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A ESTIMULAÇÃO PRECOCE E SUA CONTRIBUIÇÃO NO

DESENVOLVIMENTO DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIAS


INSERIDAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL NO MUNICÍPIO DE IRATI/PR

Lucimare Aparecida Ribeiro1 - UNICENTRO


Ana Flávia Hansel2 - UNICENTRO

Eixo – Psicopedagogia, Educação Especial e Inclusão


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Este trabalho é resultado de uma investigação realizada com alunos da Educação Especial,
matriculados em dois Centros de Educação Infantil, localizados na área urbana do município
de Irati, no interior do Paraná. A pesquisa se deu com dois alunos participantes do atendimento
em Estimulação Precoce, o qual ocorre nesse município em Escola Especial, especificamente,
no ambiente da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE). Os alunos em questão
possuíam a mesma faixa etária, mas se diferenciavam nas especificidades decorrentes das suas
deficiências, bem como do período de tempo em que participavam desse atendimento, essas
distinções tornaram-se significativas para o entendimento das problematizações encontradas
nesse artigo. Nesse sentido, a pesquisa teve por objetivo a investigação da (des)continuidade
do atendimento em Estimulação Precoce no ambiente da Educação Infantil, além da observação
de quais seriam as contribuições advindos desse atendimento no desenvolvimento desses
alunos. Portanto, esse estudo realizou-se por meio de observação sistemática e registro em
diário de campo, o qual aliado à pesquisa bibliográfica nos oportunizou chegar a algumas
reflexões acerca do tema investigado. Para a análise de dados utilizamos a perspectiva de
Análise de Conteúdos proferida por Bardin (1977). Fundamentamos-nos teoricamente em
autores da área da Educação Especial, Estimulação Precoce e Educação Infantil, tais como;
Mantoan (2013), Bolsanello (1998,2003), Perez-López; Brito de La nuez (2004), Kramer
(2007), Kishimoto (2001), entre outros, além dos documentos oficiais da Educação Especial.
Desse modo, as conclusões resultantes da pesquisa nos permitem refletir sobre os desafios de
adaptação enfrentados pelos educadores e alunos, reflexos do não conhecimento das
especificidades dos alunos da Educação Especial e do desconhecimento sobre a Estimulação
Precoce e seus benefícios para o desenvolvimento dos alunos, temas que apontam para o

1
Graduanda do curso de pedagogia pela Universidade Estadual do Centro-Oeste/ UNICENTRO – campus de Irati..
E-mail: mariribeiro659@gmail.com
2
Doutora em Educação Doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná, professora adjunta da
Universidade Estadual do Centro-Oeste/ UNICENTRO. E-mail: anaflaviahansel@gmail.com

ISSN 2176-1396
1799

despreparo de formação específica dos professores que atuam com alunos com deficiência, nos
Centros de Educação Infantil desse município.

Palavras-chave: Estimulação Precoce, Educação Infantil, Desenvolvimento Infantil.

Introdução

Os seres humanos nascem dotados de percepções e habilidades, as quais se estimuladas


de uma forma efetiva, farão com que o seu desenvolvimento ocorra de forma a proporcionar-
lhes aprendizagens significativas. Alves (2007) defende que:

o que acontece nos primeiros anos de vida de uma criança, é muito importante para as
suas construções e sua trajetória, são marcas fundantes que repercutem ao longo de
sua história. Muitas situações de obstáculo em relação ás possibilidades de
desenvolvimento têm sua origem nos momentos iniciais de constituição do sujeito [...]
(ALVES, 2007 p.22).

Soejima (2008) reitera que o fator que irá diferenciar o processo evolutivo do
desenvolvimento humano, será a forma e a qualidade dos estímulos que estes receberão durante
os seus primeiros anos de vida. Ou seja, quanto mais precocemente os estímulos forem
recebidos, haverá melhores possibilidades de potencializar o desenvolvimento global desse
sujeito sem tantas posteriores complicações. Nesse sentido, a Estimulação Precoce, primeiro
programa da Educação Especial, mostra-se como uma importante ferramenta de apoio ao
desenvolvimento global.
As Diretrizes de Estimulação Precoce (BRASIL, 1995 p.11), conceituam-na como um
“[...] conjunto dinâmico de atividades de recursos humanos e ambientais incentivadores, que
são destinados a proporcionar a criança, [...] experiências significativas para alcançar pleno
desenvolvimento no seu processo evolutivo”. Pérez-López e Brito de La Nuez (2004) em seu
livro Manual de Atención Temprana evidenciam que a Estimulação Precoce passou por
diversas raízes conceituais até chegar ao seu conceito atual, no qual tem sua atuação centrada
no atendimento às crianças, suas famílias e o seu entorno.
Sigolo e Cia (2013) declaram que ao ser realizado precocemente esse atendimento
proporciona melhores oportunidades de evolução dos quadros: cognitivo, motor e sensorial de
todas as crianças, principalmente as que são caracterizadas como público alvo da Educação
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Especial. Além disso, a Estimulação Precoce contribui na inserção dessas crianças na


