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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-graduação em Saneamento,


Meio Ambiente e Recursos Hídricos

CONSEQÜÊNCIAS ECONÔMICAS DAS


INUNDAÇÕES E VULNERABILIDADE:
Desenvolvimento de metodologia para avaliação do
impacto nos domicílios e na cidade

Vanessa Lucena Cançado

Belo Horizonte
2009
CONSEQÜÊNCIAS ECONÔMICAS DAS
INUNDAÇÕES E VULNERABILIDADE:
Desenvolvimento de metodologia para avaliação do
impacto nos domicílios e na cidade

Vanessa Lucena Cançado


Vanessa Lucena Cançado

CONSEQÜÊNCIAS ECONÔMICAS DAS


INUNDAÇÕES E VULNERABILIDADE:
Desenvolvimento de metodologia para avaliação do
impacto nos domicílios e na cidade

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em


Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da
Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito
parcial à obtenção do título de Doutor em Saneamento,
Meio Ambiente e Recursos Hídricos.

Área de concentração: Recursos Hídricos

Linha de pesquisa: Avaliação e gerenciamento de


impactos e de riscos ambientais

Orientador: Nilo de Oliveira Nascimento


Co-orientador: Ricardo Machado Ruíz

Belo Horizonte
Escola de Engenharia da UFMG
2009
C215c Cançado, Vanessa Lucena.
Conseqüências econômicas das inundações e vulnerabilidade [manuscrito] :
desenvolvimento de metodologia para avaliação do impacto nos domicílios e na cidade /
Vanessa Lucena Cançado . — 2009
xxiii, 394 f., enc.: il.

Orientador: Nilo de Oliveira Nascimento

Co-orientador: Ricardo Machado Ruíz

Tese (doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Engenharia.

Bibliografia: f. 357-381.

1. Recursos hídricos – Desenvolvimento – Teses. 2. Avaliação de riscos ambientais –


Teses. 3. Inundações – Aspectos ambientais – Teses. 4. Impacto ambiental – Teses. 5. Dano
patrimonial – Teses. I. Nascimento, Nilo de Oliveira. II. Ruíz, Ricardo Machado. III.
Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Engenharia. IV. Título.

CDU: 556.166 (043)

Ficha elaborada pelo Processamento Técnico da Biblioteca da EE/UFMG


AGRADECIMENTOS

Sobretudo ao professor Nilo de Oliveira Nascimento, que me deu todo apoio intelectual para
realização desta tese. Tive a sorte de tê-lo como o mestre que me introduziu no mundo da
engenharia ambiental, sempre com uma visão abrangente e rica das relações que envolvem a
natureza e a sociedade;

Ao professor Ricardo Machado Ruiz, pela orientação dada aos aspectos econômicos que
envolvem a pesquisa, de forma sempre precisa e atenta. Agradeço também enormemente a
ajuda preciosa na parte computacional;

À professora Sylvie Barraud, minha orientadora durante o período de estágio no INSA de


Lyon. Agradeço a atenção, disponibilidade e orientação na parte de indicadores;

À professora Leise Kelli de Oliveira, que me apresentou o “mundo” da simulação de tráfego e


colaborou imensamente nos aspectos relacionados à questão do sistema de transportes
presentes nesta tese. Obrigada também pela revisão do texto, pela atenção, generosidade e por
todo o avanço que pudemos incorporar nesta pesquisa em relação ao tema;

Aos professores da banca de qualificação, Francisco de Assis de Souza Filho, Alisson


Barbieri, Márcio Baptista, além do orientador e do co-orientador. Agradeço as análises atentas
e críticas do trabalho, as quais me serviram de apoio e inspiração para o desenvolvimento
posterior da tese;

Às agencias financiadoras da presente pesquisa: FAPEMIG, durante dois anos e meio, Capes
durante um ano e um mês, ao CNPq, pelo financiamento do meu período de pesquisa no
exterior;

À equipe de estudantes que trabalharam intensivamente na pesquisa: ao Brenner Rodrigues,


pelo grande trabalho feito na parte de utilização do SIG; ao Farney Aurélio, que atuou na
simulação do tráfego com presteza e eficiência e ao Julian Eleutério, Vitor do Vale e Vitor
Queiroz, responsáveis pela execução da maior parte das modelagens hidrológicas e
hidráulicas. Agradeço o empenho e esforço desta equipe de trabalho;

Ao Wilson Borba, em especial na parte das rotinas computacionais em Excel, e ao Douglas


Sathler, na parte de SIG. À professora Heloísa Barbosa pelas discussões e material sobre o
sistema de transportes;

Agradeço ainda ao Rodrigo França, colega a quem freqüentemente recorro nas dúvidas
relacionadas ao comportamento do rio. Aos demais colegas do grupo de inundações, Rodrigo
Bonnati e Cristiane Parisi, pela troca de idéias, bibliografia e apoio mútuos. Aos colegas
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André Guerra, Nebai Gontijo, Bernardo Furtado e Fernando Pereira pela presteza no envio de
informações sobre o espaço urbano;

À Sonaly, especialmente pela assistência ao uso do SPSS. Ao Jorge Ávila, bolsista de


iniciação científica no Cedeplar, por ter coletado e me disponibilizado grande parte das
informações censitárias necessárias ao estudo;

Agradeço à minha prima Ju que já é, desde o mestrado, minha principal consultora informal
para assuntos de estatística, e que nesta pesquisa colaborou também com informações e
análises que envolvem o setor educacional; agradeço a Dedé que, ante ao meu tempo curto, se
disponibilizou a fazer a tradução do resumo para o inglês;

Agradeço as professores do Programa de Pós-graduação, que sempre se mostraram solícitos


em discutir e responder as dúvidas de uma estudante “estrangeira”;

Agradeço aos professores do INSA-Lyon pela acolhida, pelo suporte técnico e discussões
científicas;

À UFMG, em especial ao Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e


Recursos Hídricos e ao Departamento de Engenharia Hidráulica e Recursos Hídricos da
Escola de Engenharia da UFMG, pelo apoio técnico e científico. Agradeço à Iara e a Jussara
por toda atenção e apoio logístico;

Ao Cedeplar, onde fiz as pesquisas no banco de dados do IBGE;

Agradeço aos meus colegas de pós-graduação pela troca de idéias e pelos bons momentos de
lazer; agradeço também aos colegas do INSA, pela excelente recepção e discussões sobre o
trabalho;

Agradeço enormemente o estímulo e apóio da minha família e amigos, estes imensuráveis;

Ao Pascal, com quem tive um verdadeiro encontro. Agradeço as revisões críticas dos textos e
apresentações feitas em francês e, sobretudo, o seu estímulo, serenidade e sensibilidade que
me possibilitaram a “paz do espírito” para as horas de estudo.

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RESUMO

A análise dos impactos das inundações é parte integrante do planejamento e avaliação local,
regional e global do risco. Na busca de sustentabilidade e segurança no desenvolvimento da
comunidade, é uma ferramenta para tomada de decisões em todos os níveis de governos. As
razões para um rigoroso processo de avaliação de danos – potenciais ou pós-desastre – são
inúmeras e, normalmente, associam-se à dicotomia custo e benefício, uma dualidade presente
na maior parte dos processos de decisão para a fixação do nível ótimo de projeto e da
alocação eficiente dos investimentos públicos ou privados no tempo e no espaço.

Este estudo busca estimar as conseqüências econômicas da inundação sobre os domicílios e a


cidade, caracterizando os danos diretos e indiretos, mas incorporando também a
vulnerabilidade, o que implica em avaliar a capacidade de enfrentamento e recuperação da
população exposta.

Com este objetivo foi feita uma análise multisistêmica, que incorpora a rede hidrográfica, os
domicílios, o sistema de transportes e as firmas. Os fluxos monetários da região foram
definidos a partir das trocas econômicas entre firmas e domicílios. As informações são
agregadas por meio de uma modelagem computacional em rede. Para verificar as relações
entre os sistemas e as várias regiões de um espaço urbano complexo foi construído um
protótipo, o qual procura representar os principais elementos da cidade impactados por uma
inundação. Adicionalmente, foram criados indicadores detalhados de vulnerabilidade, ameaça
e exposição a fim de se captar várias dimensões relacionadas ao risco de inundação.

As simulações feitas possibilitaram verificar a consistência dos fundamentos teóricos


adotados, a coerência das rotinas analíticas e do banco de dados. A discussão metodológico-
teórica e os resultados obtidos mostraram a viabilidade e potencialidade de aplicação da
metodologia para análise de impactos ambientais em uma perspectiva ampla e considerando a
dimensão relacional que envolve os processos.

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ABSTRACT

The analysis of flood impacts is an integral part of the planning and of the local, regional and
global evaluation of risks. In the search for sustainability and safety in community
development, the analysis of flooding impact is a tool for decision making in every level of
government and also for risk management. There are several reasons to justify an accurate
damage evaluation – pre or after disaster – and normally those reasons are connected to the
cost-benefit dichotomy, a duality that is present in the great majority of decision-making
processes to determine the most efficient allocation of public or private investment in time
and space.

This study tries to estimate the economic consequences of floods upon households and the
city, characterizing the direct and indirect damages, but also incorporating the vulnerability,
which implies the evaluation of the capacity of confrontation and recovery of the exposed
population.

For this purpose a multisystemic analysis was undertaken, incorporating the hydrographic
system, the households, the transportation system and the companies. The monetary fluxes
were defined based upon financial exchanges between companies and households. The
information was aggregated using a network computational model. In order to verify the
relationships between the system and the various regions of a complex urban space a
prototype has been devised. In addition, detailed models of vulnerability, threat and
exposition were created, to capture the several dimensions related to the risk of flooding.

The devised simulations have verified the consistency of the adopted theoretical foundations,
the coherence of the analytical routines and of the database. The methodological-theoretical
discussion and the results obtained show the viability and the potentiality of applying the
methodology to the analysis of environmental impacts from a broad perspective, also taking
into account the relational dimension involving the processes.

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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO: O IMPACTO DA INUNDAÇÃO SOBRE AS FAMÍLIAS E
VULNERABILIDADE.......................................................................................................................................... 1
2 OBJETIVOS............................................................................................................................................... 11
3 DANOS DAS INUNDAÇÕES ................................................................................................................... 12
3.1 DANOS ÀS FAMÍLIAS E AOS DOMICÍLIOS ................................................................................................... 15
3.1.1 Preocupação em relação ao risco de inundação e impactos na saúde ......................................... 16
3.1.2 Perturbações da inundação ........................................................................................................... 18
3.2 DANOS ÀS ATIVIDADES ECONÔMICAS ...................................................................................................... 19
3.2.1 Danos indiretos potenciais do comércio varejista e prestadores de serviços ............................... 20
3.2.2 Danos indiretos potenciais das atividades industriais .................................................................. 23
3.3 INTERRUPÇÕES OU PERTURBAÇÕES NA INFRA-ESTRUTURA URBANA ........................................................ 24
3.3.1 Perturbações no sistema de transporte ......................................................................................... 26
3.4 CUSTOS DOS SERVIÇOS DE EMERGÊNCIA .................................................................................................. 27
3.5 OS DANOS DIRETOS .................................................................................................................................. 28
4 VULNERABILIDADE A INUNDAÇÕES .............................................................................................. 33
4.1 AMEAÇA: CARACTERÍSTICAS DA INUNDAÇÃO .......................................................................................... 33
4.2 ANÁLISE DE VULNERABILIDADE .............................................................................................................. 41
4.3 MODELOS DE DESASTRE: PRESSÃO E ALÍVIO E ACESSO ........................................................................... 46
4.3.1 Vulnerabilidade como um processo ............................................................................................... 50
4.4 A DIMENSÃO ESPACIAL DA VULNERABILIDADE ........................................................................................ 52
4.4.1 Vulnerabilidade da rede urbana .................................................................................................... 53
4.4.2 Vulnerabilidade dos domicílios ..................................................................................................... 57
4.4.3 Vulnerabilidade dos moradores à ocorrência de danos diretos (ferimentos, doenças e morte) ... 61
4.5 METODOLOGIAS PARA MEDIR A VULNERABILIDADE À INUNDAÇÃO ......................................................... 64
4.5.1 Procedimentos para padronização de variáveis ............................................................................ 76
4.5.2 Definição dos pesos ....................................................................................................................... 77
5 FUNDAMENTOS CONCEITUAIS E TEÓRICOS PARA AVALIAÇÃO DOS BENEFÍCIOS (OU
DANOS EVITADOS) .......................................................................................................................................... 82
5.1 O QUE É VALOR? ...................................................................................................................................... 82
5.2 O BENEFÍCIO DE UM BEM PÚBLICO E COMO ESTIMÁ-LO .......................................................................... 84
5.3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS PARA AVALIAÇÃO DOS BENEFÍCIOS ............................................................... 91
5.3.1 Economia do bem-estar, utilidade e a análise custo-benefício ..................................................... 92
5.3.2 A Curva de demanda e a medida de benefício ............................................................................... 93
5.4 METODOLOGIAS PARA AVALIAÇÃO DE DANOS DE INUNDAÇÃO: TÉCNICAS ANALÍTICAS, SIMULAÇÃO E
ANÁLISE DE REDE .............................................................................................................................................. 99

