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CURSO DE LICENCIATURA EM ENSINO DE

PORTUGUÊS

MANUAL DE SOCIOLINGUÍSTICA

ENSINO ONLINE. ENSINO COM FUTURO 2022


CURSO DE LICENCIATURA EM ENSINO DE
PORTUGUÊS

MANUAL DE SOCIOLINGUÍSTICA

1º ANO

CÓDIGO

TOTAL HORAS/1º SEMESTRE 150

CRÉDITOS (SNATCA) 6

NÚMERO DE TEMAS 6
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

Direitos de autor (copyright)

Este manual é propriedade da Universidade Aberta ISCED (UnISCED), e contém reservados todos os
direitos. É proibida a duplicação ou reprodução parcial ou total deste manual, sob quaisquer formas
ou por quaisquer meios (electrónicos, mecânico, gravação, fotocópia ou outros), sem permissão
expressa de entidade editora Universidade Aberta ISCED (UnISCED).

A não observância do acima estipulado o infractor é passível a aplicação de processos judiciais em


vigor na República de Moçambique.

UNIVERSIDADE ABERTA ISCED


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Beira - Moçambique
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UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

Agradecimentos

A Universidade Aberta ISCED endereça os seus agradecimentos às seguintes individualidades e


instituições na produção deste manual:

Autor Pascoal Guiloviça

Coordenação Vice-reitoria para área académica da UnISCED

Design Universidade Aberta ISCED

Financiamento e Instituto Africano de Promoção da Educação à Distância (IAPED)


Logística
Faculdade de Ciências de Educação

Revisão Científica e
2021
Linguística
2022
Ano de Publicação
UnISCED – BEIRA
Ano de actualizaão

Local de Publicação
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

Visão geral

Benvindo ao Módulo de Sociolinguística

Objectivos do módulo

▪ Reconhecer a importância da Sociolinguística para o ensino de


línguas;
▪ Compreender a relação entre língua e cultura;
▪ Compreender os fenómenos de variação linguística e as distinções
entre língua e dialecto, registos, estilo, acento, pidgin e crioulo;
▪ Analisar as causas da mudança linguística, a resistência à mudança e
identificar as mudanças conscientes e inconscientes de uma dada
língua;
▪ Reconhecer os mecanismos linguísticos de expressão de poder no
discurso oral e escrito;
▪ Analisar fenómenos de relação entre língua e identidade;
▪ Desenvolver uma visão crítica sobre as políticas linguísticas no mundo
em geral e, em Moçambique, em particular;
▪ Planificar aulas e actividades tendo em conta a teoria de visão da
realidade para enriquecer os objectivos pedagógicos de uma aula de
língua (Objectivo sociocultural).

Quem deveria estudar este Módulo?

Páginas introdutórias
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística


▪ Um índice completo.
▪ Uma visão geral detalhada dos conteúdos do módulo, resumindo os aspectos-
chave que você precisa conhecer para melhor estudar. Recomendamos vivamente que
leia esta secção com atenção ção antes de começar o seu estudo, como componente de
habilidades de estudos.
Conteúdo deste módulo

Este módulo está estruturado em temas. Cada tema, por sua vez
comporta certo número de unidades temáticas ou simplesmente
unidades, cada unidade temática se caracteriza por conter uma
introdução, objectivos, conteúdos.
No final de cada unidade temática ou do próprio tema, são incorporados
antes o sumário, exercícios de auto-avaliação, só depois é que aparecem
os exercícios de avaliação.
Os exercícios de avaliação têm as seguintes características: puros
exercícios teóricos/práticos e actividades práticas.
Outros recursos

A equipa dos académicos e pedagogos da UnISCED, pensando em si, num


cantinho, recóndito deste nosso vasto Moçambique e cheio de dúvidas e
limitações no seu processo de aprendizagem, apresenta uma lista de
recursos didácticos adicionais ao seu módulo para você explorar. Para tal,
o ISCED disponibiliza na biblioteca virtual mais material de estudos
relacionado com o seu curso como: Livros e/ou módulos, CD, CD-ROOM,
DVD. Para além deste material físico ou electrónico disponível na
biblioteca, pode ter acesso a Plataforma digital moodle para alargar mais
ainda as possibilidades dos seus estudos.
Auto-avaliação e Tarefas de avaliação

As Tarefas de auto-avaliação para este módulo encontram-se no final de cada


unidade temática e de cada tema. As tarefas dos exercícios de auto-avaliação
apresentam duas características: primeiro apresentam exercícios resolvidos com
detalhes. Segundo, exercícios que mostram apenas respostas.
Tarefas de avaliação devem ser semelhantes às de auto-avaliação mas sem
mostrar os passos e devem obedecer o grau crescente de dificuldades do processo
de aprendizagem, umas a seguir a outras. Parte das tarefas de avaliação será
objecto dos trabalhos de campo a serem entregues aos tutores/docentes para
efeitos de correcção e subsequentemente nota. Também constará do exame do
fim do módulo. Pelo que, caro estudante, fazer todos os exercícios de avaliação é
uma grande vantagem.
Comentários e sugestões
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

Use este espaço para dar sugestões valiosas, sobre determinados aspectos, quer
de natureza científica, quer de natureza didáctico-Pedagógica, etc, sobre como
deveriam ser ou estar apresentadas. Pode ser que graças as suas observações que,
em gozo de confiança, classificamo-las de úteis, o próximo módulo venha a ser
melhorado.

Este Módulo, de Sociolinguística, foi concebido para estudantes do 3º ano do


curso de Licenciatura em Ensino de Português. Contudo, poderá haver casos
de leitores que queiram actualizar e consolidar seus conhecimentos nessa
disciplina, esses serão bem-vindos, não sendo necessário para tal se
inscrever. Mas poderão adquirir o manual.

Como está estruturado este módulo

Este módulo, de Sociolinguística, para estudantes do 3º ano do curso de


Licenciatura em Ensino de Português, à semelhança dos restantes do ISCED,
está estruturado assim:

Ícones de actividade

Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas margens das
folhas. Estes ícones servem para identificar diferentes partes do processo de
aprendizagem. Podem indicar uma parcela específica de texto, uma nova
actividade ou tarefa, uma mudança de actividade, etc.

Habilidades de estudo

O principal objectivo deste campo é o de ensinar aprender a aprender.


Aprender aprende-se.

Durante a formação e desenvolvimento de competências, para facilitar a


aprendizagem e alcançar melhores resultados, implicará empenho, dedicação
e disciplina no estudo. Isto é, os bons resultados apenas se conseguem com
estratégias eficientes e eficazes. Por isso é importante saber como, onde e
quando estudar. Apresentamos algumas sugestões com as quais esperamos
que caro estudante possa rentabilizar o tempo dedicado aos estudos,
procedendo como se segue:

1º Praticar a leitura. Aprender a Distância exige alto domínio de leitura.

2º Fazer leitura diagonal aos conteúdos (leitura corrida).

3º Voltar a fazer leitura, desta vez para a compreensão e assimilação crítica dos
conteúdos (ESTUDAR).

4º Fazer seminário (debate em grupos), para comprovar se a sua aprendizagem


confere ou não com a dos colegas e com o padrão.
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5º Fazer TC (Trabalho de Campo), algumas actividades práticas ou as de estudo


de caso se existirem.

IMPORTANTE: Em observância ao triângulo modo-espaço-tempo,


respectivamente como, onde e quando...estudar, como foi referido no início
deste item, antes de organizar os seus momentos de estudo reflicta sobre o
ambiente de estudo que seria ideal para si: Estudo melhor em
casa/biblioteca/café/outro lugar? Estudo melhor à noite/de manhã/de
tarde/fins-de-semana/ao longo da semana? Estudo melhor com música/num
sítio sossegado/num sítio barulhento!? Preciso de intervalo em cada 30
minutos, em cada hora, etc.

É impossível estudar numa noite tudo o que devia ter sido estudado durante
um determinado período de tempo; Deve estudar cada ponto da matéria em
profundidade e passar só ao seguinte quando achar que já domina bem o
anterior.

Privilegia-se saber bem (com profundidade), o pouco que puder ler e estudar,
que saber tudo superficialmente! Mas a melhor opção é juntar o útil ao
agradável: saber com profundidade todos conteúdos de cada tema, no
módulo.

Dica importante: não recomendamos estudar seguidamente por tempo


superior a uma hora. Estudar por tempo de uma hora intercalado por 10 (dez)
a 15 (quinze) minutos de descanso (chama-se descanso à mudança de
actividades). Ou seja que durante o intervalo não se continuar a tratar dos
mesmos assuntos das actividades obrigatórias.

Uma longa exposição aos estudos ou ao trabalho intelectual obrigatório, pode


conduzir ao efeito contrário: baixar o rendimento da aprendizagem. Por que o
estudante acumula um elevado volume de trabalho, em termos de estudos,
em pouco tempo, criando interferência entre os conhecimentos, perde
sequência lógica, por fim ao perceber que estuda tanto mas não aprende, cai
em insegurança, depressão e desespero, por se achar injustamente incapaz!

Não estude na última da hora; quando se trate de fazer alguma avaliação.


Aprenda a ser estudante de facto (aquele que estuda sistematicamente), não
estudar apenas para responder a questões de alguma avaliação, mas sim
estude para a vida, sobre tudo, estude pensando na sua utilidade como futuro
profissional, na área em que está a se formar.

Organize na sua agenda um horário onde define a que horas e que matérias
deve estudar durante a semana; Face ao tempo livre que resta, deve decidir
como o utilizar produtivamente, decidindo quanto tempo será dedicado ao
estudo e a outras actividades.

É importante identificar as ideias principais de um texto, pois será uma


necessidade para o estudo das diversas matérias que compõem o curso: A
colocação de notas nas margens pode ajudar a estruturar a matéria de modo
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que seja mais fácil identificar as partes que está a estudar e pode escrever
conclusões, exemplos, vantagens, definições, datas, nomes, pode também
utilizar a margem para colocar comentários seus relacionados com o que está
a ler; a melhor altura para sublinhar é imediatamente a seguir à compreensão
do texto e não depois de uma primeira leitura; Utilizar o dicionário sempre
que surja um conceito cujo significado não conhece ou não lhe é familiar;

Precisa de apoio?

Caro estudante, temos a certeza que por uma ou por outra razão, o material
de estudos impresso, lhe pode suscitar algumas dúvidas como falta de clareza,
alguns erros de concordância, prováveis erros ortográficos, falta de clareza,
fraca visibilidade, página trocada ou invertidas, etc.). Nestes casos, contacte
os serviços de atendimento e apoio ao estudante do seu Centro de Recursos
(CR), via telefone, sms, E-mail, se tiver tempo, escreva mesmo uma carta
participando a preocupação.
Uma das atribuições dos Gestores dos CR e seus assistentes (Pedagógico e
Administrativo), é a de monitorar e garantir a sua aprendizagem com
qualidade e sucesso. Dai a relevância da comunicação no Ensino a Distância
(EAD), onde o recurso as TIC se torna incontornável: entre estudantes,
estudante – Tutor, estudante – CR, etc.
As sessões presenciais são um momento em que você caro estudante, tem a
oportunidade de interagir fisicamente com staff do seu CR, com tutores ou
com parte da equipa central da UnISCED indigetada para acompanhar as sua
sessões presenciais. Neste período pode apresentar dúvidas, tratar assuntos
de natureza pedagógica e/ou administrativa.
O estudo em grupo, que está estimado para ocupar cerca de 30% do tempo
de estudos a distância, é muita importância, na medida em que permite lhe
situar, em termos do grau de aprendizagem com relação aos outros colegas.
Desta maneira ficará a saber se precisa de apoio ou precisa de apoiar aos
colegas. Desenvolver hábito de debater assuntos relacionados com os
conteúdos programáticos, constantes nos diferentes temas e unidade
temática, no módulo.

Tarefas (avaliação e auto-avaliação)

O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades e


auto−avaliação), contudo nem todas deverão ser entregues, mas é
importante que sejam realizadas. As tarefas devem ser entregues duas
semanas antes das sessões presenciais seguintes.
Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não cumprimento
dos prazos de entrega, implica a não classificação do estudante. Tenha
sempre presente que a nota dos trabalhos de campo conta e é decisiva para
ser admitido ao exame final da disciplina/módulo.
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Os trabalhos devem ser entregues ao Centro de Recursos (CR) e os mesmos


devem ser dirigidos ao tutor/docente.
Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa, contudo os
mesmos devem ser devidamente referenciados, respeitando os direitos do
autor.
O plágio1 é uma violação do direito intelectual do(s) autor(es). Uma
transcrição à letra de mais de 8 (oito) palavras do texto de um autor, sem o
citar é considerada plágio. A honestidade, humildade científica e o respeito
pelos direitos autoriais devem caracterizar a realização dos trabalhos e seu
autor (estudante da UnISCED).

Avaliação

Muitos perguntam: Com é possível avaliar estudantes à distância, estando


eles fisicamente separados e muito distantes do docente/turor!? Nós
dissemos: Sim é muito possível, talvez seja uma avaliação mais fiável e
consistente.
Você será avaliado durante os estudos à distância que contam com um
mínimo de 90% do total de tempo que precisa de estudar os conteúdos do
seu módulo. Quando o tempo de contacto presencial conta com um máximo
de 10%) do total de tempo do módulo. A avaliação do estudante consta
detalhada do regulamentada de avaliação.
Os trabalhos de campo por si realizados, durante estudos e aprendizagem no
campo, pesam 40% e servem para a nota de frequência para ir aos exames.
Os exames são realizados no final da cadeira disciplina ou modulo e decorrem
durante as sessões presenciais. Os exames pesam no mínimo 60%, o que
adicionado aos 40% da média de frequência, determinam a nota final com a
qual o estudante conclui a cadeira.
A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de conclusão da cadeira.
Nesta cadeira o estudante deverá realizar pelo menos 3 avaliações e 1 (um)
(exame).
Algumas actividades práticas, relatórios e reflexões serão utilizados como
ferramentas de avaliação formativa.
Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em
consideração a apresentação, a coerência textual, o grau de cientificidade, a
forma de conclusão dos assuntos, as recomendações, a identificação das
referências bibliográficas utilizadas, o respeito pelos direitos do autor, entre
outros.

1
Plágio - copiar ou assinar parcial ou totalmente uma obra literária, propriedade intelectual de outras pessoas, sem
prévia autorização.
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Os objectivos e critérios de avaliação constam do Regulamento de Avaliação


da UnISCED.

LISTA DE ACRÓNIMOS E SIGLAS

BSL - Língua Britânica de Sinais

INDE - Instituto Nacional de Desenvolvimento da Educação

LM's - Língua Moçambicanas

LP - Língua Portuguesa

LSF - Língua Francesa de Sinais

LSF - Língua de Sinais Francesa

ASL- Língua de Sinais Americana língua brasileira de sinais

LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais

LSM - Língua de Sinais Mexicana

LSV - Língua de Sinais Venezuelana

LIS - Língua de Sinais Italiana IRSL

IRSL- Língua de Sinais da Irlanda

LSCH - Língua de Sinais Chilena

LSE - Língua de Sinais Espanhola

LSC - Língua de Sinais Catalã


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NZSL - Língua de Sinais de Nova Zelandia

MINEDH - Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano

NPE - Norma –Padrão Europeia

NIRSL - Língua de Sinais da Irlanda do Norte

PB - Português Brasileiro

PE - Português Europeu

PL - Política Linguística

PL - Planificação Linguística

PM - Português de Moçambique

TEMA I : OBJECTO DE ESTUDO DA SOCIOLINGUÍSTICA

Introdução

Estimado estudante, na disciplina de Linguística Geral – I você aprendeu


conteúdos relacionados com a sociolinguística superficialmente. Nesta
disciplina de sociolinguística certos conteúdos serão aprofundados.

Ao completar esta unidade, você deverá ser capaz de:

▪ Identificar o objecto de estudo da Sociolinguística;


Objectivos ▪ Identificar as fases por que a Sociolinguística percorreu;
Específicos ▪ Caracterizar as fases da Sociolinguística;
▪ Caracterizar o objecto de estudo da Sociolinguística.

1.1. Percurso histórico da Sociolinguística

Segundo Alkmim (2003) a relação entre linguagem e sociedade é


inquestionável e a base da constituição do ser humano. Não deveria,
então, esta relação estar ausente das reflexões sobre o fenómeno
linguístico. No entanto, como você deve lembrar, baseado nos
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estudos feitos anteriormente em linguística, nem sempre a questão


da natureza social da linguagem foi levada em conta.
Devemos sempre ter bem claro que as concepções de linguagem que
nortearam os estudos linguísticos são fruto do momento científico e
da tradição cultural dos
linguistas ou pesquisadores. Assim, foi com a concepção que
Schleicher atribuiu à língua, o que colocava a Linguística no campo
das ciências naturais, até mesmo pela formação do estudioso. Para
ele, a linguagem era vista como um organismo natural, ao qual se
aplicava o conceito de evolução desenvolvido por Darwin, ou seja, o
desenvolvimento da linguagem era comparável ao de uma planta que
nasce, cresce e morre de acordo com as leis físicas. Para ele, ainda, a
língua era o critério mais adequado para se proceder a classificação
racial da humanidade, uma vez que a diversidade das línguas
dependeria da diversidade dos cérebros e dos aparelhos fona- dores
dos homens, de acordo com suas raças.
Em função da orientação biologizante que Scheicher atribuiu à
linguística, esta disciplina foi afastada de toda consideração de ordem
social e cultural no trato do fenómeno linguístico.

Mesmo sendo reconhecida, a relação entre linguagem e sociedade nem


sempre foi assumida como determinante, pois havia a necessidade de
determinação do objecto da Linguística. Ao falarmos em determinação
do objecto de estudo da Linguística, estamos fazendo uma referência
directa ao trabalho de Saussure, ou seja, ao estruturalismo. Você deve
lembrar, aqui, dos estudos do mestre genebrino que definiu o objecto de
estudos da disciplina, dando à mesma o carácter de cientificidade que
até então não lhe era conferido. É importante ressaltarmos que, para o
pai da Linguística Moderna, deveria ser excluída toda consideração de
natureza social, histórica e cultural na observação, descrição, análise e
interpretação do fenómeno linguístico. É necessário lembrar que, para o
autor, a língua é o sistema subjacente à actividade da fala, ou seja, é o
sistema invariante que pode ser abstraído das múltiplas variações
observáveis da fala. Como podemos verificar, Saussure privilegia o
carácter formal e estrutural do fenómeno linguístico afastando dele toda
a variação proveniente da fala, ou, mais precisamente, do falante.
Outro estudioso da linguagem, Meillet, que foi aluno de Saussure,
localizava a Linguística entre as ciências sociais, sendo que, para ele,
todo o facto de língua manifestava um facto de civilização. Vê-se,
então, que esse linguista reconhecia na linguagem um carácter social,
o que para ele se mostrava como uma constatação clara.
Já, em Bakhtin, vemos expressa em sua teoria a noção de
comunicação social. Para ele, a língua abrangia a heterogeneidade
concreta da fala, de onde vem que a linguagem é uma criação
colectiva, parte de um diálogo cumulativo entre o eu e o outro.
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Jakobson, por sua vez, privilegia o processo comunicativo amplo,


privilegiando, também, os aspectos funcionais da linguagem. É desse
autor o famoso esquema da comunicação (remetente, mensagem,
canal, código, destinatário, contexto) que determina as funções da
linguagem.
Importa lembrarmos que para Benveniste é dentro da e pela língua que o
individuo e a sociedade se determinam mutuamente uma vez que os dois
só ganham existência pela língua. O autor salienta que a língua contém a
sociedade e por isso é o interpenetrante da sociedade. Assim, ele articula a
questão da língua e sociedade no plano geral da construção do ser humano
e, particularmente, no plano das relações concretas e contingentes
estabelecidas na vida social.

1.1.1. A fixação do campo de estudos da Sociolinguística

A sociolinguística deve demonstrar a co-variação sistemática das


variações linguística e social, relacionar as variações linguísticas
observáveis em uma comunidade às diferenciações existentes na
estrutura social desta mesma sociedade. O objecto da
sociolinguística, portanto, é estudar a diversidade linguística.

Para o bom desenvolvimento dos estudos sobre a diversidade


linguística é identificado um conjunto de factores definidos, com os
quais se supõe que a diversidade linguística esteja relacionada, a
saber:
a) Identidade social do emissor ou do falante; é sabido que o
status do falante exige dele também um cuidado com a linguagem.
Com as devidas ressalvas, pode-se afirmar que cada posição social
tem sua linguagem, afinal, percebemos essa variação no contacto
entre as pessoas.
Nesse tópico são objectos de estudo os dialectos de classes sociais e
as diferenças entre falas femininas e masculinas.

b) Identidade social do receptor ou ouvinte; estudo das formas


de tratamento que são repassadas via linguagem (“baby talk”, por
exemplo, fala utilizada por adultos para se dirigirem aos bebés).

c) Contexto social; estudo das diferenças entre a forma e a função


dos estilos formal e informal existentes na grande maioria das línguas.

d) O julgamento social distinto; que os falantes fazem do próprio


comportamento linguístico e sobre o dos outros, isto é, as atitudes
linguísticas.
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

Para Bright um sistema linguístico monolítico realizado sem variações


ou com variações fortuitas e imotivadas, é incapaz de explicar toda
uma gama de associações da estrutura social.
Dando prosseguimento aos estudos de Bright, Labov passa a
descrever a heterogeneidade linguística, pois para ele, todo facto
linguístico relaciona-se a um facto social, e que a língua sofre
implicações de ordem fisiológica e psicológica. Labov ficou conhecido
por ser o representante da teoria da variação linguística.
Dessa forma, a sociolinguística é uma área da linguística que
estudará a língua através de factores externos, os quais
caracterizarão a diversidade e a heterogeneidade linguística.

1.1.2. William LABOV e a Sociolinguística


A sociolinguística fixou-se em 1964, com Willian Labov, que formulou
um modelo de descrição e interpretação do fenómeno linguístico no
contexto social de comunidades urbanas – conhecido como
Sociolinguística Variacionista ou Teoria da Variação.
Labov destaca o papel decisivo dos factores sociais na explicação da
variação linguística (diversidade linguística) e relaciona factores como
idade, sexo, ocupação, origem étnica e atitude ao comportamento
linguístico.

1.1.3. Sociolinguística e interdisciplinaridade


Os elementos linguagem, cultura e sociedade são consideradas
fenómenos inseparáveis. Linguistas e antropólogos trabalham lado a
lado e de modo integrado. A sociolinguística já nasce com um carácter
interdisciplinar, mas ela é também um fenómeno social e não só
social, ela se relaciona com disciplinas tais como: sociologia,
psicologia, biologia e fonoaudiologia, entre outras. Portanto, existe
uma relação totalmente intrinsenca entre os elementos linguagem,
cultura e sociedade uma vez que todo homem possui a linguagem
quer seja verbal quer seja não verbal e a linguagem e a cultura são
paralelas e todas estão dentro de uma determinada sociedade.

1.1.4. Objecto da sociolinguística


As pesquisas na área de sociolinguística são feitas por entrevistas
e/ou amostragem. O objecto da sociolinguística é a língua falada,
observada, descrita e analisada em seu contexto social, isto é, em
situações reais de uso. Seu ponto de partida é a comunidade
linguística, um conjunto de pessoas que interagem verbalmente e que
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

compartilham um conjunto de normas a respeito dos usos


linguísticos.
Uma comunidade de fala caracteriza - se não pelo facto de se
constituir por pessoas que falam do mesmo modo, mas por indivíduos
que se relacionam, por meio de redes comunicativas diversas, e que
orientam seu comportamento verbal por um mesmo conjunto de regras.

Sumário

Como forma de atingirmos os objectivos desejados, nesta unidade


abordamos acerca das fases pelas quais a sociolinguística passou até ao
momento em que ela se fixou, definindo deste modo o seu objecto de
estudo.

Auto-valiação

Questões de Escolha Múltipla

1. O que é sociolinguística?
a) Sociolinguistica estuda a relação entre a língua e a
sociedade.
b) Sociolinguistica estuda a relação entre a língua e o
homem.
c) Sociolinguistica estauda a relação entre a língua e as
plantas.
d) Todas as alternativas estão correctas.

2. Que relação existe entre o Homem, a língua e a sociedade?


a) A relação existe entre o Homem, a língua e a sociedade é de complementaridade.
b) A relação existe entre o Homem, a língua e a sociedade é de incomplementaridade.
c) A relação existe entre o Homem, a língua e a sociedade é de similaridade.
d) Todas as alternativas estão correctas.

3. O que é contexto social?


a) Contexto social é o estudo das diferenças entre a forma e a função dos
estilos formal e informal existentes na grande menoria das línguas.
b) Contexto social é o estudo das diferenças entre a forma e a função dos estilos formal e
informal existentes na grande maioria das línguas.
c) Contexto social é o estudo das diferenças entre a informação e a função dos estilos
formal e informal existentes na grande maioria das línguas.
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d) Todas as alternativas estão correctas.

4. Quem foi Meillet?


a) Meillet foi um dos discípulos de Saussure.
b) Meillet foi um dos discípulos de Platao.
c) Meillet foi um dos discípulos de Socrates
d) Meillet foi um dos discípulos de Newton.

5. Quais são os factores sociais que influem na variação


linguística?
a) Os factores são: idade, sexo, ocupação, origem étnica e atitude ao
comportamento linguístico.
b) sexo, ocupação, origem étnica e atitude ao comportamento linguístico.
c) ocupação, origem étnica e atitude ao comportamento
linguístico.
d) origem étnica e atitude ao comportamento linguístico.

Questões de Verdadeiro e Falso

6. A sociolinguística estuda a relação entre o Homem e a cultura.

7. A sociolinguística fixou – se em 1961.

8. O autor que concebia a linguagem numa perspectiva biologizante chama-


se Schleicher.

9. A linguagem, cultura e sociedade são fenómenos inseparáveis.

10. As pesquisas em sociolinguística são feitas através da entrevista e/ou


amostragem.

Questões de Reflexão
11. Fale sa relação entre a língua e a cultura.
12. O que se pode dizer da Hipotese de Sapir e Worf?

Respostas:
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

1.A
2.A
3.B
4. A
5. A
6. Falso
7. Falso
8. Verdadeiro
9. Verdadeiro
10. Verdadeiro

Referências Bibliográficas

ALKHMIN, T. Sociolinguística. In: MUSSALIM, F. e BENTES, A. C. (org.).


Introdução à Linguística: Domínios e fronteiras. Vol.1. São Paulo: Editora
Cortez, 2001.

BAGNO, M. Preconceito Linguístico: o que é como se faz? EditoraLoyola, 2005.

BAGNO, M.; STUBBS e GAGNÉ. Língua maternal: Letramento, variação e


ensino. Editora Parábola. 2006.

BAKER, C.; COKELY, D. American sign language: a teacher´s resource texto n


grammar and culture. 1980 IN: QUADROS, R. M.;

KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre:


Editora Artmed, 2004.

BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em língua materna: a socioLinguística


em sala de aula. Editora Parábola. 2008.

McCLEARY, L. Sociolinguistica. Curso Licenciatura em Letras-libras. UFSC,


2007.

SAUSURRE, F. Curso de Linguística geral. 20 ªedição São Paulo: Cultrix, 1995.

TARALLO, F. A pesquisa sociolinguística. Ed. Ática, 1982

II: LINGUA(GEM) E CULTURA

Introdução
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

Caro estudante, depois de conhecermos o objecto de estudo da


sociolinguística, as fases por que ela passou, nesta unidade vamos abordar
acerca da linguagem e cultura uma vez que a essência da sociolinguística é
de estudar a relação entre a língua e a cultura.

Ao completar esta unidade, você deverá ser capaz de:

▪ Conhecer a relação entre a língua e a cultura;


▪ Identificar a relação entre a língua e a cultura;
Objectivos ▪ Caracterizar a relação entre a língua e a cultura;
Específicos ▪ Relacionar a língua e a cultura;
▪ Reconhecer a importância da hipótese da Sapir e Worf no âmbito da relação entre
língua e cultura.

2.1. Língua (gem), cultura e sociedade


O homem é um ser social. Não há nada mais verdadeiro do que essa afirmação já bastante
comentada desde Aristóteles. Afirmar-se que o homem é um ser social,
consequentemente, demanda a necessidade que ele tem de se comunicar, e isso vêm de
forma espontânea, através da fala individual do usuário da língua.
A língua é o meio pelo qual o homem expressa as suas ideias, as da sua geração, as da
comunidade a que pertence, sem deixar de ser um retrato de seu tempo. Cada falante é
usuário e agente modificador de sua língua, nele imprimindo marcas geradas pelas novas
situações com que se depara. Nesse sentido, podemos destacar que a língua é instrumento
privilegiado da projecção da cultura de um povo.
Assim, devemos ter claro que mudanças sociais produzem mudanças na língua. A língua, por
sua vez, incorpora valores sociais. A estrutura social pode influenciar ou determinar a estrutura
da língua ou seu comportamento, o que prova que os valores sociais costumam ter efeito sobre
a língua.
Por conseguinte, importa salientar que a sociolinguística, na tentativa de compreender a
questão da relação entre linguagem e sociedade, postula o princípio da diversidade
linguística. Além disso, a sociolinguística na corrente das orientações teóricas contextuais
sobre o fenómeno linguístico, orientações teóricas estas que consideram as comunidades
linguísticas não somente sob o ângulo das regras de linguagem, mas também sob o ângulo
das relações de poder que se manifestam pela linguagem.
Como podemos perceber, a sociolinguística é uma
área que estuda a língua em uso real, levando em consideração as relações entre a
estrutura linguística e os aspectos sociais e culturais da produção linguística. Para essa
corrente, a língua é uma instituição social e, portanto, não pode ser estudada como uma
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estrutura autónoma, independente do contexto situacional, da cultura e da história das


pessoas que a utilizam como meio de comunicação.
O sociolinguista, por sua vez, interessa - se por todas
as manifestações verbais nas diferentes variedades de uma língua. Um dos seus objectivos
é entender quais são os principais factores que motivam a variação linguística e qual a
importância de cada um desses factores na configuração do quadro no qual se apresenta
a variável. A variação, portanto, não é vista como um efeito do acaso, mas como um
fenómeno cultural motivado por factores linguísticos e por factores extralinguísticos de
vários tipos.
De tudo quanto abordamos nas subsecções
anteriores, podemos aferir que existe uma relação entre a língua, cultura e a sociedade.

2.1.1. O relativismo linguístico

A tese da relatividade linguística ou relativismo nega a existência de propriedades universais nas


línguas humanas. Para os relativistas, cada língua é única e tem que ser descrita como tal. O
relativismo tem sido associado ao estruturalismo, principalmente ao bloomfieldiano, e ao
funcionalismo. Pode ser encarado como uma reacção metodológica à tendência de descrever as
línguas nativas das Américas com base nas gramáticas tradicionais ocidentais. O relativismo
filosófico e linguístico foi rejeitado por Chomsky e seus seguidores ao formular as bases do
gerativismo. A primeira manifestação do relativismo filosófico pertence ao sofista grego Protágoras,
citado por Platão: “A maneira como as coisas se apresentam a mim, é a maneira como elas existem
para mim e a maneira como as coisas se apresentam a você, é a maneira como elas existem para
você”. Quer dizer que não há verdade ou que tudo é verdade, depende de cada um. A Platão
bastou-lhe esta afirmativa para considerar inconsistente toda a doutrina. Ele alinhou uma série de
argumentos para provar a inconsistência do relativismo, mas a teoria continua tendo seus
defensores até os dias de hoje.

O relativismo apresenta-se de várias formas. O próprio pragmatismo é uma forma de relativismo.


Pode-se distinguir o relativismo cognitivo, que abrange toda espécie de conhecimento, do
relativismo moral, que se refere a critérios de valor, assim como o relativismo cultural que se baseia
na certeza de que as culturas são diferentes e podem conter valores muito diversos.

O relativismo linguístico é uma variedade moderna do relativismo cognitivo: a verdade é criada pela
gramática e pela semântica de uma determinada língua. Esta ideia tem sua origem filosófica em
Ludwig Wittgenstein, mas adquire independência na Linguística com a teoria de Benjamin Lee
Whorf. Segundo ele, o mundo não tem estrutura própria; a estrutura é imposta pela linguagem. A
aprendizagem de outra língua significa criar um mundo novo, onde tudo é completamente
diferente. Para Wittgenstein, as regras de uma determinada língua eram um “jogo” que se joga
quando se fala. Enquanto “jogamos”, praticamos alguma “forma de vida”.

O grande linguista e antropólogo norte-americano Edward Sapir (1844 -1939) e seu discípulo
Benjamim Lee Whorf (1897 – 1941) eram herdeiros de uma tradição do pensamento europeu, que
embora não negasse a existência de universais linguísticos, enfatiza o valor positivo da diversidade
linguística e cultural, sem deixar de lado os princípios do idealismo romântico. Esta tradição
remonta a J. G. Herder, Wilhelm von Humboldt e, possivelmente, a Franz Boas.
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Uma versão de linguagem e pensamento baseada nesta tradição, na década de 1950, foi rotulada
de “hipótese Sapir-Whorf” e é associada ao relativismo linguístico. É uma das versões mais notáveis
das características do pensamento linguístico do estruturalismo norte-americano, inclusive da
escola pós-bloomfieldiana.

A hipótese Sapir-Whorf combina determinismo linguístico com relatividade linguística: a língua


determina o pensamento e não há limites para a diversidade estrutural das línguas.

Embora a hipótese Sapir-Whorf seja considerada forte, ela não exclui a possibilidade do bilinguismo
nem da tradução. Embora ninguém defenderia o determinismo extremo nem a relatividade
extrema, é possível considerar uma versão mais fraca da hipótese levando-se em conta experiências
que vêm sendo feitas desde então. Os vocabulários de línguas diferentes costumam não ser
totalmente isomórficos e existem realidades mais facilmente codificáveis numa língua que em
outra.

