Você está na página 1de 9

Branko Milanovié

Capitalismo sem rivais


•·-· O futuro do sistema que
domina o mundo
tradução
Bernardo Ajzenberg
todavia
I.
Os contornos do mundo pós-Guerra Fria
[A burguesia] obriga todas as nações, sob pena de extinção,
a adotarem o modo de produção burguês; obriga-as a
incorporarem em seu seio aquilo que chama de civilização,
ou seja, tornarem-se elas próprias burguesas. Em uma
palavra, cria um mundo à sua própria imagem.
Marx e Engels, Manifesto comunista (1848)
Na época particular em que aquelas descobertas
[das Américas e das Índias Orientais] foram feitas, a
superioridade de forças pareceu ser imensa do lado
dos europeus, que puderam cometer com impunidade
toda espécie de injustiça naqueles países remotos. Mais
tarde, talvez, os nativos desses países poderão ficar mais
fortes, ou os da Europa mais fracos, e os habitantes de
todos os quadrantes do mundo poderão chegar àquela
igualdade de coragem e força que, inspirando temor
mútuo, sozinha poderá sobrepujar a injustiça de nações
independentes com alguma espécie de respeito pelos
direitos umas das outras. Mas nada parece ser mais
provável para estabelecer essa igualdade de força do
que aquela mútua comunicação de conhecimentos e
toda espécie de melhorias que um comércio extensivo
de todos os países para todos os países naturalmente,
ou melhor, necessariamente, acarreta consigo.
Adam Smith, A riqueza das nações (ITJ6)
1.1. O capitalismo como o único sistema socioeconômico
Abro este capítulo com duas citações. A primeira, de Karl
Marx e Friedrich Engels, tem cerca de 170 anos; a segunda, de
Adam Smith, quase 250 anos. Talvez essas duas passagens de
.
duas obras clássicas da economia política captem, mais do que
7
contemporâneo, a essência de duas mudanças de
qualquer texto , ,
ais mundo esta passando. Uma e a afirmação do regiões muito marginais e sem nenhuma influência nos acon-
época pe1as qu O . , . .
cap1t. a1·ismo, na· 0 só como dominante, mas como o umco
, sistema tecimentos mundiais.
. no· m1•coexistente no mundo. A A vitória global do capitalismo tem muitas implicações que
soc10eco • segunda
. e um novo ba-
lanceamento na relação de poder econom1co ~ntre, de um lado, foram antecipadas por Marx e Engels em 1848. O capitalismo
a Europa e a América do Norte, e do outro a Asia, devido à sua facilita - e, quando os lucros no exterior são maiores do que
ascensão. Pela primeira vez desde a Revolução Industrial, as nos próprios países, ele até mesmo busca isso - o comércio
rendas geradas nesses três continentes estão se aproximando de mercadorias, o movimento do capital e, em certos casos,
o movimento de mão de obra. Assim, não foi por acaso que
umas das outras, retornando, grosso modo, aos mesmos níveis
a globalização conheceu o seu maior desenvolvimento no
relativos que havia antes da Revolução Industrial (hoje, é claro,
período entre as Guerras napoleônicas e a Primeira Guerra
em níveis de renda absoluta muito mais elevados). Em termos
Mundial, quando o capitalismo preponderou amplamente. E
históricos, mundialmente falando, o reinado solitário do capi-
não é por acaso que a atual globalização coincide com o triunfo
talismo e o ressurgimento da Ásia são processos marcantes que
mais absoluto ainda do capitalismo. Tivesse o comunismo ven-
podem ser relacionados um ao outro.
