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SÃO PAULO
2006
12
Área de Concentração:
História e Historiografia da Arte
Orientadora:
Profª Drª Daisy V.M. Peccinini
São Paulo
2006
13
FOLHA DE APROVAÇÃO
14
Aprovada em:
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr.:__________________________________________________________
Instituição: _____________________Assinatura: ________________________
Prof. Dr.:__________________________________________________________
Instituição: _____________________Assinatura: ________________________
Prof. Dr.:__________________________________________________________
Instituição: _____________________Assinatura: ________________________
DEDICATÓRIA
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AGRADECIMENTOS
À Profª Drª Daisy Peccinini, que nos anos de convivência, muito me ensinou, por sua
compreensão, apoio e constante estímulo transmitido durante todo o trabalho.
Uma obra de arte não está obrigada a ser entendida e aprovada em princípio.
Ernst Fischer
18
RESUMO
e com isso, suas dificuldades como obra de acervo, usando a Coleção do MAC-USP
fora dos critérios adotados pelo artista ao criá-las, destacando ainda a questão
própria obra, onde a fruição do mesmo é essencial para a própria existência da obra
em inúmeros casos.
pesquisa que busca refletir sobre a transição histórica do objeto à Instalação, a obra
ABSTRACT
The object of this research is the collection of Installation Art in the Museum of
Contemporary Art at the University of São Paulo. It’s a historical and poetic reflection
about the different aspects of Installation Art; it’s ephemeral and mutant
characteristics and it’s difficulties as a museum object, using to this purpose the
This work also question the validation of an exposition of this way of art, out of
the criterion chosen by the artist at the moment of it’s creation, accentuating the
subject of it’s space and timing and the reproduction of the art work at any new
exhibition.
The reflection that this work intends to do, it’s based on the dialogue between the
art object and the observer, witch is, in the case of Installation art, an active agent in
the complement of the work itself, where the joy of the pure essence of the work it’s,
The Installation Art in the Museum of Contemporary Art at the USP, is therefore,
the result of a research that does a reflection about the historical journey that this
form of art went through from the art object to the Installation art; the masterpiece as
a museum object, the exposition of Installation art and it’s difficulties; and also, how
important time and space are to the real meaning of Installation Art.
20
LISTA DE IMAGENS
1. Figura 1
Foto do Festival Metálico, 9 de fevereiro de 1929. Um carrinho sobre trilhos
cortava os dois edifícios da Bauhaus. A figura a caráter prepara-se para entrar no
carrinho, que a levaria às salas principais da festa.
2. Figura 2
Marcel Duchamp, 1.200 Sacos de Carvão, vista da Instalação na “Exposição
Internacional do Surrealismo”, 1938, Nova Iorque.
3. Figura 3
Kurt Schwitters, Merzbau, iniciada em 1923 – destruída em 1943, Hanover,
Alemanha.
4. Figura 4
Robert Smithson, Spiral Jetty (PÍER em espiral), 1970, Great Salt Lake, Utah,
Estados Unidos.
5. Figura 5
Jannis Kounellis, Cavalos, 1969, Galeria I´Atticco, Roma.
6. Figura 6
Hélio Oiticica, Grandes Núcleos, 1960.
7. Figura 7
Hélio Oiticica, Projeto Cães de Caça (maquete), 1960/61.
8. Figura 8
Hélio Oiticica, Tropicália, 1967/68.
9. Figura 9
Lia Menna Barreto, Lassie, 1991. 59 x 200 x 42 cm. Madeira, metal e espuma
revestida de tecido. Acervo MAC-USP.
10. Figura 10
Ione Saldanha, Bambus, 1973. 117 x 17 x 17 cm. Acrílica sobre bambu. Acervo
MAC-USP.
11. Figura 11
Alex Vallauri, Sem Título, 1985. 144,5 x 77 x 65 cm. Spray sobre geladeira. Acervo
MAC-USP.
12. Figura 12
Alex Vallauri, Sem Título, 1985. 18 x 126 x 60 cm. Spray sobre pia. Acervo
MAC-USP.
13. Figura 13
21
Alex Vallauri, Sem Título, 1985 82 x 80 x 60 cm. Spray sobre fogão. Acervo
MAC-USP.
14. Figura 14
Valeska Soares, Fonte, 1991. 140 x 156,5 x 79 cm. Tapete, mármore e
essência de rosas. Acervo MAC-USP.
15. Figura 15
Simon Benetton, O Jardim dos Filósofos e Além, 1989/90. 240 x 480 x 480 cm.
Aço cromado e latonado. Acervo MAC-USP.
16. Figura 16
Luis Fernando Peláez, Chuva, 2001. 230 x 1000 x 400 cm. Ferro, madeira,
bronze, alumínio e resina epóxica. Acervo MAC-USP.
17. Figura 17
Marcelo Cipis, Cipis Transworld Art & Commerce, 1994. 300 x 400 x 340 cm.
Serigrafia em cores sobre cortina de algodão, trilhos de alumínio e ferro,
serigrafia em cores sobre papel e serigrafia sobre compensado de madeira.
Acervo MAC-USP
18. Figura 18
Carlos Alberto Fajardo, Sem Título, 1988. 100 x 100 x 20 cm. 4 blocos de
carbono prensado e cabos de aço. Acervo MAC-USP.
19. Figura 19
Carmela Gross, Sem Título, 1992. 320 x 360 x 540 cm. Alumínio, cera, parafina,
tecido e madeira. Acervo MAC-USP.
20. Figura 20
Cildo Meireles, Parla, 1982. 125 x 50,2 x 110 cm. Granito, madeira e couro.
Acervo MAC-USP.
21. Figura 21
Cildo Meireles, Camelô, 199850 x 30 x 30 cm. Boneco de borracha, tabuleiro de
madeira, alfinetes de aço, barbatanas de plástico e motor 110 V. Acervo MAC-
USP.
22. Figura 22
Fabiana de Barros, Life Vests, 1990/91. 210 x 600 x 350 cm. Têmpera sobre tela,
madeira laqueada, tecido, montagem e recorte de papel. Acervo MAC-USP.
23. Figura 23
Fabiana de Barros, Life Vests, 1990/91. (a obra montada de forma ligeiramente
diferente).
24. Figura 24
22
25. Figura 25
Detalhe da Instalação Impresso sobre Rocha.
26. Figura 26
Regina Silveira, Desenho Preparatório para O Paradoxo do Santo.(obra do
Acervo do MAC-USP).
27. Figura 27
Regina Silveira, O Paradoxo do Santo, 1994. 450 x 700 x 500 cm. Madeira
pintada e placas de poliestireno. Acervo MAC-USP.
28. Figura 28
Regina Silveira, O Paradoxo do Santo (outro exemplo de montagem).
29. Figura 29
Regina Silveira, O Paradoxo do Santo, detalhe da obra.
23
SUMÁRIO
BIBLIOGRAFIA..................................................................................................... 109
24
MAC-USP.
teóricos de Giulio Carlo Argan: em Guia da História da Arte, onde o autor afirma:
...a arte não define categorias de coisas, mas um tipo de valor. Este está sempre ligado ao
trabalho humano e às suas técnicas e indica o resultado de uma relação entre uma atividade
mental e uma atividade operacional. (...) As formas valem como significantes somente na
medida em que uma consciência lhes colhe o significado: uma obra é uma obra de arte apenas
na medida em que a consciência que a recebe a julga como tal. Portanto, a história da arte não
é tanto uma história de valores, ainda que ligados ou inerentes a fatos, o contributo da história
da arte para a história da civilização é fundamental e indispensável (ARGAN, G.C., 1992, p.
14).
E em seu livro História da Arte como História da Cidade, onde o Argan diz:
Uma vez que as obras de arte são coisas às quais está relacionado um valor, há duas
maneiras de tratá-las. Pode-se ter preocupação pelas coisas: procurá-las, identificá-las,
classificá-las, conservá-las, restaurá-las, exibi-las, comprá-las, vendê-las; ou, então, pode-se
ter em mente o valor: pesquisar em que ele consiste, como se gera e se transmite, se
reconhece e se usufrui (ARGAN, G.C., 1995, p. 13).
