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DOI 10.29327/31ENANPAP2022
ISBN 978-65-5941-887-9
ISSN 2175-8212
CDD 700
CRB-4/1241
25/03/2023, 16:19 Existências: Anais do 31º Encontro Nacional da ANPAP | Even3 Publicações
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Ex-Presidentes
Dr. José Afonso Medeiros Souza (PPGARTES/ICA/UFPA).
Dr. Cleomar de Sousa Rocha (PPGACV/FAV/UFG).
Representantes dos Comitês Associativos
Comitê de Curadoria - CC
Dr. Francisco Eduardo Coser Dalcol. PPGAV/IA/UFRGS. (Titular).
Dra. Mirtes Cristina Marins de Oliveira. PPG Design/UAM. (Titular).
Dra. Franciele Filipini dos Santos. PPGAV/IdA/UnB. (Suplente).
Comitê de Educação em Artes Visuais - CEAV
Dra. Lucia Gouvêa Pimentel. PPGARTES/EBA/UFMG. (Titular).
Dra. Ana Luiza Ruschel Nunes. PPGE/SECIHLA/UEPG. (Titular).
Dra. Leda Maria de Barros Guimrães. PPGACV/FAV/UFG. (Suplente).
Comitê de História, Teoria e Crítica de Arte - CHTCA
Dr. Shannon Figueiredo de Souza Botelho. DAV/CP II. (Titular).
Dr. Luiz Alberto Ribeiro Freire. PPGAV/EBA/UFBA. (Titular).
Dra. Tatiana da Costa Martins. PPGAV/EBA/UFRJ. (Suplente).
Comitê de Patrimônio, Conservação e Restauro - CPCR
Dra. Maria Herminia Olivera Hernández. PPGAV/EBA/UFBA. (Titular).
Dra. Rosangela Marques de Britto. PPGARTES/ICA/UFPA. (Titular).
Dra. Marilene Corrêa Maia. BAP/EBA/UFRJ. (Suplente).
Comitê de Poéticas Artísticas - CPA
Dra. Luisa Angélica Paraguai Donati. PPGINTERDISCIPLINAR/CLC/PUC Campinas.
(Titular).
Dra. Vera Lucia Didonet Thomaz. ANPAP. (Titular).
Dra. Janice Martins Sitya Appel. ILA/FURG. (Suplente).
PARECERISTAS
1. Dra. Agda Regina de Carvalho. CEUN/IMT.
2. Dr. Aldo Victorio Filho. PPGARTES/ART/UERJ.
3. Dra. Alecsandra Matias de Oliveira. MAC/USP.
4. Dra. Alessandra Mello Simões Paiva. PPGER/IHAC/UFSB.
5. Dr. Alexandre Henrique Monteiro Guimarães. DAV/CPII.
6. Dr. Alexandre José Guimarães. PROPPG/PROFARTES/IFG.
7. Dr. Alexandre Sá Barretto da Paixão. PPGARTES/ART/UERJ.
8. Dra. Ana Claudia Lopes de Assunção. CARTES/URCA.
9. Dra. Ana Del Tabor Vasconcelos Magalhães. FAED/ICED/UFPA.
10. Dra. Ana Elisabete de Gouveia. PPGAV UFPB/UFPE/CAC/UFPE.
11. Dra. Ana Júlia Melo Almeida. PPGDesign/FAU/USP.
12. Dra. Ana Maria Tavares CavalCanti. PPGAV/EBA/UFRJ.
13. Dra. Ana Paula Aparecida Caixeta. VIS/IdA/UnB.
14. Dranda. Ana Renata dos Anjos Meireles. FLUL/ULISBOA.
15. Dra. Ana Zeferina Ferreira Maio. ILA/FURG.
16. Dra. Andrea Hofstaetter. DAV/IA/UFRG.
17. Dranda. Andréia Cristina Dulianel. FAV/CLC/PUC Campinas.
18. Dra. Angela Raffin Pohlmann. PPGAVI/CA/UFPel.
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COMISSÃO ORGANIZADORA
Dr. Robson Xavier da Costa. PPGAV UFPB-UFPE/DAV/CCTA/UFPB.
