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O APOCALIPSE

Escreve, pois, as coisas que viste, e as que são, e as que


hão de acontecer depois destas (Ap 1:19)

Comissão Teológica da Igreja Adventista da Promessa


e Departamento de Educação Cristã

1
INTRODUÇÃO
O livro de Apocalipse é um livro sobre Jesus e sua igreja. É conhecido,
também, como “Apocalipse de João, o apóstolo”, por que o seu autor se refere a
si mesmo em quatro ocasiões no texto, identificando-se como João (Ap 1:1, 4, 9;
22:8). Este autor era tão bem conhecido por seus leitores e sua autoridade
espiritual era tão amplamente reconhecida que ele não precisou apresentar suas
credenciais apostólicas. Todos sabiam muito bem quem ele era! Por isso, não é
de estranharmos, que a antiga tradição eclesiástica tenha atribuído a autoria
deste escrito sagrado ao apóstolo João.
Sabe-se que o Apocalipse foi escrito durante um período em que cristãos
enfrentavam uma terrível perseguição por parte do Império Romano. Esta
perseguição, provavelmente, teve seu início ainda no tempo do imperador Nero,
quando este incendiou Roma em 64 d.C e depois colocou à culpa nos cristãos.
Desde então, o povo do caminho se viu diante de um dos seus piores algozes,
isto é, a rejeição e a intolerância do império com relação à fé cristã. Assim,
sofrimentos, ameaças, agressões, prisões, martírios foram se tornando bem mais
intensas e severas para aqueles irmãos, no decorrer dos anos. O que resultou na
morte de quase todos os apóstolos, com uma exceção, João.
O mais provável é que o apóstolo tenha escrito o livro entre os anos 90 e
96 d.C., já durante o reinado do imperador Domiciano, que também foi um dos
piores perseguidores da igreja. Sabe-se que este tomou para si o título de
“Senhor e Deus”, exigindo dos seus súditos adoração. Por isso, nem é preciso
explicar o quanto os cristãos fiéis sofreram neste tempo. João, por exemplo, foi
banido para a ilha de Patmos, uma espécie de prisão natural para criminosos e
inimigos do império. Ele escreve: Eu, João, irmão vosso e companheiro na
tribulação, no reino e na perseverança, em Jesus, achei-me na ilha chamada
Patmos, por causa da palavra de Deus e do testemunho de Jesus (Ap 1:9).
Tente imaginar a situação daqueles cristãos. Se não bastasse todo
sofrimento ao verem seus pares morrendo por causa da fé em Cristo, agora, tem
o seu principal pastor exilado, afastado do convívio deles e colocado para morrer
numa ilha. Até o crente mais maduro pensaria em desistir. Até mesmo o cristão
mais convicto chegaria a duvidar por um instante. Pois, parece não haver
esperança para a igreja. Parece que o mal está vencendo. Parece que Diabo está
no comando e que Jesus perdeu controle das coisas. Parece até que a história é
um trem descarrilado e que Deus já não tem mais domínio sobre ela. Parece que
o Senhor esqueceu o seu povo e que Jesus não volta mais. Parece que tudo está
perdido. Mas só parece! Pois lá na ilha de Patmos, Jesus Cristo mostrou a João o
que, de fato, aconteceu, o que está acontecendo e o que ainda iria acontecer (Ap
1:19), e depois ele escreveu tudo no livro.
O texto de Apocalipse começa assim: Revelação de Jesus Cristo, que
Deus lhe deu para mostrar aos seus servos... (Ap 1:1). A primeira palavra que
aparece é “Revelação”, e é a tradução do termo grego apokalupsis, que é de

2
onde vem o nome do livro. Esta palavra que dizer que Jesus estava “tirando o
véu” que cobria a percepção da verdadeira história e que ele estava, também,
trazendo discernimento para seu povo sobre determinados fatos e mistérios
vindouros. O tema do livro de Apocalipse é a vitória de Cristo e de sua igreja
sobre Satanás e seus seguidores. Tinha como propósito principal trazer
esperança aos cristãos, de maneira que estes fossem motivados a perseverar na
fé. É uma exortação à perseverança! Tanto é verdade que um dos versículos
centrais é este: Venho sem demora. Conserva o que tens, para que ninguém
tome a tua coroa (Ap 3:11).
A intenção do livro é claramente a de mostrar que as coisas não são como
parecem ser. Tanto a igreja, quanto a história estão sob o total controle de Jesus
Cristo. O mal não está vencendo. Na verdade, o diabo, o mundo, o anticristo, o
falso profeta e todos os ímpios perecerão, mas a igreja triunfará. Em Apocalipse
vemos Cristo sempre como o vencedor e conquistador sobre todas as coisas. Ele
vence a morte, o mundo, o inferno, o dragão, a besta, o falso profeta, a babilônia
e os ímpios. Cristo é Senhor sobre tudo e todos!
Pois bem, se o Apocalipse tem tema, intenções e propósitos assim tão
claros, por que é tão difícil compreender esse livro? Se o nome dele significa
“revelação”, por que ele continua sendo, em grande parte, um enigma para nós?
Para começar, uma questão a ser considerada é que o livro tem um estilo literário
peculiar, que é diferente de todos os demais escritos do Novo Testamento. Este
estilo é chamado pelos biblistas de “literatura apocalíptica”, algo que era bastante
comum entre os judeus que viveram na parte final do período interbíblico e no
primeiro século da era cristã. Outra questão importante é que esta revelação foi
dada por meio de símbolos: candeeiros, selos, trombetas, taças, etc.
Há quem diga que um dos motivos para o uso desses símbolos era,
justamente, para que perseguidores da igreja não entendessem a mensagem do
livro. Porém, tudo indica que aqueles cristãos, que foram os primeiros leitores,
compreendiam sem dificuldade esses códigos e sabia claramente o que eles
significavam. No entanto, é um desafio para nós, cristãos do século 21,
compreender essa linguagem apocalíptica do primeiro século. Mas não um
desafio impossível. Como sabemos, a Bíblia interpreta a própria Bíblia e se o
Apocalipse for interpretado à luz de toda Escritura, ele pode sim ser desvendado
mais uma vez.
Só que não podemos nos iludir, achando que esta seja uma tarefa simples.
Por esta razão, a Comissão Teológica da IAP se debruçou sobre este livro nos
anos de 2010 a 2013, através de encontros, estudos e debates, para encontrar
uma interpretação coerente. Foi um trabalho árduo, mas muito abençoado, feito
com muito temor e tremor e regado por orações. A equipe de escritores do DEC –
Departamento de Educação Cristã foi responsável pela preparação dos textos,
que agora estão passando pela análise e aprovação da Câmara Teológica. E
assim, pela graça e para glória de Deus o resultado de todo este trabalho está
chegando às mãos dos promessistas.

3
A proposta deste estudo é bastante modesta, pois não temos pretensão de
explicar todos os detalhes do livro. A intensão é apenas escrever em linhas gerais
aquilo que pensamos sobre o Apocalipse. Será um comentário promessista, em
que vamos nos concentrar apenas nas questões que causam mais dúvidas e
polêmicas. As sete igrejas do Apocalipse são igrejas reais e históricas ou são
“eras” da história eclesiástica? Quem é a besta? O que é o sinal da besta? Quem
são os 144 mil assinalados? Quem são duas testemunhas? Que livrinho é este?
O que é a grande tribulação? Onde e como será o milênio? Estas, são algumas
das perguntas que procuraremos responder nesta obra.
Neste processo de produção algo que nos chamou a atenção foi o uso
elevado dos “numerais” de forma simbólica em Apocalipse. Sobretudo o número
sete, que aparece, de forma explícita, 54 vezes. Sete, é o número da perfeição,
da plenitude. Ficamos ainda mais impressionados ao descobrir que,
propositalmente, este livro bíblico é dividido em sete blocos, e cada bloco é
composto por sete elementos, que são: sete igrejas, sete selos, sete trombetas, e
assim por diante. E decidimos adotar essa estrutura natural como esboço do
nosso texto. Pois são divisões que, em sua maioria, estão bem claras pelo uso
deste número. Mas até mesmo nos blocos em que não temos explicitamente o
número sete, basta uma leitura cuidadosa que o encontraremos lá.
É o que acontece nos capítulos 12 a 14 de Apocalipse, em que a
expressão mais forte e mais repetida é “Ouvi uma grande voz” ou simplesmente
“ouvi”. Conte e você verá que são sete vezes que ela aparece. Por isso,
chamamos esse bloco de “As sete vozes celestes”. O mesmo ocorre em
Apocalipse 17 a 19, em que a expressão que se repete é “vi” ou “eu vi”; conte e
você verá que são exatamente sete. Este bloco é chamado de “As sete visões do
julgamento”. É o que também acontece em Apocalipse 20 a 22, em que esta
mesma expressão se repete sete vezes e por isso, este bloco pode ser chamado
de “As sete visões da consumação”.
Isso é apenas uma amostra do quanto este último livro da Bíblia é
fantástico. E não podemos esquecer que embora tenha sido, incialmente,
endereçado aos cristãos perseguidos na época do apóstolo João; é, também,
destinado aos cristãos de todos os tempos. Este livro foi escrito para ser lido e
compreendido por nós também.

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CAPÍTULO 1
CARTAS DE AMOR ÀS IGREJAS
Os setes candeeiros

A primeira seção de Apocalipse vai do capítulo 1 até 3. Faremos, aqui, uma


abordagem panorâmica dela. Esta primeira parte serve para nos nortear em toda
a leitura do livro e nos ajuda a enxergar como acontecerá todo o desenrolar da
história. Esta seção é também chamada de os setes candeeiros, por que o texto
apocalíptico dá um destaque às cartas de amor que o Cordeiro enviou a sua
Noiva, que é representada pelas sete igrejas da Ásia Menor. Percebemos que,
apesar dos "pontos difíceis de entender", o livro mostra-se em sua apresentação
de maneira clara, como uma "revelação" completa para os últimos dias, antes da
volta de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.

a. “prólogo” do livro

Revelação de Jesus Cristo... É assim que começa o livro do Apocalipse. O


nome do livro vem de uma palavra grega apokalypsis e tem os seguintes
significados: descoberta, aparição, manifestação, ser revelado, revelação 1. Veja
que o significado de seu nome é bem esclarecedor e sugere uma amostra das
coisas que acontecerão nos últimos tempos antes da volta de nosso Senhor
Jesus. Algumas pessoas tem medo deste livro, pois hoje “(...) infelizmente é
sinônimo de caos e catástrofe”2. Mas aprendemos que o significado do nome
Apocalipse nada tem a ver com esta crença popular.
Embora com sua linguagem de difícil compreensão em algumas partes,
devido seu simbolismo, “neste livro, o Espírito Santo abre as cortinas e dá o
privilégio de ver o Cristo glorificado no céu e o cumprimento de seus desígnios
soberanos no mundo”3. E esta revelação feita por Jesus foi dada por Deus Pai,
como está escrito: ... que Deus lhe deu... (Ap 1:2b), afinal, tudo o que Jesus diz
vem de seu Pai (Jo 15:15). A mensagem de Cristo aqui é: ...mostrar aos seus
servos as coisas que em breve devem acontecer e que ele, enviando por
intermédio do seu anjo, notificou ao seu servo João (Ap 1:1c).
Como já foi dito, João é o autor do livro do Apocalipse, foi a ele que Jesus,
por intermédio de um anjo, revelou os momentos finais da história humana. O
apóstolo encontrava-se na Ilha de Patmos, para onde havia sido exilado por
causa da fé cristã. Esse fato ocorreu por volta de 90 d. C. no reinado de
Domiciano. João recebeu a palavra de Deus e o testemunho de Jesus (v.2), para
que todos os servos de Deus, de todos os tempos leiam, ouçam, guardem, as
palavras desta profecia ...pois o tempo está próximo. (v.3)
No v.4 deste livro, o servo de Deus, cumprimenta as sete igrejas da Ásia. O
tradicional “Graça e paz” mostra os sentimentos desejados a cada comunidade
cristã. Essa “Graça e paz” são vindas: de Deus ...daquele que é... “(...) uma
alusão à forma grega de Êx 3.14. A frase toda denota a eternidade de Deus que

1
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:2083).
2
Wiersbe (2006:721).
3
Ibden.
5
também age no palco da história humana.” 4. Além do Pai, o texto se refere ao
Espírito Santo.
A frase “Graça e paz” também vem ...dos sete Espíritos que se acham
diante do seu trono. Aqui: “presume-se que seja o Espírito Santo único (...), mas
dito sete para indicar seu ministério nas sete igrejas e através delas” 5. Esta
linguagem mostra o Espírito: “(...) não sete em número, nem em natureza, mas o
infinito e perfeito Espírito de Deus, em que há diversidade de dons e operações”. 6.
O texto pode está descrevendo a ação do Espírito sobre a vida da igreja; pode ser
sete símbolos do Espírito; pode significar ainda a ação perfeita e multiforme dele.
Como disse Isaias: Repousará sobre ele o Espírito do SENHOR, o Espírito de
sabedoria e de entendimento, o Espírito de conselho e de fortaleza, o Espírito de
conhecimento e de temor do SENHOR (Is 11:2).
Este trecho de apresentação aos destinatários encerra-se falando de Deus
Filho. Descrevendo o Senhor como a fiel testemunha, o primeiro na ressurreição
dos mortos glorificados, e o soberano sobre os reis da terra (v.5). Ele nos ama, e
por seu sacrifício na cruz, limpou os nossos pecados, nos tornando próximos de
Deus, por toda a eternidade (v.6). O v.7 descreve a segunda vinda de Cristo: Eis
que vem com as nuvens, e todo olho o verá, até quantos o traspassaram. E todas
as tribos da terra se lamentarão sobre ele. Certamente. Amém!
O inicio do v.7, Eis que vem com as nuvens, e todo olho o verá..., quer
dizer que Todos o verão o Senhor. Sobre isso John Stott acrescenta: “Sua vinda
será um evento histórico que de algum modo será simultaneamente glorioso (...),
(...) visível (nossos olhos o verão) e universal (‘(...) todo olho o verá’, tanto
penitentes como de impenitentes)” 7. E George Ladd, comentando a expressão do
texto ...até quantos o traspassaram..., acrescentando assim que: “(...) não
precisamos interpretar isto como sendo unicamente para os que crucificaram
Jesus fisicamente, mas para todos (...), em todos os tempos (...) [que] são da
mesma forma indiferentes e hostis (...)” 8.
A frase bíblica ...até quantos o traspassaram..., significa: verão Jesus,
santos ou ímpios, por ocasião da segunda volta de Cristo, e os ímpios que
morreram e não ressuscitaram na ressurreição dos santos, no juízo final O verão,
por ocasião da segunda ressurreição (Ap 20:5-6), após o milênio. Não importa se
em atitude adoração verdadeira ou de reconhecimento revelado pelos os últimos
fatos da história todos reconhecerão a Cristo, como diz a palavra: para que ao
nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda
língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai. (Fp 2:10-11)

b. O “dia do Senhor”
O cenário das visões apocalípticas é a ilha de Patmos que como já vimos,
era um lugar para onde prisioneiros eram exilados, entre eles, os que pregavam a
Jesus como o Senhor, no caso o apóstolo (Ap 1:9). É neste exílio, que João tem a
revelação dada por Jesus sobre as últimas coisas. O detalhe do v.10 que mais
salta aos olhos é a frase: ...no dia do Senhor. Sobre este trecho existem várias
interpretações. Iremos citar algumas. Há os que pensam no “dia do Senhor” como
“dia escatológico”.
4
Ladd (1986:21).
5
Stott (2006:186).
6
Henry (2008:960).
7
Stott (2006:186).
8
Ladd (1986:24).
6
A respeito deste “dia escatológico” seria “(...) como se João fosse
transportado em êxtase até o fim da história para presenciar os grandes
acontecimentos daquele dia”9. Outra teoria seria a seguinte: “(...) visto que um dia
em cada mês era designado ‘Dia do Imperador’, João pode estar apresentando o
dia do Senhor como um contraste.”10. Há os teólogos que defendem a literalidade
do dia. Dizem que é um dia semanal, como afirma Geord Ladd: “É muito mais
provável que temos aqui a maneira que os cristãos começaram a distinguir o dia
do Senhor como dia separado para o culto e devoção” 11.
A maioria dos estudiosos apoia a ideia da literalidade deste dia. Como diz
D. A. Carson: “(...) Assim, em 1.10, João também estabelece uma ligação
temporal; recebe suas visões no dia em que as igrejas se reúnem para o culto
congregacional (...)”12, e complementa: “(...) nesse mesmo dia, sua profecia deve
ser lida em voz alta (1.3) na reunião da igreja.” 13. Entendemos, este dia como
sendo literal. Porém, os estudiosos bíblicos erram quando afirmam que este “dia
do Senhor” é o primeiro dia da semana, ou seja, o domingo.
Em toda a palavra de Deus o “dia do Senhor” é o sábado. Em Gênesis 2, a
culminante e perfeita obra executada em seis dias pelo Deus Triuno, termina com
um deleitoso “olhar” para sua obra, em um sábado: “E abençoou Deus o dia
sétimo e o santificou (2:3a). Warren Wiersbe14, falando sobre este texto aponta
três coisas que diferenciam o sétimo dia dos demais. Em primeiro lugar, em
Gênesis, a expressão “tarde e manhã” não é associado ao sétimo dia, o que
mostra a atemporalidade deste dia.
Em segundo lugar, nenhum outro dia da semana, recebeu o tratamento
dado por Deus como o sábado. Este dia é uma benção para o homem. Em
terceiro lugar, Deus santificou este dia, isso significa que o separou para objetivos
especiais. O Novo Dicionário da Teologia 15 diz que: “(...) o sábado é uma
‘ordenança da criação’, ou seja, tem por base o ato de Deus de abençoar,
santificar e ele mesmo descansar no sétimo dia da criação (Gn 2.3...)”.
Cremos que o sábado é o dia do Senhor, porque ele está na lei moral de
Deus, resumida nos Dez Mandamentos. É dito sobre este dia: Lembra-te do dia
de sábado, para o santificar. (Êx 20:8) Ainda falando sobre o sétimo dia, O Novo
Dicionário da Teologia16 diz que como argumento forte a favor do sétimo dia: “(...)
o mandamento do sábado, por ser incluído no Decálogo (Êx 20.8-22; Dt 5.12-15),
é parte permanente da lei moral de Deus”, ou seja, este dia continua válido para
os cristãos.
Por ser a lei moral de Deus (os Dez mandamentos) são validos para todos
os povos, de todos os tempos. É então inconcebível afirmar que o sábado era
uma observação obrigatória só para os judeus. Em Isaías, encontramos um texto
sobre isto. A palavra diz: Quanto a essas pessoas de outros povos que se unirem
ao SENHOR e o servirem, guardando o sábado, deixando de profaná-lo e para se
apegarem à minha aliança (56:6). Veja que este texto descreve que estrangeiros
9
Ladd (1986:26).
10
Allen (1985:306).
11
Ladd (1986:26).
12
Carson (2006:250).
13
Ibden.
14
Wiersbe (2006:21).
15
Ferguson (2009:883). Embora esses argumentos sejam a favor da opinião que o domingo seria
um “sábado cristão” e não que o sétimo dia seja um dia de guarda, entendemos que os
argumentos podem ser usados em favor do sétimo dia.
16
Ferguson (2009:883).

7
eram aceitos no povo de Deus e demonstravam por meio da guarda do sábado
seu comprometimento com a aliança divina. Além do mais em Is 56:4, Deus diz
“meus sábados”, aqui numa referência ao sétimo dia da semana, ou seja, o dia do
Senhor é sim o sábado, pois pertence a ele! O sábado é propriedade Sua!
Existem outros textos no Antigo Testamento que mostram a unanimidade
sobre o sábado ser o dia do Senhor, mas estes que citamos já nos dizem muita
coisa. Vamos agora para as evidências sobre o sábado no Novo Testamento. A
afirmação evangélica de Mateus é um forte indicativo de que o sábado é o dia do
Senhor: Porque o Filho do Homem é Senhor do sábado. (12:8). Este texto trata
primariamente sobre o senhorio de Jesus em relação ao sábado. Por ser
soberano, Jesus pode dar novo significado ao dia. De maneira alguma podemos
associar Mt 12:8 com uma mudança nos mandamentos. Aqui Jesus está
resgatando o verdadeiro significado do sétimo dia.
Um comentarista bíblico descreveu a postura de Cristo em relação ao
sábado: “Jesus, como Senhor do sábado, não só o honrava assistindo
regularmente aos cultos na sinagoga nesse dia (...) [mas também] o honrava
realizando atos de misericórdia e curando nesse dia (Lc 12.9-14...)” 17. Para Jesus
o sábado era válido. Ele não o guardou num sentido abolitivo mais de maneira
exemplar, para os cristãos.
Lucas confirma essa prática de Jesus: indo para Nazaré, onde fora criado,
entrou, num sábado, na sinagoga, segundo o seu costume (...) (4:16). O Doutrinal
diz: “[A prática de guardar o sábado] (...) pode ser comprovado à luz de outras
passagens bíblicas (cf. Mt 12:9-10, 13:54; Mc 1:21, 3:1-2, 6:2; Lc 4:15-16, 31, 6:6,
13:10; Jo 18:20)”18. Mesmo que os que são contrários a guarda do sábado, tentem
torna-la inválida por falaram que Cristo tirou a importância deste dia, isto não é
verdade, pois “(...) ele [não] questiona a validade do mandamento, mas as sua
distorções. Por ser Senhor do sábado, Jesus apresenta o verdadeiro sentido
deste mandamento (...)”.
Ainda nos evangelhos, Lc 23:56, nos dá um belo exemplo,
neotestamentário da observância do sábado, após a morte de Cristo: E, no
sábado, descansaram, segundo o mandamento. (v.56b) O texto fala das mulheres
que iriam visitar o túmulo onde o corpo de Jesus fora colocado, mas só fariam
esta “visita” para levar “bálsamos e aromas” (v.56a), após descansarem no
sábado. Este texto afirma que o sábado moral foi praticado pelas mulheres
mesmo depois da morte do Senhor, mostrando que o argumento que diz, que
após a morte de Jesus o sétimo dia perdeu a validade não é certo. Com certeza,
elas haviam entendido que o sábado, presente nos mandamentos, não havia
passado.
Quando se trata da igreja primitiva, temos pela Bíblia, com mais facilidade
a guarda do sábado do que o domingo, como sendo o dia do Senhor: “(...) O
sábado foi observado pelos apóstolos (At 13.14. 15; 27; 42-22). O sábado foi
observado mesmo onde não havia sinagoga (At 16.12-15). (...) E em Tessalônica
e Corinto (At 17.1,2; 18.1-4,11).” 19 Pelo fato da igreja primitiva desenvolver suas
atividades no sábado, é ilimitadamente provável que este dia era o dia escolhido
para adorarem a Deus, imitando o seu Cristo, que tinha o costume de guardar o
sétimo dia, tanto na sinagoga como fora dela, assim como a igreja apostólica

17
Hendriksen (2001:18)
18
O Doutrinal (2012:202).

19
Rudimentos da Doutrina cristã (2011:101).

8
reunia-se no sábado, e Paulo em uma cidade sem sinagoga continuava na
observância deste dia (c.f. At 16:13-15).
O sábado além de ser um dia de descanso para os cristãos primitivos, é
usado como ilustração do descanso salvífico e eterno. Em Hebreus 4:4: ...em
certo lugar, assim disse, no tocante ao sétimo dia: E descansou Deus, no sétimo
dia, de todas as obras que fizera. Aqui “(....) o autor passa a usar o sábado como
exemplo deste descanso de fé”20, para explicar que Jesus é nosso descanso.
Temos “aqui, portanto referencias inegáveis sobre o quarto mandamento (Êx
20:8-11).”21 Embora aqui “(...) o autor não esteja preocupado em defender a
guarda do sábado, até porque isso não era problema para aqueles judeus
cristãos.”22
O sábado é usado para exemplificar o descanso pela fé em Jesus Cristo,
mas “para ilustrar esse ensino, o escritor, como um habilidoso professor, usou
algo comum àqueles irmãos, isto é, o descanso no sétimo dia.” 23. Cremos, porém,
que mesmo o sentido do sábado, neste caso não sendo normativo, “(...) a forma
como o sábado é citado aqui deve levar-nos a refletir mais profundamente sobre o
seu significado e sobre os motivos para guarda-lo.” 24.
Os próprios teólogos sentem extrema dificuldade de provar biblicamente a
mudança do sábado para o domingo. D. A. Carson, por exemplo, afirma: “(...) é
preciso reconhecer que os documentos do Novo Testamento não fornecem
qualquer evidencia direta [para crer no domingo como dia de guarda].” 25. As
explicações de defesa da guarda do domingo só são de origem interpretativas e
históricas, mas não de provas bíblicas claras. Pelo que nos diz o Antigo e Novo
Testamento, a única possiblidade para o “dia do Senhor” é o sábado!

c. A visão do “filho do homem”

Em Apocalipse 1:13-16 João vê aquele que falava com ele. Aquele que lhe
mandou escrever às sete igrejas da Ásia (v.11-12). O velho pastor volta-se para
trás, ao ouvir grande voz, e depara-se com um ser semelhante ao filho do
homem. Com toda certeza uma visão da pessoa de Jesus, pois ele é aquele que
revelas todas as coisas sobre o fim dos tempos a João. Vejamos então as
características de Cristo nesta visão que o apóstolo teve.
Primeiro: O Cristo homem: ...e, no meio dos candeeiros, um semelhante a
filho de homem (v.13a). Nesta expressão: “está em foco a pessoa de Cristo,
segundo o simbolismo do A.T., o que se vê, por exemplo, em Dan. 7.13, onde se
lê sobre ‘Filho do homem’ (um símbolo messiânico).” 26 Segundo: vestes talares e
cingido, à altura do peito, com uma cinta de ouro. (v.13b). Sobre esta parte do
v.13, o comentário bíblico popular 27, fala que: “Suas vestes externas eram
talares, isto é, longas como a beca de um juiz. A cinta de ouro ao redor do peito
simboliza a justiça e fidelidade do seu julgamento (cf. Is 11:5).”
Terceiro: João descreve alguns aspectos “físicos” do Cristo glorificado. O
texto diz: A sua cabeça e cabelos eram brancos como alva lã, como neve...
20
Lições Bíblicas (2012:37).
21
Ibden.
22
Idem (2012:38).
23
Ibden.
24
Ibden.
25
Carson (2006:245).
26
Champlin (1983:379).
27
MacDonald (2008:995).

9
Segundo John Stott: “(...) era a descrição do ‘Ancião de Dias’, ou seja, do próprio
Deus, feita por Daniel (Dn 7.9). Agora transferida para Cristo, ela mostra que a
figura humana era também divina.” 28 O texto continua: ...os olhos, como chama de
fogo... representa Cristo com: “(...) seu conhecimento perfeito, discernimento
infalível e escrutínio inescapável.”29
O texto ainda fala de mais aspectos “físicos” vistos por João, em Jesus:
...os pés, semelhantes ao bronze polido, como que refinado numa fornalha.... aqui
possivelmente representa: “(...) a função judicial de Cristo.” E sua voz é poderosa
porque ....a voz, [era] como voz de muitas águas. Jesus também tem poder e
controle, pois: ...Tinha na mão direita sete estrelas, que como veremos são os
presbíteros das igrejas. Cristo, Trazia em sua boca a Palavra de Deus (Hb 4:12)
“e da boca saía-lhe uma afiada espada de dois gumes.”, da qual daria os
vereditos às igrejas. O Cristo glorificado foi visto por João, pois ...O seu rosto
brilhava como o sol na sua força. (v.14-16)30.
João fica impactado diante da visão gloriosa da pessoa de nosso Senhor e
Salvador Cristo Jesus. Ele cai como morto, fica sem forças diante da glória de
Deus, diante do Santo. E João disse: E eu, quando o vi, caí a seus pés como
morto; e ele pôs sobre mim a sua destra, dizendo-me: Não temas; eu sou o
Primeiro e o Último e o que vive; fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o
sempre. Amém! E tenho as chaves da morte e do inferno. (Ap 1:17b-18)
Cristo por ter ressuscitado, por ter vencido a morte e o sepulcro tem todo
poder sobre ambos, e é esse o significado de “morte e inferno”. A palavra “morte”
aqui em grego é thanatos que significa morte em seu sentido literal ou figurado 31,
neste contexto, porém, esta em voga a cessação de vida. Já a palavra “inferno” é
a tradução da palavra Hades, que pode ser traduzido também por oculto e
significa sepulcro ou sepultura32. O que o Senhor quer dizer quando declara que
tem “as chaves da morte e do inferno”?
Chave significava autoridade (Mt 16:19) 33, portanto, Cristo está dizendo que
tem autoridade sobre a morte (cessação de vida) e poder para ressuscitar os
mortos que estão no inferno, ou seja, na sepultura. Um dia o Cristo que morreu e
foi colocado no Hades, ou seja, no sepulcro, mas depois de três dias ressuscitou
(At 2:27-31), trará de volta a vida em sua segunda vinda, aqueles que creram e
viveram sua mensagem. Como diz a Escritura: Porque, se cremos que Jesus
morreu e ressuscitou, assim também aos que em Jesus dormem Deus os tornará
a trazer com ele. (1 Ts 4:14).

d. As sete igrejas da Ásia


João, o servo de Deus, que recebeu a revelação para os tempos finais, ao
se apresentar em sua saudação no inicio do Apocalipse, especifica seus
destinatários: João, às sete igrejas que estão na Ásia... (v.4). Depois, quando
começa a descrever suas visões em Patmos, no sábado, dia do Senhor, o
apóstolo ouviu uma voz poderosa que dizia: ...O que vês, escreve-o num livro, e
envia-o às sete igrejas: a Éfeso, a Esmirna, a Pérgamo, a Tiatira, a Sardes, a
Filadélfia e a Laodiceia. (v.11).

28
Stott (2006:187).
29
MacDonald (2008:995).
30
MacDonald (2008:995).
31
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:2229).
32
Idem, p.2036.
33
Ladd (1986:28).

10
Na visão espiritual em que João, viu a Jesus tendo na sua mão direita as
as sete estrelas andando por entre os sete candelabros de ouro, é explicado pelo
próprio Senhor o significado de tal visão: Eis o mistério das sete estrelas, que
viste na minha destra, e dos sete candeeiros de ouro: as estrelas são os anjos
das sete igrejas, e os sete candeeiros são as sete igrejas. (v.20). percebe-se que
o número sete é um número simbólico no livro do Apocalipse. George Ladd fala
que: “(...) sete era um dos números favoritos de João, e parece ter sido o símbolo
de plenitude, estar completo. Sete não é número sagrado. O Anticristo tinha sete
cabeças e sete coroas (13:1)”34.
E então o que significa o famoso sete tão presente no Apocalipse? Ladd
conclui: “O significado aqui é diversidade dentro de uma unidade básica” 35. Assim,
as “sete igrejas da Ásia”: “(...) eram sete congregações históricas reais, na
província romana da Ásia.”36 E por sinal eram dez igrejas nesta região. Por este
motivo: “Não há nenhuma indicação nas sete igrejas que elas representem sete
períodos sucessivos da história da igreja.”37 O simbolismo do número sete mais as
igrejas estarem em localidades reais, nos dá a conclusão que: “João escolheu
estas sete igrejas que ele bem conhecia para que elas servissem de
representantes da igreja toda. (...) apesar de ser endereçado (...) o Apocalipse era
[e é] para toda a igreja”.
Na visão, Cristo andava entre os candeeiros de ouro mostrando sua total
interação e presença no meio da igreja. E como cada carta mostrará, o Senhor
está de olho nas igrejas. Ele deseja que cada igreja local progrida para que a
igreja no mundo progrida. Por isso ele fala com cada igreja, através do anjo delas.
Quando Jesus fala em Ap 1:20 que as estrelas são os anjos das sete igrejas, é
um ponto interessante de se analisar. A palavra anjo que aparece aqui é aggelos,
embora não seja usada para se referir a líderes no Novo Testamento 38, pelo seu
significa ser mensageiro, no contexto de apocalipse não se refere a seres
angelicais mais sim aos líderes das comunidades cristãs.
Um comentarista bíblico defende que João escreveu: “(...) cada carta ao
anjo daquela igreja, ao ministro ou, antes, aos presbíteros daquela igreja,
chamados anjos porque são mensageiros de Deus à humanidade” 39. Outro
estudioso esclarece: “Anjos, aqui, devem ser tomados no sentido de pastores,
ministros.”40 Outro especialista bíblico, nos ajuda a entender o significado dos
“anjos das igrejas”: “A interpretação de que os mensageiros às congregações são
seus pastores faz sentido se considerarmos os pastores como enviados e
comissionados por Cristo. São responsáveis pelo desenvolvimento espiritual do
povo de Deus”41.
Devemos nos lembrar de como também eram chamados os sacerdotes no
Antigo Testamento: Porque os lábios do sacerdote guardarão a ciência, e da sua
boca buscarão a lei, porque ele é o anjo do SENHOR dos Exércitos. Embora o
pastor da igreja não seja o equivalente do sacerdote em suas funções no NT, este
texto mostra o sacerdote como o “anjo” do Senhor, ou seja, o seu mensageiro,

34
Ladd (1986:21).
35
Ibden.
36
Ibden.
37
Ibden.
38
Ladd (1986:21).
39
Henry (2008:963).
40
Hendriksen (2001:86)
41
Kistemaker (2004:142).

11
representante. Logo, a melhor interpretação para “anjo da igreja” no Apocalipse é
uma referência ao presbítero da igreja local.
O pastor é aquele que “vela” pela vida das ovelhas, por isso a exortação do
escritor de Hebreus: ... Obedeçam aos seus líderes e sigam as suas ordens, pois
eles cuidam sempre das necessidades espirituais de vocês porque sabem que
vão prestar contas disso a Deus. (13.17 NTLH) O pastor deve então ser bem
preparado para exercer esta função na igreja local. Ele é autoridade na igreja,
uma extensão do ministério de Cristo.
Em cada carta vemos a frase “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz
às igrejas.” que significa: “a primeira parte (...) se refere à capacidade de ouvir, e
uma disposição acompanhante de dar ouvidos. A segunda parte é uma ordem
para ouvir atenta e obedientemente as palavras do Espírito Santo.” 42 Como
sabemos: “Jesus fala através do Espírito, como se faz evidente em outras
passagens da Escritura (Jo 14.26; 15.26; 16.13; At 2.33).” 43 A seguir, vamos à
mensagem às sete igrejas da Ásia.

