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A DEFICIÊNCIA, NA ANTIGUIDADE
O Antigo Egito
Ao se estudar a história do tratamento social dado ás pessoas com deficiência,
é possível observar dois tipos de comportamento em relação á esse tema. A
primeira, observável entre povos antigos, como os egípcios, por exemplo, revela
uma proteção assistencialista e tolerante, enquanto que nas sociedades de
cultura chamada clássica, como Grécia e Roma, principalmente, esse
comportamento era de rejeição, preconceito e exclusão sumária. Esse é,
obviamente, um paradoxo, quando se observa que foram exatamente as
civilizações que se desenvolveram sobre a influência helênica que trouxeram para
a História o ideal do humanismo. Mas ai, quando se verificam os pressupostos
culturais sobre os quais se desenvolveram essas antigas civilizações, não é difícil
recensear as causas que as levaram a adotar tais comportamentos.
O antigo Egito era uma terra onde a deficiência física parece ter sido bastante
natural. Pelo menos há registros dessa anomalia, que inclusive chama o país dos
egípcios de “Terra dos Cegos”, em virtude da grande quantidade de pessoas
acometidas por doenças oftalmológicas, que hoje seriam identificadas como
conjuntivite, catarata e glaucoma. Essas informações constam de um papiro
datado de 1500 a. C. descoberto pelo egiptólogo Georg Ebers. [1]
Registre-se que a sociedade do antigo Egito tinha certa tolerância para com
as pessoas com deficiência em face das próprias crenças e tradições cultivadas
por aquele povo. Uma dessas tradições era o casamento consanguíneo que
ocorria entre famílias de posse, especialmente as famílias reais, em virtude da
necessidade de conservar o poder político e a herança dentro do próprio clã.
Assim, muitas vezes, um membro da casa real casava-se com sua própria irmã,
já que a linhagem real precisava ser preservada e esta só podia ser composta,
com certeza, pelo lado feminino. Isso, geralmente dava causa a nascimentos de
filhos com deficiências notáveis, como nos mostra Hawass, em seu trabalho a
respeito do faraó Tutancâmon, cuja análise de sua múmia mostrou que esse
jovem faraó, que morreu com pouco mais de dezoito anos de idade, possuía
diversas deficiências congênitas, não só físicas, mas também intelectuais. [2] A
propósito, acredita-se que seu próprio pai, o famoso faraó Akhenaton, promotor
de uma grande revolução religiosa no Egito, implantando o monoteísmo naquele
país, também era pessoa com deficiências congênitas, provavelmente epilepsia,
doença que naquela época era considerada de origem espiritual, oriunda dos
próprios deuses.[3]
Vários documentos recuperados do antigo Egito mostram que aquela civilização
tratava as pessoas com deficiência de forma bem mais tolerante que os demais
povos da antiguidade. Há registros de pessoas nessas condições exercendo
cargos de relativa importância no serviço público, como nos mostra um estudo
conduzido pelo Dr. Chahira Kozma, do departamento de pediatria da
Universidade de Georgetown.[4]
Esse comportamento vinha principalmente das crenças religiosas praticadas
pelo povo egípcio, e da sua intensa busca pela espiritualidade. Um dos preceitos
contidos nos códigos de moral seguidos pelos egípcios vinha do culto á deusa
Maat (a deusa da justiça) que pregava, não só o exercício de um rígido
comportamento ético por parte de autoridades e pessoas mais aquinhoadas, mas
também que pessoas de condição inferior, especialmente com deficiências físicas
fossem tratadas com respeito. Esse comportamento, que aparece em um papiro
do século XII a.C é uma amostra bastante representativa da filosofia pregada
pelos sacerdotes egípcios dessa época, que se configura por um apego muito
grande á uma vida virtuosa, como forma de agradar os deuses e alcançar um
julgamento justo e favorável na vida após a morte. Nesse sentido o papiro de
Amenemope, recomendava como medida de justiça e dever moral tratar bem as
pessoas deficientes. Um de seus preceitos diz textualmente:
“Não deves zombar de um homem cego nem caçoar de um anão, nem
prevalecer obre a condição de um aleijado. Não insulte um homem que está na
mão de Deus, nem desaprove se ele erra, em razão da sua deficiência.” [5]