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Ciência & Saúde Coletiva

ISSN: 1413-8123
cecilia@claves.fiocruz.br
Associação Brasileira de Pós-Graduação em
Saúde Coletiva
Brasil

Colombo Pauleto, Adriana Regina; Toralles Pereira, Maria Lucia; Goldfarb Cyrino, Eliana
Saúde bucal: uma revisão crítica sobre programações educativas para escolares
Ciência & Saúde Coletiva, vol. 9, núm. 1, 2004, pp. 121-130
Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva
Rio de Janeiro, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=63013499012

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Saúde bucal: uma revisão crítica sobre

ARTIGO ARTICLE
programações educativas para escolares

Oral health: a critical review about educative


programmes for students

Adriana Regina Colombo Pauleto 1


Maria Lucia Toralles Pereira 2
Eliana Goldfarb Cyrino 3

Abstract The Brazilian epidemiological situa- Resumo Em saúde bucal, a situação epidemio-
tion in oral health is still serious due to inappro- lógica brasileira ainda é grave devido às condições
priate social and economic conditions of the pop- sociais e econômicas da população, à pequena
ulation; the small amount of investment com- parcela de investimentos que a área recebe em re-
pared to the total amount of SUS; and lack of in- lação ao total do SUS e à falta de informação so-
formation about basic health cares. Although the bre os cuidados básicos de saúde. Embora a odon-
dentistry sector seems to be very developed re- tologia se mostre muito desenvolvida em tecnolo-
garding technology, it does not meet significantly gia, não responde em níveis significativos às de-
the population demand for oral health. In accor- mandas dos problemas de saúde bucal da popula-
dance to this fact, oral health education has been ção. Nesse contexto, a educação em saúde bucal
required every day more, with regard to the low tem sido cada vez mais requisitada, considerando
costs and the possibilities of odontologycal impact o baixo custo e as possibilidades de impacto odon-
on public and collective scope. The main reason tológico no âmbito público e coletivo. A impor-
1 Programa de
for this study was the importance of preventive tância de práticas preventivas e educativas em
Pós-Graduação em Saúde and educative actions in oral health, aiming dif- saúde bucal nos levou a realizar este estudo,
Coletiva, Faculdade ferent odontologycal programmes by means of re- apontando diferentes programas odontológicos,
de Medicina de Botucatu, view studies, to analyse their proposals, method- mediante estudo de revisão, para analisá-los em
Universidade Estadual
Paulista. Rua Sérvio Túlio ologies, possibilities and limitations, seeking to suas propostas, metodologias, possibilidades e li-
Carrijo Coube 3-33/31, consider the theme focusing in educative aspects mitações, visando refletir sobre o tema com foco
bloco A, Jd. Infante Dom that still challenge oral health programmes. In the nos aspectos educativos que ainda desafiam os
Henrique, 17044-490,
Bauru SP. analysed programmes were identified four ten- programas de saúde bucal. Identificaram-se qua-
adrianapauleto@hotmail.com dencies. The study pointed out the necessity of re- tro tendências nos programas analisados. O estu-
2 Departamento
think the educative actions. do apontou para a necessidade de se repensar as
de Educação. Programa
de Pós-Graduação em Key words Educative programmes, Oral health, práticas educativas.
Saúde Coletiva, Faculdade Health programmes, Education in health Palavras-chave Programas educativos, Saúde
de Medicina de Botucatu, bucal, Programas em saúde, Educação em saúde
Universidade Estadual
Paulista.
3 Departamento de Saúde
Pública. Faculdade
de Medicina de Botucatu,
Universidade Estadual
Paulista.
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Pauleto, A. R. C. et al.