Parece que ainda não foi achado um bom motivo para descartar a ideia de que falantes de línguas
diferentes têm a mesma visão do mundo no que diz respeito a conceitos fundamentais como
tempo, espaço, número, matéria, etc., porém podem ter visão diferente quanto a outros conceitos,
principalmente os vinculados à cultura, porque estes implicam conhecimento da mesma.

O problema da tradução exacta é difícil e, às vezes, impossível, pelo não isomorfismo lexical e
gramatical (até no tempo gramatical, modo e número). Franz Boas (1911) apresentou o conhecido
exemplo de que o esquimó não dispunha de uma única palavra para neve e sim de diversas, uma
para cada modalidade de neve, devido à importância que este elemento tem na sua cultura.

As diferenças lexicais e gramaticais entre as línguas nem sempre se devem a diferenças culturais,
mas elas existem na estrutura gramatical e no léxico e, muitas delas podem ser atribuídas a estas
diferenças.

2.1.2. Universalismo linguístico

Contrariamente aos relativistas, que defendem a teoria de que cada língua corresponde a uma
cultura e, na sua versão mais forte, a tradução seria impossível, os universalistas acreditam que
todas as línguas humanas possuem propriedades comuns, mesmo não tendo tido qualquer
contacto que permita atribuir essas características comuns à difusão cultural .

O homem viria com algum equipamento inato, que lhe permitiria adquirir nos primeiros anos de
vida a língua de seu ambiente familiar, qualquer que ela fosse, pois já viria conhecendo as condições
básicas da língua humana, condições que lhe permitiriam a aquisição rápida da modalidade da
língua falada no ambiente que o rodeia, naqueles primeiros anos de vida. Essas propriedades gerais
da língua humana são denominadas universais linguísticos. Pelo menos quatro dessas propriedades
aparecem em todas as línguas, e podem estar interligadas de diversas maneiras. São elas a
arbitrariedade, a dualidade, a descontinuidade e a produtividade.

Os universais linguísticos vêm sendo procurados desde a antiguidade. A crença na universalidade


da linguagem humana ficou bem exemplificada na gramática de Port-Royal de 1660 e em muitos
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tratados sobre a linguagem no século XVIII. A dificuldade tem sido o saber que propriedades das
línguas humanas podem realmente ser consideradas universais. Existem propriedades comuns a
muitas línguas mas, com o conhecimento e estudo de outras línguas, verifica-se que existem
propriedades que na verdade não são universais, ou seja, inerentes a todas as línguas humanas e
sim que sua coincidência nas línguas conhecidas deve ocorrer devido à difusão cultural.

Os estruturalistas, de um modo geral, enfatizavam a diversidade estrutural das línguas. Nos Estados
Unidos, ao estruturalismo bloomfieldiano veio a opor-se, no fim da década de 1950, o gerativismo
de Noam Chomsky. Enquanto o estruturalismo norte-americano tinha por base o materialismo e
acreditava na filosofia behaviorista segundo a qual o cérebro do aprendiz era uma tábua rasa sem
qualquer qualidade inata para adquirir conhecimento, Chomsky acredita em alguma espécie de
inatismo e nas propriedades universais da linguagem. De certa forma ocorre uma volta aos
princípios universalistas da antiguidade e à gramática de Port-Royal, pois Chomsky acredita que a
linguagem humana é, ao menos nos primeiros anos de vida, transmitida geneticamente. Esta
condição é inata e específica da espécie. Assim, acredita que existem propriedades formais que são
encontradas em todas as línguas, porém essas propriedades são arbitrárias. A busca dessas
propriedades tem sido responsável por interessantes trabalhos, tanto na linguística teórica como
na descritiva.

Chomsky propõe a classificação dos universais linguísticos em formais e substantivos.

Entre os universais formais poder-se-ia classificar a teoria do componente fonológico de Jakobson


por ser caracterizada por um pequeno número de traços fonéticos fixos (talvez entre 15 e 20), que
seriam universais.

A gramática universal tradicional também poderia ser considerada uma teoria de universais
substantivos não só no que respeita à fonética universal mas também pelas categorias fixas (nome,
verbo, etc.), que se encontram na estrutura sintáctica subjacente de qualquer língua.

Ainda como propriedade universal substantiva se poderia defender uma teoria de universais
semânticos que realizam certas funções de designação em todas as línguas. Cada língua tem de
conter itens lexicais para designar pessoas, certos objectos relacionados com o ser humano, certos
comportamentos, sentimentos, etc.

Podem existir, no entanto, propriedades linguísticas universais mais abstractas. Basta que se prove
que uma propriedade abstracta é geral nas línguas humanas. Estudos recentes permitiram a
apresentação de diversas propostas acerca de universais formais nesse sentido. Uma dessas
propostas é a de que o componente sintáctico de uma gramática deve conter regras
transformacionais que projectem estruturas profundas interpretadas semanticamente em
estruturas superficiais interpretadas foneticamente. Essas propostas encaram de maneira diferente
as propriedades universais das línguas: os elementos fonéticos compõem a camada fonética em
todas as línguas, determinadas categorias específicas devem ser fundamentais para a sintaxe de
todas as línguas e determinados traços ou categorias semânticas fornecem um quadro universal
para a descrição semântica. Estes universais são substantivos porque têm a ver com o vocabulário,
enquanto os universais formais se relacionam mais com as regras que regem as gramáticas e com
suas interconexões.
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Universais formais também é possível procurá-los no campo semântico: nomes próprios (existem
em qualquer língua), nomes para designar objectos relativos a espaço e tempo, nomes de cores,
termos de determinados objectivos, necessidades e funções humanas, etc.

A existência de universais formais profundos, no sentido sugerido por exemplos tais como estes,
implica que todas as línguas são construídas obedecendo ao mesmo padrão, mas não implica que
exista uma correspondência ponto por ponto entre línguas particulares. Não implica, por exemplo,
que exista qualquer processo razoável de tradução entre as línguas.

A opinião de Chomsky sobre os universais linguísticos, que vimos seguindo aqui, foi manifestada
em 1965 e aqui ele já admite restrições em muitos universais. Os linguistas vêm acrescentando
outras restrições, inclusive à teoria da gramática universal, o que enfraquece a teoria, com o que
não estão de acordo alguns partidários do gerativismo. Em 1973, Kimbal comenta:

Quanto mais limitada a capacidade gerativa da classe de gramáticas disponíveis, como gramáticas
potenciais das línguas humanas, tanto mais próximo da explicação da aquisição da linguagem pela
criança chegou o linguista. Acrescentar novos mecanismos à gramática aumenta a capacidade
gerativa da classe de gramáticas resultante é uma perda completa de poder explicatório da
gramática universal; e cada acréscimo deve ser justificado por considerações empíricas.

Em 1969, Berlin e Kay estudaram a divisão do continuum visual do espectro das cores em vinte
línguas, o que resultou na publicação de um livro importante denominado Basic Color Terms.
Segundo sua teoria, denominada teoria de Berlin-Kay, as diferenças na divisão dos conceitos básicos
de cores não são tão arbitrárias como se pensava. Preocuparam-se com o que chamaram de
significado focal de um termo de cor e chegaram à conclusão de que havia onze cores básicas e que
a divisão do espectro nessas onze cores ocorria nas línguas estudadas, o que provaria seu
universalismo. O problema das diferenças situa-se na fronteira entre as diversas cores. Os falantes
do inglês não parecem ter dificuldade entre a distinção das diversas tonalidades e os das outras 19
línguas por eles estudadas tendem a fazer concordar os termos designativos de cores nas áreas
focais.

Qualquer língua com apenas três termos designará os focos correspondentes ao preto, branco e
vermelho; com seis acrescentará o verde, o amarelo e o azul. Com mais uma cor, o sétimo termo
corresponderá ao marrom. A seguir vêm o roxo, o rosa, o laranja e o cinza, que, num sistema de
oito cores básicas, se completará com qualquer uma destas, mas sem qualquer ordem de
preferência.

A hipótese Berlin-Kay tinha por finalidade combater o relativismo, provando que também no campo
semântico alguma forma de universalismo era possível. A hipótese tem sido muito discutida e
contestada, à medida que se iam realizando novas pesquisas em línguas pertencentes a outras
culturas, cuja lexicalização do espectro visual se realiza de formas diferentes. As restrições à teoria
começaram a aparecer e até a metodologia que empregaram é questionada, pois, se no inglês
americano, mesmo nas camadas populares, a identificação das onze cores básicas não sofre
restrições, não ocorre o mesmo nas demais. As 19 línguas restantes foram testadas cada uma em
apenas em um indivíduo bilíngue, o que não parece garantir representatividade. Berlin e Kay
continuaram defendendo sua hipótese, juntos, individualmente ou com outros colaboradores. Sua
última referência bibliográfica é de 1991.
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O problema da lexicalização do espectro visual está longe de estar resolvido. Num exaustivo
estudo que está sendo realizado por B. A. C. Saunders & J. van Brakel, na Universidade de
Leuven (Bélgica), estes linguistas solicitam a colaboração de estudiosos de todo o mundo
até seu estudo ser publicado, que pode ser enviada para seu site na Internet, onde
obtivemos estas informações. Eles dispõem de uma vasta bibliografia, parte dela bem
recente, inclusive muitas pesquisas próprias, abordando e discutindo diversos aspectos, não
só linguísticos, da lexicalização da cor nas línguas humanas naturais. Apresentamos
sucintamente suas conclusões provisórias, donde se deduz que o debate está longe de ser
concluído:

1. Não se pode negar a oposição estrutural nem funcional;

2. A história da arte e da ciência do Ocidente e seu cruzamento cultural indicam que não é
confiável o processo de acreditar na percepção popular para estabelecer a divisão em
quatro tonalidades e onze categorias básicas de cor ou em qualquer outra caracterização
perceptual da cor tida como universal;

3. Psicologicamente não existe nada natural que permita identificar a combinação ou


separação de tonalidade, brilho ou saturação;

4. Há pouca ou nenhuma evidência concreta de interligações fisiológicas e psicofísicas;

5. Não há prova suficiente para especificar os mecanismos correspondentes às quatro


tonalidades de Hering.

Os universais semânticos são ainda mais discutidos que os dos demais atributos linguísticos,
como os fonológicos e sintácticos. O campo semântico que se relaciona ao léxico das cores
é um dos preferidos, tanto de relativistas como de universalistas, no plano da semântica.
Em 1981, John Lyons, depois de analisar os estudos que até então se tinham realizado na
área, conclui:

O que é verdadeiro em relação ao vocabulário de cores parece sê-lo também em relação a qualquer
domínio lexical que se escolha. Se existe uma subestrutura universal de distinções semânticas no
âmbito de tal domínio, haverá também uma superestrutura dependente de cultura, não universal
e talvez mais ampla.

Sumário

Nesta unidade referimos sobre a relação entre a língua, cultura e sociedade, o determinismo e
relativismo linguístico, não deixando de lado o cerne da unidade, a hipótese de Sapir-whorf.

AUTO-AVALIAÇÃO

Questões de Escolha Múltipla

1. O que refuta a tese de relatividade linguística?


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a) A tese da relatividade linguística ou relativismo nega a existência de propriedades


universais nas línguas humanas.
b) A tese da relatividade linguística ou relativismo aceita a existência de propriedades
universais nas línguas humanas.
c) A tese da relatividade linguística ou relativismo nega a existência de propriedades
particulares nas línguas humanas.
d) Todas as alternativas estão corectas.

2. O que entende por relatividade linguística?


a) Relatividade linguística não consiste em diversas formas de conceber o mundo de
acordo com a cada língua.

b) Relatividade linguística consiste em diversas formas de conceber o mundo de acordo


com a cada língua.
c) Relatividade linguística consiste em diversas formas de não conceber o mundo de
acordo com a cada língua.
d) Relatividade linguística consiste em diversas formas de conceber o mundo de acordo
com sem dar importância a língua.

3. Quais são os proponentes da relatividade linguística?


a) Os proponentes da relatividade linguística são a terminologia das cores e relações de
parentesco.
b) Os proponentes da relatividade linguística não são a terminologia das cores e
relações de parentesco.
c) Os proponentes da relatividade linguística são a terminologia das cores apenas.
d) Todas as alternativas estão correctas.

4. Qual e a relação entre a língua e a cultura”?


a) A relação existente entre língua e cultura é de dependência uma vez que a medida que
a língua evolui a cultura também evolui.
b) A relação existente entre língua e cultura é de interdependência uma vez que a
medida que a língua evolui a cultura também evolui.
c) A relação existente entre língua e cultura é de interdependência uma vez que a
medida que a língua não evolui a cultura também evolui.
d) Todas as alternativas estão correctas.

5. Que relação existe entre o Homem, a língua, e a sociedade?


a) A relação existe entre o Homem, a língua, e a sociedade é de complementaridade.
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b) A relação existe entre o Homem, a língua, e a sociedade é de incomplementaridade.


c) A relação existe entre o Homem, a língua, e a sociedade é de existencialidade.
d) A relação existe entre o Homem, a língua, e a sociedade é de compatibilidade.

Questões de Verdadeiro e Falso

1) A afirmação segundo o qual o Homem é um ser social já é bastante comentada desde


Aristóteles.

2) A língua é instrumento privilegiado da projecção da cultura de um povo.


3) Os valores sociais não costumam ter efeito sobre a língua.
4) O sociolinguista, por sua vez, interessa - se por todas as manifestações verbais nas
diferentes variedades de uma língua.
5) A língua sendo uma instituição social não pode ser estudada como uma estrutura
autónoma, independente do contexto situacional, da cultura e da história das pessoas que
a utilizam como meio de comunicação.
6) Os universalistas acreditam que todas as línguas humanas possuem propriedades comuns.

7) A hipótese não Sapir-Whorf tem nada a ver com determinismo linguístico e nem com a
relatividade linguística.

8) A tese da relatividade linguística defende a existência de propriedades universais nas línguas


humanas.

9) Universais linguísticos são propriedades universais ou comuns nas linguas humanas.

10) A gramática universal tradicional também poderia ser considerada uma teoria de universais
substantivos não só no que respeita à fonética universal mas também pelas categorias fixas (nome,
verbo, etc.), que se encontram na estrutura sintáctica subjacente de qualquer língua.

6. A afirmação segundo o qual o Homem é um ser social já é bastante comentada desde


Aristóteles.

7. A língua é instrumento privilegiado da projecção da cultura de um povo.


8. Os valores sociais não costumam ter efeito sobre a língua.
9. O sociolinguista, por sua vez, interessa - se por todas as manifestações verbais nas
diferentes variedades de uma língua.
10. A língua sendo uma instituição social não pode ser estudada como uma estrutura
autónoma, independente do contexto situacional, da cultura e da história das pessoas que
a utilizam como meio de comunicação.
Questões de Reflexão
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11. Fale da Relatividade linguística.


12. Que relação existe entre a língua e a sociedade.

Respostas:

1. A
2. B
3. A
4. B
5. A
6. Verdadeiro
7. Verdadeiro
8. Falso
9. Verdadeiro
10. Verdadeiro

Referências Bibliográficas

ATKINSON, M.; HERITAGE, J. (Ed.). Structures of social action: studies in conversation analysis.
Cambridge: Maison de Sciences de l'Homme & Cambridge University Press. 1984.

GUMPERZ, J. J. Discourse strategies. Cambridge: Cambridge University Press. 1982.

JOHNSON, A. G. Dicionário de sociologia: guia prático da linguagem sociológica. Tradução: Ruy


Jungmann. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. 1997.

ORLANDI, E. P. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso. 4. Edição, São Paulo:


Pontes. 1996.

RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. Sociolinguística interaccional: antropologia, linguística e sociologia


em análise do discurso. Porto Alegre: Age. 1998.
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TEMA III: VARIEDADES LINGUÍSTICAS

Introdução

Caro estudante, tendo em conta que qualquer língua existente em qualquer sociedade está sujeita
a variação, nesta unidade vamos falar acerca das variedades linguísticas, concretamente em
Moçambique.

Ao completar esta unidade, você deverá ser capaz de:

▪ Conhecer as variedades linguísticas;


▪ Reconhecer as variedades linguísticas;
Objectivos ▪ Identificar diferentes tipos de variações linguísticas;
Específicos ▪Caracterizar os tipos de variações linguísticas existentes
em Moçambique

3.1. Variação linguística: um recorte

Os estudos da sociolinguística podem ter alcances diversos, dependendo dos seus


objectivos, pode descrever a fala da cidade de Nova York, de uma comunidade do Rio de
Janeiro, dos estudantes de direito ou dos surfistas, dos imigrantes, dos caipiras, dos
gaúchos, etc.
Ao estudar qualquer comunidade linguística, a constatação mais imediata é a existência de
diversidades ou da variação, pois, toda comunidade caracteriza- se pelo emprego de
diferentes modos de falar - variedades linguísticas.

O conjunto de variedades linguísticas utilizado por uma comunidade é chamado de


repertório verbal. Qualquer língua, falada por qualquer comunidade, exibe sempre
variações. Nenhuma língua apresenta-se como entidade homogénea. Todas são
representadas por um conjunto de variedades.

Língua e variação são inseparáveis: a Sociolinguística encara a diversidade da linguística


não como um problema, mas como qualidade constitutiva do fenómeno linguístico.
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Qualquer tentativa de buscar apreender apenas o invariável, o sistema subjacente –


valendo-se de oposições como “língua e fala” ou “competência e desempenho” – significa
uma redução na compreensão do fenómeno linguístico. O aspecto formal e estruturado do
fenómeno linguístico é apenas parte do fenómeno total.
Todas as línguas do mundo são sempre continuações históricas - gerações sucessivas de
indivíduos legam a seus descendentes o domínio de uma língua particular. As mudanças
temporais são parte da história das línguas. No plano sincrónico, as variações observadas
na língua são relacionáveis a factores diversos: dentro de uma mesma comunidade de fala,
pessoas de diferentes origens, idades e sexos falam distintamente.
Não há casualidade entre o facto de nascer em uma determinada região, ser de uma classe
social e falar de certa maneira.

3.1.1. Noções de variedade, variante e variável

Há alguns termos importantes para a sociolinguística que podem ser facilmente confundidos entre
si, nomeadamente: variedade, variante e variável. Embora alguns linguistas os utilizem
indiscriminadamente ou sem critérios bem definidos, é interessante fundamentar, com base no
conceito apropriadamente já associado a determinado fenómeno linguístico, seus limites
semânticos.

Denominamos variedade cada uma das modalidades em que uma língua se diversifica, em razão
das possibilidades de variação dos elementos do seu sistema (vocabulário, pronúncia, sintaxe)
ligadas a factores sociais e/ou culturais (escolaridade, profissão, sexo, idade, entre outros) e
geográficos. E o que se convencionou chamar de dialecto.

São exemplos de variedades socioeconómicas ou culturais: a língua culta e a língua popular, o jargão
dos médicos e o dos jogadores de futebol. São variedades geográficas: o português do Brasil em
relação ao português de Portugal e também os falares regionais como o paulista, o carioca, o sulista
e o nordestino. Embora algumas variedades sejam extremamente acentuadas, não chegam a
impedir a intercomunicação dos seus falantes com os de outras regiões ou estratos sociais.

Em relação à variante constitui a forma linguística específica (fonema, morfema, lexema ou palavra)
que é admitida na língua como alternativa de outra, com mesmo valor e mesma função.

O alofone, por exemplo, é uma variante fonética e representa uma forma possível de realização
concreta do fonema. As diferentes formas de se pronunciar a consoante “d” em determinadas
regiões do Brasil constituem alofones.

Quanto à variável, é cada uma das formas linguísticas (fonema, morfema, lexema ou palavra) que,
de acordo com o linguista norte-americano William Labov (1927), estão mais sujeitas à variação
regional, estilística, socioeconómica ou cultural. Essas formas também se alteram para expressar
mudança de função sintáctica, de sentido, de classe gramatical, de pessoa, de número e de género.

3.1.2. Variações linguísticas históricas


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Para Coseriu, a dicotomia saussuriana sincronia/diacronia contempla operações distintas e


complementares, mas não excludentes, pois o que se descreve em determinado momento
(sincronia) é sempre a actualidade de uma tradição histórica (diacronia). A língua como objecto
histórico não exclui a descrição nem a teoria.

A mudança linguística está ao alcance de qualquer falante, porque pertence à experiência corrente
sobre a linguagem, que é sempre um acto individual em sua interacção com o sistema. Além desse
aspecto individual de manifestação da intersubjectividade do ser com o outro, a mudança também
decorre das condições sistemáticas e extrassistemáticas da língua, constituindo-se num problema
histórico na sua realidade dinâmica.

As línguas mudam simplesmente porque não estão definitivamente prontas ou feitas, mas vão se
fazendo continuamente por meio da fala, da actividade linguística em que um indivíduo interage
com outro ou outros.

A fala, embora obedeça às regras estabelecidas pela língua padrão e se estruture em torno das
finitas possibilidades abstractas do sistema, é uma actividade criadora. O usuário, portanto, é o
criador e estruturador da sua expressão. O falante, na sua interacção com o outro, realiza os
fonemas da língua, adaptando-os às peculiaridades das suas necessidades expressivas. Como são
sempre utilizados basicamente modelos anteriores, a língua nunca muda de modo completo as suas
formas de expressão.

Uma vez que variados factores externos em um dinamismo constante exercem influência sobre as
línguas, estas sofrem mudanças que são reflexos desses factores. É inerente à natureza das línguas
que elas sofram mudanças e é por isso também que são chamadas de línguas naturais.

Algumas variedades socialmente prestigiadas, porque hierarquizam as relações entre os falantes,


acabam se constituindo em factor cultural.

Os factores culturais, quando sistemáticos, funcionam como facilitadores e seleccionadores das


inovações.

Qualquer desvio em relação à norma, mesmo que literário (do escritor) ou involuntário (do homem
comum), é o início provável de uma mudança. Em períodos de baixa temperatura cultural ou
informacional, criam-se condições apropriadas ou ideais para a consecução de certas mudanças,
podendo fazer com que determinadas variações ocorram com mais rapidez e com resultados mais
efectivos e duradouros.

As aquisições ou adopções diárias, cotidianas, que se actualizam no ato mesmo da realização dos
fonemas é o plano em que as mudanças podem ocorrer. Todo o processo se dá experimentalmente.
Há uma liberdade intrínseca ao falar que o falante aplica na realização ou composição da sua
expressividade linguística.

As finalidades expressivas são individuais, mas as inovações adoptadas e difundidas representam


exigências expressivas da comunidade, e são, portanto, inter-individuais, colectivas. Embora não
seja possível saber exactamente como essas finalidades expressivas actuaram em cada falante, os
usuários só adoptaram o modo de falar prestigiado em determinado momento histórico por uma
razão cultural, uma necessidade extrínseca.
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O dialecto, forma específica como uma língua é falada em determinada região, é também chamado
de variação dialectal ou diatópica. Não se deve confundir dialecto com idioma diferente. Só
podemos chamar de dialecto se houver na língua uma primeira forma linguística de referência. As
comunidades a que essas duas falas se referem devem conseguir compreender-se mutuamente,
ainda que com algumas dificuldades.

As comunidades linguísticas mais abrangentes ou hegemónicas funcionam como pontos de partida


para a formação de comunidades linguísticas menos abrangentes ou menos hegemónicas. Estas se
constituem sempre em torno dos centros de decisão, como as cidadezinhas de algumas regiões,
mesmo que isoladas ou extremamente distantes.

As capitais são pontos de convergência polarizadores de arte, cultura, política e economia,


estabelecendo assim os modos característicos de conversação e definindo os padrões linguísticos
na área de sua influência.

As diferenças linguísticas entre os falares das diversas regiões são às vezes evidentes, às vezes
graduais, e nem sempre correspondem exactamente às fronteiras ou aos limites geográficos.

Isoglossa - É a linha que, num mapa linguístico, indica as áreas em que se concentram determinados
traços de linguagem comuns. Estes podem ser de natureza fônica, morfológica, léxica ou sintática,
de acordo com a maneira específica de realização do elemento linguístico focalizado. O uso
característico de determinadas palavras ou expressões e a forma de pronunciar algumas vogais
determinam isoglossas. Há linhas específicas para cada tipo de isoglossa. As duas mais
características são as isoléxicas e as isófonas. As chamadas isoléxicas marcam regiões em que
determinada palavra é preferida em detrimento de outra para denominar o mesmo objecto. Por
exemplo, na região Sul do Brasil, mais precisamente no estado do Rio Grande do Sul, emprega- -se
“bergamota” em vez de “tangerina”, esta de uso mais frequente em todo o país. Nas regiões Norte
e Nordeste, é comum o emprego de “jerimum” para a palavra “abóbora” e “macaxeira” para
“mandioca”.

As chamadas isófonas marcam regiões em que determinado fonema é realizado de modo


específico, por exemplo, com timbre mais aberto ou mais fechado. No Nordeste brasileiro, é comum
em muitas palavras a pronúncia da vogal /o/ com o timbre aberto, como em “coração”. É sabido
que em Portugal (região setentrional e centro-litoral, na região do Porto) ocorre uma variante do
fonema M, também realizado com /b/; assim, “vinte” também é pronunciada “binte”.

Os diversos estratos socioeconómicos apresentam um conjunto de indivíduos com características,


posições ou atribuições similares. Embora seus falantes adoptem uma mesma língua, ela não é
usada da mesma maneira por todos eles.

Todo agrupamento de pessoas que convivem em estado gregário, em colaboração mútua e que
estão unidas pelo sentimento de colectividade apresenta características de linguagem específicas
constantemente realimentadas pelo idioma comum usado pelos falantes. Língua e sociedade
seguem inexoravelmente ligadas.

Dependendo do contexto, uma pessoa pode empregar diferentes variedades do idioma. Essas
variedades representam os diversos modos de funcionamento da linguagem na sua realização entre
emissor e receptor. Os modos associados à faixa etária, classe social, cultura e profissão
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estabelecem usos diversos chamados de variações socioeconómicas ou diastráticas. Suas


características dependem fundamentalmente dos estamentos aos quais se associam.

Embora existam modos mais prestigiados de usar a língua, não há melhores nem piores, mas
diferentes. O que se deve enfatizar é a adequação. Essas variedades expressam, enfim, a
diversidade de contexto e de cultura existente no grupo.

Adequação é uma pretendida correspondência entre a situação em que se realiza a comunicação e


o nível de formalidade ou convenção exigido no uso da língua.

O ajustamento com que a peculiaridade expressiva de cada um dos falantes se realiza denota seu
“saber” linguístico.

Situação é o estado ou condição de carácter económico, profissional, social ou afectivo que envolve
os usuários da língua. O repertório lexical e o tipo de estruturas sintácticas com que o falante se
dirige ao interlocutor assinalam preferências que evidenciam maior ou menor formalidade. Essas
escolhas revelam a tendência para afinar o modo operacional como a língua será empregada (para
mais ou para menos convencionalismo) e podem garantir maior eficácia na interacção e
compreensão da mensagem numa dada situação.

A cada momento, em qualquer contexto, há contacto entre murtas pessoas de diferentes estratos
socioeconómicos em diferentes situações que vão exigir na conversação, mesmo que difusa,
mínima ou monossilábica, um nível de convenção predeterminado. Até as pausas ou a duração dos
silêncios são elementos significativos durante uma conversação. Aquilo que parece apropriado, e
oportuno, do ponto de vista estrutural, em determinado instante da fala define os limites do grau
de formalidade.

A formalidade é de natureza convencional, portanto, socioeconómica e cultural.

Qualquer pessoa pode empregar diferentes registros da fala em função de suas necessidades,
calculadas com antecedência ou no exacto momento em que ocorre a enunciação. Mais formal ou
menos formal são apenas dois aspectos de uma série de modos de amoldamento da linguagem.

Uma adolescente pode utilizar registros bem diferentes em um único dia, como, por exemplo,
quando fala com suas amigas ou com seu namorado, com um pretendente ou com a mãe, com o
pai ou com o director da escola, com um professor ou alguém na rua a quem pede uma informação.

O registo coloquial é a forma mais democrática e frequente de emprego do idioma. O processo de


variação dialetal da língua padrão ao uso coloquial (ou no sentido inverso) ocorre em todos os níveis
de estruturação da linguagem.

A linguagem coloquial (do latim colloquium: “ação de falar junto”, “conversa”) é aquela em que
ocorre a troca de palavras, de ideias entre duas ou mais pessoas numa situação de conversação
sobre assunto definido ou não. E um fenômeno típico entre pessoas que por algum motivo passam
a conviver por um breve momento ou a frequentar um mesmo lugar, instaurando uma certa
familiaridade.

Não se deve confundir língua culta com língua coloquial. A fronteira entre a língua culta (falada) e
a língua coloquial (também falada) é muito tênue, mas o estudo desse assunto não deve trazer
confusão. Uma característica típica da linguagem coloquial é o uso do discurso repetido.
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A palavra “idiotismo” vem do grego (idiotismos) e significa “gênero de vida simples e particular”.
Era a linguagem específica das pessoas simples. Mais tarde passou a significar linguagem corrente
ou vulgar. No latim, com uma pequena variação semântica, era empregada com o significado de
“estilo familiar”. Tem a mesma raiz de idioma (“característica própria do indivíduo”, mais tarde com
a acepção de “língua própria de um povo”) e idiota (“indivíduo simples, do povo”).

Nos estudos sociolinguísticos, o idiotismo constitui propriedade típica ou construção peculiar a um


determinado idioma e que não encontra correspondência literal na maioria das outras línguas. O
idiotismo, também chamado idiomatismo, geralmente é representado por uma locução ou
expressão própria, específica da língua, cuja tradução literal não faria o menor sentido numa outra
língua, mesmo que de estrutura análoga. Conhecidas como expressões idiomáticas, essas
estruturas frequentes na linguagem coloquial constituem parte daquilo que o linguista romeno
Eugenio Coseriu chamou de discurso repetido.

Foi também Coseriu quem mais pertinentemente chamou a atenção para a intertextualidade,
fenômeno estudado como formas do discurso repetido. Essas formas constituem superposição de
um texto em relação a outro. Muitos textos preexistentes na língua são constantemente
resgatados, recuperados, relidos, reinterpretados, restabelecendo-se como disponíveis para
contínua reintegração no discurso.

São três os tipos de formas do discurso repetido, a saber:

(a) Textemas ou unidades de texto; que são representados pelos provérbios, brocardos, slogans,
ditados populares, citações de vários tipos, consagradas pela tradição cultural de uma comunidade.

Quem ama o feio, bonito lhe parece.

Tudo vale a pena, se a alma não é pequena. (Fernando Pessoa)

Amai o próximo como eu vos amei. (Cristo)

Só sei que nada sei. (Sócrates)

(b) Sintagmas estereotipados ou expressões idiomáticas; que são representados por frases que
somente têm sentido para os falantes de determinada língua. Embora seja possível traduzir
literalmente de uma língua para outra, essas frases parecem sem sentido, já que, na própria língua
em que foram criadas, remetem a um sentido conotativo, metafórico.

Mãos à obra!

Deixou tudo de cabeça para baixo.

Vamos pôr tudo em pratos limpos.

Ela tem pavio curto.

(c)Perífrases léxicas; que são representadas por alianças usuais de vocábulos, formando aquilo que
chamamos de clichês ou frases feitas. Essas unidades plurivocabulares são assim chamadas porque
são elaboradas com duas ou três palavras de uso muito frequente. A listagem desses sintagmas é
extensa. Geralmente não são lexicalizadas nem dicionarizadas (como ocorre com as frases
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idiomáticas incluídas em qualquer bom dicionário), e são desaconselhadas nas redações dos
grandes jornais.

3.1.3. Jargão, gíria e tabuísmo

O jargão tem um conceito mais restrito. É o dialecto usado por determinado grupo social que busca
se destacar por meio de características particulares e marcas linguísticas também exclusivas. Há o
jargão dos médicos, o jargão dos advogados, o jargão dos economistas, entre outros.

Esses grupos, em geral mais prestigiados na hierarquia social, buscam, consciente e ao mesmo
tempo involuntariamente, a não-inserção daqueles que compartilham dessa iniciação.

A palavra “gíria” tem uma origem controvertida que se confunde com a origem de “jargão”. Ambas
provavelmente vieram do espanhol jerga, com o significado de “linguagem difícil”, “linguagem
vulgar”, ou do occitano gergon, “gorjeio dos pássaros”, que mais tarde passou também a significar
“geringonça”, “linguagem vulgar”, “calão” e “jargão”.

A gíria é a linguagem informal caracterizada por um repertório lexical diminuto, mas com uma rica
força expressiva. Constituída de idiotismos e expressões metafóricas ou metonímícas curtas, cujos
significados remetem a ditos de anuência geralmente jocosos ou lúdicos, a gíria apresenta uma
estrutura concisa e desembaraçada. É eficiente em seu dinamismo efêmero, Costuma ser usada por
todo grupo social que pretende se diferenciar por meio de características particulares e marcas
linguísticas exclusivas.

No passado, a gíria esteve associada à linguagem de bandidos, de marginais, dos párias sociais.
Embora não devesse, a princípio, ser compreendida por outros indivíduos de classes sociais
diferentes, acabou se tomando, na sociedade de massas de nosso tempo, um fenômeno de
comunicação. É ainda hoje um mecanismo de diferenciação e de coesão dos grupos em que ela se
origina. E constitui-se, de fato, em um elemento fundamental na evolução de qualquer idioma.

O tabuísmo vem da palavra “tabu” (do inglês taboo), de origem polinésia, segundo o aventureiro
inglês James Cook (1728-1779), para referir-se a ritos sagrados e proibições religiosas. Mais tarde,
Sigmund Freud (1856-1939) usou-a para designar a proibição de atos contrários aos padrões morais
da época.

Hoje, além desses sentidos, tabu também pode significar “proibição de tocar, fazer ou dizer algo”.
Essa interdição de ordem socioeconômica e cultural, sobre a qual se evita falar por pudor, ou por
respeito ao interlocutor ou à situação, faz com que o falante busque alternativas lexicais para as
palavras consideradas chulas, grosseiras ou ofensivas demais na maioria dos contextos. Nesse
conjunto estão os chamados palavrões. Geralmente, referem-se ao metabolismo humano ou
animal (“peidar”) e aos órgãos e às funções sexuais.