6 AVALIAÇÃO DE DANOS: MODELOS ESTATÍSTICOS E ECONOMÉTRICOS ........................ 102


6.1 MODELOS MICROECONÔMICOS BASEADOS EXPLICITAMENTE NO MERCADO REAL ................................. 102
6.1.1 Despesas com prevenção/mitigação (defensive / averting Expenditures) ................................... 102
6.1.2 Custos de relocalização ............................................................................................................... 102
6.1.3 Método do custo de viagem ......................................................................................................... 103
6.1.4 Método dos danos evitados à propriedade (property damages avoided method) ....................... 105
6.1.5 Avaliação dos danos indiretos aos setores comercial, industrial e de serviços segundo o Modelo
de Middlesex .............................................................................................................................................. 111
6.1.6 Avaliação dos danos indiretos no sistema de transporte ............................................................. 114
6.2 MODELOS MICROECONÔMICOS BASEADOS IMPLICITAMENTE NO MERCADO REAL: MÉTODO DOS PREÇOS
HEDÔNICOS ..................................................................................................................................................... 121
6.2.1 Considerações metodológicas e limitações ................................................................................. 128
6.3 MODELOS MICROECONÔMICOS BASEADOS EM MERCADOS HIPOTÉTICOS: MÉTODO DA VALORAÇÃO
CONTINGENTE ................................................................................................................................................. 130
6.3.1 Considerações metodológicas e limitações: o que define o comportamento? ............................. 136
6.4 MODELOS MACROECONÔMICOS E REGIONAIS ........................................................................................ 139

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7 UTILIZAÇÃO DE MODELOS DE SIMULAÇÃO E ANÁLISE DE REDE PARA A AVALIAÇÃO
DOS DANOS DAS INUNDAÇÕES ................................................................................................................. 144
7.1 MODELOS DE SIMULAÇÃO SOCIAL ......................................................................................................... 147
7.1.1 Celulares autômatas (CA) ........................................................................................................... 151
7.1.2 A centralidade do indivíduo na simulação: a modelagem multiagentes ..................................... 153
7.2 MODELOS DE SIMULAÇÃO DE TRÁFEGO ................................................................................................. 160
7.3 ANÁLISE DE REDE .................................................................................................................................. 163
7.3.1 Relações a atributos .................................................................................................................... 163
7.3.2 Nós e linhas ................................................................................................................................. 165
7.3.3 Medição da relação ..................................................................................................................... 166
7.3.4 Seleção dos dados relacionais ..................................................................................................... 167
7.3.5 Caracterização da rede ............................................................................................................... 168
7.4 ANÁLISE DE AGENTES E REDE NOS ESTUDOS DE IMPACTOS AMBIENTAIS ................................................ 171
8 MATERIAL E MÉTODOS: ANÁLISE DO IMPACTO DA INUNDAÇÃO SOBRE OS
DOMICÍLIOS E SUA PROPAGAÇÃO NA CIDADE .................................................................................. 179
8.1 HIPÓTESES DO ESTUDO .......................................................................................................................... 179
8.1.1 Unidade geográfica de análise .................................................................................................... 180
8.1.2 Pressupostos do sistema .............................................................................................................. 182
8.1.3 O sistema urbano ......................................................................................................................... 183
8.2 MATRIZES DE INFORMAÇÕES SOCIOECONÔMICAS .................................................................................. 187
8.2.1 Matriz domicílio .......................................................................................................................... 188
8.2.2 Matriz residente ........................................................................................................................... 200
8.2.3 Matriz firma ................................................................................................................................. 201
8.2.4 Relacionamento entre as matrizes ............................................................................................... 204
8.3 BASE ESPACIAL DE ANÁLISE: CONSTRUÇÃO DE UM PROTÓTIPO .............................................................. 207
8.3.1 Criação da rede viária ................................................................................................................ 208
8.3.2 Zoneamento, parcelamento e adensamento na ADA e AE ........................................................... 210
8.3.3 Definição das características das firmas na ADA, AE e nos nós ................................................ 212
8.3.4 Definição das características dos domicílios na ADA, AE e nos nós .......................................... 214
8.3.5 Definição das características dos moradores.............................................................................. 215
8.3.6 Síntese das informações do protótipo .......................................................................................... 216
8.4 UTILIZAÇÃO DO SIG .............................................................................................................................. 217
8.5 SIMULAÇÃO DO COMPORTAMENTO DO RIO E INCORPORAÇÃO NO PROTÓTIPO ........................................ 218
8.6 SIMULAÇÃO DE TRÁFEGO ...................................................................................................................... 222
8.7 MODELAGEM ECONÔMICA EM REDE ...................................................................................................... 229
8.8 AVALIAÇÃO DOS DANOS DIRETOS ......................................................................................................... 233
8.8.1 Avaliação dos danos ao conteúdo dos domicílios (exceto veículos) ............................................ 233
8.8.2 Avaliação dos danos aos veículos dos domicílios ....................................................................... 234
8.8.3 Avaliação dos danos à construção do domicílio ......................................................................... 235
8.8.4 Avaliação dos danos diretos às firmas ........................................................................................ 236
8.9 CRIAÇÃO DE INDICADORES DE RISCO À INUNDAÇÃO .............................................................................. 237
8.9.1 Hipóteses de trabalho .................................................................................................................. 237
8.9.2 Risco aos domicílios .................................................................................................................... 245
8.9.3 Risco no ambiente econômico ..................................................................................................... 299
9 RESULTADOS ........................................................................................................................................ 305
9.1 SIMULAÇÃO HIDROLÓGICA-HIDRÁULICA ............................................................................................... 305
9.2 ESPAÇO DE FLUXOS ................................................................................................................................ 307
9.2.1 Análise dos fluxos globais na ADA e na AE e sua inserção na rede virtual ................................ 307
9.2.2 Fluxos discretos na ADA e na AE ................................................................................................ 311
9.2.3 Análise sob a ótica dos domicílios: gastos, emprego e renda ..................................................... 312
9.2.4 Análise sob a ótica das firmas atingidas: vendas, custos e lucros .............................................. 317
9.2.5 Análise dos fluxos de tráfego ....................................................................................................... 322
9.3 AVALIAÇÃO DOS DANOS DIRETOS E INDIRETOS SOBRE OS DOMICÍLIOS E FIRMAS DA ADA .................... 328
9.3.1 Avaliação dos danos diretos e indiretos sobre os domicílios da ADA ........................................ 328
9.3.2 Avaliação dos danos diretos e indiretos sobre as firmas da ADA ............................................... 334
9.4 SÍNTESE DOS INDICADORES DE IMPACTO QUANTITATIVO E MONETÁRIO DO EVENTO.............................. 337
9.5 INDICADORES DE RISCO E VULNERABILIDADE ........................................................................................ 339

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9.5.1 Indicadores de risco para os domicílios ...................................................................................... 339
9.5.2 Indicadores de risco no ambiente econômico .............................................................................. 347
10 CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS ..................................................................................................... 350
10.1 CONCLUSÕES .................................................................................................................................... 350
10.1.1 Modelagem econômica em rede.............................................................................................. 351
10.1.2 Simulação do tráfego .............................................................................................................. 352
10.1.3 Análise dos indicadores .......................................................................................................... 352
10.2 PERSPECTIVAS................................................................................................................................... 353
10.2.1 Aperfeiçoamento do protótipo ................................................................................................ 353
10.2.2 Perspectivas com a utilização da proposta metodológica apresentada ................................. 355
11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................... 357
APÊNDICE I - O VALOR DA VIDA HUMANA ........................................................................................... 382
APÊNDICE II – INDICADORES DE RISCO FÍSICO E FATORES DE IMPACTO ............................... 384
APÊNDICE III- VARIÁVEIS DO INDICADOR DE RISCO TOTAL........................................................ 385
APÊNDICE IV- VARIÁVEIS DA MATRIZ “DOMICÍLIO” ...................................................................... 386
APÊNDICE V– TIPOLOGIAS DE GASTO ................................................................................................... 387
APÊNDICE VI - PADRÕES DE CONTEÚDO POR CÔMODO SEGUNDO AS CLASSES DE RENDA
FAMILIAR ........................................................................................................................................................ 389
APÊNDICE VII – TIPOS DE ATIVIDADES DAS UNIDADES ECONÔMICAS ..................................... 390
APÊNDICE VIII - INDICADORES DE ENCADEAMENTO E FATORES MULTIPLICADORES DA
PRODUÇÃO ...................................................................................................................................................... 392
APÊNDICE IX – INFORMAÇÕES E PESOS DOS SETORES NO PROTÓTIPO SEGUNDO CÓDIGO
CNAE.................................................................................................................................................................. 393

