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assim, reconheço uma dificuldade em não vê-los como instrumentos de uma força maior,
colega de cartel Vicente a um ator japonês que, ao falar sobre o objetivo da encenação, dizia
que, quando um ator aponta para a lua, ele não almeja que o público enxergue seu gesto, mas
sim que mirem para onde ele está apontando. É disso que falo quando me refiro ao artista
assemelha-se com seu real cotidiano por vezes árduo, disciplinado e até mesmo burocrático.
materiais desses momentos, a maior parte deles, inacabados. Foi então que nas últimas
semanas, por razões sobre as quais eu só poderia disparar hipóteses vagas, veio-me um
"subversão do sujeito e dialética do desejo" quando este nos provoca ao indicar que, diante do
intimidador papel em branco, o autor, suposto soberano de sua escrita, revela-se como dejeto
desta. Da intimidação passo então a uma escrita já engrenada, como apenas o tempo e muitas
linhas me deram a oportunidade de deixar, aos poucos, a preocupação do estilo de lado, para
para o processo, dou-me conta que tratava-se de um conto que nascia diante de mim. E então,
acontece.
Uma parada.
Encerrou-se.
Como dizer?
escrever encerrou-se com a mesma naturalidade que, sem pensar, um olho pisca - "olho de
peixe" é o nome do conto que nasceu. Dei-me conta de que estava diante de algo inédito. Até
então fora acometido, como disse, por muitos momentos de efervescência criativa, que
daqueles em que tudo precisa ter um motivo para ali estar. Desta vez foi diferente. Senti-me um
instrumento, como que colocado de lado após seu uso. Ao escrever este pequeno texto,
livro Império dos signos. Ele nos lembra que essa modalidade poética, se assim posso dizer,
não é, como pensam alguns, a arte de condensar inúmeras camadas semânticas em poucas
palavras, mas sim a de fazer cessar o jorro das palavras que nos povoam. Fazer a palavra
A cada linha sobre essa experiência sinto-me, naturalmente, afastando-me dela. Quem
sabe ainda virão melhores formas de dizê-la. Mas por agora fico na seguinte questão, que em
nada pretende esgarçar os conceitos estabelecidos nas artes, mas apenas isto: se partimos,
pela experiência dos efeitos da psicanálise, da perspectiva de que as palavras tocam e fazem
um corpo, por que não dizer que a literatura é uma das artes do corpo? A psicanálise é uma
literatura no corpo?
13/08/2021