As variedades ou variações linguísticas são, de certa forma, subordinadas a campos


seguintes: variedades ou variações diatópica ou geográfica, variedades ou variações
históricas, variedades ou variações diastráticas, variedades ou variações diafásicas.
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(i) Variação histórica - É a comparação das diferentes etapas da história de uma língua, quer
dizer, aquela que se dá através do tempo comparando gerações. É através do estudo da variação
diacrónica que percebemos que as línguas que falamos hoje são resultados longos anos ou épocas
diferentes. Em muitos estudos , o estudo da variação e da mudança se faz com a observação da fala
e de textos escritos antigos. Há que mostrar a relação fala e escrita na documentação do passado
(CEZARIO, 2009).

“Para alguns autores, a linguística histórica é a história da língua escrita, mas sem a fala não se
escreve, pode-se entrever ou entreouvir a voz através dos textos: tarefa difícil e apenas
aproximativa, ouvir o inaudível”. (CEZARIO, 2009).

As LB's moçambicanas por terem sido ágrafas desde a origem é quase impossível estudar como era
a língua no séc. XIV, por exemplo. A obtenção de fontes, segundo Berlinck; Barbosa; Marine (2008,
p.170) é um dos grandes problemas que os pesquisadores de língua enfrentam nos seus trabalhos.

(ii) Variação diatópica ou geográfica - relaciona – se com as diferenças linguísticas distribuídas


segundo o espaço geográfico ou espaço físico, observáveis entre falantes de origens
geográficas distintas, ou seja, são as responsáveis pelos chamados regionalismos,
provenientes de dialectos ou falares locais. As variedades geográficas também conduzem
à oposição entre linguagem urbana e linguagem rural. Ex. Brasileiros e Portugueses;
Cariocas, Gaúchos e Baianos.

(iii) Variação diastrática ou social - relaciona-se a um conjunto de factores que têm a ver
com a identidade dos falantes e também com a organização sociocultural da comunidade
de fala.
As variações de natureza social são factores que estão associados à classe social, idade,
sexo e situação ou contexto social. A seguir, demonstramos como cada variável interfere
na variação social:
(a) Classe social- a classe social a que pertence o indivíduo exerce fortes influências na
maneira de falar do mesmo. É bastante fácil apontar exemplos de variantes linguísticas usadas
preferencialmente numa determinada classe e isso pode ser objecto de estudo empírico. Um
médico e o porteiro do seu prédio possuem falares diferentes.
Como em qualquer outro domínio social, também na sala de aula encontramos grande
variação no uso da língua. Essa variação pode se dar na fala entre colegas e mesmo na
linguagem da professora que, por exercer um papel social de ascendência sobre seus
alunos, está submetida a regras mais rigorosas no seu comportamento verbal e não
verbal.
(b) Idade - a variação de linguagem ligada à idade pode ser facilmente observada no seio das
famílias. Os avós falam diferentes dos filhos e dos netos; o uso de léxico particular, como
presente em certas gírias (“maneiro”, com sentido de uma avaliação positiva) denota uma
faixa etária mais jovem. A gíria é um exemplo perfeito para demonstrar essa variação.

(c)Sexo - é ponto pacífico que mulheres e homens não falam de maneira igual. Além das
diferenças observáveis no tom de voz, no ritmo, podemos perceber, também, que há
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preferência por certas estruturas sintácticas, pelo emprego de determinados vocábulos,


pela omissão de outro, etc. O tema da relação entre sexo e linguagem tem sido privi-
legiado na sociolinguística, dando margem à inúmeras pesquisas que buscam testar as
mais diversas hipóteses sobre o que de fato pode ser atribuído, em termos de variação,
ao sexo. O que é observável na relação entre a fala masculina e a feminina é a duração de
vogais como recurso expressivo, como em “maaaravilhoso”, assim como o uso frequente de
diminutivos, como “bonitinho”, costumam ocorrer na fala feminina. É importante destacar
que homens e mulheres são social- mente diferentes no sentido de que a sociedade lhes
confere papéis distintos e espera dos mesmos que utilizem padrões de comportamento
também distintos. Assim sendo, a linguagem apenas reflecte o fato social. As diferenças
linguísticas devidas ao factor sexo surgem porque a língua como fenómeno social está
intimamente relacionada a atitudes sociais.

(d) Situação ou contexto social - qualquer pessoa altera a sua fala, de acordo com o(s)
seu(s) interlocutor (es) – se este é mais velho ou hierarquicamente superior, ou ainda,
segundo o lugar em que se encontra: um bar ou uma conferência. Todo falante varia sua
fala segundo a situação em que se encontra. Uma situação é definida pela concorrência
de dois (ou mais) interlocutores mutuamente relacionados de uma maneira determinada,
comunicando sobre um determinado tópico, num contexto determinado.
Cada grupo social estabelece um contínuo de situações cujos pólos extremos e opostos
são representados pela formalidade e informalidade. O grau dessa variação será menor em
alguns domínios do que em outros. Por exemplo, no domínio do lar ou das actividades de
lazer, observamos maior variação linguística do que na escola ou na igreja. Mas em todos
eles há variação, porque a variação é inerente a toda comunidade linguística.
Exemplo: A situação de uma defesa de trabalho ou entrevista de emprego, em que a
linguagem deve ser formal e obedecer a certos critérios versus a comemoração que ocorre
à aprovação ou à admissão, envolvendo as mesmas pessoas num ambiente de
informalidade, com uso mais “frouxo” da linguagem.
As variedades linguísticas utilizadas pelos participantes das situações devem
corresponder às expectativas sociais convencionais. Aprende-se a falar na convivência.
Aprendemos quando devemos falar de um determinado modo, quando devemos falar de
outro e, ainda, quando devemos ficar em silêncio. Isso porque os membros de qual- quer
comunidade adquirem lenta e inconscientemente as competências comunicativas e
sociolinguística, com respeito ao uso apropriado da língua.
(iv)Variação diafásica/Estilística ou Registos – são as variações linguísticas relacionadas
ao contexto, ocorrem quando os falantes diversificam sua fala, usam estilos ou registros
distintos, em função das circunstâncias em que ocorrem suas interacções verbais.
Os falantes adequam suas formas de expressão às finalidades específicas de seu acto
enunciativo, sendo que tal adequação decorre de uma selecção dentre o conjunto de formas
que constitui o saber linguístico individual, de um modo mais ou menos consciente. A
selecção de formas envolve, naturalmente, um grau maior ou menor de reflexão por parte do
falante: o uso do estilo formal, em relação ao informal requer uma actuação mais consciente.
Esta variação centra - se na comparação entre a língua falada e língua escrita.
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3.1.4. As variedades linguísticas e a estrutura social

Em qualquer comunidade de fala podemos observar a coexistência de um conjunto de


variedades linguísticas. Na realidade objectiva da vida social, há sempre uma ordenação
valorativa das variedades linguísticas em uso, que reflecte a hierarquia dos grupos sociais.
Em todas as comunidades existem variedades que são consideradas superiores e outras
inferiores. “Uma variedade linguística ‘vale’ o que ‘valem’ na sociedade os seus falantes,
isto é, como reflexo do poder e da autoridade que eles têm nas relações económicas e
sociais” Gnerre (1985, p.4). É evidente a existência de variedades de prestígio e de
variedades não prestigiadas nas sociedades em geral. Tradicionalmente, o melhor modo
de falar e as regras do bom uso correspondem aos hábitos dos linguísticos dos grupos
socialmente dominantes. Na tradição ocidental – a variedade padrão.

3.1.5. Variedade padrão – representa o ideal de homogeneidade em meio à realidade


concreta da variação linguística - algo que por estar acima do corpo social, representa o
conjunto de suas diversidades e contradições.
A variedade padrão não detém propriedades intrínsecas que garantem uma qualidade
“naturalmente” superior às demais variedades. A padronização é historicamente definida:
cada época determina o que considera como forma padrão. O que é padrão hoje pode
tornar- se não padrão, e o que é considerado não padrão pode ser estabelecido como
padrão.
Ex. “dereito”, “despois”, “frecha”, “premeiramente”, são encontradas na Carta de Pero Vaz
Caminha, de 1500. E “frauta”, “escuitar”, “intonce” em Os Lusíadas, de Camões, de 1572.
Falar em línguas “simples”, “inferiores”, “primitivas”, para a linguística não tem nenhum
fundamento científico. Toda língua é adequada à comunidade que a utiliza, sendo um
sistema completo que permite a um povo exprimir o mundo físico e simbólico em que
vive. É absolutamente impróprio dizer que há línguas pobres em vocabulário. Não existem
também sistemas gramaticais imperfeitos.

Se uma determinada sociedade necessitar de um léxico específico, pode ser feito um


empréstimo linguístico ou pode ser criada uma nova palavra em função do novo conceito.
Os aspectos gramaticais apresentam-se sempre como sistemas organizados e coerentes
de regras. Uma língua não é homogénea, é produto de sua história e de seu presente, não
existem línguas nem variedades “inferiores”. “Julgamos não a fala, mas o falante, e o
fazemos em função de sua inserção na estrutura social”. As avaliações sociais feitas em
relação a uma língua se baseiam em critérios não linguísticos: são julgamentos de natureza
política e social. Não é casual, portanto, que se julgue “feia” a variedade dos falantes da
zona rural, de classe social baixa, com pouca escolaridade, de regiões culturalmente
desvalorizadas.

Para a sociolinguística as diferenças linguísticas observáveis nas comunidades em geral


são vistas como um dado inerente ao fenómeno linguístico. Porém, há outros
“(des)entendimentos” sobre o fenómeno da variação linguística que deram origem ao que
ficou conhecido como preconceito linguístico.
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3.1.6.Preconceito linguístico – é a não aceitação da diferença linguística, é um


comportamento social facilmente observável. Ocorre como rejeição a certas variedades,
concretizada na desqualificação de pronúncias, de construções gramaticais e de usos
vocabulares, sendo compartilhada sem conflito pelo senso comum. Existe sempre um
conjunto de variedades linguísticas em circulação no meio social. Aprende-se a variedade
a que se é exposto, e não há nada de errado com essas variedades. Os grupos sociais dão
continuidade à herança linguística recebida.

Os grupos situados em baixo na escala social não adquirem a língua de modo imperfeito,
não deturpam a língua “comum”. Pensar que a diferença linguística é um mal a ser
erradicado justifica a prática da exclusão e do bloqueio ao acesso a bens sociais. Trata-se
sempre de impor a cultura dos grupos detentores do poder aos outros grupos e a língua
é um dos comportamentos do sistema cultural.
Cabe aos usuários das variedades não padrões adoptarem a variedade socialmente aceitável
pelo menos, em certas circunstâncias, como em situação de fala pública ou durante uma
entrevista de emprego.
A motivação para falar de um outro modo é sempre social, e isso pode ser produzido
pela escola, ou pela experiência social.

Marcos Bagno em sua obra sociolinguística publicada em 1997, “A língua de Eulália”,


procura mostrar que o uso de uma linguagem “diferente”, nem sempre pode ser
considerado um “erro de português”. Esse modo diferente das pessoas falarem pode ser
explicado por algumas ciências como a Linguística, a História, a Sociologia e até mesmo a
Psicologia.
Embora a nossa tradição educacional negue a existência de uma pluralidade dentro do
universo da Língua Portuguesa e não aceite que a norma culta seja uma das muitas
variedades possíveis no uso do português, a “Língua Portuguesa” está em constante
modificação e recebe notadamente, a influência de palavras pertencentes a outros
idiomas, principalmente dos imigrantes que chegam a todo o momento ao Brasil, entre
eles, portugueses, americanos, japoneses, alemães e italianos.
Entre outras coisas, o livro “A Língua de Eulália” (2003) mostra que, na comparação entre
o português-padrão e o português–não-padrão o maior preconceito apontado não são
exactamente as diferentes linguísticas que prevalecem, mas sim, as diferenças sociais,
mostrando que esses preconceitos são comuns, como por exemplo, o étnico: o índio
“preguiçoso”, o negro “malandro”, o japonês “trabalhador”, o judeu “mesquinho”, o
português “burro”; o sexual: a valorização do “macho”; o cultural: o desprezo pelas práticas
medicinais caseiras, além dos socio- económicos, como a valorização do rico e o desprezo
pelo pobre; entre outros.

3.1.7. Mudança Linguística


Atribulações históricas têm feito com que numerosos povos mudem de língua no decurso dos
tempos. A adopção de um idioma novo acarreta o esquecimento, a morte do antigo, que as novas
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gerações vão progressivamente desprezando. São, de fato, os povos que, seduzidos pelo superior
prestígio de uma outra língua, adoptam-na em prejuízo daquela que haviam recebido dos
antepassados.
As mudanças linguísticas são exclusivamente funcionais e culturais. Essas mudanças só ocorrem
porque apresentam maior eficácia nas funções que são próprias à língua. São, nesse sentido,
utilitárias e práticas, e podem ser comprovadas em qualquer aspecto da língua. Por oposição a
outros elementos, ocorre uma eliminação do acessório (ou acidental), ficando apenas o que
distingue ou apresenta traço distintivo.

Além disso, aquilo que é cultural cria mais condições para que a mudança ocorra. A normatividade,
que caracteriza o sistema linguístico, e a adesão dos falantes à sua própria tradição linguística fazem
com que a língua apresente condições de relativa estabilidade e, portanto, de resistência à
mudança. Nenhum elemento se insere ao sistema se não tiver existido antes na fala e, por extensão,
na norma.

As circunstâncias históricas não são causas determinantes da mudança. Esses factores que se
constituem no conjunto de modos e princípios de comportamento, conhecimentos, crenças,
costumes, valores intelectuais, morais e espirituais afectam, mas não se reflectem de forma
paralela ou automática na estrutura interna da língua.

A mudança da língua é um fenómeno muito complexo. A morte de uma delas é precedida de um


período de bilinguismo – presença de duas línguas, mais ou menos longo, em que se trava árdua
luta pela supremacia. O que decide a vitória é o prestígio que decorre de: valor utilitário, glória
literária e situação social dos falantes (cf. SILVA NETO, 1957). Pouco a pouco, o que menos satisfaz
essas condições vai sendo falada por um número cada vez menor de pessoas e acaba por ser
relegada ao uso das camadas sociais inferiores. Logo, a língua é totalmente esquecida nos centros
urbanos e o seu emprego se limita a círculos rurais cada vez mais afastados.

3.1.8. O professor moçambicano diante da variação

Nesta parte tentaremos demonstrar quais os problemas que o professor moçambicano enfrenta
diante dos seus alunos, no ensino da disciplina de português.

As frases apresentadas em 2.3 e 2.6 mostram a diferença na relação à PE e o PM, pois “não existe
comunidade linguística alguma em que todos falem do mesmo modo e porque, por outro lado, a
variação é o reflexo de diferenças sociais, como origem geográfica e classe social, e de
circunstâncias da comunicação.” (CAMACHO, 2011, p.35). Vimos também que mesmo em Portugal
onde seria referência tem vários “dialectos” espalhados pelo país, facto que ilustra que nenhuma
língua é falada de forma homogénea.

Há no PM influências das LB. Vejamos alguns exemplos de Dias (2009, p.243):

Possíveis causas dos erros ao nível da coordenação

Ex: Mina na yena hiya ebazara. (língua xichangana)

*Eu com ele vamos ao mercado. (língua portuguesa).


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Esta é uma tradução linear do xichangana para português. O aluno transfere construções
gramaticais da sua língua materna para português, mas enfim a frase se torna agramatical.

Tem problemas de coordenação por que a LM do aluno não respeita as normas da LP. Segundo Dias
os verbos kulelelana (despedir-se) e kuhambana (divorviar-se) selecionam a preposição ni que
exprime companhia, o que contrasta com a LP que para os seus equivalentes seleciona a preposição
de que exprime afastamento. Porque o aluno se habituou, em tsonga, a associar a noção de
companhia aos verbos anteriormente referidos, ao usar a LP vai juntar aos seus equivalentes
preposições que exprimem companhia. (DIAS, 2009, p.241)

Várias construções transferidas das LB para PM passamos a citar exemplos de Dias (2009). O
asterisco diante de um enunciado ou palavra representa uma forma agramatical, isto é, uma
ocorrência inexistente no PE e no PB.:

*Ele negou com o pão dele. (xichangana: yena ayalile ni pawu rakwe.)

*Ela não quer com a casa dela (xichangana: yena angalavi ni kaya kakwe)

Para além destes exemplos, há no PM tendências em omitir artigos (ex.

*Governo da Província de Niassa); Aparecimento de passivas dativas (ex. *Eu

fui dito que não ias); acrescimento de vogal de palavra que terminam com consoantes

(ex. *Encontrari); problemas de concordância nominal (ex. *A maior parte fizeram); dificuldades de
concordância verbal (ex.* Existe pessoas.);

Aparecimento de passivas dativas (ex. *Eu fui dito não ias) dentre vários outros casos.(Dias, 2009,
p. 405-406). Por fim, há que considerar muitos empréstimos vindos do xichangana: *tchovar
(empurrar) e *timbileiro (xilofone) e estrangeirismos:

*tseque (folhas comestíveis dos quais se prepara um molho), *mulala (raiz usada para escovar e
tratar a cárie nos dentes).

Se o professor não percebe o “desvio” ao PE como poderá corrigir estas frases ou unidades lexicais
nos cadernos ou na fala dos seus alunos? É claro que vai perpetuar normas do PM mesmo pensando
que está falando/escrevendo o PE. Infelizmente, ainda há preconceito linguístico em Moçambique
no que diz respeito à variação/mudança. Muitos professores ainda reprimem qualquer tipo de
variação. Contrariamente a essa ideia, a escola não pode ignorar as diferenças sociolinguísticas e os
alunos têm de estar bem conscientes de que existem duas ou mais maneiras de dizer a mesma coisa
e que não podem desprezar nem ter preconceito para quem fala de forma diferente da sua. O
importante é sublinhar que é “papel da escola, portanto, facilitar a ampliação da competência
comunicativa dos alunos, permitindo-lhes apropriarem-se dos recursos necessários para se
desempenharem bem, e com segurança, nas mais distintas tarefas linguísticas.” (cf. BORTONI-
RICARDO, 2009, p.74). Desta forma, os professores acham que punindo os erros dos alunos, através
de reprovações resolve-se os problemas de aprendizagem.

Acredita-se que a norma europeia é a “mais certa” e essa que é exigida aos alunos. Até parece para
professores falam como “portugueses nativos”. Sobre o ensino da variação, Bagno (2009) defende
que
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Devemos apresentar aos nossos alunos todas as opções que a língua oferece, explicar o
funcionamento dessas regras, os processos gramaticais que ocorrem em cada uma e os produtos
que deles resultam. Devemos também ter a honestidade de explicar o valor social atribuído pelos
falantes culturas a cada uma dessas estratégias [...] o ensino dessas formas padronizadas
conservadoras não pode vir acompanhado da atitude tradicional da escola de negar todo e
qualquer valor às regras não-padrão, de despejar uma enorme carga de preconceito contra as
opções sintácticas mais antigas ou mais inovadoras da língua, acusando elas de serem feias, erradas,
estropiadas, etc. (BAGNO, 2009, 157-158).

Falta um pouco de “honestidade” do sistema educativo moçambicano e por parte dos professores
de português porque se enganam quando afirmam que a norma mais correcta é a portuguesa,
como se eles falassem tal como em Lisboa. Resultados dessa atitude são as reprovações “em massa”
dos alunos

na disciplina de português. Concordamos com Cagliari (2009, p.24) quando A variação linguística e
o ensino do português em Moçambique 273 afirma que “o professor de língua portuguesa deve
ensinar aos alunos o que é uma língua, quais as propriedades e usos que ela realmente tem, qual é
o comportamento da sociedade e dos indivíduos com relação aos usos linguísticos, nas mais
variadas situações de sua vida.” O que acontece em Moçambique com relação a variação linguística
é muito bem discutido pela Bortoni-Ricardo (2009) no livro Educação em língua materna: A
sociolinguística na sala de

aula onde a autora apresenta resultados de uma pesquisa realizada em sala de aula, da qual
concluiu que: O professor identifica “erros de leitura”, isto é, erros na decodificação do material
que está sendo lido, mas não faz distinção entre diferenças dialectais e erros de decodificação na
leitura, tratando-os todos da mesma forma; O professor não percebe uso de regras não padrão.
Isto se dá por duas razões: ou o professor não está atento ou o professor não identifica naquela
regra uma transgressão porque ele próprio a tem em ser repertório. A regra é, pois, invisível para
ele; O professor percebe o uso de regras não padrão e prefere não intervir para não constranger o
aluno; O professor percebe o uso de regras não padrão, não intervém, e apresenta, logo em
seguida, o modelo da variante padrão. (BORTONI-RICARDO, 2009, p.38).

Estes aspectos constituem peça fundamental para as “reprovações em massa” ou ainda na fraca
qualidade dos alunos moçambicanos. É frequente o aluno chegar ao fim do ensino médio, com
dificuldades enormes de utilizar a norma-padrão.

Outra observação é a de que os professores não percebem que estão diante de uma variante do
PE, isto é, estão diante do PM.

Um facto mais marcante é a preferência dos alunos em outras disciplinas excepto a disciplina da LP.
Outro aspecto a remarcar é que professores cuja sua LM é diferente com a do aluno tendem a
corrigir mais a fonética/pronúncia dos alunos. Este aspecto mostra que as diferenças da LM fazem
como que “falsos erros” dos alunos sejam detectados imediatamente. A gramática ainda é
aprendida como “camisa-de força” faltando a ideia de que saber falar português não é saber recitar
as normas da gramática. Falta este espírito, pois na maioria dos casos, se perde muito tempo com
gramática n ormativa ao invés de se tentar perceber como a variante moçambicana funciona. O
léxico do PM precisa ser explicado aos alunos, de forma clara e concisa, porque a escola é o espaço
de partilha dos saberes. De forma alguma devemos considerar as construções típicas como
“incorrectas” pois, elas são bem conhecidas pelos alunos, são ouvidas todos dias, aparecem nos
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meios de comunicação e fazem parte do português falado naquele ponto geográfico. Acreditamos
que em Angola, na Guiné-Bissau, em Cabo Verde hajam características linguísticas específicas,
porque para aqueles que esperam que os indivíduos saiam da escola dominando um padrão
linguístico que eles chamam de correto, isto é, de acordo com uma norma linguística idealizada,
imposta e, em parte, configurada nos manuais tradicionais de ensino, o ensino do português está
em crise, faliu, porque, a não ser alguns poucos - por já trazerem do berço na sua fala o essencial
desse padrão – dos milhões de escolarizados não sairão da escola, tal como hoje ela é, dominando
esse padrão idealizado e considerado o correto. (MATTOS e SILVA, 2004, p.73).

Pode-se trabalhar questões de variação nas aulas de português. O maior problema está com os
alunos das grandes cidades. Referimo-nos às crianças que têm o português como língua materna,
cujo número vem crescendo de forma acelerada ao longo destes últimos dez anos. Da pesquisa que
se fez em crianças das escolas da Cidade de Maputo, por exemplo, concluiu-se que elas entram na
escola com conhecimento da LP, aliás, do PM. (cf. TIMBANE, 2009). A LP tem causado muitos
problemas de aproveitamento escolar deste o início da nova era (Moçambique independente). Por
sua vez a escola se sente confiante de estar no “caminho certo” pois considera a gramática como
uma “receita mágica” para que os alunos saibam falar muito bem a LP. Para Perini (2005) é um mito
pensar que o conhecimento da gramática é a condição fundamental para saber falar uma língua.
Comentando sobre este mesmo assunto, Neves defende que o tratamento da gramática no espaço
escolar deve respeitar a natureza da linguagem, sempre activada para a produção de sentidos, o
que se opera nesse jogo entre restrições e “escolhas que equilibram o sistema [..] pois a língua é
dinâmica e variável, é um sistema adaptável, sempre em acomodação, de tal modo que só na sua
face sociocultural se poderá admitir a existência de moldes e modelos.” (NEVES, 2009, p.85). Neves
conclui dizendo que a gramática não pode ser oferecida como uma “camisa-de-força” para os
alunos facto que infelizmente acontece também na escola moçambicana. Por outro lado, a maior
parte da população de Moçambique usa as LB e assim, seria importante que se avançasse para uma
educação bilingue em que a LP é estudada em paralelo

com a LP, principalmente nas classes iniciais. Ngunga afirma que é injusto que uma criança não
avance na sua carreira escolar só porque lhe é imposta uma A variação linguística e o ensino do
português em Moçambique 275 barreira que é o português. “O uso na escola de uma língua
desconhecida como

veículo de ensino-aprendizagem fomenta timidez no estudante e desenvolve a arrogância do


professor.” (NGUNGA, 2007, p.4).

Bortoni-Ricardo revela que a escola se concentra na língua da cultura dominante desprezando a


fala do grupo populacional desfavorecido. É por isso que o comportamento linguístico é um
indicador claro da estratificação social.

Para Bortoni-Ricardo (2006) e para Bagno (2008) a escola não pode ignorar as diferenças
sociolinguísticas. Os professores e, por meio deles, os alunos têm de estar bem conscientes de que
existem duas ou mais maneiras de falar a LP e assim, é preciso transformar a escola num lugar de
inserção inevitável entre o saber erudito-científico e o senso comum, e que isso deve ser usado em
favor

do aluno e da sua formação como membro da sociedade. Apesar da escola ser considerada a
guardiã da norma e do bom-uso linguístico não consegue controlar certas formas características no
meio social em que o indivíduo está envolvido.
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Vejamos alguns exemplos de Dias (2009, p.393):

* Eu não vi ele ontem. (PM) vs Eu não o vi ontem. (PE)

* Tou chatiada. (PM) vs Estou aborrecida. (PE)

* Deixa eu pegar o telefone. (PM) vs Deixa-me pegar no telefone.(PE)

* Ninguém lhe deixou ferrar. (PM) vs Ninguém o deixou dormir.(PE)

As frases em asterisco (*) mostram a agramaticalidade com relação á norma nos PE. As frases em
asterisco mostram uma das características do PM e resultam de certo modo da transposição de
construções sintácticas da LB para PM, facto que é normal em Moçambique. Se o professor está
pouco avisado pode deixar passar estas frases em redacções e em outros textos. Aliás, ser professor
não é sinónimo de ser “especialista em gramática” da LP. Contestar estas frases seria o mesmo que
dizer os “moçambicanos não sabem falar português”. É o 2º mito apresentado por Marcos Bagno
no seu livro Preconceito linguístico: O que é, como se faz”. Bagno (2009, p.40) se defende
explicando que o “brasileiro sabe português, sim”. Quando dizemos que Brasil se fala português,
usamos esse nome simplesmente por comodidade e por uma razão histórica, justamente a de
termos sido uma colónia

de Portugal. Muitas pessoas ainda não percebem que o PM existe e precisa ser estudado e
apresentado em forma de gramática e dicionários. Matosse (2013) num artigo publicado no Jornal
“Notícias” (08 e 09/03/2013) escreve sobre os erros que são cometidos ao falar “português”.
Matosse escreve: Frequentemente, oiço professores de português, talvez por gravíssima
distracção, a dizer aos seus alunos, ainda que com algum carinho: *Meus meninos, abrem vossos
cadernos. Análise: esta frase não se enquadra em nenhum dos tipos de frase, 276 Alexandre
António Timbane que certamente o leitor terá aprendido: declarativo, exclamativo, interrogativo e
imperativo. Sem dúvida, à primeira análise, parece-nos adequar-se ao imperativo. (MATOSSE, 2013,
Grifo nosso).

Esta afirmação do Matosse prova mais uma vez de que o preconceito linguístico é uma realidade
em Moçambique. A norma européia é a mais exigida e há impressão de que moçambicanos devem
falar tal como se fala em Portugal.

A norma é artificial e nem mesmo em Portugal todos conhecem a gramática ou falam tal como está
previsto nas gramáticas. Ainda bem que o Matosse percebe que “muitos professores” falam da
forma como ele considera errado. A língua é propriedade do colectivo e não da individualidade. Se
há muitos que falam ou escrevem assim, é prova mais que suficiente de que a variante
moçambicana está a se consolidar de forma mais acelerada.

Voltando para os debates no Brasil, é importante sublinhar que a questão de preconceito linguístico
resiste no meio de alguns linguístas e no meio da sociedade em geral, tal como se viu nos debates
sobre o livro escola Por uma vida melhor. Como ficou esclarecido, com a temática pretende-se
mostrar que há variedades de língua para cada contexto social, cultural, económico, tecnológico,
geográfico e até mesmo político. O importante é saber enquadrar os falares para cada contexto. A
escola não pode ficar reprimindo, mas sim devia apoiar a diversidade linguística para que o
preconceito não prevaleça na nossa sociedade porque a escola deve “contribuir para o
desenvolvimento de uma pedagogia sensível às diferenças sociolinguísticas e culturais dos alunos e
isto requer uma mudança de postura da escola, dos professores, dos alunos e da sociedade em
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geral”. (cf. BORTONI-RICARDO, 2006, p.130). Quem disse que em Portugal se fala português da
mesma forma em todas as regiões? Aí a situação se complica ainda mais.

A escola deve ser o local que propicia e conduz uma reflexão profunda sobre o funcionamento da
linguagem e ela tem de garantir que seus alunos entendam que têm de adequar registros segundo
os contextos; garantir que hajam condições de mover-se nos diferentes padrões de tensões ou de
frouxidão, em conformidade com as situações de produção. (cf. NEVES, 2009, p.128). Não é
camuflando situações que podemos formar um cidadão linguisticamente são, porque se assim for
a educação em Moçambique continuará a ser “falsamente democratizada”, seguindo “a tradição
normativo-prescritiva cujo modelo é a um português padrão idealizado, fundado originalmente no
português europeu.” (MATTOS e SILVA, 2004, p.137). A questão é variação é muito profundo sendo
que a escola moçambicana pouco faz. Cagliari (2010) escreveu uma obra intitulada Alfabetização e
A variação linguística e o ensino do português em Moçambique linguística onde defende que “para
a escola aceitar a variação linguística como um facto linguístico, precisa mudar toda a sua visão de
valores educacionais.”

Enquanto isso, não acontece, o autor acrescenta que “os professores mais bem esclarecidos
deveriam pelo menos discutir o problema da variação linguística com seus alunos e mostrar-lhes
como os diferentes dialectos são, por que são diferentes, o que isso representa em termos das
estruturas linguísticas das línguas”. (opt.cit, 2010, p.71). Por conseguinte, a sociedade em geral
devia abandonar o preconceito linguístico que se verifica, principalmente na educação. A língua é
propriedade colectiva e espelha a realidade da sociedade. Sendo assim, ela vai de acordo com as
ansiedades dos falantes, dos contextos socioculturais facto que faz com que seja não seja estático
evoluindo ao longo do tempo. Portanto, conforme frisamos num dos capítulos anteriores, qualquer
língua varia, e o fenómeno variação é universal.

3.1.9. Características do léxico presente nos livros escolares e debates sobre ensino

Mas, o ensino primário em Moçambique tem enfrentado sérios problemas: primeiro, o tipo de
ensino (alunos com LP como língua materna usam o mesmo livro com aqueles que têm a LP como
língua segunda); segundo, os conteúdos (seguem a norma europeia e não toleram nenhuma
variação). Os conteúdos dos livros tentam convencer ao aluno que a norma-padrão é a mais correta
e que a gramática seria o “único remédio mágico” para “saber falar” português. Ao analisarmos os
livros de 1ª a 7ª classes constatamos que há estrangeirismos e empréstimos vindos das LB bem
como da língua inglesa. Os textos são adaptados para que se aproximem ao PE o que é, ao nosso
ver, uma tentativa de “apagar” a realidade sociolinguística moçambicana. Há uma tentativa da
parte dos autores de apagar estrangeirismos e empréstimos linguísticos presentes nos textos dos
escritores moçambicanos. Por vezes essas tentativas são fracassadas.

Vejamos alguns exemplos extraídos de manuais (livros de alunos) em uso:

a) “Para festa eu levei o frango à zambeziana, mucapata e mucuane.” (4ª classe, p.51)

b) “Algumas dessas madeiras são muito valiosas, como a chanfuta, o pau-preto, a umbila e o
jambirre.” (4ª classe, p.52)

c) “A vovó explicou-me que se chamam timbilas.” (5ª classe, p.42).


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4. O livro da 4ª classe, por exemplo tem os subtítulos “falar e escrever bem” que se dedicam ao

ensino da gramática normativa. Tem 33 tópicos gramaticais. O livro da 5ª classe tem 38 tópicos

gramaticais, em que a sequência é: “Texto, interpretação do texto, gramática” e finalmente o da 6ª


classe tem o título “Funcionamento da língua” onde se aprofunda a gramática de forma sistemática.

d) “A preparação de theka inicia a festa.” (5ª classe, p.52).

e) “Veículo é o carro, o machimbombo, o camião, a motorizada, a bicicleta

e tchova.” (5ª classe, p.110).

f) “Madala continuou imóvel: machamba é como o mar.” (5ª classe, p.140).

g) “Pois foi stora, adoeceu mesmo.” (6ª classe, p.30).

h) “Pr’a semana prometo talvez nos vejamos, quem sabe?” (6ª classe, p.20).

i) “Nhamussoro foi chamado e com o seu soco enorme contendo bugigangas diversas chegou.” (6ª
classe, p.90).

j) “E para ele somos todos misters e misses - Acrescentou Toshiro.” (6ª classe, p.128).

k) “Em que período do dia matabichas, almoças e jantas?” (1ª classe, p.29).

As unidades lexicais em itálico nas frases de (a) à (k) representam um pouco do tipo do léxico que
os manuais dos alunos apresentam. São palavras inseridas no contexto do PM e só são percebidas
com muita facilidade pelos falantes da variante moçambicana. Temos aqui a presença de palavras
vindas das LB (madala, nhamussoro, mucuane, timbilas, etc) do inglês (machimbombo, misters,
misses).

