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Jesse Bering

Devassos por natureza


Provocações sobre sexo e a condição humana

Tradução:
Maria Luiza X. de A. Borges
Para JCQ
Sumário

Um convite à impropriedade

PARTE I Uma visão darwiniana do que pende


Por que eles ficam pendurados?
Tão perto e tão longe: a contorcida história da
autofelação
Por que o pênis tem esse formato?: versão sem cortes
Não tão depressa… O que há de tão “precoce” na
ejaculação precoce?
Ode às muitas virtudes evolutivas do sêmen humano

PARTE II Corpos generosos


O pelo lá de baixo: o que o pelo pubiano humano tem
em comum com o pelo dos gorilas
A história natural do canibalismo
A afecção da pele humana: a acne e o macaco nu

PARTE III Mentes indecorosas


Devassos por natureza: quando um dano cerebral
torna pessoas muito, muito despudoradas
Como o cérebro adquiriu suas nádegas: travessura
medieval em neuroanatomia
Zumbis lascivos: sexo, sonambulismo, ereções
noturnas… e você
Os seres humanos são especiais e únicos: nós nos
masturbamos. E muito

PARTE IV Estranhos companheiros de cama


Sobre pedófilos, hebéfilos e efebófilos: orientação
erótica de idade
Amantes de animais: zoófilos levam cientistas a
repensar a sexualidade humana
Assexuados entre nós
Brincando com os pés: podofilia para pudicos
A história de um amante da borracha

PARTE V A noite das damas


Ejaculação feminina: uma estrada científica menos
explorada
O estranho caso das fag hags: mulheres que gostam
de homens que gostam de homens
O Teatro de Darwin apresenta… O misterioso caso
do orgasmo feminino
A megera evoluída: por que as adolescentes são tão
cruéis umas com as outras?

A gaia ciência, cada vez mais gay: há algo


PARTE VI
estranho aqui
Nunca pergunte o caminho a um gay
“Homem solteiro, raivoso, hétero… procura
semelhantes”: a homofobia como desejo
reprimido
O modismo do poliamor, o ciúme gay e a evolução
de um coração partido
Cientistas bem-dotados vão fundo nas preferências
sexuais entre homens gays
Seu filho é um “pré-homossexual”?: a previsão da
orientação sexual adulta

PARTE VII Como diz a Bíblia


Bons cristãos (mas só aos domingos)
Os coelhinhos de Deus: a taxa de reprodução dos
crentes é esmagadoramente maior do que a dos
não crentes
Criando raízes com minha mãe morta

Rumo às profundezas: trabalho


PARTE VIII
existencial em laboratório
Ser suicida: matar-se é adaptativo? Depende: suicídio
em benefício dos próprios genes (Parte I)
Ser suicida: como é a sensação de querer se matar
(Parte II)
“Cientistas dizem que o livre-arbítrio provavelmente
não existe, mas recomendam: ‘Não deixem de
acreditar nele!’”
O rato que não parava de rir: alegria e hilaridade no
reino animal

Notas
Agradecimentos
Índice remissivo
Um convite à impropriedade

ATÉ ONDE POSSO ME LEMBRAR, sempre fui abertamente curioso com relação a
certos assuntos “impróprios”. Minhas perguntas mais sérias, eu percebia,
tendiam a levar os outros a se afastar de mim bem devagar. Você poderia
dizer que eu era um pouco analítico demais para meu próprio bem. Num dia
memorável, perguntei à menina absolutamente horrorizada que se sentava
ao meu lado na sala de aula da sexta série: “Não é esquisito que meu pênis,
quando ereto, pareça mais uma cimitarra do que um punhal? Na certa isso
deve significar que sou deformado”, confidenciei, cochichando em seu
ouvido, “já que obviamente, para penetrar uma mulher como você da
maneira apropriada, o pênis deve entrar direto na vagina, não aproximar-se
dela num ângulo de 45 graus, como o meu.” Com o tempo, aprendi a ficar
calado. Mas uma mente despudorada raramente encontra descanso.
À medida que, muito devagar, adquiri algumas habilidades sociais
extremamente necessárias, vi-me gravitando cada vez mais para o mundo
da ciência, um mundo em que nada era sagrado, nenhuma questão absurda
demais ou proibida (pelo menos para efeito de discussão, se não
necessariamente forragem ética para o laboratório), e no qual descobri
outras almas de conformação semelhante, que não me olhavam como se eu
tivesse três cabeças quando eu perguntava, por exemplo, se pessoas que
preferiam ser passivas num intercurso anal poderiam ter uma anatomia
anal-genital interna diferente daquelas a quem isso parecia intensamente
desagradável. Aliás, ainda não sei a resposta para essa questão.
Por falar nisso, eu provavelmente deveria acrescentar (já que isso ficará
bastante óbvio por meu foco desproporcional na genitália masculina) que
havia algo muito importante para mim a que não pude dar plena expressão
em meus primeiros anos e que sem dúvida moldou minha visão do mundo.
Eu era gay. Na verdade, muito, muito gay. Confirmei essa verdade
irrefutável mediante numerosos experimentos em minha adolescência,
inclusive apalpadelas e beijos em “namoradas” inadvertidas, que, apesar de
suas aparências lindas e personalidades maravilhosas, eram tão excitantes
para mim quanto uma fatia de presunto perfumada com reluzentes dentes
brancos. Não era apenas o nervosismo dos virgens, posso lhe assegurar, mas
as meninas pareciam tornar meu pênis catatônico, ao passo que mesmo de
longe os garotos o faziam erguer-se naquele esquisito ângulo de 45 graus
que mencionei antes.
Permita-me começar, portanto, fazendo uma revelação completa: minha
perspectiva é a de um cientista psicológico gay, ateu, com uma queda por
teorias evolucionárias. Ainda assim, embora eu certamente não tente
esconder minhas próprias convicções pessoais, sou uma pessoa apolítica. A
única coisa que lhe peço é que tente suspender seu julgamento até ter lido
pelo menos um punhado de ensaios. Apenas recline-se, desabotoe as calças
e fique bem confortável consigo mesmo. Relaxe, talvez com um copo de
Chardonnay. E pense. Espero tornar esta última parte fácil para você. Quero
que goste de aprender sobre seu pênis impetuosamente ejaculante, sua vulva
gotejante, e seus próprios medos, preconceitos, fetiches e desejos. Apesar
de nossas diferenças, e elas são por certo muitas neste mundo, há algo que
todos nós temos em comum: somos humanos.
Não estou interessado no sensacionalismo pelo sensacionalismo, mas
muitas das questões que mais me atraem são, por definição, bastante
sensacionais. Se você as examinar com atenção suficiente, contudo, notará
quantas vezes os tópicos mais excitantes são capazes de suscitar questões
filosóficas mais profundas e trazer outras muito mais substanciais à
superfície. Por exemplo, ao ler sobre zoófilos, você poderá se ver, como eu
me vi, questionando suas próprias repulsas sexuais moralistas impensadas;
um olhar para a evolução do pelo pubiano ou da acne revela, de maneira
inesperada, nossas estreitas relações genéticas com outros símios; fantasias
de masturbação revelam o que nos torna únicos no reino animal; e
fetichistas de pés revelam como as coisas que nos excitam como adultos são
permanentemente calibradas por experiências infantis muitas vezes
inocentes.
Antes de mais nada, tento ser um bom cientista, quer esteja investigando
a ejaculação feminina, o nascimento inesperado de pelo pubiano em bebês
de seis meses ou a psicologia de mulheres encantadas por homens gay.
Como muitos destes ensaios foram publicados originalmente em minhas
colunas nas revistas Scientific American e Slate, e portanto examinam
apenas as dimensões mais interessantes de determinado tópico, certamente
não sou capaz de cobrir todos os aspectos e pontos de vista contrários que
envolvem cada questão. Entretanto, encorajo você a continuar lendo sobre
os assuntos que deixarem um gosto de quero mais na sua boca, e para isso
incluí notas finais para ajudá-lo a seguir adiante.
Então, por favor, junte-se a mim na impropriedade. Não aceitemos a
escola de vida segundo a qual sobre certas coisas é melhor não falar. Como
isso deve ser enfadonho. Convido-o a me acompanhar numa viagem de
descoberta científica. Sinta-se livre para entrar e sair de sua leitura ou ler os
ensaios fora da ordem. Eles são todos independentes. Mas olhe onde pisa: o
terreno é escorregadio. E note que, embora o tom em geral seja leve, nem
tudo será divertido. Alguns dos ensaios que incluí nesta antologia tendem
de fato a nos fazer refletir muito seriamente – eles incluem um exame
realmente detalhado da maneira de pensar de um suicida. Escrevi esse texto
específico em resposta à alarmante onda de suicídios de adolescentes gays
nos últimos anos. Foi um artigo que lamentavelmente calou fundo em
muitos leitores, alguns dos quais compartilharam corajosamente suas
histórias pessoais comigo depois de topar com ele por acaso.
Há oito seções neste volume, cada uma representando um tema geral ou
área de assuntos e examinando uma amostra das estarrecedoras esquisitices
da simples condição humana. A primeira dessas seções, “Uma visão
darwiniana do que pende”, inclui tudo que você não sabia que sempre quis
saber sobre a anatomia reprodutiva masculina. Na Parte II (“Corpos
generosos”), examinaremos como podemos ser destinados pela Mãe
Natureza a consumir a carne uns dos outros, por que somos o único símio
que sofre de acne e muitas outras coisas pouco sabidas sobre partes do
corpo aparentemente banais. Em seguida, na Parte III (“Mentes
indecorosas”), vamos explorar um pouco de neurociência realmente suja,
empurrando nosso senso comum para alguns cantos desconfortáveis nesse
processo. Isso nos prepara para a Parte IV (“Estranhos companheiros de
cama”), em que faremos um exame crítico, não condenatório, de alguns dos
mais intrigantes fetiches, parafilias e distúrbios sexuais, explorando as
origens de seu desenvolvimento, teorias e debates relacionados a
diagnósticos clínicos. Se você pensa que fazer sexo com animais é
inerentemente errado, ou que a sexualidade começa na adolescência, com a
primeira descarga de hormônios, talvez esta seção o leve a uma inesperada
mudança de ideia.
Em “A noite das damas” (Parte V), voltaremos nossa atenção
especificamente para as mentes e corpos das mulheres. Observe apenas que
sou um homem gay considerando essas mentes e corpos, portanto tenho
uma visão um pouco diferente da maioria. Por falar nisso – e não sei bem o
que Nietzsche teria a dizer sobre o conteúdo da seção seguinte –, na Parte
VI (“A gaia ciência, cada vez mais gay: há algo estranho aqui”) vamos
então focalizar alguns dos mais recentes e mais provocantes estudos sobre a
homossexualidade. Na parte VII (“Como diz a Bíblia”), examinaremos
como a religião origina-se de nossa psicologia evolutiva e como nossas
práticas usuais de sepultamento não estão fazendo nenhum favor a nós
mesmos ou ao planeta. Por fim, na última seção do livro, “Rumo às
profundezas: trabalho existencial em laboratório”, investigaremos algumas
questões densas e consternadoras sobre suicídio, o sentido da vida e a
evolução da alegria e da felicidade.
Animado? Espero que sim. Então, para começar em grande estilo, lanço
a pergunta: por que cargas-d’água os testículos ficam pendurados daquela
maneira – e por que dói tanto levar um pontapé ali?
PARTE I

Uma visão darwiniana do que


pende
Por que eles ficam pendurados?

ALGUNS ANOS ATRÁS, o psicólogo evolucionário Gordon Gallup, que


voltaremos a encontrar nesta seção, com suas colegas Mary Finn e Becky
Sammis, propôs-se a explicar as origens naturais da única parte do corpo
masculino possivelmente menos atraente que o pênis – os testículos. Sob
muitos aspectos, a chamada hipótese da ativação, elaborada pelo grupo,
acrescenta detalhes ao que muitos de nós já sabemos sobre testículos
escrotais descidos: eles servem como uma espécie de unidade fria de
armazenamento e produção para o esperma, que se conserva melhor numa
temperatura ligeiramente mais baixa que o padrão para o resto de nossos
corpos. Mas a hipótese da ativação vai muito além desse fato curioso.
Ocorre que os testículos humanos exibem algumas características
bastante complexas, embora sutis, de regulação de temperatura que
passaram em grande parte despercebidas tanto por médicos quanto por
pesquisadores e leigos. O princípio mais importante da hipótese da ativação
é que o calor da vagina de uma mulher impulsiona radicalmente o esperma
que esteve hibernando no fresco e arejado saco escrotal. Esse calor ajuda a
concepção. Ele explica, contudo, muitas outras coisas também, inclusive
por que um testículo costuma ser ligeiramente mais baixo que o outro, por
que a pele do escroto por vezes se torna rugosa (como uma ameixa seca e
tão enrugada como a pele de um elefante), por que os testículos se retraem
durante a excitação sexual, e até por que machucados testiculares –
comparados com outros tipos de danos físicos – são tão excruciantemente
dolorosos.
Para nos ajudar a chegar ao mesmo ponto, considere uma realidade
alternativa, em que os ovários, como os testículos, descem durante o
desenvolvimento embriológico e emergem fora da cavidade do corpo
feminino num saco fino, desprotegido. Depois de ter afastado essa imagem
da mente, observe que as gônadas pendentes de muitos animais machos
(inclusive os seres humanos) são igualmente intrigantes. Afinal de contas,
por que ao longo de toda a evolução a natureza teria projetado uma parte do
corpo – cuja importância reprodutiva é obviamente enorme – para ficar
pendurada fora do corpo, indefesa e vulnerável? Tendemos a nos acostumar
com as partes de nosso corpo, e com frequência não nos ocorre sequer
indagar por que elas são como são. Alguns dos maiores mistérios
evolucionários são também os aspectos mais banais de nossas vidas.
A primeira grande questão, portanto, é por que tantas espécies
mamíferas desenvolveram testículos escrotais pendentes. As gônadas
masculinas em algumas linhagens filogenéticas seguiram direções
completamente opostas, em termos evolucionários. Por exemplo, os
testículos dos elefantes modernos estão profundamente embutidos na
cavidade do corpo (os animais dotados desse traço são chamados de
testicondos), ao passo que outros mamíferos, como as focas, têm testículos
descidos, mas desprovidos de escrotos, com as gônadas sendo simplesmente
subcutâneas.
Gallup e seus colegas consideraram várias teorias possíveis sobre a
evolução testicular por descida de nossa espécie. Uma das explicações mais
extravagantes – que acabou sendo descartada pelos pesquisadores – é que
os testículos escrotais evoluíram no mesmo espírito que as penas do pavão.
Isto é, dada a enorme desvantagem de ter todo o seu potencial genético
contido numa fina bolsa de carne delicada, desprotegida e balançando a
vários centímetros de distância do resto de seu corpo, talvez os testículos
escrotais tenham se desenvolvido como uma espécie de adereço ornamental
que comunica a qualidade genética do macho. Na biologia evolucionária,
esse tipo de explicação adaptacionista recorre ao princípio da desvantagem.
O cerne teórico do princípio da desvantagem é que se o organismo é capaz
de prosperar e sobreviver enquanto ainda é atrapalhado por um traço
custoso e disfuncional como uma plumagem elaborada e incômoda, ou
(neste caso) gônadas vulneravelmente pendentes, ele deve ter alguns genes
de alta qualidade e ser um parceiro valioso.
Mas a hipótese da desvantagem não se ajusta muito bem ao caso dos
testículos escrotais descidos, explicam os autores, porque se isso fosse
verdade deveríamos esperar que essas partes do corpo se tornassem cada
vez mais elaboradas e pendentes no curso da evolução, para não mencionar
que as mulheres deveriam demonstrar uma preferência por homens que
arrastam por aí a bagagem escrotal mais ostentosa. “Com a possível
exceção de escrotos coloridos entre algumas espécies de primatas”, escreve
Gallup, “há pouca evidência de que esse tenha sido o caso.” Não tenho
conhecimento de nenhum estudo sobre variação individual intraespécie do
design escrotal, mas apesar disso tendo a conjecturar que a maioria dos
machos humanos tem escrotos bastante sem graça, desinteressantes.
Qualquer coisa que se desvie disso – em particular um conjunto de
testículos extraordinariamente pendurados, suspensos em escrotos que
chegam aos joelhos –, em vez de provocar um efeito afrodisíaco, tende mais
provavelmente a deixar uma mulher com ânsia de vômito, aos berros ou
olhando perplexa.
Uma explicação mais provável para a descida escrotal, que vem sendo
apresentada há algum tempo, é que a produção e o armazenamento de
esperma são maximizados em temperaturas mais frescas. “Não só a pele do
saco escrotal é fina para promover a dissipação do calor”, escrevem os
autores, “as artérias que fornecem sangue para o escroto são posicionadas
junto das veias que levam o sangue para fora dele e funcionam como um
mecanismo adicional de troca de resfriamento e aquecimento. Em
consequência dessas adaptações, as temperaturas escrotais médias em seres
humanos são tipicamente 2,5 a 3 graus Celsius mais baixas que a
temperatura do corpo (37 graus Celsius), e a espermatogênese é mais
eficiente a 34 graus Celsius.”
O esperma é extraordinariamente sensível mesmo a pequenas flutuações
no clima. Quando a temperatura ambiente eleva-se aos níveis do corpo, há
um aumento momentâneo da mobilidade do esperma (ele se torna mais
ativo), mas ele dura só por um período de tempo antes de se extinguir. Para
ser mais exato, o esperma prospera à temperatura do corpo por um período
de cinquenta minutos a quatro horas, o tempo que lhe seria necessário para
viajar através do aparelho reprodutivo feminino e fertilizar o óvulo. Mas
depois que a atmosfera espermática se eleva muito acima de 37 graus
Celsius, as chances de uma inseminação bem-sucedida consequentemente
despencam – qualquer esperma viável torna-se o equivalente de uma
torrada queimada. Assim, em outras palavras, exceto durante o sexo,
quando a hiperatividade é adaptativa, o esperma é armazenado e produzido
com mais eficiência no ambiente fresco e arejado do saco escrotal relaxado.
Não é desejável, contudo, que o escroto fique frio demais, pois a natureza
calibrou esse ponto de temperatura em níveis ideais precisamente definidos.
Felizmente, os escrotos humanos não apenas pendem ali contendo
nossos testículos e preparando nosso esperma; eles também empregam
“ativamente” algumas interessantes táticas termorregulatórias para proteger
e promover os interesses genéticos dos homens. Ponho “ativamente” entre
aspas, é claro, porque embora seja bastante estranho atribuir consciência a
escrotos humanos, os testículos de fato respondem de maneira não
intencional às ações reflexas do músculo cremastérico. Esse músculo serve
para retrair os testículos de modo que eles sejam puxados para mais perto
do corpo quando fica frio demais – basta pensar numa ducha fria – e
também para relaxá-los quando fica quente demais. Essa ação para cima e
para baixo acontece de um momento para outro; assim os corpos
masculinos otimizam continuamente o clima gonadal para a
espermatogênese e o armazenamento do esperma. É também por isso que
em geral é desaconselhável para homens usar jeans apertados ou cuecas
colantes; sob essas condições restritivas, os testículos são empurrados
contra o corpo e artificialmente aquecidos de tal modo que o músculo
cremastérico não pode fazer seu trabalho da maneira apropriada. Uma outra
razão para não usar essas coisas é que não estamos mais em 1988.
Agora, sei o que você está pensando: “Mas, dr. Bering, como explica o
fato de os testículos quase nunca serem perfeitamente simétricos em seu
posicionamento dentro do mesmo escroto?” De fato, a função de regulação
da temperatura governada pelo músculo cremastérico pode explicar até as
assimetrias mais tortas, mais variáveis na posição dos testículos, com um
mais acima do outro. Segundo um relato publicado em 2009 no periódico
Medical Hypotheses pelo anatomista Stany Lobo e colegas, cada testículo
migra continuamente em sua própria órbita como uma maneira de
maximizar a área da superfície escrotal disponível sujeita à dissipação do
calor e ao resfriamento. Como ocorre com o calor ambiente gerado por
painéis solares individuais, em se tratando de temperaturas espermáticas, o
todo é mais que a soma das partes. Com um olho suficientemente arguto,
presumivelmente poderíamos dominar a arte de “ler” o alinhamento
testicular, usando o escroto como um termômetro de sala improvisado. Mas
isso é só especulação minha.
De uma perspectiva evolucionária, o design da genitália masculina só
faz sentido na medida em que complementa adaptativamente a anatomia
feminina, sobre a qual percebo que deveria me aprofundar (mas o dia só
tem 24 horas). Em contraste com os homens, a menos que uma mulher se
envolva em enérgico exercício físico, o aparelho reprodutivo feminino é
mantido continuamente na temperatura normal do corpo. Esse é o ponto
crucial da hipótese da ativação de Gallup: a elevação da temperatura que
envolve o esperma, tal como ocasionada pela ejaculação dentro da vagina,
“ativa” o esperma, tornando-o temporariamente frenético e permitindo-lhe
assim adquirir o ímpeto necessário para penetrar o colo do útero e chegar às
tubas uterinas. “Em nossa concepção”, escrevem os autores, “testículos
escrotais descidos evoluíram ao mesmo tempo para tirar proveito dessa
elevação de temperatura dependente da cópula/inseminação e para
funcionar de modo a evitar ativação prematura do esperma, mantendo as
temperaturas testiculares abaixo do valor crítico estabelecido pelas
temperaturas do corpo.”
Uma das coisas que talvez você tenha notado em sua própria genitália
ou na daqueles que lhe são especialmente próximos é que, em contraste
com a pele escrotal afrouxada que acompanha os estados flácidos, não
excitados, as ereções penianas costumam ser acompanhadas por uma
reveladora retração dos testículos para mais perto do corpo. (É o tipo de
coisa mais fácil de demonstrar usando ilustrações visuais, e uma rápida
busca de imagens pelo Google forneceria exemplos diversos. Basta você
escolher seus próprios termos de busca e desabilitar “pesquisa segura” – se
estiver num lugar público neste momento, porém, talvez queira deixar para
fazer a busca mais tarde, como um dever de casa.) Segundo Gallup e seus
colaboradores, esta é uma outra engenhosa adaptação escrotal. O reflexo
cremastérico serve não só para elevar a temperatura testicular, mobilizando
esperma para a ejaculação prestes a acontecer na vagina, mas (bônus
adicional) oferece também proteção contra o dano que empurrões vigorosos
durante o intercurso poderiam causar a testículos frouxos demais.
Há também muitas outras hipóteses suplementares conectadas à
hipótese da ativação. Por exemplo, os autores ponderam se a bem
documentada preferência dos seres humanos – e bastante singular no reino
animal – pelo sexo noturno pode ser ao menos parcialmente explicada por
testículos sensíveis à temperatura. Embora os autores notem os muitos
benefícios da cópula noturna (como a acomodação do sexo clandestino ou a
minimização da ameaça de predação), essa preferência pode também
refletir uma adaptação circadiana relacionada a escrotos descidos. Uma vez
que nossa espécie evoluiu originalmente em regiões equatoriais onde as
temperaturas durante o dia elevavam-se comumente acima da temperatura
do corpo, seria difícil manter ajustes testiculares ideais nesse calor
excessivo. Em contraste, ao entardecer e à noite as temperaturas ambientes
caem abaixo da temperatura do corpo, retornando a condições
termorregulatórias ideais para os testículos. Além disso, depois do sexo
noturno a parceira do sexo feminino tende a dormir, permanecendo assim
numa posição estacionária, muitas vezes supina, que também maximiza as
probabilidades de fertilização.
Embora a hipótese da ativação nos ajude a compreender melhor a
arquitetura funcional, ainda que esquisita, das gônadas humanas
masculinas, talvez ainda lhe pareça estranho que a natureza tenha investido
tão pesadamente num banco genético tão precariamente situado. Afinal,
ainda ficamos com o fato curioso de que esses preciosos gametas estão
literalmente pendendo de um vaso completamente desprotegido. Gallup e
seus colaboradores consideraram isto também:

Qualquer explicação de testículos escrotais descidos deve também tratar


dos enormes custos potenciais de ter os testículos situados fora da
cavidade do corpo, onde são deixados praticamente desprotegidos e
especialmente vulneráveis a afrontas e danos. Para serem compatíveis
com a teoria evolucionária, os custos potenciais dos testículos escrotais
não teriam de ser apenas contrabalançados por benefícios
compensadores (isto é, ativação do esperma por ocasião da
inseminação), mas esperaríamos também encontrar adaptações
correspondentes que funcionassem para minimizar ou anular esses
custos.

Aqui entra a dor. Não apenas a dor, mas a dor inusitadamente aguda,
lancinante, que acompanha o machucado testicular. A maioria dos homens
tem histórias terríveis para contar a esse respeito – seja uma bolada na
virilha ou o pontapé de um irmão –, mas todos nós homens temos algo em
comum: tornamo-nos todos extraordinariamente hipervigilantes contra
ameaças ao bem-estar de nossos testículos escrotais. Segundo os autores, o
fato de os homens serem tão melindrosos e sensíveis em relação a essa parte
do corpo em particular pode mais uma vez ser compreendida no contexto da
biologia evolucionária. Se você é homem, a razão por que provavelmente
tem um sobressalto maior ao ouvir as palavras “esmagamento” ou “ruptura”
associadas a “testículo” do que ao ouvi-las associadas a, digamos, “braço”
ou “nariz” é que os testículos são desproporcionalmente mais vitais para seu
sucesso reprodutivo do que essas outras partes do corpo. Eu, por exemplo,
tive de fazer uma pausa para me proteger antes de sequer digitar essas
palavras juntas.
Não é que essas outras partes do corpo não sejam adaptativamente
importantes, ou que não doam quando você se machuca. Trata-se antes de
uma questão de grau de dor. A variação da sensibilidade à dor entre
diferentes regiões do corpo, segundo essa visão, reflete a vulnerabilidade de
diferentes adaptações e a importância que elas têm em seu sucesso
reprodutivo. Muitas crianças nasceram de homens de nariz quebrado, mas
nem uma única foi jamais gerada por um homem com testículos
irreparavelmente danificados. O importante é que ancestrais do sexo
masculino que aprenderam a proteger suas gônadas terão deixado mais
descendentes, e a dor é um ótimo motivador para promover a ação
defensiva preventiva. Ou, para pensar sobre isso de outra maneira: qualquer
homem no passado ancestral que ignorasse ou apreciasse o dano testicular
teria sido rapidamente extirpado do pool genético.
As maravilhas do músculo cremastérico não terminam aqui. Ele
também se flexiona em resposta a estímulos ameaçadores, de fato puxando
os testículos para mais perto do corpo e pondo-os fora de perigo. Na
verdade, salientam os autores, médicos japoneses eram conhecidos por
aplicar uma alfinetada na coxa interna de pacientes do sexo masculino
como uma preparação cirúrgica: se o paciente não exibisse nenhum reflexo
cremastérico, a anestesia epidural tinha pegado, e ele estava pronto para
entrar na faca. Outras evidências sugerem que o medo e a ameaça de perigo
desencadeiam o reflexo cremastérico. Há várias maneiras de testar isso em
casa, se você estiver disposto. Trate apenas de assegurar que o dono dos
testículos medrosamente reflexivos saiba o que você está querendo fazer
antes de apavorá-lo.
Portanto, aí está – uma explicação evolucionariamente informada dos
testículos escrotais descidos nos seres humanos. É tudo uma maluquice?
Não me deixem pendurado, pessoal. A bola está com vocês.
Tão perto e tão longe: a contorcida história
da autofelação

MUITO ANTES QUE EU SOUBESSE tudo que sei sobre sexo, fiz o que muitos
homens jovens fazem, ou seja, pus um rolo vazio de papel toalha sobre meu
pênis e chupei esperançosamente a outra ponta do papelão. Certo, talvez
nem todo mundo faça isso; eu estava um pouco confuso sobre o princípio
da sucção. E agora estou um pouco embaraçado pela história, embora um
ano inteiro tenha se passado depois disso e hoje eu esteja muito mais bem-
informado sobre a felação. Ah, relaxa, estou só brincando.
Bem, mais ou menos. Eu realmente tentei essa proeza, mas tinha doze
ou treze anos na época. Para lhe dar uma ideia mais clara de meu parco
conhecimento carnal nessa idade, esse foi também o momento aproximado
em que comuniquei à minha irmã mais velha, de maneira muito sigilosa,
que uma chupada [blow job] consistia em usar os próprios lábios para
soprar [blow] uma brisa fresca no ânus de outra pessoa.
Assim, para evitar confusões semelhantes, vamos definir nossos termos
claramente. Autofelação, o assunto em pauta, é o ato de aplicar a boca aos
próprios genitais para obter prazer sexual. A terminologia é importante
aqui, porque pelo menos uma equipe de psiquiatras que escreveu sobre o
tema distingue entre auto-fellatio e auto-irrumatio. No sexo não solitário, a
maior parte da ação na felação cabe à parte que chupa, ao passo que no
irrumatio a ação de enfiar tem um papel maior, a boca da outra pessoa
servindo como um receptáculo passivo para o pênis.
De qualquer maneira, meu ato com o rolo de papel toalha foi
simplesmente um plano B naquela idade pueril, uma tentativa vã de
contornar as óbvias limitações anatômicas da autogratificação oral. E, pelo
que todos dizem, eu não fui o único a tramar o plano A. Em
Comportamento sexual no macho humano, Alfred Kinsey e colegas
relataram, de fato, que “uma considerável porção da população registra
tentativas de autofelação pelo menos no início da adolescência”.
Infelizmente, dadas a inoportuna caixa torácica e a espinha dorsal hesitante
de nossa espécie, Kinsey estimou que somente dois ou três de cada mil
homens são capazes de realizar essa façanha. Há a história do poeta italiano
decadente Gabriele D’Annunzio, que teria mandado que lhe tirassem um
osso para facilitar o ato, ou aquele antigo esquete no Saturday Night Live
em que Will Ferrell se matricula num curso de ioga para se tornar flexível o
bastante para fazer felação em seu próprio órgão. Mas a realidade com
frequência é mais estranha que a ficção. Em 1975, a psiquiatra Frances
Millican e colegas descreveram o caso real de um paciente “muito
perturbado” que aprendeu ioga precisamente por essa razão.
Agora, talvez você pense que ser parte do percentual ultraflexível da
população é puro divertimento. (Todos nós ouvimos aqueles gracejos sobre
nunca precisar sair de casa.) Mas pense de novo. Há uma longa e
lamentável história de patologização desse comportamento; psiquiatras
descreveram seus praticantes como sexualmente desajustados, presos num
estado infantil de dependência lactente, ou mesmo motivados por desejos
homossexuais reprimidos. Tome o caso descrito pelos psiquiatras Jesse
Cavenar, Jean Spaulding e Nancy Butts, que escreveram em 1977 sobre um
soldado solitário de 22 anos que vinha fazendo felação em si mesmo desde
os doze. Ele ficava desesperado “pelo fato de que só era fisicamente capaz
de incorporar a glande, e queria ser capaz de incorporar mais”.
Sinceramente, devia ser tão – oh, qual é a palavra que estou procurando…
ela está bem na ponta da minha língua – frustrante para esse pobre soldado.
Essa é a suprema provocação, ele estar tão perto e no entanto tão longe.
Desde os dias de Freud, psicanalistas deram tratos à bola sobre o
assunto da autofelação. Num artigo de 1971 de autoria do psiquiatra Frank
Orland, vemos a linguagem típica, cheia de jargão, usada para dissecar as
bases “simbólicas” da autofelação, que é conceitualizada como um “anel de
narcisismo” virtual:

A autofelação representa uma recriação do estágio infantil precoce em


que os representantes intrapsíquicos dos objetos externos estão
separados do eu-objeto, com uma simbiose parasítica coexistente com o
objeto externo. Através do fenômeno da autofelação, o ego restabelece
o necessário domínio sobre o objeto externo representativo como uma
defesa contra a perda do objeto e para restaurar a fusão parasítica com o
mamilo-seio.

Isto, senhoras e senhores, é o mais genuíno psicoblá-blá-blá – e eu lhes


digo isto como psicólogo. Por vezes as pessoas são motivadas a lamber os
próprios genitais simplesmente porque a sensação é agradável. Sempre
haverá, é claro, aqueles, como o dúbio mestre de ioga, que levam isso um
pouco longe demais e para os quais a autofelação contribui para a doença
mental. O soldado mencionado acima, que não conseguia levá-la adiante o
suficiente, ficou tão frustrado por sua fantasia semirrealizada que, quando
se masturbava da maneira antiquada, só conseguia chegar ao clímax
imaginando estar fazendo uma autofelação.
O primeiríssimo caso psiquiátrico de autofelação publicado, que
apareceu no American Journal of Psychiatry em 1938, foi também o mais
chocante e patológico. O paciente era um balconista de 33 anos que, antes
de ser encaminhado a Eugen Kahn e Ernest Lion, psiquiatras de Yale,
acabara de cumprir uma pena de sessenta dias na prisão por agressão
sexual. “Entre suas práticas perversas”, explicam os autores, “estavam
pedofilia, cunilíngua, atos homossexuais (felação, sodomia e masturbação
mútua), exibicionismo, travestismo, fetichismo, algolagnia, voyeurismo e
espreita.” Mas esqueça todas essas parafilias banais. Os psiquiatras do
homem ficaram especialmente intrigados por seu hábito mais inusitado.
Esse paciente parece ter sido um sujeito um tantinho tortuoso. Os autores o
descrevem como um pouco efeminado na postura, no andar e em
maneirismos; não chegava a 1,58 m de altura – “um tanto magro e com
quadris largos”, escreveram, com “um padrão feminino de distribuição do
pelo pubiano” e “seu reflexo faríngeo é muito lento”.
O paciente era o terceiro mais velho de oito filhos e cresceu numa
família severa, religiosa, contra a qual os médicos julgam que se rebelou
transgredindo notoriamente seus elevados padrões morais. Ao narrar aos
psiquiatras as origens de seu interesse pela autofelação, o perturbado
balconista lembrou-se de que quando tinha catorze anos fora convidado por
um “menino aleijado” para fazer sexo oral com ele. O paciente, sendo
tímido, recusou a oferta, mas a ideia daquilo fermentara e, sem coragem de
abordar uma outra pessoa, resolveu encarregar-se ele mesmo do assunto.
“Continuou tentando noite após noite, conseguindo curvar as costas cada
vez mais, até que finalmente conseguiu em agosto de 1923.” (Só para o
caso de você querer marcar o aniversário em sua folhinha.) Acontece que
gostou daquilo – tanto, na verdade, que mesmo em meio à longa litania de
perversões que apreciava, o auto-irrumatio tornou-se instantaneamente seu
ato autoerótico favorito.
Os autores descrevem como, a partir de então, a excitação sexual do
homem, de uma estranha maneira reminiscente do cão de Pavlov, foi
acompanhada por uma “sensação de constrição na garganta”. Devia ser uma
sensação terrivelmente incômoda, eu imagino, e pelo visto também difícil
de resolver. “Ele tentou obter gratificação substituta”, dizem os autores
“fumando ou estimulando a faringe com uma banana, ducha vaginal ou um
cabo de vassoura. Essas coisas lhe proporcionavam diferentes graus de
satisfação.” E, ao que parece, ele também superou a timidez e a falta de
autoconfiança de sua adolescência: gostava particularmente de fazer felação
em si mesmo diante de uma plateia chocada.
Desde esse primeiro relato de caso por Kahn e Lion, um punhado de
outros pingaram ao longo dos anos, com subsequentes investigadores
tentando encontrar um conjunto de denominadores comuns de
personalidade naqueles que preferem a autofelação a outras formas de sexo.
Num artigo publicado em 1954 na Psychoanalytic Review, por exemplo,
William Guy e Michael Finn viram um tema começando a emergir. “Em
todas as descrições clínicas”, observam esses autores, “encontramos
repetidamente termos como retraído, tímido, efeminado e passivo.” Isso é
código para “bicha”, acredito, e de fato outros autores notaram de maneira
mais expressa os desejos homossexuais frequentemente reprimidos desses
praticantes da autofelação.
Na verdade, a julgar pela escassa literatura, uma das grandes questões
psicanalíticas que ainda não foi satisfatoriamente resolvida parece ser a
extensão em que o envolvimento com autofelação – ou simplesmente o
desejo de fazê-lo – indica uma atração erótica pelo mesmo sexo. Suspeito,
no entanto, que a super-representação de homens gays naqueles velhos
relatos de caso nada mais é que um reflexo do ethos cultural daqueles
tempos. As investigações psiquiátricas mais recentes sobre autofelação
datam do final dos anos 1970 (por volta da época em que o tênue domínio
particular de Freud sobre a psiquiatra cessou), e as mais antigas, dos anos
1930; de modo que, em geral, os homens nelas descritos enfrentavam
proscrições infundadas contra a homossexualidade. Isso significa que
chegar aos pênis de outros homens era muito difícil. Assim, não é tão
surpreendente que aqueles apavorados demais ou dentro do armário demais
para praticar felação em um outro homem desenvolvessem graves neuroses
após entregarem-se a seus próprios pênis.
Um artigo publicado em 1946 no American Journal of Psychiatry
exemplifica esse fenômeno. O caso envolve um primeiro-sargento (não
confundir com o soldado que conhecemos antes) de 36 anos, extremamente
inteligente e agradável, mas virginal, com desejos homossexuais secretos.
Segundo o registro oficial, ele praticara a autofelação pela primeira vez aos
treze anos, mas ficara tão horrorizado com esse “impulso” que nunca mais o
repetiu – isto é, até um mês antes de chegar à enfermaria psiquiátrica do
hospital. Após fazer um boquete em si mesmo a sós, o sargento tornou-se
intensamente paranoico, temendo que os outros soldados soubessem de seu
comportamento de alguma maneira e que cada risinho, sussurro ou olhar
desviado se relacionasse com sua transgressão. Ele sofreu um colapso
nervoso ao ouvir a expressão “chupador de pau” flutuando de maneira
casual e brincalhona no quartel, convencido de que ela se destinava
justamente a ele.
A história teve um desfecho bastante triste, pois, embora tivesse
respondido bem à tranquilização dos médicos de que estava sendo
excessivamente paranoico, o sargento foi exonerado por “não ser mais
adaptável dentro do serviço militar”. Os terapeutas designados para o caso,
major Morris Kessler e capitão Geoge Poucher, chegaram a uma conclusão
bastante estranha, da qual tenho a impressão que você poderia discordar. “A
autossuficiência sexual”, escreveram eles, “seja por masturbação ou
autofelação, é equivalente a ter uma afinidade com o próprio sexo.” Em
outras palavras, se vocês, meus amigos homens heterossexuais, fossem fãs
da masturbação manual em 1946 teriam sido tachados de pervertidos
homossexuais secretos, que gostavam tanto de pênis que manipulavam seus
próprios genitais. Durante a proibição de gays nas forças armadas na era
Clinton, marcada pelo “Não pergunte, não conte”, isso teria feito da
autofelação um caso gravíssimo, se ela tivesse aparecido nesse momento. E,
falando sério, ainda bem que nos livramos daqueles tempos de ignorância
de outrora. A cada um o que é seu – muito literalmente no caso da
autofelação.
Eu sei, eu sei, não tive sequer uma chance de falar sobre autocunilíngua
em mulheres. Dados os obstáculos anatômicos ainda mais sérios na falta de
um dispositivo reprodutivo protuberante, talvez esse comportamento em
mulheres nem seja possível. Confesso que não sei; e não há nenhuma
menção a isso na literatura científica. O equivalente feminino mais próximo
da autofelação com que deparei é o caso de mulheres que sugam os próprios
seios, para fins sexuais ou outros. Um terapeuta escreve sobre uma paciente
do sexo feminino de extrema autossuficiência que tinha o hábito de fazer
isso. Quando lhe perguntaram por quê, ela respondeu apenas: “Estou com
fome.” Mas esta é uma outra história para um outro dia.
Por que o pênis tem esse formato?: versão
sem cortes

SE ALGUM DIA você deu uma boa e longa olhada no falo humano, o seu ou o
de outra pessoa, provavelmente ficou pensando sobre seu formato peculiar.
Vamos admitir: ele não é o apêndice configurado do modo mais intuitivo
em toda a evolução. Mas, segundo o psicólogo evolucionário Gordon
Gallup, o pênis humano é na realidade uma “ferramenta” impressionante no
sentido mais verdadeiro da palavra – uma ferramenta manufaturada pela
natureza ao longo de centenas de milhares de anos de evolução humana.
Talvez você se surpreenda ao descobrir o quanto ela é especializada. Além
disso, ficaria pasmo com o que sua aparência pode nos revelar sobre a
natureza de nossa sexualidade.
O curioso sobre a evolução do pênis humano é que, em se tratando de
algo que difere tão obviamente em forma e tamanho do de nossos parentes
vivos mais próximos, somente nos últimos anos os pesquisadores tenham
começado a estudar sua história natural mais detalhadamente. A razão para
essa negligência não é clara. É difícil imaginar que cientistas pragmáticos
pudessem estar preocupados que o assunto trouxesse à baila sentimentos
puritanos. A questão tem, de fato, um fator risível inerente, então
compreendo que é necessário um tipo especial de cientista psicológico para
contar à velhinha sentada a seu lado num voo para Denver que ele estuda a
maneira como as pessoas usam seus pênis quando ela lhe pergunta qual é o
seu trabalho. Seja como for, se você pensa que só há uma maneira de usar o
pênis, que ele é um mero instrumento de fertilização interna que não requer
maior reflexão, ou que tamanho não importa, bem, isso só serve para
mostrar o quanto você pode aprender com os achados da pesquisa de
Gallup.
A abordagem de Gallup ao estudo do design do pênis humano é um
exemplo perfeito de engenharia reversa tal como a expressão é usada no
campo da psicologia evolucionária, e engenharia reversa é um conceito
muitas vezes não explicitado que você me verá usar repetidamente em todo
este livro. Trata-se de uma técnica investigativa lógico-dedutiva para
descobrir o propósito adaptativo ou a função de traços físicos, processos
psicológicos ou preconceitos cognitivos existentes (ou sobreviventes). Isto
é, se você começa com o que vê hoje – neste caso, o pênis com seu formato
esquisito, sua glande bulbosa (a “cabeça”, na linguagem comum), sua haste
longa e rígida, e a aresta coronal, que constitui uma espécie de lábio em
forma de guarda-chuva entre essas duas partes – e vai recuando no tempo,
observando como ele veio a assumir essa aparência, a engenharia reversa é
capaz de propor um conjunto de hipóteses baseadas na função, derivadas da
teoria evolucionária. Neste caso, estamos falando sobre pênis, mas a lógica
da engenharia reversa pode ser aplicada a praticamente qualquer coisa
orgânica, da forma de nossos dentes incisivos à oponibilidade de nossos
polegares ou o arco de nossas sobrancelhas.
Para o psicólogo evolucionário, as questões prementes são,
essencialmente: Por que isso é assim? e Para que isso serve? A resposta
não é sempre que se trata de uma adaptação biológica – de que aquilo
resolveu algum problema evolucionário e portanto deu aos nossos
ancestrais uma vantagem competitiva em termos de seu sucesso
reprodutivo. Por vezes um traço é apenas um “subproduto” de outras
adaptações. O sangue não é vermelho, por exemplo, porque vermelho
funcionava melhor do que verde, amarelo ou azul, mas apenas porque
contém a proteína hemoglobina, que é uma excelente transportadora de
oxigênio e dióxido de carbono e por acaso é vermelha. Mas no caso do
pênis humano, todos os sinais indicam que ele veio a ter a aparência que
tem por uma genuína razão adaptativa.
Se você fosse examinar o pênis objetivamente – por favor, não o faça
em público ou sem a permissão da outra pessoa – e comparar a forma desse
órgão com o design do mesmo órgão em outras espécies, notaria as
seguintes características unicamente humanas. Primeiro, apesar da variação
de tamanho entre os indivíduos, o pênis humano é especialmente grande
comparado ao dos outros primatas. Quando ereto, ele tem em média entre
12,5 e 15 centímetros de comprimento e cerca de 12,5 centímetros de
circunferência. Nem o mais bem-dotado chipanzé, nosso parente vivo mais
próximo, chega sequer perto disso. Mesmo considerando a massa total e o
tamanho do corpo, os pênis dos chimpanzés têm cerca da metade do
tamanho dos pênis humanos tanto em comprimento quanto em
circunferência. Tenho a impressão de que sou uma fonte mais confiável a
este respeito do que a maioria. Tendo passado os cinco primeiros anos de
minha vida acadêmica estudando a cognição dos antropoides, vi um número
incalculável de pênis simiescos. Certa vez passei um verão com um gorila
prateado que tinha um pênis minúsculo (mas era um ótimo sujeito) e cuidei
de um lascivo bebê orangotango que gostava de enfiar seu pênis em
praticamente qualquer coisa com um buraco, o que infelizmente um dia
incluiu minha orelha.
Além disso, só a espécie humana tem aquela glande como uma calota de
cogumelo, conectada à haste pelo fino tecido do frênulo (a delicada
saliência de pele logo abaixo da uretra). Chimpanzés, gorilas e
orangotangos têm um design fálico muito menos extravagante – quase só
haste. Ocorre que uma das características mais significativas do pênis
humano não é tanto a glande em si, mas a aresta coronal que ela forma por
baixo. O diâmetro da glande onde ela encontra a haste é mais largo que a
própria haste. Isso resulta na aresta coronal que circunda a circunferência da
haste – algo que Gallup, usando a lógica da engenharia reversa, acreditava
poder ser uma importante pista evolucionária das origens da estranha visão
do pênis humano.
Bem, a ironia não me escapa. Mas ainda que este psicólogo
evolucionário em particular (este que vos fala) seja gay, para as finalidades
da pesquisa devemos considerar a evolução do pênis humano em relação à
vagina humana. Estudos de imagiologia magnética de casais heterossexuais
fazendo sexo revelam que, durante o coito, o pênis típico se expande
completamente e ocupa o aparelho vaginal, e com penetração total pode até
chegar ao colo do útero da mulher e levantá-lo. Isso, combinado com o fato
de que a ejaculação humana é expelida com grande força e por uma
distância considerável (até sessenta centímetros se não contida), sugere que
os homens são projetados para liberar esperma dentro da porção mais alta
possível da vagina. Num artigo publicado na revista Evolutionary
Psychology, Gallup e Rebecca Burch afirmam que “um pênis mais longo
seria vantajoso não só para deixar sêmen numa parte menos acessível da
vagina, mas, ao encher e expandir a vagina, ele também ajudaria e incitaria
o desalojamento de sêmen deixado por outros machos como um meio de
maximizar a probabilidade de paternidade”.
Essa “teoria do desalojamento do sêmen” é a parte mais intrigante da
história de Gallup. Talvez prefiramos ver nossa espécie como ditosamente
monógama, mas, ao menos em algum grau, pular a cerca tem sido nosso
modus operandi pelo menos desde que andamos sobre duas pernas. Como
as células de esperma sobrevivem no muco cervical de uma mulher por até
vários dias, se ela tiver mais de um parceiro sexual do sexo masculino
durante esse período, digamos dentro de 48 horas, o esperma desses dois
homens estará competindo por acesso reprodutivo ao seu óvulo. Segundo
Gallup e Burch, “exemplos incluem sexo em grupo, estupro por bando,
promiscuidade, prostituição e insistência do macho residente em sexo em
resposta a uma suspeita de infidelidade”. E embora o desalojamento do
sêmen seja o objetivo do macho competidor, nem mesmo pênis
satisfatoriamente desenvolvidos são perfeitos. De fato, como evidência das
inclinações sexuais naturais de nossa espécie, os autores citam casos bem-
documentados de heteroparidade, nos quais “gêmeos fraternos” são de fato
gerados por dois pais diferentes que fizeram sexo com a mãe num intervalo
curto de tempo.
Como então a natureza equipou os homens para resolver o problema
adaptativo de outros homens engravidando suas parceiras sexuais? A
resposta, segundo Gallup, é que seus pênis foram esculpidos de tal maneira
que o órgão iria efetivamente desalojar o sêmen de competidores da vagina
de sua parceira, um efeito bem sincronizado facilitado pelo “sorvo” do
empurrão dos quadris durante o intercurso. Especificamente, a saliência
coronal oferece um serviço especial de remoção ao eliminar esperma
estranho. Segundo essa análise, o efeito do empurrão dos quadris seria
puxar o esperma de outros homens para fora do colo do útero e trazê-lo de
volta em torno da glande, recolhendo assim o sêmen depositado por um
rival sexual.
Você poderia pensar que tudo isso é muito bonito, mas não é possível
provar uma coisa dessas. Mas, nesse caso, estaria subestimando Gallup, que
vem a ser um pesquisador experimental muito talentoso (entre outras coisas,
ele é também muito conhecido por desenvolver, no início dos anos 1970, o
famoso teste do autorreconhecimento no espelho para ser usado com
chimpanzés). Numa série de estudos publicados na revista Evolution and
Human Behavior, Gallup e uma equipe de alunos seus puseram a hipótese
do desalojamento do sêmen à prova usando genitálias humanas artificiais de
diferentes formatos e tamanhos. Chegaram até a preparar várias fornadas de
fluido seminal realístico.
Os achados do estudo podem não ter “provado” a hipótese do
desalojamento do sêmen, mas sem dúvida confirmaram seus pontos
principais. Aqui está como o plano básico do estudo funcionou. (E talvez eu
deva me antecipar ao refrão usual observando que sim, Gallup e seus
colaboradores receberam plena aprovação ética de sua universidade para
conduzir esse estudo.) Os pesquisadores selecionaram vários conjuntos de
genitais protéticos de lojas de novidades eróticas, inclusive uma realística
vagina de látex, vendida como companheira de masturbação para homens
heterossexuais solitários e amarrada numa ponta para impedir vazamento, e
três falos artificiais. O primeiro falo de látex tinha 15,5cm de comprimento
e 3,3cm de diâmetro, com uma aresta coronal que se estendia por cerca de
cinco milímetros a partir da haste. O segundo era do mesmo comprimento,
mas sua aresta coronal estendia-se por apenas 1,2 milímetro a partir da
haste. Por fim, o terceiro igualava-se aos outros dois no comprimento, mas
era inteiramente desprovido de aresta coronal. Em outras palavras, enquanto
os dois primeiros falos assemelhavam-se bastante ao pênis humano real, o
terceiro (o falo de controle) era o cavaleiro sem graça e acéfalo do bando.
Em seguida, os pesquisadores usaram uma receita de sêmen simulado
emprestada de outro psicólogo evolucionário de ideias parecidas, Todd
Shackelford, e prepararam várias fornadas de fluido seminal. A receita
“consistia em 0,08 xícara de farinha crua, branca e peneirada misturada com
1,06 xícara de água. Essa mistura era posta no fogo até levantar fervura,
cozida em fogo brando por 15 minutos, sendo mexida ao mesmo tempo, e
depois posta para esfriar”. Numa série controlada de “ensaios de
desalojamento”, a vagina era carregada com esse sêmen falso, e os falos
eram inseridos em diferentes profundidades (para simular o empurrão dos
quadris) e removidos, e depois disso o orifício de borracha era examinado
para determinar quanto sêmen havia sido desalojado dele. Como fora
previsto, os dois falos com as arestas coronais desalojaram
significativamente mais sêmen da vagina (cada um removeu 91%) que o
controle “sem cabeça” (35,3%). Adicionalmente, quanto mais os falos eram
inseridos – isto é, quanto mais profunda era a inserção –, mais sêmen era
desalojado. Quando inserido até três quartos da extensão da vagina, o falo
com a aresta coronal mais impressionante removeu somente um terço do
sêmen, ao passo que, quando inserido completamente, removeu quase todo
o sêmen. A inserção rasa, simulada pelos pesquisadores inserindo o falo
artificial até a metade ou menos da extensão da vagina artificial, não
desalojou nenhum sêmen. Portanto se você quer um conselho que o ajudará
a ter mais sucesso na corrida armamentista evolucionária, não hesite – vá
fundo.
Para a segunda parte do estudo, Gallup administrou um questionário a
estudantes universitários sobre sua história sexual. Tomadas de estudos
anteriores que mostravam como o ciúme sexual inspira respostas previsíveis
(e biologicamente adaptativas) de “proteção da companheira” em machos
humanos, essas questões destinavam-se a determinar se certo
“comportamento peniano” (a expressão é minha, não deles) podia ser
esperado com base na suspeita, pelos homens, de infidelidade em suas
parceiras. No primeiro desses questionários anônimos, homens e mulheres
relataram que na esteira de alegações de traição da mulher, os homens
inserem seus pênis mais profunda e rapidamente. Resultados de um
segundo questionário revelaram que ao se reencontrarem sexualmente pela
primeira vez após algum tempo separados, os casais se envolviam num sexo
mais vigoroso – isto é, comparado com a atividade sexual de linha de base,
quando os casais se encontram mais regularmente, o intercurso vaginal após
períodos de separação envolvia empurrões mais rápidos e profundos dos
quadris. Espero que você esteja pensando como um psicólogo evolucionário
neste ponto e possa inferir o que esses dados de levantamento significam:
usando seus pênis de maneira mais proficiente como um dispositivo de
desalojamento, os homens estão subconscientemente (em alguns casos
conscientemente) combatendo a possibilidade de que suas parceiras tenham
feito sexo com outro em sua ausência.
Duvida desta interpretação? O que há de realmente bonito na psicologia
evolucionária – ou de mais frustrante, se você for um de seus muitos
críticos – é que você não precisa acreditar que é verdade para que isso
funcione precisamente dessa maneira. A seleção natural não se importa
muito caso você prefira uma explicação alternativa para a razão por que
você fica tão excitado ao se reencontrar com sua parceira. Seu pênis
executará sua tarefa de desalojar esperma da mesma maneira.
Muitas outras hipóteses relacionadas baseiam-se na lógica central da
teoria do desalojamento do sêmen. Em sua obra de 2004, Evolutionary
Psychology, por exemplo, Gallup e Burch expõem várias ideias fascinantes
derivadas dela num artigo de acompanhamento de seu trabalho anterior
sobre a história natural do pênis. Por exemplo, uma crítica óbvia à teoria é
que os homens iriam essencialmente prejudicar seu próprio sucesso
reprodutivo ao remover o próprio esperma da parceira sexual. No entanto,
em sua própria vida sexual você terá provavelmente notado o “período
refratário” que se segue imediatamente à ejaculação, durante o qual os
homens perdem sua tumescência de maneira quase instantânea (a ereção
esvazia-se para metade de seu tamanho pleno dentro de um minuto após a
ejaculação), seus pênis se tornam hipersensíveis e continuar empurrando os
quadris torna-se até um pouco doloroso. Na verdade, por algo entre trinta
minutos e 24 horas, a maioria dos homens fica temporariamente impotente
após a ejaculação. Segundo Gallup e Burch, essas características pós-
ejaculatórias, além do efeito de “sedação” comum do orgasmo, podem ser
adaptações ao problema do “desalojamento do próprio sêmen”, significando
que as chances de remover seu próprio esperma são consideravelmente
reduzidas quando seu pênis está dolorido e flácido ou enquanto você dorme
profundamente.
Gallup e Burch também nos deixam com uma questão hipotética muito
intrigante em seu artigo. “É possível (salvo por inseminação artificial)”,
perguntam eles, “que uma mulher engravide de um homem com quem
nunca fez sexo? Pensamos que a resposta é ‘sim’.” É uma ideia difícil de
entender, mas basicamente Gallup e Burch dizem que a teoria do
desalojamento prevê que algo como o exemplo seguinte seria possível
(observe que fiz alterações a partir do artigo original para seu prazer de
leitura; observe também como a situação é especialmente relevante para
homens não circuncidados): se “Josh” fosse fazer sexo com “Kate”, que
recentemente fez sexo com “Mike”, no processo de Josh empurrar seu pênis
para a frente e para trás na vagina, parte do sêmen de Mike seria impelido
para baixo do frênulo de Josh, se acumularia atrás de sua aresta coronal e
seria desalojado da área mais próxima ao colo do útero. Depois que Josh
ejacula e substitui o sêmen de outro macho pelo seu, quando ele se retira da
vagina, parte do sêmen de Mike ainda estará presente na haste de seu pênis
e atrás de sua aresta coronal. Quando sua ereção cede, a glande se recolhe
sob o prepúcio, levantando a possibilidade de que parte do sêmen de Mike
tenha sido capturada sob o prepúcio e atrás da aresta coronal nesse
processo. Se Josh fosse então fazer sexo com “Amy”, várias horas depois, é
possível que parte do sêmen desalojado de Mike ainda estivesse presente
sob seu prepúcio, podendo assim ser inadvertidamente transmitido a Amy,
que por sua vez poderia então ser fecundada pelo esperma de Mike.
Esta não é exatamente uma imaculada conceição. Mas imagine só os
gritos sufocados da plateia de um programa de auditório. As pessoas têm
alguns sentimentos bastante fortes em relação a pênis. As reações iniciais
ao ensaio que você acaba de ler foram de incrédulas (“Está sugerindo
seriamente que chimpanzés não são promíscuos?”) a bastante irritadas
(“Mais um pensamento idiota e tendencioso de um ‘psicólogo
evolucionário’”), passando pelas imaginosas (“Pênis! Eles são tão fofinhos,
a gente tem vontade de beliscar suas bochechas e lhes dar um doce”). Por
isso decidi conversar diretamente com Gordon Gallup, cuja controversa
teoria do desalojamento do sêmen, afinal, foi o que provocou toda a
comoção em torno do funcionamento adaptativo desse órgão enigmático.
Talvez ele pudesse nos oferecer mais alguns detalhes elucidativos sobre a
teoria. Peguei algumas das questões essenciais e pedi a Gordon que
respondesse.

PERGUNTA: A genitália de borracha não foi lá muito convincente porque


os modelos eram circuncidados, e na vida real o prepúcio iria interferir
com as funções de desalojamento do sêmen da aresta coronal. O
prepúcio representa portanto um problema para a teoria do
desalojamento do sêmen?
GALLUP: O tamanho do prepúcio é uma das características mais
variáveis do pênis humano. Quando a maioria dos homens não
circundados obtém uma ereção, ela empurra o prepúcio para trás sobre a
glande e para baixo sobre a haste do pênis, permitindo à aresta coronal
fazer seu trabalho e recolher o sêmen dos machos rivais do colo do
útero da mulher. Como a circuncisão reduz o diâmetro da haste
imediatamente atrás da glande e acentua a aresta coronal, especulamos
que a prática da circuncisão pode ter modificado inadvertidamente o
pênis de maneiras que lhes permitem funcionar como um dispositivo
mais eficiente de desalojamento de sêmen. Especulação de poltrona?
Não. Seria possível testar a ideia comparando a incidência de não
paternidade entre homens circuncidados e intactos. Minha previsão seria
de que entre homens circuncidados a incidência de cornos deve ser
menor.
PERGUNTA: Então por que os pênis humanos evoluíram para ter algum
prepúcio?
GALLUP: A evolução não ocorre segundo um plano. A melhor maneira
de pensar sobre a maioria das adaptações é em termos de razões de
custo/benefício. Suspeito que o prepúcio proporcionava uma proteção à
glande e o que vemos é o resultado de uma espécie de solução de
compromisso estatística.
PERGUNTA: Se os pênis realmente evoluíram para desalojar sêmen, por
que outras espécies primatas promíscuas, isto é, os chimpanzés, não
teriam desenvolvido pênis de design semelhante, com a aresta coronal?
GALLUP: Novamente, a evolução não obedece a um plano. Ela ocorre
por seleção, e a matéria-prima para essa seleção consiste tão somente
em acidentes genéticos aleatórios (mutações). A história evolucionária
do design genital humano encerrou algumas mutações do formato do
pênis, não presentes em outras espécies, que levaram a um dispositivo
que podia ser usado na competição com outros homens pela
paternidade. Outros primatas promíscuos, como os chimpanzés,
resolveram o problema por meio da competição do esperma. Os
chimpanzés machos têm testículos três vezes maiores que os humanos, e
as diferenças na contagem de espermatozoides são da mesma ordem de
magnitude. Os chimpanzés competem uns com os outros pela
paternidade deixando o maior e mais potente volume de sêmen no
aparelho reprodutivo feminino. Quando se trata de seleção baseada em
acidentes genéticos, há várias maneiras de esfolar o gato adaptativo.

Bering falando. E por falar em gatos, e pênis, talvez seja útil refletir, ao
terminar, sobre os pênis dos gatos. Como os machos humanos, os gatos
machos possuem pênis extraordinariamente especializados. Eles vêm
equipados com uma faixa de cerca de 150 espinhos apontados para trás que
raspam, como um ancinho, as paredes da vagina da gata (daí o uivo
ensurdecedor que muitas vezes acompanha o sexo felino). Isso provoca ao
mesmo tempo a ovulação e desaloja o esperma de machos anteriores que
possam ter cruzado com ela recentemente. Deveríamos ser gratos – e digo
isso como um homem gay, e portanto não sem algum interesse em toda essa
penosa questão – pelo fato de a evolução ter seguido um curso mais suave
em nossa espécie.
Não tão depressa… O que há de tão
“precoce” na ejaculação precoce?

OCORREU-ME POUCO TEMPO ATRÁS, em condições que deixo para sua ampla e
provavelmente sórdida imaginação (como você se atreve?), que o próprio
conceito de ejaculação precoce em machos humanos é estranho, ao menos
de uma perspectiva teórica evolucionária. Afinal, a função da ejaculação
não é realmente uma ocorrência biológica misteriosa; ela é um mecanismo
projetado pela natureza para lançar sêmen, e portanto células de
espermatozoides, o mais longe possível no abismo escuro e labiríntico do
aparelho reprodutor feminino. E quando um desses gametas masculinos
impetuosamente arremessados, numa vigorosa corrida contra milhões de
outras células com uma única tarefa, encontra um óvulo fértil e o penetra, e
– milagre dos milagres – a concepção bem-sucedida ocorre, quer dizer, a
seleção natural pode congratular a si mesma por um trabalho bem-feito.
Assim, dados estes fatos biológicos básicos – e supondo que a
ejaculação não seja tão precoce que ocorra antes da intromissão e os
espermatozoides se vejam embaraçosamente fora do aparelho reprodutivo
de uma mulher, agitando-se de um lado para outro como peixes fora d’água
–, o que, exatamente, há de tão “precoce” na ejaculação precoce? Na
verdade, tudo o mais sendo igual, no passado ancestral, não teria havido
provavelmente algumas vantagens reprodutivas em ejacular o mais depressa
possível durante o intercurso intravaginal – tal como inseminar o maior
número possível de mulheres no menor intervalo de tempo possível? Ou
permitir a nossos ancestrais concentrarem-se em outros comportamentos
adaptativos além do sexo? Ou talvez, sob condições subreptícias de
acasalamento, praticar o ato de maneira pronta e rápida sem provocar uma
grande cena?
Como tantas outras coisas, ocorre que esse meu insight estava na
verdade várias décadas atrasado, porque em 1984, quando eu ainda não
passava de um ejaculador precoce, um sociólogo chamado Lawrence Hong
publicou um artigo extremamente especulativo, mas muito original, nessas
mesmas linhas, de que vale a pena nos ocuparmos aqui. Ele é
apropriadamente intitulado “Survival of the Fastest: On the Origin of
Premature Ejaculation”. Nesse artigo, Hong – cujo trabalho mais recente,
até onde pude apurar, foi sobre a transgeneridade de cabaré – propõe que
durante o longo curso da história evolucionária, “um parceiro despachado,
que montasse rapidamente, ejaculasse de imediato e desmontasse sem
demora poderia [ter sido] o melhor para a fêmea”.
O fator empírico mais importante para que Hong chegasse a essa
conclusão é o fato de que, em média, os machos humanos alcançam o
orgasmo ejaculando apenas dois minutos após a penetração vaginal, ao
passo que as donas dessas vaginas levam, em média, duas vezes mais tempo
para fazer o mesmo depois que um pênis se introduz nela – isto é, quando
chegam a ter um orgasmo em algum momento. Esse óbvio desencontro
entre latências de orgasmo só pode ser compreendido, raciocina Hong, se
reconhecermos que o sexo evoluiu, pelo menos de início, para fins
puramente reprodutivos. Não se deve esquecer, lembra-nos ele, que o sexo
heterossexual recreativo só foi permitido por inovações tecnológicas
relativamente recentes, como os dispositivos contraceptivos.
Hong compara os hábitos de acasalamento dos seres humanos com os
de outros ejaculadores rápidos – e não tão rápidos – na família primata,
observando que quanto mais rápida uma espécie primata é na esfera do
coito, menos agressiva é quando se trata de comportamentos relacionados
ao acasalamento. Ele chama isso de “hipótese da baixa
velocidade/agressividade elevada”. Por exemplo, os resos frequentemente
se envolvem em longas e árduas sessões de coito, em que o sexo com uma
fêmea pode se estender por mais de uma hora de cada vez (incluindo muitos
intervalos, e portanto sem inserção contínua). Isso pode parecer ótimo, mas
antropomorfizadores libidinosos advertem: o sexo entre esses macacos é
uma atividade caótica e violenta, em grande parte porque a duração do ato
muitas vezes atrai atenção hostil de outros machos competitivos. Em
contraste, espécies primatas cujos machos evoluíram para ejacular
rapidamente teriam evitado em grande parte essa violência mortífera, ou
pelo menos a teriam minimizado num grau considerável.
Essencial para a análise de Hong é a ideia de que latências na ejaculação
intravaginal em machos são hereditárias; havia inicialmente variações de
nível dentro da população em nossos ancestrais machos, conjectura ele, mas
ao longo do tempo “a linhagem de Homo sapiens tornou-se superpovoada
por ejaculadores rápidos”. Segundo Hong, isso aconteceu porque machos
jovens em idade reprodutiva que ejaculavam mais rapidamente (isto é,
tinham pênis mais sensíveis) evitavam ferimentos, viviam mais tempo e por
isso tinham maior chance de alcançar um status elevado e adquirir as
fêmeas mais desejáveis.
O raciocínio de Hong sobre esses elementos de hereditariedade de fato
recebeu apoio recente. Talvez você tenha deixado isto escapar em sua
leitura mensal de periódicos, mas em 2009, num artigo publicado no
International Journal of Impotence Research, uma equipe de psicólogos
finlandeses liderada por Patrick Jern relatou evidências de um amplo estudo
de gêmeos mostrando que a ejaculação precoce é significativamente
determinada por fatores genéticos. Milhares de pares de gêmeos do sexo
masculino – fraternos e idênticos – responderam a um questionário sobre
quanto tempo demoravam para chegar ao orgasmo; e os tempos de gêmeos
idênticos eram mais estreitamente assemelhados entre si que os de gêmeos
fraternos. Portanto, tal como Hong supôs muitos anos atrás, este é
realmente um traço herdado; se vocês duvidam, vão em frente, rapazes, e
tenham aquela embaraçosa conversa com seus pais. Na verdade, uma vez
que descobriram que a ejaculação retardada – o outro extremo do contínuo
da latência da ejaculação – não revelava essas contribuições genéticas, Jern
e colegas concordam em geral com Hong, postulando que a ejaculação
“precoce” pode ser um produto da seleção natural, ao passo que a
ejaculação retardada “seria completamente disfuncional”. Os ejaculadores
retardados são consideravelmente mais raros, com uma taxa de prevalência
de apenas 0,15% na população masculina, comparados aos nada menos que
30% de ejaculadores precoces; e sua condição na maior parte é devida a
enfermidades crônicas ou ao uso recente de antiadrenérgicos, inibidores
seletivos da recaptação da serotonina, neurolépticos ou outros
medicamentos dos nossos dias que estão muitas vezes associados com
anorgasmia como um deplorável efeito colateral.
Conferindo maior credibilidade ao modelo evolucionário há um
conjunto separado de dados fornecidos pelos próprios sujeitos publicados
no Journal of Sexual Medicine, em que Jern e colegas demonstraram que as
latências de ejaculação eram significativamente menores quando homens
chegavam ao orgasmo através de penetração vaginal do que quando o
faziam no curso de outras atividades, como sexo anal, oral ou manual. De
fato, à luz dessas latências diferenciais de ejaculação, os autores sustentam
que desmembrar o próprio construto desse “timing” orgásmico em
comportamentos sexuais discretos seria melhor do que tratá-lo como um
fenômeno clínico geral. E oferecem vários acrônimos úteis para esses
subtipos de latência de ejaculação, também, como “Tleo”, para “tempo de
latência da ejaculação oral”, e “Tlem” para “tempo de latência da
ejaculação na masturbação”.
Estou com a incômoda sensação de que deixamos alguma coisa de fora
da equação evolucionária com relação à variação nas latências masculinas
de ejaculação. Hum… Mas o que poderia ser? Oh, é claro, é a satisfação
sexual das mulheres. Na realidade, Hong não deixou os orgasmos femininos
inteiramente fora desta viscosa análise; ele apenas não os considerou
centrais para pressões seletivas. Presumivelmente, como outros teóricos
daquela época que escreveram sobre as razões biológicas para orgasmos
femininos (como Stephen Jay Gould, que pensava que orgasmos femininos
eram algo muito parecido com mamilos masculinos, um feliz resquício do
Bauplan, ou projeto embriológico humano), ele via o prazer das mulheres
como uma característica agradável, mas irrelevante, do sexo humano que a
natureza tinha jogado na mistura.
Hong reconhece – com grande humildade e humor, de fato – que suas
ideias sobre as origens evolucionárias da ejaculação precoce em machos
humanos são sobretudo conjecturas. E elas foram criticadas pelo psicólogo
Ray Bixler. Entre as muitas falhas que Bixler encontra na teoria da
“sobrevivência dos mais rápidos” de Hong está a de que sua lógica básica
simplesmente não se coaduna com a óbvia busca de intercurso sexual por
parte da fêmea. Em chimpanzés, por exemplo – uma espécie para a qual as
latências de ejaculação do macho são medidas em segundos, não em
minutos –, com frequência são as fêmeas que iniciam comportamentos de
acasalamento. Além disso há o fator “ui!” de ter uma parceira fêmea não
excitada, cujos genitais secos não são nada convidativos. Se o modelo de
Hong estivesse correto, diz Bixler, “haveria pouca ou nenhuma causa
proximal, afora a coerção, para a cooperação da fêmea – e deveria estar
muito claro que ela teria de cooperar caso o acasalamento voluntário
devesse ser rápido! Se ela não estivesse lubrificada, ele teria de introduzir o
pênis raspando-o, uma experiência penosa para a mulher e… ‘não
prazerosa’ para ele também”.
De maneira decepcionante, o pensamento evolucionário sobre esse
assunto se detém mais ou menos por aqui. Ao que parece, nenhum outro
teórico – pelo menos nenhum outro teórico evolucionário de inclinação
experimental – seguiu o exemplo de Hong na tentativa de desemaranhar
argumentos adaptacionistas concorrentes com relação às latências de
ejaculação masculinas. Suspeito que peças do quebra-cabeça flutuam por aí,
como a pesquisa finlandesa que mostra que o sexo vaginal conduz a
ejaculações mais rápidas comparado a outros comportamentos sexuais. Mas
o artigo de Hong apareceu antes de seu tempo – ele próprio precoce, à luz
da biologia evolucionária mais informada de hoje, que está pronta agora
para construir um modelo empírico com mais nuances sobre esse legado
evolucionário que está por trás do fato de tantos de nós terminarmos
depressa.
Uma outra grande peça do quebra-cabeça talvez esteja ligada às
habilidades cognitivas sociais singularmente evoluídas de nossa espécie. É
possível que apenas dezenas de milhares de anos atrás, uma ínfima
lasquinha de tempo no longo curso de nossa história primata, os ancestrais
humanos tenham se tornado a única espécie capaz de experimentar empatia
com seus parceiros sexuais durante o intercurso. Os homens puderam então
pensar em satisfazer suas parceiras durante o sexo, e não apenas a si
mesmos, prolongando assim, deliberadamente, o ato do coito para retardar
seu próprio orgasmo em benefício delas. Antes disso, nossos ancestrais
mais distantes talvez fossem mais semelhantes aos chimpanzés, vendo o
corpo de outrem como carne sem sentimentos.
Dado o desagradável estigma associado à ejaculação precoce, uma
abordagem evolucionária do “problema” poderia influenciar enormemente
os tratamentos clínicos, uma área terapêutica que (não surpreendentemente)
gera muito dinheiro e em que não faltam trabalhos sendo feitos. De todo
modo, as ideias seminais de Hong deveriam fazer com que todos nós
parássemos de rotular qualquer ejaculação intravaginal particular de
“precoce” e refletíssemos. É bem possível que a Mãe Natureza, que afinal
de contas talvez seja o único amante que realmente importa, tivesse uma
predileção especial por nossos ancestrais de um minuto.
Ode às muitas virtudes evolutivas do sêmen
humano

