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Atividade 6 - Redação I (historicidade escolar)

Prezado aluno, ao longo deste longo curso, você pesquisou em redações que escreveu seus dados de
semiose, suas emoções, seus significados e muitos outros elementos de sua historicidade, de sua
Estrutura do Pensamento. Isso é parte do estudo, parte de sua formação em Filosofia Clínica.

Nesta redação vamos trabalhar toda sua historicidade escolar, em educação, desde o seu
nascimento.

Escreva onde estudou, como aprendeu e onde aprendeu o que possui hoje, e, ao final, coloque
o que entende por ensino. Ou seja, o que é ensinar, o que é aprender em sua opinião.

Era uma vez um garotinho muito danado que adorava brincar de alagar canoa.
Éramos 3 primos: Antônio, Franci e Amaro. Havia ainda uma prima muito querida, a Silvinha. Esta
funcionava como o Juízo da turma. A mãezona. Aquela que dizia a hora de parar e retornarmos pra
casa.
Então, é exatamente isso que me vem à mente; quando retorno aonde tudo começou.
Outra coisa são as manhãs de domingo, que logo ao final da missa dominical iniciavam as
brincadeiras, o Oratório Salesiano. Sim, sou muito religioso. Não no sentido carola ou beato. Mas
com uma influência muito forte da religião católica. Por exemplo, lembro mais da catequese do que
mesmo da Profª. Terezinha – a minha alfabetizadora. E taí uma dificuldade gigante que tenho.
Devido a essa formação religiosa que me marcou muito, enquanto pessoa pensante, será impossível
falar de mim sem dedicar linhas e linhas a questões religiosas. Mesmo não sendo um carola ou
beato, mas fui sim rato de sacristia, ou melhor, de seminário católico. Foi uma consequência quase
que natural, tamanha a influência de minha vovó. Claro que ir para o Seminário aos 17 anos, não foi
só para atender um desejo de minha vovó; mas também porque acreditava que para ajudar alguém
precisava ser padre. Assim aprendi o significado de caridade, de fraternidade e solidariedade na
catequese católica.
Meu Ensino Fundamental conclui com as Freiras Salesianas. Meu Ensino Médio com
os Padres Salesianos. Mas foi com os Capuchinhos que me encontrei, onde fiz o postulantado e
noviciado em meio aos índios. A simplicidade franciscana representava para mim um modo único
de vida. E assim entendi as primeiras lições, ou seja, todas atreladas ao Cristianismo. Aos valores
cristãos.
Porém, o contato com os índios (Tikunas, Makuxis, Wuapixanas e Yanomami)
acabou por reforçar todas as Semioses que me compõem. E sem medo de errar minhas Buscas estão
meio que presas em Armadilhas Conceituais religiosas. Foi um momento de confronto do meu
mundo com o mundo do outro (índio). Afirmo quase que sem dúvida. O momento atual é este:
vivo uma nova Significação de tudo que recebi de Dona Ana (minha vovó). Enfim.
E ali naquela cidade no Alto Rio Negro, por nome Barcelos-AM. Ali no coração da
Amazônia vivi meus primeiros e inesquecíveis melhores anos de minha vida, de minha infância
querida que os anos não trazem mais. De fato, eram tardes fagueiras. Na verdade, eram manhãs,
tardes, noites e madrugadas fagueiras. Tudo tinha o doce afago de uma senhorinha por nome Dona
Ana – minha vovó.
Minha mãe, muito jovem, deu-me a vida aos seus 15 aninhos de vida. Uma mulher
de luta. Guerreira. Minha mãe foi a primeira grávida a estudar em colégio de freira naquela região.
Foi fofoca para muitos anos. Para minha mãe foi tortura. Transformaram prazer em tragédia.
Inocência e espontaneidade em pecado. É ou não é uma tortura para uma jovem de 15 anos ?! Tudo
isso por minha culpa? Por que não? Vejo assim também.
Não lembro muito se sofri com todas estas coisas com minha mãe. Hoje me
solidarizo a ela, claro. Entendo que para ela é doloroso voltar àquela cidadezinha. Entendo. O que
lembro são lembranças doces de muitas brincadeiras, passeios de barco, acampamentos nas praias,
gincanas, torneios, tudo no ambiente da Paróquia. A mesma que condenou minha mãe ao inferno. E
de algum modo eu também, porque eu e minha mãe éramos um.
Diferente de minha mãe eu demorei a me deixar levar pela natureza do corpo e da
vida. Antes do Seminário fiz aquela preparação insana: adolescente regrado e casto. No Seminário
