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ROMEU E JULIETA

ADAPTAÇÕES: PABLO VAZ

Direção: Pablo Vaz e Renan Queirós


Sonoplastia: Heitor Martins e Pablo Vaz
Iluminação: Gelson Klauck
Cenário: André Oliveira e Pablo Vaz

ELENCO
Julieta Capuleto – Joanna Camargo Ama – Renan Queirós
Romeu Montecchio – Lucas Quoos Paris/Príncipe – Pedro Comin
Senhora Montechio – Vitória Bohme Teobaldo/Frei Lourenço – Alessandro
dos Santos Bueno
Benvólio – Gustavo Ferreira Menina – Maria Eduarda Nunes
Mercúcio/Frei João – André Oliveira

CENA 1
(Entra menina, acha o livro no lixão e senta no chão e começa a ler. Entra o prólogo.)

Duas casa, iguais em dignidade – na formosa Verona vos dirão – reativaram antiga
inimizade, mãos fraternas e sangue irmão. Do fatal seio desses dois rivais um par
nasceu de amantes desditosos, que em sua sepultura o ódio dos pais depuseram, na
morte venturosos. Os lances desse amor fadado à morte e a obstinação dos pais
sempre exaltados que teve fim naquela triste sorte em (horas) vereis representados.
Se emprestardes a tudo ouvido atento, supriremos as faltas a contento. (BRIGA)

Príncipe – Baderneiros, inimigos da paz, que puxam suas espadas derramando o


sangue do vizinho. (TODOS REVERENCIAM) Parecem animais, selvagens, espalhando
por Verona a semente da intriga, da discórdia e do mal. Jogai de suas mãos as armas
ou sentiras a fúria do meu castigo.... Joguem... Se voltarem a perturbar a paz serão
condenados sobre sentenças com suas próprias vidas. Malditos. (Sai. Logo saem o
elenco, cada grupo para um lado.)
CENA 2
Paris – Tenho pela senhora, honrosa consideração... E agora Senhora Capuleto,
espero que responda meu pedido.
Capuleto – Claro, respondo. Minha filha Julieta é ainda muito jovem. Mas quem sabe
daqui a dois verões, esteja preparada para assumir o compromisso, e enfim venha a
ser sua esposa.
Paris – Outras moças da mesma idade de Julieta já são mães felizes.
Capuleto – Muito cedo murcham aquelas que cedo se casam. Julieta é a dona e a
esperança do meu mundo. Eu e meu marido permitimos que a corteja, isto é, se for
do agrado de minha filha. E esta noite estas convidado a festa que darei aqui em
minha casa.
Paris – Muito me honra o convite. Toda Verona conhece a grandiosidade deste baile.
Desde já, Senhora Capuleto... Conte com minha presença.

(Todos arrumam o cenário para a festa)


CENA 3
Capuleto – Ama, onde está Julieta? Chame-a
Ama – Por minha virgindade quando eu tinha doze anos: já a chamei. Minha
ovelhinha. Vem cá, meu coração! Deus me perdoe, mas onde está a menina? Oh,
Julieta!
Julieta – Que é? Quem me chama?
Ama – Vossa mãe.
Julieta – Senhora, aqui estou eu. Que deseja?
Capuleto – Eis o assunto... Ama, deixa-nos sozinhos por algum tempo. Tenho de
falar-lhe muito em particular. Não, ama: volte! Lembrei-me agora que é preciso que
ouças nossa conversa, pois há muito tempo conheces minha filha.
Ama – É certo, posso dizer que idade tem, hora por hora.
Capuleto – Tem quatorze anos incompletos.
Ama – Jogo quatorze de meus dentes – muito embora, não gostaria – em como não
fez ainda quatorze anos. Para um de agosto quanto falta ainda?
Capuleto – Uma quinzena e pouco.
Ama – Pouco ou muito não importa. O que é certo é que no dia um de agosto
completa quatorze anos. Ela e Susana – Deus ampare sua alma! Susana está com
Deus agora – Pois bem, como disse, na noite de primeiro de agosto completa
quatorze anos. Lembro-me bem. Desde o tremor de terra, onze anos se passaram.
Desmamada foi a menina, nunca hei de esquecê-lo, pois nos seios passado havia
losna, sentada ao sol, embaixo do pombal. Vós e o patrão em Mântua vos acháveis –
Oh! Que memória a minha! – Mas, como ia dizendo: quando ela sentiu o gosto de
losna no mamilo e o achou amargo – Coisinha tola! – como ficou brava! Como bateu
nos seios, batia, batia, batia. Nisso, “Crac” fez o pombal. Não foi preciso mais para eu
mexer-me. Já se passou algum tempo. De pé, sozinha então ela já ficava. Corria a
cambalear por toda a casa. Teve um dia que ferira a testa, lembro que meu marido –
Deus conserve sua alma, pois o resto eu conservei! – levantou a menina e disse
aquelas palavras que lembro até hoje “Cais agora de frente? Pois de costas cairás
quando tiveres mais espirito. Não é, Julu?” e a menininha, parando de chorar, olhou
pra ele, com aqueles olhinhos “Sim”... (Riso)
Capuleto – Ama! Pare! Chega!
Ama – Pois não, senhora: Mas não me é possível deixar de rir, ao recordar como ela
interrompeu o choro e disse “Sim”. No entretanto, jurar posso, que crescerá na testa
um calombo maior que testículo de galo. (Riso)
Julieta – Então pare ama, é o que peço.
Ama – Bem, já acabei. Que Deus te tenha em graça. Foste a criança mais linda que eu
criei. Se algum dia eu puder te ver casada, é tudo que eu desejo.
Capuleto – Pois foi para falar em casamento que te chamei. Filha Julieta, dize-me: em
que disposição está para isso?
Julieta – É uma honra com a qual jamais sonhei.
Ama – Honra! Se não tivesses tido apenas uma ama, afirmaria que com o leite, tinha
mamado juízo.
Capuleto – Pois estamos na época de pensar em casamento. Mais jovens do que vós,
aqui em Verona, senhoras de respeito, já são mães. Para ser breve: o valoroso Paris
requesta vosso amor.
Ama – Que homem, menina! Um homem desses... É só feito por encomenda.
Capuleto – A primavera de Verona não tem mais bela flor.
Ama – Sim, uma flor! O que? Que flor o que. Ele é um macho alfa!
Capuleto – Que dizeis? É capaz de amar o jovem? Hoje à noite vê-lo-eis em nossa
festa. Folheai o livro do seu jovem rosto, que nele encontrareis doces encantos
escritos pela pena da beleza. Examinai-lhe os traços delicados e vede como se acham
bem casados. E se no livro achardes algo obscuro, encontrareis nos olhos o
esconjuro. As letras de ouro da lombada a glória terão em parte a formosa história.
Ficareis, pois, com ele associada sem que vos diminuais, com isso, em nada.
Ama – Oh! Não diminuais, as mulheres com os homens sempre aumentam.
Capuleto – Enfim, que me dizeis do amor de Paris?
Julieta – Vou ver se prendo nele os meus olhares. Mas a vista chegar além não há do
que consentir vossa vontade.
Capuleto – Muito bem, lembre-se ele é a mais bela flor. Vamos agora nos arrumar,
que os convidados não tardam a chegar. E você ama, trate de ir a cozinha. (Saem)