cido o capitalismo, não há dúvida de que ele, apesar do credo
O fato de o planeta inteiro operar segundo os mesmos prin- internacionalista professado por seus fundadores, não leva-
cípios econômicos - produção organizada com vistas ao lucro, ria à globalização. As sociedades comunistas eram altamente
ao uso de mão de obra assalariada livre, ao capital majorita- nacionalistas e autárquicas, com um intercâmbio mínimo de
riamente privado, à coordenação descentralizada - não tem mercadorias, capital e mão de obra para além das fronteiras
precedentes na história. No passado, seja no Império Romano, nacionais. Até mesmo dentro do bloco soviético só havia
na Mesopotâmia do século VI, nas cidades-estados da Itália comércio quando se registrava um excedente de produção
medieval ou nos Países Baixos da era moderna, o capitalismo de mercadorias ou de acordo com princípios mercantilistas
sempre teve de conviver - por vezes em uma mesma unidade de barganhas bilaterais. É algo totalmente diferente do capi-
política - com outras formas de organização da produção. Isso talismo, que, como Marx e Engels observaram, possui uma
inclui a caça e as colheitas, os diferentes tipos de escravidão, a tendência inerente à expansão.
servidão (em que os trabalhadores eram legalmente ligados à O predomínio inconteste do modo de produção capitalista
terra e proibidos de oferecer seus serviços a outros) e a produ- tem sua contrapartida na visão ideológica, igualmente incon-
ção simples de mercadorias por parte de artesãos independen- teste, de que ganhar dinheiro não só é algo respeitável, mas
tes ou pequenos camponeses. Até muito recentemente, cerca também o objetivo mais importante na vida das pessoas, um
de anos atrás, quando surgiu a primeira encarnação do estímulo que é compreendido por gente de todas as partes do
capitalismo globalizado, o mundo ainda abrigava todos esses mundo e de todas as classes. Pode ser difícil convencer uma pes-
modosdeprodu çao.- A partir · 1·1smo
· d a Revolução Russa, o capita soa diferente de nós, em termos de experiência de vida, gênero,
passou a divid' . raça ou formação, a respeito de algumas de nossas convicções,
, ir O mundo com o comunismo, que remava em
pa1ses que reu · . - preocupações e motivações. Mas essa mesma pessoa não terá
h . mam aproximadamente um terço da populaçao
umana. Ho1e só o · 1· • de nenhuma dificuldade para entender a linguagem do dinheiro e
' capita ismo ainda perdura, com exceçao
9
8
. lh explicamos que nosso objetivo é fazer o melhor
do lucro, se e . _ . . . capitalismo explicam esse feito como algo decorrente do cará-
, . poss i'vel , ela terá cond1çoes de dec1d1r
negocio , facilmente se a ter "natural" do capitalismo, ou seja, da suposição de que ele
melhor estratégia econômica a ser adotada e a cooperação ou
reflete à perfeição aquilo que já existe dentro de nós: o desejo
a competição. o fato de (para usar a terminologia marxista) a de negociar, de obter ganhos, de batalhar por condições eco-
infraestrutura (a base econômica) e a superestrutura (as insti- nômicas melhores e por uma vida mais agradável. Mas, a não
tuições políticas e jurídicas) estarem tão alinhadas no mundo ser no caso de algumas funções primárias, não acredito que
atual não só ajuda o capitalismo a manter seu domínio como seja correto falar em desejos inatos, como se eles existissem
também toma mais compatíveis os objetivos das pessoas e mais de forma independente da sociedade em que se vive. Muitos
clara e fácil a sua comunicação, já que todos sabem o que o ou- desses anseios são produtos da socialização que se dá dentro
tro lado almeja. Vivemos em um mundo em que todos seguem das sociedades em que vivemos - e, neste caso, dentro das
as mesmas regras e entendem a mesma linguagem, a do lucro. sociedades capitalistas, que são as únicas existentes.