sociedade, em seu entorno e futuramente no meio educacional sem maiores traumas.
Nesse estudo, reiteramos as afirmações supracitadas por meio de apontamentos e
constatações, as quais são resultados de observações realizadas com duas crianças no ambiente
educacional de dois Centros de Educação Infantil- CMEI, no município de Irati- Paraná. A fim
de um melhor entendimento, designamos as escolas participantes da pesquisa como escola A e
escola B, dessa forma, ao relatar sobre os resultados obtidos com cada aluno especificaremos
em qual das escolas eles se encontravam matriculados.

Metodologia

Ao participar de um projeto de Iniciação Científica, que teve por objetivo, identificar de


que forma a estimulação precoce ocorria no ambiente educacional dos Centros de Educação
Infantil, e quais eram as contribuições desse atendimento no desenvolvimento dessas crianças.
Mostrou-se necessária a utilização a priori de uma pesquisa bibliográfica, a fim de sanar os
questionamentos que surgiram.
Concomitante a ela, realizamos um estudo de caso com dois alunos da Educação
Especial, os quais se encontravam matriculados em duas escolas diferentes de Educação
Infantil. Ambos os alunos pertencem ao público da Educação Especial. Gil (2002 p.54) define
que o estudo de caso “[...] consiste no estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos,
de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento, tarefa praticamente impossível
mediante outros delineamentos já considerados”.
O autor supracitado defende ainda que esse meio de investigação é o mais adequado ao
se pesquisar fenômenos contemporâneos dentro de um mesmo contexto real, devido à
dificuldade de se perceber claramente os limites entre o fenômeno e o contexto. Dessa forma,
o estudo de caso exigiu que os avanços e dificuldade dos alunos fossem anotados em diário de
campo, bem como as nossas dúvidas, indagações e constatações a respeito da temática.
Para realizar a análise de dados utilizamos a perspectiva da Análise de Conteúdo
(Bardin, 1977), por acreditar ser a mais adequada a esta investigação, evidenciando-se assim a
importância de se trabalhar na busca da compreensão das informações e não da sua
quantificação.
No desdobramento da pesquisa constatamos que, por abranger temas secundários que a
princípio não havíamos considerado, esse trabalho será divido em categorias de análise para
que possamos discorrer da melhor forma possível os dados coletados e as conclusões a que
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chegamos após a sua analise. Gil (2002 p.134) define que as categorias de análise “[...] consiste
na organização dos dados de forma que o pesquisador consiga tomar decisões e tirar conclusões
a partir deles”.

Desenvolvimento

1ª categoria de análise: O cuidar, o brincar e o educar e as práticas de estimulação na


Educação Infantil.

A Educação Infantil como a primeira etapa da Educação Escolar além de ser uma ponte
que ligará a criança aos conhecimentos sistematizados, deve proporcionar a mediação entre ela
e esse novo ambiente.
Para Alves (2007), a instituição que ofertará a Educação Infantil deverá conduzir esse
processo de imersão na Educação Escolar como um elo de apoio, o qual ligará a criança, os
cuidadores e o sistema educacional, proporcionando a elas a criação de um ambiente acolhedor.
Além de que, “[...] muitos são os benefícios que uma escola de educação infantil traz para
qualquer criança, independentemente de sua condição física, intelectual ou emocional”.
(PEREIRA; GRAVE, 2012 p. 103).
Por conseguinte, nessa fase do desenvolvimento humano são estabelecidas as relações
de descoberta, da qual faz parte as noções de afetividade e sociabilidade, sendo essencial o
estímulo à linguagem, a motricidade, ao conhecimento do próprio corpo e das relações com o
meio. (BRASIL, 2013).
Uma das formas de se efetivar esse elo na Educação Infantil é por meio do lúdico,
utilizando para isso as brincadeiras. As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica
(BRASIL, 2013) discorrem sobre a importância de se utilizar o tripé cuidar, brincar e educar
como forma de se trabalhar o lúdico na educação infantil, estabelecendo relações de estímulos
a todas as crianças.
Ao brincar, a criança assimila mais facilmente os conceitos da sua nova realidade.
Vygotsky (1987 p.117 apud BORBA. 2007 p.36) declara que ao brincar “a criança se comporta
além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no
brinquedo, é como se ela fosse maior do que ela é na realidade”, ou seja, o brincar possibilita a
criança desenvolver formas de estimulação aprimorando o seu conhecimento.
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Mas não é só no brincar que a criança se desenvolve, pois, o cuidar e o educar mesmo
sendo conceitos diferenciados acabam por serem indissociáveis nesse processo. Froebel (1912,
apud KISHIMOTO 2001) já se pautava neste tripé ao afirmar que o cuidar, nunca poderia se
desvincular do educar e do brincar. Além disso, as Diretrizes Curriculares Nacionais da
Educação Básica (2013) afirmam que:

educar de modo indissociado do cuidar é dar condições para as crianças explorarem o


ambiente de diferentes maneiras [...] e construírem sentidos pessoais e significados
coletivos, à medida que vão se constituindo como sujeitos e se apropriando de um
modo singular das formas culturais de agir, sentir e pensar (BRASIL, 2013 p.89).

Ao se efetivar esse tripé na Educação Infantil, criam-se condições de práticas de


estimulação, que se realizadas precocemente contribuirão no pleno desenvolvimento das
crianças, principalmente daquelas com deficiências, síndromes ou atrasos em seu
desenvolvimento.
No entanto, nem sempre o cuidar, o brincar e o educar apesar de indissociáveis, são
trabalhados em conjunto no ambiente educacional. A investigação realizada nos Centros de
Educação Infantil do município de Irati possibilitou que chegássemos a algumas constatações.
Na escola A, observamos que as atividades que evidenciavam a imaginação e
criatividade por meio do brincar eram menos recorrentes nessa turma, esse fato se explica em
parte, devido ao número de alunos matriculados em sala de aula. A turma contava com 24
alunos na responsabilidade de duas educadoras, sendo que, nessa sala encontrava-se incluído o
aluno participante dessa pesquisa, ou seja, além da turma ser numerosa, as docentes
enfrentavam alguns desafios em adaptar esse aluno à rotina da turma e, por conseguinte, em
adequar-se as suas especificidades.
Em contraposição a essa realidade, a escola B contava com 15 alunos matriculados em
sala de aula, os quais estavam sob a responsabilidade de uma educadora, e contava com o
auxílio de uma estagiária, a qual atuava como professora de apoio, devido às demandas da aluna
observada.
Nessa sala, observamos que o cuidar, o educar e o brincar eram evidenciados na rotina
da turma de forma indissociadas. As limitações da aluna observada tornaram-se incentivo para
que as estratégias de ensino fossem adaptadas à nova realidade educacional desse Centro de
Educação Infantil.
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Dessa forma, as práticas de estimulação na primeira escola observada, focavam


atividades educativas, sendo que em sua maioria relacionadas ao estímulo da coordenação
motora fina e grossa, com atividades de recorte, pintura e desenho.
Já na segunda escola, as práticas de estimulação se davam de formas variadas. A
estimulação sensorial era utilizada por meio de objetos com formatos diferentes e materiais
diversos, tais como: areia, grãos, objetos sonoros, brinquedos com formatos e tamanhos
variados, objetos adaptados, entre outros.
A estimulação motora e a social realizavam-se em conjunto com a turma, em
brincadeiras fora da sala de aula, nas quais se adaptavam colchões e tapetes para a aluna
interagir com os demais colegas. A estimulação cognitiva por sua vez, ocorria da mesma forma
em ambas as escolas, por meio das mesmas atividades e da utilização da apostila.
Entretanto, elas se diferenciavam não apenas na forma de realizar as estimulações, mas
também no fato de como se deu a inclusão dos alunos observados nesse ambiente, resultando
em conjunturas distintas, as quais motivaram as escolas a desenvolverem encaminhamentos
pedagógicos diferentes.