CENA 4
Romeu – Por escusas faremos um discurso, ou entramos sem nenhuma apologia?
Benvólio – Muito falar destoa deste dia. Não precisamos hoje de cupido com venda
sobre os olhos e arco tártaro de ripa multicor, que infunde medo, como espantalho o
faz, no mulherio. Não; nem também de prólogo matado, que o ponto diz antes de
nossa entrada. Que nos tomem por quem melhor acharem; mediremos com todos
alguns passos e, após, saímos.
Romeu – Dai-me uma das tochas; não me acho hoje disposto para saltos. Estando
enfarruscado, aclaro a estrada.
Mercúcio – Não; Tereis de dançar, gentil Romeu.
Romeu – Não; Podeis crer-me: tendes sapatinhos de sola leve, propicio para a dança.
Eu, tenho alma de chumbo que. Prendendo-me à terra, não me deixo dar um passo.
Mercúcio – Sois um apaixonado. Por empréstimo tomai as lestes asas de Cupido, que
heis de pairar a sua sobrancelha.
Romeu – Tão traspassado estou por suas setas que suas lestes asas não conseguem
transportar-me para o alto: tão peado, que não posso deixar a dor obscura, sob o
fardo do amor.
Mercúcio – Mas para estar sobre ele, é necessário que carregais o amor, peso
excessivo para coisa tão terna.
Romeu – Coisa terna julgais o que seja o amor? Não; muito dura: dura e brutal, e fere
como espinho.
Mercúcio – Romeu, Romeuzinho, se amor convosco é duro, seja duro com ele,
revidando todas as pancadas que der. Pondo o no chão. Dai-me uma cobertura para
o rosto. Em cima de uma máscara ponho outra. Que me importa que o olhar curioso
possa perceber a feiura? Por mim hão de corar estas salientes sobrancelhas.
Benvólio – Vamos bater e entrar e, uma vez dentro, que bom uso das pernas todos
façam.

CENA 5 (FESTA)
Romeu – Quem será aquela dama que enfeita e enriquece o braço daquele
cavaleiro?! Oh, ela ensina a tocha ser luzente. Dir-se-ia que da face está pendente da
noite, tal qual jóia mui preciosa da orelha de uma etíope mimosa. Bela demais para o
uso, muito cara para a vida terrena. Vou procura-la, ao terminar a dança porque a
esta rude mão possa dar ansa de tocar nela e, assim, ficar bendita. Meu coração, até
hoje, teve a dita de conhecer o amor? Oh, que simpleza! Nunca soube até agora o
que é beleza.
Tebaldo – Pela voz este deve ser um Montecchio. Tia, vamos parar com a dança.
(Indo a lateral) Como este escravo se atreve, com máscara grotesca, vir aqui, para de
nossa festividade rir e fazer pouco? Pela honra de meu sangue e nobre estado, dar-
lhe a morte não julgo ser pecado.
Capuleto – Que tens sobrinho? O que há contigo?
Tebaldo – Tia, aquele é um Montecchio, nosso inimigo; um vilão que aqui entrou por
zombaria, para nos estragar toda a alegria.
Capuleto – Não é o jovem Romeu?
Tebaldo – O mesmo, biltre Romeu.
Capuleto – Gentil Sobrinho, fique quieto. Deixe-o tranquilo. Ele se tem mostrado
perfeito gentil-homem. Para ser-te franco, Verona tem orgulho dele, como rapaz
virtuoso e mui polido. Nem por toda a riqueza da cidade quisera que ele aqui fosse
ofendido. Acalma-te, portanto, e fica alegre; Essa é a minha vontade. Fique alegre e
desfaça essa carranca que não vai bem com a nossa festa.
Tebaldo – Vai, sim, quando um vilão se mete nela. Não o suporto.
Capuleto – Terá de suportá-lo. Estou mandando!
Tebado – Mas tia, é vergonhoso...
Capuleto – Procura me contrariar, já para dentro... Sai daqui! (Aos gritos) Alegria!
Alegria! Mais luz! Luz! (Saindo atrás de Tebaldo)

