento
de Física que girava em torno de Eurico Fermi. Ali ele conviveu com químicos como
Harold Urey, matemáticos como Chandrasekhar, foi estagiário de biologia de H. J.
Muller e aprendeu astronomia planetária com Gerard Kuiper.

Sagan teve o privilégio de estudar numa época em que o status de professor


universitário quase nada tinha a ver com pesquisa – mas com o padrão do ensino, a
capacidade de informar e inspirar a próxima geração. Bem ao contrário do padrão
moderno em que o “bom professor” é o “bom pesquisador”, cujo dedicação ao ensino
ocupa apenas uma fração de seu tempo, transformando a ciência numa fábrica de
artigos.

Na universidade Sagan preencheu muitas das lacunas de sua formação básica, e com
pouco mais de 20 anos já trabalhava numa teoria sobre as misteriosas emissões de rádio
de Vênus. Em 1960 recebeu um convite da agência espacial norte-americana (Nasa)
para participar do primeiro programa sobre vida fora da Terra.

Formado também em biologia, ensinou em Havard e obteve seu doutorado ao propor

37
um modelo da atmosfera de Vênus, responsável pela altíssima pressão e temperatura
desse planeta (efeito estufa). Uma hipótese que acabou confirmada por missões
espaciais posteriores.

Homem do Cosmos
SUA VIDA ESTEVE PROFUNDAMENTE LIGADA à exploração espacial norte-
americana. Desempenhando um papel de liderança desde o início, deu instruções aos
astronautas das naves Apollo antes da viagem à Lua e conduziu experiências das
missões planetárias Mariner, Viking, Voyager e Galileu. Com seu carisma e
extraordinária habilidade de falar em público, construiu uma próspera carreira científica
e literária, tornando-se um ícone da ciência espacial.

Embora a preocupação com a divulgação científica não tenha tido início com Carl
Sagan (nomes com George Gamow o precederam), ele retornou ao tema com veemência
ao destacar que as descobertas científicas só têm valor se forem compartilhadas,
clamando os cientistas a saírem de seus laboratórios para cumprirem seu papel social e
político (infelizmente muitos ainda não o escutam).

Foi brilhante neste sentido ao aproveitar o mais


poderoso dos veículos de comunicação em massa para
falar sobre ciência. Carl Sagan foi autor da mini-série
para televisão Cosmos, que estreou no Brasil em abril
de 1982, conquistando quinhentos milhões de
expectadores em 60 países.

Utilizando efeitos especiais na época disponíveis


apenas para produções como Guerra nas Estrelas, a
série mostrou desde uma molécula de ADN até as
maiores estruturas do Universo, sem esquecer da
A série para televisão “Cosmos”, história de alguns grandes nomes da ciência. O livro
em 13 capítulos, atingiu uma Cosmos veio logo em seguida e ficou na lista dos mais
vendidos do New York Times por 70 semanas, tendo
audiência equivalente a 10% da
42 impressões na edição americana e mais de 30
população da Terra. edições estrangeiras.

Ainda no início da década de 1980, Sagan ajudou a fundar a Sociedade Planetária,


organização não governamental aberta e dedicada à exploração do Sistema Solar, à
busca por planetas ao redor de outras estrelas e vida extraterrestre.

Hoje esta sociedade, que conta mais de 80 mil membros espalhados pelo mundo,
trabalha em sua primeira missão espacial, um veículo capaz de mover-se em órbita da
Terra usando a pressão da luz do Sol – como um barco à vela no mar. Tão romântico – e
viável – quanto as aspirações de Sagan.

Uma de suas maiores realizações envolve O MUNDO PRECISA de muitas pessoas


ainda a separação entre ciência e como CARL SAGAN
pseudociência. Sempre preocupado em levar
tanto o cientista quanto o leigo a pensar,
muitos de seus livros falavam sobre a refinada arte de detectar mentiras.

38
Homenagens
DEVIDO A SUAS EXCEPCIONAIS CONTRIBUIÇÕES, Sagan recebeu várias
homenagens, como medalhas da Nasa pelos trabalhos científicos e serviços prestados à
comunidade, o prêmio John F. Kennedy da Sociedade Americana de Astronáutica, a
medalha Konstantin Tsiolokovsky da Federação Soviética de Cosmonáutica e até o
prêmio Pulitzer de literatura.

Em 1997, durante a missão Pathfinder ao planeta Marte, a região investigada pelo


robozinho Sojourner foi batizada de "Memorial Carl Sagan", e em 1998 o filme
Contato, com Judie Foster, teve seu roteiro baseado no livro homônimo que Sagan
publicou em 1985.

Infelizmente Sagan não chegou a ver o filme ou a expedição do robô em Marte. Ele
faleceu na madrugada de 20 de dezembro de 1996, após lutar por quase dois anos contra
uma enfermidade chamada mielodisplasia, que lhe custou agonizantes seções de
quimioterapia e vários transplantes de medula.

Se estivesse vivo, Sagan teria feito 70 anos em 2004. Sua memória traz a admiração,
emoção e alegria que é aprender ciência. Poucos cientistas se equiparam a ele. Sua
capacidade de cativar nossa imaginação e explicar temas “difíceis” é um ato grandioso.
A verdade é que o mundo precisa de muitos mais como Carl Sagan.

Publicação em periódico impresso:


• Costa, J. R. V. Os astrônomos: Carl Sagan. Tribuna de Santos, Santos, 27 dez. 2004. Caderno
de Ciência e Meio Ambiente, p. D-2.

