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Origem e propriedades da água do mar

ORIGEM DA ÁGUA DO MAR

A origem e evolução dos oceanos está intimamente ligada à origem da atmosfera


que são os dois fluídos da nossa biosfera. Tanto os oceanos como a atmosfera evoluíram
na escala de tempo geológico e o aparecimento das formas de vida está ligado à
composição da atmosfera. A atmosfera da terra primitiva de 4,6 bilhões de anos atrás foi
totalmente perdida. A atmosfera atual é secundária sendo os seus constituintes oriundos do
interior da Terra. Desta forma não é possível estudar a origem dos oceanos sem estudar a
formação da atmosfera e biosfera durante as eras geológicas.
Acredita-se que a Terra foi formada a partir de material interestelar ou seja poeira
interestelar e gases do espaço. A atmosfera inicial da Terra continha gases inertes, como
Kr, Xe, Ne, Ar, He, H, NH3 e CH4 e a temperatura era muito alta ( = 8000oC) e portanto a
água estava ausente.
Sabe-se que a Terra sofria impactos de asteróides e meteoritos e com este impacto
de energia seria suficiente para expelir gases para o espaço, mas a temperatura era muito
alta (374ºC) e a água não condensava.
A formação de uma nova atmosfera ocorreu com os processos de resfriamento da
Terra. Os voláteis ocluídos em rochas ígneas sofreram processos de desgaseificação
quando as rochas esfriaram. Os gases expelidos pelos vulcões incluem H2, N2, CO, H2S,
HCl, CO2 e vapor d’água. Observar que não havia oxigênio. Estes compostos foram
chamados de “voláteis em excesso” porque deveriam ter sido perdidos para o espaço
exterior a exemplo dos gases nobres que tem peso molecular semelhante. A velocidade
deste processo de desgaseificação e a proporção relativa com que os gases acima foram
ou estão sendo liberados foi se modificando particularmente durante a separação do núcleo
e do manto. Esta é a teoria do geólogo Rubey (1951). Toda a água do planeta teria se
originado do interior da Terra por atividade vulcânica e os oceanos começaram a se formar
quando a temperatura diminuiu para 100oC e a água começou a condensar.

A QUANTIDADE DE ÁGUA FORMADA SERIA SUFICIENTE PARA FORMAR OS OCEANOS???

A fonte de água da Terra seria o seu próprio interior, o manto. A massa de água do
mar é de 1,4 x 1024 g e do manto 4,0 x 1027 g, portanto o manto deveria ter perdido 0,035%
de água para formar os oceanos. O conteúdo de água no manto foi estudado e resultou em
0,5%, ou seja 14 vezes a quantidade necessária. Desta forma, o manto teria água suficiente
para formar os oceanos.
Há 1,9 bilhões de anos atrás (temperatura ~50ºC), os oceanos primitivos eram
diferentes dos atuais porque não existia o oxigênio. Dominava o nitrogênio e o gás
carbônico. O oceano era um ambiente redutor. O ferro estava presente na forma reduzida
(Fe++) e comportava-se como o Ca++ e Mg++ e precipitava como minerais de carbonato e

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Origem e propriedades da água do mar

silicato. O enxofre estava presente na forma de sulfetos insolúveis. A ausência de ozona


permitia que os raios UV atingissem o mar permitindo a síntese de moléculas orgânicas.
O oceano atual é um ambiente oxidante devido a presença de oxigênio. Existem
duas teorias para explicar a origem do oxigênio.
1) oxigênio surgiu da dissociação do vapor d’água por radiação solar

2 H20 O2 + 2H2

Oxigênio começou a reagir c/ NH3 e CH4

2) Oxigênio surgiu com o aparecimento de algas fotossintetizadoras que utilizavam o CO2 e


liberavam oxigênio. Gradativamente o oxigênio atmosférico foi se acumulando até
chegar a quantidade atual.

H20 + CO2 algas CH2O + O2

Os registros geológicos mostram que a água na forma líquida já existe desde 3 bilhões de
anos e o oxigênio livre desde 1,5 bilhões de anos atras. A concentração atual de oxigênio na
atmosfera resulta de um balanço entre produção e consumo e é recente, entre 100 e 200
milhões de anos apenas. As próprias bacias oceânicas atuais são desta ordem de grandeza,
cerca de 250 milhões de anos.

COMO SE EXPLICA O SAL NO MAR???

A hipótese mais plausível para a formação dos oceanos seria a dos balanços
geoquímicos. Em qualquer unidade de tempo geológico a quantidade de material originado
pelo intemperismo e erosão das rochas expostas, somado ao material derivado de vulcões e
fontes termais devia ser igual a quantidade de material depositado como sedimento nas
plataformas continentais e fundos oceânicos, mais o material acumulado na hidrosfera,
atmosfera e biosfera.