A nível lexical a situação é mais visível, mas a nível sintáctico aparece um “pouco camuflado” para
quem não tem domínio da norma-padrão. Segundo Stroud e Gonçalves (1997, p.13) um teste
recente sobre aceitabilidade e correcção de frases entre falantes letrados de Português, conduzido
pelo do Instituto Nacional do Desenvolvimento da Educação (INDE), revelou que partes de frases
que de facto estavam corretas, segundo a Norma-Padrão Europeia (NPE) eram consideradas
inaceitáveis e corrigidas pelos sujeitos testados. Esse teste é mais uma prova de que o NPE está
pouco presente na fala dos moçambicanos apesar da insistência dos professores em sala de aula.
Se os professores não dominam o NPE como corrigirão as redacções dos alunos? Nota-se que os
professores nasceram, cresceram e aprenderam neste contexto sociolinguístico, o que são
“anormalidades” em relação à NPE parecem “normais”, quer dizer, professores não chegam a
identificar “os erros”. E mais, os professores do ensino primário não têm ensino superior, se
seguíssemos o conceito de “norma-culta” não estariam aptos a falar, nem a ensinar a NPE.

Contrariamente ao que acontece com os manuais do ensino primário (fundamental), no ensino


secundário (médio) os textos são menos “censurados” e recomenda-se a leitura de várias obras
literárias. Aí, entende-se a essência do PM. Orientações do Ministério da Educação quanto ao
ensino da LP determinam que
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A variação linguística e o ensino do português em Moçambique o ensino da literatura será feito de


forma sistemática, a partir do tratamento de diferentes tipologias textuais inerentes aos três modos
literários: narrativo, lírico e dramático. Neste âmbito, pequenos textos ou extractos de textos
servirão de pretexto para o estudo, quer dos aspectos formais e linguísticos que lhes são
específicos, quer dos elementos culturais e ideológicos por eles veiculados. (MINED, 2010, p.9).

Estas orientações abrem espaço para que o professor e os alunos usufruam da literatura
moçambicana que está bem recheada de empréstimos, neologismos, estrangeirismos de todo tipo.
É preciso que a sala de aulas seja um espaço de debate de discussão das diferentes variedades
linguísticas que a LP apresenta.

É preciso aproveitar esta prorrogativa das orientações do MINED dar oportunidade ao aluno de
fazer uma reflexão aprofundada sobre a LP bem como das LB que fala ou conhece.

Atribulações históricas têm feito com que numerosos povos mudem de língua no curso dos
tempos. A adopção de um idioma novo acarreta o esquecimento, a morte do antigo, que as
novas gerações vão progressivamente desprezando. São, de fato, os povos que, seduzidos pelo
superior prestígio de uma outra língua, adoptam-na em prejuízo daquela que haviam recebido
dos antepassados.

A mudança da língua é um fenómeno muito complexo. A morte de uma delas é precedida de um


período de bilinguismo – presença de duas línguas, mais ou menos longo, em que se trava árdua
luta pela supremacia. O que decide a vitória é o prestígio que decorre de: valor utilitário, glória
literária e situação social dos falantes (cf. SILVA NETO, 1957). Pouco a pouco, o que menos
satisfaz essas condições vai sendo falada por um número cada vez menor de pessoas e acaba por
ser relegada ao uso das camadas sociais inferiores. Logo a língua é totalmente esquecida nos
centros urbanos e o seu emprego se limita a círculos rurais cada vez mais afastados.

3.1.10. Falares e dialectos


Quando as diferenças entre o jeito de falar de uma região e outra são poucas, podemos chamar
essas maneiras diferentes de falar "falares". Quando as diferenças são numerosas e sistemáticas, e
atingem não só a pronúncia e o léxico, mas também a gramática, podemos chamar as variedades
regionais "dialectos". Para a Sociolinguística, "dialecto" significa uma variação regional.

O português brasileiro e o português europeu são considerados dialectos do português, e na escrita


são quase idênticos. Mas o brasileiro que não está acostumado a ouvir o português europeu vai ter
muita dificuldade de entender alguém falando fluentemente. Os linguistas consideram que
actualmente as duas variedades são tão diferentes que constituem dois sistemas linguísticos
distintos, ou seja, que são duas línguas diferentes.

3.2. Famílias de línguas

Uma família de línguas é um grupo de línguas aparentadas historicamente e que parecem derivar
de uma língua mais antiga que, por diversificação dialetal, deu lugar a diferentes línguas,
normalmente ininteligíveis entre si. Em sentido estrito, uma família de línguas é agrupamento de
línguas que derivam de um ancestral comum.
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Os estudos comparativos mediante os métodos da linguística histórica têm permitido provar que a
maioria das línguas não estão isoladas, elas formam grupos ou famílias. O estudo de muitas famílias
tem permitido reconstruir as diversas protolínguas ou línguas ancestrais.
O ancestral comum à maioria de famílias não é conhecido ou conhecido só de forma directa em
poucas ocasiões, já que o registo histórico da maioria das línguas é muito curto. No entanto, é
possível recuperar muitas das características do ancestral comum de línguas relacionadas
aplicando o método comparativo – um procedimento de reconstrução desenvolvido no século XIX
pelo linguista August Schleicher.
As famílias de línguas podem ser subdivididas em unidades menores, normalmente denominadas
ramos (a história de uma família de línguas representa-se frequentemente como uma árvore
genealógica).
O ancestral comum de uma família (ou um ramo) conhece-se como "protolíngua". Por exemplo, a
protolíngua reconstruída da bem conhecida família indo-europea é o proto-indoeuropeu (desta
língua, no entanto, não se conservam restos escritos, já que foi usada antes da invenção da escrita).
A seguir, apresentamos algumas famílias de linguas indo – europeia:
Grande Família: Indo-Europeu

Família: línguas germânicas


Línguas: alemão, dinamarquês, holandês, inglês, norueguês,
sueco

Família: línguas românicas


Línguas: catalão, espanhol, francês, italiano,
português

Família: línguas célticas


Línguas: irlandês, gaélico escocês, galês,
bretão

Família: línguas helênicas


Línguas: grego

Família: línguas eslávicas


Línguas: croata, polonês, russo, tcheco

Família: línguas indo-arianas


Línguas: bengali, hindi, nepali

As linguas de sinais também apresentam conexões históricas. Assim, por exemplo, a moderna língua
de sinais francesa, a língua de sinais norte-americana e a língua de sinais mexicana têm evoluído a
partir de variantes da mesma língua: a antiga língua de sinais francesa (usada pela comunidade de
surdos de Paris durante o século XVIII). Já a língua de sinais britânica não tem parentesco com a
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língua de sinais norte-americana, ainda que os britânicos e os norte-americanos ouvintes usem


variantes do inglês. Isto é, um usuário de língua de sinais norte- americana terá menos dificuldade
para comunicar-se com um usuário de língua de sinaiss francesa que com um usuário de língua de
sinais britânica.
Famílias conhecidas de línguas de sinais:
Baseadas na Língua Francesa de Sinais (LSF). Línguas originadas na antiga língua de sinais
francesa, da que derivam a moderna língua de sinais francesa (LSF), a língua de sinais americana
(ASL), a língua brasileira de sinais (LIBRAS), a língua de sinais mexicana (LSM), a língua de sinais
venezuelana (LSV), a língua de sinais italiana (LIS), a língua de sinais da Irlanda (IRSL), a língua de
sinais chilena (LSCH) e as línguas de sinais ibérias: a língua de sinais espanhola (LSE), a língua de
sinais catalã (LSC).
O mapa a seguir ilustra a trajectória das linguas:

Fonte:
http://planetageo.sites.uol.com.br/f
mapas.htm

O fluxograma 1 demonstra esta relação de parentesco entre as línguas no continente americano:

Antiga LSF

ASL LSM
LIBRAS

LS LSC
V H
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O fluxograma 2 demonstra a relação de parentesco entre as línguas no continente europeu:


Baseadas na Língua Britânica de Sinais (BSL). Línguas originadas na língua de sinais britânica
(BSL), que se diversificou durante o século XIX dando lugar à língua de sinais australiana (Auslan),
a língua de sinais de Nova Zelandia (NZSL) e a língua de sinais da Irlanda do Norte (NIRSL).

Fonte:
http://planetageo.sites.uol.com.br/f
mapas.htm

O fluxograma 3 demonstra a relação de parentesco entre as línguas originadas da BSL:

BSL

NZS Auslan NIRSL


L

Baseadas na língua de sinais alemã (DGS). Línguas originadas na língua de sinais alemã (DGS),
que se considera relacionada com a língua de sinais da Suíça alemã (DSGS), a língua de sinais
austríaca (ÖGS) e provavelmente a língua de sinais israelita (ISL).

Fonte:
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Fonte: http://planetageo.sites.uol.com.br/fmapas.htm
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O fluxograma 4 demonstra a relação de parentesco entre as línguas


originadas da DGS:
DGS
DSG ISL
S

ÖGS

Baseadas na língua de sinais de Kent (KSL).


Línguas originadas na antiga língua de sinais de Kent, usada durante o século
XVII, que deu lugar à língua de sinais utilizada em Martha's Vineyard
(Massachusetts) e que influiu de maneira importante na língua de sinais
americana (ASL).

Fonte:
http://planetag
eo.sites.uol.co
m.br/fmapas.ht
m

3.2.1.A distribuição das línguas

As línguas são distribuídas de modo desigual no mundo. Os falantes de apenas


uma língua, o chinês mandarim, somam quase um bilhão de pessoas (quase
15% da população do mundo).
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Se acrescentarmos as 7 línguas mais faladas no mundo (inglês, espanhol,


hindi/urdu, árabe, russo, bengali, português), chega-se a uma porcentagem
entre 40 e 45% da população mundial. Se esses 45% da população falam 8
línguas, os próximos 50% falam outras 300 línguas; e os últimos 5% falam as
mais de 6.000 línguas restantes.
Assim percebemos a imensa desigualdade de distribuição das línguas.
Enquanto uma língua (chinês mandarim) é falada por quase 1 bilhão de
pessoas, existem centenas de línguas que são faladas por menos de 1000
pessoas, ou 100 pessoas, ou mesmo 10 pessoas, como no caso de algumas
línguas indígenas brasileiras.
Mas, como destaca McCleary isso nem sempre foi assim.

“Antigamente havia muito mais línguas no mundo, apesar de a população ser menor. Cada local,
cada grupo, tinha sua língua. A hegemonia das "grandes línguas" começou com a tecnologia da
escrita e o estabelecimento das civilizações que dominavam grandes áreas geográficas e impunham
suas línguas. Só no Brasil, estima-se que na época do descobrimento havia por volta de

1.175 línguas indígenas. Hoje há pouco mais de 180. Isso quer dizer que, nos últimos 500 anos, com
a dominação da civilização européia no Brasil, 1.000 línguas foram perdidas. Ainda hoje dezenas de
línguas indígenas brasileiras estão ameaçadas de extinção. A morte de línguas continua
acontecendo. Alguns linguistas estimam que, nos próximos 50 anos, 50% das línguas que existem
hoje – 3500 dos quase 7000 línguas – vão morrer” (p. 9).

Sumário

Com o propósito de alcançarmos os objectivos desejados na presente unidade


fizemos referência à variedades ou variações linguísticas e seus tipos, factores
ou variáveis associadas a variações linguísticas e no mundo e particularmente em
Moçambique, sem deixarmos de lado o fenómeno de mudança linguística e
falares e dialectos. Abordamos também acerca de famílias linguísticas no mundo
bem como a sua distribuição.

AUTO-AVALIAÇÃO

Questões de Escolha Múltipla


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1. O que entende por variação linguística?


a) Variação linguística é a diversa forma de uso da língua.
b) Variação linguística é a inversa forma de uso da língua.
c) Variação linguística é a diversão enquanto se usa a língua.
d) Todas as alternativas estão correctas.

2. Defina variação diacrónica.


a) Variação diacrónica tem a ver com o não uso da língua de acordo com
os tempos.
b) Variação diacrónica tem a ver com o uso da língua de acordo com os
tempos.
c) Variação diacrónica não tem a ver com o uso da língua de acordo com os
tempos.
d) Todas as alternativas estão correctas.

3. Defina variação diastrática.


a) Variação diastrática corresponde ao uso da língua segundo os extractos
sociais.
b) Variação diastrática corresponde ao não uso da língua segundo os
extractos sociais.
c) Variação diastrática corresponde ao uso da língua segundo os extractos
religiosos.
d) Todas as alternativas estão correctas.
4. Defina variação diafásica.
a) Variação diafásica uso da língua ignorando os contextos.
b) Variação diafásica uso da língua segundo o valor monetário.
c) Variação diafásica uso da língua segundo os falantes.
d) Variação diafásica uso da língua segundo os contextos.

5. O que é variedade padrão?


a)Variedade padrão não corresponde a norma da língua, é a mais prestigiada
numa sociedade.
b) Variedade padrão corresponde a norma da língua, é a menos prestigiada numa
sociedade.
c) Variedade padrão – corresponde a norma da língua, é a mais prestigiada numa
sociedade.
d) Variedade padrão – corresponde a norma da língua, é a mais prestigiada no
mundo.

Questões de Verdadeiro e Falso

6. Repertório verbal é um conjunto de línguas.


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7. Nem todas línguas estão sujeitas à variação.

8. A sociolinguística concebe a diversidade da linguística não como um


problema, mas como qualidade constitutiva do fenómeno linguístico.

9. Não há casualidade entre o facto de nascer em uma determinada


região, ser de uma classe social e falar de certa maneira.
10. Numa comunidade da fala pessoas de diferentes origens, idades e sexos
falam distintamente.

Questões de Reflexão
11. “A sociolinguística concebe a diversidade da linguística não como
um problema, mas como qualidade constitutiva do fenómeno
linguístico.” Comente.
12. Fale sobre a variação linguística.

Respostas:

1. A
2. B
3. A
4. D
5. C
6. Falso
7. Falso
8. Verdadeiro
9. Verdadeiro
10. Verdadeiro

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TEMA IV: LINGUAGEM, SOCIALIZAÇÃO E CLASSE SOCIAL

Introdução

Nesta unidade vamos abordar acerca da linguagem como factor social,


associado a classe social e a socialização.

▪ Relacionar a linguagem, socialização e classe social;


▪ Identificar aspectos da linguagem e classe social;
Objectivos ▪ Reconhecer a importância da linguagem como factor social;
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Específicos ▪ Distinguir as classes sociais e o poder linguístico.

Ao completar esta unidade, você deverá


ser capaz de:

4.1. O individuo: o ser social

O homem é um ser eminentemente social. Portanto, nós tornamo - nos sociais


quando nascemos, ou até mesmo antes, devido as nossas condições históricas.
Como isso acontece?

Em todos os momentos da nossa vida, diante da nossa formação filogenética e


ontogenética, somos influenciados pelos meios sociais. Então, não podemos
dizer que o homem é um ser isolado. Somos seres individualizados e, ao mesmo
tempo, colectivos, somos influenciados pela sociedade a partir das relações
culturais.

Por isso, estudar o processo de socialização, os agentes socializadores e o


conceito de identidade social é de fundamental importância para você
compreender os problemas sociais que ocorrem actualmente na nossa
sociedade.

Cada indivíduo, ao nascer, segundo Strey (2002:59), “encontra-se num sistema


social criado através de gerações já existentes e que é assimilado por meio de
inter-relações sociais”. O homem, desde seus primórdios, é considerado um ser
de relações sociais, que incorpora normas, valores vigentes na família, em seus
pares, na sociedade. Assim, a formação da personalidade do ser humano é
decorrente, segundo Savoia (1989, p. 54), “de um processo de

socialização, no qual intervêm factores inatos e adquiridos”. Entende-se, por


factores inatos, aquilo que herdamos geneticamente dos nossos familiares, e os
factores adquiridos provém da natureza social e cultural.

O homem é um animal que depende de interacção para receber afecto, cuidados


e até mesmo para se manter vivo. Somos animais sociais, pois o facto de ouvir,
tocar, sentir, ver o outro fazem parte da nossa natureza social. O ser humano
precisa se relacionar com os outros por diversos motivos: por necessidade de se
comunicar, de aprender, de ensinar, de dizer que ama o seu próximo, de exigir
melhores condições de vida, bem como de melhorar o seu ambiente externo, de
expressar seus desejos e vontades. Essas relações que vão se efectivando entre
indivíduos e indivíduos, indivíduos e grupos, grupos e grupos, indivíduo e
organização, organização-organização, surgem por meio de necessidades
específicas, identificadas por cada um, de acordo com seu interesse. O indivíduo
tem, para si, claras as características que o diferencia dos demais, como seus
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factores biológicos, seu corpo físico, seus traços, sua psiquê que envolve
emoções, sentimentos, volições, temperamento.

4.1.1. Agentes socializadores do processo de socialização

Vimos que fazemos parte de diversos grupos sociais e que é por meio desses
grupos que o nosso processo de socialização ocorre.

De acordo com Savoia (1989) temos, como agentes socializadores, três grupos,
que são : a família, a escola (agentes básicos) e os meios de comunicação em
massa.

O primeiro contacto que o ser humano tem, ao nascer, é a família:


primeiramente, com a mãe, por meio dos cuidados físicos e afectivos, e,
paralelamente, com o pai e os irmãos, que transmitem atitudes, crenças e valores
que influenciarão no seu desenvolvimento psicossocial. Num segundo momento,
tem a interferência da escola. Geralmente, nessa fase, o indivíduo já traz consigo
referências de comportamentos, de orientação pessoal básica, devido ao
contacto inicial com a família. Já os meios de comunicação em massa são
considerados como agentes socializadores, diante das inovações tecnológicas na
actualidade histórica, porém nem sempre eles têm consciência do seu papel no
processo de socialização e na formação da personalidade do indivíduo. Na família
e na escola, existe uma relação didáctica e, com a Televisão, a relação é diferente,
visto que a comunicação é directa e impessoal (Savoia, 1989).

O processo de socialização ocorre durante toda a vida do indivíduo (Savoia,


1989); por isso, esse processo é dividido em etapas, a saber:

Socialização primária; ocorre na infância com os agentes socializadores citados


anteriormente, que exercem uma influência significativa na formação da
personalidade social.

Socialização secundária; ocorre na idade adulta.

Geralmente, nessa etapa, o indivíduo já se encontra com sua personalidade


relativamente formada, o que caracteriza certa estabilidade de comportamento.
Isso faz com que a acção dos agentes seja mais superficial, mas abalos estruturais
podem ocorrer, gerando crises pessoais mais ou menos intensas.

Nesse momento, surgem outros grupos que se tornam agentes socializadores,


como grupo do trabalho.Socialização terciária; ocorre na velhice. Pela própria
fase de vida, o indivíduo pode sofrer crises pessoais, haja vista que o mundo
social do idoso muitas vezes se torna restrito (deixa de pertencer a alguns grupos
sociais) e monótono. Nessa fase, o indivíduo pode sofrer uma dessocialização,
em decorrência das alterações que ocorrem, em relação a critérios e valores. E,
concomitantemente, o indivíduo, nesta fase, começa um novo processo de
aprendizagem social para as possíveis adaptações a nova fase da vida, o que
implica em uma ressocialização. Todo esse processo de socialização que os seres
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humanos vivenciam está ligado à cultura do indivíduo, como também a uma


estruturação de comportamentos, à medida que aprendemos e os
internalizamos. Essa estruturação e atribuição de significados ocorrem por meio
da interacção com os outros.

Isso faz com que criemos expectativas sobre esses comportamentos diante do
grupo social, desenvolvendo papéis sociais, pois o processo de socialização pode
ser visto também como um processo pelo qual cada indivíduo configura seu
conjunto de papéis.

4.1.2. Papéis sociais

Ao nascer, já temos alguns papéis prescritos como idade, sexo ou posição


familiar. À medida que adquirimos novas experiências, ampliando nossas
relações, vamo-nos transformando, adquirindo outros papéis que são definidos
pela sociedade e cultura (Savoia, 1989). Em cada grupo no qual relacionamos,
deparamo-nos com normas que conduzem as relações entre as pessoas, algumas
são mais subtis, outras mais rígidas. São essas normas que caracterizam
essencialmente os papéis sociais e que produzem as relações sociais (Lane, 2006).
Entende-se que os papéis que adquirimos nas nossas experiências e relações vão
designar o modelo de comportamento que caracteriza nosso lugar na sociedade.
Esses papéis podem ser

objectivos ou subjectivos. Em relação a isso, Savoia (1989) assevera que outro


aspecto do papel social é que ele pode ser objectivo – aquilo que os outros
esperam de nós, ou subjectivo -, como cada indivíduo assume os papéis de modo
mais ou menos fiel aos modelos vigentes na sociedade.

Quando esses dois aspectos não coincidem, podem transformar-se em obstáculo


na interacção

social. Isso significa que a objectividade e a subjectividade configuram-se como


um processo dialéctico de desenvolvimento da configuração social, dinâmico, e
está em constante interacção na vida do indivíduo, como ser histórico, capaz de
promover transformações sociais, visto que o desempenho do papel nunca é
solitário. Porque desempenhamos vários papéis sociais (de filha(o),pai ou mãe,
patrão ou empregado), estes podem se cruzar por meio de uma situação
divergente gerando conflito de papéis. Essas incompatibilidades podem ocorrer
por diferentes motivos, como, por exemplo, o conflito de valores, que Pisani
(1996:140) cita: “um

cientista pode perceber que seus valores religiosos não se coadunam com a
experiência de laboratório que precisa desenvolver”. O que se percebe é que o
conflito de papéis pode variar quanto à intensidade, diante da importância que
se dá a cada papel de conflito, o que pode provocar perturbações na pessoa.
Além disso, dependendo do papel que o indivíduo exerce, ele adquire um lugar
na sociedade que é denominado de status, que, juntamente com os papéis
sociais, determinam sua posição social (PISANI, 1996). Então, papel é o
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comportamento, a acção, enquanto que o status é o prestígio que se adquire.


Savoia (1989:60) afirma que “o papel é o comportamento que os outros esperam
de nós e o status é o que acreditamos ser”. Nesse sentido, os papéis que
desempenhamos e os status que acreditamos ter, diante da sociedade, explicam
nossa individualidade, nossa identidade social e consciência de si mesmo que
adquirimos, a partir das nossas relações sociais.

Em jeito de conclusão podemos afirmar que o ser humano, na verdade, é fruto


das relações sociais. Ao mesmo tempo em que ele é individual, é também
colectivo, pois vive em um processo constante de transformação, desde o
nascimento até sua morte, por meio de interacções grupais (família, vizinho,
trabalho), sendo influenciados por padrões culturais. A cultura fornece regras,
padrões, crenças, etc., que são aprendidas no contexto das actividades grupais.
Então, é a partir dessa realidade sócio-histórica que nos socializamos. Por isso,
também estudamos os agentes.

Os socializadores do processo de socialização que são: família, a escola e os meios


de comunicação em massa. E à medida que nos socializamos, que ampliamos
nossas relações, vamos também adquirindo novos papéis sociais e status que
determinam nossa posição social na sociedade. A partir da compreensão desses
fenómenos sociais, temos condições de explicar por que somos do jeito que
somos e entender a nossa identidade social. Mas vimos que tudo isso depende
da capacidade de termos consciência de si mesmo, que também adquirimos, a
partir das relações sociais e dos papéis que desenvolvemos.

4.1.3. Linguagem e socialização

Não se pode negar a relação existente entre língua e sociedade, e a sociolinguística já


aborda a relação entre elas. Argumenta-se que a língua ganha significação a partir de
seu contexto de produção e que o falante não fala por si só, sua fala não é
fundamentada em sua individualidade, mas em uma colectividade social, sendo que
sua fala é representante de um grupo social, por isso, quando há variações linguísticas, o
valor social é transplantado para a forma linguística, isso quer dizer que quando há
duas formas linguísticas a que é produzida por grupo social de maior status,
geralmente, tem maior valor social.
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A forma linguística do falante reflecte sua posição social, muito embora a ascensão social
não apague por completo as marcas linguísticas da classe originária ou grupo social do qual
o falante pertencia.

O movimento de classe é um processo que não acontece sem tensões, mas se


desenvolve em meio às lutas sociais que são permeadas por movimentos de resistências
e contrarresistências.

O motor dessas lutas são as desigualdades sociais, sendo que grupos que possuem um
maior quantitativo de poder lutam para manter o seu nível de poder, enquanto os
grupos com menor quantitativo de poder resistem às acções de manutenção de poder
dos grupos considerados dominantes.

Os movimentos originam-se tanto nos grupos dominantes como nos grupos que se
posicionam contra a dominação e o resultado da luta entre esses grupos é o
fortalecimento de um grupo e o enfraquecimento do outro.

O movimento linguístico equipara – se ao movimento de classe, pois a língua é um


factor que permeia as lutas sociais, sendo que as formas prestigiadas da fala geralmente
são usadas pelos grupos sociais que possuem maior status social, por isso, as lutas
sociais são reflectidas no padrão linguístico do grupo social, isso porque ela é também
um identificador social. Sendo que o valor da forma linguística de um grupo social
equivale ao status social que esse grupo possui e, dessa forma, toda mudança linguística
depende da força social do grupo que a originou. Quando o grupo não tem força social
suficiente para implementar a mudança, sua forma linguística é estigmatizada.

4.1.4. A língua e o contexto sociocultural do falante

Conforme fizemos menção numa das partes deste manual, a língua não se realiza
num vácuo social. Ela não existe fora da sociedade, da mesma forma que a
sociedade não existe sem ela. A relação entre língua e sociedade não é uma
relação em que uma determina a outra, mas de interacção entre elas, em que uma se
reflecte na outra, num sistema de influências. Numa sociedade estratificada, a língua
não foge à estratificação. Ela não é um corpo à parte, ela reflecte a estruturaestratificada
da sociedade, pois “correlacionando-se o complexo padrão linguístico com diferenças
concomitantes na estrutura social, será possível isolar os factores sociais que incidem
directamente sobre o processo linguístico” (LABOV, 2008, p. 19). A língua é um
espelho pelo qual se pode observar o desenho da sociedade. Esta não é estática, da
mesma forma que a língua não o é, ambas evoluem constantemente num processo
de interactividade.
A evolução linguística não ocorre por si só. A mudança linguística não é autónoma,
ela não engendra a si mesma, ela faz parte de um processo de interacção social.
“Sabemos que cada palavra se apresenta como uma arena em miniatura onde se
entrecruzam e lutam os valores sociais de orientação contraditória. A palavra revela-se
no momento de sua expressão, como um produto da interacção viva das forças
sociais” (BAKHITIN, 2009, p. 67). A palavra é a materialidade da língua, é nela que a língua
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se realiza, mas não só na palavra em si, mas em todo um contexto no qual está
envolto o falante. O contexto de fala não pode ser excluído da significação linguística
e é em decorrência desse contexto que a língua evolui, transforma-se.
[...] não se pode entender o desenvolvimento de uma mudança
linguística sem levar em conta a vida social da comunidade
em que ela ocorre. Ou, dizendo de outro modo, as pressões
sociais estão operando continuamente sobre a língua, não
de algum ponto remoto no passado, mas como uma força
social ima- nente agindo no presente vivo (LABOV, 2008, p.21).

O desenvolvimento linguístico de uma comunidade tem relação com a sua vida social,
as pressões sociais operam também sobre a língua. Toda mudança social se propaga
também na língua da comunidade, há uma inter-relação entre uma e outra, sendo que
tanto uma como a outra vivem continuamente em processo de transformação, que
não são autónomos, mas interdependentes. Se a língua muda, não pode ser por si só.
Se ela surge por necessidade social, também é necessário que ela se transforme em
decorrência dela.
O desenvolvimento linguístico de um falante não é um processo centrado na sua
individualidade. O falante em si não é o senhor de sua língua, ele não fala a língua que
deseja, mas a língua que lhe é possível falar, com as formas verbais próprias de sua
comunidade linguística, que também é social, cultural e económica. A língua só se
constitui como tal devido às necessidades sociais, económicas e culturais, é só em
decorrência dessas necessidades que ela existe, e é em decorrência delas que ela se
desenvolve, sendoquenão sepodedeslocá-la deseu contextode realização sem que
ela perca significação.
A linguagem não é objectiva. Deve-se considerar a posição do sujeito em relação ao
tempo e ao espaço. Ela não visa à tradução objectiva das coisas, mas também não é
produto de um subjectivismo fundamentado na consciência de um sujeito deslocado
do tempo e do espaço. Em tododiscurso está presente o sujeito que o produz, masnão
é um sujeito que fala por si mesmo, ele fala a partir de uma determinada posição
social, o seu discurso ultrapassa a sua individualidade para se tornar voz de uma
colectividade, ou melhor, de um grupo social. O sujeito não se sobrepõe ao tempo e
ao espaço, mas ele é o que é em decorrência desses factores e de outros mais, por isso
que em um discurso encontra-se a presença do sujeito que fala, mas também do
contexto sociocultural no qual ele está inserido, o qual é parte constitutiva do
próprio sujeito. Assim, através do discurso, o sujeito não só revela algo, como também
a si mesmo e ao contexto sociocultural no qual ocupa determinadas posições
sociais.

4.1.5. A língua e os reflexos da posição social do falante


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A língua identifica, mas também diferencia os grupos sociais e os falantes desses


grupos. Ela marca a posição social do falante. Numa sociedade estratificada, ela é um
elemento de identidade de um grupo social e, ao mesmo tempo, é uma marca que o
diferencia dos outros grupos. Há níveis e barreiras na sociedade que são percebidos e
exercidos também na língua. Não é ela que cria a estratificação social, mas reflecte-a,
regista e marca essa estratificação. “São as classes que agrupam as profissões e as
separam. A língua registra essa separação: as funções exercidas por artesões não se
chamam profissões e sim ofícios” (GOBLOT, 1989, p. 38). A simples distinção entre
profissão e ofício demarca uma divisão de classe que se concretiza também na língua.
Não é a partir da língua que se supera a estratificação social. Ela por si só não é capaz de
desencadear mudanças radicais na estrutura social, mas é a partir dela que se
transmitem valores e ideias, ou seja, o conteúdo ideológico que alicerça e constrói os
fundamentos da sociedade.
A variação no comportamento linguístico não exerce, em si
mesma, uma influência poderosa sobre o desenvolvimento
social, nem afecta drasticamente as perspectivas de vida do
indivíduo; pelo contrário, a forma do comportamento
linguístico muda rapidamente à medida que muda a posição
social do falante. Essa maleabilidade da língua sustenta sua
grande utilidade como indicador de mudança social (LABOV,
2008, p. 140).

O falante não muda por si só sua maneira de falar. Não é a fala em si mesma que faz
com que o falante mude de posição social, mas, ao contrário,é amudançadeposição
social que faz o falante mudar sua maneira de falar. Porém essa mudança é relativa,
pois mesmo que o falante mude de posição social, sua língua não muda por
completo. Há marcas linguísticas que permanecem e fazem com que se perceba a
sua origem social. Há sempre uma barreira linguística a transpor quando se muda de
posição social, pois existe entre os diversos grupos ou classes de uma sociedade
barreiras que impedem o acesso dos grupos de status inferior a participarem
activamente das relações sociais de poder, uma delas é a barreira linguística, que se
constitui devido os grupos de status inferior não dominarem os códigos linguísticos
usados nas relações sociais da classe dominante. Consequentemente, quem não tem
acesso a esses códigos fica à margem também das relações de poder.
Não se pode dissociar a forma linguística da posição social do falante, pois uma se
reflecte na outra. Numa sociedade de classe, as mobilidades sociais se reflectem na
língua, muito embora, numa análise mais apurada, seja possível identificar a origem
social do falante que ascendeu a uma classe de status mais elevado. As marcas
linguísticas não se resumem à posição de classe, mas também às relações de género
e etnia, entre outras.
A ascensão de um sujeito a uma classe de maior status não se completa apenas no
âmbito económico, entre outras mudanças. Faz - se necessário também a do padrão
linguístico. Com isso se torna mais difícil transpor a barreira que separa as classes ou
grupos sociais. Para transpô-la é necessário que se distancie da classe de origem e se
nivele à classe que se deseja fazer parte. É um processo que se movimenta entre a
distinção e a identificação. “Passar de uma para outra classe é desligar-se da antiga,
sem que não se é aceito na nova, a qual não admite uma sociedade misturada”
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(GOBLOT, 1989, p. 15). A mudança de classe implica também mudança linguística. Os


sujeitos que estão mais próximos da fronteira de classe são os que procuram mais
acentuar o com portamento de classe. Esse processo é reflectido no fenómeno
linguístico denominado hipercorrecção, que se caracteriza devido ao fato “que os
falantes da classe média baixa vão além do grupo de status mais elevado em sua
tendência a usar as formas consideradas corretas e apropriadas para estilos formais”
(LABOV, 2008, p. 155), ou seja, as formas linguísticas prestigiadas, em situações formais,
são mais realizadas pela classe imediatamente inferior à classe de origem da forma
prestigiada.
Nessa situação há uma tendência à correcção linguística que, geralmente, leva o falante
a exageros linguísticos na tentativa de elevar sua forma linguística a outro padrão que
é considerado de maior valor social. O falante reconhece o valor social do padrão que
deseja realizar, porém não o realiza satisfatoriamente, nem no seu cotidiano nem em
situações formais, isso gera um desacordo entre o padrão que é produzido e o que se
deseja produzir.
A correção linguística, em casa e entre os outros, que os leva à hipercorreção, sua
insegurança que atinge seu auge nas ocasiões oficiais, gerando as “incorrecções”
por hipercorrecção ou as audácias angustiadas da facilidade forçada, são efeitos
dum divórcio entre os padrões de produção e os padrões de apreciação: divididos
de alguma forma contra si mesmos, os pequeno-burgueses são, às vezes, mais
“conscientes” da verdade objectiva dos seus produtos (o que se define na
hipótese sábia do mercado perfeitamente unificado) e os mais obstinados a
recusar, a negar e a contradizer seus esforços. Como é evidente, neste caso, que se
exprime através do habitus linguístico, isto é, da posição ocupada, sincrónica.
Essa linha limítrofe entre um nível e outro, entre uma classe e outra gera insegurança
no sujeito que ascende a outra classe ou grupo. Com isso, ele procura evidenciar a sua
nova condição e isso o leva a cometer excessos que evidenciam a sua insegurança no
que se refere ao comportamento social e linguístico. A insegurança linguística faz com
que o falante deseje realizar formas linguísticas que não fazem parte do seu quotidiano,
mas que ele reconhece como marcadores de prestígio, por isso, em situações formais,
ele as realiza num grau mais elevado que os falantes pertencentes ao grupo de origem
dessas formas linguísticas, mas na fala quotidiana, esse mesmo falante não realiza essas
formas linguísticas com o mesmo rigor. Isso demonstra que a língua é um fator de
identidade sociocultural. Mesmo quando um falante procura camuflar sua origem
sociocultural elevando sua fala a outro nível, ela distingue da dos falantes
originários do grupo social ao qual ele gostaria de identificar-se.
Fica evidente que uma forma de os indivíduos de um grupo social se diferenciarem
dos de outro grupo é através da diferenciação linguística, demarcando sua identidade
sociocultural. “Não surpreende, portanto, descobrir que as diferenças fonéticas se
tornam cada vez mais marcadas à medida que o grupo luta por manter sua identidade”
(LABOV, 2008, p. 49). A forma linguística de cada um diz de si o seu posicionamento
diante da realidade; através dela o falante se aproxima ou afasta-se de determinado
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grupo social, pois a fala carrega em si o acúmulo cultural e social do grupo ao qual
pertence e não só o desejo e as aspirações do falante comomembro desse grupo.
Diacronicamente, na estrutura social, hipercorreção inscreve – se como vimos, na
lógica da pretensão dos pequeno-burgueses que tendem a se apropriar antes da hora,
ao preço duma tensão constante, das propriedades das classes dominantes;
intensificando, particularmente, a insegurança e angústia em matéria de linguagem.

