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ESCRAVIDÃO CONTEMPORÂNEA NO GARIMPO: APLICAÇÃO DE MÉTODOS

MISTOS NA ANÁLISE DE RELATÓRIOS DE FISCALIZAÇÃO

Emerson Victor Hugo Costa de Sá


Doutorando em Direito na Universidade Federal do Pará (UFPA).
Mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
Auditor Fiscal do Trabalho. Professor de Direito e Processo do Trabalho.
emersonvictor.sa@gmail.com

Luly Rodrigues da Cunha Fischer


Doutora em Direito pela UFPA e Universidade de Paris XIII em regime de cotutela.
Professora da Graduação e Pós-Graduação do Instituto de Ciências Jurídicas – ICJ/UFPA.
Advogada, membro do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico
e do Instituto Histórico e Geográfico do Pará.
lulyfischer@yahoo.com

CATEGORIA: COMUNICAÇÃO ORAL.


GRUPO DE TRABALHO: GT 28 - DIREITO, ECONOMIA E SOCIEDADE.

RESUMO
O trabalho escravo, na contemporaneidade, não se prende mais à restrição de liberdade de locomoção,
pois alcança as violações de direitos que agridem a dignidade humana do trabalhador. Trata-se de
uma realidade observada nas atividades econômicas. É preciso, então, compreender as nuances e a
configuração do fenômeno em cada contexto, e avaliar como os setores privado e público contribuem
para a continuidade ou a cessação da prática. O presente estudo objetiva identificar as peculiaridades
da dinâmica de exploração do trabalho escravo no garimpo, o que se faz por meio de indicadores da
escravidão contemporânea no Brasil, a partir dos resultados de fiscalizações, perfil das vítimas e
infrações mais recorrentes. A pesquisa utiliza o método misto de análise, do tipo convergente, que
abrange as visões quantitativa (estudos estatísticos sobre o perfil das fiscalizações, das vítimas e das
infrações) e a qualitativa (revisão de literatura e mapeamento do contexto narrado nos relatórios de
fiscalização, por meio da teoria fundamentada nos dados), e as informações são coletadas, analisadas
e interpretadas concomitantemente, de modo comparativo e complementar. Sistematiza-se as
informações constantes nos relatórios das fiscalizações realizadas de 1995 a 2019, pelas equipes da
Inspeção do Trabalho, em que houve a constatação de 161 pessoas na condição de escravidão
contemporânea no garimpo. A pesquisa possui abordagem descritiva e retrospectiva e contempla,
primeiramente, o levantamento bibliográfico, fase em que há o estudo da atividade garimpeira à luz
do Direito Minerário, Ambiental e Trabalhista. Em seguida, promove-se a análise documental de
relatórios e a sistematização dos resultados em planilhas, para análise estatística descritiva. Os dados
coletados são interpretados e discutidos, com o fim de identificar o perfil do trabalho escravo
contemporâneo no garimpo. O estudo promove o enfoque na configuração da escravidão moderna
em garimpo no município paraense de Jacareacanga, localidade em que houve a maior quantidade de
trabalhadores resgatados do trabalho escravo e uma situação de reincidência que apresenta estratégias
de mascaramento, com a pretensão de conferir ares de legalidade a um contexto que, na prática, revela
contornos de violação de normas minerárias, trabalhistas e ambientais.
Palavras-chave: Direito do Trabalho; Direito Minerário; Direito Ambiental; Trabalho escravo
contemporâneo; Garimpo.
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1 INTRODUÇÃO

O advento capitalismo industrial demandou textos legais proibitivos do tráfico de escravos e


o processo de alforria, em razão de interesses notadamente econômicos, somados à pressão interna
do movimento abolicionista1. Não obstante a escravidão legalizada tenha sido encerrada com a
assinatura da Lei Áurea, as práticas de escravização continuaram sendo uma realidade do Estado
brasileiro, agora sem o respaldo normativo, conformando o que atualmente se considera como
trabalho análogo ao de escravo, trabalho escravo moderno ou contemporâneo, ou, ainda
neoescravidão. O conceito não se prende mais à restrição de liberdade de locomoção, pura e simples,
mas alcança as violações de direitos que agridem a própria dignidade humana da pessoa trabalhadora.

Trata-se de uma realidade observada em diferentes contextos e atividades econômicas. Em


muitos casos, a relação de escravização localiza-se no início de uma cadeia produtiva e perpassa por
uma série de contratações formais e informais, até chegar no fim da cadeia de valor, aos grandes
demandantes, que comercializam produtos em larga escala. Logo, o mesmo capitalismo que
demandou o encerramento de relações escravocratas, para a formação de um mercado consumidor,
agora possui cadeias produtivas constituídas a partir de relações laborais de base que são aviltantes à
dignidade humana, elos que se mantêm em um contexto de exploração do trabalho escravo.

É preciso, pois, compreender as nuances e estudar a configuração do fenômeno em cada


atividade econômica, para que se possa avaliar de que modo os setores privado e público contribuem
para a continuidade ou a cessação de tais práticas. Nesse sentido, considerando a atualidade da
discussão, o presente estudo objetiva identificar as peculiaridades da dinâmica de exploração do
trabalho escravo no garimpo. Para tanto, apresenta-se os indicadores do trabalho escravo
contemporâneo no Brasil, relativamente ao perfil das fiscalizações, das vítimas e das infrações.

É nesse sentido que o estudo promove o enfoque na configuração da escravidão moderna em


garimpo no município de Jacareacanga, PA. Trata-se de localidade da Região Amazônica em que
houve a maior quantidade de trabalhadores resgatados do trabalho escravo e uma situação de
reincidência que apresenta estratégias de mascaramento, com a pretensão de conferir ares de
legalidade a um contexto que, na prática, revela contornos de violação de normas minerárias,
trabalhistas e ambientais. Esses motivos justificam o interesse na descrição do fenômeno a partir
desse caso, para que se possa ter elementos de comparação com os demais, em um estudo ampliado.

1 Em nosso país, a abolição ocorreu em fases. De início, houve a política de aprisionamento de navios negreiros (1845),
que resultou na Lei n. 581 de 1850 (Lei Eusébio de Queirós), proibitiva da importação de escravos, e na Lei n. 2.040 de
1871 (Lei do Ventre Livre), que concedeu liberdade para os filhos de escravos nascidos a partir de então, permanecendo
sob a tutela dos senhores até a maioridade. Depois de investidas de movimentos abolicionistas, houve a edição da Lei
Imperial n. 3.353 de 1888 (Lei Áurea), que instituiu a vedação formal da escravidão (TREVISAM, 2015).
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Utiliza-se o método misto de análise, do tipo convergente (CRESWELL, 2021; IGREJA,
2017). Associa-se a visão quantitativa (estudos estatísticos sobre o perfil das fiscalizações, das vítimas
e das infrações) e a qualitativa (revisão de literatura e mapeamento do contexto narrado nos relatórios
de fiscalização, por meio da teoria fundamentada nos dados). As informações são coletadas,
analisadas e interpretadas concomitantemente, de modo comparativo e complementar.

Nesta pesquisa empírica, emprega-se, ainda, a teoria fundamentada nos dados, de Glaser e
Strauss, que propõe a “explicação da realidade social mediante a construção de teorias indutivas,
baseadas na análise sistemática dos dados” (GIL, 2021, p. 65). Desse modo, sistematiza-se as
informações constantes nos relatórios das 31 fiscalizações realizadas de 2008 a 2020, pelas equipes
da Inspeção do Trabalho do Brasil, em que houve a constatação de 333 pessoas na condição de
escravidão contemporânea na atividade garimpeira (OBSERVATÓRIO DA MINERAÇÃO, 2021).
Nesse ponto, registra-se que, durante a pesquisa, não se chegou ao mesmo quantitativo mencionado
na reportagem, pois ainda não se teve acesso à integralidade dos relatórios das ações de 2020. Por
essa razão, a análise restringiu-se ao período de 1995 a 2019, em que ocorreram 161 resgates.

A pesquisa possui abordagem descritiva e retrospectiva e abrange, primeiramente, o


levantamento bibliográfico. Essa fase contempla o estudo da atividade garimpeira e da regulação
jurídica à luz do Direito Minerário, Ambiental e Trabalhista. Sendo assim, a análise ampara-se na
concepção normativa de trabalho escravo, do artigo 149 do Código Penal (BRASIL, 1940), conforme
a redação da Lei 10.803 (BRASIL, 2003). Também é importante a compreensão do Direito Minerário
(MORAES, 2003; BARBOSA, 2003; CARVALHO, 2003), do Estatuto do Garimpeiro (BRASIL,
2008) e das noções de trabalho decente (OIT, 2015) e meio ambiente laboral (MARANHÃO, 2016).

Em seguida, promove-se a análise documental de relatórios de fiscalização e a sistematização


dos resultados em planilhas, para análise estatística descritiva, por meio do aplicativo Statistical
Package for the Social Sciences – SPSS, e posterior exposição em tabelas e gráficos. Realiza-se,
então, a interpretação e discussão dos dados coletados, com o fim de identificar o perfil do trabalho
escravo contemporâneo no garimpo.