Introdução e órgãos defendem que a fluoração das águas de


abastecimento público é uma medida ideal de
A cárie dentária e a doença periodontal são os saúde pública para a prevenção da cárie dentá-
males que mais acometem a cavidade bucal, ria, devido à sua eficácia, segurança e, princi-
sendo a cárie o mais comum em crianças. palmente, ao baixo custo. Esta medida exige, no
Thyslstrup e Fejerskov (1995) descrevem a cá- entanto, o controle dos níveis de flúor pela Vi-
rie como um processo dinâmico que ocorre gilância da Qualidade da Água para o Consu-
nos depósitos bacterianos (placa bacteriana na mo Humano, realizado pelos serviços de saúde
superfície dos dentes), resultando em uma al- (Frazão 1998).
teração do equilíbrio entre a superfície dentá- A saúde bucal, implícita na saúde integral,
ria e o fluido da placa que, com o passar do está relacionada às condições socioeconômicas
tempo, leva à perda mineral. e culturais da população. Como observa Porto
No Brasil, a prevalência da cárie dentária (2002), a saúde bucal está diretamente relacio-
medida aos 12 anos de idade vem diminuindo nada às condições de alimentação, moradia,
desde a década de 1970, apesar de já ter sido trabalho, renda, meio ambiente, transporte, la-
um dos maiores CPO-D do mundo (representa zer, liberdade, acesso a serviços de saúde e in-
a média de dentes cariados/C, dentes perdidos/ formação. Nesse sentido, a luta pela saúde bu-
P e dentes obturados/O) (OPAS/OMS, 2001). cal está, fundamentalmente, ligada à luta pela
Conforme o levantamento epidemiológico melhoria dos determinantes sociais, políticos e
nacional de 1986, realizado na zona urbana em econômicos.
16 cidades, a pior situação aparecia entre as pes- A educação e a informação sobre os cuida-
soas de menor renda. Para o grupo da faixa etá- dos com a saúde bucal têm sido ressaltadas por
ria de 6-9 anos, o índice CPO-D encontrado ob- diversos pesquisadores. O desconhecimento
teve a média de 2,68 dentes cariados, e para o sobre cuidados necessários de higiene bucal re-
grupo etário de 10-12 anos, 5,56 dentes caria- presenta um fator a ser considerado, uma vez
dos (Brasil, 1989). Em 1996, dez anos depois que a informação, embora disponível nas gran-
desse levantamento, outro estudo realizado pelo des mídias, não chega a todas as camadas da
Ministério da Saúde nas capitais brasileiras, pes- população da mesma forma e, dificilmente, é
quisando somente a cárie dental entre escolares apreendida de modo a produzir conhecimento
de 6 a 12 anos, mostrou uma redução de 53,9% e autonomia em relação aos cuidados com a
na população estudada, atingindo praticamente saúde. A importância de programas odontoló-
os parâmetros da Organização Mundial de Saú- gicos educativos, que levantem e interpretem
de (OMS) para o ano 2000, que é de um índice as necessidades das populações de menor aces-
CPO-D menor ou igual a 3,0 (Brasil, 1999). so aos serviços de saúde odontológicos precisa
Essa queda não é uniforme nem homogê- ser valorizada.
nea pelo vasto território brasileiro. Pode-se
considerar que varia, dentre outros fatores, se-
gundo as características de abastecimento de Política Nacional de Saúde Bucal
água de cada região, dos sistemas locais de saú-
de e das classes sociais e seus diferenciais de con- Botazzo (1994) observa que, até a década de
sumo. Em regiões com água fluorada e cujos 1970, a maioria das ações coletivas, no campo
teores são mantidos adequados, a redução po- da saúde bucal, era descontínua e esporádica,
de ser atribuída a essa medida (Frazão, 2000). sendo executada na semana dos bons dentes
A fluoração das águas de abastecimento pú- ou algo parecido. Essas ações apresentavam
blico foi aplicada pela primeira vez no Brasil em mais características de campanha do que de
1953 no município de Baixo Guandu, Espírito programa. Em instituições de saúde mais bem
Santo. Constitui um meio coletivo importante estruturadas, procurava-se adotar como base
para a prevenção da cárie dentária pelos resulta- de um único método de prevenção, por exem-
dos que produz: redução de aproximadamente plo: ou a fluoração das águas de abastecimento
60% na prevalência da doença depois de 10 anos público ou a realização de bochechos fluora-
de utilização (Frazão, 1998). dos semanais.
Em 1974, o Congresso Nacional aprovou a As crises econômicas, os desajustes sociais e
lei federal n. 6.050, que determina a obrigato- uma inadequação do sistema de atenção clínica
riedade da fluoração dos municípios com esta- e preventiva à população figuram entre as mais
ções de tratamento de água. Diversas entidades notórias razões que explicam os contrastes ob-
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servados na realidade brasileira, além do limi- loca para a prática profissional da odontologia
tado acesso da população aos serviços disponí- (produção de conhecimento, produção de ser-
