Você está na página 1de 9

a alquimia do rapé

guia básico de feitio de rapé para males da atualidade - por Renê Dalton
1) O que é Rapé?

O rapé é uma medicina em pó composta basicamente por tabaco, ervas diversas, cinzas de árvores e o seu
uso por diversas etnias indígenas remonta ao período que antecede o descobrimento do Brasil.

É indicado que o seu uso seja feito por via de sopro, sendo que a pessoa que recebe esse sopro deve
manter sua respiração presa no momento da aplicação, essa aplicação é feita com um aplicador, podendo
ser o kuripe ou o tipí, o kuripe é o aplicador para uso pessoal e o tipí é utilizado para aplicar em outras
pessoas.

Sua utilização tem como função prover a cura e ou expansão de consciência, não se limitando apenas ao
físico, mas também ao espírito devido a crença e os costumes que envolvem essa medicina.
Um exemplo disso é o uso do rapé entre alguns pajés para fortalecer conexões com a floresta e com os
seres que nela habitam.

Independente da linha de fé que permeie uma aplicação ou roda de rapé, essa medicina tem sua eficiência
reforçada e comprovada no depoimento de milhares de pessoas que fazem uso dela e que se beneficiam
pelo seu poder de cura.

2) Mistérios do Rapé

Dentro do universo do rapé existem muitas histórias que relatam a presença de uma "consciência" espiritual
como guia e responsável pela medicina, algumas crenças afirmam que essa presença se manifesta a partir
do rezo, outras afirmam que não depende do rezo e sim do feitio, o que é comum em algumas aplicações é
a alteração do estado de consciência e que muitos dizem ser o espírito do rapé atuando.

Existe também algumas linhas que acreditam que os mistérios do rapé estejam diretamente ligado aos
mistérios do tabaco devido a quantidade de histórias e lendas que fazem referência a essa mesma
consciência e sua manifestação nos rituais de cachimbo, lembro agora me de uma história sobre a Mãe
Samaúma, que faz referência ao rapé como meio de comunicação entre uma curandeira e o espírito da
Samaúma.

Independente das crenças, algo a ser levado em conta é de que o uso do rapé deve ser feito dentro de um
conceito de respeito e tranquilidade, com as intenções de cura bem definidas, e seu uso não é
recomendado associado ao álcool ou fora de um contexto de cura ou espiritual, mas cabe a cada um, dentro
de sua consciência, escolher a forma de relação com essa medicina.
3) Utensílios para o feitio

1- Panela de Barro
2- Pilão
3- potes de vidro
4- pratos de vidro
5- meia de nylon
6- colher de pau
7- colher de sopa
8- canivete

4) Conceitos sobre o feitio de rapé

O feitio de rapé deve ser tratado com respeito e seriedade, devendo seguir um padrão de higiene rigoroso,
tanto quem irá fazer o rapé, bem como os utensílios e matéria utilizados devem estar limpos.
Ao pensar em fazer um rapé tenha em mente a criação de um ser de cura, que irá atuar no campo astral e
físico de acordo com a necessidade de quem o recebe, tendo essa idéia em mente, eu sigo um modelo que
é composto da seguinte forma:

alma (cinzas) - conduz


corpo (tabaco) - aterra
coração (ervas) - atua
No caso de rapés que não contenham tabaco uma das ervas deverá ocupar o seu lugar dentro desse
formato, mantendo sempre essa composição de alma, corpo e coração.
Na medida de quantidade eu uso mais ou menos a seguinte porcentagem, 50% tabaco, 35% ervas e 15%
cinzas.

5) O feitio

Antes de pensarmos no feitio, vale ressaltar que tanto os utensílios quanta a matéria que será utilizada
(tabaco, ervas, cinzas) devem estar ao alcance da mão, dispostas de forma organizada.
A aquisição do tabaco e das ervas pode ser feita junto a raizeiros, pajés ou empórios especializados, caso
não tenha como plantar em casa. O fumo de corda pode ser utilizado desde que a procedência seja
orgânica e que esteja em bom estado de conservação, o fumo de corda mofa com muita facilidade se não
for devidamente manuseado e estocado.