O estudo enfoca, ainda, ocorrências recentes em uma localidade em particular. Trata-se do


município paraense de Jacareacanga, cuja escolha decorre da reunião de alguns pontos de interesse.
Isso porque consiste na localidade em que houve a maior quantidade de trabalhadores resgatados do
trabalho escravo, além de ter sido constatada uma situação de reincidência e de reunião de estratégias
de mascaramento da atividade, com a pretensão de conferir ares de legalidade a um contexto que, na
prática, revela variados contornos de violação de normas minerárias, trabalhistas e ambientais.
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Portanto, as conclusões da pesquisa decorrem da descrição analítica do fenômeno, da
mensuração dos principais aspectos da escravidão no garimpo e da interpretação dos fatores e
características preponderantemente destacados e registrados pelas equipes de fiscalização.

2 DIREITO MINERÁRIO E TRABALHO NO GARIMPO

Esta seção presta-se à exposição das características do trabalho no garimpo. Com efeito, a
identificação, extração, beneficiamento e comercialização do minério demanda o trabalho humano.
Nas fases iniciais da cadeia de valor, encontra-se o labor modo autônomo e individual; coletivo ou
cooperada; ou, ainda, nos moldes de uma relação de natureza empregatícia. Portanto, mostra-se
relevante o interesse pela manutenção e respeito às diretrizes do trabalho decente e de proteção ao
meio ambiente laboral. Antes, porém, é necessária a compreensão de conceitos atinentes ao Direito
Minerário e da atividade garimpeira, propriamente dita.

Quanto ao Direito Minerário, é importante compreender, especialmente, as noções de


mineração, garimpo e permissão de lavra garimpeira. Desse modo, ao tratar da diferença entre
recurso, reserva e riqueza, Moraes (2003, p. 43) aponta que, antes da realização da pesquisa, “a
reserva mineral não tem conteúdo suficiente para aproveitamento, não existindo economicamente".
Desse modo, apenas depois da extração da substância mineral útil e do respectivo beneficiamento que
estará conformada a riqueza, a qual, posta em circulação, atingirá o fim social devido, na medida em
que servirá ao atendimento das necessidades e conveniências humanas.

Com relação ao domínio do subsolo, Barbosa (2003, p. 74-76) lista como principais sistemas
legais adotados para a regência da exploração mineral ao longo da história os seguintes: fundiário
(propriedade do subsolo como decorrência da titularidade do solo); regalista (transferência do bem
para o particular, condicionada ao pagamento de uma taxa denominada regalia); dominial (subsolo
considerado como res publica, pertencente à nação); e industrial (associado ao surgimento do
liberalismo, considera as jazidas minerais como res nullius, garantindo-se o direito de exploração a
quem primeiro descobrir ou revelar sua existência). Na atualidade, o autor destaca que a busca do
lucro é própria da atividade econômica, razão pela qual “a política do Estado moderno é no sentido
de deixar tal atividade à iniciativa privada” (BARBOSA, 2003, p. 82).

Ainda conforme Barbosa (2003, p. 86), “a concessão minerária confere um direito exclusivo
e excludente à exploração integral de uma jazida, de acordo com as normas legais estabelecidas,
transmitindo ao respectivo titular um complexo de direitos e obrigações”. No entanto, não se trata de
transferência da propriedade, mas de um direito real de exploração. Assim, o Estado mantém a
titularidade do domínio sobre os recursos minerais, ainda que outorgue ao concessionário o direito de
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explorá-los. De qualquer modo, os trabalhos de pesquisa e de lavra precisam ser desenvolvidos em
conformidade com as condições previstas em lei.

Com efeito, o texto constitucional prevê que são bens da União os recursos minerais, inclusive
os do subsolo (artigo 20, inciso IX). Além disso, assegura-se, nos termos da lei, à União, aos Estados,
ao Distrito Federal e aos Municípios a participação no resultado da exploração de petróleo ou gás
natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no
respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou
compensação financeira por essa exploração (artigo 20, § 1º). Na sequência, o artigo 21, inciso XXV,
estabelece a competência da União para estabelecer as áreas e as condições para o exercício da
atividade de garimpagem, em forma associativa.

Compete privativamente à União legislar sobre jazidas, minas, outros recursos minerais e
metalurgia (artigo 22, inciso XII). Ademais, é competência comum da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e
exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios (artigo 23, inciso XI). Por fim, é da
competência exclusiva do Congresso Nacional autorizar, em terras indígenas, a exploração e o
aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais (artigo 49, inciso XVI).

No mesmo sentido, tem-se que as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os
potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração
ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da
lavra (artigo 176). Além disso, a pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento de tais
potenciais somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse
nacional, por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e
administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas
atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas (artigo 176, § 1º). Assegura-
se, porém, a participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, a autorização de pesquisa
será por prazo determinado, e as autorizações e concessões não poderão ser cedidas ou transferidas,
total ou parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente (artigo 176, §§ 2º e 3º). Enfim, não
dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento do potencial de energia renovável de
capacidade reduzida (artigo 176, § 4º).

Com efeito, o artigo 174 da Constituição de 1988 prevê que o Estado, como agente normativo
e regulador da atividade econômica, exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. Desse
modo, a lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional
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equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento;
apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo; o Estado favorecerá a
organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente
e a promoção econômico-social dos garimpeiros; e tais cooperativas terão prioridade na autorização
ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas onde
estejam atuando, e naquelas fixadas em conformidade com o artigo 21, inciso XXV, na forma da lei.

Ainda no campo constitucional, é importante considerar que aquele que explorar recursos
minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida
pelo órgão público competente, na forma da lei (artigo 225, § 2º). Nesse sentido, com relação à
garimpagem de ouro, “por ser a mais comum e extensa, traz também um problema ainda não
resolvido, de contaminação por mercúrio, que preocupa órgãos internacionais de saúde e proteção ao
meio ambiente" (CARVALHO, 2003, p. 129).

Ademais, o aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a


pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização
do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas. De qualquer modo, é assegurada
participação nos resultados da lavra, na forma da lei; e tais terras são inalienáveis e indisponíveis, e
os direitos sobre elas, imprescritíveis (artigo 231, §§ 3º e 4º).

O ADCT ainda prevê que, na data da promulgação da lei que disciplinar a pesquisa e a lavra
de recursos e jazidas minerais, ou no prazo de um ano, a contar da promulgação da Constituição,
tornar-se-ão sem efeito as autorizações, concessões e demais títulos atributivos de direitos minerários,
caso os trabalhos de pesquisa ou de lavra não tenham sido comprovadamente iniciados nos prazos
legais ou estejam inativos (artigo 43) e que as empresas brasileiras titulares de autorização de
pesquisa, concessão de lavra de recursos minerais e de aproveitamento dos potenciais de energia
hidráulica em vigor teriam quatro anos, a partir da promulgação da Constituição, para cumprir os
requisitos do artigo 176, § 1º (artigo 44).

No que concerne especificamente à permissão de lavra garimpeira, Carvalho (2003, p. 115)


refere os anos 1980 como o auge da garimpagem no Brasil, período em que se observou uma

fase de intensa e ambiciosa exploração garimpeira, principalmente de ouro e


cassiterita na Amazônia, onde, além das regiões dos rios Tapajós e Madeira, Serra
Pelada foi o foco mais notório com um enorme contingente de garimpeiros
trabalhando em condições sub-humanas, cujas imagens fotográficas e
cinematográficas correram o mundo, num exemplo de trabalho primitivo, lembrando
os escravos dos tempos antigos na realização de obras faraônicas.
O autor manifesta, ainda, que o número de garimpeiros no país nunca foi precisamente
conhecido, mas afirma ser da ordem de 400 a 600 mil, e, no auge, de 1 milhão (CARVALHO, 2003,
7
p. 115). Na sequência, trata das características da permissão de lavra garimpeira, em conformidade
com a Lei n. 7.805/1989, que altera o Decreto-Lei n. 227/1967 (Código de Mineração), cria o regime
de permissão de lavra garimpeira e extingue o regime de matrícula.

Desse modo, considera-se como regime de permissão de lavra garimpeira o aproveitamento


imediato de jazimento mineral que, por sua natureza, dimensão, localização e utilização econômica,
possa ser lavrado, independentemente de prévios trabalhos de pesquisa, segundo critérios fixados
pelo Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM (artigo 1º). Em seguida, a norma prevê
que a permissão de lavra garimpeira em área urbana depende de assentimento da autoridade
administrativa local, no município de situação do jazimento mineral (artigo 2º) e que a outorga
depende de prévio licenciamento ambiental concedido pelo órgão ambiental competente (artigo 3º).
A permissão vigora por cinco anos, podendo ser renovada pelo DNPM (artigo 5º, inciso I). Caso
ocorra em área privada, depende da autorização do proprietário (artigo 74 do Código de Mineração).