procurava resistir aos prazeres da puberdade. Porém, em vão porque quando me via já estava em
cima ou ao lado de meninas que tinham o seminarista como um troféu. E para nós aquilo era muito
cômodo. Até que o superior imediato (nosso Formador) descobria e nos trocava de tarefa ou até
mesmo de paróquia. Tudo em vão. Nuca deixei de namorar, mesmo com a batina marrom
capuchinha.
Ou seja, eu sabia que era errado e fazia igual. Por quê? Eu não sei. Machismo?
Talvez sim. Não sei. Mas por que não deixar a batina e viver tudo isso de modo livre, sem
reprovações ou controle de superiores? Não sei. Acredito que porque acabei me acomodando ao
conforto de ter tudo ali. Tudo mesmo. Incluindo as meninas. Não via motivo de sair pelas meninas.
Machismo? Talvez sim. Uso o talvez porque além de machista sou também um ignorante.
E eu estava no momento bem difícil. Havia pedido um tempo. Já estava concluindo a
Teologia e já preparavam o Diaconato. Precisava pensar bem no que ia fazer. Já não podia fazer tão
somente porque isso agradaria minha vovó ou por qualquer outro motivo, que não fosse de fato uma
vocação. Estava em Porto Alegre inclusive. Estudava na ESTEF (Escola Superior de Teologia e
Espiritualidade Franciscana). E uma vez de férias conheço a mãe de meu filho. O que era pra ser
mais uma aventura de férias se transformou no maior tesouro que tenho hoje: meu filho. Este ano
ele faz 18 anos. Como “bom católico” acreditei que deixando a batina e casando estaria fazendo a
coisa certa. Eu dizia aos meus superiores, que não queriam que eu saísse: eu fui criado sem pai, não
quero que o meu filho também seja. E hoje estou aqui distante dele a quase 5 mil quilômetros e a
mais de 5 anos preso neste lugar. Será que ainda reproduzo o Padrão de meu pai? Será que
conseguirei superar tal Armadilha Conceitual e um ver tudo como meros Limites?! Não sei. Não sei
mesmo.
Perdão pelos saltos. Hoje vivo atormentado pela doença comum a todo preso: a
ansiedade.
Saindo de Barcelos fui para Manaus-AM, seguir os estudos para o sacerdócio
católico. Já com o Ensino Médio na mão fiz o vestibular para a UFAM (Univ.Fed.Amazonas). Eu
queria fazer Filosofia na Federal. Eu não tinha muito apoio de nenhum frade. Eu já cursava
Filosofia num Instituto Católico – CENESCH – Centro de Estudos do Comportamento Humano.
Hoje se chama ITEPES – Instituto de Teologia, Pastoral e Ensino Superior da Amazônia. Com o
resultado em mãos da aprovação para a Filosofia na Federal, eu procurei apoio. Então, o único que
me apoiava – Frei Mário Monacelli – torna-se Provincial (uma espécie de chefe maior). Mas a
condição seria que eu iria de ônibus. Assim se fez.
E ainda jovem percebo hoje que eu já tinha esse espírito ativista. Nunca me vi como
um padre de sacristia. Só me imaginava na Missão em meio aos índios ou africanos. Assim eu
entendia SER PADRE. Não sei se o contato tão jovem com as leituras filosóficas como por exemplo,
o Manifesto Comunista (Marx/Engels) que conheci aos 14 anos. Eu tinha uma professora de OSPB
(Organização Social e Política do Brasil) que me apresentou a eterna luta de classes. Até hoje sonho
com a ditadura do proletariado. Queria muito saber como seria um dia todas aquelas ideias em
prática. Mas é claro que a formação missionária capuchinha explica muita coisa.
Embora eu houvesse tido uma adolescência um pouco recatada, apesar dos
namoricos; eu já tinha bem pouco desse adolescente quando iniciei a Teologia. Iniciei em Curitiba
no Studium Theologicum e estava concluindo na ESTEF (Escola Superior de Teologia e
Espiritualidade Franciscana), quando engravidei a mãe de meu filho. Ela já estava grávida quando
ainda cumpri compromissos do seminário: um Seminário de Teologia Latino-americana em El
Salvador e o Fórum Social Mundial aqui em Porto Alegre no ano de 2005. Ainda pensava em não
sair. Afinal eu não seria o primeiro nem o último padre que tinha filho. Foi bem difícil deixar um
porto seguro e encarar um mundo totalmente diverso do que vivi até ali. Eu já vivia o ativismo
social, mas eu tinha toda uma estrutura segura. Eu teria agora que encarar uma vida de casado, algo
que nunca havia imaginado para mim. Algo totalmente incerto e inseguro.
