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DCMGDT

Isto tudo vai se tratar do que aconteceu a um jovem que se sentiu sortudo ao passar num
concurso público. Ao mesmo tempo será descrito os interessantes problemas políticos
administrativos de uma prefeitura de interior.

A história, que é verídica, se concentra na trajetória de 15 pessoas que ao passarem num


concurso público para Agente de Defesa Civil da Prefeitura de Guapimirim, pensaram estar
construindo o início do resto de seu futuro, as consequências que se seguiram não estavam em
seus mais sombrios pensamentos. Ao mesmo tempo que os relatos possam parecer uma
denúncia sobre os processos políticos na administração pública, trata-se também de um
tratado quase que cientifico sobre a psicologia social, onde os indivíduos se deixam levar pelas
mais absurdas provas, que chegam ao ponto de parecerem bobas aos olhos de quem não
esteja olhando atentamente.

Capitulo 1

A aprovação

O olhar vazio não era de tristeza ou de cansaço, apesar de estar com uma mistura angustiante
desses dois sentimentos. Havia mais de seis meses que não trabalhava. Em um país
subdesenvolvido como qualquer outro que compõe o sistema capitalista, o Brasil tem regras
de empregabilidade para a juventude completamente injusta, meritocráta e voltada aos
herdeiros da burguesia, “ou você jovem e não tem experiência para ocupar o cargo apesar de
possuir os requisitos ou não possui requisitos apesar da experiência” e a oferta fica para o
‘peixe’.

O exército de reserva moldado para um comercio de mão de obra terceirizada, com moldes
exploratórios completamente novos e com um proletariado também remodelado aos atuais
padrões econômicos do capitalismo, necessidade urgentíssima de um novo Karl Marx. Essa
conjuntura remoía na psique de um jovem de 25 anos, que apesar da pouca idade, havia
passado por muita coisa e se sentia cansado de todas as suas experiências e dos muitos
fracassos.

Mas agora aquele olhar significa outra coisa, ele observava em seu celular o resultado de um
concurso que havia feito de forma displicente, e que por coincidência, ficava em uma cidade
pequena do interior do Rio de Janeiro, cidade onde a familia de sua esposa morava, ela olhava
atenta, esperando uma resposta:

- E aí? – Perguntou ela tentando entender o significado daquele olhar.

- Acho que eu passei. – A resposta saiu meio baixa e embargada por um nó que não deixava-o
respirar.

- Sério? – Seus olhos se encontraram num faiscar de alegria.

- É... eu passei!

Os abraços, os parabéns, as ligações, a felicidade, o alívio, a esperança... será que os outros 14


também sentiram?

A próxima etapa parecia ser mais complicada, um exercício físico eliminatório de praxe para
concurso, era dali a um mês, ele não se sentia preparado, mas a vontade e a esperança era
maior que a dúvida e não pensou muito nisso até chegar o dia.
O caminho para o local de teste foi recheado de lindas paisagens verdes, apesar de seus
acompanhantes insistirem em dizer, ‘ Pô! Só tem mato! ’, seus olhos enxergavam uma
natureza incrivelmente bela, apesar de todos concordarem que a estrada era um ‘lixo’.

Ele foi deixado na sede da prefeitura onde seria realizado a primeira etapa da segunda fase,
apesar de estar marcado para iniciar as 9h da manhã já se passava das 11h e a única coisa que
havia sido feito era um fila preliminar.

Uma conversa desafiante se instaurou na fila de espera, era os prazos para a entrega dos
exames médicos, sua confiança ainda estava sólida, mas alguns comentários o deixou atento e
decidiu não deixar para em cima da hora a realização dos exames, apesar de não ter dinheiro o
suficiente para fazê-los, apenas um detalhe. O rapaz a sua frente tinha uma conversa
agradável, sobre tudo pelo seu sotaque nordestino, seu nome era Welinton e após alguns
minutos de conversa descobriram que haviam passado no mesmo cargo, e que ambos estavam
dentro da classificação, agora só dependia deles, passar no exame físico.

Mais 1 hora de espera, e agora estava separado em filas por ordem alfabética, transcorreu
tranquilamente as duas primeiras provas, foi até fácil demais ao seu entender e nervosismo.

O próximo teste físico era uma corrida de 2200 metros em 12 minutos, nos seus cálculos
conseguiria com alguns minutos de sobra, porém ocorreu o inesperado, depois de esperar
duas horas seu ímpeto havia diminuído, seus nervos estavam a flor da pele

Um grupo se juntou para fazer o tempo passar, sentado próximo a uma árvore ao lado do
campo de futebol no qual correriam em volta, ele ouvia as histórias hilariantes de Anderson.
Welinton estava calado próximo a eles emprestou o seu telefone para entrar em contato com
seus parentes.

- Viajo sempre para o Paraguai – Dizia Anderson sobre seus afazeres particulares – sempre
trago algumas peças de lá.

- Sério – disse outro demonstrando interesse pelo assunto. – Mas traz para revender ou é para
uso pessoal?