Dra. Madalena de Fatima Zaccara Pekala. PPGAV UFPB/UFPE/CAC/UFPE.
Dra. Maria Betânia e Silva. PPGAV UFPB-UFPE/CAC/UFPB.
Dra. Maria Emilia Sardelich. PPGAV UFPB-UFPE/CE/DME/UFPB.
Dr. Hermes Renato Hildebrand. PPGAV/DMM/IAR/UNICAMP.
Dra. Teresinha Maria de Castro Vilela. CEAV/ANPAP.
Dra. Vera Lucia Didonet Thomaz. CPA/ANPAP.
Secretária
Ma. Cristiane Peres Dias
Design Gráfico/Mídia Social
Sarah dos Santos Costa
Técnico do Site
Daniel Paz
Monitores/as/es
Ana Cláudia Araújo Do Nascimento
Ana Gabriela Do Vale Gomes
Atena Miranda
Auvaneide Ferreira de Carvalho
Breno Miranda de Souza
Cristiane Peres Dias
Jheine Alves De Moura (Montador da exposição)
Kerolainy Kimberlin dos Santos Silva
Layla Gabrielle Carlos De Oliveira
Leandro Garcia
Lucas Alves Dos Santos
Luci De Andrade Silva
Maurício Nunes De Siqueira Filho
Márcio Soares dos Santos
Millena Beatriz Ferraz da Mota Silveira
Maya Oliveira
Pedro Gabriel Leal Guimarães
Renata Venancio Santos
Sarah dos Santos Costa
Thierry de Lima Queiroz Marques
Victor Hugo Borba da Silva
EXPOSIÇÃO ON-LINE EXISTÊNCIAS
Curadoria
Dr. Robson Xavier da Costa. PPGAV UFPB-UFPE/DAV/CCTA/UFPB - CC.
Avaliadoras dos vídeos
Luisa Angélica Paraguai Donati. PPGINTERDISCIPLINAR/CLC/PUC Campinas -
CPA.
Vera Lucia Didonet Thomaz. ANPAP - CPA.
Janice Martins Sitya Appel. ILA/FURG - CPA.
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Artistas Selecionados
Amanda de Mendonça Linhares
Alexandra Martins
Alexia Bethiol
Arthur Ribeiro Frazão
Augusto César de Holanda Santos
Bursztyn de Oliveira Santos
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Frederico Carvalho Felipe
Gabriel Fampa
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Juliano Ribeiro de Moraes
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Maykon Rodrigues dos Anjos
Mônica Lorena de Sousa Moreira
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Taliboy
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Expografia
Jheine Alves de Moura
Montagem e Ajustes Técnicos
Jheine Alves de Moura
Thierry de Lima Queiroz Marques
Design Gráfico
Leandro Alves Garcia
Sarah dos Santos Costa
PLATAFORMAS UTILIZADAS
Site - http://www.anpap.org.br/
Even3 - https://www.even3.com.br/31enanpap2022/
Youtube -
https://www.youtube.com/channel/UCRNqeFgMAPj2QiyRAXP29pQ/about
Issuu - https://issuu.com/robsonxavier3/docs/anpap_2022_-_31_en_da_anpap_-
_exist_ncias_-_cadern
V4H - LAVID UFPB - https://agenda.v4h.cloud/cadastro
Artsteps - https://www.artsteps.com/view/632b55de781abe2fec439c84
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APOIO
Universidade Federal de Pernambuco - UFPE - https://www.ufpe.br/
Universidade Federal da Paraíba - UFPB - https://www.ufpb.br/
Programa Associado de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV UFPB/UFPE) -
http://www.ccta.ufpb.br/ppgav
Laboratório de Aplicações de Vídeo Digital (LAVID) - UFPB - http://lavid.ufpb.br/
Laboratório de Artes Visuais Aplicadas e Integrativas (LAVAIS) - UFPB -
http://plone.ufpb.br/lavais
Grupo de Pesquisa em Arte, Museus e Inclusão (AMI/UFPB/CNPq) -
https://www.youtube.com/channel/UC2pTUtKeAx3rSjozbBCG7mQ
Fonte: Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas – ANPAP.