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A ciência não costuma fazer parte das conversas no cotidiano das pessoas; não
como a política, os esportes ou as religiões. Os cientistas são considerados seres
humanos mais inteligentes, não raras vezes estranhos, obstinados em descobrir e
inventar coisas.

Como será que eles enxergam a natureza? Como elaboram as leis e tratados que
estudamos na escola? Como conseguem chegar às descobertas?

Fazer ciência não é privilégio daqueles que frequentaram as aulas de pós-graduação nas
universidades. A simples observação da natureza é o primeiro passo para compreendê-
la.

E por inúmeras vezes, interpretações errôneas de fenômenos naturais conduziram o


Homem a importantes acertos na história da ciência. Senão, vejamos alguns exemplos...

40
A estranha órbita de Mercúrio
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

O Universo é tudo para nós

Em meados do século XIX alguns cientistas estavam intrigados com a estranha


órbita do planeta Mercúrio, que parecia ela própria girar em torno do Sol, como se o
planeta fosse uma conta dentro de um bambolê, girando na cintura de uma menina.

Em 1860 o matemático francês Urbain Le Verrier sugeriu que o problema poderia ser
resolvido se fosse considerada a existência de um planeta movendo-se entre Mercúrio e
o Sol. Indiretamente ele se referia a uma carta que havia recebido no ano anterior de um
talentoso astrônomo amador chamado Lescarbault, que relatava ter visto um corpo
celeste realizando um trânsito solar.

Diz-se que acontece um trânsito quando um astro passa na


frente ao Sol. Quando a Lua transita à frente do Sol, ocorre um
eclipse solar.

Mas isso porque a Lua está próxima o bastante para encobrir o


astro-rei. Na maioria das vezes, os trânsitos só podem ser
observados por astrônomos experientes, pois exige a delicada (e
perigosa) tarefa de olhar na direção do Sol.

Somente os planetas Mercúrio e Vênus realizam trânsitos, porque suas órbitas são
internas à órbita da Terra. Esses trânsitos são eventos raros e bastante aguardados,
exigindo também cuidados especiais na sua observação.

Jornada para Vulcano


A PARTIR DOS RELATOS DE LESCARBAULT, Le Verrier estimou que a massa do
suposto planeta seria da ordem de 1/17 da massa de Mercúrio. Não era suficiente para
explicar o estranho comportamento da órbita de Mercúrio.

Assim mesmo Le Verrier se apaixonou pela idéia de um planeta intra-mercuriano e o


chamou de Vulcano, o deus do fogo na Mitologia grega.

Em 1860, Le Verrier mobilizou toda comunidade científica francesa para acompanhar


um eclipse total do Sol. Era uma chance de observar Vulcano nas vizinhanças da estrela.
Mas nada foi visto. Outros eclipses solares voltaram a acontecer, e nada.

Houve também estranhos relatos de trânsitos. Às vezes eram vários pequenos corpos
que de uma só vez desfilavam na frente do Sol, fazendo Le Verrier pensar que somadas
todas aquelas massas estaria o valor esperado para solucionar o problema da órbita de
Mercúrio.

Mentes que brilham


COM O TEMPO AS BUSCAS PERDERAM O RITMO, mas serviram
para estimular a criatividade de mentes curiosas, como a de um jovem
alemão que em 1916 publicou uma nova teoria com a qual, entre outras
coisas, explicava satisfatoriamente o estranho movimento da órbita de

41
Mercúrio sem a necessidade de um planeta intra-mercuriano.

Seu nome era Albert Einstein e suas idéias ficaram conhecidas como a Teoria Geral da
Relatividade. Mas ainda restava uma pergunta: o que viram, afinal, Lescarbault e outros
talentosos pesquisadores? Nunca houve motivos para duvidar da confiabilidade de suas
observações.

Presume-se que eles tenham visto asteróides. Naquela época ainda não se sabia da
existência de asteróides que passam pelo interior da órbita da Terra, e é possível que se
tenha observado o trânsito desses corpos.

Hoje se sabe que até mesmo cometas em curso de colisão com o Sol podem causar um
mal-entendido, como aconteceu no início da década de 1970, quando Mercúrio voltou a
despertar atenção no meio científico. Mas essa é uma outra história...

42
Uma lua para Mercúrio
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Tudo começou em 31 de março de 1974, dois dias depois que a nave Mariner 10
sobrevoou o planeta Mercúrio. Foi quando seus instrumentos captaram uma emissão de
radiação ultravioleta (UV) onde simplesmente "não era certo estar lá". No dia seguinte
ela se foi. Mas antes que se pensasse em falha nos instrumentos ela reapareceu vinda de
outra direção.

A Mariner 10 captou misteriosas emissões de UV.

Alguns cientistas pensaram que a fonte poderia ser uma estrela. O Sol e as outras
estrelas emitem UV em abundância; é este tipo de radiação que mesmo filtrada pela
nossa atmosfera causa queimaduras na pele de banhistas desprevenidos.

Mas era sabido que a radiação UV não pode penetrar muito no meio interestelar e além
disso a fonte parecia ter mudado de lugar, o que sugeria que estava próxima. Um
pequeno astro, escuro e muito próximo de Mercúrio poderia estar refletindo a radiação
UV do Sol para a Mariner. Teria Mercúrio uma lua?

Concepção artística de Mercúrio e sua lua.

Mal entendido
CALCULOU-SE QUE O MISTERIOSO OBJETO movia-se a cerca de 4 km/s, uma
velocidade razoável para um satélite. Deveria a suposta lua ser anunciada ao público?