25
exposição dessas obras fora dos critérios adotados pelo artista ao criá-las. Por outro
caso da Instalação é agente ativo como complemento vivo da própria obra, onde a
“Uma obra de arte nunca é uma coisa em si, fora da realidade humana; ela
uma obra de arte; mas também lhe doamos um significado.” (FISCHER, E., 1959, p.
162).
fazer artístico das mais relevantes dentro do panorama das artes no século XX, que
embora já bastante discutida, conta, ainda com frágil definição e com muitos pontos
percorrido pelo Objeto até a poética da Instalação. Com efeito, pode-se ainda
agregar as questões conceituais como núcleo gerador das obras de arte dentro da
Uma das mais preclaras conceituações sobre este complexo problema está
expresso por Neide Marcondes em seu livro (Des) Velar a Arte, onde a autora diz:
Instalação: um evento (Ereignis), um acontecimento e a obra de arte abre seu próprio mundo. A
obra instala um mundo quando no seu evento, permitindo a espacialização, e põe-em-obra a
verdade, não a verdade da metafísica, mas inaugura mundos históricos. (MARCONDES, N.,
2002, p. 107).
obra.
situ” ou ambientais seriam pensáveis e conceitualmente como tal? Que tipo de experiência
legítimas abrange? Como se trata de experiência muito recente da Arte Contemporânea, são
poucas as referências a recorrer, tanto práticas como teóricas. Além da pouca distância e
pouco recuo temporal, para avaliar mais criteriosamente toda essa produção. (JUNQUEIRA, F.,
1996, p. 552).
faz com que esta modalidade de fazer artístico se situe de forma totalmente
2005, p. 47). Kant1 defende ainda, que as experiências sensíveis são previamente
que acontece em todas as obras de arte, se faz sentir de forma arrebatadora na arte
contemporânea.
obra, e é precisamente na obra de arte que ela se consuma” (NUNES, B., 2005, p.
76).
1
Segundo texto de Benedito Nunes, Introdução à Filosofia da Arte, São Paulo, Editora Ática, 2005.
28
imediata ao apreciar a obra in-loco, mas permanece em sua fruição plena como
recordação2.
espelho de sua história, questionando assim o homem de seu tempo e sua interação
com a própria obra. A verdade da mesma se dá a partir de sua relação com o outro,
influenciando a forma de agir e sentir de todos aqueles que interagem com ela. A
espectador e através dela a interação com a obra. Neste momento, a obra é viva, é
aí que ela se completa, com a consciência que o outro toma dela, ou, através dela,
de sua própria efemeridade. Nesta relação com o tempo, defendido por Kant, onde
2
MARCONDES, Neide. (Des) Velar a Arte, São Paulo: Arte & Ciência Editora, 2002.
29
O vazio, assim como o tempo, é absorvido pela própria obra, muitas vezes
obra, seu negativo, ou, o vazio, fazem parte da obra, a absorvem e formam um todo
artísticas e é deste espaço, onde esta efetivamente se instala, que a obra emerge,
espaço, são questões cruciais quando se faz uma reflexão a cerca da arte
F., 1996, p. 559). A evidência desse espaço, do lugar instalado, onde a obra
dessa verdade espacial, que se completa através de seu negativo, dos vazios
o âmago da Instalação.
Para levar a cabo uma reflexão sobre o assunto, se faz necessário pesquisar o
Instalação, ou melhor, o caminho percorrido pelo objeto artístico até a Instalação não
tradicionais da arte, passaram a fazer trabalhos que mais tarde ficaram conhecidos
paredes e o piso da galeria, estes artistas acabaram por criar uma nova poética
participe da obra de forma não mais passiva mas como objeto último da própria
Esta participação ativa do espectador da obra faz com que a fruição da mesma
uma obra epocal, a qual só faz sentido se vista e analisada em seu tempo-espaço.
de pesquisa que busca refletir sobre questões relativas percurso histórico do objeto
1. DO OBJETO À INSTALAÇÃO
dizer arte aqui, me refiro ao fazer artístico em todos as suas mais variadas formas,
seja gráfica, musical, escrita, filosófica, metafísica, enfim...tudo aquilo que eleva o
homem à categoria de ser pensante. Essa necessidade vem não só de séculos, mas
de milênios. Duchamp define bem isso ao dizer: “Creio que a Arte é a única forma de
atividade pela qual o homem se manifesta como indivíduo. Só por ela pode superar
o estado animal, porque a Arte desemboca em regiões que nem o tempo nem o
15.000-10.000 a.C., podem ser vistas, como o que conhecemos hoje como
É verdade, no entanto, que por vários séculos a arte conheceu suportes bem
3
ROSENTHAL, M. Understanding Installation Art: From Duchamp to Holzer. NY: Prestel, 2003.
33
XX.
arte para sempre; a arte pela arte, idéia defendida e adotada por Baudelaire, foi uma
proclamação de l´art pour l´art .“ (FISCHER, E., 1959, p. 82). Desse momento em
diante, a arte, assim como a história do Ocidente, muda sua velocidade. A história
em si muda de ritmo, e é neste novo ritmo, nesta nova acelerada fome de mudança,
fazer artístico até então impensáveis. Dentre todos os movimentos, que têm na
questão conceitual seu cerne e dos quais Duchamp fez parte, podemos destacar o
Dadá e o Surrealismo.
Em seu artigo sobre Duchamp em The New York Times (6 de fevereiro de 1965), Calvin
Tomkins cita Willem de Kooning: “Duchamp é um movimento artístico feito por um único
34
homem, mas um movimento para cada pessoa, e aberto a todo mundo” (BATTCOCK, G., 2002,
p. 71)
Apesar de Marcel Duchamp ter feito de fato parte de vários movimentos das
Vanguardas Artísticas, ele fez uma arte própria, a qual inspira e influência artistas do
todo mundo até os dias atuais. “Seu fascínio diante da linguagem é de ordem
Natureza Morta, um objeto feito com madeira pintada e franja de tapeçaria. A partir
daí os objetos entram no panorama artístico de forma definitiva, seja como objetos
conceituais, a própria idéia de objeto artístico é que está em jogo. “O objeto é uma
uma meditação sobre si mesma.” (PAZ, O., 2002, p. 14). Depois de “Roda de
Em alguns casos os ready-made são puros, isto é, passam sem modificações do estado de
objetos de uso ao de ‘anti-obras de arte’; outras vezes sofrem retificações e emendas,
geralmente de ordem irônica e tendente a impedir toda confusão entre eles e os objetos
artísticos. (PAZ, O., 2002, p. 20).
35
apresentado então, como obra de arte. Os ready-made, não são no entanto, anti-
essência da arte. Seria arte apenas o objeto, ou será a arte a intenção do artista ao
contemporânea.
Depois de Duchamp a arte nunca mais seria a mesma. Sua influência na arte do
século XX, e nas criações artísticas dos princípios do século XXI são inegáveis e
questões formais. É exatamente neste ponto crucial que sua influência na arte
com os objetos e com o espectador, que em última instância, vai definir como obra
de arte, um objeto escolhido pelo artista. A existência desse objeto como arte é
definida, então, a partir de uma escolha do artista. “Não um ato artístico: a invenção
de uma arte de liberação interior.” (PAZ, O., 2002, p. 30). Será possível essa
liberdade, ou estará ela sempre “amarrada” à própria história, à busca pelo sentido
36
no próprio processo de criação, quando o artista não trata sua própria obra com o
“...a Arte é uma das formas mais altas da existência, com a condição de que o criador escape a
uma dupla armadilha: a ilusão da obra de arte e a tentação da máscara de artista. Ambas nos
petrificam: a primeira faz de uma paixão uma prisão e a segunda de uma liberdade, uma
profissão”. (PAZ, O., 2002, p. 62 e 63).
