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NOTA

TÉCNICA Outubro de 2021 • nº 8

AMAZÔNIA EM CHAMAS
DESMATAMENTO, FOGO E
PECUÁRIA EM TERRAS PÚBLICAS
Caroline S. C. Salomãoa, Marcelo C. C. Stabilea, Lucimar Souzaa, Ane Alencara, Isabel Castroa,
Carolina Guyota & Paulo Moutinhoa
a. Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.
E-mail: caroline.salomao@ipam.org.br

Introdução
Resumo
As terras públicas, que incluem terras in-
• 44% do desmatamento anual na
dígenas (TIs), unidades de conservação
Amazônia, em 2019 e 2020, ocorreu
(UCs) e as glebas públicas não destinadas,
em terras públicas;
ocupam cerca de 276 milhões de hectares
no bioma Amazônia (figura 1; tabela 1) – se • 67% do desmatamento registrado
fosse um país europeu, só perderia em terri- nas terras públicas em 2019 e
tório para a Rússia. 2020 aconteceu nas florestas não
destinadas (FPND);
Essas áreas são constantemente pressio-
• Entre 1997 e 2020, 87% do
nadas por invasões e atividades ilegais, que
desmatamento nas terras públicas
geram desmatamento e fogo (Alencar et al.,
atingiu as chamadas glebas públicas
2021). Em 2019 e 2020, cerca de 44%, da
não destinadas; 52% deste desmate
derrubada anual de florestas na Amazônia
ocorreu nos últimos dez anos;
aconteceu em terras públicas.
• Terras indígenas e unidades de
Consideradas um patrimônio dos brasilei- conservação são as terras públicas
ros, as florestas que cobrem estas terras menos desmatadas;
públicas estão, por princípio, sob o domínio
• Das áreas desmatadas em florestas
da União e dos Estados. A eles, portanto, é
públicas não destinadas, cerca de
conferida a responsabilidade de proteção.
75% viraram pasto e se mantiveram
assim após dez anos da conversão;
Contudo, a realidade ambiental no chão é
outra. A ausência atual de ações de controle • Em média, 22% da área desmatada
e combate a ilícitos ambientais na Amazô- nas glebas públicas não destinadas
nia resulta na ocupação e na apropriação é abandonada, apresentando algum
ilegal – grilagem – deste patrimônio, com grau de regeneração da vegetação
avanço do desmatamento e das queima- após cinco anos.
das na região (Azevedo-Ramos et al., 2018, 1

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2020; Alencar et al., 2020). Em certa medida, legislações ambiental e fundiária que visam
o avanço da grilagem é consequência de a regularização futura de terras, entre elas
alterações sequenciais de mudanças nas muitas invadidas e ocupadas ilegalmente.

1. Lei 11.284/2006
– Artigo 4o “Art. 4º A
gestão de florestas
públicas para pro-
Figura 1. Categorização das terras públicas na Amazônia, entre glebas públicas não destinadas e dução sustentável
destinadas. Fonte: IPAM compreende:

I - a criação de flores-
tas nacionais, esta-
As pastagens, em comparação com outros cem ativas e perenes ou são abandonadas. duais e municipais,
nos termos do art. 17
usos do solo, parecem ser a principal ferra-
da Lei nº 9.985, de 18
menta para a ocupação de terras públicas Nesta nota técnica, nós avaliamos a evolu- de julho de 2000, e
na Amazônia, em especial em regiões de ção da trajetória de conversão ilegal de flo- sua gestão direta;
fronteira de desmatamento (Tyukavina et restas em terras públicas em outros usos da II - a destinação de
al., 2017). No entanto, pouco se sabia em terra entre 1997 e 2020, com ênfase nas gle- florestas públicas às
que proporção às pastagens têm sido usa- bas públicas ainda não destinadas (figura comunidades locais,
nos termos do art. 6º
das para a ocupação ilegal destas terras, ou 2), de forma a responder a algumas dessas desta Lei;
ainda quanto destas pastagens permane- questões.
III - a concessão
florestal, incluindo
florestas naturais
ou plantadas e as
unidades de manejo
das áreas protegidas
referidas no inciso
I do caput deste
artigo.”
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Figura 2. Terras públicas localizadas no bioma Amazônia e suas classificações. Fonte: IPAM, a partir de
dados de Funai, ICMBio, Incra e SFB.