Era tarde demais, a imprensa já sabia e alguns jornais da época publicaram empolgantes
histórias sobre a misteriosa lua invisível de Mercúrio. Mas a ciência é excitante

43
justamente por ser real. Os cientistas não devem se deixar levar pelo desejo, tampouco
são vendedores de histórias. Eles tinham de ser mais cautelosos.

Jamais se localizou a suposta lua de Mercúrio. Mas o fim desta história marcou o início
de um novo capítulo para a Astronomia. Pois numa coisa os cientistas de fato se
enganaram: a radiação UV não era absorvida pelo meio interestelar como eles
imaginavam e os modernos instrumentos da Mariner provaram isso.

Na direção de onde provinha aquelas emissões, porém muito além do Sistema Solar,
estavam poderosas fontes de UV. O mal entendido estava, afinal, resolvido.

44
Neith, a misteriosa lua de Vênus
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

O Universo é tudo para nós

Era o ano de 1672 e Giovanni Domenico Cassini, um dos mais proeminentes


astrônomos de seu tempo, relatou ter visto um pequeno astro, em companhia do planeta
Vênus. Mas até então Vênus, a exemplo de Mercúrio,
não tinha satélites.

Cassini agiu com prudência e decidiu não anunciar


publicamente sua observação. Passaram-se 14 anos até
1686, quando ele viu novamente o misterioso objeto e
decidiu falar.

O suposto satélite mostrava-se com a mesma fase que


o planeta Vênus e parecia ter cerca de 1/4 de seu
diâmetro.

Mais tarde, o misterioso objeto também fora observado


por outros astrônomos, como James Short, em 1740,
Andreas Mayer, em 1759 e ainda J. L. Lagrange, em Concepção artística de Vênus
1761, que relatou que o plano orbital do satélite era (em primeiro plano) e sua lua.
perpendicular a eclíptica.

Durante o ano de 1761 o objeto foi visto num total de 18 vezes, por cinco diferentes
astrônomos. Em junho desse ano ocorreu um trânsito de Vênus, isto é, a passagem de
Vênus diante do disco solar... e ele estava em companhia de sua lua!

Nos anos seguintes as observações continuaram. Afinal, não era difícil ver a lua de
Vênus. Porém, em 1766, o diretor do Observatório de Viena publicou um artigo onde
declarava que todas as observações do suposto satélite não passavam de uma ilusão de
ótica – a imagem de Vênus era tão brilhante que refletia no olho do observador,
voltando ao telescópio e criando uma imagem secundária em menor escala.

Destino misterioso
EM 1884 O DIRETOR DO ROYAL
OBSERVATÓRIO de Bruxelas, M. Hozeau, sugeriu
uma explicação diferente.

Analisando os dados de observações recentes, Hozeau


concluiu que o objeto não era uma lua de Vênus, mas
um planeta em si, orbitando o Sol em 283 dias, e
dessa forma aparecendo próximo a Vênus a cada
1080 dias. Hozeau deu ao objeto o nome de Neith, a
misteriosa deusa egípcia dos céus, cujo véu nenhum
mortal poderia retirar.
O planeta Vênus também é
chamado de Estrela d'Alva. Três anos mais tarde a Academia de Ciências da
Bélgica publicou um longo artigo onde cada

45
observação anterior de Neith era analisada em detalhes.

Algumas de fato acabaram se revelando meras estrelas na "vizinhança" de Vênus.


Depois disso apenas um outro artigo foi publicado, em 1892. Foi quando E. E. Barnard
relatou um objeto de sétima magnitude próximo a Vênus.

Mas não havia nenhuma estrela na posição apontada por Barnard e ele era um excelente
observador. Até hoje ninguém sabe o que ele viu. Poderia ser um asteróide não
catalogado ou uma estrela nova de vida curta, que ninguém mais observou. Neith nunca
mais foi vista.

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A Terra e suas luas
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

O Universo é tudo para nós

Existe algo na Astronomia que não ousaríamos duvidar: nosso planeta tem uma
lua. Errado! A Terra tem duas luas! Pelo menos foi o que anunciou Frederic Petit,
diretor do observatório de Toulouse, na França, em 1846.

Ela teria sido vista por três observadores em dois lugares distintos, na madrugada de 21
de março daquele ano. Petit calculou que a órbita do nosso segundo satélite natural era
uma elipse bastante alongada e que o mesmo a percorria em pouco menos que 3 horas,
com um perigeu, o ponto de maior aproximação com a Terra, a 11,4 km (!?) da
superfície.

Petit teve de suportar severas críticas ao


apresentar estes dados numa conferência onde
estavam presentes inúmeros cientistas, entre
eles o matemático Le Verrier, que reclamou
que seria necessário considerar a resistência
do ar.

Afinal, nossa atmosfera se estende por muitas A lua de Petit ficava numa órbita tão
dezenas de quilômetros e, hoje em dia, os baixa que poderia se chocar com um
aviões comerciais trafegam tranqüilamente até avião.
mais alto que o perigeu da lua de Petit.

Os astrônomos da época de fato ignoraram a descoberta de Petit, e a


história teria caído no esquecimento não fosse um jovem escritor
francês chamado Júlio Verne, que em “Da Terra à Lua” narrou o
encontro de um grupo de intrépidos aventureiros com a lua de Petit.

O sucesso do livro fez a segunda lua e seu descobridor conhecidos pelo


mundo afora. E ainda atraiu a atenção de astrônomos amadores de
todos os lugares só pela aventura de reencontrá-la.
Júlio Verne
(1828-1905) A idéia original era a de que o campo gravitacional de uma segunda lua
pudesse explicar pequenos desvios observados no movimento da nossa
conhecida Lua. O que significaria que o astro deveria ter vários quilômetros de
diâmetro. Mas a lua de Petit era pequena demais para tanto, caso contrário não seria tão
difícil encontrá-la.