veis e do isolamento entre si das entidades que viços e desenvolvimento de recursos humanos)
atuam nessa área (Brasil, 1989). está baseado no estabelecimento de uma atua-
Procurando dar uma resposta correta a essa ção responsável na luta pela conquista dos ob-
situação, a Divisão Nacional de Saúde Bucal, jetivos que incluem a liberdade, os direitos e
órgão da Secretaria Nacional e a Coordenado- deveres individuais e coletivos, tendo em vista
ria de Supervisão e auditoria de Odontologia alcançar a máxima plenitude de qualidade de
do Inamps elaboraram, em 1989, a Política Na- vida (Brasil, 1993).
cional de Saúde Bucal. As prioridades dessa po- Nas últimas décadas, foi grande o desen-
lítica são definidas segundo os grupos popula- volvimento de produção, distribuição e consu-
cionais, tipos de serviços, danos, recursos hu- mo de uma quantidade enorme de bens e ser-
manos, modalidades de organização e financia- viços relativos à problemática da saúde bucal.
mento do setor (Brasil, 1989). Narvai (1994) admite que, aproximadamente,
O texto constitucional que formula o Sistema 3,4 bilhões de dólares por ano são movimenta-
Único de Saúde (SUS), sua regulamentação, e ou- dos, incluindo, entre outros aspectos, a forma-
tros textos normativos constituem as bases legais ção e remuneração de recursos humanos odon-
para as ações de saúde bucal no SUS, propondo tológicos e o faturamento da indústria de ma-
seguir os mesmos princípios que regem a dimen- teriais, de equipamentos e de produtos de hi-
são macro da saúde, ou seja, um direito básico giene bucal. Analisando as propostas e as ações
acessível a todos os cidadãos, pautado na univer- relativas à prática odontológica no Brasil no
salidade, na eqüidade, na integralidade, compon- período de 1952-1992, o autor observou que
do um sistema descentralizado, hierarquizado em estas se caracterizavam por uma odontologia
diferentes níveis de complexidade, e que esteja re- de mercado, sob a influência político-ideológi-
gulado através do controle social (Silveira Filho). ca do projeto de sociedade neoliberal, apoiada
Conforme apontam Barros e Bertoldi (2002), na assistência odontológica individual, realiza-
dados da Pesquisa Nacional por Amostragem da no restrito ambiente clínico cirúrgico.
de Domicílios (PNAD), de 1998, realizada pelo Essa concepção exerce forte influência no
IBGE, revelam que a saúde bucal no Brasil tem desenvolvimento da ciência e da tecnologia em
recebido uma parcela escassa de recursos em re- saúde bucal, mas não responde, de modo signi-
lação ao total de investimentos do SUS. Do ficativo, aos problemas de saúde bucal da po-
ponto de vista do acesso aos serviços odontoló- pulação, porque se trata de uma prática de cus-
gicos, o SUS é um agente de grande importân- to alto e baixa cobertura, com enfoque, essen-
cia, porém com um papel proporcionalmente cialmente, curativo. Como observa Garrafa
pequeno: em 1998, revela a pesquisa, apenas (1993), trata-se de uma odontologia tecnica-
5,24% dos investimentos em saúde se destina- mente elogiável (pelo nível de qualidade e sofisti-
vam aos procedimentos odontológicos. cação inegavelmente alcançado nas diversas es-
As políticas de saúde bucal do SUS buscam pecialidades), cientificamente discutível (uma
favorecer a transformação da prática odontoló- vez que não tem demonstrado competência em
gica por meio da incorporação de pessoal auxi- expandir esta qualidade para a maioria da po-
liar, novas tecnologias e ações coletivas de saú- pulação) e socialmente caótica (pela inexistência
de, visando alterar suas características epide- de impacto social ante as iniciativas e programas
miológicas e obter impacto na cobertura da públicos e coletivos implementados).
população e na construção da cidadania. Para Dentro desse modelo, também Pinto (1992)
atingir essas metas, é imprescindível criar e in- observa que aproximadamente 2/3 dos traba-
centivar práticas comunitárias que possibilitem lhadores não têm no Brasil condições reais de se-
o crescimento da consciência sanitária e a mo- rem atendidos em clínicas privadas, nas quais se
bilização da sociedade civil em torno das ques- concentram 3/4 do tempo de trabalho ofertado
tões de saúde. pelos cirurgiões-dentistas.
Apesar de as conquistas do movimento sa- Contrapondo-se à odontologia de merca-
nitário brasileiro terem sido consolidadas par- do, Narvai (1994) aponta que muitas propostas
cialmente na atual Constituição, na prática, es- e ações foram e vêm sendo implementadas no
sas conquistas não têm sido concretizadas em Brasil com o propósito de impedir o predomí-
melhoria da qualidade de vida da população nio dessa visão na organização da assistência
brasileira. No Brasil, um dos desafios que se co- odontológica e do sistema de atenção à saúde
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Pauleto, A. R. C. et al.