Uma afirmação tão enfática como essa precisa ser explicada. Há uma velha ideia, defendida por autores consagrados como
Existem, sim, espalhadas ao redor do mundo, comunidades Platão, Aristóteles e Montesquieu, segundo a qual um sistema
que renegam a geração de lucro, e há também indivíduos que o político ou econômico se sustenta ao manter uma relação har-
desprezam. Mas eles não influenciam no estado de coisas nem moniosa com os comportamentos e os valores prevalecentes
no movimento da história. A ideia de que os sistemas de cren- em uma determinada sociedade. Trata-se de algo certamente
ças e valores individuais estão alinhados com os objetivos do verdadeiro no capitalismo atual. O capitalismo tem sido notavel-
capitalismo não implica que nossas ações sempre sejam total e mente bem-sucedido em incutir nas pessoas os seus objetivos
obrigatoriamente motivadas pela obtenção de lucro. As pessoas, como sistema, induzindo-as ou persuadindo-as a adotarem suas
às vezes, executam atividades genuinamente altruístas ou são metas e construindo, assim, uma convergência extraordinária
motivadas por outros objetivos. Mas, para a maioria de nós, se entre o que o capitalismo necessita para sua expansão, de um
avaliamos essas atividades pelo tempo gasto ou pela não remu- lado, e as ideias, os anseios e os valores das pessoas, do outro.
neração, elas, ainda assim, ocupam um papel menor em nossa O capitalismo foi muito mais bem-sucedido do que seus rivais
vida. Do mesmo modo como é errado chamar de "filantropos" ao criar a condição necessária, segundo o filósofo político John
al~ns bilionários que adquirem uma fortuna gigantesca por Rawls, para a estabilidade de qualquer sistema, a saber: que em
meios escusos e depois destinam a outros uma pequena fração suas ações cotidianas os indivíduos expressem - e assim refor-
dela.' tamb'em e· errado se concentrar apenas em um pequeno cem - os principais valores nos quais se baseia o sistema social.
~on1unto de gestos altruístas de nossa parte e simplesmente O domínio do capitalismo no mundo todo se dá, porém, com
ignorar o fato d dois tipos diferentes de capitalismo: o capitalismo meritocrático
e que ta1vez 90% das horas que passamos acor-
dados são gastas t' 'd d liberal, que se desenvolveu progressivamente no Ocidente ao
_ em a 1v1 a es voltadas para melhorar o nosso
padrao de vida b d longo dos últimos duzentos anos (tema do capítulo 2), e o capita-
.
Esse ahnhament °
' uscan sobretudo ganhar dinheiro.
. . lismo político ou autoritário liderado pelo Estado, cujo exemplo
0
vos d . entre os objetivos individuais e os obJetl-
o sistema é um fi 't . ~aior é a China, mas que existe também em outras partes da
que ,._ ei O grandioso do capitalismo - feito esse
apromndarei no c , l . d Asia (Singapura, Vietnã, Burma) e em regiões da Europa e da
apitu o s. Defensores incondicionais 0
II
10
, . (R' ·a e países do Cáucaso, Ásia Central, Etiópia Ar
Africa uss1 , . na Eurásia volta a uma posição semelhante àquela que existia
, . R da) tema do capítulo 3.. Como ocorre com bastante
gelia, uan , antes da Revolução Industrial. Mas o faz com uma diferença.