DEPAREI COM UM TESOURO SECRETO, uma profusão de fatos até agora


desconhecidos, apenas recentemente revelados por uma equipe de
psicólogos evolucionários. Uma advertência vital, porém: embora os dados
e informações que estou prestes a compartilhar exalem a promessa de
melhorar de maneira espetacular praticamente todos os aspectos de seu
bem-estar, eles também podem ter consequências trágicas – até fatais – se
abusados. De fato, isso tanto é verdade que pesei os méritos de divulgar
esse material e o faço aqui apenas com grande prudência e cautela.
Portanto, por favor, sejam sensatos ao digerir este conhecimento
relacionado ao sêmen, e mais sensatos ainda ao aplicá-lo às suas próprias
vidas sexuais.
Como ocorre com as origens de tantas grandes descobertas científicas,
esta história começa com uma feliz cadeia de eventos casuais. “Nosso
interesse pelas propriedades psicológicas do sêmen surgiu como um
subproduto de um interesse inicial pela sincronia menstrual”, explicam os
codescobridores Gordon Gallup e Rebecca Burch, escrevendo sobre o
sêmen humano. Em particular, Gallup e Burch toparam com um conjunto de
dados curiosos de meados dos anos 1990 mostrando que, diferentemente de
mulheres heterossexualmente ativas que moram juntas, casais de lésbicas
que compartilham uma residência não exibiam o conhecido “efeito
McClintock”, em que ciclos menstruais de mulheres que coabitam (bem
como os de fêmeas de muitas outras espécies) são sincronizados. Como se
sabe que sinais olfativos sutis (chamados feromônios) medeiam a sincronia
menstrual, escrevem os autores, “isso nos pareceu muito peculiar… porque
era de se esperar que lésbicas estivessem em contato diário mais próximo,
mais íntimo, uma com a outra que outras mulheres que moram juntas. O
que há em mulheres heterossexuais que promove a sincronia menstrual, ou
inversamente, o que há nas lésbicas que impede a sincronia menstrual?
Ocorreu-nos que um traço que distingue mulheres heterossexuais de
lésbicas é a presença ou ausência de sêmen no aparelho reprodutivo
feminino. As lésbicas fazem sexo livre de sêmen”.
Talvez você já esteja vendo onde isso vai levar. Gallup e Burch
raciocinaram que, através da absorção vaginal, certas substâncias químicas
presentes no sêmen humano afetam a biologia feminina de tal maneira que
mulheres que fazem sexo sem preservativo começam literalmente a cheirar
diferente daquelas – lésbicas ou não – que não o fazem. Pelo menos, os
corpos das primeiras emitem feromônios que “arrastam consigo” ciclos
menstruais entre mulheres que coabitam. (Esse pressentimento foi na
verdade confirmado quando eles reviram a literatura existente sobre
sincronia menstrual.) Mas essa descoberta casual das lésbicas assincrônicas
foi apenas a ponta do iceberg do sêmen para Gallup e Burch, que logo
descobriram que, embora muito se soubesse entre os biólogos sobre a
química básica do sêmen, praticamente não se sabia nada sobre a maneira
precisa como essas substâncias químicas podiam influenciar a biologia, o
comportamento e a psicologia feminina.
E essa é, na realidade, uma omissão bastante estranha na literatura
biológica, uma vez que poucas coisas poderiam ser mais óbvias em termos
darwinianos que o fato de que o sêmen é, quase por definição, naturalmente
projetado para penetrar na quimicamente absortiva vagina. Tenha em mente
que, embora sejam muitas vezes confundidos no linguajar cotidiano, junto
com muitos outros termos menos científicos, sêmen não é a mesma coisa
que espermatozoide. De fato, talvez você se surpreenda ao saber que só
cerca de 1 a 5% da ejaculação humana habitual consiste em
espermatozoides. O resto dela, depois de drenada desses gametas
famosamente flagelados, é chamado de “plasma seminal”. Assim, quando
se discute a composição química do sêmen, é o próprio plasma, não os
espermatozoides, que está em questão.
Ora, há muito tempo os médicos sabem que a vagina é uma rota ideal
para a administração de medicamentos. A razão disso é que ela é cercada
por uma rede vascular impressionante. Artérias, vasos sanguíneos e vasos
linfáticos abundam, e – diferentemente de algumas outras rotas de
administração – os medicamentos absorvidos pelas paredes vaginais têm
uma linha quase direta para o sistema circulatório periférico do corpo.
Portanto, faz infinito sentido, argumentam Gallup e Burch, que, como
qualquer substância química artificialmente derivada inserida na vagina por
meio de um supositório vaginal, o sêmen possa também ter certas
propriedades químicas que ajustam a biologia feminina.
Ocorre que esse insight, tão óbvio a ponto de ser quase invisível, foi
uma mina de ouro teórica para esse arguto par de pensadores voltados para
a adaptação. Mas antes de saltar em seu rico tonel de teoria seminal, vamos
dar uma rápida olhada em alguns dos ingredientes essenciais do sêmen
humano. Na verdade, o sêmen tem um perfil químico muito complicado,
contendo mais de cinquenta compostos diferentes (incluindo hormônios,
neurotransmissores, endorfinas e imunossupressores), cada um com uma
função especial e ocorrendo em diferentes concentrações dentro do plasma
seminal. Talvez o mais surpreendente desses compostos seja o feixe de
substâncias que melhoram o humor no sêmen. Essa gosma faz bem. Tais
substâncias químicas incluem cortisol (conhecido por aumentar a afeição),
estrona (que melhora o humor), prolactina (um antidepressivo natural),
oxitocina (também melhora o humor), hormônio liberador da tireotropina
(um outro antidepressivo), melatonina (agente indutor do sono) e até
serotonina (talvez o neurotransmissor antidepressivo mais conhecido).
Dados esses ingredientes – e esta é apenas uma pequena amostra das
“drogas” psicoativas encontradas no sêmen humano –, Gallup e Burch,
juntamente com o psicólogo Steven Platek, formularam, de maneira
bastante ousada, a hipótese de que mulheres que faziam sexo desprotegido
deviam ser menos deprimidas que participantes adequadas de um grupo de
controle. Para investigar se o sêmen tem efeitos antidepressivos, os autores
reuniram 293 estudantes do sexo feminino do campus da Suny (State
University of New York), em Albany, que concordaram em preencher um
questionário anônimo sobre vários aspectos de suas vidas sexuais.
Atividade sexual recente sem preservativo foi usada como uma medida
indireta de plasma seminal circulando no corpo da mulher. Cada
participante completou também o Inventário Beck de Depressão, uma
medida comumente usada de sintomas depressivos.
Os achados mais significativos desse estudo, publicado de maneira
criminosamente discreta na Archives of Sexual Behavior, foram estes:
mesmo após ajustar a frequência do intercurso sexual, mulheres que
praticavam sexo e “nunca” usavam preservativos mostravam um número
significativamente menor de sintomas de depressão do que aquelas que “em
geral” ou “sempre” usavam preservativos. É importante ressaltar que essas
mulheres sexualmente ativas que rejeitavam cronicamente o preservativo
também evidenciavam menos sintomas depressivos do que aquelas que se
abstinham de sexo por completo. Em contraposição, mulheres
heterossexuais sexualmente ativas, mesmo realmente promíscuas, que
usavam preservativos eram tão deprimidas quanto as que praticavam a
abstinência total. Em outras palavras, não é apenas que mulheres que fazem
sexo são simplesmente mais felizes, mas a felicidade parece ser uma função
do fluido seminal ambiente que pulsa através das veias de uma pessoa.
Relaxe, sossegue, respire fundo – sei o que você está pensando. Este é
um estudo de correlação, e há muitas outras possíveis causas e explicações,
tanto aquelas que os autores previram e controlaram no projeto desse estudo
(não deixe de ler o trabalho original para mais detalhes, mas note que essas
diferenças na depressão entre grupos se manifestaram mesmo depois que os
seguintes fatores foram controlados: o uso de contraceptivos orais, o
número de dias desde o último sexo, a frequência do sexo e a duração da
relação com o parceiro do sexo masculino) quanto, provavelmente, algumas
que você mesmo pode sugerir. Até os autores recomendam certo grau de
ceticismo: “É importante reconhecer que esses dados são de natureza
preliminar e correlativa, e, como tais, apenas sugestivos. Evidências mais
definitivas de efeitos antidepressivos do sêmen exigiriam mais manipulação
direta da presença de sêmen no aparelho reprodutivo e, idealmente, a
medida dos componentes seminais no sangue da pessoa recipiente.”
Bem, estou tergiversando aqui, mas uma coisa que de fato quero
mencionar, com o prestimoso consentimento dos autores desse estudo, é
que os efeitos antidepressivos do plasma seminal talvez não se limitem à
absorção vaginal de suas propriedades químicas animadoras do humor.
“Seria interessante investigar”, escrevem Gallup e seus colaboradores, “os
possíveis efeitos antidepressivos da ingestão oral de sêmen, ou sêmen
aplicado através do intercurso anal (ou ambos) em casais tanto
heterossexuais quanto de homens homossexuais.”
Assim, em minha sondagem da literatura empírica em busca de estudos
sobre sexo anal não protegido entre gays do sexo masculino, conhecido em
inglês como barebacking, deparei com grande quantidade de pesquisas
exatamente sobre esse tópico. Grande parte desse trabalho, de maneira
compreensível, está na literatura sobre a prevenção do HIV. Um estudo
particularmente revelador, porém, vem de um relato publicado em 2005 na
revista Nursing Inquiry, em que os investigadores canadenses Dave Holmes
e Dan Warner entrevistaram gays do sexo masculino que praticavam sexo
anal sem proteção – não enquanto estavam envolvidos no ato, mas através
de introspecção posterior – sobre suas motivações para preferir se abster do
uso de preservativos no sexo anal à luz dos óbvios perigos de infecção. O
resultado mais intrigante que emergiu desse estudo – no contexto da
perspectiva teórica global de Gallup e Burch com relação à psicobiologia do
sêmen – foi o número de sujeitos entrevistados que viam a troca de sêmen
através do sexo anal desprotegido como lhes proporcionando um
sentimento palpável de “ligação” com seus parceiros do mesmo sexo, um
sentimento que só acontecia com a ejaculação internamente desimpedida.
Infelizmente, em vez de investigar os possíveis efeitos psicobiológicos
da troca de sêmen nessa dinâmica, Holmes e Warner lançam mão de uma
lente pós-modernista bastante típica para explorar a natureza simbólica da
troca de sêmen entre gays que praticam sexo anal desprotegido. Agora eu
lhes pergunto qual é o paradigma mais informativo para compreender por
que homens gays praticariam intercurso anal desprotegido: uma explicação
biológica evolucionária que leve em consideração a composição química do
plasma seminal e seus possíveis efeitos sobre o afeto entre homens gays, ou
uma perspectiva simbólica, pós-modernista, como a que se segue, proposta
por Holmes e Warner (com toda imparcialidade, isto é só um trechinho, mas
dá uma prova de sua abordagem)?

O corpo se torna o local de lutas intermináveis, um campo de batalha


carnal. A rota de escape (linhas de fuga) é intrínseca à
desterritorialização do Corpo-sem-Órgãos através do qual a pessoa se
torna uma outra. No entanto, as linhas de fuga poderiam ter efeitos
paradoxais. De fato, elas podem ser avenidas de potencial criativo ou,
inversamente, caminhos de grande perigo. Contudo, é “sempre numa
linha de fuga que criamos” … “que devemos continuar a experimentar
com essas linhas”. Linhas de fuga (núcleos de resistência de
ressingularização e heterogênese) permitem que a liberdade aumente
repentinamente através de um processo de transformação criativa e
metamorfose.
Acredite, mesmo no contexto essa passagem dá a impressão de que os
autores estavam compondo uma sentença em braile usando a distribuição
aleatória da acne nas costas de alguém. Lamento se estou soando um
pouquinho irascível, mas embora essa retórica pós-modernista melosa ainda
possa ter lugar em certos círculos acadêmicos, quando se está tratando de
algo tão clinicamente importante quanto sexo desprotegido entre
populações vulneráveis, uma compreensão científica das motivações dessas
pessoas é essencial antes que qualquer intervenção em seus
comportamentos de alto risco possa sequer começar a ocorrer.
Talvez você esteja também começando a compreender os perigos a que
aludi no início deste ensaio. Tanto para homens quanto para mulheres,
heterossexuais e homossexuais, saber que o pênis é capaz de distribuir uma
espécie de Prozac natural – quer seja obtido por via vaginal, anal ou oral –
sem também considerar a corrida armamentista viral envolvendo doenças
sexualmente transmissíveis pode levar a decisões de fato muito trágicas e a
muitos “experimentos” privados, não documentados e de alto risco com
sêmen em quartos de dormir. Mas aqui está apenas uma razão para pôr
freios em planos desse tipo: o vírus do HIV, que se desenvolveu muito
depois desses fatores antidepressivos adaptativos, parece ter surgido para
piratear o sêmen humano, de tal modo que certos fatores de proteína
presentes no plasma seminal, em particular uma proteína chamada fosfatase
ácida prostática, tornam o HIV até 100 mil vezes mais potente do que é fora
do plasma.
De qualquer maneira, o modelo de Gallup e Burch também me fez
lembrar aquelas tribos tantas vezes citadas da Papua Nova Guiné, como os
sâmbias, e seus rituais de ingestão de sêmen envolvendo meninos.
Aparentemente, temos aqui uma situação intrigante: essas culturas têm
longo histórico de envolvimento em guerras violentas, e por isso tendem a
atribuir um valor extraordinariamente alto à masculinidade expressa. No
entanto, práticas homoeróticas ritualizadas envolvendo a felação de homens
mais velhos por garotos no intuito de ingerir seu sêmen são comuns. Num
número da Archives of Sexual Behavior, Gilbert Herdt, antropólogo social
que estudou os sâmbias, juntamente com Martha McClintock (cujo nome
batizou a sincronia do ciclo menstrual discutida anteriormente), descreve
como, "por volta dos 11-12 anos, os meninos [sâmbias] tornaram-se
agressivos praticantes da felação, que saem ativamente ao encalço de sêmen
para masculinizar seus corpos”.
No passado, antropólogos culturais como Herdt conceitualizaram esse
ritual do sêmen principalmente em termos simbólicos. Contudo, uma vez
que a testosterona do plasma seminal poderia penetrar a mucosa oral,
juntamente com uma quantidade excessiva de outros hormônios e
substâncias com possíveis efeitos secundários sobre o comportamento
masculino, não me parece inconcebível que a ingestão de sêmen por esses
jovens produza consequências psicobiológicas genuínas não inteiramente
em desacordo com as próprias crenças folclóricas dos sâmbias. Este pode
não ser um tema que você queira desenvolver ao lado do seu pastor local ou
trazer à baila na próxima reunião da Associação de Pais e Mestres, porém
você captou a ideia.
Mas voltemos à ingestão de sêmen de todos os dias. (Talvez não de
todos os dias, acho que você sabe o que estou querendo dizer.) Além de seu
modelo do sêmen como antidepressivo, Gallup e Burch desenvolveram
muitos outros argumentos intricados e persuasivos sobre como as várias
substâncias químicas no corpo humano exerceram – e continuam a exercer
– funções biologicamente adaptativas para ambos os sexos. Por exemplo,
entre os mais curiosos ingredientes do sêmen humano estão o hormônio
folículo-estimulante (HFE) e o hormônio luteinizante (HL). Isso é curioso,
salientam Gallup e Burch, porque estes são hormônios caracteristicamente
femininos. O que fazem hormônios femininos no sêmen humano? Os
autores conjecturam que a presença do HFE e do HL no sêmen humano está
relacionada com a ovulação oculta em fêmeas humanas.
Diferentemente de outras espécies primatas, as mulheres não têm
padrões de procriação governados por estações ou ciclos determinados, e
não há sinais óbvios – como um inchado traseiro vermelho-carro-de-
bombeiro – revelando em que momento de seu período estão. Assim, para
um ingênuo macho humano, engravidar uma mulher em consequência de
intercurso sexual é algo muito mais parecido com lançar um dado do que
para os machos de outras espécies em seus rituais de acasalamento. No
entanto, como para qualquer outra espécie, escolher o momento certo de
modo que a liberação de sêmen coincida com a liberação de óvulos é
decisivo. E, como uma contradefesa contra a ovulação oculta das mulheres,
a evolução masculina tinha uma carta na manga, que era a capacidade de
manipular o momento da ovulação de uma mulher segundo a conveniência
da própria tabela de inseminação; isto é, a química do sêmen dá a óvulos
prematuros uma gentil cotovelada. Daí a evidente presença de HFE (que faz
um óvulo amadurecer no ovário) e HL (que provoca a ovulação, com a
liberação desse óvulo).
Em apoio a esta afirmação teórica sobre a química do sêmen e a
ovulação oculta em fêmeas humanas, considere que o HFE está
inteiramente ausente do sêmen dos chimpanzés e a presença do HL é
bastante insignificante. E isso faz sentido, é claro, uma vez que os
chimpanzés são procriadores cíclicos e as fêmeas que estão ovulando
exibem seus próprios sinais estilo casa-da-luz-vermelha na forma de regiões
anogenitais inchadas e multicoloridas. “Parece portanto”, raciocinam
Gallup e Burch, “que a química do sêmen humano foi selecionada para
imitar as condições hormonais que controlam a ovulação, e como tal pode
explicar casos de ovulação induzida (ovulação provocada pela copulação
em momentos do ciclo menstrual nos quais, em outras circunstâncias, ela
seria improvável).”
Acredite ou não, apenas arranhei a superfície da literatura sobre as
características evolutivas do sêmen. Aqui está um instantâneo de outros
achados recentes do laboratório de Gallup – a maioria, lembre-se,
requerendo maior investigação antes que possamos extrair quaisquer
conclusões definitivas: mulheres expostas a sêmen têm melhor desempenho
em tarefas cognitivas e de concentração; corpos de mulheres são capazes de
detectar sêmen “estranho”, que difere do sêmen característico de seu
parceiro antigo ou recorrente (um sistema adquirido por evolução que,
segundo Gallup acredita, conduz com frequência a gestações malsucedidas
– por via do maior risco de pré-eclâmpsia –, porque indica um parceiro
masculino descompromissado, que provavelmente não proverá a
subsistência da prole); mulheres que faziam sexo desprotegido com seus
parceiros – e portanto eram regularmente inseminadas por eles –
experimentavam depressão mais intensa ao romper com esses homens do
que aquelas não tão regularmente expostas ao sêmen de um ex-parceiro
(além disso, encetavam um novo relacionamento mais rapidamente, na
busca de novos parceiros sexuais, o que presumivelmente as ajudaria a
sanar sua depressão por privação de sêmen). E a lista prossegue.
Antes que eu me despeça, senhoras, por favor aceitem, com toda
sinceridade, minhas mais humildes desculpas pelo que provavelmente é
uma torrente de observações descabidas, feitas por homens que estão
dizendo: “Não sou médico, mas meus testículos são fornecedores
farmacêuticos autorizados.” Sou apenas o alegre mensageiro.
PARTE II

Corpos generosos
O pelo lá de baixo: o que o pelo pubiano
humano tem em comum com o pelo dos
gorilas

COMO MUITA GENTE, indago-me a todo instante sobre alguns dos maiores
mistérios da vida. Por que estamos aqui? Qual é o sentido da vida? Por que
temos esses pelinhos estranhamente esparsos e crespos crescendo em volta
de nossos genitais – um pelo que é singularmente diferente de todos os
outros pelos e cabelos em nossos corpos? Felizmente, cientistas foram
capazes de me tranquilizar ao menos quanto a uma dessas inquietantes
questões existenciais. Nos últimos anos, ao que parece, pesquisadores
fizeram alguns avanços espetaculares no estudo do pelo pubiano.
Assim, vamos começar pelo que já sabemos sobre o pelo pubiano. É
uma marca da maturidade sexual, brotando em volta de nossas virilhas em
algum momento no início da adolescência. Se ele aparece no corpo de uma
pessoa algum tempo antes disso no desenvolvimento (digamos, antes dos
nove anos de idade), claramente há algo errado. Algumas coisas
simplesmente não andam juntas neste mundo – bebês e pelo pubiano são
sem sombra de dúvida duas delas.
Puberdade precoce não é motivo para risos, é claro, porque crianças que
começam a desenvolver características sexuais excepcionalmente cedo em
seu desenvolvimento podem de fato ter um grave problema de saúde
subjacente, como uma lesão do sistema nervoso central que ativa
prematuramente o hipotálamo. Mas para um jovem casal no Alabama a
expressão “puberdade precoce” mal faz justiça ao que observavam em seu
bebê alguns anos atrás. Imagine estar trocando a fralda de seu filho de seis
meses e notar o que parece ser um tufo de pelo pubiano de cor clara em sua
virilha. Durante os dez meses seguintes, esse pelo se tornaria pouco a pouco
mais escuro e parecido com o pelo adulto, o que – acompanhado por um
pênis estranhamente grande para um bebê de dezesseis meses e, ahã,
frequentes ereções – foi por fim suficiente para incitar esse casal a buscar
conselho médico.
Esse foi o pano de fundo do caso, tal como apresentado a um grupo de
médicos que finalmente o relataram em Clinical Pediatrics. Ao examinar a
criança, Samar Bhowmick e colegas notaram, para seu espanto, que “o pelo
pubiano era [o de um adolescente], mais concentrado na base do falo,
escuro e crespo”. Uma inspeção mais completa revelou um bebê saudável e
vigoroso – completamente de acordo com a idade em todos os outros
aspectos –, mas os resultados de laboratório indicaram um nível de
testosterona anormalmente elevado. Por fim, os médicos decifraram o caso.
Revelou-se que o pai do menino vinha espalhando um gel de testosterona
duas vezes por dia sobre os ombros, costas e peito, num tratamento
prescrito por seu médico para uma libido baixa ocasionada por depressão.
Como o garotinho dormia na mesma cama que os pais, com o pai
acarinhando-o e abraçando-o logo após aplicar o gel, o contato entre as
peles nuas estava levando a criança a se tornar um homem muito mais cedo
do que a natureza pretendia. (Uma consulta posterior de acompanhamento
revelou, felizmente, que o pelo pubiano havia quase desaparecido depois
que o pai fora informado desse efeito de seu uso do gel, e os médicos
acreditavam que a criança não teria nenhuma complicação de longo prazo
decorrente da exposição à testosterona.)
Este caso peculiar do bebê com pelo pubiano é tão impressionante,
claro, porque esse tipo característico de pelagem na virilha tende a coincidir
com a maturação sexual, não com o estágio do desenvolvimento em que
você mal acaba de aprender a andar. O caso também realça a esquisitice do
pelo pubiano humano de maneira mais geral. Afinal, parece que somos a
única espécie de primata (talvez a única espécie, tout court) que exibe esse
estranho tipo de pelo em torno dos genitais. Robin Weiss, pesquisador na
Divisão de Infecção e Imunologia no University College London, viu-se
debaixo do chuveiro um dia, olhando para baixo e fazendo-se exatamente
essa pergunta:
Embora macacos nus [seres humanos] tenham pelos pubianos, nossos
primos peludos não os têm, não é? Como eu poderia testar minha
hipótese? Eu sabia que havia um chimpanzé empalhado no Grant
Zoological Museum no University College London e fiz-lhe uma visita
a caminho do meu laboratório. Infelizmente ele era um jovenzinho, o
que deixou minha questão em aberto. Uma enérgica caminhada através
do Regent’s Park para inspecionar os gorilas adultos em seu esplêndido
novo pavilhão no Jardim Zoológico de Londres reforçou minha
suspeita, que pude confirmar mais tarde com uma visita aos chimpanzés
no Whipsnade Zoo, no norte de Londres. De fato, todas as espécies de
símios, macacos do Velho Mundo e macacos do Novo Mundo, parecem
ser menos peludas na região pubiana que no resto do corpo; o pelo está
presente, mas é curto e fino.

Weiss especula que uma das principais razões para que o homem tenha
sido o único a desenvolver um “denso matagal de cabelo crespo” em torno
de suas regiões genitais seja indicar visualmente a maturação sexual.
(Provavelmente ele também serve para capturar odor e ajuda no transporte
de feromônios humanos.) Assim, o pelo pubiano age como um anúncio
peludo, indicando para possíveis parceiros sexuais que o acasalamento com
esse indivíduo poderia ser, potencialmente, um exercício frutífero de
perpetuidade genética. Weiss acredita que exibir nossa fecundidade dessa
maneira sugere que o pelo pubiano só deve ter aparecido depois que nos
tornamos “macacos nus”, para destacar-se vividamente contra o pano de
fundo de um corpo desprovido de pelos em outras partes.
Igualmente fascinantes no pelo pubiano são sua textura e composição
incomuns se o comparamos ao resto do pelo e ao cabelo em nossos corpos e
cabeça. Não chega a ser possível usá-lo como fio dental (acredite em mim),
mas o pelo pubiano é consideravelmente mais grosso que o pelo das axilas e
o que cresce em nossas pernas, peitos (para alguns, costas) e o cabelo de
nossas cabeças. Provavelmente não sou o único que estremece ao pensar
numa via alternativa de seleção natural, em que o cabelo de nossas cabeças
tivesse se desenvolvido para ter proporções pubianas – considere apenas
qual seria o aspecto do piso de uma barbearia comum no fim do dia. Não
está de todo claro por que o pelo pubiano é tão grosso, curto e, em geral,
crespo, mas a bióloga Anne Clark da Suny (State University of New York)
de Binghamton de fato me mostrou (enquanto caminhávamos pela ilha
Kapiti na Nova Zelândia) que qualquer outra coisa teria sido bastante pouco
prática. Ter cachos longos, fluidos e atraentes crescendo lá embaixo não
seria lá muito conveniente, em especial dada a logística do intercurso
sexual.
Mas, como Weiss salienta, embora o pelo pubiano tenha suas vantagens
como sinalização, ele também teve um preço. E o nome desse preço é
Phthirus pubis – mais comumente conhecido como chato. O chato tem uma
história evolucionária extraordinária, que Weiss relata num número do
Journal of Biology. Se alguma vez você se maravilhou com a semelhança
entre o pelo pubiano humano e a textura áspera do pelo do gorila (e vamos
encarar: quem não o fez?), já está na pista certa.

Com base na morfologia, o Phthirus pubis humano está estreitamente


relacionado ao piolho de gorila, Phthirus gorillae … A filogenia
molecular indica que os piolhos pubianos humanos divergiram dos
piolhos de gorila há apenas 3,3 milhões de anos, ao passo que a
linhagem hospedeira humano-chimpanzé separou-se da linhagem dos
gorilas há pelo menos 7 milhões de anos. Parece claro, portanto, que os
seres humanos adquiriram piolhos pubianos de maneira horizontal,
possivelmente na época da divisão da espécie Phthirus e, ao que tudo
indica, direto dos gorilas. Já estando adaptados ao áspero pelo corporal
do gorila, os chatos teriam encontrado um nicho conveniente no pelo
pubiano humano.

Certo. Adquirimos chatos dos gorilas. Mas pare de pensar indecências.


Weiss especula que nossos ancestrais adquiriram esses esfaimados parasitas
não através de sexo interespecífico, mas em consequência do hábito de
seres humanos antigos de abater e comer gorilas. Esse estreito contato com
carcaças de gorila teria permitido ao piolho de gorila (Phthirus gorillae)
saltar de um hospedeiro para outro e mutar em conformidade com a
evolução final do pelo pubiano humano – que lhe deve ter parecido um
ambiente aconchegante e familiar – para se tornar a espécie Phthirus pubis
que hoje conhecemos e detestamos (mais ou menos como práticas de abater
chimpanzés permitiram que retrovírus provenientes deles invadissem seres
humanos mais recentemente).
Seja como for que tenham chegado lá, os chatos infelizmente tornaram-
se parte integrante do púbis de nossa espécie. Contudo, de maneira
intrigante inovações comportamentais recentes na evolução cultural de
nossa espécie – em particular hábitos modernos de limpeza e a estilização
estética de nossas regiões de pelo pubiano – começaram a nos libertar do
domínio dessas criaturas irritantes. Algumas clínicas de saúde notaram uma
queda significativa na ocorrência de piolhos pubianos, em especial entre
pacientes que raspam todo o seu pelo pubiano ou parte dele. (E mesmo que
somente seus parceiros sexuais raspem suas virilhas, os próprios pacientes
correriam um risco de adquirir piolhos substancialmente menor do que
aqueles que se acasalam com parceiros cujos genitais estão escondidos no
tipo de mato cerrado em que os chatos se deliciam.) Esse não é um
fenômeno inteiramente novo. Nos tempos medievais, as prostitutas
frequentemente usavam perucas pubianas (chamadas “merkins”) após
raspar suas genitálias para ajudar a controlar seus piolhos pubianos.
Mas antes que você marque sua próxima depilação completa, considere
que o pelo pubiano parece na verdade oferecer algum grau de proteção
contra infecções virais e bacterianas ainda mais asquerosas. Embora o
diagnóstico de piolho pubiano pareça ter despencado como um resultado
direto da vaidade humana em ambos os sexos, casos de gonorreia e
clamídia aumentaram no mesmo período, correlação que talvez não seja
puramente casual. Raspando ou não, você se dana.
Apesar disso, a “norma depilada” está ganhando muita força, em
particular em países ocidentais. Vários estudos recentes revelam como
raspar as próprias regiões inferiores tornou-se de fato comum. Num número
da Sex Roles, as psicólogas Marika Tiggemann e Suzanna Hodgson, da
Universidade Flinders, na Austrália, revelam que 76% de uma amostra de
235 mulheres alunas de graduação da Austrália relataram ter removido seu
pelo pubiano em algum momento da vida. Em 61%, ele estava raspado
naquele momento, e metade da amostra disse que removia rotineiramente
todos os seus vestígios. A tendência atual para homens não parece ser
diferente. Num outro estudo feito no mesmo ano com as colegas Yolanda
Martins e Libby Churchett, Tiggemann relatou na revista Body Image que
de 106 homens gays, 82% haviam removido seu pelo pubiano ao menos
uma vez. E para que você não pense que isso é um artefato da cultura gay
masculina, homens heterossexuais não ficaram muito atrás nessa medida.
De uma amostra de 228 homens heterossexuais, 66% relataram fazer o
mesmo. Independentemente da orientação sexual ou do gênero, os
investigadores descobriram que a principal motivação para a depilação do
pelo pubiano está relacionada a preocupações com a própria aparência (em
contraste com motivações relacionadas à saúde).
Convém também não esquecer que muitos indivíduos repelem a ideia de
cunilíngua ou felação por causa daqueles irritantes pelos pubianos que
podem se alojar inadvertidamente em suas gratificantes gargantas. De fato,
esse foi o tema de um episódio da série cômica de televisão Segura a onda,
em que Larry David tinha de explicar constrangedoramente seu importuno
comichão para um médico seriíssimo. Mas agora este texto está se
transformando numa história completamente diferente.
Seja como for, o penteado do pelo pubiano não é um jogo de zero a
zero. Ao digitar “estilos de pelo pubiano” no Google, no momento em que
escrevo, obtive 467 mil ocorrências, em nenhuma das quais me atrevi a
clicar – até chegar em casa, de volta da biblioteca pública, é claro.
A história natural do canibalismo

QUANDO EU PERAMBULAVA, não muito tempo atrás, por uma das mal
iluminadas salas dos fundos de uma ala das National Galleries da Escócia,
meus olhos interiores ainda ardendo com milhares de pós-imagens
impressionistas – rechonchudos querubins rubenescos e quadrângulos
góticos –, uma pintura irreverente saltou-me aos olhos de uma maneira
muito contemporânea. Ela era parte de um tríptico do início do século XVI
mostrando o que parecia ser um sacerdote solene, de meia-idade, em vestes
eclesiásticas douradas, dando ordens a três meninos adolescentes nus diante
dele numa banheira.
Bem, devo confessar que meu primeiro pensamento ao ver essa imagem
lasciva foi que a Igreja católica vem sendo um refúgio para efebófilos há
muito mais tempo do que qualquer pessoa jamais se deu conta. Mas meu
constrangimento foi abrandado quando me inclinei para ler a legenda, que
declarava que o pintor holandês Gerard David, prolífico iconógrafo
religioso que vivia em Bruges, na Bélgica, estava apenas pintando uma cena
de canibalismo por fome. Ufa! Que alívio – então era apenas um inocente
caso de antropofagia (a ingestão de carne humana por seres humanos) e
nada mais sinistro que isso. Os meninos haviam sido abatidos por um
açougueiro, é claro, e suas carcaças estavam salgando num tonel
improvisado, à espera de ser ingeridas pela gente esfaimada da cidade.
Felizmente, calhou que ninguém menos que aquele notório amante das
crianças, são Nicolau – o clérigo de meia-idade –, estava passando por ali,
descobriu o escândalo dos meninos servindo de repasto e ressuscitou-os na
banheira.
De qualquer maneira, o tempo que passei em Edimburgo deu-me muito
o que pensar sobre o assunto da carne humana. Da galeria de arte, meu
companheiro, Juan, e eu rumamos para o Surgeon’s Hall Museum, onde
vagamos por alas abarrotadas do piso ao teto com conservas de pés
gangrenados, braços peludos amputados de mulheres idosas da era
industrial, cabeças trepanadas e diversos genitais enfermiços. Estava
também em exibição uma elegante caderneta de couro, composta de uma
substância semelhante a couro de vaca, mas na verdade feita com a pele do
famoso assassino e fornecedor de cadáveres William Burke.
E tudo isso me levou a pensar sobre a logística do canibalismo. A hábil
comercialização da indústria alimentícia mudou as coisas enormemente,
mas houve, no passado, condições relativamente frequentes – safras
perdidas, escassez de moradias, fome – em que o canibalismo teria tido uma
utilidade adaptativa vital para nossa espécie. Um par de antropólogos, por
exemplo, realmente fez os cálculos, concluindo que um adulto humano
médio fornece trinta quilos de carne comestível, incluindo gordura, tecido
conectivo, músculo, órgãos, sangue e pele. Coágulos de sangue ricos em
proteína e medula são considerados (pelos raros connaisseurs) iguarias
especiais. Pelo menos um eminente teórico evolucionário, Lewis
Petrinovich, afirmou que o canibalismo é uma genuína adaptação biológica
comum a todos os seres humanos – inclusive aqueles de vocês que estão
agarrando o assento da privada enquanto leem isto.
A antropofagia emerge rotineiramente, diz Petrinovich, sob previsíveis
condições de fome, e pelo menos durante o início de nossa evolução o
canibalismo humano não era tão raro quanto você poderia pensar. Hoje o
termo “canibalismo” evoca histórias sensacionalistas de desastres de avião
em remotas regiões montanhosas nos Andes, serial killers ou expedições
fracassadas ao Ártico no século XIX. Mas nossa história mais longínqua
sugere que ele não deve ter sido uma ocorrência de todo incomum. “O
importante é que o canibalismo está no repertório comportamental
humano”, escreve Petrinovich em The Cannibal Within, “e provavelmente é
exibido por várias razões – uma delas, comum, a privação nutricional
crônica e severa. Um comportamento poderia ser exibido apenas em
circunstâncias extremas e ainda assim fazer parte de nossa herança
biológica, e o fato de seu curso seguir um padrão sistemático refuta a
hipótese de que ele é de caráter psicótico.”
Petrinovich abre caminho através de uma história humana apinhada dos
ossos roídos de nossos ancestrais canibalizados, revelando – em oposição a
críticos que afirmam que a ingestão de carne humana é um mito fabricado
por ocidentais para demonizar os “primitivos” – que nós estivemos
realmente nos devorando uns aos outros durante um tempo muito, muito
longo. Nós somos apenas uma das 1.300 espécies em que a predação
intraespecífica foi observada. Entre primatas, o canibalismo pode em geral
ser explicado por estresse nutricional e ambiental, ou aparece como uma
estratégia reprodutiva em que babuínos, por exemplo, consomem bebês
doentios para abrir caminho para crias mais viáveis.
Apontar com precisão os fatores específicos que causam o canibalismo
é uma tarefa bastante difícil no laboratório, principalmente por causa
daqueles irritantes conselhos de ética universitários. Apesar disso, um
intrépido pesquisador japonês ignorou essas considerações e induziu
canibalismo entre uma população cativa de macacos-esquilo, fornecendo a
fêmeas grávidas uma dieta de baixa proteína. Isso levou a uma taxa elevada
de abortos espontâneos, tendo os fetos sido devorados pelas mães – uma
dose de proteína muito necessária. Agora imagine fazer esse mesmo estudo
com seres humanos sob condições controladas de laboratório similares.
Bastante assustador, eu diria, mas isso não significa que os achados não
poderiam ser generalizados para nossa própria espécie. E não me leve a
falar sobre as várias maneiras como mamães mamíferas se banqueteiam
com as placentas e membranas fetais expelidas do útero após o parto.
Algumas das nossas preferem-nas com uma pitada de páprica, outras na
forma de um prato de espaguete com almôndegas.
Mas o fato de o canibalismo em primatas, inclusive seres humanos, ser
motivado pela fome é precisamente o argumento que Petrinovich está
defendendo. Onde ele difere de outros teóricos evolucionários, porém, é em
sua afirmação de que a antropofagia representa uma verdadeira adaptação
em nossa espécie, assim como o canibalismo para outros animais. Ela não é
simplesmente um comportamento anômalo encontrado num punhado de
indivíduos depravados. Essas pessoas existem, sem dúvida – como aquele
homem que estava tão curioso para saber que gosto tinha sua própria carne
que… bem, vou deixar que o psiquiatra clínico que o examinou lhe conte
com suas próprias palavras:

Depois de cortar o primeiro dedo do pé, ele se apressou em mostrá-lo


para seus companheiros de apartamento, antes de comê-lo cru enquanto
andava pela rua. Mastigou o osso tanto quanto possível e em seguida o
cuspiu fora. Lembra-se de ter comido o dedo “pela experiência” e que
foi “uma oportunidade de comer carne humana como não se tem duas
vezes na vida”. Estava alvoroçado com o valor de choque desse
comportamento. Antes de comer o segundo dedo do pé, assou-o num
forno. Entre cortar um dedo do pé e outro, continuou trabalhando na
reforma de casas.

Hoje esse homem está presumivelmente usando sapatos ortopédicos.


Mais uma vez, porém, embora o canibalismo possa por certo ser desviante,
em outros casos é até um tanto rotineiro. Nossos primos próximos, os
neandertais, eram essencialmente predadores carnívoros e foram impelidos
para o canibalismo no final do último glacial máximo em face dos números
minguantes de grandes animais de caça. Pesquisa osteoarqueológica numa
caverna no sul da França encontrou um feixe de ossos neandertais assados
de cerca de seis indivíduos, ossos descartados ao acaso que haviam sido
deliberadamente descarnados e desarticulados e cuja medula fora extraída.
Quanto à nossa própria espécie, os astecas eram notórios por seus
sacrifícios sangrentos e rituais de canibalismo. Esses eram sobretudo
eventos religiosos simbólicos, mas alguns estudiosos sugeriram que as
sobras de gordura das vítimas dos sacrifícios astecas podem também ter
sido um suplemento nutricional de alto valor energético para a elite
opulenta, que tinha prioridade no recebimento desse chamado “milho
humano”. Na verdade, os que não praticavam o canibalismo talvez fossem
os atípicos, tanto histórica quanto transculturalmente falando. Pesquisadores
documentaram evidências de antropofagia ritual nas mais diversas
sociedades na África (entre os azandes, em Serra Leoa, no Congo belga), na
América do Sul (leste do Brasil, Equador, oeste da Colômbia, Paraguai), na
Oceania (Fiji, Papua Nova Guiné, Vanuatu, região montanhosa do leste de
Nova Guiné) e entre os nativos da América do Norte. Apareceu em
sociedades industrializadas, também, inclusive na China acometida pela
fome durante o Grande Salto Adiante (1958-62) e na Rússia na era
soviética.
O ponto-chave, diz Petrinovich, é que quando você está realmente
faminto, e quando todas as outras fontes de alimento – inclusive coisas
“incomíveis” que você preferiria não engolir, como sapatos, cordões de
sapatos, animais domésticos, volantes, alforjes de couro cru ou miolos de
asno congelados – foram esgotadas e as expectativas são suficientemente
baixas, até o moralista mais recalcitrante entre nós deixaria de lado o tabu
do canibalismo e saborearia a carne doce de um homem… ou de uma
mulher, menino ou menina. É isso ou morrer, e entre as duas opções apenas
uma é biologicamente adaptativa.
Um comportamento pode ser adaptativo sem ser uma adaptação
biológica herdada, é claro. Mas considerando a regularidade com que a
fome ocorreu em nosso passado ancestral, considerando que a mente
faminta relaxa previsivelmente suas proscrições canibalísticas,
considerando que comer outras pessoas restaura energia e sustenta vidas, e
considerando que o comportamento é universal e procede de maneira
algorítmica (comemos primeiro estranhos mortos, depois parentes mortos,
depois escravos vivos, depois estrangeiros vivos, e assim por diante,
descendo a escada rumo aos amigos e parentes), há razão para acreditar –
ao menos aos olhos de Petrinovich – que a antropofagia é um
comportamento resultante da evolução. O tabu contra o canibalismo é útil
em tempos de saúde e prosperidade; grupos não sobreviveriam por muito
tempo se os membros estivessem comendo uns aos outros. No entanto, a
fome tem uma maneira de liberar o canibal dentro de nós.
De fato, alguns cientistas sugeriram que o canibalismo provocado pela
fome pode ter sido tão prevalente no passado ancestral que literalmente
mudou nosso DNA. As populações humanas modernas parecem conter
adaptações genéticas destinadas especificamente a combater vírus
canibalísticos. Tipicamente, quando uma espécie predadora consome uma
espécie-presa, produzem-se diferenças substantivas nos sistemas imunes
entre as duas, com diferentes variedades de patógenos. Mas quanto mais
similares forem o comedor e o comido, mais vulnerável fica o primeiro a
doenças debilitantes transmitidas por alimentos. Isto ocorre porque os
organismos só podem ser comprometidos por parasitas que se adaptaram ao
ambiente particular da espécie hospedeira; eles requerem um substrato
genético reconhecível para florescer.
Segundo o microbiólogo Carleton Gajdusek, ganhador do Prêmio Nobel
de Fisiologia ou Medicina em 1976 por sua pesquisa epidemiológica sobre
o canibalismo, foi isso, quase certamente, o que aconteceu com o povo fore
da Nova Guiné no caso do kuru, uma doença neurodegenerativa que
devastou essa população na primeira metade do século passado. Gajdusek
atribuiu a origem da doença ao canibalismo mortuário; mulheres e crianças
estavam comendo os cérebros dos que haviam acabado de morrer como
parte dos ritos funerários locais. (O consumo de cérebros era um ato ritual,
mas sua frequência aumentava subitamente – talvez não por coincidência –
sempre que a carne de porco escasseava, de modo que cérebros humanos
também forneciam uma dose de proteína.) O interessante é que o kuru é
uma variante da doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) e é provável que tenha
resultado, originalmente, de um único caso de canibalismo entre os fores de
um indivíduo com cérebro afetado por DCJ, tendo depois o kuru evoluído
em seu próprio curso. Em um número da Current Biology, o geneticista
John Brookfield especulou que ao longo dos últimos 500 mil anos, os seres
humanos desenvolveram uma crescente variação no gene para a proteína
príon humana. Os que eram heterozigotos para esse gene, salienta ele,
estavam protegidos contra a DCJ através do canibalismo. “Essa vantagem
heterozigótica sustentada [foi possivelmente] criada por um estilo de vida
de canibalismo habitual, sugerindo uma nova visão dos estilos de vida de
nossos ancestrais.”
Como vimos, nem todos os casos de canibalismo se devem a
necessidades nutricionais. Indivíduos sociopáticos, como Jeffrey Dahmer,
Armin Meiwes e Issei Sagawa, viviam em ambientes urbanos salpicados
com restaurantes fast-food e supermercados abarrotados, e ainda assim
comiam gente no jantar. No livro SuperSense, o psicólogo Bruce Hood
sustenta que esses casos refletem crenças essencialistas, a ideia de que as
“essências” ocultas ou atributos de personalidade das vítimas são adquiridos
por ingestão física. É também interessante que muitos desses casos tenham
um componente sexual. Como Margaret St. Clair escreveu
provocadoramente no prefácio a To Serve Man: A Cookbook for People:
“Não há nenhuma forma de conhecimento carnal tão completa quanto saber
o gosto que uma pessoa tem.” Suspeito que haja alguma verdade nessa
piada indigesta. Crenças essencialistas também podem explicar a peculiar
história de canibalismo médico de nossa espécie. Sabe-se que os
conquistadores e seus herdeiros no Novo Mundo usavam gordura humana
de nativos ágeis para lubrificar suas juntas artríticas. Muito tempo antes que
Armin Meiwes sonhasse em nascer, mulheres grávidas do povo aché do
Paraguai mordiscavam pênis cozidos na esperança de que isso lhes
trouxesse filhos.
Assim, com todas essas cenas girando na minha cabeça, e pragmatista
como sou, vi-me perguntando a mim mesmo por que, exatamente, o
consumo de corpos humanos já mortos é tamanho tabu, em especial para
sociedades em que se considera em geral que a alma levanta voo
rapidamente no momento da morte como um balão de hélio invisível.
Afinal, se você aceita essas noções dualísticas, o corpo é apenas uma casca
vazia, de que o espírito agora liberado não mais precisa. Mesmo os
ressurreicionistas poderiam alegremente alimentar os pobres com sua carne,
a fim de não permitir, Deus nos livre, que tamanha prodigalidade de carne
comestível seja destinada a apodrecer. Todas essas mercadorias
desperdiçadas, queimadas até se reduzirem a pó seco e empedrado em
crematórios, guardadas por trás de câmaras mortuárias ornamentadas,
extravagantemente fornecidas como alimento a organismos subterrâneos
intumescidos! Caso você prefira não comer carne de pessoas mortas idosas
ou possivelmente doentes, e se preocupe com a dignidade do indivíduo,
seria bastante fácil reproduzir e depois criar industrialmente em laboratório
seres humanos com morte cerebral ou anencéfalos, tratando-os
humanamente, é claro, mas aplicando padrões de segurança alimentar para
controlar quaisquer surtos.
Afinal, não nos esqueçamos das pessoas famintas deste mundo,
cercadas – como juram alguns epicuristas – pela carne mais suculenta do
planeta.
A afecção da pele humana: a acne e o macaco
nu

O SERES HUMANOS SÃO ESPINHENTOS. Isso é parte do que nos distingue do


resto do reino animal. Embora seja verdade que um tipo de Acne vulgaris
afeta outras espécies – ele foi encontrado em alguns cachorros mexicanos
sem pelo e induzido experimentalmente em camundongos rhino –, a acne é
em boa medida uma aflição exclusiva de nossa amaldiçoada espécie. (Algo
entre 85 e 100% dos adolescentes exibem acne; e uma minoria significativa
de adultos também.) Por que o animal humano é tão peculiar em sua
tendência a formar cravos vulcânicos, pápulas, abscessos nodulares e, em
alguns casos severos, cicatrizes duradouras? Segundo os teóricos
evolucionários Stephen Kellett e Paul Gilbert, provavelmente devemos
essas detestáveis marcas ao fato de termos perdido nosso couro simiesco
depressa demais.
Embora a pele cada vez mais glabra (sem pelo) tenha evoluído
provavelmente para fins adaptativos – talvez ela tenha permitido a nossos
ancestrais manterem-se frescos, por exemplo, ao viajar através da savana
quente –, o passo firme em que os genes para carne depilada foram
selecionados gerou alguns problemas cosméticos. Kellet e Gilbert observam
que a evolução das nossas glândulas sebáceas, que estavam acostumadas a
lidar com carne coberta por pelo, não acompanhou a mudança na nossa
aparência. Em consequência, todo aquele sebo oleoso, normalmente
destinado a lubrificar o pelo, não teve muito a lubrificar. E, em vez disso,
começou a se acumular e entupir nossos poros. (Uma pessoa que sofra de
hipertricose – também conhecida como síndrome do lobisomem – tem que
se preocupar com muitos problemas, mas a acne tende a não ser um deles.)
De qualquer maneira, melhor esta explicação evolucionária que espinhas
cutâneas por desígnio inteligente. Realmente, só um deus muito impiedoso
daria corda no relógio para que nossas glândulas sebáceas pudessem
exagerar na produção de sebo justo no momento do desenvolvimento
humano em que nos tornaríamos mais conscientes de nossa aparência.
O fato de que a evolução nos deu um outro traço obviamente humano,
que torna qualquer erupção de acne muito mais perturbadora, só piora as
coisas. Refiro-me à nossa paralisante sensibilidade a outras mentes. Embora
esta afirmação possa gerar alguma controvérsia, parece provável, com base
nas evidências disponíveis, que outras espécies não compartilhem nossa
facilidade para adotar a perspectiva psicológica de outros. Se for assim, ver
a cara de nojo, ou mesmo uma curiosidade mais inocente, refletida em
outros olhos humanos quando eles evitam contemplar nossos defeitos
provoca em nós um estado de aversão inteiramente original à nossa espécie.
Qualquer pessoa que um dia tenha tido uma espinha madura, repugnante,
estrategicamente situada na ponta do nariz pelas Parcas epidérmicas já
sentiu esse penoso estado interpessoal.
Considere uma cena de Entre quatro paredes de Sartre, em que três
desconhecidos se dão conta de que acabam de ser lançados no inferno, que,
muito estranhamente, é uma sala mobiliada comum. O insidioso embaraço
criado pelo Demônio, porém, é que na sala não há janelas, não há espelho e
não é permitido dormir. Até as pálpebras dos personagens estão paralisadas,
vedando-lhes o simples luxo de piscar. A requintada torturazinha a que
estão submetidos é ficar por toda a eternidade sob o olhar implacável um do
outro. Inês, uma lésbica sádica, sabe exatamente como pôr o dedo na ferida
da outra mulher na sala. “Que é isso?”, ela pergunta, examinando o rosto de
Estelle. “Esse asqueroso ponto vermelho na parte inferior da sua bochecha.
Uma espinha?” “Uma espinha?”, responde Estelle, a frenética e mimada
debutante privada de espelho. “Oh, que horror!”
De fato, a alegoria ctônica de Sartre tem uma notável semelhança com o
tipo de inferno que muitos sofredores de acne dizem experimentar todos os
dias. Para um relato publicado no British Journal of Health Psychology, por
exemplo, os psicólogos Craig Murray e Katherine Rhodes entrevistaram
cerca de uma dúzia de membros de um grupo de apoio on-line para a acne,
os quais haviam sido submetidos a tratamentos com antibióticos ou
hormônios para sua afecção e sofriam de acne há pelo menos um ano.
“Michelle” descreve com eloquência como é ter um primeiro encontro face
a face com uma pessoa:

Posso sentir o constrangimento me consumir pouco a pouco enquanto a


conversa prossegue. Por fim, não consigo nem manter o fio do meu
pensamento e fico muda. Explico. Fico esmagada pelo que os outros
podem estar pensando – em geral não suponho o que eles poderiam
estar pensando com nenhuma especificidade. Seria um esforço penoso
demais. Mas atribuo uma voz generalizada a eles. Reconheço para mim
mesma que eles viram a acne e muito provavelmente me depreciam em
razão da sua presença.

Uma outra mulher, “Laura”, observa:

Quando estou falando com pessoas, sempre olho direto em seus olhos
para vigiar se suas pupilas vagam para outros lugares de meu rosto onde
tenho uma espinha. E em geral isso acontece.

Obviamente, a ansiedade provocada pela acne não é apenas um


problema feminino. Talvez seja pior ainda para alguns homens. Um deles,
“Karl”, explica por quê:

A sociedade não permite [aos homens] usar maquiagem, por isso temos
de sair no mundo embaraçados. E se dizemos às pessoas que estamos
nos sentindo deprimidos ou preocupados com nossa aparência, somos
encarados como fracos e patéticos, em especial por outros homens.

Por falar em pensar sobre os pensamentos dos outros, sei o que você
está pensando: os que são capazes de julgar um livro pela capa ou de
rejeitar um pobre companheiro espinhento dessa maneira deveriam ser eles
próprios desprezados em público. Concordo integralmente. Mas apesar de
nossa simpatia – talvez empatia – pelos que sofrem essas doenças de pele
visíveis, até o mais bondoso de nós parece associar os que sofrem de acne
com características indesejáveis. Pelo menos esses foram os resultados
relatados pela psicóloga Tracey Grandfield e colegas no Journal of Health
Psychology. Empregando uma variação do Teste de Associação Implícita –
uma medida empírica usada para chegar às atitudes e crenças inconscientes
das pessoas –, os autores descobriram que, em contraste com o modo como
classificamos pessoas de pele boa, apressamo-nos a associar coisas
desagradáveis (como “brutal”, “mau”, “feio”, “zangado”, “agressivo”,
“vômito” e “vil”) com pessoas que sofrem de acne. Esses autores concluem
que essa reação injusta, inconsciente e visceral aos que sofrem de acne
grave trai nossas origens evolucionárias. Pesquisas indicam que alterações
significativas da superfície da pele – exibindo sangue, pus ou descamação –
provocam mais nojo e temores de contaminação entre observadores que
alterações “mais limpas”, como vitiligo ou hemangiomas.
Para muitas pessoas, em especial aquelas com elevada sensibilidade
social, a acne não é apenas um inconveniente; na verdade, ela pode se
infiltrar de maneira ruinosa no cerne do conceito que o indivíduo tem de si
mesmo e levar a graves problemas de saúde mental, gerando um sofrimento
que rivaliza até com aquele associado à desfiguração facial resultante de
queimaduras ou acidentes. Um terço dos adolescentes da Nova Zelândia
que se dizem “sofredores de acne” tinha ideias de suicídio, um quarto exibia
níveis clinicamente significativos de depressão e um décimo tinha elevados
níveis de ansiedade. Já em 1948, os clínicos Marion Sulzberger e Sadie
Zaidens concluíram: “É nossa opinião, após cuidadosa reflexão, que não há
uma única doença que cause maior trauma psíquico, mais desajustamentos
entre pais e filhos, maior insegurança geral e sentimentos de inferioridade e
maiores somas de sofrimento psíquico que a Acne vulgaris.”
Isso foi mais de sessenta anos atrás, e é claro que a indústria do
tratamento da acne cresceu enormemente desde então. (Assim como o
subcampo psiquiátrico da psicodermatologia.) Embora nem sempre sem
seus próprios efeitos colaterais desagradáveis, há um jardim farmacêutico
sempre florescente de unguentos, cremes e pílulas com que os sofredores de
acne dos velhos tempos purulentos poderiam apenas sonhar. Apesar disso,
nem todos esses tratamentos estão igualmente disponíveis a todos os que
têm acne; há consideráveis diferenças individuais na resposta aos
medicamentos, e uma “cura” infalível continua elusiva. De fato, suspeito
que, em contraste com gerações anteriores, os que experimentam acne de
moderada a severa atualmente se veem ainda mais deprimidos. Assim como
pessoas acima do peso que experimentaram todas as dietas sem sucesso
muitas vezes relatam sentir-se impotentes em relação à sua afecção, alguém
que tenha tentado se livrar da acne sem sucesso com uma ampla variedade
de opções de tratamento pode se sentir ainda mais envergonhado que nunca.
Não é um grande consolo para essas pobres almas que a condição, como
a maioria dos outros traços humanos, seja determinada por uma combinação
de genes e ambiente. Como, exatamente, nosso DNA interage com dieta,
hábitos de lavagem do rosto, exposição ao sol ou qualquer outro fator
permanece pouco compreendido. Apesar disso, assim como alguns
membros daquela deplorável raça, os cachorros mexicanos sem pelo, alguns
de nós, macacos nus, somos mais propensos à acne que outros. No fim das
contas, a acne parece ter menos a ver com nosso modo de viver do que com
a família em que nascemos. Curiosamente, e por razões que ainda não são
claras, certas populações humanas, como os ilhéus kitavan da Papua Nova
Guiné e os achés do Paraguai, são poupadas da praga dos cravos. Embora
suas dietas e estilos de vida sejam muito diferentes dos nossos, seus genes
também são.
Sim, menos é mais no presente caso. Mas poucos de nós têm a sorte de
ter a pelagem sedosa de um wookie ou de ter nascido um ilhéu kitavan, e os
que passam toda uma existência livres de espinhas são extremamente raros.
A melhor coisa que pode acontecer é que sua pele não seja muito
workaholic quando se trata da produção de sebo, e assim, como todas as
outras pessoas, você obterá apenas uma trégua ocasional aqui e ali.
Idealmente, em termos de sua saúde psicológica, as espinhas ficarão
escondidas em algum lugar por aí, em vez de aparecer bem ali naquela
marquise lampejante que é o seu rosto, desprotegido dos elementos.
Quer sua acne tenha desaparecido na adolescência ou continue com
você nos seus quarenta, um dia, eu lhe prometo, suas glândulas sebáceas
secarão como um leito de rio antigo. Embora fosse facilmente possível se
perder nas gloriosas rugas de minha avó, por exemplo, não me lembro de
um único cravo no seu rosto quando aquela sua casca não etérea foi
reidratada tranquilamente com formaldeído. Por isso lembrem-se, todos
vocês com couros avermelhados escondidos, aqueles em penoso,
exsudativo descontentamento, a acne é uma calamidade cosmética
passageira. Não há nenhuma vergonha na vergonha, por isso peçam ajuda
se precisarem dela. Vocês não estão sozinhos em seu sofrimento, mas
poupem alguma preocupação para aquelas rugas lentamente gestadas e
bem-merecidas que haverão de chegar. Acima de tudo, sejam bondosos com
seu macaco interior, que perdeu seu pelo depressa demais.
PARTE III

Mentes indecorosas
Devassos por natureza: quando um dano
cerebral torna pessoas muito, muito
despudoradas

SE ESTÁ LENDO ISTO, meu palpite é que você é um materialista imbuído da


crença lógica de que o cérebro humano – com todas as suas alvoroçadas
complexidades neurais, suas câmaras moles e eletrificadas em arabesco e
esconderijos labirínticos – foi esculpido ao longo de inúmeras eras pela mão
lenta e firme da seleção natural. Você admitirá, portanto, que regiões
cerebrais específicas evoluíram porque geravam comportamentos benéficos
para nossos ancestrais. Quando uma parte do cérebro está comprometida –
por ferimento, lesão ou algum outro evento lamentável –, a constelação de
sintomas que resulta é muitas vezes notavelmente específica. “O cérebro é a
manifestação física da personalidade e do senso de identidade pessoal”,
escreve o neurocientista Shelley Batts em Behavioral Sciences and the Law,
“e o dano focal de áreas do cérebro pode resultar em mudanças focais no
comportamento e na personalidade, deixando ao mesmo tempo outros
aspectos do self inalterados.”
Não quero ficar técnico demais, mas se você teve a má sorte de
desenvolver uma lesão que interfere com o funcionamento de seu córtex
pré-frontal dorsolateral – uma via especializada de tecido nervoso
intricadamente entrelaçada com seu córtex cingulado anterior –, sua
memória de trabalho e habilidade de formação de estratégia e planejamento
estão fadados a sofrer um grave declínio. De súbito algo tão simples quanto
fazer a lista do que comprar no mercado torna-se uma grande façanha.
Em geral temos enorme compaixão por aqueles pacientes cujos
distúrbios cerebrais interferiram com suas capacidades cognitivas
cotidianas. Estamos perfeitamente dispostos a levar em conta suas
incapacidades intelectuais, ajudando-os a criar uma nova estratégia
mnemônica ou lhes dando um tapinha nas costas e uma palavra de
encorajamento quando tentam lembrar o nome de alguém (porque,
francamente, quem nunca lutou com essas coisas?). No entanto, quando
nacos de substância cinzenta que evoluíram para inibir, digamos, nossos
apetites sexuais e outros impulsos orgíacos experimentam uma avaria
catastrófica semelhante, somos nós igualmente compreensivos? O que
acontece quando essas deteriorações levam suas vítimas a exibir… hum,
não sei, vamos chamá-las de incapacidades morais? Casos de sistemas
cerebrais libidinais enguiçando levam nosso materialismo bondoso e
humanístico a entrar em contato – ou em conflito – com nossa crença no
livre-arbítrio e na culpabilidade moral.
Embora relativamente rara, a síndrome de Klüver-Bucy é uma das
causas neurológicas mais notórias de um completo colapso da capacidade
que tem uma pessoa de controlar seus impulsos sexuais. Em 1939, os
neuroanatomistas Heinrich Klüver e Paul Bucy removeram as maiores
partes tanto dos lobos temporais quanto do rinencéfalo dos cérebros de
resos. De início, esses cientistas estavam interessados em estudar como a
administração de mescalina produzia crises convulsivas semelhantes aos
ataques de lobo temporal em pacientes epilépticos e por isso estavam
tentando isolar os efeitos dessas regiões cerebrais perturbadas pela droga.
Entre um grande número de outros efeitos peculiares dessa vivissecção
bastante cruel, contudo, os macacos tornaram-se incrivelmente lascivos,
exibindo um óbvio e indiscriminado desejo de copular. O primeiro caso
documentado de síndrome de Klüver-Bucy plenamente desenvolvida em
seres humanos ocorreu em 1955, quando um paciente com epilepsia sofreu
uma lobotomia (excisão cirúrgica dos lobos) temporal bilateral e
subsequentemente desenvolveu um apetite sexual voraz, entre outras coisas.
Com maior frequência, a síndrome aparece em graus menores, precipitada
por uma lesão grave no lobo temporal medial. Isso poderia resultar de um
caso de encefalite por herpes ou doença de Pick, ou em decorrência de
trauma e privação de oxigênio. Mas, note bem, nem todos esses pacientes
experimentam hipersexualidade, alguns o fazem. Há outros sintomas,
contudo, que também não são muito atraentes; eles incluem hiperoralidade
(um desejo compulsivo de pôr coisas na boca), apatia, indiferença
emocional e vários distúrbios sensoriais.
Estudos de caso dramáticos ilustrando os efeitos devastadores da
síndrome de Klüver-Bucy abundam na literatura clínica, e eles suscitam
intrigantes questões filosóficas para considerarmos com relação à pura
fisicalidade do “livre-arbítrio”. Um estudo de 1998 do neurologista Sunil
Pradhan e colegas demonstra que alguns pacientes acometidos pela doença
estão dominados por impulsos carnais excessivos, e não simplesmente
usando o distúrbio como uma desculpa conveniente para se tornar
livremente promíscuos, obscenos e lascivos. No relato de Pradhan, um
grupo de meninos entre os dois anos e meio e os seis anos começou a exibir
comportamentos hipersexualizados após se recuperar parcialmente de
comas induzidos por encefalites por herpes. De um a três meses após
emergirem do estado comatoso, “todas as sete crianças”, observam os
autores, “demonstraram comportamento sexual anormal na forma de
meneio dos quadris (dois pacientes), fricção dos genitais sobre a cama (dois
pacientes) e excessiva manipulação dos genitais (todos os sete pacientes)”.
Eram essas crianças apenas fantoches indefesos e desafortunados de seus
antigos cérebros impelidos pelo prazer? É nisso que os autores acreditam:
“Como todos os pacientes [eram extremamente jovens], sem nenhuma
possibilidade de aprendizagem ambiental do sexo, é muito provável que
esses movimentos representassem atividades reflexas filogeneticamente
primitivas.”
Pode ser bastante embaraçoso contar a outros pais o motivo por que seu
pré-escolar está trepando em tudo que lhe aparece pela frente – tente apenas
repetir a descrição da síndrome de Klüver-Bucy para seus amigos na creche
–, mas tendemos, como adultos, a ser extremamente indulgentes com as
impropriedades de uma criança. Quando esse tipo de hipersexualidade
acomete um indivíduo pós-pubescente cuja sexualidade é guiada por
desejos propelidos por orgasmos, as coisas se tornam mais interessantes –
pelo menos, mais uma vez, num sentido filosófico. Ainda que fosse
inteiramente inexato descrever pacientes de Klüver-Bucy como
sexomaníacos lunáticos, eles muitas vezes exibem comportamentos que
seriam considerados impróprios por padrões convencionais. Um cavalheiro
de setenta e poucos anos, por exemplo, abraçou uma paroquiana em sua
igreja e beijou-a repetidamente. Segundo o relato do caso clínico, depois ele
perguntou à chocada mulher: “Por que não fazemos isso de novo?” Durante
os anos seguintes, suas fantasias sexuais intensificaram-se enormemente e
sua hiperoralidade tornou-se incontrolável. O relato observa que, segundo a
sua esposa, ele “levava qualquer objeto à boca, inclusive comida de
cachorro, velas, fitas adesivas e sua aliança de casamento. Seu apetite
parecia insaciável … . Ele morreu aos 77 anos de asfixia provocada por
várias fitas adesivas”.
Numa carta ao editor da European Psychiatry, dois médicos descrevem
o caso de uma estudante de catorze anos (“Srta. A.”) que, antes de
desenvolver a síndrome de Klüver-Bucy após sair de um coma causado por
encefalite, “era uma menina inteligente e sociável com bom desempenho
escolar”. Essa adolescente tranquila e bem-comportada tornou-se um pouco
difícil, para dizer o mínimo, após recuperar-se de sua doença. Você pensa
que está criando uma adolescente complicada? Considere o que estes pais
enfrentaram:

A paciente começou … a despir-se na frente de outras pessoas,


manipulando seus genitais e fazendo investidas sexuais na direção do
pai. Ela lambia qualquer objeto que estivesse pelo chão e, sempre que
tinha oportunidade, corria para o banheiro e tentava pôr urina e fezes na
boca [urofagia e coprofagia, respectivamente].