Método tamentos rurais devido a sua destinação 2. Pela Lei


6.766/1979, de-
para uso rural, ainda que estejam sob a res-
fine-se gleba toda
Nesta nota, por conveniência, nós sepa- ponsabilidade do poder público. Também terra que ainda não
ramos as terras públicas (figura 1) entre não consideramos as áreas de proteção sofreu parcelamento
aquelas existentes em (1) glebas2 públicas ambiental (APAs), pois apesar de serem legal registrado em
cartório. Deixa-se,
já destinadas pelos governos federais e categorizadas como unidades de conserva-
portanto, de ser
estaduais, mas que ainda permanecem ção têm uma dinâmica de desmatamento gleba quando esta é
sob domínio público (terras indígenas, TIs, e mais próxima de imóveis rurais. loteada.
unidades de conservação, UCs), e (2) glebas 3. “Terras devolutas
são terras públicas
públicas não destinadas, as chamadas ter- As bases fundiárias que utilizamos para as
sem destinação
ras devolutas3 (figura 2). análises foram: (1) terras indígenas: Funda- pelo poder público
ção Nacional do Índio (Funai); (2) unidades e que em nenhum
momento integraram
As glebas não destinadas foram ainda divi- de conservação: Instituto Chico Mendes
o patrimônio de um
didas em florestas públicas não destinadas para a Conservação de Biodiversidade (ICM- particular, ainda que
(FPND), constantes no Cadastro Nacional Bio); e (3) glebas públicas não destinadas: estejam irregu-
larmente sob sua
de Florestas Públicas4 gerido pelo Serviço Instituto Nacional de Colonização e Refor- posse” (veja mais em
Florestal Brasileiro (SFB), e em outras terras ma Agrária (Incra) e SFB. https://www.oeco.
não destinadas (OTND). Esta última cate- org.br/dicionario-
-ambiental/27510-o-
goria surge da premissa que uma parte das As eventuais sobreposições dessas cate- -que-sao-terras-de-
glebas públicas com florestas ainda não gorias fundiárias com outras já destinadas, volutas/).
consta do Cadastro Nacional de Florestas como assentamentos e áreas quilombolas, 4. Ver https://www.
Públicas do SFB. foram excluídas das análises. É importante florestal.gov.br/ca-
dastro-nacional-de-
notar que frequentemente há sobreposição -florestas-publicas.
Não consideramos neste estudo os assen- espacial entre categorias fundiárias nessas
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bases de dados, o que pode implicar, uma TI, FPND e OTND. Adicionalmente, no caso
vez resolvida a sobreposição pelos gover- das FPND e OTND, também se analisou esta
nos, que os dados apresentados nesta nota evolução nos intervalos de tempo citados
estejam superestimados ou subestimados. acima: 2006-2010, 2011-2015 e 2016-2020.
Particularmente para os dois últimos perío-
Para definir a dinâmica do desmatamento dos citados, examinou-se a dinâmica de uso
nas terras públicas, destinadas (UC e TI) ou e ocupação do solo com base na Coleção
não (FPND e OTND, figura 1), foram utiliza- 6 do MapBiomas entre 2010 e 2020 (anos
dos os dados históricos do Prodes Ama- finais ao primeiro e último período de análi-
zônia para o período de 1997 a 2020 (INPE, se). Assim, foi possível avaliar a trajetória do
2021). A análise também foi feita consi- uso do solo pós-desmatamento naquelas
derando recortes temporais específicos terras públicas.
(2006-2010, 2011-2015 e 2016-2020), que
se relacionam com artigos encontrados nas Por fim, nós utilizamos as declarações de
leis federais 11.952/2009 e 13.465/2017 posse, até 2020, registradas no Cadastro
(Brasil, 2009; 2017) e nos decretos federais Ambiental Rural (CAR) que se encontram
9.309/2018 e 10.165/2019, os quais alte- sobrepostas às terras públicas e a suas dife-
ram as datas de reconhecimento para a rentes categorias analisadas. Nós assumi-
regularização fundiária de áreas de posse mos que o registro de posse no CAR sobre
e podem impactar o processo de regulari- terra pública indica claro indício de grilagem,
zação e incentivo a ocupação irregular de podendo resultar em desmatamento ilegal.
terras públicas (anexo 1).
Resultados
Por fim, para identificar as trajetórias do uso Cerca de 44% do desmatamento anual nos
do solo nas áreas desmatadas dentro das dois últimos anos (2019 e 2020) no bioma
terras públicas, foram utilizados dados da Amazônia ocorreu em terras públicas.
Coleção 6 do MapBiomas (2021), que per- Entre 1997 e 2020, um total de 21 milhões
mite acompanhar a dinâmica de mudança de hectares de florestas foram destruídas,
de uso do solo anualmente de 1985 a 2020. ou 8% dos 276,5 milhões de hectares de
A acurácia geral do MapBiomas para o florestas públicas existentes da Amazônia
bioma Amazônia é de 97%. Esses dados fo- Legal. É uma área maior do que o Paraná. A
ram reclassificados e reagrupados em três emissão de gases estufa associada a essa
classes: (1) floresta primária ou secundária/ destruição chega, no período analisado, a
regeneração; (2) pecuária; e (3) outros usos. 10,2 gigatoneladas de CO25, corresponden-
do a cinco anos de emissões nacionais de
Uma vez organizadas essas três bases de gases estufa do Brasil (SEEG, 2020).
dados (fundiária, desmatamento e uso e
5. Consideramos
ocupação do solo), combinamo-as de for- Terras destinadas versus não destinadas
uma densidade
ma a quantificar e analisar a evolução e a ex- Dos 21 milhões de hectares desmatados média de carbono de
tensão de desmatamento de 1997 a 2020, entre 1997 e 2020 nas terras públicas, a 132 tC/ha.
nas seguintes categorias fundiárias: UC, menor proporção ocorreu nas glebas já des-
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tinadas – 6% no caso das terras indígenas e A grande maioria do desmatamento, ou 87%