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Uma lua para a Lua
EM 1898 FOI ANUNCIADA A DESCOBERTA de nada
menos que um sistema inteiro de novas luas! Em 1969,
durante a chegada dos primeiros homens à Lua, houve
rumores de que os astronautas teriam finalmente visto o
tão misterioso satélite, agora do lado oculto da Lua.

Um astrólogo chegou a batizá-la de Lilith e até hoje uma


lua negra é usada em alguns horóscopos.

Nada disso implica que a idéia de um outro satélite natural Montagem fotografica da
seja absurda. A Terra pode ter uma nova lua por um curto fictícia lua por trás da Lua.
período de tempo.

Meteoróides passando muito perto do nosso planeta, cruzando as camadas mais altas da
atmosfera, podem perder velocidade e se tornar satélites efêmeros da Terra. São
efêmeros porque após cada perigeu perderão mais e mais velocidade até colidirem como
meteoritos.

...E no entanto, ela existe!


NA VERDADE, A TERRA POSSUI PELO MENOS UM OUTRO COMPANHEIRO
em sua jornada. Descoberto em 1997 por Paul Wiegert e sua equipe, o asteróide 3753
Cruithne não é exatamente uma segunda lua, mas seu curioso movimento envolve
interações com o sistema Terra - Lua. O astro tem uma órbita em forma de ferradura.

Para compreender melhor, imagine uma estrada circular com três pistas. A Terra é um
grande caminhão viajando com velocidade constante na pista central e o asteróide é um
carro movendo-se um pouco mais lentamente na pista externa.

Pouco antes do caminhão ultrapassar o carro este aumenta a velocidade e desvia para a
pista interna. O carro então se afasta, mas, sendo uma estrada circular, ele acaba sendo
alcançado pelo caminhão.

Pouco antes de ser ultrapassado ele de novo desvia para a pista externa e todo o ciclo se
repete. O asteróide não ficará neste movimento para sempre, porém hoje ele é, sem
dúvida, um inusitado parceiro de dança da Terra.

Não é um movimento fácil de entender e uma simples figura não seria muito
esclarecedora, por isso disponibilizamos a animação ao lado. Nela estão os movimentos
relativos de Cruithne (ponto amarelo) e do sistema Terra-Lua (representado pela Terra,
em verde).

Após umas poucas órbitas, linhas conectam Cruithne à Terra, construindo a aparente
trajetória do astro do nosso ponto de vista. Repare como a órbita desse asteróide
interage com a nossa. Mas não há risco de colisão: a maior aproximação de Cruithne
fica a cerca de 40 vezes a distância da Lua.

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A escuridão e a chuva de estrelas
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

O Universo é tudo para nós

No dia 19 de maio de 1780 aconteceu um fenômeno que assustou os moradores


da Nova Inglaterra, uma região que abrange seis Estados norte-americanos,
Connecticut, Maine, Massachusetts, New Hampshire, Rhode Island e Vermont, todos ao
norte do país.

As pessoas relataram uma “Grande Escuridão”. O Sol sumiu quase de repente e o meio-
dia transformou-se em meia-noite. Tudo ficou escuro e tenebroso. Naquele dia não
houve eclipse.

Passados pouco mais de cinqüenta anos, outro fenômeno nos céus dos Estados Unidos
deixou muitas gente boquiaberta. Era madrugada de 13 de novembro de 1833. Durante
horas, literalmente milhares de “estrelas cadentes” caíram a cada minuto.

Foi como se todo o céu estrelado estivesse desabando. As testemunhas estavam


principalmente da costa leste do país até o sul da Flórida.

O que houve nesses lugares?

Os habitantes da Nova Inglaterra do século XVIII eram muito religiosos e perpetuaram


a idéia de um castigo divino – até porque ninguém se arriscou a tentar explicar o que
aconteceu em maio daquele ano. Já em novembro de 1833, embora a ciência
astronômica já conhecesse o fenômeno,
muitos acreditaram que o fato era
inexplicável.

Clima ruim
EM MAIO DE 1780 O SOL NÃO
SUMIU em todos os lugares, somente na
Nova Inglaterra. Foi um fenômeno local e
na verdade não envolveu diretamente o
Sol. Até hoje essa região costuma ser
palco de fenômenos climáticos
inesperados, e foi exatamente isso o que
aconteceu.

A famosa escuridão daquele dia foi


resultado de uma densa nuvem de fumaça
de incêndios florestais a oeste da Nova
Inglaterra, tornando o céu diurno opaco à Localização da Nova Inglaterra, New England,
luz do Sol, mudando o comportamento dos nos Estados Unidos: maio é crítico (veja
animais e fazendo muitas pessoas crerem quadro).
em ira divina.

O clima no noroeste da América do Norte permanece instável e surpreendente.


Particularmente no mês de maio ocorrem incêndios florestais espontâneos e existe 60%

49
de chances de um dia com céu limpo mudar repentinamente, podendo ocorrer desde
neve até um tornado (embora a Nova Inglaterra não seja uma região de ocorrência típica
dos tornados).

É que em maio começam os primeiros dias quentes após o rigoroso inverno dessa
região. O solo começa a aquecer rapidamente – bem mais depressa que as regiões
costeiras, ainda sujeitas aos ventos gelados do norte, que acabam trazendo brisas frias
para o continente. O choque térmico costuma provocar densas neblinas – ou coisa muito
pior.