Em outro caso, uma mulher epiléptica foi submetida a uma malsucedida


lobotomia esquerdo-temporal para ajudá-la a se livrar de crises convulsivas
debilitantes. Sintomas de Klüver-Bucy, inclusive hipersexualidade,
emergiram após a cirurgia. Ela começou a masturbar-se em público e a
solicitar sexo de maneira agressiva a outros membros da família e vizinhos.
Após ter um outro ataque, foi levada ao serviço de emergência, onde, após
meia hora na sala de espera, começou a fazer uma felação num paciente
cardíaco idoso. (Este pode ou não ser um dos poucos exemplos em que a
síndrome de uma pessoa é o dia de sorte de outra; não está claro tampouco
se isso foi uma manifestação de hipersexualidade ou de hiperoralidade, mas
talvez seja inevitável que as duas coisas se encontrem ocasionalmente.)
Outros epilépticos do lobo temporal também exibiram hipersexualidade
no estado “pós-ictal”, que é o período de recuperação após uma crise
convulsiva. A neurologista Vanessa Arnedo e colegas apresentaram o caso
de um homem de 39 anos que começou a ter crises um tanto frequentes no
meio da noite. Após convulsões noturnas, ele dormia por mais dez minutos,
acordava e em seguida estuprava a esposa. (No palavreado mais delicado da
autora, ele é descrito como “tornando-se sexualmente agressivo em relação
à esposa ao forçar o intercurso”.) Digno de nota, porém, é que “o enorme
remorso e repugnância pelo que havia feito ao ficar sabendo de suas ações o
levaram a buscar uma possível cirurgia principalmente para eliminar esse
comportamento pós-ictal”. Outras pessoas com perfis epilépticos
semelhantes também se tornam hipersexualizadas no estado pós-ictal. Para
seu horror posterior, um homem acenou para a filha de doze anos,
chamando-a para se juntar a ele e à esposa no quarto após uma crise
convulsiva noturna.
É nestes últimos exemplos, em que a síndrome de Klüver-Bucy se
manifesta em comportamento criminoso como estupro ou molestação
infantil, que nossas convicções materialistas são realmente postas à prova.
Em 2003, os neurologistas Jeffrey Burns e Russell Swerdlow descreveram
como um homem de quarenta anos, sob outros aspectos bem-educado,
desenvolveu um caso de “pedofilia de início recente” após sofrer o
aparecimento de um tumor órbito-frontal direito. O homem negou qualquer
interesse preexistente por crianças; tinha de fato uma predileção por
pornografia antes do tumor, diz Burns e Swerdlow, mas agora estava
baixando pornografia infantil e fazendo avanços sexuais sutis para a
enteada pré-púbere. Sua hipersexualidade aplicava-se a mulheres maduras,
também – tanto que, de fato, ele não conseguiu se impedir de acariciar
enfermeiras e membros do sexo feminino pertencentes à equipe durante um
exame neurológico. Para encurtar a história, quando o tumor do homem foi
removido, seus comportamentos e interesses obscenos quase
desapareceram, e como ele não era mais considerado uma ameaça para a
enteada, voltou para casa. Mas suas dores de cabeça recomeçaram, seu
tumor voltou a crescer, e o mesmo aconteceu com seu impulso criminoso.
Uma nova remoção cirúrgica do tumor foi feita, o homem tornou-se um
bom cidadão novamente e, até onde sabemos, assim continua até hoje. Num
caso mais recente copublicado pelo famoso neurocientista Oliver Sacks, um
homem de 51 anos sem nenhuma história criminosa teve parte de seu lobo
temporal direito removido para evitar crises convulsivas. Depois disso,
desenvolveu sinais reveladores de Klüver-Bucy, inclusive hipersexualidade.
Esse foi mais um caso de “pedofilia de início recente”, mas, como Sacks
lamenta, apesar disso ele foi condenado a vários anos de prisão por baixar
arquivos de pornografia infantil da internet.
Que mensagem devemos extrair disso? Vou deixá-los fazer o trabalho
árduo de refletir sobre suas implicações para nossa crença no livre-arbítrio e
sobre como ele pode ou não se aplicar à síndrome de Klüver-Bucy. Mas
uma outra questão intrigante emerge, também: se o cérebro de uma pessoa
até então “boa” pode ser moralmente incapacitado de repente por um tumor
invasivo ou um curto-circuito epiléptico, levando-a em seguida a praticar
atos muito maus, não é então um tanto hipócrita supor que uma “má”
pessoa sem lesão cerebral – cujo cérebro e funcionamento neural são
organizados pela complexa interação entre genes e experiência (e cuja
mente é portanto fisicamente coagida em absolutamente todos os seus
aspectos fenomênicos) – tem alguma medida maior de livre-arbítrio que o
caso neuroclínico? Afinal de contas, as pessoas têm zero controle sobre o
cérebro particularmente idiossincrático com que nascem, e muito pouco
controle sobre suas primeiras experiências de vida, as quais, por sua vez, só
podem trabalhar com o substrato neural congênito que já está lá, seja ele
qual for.
Talvez seja apenas uma questão de timing: os “bons” nascem com
cérebros que podem “ficar ruins”, ao passo que os “maus” estão cerceados
por uma arquitetura neural prospectiva moralmente incapacitada desde o
início. E embora isso possa ser menos comum, se uma “má” pessoa se
comporta de maneira correta, poderia isso ser o resultado de um dano
cerebral fortuito ou de uma epilepsia, também? Deveríamos deixar de
admirar essa pessoa se ela salva uma criança de um prédio em chamas
porque, como o homem que acena para a enteada de doze anos convidando-
a para fazer sexo, isso não é realmente ele?
Não se trata de fazer pessoas saudáveis aderirem a um “padrão mais
elevado” ou de desculpar criminosos, mas simplesmente de reconhecer que
o grau de controle que temos – qualquer um de nós – sobre nossas ações
tem bases inteiramente neurobiológicas. O livre-arbítrio é físico. E se de
fato ele é, em última análise, inteiramente baseado no cérebro, opinião que
você provavelmente aceitou no início deste ensaio, isso inclui também a
extensão, a sofisticação e os parâmetros pelos quais se pode, até
objetivamente, contemplar o livre-arbítrio (tal pensamento é constrangido
por capacidades cognitivas baseadas no cérebro, afinal de contas). A
verdade chocante é que somos livres apenas na medida em que nossos
genes são flexíveis no lodo dos meios em que nos desenvolvemos.
Como o cérebro adquiriu suas nádegas:
travessura medieval em neuroanatomia

HÁ TANTA ESPECIALIZAÇÃO dentro da neurociência que nem o cérebro mais


arguto tem capacidade suficiente para aprender tudo que há para saber sobre
si mesmo. Mas se há um fato sobre o qual a ameixa seca do tamanho de um
teacup yorkshire que você tem na cabeça poderia querer refletir é que ela
compartilha um passado peculiar com algo consideravelmente inferior em
sua anatomia – sua genitália. Não estou querendo dizer que nossos cérebros
e órgãos reprodutivos compartilham uma história embriológica ou
evolucionária, mas sim que eles estiveram outrora (e, em certa medida,
ainda estão) entrelaçados na linguagem do corpo. O que essa estranha
história revela é que os anatomistas antigos tinham o pênis na cabeça.
Todos nós tínhamos, naquela época. Aliás, segundo a nomenclatura antiga,
até as mulheres.
O professor de anatomia Régis Olry e o neurobiólogo Duane Haines
trouxeram toda a sórdida história à luz num par de artigos intrigantes
publicados no Journal of the History of the Neurosciences. Esses
historiadores da neuroanatomia (sim, existe tal profissão, e deveríamos ser
todos gratos por isso) analisaram uma literatura médica muito antiga,
tortuosa, e descobriram que o cérebro humano foi descrito antigamente
como compreendendo sua própria vulva, pênis, testículos, nádegas e até
ânus. Como não é de surpreender, toda a classificação e rotulação estavam a
cargo de homens. De fato, parte do cérebro ainda é denominada em
homenagem a prostitutas há muito esquecidas – chego lá daqui a pouco.
Em seu primeiro artigo, mais de dez anos atrás, uma eternidade em
termos acadêmicos, Olry e Haines revelaram as surpreendentes origens do
termo fórnice. Para os ignorantes em neuroanatomia, o fórnice é uma faixa
arqueada de fibras nervosas que conecta o hipocampo e o sistema límbico e
transpõe certas câmaras cheias de fluido do cérebro conhecidas como
ventrículos. Você teria vários problemas muito perceptíveis se seu fórnice
não estivesse funcionando a contento, inclusive vários prejuízos da
aprendizagem espacial e da orientação espacial global.
Alguns fundamentos de etimologia. Embora hoje a palavra fórnice
esteja reservada quase exclusivamente para estruturas anatômicas – há
também um fórnice das conjuntivas, que conecta as membranas do olho,
bem como vários outros fórnices corporais, mas sigamos adiante –, a
palavra possuía originalmente uma conotação arquitetônica, vindo da
palavra latina para “arco”. Olry e Haines observam que, durante o século I
a.C., arquitetos romanos criaram quartos de madeira com tetos abobadados,
chamados de fornices. Quando esses quartos eram feitos de tijolos, eram
chamados de camarae (há uma história etimológica diferente envolvendo a
câmara de nossos dias e esses quartos romanos de tijolos arqueados, mas é
o fórnice que nos interessa aqui).
Ora, nada disso é terrivelmente impudico, e é muito possível que o
primeiro neuroanatomista a usar esse termo, o inglês Thomas Willis, no
século XVII, não tivesse um só pensamento sujo na mente. Mas é fato
também que os quartos de madeira abobadados de antanho eram usados
expressamente para o exercício de um ofício particular na Roma antiga, a
prostituição (daí a palavra “fornicação”). “A real etimologia do termo
‘fórnice’”, concluem Olry e Haines, “está portanto relacionada à forma do
teto do terceiro ventrículo, mas também ao intercurso sexual que ocorria
nesses quartos, comparados com esse ventrículo.” É apenas uma
coincidência irônica que o fórnice, como parte do sistema límbico, ajude a
regular o comportamento sexual humano; como os autores ressaltam, o
nome foi dado muito antes que qualquer pessoa soubesse dessa função.
De qualquer maneira, depois que puseram o fórnice na cama, Olry e
Haines esperaram cerca de uma década para revisitar o sexy terceiro
ventrículo. Num artigo de acompanhamento, eles expuseram alguns outros
elementos com nomes bastante curiosos da mesma parte do cérebro.
Quando o anatomista italiano de meados do século XVI Matteo Realdo
Colombo examinou o pequeno recesso contíguo às comissuras anteriores e
a linha divisória das duas colunas do fórnice, relatam Olry e Haines, viu o
que se assemelhava a uma vulva lubrificada – e chamou-o de vulva cerebri.
Talvez isso não seja muito surpreendente, uma vez que em geral se
considera que Colombo foi o anatomista que primeiro “descobriu” o clitóris
(o verdadeiro).
Os autores ressaltam que há algum mistério com relação a que buraco
Colombo estava cutucando precisamente com sua sonda italiana. Poderia,
de fato, ter se tratado da abertura mais posterior identificada no século XVII
pelo anatomista holandês Isbrand van Diemerbroeck, que descobriu, no
sulco de Colombo, “o ânus inteiro”. O ânus do seu cérebro, diga-se de
passagem, é o que chamaríamos hoje de a “abertura posterior comum” do
aqueduto do mesencéfalo, que se expande para o terceiro ventrículo. Há
tantos trocadilhos com fezes e inteligência que se pode fazer aqui que
minha mente está ficando com câimbra, portanto, que merda, vou deixar
essa parte para vocês, seus bostas.
Ora, Van Diemerbroeck não descobriu apenas pedacinhos da anatomia
feminina no cérebro; pelo contrário, ele e seus companheiros anatomistas o
encaravam como um órgão essencialmente hermafrodita. Afinal de contas,
ele não tinha apenas uma vulva cerebri; possuía também um claramente
reconhecível penis cerebri. René Descartes pode ter celebrado a glândula
pineal como a “sede da alma”, mas para a mente menos metafísica de Van
Diemerbroeck, bem como para um dos contemporâneos de Descartes, o
médico dinamarquês Thomas Bartholin, essa estrutura era mais parecida
com um pênis. Essa metáfora pode ter suas raízes, explicam Olry e Haines,
na posição da glândula acima e entre os colículos, que já haviam sido
comparados com testículos.
Essa expressão ridícula, penis cerebri, provou-se embaraçosa demais
para futuros estudiosos e logo caiu em desuso. O pênis de ontem é hoje a
desalmada glândula pineal (uma expressão mais recatada, sem dúvida). Por
volta de meados do século XVIII, na França, um anatomista que era um
verdadeiro desmancha-prazeres chamado Jacques-Bénigne Winslow já
olhava com repulsa as indelicadas classificações de seus antepassados; os
antigos, refletia ele, só pensavam em indecências quando se tratava do que
havia dentro de suas cabeças. Winslow lançou os fundadores da
neurociência em particular descrédito por terem visto nádegas (eminentiae
natiformes) e testículos (eminentiae testiformes) nos colículos: “Os nomes
que foram dados a esses tubérculos são muito impertinentes, e não têm
nenhuma semelhança com as coisas de que foram derivados.” Outros
discordaram, e estudiosos continuaram a se referir às nádegas e aos
testículos em nossos cérebros por séculos depois que Winslow estrilou por
causa disso, mesmo já no século XX. Finalmente, porém, a pudicícia
acadêmica eclipsou esses obsoletismos absurdos.
Apesar disso, um brioso remanescente desses tempos passados de
devassidão cerebrina não deixou de se infiltrar no vocabulário atual.
Segundo Olry e Haines, a origem da porção glandular da expressão
“glândula pineal” pode ser atribuída à seu predecessor terminológico
bulboso, a glande peniana. Hoje sabemos que a glândula pineal produz
melatonina, uma substância química essencial para a regulação de nosso
ciclo de sono-vigília. Assim, da próxima vez que você tiver um jet lag,
lance a culpa no seu pênis. E se não tratei da história dos corpos mamilares
– aqueles pequenos corpos redondos na superfície do cérebro considerados
responsáveis por acrescentar olfato à memória de reconhecimento – é
porque isso seria fácil demais.
Olry e Haines não foram os primeiros a dar tratos à bola com relação a
essa rotulação obscena de regiões neuroanatômicas. Fazendo coro com o
pudico Winslow em seu desdém, o anatomista francês Joseph Auguste
Aristide Fort observou em 1902 que os anatomistas dos séculos anteriores
“gostavam de dar nomes indecentes às diferentes partes que cercavam o
terceiro ventrículo”. Mas Olry e Haines revelaram exatamente como esses
anatomistas medievais lançaram seus olhos libidinosos sobre a substância
cinzenta e viram não só o mecanismo cintilante de nossos pensamentos,
mas também nossas partes pudendas.
Zumbis lascivos: sexo, sonambulismo,
ereções noturnas… e você

PODE LHE PARECER QUE, similarmente aos galos, os órgãos reprodutivos dos
homens no mundo inteiro participam de uma irrefletida sincronia de rígidas
saudações ao sol nascente. Contudo, esse “tesão matinal”, na verdade, é um
resto autonômico de uma série de episódios de tumefação peniana noturna
(TPN) que ocorrem pontualmente durante a noite para todos os machos
humanos saudáveis – com mais frequência nos períodos de sono marcados
por movimentos oculares rápidos (REM, na sigla em inglês) e cheios de
sonhos, dos quais somos tantas vezes rudemente despertados de manhã por
campainhas, mães ou outras pessoas.
Para aqueles com pênis, talvez surpreenda saber com que frequência seu
membro se levanta enquanto o resto de seu corpo está reduzido a um estado
de catatonia pela paralisia muscular que o impede de pôr seus sonhos em
ação. (E dê graças a Deus por isso. Carlos Schenck e colegas do Minnesota
Regional Sleep Disorders Center descrevem o caso de um rapaz de
dezenove anos com um distúrbio dissociativo relacionado ao sono que certa
vez andou de gatinhas pela casa, rosnando e mastigando um pedaço de
bacon – ele “sonhava” que era uma jaguatirica, saltando sobre um naco de
carne crua que uma tratadora do zoológico segurava.) Cientistas
determinaram que o pênis de um homem normal de treze a dezenove anos
fica ereto por cerca de noventa minutos a cada noite, ou 20% do tempo total
de sono. Com seu cérebro girando entre os quatro estágios do sono, suas
“ereções relacionadas ao sono” se produzem a intervalos de 85 minutos,
durando em média 25 minutos. (É verdade; eles usaram um cronômetro.)
Até onde sei, não há muitas teorias evolucionárias bem desenvolvidas da
TPN, nem foi proposta uma “função adaptativa” para ela, mas sabemos que
ela não tem relação com a atividade sexual exercida durante o dia, declina
com a idade e está positivamente correlacionada com os níveis de
testosterona. Embora um número muito menor de estudos tenha examinado
a atividade genital noturna de mulheres, elas exibem similarmente
lubrificação vaginal durante seus episódios de sono REM, presumivelmente
com muitas delas sonhando com pênis eretos.
Bem, talvez você não pense que esses enfadonhos detalhes biológicos
poderiam ser matéria para dilema moral, mas está subestimando a enorme
confusão de nossa espécie quando se trata de compreender como nosso
cobiçado livre-arbítrio se conjuga com nossos genitais. Considere o caso do
jovem francês cujas ereções relacionadas ao sono foram interpretadas por
um outro homem como sinal de interesse sexual, mas o jovem jurou que
não se tratava de nada parecido. Como descrito por um um grupo de
investigadores na reunião anual da Sociedade Francesa de Pesquisa do Sono
em 2001, o homem heterossexual de 24 anos despertou, para seu horror,
com dolorosas lesões anais. Embora não tivesse nenhuma lembrança
consciente da ocorrência de tal incidente, uma vez que estava
completamente embriagado no momento, isso o levou a deduzir que devia
ter sido violentado durante a noite. “O exame médico-legal relatou de fato
dilaceramentos visivelmente recentes da margem anal”, confirmaram os
pesquisadores.
Seguiu-se a busca do culpado. Especialmente inquietante era o fato de
que o patrão do homem passara aquela noite na casa dele. Antes os dois
relaxaram junto à piscina e assaram juntos na sauna. Não houve
absolutamente nenhuma evidência de drogas facilitadoras de estupro, mas o
álcool, como acontece tantas vezes no sul da França, fluiu com alegre
abandono aquela noite, e por isso o empregado heterossexual, sendo um
cavalheiro, havia convidado o chefe para curar o porre dormindo em seu
sofá enquanto ele se recolhia ao mezanino. Ao que parece, porém, foi o
empregado que dormiu um sono particularmente pesado aquela noite, não o
patrão embriagado. O homem mais velho admitiu prontamente que sem
dúvida os dois haviam feito sexo durante a noite, e ele só podia supor que a
ereção de seu subordinado, combinada com o fato de o mesmo não ter
resistido quando montara nele, sugeria ser ele um parceiro consensual.
(Você pensava que seu sono era pesado; imagine a potência sonambulística
necessária para ressonar durante sua primeira penetração anal.) Enquanto os
tribunais tentavam resolver o caso, o suposto estuprador passou dois anos
na cadeia, até que finalmente um juiz decidiu que os dois homens estavam
mais ou menos certos, e o acusado deveria ser libertado.
Mas este é apenas um de muitos exemplos curiosos de entrelaçamento
de sexo e lei. O fenômeno relacionado da “sexônia” (sexo durante o sono)
despertou interesse público periódico através de uma série de casos muito
divulgados, histórias que por sua vez motivaram intrigante pesquisa
acadêmica sobre esse assunto pouco conhecido. Nem Alfred Kinsey – o
grande arquivista de fatos carnais, que dedicou grande parte de suas
discussões à questão dos “sonhos molhados” e das poluções noturnas em
ambos os sexos – mencionou como algumas pessoas exibem
comportamentos sexuais durante o sono.
Diferentemente do caso referido anteriormente, em que o empregado
adormecido é o recipiente passivo, imobilizado, do intercurso indesejado,
em acessos de sexônia é a pessoa adormecida que provoca o problema.
Embora os pesquisadores ainda não tenham uma estimativa exata da
frequência dessa parassonia, a maioria dos especialistas acredita que ela é
provavelmente bastante comum. Quase todas as pessoas que exibem atos
sexuais recorrentes enquanto dormem têm uma história de sonambulismo.
De fato, muitos especialistas acreditam que a sexônia nada mais é que uma
variante do sonambulismo, que afeta de 1 a 2% dos adultos, e é assim que
ela é classificada atualmente no principal manual de diagnósticos, The
International Classification of Sleep Disorders, Revised. A maioria das
pessoas não busca tratamento clínico, seja em razão de sua ignorância da
doença ou de embaraço; ademais, muitas vezes seus “automatismos”
sexuais são bastante inócuos – como masturbação, empurrões pélvicos
fracos, ou conversas sexualmente excitantes em estado de fuga. (Mais sobre
o conceito de automatismo logo adiante.)
Num número de 2007 da Brain Research Reviews, porém, a
psicobióloga Monica Andersen e colegas investigaram todos os estudos de
caso publicados até então na literatura e tentaram reunir alguns
denominadores comuns subjacentes à sexônia. Descobriram que os fatores
precipitantes mais comuns do sexo durante o sono são privação de sono,
estresse, consumo de álcool ou drogas, fadiga excessiva e superatividade
física à noite. Ser homem e ter menos de 35 anos é também um fator
importante, relataram eles. Além disso, quando mulheres caem nesse estado
noturno alterado, suas ações tendem a ser comparativamente inofensivas;
elas gemem e se masturbam, em vez de acariciar e agarrar qualquer coisa
que tenha a má sorte de estar nas proximidades de sua cama aquela noite,
como fazem os homens acometidos de sexônia.
Uma das coisas mais extraordinárias sobre a sexônia é que os
comportamentos impróprios da pessoa adormecida são por vezes dirigidos a
pessoas que, durante suas vidas despertas, não lhes pareceram
particularmente excitantes. Num número de 1996 da Medicine, Science, and
the Law, o psiquiatra Peter Fenwick descreve o caso de um cadete
supostamente heterossexual que foi levado à corte marcial por agressão
homossexual depois que se enfiou na cama de outro soldado e acariciou-lhe
as partes pudendas. O caso foi encerrado depois que a corte aceitou que a
ausência de ereção no acusado – a sexônia pode ou não envolver ereções –
significava ser improvável que o episódio tivesse sido “proposital”,
devendo ter sido apenas um bizarro incidente de sonambulismo. Um outro
exemplo de homossexualidade atípica na sexônia envolveu um menino de
dezesseis anos que entrou no quarto da tia e do tio uma noite e começou a
molestar o tio adulto.
Ereções, como sugeri anteriormente, complicam as coisas para o
sistema judicial. Um caso notório que atraiu atenção da mídia internacional,
tal como revisto na Current Psychiatry por um grupo de pesquisadores do
sono da Cleveland Clinic, girou em torno de um paisagista de trinta anos
chamado Jan Luedecke, que bebeu demais durante um animado coquetel
em um jogo de croquet nos subúrbios de Toronto numa noite de 2003 e
adormeceu num sofá. “Algum tempo depois”, explicam os autores, “ele se
aproximou de uma mulher que dormia num sofá adjacente, pôs um
preservativo e iniciou um intercurso sexual com ela.” De sua aterrorizada
perspectiva, a mulher acordou para descobrir que sua calcinha fora
removida e um Luedecke de olhos vidrados tentava estuprá-la. Ela o
empurrou, correu para o banheiro e, ao voltar, encontrou-o parado ali,
perplexo. Luedecke, que tinha um histórico estabelecido de sonambulismo,
foi absolvido depois que o psiquiatra Colin Shapiro provou, em sua defesa,
que ele se encontrava num estado dissociativo quando o incidente ocorreu,
não tendo portanto consciência de suas ações.
Casos legais difíceis como esses dependem inteiramente da
demonstrabilidade (ou pelo menos forte probabilidade) de um automatismo
– um crime cometido durante o sono. Fenwick forneceu uma das mais
claras definições desse conceito:
Um automatismo é um comportamento involuntário sobre o qual um
indivíduo não tem controle. O comportamento é em geral inapropriado
às circunstâncias e pode ser incongruente com o indivíduo. Pode ser
complexo, coordenado e aparentemente deliberado e dirigido, embora
desprovido de julgamento. Posteriormente o indivíduo pode não ter
nenhuma lembrança ou apenas uma memória parcial e confusa de suas
ações.

Em outras palavras, as pessoas que sofrem de sexônia são basicamente


zumbis lascivos. Não há atualmente nenhuma maneira de determinar com
absoluta certeza se o fenômeno, quando invocado como defesa, foi
realmente a causa de um comportamento ou está sendo usado como um
álibi conveniente. Ainda assim, certos critérios (dados detalhados de padrão
de sono fornecidos por uma polissonografia noturna; sonambulismo e sexo
relacionado ao sono no passado; fatores desencadeantes conhecidos como
embriaguez, fadiga e estresse; linha do tempo do suposto ataque, pois os
episódios ocorrem tipicamente dentro de duas horas após o adormecimento
durante sono não REM; amnésia com relação ao evento; confusão, em vez
de qualquer tentativa de disfarçar ou encobrir o incidente) podem ao menos
ajudar um júri a chegar à sua decisão. É tentador, para dizer o mínimo, ser
cético em relação à capacidade de um sonâmbulo de agir de maneira tão
deliberada a ponto de lidar com sucesso com uma camisinha, estando ao
mesmo tempo tão consciente quanto um ortóptero, mas o pesquisador do
sono londrino Irshaad Ebrahim nos lembra de que os comportamentos
sonambúlicos são extremamente variáveis e podem ser muito meticulosos,
citando pessoas que preparam refeições e comem, dirigem motocicletas e
carros e até andam a cavalo, tudo isso durante uma boa noite de sono.
Para os que sofrem de sexônia e esta se tornou um problema sério, num
sentido legal ou em outro, a boa notícia é que ela responde bem a
intervenções farmacêuticas. Apenas uma pequena dose de benzodiazepinas
– em especial o clonazepam – antes de ir para a cama parece resolver o
problema para a maioria. Se você tiver manifestado uma história de
violência sexual durante o sono ou, digamos, se for um sonâmbulo
frequente e houver crianças em casa, talvez valha a pena considerar a ideia
de discutir isso com seu médico. (Vários casos, de fato, envolveram
acusações muito perturbadoras de abuso de crianças sendo feitas a pessoas
que supostamente sofreriam de sexônia.) Mas a sexônia pode ser um
problema até para os que moram e dormem sozinhos. Após acordar várias
noites por semana durante cinco anos com os dedos misteriosamente
lambuzados de sêmen, um homem de 27 anos ficou desolado ao se dar
conta de que era um masturbador sonambúlico. O pobre homem quebrou
dois dedos quando seu alter ego noturno rasgou as amarras que usava para
evitar se mover na cama.
Há também, eu deveria assinalar, aqueles cujas vidas sexuais foram de
fato beneficiadas pela sexônia de seus parceiros. Schenck e colegas reviram
vários desses casos, inclusive o de uma mulher que “relatava sexo
infrequente e apressado com o marido [acordado], que ela descrevia como
distante e relutante na vida desperta”. Essa senhora descobriu que, pelo
menos com ele, “o sexo noturno era mais satisfatório, ainda que estivesse
por vezes associado a contusões”.
Assim, para concluir, como se pode determinar se as bolinações do seu
parceiro durante a noite são irrefletidas ou deliberadas? Vou poupá-lo dos
detalhes, mas foi exatamente esta pergunta que me estimulou, várias noites
atrás, a escrever este ensaio. Ao que parece, roncar durante o
comportamento sexual é um bom sinal e algo que os parceiros de muitos
dos que padecem de sexônia dizem ocorrer, sem mais nem menos, até
durante os mais complicados atos sexuais. Ocorreu-me também que os
episódios de tumescência peniana noturna zumbificada podem ser
distinguidos da excitação sexual consciente real pela presença ou ausência
da, hum, como chamar isso, “sacudidela peniana”. (Este não é um termo
técnico, mas como draguei as profundezas da literatura em vão na tentativa
de encontrar o termo apropriado para esse movimento voluntário para cima
e para baixo do pênis ereto por meio da contração do músculo
pubococcígeo – ora, vamos, não finja que não sabe do que estou falando –,
por favor, permita-me um pequena licença poética.) Sempre pensei que
essas reações de sacudidela do pênis deviam servir para alguma função de
sinalização comunicativa em nossa espécie, mas ao que parece ninguém
pensou em estudá-las de uma perspectiva adaptativa. Imagine isso.
Seja como for, poderia alguém acometido de sexônia usar sua cognição
social para comunicar deliberadamente uma mensagem de interesse sexual
sacudindo seu pênis para a parceira? Esta provavelmente não é uma pista
infalível, mas suspeito que não. E mantenha essa dica útil em mente para
quando quer que o apocalipse chegue, pois só Deus sabe que ele chegará
com sua porção de zumbis do sexo masculino obcecados por sexo – um
bando de gays lascivos também, segundo muitos conservadores cristãos.
Os seres humanos são especiais e únicos: nós
nos masturbamos. E muito

DEVE HAVER ALGUMA COISA na água em Lanesboro, Minnesota, porque na


noite que passei lá, a caminho de uma conferência, sonhei com um embate
com um centauro afro-americano muito musculoso, uma experiência
orgíaca com membros embriagados do sexo oposto e então (como se isso
não fosse o bastante) sonhei que era solicitado depois por minha anfitriã a
vestir um vestido de noiva branco para minha iminente apresentação na
abertura da conferência. “Ele não me faz parecer feminino demais?” “De
maneira alguma”, ela me garantiu, “é um vestido de homem.”
Ora, Freud poderia alçar as sobrancelhas diante de uma cena onírica tão
escandalosa, mas se essas imagens representam meus anseios sexuais
reprimidos, há um lado de mim que aparentemente ainda estou por
descobrir. Duvido que seja esse o caso. Sonhos com conotações eróticas são
parecidos com a maioria dos outros sonhos durante o sono REM – trens
descarrilados com um condutor incapaz de controlar as direções
surrealísticas que eles tomam. Na verdade, se você quiser realmente saber
sobre os desejos sexuais ocultos de uma pessoa, descubra o que ela tem na
cabeça quando está mais profundamente mergulhada na masturbação.
Essa capacidade de criar em nossas mentes cenas fantasiosas que
literalmente nos levam ao orgasmo quando convenientemente emparelhadas
com nossos destros apêndices é um truque de mágica evolucionário. Ele
requer uma capacidade cognitiva chamada representação mental (uma “re-
apresentação” interna de uma imagem anteriormente experimentada ou
algum outro input sensorial), que muitos teóricos evolucionários acreditam
ser uma inovação hominídea relativamente recente. Quando se trata de
sexo, fazemos um uso muito bom – ou pelo menos muito frequente – dessa
capacidade.
Um estudo clássico sobre pornografia pré-internet (chegarei à
pornografia na internet num instante) realizado pelos biólogos
evolucionários Robin Baker e Mark Bellis constatou que estudantes
universitários do sexo masculino masturbam-se até ejacular a cada 72 horas,
e “na maioria das ocasiões, sua última masturbação se dá nas 48 horas que
se seguem à cópula anterior”. Isto é, se não estiverem tendo intercurso
todos os dias, os homens tendem a se dar prazer até à satisfação não mais de
dois dias após sexo real pela última vez.
A explicação bastante lógica de Baker e Bellis para esse estado de
coisas que parece contrariar o senso comum (afinal, não deveriam os
homens tentar estocar a maior quantidade de esperma possível nos
testículos em vez de derramar suas sementes de maneira tão esbanjadora
num pedaço sem dúvida infértil de papel higiênico ou numa meia?) é que os
espermatozoides têm um “prazo de validade” – eles permanecem viáveis
por apenas cinco a sete dias após a produção – e, como os machos humanos
adultos fabricam colossais 3 milhões de espermatozoides por dia, a
masturbação é uma estratégia resultante de evolução para se desvencilhar
de esperma velho e criar ao mesmo tempo espaço para esperma novo, mais
apto. É uma questão de qualidade acima de quantidade. Aqui está a
logística adaptativa, segundo os cientistas:

A vantagem para o macho poderia ser que o esperma mais jovem é mais
aceitável para a fêmea e/ou mais capaz de alcançar uma posição segura
no aparelho feminino. Além disso, uma vez retido no aparelho
feminino, o esperma mais jovem poderia ser mais fértil na ausência de
competição de espermas [relações sexuais monogâmicas] e/ou mais
competitivos na presença de competição de espermas [quando a mulher
está tendo sexo com outros homens]. Por fim, se esperma mais jovem
vive mais tempo no aparelho feminino, qualquer maior fertilidade e
competitividade também durariam mais tempo.

Não está convencido? Bem, Baker e Bellis são experimentadores


inteligentes. Têm também estômagos de aço. Uma das maneiras pelas quais
testaram suas hipóteses foi pedindo a mais de trinta bravos casais
heterossexuais que lhes fornecessem algumas amostras bastante concretas
de suas vidas sexuais: seus “refluxos” vaginais pós-coitais, isto é, a porção
da ejaculação do homem espontaneamente rejeitada pelo corpo da mulher
após a cópula. Como Baker e Bellis explicam: “O refluxo emerge de 5 a
120 minutos após a copulação como um evento relativamente discreto
durante um período de 1 a 2 minutos na forma de três a oito glóbulos
brancos. Com prática, as mulheres podem reconhecer a sensação do início
do refluxo e colher o material agachando-se sobre um béquer de vidro de
250 ml. [E aqui vem uma sugestão útil, senhoras…] Quando o refluxo está
quase pronto para emergir, é possível acelerá-lo, por exemplo, tossindo.”
Como os autores previram, o número de espermatozoides nos refluxos
das namoradas aumentava de maneira significativa quanto maior o tempo
decorrido desde a última masturbação do namorado – mesmo depois que os
pesquisadores tinham controlado o volume relativo da emissão de fluido
seminal como uma função de tempo desde a última ejaculação (quanto
maior ele tivesse sido, mais sêmen, na média, estava presente). Se pelo
menos os pais dos meninos adolescentes tivessem tido acesso a estes dados
durante os últimos 100 mil anos de nossa história, pense em toda a
ansiedade, culpa e vergonha que poderiam nunca ter existido.
De fato, até G. Stanley Hall, o pai da pesquisa em psicologia do
adolescente, se viu em maus lençóis quando se tratava do assunto da
masturbação. Hall admitia que poluções noturnas espontâneas (isto é,
sonhos molhados) em meninos adolescentes eram “naturais”, mas
considerava a masturbação um “flagelo da raça humana… destrutiva do que
é talvez a coisa mais importante do mundo, o potencial de boa
hereditariedade”. Na concepção de Hall, a prole dos masturbadores
adolescentes mostraria sinais de “infantilismo persistente ou maturidade
excessiva”. Meninos serão meninos, dr. Hall, e – embora lamentavelmente
não haja nenhum dado sobre isso – eu ainda apostaria que aqueles
adolescentes que negam a si mesmos esse comportamento natural tendem a
ter mais problemas que os que não o fazem.
Voltemos agora às fantasias e à cognição relacionadas à masturbação, e
é aí que as coisas ficam realmente interessantes. A teoria de Baker e Bellis
pode ser peculiarmente verdadeira no tocante a seres humanos, porque, ao
que tudo indica, em condições naturais, somos a única espécie primata que
parece ter tomado os benefícios desses derramamentos de sêmen em suas
próprias mãos. Infelizmente, houve um número insignificante de estudos
rastreando os comportamentos masturbatórios de primatas não humanos.
Embora provavelmente haja alguns dados pertinentes enterrados em alguma
montanha de notas de campo, não topei com nenhum estudo direcionado
sobre o assunto em chimpanzés selvagens, e nem a prolífica Jane Goodall
parece ter jamais investigado isso. Contudo, a julgar por todos os relatos, e
em contraste com os seres humanos, a masturbação até o gozo é um
fenômeno extremamente raro em outras espécies com mãos hábeis muito
parecidas com as nossas. Como qualquer pessoa que já foi ao jardim
zoológico sabe, não há dúvida de que outros primatas brincam com seus
genitais (bonobos são notórios por isso); o importante é que esses episódios
de manipulação raramente levam a um orgasmo intencional.
Não há muita coisa por aí em matéria de pesquisa apropriada sobre a
masturbação em símios, mas alguns estudos, aqui e ali, parecem
documentar a baixa frequência da masturbação em outros primatas. No
início dos anos 1980, cientistas observaram os comportamentos sexuais de
vários grupos de macacos Cercocebus albigena selvagens por mais de 22
meses na floresta Kibale, em Uganda ocidental. Houve muito sexo, em
particular nos momentos em que as fêmeas estavam mais inchadas. Mas os
pesquisadores só depararam com dois incidentes de masturbação masculina
levando à ejaculação. Sim, é isso mesmo. Enquanto machos humanos
saudáveis parecem não poder prescindir de masturbação por mais de 72
horas, dois casos de Cercocebus se masturbando foram registrados ao longo
de um período de quase dois anos.
A antropóloga E.D. Starin também não teve muita sorte ao espionar
incidentes de masturbação entre Procolobos badius em Gâmbia. Num breve
artigo publicado em 2004 em Folia Primatologica, Starin relata que num
período de cinco anos e meio de observações acumuladas, totalizando mais
de 9.500 horas, ela viu apenas cinco – isso mesmo, cinco – incidentes em
sua população de cinco macacos Procolobos badius masturbando-se até a
ejaculação, e esses raros incidentes ocorreram enquanto fêmeas próximas e
sexualmente receptivas exibiam enfáticos comportamentos de cortejo e
copulações com outros machos.
Curiosamente, Starin diz que, embora essas fêmeas não estivessem na
vizinhança imediata, é possível que ainda pudessem ser vistas ou ouvidas
pelo macho que se masturbava quando os incidentes em questão ocorreram.
(Em outras palavras, nenhuma representação mental foi necessária.) Na
verdade, as descrições que a autora faz desses eventos me dão a impressão
de que eles produziram ejaculações acidentais, não deliberadas. Não que
não tenham sido acidentes felizes, mas mesmo assim. “Durante cada
observação”, escreve Starin, “os machos sentaram-se e friccionaram,
esticaram e coçaram o pênis até que ele ficasse ereto, após o que a fricção
adicional produziu ejaculação.” Além disso, de catorze macacas cólobos
rastreadas durante esse período de tempo, “três fêmeas diferentes foram
observadas possivelmente masturbando-se” por autoestimulação de seus
genitais – só possivelmente porque nenhum desses episódios culminou nos
sinais reveladores do orgasmo entre os cólobos: contrações musculares,
expressões faciais ou gritos arrebatados de insuportável prazer.
Talvez o relato mais vívido de masturbação primata não humana – ou
antes, da assombrosa ausência dela, mesmo em machos subordinados, que
não estão conseguindo nenhuma fêmea – venha de um estudo publicado em
1914 no Journal of Animal Behavior por um tipo peculiar chamado Gilbert
van Tassel Hamilton. Hamilton aparentemente dirigiu uma espécie de
mistura de centro de pesquisas e santuário nos luxuriantes terrenos de sua
propriedade em Montecito, Califórnia. Ele foi também, claramente, um
sexologista pioneiro, ou pelo menos tinha atitudes especialmente liberais
para seu tempo, defendendo a naturalidade do comportamento homossexual
no reino animal, entre outras coisas. Ao justificar sua pesquisa, que
significava um contato íntimo e pessoal com os genitais de seus macacos,
Hamilton opina: “A possibilidade de que os tipos de comportamento sexual
a que o termo ‘pervertido’ é em geral aplicado possam ser de manifestação
normal e biologicamente apropriados em algum lugar na escala filética
ainda não foi suficientemente explorada.”
De fato, ele parece ter esperado masturbação desenfreada em seus
animais, mas para sua surpresa apenas um macho (chamado Jocko)
envolveu-se em algum momento nesses prazeres manuais. “De todos os
meus macacos machos”, escreveu Hamilton,

apenas Jocko foi observado masturbando-se. Após alguns dias de


confinamento ele se masturbava e comia parte de seu sêmen. Tenho
razões para acreditar que viveu em condições antinaturais durante
muitos anos antes que eu o adquirisse. Em vista desse fato de nenhum
de sete macacos sexualmente maduros ter se masturbado após várias
semanas de isolamento em condições que favoreciam uma vida mental e
física bastante saudável (estreita proximidade com outros macacos,
jaula ampla, clima cálido), inclino-me a crer que a masturbação não é de
ocorrência normal entre macacos.

Hamilton parece sem dúvida ter sido um pouquinho excêntrico. Um


pouco antes em seu artigo, ele relata que uma de suas macacas, chamada
Maud, gostava de ser montada (e penetrada) por um cachorro de estimação
no quintal, até que um dia a pobre Maud, muito excitada, ofereceu seu
traseiro para um vira-lata estranho que logo tratou de lhe arrancar a pata
com uma mordida. Mais perturbadora é a descrição que Hamilton fez de um
macaco chamado Jimmy que, numa tarde ensolarada, descobriu um bebê
humano deitado numa rede. “Jimmy esforçou-se prontamente para copular
com o bebê”, observa Hamilton com naturalidade. Não fica claro se esse era
ou não filho do próprio pesquisador, nem há menção à expressão no rosto
da mãe do referido bebê humano ao ver o que Jimmy estava aprontando. De
qualquer maneira, ainda que suas habilidades na supervisão infantil fossem
questionáveis, a franqueza com que Hamilton relata as vidas sexuais de
seus macacos confere grande crédito às suas histórias.
Sendo assim, por que macacos e símios quase não se masturbam se
comparados a seres humanos? Esse comportamento é uma raridade, mesmo
entre primatas machos e não humanos de baixo status que experimentam
frustrante falta de acesso sexual a fêmeas – de fato, os poucos incidentes
observados parecem se dar com machos dominantes. E por que uma
diferença tão óbvia, com significação potencialmente enorme para a
compreensão da evolução da sexualidade humana, não foi percebida por um
maior número de pesquisadores? Afinal, faz quase sessenta anos que Alfred
Kinsey relatou pela primeira vez que 92% dos americanos estavam
envolvidos em masturbação conduzindo ao orgasmo.
A explicação para essa diferença interespecífica, estou convencido,
reside em nossas habilidades de representação singularmente
desenvolvidas: somos os únicos com capacidade para fazer surgir à vontade
cenas eróticas, indutoras de orgasmo, nos cinemas pessoais de nossas
mentes – fantasias internas, lascivas, completamente desconectadas de
nossas realidades externas imediatas. Um dos primeiros pesquisadores
sexuais, Wilhelm Stekel, descreveu as fantasias de masturbação como uma
espécie de transe ou estado alterado de consciência, “uma espécie de
embriaguez ou êxtase, durante o qual o momento atual desaparece e
somente a fantasia proibida reina suprema”.
Vamos, deixe isto aqui de lado, faça uma pausa de cinco minutos e
ponha meu desafio à prova (se estiver num avião, talvez seja melhor você ir
até o toalete): tente se masturbar com sucesso – isto é, até chegar ao
orgasmo – sem procurar visualizar uma cena erótica internamente. Em vez
disso, limpe por completo a sua mente, ou pense em, não sei, uma enorme
tela em branco pendurada numa galeria de arte. E, claro, nenhuma
pornografia ou assistentes prestativas nuas são permitidas para essa tarefa.
Como se saiu? Se você for como a maioria, viu a impossibilidade disso.
Esta é, aliás, uma das razões pelas quais tenho tanta dificuldade em
acreditar que as pessoas que se dizem assexuadas e admitem chegar ao
orgasmo masturbando-se são real e verdadeiramente assexuadas. Elas têm
de estar imaginando alguma coisa, e essa coisa, seja lá o que for, revela sua
sexualidade.
Apreender empiricamente a fenomenologia das fantasias masturbatórias
não é coisa fácil. Alguns intrépidos estudiosos, porém, realmente tentaram
fazê-lo. Em 1960, um médico britânico chamado Narcyz Lukianowicz,
publicou na Archives of General Psychiatry um dos relatos científicos mais
sensacionais que já tive o prazer de ler. Lukianowicz entrevistou
pessoalmente 188 indivíduos (126 homens e 62 mulheres) sobre suas
fantasias de masturbação. Uma advertência importante: todas essas pessoas
eram pacientes psiquiátricos com “várias queixas e diferentes manifestações
neuróticas”, de modo que suas fantasias masturbatórias não são
necessariamente típicas. Apesar disso, os detalhes fornecidos por esses
pacientes sobre suas fantasias eróticas nos dão um extraordinário vislumbre
da rica variedade das imagens internas que acompanham a masturbação
humana.
Considere o relato feito por um funcionário público aposentado, de 71
anos, que estava sendo tratado por sentimentos obsessivos de culpa em
razão de sua “masturbação excessiva”:

Vejo diante de mim belas mulheres nuas, dançando e fazendo alguns


movimentos extremamente excitantes e tentadores. Depois da dança
elas se deitam e, mantendo as pernas muito abertas, mostram seus
genitais e me convidam para ter intercurso com elas. Parecem tão reais
que quase posso tocá-las. Estão no cenário de um harém oriental, numa
grande sala oval com divãs e muitas almofadas em torno das paredes.
Posso ver claramente as esplêndidas cores e os bonitos padrões da
tapeçaria, com extraordinária nitidez e todos os mínimos detalhes.

Ou considere o relato que Lukianowicz faz das fantasias de um mestre-


escola de 44 anos, que se assemelha a uma cena orgíaca temperada com
morfina tirada das páginas de Almoço nu, de William Burroughs:

Neles ele “via” meninos adolescentes nus com seus pênis rigidamente
eretos, desfilando diante de si. À medida que ele avançava em sua
masturbação, os pênis dos meninos cresciam, até que por fim todo o seu
campo de visão estava preenchido por um pênis pulsante, ereto, imenso,
e em seguida o paciente tinha um orgasmo prolongado. Esse tipo de
fantasia masturbatória homossexual começou pouco depois de sua
primeira experiência homossexual, que ele teve aos dez anos, e persiste
inalterado até agora.

Ora, obviamente estes são casos patológicos de masturbação crônica em


que ela realmente interfere com o funcionamento dos indivíduos. De fato,
não é um problema incomum para muitos que cuidam de adolescentes e
adultos com distúrbios mentais que estes gostem muitas vezes de se
masturbar em público, fazendo os circunstantes reclamarem e contorcerem-
se em desconforto. (Mais ou menos como alguns primatas cativos alojados
em míseras condições, como em laboratórios ou zoológicos de beira de
estrada, para os quais a autoestimulação se torna obsessiva.)
Uma coisa que clínicos que lidam com esse problema podem querer
considerar é que as limitações cognitivas do indivíduo talvez não lhe
permitam envolver-se em masturbação privada mais “apropriada” por causa
de dificuldades com a representação mental. De fato, há uma correlação
positiva entre a frequência de fantasias eróticas e a inteligência. O QI médio
da amostra de Lukianowicz era 132. Assim, talvez a masturbação pública,
em que outras pessoas estão fisicamente presentes para induzir a excitação
sexual, seja a única maneira pela qual muitos com desordens do
desenvolvimento conseguem alcançar satisfação sexual. Infelizmente, é
claro, a sociedade não é muito condescendente em relação a esse problema
particular: entre 1969 e 1989, por exemplo, uma única instituição nos
Estados Unidos realizou 656 castrações com o objetivo de impedir homens
de se masturbarem. Segundo um estudo clínico, obteve-se algum sucesso na
eliminação desse comportamento problemático espremendo suco de limão
na boca de um jovem paciente cada vez que ele puxava o pênis para fora em
público.
De qualquer maneira, Lukianowicz afirma que fantasias eróticas
envolvem companheiros imaginários não muito diferentes dos amigos de
faz de conta das crianças. Mas admite que diferentemente destes, que têm
uma vida mais longa, os primeiros são evocados para uma finalidade única
e muito prática: “Assim que o orgasmo é alcançado, o papel do parceiro
sexual imaginário se encerra, e ele é simples e rapidamente excluído da
mente de seu senhor.”
Segundo a maior parte dos achados nessa área, os homens parecem
receber mais visitas em suas mentes que as mulheres. Num estudo de 1990
publicado no Journal of Sex Research, os psicólogos evolucionários Bruce
Ellis e Donald Symons descobriram que 32% dos homens diziam ter tido
encontros sexuais em sua imaginação com mais de mil pessoas diferentes,
comparados com somente 8% das mulheres. Os homens também relataram
alternar de uma parceira para outra de suas listas imaginárias durante uma
única fantasia com mais frequência do que as mulheres.
Os psicólogos Harold Leitenberg e Kris Henning resumiram várias
diferenças interessantes entre os sexos nessa área. Em sua revisão de
achados de pesquisas, esses autores concluíram que, em geral, a
porcentagem de homens que relatava fantasiar durante a masturbação era
maior que a de mulheres. É importante salientar, contudo, que nem
“fantasia” nem “masturbação” foram definidas de maneira invariável pelos
diversos estudos resumidos por Leitenberg e Henning, e provavelmente
alguns participantes interpretaram “masturbação” como significando
simplesmente autoestimulação (em vez de indução de orgasmo) ou tinham
uma concepção mais elaborada de “fantasia” do que a que estamos usando
aqui, como alguma forma de representação mental básica. Por razões
incertas, um estudo duvidoso comparou “negros” e “brancos”, de modo que
se trata sem dúvida de um saco de gatos em termos de qualidade empírica.
Eles não encontraram muitas diferenças, diga-se de passagem.
Uma observação lateral: ambos os sexos afirmaram igualmente ter
usado sua imaginação durante intercursos. Basicamente, em algum ponto,
todos tendem a imaginar uma outra pessoa – ou uma outra coisa – quando
estão fazendo sexo com seus parceiros. Não há nada como a pergunta “Em
que você está pensando?” para arruinar a disposição de ânimo durante o
sexo apaixonado.
Aqui estão alguns outros achados interessantes. Os homens relatam ter
fantasias sexuais mais cedo em seu desenvolvimento (idade média de
início: 11,5 anos) que as mulheres (idade média de início: 12,9 anos). As
mulheres são mais propensas a dizer que suas primeiras fantasias sexuais
foram desencadeadas por um relacionamento, ao passo que os homens
relatam que as suas foram desencadeadas por um estímulo visual. Tanto
para homens quanto para mulheres, hétero ou homossexuais, as fantasias
masturbatórias mais comuns envolvem reviver uma experiência sexual
excitante, imaginar fazer sexo com o parceiro atual e imaginar fazer sexo
com um novo parceiro.
As coisas ficam mais interessantes, é claro, quando examinamos os
dados um pouco mais de perto. Num estudo com 141 mulheres casadas, as
fantasias mais frequentemente relatadas incluíam “ser dominada ou
obrigada a ceder” e “fingir que estou fazendo alguma coisa depravada ou
proibida”. Um outro estudo com 3.030 mulheres revelou que “sexo com
uma celebridade”, “seduzir um homem mais jovem ou menino” e “sexo
com um homem mais velho” foram alguns dos temas mais comuns. As
fantasias dos homens contêm mais detalhes visuais e anatômicos explícitos
(lembra-se do pênis gigantesco, pulsante, do estudo de Lukianowicz?), ao
passo que as das mulheres envolvem mais enredo, emoções, afeição,
compromisso e romance. As fantasias sexuais de homens gays com
frequência incluem, entre outras coisas, “encontros sexuais idílicos com
homens desconhecidos”, “observar atividade sexual de grupo” e – que
choque – imagens de pênis e nádegas. Segundo um estudo, as cinco
principais fantasias lésbicas são “encontro sexual forçado”, “encontro
idílico com parceiros estabelecidos”, “encontros sexuais com homens”,
“encontros sexuais gratificantes passados” e – ui! – “imagens sádicas
dirigidas para genitais tanto de homens quanto de mulheres”.
Uma das conclusões mais intrigantes de Leitenberg e Henning é que,
contrariando a crença comum (e a freudiana), fantasias sexuais não são
simplesmente o resultado de desejos insatisfeitos ou privação erótica:

Como pessoas privadas de alimento tendem a ter devaneios mais


frequentes sobre comida, poderíamos esperar que a privação sexual
tivesse o mesmo efeito sobre os pensamentos sexuais. As poucas
evidências que existem, no entanto, sugerem outra coisa. As pessoas
com vidas sexuais mais ativas parecem ter mais fantasias sexuais, e não
o contrário. Vários estudos mostraram que a frequência da fantasia está
positivamente correlacionada com frequência de masturbação,
frequência de intercurso, número de parceiros sexuais durante a vida e
impulso sexual avaliado pela própria pessoa.

Os autores fornecem também uma fascinante discussão sobre a relação


entre fantasia sexual e criminalidade, incluindo um estudo clínico em que
fantasias masturbatórias desviantes foram emparelhadas com o odor fétido
de ácido valérico ou tecido em putrefação. Bem, eu diria que isso é o
suficiente para tolher a libido de qualquer um. Mas o artigo de Leitenberg e
Henning foi escrito em 1995, resumindo pesquisas ainda mais antigas. Isso
é importante porque foi observado muito antes do domínio atual da cena
pornográfica da internet, em que zero é deixado para a imaginação.
E assim vejo-me perguntando a mim mesmo: num mundo em que a
fantasia sexual na forma da representação mental tornou-se obsoleta, em
que imagens alucinatórias de genitálias dançantes, lésbicas vigorosas e
estranhos sadomasoquistas foram substituídas por um verdadeiro serviço de
bufê de pessoas de carne e osso fazendo coisas que nossos avós não
poderiam ter evocado nem mesmo em seus sonhos mais molhados, em que
adolescentes excitados não mais fecham os olhos e se perdem no
esquecimento e na beatitude, mas abrem seus laptops e fazem aparecer uma
atriz pornográfica real, quais são, num sentido geral, as consequências da
extinção de nossas habilidades de representação para a sexualidade de nossa
espécie? Estará a próxima geração fadada a ser tão intelectualmente
preguiçosa em suas fantasias sexuais que sua criatividade em outros
domínios será também afetada? Irão seus casamentos ter mais chance de
terminar porque lhes falta a experiência de representação e o treino em
fantasia masturbatória para imaginar seus maridos e mulheres durante o
intercurso como a pessoa ou coisa que realmente desejam? Não estou
dizendo que pornografia não é progresso, mas no decorrer do tempo ela
poderia vir a provocar uma mudança real no jogo evolucionário.
PARTE IV

Estranhos companheiros de
cama
Sobre pedófilos, hebéfilos e efebófilos:
orientação erótica de idade

MICHAEL JACKSON, o falecido “Rei do Pop”, provavelmente não era um


pedófilo – pelo menos não no sentido estrito, biológico, da palavra. Esse é
um termo moralmente carregado que se tornou sinônimo dos mais sórdidos
dos males. (Na verdade, é difícil até pronunciá-lo em voz alta sem se
encolher, não é?) Mas segundo pesquisadores do sexo, esse é também um
termo excessivamente mal empregado.
Se Jackson de fato se afastava da norma em sua “orientação erótica de
idade” – e talvez nunca venhamos a saber se o fazia –, ele era quase
certamente o que se chama de hebéfilo, uma classificação diagnóstica
recentemente proposta em que adultos maduros exibem uma preferência
sexual por crianças no auge da puberdade, entre as idades aproximadas de
nove e catorze anos. Os pedófilos, em contraposição, mostram uma
preferência sexual por crianças claramente pré-púberes. Há também
efebófilos (de ephebos, que significa “aquele que chegou à puberdade” em
grego), que são atraídos sobretudo por jovens de quinze a dezesseis anos;
teleiófilos (de teleios, que significa “plenamente desenvolvido” em grego),
que preferem os que têm dezessete anos ou mais; e até os muito raros
gerontófilos (de gerontos, que significa “idoso” em grego), alguém que
sempre se sentiu excitado principalmente pelos idosos (em geral definidos,
pelo menos para esses propósitos, como os que têm mais de 65 anos).
Portanto, embora os que agridem sexualmente crianças sejam muitas vezes
amontoados na classificação única de pedófilos, biologicamente falando
esse é um assunto bastante complexo. Alguns até propuseram uma
subcategoria adicional da pedofilia, “infantofilia”, para distinguir os
indivíduos mais intensamente atraídos por crianças com menos de seis anos
de idade.
Com base neste esquema classificatório das orientações eróticas de
idade, até o “pedófilo” fictício mais conhecido do mundo, Humbert
Humbert, da obra-prima de Nabokov, Lolita, seria mais propriamente
considerado um hebéfilo. (Assim também o protagonista de Morte em
Veneza, de Thomas Mann, obra que sempre vi como uma espécie de “Lolita
gay”.) Considere a reveladora descrição que Humbert faz de uma “ninfeta”.
Após uma breve introdução àquelas “pálidas meninas púberes com pestanas
foscas”, Humbert explica:

Entre os limites de idade de nove e catorze ocorrem donzelas que, para


certos viajantes enfeitiçados, duas ou muitas vezes mais velhos que elas,
revelam sua verdadeira natureza, que não é humana, mas ninfeia (isto é,
demoníaca); e são essas criaturas escolhidas que proponho chamar de
“ninfetas”.

Embora Michael Jackson possa ter caído em desgraça por causa de sua
orientação hebefílica, e seu nome vá ficar para sempre emaranhado com o
sinistro termo “garotinhos”, ele não foi a primeira celebridade ou figura
famosa que pôde ser vista caindo nessa categoria hebefílica. De fato,
ironicamente, a primeira mulher de Michael Jackson, Lisa Marie Presley, é
o produto de uma atração hebefílica. Afinal, não nos esqueçamos que
Priscilla atraiu o olhar muito adulto de Elvis quando não tinha mais que
catorze anos, sendo apenas um ou dois anos mais velha que os meninos que
Michael Jackson foi acusado de molestar sexualmente. Depois houve, é
claro, o escandaloso incidente Jerry Lee Lewis, em que o cantor de 22 anos
de “Great Balls of Fire” se casou com uma prima em primeiro grau de treze
anos.
Na comunidade psiquiátrica, houve recentemente intenso debate em
torno da questão da adequação de considerar a hebefilia um distúrbio
médico, como a pedofilia, ou, em vez disso, vê-la simplesmente como uma
variante normal da orientação sexual e não indicativa de patologia cerebral.
O acréscimo da hebefilia à lista das doenças mentais tem importantes
implicações políticas, uma vez que isso pode permitir a pessoas que abusam
sexualmente de púberes invocar uma doença mental em sua defesa. Por um
lado, essa defesa daria aos perpetradores uma desculpa médica para seus
comportamentos criminosos. Na maior parte das sociedades ocidentais, a
maioria das pessoas não se sente inteiramente confortável com isso, não só
porque elas desejam que o indivíduo seja considerado responsável por suas
ações criminais, mas porque uma defesa com base em doença mental pode
também traduzir-se no acesso, pelo ofensor, às comodidades de uma
internação hospitalar, em vez do encarceramento em prisões menos
acolhedoras. Por outro lado, se a hebefilia fosse encarada como uma
legítima doença mental, seria mais fácil manter esses indivíduos
indefinidamente longe de crianças, uma vez que suas liberdades civis
seriam, de fato, absorvidas pelo Estado e eles poderiam portanto ser
mantidos em instituições após cumprir suas sentenças iniciais. Assim, um
homem que violenta uma criança de dez anos poderia mais facilmente
evitar a prisão porque é visto como tendo um distúrbio mental
“certificável”, reconhecido pela Associação Psiquiátrica Americana, mas a
longo prazo é mais provável que isso signifique que ele nunca mais poderá
reingressar na sociedade como um cidadão livre que “cumpriu sua pena”.
Um pesquisador que argumentou veementemente em favor da
classificação da hebefilia como distúrbio mental foi o psicólogo Ray
Blanchard. Num número da Archives of Sexual Behavior, Blanchard e
colegas fornecem novas evidências de que muitas pessoas diagnosticadas
sob o rótulo tradicional de pedofilia estão de fato interessadas não em
crianças pré-púberes, mas em pré-adolescentes. Para distinguir essas
diferenças de orientação erótica de idade, Blanchard e colegas estudaram
881 homens (heterossexuais e gays recrutados na população geral) em seu
laboratório usando testes falométricos (também conhecidos como
pletismografia peniana) enquanto lhes mostravam imagens de modelos nus
de diferentes idades. Por medir mudanças de volume sanguíneo no pênis,
essa técnica é vista como um índice bastante objetivo de excitação sexual
diante dos modelos que estão sendo mostrados na tela – pelos quais, para
aqueles atraídos por crianças e pré-adolescentes, o participante poderia
negar verbalmente sentir-se atraído. Em outras palavras, o pênis não sabe
mentir muito bem. Assim, por exemplo, a imagem de uma menina nua de
doze anos (nada lasciva, mais parecendo um sujeito num livro didático de
medicina) era acompanhada pela seguinte narrativa gravada em fita
magnética: “Você está vendo um filme na TV tarde da noite com a filha de
doze anos de seus vizinhos. Seu braço está em volta dos ombros dela, e seus
dedos roçam-lhe o peito. Você percebe que os seios dela começaram a se
desenvolver…”
Blanchard e seus coautores descobriram que os homens em sua amostra
caíam em categorias um tanto discretas de orientação erótica de idade:
alguns tiveram a resposta peniana mais forte para as crianças pré-púberes
(os pedófilos), outros para as crianças púberes (os hebéfilos) e os demais
para os adultos mostrados na tela (os teleiófilos). Essas categorias não eram
mutuamente exclusivas. Por exemplo, alguns teleiófilos mostraram alguma
excitação por crianças púberes, alguns hebéfilos mostraram alguma atração
por crianças pré-púberes, e assim por diante. Mas os autores constataram
que é possível distinguir empiricamente um verdadeiro pedófilo de um
hebéfilo usando essa técnica, em termos das faixas de idade para as quais os
homens exibiam sua excitação mais forte.
Com base nos achados desse estudo, eles concluem que a hebefilia “é
relativamente comum comparada com outras formas de interesse erótico
por crianças”. Blanchard e colegas afirmam também que a hebefilia deveria
ser acrescentada à próxima versão do DSM (Diagnostic and Statistical
Manual of Mental Disorders, atualmente sob revisão) como um genuíno
distúrbio mental parafílico – distinto da pedofilia. Mas nem todos os
colegas de Blanchard que trabalham na área concordam com essa
abordagem patologizante. A maioria, de fato, opõe-se fortemente à
conceituação da hebefilia como um distúrbio mental. Sua recalcitrância tem
origem nas razões políticas mencionadas antes (nós as exploraremos em
algum detalhe mais adiante), mas também em preocupações logísticas
muito básicas. O psicólogo Thomas Zander salienta que, como a idade
cronológica nem sempre corresponde perfeitamente à idade física, incluir
essas gradações sutis de preferências eróticas de idade seria problemático
de uma perspectiva diagnóstica: “Imagine a inviabilidade de exigir que
avaliadores forenses determinem a existência de pedofilia com base no
estágio de adolescência da vítima. Tais determinações poderiam degenerar
literalmente numa cisão de pelos pubianos.”
Há também importantes razões teóricas para se questionar a
recomendação de Blanchard. Homens que se veem atraídos em especial por
pré-adolescentes ou adolescentes de “meia-idade” são párias sociais,
tamanho o estigma social em que isso incorre, mas em termos históricos (e
evolucionários) esse não foi necessariamente o caso. De fato, hebéfilos – ou
pelo menos efebófilos – podem ter uma vantagem significativa sobre seus
competidores. Psicólogos constataram de forma repetida que marcadores de
juventude têm alta correlação, atual e historicamente, com percepções de
beleza e atratividade. Para homens heterossexuais, isso faz sentido, pois o
potencial reprodutivo de uma mulher (e portanto seu “valor”, de uma fria
perspectiva evolucionária) declina de modo progressivo após os vinte anos,
mais ou menos. É óbvio que fazer sexo com uma criança pré-púbere seria
infrutífero – literalmente. Mas, quer gostemos disso ou não, o mesmo não
pode ser dito em relação a uma adolescente recém-chegada à maturidade,
que é viável em termos reprodutivos e cujo estado de fertilidade novo em
folha pode mais ou menos assegurar a paternidade (portanto, ser atraído por
meninas representa uma poderosa estratégia anticorneação) para o macho.
Esses motivos evolutivos foram inadvertidamente retratados em muitos
livros e filmes, inclusive o controverso Pretty Baby – menina bonita. Nele,
uma jovem Brooke Shields fez o papel de Violet, a filha de doze anos de
uma prostituta na Nova Orleans de 1917, cuja cobiçada virgindade vai a
leilão.
Compreender a atração de homens adultos por meninos ou adolescentes
do sexo masculino é um enigma evolucionário mais complicado; afinal, a
corneação ou os anos reprodutivos que restam não são uma questão aqui.
Mas a “teoria da formação de aliança” do psicólogo Frank Muscarella tenta
desemaranhar essa orientação de idade homossexual. Segundo ele, no
passado, casos homoeróticos entre homens mais velhos, de alto status, e
adolescentes serviam aos últimos como uma maneira de galgar categorias
superiores, uma espécie de ficha de barganha expressa em capacidade de
sexo. O exemplo mais óbvio desse tipo de dinâmica homossexual era
encontrado na Grécia antiga, mas algumas tribos na Nova Guiné também
exibem essas tendências. E, claro, aquele desejo que inspirou o malicioso
Davi de Donatello ainda floresce, para dizer o mínimo, no mundo hoje.
Apenas digite a palavra twink (um termo de gíria derivado de “hostess
twinkie” – um bolinho dourado, recheado de creme, de formato fálico – que
descreve um jovenzinho gay “de constituição esguia, ectomorfo, com pouco
ou nenhum pelo corporal e nenhum pelo facial”) na barra de pesquisa de
imagens do seu Google e veja o que (ou melhor, quem) aparece. Se você é
tímido demais para isso, não faltam artigos sobre esse tipo de
apadrinhamento homossexual escandaloso acontecendo no Congresso que
podem ser pesquisados com mais segurança.
De qualquer maneira, aposto que Oscar Wilde teria endossado a
perspectiva teórica de Muscarella. Afinal, seu famoso “amor que não
ousava dizer seu nome” não era a homossexualidade per se, mas sim uma
“grande afeição de um homem mais velho por um mais jovem”,

como houve entre Davi e Jônatas, como aquela que Platão transformou
na própria base de sua filosofia, e como aquela que encontramos nos
sonetos de Michelangelo e Shakespeare. É essa afeição espiritual
profunda que é tão pura quanto perfeita. Ela dita e impregna grandes
obras de arte como as de Shakespeare e Michelangelo … . Ela é bela, é
excelente, é a mais nobre forma de afeição.
Não há nela nada de antinatural. Ela é intelectual, e existe
reiteradamente entre um homem mais velho e um mais jovem, quando o
mais velho tem intelecto, e o mais jovem tem toda a alegria, esperança e
encantamento da vida diante de si. Que deva ser assim, o mundo não
compreende. O mundo zomba dela e por vezes leva alguém ao
pelourinho por causa dela.

Na minha opinião, porém, a teoria de Muscarella não se sustenta


inteiramente. Ela trata dos interesses eróticos do homem adulto na relação,
sem dúvida, mas não se aplica muito bem aos padrões de excitação de
meninos adolescentes. Dinheiro, prestígio e status podem tornar esses casos
fisicamente possíveis, e até simbióticos, como o autor sugere. Mas, via de
regra, meninos adolescentes gays sentem-se mais excitados por outros
meninos adolescentes que por homens de meia-idade. Assim como seus
análogos heterossexuais do sexo masculino crescem mas continuam
desejando parceiras jovens, meninos gays simplesmente se transformam em
homens gays de meia-idade; sua preferência erótica por parceiros jovens
também não muda ou desaparece. E, embora haja exceções, tal como na
Grécia antiga, homens jovens na maioria das culturas nunca pareceram
terrivelmente interessados em tomar essa rota particular para o sucesso. De
fato, e posso estar errado a este respeito, uma vez que esse não é o tipo de
coisa com que fazemos experimentos hoje em dia, penso que a maioria iria
preferir esfregar banheiros pelo resto da vida ou vender rosquinhas num
shopping center a se tornar o brinquedo sexual de um cavalheiro mais
velho.
Seja como for, dadas as verdades biológicas (até adaptativas) da atração
de adultos por adolescentes, a maioria dos especialistas nessa área considera
completamente ilógico que Blanchard recomende o acréscimo da hebefilia
ao DSM (em especial dado que outras parafilias, mais claramente
inadaptadas, como a gerontofilia, em que homens se sentem atraídos por
mulheres que passaram da menopausa, hoje não estão incluídas). A pressão
para patologizar a hebefilia, afirma a psicóloga forense Karen Franklin,
parece ser motivada por uma “florescente indústria caseira” na psicologia
forense, associada não por coincidência com uma “era punitiva de pânico
moral”. Como a “incapacitação civil” (em linhas gerais, a capacidade do
governo de privar uma pessoa de seus direitos civis no interesse da
segurança pública) requer que a pessoa esteja sofrendo de um distúrbio
mental diagnosticável, Franklin chama a proposta de Blanchard de “um
exemplo de manual de valores subjetivos mascarados como ciência”.
Outras críticas sustentam que quaisquer dessas classificações médicas
baseadas em orientações eróticas de idade estão enraizadas em distinções
arbitrárias ditadas por padrões culturais.
Uma questão inexplorada, inseparável do caso para-raios que foram os
julgamentos de Michael Jackson por molestações, é se tendemos a ser mais
benevolentes com os deslizes de uma pessoa quando consideramos que ela
possui alguns talentos inestimáveis ou culturalmente insubstituíveis. Por
exemplo, considere uma história verdadeira, que vou expor primeiro nos
seguintes termos gerais:

Houve certa feita um homem que gostava de jovenzinhos. Como as leis


eram mais frouxas em outras nações, esse homem decidiu viajar para
um país estrangeiro, deixando a mulher e a filha para trás. Lá conheceu
um outro ocidental que compartilhava suas predileções pela pederastia,
e os dois passaram suas férias felizes, esquadrinhando o andrajoso
submundo desse país à procura de cáftens e alugando meninos para
fazer sexo.

Se você é como a maioria das pessoas, provavelmente está


experimentando um arrepio de repugnância e uma centelha de raiva. Talvez
sinta até que esses homens deveriam ter seus testículos puxados e rasgados
em quatro (pela metade?) por éguas selvagens, ser arremessados a um
grupo truculento de estupradores, castrados com tesouras de jardim, ou, se
você for do tipo pragmático, receber o tratamento que seria dado a qualquer
outro animal doente no rebanho, com uma humana bala na têmpora ou
talvez uma rápida e segura corrente de cloreto de potássio injetada na veia.
Observe, porém, a sutil mudança em suas percepções quando lhe digo
que esses eventos são da autobiografia de André Gide, que em 1947 –
muito tempo depois de ter divulgado estes mesmíssimos detalhes – ganhou
o Prêmio Nobel de Literatura. Gide está de fato expurgando o tempo que
passou em Argel com ninguém menos que aquele grande espírito
dublinense, Oscar Wilde. Aqui está o relato do escritor:

Wilde tirou uma chave do bolso e introduziu-me num minúsculo


apartamento de dois cômodos … . Os meninos o seguiram, cada qual
enrolado num albornoz que lhes escondia o rosto. Em seguida o guia
nos deixou e Wilde mandou-me para o quarto do fundo com o pequeno
Mohammed e trancou-se no outro com o [outro menino]. Desde então,
todas as vezes que saí em busca de prazer, foi a lembrança dessa noite
que persegui.

Não é que julguemos perfeitamente aceitável que Gide e Wilde fizessem


sexo com menores, ou mesmo que não deveriam ter sido punidos. (Na
verdade, Wilde foi condenado em Londres a dois anos de trabalhos árduos
por crimes relacionados não muito tempo depois dessa excursão ao Magreb
com Gide e morreu em mísera ignomínia.) Mas de alguma maneira, como
no caso dos sentimentos mistos de muitas pessoas por Michael Jackson (“o
maior artista de todos os tempos”) ou talvez até pelo diretor Roman
Polanski, o fato de que esses homens eram tesouros nacionais pode diluir
nossa ira moralista.
Por exemplo, você teria realmente desejado que Oscar Wilde fosse
sacrificado como um animal estropiado por gostar de meninos? Deveria
André Gide – que o New York Times aclamou em seu obituário como um
homem “considerado o maior escritor francês deste século pelos
connaisseurs literários” – ter sido privado de sua pena, retalhado em
pedaços por assassinos analfabetos? (Há também a amada obra Aventuras
de Alice no País das Maravilhas, que teria, ao que se diz, sido inspirada
pela devoção hebefílica do autor a uma menina de onze anos chamada Alice
Liddell, para não mencionar as representações notoriamente homoeróticas
que o pintor italiano Caravaggio fez de “meninos roliços, de lábios
carnudos, langorosos”, nas palavras de um crítico.) É complicado. E
embora em princípio saibamos que todos os homens são iguais perante a lei,
exatamente como fizemos em relação a Michael Jackson durante seus
bizarros affaires legais, tenho o palpite de que muitas outras pessoas
também tendem a sentir (ainda que com desconforto) um pouco de simpatia
pelo Diabo nessas circunstâncias.
Sejam quais forem seus sentimentos nessa questão candente, um dos
desafios mais significativos no estudo da orientação erótica de idade das
pessoas, a partir de qualquer perspectiva teórica, é o fato de tantos cientistas
reconhecidos terem receio de comentar essa área de assuntos ou de se
envolver com a pesquisa que abrange os limitados dados disponíveis. Uma
vez que a esmagadora maioria dos casos de abuso sexual de crianças
envolve perpetradores do sexo masculino, tenderíamos a prever outra coisa,
mas ainda não sabemos, por exemplo, se medidas da excitação sexual
feminina mostrariam taxas equivalentes de pedofilia, hebefilia e efebofilia
em mulheres recrutadas na população geral.
Minha suposição é que o desconforto acadêmico se deve em boa parte
ao temor dentro da comunidade científica, uma vez que o simples
tratamento da questão de uma perspectiva amoral pode ser visto por alguns
segmentos ultrajados da sociedade como apologia da pedofilia.
Francamente, penso que essas reações morais alimentadas pelo sistema
límbico são não apenas ingênuas, mas míopes. Afinal, não podemos
considerar adequadamente ou mudar aquilo que não compreendemos.
Tenho também uma suspeita de que toda a nossa fúria em relação a esse
assunto revela algo bastante significativo sobre nossa sexualidade. Se há
uma coisa que aprendi sobre a natureza humana, é que sempre que a
sociedade esbraveja sobre um demônio ou outro, ela provavelmente acabou
de surpreender uma visão especialmente alarmante de si mesma no espelho.
E embora nem todos os homens e mulheres se sintam atraídos por
adolescentes, essa é uma coisa muito mais comum do que gostaríamos de
admitir. O ponto decisivo é este: a menos que você esteja praticando
ginásticas mentais da variedade que exploramos naquele ensaio anterior
sobre masturbação, as pessoas não têm absolutamente nenhum controle
sobre aquilo a que seus genitais reagem. Mas elas têm realmente um
controle consideravelmente maior sobre exatamente o que fazem com esses
genitais. E, pelo menos em meu livro, essas são coisas completamente
diferentes.
Amantes de animais: zoófilos levam cientistas
a repensar a sexualidade humana

FORA DE CONTEXTO, alguns de nossos comportamentos – se limitados à mera


camada superficial da simples descrição – fariam muitas sobrancelhas se
arquearem. A mais inocente das coisas pode soar indecorosa e estranha
quando certos fatos e detalhes são omitidos. Aqui está um exemplo perfeito:
pouco tempo atrás, mordi acidentalmente a língua de meu cachorro
Gulliver. Ora, você pode estar se perguntando, para início de conversa, o
que eu fazia com a língua dele dentro da minha boca. Mas vou sugerir que
seria mais adequado fazer essa pergunta a Gulliver, uma vez que foi ele que
violou minha boca ocupada em mastigar enfiando aquele seu músculo
longo e fino, como se fatiado em delicatéssen, enquanto eu estava
simplesmente apreciando um pedaço de rosquinha muito banal. Chocado
com a sensação de dentes humanos mordendo-lhe a língua, ele ganiu, e em
seguida tratou de fugir. Felizmente Gulliver não mostrou nenhum sinal de
trauma duradouro, e não precisei explicar ao veterinário em que
circunstâncias eu arrancara fora a língua de meu cachorro; mas por vários
dias após o “incidente” Gulliver manteve seu precioso bem encerrado atrás
da abóbada de seus próprios maxilares trancados. Isso deu a meu parceiro,
Juan, e a mim pelo menos uma trégua temporária do uso em geral
superindulgente que Gulliver faz desse órgão particular nos nossos rostos.
A história foi estranha o bastante para que eu a compartilhasse com amigos,
e esse caso particular de um homem que morde um cachorro desencadeou a
previsível torrente de insinuações jocosas de bestialismo. E é aí, senhoras e
senhores, que começa a verdadeira história.
Esses comentários sarcásticos de meus confidentes me lembraram um e-
mail bastante peculiar que eu havia recebido meses antes, escrito por um
leitor incomumente erudito de minha coluna. Esse indivíduo dizia ser um
“zoófilo” (grego para “amante de animais”) com uma particular afinidade
romântica por cavalos, e esperava que eu viesse a escrever sobre esse tópico
negligenciado e muito caluniado de amor interespecífico proibido. “A
política do reconhecimento da zoofilia como uma orientação sexual
‘legítima’”, afirmava esse leitor, “significa muitas vezes que zoófilos são ou
ignorados como classe ou submetidos ao que só pode ser descrito como os
mais viciosos, constantes e odiosos ataques pela sociedade convencional.”
Tenho meus próprios preconceitos irracionais, visceralmente baseados,
e – confesso – após uma primeira leitura dessa mensagem, arquivei-a
prontamente na intocável categoria Eca!… da minha mente. Mas a língua
de Gulliver, combinada com minha simpatia por perdedores humanos,
inspirou-me a voltar atrás e relê-la, e vi uma questão científica bastante
intrigante escondida ali. Será realmente possível para uma pessoa normal,
saudável sob os demais aspectos, desenvolver uma preferência sexual
genuína por uma espécie não humana?
É claro que não há nada de novo sob o sol com relação a bestialismo
como comportamento. Representações pré-históricas de bestialismo foram
encontradas na Sibéria, Itália, França, Fezzan (na Líbia moderna) e Suécia.
Consta que os gregos, os egípcios, os hebreus e os romanos antigos
compartilhavam dessas atividades sexuais também. Diz-se que mulheres
romanas inseriam cobras em suas vaginas e as treinavam para lhes sugar os
mamilos. Mulheres permitiam que bodes as penetrassem como parte de
alguns rituais religiosos no Egito antigo. Macacos eram outrora comumente
treinados para acariciar os genitais de homens nos vales do Nilo e do Indo.
Mas o ato de fazer sexo com um animal é uma coisa; ficar mais excitado
com animais do que com outros seres humanos é outra completamente
diferente. Afinal, o fato de que eu poderia, em princípio, fazer sexo com
uma mulher – se me entupissem de álcool o suficiente e ela tivesse um quê
de rapaz, capaz de criar uma conveniente ilusão modificadora de gênero –
não faz de mim exatamente um heterossexual. Assim é com, digamos, um
fogoso rapaz do campo, que se vê um dia com seu falo alojado
curiosamente dentro de um bode, seus olhos fechados e seu cérebro
repassando cenas daquela líder de torcida namoradeira da aula de química.
O ato apenas não faria dele essencialmente um zoófilo.
Por décadas, o estudo científico das relações sexuais de seres humanos
com (outros) animais concentrou-se quase inteiramente no ato declarado de
bestialismo, vendo tal comportamento como um substituto do sexo entre
seres humanos. Em consequência dessa abordagem, os pesquisadores
negligenciaram até muito recentemente a possibilidade de que algumas
pessoas poderiam realmente preferir um caso amoroso com um cavalo (ou
cachorro, cordeiro, vaca, porca ou qualquer outra espécie escolhida) à ideia
de enredar-se nessas impensáveis relações carnais com outra pessoa.
A origem dessa ênfase no bestialismo como um comportamento e não
como uma possível orientação sexual pode ser encontrada já na obra de
Alfred Kinsey. No clássico Comportamento sexual no macho humano,
Kinsey relatou que 50% da população americana de “homens criados em
fazendas” afirmavam ter tido “contato sexual” – como ele não aprofunda a
questão, só Deus sabe em que comportamentos esses homens criados em
fazendas se envolviam, exatamente – com várias outras espécies, em geral
animais com cascos. Muitas dessas pessoas, disse Kinsey, envergonhavam-
se de sua experimentação sexual precoce com animais (a maior parte desses
encontros pueris ocorria quando os meninos tinham entre dez e doze anos
de idade), e por isso ele aconselhava os médicos clínicos a assegurar a esses
homens agora adultos de que tudo isso fazia parte da criação num ambiente
rural, onde as mulheres eram escassas e as relações pré-maritais
estritamente proibidas. “Em considerável medida”, escreveu Kinsey,
“contatos com animais são substitutos para relações heterossexuais com
fêmeas humanas.”
Mas o retrato estereotipado do zoófilo como um homem pouco
instruído, privado de mulheres e vivendo nos confins de uma fazenda está
sendo contestado por alguns achados contemporâneos. O mais fascinante
deles, na minha opinião, é um conjunto de dois casos publicado pelos
psicólogos Christopher Earls e Martin Lalumière. O primeiro estudo de
caso documentou a história de um sentenciado de 55 anos, antissocial e de
baixo QI que tinha forte interesse por cavalos. De fato, era por isso que ele
estava na prisão pela quarta vez por crimes relacionados; no último
incidente, ele havia matado cruelmente uma égua por ciúmes porque
pensava que ela estava dando bola para um certo garanhão. (E você pensava
que tinha problemas.) O interesse que o próprio homem relatava ter por
éguas foi na verdade verificado por um estudo falométrico controlado.
Quando ele consentiu em ser conectado a um pletismógrafo peniano na
prisão e lhe mostraram fotografias dos seres humanos mais variados e de
todas as idades despidos, o homem permaneceu decididamente flácido.
Nada aconteceu lá embaixo, tampouco, quando ele olhou para slides de
gatos, cachorros, ovelhas, galinhas ou vacas. Mas certamente não era
impotente, como os pesquisadores observaram claramente quando lhe
foram mostradas imagens de cavalos.
Esse caso e evidências anedóticas afins relatadas pelos autores
(inclusive um estudo de 1950 de um “imbecil” de dezesseis anos que
preferia sexualmente coelhos a mulheres) foram importantes na época
porque sugeriam que a zoofilia podia ser um tipo de orientação sexual
extraordinariamente raro – mas real. Isto é, para algumas pessoas, ter sexo
com seus “amantes” animais pode representar mais do que meramente
substituir sexo humano pela melhor coisa à mão. Para elas, a melhor coisa é
o sexo com animais não humanos.
Logo após seu estudo em 2002, Earls e Lalumière relatam ter recebido
muitas cartas e e-mails de pessoas que também se identificavam como
zoófilos (ou “zoos”, como muitos desses indivíduos se referem a si mesmos
na internet, o que serviu para conectá-los de maneira sem precedentes e
atrair chusmas de pesquisadores curiosos). E muitos desses missivistas
afirmavam com veemência não se encaixar no estereótipo do homem rural e
mentalmente deficiente refletido pela análise de Kinsey. Alguns eram, de
fato, profissionais com elevado nível de instrução. Mas o que mais
preocupava essas pessoas era a ideia errônea da sociedade de que eles
estavam prejudicando os animais de alguma maneira ao serem amorosos
com eles. A maioria dos zoófilos zombava da noção de que eles eram
abusivos para com os animais de qualquer maneira que fosse – longe disso,
diziam. Muitos até se consideravam, além de zoófilos, defensores do bem-
estar animal.
Em seguida, num esforço para deslindar o mito da realidade, Earls e
Lalumière publicaram um novo estudo de caso focalizando o relato na
primeira pessoa de um homem de 47 anos, inteligente (doutor em medicina
aos 28 anos) e aparentemente bem-ajustado, que tivera, segundo todos os
indícios, uma criação urbana sem nada de extraordinário com pais afetuosos
e nenhuma lembrança de maus-tratos ou negligência. Apesar disso, desde
tenra idade esse homem havia lutado para combater suas tendências
zoofílicas. Mais uma vez, cavalos serviam como o principal alvo erótico:
Quando entrei na adolescência, minha ideação sexual era diferente do
que deveria ser. Eu olhava para cavalos do mesmo jeito que outros
meninos olhavam para meninas. Eu assistia a filmes de cowboy para ver
cavalos. Olhava furtivamente fotografias de cavalos na biblioteca. Isso
foi antes da internet, e eu me sentia totalmente isolado. Era um menino
da cidade. Nunca tinha visto um cavalo de perto, nunca tinha tocado ou
cheirado um cavalo. Ninguém em minha família tinha qualquer contato
com cavalos, mas sobre mim eles exerciam uma atração forte,
maravilhosa e até – bem, sobretudo – sexual. Eu não tinha nenhuma
ideia de que havia outros como eu no mundo. Tentava ser normal.
Tentava me interessar por meninas, mas para mim elas eram sempre
estranhas, desagradáveis e repulsivas. Umas duas explorações sexuais
adolescentes precoces … foram mecânicas, forçadas e malogradas.