frequência na história d~ huma~1dade, a asce~~~o e O triunfo
Se os níveis de desenvolvimento da Europa Ocidental e da Ásia
aparente de um determmad~ s1ste~a ou rehg1ao são rapida- (China) eram basicamente os mesmos, por exemplo, nos séculos
mente seguidos por algum tipo de cisma entre as diferentes I e II, ou nos séculos XIV e XV, essas duas partes do mundo, no
variantes do mesmo credo. Depois de triunfar no Mediterrâ- entanto, quase não interagiam entre si e, em geral, conheciam
neo e no Oriente Próximo, o cristianismo enfrentou disputas muito pouco uma da outra. Com efeito, hoje em dia nós sabemos
e divisões ideológicas atrozes (sendo a mais notável a ocorrida muito mais do que os contemporâneos da época sabiam a respeito
entre a ortodoxia e o arianismo), produzindo por fim o primeiro dos níveis relativos de desenvolvimento de então. E a interação
grande cisma entre as Igrejas ocidentais e orientais. O destino no presente é tão intensa quanto contínua. Os níveis de renda nas
do islamismo não foi diferente. Quase imediatamente após sua duas regiões, por sua vez, também são muito mais elevados. Essas
vertiginosa expansão, dividiu-se entre os ramos sunita e xiita. E, duas partes do mundo - Europa Ocidental e suas ramificações
por fim, o comunismo, o principal adversário do capitalismo no norte-americanas, de um lado, e Ásia do outro -, que abrigam
século XX, não perdurou por muito tempo de forma monolítica, juntas 70% da população e 80% da produção mundial, mantêm
um intercâmbio permanente em termos comerciais, de investi-
dividindo-se entre a versão liderada pela União Soviética e a ver-
mentos, movimentação de pessoas, transferência de tecnologia
são chinesa. Nesse quesito, a vitória mundial do capitalismo não
e troca de ideias. A competição entre essas duas regiões é mais
é diferente: temos diante de nós dois modelos de capitalismo
aguda porque, embora seus sistemas sejam semelhantes, não são
que se diferenciam um do outro tanto na esfera política quanto
necessariamente idênticos. Isso ocorre por meio de uma com-
na econômica e, em menor grau, na social também. E, quaisquer
petição intencional, planejada, com um sistema procurando se
que venham a ser os desdobramentos da competição entre os impor ao outro e ao restante do mundo, ou apenas pelo exemplo,
capitalismos liberal e político, acredito ser pouco provável que quando um sistema é copiado mais facilmente do que o outro
um deles venha a dominar todo o planeta. pelo restante do mundo.
Esse rebalanceamento geográfico está colocando um ponto-
. final na superioridade militar, política e econômica do Oci-
1.2. A ascensão da Ásia e o novo equilíbrio mundial
dente, tida como algo inquestionável nos últimos dois séculos.
O sucesso econômico do capitalismo político é a força qu_e es~á Nunca na história a superioridade de uma parte do mundo em
· d
por tras o segundo processo marcante que destaque iac1ma. ª relação à outra foi tão grande quanto a da Europa em relação
• da Asia.
ascensao , E, bem verdade que a ascensão d a As'.1a não se . à África e à Ásia no século XIX. Essa superioridade se tornava
deve apenas ao capitalismo político· países capita
. 11stas
. liberais
. mais evidente nas conquistas coloniais, mas também se refle-
, . ' . ida- tia na defasagem de renda entre as duas partes do mundo e,
como lndia e Indonésia também estão crescendo mmto rap
mente. Mas a transformação histórica da Ásia é liderada, sedrn com isso, na desigualdade de renda global entre as pessoas no
dúvida p l Chº d ensão o mundo todo, a qual podemos estimar com relativa precisão de
' e ª lila. Essa mudança diferente a ase ._
capital' , ' d nte his 1820 em diante, como ilustra a Figura I.I. Nesse gráfico, e ao
ismo rumo a supremacia global tem um prece e .
t· · ' • ica
onco, na medida em que a distribuição da atividade econorn
13
12
longo deste livro, a desigualdade é mensurada com O uso d
chamado coeficiente de Gini, que varia de o (nenhuma d es1- global aumentou de forma mais ou menos contínua de 1820 até
gualdade) a 1 (desigualdade máxima). (Esse índice é expresso a véspera da Primeira Guerra Mundial, subindo de 55 pontos
Gini (praticamente o mesmo nível de desigualdade existente
frequentemente de forma percentual, indo de o a rno, sendo
hoje em dia nos países latino-americanos) para quase 70 (nível
cada ponto percentual chamado de ponto Gini.)
de desigualdade superior ao da África do Sul atualmente). O
aumento dos níveis de renda na Europa, na América do Norte
Figura 1.1. Desigualdade estimada de renda global, 1820-2013
e posteriormente no Japão (combinado com a estagnação da
China e da Índia) impulsionou grande parte desse crescimento,
Índice
Gini embora a crescente desigualdade de renda entre as nações que
se tomariam mais tarde o Primeiro Mundo também tenha con-
80
75 •······· ······ SG e domínio dos EUA .. tribuído para isso. Depois de 1918, houve uma breve queda da
desigualdade global, causada por aquilo que - considerando
70
o espectro amplo aqui estudado - se mostra como um desvio
65
RTe
temporário entre a Primeira Guerra e a Grande Depressão,
60 · · • · ~········ ····· Grande Depressão
ascensão quando a renda no Ocidente deixou de crescer.