2ª categoria de análise: Encaminhamentos pedagógicos da escola

Além de o aluno possuir o direito constituído, de ser estimulado através da utilização


do tripé que norteia toda a educação infantil, a instituição que o receber deverá incluí-lo na
cultura escolar, de forma a proporcioná-los um primeiro contato sem maiores traumas. Kramer
(2007 p.21) defende que “[...] as crianças têm o direito de estar numa escola estruturada de
acordo com uma das muitas possibilidades de organização curricular que favoreçam a sua
inserção crítica na cultura”. Além disso:

a questão da inclusão de crianças, com necessidades educativas especiais, trouxe a


escola infantil, questionamentos à respeito do seu trabalho, pois antes essas crianças
ficavam privadas do acesso às creches e escolas infantis, tendo apenas as escolas
especiais como espaço de circulação, quando as tinham. Com o ingresso de crianças
com necessidades educativas especiais nas escolas infantis, aparecem inúmeras
dúvidas de como trabalhar (ALVES, 2007 p.21).

Nesse sentido, os educadores se vêm diante de desafios que até então não haviam
enfrentado anteriormente, os quais oportunizaram a escola repensar o seu papel social e a
desenvolver novas estratégias de ensino.
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Para Mantoam (2013), a escola do século XXI deve ser o ambiente educacional em que
os alunos sejam ensinados a valorizar e questionar a diferença, que educadores e gestores
trabalhem de forma democrática no sentido de proporcionar ao aluno e a seus pares, a sua
inserção e inclusão nesse ambiente.
Uma das formas de contribuir na efetivação desses objetivos são os encaminhamentos
pedagógicos referendados pela escola. Eles podem se pautar em vários critérios e diferenciadas
perspectivas, dentre eles, analisaremos apenas três. O preparo dos professores em receber os
alunos da Educação Especial em sua turma; a conscientização dos educadores e da escola sobre
os desafios que encontrariam na adaptação desses alunos e a sua disponibilidade em
conscientizar os pais em relação a esses desafios, agindo como mediadora dessa inclusão e do
desenvolvimento global desse aluno.
No que se referem ao primeiro critério analisado, em ambas as escolas, as docentes
responsáveis pela turma se mostravam receosas pela nova situação apresentadas a elas, ambas
sentiam-se despreparadas em desenvolver o papel de mediadoras entre o aluno e o
conhecimento. Bolsanello (2003) salienta que:

[...] conteúdos programáticos referentes à estimulação precoce não estão ainda


presentes nos cursos de formação de profissionais em educação especial, o que pode
propiciar distorções na compreensão das dificuldades e possibilidades da criança
pequena com necessidades especiais e, consequentemente, não garantir o atendimento
especializado que ela necessita. (BOLSANELLO, 2003 p.343).

Na escola A, as educadoras relataram que, não sabiam quais as especificidades do aluno


observado e como não possuíam preparo, decidiram vê-lo da mesma forma que os demais, sem
atentar para as suas limitações e necessidades educacionais.
Ao contrário, a coordenação pedagógica da escola B, apesar de afirmar seu despreparo
de formação específica, se organizou na busca por informações do quadro neurológico da aluna,
junto aos pais, a equipe da educação especial da secretaria de educação municipal, e via internet.
Porém, ambas as escolas estavam cientes que necessitavam buscar preparo além da formação
inicial, e da formação de serviço.
Sobre o segundo critério, todas as educadoras das salas observadas, em conjunto com
as respectivas coordenadoras pedagógicas se encontravam conscientes dos desafios do processo
inclusivo e da adaptação do aluno nesse ambiente educacional.
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Ao analisarmos o último critério de encaminhamento pedagógico, notamos que, a escola


B possuía uma relação de maior diálogo com os pais da criança inclusa do que a escola A. Esse
fato se atesta devido à forma que cada aluno foi incluído na escola.
Na escola B, os pais da aluna procuraram a secretaria de educação para efetivar a
matrícula da filha, após conselho do psicólogo, visto que isso traria benefícios à aluna. Já com
o segundo aluno observado, a situação mostrou-se contrária, pois segundo dados
disponibilizados pela coordenadora da escola, a secretaria de Educação Municipal procurou
junto aos pais, a efetivação da matrícula do aluno por entender que a inclusão no ambiente
escolar traria benefícios a ele.
Bolsanello (1998) afirma que, em muitos casos o nascimento de uma criança com
deficiência na família, produz situações ora de proteção excessiva, ora de desprezo por parte
dos cuidadores, ocasionando com isso uma ação desfocada, a qual resulta na total desatenção
para as necessidades dessa criança.
Porém, esse fato é minimizado por meio da intervenção do sistema educativo junto aos
pais ou cuidadores dessas crianças, no sentido de conscientizá-los da real necessidade dos seus
filhos.
Dessa forma, concluímos que ambas as escolas concebiam a conscientização dos pais
como parte do processo inclusivo, procurando estabelecer diálogos entre a escola, a secretaria
de educação municipal e os pais, na tentativa de ser o elo de ligação, anteriormente citado, a
fim de fortalecer os vínculos educativos.
Por conseguinte, o desenvolvimento do aluno, pauta-se além do tripé da Educação
Infantil ou dos encaminhamentos pedagógicos realizados pela escola. Mas relaciona-se também
com as estratégias de estimulação que esses educadores estabelecerão para aprimorar o
desenvolvimento dessa criança.
Entre essas estratégias destacamos o acompanhamento do desenvolvimento infantil por
parte da escola, do sistema educacional, dos pais e de toda a sociedade, o qual pode ser realizado
por meio de estudos, observações e investigações, ou ainda através do acompanhamento
profissional especializado, os quais são fundamentais no desenvolvimento global do aluno.