Nessa nova forma de fazer artístico o público se coloca de forma definitiva como
elemento último da própria obra, sem essa interação a obra muitas vezes não existe
de forma plena.
Resumindo, o ato criador não é executado pelo artista sozinho; o público estabelece o contato
entre a obra de arte e o mundo exterior, decifrando e interpretando suas qualidades intrínsecas
e, desta forma, acrescenta sua contribuição ao ato criador. (DUCHAMP, M. In: BATTCOCK, G.,
2002, p. 74).
Em 1915, Duchamp, vai para os Estados Unidos, assim como vários artistas
europeus que emigram, fugindo da Guerra. A situação fica mais difícil com a
ascensão do Nazismo em 1933, assim como dos vários regimes totalitários por toda
artístico mundial.
Nesse sentido a atitude surrealista tende a provocar uma revolução total do objeto 6.
4
BRADLEY, F. Surrealismo. COSAC & NAIF EDIÇÕES, São Paulo, 1999.
5
Difere do Happening por ser em geral mais cuidadosamente planejada e não envolver necessariamente a
participação do espectador. Dicionário Oxford de Arte. Edit. Martins Fontes, São Paulo, 2001.
6
Definição feita por André Breton em Crise do Objeto, 1936. In: Breton Lê Surréalisme et la Peinture. Paris,
Editions Gallimard, 1965.
38
Figura 1 Figura 2
muito pessoal frente às questões artísticas, Schwitters cria seu próprio movimento,
ao qual chama de Merz. Interessado nas questões do espaço, ele projeta Merzbau
(Figura 3), de 1923, obra que se mantém em constante “mutação” até sua destruição
em 1943. “A Merzbau era uma obra mais forte e sinistra do que aparentam as
Figura 3
década de 60.
anos do século XX, por cubistas, surrealistas e dadaístas, dentre outros, evolui para
que surgiam nesse período na arte, tendo grande importância nos conceitos que
A arte feita nos Estados Unidos do pós-guerra surge como força renovadora no
jovens artistas americanos que se apropriaram de objetos com certo eco surrealista,
7
Termo cunhado na década de 50 por Jean Dubuffet. Dicionário Oxford de Arte, São Paulo, 2001.
40
dentre eles Jasper Johns e Robert Rauschenberg. Estes dois artistas pairaram no
artistas do pop-art, fazendo uma arte questionadora, com forte traço intelectual,
denominada neodadaísta.” (LUCIE-SMITH, E., 2006, p. 92). Além deles, Peter Blake
com sua idéia de realismo, também é destaque entre os artistas britânicos, no grupo
Yves Klein, “um exemplo de artista importante pelo que fez – pelo valor simbólico de
suas ações – e não por sua obra. Vê-se nele um exemplo da tendência cada vez
maior para que a personalidade do artista seja sua única criação completa e
em Paris em 1958 uma exposição onde o vazio era, de certa forma, a obra.
Nos anos 50 o pop-art domina a cena artística americana. Artistas como Andy
entre si, apresentavam obras pictóricas com certo traço crítico, que “brincam” com
Enquanto isso, Claes Oldenburg e Jim Dine, mais próximos dos neodadá,
nova arte, como o ambiente de Peter Blake, Loja de Brinquedos, de 1962, as telas-
1959, além de happenings, como, The Car Crash, de Jim Dine de 1960 e, Store
Estado, de 1964-66, assim como os vários criados por George Segal, também
todo, ainda se mantém como uma obra. Os ambientes são de certa forma uma
São exemplos disso as obras de Stuart Brisley, And For Today – Nothing, de
1972, onde o artista passou horas em uma banheira com água e vísceras de
sadomasoquistas.8
Judd, Sol LeWitt, Dan Flavin, Carl Andre e Robert Morris. Apesar de usarem
8
LUCIE-SMITH, E., Os Movimentos Artísticos a partir de 1945, Edit. Martins Fontes, São Paulo, 2006.
43
linguagens distintas, todos apresentam sua arte “ocupando” o espaço com obras
obras são muitas vezes complexas. Como é o caso das obras de Sol LeWitt,
1974, ambas ocupando ambientes, como objetos que dependendo da forma como
Dan Flavin também ocupa o espaço com suas obras luminoso-coloridas, como
em Ursula´s one and two picture 1/3, de 1964. Esta obra que é um objeto que se
Proposition Three, de 1971, assim como a obra, Sem Título, de Robert Morris de
1968.
Ainda na década de 60, artistas como Christo, famoso por seus “pacotes”, dentre
eles, Packaged Public Building, de 1961, que utilizam a questão tridimensional, mas
Assim como Christo, Robert Smithson e Richard Long, também criam obras
aberto em vários casos, o que leva suas obras a serem conhecidas como Arte
4), de Smithson, feita em 1970 no Great Salt Lake, em Utah, obra efêmera, que é
Line in Ireland, de 1974, que também lida com questões conceituais e arte
ambiental.
Figura 4
James Turrel é outro artista que mantêm vínculos com a Earth art, a Land art e
com a arte ambiental. Tem como principal obra do gênero um projeto ambicioso
Conhecido por seu projeto contínuo Roden Crater, que envolve a escavação e alteração de um
vulcão extinto em Sedona, no deserto do Arizona. Esse trabalho começou em 1972 e ainda
está em andamento. O objetivo de Turrel é criar uma série de experiências que, embora
dependentes de fenômenos óticos conhecidos, causem um impacto quase místico sobre o
espectador. (LUCIE-SMITH, E., 2006, p. 148-149).
A arte, a partir da década de 60, mesmo quando não faz parte da chamada arte
artística não é a obra, mas a liberdade. A obra é o caminho e nada mais.” (PAZ, O.,
2002, p. 64).
inaugura um novo fazer artístico que contagia a arte do século XX, principalmente na
sua segunda metade, após o fim da segunda guerra mundial. É deste conceito, onde
XVI).
Os templos gregos, assim como as catedrais góticas, também têm sua aura
sacra, onde o homem não se comporta de forma normal, se espera de quem adentra
Museus, apesar de não serem efetivamente um local religioso, são carregados hoje
....a arte precisa libertar-se “de ficar só com uma elite a que damos o nome de ‘público’, pois
esta elite em breve não mais existirá e, de fato, atualmente já não existe. E, quando ela deixar
de existir de todo, a arte ficará completamente sozinha, mortalmente só, a menos que encontre
um caminho para o ‘povo’, ou, para dize-lo em termos menos românticos, a menos que
encontre um caminho para os homens”. 9
visto desta forma, cria certa inibição. O espaço museal, ou mesmo o espaço de uma
anteriormente, seu elemento final, sem ele, muitas vezes, ela não existe de forma
plena.
tamanha ambigüidade.
9
Pensamento da personagem Adrian Leverkühn, no romance Doutor Fausto de Thoma Mann. In: FISCHER, E.,
A Necessidade da Arte, CÍRCULO DO LIVRO, São Paulo, 1959.
48
utilizando suportes inovadores, como é o caso das obras de Duchamp, 1.200 Sacos
de Cal, de 1938 e Milha de Fio, de 1942, e de Kurt Schwitters, com sua Merzbau, de
1923. A questão do espaço é portanto tratada aqui como uma Instalação feita pelo
artista, mesmo estas obras sendo, na época, experiências conceituais e formais que
apoderaram das galerias, utilizando seu espaço como parte da obra, e, em alguns
casos, até mesmo como obra. É o caso da obra de Yves Klein, de 1958, em Paris,
artista Arman, realizou em 1960, uma exposição, onde encheu de lixo do chão ao
teto, de parede a parede, a mesma galeria usada anteriormente por Klein, criando
espectador era impossibilitado de entrar, pois a galeria estava repleta de lixo. Nos
Em 1969, Robert Barry, fecha a galeria Eugenia Butler Gallery, por três
caso, era a própria galeria fechada. Sua intenção, segundo O´Doherty, era mostrar o
invisível na arte, onde peças ou coisas existem, mas não podem ser sentidas ou
10
In: O´DOHERTY, B., No Interior do Cubo Branco, EDIT. MARINS FONTES, 2002.