Aos catorze anos, o menino conseguira por fim encontrar a estrebaria


mais próxima, que passou a visitar com frequência – em segredo – de
bicicleta. Imagine-o ali, um menino escondendo-se no campo, apoiado
contra uma cerca no prado, talvez sob o céu rosa pálido do início do outono,
ansiando por estar perto dessas enormes e misteriosas criaturas que
geravam aqueles estranhos rebuliços em seu púbis. Por fim, eles chegaram
perto o bastante para que ele os tocasse e cheirasse, um odor que
descreveria mais de trinta anos mais tarde como “surpreendentemente
maravilhoso”. Longe de ser uma imitação da célebre peça de teatro Equus
(na verdade, o episódio se passou anos antes do suposto caso britânico de
bestialismo em que a peça se baseou frouxamente), esta foi de fato uma real
experiência de desenvolvimento para um ser humano normal sob os demais
aspectos. Três anos depois, o adolescente comprou sua própria égua,
tomando lições de equitação, e iniciou um “longo namoro” com o cavalo-
fêmea até que, finalmente, o casal consumou sua relação:

Quando aquela égua preta finalmente ficou ali parada enquanto eu a


abraçava e acariciava, quando levantou a cauda e afastou-a para o lado
quando dei batidinhas em sua raiz, e quando a deixou ali, e permaneceu
imóvel enquanto eu subia num balde e depois, ofegante, eletrizado e
excitado, introduzia-me dentro dela, foi um momento de pura paz e
harmonia, parecia tão certo, e foi uma epifania.
Esse estudo de caso revela, mais uma vez, que não são apenas
trabalhadores agrícolas mentalmente deficientes que fazem sexo com
animais. E tampouco, ao que parece, apenas homens sem atrativos,
repulsivos, que não podem encontrar parceiras sexuais dispostas de sua
própria espécie. Na verdade, pouco depois de obter seu diploma de médico,
esse homem em particular casou-se com uma mulher (humana) e teve dois
filhos com ela. Mas a vida sexual de ambos baseava-se na imaginação, por
parte dele, de que ela era uma égua, e – como talvez não seja de surpreender
– o casamento não durou. Como disse minha irmã quando lhe contei essa
fofoca: “Posso imaginar como isso devia ser complicado.”
Uma outra pesquisadora pioneira em zoofilia, Hani Miletski,
sexologista baseada em Maryland, descobriu que mais da metade dos 93
zoófilos autodeclarados com quem conversou (82 homens e onze mulheres
com idade média de 38 anos) dizia sentir-se mais atraída por animais que
por pessoas. E assim como o amante de éguas do estudo de Earls e
Lalumière, a maioria (71%) considerava-se bem ajustada às suas vidas
atuais, e 92% não viam razão para parar de ter sexo com seus parceiros
animais. Este é um ponto importante, porque a versão atual do DSM-IV da
American Psychological Association classifica a zoofilia como uma
desordem apenas se a atração sexual de uma pessoa por animais não
humanos for causa de sofrimento para ela. O bestialismo continua sendo
ilegal na maioria dos estados, mas raramente é levado a julgamento,
sobretudo porque é um considerável desafio fazer o flagrante de uma união
coital interespecífica.
Como talvez você possa imaginar, porém, o assunto da zoofilia é muito
controverso, atraindo a ira dos grupos que defendem os direitos dos
animais, como o People for the Ethical Treatment of Animals, e provocando
uma reação moralística reflexa em nós outros, amantes platônicos dos
animais. De maneira irônica, o tema pôs um eminente defensor dos direitos
dos animais, o filósofo de Princeton e escritor Peter Singer, em maus
lençóis. Num ensaio para a revista Nerve intitulado “Heavy Petting”, ele foi
solicitado a fazer uma crítica do livro Dearest Pet, do biólogo holandês
Midas Dekkers. Mas Singer fez mais que apenas resenhar o livro; ele
também pediu aos leitores para reconsiderar se a prática de sexo
mutuamente prazeroso, não abusivo, com outros animais por parte de seres
humanos é tão inerentemente errada como fomos levados a crer por nossos
costumes tradicionais judaico-cristãos (vá em frente, cite o Levítico).
Assim, ele observou: “A veemência com que essa proibição [contra sexo
com outras espécies] continua a ser mantida, sua persistência enquanto
outros atos sexuais não reprodutivos tornaram-se aceitáveis, sugere que há
[uma] poderosa força em ação: nosso desejo de nos diferenciar,
eroticamente e de todas as outras maneiras, dos animais.”
Singer me disse que não estava defendendo sexo com animais, apenas
questionando por que ele nos parece tão censurável. Desde então, o artigo
foi usado contra ele por seus opositores, a maioria dos quais empenhada em
desacreditar suas ideias polêmicas sobre eutanásia e aborto humano. “Como
podemos levar a sério alguma coisa que esse sujeito diz quando ele quer
que façamos sexo com animais?”, argumentam muitos dos críticos do
filósofo. Mas a maioria dos zoófilos, é claro, tende a concordar com a
avaliação geral de Singer de que o “especismo” humano se oculta sob a
tênue justificativa da proteção aos animais. Afinal de contas, somos todos
animais.
Num capítulo publicado em Transgressive Sex: Subversion and Control
in Erotic Encounters, a antropóloga Rebecca Cassidy oferece um relato
particularmente triste de como esse pressuposto religiosamente carregado
de que seres humanos são “mais do que animais” manifestou-se em 1601
num tribunal em Rognon, na França. Era ali que uma menina de dezesseis
anos chamada Claudine de Culam estava sendo julgada por bestialismo com
seu cachorro de estimação:

Duvidando, ao que parece, de que semelhante ato fosse anatomicamente


possível, o juiz designou certo número de assistentes do sexo feminino
para pôr a menina à prova. Quando as mulheres despiram Claudine, o
cachorro saltou sobre ela. Com base nesta evidência, o cachorro e a
jovem foram ambos estrangulados, seus corpos queimados e as cinzas
espalhadas aos quatro ventos, “para que restasse tão pouco vestígio
quanto possível para lembrar à humanidade seus monstruosos atos”.

Como parte de um estudo especialmente provocativo publicado na


Archives of Sexual Behavior, os sociólogos Colin Williams e Martin
Weinberg assistiram a uma reunião de zoófilos numa fazenda, onde um
grupo de homens em sua maioria jovens – quase todos com educação
universitária – demonstrou ter “genuína afeição” pelos animais com que
faziam sexo. Muitos zoófilos consideram os “zoossádicos” anátemas, e têm
se esforçado sinceramente para se distanciar daqueles que obtêm prazer
machucando animais. Apesar disso, alguns estudiosos, como o
criminologista Piers Beirne, sustentam que os zoófilos se enganam ao supor
que animais são capazes de consentir em fazer sexo com eles, e portanto
relações sexuais humanas com animais de qualquer espécie deveriam ser
consideradas “agressão sexual interespecífica”.
Ao examinar com cuidado minha própria posição nesse assunto
delicado, vejo-me emocionalmente atraído pela posição de “tolerância zero”
de Beirne. Se algum zoófilo inescrupuloso seduzisse minha amada cadela
Uma com uma tira de bacon na traseira de sua caminhonete… Mas isso é
apenas, em grande parte, uma reação reflexa do moralizador em mim.
Palavras como pervertido e antinatural têm toda a profundidade teórica de
um dedal. Racionalmente, Singer está certo ao questionar nossa aversão
visceral ao sexo interespecífico. E tendo visto uma chimpanzé no cio
pressionar com força sua região anogenital inchada contra minha seção do
meio (“Querida”, eu disse, “você não só é da espécie errada, mas do sexo
errado”) e mais cachorros do que posso contar treparem em minha perna,
sei que não são apenas seres humanos que correm o risco de perceber
erroneamente interesse sexual em outra espécie. O garanhão árabe que
impalou um homem de Seattle com seu pênis ereto em 2005, perfurando
fatalmente o cólon do homem, nos leva a perguntar quem foi de fato a
vítima.
E se a zoofilia ocorre entre certos membros de nossa própria espécie,
poderiam membros de outras espécies sentir-se atraídos principalmente por
seres humanos? No livro de Maurice Temerlin Lucy: Growing Up Human, o
autor afirma que assim que a “filha” de sua chimpanzé alcançou a
maturidade sexual, passou a se interessar unicamente por machos humanos.
Temerlin, um psicoterapeuta, chegou a comprar para Lucy um número da
revista Playgirl e encontrou-a friccionando os genitais diante da foto em
página dupla de um homem nu.
Seja como for, deixando de lado questões filosóficas, parece-me
estarrecedor – e incrivelmente fascinante de uma perspectiva evolucionária
– que tantas pessoas (nada menos que 1% da população geral) sejam
zoófilos “certificáveis”. E os pesquisadores científicos parecem estar
admitindo pouco a pouco que a zoofilia pode ser uma genuína orientação
sexual humana. Apesar disso, tenho, como você provavelmente também,
uma grande quantidade de perguntas que ainda estão por ser consideradas
empiricamente. O que faz de algumas espécies domésticas – como cavalos
e cachorros – alvos eróticos mais comuns para zoófilos que outras como,
digamos, gatos, lhamas ou porcos? (Gatos com garras seriam um
problema.) Acaso os zoófilos acham membros particulares de sua espécie
preferida mais “atraentes” que outros indivíduos dessas espécies, e, se for
assim, sentem-se eles seduzidos por índices de beleza comuns, como
simetria facial, em cavalos? Qual é a porcentagem de zoófilos
homossexuais (aqueles que preferem parceiros animais do mesmo sexo) em
relação a zoófilos heterossexuais? Afora as marcas de casco em suas testas,
como zoófilos distinguem entre um parceiro animal anuente e um que “não
está a fim”? Por que homens têm mais propensão a ser zoófilos que
mulheres? São os zoófilos atraídos apenas por animais sexualmente
maduros? Se não, isso faz deles “zoopedófilos”? Que dizer sobre diferenças
transculturais? A tendência a tornar-se zoófilo é hereditária?
Temos de esperar um pouco mais para que algum intrépido sexologista
investigue estas e outras questões científicas não respondidas sobre zoofilia,
talvez a mais rara de todas as parafilias sexuais. Enquanto isso, devo
confessar que estou com uma pontinha de inveja de vocês, zoófilos
afetuosos espalhados por aí. Como deve ser bom poder ficar livre de todos
esses estorvos emocionais que a atração por outros membros da espécie
humana acarreta. Se ao menos eu pudesse me estabelecer discretamente
com uma cadelinha atrevida – uma adulta anuente, é claro –, talvez a vida
fosse muito mais fácil.
Assexuados entre nós

OS GAYS OUVEM MUITAS VEZES uma pergunta de heterossexuais curiosos:


“Quando você se deu conta pela primeira vez de que era gay?” Em meu
caso, lembro-me de tirar a roupa de meu boneco do Super-Homem – e ficar
terrivelmente desapontado com o resultado –, bem como de me sentir
motivado a fazer amizade com os meninos mais atraentes na terceira série.
Hormonalmente falando, porém, foi só quando eu tinha cerca de catorze
anos que olhei pela primeira vez no espelho e pensei: Ah, sem dúvida é isso
que eu sou, agora tudo faz pleno sentido.
Não era um mistério tão grande. Afinal, desejo sexual não é exatamente
uma coisa sutil. Naquela época, trocar carícias com minha “namorada” me
dava tanto prazer quanto raspar a placa dos dentes do meu cachorro. Em
contraste, roçar minha perna na de um menino por quem eu tinha uma
paixonite produzia um êxtase elétrico, inefável. No vestiário após a aula de
ginástica no curso secundário, eu me obrigava a visualizar mentalmente
meninas nuas (em particular minha namorada) como uma espécie de
chuveiro frio cognitivo, um choque preventivo contra uma reação física que
de outro modo poderia ser embaraçosa. Eu conseguia seguir em frente, mas
você entendeu: quer gostemos ou não do que somos, escondamos isso ou
aceitemos, nossas verdadeiras identidades – gay, heterossexual, bissexual –
afloram conscientemente em cada um de nós em algum ponto de nossas
vidas, em geral na adolescência. Todos nós temos uma “orientação” natural
para o contato sexual com outros, e o mais das vezes somos apenas peões
impotentes, observadores incapazes, dos desejos de nossos corpos.
Pelo menos é isso que a maioria das pessoas tende a pensar. Alguns
cientistas, porém, acreditam que pode haver uma outra orientação sexual
em nossa espécie, caracterizada pela ausência de desejo e nenhum interesse
sexual por homens ou mulheres, apenas uma lacuna completa e vitalícia de
atração sexual por todo e qualquer ser humano (ou não humano). Essas
pessoas são consideradas assexuadas. Diferentemente dos bissexuais, que
são atraídos tanto por homens quanto por mulheres, os assexuados são
igualmente indiferentes e desinteressados em fazer sexo com ambos os
gêneros. Assim, imagine que você é um adolescente à espera de que sua
identidade sexual se expresse, aguardando com paciência que um jorro de
lascívia embriagadora o torne tão apatetadamente carnal quanto seus pares,
e isso simplesmente não acontece. Esses indivíduos não são apenas
celibatários, o que é uma escolha de estilo de vida. Para eles, o sexo é
simplesmente tão… enfadonho.
Num estudo de 2007, foi perguntado a um grupo de adultos que se
descreviam como assexuados como eles haviam ganhado consciência de
que eram diferentes. Uma mulher respondeu:

Eu diria que nunca tive um sonho ou uma fantasia, uma fantasia sexual,
por exemplo, sobre estar com outra mulher. Portanto posso muito bem
dizer que não tenho nenhum tipo de tendência lésbica. Você poderia
pensar que na minha idade eu teria alguma fantasia ou sonho ou alguma
coisa, não é? … Mas nunca tive um sonho ou uma fantasia sexual sobre
estar fazendo sexo com um homem também. Nunca, nunca, ao que me
lembre.

Num outro estudo, uma mulher de dezoito anos colocou a questão


assim:

Simplesmente não sinto atração sexual pelas pessoas. Amo a forma


humana e posso contemplar indivíduos como obras de arte e achar
pessoas esteticamente agradáveis, mas nunca sinto desejo de entrar em
contato sexual nem mesmo com as mais belas das pessoas.

Segundo o psicólogo Anthony Bogaert, deve haver mais assexuados


genuínos por aí do que nos damos conta. Em 2004, ele analisou dados de
um levantamento feito com mais de 18 mil residentes na Grã-Bretanha e
descobriu que o número de pessoas (185, ou cerca de 1%) que se
descreviam como “nunca tendo sentido atração sexual por ninguém” era
apenas ligeiramente mais baixo que o dos que se identificavam como
atraídos por pessoas do mesmo sexo (3%). Desde essa descoberta, um
punhado de pesquisadores acadêmicos vem tentando determinar se a
assexualidade é um verdadeiro fenômeno biológico ou, alternativamente,
um falso rótulo social que, por várias razões, algumas pessoas podem
preferir adotar e abraçar.
O desejo sexual pode aumentar e diminuir no curso de uma vida ou –
como muitas pessoas que tomam antidepressivos experimentaram – tornar-
se praticamente inexistente por causa de medicação ou doença. Há também
anormalidades cromossomiais, como a síndrome de Turner, muitas vezes
associada a uma ausência de desejo sexual. Eventos traumáticos na
infância, como abuso sexual, podem contribuir para uma aversão ao sexo
também. Mas se ela existe como uma orientação distinta, a verdadeira
assexualidade não se deveria nem à anomalia genética nem à agressão
ambiental. E de fato, embora pouco se saiba sobre sua etiologia (Bogaert
acredita que ela pode ser atribuída a alterações pré-natais do hipotálamo),
os assexuados são em sua maioria adultos normais, saudáveis,
hormonalmente equilibrados e sexualmente maduros. Por razões ainda
incertas, o sexo simplesmente sempre lhes pareceu um grande e insípido
bocejo. Portanto, a assexualidade seria semelhante a outras orientações
sexuais no sentido de não ser “adquirida” ou “situacional”, mas sim uma
parte essencial da constituição biológica de uma pessoa. Assim como um
homem hererossexual ou uma lésbica não podem acordar um dia e decidir
passar a sentir atração por homens, uma pessoa não poderia tampouco –
pelo menos em princípio – “tornar-se” assexuada. Disfunções sexuais como
o distúrbio do desejo sexual hipoativo podem também ser excluídas se uma
“preferência” por um gênero não for despertada em resposta a uma
intervenção clínica, por exemplo um tratamento hormonal. Como Bogaert
observa, mesmo aqueles que têm fetichismos ou parafilias em geral exibem
uma atração baseada em gênero, como homens que têm uma queda por
sapatos de mulher ou necrófilos que fazem sexo com cadáveres de mulheres
(mas não de homens).
Mas a história da assexualidade é muito complicada. Por exemplo,
como a discussão nos fóruns do website da Aven (Asexual Visibility and
Education Network) demonstra, há enorme variação nas inclinações sexuais
dos que se consideram assexuados. Alguns se masturbam; outros não.
Alguns têm interesse por relações românticas, não sexuais (inclusive
abraços e beijos, mas sem contato genital), ao passo que outros não. Alguns
se consideram “hétero-assexuados” (tendo uma preferência estética ou
romântica não sexual pelas pessoas do sexo oposto), enquanto outros se
veem como “homo-” ou “bi-assexuados”. Há até um website de promoção
de encontros para o amor assexuado chamado Asexual Pals. Apesar disso,
muitos assexuados mostram-se também perfeitamente dispostos a fazer
sexo caso isso satisfaça seus parceiros sexuais; isso não é constrangedor ou
penoso para eles, mas sim algo como fazer uma torrada ou limpar o cinzeiro
– simplesmente eles mesmos não obtêm nenhum prazer com o ato. Como os
pesquisadores Nicole Prause e Cynthia Graham descobriram em suas
entrevistas com pessoas que se identificam como assexuados: “Eles não
eram particularmente receosos de sexo … tinham um impulso excitatório
mais baixo.” Outros insistem em manter relacionamentos completamente
assexuados, de preferência com outros assexuados. Assim, embora muitos
assexuados sejam virgens, outros são ironicamente até mais experientes que
seus amigos sexuados da maneira tradicional. Alguns desejam filhos por
meios artificiais, como fertilização in vitro; outros estão dispostos a tê-los
da maneira antiquada ou não querem filhos de maneira alguma.
Assim, por um lado, parece haver um problema sociológico de pessoas
de identidade sexual marginalizada que vem ganhando força e começa a
formar uma comunidade identificável (e, no processo, atraindo significativa
atenção da mídia, inclusive cobertura em The Montel Williams Show e The
View e uma reportagem de destaque na New Scientist). Por outro lado, resta
– para mim – a questão biológica mais intrigante do essencialismo
assexuado: é de fato possível desenvolver-se “normalmente” sem ter jamais
experimentado desejo sexual, nem mesmo um ínfimo sinal intermitente no
radar da excitabilidade, em relação a nenhum ser humano na face da Terra?
Tenho pouca dúvida de que há assexuados autoidentificados que não
corresponderiam a esse critério essencialista, mas se houver na comunidade
assexuada mesmo uma fina fatia que realmente nunca experimentou
excitação, isso apresentaria questões fascinantes para nossa compreensão da
sexualidade humana e dos processos evolucionários.
Os cientistas apenas arranharam a superfície no estudo da assexualidade
humana. Podemos contar o número de estudos sobre o assunto nos dedos de
uma só mão. Portanto questões permanecem. Possui a assexualidade, como
a homossexualidade, componentes hereditários? Sem dúvida isso é
plausível. Afinal, historicamente, pelo menos assexuados do sexo feminino,
que não precisariam ter orgasmo para conceber, devem provavelmente ter
tido filhos com seus parceiros sexuais do sexo masculino, assegurando
assim a continuidade das bases genéticas da assexualidade. (Embora os
achados originais de Bogaert sugerissem que a assexualidade era um tanto
mais comum entre mulheres, pesquisa mais recente de Prause e Graham não
encontrou essa diferença de gênero em sua amostra de idade universitária
de assexuados autodeclarados.) Se alguns assexuados se masturbam na
ausência de fantasia sexual ou pornografia, o que é exatamente que os deixa
fisicamente excitados? (E como pode alguém chegar ao orgasmo – como
alguns assexuados parecem fazer – sem experimentar prazer?) Além disso,
se você está teoricamente de acordo com a psicologia evolucionária, quase
toda a cognição e o comportamento social humano reduzem-se em última
análise à competição sexual. Nesse caso, como o psicólogo evolucionário
explicaria a assexualidade? Se o sexo é a artimanha de bem-estar para fazer
nossos genes chegarem lá, haverá de fato uma categoria natural de pessoas
imune ao maior truque da evolução?
Devo dizer que a única boa maneira de solucionar o enigma é também
um pouco repugnante. Mas, a menos que os cientistas psicológicos reúnam
um dia um grupo de voluntários assexuados autoidentificados e,
sistematicamente e sob condições controladas, os submetam a uma série de
estímulos eróticos enquanto medem seu grau de excitação física (ereção
peniana ou lubrificação vaginal), a verdade sobre a matéria ficará para
sempre escondida dentro das calças dos assexuados.
Brincando com os pés: podofilia para pudicos

JÁ DISCUTIMOS PEDOFILIA, mas vamos falar sobre podofilia, o amor aos pés e,
por extensão, aos sapatos. De fato, como há uma parcela de podófilos
pedófilos, vale a pena assinalar que as duas coisas não são mutuamente
exclusivas. Mas, seja como for, sob o risco de me desviar desde já para um
fetiche de tipo inteiramente diferente (a acrotomofilia, que é o amor pelos
amputados ou, mais especificamente, desejo sexual por seus membros
cortados), permita-me começar dizendo que de certa forma sempre achei
pés – aquelas mãos terrestres, compridas, malcheirosas e cheias de nós –
extremamente repelentes. Não que eu preferiria que os de meus parceiros
fossem cortados fora, mas você entende o que quero dizer.
Na verdade, minha própria aversão por pés torna a podofilia ainda mais
intrigante para mim, porque, entre outras coisas, ela mostra o quanto nossas
papilas gustativas podem ser de fato receptivas à aprendizagem ao
contribuir para o que se torna deleitável mais tarde. Talvez tenha faltado a
meus genitais apenas um misterioso encontro com os pés de outras pessoas
durante um período crítico de meu desenvolvimento sexual. Muitas pessoas
que derivam sua principal satisfação sexual de carícias com os pés podem
encontrar as origens de seu gosto por pés em episódios específicos seja em
sua infância ou durante a puberdade.
Um dos tratamentos históricos mais importantes e detalhados do assunto
do fetichismo de pé (e de sapato) foi o realizado em 1927 pelo sexologista
britânico Havelock Ellis. “Numa minoria pequena, mas não insignificante
de pessoas”, escreve Ellis, “o pé ou a bota torna-se a parte mais atraente de
uma mulher, e em alguns casos mórbidos a própria mulher é vista com um
apêndice comparativamente sem importância.” Ellis descreve o caso de
Rétif de la Bretonne, um romancista francês do século XVII cujas
irreverentes obras literárias estavam cheias de referências a seus gostos
pessoais. (De fato, a palavra inglesa epônima, retifism, é um termo
enigmático para fetichismo de pé.) Na autobiografia muito franca de Rétif,
Monsieur Nicolas, o escritor, então com sessenta anos, recorda ter se
enamorado pelos pés de uma menina quando tinha apenas quatro anos de
idade. A teoria de Rétif sobre as origens de seu fetichismo de pé era que,
sendo a pureza e o frescor femininos tão valorizados em seu tempo, aquelas
damas que conseguiam manter essa parte de seu corpo que entrava em
contato direto com a sujeira tão delicada e intacta eram as mais atraentes de
todas.
“Esse gosto pela beleza dos pés”, reflete Rétif em relação à sua criação
na região francesa da Borgonha, “era tão forte em mim que infalivelmente
despertava desejo … . Quando eu entrava numa casa e via as botinas
arrumadas numa fileira, como é o costume, tremia de prazer; ficava corado
e baixava os olhos como se estivesse na presença das próprias moças.” O
que era especialmente excitante para Rétif, explica Ellis, era seu
conhecimento de que esses objetos haviam absorvido a essência dos pés que
tanto desejava. “Ele beijava com fúria e arrebatamento qualquer coisa que
tivesse entrado em contato com a mulher que adorava.” Na realidade,
desejava desesperadamente ser enterrado com os “chinelos verdes com
saltos cor-de-rosa e debruns” de uma mulher mais velha por quem se
apaixonara na adolescência.
Trabalho mais recente confirmou o palpite de Ellis de que o fetichismo
de sapato não é simplesmente uma atração peculiar por esses objetos
inanimados e que a excitação sexual está relacionada com a íntima conexão
entre determinados sapatos e os pés de seu dono. Por exemplo, numa série
de relatos sobre fetichismo de pé em homossexuais do sexo masculino, o
sociólogo Martin Weinberg e colegas perguntaram a membros da Foot
Fraternity o que lhes parecia especialmente atraente em sapatos. A maioria
desses 262 homens expressou completo desinteresse por sapatos novos,
nunca usados. Ao contrário, tinham clara preferência por calçados que
haviam sido muito usados por uma pessoa atraente. Comprar sapatos em
brechós era uma dádiva de Deus para muitos desses fetichistas, pois isso
lhes permitia fazer fantasias sobre o dono original, em vez de encarar a
feiura de uma criatura esteticamente prejudicada. E assim como a podofilia
heterossexual tem um elemento simbólico, com connaisseurs
heterossexuais exibindo gostos muito particulares por certos estilos de
calçados e polainas femininas, podófilos gays associam tipos de sapato com
homens idealizados. Um homem, por exemplo, explicou aos investigadores
como uma rica tapeçaria de sentidos havia se vinculado a associações
estereotipadas com diferentes tipos de calçado masculino: “os odores e as
imagens correspondentes; docksides e mauricinhos, tênis e jovens rebeldes,
botas e homens dominadores.” Outros fetichistas de pé gays do sexo
masculino repetiram esse tema simbólico em seus gostos e aversões:

“Botas representam poder e força … . Elas exemplificam a essência da


virilidade, um exagero da masculinidade.”

“Sapatos de couro tipificam um homem de negócios bem-sucedido.”

“Tênis estiveram em contato com um belo e jovem garanhão.”

“Mocassins são usados por universitários mauricinhos.”

Num artigo subsequente no Journal of Sex Research, Weinberg e


colegas retornaram à sua base de fãs de sapatos (a Foot Fraternity dizia ter
mais de mil membros em 1995, a vasta maioria sendo homens brancos
instruídos com empregos de colarinho-branco) e pediram a esses indivíduos
para refletir por escrito sobre as origens de seu amor por pés masculinos.
“Perguntamos especificamente a idade em que os sujeitos primeiro se
interessaram por pés/calçados”, explicam os autores, “e, para tirar proveito
do efeito reforçador da masturbação, suas experiências com fantasias sobre
pés/calçados quando eles se masturbavam durante a adolescência.” Segundo
os fetichistas, foi com a idade média de doze anos que ficaram pela
primeira vez (de maneira consciente) excitados sexualmente por pés, e
quase todos eles se masturbavam regularmente fantasiando objetos
relacionados a pés (como sapatos, meias ou fotografias de pés), ou imagens
de ardorosos encontros podiátricos.
Em termos de contexto de desenvolvimento, muitos dos 204 sujeitos
não puderam se lembrar de um incidente específico de seus passados a que
pudessem atribuir esse aspecto agora concretizado de sua identidade sexual
adulta. No entanto, 89 foram capazes de fazer relatos detalhados do que
supunham ter sido os primeiros gatilhos relacionados ao pé. E para vocês
pais que andam por aí balançando promiscuamente seus dedos dos pés à
vista de seus impressionáveis filhos pequenos, as respostas que deram
podem fazê-los parar para refletir. “Dormir às avessas com meus pais”,
reflete um homem adulto sobre sua primeira infância e seu costume de
aconchegar-se inocentemente a eles debaixo das cobertas, “e encontrar os
pés de meu pai em meu rosto.” “Eu costumava fazer cócegas nos pés de
meu pai”, lembra um outro. “Eu gostava muito de seu riso … . Ele
costumava fingir que se divertia como parte da brincadeira.” Uma outra
reminiscência: “Por volta dos cinco ou seis anos, tirar os sapatos de meu pai
e massagear seus pés quentes … . Os pés macios, mornos, e o prazer que
ele parecia experimentar – em geral ao ir para a cama – e eu podia beijar e
lamber seus pés.” Outros sujeitos tinham tido experiências semelhantes,
mas não relacionadas com os pés dos pais. Ter o pé de um irmão mais velho
cultuado como um herói pendendo diante do próprio rosto quando ele
estava deitado na cama de cima de um beliche, por exemplo, ou lutar de
brincadeira com amigos ou vizinhos e encontrar um pé enterrado, e não
desagradavelmente, na própria entreperna.
Como no caso da análise de podófilos heterossexuais feita por Ellis,
Weinberg e colegas observaram que as origens dessa podofilia homossexual
podia quase sempre ser encontrada nessas experiências positivas durante o
desenvolvimento, não em experiências negativas ou abusivas. Esta é uma
observação importante, de fato, porque muitas vezes se supõe que esse
fetiche representa o desejo masoquista da pessoa de ser chutada ou
violentamente pisoteada. Embora isso seja verdade em certos casos, Ellis
adverte que não devemos concluir de maneira tão apressada que o amante
de pé comum alimenta um desejo secreto de ser subserviente a uma figura
dominante. “Supor que uma admiração fetichista de um amante pelo pé de
sua amada decorre de um desejo latente de ser chutado por ela”, proclama
ele, “é tão descabido quanto supor que uma admiração fetichista pela mão
dessa mulher indica um desejo latente de levar um tapão na orelha.”
Ellis estava convencido de que as crianças mais inteligentes e precoces
com frequência são particularmente “sujeitas a se tornar presas de um
simbolismo casual” em seu desenvolvimento sexual, o qual molda para
sempre suas orientações adultas. Um exemplo especialmente vívido de uma
criança assim, nesse caso uma muito perturbada, está exposto no American
Journal of Psychotherapy num artigo intitulado “The Treatment of a Child
Foot Fetishist”. Uma equipe de médicos liderada por Jules Bemporad tratou
do caso. O menino, que os psiquiatras chamaram de “Kurt”, apresentou-se
pela primeira vez ao pediatra aos oito anos. Seu resultado em testes
completos de QI, de 129, situava-o na faixa superior, mas em algum ponto
ao longo do caminho ele havia adquirido o estranho hábito de se aproximar
sorrateiramente da mãe, tirar-lhe os sapatos e lamber-lhe os pés com grande
excitação. “Enquanto lambia os pés”, escrevem os psiquiatras, “ele tinha
regularmente uma ereção e brincava com seu pênis.” Uma investigação um
pouco mais profunda do passado do menino trouxe à tona a seguinte
história:

A preocupação do menino com os pés da mãe começou no primeiro ano


de vida; a mãe se lembra de que ele “gostava de brincar com os meus
pés” e ela o estimulava, considerando aquilo bonitinho. Ela costumava
se deitar na cama enquanto Kurt lhe fazia uma massagem nos pés – uma
experiência agradável para ela e uma fonte de conforto para ele. Pouco a
pouco, a fricção passou a ser acompanhada por toques com a boca e
lambidas, e a mãe passou a dar recompensas monetárias ao filho por
suas “massagens”. Quando ele tinha cinco ou seis anos, o ato havia se
tornado sexualmente excitante, conduzindo a gritos arrebatados e
manipulação genital. Foi nesse estágio que a mãe alega ter começado a
proibi-lo de entrar em contanto com seus pés.

Nesse estágio, é claro, era tarde demais. Os autores acompanharam Kurt


até os dezesseis anos. Embora ele continuasse a se sobressair na escola e
conseguisse ganhar controle sobre seus sintomas óbvios em relação aos
dedos do pé da mãe, sua obsessão por pés continuou praticamente intacta, e
a permissividade brincalhona da mãe deixou-lhe problemas sexuais para
toda a vida. Havia outros fatores envolvidos também, que compunham um
pesadelo freudiano. O pai judeu distante e anal-retentivo do menino
supostamente lhe teria contado um dia, quando passavam por uma
delicatéssen, que os salames pendurados na vitrine eram os pênis cortados
de cadáveres. (Em retaliação, Kurt começou a decorar seu quarto com
adornos cristãos.) E a mãe admitiu que brincava com o pênis do filhinho
durante os banhos, chamando-o de “lindinho”.
Cerca de uma década mais tarde, a psicoterapeuta infantil britânica
Juliet Hopkins descreveria o caso de uma menina pequena de
comportamento muito masculinizado que também tinha um problemático
interesse erotizado por pés. A interpretação de Hopkins das origens do
fetiche de pé da menina é que tudo começou na banheira. O pai costumava
dar banho na filha mantendo-a sentada em seu colo na banheira. Da
perspectiva da criança, diz Hopkins, ver os dois pares de pés juntos, com
sua aparência semelhante, lhe parecia confortador e encorajador, porque
contrabalançava a diferença mais óbvia – e ameaçadora – na anatomia
genital.
Apesar disso, embora seja fácil topar com histórias sensacionais, é só
para uma exígua minoria que essa queda erótica por pés se torna sinistra ou
criminosa. A maioria dos psiquiatras acredita que, a menos que ela interfira
com o ajustamento do indivíduo à sociedade ou seu bem-estar mental,
fetiches não deveriam ser tratados como um “problema” a requerer
intervenção clínica. De fato, 80% da amostra homossexual de Weinberg
relatou manter um relacionamento com um companheiro compreensivo,
disposto a aceitar seu fetiche não compartilhado incorporando as carícias
com os pés nas rotinas sexuais normais do casal. (De fato, olhando para
trás, desconfio que, dado seu extraordinário interesse em praticar felação
com meus dedos dos pés, um dos primeiros homens com quem estive tinha
um fetiche de pé secreto. Sinceramente, eu não teria me importado muito;
só o enxotei para seu próprio bem, pois eu estava sofrendo um caso grave
de pé de atleta naquele verão.) Em relação ao apoio do parceiro, os
pesquisadores também descobriram que ter acesso a grupos como o Foot
Fraternity reduz significativamente a confusão e o descontentamento,
permitindo que indivíduos de gostos semelhantes saiam do armário – ou da
caixa de sapatos – e explorem seus interesses comuns em aberto conforto
dentro de uma comunidade não estigmatizante.
Essa abordagem de viva e deixe viver não foi certamente, contudo,
aquela adotada pelo terapeuta Joseph Cautela em 1986. Cautela apresentou
a transcrição real de um caso ao Journal of Behavior Therapy and
Experimental Psychiatry detalhando sua primeira sessão com um fetichista
de 31 anos muito solitário que, desde que participara de brincadeiras
turbulentas com outros meninos quando era adolescente, e ficara excitado
por todos aqueles pés no ar, viu-se fantasiando sobre pés de meninos de
doze a catorze anos. É importante ressaltar que o homem nunca se deixara
levar por esses sentimentos; queria ser “normal” e por isso procurou
tratamento. Cautela tentou reorientar o paciente, esforçando-se por desviá-
lo não só de pés de meninos, mas do sexo masculino de maneira geral.
Claro que poucos pais ficariam muito satisfeitos de ver esse sujeito
trabalhando numa loja de calçados infantis, mas a julgar pelo relato do caso,
ele pelo menos parecia ser bastante inofensivo, de modo que seu tratamento
é uma evidência muito triste daquele tempo. Mas cabe a você julgar. Vamos
ouvir o que se passou em sua primeira sessão de terapia:

TERAPEUTA: É muito importante que você saiba que cada vez que se
fantasia e se masturba em torno de lutas com meninos, está agravando
seu fetiche. É como fazer isso na realidade. Você fortalece o hábito.
PACIENTE: Suponho que você está certo, mas isso foge ao meu
controle.
TERAPEUTA: Bem, vou ajudá-lo a ganhar controle sobre o hábito.
PACIENTE: Você pode?
TERAPEUTA: Bem, temos uma boa chance, se você cooperar. Posso lhe
ensinar relaxamento, ensinar-lhe a tríade de autocontrole para você se
livrar de seus pensamentos negativos e passar a imaginar que algo
terrível ou repugnante está acontecendo se iniciar uma fantasia sexual
inadequada.
PACIENTE: É só isso?
TERAPEUTA: Não. Há outros mecanismos de enfrentamento que
podemos usar. Além disso, podemos tentar fazê-lo sentir-se excitado por
mulheres.
PACIENTE: Mas isso não é pecado?
TERAPEUTA: Bem, o que é mais pecaminoso: ter um fetiche de pé que
pode arruinar sua vida ou aprender a ser excitado por mulheres?
PACIENTE: Bem, se você põe as coisas nesses termos.
TERAPEUTA: Estou apenas dizendo que, em minha experiência no
tratamento de fetiches, é necessário desenvolver relações e excitação
heterossexuais. Depende de você querer mudar. Essa é a minha
abordagem.
PACIENTE: Certo. Isso faz sentido.
É bastante difícil explicar a existência de heterossexuais podófilos de
uma perspectiva evolucionária. Sob certas condições no passado ancestral,
esses fetichistas de pé do sexo masculino (talvez entre outros fetichistas)
podem ter tido, muito estranhamente, uma vantagem sobre aqueles cujos
padrões de excitação eram menos discriminativos. Sabe-se que a maioria
dos fetichistas tem gostos muito específicos, por isso parceiros que
correspondam a seus desejos e se disponham a aceitá-los – ou, neste caso,
que possuam pés que os façam ruborizar – são difíceis de encontrar. Apesar
disso, em alguns casos, ter menos parceiros reprodutivos e fazer sexo
apenas com mulheres muito particulares pode ser a chave para o sucesso.
Esta é a teoria intrigante, ainda que especulativa, sugerida pelo
pesquisador James Giannini e colegas na revista Psychological Reports.
Parece que, historicamente, a erotização cultural do pé feminino coincidiu
com a ocorrência de epidemias sexualmente transmissíveis nessas culturas.
Gostos podofílicos ampliaram-se e declinaram à medida que doenças
seguiram seu curso, e os autores ilustram como o amor ao pé se manifestou,
depois declinou, durante as epidemias de gonorreia no século XIII, de sífilis
no século XVI e XIX e de Aids no século atual. Na Espanha do século XVI,
por exemplo, os pintores começaram a se especializar, pela primeira vez na
história, em retratos do pé feminino, e sapatos que mostravam um
pedacinho provocante da “divisão entre os dedos” faziam o maior sucesso.
Mais uma vez, as ideias de Giannini aqui são extremamente especulativas,
mas essa é uma hipótese promissora à espera de ser corroborada por mais
dados populacionais sobre comportamentos sexuais e fetichismo. Se o
sapato servir, como se costuma dizer.
A história de um amante da borracha

EM 6 DE JUNHO DE 1969, na zona sul de Michigan, um detetive,


aparentemente percebendo alguma significação para a ciência no inusitado
relato que tinha diante de si, sentou-se à sua mesa e datilografou uma
prosaica carta de encaminhamento para um conhecido no Kinsey Institute
for Sex Research. O detetive estava escrevendo a respeito de um paciente
do sexo masculino que fora mantido voluntariamente numa enfermaria
psiquiátrica em Kalamazoo – um polido e confesso “borrachófilo” que, nos
recônditos mais sombrios de sua própria profunda vergonha e mortificação,
ao som do estival zumbido elétrico das cigarras, do som estridente de rodas
enferrujadas de carrinhos de hospital e dos gemidos dos demais pacientes
como uma orquestra para seus pensamentos, havia passado várias longas
semanas sentado em seu leito, encurvado, tentando furiosamente expurgar
seus demônios sexuais através de sua pena. “Este relato é minha alma e irá
salvar minha vida”, escreveu o paciente. E foi esse relato que acabou
pousando pouco depois sobre a mesa do detetive e foi olhado de esguelha,
enfiado num envelope, despachado por via aérea para Bloomington e por
fim discretamente engavetado junto com dezenas de milhares de outros
relatos semelhantes nos arquivos inéditos do Kinsey Institute.
Quarenta anos depois, sob o brilho suave da iluminação fluorescente da
biblioteca do instituto, deparei por acaso com a autobiografia sexual
manuscrita desse fetichista – juntamente com a austera nota de
encaminhamento do detetive – quando trabalhava num livro, e devo dizer
que a apresentação que esse homem fazia de sua condição era um bem
formulado e surpreendente autoexorcismo. Num documento ainda
efervescente de medo, que se expandia por cerca de cinquenta páginas de
prosa lúcida, densamente comprimida, ilustrada com passagens bíblicas,
esse “amante da borracha” – que havia sido preso por vários crimes
relacionados a borracha, o menor deles tendo sido o ato de fazer milhares
de ligações telefônicas indecentes para vendedoras de lojas de
departamentos, perguntando sobre biquínis de borracha para sua esposa
imaginária enquanto acariciava anúncios plastificados de modelos com
trajes de elástico com uma das mãos e a si mesmo com a outra – fazia um
esforço febril para compreender as origens de seu próprio desejo insaciável
por borracha e carne.
Pelo que lhe era dado saber, tudo começara quando, aos sete anos,
deparara com o cintilante maiô branco de borracha da mãe pendurado numa
corda na varanda dos fundos, um evento excitante que coincidiu com sua
primeira tomada de consciência dessa estranha excitação em seu baixo-
ventre. O que começou como um hábito juvenil bastante inocente, porém,
iria acabar criando chifres e se transformando numa identidade sexual
adulta extremamente fetichista – e criminosa. “Ele datilografava num cartão
8 × 13 que gostava de esguichar esperma em toucas e cintas de borracha”,
escreveu o detetive, que num típico desleixo administrativo deixou a
característica mancha de uma caneca de café no memorando da delegacia.
“Depois [ele] punha os cartões na caixa de correspondência das vítimas e
por vezes sob o limpador de para-brisa de seus carros.”
Você pode pensar que este amante patológico da borracha é um caso
extremo de sexualidade que desandou, e talvez realmente seja. Mas
mediante o estudo dos sexualmente anormais, os pesquisadores podem
adquirir uma compreensão única dos mecanismos nuançados e de outro
modo ocultos do desenvolvimento sexual humano e da psicossexualidade
normal. A exposição do borrachófilo ao maiô da mãe na infância, uma peça
incrivelmente branca de tecido, ainda rebrilhando com a água do lago e
fragrante com seu suor, talvez tenha simplesmente coincidido com uma
ereção casual. Essa química foi contudo tão poderosa que, depois que ele
massageou aquele elástico entre seu pequeno polegar e o indicador, tudo
ficou perdido para sempre.
Esse sistema básico de desenvolvimento, em que certos eventos
salientes de nossa infância deixam uma marca permanente em nossas
sexualidades em desenvolvimento, talvez não seja extremamente raro. De
fato, que nossas primeiras experiências de infância moldam nossas
preferências sexuais adultas – em especial, o que nos acende e apaga, por
mais sutis ou mesmo inconscientes que essas tendências particulares
possam ser – poderia até ser banal. E assim como o amante da borracha
institucionalizado, os mais carnalmente triviais entre nós poderíamos
também dever nossas preferências secretas no quarto de dormir ao fato de
nos termos sentido excitados, em algum momento no passado distante, por
nossos próprios pais, parentes ou amigos de infância.
Considere o caso de uma mulher de 29 anos, relatado num velho artigo
da Archives of General Psychiatry, que percebeu, para sua consternação,
que não era avessa a um pouquinho de sadomasoquismo e a olhar fixamente
o pênis quando fazia sexo com homens. Ao explicar esses estranhos
gatilhos eróticos, a mulher lembrou:

Quando eu tinha quatro anos, meu pai me pegou uma vez me


masturbando. Ele me pôs de joelhos e me deu palmadas no traseiro.
Estava de pijama, e a abertura na frente de suas calças abriu-se
largamente, deixando-me ver seu grande pênis e o escroto escuro
movendo-se bem perto de minha boca cada vez que ele levantava a mão
… . Desde então, associei subconscientemente batidas em meu traseiro
com a visão de seu pênis e minha primeira excitação sexual.

O problema, claro, é que experiências sexuais de infância, e em


particular sua relação causal com a sexualidade humana adulta, são um
tópico elusivo, difícil de estudar, pelo menos em um sentido rigorosamente
controlado. Trata-se também de uma área de pesquisa de que uma sociedade
pudica – ou pelo menos que concebe a sexualidade de um indivíduo como
surgindo do nada junto com as primeiras descargas de hormônios (ou,
alternativamente, como se revelando num sentido extremamente inato,
programado, impenetrável à experiência, por exemplo, “o gene gay”) –
prefere desviar os olhos, apesar de sua centralidade para a experiência
humana. Diferentemente de, digamos, estudar a aquisição de linguagem em
crianças, examinar as vias de desenvolvimento precisas que conduzem à
sexualidade adulta é mais ou menos impossível. Não por ser empiricamente
impossível, mas porque a sexualidade infantil é um daqueles assuntos
intocáveis que são exterminados pelas cercas elétricas dos conselhos de
ética das universidades, e por isso corre o risco de permanecer mal
compreendida para sempre. Assim, por mais intrigantes que relatos pessoais
retrospectivos como os que vimos acima possam ser, infelizmente eles são
pouco mais que anedotas.
Nunca subestime, porém, a engenhosidade de um bom experimentalista.
Embora o exame dos vínculos causais precisos entre a exposição precoce a
estímulos específicos e a sexualidade adulta não se preste exatamente à
manipulação de laboratório, ainda pode haver maneiras de explorar os
mistérios do desenvolvimento geral usando métodos controlados. Por
exemplo, para muitos propósitos investigativos, crianças podem ser muito
facilmente substituídas por ratos, e foi isso mesmo que os pesquisadores
Thomas Fillion e Elliott Blass fizeram num estudo hoje clássico, mostrando
como experiências precoces podem ser importantes para moldar o
comportamento sexual adulto. Como relatam no estudo que publicaram na
Science em 1986, Fillion e Blass pegaram três ratas que haviam acabado de
dar à luz ninhadas de filhotes e alteraram experimentalmente os odores
dessas mães de diferentes maneiras. Uma das mães-ratas teve os mamilos e
a vagina revestidos com um perfume semelhante ao de limão chamado
citral; outra mãe-rata teve apenas seu dorso revestido com o mesmo
perfume citral; e por fim, na terceira mãe-rata, nenhum perfume de limão
foi aplicado – em vez disso, seus mamilos e vagina foram pincelados com
uma solução salina isotônica inodora. Assim, depois que as mães foram
reunidas com seus filhotes, as três ninhadas diferiram uma da outra com
relação ao odor particular – ou pelo menos a localização desse odor – que
emanava de suas mães enquanto ela as amamentava.
Depois de desmamados, os ratinhos foram afastados permanentemente
de suas mães, e se dedicaram a fazer as coisas que os ratos jovens fazem.
Mais tarde, quando tinham cerca de cem dias de idade, os ratos machos
sexualmente maduros dessas ninhadas iniciais foram introduzidos,
individualmente, a uma de duas ratas receptivas. Mas aqui está o truque.
Antes de introduzir os machos a essas novas ratas, Fillion e Blass haviam
revestido uma delas perivaginalmente com um odor citral, deixando a outra
com sua vagina cheirando au naturel. Embora os genitais com odor de citral
fizessem pouca diferença para machos das duas outras ninhadas – eles
ficavam felizes por fazer sexo com ambas as fêmeas –, aqueles machos que,
quando filhotes, haviam mamado numa mãe cujos mamilos e vagina
cheiravam a limão ejaculavam significativamente mais depressa quando
eram agora acasalados como adultos com uma parceira sexual fêmea com
cheiro de limão. De fato, os investigadores relataram que esses machos
tinham até dificuldade em chegar ao orgasmo quando se acasalavam com as
fêmeas inodoras (ou pelo menos tão inodoras quanto vaginas de ratas
podem ser).
Mas podemos generalizar esses achados sobre o Édipo entre os roedores
para o desenvolvimento da sexualidade humana? Pelo que sei, estudos
similares não foram feitos com nossa própria espécie – embora seja
interessante especular a respeito dos possíveis efeitos da amamentação
humana sobre as preferências e tendências sexuais de homens adultos. Por
mais presos que estejamos à ideia de que as crianças são assexuadas,
contudo, é improvável que algum dia saibamos ao certo se esses dados têm
algum análogo na sexualidade humana; além disso, imagino que seria um
verdadeiro desafio encontrar mães dispostas a bulir com o desenvolvimento
de seu filho nesse domínio. Transformar o próprio filho num fetichista com
uma atração doentia por órgãos reprodutivos com cheiro de Ajax Fresh
Lemon pode ser ir muito além do que a ciência exige de nós, mesmo que
isso seja feito por razões louváveis.
Se pelo menos aquele borrachófilo há muito esquecido de Michigan
tivesse tido conhecimento desses curiosos mecanismos de marca sexual,
poderia ter encontrado algum conforto na ciência em vez de ser
implacavelmente acossado por sentimentos religiosos de culpa. Que
desgraça ser igual a todas as outras pessoas em princípio, de maneira
subjacente, mas, em decorrência de algo que foge em grande parte ao nosso
controle, tão diferente na expressão técnica.
Na verdade, talvez não seja tarde demais para ele, afinal de contas. Em
sua carta o detetive escreveu que nosso amante da borracha estava na
enfermaria psiquiátrica, “onde ele espera passar o resto de seus dias e viver
até chegar realmente à velhice”. Segundo meus cálculos, ele deveria estar
com cerca de 85 anos agora. Se o pessoal do hospital soube lidar com
computadores e foi liberal o bastante para permitir aos pacientes navegar
on-line, espero sinceramente que ele tenha vivido o suficiente para
experimentar o renascimento sexual propiciado pela internet… Ele teria
encontrado dezenas de milhares de outros como ele que teriam satisfeito
com prazer suas fantasias, poupando-o de recorrer a atividades criminosas.
E talvez, apenas talvez, ele esteja lendo este livro neste exato momento,
pensando afetuosamente em sua mãe envolta em borracha branca.
PARTE V

A noite das damas


Ejaculação feminina: uma estrada científica
menos explorada

A DESPEITO DAS MINHAS PRÓPRIAS inclinações sexuais, que tentarei impedir


que saturem nossas discussões, a ejaculação feminina é um assunto
imensamente fascinante que em grande parte escapou à investigação
científica séria, particularmente de uma perspectiva evolucionária. Isso é
ainda mais intrigante quando se sabe que a ejaculação feminina, definida
em geral como a expulsão de uma quantidade significativa de fluido por
volta do momento do orgasmo – as estimativas variam, em média, de três a
cinquenta mililitros (cerca de dez colheres de chá) –, é um tópico que foi
descrito pela primeira vez por estudiosos cerca de dois mil anos atrás. Não
estamos falando aqui da lubrificação vaginal normal, que acompanha a
excitação feminina, mas de algo mais semelhante às copiosas emissões
seminais que ocorrem com os orgasmos masculinos.
Num extraordinário artigo publicado em 2010 no Journal of Sexual
Medicine, a urologista Joanna Korda e colegas esquadrinharam os textos
traduzidos das literaturas oriental e ocidental antigas e colheram múltiplas
referências que pareciam distinguir entre lubrificação vaginal comum
durante o intercurso e a mais rara ejaculação externa de fluidos sexuais. O
texto taoista do século IV Instruções secretas concernentes à câmara de
jade, por exemplo, escrito para o homem audacioso sobre a arte de
satisfazer uma mulher na cama, sugeria que ele decifrasse os “cinco sinais”
de excitação feminina da seguinte maneira:

1. rosto avermelhado = ela quer fazer amor com você


2. peitos duros e perspiração no nariz = ela quer que você insira seu pênis
3. garganta seca e saliva obstruída = ela está muito estimulada e excitada
4. vagina escorregadia = ela quer ter seu orgasmo em breve
5. os genitais transmitem fluido = ela já ficou satisfeita

Eu não recomendaria que você pusesse em prática estas instruções


secretas hoje em dia; a menção da segunda em sua defesa, alegando,
digamos, que uma mulher com nariz suado queria que você inserisse seu
pênis nela, provavelmente não se sustentaria num tribunal. Mas o fato de
esse texto antigo distinguir entre “vagina escorregadia” e “os genitais
transmitem fluido”, raciocinam Korda e seus coautores, significa que esta
segunda coisa pode “claramente ser interpretada como ejaculação feminina
[no] orgasmo”. Na Índia antiga, o Kama Sutra, que data de 200-400 d.C.,
fala de “sêmen feminino” que “cai continuamente”. E no Ocidente, até
Aristóteles teve algo a dizer sobre a descarga feminina durante o intercurso
sexual, a qual, ressaltou ele, “excede de muito” a emissão seminal do
homem. Ele observou também – e é muito tentador especular sobre como
exatamente teria chegado a essa conclusão – que as ejaculações femininas
tendem a ser “encontradas em geral naquelas que têm pele clara e são de
um tipo feminino, mas não naquelas escuras e de aparência masculina”.
Só na segunda metade do século XVII, contudo, seria apresentado o
primeiro relato verdadeiramente científico da ejaculação feminina: o
ginecologista holandês Reinier de Graaf distinguiu precisamente entre a
lubrificação vaginal, que acompanha a excitação e facilita o intercurso, e a
ejaculação feminina, que é equivalente à emissão seminal. “Esse líquido
claramente não foi destinado pela Natureza a umedecer a uretra (como
pensam alguns)”, escreveu de Graaf, descrevendo o “suco pituitoso” por
vezes excretado por volta do momento do orgasmo feminino. “Os dutos [de
que eles se originam] são situados de tal modo na saída da uretra que o
líquido não toca nela ao escapar.”
Dando um salto no tempo para 1952, deixamos para trás as hordas
históricas de mulheres ejaculando em confusão coletiva e chegamos ao
consultório do ginecologista de origem alemã Ernst Gräfenberg (curioso
como havia tantos homens nessa profissão), a quem, enquanto as
contribuições de de Graaf e outros são negligenciadas, é atribuída a
“descoberta” de uma zona erótica na parede anterior da vagina, correndo ao
longo do curso da uretra. Ernst, em outras palavras, foi quem batizou o
“ponto G” com seu artigo “The Role of Urethra in Female Orgasm”. Ao
rever essa descoberta, Korda e colegas contam como Gräfenberg observou
mulheres se masturbando (presumivelmente em seu consultório) e
expelindo fluidos de sua uretra “em jorros” com o orgasmo. Como isso
nunca ocorria no início da estimulação sexual, mas apenas no clímax do
orgasmo, o médico concluiu que sua finalidade era mais o prazer que a
lubrificação. “Nos casos observados”, escreveu Gräfenberg, “o fluido foi
examinado e não tinha nenhum caráter urinário. Inclino-me a acreditar que
a ‘urina’ relatada como sendo expelida durante o orgasmo feminino não é
urina, mas apenas secreções das glândulas intrauretrais correlacionadas com
aquela zona erógena ao longo da uretra na parede vaginal anterior.”
Na verdade, a ejaculação feminina só foi analisada em termos de suas
propriedades químicas em 1982. Se não é urina e não é sêmen, o que ela é
exatamente? Afinal, segundo um estudo publicado por Amy Gilliland, a
maior parte das ejaculadoras relata a liberação de quantidades “copiosas” de
fluido em torno do momento do orgasmo, o bastante para “ensopar a cama”
ou “borrifar a parede”. É bastante estranho, portanto, que ainda não
tenhamos um nome para essa substância que pelo menos 40% das mulheres
produzem liberalmente pelo menos uma vez em suas vidas.
Quase todos os estudos mostraram uma dissimilaridade química entre a
urina e a ejaculação feminina – de fato, ela tem características em comum
com o fluido seminal. Talvez você se lembre, da nossa discussão anterior
sobre o sêmen masculino, que apenas uma pequena porção daquele fluido
contém espermatozoides; o resto é uma mistura de psicotrópicos. Para
muitas mulheres, no entanto, a urina não está tampouco inteiramente
ausente da emissão. A maioria das ejaculadoras femininas, por si mesmas, e
sem acesso a informação científica, descreve suas próprias explorações do
misterioso material. Algumas o descrevem como grosso e viscoso, ou
salgado, outras como aquoso e inodoro. “Nenhuma pesquisa foi feita nessa
área por mais de vinte anos”, lamenta Gilliland, “e ainda não temos uma
resposta que satisfaça à maioria dos sexologistas sobre o que é o fluido
ejaculado por mulheres ou onde ele é fabricado.”
Parte do problema na investigação do fenômeno sob condições
devidamente controladas, porém, é o fato de que ele não se presta muito a
pesquisas de laboratório. Segundo a maioria das mulheres, elas precisam
estar intensamente excitadas, bem como bastante relaxadas, para ejacular.
Assim, embora a imagem mais clara do que está acontecendo lá embaixo só
possa ser obtida mediante estudos rigorosos, o problema é que sujeitar as
ejaculadoras femininas autodeclaradas a um bombardeio de técnicas
laboratoriais eletromiográficas destinadas a estimular seus clitóris e
provocar ejaculação de certo modo destrói sua disposição. Isso foi algo que
uma equipe de pesquisadores egípcios aprendeu da maneira difícil. Após
afixar múltiplos eletrodos nos genitais de 38 jovens mulheres saudáveis,
além de usar balões vaginais e uterinos para medir pressão, eles
estimularam as mulheres ao orgasmo com o uso de eletrovibração; não
encontraram, porém, uma só gota de ejaculação, apenas lubrificação
vaginal. A única conjectura que puderam fazer é que preliminares talvez
tivessem surtido o efeito desejado. Em contraposição, embora o estudo
envolvesse uma outra amostra de tamanho muito pequeno, uma equipe de
tchecos conseguiu provocar “expulsões uretrais femininas” em dez
mulheres em condições de laboratório em 1988. Mas essas mulheres,
diferentemente daquelas no estudo egípcio, relatavam uma história de
ejaculações frequentes.
De muitas maneiras, portanto, nossa melhor compreensão da ejaculação
feminina até hoje vem dos relatos das próprias ejaculadoras. Mas sabemos
pelos ensaios químicos pelo menos isto: embora possa ter traços de ureia, a
ejaculação feminina obviamente não é urina. Muitas das mulheres
entrevistadas por Gilliland contaram que, após vários episódios humilhantes
diante desse inesperado jorro de fluido, haviam passado a esvaziar a bexiga
antes de fazer sexo, mas ainda assim ejaculavam prodigiosamente. De fato,
seis das treze mulheres que participaram do estudo nunca tinham ouvido
falar de ejaculação feminina antes de ler a descrição feita no estudo; elas
simplesmente supunham ser “anormais”.
Para a maioria das ejaculadoras, o fenômeno não acontece todas as
vezes que ocorre um orgasmo. Mas isto está em nítido contraste com uma
dúbia afirmação feita por William Masters e Virginia Johnson, em 1966, de
que a ejaculação feminina não passa de lenda urbana. Embora algumas
mulheres tivessem tido a sorte de encontrar parceiros que apreciavam suas
ejaculações – os parceiros estariam certos ao supor, afinal, que eram
amantes triunfantes se realmente conseguiam levar uma mulher a ejacular –,
a maioria tinha, pelo menos a princípio, sentido profunda vergonha. Em
alguns casos, isso se traduziu em celibato autoimposto e, como não é de
surpreender, tensão no relacionamento. A educação pode transformar vidas,
e até salvar casamentos. Uma participante no estudo de Gilliland descreveu
a transformação ocorrida no marido depois que ele compreendeu que sua
ejaculação era sinal de sua extraordinária excitação sexual: “Antes ele dizia:
‘Não quero xixi em mim’, ou ‘Você não pode ir ao banheiro antes de fazer
sexo?’ Agora ele acha isso atraente e diz: ‘Esguiche em mim!’”
A boa notícia é que muitas mulheres percebem que estão conceituando
suas ejaculações de maneiras cada vez mais positivas e fortalecedoras ao
longo de suas vidas. Vejo com muita simpatia a posição de Gilliland quando
ela conclui que, “em geral, é o efeito da ignorância com relação à
ejaculação feminina que deveria nos estimular à ação, não apenas a
curiosidade científica”. Não penso que tenha sido um jogo de palavras
intencional da parte dela, aliás, mas você vê como por vezes é difícil evitá-
los. Apesar disso, e por favor não me tache de insensível, continuo
enormemente curioso com relação à ciência. Por que somente algumas
mulheres ejaculam e não outras? Qual foi o papel da ejaculação feminina na
evolução humana, se é que ela teve algum? E por que – olhe simplesmente
para você mesmo agora – esse é um assunto tão provocador de risinhos, tão
fetichístico para alguns? A ciência tem realmente pela frente um longo,
molhado e escorregadio desafio.
O estranho caso das fag hags: mulheres que
gostam de homens que gostam de homens

COMO FÃ HÁ VÁRIAS DÉCADAS do seriado As supergatas, fiquei triste ao saber


da morte de Rue McClanahan em junho de 2010. De fato, creio que
derramei uma lágrima palpável, detectável, algo que não me lembro de ter
feito pela morte de qualquer outra celebridade, com exceção talvez de Bea
Arthur e Estelle Getty. Soa como um clichê homossexual, eu sei, mas meu
companheiro, Juan, e eu adquirimos o hábito de assistir a um episódio de As
supergatas toda noite antes de dormir. E junto com as outras “gatas”, como
as chamamos, a personagem de McClanahan, Blanche Devereaux – a
petulante beldade sulista com insaciável apetite por cheesecake gorduroso e
homens ricos –, tornou-se uma espécie de amiga imaginária, indutora de
sorrisos, em nossa casa. Felizmente, o espírito carnal de Blanche está
gravado para sempre em nossos DVDs. Sim, eu sei, sou tão gay.
A notícia da morte de McClanahan inspirou-me a ler mais sobre ela na
vida real – bem, pelo menos a gastar energia suficiente para passar os olhos
em seu verbete na Wikipédia. Eu sabia que ela havia sido uma sincera
defensora dos gays e das lésbicas, bem como dos animais, mas não havia
observado que seu apoio aos primeiros remontava aos idos de 1971. Apenas
dois curtos anos após os distúrbios de Stonewall, ela coestrelou um filme
ambientado num bar gay do Greenwich chamado Some of My Best Friends
Are…a e por acaso ela fazia o papel de uma “fag hag depravada”.
E em seguida meu pensamento tomou um outro rumo, deixando a
inimitável Rue e a questão dos direitos humanos de lado para em vez disso
focalizar essa expressão, fag hag.b Ora, nunca vi a mim mesmo como um
fag – embora tenha certeza de que muitas outras pessoas me veem assim, e
infelizmente como nada além disso –, mas, o que é mais importante,
certamente nunca encarei minhas muitas grandes amigas como “hags”. Por
isso eu estava curioso para aprender mais sobre os estereótipos não
lisonjeiros situados na raiz etimológica dessa designação, que descreve
mulheres heterossexuais que tendem a gravitar em torno de homens gays.
Aqui entram a psicóloga Nancy Bartlett e colegas, que publicaram o
primeiro estudo quantitativo sobre “fag hags” na Body Image.
Essas pesquisadoras também achavam a expressão intrigante. Na língua
inglesa, há muitas outras expressões coloridas que captam esse grupo
distinto da população de maneira muito vívida, algumas menos insultantes
que outras, como por exemplo “fruit fly” [mosca-da-fruta], “queen bee”
[abelha-rainha], “fagnet” [ímã de bicha] e “fairy princess” [princesa das
fadas].
Mas é fag hag que encontra ressonância na consciência do público. Os
pesquisadores observam que, tanto na mídia popular quanto na linguagem
cotidiana, a expressão suscita nas mentes da maioria das pessoas a imagem
de uma mulher sem atrativos, acima do peso e desesperada que busca a
companhia de homens gays para compensar a falta de atenção romântica
por parte de homens heterossexuais, de que se ressente. Examinando
anedotas relatadas em pesquisas anteriores, na televisão e em romances
baratos, os autores constatam que outros estereótipos comuns pintam a fag
hag como sendo notoriamente afetada, excessivamente emotiva, instável,
carente de atenção (pense na Karen Walker interpretada por Megan
Mullally em Will & Grace). Especialmente fascinante é a observação dos
autores de que essa categoria social de mulheres que gostam de homens que
gostam de homens pode ser “transculturalmente robusta”: os franceses,
observam eles, referem-se a essas mulheres como soeurettes (irmãzinhas),
os alemães as rotulam de Schwulenmuttis (mamães de gays) e os mexicanos
as conhecem como joteras (jota é comumente usado para “fag”, ou bicha).
No Japão, essas mulheres são chamadas de okoge, cuja tradução literal é “o
arroz queimado que gruda no fundo da panela”.
Segundo os investigadores, o componente “hag” é essencialmente a
crença comum de que essas mulheres “não se sentem bem com seus corpos,
e, em consequência, refugiam-se no ‘mundo gay’ para evitar o julgamento
mais severo e a ênfase na atratividade física feminina inerente à cena social
heterossexual”. A comediante Margaret Cho, uma conhecida e
autoproclamada “fag hag”, declara: “O homem gay na sua vida não está
interessado em sua juventude e beleza. Ele quer conhecer a sua alma. Ele
gosta de você por sua coragem e intelecto. Quer seja linda ou feia, você é
bonita para ele por essas qualidades – e muitas mais.”
Na qualidade de “o homem gay” nas vidas de muitas mulheres, não
estou convencido de que Cho esteja de todo certa a nosso respeito; ela
parece estar idealizando os homens gays. Sem dúvida não faltam homens
gays estúpidos e superficiais por aí. Ela parece também nunca ter ouvido
falar da hipótese evolucionária do “sacana furtivo” do biólogo John
Maynard Smith para a homossexualidade masculina, que postula que, no
passado ancestral, homens gays tinham um acesso singular ao nicho
reprodutivo porque as mulheres baixavam suas guardas na proximidade
deles e outros homens não os viam como competidores sexuais. Afinal de
contas, não somos estéreis, só gays. E coisas mais estranhas aconteceram –
em especial ao se jogar um pouco de gim na mistura.
Mas o que interessava em especial a Bartlett e colaboradores era saber
se há alguma verdade nos estereótipos negativos que envolvem as fag hags.
Assim, eles convidaram 154 mulheres heterossexuais para participar de um
levantamento baseado na internet sobre fag-haggery (a expressão é minha,
não delas). Essas mulheres tinham entre dezessete e 65 anos de idade (28
anos em média) e uma história variada de relacionamentos românticos.
Algumas eram casadas, algumas solteiras, outras divorciadas, viúvas,
namorando no momento, e assim por diante, e a maioria tinha um nível de
instrução razoável, tendo pelo menos alguma formação universitária. Cada
mulher foi solicitada a fornecer certas informações quantificáveis que
permitiriam aos autores testar várias hipóteses fundamentais sobre mitos
que envolvem a fag hag.
Primeiro, as mulheres simplesmente deram os números totais dos
amigos gays, heterossexuais e do sexo feminino que tinham. Além disso,
entre esses amigos, foram solicitadas a classificar seu grau de
“proximidade” com seu melhor amigo gay, hétero e do sexo feminino. Em
seguida, as mulheres completaram um instrumento comumente usado,
chamado “Escala de estima corporal”, um questionário de 24 itens que
mede a atratividade sexual que uma mulher atribui a si mesma e suas
preocupações com o peso. Por fim, cada uma das participantes forneceu
informações sobre sua história romântica nos dois últimos anos, indicando,
entre outras coisas, se havia abandonado o parceiro ou fora abandonada por
ele em relações fracassadas recentes.
Os resultados foram analisados para testar a suposição comum de que
mulheres fazem amizade com homens gays porque têm baixa estima por
seu próprio corpo e se sentem pouco atraentes para homens héteros. Se isso
fosse verdade, raciocinaram os autores, haveria uma associação estatística
significativa entre o número de amigos gays de uma mulher, sua autoestima
corporal e seu sucesso em relacionamentos; em outras palavras, quanto
mais patética fosse a vida romântica de uma mulher e mais ela se visse
como indesejável para homens heterossexuais, mais ela procuraria homens
gays como amigos. Mas os dados revelaram outra coisa. De fato, pelo
menos com essa amostra, não houve absolutamente nenhum vínculo entre o
status de relacionamento de uma mulher, o número de vezes em que ela
estivera na ponta receptora de um rompimento ou sua autoestima corporal e
o número de amigos gays em sua vida.
O desmascaramento de suposições comuns não é novidade na ciência, e
isso se aplica igualmente ao mito da fag hag. Mas esse estudo fez também
alguns achados inesperados. Por exemplo, quanto mais amigos gays uma
mulher tinha, mais sexualmente atraente ela se achava. Ora, obviamente
isso é uma correlação, de modo que podemos apenas especular sobre a
causalidade. Seria possível – como os autores sugerem – que as mulheres
com mais amigos gays sejam na realidade mais atraentes fisicamente que
aquelas com menos amigos gays. Talvez estar na proximidade de homens
gays ofereça a essas mulheres uma trégua do constante assédio de homens
heterossexuais. (Como o estudo de Bartlett mediu apenas a atratividade que
as próprias mulheres julgavam ter, não seu grau de atratividade na avaliação
de outros, esta é uma questão em aberto.) Alternativamente, é possível que
estar cercada por homens gays lisonjeadores eleve a autoestima da fag hag,
e como essa atenção vem de homens, talvez seja especialmente eficaz nesse
sentido. É interessante notar, no entanto, que quanto mais longa era a
duração da amizade de uma mulher com seu amigo gay mais próximo, mais
baixa era a atratividade sexual que ela se atribuía. Interpretando esse
achado inesperado, os autores sugerem que ele pode refletir na realidade
uma verdade essencial mas nuançada do estereótipo da “fag hag”: “Talvez
mulheres que se consideram menos sexualmente atraentes desenvolvam
relações mais estreitas com homens gays.” Outras apenas buscam ligações
superficiais, menos duradouras, com eles.
Para minha própria “princesa das fadas” favorita, Ginger: Isto é para
você. Eu te amo. Para todas as outras, aqui está uma reflexão final para
fazê-las quebrar a cabeça um pouco. Enquanto eu escrevia este ensaio,
ocorreu-me que a categoria social dos homens heterossexuais que gostam
de conviver com lésbicas é espantosamente vazia em nossa sociedade. Sem
dúvida você pode ouvir falar sobre um ou outro “dyke tyke” ou “lesbro”
casual (dois termos que, diferentemente de “fag hag”, estão longe de fazer
parte do vocabulário de gíria popular e que de fato só descobri pesquisando
no Google)c, mas a existência deles é claramente mínima. Sua suposição é
tão boa quanto a minha quando se trata de explicar por que há tamanha
discrepância em frequência na amizade entre heterossexuais dos dois
gêneros e homossexuais.

a Exibido na TV a cabo no Brasil com o título Gay Bar. (N.T.)


b Fag é um termo depreciativo para o homem gay, algo como veado, bicha, e hag é uma bruxa, uma
velha megera. A expressão fag hag designa a mulher que se associa sobretudo ou exclusivamente a
homens gays ou bissexuais, ou tem homens gays ou bissexuais como amigos íntimos. (N.T.)
c Termo depreciativo para a mulher gay, dyke é algo como sapatão, e tyke significa tanto garotinho
quanto cão vira-lata. Lesbro é uma junção entre lesbian, lésbica, e brother, irmão, mas também
colega ou amigo em sentido mais coloquial, como aqui. (N.T.)
O Teatro de Darwin apresenta…
O misterioso caso do orgasmo feminino

DEDIQUEI BASTANTE TEMPO a escrever sobre a curiosa evolução do sistema


reprodutivo masculino em nossa espécie, de modo que é justo dedicar
algum tempo às origens naturais de um mecanismo biológico que não
envolve o cromossomo Y. (Bem, pelo menos não necessariamente.) Não
preciso dizer que o assunto dos orgasmos femininos não é exatamente o
meu preferido. Sendo um homem gay, sempre pensei neles como algo
bastante exótico e estranho, mais ou menos como a urdidura de cestos
decorativos numa pequena aldeia africana. Posso estar errado, mas, até onde
sei, nunca estive sequer no mesmo aposento que uma mulher tendo um
orgasmo, muito menos propiciei um a alguma. Assim, com isso em mente,
vamos dar uma olhada no que acontece com aquelas cuja beatitude
orgásmica não é neurologicamente fundada em algo que se projeta dezoito
centímetros (mais ou menos) além do resto de seus corpos.
Felizmente, um punhado de pesquisadores dedicados despendeu muito
mais tempo com essa questão do que eu. É justo dizer, contudo, que mesmo
esses cientistas ainda dão tratos à bola a propósito da evolução do orgasmo
feminino. Antes de entrarmos no âmago da questão, vamos nos assegurar de
que estamos todos na mesma página com relação ao que um orgasmo
feminino realmente é. Uma boa definição operacional pode ser encontrada
na Annual Review of Sex Research. Segundo a psicóloga Cindy Meston e
colegas:

O orgasmo feminino é uma sensação máxima variável e transiente de


intenso prazer, que cria um estado alterado de consciência, em geral
com uma iniciação acompanhada por contrações rítmicas e
involuntárias da musculatura circunvaginal estriada pélvica, muitas
vezes com contrações uterinas e anais concomitantes e miotonia que
reduz a vasocongestão sexualmente induzida (por vezes só
parcialmente), em geral com uma indução de bem-estar e
contentamento.