Além disso, o não-cumprimento das obrigações do permissionário2 sujeita o infrator às


sanções de advertência e multa (artigo 63, incisos I e II, do Código de Mineração) e de cancelamento
da permissão (artigo 9º, § 1º, da Lei n. 7.805/1989). A concessão de lavra em área objeto de permissão
de lavra garimpeira será admitida, a critério do DNPM, com autorização do titular, quando houver
viabilidade técnica e econômica no aproveitamento por ambos os regimes (artigo 8º).

A lei também expressa o que se entende por garimpagem. Trata-se da atividade de


aproveitamento de substâncias minerais garimpáveis, executadas no interior de áreas estabelecidas
para este fim, exercida por brasileiro, cooperativa de garimpeiros, autorizada a funcionar como
empresa de mineração, sob o regime de permissão de lavra garimpeira (artigo 10)3. Sendo assim, a
norma considera como garimpo, genericamente, o local em que ocorre a extração de minerais
garimpáveis, assim compreendidos os seguintes: ouro, diamante, cassiterita, columbita, tantalita e

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Lei n. 7.805/1989. Art. 9º São deveres do permissionário de lavra garimpeira: I - iniciar os trabalhos de extração no
prazo de 90 (noventa) dias, contado da data da publicação do título no Diário Oficial da União, salvo motivo justificado;
II - extrair somente as substâncias minerais indicadas no título; III - comunicar imediatamente ao Departamento Nacional
de Produção Mineral - DNPM a ocorrência de qualquer outra substância mineral não incluída no título, sobre a qual, nos
casos de substâncias e jazimentos garimpáveis, o titular terá direito a aditamento ao título permissionado; IV - executar
os trabalhos de mineração com observância das normas técnicas e regulamentares, baixadas pelo Departamento Nacional
de Produção Mineral - DNPM e pelo órgão ambiental competente; V - evitar o extravio das águas servidas, drenar e tratar
as que possam ocasionar danos a terceiros; VI - diligenciar no sentido de compatibilizar os trabalhos de lavra com a
proteção do meio ambiente; VII - adotar as providências exigidas pelo Poder Público; VIII - não suspender os trabalhos
de extração por prazo superior a 120 (cento e vinte) dias, salvo motivo justificado; IX - apresentar ao Departamento
Nacional de Produção Mineral - DNPM, até o dia 15 de março de cada ano, informações quantitativas da produção e
comercialização, relativas ao ano anterior; e X - responder pelos danos causados a terceiros, resultantes, direta ou
indiretamente, dos trabalhos de lavra.
3
O artigo 70 do Código de Mineração considera a garimpagem como: “O trabalho individual de quem utiliza instrumentos
rudimentares, aparelhos manuais ou máquinas simples e portáteis, na extração de pedras preciosas, semipreciosas e
minerais metálicos ou não metálicos, valiosos, em depósitos de eluvião ou aluvião, nos álveos de cursos d'água ou nas
margens reservadas, bem como nos depósitos secundários ou chapadas (grupiaras), vertentes e altos de morros, depósitos
esses genericamente denominados garimpos”.
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wolframita, nas formas aluvionar, eluvionar e coluvial; sheelita, demais gemas, rutilo, quartzo, berilo,
muscovita, espodumênio, lepidolita, feldspato, mica e outros, em tipos de ocorrência que vierem a
ser indicados, a critério do DNPM (artigo 10, §§ 1º e 2º).

O DNPM estabelecerá as áreas de garimpagem, levando em consideração a ocorrência de bem


mineral garimpável, o interesse do setor mineral e as razões de ordem social e ambiental (artigo 11).
Nas áreas estabelecidas para garimpagem, os trabalhos deverão ser realizados preferencialmente em
forma associativa, com prioridade para as cooperativas de garimpeiros, e a criação de áreas de
garimpagem fica condicionada à prévia licença do órgão ambiental competente (artigos 12 e 13).

Enfim, “as cooperativas para o exercício da lavra garimpeira devem estar constituídas e se
regularem pelas disposições que regem a matéria, em legislação própria, especificamente a Lei n.
5.674, de 16 de dezembro de 1971” (CARVALHO, 2003, p. 124). Com efeito, a mencionada lei
dispõe que celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a
contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum,
sem objetivo de lucro (artigo 3º). Prevê, ainda, que são sociedades de pessoas, com forma e natureza
jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos
associados, distinguindo-se das demais sociedades por determinadas características (artigo 4º).

Em razão da importância para a pesquisa, lista-se, na íntegra, as referidas características: 1)


Adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação
de serviços; 2) Variabilidade do capital social representado por quotas-partes; 3) Limitação do
número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o estabelecimento de
critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais;
4) Incessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade; 5) Singularidade de
voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas, com exceção das
que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade; 6) Quórum para o
funcionamento e deliberação da Assembleia Geral baseado no número de associados e não no capital;
7) Retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo
associado, salvo deliberação em contrário da Assembleia Geral; 8) Indivisibilidade dos fundos de
Reserva e de Assistência Técnica Educacional e Social; 9) Neutralidade política e indiscriminação
religiosa, racial e social; 10) Prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos estatutos,
aos empregados da cooperativa; e 11) Área de admissão de associados limitada às possibilidades de
reunião, controle, operações e prestação de serviços.

A Lei n. 11.685, de 2 de junho de 2008, institui o Estatuto do Garimpeiro, com o fim de


disciplinar os direitos e deveres assegurados a tais trabalhadores. A norma considera como garimpeiro
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toda pessoa física de nacionalidade brasileira que, individualmente ou em forma associativa, atue
diretamente no processo da extração de substâncias minerais garimpáveis (artigo 2º, inciso I). Por sua
vez, entende como garimpo a localidade onde é desenvolvida a atividade de extração de substâncias
minerais garimpáveis, com aproveitamento imediato do jazimento mineral, que, por sua natureza,
dimensão, localização e utilização econômica, possam ser lavradas, independentemente de prévios
trabalhos de pesquisa, segundo critérios técnicos do DNPM (artigo 2º, inciso II). Enfim, compreende
como minerais garimpáveis os seguintes: ouro, diamante, cassiterita, columbita, tantalita, wolframita,
nas formas aluvionar, eluvional e coluvial, scheelita, demais gemas, rutilo, quartzo, berilo, muscovita,
espodumênio, lepidolita, feldspato, mica e outros, em tipos de ocorrência que vierem a ser indicados,
a critério do DNPM (artigo 2º, inciso III).

Segundo o Estatuto, o exercício da atividade de garimpagem só poderá ocorrer após a outorga


do competente título minerário, expedido nos termos do Código da Mineração, e da Lei n. 7.805/1989,
sendo o referido título indispensável para a lavra e a primeira comercialização dos minerais
garimpáveis extraídos (artigo 3º). Os garimpeiros realizarão as atividades de extração de substâncias
minerais garimpáveis sob as seguintes modalidades de trabalho: 1) Autônomo; 2) Em regime de
economia familiar; 3) Individual, com formação de relação de emprego; 4) Mediante contrato de
parceria, por instrumento particular registrado em cartório; e 5) Em cooperativa ou outra forma de
associativismo (artigo 4º). Conforme o texto constitucional (artigo 201, § 7º, inciso II), garante-se
aposentadoria em condições diferenciadas ao garimpeiro em regime de economia familiar4.

Quanto aos direitos do garimpeiro, tem-se que as cooperativas de garimpeiros gozam de


prioridade na obtenção da permissão de lavra garimpeira nas áreas nas quais estejam atuando, desde
que a ocupação tenha ocorrido em áreas consideradas livres, nos termos do Código de Mineração; em
áreas requeridas com prioridade, até a data de 20 de julho de 1989; ou em áreas onde sejam titulares
de permissão de lavra garimpeira (artigo 5º). Faculta-se ao garimpeiro associar-se a mais de uma
cooperativa que tenha atuação em áreas distintas. Ademais, assegura-se ao garimpeiro, em qualquer
das modalidades de trabalho, o direito de comercialização da produção diretamente com o
consumidor final, desde que comprove a titularidade da área de origem do minério (artigo 9º). A lei
ainda estabelece que a atividade de garimpagem será objeto de elaboração de políticas públicas
destinadas à promoção do desenvolvimento sustentável (artigo 10) e assegura o registro do exercício
da atividade de garimpagem nas carteiras expedidas pelas cooperativas de garimpeiros (artigo 11).

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Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na
forma da lei, a: [...] § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas
as seguintes condições: [...] II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher,
para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o
produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.
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Com relação aos deveres do garimpeiro, da cooperativa de garimpeiros e da pessoa que tenha
celebrado contrato de parceria com garimpeiros, em qualquer modalidade de trabalho, tem-se o dever
de recuperar as áreas degradadas por suas atividades; atender ao disposto no Código de Mineração; e
cumprir a legislação vigente em relação à segurança e à saúde no trabalho (artigo 12). Além disso, o
Estatuto veda expressamente o trabalho da pessoa com idade inferior a dezoito anos (artigo 13).

É livre a filiação do garimpeiro a associações, confederações, sindicatos, cooperativas ou


outras formas associativas, devidamente registradas, conforme legislação específica (artigo 14).
Ademais, as cooperativas, legalmente constituídas, titulares de direitos minerários deverão informar
ao DNPM, anualmente, a relação dos garimpeiros cooperados, exclusivamente para fins de registro,
sob pena de multa, a ser aplicada pelo DNPM, dobrada em caso de reincidência, e o não pagamento
ou nova ocorrência pode ensejar a caducidade do título (artigo 15).