O poder das palavras reside no facto que elas não são pronunciadas a título
pessoal por aquele que não é seu “portador”: o porta-voz autorizado não age por suas
próprias palavras sobre as coisas, porque sua palavra concentra o capital simbólico
acumulado pelo grupo que lhe mandatou e que ele é o mandatário.
O capital cultural de um grupo social está presente na fala de um falante desse
grupo, o qual não fala por si só; ele fala em nome do grupo.Em uma comunidade
de fala existem vário s grupos sociais que se identificam a partir de aspectos
socioculturais inerentes a cada grupo. A forma linguística é um desses aspectos, pois
uma comunidadede fala não se caracteriza pela homogeneidade linguística, podendo
existir, em vez disso, uma estratificação linguística que se relaciona com a estratificação
social existente nessa comunidade.
Fica nítida a existência de barreira e nível dentro de uma comunidade de fala, pois “uma
comunidade de fala não pode ser concebida como um grupo de falantes que usam
todos as mesmas formas; ela é mais bem definida como um grupo que compartilha as
mesmas normas a respeito da língua” (LABOV, 2008, p. 188t). Isso quer dizer que a
língua de uma comunidade de fala não é homogênea, existem variações e
estratificações linguísticas dentro dela, pois o que constitui uma comunidade de fala não
é a unicidade da forma linguística, mas o compartilhamento de uma norma linguística
que se universaliza para essa comunidade, mas que não exclui a diversidade de formas
linguísticas no seu interior. Essa diversidade possibilita a existência de grupos sociais
distin- tos dentro da mesma comunidade de fala.
Cada grupo possui formas linguísticas diferenciadas e são elas que o identificam
como grupo. O que faz grupos distintos pertencerem a uma mesma comunidade de fala
é a possibilidade de interacção entre eles, pois compartilham das mesmas normas
linguísticas, mas se distinguem no uso particular da língua, ou seja, cada grupo cria
formas linguísticas próprias que possibilitam a sua distinção como grupo social. Daí
existirem formas linguísticas de prestígio e formas estigmatizadas dentro de uma
comunidade de fala. A existência dessa estratificação linguística dentro de uma
comunidade de fala correlaciona-se à estratificação sociocultural dessa comunidade. As
formas linguísticas de prestígio são consideradas códigos elaborados, que possibilitam
ao sujeito influir nas relacções sociais de poder. Quem não consegue produzir esses
códigos permanece em situação inferiorizada nas relacções de poder.
As condições de produção dos discursos são diversificadas, assim como o sujeito do
discurso não é um sujeito ideal, mas um sujeito real, que está submetido a certas
condições e circunstâncias. Quando ele profere um discurso, não fala de um lugar
vazio; ele ocupa uma posição social e a sua fala é um reflexo dessa posição. Sendo que
o processo de escolarização leva o sujeito a ter consciência do significado social da fala
e, com isso, desenvolver formas prestigiadas de falar, porém aque- les que pertencem
a grupos que não possuem prestígio social e cuja forma linguística não se aproxima
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das formas de prestígio apresentam dificuldades, às vezes insuperáveis, no processo


de aquisição das formas linguísticas de prestígio.
É no primeiro ano do ensino médio que o falante começa a
adquirir o conjunto de normas avaliativas [...]. Ele se torna
sensível ao significado social de sua própria maneira de falar e
de outras; a familiaridade total com as normas da comunidade
parece ser atin- gida aos 17 ou 18 anos de idade. Por outro
lado, a capacidade de usar formas prestigiadas de falar, [...], só é
adquirida relativamente tarde: os mais jovens parecem iniciar
esse processo aos 16 ou 17. Um jovem da classe operária ou
da classe média baixa nunca adquire no uso desta forma de
prestígio a segurança que os jovens da classe média alta
adquirem(LABOV, 2008, p. 168).

O processo de aquisição das normas linguísticas da comunidade de fala é demorado.


Dependendo do contacto do falante com as normas linguísticas, a aquisição pode
ocorrer mais cedo. Para um falante de classe média baixa, que não tem uma
exposição contínua às normas de prestígio, a aquisição é um processo demorado e
contínuo e não alcança o mesmo sucesso obtido pelos falantes de classe média alta,
que convivem continuamente expostos às normas de prestígio. A escola e a
universidade são instituições que favorecem o contacto com as normas prestigiadas,
assim, à medida que a escolarização avança, o sujeito toma consciência da estratificação
da língua e, geralmente, procura usar as formas de maior prestígio, pois “o correlato da
estractificação regular de uma variável sociolinguística no comportamento é a
concordância uniforme em reacções subjectivas a essa variável” (LABOV, 2008, p. 288).
Assim, o comportamento linguístico de um falante tem correspondência com a sua
reacção subjectiva, ou seja, se um falante produz determinada variável de prestígio é
porque ele tem uma reacção positiva a essa variável, ao contrário, se um falante produz
uma variável estigmatizada, ele não a reconhece como tal, na medida em que há um
reconhecimento o falante se esforça para realizar a forma não estigmatizada, pelo
menos em contexto estilístico mais monitorado.
Do facto que o domínio da língua legítima pode se adquirir pela familiarização, ou
seja, por uma exposição mais ou menos prolongada à língua legítima ou por
inculcação expressa de regras explícitas. As grandes classes de modos de
expressão correspondem às classes de modos de aquisição, ou seja, as formas
diferentes da combinação entre os dois principais factores de produção da
competência legítima, a família e o sistema escolar e de sua posição na estrutura
social. A escola, por sua vez, tem a responsabilidade de possibilitar o desenvolvimento
linguístico do estudante para que ele possa ampliar sua acção comunicativa dentro da
sociedade, porém ela não é capaz de realizar isso sozinha, pois faz parte de uma
estrutura social estratificada em que o padrão linguístico usado na escola se distancia
do padrão dos estudantes da classe trabalhadora, evidenciando a relação existente
entre língua e posição de classe, sendo que uma mudança linguística não ocorre
isolada do movimento de classe.
As relações sociais numa sociedade de classe são desiguais. Assim como as relações
de poder, essa desigualdade é reflectida no grau de classificação das relações entre
os grupos e nas relações internas de cada grupo. A classificação é uma forma de
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circunscrever os limites de cada grupo, definindo os elementos de identificação de


grupo e os de distinção em relação aos outros grupos.
A existência de uma classificação forte entre os grupos sociais reflecte uma
acentuada desigualdade entre eles, sendo que o objectivo dela é a manutenção das
desigualdades e, consequentemente, da própria estrutura social e de poder. O
processo de classificação é um movimento de cima para baixo, mas não se efectiva
sem resistência. Um dos reflexos dessa resistência é o enfraquecimento da própria
classificação. Nenhum movimento de cima para baixo se efectiva sem resistência, da
mesma forma que nem todo movimento tem esse sentido. A resistência,
geralmente, tem sentido contrário, de baixo para cima, mas não só a resistência, há
movimentos que se originam em baixo, da mesma forma não conseguem implantar
as transformações que objectivam devido às contrarresistências que vêm de cima.
Seja onde for que se origine o movimento, sempre há resistência ou contrarresistência,
sempre há confronto, e o que determina o sucesso ou insucesso do movimento são as
relações de força manifestadas nesse embate, que geralmente são desiguais, sendo
que “enquanto as relações de poder são uma relação desigual e relativamente
estabilizada de forças, é evidente que isso implica um em cima e um em baixo, uma
diferença de potencial” (FOUCAULT, 2013, p. 372), essa diferença de potencial é o
termómetro das lutas sociais e o que determina o recuo ou avanço do movimento.
O movimento deflagrado não recua ao seu ponto de origem. O confronto imprime
mudanças que fortalecem um grupo e enfraquecem o outro. O que sai fortalecido
não alcança plenamente seus objectivos, porque do outro lado houve um
quantitativo de força capaz de resistir às investidas de domínio e controle do outro
grupo. Toda mudança parte de um movimento, nem sempre de cima para baixo.
Quando tem esse sentido geralmente objectiva a manutenção do poder e o
fortalecimento do controle; quando tem sentido contrário, geralmente objectiva o
enfraquecimento do poder e do controle. Por isso, toda mudança que ocorre suscita
questões sobre a origem do movimento que a protagonizou; reconhecendo-se sua
origem compreende-se a natureza das mudanças.
A mudança social não é autónoma. Há sempre um movimento que a impulsiona.
Uma uma vez que a sociedade não é homogênea, os interesses dos grupos sociais
que a compõem não convergem para o mesmo fim e, devido à estratificação social,
são por vezes conflitantes. É do conflito social que surgem os movimentos que
engendram as mudanças, por isso, essas possuem, geralmente, duas orientações
distintas: uma para a reprodução e a outra para a transformação. Isso observa –se
em todos os âmbitos sociais, do económico ao linguístico.
A ordem social mantém –se sob o risco constante de desordenar-se, pois é
confrontada continuamente com ações de resistência, as quais se refletem em todos
os âmbitos da vida social. Sendo a língua um reflexo do grau de desenvolvimento de
uma sociedade e que seus valores são traduzidos na fala da comunidade, ela não
deixa de ser uma forma de demarcação social, porque as barreiras de classe também
são barreiras linguísticas e quando há um nivelamento de classe também há um
nivelamento linguístico. Dessa forma, “toda demarcação social é ao mesmo tempo
barreira e nível. É preciso que a fronteira seja uma escarpa, mas que acima da escarpa
haja um planalto” (GOBLOT, 1989, p. 20), ou seja, a ascensão social é uma mudança de
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nível que pressupõe a superação de uma barreira, esta superação recoloca o indivíduo
em outro nível que exige o seu desligamento com o nível suplantado.
As mudanças sociais são reflectidas no padrão linguístico e, da mesma forma que
estas, as mudanças linguísticas podem acontecer de baixo para cima ou de cima
para baixo como reflexo das lutas sociais no âmbito linguístico. Como não se pode
correlacionar os dados linguísticos com medidas de comportamento social que não
se pode fazer a comparação ao longo do tempo, o mais viável é “conectar o
comportamento linguístico com a medida do status atribuído ou adquirido pelos
falantes” (LABOV, 2008, p. 327), pois as mudanças na língua parecem “estar
correlacionadas com mudanças na posição dos subgrupos com os quais o falante se
identifica” (LABOV, 2008, p. 327), ou seja, a identificação social do falante interfere no
seu padrão linguístico, sendo que a língua pode ser considerada como identificador
de grupo ou classe social e há uma correlação entre mudança linguística e
movimento de classe.

Sumário

Na presente unidade abordamos acerca da linguagem, socialização e classe


social, sobretudo a relação existente entre estes três elementos.

AUTO-AVALIAÇÃO

Questões de Escolha Múltipla

1. O que marca a língua?


a) A língua marca a posição social do falante.
b) A língua marca a posição financeira do falante.
c) A língua marca a oposição social do falante.
d) A língua não marca a posição social do falante.

2. O que acontece quando um grupo não tem força suficiente para a


implementação da mudança linguística?
a) Quando o grupo não tem força social suficiente para implementar a
mudança, sua forma linguística é estigmatizada.
b) Quando o grupo não tem força social suficiente para implementar a
mudança, sua forma linguística não é estigmatizada.
c) Quando o grupo não tem força social suficiente para implementar a
mudança, sua forma linguística é aternizada.
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d) Quando o grupo não tem força social suficiente para implementar a


mudança, sua forma linguística é investigada.

3. Que significado ou representação tem a língua numa sociedade


estratificada?
a) Significado nenhum.
b) Numa sociedade estratificada, a língua é um elemento de identidade de
um grupo social e, ao mesmo tempo, é uma marca que o diferencia dos
outros grupos.
c) Numa sociedade estratificada, a língua é um elemento de identidade de
um grupo social e, em diferentes tempos, é uma marca que o diferencia
dos outros grupos.
d) Todas as alternativas estão correctas.

4. Que relação existe entre a forma linguistica e a posição social do falante?


a) Não se pode dissociar a forma linguística da posição social do falante, pois
uma se reflecte na outra.
b) Não se pode dissociar a forma linguística da oposição social do falante, pois
uma se reflecte na outra.
c) Não se pode dissociar a forma linguística da posição financeira do falante,
pois uma se reflecte na outra.
d) Não se pode dissociar a forma linguística da posição social do falante, pois
uma não se reflecte na outra.

5. Mencione pelo menos dois (2) elementos que reflectem as marcas


linguísticas do falante.
a) Os elementos que reflectem as marcas linguísticas do falante são o género
e etnia.
b) Os elementos que reflectem as marcas linguísticas do falante são o género
e a situação financeira.
c) Os elementos que reflectem as marcas linguísticas do falante são o género
e a religião.
d) Os elementos que reflectem as marcas linguísticas do falante são o género
e o estado civil.

Questões de Verdadeiro e Falso


6. A língua ganha significação a partir da colectividade.
7. A língua ganha significação a partir da individualidade.
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8. Não existe a relação entre a língua e a sociedade.


9. A língua tem reflexos na posição social do falante.
10. A língua manifesta – se fora da sociedade.

Questões de Reflexão
11. Diga por palavras suas, o que acontece quando um grupo não tem força
suficiente para a implementação da mudança linguística.
12. Fale sobre a mudança linguística.

Respostas:
1. A
2. A
3. B
4. A
5. A
6. Verdadeiro
7. Falso
8. Falso
9. Verdadeiro
10. Falso

Referências Bibliográficas

LOPES, A.J. A batalha das línguas: Perspectivas sobre a linguística aplicada em


Moçambique. Maputo: Imprensa Universitária.2004.

LYON, John. Lingua(gem) e Linguística: Uma introdução. Rio de Janeiro: LTC. Pp.
223-243, 2009.

PISANI, Elaine Maria. Temas de psicologia social. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1996.

SAVOIA, Mariângela Gentil. Psicologia social. São Paulo: McGraw-Hill, 1989.


UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

SAWAIA, Bader (Org.). As artimanhas da Exclusão: análise psicossocial e ética da


desigualdade social. 6. ed. Petrópolis, 2006.

STREY, Marlene Neves (Org.). Psicologia Social Contemporânea. 7. ed. Rio de


Janeiro: Vozes, 2002.

TEMA V: O BILINGUISMO

Introdução

Para esta unidade associada aos objectivos da mesma, vamos abordar acerca do
conceito de bilinguismo, graus de bilinguismo e tipos de bilinguismo, sem
deixarmos de lado a grande questão do ensino bilingue em Moçambique.

Ao completar esta unidade, você deverá


ser capaz de:

▪ Reconhecer os tipos de bilinguismo;


▪ Identificar os tipos de bilinguismo;
Objectivos ▪ Identificar os graus de bilinguismo;
Específicos ▪ Comparar os tipos de bilinguismo existentes;
▪ Reflectir em torno do ensino bilingue em Moçambique

5.1. Visão do conjunto

Ao longo do final do século XIX e na primeira metade do século XX, considerava


– se a situação de monolinguismo como a mais normal, porque aparentemente
era a mais dominante. A evolução rápida desta segunda metade do século XX,
um conhecimento melhor dos contextos geopolíticos de um grande número de
regiões do globo, um conhecimento mais esclarecido de situações antigas,
anteriormente pouco conhecidas, que são maioritariamente o facto de existirem
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minorias linguísticas muito numerosas no mundo, permitem a inversão desta


tendência actualmente.
A par dos agrupamentos geopolíticos antigos, que incluem no seu seio
comunidades linguísticas diferentes que conduzem um certo número de seus
membros a um bilinguismo de facto, a resolução dos conflitos resultantes dos
colonialismos militares, políticos ou económicos obrigaram certas jovens nações
a admitir a necessidade de um estado parcial de bilinguismo que será duradouro
ou temporário ignoramo-lo.

5.1.1. Conceito de bilinguismo

Do latim bilinguis, bilingue é um adjectivo que se utiliza em referência a quem


fala duas línguas ou àquilo que está escrito em duas línguas.
Exemplo: “A empresa multinacional necessita admitir um licenciado em
Administração 0preferencialmente bilingue Português – Inglês. Então, no
mercado laboral actual, ser bilingue é praticamente uma necessidade.
O bilinguismo (a capacidade de uma pessoa para utilizar duas línguas com
destreza e facilidade) pode ser nativo ou adquirido. Se uma criança for filho de
Portugueses , mas que tenha nascido e criado nos EUA, é provável que seja um
bilingue nativo, uma vez que, em sua casa, se fala Português , ao passo que, na
escola e na comunidade em geral, comunica em inglês.
O contexto sociolinguístico de bilinguismo, que implica o uso simultâneo de duas
línguas num mesmo espaço geográfico, económico ou politico devido a
coexistência nesse “espaço” de duas comunidades diferentes , é muito mais fácil
de captar que o estado individual de bilingue.
A noção de bilingue, por conseguinte, está associada a uma manejar perfeito de
duas línguas que possam ser utilizadas pelo indivíduo com toda a facilidade (na
medida em que se consegue expressar sem problemas em ambos os idiomas).
Um sujeito que tenha conhecimentos de outra língua fora o seu idioma materno
não será bilingue, uma vez que não se expressa com fluidez nessa língua.
Com a globalização, o bilinguismo (ou multilinguismo) tornou-se mais frequente,
uma vez que as viagens e as comunicações internacionais se massificaram.
Um ser humano pode viver num contexto sócio – político de bilinguismo sem que
seja bilingue, ao contrário, pode ser bilingue fora de qualquer contexto sócio –
político de bilinguismo. Considera – se bilingue o individuo que serve
correctamente de acordo com as situações do quotidiano de duas línguas para
se comunicar com o outro, devido à situação sociolinguística do seu ambiente de
origem ou de adopção. Pode – se diferenciar o bilingue do que se esforçou para
aprender, num contexto escolar, sempre artificial uma língua estrangeira que não
usa frequentemente e cujo uso sobretudo, não lhe é imposto pelas circunstâncias
particulares do meio social, que podemos denominar bilingualidade.
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A bilingualidade individual está intimamente dependente das situações sociais


do bilinguismo que a determina. Podemos classificar estas situações do seguinte
modo (na perspectiva da criança):

1º O bilinguismo familiar; resultante de um casamento misto entre a língua da


mãe, que pode ser

meio do social amplo onde a criança está inserida sendo a língua do pai alógena,
ou então situação contrária, a língua do pai é a do meio onde a criança está
integrada, e a da mãe é de fora. Neste segundo caso, a língua “materna” da
criança, no sentido amplo do termo é colocada em minoria pelo meio, facto que
pode originar situações conflituosas.

2º O bilinguismo de emigração; caracterizado pelo facto da criança ter de


enfrentar fora do contexto familiar, que geralmente é monolingue, uma língua
diferente que os pais não falam obrigatoriamente, ou que falam mal. Este tipo
de situação bilingue tende a desenvolver – se actualmente nos países mais ricos
devido ao afluxo de mão – de – obra estrangeira.

3º O bilinguismo geopolítico; que resulta do facto de duas comunidades


linguísticas diferentes, com direitos igualmente reconhecidos, viverem no mesmo
espaço geográfico e político.

4º O bilinguismo técnico – económico; que poderia ser designado de bilinguismo


de necessidade, pelo facto do individuo aprender uma língua de informação e
formação tecnológica que serve de garantia da sua sobrevivência económica e
que é usada pela elites e “quadros” a par de uma língua nacional ou regional.

Em termos históricos, estas situações de bilinguismo mais ou menos conflituosas


sempre existiram. Em situações mais confusas ou muito mais profundamente
minoritárias, determinadas comunidades judaicas, souberam no conjunto da
diáspora conservar o essencial do seu património – linguístico.

Uma situação de bilinguismo não é forçosamente geradora de conflitos, mas que


também pode, em m muitos casos, ser um factor de desenvolvimento de plena
realização de personalidade.

5.1.2. Critérios para classificação de bilinguismo

O bilinguismo como um dos fenómenos integrantes da sociolinguística classifica


– se de acordo com os parâmetros seguintes:

1.Proficiência nas línguas em questão;


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Esse critério diz respeito à capacidade do indivíduo no uso das duas línguas em
questão. A partir desse critério, é possível chegar a dois tipos de falantes bilíngues,
os balanceados e os dominantes:

a)Falante bilíngue balanceado: tem competência similar no uso das duas línguas.

b)Falante bilíngue dominante: tem melhor competência em uma das duas


línguas.

2. Idade de aquisição da segunda língua;

O termo aquisição de linguagem pela criança ou pelo adulto pode se referir


amplamente à aquisição da língua materna, de uma segunda língua e da língua
escrita (Scarpa, 2012:243-4). No caso aqui em questão, trata mais profundamente
da aquisição de uma segunda língua. A depender da idade em que adquirem a
segunda língua, os falantes bilíngues podem ser classificados em precoces
(subdivididos em tipos de bilinguismo simultâneo ou sequencial) e

tardios: Falante bilíngue precoce: adquire a segunda língua durante a infância,


sendo que a situação de aquisição pode ser de: Bilinguismo Simultâneo: a
aquisição das duas línguas se dá

ao mesmo tempo; Bilinguismo Sequencial: a aquisição da segunda língua se inicia


após a aquisição da primeira estar completa. Falante bilíngue tardio: adquire a
segunda língua durante a adolescência ou idade adulta. Essa questão do período
em que a segunda língua é adquirida traz um ponto bastante controverso nos
estudos linguísticos e psicolinguísticos: a existência de um período ideal, chamado
período crítico, para o desenvolvimento da linguagem. Alguns autores
consideram que existe um período ideal para o desenvolvimento da linguagem
pela criança e que, depois desse período crítico, a aquisição se torna muito mais
complicada, até deixa de ser um processo genuíno de aquisição e passa a se
configurar como um processo de aprendizagem de habilidades. Outros acreditam
que os argumentos utilizados até hoje não são

completamente convincentes para assumir esse período crítico.

3.Organização dos códigos linguísticos;

O terceiro critério refere-se ao modo como os falantes bilíngues organizam seus


códigos linguísticos. Isso, por sua vez, se relaciona à organização cognitiva. São
previstos, a partir deste critério, três tipos de bilinguismo:

(a) Bilinguismo incipiente; é o caso da competência mínima na língua, podendo


ser a capacidade de produção de algumas frases, pronunciar algumas
palavras na L2/Língua segunda ou mesmo compreendê-la.
Exemplo: falantes das línguas moçambicanas do grupo bantu que vivem ao redor
da cidade que entendem o Português sem realmente o falar. A língua tsonga é
alógena para os makuwas que vivem em Maputo.
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(c) Bilinguismo subordinado; o individuo é bilingue subordinado à L1 quando


para emitir palavras ou sentenças na L2 necessita primeiramente pensar na
L1 e traduzir na L2.
As formas que usa podem ser as da L2, porém estão sempre ligados aos
conceitos da L1.

(d) Bilinguismo coordenado; acontece quando o bilingue não apresenta quer


problemas de incipiência quer de subordinação. Os dois sistemas de língua na
sua competência linguística estão totalmente separados.

4. Status da língua em questão;

Este critério organiza o bilinguismo de acordo com o status social e político das
línguas dentro da sociedade em que são faladas. São propostos dois tipos:

Bilinguismo de Elite; o indivíduo fala a língua dominante dentro daquela


sociedade e também fala uma língua que lhe confere prestígio neste mesmo
grupo.

Bilinguismo Popular; esse tipo de bilinguismo ocorre em grupos linguísticos


minoritários. A língua falada não tem status elevado na sociedade em que seus
falantes estão inseridos.

5. Manutenção da Língua Materna;

Este critério diz respeito à manutenção (ou não) da língua materna no processo
de aquisição de segunda língua. Com relação a esse critério, o bilinguismo pode
ser de dois tipos:

(i)Bilinguismo Aditivo: o indivíduo adquire a segunda língua sem prejuízo da


primeira. Nesses casos, em geral, as duas línguas são valorizadas na sociedade
em que está inserido.

(ii)Bilinguismo Subtrativo: o indivíduo adquire a segunda língua às custas da


perda da língua materna. Nesses casos, em geral, a língua materna não é
valorizada na sociedade em que o falante está inserido.

6. Identidade cultural do indivíduo bilíngue;

O sexto e último critério de bilinguismo diz respeito ao tipo de identificação do


indivíduo com os grupos culturais que falam as suas línguas e se este indivíduo
quer ou não ser reconhecido como membro desses grupos. A partir daí, são
derivados quatro tipos de bilinguismo:

a)Bilinguismo bicultural: o falante identifica - se positivamente com os dois


grupos de falantes e é reconhecido como membro de ambos.

b) Bilinguismo monocultural: o falante tem competência bilíngue, mas somente


se identifica culturalmente com o grupo de sua língua materna.
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c) Bilinguismo aculturado: o falante renuncia ou é obrigado a renunciar da


identidade cultural do grupo de sua língua materna e adopta a identidade
cultural do grupo falante da segunda língua.

d) Bilinguismo deculturado: o falante renuncia da identidade cultural própria,


mas não passa a adoptar a identidade cultural do grupo falante da segunda
língua.

5.1.3. Tipos de interferências

A interferência consiste na utilização desadequada de estruturas e elementos


linguísticos da língua de partida, na língua de chegada. Existem diferentes tipos
de interferências, a saber:

a) Culturais – o elemento estrangeiro é consequência de um esforço para


exprimir novos fenómenos ou novas experiências numa língua. Ex: novas
tecnologias; introdução dos padrões de saudação ou argumento na
Língua segunda ou L2.
b) Semânticas – é devido a fenómenos de experiências comuns que são
classificados ou estruturados de modo diferente na outra língua. Ex: “
ouvir dores” resultante de ausência de verbos na língua de origem que
designam sensações.
c) Lexicais – quando palavras de língua A são introduzidas na B, vice-versa.

5.1.4. Elementos conflituosos das situações de bilinguismo

No estado de bilingualidade uma criança educada num meio familiar bilingue


somente reflectirá eventualmente no seu comportamento verbal perturbações
que correspondem às do seu meio. Por exemplo, quando há oposição cultural
entre o pai e a mãe, a criança, tomando partido por um ou por outro, pode
recusar – se a falar a língua de que é exposta em minoria, ou fazer a escolha
contrária.

Quando a família for monolingue, contudo vive num meio linguisticamente


oposto (bilinguismo de emigração) a criança pode opor – se a língua do meio
familiar, que aos seus olhos apresenta um valor social inferior para se empenhar
em usar apenas mesmo nos contactos familiares, a língua exterior à família.

Esta valorização da língua de fora em relação à do seio familiar não se deve


geralmente a uma apreciação objectiva das duas línguas em contacto na vida da
criança porém a simples preocupação de não ser ou parecer diferente das
outras crianças com as quais a vida escolar a põe em relação a quotidiana. Esta
questão, não se levantaria com toda acuidade se a prática da língua não
supusesse uma referência constante a toda uma gama de valores
extralinguísticos de ordem cultural. É, de facto frequentemente, um conflito
cultural, um conflito entre dois modelos de vida antagónicos que se apresenta à
criança desde a idade da escolarização.
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A língua maioritária é quase sempre, para a criança, ao do meio exterior, da


escola, da vida social, dos amigos.

Quando a língua do meio familiar domina, geralmente ocorre um conflito entre


o meio exterior e o universo íntimo da criança, facto que poderá gerar
consequências graves no seu desenvolvimento.

Um desenvolvimento harmonioso entre as duas línguas supõe influências que se


equilibrem e se completem e que se devem primeiramente a uma grande
harmonia familiar perante o meio linguístico exterior, aceite e vivido com um
sentido desenvolvido de adaptação de espirito de concessão servil e com uma
grande compreensão dos valores culturais hierarquicamente em presença.

Sendo assim, o bilinguismo será aceite como uma expressão de superioridade


cultural.

Este caso continua a ser, contudo, excepcional e a criança bilingue é quase


sempre uma criança desfasada, caso o meio escolar extrafamiliar não
restabeleça o equilíbrio o que infelizmente constitui um caso raro.
Manifestações patológicas podem traduzir, deste modo a confusão da criança.

Por volta de 1937, S. Borel- Maisonny e E. Pichon acusaram o bilinguismo ou


multilinguismo de favorecer a gaguez, de acordo com estes autores 14% dos
gagos seriam bilingues, enquanto que a proporção das crianças bilingues numa
proporção normal seria muito menor.

Para S. Borel- Maisonny, o bilingue está dividido entre dois sistemas de


pensamentos diferentes impostos por causa das estruturas gramaticais das duas
línguas. O bilingue tem a impressão que pensa nas duas línguas, de facto não
pensa em nenhuma delas, o seu pensamento não transforma facilmente em
linguagem, manifesta uma insuficiência lingui – especulativa que é o motivo da
sua gaguez.

12.1.5. Diglossia/Bilinguismo

A diglossia (do grego diglottos, bilingue) é um conceito sociolinguístico usado


para descrever toda situação social em que duas variedades de uma mesma
língua são usadas em domínios e com funções complementares. Exemplo: uma
variedade é usada em contextos formais, como a administração, religião,
enquanto a outra é reservada aos contextos de conversação, discussões
informais e correspondência não oficial.
O termo diglossia estendeu – se ao uso complementar institucionalizado de duas
línguas diferentes numa determinada comunidade ou região. Neste caso, uma
das línguas é destinada ao uso oficial enquanto a outra é usada na vida familiar
ou ainda privada.
Cada nação tem sua língua ou línguas oficiais como, por exemplo, o Canadá que
possui a língua inglesa e a francesa. Os países que possuem somente uma língua
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oficial são, politicamente, monolíngües, os que possuem duas ou mais são


bilíngues.

Mas, em todos os países, existem minorias Linguísticas que por motivo de etnia
e/ou imigração, mantém suas línguas de origem, embora as línguas oficiais dos
países, onde estas minorias coabitam, ou politicamente fazem parte, sejam
outras. Este é o caso das tribos indígenas no Brasil e nos Estados Unidos e dos
imigrantes que se organizam e continuam utilizando suas línguas de origem,
como nos Estados Unidos e na França. Os indivíduos destas minorias geralmente
são discriminados e precisam se tornar bilíngues para poderem participar das
duas comunidades por estarem inseridos em comunidades Linguísticas que
utilizam línguas distintas.

Nesses casos pode-se falar de bilinguismo social, já que uma comunidade, por
algum motivo, precisa utilizar duas línguas.

Há também o bilinguismo individual que é a opção de um indivíduo para aprender


outra língua além da sua materna, embora isso não seja uma necessidade de sua
comunidade Linguística.

Trazendo essa temática para os Surdos, em todos os países, eles são minorias
Linguísticas como outras, mas não devido à imigração ou à etnia, já que a maioria
nasce de famílias que falam a língua oficial da comunidade maior, a qual também
pertencem por etnia; eles são minoria Linguística por se organizarem em
associações onde o fator principal de agregação é a utilização de uma língua
gestual-visual por todos os associados. Sua integração está no fato de poderem
ter um espaço onde não há repressão ou discriminação devido ao fato de
poderem se expressar da maneira que mais lhes satisfazem para manterem entre
si uma situação prazerosa no ato de comunicação.
Quando imigrantes vão para outros países, formando minorias Linguísticas ou
guetos, a língua que trazem, geralmente, é a língua oficial de sua cultura, sendo
respeitada, enquanto língua, no país para onde imigram, mas as línguas dos
Surdos, por serem de outra modalidade - gestual-visual - e por serem utilizadas
por pessoas consideradas "deficientes" - por não poderem, na maioria das vezes,
expressarem-se como ouvintes - eram desprestigiadas e, até bem pouco tempo,
proibidas de serem usadas nas escolas e em casa de criança surda com pais
ouvintes.

Este desrespeito, fruto de um desconhecimento, gerou um preconceito e


pensava-se que este tipo de comunicação dos Surdos não poderia ser língua e, se
os surdos ficassem se comunicando por "mímica", eles não aprenderiam a língua
oficial de seu país. Mas as pesquisas que foram desenvolvidas nos Estados Unidos
e na Europa mostraram o contrário. Se uma criança surda puder aprender a
língua dos sinais da Comunidade Surda de sua cidade à qual será inserida, ela terá
mais facilidade em aprender a língua oral-auditiva da Comunidade Ouvinte, a
qual também pertencerá (FELIPE, 1991).