Na verdade, à luz dessa descrição e com exceção dos detalhes


femininos, talvez isso não seja, afinal de contas, inteiramente estranho para
mim. De fato, em termos de função evolucionária, mulheres tendo
orgasmos com homens é quase tão intrigante quanto homens tendo
orgasmos com homens. Talvez nunca venhamos a saber quantos de nós
seres humanos fomos concebidos depois que nossas mães tiveram
orgasmos, mas o mesmo mistério não envolve os orgasmos de nossos pais
naquele dia. Diferentemente dos homens, as mulheres não precisam ter um
orgasmo para propagar seus genes.
Assim, de uma perspectiva biológica, a “função adaptativa” do orgasmo
feminino ainda é veementemente contestada. Alguns teóricos, entre os quais
o falecido e legendário Stephen Jay Gould, afirmaram que ele não serve a
absolutamente nenhuma finalidade, sendo apenas um subproduto um tanto
esquisito e não funcional da resposta ejaculatória em homens. Em um de
seus ensaios mais provocativos, “Male Nipples and Clitoral Ripples”,
Gould desenvolveu um antigo argumento apresentado pelo antropólogo
Donald Symons. Em 1979, Symons observou que no início do
desenvolvimento embriológico, homens e mulheres compartilham um
mesmo plano corporal básico. Numa feliz consequência casual da seleção
para a ejaculação masculina (que em homens heterossexuais serve a óbvias
finalidades reprodutivas), alguns dos tecidos conectivos e vias do sistema
nervoso compartilhados foram “acidentalmente” moldados para o prazer
pela evolução nas mulheres também, levando felizmente ao orgasmo
ocasional em mulheres sexualmente maduras. O clitóris é essencialmente a
versão feminina do pênis, uma vez que ambos derivam do mesmo substrato
embriológico. Isso também explica por que os orgasmos femininos são
alcançados mais por estimulação clitoridiana que vaginal.
Para que você não pense que a hipótese do subproduto foi
propagandística, preparada numa bolorenta sala de professores por
misóginos isolados numa torre de marfim, observe que durante anos a
principal defensora dessa posição foi a filósofa da biologia Elisabeth Lloyd.
De fato, foi Lloyd quem inicialmente introduziu Gould ao pensamento de
Symons sobre o assunto, e mais tarde ela escreveria um livro endossando
fortemente a hipótese do subproduto intitulado The Case of the Female
Orgasm. O livro de Lloyd foi acerbamente criticado por muitos pensadores
evolucionários em razão das sugestões feministas não muito sutis do texto;
basicamente, ela afirma que a beatitude carnal feminina foi libertada das
feias realidades da biologia reprodutiva. Sua posição? Senhoras, saiam – ou
fiquem sozinhas em casa, como queiram – e divirtam-se, sua sexualidade
não é uma mera questão de produzir bebês. Com o correr dos anos, porém,
outros detetives de inclinação empírica estiveram trabalhando no caso, e
muitos começaram a questionar a explicação do subproduto, afirmando que
é para uma possível função adaptativa do orgasmo feminino que as
evidências de fato apontam.
Para ajudá-lo a continuar colaborando no papel de detetive orgásmico,
aqui estão algumas pistas sugestivas que pesquisadores nessa área vêm
tentando reunir numa história evolucionária plausível:
1ª pista: Evidências baseadas em gêmeos mostram que a frequência do
orgasmo tem um modesto componente hereditário. Por mais desconfortável
que seja pensar em sua avó de rosto afogueado, gemendo em êxtase, há uma
clara contribuição genética para o orgasmo feminino. Mas os fatores
hereditários explicam apenas um terço da variância na população.
2ª pista: A maioria das mulheres relata que tem maior probabilidade de
experimentar um orgasmo ao se masturbar do que durante o intercurso
sexual com um parceiro masculino, e, o que é importante, esses orgasmos
masturbatórios nem sempre dependem da simulação de sexo peniano-
vaginal. No entanto, como o psicólogo evolucionário David Barash
observa, “o simples fato de algo (i.e., orgasmo feminino) poder ser
alcançado de diversas maneiras (i.e., masturbação) não desmente que ele
tenha evoluído por ser particularmente adaptativo num contexto diferente,
específico (i.e., intercurso heterossexual)”.
3ª pista: Mulheres instruídas são mais propensas a relatar orgasmos
masturbatórios – mas não mais propensas a experimentar orgasmos durante
o coito – que mulheres menos instruídas. A religiosidade é um outro
mediador social: mulheres religiosas tendem a ter orgasmos menos
frequentes que mulheres não religiosas (ou pelo menos relatam isso).
4ª pista: Usando dados de relatos pessoais colhidos de mulheres
americanas em idade universitária, pesquisadores como o psicólogo Todd
Shackelford e o biólogo Randy Thornhill descobriram uma correlação
positiva entre a frequência de orgasmos e a atratividade física de parceiros
masculinos, com a atratividade sendo medida por classificações subjetivas e
índices de simetria facial. Lembre-se de que em termos de “aptidão
genética”, a atratividade tende a se correlacionar positivamente com saúde e
valor genético global.
5ª pista: Há alguma evidência fisiológica de que o orgasmo feminino
leva à retenção de mais esperma, ou esperma de melhor qualidade, em meio
a uma única ejaculação. Creio que não posso expressar isso melhor que os
psicólogos Danielle Cohen e Jay Belsky: “Durante o orgasmo copulativo
feminino, o colo do útero mergulha ritmicamente na poça de sêmen,
aumentando com isso a retenção de espermatozoides (em cerca de 5%) em
relação ao intercurso sem orgasmo, juntamente com a probabilidade de
concepção.” Mas, como Lloyd ressalta, a maior parte das referências a esses
“dados” clássicos sobre as propriedades de “sucção uterina” do orgasmo
feminino deriva de uma única participante e foi parte de um velho estudo
realizado em 1970. Apesar disso, de maneira reveladora, o “desejo de
conceber” de uma mulher leva a orgasmos autorrelatados mais frequentes
durante o sexo, e os orgasmos femininos são também mais propensos a
ocorrer durante o período mais fértil do ciclo menstrual.
6ª pista: Num provocativo estudo feito pelos psicólogos Thomas Pollet
e Daniel Nettle, mulheres chinesas que namoravam ou estavam casadas
com parceiros ricos relatavam ter orgasmos com mais frequência que
mulheres cujos parceiros ganhavam menos dinheiro. Isto é, a renda do
parceiro do sexo masculino tinha forte correlação positiva com a frequência
do orgasmo feminino, e esse efeito da renda manifestou-se mesmo depois
que os autores controlaram (excluíram) um grande número de variáveis
estranhas, inclusive saúde, felicidade, educação, renda pessoal da mulher e
grau de “ocidentalização”. De qualquer maneira, se aplicássemos a teoria de
Pollet e Nettle a outras espécies, talvez constatássemos que as mulheres não
são as únicas fêmeas no reino animal cujos orgasmos estão vinculados ao
status e à riqueza de seus parceiros sexuais machos. Entre os macacos-
japoneses, as fêmeas exibem a reação de estreitamento de “tipo orgásmico”
com mais frequência quando estão se acasalando com machos de status
elevado. Ainda não há dados que nos indiquem se elas também mordem ou
não seus lábios inferiores no processo.
Juntos, esses achados parecem dar razão a Barash, um veemente crítico
de Lloyd que, de fato, tem afirmado que o orgasmo feminino “é um sinal
pelo qual o corpo de uma fêmea diz a seu cérebro que ela está sexualmente
envolvida com um indivíduo [socialmente dominante]”. Pollet e Nettle
especulam que o orgasmo feminino pode estar associado à renda do homem
porque dinheiro (recursos) é um indicador confiável do investimento a
longo prazo do macho na prole e pode também refletir características
genéticas subjacentes desejáveis. Sob essa luz, o orgasmo feminino pode ter
um papel de vinculação emocional, motivando o comportamento sexual – e
portanto a concepção – com machos de status elevado. Esta é uma maneira
de interpretar os dados, é claro, mas talvez você tenha suas próprias ideias a
respeito. A autoestima dos homens de status elevado tipicamente é maior
que a dos demais, por exemplo, o que possivelmente lhes permite ser
amantes melhores, mais seguros, no boudoir. Em outras palavras, é possível
que o comportamento real dos homens no quarto de dormir importe mais do
que seu capital social ou seu valor líquido.
Como você pode ver, as origens naturais do orgasmo feminino
permanecem um tanto misteriosas. Alguns dos achados e a lógica falam em
favor da hipótese do subproduto, ao passo que dados recentes sobre a
qualidade do macho e a frequência do orgasmo feminino lançam razoável
dúvida sobre as explicações segundo as quais ele não tem função. Mais
ainda, o orgasmo feminino é uma dessas questões que não se prestam
facilmente à experimentação controlada no laboratório. Não podemos, é
claro, instruir mulheres a ter sexo com homens com diferentes status e graus
de atratividade para ver se elas chegam ao clímax ou não. Há muitas outras
avenidas importantes a explorar, inclusive se orgasmos em lésbicas, por
exemplo, estão associados a atributos da parceira semelhantes aos
apontados acima, ou se obedecem a um padrão completamente diferente.
Eu gostaria muito que esta história tivesse um clímax e que eu pudesse
deixar você satisfeito, mas infelizmente ela não tem um final feliz. Como
vimos, algumas das maiores mentes na biologia evolucionária moderna
debruçaram-se sobre as partes pudendas tomadas pelo prazer com um
sucesso (ou pelo menos concordância) assombrosamente pequeno. Assim,
no fim das contas, creio que tenho de deixar para vocês, queridos leitores, a
tarefa de compilar um conto de fadas sobre o orgasmo feminino dando
especial atenção às pistas que lhes foram oferecidas.
A megera evoluída: por que as adolescentes
são tão cruéis umas com as outras?

NÃO MUITO TEMPO ATRÁS, fui convidado a fazer uma breve palestra para a
turma da primeira série de meu sobrinho Gianni. Nada muito profundo,
claro, apenas contar como foi viver num lugar estrangeiro como Belfast. O
ponto alto de minha apresentação foi a gargalhada que arranquei ao
mencionar que as pessoas daquele lado do Atlântico chamam fraldas de
“nappies” e não de “diapers” e biscoitos de “biscuits” e não de “cookies”.
Mas é preciso agradar à plateia.
Ora, minha irmã mora numa cidadezinha no centro de Ohio, de modo
que talvez haja algo no Meio-Oeste que gera crianças de seis anos
especialmente cativantes e afetuosas. Mas eu deveria ser perdoado por
tomar o partido de Rousseau por um momento naquela tarde com relação à
sua ideia excessivamente simplista de que a sociedade corrompe e
transforma esses anjinhos ingênuos, inocentes, em adultos monstruosos.
Para dar um exemplo, uma menininha acenou para mim de uma maneira tão
gentil que tive a impressão, naquele instante, de estar em presença de uma
espécie melhor de ser humano, para o qual as outras pessoas aparecem
como benévolas curiosidades, e para o qual os artifícios da etiqueta social
não embaçaram e subjugaram brutalmente as emoções genuínas.
O que estilhaçou essa minha rósea ilusão foi ter consciência de que
essas diminutas pessoinhas que riam, sentadas de pernas cruzadas no tapete
diante de mim, podiam também ser vistas como incubando adolescentes.
Talvez seja coisa minha, mas eu seria capaz de jurar que o mundo não
conhece uma alma mais sádica que a de uma adolescente intoxicada por
hormônios, irritada e dominada pela angústia. E dentro de poucos anos essa
garotinha de tranças pode se transformar numa aluna da nona série, que
revira os olhos, fofoca, rejeita, faz sarcasmos, repudia e forma panelinhas,
enredada no clássico comportamento maldoso que as adolescentes exibem
nas cantinas das escolas.
Se isso lhe parece uma expressão de misoginia, esteja certo de que é
apenas uma afirmação empírica. (Fique certo, também, que temo ter muito
em comum com esse estilo tático, e tenho grande respeito por
maquiavélicos mais refinados, de modo que não estou jogando pedras aqui.)
De fato, ao longo das últimas décadas, estudiosos de várias disciplinas –
inclusive psicologia do desenvolvimento, biologia evolucionária e
antropologia cultural – observaram uma surpreendente diferença nos
padrões usuais de agressão entre homens e mulheres em idade reprodutiva.
Embora os meninos adolescentes e adultos jovens sejam mais propensos a
se envolver em agressão física direta, inclusive golpes, socos e chutes, as
meninas, em comparação, exibem pronunciada agressividade social.
Aqui está um exemplo prototípico, tomado de um estudo publicado no
International Journal of Adolescence and Youth:

Jo é uma menina de quinze anos. É uma aluna mediana em sua escola


secundária, onde pratica tênis no verão e netball no inverno. No
passado, era bem-aceita, tendo um grupo unido de amigas e dando-se
bem com a maioria dos colegas. Após faltar ao colégio um dia por
doença, porém, ela volta para descobrir que as coisas mudaram.
Aproxima-se de seu grupo usual, mas quando tenta conversar com
qualquer das meninas, estas lhe dão respostas abruptas e hostis. Tenta
trocar um olhar com a amiga, Brooke, mas esta desvia os olhos. Na
primeira aula, senta-se em seu lugar habitual, só para descobrir que
Brooke está sentada com outra pessoa. No intervalo, junta-se ao grupo
com atraso, mas a tempo de ouvir uma das meninas falando mal dela.

Em grupos de discussão com meninas adolescentes no sul da Austrália,


pesquisadores descobriram que a situação de Jo é incrivelmente comum.
Lamentável, em especial, é que figuras adultas de autoridade como
professores e pais muitas vezes não percebam esses atos devastadores de
violência social por serem tão sutis e ocorrerem muitas vezes “em contexto”
– isto é, por serem menos visíveis que as altercações físicas dos meninos.
Permitam-me tentar evitar as críticas óbvias observando que não quero
dizer com isto, é claro, que todas as adolescentes são felinas – será que
preciso ressaltar o óbvio, dizendo que muitas são, é claro, pessoas
maravilhosas, atenciosas e maduras? Não quero dizer tampouco que os
meninos adolescentes nunca são socialmente agressivos ou que as meninas
não manifestam violência física. Mas os achados culturalmente recorrentes
de agressão social feminina, e a distribuição de idade em boa medida
invariante em que tais comportamentos e atitudes são especialmente
proeminentes (surgindo de maneira súbita entre as idades de onze e
dezessete anos nas meninas), sugerem a presença, no belo sexo, de uma
forte inclinação psicológica que conduz “naturalmente” a esses tipos de
manifestação.
Os antropólogos Nicole Hess e Edward Hagen investigaram o caráter
inato ou não da agressividade social feminina. Eles reuniram 255 alunos de
graduação – homens e mulheres com idades entre os dezoito e 25 anos – e
pediram-lhes para ler e refletir sobre a situação social que passo a resumir.
Digamos que você está numa festa no campus e com o canto do olho
nota um de seus colegas de classe (do sexo masculino para os participantes
homens e do sexo feminino para as participantes mulheres) conversando
com o monitor de uma disciplina que você faz junto com esse outro
estudante. Você o ouve dizer mentiras bastante graves a seu respeito; em
particular, ele ou ela diz ao monitor que você não tem trabalhado num
projeto comum para a matéria. Em vez disso, tem sido negligente, chegando
à aula de ressaca e aloprando num carro incrementado. O monitor lança um
olhar sobre você, com sua cerveja na mão, e desvia os olhos depressa, como
se enojado. Em seguida seu colega dissimulado aproxima-se de você e diz
inocentemente: “Olá! Como vão as coisas? Tem feito um tempo ótimo estes
dias, não?”
Depois de lerem esta pequena história, os participantes completavam
um questionário dizendo como teriam gostado de responder a esse colega
mexeriqueiro. Numa escala de 1 a 10, com 1 sendo “discordo fortemente” e
10 sendo “concordo fortemente”, eles eram solicitados a classificar
afirmações como “Gostaria de dar um soco nessa pessoa agora mesmo”,
“Tenho vontade de dizer a todo mundo na festa que essa pessoa é ignorante
e vomita comentários inúteis durante as aulas”, e “Sinto vontade de dizer:
‘É mesmo, tem feito um ótimo tempo’”. Enquanto os dois primeiros itens
são medidas de agressão direta e indireta, respectivamente, o último item
presumivelmente explorava a disposição dos participantes a virar a outra
face, por assim dizer. É importante destacar que Hess e Hagen pediam
também aos participantes para indicar o grau de adequação de vários atos
de violência contra o colega traiçoeiro.
Seus achados indicaram uma clara diferença entre os sexos nas
respostas agressivas, com as mulheres sendo esmagadoramente compelidas
a retaliar atacando a reputação do ofensor, sobretudo por meio de
mexericos. Esse efeito de gênero apareceu mesmo depois que a avaliação
da adequação desses atos pelos participantes foi controlada. Em outras
palavras, embora as mulheres compreendessem que mexericos maldosos
não eram socialmente apropriados, esse era seu primeiro ponto de ataque
preferido. Os homens, por outro lado, dividiam-se mais uniformemente em
sua resposta, mas não mostravam a mesma inclinação preferencial por atos
de “guerra de informação” contra o colega desagradável.
Embora a maioria dos pesquisadores reconheça a natureza especulativa
dos argumentos evolucionários nessa área, a agressão social entre fêmeas
reprodutivamente viáveis é interpretada em geral como uma forma de
competição pelo macho. Hess e Hagen, por exemplo, sugerem que as
diferenças entre os sexos reveladas em seu estudo tenderiam a ser ainda
mais pronunciadas num grupo de participantes mais jovens. Evolucionária,
histórica e transculturalmente, salientam eles, meninas na faixa etária dos
quinze aos dezenove anos estariam competindo mais ativamente por
parceiros. Assim, tudo que poderia sabotar a imagem de outra mulher como
parceira reprodutiva desejável, como comentários sobre sua promiscuidade,
aparência física ou quaisquer outros traços aberrantes ou esquisitos, tende a
ser matéria de intensos mexericos.
Além disso, o grau de agressividade obedeceria a uma espécie de curva
em forma de sino ao longo da vida da mulher. À primeira vista, isso parece
extremamente verdadeiro. Em minha experiência, não posso pensar numa
única mulher na pós-menopausa que pareça firmemente decidida a solapar a
vida de namoros de uma outra – a menos, talvez, que isso envolva espalhar
rumores sobre a rival sexual de sua filha fértil, em quem ela tem um
interesse adaptativo pessoal. Nesse caso posso realmente citar nomes.
O trabalho da psicóloga Anne Campbell sobre diferenças entre os sexos
e agressão foi capaz de deslindar cuidadosamente os muitos fios complexos
da transmissão cultural e de mediadores hormonais na violência feminina.
Campbell demonstrou que grande parte das diferenças entre os sexos na
agressão pode ser compreendida em termos da “teoria parental do
investimento”. Essa teoria foi desenvolvida no início dos anos 1970 pelo
biólogo Robert Trivers. Uma de suas implicações básicas é que como as
mães humanas dão uma contribuição desproporcionalmente maior que os
pais humanos para a sobrevivência da prole, e fazem um investimento físico
maior nela, as mulheres evoluíram de modo a serem em geral mais
reservadas que os homens nas estratégias de acasalamento. A violência
física masculina, sustenta Campbell, é em grande parte uma forma de
competição sexual ostentosa entre os homens pelo acesso reprodutivo às
mulheres mais desejáveis. O tipo de agressão social que acabamos de
observar em mulheres também parece ser uma forma de competição
intrassexual pelo homem mais desejável, mas evita o custo
comparativamente mais alto de causar dano físico aos corpos precariamente
férteis das mulheres.
Nenhum pai ou mãe quer pensar que está criando uma filha socialmente
insensível. Lembre-se, porém, que a ciência psicológica é uma disciplina
baseada em diferenças estatisticamente significativas, agregadas, entre
grupos que são comparados. No presente caso, há diferenças observadas
nos estilos agressivo-retaliatórios entre os sexos – diferenças que continuam
a aparecer mesmo depois que se estabelecem controles para normas sociais.
Mas há também, é claro, variações individuais bastante surpreendentes.
Quanto mais compreendemos sobre as pressões evolutivas subjacentes aos
nossos comportamentos, mais podemos compreender como lidar com elas e
avaliar nossos próprios motivos. Uma de minhas pensadoras favoritas, a
construtivista cultural feminista Simone de Beauvoir, escreveu uma frase
famosa: “Não se nasce mulher, torna-se mulher.” Embora seja verdade que
a cultura exerce fortes pressões, moldando expressões de disparidades de
gênero, ela também ajuda a conhecer o molde biológico com que a
sociedade tem de se haver.
PARTE VI

A gaia ciência, cada vez mais


gay: há algo estranho aqui
Nunca pergunte o caminho a um gay

TENHO A IMPRESSÃO DE SER O SUJEITO a quem as pessoas sempre pedem


informação sobre o caminho. Isto é, eu, a personalidade antissocial
desprovida de senso de direção, cabeça baixa, que evita trocar olhares com
qualquer passante. Isso era ainda mais frequente quando eu era um
expatriado, vivendo em Belfast. Em geral eu tentava responder qualquer
coisa para não parecer completamente estúpido. Mas, por mais que eu
tentasse, minha resposta sempre acabava num melancólico dar de ombros e
no honesto recuo: “Desculpe-me, mas sou americano. Creio que você
perguntou à pessoa errada.” Dado o status de personagem de desenho
animado que os Estados Unidos têm em grande parte da Europa, ser um
ianque ingênuo e contrito permitia-me escapar de muitos embates sociais
inconvenientes no Reino Unido, por isso essa tática funcionava muito bem.
(A menos que eu topasse com um tagarela que estivesse sem nenhuma
pressa e eu fosse seu primeiro vínculo vivo com o Novo Mundo. Nesse caso
eu corria o risco de enfrentar uma longa discussão sobre Obama e a
Disneylândia.)
Mas a verdade é que eu chamei a Irlanda do Norte de meu país por
quase seis anos e deveria ter sido capaz de dar orientações como um nativo.
Ademais, as pessoas não me perguntavam como chegar a uma trilha pouco
conhecida nas montanhas Mourne; elas queriam saber onde poderiam
encontrar uma farmácia ou o caminho mais curto para o centro estudantil na
universidade onde eu trabalhava. Não era só dar informações que era difícil
para mim. Desde que me entendo por gente, tenho tendência a me perder. Já
passei mais tempo de minha vida vagando por estacionamentos, hospitais e
campi universitários do que posso calcular. Mapas? Anátema. Para mim é o
mesmo que olhar para hieróglifos maias num rolo de casca de árvore.
O que torna minha “deficiência” ainda mais irônica é que, segundo a
lenda da família, sou descendente do grande navegador dinamarquês Vitus
Bering. Bem, ele não era tão fabuloso assim, pois naufragou nas ilhas
Commander e perdeu quase metade de sua tripulação antes de morrer de
uma doença desconhecida. Mas imagino que teria precisado ao menos saber
orientar-se num mapa náutico para ser contratado por Pedro, o Grande, e
aclamado como o primeiro europeu a espionar a costa sul do Alasca.
Portanto, se provenho dessa cepa genética de espírito tão euclidiano, por
que meu próprio cérebro é tão obtuso quando se trata de encontrar meu
caminho pela cidade?
Segundo as crescentes evidências que vêm sendo colhidas pelo
psicólogo Qazi Rahman e colegas, é bem possível que isso tenha alguma
relação com o fato de eu ser gay. Veja bem: não é que eu seja desorientado
porque sou gay, o que ocorre é que Rahman descobriu uma correlação
neural não trivial entre esses dois traços psicológicos. Essa correlação é
similar em natureza ao achado de que indivíduos canhotos demonstram uma
memória melhor para acontecimentos que os destros em razão do tamanho
geralmente maior de seus corpos calosos, um bônus neurológico que facilita
a rememoração episódica. Canhotos são melhores para evocar lembranças
não por serem canhotos, mas em razão do denominador físico (cerebral)
comum subjacente à expressão de ambos os traços.
Em decorrência de influências hormonais atípicas sobre o feto em
desenvolvimento durante o crescimento pré-natal, inclusive a quantidade de
androgênios em circulação (por exemplo, testosterona) presente no útero da
mãe, os homossexuais (tanto homens quanto mulheres) muitas vezes
exibem vários marcadores “biodemográficos” reveladores – características
físicas residuais que indicam o efeito pré-natal desses fatores hormonais.
Por exemplo, talvez você já tenha tomado conhecimento do muito
difundido efeito 2D:4D, abreviatura científica para o achado peculiar de
que, tanto para mulheres heterossexuais quanto para homens gays, a razão
dos comprimentos entre o segundo e o quarto dígitos (dedos) é, em média,
maior que em mulheres gays e homens heterossexuais. Como o cérebro é
apenas mais um molde físico, há também diferenças entre heterossexuais e
gays na estrutura cerebral (notavelmente no hipocampo) e portanto nas
habilidades cognitivas. Por exemplo, homens gays e mulheres
heterossexuais tendem a ter um desempenho melhor que mulheres gays e
homens heterossexuais na maior parte das medidas verbais, ao passo que
homens heterossexuais têm desempenho melhor que os outros grupos em
medidas da inteligência espacial.
Num estudo relatado na Behavioral Neuroscience, Rahman e colegas
descobriram que homens gays se parecem mais com mulheres do que com
homens heterossexuais no fato de serem mais dependentes, para se orientar,
de estratégias baseadas em pontos de referência à direita e à esquerda (por
exemplo, “vire à direita na igreja”) do que das estratégias de orientação
euclidianas preferidas por homens heterossexuais (por exemplo, “o bar fica
oito quilômetros a leste”). E num estudo de acompanhamento publicado na
revista Hippocampus, Rahman e sua colaboradora, a psicóloga Johanna
Koerting, descobriram que homens héteros são diferentes de homens gays,
mulheres héteros e mulheres gays pelo fato de cumprirem de maneira
significativamente mais rápida tarefas que requerem a exploração de um
terreno novo no intuito de encontrar um alvo de busca escondido. (Observe
que os pesquisadores só testaram pessoas que se consideravam
exclusivamente heterossexuais ou homossexuais. Bissexuais foram
excluídos.)
Mas antes que você descubra exceções a estes achados gerais, com seu
espírito de contradição, observe que eles se referem a diferenças em nível
de população agregada. Embora eu pessoalmente corresponda na perfeição
ao que o modelo neurocognitivo para os diferentes sexos de Rahman prevê
para cérebros gays, o cérebro de meu companheiro Juan é um instrumento
de navegação por satélite que poderia ter sido um sério rival do velho tio
Vitus. E Juan, diferentemente de mim, tem uma pronunciada razão 2D:4D.
Além disso, em ciência, uma diferença estatisticamente significativa entre
grupos de controle pode de fato traduzir-se em diferenças insignificantes no
mundo real. Por fim, Rahman se apressa em salientar que não está
sugerindo que homens gays simplesmente têm cérebros de mulher, ou que
mulheres gays têm cérebros de homem. O que ele aponta é que os cérebros
de homossexuais são mais assemelhados a mosaicos neurocognitivos de
ambos os sexos. Por exemplo, lésbicas não parecem diferir de mulheres
héteros em medidas cognitivas exceto no tocante à fluência verbal, em que
seus escores se situam na direção típica dos homens.
Uma observação final. Certa vez deparei com um achado indicativo de
uma outra diferença fisiológica entre homossexuais e heterossexuais. Além
de nossas deficiências no plano da orientação, evidências sugerem que as
axilas de gays exalam odores diferentes das dos héteros e que esses odores
são detectáveis. Assim, se eu parasse de usar desodorante, é possível que
isso dissuadisse as pessoas de me pedirem orientações… bem como quase
qualquer outra coisa.
“Homem solteiro, raivoso, hétero… procura
semelhantes”: a homofobia como desejo
reprimido

EU GOSTARIA DE PODER DIZER que decidi sair do armário com vinte e poucos
anos por razões mais admiráveis – como amor ou o princípio da coisa. Mas
a verdade é que passar por heterossexual havia se tornado uma tal amolação
que não me parecia valer a pena. Desde a terceira série, eu havia
despendido muitos recursos cognitivos valiosos inventando esquemas
enganosos para encobrir o fato de que eu era gay.
Na verdade, minha primeira tática consciente para encobrir minha
homossexualidade envolveu ser grotescamente homofóbico. Quando eu
tinha oito anos de idade, imaginei que se usasse a palavra “bicha” a torto e a
direito e expressasse minha repugnância por gays em todas as ocasiões
possíveis, os outros pensariam obviamente que eu era hétero. Embora isso
parecesse bom na teoria, eu não era muito hostil por temperamento e tinha
dificuldade em canalizar minha indignação fictícia numa prática
convincente.
Posso ter fracassado como homofóbico, mas muitas pessoas têm êxito.
E o que se revela é que podemos ter algo em comum: muitos homens
jovens homofóbicos podem alimentar secretamente desejos homossexuais
(quer estejam tentando conscientemente enganar o mundo a respeito de si
mesmos, como eu, ou não tenham sequer ciência de que eles existem). Uma
das linhas de trabalho mais importantes nessa área remonta a um artigo
publicado em 1996 no Journal of Abnormal Psychology em que os
pesquisadores Henry Adams, Lester Wright Jr. e Bethany Lohr relatam
evidências de que homens jovens homofóbicos podem ter secretamente
impulsos gays.
Nesse estudo, 64 homens que se diziam heterossexuais com idade média
de vinte anos foram divididos em dois grupos (“homens não homofóbicos”
e “homens homofóbicos”) com base em seus escores num questionário que
media a aversão a homens gays. Aqui, a homofobia foi operacionalmente
definida como o grau de “pavor” experimentado quando posto em estreita
proximidade com um homossexual – basicamente, quão confortável ou
desconfortável a pessoa se sentia ao interagir com gays. (Há um debate na
literatura clínica sobre a semântica desse termo, com alguns estudiosos
introduzindo outros construtos como “homonegativismo” para sublinhar a
natureza mais cognitiva da postura antigay de algumas pessoas.)
Em seguida cada participante concordava em prender um pletismógrafo
peniano a seu, bem, “eu inferior”. Esse aparelho, com que já nos
encontramos antes, é “um extensômetro circunferencial de mercúrio em
elástico usado para medir respostas eréteis a estímulos sexuais. Quando
preso, mudanças na circunferência do pênis causam mudanças na
resistência da coluna de mercúrio”. Pesquisas anteriores com esse aparelho
(o pletismógrafo, não o pênis – bem, na verdade com ambos) haviam
confirmado que mudanças significativas na circunferência ocorrem apenas
durante a estimulação sexual e o sono.
Em seguida, os participantes foram levados para uma câmara privada
onde lhes foram mostrados três breves segmentos de pornografia gráfica.
Os três trechinhos de vídeo representavam pornografia heterossexual (cenas
de felação e intercurso vaginal), pornografia lésbica (cenas de cunilíngua ou
de “tribadismo”, que é, essencialmente, a fricção das vulvas) e pornografia
masculina gay (cenas de felação e intercurso anal). Após cada apresentação
aleatoriamente ordenada, cada participante classificou o grau em que se
sentira sexualmente excitado e também o grau de sua própria ereção
peniana. Continue. Adivinhe os resultados.
Ambos os grupos – homens não homofóbicos e homofóbicos –
mostraram significativo engurgitamento diante da pornografia hétero e
lésbica, e suas classificações subjetivas da própria excitação
corresponderam às medidas do pletismógrafo peniano para esses dois tipos
de vídeo. No entanto, tal como previsto, somente os homens homofóbicos
mostraram um significativo aumento da circunferência peniana em reação à
pornografia masculina gay: especificamente, 26% desses homens
homofóbicos mostraram “tumescência moderada” (seis a doze milímetros)
diante desse vídeo, e 54% mostraram “clara tumescência” (mais de doze
milímetros). (Em contraposição, para os homens não homofóbicos, essas
porcentagens foram 10% e 24%, respectivamente.) Além disso, os homens
homofóbicos subestimaram significativamente seu grau de excitação sexual
diante da pornografia masculina gay.
A partir destes dados, os pesquisadores concluíram que “indivíduos que
tiveram escore elevado no questionário de homofobia e admitiam afeto
negativo em relação à homossexualidade demonstram significativa
excitação sexual diante de estímulos eróticos homossexuais masculinos”.
Evidentemente, não fica claro se essas pessoas estão se autoenganando de
maneira inconsciente ou tentando conscientemente esconder dos outros sua
atração secreta por membros do mesmo sexo. O mecanismo de defesa de
formação reativa freudiano – no qual os desejos reprimidos das pessoas se
manifestam por suas ardorosas reações emocionais e comportamentos
hostis em relação à própria coisa que desejam – poderia explicar a primeira
hipótese. (Shakespeare escreve em Hamlet: “A senhora protesta demais, ao
que me parece.”) A segunda sugere um ato de trapaça social deliberada, tal
como minha equivocada maquinação aos oito anos. Poderia, é claro, ser um
pouco de cada coisa, ou funcionar de maneira diferente para diferentes
pessoas. Quem pode dizer se todas aquelas figuras públicas cujo
homossexualismo foi inconvenientemente revelado (como os
televangelistas Eddie Long e Ted Haggard, o psiquiatra conservador George
Rekers e os políticos Mark Foley e Larry Craig) – as próprias encarnações
desse fenômeno – estavam se autoenganando ou se sabiam o tempo todo
que tinham impulsos homossexuais plenamente desenvolvidos?
A interpretação de Adams e colegas para esses achados obtidos por
meio do pletismógrafo não passaram incontestes. Num artigo publicado no
Journal of Research in Personality, o pesquisador Brian Meier e colegas
afirmam que os achados de Adams podem ser mais bem interpretados como
uma “aversão defensiva” de homossexuais gays do que como atração
secreta. Recorrendo a uma analogia com outras fobias, eles declaram:
“Acreditamos ser inexato afirmar que os fóbicos a aranhas têm um desejo
secreto por elas, ou que claustrofóbicos gostam secretamente de ser metidos
em espaços escuros e apertados.” Esses investigadores raciocinam que a
amostra homofóbica de Adams experimentava ereções em resposta à
pornografia masculina gay não por excitação sexual, mas em razão da
ansiedade que as imagens lhes transmitiam, a qual por sua vez provocava a
resposta fisiológica do engurgitamento peniano.
Em minha opinião, contudo, essa reinterpretação de Meier da ereção
como expressão de “aversão defensiva” é um pouquinho tortuosa. É
verdade que foi demonstrado que a ansiedade ambiente aumenta o grau de
excitação sexual em resposta a estímulos que já são sexualmente excitantes,
mas não pude encontrar nenhuma evidência de que a ansiedade por si só
pode dar uma ereção a um homem. Pelo menos espero que seja assim. Falar
em público me deixa ansioso. Se, como se isso não bastasse, eu tivesse de
ter medo de ter uma ereção durante minhas palestras, talvez eu devesse
simplesmente cancelar minhas apresentações. Da mesma maneira, pela
lógica desses investigadores, aracnófobos do sexo masculino deveriam
sentir um leve comichão lá embaixo sempre que avistam uma aranha
correndo por suas mesas de trabalho. Suponho que seja possível, mas me
parece bastante improvável.
Se tomarmos os achados de Adams de que homens homofóbicos têm
ereções ao assistir à pornografia gay como uma razoável evidência de sua
excitação sexual, esses achados assumem enorme importância. Por
exemplo, eles podem nos ajudar a compreender algumas das causas
psicológicas das agressões físicas violentas a gays. Alguns dos dados mais
surpreendentes com que deparei envolvem um levantamento feito em 1998
junto a quinhentos homens heterossexuais na área de São Francisco.
Cinquenta por cento desses homens declararam que haviam sido agressivos
de alguma maneira contra homossexuais (e estes foram apenas os que
admitiram tais atos). E um terço dos que não haviam atacado gays dessa
maneira disse que agrediria ou maltrataria um “homossexual que lhes
fizesse uma proposta”. Se você não percebeu a ironia, isso foi em São
Francisco – presumivelmente um dos lugares mais “amigáveis com gays”
no mundo.
De fato, um estudo posterior publicado no Journal of Abnormal
Psychology por Adams e colegas descobriu que, numa tarefa competitiva,
homens homofóbicos se mostravam mais agressivos com homens gays do
que com heterossexuais. Nesse estudo, 52 homens que se declaravam
heterossexuais com idade média de dezenove anos foram novamente
classificados como “homofóbicos” ou “não homofóbicos” com base em
suas respostas a vários itens num questionário de homofobia. Em seguida
foi dito aos participantes que eles seriam expostos a tipos aleatórios de
estímulos sexuais para determinar o efeito da pornografia no tempo de
reação. Na realidade, só lhes foi mostrada pornografia masculina gay.
Antes e depois de assistir a esse vídeo de dois minutos de um casal de
homens envolvendo-se em preliminares, felação e penetração anal, os
participantes responderam a várias perguntas que mediam seu estado
emocional no momento (por exemplo, se sentiam raiva, ansiedade, tristeza e
assim por diante). Em seguida passavam à tarefa competitiva de tempo de
reação, em que, em vinte provas diferentes, deviam apertar um botão assim
que uma luz vermelha se acendesse no console. Os participantes
acreditavam que, nessa tarefa, estavam competindo com um outro jogador
numa sala vizinha. Na verdade, não havia nenhum outro jogador, e o jogo
estava armado de tal maneira que o participante perderia numa metade
aleatoriamente distribuída das provas. A cada “vitória”, o participante era
informado de que poderia dar um choque elétrico de grau e intensidade
variados no outro jogador (inexistente); alternativamente, ele tinha a opção
de não administrar absolutamente nenhum choque nessa outra pessoa.
Todos os jogadores “perderam” na primeira prova e experimentaram
eles mesmos um choque elétrico brando, presumivelmente administrado
pelo outro jogador. A manipulação decisiva nesse estudo foi que metade
dos participantes pensava estar competindo com um homem gay, ao passo
que a outra metade pensava estar competindo com um homem hétero. Antes
da tarefa, e após assistir à pornografia gay, os participantes tinham visto um
breve vídeo que lhes apresentava esse outro “jogador”. Numa condição,
esse competidor fictício era mostrado como um homossexual com afetações
estereotipadas que dizia ao entrevistador estar numa “relação gay de
compromisso com seu parceiro, Steve, há dois anos”. Na outra condição,
esse mesmo ator fazia o papel de um heterossexual e dizia-se “envolvido
numa relação de compromisso com sua namorada há dois anos”.
Embora não tenha havido nenhuma diferença significativa entre os
grupos homofóbico e não homofóbico na intensidade e duração do choque
administrado ao competidor hétero ao levar a melhor em provas, o grupo
homofóbico administrou choques mais intensos e de maior duração quando
pensava que a pessoa na outra sala era gay. Nas classificações subjetivas de
disposição de ânimo, a maior diferença entre os dois grupos foi na
dimensão raiva-hostilidade: os não homofóbicos mostraram um pequeno
sinal positivo no radar nessa dimensão, ao passo que os homofóbicos
mostraram um enorme aumento na raiva-hostilidade entre a medição da
disposição de ânimo anterior ao vídeo e a classificação posterior. Esses
dados sugerem que estímulos homoeróticos – como ver dois homens de
mãos dadas – poderiam fazer um homofóbico já irritado perder o controle.
Embora seja certamente verdade que o mundo hoje “aprova” a
homossexualidade mais do que há uma década – muitas vezes a
contragosto, em minha opinião –, ainda há elementos sociais perigosos e
nefastos sob a superfície impedindo a verdadeira aceitação. O dia em que,
estando em público em qualquer cidade dos Estados Unidos, eu puder
simplesmente ficar de mãos dadas com a pessoa que amo (algo que a
maioria dos casais faz sem pensar duas vezes) sem nos expor, a meu
parceiro e a mim, a perigo físico – esse será o dia em que ficarei
convencido de que fomos além da retórica com relação a “direitos iguais” e
mudamos realmente corações e mentes.
Nesse meio-tempo, na próxima vez que você topar com alguém que se
revela especialmente hostil ou crítico em relação a gays, olhe-o nos olhos,
coce seu queixo e repita comigo: “Humm… muito interessante.”
O modismo do poliamor, o ciúme gay e a
evolução de um coração partido

HÁ UM CHEIRO ESTRANHO NO AR, uma espécie de modismo do poliamor em


que jornalistas liberais, uma massa agregada de experts antirreligiosos e até
os próprios cientistas começaram a encorajar as pessoas a usar a teoria
evolucionária para revisitar e rever suas atitudes sexuais e, mais importante,
seus comportamentos de modo a melhor ajustá-los às suas libidos animais.
Essas tentativas recentes, que incluem muitos best-sellers, exploram
como nossa sociedade moderna, oprimida por Deus e puritana, entra em
conflito com o desígnio evolucionário de nossa espécie, uma tensão que nos
torna patologicamente envergonhados do sexo. Há, é claro, muitas ressalvas
importantes, mas a lógica básica é que, como os seres humanos não são
naturalmente monógamos, tendo sido de fato explicitamente projetados por
seleção natural para buscar “parceiros copulatórios fora do casal” – fazer
sexo com alguém que não seja seu companheiro ou cônjuge em benefício
da replicação dos próprios genes irracionais –, reprimir esses profundos
instintos mamíferos é inútil e, pior ainda, um inevitável anúncio de morte
para uma relação honesta e saudável sob outros aspectos.
Intelectualmente, posso aceitar isso. Se acreditamos, como acredito, que
vivemos num mundo natural, não num mundo sobrenatural, passa a não
haver nenhuma razão inerente, de inspiração divina, para sermos
sexualmente exclusivos de nossos parceiros. Se você e seu companheiro
querem transar com seus vizinhos nas noites de quarta-feira após comer
tacos, participar de orgias na praia à luz de fogueiras ou enfiar seu capacete
disciplinar de pelica, sem viseira, e ser conduzido por rédea e freio pela
estrada até a festa sexual semanal da sua sociedade local de bondage, então
você deve sem dúvida fazer isso (e tirar fotografias). Mas a beleza amoral
do pensamento darwiniano é que ele não prescreve – ou pelo menos não
deveria e não pode prescrever – nenhum comportamento social, sexual ou
de qualquer outro tipo como sendo a coisa “certa” a fazer. O certo é
irrelevante. Há apenas o que funciona e o que não funciona, dentro de um
contexto, em termos biologicamente adaptativos. E assim, ainda que todo
cidadão bom e respeitável fosse um libertário sexual bem-informado,
Charles Darwin não proporciona maior compreensão de uma realidade
moral do que, digamos, a dra. Laura Schlessinger.
Numa observação relacionada, é bastante estranho que procuremos
orientação sobre a sexualidade humana no resto do reino animal, uma
falácia lógica em que o que é “natural” – como comportamento
homossexual em outras espécies – é encarado como “aceitável”. É como se
o fato de os bonobos, os sapos do deserto e os emus terem ligações
ocasionais com parceiros do mesmo sexo tivesse uma relação moral com os
direitos dos gays entre seres humanos. Mesmo que fôssemos a única
espécie homossexual nesta galáxia sem Deus, mesmo que isso fosse
exclusivamente uma “escolha” feita de comum acordo por dois adultos, por
que isso tornaria mais razoável discriminar pessoas envolvidas em relações
homossexuais?
Além desses problemas filosóficos que envolvem a busca de prescrições
sociais numa natureza que é completamente muda com relação ao que
deveríamos fazer com nossos pênis e vaginas, contudo, há um obstáculo
ainda maior a se levar o modismo do poliamor além dos tabloides,
programas de entrevistas e fóruns da internet, transformando-o em prática
comum no quarto de dormir. Trata-se do simples fato de que evoluímos de
modo a empatizar com o sofrimento das outras pessoas, inclusive o
sofrimento das pessoas que trairíamos ao dar a nossos afáveis genitais sua
evoluída utilização promíscua.
A mágoa profunda é, sob todos os aspectos, uma adaptação psicológica
tanto quanto a compulsão de fazer sexo com outros além de nossos
parceiros, e ela joga uma monstruosa chave-inglesa no poliamor, prático
sob os demais aspectos, dos evolucionistas. De fato, é natural para as
pessoas – em especial os homens, dado seu potencial reprodutivo
essencialmente ilimitado, ao contrário do das mulheres – buscar variedade
sexual. Meu companheiro uma vez comparou isso a fazer a mesma velha
refeição muitas e muitas vezes, por anos a fio; você vai acabar sentindo um
intenso desejo de comer um prato diferente. Mas lembrei a ele que as
pessoas não são equiparáveis a um prato de espaguete. De maneira bastante
inconveniente, temos sentimentos.
A menos que você tenha a má sorte de estar unido a um psicopata, ou
tenha a boa sorte de ser um deles você mesmo, mágoas profundas não são
experimentadas com facilidade em nenhuma das pontas, nem podem ser
remendadas com facilidade pela razão ou afastadas por toda a lógica
evolucionária do mundo. E como fomos destinados por natureza não só a
ser moderadamente promíscuos mas também a nos tornar egoístas quando
essa promiscuidade natural levanta a cabeça – mais uma vez, naturalmente
– em nossos parceiros, “pessoas sensatas” estão longe de ser imunes a
feridas causadas pelo sexo aberto e consentido de seus parceiros com
terceiros. A monogamia pode não ser natural, mas a indiferença pelas vidas
sexuais de nossos parceiros por poliamor tampouco é natural. Na verdade,
para muitas pessoas, em especial aquelas que se deixam levar ingenuamente
pelo que dizem cientistas e experts, sem refletir com suficiente
profundidade sobre essas questões, o poliamor pode ocasionar efeitos
devastadores.
Um dos melhores relatos da experiência da mágoa humana é um
sumário da autoria da antropóloga e escritora Helen Fisher. Recorrendo em
grande parte ao trabalho de psiquiatras, Fisher supõe que há dois estágios
principais associados a uma relação romântica morta e moribunda, o que
está tantas vezes associado às infidelidades de um dos parceiros. Durante o
estágio do “protesto” que ocorre logo em seguida à rejeição, “amantes
abandonados dedicam-se em geral a reconquistar seus amados. Eles
dissecam obsessivamente a relação, tentando estabelecer o que deu errado;
e empenham-se obstinadamente na criação de estratégias destinadas a
reacender o romance. Amantes desapontados muitas vezes fazem incursões
dramáticas, humilhantes ou até perigosas na casa ou no local de trabalho do
bem-amado, depois se retiram furiosos, de maneira intempestiva, apenas
para voltar e suplicar de novo. Eles visitam lugares que costumavam
frequentar e amigos comuns. E telefonam, enviam e-mails e escrevem
cartas, suplicando, acusando e/ou tentando seduzir aquele que os
abandonou”.
No nível neurobiológico, o estágio do protesto é caracterizado por uma
atividade excepcionalmente elevada, até frenética, dos receptores de
dopamina e norepinefrina no cérebro, o que produz um alerta intenso,
similar ao encontrado em filhotes abandonados pelas mães. O estágio do
protesto apaixonado – se ele fracassar no restabelecimento da relação
romântica – desintegra-se pouco a pouco no segundo estágio da mágoa, a
que Fisher se refere como “resignação/desesperança”, em que o parceiro
rejeitado perde toda a esperança de reconquistar o outro. “Narcotizada pelo
sofrimento”, escreve Fisher, “a maioria chora, fica na cama, olha para o
nada, bebe demais ou se esconde e vê TV.” No nível do cérebro, células
produtoras de dopamina, sobrecarregadas, começam a se inativar, causando
letargia e depressão. E nos casos mais tristes essa depressão está ligada a
ataques cardíacos ou acidentes vasculares cerebrais, de modo que as
pessoas podem, muito literalmente, morrer de dor. Portanto, talvez não
sejamos “naturalmente monógamos” como espécie, mas tampouco somos
naturalmente polígamos de maneira plena.
É deprimente até ler sobre isso, compreendo, mas para a maioria das
pessoas essas substâncias químicas fundamentais acabam começando a
pulsar mais uma vez quando um novo caso de amor se inicia. Deixe-me
observar, contudo, que uma das coisas mais fascinantes sobre o estágio da
resignação/desesperança é a possibilidade de que ele sirva realmente a uma
função adaptativa que pode ajudar a salvar a relação condenada, em
especial para uma espécie empática como a nossa. Como mencionei antes, a
dor da separação não é facilmente experimentada em nenhuma das pontas, e
quando nossas ações produzem uma reação tão triste e lamentável em outra
pessoa, quando vemos alguém de quem gostamos (mas por quem não mais
sentimos nenhum desejo duradouro ou sexual) sofrer dessa maneira,
podemos ter dificuldade em nos desvencilhar por completo de um romance
murcho. Se tivesse de adivinhar – sem nenhum estudo para respaldar esta
afirmação –, eu diria que um número considerável de genes se replicou em
nossa espécie unicamente porque, com nossas execráveis habilidades
cognitivas sociais, simplesmente não tivemos coragem de partir os corações
de outras pessoas.
Mais uma vez, podemos não ser uma espécie sexualmente exclusiva,
mas o fato é que formamos ligações românticas profundas, e o andaime
emocional sobre o qual essas ligações são construídas é extraordinariamente
sensível às indiscrições de nosso parceiro. Digo isto também como um
homem gay, que, segundo o pensamento evolucionário convencional, não
deveria estar terrivelmente preocupado com a possibilidade de seu parceiro
fazer sexo com estranhos. Afinal, não está em jogo o risco de que ele
engravide, fazendo de mim o corno que cria o filho de outro homem. Mas
se você me desse essa explicação no momento em que eu vociferava
insultos contra um de meus parceiros logo após descobrir que ele estava me
enganando, enroscado em posição fetal no canto da cozinha e balançando-
me em autopiedoso alheamento, ou no momento em que eu vomitava as
tripas na privada por quase duas semanas depois disso, eu teria inclinado a
cabeça numa concordância darwiniana racional, e continuaria a tremer
como um animal ferido.
De fato, o ciúme em relações homossexuais, sobretudo masculinas, é
um lugar em que o modismo do poliamor encontra alguns problemas
teóricos significativos. Um dos achados citados com mais frequência na
psicologia evolucionária é o fato de que os homens tendem a sentir mais
ciúmes quando suas parceiras fazem sexo com outros homens, ao passo que
as mulheres tendem a ficar mais enciumadas quando seus parceiros
mostram sinais de “infidelidade emocional” (comportamentos que indicam
que o homem pode estar interessado em “mais do que sexo” com uma outra
mulher e desenvolveu sentimentos significativos por ela, possivelmente
sinalizando planos de longo prazo). Veja bem, não há tipos exclusivos de
ciúme; o que eles representam são antes pontos ao longo de um contínuo ou
espectro de ciúme – ciúme emocional numa ponta e ciúme sexual na outra.
Homens e mulheres simplesmente tendem a cair, em média, em lugares
diferentes ao longo do caminho em termos do que desencadeia seus níveis
mais elevados de ciúme. Essa diferença geral entre os sexos faz sentido de
uma perspectiva evolucionária. Antes da era do teste de DNA, que foi
quando os cérebros humanos evoluíram, os homens estavam extremamente
vulneráveis a investir, inadvertidamente, nos genes de um outro sujeito
(convenientemente embalados na forma de crianças). Em contraposição, as
mulheres, embaraçadas pelas muitas exigências físicas de parir e cuidar de
crianças pequenas, teriam evoluído para depender basicamente de seu
parceiro permanente para ajudá-las a criar a prole até a idade reprodutiva.
Assim sendo, elas teriam corrido o risco de que ele desviasse sua atenção e
seus recursos para uma outra mulher e seus filhos.
Portanto, em se tratando de relacionamentos homossexuais, escrevem o
psicólogo Brad Sagarin e colegas na Evolution and Human Behavior, “uma
infidelidade a um parceiro do mesmo sexo não acarreta as ameaças
assimétricas de paternidade equivocada e de desvio de recursos para os
filhos de outra mulher, sugerindo tanto que os sexos podem ser semelhantes
em suas respostas de ciúme quanto que essas respostas podem ser menos
intensas que no caso de infidelidades do sexo oposto”. Na verdade, em
estudos projetados para testar essa hipótese básica, os pesquisadores
constataram de fato que o ciúme era menos intenso quando foi perguntado a
participantes heterossexuais como se sentiriam, hipoteticamente, se seus
parceiros tivessem uma aventura homossexual em vez de com alguém do
sexo oposto. Pessoalmente, creio que os participantes teriam outras coisas
com que se preocupar além de ciúme se seus parceiros estivessem tendo
relações fortuitas com outros do mesmo sexo, mas esses dados mostram
claramente que preocupações associadas à reprodução realmente moderam
sentimentos de ciúme em relações românticas humanas.
Mas o estudo precedente realça de fato relações bissexuais, já que o
hipotético cônjuge traidor tem um relacionamento sexual principal com
alguém do sexo oposto. Em contraposição, da perspectiva de um parceiro
de mesmo sexo num relacionamento prolongado, a infidelidade
homossexual pode provocar um padrão completamente diferente de ciúme.
Afinal, como qualquer pessoa gay com um passado sabe, relações
homossexuais certamente não estão isentas de sua justa parcela desse tipo
de drama. Homens gays podem, de fato, ficar menos aflitos por infidelidade
sexual que homens héteros. Mas há diferenças individuais significativas a
esse respeito. Ainda assim, disponho-me a especular e dizer isto: a maioria
de nós não convive completamente bem com a ideia de nossos parceiros
fazerem sexo com quem bem entenderem. Imagino que a maioria das
lésbicas tampouco se sente confortável vendo suas parceiras saírem com
outras lésbicas e desenvolvendo relações estreitas com elas (isto é,
infidelidade emocional). Mas talvez eu esteja em minoria ao me preocupar
tanto com os comportamentos de meu parceiro com pessoas do mesmo sexo
– pelo menos aqueles que não me incluem. Por exemplo, em 2010, quando
um repórter da revista New York lhe perguntou como ele se sentiria se seu
marido, Terry, o traísse, o conhecido colunista sexual Dan Savage
respondeu que “não daria a mínima” e que homens gays “não são malucos
como os héteros” com relação à infidelidade sexual de seus parceiros. Não
estou tão certo com relação a isso. Muitas vezes, somos igualmente
malucos. Em meu caso, informei ao intruso sexual que teria muito prazer
em emasculá-lo com um par de tesouras bem amoladas se ele algum dia
voltasse a ter contato com meu parceiro. Esse foi um comportamento
classicamente agressivo de “proteção do cônjuge” como visto em homens
héteros ameaçando seus rivais sexuais. Enxotar outros homens dessa
maneira, acredita a maioria dos teóricos evolucionários, é uma tática
preventiva destinada a impedir a corneação.
Homens gays, é claro, são incomumente vulneráveis ao HIV, e isso é
razão suficiente para ficar absolutamente furioso com um parceiro que nos
engana pelas costas. No entanto, embora muitas vezes se misture com ela, o
ciúme é diferente da raiva. Além disso, o flagelo moral que é a Aids não
estava presente no passado ancestral, de modo que o medo dessa doença
não poderia ter produzido nenhuma defesa psicológica adaptativa especial
nos cérebros de homens gays. Então de que outra maneira poderíamos
explicar o ciúme sexual entre homens gays? Ele pode de fato ser
compreendido por uma espécie de disposição mental de pseudo-
heterossexualidade, em que os cérebros dos homens gays são exatamente
iguais aos dos homens heterossexuais nesse aspecto – hipervigilantes
quanto a ser enganosamente induzidos a criar o filho de um outro homem.
O que quero dizer com tudo isto é que reagi como reagi quando meu
parceiro me enganou porque, num nível inconsciente, eu não queria que
meu benzinho provido de testículos fosse engravidado por um outro
homem. Eu não pensava nele conscientemente como uma mulher, entenda;
de fato, se o fizesse, não estaria com ele. Mas diga isso para minhas
gônadas e minha amígdala. Pergunto-me também, de fato, se essas
diferenças podem estar relacionadas ao fato de sermos mais “ativos” ou
“passivos”, assunto que examinaremos no próximo ensaio.

Assinado, não mais deploravelmente seu, contudo em


sofrimento perpetuamente pronto e melodramático, seu ex- e
provavelmente futuro amigo gay de coração partido, J.B.
Cientistas bem-dotados vão fundo nas
preferências sexuais entre homens gays

TENHO A IMPRESSÃO de que muitos heterossexuais acreditam haver dois


tipos de homens gays neste mundo: os que gostam de dar e os que gostam
de receber. Não, não estou me referindo à generosidade relativa dos hábitos
de presentear dos homossexuais. Não exatamente, pelo menos. Para ser
mais preciso, a distinção diz respeito ao papel sexual de homens gays em se
tratando do ato de intercurso anal. Mas, como na maioria dos aspectos da
sexualidade humana, as coisas não são tão simples assim.
Sei perfeitamente que alguns leitores podem pensar que este tipo de
discussão não é ciência respeitável. Mas o que a boa ciência tem de
excelente é ser amoral e objetiva, e não procurar agradar ao tribunal da
opinião pública. Dados não se curvam; pessoas sim. Quer estejamos falando
sobre um pênis numa vagina ou um pênis num ânus, trata-se igualmente de
comportamento humano. A ubiquidade do comportamento homossexual por
si só o torna fascinante. Mais ainda, o estudo de autodesignações em
homens gays tem considerável aplicação, assim como sua possível
capacidade preditiva no rastreamento de comportamentos sexuais de risco e
práticas sexuais seguras.
Pessoas que obtêm mais prazer (ou talvez sofram menos ansiedade ou
desconforto) atuando como o parceiro “insertivo” são chamadas
coloquialmente de ativas, ao passo que aquelas que têm clara preferência
por servir como o parceiro receptivo são comumente chamadas de passivas
(em inglês, tops e bottoms, respectivamente). Há muitas outras gírias para
essa dicotomia gay, várias delas irrepetíveis, pelo menos por um cavalheiro.
Na verdade, estudos baseados em levantamentos descobriram que
muitos homens gays de fato se autoidentificam como “versáteis”, o que
significa que não têm nenhuma preferência acentuada pelo papel insertivo
ou o de receptor. Para uma pequena minoria, a distinção nem sequer se
aplica, porque alguns homens gays não têm nenhum interesse por sexo anal,
preferindo diferentes atividades sexuais. Outros homens ainda se recusam a
se rotular como ativos, passivos, versáteis ou mesmo como gays, embora
façam frequente sexo anal com homens gays. Esses são os chamados
homens que fazem sexo com homens (HSH), que muitas vezes têm relações
heterossexuais também e tendem a se ver como héteros e não como
bissexuais.
Vários anos atrás, uma equipe de cientistas liderada por Trevor Hart nos
Centers for Disease Control and Prevention estudou um grupo de 205
participantes gays do sexo masculino. Entre os principais achados do grupo
estavam os seguintes:

1. As autodesignações estão significativamente correlacionadas com


comportamentos sexuais reais. Isto é, com base em relatos que eles
fazem de suas histórias sexuais recentes, aqueles que se identificam
como ativos são de fato mais propensos a atuar como o parceiro
insertivo, os que se dizem passivos são mais propensos a ser o parceiro
receptivo e os versáteis ocupam um status intermediário no
comportamento sexual.
2. Comparados com os passivos, os ativos participam com mais
frequência de outros comportamentos sexuais que envolvem inserção
(ou pelo menos reconhecem sentir-se atraídos por eles). Por exemplo, os
ativos tendem a ser o parceiro insertivo com mais frequência durante o
intercurso oral. Na verdade, esse achado sobre o caráter generalizável
dos rótulos de ativo/passivo para outros tipos de práticas sexuais foi
também revelado num estudo que mostrou que os ativos eram mais
propensos a ser o parceiro insertivo em tudo, do jogo com brinquedos
sexuais ao jogo de urinação (também conhecido como “esportes
aquáticos”), passando pelo abuso verbal.
3. A frequência dos que rejeitavam a identidade gay e tinham feito
sexo com mulher nos últimos três meses foi maior entre os ativos que
entre os passivos e os versáteis. Eles também manifestavam maior
homofobia internalizada – essencialmente, o grau de aversão por si
mesmo relacionado a seus desejos homossexuais.
4. Os versáteis tendem a gozar de mais saúde psicológica. Hart e seus
colaboradores especulam que isso pode se dever à sua maior busca de
sensações sexuais, menor erotofobia (medo de sexo) e maior conforto
com uma variedade de papéis e atividades.

Um dos principais objetivos desse estudo foi determinar se as


autodesignações em homens gays poderiam lançar luz sobre a difusão
epidêmica do vírus da Aids. De fato, não se encontrou correlação entre
autodesignações e intercurso desprotegido e por isso não foi possível usá-
las como um preditor confiável do uso de preservativos. No entanto os
autores fazem uma observação excelente, com o potencial de salvar vidas:

Embora as autodesignações não estivessem associadas a intercurso


desprotegido, os ativos, que se envolviam numa maior proporção de
sexo anal insertivo que outros grupos, eram também menos propensos a
se identificar como gays. HSH [novamente, homens que fazem sexo
com homens] não identificados como gays podem ter menos contato
com mensagens de prevenção ao HIV e podem ter menos chances de
serem alcançados por programas de prevenção ao HIV se comparados a
homens identificados como gays. Os ativos podem ter menos chances
de ser recrutados em locais frequentados por homens gays, e sua maior
homofobia internalizada pode resultar em maior negação do fato de que
por vezes se envolvem em sexo com outros homens. Os ativos também
podem ter maiores chances de transmitir HIV a mulheres por causa de
sua maior propensão a ser comportamentalmente bissexuais.