Por fim, o garimpeiro que tenha contrato de parceria com o titular de direito minerário deverá
comprovar a regularidade de sua atividade na área titulada mediante apresentação de cópias
autenticadas do contrato e do respectivo título minerário, sem a necessidade de averbação deste
instrumento no DNPM (artigo 16). Todavia, fica o titular de direito minerário obrigado a enviar,
anualmente, ao DNPM a relação dos garimpeiros que atuam em sua área, sob a modalidade de
contrato de parceria, com as respectivas cópias desses contratos (artigo 17), obrigação cujo
descumprimento também pode resultar em multa, simples ou dobrada, e, em caso de falta de
pagamento ou de nova ocorrência, na caducidade do título.

Entende-se relevante o destaque à necessária qualidade do meio ambiente laboral, que possui
base constitucional como um aspecto do meio ambiente (artigo 200, inciso VIII), dever especialmente
violado nas relações trabalhistas que se apresentam como análogas à escravidão. Quanto ao meio
ambiente do trabalho, utiliza-se o conceito de Maranhão (2016, p. 112), que o entende como
“resultante da interação sistêmica de fatores naturais, técnicos e psicológicos ligados às condições de
trabalho, à organização do trabalho e às relações interpessoais que condiciona a segurança e a saúde
física e mental do ser humano exposto a qualquer contexto jurídico-laborativo”.

As condições de trabalho dizem respeito “à incidência dos clássicos elementos físicos,


químicos e biológicos, além das condições estruturais e de mobiliário do local de trabalho”
(MARANHÃO, 2016, p. 90). Por sua vez, a organização do trabalho relaciona-se às normas e modo
de produção, tempo e ritmo de trabalho, conteúdo das tarefas, jornada, remuneração, conhecimento e
técnicas de gerenciamento e de cobrança de resultados. Sob esse ponto de vista, “o meio ambiente
laboral está mais diretamente ligado à ideia de situação de trabalho, com ênfase na saúde psicofísica
dos trabalhadores” (MARANHÃO, 2016, p. 91). Por fim, quanto às relações interpessoais, tem-se “a
11
qualidade das interações socioprofissionais travadas no cotidiano do trabalho, em todos os níveis”
(MARANHÃO, 2016, p. 91), estando mais diretamente vinculado à noção de convivência, com
ênfase na saúde mental, e envolve questões ligadas, por exemplo, à prática da violência no trabalho.

A exploração do trabalho escravo contemporâneo distancia-se do objetivo central de garantia


do trabalho decente. Trata-se de conceito formulado pela Organização Internacional do Trabalho –
OIT que sintetiza a busca e promoção de oportunidades de “trabalho produtivo e de qualidade, em
condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas, [...] condição fundamental para a
superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática
e o desenvolvimento sustentável” (OIT, 2015). Decorre da convergência dos quatro objetivos
estratégicos da organização, quais sejam:

[...] o respeito aos direitos no trabalho, especialmente aqueles definidos como


fundamentais (liberdade sindical, direito de negociação coletiva, eliminação
de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação e
erradicação de todas as formas de trabalho forçado e trabalho infantil); a
promoção do emprego produtivo e de qualidade; a ampliação da proteção
social; e o fortalecimento do diálogo social. (OIT, 2015).
Como será exposto, o trabalho no garimpo, quando apresenta características de escravização
do trabalhador, envolve prejuízos ao meio ambiente laboral e a outras obrigações trabalhistas. Por
conseguinte, descumpre-se o dever de garantia do trabalho decente. Antes, porém, é essencial analisar
em termos quantitativos as características das fiscalizações de trabalho escravo no garimpo.

3 ESTATÍSTICAS DAS AÇÕES DE COMBATE À ESCRAVIDÃO CONTEMPORÂNEA


NA ATIVIDADE GARIMPEIRA, BRASIL (1995-2019)

Nesta seção, apresenta-se os principais indicadores do trabalho escravo contemporâneo no


exercício da atividade garimpeira no Brasil, relativamente aos resultados mais relevantes decorrentes
das situações enfrentadas pelas equipes de fiscalização. Trata-se da sistematização de informações
das fiscalizações realizadas pelas equipes da Inspeção do Trabalho do Brasil, em que houve a
constatação de pessoas na condição de escravidão contemporânea no garimpo.

Com efeito, à Inspeção do Trabalho incumbe o exercício da fiscalização e exigência das


normas trabalhistas, tal como internacionalmente referenciado em documentos internacionais, a
exemplo das Convenções n. 81 e 129 da OIT. No Brasil, os agentes de inspeção compõem a carreira
da Auditoria Fiscal do Trabalho e desempenham a atividade de fiscalização, entre outras matérias
pertinentes ao universo laboral, das situações potencialmente configuradoras de trabalho escravo.

Fagundes (2020, p. 88) afirma que o início da política pública de combate ao trabalho escravo
no território nacional ocorreu com a instituição do Grupo Especial de Fiscalização Móvel – GEFM,
12
em 1995. Desde então, as equipes do GEFM atuam em todo o país, sob a coordenação da Divisão de
Erradicação do Trabalho Escravo – DETRAE. O autor informa que a Inspeção do Trabalho constituiu
parcerias institucionais ao longo do tempo. Enfim, menciona que participam das operações os
servidores da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Defensoria Pública da União, Ministério
Público do Trabalho e Ministério Público Federal.

Relativamente à definição de trabalho escravo contemporâneo vigente no território nacional,


destaca-se a importância do Caso José Pereira, que tramitou perante a Comissão Interamericana de
Direitos Humanos e findou em solução amistosa em 2003. No acordo, o Brasil assumiu uma série de
compromissos, dentre os quais a atualização normativa, promovida pela Lei n. 10.803, de 11 de
dezembro de 2003. Essa lei alterou o artigo 149 do Código Penal, e inseriu a previsão da prática de
jornada exaustiva e de condição degradante de trabalho.

Além das citadas modalidades, a concepção normativa abrange a submissão a trabalho forçado
e a restrição de locomoção ou retenção no local de trabalho. A limitação no deslocamento pode
decorrer da existência de dívida, do cerceamento de transporte, da manutenção de vigilância ostensiva
ou do apoderamento de documentos ou objetos pessoais. São condutas que podem ocorrer de forma
isolada ou conjunta, de modo que a materialização do delito, em determinadas hipóteses, dispensa a
ofensa à liberdade de locomoção (MESQUITA, 2016), pois se volta à tutela da dignidade humana.

Para esta pesquisa, promoveu-se a sistematização de informações sobre as operações de


resgate de trabalhadores escravizados no país. Esses dados foram fornecidos pela DETRAE, órgão
vinculado à Subsecretaria de Inspeção do Trabalho – SIT, do Ministério do Trabalho e Previdência.
Quanto às variáveis analisadas, destacam-se o resultado e a quantidade de fiscalizações e de
trabalhadores alcançados, identificados em situação de trabalho escravo, bem como a proporção de
pessoas efetivamente resgatadas dessa condição, e as que tiveram os vínculos de emprego
formalizados, as guias de seguro-desemprego liberadas e as Carteiras de Trabalho e Previdência
Social – CTPS emitidas durante o processo de fiscalização. Identificou-se, ainda, a distribuição
espacial das referidas fiscalizações e as principais atividades econômicas compreendidas na análise,
notadamente aquelas relacionadas ao desempenho da atividade garimpeira.

De acordo com a OIT (2016, p. 36-38), a exposição dos dados é tão importante quanto a
qualidade da informação em si. Isso porque influencia a interpretação das estatísticas, razão pela qual
a tabulação deve ser projetada para apresentar todas as observações e conclusões interessantes à
análise. As estatísticas não constituem um fim em si mesmas. São ferramentas para a exposição de
problemas específicos. Assim, interessa calcular ações, taxas e proporções, pois os padrões aparecem
de forma mais evidente na observação de números relativos do que em valores absolutos. A definição
13
do tipo de informação requerida depende da situação nacional, conforme as políticas ou aspectos de
condições laborais a serem avaliados. Assim, permite-se a avaliação da infraestrutura, funcionamento
e eficiência do sistema, e a identificação das ações necessárias para enfrentar as carências.

De início, listam-se o código e a descrição da Classificação Nacional de Atividades


Econômicas – CNAE que serão considerados nos recortes deste estudo (Tabela 1). Além disso, expõe-
se a quantidade fiscalizações realizadas, estratificadas conforme o resultado tenha apontado a
presença ou a ausência de trabalhadores resgatados da condição de escravização. Nesse sentido,
destaca-se a prevalência da identificação de trabalho escravo contemporâneo na extração de minério
de metais preciosos (79,2%). Esse fator reforça a importância do direcionamento da regulação e do
emprego das técnicas de monitoramento nos estabelecimentos exercentes dessa atividade econômica.

Tabela 1 - Quantidade de fiscalizações consideradas no estudo, conforme o código e a descrição da Classificação


Nacional de Atividades Econômicas – CNAE.