3ª Categoria de análise: Acompanhamento do desenvolvimento infantil

Atualmente, a criança é concebida como sujeito histórico- social de direitos, os quais


podem e devem ser estimulados a fim de desenvolver-se de forma mais efetiva. Entretanto, essa
conceitualização de criança e infância transformou-se de acordo com os contextos históricos e
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sociais em que estas se encontravam inseridas. Não nos deteremos nas mudanças contextuais
ocorridas, mas destacamos que a partir do século XIX houve uma mudança de paradigmas,
produzindo reformulações na concepção do cuidar e educar direcionado às crianças pequenas.
Segundo Kramer (2007) é somente depois dessa visão que a criança passa a ser definida
como sujeito da sua própria cultura, ou seja, ela produz cultura e por ela é produzida ao ser
inserida em seu ambiente social. No entanto é somente no século XX que o conceito do cuidar
começa a ser pensado além de garantir apenas a integridade física, moral e psicológica da
criança e torna-se um meio de estimular o seu desenvolvimento cognitivo, motor e sensorial.
Assim, torna-se necessário situar essa criança, como sujeito do seu próprio
conhecimento, acompanhando e mediando o seu desenvolvimento infantil. Isso se dá por meio
de pesquisas e estudos voltados à compreensão de como se organiza o seu aprendizado.
Bolsanello (2003) reitera que toda pesquisa realizada nessa área, auxiliará no processo
educativo, o qual refletirá no atendimento e avaliação da intervenção realizada em estimulação
precoce.
Além disso, se refere também ao acompanhamento específico realizado por
profissionais que tenham por campo de estudo o desenvolvimento da criança e da infância em
suas diversas áreas. Entre eles, estão os profissionais da Estimulação Precoce (Educação
Especial) e os da Educação Infantil, pois são eles que na maioria das vezes convivem
diariamente com essa criança. Alves (2007) defende que os educadores devem dar continuidade
ao processo de conquistas e avanços que essas crianças obtiveram por meio da estimulação
precoce no ensino infantil.
Porém, esse fato só se efetivará, se estes possuírem noções básicas da concepção e
conceitualização do atendimento em Estimulação Precoce, e dos benefícios advindos dele, fato
que constatamos ser desconhecidos pelas educadoras investigadas. Em ambas as escolas
observadas as docentes afirmavam ignorar as práticas de Estimulação Precoce.
No entanto, na escola B a equipe da instituição se propôs a trabalhar práticas de
estimulação e compilaram atividades em um portfólio organizado em conjunto com a
coordenadora pedagógica, a secretaria de educação e os pais da aluna para que, por meio dele
a estagiária realizasse as estimulações com a criança.
Concomitante a esse atendimento, a aluna em questão recebia acompanhamento de
outros profissionais fora do seu contexto escolar. Além do atendimento em estimulação
precoce, o qual ocorre nesse município em escola especial, recebe auxílio de psicólogos,
neurologistas, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas.
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Em contrapartida, o aluno da escola A, havia participado do programa de estimulação