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LISTA DE FIGURAS
Figura 1.1 - Etapas na avaliação global do risco ........................................................................ 1
Figura 1.2 - Da ameaça aos danos .............................................................................................. 3
Figura 1.3 - Marco analítico para estudo dos danos das inundações em uma cidade ................ 5
Figura 3.1 - Conexões de uma cadeia econômica .................................................................... 20
Figura 4.1 - Índice de ameaça ................................................................................................... 37
Figura 4.2 - Índice de risco da ameaça, segundo o fator de velocidade e o tempo de retorno . 38
Figura 4.3 - O modelo de pressão e alívio (PAR) e o modelo de acesso ................................. 48
Figura 4.4 - Mudança do bem-estar com a ocorrência do desastre .......................................... 50
Figura 4.5 - O ciclo de decisões nas famílias ........................................................................... 51
Figura 4.6 - Diferença, em pontos percentuais, entre o número de fatalidades decorrentes da
inundação e o número de habitantes do país por faixa etária. Estados Unidos, 1859-2005. .... 62
Figura 4.7 - Marco conceitual de um índice de risco de desastre utilizado em Bollin et al.
(2003) ....................................................................................................................................... 70
Figura 5.1 - Curva de demanda de um bem i ........................................................................... 94
Figura 5.2 - Curva de demanda e excedente do consumidor .................................................... 95
Figura 5.3 - Curvas de demanda e excedentes do consumidor marshalliano e hicksiano ........ 97
Figura 5.4 - Modelos para estimar os danos econômicos da inundação................................. 101
Figura 6.1 - Valor adicionado por uma empresa comercial ................................................... 113
Figura 6.2 - Exemplo de um diagrama de rede viária com a extensão da inundação (tempo de
retorno de 20 e 100 anos), as junções e os tipos de via .......................................................... 120
Figura 7.1 - Interação entre modelos ...................................................................................... 145
Figura 7.2 - Modelo de fila para uma fila de verificação (check-in) em um aeroporto .......... 150
Figura 7.3 - (a) Distribuição aleatória de células brancas e pretas; (b) distribuição das células,
após cinco passos de tempo; (c) após dezenove passos e (d) após 482 passos ...................... 153
Figura 7.4 - Curva de desempenho do BPR ........................................................................... 161
Figura 7.5 - Tipos de dados e análises associadas .................................................................. 164
Figura 7.6 - Duas representações de ligações entre nós ......................................................... 165
Figura 7.7 - Matriz agentes x agentes (matriz 4 x 4) .............................................................. 166
Figura 7.8 - Sociograma de agentes........................................................................................ 166
Figura 7.9 - Níveis de medida em dados relacionais .............................................................. 167
Figura 7.10 - Redes e amostras ............................................................................................... 168
Figura 7.11 - Uma rede com centralidade local...................................................................... 170
Figura 8.1 - Os subsistemas do sistema urbano ...................................................................... 180
Figura 8.2 - Etapas para definição da escolha locacional da firma ........................................ 204
Figura 8.3 - As inter-relações entre os sistemas ..................................................................... 205
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Figura 8.4 - Regiões do protótipo ........................................................................................... 208
Figura 8.5 - Organização espacial do protótipo – Área diretamente atingida, área de entorno e
rede viária ............................................................................................................................... 209
Figura 8.6 - Zonas, rede viária modelada e o rio na ADA e na AE........................................ 211
Figura 8.7 - Exemplo de um TIN ........................................................................................... 217
Figura 8.8 - Mapa digital da área de estudo, em formado .dwg. ............................................ 220
Figura 8.9 - Perfil longitudinal da linha d`água do rio Betim, Minas Gerais, em dois
momentos da cheia ................................................................................................................. 221
Figura 8.10 - Área de inundação do rio Betim, no município de Betim, para chuva com
duração de 2 h. ........................................................................................................................ 221
Figura 8.11 - Rede viária do protótipo e identificação da região modelada ........................... 223
Figura 8.12 - Rede viária na ADA e na AE ............................................................................ 223
Figura 8.13 - Distribuição do fluxo de veículos ao longo do dia ........................................... 226
Figura 8.14 - Interface do modelo .......................................................................................... 227
Figura 8.15 - Os nós e links da rede econômica discutida neste estudo ................................. 230
Figura 8.16 - Interface do NetLogo 4.0.4 ............................................................................... 231
Figura 8.17 - Curva de danos a residências (danos à construção e ao conteúdo) em função da
profundidade para a classe A - Ajuste da função logaritmo ................................................... 236
Figura 8.18 - O risco e seus constituintes ............................................................................... 241
Figura 8.19 - Marco analítico: das hipóteses à criação de índices associados ao risco de
inundação ................................................................................................................................ 241
Figura 8.20 - Critérios na definição dos danos potenciais ao domicílio................................. 246
Figura 8.21 - Índice de ameaça à construção (IAM1) .............................................................. 249
Figura 8.22 - Índice de ameaça ao conteúdo (IAM2)............................................................... 251
Figura 8.23 - Índice de ameaça aos moradores do domicílio (IAH) ....................................... 252
Figura 8.24 - Índice de ameaça ao acesso ao bem-estar - IAA ............................................... 255
Figura 8.25 - Índice de ameaça de inundação - IAI ................................................................ 256
Figura 8.26 - Valor médio dos danos à construção segundo a área construída e as classes
socioeconômicas (em reais de 2000) ...................................................................................... 257
Figura 8.27 - Distribuição da área construída dos imóveis no protótipo ................................ 258
Figura 8.28 - Índice de exposição da construção à inundação (IEM1) relacionado à área
construída do domicílio .......................................................................................................... 259
Figura 8.29 - Valor médio dos danos ao conteúdo segundo a área construída do domicílio (em
reais de 2000).......................................................................................................................... 262
Figura 8.30 - Índice de exposição do conteúdo à inundação (IEM2) relacionado à área
construída do domicílio .......................................................................................................... 263
Figura 8.31 - Freqüência de moradores por domicílio em Belo Horizonte no ano 2000. ...... 264

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Figura 8.32 - Índice de exposição humana à inundação (IEH) relacionado ao número de
moradores do domicílio .......................................................................................................... 265
Figura 8.33 - Valor dos danos à construção por metro quadrado de área construída segundo as
classes socioeconômicas e profundidade da inundação (em reais de 2000)........................... 267
Figura 8.34 - Índice relacionado ao valor da suscetibilidade da construção à inundação (IVM1)
................................................................................................................................................ 268
Figura 8.35 - Valor dos danos ao conteúdo por m2 de área construída segundo as classes
socioeconômicas e profundidade da inundação (em reais de 2000) ....................................... 269
Figura 8.36 - Valor dos danos ao conteúdo total e por unidade de área construída segundo as
classes socioeconômicas padronizados com base 1 ............................................................... 270
Figura 8.37 - Índice relacionado ao valor da suscetibilidade do conteúdo do domicílio à
inundação (IVM2) .................................................................................................................... 270
Figura 8.38 - Critérios e grupos de atributos relacionados ao indicador de vulnerabilidade
humana do domicílio .............................................................................................................. 272
Figura 8.39 - Critérios e grupos de atributos relacionados ao indicador de vulnerabilidade
humana da família .................................................................................................................. 276
Figura 8.40 - Índice de restrição ao acesso às unidades de consumo preferidas (IVA1) ......... 283
Figura 8.41 - Critérios e variáveis relacionadas à possibilidade de resiliencia do domicílio à
inundação pelo acesso à educação .......................................................................................... 286
Figura 8.42 - Índice de resiliência humana (IS1) relacionado ao nível de escolaridade do
responsável ou cônjuge do domicílio ..................................................................................... 288
Figura 8.43 - Critérios e variáveis relacionadas à possibilidade de resiliencia do domicílio à
inundação pelo acesso à renda ................................................................................................ 289
Figura 8.44 - Critérios e indicadores de vulnerabilidade da estrutura econômica ................. 302
Figura 8.45 - Critérios e indicadores de vulnerabilidade nas fontes de consumo das famílias
................................................................................................................................................ 303
Figura 9.1 - Inundação para o Tr = 5 anos - Protótipo ........................................................... 305
Figura 9.2 - Inundação para o Tr = 25 anos - Protótipo ......................................................... 306
Figura 9.3 - Inundação para o Tr = 100 anos - Protótipo ....................................................... 306
Figura 9.4 - Os fluxos de trabalho no protótipo ..................................................................... 310
Figura 9.5 - Os fluxos de estudantes no protótipo .................................................................. 310
Figura 9.6 - Os fluxos discretos na ADA e AE ...................................................................... 311
Figura 9.7 - Distribuição percentual dos trabalhadores das firmas atingidas pela inundação
segundo região de domicílio ................................................................................................... 314
Figura 9.8 - Distribuição dos gastos segundo os grandes grupos de despesa e tempos de
retorno da inundação .............................................................................................................. 315
Figura 9.9 - Variação total dos gastos das famílias, considerando diferentes probabilidade de
inundação e impacto ............................................................................................................... 316
Figura 9.10 - Danos indiretos totais sofridos pelas firmas atingidas, considerando o custo dos
salários pagos na inundação ................................................................................................... 319
xv
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Figura 9.11 - Danos indiretos totais sofridos pelas firmas atingidas e que ofertam bens e
serviços para as famílias, considerando o custo dos salários pagos na inundação e os lucros
cessantes ................................................................................................................................. 320
Figura 9.12 - Variação no valor das vendas segundo os três cenários de ocorrência da
inundação ................................................................................................................................ 321
Figura 9.13 - Rede viária e curso d`água na ADA e AE – Protótipo .................................... 323
Figura 9.14 - Tempo médio de viagem e velocidade média por veículo nos quatro cenários de
estudo – Início da inundação às 10h, ADA e AE – Protótipo ................................................ 324
Figura 9.15 - Custos associados à poluição emitidas pelos veículos durante um dia nos quatro
cenários de estudo – Início da inundação às 17h, ADA e AE – Protótipo ............................. 327
Figura 9.16 - Total dos custos associados ao tráfego durante um dia – ADA e AE – Protótipo
................................................................................................................................................ 327
Figura 9.17 - Danos diretos sofridos pelos domicílios da ADA para os cenários de inundação
estudados - Protótipo .............................................................................................................. 329
Figura 9.18 - Média da participação dos danos aos veículos em relação aos danos totais nos
domicílios onde eles ocorrem – Protótipo .............................................................................. 330
Figura 9.19 - Diagrama box plot para a relação entre danos diretos / rendimento presente nos
domicílios atingidos (valores em percentual) ......................................................................... 331
Figura 9.20 - A inundação na firma e os possíveis reflexos na economia urbana ................. 337
Figura 9.21 - A propagação do impacto da inundação ........................................................... 338
Figura 9.22 - Distribuição do risco potencial entre os domicílios .......................................... 339
Figura 9.23 - Risco de danos materiais nos domicílios do primeiro pavimento– Inundação
com tempo de retorno de 100 anos ......................................................................................... 343
Figura 9.24 - Risco de danos humanos nos domicílios do primeiro pavimento – Inundação
com tempo de retorno de 100 anos ......................................................................................... 344
Figura 9.25 - Risco no acesso dos domicílios do primeiro pavimento – Inundação com tempo
de retorno de 100 anos ............................................................................................................ 345
Figura 9.26 - Resiliência dos domicílios do primeiro pavimento – Inundação com tempo de
retorno de 100 anos ................................................................................................................ 346

xvi
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
LISTA DE TABELAS

Tabela 3.1 - Principais danos decorrentes de inundações em áreas urbanas ............................ 13


Tabela 3.2 - Impactos da inundação nas famílias ..................................................................... 16
Tabela 3.3 - Fases de um desastre e os possíveis impactos na saúde ....................................... 18
Tabela 3.4 - O consumo das famílias e as conseqüências nas atividades comerciais .............. 23
Tabela 3.5 - O consumo das famílias e as conseqüências nas atividades prestadoras de
serviços ..................................................................................................................................... 23
Tabela 3.6 - Elementos da construção e danos ......................................................................... 29
Tabela 4.1 - Possibilidade de falha estrutural em edificações de alvenaria, segundo as
características da inundação – Estudo de Clausen (1989) ....................................................... 34
Tabela 4.2 - Parâmetros do escoamento com possível influência na ocorrência de danos
estruturais em casas acabadas, segundo recomendação do RESCDAM ... (2000) .................. 35
Tabela 4.3 – Recomendação para estabilidade humana em presença de escoamento, segundo
RESCDAM ... (2000) ............................................................................................................... 35
Tabela 4.4 - Ameaça de afogamento, segundo Prevene (2001) ............................................... 36
Tabela 4.5 - Funções de mortalidade definidas a partir de dados sobre a inundação de New
Orleans, segundo Jonkman et al., 2008.................................................................................... 36
Tabela 4.6 - Os parâmetros de ameaça, segundo Stephenson (2002)....................................... 37
Tabela 4.7 - Os fatores de ameaça ............................................................................................ 39
Tabela 4.8 - Razão danos reais/danos potenciais ..................................................................... 60
Tabela 4.9 - Distribuição do número de fatalidades decorrentes de inundação e da população
segundo grupos etários - Estados Unidos, 1959-2005 .............................................................. 62
Tabela 4.10 - Distribuição da população e do número de fatalidades decorrentes da inundação
segundo local ou atividade desenvolvida no momento do evento ........................................... 63
Tabela 4.11 - Componentes do índice de vulnerabilidade social à inundação ......................... 74
Tabela 4.12 - Descrição das variáveis de estudo ...................................................................... 75
Tabela 4.13 - Os principais métodos de padronização de vetores de informação .................... 77
Tabela 4.14 - Escala de definição de pesos para o método AHP segundo Saaty (1977) ......... 80
Tabela 5.1 - Alguns exemplos de métodos de valoração dos bens públicos baseados em
associações comportamentais ................................................................................................... 86
Tabela 5.2 - Medidas de bem-estar de Hicks............................................................................ 97
Tabela 5.3 - Medidas de benefício de Hicks ............................................................................ 98
Tabela 6.1 - Funções baseadas em curvas DPS obtidas em Machado (2005) para o setor
residencial ............................................................................................................................... 109
Tabela 6.2 - Métodos de estimativas de danos indiretos segundo o Modelo Middlesex ....... 112
Tabela 6.3 - Síntese de estudos com a utilização do método dos preços hedônicos para avaliar
o impacto do risco de inundação ............................................................................................ 128