Considerando que todas as línguas, em essência, são sistematizadas a partir de


universais linguísticos, que as tornam linguagem humana, é preconceito e
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ingenuidade dizer, hoje, que uma determinada língua é superior a qualquer


outra, mesmo em relação à modalidade, já que elas independem dos fatores
econômicos ou tecnológicos, não podendo ser classificadas em desenvolvidas,
subdesenvolvidas ou, ainda, primitivas (FELIPE, 1889).

As línguas transformam – se a partir das comunidades Linguísticas que a utilizam.


Uma criança surda precisará se integrar à Comunidade Surda de sua cidade para
poder ficar com um bom desempenho na língua de sinais desta comunidade.

Como os surdos estão em duas comunidades, precisam manter esse bilinguismo


social, e uma língua ajuda na compreensão da outra.

5.1.6. Bilinguismo social e individual

Cada nação tem sua língua ou línguas oficiais como, por exemplo, o Canadá que
possui a língua inglesa e a francesa. Os países que possuem somente uma língua
oficial são, politicamente, monolíngües, os que possuem duas ou mais são
bilíngues.

Mas, em todos os países, existem minorias linguísticas que por motivo de etnia
e/ou imigração, mantém suas línguas de origem, embora as línguas oficiais dos
países, onde estas minorias coabitam, ou politicamente fazem parte, sejam
outras. Este é o caso das tribos indígenas no Brasil e nos Estados Unidos e dos
imigrantes que se organizam e continuam utilizando suas línguas de origem,
como nos Estados Unidos e na França. Os indivíduos destas minorias geralmente
são discriminados e precisam se tornar bilíngues para poderem participar das
duas comunidades por estarem inseridos em comunidades linguísticas que
utilizam línguas distintas.

Nesses casos pode-se falar de bilinguismo social, já que uma comunidade, por
algum motivo, precisa utilizar duas línguas.

Há também o bilinguismo individual que é a opção de um indivíduo para aprender


outra língua além da sua materna, embora isso não seja uma necessidade de sua
comunidade Linguística.

Trazendo essa temática para os surdos, em todos os países, eles são minorias
linguísticas como outras, mas não devido à imigração ou à etnia, já que a maioria
nasce de famílias que falam a língua oficial da comunidade maior, a qual também
pertencem por etnia; eles são minoria Linguística por se organizarem em
associações onde o fator principal de agregação é a utilização de uma língua
gestual-visual por todos os associados. Sua integração está no fato de poderem
ter um espaço onde não há repressão ou discriminação devido ao fato de
poderem se expressar da maneira que mais lhes satisfazem para manterem entre
si uma situação prazerosa no ato de comunicação.
Quando imigrantes vão para outros países, formando minorias Linguísticas ou
guetos, a língua que trazem, geralmente, é a língua oficial de sua cultura, sendo
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respeitada, enquanto língua, no país para onde imigram, mas as línguas dos
surdos, por serem de outra modalidade - gestual-visual - e por serem utilizadas
por pessoas consideradas "deficientes" - por não poderem, na maioria das vezes,
expressarem-se como ouvintes - eram desprestigiadas e, até bem pouco tempo,
proibidas de serem usadas nas escolas e em casa de criança surda com pais
ouvintes.

Este desrespeito, fruto de um desconhecimento, gerou um preconceito e


pensava-se que este tipo de comunicação dos surdos não poderia ser língua e, se
os surdos ficassem se comunicando por "mímica", eles não aprenderiam a língua
oficial de seu país. Mas as pesquisas que foram desenvolvidas nos Estados Unidos
e na Europa mostraram o contrário. Se uma criança surda puder aprender a
língua dos sinais da comunidade surda de sua cidade à qual será inserida, ela terá
mais facilidade em aprender a língua oral-auditiva da comunidade ouvinte, a qual
também pertencerá (FELIPE, 1991).

Considerando que todas as línguas, em essência, são sistematizadas a partir de


universais linguísticos, que as tornam linguagem humana, é preconceito e
ingenuidade dizer, hoje, que uma determinada língua é superior a qualquer
outra, mesmo em relação à modalidade, já que elas independem dos fatores
econômicos ou tecnológicos, não podendo ser classificadas em desenvolvidas,
subdesenvolvidas ou, ainda, primitivas (FELIPE, 1889).

As línguas transformam - se a partir das comunidades linguísticas que a utilizam.


Uma criança surda precisará integrar - se à comunidade surda de sua cidade para
poder ficar com um bom desempenho na língua de sinais desta comunidade.

Como os surdos estão em duas comunidades, precisam manter esse bilinguismo


social, e uma língua ajuda na compreensão da outra.

5.1. 7. Reflexões sobre a educação bilíngue

Geralmente, a educação bilingue está associada ao ensino em duas línguas.


Contudo, para Romaine, (1989: 217), o termo educação bilingue pode assumir
significados diferentes de acordo com os contextos. Ainda de acordo com a
autora, “se nos baseamos no senso comum que define a educação bilingue como
um programa em que duas línguas são usadas da mesma maneira como meio de
ensino, muitos programas chamados de educação bilingue não podem ser tidos
como tal.” Estudos sobre educação bilingue realizados por: (Grosjean, 1982;
Romaine, 1989; Hornberger, 1997; Baker, 1993; Skutnabb-Kangas, 1984),
mostram que existem programas associados a um bilinguismo de “imposição”,
ou seja, os alunos são submetidos a um sistema de ensino em que a sua língua
materna se submete à língua dominante. Os programas desenvolvidos em
contextos de imigração nos Estados Unidos da América e Europa, são exemplos
deste tipo de ensino bilingue. Outro tipo de programa, também, tidos como
sendo de “imposição” decorrem em contextos em que a língua maioritária é
tratada como minoritária como é o caso de muitos países da América Latina e
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África (Hamel, 1989; Benson 1997, 2004). Cavalcanti (1999: 387), refere-se a
outro tipo de programas de educação bilingue que se considera de escolha como,
por exemplo, os que envolvem línguas dominantes como o Francês e o Inglês.
Hamel, (1989: 35), agrupa os vários tipos de programas de educação bilingue em
programas de enriquecimento, segregação e assimilação, de acordo com os seus
objectivos sociolinguísticos, culturais e estruturais.

Na literatura sobre o bilinguismo e educação bilingue o programa de


enriquecimento mais conhecido é o de imersão do Francês desenvolvido no
Canadá há mais três décadas, de forma voluntária. Algumas crianças falantes do
Inglês, maioria dominante no Canadá são expostas ao programa integralmente
conduzido em Francês desde o início da sua escolarização. Este tipo de programa
promove o pluralismo linguístico e está associado ao bilinguismo do tipo aditivo
que faz com que a criança possa acrescentar mais línguas à sua aprendizagem
sem pôr em causa a sua L1. O êxito deste programa consiste, sobretudo, no facto
de que tanto o Inglês como o Francês gozam de muito prestígio, considerando-
se, por isso, que este tipo de programa tem mais possibilidades de êxito em
contextos como o que foi descrito. Outro tipo de programa de educação bilingue
é conhecido como de segregação. De acordo com

Hamel (1989:37), caracteriza-se pelo objectivo de querer desenvolver nos alunos


uma competência avançada na L2. Geralmente são orientados para crianças de
uma minoria ou

maioria etnolinguística às quais se recusa explicitamente a possibilidade de se


integrarem na sociedade dominante. O caso mais conhecido é o que era usado
pelo regime do apartheid na África do Sul, em que o objectivo era que a maioria
negra não adquirisse de forma plena, em inglês, as habilidades académico
cognitivas avançadas que eram reservadas à minoria branca. Este tipo de
programa está associado ao bilinguismo do tipo subtractivo em que os alunos,
muitas vezes, não desenvolvem plenamente, nem a L1, nem a L2, ocorrendo o
que Baker, (1993) e SkutnabbKangas, (1984) denominam de semilinguismo. Um
terceiro programa de educação bilingue, o mais disseminado em várias partes do
mundo é o de assimilação. Este, geralmente, pode tomar contornos de
submersão total ou relativa e transição sistemática à L2, de acordo com os
objectivos educativos (Hamel, 1989). Os programas de submersão total são
associados à metáfora aquática em que os alunos são jogados numa piscina
esperando-se que aprendam a nadar, o mais rápido possível, sem ajuda de bóias
ou aulas especiais de natação, sendo que a língua da piscina é a língua dominante
(Baker, 1993: 220). Os alunos de minorias

linguísticas ou maiorias tratadas como minorias são submetidos a um processo


de ensino somente na L2, sem nenhum tipo de recurso à sua L1. O objectivo deste
tipo de programa é forçar os alunos à assimilação da sociedade envolvente. Tanto
o professor como os alunos só podem usar a L2 na sala de aula. Na escola não se
reconhece a importância da primeira língua sendo que esta é sistematicamente
substituída pela L2. Os programas de submersão relativa não excluem totalmente
o uso da L1. Em Moçambique, o programa de educação monolingue em
Português enquadra-se nesta categoria.
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

5.1.8. Línguas pidgins e crioulas

Em situações de contacto entre falantes de línguas maternas diferentes


(europeus e escravos) que por motivos de ordem social, têm necessidade urgente
de comunicar entre si, surge frequentemente uma forma de linguagem veicular
denominada pidgin.
De acordo com BAXTER (1996: 535) as línguas pidgins e crioulas são línguas que
surgiram em situações de contacto linguístico entre duas ou mais línguas. São
línguas emergentes/línguas de necessidade.
O pidgin corresponde aos primeiros estágios da aquisição espontânea de uma
das línguas em presença – a língua do grupo socialmente dominante – pelos
falantes de outras línguas.
A língua pidgin uma vez originada em contexto de necessidade ou emergência
entre povos linguística e culturalmente diferentes apresentava um léxico e
morfologia bastante reduzidos, assim sendo, era suportada por outros sistemas
de comunicação como o gesto, e dependia maioritariamente para sua
interpretação de contexto situacional.
Um pidgin é uma linguagem caracterizada por combinar os rasgos sintácticos,
fonéticos e morfológicos de uma língua com as unidades léxicas de outra. O
pidgin não é habitualmente de nenhum grupo étnico ou social; costuma ser a
língua que emprega um imigrante em seu novo lugar de residência, ou uma língua
franca usada em uma zona de contacto intenso de populações linguisticamente
diferenciadas, como um porto muito activo; os pidgins foram frequentes também
nas colónias, misturando elementos da língua da nação dominante com os dos
nativos e os escravos introduzidos nela.
Parafraseando BAXTER (1996: 535) espécie de língua reduzida que se forma
quando grupos de falantes de várias línguas mantêm um contacto prolongado e
necessitam de comunicar em casos seguintes: viagens de reconhecimento;
comércio; escravidão.

5. 1.9. Características do pidgin

-Apresenta um léxico/vocabulário reduzido sem complicações gramaticais casos


de flexão e regras gramaticais;
-Apresenta uma estrutura desprovida de redundâncias e ambiguidades;
-Apresenta homónimos e circunlocuções.
Tipos de pidgin: Tok pisin que é de base inglesa da Nova Guiné, que originou
como pidgin de lavoura, plantação e mais tarde língua franca e nacional. Para
que um pidgin possa funcionar plenamente como língua materna, houve
necessidade de reestruturá-lo e complexifica- lo, de maneira a cumprir todas
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

funções de uma língua natural. É através reestruturação que origina a um


crioulo.

5.1.10. Principais condições que determinam a pidginização e a crioulização

▪ sócio-históricas: importância e ritmo das chegadas de mão – de – obra;


isolamento do grupo dominante, fazendo – se o contacto através de
intermediários; presença de mulheres e crianças;
duração dos contratos.
▪ sócio-linguísticas: multiplicidade de línguas – substrato; corte das raízes
linguísticas e culturais; necessidade de comunicação entre os escravos; ausência
de língua comum.

5. 1.11. Línguas crioulas

BAXTER (1996: 541) “crioulo é língua nativa que surge em situações especiais que
conduzem à aquisição de uma L1 com base num modelo de L2 defectiva, tipo
pré –pidgin/pidgin”.
Uma língua crioula é uma língua gerada habitualmente numa comunidade
composta de diversas origens. Esta comunidade não partilha previamente uma
língua e como tem necessidade de se comunicar vê – se obrigada a valer – se de
uma língua que não é de nenhuma delas. O resultado é uma língua que toma o
léxico (normalmente muito deformado) da língua imposta e que, no entanto, tem
uma sintaxe que se parece mais a de outras línguas crioulas que à da língua
materna. Os países africanos vivem esta realidade.

Tipos de crioulo: Cabo verdiano, que é de base portuguesa.

5.1.12. Língua franca


É o idioma adoptado para um entendimento comum entre um grupo de várias
coexistentes. A aceitação pode dever-se por mútuo acordo ou por questões
políticas. Na Europa durante uma parte da antiguidade adoptaram-se como
línguas francas o grego e o latim. No mundo actual, o inglês se apresenta como
língua franca especialmente nas organizações internacionais e nas publicações
científicas de alcance internacional.

Sumário
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

Nesta unidade abordamos o bilinguismo, tipos de bilinguismo, graus de


bilinguismo, a questão das interferências linguísticas, a diglossia e as línguas
pidgins, crioulas e línguas francas.

AUTO-AVALIAÇÃO

Questões de Verdadeiro e Falso

I.Assinale com um (V) as afirmações verdadeiras e com um (F) as afirmações


falsas

1) Um individuo bilingue pode falar duas línguas.


2) Um ser humano pode viver num contexto sócio – político de bilinguismo
sem que seja bilingue, ao contrário, pode ser bilingue fora de qualquer contexto
sócio – político de bilinguismo.
3) O bilinguismo familiar resulta de casamento misto entre a língua falada em
casa e da escola ou instrução.
4) O bilinguismo subordinado – acontece quando o bilingue não apresenta quer
problemas de incipiência quer de subordinação. Os dois sistemas de língua na
sua competência linguística estão totalmente separados.
5) Uma das condições que determinam a pidginização e a crioulização é socio-
histórica.

Questões de Escolha Múltipa

1. De entre os critérios abaixo somente um não concorre para a classificação


do bilinguismo, que é:

a. idade de aquisição da segunda língua;

b. proficiência nas línguas em questão;

c. organização dos códigos linguísticos;

d. aceitabilidade

2. O falante bilingue monocultural é assim denominado quando:

a. renuncia ou é obrigado a renunciar da identidade cultural do grupo de sua


língua materna e adopta a identidade cultural do grupo falante da segunda
língua;

b. renuncia da identidade cultural própria, mas não passa a adoptar a identidade


cultural do grupo falante da segunda língua;

c. tem competência bilíngue, mas somente se identifica culturalmente com o


grupo de sua língua materna;
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d. identifica - se positivamente com os dois grupos de falantes e é reconhecido


como membro de ambos.

3. O bilinguismo pode gerar:

a. mudança linguística;

b. interferência de uma língua sobre a outra;

c. variação linguística;

d. surgimento de famílias linguísticas

4. Sobre a educação bilingue, Romaine, (1989: 217):

a. o termo educação bilingue pode assumir significados diferentes de acordo com


os contextos;

b. o termo educação bilingue não pode assumir significados diferentes de acordo


com os contextos;

c. o termo educação bilingue acontece quando usamos uma língua num só


contexto;

d. o termo educação bilingue acontece quando usamos quatro línguas em


diferentes contextos.

5. De entre as características abaixo, somente uma não faz parte do pidgin:

a. Apresenta um léxico/vocabulário reduzido sem complicações gramaticais


casos de flexão e regras gramaticais;
b. Apresenta uma estrutura desprovida de redundâncias e ambiguidades;
c. Apresenta homónimos e circunlocuções;
d. Apresenta um léxico/vocabulário amplo com complicações gramaticais casos
de flexão e regras gramaticais.

III. Responda às questões abaixo:

1.Defina diglossia.

2. O que entende por interferências linguísticas?

3. Mencione os tipos de interferências que conhece.

4. Defina bilinguismo subordinado.

5. Defina bilinguismo geopolítico.

Respostas:

1) F;
2) V);
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3) V
4) F
5) V
1) D

2) C

3) B

4) A

5) D

Referências Bibliográficas

FLORY, Elizabete Villibor; SOUZA, Maria Thereza Costa Coelho. Bilinguismo:


Diferentes definições, diversas implicações.Revista Intercâmbio, volume XIX: 23-
40. São Paulo. 2009.

LENNEBERG, Eric. Biological foundations of language. Nova York: Wiley. 1967.

SCARPA, Ester Mirian. Aquisição da Linguagem. In: Mussalin, F; Bentes, C (orgs).


Introdução à Linguística: domínios e fronteiras. Vol.2. São Paulo: Cortez. 2012.

PATEL, Samima Amade. Olhares sobre a educação bilingue e seus Professores em


uma região de moçambique. UNICAMPI: Instituto de estudos da linguagem
Campinas. Dissertação de Mestrado. 2006.
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TEMA VI: POLÍTICA LINGUÍSTICA

Introdução

Caro estudante, depois de vermos temas muito pertinentes na presente


disciplina, nesta unidade vamos falar acerca da política linguística no geral,
concretamente a política linguística de Moçambique.

Ao completar esta unidade, você deverá


ser capaz de:

- Definir a política linguística;


- Identificar a política linguística dos países africanos;
Objectivos - Identificar a política linguística de Moçambique;
Específicos - Caracterizar a política linguística de Moçambique;

6.1. Política Linguística

A Política Linguística (Language Policy) é um campo de investigação


relativamente recente em comparação com outras áreas dos Estudos da
Linguagem. Consequentemente, não há um consenso em relação à terminologia
específica da área. Enquanto alguns autores utilizam as expressões
"Planeamento Linguístico" (Language Planning) e "Política Linguística" (Language
Policy) de forma distinta, outros preferem utilizá-las conjuntamente na
expressão "Planeamento e Política Linguística" (Language Planning and Policy).
Há, ainda, pesquisadores que optam pelos termos "Engenharia Linguística"
(Language Engineering) e/ou "Tratamento Linguístico" (Language Treatment)
(CRYSTAL, 1992, p. 310-311).
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Para além dessa discussão terminológica, o importante, como lembram Kaplan e


Baldauf Jr. (1997), é que se compreenda que se tratam, na realidade, de dois
aspectos distintos de um processo sistematizado de mudança linguística. Para
eles, o "planeamento linguístico' é uma actividade, mais visivelmente
implementada pelo Governo (simplesmente porque envolve profundas
transformações na sociedade), que visa promover uma mudança linguística
sistemática numa comunidade de fala" enquanto a política linguística
caracterizara-se como
[...] um conjunto de ideias, leis, regulamentos, regras e práticas que visam
implementar, na sociedade, grupo ou organização sócio-política, as mudanças
linguísticas planeadas. Somente quando tal política existe é que algum tipo de
avaliação efectiva do planeamento linguístico ocorre" (KAPLAN e BALDAUF JR.,
1997, p. xi).
Eastman (1983), Ferguson (2006), Jahr (1992), Kaplan (1991), Kaplan e Baldauf Jr.
(1997), Wiley (1996), entre outros autores, situam o surgimento da área por volta
da década de 1960. A expressão "planeamento linguístico", especificamente,
aparece pela primeira vez nos estudos de Haugen (1959, 1966) sobre o processo
de desenvolvimento da língua nacional da Noruega (FERGUSON, 2006, p. 1) e
teria sido cunhada por Uriel Weinreich, em 1957 (JAHR, 1992, p. 12), por ocasião
de um seminário na universidade norte-americana de Columbia (COOPER, 1989,
p. 29).
No período inicial de sua constituição, os pesquisadores da área dedicaram-se
maioritariamente ao estudo e à resolução de "problemas linguísticos" de nações
recém liberadas da dominação colonial na África e na Ásia. Como aponta
Ferguson (2006, p. 1), a ênfase na resolução de "problemas linguísticos" pode ser
observada nos títulos das principais obras desse período inicial. São exemplares,
nesse sentido, os livros Language problems of developing nations (FISHMAN,
FERGUSON e DAS GUPTA, 1968) e Can language be planned? Sociolinguistic
theory and practice for developing nations (RUBIN e JERNUDD, 1971). O foco na
resolução de "problemas linguísticos" também é evidente no título do primeiro
periódico da área, a revista Language problems and language planning, cujo
primeiro número foi publicado em 1980.
A resolução de "problemas linguísticos" ainda é uma das principais características
da área, como se pode observar nas definições de "Planeamento Linguístico"
(Language Planning) presentes na International encyclopedia of linguistics
(BRIGHT, 19925). No glossário dessa obra, Crystal define planeamento linguístico
como
[a] tentativa deliberada, sistemática e teoricamente orientada de resolver os
problemas de comunicação de uma comunidade por meio do estudo das
diferentes línguas ou dialectos que ela utiliza e do desenvolvimento de uma
política relativa à selecção e ao uso dessas línguas/dialectos; [o planeamento
linguístico] algumas vezes também é denominado engenharia ou tratamento
linguístico. O planeamento de corpus refere-se aos processos de selecção e
codificação linguísticos, tais como a elaboração de gramáticas e a padronização
da ortografia; o planeamento de status envolve a escolha inicial de uma língua,
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

incluindo as atitudes (da comunidade) em relação a línguas alternativas e as


implicações políticas decorrentes das diferentes escolhas [...] (CRYSTAL, 1992, p.
310-311).
No verbete "planeamento linguístico", Jahr afirma que
o PL (Planeamento Linguístico) refere-se à actividade organizada (privada ou
oficial) que busca resolver problemas linguísticos existentes no interior de uma
determinada sociedade, geralmente em nível nacional. Por meio do PL, procura-
se gerir, transformar ou preservar a norma linguística ou o status social de uma
determinada língua (escrita/falada) ou variedade linguística. Em geral, o PL é
conduzido em conformidade com um programa oficial ou um conjunto definido
de critérios e a partir de um objectivo deliberado, por comités ou grupos
oficialmente constituídos, organizações de carácter privado ou linguistas
prescritivistas a serviço de autoridades governamentais. Seu objectivo é
estabelecer normas (primeiramente escritas), as quais são ratificadas por seu
elevado status social; sucedem-se a elas normas de fala associadas a esses
padrões (JAHR, 1992, p. 12-13).
Além de evidenciar o foco na resolução de "problemas linguísticos", essas duas
definições explicitam alguns dos postulados básicos do período de consolidação
da área de Política Linguística, pelo menos no que se refere às pesquisas
desenvolvidas em sua corrente maioritária: (1) a diversidade linguística constitui
um "problema" para as nações (em desenvolvimento); (2) as línguas são passíveis
de modernização; e (3) cabe ao linguista propor, com base em parâmetros
científicos, soluções para os "problemas" dessas comunidades e/ou nações.
Como se apontou acima, a génese da Política Linguística coincide, com o processo
de descolonização de partes da África e da Ásia. Muitos dos novos países que
emergiram desse processo caracterizam-se (ou caracterizavam-se) por uma
grande heterogeneidade étnica e linguística. Essa diversidade de etnias e de
línguas era um obstáculo a ser superado na constituição desses novos estados
nacionais (KAPLAN, 1991, p. 143-144), uma vez que eles estavam sendo
projectados a partir do modelo de estado-nação dominante na Europa, isto é, o
estado monolingue e monocultural. Segundo esse modelo, esses novos países
somente se modernizariam a medida em que seus "problemas linguísticos"
fossem superados. Assim, uma das línguas ou variantes faladas pela população
deveria ser elevada à condição de língua nacional e, para que isso fosse possível,
a língua/variante seleccionada deveria passar por um processo de modernização.
A possibilidade de se manipular ou planear as línguas naturais constitui um dos
pilares sobre os quais se fundou a área de Política Linguística e,
consequentemente, foi objecto de debate entre os primeiros pesquisadores da
área. A publicação do livro Can language be planned? Sociolinguistic theory and
practice for developing nations (RUBIN e JERNUDD, 1971), já mencionado,
reflecte a importância do tema. Contudo, em sua introdução ao livro Advances in
language planning (1974a), também já mencionado, Fishman (1974b) afirma que
a pergunta presente no título do livro de Rubin e Jernudd é, na verdade, uma
pergunta retórica, uma vez que obviamente, a língua vem sendo planeada, de
uma forma ou de outra, há muito tempo [...]. Também obviamente, ela, algumas
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vezes, foi planeada com considerável sucesso. Por fim, está claro que a língua
continuará sendo planeada no futuro, tanto em conexão com o cultivo de uma
língua previamente modernizada, quanto em conexão com a modernização de
línguas até então utilizadas apenas para actividades tradicionais. Assim, a
questão a ser enfrentada no futuro não é se a língua deve ou pode ser planejada
mas, sim, como fazer isso mais efectivamente, em conexão com critérios de
sucesso pré-estabelecidos (FISHMAN, 1974b, p. 25-26).
Como se depreende desse excerto, a possibilidade de se manipular ou planear as
línguas é/era algo evidente para Fishman, autor que, como aponta Estman (1983,
p. 3), é considerado o fundador da área. Também transparece a ideia segundo a
qual o que importa, de facto, é discutir a eficiência dos processos de planeamento
linguístico. Na mesma direcção, Neustupný (1974), outro dos pioneiros da
pesquisa na área, ao discutir o que ele define como "tratamento de problemas
linguísticos" (treatment of language problems), afirma:
o tratamento racional (dos problemas linguísticos) é caracterizado por
neutralidade afectiva, por especificidade de metas e soluções, por universalismo,
por ênfase na efectividade e por objectivos de longo prazo. Por outro lado, a falta
de racionalidade é marcada por afectividade, difusão, particularismo, por ênfase
na qualidade, em vez de na efectividade, e por preocupação com metas de curto
prazo (NEUSTUPNÝ, 1974, p. 38).
Como se pode observar, Neustupný, além de se posicionar favoravelmente
quanto à manipulação linguística no âmbito de processos de planeamento
linguístico, entende que se trata de um procedimento fundamentado no
raciocínio lógico e prático. Assim, podemos afirmar seguramente que a posição
de Fishman e de Neustupný era compartilhada pela maioria dos seus pares, pois,
como lembram Kaplan e Widdowson (1992)
[a] questão da modernização está necessariamente incluída no planeamento
linguístico; à medida que novas nações emergem, surgem preocupações quanto
à capacidade de o sistema político subsidiar seus cidadãos. Modernização implica
disponibilidade de informação científica e técnica, além de preocupação com
tecnologia apropriada e com sua transferência (KAPLAN e WIDDOWSON, 1992,
p. 78).
Como se apontou anteriormente, a modernização linguística (segundo dos três
postulados fundamentais da área de Política Linguística em seus primeiros anos)
era percebida como uma prática necessária nos contextos de descolonização,
pois se acreditava que as nações liberadas da dominação política e linguística
dificilmente poderiam se gerir, dada sua heterogeneidade étnica e linguística.
Frente a essa necessidade (e a esse pressuposto "científico"), as lideranças desses
novos países desenvolviam e implementavam, com base no parecer de linguistas,
políticas linguísticas visando alçar uma das línguas ou das variedades linguísticas
faladas pela população à condição de língua nacional.

6.1.1. A politica linguística como um campo multifacetado


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O conceito de política linguística é complexo e polissêmico. A heterogeneidade


deste campo de saber varia entre os seus alvos e níveis de intervenção, além de
sua relação com a planificação
linguística, em que este ora é tido como mera aplicação da política linguística, ora
é tido como o seu coração, gerando um desequilíbrio entre as prioridades
teórico-metodológicas adoptadas. Além disso, em alguns casos, priorizam-se
aspectos técnicos em detrimento de políticos na atuação sobre questões
linguísticas, prática que tem sido alvo de críticas reiteradas, como o
posicionamento de Rajagopalan (2005).
A heterogeneidade do campo ocorre também em relação aos diferentes
contextos sócio-políticos de constituição da disciplina: as tradições americana,
europeia e soviético-russa, por exemplo, não compartilham as mesmas
prioridades e enfoques teóricometodológicos, o que pode estar vinculado tanto
às regras (históricas) de configuração do campo disciplinar, como à realidade
política das línguas nesses contextos:
[...] os primeiros teóricos – norte-americanos – da
política e
da planificação linguística [...] tendiam a negligenciar
o
aspecto social da intervenção planificadora sobre as
línguas.
Diante deles, os linguistas europeus [...] insistiram
na
existência de conflitos linguísticos [...] Mas sua
situação os
levou a misturar assuntos e a passar, lentamente, do
teórico
ao militante (CALVET, 2007).

Um outro traço indicador da heterogeneidade do campo da Política Linguística


abrange tanto os contextos (nacionais, pós-coloniais) estudados, como os níveis
macro, meso e micro de intervenção. É o que se percebe, por exemplo, em
estudos de caso em torno da especificidade da política linguística em contextos
pós-coloniais (CANAGARAJAH, 2005; HILL, 2010; SEVERO, 2011a, 2011b); ou no
desmembramento da intervenção da política linguística em três eixos: oficial,
educacional e geral, estando o primeiro vinculado às decisões sobre o estatuto
oficial das línguas, o segundo ao ensino das línguas e o terceiro às línguas da
comunicação de massa, dos negócios e das relações com os estrangeiros (NOSS,
1971 apud GADELII, 1999). Diferentemente desse desmembramento do nível
macro de intervenção da política linguística, Spolsky (2004 apud
BONACINAPUGH, 2012) propõe uma aproximação entre as políticas e as práticas
locais, indicando os seguintes elementos como constitutivos dos diferentes níveis
da política linguística: a gestão das línguas, que lida com uma política explícita e
oficializada de uso
das línguas; as crenças e ideologias linguísticas, que afectam os usos linguísticos;
e as práticas linguísticas, que se vinculam aos padrões interaccionais. Neste caso,
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as fronteiras entre política e planificação linguística tornam-se mais tênues.


Comparando as propostas de Noss e Spolsky, notam-se, de início, duas
dimensões políticas em jogo: uma que vincula a dimensão política mais
fortemente às atuações institucionais, verticais, oficiais e jurídicas; e outra que
prioriza uma política vinculada às crenças e práticas locais, às ideologias e às
motivações que levam os sujeitos a fazerem uma ou outra opção linguística.
Assim como a política linguística, o conceito de planificação linguística também
não é uniforme e homogêneo. Para ilustrar a complexidade desse conceito,
considera-se o trabalho de Einer. Haugen (1966) intitulado Language conflict and
language planning: the case of modern Norwegian. O autor sistematizou quatro
níveis envolvidos na planificação linguística da língua norueguesa: selecção da
norma, codificação/padronização da norma, implementação/aceitação e
elaboração/modernização da língua pela disseminação de novos termos. Esses
níveis foram posteriormente desdobrados por outros estudiosos em: práticas de
planificação de corpus (codificação, elaboração de alfabetos, gramatização,
sistematização do léxico, manuais literários, entre outros), planificação do status
(designações e usos da língua pautadas por leis e decretos), planificação das
formas de aquisição (políticas de ensino e aprendizagem das línguas),
planificação de usos (políticas de divulgação e uso das línguas) e planificação de
prestígio (avaliação dos usos linguísticos). Os dois primeiros foram tratados por
Kloss (1967), o terceiro foi adicionado por Cooper (1989) e o último foi proposto
por Baker (2003) (MANLEY, 2008; BIANCO, 2004; COOPER, 1989). O papel da
planificação de prestígio, embora reconhecido, não é tomado como uma questão
central no campo da Planificação Linguística.
Acredita-se que esta dimensão está diretamente vinculada à
propagação/circulação das línguas e dos usos linguísticos, uma vez que as
diferentes valorações influem directamente nos usos.
Além daquelas cinco planificações, Bianco (2004) sugere a incorporação de uma
sexto: o planificação discursiva, encarregado de lidar com o trabalho ideológico
das instituições, mídia, discursos de autoridade, entre outros, na produção e
circulação de crenças sobre as línguas, o que afeta diretamente os usos
linguísticos. Este nível, contudo, parece - se aproximar da planificação de
prestígio, sendo que o autor não esclarece a diferença entre ambos.
Ainda para problematizar a heterogeneidade dos conceitos de política e
planificação linguística, mencionam-se os estudos de Cooper (1989) sobre quatro
casos envolvendo questões de língua: a fundação da Academia Francesa, em
1635, por Richelieu, a revitalização da língua hebraica na Palestina a partir do
século XIX, o movimento feminista americano da década de 1960, e a campanha
de alfabetização em massa na Etiópia conduzida por estudantes universitários
em 1974. O autor expande o entendimento clássico dos conceitos para incluir
maneiras de resolução de problemas, em âmbito macro e/ou local, que envolvam
questões linguísticas de natureza política. Cooper (1989), ao revisar doze
conceitos de política linguística, identificou uma questão comum a todos eles:
“Quem planifica o que para quem e como?”. Subentende-se daí que há, pelo
menos, quatro instâncias envolvidas em políticas e planificação linguística: a
instância legisladora/regulamentadora vinculada, tradicionalmente, embora não
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unicamente, aos órgãos governamentais; o campo de intervenção que vai da


documentação e descrição do sistema linguístico (planificação de corpus) à
distribuição, designação e normatização das línguas e dos usos linguísticos
(planificação de status); o público-alvo e os efeitos da intervenção linguística e;
os procedimentos implicados na execução da política linguística com vistas, por
exemplo, ao aumento do número de falantes (planificação da aquisição).
Destrinchando os participantes (quem faz e para quem), o objecto (o que) e as
metodologias (como) envolvidos na política e na planificação linguística, tem-se,
de forma geral:

(i) Quem e para quem; as instâncias envolvidas na planificação das políticas


linguísticas são diversas, como: os poderes executivo e legislativo, as esferas
jurídica, administrativa, de negócios, educacionais, midiática, as academias
literárias, as organizações civis, entre outros. Tradicionalmente, os actores
envolvidos na gestão de políticas linguísticas se vinculam, directa ou
indirectamente, às esferas governamentais como representantes de um discurso
oficial. Contudo, uma abordagem mais crítica tem defendido a incorporação de
crenças e ideologias como variáveis directamente envolvidas na prática de
política linguística. Nesta perspectiva, “[...] política e planificação linguística são
processos ideológicos que contribuem para a manutenção de relações de poder
desiguais entre grupos linguísticos maioritários e minoritários.”
(BONACINAPUGH, 2012:216). Além dos participantes oficiais e das crenças e
atitudes dos sujeitos, há ainda uma terceira via, embora não excludente das
demais, quepropõe incorporar as práticas como alvo das políticas linguísticas.
Neste caso, trata-se de averiguar a maneira pela qual uma dada política
linguística pode ser construída em práticas interaccionais (BONACINA-PUGH,
2012) ou, em outros termos, de que maneira certos padrões linguísticos são
reiterados em diferentes práticas interaccionais, que não são espontâneas, mas
obedecem a regras (implícitas) que actuam tanto regulando como inovando o
comportamento linguístico.
(ii) O que; o objecto privilegiado de intervenção da política e planificação
linguística envolve a planificação do corpus, que inclui as seguintes acções:
criação, reforma e padronização do sistema ortográfico; especificação de
pronúncias, escolha da grafia, expansão vocabular e terminológica; alterações na
estrutura gramatical; criação de registos simplificados para fins específicos;
cultivo e valorização dos diferentes estilos e géneros; produção de cartilhas,
manuais e livros didácticos voltados para a alfabetização; tradução de obras
variadas; produção de dicionários e gramáticas; produção de textos escritos
vinculados a diferentes géneros; e criação de órgãos especializados em questões
linguísticas (GADELII, 1999).