Além dessas importantes implicações para a saúde, as autodesignações


ativo/passivo/versátil têm uma variedade de outros correlatos de
personalidade, sociais e físicos. Alguns psicólogos salientam que casais de
homens gays poderiam desejar ponderar seriamente essa questão das
preferências de papel sexual antes de se comprometer com alguma relação
mais duradoura. De um ponto de vista sexual, há problemas logísticos
óbvios no estabelecimento de uma relação monogâmica por dois ativos ou
dois passivos. Mas como essas preferências de papel sexual tendem a
refletir outros traços comportamentais (tais como o fato de ativos serem
mais agressivos e assertivos que passivos), “essas relações também
poderiam ser mais propensas a experimentar conflitos mais depressa que
relações entre autodesignações complementares”.
Um outro estudo intrigante foi relatado na Archives of Sexual Behavior
pelo antropólogo Matthew McIntyre. Esse pesquisador pediu a 44 membros
gays do sexo masculino do grupo de alunos gays e lésbicas da Universidade
Harvard que lhe enviassem um e-mail com fotocópias claras de sua mão
direita junto com as respostas a um questionário sobre suas ocupações,
papéis sexuais e outras medidas de interesse. Esse procedimento lhe
permitiu investigar possíveis correlações entre essas variáveis e o conhecido
efeito 2D:4D, que mencionei em meu ensaio sobre homens gays e
habilidades de orientação espacial. Um tanto curiosamente, McIntyre
descobriu uma correlação negativa pequena, mas estatisticamente
significativa, entre 2D:4D e autodesignações sexuais. Isto é, pelo menos
nessa pequena amostra de alunos gays de Harvard, aqueles com o perfil
2D:4D mais masculinizado eram de fato mais propensos a relatar estar na
ponta receptora do intercurso anal e a demonstrar atitudes mais “femininas”
em geral.
Muitas questões sobre autodesignações gays e sua relação com
desenvolvimento, comportamento social, genes e substratos neurológicos
continuam sem resposta; de fato, elas ainda não foram sequer formuladas. O
fato de muitos gays darem um passo adiante e usarem designações
secundárias como “service top” e “power bottom” (em que o ativo está na
verdade submisso ao passivo) revela uma complexidade maior ainda. Para o
cientista certo, há uma vida inteira de trabalho árduo esperando ser feito.
Seu filho é um “pré-homossexual”?: a
previsão da orientação sexual adulta

EM CERTAS CONDUTAS DE CRIANÇAS transparecem sinais, alguns diriam


agouros, que, provavelmente desde que existem crianças, levaram os pais a
franzir as sobrancelhas, preocupados, precipitaram conversas forçadas com
sogras intrometidas, tensionaram casamentos e introduziram números
incalculáveis de pessoas no profundo pacto da negação sexual. Nós todos
conhecemos os estereótipos: um ar inusitadamente leve, delicado e
efeminado no andar de um menino pequeno, muitas vezes associado ao
gosto por leituras solitárias, ou um pulso mole, um interesse por bonecas,
maquiagem, princesas, vestidos, e uma forte aversão por brincadeiras
abrutalhadas com outros meninos; em meninas pequenas, há a postura
exterior de menino, talvez uma queda por ferramentas, um andar pesadão,
um queixo quadrado e uma disposição para lutas físicas com meninos, uma
aversão a todos os adornos perfumados, delicados e rendados da
feminilidade.
Vamos ao que interessa. É o que esses comportamentos indicam para os
pais sobre a sexualidade incipiente de seu filho que os tornam tão
indesejáveis; esses padrões de comportamento são temidos, abominados e
muitas vezes tratados diretamente como precursores da homossexualidade.
No entanto, foi só há relativamente pouco tempo que cientistas do
desenvolvimento conduziram estudos controlados com um claro objetivo
em mente: identificar com precisão os sinais precoces e mais confiáveis da
homossexualidade adulta. Examinando com atenção as infâncias de adultos
gays, pesquisadores estão encontrando uma intrigante série de indicadores
comportamentais que os homossexuais parecem ter em comum. E, muito
curiosamente, os antiquíssimos temores homofóbicos de muitos pais
refletem algum valor preditivo genuíno.
Em seus escritos técnicos, os pesquisadores nessa área referem-se
simplesmente a gays e lésbicas prospectivos como “pré-homossexuais”.
Essa expressão não é perfeita: ela consegue ter ao mesmo tempo uma
desconfortável aparência de determinismo biológico e de intervencionismo
clínico. Mas, pelo menos, é provavelmente bastante precisa. Embora não
tenham sido os primeiros cientistas a investigar os primeiros antecedentes
da atração pelo mesmo sexo, o psicólogo J. Michael Bailey e o psiquiatra
Kenneth Zucker publicaram na Developmental Psychology, em 1995, um
artigo seminal e controverso sobre os marcadores da homossexualidade na
infância. O objetivo explícito desse texto, segundo os autores, “foi rever as
evidências relacionadas à possível associação entre comportamento típico
de sexo na infância e orientação sexual adulta”. Assim, uma coisa a ter em
mente é que este trabalho particular não pretende identificar as causas da
homossexualidade em si, mas sim indexar os correlatos da atração pelo
mesmo gênero na infância. Em outras palavras, ninguém está discutindo os
prováveis fatores genéticos subjacentes à homossexualidade adulta ou as
bem estabelecidas influências pré-natais. O que se pretende é simplesmente
indexar as pistas comportamentais não eróticas que melhor permitem prever
que crianças são mais ou menos propensas a ser atraídas, quando adultas,
por pessoas do mesmo sexo.
Por “comportamento típico de sexo”, Bailey e Zucker referem-se àquela
longa lista, agora cientificamente canônica, de diferenças sexuais inatas nos
comportamentos de jovens do sexo masculino versus jovens do sexo
feminino. Em inúmeros estudos, cientistas documentaram que essas
diferenças entre os sexos são em grande parte impermeáveis à
aprendizagem e encontradas em todas as culturas examinadas (até mesmo,
acreditam alguns pesquisadores, em filhotes de outras espécies primatas).
Agora, antes que essa sua veia contestadora comece a apresentar exceções à
regra – obviamente há variância tanto entre crianças quanto em cada uma
delas –, apresso-me a acrescentar que é somente ao comparar os dados
agregados que as diferenças entre os sexos saltam dentro da estratosfera da
significação estatística. As mais salientes entre essas diferenças são
observadas no domínio da brincadeira. Meninos envolvem-se no que
psicólogos do desenvolvimento chamam de “brincadeiras turbulentas”, ao
passo que as meninas preferem a companhia de bonecas a uma joelhada nas
costelas.
Na verdade, os brinquedos são uma outra diferença fundamental entre
os sexos, com os meninos gravitando para metralhadoras e caminhonetes
enormes e as meninas se orientando para bonecos bebês e figurinos
ultrafeminizados. Crianças pequenas de ambos os sexos gostam de
brincadeiras que envolvem fantasia – ou “faz de conta” –, mas os papéis
que os dois sexos assumem dentro do contexto da fantasia já são claramente
segregados segundo o gênero desde os dois anos de idade, com as meninas
representando o papel de, digamos, mamães arrulhantes, bailarinas ou
princesas e os meninos preferindo de longe personagens mais masculinos,
como soldados e super-heróis. Como não é de surpreender, os meninos
escolhem naturalmente outros meninos como companheiros de brincadeira
e as meninas preferem de longe brincar com outras meninas.
Assim, com base em algumas pesquisas anteriores, mais duvidosas,
juntamente com uma boa dose de senso comum, Bailey e Zucker
formularam a hipótese de que homossexuais mostrariam um padrão
invertido de comportamentos infantis típicos de sexo (meninos pequenos
preferindo brincar com meninas e apaixonados pelos estojos de maquiagem
das mães; meninas pequenas estranhamente entusiasmadas por hóquei sobre
grama ou luta livre profissional… esse tipo de coisa). Empiricamente,
explicam os autores, há duas maneiras de investigar a relação entre
comportamentos típicos de sexo e orientação sexual posterior. A primeira
delas consiste em usar um método prospectivo, em que crianças pequenas
exibindo padrões atípicos de sexo são acompanhadas longitudinalmente até
durante a adolescência e o início da idade adulta, de tal modo que a
orientação sexual do indivíduo na maturidade reprodutiva possa ser
avaliada. Em geral isso é feito com o uso de algo como a famosa escala
Kinsey, que envolve uma entrevista clínica semiestruturada sobre
comportamento sexual e fantasias sexuais para classificar pessoas numa
escala de zero (exclusivamente heterossexual) a 6 (exclusivamente
homossexual). Sou um firme 6; como Stephen Fry, eu quis sair de uma
vagina em um ponto de minha vida, mas desde então nunca tive o mais
ligeiro interesse em retornar a uma.
Conduzir estudos prospectivos desse tipo não é muito prático, explicam
Bailey e Zucker, por várias razões. Primeiro, uma vez que uma proporção
relativamente pequena da população total é exclusivamente homossexual, é
necessário um número bastante grande de pré-homossexuais para se obter
uma amostra de tamanho suficiente, e isso exigiria uma enorme
superamostragem de crianças para o caso de um pequeno subconjunto vir a
se revelar gay. Segundo, um estudo longitudinal acompanhando a
sexualidade de crianças até o final da adolescência demanda tempo – por
volta de dezesseis anos –, de modo que a abordagem prospectiva avança de
maneira muito lenta. Por fim, e talvez este seja o maior problema com
estudos prospectivos da homossexualidade, não são muitos os pais
propensos a permitir que seus filhos sejam estudados. Com ou sem razão,
esse é um tópico sensível, e via de regra apenas crianças que apresentam
comportamentos atípicos de sexo significativos – como aquelas com
distúrbio de identidade de gênero – são levadas a clínicas e têm seus casos
postos à disposição de pesquisadores.
Por exemplo, a psicóloga Kelley Drummond e colegas entrevistaram 25
mulheres adultas que foram enviadas pelos pais para avaliação numa clínica
de saúde mental quando tinham entre três e doze anos de idade. Na época,
todas essas meninas receberam diversos diagnósticos indicadores de
distúrbio de identidade de gênero. Elas podiam exibir forte preferência por
brincar com meninos, insistiam em vestir roupas de menino, preferiam
brincadeiras turbulentas a bonecas e se fantasiar de gente grande,
declaravam que ainda teriam um pênis ou se recusavam a urinar sentadas.
Quando essas meninas se tornaram adultas, porém, apenas 12% delas
vieram a manifestar disforia de gênero (a desconfortável sensação de que
nosso sexo biológico não corresponde à nossa identidade de gênero). De
fato, as histórias de infância dessas mulheres foram muito mais preditivas
de sua orientação sexual adulta. Assim, os pesquisadores descobriram que
as probabilidades de que essas mulheres relatassem uma orientação
bissexual/homossexual chegava a ser 23 vezes maior do que ocorreria
normalmente numa amostra geral de jovens mulheres. Nem todas as garotas
se tornam lésbicas, é claro, mas esses dados realmente sugerem que as
lésbicas muitas vezes têm um histórico de comportamentos típicos do outro
sexo.
E, segundo Bailey e Zucker, o mesmo pode ser dito em relação a
homens gays. Eles revelaram que em estudos retrospectivos (o segundo
método usado para examinar a relação entre comportamento infantil e
orientação sexual adulta, em que adultos simplesmente respondem a
perguntas sobre suas infâncias), 89% de homens gays numa amostra
aleatoriamente reunida recordaram ter tido na infância mais
comportamentos típicos do outro sexo que o número médio entre os
heterossexuais. Alguns críticos questionaram a abordagem retrospectiva
geral, argumentando que as lembranças dos participantes (tanto as dos
indivíduos gays quanto as dos héteros) podiam estar distorcidas para se
ajustar às expectativas e estereótipos sociais com relação a como são gays e
heterossexuais quando crianças. Mas num estudo muito engenhoso
publicado na Developmental Psychology, evidências tomadas de vídeos
caseiros feitos na infância validaram o método retrospectivo, quando
pessoas foram solicitadas a codificar às cegas crianças-alvo segundo seus
comportamentos típicos de sexo, tal como mostrados na tela. Os
pesquisadores descobriram que “aqueles alvos que, quando adultos, se
identificaram como homossexuais foram julgados não adequados a seu
gênero na infância”.
Desde então, numerosos estudos replicaram esse padrão geral de
achados, todos revelando um forte vínculo entre desvios das normas de
papéis de gênero na infância e orientação sexual adulta. Há também
evidências de um “efeito de dosagem”: quanto mais características não
conformes ao gênero se manifestam na infância, mais provável é que uma
orientação homossexual/bissexual esteja presente na vida adulta.
Mas – e talvez você estivesse esperando que eu dissesse isto – há várias
ressalvas importantes a fazer a este corpo de trabalho. Embora
comportamento atípico de gênero na infância esteja fortemente
correlacionado com homossexualidade adulta, trata-se ainda de uma
correlação imperfeita. Nem todos os meninos que gostam de usar vestidos
serão gays quando crescerem, e nem todas as meninas que desprezam
vestidos se tornarão lésbicas. Muitas dessas crianças serão heterossexuais, e
algumas, não esqueçamos, serão transexuais. Falando por mim mesmo, eu
era mais propriamente andrógino, exibindo um padrão mosaico de
comportamentos típicos de sexo e atípicos de sexo quando criança. Apesar
da teoria preferida de meus pais de que fui simplesmente um jovem
Casanova, os achados de Zucker e Bailey podem explicar aquela velha
Polaroid em que, das treze crianças convidadas para minha sétima festa de
aniversário, onze eram menininhas. Mas também não fui uma criança
excessivamente efeminada, nunca sofri bullying como “maricas” e, quando
tinha dez anos, era indistinguivelmente tão irritante, rude e agitado quanto
meus colegas mais chegados.
De fato, aos treze anos, eu estava profundamente socializado nas
normas masculinas. No caso, comecei a gostar de luta livre no ensino médio
como um magricela de 36 quilos da oitava série e, ao fazê-lo, tornei-me por
ironia extremamente consciente de minha orientação homossexual. Dados
transculturais mostram, de fato, que meninos pré-homossexuais são mais
atraídos por esportes solitários como natação, ciclismo e tênis que por
esportes de contato mais rudes como futebol americano e futebol; são
também menos propensos a ser crianças provocadoras. (Gays prospectivos
do sexo masculino que se adaptam de maneira excessivamente rígida às
normas de gênero percebidas à medida que ficam mais velhos podem, de
fato, tornar-se hipermasculinizados em tal grau que, como já vimos, acabam
também perigosamente homofóbicos no processo.) De qualquer maneira,
lembro nitidamente de ficar com as meninas nas barras horizontais
enquanto os meninos estavam no campo jogando futebol americano, e de
olhar para eles e pensar como era estranho que alguém pudesse querer se
comportar daquela maneira.
Uma outra ressalva é que os pesquisadores nessa área não hesitam em
admitir que há provavelmente múltiplas – e sem dúvida muito complicadas
– rotas de desenvolvimento para a homossexualidade adulta. Fatores
hereditários, biológicos, interagem com experiências ambientais para
produzir resultados fenotípicos, e isso não é menos verdadeiro para a
orientação sexual que para qualquer outra variável dentro de uma
população. No entanto, uma vez que os dados prospectivos e retrospectivos
discutidos nos estudos mencionados acima revelam muitas vezes traços
emergentes muito precoces em pré-homossexuais, essas crianças que
mostram pronunciados comportamentos atípicos de sexo podem ter um
maior componente genético em sua homossexualidade, ao passo que
adultos gays que foram típicos de sexo quando crianças poderiam dever sua
homossexualidade mais diretamente a experiências de infância. Por
exemplo, num caso bastante espantoso de ciência que produz resultados que
contrariam frontalmente sentimentos populares, politicamente corretos ou
emocionalmente atraentes, achados recentes e controversos publicados na
Archives of Sexual Behavior indicam que homens – mas não mulheres – que
foram vítimas de abusos sexuais quando crianças são significativamente
mais propensos que crianças do sexo masculino não vítimas de abuso a ter
tido relações homossexuais como adultos. Seja qual for a rota causal, no
entanto, nada disso implica, de modo algum, que a orientação sexual é uma
escolha. De fato, sugere exatamente o contrário, pois, como sabemos pelo
amante da borracha e pelos fetichistas de pés que encontramos antes neste
livro, experiências eróticas anteriores à puberdade podem mais tarde se
consolidar em orientações e preferências sexuais irreversíveis.
Está na moda hoje em dia, em particular no Ocidente, dizer que alguém
é um “gay nato”. Compreendo os motivos antidiscriminatórios e acredito
firmemente que essa atitude reflete um ethos cada vez mais humanitário em
relação às minorias sexuais. Mas se pensarmos sobre isso de maneira mais
crítica, é extremamente esquisito, e disparatado, referir-se a um bebê recém-
nascido, ainda pingando líquido amniótico, como sendo um membro da
comunidade LGBT. Sim, é necessário um grau prodigioso de estupidez para
falar sobre o que faz a genitália de alguém ficar intumescida como uma
escolha consciente, mas está longe de ser óbvio que todo mundo é
igualmente expelido da vagina da mãe com um gosto já discriminador por
pênis e não por vaginas, ou vice-versa.
Chegamos então à questão mais importante de todas. Por que os pais se
preocupam tanto em saber se seus filhos podem ou não ser gays? Talvez
você não seja um desses pais ou mães ansiosos; de fato, talvez você goste
de se ver como indiferente à sexualidade de seu filho, contanto que ele ou
ela seja feliz. Mais uma vez, tudo mais sendo igual, suspeito que teríamos
muita dificuldade para encontrar pais que realmente prefeririam que seus
filhos fossem homossexuais e não heterossexuais. Nem é preciso dizer que,
evolucionariamente, a homofobia parental é uma obviedade: filhos gays e
filhas lésbicas não são propensos a se reproduzir (a menos que sejam
criativos). E eu imaginaria, num palpite viável, que, mesmo nas
comunidades de mentalidade mais liberal de hoje, sair do armário perante
os pais é algo muito mais fácil de fazer para indivíduos gays que têm o luxo
de irmãos demonstravelmente heterossexuais que arcam com sua própria
carga reprodutiva. Quanto a mim, com um irmão e uma irmã mais velhos
reproduzindo-se – não um com o outro, que fique claro – e suas respectivas
pequenas ninhadas que são meus fantásticos sobrinhos e sobrinhas, meus
pais pelo menos não precisam se preocupar com a possível extinção de seus
genes. De qualquer maneira, creio que para os pais é muito melhor
reconhecer a fonte de suas inquietações com relação a ter um filho gay
como motivada por interesses genéticos inconscientes do que mentir para si
mesmos ao dizer que o fato de seu filho ou filha “vir a ser” gay os deixa
inteiramente indiferentes.
E, tenham isto em mente, pais: também é importante enfatizar que,
como o sucesso genético é medido em termos biológicos evolucionários,
com base na porcentagem relativa de nossos genes que se transmitem a
gerações subsequentes – não com base no simples número de filhos em si –,
além da reprodução sexual trivial há outras maneiras, ainda que tipicamente
menos lucrativas, pelas quais um filho pode contribuir para o sucesso
genético global dos pais. Por exemplo, não sei quanto dinheiro ou fama
residual estão sendo distribuídos entre os parentes próximos de, digamos,
k.d. lang, Elton John e Rachel Maddow, mas posso apenas imaginar que
esses parentes heterossexuais estão em situação muito melhor, em termos de
suas próprias oportunidades reprodutivas, do que estariam se não houvesse
um homossexual pendurado, de maneira tão magnífica, em suas árvores
genealógicas. A própria ideia de fazer amor com um parente consanguíneo
de Michelangelo ou Hart Crane, independentemente de qualquer
característica dessa pessoa exceto sua herança, deixa-me estranha e
instantaneamente excitado, e eu imaginaria que tal pessoa também seria
eminentemente desejável para mulheres heterossexualmente fecundas.
Assim, esta é minha mensagem: cultive os talentos inatos do seu pequeno
pré-homossexual, e é possível que seu ganho genético final seja,
curiosamente, até maior com um filho gay muito especial do que seria se
dez filhos héteros medíocres brotassem de seu ventre.
Há uma observação final a fazer, e ela se refere ao futuro dessa pesquisa
e suas aplicações no mundo real. Se os pesquisadores finalmente
aperfeiçoarem a previsão da orientação sexual adulta em crianças, quais são
as implicações? Deveriam mães liberais descrever despreocupadamente
como “bi” seus filhinhos de três anos vestidos com macacõezinhos, ou
deveriam pais contar como suas filhas “héteros” começaram a comer
alimentos sólidos ou deram seus primeiros passos hoje no mercado? Terão
os pais vontade de saber? Os pais muitas vezes dizem para seus filhos gays,
retrospectivamente, “eu sempre soube”. Mas a percepção tardia dos eventos
é fácil, e aqui estamos falando da possibilidade de saber realmente,
definitivamente, sem nenhuma dúvida, que seu filho será gay desde uma
idade muito, muito tenra.
Posso dizer, já tendo sido um pequeno e insignificante pré-
homossexual, que alguma preparação da parte de outros teria tornado as
coisas mais fáceis para mim, evitando que eu tivesse precisado estar sempre
com medo da rejeição ou temendo que alguma escorregadela descuidada
levasse ao meu “desmascaramento”. Teria ao menos evitado todas aquelas
incômodas e incessantes perguntas durante minha adolescência sobre a
razão pela qual eu não estava namorando uma linda menina (ou perguntas
da linda menina sobre a razão pela qual eu estava saindo com ela e
rejeitando seus avanços).
E uma outra coisa: deve ser muito difícil olhar nos olhos límpidos de
sua filha de três anos, limpar os farelos de biscoito de sua bochecha e jogá-
la no olho da rua por ser gay.
PARTE VII

Como diz a Bíblia


Bons cristãos (mas só aos domingos)

ESTA É UMA CONFISSÃO DIFÍCIL DE FAZER, porque, à primeira vista, tenho


certeza de que ela soa extremamente hipócrita. Mesmo assim aqui vai:
tenho mais confiança em pessoas religiosas que em ateus. A parte hipócrita
é que acontece que sou um ateu com convicções ímpias inabalavelmente
fortes. Em meu livro The Belief Instinct, tentei explicar de maneira bastante
detalhada, de fato, por que me sinto assim. Mas para nossas finalidades aqui
a única coisa importante é que não tenho um pingo de hesitação agnóstica
em minha crença de que não existe um Deus intencional – pelo menos um
muito inteligente. Sofro também alguma trepidação diante de pessoas
religiosas em geral sempre que se discute algo de substância moral, uma
vez que sou há muito da opinião de que Deus é o Grande Ofuscador,
complicando desnecessariamente muitos assuntos humanísticos que de
outra forma seriam claros.
Assim, agora que saí do armário ateístico, inteiramente nu, como posso
dizer que confio mais nos que acreditam em Deus do que naqueles que de
outro modo eu veria como simpáticos às minhas ideias e de opinião
semelhante à minha? Bem, confiança é algo completamente diferente de
intelecto, e suponho que sou sempre um pragmatista social em minhas
relações com as pessoas.
Tomemos, por exemplo, uma situação em que me encontrei anos atrás,
na porta de uma estação ferroviária numa cidade de praia irlandesa. Minha
bagagem na mão, o céu frio, cinza e ventoso prenunciando chuva,
confrontei-me com dois táxis parados à espera de passageiros. Num dos
carros um crucifixo pendia do espelho retrovisor e um exemplar da Bíblia
com muitas folhas marcadas estava bem visível no console. O outro táxi
não mostrava nenhum sinal de qualquer ícone religioso. Ora, tudo mais
sendo igual, qual desses táxis você escolheria, considerando-se que está
tentando evitar ser cobrado em excesso – prática pela qual essa parte do
país é notória – e que ser um americano durante a administração Bush, eu
poderia acrescentar, eleva uma pessoa um degrau acima de nosso 43o
presidente em respeitabilidade? Ambos os motoristas eram provavelmente
católicos devotos – afinal, eu estava na Irlanda. Apesar disso, não havia
nenhum meio de saber ao certo.
A menos que você esteja tentando defender a ideia de que “os ateus
também são boas pessoas”, ou por acaso despreze a Igreja católica,
realmente a solução é óbvia: vá com Deus. Por que isso é tão óbvio? Como
argumentou o cientista político Dominic Johnson: “Se a punição
sobrenatural é sustentada como uma crença, essa ameaça tem um efeito
dissuasivo na realidade, de modo que o mecanismo pode funcionar, quer a
ameaça seja genuína ou não.” Em outras palavras, de uma perspectiva
psicológica, a questão ontológica da real existência de Deus é
completamente irrelevante; a única coisa que importa no caso acima é que o
motorista de táxi está plenamente convencido de que Deus não gosta que
ele engane seus passageiros.
Esta suposição teórica de que crentes se comportam melhor porque
sentem que Deus os está observando, e presumivelmente comunica Seu
desprazer com relação a seus atos pecaminosos na forma de vários
infortúnios, é um dos argumentos científicos mais convincentes para a
simples persistência da religião na sociedade hoje. Deus simplesmente não
irá embora, e isso em grande parte, segundo essa lógica evolucionária
puramente mecanicista, porque a ilusão cognitiva de um Deus punitivo
funciona para estancar os comportamentos egoístas dos indivíduos e ajuda a
sustentar a harmonia social.
Vários estudos ofereceram apoio empírico para essa hipótese do
monitoramento sobrenatural. Esta é uma expressão cunhada por Ara
Norenzayan, que descobriu em múltiplos estudos que quando participantes
são implicitamente instruídos com palavras relacionadas a Deus (“espírito”,
“divino”, “sagrado” e assim por diante), tornam-se ao mesmo tempo mais
“pró-sociais” e menos antissociais. Em contraste com o que ocorre com
palavras não religiosas ou neutras, pessoas que veem essas palavras
religiosas, por exemplo, doam mais dinheiro para uma obra filantrópica
após completar uma tarefa de palavras embaralhadas em que juntam as
palavras em algumas frases coerentes. Embora ele e seu colaborador Azim
Shariff tenham favorecido a interpretação de que os participantes se
comportavam de maneira mais altruística na condição religiosa porque as
palavras religiosas lhes lembravam que Deus os estava observando e
portanto julgando, Norenzayan teve também a cautela de não concluir
prematuramente que isso era causado apenas por preocupações com a
espionagem celeste. É também possível, claro, que essas palavras religiosas
tivessem simplesmente ativado conceitos sociais relacionados como
“benevolência” e “boas ações”, induzindo a tomada de decisão altruística
independentemente do temor dos olhares rabugentos de Deus.
Um trabalho mais recente, no entanto, permitiu a Norenzayan
tranquilizar-se. Levar as pessoas a pensar em Deus – mesmo
inconscientemente, e, de maneira bastante curiosa, até entre não crentes –
de fato desencadeia um raciocínio específico sobre estarem eles sendo os
alvos da atenção visual de alguém. Norenzayan e Will Gervais descobriram
que esse efeito básico de palavras religiosas, de levar pessoas a se sentirem
visualmente expostas, produzia-se numa variedade de condições
experimentais. Em um estudo, por exemplo, os investigadores usaram o
mesmo método implícito de instrução que antes, ao atribuir a crentes e ateus
uma tarefa envolvendo palavras embaralhadas, religiosas ou não. Em
seguida os participantes completaram algo chamado “Escala de
autoconsciência situacional”, e, de maneira notável, independentemente de
sua crença ou descrença explícitas em Deus, todos aqueles que haviam sido
expostos inconscientemente às palavras religiosas – mas não às palavras
neutras – mostraram um súbito aumento em sua autoconsciência pública.
Isto é, tornaram-se significativamente mais conscientes e preocupados com
a transparência de seus comportamentos sociais do ponto de vista de uma
plateia.
Além disso, “quando pessoas sentem que seu comportamento está sendo
monitorado”, concluem Norenzayan e Gervais num experimento de
acompanhamento, “elas tendem a se mostrar sob uma luz positiva”. Isso os
levou a formular a hipótese de que lembretes sobre Deus não apenas
aumentariam a autoconsciência, mas também estimulariam respostas
socialmente desejáveis. As respostas dos participantes a afirmações tais
como “Pessoas que me pedem favores por vezes me deixam irritado” e
“Não importa com quem eu esteja conversando, sou sempre um bom
ouvinte” refletiriam suas crenças sobre o que Deus quer ouvir, não a
verdade sobre esses atributos sociais irrealisticamente positivos. Nesse
estudo, contudo, as únicas pessoas que produziram respostas socialmente
desejáveis às instruções implícitas relacionadas a Deus foram as que
realmente acreditavam em Deus. Isso significa que, embora não crentes
possam se sentir “expostos” após receberem instruções implícitas
relacionadas a Deus, tal como os crentes, esse sentimento não influencia o
modo como eles tendem a se apresentar em público.
Para crentes, de fato, evidências adicionais mostram que deixas
relacionadas a Deus não só influenciam seu desejo de que os outros os
vejam sob uma luz positiva, mas realmente os motivam a praticar boas
ações. Uma das melhores corroborações disso é o chamado “efeito do
domingo”, identificado pela primeira vez por Deepak Malhotra, da Harvard
Business School. A pesquisa de Malhotra revelou também como é o
contexto da situação – em particular a presença ou ausência de deixas
ostensivamente sagradas – que torna evidentes quaisquer diferenças reais
em matéria de altruísmo entre crentes e não crentes. “Essa abordagem nos
ajuda a deixar de buscar uma resposta simples para a questão da maior
bondade ou não das pessoas religiosas”, argumenta Malhotra na revista
Judgment and Decision Making, “e a passar a avaliar quando as pessoas
religiosas podem ser mais bondosas, se é que isso ocorre em algum
momento.” Malhotra formulou a hipótese de que indivíduos religiosos
seriam mais sensíveis a apelos de instituições filantrópicas que os não
religiosos, mas somente nos dias em que foram antes à igreja.
Para pôr esta predição à prova, o autor colaborou com uma casa de
leilões on-line que concordou em alternar sistematicamente seu texto
preparado para estimular lances contínuos. Para participantes on-line que
tinham sido aleatoriamente destinados à mensagem “focalizada em
filantropia”, o estímulo era o seguinte:

Esperamos que você continue a apoiar esta obra de caridade não


deixando os lances cessarem. Cada dólar extra que você oferece no
leilão nos ajuda a realizar nossa tão importante missão.

Em contraposição, as pessoas escolhidas para receber a mensagem


“competitiva” viam isto:
A competição está esquentando! Se você espera vencer, tem de fazer
outro lance.
Vai encarar o desafio?

Um detalhe importante é que Malhotra também contou com uma


medida independente da religiosidade dos arrematantes, inclusive seus
hábitos de frequência à igreja, que obteve seis semanas depois que eles
haviam tomado suas decisões como arrematantes em resposta a um desses
dois estímulos. “O tamanho do efeito é impressionante”, explicou ele. “Nos
domingos, os apelos à filantropia eram 300% mais eficazes sobre
indivíduos religiosos que sobre os não religiosos.” Em contraposição, não
havia absolutamente nenhuma diferença entre os arrematantes religiosos e
não religiosos no tocante à eficácia dos apelos das obras filantrópicas em
qualquer outro dia da semana. Há também um outro interessante “efeito do
domingo”, este descoberto por acaso pelo economista Benjamin Edelman,
também da Harvard Business School. Analisando os impudicos números
referentes à pornografia on-line, Edelman descobriu que a população dos
Estados Unidos é significativamente menos propensa a comprar assinaturas
de websites pornográficos aos domingos que em qualquer outro dia da
semana.
Embora grande parte disso possa corresponder ao senso comum, o fato
de deixas religiosas óbvias estimularem decisões prestativas e reprimirem
transgressões sociais por concentrarem a atenção dos crentes na arguta
visão que Deus tem de seus comportamentos é extremamente importante
para a compreensão da função adaptativa da religião. E esses efeitos se
produzem por toda parte à nossa volta. Em muitos tribunais por todo o
mundo ocidental, por exemplo, réus e testemunhas têm que pôr a mão sobre
a Bíblia e aceitar prestar um juramento religioso: “Jura dizer a verdade, toda
a verdade, e nada além da verdade, com a ajuda de Deus?” E no mundo
hebraico antigo, havia o similar “juramento pela coxa” – em que “coxa” era
o termo polido para nossas partes pendentes –, pois se dizia que ao tocar
seus órgãos sexuais antes de prestar um testemunho a pessoa invocava os
espíritos de sua família (que tinham um interesse pessoal nas sementes
nascidas daqueles órgãos reprodutivos particulares), o que assegurava que
ela não prestaria falso testemunho. Prefiro este ritual antigo, de fato, pois
está mais de acordo com a biologia evolucionária. Mas, em geral, jurar por
Deus, não importa como isso é feito, costuma ser eficaz para persuadir os
demais de que você está dizendo a verdade. Sabemos por estudos
controlados com júris simulados que se uma pessoa jura sobre a Bíblia – ou,
melhor ainda, a beija – antes de testemunhar, a percepção de sua
confiabilidade pelo júri aumenta de maneira significativa.
Afinal, quem em sã consciência iria mentir perante Deus? Bem, como
esses achados sugerem, ateus são mais propensos a isso. E essa é a razão – a
única razão – pela qual eu escolheria um motorista de táxi católico na
Irlanda e não um que, como eu, acha que aquele livrinho no console do
outro motorista está cheio de despautérios de proporções papais.
Os coelhinhos de Deus: a taxa de reprodução
dos crentes é esmagadoramente maior do que
a dos não crentes

COMO ERA MESMO AQUELA frase famosa de Edna St. Vincent Millay? Ah,
sim. Agora me lembro: “Eu amo a humanidade; mas detesto pessoas.” Esse
sentimento expressa bem meu tipo normal de humanitarismo temperado
com uma pitada de misantropia, mas ele vem extremamente a propósito em
certas ocasiões. Por exemplo, quando eu estava conversando na pizzaria de
uma pequena aldeia na Irlanda do Norte, o assunto recaiu em como eu
ganhava a vida. Ora, eu costumava ter muita dificuldade para responder a
essa pergunta simples; quando dizia que era professor, inevitavelmente me
perguntavam o que ensinava. Quando falava em psicologia, as pessoas
diziam alguma coisa sobre seus problemas, entre risadinhas contrafeitas, ou
respondiam – como se essa fosse a fala mais original – que eu estava na
cidade certa para isso. Quando eu as corrigia dizendo não ser um psicólogo
clínico mas um pesquisador, tinha de explicar exatamente o que pesquiso.
“Psicologia evolucionária” tende a fazer surgir algumas ideias esquisitas
na mente de muitas pessoas. E foi o que aconteceu nessa ocasião, enquanto
eu me esforçava para expressar a natureza de minha profissão no salão
apinhado de uma pizzaria com cerca de uma dúzia de moradores do lugar
tentando ouvir o que eu dizia de outras mesas. De uma maneira ou de outra,
como ocorre com frequência em conversas comigo, a homossexualidade
veio à baila como um exemplo de comportamento humano complexo que os
psicólogos evolucionários ainda estão tentando compreender.
Teria sido ótimo ter um notebook em mãos para registrar palavra por
palavra os comentários do jovem empregado, de modo a poder lhes
fornecer um relato etnográfico apropriado. Mas aqui está, em síntese, o que
ele me disse com muita segurança, condimentado com os peculiares floreios
de linguagem encontrados naquela parte do mundo: “Sim. Não me entenda
mal, não tenho nada contra os gays. Mas o que não entendo é por que eles
escolhem ser egoístas e não ter uma família e filhos – pois é para isso que
estamos aqui, o sujeito vai contra a evolução não continuando a linhagem
porque ele não pode ajudar a espécie se não tiver filhos. Isso me parece
meio egoísta.” Respondi que para mim, sendo eu mesmo um homem gay,
não se tratava de uma questão de “escolher” não reproduzir; como mulheres
são mais ou menos tão excitantes a meus olhos como aquela fatia de pizza
com pepperoni pela metade que estava ali sobre a mesa, eu nunca seria
capaz de engravidar uma delas. Consigo contudo, continuei, obter uma
grande ereção vendo a ereção de outros homens, ali portanto – apontei o
dedo para o céu para efeito de ênfase – reside o verdadeiro mistério
darwiniano! Em seguida peguei minha pizza e saí. Depressa. E agora estou
escrevendo isto em Ohio.
De qualquer maneira, porém, a conversa me fez lembrar o que disse o
sociólogo alemão Michael Blume sobre reprodução e religiosidade. E
ocorreu-me que a homofobia motivada pela religião pode estar, pelo menos
em parte, enraizada nessa suposição de que as pessoas gays estão se
furtando às suas obrigações reprodutivas. Detecto um forte cheiro de
resíduo religioso nos comentários do empregado sobre homossexualidade, o
que, dada a forte presença da Igreja na Irlanda do Norte, provavelmente não
foi imaginação minha.
Em termos biológicos evolucionários, em que a seleção natural ocorre
no nível do gene, não no da espécie, há sérias falhas na conjectura dessa
pessoa sobre reprodução da linhagem. Deixando de lado métodos
tecnológicos modernos que ajudam gays a ser pais, há muitas maneiras
pelas quais indivíduos sem filhos podem, ainda assim, ser geneticamente
bem-sucedidos, em alguns casos mais do que sendo pais ou mães
biológicos, por exemplo investindo pesadamente em parentes biológicos
que compartilham seus genes. (Em linguagem científica, isso é conhecido
como seleção de parentesco ou aptidão genética inclusiva.) Tendo dito isto,
vou reconhecer que ele também não estava inteiramente errado com relação
à principal significação evolucionária da reprodução. As pessoas realmente
precisam se reproduzir, direta ou indiretamente, para que a natureza
continue operando em seus genes. Esta não é a “razão” ou a “finalidade” de
nossa presença aqui, pois isso seria insinuar alguma forma de desígnio
inteligente para a existência humana; trata-se antes tão somente de um fato
mecânico.
Mas tudo isso fica realmente interessante, diz Blume, no ponto em que a
ilusão de desígnio inteligente cruza com um imperativo reprodutivo –
essencialmente, a ideia lugar-comum de que Deus “quer” ou “pretende” ou
“exige” que nós, como membros fiéis de nossas comunidades, tenhamos
uma ninhada de filhos igualmente crentes. Você foi abençoado com seus
órgãos reprodutivos produtores de prazer por uma razão, diz essa lógica, e
ela é casar-se com o sexo oposto e procriar. Por Deus, basta olhar para o
Antigo Testamento. “Sede fecundos e multiplicai-vos” é exatamente o
primeiro dos 661 mandamentos diretos. Deus parece não estar fazendo
meramente uma sugestão aqui, mas emitindo uma ordem categórica.
Blume descobriu que as religiões que realmente põem essa questão no
centro de seus ensinamentos estão – por razões bastante óbvias – em
vantagem como grupo seletivo em relação àquelas que não endossam esse
implacável mandamento. Ele examina várias religiões que estão ou já
extintas ou em vias de desaparição atualmente por terem se afastado demais
desse princípio reprodutivo. Os shakers, por exemplo, restringiam e até
proibiam a reprodução entre seus próprios seguidores, preferindo enfatizar
o trabalho missionário, o proselitismo e a conversão de infiéis. Mas esta se
revelou uma estratégia insensata, evolucionariamente falando. “No final das
contas”, salienta Blume, “conversões em massa vêm a ser a exceção
histórica, não a regra. O mais das vezes, só frações de populações tendem a
se converter a partir da mitologia religiosa que lhes foi transmitida
verticalmente pelos pais e convertem-se em diferentes direções … .
Comunidades em que membros jovens começam a escassear também
tendem a perder seu apelo missionário para outros jovens. Por isso os
shakers ficaram velhos demais e se deterioraram.”
Alguns grupos religiosos cismáticos também brincaram um pouco
demais com o imperativo reprodutivo de Deus, chegando até a explorar a
eugenia ao tentar “aperfeiçoar” a prole comunal. Mas um plano deliberado
de procriação humana como esse pode malograr, caso signifique também
impedir as pessoas de se reproduzirem segundo sua vontade pessoal. Esse
foi um dos fatores da ruína da Comunidade Oneida, do norte do estado de
Nova York, uma comunidade cristã do século XIX que tinha uma visão
muito prática – quase prática demais – da sexualidade humana. A
reprodução era estritamente regulada por um sistema eugênico conhecido
como “estirpicultura”. Ao longo de várias gerações, os médicos da
comunidade Oneida acasalaram homens e mulheres cuidadosamente
selecionados por sua saúde genética (vi algumas fichas médicas manuscritas
quando examinava os arquivos do Kinsey Institute, e posso lhe assegurar
que o sistema de procriação era real e meticuloso). As crianças que nasciam
através desse processo de seleção artificial eram criadas comunalmente, e o
vínculo materno era desencorajado.
Para evitar crianças não planejadas, não produzidas por engenharia, os
membros da Comunidade Oneida implementavam uma série de controles,
um dos quais consistia em estimular meninos adolescentes a fazer sexo com
mulheres já na menopausa. Isso saciava simultaneamente as libidos de
ambas as partes e, ao forjar alianças pessoais entre os dois, fornecia aos
jovens uma importante tutelagem ecumênica exercida por mulheres mais
velhas muito devotas. Homens adultos praticavam a continência masculina,
uma “técnica” sexual em que os homens não ejaculam durante o intercurso;
uma vez que Oneida admitia também relações poliamorosas, isso era
fundamental para os propósitos da estirpicultura.
Tudo isto pode soar lógico na teoria, até notavelmente racional em se
tratando de religiões, mas as regulações estritas significaram uma morte
rápida para a Comunidade Oneida. Após cerca de apenas trinta anos, e
tendo chegado a seu apogeu com apenas cerca de duzentos membros, a
comuna religiosa dissolveu-se oficialmente em 1881. Seus membros,
presumivelmente de boa cepa genética mas escassos em número, passaram
a se dedicar ao comércio de prataria; hoje a Comunidade Oneida é
conhecida como a companhia extremamente bem-sucedida Oneida Limited.
Em contraposição, religiões igualmente isoladas, não proselitistas, que
estimulam seus membros a propagar alelos da maneira antiquada – como os
judeus ortodoxos, os huteritas e os amish – e além disso enfatizam a fé
“nativa” em que os membros do grupo nascem e são doutrinados, estão
prosperando. A história dos amish, marcada por uma explosão exponencial
em seus números num espaço muito curto de tempo, é particularmente
impressionante. Os amish emergiram como um ramo do movimento
anabatista na esteira da Reforma Protestante na Europa, e cerca de quatro
mil deles fugiram da Alemanha para evitar perseguição e encontraram
refúgio nos Estados Unidos e no Canadá durante o século XVIII e início do
século XIX. A maioria das pessoas sabe que os amish vivem extremamente
isolados, evitando todo contato com o mundo não amish – exceto durante o
breve período Rumspringa (ou “pular por aí”), em que jovens amish ainda
não batizados flertam com as diabólicas coisas boas do exterior antes de
decidir se querem ou não retornar para sua família e sua fé. Para rapazes,
um incentivo para retornar à comunidade é que se você quiser fazer sexo
(isto é, casar-se) com uma moça amish local, precisa ter sido batizado antes,
o que só é possível para os que voltam para casa. Oitenta por cento o fazem.
O que você talvez não saiba é que a população amish vem crescendo
desde a chegada da seita ao Novo Mundo. Com taxas de crescimento
oscilando entre 4% e 6% ao ano, seus números dobram de vinte em vinte
anos, aproximadamente. Em 2008 eles eram 231 mil; no ano anterior, 218
mil. Ter filhos é uma bênção do céu, mas também um dever oficial. Com
uma média de seis a oito filhos nascidos para cada mulher amish, e com
80% dos jovens retornando ao grupo depois de seu Rumspringa, é fácil
compreender essa extraordinária taxa de crescimento. O que é
especialmente irônico, salienta Blume, é que o país de origem dos amish, a
Alemanha, vem sucumbindo há décadas a acentuados declínios da
população: “O fechamento das igrejas foi seguido pelo dos playgrounds,
jardins de infância, escolas e aldeias inteiras.” Portanto, pelo menos em
termos puramente numéricos, parece que os amish – por muito tempo
ridicularizados por seus compatriotas europeus como os “alemães patetas”
que não queriam abrir mão de suas tolas crenças arcaicas – estão rindo por
último.
De fato, a pesquisa de Blume também mostra muito vividamente que
pessoas seculares, não religiosas, estão se reproduzindo em taxas
muitíssimo menores que pessoas religiosas de qualquer fé. Através de uma
larga faixa de dados demográficos relativos à religiosidade, os devotos
estão ganhando força em termos de filhos gerados. Por exemplo, há uma
correlação positiva em nível global entre a frequência de comparecimento
ao serviço religioso pelos pais e o número de filhos. Os que “nunca”
comparecem a serviços religiosos têm, numa média mundial, 1,67 filho
durante a vida; entre os que o fazem “uma vez por mês” a média sobe para
2,01 filhos; “mais de uma vez por semana”, 2,5 filhos. Esses números
crescem – e rapidamente.
Alguns dos dados mais fortes das análises de Blume, no entanto, vêm de
um levantamento conduzido pelo Departamento Suíço de Estatísticas em
2000. Esses dados são especialmente valiosos porque quase toda a
população da Suíça respondeu a esse questionário – 6.972.244 pessoas,
correspondendo a 95,67% da população –, que incluiu uma pergunta sobre
filiação religiosa. “Os resultados são extremamente significativos”, escreve
Blume. “Mulheres de todas as categorias denominacionais dão à luz muito
mais crianças que aquelas sem filiação religiosa. E isto se aplica até àquelas
comunidades (judaica e cristã) que combinam quase o dobro de
nascimentos com porcentagens maiores de professores universitários e
classes de renda mais alta que seus contemporâneos suíços sem filiação
religiosa.”
Em outras palavras, não se trata apenas de que pessoas “instruídas” ou
da “classe alta” têm menos filhos e tendem também a ser menos religiosas;
mesmo que essas coisas sejam estatisticamente controladas, a religiosidade,
por si só, permite prever o número de filhos que as mães têm. Mesmo em
denominações religiosas turbulentas, que põem sua ênfase na conversão de
infiéis, como as Testemunhas de Jeová, as mulheres reproduzem mais que
as não religiosas. Por outro lado, os hindus (2,79 nascimentos por mulher),
muçulmanos (2,44) e judeus (2,06) são prolíficos produtores de seres
humanos. Mães suíças não religiosas têm míseros 1,11 filho.
Blume reconhece, é claro, que não se pode inferir demais desses dados.
Não está inteiramente claro se ser religioso leva as pessoas a ter mais filhos
ou se – como é um pouco menos plausível, mas também possível – a
ligação segue a direção contrária (com pessoas que têm mais filhos
tornando-se mais religiosas). É muito provável que ocorram as duas coisas.
Apesar disso, Blume especula sobre intrigantes caminhos causais
associados ao fato de pessoas religiosas terem mais filhos. Sabemos por
estudos de gêmeos, por exemplo, que os componentes emocionais da
religiosidade são hereditários. A palavra “religiosidade” designa a
intensidade dos sentimentos associados à religião, não o conteúdo
proposicional de crenças particulares. (Em outras palavras, um gêmeo
idêntico pode ser um ateu arrebatado enquanto o outro é um pastor
evangélico, mas ambos são impetuosos e preocupados com Deus.) Assim,
Blume supõe que quaisquer filhos nascidos de pais religiosos são não
apenas impregnados de sua fé através de sua cultura, mas também
geneticamente mais suscetíveis à doutrinação que filhos de pais não
religiosos.
Seja como for, a situação em seu conjunto não parece propícia para
movimentos secularistas. A biologia evolucionária opera segundo uma lei
de números, não de sentimentos racionais. Blume, que não tenta esconder
suas próprias crenças religiosas, vê a cruel ironia que existe nisso também:
“Alguns naturalistas estão tentando livrar-se de nossas habilidades
evolutivas de religiosidade citando a biologia. Mas, de uma perspectiva
evolucionária, tanto quanto de uma perspectiva filosófica, pode parecer
bastante estranho tentar derrotar a natureza com argumentos naturalísticos.”
Como uma alma ateia gay sem filhos, nascido de um nada rígido casal
inter-religioso, suspeito que, talvez felizmente, meus próprios genes têm um
futuro muito mortal pela frente. Quanto ao resto de vocês, casais
heterossexuais não religiosos que estão lendo isto, joguem fora seus
contraceptivos e ocupem-se na cama. É isso, ou percam as esperanças, Deus
não vai desaparecer tão cedo.
Criando raízes com minha mãe morta

O DIA DAS MÃES ESTÁ PARA SEMPRE marcado em mim com uma certa
tristeza, porque foi o dia em que acompanhei minha mãe, muitos anos atrás,
até o cemitério em que ela está enterrada desde então. Bem, isto não é
inteiramente verdade. Ela não morreu exatamente naquele dia; a morte
ainda demoraria mais seis meses para chegar.
Estivemos na agência funerária para comprar um lustroso caixão novo e
tomar as providências finais para seu cadáver, um visitante indesejado que
não demoraria a chegar, embora nem os médicos pudessem dizer quando
isso ocorreria ao certo. Ainda que apenas para sua paz de espírito, ela estava
decidida a pôr em ordem as minúcias financeiras e administrativas que vêm
com a morte de um ser humano. Afinal, assim que o cordão umbilical é
cortado, começamos a nos prender a regras e regulações burocráticas, um
cipoal que fica mais denso a cada ano que passa, de modo que ao final
morremos emaranhados nele.
Não sei por que ela escolheu logo o Dia das Mães, entre todos os outros,
para uma tarefa tão lacrimosa quanto essa, mas ela tinha certo ar de atriz
trágica – o que, eu poderia acrescentar, era bem merecido, em face de tudo
por que passara. Antes de fazer quarenta anos, ela sofrera uma mastectomia
em razão de um câncer de mama, junto com várias longas rodadas de
quimioterapia. Dentro da mesma década meus pais passariam por um súbito
e doloroso divórcio, e poucos meses depois do divórcio, justamente quando
“estava conseguindo se reerguer”, minha mãe foi atingida por um outro
golpe pesado, sendo diagnosticada com um câncer ovariano em estágio
avançado, e teve de se submeter a mais cirurgias e enfrentar mais sete anos
de quimioterapia. Ela morreu – relutantemente – com apenas 54 anos.
É uma história muito triste, nem é preciso dizer, e infelizmente
compartilhada por muitas outras mães amorosas e maravilhosas que não
estarão conosco no próximo Dia das Mães. O fato de que eu estava
conduzindo uma pesquisa sobre as crenças das pessoas numa vida após a
morte quando ela morreu devia-se quase inteiramente às muitas conversas
teoricamente inspiradoras e perceptivas que tivemos quando ela tentava
imaginar sua própria vida após a morte. (Ela tendia para o materialismo
científico, mas não era ateia e tinha uma mente aberta em relação a toda
essa questão, creio que é seguro dizer.)
Entre os aspectos mais desagradáveis dessa história – tanto para ela na
época quanto para meus irmãos e para mim até hoje – foi a logística
sombria de organizar seu sepultamento. O que mais ficou gravado na minha
mente de todo aquele Dia das Mães de 2000 foi a imagem de minha mãe
com seus dedos trêmulos folheando um catálogo, semelhante aos das
cadeias de lojas de luxo, que lhe foi entregue pelo agente funerário muito
amável, mas insensível. Era um livreto bastante grosso, cheio de imagens
lustrosas de todos os últimos modelos de caixões, câmaras mortuárias,
urnas, catafalcos, lápides e outros novos produtos então em voga funerária,
sendo essa coleção particular especialmente adequada para cadáveres de
classe média. Como ela morreu perto de Fort Lauderdale, desejosa de ficar
mais próxima de sua própria mãe, encontrava-se numa parte do país
especialmente lucrativa para a indústria da morte, pois a área concentra
grande população idosa.
Todo o incidente aquele dia deixou um gosto ruim em minha boca.
Havia alguma coisa de tão plástico, tão escorregadio, tão “comercial”
naquele negócio da morte que ele – mais ou menos como o resto do
superdesenvolvido sul da Flórida, em que esse cemitério sem graça,
adjacente a uma autoestrada, está situado – me pareceu frio demais. Os
cemitérios modernos, com seus lotes sem nenhuma delimitação, suas sebes
perfeitamente manicuradas e lápides de aparência idêntica, tornaram-se
lugubremente parecidos com os subúrbios; ou talvez os subúrbios tenham
se tornado lugubremente parecidos com cemitérios. De uma maneira ou de
outra, o que mais me incomoda é que, olhando para trás, isso não precisava
ter sido assim.
A morte raramente é agradável, é claro, não importa como nos
desfaçamos do cadáver. Nos últimos anos, porém, tornei-me cada vez mais
interessado em “sepultamento verde”, um termo amplo que designa
qualquer prática funerária “alternativa” em que o morto é enterrado num
caixão ou mortalha biodegradável, muitas vezes em reservas florestais, e
sem conservantes embalsamadores (fluidos que mantêm um cadáver com
boa aparência, em geral apenas para que possa ser visto) que retardam e
perturbam enormemente o processo de decomposição.
Embora isto seja objeto de permanente debate e as implicações reais
para a saúde permaneçam obscuras, esses produtos químicos
embalsamadores podem se tornar contaminadores à medida que
formaldeído e outros agentes potencialmente carcinogênicos forem
absorvidos pelo solo e pelo lençol freático. Os defensores do sepultamento
verde colocaram a questão quase inteiramente em termos de evitar o
tremendo impacto do enterro tradicional. Considere que, a cada ano, os
americanos enterram 827.060 galões de fluido embalsamador, 90.272
toneladas de aço (caixões), 2.700 toneladas de cobre e bronze (caixões),
1.663.000 toneladas de concreto reforçado (câmaras mortuárias) e mais de
70.800 metros cúbicos de madeira de lei (grande parte dela tropical;
caixões). Além disso há os incontáveis hectares terraplenados para esses
indisfarçados aterros sanitários de restos humanos sintéticos.
A cremação não constitui um aperfeiçoamento muito grande em relação
a essas coisas. A subida na forma de fumaça pode usar menos recursos
naturais que o enterro tradicional, mas também consome uma significativa
quantidade de combustíveis fósseis. O Trust for Natural Legacies, uma
organização sem fins lucrativos de conservação do solo que trabalha para
impulsionar o crescimento sustentável de práticas verdes de sepultamento
no Meio-Oeste, fez a seguinte declaração: “Seria possível dirigir mais de
7.700 quilômetros com a energia equivalente à usada para cremar uma
pessoa – e ir e voltar à Lua 83 vezes com a energia usada em todas as
cremações feitas em um ano nos Estados Unidos.” Há também o problema
não desprezível do mercúrio que é liberado na atmosfera sempre que uma
pessoa com obturações dentais de amálgama é cremada.
Essas preocupações ambientais por si sós tornam o enterro verde uma
solução óbvia. Mas como psicólogo, e alguém que também teve uma
experiência pessoal negativa ao enterrar uma pessoa amada da maneira
tradicional, penso que nossa concepção da morte e do sepultamento precisa
ser seriamente repensada. Vamos fechar a tampa sobre essas práticas
culturais laminadas anônimas, impelidas pelo lucro, com que temos sido
todos tão complacentes. Tem de haver uma maneira melhor de lidar com
essas coisas do que a que temos adotado todos esses anos. E uma forma
específica de enterro verde, que vou resumir em seguida, é benéfica para
todos.
Embora a ideia de enterros verdes em reservas florestais ou ambientes
semelhantes a parques não seja nova, e constitua provavelmente uma
perspectiva desejável para certas futuras almas mortas que prefeririam o
esquecimento absoluto, parece-me que isso não atrairá a maioria das
pessoas porque nós, seres humanos, tendemos a ter uma premente
necessidade de “imortalidade simbólica”. Esta expressão foi cunhada pelo
antropólogo cultural Ernest Becker em seu livro A negação da morte, mas
desde então vem sendo empiricamente desenvolvida por cientistas que
trabalham com a teoria do controle do terror. A ideia básica por trás da
imortalidade simbólica é que artefatos culturais que sobrevivem à morte
literal do indivíduo, contendo ao mesmo tempo algum lembrete de sua
existência especial, podem reduzir de maneira significativa a ansiedade
humana perante a morte.
A teoria do controle do terror e este construto têm muitas nuances, mas
o ponto importante a mencionar aqui é que um sentimento de imortalidade
simbólica pode ser obtido por marcadores concretos de prosperidade,
qualquer coisa, desde bancos num parque com o nome do falecido gravado
em ouro a lápides num cemitério, passando por iniciais entalhadas no
tronco de uma árvore ou grafites num vagão de carga. Assim, embora
possam ser desnecessariamente sombrios, os cemitérios convencionais pelo
menos satisfazem essa necessidade psicológica das pessoas de permanecer
implantadas, ainda que apenas simbolicamente, por meio de lápides de
granito sem vida, na cultura imortal. Para que a indústria do sepultamento
verde decole um dia e comece a atrair mais pessoas, suspeito que essa seja
uma questão fundamental – a celebração física – que seus defensores vão
precisar enfrentar.
Parece-me que uma maneira de resolver esse problema, permanecendo
ao mesmo tempo fiel à filosofia central do enterro verde, é enterrar as
pessoas debaixo de uma árvore específica – uma arvorezinha nova de sua
escolha alimentada por seu corpo em decomposição embaixo dela. Em
condições favoráveis de solo, um corpo não embalsamado, com esqueleto e
tudo, pode se decompor inteiramente em quinze a 25 anos. Mas muitas
espécies de árvores, não esqueçamos, podem viver por muitas centenas de
anos (algumas, por milhares). Imagine que um dia, ao tomar as
providências finais na agência funerária, você e seus entes queridos
pudessem escolher entre uma ampla variedade de espécies de árvores
coabitáveis para encontrar exatamente aquela condizente com seu ser
fabulosamente inesquecível – isso em vez de folhear um catálogo cheio de
caixões, ataúdes e criptas como minha mãe viu-se fazendo. Não só sua
morte alimentará uma nova vida, mas você também estará salvando mais
uma árvore, aquela que teria sido sacrificada em seu benefício na forma de
um caixão produzido em massa, com alças de plástico.
Além de proporcionar uma dose saudável de imortalidade simbólica,
essa forma de enterro sob uma árvore específica atenderia a um outro
aspecto central de nossa psicologia. Nos últimos anos, pesquisadores
descobriram que os seres humanos operam com uma forte tendência
essencialista. Tendemos a raciocinar implicitamente, e muitas vezes
explicitamente, como se a “essência” inobservável de uma pessoa fosse
transmitida através do contato físico com ela. Você provavelmente recuaria
ante a ideia de usar os óculos de um molestador de crianças, ou a camiseta
lavada de um assassino serial, mas tem dificuldade em expressar
precisamente por que usar esses objetos lhe causa tanta aversão. De maneira
semelhante, você pode ter o anel de casamento de sua falecida avó, ou a
camisa usada de seu jogador de futebol favorito enfiada em algum lugar, e
tem carinho por esses objetos por estarem estreitamente ligados a essas
pessoas adoradas. No presente contexto, digamos que você enterrou seu
cachorro querido sob uma roseira em seu jardim. Se você for pelo menos
um pouco parecido comigo, terá uma maior afinidade com essa roseira do
que com outras, e lhe seria especialmente desagradável se, digamos, alguém
a desenraizasse e sacudisse na sua frente.
Agora imagine um cemitério inteiramente novo, um terreno planejado,
verdejante, cuidado por arboricultores treinados e cheio não de fileiras de
pedras tumulares desinteressantes e desmoronando, mas sim de fileiras de
árvores vivas. Cada árvore, selecionada segundo sua compatibilidade com a
região e outros fatores de adequabilidade tal como aconselhados pelo staff
arboricultor, simbolizaria uma existência humana singular. (Não devemos
nos empolgar, mas talvez uma placa ou marcador possa ser acrescentado
também, reforçando o elemento simbólico de imortalidade, mas a estética
iria, é claro, variar.) Essas não seriam simples árvores plantadas em
memória dos mortos, mas híbridos frondosos cujas veias absorveram vidas
humanas individuais.
Vou me arriscar aqui e dizer que, mesmo que não acreditemos em uma
versão etérea ou religiosa da vida após a morte, é bastante difícil escapar à
ilusão cognitiva de que a essência inobservável de cada pessoa foi de algum
modo transmudada pouco a pouco para sua árvore individual. Duas
enormes nogueiras crescendo lado a lado, com galhos entrelaçados,
parecem de algum modo mais do que meras árvores quando nos é dito que
estão de fato crescendo sobre o que foram outrora um marido e uma mulher
que viveram séculos atrás. Não faltam imagens essencialistas idílicas como
esta – netos subindo nos braços do avô, crianças que foram enfermiças
durante sua vida agora explodindo com as cores flamejantes do outono,
vencedoras de concursos de beleza para sempre fragrantes com imaculadas
flores de cereja, bebês natimortos agora carvalhos magníficos. Levaria
algum tempo, é claro, para que esse arboreto chegasse à plena maturidade.
Mas para que pressa?
Na verdade, a notória dificuldade de nossa espécie em imaginar sua
própria inexistência psicológica é ainda mais um fator cognitivo que torna
essa forma particular de enterro verde atraente. Como não temos nenhuma
analogia apropriada para o estado de inexistência da morte (não somos
capazes de recriar conscientemente em nossas cabeças “como era” quando
estávamos sob anestesia geral, ou antes de termos sido concebidos, ou
mesmo durante o sono sem sonhos, não REM, da noite passada), o mais
perto que conseguimos chegar de apreender mentalmente “como será” estar
morto reifica inevitavelmente o nada.
Com o sepultamento sob árvores específicas, esse princípio de limitação
da simulação da vida após a morte encontra uma saída não religiosa, ou até
religiosa. Por exemplo, você poderia não acreditar que foi literalmente
reencarnado ou renascido na árvore, mas imaginando o crescimento e o
rejuvenescimento dela ano após ano através de todos os séculos de
atividades sociais humanas ainda por vir, você terá muita dificuldade em
impedir de atribuir algumas de suas próprias emoções a esse caráter vivo da
árvore.
Eu certamente gostaria de abraçar uma jovem palmeira na Flórida este
fim de semana. Claro, teria de me preocupar novamente com a saúde de
mamãe, com a possibilidade de ela pegar uma grave infestação por broca ou
talvez de ser rudemente partida em dois por um raio. Mas nós teríamos
incluído esses “atos de Deus” no contrato, o agente funerário e eu.
PARTE VIII

Rumo às profundezas: trabalho


existencial em laboratório
Ser suicida: matar-se é adaptativo? Depende:
suicídio em benefício dos próprios genes
(Parte I)

A MAIOR PARTE DA CIÊNCIA PSICOLÓGICA é a ciência de ser e sentir-se como


um ser humano, e como há apenas um ser humano que tenho ou terei algum
dia a experiência de ser, nem sempre fica claro para mim onde termina
minha carreira e começa minha vida pessoal. Isso tem sido especialmente
verdadeiro nos últimos tempos, pois, como ocorreu com muitos outros
comentadores gays adultos e observadores horrorizados, o grande número
de suicídios de adolescentes gays que teve lugar nos últimos anos reacendeu
lembranças de minhas próprias batalhas adolescentes com pensamentos
suicidas. Há muito a dizer sobre isso, de fato, porque me voltam à mente
muitas das teorias e estudos iluminadores sobre suicídio com que deparei e
que me ajudaram a compreender – e, mais importante, a superar – aquele
desejo horrivelmente embriagador de me livrar prematuramente de um
inferno que parecia interminável.
Se pelo menos eu pudesse ter estendido a mão e segurado a fralda da
camisa de Tyler Clementi da Universidade Rutgers antes que ele saltasse da
ponte George Washington, ou enfiado as pontas dos dedos entre a corda e o
pescoço de Seth Walsh, de treze anos, antes que ele se pendurasse de uma
árvore em seu quintal, eu lhes teria dito que sua orientação sexual os põe na
companhia de algumas das maiores figuras e anjos seculares da história
criativa – para citar apenas alguns, Michelangelo, Caravaggio, Oscar Wilde,
Andy Warhol, Leonardo da Vinci, Marcel Proust, Jean Genet, Hans
Christian Andersen e Tchaikovsky. Por fim, eu lhes falaria sobre a pesquisa
científica e as ideias que vou compartilhar com você, ideias muito
claramente delineadas de estudiosos brilhantes, que poderiam ter penetrado
em sua cognição suicida o bastante para lhes permitir respirar com um
pouco mais de facilidade através dessas emoções negativas sufocantes.
Uma compreensão científica do suicídio é útil não apenas para
adolescentes gays vulneráveis, mas para todos aqueles que se encontram em
algum momento em condições favoráveis ao suicídio. Digo “favoráveis” ao
suicídio porque há trabalhos convincentes – todos inspirados pelas ideias
em grande parte esquecidas que Denys deCatanzaro divulgou no início dos
anos 1980 – indicando que o suicídio humano é uma estratégia
comportamental adaptativa cuja frequência torna-se cada vez maior sempre
que há um conjunto perfeito de variáveis sociais, ecológicas, de
desenvolvimento e biológicas atuando como fatores numa equação
evolucionária. Em suma, deCatanzaro postulou que os cérebros humanos
são projetados pela seleção natural de maneira a nos estimular a pôr fim a
nossas vidas quando enfrentamos certas condições, porque isso foi melhor
para os interesses genéticos globais de nossos ancestrais suicidas.
Para humanitários de bom coração, pode soar bastante estranho, talvez
até quase insensível, ouvir que o suicídio é “adaptativo”. Mas lembre-se de
que, em termos evolucionários, essa palavra significa uma coisa muito
diferente do que quando usada em contextos clínicos. Como a seleção
natural opera somente em fenótipos, não em valores humanos, até as mais
sombrias emoções humanas podem ser adaptativas se motivarem decisões
comportamentais que melhoram os genes. Não que a evolução seja cruel,
mas como um mecanismo irracional ela não se preocupa nem deixa de se
preocupar com indivíduos particulares; a seleção, afinal, não é conduzida
por um cérebro real que alimente quaisquer sentimentos sobre, bem,
absolutamente qualquer coisa. Em nenhum caso esse fato sério fica tão em
evidência quanto no suicídio adaptativo.
Dizer que o suicídio é adaptativo pode também soar estranho de uma
perspectiva evolucionária, porque aparentemente isso fere o primeiro
princípio geral da evolução, que é sobreviver e reproduzir. No entanto,
como o famoso princípio da aptidão inclusiva de William Hamilton
elucidou tão claramente, o que importa é a proporção de nosso material
genético que sobrevive em gerações futuras; assim, se nossa própria
sobrevivência se dá à custa da capacidade de nossa família genética de
transmitir seus genes, sacrificar a própria vida por um ganho genético
líquido pode ter sido ancestralmente adaptativo.
Mas não nos precipitemos. Primeiro, vamos esclarecer o argumento do
suicídio como adaptação com alguns exemplos não humanos, que vêm
sobretudo dos mundos dos insetos e dos artrópodes. Tome as aranhas-de-
dorso-vermelho (Latrodectus hasselti) australianas do sexo masculino, por
exemplo, que parecem contentes ao serem canibalizadas durante o sexo
pelas fêmeas – para dizer o mínimo – sexualmente agressivas da espécie.
Além de estragar um ato de outra forma prazeroso, ser comido vivo durante
a copulação pareceria contrariar frontalmente o senso comum de uma
perspectiva evolucionária. Mas quando biólogos examinaram com mais
atenção esse sexo entre aranhas, perceberam que machos que são
canibalizados copulam durante mais tempo e fertilizam mais óvulos que os
que não são, e que, de fato, quanto mais canibalesca é uma aranha-de-
dorso-vermelho, mais desejável ela parece aos machos, chegando mesmo a
rejeitar mais pretendentes machos que suas companheiras menos
canibalescas.
Um outro exemplo são as mamangabas (Bombus lucorum), uma espécie
de abelha que é muitas vezes parasitada por pequenas moscas conopídeas
que inserem larvas no seu abdome. Depois de infectada, a abelha morre em
cerca de doze dias, e as moscas parasíticas desenvolvem-se em pupas até
emergirem no verão seguinte. O que há de interessante nisso, contudo, é
que as mamangabas parasitadas partem essencialmente para cometer o
suicídio, abandonando sua colônia e passando o resto de seus dias sozinhas
em distantes prados floridos. Ao fazê-lo, essas mamangabas infectadas
estão levando as moscas para longe de sua família não infectada, e, ao
proteger a colônia da infestação, estão aumentando a aptidão inclusiva.
A lição decisiva a tirar desses exemplos não humanos é que o
organismo suicida não está pesando de maneira consciente os custos de sua
própria sobrevivência contra ganhos de aptidão. Aranhas-de-dorso-
vermelho e mamangabas não estão fazendo cálculos racionais, sacrificando-
se em atos heroicos de altruísmo, ou tecendo considerações filosóficas
sobre sua própria mortalidade. Em vez disso, elas são meros fantoches no
barbante invisível dos algoritmos comportamentais evolutivos, com
sistemas neurais respondendo a gatilhos específicos. E, diz deCatanzaro, o
mesmo ocorre com seres humanos suicidas cujas emoções por vezes levam
a melhor sobre eles.
Voltemos nossa atenção agora para o suicida humano. Para cristalizar
sua posição, apresento o “modelo matemático de autopreservação e
autodestruição” de deCatanzaro (c.1986): ,

onde Ψi = o grau ótimo de autopreservação expresso pelo indivíduo i (a


capacidade residual de promover aptidão inclusiva); ρi = o potencial
reprodutivo restante de i; ρk = o potencial reprodutivo restante de cada
membro da família k; bk = um coeficiente de benefício (valores
positivos de bk) ou de custo (valores negativos de bk) para a reprodução
de cada k fornecida pela existência continuada de i (−1 ≤ b ≤ 1); rk= o
coeficiente de relação genética de cada k com i (irmão, pais, filho = 0,5;
avós, neto, sobrinho ou sobrinha, tio ou tia = 0,25; primo em primeiro
grau = 0,125 etc.)

Para os que não têm pendor para matemática, tudo isso pode ser
traduzido da seguinte maneira: as pessoas são mais propensas a cometer
suicídio quando suas perspectivas reprodutivas diretas são desencorajadoras
e, simultaneamente, sua existência continuada é percebida, correta ou
incorretamente, como reduzindo a aptidão inclusiva ao interferir com a
produção genética de sua família. É importante destacar que deCatanzaro,
bem como outros pesquisadores independentes, apresentou dados em apoio
a esse modelo adaptativo.
Num estudo publicado em 1995 na Ethology and Sociobiology, por
exemplo, deCatanzaro administrou um questionário de 65 itens incluindo
questões sobre demografia (como idade, sexo e instrução), número e grau
de dependência de filhos, netos, irmãos e filhos de irmãos, “peso percebido
para a família”, significação percebida de contribuições para a família e a
sociedade, frequência de atividade sexual, homossexualidade, número de
amigos, solidão, tratamento recebido dos outros, bem-estar financeiro e
saúde física, sentimentos de satisfação, depressão e esperança em relação ao
futuro. Os sujeitos foram indagados também sobre seus pensamentos e
comportamentos suicidas – por exemplo, se haviam alguma vez pensado em
suicídio, se já o haviam tentado alguma vez no passado ou pretendiam
tentá-lo alguma vez no futuro. O questionário foi aplicado a uma amostra
aleatória da população geral de Ontário, mas também a grupos específicos
escolhidos, inclusive moradores de lares para cidadãos idosos, pacientes
internados num hospital psiquiátrico, homens presos indefinidamente por
crimes antissociais e, por fim, homens e mulheres exclusivamente gays.
Muitos achados fascinantes – e bastante tristes – emergiram desse
estudo. Por exemplo, os níveis mais altos de ideação suicida recente
estavam entre os homossexuais do sexo masculino e os pacientes
psiquiátricos, ao passo que a população da prisão mostrou o maior número
de tentativas anteriores de suicídio. “As coisas melhoram”, sem dúvida, mas
estamos sempre em risco, e esse modelo evolucionariamente informado
ajuda indivíduos gays a enfrentar e compreender a lamentável realidade.
Mas a importante mensagem a extrair é que o padrão de dados
correlacionais mostrou-se de acordo com aqueles previstos pelo modelo
evolucionário de deCatanzaro. O autor faz a importante ressalva de que “a
natureza observacional deste estudo limita inferências causais fortes”, mas,
ainda assim: “O perfil das correlações está de acordo com a noção de que a
ideação suicida está relacionada a uma conjunção de más perspectivas
reprodutivas e senso de valor para a família diminuído. A concordância dos
dados com a hipótese fica clara em relações confiáveis de padrões
reprodutivos e produtivos com a ideação suicida.”
Algo que vale a pena ressaltar nesses dados é a significativa mudança
associada ao desenvolvimento que ocorre no algoritmo motivacional.
Enquanto a atividade heterossexual é o melhor preditor inverso de
pensamentos suicidas entre amostras mais jovens, isso é em grande parte
substituído entre os idosos por preocupações com as finanças, a saúde e, em
especial, a sensação de “peso percebido” para a família. Alguns anos depois
da publicação desse relato na Ethology and Sociobiology, um estudo de
acompanhamento publicado na Suicide and Life-Threatening Behavior,
conduzido por um grupo independente de pesquisadores que buscava
submeter o modelo de deCatanzaro a mais provas, replicou as mesmas
tendências previstas.
Por mais que esse modelo me pareça convincente, ainda tenho uma
questão a que a argumentação básica de deCatanzaro não responde, por isso
lhe pedi esclarecimento. Basicamente, eu queria saber como os padrões
suicidas dos seres humanos contemporâneos se relacionam com os de
nossos parentes ancestrais, que presumivelmente enfrentaram as condições
em que a adaptação se desenvolveu originalmente, mas que, sob muitos
aspectos, viveram num mundo muito diferente do nosso. Afinal, mesmo
com armas de fogo, facas e medicamentos à nossa disposição, cometer
suicídio não é sempre uma coisa fácil de fazer, em termos práticos.
Num artigo publicado na Psychological Review, por exemplo, a
psiquiatra Kimberly van Orden e colegas citam o caso de uma suicida
particularmente tenaz: “[Ela] era descrita como socialmente isolada quando
tentou suicídio com uma quantidade e um tipo desconhecido de analgésico
e também cortou suas artérias do pulso. Essa ação levou a certo grau de
inconsciência, do qual ela acordou … . Depois ela se jogou diante de um
trem, o que foi a causa final de sua morte.”
Agora considere os métodos de suicídio que teriam estado disponíveis a
nossos antigos parentes num ambiente de escassa tecnologia – talvez um
salto de uma grande altura que, mesmo sendo malsucedido, poderia ao
menos ocasionar ferimentos suficientes para que ela acabasse morrendo de
uma infecção. Fome. Exposição aos elementos. Afogamento.
Enforcamento. Oferecer-se a um predador faminto. Certo, talvez houvesse
mais métodos à disposição de nossos antepassados do que supus. Mas você
entende o que quero dizer. Hoje, mover um dedo apenas um milímetro num
gatilho é uma rota mais segura para o olvido que qualquer coisa que nossa
espécie tenha algum dia conhecido antes; é tão simples atualmente que é
como se os donos de armas de fogo tivessem um botão de “desligar”. (Essa
é uma das muitas razões por que não tenho um revólver; o algoritmo do
suicídio de deCatanzaro é estocástico, o que significa que o número que ele
gera para um dado indivíduo está em constante estado de fluxo.)
Mas deCatanzaro não vê os avanços técnicos como particularmente
problemáticos para seu modelo. Não é fácil encontrar fósseis de
australopitecíneos ou de Homo sapiens primitivos suicidas, é claro. Mas,
como ele me escreveu:

As evidências indicam taxas apreciáveis de suicídio ao longo de toda a


história registrada e em quase todas as culturas que foram
meticulosamente estudadas. Ao que parece, o suicídio foi muito comum
nas civilizações grega e romana. Estudos antropológicos indicam muitos
casos em culturas tecnologicamente primitivas tão diversas quanto as
ameríndias, inuítes, africanas, polinésias e indonésias, bem como entre
tribos menos desenvolvidas da Índia. O autoenforcamento era um dos
métodos de suicídio mais comuns nessas culturas. Há também dados de
países desenvolvidos comparando taxas de suicídio desde o final do
século XIX até o século XX. Esses dados mostram notável constância
das taxas nacionais de suicídio ao longo do tempo, apesar de muitas
mudanças tecnológicas. Pode-se inferir, portanto, que os dados não
mostram realmente um maior aumento do suicídio nos tempos
modernos, embora se deva ressalvar que pode ter havido mudanças nas
distorções sistemáticas ocorridas no registro dos casos. É interessante
notar que os métodos de suicídio mudaram muito mais do que as taxas.
Por exemplo, no Japão o enforcamento prevaleceu até 1950, após o que
comprimidos e venenos tornaram-se o método mais usado. Na
Inglaterra e no País de Gales, enforcamento e afogamento eram comuns
no final do século XIX, mas foram progressivamente substituídos por
medicamentos e envenenamento por gás. Talvez os motivos tenham se
mantido mais constantes que os meios.