1. Éfeso: Firme, mas fria (2:1-7):


Sobre a cidade: A cidade em que viviam estes cristãos, “Éfeso estava
situada 96 quilômetros a nordestes da ilha de Patmos, onde o apóstolo escrevia
(...)”44. E ainda mais: “Éfeso era a principal cidade da Ásia, e nela estava a igreja
mais importante de toda província. (...) No primeiro século ela era o porto mais
importante de toda a Ásia.” 45 Esta cidade tinha o templo, que era umas das
maravilhas do mundo antigo dedicado a: Deusa-Mãe (Artemis para os gregos;
Diana para os romanos); e no mesmo templo era prestada devoção a: deusa
Roma e ao imperador46. Hoje Éfeso ficaria situada na atual Turquia 47.
Apresentação de Cristo: A primeira carta é endereçada a igreja em Éfeso.
Ela começa com a apresentação de Jesus: como aquele que está com as sete
estrelas na mão direita (os sete pastores das igrejas) tendo poder e controle sobre
os líderes da igreja; e como aquele que anda no meio das igrejas (os sete
candeeiros) (v.1), mostrando companhia constante.
Elogio a Igreja: A comunidade cristã de Éfeso era uma igreja operosa,
trabalhadora e perseverante. Lutava contra a maldade e testava os que se
intitulavam apóstolos, mais que na verdade eram homens mentirosos. (v.2) a
igreja perseverava mesmo em meio a toda esta situação, estava até sofrendo as
consequências pelo nome do Senhor. A igreja não desanimava. (v.3)
Repreensão à igreja: Apesar de muitas obras, de muitas atividades, de
ser uma igreja doutrinariamente pura, a igreja de Éfeso havia abandonado o
primeiro amor. Esse primeiro amor é marcado por um intenso desejo de
comunhão com Cristo. A ideia de “abandonar” aqui é a mesma que “repúdio ou
divórcio”48. Os crentes perderam o fervor do início, deixaram de manter o
relacionamento com Cristo como no início, “a igreja fazia tudo para Deus, mas
não tinha real interesse (não tinha o coração naquilo que fazia) por Deus. Ter o
coração em Deus tem um nome nessa carta: primeiro amor.” 49
42
Idem, p. 160.
43
Ibden.
44
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:1321).
45
Ladd (1986:30).
46
Ibden.
47
Azevedo (2011:36).
48
Champlin (1983:389).
49
Azevedo (2011:36).

12
Se você quiser entender mais profundamente o que era o “primeiro amor”
na igreja de Éfeso, basta relembrar o início de sua história, que está registrado no
livro de Atos, capítulo 19. Ela é inaugurada com os seus primeiros membros
sendo batizados no Espírito Santo (At 19:1-7) e partir desta igreja a Ásia menor foi
evangelizada (Ap 19:10). Ela cresceu bem e rapidamente, e logo se tornou uma
das igrejas mais importante da época. Esta comunidade cristã tinha duas marcas
claras: era fervorosa e missionária. Contudo, agora ela havia perdido o seu brilho.
Os crentes daquela igreja não deixaram de ser fiéis a Deus. Eles eram
muito bons de doutrina, eram bastante ortodoxos, mas faltava-lhes o entusiasmo
de outrora. Eles não eram mais fervorosos, nem missionários como antes e agora
eram muito ruins em seus afetos, tanto para com Deus e quanto para com o
próximo. O que os moveu deste sentimento de amor, possivelmente foi “(...) a sua
luta com os falsos mestres e seu ódio por ensinos heréticos parece que trouxeram
endurecimento aos sentimentos e atitudes rudes (...)” 50. Eram tão zelosos com a
doutrina que acabaram por se tornaram mero religioso.
Para retornar ao “ardor” dos primeiros dias, a igreja precisava olhar para o
seu passado, e lembrar de onde havia sido tirada, se arrepender por ter
esquecido de tão grande misericórdia divina e voltar a praticar as obras como
eram praticadas no princípio de sua fé (v.4-5a). Se essa atitude de considerar o
seu passado, não fosse atendida, Jesus certamente tiraria o candelabro do seu
lugar, ou seja, a igreja fecharia, pois o próprio Jesus faria isso. (v.6). Veja que
consequência grave que Jesus os ameaça: Se não se arrependerem, eu virei e
tirarei o candelabro de vocês do seu lugar. (v.5c NTLH) A igreja deixaria de
desistir, “seu testemunho se apagaria”51.
Depois de mostrar os erros e sugerir mudanças, Cristo volta a elogiar a
igreja, e diz que, pelo fato dela “odiar as obras dos nicolaítas”, isso era algo a
favor da igreja, já que o próprio Senhor odiava tais obras. Estes “nicolaítas” são
desconhecidos fora do Apocalipse, mas a que tudo indica eram uma seita nos
primeiros tempos da igreja cristã52. Há várias opiniões sobre quem seriam eles:
“Uns dizem que eram seguidores de um líder religioso chamado Nicolau. Outros
afirmam que o nome significa ‘exercer liderança sobre os leigos’ e vêem aqui uma
referência ao surgimento do sistema clerical [clero e leigos].” 53
Seja qual for o significa (mais a frente apresentaremos mais um
significado), o ódio expressado da igreja e do Cristo glorificado pela doutrina
herética, expressa a luta contra a influência da doutrina errada 54. Isso mostra
como esta seita era perniciosa para a igreja de Éfeso (v.6).
Promessa a Igreja: Em seguida, Jesus faz uma promessa de que todo
aquele que crê no evangelho irá: comer da árvore da vida. Nossos primeiros pais,
Adão e Eva, não comeram desta árvore devido ao pecado, mais a igreja com a
graça de Cristo, recebe essa promessa da voz do Espírito “Quem tem ouvidos,
ouça o que o Espírito diz às igrejas.” Esta é uma promessa maravilhosa de vida
eterna (v.7).

2. Esmirna: Pobre, mas rica (2:8-11)

50
Ladd (1986:32).
51
MacDonald (2008:995).
52
Idem, p.32.
53
MacDonald (2008:997).
54
Ibden.

13
Sobre a cidade: O cenário em que a igreja estava inserida era a cidade de
“(...) Esmirna (hoje, Izmir, na Turquia), cidade localizada a 60 km de Éfeso e com
uma população aproximada de 200 mil pessoas na época apostólica.” 55 Esta
cidade: “(...) era a mais esplêndida das sete cidades, e o orgulho da Ásia. (...)
[nesta cidade] desenvolveu-se a adoração ao imperador.” 56
Apresentação de Cristo: Cristo aparece aqui como aquele que é o
primeiro e o último; aquele que foi morto mas reviveu. Esta é uma descrição
encontrada no Ap 1.17c-18. Onde Cristo parece mostrar a igreja que é que o que
“abre e fecha” a história, passou pela morte, mas agora voltou a viver (At 3:15)!
(Ap 2:8).
Elogio a Igreja: O v.9 parece fazer uma conexão com o sofrimento vencido
pelo Messias glorificado. Cristo sabia melhor do que ninguém o que era passar
por uma tribulação. Pois, Ele aprendeu a obediência por meio daquilo que sofreu
(Hb 5:8), e assim conhecia a tribulação da igreja de Esmirna. Mas não só isso,
também sua pobreza, apesar de que aos olhos do Senhor esta igreja era rica.
Ainda conhecia os blasfemos judeus, que se diziam judeus, mas eram na verdade
“sinagoga de Satanás” (v.9);
No v.10, Jesus avisa à esta igreja de alguns sofrimentos que haveria de
passar: o Diabo colocaria alguns cristãos daquela comunidade, para serem
provados. E eles passariam uma “tribulação de dez dias”. Diz um estudioso: “(...)
dez dias não tem nenhum significado simbólico especial além de indicar um
período relativamente curto de perseguição. João (...) [neste caso], não prevê
uma perseguição mundial, mas local e de curta duração.” 57. Jesus pedi aos
crentes em Esmirna fidelidade até a morte.
Promessa a Igreja: Esmirna era uma igreja que não recebeu nenhuma
repreensão do Senhor, ao contrário, recebeu ela duas promessas de Deus: a
primeira está no final do v.10: ... Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida.
Fidelidade diante dos sofrimentos desta vida, por amor ao evangelho, resultam
em glória já prometida no futuro. Em segundo lugar, eles receberam a promessa
de, se vencerem, não sofreriam a “segunda morte”. O que é isso? Ap 20:14 nos
explica: Então a morte e o mundo dos mortos foram jogados no lago de fogo.
Esse lago de fogo é a segunda morte.

3. Pérgamo: Martirizada, mas tolerante (2: 12-17)


Sobre a cidade: A cidade onde estava instalada esta igreja “(...) Pérgamo
(hoje Bergama [Turqui]) (...) era conhecida por seus muitos templos aos deuses
pagãos e aos imperadores romanos.” 58 Sobre a religiosidade da cidade: “Um
imenso altar para Zeus, o principal dos deuses mitológicos gregos, situava-se na
Acrópole (a parte mais elevada da cidade) a 300 metros acima da planície.” 59
Apresentação de Cristo: Jesus é descrito a esta comunidade cristã de
Pérgamo, como “aquele que tem a espada afiada de dois gumes”, uma referência
encontrada também na visão que João tem no inicio do livro (1.16). (v.12). Essa
espada “(...) é a palavra de julgamento pronunciada sobre uma igreja que
começou a relaxar em sua atitude diante das práticas cristãs (...).” 60

55
Azevedo (2011:50).
56
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:1321).
57
Ladd (1986:36).
58
Azevedo (2011:64).
59
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:1321).
60
Ladd (1986:37).

14
Elogio a Igreja: Esta igreja estava em uma localidade terminantemente
difícil, onde ficava o “trono de Satanás”, que entre vários significados o mais forte
é que esta frase é uma referência ao “(...) centro do culto ao imperador, que
estava se transformando no maior perigo para a igreja cristã.” 61 . Apesar de
conviver com esta realidade religiosa, a igreja havia “conservado” o nome do
Senhor e não havia “negado a fé”. A igreja vivia dias de perseguição, um exemplo
disso foi a morte de um cristão chamado Antipas, que Jesus chama de “fiel
testemunha”. Ele foi vítima de perseguição religiosa. (v.13).
Repreensão à igreja: Apesar da perseverança em meio a perseguição,
Jesus dectou duas doutrinas que estavam sendo toleradas pela igreja de
Pérgamo: A primeira era, A doutrina de Balaão, que consistia em fazer o cristão
“comer coisas sacrificadas a ídolos” e “se prostituírem”. O apóstolo utiliza-se de
um personagem do Antigo Testamento para ensinar como essa doutrina de
milênios estava “infectando” aquela igreja local (c.f Nm 22 e 23). Veja que
praticando as propostas desta doutrina, eles estavam desobedecendo às ordens
dadas pelo Espírito Santo e os apóstolos no concílio de Jerusalém (At 15). (c.f. Ap
2:14)
A segunda doutrina tolerada pela igreja de Pérgamo, era a doutrina dos
nicolaítas (v.15). Segundo Ladd: “a maneira de expressar dá a ideia de que os
nicolaítas não são outra seita, mas um termo mais específico para a ‘doutrina de
Balaão’.”62 O conselho de Jesus a igreja era que se arrependessem. Se não o
Senhor iria lutar contra os hereges com a espada da sua boca (v.16).
Essas duas doutrinas são sinônimas aqui. E como vimos envolvem um
desvio do verdadeiro sentido do evangelho. Muitos desta igreja achavam que não
tinha nada a ver participar das coisas do mundo mesmo sendo crentes, “(...)
achavam que podiam participar das festas celebradas nos templos pagãos em
honra aos deuses pagãos ou imperadores romanos, sem que isso significasse
que aceitavam tais deuses.”63 Além do sincretismo religioso, havia também
prostituição sagrada, pois para as religiões pagãs o sexo entre as pessoas no
culto aos ídolos era uma expressão de adoração.
Estas doutrinas permanecem infelizmente em muitas igrejas e em muitos
cristãos individualmente, e como alguns cristãos em Pérgamo, todas essas
práticas erradas se tornaram normais. Eles poderiam até dizer: “Casar para quê,
se podemos viver juntos? Esperar para quê, se nos amamos? O que tem eu ir
numa festa regada a álcool, se eu não bebo?” 64 Devido este quadro pecaminoso
presente na igreja, era mais que necessário praticarem a palavra de Deus. Só
uma mudança de rota, na mente e no comportamento, traria essas pessoas para
a vontade de Deus novamente, se não eles seriam combatidos pela palavra de
julgamento de Cristo.
Promessa a Igreja: À igreja de Pérgamo é feito duas promessas: a
primeira diz que, ao vencedor, seria lhe dado de comer do maná escondido. Esta
referencia acontece porque o maná foi o alimento do povo de Deus no deserto e
depois foi guardado na arca da aliança (Êx 16:32-34; Hb 9:4). E, a outra
promessa, era a pedrinha branca. Os estudiosos dizem que as pedras eram muito
usadas nos tempos de João.

61
Idem, p.37.
62
Ladd (1986:39).
63
Azevedo (2011:64).
64
Azevedo (2011:64).

15
Em um julgamento, era símbolo de absolvição por um júri, já uma pedra
preta era símbolo de condenação. As pedras eram também os “ingressos” em
festivais públicos. Este significado pode ser a melhor forma de entender o
simbolismo da “pedra branca”, como um símbolo de entrada na festa de
casamento do Cordeiro (Ap 19:9)65.

4. Tiatira: Ativa, mas transigente (Ap 2:18-29)


Sobre a cidade: Segundo os estudiosos “Tiatira [hoje Aquizar] era a
menos importante das sete cidades que são mencionadas, e estava localizada
entre Pérgamo e Sardes. Era uma cidade mais comercial do que política.” 66 Sobre
ela fala-se que: “(...) [tinha] inúmeras associações de profissionais (corporações,
próximas das cooperativas de hoje). Lídia, que comercializava tecidos em Filipos,
era de Tiatira (At 16.14).”67 E provavelmente “estas corporações promoviam
almoços que provavelmente eram dedicados a algum deus pagão, e é deste lado
que os cristãos tiveram problemas em Tiatira.” 68
Apresentação de Cristo: Aqui o Cristo se apresenta à igreja como “Filho
de Deus”, descrevendo sua divindade. Além de ter algumas características em
sua aparência, presentes no c.1: o olhar “como chama de fogo”, e os pés
semelhantes ao “latão reluzente”. (v.18) Entendemos aqui: “Os olhos se referem
à sua visão penetrante, e os pés, à ameaça de julgamento.”69
Elogio a Igreja: Jesus observa cada igreja local, e aqui elogia o serviço
que vinha sendo prestado por Tiatira. Ela era uma igreja com muitas obras: amor,
serviço, fé e paciência. Além disso, nosso Senhor especificou que as obras que
eram realizadas por esta igreja, naquele momento, eram mais do que as
primeiras. (v.19)
Repreensão à igreja: Mas ainda que se opere muitas obras, ainda que as
atividades sejam feitas, ou a igreja tivesse vida cotidiana, Jesus aponta algumas
coisas que deveriam mudar. A igreja em Tiatira era ativa, mas transigente. Existia
uma mulher chamada Jezabel, que se declarava profetiza que estava sendo
tolerada por aquela comunidade. Cristo diz que aquela profetiza ensinava seus
servos, a se prostituírem e comerem dos sacrifícios dedicado aos ídolos. (v.20).
Os pecados dessa mulher eram tão perversos que ela talvez foi identificada
com a Jezabel do AT: “(...) descrita nos livros de 1 e 2 Reis era uma feiticeira, filha
de um rei pagão, que introduziu o culto a Baal e que trouxe seus profetas para o
Reino do Norte de Israel”70. E mais: “Ela se casou com o rei Acabe (1 Rs 16:31),
exterminou os profetas do Senhor (1 Rs 18:4), tentou matar Elias (1 Rs 19:2),
ordenou o assassinato de Nabote para apossar-se de sua vinha (1 Rs 21:19)
(...)”71.E por fim, ela: “(...) além de pressionar e de induzir seu marido a ‘vender-se
para fazer o que o Senhor reprova’ (1 Rs 21:25).” 72
Veja que a Jezabel do NT não era muito diferente da Jezabel do AT.
Influenciou muitos cristãos a se envolverem com as relações sexuais ilícitas e a
se alimentar com comidas que eram oferecidas a ídolos. Os crentes de Tiatira

65
Ibden.
66
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:1322).
67
Azevedo (2011:80).
68
Ladd (1986:40).
69
MacDonald (2008:995).
70
Barro (2004:86).
71
Ibden.
72
Ibden.

16
“(...) não concordavam com Jezabel, mas a toleravam em seu meio.” 73 No v.21, o
Senhor, diz que havia dado tempo para que tal mulher se arrependesse dessa
prostituição, porém, ela não se arrependeu. A melhor saída para vencermos o
pecado é se arrependendo das iniquidades, do contrário a destruição é certa!
Cristo deu-lhe uma sentença: colocaria ela em uma cama, numa referência
a uma provável enfermidade. E também a todos os que a seguissem praticando a
prostituição viria uma grande tribulação, se não mudassem de atitude (v.22). No
v.23 o texto expressa a sentença de que Jesus: “feriria de morte os filhos de
Jezabel”. João parece fazer distinção dos que estão lutando com os que caem no
problema, e os que já se entregaram, por isto estes “filhos” seriam mortos 74. O
Senhor faria isso, porque ele conhece o ser humano por dentro e dá a
recompensa a cada um, segundo as suas obras.
Promessa a Igreja: A carta encerra-se com algumas palavras de Cristo,
aos que não se contaminaram com tais doutrinas em Tiatira. A única exigência de
Jesus, era que os cristãos não se envolvessem e nem conhecessem esta
demoníaca doutrina chamada “profundezas de Satanás”. Os crentes de Tiatira
foram convocados pelo Senhor a conservar todos os valores evangélicos até que
o Senhor voltasse. (v.25) Certamente, o que vencesse era aquele que praticasse
as obras de Cristo, e que desfrutaria no futuro das promessas de Deus.
E aqui essas promessas eram: governar sobre as nações, regendo-as com
vara de ferro. O povo de Deus é chamado “reis”, que junto com Cristo reinarão
(1:6)75. De alguma forma, o povo de Deus participará da instalação do Reino de
Cristo, e para isso todo mal será destruído 76. Além de participarem do reinado
messiânico, os cristãos receberiam de Jesus a estrela da manhã (v.26-28).
Provavelmente uma referência do próprio Cristo (Ap 22.16), pois como “(...) a
estrela da manhã reina nos céus, assim os crentes reinarão com Cristo;
compartilharão do seu domínio e esplendor reais. A estrela é sempre símbolo de
realeza, estando ligada ao cetro (Nm 24.17;cf. Mt 2.2).”77

5. Sardes: Famosa, mas morta (Ap 3:1-6)


Sobre a cidade: Algumas informações sobre a cidade: “Ali reinava o
homem mais rico da época, Creso. A cidade foi destruída por um terremoto, em
17 d.C., mas foi reconstruída posteriromente.” 78 Ladd diz ainda: “O culto mais
importante em Sardes era a Cibele, a deusa mais famosa das religiões de
mistério da Ásia. Sardes também promovia com zelo o culto ao imperador.” 79 Hoje
Sardes, se localizaria na parte ocidental da atual Turquia 80.
Apresentação de Cristo: A forma como Cristo se apresenta a esta igreja
mostra que as ações de Cristo são totalmente influenciadas pelo perfeito Espírito.
Estas palavras parecem fazer eco às palavras de Isaias que disse: Repousará
sobre ele o Espírito do SENHOR, o Espírito de sabedoria e de entendimento, o
Espírito de conselho e de fortaleza, o Espírito de conhecimento e de temor do
SENHOR. (11:2) e através do Espírito Cristo pode dar nova vida a igreja 81. O
73
Azevedo (2011:83).
74
Ladd (1986:42).
75
Ibden.
76
Idem, p.43.
77
Hendriksen (2001:105).
78
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:1322).
79
Ladd (1986:44).
80
Champlin (1983:389).
81
Ibden.

17
Senhor tem também os pastores como propriedade sua, chamados aqui de “as
sete estrelas”. (v.1).
Repreensão à igreja: Jesus não estava nada feliz com a igreja de Sardes,
ela parecia uma igreja conhecidamente viva, mas na verdade o Senhor a
conhecia profundamente a ponto de dizer que na verdade “seu nome era de
morte”. A advertência de Jesus era que a igreja “conservasse o que de bom
restava”, porque as obras desta comunidade estavam imperfeitas diante do Pai.
(v.2). Segundo Israel Belo de Azevedo: “Aquela igreja era, na verdade, contra
todas as aparências, um cemitério espiritual. O cemitério é um lugar bonito,
especialmente as alas das famílias ricas, mas ali não há vida.” 82
Para clarear ainda mais sobre os estado desta igreja, um comentário
bíblico diz: “Sardes era uma igreja que professava a sua fé, e era conhecida como
uma congregação de cristãos. Em geral, porém, apenas seguia uma rotina formal
e enfadonha. Não transbordava de vida espiritual.” 83 Como ela há muitos igrejas
locais e consequentemente crentes assim, fazem e participam de eventos; fazem
boletins, mas tudo é apenas uma rotina vazia.
Havia algumas posturas que a igreja de Sardes deveria tomar: Lembre-se,
portanto, do que você recebeu e ouviu; obedeça e arrependa-se. Mas se você
não estiver atento, virei como um ladrão e você não saberá a que hora virei contra
você. (Ap 3:3 NVI) Era necessário lembrar-se daquilo que haviam recebido: a
mensagem do evangelho; vive-lo: guardar (praticar); além de arrepender-se.
Precisavam de vigilância para se aperceber e estarem preparados para volta do
Senhor. (v.3). Essa volta do Senhor como um ladrão, possivelmente refere-se
aqui, há um juízo específico contra esta igreja, se ela não muda-se, e não há
segunda volta de Cristo.84
Elogio a Igreja: Nesta igreja, o Senhor diz que algumas pessoas não
haviam contaminado sua fé. Continuavam na prática da justiça. Não haviam se
desviado dos propósitos de Deus, de uma vida santificada a ele. Para elas é feita
uma promessa: andar de branco num futuro com o Senhor. (v.4).
Promessa a Igreja: Parece haver uma ligação entre esta promessa e a
promessa de andar de branco com Cristo feita no v.4. No versículo anterior
parece que a ação de não se contaminar é do cristão, já aqui a ênfase está em
Deus vesti-los de vestes brancas. Além disso, aqueles cristãos teriam
preservados o seu nome no livro da vida e Jesus confessaria diante do Pai e dos
anjos o nome de cada pessoa que pela graça não contaminasse sua vida com o
pecado. (v.5-6).

6. Filadélfia: Pequena, mas perseverante (Ap 3:7-13)


Sobre a cidade: Segundo especialistas bíblicos: “A cidade de Filadélfia foi
construída em uma área vulcânica perigosa (...). Ela foi destruída completamente
num terremoto em 17 d.C. (...)”85 sua reconstrução ocorreu quando: “o imperador
Tibério isentou os seus cidadãos do pagamento de impostos durante cinco anos
(...)”86. Além destes detalhes geográficos, é dito que: “Filadélfia era a mais jovem
das igrejas da Ásia. O culto pagão principal era a Dionísio, mas o maior problema

82
Azevedo (2011:97).
83
MacDonald (2008:999).
84
Ladd (1986:46).
85
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:1322).
86
Ibden.

18
da igreja eram os judeus, e não tanto os pagãos.” 87 Hoje essa igreja ficaria na
cidade de Alasehir, na Turquia88.
Apresentação de Cristo: Jesus se apresenta como o “santo” e de fato tem
este atributo. Jesus tem a absoluta santidade. Ele é perfeitamente Deus e
perfeitamente homem. Mesmo tendo enfrentado todas as tentações ele venceu o
mundo sem ter pecado (Hb 4:15). Ele é chamado em Atos de “Santo” (3:14), e por
isso se apresenta assim a igreja. Além disso, Jesus se coloca como o verdadeiro.
Aqui esta palavra: “‘verdadeiro’ ou ‘genuíno’ tem dois significados diferentes. No
contexto grego a palavra significa o que é real, que é confiável. Mas no contexto
hebraico ela significa o que é fiel e confiável.” 89
O sentido de verdadeiro “(...) lembra o pacto que Deus fez com Israel nos
tempos do Antigo Testamento e que ele agora cumpriu fielmente na igreja, em
Jesus Cristo.”90 Outra expressão interessante é a que diz que Jesus tem a chave
de Davi cujo significado é: “a chave de Davi é a chave da casa de Davi – o Reino
messiânico”91. E a frase abre e fecha e fecha e abre é uma explicação do
exercício desse poder do messias.92 (v.7)
Elogio a Igreja: Em seguida a sua apresentação à igreja de Filadélfia,
Cristo faz suas considerações positivas a respeito desta comunidade cristã. Mais
uma vez Jesus inicia seus elogios falando sobre o conhecimento que tinha da
igreja. A porta aberta pode significar um acesso ao reino de Deus. 93 Em seguida,
Jesus constata a “pouca força” da igreja, mas logo lembra que ela havia guardado
a palavra e não negou o nome de Jesus.
Em seguida, o Senhor faz uma consideração em relação aos opositores
dos cristãos de Filadélfia, chamando-os de “sinagoga de Satanás” e “falsos
judeus”. A expressão ...farei vir e prostrar-se aos teus pés e conhecer que eu te
amei. (v.9), segundo Matthew Henry: “não para prestar honra religiosa e divina à
própria igreja, (...) mas serão convencidos de que estavam no erro, e que esta
igreja está certa e é amada de Cristo (...)” 94. Também: “(...) eles desejarão ser
introduzidos na comunhão com ela [igreja] para adorar o mesmo Deus da mesma
maneira.”95 Jesus, no v.11, fala de que sua vinda era breve, e animou a igreja a
perseverar em “guardar o que tem” para que ninguém tomasse sua coroa.
Promessa a Igreja: A promessa a esta igreja era que quem vencesse
todas as ameaças a sua fé cristã seria: “coluna no templo” de Deus, que é a
certeza da admissão e permanência no reino futuro do Senhor. 96 e também
receberiam “o nome de Deus (sentido de posse); da cidade de Deus, a nova
Jerusalém que descerá do céu e se instalará na nova terra (nova cidadania), e
também o nome do Cristo (participação na glória de Cristo)” 97 (v.14).

7. Laodiceia: Próspera, mas morna (Ap 3:14-22)

87
Ladd (1986:46).
88
Azevedo (2011:112).
89
Ladd (1986:46).
90
Ibden.
91
Ibden.
92
Ibden.
93
Kistemaker (2004:212).
94
Henry (2008:971).
95
Ibden.
96
Ladd (1986:49).
97
Ibden.

19
Sobre a cidade: Os especialistas bíblicos dizem que Laodiceia: “Era
conhecida como um centro bancário e possuía uma famosa escola de medicina.” 98
Fala-se ainda que: “A cidade era famosa pelo belo tecido negro, de lã, que era
usado para fazer roupas e tapetes.” 99 A cidade desfrutava de uma boa condição
econômica, e com certeza, havia muitos cristãos ricos. Laodiceia, assim como
Sardes, estaria na parte ocidental da Turquia 100.
Apresentação de Cristo: Cristo usa para si várias expressões: “o Amém”
(Cristo é digno de confiança); “a testemunha fiel e verdadeira” (testemunha que
diz a verdade); “o principio da criação de Deus” (Cristo é a origem da criação de
Deus)101. Aprendemos através destes títulos, que o Senhor cumpre aquilo que diz,
pois sua essência é a própria palavra de Deus e ele oferece todas as boas coisas
capazes de produzir bem em todas as áreas da vida humana. Por certo, ele não é
qualquer um, mais é o que nós precisamos para existir.
Repreensão à igreja: Eu sei as tuas obras, que nem és frio nem quente.
Tomara que foras frio ou quente! (Ap 3:15). É assim que Cristo começa sua
repreensão a igreja, porque Jesus conhecia a igreja de Laodiceia. Ela não era
“fria nem quente”, era “morna”: “ser morno é viver sem propósito, sem um alvo.
Viver assim é como fazer uma viagem sem destino.” 102 Os “mornos” tem três
marcas: “Satisfação – O morno está SATISFEITO com a vida que leva.
Indiferença – O morno é INDIFERENTE ao toque de calor renovador do Espírito.
Claudicância – O morno é CLAUDICANTE (...) [toma] (...) compromissos pela
metade.”103 Era esse tipo de gente que estava causando ânsia de vômito no
Senhor Jesus (v.16).
Os cristãos dali precisavam mudar de atitude. (vs.15-16). Além de sua
mornidão, outro pecado estava tirando a confiança devida somente ao Senhor,
por causa da sua prosperidade, esta comunidade achava-se rica, e sempre
abastecida, mas na opinião de Cristo ela não passava de “desgraçada, miserável,
pobre, cega e nua”, ou seja estava desprovida da “verdadeira prosperidade”
(v.17)!
Nosso Senhor aconselha então a igreja que adquirisse bens dele: ouro
purificado vindo dele, ou a verdadeira riqueza vinda de Deus; “vestes brancas”,
para cobrir a nudez daquela igreja e colírio para enxergar verdadeiramente.
Essas repreensões vinham daquele que ama a igreja: Jesus Cristo. Deviam ser
zelosos, ou seja, “levar as coisas a sério” (NTLH) e se arrepender. (v.19)
Jesus amava tanto esta igreja, mesmo que estivesse do lado de fora dela
por “expulsão” vinda da parte daqueles crentes, mas ainda persistia, porque
estava “batendo a porta” deles e ansiava que a abrissem para ter comunhão com
aqueles cristãos. (v.20).
Promessa a Igreja: Embora não houvesse nenhum elogio a esta igreja,
Jesus é tão gracioso, que fez promessas àqueles que vencessem. A promessa
era: “assentar-se com Cristo em seu trono” assim como Cristo fez com seu Pai.
Entende-se: “O lado direito é a posição de maior honra possível. Não há maior
significado na diferença entre ser entronizado à direita de Deus e estar com ele no

98
Bíblia de estudo palavras-chave hebraico e grego (2011:1322).
99
Ladd (1986:50).
100
Champlin (1983:429).
101
Ladd (1986:50-51).
102
Azevedo (2011:112).
103
Idem, p.112.

20
mesmo trono (...); ambos tem a mesma ideia teológica.” 104 Os cristãos então vão
participar da glória do reino de Deus!

Capítulo 2
QUEM PODE ABRIR O LIVRO?
Os sete selos

Acabamos de analisar os primeiros capítulos do livro de Apocalipse (do 1


ao 3). Agora, daremos prosseguimento ao nosso estudo analisando outro trecho
deste livro – que se inicia no capítulo 4 e vai até o 8:1. Neste trecho, João introduz
a visão de um trono no céu (capítulo 4) e de um livro escrito por dentro e por fora
totalmente selado com sete selos que somente o Cordeiro é digno e capaz de
abrir (capítulo 5); logo em seguida, o velho apóstolo nos mostra a abertura dos
seis primeiros selos deste livro (capítulo 6); a visão dos cento e quarenta e quatro
mil selados na terra e de uma grande multidão no céu (capítulo 7) e, por fim, a
abertura do sétimo selo seguido por um silêncio no céu (capítulo 8:1). Nosso
papel, nesse momento, é o de interpretar essas visões e simbolismos
descobrindo seus respectivos significados. Então, vamos lá.

1. A VISÃO DO TRONO (APOCALIPSE 4)

O capítulo 4 se inicia com um convite feito a João: "Suba para cá, e lhe
mostrarei o que deve acontecer depois dessas coisas" (v.1 NVI). O apóstolo
aceita e convite e vê “um trono no céu e nele estava assentado alguém” (v.2). De
acordo com texto, aquele que estava assentado no trono “era, na aparência,
semelhante à pedra de jaspe e de sardônica e o arco celeste estava ao redor do
trono e era semelhante à esmeralda” (v.3). É evidente que aquele que se assenta
no trono é Deus. As pedras, por sua vez, não são literais, é claro. João as utiliza
metaforicamente para fazer referência a resplandecente majestade e glória
reluzente de Deus. Isto está de acordo com as Escrituras que dizem que Deus
“habita em luz inacessível, a quem ninguém viu nem pode ver” (I Tm 6:16 NVI).
A descrição de um mar de vidro, claro como cristal (v.6), diante do trono
corrobora para a interpretação de que João está pretendendo descrever algo
simplesmente indescritível e impossível de ser compreendido em sua totalidade
por qualquer ser humano: a majestade translúcida, reluzente e fulgurante de
Deus. Essa visão tem apenas um significado, muito simples, aliás. Ela apresenta
aquilo que a Bíblia testemunha de Gênesis a Apocalipse: que Deus reina sobre
todo o universo. A mensagem deste capítulo é clara: “Deus está entronizado e
governando o Seu universo. Não importa quão temíveis ou incontroláveis forças
do mal pareçam agir na terra, elas não podem frustrar os desígnios de Deus nem
vencer a igreja, pois Deus está governando o Universo, do Seu torno” 105.

104
Ladd (1986:53).

105
Lopes (2005:150).

21
Os vinte e quatro anciãos (Apocalipse 4:4)

Da descrição de quem estava no trono João passa a apresentar o que


estava ao seu redor (v.4-6). O apóstolo viu que ao redor do trono de Deus
“estavam outros vinte e quatro tronos, e assentados neles havia vinte e quatro
anciãos. Eles estavam vestidos de branco e tinham na cabeça coroas de ouro”
(v.4). Quem são estes vinte e quatro anciãos? Há quem diga que estes vinte e
quatro anciãos representem a totalidade dos redimidos tanto do Novo quanto do
Antigo Testamento, representados pelos doze cabeças tribais do Antigo
Testamento e os doze apóstolos de Jesus Cristo 106 do Novo Testamento. Além
deste, existe outro ponto de vista que interpretam estes anciãos como sendo
crentes arrebatados que estão no céu juntamente com Deus. Entretanto, estas
interpretações são muito improváveis.
No capitulo 5, por exemplo, estes anciãos oferecem a Deus taças de
incenso, que são as orações dos santos (v.8). Se eles fossem redimidos teríamos
que concordar que estariam fazendo o papel de mediação entre Deus e os
cristãos, levando ao Senhor suas orações, o que não encontra respaldo em lugar
algum das Escrituras. Por esta razão não podemos entender que os vinte e quatro
anciãos simbolizem a igreja os alguns redimidos. Em nenhum lugar da Bíblia
existe esta identificação entre eles, muito pelo contrário. Os vinte e quatro anciãos
são normalmente identificados com seres angelicais como os quatro seres
viventes, e não com os redimidos.
É fácil perceber que o livro de apocalipse ao invés de identificar os vinte e
quatro anciãos com a igreja os distingue claramente dela (Ap 19:1-4). No capitulo
5 por exemplo, os vinte e quatro anciãos cantavam um cântico novo, dizendo:
Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o
teu sangue compraste para Deus homens de toda tribo, e língua, e povo e nação;
e os constituíste reino e sacerdotes” (v.9-10). Perceba que os vinte e quatro
anciãos não se incluem como comprados e redimidos. A razão é muito simples:
“os anciãos não são redimidos, mas cantam deles” 107. Eles cantam não porque
são redimidos, mas porque Deus redimiu “os” homens (v.10). Esta distinção dos
vinte e quatro anciãos dos redimidos fica ainda mais evidente na visão que João
tem em Apc 7:9-11.
Neste texto, temos primeiramente os salvos: “uma grande multidão, que
ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas, que estavam
em pé diante do trono e em presença do Cordeiro, trajando compridas vestes
brancas, e com palmas nas mãos” (v.9); depois, e somente depois, em outro
grupo – agora não mais de salvos, mas de seres celestiais – temos “todos os
anjos que estavam em pé ao redor do trono e dos anciãos e dos quatro seres
viventes, e prostraram-se diante do trono sobre seus rostos, e adoraram a Deus”
(v.11). Ora, fica muito claro que os vinte e quatro anciãos não fazem parte da
grande multidão de redimidos (ver também Ap 19:1-4); eles pertencem a um outro
grupo, não de seres humanos, mas de seres angelicais!
Por fim, ainda em Ap 7, nos versículos 13-14, João se dirige a um destes
vinte e quatro anciãos muito respeitosamente como “senhor”, título não
apropriado para um irmão na fé 108. Por isso, podemos chegar à conclusão, de que
melhor interpretação é aquela que entende os vinte e quatro anciãos como seres
106
Stott (2006:195).
107
Ladd (2007:58).
108
Idem, p. 57.