(iii) Como; as formas de estudo, análise e aplicação da política e planificação


linguística variam, conforme visto, segundo o nível de intervenção (macro,
micro), o enfoque (linguístico, linguístico discursivo, discursivo), a finalidade
(planificação do corpus, da função, do prestígio, etc.) e os participantes
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envolvidos (esferas oficiais, atitudes e crenças dos sujeitos ou práticas de


interação). Enquanto a literatura sobre a planificação linguística tem focado
principalmente o nível macro, é importante compreender que política e
planificação linguística também operam no nível micro. Neste confronto, como
se dá a relação entre o micro e o macro?
Não se trata, nesse caso, de considerar o micro como efeito do macro, mas de
averiguar como ambos se relacionam produzindo efeitos mútuos. A título de
ilustração, menciona-se o trabalho de planificação linguística encabeçado pelo
Departamento de Governo Local e Provincial (Department of Provincial and Local
Government, DPLG) da África do Sul e conduzido pelos municípios – terceiro nível
do governo – em busca de uma valorização positiva do uso das línguas locais em
contexto público, envolvendo tanto agentes governamentais municipais, como
representantes da comunidade civil local (WEBB, 2009). Trata-se de um tipo de
planificação centrada na comunidade local, priorizando “[...] o envolvimento
activo da comunidade, especialmente de pessoas pobres, por forma a melhorar
a qualidade dos planos e serviços, ampliar o controle comunitário sobre o
desenvolvimento e empoderar as comunidades para que elas ajam.” (Relatório
do DPLG apud WEBB, 2009:3). Tal iniciativa de planificação linguística na África
do Sul visou a lidar com a ineficácia da abordagem tradicional (de cima para
baixo) de planificação linguística para uma realidade multilíngue, em que as
línguas africanas não têm o mesmo status (econômico, político, cultural) que o
inglês. Nesta política linguística ascendente (bottom-up), dois requisitos foram
tomados como necessários para a sua efetivação (WEBB, 2009): que os
representantes locais fossem legitimados pela comunidade e, por isso mesmo,
pudessem falar por ela; que as organizações e os representantes locais fossem
munidos de conhecimento e capacidade para lidar com a questão, neste caso,
uma política local das línguas. A intervenção sobre a promoção e circulação das
línguas locais implica a mobilização das mídias de massa (programas de rádio e
TV locais), de mídias impressas (revistas, jornais e boletins locais) e de mídias
digitais (internet), de forma que elas se tornem instrumentos tanto de veiculação
como de legitimação das línguas locais. Além disso, há a promoção das línguas
em contexto educacional, com o investimento em educação bi-multilingue o que
implica, por exemplo, a elaboração de material didáctico específico, entre outros.
Ainda no âmbito governamental de nível micro, em Moçambique, algumas
iniciativas têm oficializado línguas de grupos e comunidade locais. É o caso, por
exemplo, da introdução das línguas moçambicanas no ensino através da
modalidade de Ensino Bilingue.

6.1.2. Politica linguística de Moçambique

Moçambique localiza-se na costa Sudeste da África e foi colonizado por Portugal.


O país tem como língua oficial o Português e alcançou a sua independência a 25
de Junho de 1975, após uma luta armada que decorreu de 1964 a 1974, liderada
pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), movimento na- cionalista
formado pela união de outros três movimentos, nomeadamente União Nacional
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Africana de Moçambique (MANU), União Democrática Nacional de Moçambique


(UDENAMO) e União Nacional Africana para a Independência de Moçambique
(UNAMI). Foi com base nesta união que se criaram as premissas mais sólidas para
a libertação de Moçambique da dominação portuguesa.
À semelhança dos demais países africanos pós-coloniais, Moçambique herdou
uma política linguística e cultural europeia significativa, como consequência do
processo de colonização, com particular destaque para área social, econômica,
cultural e ideológica, por meio da exploração desenfreada dos recursos naturais,
implementação de um sistema educacional diferenciado, hierarquização das
pessoas em função das suas funcionalidades e (re) utilizações – a coisificação do
Homem. Além disso, são também heranças coloniais as formas diferenciadas de
acesso aos bens de consumo e de serviços, à educação, à saúde, ao emprego e à
habitação condignas à dignidade humana, aliadas à desestruturação sócio-
histórica, cultural, político-administrativa e ao apagamento das línguas e culturas
locais tendo em vista a alienação individual e coletiva do povo moçambicano.
É nesse sentido que no processo de construção do Estado-Nação, o país, que
outrora combatera o sistema colonialista português e todas as suas práticas im-
perialistas, viu-se obrigado a adotar as políticas linguísticas do colonizador, uma
decisão político-ideológica que visava consolidar o espírito da luta armada de
libertação nacional, salvaguardar as conquistas daí decorrentes, gerar o
sentimento de unidade (nacional) na diversidade, assegurar e consolidar a
integração intra e inter-étnica e gerar um ambiente propício à governabilidade
do território, o que resultou na neutralização das línguas bantu como línguas
francas de ordenamento sociocultural, linguístico e ideológico das populações na
perspectiva de, entre outras, matar a tribo para fazer nascer a nação.
Para tal, era imprescindível massificar o uso da língua portuguesa vista naquele
contexto histórico como o único meio auxiliador mais eficaz para (re) produzir
semelhanças dentro de um mercado de trocas linguísticas e simbólico
heterogêneo e gerar um sentimento de pertencimento à pátria e engajamento
na mesma causa nacionalista – a libertação da terra e do Homem do jugo colonial.

6.1.3. Contextualização histórica, poítico – ideológica e sociolinguística de


Moçambique

O actual território de Moçambique resulta do processo de ocupação efectiva


exercida por Portugal, com o “auxílio” de algumas potências europeias e das
companhias majestáticas que as delegou poderes para tal, em conformidade com
as deliberações saídas da Conferência de Berlim (1884-1885), na qual as
potências coloniais europeias dividiram entre si o continente africano e, por
consequência, os destinos dos seus povos. É neste sentido que, para
compreendermos as políticas linguísticas de Moçambique, afigura-se essencial
uma incursão na sua história e na ideologia por detrás da sua libertação e da
construção do Estado-Nação.
Ocupado por quase 500 anos por Portugal, aquando da chegada dos primeiros
navegadores liderados por Vasco da Gama, em 1498, e formalmente colonizado,
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de forma efetiva, a partir de 1930, depois de sucessivas lutas de resistência


protagonizadas por moçambicanos ao longo do processo histórico de negação
à dominação imperialista, o país sucumbiu às políticas segregacionistas do
colonizador com o objectivo de dividir para reinar e garantir a manutenção e
reprodução da dominação.
É neste contexto que, em conformidade com a necessidade de uma presença
mais efectiva, Portugal, para além de consolidar os esforços militares para garantir
a ocupação e domínio territorial de Moçambique, investiu fortemente na
presença da sua máquina administrativa. Com isso, estabeleceu novas fronteiras
físicas, jurídicas e simbólicas, destruíndo as anteriormente existentes, com
destaque para as simbólicas de matriz étnico-tribal e sociocultural pré-existentes
à ocupação e implementou políticas separatistas que hierarquizaram as pessoas
de acordo com a cor da sua pele e utilidade nos esforços de colonização.
Assim sendo, a ideologia do Aparelho Administrativo Colonial Português
introduzida a partir de 1930, com o “Acto Colonial”, deu origem ao Estado Novo
em Portugal e preconizou novas diretrizes de exploração das suas colônias, fato
que contribuiu para a acentuação das explorações a nível econômico, físico, so-
cial, ancestral, antropológico, religioso, cultural, educacional e intelectual e res-
significou novas condutas sociais; status quo, modus vivendi e modus operandi
marcadamente deprimentes, fazendo vingar a plenitude da política de dividir para
reinar e a reedificação do Homem.
O conceito de ideologia que usamos recorrentemente está em conformidade com
a definição de Eagleton (1997, p. 15) como “idéias e crenças que ajudam a
legitimar os interesses de um grupo ou classe dominante”, razão pela qual
estudar a ideologia é estudar as formas de sustentar relações de domi- nação,
pois ela está ao serviço de quem a manipula, sendo que a forma de exercer esse
poder passa por perceber os modos a partir dos quais o significado é construído e
comunicado por formas simbólicas (Thompson, 2009).
E, para conseguir os seus intentos, Portugal aliou-se à Igreja Católica por meio do
acordo denominado Concordata assinado em 1940, o qual estipulou o uso das
línguas autóctones nos cultos religiosos e, posteriormente, por volta de 1963,
segundo Mazula (1995, p. 88), foi “autorizado o emprego do idioma local como
instrumento de ensino da língua portuguesa”. É neste quadro que o Estatuto Mis-
sionário publicado em 5 de Abril de 1941 conferiu mais poderes à Igreja Católica
em Moçambique, tornando-a num aliado privilegiado do Governo Colonial
Português na condução de todo o ensino indígena com o fim, segundo Castiano,
Ngoenha e Berthoud (2006, p. 27), de “civilizar e nacionalizar o indígena por meio
da língua portuguesa e gradual compreensão da doutrina e moral cristã”.
Como se pode constatar, o uso das línguas autóctones no ensino e nos cultos
religiosos não visava a sua valorização, muito menos das culturas locais por meio
delas veiculadas e nem sequer fomentar as aprendizagens de forma eficaz, já que
o propósito era formar moçambicanos como aprendizes e com baixa educação
escolar. Por isso, o objectivo central era permitir que, a partir das suas línguas
bantu e das suas culturas, os moçambicanos acedecem à aprendizagem do
Português e fossem aculturados lusitanamente. Assim sendo, o uso da doutrina
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moral cristã católica servia para neutralizar as revoltas e reproduzir um ser


humano manso e incorporável à dominação colonial portuguesa.
A partir destes pressupostos, o Português ganhou uma importância particular na
medida em que serviu de mecanismo aglutinador das diferenças linguísticas e
culturais entre os moçambicanos e os portugueses, o que permitiu a Portugal
estratificar dois grupos sociais: os civilizados, também denominados assimilados,
que em larga medida serviam de suporte ao Aparelho Administrativo Colonial e
os não civilizados, tipificados como indígenas, os deserdados da sua própria terra.
Segundo Mazula (1995, p. 100), são considerados indígenas nas respectivas
províncias “os indivíduos de raça negra que, nelas tendo nascido ou vivido
habitualmente, ainda não possuem a cultura e os hábitos individuais e sociais
exigidos pela integral aplicação do direito público e privado dos cidadãos
portugueses”.
Estes factos permitem-nos perceber que o ensino e aprendizagem da língua
portuguesa constituía, também, um meio ideológico de dividir para reinar,
sucedendo ao que Bourdieu (2007, p. 10) chama de produções simbólicas como
instrumento de dominação para a legitimação dessas distinções cujo objetivo é
a “integração fictícia da sociedade no seu conjunto, portanto, à desmobilização
(falsa consciência) das classes dominadas; para a legitimação da ordem
estabelecida por meio do estabelecimento das distinções”, razão pela qual o autor
defende que (op. cit., p. 11), “a cultura que une (intermediário de comunicação)
é também a cultura que separa (instrumento de distinção)”, tendo em conta que,
ao legitimarem-se as distinções, consagra-se o marco hierárquico entre a cultura
dominante e a cultura dominada e, com isso, perpetuam-se as correlações de
força deixando-se crer que existem culturas e línguas mais importantes que
outras.
É por isso mesmo que julgamos que os moçambicanos com capacidade de
aprender e falar “correctamente” o Português tornaram-se auxiliares da
Administração Colonial, porém sem ocupar cargos de relevância administrativa.
Com esta estratégia, Portugal foi, aos poucos, alargando o número de falantes do
Português, até porque estava consciente da necessidade da existência de pessoas
“aportuguesadas” em Moçambique como forma de garantir o seu domínio aos
olhos da comunidade internacional. Em paralelo, os portugueses investiram em
larga escala para a expurgação da “identidade cultural dos moçambicanos” com
vista a torná-los novos “cidadãos portugueses”, contudo, sem gozarem das
benesses que tal nacionalidade atribuía, fomentando, deste modo, a falsa
consciência no seio da população e que mais tarde veio a rebelar-se contra a
exploração imperialista e contra todas as formas de aculturação sistemática
levadas a cabo pela metrópole. A aculturação, segundo Cuche (2002, p. 115), é o
“conjunto de fenômenos que resultam de um contato contínuo e direto entre
grupos de indivíduos de culturas diferentes e que provocam mudanças nos
modelos (patterns) culturais iniciais de um ou dos dois grupos” e refere que ela
é diferente da assimilação. Portanto, “a assimilação deve ser compreendida
como a última fase da aculturação, fase, aliás, raramente atingida. Ela implica o
desaparecimento total da cultura de origem de um grupo e na interiorização
completa da cultura do grupo dominante” (Cuche, 2002, p. 116). Desta feita, a
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língua portuguesa foi expandida por meio das escolas com o alicerce da Igreja
Católica e, posteriormente, com o apoio das Igrejas Pro- testantes que também
ensinavam a língua inglesa. Com isto, pode-se dizer que à Igreja Católica cabe o
mérito, em parte, da massificação do Português, às Igrejas Protestantes do Inglês.
É caso para dizer que os católicos idolatraram o Português e os protestantes o
Inglês.
O ensino e a aprendizagem do Português em larga escala constituíam, para
Portugal, um desiderato patriótico, nacionalista e mercantilista para gerenciar o
mercado das trocas linguísticas e também como um mecanismo de domínio
social, ideológico, econômico, político, cultural e simbólico dos moçambicanos.
Para além disso, visava responder, de forma firme, ao avanço vertiginoso da
aprendizagem do Inglês por parte de moçambicanos que almejavam trabalhar
nas minas sul-africanas, mal necessário, já que entre Portugal e a África do Sul
existia um acordo de fornecimento de mão-de-obra, negócio muito rentável para
os cofres da metrópole.
Apesar de todos os esforços, a dominação portuguesa sofreu revés por conta do
grupo dos assimilados e de outros compatriotas nacionalistas no território
nacional e na diáspora que, impulsionados pelo contacto de línguas e culturas, e
também pelos movimentos de libertação nacional que levaram alguns países
africanos a alcançarem as suas independências a partir da década de 1960,
ampliaram o seu ângulo de cosmovisão do mundo e, com isso, uma nova forma
de estar, de ser, de sentir, de ver e de fazer na sociedade que os despertou das
crueldades a que o povo fora submetido.
Foi uma etapa de nova (re)orientação que permitiu a “limpeza psicológica” dos
vestígios do colonialismo, sobretudo aqueles que foram considerados maléficos,
porque o objectivo do discurso colonial, segundo Bhabha (1998, p. 111), era de
“apresentar o colonizado como uma população de tipos degenerados com base na
origem racial de modo a justificar a conquista e estabelecer sistema de
administração e instrução”. A este respeito, Fanon (2005) refere que o colonialismo
não se satisfaz em prender o povo nas suas redes, em esvaziar o cérebro do
colonizado com o recurso à opressão de toda forma e de todo o conteúdo, e
defende que

a cultura, que é arrancada do passado para ser desdobrada em todo o seu


esplendor, não é a do seu país. O colonialismo, que não matizou os seus
esforços, que não deixou de afirmar que o negro é um selvagem e o negro, para
ele, não era nem angolano nem nigeriano. Ele falava a língua negra (Fanon,
2005, p. 244-245).

A tomada de uma nova consciência por uma parte dos moçambicanos, cuja
negritude é bem descrita por Fanon, foi expressa, por exemplo, com o recurso à
denúncia dos males do colonialismo nos jornais e a formação de movimentos
cívicos e políticos contra a presença colonial, facto que originou a desculturação
que, segundo Cuche (2002), ocorre quando os povos se manifestam contrários
aos valores impostos.
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Este pensamento conecta-se ao de Hall (2009) ao referir que a relação


colonização e pós-colonização está sujeita, irrevogavelmente, a um campo de
poder-saber e a partir do momento em que se verifica o deslocamento do foco
das relações que caracterizam o colonializador e o colonizado, este último
torna-se dono do seu próprio destino e desenvolve a capacidade de criticar e
desconstruir as representações ideológicas até então vigentes com vista a traçar
novos rumos orientadores, razão pela qual, para Freire (2006), o oprimido tem
o opressor dentro de si.
Com base nisso, na construção dos alicerces do Estado-Nação, primeiro no seio
dos grupos de guerrilheiros, políticos e simpatizantes filiados à FRELIMO no
interior do território nacional e na diáspora, e depois nas zonas libertadas, onde
se plantou a semente da governação pós-colonial, e após a proclamação da
independência nacional, o Estado Moçambicano expurgou da herança colonial os
seus malefícios e adotou os aspectos positivos que lhe serviam de base para a
construção e consolidação do Estado Nacional, nomeadamente as políticas lin-
guísticas que vigoravam até então.
Para o efeito, o Estado adotou uma série de políticas concertadas que visavam
promover, quer por meio da língua(gem), entendida como um caleidoscópio por
ser multifacetada e dinâmica (César; Cavalcanti, 2007), quer por meio da cultura
definida por Canclini (2009, p. 41) como “conjunto dos processos sociais de
significação ou, de um modo mais complexo, a cultura abarca o conjunto de
processos sociais de produção, circulação e consumo da significação na vida
social”, a produção e reprodução da violação simbólica nos termos de Bourdieu
(2007) como construção da realidade para estabelecer uma ordem gnoseológica
assente na promoção da falsa consciência.
Assim sendo, a língua(gem) e a cultura ligadas à representação conceituada por
GoRman (1975, p. 29) como a “atividade de um indivíduo que se passa num
período caracterizado por sua presença contínua diante de um grupo particular
de observadores e que tem sobre estes alguma influência” e à identidade vista
de forma não essencialista, já que as pessoas são portadoras de inúmeras e
complexas identidades e que as manifestam em função dos contextos (Hall
2000; Silva, 2000) constituem, por excelência, um mecanismo de exercício do
poder simbólico na medida em que criam uma ilusão óptica e gnoseológica de
que todas as pessoas têm a mesma identidade e a mesma cultura no território
do Estado-Nação e basta arregimentá-las por uma língua comum e que se
considere língua de Estado para gerar sentimento de pertencimento ao território
do Estado Nacional, na tentativa de visibilizar a nação e silenciar a tribo e o
etnicismo, vistos como males que atentam contra a unidade nacional.
Com isso, a língua oficial é erigida de dogmas e veneração o que faz com que, na
visão ideológica do Estado-Nação, tenha de ser reproduzida como se fosse cópia
em carbono da norma em uso, razão pela qual se legitima a norma e promove-
se o seu uso na sociedade sem se levar em consideração que uma norma
linguística é uma hipóstase e como tal sujeita às dinâmicas sociais e históricas,
até porque, conforme sustenta Back (1987), a língua é um espelho da cultura e
como tal ela deve ser diferente, de uma cultura à outra, facto que também
subverte a lógica ideológica por detrás da construção dos Estados Nacionais
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assente na trilogia um povo, uma língua e uma cultura, facto que não passa,
segundo Geertz (1989), de uma utopia, uma esperança alimentada pelas
tradições inven- tadas (Hobsbawn, 1984).
No entanto, apesar de tudo isso, interessa à política do Estado-Nação disse-
minar estas ideologias, crenças e ritualizações, pois as “culturas nacionais são
sistemas de representações” (SARUP, 1996, p. 152). Por isso, as identidades
únicas e fixas no território do Estado-Nação são uma crença, uma construção
socios- simbólica do que é política e ideologicamente ideal, pelo que não passa
de um estereótipo, segundo Bhabha (1998), até porque “nenhuma sociedade
consiste unicamente de excêntricos anônimos que se tocam e ricocheteiam
como bolas de bilhar” (Geertz, 2008, p. 99).
É neste quadro que Lopes (2004, p. 21), que cita Machel (1979), refere que “a
necessidade de combatermos o opressor exigia um combate intransigente
contra o tribalismo e o regionalismo. Foi esta necessidade de unidade que nos
impôs que a única língua comum – a que servia para oprimir – assumisse uma
nova dimensão”, consagrando-se assim a herança tácita da política linguística do
período colonial e adaptada para o período pós-colonial. Com a independência
nacional, novos valores culturais e ideológicos foram colocados em prática, e é
neste contexto que o país adota o Português como língua oficial e de unidade
nacional, tendo em vista consolidar os propósitos da construção do Estado-
Nação assentes na homogeneização linguística e cultural.
A ideia de moçambicanidade não está dissociada das representações que estão
por detrás da construção do Estado-Nação. Por isso, a construção do Estado-
Nação em Moçambique é um processo contínuo e permanente, visto que Estado
e Nação são duas categorias que estão intimamente ligadas ao nacionalismo,
com- pondo facetas da mesma moeda quando falamos do processo de formação
de um Estado Nacional, pois “o nacionalismo não é o despertar das nações para
a auto- consciência: ele inventa nações onde elas não existem” (Anderson, 2008,
p. 32). Por isso, Bauer (1996, p. 81) defende que “a nação apresenta-se como um
modelo natural, e o Estado um produto artificial. […]. O Estado, portanto, deve
seguir a nação e uni-la politicamente”. Ainda de acordo com Bauer (op. cit.), a nação
tem um carácter nacional. Todavia, tal carácter não significa que haja uma
comunhão, a priori, pré-estabelecida. Pelo contrário, existe um esforço para se
estabelecer a comunhão, mesmo reconhecendo-se as diferenças individuais e
grupais, pelo que “nação é comumente entendida como a totalidade dos cidadãos
do Estado, ou a totalidade dos habitantes de um espaço econômico” (Bauer,
1996. p. 76).
A este propósito, Weber (1994, p. 72) defende que a nação não é simétrica a uma
comunidade linguística e defende que “a nação, no uso linguístico habitual, não
é idêntica ao povo de um Estado”, até porque no mesmo Estado podem existir
várias nações, facto que também caracteriza Moçambique, visto que ela é, acima
de tudo, uma construção simbólica que decorre de sentimentos, expectativas,
esperanças, pertencimento e adesão, por vezes obrigatória, a uma colectividade
com a qual se pode compartilhar um passado comum, valores históricos, sociais,
culturais, ou sofrimento suscetíveis de serem intelegíveis.
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Por essa razão, uma pessoa pode pertencer a múltiplas e variadas nações no
interior do seu país, porém cabe à política ideológica e hegemônica do Estado
Nacional perseguir estes sentimentos, por vezes dispersos e fragmentados,
condensá-los na mesma base de harmonização colectiva e reproduzir a
hegemonia conducente à mesma jurisdição do território no qual vegetam estes
sentimentos para integrá-los ao exercício da soberania do Estado.
Segundo Hall (2006, p. 62), a etnia é um termo que se usa para referir às
características culturais, tais como língua, religião, costume e tradições, e
aponta que “essa crença acaba, no mundo moderno, por ser um mito. A Europa
Ocidental não tem qualquer nação que seja composta de apenas um único povo,
uma única cultura ou etnia. As nações modernas são, todas, híbridos culturais”.
O mesmo autor (op. cit. p. 62-63) enfatiza também que “é ainda mais difícil
unificar a identidade nacional em torno de uma raça. […] A raça não é uma
categoria biológica ou genética que tenha qualquer validade científica. […]. A
raça é uma categoria discursiva e não uma categoria biológica”.
Com a ideia de que a nação não se funda unicamente por pressupostos étnicos
e nem raciais, uma vez que a raça não explica, por exemplo, que o ser branco
ariano significa ser alemão, ou então que ser negro é ser africano, até porque
existem em África Estados cuja população é maioritariamente branca, como são
os casos do Egipto, Tunísia, Líbia e Argélia, que fazem parte da denominada
“África Branca”, Renan (1997) coloca em causa o mito de formação das nações
com base na raça e na língua ao defender que “as línguas são formações históricas
que indicam pouco sobre o sangue dos que as falam e que, em todo o caso, não
poderiam agrilhoar a liberdade humana de escolher a família com a qual deseja
unir-se para a vida e para a morte” (Renan, 1997, p. 169-170).
Ainda no mesmo diapasão, Bauer (1996, p. 45) refere que “os ingleses e
irlandeses, os dinamarqueses e noruegueses, os sérvios e os croatas, falam, em
cada um dos casos, a mesma língua, e nem por isso são um único povo. Os judeus,
por outro lado, não têm uma língua comum mas são uma nação”. A propósito da
impossibilidade de qualificar sentimentos de pertença tomando a língua como
base para a formação de uma nação, Hobsbawn (1990, p. 75) faz a seguinte
consideração: “o que sabemos é que lutas nacionalistas foram agravadas
algumas vezes, nos tempos modernos, pela recusa de frações de grupos
linguísticos em aceitar a unidade política com outros que falam a mesma língua”.
Weber (1994, p. 173), no mesmo sentido, refere que os “alsacianos de língua
alemã que rejeitam a pertinência à ‘nação’ alemã não se consideram, por isso,
simples membros da ‘nação’ francesa”.
Assim sendo, afigura-se pouco consistente a percepção de algumas correntes
de opinião de que Moçambique não é uma nação devido à sua diversidade ético-
linguística que traduz-se nas acentuadas assimetrias e heterogeneidades para a
formação da colectividade, até porque a nação é um sentimento de pertença
que não está diretamente indexado a questões étnicas, raciais, culturais,
linguísticas e um dos seus sustentáculos é o sofrimento e o desejo de as pessoas
alcança- rem objetivos comuns, o que justifica o fato de inúmeros e
diversificados grupos étnico-linguísticos e culturais se terem unido e superado
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as suas divergências estruturantes, em decorrência do sofrimento imposto pela


colonização, em torno do mesmo movimento nacionalista para libertar o país.
Por isso, corroboramos com Hobsbawn (1990) ao analisar as inferências a partir
das quais se podem determinar as bases para a constituição de uma nação,
nomeadamente: associação histórica com um Estado de passado recente e
razoavelmente durável; existência de uma elite cultural longamente estabelecida
que possuísse um vernáculo administrativo e literário escrito e uma provada
capacidade de conquista. Neste sentido, segundo Renan (1997, p. 173), “uma
nação é, portanto, uma grande solidariedade, constituída pelo sentimento dos
sacrifícios que se fizeram e que ainda se fariam. Ela supõe um passado, mas se
resume no presente a um fato tangível: o consenso, o desejo claramente
expresso de conti- nuar a vida em comum”, ou seja, como advoga Anderson
(2008, p. 32), a naçãoé “uma comunidade política imaginada – e imaginada como
sendo intrinsecamente limitada, e ao mesmo tempo soberana”, pois a “a
colectividade é vivenciada e os símbolos são representados como algo separado
dos indivíduos em questão, algo superior e mais sagrado do que eles” (Elias,
1997, p. 143).
Desta feita, entendemos que o sentimento de pertença à genérica nação mo
çambicana vingou independentemente da etnia vários grupos de diferentes
origens lutaram para libertar as terras conquistadas pelos portugueses; da raça
houve casos de brancos europeus que auxiliaram os moçambicanos (negros e
brancos) na luta contra o colonialismo português; da religião – católicos,
muçulmanos, protestantes e ateus resistiram à ocupação europeia; da língua
pessoas de diferentes idiomas juntaram-se na luta de libertação nacional,
pensamento que ecoa em Machel (1983, p. 20) ao defender que “a nação
identifica-se pelos seus símbolos. Perante a história, perante a cultura, perante a
nação não há católicos, não há muçulmanos, não há protestantes, não há ateus
há moçambicanos pátriotas ou antipatriotas”. Este facto é também
testemunhado em Mondlane ao defender que
O movimento nacionalista não surgiu numa comunidade
estável, historicamente com uma unidade linguística,
territorial, económica e cultural. Em Moçambique foi a
dominação colonial que deu ori- gem à comunidade
territorial e criou as bases para uma coerência psicológica
fundada na experiência da descriminação, exploração,
trabalho forçado, e outros aspectos de dominação colonial
(Mondlane, 1995, p.87).

É neste sentido que a moçambicanidade se forma a partir da política de


homogeneização da diversidade linguística e cultural da FRELIMO forjada nos
tempos de luta armada de libertação nacional preconizada na filosofia política de
Eduardo Mondlane e de Samora Machel, ícones do nacionalismo moçambicano,
visto que o primeiro é considerado o arquitecto da unidade nacional por ter
contribuído, com a sua visão de totalidadade, na união dos principais
movimentos nacionalistas de luta pela independência num único movimento
libertador; o segundo por ser considerado o pai da nacionalidade moçambicana,
ao ter declarado a independência do país e por ter sido um dos principais
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ideólogos da construção de um Estado-Nação indexado aos princípios de


‘Homem Novo’.
Com base nessas políticas, o Estado Moçambicano, por meio da FRELIMO, já que
praticamente não existiam fronteiras entre o Estado e o partido do governo,
realidade expressa na primeira Constituição da República de 1975 (revista em
1990 e em 2004) no artigo terceiro ao referir-se que “A República Popular de
Moçambique é orientada pela linha política definida pela FRELIMO, que é a força
dirigente do Estado e da Sociedade”, enveredou por um sistema de governação
socialista e comunista de base marxista e leninista, programando a vida da
sociedade, arregimentando e complexificando ainda mais o sistema de violação
simbólica, promovendo uma educação escolar de (re)produção de semelhanças
e apagamento de diferenças para sustentar a ideia de um Estado-Nação uno e
indivisível sustentado na moçambicanidade, estereótipo representativo de base
homogeneizante da diversidade linguística, cultural e de identidade que
caracteriza Moçambique.
É a moçambicanidade que faz existir a ideia de nacionalidade, do nacionalismo e
de pertença a uma coletividade do Estado, uma vez que gera o sentimento de
gnoseologia e de partilha de valores comuns. Ainda que sentida como essência e
forma, a moçambicanidade não passa de uma construção filosófica e simbólica
alicerçada em representações que cosntituem a identidade nacional. Ainda assim,
ela não é estática. Pelo contrário, é dinâmica, processual, controversa e em
constantes crises como qualquer outra identidade e processa-se como
mecanismo de negação a todo o tipo de alienação colonial e, ao mesmo tempo,
como afirmação e auto-definição das categorias socioculturais e simbólico-
ideológicas que definem o que é ser um cidadão moçambicano, ou seja, a
moçambicanidade é a negação à portugalidade.
Portanto, a moçambicanidade, como projeto político-ideológico, nasce da
resistência e da negação da portugalidade e funda-se na base da
“representatividade” sociocultural e étnico-linguística da diversidade do país em
estereótipos ideológicos e revigora-se a partir da ideia de que é possível
arregimentar as pessoas no território do Estado-Nação recorrendo-se às
amálgamas representacionais das formas de ser, de estar, de pensar, de sentir,
de agir e de fazer, concomitantes à construção e (re)produção de semelhanças
num mercado de trocas linguísticas e simbólicas.
Com a filosofia de (re)produção em larga escala de semelhanças para consolidar
a moçambicanidade, o Estado-Nação em Moçambique aprofundou o seu
emparelhamento ideológico e com isso a mediatização das suas políticas
estruturantes da territorialização do poder, isto é, disseminar em massa e à escala
nacional os fundamentos do Homem Novo, a ideia de várias culturas de base única
moçambicana, facto que se enquadra no posicionamento de Fanon (2005),
quando analisa o papel dos movimentos independentistas em África, ao defender
que combater pela cultura nacional é combater pela libertação da nação, já que
não existe um combate cultural que se desenvolva literalmente ao combate
popular.
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6.1.4. As faces e interfaces das políticas linguísticas de Moçambique

No contexto da formação dos Estados Nacionais, cada país adota as suas políticas
linguísticas em função dos objetivos que pretende alcançar, o que faz da política
linguística e da planificação linguística dois complementos importantes na
materialização das políticas públicas dos Estados tendo em conta as implicações
político-ideológicas a partir das quais se estrutura todo o processo de
desenvolvimento. Neste sentido, partimos do mote lançado por Bourdieu (2008,
p.31) segundo o qual “os linguistas incorporam à teoria um objeto pré-construído
cujas leis sociais de construção esquecem e cuja génese social em todo o caso
mascaram” e defende que não é o espaço que determina a língua, pelo contrário,
é a língua que define o seu espaço.
Segundo Calvet (1987), citado por Fiorin (2009, p. 15), política linguística é um
“conjunto de escolhas conscientes efectuadas no domínio das relações entre
língua e vida social, e mais particularmente entre língua e vida nacional”. E por
que a existência de uma política linguística pressupõe, a priori, a existência de
uma planificação linguística, Fiorin (ibidem) define-a como “a busca e o emprego
dos meios necessários para a aplicação de uma política linguística”, o que nos
leva a concluir que a primeira implica, necessariamente, a existência da segunda,
pois é o seu instrumento materializador, porém o inverso não procede. Em
Moçambique, o contexto político-ideológico da escolha da língua portuguesa
como língua oficial, língua de Estado e língua de unidade nacional, a partir da qual
se estruturam as ações do Estado Nacional é ancorada na seguinte passagem de
Ga- nhão (1979) citado por Lopes (2004)
A decisão de se optar pela língua portuguesa, como língua oficial na República
Popular de Moçambique, foi uma decisão política meditada e ponderada
visando atingir um objectivo – a preservação da unidade nacional e
integridade do território. A história da apropriação da língua portuguesa, como
fac- tor de unidade, nivelador das diferenças veio desde a criação da Frelimo
em 1962 (Lopes, 2004, p. 21).