Código da Com resgate Sem resgate Total


Descrição da atividade
atividade
N % N % N %
724301 Extração de minério de metais preciosos 19 79,2 13 43,3 29 56,9
722701 Extração de minério de estanho 2 8,3 7 23,3 9 17,6
Beneficiamento de gesso e caulim associado
810010 2 8,3 1 3,3 3 5,9
à extração
810005 Extração de gesso e caulim 1 4,2 9 30,0 10 19,6
Total 24 100,0 30 100,0 51 100,0
Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações da DETRAE.

Por sua vez, apresentam-se o código e a descrição da Classificação Nacional de Atividades


Econômicas – CNAE que foram excluídas do estudo (Tabela 2). Não obstante a consulta pelo termo
“extração de minério” tenha resultado em registros de fiscalização, essas atividades não foram
consideradas na classificação “trabalho escravo no garimpo” pela DETRAE. O motivo desse
afastamento será analisado posteriormente, mas é importante ressaltar que as situações associadas a
essas atividades econômicas não serão contempladas nas análises promovidas adiante. De qualquer
modo, nas fiscalizações assim registradas não houve indicação de trabalhadores encontrados em
condição análoga à escravidão.
14

Tabela 2 - Quantidade de fiscalizações excluídas do estudo, conforme o código e a descrição da Classificação


Nacional de Atividades Econômicas – CNAE.

Código da Com resgate Sem resgate Total


Descrição da atividade
atividade
N % N % N %
Extração de minérios de cobre, chumbo,
729404 zinco e outros minerais metálicos não- - - 10 66,7 10 66,7
ferrosos não especificados anteriormente
710301 Extração de minério de ferro - - 4 26,7 4 26,7
723501 Extração de minério de manganês - - 1 6,7 1 6,7
Total - - 15 100,0 15 100,0
Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações da DETRAE.

Feitas essas ponderações sobre as atividades contempladas e excluídas do estudo, segue-se à


primeira análise. Trata-se da exposição da quantidade e proporção de trabalhadores alcançados,
encontrados em condição análoga à de escravo (escravizados), efetivamente resgatados, e
formalizados, conforme o agrupamento por atividade econômica (Tabela 3).
No recorte em questão, todos os trabalhadores escravizados foram afastados dessa condição.
Destaca-se a predominância da extração de minério de metais preciosos em todos os aspectos
considerados, na medida em que concentra as maiores proporções de trabalhadores alcançados
(56,0%), escravizados (82,0%), resgatados (82,0%) e formalizados (76,7%). Esses quantitativos
revelam o sucesso do maior esforço fiscal concentrado na abordagem de estabelecimentos exercentes
da atividade econômica em questão.
Tabela 3 - Quantidade (n) e proporção (%) de trabalhadores alcançados, encontrados em condição análoga à de
escravo (escravizados), resgatados, e formalizados, por atividade econômica (1995-2019).
Alcançados Escravizados Resgatados Formalizados
Atividade econômica
N % N % N % N %
Beneficiamento de gesso e caulim
26 0,6 8 5,0 8 5,0 20 13,7
associado à extração
Extração de gesso e caulim 514 12,3 4 2,5 4 2,5 9 6,2
Extração de minério de estanho 1.303 31,1 17 10,6 17 10,6 5 3,4
Extração de minério de metais preciosos 2.345 56,0 132 82,0 132 82,0 112 76,7
Total 4.188 100,0 161 100,0 161 100,0 146 100,0
Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações da DETRAE.

A seu turno, analisa-se a quantidade e proporção de indenização paga, autos de infração


lavrados, guias de seguro-desemprego especial liberadas e CTPS emitidas, novamente segundo o
agrupamento por atividade econômica (Tabela 4). De igual modo, a extração de minério de metais
preciosos apresenta relevo ao concentrar a maior quantidade relativa de indenização paga aos
trabalhadores a título de verbas rescisórias (84,8%), autos de infração (69,7%), guias de seguro-
desemprego (80,7%) e CTPS emitidas (86,0%). Considerando o enfoque da pesquisa, os
estabelecimentos do gênero despontam, então, dentre os que mais empregam mão de obra escrava e
que incorrem em maior variedade de infrações administrativas de cunho trabalhista.
15
Tabela 4 - Quantidade (n) e proporção (%) de indenização paga (valor), autos de infração lavrados, guias de
seguro-desemprego especial liberadas e Carteiras de Trabalho e Previdência Social (CTPS) emitidas, por atividade
econômica (1995-2019).
Indenização Autos de Seguro- CTPS
Atividade econômica paga infração desemprego emitidas
Valor (R$) % N % N % N %
Beneficiamento de gesso e caulim associado à
29.422,23 5,4 50 7,2 8 5,3 4 8,0
extração
Extração de gesso e caulim 15.463,44 2,8 75 10,8 4 2,7 2 4,0
Extração de minério de estanho 37.672,20 6,9 85 12,3 17 11,3 1 2,0
Extração de minério de metais preciosos 461.072,57 84,8 483 69,7 121 80,7 43 86,0
Total 543.630,44 100,0 693 100,0 150 100,0 50 100,0
Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações da DETRAE.

Verifica-se, ainda, a quantidade e proporção de estabelecimentos e trabalhadores em condição


análoga à de escravo, conforme o agrupamento por unidade federativa e município (Tabela 5). Com
efeito, o estado do Pará reúne a maior parcela das fiscalizações (19,6%, ao lado do Amapá) e de
trabalhadores encontrados em situação de trabalho escravo moderno (48,4%). No período
considerado, o município paraense de Jacareacanga não reuniu uma quantidade expressiva de
estabelecimentos fiscalizados (3,9%), mas se destacou com a maior proporção de pessoas em
condição análoga à de escravo (27,3%).

Esses achados foram considerados na seleção de uma ação fiscal recentemente promovida no
âmbito daquele município, com vistas à exibição dos contornos de uma situação de trabalho escravo
contemporâneo no desempenho da atividade garimpeira. A descrição analítica correspondente será
realizada na próxima seção deste estudo.

Portanto, a concentração de situações de trabalho escravo em estados da Região Norte, e em


especial no estado paraense, indica a necessidade de investimento de esforço fiscal com enfoque nas
regiões que apresentem maior probabilidade de ocorrência de trabalho escravo no garimpo. Isso
porque abrange atividades econômicas que, se desempenhadas de modo informal, apresentam riscos
consideráveis de afronta à legislação trabalhista, ambiental e minerária.

Como será descrito adiante, as experiências práticas de fiscalização apontam o


comportamento dos responsáveis no sentido da criação de barreiras formais para impedir o
enfrentamento de ações ilícitas na atividade garimpeira. Essas ações envolvem notadamente a prática
de condutas criminosas, a exemplo da exploração de pessoas na condição análoga à escravidão e do
estímulo à prostituição nas frentes de trabalho.
16
Tabela 5 - Quantidade (n) e proporção (%) de estabelecimentos inspecionados e trabalhadores encontrados em condição
análoga à de escravo, por unidade federativa e município (1995-2019).
Estabelecimentos inspecionados Trabalhadores escravizados
UF / Município
N % N %
Amazonas 1 2,0 12 7,5
Presidente Figueiredo 1 2,0 12 7,5
Amapá 10 19,6 11 6,8
Calçoene 7 13,7 11 6,8
Pedra Branca do Amaparí 1 2,0 - -
Serra do Navio 2 3,9 - -
Bahia 1 2,0 - -
Andaraí 1 2,0 - -
Goiás 1 2,0 - -
Catalão 1 2,0 - -
Minas Gerais 1 2,0 - -
Coromandel 1 2,0 - -
Mato Grosso 5 9,8 41 25,5
Matupá 1 2,0 15 9,3
Nova Bandeirantes 1 2,0 - -
Nova Santa Helena 1 2,0 20 12,4
Novo Mundo 2 3,9 6 3,7
Pará 10 19,6 78 48,4
Água Azul do Norte 1 2,0 13 8,1
Anapu 3 5,9 7 4,3
Curionópolis 2 3,9 2 1,2
Jacareacanga 2 3,9 44 27,3
Novo Progresso 1 2,0 - -
Santa Maria das Barreiras 1 2,0 12 7,5
Paraíba 4 7,8 8 5,0
Junco do Seridó 3 5,9 8 5,0
Salgadinho 1 2,0 - -
Pernambuco 8 15,7 - -
Araripina 4 7,8 - -
Ipubi 4 7,8 - -
Rio Grande do Norte 1 2,0 4 2,5
Equador 1 2,0 4 2,5
Rondônia 8 15,7 5 3,1
Ariquemes 3 5,9 - -
Candeias do Jamari 2 3,9 - -
Monte Negro 2 3,9 5 3,1
Pimenta Bueno 1 2,0 - -
Tocantins 1 2,0 2 1,2
Paranã 1 2,0 2 1,2
Total 51 100,0 161 100,0

Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações da DETRAE.


17
Por fim, como será detalhado nas próximas seções, verifica-se que as estratégias de
aliciamento e manutenção da lógica subjacente ao trabalho escravo no garimpo apresentam
características peculiares, que a distanciam de outras atividades urbanas e rurais.