22
angelicais. Não encontramos problemas nesta interpretação. Afinal de contas,
como nos lembra o estudioso George Eldon Ladd 109, vestimentas brancas são o
traje típico dos anjos (Jo 20:12; Mt 28:3, At 1:10; Mc 16:5). Além disto, no Novo
Testamento Paulo se refere a certas divisões hierárquicas dos anjos em termos
de tronos, principados e potestades (Cl 1:16; Rm 8:30; Ef 3:10). E, por fim, no
Antigo Testamento Deus às vezes é retratado cercado de um conselho de seres
celestiais da mesma maneira como nós podemos ver aqui nos capítulos 4 e 5 de
Apocalipse (Sl 89:7; Is 24:23; I Rs 22:19). Sendo assim devemos entender os
vinte e quatro anciãos como sendo anjos que estão ao redor do trono e que
rendem glória a Deus por seu governo histórico sobre o mundo.

Os quatro seres viventes (Apocalipse 4:6-9)

A visão do trono ainda não terminou. João não viu apenas vinte e quatro
anciãos, mas também “quatro seres viventes cobertos de olhos, tanto na frente
como atrás” (v.6 NVI). Segundo o apóstolo, “o primeiro ser era semelhante a um
leão; o segundo, semelhante a um touro; o terceiro tinha rosto de homem e o
quarto era semelhante a uma águia voando” (v.7 AS21). No passado estes seres
viventes já foram interpretados como símbolos para os Quatro Evangelhos
(Mateus, Marcos, Lucas e João). Este é o caso dos “pais da Igreja (Orígenes,
Vitorino e Atanásio) que viam os Quatro evangelhos retratados por estes quatro
símbolos”110. Além desta intepretação, há também aqueles que interpretam os
quatro seres viventes como sendo representantes de “tudo o que há de mais
nobre, forte, sábio e rápido na natureza animada” 111.
Contudo, estas duas compreensões não encontram respaldo em lugar
algum das Escrituras. Quando pesquisamos na própria Bíblia fica impossível não
perceber a incrível semelhança destes seres apresentados aqui em Apocalipse
com os Serafins (Is 6:1-3) e os Querubins (Ez 1:1-25; 10:14) descritos no Antigo
Testamento. Por esta razão, a maneira mais bíblica de interpretá-los é
considerando-os como seres angelicais de elevada categoria, podendo ser
Serafins ou Querubins. Com relação à associação destes seres com o leão, o boi,
o homem e a águia, deve-se entender isto como sendo as características que são
atribuídas a anjos tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, como força,
serviço, inteligência e rapidez (cf. Sl 103:20, 21; Dn 9:21; Lc 12:8; 15:10; Hb 1.14
etc.)112. Desta forma, o que João está dizendo de maneira simbólica é que estes
seres viventes possuem força como um leão; servem como o boi; são inteligentes
como o homem e rápidos como a águia.

2. O livro selado (Apocalipse 5)

No capitulo 5 João continua descrevendo a visão que teve do trono de


Deus (mostrado no capítulo 4 de Apocalipse). O apóstolo nos conta: “No lado
direito de quem estava assentado no trono, vi um livro escrito por dentro e por
fora, bem selado com sete selos” (v.1). Este livro possui grande semelhança com
o livro que o profeta Ezequiel recebeu de Deus em seu chamado para exercer o

109
Idem, p. 57-58.
110
Kistemaker (2004:252).
111
Stott (2006:196).
112
Hendriksen (2001:123).

23
ministério profético – ambos estão escritos dos dois lados (Ez 2.9-10). Contudo,
existe também inúmeras diferenças entre eles. O livro que está nas mãos de
Deus aqui em Apocalipse estava selado o que significa que seu conteúdo não
estava acessível – ao contrário do livro de Ezequiel onde se podia ver o que
estava escrito: “palavras de lamento, de pranto e de ais”. Além disto, aqui em
Apocalipse 5 não há ninguém digno de abrir tal livro selado (Ap 5:3) o que nos
deixa certos do fato de que este não é o mesmo livro de Ezequiel.

O significado do livro

De acordo com João o autor deste livro é o próprio Deus que o segura em
sua mão. Mas qual o seu significado? Neste quesito, concordamos com
Hendriksen de que este livro “simboliza o propósito de Deus com respeito à
totalidade do universo através da História, e com respeito a todas as criaturas em
todas as épocas e para toda a eternidade 113”. Este livro contém o plano eterno de
Deus na história da humanidade, incluindo sua revelação e redenção eterna. Em
linhas gerais, ele “revela o plano completo de Deus e o propósito para o mundo
todo ao longo das eras, do começo ao fim” 114. Note, porém, que, de acordo com a
visão de João este livro está selado (v.1).
Isto significa que enquanto o livro permanecesse selado o plano salvífico
de Deus não poderia ser revelado, nem o seu propósito cumprido. Isto quer dizer,
que se Cristo não viesse a terra o propósito de Deus não seria cumprido; não
haveria salvação para as pessoas; o problema universal do pecado não teria uma
solução e a odisseia humana não teria um desfecho. É por esta razão que João
se vê entristecido e começa a chorar ao perceber que ninguém era digno de abrir
o livro, nem mesmo de olhar para ele (v.4). É justamente neste momento que o
apóstolo recebe a ótima notícia: existe alguém capaz de abrir o livro e ele é Jesus
Cristo “o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, que venceu para abrir o livro e os
seus sete selos" (v.5 NVI). O filho de Deus desceu a terra para revelar e executar
o plano eterno e salvífico de Deus para a humanidade!
Cristo executou e revelou o plano salvífico de Deus aos homens ao morrer
no Calvário possibilitando assim, a todas as pessoas, a salvação por sua
maravilhosa graça. Logo, é simplesmente antibíblica a visão de um Jesus vencido
e abatido na cruz do Calvário. No madeiro Jesus não é derrotado, muito pelo
contrário, foi exatamente naquelas duas rústicas traves de madeira ele venceu
sobre as hostes do mal e trinfou gloriosamente sobre elas (Cl 2.15)! É isto o que
torna Jesus Cristo o único digno de abrir os selos do livro, pois ele revelou e
executou o plano eterno de Deus. “Na cruz, esse Leão de Judá, essa Raiz de
Davi, venceu e, portanto, conquistou o direito de abrir o livro e de quebrar seus
selos, isto é, de reger o universo em concordância com o plano de Deus” 115.
Isto explica o que João viu logo em seguida: “Ele [o Cordeiro] se aproximou
e recebeu o livro da mão direita daquele que estava assentado no trono” (v.7
NVI). O fato do livro se encontrar nas mãos do Cordeiro nos mostra que o
governo da história se encontra agora sob seu poderoso comando. Não significa,
entretanto, que Deus Pai deixou o trono, mas que ambos, Pai e Filho,
compartilham o trono eterno (Ap 22.1). A Escritura nos mostra claramente Jesus

113
Idem, p.125.
114
Kistemaker (2004:265).
115
Hendriksen (2001:126).

24
Cristo exaltado à destra de Deus nos céus por haver concluído sua obra
redentora (At 1:9; 7:55-56; Fp 2:6-11; Apc 3:21).
Diante desta cena gloriosa a multidão inumerável de seres angelicais
explode em êxtase oferecendo a Jesus Cristo honras e glórias que lhe são
devidas por ter morrido na cruz e também ao Pai que se assenta no trono. Assim,
eles cantam rejubilantes: "Digno é o Cordeiro que foi morto de receber poder,
riqueza, sabedoria, força, honra, glória e louvor” (v.12). Sim, "Àquele que está
assentado no trono e ao Cordeiro sejam o louvor, a honra, a glória e o poder, para
todo o sempre!" (v.13).

3. A abertura dos seis primeiros selos (Apocalipse 6)

O capitulo 5 termina com a explosão de louvor ao Cordeiro que é digno de


abrir os selos do livro. É aqui no capitulo seis que vemos o Cordeiro abrindo estes
selos um por um. Os selos representam eventos que já aconteceram, estão
acontecendo e ainda acontecerão até o retorno de Jesus Cristo a terra. Eles nos
mostram os eventos que nos levarão ao fim. “O desatar dos selos retrata as
forças que atuarão durante a história, pelas quais os propósitos de Deus relativos
à redenção e ao julgamento serão transmitidos” 116. Ao romper os quatro primeiros
selos quatro cavalos com seus respectivos cavaleiros são vistos por João. Cada
um deles tem significado. Vejamos, então, de maneira detalhada a abertura de
cada selo e seus referentes significados.

A abertura do primeiro selo (6:1-2)

João, na descrição de sua visão, nos mostra a abertura do primeiro selo:


“E, havendo o Cordeiro aberto um dos selos, olhei e ouvi um dos quatro seres,
que dizia, como em voz de trovão: Vem e vê! E olhei, e eis um cavalo branco; e o
que estava assentado sobre ele tinha um arco; e foi-lhe dada uma coroa, e saiu
vitorioso e para vencer” (v.1-2). Quem é este cavaleiro vitorioso? Há um
pensamento equivocado de interpretes que insistem que este cavaleiro branco
deva ser entendido como sendo do mesmo tipo que os outros três cavaleiros; já
que os outros são poderes maus, de destruição e morte, pelos quais Deus
executa seu julgamento, o cavalo branco não pode destoar do conjunto 117. Além
desta interpretação, há ainda aquela que entende este cavaleiro como sendo o
anticristo ou mesmo como um símbolo de conquistas militares.
Entretanto, estas intepretações são completamente absurdas de acordo
com o livro de Apocalipse. Certamente, este primeiro cavaleiro não pode
simbolizar outro senão Jesus Cristo nosso Senhor. Em primeiro lugar, porque no
Apocalipse a vitória é claramente atribuída a ele. Jesus disse a igreja de
Laodiceia: “eu venci e me assentei com meu Pai no seu trono” (3:21); depois, é
nos dito que Jesus, o Leão da Tribo de Judá, a Raiz de Davi “venceu para abrir o
livro e desatar os seus sete selos” (5:5); além disto, enquanto estava aqui na terra
o mesmo Jesus garantiu aos seus discípulos “no mundo passais por aflições, mas
tende bom ânimo, eu venci o mundo” (Jo 16:33).
Em segundo lugar, o cavaleiro assentado sobre o cavalo branco, deve ser
interpretado como sendo Jesus, pois, especialmente no livro de Apocalipse, o

116
Ladd (2007:72).
117
Idem, p. 73.

25
branco é sempre símbolo de Cristo ou de algo relacionado a ele 118. Na primeira
visão que João tem de Jesus, por exemplo, os “seus cabelos eram brancos como
a lã, tão brancos quanto a neve” (Apc 1:14); à igreja de Pérgamo ele promete
“uma pedra branca om um novo nome nela inscrito” (Apc 2:17) e para a igreja de
Sardes vestimentas brancas aos que forem fieis até o fim (Apc 3:4, 5 e 18). Além
disto, Jesus é visto por João retornando em glória montado em um cavalo branco
juntamente com seus exércitos que “o seguiam, vestidos de linho fino, branco e
puro, e montados em cavalos brancos” (Apc 19:11, 14). Esta cena, em
especial, se mostra uma evidência incontestável de que Jesus é cavaleiro branco
visto na abertura do primeiro selo, pois em Apocalipse 19 é descrito o retorno de
Jesus, sua vitória sobre Anticristo e o seu casamento com sua amada noiva, a
igreja. A semelhança entre o cavaleiro montado no cavalo branco em Apocalipse
capítulo 6 e o do capítulo 19 são incríveis. A razão é uma só: ambos fazem
menção a Jesus Cristo. Sendo assim, não resta dúvida alguma de que Jesus é
este primeiro cavaleiro montado em um cavalo branco com arco na mão que “saiu
vencendo para vencer” (Apc 6:2). Afinal, “Cristo vence com a Palavra. Vence com
o evangelho”119. Mesmo diante dos poderes do mau, das perseguições religiosas,
das guerras e catástrofes naturais, Cristo, por meio do seu evangelho, é vitorioso
e o será plenamente no último dia.
Além disto, entender que Jesus é o cavaleiro assentado no cavalo branco é
fundamental para interpretarmos o que simboliza os acontecimentos que
decorrem da abertura dos demais selos. É importante ainda notar o paralelo que
existe entre apocalipse 6 com os sinais anunciados por Jesus que antecederiam
seu retorno a terra presentes nos evangelhos (Mc 13; Mt 24 e Lc 21:10-13). Os
outros três cavalos, por exemplo, fazem menção aos mesmos sinais preditos por
Jesus: “Vocês ouvirão falar de guerras e rumores de guerras, mas não tenham
medo. É necessário que tais coisas aconteçam, mas ainda não é o fim. Nação se
levantará contra nação, e reino contra reino. Haverá fomes e terremotos em
vários lugares. Tudo isso será o início das dores. Então eles os entregarão para
serem perseguidos e condenados à morte, e vocês serão odiados por todas as
nações por minha causa” (Mt 24:6-9). “Assim, estamos certos que, antes de
outros cavaleiros disseminarem os horrores da guerra, fome e morte, Cristo
cavalga primeiro como o cabeça da cavalgada, decidido a ganhar as nações pelo
evangelho. E ele consegue”120.

A abertura do segundo selo (6:3-4)

João prossegue narrando o que viu quando o Cordeiro abriu o segundo


selo: “Então saiu outro cavalo; e este era vermelho. Seu cavaleiro recebeu poder
para tirar a paz da terra e fazer que os homens se matassem uns aos outros. E
lhe foi dada uma grande espada” (v.4). Não há grandes dificuldades para se
interpretar o que significa este cavalo e seu cavaleiro. É explicito no texto o seu
sentido: guerra e derramamento de sangue. As guerras sempre marcaram a
história humana. Ela perpassa séculos e civilizações. “As guerras estão
aumentando em número e em barbárie (as duas guerras mundiais, as guerras
tribais, as guerras étnicas, as guerras religiosas e de interesse econômico)” 121. O

118
Idem, p. 74.
119
Lopes (2005:175).
120
Stott (2006:200-201).
121
Lopes (2005:176).

26
mundo sempre falou de paz, mas sempre se armou para a guerra. Mesmo com
um suposto avanço da sociedade humana as guerras não foram extintas e não o
serão, de acordo com este trecho das Escrituras. Até os dias de hoje elas pode
ser vistas no mundo e, de acordo com Apocalipse, assim será até o retorno de
Jesus Cristo a terra. Este cavalo e seu cavaleiro, portanto, fazem menção a
guerra de maneira generalizada, ou seja, a todas guerras que houveram na
história da civilização humana e ainda haverá até a volta de Jesus. Este cavaleiro
também faz eco ao que Jesus já havia ensinado, de que ouviríamos “falar de
guerras e rumores de guerras” e, que “nação se levantaria contra nação, e reino
contra reino” (Mt 24:6-7).

A abertura do terceiro selo (6:5-6)

Após a visão do cavalo vermelho e seu cavaleiro João vê o Cordeiro


abrindo o terceiro selo. Desta vez ele viu “um cavalo preto. Seu cavaleiro tinha na
mão uma balança. Então ouvi o que parecia uma voz entre os quatro seres
viventes, dizendo: "Um quilo de trigo por um denário, e três quilos de cevada por
um denário, e não danifique o azeite e o vinho!”(v.5-6). De acordo com a parábola
contada por Jesus em Mt 20:2 o denário era o salário referente a um dia de
trabalho de um operário. O que vemos simbolizado aqui é uma surpreendente
inflação dos alimentos básicos para a sobrevivência humana, por isso o cavaleiro
está com uma balança em sua mão. Ele pesa os alimentos super inflacionados. O
“trigo era o alimento principal no mundo antigo, e cevada era o alimento dos
pobres, porque era mais barato” 122. A inflação destes alimentos essenciais produz
a fome e a escassez de milhares.
No final do versículo 6 é dito que João ouviu a seguinte ordem: “não
danifiques o azeite e o vinho”. O que esta ordem significa? Neste caso, é
preferível entender que estas palavras põem um limite ao grau de escassez 123.
Desta forma o cavalo preto e seu cavaleiro simbolizam a carência e a falta de
alimentos básicos em decorrência de uma super inflação, que produz sofrimento a
milhões de pessoas pelo mundo. Cabe lembrar aqui as palavras de Cristo que
nos alertou para o fato de que, antes de seu retorno glorioso, haveria fomes em
vários lugares da terra (Mt 24:7).

A abertura do quarto selo (6:7-8)

Quando o quarto selo é aberto outro cavaleiro surge. Desta vez ele é
amarelo e seu cavaleiro chamava-se Morte, e o Hades o seguia de perto. Foi-lhes
dado poder sobre um quarto da terra para matar pela espada, pela fome, por
pragas e por meio dos animais selvagens da terra (v.7-8 NVI). Este cavalo e seu
cavaleiro representam a morte de forma geral e universal promovida no mundo
pela violência (simbolizada aqui pela espada), pela fome (provocada pela
escassez de alimentos e o encarecimento dos mesmos), por pestilências e
doenças que se alastram como pragas vitimando a muitos e também por animais
selvagens. De acordo com texto o inferno segue de perto este cavaleiro (v.8). A
palavra grega hades, traduzida aqui, por inferno significa mundo dos mortos que é
a sepultura. Portanto, o significado desta visão é óbvio: a morte é universal –

122
Ladd (2007: 76).
123
Idem.

27
atinge crentes e não crentes – logo, todos terão de enfrentá-la, das mais variadas
maneiras, até que o Senhor volte.

A abertura do quinto selo (6:9-11)

Depois da abertura dos quatro primeiros selos, João presencia a abertura


do quinto, veja só: “Quando abriu o quinto selo, vi debaixo do altar as almas dos
que tinham sido mortos por causa da palavra de Deus e por causa do testemunho
que deram” (v.9). É preciso entender bem este texto, pois com base nele, muitos
são os que afirmam erroneamente um estado intermediário para onde os cristãos
vão depois que morrem. É claro que o texto não diz nada a cerca disto. É preciso
lembrar, não somente aqui, mas em todo o livro de Apocalipse, que a linguagem
utilizada é figurada e não literal. “João vê as almas dos mártires debaixo do altar,
mas isto não tem nada a ver com o estado intermediário dos mortos e sua
situação naquele momento; é só uma maneira vívida de mostrar que eles foram
martirizados pelo nome do seu Deus”124.
João está falando sobre todos os mártires de todos os lugares e épocas. É
importante lembrar que Jesus disse que isto aconteceria: “Então sereis entregues
a tortura e vos matarão; e sereis odiados por todas as nações por causa do meu
nome” (Mt 24:9). João vê sob este altar o sangue destes mártires sacrificados. Ele
viu a alma deles, pois de acordo com Levíticos 17:11 “a alma da carne está no
sangue” ou seja a “vida está no sangue”. João ainda descreve que estes mártires
clamavam “com grande voz, dizendo: Até quando, ó Soberano, santo e
verdadeiro, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a
terra?”(v.10).
A primeira vista pode parecer estranho este clamor por vingança uma vez
que Cristo ensinou aos seus discípulos a prática de orar por seus inimigos e
perseguidores (Mt 5:44) a semelhança de Estevão e do próprio Jesus que em
suas mortes oraram pelo perdão de seus executores (Lc 23:34 e At 7:60).
Contudo não existe dificuldade alguma de se entender este clamor, uma vez que
os mártires “não invocam retribuição por sua própria causa, mas por causa de
Deus. Esses santos foram sacrificados porque colocaram sua certeza e sua
confiança no Senhor. Imolando-os, o mundo desprezou a Deus” 125. Eles oram,
portanto, pela justiça divina.
Depois disso, João prossegue dizendo que “foram dadas a cada um deles
compridas vestes brancas e foi-lhes dito que repousassem ainda por um pouco de
tempo, até que se completasse o número de seus conservos, que haviam de ser
mortos, como também eles o foram” (v.11). O que isto significa? Isso indica que
João sabe que o fim não virá logo, e que a igreja experimentará mais épocas de
martírio126 antes que Jesus retorne para vingar o sangue de seus mártires e fazer
justiça a todos os que foram injustiçados.

A abertura do sexto selo (6:12-17)

Quando o Cordeiro abriu o sexto selo foi visto fenômenos e acontecimentos


incríveis nunca antes vistos na terra: “Houve um grande terremoto; e o sol tornou-
se negro como saco de cilício, e a lua toda tornou-se como sangue; e as estrelas

124
Idem, p. 78.
125
Hendriksen (2001:147).
126
Ladd (2007:80).

28
do céu caíram sobre a terra, como quando a figueira, sacudida por um vento forte,
deixa cair os seus figos verdes. E o céu recolheu-se como um livro que se enrola;
e todos os montes e ilhas foram removidos dos seus lugares. E os reis da terra, e
os grandes, e os chefes militares, e os ricos, e os poderosos, e todo escravo, e
todo livre, se esconderam nas cavernas e nas rochas das montanhas; e diziam
aos montes e aos rochedos: Caí sobre nós, e escondei-nos da face daquele que
está assentado sobre o trono, e da ira do Cordeiro; porque é vindo o grande dia
da ira deles; e quem poderá subsistir?” (6:12-17).
Os acontecimentos narrados por João neste texto são de caráter singular,
universal e catastrófico. São tão excepcionais e inimagináveis que nenhum filme
de Hollywood seria capaz de reproduzir com realismo as cenas vistas por João.
“A linguagem não é somente poética ou simbólica de realidades espirituais, mas
descreve uma catástrofe cósmica real de caráter inconcebível para nós” 127. Mas
como interpretar estes acontecimentos vistos por João? Alguns estudiosos
entendem que não devemos interpretá-los “como eventos literais, mas como
agitações sociais e políticas descritas com figuras apocalípticas familiares” 128.
Contudo, a melhor intepretação é aquela que compreende as cenas
descritas por João no abrir do sexto selo como sendo eventos literais que
acontecerão num curto período antecedendo a volta de Jesus a terra. Além de
literais, estes eventos serão universais. Todas as pessoas, de todas as classes
sociais estarão presentes: “os reis da terra, e os grandes, e os chefes militares, e
os ricos, e os poderosos, e todo escravo, e todo livre” (v.15). As catástrofes, por
sua vez, também acontecem em escala global: “o céu recolheu-se como um livro
que se enrola; e todos os montes e ilhas foram removidos dos seus lugares”
(v.14). Mas o que estes eventos significam? Os eventos narrados por João por
ocasião da abertura do sexto selo mostram fatos e acontecimentos que ocorrerão
na terra num curto período antes do retorno de Jesus Cristo; eles nos levam ao
limiar do último dia. Este curto mais intenso período de sofrimento é chamado de
grande tribulação (Ap 7:14; Mt 24:29). Sendo assim, o sexto selo é uma breve
amostra do período da grande tribulação que será descrito por João com maiores
detalhes na visão das setes trombetas (capítulos 8 e9) e das sete taças (capítulos
15 e 16).

4. UMA PAUSA ENTRE A ABERTURA DO SEXTO E DO SÉTIMO SELO


(Apocalipse 7)

Depois de todos estes eventos da grande tribulação descritos na abertura


do sexto selo espera-se que Jesus apareça em seu retorno glorioso a terra, afinal
a grande tribulação antecede a vinda de Jesus (Mt 24:29). No entanto, João “não
continua descrevendo o fim e a vinda do Senhor como poderíamos esperar” 129.
Ele retrocede em sua narrativa para mostrar com mais detalhes os
acontecimentos últimos que antecederão o fim. Desta forma, o “sexto selo nos
traz ao limiar do fim; e então João recua, de alguma forma, para contar a história
do fim com mais detalhes”130. João vê “quatro anjos de pé nos quatro cantos da
terra, retendo os quatro ventos, para impedir que qualquer vento soprasse na
terra, no mar ou em qualquer árvore” (v.1). Logo em seguida, o apóstolo

127
Idem, p. 82.
128
Stott (2006:201).
129
Ladd (2007:82).
130
Idem, p. 82.

29
presenciou “outro anjo subindo do Oriente, tendo o selo do Deus vivo. Ele bradou
em alta voz aos quatro anjos a quem havia sido dado poder para danificar a terra
e o mar: Não danifiquem nem a terra, nem o mar nem as árvores, até que
selemos as testas dos servos do nosso Deus" (v.2-3 NVI).
O que João continua nos dizendo é que antes do fim, um período de
grande tribulação virá sobre a terra – o mar, a terra e a vegetação sofrerão
terríveis danos. Antes disto, porém, os servos de Deus serão selados diz o
versículo 3. Não devemos confundir este selo com o selo do Espírito que todos os
que receberam Jesus como Senhor possuem (Ef 1:13). O texto deixa claro que
este selo não tem o sentido de salvação ou redenção, mas de proteção, pois os
anjos “não danificarão nem a terra, nem o mar nem as árvores, até que as testas
dos servos do nosso Deus sejam seladas".
Em Apocalipse 9:3-4 João tem uma visão onde vê algo parecido com
“gafanhotos que vieram sobre a terra, e lhes foi dado poder como o dos
escorpiões da terra. Eles receberam ordens para não causar dano nem à relva da
terra nem a qualquer planta ou árvore, mas apenas àqueles que não tinham o
selo de Deus na testa”. Deus em sua justa ira castigará a sociedade humana
cruel, violenta, apóstata e rebelde com terríveis pragas antes do julgamento final.
“No meio desta sociedade rebelde está o povo de Deus, mas a ira de Deus não o
atinge; eles estão selados, e desta forma protegidos da ira” 131.
Esta cena nos faz lembrar a épica história da saída de Israel da escravidão
do Egito. Como você deve se lembrar, Deus castigou os egípcios por meio de dez
pragas, mas seu povo estava protegido de maneira que nenhuma daquelas
pragas os atingiu. Assim também será na grande tribulação: os cristãos estarão
protegidos da ira de Deus que se derramará sobre o mundo. Isto também fica
evidente em Apocalipse 16 que narra as taças da ira de Deus sendo despejadas
somente sobre aqueles que trazem a marca da besta e adoraram sua imagem.
Algo importante neste momento é entender quem são os selados de Apocalipse
7, que de acordo com o texto totalizam o número de cento e quarenta e quatro
mil, de todas as tribos de Israel (v.4).

Os cento e quarenta e quatro mil selados (7:3-8).

Há grande variedade de interpretação a respeito dos cento e quarenta e


quatro mil que foram selados. Alguns dizem que eles representem o povo de
Israel convertido ou o número de judeus que se converterão a Cristo durante a
grande tribulação. Entretanto, isto não faz sentido, pois, de acordo com texto,
aqueles que são selados o são para proteção e não para salvação. Isto significa
que os selados já são salvos; eles não se converterão durante a grande
tribulação, mas serão protegidos nela. A melhor maneira de interpretar os cento e
quarenta e quatro mil é afirmando que eles simbolizam a Igreja de Cristo que no
Novo Testamento é chamada de Israel espiritual.
Sendo assim os cento e quarenta e quatro mil, de todas as tribos de Israel
simbolizam a igreja que é selada para passar pela grande tribulação. A lista
apresentada por João dos selados de cada tribo nos versículos de 5 a 8 possuem
algumas irregularidades. A tribo de Dã não aparece e a tribo de José, por sua vez,
aparece duas vezes já que Manassés é seu filho. “Até hoje não foi apresentada
nenhuma explicação satisfatória para esta lista de nomes irregular, a não ser esta:
que João queria dizer que as doze tribos não são o Israel literal, mas o Israel
131
Idem, p. 84.

30
verdadeiro, espiritual – a igreja” 132. Esta interpretação encontra vasto apoio
bíblico.
Pedro chamou a igreja de “geração eleita, sacerdócio real, nação santa,
povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou
das trevas para a sua maravilhosa luz” (I Pd 2:9). Por sua vez, Paulo ensinou a
igreja de Filipos que “nós é que somos a circuncisão, nós que adoramos pelo
Espírito de Deus, que nos gloriamos em Cristo Jesus e não temos confiança
alguma na carne” (Fp 3:3) e, aos romanos que “judeu é quem o é interiormente, e
circuncisão é a operada no coração, pelo Espírito, e não pela lei escrita” (Rm
2:29). Por fim, em sua carta aos gálatas, ao se despedir, Paulo diz: “Paz e
misericórdia estejam sobre todos os que andam conforme essa regra, e também
sobre o Israel de Deus” (Gal 6:16).
Ora, fica evidente, neste texto de Apocalipse 7:4-8, que o único motivo pelo
qual os salvos estão sendo representados como as doze tribos de Israel é que em
todo o Novo Testamento a igreja é vista como “o Israel de Deus”, “a verdadeira
circuncisão” e “um povo escolhido... nação santa, povo exclusivo de Deus” 133.
Além disto, entender os cento e quarenta e quatro mil representando a igreja faz
todo o sentido, pois facilita a intepretação acerca da grande multidão que logo em
seguida é vista por João.

A grande multidão (7:9-17)

Depois da visão dos cento e quarenta e quatro mil João vê “uma grande
multidão que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas,
de pé, diante do trono e do Cordeiro, com vestes brancas e segurando palmas”
(v.9). Um dos anciãos que estavam diante do trono perguntou a João: "Quem são
estes que estão vestidos de branco, e de onde vieram?" João não sabe e, por
isso se cala. O mesmo ancião então responde a pergunta que havia feito: "Estes
são os que vieram da grande tribulação e lavaram as suas vestes e as
branquearam no sangue do Cordeiro” (v.14). Perceba que num primeiro momento
os cento e quarenta e quatro mil são selados para passar pela grande tribulação
e, agora, é dito que as pessoas desta grande multidão vieram da mesma grande
tribulação.
Ora, fica evidente, portanto, que os cento e quarenta e quatro mil selados e
a grande multidão “são constituídas das mesmas pessoas – a igreja – vista em
dois estágios da sua história nos últimos tempos: primeiro no limiar da grande
tribulação e depois de ter passado por ela” 134. Podemos deixar isto mais claro
dividindo o capítulo 7 em dois quadros cada um apresentando um momento da
igreja: nos versículos de 1 à 8 temos uma visão dos crentes no limiar da grande
tribulação (os 144 mil), sendo selados para serem protegidos da ira de Deus que
se derramará sobre o mundo; este é o primeiro quadro. O segundo quadro vai dos
versículos 9 ao 17 onde temos este mesmo grupo depois de ter passado pela
tribulação, já na eternidade com Deus.
Os dois grupos (os 144 mil e a grande multidão), portanto, são a igreja
perseguida vista em dois momentos diferentes. A grande multidão é vista por
João desfrutando da eternidade, pois é dito que “nunca mais terão fome, nunca
mais terão sede; nem sol nem calma alguma cairá sobre eles, porque o Cordeiro
132
Idem, p. 87.
133
Stott (2006: 202).
134
Ladd (2007:87-88).

31
que está no meio do trono os apascentará e lhes servirá de guia para as fontes
das águas da vida; e Deus limpará de seus olhos toda lágrima” (v.16-17).
Obviamente, estas são as bênçãos que todos os salvos irão desfrutar na
eternidade quando o Reino glorioso de Deus for consumado na história de acordo
com Ap 21:4. É por isto que essa grande multidão também deve ser interpretada
de maneira mais abrangente e universal, como sendo a representação de todos
aqueles que sofreram por Cristo em todos os tempos. São os que vieram da
grande tribulação dos últimos dias, mas não somente, eles representam de forma
geral os que sofreram pelo evangelho no decorrer de toda a história.

A grande tribulação (7:14)

Novamente não são poucas as intepretações existentes a cerca da grande


tribulação – muitas delas absurdas e ilógicas. A expressão “grande tribulação”, da
qual já falamos na abertura do sexto selo e que aparece também aqui no
versículo 14 refere-se a um curto período de tempo, mas de intenso sofrimento no
mundo que antecederá o retorno poderoso de Cristo a terra. Jesus já havia
mencionado este período: “Porque haverá então grande tribulação, como nunca
houve desde o princípio do mundo até agora, nem jamais haverá” (Mt 24:21).
Neste tempo Deus derramará sua ira sobre os ímpios trazendo catástrofes e
pragas terríveis (Ap 7:3), mas antes disto, os crentes serão selados para que
estejam salvos do poder de sua ira (Ap 7:4). Ainda sim, na grande tribulação a
igreja não será poupada do sofrimento e será duramente perseguida.
Não devemos estranhar isto, pois como Paulo já havia advertido: "É
necessário que passemos por muitas tribulações para entrarmos no Reino de
Deus" (At 14:22); e, “de fato, todos os que desejam viver piedosamente em Cristo
Jesus serão perseguidos” (II Tm 3:12). O próprio Jesus disse: “Sereis entregues
até por vossos pais, irmãos, parentes e amigos; e matarão alguns dentro vós” (Lc
21:16). Desta forma, “a grande tribulação nada mais será que uma forte
intensificação da mesma hostilidade satânica que a igreja experimentou durante
toda a sua existência; Satanás, em um último esforço desesperado, tenta desviar
o coração do povo de Deus do seu Senhor” 135.
Neste período se revelará “o homem da iniquidade, o filho da perdição, o
qual se opõe e se levanta contra tudo que se chama Deus ou é objeto de
adoração, a ponto de se assentar no santuário de Deus, proclamando que ele
mesmo é Deus” (II Ts 2:3-4). Em Apocalipse 13 é dito que “foi-lhe dado poder
para guerrear contra os santos e vencê-los” (v.7) e também para matar todos os
que não adorassem a sua imagem (v.15). Como foi dito a pouco, a grande
multidão de remidos vista por João “que ninguém podia contar, de todas as
nações, tribos, povos e línguas, que estavam de pé, diante do trono e do
Cordeiro, com vestes brancas” (Ap 7:9) é composta por aqueles que vieram dessa
“grande tribulação, lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue do
Cordeiro” (Ap 7:14).
De acordo com George Eldon Ladd, a teologia que está por trás da grande
tribulação é o conflito secular entre Deus e Satanás 136; Cristo e o Anticristo; o bem
e o mal. Por fim, a grande tribulação está claramente associado com iminente
volta de Cristo a terra. O próprio Jesus disse: “Logo depois da tribulação daqueles

135
Idem, p. 89.
136
Idem, p. 88.

32
dias (...) verão vir o Filho do homem sobre as nuvens do céu, com poder e grande
glória” (Mt 24:29-30).

5. A ABERTURA DO SÉTIMO SELO (Apocalipse 8:1)

Como pode ser facilmente observado, o capítulo sete interrompeu a visão


da abertura dos setes selos. Ocorreu uma pausa narrativa. Em Ap 6:12-17, a
abertura do sexto selo nos levou ao limiar do fim, ao curto período da grande
tribulação que antecederá o retorno de Jesus, mas João, no capitulo 7, retrocedeu
na história para nos mostrar que antes deste período e do próprio fim os salvos
seriam selados. O apóstolo nos tranquilizou ao mostrar que a igreja seria
protegida da ira de Deus que se derramaria sobre o mundo rebelde. Foi mostrado,
então, a visão da igreja em dois momentos: no primeiro, sendo protegida (selada)
para enfrentar a grande tribulação e, depois, num segundo momento, recebendo
as bênçãos do Reino consumado – uma vez que, mesmo perseguida, não negou
a fé durante a grande tribulação.
Agora, aqui, em Apocalipse 8:1 vemos a abertura do sétimo selo. Se
atentarmos bem percebemos que o sétimo selo não traz nenhuma descrição de
evento específico, catástrofe ou maldição como aconteceu nos demais selos. Isto
só pode significar que o conteúdo do sexto selo são as setes trombetas que serão
mostradas nos capítulos 8 e 9. Cada trombeta descreverá pragas que cairão
sobre os homens no período da grande tribulação. Desta maneira, o sétimo selo
descreve de modo pormenorizado a grande tribulação já descrita de maneira
sucinta no sexto selo. O conteúdo do sétimo selo é a descrição das sete
trombetas que apresentam o mesmo período, a grande tribulação que sobrevirá
sobre o mundo. É nos dito por João que: “Quando o Cordeiro quebrou o sétimo
selo, houve silêncio no céu por mais ou menos meia hora” (Ap 8:1 NTLH). Este
silêncio é sinônimo de expectativa e tremor. Diante dos acontecimentos que se
seguirão os céus ficaram em silêncio, pois as trombetas que são vistas a partir de
agora nos mostram de maneira pormenorizada o início do julgamento de Deus
sobre o mundo apóstata e rebelde – o período da grande tribulação. Este será o
assunto do próximo capítulo. Vire a página e vamos lá!