49
espectador ou do olho, só pode ser penetrado pela mente.” (O´DOHERTY, B., 2002,
p. 115).
quando é profanado pelo lixo de Arman. Dá-se a ele um valor místico-religioso, que
de fato ele não tem. Mas, no momento em que está ocupado por obras de arte, ele
elemento final, e mais , quando ela é apenas a idéia de obra, concebida pelo artista.
Há, porém, um outro aspecto questionado nas obras acima citadas, a própria
existente. Seja o espaço interno da galeria, como sua relação com o espaço externo.
espacial. “Demócrito concebeu o espaço como extensão vazia (kené daistolé) sem
vazio, a idéia da arte se sobrepõe a questão formal da arte. Neste novo conceito de
diálogo com o espaço externo. A própria discussão aqui sobre espaço interno,
tempo, tanto na galeria fechada por Barry por três semanas, onde a obra existe, por
sendo então finita enquanto obra, o que seria forma em uma visão tradicional de
de Janis Kounellis, Sem título (Figura 5), de 1969, Instalação executada na Galeria L
´Attico em Roma, onde a artista apresenta doze cavalos vivos em estábulos, dentro
da galeria, trazendo assim, para o espaço sagrado da arte o mundo animal. Mais
uma vez a obra existe efetivamente como idéia ou conceito, permanecendo apenas
elas não são um happening ou uma performance, e sim uma nova linguagem, onde
Figura 5
Fluxus.
pelos dadaístas, e alguns artistas que fizeram parte do Dadá se ligaram ao Fluxus.
O grupo tinha na essência de sua arte questões intelectuais, filosóficas e uma crítica
Havia, contudo, uma semelhança gritante entre os “eventos” do Fluxus e as atividades da arte
pop do início da década de 1960 – como os “Happenings” de Claes Oldenburg e Jim Dine -,
ainda que as incursões do Fluxus na performance ao vivo quase sempre tivessem insinuações
intelectuais, políticas ou filosóficas mais explícitas que as da arte pop. (LUCIE-SMITH, E.,
2006, p.161).
Foi dentro do Fluxus que Joseph Beuys, artista que como Duchamp tem uma
arte própria, desenvolveu as bases reflexivas de suas primeiras obras. “No entanto,
arte, e ainda, uma arte que tivesse na liberdade suas premissas, traria consciência e
Suas obras eram realizações ritualísticas, onde cada ação tinha um significado.
Ele lidava com a questão do espaço, do vazio, do tempo, e mais, com a relação com
Sua obra mais conhecida e mais comentada é sem dúvida, Coiote, de 1974,
realizada na galeria René Block, em Nova Iorque. A obra toda é um grande ritual.
Beuys chegou ao aeroporto Kennedy enrolado da cabeça aos pés em feltro, material que, para
ele, era um isolante ao mesmo tempo físico e metafórico. Dentro de uma ambulância, foi levado
para o espaço que dividiria com um coiote selvagem por sete dias. Durante esse tempo, ele
conversou com o animal, ambos separados do público da galeria apenas por uma corrente. Os
rituais diários incluíam uma série de interações com o coiote, que ia sendo apresentado aos
materiais – feltro, bengala, luvas, lanterna elétrica e um exemplar do Wall Street Journal (a
edição do dia) – sobre os quais o animal pisava e urinava, como que reconhecendo, a seu
próprio modo, a presença humana. (GOLDERG, R., 2006, p. 141).
formais. Nesse sentido, sua obra, mesmo sendo realizada em uma galeria, vai muito
A Instalação tem em seus primórdios, como visto aqui, a galeria como espaço
primordial, sendo ela não apenas um receptáculo desta poética, mas também
agente ativo das obras, em muitos casos. Muitos outros exemplos poderiam ter sido
galeria, para galeria, e mais, sua relação com o espaço da galeria, tantas são elas
até hoje.
que exploram essa forma de fazer artístico estão Robert Smithson, com sua obra
Spiral Jetty, feita em 1970 no Great Salt Lake, em Utah, Christo e Jeanne-Claude,
Paris e James Turrel, com sua obra Roden Crater, iniciado em 1972 e em continuo
tempo. Enquanto as obras de Smithson e Christo são feitas para durarem por tempo
Arizona, quanto em algumas Instalações que criou para museus, tem obras feitas
perenidade é o diferencial.
espectador entra, se instala, e tem a experiência do teto se abrindo, cada vez que a
experiência são únicas e diferentes entre si, fazendo com a mesma obra seja outra a
cada dia. Já em Roden Crater, a obra sofre, efetivamente, uma constante mudança,
ela vem sendo modificada desde o dia de sua criação, no entanto é a mesma, assim
como o homem, que mesmo se modificando a cada dia, nasce e morre sendo o
mesmo indivíduo. Além da busca por uma experiência mística, a obra de Turrel lida
ainda assim são, em muitos casos, uma forma de Instalação. Se não em sua
Pode-se dizer então, que a Instalação nasceu na galeria de arte, passou por
iniciados por Duchamp e pelos seus contemporâneos. Nos anos 60 a arte passa por
assim como todo tipo de arte conceitual. É no meio desta efervescência de idéias,
visível e do tempo.
entre eles, se não diálogo, ao menos conhecimento do outro e com isso, influências
John Cage, músico e artista que cria em parceria com Robert Rauschenberg,
criar uma obra. Suas composições musicais incorporavam ruídos do ambiente das
ruas, sons produzidos pelo martelar sobre a madeira e sobre as cordas de um piano,
outros artistas que viam no acaso e na experimentação, uma forma de arte. Quando
forma, os artistas para a criação sem barreiras. Essa liberdade, tão perseguida por
liberdade alcançada pelos artistas a partir do século XX, na produção de sua arte.
como uma “declaração pessoal de arte”. (RUSH, M., 2006, p. 1). Dessa forma, o
artista ficou livre para se expressar e com isso se colocar à frente de sua obra.
questões centrais na arte. Pode-se dizer em muitos casos, que o espaço é a obra, e,
modernidade, já tinham dado o primeiro passo para essa libertação, mas quando
concluíram que tudo pode ser arte, ou, que é possível fazer arte de tudo, usando
57
qualquer tipo de suporte, a liberdade foi por fim alcançada. No momento em que a
idéia está colocada como a grande questão da arte e a questão formal, mesmo
quando muito bem trabalhada, está atrelada ao conceito, a arte passa a, ao menos,
público, seja de forma a integrar a obra como último elemento, quando a obra
A nova arte, que lidava com um novo processo artístico, questões conceituais e
No fim dos anos 60, portanto, a mudança no fazer artístico já estava sendo
Essa mudança era reconhecida em uma série de exposições internacionais de grande escala
montadas entre 1969 e 1972, cada uma tentando fazer um levantamento geral das várias
produções do parecia ser uma vanguarda ampla e cosmopolita. .... Esse ajuntamento de
artistas de vários países e continentes levou a uma rápida troca de informações e ao
estabelecimento de redes internacionais de contato e amizade. (HARRISON; WOOD, 1998, p.
197).
58
vinham buscando uma nova linguagem, e, nessa época, vários artistas nacionais
A arte nos anos 70, conta com espaços expositivos e eventos da nova arte,
O crítico de arte Mário Pedrosa, em seu artigo 11 sobre a obra de Hélio Oiticica,
mais do que definir a arte de Oiticica como pós-moderna, o crítico a define como arte
ambiental.