Maio na Nova Inglaterra

1° de maio de 1854 66 horas de chuva pesada, sem parar.

Ventos de até 145 km/h ao longo da costa.


26 de maio de 1967
Chuva pesada e neve.

Onda de calor faz a temperatura chegar a quase 40°C em 18


30 de maio de 1987
cidades.

Um tornado classe 3 (numa escala até 5) causa prejuízos de


29 de maio de 1995
US 25 milhões numa extensão de 72 km.

Tempestades produzem 140 mm de chuva em apenas 3


30 de maio de 1991
horas. Inundações severas.

Meteoros
JÁ COM RELAÇÃO À CHUVA DE ESTRELAS cadentes de 1833, mais uma vez
temos a ocorrência de um fenômeno natural, só que desta vez bem mais raro. Na
Astronomia ficou conhecido como “A Grande Chuva de Meteoros Leônidas de 1833”.

Gravura mostra como as pessoas relataram a espetacular


chuva de meteoros Leonídas de 13 de novembro de 1833.

50
Por que meteoros? Naturalmente o termo “estrelas cadentes” está equivocado. As
estrelas são astros distantes e não correm risco de cair sobre nós. A Terra gira em torno
de uma delas, o Sol, que é mais de um milhão de vezes maior que o nosso planeta. Se
alguém tivesse de cair decididamente não seria o Sol.

Meteoros é o termo correto. Eles são pequenos pedaços de rocha, a maioria menor que
uma ervilha, e que se tornam incandescentes ao penetrar velozmente na atmosfera. As
fontes de meteoros são os asteróides e, principalmente, as sucessivas passagens recentes
de cometas cujas caudas cruzam a órbita da Terra.

É notável que as chuvas de meteoros ocorram aproximadamente na mesma data a cada


ano. Tanto é que recebem nomes relacionados às constelações a partir das quais os
meteoros parecem surgir (um mero efeito de perspectiva). Leônidas é uma chuva cujos
meteoros são vistos todo o mês de novembro como se partissem da constelação do
Leão.

Porém, uma mesma chuva de meteoros não tem a mesma intensidade todos os anos, ou
é vista da mesma forma de todos os cantos da Terra. Em novembro de 1833 a Leônidas
foi particularmente espetacular – e provocou medo em muita gente. Hoje, astrônomos e
entusiastas esperam ansiosos novembro chegar para ver se o Leão vai rugir de novo.

Chuvas de meteoros famosas

Nome Constelação associada Época em que ocorrem

Quadrântidas Boieiro Início de janeiro

Aquáridas Aquário Início de maio

Perseidas Perseu Início a meados de agosto

Leônidas Leão Meados de novembro

Geminidas Gêmeos Início de dezembro

51
Os segredos de Marte
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Marte, o planeta vermelho, é sem dúvida um mundo especial. Há tempos vem


despertando a curiosidade e, principalmente, a imaginação das pessoas. Não é para
menos. Ao contrário da Lua, Marte tem atmosfera, estações do ano e um dia com pouco
mais de 24 horas.

Melhor que isso: existe água lá. Hoje toda ela se concentra nas regiões polares do
planeta, abaixo de uma camada de gelo de gás carbônico. Mas num passado distante, é
bem provável que Marte tenha tido oceanos de água líquida e então, talvez, alguma
espécie de vida tenha se desenvolvido.

Quando tudo começou


NO FINAL DO SÉCULO XIX TINHA-SE COMO CERTO que Marte
era o lar de uma civilização muito mais avançada que a nossa, lutando
bravamente pela sua sobrevivência num planeta onde havia severas
mudanças climáticas e escassez de água.

Tudo isso começou com as observações do astrônomo italiano


Canais de Marte,
Giovanni Schiaparelli (1835-1910). Ao telescópio, ele notou uma série
desenho do de linhas finas que uniam áreas escuras na superfície do planeta, como
século XIX. canais naturais que unem regiões alagadas. Schiaparelli as chamou de
canali. Mas o termo foi traduzido para o inglês channel, que significa
canal artificial.

O recém-construído canal de Suez representava um marco


na engenharia mundial, e até mesmo renomados cientistas,
como o americano Percival Lowell, entusiasmaram-se com
os “engenheiros marcianos”.

Lowell construiu um observatório com recursos próprios,


onde durante quinze anos viu os canais de Schiaparelli e
imaginou que serviam para trazer água dos pólos para irrigar
as regiões equatoriais.

Os canais de Marte foram uma “realidade” por muitos anos,


até que, com o aperfeiçoamento dos instrumentos óticos e o
envio de sondas espaciais ao planeta vermelho, descobriu-se
que eles simplesmente nunca existiram.
Percival Lowell (1855-1916)
A interpretação errônea de dados observacionais – aliada ao
forte desejo de encontrar vida inteligente – tinham criado os
canais e seus construtores.

52
A transformação da Face
PORÉM, NEM MESMO AS SONDAS ESPACIAIS que
pousaram em Marte foram capazes de torná-lo um lugar
comum. Quando em 1976 a nave Viking entrou em órbita ao
redor de Marte foi obtida uma curiosa imagem, numa região do
planeta chamada Cydonia, que reacendeu as esperanças de quem
acreditava em vida inteligente no planeta vermelho.

Em meio a algumas crateras e montes comuns, uma formação


era incrivelmente semelhante a um rosto humano ficou
conhecido como “A Face”.

Teria sido construída por uma antiga civilização marciana?


