proposto por Nassetti, além de in- Os aspectos problemáticos aqui
troduzir quarto particular, pouco discutidos não impedem, de uma verossímil na língua portuguesa, maneira geral, a legibilidade do é empobrecido pelas opções dema- texto de Nassetti; constituem tão siado correntes do tradutor. É cla- somente observações, que, para ro que não se espera que o tradu- alguns leitores, passarão desperce- tor seja um especialista em século bidas. O médico e o monstro já XIX, tampouco que produza um conta com várias traduções em lín- texto que se pretenda daquela épo- gua portuguesa que, na verdade, ca. Contudo, as escolhas lexicais se complementam. Cada tradução de Nassetti dão um tom de favorece aspectos e nuances diver- contemporaneidade que acaba por sas do texto fonte e do estilo do surpreender o leitor. Afinal, a nar- autor. Quanto maior o número de rativa se passa na Londres do sé- propostas de textos em português, culo XIX, o que cria uma expec- maior será o conhecimento dos lei- tativa de distanciamento necessá- tores sobre The strange case of Dr. rio que poderia ser atingido por Jekyll and Mr. Hyde e sobre arcaísmos incidentais ao longo do Stevenson. texto traduzido. Luana Ferreira de Freitas UFSC
surpresa, títulos como: Histórias
de Amor, de Bioy Casares, Arma- A galinha degolada e outros dilha Mortal, de Roberto Arlt, contos, seguido de Heroísmos Dom Segundo Sombra, de Ricardo (Biografias exemplares) de Güiraldes, A Galinha Degolada e Horacio Quiroga. Tradução e outros contos, de Horacio notas: Sergio Faraco. Posfácio: Quiroga. Estes são apenas alguns Pablo Rocca. Porto Alegre: dos muitos escritores hispano-ame- L&PM POCKET, 2002, 152 pp. ricanos que fazem parte do catá- logo da L&PM POCKET. A edi- tora é conhecida no mercado pela Hoje já é possível encontrar em comercialização de livros a preços uma banca de revistas, não sem populares, o que talvez desperte a Resenhas de Traduções 277
desconfiança acadêmica quanto à Na tradução para o português,
qualidade de suas traduções. Faraco se revela um tradutor Em primeiro lugar, não pode- criterioso, experiência adquirida mos esquecer da importante con- nas traduções de várias obras de tribuição destas editoras popula- autores rioplatenses como, Mario res, que permitem o acesso do lei- Aguirre, Eugenio Montejo, tor brasileiro a textos antes res- Acevedo Díaz e Roberto Arlt. Essa tritos a bibliotecas universitárias experiência empresta um valor es- ou a tomos de Obras Completas pecial ao texto, o que não é o caso de alto custo. Porém, que preço da maioria das traduções, que de- além dos nove reais e cinqüenta vido a aparente proximidade entre centavos, este mesmo leitor terá o português e o espanhol são leva- que pagar? Qual é o custo de uma dos, freqüentemente, a simples- tradução descuidada? Difícil es- mente aportuguesar palavras e ex- tabelecer, o certo é que as perdas pressões do original. são muitas. Na tradução da segunda parte Em A Galinha Degolada e ou- do livro, as Biografias exempla- tros contos, do escritor uruguaio res, Faraco consegue encontrar Horacio Quiroga, a tradução fi- equivalentes em nosso idioma. É cou a cargo do também escritor certo que os textos são curtos cer- Sergio Faraco. Neste volume os ca de meia página cada um, e apa- textos foram divididos em duas rentemente informativos, mas partes; na primeira os contos se- Quiroga os escreve sob uma ótica lecionados são; “Travesseiro de ficcional, o que dificulta o traba- penas”, “A galinha degolada”, lho do tradutor. “O solitário”, “O espectro”, “O Já ao traduzir os contos, Faraco mel silvestre” e “A câmara escu- opta por manter o tom um tanto ra”. Na segunda parte temos quanto formal, característico em Heroísmos (Biografias exempla- alguns destes relatos que represen- res): são biografias breves, den- tam uma atmosfera sombria. Con- tre elas a de Robert Scott, Louis tudo, esta opção, acaba levando o Pasteur, Lope de Aguirre e tradutor a reproduzir expressões Richard Wagner. A séria comple- em desuso no português do Bra- ta dessas biografias foi publicada sil, e