A tese de deCatanzaro de que o suicídio é adaptativo me parece ao


mesmo tempo convincente e intrigante. Mas creio que ela precisa ser
respaldada por mais pesquisas. Por exemplo, a lógica da aptidão inclusiva
deveria aplicar-se a absolutamente todas as espécies sociais na face da
Terra, então por que há uma diferença tão óbvia entre a frequência de
suicídios em seres humanos e outros animais? Cada ano, até 20 milhões de
pessoas no mundo todo tentam se suicidar, com cerca de um milhão delas
consumando o ato. Essa é uma significativa minoria das mortes – e quase
mortes – em nossa espécie. E há razão para se suspeitar que animais não
humanos usados como modelos (como mamangabas parasitadas, baleias
encalhadas na praia, lemingues saltadores e chimpanzés enlutados) podem
não ser bons análogos para o suicídio humano. Em nossa própria espécie, o
suicídio significa em geral a tentativa deliberada de pôr fim a nossa
existência psicológica – ou ao menos a essa existência psicológica
particular. E embora a maior parte dos outros relatos de “autodestruição” no
mundo natural pareça envolver algum tipo de predação interespecífica ou
manipulação parasítica, os suicídios humanos são mais frequentemente
impelidos por avaliações interpessoais negativas feitas por outros membros
de nossa própria espécie. De fato, Robert Poulin, o zoólogo que descreveu
pela primeira vez o comportamento alterado daquelas mamangabas
parasitadas, chega a instar os pesquisadores a terem cautela ao se referirem
a esses exemplos como “suicídio”: “A adoção de um estilo de vida mais
perigoso por um inseto que está condenado a morrer em breve pode ser
adaptativa em termos de aptidão inclusiva, mas não mais suicida que, por
exemplo, a conduta de um animal em processo de envelhecimento que corre
riscos para se reproduzir na presença de um predador quando sua morte
inevitável se aproxima.”
Acredito que o suicídio, como a masturbação possibilitada pela fantasia,
requer processos sociais cognitivos evolutivos relativamente únicos – neste
caso, penosamente únicos – de nossa espécie. Contam-se muitas histórias, é
claro, mas não há casos confirmados de suicídio em nenhuma espécie
primata não humana. Embora haja certos casos de comportamentos
autoinjuriosos, como a autolimpeza excessiva, eles se limitam quase sempre
a ambientes sociais tristes ou anormais, como laboratórios biomédicos ou
jardins zoológicos. Sim, há notícia de jovens chimpanzés enlutados que se
deixam morrer de fome por depressão após a morte de suas mães, mas não
há evidência de manifestações letais autoinfligidas em macacos e
antropoides. Talvez Jane Goodall possa me corrigir se eu estiver errado a
este respeito, mas, pelo que sei, não há casos em que chimpanzés tenham
sido observados subindo até o galho mais alto que puderam encontrar… e
pulando.
Creio que parte da resposta para essa misteriosa diferença entre as
espécies pode ser encontrada em um outro modelo de suicídio, este da
autoria do psicólogo Roy Baumeister, que sempre vi como o nível “mais
próximo” do nível “máximo” de explicação do suicídio de deCatanzaro.
Estas não são explicações alternativas do suicídio humano, mas
profundamente complementares. Enquanto deCatanzaro explica o suicídio
em termos de dinâmica evolucionária, Baumeister dirige sua atenção para
os processos psicológicos específicos, a lente subjetiva através da qual uma
pessoa suicida vê o mundo. Seu modelo descreve o motor que promove
ativamente a resposta adaptativa do suicídio. Devo me apressar em
acrescentar que penso que nenhum dos dois – deCatanzaro ou Baumeister –
considera seu modelo complementar ao do outro, não necessariamente e
não desta maneira. Não sei sequer se um tem conhecimento do modelo do
outro. Mas essa é impressão que as duas abordagens sempre me causaram.
A maneira como Baumeister encara o assunto é, com toda franqueza, uma
das mais chocantemente argutas que já li, em qualquer literatura de
pesquisa. Na parte II de nosso exame da questão do suicídio e psicologia,
voltaremos nossa atenção para esse trabalho.
Ser suicida: como é a sensação de querer se
matar (Parte II)

UMA DAS CONDIÇÕES PSICÓTICAS mais fascinantes na literatura médica é


conhecida como síndrome de Cotard, um distúrbio raro, em geral curável,
cujo principal sintoma é um “delírio de negação”. Segundo os
pesquisadores David Cohen e Angèle Consoli da Universidade Pierre et
Marie Curie, muitos pacientes com a síndrome de Cotard estão
absolutamente convencidos, sem sombra de dúvidas, de que já estão
mortos.
Algumas evidências recentes sugerem que a síndrome pode ocorrer
como um efeito colateral neuropsiquiátrico em pacientes que tomam os
medicamentos aciclovir ou valaciclovir para herpes e que também sofrem
de falência renal. Descrita pela primeira vez pelo neurologista francês Jules
Cotard na década de 1880, a síndrome é muitas vezes acompanhada por
algum outro problema debilitante, como depressão profunda, esquizofrenia,
epilepsia ou paralisia geral – para não mencionar a visão de rostos
perturbadores no espelho. Considere o caso de uma jovem descrito por
Cohen e Consoli: “O delírio consistia na absoluta convicção da paciente de
que já estava morta e esperando para ser enterrada, de que não tinha dentes
nem cabelo, e de que seu útero era malformado.”
Pobrezinha – essa imagem certamente não podia ser muito boa para sua
autoestima. Apesar disso, e você pode me qualificar de estranho, de fato
vejo certo encanto na convicção de que uma pessoa, ainda que lúcida
quanto ao resto, está todavia já morta. Contanto que não houvesse nenhum
sintoma desconfortável de rigor mortis retorcendo-me as mãos, nem
demônios ilusórios mordendo-me os pés, como seria libertador poder
escrever como um morto, sem aquele temor importuno e hesitante de ser
imperturbavelmente franco. Sabendo que após a publicação eu estaria
aconchegado em segurança na minha tumba, eu poderia finalmente dizer o
que me passa pela cabeça. É claro que viver a nossa vida como se ela fosse
um bilhete suicida encarnado (lembro, contudo, que a vida é precisamente
isso, e eu aconselharia qualquer pessoa dotada de reflexão a passear por um
cemitério todos os dias, contemplar aqueles campos de pedras tumulares em
ruínas cheios de grilos cricrilantes e ponderar, ilogicamente, o que essas
pessoas desejariam ter podido dizer ao mundo quando isso ainda lhes era
possível) é completamente diferente de sentir o peso esmagador,
insuportável, de uma verdadeira mente suicida perigosamente tentada pela
promessa de permanente quiescência.
Ao considerar as motivações das pessoas para se matarem, precisamos
reconhecer que a maioria dos suicidas é movida por um súbito fluxo de
emoções fortes, não por pensamentos racionais, filosóficos, em que os prós
e os contras são criticamente avaliados. E, como mencionei no capítulo
anterior sobre a biologia evolucionária do suicídio, penso que, da
perspectiva da ciência psicológica, nenhum estudioso captou a mente
suicida melhor que Roy Baumeister no artigo que publicou em 1990 na
Psychological Review: “Suicide as Escape from Self”. Repetindo, vejo a
rubrica cognitiva de Baumeister como o motor das emoções que movem a
tomada de decisão suicida biologicamente adaptativa de deCatanzaro. Há
por certo modelos teóricos do suicídio mais modernos que o de Baumeister,
mas nenhum, em minha opinião, constitui um aperfeiçoamento. O autor nos
dá um vislumbre singularmente detalhado do estreitamento da visão
experimentado por uma pessoa genuinamente suicida.
Segundo Baumeister, há seis passos principais na teoria da fuga,
culminando num provável suicídio quando todos os critérios são atendidos.
Espero realmente que um conhecimento sobre a fenomenologia da sensação
de “ser” suicida ajude as pessoas a reconhecer seus próprios possíveis
sintomas de ideação suicida e – se isso de fato estiver acontecendo –
permita-lhes escapar de alguma maneira, antes que seja tarde. Note que não
está claro de maneira alguma que as pessoas em risco de suicídio têm
sempre consciência de serem de fato suicidas, pelo menos quando ocorrem
as primeiras manifestações cognitivas da ideação suicida. E se esse
pensamento prosseguir sem impedimentos, a tentativa de evitar que uma
pessoa suicida complete o ato pode ser tão inútil quanto pedir a alguém que
está no auge da excitação sexual para fazer o favor de se abster gentilmente
de ter um orgasmo, o qual é ele próprio chamado por vezes de la petite mort
(a pequena morte).
Empreendamos portanto uma viagem dentro da mente suicida, pelo
menos tal como ela é vista por Roy Baumeister. Talvez você venha até a
descobrir que de fato já pisou nesse escuro espaço psicológico antes, talvez
sem o saber na época.

Passo 1: Fracasso em atender aos padrões. A maioria das pessoas que se


mata viveu, na realidade, vidas melhores que a média. As taxas de suicídio
são mais elevadas em nações com padrões de vida mais altos que em nações
menos prósperas; mais altas em estados dos Estados Unidos com melhor
qualidade de vida; mais altas em sociedades que respeitam as liberdades
individuais; mais altas em áreas com clima melhor; em áreas com mudanças
sazonais, são mais altas nas estações mais quentes; e são mais altas entre os
alunos universitários que têm notas melhores – e pais com expectativas
mais elevadas.
Baumeister argumenta que essas condições próximas do ideal elevam de
fato o risco de suicídio porque criam com frequência padrões exorbitantes
para a felicidade pessoal, tornando assim as pessoas emocionalmente mais
frágeis em reação a reveses inesperados. Assim, quando as coisas se tornam
um pouco complicadas, essas pessoas, muitas das quais parecem ter vivido
vidas extremamente privilegiadas, têm maior dificuldade em suportar
fracassos. “Um grande corpo de evidências”, escreve o autor, “é compatível
com a ideia de que o suicídio é precedido por eventos que ficam aquém de
padrões e expectativas elevados, produzidos quer por realizações passadas,
circunstâncias cronicamente favoráveis ou exigências externas.” Por
exemplo, simplesmente ser pobre não é um fator de risco para o suicídio.
Mas a passagem de maneira bastante repentina da relativa prosperidade
para a pobreza foi fortemente associada a suicídio. Assim também, ser uma
pessoa solteira durante toda a vida não é um fator de risco, mas a transição
do casamento para a condição de solteiro põe uma pessoa em risco
significativo de suicídio. A maioria dos suicídios registrada em ambientes
de prisão e hospital psiquiátricos ocorre no primeiro mês de confinamento,
durante o período inicial de ajustamento à perda de liberdade. As taxas de
suicídio são mais baixas nas sextas-feiras e mais altas nas segundas-feiras;
elas também caem logo antes de feriados importantes, para sofrer
acentuadas elevações logo depois deles. Baumeister interpreta esses padrões
como compatíveis com a ideia de que as expectativas elevadas das pessoas
para fins de semana e feriados se convertem, após o fato, em dolorosos
desapontamentos.
Para resumir este primeiro passo na teoria da fuga, Baumeister nos diz
que “aparentemente é o tamanho da discrepância entre padrões e a realidade
percebida que é decisivo para desencadear o processo suicida”. É a lei
proverbial da gravidade social: quanto mais elevada for sua posição
original, mais penoso será cair de cara no chão.

Passo 2: Atribuições a si mesmo. Não é apenas a queda do estado de graça


que o fará entrar num parafuso suicida. É também necessário que você
abomine a si mesmo por enfrentar a dificuldade em que se encontra. Nas
mais diversas culturas, a “autocensura” ou “autocondenação” manteve-se
constante como um denominador comum em suicídios. A teoria de
Baumeister dá lugar para esses dados, mas seu modelo enfatiza que o maior
fator de risco não é a autoestima cronicamente baixa em si, mas uma
demonização relativamente recente de si mesmo em reação ao revés
imprevisto ocorrido no passo anterior. Pessoas com baixa autoestima
costumam ser misantrópicas, ele observa, uma vez que, embora sejam
realmente autocríticas, em geral se mostram igualmente críticas em relação
aos outros. Em contraposição, indivíduos suicidas que desenvolvem
avaliações negativas de si mesmos parecem estar sob a impressão errônea
de que os outros são em sua maioria bons enquanto eles mesmos são maus.
Sentimentos de imprestabilidade, vergonha, culpa, inadequação,
desmascaramento, humilhação ou rejeição levam pessoas suicidas a
desgostar de si mesmas de uma maneira que, essencialmente, as isola de
uma humanidade idealizada. A pessoa vê a si mesma como
persistentemente indesejável; não há esperança de mudança e o âmago de si
mesmo é visto como corrompido.
É por isso que adolescentes e adultos com orientações sexuais
minoritárias que são gestados num útero social cheio de mensagens –
implícitas e explícitas – de que eles são em essência seres humanos
inferiores são especialmente vulneráveis ao suicídio. Ainda que possamos
rejeitar de maneira consciente essas atribuições pessoais feitas por uma
sociedade intolerante, elas se infiltraram em nós.
Passo 3: Autoconsciência elevada. A maioria dos estudiosos descreve a
emergência da autoconsciência como um avanço fundamental para nossa
espécie. Mas com ela vem a esmagadora verdade de nosso valor, como
indivíduos, em comparação com os demais. “A essência da autoconsciência
é a comparação de si mesmo com padrões”, escreve Baumeister. E segundo
sua teoria da fuga, é essa comparação incessante e implacável com um self
preferido – talvez um self de um passado mais feliz ou um self ideal que
agora, à luz de eventos recentes, parece ser impossível alcançar – que
alimenta a ideação suicida.
Esses pensamentos implacáveis e incessantes em indivíduos suicidas
são de fato mensuráveis, pelo menos indiretamente, mediante a análise da
linguagem usada em bilhetes suicidas. Edwin Shneidman, um conhecido
“suicidologista”, escreveu certa vez: “Nosso melhor caminho para a
compreensão do suicídio não é o estudo da estrutura do cérebro, nem o
estudo de estatísticas sociais, nem o estudo de doenças mentais, mas o
estudo direto de emoções humanas descritas em linguagem clara, nas
palavras do suicida.” Pessoalmente, sinto-me uma espécie de voyeur ao ler
os bilhetes suicidas de desconhecidos, mas essa é uma prática antiga na
pesquisa psicológica. Só durante as últimas décadas, foram publicados
quase trezentos estudos sobre bilhetes suicidas. Eles cobrem uma ampla
variedade de questões de pesquisa, mas como tendem a produzir achados
incoerentes, também pintaram uma imagem confusa da mente suicida.
Esse é especialmente o caso quando se tenta revelar as motivações para
o ato. Algumas pessoas que cometem suicídio podem nem mesmo ter
consciência de suas próprias motivações, ou pelo menos podem não ter sido
inteiramente sinceras em suas cartas de despedida ao mundo. Um bom
exemplo vem do relato publicado pela socióloga Susanne Langer e colegas
num número de 2008 da Sociological Review. Os pesquisadores descrevem
como o bilhete suicida escrito por um jovem era bastante banal,
mencionando sentimentos de solidão e vazio como causas de seu suicídio,
quando, de fato, “seu arquivo continha um memorando que indagava sobre
o estado de uma investigação relacionada a crimes sexuais de que o falecido
era acusado numa jurisdição vizinha”.
Os estudos mais convincentes de bilhetes suicidas, em minha opinião,
são aqueles que usam programas de análise de texto que permitem aos
investigadores fazer contagens exatas de tipos particulares de palavras.
Comparados com bilhetes suicidas imaginários escritos como um exercício
e “como se” o autor estivesse prestes a se matar, bilhetes de suicídio reais
são notórios por conter pronomes da primeira pessoa do singular, um
reflexo de elevada autoconsciência. E, diferentemente de cartas escritas por
pessoas que se veem diante de uma morte involuntária, como aquelas
prestes a ser executadas, os autores de bilhetes suicidas raramente usam
linguagem inclusiva, como o pronome plural nós. Quando mencionam
outras pessoas significativas, os suicidas em geral falam delas como estando
desligadas, distantes, separadas, como pessoas que não os compreendem ou
estão contra eles. Amigos e família, até uma mãe amorosa muito próxima,
parecem estar a oceanos de distância.

Passo 4: Afeto negativo. Talvez pareça desnecessário dizer que suicídios


tendem a ser precedidos por um período de emoções negativas. Porém, mais
uma vez, no modelo de fuga de Baumeister, emoções suicidas negativas são
experimentadas como um estado agudo, não como um estado prolongado.
“Concluir simplesmente que depressão causa suicídio e ficar por aí pode ser
inadequado por diversas razões”, escreve ele. “É abundantemente claro que
a maioria das pessoas deprimidas não tenta o suicídio e que nem todos os
que tentam estão clinicamente deprimidos.”
A ansiedade – que pode ser experimentada como culpa, autocensura,
ameaça de exclusão social, ostracismo e angústia – parece ser um elemento
comum na maioria dos suicídios. É bem possível que sejamos a única
espécie para a qual avaliações sociais negativas podem levar a suicídios
induzidos pela vergonha. Os dados mais convincentes de estudos com
animais não humanos sugerem muito fortemente que somos a única espécie
da face da Terra capaz de adotar a perspectiva de um outro organismo ao
julgar nossos próprios atributos. Isso decorre de uma inovação
evolucionária conhecida como teoria da mente (literalmente, teorizar sobre
aquilo que uma outra pessoa está pensando, inclusive aquilo que ela está
pensando sobre você mesmo; e, o que talvez seja mais importante nesse
caso, até sobre o que você está pensando sobre você), que foi uma bênção e
uma maldição. Foi uma bênção porque nos permite sentir orgulho, e foi
uma maldição porque também engendra o que julgo ser a emoção
singularmente humana e singularmente dolorosa da vergonha. (Você
também se lembrará disso da nossa discussão anterior sobre
psicodermatologia e acne.)
Teóricos psicodinâmicos muitas vezes postulam que a culpa suicida
busca punição, sendo o suicídio, portanto, uma espécie de autoexecução.
Mas a teoria de Baumeister rejeita em grande parte essa interpretação; em
seu modelo, o atrativo do suicídio está antes na perda de consciência, e
assim no fim da dor psicológica que está sendo experimentada. E como a
terapia cognitiva não é facilmente disponível – ou vista como alcançável –
para a maioria dos suicidas, restam apenas três maneiras para escapar dessa
penosa autoconsciência: drogas, sono e morte. E delas, somente a morte, o
maior anestésico da natureza, oferece uma solução permanente.

Passo 5: Desconstrução cognitiva. O quinto passo na teoria da fuga é talvez


o mais intrigante de uma perspectiva psicológica, porque ilustra como a
mente suicida é diferente e alarmantemente inacessível a partir daquela de
nossa cognição comum. Com a desconstrução cognitiva, conceito proposto
originalmente pelos psicólogos sociais Robin Vallacher e Daniel Wegner, o
mundo exterior torna-se algo muito mais simples em nossas cabeças – mas
em geral não de uma boa maneira.
A desconstrução cognitiva é mais ou menos o que parece ser. As coisas
são cognitivamente decompostas em elementos cada vez mais básicos e de
nível mais baixo. Por exemplo, a perspectiva temporal das pessoas suicidas
muda de uma maneira que faz o presente momento parecer
interminavelmente longo; isso se dá porque “os suicidas têm uma
consciência aversiva ou ansiosa do passado recente (e possivelmente do
futuro também), do qual tentam escapar num foco estreito, desprovido de
emoção no momento presente”. Num estudo interessante, por exemplo,
quando comparados com grupos de controle, participantes suicidas
superestimam de maneira significativa, por uma ampla margem, a passagem
de intervalos de tempo experimentalmente controlados. Baumeister
conjectura: “Por conseguinte, suicidas parecem ser pessoas agudamente
entediadas: o presente parece interminável e vagamente desagradável, e
sempre que a pessoa olha o relógio, fica surpresa com o pouco tempo que
realmente passou.”
As evidências também sugerem que indivíduos suicidas têm dificuldade
em pensar sobre o futuro – o que mostra, para os que usariam a ameaça do
inferno como um argumento dissuasivo, exatamente por que essa estratégia
tem pouca chance de ser eficaz. Esse estreitamento temporal, acredita
Baumeister, é na realidade um mecanismo defensivo que ajuda a pessoa a se
afastar cognitivamente do pensamento sobre fracassos passados e da
ansiedade provocada por um futuro intolerável, sem esperança.
Um outro aspecto central da desconstrução cognitiva operada pela
pessoa suicida, diz Baumeister, é um enorme aumento do pensamento
concreto. Como a autoconsciência intrusivamente elevada discutida antes,
essa concretude muitas vezes se expressa em bilhetes suicidas. Vários
artigos de revisão observaram a relativa escassez, em bilhetes suicidas, de
“palavras de pensamento”, isto é, termos abstratos, significativos, de alto
nível. Com maior frequência, eles incluem instruções banais e específicas,
como “Não se esqueçam de dar comida para o gato” ou “Lembrem-se de
tomar cuidado com a conta de luz”. Bilhetes suicidas reais são em geral
suspeitamente desprovidos de pensamentos contemplativos ou metafísicos,
ao passo que falsos bilhetes suicidas, escritos por participantes de estudos,
tendem a incluir termos mais abstratos ou de alto nível (“Um dia vocês
entenderão o quanto eu os amei” ou “Sejam sempre felizes”). Um estudo
antigo constatou até que bilhetes suicidas genuínos continham mais
referências a objetos concretos do ambiente – coisas físicas – que os
bilhetes suicidas “falsos” (simulados).
O que esse deslocamento cognitivo para o pensamento concreto reflete,
sugere Baumeister, é a tentativa do cérebro de mergulhar num trabalho
mental inútil, evitando assim os sentimentos sufocantes que descrevemos.
Muitos universitários suicidas, por exemplo, exibem um padrão
comportamental de se enterrar em trabalhos acadêmicos enfadonhos e
rotineiros nas semanas precedentes, presumivelmente para entrar numa
espécie de “entorpecimento emocional” que é “um fim em si mesmo”.
Quando fui um adolescente suicida, lembro-me de ler vorazmente; o que eu
lia não importava – sobretudo romances vagabundos, na verdade –, uma vez
que meu único objetivo era substituir meus pensamentos pelos do escritor.
Para o suicida, as palavras de outras pessoas podem ser estendidas sobre
suas próprias ruminações exaustivas, como uma luva sem costuras sendo
enfiada numa mão perturbadoramente ferida.
Até os detalhes sinistros da organização do próprio suicídio podem
oferecer uma trégua bem-vinda: “Ao se preparar para o suicídio, a pessoa
pode por fim cessar de se preocupar com o futuro, pois decidiu
efetivamente que não haverá nenhum futuro. O passado, também, deixou de
importar, pois está quase acabado e não mais causará sofrimento,
inquietação ou ansiedade. E a iminência da morte pode ajudar a concentrar
a mente no presente imediato.”

Passo 6: Desinibição. Agora já montamos o palco mental, mas


evidentemente é o ato final que separa a ideação suicida do suicídio real.
Baumeister especula que a desinibição comportamental, exigida para a
superação do medo intrínseco de causar dor a si mesmo através da morte,
para não mencionar o sofrimento antecipado dos entes queridos, é uma
outra consequência da desconstrução cognitiva. Isso ocorre porque ela
impede as abstrações de alto nível (a reflexão sobre o caráter inerentemente
“errado” do suicídio, sobre os sentimentos dos outros, até preocupações
com a autopreservação) que, em condições normais, nos mantêm vivos.
Uma análise teórica feita pela psiquiatra Kimberly van Orden e colegas
lançou uma luz adicional sobre esse componente de desinibição
comportamental. Esses autores salientam que, embora haja um número
considerável de pessoas que querem se matar, o suicídio propriamente dito
permanece relativamente raro. Isso ocorre em grande parte porque, além do
desejo de se suicidar, o indivíduo precisa da “capacidade adquirida para o
suicídio”, que envolve tanto um menor medo da morte quanto uma maior
tolerância à dor física. O suicídio dói, literalmente. Segundo o modelo
desses autores, essa capacidade é adquirida com a exposição a condições
relacionadas que habituam sistematicamente o indivíduo à dor física. Por
exemplo, um dos melhores preditores do suicídio é uma tentativa anterior,
não letal, de suicídio.
Mas uma história de outras experiências fisicamente penosas, indutoras
de medo, também põe uma pessoa em risco. Violência física ou sexual
quando criança, exposição em combate e violência doméstica podem
também “preparar” o indivíduo para a dor física associada ao
comportamento suicida. Além disso, variantes hereditárias de
impulsividade, destemor e maior tolerância à dor física podem ajudar a
explicar por que, com frequência, o comportamento suicida se repete em
certas famílias. Van Orden e colegas também citam algumas intrigantes
evidências de que a habituação à dor não é sempre a mesma para qualquer
método antigo de suicídio, e sim, muitas vezes, específica ao método
particular que a pessoa usa para pôr fim à própria vida. Por exemplo, um
estudo sobre suicídios nos ramos das forças armadas dos Estados Unidos
verificou que armas de fogo estavam mais frequentemente associadas aos
suicídios de membros do Exército, enforcamentos e nós aos de membros da
Marinha e quedas de alturas aos de membros da Aeronáutica.

PORTANTO, AÍ ESTÁ. Realmente não é um quadro bonito. Mais uma vez,


porém, se algum dia você tiver o infortúnio de experimentar essa dinâmica
cognitiva em sua própria mente – e eu, por exemplo, a experimentei
intensamente – ou suspeitar que está vendo em outras pessoas
comportamentos indicadores de que esses padrões de pensamento podem
estar ocorrendo, espero que esta informação lhe ajude a perfurar
metacognitivamente a ideação suicida. Se há uma coisa que aprendi desde
aqueles dias muito tenebrosos de meus anos suicidas é que o conhecimento
científico transforma perspectivas. E as perspectivas transformam todas as
coisas. Todas as coisas.
E, como mencionei no início, lembre-se sempre: você vai morrer muito
em breve de qualquer maneira; mesmo que isso leve cem anos para
acontecer, isso ainda é a piscadela de um olho cósmico. Nesse meio-tempo,
viva como um cientista – mesmo um cientista controverso, com apenas um
ou dois colegas em todo o mundo – e trate a vida como um experimento
grandioso, sangue, suor, lágrimas e tudo mais. Tenha em mente que não
existe algo como um experimento fracassado – apenas dados.
“Cientistas dizem que o livre-arbítrio
provavelmente não existe, mas recomendam:
‘Não deixem de acreditar nele!’”

SUSPENDA SUA INCREDULIDADE por um momento e imagine que você


concordou, na qualidade de agente secreto em uma operação militar
confidencial, em viajar para trás no tempo até o ano 1894. Para seu
assombro, a viagem é um sucesso! E agora – após esfregar os olhos para
tirar a poeira da viagem mágica através do tempo – você se vê nos arredores
de uma aldeia bávara, camuflado numa moita de mato, as vozes
desencarnadas e distantes de alemães do século XIX mesclando-se com o
som inconfundível de sinos de igreja.
Você examina rapidamente as adjacências: parece que está bem atrás de
um conjunto de velhas casas geminadas; há lençóis brancos pendurados
para secar; um pequeno regato murmura atrás de você; janelas foram
abertas para deixar entrar o cálido ar de primavera. Curioso. Parece não
haver mais ninguém por ali, embora você vislumbre vez por outra um
pedestre passando entre os estreitos espaços que separam as casas. E então
você o percebe. É um menino silencioso, de ar solene que está ali perto,
brincando tranquilamente com alguns brinquedos na terra. Ele parece ter
cerca de cinco anos de idade – estaria apenas no jardim de infância, na era
moderna. É nesse momento que você se lembra de sua missão: esta é a vila
de Passau no sul da Alemanha. E aquele não é um menino comum. Não é
outro senão o jovem Adolf Hitler. O que você faria em seguida?
Essa situação, muito infelizmente para nós, está no domínio da ficção
científica. Mas a maneira como você responde à pergunta hipotética – e a
outras semelhantes – é um assunto para cientistas psicológicos, porque,
entre outras coisas, revela suas suposições subjacentes sobre se Hitler, bem
como as decisões que ele tomou mais tarde na vida, foi simplesmente o
produto da ação de seu meio ambiente sobre seus genes ou se ele poderia
ter agido de maneira diferente, exercendo seu “livre-arbítrio”. A maioria
dos cientistas nessa área não está demasiadamente preocupada em saber se
o livre-arbítrio existe ou não; em vez disso, concentra-se na maneira como o
pensamento comum das pessoas sobre o livre-arbítrio, em particular no
domínio moral, influencia seus comportamentos e atitudes sociais.
Já conhecemos um dos principais investigadores nessa área, Roy
Baumeister, que desarmou de maneira tão eficaz a psicologia subjacente aos
pensamentos suicidas. Aqui está a visão de Baumeister sobre a psicologia
do livre-arbítrio:

No cerne da questão do livre-arbítrio está um debate sobre as causas


psicológicas da ação. Em outras palavras, a pessoa é uma entidade
autônoma que escolhe genuinamente como agir entre múltiplas opções
possíveis? Ou ela é essencialmente apenas um elo numa cadeia causal,
de modo que suas ações não são mais que o produto inevitável de
causas legais originadas de eventos anteriores, e nenhuma pessoa
poderia jamais ter agido senão exatamente da maneira como de fato
agiu? …
Discutir livre-arbítrio em termos de psicologia científica é, portanto,
invocar noções de autorregulação, processos controlados, plasticidade
comportamental e tomada de decisão consciente.

Com esse entendimento do que os psicólogos estudam quando voltam


sua atenção para as crenças das pessoas com relação ao livre-arbítrio,
retornemos ao exemplo de Hitler acima. No papel desse agente secreto que
viaja no tempo a partir do século XX, você foi equipado com as seguintes
informações. Primeiro, a tecnologia da viagem no tempo está ainda em sua
infância, e os pesquisadores não sabem ao certo se algum dia voltarão a ter
sucesso. Segundo, você tem só dez minutos antes de ser despachado de
volta para o presente (e dois desses minutos já se passaram desde que você
chegou). Terceiro, você foi informado de que sete minutos é exatamente o
tempo suficiente para estrangular uma criança de cinco anos com suas mãos
nuas e confirmar que ela está sem dúvida morta. Isso significa que só lhe
resta um minuto para decidir se vai ou não matar o garotinho.
Mas você tem outras opções. Sete minutos é também tempo suficiente,
disseram-lhe seus conselheiros, para entrar na residência de Hitler e
entregar em mãos a Alois e Klara, o pai desprovido de senso de humor e a
bondosa e acanhada mãe de Adolf, um pacote especialmente preparado de
documentos históricos relacionados ao Holocausto, inclusive nítidas
fotografias de seu filho como um Führer de bigode, e uma visão detalhada
do Terceiro Reich quatro décadas depois. Ninguém sabe ao certo que efeito
isso teria, mas a maioria dos estudiosos modernos acredita que essa
horripilante antevisão da Segunda Guerra Mundial teria alterado de maneira
significativa a infância de Adolf. Talvez Klara tivesse finalmente deixado o
marido dominador e violento; Alois, infeliz com a ideia de ver seu
sobrenome tornar-se sinônimo de tudo que é ruim, poderia mudar sua
conduta e transformar-se em um pai mais afável; ou eles poderiam ter se
sentado com o jovem Adolf e compartilhado com ele perturbadoras
imagens dos campos da morte e testemunhos de sobreviventes do
Holocausto, tão chocantes e aterradoras que até o próprio Adolf passaria a
desprezar sua tão odiada persona adulta. Mas pode Adolf realmente mudar
o curso de sua vida? Ele tem livre-arbítrio? Algum de nós tem?
Um dos achados mais impressionantes que emergiram nos últimos
tempos na ciência do livre-arbítrio é que, quando as pessoas acreditam – ou
são levadas a acreditar – que o livre-arbítrio é apenas uma ilusão, elas
tendem a se tornar mais antissociais. Voltemos brevemente ao pequeno
Adolf. (Qual lhe parece ser a decisão antissocial nesse caso: matar ou não
matar o menino Hitler?) Mas antes que você tome sua decisão, dê uma
olhada no que diz a ciência. O primeiro estudo que demonstrou diretamente
as consequências antissociais de crenças determinísticas foi feito pelos
psicólogos Kathleen Vohs e Jonathan Schooler. Eles relatam na
Psychological Science ter convidado trinta estudantes de graduação para
participar em seu laboratório de um pretenso estudo sobre aritmética
mental, no qual os sujeitos foram solicitados a calcular de cabeça as
respostas de vinte problemas de matemática (por exemplo, 1 + 8 + 18 − 12
+ 19 − 7 + 17 − 2 + 8 − 4 = ?). Mas, como ocorre com frequência em
experimentos de psicologia social, testar algo tão trivial quanto as
habilidades matemáticas dos estudantes não era o real objetivo do estudo.
Antes de fazer o teste matemático, metade do grupo (quinze
participantes) foi solicitada a ler a seguinte passagem do livro de Francis
Crick, A hipótese espantosa:

“Você”, suas alegrias e suas dores, suas lembranças e suas ambições,


seu senso de identidade pessoal e livre-arbítrio não passam de fato do
comportamento de uma vasta reunião de células nervosas e suas
moléculas associadas. Você não é nada senão um amontoado de
neurônios … embora pareçamos ter livre-arbítrio, de fato nossas
escolhas já foram predeterminadas para nós e não podemos mudar isso.

Em contraposição, os outros quinze participantes leram uma mensagem


diferente do mesmo livro, na qual Crick não faz nenhuma menção ao livre-
arbítrio. E, muito surpreendentemente, quando lhes foi dada a oportunidade,
as pessoas do segundo grupo colaram muito menos no teste de matemática
que aquelas que haviam lido a passagem de Crick sobre o livre-arbítrio
como ilusão transcrita acima. (O estudo foi engenhosamente montado para
medir a cola: os participantes foram levados a acreditar que havia uma
“falha” no programa de computador, e que se a resposta aparecesse na tela
antes que eles terminassem de resolver o problema, deveriam pressionar a
barra de espaço e terminar o teste honestamente. O número de vezes em que
a barra de espaço havia sido pressionada durante toda a tarefa, portanto,
indicava o grau de honestidade dos sujeitos.) Esses efeitos gerais foram
replicados num segundo experimento que usou uma tarefa de alocação de
dinheiro. Nele, os participantes que foram aleatoriamente designados para
uma condição de determinismo e solicitados a ler declarações como “A
crença no livre-arbítrio contradiz o fato conhecido de que o universo é
governado por princípios legais da ciência” furtaram essencialmente mais
dinheiro do que aqueles aleatoriamente escolhidos para uma condição de
livre-arbítrio, que tiveram de ler declarações como “Para evitar a tentação é
preciso que eu exerça meu livre-arbítrio”, ou para uma condição neutra, em
que leram declarações de controle (por exemplo, “A cana-de-açúcar e a
beterraba-branca são cultivadas em 112 países”).
Os achados de Vohs e Schooler revelam um dilema bastante estranho
enfrentado pelos cientistas sociais: se uma compreensão determinística do
comportamento humano encoraja o comportamento antissocial, como
podemos nós, os cientistas, justificar a comunicação de nossos achados de
pesquisa determinísticos? De fato, há uma linha bastante chocante nesse
artigo na Psychological Science, que quase me escapou em uma primeira
leitura. Vohs e Schooler escrevem: “Se a exposição a mensagens
determinísticas aumenta a probabilidade de ações antiéticas, a identificação
de abordagens que protejam o público contra esse perigo torna-se
imperativa.”
Talvez você também não tenha entendido em sua primeira leitura, mas
os autores estão fazendo uma sugestão extraordinária. Eles parecem estar
afirmando que o público “não sabe como lidar com a verdade”, e que
deveríamos de algum modo proteger as pessoas (mentir-lhes?) sobre as
verdadeiras causas dos comportamentos sociais humanos. Talvez tenham
razão. Considere o seguinte exemplo:
Um homem de meia-idade contrata uma prostituta, expondo sua mulher,
com conhecimento de causa, a uma infecção sexualmente transmissível e
explorando uma viciada em drogas para seu próprio prazer. Deveria ele ser
punido de alguma maneira por sua transgressão? Deveríamos considerá-lo
responsável? A maioria das pessoas, eu apostaria, não hesitaria em
responder sim a ambas as perguntas.
Mas e se você pensasse sobre isso nos seguintes termos científicos,
ligeiramente diferentes? A decisão do homem de fazer sexo com essa
mulher estava em conformidade com sua fisiologia naquele momento, a
qual surgira como consequência de suas experiências singulares de
desenvolvimento, que tiveram lugar dentro de um ambiente cultural
particular em interação com um genótipo particular, o qual ele herdou de
seus pais particulares, que herdaram por sua vez variantes genéticas de
traços similares de seus próprios pais particulares, ad infinitum. Até sua
capacidade de inibir ou “ignorar” essas forças, ou de compreender seu
próprio comportamento, é ela própria produto dessas forças! Mais ainda, o
cérebro desse homem agiu sem primeiro consultar sua autoconsciência; em
vez disso, seu sistema neurocognitivo encenou algoritmos comportamentais
evoluídos que reagiram, normal ou erroneamente, de maneiras que haviam
favorecido o sucesso genético no passado ancestral.
Dada a combinação desses fatores determinísticos, poderia o homem ter
respondido de alguma outra maneira aos estímulos com que se confrontou?
Atribuir responsabilidade pessoal a esse tolo torna-se meramente uma
convenção social que reflete apenas uma compreensão ingênua das causas
de seus comportamentos. Como nós ao julgá-lo, o self desse homem faz
meramente o papel de espectador nos assuntos sexuais de seu corpo. Há
apenas a corporificação de um homem que é impotente para agir de
qualquer maneira que seja contrária à sua natureza particular, que é um
derivado de uma natureza mais geral. O self é apenas uma criatura iludida
que pensa estar participando de um jogo moral quando de fato nada mais é
que um membro emocionalmente envolvido da plateia.
Se essa compreensão determinística dos comportamentos do homem o
levar a sentir mesmo que uma gota a mais de comiseração do que teria
sentido de outro modo, essa reação é precisamente aquilo contra o que Vohs
e Schooler nos advertem. Como podemos culpar esse “amontoado de
neurônios” – que dirá puni-lo – por agir como sua natureza determina,
mesmo se nossa própria natureza nos teria conduzido de outra maneira?
Mais ainda, não deveríamos ser mais compreensivos em relação a nossos
próprios defeitos morais? Afinal, não podemos tampouco deixar de ser
quem somos. Certo?
De fato, um estudo publicado no Personality and Social Psychology
Bulletin por Baumeister e colegas constatou que a simples exposição de
pessoas a afirmações determinísticas, como “Tal como tudo mais no
universo, todas as ações humanas decorrem de eventos anteriores e podem
ser compreendidas em última análise em termos do movimento de
moléculas”, as fazia agir de maneira mais agressiva e egoísta se comparadas
àquelas que liam afirmações endossando a ideia do livre-arbítrio, como
“Demonstro meu livre-arbítrio todos os dias quando tomo decisões”, ou
aquelas que simplesmente liam afirmações neutras, como “Os oceanos
cobrem 71% da superfície da Terra”. Participantes aleatoriamente
designados para a condição determinística, por exemplo, são menos
propensos que os dos outros dois grupos a dar dinheiro a um sem-teto ou a
permitir que um colega de classe use seu telefone celular. Ao discutir as
implicações sociais desses resultados, Baumeister e colegas fazem eco às
preocupações de Vohs e Schooler em “proteger o público” contra uma
compreensão detalhada das causas dos comportamentos sociais humanos:
“Algumas análises filosóficas podem concluir que um determinismo
fatalístico é compatível com um comportamento extremamente ético, mas
os presentes resultados sugerem que muitos leigos ainda não apreciam essa
possibilidade.”
Esses achados de laboratório que demonstram as consequências
antissociais da visão dos seres humanos individuais como pobres joguetes
aprisionados num sistema mecânico – mesmo quando, na verdade, é
praticamente isso que somos – são suficientes para me obrigar a fazer uma
pausa em meu proselitismo científico. Retornando ao pequeno e inocente
Adolf, poderíamos, é claro, jogar com este exemplo particular para sempre.
É um pensamento impalatável, mas e se uma das crianças massacradas em
Auschwitz tivesse crescido para ser ainda mais desprezada que Hitler, como
um adulto que ordenou as mortes de dez milhões de pessoas? Sua
capacidade de tomar uma decisão não é uma questão que envolve
fundamentalmente seu próprio livre-arbítrio? Mas o importante não é jogar
o jogo “e se Hitler” de maneira infinitamente regressiva, e sim provocar
suas intuições sobre o livre-arbítrio sem lhe perguntar diretamente se você
acredita nele ou não. Como qualquer bom cientista sabe, as crenças das
pessoas nem sempre expressam sua psicologia privada.
Neste caso, não é tanto em sua decisão de matar a criança ou entregar o
pacote aos pais que os psicólogos pesquisadores estariam interessados. O
importante seria, em vez disso, a maneira como você justificaria sua
decisão (por exemplo, “Eu o mataria porque [preencha a lacuna aqui]” ou
“Eu entregaria o pacote porque [preencha a lacuna]”). Aparentemente,
estrangular uma inocente criança de cinco anos parece bastante antissocial,
e assim, talvez ouvir uma mensagem determinística antes de responder a
esta questão o levasse a matá-la (por exemplo: “Hitler é mau, ele vai crescer
para assassinar pessoas, aconteça o que acontecer – ele não tem nenhum
livre-arbítrio para fazer outra coisa”). Para algumas pessoas, no entanto, é a
decisão de não matar a criança que é antissocial, porque ela pode
certamente significar o impensável para mais de seis milhões de seres
humanos.
Eu, por exemplo, não teria hesitado em estrangular alegremente aquele
imbecilzinho nos idos de 1894 em Passau. (O fato de eu ter visitado
Auschwitz recentemente pode ter algo a ver com isso.) Não posso deixar de
sentir que Hitler poderia ter levantado a mão a qualquer momento e anulado
a chamada Solução Final do povo judaico antes mesmo que ela começasse.
Essa justificativa parece revelar minha crença oculta no livre-arbítrio: Adolf
poderia ter agido de maneira diferente, mas escolheu não o fazer. Isto é, a
cadeia de eventos causais que precedeu a ascensão de Hitler ao poder me
parece em grande parte irrelevante, ou pelo menos pouco importante. Suas
más ações teriam ocorrido independentemente das vicissitudes de seu
passado pessoal. Há algo de essencialmente mau nesse indivíduo. E por isso
decido matar a criança: provavelmente é o melhor nessa circunstância,
pareço estar dizendo, matar a fera enquanto ela ainda está adormecida num
garotinho que brinca com soldadinhos de chumbo.
Mas você poderia optar por uma maneira menos homicida de passar seu
tempo com Adolf. Por exemplo, se você poupa a vida desse menino pálido,
infeliz, e decide entregar o pacote a seus pais porque, a seu ver, se os Hitler
soubessem o que seria de seu perturbado filho eles o teriam criado de outra
maneira, e essa mudança no ambiente durante seus primeiros anos teria
quase certamente evitado o genocídio, isso sugere que você é mais adepto
do princípio do determinismo causal.
Seja como for, seu minuto se esgotou! Portanto, qual será sua decisão –
e por quê? Com milhões de vidas futuras em jogo, você assassina o
inocente menino de cinco anos num homicídio preventivo? Entrega o
pacote a seus pais, na esperança de que a chocante visão do Holocausto leve
Adolf – de uma maneira ou de outra – a escolher uma carreira diferente, ou
até a estragar sua própria ascensão à fama em decorrência de toda a
pressão? Ou, como aqueles que viveram na Alemanha nazista e eram
bombardeados com (falsas) mensagens determinísticas sobre os judeus,
você simplesmente não interviria de maneira alguma?
O rato que não parava de rir: alegria e
hilaridade no reino animal

CERTA VEZ, quando estava num sonolento delírio induzido pela altitude,
voando a 10 mil metros sobre algum lugar da Islândia, procurei às
apalpadelas a confortável manta azul cuja ponta eu via debaixo de meu
assento, só para perceber – para meu inexprimível horror – que estava de
fato puxando com força um dedão do pé coberto por uma meia, que tentava
se esquivar. Ora, com um temperamento como o meu, a vida tende a ser
uma conversa embaraçosa após a outra, assim, quando me virei, sorrindo,
para pedir desculpa ao dono do dedo, meus olhos depararam com um
homem enorme cujo grunhido sugeria que ele estava tendo alguma
dificuldade em ver graça no incidente.
Desagradável, sem dúvida, mas agora eu diria que esse foi um evento
afortunado. Quando pousei de novo a cabeça contra aquele travesseiro
forrado de papel-toalha de companhia aérea, iluminou-se em minha mente,
no meio daquele voo, uma lembrança muito mais feliz. Ela envolvia um
outro dedão, este pertencente a um animal notavelmente mais bem-
humorado que aquele sentado atrás de mim. Esse outro dedão – que era em
tudo e por tudo tão sensível quanto seu superestofado equivalente humano,
devo acrescentar – estava preso a um gorila-ocidental-das-terras-baixas de
mais de duzentos quilos, com gengivas calcificadas, chamado King. Em
1996, quando eu tinha vinte anos e ele 27, passei grande parte do verão com
meu desdentado amigo King, ouvindo Frank Sinatra e os Três Tenores,
brincando de pega-pega e fazendo cócegas em seus dedos do pé. Ele
costumava se recostar em sua casinhola de dormir, esticar um enorme pé
acinzentado através das barras da jaula e deixá-lo pendurado ali, cheio de
expectativa, irrompendo numa gargalhada gutural que o fazia sacudir os
ombros quando eu agarrava um de seus dedos e lhe imprimia gentilmente
um palpável apertão. Ele quase não conseguiu se controlar quando, um dia,
inclinei-me, como se estivesse prestes a dar uma mordida naquele dedo
rechonchudo. Se você nunca viu um gorila tendo um ataque de riso, eu lhe
recomendaria procurar ter essa visão antes de ir embora deste mundo. É
algo que provocaria dissonância cognitiva até no mais sincero dos
criacionistas.
Outros animais além dos seres humanos são dotados de humor? Talvez,
sob certos aspectos, sim. Sob outros, porém, é provável que emoções como
essa tenham propriedades unicamente humanas. Exceto por anedotas,
sabemos muito pouco sobre o riso e o humor de primatas não humanos, mas
alguns dos achados mais significativos a emergir da ciência comparativa
durante a última década envolveram a inesperada descoberta de que ratos –
em particular ratos jovens – riem. É isso mesmo: ratos riem. Pelo menos
essa é a assertiva resoluta que está sendo feita pelo pesquisador Jaak
Panksepp, que publicou um notável, e bastante acalorado, artigo opinativo
sobre o assunto na revista Behavioural Brain Research.
Em particular, o trabalho de Panksepp concentrou-se na “possibilidade
de que os sujeitos animais que usamos mais comumente, os roedores de
laboratório, possam ter experiências semelhantes à alegria social durante
suas atividades brincalhonas e que um importante componente
comunicativo-afetivo desse processo, que fortalece o envolvimento social,
seja uma forma primordial de riso”. Agora, antes que você comece a
imaginar uma risada semelhante às de um jovial ratinho Stuart Little (ou ele
era um camundongo?), o riso de um rato não tende a soar muito parecido
com a variedade humana, que em geral envolve explosões de som pulsantes
que começam com uma inalação vocalizada e consiste numa série de
trinados curtos e distintos com intervalos de tempo quase isocrônicos. O
som estereotípico do riso humano é um h aspirado seguido por uma vogal,
em geral a, e, graças sobretudo à nossa laringe, é rico em harmônicos. Em
contraposição, o riso do rato assume a forma de gritos ultrassônicos de 50
kHz de alta frequência, ou “chilreios”, distintos de outras emissões vocais
em ratos. Aqui está a maneira como Panksepp descreve sua descoberta do
fenômeno:
Tendo acabado de concluir o que talvez tenha sido a primeira análise
etológica formal (i.e., bem controlada) da brincadeira turbulenta na
espécie humana no final dos anos 1990, em que o riso foi uma resposta
abundante, tive o “insight” (talvez a ilusão) de que nossa resposta de
chilreios de 50 kHz em ratos que estão brincando poderia ter alguma
relação ancestral com o riso humano. Na manhã seguinte, cheguei ao
laboratório e pedi ao aluno de graduação que era meu assistente na
época para “vir fazer cócegas em alguns ratos comigo”.

Ao longo dos anos seguintes, Panksepp e seus assistentes de pesquisa


conduziram sistematicamente estudos sobre o riso do rato, revelando uma
impressionante sobreposição entre as características funcionais e
expressivas dessa resposta de chilreio em jovens roedores e o riso em
crianças humanas de tenra idade. Para provocar riso em seus filhotes de
rato, Panksepp usava uma técnica que chamou de “jogos de mão
heteroespecíficos”, que é essencialmente apenas jargão para cócegas. “Para
que essa manobra funcione bem”, escreve ele,

devemos ser competentes no desempenho de formas dinâmicas de


interações interespecíficas. Com um modesto treinamento, a maioria
dos investigadores pode adquirir rapidamente a habilidade – é bastante
similar aos movimentos dinâmicos de mãos e dedos que poderíamos
usar ao fazer cócegas em crianças humanas de tenra idade, que podem
ser induzidas a acessos de jocosidade e ataques de riso por essa simples
manobra.

Ao que parece, ratos são particularmente coceguentos na área da nuca,


que é também aquela visada pelos jovens em suas próprias atividades
brincalhonas como comportamento de imobilização. Panksepp logo
descobriu que os ratos mais coceguentos – o que, empiricamente, significa
simplesmente aqueles que emitiam os mais frequentes, robustos e
confiáveis chilreios de 50 kHz em mãos humanas – eram também os
indivíduos mais naturalmente brincalhões entre os sujeitos ratos. E
descobriu que a indução de riso em ratos jovens promovia ligação
emocional: depois que lhes faziam cócegas, ratos procuravam ativamente
mãos humanas específicas que os haviam feito rir anteriormente. Além
disso, como se teria esperado em seres humanos, certos estímulos
ambientais aversivos reduziam enormemente a ocorrência de riso entre
sujeitos roedores. Por exemplo, mesmo quando a estimulação das cócegas
era mantida constante, os chilreios diminuíam significativamente quando os
filhotes de rato sentiam um sopro de cheiro de gato, quando estavam com
muita fome ou quando eram expostos a luzes fortes desagradáveis enquanto
lhes faziam cócegas. Panksepp descobriu também que fêmeas adultas eram
mais receptivas a cócegas que machos, mas em geral era difícil induzir
cócegas em animais adultos “a não ser que lhes tivessem feito cócegas
abundantemente quando eram jovens”. Por fim, quando filhotes de ratos
podiam escolher entre dois ratos adultos diferentes – um que ainda
chilreava muito espontaneamente e um que não o fazia –, eles passavam um
tempo substancialmente maior com o rato adulto aparentemente mais feliz.
Como talvez não seja de surpreender, Panksepp encontrou uma
lamentável resistência à sua interpretação desse corpo de achados, em
especial entre seus colegas cientistas. Mas ele protesta:

Tentamos refutar nossa concepção várias vezes, e não conseguimos.


Assim, sentimo-nos justificados em propor com cautela e a cultivar
empiricamente a possibilidade teórica de que haja algum tipo de relação
ancestral entre os chilreios brincalhões de ratos juvenis e riso humano
infantil. Essa hipótese causou grande consternação a muitos colegas na
comunidade da neurociência comportamental; eles não veem razão para
se assumir uma posição ontológica tão arriscada. Vários colegas
desencorajaram esse tipo de teorização, sugerindo que é
fundamentalmente inapropriado, até embaraçoso, para membros de
nossa disciplina falar sobre funções cerebrais animais de maneiras tão
flagrantemente antropomórficas.

Observe-se, porém, que Panksepp seria o primeiro a reconhecer que


seus achados não implicam que ratos têm “senso de humor”, apenas que
parece haver contiguidades evolucionárias entre o riso em crianças humanas
durante brincadeiras turbulentas e a expressão de vocalizações semelhantes
em ratos jovens. O senso de humor – em especial humor adulto – requer
mecanismos cognitivos que podem ou não estar presentes em outras
espécies. Ele sugere, no entanto, que esta pode ser uma hipótese
empiricamente falsificável: “Se um gato … tiver sido um elemento
persistentemente perturbador na vida de um rato, poderia esse rato
manifestar alguns chilreios felizes se algo de ruim acontecesse com seu
adversário? Iria o rato chilrear se o gato caísse uma armadilha, ou fosse
levantado no ar pela cauda? Não recomendaríamos a realização desses
experimentos maldosos, mas encorajaríamos qualquer pessoa que deseje
tomar essa direção a encontrar meios mais benignos de avaliar essas
questões.”
Diferenças entre “sistemas” de riso entre mamíferos refletem-se em
diferenças estruturais em regiões cerebrais, bem como na arquitetura vocal,
entre as espécies. No mesmo número da Behavioural Brain Research, o
neuropsicólogo Martin Meyer e colegas descrevem essas diferenças com
grande riqueza de detalhes. Por exemplo, embora estudos de imagiologia
cerebral de participantes humanos vendo desenhos animados engraçados ou
ouvindo piadas revelem a ativação de estruturas evolucionariamente antigas
como a amígdala e o núcleo accumbens, estruturas de “ordem mais
elevada” de evolução mais recente são também ativadas, entre as quais
regiões distribuídas do córtex frontal. Assim, embora primatas não humanos
riam – de fato, os autores descrevem como, em 1943, uma equipe de
vivisseccionistas descobriu que quando eles estimulavam o diencéfalo, a
ponte do mesencéfalo e a medula de macacos do gênero Macaca, os
animais começavam a rir incontrolavelmente e a exibir faces brincalhonas
–, o humor humano parece também envolver redes cognitivas mais
especializadas que não são compartilhadas por outras espécies.
O riso em nossa própria espécie, é claro, é desencadeado por uma
variedade de estímulos sociais e ocorre sob um amplo guarda-chuva de
emoções, nem sempre positivas. Para citar apenas alguns contextos
emocionais típicos para o riso, ele pode acompanhar satisfação, afeição,
diversão, alegria, surpresa, nervosismo, tristeza, medo, vergonha, agressão,
triunfo, escárnio e prazer com o infortúnio alheio. De fato, como fantasias
masturbatórias, o riso pode ocorrer até na ausência de quaisquer estímulos
sociais. Se você alguma vez já notou alguém andando pela calçada, cabeça
baixa, sorrindo, reprimindo um risinho embaraçoso por medo de que ele
possa parecer um sintoma de esquizofrenia para um observador ingênuo,
essa pessoa está na realidade envolvida numa atividade cognitiva bastante
sofisticada, em que está “reapresentando” uma cena cômica aos olhos de
sua mente.
Tipicamente, porém, o riso serve como um rico sinal social e ocorre na
presença de outros. Esse fenômeno levou a psicóloga Diana Szameitat e sua
equipe a explorar a possível função adaptativa do riso humano. Publicado
na revista Emotion, esse estudo fornece as primeiras evidências
experimentais que demonstram que seres humanos possuem uma fantástica
capacidade de detectar a intenção psicológica de uma gargalhada apenas
pelas qualidades fonéticas de sons de riso. E por vezes, assinalam os
autores, o riso indica algumas intenções muito agressivas, um fato que deve
– de uma perspectiva evolucionária – motivar respostas comportamentais
apropriadas, ou biologicamente adaptativas, da parte do ouvinte.
Mas como é difícil, se não impossível, induzir diferentes emoções
genuínas sob condições de laboratório, para seu primeiro estudo Szameitat e
colegas fizeram a melhor coisa aproximada: contrataram oito atores
profissionais (três homens e cinco mulheres) e gravaram suas risadas. Isso
não é o ideal, obviamente, e os pesquisadores reconhecem a aplicabilidade
limitada do uso de “retratos emocionais” em vez das emoções genuínas.
Mas eles usaram técnicas de autoindução, instruindo os atores a entrar por
completo no personagem, usando suas imaginações, movimentos corporais
e memória emocional. Em outras palavras, “os atores foram instruídos a se
concentrar exclusivamente na experiência do estado emocional, mas não, de
maneira alguma, na expressão externa do riso”. Aqui estão os quatro tipos
básicos de riso que os atores foram solicitados a representar, juntamente
com suas descrições e as situações usadas para ajudar os atores a entrar no
personagem para seus papéis:

1. Riso de alegria: Encontrar um bom amigo após passar muito tempo


sem vê-lo.
2. Riso de escárnio: Rir de um adversário após tê-lo derrotado. O riso
reflete a emoção de desprezo escarninho e serve para humilhar o
ouvinte.
3. Riso com o infortúnio alheio: Rir de uma outra pessoa que foi
vítima de um revés, como escorregar em cocô de cachorro.
Diferentemente do riso de escárnio, porém, a pessoa que ri não quer
prejudicar seriamente a outra.
4. Riso de cócegas: Riso provocado pelo fato de estar sentindo
cócegas, literal e fisicamente.
Depois que esses registros foram colhidos, 72 participantes anglófonos
foram convidados ao laboratório, receberam fones de ouvido e foram
instruídos a identificar as emoções por trás dessas sequências de risos – um
total de 429 gravações de risos aleatoriamente entremeadas, cada uma
representando um pulso de riso com duração de três a nove segundos, de
modo que havia 102-111 risadas por emoção. (Isso lhes tomava cerca de
uma hora – um verdadeiro pesadelo, fazendo-me lembrar as séries cômicas
que via nos anos 1980, concentrando minha atenção nas peculiares risadas
gravadas em segundo plano.) Mas os achados foram impressionantes; os
participantes foram capazes de classificar de maneira correta esses risos
gravados segundo as emoções muitas vezes sutis que exprimiam com uma
taxa de sucesso significativamente maior do que a que poderia ser atribuída
ao acaso.
Num segundo estudo, o procedimento foi quase idêntico, mas foi feita
aos participantes uma diferente série de perguntas relacionada à dinâmica
social. Especificamente, para cada riso gravado, foi-lhes perguntado se o
“emissor” (isto é, a pessoa que ri) estava num estado fisicamente excitado
ou calmo, se ele era dominante ou submisso em relação ao “receptor” (isto
é, o objeto do riso), se estava num estado agradável ou desagradável, e se
estava sendo amistoso ou agressivo em relação ao receptor. Para este
segundo estudo, não havia respostas “corretas” ou “incorretas”, pois a
percepção dessas características nos risos gravados envolvia atribuições
subjetivas. Ainda assim, como fora previsto, cada categoria de riso (alegria,
escárnio, gozo com o infortúnio alheio, cócegas) teve um perfil único
nessas quatro dimensões sociais. Isto é, os participantes usaram esses sons
para inferir com segurança informação social específica com relação à
situação não observada. A alegria, por exemplo, evocou avaliações de baixo
grau de excitação, submissão e valência positiva de ambos os lados. O riso
de escárnio sobressaiu-se claramente: pareceu muito dominante e foi o
único som percebido pelos participantes como tendo uma valência negativa
dirigida ao receptor.
A percepção que os participantes tiveram do riso de gozo com o
infortúnio alheio foi especialmente interessante. Foi ouvido como sendo
dominante, mas não tanto quanto o riso de escárnio; os participantes
julgaram que seus emissores estavam num estado positivo, mais que os do
riso de escárnio, mas menos do que os que riam por sentir cócegas; e o riso
por gozo com o infortúnio alheio foi ouvido como não sendo nem agressivo
nem amistoso em relação ao receptor, mas neutro. Segundo os autores,
cujas interpretações desses dados foram inspiradas pela lógica
evolucionária: “O riso de gozo com o infortúnio alheio poderia, portanto,
representar uma ferramenta precisa (e socialmente tolerada) para dominar o
ouvinte sem segregá-lo ao mesmo tempo do contexto grupal.”
Seja como for, eu gostaria de pensar que estava testemunhando a mais
pura e genuína alegria em King anos atrás, mas é claro que meu cérebro não
foi feito para decifrar estados emocionais distintos em gorilas. Depois disso
ele tem rido, ao que parece, de Ellen DeGeneres ao vê-la na televisão de sua
jaula; dois é uma amostra pequena, eu percebo, mas talvez seres humanos
homossexuais lhe pareçam particularmente cômicos. No entanto me alegra
pensar na evolução da alegria. E, preciso dizer, aqueles dados sobre ratos
me levaram a considerar seriamente um retorno a meus velhos tempos de
vegetariano – não que eu coma ratos no jantar, é claro, mas animais que
riem tornam a perspectiva de animais que sofrem extremamente relevante e
desconfortável em minha mente.
Se pelo menos porcos mortos não fossem tão espetacularmente
deliciosos.
Notas

Por que eles ficam pendurados?

“Com a possível exceção”: Gordon G. Gallup Jr., Mary M. Finn e Becky Sammis, “On the Origin of
Descended Scrotal Testicles: The Activation Hypothesis”, Evolutionary Psychology 7, n.4, 2009,
p.519.
“Não só a pele”: Ibid, p.519.
Segundo um relato publicado em 2009: Stany W. Lobo et al., “Asymmetric Testicular Levels in the
Crotch: A Thermodynamic Perspective”, Medical Hypotheses 72, n.6, 2009, p.759-60.
“Em nossa concepção”: Gallup, Finn e Sammis, “On the Origin of Descended Scrotal Testicles”,
p.521.
“Qualquer explicação de testículos”, Ibid, p.523.
Ou, para pensar sobre isso de outra maneira: Isto não quer dizer que tais indivíduos não existam.
Existem casos de algolagnia (do grego algos [dor] e lagneia [desejo sexual]), e algumas dessas
pessoas derivam sua principal satisfação sexual de agressões a suas zonas erógenas. Mas isso é tão
bizarro que muitos pesquisadores contemporâneos acreditam que a algolagnia – em especial
quando a pessoa só pode ficar excitada por dor testicular ou dilaceramento da vagina – só pode ser
compreendida como sintoma de um perigoso distúrbio neurológico que envolve uma falha da
decodificação de estímulos nocivos.

Tão perto e tão longe: a contorcida história da autofelação

“uma considerável porção”: Alfred C. Kinsey, Wardell B. Pomeroy e Clyde E. Martin, Sexual
Behavior in the Human Male. Filadélfia, W.B. Saunders, 1948, p.510.
mandado que lhe tirassem um osso: Grazia D’Annunzio, “The Randy Dandy”, New York Times,
disponível em www.nytimes.com/2009/09/13/style/tmagazine/13slijperw.html.
um paciente “muito perturbado”: Frances Millican et al., “Oral Autoaggressive Behavior and Oral
Fixation”, in Irwin M. Marcus e John J. Francis (orgs.), Masturbation: From Infancy to
Senescence. Madison, Conn., International Universities Press, 1975, p.150.
soldado solitário de 22 anos: Jesse O. Cavenar, Jean G. Spaulding e Nancy T. Butts, “Autofellatio:
A Power and Dependency Conflict”, Journal of Nervous and Mental Disease 165, n.5, 1977,
p.356-60.
linguagem típica, cheia de jargão: Frank Orland, “Factors in Autofellatio Formation”, International
Journal of Psychoanalysis 52, n.3, 1971, p.289-96.
O primeiríssimo caso psiquiátrico de autofelação publicado: Eugen Kahn e Ernest G. Lion, “A
Clinical Note on a Self-Fellator”, American Journal of Psychiatry 95, n.1, 1938, p.131-3.
um tema começando a emergir: William Guy e Michael H. Finn, “A Review of Auto-Fellatio: A
Psychological Study of Two New Cases”, Psychoanalytic Review 41, n.4, 1954, p.354-8.
O caso envolve um primeiro-sargento: Morris M. Kessler e George E. Poucher, “Auto-Fellatio:
Report of a Case”, American Journal of Psychiatry 103, n.1, 1946, p.94-6.
paciente do sexo feminino de extrema autossuficiência: Orland, “Factors in Autofellatio Formation”,
op.cit.

Por que o pênis tem esse formato?: versão sem cortes

“um pênis mais longo seria”: Gordon G. Gallup Jr. e Rebecca L. Burch, “Semen Displacement as a
Sperm Competition Strategy in Humans”, Evolutionary Psychology 2, n.1, 2004, p.14.
“Exemplos incluem sexo em grupo”: Ibid, p.15.
Numa série de estudos: Gordon G. Gallup Jr. et al., “The Human Penis as a Semen Displacement
Device”, Evolution and Human Behavior 24, n.4, 2003, p.277-89.
“É possível”: Gallup e Burch, “Semen Displacement as a Sperm Competition Strategy in Humans”,
p.16.

Não tão depressa… O que há de tão “precoce” na ejaculação precoce?

“um parceiro despachado, que”: Lawrence K. Hong, “Survival of the Fastest: On the Origin of
Premature Ejaculation”, Journal of Sex Research 20, n.2, 1984, p.113.
“a linhagem de Homo sapiens”: Idem, p.117.
mas em 2009, num artigo publicado: Patrick Jern et al., “Evidence for a Genetic Etiology to
Ejaculatory Dysfunction”, International Journal of Impotence Research 21, n.1, 2009, p.62-7.
Conferindo maior credibilidade: Patrick Jern et al., “Subjectively Measured Ejaculation Latency
Time and Its Association with Different Sexual Activities While Controlling for Age and
Relationship Length”, Journal of Sexual Medicine 6, n.9, 2009, p.2.568-78.
“haveria pouca”: Ray Bixler, “Of Apes and Men (Including Females)”, Journal of Sex Research 22,
n.2, 1986, p.265.

Ode às muitas virtudes evolutivas do sêmen humano

“Nosso interesse pelas”: Rebecca L. Burch e Gordon G. Gallup Jr., “The Psychobiology of Human
Semen”, in Steven M. Platek e Todd K. Shackelford (orgs.), Female Infidelity and Paternal
Uncertainty: Evolutionary Perspectives on Male Anticuckoldry Tactics. Cambridge, Mass.,
Cambridge University Press, 2006, p.141.
“isso nos pareceu muito peculiar”: Idem, p.141.
Os achados mais significativos: Gordon G. Gallup Jr., Rebecca L. Burch e Steven M. Platek, “Does
Semen Have Antidepressant Properties?”, Archives of Sexual Behavior 31, n.3, 2002, p.289-93.
que pulsa através das veias de uma pessoa: E isso fica ainda melhor. Uma porcentagem menor
(4,5%) das mulheres sexualmente ativas que “nunca” tinham usado preservativos tinha menor
probabilidade de ter tentado o suicídio que aquelas que “de vez em quando” (7,4%), “usualmente”
(28,9%) e “sempre” (13,2%) usavam preservativos.
“É importante reconhecer”: Idem, p.291.
“O corpo se torna o local”: Dave Holmes e Dan Warner, “The Anatomy of Forbidden Desire: Men,
Penetration, and Semen Exchange”, Nursing Inquiry 12, n.1, 2005, p.18.
tornam o HIV até: Jan Münch et al., “Semen-Derived Amyloid Fibrils Drastically Enhance HIV
Infection”, Cell 131, n.6, 2007, p.1.059-71.
“por volta dos 11-12 anos”: Gilbert Herdt e Martha McClintock, “The Magical Age of 10”, Archives
of Sexual Behavior 29, n.6, 2000, p.596.
O que fazem hormônios femininos: Burch e Gallup Jr., “Psychobiology of Human Semen”, op.cit.,
p.159.
“Parece portanto”: Idem, p.160.

O pelo lá de baixo: o que o pelo pubiano humano tem em comum com o


pelo dos gorilas

“o pelo pubiano era”: Samar K. Bhowmick, Tracy Ricke e Kenneth R. Retig, “Sexual Precocity in a
16-Month-Old Boy Induced by Indirect Topical Exposure to Testosterone”, Clinical Pediatrics 46,
n.6, 2007, p.540-1.
“Embora macacos nus [seres humanos]”: Robin A. Weiss, “Apes, Lice, and Prehistory”, Journal of
Biology 8, n.2, 2009, p.20.
“Com base na morfologia”: Ibid.
as psicólogas: Marika Tiggemann e Suzanna Hodgson, “The Hairlessness Norm Extended: Reasons
for and Predictors of Women’s Body Hair Removal at Different Body Sites”, Sex Roles, 59, n.11-
12, 2008, p.889-97.
Num outro estudo: Marika Tiggemann, Yolanda Martins e Libby Churchett, “Hair Today, Gone
Tomorrow: A Comparison of Body Hair Removal Practices in Gay and Heterosexual Men”, Body
Image 5, n.3, 2008, p.312-6.

A história natural do canibalismo

“O importante é que”: Lewis Petrinovich, The Cannibal Within. Piscataway, N.J., Aldine
Transaction, 2000, p.107.
“Depois de cortar o primeiro dedo do pé”: Gregory M. De Moore e Marcus Clement, “Self-
Cannibalism: An Unusual Case of Self-Mutilation”, Australian and New Zealand Journal of
Psychiatry 40, n.10, 2006, p.937.
Pesquisa osteoarqueológica numa: Alban Defleur et al., “Neanderthal Cannibalism at Moula-
Guercy, Ardèche, France”, Science 286, n.5437, 1999, p.128-31.
“Essa vantagem heterozigótica sustentada”: John Brookfield, “Human Evolution: A Legacy of
Cannibalism in Our Genes?”, Current Biology 13, n.15, 2003, p.592.
esses casos refletem crenças essencialistas: Bruce Hood, SuperSense: Why We Believe in the
Unbelievable. Nova York, HarperOne, 2009.
“Não há nenhuma forma”: Margaret St. Clair, prefácio para To Serve Man: A Cookbook for People,
de Karl Würf. Filadélfia, Owlswick Press, 1976, p.1.

A afecção da pele humana: a acne e o macaco nu

lidar com carne coberta por pelo: Stephen Kellett e Paul Gilbert, “Acne: A Biopsychosocial and
Evolutionary Perspective with a Focus on Shame”, British Journal of Health Psychology 6, n.1,
2001, p.1-24.
Considere uma cena: Jean-Paul Sartre, No Exit: And Three Other Plays, 1946. Nova York, Vintage,
1989, p.21.
“Posso sentir o”: Craig Murray e Katherine Rhodes, “The Experience and Meaning of Adult Acne”,
British Journal of Health Psychology 10, n.2, 2005, p.193.
“Quando estou falando”: Idem, p.192.
“A sociedade não permite”: Idem, p.196.
esses foram os resultados relatados: Tracey A. Grandfield, Andrew R. Thompson e Graham Turpin,
“An Attitudinal Study of Responses to a Range of Dermatological Conditions Using the Implicit
Association Test”, Journal of Health Psychology 10, n.6, 2005, p.821-9.
Um terço dos adolescentes da: Diana Purvis et al., “Acne, Anxiety, Depression, and Suicide in
Teenagers: A Cross-Sectional Survey of New Zealand Secondary School Students”, Journal of
Paediatrics and Science Health 42, n.12, 2006, p.793-6.
“É nossa opinião, após”: Marion Sulzberger e Sadie Zaidens, “Psychogenic Factors in Dermatologic
Disorders”, Medical Clinics of North America 32, 1948, p.684.
certas populações humanas: Loren Cordain et al., “Acne Vulgaris: A Disease of Western
Civilization”, Archives of Dermatology 138, n.12, 2002, p.1.584-90.