4 ESCRAVIDÃO NO GARIMPO: UMA REFLEXÃO A PARTIR DE UMA SITUAÇÃO


DE REINCIDÊNCIA NO MUNICÍPIO DE JACAREACANGA, PA

O combate ao trabalho análogo à escravidão em garimpos tem sido um dos maiores desafios
atuais do GEFM. Isso decorre da notória expansão desta atividade econômica nos últimos anos e da
complexidade envolvida em todas as etapas das ações fiscais. Desde o planejamento, até a
responsabilização daqueles que integram a cadeia econômica da extração mineral, trata-se de um
processo que envolve muitos fatores de dificuldade.

A bacia aurífera do Tapajós, no Oeste do Estado do Pará, concentra centenas de frentes de


extração de ouro, e emprega milhares de trabalhadores garimpeiros, a maior parte deles oriundos de
outras regiões do país. As ações estatais nesta região têm revelado que ilícitos diversos são praticados
na exploração da atividade econômica, como usurpação de bens da União, crimes ambientais,
corrupção de agentes públicos e lavagem de dinheiro. A submissão de trabalhadores à escravidão
contemporânea é um destes múltiplos crimes.

Sendo assim, tem-se buscado continuamente aprimorar a execução das ações fiscais em
garimpos, visando à erradicação da condição análoga à escravidão. Um dos principais meios consiste
na aplicação de recursos tecnológicos disponíveis, com destaque para o uso de imagens de satélites,
consideradas fonte de informação de inteligência essencial para a definição de estratégias de atuação.

Dentre os resgates realizados pela Auditoria-Fiscal do Trabalho em garimpos, destaca-se


aquele realizado na localidade conhecida por Coatá, no município paraense de Jacareacanga. Trata-
se de um conjunto de frentes de garimpagem, a maior parte delas no interior da Floresta Nacional do
Amana, às margens da Rodovia Transamazônica. Foi neste lugar que o GEFM resgatou 38
trabalhadores em 2018, dentre garimpeiros e cozinheiras, estas também exploradas sexualmente
(ARANHA, 2018). No mesmo local, constatou que outros 39 trabalhadores foram submetidos a
condições análogas à escravidão, em 2020, ação que será objeto de detalhamento adiante. Nessa
primeira fiscalização, foram lavrados 46 autos de infração, em decorrência do descumprimento de
obrigações trabalhistas de diferentes naturezas.

Conforme o relato do coordenador da equipe, a fiscalização foi iniciada em 26 de outubro de


2020. A ação compreendeu a inspeção de áreas em que se exploram garimpos de ouro. Participaram
dessa operação do GEFM os Auditores-Fiscais do Trabalho e Motoristas Oficiais do Ministério do
18
Trabalho e Previdência, Procuradoras do Trabalho, Procurador da República, Defensor Público
Federal, agentes fiscais do IBAMA e Policiais Federais.

O retorno aos garimpos do Coatá foi motivado pela manutenção das condutas por parte dos
exploradores anteriormente flagrados, o que foi apurado pela inteligência fiscal por meios diversos.
Dentre as estratégias de averiguação, destaca-se o emprego de imagens de satélite, que apontaram a
abertura de novas frentes de garimpagem, próximas àquelas já fiscalizadas. O monitoramento e a
realização de novas fiscalizações dos empregadores escravagistas são estratégias da política pública
de combate ao trabalho escravo.

As equipes de fiscalização verificaram as condições de trabalho e inspecionaram as


instalações em que os trabalhadores permaneciam alojados. Tratava-se de ambientes construídos
rusticamente, com madeira extraída da floresta, cobertura de lona plástica ou telhas de fibrocimento,
sem instalações sanitárias, com extração de água para consumo humano sem garantia de potabilidade.
Os trabalhadores foram submetidos à condição análoga à escravidão, pois se encontravam em
condições degradantes de trabalho e de vivência, conforme as 36 autuações promovidas.

A relação de trabalho era completamente informal. Não havia regularização dos vínculos
empregatícios, embora presentes os requisitos previstos em lei que caracterizam a relação dessa
natureza. Uma cooperativa foi formalmente criada entre as duas ações fiscais, constando na
presidência a empregadora flagrada em ambas as fiscalizações. Todavia, nenhum dos trabalhadores
tinha qualquer vínculo com a cooperativa. Sequer a conheciam, o que denota a inexistência dessa
organização no plano dos fatos. Ademais, restaram prejudicadas uma série de exigências legais para
a regular formação e funcionamento do trabalho cooperativo.

Na segunda ação fiscal, não foram caracterizadas a exploração sexual de trabalhadoras e a


servidão por dívidas, comprovadas na primeira fiscalização. Nenhum dos trabalhadores resgatados
em 2018 foi encontrado na ação executada em 2020. Embora um deles tenha relatado o trabalho no
Coatá desde 2012, não foi alcançado na primeira fiscalização. Nas duas ações fiscais, os responsáveis
pela atividade econômica (todos familiares entre si) não atenderam às determinações do GEFM,
inclusive quanto aos pagamentos das verbas rescisórias e demais direitos trabalhistas, tendo sido
ajuizadas ações civis públicas junto à Justiça do Trabalho em ambos os casos. No resgate realizado
em 2018, houve acordo judicial e pagamento parcelado dos valores devidos aos trabalhadores
resgatados. Por sua vez, a ação judicial decorrente da fiscalização de 2020 ainda não foi finalizada.

Com relação ao perfil das infrações identificadas, é importante explorar com mais detalhes as
irregularidades apontadas nos relatórios de fiscalização das abordagens realizadas em 2018 e em
2020. A comparação realizada entre os dois procedimentos fiscais apontados servirá de parâmetro
19
para uma análise mais ampla e detalhada desses e dos demais relatórios de fiscalização relativos ao
trabalho escravo no garimpo. Portanto, analisa-se inicialmente as infrações que foram constatadas
tanto na primeira (2018) quanto na segunda (2020) fiscalização realizada no Garimpo Coatá, no
município paraense de Jacareacanga, PA (Quadro 1).

Nota-se que as situações apontadas pela fiscalização do trabalho possuem dezenove infrações
em comum, com destaque para a exploração de trabalho sob condição análoga à de escravo. Desse
conjunto, também se observa que estiveram presentes nas duas abordagens o descumprimento de
regras concernentes à situação de informalidade, o que abrange a falta de anotação de CTPS, no prazo
legal; a admissão ou manutenção de empregado sem o respectivo registro; e a ausência de depósito
de FGTS mensal. Com relação à remuneração, tem-se o pagamento sem a devida formalização do
recibo; e a falta de pagamento da gratificação natalina (13º salário) no prazo devido.

Quadro 1 - Infrações identificadas nas fiscalizações realizadas em 2018 e 2020 no Garimpo Coatá, Jacareacanga, PA.
N Ementa
1 Deixar de anotar a CTPS do empregado, no prazo de 5 (cinco) dias úteis, contado do início da prestação laboral.
2 Deixar de depositar mensalmente o percentual referente ao FGTS.
3 Efetuar o pagamento do salário do empregado, sem a devida formalização do recibo.
Deixar de efetuar o pagamento do 13º (décimo terceiro) salário até o dia 20 (vinte) de dezembro de cada ano, no
4
valor legal.
Manter empregado trabalhando sob condições contrárias às disposições de proteção do trabalho, quer seja
5
submetido a regime de trabalho forçado, quer seja reduzido à condição análoga à de escravo.
Admitir ou manter empregado sem o respectivo registro em livro, ficha ou sistema eletrônico competente, o
6
empregador não enquadrado como microempresa ou empresa de pequeno porte.
7 Deixar de submeter o trabalhador a exame médico admissional.
8 Deixar de submeter o trabalhador a exame médico periódico.
Deixar de equipar o estabelecimento com material necessário à prestação de primeiros socorros, considerando as
9 características da atividade desenvolvida ou guardar o material necessário à prestação de primeiros socorros em
local inadequado ou manter o material sob cuidado de pessoa não treinada para esse fim.
Deixar de fornecer aos empregados, gratuitamente, equipamento de proteção individual adequado ao risco, em
10
perfeito estado de conservação e funcionamento.
11 Deixar de estabilizar ou de remover material com risco de queda das cristas da bancada superior.
12 Deixar de fornecer água potável, em condições de higiene, nos locais e postos de trabalho.
Executar obra de mineração sem levantamento topográfico ou sem representação em mapas e plantas ou deixar de
13 providenciar a revisão e atualização das plantas de obras de mineração ou permitir a revisão das plantas de obras
de mineração por profissional que não seja habilitado.
Manter mina sem a supervisão técnica de profissional legalmente habilitado ou manter atividade prevista na NR-
14
22 sem a supervisão técnica de profissional legalmente habilitado.
15 Deixar de elaborar e/ou de implementar o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional.
16 Deixar de elaborar e/ou de implementar o Programa de Gerenciamento de Riscos.
Deixar de identificar as entradas das áreas de mineração com atividades operacionais com o nome da empresa ou
17 do Permissionário de Lavra Garimpeira ou deixar de sinalizar os acessos e as estradas das áreas de mineração com
atividades operacionais.
18 Deixar de monitorar e controlar as bancadas e taludes das minas a céu aberto.
19 Deixar de elaborar e/ou implementar e/ou manter atualizado um plano de emergência.
Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações do coordenador da equipe do GEFM.