Pesquisa e produção de dados: Vera Lucia Didonet Thomaz. CPA/ANPAP.
Atualização: Curitiba, PR, 30 de setembro de 2022.
Periodicidade da publicação
Anual
Idiomas
Português
Editor
Even3 - R. Sen. José Henrique, 231 - Sala 509 - Ilha do Leite, Recife - PE
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FOTOGRAFIA COMO VERDADE SOB SUSPEITA: FAKE NEWS E FORMAÇÃO CRÍTICA DIANTE DAS
IMAGENS
Julia Rocha; Ana Carolina Ribeiro Pimentel (/Anais/31ENANPAP2022/507186-FOTOGRAFIA-COMO-VERDADE-
SOB-SUSPEITA--FAKE-NEWS-E-FORMACAO-CRITICA-DIANTE-DAS-IMAGENS)
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Ficha catalográfica
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Modalidade
Apresentação Artística em Vídeo
Área temática
Comitê de Curadoria - CC
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NUVEM DE SOPROS:
VOLÁTIL (1980-1994) DE CILDO MEIRELES
BLOW CLOUD:
VOLATILE (1980-1994) BY CILDO MEIRELES
RESUMO
Este artigo analisa a obra Volátil (1980-1994) de Cildo Meireles. Apresentamos o projeto
inicial da obra e suas versões efetivamente executadas, notadamente, sua última versão
que integrou a exposição Entrevendo: Cildo Meireles, realizada entre 2019 e 2020 no SESC
Pompeia em São Paulo. Recorremos ao Capp Street Project Archive (California College of
the Arts), a um conjunto de três entrevistas e uma conversa realizadas com o artista entre
1997 e 2013, bem como a mais duas entrevistas realizadas pela autora com Cildo Meireles,
uma em 2019 e outra em 2020. Analisamos a obra nos apresentando enquanto sujeito
fenomenológico (MERLEAU-PONTY, 2015), destacando, para além de questões do olfato e
do tato, o silêncio e o ruído. (SCHAFER, 2011; CAGE, 2013)
PALAVRAS-CHAVE
Volátil (1980-1994). Cildo Meireles. Silêncio. Ruído. Percepção.
ABSTRACT
This paper analyses the work Volatile (1980-1994) by Cildo Meireles. We present the initial
project of the work and its versions actually executed, notably, the last one that integrated
the show Entrevendo: Cildo Meireles, held between 2019 and 2020 at SESC Pompeia in São
Paulo. We resorted to the Capp Street Project Archive (California College of the Arts), to a
set of three interviews and one conversation with the artist held between 1997 and 2013, as
well as two more interviews conducted by the author with Cildo Meireles, one in 2019 and
the other in 2020. We analyse the work by presenting ourselves as a phenomenological
subject (MERLEAU-PONTY, 2015), highlighting, in addition to issues of smell and touch,
silence and noise. (SCHAFER, 2011; CAGE, 2013)
KEYWORDS
Volatile (1980-1994). Cildo Meireles. Silence. Noise. Perception.