55 ······· da Ásia
RI e ascensão Depois do final da Segunda Guerra Mundial, a desigualdade
50 ········do Ocidente
global se manteve em seu nível mais alto, com cerca de 75 pontos
45
Gini, permanecendo nesse patamar elevado até a última década
40
do século XX. Nesse período, a defasagem entre o Ocidente e a
35
Ásia - em especial China e Índia - não aumentou devido à inde-
30
1800 1850 1900 2050
pendência da Índia e à Revolução Chinesa, que estabeleceram as
1950 2000
bases para o crescimento desses dois gigantes. A partir daí, desde
Ano
o fim dos anos 1940 até o começo dos anos 1980, esses dois países
PG = Primeira Guem; SG = Segunda Guerra; RI = Revolução Industrial; RT = Revolução tecnoló- mantiveram suas posições relativas diante do Ocidente. Mas essas
gica de informática e comunicaçõe.. FONTES: Os dados de 1820-1980 se baseiam em Bourguignon
e Morrisson (2002), com seus PJBs per capita substituídos por novos dados do Maddison Project
posições eram altamente distorcidas em favor dos países ricos: o
(loi8). Os dados de 1988-1001 se baseiam em Lakncr e Milanovié (2016), com atualização minha- PIB per capita tanto da Índia quanto da China representava menos
Todas as rendas estão em dólares de PPC (Paridade do Poder de Compra) de 2011 - o último lcvan·
do que um décimo daquele dos países ocidentais.
Umento do lnternationat Comparison Project até o momento cm que escrevo este livro é de 1018·
Para mais detalhes técnicos, ver Apêndice C. A defasagem na renda começou a mudar dramaticamente
depois dos anos 1980. As reformas na China leva.r am a um cres-
cimento de cerca de 8% per capita por ano ao longo de quarenta
Antes da Revolução Industrial do Ocidente, a desiguald~de
anos, reduzindo bastante a distância do país em relação ao Oci-
global era moderada, e quase que a maior parte dela se devia ª
dente. O PIB per capita da China, hoje, representa entre 30% e
diferenças entre a renda das pessoas que viviam num mesmo
35% do nível do Ocidente, a mesma diferença que havia em tomo
país e a renda média das pessoas de diferentes países. Com ª
de 1820, mostrando uma tendência nítida de que continuará a
ascensão do Ocidente, isso mudou radicalmente. A desigualdade
IS
14
~ tr lt ffl •_,-in
...""\....
IO Qc-idcntt); e: prowvelmc:nte ~tcU1r:i Uti-
• .. ,.,
. IDOffl(fllO cm qut a ttncb cht-pr a um ~ I S:imibr. América do Norte, a}udando. a.ulm. a diminuir ainda maJJ a
* Àº m-ol~ cconómlc.l . n.a Ch'. 1n.a st'8Ulr.un•se
. acc.lcraç6c, deslgualcbde gloNJ. (Há uma grande incôpúu. portm. que lo
de ~ mc:.nto n.a indb. "f:'ilàndia, lndo~sia e ou. destino da ÁJ.rk-a. que até o mmm-nto mo vm, acompanhando o
mundo rico e cuja popu.laçlo é a que Cff.'.JCC mal, rapidamente.)
ttc» ~ s A.,i.J. Embora esse crc:,amc:nto tenha sido acorn.