Com relação às regras de proteção ao meio ambiente do trabalho, destaca-se as infrações


consistentes na falta de elaboração e/ou de implementação do Programa de Controle Médico de Saúde
Ocupacional; a não submissão dos trabalhadores a exame médico admissional e periódico; bem como
20
a ausência de disponibilização de material necessário à prestação de primeiros socorros, ou manter o
material sob cuidado de pessoa não treinada para esse fim. Além disso, tem-se o descumprimento do
dever de fornecimento gratuito de equipamento de proteção individual adequado ao risco, em perfeito
estado de conservação e funcionamento; a ausência de estabilização ou remoção de material com
risco de queda das cristas da bancada superior. Quanto às condições de vivência em si, observa-se
que são comuns às duas operações de fiscalização o desatendimento à obrigação de fornecer água
potável, em condições de higiene, nos locais e postos de trabalho.

Relativamente à execução da atividade laboral, destacam-se as infrações consistentes na


execução de obra de mineração sem levantamento topográfico ou sem representação em mapas e
plantas ou falta de revisão e atualização das plantas de obras de mineração ou, ainda, de permissão
para a revisão das plantas de obras de mineração por profissional que não seja habilitado. Ademais,
consta a manutenção de mina sem a supervisão técnica de profissional legalmente habilitado ou de
atividade prevista na NR-22 sem a supervisão técnica de profissional legalmente habilitado.

Também nesse sentido, o empregador deixou de elaborar e/ou de implementar o Programa de


Gerenciamento de Riscos; de identificar as entradas das áreas de mineração com atividades
operacionais com o nome da empresa ou do Permissionário de Lavra Garimpeira ou de sinalizar os
acessos e as estradas das áreas de mineração com atividades operacionais. Enfim, foram constatadas
as irregularidades referentes à falta de monitoramento e controle das bancadas e taludes das minas a
céu aberto e de elaboração, implementação ou manutenção de um plano de emergência atualizado.

Portanto, não obstante o transcurso de um biênio entre as duas fiscalizações, o que se percebe
é a manutenção de um padrão de indignidade e de agressão às normas ambientais laborais, somado
ao descumprimento também de obrigações trabalhistas, propriamente ditas. Esse núcleo de dezenove
irregularidades denuncia a insistência e permanência de um quadro de violação de direitos, mesmo
depois de o empregador ter sido devidamente responsabilizado administrativamente anteriormente.

Diante disso, é importante analisar em que medida as ações estatais de enfrentamento da


escravidão no garimpo podem ser aperfeiçoadas, de modo que a reprimenda resulta na cessação ou
adequação da atividade, não na continuidade em condições igualmente precárias que as identificadas
e destacadas pelas equipes de fiscalização.

Além da listagem das infrações comuns às duas fiscalizações, destaca-se em separado o


quadro de irregularidades que foram identificados apenas na ação mais recente, bem como aquelas
presentes tão somente na primeira abordagem. A fiscalização promovida em 2020 possui 17
autuações exclusivas, ou seja, não apontadas na primeira ação (Quadro 1). Por sua vez, no
procedimento fiscal de 2018, houve 27 infrações não apontadas na segunda averiguação (Quadro 2).
21
Dentre as dezessete infrações registradas pela fiscalização do trabalho na ação de 2020 e não
constantes no relatório de 2018, destaca-se a ausência de concessão de descanso semanal remunerado;
a falta de comunicação da admissão e desligamento ao poder público, no prazo legal (infração
inexistente à época da ação de 2018); e a falta de pagamento das verbas rescisórias até a data devida.

Quanto às condições de vivência, consistiu em objeto de autuação a falta de vestiário no local


de trabalho; a ausência de local em condições de conforto e higiene para tomada das refeições; a
manutenção de cozinha em desacordo com as características estabelecidas na Norma
Regulamentadora n. 24; a disponibilização de dormitório em condição inapropriada; a manutenção
de alojamento cujo piso não seja impermeável e lavável; a ausência de higienização diária dos
sanitários dos alojamentos; a desproteção dos locais de armazenamento de água, poços e fontes de
água potável contra a contaminação; e a falta de fornecimento de vestimentas gratuitas.

Quadro 2 - Infrações identificadas apenas na fiscalização realizada em 2020 no Garimpo Coatá, Jacareacanga, PA.
N Ementa
1 Deixar de conceder ao empregado um descanso semanal de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas.
Deixar de comunicar ao Ministério da Economia, até o dia 7 (sete) do mês subseqUente ou no prazo definido em
2
regulamento, a admissão e desligamento de empregados.
Deixar de promover o pagamento dos valores constantes do instrumento de rescisão ou recibo de quitação em até
3
10 (dez) dias contados a partir do término do contrato de trabalho.
Manter estabelecimento desprovido de vestiário quando a atividade exigir a utilização de vestimentas de trabalho,
4 ou quando for imposto o uso de uniforme cuja troca deva ser feita no próprio local de trabalho, ou quando a atividade
exigir que o estabelecimento disponibilize chuveiro.
Deixar de oferecer aos trabalhadores local em condições de conforto e higiene para tomada das refeições por ocasião
5
dos intervalos concedidos durante a jornada de trabalho.
6 Disponibilizar cozinha em desacordo com as características estabelecidas na NR 24.
Disponibilizar dormitório do alojamento em desacordo com as características estipuladas no item 24.7.2 da NR 24,
e/ou disponibilizar instalação sanitária que não seja parte integrante do dormitório localizada a uma distância
7
superior a 50 m (cinquenta metros) dos mesmos, e/ou que não seja interligada por passagem com piso lavável e
cobertura.
Disponibilizar quarto de dormitório em desacordo com as características estabelecidas no item 24.7.3 e subitens da
8
NR 24.
9 Manter alojamento cujo piso não seja impermeável e lavável.
10 Deixar de higienizar diariamente os sanitários dos alojamentos.
11 Deixar de fornecer gratuitamente ao trabalhador vestimentas de trabalho.
12 Deixar de proteger os locais de armazenamento de água, os poços e as fontes de água potável contra a contaminação.
Deixar de manter as vias de circulação de pessoas sinalizadas e/ou desimpedidas e/ou protegidas contra queda de
13
material e/ou em boas condições de segurança e trânsito.
Deixar de manter instalações sanitárias tratadas e higienizadas ou manter instalações sanitárias distantes dos locais
14
e frentes de trabalho.
15 Deixar de sinalizar as vias de circulação e acesso da mina.
Deixar de ministrar treinamento introdutório geral para os trabalhadores ou ministrar treinamento introdutório geral
16
com carga horária e/ou conteúdo em desacordo com o previsto na NR-22 ou fora do horário de trabalho.
Deixar de promover capacitação aos trabalhadores envolvidos na operação, manutenção, inspeção e demais
17 intervenções em máquinas e equipamentos,compatível com suas funções, que aborde os riscos a que estão expostos
e as medidas de proteção existentes e necessárias, nos termos da NR 12, para a prevenção de acidentes e doenças.
Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações do coordenador da equipe do GEFM.

Sobre as condições de trabalho, consta a ausência de vias de circulação de pessoas mantidas


sinalizadas, desimpedidas, protegidas contra queda de material ou em boas condições de segurança e
22
trânsito; a falta de instalações sanitárias tratadas e higienizadas e adequadamente localizadas; e a
ausência de sinalização das vias de circulação e acesso da mina. Além disso, tem-se a falta ou
irregularidade do treinamento introdutório geral e da capacitação adequada aos garimpeiros.

Com o intuito de verificar as irregularidades que haviam sido observadas na primeira


fiscalização, mas que não foram identificadas na segunda ação fiscal, lista-se abaixo as 27 infrações
apontadas pela equipe naquela oportunidade (Quadro 3).

Na fiscalização promovida em 2018, foram identificadas as seguintes infrações, que não se


repetiram em 2020: admissão de empregado sem CTPS (a digitalização deste documento tornou
dispensável a existência na forma física); falta de registro dos horários de entrada, saída e repouso
efetivamente praticados; realização de descontos nos salários do empregado, para além dos
legalmente permitidos; coação ou indução do empregado a utilizar-se de armazém ou serviços do
empregador; não recolhimento de FGTS e contribuição social rescisória no prazo devido; ausência
de apresentação da Relação Anual de Informações Sociais (essa obrigação deixou de existir para os
empregadores submetidos ao regime do eSocial); falta de concessão de férias anuais; e ausência ou
atraso no pagamento integral do salário mensal devido ao empregado.

Sobre as condições de higiene e conforto, referidas na Norma Regulamentadora n. 24,


encontravam-se ausentes ou em desacordo com a referida normativa: camas; armários individuais;
porta, janela, parede e piso da cozinha; porta, janela, piso e cobertura do alojamento. Igualmente,
identificou-se a ausência ou inadequação de instalações sanitárias separadas por sexo; e a falta de
adequado conforto para as refeições.