7% no caso das unidades de conservação6 do registrado nas terras públicas até 2020,
(figura 3). Isso mostra que as TIs e as UCs aconteceu nas glebas não destinadas. Nas
são as categorias fundiárias mais preserva- florestas públicas não destinadas, que ocu-
das da Amazônia. Ainda que detenham uma pam 20% das terras públicas, ocorreram
grande proporção dessa classe no território, cerca de 3,4 milhões de hectares de desma-
39% das terras públicas (no caso das TIs) e tamento, ou 16% do total para o período; nas
32% (no caso das UCs), somente 1% e 2% de outras terras não destinadas, que ocupam
suas áreas totais, respectivamente, foram apenas 9% das terras públicas, ocorreram
convertidas para outros usos (tabela 1). 14,8 milhões de hectares de desmatamen-
to, ou 71% do total (figura 3, tabela 1).

6. Com exceção das


áreas de proteção
Figura 3. Desmatamento acumulado em terras públicas na Amazônia até 2020 (acima) e ambiental (APA),
extensão total de terras públicas por categoria fundiária (abaixo). Fonte: IPAM, a partir de dados de conforme descrito no
ICMBio, Incra, Funai e SFB. método.

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Tabela 1. Área e percentual de floresta e desmatamento nas principais categorias de terras pú-
blicas até 2020. Fonte: IPAM, com dados do ICMBio, Incra, INPE, Funai e SFB.

Proporção Proporção Área


Área até Desmate
Categorias entre as de desmate remanescente
2020 até 2020
fundiárias terras X área da de vegetação
(em ha) (em ha)
públicas categoria nativa (em ha)
Glebas UC* 83.152.597 32% 2% 83.152.597
destinadas 1.433.380
(áreas
protegidas) TI 106.480.121 38%
1.329.225
1% 100.375.713

Glebas FPND 56.500.476 20% 6% 49.959.935


públicas 3.438.107
não
destinadas OTND 25.604.123 9% 58% 9.512.777
14.829.277
Total 276.587.070 100% 21.029.989 8% 255.557.081

* Exceto APA, conforme descrito no método.