CENA 6
Romeu – (A Julieta) Se minha mão profana o relicário em remissão aceito a
penitência: meu lábio, peregrino solitário, demonstrará, com sobra, reverência.
Julieta – Ofendeis vossa mão, bom peregrino, que se mostrou devota e reverente.
Nas mãos dos santos pega o paladino. Esse é o beijo mais santo e conveniente.
Romeu – Os santos e devotos não tem boca?
Julieta – Sim, peregrino, só para orações.
Romeu – Então fica quietinha (Leva sua mão de sua boca a de Julieta), eis o devoto.
Em tua boca me limpo dos pecados.
Julieta – Que passaram, assim, para meus lábios.
Romeu – Pecados meus? Oh! Quero-os retornados. (Indo beija-la)
Ama – Juuliiietaaa!
Julieta – Ama. Que foi?
Ama – Vossa mãe lhe chama.
Julieta – Agora?
Ama – Já, Ande, menina. (Sai Julieta)
Romeu – Quem é a mãe dela?
Ama – Ora essa, menino. A Dona dessa casa, dona de quase tudo que tem nas
redondezas. E digo uma coisa, com certeza: quem vier a desposá-la, será banhado a
ouro. E você quem é?
Romeu – Sou Romeu Montecchio!
Ama – AAAAAAH . (Sai gargalhando)
Romeu – É uma Capuleto! Oooh conta cara! Minha vida é dividida de hoje em diante
no livro do inimigo.
Mercúcio – (Voltando) E então dançaste gentil, Romeu?
Romeu – Dançar? Oh, não. Mas subi aos céus e despenquei repentinamente.
Mercúcio – Não entendi. (Sai)
Benvólio – (Voltando) A festa acabou; vamos embora.
Romeu – Acabou? Pra mim começou agora.
Benvólio – Então vamos embora. (Sai)

CENA 7
Julieta – (Para Ama) Ama, quem é aquele gentil-homem?
Ama – E eu que vou saber, sabes que enxergo mal e tem tanta gente indo embora,
outros caindo, outros parados... Nunca entendi esses finais de festa.
Julieta – Em falar em parados, e aquele ali, que não dançou. Quem é?
Ama – Aah, aquele... Aquele ali é Romeu.
Julieta – Romeu, que lindo nome!
Ama – Lindooo... Mas é um Montecchio! Filho único do vosso grande inimigo. Então
não te metas com ele... E agora vamos.
Julieta – Como do amor a inimizade me arde! Como esse monstro, o amor, brinca
comigo: Apaixonada ver-me do inimigo!
Ama – O que é isso Julieta?
Julieta – É uma rima que aprendi com quem...
Ama – Que rima o que, tome jeito. Vamos! (Saem)

CENA 8 (Varal)
Julieta – Ai de mim!
Romeu – Oh, falou! Fala de novo, anjo resplandecente, como o emissário alado das
alturas ser poderia para os olhos brancos e revirados dos mortais atônitos, que, para
vê-lo, se reviram, quando montado passa nas ociosas nuvens e veleja no seio do ar
sereno.
Julieta – Romeu, Romeu! Ah! Por que és tu, Romeu? Renegai o pai, despoja-te do
nome; ou então, se não quiseres, jura ao menos que amor me tens, porque uma
Capuleto deixarei de ser logo.
Romeu – (À parte) Continuo ouvindo-a mais um pouco, ou lhe respondo?
Julieta – Meu inimigo é apenas o teu nome. Continuarias sendo o que és, se acaso
Montecchio tu não fosses. Que é Montecchio? Não será mão, nem pé, nem braço ou
rosto, nem parte alguma que pertença ao corpo. Sê outro nome. Que há num
simples nome? O que chamamos rosa, sob uma outra designação teria igual
perfume. Assim Romeu, se não tivesses o nome de Romeu, conservara a tão preciosa
perfeição que dele é sem esse título. Romeu, risca teu nome, e, em troca dele, que
não é parte alguma de ti mesmo, fica comigo inteira.
Romeu – E farei teu desejo de bom grado. Então me chama somente de amor e serei
de novo batizado.
Julieta – Conheço o som desta voz! Não és Romeu? Não és um Montecchio?
Romeu – Nem um, nem outro, se os dois te desagradam.
Julieta – És louco! Como chegaste aqui?
Romeu – O amor me guiou.
Julieta – Corres perigo. Se algum de meus parentes lhe encontrar aqui, seria a morte
– A sua.
Romeu – Ah, mais perigos em teus olhos que em vinte espadas. Basta me olhar com
tua doçura que estarei protegido de tanto ódio. Mas se não me amas, deixe-os que
me surpreendam, pois prefiro que o ódio abrevie os meus dias a viver sem teu amor.
Julieta – Bem sabes que a máscara do amor vela meu rosto, se não tu verias o pudor
que se pinta em minha face só de pensar nas coisas que te disse. Más... Adeus
descrição, enfim, tu me amas? Vai dizer-me que sim. E também vou acreditar em ti,
meigo Romeu. Se me amas deve dizer-me francamente, ou se julgas que fui fácil
demais eu fecharei a cara e me farei de má, dar-te-ei um não para que me
conquistes. O fato é que estou perdida de amor por ti, por isso poderás de olhar
minha conduta leviana, mas afianço te amar da forma mais sincera do que essas que
aparentam mais recato.
Romeu – Meu amor já tens, eu juro... pela lua.
Julieta – Não jures pela lua que todo mês muda de semblante, para que teu amor
não faça o mesmo...
Romeu – Jurarei pelo o que então?
Julieta – Por nada. Por ninguém, ou se quiseres jure por ti mesmo. Embora suas juras
me deixam feliz, oh, Deus da minha idolatria.
Romeu – Pois eu jurarei. Se o amor querido, do meu coração.
Julieta – Não, não jures não. Pois apesar da tua presença ser uma alegria imensa, eu
não posso gozar de uma vez de tanta felicidade assim, uma entrevista que foi tão
brusca, súbita, imprevista... Que essa doce calma que me enche o coração também
encha a tua alma... Bom dia!
Romeu – Mas vai me deixar assim insatisfeito?
Julieta – Mas que satisfação esperava que ia acontecer?
Romeu – Suas juras de amor em troca das que te dei.
Julieta – E as que te pedi e eu que te dei? Pois seria melhor se não tivesse as dado.
Romeu – Por que razão queria retirá-las.
Julieta – Para ser generosa e novamente dá-las. Mas estou desejando aquilo que já
tenho. A generosidade em mim é como o mar, ilimitada. E o meu amor, profundo
como o mar. E ambas são tão infinitas que quanto mais te der, mais tenho pra dar.
Ser fiel, belo Montecchio... Bom dia, Romeu querido, de uma vez por todas. E se são
boas suas intenções mande dizer amanhã por meio de minha ama em que local e
hora quer realizar o nosso casamento, e então o meu destino a teus pés deporei e
como ao meu senhor te seguirei até o fim do mundo.
Romeu – A ida para escola é triste e a volta é alegre. Mas pro amor, a ida é alegre e a
volta é triste.
Julieta – Romeu!
Romeu – Querida?
Julieta – Ah! Já nem sei porque é que te chamei...
Romeu – E eu ficarei até te recordares.
Julieta – Então me esquecerei. Só para que demores.
Romeu – E eu ficarei, para que esqueças de tudo. Como eu mesmo me esqueço, ao
pé de ti, de tudo que não seja este momento!
Julieta – Seria bom, querido. Mas eu te mataria de carinho! Bom dia! Bom dia! Bom
dia! A despedida é dor, tão doce, todavia, que eu te darei bom dia até o fim dos
meus dias. (Sai)
Romeu – Oh! Quem me dera ser a paz, para ficar contigo, num só lugar. Agora vou
pedir o auxílio do bom frade e lhe contar minha felicidade. (Sai)