impõe um ritmo lento à nar- durante o ano de 1927 na revista rativa, como podemos perceber portenha Caras y Caretas. nestes exemplos: “Entre suas alucinações mais como um material de apoio para a pertinazes”. (“O Travesseiro leitura e compreensão do texto. O de penas” p. 10). que ocorre com esta tradução dos textos de Quiroga é que ela parece “O sol se ocultava trás entrar em conflito com o que pro- interregno festivo”. (“A Ga- põe o modelo editorial. linha degolada” p.13). Já que o objetivo de uma edi- ção popular é alcançar através do “Mas todos nós éramos menor preço, um maior número aquinhoados com as efusões de leitores, por que então dificul- do melífluo senhor”. (“A tar os termos na tradução? Cabe- Câmara escura’’p.59). ria aqui, ao tradutor resolver al- guns dos problemas que surgem ao “... nos olhos de vidro opaco transpor um texto de um idioma sob as pestanas como para outro, através de notas de glutinosas e inchadas, em rodapé, notas explicativas no fi- toda a crispatura daquela bru- tal caricatura de homem”. nal do texto, ou qualquer alterna- (“A Câmara escura” p.63). tiva que possa auxiliar o leitor. É importante lembrar que o leitor “Mais longe, depois da pon- monolíngüe construirá a sua inter- te, a mandioca tostada se er- pretação do texto, através das es- guia, por fim erétil, perlada colhas lexicais do tradutor. de sereno”. (“A Câmara es- Contudo, não estamos propon- cura” p.65). do que o tradutor faça uma com- pleta adaptação do texto, para fa- O leitor se encontra, então, di- cilitar a leitura, estas adaptações ante de duas alternativas; já existem e cumprem o seu papel 1- tenta adivinhar o significa- na literatura infanto-juvenil, mui- do da expressão no contexto da tas vezes questionável devido ao frase, alternativa adotada também estilo de resumo adotado na maio- em alguns momentos pelo tradu- ria das edições. tor, ou O que sugerimos para esta tra- 2- procura um dicionário. dução é uma melhor adequação ao A segunda alternativa não re- modelo editorial, até mesmo para presenta um problema em si, já que cumprir um dos objetivos do livro o dicionário deveria servir sempre de bolso, que é ser de fácil manu- praça, o que impossibilitaria a con- seio, para poder ser lido no ôni- sulta a uma obra de referência. bus, na lanchonete, no banco da Ana Claudia Trierweiller UFSC
do mérito poético de Borges, seus
ensaios encontram uma rara una- Obras completas IV, de Jorge Luis nimidade. Completando o vo- Borges, vários tradutores. São lume há uma pormenorizada cro- Paulo: Globo, 1999, 680 pp. nologia e uma bibliografia de Borges elaborada por um de seus melhores críticos e biógrafos, Este quarto e último volume Emir Rodríguez Monegal e devi- das chamadas Obras completas de damente adaptada e atualizada por Borges compreende livros publi- Jorge Schwartz e Gênese Andrade cados entre 1975, quando o autor da Silva. Tanto a cronologia como tinha 76 anos, e 1988, quando se a bibliografia não constam do ori- completavam dois anos de sua ginal e foram tiradas do livro morte. São quatro textos, todos Ficcionario, ampla antologia de eles de prosa ensaística, todos eles Borges, organizada e anotada por excelentes: Prólogos com um pró- Monegal e publicada no México logo de prólogos, Borges, oral, em 1981. Textos cativos e Biblioteca Pesso- Borges, inserido em uma cul- al. Prólogos. Neles está o melhor tura, a hispânica, notória por obras Borges, com toda a sua imensa prolixas, foi, como se sabe, um cultura, sua incrível autonomia virtuose das formas breves e des- intelectual, sua originalidade, sua denhadas. Três dessas formas es- inteligência ágil e seu estilo que tão presentes aqui em textos para revolucionou a prosa hispânica do os quais o adjetivo certo é simples- século XX. Se ainda há alguns mente geniais: prólogos, resenhas (cada vez menos, é verdade) que e minibiografias. Aliás, as rese- questionam a narrativa inovadora nhas e as minibiografias estão tam- de Ficciones e Al Aleph e se mui- bém embutidas em muitos de seus tos não se convencem totalmente mais inspirados prólogos. Uma