Na+, k+, Ca++, Mg++


Presença de cátions Intemperismo de silicatos e desgate de rochas ígneas
Transporte pelo vento e água

Presença de ânions Cl-, Br-, HCO3-, SO4=


“voláteis em excesso”
gases de emanações vulcânicas

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Origem e propriedades da água do mar

O método dos balanços geoquímicos para explicar a origem da água do mar foi
originalmente proposto por Goldschmidt em 1933 e posteriormente testado e aprimorado
por Sílen (1965). Horne e Adans (1966) demonstraram que a equação abaixo é balanceada
para ~60 elementos presentes na água do mar.

1,2 Kg rochas ígneas + 1,0 Kg voláteis em excesso = 0,6 kg sedimento + 1 L água do mar + 3 L ar

Em 1973, Lafon e Mackenzie com o auxílio de computadores reavaliaram o modelo


concluindo que:
• a composição final é igual à água do mar
• o pH da solução é básico ( > 7) e aumenta a medida que a reação prossegue indicando a
natureza ácido base da reação
• a sílica amorfa estaria em excesso em relação aos cálculos teóricos e a salinidade seria o
dobro uma vez que o modelo nao prevê a retirada do NaCl para o sedimento
O método do balanço geoquímico mostra que a origem dos oceanos está intimamente
ligada à origem da atmosfera.

Teoria dos voláteis em excesso (Rubey, 1951)


A desgasificação, após a formação da Terra, seria uma conseqüência de:
1) metamorfose termal rápida da Terra ou
2) processo contínuo da ação vulcânica durante as escalas de tempo geológico

Não existe uma evidência inequívoca para nenhuma das 2 hipóteses e essa ambigüidade se
deve a duas razões:
1. A idade da Terra inferida de meteoritos é de 4,6 bilhões de anos, enquanto que as
rochas mais antigas datam de 3,8 bilhões
2. Não existem evidências claras e nem modo para se quantificar a emissão dos voláteis
das profundezas da Terra (manto)

Em 1986, o astrônomo Louis Frank anunciou a teoria de que os oceanos teriam vindo
do espaço sob a forma de grandes blocos de gelo como minicometas de 9 m de diâmetro
numa taxa de 20/minuto. A Terra receberia 0,0025 mm de água por ano. Após 4 bilhões de
anos com estes bombardeamentos a Terra teria água suficiente para encher os oceanos até
o volume presente.

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PROPRIEDADES DA ÁGUA DO MAR -

Para entender as propriedades da água do mar é necessário entender a estrutura da


molécula de água.
A água pode ser encontrada nos 3 estados físicos: sólido, líquido e gasoso. A
estrutura da água no estado sólido é um tetraedro (obtido por difração de raios X). No
estado de vapor não há estrutura. É principalmente monomérica com dímeros ocasionais e
raros trímeros. No estado líquido não é conhecida. Existem algumas hipóteses que sugerem
cadeias de 4 ou 5 unidades.
A molécula de água é constituída de 2 elementos químicos: oxigênio e hidrogênio.
Possui peso atômico 18 e comporta-se de maneira diferente dos demais hidretos do seu
grupo da tabela periódica (6A) O, S, Se, Te e Po. Comparando-se com outros compostos
hidrogenados de peso molecular próximo, sua massa molecular sugeriria um ponto de
congelamento em - 100oC ao invés de zero e de ebulição -80oC ao invés de 100oC. A
densidade da maioria dos sólidos é maior do que seus líquidos correspondentes e a
densidade dos líquidos progressivamente decresce quando é aquecido desde o ponto de
fusão. Entretanto o gelo é menos denso que a água e o máximo de densidade da água pura
é alcançada a 4oC.
Estas propriedades anômalas da água são devidas às interações de hidrogênio entre
suas moléculas. Isto ocorre porque a molécula de água possui uma configuração geométrica
que lhe permite uma interação entre as moléculas, chamadas “pontes de hidrogênio”.
A molécula torna-se polar com ângulo da ligação 105o, atraindo outras moléculas
para seu redor e existe uma diferença de eletronegatividade entre o oxigênio e hidrogênio.
As pontes de hidrogênio apresentam energia de ligação da ordem de 4.5 Kcal/mol e são
intermediárias entre as forças de Van der Waals (0,6 Kcal/mol) e as da ligação covalente
normal (20 Kcal/mol). Cada molécula de água tem a capacidade de formar 4 ligações do
tipo dipolo-dipolo.
No estado líquido este fenômeno produz uma grande dificuldade na quebra dessa
ligação, fazendo com que o ponto de fusão e ebulição, condutividade térmica atinjam
valores mais elevados do que outras substâncias.
Portanto, torna-se um líquido muito estável e sua facilidade para dissociar as
substâncias nela adicionadas (devido à polaridade) faz com que a água seja considerada
um solvente universal.
Sua constante dielétrica alta faz com que a molécula se dissocie minimamente,
evitando a reação com as substâncias dissolvidas e facilitando a recuperação das espécies
em solução intactas.
A capacidade de dissolver compostos é uma das mais importantes propriedades da
água porque facilita a incorporação dos compostos pelos microorganismos.
Algumas características anômalas da água e sua importância estão na tab. 1
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Origem e propriedades da água do mar

Tabela 1 – Propriedades anômalas da água pura no estado líquido e sua importância

Propriedades Comparação com outras substâncias importância

+ alta p/ sólidos e líquidos calor específico alto evita grandes extremos na temperatura, transferência de calor por
Capacidade calorífica movimentos da água é muito grande, tendência a manter uniforme a temperatura dos corpos.
exceto para NH3 liq.
Calor latente de fusão + alto O calor latente de fusão possui efeito termostático no ponto de congelamento devido à
exceto para NH3 absorção ou liberação do calor latente.