CENA 9
Frei Lourenço – (Entrando com o púlpito) Misericórdia, que sacrilégio, oooh bendito!
Romeu – Bom dia, padre.
Frei Lourenço – Bom dia, Romeu. Passaste a noite em claro?!
Romeu – Passei. Porém mais do que o sono, o velar me foi caro.
Frei Lourenço – Deus te perdoe! E foi com Rosalina então que estiveste?
Romeu – Oh! Não! Esqueci esse nome e o mal que me fazia.
Frei Lourenço – Se não foi isso... que seria?
Romeu – Num baile inimigo encontrei alguém. De repente, senti que esse alguém me
feriu, e ferido por mim por sua vez se viu.
Frei Lourenço – Meu rapaz, expõe-me claramente o que te traz, pois somente uma
franca confissão pode obter franca absolvição.
Romeu – Pois bem. Amo a filha dos Capuleto. E assim como eu adoro, ela também
me adora. Já combinamos tudo, e só nos falta agora combinar com o senhor o
casamento. Peço-lhe: Consista em nos casar, hoje mesmo!
Frei Lourenço – Oh meu São Francisco! Mas que pressa! E que mudança súbita é
essa? Rosalina, por quem davas a vida, já tão depressa assim foi esquecida? Bem se
vê que nos moços a paixão está nos olhos, não no coração.
Romeu – Não ralhe mais. Aquela que amo agora também me ama.
Frei Lourenço – Tenho uma razão para te auxiliar... Quem sabe esta união poderá
transformar a inimizade entre as famílias rivais em pura amizade? Vai meu volúvel,
vá! Mas devagar. Quem mais corre, mais tropeça.
Romeu – Vou sim, meu bom frade. E obrigado... Vou buscar avisar minha amada.
(Sai. Logo sai o Frei com o púlpito)

CENA 10
Mercúcio – Onde diabo se meteu esse Romeu? Será que posou fora?
Benvólio – Fora da casa dele pelo menos. O criado me disse.
Mercúcio – Aquela lambisgóia, de coração de ferro, a tal Rosalina. Tanto o atormenta
que ele acaba doído.
Benvólio – Fiquei sabendo também que o sobrinho dos Capuleto, Teobaldo, escreveu
uma carta a Romeu. Não gostou de nossa presença na festa; Ai vem Romeu!
Mercúcio – Só pele e osso! Amarelo e seco como um bacalhau! Ó carne, ó carne,
como viraste peixada! Senhor Romeu, bom jour! Aliás, ontem à noite saíste a
francesa.
Romeu – Bom Jour para ambos. Mas como assim, se vocês saíram primeiro que... Ah!
Perdão, meu caro Mercúcio. É que ontem à noite tive uma urgência, e nessas
ocasiões a gente esquece as cerimônias.
Ama – Bom dia, meus senhores.
Mercúcio – Bom soir, madame.
Ama – Como soir, já é de tarde?
Mercúcio – Oh madame! Que vais-je de tout ce temps que ser ama vie? Tu m’as
laissé la terre entièrre. Je vous em prie! Pour qui? Pour quoi? Et ce matin que revient
pour rien? Ne me quittes pas, Madame, l avie em rose, s’il vous plait!
Ama – Afaste-se! Afaste-se! Que espécie de homem é o senhor? Algum dos senhores
pode me dizer onde encontro o jovem Romeu?
Mercúcio – Oh, madame! Que vais-je faire de tout ce temps que sera ma vie?
Ama – Oui...
Mercúcio – Tu m’as laissé la terre entièrre!
Ama – Oui...
Mercúcio – Liberté, égalité, fraternité!
Ama – Oui!!
Mercúcio – Voilá, madame, c’ést Romeu!
Ama – Ai está o senhor! Bom eu desejaria lhe falar...
Mercúcio – Fala madame, fala.
Ama – Em particular.
Mercúcio – D’ácord, madame, d’ácord. Au revoir, Madame! (Sai com Benvólio)
Ama – Au revoir! Diga-me, meu senhor, quem é esse atrevido vendeiro de
insolências que tem o seu armazém tão bem sortido de asneiras?
Romeu – É um fidalgo!
Ama – Ah! Me dê uma palavrinha, senhor. Julietinha me mandou procura-lo, mas o
que ela me mandou dizer fica comigo. Antes, deixe-me lhe dizer que se o senhor está
pensando em leva-la para a rua da amargura, isso é muito mal feito, porque minha
ama é muito mocinha, portanto, não vá com pau de dois bicos pra cima dela, porque
isso a magoaria muito e não há moça que aguente isso.
Romeu – Recomenda-me à tua ama, Eu te afianço...
Ama – Ah!
Romeu – O que?
Ama – Ah! Que belo coração, sim senhor.
Romeu – O que você está dizendo?
Ama – Eu direi a ela tudo, tudo, tudo...
Romeu – Que é que vais dizer se não falei nada,
Ama – Eu lhe direi, que o senhor afiança – o que ao meu ver é falar bonito!
Romeu – Vai dizer-lhe que arranje um pretexto qualquer para ir a confissão, hoje à
tarde, com Frei Lourenço, em cuja cela. Depois de confessada, ela será casada. E
agora tome pelo teu trabalho.
Ama – Não, senhor, francamente, propina não!
Romeu – Aceita, estou mandando.
Ama – Não, propina não. Hoje à tarde ela estará lá. (Saindo) Romeu!
Romeu – O que é?
Ama – Dá me. (Entrega o dinheiro) Vou comprar um espartilho novo pro teu
casamento. (Saem cada um pra um lado)