xvii
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 6.4 - Formas de eliciação no Método de Valoração Contingente ............................... 134
Tabela 6.5 - Possibilidades de vieses nas preferências declaradas ......................................... 138
Tabela 7.1 - Técnicas de simulação social ............................................................................. 148
Tabela 7.2 - Modelagem baseada em agentes x modelagem baseada em equações .............. 155
Tabela 7.3 - Parâmetros para estimativa do tempo de viagem segundo BPR ........................ 162
Tabela 7.4 - Indicadores associados à análise da vulnerabilidade da rede ao impacto da
inundação ................................................................................................................................ 171
Tabela 8.1 - Informações básicas do sistema urbano ............................................................. 184
Tabela 8.2 - Tipologias de famílias e sua distribuição na amostra ......................................... 189
Tabela 8.3 - Freqüência de deslocamento para aquisição do bem.......................................... 192
Tabela 8.4 - Tipologias de gastos, segundo suas características de demanda e oferta ........... 192
Tabela 8.5 - Alguns tipos de gastos estudados segundo a tipologia ....................................... 193
Tabela 8.6 - Tipologias de gastos, segundo suas características de demanda e oferta ........... 193
Tabela 8.7 - Classes de renda média familiar ......................................................................... 195
Tabela 8.8 - Classes de renda média familiar per capita........................................................ 196
Tabela 8.9 - Área por cômodo e padrão construtivo segundo classes de renda ..................... 197
Tabela 8.10 - Correlações (coeficiente r) entre o número de ativos presente no domicílio e
outras variáveis de estudo – Amostra de 14.314 domicílios .................................................. 198
Tabela 8.11 - Classe de renda e qualidade dos bens ............................................................... 199
Tabela 8.12 - Valores de automóveis por classe socioeconômica .......................................... 200
Tabela 8.13 - Critérios para distribuição espacial das firmas no protótipo ............................ 204
Tabela 8.14 - Edificações residenciais da ADA e da AE - Protótipo ..................................... 212
Tabela 8.15 - Edificações comerciais e total de edificações ADA e da AE - Protótipo......... 212
Tabela 8.16 - Distribuição dos domicílios da ADA e AE segundo as tipologias de família.. 214
Tabela 8.17 - Distribuição dos domicílios da ADA e na AE segundo classes socioeconômicas
................................................................................................................................................ 214
Tabela 8.18 - Síntese das informações do protótipo............................................................... 217
Tabela 8.19 - Cenários utilizados na simulação do tráfego ADA e AE - Protótipo .............. 226
Tabela 8.20 - Critérios para fluxos de veículos durante o evento na ADA e AE - Protótipo. 227
Tabela 8.21 - Grupos de gastos e critérios de escolha das unidades de consumo - Protótipo 232
Tabela 8.22 - Valor dos danos dos veículos segundo sua categoria (em reais de 2000) ........ 235
Tabela 8.23 - Intensidade de importância da alternativa (ou variável) ou do critério em
escalas cardinais e verbais ...................................................................................................... 244
Tabela 8.24 - Variação do dano médio à construção por metro quadrado de área construída
segundo a altura da inundação e o índice correspondente ...................................................... 247
Tabela 8.25 - Variação do valor da suscetibilidade média do conteúdo, segundo a altura da
inundação, e índice associado ................................................................................................. 249
xviii
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.26 - Fator velocidade e o peso e padronização utilizados ....................................... 252
Tabela 8.27 - Profundidade associada ao acesso, peso e padronização utilizados ................. 254
Tabela 8.28 - Padronização dos danos na base 1 .................................................................... 257
Tabela 8.29 - Área por cômodo segundo classes de renda ..................................................... 259
Tabela 8.30 - Matriz de correlações entre variáveis (coeficiente r) ....................................... 261
Tabela 8.31 - Nível de exposição do domicílio e definição do IED........................................ 265
Tabela 8.32 - Tipos de vulnerabilidade física dos moradores e importância relativa na
vulnerabilidade à inundação ................................................................................................... 272
Tabela 8.33 - Atributos de vulnerabilidade e pesos em relação aos critérios ......................... 273
Tabela 8.34 - Matriz normalizada de comparação dos critérios de segundo nível ................. 274
Tabela 8.35 - Média e mediana do rendimento domiciliar per capita, segundo sexo do
responsável pelo domicílio - Belo Horizonte, 2000 ............................................................... 277
Tabela 8.36 - Mediana do rendimento domiciliar total e per capita médio, segundo tipologia
de família - Protótipo, 2000 .................................................................................................... 278
Tabela 8.37 - Tipologias de família, sua importância relativa em relação à vulnerabilidade à
inundação (IVH1) e distribuição no protótipo ......................................................................... 279
Tabela 8.38 - Tipologias de despesas e ponderação, segundo as características de demanda e
oferta do bem consumido ....................................................................................................... 282
Tabela 8.39 - Peso de cada tipologia de bens ou de gastos do domicílio ............................... 282
Tabela 8.40 - Nível de escolaridade do responsável ou cônjuge do domicílio, sua distribuição
no protótipo e sua escala de importância para o acesso à informação ................................... 287
Tabela 8.41 - Classes socioeconômicas e transformação no IS2 ............................................ 290
Tabela 8.42 - Escolaridade e classe socioeconômica dos domicílios do protótipo atingidos
pela inundação de tempo de retorno de 100 anos ................................................................... 290
Tabela 8.43 - Importância relativa: classe socioeconômica x escolaridade .......................... 291
Tabela 8.44 - Padronização dos pesos do índice de resiliência .............................................. 291
Tabela 8.45 - Indicadores associados ao risco de inundação e hipóteses e variáveis utilizadas
................................................................................................................................................ 292
Tabela 8.46 - Indicadores associados à resiliência ao risco de inundação e hipóteses e
variáveis utilizadas ................................................................................................................. 296
Tabela 9.1 - Domicílios e firmas (unidades econômicas) atingidas ....................................... 307
Tabela 9.2 - Links econômicos na ADA e AE ....................................................................... 308
Tabela 9.3 - Links econômicos na ADA e AE e os outros nós da rede .................................. 309
Tabela 9.4 - Número total de domicílios e número de domicílio localizados em área atingida -
Protótipo ................................................................................................................................. 312
Tabela 9.5 - Número total de moradores e número de moradores localizados em área atingida
- Protótipo ............................................................................................................................... 312
Tabela 9.6 - Número total de trabalhadores atingidos – Protótipo1 ....................................... 313

xix
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 9.7 - Renda salarial em risco para uma inundação com Tr= 100 anos - Protótipo (em
reais de 2000).......................................................................................................................... 314
Tabela 9.8 - Impacto da inundação sobre as firmas da ADA e AE ........................................ 317
Tabela 9.9 - Valor das vendas para as famílias nos quatro cenários de estudo ...................... 321
Tabela 9.10 - Aspectos da ameaça da inundação sobre a rede viária ..................................... 322
Tabela 9.11 - Resultados médios por viagem e por UVE na simulação de tráfego – ADA e
AE, início da inundação às 10h .............................................................................................. 323
Tabela 9.12 - Resultados médios por viagem e por UVE na simulação de tráfego – ADA e
AE, início da inundação às 17h .............................................................................................. 324
Tabela 9.13 - Custo total do tempo de viagem em um dia na rede viária da ADA e AE,
segundo cenários de risco hidrológico.................................................................................... 325
Tabela 9.14 - Custo total do consumo de combustível em um dia na rede viária da ADA e AE,
segundo cenários de risco hidrológico.................................................................................... 326
Tabela 9.15 - Custo total dos poluentes em um dia na rede viária da ADA e AE, segundo
cenários de risco hidrológico .................................................................................................. 326
Tabela 9.16 - Domicílios atingidos e valor total e médio dos danos diretos (em
reais de 2000) - Protótipo ....................................................................................................... 328
Tabela 9.17 - Danos diretos aos veículos dos domicílios atingidos ....................................... 329
Tabela 9.18 - Domicílios atingidos, valor total dos danos diretos (em reais de 2000) e renda
domiciliar (em reais de 2000) – Protótipo .............................................................................. 330
Tabela 9.19 - Domicílios atingidos, valor total dos danos diretos (em reais de 2000) e renda
domiciliar (em reais de 2000), por classe socioeconômica – Protótipo, Tr = 100 anos ......... 332
Tabela 9.20 - Danos diretos e danos indiretos pelo congestionamento decorrentes da
inundação - ADA, Protótipo (em reais de 2000) .................................................................... 334
Tabela 9.21 - Danos diretos das firmas avaliadas no protótipo .............................................. 335
Tabela 9.22 - Distribuição dos danos diretos por firma segundo classificação da atividade . 335
Tabela 9.23 - Danos diretos e indiretos das firmas avaliadas na ADA (em reais de 2000) ... 336
Tabela 9.24 - Indicadores quantitativos de impacto ............................................................... 338
Tabela 9.25 - Indicadores monetários de impacto (em reais de 2000) ................................... 338
Tabela 9.26 - Distribuição dos índices de risco e de resiliência entre os domicílios atingidos
pela inundação – Inundação com tempo de retorno de 100 anos ........................................... 339
Tabela 9.27 - Distribuição dos índices de risco nos domicílios com índice de resiliência global
- IDSG – abaixo de 0,56 – Inundação com tempo de retorno de 100 anos ............................. 341
Tabela 9.28 - IVE1 nos cenários de estudo .............................................................................. 347
Tabela 9.29 - IVE2 nos cenários de estudo .............................................................................. 348
Tabela 9.30 - IVE3 nos cenários de estudo .............................................................................. 349

xx
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABEP - Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa


ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas
EC - Excedente Compensatório
EE - Excedente Equivalente
AHP - Analytical Hierarchy Process (em português PAH)
ANTP - Associação Nacional de Transportes Públicos
AP - Área de Ponderação
AIMSUN2-– Advanced Interactive Microscopic Simulator for Urban and Non-Urban
Networks
BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento
BPR - Bureau of Public Roads
CA - Celular autômata
CASA - Centre for Advanced Spatial Analysis
CEDEPLAR - Centro de Desenvolvimento e Análise Regional
CEMPRE - Cadastro Central de Empresas
CLT - Consolidação das Leis de Trabalho
CNAE - Classificação Nacional das Atividades Econômicas
CONCLA - Comissão Nacional de Classificação
DPS (curva) - Curva de Danos versus Profundidade de Submersão
DAP - Disposição a Pagar
DAA - Disposição a Aceitar uma Compensação
DPP - Domicílios Particulares Permanentes
EC - Excedente Compensatório
EE - Excedente Equivalente
EGC (modelo) - Modelo de Equilíbrio Geral Computável
EIRD - Estratégia Internacional para Redução de Desastres
ELECTRE - ELimination Et Choix Traduisant REalité
EM - Excedente do Consumidor Marshalliano
FEMA - Federal Emergency Management Agency
GEM - Graded Eigenvalue Method
GIS - Geographic Information System
HCM - Highway Capacity Manual
xxi
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
IA - Inteligência Artificial
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEA - Instituto de Estudios Ambientales de la Universidad Nacional de Colômbia
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPTU - Imposto sobre Propriedade Territorial e Urbana
IPVS - Índice Paulista de Vulnerabilidade Social
ISDR - International Strategy for Disaster Reduction (em português, EIRD)
ISSQN - Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza
MBA - Modelagem Baseada em Agentes ou Modelos Multi-Agentes
MCC - Método Classificação Contingente
MDE - Método dos Danos Evitados
NBR – Norma Brasileira
NCHRP - National Cooperative Highway Research Program
MDT - Modelo Digital de Terreno
MPFHC - Middlesex Polytechnic Flood Hazard Centre
MPH - Método dos Preços Hedônicos
MVC - Método da Valoração Contingente
ONU - Organização das Nações Unidas
PAC - Pesquisa Anual do Comércio
PAH - Processo Analítico Hierárquico
PAR modelo - Modelo de Pressão e Alívio
PAS - Pesquisa Anual de Serviços
PBH - Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
POF - Pesquisa de Orçamentos Familiares
PROMETHEE - Preference Ranking Organization METHod for Enrichment Evaluations
RAIS - Relação Anual de Informações Sociais
RAM - Rapid Appraisal Method
SAS - Statistical Analysis System
SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
SIG - Sistema de Informações Geográficas (para a sigla em inglês, ver GIS)
SPN (modelo) - Stochastic Petri Net Model

xxii
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
TIN - Triangular Irregular Network
Tr – Tempo de Retorno
TRASYT - Traffic Network Study Tool
TRB - Transportation Research Board
UD - Unidade de Decisão
UP - Unidade de Planejamento
USACE - US Army Corps of Engineers
UVE - Unidade de Veículo Equivalente
VA - Valor Adicionado
VC - Variação Compensatória
VE - Variação Equivalente
VED - valor Esperado dos Danos

xxiii
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
1 INTRODUÇÃO: O IMPACTO DA INUNDAÇÃO SOBRE AS
FAMÍLIAS E VULNERABILIDADE