Andar em nuvens
Cildo Meireles (1948-) recorda que, por volta de seus cinco anos idade, quando
visitava a família de sua mãe em uma fazenda em Anápolis (GO), gostava de jogar
bola com as crianças da região. As ruas eram de terra e o clima seco se
intensificava nos meses de estiagem, entre agosto e setembro, provocando uma
elevada produção de poeira que se avolumava com o trânsito de carroças com
rodas de madeira e de ferro que acabavam por moer a terra, refinando-a. As mães,
inclusive a de Cildo Meireles, com o intuito de evitar a poeira, proibiam o jogo de
bola das crianças que, rapidamente, esqueciam-se da restrição. No meio da
brincadeira, quando alguma mãe chegava, “a gente só afundava a bola na terra e
era uma terra em suspensão, era uma sensação como se você estivesse andando
em nuvens. Era assim na rua. E eu queria recriar isso.” (MEIRELES, 2020)
O artista relata que a versão de Volátil (Imagem 1) que vem sendo exposta desde
1994iv seria, na verdade, uma segunda – a “versão artística” –, explicando que
Imagem 1. Cildo Meireles, Volátil, 1980-1994. Instalação: vela, talco e odor de gás natural. 300 X
1500 x 400 cm. Capp Street Project Residency, 1994 (Oakland, California College of the Arts). Fonte:
Caap Street Project Archive.
O artista pretendia utilizar cinzas em sua obra. Porém, em virtude das leis de
proteção ambiental da Califórnia, Cildo Meireles precisou realizar outra adaptação
no projeto inicial de Volátil, substituindo cinzas por talco, o que permite o controle
industrial de seu refinamento e de sua tonalidade:
Pensei em coletar cinza de churrascarias e pizzarias, mas seria
muito lento e o odor de comida não tinha a ver com o projeto original,
o odor a ser exalado é o de gás. Optei pelo talco, réplica quase
perfeita, pelo grau de refinamento e pela tonalidade, que você pode
controlar industrialmente. (MEIRELES, 2009, p. 130)
Imagem 2. Cildo Meireles, Volátil, 1980-1994. Projeto da obra. Fonte: Cildo Meireles: estudos,
espaços, tempos. (MATOS; WISNIK; 2017).
Volátil (1980-1994)
A porta se abre, tudo está escuro no interior do ambiente em que a visão alcança
quase nada. Mesmo assim, algo nos impele a enveredar pelo seu interior. Antes que
o primeiro passo encontre o piso, o restante do corpo acaba por ser levado na busca
por sustentação e equilíbrio. Afundados na escuridão, tomamos o impulso de nos
virar e talvez retornar à claridade – mas a porta já foi fechada. Tudo é escuridão e
um imenso mar de cinzas movediças que nos traga em suas vagas.
Caminhamos mesmo sem saber para onde, como se não houvesse outra opção a
não ser prosseguir a uma direção que nos é desconhecida. Estranhamos os pés,
soterrados em algo macio que nos faz crer que flutuamos, ou que caminhamos
sobre nuvens. Porém, algo nos incomoda: um odor que toma conta da escuridão e
nos impele a caminhar cautelosamente dada a presença de um gás e de uma
quase-luz que tremula desde sua fonte ainda não alcançada por nossa visão. Cada
passo traz consigo o quase imperceptível som do deslize dos pés nas cinzas, finas e
aveludadas. Um sussurro ininterrupto sopra em nossos ouvidos imagens de solidão.
O vento toca os poros e adentra nossas vias respiratórias, carregando consigo as
cinzas que flutuam no ar. Uma nevasca seca, sem água, somente cinzas por todos
os lados de um caminho deserto e repleto de escuridão. A vista se acostuma,
seguimos em direção à luz (Imagem 3).
Imagem 3. Cildo Meireles, Volátil, 1980-1994. Instalação: vela, talco cinza e odor de gás natural,
56m2. Exposição: Entrevendo: Cildo Meireles, 2019. (SESC Pompeia, São Paulo). Foto: Caroline
Alciones de Oliveira Leite.
O odor do gás alerta para o perigo, para a iminência de uma explosão quando gás e
chama se encontram. O vento sopra o caminho, alguns passos a mais e, depois da
curva, avistamos a chama ao fundo do corredor – apesar do temor, prosseguimos.