Até 2005, quase todo desmatamento regis- tou para 85% no período de 2015 a 2020
trado nas glebas sem destinação ocorria (figura 4). No agregado, de 2006 a 2020, o
nas outras terras não destinadas. Após desmatamento em FPND representou 76%
2006, quando a Lei de Florestas foi decre- do registrado em glebas sem destinação
tada, a situação se inverteu: altas taxas – e, somente nos últimos dois anos (2019
passaram a ser registradas nas florestas e 2020), o desmatamento nas FPND res-
não destinadas: de 2006 a 2010, 73% do pondeu por 67% do total de desmatamento
desmatamento em glebas não destinadas registrado nas terras públicas da Amazônia,
ocorreu em FPND. Esta proporção aumen- destinadas ou não.

Figura 4. Proporção do desmatamento das glebas sem destinação na Amazônia, separadas


entre florestas públicas não destinadas (FPND) e outras terras públicas não destinadas (OTND).
Fonte: IPAM, a partir de dados do INPE e do SFB.

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Indícios de grilagem 2). O desmatamento nas áreas com CAR foi


A existência de Cadastros Ambientais Ru- 59% maior no período 2016 a 2020 em rela-
rais (CAR) sobrepostos a terras públicas da ção ao período anterior, de 2011 a 2015.
Amazônia pode ser considerado um forte
indício de grilagem (Azevedo-Ramos et al., Apesar de o CAR ser um instrumento bas-
2020). Atualmente, existem 16 milhões de tante utilizado por grileiros para viabilizar
ha de florestas públicas não destinadas a posse de terra pública, uma vez que é
declarados como propriedade privada no autodeclaratório, vale lembrar que ele não
Sistema Nacional de Cadastro Ambiental comprova direito à terra. Trata-se de um
Rural (Alencar et al., 2021) e 15,2 milhões de instrumento para regularização ambiental e
ha nas outras terras não destinadas (tabela não fundiária.

Tabela 2. Área de CAR nas glebas não destinadas da Amazônia. Fonte: IPAM, com dados do Incra e do SFB.

Área total da classe Área com CAR Proporção da


Categoria fundiária
(em ha) (em ha) área com CAR
Florestas públicas não
56.500.476 16.001.187 28%
destinadas (FPND)
Outras terras não
25.604.123 15.227.037 60%
destinadas (OTND)
Total 82.104.599 31.228.224 38%

Uso do solo nas terras griladas ração de vegetação florestal, de acordo com
Além da pretensa declaração de posse via a Coleção 6 do MapBiomas.
CAR, a grilagem avança tentando dar um ca-
ráter “produtivo” à terra ilegalmente ocupa- Esse padrão – a maior parte da área desma-
da. Uma vez a floresta derrubada e queima- tada convertida para pastagens, enquanto
da, a tendência é a instalação de pastagens. uma parcela menor se regenera – parece
se consolidar ao longo do tempo. Em 2010,
Em 2020, por exemplo, a pecuária era o 79% das florestas públicas não destinadas
principal uso do solo em 75% das áreas (FPND) eram ocupadas por pasto e 19% por
desmatadas das florestas públicas não regeneração, enquanto nas outras terras
destinadas, aproximadamente 2,6 mi- não destinadas (OTND) 73% eram pasto e
lhões de hectares. Nas outras terras não 25%, regeneração (figura 5). As áreas des-
destinadas, o padrão se repete (tabela 3). É matadas com CAR seguiram uma dinâmica
importante notar que, em 2020, aproxima- semelhante de uso e ocupação do solo que
damente 20% da área desmatada em FPND as áreas desmatadas sem CAR.
e OTND apresentou algum grau de regene-

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Tabela 3. Proporção do desmatamento entre 2011 e 2020 e uso do solo em 2020 nas glebas
sem destinação da Amazônia. Fonte: IPAM, com dados do Incra, INPE, MapBiomas 6 e SFB.