Poucos acreditaram em mera coincidência. Os olhos, o nariz e a
boca inevitavelmente lembravam um rosto (veja Figura 1 à
direita). Para alguns era a face de Cristo. Tinha de ser artificial.

Para piorar um funcionário do projeto descartou a foto, obtida


sob céu nublado, considerando-a mera ilusão provocada por um
jogo de luz e somba. Isso bastou para surgir a acusação de que a
Nasa estaria escondendo evidências de extraterrestres.

Naquela época não havia como confirmar as fotos da Viking.


Foi uma longa espera até 1998, quando a Mars Global Surveyor tornou-se a primeira
sonda a retornar com sucesso a Marte.

Em 5 de abril daquele ano, os instrumentos da sonda, naturalmente muito mais


modernos e sofisticados, mostraram uma imagem totalmente diferente. Com uma
resolução de 4,3 m por pixel, dez vezes a resolução da melhor imagem da Viking, o
Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) nos Estados Unidos revelou apenas mais uma
montanha corroída pelos fortes ventos marcianos.

Mas nem todos ficaram satisfeitos. A foto da Surveyor foi obtida sobre um céu de
inverno e talvez alguma névoa pudesse ter atrapalhado outra vez, deixando algum
vestígio alienígena encoberto.

Então eles fizeram de novo – e melhor. Não foi tão simples, porque a sonda não
sobrevoa a região da Face com freqüência. Mas o esforço valeu a pena. A nova imagem
tem resolução de 1,56 m por pixel e revela a verdadeira natureza da Face: uma formação
geológica chamada mesa, também existente na Terra.

Os dados de uma altimetria a laser são ainda mais eficientes. Mapas de elevação em 3D
mostram a formação por qualquer ângulo: e nada de olhos, nariz ou boca.

53
Perspectiva em 3D da "Face de Marte" produzida pela Nasa
em 8 de abril de 2001 por altimetria a laser.

Marte, porém, continua desafiando nossa inteligência. E


não está sozinho. Quando em 1727 Jonathan Swift
escreveu “As Viagens de Guliver”, dizem que os
astrônomos da fictícia cidade de Liliput citaram duas
luas do planeta vermelho, com revoluções de 10 e 21,5
horas.
Fobos e Deimos, os dois
Mas foi só em 1877 que Asalph Hall descobriria Fobos e
pequenos satélites de Marte,
Deimos, os satélites de Marte, cujos períodos orbitais são
com 27 e 15 km de diâmetro. de 7,5 e 30 horas, respectivamente. Bela precisão para
um palpite antecipado em 150 anos.

54
O fantástico planeta X
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

Enquanto investigava o planeta Urano, em 1841, John Couch Adams encontrou


estranhos desvios em seu movimento orbital, comportamentos estranhos que só
poderiam ser causados assumindo a existência de um planeta até então desconhecido,
além de Urano.

Mas Adams era muito jovem e seu trabalho não foi


considerado pelos pesquisadores do famoso
Observatório de Greenwich, onde ele apresentou
suas idéias. Foi então que um outro astrônomo da
época, o francês Urbain Le Verrier, também se
interessou pelo problema. Ele não obteve respaldo
do seu governo para iniciar suas observações.

Assim mesmo enviou os seus cálculos para o


O planeta Netuno foi previsto Observatório de Berlim, onde um novo planeta
matematicamente antes de ser acabou sendo localizado em 23 de setembro de
observado pela primeira vez. 1846. Era Netuno.

Hoje, Adams e Le Verrier dividem os créditos de


terem previsto a existência de um planeta antes de sua observação. Le Verrier, porém,
não ficou plenamente satisfeito com sua descoberta: ele acreditava haver mais um
planeta além do recém-descoberto Netuno.

Memórias de um planeta
VÁRIOS ASTRÔNOMOS E MATEMÁTICOS publicaram suas próprias idéias sobre
onde encontrar e como seria a órbita de um planeta trans-netuniano (além de Netuno).
Os dois trabalhos mais cuidadosos apareceram no início do século XX, em “A procura
de um planeta além de Netuno“, Pickering, 1909, e “Memórias de um planeta trans-
netuniano“, Percival Lowell, 1915.

Pickering chegou a propor sete planetas, denominados O, P, Q, R, S, T e U, com


características físicas e orbitais diferentes entre si. Mais tarde apenas P seria
considerado. Lowell chamou o hipotético astro de planeta X e assim que ficou
conhecido do público.

A partir de 1909 Lowell empenhou-se numa jornada pessoal em busca


desse astro e seu maior desapontamento foi ter falhado em encontrá-lo.
Ironicamente, entre as quase mil fotos tiradas em seu observatório, lá
estava Plutão, que não foi reconhecido até 1930, ano em que foi
novamente observado – e oficialmente descoberto.

Um “novo” cinturão
AS ESTIMATIVAS PARA O PLANETA X apontavam para valores em torno de 50

55
vezes a massa terrestre. Com uma massa de apenas 1/455 vezes a da Terra, Plutão
definitivamente não era o hipotético astro.

Buscas cada vez mais minuciosas se sucederam, até que se acreditou que não haveria
astro algum com massa e brilho semelhantes ao do planeta Netuno, exceto se numa
órbita polar e situado próximo ao pólo celeste sul, onde poderia ter escapado da
detecção.

No Observatório de Hale, em outubro de 1977, foi


descoberto o asteróide Chiron, mais tarde identificado
como um cometa.

Com um diâmetro de 50 km e movendo-se muito além


do cinturão de asteróides entre Marte e Júpiter, Chiron
chegou a ser anunciado como sendo um novo planeta,
algo prontamente corrigido.

