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“Vinte anos atrás, uma amiga e eu fomos até o centro de Portland no Natal.

As
grandes lojas de conveniência: Meier & Frank… Frederick & Nelson…
Nordstroms… cada uma das grandes vitrines exibia uma cena simples,
bonita: um manequim vestindo roupas ou uma garrafa de perfume de pé sobre a
neve falsa. Mas as janelas na loja J.J. Newberry, droga, elas eram abarrotadas
com bonecas e ouropel e espátulas e kits de parafusos e travesseiros, aspiradores
de pó, cabides de plástico, gerbils, flores de seda, doces – você entende o que
quero dizer. Cada um das centenas de objetos diferentes era tabelado com um
círculo descolorido de papelão. E, caminhando por lá, minha amiga, Laurie, deu
uma longa olhada e disse, “A filosofia de decoração de janelas deles deve ser: ‘se
a janela não parecer bem o bastante – coloque mais’.”

Ela disse o comentário perfeito no momento perfeito, e eu lembro disso duas


décadas depois porque isso me fez rir. Aquelas outras vitrines bonitas… Estou
certo de que elas eram estilosas e de bom gosto, mas eu não tenho recordações
claras de como elas eram.

Para este ensaio, minha meta é colocar mais. Reunir um estoque de ideias ao
estilo do Natal, com a esperança de que algo seja útil. Ou como se estivesse
empacotando caixas de presentes para os leitores, colocando doces e um esquilo
e um livro e alguns brinquedos e um colar, estou na esperança de que variedade
o bastante é garantia de que algo aqui vai soar completamente estúpido, mas
também de que alguma outra coisa poderá ser perfeita.

1: Dois anos atrás, quando escrevi o primeiro desses ensaios tratava-se do meu
“método do cronômetro” de escrever. Você nunca viu esse ensaio, mas eis o
método: Quando você não quiser escrever, programe um cronômetro para uma
hora (ou meia hora) e sente-se para escrever até que o alarme toque. Se você ainda
detesta estar escrevendo, estará livre em uma hora. Mas geralmente, ao momento
em que o alarme tocar, você estará tão envolvido no seu trabalho, divertindo-se
tanto com ele, que vai seguir em frente. Ao invés de um cronômetro, você pode
colocar algumas roupas na máquina de lavar ou de secar e usá-los para
cronometrar seu trabalho. Alternar entre o trabalho cerebral de escrever com o
trabalho não-pensante da máquina de lavar roupas ou pratos te dará os intervalos
que você precisa para que novas ideias e epifanias ocorram. Se você não sabe o
que vem a seguir na estória… limpe seu banheiro. Troque os lençóis. Pelo amor
de Cristo, tire a poeira do computador. Uma ideia melhor surgirá.

2: Seu público é mais esperto do que você imagina. Não tenha medo de
experimentar com formatos de narrativa e mudanças temporais. Minha teoria
pessoal é de que os jovens leitores se enjoam da maioria dos livros – não porque
estes leitores sejam mais estúpidos que os leitores antigos, mas porque o leitor de
hoje é mais esperto. Filmes nos tornaram muito sofisticados no quesito narrativa.
E seu público é muito mais difícil de chocar do que você jamais poderia imaginar.

3: Antes de sentar e escrever uma cena, pondere sobre ela em sua mente e saiba
o propósito daquela cena. Para quais tramas anteriores esta cena vai ser
vantajosa? O que isso criará para as cenas seguintes? Como esta cena levará seu
enredo adiante? Conforme você trabalha, dirige, se exercita, tenha apenas esta
questão em sua mente. Tome algumas notas conforme tiver ideias. E apenas
quando você decidiu a ‘coluna vertebral’ daquela cena – então, sente e escreva-a.
Não vá até aquele computador chato e empoeirado sem algo em mente. E não faça
seu se esforçar ao longo de uma cena na qual pouco ou nada acontece.

4: Surpreenda-se. Se você pode levar a história – ou deixar que ela o leve – a um


lugar que te maravilha, então você pode surpreender seu leitor. No momento em
que você visualizar qualquer surpresa bem planejada, muito provavelmente, o seu
sofisticado leitor também o fará.

5: Quando você ficar preso, volte e leia suas cenas anteriores, procurando por
personagens abandonados ou detalhes que você pode ressuscitar como “armas
enterradas”. Quando terminava de escrever Clube da Luta, eu não tinha a menor
ideia do que fazer com o edifício do escritório. Mas, relendo a primeira cena, eu
encontrei um comentário aleatório sobre misturar nitroglicerina com parafina e
como era um método duvidoso de fazer explosivos plásticos. Este detalhe bobo
(… parafina nunca funcionou comigo…) criou a “arma escondida” perfeita para se
ressuscitar no final e salvar meu rabo contador de histórias.