Área Uso do solo em 2020


Categoria desmatada % do desmate
fundiária até 2020 2011-2020 Outros
Pecuária Regeneração
(em ha) usos
Florestas
públicas não
3.438.107 52% 75% 24% 1%
destinadas
(FPND)

Outras
terras não
14.829.277 2% 74% 20% 6%
destinadas
(OTND)

Figura 5. Evolução do uso das áreas desmatadas as glebas sem destinação na Amazônia por
período estudado. Fonte: IPAM, a partir de dados do Incra, Inpe, MapBiomas 6 e SFB.

Mesmo após dez anos, a área desmatada


em FPND não só continuou ocupada por
pasto como a proporção aumentou cinco
pontos percentuais, na comparação entre
os períodos 2006-2010 e 2016-2020. Ou
seja, houve investimento econômico para
permanência e conversão de novas áreas
para a pecuária naquele período.
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Discussão e recomendações Fetzer e Marden, 2017). Ainda, o uso da pe-


Nossos achados indicam que mais da me- cuária como meio de legitimar posse de ter-
tade dos desmatamentos (52%) nas flores- ra pública apresenta um potencial de dano
tas públicas não desmatadas ocorreram nefasto para a imagem do produtor que
na última década e o desmatamento ali segue as legislações ambiental e fundiária
vem crescendo, confirmando que, em boa e coloca em risco para a reputação do setor,
medida, a grilagem avança sem controle na dentro e fora do Brasil.
região (Alencar et al., 2021; Azevedo-Ramos
et al., 2018, 2020). Neste sentido, o fim da grilagem na Ama-
zônia está intimamente ligada ao desestí-
Aproximadamente 28% das áreas de FPND mulo a novas invasões. Para isto é preciso
têm CAR (tabela 2), o que é completamen- rapidamente destinar florestas públicas tal
te ilegal de acordo com a Lei de Florestas qual determina a Lei de Gestão de Florestas
Públicas (Brasil, 2006). Em outras palavras, Públicas, de 2006. Os dados reforçam a
este pode ser o prenúncio de uma explosão importância da proteção desses territórios,
do desmatamento ilegal nestas florestas mesmo que ambas as categorias sofram
não destinadas nos próximos anos, já que o intensa pressão de invasores. Este é um
CAR tem precedido o desmatamento (IPAM, caminho comprovadamente eficiente para
não publicado). pacificar o uso e a ocupação da terra, e em
conjunto com as ações de comando e con-
Uma vez desmatadas, as florestas em trole pode frear os níveis de desmatamento
glebas não destinadas dão lugar predomi- ilegal na região (Stabile et al., 2020; Nepstad
nantemente às pastagens (figura 3). O boi et al., 2014). Na mesma direção, é funda-
é utilizado como uma espécie de “zelador” mental que haja um sério engajamento dos
da terra grilada e usado para ensejar a sua frigoríficos quanto ao monitoramento e a
“posse”. Historicamente, esta tem sido a rastreabilidade de suas cadeias de fornece-
prática da grilagem na Amazônia (Lima Fi- dores, sejam eles diretos ou indiretos (Rajão
lho et al., 2021). O foco não é a produção de et al., 2020) (anexo 2).
bezerros ou carne, mas sim a “legitimação”
da ocupação da terra para posterior regula- Nossos resultados também revelam que
rização fundiária. Para tanto, o CAR passa a cerca de 20% das áreas invadidas e des-
ser um instrumento adicional para demons- matadas nas glebas não destinadas foram
trar que supostamente a posse da terra é abandonadas após ocupação e desmate,
legítima, aumentando assim as chances pois apresentaram algum grau de regene-
de negociação no mercado de especulação ração (tabela 3). Embora essa regeneração
imobiliária (Reydon et al., 2020). seja bem-vinda do ponto de vista da biodi-
versidade e do clima, ela indica a proporção
Cabe lembrar que essa conversão de flores- do desperdício ambiental e econômico
tas públicas em pastos está, quase sem- que essa dinâmica representa: derruba-se
pre, repleta de direitos fundiários incertos, florestas ricas e densas para depois aban-
violência e corrupção (Alston et al., 2000; doná-las. Há um acúmulo de custos ecoló-
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gicos e econômicos, além do próprio custo pecuária. Em boa parte, o regime de chuvas