bucal. São propostas que visam à maior apro- lho em saúde fundamentada no ideal da integra-
ximação com os determinantes do processo ção sanitária, para o que busca inspirar-se em
saúde-doença bucal, considerando as políticas tecnologias de base epidemiológica. Esse é o pon-
econômicas e sociais, especialmente as de saú- to de partida lógico para a estruturação dos pro-
de e educação, e manifestam explícita vincula- gramas de saúde. Ainda segundo Nemes et al.
ção a projetos sociais em que a saúde tem rele- (1996), a programação em saúde articula ins-
vância pública, com prioridade pelo Estado e trumentos de trabalho dirigidos a indivíduos, en-
pela sociedade. Referindo-se a esse movimen- tre eles a assistência médica individual, a instru-
to, Botazzo (1994) afirma: A saúde bucal coleti- mentos diretamente dirigidos a coletivos, objeti-
va deve direcionar-se para o social como o lugar vando potencializar a efetividade epidemiológica
de produção das doenças bucais e aí organizar de todos os instrumentos.
tecnologias que visem não a “cura” do paciente No caso específico da programação em saú-
naquela relação individual-biológica... mas sim de bucal, em nosso país, pode-se perceber a
a diminuição e o controle sobre os processos mór- existência de diversas formulações, algumas
bidos tomados em sua dimensão coletiva. voltadas a ações coletivas, outras mais centra-
Propostas com o foco no coletivo ainda re- das no atendimento clínico individual e muitas
presentam um desafio ao campo da odontolo- focadas na assistência à criança. Estudo realiza-
gia, tanto pelo fato de a formação na área diri- do em Botucatu, por Cyrino (1994), aponta
gir-se para o individual, quanto pelo fato de que muitas vezes essas programações em saúde
apenas uma pequena parte do investimento bucal estão descoladas ou desarticuladas de
feito em ciência e tecnologia dirigir-se aos pro- uma programação maior voltada à população-
blemas de saúde bucal com relevância para a alvo, com ações educativas e preventivas.
saúde pública. A existência de programas odontológicos
Nesse contexto, a educação em saúde, como com diferentes abordagens, nem sempre claras
prática social voltada para o coletivo, represen- quanto às concepções de saúde, de conheci-
ta uma importante possibilidade de ampliar a mento e de práticas comunicacionais que utili-
atuação das práticas de promoção da saúde bu- zam, motivou realizar este estudo e analisar
cal no espaço público. Soares (1988) aponta abordagens de programas desenvolvidos em
que muitas medidas preventivas permitem saúde bucal no Brasil, nos últimos dez anos,
combater a cárie e a doença periodontal. A hi- para compreendê-los criticamente, em suas
giene bucal, fluoração e alimentação não-ca- possibilidades e limitações.
riogênica constituem medidas eficazes para fa-
zer frente aos problemas bucais. Mas, para que
tenham êxito, precisam fundamentar-se em Objetivo
programas educativos.
O objetivo deste trabalho foi rever os principais
programas educativos em saúde bucal, visando
Programas em saúde pública desenvolver uma reflexão crítica sobre o tema,
tendo em vista contribuir para a elaboração de
Uma política, designada Programação, foi a for- novos programas educativos na área de odon-
ma específica como a saúde pública de São Paulo tologia. Além disso, buscamos trazer para o es-
se engajou nesse movimento, propondo a amplia- paço de discussão alguns aspectos pedagógicos
ção e diversificação da assistência médica na rede que têm desafiado as práticas de educação em
de centros de saúde, antes restrita a algumas saúde: problematização do cuidado com a saú-
doenças infecciosas e a atividades higienistas e de bucal; aprendizagem significativa; constru-
preventivas como o pré-natal. A proposta da Pro- ção de conhecimento emancipatório; autono-
gramação buscou realizar essa ampliação de mo- mia em relação aos cuidados com a saúde; di-
do que a assistência médica fosse um dos meios reito à informação e cidadania.
do trabalho definido epidemiologicamente (Ne-
mes et al. 1996).
As práticas programáticas constituem a for- Metodologia
ma de organizar o trabalho coletivo no serviço
de assistência à saúde. Trata-se de uma revisão bibliográfica sobre
A ação programática em saúde pode ser defi- programas em saúde bucal desenvolvidos em
nida como uma proposição de organizar o traba- âmbito nacional, especialmente no Estado de
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São Paulo, tendo como referência o período de balho coletivo e na participação ativa dos dife-
1992 a 2001. O tema “programação em saúde rentes sujeitos envolvidos no trabalho preven-
bucal” foi levantado em bases de dados e bi- tivo (equipe escolar e equipe de saúde), bus-
bliotecas da área da saúde. Dedalus (Banco de cando construir uma rede de parcerias e inte-
dados bibliográficos da USP); Bireme (Biblio- grar o tema “saúde bucal” na grade curricular
teca virtual da saúde); LILACS (Literatura La- da escola para viabilizar a continuidade do tra-
tino-Americana e do Caribe em Ciências da balho educativo e a consolidação do programa
Saúde) e BBO (Bibliografia Brasileira de – uma das condições necessárias para garantir
Odontologia). o impacto do trabalho coletivo. Concluíram
O material levantado (23 referências na ba- que é possível a realização de programas edu-
se Dedalus, 13 na BBO e 11 na LILACS) e sele- cativos eficazes na escola, desde que toda a es-
cionado para o trabalho foi organizado de mo- cola esteja envolvida e motivada.
do a permitir identificar categorias de atuação
programática na área da saúde bucal.
Programas voltados à prevenção com
flúor e práticas educativas pontuais
Resultados
Para trabalhar com a prevenção da cárie dentá-
Embora nem todos os programas estudados ria e da inflamação gengival, Milori et al.
possam ser considerados efetivamente progra- (1994) avaliaram 90 crianças de 7 a 9 anos de
mas em saúde bucal pelo caráter pontual, a re- idade, de ambos os sexos, do ensino fundamen-
visão bibliográfica sobre o tema permitiu iden- tal. Realizaram exames clínicos aplicando os
tificar quatro tendências: ações curativas e pre- critérios dos índices de gengivite (IG) e de pla-
ventivas com práticas educativas; ações preven- ca bacteriana (IPL), apenas nos dentes perma-
tivas com bochechos fluorados e práticas edu- nentes. As crianças foram divididas aleatoria-
cativas pontuais; práticas educativas com foco mente em três grupos distintos, recebendo di-
na informação e no uso de recursos mobiliza- ferentes tratamentos. No grupo 1, as crianças
dores; prevenção e práticas educativas de cons- receberam tratamento educativo e preventivo
cientização. (aula de educação sanitária sobre placa dentá-
ria bacteriana e inflamação gengival, aplicação
tópica de flúor gel e escovação dentária super-
Programas voltados ao tratamento visionada a cada 15 dias); no grupo 2, recebe-
curativo, prevenção e educação ram apenas educação sanitária, apoiada em pa-
lestras pontuais, orientações fundamentadas
A literatura sobre o tema mostra muitos estu- em normas de conduta; e no grupo 3, apenas
dos descrevendo programas educativos e pre- tratamento preventivo (aplicação tópica de
ventivos associados a tratamentos curativos flúor gel e escovação supervisionada a cada 15
(Sawazaki e Nakama, 1997; Takahashi e Ursi, dias). Comparando os resultados dos índices
1997). Gonçalves e Silva (1992) elaboraram um de gengivite e placa bacteriana obtidos após oi-
plano de ação educativo no Centro Educacio- to meses, os escolares do grupo 1, seguidos dos
nal de Palhoça, em Santa Catarina (regime de do grupo 3, foram os mais beneficiados pelos
internato, semi-internato e externato), abor- programas propostos.
dando aspectos educativos, preventivos e cura- Os resultados apresentados por Milori et al.
tivos, porque não havia no local nenhuma ati- (1994) confirmam a ineficácia das palestras e
vidade direcionada à promoção de saúde bu- orientações pontuais. Embora apontem as prá-
cal. O tratamento curativo foi realizado priori- ticas de prevenção apoiadas na aplicação de
zando as necessidades epidemiológicas: inicial- flúor associadas ao controle mecânico da placa
mente os primeiros molares permanentes, se- dentária como ações de maior impacto, as prá-
guidos dos pré-molares, molares decíduos e in- ticas educativas desenvolvidas nesse programa,
cisivos e caninos permanentes. Paralelamente a apoiadas na simples transmissão de informa-
esse atendimento, foram realizadas atividades ções com base na abordagem higienista (anco-
preventivas como: escovação supervisionada, rada no paradigma comportamentalista), não
bochechos com solução fluorada e evidencia- expressam qualquer preocupação com a pro-
ção de placa bacteriana. A abordagem do pro- blematização da saúde bucal para o grupo po-
grama de saúde bucal esteve ancorada no tra- pulacional enfocado nem com a busca de estra-
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Pauleto, A. R. C. et al.