O novo b~anccamento econõmko do mundo n1o 6 apc •
nb:ado de u.m aumento d.l de,igualdade dentro de cada wn
nu geográfico. Ê também político. O IUCCJIO económico da
~ ~ (cm espec.iaJ na China). o fim da delas-agem crn
China põe abaixo a c.renç~ ocidental de que nllte uma Up
t t ~ ao Ocl«nle ajudou a diminuir a desigualdade de re:n(b
ção obrigatória entre capitalismo e democracia liben.L A ri,or,
CJD tcnnot J)obm. Ê o que esd por tm da queda recente do
esu crença vem sendo derrubada dentro do próprio Oc.ide:nte
tncfi«GiniJlobal. através doa desa:tio. lançadot à democracia liberal pelos popu•
Ac ~ enuc a renda na Âm e a renda do Ocidente tismos e pela plutocracia.
ocomu durante outra revolução tec.noJógica. a cb tcc:noJogb cb O novo balanceamento do mundo coloca a experi~ncia ui.á•
e cb comunicação (TIC) - uma revo1ução na pro• tica na vangJ,W'da do penumento sobre desenvolvimento eco-
duçjo qut. dcSA favoreceu a Á.tia (o assunto será abordado nômico. O sucesso eeonômico da Ásia tornará o seu modelo
mais ad:ia.otc. no capítulo 4). A revolução TlC contribuiu não mais atraente para outros países. podendo induzir ao surgi·
apems pm uma maior rapidez do crescimento da Ásia, mas mento de novas vi.sões sobre desenvolvimento e crescimento
wnhê.m pm a des.lndustrialização no Ocidente. que. por sua económicos. de maneira não muito diferente <bquela.s com que
IU. NO dife.re muito da desindustrialização que aconteceu a experiência britânica e Adam Smith. que se ínspirou nessa
m Índi.i durante a Revolução Industrial. Temos, assim. dois experiência. ín.Ouenciaram o nosso pensamento ao longo dos
pcrfodos de rápidas mudanças tecnológicas que marc.ara.m a últimos duzentos anos.
t:'VOluçlo da desigualdade global (ver Figura 1.1). Os efeitos d2
Nos últimos quarenta anos - com exceção de dois anos - ,
os cinco maiores países da Ásia, juntos (excluindo-se a China),
rnolução TIC aincb não se encerraram. mas já é possível atinmr
reglstraram tuas de crescim.ento per capita mais elevadas do
eles ÀO. em vários aspcctos, semelhantes aos da Revolu·
que as das economias ocidentais, e é improvável que essa ten-
ção lndustrw: uma ampla recomposição do ranking mundial
dência se altere. Em 1970, o Ocidente foi responsável por 56%
da obtençio de renda. com alguns grupos avançando e outros da produção mundial e a Ásia (incluindo o Japão), por apenas
rttw.odo. somada a u.ma concentração geográfica bastante ex· 1
19%. Hoje, essas proporções são de 37% e 43%. Podemos verifi-
P~va de ganhadores e perdedores. car essa tendência claramente comparando os Estados Unidos
E interessante pensar nessas duas revoluções tecnológicas com a China e a Alemanha com a Índia (Figura 1.2). A nítida as-
~mo iimge.ns espelhadas uma da outra. Uma levou a um cres· censão da Ásia durante a era.da globalização se reflete no apoio
CUDento da desigualdade global por meio do enriquecimento popular à globalização, que é muito forte na Ásia, notadamente
do Ocidente· a tra
· • Ou a uma • .
convergenc1a da renda entre aJil· no Vietnã (onde 91% das pessoas entrevistadas acreditam que
Pb.sre ·· do · ·
Deve: gJocs mundo por meio do enriquecimento da As1ª· a globalização é positiva), e muito fraco na Europa, em espe-
2
se tnos esperar que os níveis de renda acabem por se tornar cial na França (onde o apoio à globalização é de apenas 37°/4).
melbantcs entre O con1unto
• • , u· o e a
do continente Euroas1a e
rJ
16
,___u.plbal
ao ,. 1
,-ceatualdoa Eatlldoa Ua.ldoe
(j Of.)c dl ANeanha da lndla (j lllr,), 19$0-Jott,
••au...
certa Ironia, aquele cari ter duplo de mulw economw em de-
senvolvimento vem diminuindo com a ,ua plena incluaão no
sistema globalizado du c•deiu de abastecimento.