O processo do feitio basicamente se divide em 5 estágios, picar, energizar, secar, moer e coar, mas no meu
caso após todo o processo eu faço meu rezo, que prefiro chamar de afirmação positiva.

Abaixo trataremos de cada um desses estágios separadamente:

1) Picar
Para cada item do seu rapé você deverá ter um pote ou uma travessa funda de vidro para ser energizado
ao sol e um prato ou pires de vidro para cobrir o pote ou a travessa, sendo assim use o canivete para picar
o tabaco, as ervas, e as lascas de tronco que serão usadas para as cinzas lavando sempre o canivete entre
cada item.

2) Energizar
Coloque cada item um em pote separado e leve ao sol por pelo menos 10 minutos não esquecendo de
cobrir com o prato ou pires.
3) Secar
Nesse estágio usaremos a panela de barro e a colher de pau, secando cada item separado e em fogo baixo,
mexendo com frequência para evitar que queime, que fique torrado.

Uma forma de evitar que o tabaco ou as ervas acabem torrando é observar a coloração e a fumaça, quando
começar a mudar o tom da cor, escurecendo, ou quando a fumaça começar a subir em quantidade é o
momento de tirar da panela e reservar até diminuir a temperatura.
Por fim para fazer as cinzas pode se usar uma chapa de metal sobre o fogão ou a panela de barro em fogo
alto, as lascas irão torrar, virando carvão e por fim cinzas.

"Eu fui secar tabaco pro feitio de rapé, na fumaça do tabaco quero ver quem para em pé" - quando a fumaça
do tabaco subir evite respirar!

4) Moer
Agora é o momento da transformação, onde usaremos o pilão para moer o tabaco e as ervas.
Com a colher de sopa coloque o material no pilão e use o taco do pilão para moer cada item
separadamente, após isso reserve cada item separado, usando o pote ou a travessa de vidro e o prato ou
pires para cobrir.
5) Coar
Esse é o momento que requer muito cuidado e atenção, algumas coisas a serem observadas é o estado da
meia de nylon e da colher de sopa, colher com pequenas farpas pode danificar a meia causando furos e
para coar o rapé é preciso que a meia esteja em bom estado e com a trama bem fechada.
Cubra uma travessa com a meia de nylon e prenda com um elástico ou vista a travessa com a meia,
coloque o material que foi moído sobre a meia e com a colher de sopa mexa delicadamente espalhando o
material sobre a meia até que não sobre nada ou sobre partículas que não viraram pó, esse material que
sobra deve ser levado novamente ao pilão até virar pó.
Repita o processo para cada item do rapé e isso inclui as cinzas, as cinzas também devem ser coadas.

6) O rezo ou afirmação positiva

O pensamento tem poder bem como as emoções, dentro do meu entendimento e prática a vibração do
pensamento e as emoções atuam como a fina costura que agrupa energeticamete todos os ingredientes do
rapé, ativando assim a força, o poder de cura e determinando por uso da fala o objetivo final dessa
medicina. Você pode fazer uso de uma oração ou afirmação positiva dentro de sua crença ou linha religiosa.
Eu particularmente começo meu rezo agradecendo ao Sagrado Universo e a Divina Natureza a bênção da
vida, saúdo o reino vegetal, o reino elemental e por fim as forças e espíritos das matas.

Sagrado Universo, Divina Natureza


Eu agradeço a bênção da vida
Eu agradeço por experimentar a vida manifestada na matéria

Eu saúdo o reino vegetal e todo o seu poder de vida e consciência


Eu saúdo o reino elemental e reconheço sua força presente em tudo que existe no Cosmos
Eu saúdo os espíritos das matas e seus encantados

Peço a bênção e a proteção


Das correntes de cura, das benzedeiras e curandeiras

Meu respeito e saudação à todos os pajés, aos catimbozeiros e à todas tendas de umbanda de mesa
branca

Que a energia contida nesse rapé seja força de cura, amor e luz
7) Uso pessoal e aplicações - soprar e não cheirar

O uso do rapé é feito com aplicador, existem dois tipos de aplicadores de rapé, um para uso pessoal
conhecido por Kuripe e o tipí que é utilizado para aplicações em outras pessoas.