Devassos por natureza: quando um dano cerebral torna pessoas muito,


muito despudoradas

“O cérebro é a manifestação física”: Shelley Batts, “Brain Lesions and Their Implications in
Criminal Responsibility”, Behavioral Sciences and the Law 27, n.2, 2009, p.267.
“todas as sete crianças”: Sunil Pradhan, Madhurendra N. Singh e Nirmal Pandey, “Klüver-Bucy
Syndrome in Young Children”, Clinical Neurology and Neurosurgery 100, n.4, 1998, p.256.
“Por que não fazemos”: Shawn J. Kile et al., “Alzheimer Abnormalities of the Amygdala with
Klüver-Bucy Syndrome Symptoms: An Amygdaloid Variant of Alzheimer Disease”, Archives of
Neurology 66, n.1, 2009, p.125.
“era uma menina inteligente”: D.N. Mendhekar e Harpreet S. Duggal, “Sertraline for Klüver-Bucy
Syndrome in an Adolescent”, European Psychiatry 20, n.4, 2005, p.355.
começou a fazer uma felação: John A. Anson e Donald T. Kuhlman, “Post-Ictal Klüver-Bucy
Syndrome After Temporal Lobectomy”, Journal of Neurology, Neurosurgery, and Psychiatry 56,
n.3, 1993, p.311-3.
“tornando-se sexualmente agressivo”: Vanessa Arnedo, Kimberly Parker-Menzer e Orrin Devinsky,
“Forced Spousal Intercourse After Seizures”, Epilepsy and Behavior 16, n.3, 2009, p.563.
se juntar a ele e à esposa: Dietrich Blumer, “Hypersexual Episodes in Temporal Lobe Epilepsy”,
American Journal of Psychiatry 126, n.8, 1970, p.1.099-106.
Em 2003, os neurologistas: Jeffrey Burns e Russell Swerdlow, “Right Orbitofrontal Tumor with
Pedophilia Symptom and Constructional Apraxia Sign”, Archives of Neurology 60, n.3, 2003,
p.437-40.
Num caso mais recente: Julie Devinsky, Oliver Sacks e Orrin Devinsky, “Klüver-Bucy Syndrome,
Hypersexuality, and the Law”, Neurocase: The Neural Basis of Cognition 16, n.2, 2009, p.140-5.

Como o cérebro adquiriu suas nádegas: travessura medieval em


neuroanatomia

Em seu primeiro artigo: Régis Olry e Duane Haines, “Fornix and Gyrus Fornicatus: Carnal Sins?”,
Journal of the History of the Neurosciences 6, n.3, 1997, p.338-9.
“A real etimologia do”: Idem, p.338.
Num artigo de acompanhamento: Régis Olry e Duane Haines, “The Brain in Its Birthday Suit: No
More Reason to Be Ashamed”, Journal of the History of the Neurosciences 17, n.4, 2008, p.461-4.

Zumbis lascivos: sexo, sonambulismo, ereções noturnas… e você

E dê graças a Deus: Carlos H. Schenck, Isabelle Arnulf e Mark W. Mahowald, “Sleep and Sex:
What Can Go Wrong? A Review of the Literature on Sleep Related Disorders and Abnormal
Sexual Behaviors and Experiences”, Sleep 30, n.6, 2007, p.683-702.
Considere o caso do: Peter B. Fenwick, “Sleep and Sexual Offending”, Medicine, Science, and the
Law 36, n.2, 1996, p.122-34.
Num número de 2007: Monica L. Andersen et al., “Sexsomnia: Abnormal Sexual Behavior During
Sleep”, Brain Research Reviews 56, n.2, 2007, p.271-82.
Num número de 1996: Fenwick, “Sleep and Sexual Offending”, op.cit.
“Algum tempo depois”: Mia Zaharna, Kumar Budur e Stephen Noffsinger, “Sexual Behavior During
Sleep: Convenient Alibi or Parasomnia”, Current Psychiatry 7, n.7, 2008, p.21.
“Um automatismo é um”: Fenwick, “Sleep and Sexual Offending”, op.cit., p.131.
o pesquisador do sono londrino: Irshaad Osman Ebrahim, Somnambulistic Sexual Behavior
(Sexsomnia)”, Journal of Clinical Forensic Medicine 13, n.4, 2006, p.219-24.
Após acordar várias noites: Schenck, Arnulf e Mahowald, “Sleep and Sex”, op.cit.

Os seres humanos são especiais e únicos: nós nos masturbamos. E


muito

“na maioria das ocasiões”: R. Robin Baker e Mark A. Bellis, “Human Sperm Competition:
Ejaculate Adjustment by Males and the Function of Masturbation”, Animal Behavior 46, n.5,
1993, p.871.
“A vantagem para o macho”: Idem, p.863.
“O refluxo emerge”: Idem, p.864.
“flagelo da raça humana”: Jeffrey Jensen Arnett, “G. Stanley Hall’s Adolescence: Brilliance and
Nonsense”, History of Psychology 9, n.3, 2006, p.192.
No início dos anos 1980: Simon J. Wallis, “Sexual Behavior and Reproduction of Cercocebus
albigena johnstonii in Kibale Forest, Western Uganda”, International Journal of Primatology 4,
n.2, 1983, p.153-66.
“Durante cada observação”: E. D. Starin, “Masturbation Observations in Temminck’s Red
Colobus”, Folia Primatologica 75, n.2, 2004, p.115.
“A possibilidade de que os tipos”: Gilbert van Tassel Hamilton, “A Study of Sexual Tendencies in
Monkeys and Baboons”, Journal of Animal Behavior 4, n.5, 1914, p.296.
“De todos os meus macacos machos”: Idem, p.314.
“Jimmy esforçou-se prontamente”: Idem, p.315.
“uma espécie de embriaguez”: Wilhelm Stekel, Auto-Erotism: A Psychiatric Study of Onanism and
Neurosis. Nova York, Grove Press, 1961, p.139.
“Vejo diante de mim”: Narcyz Lukianowicz, “Imaginary Sexual Partner: Visual Masturbatory
Fantasies”, Archives of General Psychiatry 3, n.4, 1960, p.438.
“Neles ele ‘via’”: Idem, p.441.
Num estudo de 1990: Bruce J. Ellis e Donald Symons, “Sex Differences in Sexual Fantasy: An
Evolutionary Psychological Approach”, Journal of Sex Research 27, n.4, 1990, p.527-55.
Em sua revisão de achados de pesquisa: Harold Leitenberg e Kris Henning, “Sexual Fantasy”,
Psychological Bulletin 117, n.3, 1995, p.469-96.
“Como pessoas privadas”: Idem, p.477.

Sobre pedófilos, hebéfilos e efebófilos: orientação erótica de idade

“Entre os limites de idade”: Vladimir Nabokov, Lolita, 1955. Nova York, Random House, 1997,
p.16.
“Você está vendo”: Ray Blanchard et al., “Pedophilia, Hebephilia, and the DSM-V”, Archives of
Sexual Behavior 38, n.3, 2009, p.339.
“Imagine a inviabilidade”: Thomas K. Zander, “Adult Sexual Attraction to Early-Stage Adolescents:
Phallometry Doesn’t Equal Pathology”, Archives of Sexual Behavior 38, n.3, 2008, p.329.
“teoria da formação de aliança”: Frank Muscarella, “The Evolution of Homoerotic Behavior in
Humans”, Journal of Homosexuality 40, n.1, 2000, p.51-77.
“como houve entre Davi e Jônatas”: Oscar Wilde, “The Love That Dare Not Speak Its Name”,
disponível em www.phrases.org.uk/meanings/the-love-that-dare-not-speak-its-name.html.
A pressão para patologizar: Karen Franklin, “The Public Policy Implications of ‘Hebephilia’: A
Response to Blanchard et al.”, Archives of Sexual Behavior 38, n.3, 2008, p.319-20.
“um exemplo de manual”: Idem, p.319.
“Wilde tirou uma chave”: André Gide, If It Die: An Autobiography. Nova York, Random House,
1935, p.288.
“considerado o maior”: “André Gide Is Dead: Noted Novelist, 81”, disponível em
www.andregide.org/remembrance/nytgide.html.
“meninos roliços, de lábios carnudos, langorosos”: Posner, Donald. “Caravaggio’s Homo-Erotic
Early Works”, Art Quarterly 34, 1971, p.301-24.
Amantes de animais: zoófilos levam cientistas a repensar a sexualidade
humana

“Em considerável medida”: Alfred C. Kinsey, Wardell B. Pomeroy e Clyde E. Martin, Sexual
Behavior in the Human Male. Filadélfia: W. B. Saunders, 1948, p.675-6.
O primeiro estudo de caso: Christopher M. Earls e Martin L. Lalumière, “A Case Study of
Preferential Bestiality (Zoophilia)”, Sexual Abuse 14, n.1, 2002, p.83-8.
“Quando entrei na adolescência”: Christopher M. Earls e Martin L. Lalumière, “A Case Study of
Preferential Bestiality”, Archives of Sexual Behavior 38, n.4, 2009, p.606.
“Quando aquela égua preta”: Idem, p.606.
“Uma outra pesquisadora pioneira”: Hani Miletski, Understanding Bestiality and Zoophilia.
Bethesda, Md., publicação própria, 2002.
“A veemência com que”: Peter Singer, “Heavy Petting”, Nerve, disponível em
www.utilitarian.net/singer/by/2001----.htm.
“Duvidando, ao que parece”: Rebecca Cassidy, “Zoosex and Other Relationships with Animals”, in
Hastings Donnan e Fiona Magowan (orgs.), Transgressive Sex: Subversion and Control in Erotic
Encounters. Nova York, Berghahn Press, 2009, p.95.
estudo especialmente provocativo: Colin Williams e Martin Weinberg, “Zoophilia in Men: A Study
of Sexual Interest in Animals”, Archives of Sexual Behavior 32, n.6, 2004, p.523-35.
No livro de Maurice Temerlin: Maurice Temerlin, Lucy: Growing Up Human. Palo Alto, Science and
Behavior Books, 1975.

Assexuados entre nós

“Eu diria que nunca”: Nicole Prause e Cynthia A. Graham, “Asexuality: Classification and
Characterization”, Archives of Sexual Behavior 36, n.3, 2007, p.344.
“Simplesmente não sinto”: Kristin S. Scherrer, “Coming to an Asexual Identity: Negotiating Identity,
Negotiating Desire”, Sexualities 11, n.5, 2008, p.626.
Em 2004, ele analisou: Anthony F. Bogaert, “Asexuality: Prevalence and Associated Factors in a
National Probability Sample”, Journal of Sex Research 41, n.3, 2004, p.279-87.
“Eles não eram particularmente”: Prause e Graham, “Asexuality”, op.cit., p.344.

Brincando com os pés: podofilia para pudicos

“Numa minoria pequena, mas não insignificante”: Havelock Ellis, Studies in the Psychology of Sex
(online-ebooks.info, 2004), 5, p.12.
“relatos sobre fetichismo de pé em homossexuais”: Martin S. Weinberg, Colin J. Williams e
Cassandra Calhan, “Homosexual Foot Fetishism”, Archives of Sexual Behavior 23, n.6, 1994,
p.611-26.
Num artigo subsequente: Martin S. Weinberg, Colin J. Williams e Cassandra Calhan, “‘If the Shoe
Fits…’: Exploring Male Homosexual Foot Fetishism”, Journal of Sex Research 32, n.1, 1995,
p.17-27.
Ellis adverte que: Ellis, Studies in the Psychology of Sex, 5, op.cit., p.19.
Um exemplo especialmente vívido: Jules R. Bemporad, H. Donald Dunton e Frieda H. Spady, “The
Treatment of a Child Foot Fetishist”, American Journal of Psychotherapy 30, n.2, 1976, p.303-16.
Cerca de uma década mais tarde: Juliet Hopkins, “A Case of Foot and Shoe Fetishism in a 6-Year-
Old Girl”, in Trevor Lubbe (org.), The Borderline Psychiatric Child: A Selective Integration.
Londres, Routledge, 2000, p.109-29.
Essa abordagem de viva e deixe viver: Joseph R. Cautela, “Behavioral Analysis of a Fetish: First
Interview”, Journal of Behavioral and Experimental Psychiatry 17, n.3, 1986, p.161-5.
Esta é a teoria intrigante: A. James Giannini et al., “Sexualization of the Female Foot as a Response
to Sexually Transmitted Epidemics: A Preliminary Study”, Psychological Reports 83, n.2, 1998,
p.491-8.

A história de um amante da borracha

“Quando eu tinha quatro anos”: Narcyz Lukianowicz, “Imaginary Sexual Partner: Visual
Masturbatory Fantasies”, Archives of General Psychiatry 3, n.4, 1960, p.432.
Como relatam no estudo: Thomas J. Fillion e Elliott M. Blass, “Infantile Experience with Suckling
Odors Determines Adult Sexual Behavior in Male Rats”, Science 231, n.4739, 1986, p.729-31.

Ejaculação feminina: uma estrada científica menos explorada

Num extraordinário artigo: Joanna B. Korda, Sue W. Goldstein e Frank Sommer, “The History of
Female Ejaculation”, Journal of Sexual Medicine 7, n.5, 2010, p.1.965-75.
liberação de quantidades “copiosas”: Amy L. Gilliland, “Women’s Experiences of Female
Ejaculation”, Sexuality and Culture 13, n.3, 2009, p.121-34.
uma equipe de pesquisadores egípcios: Ahmed Shafik et al., “An Electrophysiologic Study of
Female Ejaculation”, Journal of Sex and Marital Therapy 35, n.5, 2009, p.337-46.
uma equipe de tchecos: Milan Zaviačič et al., “Female Urethral Expulsions Evoked by Local Digital
Stimulation of the G-Spot: Differences in the Response Patterns”, Journal of Sex Research 24, n.1,
1988, p.311-18.
dúbia afirmação feita por: William H. Masters e Virginia E. Johnson, Human Sexual Response.
Nova York, Little, Brown, 1966.
“Antes ele dizia”: Gilliland, “Women’s Experiences of Female Ejaculation”, p.126.

O estranho caso das fag hags: mulheres que gostam de homens que
gostam de homens

seu verbete na Wikipédia: Rue McClanahan, disponível em en.wikipedia.org/wiki/Rue_McClanahan


(acessado em 14 de junho de 2011).
Nancy Bartlett e colegas: Nancy H. Bartlett et al., “The Relation Between Women’s Body Esteem
and Friendships with Gay Men”, Body Image 6, n.3, 2009, p.235-41.
“O homem gay na sua vida”: Margaret Cho, I’m the One That I Want. Nova York, Ballantine Books,
2002, p.37.
O Teatro de Darwin apresenta… O misterioso caso do orgasmo feminino

“O orgasmo feminino é uma sensação”: Cindy M. Meston et al., “Women’s Orgasm”, Annual
Review of Sex Research 15, 2004, p.174.
Gould desenvolveu: Stephen Jay Gould, “Male Nipples and Clitoral Ripples”, in Bully for
Brontosaurus: Further Reflections in Natural History. Nova York, W.W. Norton, 1992, p.124-38.
De fato, foi Lloyd quem: Elisabeth A. Lloyd, The Case of the Female Orgasm. Cambridge, Mass.,
Harvard University Press, 2005.
Evidências baseadas em gêmeos: Kate M. Dunn, Lynn F. Cherkas e Tim D. Spector, “Genetic
Influences on Variation in Female Orgasmic Function: A Twin Study”, Biology Letters 1, n.3,
2005, p.260-3.
“o simples fato de algo”: David P. Barash, “Let a Thousand Orgasms Bloom! A Review of The Case
of the Female Orgasm by Elisabeth A. Lloyd”, Evolutionary Psychology 3, 2005, p.351.
A religiosidade é um outro: Sheryl A. Kingsberg e Jeffrey W. Janata, “Female Sexual Disorders:
Assessment, Diagnosis, and Treatment”, Urologic Clinics of North America 34, n.4, 2007, p.497-
506.
Usando dados de relatos pessoais: Todd K. Shackelford et al., “Female Coital Orgasm and Male
Attractiveness”, Human Nature 11, n.3, 2000, p.299-306.
orgasmos e a atratividade física: Randy Thornhill et al., “Human Female Orgasm and Mate
Fluctuating Asymmetry”, Animal Behaviour 50, n.6, 1995, p.1.601-15.
“Durante o orgasmo copulativo”: Danielle Cohen e Jay Belsky, “Avoidant Romantic Attachment and
Female Orgasm: Testing an Emotion-Regulation Hypothesis”, Attachment and Human
Development 10, n.1, 2008, p.1.
mulheres chinesas que namoravam: Thomas Pollet e Daniel Nettle, “Partner Wealth Predicts Self-
Reported Orgasm Frequency in a Sample of Chinese Women”, Evolution and Human Behavior 30,
n.2, 2009, p.146-51.
“é um sinal pelo qual”: Barash, “Let a Thousand Orgasms Bloom!”, op.cit., p.349.

A megera evoluída: por que as adolescentes são tão cruéis umas com as
outras?

“Jo é uma menina de quinze anos”: Rosalyn Shute, Laurence Owens e Phillip Slee, “‘You Just Stare
at Them and Give Them Daggers’: Nonverbal Expressions of Social Aggression in Teenage Girls”,
International Journal of Adolescence 10, n.4, 2002, p.353-72.
e refletissem sobre ela: Nicole H. Hess e Edward H. Hagen, “Sex Differences in Indirect Aggression:
Psychological Evidence from Young Adults”, Evolution and Human Behavior 27, 2006, p.231-45.

Nunca pergunte o caminho a um gay

Num estudo relatado na: Qazi Rahman, Davinia Andersson e Ernest Govier, “A Specific Sexual
Orientation-Related Difference in Navigation Strategy”, Behavioral Neuroscience 119, n.1, 2005,
p.311-6.
num estudo de acompanhamento: Qazi Rahman e Johanna Koerting, “Sexual Orientation-Related
Differences in Allocentric Spatial Memory Tasks”, Hippocampus 18, n.1, 2008, p.55-63.
axilas de gays exalam: Ivanka Savic et al., “Smelling of Odorous Sex Hormone-Like Compounds
Causes Sex-Differentiated Hypothalamic Activations in Humans”, Neuron 31, n.4, 2001, p.661-8.

“Homem solteiro, raivoso, hétero… procura semelhantes”: a homofobia


como desejo reprimido

Uma das linhas de trabalho: Henry E. Adams, Lester W. Wright Jr. e Bethany A. Lohr, “Is
Homophobia Associated with Homosexual Arousal?”, Journal of Abnormal Psychology 105, n.3,
1996, p.440-5.
“um extensômetro circunferencial”: Idem, p.441.
“Acreditamos ser inexato”: Brian P. Meier et al., “A Secret Attraction or Defensive Loathing?
Homophobia, Defense, and Implicit Cognition”, Journal of Research in Personality 40, n.4, 2006,
p.388.
Alguns dos dados mais surpreendentes: Gregory M. Herek, Stigma and Sexual Orientation:
Understanding Prejudice Against Lesbians, Gay Men, and Bisexuals. Thousand Oaks, Sage, 1998.
um estudo posterior publicado: Jeffrey A. Bernat et al., “Homophobia and Physical Aggression
Toward Homosexual and Heterosexual Individuals”, Journal of Abnormal Psychology 110, n.1,
2001, p.179-87.

O modismo do poliamor, o ciúme gay e a evolução de um coração


partido

“amantes abandonados dedicam-se”: Helen E. Fisher, “Broken Hearts: The Nature and Risks of
Romantic Rejection”, in Ann C. Crouter e Alan Booth (orgs.), Romance and Sex in Adolescence
and Emerging Adulthood: Risks and Opportunities. Mahwah, N.J.: Lawrence Erlbaum, 2006, p.13.
“uma infidelidade a um parceiro”: Brad J. Sagarin et al., “Sex Differences (and Similarities) in
Jealousy: The Moderating Influence of Infidelity Experience and Sexual Orientation of the
Infidelity”, Evolution and Human Behavior 24, n.1, 2003, p.18.
Por exemplo, em 2010, quando um repórter: Boris Kachka, “The Kid Stays in the Picture”, Nova
York, 16 de maio de 2010, disponível em nymag.com/arts/theater/features/66008/.

Cientistas bem-dotados vão fundo nas preferências sexuais entre


homens gays

Vários anos atrás: Trevor A. Hart et al., “Sexual Behavior Among HIV-Positive Men Who Have Sex
with Men: What’s in a Label?”, Journal of Sex Research 40, n.2, 2003, p.179-88.
num estudo que mostrou: David A. Moskowitz, Gerulf Rieger e Michael E. Roloff, “Tops, Bottoms,
and Versatiles”, Sexual and Relationship Therapy 23, n.3, 2008, p.191-202.
“Embora as autodesignações”: Hart et al., “Sexual Behavior Among HIV-Positive Men Who Have
Sex with Men”, p.188.
“essas relações também”: Moskowitz, Rieger e Roloff, “Tops, Bottoms, and Versatiles”, op.cit.,
p.199.
Um outro estudo intrigante: Matthew H. McIntyre, “Letter to the Editor: Digit Ratios, Childhood
Gender Role Behavior, and Erotic Role Preferences of Gay Men”, Archives of Sexual Behavior 32,
n.6, 2003, p.495-7.

Seu filho é um “pré-homossexual”?: a previsão da orientação sexual


adulta

“foi rever as evidências”: J. Michael Bailey e Kenneth J. Zucker, “Childhood Sex-Typed Behavior
and Sexual Orientation: A Conceptual Analysis and Quantitative Review”, Developmental
Psychology 31, n.1, 1995, p.44.
referem-se àquela longa lista: Ibid.
entrevistaram 25 mulheres adultas: Kelley D. Drummond et al., “A Follow-Up Study of Girls with
Gender Identity Disorder”, Developmental Psychology 44, n.1, 2008, p.34-45.
“aqueles alvos que, como adultos”: Gerulf Rieger et al., “Sexual Orientation and Childhood Gender
Nonconformity: Evidence from Home Videos”, Developmental Psychology 44, n.1, 2008, p.53.
Dados transculturais mostram: Fernando Luiz Cardoso, “Recalled Sex-Typed Behavior in
Childhood and Sports’ Preferences in Adulthood of Heterosexual, Bisexual, and Homosexual Men
from Brazil, Turkey, and Thailand”, Archives of Sexual Behavior 38, n.5, 2008, p.726-36.
num caso bastante espantoso: Helen W. Wilson e Cathy Spatz Wisdom, “Does Physical Abuse,
Sexual Abuse, or Neglect in Childhood Increase the Likelihood of Same-Sex Sexual Relationships
and Cohabitation? A Prospective 30-Year Follow-Up”, Archives of Sexual Behavior 39, n.1, 2010,
p.63-74.

Bons cristãos (mas só aos domingos)

Em meu livro The Belief Instinct: Jesse Bering, The Belief Instinct: The Psychology of Souls,
Destiny, and the Meaning of Life. Nova York, W.W. Norton, 2011.
“Se a punição sobrenatural é sustentada”: Dominic Johnson e Jesse Bering, “Hand of God, Mind of
Man: Punishment and Cognition in the Evolution of Cooperation”, Evolutionary Psychology 4,
2006, p.219-33.
Esta é uma expressão cunhada: Azim F. Shariff e Ara Norenzayan, “God Is Watching You: Priming
God Concepts Increases Prosocial Behavior in an Anonymous Economic Game”, Psychological
Science 18, n.9, 2007, p.803-9.
Um trabalho mais recente: Will Gervais e Ara Norenzayan, “Like a Camera in the Sky? Thinking
About God Increases Public Self-awareness and Socially Desirable Responding”, Journal of
Experimental Social Psychology (no prelo).
“Essa abordagem nos ajuda”: Deepak Malhotra, “(When) Are Religious People Nicer? Religious
Salience and the ‘Sunday Effect’ on Pro-Social Behavior”, Judgment and Decision Making 5, n.2,
2010, p.139.
Analisando os impudicos: Benjamin Edelman, “Red Light States: Who Buys Online Adult
Entertainment?”, Journal of Economic Perspectives 23, n.1, 2009, p.209-20.

Os coelhinhos de Deus: a taxa de reprodução dos crentes é


esmagadoramente maior do que a dos não crentes

“No final das contas”: Michael Blume, “The Reproductive Benefits of Religious Affiliation”, in E.
Voland e W. Schiefenhövel (orgs.), The Biological Evolution of Religious Mind and Behaviour.
Berlim, Springer Frontiers Collection, 2009, p.122.
“Os resultados são”: Idem, p.119.
“Alguns naturalistas estão tentando”: Idem, p.125.

Criando raízes com minha mãe morta

Considere que, a cada ano: “Natural burial”, disponível em en.wikipedia.org/wiki/Natural_burial


(acessado em 14 de junho de 2011).
“Seria possível dirigir mais de”: disponível em www.naturallegacies.org (acessado em 14 de julho
de 2011).
Esta expressão foi cunhada: Ernest Becker, The Denial of Death. Nova York, Free Press, 1973.

Ser suicida: matar-se é adaptativo? Depende: suicídio em benefício dos


próprios genes (Parte I)

deCatanzaro postulou que os cérebros humanos: Denys deCatanzaro, Suicide/Self-Damage


Behavior, Studies in Archaeological Science. Nova York, Academic Press, 1981.
Mas quando biólogos examinaram: Maydianne C.B. Andrade, “Sexual Selection for Male Sacrifice
in the Australian Redback Spider”, Science 5, n.5245, 1996, p.70-2.
Um outro exemplo são as mamangabas: Robert Poulin, “Altered Behaviour in Parasitized
Bumblebees: Parasite Manipulation or Adaptive Suicide?”, Animal Behaviour 44, n.1, 1992,
p.176.
Para cristalizar sua posição: Denys deCatanzaro, “A Mathematical Model of Evolutionary
Pressures Regulating Self-Preservation and Self-Destruction”, Suicide and Life-Threatening
Behavior 16, n.2, 1986, p.166-81.
Num estudo publicado em 1995: Denys deCatanzaro, “Reproductive Status, Family Interactions, and
Suicidal Ideation: Surveys of the General Public and High-Risk Groups”, Ethology and
Sociobiology 16, n.5, 1995, p.385-94.
“a natureza observacional deste”: Idem, p.391.
Alguns anos depois da: R. Michael Brown et al., “Evaluation of an Evolutionary Model of Self-
Preservation and Self-Destruction”, Suicide and Life-Threatening Behavior 29, n.1, 1999, p.58-71.
“[Ela] era descrita como”: Kimberly A. van Orden et al., “The Interpersonal Theory of Suicide”,
Psychological Review 117, n.2, 2010, p.585.
“A adoção de um estilo de vida”: Poulin, “Altered Behaviour in Parasitized Bumblebees: Parasite
Manipulation or Adaptive Suicide?”, op.cit.

Ser suicida: como é a sensação de querer se matar (Parte II)

Segundo os pesquisadores: David Cohen e Angèle Consoli, “Production of Supernatural Beliefs


During Cotard’s Syndrome, a Rare Psychotic Depression”, Behavioral and Brain Sciences 29, n.5,
2006, p.468-70.
Algumas evidências recentes sugerem: Anders Helldén et al., “Death Delusion”, British Medical
Journal 335, n.7633, 2007, p.1.305.
“O delírio consistia na absoluta”: Cohen e Consoli, “Production of Supernatural Beliefs During
Cotard’s Syndrome, a Rare Psychotic Depression”, op.cit., p.469.
penso que, da perspectiva: Roy F. Baumeister, “Suicide as Escape from Self”, Psychological Review
97, n.1, 1990, p.90-113.
“Um grande corpo de evidências”: Idem, p.95.
“aparentemente é o tamanho”: Idem, p.95.
“A essência da autoconsciência”: Idem, p.98.
“Nosso melhor caminho”: Edwin S. Shneidman, The Suicidal Mind. Nova York, Oxford University
Press, 1996, p.6.
“seu arquivo continha”: Susanne Langer, Jonathan Scourfield e Ben Fincham, “Documenting the
Quick and the Dead: A Study of Suicide Case Files in a Coroner’s Office”, Sociological Review
56, n.2, 2008, p.304.
“Concluir simplesmente que depressão”: Baumeister, “Suicide as Escape from Self”, p.90.
“Por conseguinte, suicidas parecem”: Idem, p.100.
“Ao se preparar para o suicídio”: Idem, p.108.
“capacidade adquirida para o suicídio”: Kimberly A. van Orden et al., “The Interpersonal Theory of
Suicide”, Psychological Review 117, n.2, 2010, p.585.

“Cientistas dizem que o livre-arbítrio provavelmente não existe, mas


recomendam: ‘Não deixem de acreditar nele!’”

“No cerne da questão”: Roy F. Baumeister, “Free Will in Scientific Psychology”, Perspectives on
Psychological Science 3, n.1, 2008, p.14.
O primeiro estudo que demonstrou: Kathleen D. Vohs e Jonathan W. Schooler, “The Value of
Believing in Free Will”, Psychological Science 19, n.1, 2008, p.49-54.
“‘Você’, suas alegrias e”: Francis Crick, The Astonishing Hypothesis: The Scientific Search for the
Soul. Nova York, Scribner, 1994, p.3.
“Se a exposição a mensagens”: Vohs e Schooler, “Value of Believing in Free Will”, op.cit., p.54.
“Algumas análises filosóficas”: Roy F. Baumeister, E.J. Masicampo e C. Nathan DeWall, “Prosocial
Benefits of Feeling Free: Disbelief in Free Will Increases Aggression and Reduces Helpfulness”,
Personality and Social Psychology Bulletin 35, n.2, 2009, p.267.
O rato que não parava de rir: alegria e hilaridade no reino animal

“possibilidade de que os sujeitos”: Jaak Panksepp, “Neuroevolutionary Sources of Laughter and


Social Joy: Modeling Primal Human Laughter in Laboratory Rats”, Behavioural Brain Research
182, n.2, 2007, n.232.
“Tendo acabado de concluir”: Idem, p.235.
“devemos ser competentes”: Idem, p.234.
“a não ser que lhes tivessem feito cócegas”: Idem, p.235.
“Tentamos refutar”: Idem, p.235.
“Se um gato”: Idem, p.241.
No mesmo número da: Martin Meyer et al., “How the Brain Laughs: Comparative Evidence from
Behavioral, Electrophysiological, and Neuroimaging Studies in Human and Monkey”, Behavioural
Brain Research 182, n.2, 2007, p.245-60.
as primeiras evidências experimentais: Diana P. Szameitat et al., “Differentiation of Emotions in
Laughter at the Behavioral Level”, Emotion 9, n.3, 2009, p.397-405.
“os atores foram instruídos”: Idem, p.398.
“O riso de gozo com o infortúnio”: Idem, p.403.
Agradecimentos

Muita gente reclamou de coisas que escrevi neste livro. Para grande
contrariedade delas, meu parceiro, Juan Quiles, aparece de vez em quando,
e sou-lhe muito grato por servir de musa, crítico e, falando de maneira mais
geral, o sempre misterioso yin para meu yang. Ele é uma das poucas
pessoas que conseguiram me manter continuamente conjecturando (o que
significa que introduz um saudável caos de que sempre preciso).
Meu agente, Peter Tallack, da Science Factory, foi um fantástico aliado
trabalhando incansavelmente nos bastidores. É muita sorte minha tê-lo
como meu representante, não só porque o considero um dos melhores
agentes em ação no mundo da ciência atualmente – isto dá a ideia de que é
um cafetão, minhas profundas desculpas, Peter –, mas também porque ele
em geral concorda comigo. Pelo menos é nisso que me faz acreditar.
Tenho também a sorte de ter colaborado neste projeto uma equipe
maravilhosa de editores e revisores. Em especial, minha editora Amanda
Moon, da Farrar, Straus and Giroux, e sua maravilhosa assistente Karen
Maine estiveram no leme, organizando esta coletânea. Amanda representa a
Pessoa Número Um no processo editorial; como a primeira leitora de meus
originais, é ela quem avalia os pontos fortes e, sem dúvida, as muitas
debilidades de meus ensaios antes que qualquer outro possa apontá-los para
mim. Sinto que deveria incluir uma daquelas ressalvas sobre “as atitudes e
opiniões aqui expressas são unicamente do autor e não refletem
necessariamente as de seu patrão”. Mas você entende o que quero dizer.
Estamos ambos, você e eu, em muito boas mãos com ela.
Um outro importante conjunto de editores foi o que surgiu muito antes
que este livro se materializasse, quando versões preliminares dos ensaios
foram publicadas on-line. Apoiando-me na conceituação e implementação
de minha coluna “Bering in Mind” na Scientific American, Karen Schrock
foi quem realmente me fez decolar. Não posso lhe agradecer o suficiente
por me proporcionar o escape para exercitar meus pensamentos obscenos e
lascivos – através da Scientific American, nada menos.
Mais recentemente, meu editor na revista Slate, Daniel Engber, também
contribuiu de maneira decisiva para que eu pudesse conversar com leitores
sobre tantos tópicos gloriosamente impróprios. Dan e eu compartilhamos
uma queda pelo absurdo e o científico, duas coisas que se harmonizam
muito naturalmente e podem ser uma mistura jubilosa quando as coisas dão
certo. Sou enormemente grato por trabalhar ao lado de Dan e aprender com
ele, em seu papel como editor mas também como um colega escritor.
Que seria de mim sem minha família? Estaria em condições muito
piores, na certa. Suponho que durante muito tempo, os membros de minha
família não souberam muito bem como responder à pergunta de qual era
meu ganha-pão. Obrigado de qualquer maneira, papai, Linda, Stacey(s),
Adam, Jodi, Jakob, Gianni, Sydney e aqueles que estão entre os muitos fios
próximos mas dispersos dos Bering e Roth.
Talvez as pessoas mais importantes a agradecer, contudo, sejam os
cientistas e estudiosos que fizeram o trabalho duro de verdade. Meus
resumos aqui são apenas pálidos relatos de sua inventividade e, muitas
vezes, gênio. Entre os que eu gostaria de mencionar especificamente por
suas contribuições e ajuda ao longo do percurso estão: Gordon Gallup,
Becky Burch, Ray Blanchard, Ara Norenzayan, Denys deCatanzaro, Roy
Baumeister e Michael Blume. Jonathan Jong foi um assistente engenhoso,
que gentilmente me enviou da Nova Zelândia mais de um artigo obscuro.
Eu também gostaria de agradecer ao pessoal do Kinsey Institute em
Bloomington, Indiana, por me acolher como um estudioso independente.
Por fim, permitam-me ao final meditar, com sincera e sorridente
gratidão, sobre alguns dos heróis de meu dia a dia, meus melhores amigos
não humanos, “Big Tommy”, Gulliver e Uma.
Índice remissivo

Aché, 1
acne, 1-2
ansiedade, 1-2
evolução, 1-2
genética, 1
tratamento, 1
acrotomofilia, 1
Adams, Henry, 1, 2, 3
adolescentes, 1, 2-3
como megeras, 1-2
comportamento típico de sexo, 1-2, 3-4
do sexo feminino, 1, 2-3
do sexo masculino, 1-2
homossexuais, 1-2, 3-4, 5-6
masturbação, 1
sexo com, 1-2
suicídio de adolescentes gays, 1-2, 3-4
África, 1, 2
agressão feminina, 1-2
agressão, 1-2, 3
comportamento de proteção do cônjuge, 1-2
feminina, 1-2
“hipótese da baixa velocidade/agressividade elevada”, 1
homofobia, 1-2
masculina, 1, 2-3
Aids, 1, 2, 3-4, 5-6, 7
álcool, 1, 2, 3
Alemanha, 1, 2-3, 4-5
nazista, 1-2
algolagnia, 1
amamentação, 1
América do Sul, 1, 2
American Journal of Psychiatry, The, 1, 2
American Journal of Psychotherapy, 1
American Psychiatric Association, 1
American Psychological Association, 1-2
americanos nativos, 1
amish, 1-2
amnésia, 1
Andersen, Hans Christian, 1
Andersen, Monica, 1
androgênios, 1
animais ver animais específicos; zoofilia
Annual Review of Sex Research, 1
ansiedade, 1, 2
acne, 1-2
ereção e, 1
homofobia, 1-2
morte, 1
suicídio e, 1-2
antiadrenérgicos, 1
antibióticos, 1
antidepressivos, 1, 2
sêmen como, 1-2
antropofagia, 1-2
apatia, 1
aptidão genética inclusiva, 1, 2-3
aranhas-de-dorso-vermelho, 1, 2
Archives of General Psychiatry, 1, 2
Archives of Sexual Behavior, 1, 2, 3, 4, 5
Aristóteles, 1
Arnedo, Vanessa, 1
assexualidade, 1-2
essencialismo, 1-2
genética e, 1
assimetria, 1
testicular, 1-2
astecas, rituais de canibalismo dos, 1
ateísmo, 1-2
Austrália, 1, 2
australopitecíneos, 1-2
autocunilíngua, 1
autofelação, 1-2
homossexualidade e, 1-2
auto-irrumatio, 1, 2
automatismo, 1
Aven, 1

babuínos, 1
canibalismo, 1
Bailey, J. Michael, 1-2
Baker, Robin, 1-2
Barash, David, 1, 2
barebacking, 1-2
Bartholin, Thomas, 1
Bartlett, Nancy, 1, 2
Batts, Shelley, Behavioral Sciences and the Law, 1
Baumeister, Roy, 1, 2-3, 4, 5
teoria da fuga de, 1-2
Beauvoir, Simone de, 1
Becker, Ernest, A negação da morte, 1
Behavioral Neuroscience, 1
Behavioural Brain Research, 1, 2
Beirne, Piers, 1
Belfast, 1
Belief Instinct, The (Bering), 1
Bellis, Mark, 1-2
Belsky, Jay, 1
Bemporad, Jules, 1
benzodiazepínicos, 1
Bering, Vitus, 1
bestialismo, 1-2
Bhowmick, Samar, 1
Bíblia, 1, 2, 3
bissexualidade, 1, 2, 3, 4, 5
Bixler, Ray, 1
Blanchard, Ray, 1-2, 3-4
Blass, Elliott, 1, 2
Blume, Michael, 1, 2, 3, 4
bodes, sexo com, 1
Body Image, 1
Bogaert, Anthony, 1-2, 3
bonobo, 1, 2
“borrachofilia”, 1-2
Brain Research Reviews, 1
Brasil, 1
British Journal of Health Psychology, 1-2
Brookfield, John, 1
Bucy, Paul, 1
Burch, Rebecca, 1, 2, 3, 4-5
Burke, William, 1
Burns, Jeffrey, 1
Burroughs, William, Almoço nu, 1
Butts, Nancy, 1

cachorros, 1
sexo com, 1, 2, 3, 4
Campbell, Anne, 1
câncer, 1-2
canibalismo, 1-2, 3
fome, 1, 2, 3, 4-5
genética e, 1-2
médico, 1
ritual, 1-2, 3
sociopático, 1-2
tabu, 1, 2
caranguejos, 1-2
Caravaggio, 1, 2
Carroll, Lewis, As aventuras de Alice no País das Maravilhas, 1
Cassidy, Rebecca, Transgressive Sex: Subversion and Control in Erotic
Encounters, 1
castração, 1-2
Cautela, Joseph, 1
cavalos, sexo com, 1, 2, 3, 4-5, 6-7, 8
Cavenar, Jesse, 1
cemitérios, 1-2, 3-4
Centers for Disease Control and Prevention, 1
Cercocebus albigena, 1
cérebro, 1-2, 3, 4
consumo, 1
dano, 1-2
epiléptico, 1-2
ereções relacionadas ao sono, 1-2
evolução, 1, 2
homossexualidade e, 1-2
livre-arbítrio e, 1-2
masturbação e, 1-2
neuroanatomia, 1-2
pedofilia e, 1-2
regiões, 1
riso e, 1-2
sistemas libidinais e, 1-2
suicídio e, 1-2
cheiro, 1
chimpanzés, 1, 2-3, 4-5, 6-7, 8
masturbação, 1
pênis, 1, 2-3
sêmen, 1-2
sexo com, 1-2
suicídio, 1-2, 3
teste do autorreconhecimento no espelho, 1
China, 1
canibalismo na, 1
Cho, Margaret, 1
chupador de pau (expressão), 1-2
Churchett, Libby, 1
circuncisão, 1-2
teoria do desalojamento do sêmen e, 1-2
ciúme sexual, 1-2
clamídia, 1-2
Clark, Anne, 1
Clementi, Tyler, 1
Clinical Pediatrics, 1
clitóris, 1, 2-3, 4
clonazepam, 1
cobras, sexo com, 1
coelhos, sexo com, 1-2
Cohen, Danielle, 1
Cohen, David, 1
colículos, 1, 2
colo do útero, 1, 2, 3
Colômbia, 1
Colombo, Matteo Realdo, 1
coma, causado por encefalite, 1, 2
Comunidade Oneida, 1-2
concepção, 1
conjuntivas, 1
Consoli, Angèle, 1
continência masculina, 1
contracepção, 1, 2
contraceptivos orais, 1
coprofagia, 1
copulação ver sexo
córtex cingulado anterior, 1
córtex pré-frontal dorsolateral, 1
córtex pré-frontal, 1
cortisol, 1
Cotard, Jules, 1
Craig, Larry, 1
Crane, Hart, 1
cremação, 1-2
crenças na vida após a morte, 1, 2
crianças, 1-2
abuso sexual de, 1-2, 3, 4-5
comportamento típico de sexo, 1-2
comportamentos hipersexualizados, 1, 2
desenvolvimento sexual de, 1-2, 3-4
fantasias, 1
fetichismo do pé, 1-2, 3-4
interesse por brinquedos, 1
pré-homossexuais, 1-2
puberdade precoce, 1-2
religião e reprodução, 1-2
Crick, Francis, A hipótese espantosa, 1
criminalidade:
fantasia sexual e, 1-2
pedofilia e, 1-2
suicídio e, 1-2
cristianismo, 1-2, 3-4
culturas primitivas, suicídio em, 1-2
cunilíngua, 1, 2-3, 4, 5
autocunilíngua, 1-2, 3-4
pelo pubiano e, 1-2
Current Psychiatry, 1
Current Biology, 1

D’Annunzio, Gabriele, 1
Dahmer, Jeffrey, 1
dano cerebral, 1-2
hipersexualidade e, 1-2
pedofilia e, 1-2
Darwin, Charles, 1, 2, 3
David, Gerard, 1
David, Larry, 1
de Graaf, Reimer, 1-2
deCatanzaro, Denys, 1-2
modelo matemático de autopreservação e autodestruição, 1
sobre suicídio adaptativo, 1-2, 3
deficiências na orientação espacial e homossexualidade, 1-2
Dekkers, Midas, Dearest Pet, 1
Descartes, René, 1
desígnio inteligente, 1
determinismo, 1-2
Developmental Psychology, 1, 2
direitos dos gays, 1
disforia de gênero, 1-2
distúrbio de identidade de gênero, 1-2
distúrbio do desejo sexual hipoativo, 1
DNA, 1, 2
doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ), 1
doença de origem alimentar, 1
doença de Pick, 1
doença, e canibalismo, 1
Donatello, 1
dopamina, 1
dor, 1
suicídio, 1-2
testicular, 1, 2-3
drogas, 1, 2-3, 4
administração vaginal, 1-2
facilitadoras do estupro, 1
Drummond, Kelley, 1
DSM, 1, 2-3

Earls, Christopher, 1-2, 3-4


Ebrahim, Irshaad, 1
Edelman, Benjamin, 1
efebofilia, 1, 2, 3-4
efeito 2D: 1, 2
efeito de dosagem, 1-2
“efeito do domingo”, 1-2
“efeito McClintock”, 1, 2
Egito, 1
antigo, 1
ejaculação feminina, 1-2
ejaculação precoce, 1-2
genética e, 1-2
teoria da “sobrevivência do mais rápido”, 1-2
ejaculação, 1, 2-3, 4, 5, 6
ejaculadores retardados, 1-2
feminina, 1-2
genética e, 1-2
masturbação, 1, 2
“período refratário” após, 1-2
precoce, 1, 2
refluxo, 1
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
variação nas latências da ejaculação masculina, 1-2
elefantes, 1
Ellis, Bruce, 1
Ellis, Havelock, 1-2, 3-4
Emotion, 1-2
empatia, 1
acne e, 1
sexo e, 1-2
encefalite por herpes, 1, 2, 3
endorfinas, 1
engenharia reversa, 1, 2
enterro verde, 1-2
epilépticos do lobo temporal, 1-2
epilépticos, 1, 2
hipersexualidade e, 1-2
Equador, 1
Equus ver Shaffer, Peter, Equus
ereções, 1, 2, 3-4, 5, 6
homens homofóbicos e, 1-2
relacionadas ao sono, 1-2
erotofobia, 1
Escócia, 1
escroto, 1-2
temperatura, 1, 2-3
testículos descidos, 1-2
Espanha, 1
esperma, 1, 2-3
ejaculação precoce, 1-2
masturbação e, 1, 2
mobilidade, 1-2, 3-4
química do sêmen e, 1-2
retenção e orgasmo feminino, 1
temperatura, 1, 2-3
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
testículos e, 1-2
viabilidade, 1
esportes, 1, 2
de contato versus solitários, 1
trauma testicular, 1
estado “pós-ictal”, 1
estirpicultura, 1
estresse, 1
estrona, 1
estupro, 1, 2
dano cerebral e, 1
de crianças, 1-2
drogas facilitadoras do, 1
sexônia, 1, 2
Ethology and Sociobiology, 1, 2
etimologia, 1
eugenia, 1-2
European Psychiatry, 1
evolução, 1, 2
acne, 1-2
assexualidade e, 1-2
canibalismo, 1-2
cérebro, 1, 2-3
ciúme sexual e, 1-2
ejaculação precoce, 1-2
pelo pubiano, 1-2
pênis, 1-2
química do sêmen, 1-2
religião e, 1-2
suicídio e, 1-2
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
testicular, 1-2
zoofilia e, 1-2
Evolution and Human Behavior, 1, 2
Evolutionary Psychology, 1, 2
exibicionismo, 1

fadiga, 1
fag hags, 1-2
estereótipos negativos, 1-2
na televisão, 1, 2-3
fantasias, 1-2
durante o sexo, 1-2
infância, 1-2
masturbação, 1-2
felação, 1, 2-3, 4-5, 6-7, 8, 9, 10
autofelação, 1-2
pé, 1-2
pelo pubiano e, 1-2
pornografia masculina gay, 1-2
felicidade, 1, 2-3
de primatas não humanos, 1-2
padrões exorbitantes para, 1-2
riso e, 1-2
sêmen e, 1
Fenwick, Peter, 1
ferimentos testiculares, 1, 2-3
feromônios, 1-2
pelo pubiano e, 1
sincronia menstrual e, 1-2
Ferrell, Will, 1
fertilização, 1, 2, 3, 4, 5
fertilização in vitro, 1
fetiche de sapato, 1, 2, 3, 4
fetichismo de pé, 1-2
crianças, 1-2, 3-4
homossexual, 1-2, 3-4, 5
fetichismo ver fetiches específicos
fetichismos, 1-2, 3-4, 5
ver também fetiches específicos
Fillion, Thomas, 1-2
Finn, Mary, 1
Finn, Michael, 1
Fisher, Helen, 1-2
focas, 1
Foley, Mark, 1
Folia Primatologica, 1
Foot Fraternity, 1, 2, 3-4
forças armadas, 1
autofelação e, 1-2
homossexualidade nas, 1, 2
proscrição dos gays com a política do “Não pergunte, não conte”, 1
sexônia, 1
suicídio, 1-2
fórnice, 1-2
Fort, Joseph Auguste Aristide, 1
fosfatase ácida prostática, 1-2
França, 1, 2, 3, 4, 5, 6
Franklin, Karen, 1
frênulo, 1
Freud, Sigmund, 1, 2, 3, 4, 5
Fry, Stephen, 1

Gajdusek, Carleton, 1
Gallup, Gordon, 1-2, 3-4, 5-6
hipótese da ativação, 1-2
sobre a química do sêmen, 1-2
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
gatos, 1-2,
pênis, 1-2
sexo com, 1-2
gêmeos fraternos, 1
gêmeos idênticos, 1-2
gêmeos, 1-2, 3-4
ejaculação, 1-2
fraternos, 1-2, 3-4
idênticos, 1-2
Genet, Jean, 1
genética, 1, 2, 3, 4-5
acne e, 1-2
assexualidade e, 1-2
canibalismo e, 1-2
ejaculação precoce e, 1-2
homossexualidade e, 1-2, 3-4
livre-arbítrio e, 1, 2-3
orgasmo feminino e, 1, 2
religião e, 1-2
suicídio e, 1-2
gerontofilia, 1, 2-3
Gervais, Will, 1
Giannini, James, 1-2
Gide, André, 1-2
Gilbert, Paul, 1
Gilliland, Amy, 1-2
glândula pineal, 1, 2
glândulas sebáceas, 1-2
gônadas, 1-2
gonorreia, 1-2, 3-4
Goodall, Jane, 1, 2
gorilas, 1
pelo, 1-2
pênis, 1
piolhos, 1-2
Gould, Stephen Jay, 1, 2, 3
“Male Nipples and Clitoral Ripples”, 1
Gräfenberg, Ernst, 1
Graham, Cynthia, 1
Grande Salto Adiante, 1
Grandfield, Tracey, 1
gravidez, 1-2
Grécia antiga, 1, 2, 3, 4
suicídio na, 1
grupos de defesa dos direitos dos animais, 1, 2
Guy, William, 1

Hagen, Edward, 1-2


Haggard, Ted, 1
Haines, Duane, 1-2
Hall, G. Staley, 1
Hamilton, Gilbert van Tassel, 1-2
Hamilton, William, 1
Hart, Trevor, 1, 2
Harvard Business School, 1, 2
Harvard University, 1
hebefilia, 1-2
como distúrbio mental, 1-2
homossexualidade e, 1-2
hebreus, 1
hemangiomas, 1
Henning, Kris, 1-2
Herdt, Gilbert, Archives of Sexual Behavior, 1
Hess, Nicole, 1-2
heteroparidade, 1
hindus, 1-2
hiperoralidade, 1-2
hipersexualidade, 1
dano cerebral e, 1-2
epilépticos e, 1-2
hipertricose, 1
hipocampo, 1
hipotálamo, 1
hipótese da ativação, 1-2
“hipótese da baixa velocidade/agressividade elevada”, 1-2
hipótese do monitoramento sobrenatural, 1-2
hipótese do subproduto, 1
Hippocampus, 1
Hitler, Adolf, 1-2, 3-4
HIV, 1, 2, 3, 4, 5
Hodgson, Suzanna, 1
Holmes, Dave, 1, 2
Holocausto, 1, 2, 3, 4
homens:
acne, 1
agressão, 1, 2-3
autofelação, 1-2
ejaculação precoce, 1-2
ereções relacionadas ao sono, 1-2
fantasias masturbatórias, 1-2, 3-4
fetichistas de pé, 1-2
formato do pênis, 1-2
homofobia, 1-2
homossexuais, 1-2
orgasmo, 1, 2, 3
poliamor, 1-2
química do sêmen, 1-2
respostas de “proteção da companheira” em, 1-2
remoção do pelo pubiano, 1-2
riqueza dos, e orgasmo feminino, 1-2
sexônia, 1-2
sexo com meninos adolescentes, 1-2
testículos, 1-2
“homens que fazem sexo com homens” (HSH), 1, 2
homofobia, 1-2, 3, 4-5
como desejo reprimido, 1-2
em pais, 1-2
ereção e, 1-2
pornografia gay e, 1-2
religião e, 1
homonegativismo (termo), 1
homossexualidade, 1-2, 3-4, 5, 6-7, 8-9
adolescente, 1-2, 3-4, 5-6
autodesignações ativo/passivo/versátil, 1-2
autofelação e, 1-2
barebacking, 1-2
cérebro e, 1-2
deficiências na orientação espacial, 1-2
fag hags e, 1-2
fetichismo de pé, 1-2, 3, 4-5
genética e, 1, 2-3
homens e meninos adolescentes, 1-2
homofobia como desejo reprimido, 1-2
masturbação, 1-2, 3-4
nas forças armadas, 1-2, 3
poliamor, 1-2
pornografia, 1-2
preferências de papel sexual, 1-2
previsão em crianças, 1-2
sexônia, 1-2, 3
suicídio e, 1-2, 3-4, 5-6
suicídio de adolescentes, 1-2, 3-4
zoofilia, 1-2
Hong, Lawrence, 1-2
teoria da “sobrevivência dos mais rápidos”, 1-2
Hood, Bruce, SuperSense, 1
Hopkins, Juliet, 1
hormônio folículo-estimulante (HFE), 1-2
hormônio liberador da tireotropina, 1
hormônio luteinizante (HL), 1-2
hormônios, 1, 2, 3, 4, 5
acne e, 1
feminino, 1
HFE e HL no sêmen, 1-2
huteritas, 1

Igreja católica, 1, 2
ilhéus kitavan, 1
imortalidade simbólica, 1-2
imunossupressores, 1
Índia, 1, 2
infantofilia, 1-2
infidelidade, 1, 2, 3-4
mesmo sexo, 1-2
ingestão da placenta, 1
Inglaterra, 1
inibidores seletivos da recaptação da serotonina, 1-2
inseminação, 1, 2, 3
Instruções secretas concernentes à câmara de jade, 1
International Classification of Sleep Disorders, Revised, The, 1
International Journal of Adolescence and Youth, 1
International Journal of Impotence Research, The, 1
internet, 1, 2
pornografia, 1, 2-3, 4
Inventário Beck de Depressão, 1
ioga, 1, 2
Irlanda do Norte, 1, 2, 3
Irlanda, 1, 2, 3, 4
Itália, 1

Jackson, Michael, 1, 2, 3-4, 5-6


Japão, 1, 2, 3-4, 5
Jern, Patrick, 1
jogo de urinação, 1
John, Elton, 1
Johnson, Dominic, 1
Johnson, Virginia, 1
Journal of Abnormal Psychology, 1, 2
Journal of Animal Behavior, 1
Journal of Behavior Therapy and Experimental Psychiatry, 1
Journal of Biology, 1
Journal of Health Psychology, 1
Journal of Research in Personality, 1
Journal of Sex Research, The, 1, 2
Journal of Sexual Medicine, The, 1, 2
Journal of the History of the Neurosciences, 1
judeus, 1, 2, 3
Holocausto e, 1, 2-3, 4-5
ortodoxos, 1

Kahn, Eugen, 1, 2
Kama Sutra, 1
Kellett, Stephen, 1
Kessler, Morris, 1
Kinsey Institute for Sex Research, 1, 2
Kinsey, Alfred, 1, 2, 3, 4, 5, 6
Comportamento sexual no macho humano, 1, 2
Klüver, Heinrich, 1
Koerting, Johanna, 1
Korda, Joanna, 1, 2, 3
“kuru”, 1

Lalumière, Martin, 1-2, 3-4


lang, k.d., 1
Langer, Susanne, 1
Leitenberg, Harold, 1-2
Leonardo da Vinci, 1
lesbianismo, 1, 2
cérebro e, 1-2
infidelidade, 1
masturbação, 1-2
orgasmo, 1-2
pornografia, 1
previsão em crianças, 1-2
sincronia menstrual e, 1-2
Lewis, Jerry Lee, 1
Lion, Ernest, 1, 2
livre-arbítrio, 1, 2, 3-4
cérebro e, 1-2
como ilusão, 1-2
fatores determinísticos, 1-2
genética e, 1, 2-3
Lloyd, Elisabeth, 1, 2
The Case of the Female Orgasm, 1
lobo temporal, 1
Lobo, Stany, 1
lobotomia, 1, 2
Lohr, Bethany, 1
Long, Eddie, 1
Luedecke, Jan, 1-2
Lukianowicz, Narcyz, 1-2

macacos, 1, 2, 3-4
masturbação, 1-2
riso, 1-2
sexo com, 1
macacos-esquilo, canibalismo em, 1-2
Maddow, Rachel, 1
mágoa profunda, 1, 2
no poliamor homossexual, 1-2
Malhotra, Deepak, 1-2
Judgment and Decision Making, 1
mamangabas, 1, 2, 3-4
Mann, Thomas, Morte em Veneza, 1
Martins, Yolanda, 1
Masters e Johnson, 1
Masters, William, 1
masturbação em Procolobusbadius, 1-2
masturbação, 1, 2-3, 4, 5-6, 7-8, 9, 10, 11-12
em adolescentes, 1
em primatas não humanos, 1-2
fantasias, 1-2
homossexualidade e, 1-2, 3-4
orgasmo feminino, 1-2
pública, 1, 2-3
sexônia, 1-2
McClanahan, Rue, 1
McClintock, Martha, 1
McIntyre, Matthew, 1
Medical Hypotheses, 1
Medicine, Science, and the Law, 1
Meier, Brian, 1, 2
Meiwes, Armin, 1-2
melatonina, 1
memória, 1, 2, 3
meninas adolescentes como megeras, 1-2
menstruação, 1-2
feromônios e, 1-2
sincronia, 1-2
Meston, Cindy, 1
México, 1
Meyer, Martin, 1
Michelangelo, 1, 2, 3
Miletski, Hani, 1
Millay, Edna St. Vincent, 1
Millican, Frances, 1
monogamia, 1
Montel Williams Show, The, 1
morte, 1,-2, 3
ansiedade, 1
imortalidade simbólica, 1-2
indústria, 1
práticas de sepultamento, 1-2
produtos químicos embalsamadores, 1
síndrome de Cotard, 1
suicídio, 1-2
muçulmanos, 1-2
mulheres:
acne, 1
agressão, 1-2
assexuadas, 1, 2-3
atividade genital noturna, 1
autocunilíngua, 1-2
efeitos antidepressivos do sêmen, 1-2
ejaculação feminina, 1-2
fag hags, 1-2
fantasias masturbatórias, 1-2
orgasmo, 1, 2-3, 4-5, 6-7, 8-9
química do sêmen e, 1-2
remoção do pelo pubiano, 1-2
saúde pós-menopausa, 1-2
sexônia, 1, 2, 3
sincronia menstrual, 1-2
Mullally, Megan, 1
Murray, Craig, 1
Muscarella, Frank, “teoria da formação de aliança”, 1-2
músculo cremastérico, 1-2
músculo pubococcígeo, 1

Nabokov, Vladimir, Lolita, 1


nádegas, 1
narcisismo, 1-2
National Galleries, Escócia, 1
neandertais, 1
necrofilia, 1-2
Nerve, revista, 1
Nettle, Daniel, 1
neuroanatomia, 1-2
neuroepilépticos, 1
neurotransmissores, 1
New Scientist, 1
New York Times, 1
New York, revista, 1
Nicholas, Saint, 1
Norenzayan, Ara, 1-2
Nova Zelândia, 1, 2
Nursing Inquiry, 1

Oceania, 1
ocorrências noturnas:
crises convulsivas, 1
sexo, 1, 2, 3-4
sexônia, 1-2
tumefação peniana noturna (TPN), 1-2
olho, 1
Olry, Régis, 1-2
orangotango, 1-2
pênis, 1-2
orgasmo feminino, 1, 2-3, 4-5, 6-7
genética e, 1, 2
lésbico, 1
masturbatório, 1-2
renda do homem e, 1-2
retenção do esperma e, 1
orgasmo, 1-2, 3, 4, 5
através da penetração vaginal, 1
efeito de “sedação” do, 1-2
falta de, 1
feminino, 1, 2-3, 4, 5-6, 7-8
masculino, 1, 2, 3
masturbação, 1, 2, 3
orientação erótica de idade, 1-2
Orland, Frank, 1
ovários, 1, 2
ovulação, 1-2
induzida, 1
oculta, 1
óvulo:
fertilização, 1, 2, 3, 4, 5
liberação, 1-2
oxitocina, 1

pais, homofobia em, 1-2


Panksepp, Jaak, 1-2
Papua Nova Guiné, tribos da, 1, 2, 3-4, 5-6
canibalismo, 1
rituais de ingestão de sêmen, 1-2
Paraguai, 1, 2, 3
Parasitas, 1-2, 3
pares assexuados, 1
paternidade, 1-2, 3
equivocada, 1
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
pedofilia, 1, 2, 3-4
como distúrbio mental, 1-2
dano cerebral e, 1-2
homossexualidade e, 1-2
podofílica, 1
pele, 1
acne, 1-2
pelo pubiano, 1-2
evolução, 1-2
feromônios e, 1
piolhos, 1-2
raspagem, 1-2
textura e composição, 1-2
pênis, 1, 2
aresta coronal, 1, 2, 3-4, 5-6, 7-8
autofelação, 1-2
circuncidado, 1-2
ejaculação precoce, 1-2
ereções, 1, 2, 3-4, 5, 6-7, 8
ereções relacionadas ao sono, 1-2
evolução, 1-2
formato, 1-2
glande, 1, 2, 3-4, 5
haste, 1, 2, 3-4
não circuncidado, 1
pós-ejaculação, 1-2
prepúcio, 1-2
resposta a crianças, 1-2
tamanho, 1
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
testagem do, 1, 2-3
vagina penetrada por, 1-2, 3, 4, 5-6
penis cerebri, 1
People for the Ethical Treatment of Animals, 1
Personality and Social Psychology Bulletin, 1
Petrinovich, Lewis, 1-2
The Cannibal Within, 1
piolhos, 1-2
Platão, 1
Platek, Steven, 1
pletismógrafo peniano, 1, 2
podofilia, 1-2
Polanski, Roman, 1
poliamor, 1-2
Comunidade Oneida, 1
evolução e, 1-2
homossexualidade, 1-2
Pollet, Thomas, 1
poluções noturnas, 1, 2
ponto G, 1
pornografia, 1-2
criança, 1-2
gay do sexo masculino, 1-2
heterossexual, 1
internet, 1, 2-3, 4
lésbica, 1
Poucher, George, 1
Poulin, Robert, 1
Pradhan, Sunil, 1
práticas de sepultamento, 1-2
cremação, 1-2
enterro verde, 1-2
imortalidade simbólica, 1-2
sepultamento sob árvore específica, 1-2
práticas sexuais seguras, 1
Prause, Nicole, 1, 2
predação, 1, 2, 3
pré-eclâmpsia, 1-2
preferências de papel sexual, 1-2
autodesignações ativo/passivo/versátil, 1-2
homossexuais, 1-2
pré-homossexualidade, 1-2
crianças, 1-2
genética e, 1, 2
preservativos, 1, 2
Presley, Elvis, 1
Presley, Lisa Marie, 1
Pretty Baby – Menina bonita, 1
princípio da desvantagem, 1-2
produção de sebo, 1-2, 3-4
prolactina, 1
prostituição, 1, 2, 3, 4-5
piolhos pubianos, 1-2
proteína, feto abortado como fonte de, 1
Proust, Marcel, 1
psiquiatria, 1, 2, 3
autofelação e, 1-2
freudiana, 1, 2, 3
hebefilia e, 1-2
Psychoanalytic Review, 1, 2
Psychological Reports, 1
Psychological Review, 1
Psychological Science, 1, 2
puberdade, 1, 2
precoce, 1-2

Rahman, Qazi, 1, 2
ratos, 1-2
riso, 1-2
refluxo, 1
Reforma Protestante, 1
Rekers, Eddie, 1
religião, 1-2
cristianismo, 1-2
evolução e, 1-2
genética e, 1-2
hipótese do monitoramento sobrenatural, 1-2
homofobia motivada pela, 1
práticas de sepultamento, 1-2
reprodução e, 1-2
reprodução, como imperativo de Deus, 1-2
resos, 1, 2
cérebro, 1
sexo, 1-2
Rétif de la Bretonne, 1
Monsieur Nicolas, 1
retifism, 1
Rhodes, Katherine, 1-2
riqueza e orgasmo feminino, 1-2
riso, 1-2
alegre, 1-2, 3
cérebro e, 1-2
como um sinal social, 1-2
de escárnio, 1, 2
de primatas não humanos, 1-2
do infortúnio alheio, 1-2, 3
humano, 1-2
por cócegas, 1, 2
Roma, antiga, 1
suicídio na, 1-2
Rússia, canibalismo na, 1

Sacks, Oliver, 1
“sacudidela peniana”, 1
Sagarin, Brad, 1
Sagawa, Issei, 1
sâmbias, rituais de ingestão de sêmen dos, 1-2
Sammis, Becky, 1
sangue, 1
vasos, 1
São Francisco, 1
Sartre, Jean-Paul, Entre quatro paredes, 1
Saturday Night Live, 1
Savage, Dan, 1
Schenck, Carlos, 1, 2
Schooler, Jonathan, 1-2
Science, 1
Segunda Guerra Mundial, 1
Segura a onda, 1-2
seios, 1
seleção de parentesco, 1
seleção natural, 1, 2-3, 4, 5-6, 7-8, 9, 10, 11, 12
sêmen, 1-2, 3
efeitos antidepressivos do, 1-2
ejaculação precoce, 1-2
evolução, 1-2
felicidade e, 1
hormônios HFE e HL no, 1-2
ingestão oral de, 1, 2-3
química, 1-2
rituais de ingestão, 1-2
teoria do desalojamento, 1-2
sepultamento sob árvore específica, 1-2
serotonina, 1
Sex Roles, 1
sexo anal, 1-2, 3, 4, 5, 6
barebacking, 1-2
desprotegido, 1-2
pornografia masculina gay, 1-2
preferências de papel sexual, 1-2
sexônia, 1, 2
termos de gíria, 1
sexo interespecífico, 1-2
sexo oral ver cunilíngua; felação
sexo, 1, 2-3
ausência de desejo, 1-2
autofelação, 1-2
de grupo, 1-2, 3
ejaculação feminina, 1-2
ejaculação precoce, 1-2
empatia e, 1-2
fantasias durante, 1-2
interespecífico, 1-2
noturno, 1, 2, 3-4
orientação erótica de idade, 1-2
ovulação induzida durante, 1-2
poliamor, 1-2
química do sêmen e, 1-2
relacionado ao sono, 1-2
retração dos testículos durante, 1, 2-3
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
vagina penetrada por pênis, 1-2, 3, 4-5, 6
vigoroso, 1-2
ver também tipos específicos de sexo
sexônia, 1-2
estupro, 1, 2
homossexualidade, 1-2, 3
sonambulismo e, 1-2
Shackelford, Todd, 1-2, 3
Shaffer, Peter, Equus, 1
shakers, 1
Shakespeare, William, 1
Hamlet, 1
Shapiro, Colin, 1
Shariff, Azim, 1
Shields, Brooke, 1
Shneidman, Edwin, 1
sífilis, 1-2
síndrome de Cotard, 1
síndrome de Klüver-Bucy, 1-2
síndrome de Turner, 1
Singer, Peter, 1-2, 3
sistema límbico, 1
Smith, John Maynard, 1
Sociedade Francesa de Pesquisa do Sono, 1
Sociological Review, The, 1
sonambulismo, 1
sexônia e, 1-2
sonhos molhados, 1, 2
sono REM, 1, 2, 3, 4
sono, 1-2
ereções durante, 1-2
REM, 1, 2, 3, 4
sexônia, 1-2
Spaulding, Jean, 1
St. Clair, Margaret, To Serve Man: A Cookbook for People, 1
Starin, E.D., 1-2
Stekel, Wilhelm, 1
Suécia, 1
Suíça, 1-2
Suicide and Life-Threatening Behavior, 1-2
suicídio adaptativo, 1-2, 3
suicídio, 1-2
adaptativo, 1-2, 3
afeto negativo e, 1-2
animais não humanos, 1-2, 3-4
autoconsciência elevada e, 1-2
baixa autoestima e, 1-2
cérebro e, 1-2
desinibição comportamental e, 1-2
desconstrução cognitiva e, 1-2
em adolescentes gays, 1-2, 3-4
em culturas primitivas, 1-2
evolução e, 1-2
genética e, 1-2
homossexualidade e, 1-2, 3-4, 5-6
métodos, 1-2
prisão, 1-2
padrões exorbitantes e, 1-2
teoria da fuga, 1-2
Sulzberger, Marion, 1
Supergatas, 1
Swerdlow, Russell, 1
Symons, Donald, 1, 2, 3
Szameitat, Diana, 1

taoismo, 1
teleiofilia, 1, 2-3
televisão, 1, 2
fag hags na, 1, 2-3
Temerlin, Maurice, Lucy: Growing Up Human, 1
temperatura, 1
esperma, 1, 2-3
testículos, 1, 2-3
teoria da formação de aliança, 1-2
teoria de desalojamento do sêmen, 1-2
testagem falométrica, 1-2, 3
Teste de Associação Implícita, 1
teste do autorreconhecimento no espelho, 1-2
Testemunhas de Jeová, 1-2
testículos, 1-2, 3, 4
assimetrias, 1-2
descidos, 1-2
dor, 1, 2-3
evolução, 1-2
ferimentos, 1, 2-3
hipótese da ativação, 1-2
reflexo cremastérico e, 1-2
retração durante excitação sexual, 1, 2-3
temperatura, 1, 2-3
testosterona, 1, 2, 3
Thornhill, Randy, 1
Tiggemann, Marika, 1
“Tlem”, 1
“Tleo”, 1
travestismo, 1-2
Trivers, Robert, 1
trompas de falópio, 1
Trust for Natural Legacies, 1

Universidade Flinders, 1
University College, London, 1-2
urofagia, 1
útero, 1-2
orgasmo feminino e, 1

vagina, 1, 2, 3, 4
administração de drogas via, 1-2
ejaculação feminina, 1-2
lubrificação, 1-2
penetrada por pênis, 1-2, 3-4, 5-6, 7
química do sêmen e, 1-2
teoria do desalojamento do sêmen, 1-2
Vallacher, Robin, 1
van Orden, Kimberly, 1, 2, 3
van Diemerbroeck, Isbrand, 1
ventrículos, 1
View, The, 1
virgindade, 1, 2
vitiligo, 1-2
Vohs, Kathleen, 1-2
voyeurismo, 1
vulva, 1
vulva cerebri, 1

Walsh, Seth, 1
Warhol, Andy, 1
Warner, Dan, 1, 2
Wegner, Daniel, 1
Weinberg, Martin, 1, 2-3, 4
Weiss, Robin, 1, 2-3
Wilde, Oscar, 1-2, 3, 4
Will & Grace, 1
Williams, Colin, 1
Willis, Thomas, 1
Winslow, Jacques-Bénigne, 1-2
Wright, Lester, Jr., 1

Zaidens, Sadie, 1
Zander, Thomas, 1
zoofilia, 1-2
evolução e, 1-2
homossexual, 1-2
Zucker, Kenneth, 1-2
Título original:
Why Is the Penis Shaped Like That?
(…And Other Reflections on Being Human)

Tradução autorizada da primeira edição americana,


publicada em 2012 por Scientific American/Farrar, Straus and Giroux,
um selo da Farrar, Straus and Giroux, de Nova York, Estados Unidos

Copyright © 2012, Jesse Bering

Copyright da edição brasileira © 2013:


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A reprodução não autorizada desta publicação, no todo
ou em parte, constitui violação de direitos autorais. (Lei 9.610/98)

Grafia atualizada respeitando o novo


Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa

A maioria dos ensaios neste livro apareceu primeiro na Scientific American, como colunas on-line e
em versões diferentes. Os ensaios “Tão perto e tão longe: a contorcida história da autofelação”, “A
história natural do canibalismo”, “Devassos por natureza:quando um dano cerebral torna pessoas
muito, muito despudoradas” e “Como o cérebro adquiriu suas nádegas: travessura medieval em
neuroanatomia” foram publicados originalmente na Slate, em versões diferentes.

Preparação: Diogo Henriques | Revisão: Eduardo Farias, Clarice Goulart


Indexação: Nelly Praça | Capa: Bruna Benvegnù
Foto da capa: © Elliott Erwitt/Magnum Photos/Latinstock

Edição digital: janeiro 2013

ISBN: 978-85-378-1036-1

Arquivo ePub produzido pela Simplíssimo Livros

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