Como se pode constatar, a escolha, não linguística, mas política, é herança de uma
política linguística implementada pela própria FRELIMO durante a luta armada.
Produto de um território caracterizado pela diversidade social, linguística, étnica
e cultural, a FRELIMO, desde cedo, adotou, no seu seio, uma política linguística
de emancipação do Português como língua de comunicação tendo em vista a
neutralizar divisionismos intra e inter-étnicos de base tribal, pois a orientação
era clara: matar a tribo para fazer nascer a nação e, como tal, era necessário
reproduzir semelhanças de pertencimento da mesma terra de acolhimento, já
que não se lutava pela terra pré-chegada dos portugueses visto que as fronteiras
foram desarticuladas pelas dinâmicas da ocupação das potências imperialistas.
Com isso, a escolha da norma europeia como padrão em Moçambique foi
decorrente das contingências de uma realidade específica: a diversidade
linguística constituía um entrave para os propósitos da consolidação do jovem
Estado-Nação na visão político-ideológica, como também para a materialização
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das políticas públicas para o desenvolvimento que não deviam descurar o


emparelhamento de todas as sensibilidades étnico-linguísticas e culturais num
sistema nacional para gerar e consolidar o Estado Nacional e combater as
assimetrias regionais que poderiam atentar contra a unidade nacional e a
soberania do Estado.
É neste contexto que a língua portuguesa se torna num elemento sine qua non
para a estruturação ideológica da população, por meio da política da formação
do Homem Novo, tipificado como aquele que defende a política da FRELIMO e
reconhece nela o poder de guia supremo do Estado e do povo; combate o
regionalismo, o tribalismo, o individualismo e o obscurantismo; tem um espírito
de sacrifício pela pátria. Um ‘Homem Novo’ capaz de se adequar à nova ordem
social, política, econômica, religiosa, ideológica, enfim, construir um ‘Homem
Novo’ capaz de fazer face aos desafios da construção do Estado Nacional, razão
pela qual “a imposição da língua legítima contra os idiomas e os dialectos faz
parte das estratégias políticas destinadas a assegurar a eternização das
conquistas da Revolução pela produção e reprodução do homem novo”
(Bourdieu, 2008, p. 34). Com isso, e de forma equivocada, mas intencional, as
línguas autóctoes, num total de 19, segundo Firmino (2001) – ainda que
reconheçamos que existem números díspares a este respeito, porém não nos
iremos deter neste aspecto, foram neutralizadas e silenciadas, pois para a lógica
ideológica a sua existência atentava contra a unidade nacional e a construção
de um Estado-Nação uno e indivisível, situação que gerou dissonância no seio
da FRELIMO, uma vez que havia certos círculos de opinião que não viam com
bons olhos a crescente subalternização das línguas autóctones tendo em conta
o seu papel importante na consciencialização da sociedade, por exemplo, na
estruturação e ramificação das relações intra-familiares, inter-culturais, inter-
étnicas e intra-étnicas e na moralização da população. É por essa razão que
Mazula (1995) aponta que, em 1982, no contexto de ideias liberais no seio da
FRELIMO, e no âmbito do IV Congresso, é que se reconheceu a diversidade
cultural como riqueza nacional, abrindo-se as portas para o início do estudo e
da necessidade de valorização das línguas autóctones, ainda que reconheçamos
que muito ainda falta por se fazer. Como se pode constatar, as políticas
linguísticas de Moçambique estão associadas ao processo de construção e
consolidação do Estado-Nação razão pela qual corroboramos com Bourdieu
(2008, p. 32) ao referir que “a língua oficial está enredada com o Estado tanto em
sua gênese, como em seus usos. É no processo de construção do Estado que se
criam as condições de constituição de um mercado linguístico unificado e
dominado pela língua oficial”.
Dessa forma, Moçambique, como a generalidade dos países africanos, viu-se
obrigado a herdar parte significativa das políticas linguísticas que o colonialismo
implementara no país como forma de sustentar a ideia de unidade na diversidade
e garantir a governabilidade do território a partir da (re) produção de
semelhanças concomitantes ao povo da mesma nação tendo em vista a
implementação das políticas públicas para o desenvolvimento. Esta escolha, que
resultou de um metabolismo político-ideológico no seio da própria FRELIMO, já
que comba- tera o colonialismo, porém acabou por herdar algumas das suas
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práticas, como é o caso das políticas linguísticas, justificou-se, de entre outras,


pelas seguintes razões: a) impossibilidade de unificar a diversidade linguístico-
cultural a partir de uma língua autóctone; b) tentativa de unificar na diversidade,
contornando possíveis levantamentos intra- e inter-étnicos de insubordinação e
que atentassem contra a soberania e a consolidação do Estado-Nação em caso
de escolha de uma língua autóctone como língua oficial; c) inexistência de línguas
autóctones mais representativas à escala nacional; d) incapacidade do Estado
Nacional vencer a ideologia neocolonialista.
É diante deste cenário que com a proclamação da independência nacional de
Moçambique, a 25 de Junho de 1975, também se proclama e outorga-se o novo
estatuto funcional da língua portuguesa, língua do antigo colonizador que, com
a retomada da soberania do território, passa a ser, também, legitimada como
língua de Moçambique e dos moçambicanos, e mecanismo a partir do qual se
deve pensar e construir-se a unidade nacional na diversidade. Essa apropriação
do português decorreu, também, do desejo do Estado-Nação de afirmação da sua
legitimidade e de empoderamento dos seus diversificados usos na extensão
territorial, facto que procede na análise seguinte de Rosário (1982) ao defender
que
Diferentemente de muitos países do continente, a situação da
língua portuguesa não é a de uma herança incómoda com
carácter provisório enquanto se não encontra uma língua
‘genuinamente’ africana. [...]. É um projecto que visa anular
todas as consequências da arbitrariedade do traçado
geográfico do País, dar-lhe uma identidade nacional e uma
consciência cultural, através do povo que nele habita (Rosário,
1982, p. 64-65).

Curiosamente, apesar de a FRELIMO ter escolhido o Português como língua


oficial, tal estatuto não foi expresso formalmente na primeira Constituição da
República Popular de Moçambique de 19751, facto que viria acontecer na Consti-
tuição da República de 1990, aprovada no dia 2 de Novembro e entrou em vigor
no dia 30 do mesmo mês e do mesmo ano. O estatuto do Português, nesta cons-
tituição, foi clarificado de forma equivocada. No artigo 5°, ponto 1, prescreve-se
que “Na República de Moçambique a língua portuguesa é a língua oficial” e não
se atribui a ela, de forma clara, o papel prescrito para as línguas autóctones
conforme se estipula, no mesmo artigo, no ponto 2, que “O Estado valoriza as
línguas nacionais e promove o seu desenvolvimento e utilização como línguas
veiculares e na educação dos cidadãos”.
Esta situação deixa certas ambivalências pelo facto de, à língua portuguesa, ter-
se conferido o estatuto de língua oficial e deixar-se a descoberto a sua
restritividade decorrente da ênfase do papel que se atribuiu às línguas
denominadas nacionais como veiculares e de educação dos cidadãos como se o
Português não o fosse e não desempenhasse também tal papel. Já na atual
Constituição da Repú- blica que foi aprovada em 16 de Novembro de 2004 e
entrou em vigor em 21 de Janeiro de 2005, prescreve-se, no artigo 9°, que “o
Estado valoriza as línguas nacionais como património cultural e educacional e
promove o seu desenvolvimento e utilização crescente como línguas veiculares
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da nossa identidade” e no artigo 10° que “na República de Moçambique a língua


portuguesa é a língua oficial”.
Mais uma vez, nesta constituição, percebe-se outro equívoco das políticas
linguísticas preconizadas pelo Estado Moçambicano pelo facto de se dar ênfase
às línguas nacionais como veiculadoras da identidade nacional, deixando-se
transparecer uma falsa lógica de que o que se veicula a partir do Português não é
identidade nacional. Afinal, ela é a língua oficial e, por conseguinte, o símbolo
mais abrangente e aglutinador da política ideológica da construção do Estado-
Nação. Olhando para a Lei 6/92, de 6 de Maio de 1992 (lei que regula o
funcionamento do Sistema Nacional de Educação – SNE), no artigo 4°, determina-
se o dever de “valorizar e desenvolver as línguas nacionais, promovendo a sua
introdução pro- gressiva na educação dos cidadãos”, aclarando-se, mais uma vez,
a preocupação do Estado na disseminação dessas línguas.
Assim sendo, o Português é considerado língua oficial e, por conseguinte, meio de
uso em fóruns oficiais e as línguas autóctones são consideradas línguas nacionais,
patrimônio cultural e educacional e o Estado promove o seu desenvolvimento e
utilização crescente como línguas veiculares da identidade moçambicana, facto
que não deixa de ser curioso visto que no texto constitucional não se reconhece à
língua portuguesa, de forma explícita, o estatuto de patrimônio cultural e educa-
cional apesar de ser a língua de ensino no país, e muito menos como veiculadora
da identidade nacional, naturalizando-se uma ideia, a nosso ver, errônea de que
é cultura nacional o que provém apenas das línguas autóctones e escamoteia-se
uma realidade presente na sociedade – a existência de muitos moçambicanos cujo
repertório sociocultural está intimamente ligado à língua portuguesa e é a partir
dela que transmitem culturas e identidades também nacionais.
Apesar de oficialmente determinarem-se os papéis e os estatutos das línguas em
Moçambique, algo importante não nos passou despercebido. O Português é
considerado língua oficial e também língua de unidade nacional, apesar de esta
última tipificação não estar expressa na Constituição da República e isso decorre
da crença de que por meio dela pode-se gerir e aglutinar-se a diversidade linguís-
tico-cultural que caracteriza o país e forjar-se uma pretensa identidade nacional
unificadora. Porém, a LP, que é um símbolo nacional, língua de Estado, língua da
nacionalidade moçambicana, um meio de comunicação importante no contex- to
da diversidade que caracteriza o país e língua veicular dos desígnios da pátria e
do Estado não é considerada, oficialmente, uma língua nacional nem sequer lín-
gua estrangeira, abrindo-se uma ambivalência sobre a sua tipificação em termos
de origem ou de acolhimento, o que não coloca em causa a sua funcionalidade
multifacetada e prestígio social, apesar de ser a língua segunda de quase todo o
universo populacional.
Às línguas autóctones reservou-se o estatuto de línguas nacionais, o que não
deixa de ser curioso, pois elas não têm expressividade nacional, ou seja, abran-
gência nacional e fragmentam-se por alguns territórios localizados. Mais ainda,
são consideradas nacionais, mas o seu uso é restritivo nos fóruns oficiais e na vida
nacional. Por isso, Firmino (2006) refere que
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esta política linguística oficializou o Português sem o nacionalizar, e


nacionalizou as línguas autócto- nes, sem as oficializar. Como resultado, a
actual política linguística não está em conformidade, nem simbólica, nem
instrumental com a natureza da diversidade linguística que caracteriza
Moçambique (Firmino, 2006, p. 182).

Neste sentido, o Português, sendo a língua de abrangência nacional deveria,


também, ser denominado como uma língua nacional em razão da sua
apropriação linguística, simbólica, cultural e ideológica pelos moçambicanos e
porque é suposto que seja falado em todo o país tendo em conta que é língua
oficial. Mais ainda, a sua nacionalização justifica-se pelo fato de que o Português
Europeu, que é a língua oficial, estar pouco enraizada e de pouco domínio público
e porque nem sempre existe intelegibilidade entre a norma europeia e a
realidade consuetudinária de Moçambique, resultando daí lexemas e
construções léxico - sintácticas, léxico-semânticas, morfossintáticas e
morfológicas à margem do que está prescrito na norma. Por conseguinte, em
Moçambique, falam-se várias línguas portuguesas sob denominação genérica de
Português de Moçambique, que é outra língua portuguesa que resulta da
apropriação e nativização da norma europeia e torna-se língua dos
moçambicanos e legitimada pelo contexto sociocultural, sociolinguís tico, sócio -
simbólico e ideológico dos usos da língua. Apesar do prestígio e mas- sificação
dos usos do Português, também se verifica um movimento, ainda que pouco
sistematizado, mas consolidado, de valorização das línguas autóctones no
cenário sociolinguístico e cultural moçambicano para atender ao clamor nacional
de “preservação” destas línguas.
Neste contexto, assinalamos o fato de altos dignitários do Estado recorrerem ao
uso das suas línguas bantu em comícios populares com as populações; o uso de
lexemas bantu em discursos e cerimônias oficiais; o aumento do número de
gramáticas e de dicionários destas línguas; a existência de cursos superiores do
nível de licenciatura e de mestrado na Universidade Eduardo Mondlane e na Uni-
versidade Pedagógica; a formação de professores nos magistérios nestas línguas;
existência de programas na rádio e na televisão, com o destaque para a Rádio
Moçambique e a Televisão de Moçambique, respectivamente emissoras públicas;
o movimento cada vez mais crescente de escritores, escultores, músicos, pintores
e outros artistas que recorrem sistematicamente ao uso de lexemas de origem
bantu nas suas produções artísticas.
A estes exemplos, junta-se o movimento crescente que pretende retomar alguns
topônimos de origem bantu que, pela força da colonização portuguesa, ti- nham
sido suprimidos ou então aportuguesados. O caso mais evidente aconteceu na
capital do país, Maputo, com a mudança da nomenclatura dos distritos
municipais. Com efeito, Maxaquene passou para KaMaxaquene, Inhaca para
KaNhaca e Catembe para KaTembe. Foi ainda na capital moçambicana que, no
ano 2000, a Assembleia Municipal adotou o Xironga como uma das línguas de
trabalho, a par do Português.
Desta feita, é lícito afirmarmos que a política linguística de Moçambique ainda
está em construção, pelo que existe a necessidade de se desenvolver esforços
para que as fissuras que resultaram da imposição de uma língua minoritária sejam
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finalmente sepultadas e que o país se revigore dentro da sua diversidade


linguística e cultural através da (re)padronização da língua portuguesa, uma
vez que o processo de nacionalização traz subsídios que demonstram que o
Português falado pela maioria está na contra-mão da norma europeia, daí ser
outra língua portuguesa.
A este respeito, trazemos um diálogo atemporal e ontológico de matriz filosófica
entre três ilustres do mundo lusófono. O poeta português Fernando Pessoa dizia
já nos seus tempos logínquos que “a minha pátria é a língua portuguesa”
(Pessoa, 1982, p. 17). Já Mia Couto, escritor contemporâneo moçambicano,
defende que “a minha língua portuguesa, repito a minha língua portuguesa, é a
pá- tria que estou inventando para mim” (Couto, 2011, p. 186). E para aflorar
ainda mais as hostes, José Saramago, escritor português e Prémio Nobel da
Literatura, num pronunciamento proferido no documentário2 “Línguas Vidas em
Português” dirigido pelo moçambicano Víctor Lopes que reside no Brasil toma
um posicionamento discursivo performativo de cariz democrático ao defender
que “não há uma língua portuguesa, há línguas em português”.
Assim sendo, percebemos, seja no pensamento de Fernando Pessoa, seja no de
Mia Couto, que a língua portuguesa é um meio de manifestação do patriotismo,
do nacionalismo e da nacionalidade que se entrelaçam na pretensa identidade
do país de onde o falante é proveniente, razão pela qual, a priori, espera-se que
um cidadão português fale o Português Europeu, o moçambicano fale Português
de Moçambique, assim sucessivamente nos demais países lusófonos. Já em José
Sa- ramago desmistifica-se a ideia de uma língua portuguesa hegemônica e
rebate-se a pretensão da paternidade lusitana do Português ao defender-se a
existência de várias línguas em Português, democratizando-se e legitimando-se o
seu uso como línguas e não dialectos ou variedades.
Em função de todos os aspectos arrolados ao longo deste capítulo, um ponto de
ordem, para a reflexão sobre as políticas linguísticas de Moçambique se impõe,
fundada no questionamento, que se diga bem perspicaz, do linguista brasileiro
Celso Cunha: Será admissível a hipótese de que Portugal nos cedeu a utilização
do idioma e, por isso, dele deve ter para sempre o controlo normativo? E como
que a colocar o dedo na ferida, ressaltando a soberania dos usos do Português
pelo mundo afora onde se fala esta língua, o mesmo autor defende que “a capital
da língua portuguesa estará onde estiver o meridiano da cultura” (Cunha, 1975,
47), deixando bem claro que o Português é patrimônio de todos os falantes
legitimados pela sua apropriação e não única e exclusivamente dos portugueses.

6.1.5. Revitalização linguística: O Xirhonga em Maputo

Kaplan e Baldauf (1997) citados por Lopes (2004:102) “ a revitalização linguística


refere-se ao vigor readquirido de uma língua em perigo ainda em uso”. Nesta
língua tem havido indícios de predominância dos dois tipos de revitalização
linguística, na educação: estudos e teses. Na intervenção politica por parte das
autoridades junto do povo: discursos, campanhas, etc.
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Em Setembro de 2000 a Assembleia Municipal de Maputo adoptou por


unanimidade o princípio de promoção do Xirhonga e das demais línguas bantu
do país. Então, esta Assembleia decidiu adoptar o Xirhonga como uma das
línguas de trabalho, nas sessões plenárias e nas comissões, com o propósito de
estimular a participação dos munícipes na vida do Município.
A promoção desta língua pela Assembleia Municipal de Maputo significava que a
partir daquele momento qualquer munícipe que quisesse dirigir – se aos órgãos
autárquicos na língua Xirhonga poderia fazê - lo, assumindo o município o
encargo organizativo e orçamental de providenciar intérpretes ou tradutores
para esta língua, a qual passaria a ser uma língua de trabalho nos diferentes
órgãos do Conselho Municipal de Maputo. De outro lado, qualquer cidadão
falante de outra língua bantu que a queira usar no seu contacto com os órgãos
autárquicos poderá fazê-lo desde que providencie a interpretação necessária.
Deste modo, através do seu uso numa instituição importante o Xirhonga passou
a gozar de uma maior prominência na sua região, ficando mais equilibrado o seu
estatuto psicológico face ao Xichangana e Português.
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6.1.6. A Questão da Língua nacional

No contexto africano, a integração nacional é muitas vezes vista em termos de


facilitação de comunicação entre vários grupos étnicos. A questão é se a
integração nacional assemelha-se a integração das elites. Mas uma alternativa
para este tipo de integração é a que junta as elites e as massas, que é concebida
como integração vertical.
Por conseguinte, este tipo de integração é possível quando maior parte de
pessoas que não têm acesso á língua oficial podem ser integradas num sistema
ao mesmo nível que outro, e isso somente é possível através de uma língua
africana.
Acerca do papel das línguas oficiais, parafraseando Thompson (1969:30) é
duvidoso que língua europeia possa se tornar um instrumento eficiente de
construção da nação em muitos países africanos. As línguas europeias são apesar
disso estrangeiras para as massas africanas.

Um assunto intrinsecamente relacionado com a integração vertical é a questão


da língua nacional, sendo assim levanta – se a questão seguinte:

▪ Que língua (s) deve (m) ser adoptada (s) como oficia (is) em África?

A (s) língua (s) deve (m) ser concebidas como tendo esse papel em África são:

1.LWC (Línguas de Comunicação mais ampla) casos de Inglês, Francês, Espanhol


e Português que são línguas oficiais europeias usadas no período colonial que
até hoje são usadas em diferentes países africanos como línguas oficiais;

2.O Arabic que é sempre associada ao Islão;

3.Línguas africanas que podem ser consideradas como maioritárias, tais como:
Wolof em Senegal ou Hausa em Níger; uma língua maioritária que tem de ser
estendida a um grande segmento populacional tal como o Krio , na Serra Leoa;
uma língua artificial sempre concebida como uma língua de união de pessoas de
línguas diferentes, como o Guosa em Nigéria;

4. Um Inglês baseado no Pidgin, como o de Nigéria e Camarões.


Em qualquer parte do mundo para a escolha de uma língua nacional é crucial
considerar alguns factores, a África não é excepção.
No continente africano para a escolha de uma língua com estatuto de oficial
concorrem vários factores, a saber:

a)Nacionalismo vs Nacionismo;

A reivindicação da autenticidade corresponde ao nacionalismo enquanto que a


reivindicação da eficiência diz respeito ao nacionismo.
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Deste modo, em termos de escolha de língua nacional o nacionalismo que


envolve a integração sócio – cultural e autenticidade, reivindica a adopção de
uma língua indígena como oficial enquanto que o nacionismo se preocupa com a
integração política e eficiência, isto é; reivindica por uma língua que pode
desempenhar estes papéis (integração política e eficiência). Um facto notório é
que a língua do nacionismo em maior parte dos países africanos é usada na
educação, desde o ensino primário ao superior, tecnologia, saúde, órgãos de
comunicação social, entre outros, motivo pelo qual Fishman (1971) afirma que “
as novas nações tendem a enveredar pelo nacionismo do que nacionalismo”.

A língua do nacionismo é uma das LWC termo que pressupõe a existência de LNC
(Língua de comunicação menos ampla) tais como: Danish, Czech, Dutch, estas
que não são faladas ou conhecidas por falantes de outras línguas.

Uma LWC é vantajosa em qualquer parte do mundo, particularmente no


continente africano visto que em muitos casos é uma língua usada pelo governo
em diferentes infra – estruturas, nomeadamente: órgãos de comunicação social
( jornal, radio, televisão) educação, saúde, entre outras, geralmente ela
apresenta um estatuto profundamente enraizado não só, como também é uma
língua de prestígio internacional estando associada ao mundo de tecnologia.

Segundo a perspectiva para a escolha de uma língua nacional nos países africanos
Fishman (1971) apresenta três decisões correspondentes a três divisões
possíveis:

(i) Decisões do tipo A; que correspondem a decisões de países que não têm
grande tradição e a população pode apelar pela integração. Desde modo, são
decisões de países que não se fala muito em integração, são decisões feitas tendo
em conta o nacionismo, desta forma, escolhe- se uma LWC como símbolo
nacional permanente. Exemplo: Camarões, Ghana, Gâmbia e Tanzânia.

(ii)Decisões do tipo B; que correspondem a decisões de países que apresentam


grande tradição e a escolha da nacional é feita segundo o nacionalismo,
primeiramente escolhe –se uma língua indígena como nacional porém a
eficiência também é desejada, a LWC é sempre adoptada como uma escolha
transitória. Exemplo: Etiópia.

(iii)Decisões do tipo C; que acontece entre países que têm várias outras
tradições. Sendo assim, em via de conflito ou reivindicação destas tradições,
assume – se nestes países um compromisso entre a integração nacional e a
identidade étnica que são a conciliação entre o nacionismo e nacionalismo.
Exemplo: India e Malásia. Não tem exemplo de nenhum pais africano.
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2)Integração vertical;

Consiste em adoptar uma língua estrangeira como oficial de modo a que nela
participem tanto as massas de um determinado grupo étnico como as elites de
outro grupo étnico. A integração vertical nem sempre é satisfatória visto que
limita a participação de um determinado grupo étnico privilegiando o outro.

A integração vertical predomina em países como a Tanzânia, que adoptou o


Swahili como língua indígena na sua politica linguística diferentemente do
Uganda que não adoptou a língua nativa mas sim o Inglês, facto que revela
insatisfação de todos grupos sociais.

3)Aceitabilidade;

Tem a ver com a integração vertical visto que para que uma língua seja aceite
num país deve ser aceite por diferentes componentes do mesmo.

4) População;

Desempenha um papel relevante na escolha de uma língua. Existem dois


modelos possíveis:

(a)Modelo maior , que acontece quando a escolha da língua nacional é feita de


acordo com a língua que é falada por maior parte da população.

(b)Modelo menor, que acontece quando a escolha da língua nacional é feita de


acordo com a língua que é falada por menor parte da população.

Em debates acerca da questão da escolha da língua nacional sugere – se a


escolha do modelo menor uma vez que põe muitas pessoas em desvantagens
semelhantes embora se comente que a língua minoritária o problema real seja
de como expandi – la ao resto da população uma vez que tem que se formar e/
ou especializar professores, etc . Tal longe de existir o modelo menor é um facto
histórico resultante de factores como: menos ou menor tradição escrita e
alfabetização.

Exemplo: O Swahili, em Tanzânia, o Krio na Serra Leoa primeiramente foram


linguas nativas faladas pela minoria. Actualmente o Swahili tornou – se uma
língua franca nacional enquanto o Krio gradualmente vai obtendo o estatuto de
língua franca e num futuro não distante poderá emergir como língua oficial na
Serra Leoa.

5) Estatuto/Estado de desenvolvimento da língua


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Neste tipo de indicador, de acordo com exercícios feitos, o uso de língua é feita
em diferentes infra – estruturas que são: jornais, rádio, gramática, dicionário,
ortografia, alfabetização, tradução, etc, Brann (1975) após o estudo feito,
concluiu que das 51 línguas existentes na Nigéria, as línguas que apresentavam
um estado de desenvolvimento mais avançado são: Yoruba com (26); Hausa com
(25); Igbo (23.5) e Efik (20).

Parafraseando Ferguson (1962) considera é possível estimar o estado de


desenvolvimento de uma língua através de indicadores como: uso ou não uso
dela em contextos formais (livros, jornais, cartas) publicações cientificas e níveis
de padronização.

Sendo assim, é a partir de uso ou não de uma língua em diferentes contextos que
podemos afirmar se determinadas línguas estão ou não num grande estado de
desenvolvimento linguístico.

De acordo com os factores que concorrem para o estatuto de desenvolvimento


de uma língua acima referenciados, podemos considerar que existem línguas
candidatas à língua nacional, a saber:

(i) LWC, que apresenta uma grande vantagem uma vez que é usada
internacionalmente e particularmente em diferentes infra – estruturas de um
determinado pais;
(ii) Arabic, que já está sendo usada em diferentes domínios;
(iii) As línguas indígenas africanas, que não competem como uma LWC em termos
de uso, excepto o Somali.

Sumário

Nesta unidade abordamos acerca de politica linguística, revitalização linguística,


concretamente a revitalização do Xirhonga em Maputo, e também fizemos
referência à questão da língua nacional bem como os factoreskm que concorrem
para que uma língua tenha estatuto de língua nacional ou oficial nos países
africanos.

AUTO-AVALIAÇÃO

Questoes de Verdadeiro e Falso

1)Política linguística é um conjunto de ideias, leis, regulamentos, regras e práticas


que visam implementar, na sociedade, grupo ou organização sócio-política,
as mudanças linguísticas planeadas.

2)Planeamento Linguístico refere-se à actividade organizada (privada ou oficial)


que busca resolver problemas linguísticos existentes no interior de uma
determinada sociedade, geralmente em nível nacional.
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3)A revitalização do Xirhonga pelo município da cidade de Maputo foi no ano


2010.

4)A revitalização do Citswa pelo município da cidade de Maputo foi no ano 2000.

5)A política linguística de Moçambique é endoglóssica.

II. Escolha a opção correcta

1) A política linguística vigente em Moçambique é:

a. diglossia;

b. endoglossia;

c.exoglossia;

d. mudança linguística

2. De entre as linguas moçambicanas abaixo somente uma sofreu revitalização,


que é:

a. citswa;

b. emakuwa;

c. xirhonga;

d. cisena

3.Na escolha das linguas nacionais/oficias em África,o nacionalismo


corresponde a:
a. eficiência;
b. integração vertical;
c. nacionismo;
d. autenticidade
4. De entre os factores concorrentes para a escolha das linguas
nacionais/oficiais em África apenas uma não faz parte integrante destes, que
é:
a) planificação linguística;
b) nacionalismo;
c) integração vertical;
d) aceitabilidade
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5. De entre as linguas abaixo, somente uma se integra nas linguas


minoritárias, que é:
a) cisena;
b) gitonga;
c) emakuwa;
d) xichangana

III. Responda às questões abaixo:

1.Defina revitalização linguística.

2.Como se revitaliza uma língua em perigo de extinção no sector educacional?

3. Porque se revitaliza uma língua?

4.O que é LWC (Língua de Comunicação mais ampla)?

5. Mencione pelo menos dois (2) factores que concorrem para eleição de uma
língua como nacional ou oficial.

Respostas:

I. 1) V; 2) V; 3) F; 4) F; 5) F
II. 1) C; 2) C; 3)D; 4)A; 5) B

III.1.Revitalização linguística refere-se ao vigor readquirido de uma língua em


perigo ainda em uso.

2. A revitalização de uma língua no sector educacional pode ser feita através de


estudos e teses.

3. Revitaliza-se uma língua quando estiver em risco de extinção.

4. LWC/ Língua de Comunicação mais ampla é uma língua que é usada por maior
parte de população no mundo.

5. Dois (2) factores que concorrem para eleição de uma língua como nacional ou
oficial são nacionismo e integração vertical.

1)Política linguística é um conjunto de ideias, leis, regulamentos, regras e práticas


que visam implementar, na sociedade, grupo ou organização sócio-política,
as mudanças linguísticas planeadas.

2)Planeamento Linguístico refere-se à actividade organizada (privada ou oficial)


que busca resolver problemas linguísticos existentes no interior de uma
determinada sociedade, geralmente em nível nacional.
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3)A revitalização do Xirhonga pelo município da cidade de Maputo foi no ano


2010.

4)A revitalização do Citswa pelo município da cidade de Maputo foi no ano 2000.

5)A política linguística de Moçambique é endoglóssica.

Respostas:

I.1) V; 2) V; 3) F; 4) F; 5) F

Questões de Escolha Multipla

1) A política linguística vigente em Moçambique é:

a. diglossia;

b. endoglossia;

c.exoglossia;

d. mudança linguística

2. De entre as linguas moçambicanas abaixo somente uma sofreu revitalização,


que é:

a. citswa;

b. emakuwa;

c. xirhonga;

d. cisena

3.Na escolha das linguas nacionais/oficias em África,o nacionalismo


corresponde a:
a. eficiência;
b. integração vertical;
c. nacionismo;
d. autenticidade
4. De entre os factores concorrentes para a escolha das linguas
nacionais/oficiais em África apenas uma não faz parte integrante destes, que
é:
a) planificação linguística;
b) nacionalismo;
c) integração vertical;
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d) aceitabilidade
5. De entre as linguas abaixo, somente uma se integra nas linguas
minoritárias, que é:
a) cisena;
b) gitonga;
c) emakuwa;
d) xichangana
Respostas:

III. 1) C; 2) C; 3)D; 4)A; 5) B

I. Responda às questões abaixo:

1.Defina revitalização linguística.

2.Como se revitaliza uma língua em perigo de extinção no sector educacional?

3. Porque se revitaliza uma língua?

4.O que é LWC (Língua de Comunicação mais ampla)?

5. Mencione pelo menos dois (2) factores que concorrem para eleição de uma
língua como nacional ou oficial.

II. Respostas:

1.Revitalização linguística refere-se ao vigor readquirido de uma língua em perigo


ainda em uso.

2. A revitalização de uma língua no sector educacional pode ser feita através de


estudos e teses.

3. Revitaliza-se uma língua quando estiver em risco de extinção.

4. LWC/ Língua de Comunicação mais ampla é uma língua que é usada por maior
parte de população no mundo.

5. Dois (2) factores que concorrem para eleição de uma língua como nacional ou
oficial são nacionismo e integração vertical.

Referências Bibliográficas

BAKER, C. Language planning: a grounded approach. In: DEWAELE, J.-M.;


HOUSEN, A.; WEI, L. (Org.). Bilingualism: beyond basic principles. Clevedon:
Multilingual Matters Ltd, 2003.
UnISCED CURSO: Ensino de Português ; 30 Ano Disciplina/Módulo: Sociolinguística

BIANCO, J. L. Language planning as applied linguistics. In: DAVIES, A.; ELDER, C.


(Org.). The handbook of applied linguistics. Oxford: Blackwell Publishing, 2004.

DE PAULA, M. H. e QUIRAQUE, Z. A. S. A necessidade de uma política linguística


inclusiva para o multilinguismo em Moçambique. Domínios de Lingu@gem:
Uberlândia. 2016.

SEVERO, C. G. Política(s) linguística(s) e questões de poder. Alfa: São Paulo.


2013.

APÊNDICES
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TEMAS PARA FÓRUM – I


1. Diferenças entre variação social e variação diafásica;
2. A língua franca
3. As linguas pidgins e crioulas
4. Tabus linguiticos e eufemismos
5. Diferenças entre variação geográfica e histórica da língua
6. Sincronia e Diacronia
7. Noções de variedade e variante
8. Graus de bilinguismo
9. Tipos de bilinguismo;
10. O ensino bilingue em Moçambique
TEMAS PARA FÓRUM – II
1. Diferenças entre linguas pidgins e crioulas
2. Variedade padrão
3. Interferências linguísticas
4. Preconceito linguístico
5. Diferenças entre PE e PB
6. A sociolinguística Laboviana
7. Objecto de estudo da sociolinguística
8. Mudanças linguísticas
9. Relação entre língua e cultura
10. Girias e calão
TEMAS PARA TRABALHO DE CAMPO
1.Variação linguística em Moçambique
2. O bilinguismo na educação
3. Planificação linguística em Moçambique
4. Política linguística de Moçambique
5. O bilinguismo
6. Surgimento da sociolinguística
7. Linguagem e socialização
8. A hipótese de Sapir-worf
9. O multilinguismo em Moçambique
10. O universalimo linguístico
11. A teoria das cores e relações de parentesco nas linguas

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