6: Use a escrita como sua desculpa para lançar uma festa toda semana – mesmo
se você chamar aquela festa de “workshop.” Sempre que você puder passar tempo
em meio a outras pessoas que valorizam e apoiam a escrita, isso vai balancear
aquelas horas que você passou sozinho, escrevendo. Mesmo se algum dia você
vender seu trabalho, nenhuma quantia de dinheiro vai compensá-lo pelo seu
tempo gasto sozinho. Então pegue seu cheque adiantado, faça da escrita uma
desculpa para estar entre pessoas. Quando você alcançar o fim da sua vida –
confie em mim, você não vai olhar para trás e saborear os momentos que passou
sozinho.

7: Deixe-se em companhia do Não Saber. Este pequeno conselho parte de


centenas de pessoas famosos, de Tom Spanbauer até mim e agora você. O quanto
mais você puder permitir que uma história tome forma, melhor ficará esta forma
final. Não se apresse ou force o fim de uma história ou livro. Tudo o que você tem
de fazer é a cena seguinte, ou as próximas cenas. Você não precisa saber de cada
momento até o final. De fato, isso será chato para caramba de se executar.

8: Se você precisa de mais liberdade ao longo da história, rascunho a rascunho,


mude os nomes dos personagens. Personagens não são reais, e eles não são você.
Por mudar arbitrariamente seus nomes, você consegue a distância de que precisa
para realmente torturar um personagem. Ou pior, apague um personagem, se é
disso que a história realmente precisa.

9: Há três tipos de discurso – eu não sei se isso é VERDADE, mas ouvi em um


seminário e fez sentido. Os três tipos são: Descritivo, Instrutivo e Expressivo.
Descritivo: “O sol se ergueu bem alto…” Instrutivo: “Caminhe, não corra…”
Expressivo: “Ai!” A maioria dos escritores de ficção usará apenas uma – no
máximo, duas – dessas formas. Então use todas as três. Misture-as. É assim que
as pessoas falam.

10: Escreva os livros que você deseja ler.

11: Tenha suas fotos de autor de livro vestindo jaqueta tiradas agora, enquanto
você é jovem. E obtenha os negativos e direitos de imagem dessas fotos.
12: Escreva sobre os assuntos que realmente te desagradam. Estas são as únicas
coisas sobre as quais vale a pena escrever. Neste curso, chamado “Escrita
Perigosa”, Tom Spanbauer enfatiza que a vida é preciosa demais para passá-la
escrevendo histórias mansas e convencionais com as quais você não tem
nenhuma ligação pessoal. Há tantas coisa sobre as quais Tom falou mas que eu
apenas me lembro parcialmente: a arte da “manumissão”, que eu não sei de cor,
mas entendo que se refira à preocupação que você tem em mover um leitor ao
longo dos momentos de uma história. E “sous conversation”, que eu interpretei
como a mensagem escondida, enterrada dentro da história óbvia. Por eu não me
sentir confortável descrevendo tópicos que eu apenas entendo pela metade, Tom
concordou em escrever um livro sobre sua oficina literária e as ideias que ele
ensina. O título é “Um buraco no coração”, e ele planeja ter um rascunho lido em
Junho de 2006, com data de publicação no começo de 2007.

13: Outra história sobre uma janela no Natal. Quase todas as manhãs eu tomo
meu café no mesmo restaurante, e nesta manhã um homem estava pintando as
janelas com ilustrações de natal. Bonecos de neve. Flocos de neve. Sinos. Papai
Noel. Ele ficou do lado de fora na calçada, pintando no frio congelante, sua
respiração fazendo vapor, alternando pinceladas e passadas de rolo com
diferentes cores de tinta. Dentro do restaurante, os clientes e garçons observavam
conforme ele passava camadas de tinta vermelha, branca e azul na parte de fora
das grandes janelas. Atrás dele a chuva se transformou em neve, caindo
lateralmente com o vento.

O cabelo do pintor tinha todas as diferentes cores de cinza, e seu rosto era frouxo
e enrugado como o bolso vazio de seu jeans. Entre cores, ele parava para beber
alguma coisa num copo de papel.

Assisti-lo de dentro, comendo ovos e torradas, alguém disse que aquilo era triste.
Um cliente disse que o homem era provavelmente um artista fracassado. Era
provavelmente uísque no copo. Ele provavelmente tinha um estúdio cheio de
pinturas fracassadas e agora ganhava a vida decorando janelas cafonas de
restaurantes e lojas de doces. Apenas triste, triste, triste.

Um garçom passou pelo local, servindo café às pessoas, e disse, “Isso é tão bacana.
Eu queria poder fazer isso…”

E a despeito de nós invejarmos ou sentirmos pena desse cara no frio, ele


continuou pintando. Adicionando detalhes e camadas de cor. Eu não estou certo
sobre quando aconteceu, mas em algum momento ele não estava lá. As figuras
sozinhas eram tão ricas, elas preencheram as janelas tão bem, as cores eram tão
vibrantes, que o pintor havia sumido. Fosse ele um fracasso ou um herói. Ele
desapareceu, sumiu para qualquer lugar, e tudo o que nós estávamos vendo era
seu trabalho.

Como lição de casa, pergunte a sua família e amigos como você era quando
criança. Melhor ainda, pergunte a eles como eles eram quando crianças. Então,
simplesmente escute.

Feliz Natal, e obrigado por ler meu trabalho.”

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