Aceitamos o risco, aguardamos por aquilo que ele nos trará. Nossos passos são
cada vez mais leves, aprendendo a flutuar. O tempo dos passos nos avisa que não
precisamos ter pressa, afinal, já encontramos a luz. A chama resiste, provocando e
quebrando a plenitude da escuridão. A vela acesa se alimenta do breu, não se
importando em ser por ele consumida, pois é na ausência de luz que a chama se faz
mais plena e incansável em seu feito de queimar, de se entregar às consequências
de ser.
Aproximamo-nos cada vez mais da vela, nossos joelhos vacilam, quase flexionam
interrompidos, porém, por murmúrios outros. Além de nós e de nossa solidão, outros
dois sujeitos cochicham uma conversa de impressões segredadas. Os sujeitos
desaparecem e, novamente, estamos somente nós e nossa solidão iluminados pelo
silêncio e pela chama da vela. Percorremos o espaço sem saída, não há nada além
das vagas, trilhas que circulam a vela. O pavio se consome, escutamos o sopro do
gás, aguardamos pela explosão anunciada pelo vento. Tentamos ser mais insistente
do que o pavio, impávido em seu desaparecimento mesmo quando praticamente
toda a cera já derreteu. A chama sabe que a cera não tem outra opção, a não ser se
esparramar ao seu redor, protegendo o pavio de seu destino ao mesmo tempo em
que caminha para ele.
A visão se despede da luz que resiste à escuridão, as pernas ainda não sabem se
flutuam ou se se afogam no movediço, mas retornam, em passos desacelerados, até
o ponto em que havíamos entrado. A porta se abre. Avisamos à guardiã do espaço o
que se passa lá dentro. Todos terão que aguardar até que outra vela tome para si o
direito de queimar-se, de consumir a escuridão e de iluminar o silêncio. Saímos de
Volátil, mas a obra nos acompanha. Percebemos o tempo em sua relatividade,
esticando-se em determinados espaços e acelerando-se em outros. Somos avisados
– nossa pele, roupas e cabelos estão cobertos por uma cinza que nos revela que a
solidão tem sua cor, seu tempo e seu som.
O som da espera
Em meio à escuridão, estamos envoltos em um ruído branco, um ruído que nos isola
de frequências outras através de seu caráter translúcido (SCHAFER, 2011), algo
que se faz no deslizar dos pés por entre as cinzas movediças e no sussurro do gás
que sopra, insistentemente, as cinzas por todo o ambiente. O vento em Volátil, tal
qual aquele analisado por Schafer (2011), se apodera dos ouvidos através de
percepções táteis, auditivas e também visuais. O vento nos carrega na nuvem de
poeira por ele levantada, enquanto sua voz canta uma história de solidão. Um canto
constante e envolvente nos isola do mundo lá fora. Nem mesmo nossa tosse
prejudica a desenvoltura do vento. Ao contrário, um corrobora o outro dispensando
vocalizações que não as do silêncio ali cantado. Sem a presença de quem quer que
seja, o canto do vento é nulo, irreverberante. Mas quando encontra nossa pele, o
vento exultante percorre nossos poros, tornando sua presença evidente,
acariciando-nos com as cinzas que nos traz enquanto sussurra em nossos ouvidos.
Caminhamos o vento. Encontrar o ruído do vento e percebê-lo enquanto silêncio
implica tornar-se um pouco vento também.
Tal questão nos remete a uma provocação objetiva que fizemos em relação a
presença do sonoro em Cinza (1986), ao que Cildo Meireles nos respondeu: “eu não
considerei o som na verdade. Porque, seria muito sutil.” (MEIRELES, 2019)
Escapando ou não das intenções do artista, o sonoro impregna Volátil tanto quanto
as cinzas e o perfume do gás. Cildo Meireles forja seu próprio vento, um vento de
cinzas que perfuma o gás no ambiente e nos envolve não somente pela iminência
da explosão, mas por soprar, eficientemente, em cada pedaço do espaço e em
nossos tímpanos, a poesia do silêncio.