tégias capazes de viabilizar a continuidade de pelo desenvolvimento de métodos preventivos


ações educativas entre os escolares. individuais e coletivos associados a práticas
Outro programa que pode ser destacado educativas: palestras mensais, escovação super-
nesta tendência é o de Queluz (1995), desen- visionada, bochecho fluorado semanal e avalia-
volvido na cidade de Piracicaba em escolas da ção mensal sobre o conteúdo das palestras por
rede pública. Incluiu 320 escolares de 6 a 15 meio de atividades escritas ou práticas (Progra-
anos de ambos os sexos. Todos os alunos foram ma Sorria Bauru, 1999).
submetidos a um questionário de 11 perguntas Embora apoiado em palestras de caráter
para levantar o nível de conhecimento sobre mais informativo, sem avançar no sentido de
saúde bucal. Após a aplicação e avaliação do buscar uma problematização do tema para a
instrumento, desenvolveram o programa em população focada, a periodicidade das ativida-
saúde bucal mediante trabalho educativo pon- des garantiu alcançar um índice de 1,44, no fi-
tual (palestras) e práticas de prevenção da cá- nal de 2001, mostrando impacto no trabalho
rie, por meio de higiene bucal e flúor. Os resul- preventivo pela associação da prática dos bo-
tados analisados estatisticamente revelaram chechos com flúor e o trabalho educativo mais
que 85% dos escolares participantes do estudo sistemático.
tinham menos de 11 anos de idade e apresen- Pinto (2000) ressalta que a fluoração das
tavam conhecimentos insuficientes sobre saú- águas de abastecimento e dos dentifrícios são
de bucal; 43% não tinham conhecimentos so- medidas que podem permitir a universalização
bre o flúor na prevenção da cárie. Embora o do uso do flúor no país e contribuir decisiva-
autor não discuta o impacto do trabalho pre- mente para o declínio e controle da cárie dentá-
ventivo no grupo estudado, também aponta ria na população. Mas, para garantir o seu uso
para as limitações de programas educativos an- seguro, os sanitaristas concordam com Manfre-
corados em palestras e orientações pontuais dini (1996) que, além de medidas de heterocon-
em relação ao impacto na prevenção das doen- trole, preconiza que sejam adotadas medidas
ças e na promoção da saúde bucal. para impedir a comercialização de medicamen-
As práticas de prevenção com utilização de tos e produtos de uso sistêmico que contenham
flúor, associadas ou não a práticas educativas flúor em sua composição, considerando que o
pontuais têm sido muito utilizadas. Em Bauru, excesso de flúor pode levar à fluorose dentária,
um levantamento epidemiológico de cárie den- que se caracteriza clinicamente pelo apareci-
tária, realizado em 2001 por alunos da especia- mento de estrias esbranquiçadas, em geral hori-
lização do curso de odontologia em saúde cole- zontais e translúcidas, no esmalte no período de
tiva, da Associação Paulista de Cirurgiões-Den- calcificação dos dentes (Pinto, 2000).
tistas de Bauru, mostrou que a cidade obteve o
menor índice de cárie dentária desde 1975,
quando começou a fluoração da água na cida- Programas voltados a práticas
de. No início dessa implantação, o índice CPO- educativas com foco na informação
D era de 9,89 e, em 1990, teve uma queda sig- e no uso de recursos mobilizadores
nificativa para 3,9. Mas, o estudo mostrou tam-
bém que, apesar da fluoração no ano de 1995, Garcia et al. (1998) desenvolveram programa
o índice CPO-D havia aumentado para 4,13, de prevenção e educação em saúde bucal utili-
surpreendendo a todos e gerando novos desa- zando material audiovisual, orientação direta e
fios em relação à prevenção em saúde bucal. apresentação do Robô-Dente. Avaliaram o
A preocupação gerada com o aumento des- aprendizado de 682 crianças das primeiras às
se índice resultou no programa Sorria Bauru, quartas séries do ensino fundamental de três
iniciado em 1999 e desenvolvido em sistema de escolas públicas da cidade de Araraquara, sub-
parceria entre Secretaria Municipal de Saúde metidas a esse programa educativo em saúde
(SMS), Universidade do Sagrado Coração, Uni- bucal, mediante análise de redações feitas pelas
versidade de São Paulo e Universidade Paulista crianças, após 15 dias da aplicação do progra-
(Agenda USP, 2002). ma, utilizando palavras-chave no contexto da
Atuando na Educação e Promoção de Saú- saúde bucal. A programação, apoiada na ava-
de de crianças pertencentes às Escolas Munici- liação neurolingüística das informações, valo-
pais de Educação Infantil (EMEIs) da cidade de rizou o trabalho com os sentidos: visual, audi-
Bauru, o programa Sorria Bauru da SMS de tivo e cinestésico. Esteve apoiada em três mo-