de conversão da vegetação nativa em pasto na Amazônia e fora dela depende de um
(Garcia et al., 2017), com o comprometi- volume de florestas mantida preservadas
mento da biodiversidade (Solar et al., 2015) (Leite-Filho et al., 2021) e, como apresen-
e de inúmeros serviços ecossistêmicos tando nesta nota, em boa medida estas são
(Strand et al., 2018; Strassburg et al, 2014). públicas.
Cabe lembrar, ainda, que essa vegetação
secundária muito dificilmente voltará às Portanto, a grilagem precisa ser, urgente-
condições originais e está mais susceptível mente, combatida. Para tanto, ações de
a novas degradações, por exemplo, pelo comando e controle aliada ao fim de propo-
fogo (Alencar et al., 2020). sições executivas7 ou legislativas8 para se
anistiar ocupação ilegal de terras públicas
Finalmente, como já demonstrado por es- devem ser perseguidas. Esse movimento
tudos anteriores (Soares-Filho et al., 2010; cria instabilidade política e institucional,
Kruid et al., 2021), as terras públicas já desti- além de uma espécie de “corrida” para
nadas apresentam grau de desmatamento a ocupação irregular de terras públicas,
e grilagem bem menor. Por exemplo, nos destinadas ou não, na expectativa de uma
encontramos que as TI e UC ocupam 71% mudança futura da legislação em seu be-
de todas as terras públicas da Amazônia nefício, com impacto direto sobre os ativos
(tabela 1), mas concentraram apenas 13% ambientais do Brasil.
da área total desmatada até 2020 (figura 3).
7. Por exemplo, os
É necessário frisar, contudo, que a regulari- Decretos Federais
No caminho inverso, as glebas públicas não zação fundiária em OTNDs é possível à luz nos 9.309/2018 e
destinadas (FPND e OTND) cobrem 29% de normativas relacionadas à regularização 10.165/2019, que
propuseram a exten-
da área total de terras públicas (tabela 1), ambiental (anexo 1) e de programa oficiais
são da data de corte
mas concentraram 87% do desmatamento como o Terra Legal. Já as FPNDs, conforme de 2008 para 2014
acumulado (figura 3) até 2020. Novamente disposto na Lei de Gestão de Florestas Pú- para concessão da
aqui, a indicação é que grilagem avança blicas de 2006, não são passíveis de legali- titularidade da terra,
e outras iniciativas
como o novo motor da destruição florestal zação para uso particular.
que mantêm a data
na região. Nas OTNDs, a supressão da ve- de corte em 2014 e
getação ocorreu, em grande parte, antes de Recomendações flexibilizam outros
2005, mas de 2006 até 2020 a proporção de critérios, como
tamanho mínimo
desmatamento ocorrendo nas FPND osci- • Os governos estaduais e federal devem
do imóvel, além de
lou entre 73% e 85% do total (figura 4). avançar com a destinação de florestas pú- propor a dispensa de
blicas federais e estaduais para unidades vistoria para regulari-
O avanço rápido e amplo da grilagem sobre de conservação, terras indígenas, florestas zação da posse.

terras públicas na Amazônia impõe um de produção, entre outras categorias previs- 8. Por exemplo, as
sério risco aos esforços do país no cum- tas pela Lei 11.284/2006, que rege a gestão Leis 510/2020 e
2633/2021 atual-
primento de suas metas de redução de de florestas públicas; mente em debate no
emissões (Albuquerque et al., 2019; IPCC Senado.
2021), bem como a própria produção agro- • Promover, por parte dos poderes Execu-
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tivo e Legislativo, debates claros e trans- tos (GTFI), Selo Verde etc, inclusive com o
parentes sobre legislações referentes à intuito de se separar a grilagem de terras de
regularização fundiária, fazendo valer a Lei produção pecuária;
13.465/2017;
• Apoiar, por parte dos frigoríficos, seus for-
• Combater as ocupações ilegais em flo- necedores em atividades de capacitação
restas públicas não destinadas, incluindo em temas como melhoria produtiva e regu-
nesta ação os CAR a elas sobrepostos e larização ambiental e fundiária, de forma
declarados nos banco de dados cadastrais a promover o uso e a ocupação do solo já
dos estados; aberto, de forma sustentável e legal;