CENA 11
Julieta – Graças a Deus! Até que enfim... E então, ó Bá, o que aconteceu? O que lhe
disse Romeu?
Ama – Mas que pressa! Jesus! Não pode esperar um pouquinho? Não vê que estou
cansada e sem ar? Pois então. Que escolha tu fizeste, não podia ser pior! Romeu!
Que homem! Apesar da cara não ser das mais bonitas, tem as pernas... mais bem
feitas que qualquer outro. E quanto as mãos, os pés, a estatura, apesar de não serem
também lá essas coisas... são incomparáveis! Não é nenhum primor de cortesia...
Mas é meigo como um cordeirinho, isso eu garanto! Segue teu caminho menina e vai
com Deus!
Julieta – Tudo isso eu já sabia, Bá! E sobre o casamento o que foi que ele lhe disse?
Ama – Casamento, ah claro, casamento. Tens permissão para te confessares?
Julieta – Tenho.
Ama – Então corre à cela do Frei Lourenço. Lá encontrarás o homem a qual será
casada. Vá bem ligeiro!
Julieta – Minha boa, Bá. Para minha ventura é que vou!

CENA 12 (Casamento)
Frei Lourenço – (Entrando com o púlpito. Logo entra Romeu) Que o céu abençoe este
nosso ato santo que dele nunca nos arrependemos!
Romeu – Amém, amém! Haja o que houver, no entanto. Nem toda a dor do mundo é
um preço bastante para o gozo de vê-la um só instante!
Frei Lourenço – Ai vem correndo a noiva. Na verdade, não será um passinho assim
leve e ligeiro que há de gastar o chão da eternidade! Quem ama pode andar sobre as
teias de aranha que a brisa do verão balança no ar, tamanha é a leveza das coisas
vãs!
Julieta – Boa tarde meu santo confessor.
Frei Lourenço – Que Romeu te agradeça em seu nome e no meu.
Julieta – Quem deve agradecer a ambos sou eu! O sentimento, quanto mais
profundo, mais pobre é na aparência e mais rico no fundo. Não de ornamentos vãos
e frívola aparência se orgulha, mas de sua própria essência. Poder contar seu ouro é
sinal de pobreza. E o meu amor chegou a tal riqueza, que nem pela metade o
contarei agora!
Romeu – Ah, se tua alegria a minha iguala, perfuma com o teu hálito este ambiente!
Que a tua doce voz descreva suavemente a imagem da ventura e do
deslumbramento, que em ambos nos produz esse grato momento!
Frei Lourenço – Não me levem a mal, porém somente após uni-los pela igreja é que
eu os deixo a sós. Julieta Capuleto, aceita Romeu Montecchio como seu esposo?
Julieta – Sim.
Frei Lourenço – Romeu Montecchio aceita Julieta como sua esposa?
Romeu – Sim.
Frei Lourenço – Então! Ego vos uno in matrimonio, Romeu Montecchio et Julieta
Capuleto, miserato vestri Benedicat vos in nomine patri, er fili et spiritu santu!
Romeu e Julieta – Amém! (Fim da cena. Luz se apaga)