O estudo de inundações envolve essencialmente três dimensões: suas características físicas,


hidrológicas e hidráulicas; a avaliação de impactos ambientais e sócio-econômicos e a
formulação de ações e políticas públicas - inseridas em um contexto de gerenciamento dos
recursos hídricos e gestão e planejamento urbanos - para minimização de seus danos
(Yevjevich, 1994). São dimensões correlacionadas, pois o gerenciamento eficiente dos
recursos hídricos requer o conhecimento das características das cheias e dos danos causados
pelas inundações e esses só podem ser adequadamente estimados com a análise de suas causas
e riscos. Esta pesquisa insere-se na segunda dimensão, com uma proposta de avaliação e
valoração dos danos causados pelas inundações.

Objetivamente, a avaliação do impacto de uma cheia traz informações relevantes no


planejamento da recuperação e reconstrução de uma área atingida, na avaliação econômica de
estratégias de mitigação, estruturais e não estruturais, e no desenvolvimento do planejamento
emergencial. Metodologicamente, o desenvolvimento nas análises de risco possibilita que o
custo provável das perdas em uma região e sua vulnerabilidade possam ser estimados mais
rapidamente, com maior abrangência e com menor margem de incerteza (Handmer, Reed &
Percovich, 2002).

Em uma possível linha de ação de avaliação global do risco, têm-se seis etapas (Figura 1.1):

Consequência Avaliação das Medidas Risco


Identificação causas e
Probabilidade (danos) de residual
da ameaça consequências mitigação
•1 •2 •3 •4 •5 •6

Figura 1.1 - Etapas na avaliação global do risco


Fonte: Adaptado de FLOOD... (2000: 22).

A probabilidade, os danos e a avaliação do risco (causas e conseqüências) são discutidos nas


sessões seguintes. A implantação de medidas mitigadoras, quando necessárias, envolve desde
o levantamento dos recursos e escolha da tecnologia adequada, até a implantação efetiva,
manutenção e monitoramento.

1
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
As medidas de mitigação reduzem a probabilidade ou as conseqüências de um evento.
Existem várias técnicas e abordagens para a avaliação das alternativas de projeto: desde
análises de critério único, em que os diferentes efeitos e os ganhos são analisados de forma
agregada em um único critério (e.g.: análise custo-efetividade, análise custo-benefício e
análise risco-benefício), até abordagens multicritério, nas quais a multiplicidade dos aspectos
de análise, como os econômicos, sociais, ambientais e políticos, são considerados no processo
de escolha. Algumas medidas de mitigação podem tender a zero o limite do risco, outras
podem deixar uma probabilidade residual, definida como tolerável, pois, supostamente, a
comunidade atingida teria capacidade de enfrentar o risco, caso ele ocorra. 1

Como se pode considerar impossível diminuir a zero a magnitude do risco, a questão é definir
qual o risco aceitável, o que depende, entre outros fatores, do nível que a população está
disposta a aceitar ou é capaz de absorver. Neste sentido, Chardon (1999) apresenta três níveis
de risco:

1. o risco tolerável devido ao baixo nível de exposição ou vulnerabilidade;

2. o risco tolerável após o desenvolvimento de medidas com o objetivo de reduzi-lo, atuando


na ameaça, com o uso de intervenção técnicas (redução da freqüência ou amplitude da
ocorrência), ou nos elementos vulneráveis (e.g.: edificações resilientes, uso de alerta);

3. o risco intolerável: quando a sociedade não tem possibilidade de resistir ou absorver as


conseqüências do fenômeno natural gerando uma situação de crise.

O risco intolerável representaria uma situação de desastre.

O termo risco, embora cotidianamente utilizado, apresenta diversos enfoques na literatura


específica, o que dá origem a diferentes formas de conceituação. No estudo estatístico, há o
risco hidrológico: a análise da probabilidade de ocorrência de uma cheia ou, considerando
uma estrutura de proteção, de sua falha ou ruptura (Etapas 1 e 2 na Figura 1.1). Ao ampliar
essa definição, tem-se o risco como a esperança matemática do prejuízo. Ao componente
probabilístico, são associadas as perdas monetárias do evento (Etapas 1, 2 e 3 na Figura 1.1).
Pode-se, ainda, analisar o risco sob o ponto de vista da ameaça e de seus fatores físicos de
impacto (hazard, em inglês), como velocidade, profundidade e duração da cheia.

Nesta pesquisa, utiliza-se uma abordagem ampla do risco que agrega algumas das
conceituações anteriores. O risco surge como conseqüência da interação entre a natureza e

1
Para uma analise sobre os diferentes métodos para avaliação de alternativas, ver Castro (2007).
2
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
as características do evento natural (ameaça) e aquelas da população exposta, ou seja,
sua vulnerabilidade (Green, Parker & Tunstall, 2000) (Equação 1.1). Ocorrendo o fator de
gatilho, a inundação, o risco se traduz pelo impacto na comunidade em danos e na capacidade
de reconstrução.

Risco = Ameaça x Vulnerabilidade 1.1

Considerar, isoladamente, a população em risco, desprezando as características da inundação,


implica em aceitar que a comunidade está exposta ao mesmo nível de risco, independente da
magnitude e tipo de ameaça. O outro extremo, uma análise focada no evento, traduz-se em um
estudo essencialmente hidrológico e o problema da inundação torna-se algo desconectado de
suas conseqüências socioeconômicas. Dois componentes interagem e se realimentam: o físico
- hidrológico e hidráulico - e o socioeconômico (Figura 1.2).

Figura 1.2 - Da ameaça aos danos

Na Figura 1.2, a ameaça compreende as propriedades da inundação, como probabilidade,


profundidade, duração, velocidade do escoamento e área atingida. A vulnerabilidade se refere,
entre outros fatores, às características sócio-econômicas, políticas e institucionais da área
ameaçada. A interação entre estes dois elementos indica o nível de risco ao qual o local está
exposto. Concretizada a ameaça, têm-se os danos.

Este estudo busca estimar as conseqüências econômicas da inundação sobre as pessoas e a


cidade, caracterizando os danos diretos e indiretos, mas incorporando também a
vulnerabilidade, o que implica em avaliar a capacidade de enfrentamento e recuperação da
população exposta. A vulnerabilidade pode ser definida como uma situação de exposição ao
risco, somada à falta de habilidade em se evitar ou absorver suas conseqüências (Pelling,
3
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
2003). Aqui, ela é estudada em dois níveis: a vulnerabilidade das famílias, considerada a
unidade básica de análise, e a vulnerabilidade da economia urbana. As famílias, com
características socioeconômicas e locacionais distintas, sofrem impacto diferenciado ante uma
inundação. Mas a forma como a cheia as afeta também depende das interações que se
estabelecem entre elas e o meio ambiente no qual desenvolvem funções básicas (e.g.
consumo, educação, trabalho e atividades de lazer).

Grande parte das pesquisas na área produz estimativa apenas dos danos decorrentes do
contato direto de bens com as águas da inundação (Machado, 2005; Penning-Rowsell &
Chatterton, 1977; Torterotot, 1993). Estudos que procuram captar os efeitos indiretos
normalmente o fazem considerando danos específicos, como os decorrentes de
congestionamentos de carros ou custos de serviços emergenciais. Há, ainda, abordagens que
buscam captar a percepção de valor de uma diminuição do risco por meio de entrevistas
diretas (Método de Valoração Contingente) ou pela comparação das condições imobiliárias
entre áreas de risco hidrológico e áreas seguras (Método dos Preços Hedônicos) (Shabman et
al., 1998; Brouwer et al., 2006).

Estes estudos, embora tragam avanços para discussão sobre benefícios no controle de
inundação, não incorporam aspectos que podem emergir de uma análise que capte a rede de
relações econômicas que se estabelece entre domicílios e as atividades econômicas e sua
alteração frente ao choque externo representado pela ocorrência da inundação. Normalmente,
são metodologias que trabalham de forma estática, mensurando os danos (ou os benefícios de
uma medida de controle) em um local específico, ou simplesmente desconsiderando a
propagação espacial dos impactos de uma enchente.

Por outro lado, modelos macroeconômicos, como os de Equilíbrio Geral Computável,


necessitam de grande volume de dados, o que inviabiliza seu uso para eventos de inundação
mais restritos ou com conseqüências limitadas ao município, sendo mais adequados para
análise de desastres de abrangência regional ou nacional. Ademais, possuem limitações para
captar efeitos de ocorrências temporárias e intensas, como as decorrentes de um desastre
natural (THE IMPACTS..., 1999).

Na tentativa de mensurar os impactos diretos e indiretos das inundações, orientou-se a


pesquisa bibliográfica em torno fundamentalmente de três temas: a estrutura do espaço intra-
urbano, com ênfase nas relações de consumo empreendidas pelas famílias; os modelos de
microsimulação, os quais se baseiam em micro-unidades de análise; e, de forma abrangente,

4
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
os estudos sobre danos decorrentes dos desastres naturais, especialmente, das inundações.
Desta forma, procura-se unir três aspectos julgados relevantes para compreensão do impacto
das inundações: o espaço intra-urbano, as relações dos agentes neste espaço e, como elemento
de choque, a inundação. Não foram encontradas pesquisas relevantes onde estes três aspectos
foram discutidos conjuntamente.

Ante a análise crítica da literatura, verificou-se a análise de rede, os modelos regionais e a


modelagem multi-agentes como metodologias eficazes para compreensão dos impactos das
inundações em sistemas complexos e interligados como é o sistema urbano. Destas técnicas,
tiraram-se elementos para elaborar a proposta metodológica no presente trabalho.

Modelo de impacto econômico das inundação sobre a


cidade e os domicílios

Análise do impacto dos desastres Análise do espaço intra-urbano


naturais

SIG

Danos Danos
diretos indiretos Análise de rede

Microsimulação,
Adapatação de modelos multi-agentes
metodologias
consolidadas
Modelos regionais

Figura 1.3 – Marco analítico para estudo dos danos das inundações em uma cidade

A Figura 1.3 mostra a linha de pesquisa utilizada no estudo. A análise tem início com os
danos diretos, pois eles representam o impacto do evento no primeiro momento, quando as
águas atingem as pessoas e os componentes do espaço urbano. A análise destes danos foi feita
por meio de adaptação de metodologias já consideravelmente discutidas na literatura
(essencialmente, a aplicação de fatores de suscetibilidade material ou o uso de curvas de
“danos x profundidade de inundação” apresentadas no item 6.1.4.1).