• Governos e Ministérios Públicos Federal e • Combater a ilegalidade na cadeia da car-


Estadual devem entender os desafios e de- ne, por meio da suspensão/bloqueio, por
senvolver estratégias para estimular mais parte dos agentes financeiros, de financia-
adesão de frigoríficos no TAC da Carne, em mentos agropecuários nas florestas públi-
especial frigoríficos regionais; cas não destinadas, bem como estimular o
comprometimento, por parte do varejo, de
• Frigoríficos devem mapear fazendas pro- não comprar produtos agropecuários origi-
dutoras por meio de ferramentas de SIG e nados dessas áreas.
sensoriamento remoto para identificação
de quais regiões concentram-se os maiores
desafios relativos à legalidade da cadeia, Agradecimentos
e intensificar o monitoramento de diretos Gostaríamos de agradecer a Jarlene Gomes
dessas regiões e fazendas; e Pedro Nogueira por contribuições à dis-
cussão, e a Cristina Amorim, pela edição e
• Frigoríficos e varejistas devem intensificar revisão. Também agradecemos pelo apoio
ações de monitoramento dos fornecedores concedido pela Rainforest Foundation
indiretos, dando escala e implementando Norway (RFN), a Fundação Gordon e Betty
ações discutidas em iniciativas como Boi Moore, a Fundação Mott e o Instituto Clima
na Linha, GT Rastreabilidade do Grupo de e Sociedade (iCS).
Trabalho da Pecuária Sustentável (GTPS),
Grupo de Trabalho de Fornecedores Indire-

Sugestão de referência
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Anexo 1 – Marcos regulatórios relacionados à regularização fundiária em glebas públicas.

Instrumento Lei Federal Lei Federal Decreto Federal Decreto Federal


regulatório 11.952/2009 13.465/2017 9309/2018 10.165/2019
Status Revogado Aprovado Não aprovado Não aprovado
Artigo Art. 5° Art. 4° e Art. 2° Art. 10° A. Art. 10° A.
Descrição “IV – compro- “Lei nº 11.952, “A comprovação A comprovação
var o exercício de 25 de junho da prática de da prática de
de ocupação e de 2009 , passa cultura efetiva, cultura efetiva,
exploração direta, a vigorar com as ocupação e ocupação e
mansa e pacífica, seguintes alter- exploração direta, exploração direta,
por si ou seus ações: mansa e pacífica, mansa e pacífica,
antecessores, ...IV - compro- por si ou por seus por si ou por seus
anteriores a 1° var o exercício antecessores, antecessores,
de dezembro de de ocupação e anteriores a 5 de anteriores a 5 de
2004”. exploração direta, maio de 2014, maio de 2014,
mansa e pacífica, poderá ser feita poderá ser feita
por si ou por seus por meio de doc- por meio de doc-
antecessores, umentos, de técni- umentos, de técni-
anterior a 22 de cas de sensoria- cas de sensoria-
julho de 2008”. mento remoto e mento remoto e
de outros meios de outros meios
de prova. (Incluído de prova.”
pelo Decreto nº
10.165, de 2019).”

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Anexo 2 – Compromissos públicos da nitoramento para estabelecer uma aborda-


pecuária e o monitoramento de diretos e gem única de monitoramento de fornece-
indiretos dores da cadeia da pecuária (MPF, 2020).