CENA 13
Benvólio – Temos de nos cuidar Mercúcio, vamos embora! O dia está quente, e os
Capuleto andam pela cidade.
Teobaldo – Preciso dar uma palavra a um dos senhores.
Mercúcio – Só uma palavra a um de nós? Junta isso alguma coisa e teremos, por
exemplo, uma palavra... e uma estocada!
Teobaldo – Com todo o prazer, desde que a ocasião se apresente. Podes ficar em paz,
ai vem o homem que aguardava. Romeu, és um patife!
Romeu – Tenho razões para gostar de ti, Teobaldo, e elas me fazem reprimir a
resposta que tal saudação merecia. Eu não sou patife. Agora, adeus. Vejo que tu não
me conheces ainda.
Teobaldo – Mas isso não repara o ultraje recebido de ti. Volta e te põe em guarda!
Mercúcio – Ó vergonhosa submissão! Eu decido a questão! Vamos! Uma estocada,
Teobaldo, caçador de ratos!
Teobaldo – O queres de mim?
Mercúcio – Nada mais, meu caro rei dos gatos, do que um dos teus sete fôlegos, para
fazer dele o que bem me aprouver, e conforme te portares comigo, esmigalhar em
seguida os outros seis.
Teobaldo – Às tuas ordens! (Luta)
Romeu e Benvólio – Parem! Parem!
Romeu – Parem! O príncipe proibiu expressamente.
Mercúcio – Fui ferido! Desta vez fui mesmo despachado! E ele escapou são e salvo!...
Benvólio – Estás ferido?
Mercúcio – Sim, sim, somente um arranhão, mas já chega.
Benvólio – Coragem, amigo! O ferimento não pode ser grave.
Mercúcio – Não. Não tem a profundidade de um poço, nem a largura de um portal de
igreja, mas assim mesmo chega. Garanto que vou desta para melhor! Malditas sejam
as vossas famílias. Por que diabo te meteste entre nós dois? Recebi o golpe sob teu
braço.
Romeu – Minha intenção era boa!
Mercúcio – Que a peste mate as vossas duas famílias, que fizeram de mim um pasto
para vermes! Às vossas famílias!
Romeu – Por minha causa, foi ferido mortalmente um nobre coração, um amigo leal,
um parente tão próximo do Príncipe!
Benvólio – Romeu, Mercúcio está morto!
Romeu – A atroz fatalidade deste dia ainda estenderá a outros dias futuros sua
nefasta influência! Este apenas começa o mal que outros terminarão. Teobaldo!
Caçador de Ratos!
Teobaldo – Vai lutar comigo enfim, Romeu?
(Romeu mata Teobaldo)
Benvólio – Romeu, foge! Vem gente aí!
Romeu – Sou um joguete da sorte! (Sai)
Príncipe – Onde é que estão os vis autores dessa rixa?
Benvólio – Nobre Príncipe, eu posso vos narrar os pormenores dessa infausta rixa.
Capuleto – Teobaldo! Meu sobrinho! Está morto! O filho do meu irmão querido! Ó,
Príncipe, fazei justiça! Se o nosso sangue foi derramado, que seja derramado
também o sangue dos Montecchio!
Príncipe – Quem começou, essa rixa sangrenta?
Benvólio – Teobaldo, que atingiu mortalmente o intrépido Mércúcio, e em seguida
bateu-se com Romeu em quem já despertara a sede de vingança. O combate durou o
que dura um clarão.
Capuleto – Ele mente! É um parente dos Montecchio! Foram vinte, talvez, que se
empenharam contra um só, nessa atroz carnificina! Vinte para matar um só! Eu
reclamo justiça! Romeu matou Teobaldo, então deve morrer!
Príncipe – Basta! Romeu matou Teobaldo, o qual matara Mercúcio. E por tal crime
deve exilado imediatamente. Até eu já sofri as consequências do vosso ódio e de
suas violências. Romeu deve partir já, sem demora. Se ainda for visto aqui, morrerá
na mesma hora. Levem daqui os corpos, vivos ou mortos, e cumpram minhas ordem.
A clemência com o crime é o pior das desordens.
CENA 14
Julieta – Galopai, galopai a toda a brida, ó fogosos corcéis, em direção à noite
nebulosa. Noite, propiciadora dos amores, vem fechar os olhos dois que passam, A
fim de que Romeu, sem ser falado ou visto, caia em meus braços! Os amentes não
precisam de outra luz, para os ritos amorosos, que a da própria beleza dos seus
corpos! Vem, noite grave! Ensina-me a ganhar nesse jogo, em que se apostam duas
virgindades imaculadas! Ensina-me a olhar o ato do amor naturalmente, sem
nenhum pudor! Vem, noite escura, amante, amiga, e dá-me o meu Romeu! E quando
ele morrer, toma-o de novo e corta-o em pequenas estrelas, e ele assim tornará tão
belo o firmamento, que o mundo inteiro adorará a noite e negará o seu culto ao
ofuscante sol! Oh! Eu comprei linda mansão de amor que ainda não habito! Eu fui
vendida, porém, quem me comprou não me possui ainda!
Ama – Ai de mim! Ele está morto! Nós estamos perdidas, Julieta! Teobaldo foi morto,
Romeu desterrado. Romeu matou Teobaldo! Maldito, Romeu!
Julieta – Que? Que o cancro te devore a língua por tal praga! Maldito é que ele não
seria nunca! Esse malvado do meu primo quis matar o meu marido, com certeza...
Mas nisso tudo há uma palavra horrível: “desterrado”. Esta palavra vale por dez mil
mortes de Teobaldo! Romeu está banido. E eu, virgem, morrerei viúva sem ser
casada. Oh, Bá, a morte, e não Romeu, quem me possuirá.
Ama – Mas meu Santo Cristo, então é nisso que está pensando?
Julieta – Mas, Bá!
Ama – Julieta, vá já pro teu quarto. Vou trazer Romeu pra te consolar.
Julieta – Obrigada minha boa, Bá! Obrigada. Vá, logo. Para que ele venha me dar o
seu último adeus!

CENA 15
Romeu – Ó desterro! Ó desterro!
Frei Lourenço – Romeu! Tu foste desterrado apenas de Verona. Tem paciência, o
mundo é muito grande!
Romeu – Fora dos muros de Verona, o mundo não existe! Como pode o senhor – um
santo confessor que absolve pecadores, o senhor que se diz meu amigo – ter a
coragem de me matar com essa palavra “desterrado”?
Frei Lourenço – Ó amante insensato, escuta-me um momento! Deixa-me discutir a
situação contigo.
Romeu – Como pode o senhor falar do que não sente? Fosse jovem como eu e
amasse a Julieta, e se uma hora depois de ter casado com ela matasse a Teobaldo,
assim como eu matei, e estivesse, como eu, apaixonado, e fosse desterrado, como eu
fui, então sim, o senhor poderia falar, poderia arrancar os cabelos, como eu, se atirar
no chão, como estou fazendo, como quem quer medir a própria cova!
Frei Lourenço – Esconda-te, vem vindo alguém.
Ama – Senhor frade, preciso dar um recado a Romeu. Venho da parte da senhora
Julieta, minha ama. Onde é que está o esposo de minha ama?
Frei Lourenço – Atirado no chão e embebedado pelas próprias lágrimas!
Ama – Levante-se, seja homem! Em nome de Julieta!
Romeu – Onde está ela e como vai? Que diz minha secreta esposa, do nosso
desgraçado amor?
Ama – Nada, senhor! Não diz nada, mas chora, chora, chora... (Romeu tenta se
matar)
Frei Lourenço – Retém teu gesto louco! És homem mesmo? Não vês que matando-te,
tu matas também tua esposa, que vive em ti? Vamos! Vai-te encontrar com a tua
bem amada. Vá até seu quarto.
Ama – Isso, vá consola-la!
Frei Lourenço – Mas olha lá! Deves partir antes do toque da alvorada, senão não
poderás seguir para Mântua, onde deves ficar, até que eu ache ocasião de revelar
teu casamento, de reconciliar vossas famílias e de obter o perdão do Príncipe e, por
fim, de te fazer voltar vinte mil vezes mais feliz do que partes infeliz. A tua sorte só
depende disto: Partir antes da guarda ser rendida, ou pelo amanhecer, se fores
disfarçado. Agora vá!
Romeu – Adeus! (Sai)