precoce e no momento da pesquisa se encontrava sendo acompanhado apenas no contexto
escolar pelos profissionais da educação infantil. Essa falta de acompanhamento profissional
repercutiu na aprendizagem do aluno e aumentou os desafios de sua adaptação.
Alves (2007) destaca que o acompanhamento em educação infantil deveria ser associado
ao atendimento realizado por um profissional da Estimulação Precoce, pois essa ligação torna-
se primordial pra que os alunos da Educação Especial obtenham avanços em seu
desenvolvimento global.
Soejima e Bolsanello (2012) defendem que, ao aliar o acompanhamento do
desenvolvimento infantil com o atendimento em estimulação precoce, essa intervenção passa a
ser entendida além de um atendimento voltado a reabilitação, à intervenção psicossocial ou
apenas a fins educativos, mas passa a ser concebido como um atendimento que “[...] deve fazer
parte de um processo integral que tem como fim último o desenvolvimento harmônico de
crianças integradas aos contextos em que vivem” (SOEJIMA; BOLSANELLO, 2012 p, 68).
Assim, salientamos que o acompanhamento do desenvolvimento infantil por
profissionais da área do desenvolvimento infantil, mostra-se de fundamental relevância. No
entanto, se esse acompanhamento for cancelado ou tiver lacunas em seu desenvolvimento,
todos os avanços conquistados pelos alunos poderão estacionar e até mesmo retroceder.
Nesse sentido, a aluna da escola B, a qual estava sendo acompanhada por atendimento
especializado, demonstrou avanços cognitivos e motores em seu desenvolvimento, devido aos
estímulos diferenciados que recebera. Todavia as complicações de seu quadro neurológico
fizeram com que essa aluna interrompesse esse acompanhamento, comprometendo assim os
avanços em seu desenvolvimento já conquistados.

Considerações Finais

A Estimulação Precoce é um programa que visa incentivar o desenvolvimento motor,


cognitivo, psíquico e sensorial de crianças da Educação Especial. Torna-se de total relevância
ao ser aliada com as práticas da Estimulação Precoce na Educação Infantil. Ao receber esse
estimulo, a criança passa a desenvolver o papel de agente do seu próprio conhecimento, o que
contribui em seu desenvolvimento global e proporciona a elas um ambiente de aprendizagem
estimulante de acordo com as suas especificidades.
No entanto, nos Centros de Educação Infantil- CMEI, observados, as educadoras, bem
como a coordenação pedagógica das escolas conheciam parcialmente as práticas de
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estimulação, o funcionamento do programa de Estimulação Precoce e os benefícios que o aluno


adquire ao participar dessa intervenção. Os desafios de adaptação encontrados pelos alunos da
Educação Especial nesse ambiente, em grande parte, foram reflexos desse desconhecimento.
Todavia, as docentes e as coordenadoras em ambas as escolas, mostraram-se
preocupadas com o seu despreparo, sendo que, algumas delas, após a realização dessa pesquisa,
estavam em busca de especializar-se em formação continuada, a fim de sanar as suas dúvidas
sobre as especificidades dos seus alunos.
Dessa forma, concluímos que essa investigação possibilitou um olhar reflexivo por parte
das educadoras sobre a sua prática docente. Pimenta (2006 p.20) declara que esse olhar é
imprescindível a todo docente, pois “frente a situações novas que extrapolam a rotina, os
profissionais criam, constroem novas soluções, novos caminhos, o que se dá por um processo
de reflexão na ação”.
Assim, pontuamos que elas compreenderam a necessidade de possuírem um arcabouço
teórico específico que fundamente a sua prática profissional docente, a qual aliada aos
elementos e vivências das suas práticas, da formação inicial e em serviço, trarão a discussão e
a reflexão indispensáveis ao efetivo exercício docente. É importante destacar que entendemos
que a teoria e a prática se fundem na profissão docente, ao ponto de se tornarem dois eixos do
mesmo processo, dois elos indissociáveis, os quais possibilitam que o professor se aprimore
cada vez mais.
Além disso, por meio desse estudo reiteramos a escassez de materiais voltados a sanar
os questionamentos sobre a Estimulação Precoce no meio educacional, esse fato contribuiu para
que os educadores, pais e coordenadores manifestassem a carência de informações a cerca das
práticas de estimulação que poderiam ser utilizadas na Educação Infantil, bem como em todas
as etapas da Educação Escolar.
Nesse sentido, finalizamos as conclusões reiterando que a Estimulação Precoce
contribui para o desenvolvimento do aluno da Educação Especial no ambiente da Educação
Infantil, desde que aliado às práticas de estimulação realizadas pelas educadoras. Mas para que
isso ocorra cremos ser necessário um esforço contínuo de pais, professores e toda equipe
pedagógica, os quais estejam envolvidos na educação das crianças que participam do
atendimento da Estimulação Precoce no sentido de conscientizar a toda comunidade escolar
sobre a sua importância.

REFERÊNCIAS
1809

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