Em 1992 um asteróide ainda mais distante foi


encontrado: Pholus. Logo, vários outros objetos
situados além da órbita de Plutão foram sendo pouco a
O Telescópio de Hale (Monte
pouco descobertos, o que ajudou a confirmar o modelo
Palomar, Califórnia, EUA) já foi o do Cinturão de Kuiper.
maior do mundo.
Foi nessa misteriosa região que encontramos Éris.
Descoberto em 2005, ele é 27% maior que Plutão e sua mera existência gerou a
polêmica que levou a reclassificação de Plutão, então último planeta do Sistema Solar.

A busca continua
BEM ANTES DISSO, EM 1987, Daniel P. Whitmire e John J. Matese sugeriram a
presença de um planeta 80 vezes mais distante do Sol que a Terra. Sua órbita estaria
inclinada 45º sobre o plano da eclíptica, e seu período orbital chegaria aos 700 anos
(Plutão leva 248 anos para completar uma volta em torno do Sol, Éris demora 557). A
idéia acabou se revelando uma alternativa à hipótese Nêmesis, a estrela assassina.

Alguns pesquisadores ainda acreditam na existência de um astro maior que Éris, talvez
do tamanho de Mercúrio ou até mesmo de Marte. Modelos computacionais sugerem que
ele poderia explicar características incomuns do Cinturão de Kuiper. A busca pelo
planeta X não terminou.

56
Nêmesis, a estrela da morte
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

O Universo é tudo para nós

Embora não seja possível determinar quantas estrelas duplas existem na nossa
galáxia, os astrônomos arriscam um limite inferior. Cerca de três em cada quatro
estrelas da Via-láctea possuem uma companheira orbital. O nosso Sol é uma das poucas
isoladas. Uma afirmação que só permanece válida dentro dos limites dos instrumentos
que possuímos.

E se estivermos enganados? Não é difícil imaginar uma


pequena estrela percorrendo lentamente uma órbita muito
alongada em torno do Sol, de modo que dele não se aproxima
menos que 20.000 UA, afastando-se até 90.000 vezes essa
distância.

Não seria muito luminosa, tampouco massiva, caso contrário


já teria sido notada através dos telescópios na Terra ou das oscilações que provocaria no
Sol. Seria um tipo de estrela conhecida pelos astrônomos como anã marrom. Estaria, no
presente, no ponto mais afastado de sua órbita, cujo período teria não menos que 26
milhões de anos.

As sementes do caos
CADA VEZ QUE ESTIVESSE MAIS PRÓXIMA do Sol, a força gravitacional da
estrela anã já seria o bastante para perturbar severamente as órbitas dos pequenos corpos
de gelo e rocha que, aos bilhões, gravitam muito além de Plutão formando um
gigantesco ninho de cometas conhecido como nuvem de Oort.

O desequilíbrio na nuvem de cometas faria com que milhares deles fossem atraídos em
direção ao centro do Sistema Solar, onde alguns fatalmente encontrariam pelo caminho
pequenos e frágeis mundos, como a Terra.

A cratera do Arizona foi provocada por


um meteorito que caiu há 60.000 anos.

Mas onde estariam as marcas de tais impactos? Não é fácil encontrá-las na Terra. O
movimento das placas tectônicas já destruíram um número sem fim de crateras. Os
períodos glaciares aplanaram tantas outras. Os ventos e as chuvas vão desgastando a
beira das crateras, arrastando o solo das encostas para o centro.

57
Assim mesmo ainda existem cerca de 100 crateras, embora a idade de todas elas não
possa ser determinada com precisão. Se a Terra preservasse suas crateras, certamente
seria tão esburacada quanto a Lua ou Mercúrio. E como a Lua não está sujeita aos
processos erosivos que ocorrem aqui, nosso satélite é a melhor evidência de impactos
violentos periódicos. E tais evidências, de fato, existem.

Nêmesis
A HIPOTÉTICA COMPANHEIRA DO SOL foi sugerida pela primeira vez em 1985
por Whitmire e Matese, que a batizaram de Nêmesis, a deusa da vingança. Seria até
mesmo possível que esta "estrela da morte" já estivesse presente em algum catálogo
estelar, sem que ninguém tivesse notado algo incomum.

Entre os defensores da existência de Nêmesis estão


geólogos que apostam que a cada 26 ou 30 milhões de
anos ocorrem extinções em massa da vida na Terra,
paralelamente ao surgimento de uma grande cratera de
impacto (ou várias delas).

Registros geológicos de fato indicam uma enorme cratera


de impacto no mar do Caribe, com 65 milhões de anos, do
Ciclo das extinções em massa
final do período cretáceo, coincidindo com o fim do
Clique para ampliar.
reinado dos dinossauros

Esse evento teria aberto caminho para que nossos antepassados mamíferos tomassem
conta do planeta e nossa própria espécie pudesse evoluir. Um ou mais cometas teria
atingido a Terra, argumentam, envolvendo-a numa nuvem de poeira durante meses.

Ainda em apoio à hipótese Nêmesis, os dados enviados pelo satélite IRAS (Infra-Red
Astronomical Satellite), que permaneceu 10 meses em órbita no ano de 1983, revelaram
um número altíssimo de objetos celestes até então desconhecido, muitos dos quais
mudaram de posição nesse curto período de tempo, indicando que estavam
relativamente próximos.