CENA 16 (NOITE NUPCIAL)


(Romeu e Julieta se encontram no quarto, deitam, fecha a luz, até vir o dia)
Julieta – Queres partir? Ainda está longe o dia! Isso foi o rouxinol, e não a cotovia,
Era essa a voz que te feriu o ouvido.
Romeu – É a cotovia anunciando o sol! As candeias noturnas que velaram nossa
noite nupcial já se apagaram. Devo partir, partir para viver, ou ficar em teus braços e
morrer.
Julieta – Não é a luz do dia o clarão que tu vês, é um meteoro, talvez, para guiar-te a
Mântua, em meio ao nevoeiro! Fica um pouquinho mais, ainda é cedo!
Romeu – Preso ou morto, que importa? É o teu desejo? Eu cedo! Direi que esse
clarão cinzento que além vejo não é a luz da manhã que no céu se insinua, mas um
reflexo pálido da lua! Eu não quero partir, eu prefiro ficar! Ó morte, podes vir! Serei
feliz morrendo aqui! Julieta assim o quis! Que venha a morte!
Julieta – Não! É o dia! Anda. Foge! É a cotovia, sim! E há quem diga que é doce o seu
cantar! Mentira! Se ela nos vai separar|! Voz que nos enche de um pavor atroz, que
te arranca de mim, que me separa de ti, com os seus sons matinais que te expulsam
daqui! Agora, vai! É o dia que amanhece!
Romeu – Amanhece... porém, para nós anoitece!
Julieta – Então, janela, deixe que entre o dia e que saia por ti minha alegria!
Romeu – Adeus! Já vou descer. Um beijo mais!
Julieta – Ai de mim! Meu esposo, senhor, amado. Vais embora! Manda notícias
sempre, a toda hora, pois num minuto só, na tua ausência, há dia e mais dias de
existência! Crês que um dia nos veremos?
Romeu – Sim, sim! E tudo o que hoje nós sofremos, está tristeza, essa amargura, será
nosso assunto em conversas futuras!
Julieta – Oh! Meu Deus! Tenho na alma um mau pressentimento! Agora vá.
Romeu – Isole esses pressentimentos e devaneios. Adeus, minha bela e doce Julieta!

CENA 17
Capuleto – Filha.
Julieta – Minha mãe?
Capuleto – Ainda e sempre chorando a morte de teu primo?
Julieta – Deixe-me chorar uma perda tão grande!
Capuleto – Tenho uma notícia alegre para ti.
Julieta – Ainda bem.
Capuleto – Minha filha, que pais dedicados tens tu. Tanto, tanto, que para te livrar
do teu abatimento, inesperadamente, acabamos de te arranjar um dia alegre. Com o
qual tu nem sonhavas, sequer!
Julieta – Em boa hora, mamãe; porém que dia é esse?
Capuleto – Quinta-feira que vem, de manhã cedo, na igreja de Saint Peter, o conde
Paris fará de ti uma feliz esposa.
Julieta – Nem por Saint Peter mesmo e nem na sua igreja, ele fará de mim uma
esposa feliz! O que me espanta é a precipitação com que querem casar-me, ainda
mais você mamãe a qual sempre demonstrava sobriedade sobre assuntos do amor. E
outra, aquele que deverás tornar-se meu marido jamais declarou-se a mim! Peço-
lhe, mamãe que diga a meu pai que não desejo ainda me casar.
Capuleto – Insensata! Recusa tamanho pretendente... Um fidalgo tão digno! Deveria
estar orgulhosa!
Julieta – Não me sinto orgulhosa. Não me posso orgulhar daquilo que detesto, mas
agradeço o mal que me é feito por bem.
Capuleto – Ficas prevenida: ou vais quinta-feira à igreja ou nunca mais olhará para
mim! Nem mais uma palavra! Filha ingrata.
Ama –Deus a abençoe! Como a senhora a trata!
Capuleto – Você, meta a língua para dentro e vá mexericar com as comadres.
Ama – O que eu disse é algum crime?
Julieta – Não haverá lá no alto um olhar de piedade que leia bem no fundo desta
dor? Ó minha boa mãe, não me renegue! Adie o casamento por um mês, ou por uma
semana pelo menos!
Capuleto – O que está dito, segue dito. Não trocarei contigo uma palavra, está tudo
acabado entre nós duas. (Sai)
Julieta – Meu Deus! Ó, Bá! Como impedirmos isso? O meu esposo ainda está na
terra, mas o meu juramento está no céu! Como fazer para me desligar do juramento?
Consola-me e aconselha-me!
Ama – Julieta! Romeu está banido, e aposto o mundo inteiro contra nada que ele
nunca ousará vir aqui reclamar-te. Penso que o melhor é te casares com o Conde
Paris.
Julieta – Falas de coração?
Ama – Com toda minha alma também.
Julieta – Velha danada! Pérfido demônio! Pois vai-te alcoviteira! Entre nós dias de
hoje em diante há um abismo. Eu vou falar com o frade. Talvez ele me salve e me
conforte. Vá! E se tudo falar... resta-me ainda a morte! Vá!

CENA 18
Julieta – Oh, padre! Por favor, chore comigo!
Frei Lourenço – Ah! Julieta, eu já soube da desgraça! Sei que tens de casar, na quinta-
feira próxima, com o Conde Paris.
Julieta – Não me diga que sabe da desgraça sem me dizer que sabe o meio de
impedi-la! Com a sua velha e longa experiência dê-me, um conselho imediatamente,
responda já, pois se o que tem a me dizer não me dê salvação, eu prefiro morrer!
Frei Lourenço – Detém-te, minha filha! Se para não te casar com o Conde Paris tu és
capaz até de te matares, é provável que tu seja capaz, também, de um sacrifício
semelhante à morte.
Julieta – Pois ordene, e eu obedecerei, cegamente, sem medo e sem hesitação
sequer.
Frei Lourenço – Pois amanhã, à noite, arranje um meio de dormir só. Toma este
frasco e quando estiveres deitada, beba todo o licor que ele contém. O teu pulso,
cessando o ritmo compassado, deixará de bater. Teus membros ficarão, como os de
um morto, rígidos e frios. E, sob essa aparência enganosa de morte, tu permanecerás
quarenta e duas horas. Depois despertarás, mas nesse meio tempo, antes que tu
despertes, Romeu, a quem por carta eu comunicarei o nosso plano, chegará aqui. E
nessa mesmo noite, ele te levará consigo para Mântua. Mandarei um irmão a
Mântua, toda a pressa, levar minha carta a Romeu.
Julieta – Que o amor me dê coragem, e a coragem me salvará! Adeus, querido padre.
Frei Lourenço – Adeus, Juju!