Bauru visa diminuir o índice da doença cárie delos de práticas informativas: palestras, para
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estimular os sentidos visual e auditivo; ativida- decorrer do processo, essa placa, que era visível
de clínica de educação e higiene bucal, cujo e potencialmente patológica, decaiu para 12%
principal estímulo foi o cinestésico e tátil-mo- após a intervenção das instrutoras. Também
tor, além do estímulo auditivo e visual; e utili- chamou atenção a existência de manchas bran-
zação de recurso (o Robô-Dente) para traba- cas em 47% das superfícies examinadas. No de-
lhar informação, que foi centralizada no estí- correr do trabalho as manchas brancas ativas
mulo auditivo e visual, que, embora colabore diminuíram 7,4% e esse nível foi mantido até o
no processo de retenção de informações, não final do processo (quatro meses). Houve um
garante a consciência da necessidade do cuida- aumento das superfícies hígidas, devido ao uso
do com a saúde. Os autores do estudo consta- do flúor e controle de placa, sendo este manti-
taram que apesar de a proposta ter tido grande do durante os quatro meses. Os autores con-
aceitação, programas baseados no binômio cluem que, pela conscientização sobre a impor-
prevenção-educação precisam ser realizados tância da saúde bucal na vida das pessoas, a
com continuidade para que ganhem impacto. educação em relação aos métodos preventivos
Dinelli et al. (1998) desenvolveram progra- e a ênfase na motivação por meio de recursos
ma educativo em saúde bucal, com 90 alunos materiais e humanos, houve praticamente uma
do ensino fundamental da rede particular da reversão do quadro inicial.
cidade de Araraquara, apoiado na informação
e uso de recurso didático-pedagógico: o Robô-
Sorriso que transmitia, por gravação em fita Críticas ao recorte
cassete, mensagens educativas às crianças. Pelo dos programas estudados
estudo, concluíram que houve motivação, assi-
milação e retenção do conhecimento. Ressalta- Pinto (2000) ressalta que a educação em saúde
ram que o bom nível das respostas obtidas nas bucal (ESB) é uma ação importante do proces-
avaliações realizadas deveu-se, principalmente, so de promoção da saúde, exigindo caracterís-
às condições socioeconômico-culturais do gru- ticas específicas que envolvem práticas e co-
po de estudantes, que pertencia à rede particu- nhecimento. Contudo, ressalta que o conceito
lar de ensino. de educação em saúde bucal precisa ser am-
Embora mostrando dados de impacto rela- pliado para incluir, entre suas tarefas, o traba-
tivos ao aprendizado dos escolares com o pro- lho de conscientização com os grupos sociais
grama, a abordagem utilizada para trabalhar as com menor acesso aos programas de saúde
informações e avaliar esse impacto está nitida- odontológica. Invocando as propostas do edu-
mente ancorada em métodos preventivos mais cador Paulo Freire (1980), o autor traz o termo
tradicionais, apoiados em concepções de ensi- conscientização como estratégia que leva a
no-aprendizagem pautadas pela memorização uma aproximação crítica da realidade, valori-
de informações, o que se sabe hoje não ser sufi- zando o conhecimento como possibilidade de
ciente para transformar o conhecimento em al- autonomia para que cada sujeito possa criar
go significativo, capaz de concretizar-se em sua existência com o material que a vida lhe
práticas emancipatórias, geradoras de autono- oferece.
mia em relação aos próprios cuidados com a Falar de prática educativa em saúde bucal
saúde (Ayres, 2002). não é suficiente nem garante a qualidade do
trabalho de promoção da saúde e prevenção
das doenças. A educação, muitas vezes, chega
Programas voltados à prevenção de modo abstrato, descolada da realidade da
e práticas educativas de conscientização população. Como relata Freire (apud Pinto,
2000), é muito difícil aprender e reter conheci-
Gomes et al. (1993) observaram a necessidade mentos quando a preocupação maior é a sobrevi-
de utilizar práticas educativas conscientizado- vência e os educadores falam de coisas como Eva
ras. Participaram do projeto 40 crianças entre e as uvas, existindo homens que sabem muito
8 e 10 anos. O processo incluiu o exame clínico pouco de Eva e nunca comeram uvas.
para avaliar a condição de saúde bucal das Ainda que muitos programas venham apa-
crianças e práticas educativas de mobilização e recendo nos últimos anos, a educação em saú-
conscientização. Observaram que no início do de bucal ainda é um desafio: nem sempre con-
trabalho 60% dos dentes examinados apresen- segue ganhar sentido entre os grupos sociais
tavam placa bacteriana visível a olho nu. No desenvolvidos. A presença de programas sem a
128
Pauleto, A. R. C. et al.