- Cara... – Anderson deu uma pausa passando a mão no queixo – Os dois. Por quê tem algum
interesse em comprar?

Gargalhou um pouco, descontraindo a galera que ria com ele.

- Até tenho interesse em comprar alguns perfumes. – Respondeu o outro.

- Mas vem cá e a federal? – Um outro perguntou meio desconfiado – não dá merda?

- Pô cara... – Novamente a mão foi até o queixo – Às vezes dá sim, depende muito. Teve um
amigo que trouxe Whisky de lá, tem uma quantidade que não precisa declarar né, ai você pode
alegar que é pra uso, por que eles coíbem é o comercio. Tá ligado!

- Sei qual é – Ele respondeu interessado no assunto – Por causa de imposto né?

- Exatamente! – Anderson respondeu concordou com veemência, apesar de parecer não ter
prestado muita atenção no que ele havia dito. – Esse cara são sinistros irmão! Parece que
sentem cheiro. Esse amigo tinha trazido 4 caixas de black label. Tá ligado que é o mais caro né?
Então... eles perguntaram ‘ta levando pra consumir ou vender?’, o amigo vai e fala que é pra
consumir!
Todos riram e um gritou alto:

- Aí eles fizeram ele beber tudo!

- Não! – Anderson gesticulou com os braços e todos ficaram atentos para o final da estória. –
Pegaram uma das caixas fechadas, tiraram um garrafa de dentro e perguntou pra ele
novamente ‘ é pra vender ou pro seu consumo?’, ele novamente disse que era pra ele.

Um burburinho de incredibilidade se rompeu e Anderson continuou.

- O cara pegou a garrafa abriu, derramou um pouco no chão e disse ‘ me fala a verdade’. O
cara disse novamente que era pra ele, ele derramou o whisky todo da garrafa e pegou outra
dentro da caixa e disse, ‘se não falar a verdade vou derramar tudo’, ai ele foi e disse que era
pra vender.

Todos romperam em risada descontraída e Anderson continuou seu incrível relato:

- Se o cara pega e fala logo não tinha perdido nada – ele olhou para um que estava a seu lado
explicando-se dando um tapinha em seu ombro – Irmão, vamos dizer que ele comprou uma
caixa com seis garrafas de Black Label lá por 500 reais, aqui ele vende por mais que o dobro,
mas se ele chega com as garrafas aqui todas abertas ele não consegue nem metade do que
pagou. Tem que fazer o jogo dos caras...

Ele não terminou de sua última frase, uma aglomeração despertou os homens do transe e
voltaram para realidade, o teste iriam começar.

Seus olhos lacrimejavam de tanta euforia, o coração parecia fibrilar, caminhou até uma mesa
de instruções, já chegava as três da tarde quando organizaram os grupos para o teste, foi
separado por nome e cada grupo com cinco que correria por vez, pelos seus cálculos
demoraria mais uma hora até que chegasse sua vez, apesar do cansaço seu nervosismo queria
que demorasse um pouco mais.

Se reuniu com sua familia que havia chegado, sua mãe toda orgulhosa sempre olhava
sorridente para ele, também sua esposa. Ele olhava para a sede da Defesa Civil que fica atrás
do campo onde acontece os treinamentos, havia uma frase que ele deve ter lido no mínimo
umas vinte vezes, ‘Nós resgatamos Vítimas, mas só Deus salva vidas’, aquilo lhe pareceu tão
bom, que o encorajou a seguir e deixou de se preocupar novamente.

Os cinco estavam na marca, e os candidatos receberam 8 fichas que deveria ser jogado em
uma caixa no canto determinado pelo instrutor da prova. Ele se preparou e teve fé, seu corpo
tremia um pouco, não era frio, pois estavam embaixo de um sol de 35 graus as três horas da
tarde, mas seu corpo tremia um pouco e as mãos suavam, pensou numa estratégia ideal, se
segurar no início e guardar um pouco de gás para o final. Quando deram o sinal para começar
ele correu com passos largos, naquele momento já percebia estava muito rápido, mas algo fez
com que ele mantivesse aquele ritmo e prosseguiu, na primeira volta já se sentia muito
cansado, mas agora só faltava 1900 metros, ou mais sete voltas, foi jogando as fichas na caixa,
o sinal de que faltava cinco minutos para acabar a prova tocou, ainda faltava duas voltas e
meia, não conseguiria, andou alguns metros pois se sentia esgotado, voltou a correr se
esforçando ao máximo, a caixa estava a sua frente.

- Por que ele parou? – Sua mãe disse assustada. – Não acredito... ele desistiu Liliane?

- Não sei... – Elas olhavam sem acreditar com o semblante carregado.


A caixa estava a sua frente, mas faltava duas voltas, quando estava se aproximando do
instrutor ele disse:

- Vai andando até aquele lado e aguarde. – E repetiu para o que vinha logo atrás.

Passou lentamente pela trave do campo e quando chegou no escanteio desabou no chão, logo
depois chegou um outro questionando:

- O que aconteceu?

- Não sei. Acho que acabou o tempo. – Totalmente exausto e acabado.