A propósito da música, John Cage (2013 [1961]) observa que o silêncio era
compreendido como um lapso de tempo entre sons com variadas finalidades, como
separação de sons, estabelecimento de ênfase, expressividade, pontuação, dentre
outros aspectos e finalidades. Volátil, por outro lado, nos permite conjecturar o
silêncio como lapso temporal e espacial à medida que somos deslocados de nossa
rotina, aceitando e nos engajando nos termos perceptivos da obra. O silêncio
ruidoso de Volátil se bifurca e toma direções opostas – o sopro do gás e o interior de
quem a percorre. Somos deslocados da lógica circadiana, deslocados do automático
da rotina pelo tempo em que caminhamos e durante o qual nos permitimos
submergir nas vagas da obra – silêncio e escuridão iluminados pela iminência.
O tempo e o espaço de Volátil não são acolhedores para aqueles que não gostam
ou que não sabem lidar com o silêncio e seus ruídos. Para muitos, o silêncio
representa a privação da necessidade de estabelecer contato com o outro, de se
comunicar, trazendo um traço da cultura ocidental: a necessidade de “produzir sons
para se lembrar de que não está só”. (SCHAFER, 2011, p. 354) Schafer afirma que
o silêncio seria incompatível com a personalidade humana. Tal incompatibilidade
talvez se abra quando nos percebemos próximos à única possibilidade de silêncio
pleno – a morte – e, neste sentido, qualquer aspecto do silêncio que nos aproxime
desta condição demasiadamente humana tende ao aterrador.
Imagem 4. Cildo Meireles, Volátil, 1980-1994. Instalação: vela, talco cinza e odor de gás natural,
56m2. Exposição: Entrevendo: Cildo Meireles, 2019. (SESC Pompeia, São Paulo). Foto: Caroline
Alciones de Oliveira Leite.
Volátil se faz através do acúmulo de cinzas sobre o qual o sujeito caminha, do odor
do gás que impregna o ambiente e do sussurro que transporta o gás e as cinzas em
diálogo com a vela solitária e persistente. O espaço aberto se faz mais do que um
“ambiente (real ou lógico) em que as coisas se dispõem, mas o meio pelo qual a
posição das coisas se torna possível.” (MERLEAU-PONTY, 2015, p. 328) À medida
que a obra atua no sujeito fenomenológico, também o sujeito atua na obra em cada
passo que lança em direção à chama e ao seu ao redor. Sujeito e obra se
encontram no oxigênio compartilhado e nas partículas de cinza que transportará em
seu corpo em direção ao mundo. Volátil somente abre seu espaço no encontro com
aquele que a alcança, que a pratica – ambos se fazendo um em relação ao outro.
Na espera, um tempo que pertence à obra, um tempo por ela ocupado. A obra
invade o sujeito, tomando para si suas percepções tátil, olfativa, sonora, visual e
espaço-temporal.
Caminhar o vento
A pupila dilatada encontra uma fonte luminosa a nos interrogar mais do que
interrogamos toda aquela escuridão. Mesmerizados pela insistência da chama e
pela persistência do sopro do gás que impregna de cinzas a nós e ao ambiente,
somos levados pela multiplicidade de percepções provocadas por Volátil. A obra se
dá em um registro próprio, marcado por sua poesia noturna que embota o alcance
da visão em favor de outros sentidos. Se para refinar a escuta, quase como em um
reflexo, cerramos os olhos; na obra de Cildo Meireles o ambiente carrega consigo a
escuridão, nos advertindo que há mais ali para o corpo do que somente para os
olhos. A vela ilumina os silêncios – o visual e o sonoro – que se amplificam na
extensão e na intensidade da ausência de luz, no caminhar solitário em uma nuvem
de gás que sopra um ruído branco, ou cinza, e que nos devolve a nós mesmos.