A aplicação de rapé dever ser feita pelo sopro e quem o recebe deve manter a respiração presa no
momento da aplicação.

Existem 3 fatores importantes a serem observados na aplicação do rapé:

1- O rapé
2- Quem o aplica
3- O sopro utilizado

Dentro da tradição indígena o sopro do rapé sempre estará relacionado com algum animal bem como sua
representação de força e poder, eu particularmente faço uso de 3 tipos de sopro de acordo com o rapé, de
acordo com a necessidade e o estado de quem receberá esse sopro, cabe dentre desse entendimento
sabedoria e bom senso.

1 - Sopro suave
indicado para iniciantes ou pessoas em estado de fraqueza ou adoentadas
sopro contínuo - duração aproximada 3 segundos

2 - Sopro médio
indicado para iniciados e rapés de atuação mais sutil (sem tabaco)
sopro de início suave finalizando com força - duração aproximada 2 segundos

3 - Sopro forte
Indicado para casos específicos, necessidade de força de atuação sobre a
pessoa que recebe, sessões com enteógenos ou meditação
sopro forte único - duração aproximada 1 segundo
8) Como fazer um aplicador 2 em 1 - kuripe e tipí na mesma peça

Material utilizado
Um pedaço de bambu de aproximadamente 10cm
Um pedaço mangueira de borracha cirúrgica ou mangueira de plástico
Uma lixa fina para madeira

Corte o bambu em duas partes e lixe com cuidado as extremidades, o bambu será a piteira de sopro do
aplicador, assim teremos duas piteiras de bambu de aproximadamente 5cm
Prenda as duas piteiras de bambu cada uma em uma das extremidades da mangueira e pronto, você terá
assim um aplicador que servirá tanto para uso pessoal bem como para aplicação em outras pessoas

9) Considerações Finais

Dentro da minha vivência com o rapé e no passar do tempo observei alguns fatores que merecem atenção e
que são desconhecidos pela maioria das pessoas

* Prazo de validade - qualquer alteração na coloração e no cheiro do rapé pode ser indício de fim de
validade, atenção ao cheiro de azedo, o prazo de validade de um rapé pode variar de 1 a 3 anos

* Cuidados com a manipulação - evite deixar o recipiente de rapé aberto e exposto a umidade e sol, isso
pode tanto alterar como anular o rapé

* Cuidados com a higiene - é indicado higienizar os aplicadores com frequência, evite aplicadores que
tenham em suas partes pedaços de animais, dentes, ossos, penas e couro, além de ser considerado crime
pela atual legislação brasileira é anti-higiênico, restos mortais podem conter bactérias indesejadas

* Evite misturar rapés no mesmo recipiente, independente que seja o mesmo tipo de rapé, cada feitio é
único.

* Conhecimento fitoterápico nunca é demais, procure estudar o poder medicinal das plantas junto aos
raizeiros e raizeiras, compre livros, faça cursos. Tenha consigo um caderno aonde possa sempre anotar
essas informações

Agora é com você, desejo do fundo do meu coração que de hoje em diante a tua relação com o rapé seja
mais ativa, positiva e edificante.
RECEITAS DE RAPÉ PARA ALGUNS DOS MALES DA ATUALIDADE

ANSIEDADE - Rapé de camomila e capim santo sem tabaco


Ingredientes: 100g de camomila, 35g de capim santo e 15g de lascas de pau pereira
Fazer de acordo com o tópico 5

ENXAQUECA - Rapé de gengibre com tabaco


Ingredientes: 100g de tabaco, 35g de gengibre, 15g de lascas de pau pereira
Fazer de acordo com o tópico 5

PREGUIÇA - Rapé de pimenta com tabaco


Ingredientes: 100g de tabaco, 35g de pimenta malagueta, 15g de lascas de pau pereira
Fazer de acordo com o tópico 5

SINUSITE - Rapé de arruda com tabaco


Ingredientes: 100g de tabaco, 35g de folhas de arruda, 15g de lascas de pau pereira
Fazer de acordo com o tópico 5

MEDITAÇÃO - Rapé de alecrim com tabaco


Ingredientes: 100g de tabaco, 35g de alecrim, 15g de lascas de pau pereira
Fazer de acordo com o tópico 5

Você também pode gostar