Relativamente às condições de trabalho, destaca-se a falta de proteção das partes móveis de


máquinas e equipamentos que ofereçam riscos; a ausência de treinamento, qualificação, informações,
instruções e reciclagem necessárias para preservação da segurança e saúde dos trabalhadores; a falta
ou inadequação de análise dos acidentes e doenças profissionais; a não verificação da presença de
fatores condicionantes de instabilidade dos maciços; e, ainda, a ausência de organização e regular
funcionamento de Comissão Interna de Prevenção de Acidentes na Mineração.

A comparação do quadro de infrações observado nas duas fiscalizações é importante para se


compreender em que pontos houve uma eventual evolução, manutenção ou regressão nas condições
de trabalho mantidas no garimpo em questão. Os passos seguintes do estudo em curso contemplam a
categorização e o aprofundamento na análise dos principais indicadores observados nessas e nas
demais ações fiscais que encontraram trabalhadores em condição análoga à de escravo.
23
Quadro 3 - Infrações identificadas apenas na fiscalização realizada em 2018 no Garimpo Coatá, Jacareacanga, PA.
N Ementa
1 Admitir empregado que não possua CTPS.
Deixar de consignar em registro mecânico, manual ou sistema eletrônico, os horários de entrada, saída e período
2
de repouso efetivamente praticados pelo empregado, nos estabelecimentos com mais de 10 (dez) empregados.
Efetuar descontos nos salários do empregado, salvo os resultantes de adiantamentos, de dispositivos de lei,
3
convenção ou acordo coletivo de trabalho.
4 Coagir ou induzir empregado a utilizar-se de armazém ou serviços mantidos pela empresa.
Deixar de recolher, ou recolher após o vencimento sem os acréscimos legais, a contribuição social incidente sobre
5 o montante de todos os depósitos devidos ao FGTS, corrigido e remunerado na forma da lei, relativos ao contrato
de trabalho de empregado despedido sem justa causa, à alíquota de 10% (dez por cento).
6 Deixar de apresentar, no prazo legalmente estabelecido, a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS).
7 Deixar de conceder ao empregado férias anuais a que fez jus.
Deixar de efetuar, até o 5º (quinto) dia útil do mês subseqüente ao vencido, o pagamento integral do salário mensal
8
devido ao empregado.
Deixar de depositar, por ocasião da rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, por iniciativa do empregador,
importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados ou que deveriam ter sido
9
realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos
dos respectivos juros, nos prazos de que trata o §6º do art. 477 da CLT.
Deixar de depositar na conta vinculada do trabalhador, por ocasião da rescisão do contrato de trabalho, os valores
10 do FGTS relativos ao mês da rescisão e ao mês imediatamente anterior, que ainda não houverem sido recolhidos,
nos prazos de que trata o §6º do art. 477 da CLT.
11 Manter cozinha sem portas ou com portas em desacordo com o disposto na NR-24.
12 Manter cozinha sem janelas ou com janelas em desacordo com o disposto na NR-24.
13 Manter alojamento sem cobertura ou com cobertura em desacordo com o disposto na NR-24.
14 Manter alojamento sem portas ou com portas em desacordo com o disposto na NR-24.
15 Manter alojamento sem janelas ou com janelas em desacordo com o disposto na NR-24.
16 Deixar de manter instalações sanitárias ou manter instalações sanitárias que não sejam separadas por sexo.
Deixar de assegurar aos trabalhadores condições suficientes de conforto para a ocasião das refeições, em
17
estabelecimento em que trabalhem entre 30 e 300 empregados.
Manter cozinha com paredes construídas e/ou revestidas de material inadequado ou manter cozinha com paredes
18
sem revestimento.
19 Manter cozinha com piso em desacordo com o disposto na NR-24.
20 Manter alojamento com piso em desacordo com o disposto na NR-24.
21 Deixar de dotar o alojamento de camas ou dotar o alojamento de camas inadequadas.
Deixar de dotar os alojamentos de armários individuais ou dotar os alojamentos de armários com dimensões
22
inferiores às previstas na NR-24.
23 Deixar de proteger as partes móveis de máquinas e equipamentos que ofereçam riscos aos trabalhadores.
Deixar de proporcionar aos trabalhadores treinamento, qualificação, informações, instruções e reciclagem,
24
necessárias para preservação da sua segurança e saúde.
Deixar de analisar os acidentes e doenças profissionais ou utilizar metodologia de análise dos acidentes e doenças
profissionais que não permita identificar as causas principais e contribuintes que levaram à ocorrência do evento
25
ou deixar de indicar, na análise dos acidentes e doenças profissionais, as medidas de controle para prevenção de
novas ocorrências.
26 Deixar de verificar a presença de fatores condicionantes de instabilidade dos maciços.
Deixar de organizar e manter em regular funcionamento, em cada estabelecimento, uma Comissão Interna de
27
Prevenção de Acidentes na Mineração.
Fonte: Elaboração própria, de acordo com informações do coordenador da equipe do GEFM.

Com efeito, a aplicação de métodos mistos na análise de tais relatórios de fiscalização tem o
condão de viabilizar a identificação do perfil do trabalho escravo contemporâneo na atividade
garimpeira. Desse modo, na continuidade da pesquisa será avaliada uma quantidade de variáveis mais
ampla, com vistas ao enriquecimento da análise documental.
24
Sendo assim, a classificação que será objeto de registro, exposição e discussão contemplará a
identificação dos órgãos e quantidade de servidores participantes de cada operação; o período médio
de duração das ações fiscais; as principais dificuldades e intercorrências registradas; a forma de
identificação dos inícios da existência de trabalho escravo em dada localidade; os elementos
considerados no reconhecimento da relação de emprego; existência e conteúdo de mandados de busca
e apreensão; ocorrência de outros crimes, além da exploração de mão de obra escrava; as medidas
administrativas adotadas pelas equipes de fiscalização; o perfil dos trabalhadores resgatados; e o
tempo de duração, até a finalização dos trabalhos e envio dos relatórios às autoridades competentes.
Para além dos relatórios de fiscalização, também serão objeto de apreciação a síntese das repercussões
administrativas e judiciais, notadamente nas searas trabalhista e criminal.

5 CONCLUSÃO

As informações apresentadas ao longo da pesquisa confirmam que as estratégias de


aliciamento e manutenção da lógica subjacente ao trabalho escravo no garimpo apresentam
características peculiares, que a distanciam das dinâmicas de escravização laboral observada em
outras atividades econômicas. Os resultados preliminares indicam a existência de afronta à legislação
trabalhista, ambiental e minerária, além da imposição de barreiras formais para impedir o
enfrentamento de ações ilícitas na atividade garimpeira, que envolvem a prática de condutas
criminosas, a exemplo da exploração do trabalho análogo ao de escravo.

Logo, a atuação interinstitucional mostra-se, mais que adequada, necessária. As estratégias de


enfrentamento ao trabalho escravo contemporâneo na atividade garimpeira demandam, pois, o
fortalecimento estrutural dos órgãos públicos destinados a tal mister. Também é preciso estimular o
emprego da tecnologia no monitoramento das localidades com potencial ocorrência de utilização de
trabalho análogo à escravidão no garimpo. As limitações de pessoal na atividade de fiscalização
laboral tornam ainda mais relevante o investimento em tecnologia.

Entende-se que seria relevante o investimento em processos de rastreamento diferenciado em


determinadas atividades e cadeias produtivas que revelam quadros de exploração de trabalho escravo,
a exemplo da atividade garimpeira ilegal. Tais medidas viabilizariam a identificação e a consequente
responsabilização dos responsáveis por práticas nocivas em situações como as verificadas nas duas
fiscalizações em destaque, promovidas na região de Jacareacanga, PA.

Não obstante a atuação estatal tenha identificado um contexto de escravidão contemporânea


em 2018, apenas dois anos depois, na mesma região, verificou-se que os mesmos responsáveis pela
manutenção de relações escravistas continuam agindo, dessa vez com utilização de barreiras formais
25
para impor uma aura de legalidade a um contexto que reúne em grande medida um conjunto de
infrações similares às encontradas na primeira ação fiscal.

Logo, é importante que o processo de enfrentamento considere essa experiência em particular


como parâmetro para a continuidade do acompanhamento das localidades em que se identificou
anteriormente a prática de trabalho escravo no garimpo. O exercício de mapeamento pode levar à
constatação de novos quadros de reincidência. A atuação organizada e incisiva frente a tais realidades
pode contribuir para o desestímulo à escravidão no garimpo, mas isso não impede que outras medidas
de fortalecimento da atuação estatal sejam adotadas, tais como o investimento em questões estruturais
e tecnológicas que possam servir de suporte aos órgãos de fiscalização.
26
REFERÊNCIAS

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no âmbito da pesquisa empírica em Direito. In: MACHADO, Maíra Rocha (Org.). Pesquisar
empiricamente o direito. São Paulo: Rede de Estudos Empíricos em Direito, 2017. 428 p.
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clandestinidade e as garras da exclusão. Curitiba: Juruá, 2015.

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