Cildo Meireles manipula as imagens do fogo que se apresentam a partir do atrito do
pinho e do carvalho e da possibilidade de manifestação de Tupã, em Cruzeiro do Sul
(1970). Também com o fogo, o artista incinerou as galinhas em Tiradentes – Totem-
Monumento ao Preso Político (1970); fogo que se conteve em uma explosão
inocorrida em O Sermão da Montanha: Fiat-Lux (1973-1979). Em Volátil, talvez
inúmeras explosões tenham acontecido e as cinzas em suspensão no ar e as que
pavimentam o piso flutuante sejam testemunhas dos feitos da chama. Repletos de
cinzas, no olfato, na pele, nos cabelos, na escuta e na visão, deixamos a obra. O
fogo está guardado em Volátil, na privacidade que lhe assegura sua ação de
transformar o que quer que seja em cinzas enquanto transforma a si próprio. As
imagens do fogo nos levam ao ato de Prometeu, o titã que roubou o fogo dos
deuses e o entregou à humanidade, por certo, através de um artista ou através de
uma criança que sabe enterrar coisas preciosas e caminhar o vento – flutuar.
Notas
Hatch em 1983, apresentando-se como a primeira residência em artes visuais nos Estados Unidos dedicada
exclusivamente à apresentação e criação de instalações de arte do qual teriam participado mais de cem artistas
nacionais e internacionais. Em 1998, o Capp Street Project passou a integrar o Wattis Institute. Disponível em <
https://wattis.org/capp>. Acesso em 1 jul. 2021.
iii De acordo com informações obtidas no catálogo da exposição Cildo Meireles: Installations, em 1995, na
Galeria Lelong em Nova York, a obra foi montada em um espaço com o formato de um L, sendo necessário
percorrer uma pequena curva, passando de um cômodo a outro, antes de vislumbrar a vela. Na exposição
itinerante Cildo Meireles, entre 1999 e 2000, a obra foi montada em salas no formato de L, enquanto em sua
versão na Tate Modern (Londres, 2008), a obra foi instalada em uma sala retangular. Na exposição Entrevendo:
Cildo Meireles, a obra foi exposta no formato da vogal U.
iv Volátil foi exposta, pela primeira vez, na exposição Volatile and Entrevendo, Capp Street Project, San
Francisco, 1994. Em 1995, a instalação foi exposta na mostra Volatile, na Galeria Lelong, Nova York. Entre 1999
e 2000, Volátil integrou a exposição itinerante Cildo Meireles, sendo exposta em New Museum of Contemporary
Art, Nova York, 1999; no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, 2000; e no Museu de Arte Moderna de São
Paulo, 2000. A instalação tornou a ser montada na exposição itinerante Cildo Meireles, percorrendo as seguintes
instituições: Tate Modern (Londres), 2008; Museu d’Art Contemporani de Barcelona, 2009; Museu Universitario
de Arte Contemporáneo (Cidade do México), 2009. Por fim, a obra integrou a exposição Entrevendo: Cildo
Meireles, realizada no SESC Pompeia, São Paulo, de 26 de setembro de 2019 a 2 de fevereiro de 2020.