preocupação com a continuidade das propos- atendimento ao paciente, a educação odontoló-


tas e, na maioria das vezes, priorizando os tra- gica não estava sendo realizada de maneira sis-
tamentos preventivos medicalizadores e curati- temática em ambos os serviços avaliados. Ape-
vos em detrimento da educação, ainda torna as sar de grande parte deles ter respondido orien-
práticas educativas um desafio no campo da tar os pacientes, os autores verificaram que
saúde pública na área de odontologia, princi- aproximadamente a metade dos profissionais
palmente quando se analisa a prevalência mun- do serviço público e particular destinava ape-
dial das odontopatias, aliada ao alto custo do nas uma breve sessão para este fim, com dura-
tratamento restaurador e à compreensão que ção máxima entre 20 e 25 minutos, tempo con-
hoje temos de que o tratamento sintomático siderado insuficiente para uma comunicação
das doenças não é suficiente para garantir a efetiva, com possibilidades de aprendizagem e
saúde bucal, como afirmam Yatsuda e Ramos construção de conhecimentos novos. Esta veri-
(1998). ficação reafirma a necessidade das práticas de
Embora os próprios estudos analisados si- educação e prevenção em saúde bucal.
tuem a prática educativa como componente Bijella (1993) também observou que a prá-
importante e necessário à redução dos proble- tica do cirurgião-dentista não deve se voltar
mas de saúde bucal, o conceito de educação em apenas à dimensão técnica, curativa; precisa in-
saúde na área de odontologia ainda não ganhou corporar uma dimensão de educação em saúde
espaço de discussão. Poucos programas mos- bucal, fornecendo informações, orientações e
tram estratégias de ruptura com propostas mais desenvolvendo habilidades de cuidado por meio
tradicionais e comportamentalistas, ancoradas de métodos que mobilizem o cuidado com a
em práticas comunicacionais unidirecionais saúde bucal, buscando no paciente um colabo-
que não possibilitam o diálogo nem a partici- rador e não apenas o alvo do programa de pre-
pação efetiva dos alunos, necessários à constru- venção. A autora enfatiza ainda que a educação
ção de um conhecimento emancipatório que em saúde bucal significa aquisição de conheci-
produza autonomia em relação aos cuidados mentos, desenvolvimento de habilidades, atitu-
com a saúde bucal. A exemplo da observação de des e construção de valores que levem o pacien-
Pinto (2000) sobre a necessidade de incorporar te e/ou seus pais a agirem, no seu dia-a-dia, em
uma dimensão conscientizadora no trabalho de benefício da própria saúde bucal e da saúde dos
educação em saúde, na educação de escolares, outros. Ressalta que a educação em saúde, reali-
talvez o primeiro desafio seja incorporar uma zada no ambiente escolar, pode favorecer o en-
dimensão problematizadora nas práticas edu- volvimento da criança para trabalhar e cons-
cativas, apoiada nos estudos de Freire (2000), truir novos conhecimentos, facilitando a mu-
abrindo espaço para uma prática participativa dança de atitudes, hábitos e cuidados, na faixa
em que os alunos possam ser protagonistas do etária pré-escolar e escolar. E este é um desafio
processo de ensino-aprendizagem. que não é exclusivo do cirurgião-dentista.
Para Pinto (2000), há uma tendência a acre-
ditar que as pessoas cujas necessidades básicas
A educação em saúde odontológica: são satisfeitas motivam-se mais facilmente e
a comunicação como desafio consomem ensinamentos educativos até mes-
mo de modo voluntário. Relata, no entanto,
Ao lado da análise desses programas, é necessá- que nas décadas de 1960 e 1970, diante dos re-
rio reconhecer também o despreparo dos pro- sultados positivos obtidos em projetos piloto
fissionais da odontologia quanto às práticas de em comunidades carentes, muitos pesquisado-
comunicação e informação utilizadas para de- res chegaram a acreditar que bastaria a educa-
senvolver hábitos adequados de manutenção da ção para que as populações carentes modificas-
saúde bucal. No estudo de Moimaz et al. sem seus hábitos. Mesmo que, nos dias atuais
(1994), os autores avaliaram a utilização dos já tenhamos clareza das possibilidades e limites
métodos de prevenção e educação em saúde bu- da educação diante dos condicionantes sociais
cal por cirurgiões-dentistas dos serviços públi- e econômicos, muitos cirurgiões-dentistas ain-
co e particular. A análise desse estudo, realizado da têm visão mais ou menos ingênua, respon-
a partir de questionários aplicados aos profis- sabilizando as próprias pessoas por todos os
sionais, permitiu concluir que, apesar da utili- problemas de saúde que apresentam.
zação de medidas preventivas por grande parte Com essa visão ingênua e pouco crítica dos
dos profissionais entrevistados, na prática de condicionantes sociais e econômicos que inter-
12