33
Capítulo 3
O JULGAMENTO JÁ COMEÇOU!
As sete trombetas

Nos dois primeiros capítulos deste livro, em linhas gerais, estudamos sobre
o recado de Jesus enviado às sete igrejas e sobre os sete selos. Os seis primeiro
selos foram abertos (Ap 6:1-17). Eles relatam os eventos que trazem o fim.
Quando o sexto selo foi aberto, fomos apresentados a alguns acontecimentos
catastróficos. Ele nos deixou no limiar da grande tribulação. O sétimo selo trará os
detalhes deste difícil período. Antes disso, porém, no capítulo 7, tivemos uma
visão confortante para os fiéis. Eles foram “selados” para ser protegidos durante
este período. Isto não significa que não sofrerão. De maneira indireta eles
sofrerão com o juízo que virá contra os ímpios. Contudo, como vimos, João
antecipa a vitória da igreja e apresenta uma visão dos mártires na glória (Ap 7:9-
17).
Enfim, chegamos ao capítulo 8, quando o sétimo e último selo será aberto.
Este sétimo selo é constituído das Sete Trombetas. Alguns comentaristas
procuram relacionar os Selos e as Trombetas de forma que os primeiros seriam a
repetição da mensagem das últimas. Existem os que propõem que eles se
referem aos mesmos fatos escatológicos. Outros opinam que as Trombetas se
referem apenas ao vislumbre do sétimo selo. Esta última proposta parece
respeitar mais o texto por si mesmo, pois todas as Trombetas estão relacionadas
apenas ao Sétimo selo. Ladd comenta isso deste modo:

“... As sete trombetas constituem o sétimo selo; a recapitulação é só parcial. Os seis


selos relatam as forças que trazem o fim, enquanto que as trombetas relatam o inicio
dos acontecimentos do fim em si, em particular o tempo de grande tribulação que
antecederá o fim”.137

Concordamos com Ladd que as trombetas trazem-nos narrações sobre


eventos que acontecerão na grande tribulação, no momento final da história do
nosso mundo, antes de chegar o grande dia da ira do nosso Deus. Temos a
descrição das seis primeiras trombetas em Apocalipse capítulos 8-9. Entre a
sexta e a sétima trombeta, conforme veremos, temos novamente um intervalo
que, de alguma maneira, explicará as razões do porque este castigo está sendo
infringido sobre os ímpios (Ap 10:1-11:14). Por fim, temos a narração da sétima
trombeta (Ap 11:1519). Vamos, a partir de agora, analisar estes capítulos em
busca dos seus ensinos para nós!

137
Ladd (1980:91)

34
O Silêncio da Expectação (8:1)

Começamos o capítulo 8. Deus, através de João tem muito a nos dizer.


Mas de forma até que aparentemente antagônico, a primeira palavra que nos
chama a atenção é silêncio: Quando ele abriu o sétimo selo, houve silêncio no
céu acerca de meia hora (v.1). Aqui, não apenas o silêncio nos chama a atenção,
mas o local onde ele acontece: No céu. O Silêncio dura meia hora. Meia hora
estabelece que falta pouco, que o tempo do juízo se aproxima, mas antes de
Deus dar cabo a isso, há silêncio no céu. Este silêncio, porém, é provisório, pois
haverá o momento do Senhor agir. O silêncio revela a grande e terrível
expectativa do juízo de Deus que virá de maneira devastadora sobre a terra.
Quem lê o texto, identifica claramente este senso de expectativa e ansiedade pelo
que vai acontecer, pois sabemos que é terrível! O próprio Ladd entende que o
silêncio...

“... representa uma atitude de suspense e tremor por parte dos exércitos
celestiais, vendo os julgamentos de Deus que desabarão sobre o mundo. É o silêncio
da terrível expectativa dos acontecimentos que estão por vir, agora que o tempo do
fim chegou”.138

Além dessa conotação, é possível perceber aí também um sentimento de


Reverência. Reverência angelical, pois é Deus que estabelece o julgamento, e ao
fazê-lo, tem diante de si, todos os seres celestiais à sua disposição para decretar
sua vontade Soberana. Esta vontade se revela através do toque das Trombetas.
Antes das trombetas soarem, contudo, temos apresentado alguns acontecimentos
interessantes.

A oração dos santos (8:2-5)

O v. 2 começa nos dizendo que João vê sete anjos de pé diante de Deus, e


a eles foram dadas sete trombetas nas mãos. Quem são estes anjos? Não
sabemos ao certo. Contudo, pela posição destes, isto é, “em pé diante de Deus”,
parecem ser anjos especiais. Barclay faz o seguinte comentário sobre os
mesmos:

Seu título de "anjos da presença" significa (...) que desfrutavam de uma honra
especial. Nos reinos orientais somente os súditos mais queridos por seu soberano
tinham direito a estar permanentemente em sua presença. Ser um cortesão da
presença, como eram chamados, era uma honra muito especial. (...) Na ordem
celestial de coisas a maior honra é estar preparado todo o tempo para ser enviado
por Deus a cumprir suas ordens; e é esta a honra que possuíam os "anjos da
presença".139

Além da honra especial, estes anjos têm trombetas em suas mãos. Nas
“visões do Antigo e do Novo Testamento as trombetas sempre são o símbolo das
intervenções de Deus na história”. 140 Antes destes anjos tocarem as suas
trombetas (v. 6), João aparentemente quer que entendamos, pelo que narra na
sequência, que a ação deles é uma reação direta a oração da igreja (vs. 3-5).

138
Ladd (1980:91).
139
Barclay (p. 265).
140
Ibidem.

35
Somos apresentados a um “outro anjo” que se coloca junto ao altar,
segurando um incensário de ouro; foi-lhe dado muito incenso para que ele o
oferecesse junto ao altar de ouro que está diante do trono, juntamente com as
orações de todos os santos (v. 3). Ele vai até o altar, “símbolo da presença de
Deus”, oferecer a oração dos santos. Ele fica em pé junto ao altar, como um
sacerdote que vai oferecer o incenso (Ex 40:5; Lv 4:7). 141 Da mão do anjo sobe
até Deus a fumaça do incenso junto com as orações dos santos (Ap 8:4).
Podemos presumir que as “orações dos santos são pela vinda do Reino de Deus
e pela manifestação do julgamento de Deus contra os poderes demoníacos que
oprimiram os que confessaram com fidelidade o nome de Jesus”. 142 Sobre isto,
Turner faz o seguinte comentário:

Durante séculos os discípulos do Senhor tem orado: “Pai nosso... venha o teu reino,
faça-se a tua vontade...”. Agora chegou o tempo do pleno cumprimento deste
período. É verdade que quando oramos sinceramente esta prece que Cristo ensinou
aos seus discípulos pensamos no desejo honesto de que Ele reino hoje em nossos
coração e que façamos hoje sua santa vontade com a mesma prontidão e perfeição
com que fazem os santos anjos. Todavia, devemos também desejar que Ele volte a
terra para estabelecer seu reino perfeito. Incluído nisto está o desejo fervoroso de que
chegue logo o dia quanto neste mundo seja feita só a vontade de Deus. 143

As orações dos santos sobem a presença de Deus, suas orações


provocam o juízo de Deus. Por isso, lemos no v. 5 que, o anjo toma o incensário,
“agora esvaziado do incenso, e enche-o com as brasas do altar, lançando-as
sobre a terra, isto é, Deus ouviu as orações dos santos, e os juízos sobre a terra
são respostas a elas”.144 Os anjos se preparam para tocar as trombetas. Começa
o julgamento de Deus. A expressão que começará o v. 6 é esclarecedora: Então...
Ela estabelece a ligação dos eventos: pelas orações de todos os santos ocorrerá
o quem a seguir. Deus então determina o toque das primeiras Trombetas, que é o
que veremos no próximo tópico.

Começa o Toque das Trombetas (8:6)

O Versículo 6 nos diz que os anjos pegaram as Trombetas e se


prepararam para tocar. A partir daí, será possível perceber claramente a distinção
entre as quatro primeiras Trombetas e as três últimas. Nas quatro primeiras, o
autor, inspirado pelo Senhor, é bastante sintético, de forma que a visão é curta
sobre cada Trombeta. Que significam estas Trombetas iniciais? Elas representam
um juízo que é parcial e não final, por isso, temos a repetição seis vezes no
capítulo 8 da expressão a terça parte em referência a coisas e pessoas atingidas
pelas consequências do toque das Trombetas (vs. 7, 8, 9, 10, 11 e 12). Cada anjo
e cada Trombeta tocada manifestam o juízo parcial de Deus sobre o planeta. O
juízo é parcial nas trombetas, pois o desfecho da Grande Tribulação se dará
posteriormente, quando as sete taças forem derramadas. As trombetas abrem o
período da Grande Tribulação, enquanto as taças o encerram.

As quatro primeiras trombetas (9:7-13)

141
Ladd (1980:93).
142
Idem, p. 94.
143
Turner (1983:133).
144
Hendriksen (2001:163).

36
A 1ª Trombeta revela o juízo sobre a terra (8:7). Foram lançados sobre a
terra granizo e fogo misturado com sangue, e um terço da terra, das florestas e de
toda relva verde foram queimadas. Saraiva e fogos são visto misturados com
sangue, um indicativo do caráter destruidor desta primeira ação de Deus. A 2ª
Trombeta manifesta o juízo sobre o mar (8:8-9). Foi lançado no mar algo como
um grande monte em chamas, e a terça parte dos peixes e das embarcações (e
com elas, possivelmente, os seus tripulantes) foi destruída. A 3ª Trombeta nos
mostra o juízo sobre rios e fontes de águas (8:10-11). Cai uma grande estrela
chamada “Absinto” e um das águas tornam-se impróprias para o consumo. Alguns
homens morrem por bebê-la. Barclay diz que o absinto é o nome genérico de um
tipo de plantas que se conhecem, também, como artemísia; sua característica é a
amargura de seu gosto; não são plantas venenosas, ainda que possam ocasionar
mal estar.145 A 4ª Trombeta estabelece o juízo que alcança até mesmo os
luminares (8:12). Segundo João uma terça parte dos luminares se apagam.
Durante as quatro Trombetas, as coisas criadas e os seres humanos
aparecem sempre na forma passiva. Eles sofrem a intervenção do Senhor por
meio dos anjos. É a soberania de Deus e o Juízo de Deus que começam. O
Homem contempla o agir do Senhor, sua Soberania. No começo do versículo 13,
temos a presença de uma águia. Das muitas características deste animal, a que
sobressai é sua visão apurada. Ela vê de longe a caça ou o objeto desejado,
antes de qualquer outro ser. E a águia aqui aparece para dizer por meio de sua
visão a partir do céu que ainda tem muita coisa a ser contemplada. As três últimas
trombetas serão piores que as primeiras. Isso acontecerá nas próximas
Trombetas, que veremos no tópico a seguir.

A 5ª Trombeta (9:1-12)

Embora nas nossas Bíblias o capítulo 8 se encerre com o v. 13, é preciso


aferir que este versículo deveria na realidade abrir o capítulo 9, pois ele tem
relação com a 5ª Trombeta e não mais com a 4ª. A expressão enfática do mesmo
estabelece o que vem pela frente: Ai, Ai, Ai dos que habitam na terra, por causa
dos toques das Trombetas dos três anjos que ainda faltam tocar (8:13b). Cada um
dos Ais representa uma das Trombetas restantes. O juízo se intensifica, por isso,
a presença dos Ais, que não se encontram nas quatro primeiras Trombetas.
Quando o quinto anjo toca a sua trombeta, João vê uma estrela que havia
caído do céu sobre a terra; e foi lhe dado a chave do poço do abismo (Ap 9:1).
Quem é esta estrela que caiu do céu? Esta estrela cai sobre a terra, a exemplo do
que acontece na profecia de Is 14:12. E esta estrela tem ligação direta com o
abismo, o que também acontece com satanás (Ap 9:11; 20:1 e 20:3). Diante
disso, entendemos ser uma menção direta a Satanás. Chave é símbolo de
autoridade. Foi-lhe dada à chave, diz o texto. Isto mostra que o poder de Satanás
é limitado. Todos os atos e Fatos, mesmo os do diabo, são determinados pelo
Senhor. Isso é provado nas expressões: Foi-lhe dada chave do abismo (9.1); Foi
lhes dado poder (9.3); Foram dadas ordens (9.4); Foi-lhes permitido atormentar
(9.5). Vemos por estas expressões que é lá do céu que vem a ordem, é decisão
do alto, e por isso, se cumpre.
Com a chave que recebeu, Satanás abriu o poço do abismo, e saiu fumaça do
poço, e da fumaça, saíram gafanhotos sobre a terra e foi-lhe dado poder como os
escorpiões da terra (v. 2-3). Gafanhotos são símbolos de maldição no Antigo
145
Barclay (p. 267).

37
Testamento. Aqui, neste caso, não “são gafanhotos verdadeiros, mas criaturas
que simbolizam o poder demoníaco”. 146 Eles não tinham poder, mas “...foi-lhes
dado poder...” Tudo está sob o total controle de Deus. Sobre a descrição terrível
destes, Barclay comenta:

“... os gafanhotos infernais têm um aguilhão como o dos escorpiões. O


escorpião era uma das pragas da Palestina. Sua forma é similar à de um gafanhoto
marinha pequeno. Tem pinças como as da gafanhoto marinho, com as quais se
agarra à sua vítima. Tem uma cauda longa que se dobra acima do corpo e da
cabeça; no extremo da cauda tem um aguilhão curvo; é com este aguilhão que os
escorpiões lançam seu golpe, pois ao fincar-se na carne da vítima segrega um
veneno que pode ser mortal. O escorpião na Palestina pode medir até 15 centímetros
de comprimento; é encontrado nas gretas das rochas e debaixo das pedras. Os que
acampam nessas regiões devem ter a precaução de levantar cada uma das pedras
do lugar onde projetam levantar suas tendas, para terem certeza que não escondem
escorpiões: A picada do escorpião é muito mais grave que a de uma vespa. Nem
sempre é fatal, mas pode chegar a matar. Os gafanhotos infernais têm, além de sua
destrutibilidade como gafanhotos, e poder dos escorpiões”. 147

Na continuação lemos: Foi-lhes dito que não causassem dano à erva... (v.
4). Estes gafanhotos recebem uma missão incomum, afinal de contas, comem
tudo o que é verde, mas isto lhes é explicitamente proibido. Estes devem atacar
os seres humanos. Mas não é qualquer ser humano: a ação do diabo é limitada, é
Deus quem impõe. Há neste versículo uma visão confortante, o inimigo só tem a
permissão de Deus para tocar naqueles que não tem o selo de Deus.
Percebemos também que o diabo é inteligente, ele sabe quais são aquelas
pessoas que não estão seladas.

“Isto nos leva de volta ao capítulo sete, onde João vê o povo de Deus sendo selado
antes do terrível período de tribulação; este versículo é a razão do selo. Na tribulação
a cólera de Deus começara a cair sobre uma sociedade rebelde, será uma época em
que a besta perseguirá ferozmente a igreja e, como mostra esta trombeta, uma época
de atividade demoníaca. A ira de Deus alcançara somente os adoradores da besta
(16:2), o povo de Deus será protegido divinamente da atividade demoníaca”. 148

O quadro por este período será de terribilidade. O v. 6 é enfático quanto a


isso: Naqueles dias os homens buscarão a morte, mas não a encontrarão;
desejarão morrer, mas a morte fugirá deles. Deus permite no v. 5 que o inimigo
atormente, ainda não é para matar. Diante de tanta tortura os homens que não
tem o selo de Deus não suportarão.
Nos vs. 7-11 temos uma descrição dos gafanhotos. Esses gafanhotos tem
coroa, símbolo do poder que lhes foi dado. Têm cabelos como os de mulher:
Simboliza uma máscara atraente, sensual. Além disso, possuem dentes de leão:
são destruidores. Tem, igualmente, couraça de ferro: Eles são humanamente
indestrutíveis. Por fim, possuem asas, que simboliza agilidade. Não são
onipresentes, mas são ágeis. Eles agirão por um curto período de tempo (Cinco
meses). Eles têm como rei “Abadom” ou “Apolion” que significa aquele que
destrói, e também é uma referência ao chefe dos demônios, o anjo do abismo,
Satanás. Assim, termina-se 5ª Trombeta, o primeiro Ai, e como diz o v. 12 do

146
Ladd (1980:97).
147
Barclay (p. 274).
148
Ladd (1980:98).

38
capítulo 9, ainda restam dois Ais. O Segundo Ai, a 6ª Trombeta é o que veremos
agora.

A 6ª Trombeta (9.13-21)

A palavra tema desta porção, o 2º Ai é Homem. É aqui onde ela mais


aparece no Apocalipse (9:15, 9.18 e 9.20). Quanto o sexto anjo toca a sua
trombeta, João ouviu uma voz que disse ao anjo: Solta os quatro anjos que estão
presos juntos ao rio Eufrates (v. 14). É interessante nesta porção a menção feita
ao Rio Eufrates. Das razões possíveis para o autor utilizá-lo, uma das mais
aceitas é de que era uma região geográfica bastante conhecida dos primeiros
leitores do Apocalipse. Era também bastante habitada. Na continuidade, o texto
vai falar da destruição que chega a muitos, e Deus inspira João a mencionar o
Eufrates para que essa noção de risco iminente e de risco para muitos fique clara.
Estes quatro anjos do fim do cap. 9 de Ap. são os seres presos em Judas v. 6. O
fato deles estarem amarrados significa que Deus estava contendo as suas
intenções maldosas, e não que eles estavam presos literalmente. Eles estavam
impedidos de realizarem suas artimanhas malignas.
Até o presente momento os inimigos só poderiam atormentar o ser humano
(9:5), mas a partir da sexta trombeta ele foi liberado para matar a terça parte dos
homens. Por todo tempo eles estavam presos, no sentido de não poderem
realizar seus desejos, era uma limitação de poder, agora após a permissão de
Deus, eles poderão enfim matar (Ap 9:15). É interessante notar que eles soltos na
hora, dia, mês e ano que Deus quis. Ele sabe o momento exato de fazer as coisas
acontecerem. É Deus quem controla o tempo; quem controla tudo! A ideia
subentendida é que “os anjos maus são controlados por Deus; enquanto Deus
não permitir, eles não poderão agir”. 149
Somos informados que o número dos exércitos destes anjos são
absurdamente grades (v. 16). Do v. 17 ao 19 temos descrições de como estes
seres são poderosos. Por fim, o juízo de Deus foi severo mais ainda foi parcial (v.
18), apenas 30% dos homens sofreram a ira de Deus. A sexta trombeta é a última
chamada de Deus aos ímpios para o arrependimento, mesmo assim eles não se
arrependeram. Nem sempre sofrimento produz arrependimento, senão o mundo
inteiro se converteria (Ap. 16:9). Poderíamos “pensar que o restante da
humanidade, que não foi morto por estas pragas, aprenderia a lição da terça parte
que morreu, caindo diante de Deus com temor e tremor. Mas não é isso que
acontece”150 (vs. 20-21).

O Livrinho Aberto (10:1-11)

O Capítulo 10 do Apocalipse e a primeira parte do capítulo 11 são


entendidos por muitos como uma pausa. Isto porque só no v. 15 do capítulo 11,
teremos a menção direta à Sétima Trombeta. E qual é o ensino central desta
pausa? É o que veremos. Na primeira visão de João, temos a menção de um
“anjo forte” que descia do céu. A Grande questão aqui é estabelecer quem é o
Anjo Forte que Desce do Céu (10.1). O Anjo em questão se refere ao próprio
Senhor Jesus Cristo? A expressão “Anjo Forte” parece apontar para Jesus. No

149
Ladd (1980:101).
150
Ladd (1980:103).

39
entanto, a expressão completa é “outro anjo forte”, o que indica não ser Jesus,
pois no grego, a palavra para Outro é “outro da mesma espécie”.
Assim, é preferível crermos que este Anjo é um Representante de Cristo,
mas não é o próprio Cristo. Champlin corrobora com esta ideia, pois assim
escreve: “O uso geral dos apocalipses a respeito do termo ‘anjo’[...] assegura-nos
que algum arcanjo é o anjo forte do décimo capítulo”. 151 Ladd é da mesma
opinião, e assim comenta: “Este anjo jurou por aquele que vive pelos séculos dos
séculos (10.6) e isto é significativo quando vem de um anjo, mas muito mais difícil
de aplicar a Cristo”.152 Este Anjo Forte, representante de Cristo, segura um livrinho
(v. 2). Este livrinho se refere à Palavra de Deus. Assim como o livrinho tem
relação com o Arrependimento do capítulo anterior, ele aponta para as profecias
que virão pela frente, pois todas elas estão descritas na própria Palavra de Deus.
Esta palavra, como o livrinho, é doce na boca (10.9), como diz Davi no Sl.
119.103, pois ele determina a segurança da igreja em Cristo, mas ao chegar ao
ventre se torna amargo (10.10). Isto é, ele vai também declarar o sofrimento e a
assolação que virá ao mundo. O próprio livrinho e sua atuação aparecem como
preparando o caminho para a 7ª Trombeta e já fazendo menção dela (10:7). Muito
do que pode ser revelado pelo livrinho só virá à tona na 7ª trombeta.

As Duas Testemunhas (11.1-14)

Começa o Capítulo 11. Já estamos quase na metade da Profecia do


Apocalipse. O autor, João, é peça cada vez mais fundamental para a revelação.
Ele aparece no v. 1 recebendo um caniço para medir o santuário de Deus. O que
simboliza isso? Medir significa “apartar”. Os crentes serão medidos e não os
descrentes. Apartar para proteger, os que foram medidos serão protegidos. Em
Ezequiel 40:3, medir significa “restaurar”, no Novo Testamento medir é “proteger”.
É para se medir o santuário de Deus (gr. Naon: Templo). No Novo Testamento
dificilmente essa palavra é empregada para construção, mas para pessoas
“santuário de Deus”. É santuário no sentido de povo. As pessoas serão
protegidas.
É para se medir também o “altar”. Ficava no “Santo do santos”. Só o sumo
sacerdote poderia entrar. Era o lugar mais próximo de Deus. Altar denota
proximidade de Deus. Quando Deus diz para João medir o altar estava querendo
dizer que o relacionamento Dele com a igreja seria protegido. O versículo termina
dizendo que “os que nele adoram”, ou seja, os adoradores serão protegidos. No v.
2 é dito que o átrio exterior deveria ser deixado de fora: Era o lugar destinado aos
gentios. Esse não será protegido, as tormentas atingiram a todos os que estão no
átrio. Todos aqueles que não fizeram pacto com Deus não serão protegidos. Deus
guarda aqueles que adoram a Ele! 42 meses neste versículo é um tempo que se
tornou símbolo de todas as perseguições (Dn 7:25). Este é o tempo que as duas
testemunhas, que aparecem na continuação do versículo, exercerão seu
testemunho.
Mas, O que ou quem seriam essas Duas Testemunhas? Historicamente,
temos uma interpretação de que a Bíblia é as duas Testemunhas: A primeira
delas, O Antigo e a segunda, O Novo Testamento. Mas, é preciso um exame
crítico dessa opinião, para saber se isso procede, afinal, caso as Duas
Testemunhas sejam uma figura da Bíblia, elas se tornariam apenas uma
151
Champlin (2002:511)
152
Ladd (2011:105)

40
recapitulação do Livrinho, que já fora interpretado como sendo a própria Palavra
de Deus. A palavra traduzida por “testemunhas” (11.3) é Martur. Significa
testemunha ou de modo geral, aquele que testemunha ou pode testemunhar
sobre a verdade do que viu, ou viu ou conhece (At. 1.8; Ro 1.9; 2ª Co.1.23; Fp.
1.8). Em especial, é utilizada na Bíblia em referência aos que testemunharam a
vida, morte e ressurreição de Jesus, que testemunham a verdade como é exibida
em Jesus.153 Martur diz respeito à testemunha diante de um tribunal, por isso, a
visão do Apocalipse faz uso de duas testemunhas para o testemunho ser válido.
É assim que se nos apresenta outra possibilidade: As Duas Testemunhas se
referem ao testemunho da igreja. Os servos de Deus que compõe a igreja são
profetas do Senhor para este mundo, e por isso, eles aparecem profetizando
(11.3). O testemunho da igreja causa dano ao mundo (11.5). A igreja é
indestrutível até cumprir a sua missão, e será perseguida após cumprir a missão.
No versículo 7 diz que “...a besta que sobe do abismo a vencerá e a matará...”
Cumprida a sua missão a igreja se tornará vítima da cólera da besta.
Os vs. 8 e 9 mostram o povo da terra festejando a morte da igreja. “...
nações verão os seus corpos mortos... e não permitiram que sejam sepultados.
Os que habitam na terra se regozijaram sobre eles, e se alegraram...” Não ser
sepultado na cultura judaica era uma vergonha e motivo de chacota. A igreja será
ridicularizada por este tempo. A igreja foi perseguida e silenciada. 154 Assim como
nos chamou a atenção a menção ao Eufrates no capítulo 9, aqui é interessante a
citação de Sodoma e Egito (11.8). Elas aqui estão para representar o sistema
mundano e iníquo, sistema opressor. É o pecado, a corrupção, a perseguição
contra a igreja. É o sistema que matou Jesus, e tentará matar a igreja. Esta
Trombeta esboça tormenta, ao referir-se nos versículos 9 e 11 de 3 dias e meio
de Tribulação, quando os habitantes da terra se alegrarão ao verem os corpos
das testemunhas estendidos. Neste 2º Ai o tempo do juízo sobre este sistema é
cada vez mais evidenciado.
Os versículos 11-14 falam da ressurreição, da segunda vinda, do
arrebatamento e do juízo. Agora a alegria do mundo se transforma em tristeza. Os
cadáveres começarão a mexer! Em conexão com a segunda vinda de Cristo a
igreja será restaurada á vida, à honra, ao poder, à influência. 155 Diante da vitória
cabal e incontestável da igreja, há uma menção a homens “dando glória a Deus”
depois destes feitos. Ladd entende que esta deve ser uma referência ao povo
judeu que se arrependerá dos seus pecados no fim dos tempos, e darão glória ao
Deus verdadeiro. Antes eles não glorificaram a Deus e rejeitaram o messias,
agora, se arrependem da sua desobediência e dão glória a Deus. 156 Hendriksen
não entende desta maneira, pois para ele, a oportunidade de arrependimento já
se foi. Para ele, a expressão é aplicada ao iníquos que estiverem vivos por
ocasião do juízo de Deus descrito no v. 13. Eles ficarão aterrorizados e darão
glória ao Deus do céu, isso, é claro, “não significa que se converteram. Longe
disso! Estão, simplesmente, chocados de terror. O Rei Nabucodonosor, em seus
dias, muitas vezes glorificou o Deus do céu (Dn 2.47; 3.28; 4.1ss; 4.34; 4.37). Mas
isso não implica que ele era um homem convertido”. 157

153
A Bíblia A Palavra Chave
154
Lopes – Fazer a inserção do ano da obra e inserir referência bibliográfica, pois eu não tenho. Expus
porque foi citado durante a reunião da comissão.
155
Hendriksen (2001:180).
156
Ladd (1980:119).
157
Hendriksen (2001:181).

41
A 7ª Trombeta (11.15-19)

A palavra chave dessa porção, que fecha o capítulo 11 e as descrições das


Trombetas é Triunfo. O sétimo anjo tocou a sua trombeta, e, contudo, o terceiro
“ai” não veio imediatamente. Este terceiro “Ai” na verdade, são os sete flagelos ou
taças (16:1-21). Assim como as sete trombetas constituem o sétimo selo, os sete
flagelos constituem a sétima trombeta, ou terceiro Ai. Antes deles porém, em vez
de pragas, o final do capítulo 11 anuncia fortes vozes com notícias sobre o fim. E
a está expressa no v. 15 de forma tremendamente bela: “O Reino do mundo
passou a ser de nosso Senhor e de seu Cristo, e Ele reinará pelos séculos dos
séculos”. Esta última Trombeta é o prenuncio das últimas coisas que acontecerão.
E é ao mesmo tempo uma Declaração tremendamente bela da vitória do Reino
Monocrático de Cristo sobre todos os reinos que existiram na história mundial. Em
um só versículo temos a profundidade geográfica “Reino do Mundo” e temporal
“reinará pelos séculos dos séculos” deste reinado. Como escreve Lopes, é o
desfecho da história158. São dias que descrevem os últimos acontecimentos. Um
louvor ao nosso Deus é entoado pelos vinte e quatro anciãos (11.16-18). Eles
declaram a justiça de Deus, marca de seu julgamento, pois Deus “destrói os que
destroem a terra” (11.18). Embora esta menção à destruição, Carson et. Al.
Observam que em contraste com as outras Trombetas, “a sétima Trombeta não
trás nenhum acontecimento específico – calamidades – mas solenemente
introduz hinos que louvam a Deus por seu triunfo e juízos”. 159
É preciso, no entanto, identificar o fechamento das Sete Trombetas não
como o tempo do fim em sua totalidade, mas apenas como o “começo do fim”,
como observa acertadamente Ladd. 160 Este começo do fim, no entanto, já expõe
sem rodeios que a Vitória é do Cristo (11.15). Toda a Temática das 7 Trombetas
termina com a visão do céu aberto e da Arca da aliança (11.19). Aqui é clara a
menção à Fidelidade do Senhor.

158
Lópes (2005:250 e 251)
159
Carson Et. Al. (1997:519)
160
Ladd (2011:119)

42
Capítulo 4
A MULHER E A TRÍADE DO MAL
As sete vozes celestes

INTRODUÇÃO

Se você estiver lendo este livro desde o início, já sabe que decidimos
adotar a estrutura natural do próprio livro do Apocalipse - que possui sete blocos
com sete elementos cada -, para ser à base da estrutura deste comentário. Neste
capítulo, então, vamos analisar a quarta destas sete divisões naturais do livro,
que vai do capítulo 12 até 14. Neste bloco, por sete vezes João ouve vozes
vindas do céu (cf. Ap 12:7, 14:6-7, 8, 9, 13, 15, 18). Por isso, chamamos esse
bloco de “As sete vozes celestes”. E do que tratam estas vozes? Em que contexto
elas estão inseridas?
Ao lermos os capítulos mencionados acima, percebe-se que as sete vozes
aparecem no contexto da descrição da luta do mal contra o bem. Satanás é
apresentado guerreando contra Jesus, seus anjos e sua igreja, no capítulo 12.
Mais especificamente, no que se refere à batalha de Satanás contra a igreja,
temos informações mais pormenorizadas, no capítulo 13. Lemos ali que ele não
vem sozinho. Há a descrição de uma tríade do mal: o dragão e duas bestas a seu
serviço. Por fim, temos narrado no capítulo 14, algo confortante para os cristãos.
Mesmo diante da realidade de uma batalha, eles podem ter confiança, há uma
descrição da salvação dos cristãos e da condenação dos ímpios. Seres angélicos
trazem recados confortantes para os cristãos diante desta batalha.
Diante disso, a partir de agora, passaremos a analisar estes capítulos de
forma mais detalhada, com o objetivo de entendermos precisamente quem é a
mulher vestida do sol; quem é o dragão vermelho; quando aconteceu a peleja no
céu de Miguel e seus anjos contra o dragão; quem são as bestas a serviço do
dragão; o que é a marca da besta, o 666, qual é o significado da mensagem dos
três anjos do final do capítulo 14; e etc. Na medida em que formos analisando
estes capítulos, estas respostas irão surgindo. Em suma, conforme anunciamos
no parágrafo anterior, estes capítulos trazem à tona a luta do mal contra o bem.
Temos informações sobre os antecedentes históricos desta batalha, seu estado
atual e seu desfecho final.

OS ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA LUTA DO MAL CONTRA O BEM

A luta do bem contra o mal não é de agora, é antiga, como pode se


perceber, à luz da leitura e interpretação do capítulo 12 de Apocalipse. Três cenas
nos são apresentadas, que mostram esta verdade de forma clara. O dragão faz
três investidas: 1) Contra Cristo e seu povo (v. 1-6); 2) contra os anjos no céu (v.
7-12); 3) contra a igreja (v. 13-18). Este capítulo descreve Satanás, o tempo todo,
43
em suas tentativas fracassadas de frustrar os planos divinos. Como não
consegue, ele vai ficando cada vez mais feroz, e mais limitado em sua área de
atuação.

A luta histórica do dragão contra Cristo e seu povo (Ap 12:1-6)

O início do capítulo 12 fala de uma mulher: Viu-se um grande sinal no céu,


a saber, uma mulher vestida do sol com a lua debaixo dos pés e uma coroa de
doze estrelas na cabeça (v. 1). Quem é esta mulher? De acordo com o nosso
entendimento, esta mulher é um símbolo do povo de Deus do Antigo e do Novo
Testamento. Este povo pode ser chamado de “igreja” nos dois momentos. Paulo
chama os crentes de “Israel de Deus” (Gl 6:16). Pedro interpretou que as
promessas de Deus feitas a Abraão estavam se cumprindo na igreja (At 3:25-26).
Hendriksen entende que o povo de Deus, de ambos os testamentos, é um só, “é o
povo escolhido em Cristo (...). Abraão é o pai de todos os crentes, que sejam
circuncidados quer não”.161 John Stott, de igual modo, afirma que esta mulher é
uma figura que representa a igreja do Antigo e do Novo Testamento em
continuidade.162
É importante afirmarmos que, apesar de reconhecer que existem algumas
diferenças no trato de Deus com seu povo diante do Novo Testamento – por
exemplo, adoração e serviço passam a ser descentralizados para o povo de Deus
na Nova Aliança -, ainda assim, estamos falando do mesmo povo de Deus.
Inclusive, em Atos 7:38, Estevão refere-se ao povo de Israel como “congregação
do deserto”. Ele usa a palavra grega ekklesia, a mesma palavra que traduzimos
por “igreja”. Diante disso, podemos dizer, de maneira geral, que a mulher
representa a igreja, no sentido de povo de Deus, de ambos os testamentos.
E como é esta mulher? A descrição que João faz dela é interessantíssima.
Esta mulher é descrita como “vestida do sol”. Esta vestida como o sol, pois é
exaltada e gloriosa.163 A igreja “reverbera o brilho da glória de Deus. (...) A beleza
de Deus está estampada na igreja. A glória de Deus refulge através da igreja”, do
seu povo.164 A mulher também é descrita como tendo a “lua” debaixo dos pés, um
indicativo de domínio. A igreja recebeu autoridade de Cristo. Por fim, a mulher
tem uma “coroa de doze estrelas na cabeça”, um símbolo de vitoria. A vitória do
Cristo da igreja é a vitória da igreja de Cristo.
Esta mulher é descrita como estando grávida, gritando com dores de parto,
sofrendo tormentos para dar à luz (v. 2). Como ficará claro mais à frente, a
semente da mulher, esta criança poderosa que nasceria, é uma referência a
Cristo.165 Por este versículo entende-se que, a grande missão do povo de Deus,
ao longo da história, foi a de dar à luz a Cristo. Deus preparou um povo especial
para trazer Jesus Cristo ao mundo. Contudo, a chegada do Messias não
aconteceu sem sofrimentos. Ao longo “da história narrada no Velho Testamento
houve muitas perseguições tentando impedir a vinda do Messias prometido. Mas
Deus protegeu seu povo e na plenitude dos tempos Jesus nasceu”. 166 Este

161
Hendriksen (2001:187).
162
Stott (2006:212).
163
Hendriksen (2001:187).
164
Lopes (2005:257).
165
Hendriksen (2001:188).
166
Lopes (2005:258).