CENA 19
Capuleto – Julieta! Julieta! Ah, ai está você. Então minha teimosa, onde andaste a
saracotear?
Julieta – Encontrei o conde Paris com o Frei Lourenço e lhe manifestei tanto quanto o
permite a discrição, o meu amor por ele.
Capuleto – Isso muito me alegra! Agora, anima-te e vá para teu quarto enfeitar-te
para amanhã. Adeus!
Julieta – Adeus! Sabe Deus quando nós nos veremos novamente! Sinto correr-me às
veias vagamente um gélido arrepio de pavor. Bá!... Não, não! Para quê? Não vale a
pena... Devo representar sozinha a horrível cena! Mas se a bebida não fazer efeito?
E se fosse um veneno que o frade astutamente tivesse me dado para me dar a morte,
com receio de se perder também com esse outro casamento? E se eu, quando estiver
no túmulo, acordar antes que Romeu venha me libertar? Que horror! Não
enlouquecerei, vendo-me assim cercada de todas essas coisas tenebrosas? Parece-
me ver o espectro de Teobaldo em busca de Romeu que lhe tirou a vida! Para aí,
Teobaldo, para aí! Romeu, já vou! Eu bebo isto por ti! (Bebe)
Ama – (Entrando) Julieta! Julieta! Menina! Ó menina! Dorme como uma pedra, não
há dúvida! Dorme por toda a semana, já que o conde apostou todo o seu sono como
logo à noite irá dormir bem pouco! Menina! Menina! Já vestida e pronta! Menina...
Meu Deus, ela está morta! Socorro, Julieta está morta!
Capuleto – Mas que gritaria é essa?
Ama – Oh! Senhora Capuleto, uma desgraça!
Capuleto – (Observando Julieta) Não! Não ! Oh! Maldito dia! Está morta.
Frei Lourenço – A noiva já está pronta, enfim, para ir à igreja?
Capuleto – Está pronta para ir e nunca mais voltar. Ai de mim, minha filha está
morta! E com ela se enterrará minha alegria!
Frei Lourenço – Basta, basta! Silêncio, por favor! Não é com exclamações
desesperadas que havemos de curar o nosso desespero! Está linda criança era uma
parte vossa e outra parte do céu; agora é só do céu! (Saem)

CENA 20
Romeu – Notícias de Verona! E Julieta como está?
Benvólio – Perdoe-me primo por trazer tão más notícias, pois apenas achei que
deveria saber. O corpo de Julieta repousa em paz no mausoléu dos Capuleto, e sua
alma imortal, essa está entre os anjos.
Romeu – Então é isso? Eu te desafio, ó estrela funesta! Mas não tens mesmo
nenhuma carta do frade para mim.
Benvólio – Sinto em dizer, meu bom primo. Mas, não.
Romeu – Julieta, está noite eu dormirei contigo! (Saem)

Frei Lourenço – Já de volta de Mântua? Então Romeu que disse?


Frei João – Os inspetores de saúde da cidade, suspeitando que houvesse estado
numa casa onde há peste, fecharam-me as portas e não me permitiram sair. Minha
viagem a Mântua, assim, foi impedida.
Frei Lourenço – Mas então quem levou minha carta a Romeu?
Frei João – Ninguém meu bom frade, ainda a tenho aqui.
Frei Lourenço – Contratempo fatal! Esta não era uma carta banal, e o seu atraso
poderá causar grandes calamidades! Pobre enterrada viva, encerrada num túmulo de
mortos! Vamos... (Saem)

CENA 21 (MORTE DE ROMEU E JULIETA)


Romeu – Ó minha bem amada! Ó minha esposa! A morte, que sugou o mel do teu
alento, ainda não dominou a tua beleza! Tu não foste vencida! As cores da beleza
trilham em tua face e em teus lábios! A morte ainda não pode desfraldar no teu
corpo o seu pálido estandarte! Ah! Julieta querida, como podes estar tão bela,
ainda? Eu quero ficar contigo! Olhos, o último olhar! Braços, o último abraço!
Lábios, portas do alento, um último beijo para selar com a morte um contrato sem
termo! Vamos, nojento guia, piloto alucinado, atira de uma vez teu barco fatigado
pelos trabalhos do mar, sobre os rochedos fragorosos! Ao meu amor! (Bebe) Este
veneno é eficaz! Morrerei num beijo!
Julieta (Acordando) Romeu! Mas o que é isto? É um veneno bem vejo, que tão cedo
pôs fim a sua vida! (Bebe) Egoísta! Bebeu tudo, sem deixar ao menos uma gota para
mim! Eu beijarei teus lábios! Talvez neles ainda reste um pouco de veneno que me
possa salvar ao me matar. Como os teus lábios estão quentes! (Pegando punhal)
Abençoado punhal! Eis a tua bainha! Cria ferrugem nela e deixa-me morrer!

Menina - O Céu se serviu do amor e fez todos castigados. Os Montecchio e os


Capuleto, por fraterna dos irmanados, findaram as discórdias e, um ao outro
abraçados, prometeram-se em ouro, lado a lado, estátuas aos filhos eternizados. No
definitivo da história, Romeu e Julieta celebram o circo céu da paixões, abrindo livre
vereda no dentro do ferro das grandes prisões.

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