A arte na Europa e nos Estados Unidos, como vimos anteriormente, passa por
em sua grande maioria, estão imbuídas de forte conceito, onde a idéia é, muitas
No Brasil, também houve uma rica produção de arte conceitual e arte ambiental feita para
locais específicos. Estas correntes, com sua desconsideração por formatos convencionais e
preferências por materiais inesperados e freqüentemente insubstanciais, têm semelhança com
a Arte Povera italiana, mas suas raízes mais profundas encontram-se nas obras feitas na
década de 1960, por neococretistas brasileiros como Lygia Clark e Hélio Oiticica, que já haviam
prefigurado muitas das idéias mais típicas da Arte Povera. Hoje, no Brasil, os principais
herdeiros dessa forma de trabalhar são artistas como Tunga (Antônio José de Mello Mourão),
cujas obras ambientais extraordinárias, muitas vezes preenchidas por mechas gigantescas de
‘cabelos’ trançados (tranças feitas de fios de chumbo), combinam o fetichismo sexual com
imagens que lembram Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. (LUCIE-SMITH, E.,
2006, p. 214-215)
11
Artigo publicado pelo Jornal Correio da Manhã, “Arte ambiental, arte pós-moderna, Hélio Oiticica”. Rio de
Janeiro, 26 de junho de 1966.
60
Aos olhos de Pedrosa, a arte pós-moderna, seria, de certa forma, uma arte
M. In: org. Amaral, A., 1981, p. 206). Com isso, Pedrosa nos afirma, que a questão
a produção, desses novos artistas brasileiros, caracterizada por ele como uma
neoconcreto, estão no fim dos anos 50 e, principalmente nos anos 60, buscando e
criando, assim como Duchamp o havia feito no princípio do século, objetos insólitos,
relevos no espaço12, ou seja, estão em busca de uma poética espacial, mas com
entanto, eles não lidam com ready-mades, mas criam seus próprios objetos.
tempo, tão presentes na arte contemporânea. Na obra de Lygia Clark, que cria seus
bichos, o espectador passa a sujeito de ação, sem ele a obra inexiste de fato, já que
12
Pedrosa, M. Arte Ambiental, Arte Pós-Moderna, Hélio Oiticica. In: org. Amaral, A. Dos Murais de Portinari
aos Espaços de Brasília. Edit. Perspectiva, São Paulo, 1981.
61
...o espectador deixava de ser um contemplador passivo, para ser atraído a uma ação que não
estava na área de suas cogitações convencionais cotidianas, mas na área das cogitações do
artista, e destas participava, numa comunicação direta, pelo gesto e pela ação. (PEDROSA, M.
In: org. Amaral, A., 1981, p. 207).
existe, plenamente, enquanto forma, mas, sem a ação do outro, ela não existe
enquanto experimentação.
efetivamente. Ele tem uma característica singular, pois é um artista conceitual, com
intrinsecamente construtiva.
Em 1959, com a criação de seus primeiros núcleos, Oiticica coloca em sua arte,
trabalho, a questão do tempo. Esse tempo vivenciado chega a seu apogeu com seus
Oiticica inaugura uma nova arte, onde cria ambientes, Instalações e projetos-
obra. Cria-se portanto um “conceito novo de obra que se definia como núcleo
1999, p. 114).
62
núcleos, obras que poderiam ser chamadas de Instalações, como por exemplo,
Grandes Núcleos (Figura 6), de 1960. Neste caso, a obra é absorvida através do
ambiente.
Figura 6 Figura 7
importante quanto o espectador, que, assim como na obra de Lygia, é essencial para
vivência, inclusive, que a obra se completa. As cores vibrantes são para o artista,
uma forma de expressar as paixões humanas. A intensidade em sua obra vem junto
insolúvel.
“Arte ambiental é como Oiticica chamou sua arte.” (PEDROSA, M. In: org.
Amaral, A., 1981, p. 207). De fato, ela se apodera do ambiente, tanto em seus
1964. Em todas suas obras, nada é isolado, a apreciação pura não existe, é
(PEDROSA, M. In: org. Amaral, A., 1981, p. 207). Todas essas características fazem
samba mais tradicional do Rio de Janeiro. Como muito bem definiu Frederico
Morais:
A palavra nada significa, mas na obra de Hélio Oiticica, a partir de 1964, Parangolé é um
programa, uma visão de mundo, uma ética. São capas, tendas, estandartes, bandeiras e faixas
construídas com tecidos e cordões, às vezes guardando em seus bolsos pigmentos de cor ou
64
reproduzindo em sua face palavras, textos e fotos. São para ser vestidos, seu uso podendo ser
associado à dança e à música. (MORAIS, F., 1989, p. 123).
artista intitulou sua arte não como obra, mas como manifestação ambiental ou como
não-objeto,13 influenciado pelo crítico Ferreira Gullar e por Mário Pedrosa, ambos
fruição da mesma se dá de forma plena, criando uma experiência única para cada
13
Teoria do não-objeto de Ferreira Gullar: “O não-objeto não é um antiobjeto mas um objeto especial em que se
pretende realizada a síntese de experiências sensoriais e mentais: um corpo transparente ao conhecimento
fenomenológico, integralmente perceptível, que se dá à percepção sem deixar resto.” In: Gullar, F. Etapas da
Arte Contemporânea. Edit. Revan, Rio de Janeiro, 1999.
65
Com a obra Tropicália (Figura 8), de 1967, o artista alcança a plenitude de suas
artista usa tanto materiais rústicos como areia, folhas, pedras, tijolos, entre outros,
seres vivos, como uma arara. Ao entrar na obra, o espectador passa por poemas
Figura 8
Com Tropicália, Oiticica vai além das experiências sensoriais para uma
liberdade cultivada e vivenciada por ele e por vários artistas de sua geração sofre
A década de 1960 foi marcada por uma densa produção artística no Brasil. Onde
cultural que se delineava pesaria o arbitrário regime político de 1964.” (ZANINI, W.,
1994, p. 306).
arte e da existência, propondo uma dialética nova para o diálogo entre espectador e
nacionais e estrangeiros.
67
A fase de questionamento, por parte dos artistas passa por todas os suportes
artísticos, incluindo até mesmo a moda, como é o caso da proposta para o traje
João Goulart (1962-1964), com a criação dos CPCs, a arte ambiental e de forte
No começo dos anos 60, o país atravessa forte agitação política. É no meio
Cultura, com sua arte engajada e popular. Vários CPCs seriam criados por todo o
Brasil na primeira metade desta década. “No tocante à cultura e portanto às artes, a
atuação dos Centros Populares de Cultura vai atrais jovens intelectuais objetivando
1999, p. 15).
14
RIBEIRO, M. Arte e Política no Brasil: A atuação das neovanguardas nos anos 60. In: org. FABRIS, A., Arte
& Política – algumas possibilidades de leitura. Edit. C/Arte, Belo Horizonte, 1998.
68
ordem formal e conceitual fervilham nesse período na arte brasileira. A nova arte
se modifica após a teoria do não-objeto, formulada por Gullar, assim como da arte
brasileiras, onde “o discurso utópico é tão criativo quanto uma obra de arte ou uma
ação política e leva em conta o afeto e o imaginário.” (RIBEIRO, M., In: org FABRIS,
participação dos críticos Mário Pedrosa, Mário Schenberg, Sérgio Ferro, Frederico
Opinião 66, em paralelo aos seminários de São Paulo, Proposta 65 e Proposta 66.
crítica à situação política e também em busca de uma nova linguagem artística. Por
O clima de relativa liberdade do período de 1964 a fins de 1968, quando as atividades culturais
da esquerda foram toleradas, como bem observou Roberto Schwarz, acabou com o
recrudescimento da censura e da repressão política, com a edição do AI-5. Conseqüentemente,
desapareceram as condições de liberdade que tornavam factíveis as proposições coletivas da
nova objetividade – ou mesmo qualquer outra, individual – com a intenção de interferir na
realidade.” (PECCININI, D., 1999, p. 152).