44
versículo mostra, então, o povo de Deus “agonizando durante séculos, enquanto
esperava o messias que viria, o libertador”. 167
Na continuação do texto, temos apresentado o grande inimigo da criança e
do povo de Deus: um dragão grande e vermelho (v. 3). Este dragão, sem dúvida
nenhuma, é uma referência ao Diabo, à Satanás (12:9). A cor do dragão é
vermelha, no grego pyrros (vermelho ardente), o que simboliza a cor da guerra. 168
Ele vem para batalhar contra a criança e contra a mulher. Este dragão também é
chamado de “grande”, o que evidencia que o mesmo é perigoso, terrível e
destruidor.169 Além disso, o dragão tem “sete cabeças e dez chifres, e nas sete
cabeças, sete diademas”. As sete cabeças com sete diademas representam o
governo ou domínio universal do dragão sobre as nações. 170 Os dez chifres são
uma referência ao grande poder do dragão – chifre é símbolo de poder-, 171 ou,
uma referência ao poder destruidor do dragão. 172 Ladd, comentando sobre estes
elementos, escreve:

“Diadema era uma espécie de coroa; o Cristo conquistador será coroado com
muitos diademas (19:12). As setes cabeças coroadas com sete diademas falam do
grande poder que o dragão pode exercer. Os dez chifres remontam a Dn 7:7, 24,
símbolos do grande poder de Satanás. O simbolismo é interessante. Como devemos
imaginar um dragão com sete cabeças e dez chifres? Será que uma cabeça tem
quatro chifres, ou três das sete cabeças têm cada uma dois chifres? Este tipo de
perguntas se anulam mutuamente; é tudo retrato simbólico do grande poder de
Satanás como ‘deus deste século’ (2 Co 4:4)”.173

É importante dizer, também, que o dragão, mesmo sendo poderoso, só age


no livro de Apocalipse, de acordo com as ordens de Deus. Na continuação do
texto, além de ser poderoso, somos informados que o dragão também é sedutor
(v. 4). A sua cauda arrastou a terça parte das estrelas do céu. Temos, aqui, uma
referência aos anjos caídos,174 que foram seduzidos pelo programa de rebelião de
Lúcifer (Satanás) contra Deus. E como isto aconteceu? Quando este deixou-se
ser tomado por sentimentos de iniquidade em seu coração (Ez 28:15). O texto
não diz que Lúcifer revelou sua iniquidade, mas que Deus, por sua onisciência, foi
quem achou iniquidade no coração dele. Ele foi criado perfeito, mas desejou o
lugar de Deus (Is 14:12-14). E não guardou seus sentimentos contra Deus apenas
para si. Isto pode ser visto nos seguintes textos: Na multiplicação do teu
comércio... (Ez 28:16); ... pela injustiça do teu comércio (Ez 28:18). O significado
do termo comércio é “andar por aí”, no sentido de difamação, segundo o contexto,
e talvez indique o andar entre os anjos para assegurar a fidelidade deles ao seu
programa de rebelião contra Deus. 175 E ele conseguiu a fidelidade de pelo menos
a terça parte deles.
Desta forma, quando Satanás caiu, arrastou consigo em sua ruína, um
terço do exército angelical (2 Pd 2:4; Jd 6). Como já afirmamos, ele não os trouxe
à força, ao contrário, a terça parte dos anjos foi seduzida. Juntamente com estes
167
Grangeão; Liborio, ed. (2009:877).
168
Kistemaker (2004:452).
169
Lopes (2005:261).
170
Ibidem.
171
Wilcock (2003:91).
172
Lopes (2005:261).
173
Ladd (1980:125).
174
Kistemaker (2004:453).
175
Chafer (1986:365).

45
anjos, ele é lançado a terra! Depois desta informação, chegamos ao ponto chave
do v.4: o dragão se deteve em frente da mulher que estava para dar à luz, a fim
de lhe devorar o filho quando nascesse. O inimigo, em toda a história, sempre deu
investidas pesadas para que Cristo não viesse ao mundo. Um dos exemplos mais
claros disso foi quando Jesus nasceu. Ele usou Herodes para mandar matar
todas as crianças de 2 anos para baixo da cidade de Belém e dos seus arredores
(Mt 2:16). O fato é que desde Gênesis 3:15 o dragão não faz outra coisa, a não
ser tentar destruir a mulher e o seu descente. Apocalipse 12:4b, é uma expressão
da inimizade milenar entre a serpente e a mulher. 176
Mesmo com todas as investidas do dragão, nasceu-lhe, pois, um filho
varão (v.5a). A mulher, representando a Igreja dos crentes da antiga aliança, deu
à luz seu Filho, o Messias.177 Ele é o que nasceu para reger as nações com cetro
de ferro (v. 5b). Estas palavras “identificam claramente a criança; ela é o Ungido
de Deus, que deveria reinar no Reino de Deus sobre a terra 178 (Sl 2:9). O Filho
que nasceu “é o Rei que tem o cetro nas mãos. Seu reinado é universal e
irresistível”.179 Isto pode ser visto na continuação do texto, que salta do
nascimento para a ascensão de Jesus: E o seu filho foi arrebatado para Deus até
o seu trono (v. 5c). Jesus cumpriu sua missão, e ascendeu ao céu. Hoje, está
assentado no trono, governando os céus e a terra! A ascensão de Jesus é a
“vitória judicial sobre Satanás, o pecado e a morte”. 180
Depois da ascensão de Jesus, a mulher fugiu para o deserto, onde havia
Deus preparado um lugar, para que nele a sustasse, durante mil duzentos e
sessenta dias (v. 6). Depois que o Senhor da igreja volta ao céu ela vai para o
deserto. Deserto é lugar de provação. Ela está no deserto passando por
provações, mas tudo sob o comando do seu Senhor. Durante mil duzentos e
sessenta dias, ou 3 anos e meio (período utilizado na Bíblia como símbolo de
tribulação, Dn 7:25). Aqui em Apocalipse é usado para englobar todo período da
igreja, entre a ascensão e a volta de Cristo. Durante todo este tempo ela será
protegida por Deus; às vezes não da morte (12:11), mas na morte. 181 Deus
cuidará do seu povo enquanto o mal ainda estiver controlando o mundo. No
“deserto, o povo de Deus seria perseguido pelas pessoas da terra (...), mas Deus
tomaria conta deles. Muitos seriam martirizados, mas Deus cuidaria deles”. 182

A luta do dragão contra os anjos de Deus (Ap 12:7-12)

Depois de relatar a luta histórica do dragão contra Cristo e o seu povo, o livro
de Apocalipse menciona a luta do dragão contra os anjos de Deus. O v. 7 começa
dizendo que houve peleja no céu. Quando aconteceu esta batalha entre Miguel e
seus anjos contra o dragão e seus anjos? Alguns entendem que esta batalha
aconteceu no início, quando Satanás se rebelou, mas não é o que o contexto do
texto indica. Tudo nos leva a crer que a batalha aconteceu com a exaltação de
Cristo.183 Esta batalha aconteceu como efeito do nascimento, expiação e
ascensão de Cristo ao trono celeste. Há uma batalha, Miguel “como líder dos
176
Stott (2006:213).
177
Kistemaker (2004:454).
178
Ladd (1980:126).
179
Lopes (2005:259).
180
Lopes (2005:259).
181
Idem, p. 258.
182
Grangeão; Liborio, ed. (2009:878).
183
Lima (2006:583).

46
anjos bons de Deus e defensor do seu povo (Dn 10:13, 21; 12:1; Jd 9), move um
ataque contra o dragão, o líder dos anjos maus e opositores do povo de Deus”. 184
O interessante é que Miguel e seu exército é quem promovem este ataque. O
resultado “é que o dragão é derrotado e lançado para fora do céu”. 185 Depois
desta batalha, não se achou mais o seu lugar no céu, ele foi expulso
completamente (v. 8-9). O lugar de satanás que não se acha mais no céu refere-
se à posição dele. Sua posição no céu depois de sua queda é a de acusador. Ele
perde esta posição por causa da cruz. Cristo, por causa de sua morte,
ressurreição e ascensão, “pôs fim ao poder do diabo, tirando-lhe o status de
acusador (Rm 8.33)”.186 Nunca mais “ele será aceito no céu como acusador.
Definitivamente não conseguirá mais nada ali. No céu permanecem no governo
tão somente Deus e o Ungido entronizado com ele”. 187
Por causa desta vitoriosa batalha, João ouve a primeira, das sete vozes
celestiais, deste trecho do Apocalipse. Esta voz dizia o seguinte:

Então, ouvi uma grande voz no céu, que dizia: Agora é chegada a
salvação, e o poder, e o reino do nosso Deus, e a autoridade do seu
Cristo; porque já foi lançado fora o acusador de nossos irmãos, o qual
diante do nosso Deus os acusava dia e noite. E eles o venceram pelo
sangue do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho; e não amaram
as suas vidas até a morte. Pelo que alegrai-vos, ó céus, e vós que
neles habitais. Mas ai da terra e do mar! porque o Diabo desceu a vós
com grande ira, sabendo que pouco tempo lhe resta (Ap 12:10-12).

O dragão foi vencido pelo sangue do Cordeiro! Contudo, por causa de sua
derrota, ele se enche de ira, e como sabe que pouco tempo lhe resta, vem com
tudo sobre a terra para atacar a igreja, afinal de contas, esta foi a única
possibilidade que lhe restou: perseguir diretamente a igreja. 188 O diabo é uma
serpente golpeada na cabeça que está furiosa, no estampido da morte, sabendo
que pouco tempo lhe resta e que sua sentença já foi lavrada: em breve será
lançado no lago de fogo (20:10). Ele sabe que “está derrotado, mas luta para que
os homens não saibam”.189
De acordo com este texto, a igreja vence o dragão por causa do sangue do
cordeiro (12:11). Ele está furioso, mas a igreja, ainda assim, caminhará em vitória,
afinal, a morte de Jesus é a vitória da igreja. O sacrifício de Cristo na cruz desfez
todas as possibilidades do diabo triunfar sobre a igreja, segundo Lopes. 190 Além
disso, a igreja é vitoriosa por causa do testemunho. A igreja “vence o dragão
quando testemunha de Cristo mesmo em face da perseguição e da morte. Ela
prefere ser mártir a ser uma igreja apóstata”.191

A luta do dragão contra a igreja de Deus (Ap 12:13-17)

184
Hendriksen (2001:193).
185
Ibidem.
186
Lima (2006:193).
187
Pohl (2001:157-158).
188
Lima (2006:583).
189
Lopes (2005:263).
190
Lopes (2005:265).
191
Ibidem.

47
Satanás está revoltado. Impossibilitado de atacar “no céu, o Senhor
exaltado, o diabo, na terra, busca destruir a igreja, o corpo de Cristo”. 192 Foi a
única possibilidade que lhe restou. Ele faz uso dela. Faz guerra contra a mulher
(v. 13). Contudo, foram dadas à mulher as duas asas da grande águia, para que
voasse até o deserto, ao seu lugar, onde seria sustentada por 3 anos e meio, ou
mil duzentos e sessenta dias, da vista da serpente (v. 14). Se Satanás foi
rebaixado, por outro lado, a igreja é enaltecida e exaltada a se assentar com
Cristo nas regiões celestiais, acima de todo principado e potestade. A igreja de
Cristo é uma comunidade vitoriosa, mesmo diante da perseguição.
Novamente vemos aparecendo a expressão que se refere ao intervalo
entre a primeira e a segunda vinda de Cristo, ou ao período da igreja (mil
duzentos e sessenta dias, ou três anos e meio, ou 42 meses). O que este
versículo esta ensinando é que, até a volta de Cristo a terra a igreja seria
sustentada e protegida por ele! A “igreja tem asas para voar para longe e escapar
em segurança dos ataques do diabo. É óbvio que com todos os seus recursos no
mundo, Satanás está impossibilitado de aniquilar a igreja”. 193 A boa notícia deste
texto é que Deus preservará seu povo; “todo esforço de Satanás para destruí-lo
será em vão”.194
Os versículos 15-16 descrevem o esforço de Satanás para destruir o povo
de Deus. A mensagem, novamente, é simples e clara: “Satanás fará tudo que
estiver em seu poder para destruir o povo de Deus, só que é em vão”. 195 Carson
afirma que a imagem da serpente enviando uma enxurrada de água atrás da
mulher, mas a terra engolindo, e a serpente não podendo fazer nada quanto a
isso, ilustra a “segurança espiritual dos crentes em relação a tudo que Satanás
pode fazer contra eles”.196
O capítulo termina afirmando que novamente o dragão “irou-se contra a
mulher”, e foi pelejar contra “os restantes de sua descendência” (v. 17). Segundo
Adolf Pohl, todos os milagres de preservação em conjunto não conseguem
transformá-lo e levá-lo a parar. Ele continua sendo dragão e se enfurece sem
cessar. Ele já se irou no v. 4 contra o Messias, no v. 7 contra Miguel, no v. 12
contra os moradores da terra, e agora e reiteradamente contra a mulher. 197 Os
“restantes” aqui, apontam para a igreja como um todo, que permanecerá intacta
até o final dos tempos, até o regresso de Cristo. O dragão vai perseguir até o
final, mas Deus vai cuidar de sua igreja, também, até o final!
Aqui é importante fazer outra consideração sobre os “restantes de sua
descendência”. Hendriksen198 e Adeyemo,199 ligam este período de perseguição
contra os “restantes” com o período depois dos mil duzentos e sessenta dias ou 3
anos e meio (um tempo – 1 ano -, tempos – 2 anos – e metade de um tempo –
meio ano) em que a igreja está sendo perseguida, mas que o evangelho está
sendo proclamado abertamente (Ap 11:3; 12:14). Depois deste período, temos um
breve espaço de tempo, descrito como “três dias e meio”, durante os quais as
testemunhas são mortas e seus corpos ficam expostos (11:7). O mundo anti-
cristão perseguirá duramente a igreja, tentando silenciar a voz do evangelho. Esta
192
Kistemaker (2001:466).
193
Idem, p. 467.
194
Ladd (1980:130).
195
Ladd (1980:130).
196
Carson et all (2009:2157).
197
Pohl (2001:164).
198
Hendriksen (2001:196).
199
Adeyemo, ed. (2010:1605).

48
é uma possível menção à grande tribulação, onde os santos mais uma vez darão
testemunho de sua fidelidade a Deus, e terão sua fé provada como nunca antes.
Ainda assim, continuarão guardando os mandamentos de Deus e o testemunho
de Jesus (12:17). Mesmo que o dragão venha com toda fúria contra eles, Deus
continuará com seu povo, e estes conseguirão suportar o sofrimento final.

O ESTADO PRESENTE DA LUTA DO MAL CONTRA O BEM

O capítulo 13 do livro de Apocalipse mostra que o dragão não está sozinho


em sua luta contra o povo de Deus. Para perseguir os descendentes da mulher
ele foi buscar ajuda, chamando a besta do mar e a besta da terra. 200 Estas duas
figuras são os “agentes ou instrumentos usados pelo dragão em seu ataque
contra a igreja”.201 E quem são estes agentes? O que estas duas bestas
representam? Precisamos saber muito bem quem são estas duas figuras, pois, de
acordo com o que veremos, elas já estão atuando, tentando dissuadir o povo de
Deus. Vejamos, agora, o seu significado.

A besta que subiu do mar (Ap 13:1-10)

Assim começa descrição da primeira besta: Vi subir do mar uma besta com
dez chifres e sete cabeças, e sobre os dez chifres havia dez coroas, e sobre as
cabeças trazia nomes de blasfêmia (v.1). Esta besta emerge do mar, que é
símbolo de povos e nações (Ap 17:15). Pense nestes dez chifres e nestas sete
cabeças como uma descrição do poder desta besta (esta interpretação ficará
mais clara quando chegarmos ao capítulo 17). 202 Ela traz “nomes de blasfêmia”,
uma possível referência ao desafio da besta à soberania de Deus, e o fato de que
ela se considera um deus.203
Na sequência do texto somos informados que esta besta é semelhante a
um leopardo, seus pés eram como os de um urso, e sua boca, como a de um
leão. O dragão deu-lhe poder, seu trono e grande autoridade (v. 2). Lembra onde
uma visão parecida é mencionada? No livro do profeta Daniel (7:3-6). E o que
estes elementos representam, no livro no profeta? Impérios mundiais. Esta é uma
pista para entendermos quem é esta besta. Observe que, conforme já
mencionamos, ela surge do mar, que representa as nações. Por isso, tudo indica
que esta besta tem a ver com o poder político. 204 Satanás usa os poderes políticos
para governar o mundo. Hendriksen afirma que esta besta que sobe do mar,
“simboliza o poder perseguidor de Satanás incorporado em todas as nações e
governos do mundo, através da história. O domínio mundial dirigido contra o povo
de Deus, onde e quando isto ocorre na história, isso é a besta”. 205 Kistemaker,
nesta mesma linha, afirma se tratar de “todos os poderes mundiais hostis a Jesus
Cristo”.206 Eles governam na força de Satanás (v. 2b). Nunca é demais lembrar
que toda a força e poder que Satanás exerce e dá para a besta, é aquele
permitido por Deus.

200
Lima (2006:584).
201
Lopes (2005:267).
202
Wilcock (2003:96).
203
Grangeão; Liborio, Ed. (2009:881).
204
Lima (2006:584).
205
Hendriksen (2001:199).
206
Kistemaker (2001:479).

49
Esta besta vai se manifestar com um grande milagre. O v. 3 fala de uma de
suas cabeças como se estivesse ferida de morte, mas que tem esta ferida curada.
Diante disso, toda a terra se maravilhou e a seguiu. A besta realizará milagres
espetaculares para persuadir as pessoas. Lima entende que esta ferida mortal é
fácil de entender, se levarmos em conta que os impérios levantam e caem, e
sempre existe um novo império dominando o mundo. Além disso, ele também
propõe que o texto pode estar se referindo a um império que foi destruído no
passado e que pode voltar a dominar no futuro; e cita uma crença da época
relativa ao imperador Nero, que se suicidou em 68 d.C., mas que voltava a toda
força com Domiciano.207 O fato é que esta besta se tornará irresistível e levará as
pessoas a adorarem ao próprio Satanás (v. 4, 8).
O tempo da perseguição infligido pela besta é 42 meses (ou mil
duzentos e sessenta dias), que simbolicamente representa o período do
testemunho da igreja, o tempo entre a primeira e a segunda vinda de Jesus.
Neste “período, os governos anticristãos blasfemam contra Deus e oprimem a
igreja. A igreja deve suportar com paciência esta perseguição, sabendo que, no
fim, Cristo lhe assegurará a vitória” (vs. 6-10). 208 Blasfemar contra Deus é uma
reivindicação humana, que se exalta acima da exigência divina de que as
pessoas lhe sejam fiéis e o adorem. 209 Ela atacará os santos (v. 7). A “meta
primordial da besta é desviar as pessoas de Cristo, o que ela tenta com
perseguição feroz”.210 O último versículo sobre esta besta, é interessante (v. 10).
Na versão NTLH, assim lemos: Quem tem de ser preso será preso; quem tem de
ser morto pela espada será morto pela espada. Isso exige que o povo de Deus
aguente o sofrimento com paciência e seja fiel. A perseguição pela besta, por
mais estranho que pareça, faz parte da providencia de Deus, e não cabe
resistência violenta. O convite do versículo é para que confiemos em Deus.
Agora, cabe uma pergunta: qual a relação desta besta com o Anticristo? É
incrível a similaridade na descrição de Paulo sobre este personagem com a
descrição de João da primeira besta (cf. 2 Ts 2:1-8). Por isso, não há como não
identificar o Anticristo com esta primeira besta. Ela tanto um sistema de governo
anticristão quanto uma pessoa. Ela expressa todo o governo anticristão que
persegue a igreja ao longo dos tempos e será um homem que receberá o poder
do dragão para governar por um breve tempo, no final dos tempos. Este homem é
o que a Bíblia chama de Anticristo ou de iníquo, homem da iniquidade, Filho da
Perdição (1 Jo 2:18; 2 Ts 2:3-4, 9). Ele “será uma espécie de personalização da
besta na sua forma mais poderosa e destrutiva”. 211 Lopes entende que esta besta
é o poder perseguidor de Satanás incorporado em todas as nações e governos do
mundo, através da história, que vem tomando diferentes formas, mas que no fim,
se manifestará na pessoa do homem da iniquidade. 212 É possível afirmarmos isso
à luz de 2 Tessalonicenses: o ministério da iniqüidade já opera (2 Ts 2:7). Um dia,
a partir deste ministério da iniqüidade operante, será, de fato, revelado o “iníquo”
(2 Ts 2:8). Ladd também entende que esta besta é o Anticristo escatológico com
algumas manifestações já presentes em toda a história. 213 Por fim, então, a
primeira besta é o sistema político, representado pelos anticristos atemporais já
207
Lima (2006:584).
208
Ibidem.
209
Ladd (1980:134).
210
Ibidem.
211
Lima (2006:587).
212
Lopes (2005:271).
213
Ladd (1980:132).

50
presentes na história - sempre existiram anticristos -, contudo, este sistema será
incorporado numa pessoa, no final dos tempos, no Anticristo escatológico – do
final dos tempos.

A besta que subiu da terra (Ap 13:11-18)

A segunda besta surge da terra; e não surge para competir com a primeira,
mas para ajudá-la. A segunda besta é “serva da primeira e seduzirá o mundo
inteiro a adorar a primeira besta” 214 (13:11-12). Esta besta defende as ideologias
da primeira. O curioso é que ela é uma imitação do cordeiro, isto é, em tudo ela
parece com algo bom, mas intimamente é um agente do diabo. É importante dizer
que, se a primeira besta age no campo político, a segunda age no campo
religioso.215 A segunda besta é a falsa religião que, de mãos dadas com o Estado,
afasta as pessoas de servirem o Deus verdadeiro. 216 As duas bestas trabalham
em harmonia, e são dois grandes instrumentos do dragão. Elas são, também, a
sustentação do ministério do Anticristo, que, quando aparecer, irá controlar a terra
por meio da política e da religião. 217
Esta besta “simboliza todos os falsos profetas em cada nova época que a
igreja vive. Eles vêm disfarçados como ovelhas, mas interiormente são lobos
vorazes (Mt 7.15)”.218 Além de simbolizar os falsos profetas de todas as épocas,
Kistemaker afirma que Satanás usa a besta que emerge do mar como Anticristo,
e a besta que emerge da terra como o falso profeta. 219 Isto é, esta besta pode ser
identificada também com o Falso Profeta que surgirá no final dos tempos, e será
destruído por Jesus (Ap 19:20). Esta besta representa, então, tanto falsos
profetas atemporais (todas as épocas), como também surgirá o Falso Profeta
escatológico (do final dos tempos). Carson também concorda com esta
possibilidade, quando afirma que assim como a primeira besta será personificada
no anticristo pessoal, assim também a segunda besta será representada no final
por uma cabeça que dirigirá toda obra demoníaca. 220 Este falso profeta aparece
três vezes no livro do Apocalipse (16:13; 19:20; 20:10). Ele está a serviço do
Anticristo. No final dos tempos, fará com que todos aqueles que não estão no livro
do cordeiro o adorem. Ele usará as “instituições de comunicação, todos os
recursos governamentais e administrativos, todos os recursos educacionais e
todo comércio e indústria”.221
Esta segunda besta, o falso profeta, realizará milagres (vs. 13-14). Estes
milagres têm como único objetivo enganar os homens com supostos poderes
divinos, fazendo-os crer no que na realidade é poder de Satanás. 222 O texto é
muito claro em dizer: “fora permitido fazer”. Além do que Deus permite, Satanás e
seus aliados nada podem fazer! Muito bem, a além da permissão de realizar
milagres, foi lhe dado permissão de comunicar “fôlego a imagem da besta, de
modo que a imagem da besta podia falar e fazer com que fossem mortos todos os
que se recusassem a adorar a imagem da besta” (v. 15). Os mágicos do mundo
214
Lopes (2005:275).
215
Lopes (2005:275).
216
Lima (2006:585).
217
Ibidem.
218
Lima (2006:585).
219
Kistemaker (2001:491).
220
Carson et all (2010:2158).
221
Idem, p. 493.
222
Ladd (1980:137).

51
antigo se gabavam por poderem fazer estátuas falarem e se moverem. É possível
que é isto que se tenha em mente aqui. Mais especificamente, a uma imagem do
imperador Domiciano (81-96 d.C), erguida na cidade de Éfeso em sua honra, e
toda população local foi obrigada a lhe prestar honra, com pena de morte para
quem se recusasse.223 Além desta interpretação ligada ao contexto, a besta que
surgiu da terra continua a enviar seus cúmplices com o intuito de forçar alguém a
adorar e curvar-se diante dela.224
A segunda “besta usará também a arma do controle para garantir adoração
a primeira besta”.225 Assim termina o texto sobre esta segunda besta:

Também obrigou todos, pequenos e grandes, ricos e pobres, livres e escravos, a


receberem certa marca na mão direita ou na testa, para que ninguém pudesse
comprar nem vender, a não ser quem tivesse a marca, que é o nome da besta ou o
número do seu nome. Aqui há sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o
número da besta, pois é número de homem. Seu número é seiscentos e sessenta e
seis (Ap 13:16-18, NVI).

O que seria esta marca da besta? Como os seguidores de Cristo, os


seguidores da besta tem um sinal. Trata-se, aqui, de uma marca de propriedade.
No mundo antigo não só o gado era marcado, mas também os escravos. Ter a
marca de alguém significava pertencer a este alguém, ser um escravo dele.
Lembremo-nos, aqui, que sempre que a marca aparece no Apocalipse está ligada
com o ato de adorar a besta (14:11; 20:4). 226 Ter a marca pode significar adorar a
besta, pertencer a ela, ser escravo dela. A marca dos seguidores da besta é posta
na mão direita e na testa. Um sem número de especulações e teorias surgiu ao
longo da história para explicar esta marca. Mas, preferimos não entender esta
marca de maneira literal. A fronte “simboliza a mente, o intelecto da pessoa,
enquanto a mão representa sua atividade física, a sua ocupação, o seu
trabalho”.227 Esse sinal na mão e na testa, se refere às pessoas que vão trabalhar
e pensar para besta. Trabalhar e pensar para o dragão. Kistemaker, nesta linha,
afirma que a mão direita significa amizade e companheirismo; é um sinal de
companheirismo em uma causa comum, isto é, a oposição a Deus. A marca na
fronte implica que tais pessoas são influenciadas pela mesma filosofia e padrões
de pensamento. Em seu pensamento anticristão, glorificam a besta em seus
empreendimentos e tentativas de destruir a obra de Cristo na terra. 228 Lima
entende que esta marca é o secularismo e a falsa religião que domina àqueles
que não têm o nome do livro da vida, os perdidos. 229
Sobre o fato de não poderem comprar e vender, Kistemaker entende ser
algo literal, e cita alguns boicotes ao povo de Deus na história. 230 Ladd também
vai nesta mesma linha, dizendo que a besta assumirá poderes totalitários, com
controle completo de toda a política e religião e economia do mundo, com objetivo
de levar toda a humanidade a adorá-la.231 Lima, entretanto, vai num caminho
diferente, e oferece uma solução interessante. Segundo ele, o que o texto está
223
Stott (2006:217).
224
Kistemaker (2001:497).
225
Lopes (2005:276).
226
Idem, p. 585.
227
Lima (2006:585).
228
Kistemaker (2001:499).
229
Lima (2006:586).
230
Kistemaker (2001:499).
231
Ladd (1980:138).

52
querendo dizer é que vai ficar cada vez mais difícil um crente sobreviver
honestamente neste mundo. Se ele não faz parte do sistema, não sonega,
suborna, usa pesos e medidas falsos, e outros meios ilícitos que todos praticam,
pode acabar ficando sem lucros. Além do mais, se ele recusa a fazer trabalhos
ilícitos para os patrões pode perder o emprego. Estas coisas só vão piorar no final
dos tempos.232 Depois de tecer estes comentários, Lima termina dizendo não
descartar também a possibilidade de haver alguma marca física imposta pelo
governo do Anticristo no final dos tempos. A igreja deve ficar atenta, mas não
deve se assustar, segundo ele.233
O último versículo do capítulo 13, afirma que o número da besta é um
número de homem, e que esse número é 666. Muitas especulações surgiram, ao
longo da história, para tentar interpretar este número. A idéia mais comum é que o
número denota uma pessoa específica, e sua identificação deve ser descoberta
mediante alguma espécie de calculo numérico, onde o número é transformado em
um nome. Contudo, precisamos no precaver, pois todo tipo de cálculo ou
estatística é perigosa. Devemos entender este número como simbólico. Mas se é
simbólico, o que ele significa? Podemos entendê-lo como sendo uma referência
ao ser humano, pois é dito que é número de homem, ou seja, representa o ser
humano, e isto porque o homem foi criado no sexto dia. 234 Como o número se
repete três vezes, traz consigo a idéia de um homem que confia em si mesmo.
Além disso, levando-se em conta que no Apocalipse o 7 é símbolo de perfeição, o
6 é algo errado, imperfeito. Então, este número poderia representar também o ser
humano caído, o ser humano totalmente desprovido de Deus. Esta é uma marca
daqueles que têm este número.
Não podemos esquecer, ao pensarmos sobre este número, que é o
número “da” besta. Isto é, este número tem que ser relacionado a ela. A idéia de
tentar identificar o número é para tentar identificá-la. Porque a besta usa o
número 666? Kistemaker diz que o número 7 significa completude, e o número 6
incompletude.235 A besta sempre tentará chegar à soma total de sete, mas sempre
fracassará. Lopes afirma que 666 é o número representativo da maior encarnação
concebível da depravação do mal.236 Grangeão e Liborio afirmam que três
números “seis” juntos, implicam uma trindade de imperfeição (Dragão e as duas
bestas). O número simboliza, então, o domínio universal e a completa iniquidade
desta trindade ímpia, que tinha a intenção de desfazer a obra de Cristo. 237
Adeyemo afirma que o número 7 sugere inteireza, enquanto que o 6 sempre está
aquém dela. A besta parece próxima da perfeição e quase messiânica, mas não
é. O número 666 apresenta algo que fica três vezes aquém da perfeição. E uma
vez que se aproxima da perfeição e apresenta quase todas as características da
verdade, pode enganar os outros com facilidade. Não é de admirar que seja
preciso ter sabedoria!238

O DESFECHO FINAL DA LUTA DO MAL CONTRA O BEM

232
Lima (2006:586).
233
Ibidem.
234
Lima (2006:586).
235
Kistemaker (2001:501).
236
Lopes (2005:279).
237
Grangeão; Liborio, Ed. (2009:884).
238
Adeyemo, ed. (2010:1607).

53
Estamos chegando ao final deste quarto bloco do livro de Apocalipse, que
se encerra com o capítulo 14. Já estudamos sobre as sete igrejas, os sete selos,
as sete trombetas, e agora, estamos analisando o bloco das sete vozes celestes.
Seis, destas sete vozes, se encontram neste capítulo, e vamos analisá-las. Este
capítulo apresenta alguns detalhes sobre o desfecho final da luta do bem contra o
mal. Temos um encorajamento diante da luta, a condenação dos inimigos, e a
colheita final.

Encorajamento diante da luta (Ap 14:1-5)

Assim começa o capítulo 14: Então, olhei e vi diante de mim, o Cordeiro em


pé sobre o monte Sião, e junto dele os cento e quarenta e quatro mil, que traziam,
escritos na testa, o nome dele e de seu Pai (v. 1). Esta é a segunda vez, no livro
de Apocalipse, que temos a menção dos 144 mil. Conforme já mencionamos nos
comentários do capítulo 7:1-8, os 144 mil são os servos de Deus que foram
selados antes do início da grande tribulação para serem protegidos, durante a
mesma. Lá no capítulo 7, temos uma visão destes crentes no limiar da grande
tribulação, sendo selados para ser protegidos por Deus (vs. 1-8); em nos vs. 9-17
temos este mesmo grupo depois de ter passado pela tribulação, em pé diante do
Cordeiro, isto é, eles são vistos no céu. Aquela grande multidão é o mesmo grupo
dos 144 mil (7:9,14).
No início do capítulo 14, de novo, João apresenta uma visão dos crentes
perseguidos diante do cordeiro. Ele faz outra PAUSA ou PARENTESE, para que
o leitor tome fôlego, pois no meio de tantas visões horrendas (das bestas e do
dragão), ele mostra os cristãos no céu. O propósito desta visão “é encorajar os
cristãos em vista do relato do reinado do anticristo nos cp. 12-13”. 239 É uma visão
de consolo, pois João vê o povo de Deus que foi preservado da grande tribulação.
Na imagem do capítulo anterior a igreja estava na terra sendo perseguida, mas
agora está no céu, de pé. Monte Sião na Bíblia é símbolo da soberania de Deus,
da salvação, da Jerusalém celestial (cf. Hb 12:22). É lá que estão os 144 mil!
João quer assegurar para todos os crentes que, mesmo que uma batalha esteja
ocorrendo na terra, eles podem ficar tranquilo, a guerra já foi ganha! Apesar de
terem sido “vítimas da besta por se recusarem a adorá-la, sua salvação está
assegurada. Em certo sentido isto é uma repetição da visão da grande multidão
em 7:9-17, que passou pela grande tribulação e agora está diante do Cordeiro”. 240
Apesar do texto se referir, em primeiro plano, ao grupo de cristãos que passará
pela grande tribulação, eles representam aqui, também, a totalidade dos
redimidos.
Na sequência do texto, João ouve um som do céu (aqui não é uma voz
angélica, por isso não contaremos como sendo uma das sete vozes celestes). O
som era como de um barulho de um temporal e o estrondo de um grande trovão.
O som que ouvi era como de harpistas que tocavam suas harpas (v. 2). De quem
eram estas vozes? Os cento e quarenta e quatro mil estavam diante do trono, e
dos quatro seres vivos, e dos líderes e cantavam uma nova canção (v. 3, NTLH).
Esta cena “de grande alegria no céu inclui cânticos de vitória e música
instrumental. Este não era um coro angelical que cantava, mas os 144 mil”. 241
“Ninguém podia aprender” este cântico: nem os anciãos e nem os quatro seres
239
Carson et all (2010:2159).
240
Ladd (1980:140).
241
Grangeão; Liborio, ed. (2009:885).