Os danos indiretos decorrem de perdas causadas pela interrupção das conexões físicas e
econômicas existentes na economia, eles incorporam elementos de propagação espacial e
5
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
temporal do evento. Para sua análise buscou-se subsídios em estudos que discutem as relações
econômicas existentes no espaço intra-urbano.

Da análise de rede, retiraram-se elementos essenciais, como a configuração espacial do


sistema de análise e o relacionamento entre os agentes por meio de links.

A economia urbana pode ser modelada como uma rede formada por nós e ligações (links). Os
nós são os pontos de atividade econômica ou de moradia. A infra-estrutura urbana necessária
para que a rede funcione representa as ligações. A inundação provoca rupturas no
funcionamento de ligações (e.g.: fechamento de uma via) e nós (e.g.: paralisação de atividades
econômicas) com possibilidade de impactar famílias e o nível de atividade e renda local.
Características da rede, como sua capacidade ociosa, existência de rotas ou ligações
alternativas, poder de transferência e suscetibilidade, se refletem na forma e intensidade do
impacto da cheia extrema e de como ele se propaga na cidade. Observa-se que os danos
indiretos da inundação ocupam centralidade na análise.

Os modelos de microsimulação analítica possibilitam, a partir da ampla caracterização das


micro unidades e suas interações e, eventualmente, com a utilização de funções de
probabilidade aplicadas a cada evento, verificar os possíveis comportamentos e estruturas que
surgem ao nível macroeconômico. A microsimulação, na sua forma clássica, é feita nesta
pesquisa na modelagem do sistema de transporte na área de impacto da cheia e na sua
vizinhança. Os resultados do sistema são obtidos a partir das observações de cada veículo
individualmente.

Para a compreensão do comportamento dos domicílios e atividades econômicas pensou-se,


inicialmente, em utilizar a modelagem computacional baseada em agentes (MBA). A MBA
possibilita representar agentes em suas interações entre si e com o meio ambiente. Cada
agente é individualmente diferenciado (e.g: sexo, idade e renda) e se relaciona com o meio
segundo regras comportamentais que podem se adaptativas e reativas. Por ser um modelo
dinâmico, é possível captar a propagação temporal e espacial do impacto.

Entretanto, devido a limitações computacionais e de tempo, não foi possível efetuar


integralmente a MBA, da qual, entretanto, retiraram-se alguns elementos: ênfase sobre as
micro-unidades de análise espacialmente distribuídas, como os domicílios e seus moradores, e
a utilização de padrões comportamentais de consumo e de alocação do trabalho.

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Os modelos regionais são baseados na representação da área geográfica em zonas, as quais
trocam entre si população, bens e capital (Benenson, 1999). Cada zona é então representada
por um vetor de informações socioeconômicas. Na metodologia de análise aqui proposta
utiliza-se, em parte do sistema urbano, sua representação em zonas, com informações
agregadas, como é feito nos modelos regionais. Em outra parte, aquela que sofre o impacto,
utilizam-se microunidades de informação. Tem-se, portanto, um modelo híbrido.

Para localizar espacialmente os componentes estudados do sistema urbano - regiões,


domicílios, firmas, vias e o curso d‟água em condições normais e inundado - são utilizadas
ferramentas do Sistema de Informações Geográficas (SIG). O SIG permite armazenar,
analisar e manipular os dados geográficos, o que o torna uma ferramenta relevante de suporte
à decisão.

Pretende-se, adicionalmente, mensurar a vulnerabilidade e o risco de inundação por meio de


indicadores que ofereçam subsídios para compreensão dos fatores centrais que atuam sobre
estes dois processos.

A fim de discutir todos estes aspectos, a presente tese é dividida em 10 seções, excluída a
presente introdução. O segundo capítulo mostra de maneira direta e sintética os objetivos do
trabalho. Os capítulos 3 e 4 discutem os componentes do risco mencionados na Figura 1.2, a
vulnerabilidade, a ameaça e os danos potenciais. No capítulo três são mostrados os danos
diretos e indiretos decorrentes da inundação sobre um espaço urbano. Os danos indiretos,
como as possíveis perturbações nas vendas dos estabelecimentos comerciais e na circulação
de automóveis ocasionada pela inundação, são discutidos com maiores detalhes. Por não
estarem diretamente associados à presença da água, estes impactos tendem a ter maior
dimensão espacial e temporal do que os danos indiretos, o que torna os seus efeitos
particularmente importantes para o funcionamento da cidade como um todo.

A ameaça e a vulnerabilidade à inundação são analisadas no capítulo 4. A ameaça é


conceituada e caracterizada e são apresentados parâmetros que definem a sua magnitude
segundo o objeto de impacto (pessoas ou bens materiais). Entretanto, o enfoque recai sobre a
análise de vulnerabilidade, tema ainda controverso, na qual dimensão social é incorporada de
forma decisiva. A tese procura avançar na sua reflexão, com uma análise crítica da literatura e
com propostas para sua avaliação.

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Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
No capítulo 5 entra-se nos fundamentos conceituais e teóricos para avaliação dos benefícios
do controle de inundações. O valor dos benefícios é considerado, em uma análise econômica
tradicional, como os danos evitados com a adoção da medida de controle. São conceituados
termos usuais na economia ambiental, como “valor”, “benefício”, “bem-estar” e “excedente
do consumidor”. A base teórica mostrada apóia-se na economia do bem-estar, em uma visão
neoclássica.

Para análise dos danos ou benefícios das inundações existe uma ampla gama de modelos
matemáticos, computacionais e estatísticos. Eles também podem ter um enfoque em
macrounidades – como o país ou uma cidade – ou em microunidades – como pessoas e
domicílios. Estes modelos são apresentados nos capítulos 6 e 7.

No capítulo 6 têm-se os modelos definidos como “estatísticos e econométricos”.


Normalmente são modelos intensivos no uso de equações, onde não é necessário elevado
conhecimento em programação computacional, já que existem softwares diversos que
processam as variáveis e parâmetros de entrada por meio de procedimentos uniformes.

O capítulo 7 mostra os modelos definidos como de simulação e análise de rede. Consideram-


se modelos de “simulação” aqueles em que este aspecto da modelagem, a simulação, recebe
grande destaque no processo, sendo um espaço de experimentação e análise dos resultados.
Muitas vezes são modelos dinâmicos e flexíveis, processados em intervalos curtos de tempo,
nos quais é possível verificar o comportamento de várias variáveis ao longo do tempo. Alguns
procedimentos exigem conhecimento de programação computacional, especialmente em
simulações orientada para objetos.

A análise de rede, além de apresentar um arcabouço analítico para estudo de variáveis


relacionais, é uma ferramenta suplementar ou complementar que pode ser feita tanto nos
modelos estatísticos, quanto nas simulações computacionais. Ela é utilizada na organização,
estruturação e interpretação dos dados, pois eles são analisados a partir das relações que se
estabelecem entre eles e não apenas de forma isolada ou agregada.

Por meio destes sete capítulos tem-se uma ampla revisão dos conceitos e metodologias
apresentados na literatura relacionados ao tema da tese, a qual contribuiu para justificar a
escolha metodológica feita. Esta é apresentada no capítulo 8, de material e métodos. O
capítulo mostra as hipóteses e procedimentos utilizados para criação de dois métodos de
investigação do impacto econômico da inundação propostos nesta pesquisa: a modelagem

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econômica em rede do espaço urbano para avaliação de impactos e a criação de indicadores
de risco de inundação.

O capítulo 8 é formado por nove grandes seções. Na primeira, têm-se as hipóteses que foram
utilizadas no método proposto, como aquelas que envolvem a escolha dos sistemas de análise.
Na segunda seção é apresentada as matrizes de informações socioeconômicas utilizadas e os
procedimentos para sua aquisição e organização. Referem-se a três matrizes: “matriz
domicílio”, “matriz residente” e “matriz firma” que inter-relacionam entre si. Elas
compreendem, aproximadamente, a informações de 179 mil domicílios, 639 mil residentes e
24 mil firmas, as quais são apresentadas de forma georeferenciada.

Na terceira seção do capítulo 8 é mostrada a base espacial para a análise das metodologias
propostas. Refere-se à criação de um protótipo, um ambiente de simulação que procura
representar de forma simplificada os principais elementos do espaço intra-urbano que
interferem na magnitude dos danos da inundação: os domicílios, as firmas, a rede viária e o
rio. Na quarta seção são mostrados os procedimentos de SIG utilizados para definição da
localização dos elementos do protótipo - os quais são representados por um vetor de
informações socioeconômicas – e do mapa de inundação.

Nas seções cinco, seis e sete têm-se os procedimentos de modelagem feitos na tese: a
modelagem hidrológico-hidráulica, a modelagem de tráfego de veículos e a modelagem
econômica em rede do espaço urbano. Estas são feitas para três cenários de tempo de retorno
da inundação: 5 anos, 25 anos e 100 anos. As duas primeiras simulações são feitas em
softwares distintos. Seus resultados são incorporados à terceira modelagem, feita em uma
plataforma de MBA, que é simulada no protótipo. Por meio dela é possível verificar o
impacto econômico, em termos de variação no consumo, renda e acesso ao trabalho, entre
outros indicadores.

Na seção oito, tem-se a metodologia para definição dos danos diretos, a qual segue
parâmetros de suscetibilidade dos bens ao contato com a água propostos na literatura ou a
utilização de curvas de danos versus profundidade de inundação (Penning-Rouwsell &
Chatterton, 1977; Machado, 2005).

Finalmente, na seção nove, são propostos indicadores de risco à inundação. Nele são
apresentados diversos indicadores de ameaça, vulnerabilidade, suscetibilidade, exposição e
resiliência, os quais variam segundo o objeto de impacto, material ou humano. Estes

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indicadores são agregados, criando indicadores de risco e resiliência. Os indicadores são
definidos para os domicílios e também para o ambiente econômico de maneira geral.

Os resultados do estudo são apresentados no capítulo 9, o qual é dividido em cinco grandes


seções. Na primeira seção são apresentados os resultados da simulação hidrológico-hidráulica
do rio e sua espacialização, com a distribuição da velocidade e profundidade da inundação ao
longo da área atingida, considerando os três tempos de retorno estudados.

Na seção dois, têm-se os resultados da simulação econômica de impacto, os quais identificam


as rupturas na rede e seus efeitos em termo de acesso aos bens de consumo e à renda. A partir
da agregação do impacto individual de cada domicílio, avalia-se a conseqüência do evento nas
relações de consumo da “cidade virtual” como um todo. A seção três detalha a análise dos
danos com a avaliação dos resultados para a área diretamente atingida pelas águas, a qual
tende a sofrer maior impacto direto e indireto. Como o estudo envolve uma série de
interconexões, o que possibilita vários tipos de análises, a seção quatro apresenta um resumo
dos resultados para o protótipo.

E, na última seção, têm-se os resultados obtidos pela análise dos indicadores para os
domicílios e para o ambiente econômico. Os indicadores para cada domicílio puderam ser
mapeados, o que possibilitou verificar a configuração espacial do risco em termos de micro-
unidades de análise, os domicílios.

Finalmente, as conclusões e perspectivas do estudo mostradas no capítulo 10, indicam a


consistência dos fundamentos teóricos adotados, a coerência das rotinas analíticas e
computacionais e do banco de dados utilizados na pesquisa. Além disso, mostra a viabilidade
e potencialidade de aplicação da metodologia para análise de impactos ambientais em uma
perspectiva ampla e considerando a dimensão relacional que envolve os processos.

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2 OBJETIVOS

Criar metodologia para investigação dos impactos econômicos causados por inundações nas
famílias e na cidade em uma análise de vulnerabilidade social, de rede urbana e danos
associados, com potencialidades de generalização para vários municípios. Desta forma, busca-
se estimar os danos diretos e indiretos do evento, em uma dimensão espacial. A pesquisa
compreende cinco objetivos específicos:

1. Estudar a ameaça, vulnerabilidade, exposição, resiliencia e risco dos moradores


atingidos com a criação de indicadores.