As características físicas e orbitais de Nêmesis


justificariam o fato dela ainda não ter sido descoberta.
Embora os mesmos dados do IRAS revisados e
analisados com mais profundidade, além de observações
mais recentes, parecem contestar a existência de
qualquer objeto celeste que possa se enquadrar como
Nêmesis.
Infra-Red Astronomical Satellite
Para Richard A. Muller, da Universidade da Califórnia,
Nêmesis poderia ser uma estrela anã vermelha, muito
comum em nossa galáxia – e seria visível através de um binóculo ou pequenos
telescópios! Como? Há cerca de 3.000 estrelas desse tipo já catalogadas, mas suas
distâncias não são conhecidas.

Muller acredita que a órbita de Nêmesis varia entre 1 e 3 anos-luz em torno do Sol (a
estrela conhecida mais próxima é Proxima Centauri a 4,25 anos-luz). Assim mesmo a
órbita de Nêmesis não seria usual, afirma Muller.

58
Como poderia ser a órbita de Nêmesis?
Clique na imagem para descobrir.

Também existem astrônomos que pensam que a órbita sugerida para Nêmesis seria
demasiado instável para permitir que a estrela regressasse tantas vezes. Eles crêem que a
estrela da morte, se algum dia chegou a existir, deve ter desaparecido no espaço
profundo há muito tempo ou foi despedaçada pelo Sol.

Há geólogos que afirmam que o surgimento regular de vulcões poderia imergir a Terra
em meses de escuridão, levando a extinção de muitas espécies. A respeito de Nêmesis,
um paleontólogo, Dewey McLean, chegou a declarar que "a ciência enlouquecera de
vez".

No início de 2005, Varun Bhalerao e M. N. Vahia (do Instituto de Tecnologia da Índia)


mostraram que nenhuma anã-vermelha companheira do Sol poderia existir num raio de
25 mil Unidades Astronômicas ou já teria sido descoberta. Também não há nenhuma
estrela anã-marrom com várias massas de Júpiter.

A hipótese de uma Nêmesis parece cada vez mais remota.

59
O preto sagrado
JOSÉ ROBERTO V. COSTA

Astronomia no Zênite

O espaço é negro. Preto como breu. Esta constatação fica especialmente evidente
para os astronautas, pessoas que contemplaram as estrelas acima da atmosfera da Terra.
Porém aqui mesmo na superfície, numa noite límpida, sem luar e longe da cidade, onde
distinguimos com facilidade as cores das estrelas e as manchas mais sutis, assim mesmo
percebemos a vastidão do espaço escuro.

Mas não deveria ser assim. Afinal, se considerarmos que as estrelas se distribuem
uniformemente por um espaço infinito, à medida que um observador em qualquer lugar
do Universo olha para mais longe vê um número cada vez maior de estrelas. Qualquer
que seja sua linha de visada, seu olhar sempre interceptará uma estrela, não importa a
direção em que olhemos o espaço.

Campo de girassóis

É COMO ESTAR NO MEIO de


um grande campo de girassóis.
Quando olhamos ao redor
vemos as flores mais próximas
igualmente espaçadas. Mas
quanto mais distante
procuramos enxergar, menor é o
espaçamento entre elas, até que,
no limite da acuidade visual,
todos os girassóis parecerão uma
única massa amarela de flores
no horizonte. Nada existe além
deles.

Então o céu não deveria ser Como o brilho das estrelas cai com o quadrado da
negro. Em média o firmamento
distância, enquanto seu número aumenta na mesma
deveria ser tão brilhante quanto
a superfície de uma estrela proporção, o céu deveria ser tão brilhante quanto a
média, pois estaria inteiramente superfície de uma estrela média, pois estaria cheio
preenchido por elas. delas. Na foto, um campo de girassóis em West
Newbury, Massachusetts (EUA), fotografado por
Naturalmente não é isso que Frank Vetere.
acontece. Então, onde está o
erro do nosso raciocínio? Por
mais tola que pareça, essa questão atordoou a mente de sábios cientistas durante muitos
e muitos anos, sem que ninguém fosse capaz de solucioná-la com efeito.

Primeiro o alemão Johannes Kepler (1571-1630), depois o inglês Isaac Newton (1642-

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1727). A questão foi retomada por Edmund Halley (1656-1742), famoso pela
descoberta do cometa que leva o seu nome, e depois pelo alemão Heinrich W. M.
Olbers (1758-1840), quando então passou a ser conhecida como o “Paradoxo de
Olbers”.

Paradoxo de Olbers

VEJAMOS ALGUMAS ALTERNATIVAS. Primeiro, a poeira


interestelar absorve a luz das estrelas. Esta foi a solução do próprio
Olbers, mas ela tem um problema. Com o passar do tempo, à
medida que fosse absorvendo a radiação do meio interestelar, a
poeira passaria a brilhar tanto quanto as próprias estrelas, tornando-
se incandescente. Não é a resposta.

Segunda hipótese: a expansão do Universo faz com que a luz das


estrelas muito distantes chegue até o observador fraca demais para
ser vista. Mas os cálculos mostram que a expansão do Universo
não seria suficiente para tanto.

Terceira: o Universo não existiu por todo o sempre. Se o Universo tiver um início, e
portanto uma idade, então a luz das estrelas mais distantes ainda não teve tempo de
chegar até nós (pois sabemos que a velocidade da luz é finita). O Universo que
enxergamos é limitado em espaço, precisamente por ser finito no tempo!

Esta é a solução atualmente aceita para o Paradoxo de Olbers. A escuridão da noite não
surge apenas porque o Sol se pôs. Esse acontecimento cotidiano revela que houve um
tempo em que nenhuma estrela iluminava o cosmos. O preto sagrado acima de nossas
cabeças é uma evidência de que o Universo teve um começo.

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