54
viventes, mas só os 144 mil. Ele trata “da experiência da redenção, que somente
os pecadores salvos podiam saber”. 242 Aqui na “terra, os crentes sofrem e choram.
Mas Deus lhes enxugará dos olhos toda lágrima e então a alegria da igreja será
completa e ela cantará um novo cântico que ninguém poderá aprender”. 243
Na sequência do texto, somos informados que os 144 mil não se
contaminaram com mulheres, porque são virgens. São os que seguem o Cordeiro
aonde quer que vá (v. 4). A ideia apresentada por este versículo é que eles são
virgens, não sentido físico, mas em sua condição espiritual, no sentido de “terem
se recusado a se manchar, participando da prostituição que é adorar a besta,
mantendo-se puros em relação a Deus”.244 Eles seguem somente o cordeiro! Por
isso são chamados de primícias, no final do v. 4. As primícias eram as primeiras
partes da colheita consagradas a Deus. Estes crentes, igualmente, tinham “sido
consagrados unicamente e completamente a Deus. Eles não pertenciam a
ninguém mais - e nunca pertenceriam”. 245 Além disso, mentira alguma saiu da sua
boca, pois são irrepreensíveis (v. 5). Eles são puros de vida e de lábios. Não
blasfemaram contra Deus! Não “aceitaram a mentira do anticristo segundo o qual
um simples homem devia ser adorado. Mostraram-se firmes e irrepreensíveis em
sua confissão de Cristo”.246

A condenação dos inimigos (Ap 14:6-13)

Depois desta visão consoladora, João vê três anjos que proclamam os


juízos vindouros de Deus tendo por objetivo que a humanidade se volte para
Deus em verdadeira fé. O primeiro anjo traz o evangelho que, segundo a
descrição, é eterno em sua validade, e abrangente em seu alcance: para
proclamar aos habitantes da terra e a toda nação, tribo, língua e povo (v. 6). Este
anjo proclama em alta voz que a hora do juízo havia chegado (v.7). Contudo, a
mensagem do anjo inclui um desafio aos “seus ouvintes: que correspondessem,
temessem e glorificassem a Deus”. 247Antes do juízo, então, o anjo faz uma
convocação ao arrependimento, enquanto há tempo para tal. À luz do versículo,
parece que, quando este chamamento acontece, ainda não é tarde demais: os
seres humanos podem se arrepender e buscar a misericórdia de Deus. Carson
entende que a “representação de um anjo pregando o evangelho é parte do
simbolismo das profecias; o termo ‘anjo’ significa mensageiro, e os mensageiros
são de carne e sangue”.248
O segundo anjo aparece dizendo: Caiu a grande Babilônia, que deu de
beber a todas as nações do vinho da ira da sua prostituição (v. 8). Esta é a
primeira vez que a figura da “Babilônia” aparece. Podemos entendê-la como o
sistema corrompido secular e mundano que vai estar a serviço da primeira besta
(a que emerge do mar) e de Satanás, no mundo. Ela embriagou e seduziu as
nações, mas agora cairá. Sua queda anunciada aqui será tratada em detalhes em
Apocalipse 17:1-18:24.
O terceiro anjo proclama o castigo aos adoradores da besta, àqueles que
não quiseram se arrepender. Veja que descrição terrível:
242
Carson et all (2010:2159).
243
Lopes (2005:283).
244
Ibidem.
245
Grangeão; Liborio, ed. (2009:886).
246
MacDonald (2010:910).
247
Stott (2006:219).
248
Carson et all (2010:2159).

55
Um terceiro anjo os seguiu, dizendo em alta voz: "Se alguém adorar a besta e a sua
imagem e receber a sua marca na testa ou na mão, também beberá do vinho do furor
de Deus que foi derramado sem mistura no cálice da sua ira. Será ainda atormentado
com enxofre ardente na presença dos santos anjos e do Cordeiro, e a fumaça do
tormento de tais pessoas sobe para todo o sempre. Para todos os que adoram a
besta e a sua imagem, e para quem recebe a marca do seu nome, não há descanso,
dia e noite" (14:9-11).

Segundo este texto, o cálice da ira de Deus será derramado de maneira


terrível sobre a terra; mais precisamente sobre aqueles que hostilmente decidiram
virar as costas para Deus. Até então, a ira de Deus veio “com misericórdia, mas
quando o juízo chegar, os ímpios terão que beber o cálice da ira de Deus sem
mistura, ou seja, sem oportunidade de arrependimento”. 249 Temos aqui uma
referência ao período da grande tribulação, que se inicia depois que todos os
salvos já estão selados, e onde não há mais chance de arrependimento (7:1-4). A
consumação final do “cálice da ira de Deus” será objeto de assunto do próximo
capítulo deste livro, que tratará dos capítulos 15-16, onde ele é descrito.
Entretanto, além do cálice da ira de Deus, este texto ainda diz que os
ímpios serão atormentados com fogo e enxofre. Os comentaristas bíblicos, neste
ponto, veem uma alusão ao inferno, onde os adoradores da besta serão
atormentados eternamente. Neste ponto precisamos discordar destes. A Bíblia
fala mesmo de um inferno de fogo como destino dos ímpios, depois da vinda de
Jesus (cf. Mt 5:22, 29, 30; 25:46). Contudo, estes não irão para o inferno para
serem queimados para todo o sempre, mas para serem aniquilados de uma vez
por todas. Neste sentido, o fogo é eterno em seus efeitos e não em sua duração.
A própria presença de fumaça no texto aponta para esta interpretação – a fumaça
sobe para todo o sempre. O fato de haver fumaça mostra que o fogo cumpriu o
seu papel. John Stott, em seu livro O incomparável Cristo, apresenta a
possibilidade de inferno se referir a aniquilação eterna e final como sendo válida
aqui, quando comenta este versículo. Ele chega a dizer que, inferno, em
essência, é “separação de Deus” ou uma “destruição eterna”. 250
Na continuação do texto, uma vez mais os santos são convocados a
perseverarem (v. 12). Aqueles que guardam os mandamentos de Deus e a fé em
Jesus estão seguros! Por fim, este parágrafo termina com uma bem-aventurança:
Então ouvi uma voz do céu dizendo: "Escreva: Felizes os mortos que morrem no
Senhor de agora em diante". Diz o Espírito: "Sim, eles descansarão das suas
fadigas, pois as suas obras os seguirão" (v. 13, NVI). Mesmo que sejam atacados
e mortos, os seguidores do Cordeiro são bem-aventurados. Sua vitória está
assegurada. E, de fato, ao que tudo indica, no período da grande tribulação,
vários cristãos serão martirizados. Mas estes devem permanecer firmes, pois
serão recompensados!

A colheita final (Ap 14:14-20)

Na parte final do capítulo 14, João olha e vê uma nuvem branca diante
dele, e sobre esta nuvem, alguém assentado, semelhante a um filho de homem,
com uma coroa de ouro sobre a cabeça e uma foice na mão (v. 14). Este ser
recebe a ordem de “outro” anjo para realizar suas atividades. Por isso, fujamos da

249
Lopes (2005:287).
250
Stott (2006:220).

56
tentação de tentar interpretar este “semelhante a um filho de homem” como se ele
fosse Cristo. Parece “estranho que Cristo receba a ordem de um anjo para
aparecer em glória e realizar a sua obra salvífica. É mais provável que o
‘semelhante a ser humano’ seja uma figura celestial partilhando parte da glória de
Cristo”.251
Outro anjo, que saiu do santuário, isto é, que saiu da presença de Deus,
deu ordens para o que estava assentado sobre as nuvens para que a ceifa se
iniciasse, pois a terra já está madura para a colheita (v. 15). Em uma de suas
parábolas, Jesus descreve o fim dos tempos como uma seara (Mt 13:30). Nela, a
ceifa é a “consumação dos séculos” e os anjos são os ceifeiros. Enfim, este
primeiro anjo vem e passa sua foice sobre a terra, e ela é ceifada (v.16). Alguns
entendem que esta primeira colheita é uma referência a reunião dos justos que
creem, a colheita dos justos.252
Na continuação temos mais dois anjos aparecendo. O primeiro sai do
santuário do céu com uma foice (v. 17); e é seguido por outro anjo que sai do altar
com poder sobre o fogo – uma possível referência ao fogo do altar, 8:3-5, o altar
está relacionado com os mártires, 6:9, e com a oração dos santos, ambos
importantes neste drama final, afinal, eles contribuem para que o juízo final se
realize. O anjo que sai do altar diz: Passa a tua foice afiada e colhe os cachos da
vinha da terra, pois as uvas já estão maduras (v. 18). Temos, deste modo, dois
anjos com uma foice afiada, e dois anjos que trazem ordens para estes primeiros
ajam. Este segundo anjo com a “foice afiada” colheu as uvas da vinha e as lançou
no lagar da ira de Deus (v. 19). Esta segunda colheita claramente se refere aos
ímpios. As “uvas pisadas são os incrédulos. Assim como as uvas são pisadas e
esmagadas, assim também os ímpios vão ser destruídos”. 253 Concordando com a
parábola de Cristo, os justos serão colhidos e vão para os celeiros celestiais, os
ímpios serão colhidos e mandados para o fogo infernal.
Por fim, lembramos que lagar é lugar das uvas serem pisadas, os ímpios
serão pisados. O juízo vai ser muito cruel. Esta imagem “ressalta a natureza
violenta do julgamento final”. 254 O texto diz que a altura do sangue que saiu do
lagar é da altura de um freio de cavalo (1,5 mts. do chão), por um espaço de 320
à 350 Km de sangue, a extensão da Palestina, de Dã a Berseba. É uma medida
exagerada para dizer simbolicamente que o juízo será feito sem misericórdia. É
“sem dúvida um símbolo completo e total do juízo de Deus que alcança os ímpios
plenamente e em todos os lugares”. 255 Este lagar é fora da cidade, ou seja, os
salvos não participarão deste juízo.256

CONCLUSÃO

Como você pode ler, este bloco tratou da luta do bem contra o mal. Ele
analisou os capítulos 12-14 de Apocalipse. Tratamos sobre os antecedentes
históricos, o estado atual e sobre o desfecho final desta luta do mal contra o bem.
Ficou bem claro para nós, que o dragão não está para brincadeiras. Ele, as
bestas e a Babilônia têm como único objetivo destruir a igreja. Alegra-nos saber,

251
Carson et all (2010:2160).
252
Stott (2006:220).
253
Lopes (2005:290).
254
Grangeão; Liborio, Ed. (2009:888).
255
Lopes (2005:290).
256
Ibidem.

57
entretanto, que neste período esta estará protegida por Deus. Alguns podem até
morrer, mas a igreja jamais será destruída. Caminharemos com muitas lutas até o
desfecho final, quando Deus porá um fim em toda a maldade. Até lá,
mantenhamos firme nossa fé em Jesus!

Capítulo 5
O JUÍZO ESTÁ CONSUMADO!
58
As sete taças

Chegamos ao quinto bloco do livro de Apocalipse. Para recapitular: já


estudamos sobre as sete igrejas, os sete selos, as sete trombetas, as sete vozes
celestes, e agora vamos tratar das sete taças da ira de Deus. É um trecho onde a
ira de Deus irá se consumar de maneira definitiva. Estamos falando dos
momentos finais da grande tribulação, que foi anunciada no sexto selo,
evidenciada com os julgamentos parciais das sete trombetas, e será finalizada
com o derramamento das sete taças. Será uma descrição terrível. Contudo, mais
uma vez, vemos esperança e alento em meio ao caos, pois esta parte do texto
começa no céu e relata uma visão do Cordeiro com seu povo (Cap. 15). Depois
da visão de consolo para os fiéis, vemos uma espantosa descrição do juízo; agora
é para valer, a destruição é completa (Cap. 16). O que acontecerá quando cada
taça for derramada? É isso que veremos agora, ao estudarmos estes dois
capítulos.

O cântico da vitória (Ap 15:1-4)

Assim começa Apocalipse 15: Ainda vi no céu outro sinal, grande e


admirável: sete anjos com as sete últimas pragas; pois nelas a ira de Deus se
consuma (v. 1). O completo juízo de Deus será concretizado. A palavra traduzida
por “consuma” é tetelesthe, que também significa “levar a um fim, finalizar”. A
obra de julgamento de Deus será completada de uma vez por todas! Os
julgamentos anteriores eram parciais, mas as taças são finais. Por isso João
chama esta visão de “grande e admirável”, mesmo depois de já ter visto horrores
espantosos. É que agora chegou o momento da ira de Deus se consumar, é o
“término de uma guerra entre o bem e o mal, nesta última batalha, pode-se dizer
com certeza que é um evento importante, embora terrível”. 257
Novamente João faz uma pausa. Ele é muito repetitivo. Apresenta mais
uma vez a igreja na glória (Ap 15:2-4). É lógico que nós não podemos perder de
vista que os cristãos para os quais João estava escrevendo estavam enfrentando
duras perseguições, eles tinham de ser confortados; ter a certeza de que um dia
aquilo teria fim, por isso João exagera no consolo. Aqueles que permaneceram
firmes obedecendo aos mandamentos de Deus e retendo a fé em Jesus (Ap
14:12), que não negaram o nome de Jesus, que recusaram adorar a besta e
inclinar-se à sua imagem e receber o número do seu nome, estão com harpas de
Deus em suas mãos (Ap 15:2), um símbolo de vitória. 258 Estes redimidos estão
junto ao mar de vidro misturado com fogo, que simboliza a vitória transparente de
Deus revelada no julgamento contra o iníquo. 259
Neste texto temos relatado o cântico de Moisés. A “vitória sobre os
egípcios foi um vislumbre da vitória de todos os redimidos de Deus sobre a besta,
sua imagem e seu número”.260 Os servos do Senhor estão cantando o hino da
vitória para o Cordeiro! O dragão tem poder, mas o Cordeiro é o todo poderoso.
Rei das nações é o Senhor! Quem é como o Senhor? (um contraste com a besta,
13:4). Stott faz as seguintes ponderações sobre estes versículos:
257
Turner (1983:214).
258
Ladd (1980:152).
259
Hendriksen (2001:216).
260
Hendriksen (2001:216).

59
“Assim como os israelitas reuniram-se junto ao Mar Vermelho, vitoriosos sobre Faraó,
João vê a multidão de pessoas em pé, junto ao que parecia um mar de vidro e fogo,
vitoriosos sobre a besta e a sua imagem. (...) Assim como Moisés e Miriã cantaram
em louvor a Deus (Êx 15), o cântico de Moisés (o vencedor do Antigo Testamento)
também tornou-se o cântico do Cordeiro (o vencedor do Novo Testamento), louvando
a Deus pela grandeza dos seus feitos e pela justiça dos seus caminhos”. 261

Uma introdução às sete taças (Ap 15:5-8)

“Depois disso”, isto é, depois do cântico de vitória dos redimidos, João tem
a seguinte visão:

Depois disso olhei, e vi que se abriu no céu o santuário, o tabernáculo da aliança.


Saíram do santuário os sete anjos com as sete pragas. Eles estavam vestidos de
linho puro e resplandecente, e tinham cinturões de ouro ao redor do peito. E um dos
quatro seres viventes deu aos sete anjos sete taças de ouro cheias da ira de Deus,
que vive para todo o sempre. O santuário ficou cheio da fumaça da glória de Deus e
do seu poder, e ninguém podia entrar no santuário enquanto não se completassem as
sete pragas dos sete anjos (Ap 15:5-8).

Santuário aqui é um símbolo da presença de Deus, representa o lugar


onde Deus está.262 Os anjos saem da presença de Deus. Ou seja, “foi por sanção
direta de Deus que os sete anjos emergiram como agentes de julgamento”. 263 As
roupas dos anjos são roupas de sacerdotes. Seus “vestidos provam que são
servos de grau elevado: linho puro e resplandecente, com cintos de ouro”. 264 Um
dos quatro seres viventes coloca uma taça na mão de cada um deles. Estas taças
são de ouro. As “taças de ouro eram utensílios do templo para derramar libações,
e, aqui, retratam a plenitude (sete) da ira de Deus derramada”. 265 No último
versículo temos, ainda, uma menção da fumaça da glória e do poder de Deus no
santuário. Por causa disso, ninguém mais pode entrar no mesmo, enquanto as
pragas não se consumarem. A “fumaça é resultante do fogo da cólera de Deus,
que agora oculta sua graça porque o pecado está plenamente maduro e precisa
ser julgado sem misericórdia”.266 Vamos então a descrição dos sete flagelos ou
traças!

As sete taças são derramadas (Ap 16:1-21)

Chega o grande momento do derramamento da ira de Deus sobre a terra.


Do santuário vem uma voz de comando para que as taças comecem a ser
derramadas (16:1). Como ninguém podia entrar no santuário (15:8), presume-se
que só Deus estava no mesmo. Esta voz, obviamente, é a voz do próprio Deus
dando autorização para que as taças sejam derramadas.

A primeira taça (Ap 16:1-2)

261
Stott (2006:221-222).
262
WilCock (2003:114).
263
Sttot (2006:223).
264
Turner (1983:214).
265
Unger (2006:694).
266
Ibidem.

60
O primeiro anjo derramou a sua taça, e a terra foi atacada: apareceram
feridas malignas nos homens que levavam o sinal da besta e adoravam a sua
imagem (v. 2). É uma praga especifica aos adoradores da besta. Todos “os que
não foram selados como seguidores do Cordeiro são marcados de forma
irreversível como adoradores da besta e todos eles, não somente um terço, irão
sofrer. Não são mais advertências, mas punições”. 267 Uma “úlcera maligna atinge
aqueles que trazem o sinal da besta. Esse é o juízo de Deus sobre aqueles que
rejeitam sua graça e se rebelam contra o seu culto”. 268

A segunda taça (Ap 16:3)

O segundo anjo derrama a sua taça sobre o mar, assim como a segunda
trombeta era sobre o mar. A diferença é que na trombeta o julgamento era parcial,
agora, será total. O mar de maneira geral, se torna como sangue de um morto; e
todos os seres viventes que estão no mar morrem.

A terceira taça (Ap 16:4-7)

Quando o terceiro anjo derrama sua taça, a fonte das águas são atacadas,
rios se tornam sangue. Temos, aqui, uma referência à água potável. Este castigo
foi muito penoso, segundo Turner. Afinal de contas, “o homem pode passar sem
comer durante alguns dias, contato que tenha água para beber, mas sem ela logo
sucumbe”.269 Não temos registrado o efeito deste flagelo, mas com toda certeza,
muita gente vai perecer por isso. Na sequência, um anjo brada um cântico ao
Senhor: Justo és o Senhor, que és que eras, o Santo porque julgaste todas as
coisas, pois derramaram o sangue de santos e de profetas, e tu lhes tem dado
sangue para beber; eles o merecem (v. 5). Os opressores do povo de Deus estão
prestando contas pelo que fizeram! Realmente, os juízos do Senhor são de fato
verdadeiros e justos (v. 6). Não podemos nos esquecer que estamos falando dos
últimos dias, quando o Anticristo e o Falso Profeta já estarão atuando de maneira
plena, junto com o dragão. Os santos sofrerão com a perseguição destes, que
vão tripudiar da igreja. Muitos cristãos morrerão! Mas a festa desta tríade
demoníaca, junto com os seus seguidores, logo acabará!

A quarta taça (Ap 16:8-9)

O quarto anjo derrama sua taça. Nela, a “absoluta autoridade de Deus


sobre a criação é exibida”.270 No quarto flagelo, o sol é aquecido. Esse flagelo é,
então, “um calor excessivo, que afligia as pessoas com uma insolação terrível”. 271
Mesmo assim em vez de arrependimento há blasfêmia. Não é sempre que o
arrependimento vem pelo sofrimento. Do contrário, os homens “tornar-se-ão mais
vis e blasfemarão contra o Deus do céu que tem poder sobre este flagelo”. 272 O
coração destes homens se “endurece, e revela-se seu verdadeiro caráter”. 273 São
teimosos e resolutos seguidores da besta!
267
Wilcock (2003:115).
268
Unger (2006:694).
269
Turner (1983:217).
270
Unger (2006:694).
271
Ladd (1980:156).
272
Hendriksen (2001:219).
273
Unger (2006:694).

61
O curioso é que estes homens sabem que as pragas vindas sobre eles
estão sendo enviadas por Deus, por isso mesmo estão blasfemando o seu nome.
Concordamos com Barclay que temos uma imagem estranha, de homens que...
“... vêem a mão de Deus nos atos e circunstâncias da história, e que entretanto
preferem andar por seus próprios caminhos. Nada que Deus possa fazer com eles,
nas manifestações de seu amor ou nas manifestações de sua ira os comoverá ou
conseguirá fazer com que se submetam”.274

A quinta taça (Ap 16:10-11)

O quinto anjo derrama a sua taça sobre o trono da besta. O reino da besta
se torna tenebroso. Leia a descrição de João:

O quinto anjo derramou a sua taça sobre o trono da besta, cujo reino ficou em trevas.
De tanta agonia, os homens mordiam a própria língua, e blasfemavam contra o Deus
do céu, por causa das suas dores e das suas feridas; contudo, recusaram-se a
arrepender-se das obras que haviam praticado (Ap 16:10-11).

Este flagelo atinge o centro do poder da besta (Anticristo). Por causa disso,
Ladd afirma que estes flagelos não representam a ira de Deus contra o pecado
das pessoas de maneira geral, apesar de isto ser um tema bíblico (Rm 1:18), mas
representa sua ira derramada sobre a civilização demoníaca dos últimos dias.
Este flagelo, especificamente, veio acompanhado de dor aguda. Apesar do texto
não explicar porque, as pessoas mordiam suas línguas em agonia. 275 Stott sugere
que o fato do trono da besta ser lançado nas trevas, fará surgir uma consequente
anarquia, que trará todos estes sofrimentos aos seres humanos. 276 Mesmo assim,
os corações destes pecadores mostram-se inflexíveis, e continuam a blasfemar o
Deus do céu!

A sexta taça (Ap 16:12-16)

O sexto anjo derrama sua taça sobre o grande rio Eufrates, e a água do rio
secou, para que se preparasse o caminho dos reis que vêm do oriente (v. 12).
Esta praga não apresenta nenhuma ação direta contra os seres humanos, ela é
uma preparação para a grande batalha final. A “secura do rio Eufrates, rio de dois
mil oitocentos e cinquenta quilômetros de extensão, o maior curso d’água da Ásia
Ocidental, simboliza a remoção de toda a barreira que impede o avanço dos ‘reis
que vem do Oriente’” rumo à batalha final. 277 Este grande rio funcionava como
uma barreira natural contra a invasão dos exércitos inimigos do império romano,
que vinham do leste. Uma vez que ele se seca, “abria-se o caminho para a
invasão dos reis do leste”. 278 Contudo, conforme já afirmamos, a ideia aqui não é
uma invasão contra o império romano: estes reis estão vindo para a batalha do
Grande dia do Deus Todo Poderoso (v. 14).

274
Barclay (p. 362).
275
Ladd (1980:157).
276
Stott (2006:224).
277
Unger (2006:694).
278
Stott (2006:224).

62
O v. 13 apresenta a tríade demoníaca: dragão, besta (Anticristo) e falso
profeta. É a primeira menção clara ao falso profeta, “ele é a segunda besta que
surgiu da terra para dar apoio à besta em suas exigências blasfemas”. 279 Da boca
de cada um deles João viu sair um espírito imundo, semelhante a rãs. Estes
espírito imundos (demônios) são comparados a rãs para indicar seu caráter
“abominável, repugnante, asqueroso”.280 Segundo Sttot, eles representam as
“mentiras de propaganda pelas quais os reis de todo o mundo são persuadidos a
se reunir para a batalha final”. 281 Hendriksen, nesta mesma linha, afirma que eles
representam ideias satânicas; planos, projetos, métodos e empreendimentos
infernais apresentados na esfera do pensamento e da ação. Assim, quando os
reis da terra se juntam para lutar contra os crentes, tal batalha ou perseguição, é
inspirada pelo próprio reino satânico. 282 Unger diz que esses demônios são o meio
enganador de persuadir as nações a se reunir para a suprema insensatez do
Armagedom.283 Estas interpretações parecem estar corretas, pois o v. 14 afirma
que estes espíritos vão ao encontro dos reis de todo o mundo, a fim de reuni-los
para a batalha.
Este exército, pronto para a batalha, sob o domínio de Satanás, do governo
anticristão e da religião anticristã, se reúne no lugar que em hebraico se chama
“Armagedom” (v. 16). Muitos acreditam que esta palavra se deriva de “Megido”. O
equivalente hebraico seria Har megiddon (a montanha de Megido), um ponto
estratégico na Palestina, lugar onde aconteceu muitas batalhas antigas. Apesar
do nome, Megido não é uma montanha, mas uma planície. Ao usar o termo,
possivelmente João não o faz pensando em um lugar literal, mas para se referir a
batalha final entre os poderes do mal e o reino de Deus. 284 Simboliza “a batalha
final entre o Cordeiro e o Dragão, entre Cristo e o Anticristo. Ora, Cristo vai vir em
poder e glória para derrotar e destruir as forças do mal”. 285
O v. 15 traz uma palavra importante para os servos de Deus, diante da
iminência desta batalha: Eis que venho como ladrão! Feliz aquele que permanece
vigilante e conserva consigo as suas vestes, para que não ande nu e não seja
vista a sua vergonha. Dizer que Jesus vem como um ladrão significa dizer que
sua vinda não é esperada. Mas por quem está vinda não é esperada? Quando
Paulo usa esta figura de linguagem, aplica a mesma àqueles que estão em trevas
(1 Ts 5:2-4). Segundo Paulo, para os que estão despertos, atentos, sua vinda
“não será surpresa, inesperada, mas uma libertação feliz da situação trágica do
mundo em que se encontra”.286 O reino Satânico se reunirá para a batalha, e
quando eles menos esperarem, Cristo aparecerá nos céus! Tão “densos serão a
escuridão e o engano naquela hora que as hordas terrenas reunidas em
Armagedom serão subitamente surpreendidas pelo glorioso advento de Cristo”. 287
Por isso diz João: Feliz o que permanece vigilante, isto é, aquele que não perdeu
de vista os valores espirituais, mesmo apesar de a besta reinar. 288 A advertência
quanto guardar as vestes, para não andar nu, é uma exortação ao zelo espiritual.
279
Ladd (1980:158).
280
Hendriksen (2001:221).
281
Stott (2006:224).
282
Hendriksen (2001:221).
283
Unger (2006:695).
284
Ladd (1980:160).
285
Stott (2006:225).
286
Ladd (1980:159).
287
Unger (2006:695).
288
Ladd (1980:160).

63
A sétima taça (Ap 16:17-21)

Por fim, o último anjo derrama sua taça. Ela indica o aniquilamento total do
mal. Os eventos narrados neste trecho sinalizam que já é a descrição da segunda
vinda de Jesus. Leiamos:

O sétimo anjo derramou a sua taça no ar, e do santuário saiu uma forte voz que vinha
do trono, dizendo: "Está feito! " Houve, então, relâmpagos, vozes, trovões e um forte
terremoto. Nunca havia ocorrido um terremoto tão forte como esse desde que o
homem existe sobre a terra. A grande cidade foi fracionada em três partes, e as
cidades das nações se desmoronaram. Deus lembrou-se da grande Babilônia e lhe
deu o cálice do vinho do furor da sua ira. Todas as ilhas fugiram, e as montanhas
desapareceram. Caíram sobre os homens, vindas do céu, enormes pedras de
granizo, de cerca de trinta e cinco quilos cada; eles blasfemaram contra Deus por
causa do granizo, pois a praga fora terrível (Ap 16:17-21).

Este último castigo dará fim à Grande Tribulação: “Feito está” (v. 17). Sua
taça é derramada no ar. Os seres humanos respiram do ar, se “o ar se
contaminar, a própria força da vida humana está contaminada”. 289 Em seguida,
como “sacudida pela voz do criador, a terra treme com uma convulsão muito
grande” (v. 18).290 No v. 19 temos descrito o “colapso completo da civilização
humana, ateísta”.291 As cidades das nações caíram. As “cidades, centros de
grande desenvolvimento comercial e social, e também de grande iniquidade em
todas as suas formas, tem altos edifícios e grandes concentrações de habitantes,
que naturalmente vem a ser o alvo da maior devastação e do maior sofrimento
humano em um terremoto”.292
Deus “lembrou-se da grande Babilônia” e lhe deu o “cálice do furor da sua
ira”. Por um curto período de tempo, parecerá que Deus se esqueceu do seu
povo, mas isto não é verdade. Deus se lembra, e se lembrará “do poderoso
inimigo do seu povo para retribuir-lhe com justiça”. 293 No próximo capítulo deste
livro, veremos com detalhes a queda da grande Babilônia. Aqui, temos somente
uma rápida menção. Os capítulos 17-18 de Apocalipse, que serão analisados
mais à frente, tratarão exclusivamente deste assunto.
Todas as ilhas fugiram, e os montes desapareceram (v. 20). Estas
mudanças na natureza preparam o mundo para as condições de caos que
prevalecerão no mundo durante o milênio. Por fim, pedras de mais de trinta quilos
caem do céu sobre os homens (v. 21), e mesmo assim eles continuam
blasfemando contra Deus. E se blasfemam contra Deus, é porque sabem que é
dele que vêm estas pragas, e mesmo assim, continuam com seu coração duro.
Isto só mostra que Deus foi justo em “colocar esta época no fim da história
humana. Verifica-se que não há razão para prolongar este período nem provar
outras medidas, pois não há esperança de conduzir homens rebeldes ao
arrependimento”.294 Barclay conclui seu comentário deste versículo lembrando
que, uma das verdades mais tremendas diante do relato do derramamento das
taças, “é que nem Deus, com todo seu poder, pode tomar de assalto a cidadela
289
Barclay (p. 362).
290
Turner (1983:221).
291
Ladd (1980:161).
292
Turner (1983:221).
293
Ladd (1980:162).
294
Turner (1983:222).

64
do coração humano, porque o próprio Deus deu aos homens a terrível
responsabilidade de ser capazes de fechar seus corações”. 295

CONCLUSÃO

Chegamos ao final do quinto bloco do Apocalipse. Os acontecimentos


narrados neste bloco não foram nada agradáveis. A ira de Deus foi completada. O
fim definitivo da maldade chegou. Com a volta de Cristo, todos os planos
malignos foram frustrados. Não deixe de ler o próximo capítulo deste livro, que
dará continuidade a este desfecho final da história. Nesta parte, apresentamos os
preparativos para a grande batalha, que será descrita em detalhes em Apocalipse
19, quando Cristo vem vitorioso para derrotar seus inimigos. 296 Além disso, aqui
só citamos a queda da Babilônia, que também será tratada em detalhes na
próxima parte. É isso. De fato, podemos dizer, ao terminarmos de analisar estes
dois capítulos que...

"Grandes e maravilhosos são os seus feitos, Senhor Deus todo-poderoso.


Justos e verdadeiros são os seus caminhos, O Rei dos Séculos. Quem não
temerá o Senhor, e não glorificará o seu Nome? Pois só o Senhor é santo.
Todas as nações virão e adorarão diante do Senhor, porque os seus feitos
justos têm sido manifestos" (Ap 15:3-4, BV).

Capítulo 6
A MERETRIZ E A NOIVA DO CORDEIRO
As sete cenas do julgamento
295
Barclay (p. 369).
296
Ladd (1980:160).

65
Passaremos a falar agora sobre o sexto bloco do livro de Apocalipse, que
inicia com capítulo 17 e vai até o final do capítulo 19. Nestes três capítulos, a
maior ênfase é dada à grande Babilônia, fazendo um contraste, obviamente, com
nova Jerusalém (cf. Ap 21:1-27), que representa a Igreja de Cristo em sua
exaltação. Enquanto aquela é a grande meretriz, esta é Noiva do Cordeiro.
Algo interessante acontece nesta parte do texto: de forma sutil, como se
fosse um código, vemos se repetindo a expressão “vi” (17:3, 6a, 6b; 18:1; 19:11,
17, 19). Conte e você verá que são exatamente sete vezes. É por isso chamamos
essa seção de as sete cenas do julgamento. Em Apocalipse 12 a 14 nos são
apresentados os cinco inimigos de Cordeiro: O dragão, o anticristo, o falso
profeta, a grande meretriz e os homens que têm a marca da besta. Porém, desde
o capítulo 15, João passa descreve a ruína de cada um deles, de forma
sequencial, do menor até o maior.
Se no bloco anterior, vimos o juízo de Deus sobre os homens que tinham o
sinal da besta, a partir de agora, veremos o juízo sobre os comparsas do dragão.
No capítulo 17 encontramos a descrição da Babilônia e no capítulo 18 a sua
queda. Já no capítulo 19 vemos claramente Cristo triunfando sobre a Babilônia, e,
também, sobre a besta e sobre o falso profeta, numa descrição muita nítida de
sua Segunda Vinda. A derrota do dragão é reservada para o capítulo 20, onde é
descrito o ato final do julgamento de Deus.

1. A MULHER MONTADA NA BESTA

Segundo Apocalipse 17:1, um dos sete anjos que tinham as sete taças
aparece a João. Este anjo fala com o apóstolo de forma amistosa e tranquila:
Venha, eu lhe mostrarei o julgamento da grande prostituta que está sentada sobre
muitas águas. Assim ele é conduzido pelo anjo até o deserto onde vê a besta
escarlate. Esta é aquela mesma besta que emerge do mar e que encontrada no
capítulo 13.297 Ela representa o sistema político pernicioso do mundo. Este
sistema ao longo da história produziu seus vários anticristos, mas que, por fim,
culminará com o surgimento do assustador homem do pecado: O Anticristo. Esta
pessoa maligna é a personificação final deste sistema anticristão, que ao longo
dos tempos, através dos governos e nações, principalmente, nos grandes
impérios do mundo, perseguiu a igreja. 298
Curiosamente, João enxerga a besta no deserto, exatamente para onde a
mulher vestida do sol do capítulo 12, que representa a igreja, havia fugido.
Quando vê a besta, nota que ela não está sozinha: há uma mulher sentada sobre
ela. Contudo, esta mulher não pode ser confundida com aquela vestida do sol. As
duas são rivais e se abominam. 299 Diferente daquela, esta mulher do capítulo 17,
que está sentada sobre a besta, é chamada de a grande prostituta. Está bem
vestida e repleta de adereços. Como uma rainha, ela está vestida de púrpura e
escarlate. Está coberta de ouro, de pedras preciosas e de pérolas. Os soberanos
e imperadores das nações são seus amantes. Os povos da terra se embriagam
com o vinho da sua prostituição. Ela carrega na mão uma taça cheia de
abominações, que são as imundícias de sua vida promíscua. E na sua testa há
297
Hendriksen (2001:224).
298
Lopes (2005:323).
299
Hendriksen (2001:224).

66
uma inscrição terrível: Mistério: Babilônia, a grande; a mãe das prostitutas e das
práticas repugnantes da terra. (Ap 17:5 – NVI).
O capítulo 17 de Apocalipse nos apresenta uma descrição detalhada a
respeito da grande meretriz, e desta descrição há algumas marcar dela que são
dignas de destaque: a. Ela é o oposto da noiva do Cordeiro (v.1). b. Ela tem
influência mundial (v.1,15). c. Ela é muita rica (v. 4). d. A sedução é seu forte (v.
2,4,5). e. A violência é um de suas marcas (v.6). f. A grande meretriz está
associada com a besta (v. 3).