2. Estimar o efeito do evento nas rotinas dos moradores: estudo da re-alocação dos
gastos, alterações no acesso aos bens e à renda e perda de bens e diminuição do bem-
estar.

3. Analisar a propagação do impacto na cidade: estudo sobre como os efeitos da


inundação se propagam na cidade, não se restringindo aos locais fisicamente afetados
por ela.

4. Análise dos danos diretos da inundação.

5. Analisar o impacto no sistema de transportes, em termos de distância e tempo de


viagem adicionais, custos materiais de transporte e emissão de poluentes.

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3 DANOS DAS INUNDAÇÕES

Embora o termo “inundação” usualmente represente uma conotação negativa, de desastre e


danos, as inundações possuem vários efeitos positivos: aumento da umidade do solo e
reabastecimento de sedimentos, de origem aluvial ou de processos erosivos na bacia,
influenciando na fertilidade e produtividade do solo; regulação da abundância e diversidade
de peixes; ganhos financeiros de atividades relacionadas à recuperação pós-inundação e de
setores econômicos situados fora da área inundada.

No médio e longo prazo a inundação pode levar à maior eficiência produtiva, quando
instalações e máquinas antigas, destruídas pelas águas, são substituídas por novas; incentivar
o redesenho e reorganização da área urbana para reduzir a vulnerabilidade de uma maneira
geral; e mesmo possibilitar o crescimento da união familiar e do senso de solidariedade na
comunidade (Green, Parker & Tunstall, 2000).

Mas há os impactos negativos que, com o processo de urbanização e adensamento, tendem a


ser relevantes nas áreas urbanas. As características socioeconômicas da comunidade exposta,
o padrão de uso e ocupação do solo, a ocorrência do evento e as características da cheia
definem a magnitude dos danos da inundação na área atingida.

Os danos causados por inundações classificam-se em tangíveis e intangíveis. Os danos


tangíveis são aqueles passíveis de mensuração em termos monetários, normalmente estimados
por meio dos preços de mercado. As perdas intangíveis, ao contrário, relacionam-se a bens de
difícil quantificação ou quando esta, por questões éticas ou ideológicas, é considerada
indesejável ou inapropriada. São exemplos a vida humana, bens de valor histórico e
arqueológico e objetos de valor sentimental (Tabela 3.1). Os bens intangíveis relacionam-se a
determinado estado da arte nos procedimentos de estimativa de danos; muitos bens, hoje
intangíveis, podem tornar-se passíveis de mensuração no futuro (Green, Parker & Tunstall,
2000).

Em um segundo critério de classificação, os danos são diretos e indiretos. Os danos diretos


resultam do contato físico de bens e pessoas com a água de inundação. Os danos que ocorrem
em conseqüência dos danos diretos, como interrupções e perturbações das atividades sociais e
econômicas, classificam-se como indiretos. Em termos simples, qualquer dano decorrente da
inundação que não seja direto, é considerado indireto. Esses podem ocorrer dentro e fora da

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área física atingida pelo evento (Tabela 3.1) (Machado, 2005; Parker, Green & Thompson,
1987).

Tabela 3.1 - Principais danos decorrentes de inundações em áreas urbanas


Danos Tangíveis
Danos Diretos Danos Indiretos
Custos de limpeza, alojamento e
Danos físicos aos domicílios: construção e
medicamentos. Re-alocação do tempo e dos
conteúdo das residências.
gastos na reconstrução. Perda de renda.
Lucros cessantes, perda de informações e
Danos físicos ao comércio e serviços: base de dados. Custos adicionais de criação
construção e conteúdo (mobiliário, estoques, de novas rotinas operacionais pelas
mercadorias em exposição, etc.). empresas. Efeitos multiplicadores dos danos
nos setores econômicos interconectados.
Interrupção da produção, perda de produção,
Danos físicos aos equipamentos e plantas receita e, quando for o caso, de exportação.
industriais. Efeitos multiplicadores dos danos nos
setores econômicos interconectados.
Perturbações, paralisações e
congestionamento nos serviços, custos
Danos físicos à infra-estrutura adicionais de transporte, efeitos
multiplicadores dos danos sobre outras
áreas.
Danos Intangíveis
Danos Diretos Danos Indiretos
Ferimentos e perda de vida humana. Estados psicológicos de stress e ansiedade.
Doenças pelo contato com a água, como
Danos de longo prazo à saúde.
resfriados e infecções.
Perda de objetos de valor sentimental. Falta de motivação para o trabalho.
Inconvenientes de interrupção e
Perda de patrimônio histórico ou cultural. perturbações nas atividades econômicas,
meios de transporte e comunicação.
Perda de animais de estimação. Perturbação no cotidiano dos moradores.
Fonte: Elaboração própria baseada em Machado (2005) e Green, Parker & Tunstall (2000).

O valor da magnitude dos danos indiretos é controverso na literatura. Segundo Barbat &
Carreño (2004), os efeitos indiretos de um desastre natural dependem do tipo de desastre. Se
“úmido”, como as inundações, os danos indiretos podem chegar a 50% dos danos diretos; se é
do tipo “seco”, a exemplo dos terremotos, estima-se que este percentual seja até mesmo
superior a 75%.

Há impactos indiretos de médio e longo prazo, como alteração dos fluxos migratórios;
mudanças nos valores de moradias; redução do padrão de consumo de famílias em
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conseqüência do endividamento para cobrir os custos ocasionados pelos danos da enchente; e
alteração dos gastos governamentais com o surgimento de um novo padrão migratório e de
desenvolvimento na região, quando a consciência da inundação tenha se tornado efetivamente
presente (THE IMPACTS..., 1999). Estes efeitos são particularmente observados em grandes
desastres naturais, como a seqüência de tsunamis no Oceano Índico no final de 2004 ou o
furacão Katrina na região litorânea sul dos Estados Unidos em 2005.

A definição espacial e temporal é central na avaliação dos danos da inundação. Ela se reflete
no tipo de metodologia a ser utilizada: em uma perspectiva local de curto prazo, as análises
microeconômicas baseada na economia do bem-estar tendem a ser adequadas; em um
horizonte de tempo mais amplo e com a incorporação de danos indiretos, o uso de
microsimulações pode trazer resultados satisfatórios; em escalas regionais ou nacionais,
modelos econômicos de insumo produto ou equilíbrio geral talvez sejam apropriados.

Os danos são diferentes segundo as escalas. As compensações e re-equilíbrio buscados pelo


sistema variam no tempo e espaço. Compensações regionais - como financiamento à
reconstrução por meio de ajuda estatal ou pagamento de seguros - são consideradas perdas em
uma perspectiva nacional.

Mas, segundo Parker, Green & Thompson (1987), os danos indiretos ocasionados pela
inundação de atividades comerciais e de serviços, embora possam gerar prejuízos financeiros
para o estabelecimento, dificilmente se traduzirão em uma perda econômica para a região ou
nação, pois ocorrerá uma transferência da demanda para outros locais. Ressalta-se que, como
os agentes econômicos “ganhadores” são diferentes dos “perdedores”, na ótica distributiva, o
impacto do evento natural não é nulo (Handmer, Reed & Percovich, 2002).

Em suma, o estudo dos danos das inundações envolve a dimensão espacial-temporal e um


amplo leque de valores não observáveis no mercado. Corre-se o risco de dupla contagem,
horizonte de análise estreito, ignorar os passivos pós-desastre e as perdas não identificáveis
via mercado (e.g.: redução do tempo de lazer, danos a objetos de valor histórico, cultural e
sentimental) (Cochrane, 2004). Como a análise dos danos envolve estoques (danos diretos) e
fluxos (custos de interrupção e paralisação de atividades econômicas) freqüentemente existem
erros de cálculo e sobreposições de valores.

Torna-se necessário definir o tipo de abordagem adequado e possível, se financeira,


econômica, social, ambiental ou integrada. Aspectos institucionais, políticos, técnicos e

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metodológicos orientam esta escolha. Objetivamente, as inundações causam inúmeras
perturbações, sofrimento e perdas econômicas individuais. Com ganhadores e perdedores
diferentes, deixar de considerá-las no planejamento das políticas públicas não é compatível
com uma economia socialmente justa.

Tradicionalmente, as metodologias para estimar os danos baseiam-se na eficiência econômica,


com a utilização da análise custo-benefício. O conceito de disposição a pagar (DAP) por um
bem ou serviço é central. Segue-se o princípio de que o indivíduo é quem melhor conhece
seus interesses. Os benefícios sociais de uma medida de proteção à inundação seriam a
agregação das preferências de todas as partes afetadas por ela (Parker, Green & Thompson,
1987).

Utilizando o arcabouço teórico da microeconomia neoclássica, estas metodologias ligam as


conseqüências da inundação a uma diminuição de nível de bem-estar da coletividade, ou seja,
do excedente do consumidor. O excedente é medido pela diferença entre o preço que um
consumidor estaria disposto a pagar por um bem (a percepção individual do seu valor) e o
preço efetivamente pago (valor definido pelo mercado) (Nutti, 2000).2

Em períodos recentes, a teoria do consumidor tem incorporado elementos de incerteza (risco)


e tempo e a utilidade passa a ser percebida sob duas novas dimensões: a probabilidade de
ocorrência do evento (risco) e a distribuição das preferências no tempo (Shabman et al.,
1998). Há ainda avanços advindos do uso de modelos de microsimulação e análise de rede,
que introduzem elementos de teoria comportamental e inteligência artificial.

As seções 3.1 a 3.3 discutem os danos das inundações sobre as famílias, atividades produtivas
e rede viária. Embora o foco do trabalho sejam as famílias, os dois últimos também são
tratados, pois é fonte de renda, consumo e meio de deslocamento dos residentes. A ênfase
recai sobre os danos indiretos, aspecto mais relevante da tese.

3.1 Danos às famílias e aos domicílios

A Tabela 3.2 apresenta o leque de impactos que afetam os moradores, sendo que eles não são
necessariamente mutuamente exclusivos. Entre os danos destacados, estão os efeitos sobre a
saúde da população e as perturbações no dia-a-dia do domicílio após o desastre.

2
O conceito de excedente do consumidor é explicado com detalhes no capítulo 5, item 5.3.2.
15
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Tabela 3.2 - Impactos da inundação nas famílias
Danos à construção e ao conteúdo da residência.
Danos nas instalações elétricas, telefônicas e de saneamento.
Custos de limpeza.
Danos diretos
Perda de itens insubstituíveis, de valor sentimental.
Perda de animais de estimação.
Danos à saúde, ferimentos ou morte.
Preocupação sobre inundações futuras (ansiedade, stress e medo).
Remoção permanente da área.
Transtornos no cotidiano em conseqüência dos danos da inundação.
Mudança temporária de residência.
Perturbações devido aos sistemas de alerta e alarme de inundação.
Piora e paralisações nos serviços de utilidade pública.
Danos indiretos Perda de renda pela falta no trabalho e perda de oportunidades.
Gastos com a recuperação do domicílio diminuem a renda disponível
para demanda de outros bens.
Uso do tempo na recuperação dos danos as expensas de outras
atividades, como as de lazer.
Problemas financeiros de curto prazo pelo elevado volume de despesas
associadas ao evento.
Ajuda ou acomodação temporária de parentes e amigos, vítimas da
inundação, causando custos adicionais e alteração da rotina.
Custos adicionais de transporte, caso sejam utilizadas vias inundadas
Danos indiretos ou ocorra um aumento no congestionamento de trânsito.
decorrentes de Diminuição das oportunidades de consumo na região ou cidade, caso
inundação em lojas, serviços e locais de lazer tenham sido inundados.
outras áreas Perturbações nas redes podem interromper ou piorar os serviços de
infra-estrutura.
Possibilidade de aumento dos custos associados às compras domésticas
e serviços de recreação.
Fonte: Elaboração própria baseada em Parker, Green & Thompson (1987).