ferem na saúde da população, parte dos cirur- Considerações finais


giões-dentistas não percebe a complexidade
dos determinantes que levam à extração e às Com este estudo procuramos identificar algu-
próteses como única alternativa para as popu- mas tendências encontradas nos programas
lações mais pobres. Como observa Pinto (2000), odontológicos, ressaltando suas principais ca-
é certo que programas educativos apoiados racterísticas. Observamos que, apesar da exis-
nessa visão pouco crítica estão fadados a falhar, tência de vários programas, a dimensão educa-
pois desconsidera a desnutrição, o custo dos tiva é pouco desenvolvida e, quando realizada,
alimentos, o difícil acesso aos serviços de saúde está fortemente apoiada em práticas de trans-
em geral, além do fato de os centros de saúde missão de conhecimentos, sem espaço para
praticarem a odontologia curativa apoiada em práticas dialógicas capazes de mobilizar as
extrações radicais. Sem acesso aos serviços e crianças quanto à problemática da saúde bucal,
enfrentando tantas carências, grande parte da visando a autonomia em relação ao cuidado
população não consegue valorizar os proble- com a saúde.
mas dentários e dos tecidos moles da boca. Como observa Ayres (2002), em estudo crí-
O ensino de saúde tem sido um desafio para tico sobre as práticas educativas no âmbito das
a educação, no que se refere à possibilidade de doenças sexualmente transmissíveis, especial-
garantir uma aprendizagem efetiva e transfor- mente do HIV/Aids, as estratégias educativas
madora de atitudes e hábitos de vida. As expe- em saúde ainda não passam da superfície do
riências mostram que transmitir informações a problema, observando que, mais uma vez, pre-
respeito do funcionamento do corpo e descrição cisamos recorrer às teorias de Paulo Freire para
das características das doenças, bem como um avançar no trabalho educativo, abrindo espaço
elenco de hábitos de higiene, não é suficiente pa- para a discussão dos temas de saúde e não ape-
ra que os alunos desenvolvam atitudes de vida nas transmitir informação. É preciso ultrapassar
saudável. É preciso educar para a saúde levando o paradigma comportamentalista, ancorado na
em conta todos os aspectos envolvidos na forma- abordagem higienista e individualista da pre-
ção de hábitos e atitudes que acontecem no dia- venção para construir métodos mais dialógicos
a-dia escolar (Brasil, 1997). e construtivistas, que substituam a atitude nor-
Embora a educação, sozinha, não tenha for- mativa e modeladora de comportamento pela
ças para possibilitar a saúde desejável à popu- atitude emancipatória, valorizando a interação
lação, pode fornecer elementos que capacitem entre pares, a reflexão, o protagonismo dos alu-
os indivíduos para ganhar autonomia e conhe- nos e a busca de parcerias (escola, universidade,
cimento na escolha de condições mais saudá- serviços de saúde, ONGs) para viabilizar a con-
veis. A Educação para a Saúde como fator de tinuidade dos programas implantados.
promoção e proteção à saúde é, também, uma É preciso substituir modelos ancorados em
estratégia para a conquista dos direitos de ci- práticas de comunicação unidirecional, dog-
dadania (Brasil, 1997). mática e autoritária com foco na transmissão
de informação, pela discussão e reflexão, de-
sencadeadas pela problematização de temas de
saúde bucal.

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