A mulher representa uma ideia, é um símbolo

A grande prostituta é, claramente, a Babilônia, que aparece várias vezes


neste bloco do livro. Mas o que a Babilônia simboliza ou significa? Segundo
Ladd,300 fato de a meretriz está sentada sobre muitas águas, é algo que merece
nossa atenção, pois fornece uma chave para a sua interpretação. Esta descrição
não pode ser aplicada literalmente a Roma histórica, pois ela não fora edificada
sobre muitas águas. Aplica-se melhor a Babilônia histórica, que fora construída
numa região cheia de rios e canais, como afirmou o profeta Jeremias a seu
respeito: Você que vive junto a muitas águas... (Jr 51:13).
A questão é que nos dias de João a Babilônia já existia mais como cidade.
Babilônia, agora, é uma ideia, é um conceito, é símbolo de filosofia de carnal e
mundana.301 Para compreender essa questão de forma melhor é imprescindível
relembrar o que foi a Babilônica. Esta cidade é citada na Bíblia por mais de 200
vezes. Estava localizada no que hoje conhecemos como Iraque, entre os rios
Eufrates e Tigre, na Planície de Sinear (cf. Gn 10:10). Esta localidade ficou
famosa na antiguidade pela construção da Torre de Babel, em que os homens,
liderados por Ninrode, quiserem fazer seus nomes celebres e em arrogância
decidiram trilhar seus próprios caminhos, independentes de Deus (cf. Gn 11:1-9).
É a primeira cidade mencionada após o Dilúvio e é a mesma, que posteriormente,
será chamada de Babilônia e que fica na região chamada Caldéia. 302
Babilônia era a cidade das maravilhas, com suas lindas e enormes pedras
bem ajustadas, com seus jardins suspensos, que foram uma das 7 maravilhas do
mundo antigo, e com o templo de Bel que tinha 200 metros de altura. 303 Na época
de Nabucodonor, por exemplo, abrigava uma civilização bastante avançada. Era o
centro do comércio do mundo antigo. Suas muralhas tinham mais de 100 metros
de altura, e tinham a capacidade de suportar a passagem de dois carros de
guerra, lado a lado, por cima dela. Cada lado da cidade tinha 25 portas de metal,
com uma rua saindo de cada porta, possuindo 6 Km de extensão. Era uma cidade
muito bem planejada e estruturada. Extremamente segura. Sua riqueza era
imensurável, pois em seus depósitos estavam os tesouros da terra. Nela estava o
melhor da ciência e da sabedoria dos homens, pois os maiores sábios da terra,
daquela época, moravam ali.
Era realmente uma cidade magnífica! Entretanto, mesmo diante de
tamanha grandeza física e imponência social, Babilônia não se destacava apenas
por isso, mas também por causa de suas características espirituais e morais. É
uma cidade arrogante, materialista, idólatra e promíscua. Diferente da nova

300
Ladd (1986:163).
301
Alexander, et al. (2009: 599).
302
Douglas (1986:179).
303
Idem, p. 179-191.

67
Jerusalém de Apocalipse 21, que depende de Deus para tudo e que é o
tabernáculo de Deus, Babilônia era a cidade que não “precisava” de Deus. 304 Ela é
o protótipo de uma sociedade sem Deus e sem os valores e os princípios morais
ensinados por ele. Por isso que a Babilônia histórica foi alvo do juízo de Deus,
assim como foram Sodoma e Gomorra. Deus suporta aquilo o que esta cidade
representa. Veja o que Isaías profetizou a respeito dela:

Babilônia, a jóia dos reinos, o esplendor do orgulho dos babilônios, será


destruída por Deus, à semelhança de Sodoma e Gomorra. Nunca mais
será repovoada nem habitada, de geração em geração; o árabe não
armará ali a sua tenda e o pastor não fará descansar ali o seu rebanho.
Mas as criaturas do deserto lá estarão, e as suas casas se encherão de
chacais; nela habitarão corujas e saltarão bodes selvagens. As hienas
uivarão em suas fortalezas, e os chacais em seus luxuosos palácios. O
tempo dela está terminando, e os seus dias não serão prolongados. (Is
13:19-22 – NVI)

A Babilônia se destaca como: O berço da vaidade, em que o homem tem o


desejo de atrair a atenção, elogios e homenagens. O berço da ostentação, em
que o luxo, vanglória e pompa são destaques. O berço do materialismo, em que o
mais importante é ter, e não ser; em as coisas são mais importante que as
pessoas. O berço da impiedade, em que impera a crueldade e descrença. O
berço da idolatria, em que “deuses” são adorados, idolatrados e servidos. O berço
da promiscuidade, em que o sexo é parte do culto aos deuses a satisfação
pessoal, em que prostituição, adultério, homossexualismo e todo forma de
aberração sexual são considerados práticas lícitas e normais. O berço do orgulho,
em que a soberba, o egoísmo, a auto-estima exagerada e a altivez são
alimentados. O berço da crueldade, em que idosos e crianças são maltratados e a
maldade é cultivada. O berço da feitiçaria, onde práticas ocultas, poções mágicas
e drogas são desenvolvidas.
Na Babilônia, a humanidade se organiza em patente rebelião contra Deus
(Ap 17:5), desenvolvendo e sustentando um sistema político (Ap 18), trazendo a
unificação de poderes, desenvolvendo forças organizacionais e militares.
Desenvolvendo um sistema econômico (Ap 18), criando a unificação de moedas,
para a distribuição de renda e unificação econômica. Desenvolvendo um sistema
religioso, através da idolatria (Ap 17) e ecumenismo. Nela, encontramos traços
característicos da sociedade atual. Na verdade, em nossos dias, encontramos
sinais ainda mais avançados de uma Babilônia que continua viva e atuante.
É isso mesmo, Babilônia, agora, é uma ideia, é um conceito, é a filosofia de
vida regente no mundo: aquilo que chamamos de mundanismo. De acordo com
William Hendriksen:

A Babilônia, portanto, representa o mundo como centro de indústria,


comércio, arte, cultura etc., por meio do que busca atrair e seduzir os
crentes, isto é, afastá-lo de Deus. Ela simboliza a concentração da luxúria,
do vício, das atrações deste mundo. 305

304
Alexander, et al. (2009: 598).
305
Hendriksen (2001:225).

68
Ela é personificação da concupiscência da carne, a concupiscência dos
olhos e soberba da vida (1 Jo 2:16), que seduz os homens e os leva a adorar o
que não é Deus.
Segundo Lopes, a Babilônia de Apocalipse 17 e 18 é mais um símbolo do
que um lugar.306 Faz menção à Babilônia dos tempos de Babel, à Babilônia de
Nabuconodosor (senhora do mundo); a Roma dos Césares e a todos os impérios
do mundo que se levantaram contra Deus e sua igreja. A Babilônia, nestes
capítulos, não é apenas a Babilônia escatológica, mas também a Babilônia
atemporal, o mundo como centro de sedução em qualquer época. Ela é um
símbolo da rebelião humana contra Deus. É o sistema mundano que opõe contra
Deus.
É sobre este sistema que Paulo está falando, quando escreve:

Não se amoldem ao padrão deste mundo, mas transformem-se pela


renovação da sua mente, para que sejam capazes de experimentar e
comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus (Rm 12:2).

Ao desenvolver essa ideia representada pela Babilônia, o autor Martyn


Lloyd-Jones faz o seguinte comentário destes capítulos de Apocalipse que
estamos analisando:

Pensem no mundo, pensem no mundanismo, vejam-no nas ruas de


qualquer cidade grande. Vejam-no e ponderem-no nos noticiários. Vejam-
no nos assim chamados informes da sociedade e em particular, e então,
uma vez feito isso, venham e leiam estes capítulos reveladores. Vejam o
adorno, a riqueza, a luxúria, a própria devassidão do mundo; vejam a
ostentação de si mesmo e de seus grandes homens e mulheres. Eis toda a
sedução do mundo, o resultado da ação da grande meretriz que chama e
atrai reis, príncipes, ricos mercadores e igualmente pessoas comuns. É-
nos fornecido um quadro perfeito do mundo à parte de Cristo, blasonando
[gabando] de sua riqueza, blasonando de sua alimentação, de seus
banquetes, de seus carros, de seu equipamento, de seu vestuário e de sua
beleza e sua glória. Mas logo em seguida leiam o que lhe acontecerá.
Leiam como será destruído total e absolutamente. Oh, se ao menos
compreendêssemos esse ensino, jamais nos sentiríamos tentados outra
vez pelo mundanismo.307

A Babilônia é sedutora. Os reis e os habitantes da terra foram atraídos pela


sua tentadora presença e se embriagam com o vinho da sua prostituição (Ap
17:2). Sobre isso, há um detalhe de sua descrição chama a atenção. O texto diz
que ela segurava um cálice de ouro em suas mãos (Ap 17:4b). Um cálice ou uma
taça de ouro induzem as pessoas a beberem, pois se pressupõe que, em taça tão
preciosa, esteja servindo também uma bebida preciosa. Contudo, esse cálice está
cheio de coisas repugnantes (abominações) e da impureza de sua prostituição
(Ap 17:4c).
Qual é a aplicação que temos aqui? Tudo o que é usado pelo mundo para
afastar o cristão de seu Deus está neste cálice da meretriz: a pornografia, a
luxúria, a fama, o poder, o dinheiro fácil, o sexo ilícito, o consumismo
desenfreado, a ilusória alegria das festas, das drogas e das bebidas e assim por

306
Lopes (2005:323).
307
Lloyd-Jones (1998:242).

69
diante. Cada um faça a sua lista.308 Pois cada um de nós é tentado em áreas
diferentes da vida, cada um tem sua própria tentação. A Babilônia tem um produto
certo para atrair cada cristão. Portanto, fique atento! Lembre-se das palavras de
Jesus: Venho sem demora. Conserva o que tens, para que ninguém tome a tua
coroa (Ap 3:11).

A besta que está associada à mulher

A besta vista por João e que está montada pela meretriz é a mesma que
emergiu do mar, conforme está registrado nos versículos 1, 7 e 8 do capítulo 17
(comparar com Ap 13:1-10). Essa besta recebe o trono do dragão, seu poder e
autoridade. Essa besta é temida e ninguém é considerado capaz de enfrentá-la.
Essa besta recebe adoração de pessoas de todos os povos e nações. Essa besta
é um sistema de governo anticristão e uma pessoa.
A besta é uma expressão de todo o governo anticristão que persegue a igreja ao
longo dos séculos e será um homem escatológico que receberá o poder do
dragão para governar um breve tempo.
Se fizermos uma leitura atenciosa de Apocalipse 13:1-10 veremos que há
muitas coisas que a besta e a meretriz tem em comum. Elas têm características
semelhantes. Veja que elas aparecem juntas no texto (Ap 17:3), e isso por que
uma depende da outra. Esta besta, como se sabe, é o sistema político e
governamental que dá sustentação a essa ideia que Babilônia representa, isto é,
o mundanismo. Por sua vez, o mundanismo é a mentalidade que rege esse
sistema político preservo e sem Deus. De acordo com João, a prostituta e besta
andam juntas até o relacionamento delas entrar em colapso (cf. Ap 17:16-17).
A descrição que o apóstolo João faz desta besta é muito intrigante: ela é
vermelha e tem sete cabeças e dez chifres. Sua cor é vermelha por causa do
sangue dos santos, o sangue das testemunhas de Jesus (Ap 17:6). Com relação
as cabeças e os chifres, o anjo explica a João dizendo:

Aqui se requer mente sábia. As sete cabeças são sete colinas sobre as
quais está sentada a mulher. São também sete reis. Cinco já caíram, um
ainda existe, e o outro ainda não surgiu; mas, quando surgir, deverá
permanecer durante pouco tempo. A besta que era, e agora não é, é o
oitavo rei. É um dos sete, e caminha para a perdição. Os dez chifres que
você viu são dez reis que ainda não receberam reino, mas que por uma
hora receberão autoridade como reis, junto com a besta. Eles têm um
único propósito, e darão seu poder e sua autoridade à besta. (Ap 17:9-13)

Sendo assim, passemos a analisar algumas características desta besta.


Em primeiro lugar, ela era e já não. Essa frase é usada porque “a besta foi
personificação dos grandes impérios do passado. Já não é porque esses impérios
caíram. Está para emergir porque antes da segunda vinda, o anticristo se
levantará para caminhar para a destruição”. 309 Em segundo lugar, ela tem sete
cabeças. Na explicação do anjo, as sete cabeças simbolizam, ao mesmo tempo,
sete colinas e sete reinos. As sete colinas podem ser interpretadas,
geograficamente, como as sete colinas de Roma. Vemos aqui uma clara menção
a Roma imperial, que no contexto de João, assumia muito bem o papel da
308
Hendriksen (2001:227).
309
Lopes (2005:318).

70
Babilônia. Pois vivia no luxo, espalhando falsas religiões, contaminando as
nações com sua idolatria e pecado e perseguindo a igreja de Cristo. 310
Com relação aos sete reinos, podemos sem receio interpretar
historicamente. De acordo Wiersbe, esse texto está falando de setes grandes
reinos “anticristãos”: o Reino Egípcio, o Império Assírio, o Império Babilônico, o
Império Persa, o Império Grego, o Império Romano, e por fim, o Reino do
anticristo.311 De acordo com o versículo 10, cinco destes reinos já haviam caído no
tempo de João, um estava existindo e outro ainda não havia chegado e quando
esse chegasse duraria pouco tempo. A interpretação é simples: Na lista à cima,
os cinco primeiros impérios já tinham caído. Naquele momento João via o Império
Romano. Contudo, o reino do anticristo escatológico ainda não chegou e quando
chegar vai durar pouco.312 Em terceiro lugar, ela tem dez chifres. Chifre significa
poder e autoridade. Esses dez chifres, segundo o versículo 12, são dez reis da
terra. Representam todos os governos e autoridades da terra que darão
sustentação ao reinado do Anticristo, que surgirá no fim dos tempos. 313

A decepção com a grande meretriz

Por certo tempo, parece que tudo está indo bem para a meretriz: todas as
pessoas do mundo, sobretudo, os mais poderosos da terra se envolveram e se
corromperam com ela. Eles sustentam esta mulher, e por estarem apaixonados,
acreditam plenamente em suas ilusões e mentiras, ou seja, em sua cultura
anticristã. Contudo, nos versículos 15 e 16 de Apocalipse 17, encontramos o
mundo inteiro decepcionado com a grande meretriz. Todas as pessoas que
compõem este mundo anticristão, juntas com a besta se voltam contra meretriz.
No final, todos a odiarão e, em grande decepção, arrancarão suas vestes e a
despojarão de seus enfeites luxuosos e caros, depois devorarão sua carne e a
farão dela um grande incêndio.
O que isso que dizer? Significa que chegará um tempo em “as pessoas do
mundo – que com seus governos anticristãos constituem ‘a besta’ e que estão
enfeitiçados com a ‘meretriz’, isto é, a sedução deste mundo, seus prazeres e
ilusões, sua cultura e luxúria – verão quão tolas elas têm sido”. 314 Como diz
William Hendriksen: “Os prazeres do pecado sempre desapontam no final”. 315 Este
texto nos mostra a trajetória das pessoas no mundo: elas são seduzidas e se
apaixonam pelos prazeres e devaneios mundanos e ficam endurecidas com
relação a Deus, fazendo todo tipo de blasfêmia contra ele. Acreditam que podem
fazer o que quiserem e isso não lhes trará nenhuma consequência. Ledo engano!
Só notarão o que fizeram quando for tarde demais, em que não haverá mais
chances de voltar atrás. Chegará um tempo em que experimentarão um choque
de realidade. Pois se acharão sendo castigadas por causa de sua própria idiotice!
Assim se revoltarão contra os sistemas que sempre acreditaram.
O trecho final de Apocalipse 17 aponta para um colapso econômico e
político, que abrirá caminho o Anticristo reinar. Este se apresentará como
“salvador” dos revoltados e os reunirá para uma batalha (cf. Ap 19:19). Vale
lembrar que a besta que, inicialmente, sustenta a meretriz e depois se levanta
310
Wiersbe (2006:780).
311
Lopes (2005:318).
312
Ladd (1986:170).
313
Idem, p. 171.
314
Hendriksen (2001:231).
315
Idem

71
contra ela, é o sistema político perverso, representado pelos seus anticristos ao
longo da história, mas que nos últimos dias, será manifestado na pessoal do
grande e terrível Anticristo escatológico. Em outras palavras, o colapso da
Babilônia indica o início do reinado deste maligno, que está para subir do abismo
e caminha para perdição (Ap 17:8,11). Seu reinado durará pouquíssimo tempo,
pois logo em seguida acontecerá a segunda vinda de Cristo.

2. A QUEDA DA GRANDE BABILÔNIA

O capítulo 18 de Apocalipse é em essência um cântico fúnebre que celebra


a queda da Babilônia. 316 Nele, o apóstolo João, vê outro anjo descendo do céu.
Este vem cheio de autoridade e esplendor, com missão de anunciar a queda da
Babilônia. Em grande voz, ele grita dizendo:

“Caiu! Caiu a grande Babilônia! Ela se tornou habitação de demônios e


antro de todo espírito imundo, antro de toda ave impura e detestável, pois
todas as nações beberam do vinho da fúria da sua prostituição. Os reis da
terra se prostituíram com ela; à custa do seu luxo excessivo os
negociantes da terra se enriqueceram”. (Ap 18:2-3 - NVI)

A queda da Babilônia é tão certa, que é anunciada pelo anjo como se já


houvesse acontecido.317 E de acordo com este texto, o motivo de sua queda é a
corrução total que praticou com as nações e seus mercadores (Ap 18:3). Os
“mercadores” aqui são todos aqueles que se envolvem os “negócios” da Babilônia
vendendo suas mercadorias. Representam todos os que aplicam o coração aos
cuidados do mundo. São os líderes, artistas, sábios, filósofos e pensadores que
pregam a mentalidade de um mundo sem Deus. São também os meios midiáticos
e marqueteiros, também, as grandes empresas que vendam a imagem da
Babilônia. São ainda todos os grandes ou pequenos, que lucram com este
sistema corrupto. É peculiar a formar como NTLH tradução esse texto: ... os
homens de negócio deste mundo se enriqueceram à custa das práticas sexuais
sujas da prostituta (grifo nosso).
Em seguida, vem outra voz do céu, e esta é dirigida aos crentes em Cristo:

“Saiam dela, vocês, povo meu, para que vocês não participem dos seus
pecados, para que as pragas que vão cair sobre ela não os atinjam! Pois
os pecados da Babilônia acumularam-se até o céu, e Deus se lembrou dos
seus crimes...” (Ap 18:4-5)

Nesta mensagem o povo de Deus é alertado para se retirar do meio desse


sistema iníquo e condenado, na véspera de sua destruição total. Esta mesma
admoestação também foi feita aos crentes de todas as épocas e lugares (cf. Is
48:20; 52:11; Jr 50:8; 41-44; Zc 2:7). A voz que vem do céu diz que qualquer
cristão que tiver algum tipo de relação ou envolvimento, por mínimo que seja, com
a meretriz, também participará dos castigos reservados a ela. Os filhos de Deus
devem se separar do mundo, para não ser cumplice de seus pecados e para não
serem destruídos junto com ele.
No versículo 6 lemos que a Babilônia receberá “em dobro” a paga de suas
obras. O que indica a gravidade dos pecados praticados por ela. Isso não que
316
MacDonald (2008:1013).
317
Hendriksen (2001:232).

72
dizer que ela receberá duas vezes mais punição do que merece, significa, na
verdade, que ela receberá a quantia exata de punição por tudo o que fez. É tudo
que ela merece! A ideia do texto no original e dá a castigo em partes dobradas:
conforme o pecado que é duplo e receberá castigo duplo. 318 É o que diz o
versículo 7: O quanto a si mesma se glorificou e viveu em luxúria, dai-lhe em igual
medida tormento e pranto... A balança de Deus pesa com precisão!
De acordo com Ladd, a ideia de pagar em dobro as obras de alguém é uma
as obras de alguém é uma expressão do Antigo Testamento que indica castigo
completo 319 (cf. Jr 16:18; 17:18). A Babilônia terá o que merece, por que em sua
soberba, ela debocha de Deus, dizendo: “Estou sentada como rainha; não sou
viúva e jamais terei tristeza” (Ap 18:7c). Diz o texto que, por causa disto, seu
julgamento virá em um só dia e causará morte, pranto e fome (Ap 18:8). O Todo
Poderoso Senhor é que a castigará com fogo.
O restante do capítulo 18 pode ser resumido em duas reações distintas da
plateia que assiste a queda da Babilônia: lamentação e celebração. 320 Em primeiro
lugar vemos nos versículos 9 a 19 a lamentação dos reis, dos mercadores e dos
marinheiros ao verem a derrocada da Babilônia e futilidade de seus
investimentos. João diz que eles chorarão e se lamentarão, principalmente, os
mercadores, pois verão que se esvaziaram suas expectativas de lucro. Agora,
ninguém compra mais sua mercadoria! A mentira foi desmascarada. Ninguém
acredita mais nas falsas promessas de seus produtos. Por isso, o prejuízo deles é
colossal. É impressionante a lista de produtos comercializados por eles na
Babilônia:

...artigos como ouro, prata, pedras preciosas e pérolas; linho fino, púrpura,
seda e tecido vermelho; todo tipo de madeira de cedro e peças de marfim,
madeira preciosa, bronze, ferro e mármore; canela e outras especiarias,
incenso, mirra e perfumes; vinho e azeite de oliva, farinha fina e trigo; bois
e ovelhas, cavalos e carruagens, e corpos e almas de seres humanos. (Ap
18:12-13)

Isso mostra que a abrangência da Babilônia alcança todo o comércio


mundial.321 E tem muito a ver com todo esse sistema consumista e materialista
vigente, que nos últimos dias entrará em colapso. Por isso, ao verem o sistema
destruído, os negociantes lamentaram o desaparecimento súbito e definitivo de
sua riqueza e esplendor e de toda chance de ganho.
Em segundo lugar vemos nos versículos 20 a 24, a celebração dos céus e
do povo de Deus por causa de sua justiça. Diz assim a palavra: Celebrem o que
se deu com ela, ó céus! Celebrem, ó santos, apóstolos e profetas! Deus a julgou,
retribuindo-lhe o que ela fez a vocês (v.20).
Não podemos estranhar esta citação acima dos mártires sendo convidado
a celebrar. Por que a queda da Babilônia acontece muito próxima à volta de Cristo
e à ressureição dos salvos. O que fica nítido no texto é o contraste: enquanto os
ímpios choram na terra, há grande júbilo nos céus. Pois, enfim, o Senhor julgou a
Babilônia e se vingou dela por ter maltratado os santos, apóstolos e profetas. 322

318
Hendriksen (2001:233).
319
Ladd (1986:176).
320
Wiersbe (2006:783-784).
321
MacDonald (2008:1014).
322
Idem.

73
Esta celebração é tema principal de Apocalipse 19, capítulo que analisaremos a
partir de agora.

3. AS BODAS DO CORDEIRO E A IGREJA

O capítulo 19 começa com um tom de triunfo. É mais uma pausa para dá


esperança e alento ao leitor do Apocalipse. Esse capítulo, lemos que depois
destas coisas, João ouve nos céus algo semelhante à voz de uma grande
multidão. São os anjos celebrando a vitória de Deus sobre a meretriz, Babilônia
(Ap 19:1-6). Veja o que texto diz: “Aleluia! A salvação, a glória e o poder
pertencem ao nosso Deus, pois verdadeiros e justos são os seus juízos. Ele
condenou a grande prostituta que corrompia a terra com a sua prostituição. Ele
cobrou dela o sangue dos seus servos” (Ap 19:1-2). Além deste, há um motivo
ainda maior para festejar: Cristo está vindo, em glória, para tomar para si a sua
noiva. Esta é uma das cenas mais belas do livro. Observe o que está registrado
nos versículos 6 a 9:

Então ouvi algo semelhante ao som de uma grande multidão, como o


estrondo de muitas águas e fortes trovões, que bradava: “Aleluia!, pois
reina o Senhor, nosso Deus, o Todo-poderoso. Regozijemo-nos! Vamos
alegrar-nos e dar-lhe glória! Pois chegou a hora do casamento do
Cordeiro, e a sua noiva já se aprontou. Para vestir-se, foi-lhe dado linho
fino, brilhante e puro”. O linho fino são os atos justos dos santos. E o anjo
me disse: “Escreva: Felizes os convidados para o banquete do casamento
do Cordeiro!” E acrescentou: “Estas são as palavras verdadeiras de Deus”.

Você já recebeu um convite de casamento? Esse tipo de convite segue


sempre o mesmo padrão: pais e noivos chamam os familiares e amigos para
celebrarem um dia muito especial. Assim, por mais simples que seja o convite de
casamento ele sempre transmite a ideia de felicidade e realização. Em Apocalipse
19:6-9, encontramos o mais precioso de todos os convites de casamento. É o
casamento de Cristo e sua igreja! A Bíblia o chama de bodas do Cordeiro e ele
acontecerá na vinda do Senhor.
Na cultura dos hebreus, um casamento ocorria basicamente em duas
fases: o noivado e o casamento.323 O noivado iniciava com compromisso sério
firmado entre os pais dos noivos. Daquele momento em diante, mesmo sem ter
nenhuma intimidade, eles já eram considerados legalmente casados. “Qualquer
infidelidade durante o noivado era considerada adultério”. 324 Só depois de certo
tempo é que ocorria o casamento propriamente dito, quando o noivo ia, em
procissão, até a casa noiva e a levava para casa dele e lá ocorria um grande
banquete. É essa a imagem que a Bíblia usa em Apocalipse 19.

Uma alegria inefável

Veja como o versículo 7 começa: Alegremo-nos, exultemos e demos-lhe a


glória, porque são chegadas as bodas do Cordeiro. Os verbos “alegrar” e
“exultar”, no original, comunicam a ideia de “ser feliz” e “regozijar-se
exuberantemente”.325 Eles aparecem juntos somente mais uma vez na Bíblia:
323
Stott (2007:431).
324
Wiersbe (2006:786).
325
Rienecker & Rogers (1995:634).

74
Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim
perseguiram aos profetas que viveram antes de vós (Mt 5:12). Nas duas citações,
a mensagem é a mesma: os dias podem ser difíceis e escuros; o rosto pode estar
molhado de lágrimas, mas ainda não é fim. Dias melhores virão! Alegre-se, o
Noivo está chegando!
Cristo está voltando para buscar a sua noiva, que é a igreja. Esse será o
dia mais feliz do mundo! Sabemos que, ao redor do mundo, em meio a diversas
culturas e muitas gerações, encontramos costumes diferentes em torno do
casamento. Contudo, independentemente do tempo e do lugar, há um sentimento
sempre presente nessa festa. Sabe qual é? É a alegria! Será assim também nas
bodas do Cordeiro. A festa de um casamento judaico poderia demorar muitos
dias, mas a do casamento de Cristo com a igreja permanecerá por toda a
eternidade, numa alegria que nunca se acaba! 326

O preparo necessário

É claro que aquele dia será alegre, somente aos que estiverem preparados
na volta de Jesus. E sobre isso a figura do casamento judaico tem muito a nos
ensinar. Por exemplo, entre o noivado e o casamento havia um intervalo
designado à preparação.327 Neste período, o noivo buscava recursos e pagava o
dote ao pai da noiva. Por outro lado, a noiva se preparava e se adornava para
receber o seu noivo. No caso de Cristo e sua igreja, ele já pagou o dote por ela: o
preço foi o seu próprio sangue! (cf. At 20:28). E a igreja, como deve se preparar?
Veja o que nos diz texto: ... cuja esposa a si mesma já se ataviou, pois
lhe foi dado vestir-se de linho finíssimo, resplandecente e puro. Porque o linho
finíssimo são os atos de justiça dos santos (Ap 19:7c-8). Aqui, há duas preciosas
verdades: a primeira é que ela “enfeitou” o seu próprio vestido, santificando-se e
desenvolvendo a salvação (Fl 2:12). Mas a segunda verdade, e a mais profunda,
é que lhe foi dado, ou seja, Deus trabalhou nela e a santificou (Fl 2:13). 328 Sobre
isso, afirmou Paulo: Cristo amou a igreja e entregou-se por ela para santificá-la
(...) e para apresentá-la a si mesmo como igreja gloriosa, sem mancha (...) mas
santa e inculpável (Ef 5:25-27 – NVI).

Sem o convite, não entra!

Após descrever a sua visão com respeito à “alegria” e ao “preparo” do


casamento celestial, o apóstolo João passa a tratar sobre o “convite”. Ele anota
as palavras ditadas por um anjo, que diz: Bem-aventurados aqueles que são
chamados à ceia das bodas do Cordeiro. (Ap 19:9a). Na Nova Tradução
Linguagem de Hoje, está escrito assim: Felizes os que foram convidados para a
festa de casamento do Cordeiro! Que privilégio! Mas quem são esses
convidados? O contexto indica que são os que entenderam e aceitaram o convite
de Jesus.329
Mas que convite é esse? Aquele magnífico convite estendido a todos:
O Espírito e a noiva dizem: “Vem!” E todo aquele que ouvir diga: “Vem!” Quem
tiver sede, venha; e quem quiser, beba de graça da água da vida (Ap 22:17 –

326
Lopes (2005:336).
327
Hendriksen (2001:239-240).
328
Wilcock (2003:142).
329
Kistemaker (2004:649).

75
NVI). Todos os que respondem positivamente recebem a salvação, são vestidos
de vestes brancas e podem assentar-se à mesa do Cordeiro. Há, aqui, uma
sobreposição de imagens: os convidados e a noiva são a mesma pessoa! “A
noiva é a igreja e os convidados para as bodas são todos aqueles que fazem
parte dela (...) a igreja é povo mais feliz do universo”. 330

A noiva pode acreditar

Em conclusão, o anjo acrescentou: São estas as verdadeiras palavras de


Deus (Ap 19:9b). Diante das constantes aflições que a igreja enfrenta, aqui na
terra, a cena descrita por João poderia lhe parecer uma “miragem no deserto” ou
“um sonho utópico”. Mas o mensageiro celeste faz questão de lembrá-la que tudo
aquilo, é uma promessa de Deus e que ele é fiel para cumprir as suas
promessas331: O próprio Deus declarou isso (Ap 19:9b – BV). A promessa de sua
vinda é repetida, no Novo Testamento, mais de 300 vezes 332. É a maior certeza
cristã!
Portanto, a igreja pode confiar: O Cordeiro não esqueceu sua noiva, e
logo ele virá buscá-la. Ele mesmo disse: Não fiquem aflitos. Creiam em Deus e
creiam também em mim (...) e eu vou preparar um lugar para vocês (...) voltarei e
os levarei comigo para que onde eu estiver vocês estejam também (Jo 14:1-3
NTLH). Que esperança maravilhosa! Estaremos nas bodas do Cordeiro! Portanto,
alegremo-nos, exultemos e demos-lhe a glória (Ap 19:7). Os descrentes podem
até debochar das promessas de Deus, mas o Senhor quer que seu povo saiba
que pode confiar nelas!
Por favor, leia novamente, com bastante atenção, Apocalipse 19:7-9.
Qual é o sentimento mais forte nesse texto? Se você respondeu “alegria” ou
“felicidade”, acertou. Agora, Cristo está conosco (Mt 19:20), mas, no porvir,
estaremos para sempre com ele. A história da igreja terá um final muito feliz!
Contudo, não será apenas por um instante, mas por toda a eternidade!

O espírito da profecia

Antes de passarmos para o próximo tópico e necessário falarmos um


pouco desta questão. Em Apocalipse 19:10, algo bem diferente acontece. Note o
que texto diz: Prostrei-me ante os seus pés para adorá-lo. Ele, porém, me disse:
Vê, não faças isso; sou conservo teu e dos teus irmãos que mantêm o
testemunho de Jesus; adora a Deus. Pois o testemunho de Jesus é o espírito da
profecia. As declarações ouvidas são tão fortes, as cenas vistas são tão sublimes
e o ser, que está diante dele, é tão glorioso e poderoso, que João fica atordoado.
Chega ao ponto de confundir o anjo com o próprio Jesus, e, por isso, prostra-se
para adorá-lo. Mas o anjo repreende o apóstolo dizendo: Adora a Deus. Pois o
testemunho de Jesus é o espírito da profecia.
O que significa a expressão “o espírito da profecia”? Basta uma simples
observação do texto no seu contexto para encontrarmos a resposta. A palavra
traduzida aqui por “espírito” é pneuma, que pelo contexto tem o sentido de
“essência ou princípio vital”. Não se refere a uma pessoa, mas a um princípio.
Assim a expressão pode ser traduzida por “a essência da profecia” ou “o
330
Lopes (2005: 336).
331
Ladd (1986:185).
332
Duffield & Cleave (1991:360).

76
propósito da profecia”. É importante notar que esta expressão faz parte da
repreensão que o anjo fez a João. É como se o anjo dissesse: “João, as cenas
que estou lhe mostrando, não são para levá-lo a me adorar. São para levá-lo a
adorar a Deus, o Cristo”. Neste sentido, o autor William MacDonald explica esse
versículo 10 dizendo que “o verdadeiro propósito da profecia é dar testemunho da
Pessoa e da obra de Jesus”.333

4. A SEGUNDA VINDA DE CRISTO

A descrição das Bodas do Cordeiro que vemos na primeira parte do


capitulo 19 é uma forma poética e figurada para referir-se a volta de Cristo.
Contudo, a leitura da segunda parte deste capítulo não deixa dúvida, o texto está
tratando a respeito do retorno, visível e pessoal, de Cristo a terra, para trazer o
juízo sobre os maus e para buscar a sua igreja e levá-la para casa do Pai. Ele
cumprirá a promessa que fez em João 14:1-3, que dizia: Na casa de meu Pai há
muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou preparar-vos
lugar. E, quando eu for e vos preparar lugar, voltarei e vos recebereis para mim
mesmo...

O cavaleiro no cavalo branco (Ap 19:11-16)

Vamos a análise do texto. O apóstolo vê uma cena magnífica da segunda


vinda de Cristo, que ele descreve assim:

Vi os céus abertos e diante de mim um cavalo branco, cujo cavaleiro se


chama Fiel Verdadeiro. Ele julga e guerreia com justiça. Seus olhos são
como chamas de fogo, e em sua cabeça há muitas coroas e um nome que
só ele conhece, e ninguém mais. Está vestido com um manto tingido de
sangue, e o seu nome é Palavra de Deus. Os exércitos dos céus o
seguiam, vestidos de linho fino, branco e puro, e montados em cavalos
brancos. De sua boca sai uma espada afiada, com a qual ferirá as nações.
(Ap 19:11-15 – NVI)

Chegamos enfim ao acontecimento mais aguardado de todo livro. João vê


uma grande abertura nos céus, por onde Cristo desce montado em um cavalo
branco, tal como já havia sido o descrito em Ap 6:2. Ele é chamado de Fiel e
Verdadeiro. De fato, ele é fiel às suas promessas e verdadeiro quanto ao seu
próprio caráter.334 Por isso, ele julga e peleja com justiça, como diz o texto. A
descrição de seus olhos como “chamas de fogo”, segundo Ladd, quer dizer que
seu olhar perscruta tudo. A vida humana está cheia de ministérios e enigmas sem
solução; mas os olhos de Cristo passam por tudo; nada lhe é oculto. 335 Já os
muitos diademas em sua cabeça são a sua coroa de rei. Ele usa esta coroa por é
Rei dos reis e Senhor dos senhores (Ap 19:14). Agora, ele não vem como
servo, vem como Senhor e Rei. Não é mais advogado, agora ele é o grande juiz,
que veio dar sentença.
De acordo com o versículo 14, Cristo vem acompanhado pelos exércitos
dos céus. Trata-se dos anjos de Deus. Eles também virão vestidos de branco e
333
MacDonald (2008:1014).
334
MacDonald (2008:1015).
335
Ladd (1986:188).

77
montados em cavalos brancos. A presença de anjos no dia apocalíptico é uma
ideia recorrente na Bíblia, como pode ser visto em Zc 14:5; Mc 8:38; Lc 9:26; 1Ts
3:13 e 2 Ts 1:7. As roupas brancas e puras dos exércitos celestiais mostram que
eles compartilham da vitória do Cordeiro. Contudo, neste texto, nada é dito sobre
a participação deles na batalha, pois esta batalha pertence apenas ao Cristo
glorioso.336 É possível que a função dos anjos aqui seja a de acompanhar o Noivo
em cortejo e depois a de levar a Noiva ao seu encontro.
No versículo 15, João diz que da boca do Cavaleiro sai uma espada afiada,
com a qual ferirá as nações. Sobre tal afirmação, Ladd comenta que a única arma
usada na batalha é a Palavra de Deus.337 O interessante é que no versículo 13 o
próprio Cristo é chamado de Palavra de Deus. Ele é Verbo ou Logos de Deus
(Jo1:1). Ele é a própria palavra que julgará o mundo. Por isso, a simples presença
de Cristo na terra será a ruína aos ímpios. Eles não suportarão vê-lo em sua total
pureza e santidade e se desfarão diante de sua glória (cf 2 Pd 3:10). Cremos que
este momento coincide com o arrebatamento da igreja, conforme está descrito em
1 Tessalonicenses 4:16-17.