Nos anos que se seguiram, alguns projetos foram desenvolvidos por alguns
críticos e artistas que não haviam sido exilados, e que não optaram pelo auto-exílio,
Três dos principais eventos foram a JAC-72, a partir do conceito de “arte como processo”, com
instalações simultâneas de duzentos artistas; Perspectiva 74 e Poéticas Visuais (1977),
mostras internacionais para os que não se inseriam nos circuitos de consumo convencional.
Todas eram de risco e davam ensejo de liberdade de expressão aos participantes. Havia uma
consciência difusa da efemeridade dos atos artísticos. (ZANINI, W., 1994, p. 318).
funde em uma busca pela própria essência da existência. É dentro deste contexto
acervo exibido de forma estática, temos visto, mostras que fazem inúmeras
mesma obra sob prisma diferente ao público, dentro da proposta apresentada pelo
curador.
sua concepção. A partir dos ready-mades de Duchamp, a arte passa a não mais ter
comuns como obra de arte, Duchamp nos fala de conceito de arte, e não mais de
15
FREIRE C. Práticas Museológicas em Museus de Arte. In: org. AJZENBERG, E. Arteconhecimento,
Universidade de São Paulo, 2004.
73
que é arte?, ou, o que podemos definir como arte?, é extremamente comum na arte
contemporânea. Podemos dizer que é tido como arte toda manifestação ou idéia que
existe tão somente como idéia, sendo impossível sua guarda ou reprodução. É uma
possui um acervo.” (COSTA, H. In: org. AJZENBERG, E., 2004, p. 74). Fazendo
nesta questão da obra como “objeto” de acervo, que entra a problemática da arte
contemporâneas são feitas com materiais perecíveis, outras, com materiais como
ainda aquelas que são idealizadas para ter um fim. Nesse sentido, Isis Baldini Elias,
É necessário saber quando intervir. No entanto, é fundamental saber quando parar ou não
intervir, pois é muito tênue a linha que separa o restauro conservativo do especulativo. É
importante verificar até que ponto é correto protelar ou até mesmo interromper a degradação
de uma obra concebida pelo artista para ser somente a concretização temporária de uma
idéia.16
da obra. Mesmo quando a obra não tem características perecíveis, o que por
de guarda, pelas dimensões das obras, já que na maioria dos casos, Instalações são
obras grandes. Daisy Peccinini, fala sobre isso ao fazer uma análise das Práticas
As práticas museológicas nos defrontam impasses que são próprios da natureza de um Museu
Contemporâneo. (...) No tocante à preservação em particular da obra e em geral da coleção.
(...) Outras antinomias aqui se apresentam a integridade da instalação que deveria ser
respeitada se contrapõe à condições de segurança e salubridade do espaço expositivo quer em
relação às demais obras, quer em relação ao público.
É bem conhecida a característica de grandes dimensões que as obras de arte contemporânea
apresentam. A guarda, o manejo e a exposição deste tipo de trabalho representa outro impasse
na medida em que, se de um lado a obra representa a atualidade da coleção ela pode trazer
inúmeros problemas para o museu desde o atulhamento de sua reserva técnica e exigências
especiais de seu manejo em caso de translado para o espaço expositivo. (PECCININI, D., In:
org. AJZENBERG, E., 2004, p.70-71).
16
ELIAS, B. I. Acervo Conceitual: Conservação e Restauro. In: Folder da Exposição Arte Conceitual e
Conceitualismos, MAC-USP, 2000.
75
outra ordem, sua montagem. Em vários casos, o artista define em seu projeto a
forma exata como sua Instalação deve ser reconstruída, em outros deixa mais de
uma possibilidade de montagem, como é o caso da obra de Regina Silveira, que faz
parte do acervo do MAC, O paradoxo do santo, de 1994. Mas, há ainda casos, onde
o artista não especifica a forma de montagem, o que permite uma intervenção direta
uma obra é apresentada ao público, sem ser respeitada a idéia concebida pelo
espaço institucional não permite que a obra seja efetivamente vivenciada, como
previsto por seu criador. Mário Pedrosa, já falava sobre isso, nos idos de 1967, em
Lá se põe um problema: ou as instruções dos artistas são para serem obedecidas, e suas
proposições tomam então sua verdadeira significação, ou não o são, em virtude de ordens
administrativas aos guardas para que proíbam a “participação” do espectador, e o desastre
será muito maior: a experiência estética e...revolucionária proposta terá sido condenada.
(PEDROSA, M. In: org. AMARAL, A., 1986, p. 189).
participação seu complemento, sem a mesma, a obra fica de certa forma incompleta,
Instalação, como obra de acervo, são inúmeras; mas, estes desafios são próprios da
o que diferenciam um museu de arte contemporânea dos demais. “Um dos desafios
AJZENBERG, E., 2004, p. 75). Ao conquistar o espaço proposto por Helouise Costa,
São Paulo), as obras que constituíam o acervo do MAM, o qual o próprio havia
criado em 1947.
Com o crescimento da Bienal, criada em 1951 e, que em seus primeiros anos foi
duas instituições, Ciccillo decide doar o acervo do MAM, além de sua coleção
de sua esposa Yolanda Penteado. Sendo assim, a coleção inicial do MAC tem forte
Rockfeller.
do século XX da América Latina, contando hoje em seu acervo com mais de 8.000
78
a mostra das obras pertencentes à coleção do Museu. Por esse motivo, a coleção
vem sendo constituída basicamente a partir de doações, o que não lhe permite ter
uma característica una. É uma coleção sem um perfil claro, principalmente quanto à
um perfil claro para o mesmo, tornam esta pesquisa mais instigante e desafiadora, já
que discutir um acervo público, e ainda mais universitário, traz em si questões não
Desde sua criação em 1963, sob a direção de Walter Zanini, o MAC-USP busca
da Bienal de São Paulo, que mesmo após ter se tornado uma instituição
independente ainda doou várias obras à coleção do MAC, e ainda com prêmios-
nessa fase de sua história. Nas várias gestões posteriores, outras questões foram
que se caracterizam como Instalações, seja por seu diálogo com o espaço, pelas
contemporâneas, são compostas por doações feitas por artistas ou instituições, por
isso elas não formam uma coleção com características claras. A falta de identidade,
que o curador e a montagem têm na fruição da obra de arte como um todo e na arte
contemporânea em especial.
81
ACERVO DO MAC-USP
que as Instalações que fazem parte do acervo do MAC-USP têm, em sua maioria,
características inusitadas que fazem com que elas possam migrar de uma rotulação
analisadas. Este talvez tenha sido o maior aprendizado em relação à pesquisa, que
montagem da exposição.
Desta forma, a análise aqui proposta em relação às Instalações que fazem parte
Esta seleção de obras abriga um universo bastante variado, do qual fazem parte
Pode-se dizer, que a fruição que se dá perante toda obra de arte é única e
obra não existe, ela é concluída através do tempo e do espaço que o mesmo ocupa.
fossem vitais à sua própria existência, assim como aquele personagem que a
vivencia.
É dentro desta questão que a forma de expor a obra / Instalação é crucial para
definir sua própria essência. De fato, ao ser feita para ser vivenciada, penetrada e
Instalação e Instalação
de objetos que por sua fragilidade conceitual e portanto maior polivalência, migram
Pertencente à geração do final dos anos 1980, Lia Menna Barreto (1959 - )
manipulação irresistível.
todo.
Figura 9 – Lassie, 1991. 59 x 200 x 42 cm. Madeira, metal e espuma revestida de tecido.