Calor latente de evaporação + alto O calor latente de evaporação é o mais alto e é extremamente importante na transferência de
água e calor para a atmosfera.
Expansão térmica Temperatura de dmax diminui com A expansão térmica tem um papel importante no controle da distribuição da temperatura de
aumento da salinidade densidade e circulação vertical em lagos. A água pura e água do mar diluída tem suas
densidades máximas a temperatura acima do ponto de congelamento.
Tensão superficial + alta de todos os líquidos Tensão superficial é importante na fisiologia da célula, controla alguns fenômenos de
superfície e a formação e comportamento de gotas.
Poder de dissolução dissolve mais substâncias O poder de dissolução tem implicações em fenômenos físicos e biológicos.
em grande quantidade
Constante dielétrica + alta A constante dielétrica é importante no comportamento de substâncias inorgânicas dissolvidas
exceto p/ H2O2 e HCN por causa da alta dissociação resultante.

Dissociação eletrolítica muito baixa A dissociação eletrolítica é muito pequena. É uma substância neutra, e ainda contém íons H+
e OH-, cujo comportamento é importante em muitos processos geológicos e biológicos.
Transparência Relativamente alta A transparência relativamente grande da água absorve a energia radiante, principalmente no
IV e UV, na porção visível do espectro de energia há uma pequena absorção seletiva, já que
água pura é incolor em pequenas quantidades. Importante para fenômenos físico e
biológicos.
Condução de calor + alto Condução de calor é importante para as células vivas. Os processos moleculares são
escoados por difusão turbulenta.

De Horne, 1969

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Propriedades coligativas da água do mar

Devido ao grande número de eletrólitos dissolvidos na água domar ocorre a


alteração das propriedades coligativas da solução.
A propriedade mais importante do ponto de vista oceanográfico é o abaixamento do
ponto de fusão. Este abaixamento será diretamente proporcional a salinidade, e é dado pela
expressão
Tfusão (ºC) = - 0,0137 - 0,051990S - 0,000072255S2 - 0,000758z
onde: S = salinidade e z = profundidade
Deve-se considerar ainda que a densidade máxima da água do mar até uma
determinada salinidade está numa temperatura acima do ponto de congelamento. Na
salinidade 24,7 ocorre a coincidência da temperatura de máxima densidade com o ponto de
congelamento -1,322oC.

Ciclo hidrológico

O processo pelo qual a água é ciclada entre o oceano, os continentes e a atmosfera


chama-se ciclo hidrológico. Estudos do ciclo hidrológico são importantes para pesquisas
relativas ao clima e para os possíveis efeitos de aumento dos gases estufa na atmosfera.
Entretanto, a quantidade de água nos vários reservatórios de água da Terra e os fluxos de
água entre eles é ainda pouco conhecida para ter conclusões sobre o efeito estufa. O que é
conhecido é que os oceanos perfazem mais que 97% da água da Terra enquanto que a
atmosfera perfaz somente 0,001%. Baseado neste conhecimento, a melhor estimativa da
quantidade de água dos vários reservatórios foi descrita por Chahine (1992).
O efeito estufa da água na atmosfera é aproximadamente o dobro do efeito de todos
os outros gases estufa combinados. A evaporação dos oceanos excede a precipitação e
35% da precipitação nos continentes é água evaporada dos oceanos. A precipitação excede
a evaporação nos continentes e o excesso retorna para os oceanos pelos rios. O tempo de
residência da água na atmosfera é de ~ 10 dias.
A figura abaixo mostra a estimativa do ciclo global da água e seus reservatórios. A
exatidão de alguns dos balanços é baixa, resultando num erro para o ciclo como um todo de
~2. A óbvia natureza interativa dos ciclos tornam impossível reduzir os erros sem estudar o
ciclo todo. Os valores dos reservatórios está em 1015 Kg e os fluxos em 1015 Kg/ano.

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Origem e propriedades da água do mar

Figura 1- Ciclo hidrológico

advecção
Atmosfera terrestre Atmosfera marinha
4,5 x 1015 Kg. 36x1015 11 x 1015 Kg.

evaporação chuva chuva evaporação


71x1015/ano 107x1015/ano 398x1015/ano 434x1015/ano

Continentes (x 1015 Kg) Oceanos (x 1015 Kg)


gelo e neve 43.400
água superficial 360 rios camada de mistura 50.000
águas subterrâneas 15.300 36x10 15 termoclina 460.000
biota 2 água profunda 890.000
total 59.062 total 1.400.000

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