.., 40
Os dois tipos de capitafüimo, o mcritocrátk o liberal e o
político, parecem agon competir entre li. Ele, alo liderados.
l· 1 lO
rcspectivamente, pelos Estad01 UnJdos e pela Chi.na. Mu, in-
depcmdentemente da vontade da China de tomar disponível
l\/.A i e "exportar" ou não uma vcrd o política e. em certa medi~
!1 'l 20
t» econômlca alternativa de capitalismo, o capitalismo político
contém algumas características que o tornam atraente para
j. _J · 1•:i_~
as elites políticas do restante do mundo, e não apenas m Ásia.
pois esse sistema proporciona uma autonomia maior para elas.
E se torna atraente também para muitas pessoas comuns, por
º---------
1'40 1'60 1'80
Arto
zooo 2020 1')40 1960 1980
Mo
2000 20'20

causa das elevadas taxas de crescimento que parece prometer.


Por outro lado, o capitalismo liberal possui muitas vantagens já
conhecidas, sendo a mais importante delas a de que a democra-
cia e a prevalência do estado de direito constituem valores em
l'Olt'1:II W...c._ ._ no a..co Mlllldial, World Onciop-na lndlcaton, 1017, si mesmos, e ambos, cm tese, podem ser vistos como respon-
- • - , - a , I Q ~ cmdóbrc, r,c:,
sáveis pelo impulso de um desenvolvimento econômico mais
rápido, promovendo a inovação e a chance de mobilidade social,
e proporcionando com isso quase as mesmas oportunidades
O mal-estar causado no Ocidente pela globalização se deve, de sucesso para todos. É a negação de alguns aspectos cruciais
em parte, à distância existente entre as elites, que se deram desse sistema implícito de valores, sobretudo o movimento
muito bem, e um número significativo de pessoas que se be· de criação de uma classe alta que se autoperpetua e a polariza-
neficiaram muito pouco da globalizaçào, ressentem-se dela e, ção entre as elites e o restante da população, que representa a
com ou sem razão, veem o comércio e a migração global como ameaça mais importante à viabilidade do capitalismo liberal a
a causa de seus males (ver capítulo 4). Essa situação lembra, es· longo prazo. Essa ameaça é um perigo tanto para a sobrevivên-
tranhamente, a dos países do Terceiro Mundo nos anos 197°, cia do próprio sistema quanto para a atratividade geral desse
modelo aos olhos do restante do mundo.
que também tinham esse duplo caráter: a burguesia conecta~
O Nos próximos dois capítulos, abordarei os aspectos princi-
com sistema econômico global e a maioria dos cidadàos dei·
pais dessas duas variantes do capitalismo moderno, centrando-
xada para bis. A "doença" que deveria afetar apenas os países
5 ·me mais nas suas características inerentes do que nas suas
em de envolvimento (o que era chamado de "desarticulação"
distorções temporárias. Ter em mente a diferença entre traços
na litcritura neomarxista) parece ter se deslocado agora para
o Norte atinaindO , . e com sistêmicos e traços pontuais é essencial quando se quer estudar
' o-o os paISes ncos. Ao mesmo tempo,
19
18
a evolução a longo,~razo d~ capitalis~o °?eritocrático liberal e
do capitalismo pohtico, e nao suas. .oscilaçoes
,. passageiras.
. Trato,
em particular, das estruturas so~1ats e econ~m1cas reproduzidas
pelos dois sistemas, em especial seus efeitos nas questões de
desigualdade de renda e estrutura de classes. A maneira como
os dois sistemas lidam com essas questões será determinant
acredito, para sua relativa atratividade e estabilidade. E, cons::
quentemente, para definir o nosso desejo de viver sob as regras
de um ou de outro.
20

Você também pode gostar