v “Na Tate, [foi] contatado um perfumista francês que morava em Berlim. [...] O rapaz chegou, expliquei o que era
a obra, o que eu precisava, disse o nome do composto [t-butil mercaptano]. Eu disse que era só um alarme, para
você notar que está tendo um vazamento de gás, algo do tipo. [...] Três meses depois me chamaram para uma
reunião. [...] O rapaz foi para o corredor e botou um pouco da substância que ele tinha feito. Daqui a pouco todas
as portas [das salas onde ficavam os curadores] começaram a abrir. [...] Lembro também que na Lelong, [o
frasco] chegou hermeticamente fechado e ficou no escritório da Mary, lá no fundo. No dia em que estava tudo
pronto e que era necessário botar lá na parede [...]. Para tirar do escritório e poder abrir e fechar o frasco, em
menos de cinco minutos, tinha brigada de incêndio do prédio [e] carro de bombeiro na rua. [...], porque é muito
forte mesmo. Mas, acabou que lá [em São Paulo] ficou um tempo fechado para o público, porque não
conseguiram acertar [o odor].” (MEIRELES, 2020)
vi Como na montagem de Volátil no SESC Pompeia, o odor da instalação não remetia ao gás natural, a obra foi
fechada ao público ainda nos primeiros dias de outubro, sendo reaberta somente ao final de novembro. Durante
o período, buscou-se ajustar o odor o mais próximo possível ao do gás natural.
vii “O gás natural é inodoro e incolor. Para facilitar a identificação de um possível vazamento, compostos à base
de enxofre (mercaptanas e/ou sulfetos) são adicionados ao gás em concentrações suficientes para lhe dar um
cheiro marcante, mas sem lhe atribuir características corrosivas, num processo conhecido como odoração”.
(IVANOV et al. apud GROSS, 2017, p. 38)
viii
A partir da proposição do artista e sonólogo Rodolfo Caesar (2016) de que a imagem não é atributo exclusivo
do domínio da visualidade e de que o som é imagem, recorremos à noção de imagem de forma alargada,
compreendendo que há imagens táteis e olfativas.
ix Para mais informações a este respeito, ver GILBERT, 2008.
x Quando tudo estava quieto, no centro da noite da trama do romance do alemão Patrick Süskind, O Perfume: a
História de um Assassino (1985), o assassino Jean-Baptiste Grenouille pôde sentir o odor da paz. Uma paz que
vinha de dentro, mas que encontrava reverberação na quietude dos odores que o cercava.
xi De acordo com Ingold, Darwin compreendia, no entanto, que “a superioridade humana não era de tipo, mas
apenas de grau. Rudimentos de inteligência, segundo ele, podem ser encontrados nos mais modestos dos
animais, como na humilde minhoca [...].” (INGOLD, 2015, p. 72)
xii “Ela pode ser encontrada nos escritos de Xenofonte, Aristóteles, Vitrúvio e Gregório de Nissa, e já era comum
entre os naturalistas do século XVIII e início do século XIX.” (STOCZKOWSKI apud INGOLD, 2015, p. 72)
Referências
BECKETT, Samuel. Waiting for Godot: a Tragicomedy in Two Acts. Nova York: Grove
Press, 1994
GILBERT, Avery. What the nose knows: the science of scent in everyday life. Crown
Publishers: Nova York, 2008.
INGOLD, Tim. Estar vivo: ensaios sobre movimento conhecimento e descrição. Petrópolis
(RJ): Vozes, 2015.
MEIRELES, Cildo. Cildo Meireles e Manuel Aires Mateus. (Conversa registrada em dois
vídeos) In: MOUTINHO, Vera; GARRIDO, Nelson; GOMES, Kathleen; PINTO, Mariana
Correia; ROCHA, Daniel. Cildo Meireles e Manuel Aires Mateus: um encontro em Serralves.
Público, Lisboa, 5 dez. 2013. Disponível em: <https://acervo.publico.pt/multimedia/cildo-
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(Org.). Cildo Meireles (Coleção Encontros). Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2009b, p.
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Guilherme. Cildo: estudos, espaços, tempo. São Paulo: Ubu Editora, 2017. p. 110.
MIZRAHI, Vivian. Sniff, Smell, and Stuff. Philosophical Studies, v. 171, n. 2, p. 233-250,
nov. 2014.
SESC POMPEIA. Entrevendo: Cildo Meireles. (Catálogo de exposição) São Paulo: SESC
Pompeia, 2019.