Não foi fácil, porém com o apoio de ambas as famílias tudo foi se ajustando. E
graças a muita luta (trabalhando nos três horários), eu e a mãe de meu filho, juntos construímos
muita coisa. Meu filho tinha um aninho quando levamos ele para conhecer a casa em construção
num condomínio da Zona Norte de Manaus, onde ele está hoje. E já no seu segundo aninho já
tínhamos a tão sonhada casa própria.
Costumo dizer que tanto eu quanto ela, nós tentamos. Foram 5 anos difíceis para
mim e para ela. Eu me via totalmente perdido naquela vida. Minha alegria era somente estar
próximo do meu filho. Eu não me dava conta que precisava também amar a mulher ao meu lado. A
separação foi difícil. E novamente atendo o que aprendi daquela senhorinha, comprei uma moto e
fui morar bem próximo a ele (meu filho). Assim todos os dias eu o via. Quase todas as tardes levava
ele para lanchar (pastel de queijo e um suco de cupuaçu). Ele adora isso. Sim, eu novamente repeti
o aprendizado que guardo daquela senhorinha Dona Ana – minha vovó – que novamente acabou
falando mais alto. Porque eu sentia que fazer diferente eu estaria traindo aquela senhorinha a quem
devo muita lealdade.
Com o fim do primeiro casamento, retomo os estudos. Já havia feito uma Pós-
Graduação (Metodologia do Ensino Superior), quando inicio o curso de Direito. Ainda em Manaus.
E seguindo uma Armadilha Conceitual, Paixão Dominante ou tão somente Como o mundo me
parece. De fato não sei mesmo. O que sei é que mantive o ativismo político junto aos índios, depois
na cidade junto ao MNLM (Movimento Nacional de Luta por Moradia) passo a atuar de modo mais
perigoso. E um triste dia quase perco meu Tesouro (meu filho). Pessoas combatidas no mundo da
grilagem de terra tentam contra minha vida e de meu filho. Foram três atentados antes de eu decidir
sair de Manaus. Ou seja, eu ainda acreditava que para ajudar as pessoas eu precisava esquecer de
mim. E até mesmo de meu filho. Assim eu acreditava está fazendo certo. A força do aprendizado
religioso que dizia amar o próximo como eu amei tinha muita força em mim. Digo tinha porque
não sei se ainda faria tudo de novo. Espero que não. Espero que quando conquistar minha liberdade
não me meta mais com isso. Não sei. Preciso encontrar um novo ativismo social. Enfim.
Sobre o porquê de estar hoje preso, eu prefiro deixar para as Clínicas Didáticas. A
vergonha é tamanha que prefiro assim. O que consigo dizer é que de fato atendi a uma Pulsão de
Morte que quase me autodestruiu. Na verdade, nem sei ao certo porque fiz aquilo. Até hoje esse
porquê me atormenta. Porém, tenho certeza que não devia ter feito. Não pela condenação do Código
Penal. Mas pela condenação que me atormenta todos os dias a Consciência. Mas enfim, deixemos
para as Clínicas Didáticas.
Hoje me agarro a esta Filosofia Clínica como meu porto seguro. Fico feliz quando
penso que não tenho aquela Natureza criminosa, mas sim uma História que talvez tenha me levado
àquele triste dia. Enfim. Tenho mais dúvidas do que certezas de mim mesmo.
Procuro consolo em Schopenhauer: “sempre posso fazer algo com aquilo que
fizeram de mim”. Ou Sartre: Não importa o que fizeram com você. O que importa é o que você
faz com aquilo que fizeram com você. Ou Nietzsche: É preciso ter o caos dentro de si para gerar
uma estrela dançante. Ou A grandeza do homem consiste em que ele é uma ponte e não um fim;
o que nos pode agradar no homem é ele ser transição e queda. Ou nenhum homem é
irrecuperável, desde que receba tratamento adequado (Mário Ottoboni - Fundador da APAC).
Enfim é isso. Assim vejo meu Mundo hoje. Em plena transformação. Graças a este
Opus Dei por nome APAC que possibilita ao um apenado sonhar. Consigo hoje fazer abstrações de
um futuro possível. Moro ao lado do Presídio Central de Porto Alegre. O que nos divide é um muro
de concreto. Aqui deste lado o Céu e do outro lado o Inferno. Aqui deste lado pagamos nossa pena
de forma humanizada. Um dia quero escrever sobre esta obra que salva vidas há mais de 50 anos.
Ao Grande Oráculo de Delphos peço que me permita viver o bastante para aprender
um pouco mais da vida. Até aqui gratiam aeternam omnibus.

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