Pois, dada a ordem, com a voz do arcanjo e o ressoar da trombeta de


Deus, o próprio Senhor descerá dos céus, e os mortos em Cristo
ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que estivermos vivos seremos
arrebatados com eles nas nuvens, para o encontro com o Senhor nos ares.
E assim estaremos com o Senhor para sempre.

Nesta ocasião, conforme o texto acima, Cristo não pisará na terra. Ele
ficará suspenso nos ares. Contudo, quando ele aparecer em meio às nuvens do
céu, a glória de sua presença mostrará a diferença entre os justos e ímpios, entre
os que servem a Deus e os que não servem, entre as ovelhas e os bodes. Pois os
mortos de Cristo ressuscitarão em corpos glorificados (1 Co 15:42), os salvos que
estiverem vivos serão transformados e arrebatados para perto de Jesus (1 Co
15:50-54; 1 Ts 4:17). No entanto, os ímpios não suportarão a glória de sua vinda
e derreterão em sua presença.

A vitória esmagadora do cavaleiro (Ap 19:17-21)

A parte final de Apocalipse 19 nos faz vislumbrar uma guerra bastante


desproporcional.338 Pois aqueles que tentam se levantar contra Cristo, não são,
nem de longe, oponentes à altura dele. Tanto que nos versículos 17 e 18 João vê
um anjo trazendo uma mensagem que mais parece um escárnio. Pois se dá a
impressão que o anjo está debochando dos inimigos de Deus. A razão é simples:
a besta reúne os seus exércitos para guerrearem contra aquele que está montado
no cavalo e contra o seu exército (Ap 19:19); contudo, a batalha não acontece.
Pois Cristo, em sua vinda, derrota o oponente com sopro de sua boca. Ele dissipa
seus inimigos pela manifestação de sua presença (cf. 2 Ts 2:8).
A vitória é esmagadora! Os adversários não suportam nem o 1º round.
Assim, a besta e o falso profeta são lançados no lago de fogo. E os ímpios são
336
Ladd (1986:189).
337
Idem.
338
Hendriksen (2001:243).

78
mortos com a espada que saía da boca daquele que está montado no cavalo (Ap
19:21). Estes ímpios permaneceram neste estado até o fim do milênio (cf. Ap
20:5), e depois Deus permitirá que eles voltem a vida para receberem o castigo
final. No capítulo 19, com o aparecimento de Cristo, eles já receberam o veredito,
todavia, no capítulo 20, após o milênio, eles se levantarão para cumprirem a
pena: a extinção definitiva ou a aniquilação completa, que também é chamada de
segunda morte (cf. Ap 20:5,6,14).
Contudo resta ainda um inimigo. O líder maior ainda permanece. É o
dragão, a antiga serpente, Satanás. O que é dele está guardado! Sua destruição
é descrita em detalhes na seção final de Apocalipse. 339 Em que será amarrado por
um tempo e depois será solto para também ser exterminado. Mas, esse é um
assunto para o próximo capítulo; por agora, basta sabermos que no final de
Apocalipse 19, temos Cristo, o Cavaleiro do cavalo branco, triunfando sobre seus
inimigos. A Babilônia foi humilhada e, agora, está destruída. O Anticristo e o falso
profeta estão derrotados. Mas, a igreja está nos céus glorificada, desfrutando de
uma grande festa que irá demorar mil anos.

Capítulo 7
O FIM E UM NOVO COMEÇO!
As sete visões da consumação

Chegamos a última sessão do Apocalipse, que é composto pelos capítulos


20 a 22. Curiosamente, assim como no bloco anterior, neste também se repete o
termo “vi” (gr. eido). Basta você conferir para notar que deste termo aparece não
menos e nem mais que sete vezes nestes capítulos do livro (20:1,4,11,12;
21:1,2,22). É por isso que chamamos essa sessão do livro de “As sete visões da
consumação”.
Os três últimos capítulos de Apocalipse não são somente uma
demonstração, mas também, uma prova cabal da derrota de Satanás e de suas
hostes. Sem poder fazer nada, a antiga serpente assiste sua história se

339
Hendriksen (2001:244).

79
encaminhar para um calamitoso final. Ao mesmo tempo, os capítulos finais do
livro também mostram a vitória da igreja. Ela está destinada à vitória e gozará de
felicidade eterna. Neste bloco abordaremos juntamente com seus
desdobramentos: o milênio, a batalha final, a nova terra, a nova Jerusalém e a
volta do noivo.

1. O milênio: um período singular.

A doutrina do milênio é bem mais enfatizada no capítulo 20 de Apocalipse.


A expressão mil anos é encontrada não menos que seis vezes neste capítulo (cf.
vv. 2-7). Logo, é no período de mil anos que Satanás ficará preso (vv.2-3); é
durante mil anos que os salvos reinarão com Cristo (v.4,6); até se completarem os
mil anos os ímpios mortos não reviverão (v.5); somente após mil anos Satanás
será solto de sua prisão (v.7). Como se pode concluir, os fatos relacionados ao
milênio têm inicio, meio e fim, o que ratifica ainda mais a sua importância nas
Escrituras.
Há algumas correntes teológicas quanto ao milênio que devem ser
consideradas. Os pré-milenaristas entendem que Cristo voltará antes do milênio e
iniciará, ele mesmo, o seu reino de mil anos sobre a terra. Os pós-milenaristas
acreditam que Cristo retornará depois que um milênio tenha ocorrido na Igreja. Os
amilenaristas rejeitam a ideia de qualquer reino literal de Cristo na terra por mil
anos.340 A Igreja Adventista da Promessa não defende nenhuma dessas posições
acerca do milênio. Ela não é pré-milenarista, pois apesar de crer e defender a
volta de Cristo antes do milênio, não acredita que o período milenar ocorrerá na
terra e sim, no céu; não é pós-milenarista, pois acredita que o milênio acontecerá
somente após a volta de Cristo; também não é amilenarista, pois crê que o
milênio será literal, ao contrário dessa vertente teológica que enxerga o evento do
milênio como figurado. A IAP é, portanto, milenarista, isto é, crê e defende que o
milênio é um evento literal que ocorrerá após a volta de Jesus, no céu.
A abordagem sobre a literalidade do milênio gira em torno de, pelo menos,
dois aspectos principais. O primeiro deles é o tempo da prisão de Satanás. Os
que defendem que o milênio não é um evento literal, o fazem utilizando, dentre
outros, o argumento de que a cena vista por João nos três primeiros versículos de
Apocalipse 20, descreve o efeito do ministério terreno de Jesus sobre Satanás. 341
Em outras palavras, a prisão do diabo está acontecendo no presente. Assim, já
estamos vivendo o milênio. Segundo este ponto de vista, Satanás já está preso,
pois Cristo, pelo seu sacrifício, restringiu as forças dele, o que não significa que o
diabo está neutralizado, pois Deus permite que o mesmo incite e influencie a
sociedade nos limites de sua prisão.342
Será que esse pensamento está correto de acordo com a Escritura? Não,
obviamente. Segundo o v.3, Satanás foi preso para que não mais enganasse as
nações até se completarem os mil anos. Conquanto seja Satanás perito em
enganar, o texto deixa clara a ideia de que ele não fará isso durante o milênio.
Nesse período suas atividades cessarão por completo, não de forma parcial. Isso
já acontece no presente? Claro que não! O diabo ainda não parou de enganar os
incautos (Rm 16:18). Aliás, Pedro indica que ele anda em derredor, como leão

340
Taylor (2006: 490).
341
Pate (2003:125).
342
Idem 2.

80
que ruge procurando alguém para devorar (1Pd 5:8). Logo, o milênio não pode
ser uma realidade presente na vida da igreja. Não é simbólico.
O segundo aspecto em que gira a abordagem sobre a literalidade do
milênio é a natureza da ressurreição. Referindo-se aos salvos, a ultima parte do
versículo 4 de Apocalipse 20 descreve: e viveram e reinaram com Cristo durante
mil anos. O termo viveram (gr. ezesan), é uma referência à primeira ressurreição,
a dos justos. Talvez seja este o motivo de a Bíblia NVI traduzir esse trecho da
seguinte maneira: Eles ressuscitaram e reinaram com Cristo durante mil anos
(grifo nosso). Somente após passar pela primeira ressurreição, eles reinarão com
Jesus. A primeira parte do v.5, por sua vez, é uma referência à segunda
ressurreição, experimentada pelos não salvos: Os restantes dos mortos não
reviveram até que se completassem os mil anos. A sentença breve na parte b do
v.5: Esta é a primeira ressurreição, deve ser analisada como a conclusão do
versículo 4.343
Os adeptos da defesa de um milênio não literal ensinam que a natureza da
ressurreição em Ap 20:1-4 é espiritual, não física. 344 Alguns acreditam que essa
ressurreição destina-se à vida eterna e é uma realidade espiritual para todo
crente, quando ele se converte.345 Esse ponto de vista, porém, é falho. As
ressurreições que antecedem e sucedem o milênio são físicas. O melhor
entendimento do verbo ezesan (viveram) no versículo 4 é que recorre a uma
ressurreição corporal. Zao (viver) com frequência em Apocalipse se refere à
ressurreição corporal (1:18, 2:8, 13:14, 20:5). De fato, zao no contexto de morte
sempre recorre à ressurreição física no Novo Testamento (cf. Jo 11:25; At 1:3,
9:41).346 Essa informação é significativa na defesa da literalidade do milênio.
O início do milênio se dará mediante a ocorrência de alguns eventos
importantes. O primeiro deles é a volta de Jesus. Assim narra o fiel apóstolo sua
visão: Vi o céu aberto, e eis um cavalo branco. O seu cavaleiro se chama Fiel e
Verdadeiro e julga e peleja com justiça (Ap 19:11). O segundo advento de Jesus
será literal e visível, pois virá com as nuvens, e todo olho o verá, até quantos o
traspassaram (Ap 1:7). Tanto os justos quanto os ímpios que estiverem vivos por
esta ocasião, testemunharão este evento. Todos se depararão com aquele que
morreu de forma humilhante, mas que ressuscitou de modo glorioso! Ele virá e
não tardará! (Hb 10:37).
Após o evento da volta de Jesus, a ressurreição dos salvos precederá o
milênio. O v.4 é revelador nesse sentido. Nesse texto João afirma que viu (...) as
almas dos que foram decaptados por causa do testemunho de Jesus e da palavra
de Deus. Eles não tinham adorado a besta nem a sua imagem, e não tinham
recebido a sua marca na testa nem nas mãos (v.4). As pessoas mencionadas
nesse texto abdicaram literalmente de suas vidas em prol de algo maior. Viveram
o cristianismo sob forte ameaça, mas não recuaram da fé. Possivelmente João
tinha em mente os mártires da sua época, as vítimas de Nero e Domiciano. 347
Entretanto, os fiéis mencionados nesse versículo não se limitam aos mártires
daquela geração. O sentido do texto vai além disso, pois sempre “que João faz
menção do conceito martiriológico por causa de Jesus, o contexto parece indicar

343
Kistemaker (2004:679).
344
Pate (2003:176).
345
Ladd (1986:193).
346
Idem 5.
347
Taylor (2006:491).

81
a inclusão de todos os crentes que têm sido obedientes a seu Senhor” 348, no
tempo e no espaço.
Outra questão a se considerar nesse versículo é que o termo almas
(psuche), não se refere à entidades fora de seus corpos, mas às almas no sentido
de pessoas integrais. Em outras palavras, João não estava falando de cristãos
mortos. Ele não sugere que espíritos de cristãos já estão no céu. A propósito,
ninguém subiu ao céu, senão aquele que de lá desceu, a saber, o Filho do
Homem que está no céu (Jo 3:13). Não há nem haverá espíritos de crentes no
céu. O que a Bíblia deixa claro é que os cristãos ressuscitados corporalmente
reinarão com Cristo. Isso fica claro na última parte do v.4: Eles ressuscitaram e
reinaram (...). Essa ressurreição é corporal, como a principio mencionamos; se
trata da primeira ressurreição. Paulo assim a descreve em sua primeira carta aos
coríntios: A trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos
transformados (1Co 15:52b). À igreja de Tessalônica, ele escreve na mesma
direção: Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de
arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão
primeiro (1Ts 4:16). Após esse processo, os salvos estarão aptos a reinar com o
Senhor durante mil anos!
Os justos mortos serão ressuscitados por ocasião da volta de Jesus; e
quanto aos justos vivos? Eles serão transformados! Este é, também, outro
importante evento que antecederá o milênio. No mesmo contexto da ressurreição
dos santos, Paulo menciona a transformação dos justos: Eis que eu lhes digo um
mistério: Nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados (1Co 15:51).
Obviamente não encontraremos o Senhor nos ares com o corpo que temos.
Nosso corpo, no presente estado, não é perfeito nem digno de entrar no céu. Nele
ainda há corrupção de algum modo. Nossa mente ainda é suscetível às más
maquinações (Mc 7:21). Nosso caráter ainda é sujeito à oscilação. A santificação
não é uma virtude completa em nós, mas progressiva (Cl 1:10). Por isso, Deus
fará em nós uma obra jamais vista na história da humanidade: ele revestirá de
incorruptibilidade e de imortalidade os santos ressurretos e transformados (1Co
15:53). Tanto a morte quanto a corrupção serão coisa do passado e não mais
causarão desconforto e temor aos filhos de Deus.
Os salvos mortos serão ressuscitados e os salvos vivos, transformados.
Assim será no início do milênio, na ocasião da volta de Cristo. Os ímpios que
estiverem vivos, porém, não usufruirão da mesma sorte, pois morrerão. João
reforça esta ideia ao narrar: Os restantes foram mortos com a espada que saía da
boca daquele que estava montado no cavalo. E todas as aves se fartaram das
suas carnes (Ap 19:21). Por sua vez, os ímpios que estiverem mortos
simplesmente não ressuscitarão; não na primeira ressurreição, pois esta está
reservada para os salvos, somente (Ap 20:6). A morte dos ímpios, portanto, é um
dos eventos que antecederão o milênio.
Após os eventos mencionados, ocorrerá o arrebatamento da igreja. É o que
afirma a Bíblia:
Pois, dada a ordem, com a voz do arcanjo e com o ressoar da
trombeta de Deus, o próprio Senhor descerá dos céus, e os mortos
em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que estivermos vivos
seremos arrebatados com eles nas nuvens, para o encontro com o
Senhor nos ares. E assim estaremos com o Senhor para sempre.
(1Ts 4:16-17)

348
Kistemaker (2004:677).

82
O que é arrebatamento? O verbo “arrebatar” aqui tem duplo significado:
remover de uma condição para a outra ou de um lugar para outro. Neste caso, é
de um lugar para outro, ou seja, da terra para o céu. 349 Eis outro importante
evento que precederá o milênio.
Por fim, a prisão de Satanás também antecederá o milênio. Para o
adversário do povo de Deus, o fim se aproxima cada vez mais. A visão de João
foca esta certeza de modo ainda mais nítido a partir de agora. O versículo 1 do
capítulo 20 de Apocalipse afirma que um anjo desceu do céu trazendo consigo a
chave do abismo e uma grande cadeia na sua mão. Isso ele faz com um propósito
em mente: prender e trancafiar alguém. O anjo tem autoridade para pôr em prisão
o criminoso mais perigoso do universo, e não hesita em lançar mão de tal artifício:
Ele prendeu o dragão, a antiga serpente, que é o diabo e Satanás, e amarrou-o
por mil anos (v.2). A Bíblia aqui delimita uma sentença (a prisão de Satanás) e o
tempo da mesma (mil anos).
Mil anos será, literalmente, o período em que esse inimigo de Deus ficará
preso. Conquanto seja astuto, Satanás não poderá escapar das amarras. Uma
fuga, nesse caso, será impossível, pois ele estará preso, de acordo com a visão
do apóstolo, sob uma grande cadeia. Naquela época uma cadeia (gr. halusis) era
usada para amarrar as mãos e os pés de alguém, podendo ser este um (suposto)
criminoso, limitando-lhe a mobilidade. Preso, portanto, o bandido Satanás não
poderá fazer mal a ninguém. Durante milênios ele tem tornado cativa a vida de
muitos, mas no período milenar narrado em Apocalipse 20, é ele quem ficará
“trancafiado”.
Outra questão que não se pode ignorar em relação à prisão do diabo é que
este evento tem caráter figurado. Satanás será, de fato, preso. Esta certeza é
real. Sua prisão, porém, não pode ser, ao contrário do que se possa imaginar,
comparada ao sistema carcerário que conhecemos hoje. Ele não ficará
trancafiado dentro de quatro paredes, num cárcere literal. O mesmo se pode dizer
acerca da cadeia que estava em posse do anjo. Ela “indica o poder de amarrar e
manter aprisionado a Satanás, um poder dado por Deus, e não algum objeto
literal”.350
Tendo feito tais considerações, cabe aqui um questionamento oportuno:
“Como será a prisão de Satanás?”; “onde ele ficará preso?”. Uma vez que os
salvos ressuscitados e transformados serão arrebatados ao céu na ocasião do
advento de Jesus, e os ímpios que estiverem vivos serão mortos, e os que
estiverem mortos permanecerão na mesma condição, Satanás não mais terá a
quem enganar. Ele percorrerá as nações, mas a ninguém encontrará. A terra
estará completamente vazia, como um deserto. Ela, nesse estado, será o abismo
no qual o inimigo ficará preso. Neste período, haverá nada mais que cadáveres
sobre a face da terra. Estes são os ímpios que estarão aguardando a segunda
ressurreição, que se concretizará após o período milenar (Ap 20:5b).
A prisão do maligno sugere grande humilhação. Sabe-se que há muito
Satanás almejou tomar o lugar do Soberano Deus, apesar dos privilégios que
dispunha (cf. Ez 28:13-17). Ele, portanto:

349
O Doutrinal (2012:307).
350
Champlin (1988:631).

83
... dizia no seu coração: Eu vou subir bem alto nos céus;
erguerei o meu trono acima das estrelas de Deus; dominarei
todos os anjos, sentado no trono mais importante! Eu serei a
figura principal no monte Sião, ao norte. Subirei até o último
céu e serei igual ao Altíssimo (Is 14:13-14).

A sua soberba não lhe deu o trono, mas o desprezo e castigo do Senhor. A
derrota e não a vitória foi a sua aliada. Satanás foi humilhado ao ser expulso do
céu e jogado por terra (Is 14:12). Tempos mais tarde, Cristo, despojando os
principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando
deles na cruz (Ef 2:15). Como se não bastasse, o capítulo 20 de Apocalipse
sugere que, durante o período milenar, o nosso adversário será outra vez alvo de
horrenda vergonha. Deus removerá o seu grande poder e um anjo o amarrará.
Nem ao menos se torna necessário Miguel, o arcanjo, mas apenas um anjo. Que
humilhação!351 Ele havia começado bem, mas por causa de sua rebeldia e
soberba, terminará mal.
Durante o milênio, portanto, Satanás continuará preso na terra que estará
desolada e vazia. Pedro escreveu, inspirado pelo Espírito Santo, que no dia do
Senhor, os céus desaparecerão com um grande estrondo, os elementos serão
desfeitos pelo calor, e a terra, e tudo o que nela há, será desnudada (2Pd 3:10).
No planeta, o caos será total. Os ímpios continuarão mortos. Enquanto isso, longe
da terra e perto de Cristo estarão os santos, aqueles que como Paulo
combateram o bom combate, completaram a carreira e guardaram a fé (cf. 2Tm
4:7).
Sim, estes são aqueles que terão parte na primeira ressurreição; sobre
esses a segunda morte não tem autoridade; pelo contrário, serão sacerdotes de
Deus e de Cristo e reinarão com ele os mil anos (Ap 20:6). Esse reinado não é
terreno, mas celestial. No céu os salvos permanecerão durante o milênio e não na
terra, como afirmam os pré e pós-milenaristas. João viu tronos (v.4). O lugar
desses tronos é, sem dúvida, no céu (Ap 4:4). É lá que está o trono de Deus, não
na terra (Ap 4:2). No céu os salvos terão autoridade da parte de Deus para julgar
(Ap 20:4). De fato, “a Bíblia afirma que a igreja de Cristo julgará as tribos de Israel
(Mt 19:28), o mundo (1 Co 6:2) e até os anjos (1 Co 6:2). Foi Jesus quem
prometeu que o vencedor sentaria com ele no trono (Ap 3:21).” 352 Quem ali
poderia prejudicá-los? Ninguém! Naquela fortaleza divina o mal não tem vez. Os
que ali se abrigarem estarão seguros.

2. A batalha final: um confronto decisivo.

O capítulo 20 não hesita em abordar os eventos que ocorrerão no término


do milênio, a começar pela ressurreição dos ímpios. O v.5 diz: Os restantes dos
mortos não reviveram até que se completassem os mil anos. Após esse período
os ímpios mortos obterão permissão para deixarem os seus túmulos. Logo,
ressuscitarão, porém, não incorruptíveis nem imortais, pois esta será a segunda
ressurreição. O v. 7 descreve o outro evento que ocorrerá no final do milênio, a
saber, a soltura de Satanás: Quando, porém, se completarem os mil anos,
Satanás será solto da sua prisão (...). Após o milênio, portanto, a terra não mais
estará vazia, visto que os ímpios ressuscitarão. Por isso, Satanás não mais ficará
preso. Agora poderá fazer o que mais sabe: enganar.
351
Idem 11.
352
O Doutrinal (2012:308).

84
Outro importante evento ocorrerá após o milênio: a descida de Jerusalém
do céu: Vi também a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do céu, da parte
de Deus, ataviada como noiva adornada para o seu esposo (Ap. 21:2). Os santos
estarão nessa cidade, retornando à terra após reinarem com Cristo mil anos. É
nessa ocasião que ocorrerá outro importante evento: a batalha final. João é
categórico em dizer que Satanás sairá a seduzir as nações que há nos quatro
cantos da terra, Gogue e Magogue ... (Ap 20:7). Gogue e Magogue são nomes
bíblicos para as nações que se rebelaram contra Deus e são hostis a seu povo.
Em Ez 38:2 Gogue é o príncipe da terra de Magogue, vindo do norte nos últimos
dias para lutar com o povo de Deus. No Apocalipse as duas palavras representam
as nações hostis.353 Tal como seduziu a terça parte dos anjos no céu, Satanás
ludibriará os ímpios na terra. O seu intento não será outro, a não ser reunir as
nações para a peleja (Ap 20:8).
O versículo 9a narra o aparente êxito de Satanás em seu intento:
Marcharam, então, pela superfície da terra e sitiaram o acampamento dos santos
e a cidade querida. Porém, não será o diabo juntamente com seus seguidores
vitorioso, apesar de seu grande número: ... Seu número é como a areia do mar
(v.8). A multidão de ímpios liderados pelo deus deste século tentará atacar
mortalmente a cidade amada, onde estará o povo de Deus, contudo, antes que
consigam tal feito, descerá fogo do céu e os consumirá (v.9). Satanás, por sua
vez, será lançado no lado de fogo, onde estarão a besta e o falso profeta (v.10).
Uma importante consideração merece destaque no versículo 10. As
expressões: “lago de fogo e enxofre” e “atormentados dia e noite, pelos séculos
dos séculos”, não são literais, mas figuradas. Analisemos a primeira delas. No
v.14a, a mesma aparece de modo figurado: Então, a morte e o inferno foram
lançados para dentro do lago de fogo. Esta afirmação deixa claro que a ideia do
lado de fogo é simbólica. A morte e o inferno são personificados e retratados
como se fossem lançados no lago de fogo, junto com a besta e o falso profeta e
Satanás. É impossível construir isto literalmente. 354 A expressão lago de fogo é
usada para descrever a segunda morte (v.14b), que é por si só, a morte da morte;
a destruição final desta, do diabo e de seus súditos.
Quanto à segunda expressão: atormentados dia e noite, pelos séculos dos
séculos, não pode ser usada para se afirmar que Satanás, a besta e o falso
profeta queimarão para sempre. Seguramente não é isso que o texto quer dizer.
Algumas razões nos fazem chegar a esta conclusão. Em primeiro lugar, Satanás,
a besta e o falso profeta não são eternos, logo não poderão queimar para toda a
eternidade. Só Deus é detentor do atributo da eternidade (1Tm 1:17). Em
segundo lugar, o diabo e seus anjos são espíritos, não têm corpo físico; e fogo é
material, físico. Como pode um lago de fogo material torturar para sempre seres
espirituais?355 Simplesmente, não pode.
Em terceiro lugar, a expressão “fogo eterno” (Mt 18:8, 25:41), que não
raras vezes é utilizada no âmbito teológico para defender a ideia do tormento
eterno, não é usada na Escritura no sentido de queimar para sempre, mas no
sentido de queimar enquanto houver combustível. É tal que se assim não fosse,
Sodoma e Gomorra estariam queimando ainda hoje (Jd 7). Em quarto lugar, se
os ímpios continuarem existindo e sofrendo após a derrota das forças malignas,
não há como se conceber a ideia de redenção total. Em quinto lugar, como pode
353
Ladd (1986:200).
354
Ladd (1986:204).
355
Ladd (1986:201).

85
uma terra restaurada ter ao lado, um lago de fogo onde há seres queimando noite
e dia? O sofrimento não seria extinto do planeta. Além disso, se as expressões
“lago de fogo” e “atormentados dia e noite, para todo o sempre”, fossem literais,
daria a impressão de que a participação da maldade seria maior na nova terra do
que nos dias de hoje.
Por fim, em sexto lugar, a Bíblia não promete tormento eterno aos ímpios,
mas aniquilação ou destruição dos mesmos. O trecho de Ap 14:8-10 é figurado à
semelhança de Ap 20:10. No v. 9, porém, o fogo devora os ímpios, de uma vez
por todas. O v.10 apenas dá uma ênfase maior do sentido desse texto. O sentido
de ambos é o mesmo, ou seja, “a destruição final e eterna das forças do mal, que
torturaram os homens desde o Jardim do Éden.” 356 O escritor da carta aos
Hebreus reforça a ideia da aniquilação das forças malignas: ...ele [Cristo] também
participou dessa condição humana, para que, por sua morte, derrotasse aquele
que tem o poder da morte, isto é, o Diabo (Hb 2:14).
Os versículos 11-15 falam sobre o juízo final. Este foi mentalizado para os
ímpios, que serão os réus no julgamento. João conta o que viu a respeito: Vi
também os mortos, grandes e pequenos, em pé diante do trono, e livros foram
abertos. Os mortos vistos por João são, provavelmente, os mesmos mencionados
no v.5a, os restantes dos mortos, os ímpios. Todos os que não forem encontrados
no livro da vida, serão condenados à destruição (v.15). Os salvos, por sua vez,
não serão julgados no juízo final, mas ali estarão presentes como expectadores.
No céu, durante o milênio, eles se assentarão em tronos para julgar (v.4), mas na
terra, após o período milenar, presenciarão o anúncio da sentença dos ímpios.
O juízo representa o caráter justo de Deus. Ele não condenaria o ímpio
sem base plausível. Todos saberão os reais motivos de receberem determinada
punição. Mesmo que a impunidade passe despercebida aos olhos dos homens da
atualidade, o juízo dá a entender que a justiça, mais cedo ou mais tarde, triunfará.
No juízo final, de acordo com João, os maus foram julgados, segundo as suas
obras, conforme o que se achava escrito nos livros (v.12).

3. A nova terra: um lar propício.

Após visualizar a derrota do diabo e de seus seguidores, a vitória dos


servos de Deus, João se depara com um cenário diferente daquele narrado no
capítulo anterior. No capítulo 20 o apóstolo viu, dentre outras coisas, a prisão do
diabo e sua destruição, o juízo e a batalha final, a morte dos ímpios. Mas no início
do capítulo 21, ele descreve a cena: Vi novo céu e nova terra, pois o primeiro céu
e a primeira terra passaram, e o mar já não existe (v.1). Após o milênio, será a
nova terra, o endereço dos salvos.
Céu e terra serão renovados por Deus. O “novo céu” e a “nova terra” não
devem ser entendidos como uma nova criação a partir do nada. Deus não criará
outro planeta para habitarmos. A terra na qual moramos no presente não será
destruída, mas redimida. Por isso é chamada por João de nova terra. A palavra
“novo” usada nesse texto é a tradução do termo grego kainós, que traz consigo a
ideia daquilo que é novo quanto à qualidade, em comparação com aquilo que
existia anteriormente, ou seja, a ideia é de um novo que é melhor do que o
antigo,357 um do novo nunca vivido. Não é o novo criado a partir do nada, pois a
ideia de kainós expressa o novo que tem a sua origem no velho. Exemplo disso é
356
Idem 16.
357
O Doutrinal (2012:336).

86
que o novo pacto é procedente do velho; o novo mandamento é procedente do
velho; a nova Jerusalém tem sua fonte na velha; o novo homem é a
transformação do velho homem; e o novo céu e a nova terra têm por base o
velho.358 A nova terra será muito melhor que esta. Sim, o melhor está reservado
aos santos.
Consideremos agora a expressão e o mar já não existe. Ela é simbólica,
não literal. O mar na Bíblia é uma representação do sistema iníquo. Logo, o “mar
significa aqui o local de gestação do satânico, da rebelião contra Deus e sua boa
criação. Do ‘mar’ ergueu-se a besta com sua blasfêmia, sedução, perseguição e
assassinato. Essa fonte maligna nunca mais jorrará da nova criação”. 359 Será
extinta para sempre e dela não se terá conhecimento na nova terra. E quanto ao
mar literal, continuará ele existindo na nova terra? Provavelmente sim. O mar
literal faz parte da terra, e isso desde o princípio (Gn 1:9-10). Se a terra será
redimida como cremos, o mar também o será e, portanto, existirá.
A nova terra terá características singulares. Nela não haverá dor (Ap 21:4).
Os habitantes da nova terra estarão imunes a este mal. O sofrimento ali será
extinto juntamente com as lágrimas. Não haverá quem faça o mal (v.8). Hoje
todas as pessoas, inclusive os crentes, estão sujeitos a enfermidades, perdas,
depressão, decepções. Todos nós, em algum momento, podemos nos tornar
vítimas fatais de homens maus. Ninguém está imune a essas coisas, não aqui,
nesta terra deformada pelo pecado. Na nova terra, porém, será diferente. Aquele
que está assentado no trono fará novas todas as coisas (v.5). Lá haverá
comunhão plena entre os seres humanos e seu criador: Eis o tabernáculo de
Deus com os homens. Deus habitará com eles. Eles serão povos de Deus, e
Deus mesmo estará com eles (v.3). Na nova terra não haverá nenhuma sorte de
crise entre as pessoas. Todos conviverão harmoniosamente uns com os outros.

4. A nova Jerusalém: uma cidade santa.

Além do novo céu e da nova terra, João também viu a santa cidade,
Jerusalém, que descia do céu, da parte de Deus (Ap 21:10). As características
mencionadas sobre a nova Jerusalém a qualificam como uma cidade sem igual.
Ela não é igual à Jerusalém terrena. Esta era a capital de Judá. Era a cidade mais
importante do reino do Sul. Jerusalém era o lugar de adoração dos judeus (Jo
4:20). Daniel tinha o costume de orar diariamente direcionando-se para Jerusalém
(Dn 6:10). Contudo, esta Jerusalém era frágil. Ela foi vítima de invasões no
decorrer da história (2Cr 12:9; Dn 1:1). A nova Jerusalém, porém, é segura (Ap
21:12). Jamais será abalada. A sua origem é celestial, não terrena; é divina, não
humana (v.10). Ao contrário da antiga, a nova Jerusalém é eterna. Enquanto
aquela foi muitas vezes cenário de muitos males, esta será uma cidade
completamente pura (v.27).
A nova Jerusalém será a capital da nova terra, o centro de adoração para
todos os remidos. Todos os salvos terão acesso a essa cidade. 360 É um lugar
repleto de justiça e saúde com acessibilidade. Aliás, a árvore da vida, mencionada
no v.2 do capítulo 22 é representativa. Ela representa a ideia de que nunca mais o
ser humano será alvo de doença, maldição e morte. Os salvos habitarão na nova
terra enquanto que a nova Jerusalém será o templo. Na nova terra a santa cidade
358
Kistemaker (2004:696).
359
Pohl in Lopes (2005:362).
360
O Doutrinal (2012:340).

87
será o tabernáculo de Deus com os homens (v.3) e representa o governo de
Deus. Este continuará sendo Deus e o lugar em que ele habitar será diferente do
nosso.
O v.16 sugere que a santa cidade terá uma dimensão cúbica. A cidade é
literal, mas suas medidas, não. Os números não podem ser tomados como
literais. Na verdade “estes números representam a simetria, a perfeição, a
vastidão e a totalidade ideais na nova Jerusalém”. 361 A nova Jerusalém é bela,
esplendorosa (vv.12-22). É a cidade perfeita de adoração ao Deus perfeito.
.
5. A volta do noivo: uma promessa oportuna.

O livro chega a sua conclusão com uma promessa: Eis que venho sem
demora (Ap 22:7a). A volta de Jesus não será tardia nem precipitada. Ele voltará
no momento certo. Ainda que o injusto faça injustiça e o imundo continue a se
deleitar em sua imundícia, ele virá sem demora (v.11). Esta é a promessa do
Senhor da igreja ao seu povo.
A promessa da volta de Cristo é oportuna levando-se em consideração dois
motivos importantes. Em primeiro lugar, ela instiga esperança nos crentes. Os
crentes fiéis que viveram na mesma época de João, escritor do livro de
Apocalipse, viviam sob forte perseguição do Estado. Para eles, a volta de Jesus
era a certeza de que todo o sofrimento pelos quais estavam passando por Cristo,
valeria a pena, visto que o Senhor trará o galardão com o qual retribuirá a cada
um segundo as suas obras (v.12). Apesar das adversidades, serão bem
aventurados aqueles que lavam as suas vestiduras no sangue do Cordeiro (v.14).
Paulo havia dito que os sofrimentos do tempo presente não podem ser
comparados com a glória a ser revelada em nós (Rm 8:18).
Em segundo lugar, a volta de Cristo instiga o preparo dos crentes. Uma vez
que o Senhor prometeu que retornaria em breve, é preciso que a sua igreja,
composta por cristãos daquela e desta época, o aguarde. Para isso é preciso
preparo. O alerta de Jesus a esse respeito é: Bem aventurado aquele que guarda
as palavras da profecia deste livro (Ap 22:7b). O conteúdo expresso no livro da
revelação deve ser guardado. Guardar significa aceitar o conteúdo como legítimo,
não mudar, não acrescentar nem subtrair nada a ele (Dt 4:2; Pv 30:5-6). A
profecia não é apenas para informar sobre o fim, mas para preparar um povo
santo para o fim.362 Enquanto aguarda o retorno do noivo, a Noiva do Cordeiro
deve clamar ansiosamente para que o seu Noivo venha (Ap 22:17). Seu coração
não está em coisas, mas no seu Amado. 363 A noiva deve aguardar o noivo em
pureza (v.11). A santificação deve ser sua característica nessa espera.

361
Ladd (1986:210).
362
Lopes (2005:380).
363
Lopes (2005:384).

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