O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) Além disso, governos estaduais, como


da Pecuária foi estabelecido em 2009 os do Pará e Amazonas, em parceria com
pelo Ministério Público Federal do Pará com o MPF, têm implementado ferramentas
foco nos frigoríficos desse estado, e a partir como Selo Verde e o Visipec, que realizam
de 2010 nos outros estados da Amazônia o rastreamento da cadeia e conectam infor-
Legal, ato conhecido como TAC da Carne mações de inspeção sanitária, como a GTA,
Legal. Eles se comprometem a não com- e de regularização ambiental, como o CAR.
prar carne de fazendas que: (i) possuam 9. O Projeto Boi na
Linha (www.boi-
embargo ambiental por desmatamento Entretanto, as ações e a adesão a esses
nalinha.org) é uma
ilegal, (ii) não apresentem polígono de des- compromissos públicos por parte dos articulação voltada
matamento do Prodes após a assinatura frigoríficos foram inconsistentes entre a fortalecer os com-
do TAC, (iii) não possuam CAR, (iv) apre- os estados da Amazônia (Moffette et al., promissos sociais e
ambientais na cadeia
sentem sobreposição com TIs e UCs, (v) 2018). Segundo o projeto Boi na Linha 9,
de valor da carne
constem na lista de trabalho de análogo ao existem 132 indústrias frigoríficas no bio- bovina na Amazônia
escravo, e (vi) e que não possuam a Licença ma Amazônia: cem assinaram o TAC e 32 e impulsionar sua
Ambiental Rural (LAR), no caso do Pará. ficaram de fora. Aquelas que não parti- implementação.

cipam de nenhum compromisso evitam 10. Disponível


em https://forbes.
Seja pelo TAC da Pecuária e da Carne Le- custos de fiscalização e monitoramento
com.br/forbe-
gal, seja pelo Compromisso Público de e aumentam seu lucro líquido (Barreto sagro/2021/04/
Desmatamento Zero (Greenpeace, 2009), et al., 2017), travando uma concorrência jbs-inicia-monitora-
avanços foram feitos a fim de impedir a desleal com quem assinou o acordo. mento-de-fornece-
dor-indireto-de-gado-
comercialização do gado produzido em
-com-blockchain/
terras embargadas por desmatamento Hoje, o monitoramento feito pelos frigorí-
11. Disponível em
ilegal ou por outros requisitos ambien- ficos dos seus fornecedores foca apenas
https://www.noti-
tais, fundiários e sociais não atendidos. nos diretos, ou seja, quem vende para ciasdapecuaria.com.
as plantas de abate, ainda que os três br/noticias-agrone-
Frigoríficos e varejo criaram metodo- maiores frigoríficos tenham feito anún- gocio/noticia/geral/
marfrig-lanca-ferra-
logias e protocolos próprios, mas que cios recentes sobre o monitoramento
menta-de-monitora-
produzem resultados individuais que em de indiretos 10,11,12. A maior parte do des- mento-de-produto-
muitos casos não consegue ser cruza- matamento nas cadeias de suprimentos res-indiretos
dos. Para remediar esse cenário, as três ocorre justamente nas propriedades de 12. Disponível em
indústrias líderes em abate e processa- fornecedores indiretos, não monitorados. https://www.isto-
edinheiro.com.br/
mento de carne bovina no bioma Ama-
minerva-testa-siste-
zônia - JBS, Marfrig e Minerva - e as três Uma parte desse gado é criada e recriada ma-para-monitorar-
principais empresas do varejo no Brasil em fazendas que não seguem os princí- -fornecedores-indire-
- Carrefour, Grupo Pão de Açúcar e Walmart pios dos acordos citados acima, incluindo tos-de-gado/

- harmonizaram seus protocolos de geomo- aquelas que estão irregularmente dentro


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NOTA
TÉCNICA Outubro de 2021 • nº 8

de áreas protegidas ou terras públicas. cos (Gibbs et al., 2016; Klingler et al., 2018;
O gado é vendido para propriedades em Skidmore et al., 2020). Essa “lavagem” do
conformidade, que funcionam como inter- gado que vem de áreas invadidas conta-
mediários antes da venda para os frigorífi- mina a cadeia da pecuária da Amazônia.

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