Doação da artista.
com a pintura, sendo que a partir de 1968 a artista passa a utilizar suportes diversos
em seus trabalhos, tais como ripas e bambus, bobinas de madeira para cabos
a criar não mais pinturas, mas sim objetos pictóricos e conjuntos de objetos até
chegar às Instalações. O interesse, que até o momento era por cores e formas,
através dessa nova poética que a artista expressa suas origens e a origem de seu
povo de forma vibrante e colorida. Sua obra, no início da década de 1970, é dotada
mesma provoca. É através das cores que temos as raízes populares e uma
89
da artista. Feita como que de um fragmento de tela, esta Instalação de Ione, nos
Artista que também lida com a questão do objeto, o qual ao ser apresentado
uma Instalação, Alex Vallauri (1949 – 1987) em suas obras do acervo do MAC-USP
São Paulo e um dos mais importantes grafiteiros do Brasil. Seus grafites brincam
seus trabalhos em galeria de arte, ele leva o mundo de seus muros e a questão da
Figura 11 – Sem Título, 1985 Figura 12 – Sem Título, 1985 Figura 13 – Sem Título, 1985
144,5 x 77 x 65 cm. 18 x 126 x 60 cm. 82 x 80 x 60 cm.
Spray sobre geladeira. Spray sobre pia. Spray sobre fogão.
Doação Fund. Bienal de SP Doação Fund. Bienal de SP Doação Luiz N. C. Loureiro
simultaneamente.
O ambiente, forma de fazer artístico tão explorada desde a pop art, aparece na
Horizonte, em 1957, que por sua própria formação (arquiteta formada pela
Nesta obra a artista trabalha com objetos discretos e sutis, que perpassam não
de beleza efêmera que surge da essência de rosas, que por ser perfume é
tempo, atravessam portanto sua poética, através de uma obra singela que atinge
presente neste trabalho, que compõe um mundo quase secreto, onde as questões
ambiente quando ao lado de outras obras, exposta como um display, como uma
simples fato de expor uma obra em uma sala determinada apenas para ela, não a
veremos a seguir.
todo da obra com seu espaço circundante. Ela permite o caminhar do espectador-
experimentador entre seus elementos, bem como este faz os totens produzirem
93
apresentam, criam uma relação intrínseca entre elas, onde a fragilidade aparente
das partes contrasta com a rigidez e a matéria do todo. O espaço é definido através
A questão entre matéria, peso e leveza, assim como cheios e vazios, também é
sempre uma relação entre os objetos, tendo como principal poética artística a
Instalação.
luz e sombra. Diferente de Benetton não se pode passear pela obra de Peláez.
O jogo de cheios e vazios, que permitem jogos de luz e sombra, faz com que
Chuva, uma obra onde apesar da questão espacial e de suas determinação quanto
Figura 16 – Chuva, 2001. 230 x 1000 x 400 cm. Ferro, madeira, bronze, alumínio e resina epóxica.
Doação do artista.
A fragilidade que emana desta obra contrasta com a dureza de seu material.
Criando uma leveza de difícil explicação, arrebatada pela luz e pelas sombras, pelos
espaços negativos que surgem da densidade da obra, que sobre sua superfície
rígida, é repleta de vazios que expressam o silêncio absoluto que ela apresenta.
Artista nascido em São Paulo, em 1959, Marcelo Cipis inicia-se nas artes
plásticas em 1968, ao cursar o ateliê livre de criação, coordenado por Naum Alves
tridimensionais, como é o caso de Cipis Transworld Art Industry & Commerce, obra
do MAC.
96
outros suportes, como no caso da obra que faz parte do acervo do museu. Neste
ambiente, que se apropria do espaço, através das cortinas coloridas que criam um
externo, brincando, de certa forma, com aquilo que é visível e o não visível. Onde o
Cipis cria uma obra divertida, com cores fortes que direcionam o olhar e
comércio, criando assim uma alusão à obra como arte x comércio de arte. O viés
crítico está presente na obra deste artista paulista, que com sua formação de
aqueles que definem que sua obra, por sua contextualização espacial, e, por sua
É este o caso que nos apresenta Carlos Alberto Fajardo (1941 - ), em sua obra
Sem Título, de 1988, do acervo do MAC. Um dos mais importantes artistas da arte
Assim como outros artistas aqui citados, Fajardo também estudou arquitetura,
talvez uma coincidência, no entanto todos eles têm na pesquisa do espaço uma
Fajardo sempre buscou novos materiais como suporte de seu trabalho, sua
Esta obra, que faz parte do acervo do MAC, é parte de um conjunto de obras
apresentado pelo artista na Galeria Raquel Arnaud, em São Paulo, em 1989, onde
ele questiona o espaço entre as coisas, bem como a relação das partes dentro de
um todo, tecendo uma ligação entre as mesmas, delas com o ambiente onde são
Fajardo.
18
Frase do artista segundo texto sobre o mesmo de Ana Cláudia Salvato Pelegrini e Daisy Peccinini no Projeto
“Arte do Século XX e XXI – visitando o MAC USP na Web” no site do MAC-USP.
99
por suas relações com o todo e por definição do artista, se caracteriza como um
Assim como Fajardo, a artista Carmela Gross (1946 - ), também lida em sua arte
com a questão do olhar diferenciado em relação a sua obra. Ela busca, de certa
forma, um diálogo entre olho e imagem, criando assim uma passagem para novos
tem mestrado e doutorado pela mesma instituição, com pesquisas sobre novas
poéticas artísticas.
intervir no real, usando sua arte como caminho para uma nova sensibilidade visual ,
Carmela apresenta novos conceitos, através dos quais cria processos visuais
olhar, através do vazio, do que está presente, mas também daquilo que não é
Figura 19 – Sem Título, 1992. 320 x 360 x 540 cm. Alumínio, cera, parafina, tecido e madeira.
Doação da artista.
através dos objetos múltiplos apresentados pela artista, como que dispostos em uma
olhar, através de um fio condutor delicado que é imperceptível a primeira vista, mas
Este trabalho, assim como o de Fajardo, também se caracteriza por ser um objeto-
101
instalação, sendo, mais claramente uma Instalação quanto a sua relação com o
direcionador deste olhar que perpassa não só a forma, como a essência da obra,
forma clara nas obras de Cildo Meireles (1948 - ) que fazem parte do acervo do
MAC.
Mário Cravo a expor seus desenhos no Museu de Arte Moderna da Bahia, desistindo
crítico. Ele via na arte, nos anos de chumbo da ditadura, uma forma de
reprodução dessa peça é livre e aberta a toda e qualquer pessoa”, mostrando assim
trazendo sempre forte traço conceitual. A questão do objeto se torna uma constante
obra.
Nas duas obras que fazem parte do acervo do MAC, encontramos um misto de
Parla, obra adquirida pelo Museu, faz parte de um conjunto de seis trabalhos
em frente à cadeira, como que para dialogar com o outro que está efetivamente
Pensador.
103
instâncias se colocam nesta obra de Cildo. Além da referência a Rodin, o artista faz
ainda referência a Michelangelo que em frente a uma de suas obras que de tão
assim da obra, que em seu conceito, nos leva a questões referentes à vida, além da
Cildo Meireles nos apresenta aqui, a partir de uma obra singela, questões que
vão além da forma, partindo de uma obra de forte conceitualismo. Neste caso, ao
suas relações intrínsecas com as partes nos revela o todo. A variedade de materiais,
própria vida. Ele prioriza a arte que permita a experimentação formal e uma
Assim como Cildo Meireles, Fabiana de Barros (1957 - ) também utiliza uma
Nascida em São Paulo em 1957, Fabiana cursou Artes Plásticas na FAAP, entre
Sua obra Life Vests, do acervo do MAC-USP, consiste em uma Instalação, feita a
partir de objetos variados que ligam uns aos outros formando um todo em seu
conjunto.
experimentador, o qual surge como elemento final em boa parte de suas obras. Em
Life Vests, a questão do espaço é trabalhada com grande liberdade tanto pela artista
como por aqueles que montam a exposição, já que o espaço não é determinado à
Essa liberdade permitida pela artista, denota uma posição de total conforto
contemporâneo.