O Instrutor demorou alguns minutos e se juntou aos cinco:

- Pronto! Acabou, vocês passaram.

Nenhum deles questionou, a felicidade voltou em instantes, até o cansaço parecia ter sumido,
caminhou lentamente até um chuveiro no campo, molhou a cabeça, não sentiu sede, foi até
sua mãe e sua esposa e as abraçou, orgulhoso. Acabou.

Capitulo 2

A mudança

Já havia quatro o dias que dormia na casa de sua sogra, ela não demostrava se importar, um
sitio numa rua próximo a casa da sogra estava disponível para caseiro, ele convenceu o dono a
fazr um contrato de comodato de dois anos, porem precisava trazer a mudança.

O frete de Niterói para Guapimirim não seria menos de quatrocentos reais e não havia
dinheiro, um tio de sua esposa sugeriu que fosse falar com um vereador local, ele
disponibilizaria um carro para o frete.

No gabinete da vereadora Necy Brandão da oficina foi acertado os detalhes, ele era um
homem de meia idade, dono de uma oficina muito conhecida em Guapimirim, era dono
também da única empresa de ônibus concedida no município. Sua assessora fez alguns
comentários para que votássemos nele nas eleições, claro que ele disse sim, mas esse mesmo
jovem, vendeu seu voto para quatro políticos sem ao menos ter título de eleitor em seu
passado, era uma quarta feira e incrivelmente já haviam conseguido um frete para a sexta,
mais dois dias na casa da sogra, sobreviveria.

Acordou cedo, era o dia da entrega dos exames, foi feita a perícia e constatado as condições
adequadas e com o aval da medica correu para a prefeitura para tomar posse. Com o
documento de posse na mão perguntou a alguns funcionários onde ficava a sede da defesa
Civil e decidiu ir andando, no caminho uma viatura da Defesa Civil passou por ele, uma blazer
com giro-flex e tudo, pensou em para-los para perguntar como era o serviço, mas não
aconteceu. Ao chegar na recepção do sede três mulheres estavam sentadas, uma negra bonita
sentada na mesa da frente que não deu muita atenção enquanto ele esperava. Após alguns
minutos uma das três, a bem baixa, parecia ser anã, indicou-lhe o caminho da sala do
coordenador, ao chegar comprimentou –lhe com aperto de mão firme, não correspondido, as
feições meio indígenas do homem estava fechada, ele era um pouco gordo, com uma papada
que se dobrava quando movia a cabeça para baixo, parecia estar aborrecido com alguma coisa,
impossível saber:
- Bom dia. – Disse ele com tom formal em excesso. – Sou J. Ricardo, Coordenador municipal de
defesa Civil e Subsecretário do meio ambiente.

- Olá sou Maycon. – Respondeu em tom amigável.

- Por que o senhor está de bermuda numa repartição ‘púbrica’. – O erro de português acendeu
um sinal em sua cabeça, mas poderia ser pré-conceito, porem a pergunta sobre a bermuda
ficou suspensa. Ele sabia que era proibido somente em casas solenes.

- Não sabia que aqui não podia entrar, como não tenho dinheiro para andar de ônibus pela
cidade entregando a documentação achei melhor estar confortável. Tentou comovê-lo com
sua situação econômica, sem efeito. A cara fechada permanecia. – Me desculpe.

- Não se pode entra em repartição ‘pubrica’ de bermuda, tem que ser calça. – ele insistiu com
a advertência. – O senhor terá trinta ‘dia’ para começar a trabalhar, vou assinar um
documento aqui e será entregue ao senhor.

Ele entregou um documento rapidamente a Maycon e ficou encarando como que expulsando
com os olhos de sua sala, apesar disso Maycon não se tocou e continuou a conversa:

- como é o serviço aqui?

- O senhor vai saber quando começar a trabalhar, estava no edital do concurso, o senhor leu? –
a resposta foi demasiadamente ríspida, mesmo assim Maycon ainda não percebeu.

- Só mais uma coisa, tem corporativismo aqui, como funciona isso? – Perguntou se referindo a
guarda municipal, estava interessado se havia partidas de futebol contra, com rivalidade, seria
interessante.

- Eu só não gosto de fofoca. – Respondeu secamente.

Obviamente o senhor J. Ricardo não sabia o que era Corporativismo.

- Bem começarei na segunda. – Disse animado. – Só não venho amanhã logo por que tenho
que fazer minha mudança.

- O senhor tem trinta dias. – sempre com muita rispidez e com a papada tremulante.

Desceu se despediu das meninas na recepção e voltou orgulhoso para casa, segunda
começaria nova vida, mas ainda tinha a mudança pra fazer.

Às oito horas da manhã estava aguardando o motorista na oficina da vereadora Necy Brandão,
era um furgão do grandes:

- Caraca! Parece um ônibus. – Maycon disse cutucando Joarez com o cotovelo.

- É rapaz! – Retrucou torcendo a boca.

- Ela usa ele pra levar suas duas motos para o sitio. – Disse o motorista.

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