conhecido, com o asséptico do branco, que nos repele, nos bloqueia e nos faz
aquele que repele, são postas aqui pela artista, que solicita ainda, uma posição do
espectador-fruidor em relação à sua obra. Além disso as várias partes que compõe o
todo da obra apresentam, de certa forma, uma narrativa não muito clara da própria
O espaço que se determina aqui de forma tão clara, se contrapõe ao tempo, que
a cama, o espaço enfim, esta não é uma obra acolhedora ou singela, e sim, uma
convidando e ao mesmo tempo repelindo, num jogo sutil e muito bem elaborado,
107
da própria obra.
do material utilizado pela condição não usual dado ao mesmo dentro do propósito
como neve, areia, troncos e até mesmo a água, que depois de passar por suas
origens com utopias ideológicas futuristas que estão além do controle da mão
simples, frias e fortes ao mesmo tempo. A busca aqui, vem de uma universalidade
que traz em si a vivência do próprio artista, nascido no Japão, antes das bombas
harmonia com as inscrições textuais colocadas pelo artista de forma impessoal, que
Cada vez que esta obra é exposta, em cada novo ambiente em que é
Shimotani se faz clara, seja pela mutabilidade, pela forte adaptação a novos
espaços, ou ainda pelas múltiplas leituras que a mesma possibilita a cada nova
Grande do Sul – PUC-RS, estudou ainda com Iberê Camargo, com Francisco
Stockinger e com Marcelo Grassmann. Em 1973, após morar quatro anos em Porto
obras que chamou de “Laberintos”; muda-se para São Paulo, onde ao lado de Julio
formal em sua obra, e em 1984 defende sua tese de doutorado com Simulacros,
linguagem artística. Nos anos 90, recebe várias bolsas de estudo, o que faz com que
fique entre Nova Iorque, Alberta no Canadá e em Umbertide na Itália até o ano de
1995.
111
projetadas, como sombras fictícias que inauguram novos mundos, Regina Silveira
A obra "The Saint's Paradox" explora os significados que podem derivar das diferenças entre
uma pequena imagem religiosa, feita de madeira, e uma sombra grande e distorcida,
correspondendo não ao próprio santo, mas a um monumento eqüestre militar.
A imagem religiosa, proveniente da coleção do El Museo del Barrio, em Nova York, representa
o apóstolo São Tiago, o patrono militar da Espanha. Ele inspirou a guarda espanhola em
batalhas para expulsar os Mouros, e também foi celebrado como o patrono militar no Novo
Mundo, durante a Era dos Descobrimentos, com a chegada dos conquistadores. São Tiago
cavalga em um cavalo branco e teria uma espada (hoje perdida) em sua mão direita.
O monumento é uma grandiosa escultura em bronze, feita na década de 40, pelo escultor
Victor Brecheret, e está localizada na Praça Princesa Isabel, em São Paulo. O monumento
representa o patrono das Forças Armadas Brasileiras, Duque de Caxias, o general que
comandou a controvertida e devastadora guerra, que reuniu Brasil, Uruguai e Argentina contra
o Paraguai, durante a segunda metade do século XIX.
A diferença entre o objeto e a sombra, proposta como um paradoxo visual e conceitual, é um
comentário sobre a história e a tradição. Ao justapor o São Tiago de madeira e o general,
pretendi construir uma síntese das relações e afinidades entre religião, militarismo e poder,
que, historicamente, apoiaram lutas pela dominação da América Latina.
As distorções de perspectiva que agigantam a sombra em "The Saint's Paradox", são meus
principais instrumentos para enfatizar estes significados visuais. Elas revelam o general com a
espada como o diabólico e sombrio "outro" do santo de madeira.19
19
Depoimento da artista, retirado do site oficial da artista: www2.uol.com.br/reginasilveira.
112
O Paradoxo do Santo é uma obra que permite várias formas de montagem. Foi
montada pela primeira vez no Museo Del Barrio, em Nova Iorque, em 1994, com a
sombra pintada em tinta preta; ao ser doada ao MAC, a sombra foi substituída por
Esta obra de Regina Silveira perpassa pela questão formal, suas sombras são
de percepção visual, de forma quase sensorial. A obra faz uma analogia entre a
o mal, e porque não levando esse jogo ao espectador-experimentador que liga o real
x o imaginário.
permanência, sua dualidade, sua necessidade de diálogo com o outro, para existir
As Instalações que fazem parte do acervo do MAC-USP, têm como visto acima,
suporte artístico.
intelectual, que assim como a própria Instalação não permanece, mas se torna
documentos.
114
A Instalação como obra de acervo traz grandes problemas práticos, mas como
linguagem artística e como suporte para questionamentos e debates nos traz a base
para soluções, sejam formais, sejam conceituais, e até mesmo em sua fruição final,
existenciais.
115
para a exibição da arte. Com isso, o curador se coloca, de certa forma, como co-
século XX, em especial nos anos 90, trazendo consigo um sem número de adeptos
Nasce uma nova estética da exposição, em cuja construção o curador assume um papel que
vai muito além da reunião de um conjunto de telas, esculturas, objetos ou instalações. O
curador concebe a exposição como um projeto crítico que é partilhado com o artista
(obviamente, se ele estiver vivo). Esse projeto pode tomar forma, mediante uma “cenografia”
pensada por um especialista em montagem de mostras, que pode ser tanto um técnico de
museu, um arquiteto ou um cenógrafo da área teatral quanto o próprio curador. (GONÇALVES,
L., 2004, p. 41).
espectador fará sua interação com a obra, ele se torna responsável por esta relação,
criando assim uma nova realidade na qual a obra será, de certa forma,
20
Definição feita por Lisbeth Rebollo Gonçalves em seu livro: Entre Cenografias – O Museu e a Exposição de
Arte no século XX.
116
intenção da curadoria.
como a obra é montada, a qual pode modificar efetivamente sua expressividade, sua
experimentação da Instalação para expor a arte e criar uma relação com o outro.
Ao criar mundos novos para expor a arte, o curador está, de certa maneira,
A questão mais problemática não está nas duas correntes, paredes brancas / o
Tanto a exposição de paredes brancas, dita neutra, fria, quanto a que cria um
ambiente específico para passar sua mensagem, advém de uma escolha e desta
escolha vem a maneira como o curador quer mostrar as obras que escolheu para
quanto à sua fruição plena. Ela foi exibida na XXV Bienal de São Paulo, em 2002,
exclusivamente para ela, a obra perdeu sua força. Não cabe aqui a crítica à forma
diferentes formas, já que por sua própria natureza a Instalação permite essa
de expor a obra neste caso, não estava na diferença entre paredes brancas e
mutação constante, no entanto o que se coloca, não é uma crítica e sim uma
com o outro e ainda, em alguns casos a própria essência da obra. Isso também
ocorre com O Paradoxo do Santo, de Regina Silveira, a maneira como este trabalho
é apresentado / montado, já que ele permite certa liberdade em sua montagem, faz
com que o impacto do mesmo e sua dualidade, bem x mal, sacro x profano, real x
a obra dependendo da forma como a mesma é exposta. Isso faz parte da vivência
A Instalação inaugura mundos novos a cada nova recriação, sim, porque ela é,
de fato, recriada em cada nova montagem, em cada novo local, em um novo tempo.
eterna...
119
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS:
século XXI
A Instalação segundo seus princípios básicos é uma obra sem limites, ela
permite qualquer tipo de suporte em sua produção, já que mais que um suporte, ela
é uma poética, uma verdade em si, que permite a criação plena de mundos
múltiplos, verdadeiros em sua própria essência, mesmo que imaginários e/ou virtuais
em sua concepção.
de um diálogo com o meio urbano, assim como com os meios naturais e virtuais se
meio urbano, no meio natural ou mesmo no virtual, que são re-escritas a partir de
A Instalação se coloca como mais que um suporte, uma poética, que pode ser
sendo sempre re-criável, seja pelo artista, pelo curador, ou pela própria interação
com o espectador.
nos conecta com nossa memória afetiva, e nos faz vivenciar a obra de forma plena.
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