3.1.1 Preocupação em relação ao risco de inundação e impactos na saúde

O risco é uma noção virtual, um espaço vazio que pode conduzir ou dar lugar à ansiedade ou
ao medo. Em função disso, podem ocorrer estratégias de construção do risco, ocultação e
amplificação (Blancher, 1989).

Numerosos trabalhos discutem a psico-sociologia do risco, ou seja, como os indivíduos


percebem o risco e reagem ante a ele. Normalmente são trabalhos que procuram captar esta
percepção segundo as diferentes características dos indivíduos (idade, escolaridade, etc.) ou
dos diferentes eventos de risco. Há estudos menos usuais que se ocupam das formas de
produção e avanço do risco pelos meios de comunicação ou entre categorias sociais ou grupos
profissionais - as “culturas locais”, segundo denominação utilizada por Blancher, 1989:12. Os
grupos profissionais compreendem desde experts em risco até trabalhadores que, face ao
risco, desenvolvem seu próprio know-how em estratégias de proteção.
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Obviamente, como um fenômeno probabilístico, a percepção do risco da inundação pela
população é central na magnitude de seus efeitos, sejam psicológicos ou materiais (a
percepção individual do risco pode estar relacionada à construção de casas resilientes). Este
item introduz alguns aspectos relacionados à expectativa em relação ao risco, enfatizando
principalmente os seus efeitos psicológicos com a possível evolução para quadros de doenças.

A preocupação é caracterizada por ansiedade, stress e medo. Residentes em áreas inundáveis


freqüentemente afirmam possuir um elevado grau de preocupação quando acreditam que uma
inundação pode ocorrer (Tapsell et al., 2002). A preocupação ocasiona stress e esse exige
cuidados à saúde. Pode levar a ajustes no estilo de vida e uso de medidas adaptativas (e.g.:
utilização do sótão como refúgio e implantação de medidas waterproofing na residência), os
quais implicam em gastos financeiros.

A ansiedade decorrente da possibilidade de uma inundação no futuro é função de dois


aspectos principais: o risco “real”, em termos de freqüência e de magnitude das perdas
potenciais, e as características dos que se sentem ameaçados. Claramente os residentes em
áreas com eventos freqüentes e severos têm maior grau de preocupação do que os moradores
em áreas de menor risco. Mas há aqueles localizados em áreas com inundações tão freqüentes
que, muitas vezes, um processo adaptativo já foi desenvolvido.

A consciência em relação ao risco associa-se, entre outros fatores, à experiência com


inundação e ao tempo de residência na região inundável (Parker, Green & Thompson 1987).
A mobilidade residencial diminui a memória agregada sobre o risco, na medida em que novos
moradores sem experiência de cheia substituem antigos. Segundo Parker, Green & Thompson
(1987), em uma área inundável, uma comunidade com maior mobilidade tende a ser menos
ansiosa em relação ao risco do que em uma comunidade estável. Deve ser esperada maior
ansiedade entre moradores proprietários do que moradores inquilinos.

Embora exista a ansiedade em relação à inundação, indivíduos tendem a ter memória curta ou
a acreditar que o evento é demasiado raro para ocorrer. Experiências mostram que a
indiferença em relação ao risco é generalizada. Um percentual significativo de moradores em
áreas inundáveis ignora a ameaça até a primeira ocorrência (Parker, Green & Thompson,
1987; Debo & Reese, 1995). E, mesmo após um evento, a preocupação, inicialmente alta, cai
rapidamente. Há indivíduos que consideram que o evento não vai se repetir, sendo apenas um
fruto da casualidade. Estas pessoas, obviamente, não sofrem de ansiedade.

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O stress, da mesma forma que a ansiedade, depende da natureza do evento e das
características do residente. O stress é o resultado de uma reação que o nosso organismo tem
quando estimulado por fatores externos desfavoráveis. O “fator surpresa” tem um efeito
importante, como também a magnitude dos danos e prejuízos. O choque será grande em um
evento repentino, sem alerta, no meio da noite. Cheias de grande impacto - como em áreas
costeiras onde o volume de água é acompanhado pela ação das ondas – levam a uma elevada
carga de stress emocional.

Embora eventos repentinos possam ser traumáticos, existe o stress constante dos eventos de
longa duração. Relaciona-se a um prolongado período de isolamento, perda de serviços e
perturbações no estilo de vida usual. Sabe-se que um estado de stress pode levar a uma
sobrecarga de órgãos vitais, deixando-os debilitados. No meio médico é consensual sua
influência no sistema imunológico, diminuindo a resistência a doenças.

A saúde é um direito do cidadão. Os problemas agudos e crônicos que possam surgir em


decorrência da experiência com a inundação implicam em menor tempo e energia disponíveis
para a execução de todas as atividades, entre elas a própria subsistência. Parker, Green &
Thompson (1987) citam estudos mostrando que inundações levam a um aumento na
mortalidade. A Tabela 3.3 mostra as fases que acompanham os desastres naturais com alguns
impactos à saúde observados.

Tabela 3.3 - Fases de um desastre e os possíveis impactos na saúde


Pré-ameaça: Ansiedade, preocupação, medo de chuva, sintomas psicológicos.
Excesso de exercício ante a ameaça (e.g.: movimentação de
Alerta:
mobília e “correria”) causando dores na coluna, torções, etc.
Impacto: Resfriados, gripes, infecções etc.
Preocupações pela perda financeira e de pertences com valor
Recuperação inicial:
sentimental, depressão.
Redução geral da resistência a doenças, decorrência do stress
Recuperação e
causado pelo evento e pela possibilidade de inundações futuras.
conseqüências
Surgimento de doenças, mesmo a médio e longo prazo, ou piora
posteriores:
de uma enfermidade atual. Pode causar mortalidade.
Fonte: Parker, Green & Thompson (1987:105) baseados em vários autores.

3.1.2 Perturbações da inundação

Ocorrendo a inundação, talvez seja necessária uma mudança temporária de residência,


principalmente se há ameaça de uma segunda cheia. Usualmente as autoridades locais provêm
abrigos temporários, mas parte dos desabrigados encontram refúgio na casa de parentes e
amigos.

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A perda de itens insubstituíveis constitui um dos maiores danos para as famílias. Lembranças
acumuladas reconstroem o passado de uma pessoa e são particularmente valiosas para os
idosos. Há um elevado transtorno para reaquisição de documentos perdidos, como certidões,
carteiras de habilitação, cheques e contratos.

Passada a inundação, é o momento de verificar o estado da residência, avaliar as perdas e o


que pode ser aproveitado, limpar a casa. Começam as reparações e a compra do que é
necessário. Parte do tempo é direcionada para contatar advogados, empresas de seguro,
administração pública, prestadores de serviços, serviços burocráticos de segunda-via, etc. A
possibilidade de substituição de bens e reforma depende da renda disponível, da capacidade
de empréstimo, da poupança, da existência de seguros e outras possíveis fontes de recursos.
Um domicílio que sofreu danos dificilmente consegue repará-los imediatamente após a cheia.
O dia-a-dia do domicílio é alterado. Geralmente a trajetória da qualidade da vida após a
inundação não é analisada. É possível que danos se estendam por um longo período, ou
mesmo indefinidamente, afetando de forma crônica a qualidade de vida (Green, 2004).

3.2 Danos às atividades econômicas


Segundo van der Veen et al. (2003), a magnitude dos efeitos indiretos na economia depende
de 1) disponibilidade de fonte alternativa de oferta e demanda (substituibilidade); 2) duração
da perturbação e 3) possibilidade de aumento da produção.

Estes três aspectos interferem nos encadeamentos para frente e para trás presentes na
economia (no inglês, forward and backward linkages), que podem propagar os danos. Se há
redundância econômica, ou seja, fontes substitutas para suprir as rupturas que eventualmente
ocorram, o impacto e seu encadeamento tendem a ser amortecidos.

Na Figura 3.1, a interrupção da firma C2 não necessariamente afeta de forma significativa os


outros setores da cadeia. Durante a paralisação de C2, a manutenção do restante da rede, sem
custos adicionais relevantes, depende da habilidade dos estabelecimentos não inundados (C1)
em suprir o crescimento do consumo (a qual é função do tempo de paralisação em C2 e da
capacidade de aumento da produção) e da possibilidade de transferência dos consumidores de
C2 para C1. Ressalta-se que os efeitos tendem a se diluir na cadeia, o impacto em B é maior
do que em A. Em um cenário pessimista, C1 pode ter capacidade nula de produção adicional e
toda a rede sofre o impacto da inundação em C2.

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Sem inundação

C1

A B Demanda
Final
C2

Com inundação

Figura 3.1 - Conexões de uma cadeia econômica


Fonte: Adaptado de van der Veen (2004)

3.2.1 Danos indiretos potenciais do comércio varejista e prestadores de serviços

Nesta categoria encontram-se atividades não envolvidas com a produção de um bem físico,
mas com a sua venda. São atividades que tendem a ter menor grau de dependência do que a
indústria em relação a máquinas e equipamentos, embora ele seja cada vez maior com a
intensificação do uso da informática.

O comércio varejista e os serviços são afetados pelas inundações de duas formas: 1) o próprio
estabelecimento é inundado e com isto há perturbação dos negócios e 2) as residências dos
consumidores ou as vias de acesso são atingidas pela cheia levando a uma diminuição na
demanda (Parker, Green & Thompson, 1987). Geralmente o período de paralisação da
atividade é maior do que o da inundação, especialmente se for um evento de grande
magnitude que exija intenso trabalho de reparação e limpeza do estabelecimento.

Os danos diretos tendem a ser significativos nestas atividades, principalmente se atingirem os


estoques, já a magnitude dos efeitos indiretos é incerta. Para Parker, Green & Thompson
(1987), se considerado o município como um todo e um horizonte temporal amplo, a
tendência é de que eles sejam pequenos. Geralmente, não ocorre uma perda de demanda no
setor, mas uma transferência ou adiamento. A diminuição ou paralisação momentânea do
faturamento de uma firma poderá ser compensada por um aumento futuro ou por uma
transferência da demanda com crescimento de receita em outro estabelecimento (ver item
4.4).

Ainda que o prejuízo financeiro da firma não se traduza em perda econômica para região ou
país; para a comunidade, sempre haverá perda, pois há consumidores que incorrerão em
gastos extras de transporte, pois terão que consumir em estabelecimentos mais distantes, e
diminuição de bem-estar por adiar o consumo ou consumir bens menos satisfatórios.
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3.2.1.1 Danos indiretos no comércio varejista
O comércio varejista ocupa-se da distribuição final de bens. Ante a inundação de um
estabelecimento, se os seus clientes optarem por adiar o consumo, ele sofrerá perdas pequenas
de receita, apenas aquelas relacionadas a mudanças de rotinas ou perda de equilíbrio contábil
decorrentes de uma súbita modificação no comportamento das vendas ou, eventualmente,
alguma perda pelo estoque parado. Alternativamente, caso a estratégia do consumidor seja
substituir ou transferir o consumo, o estabelecimento sofrerá prejuízos mais significativos.

A opção por transferir ou substituir o consumo em detrimento do adiamento é função das


opções existentes e da duração da inundação. Grande densidade de estabelecimentos, baixo
grau de especialização e alto grau de substituição entre bens, implicam em maiores
possibilidades para os consumidores e, em conseqüência, possíveis prejuízos financeiros para
as lojas inundadas. Um exemplo são as padarias. Em outros setores, mais oligopolizados,
específicos ou diferenciados, o comprador pode preferir adiar o consumo a substituí-lo, e as
perdas individuais serão menores.

Em relação à duração, embora se saiba da sua importância na magnitude dos danos, há


dificuldades para se estimar como ocorre a relação entre danos e duração, embora se suponha
que não seja linear.

Do ponto de vista da firma, pode-se supor, por exemplo, que quanto maior o número de dias
parados, maior a possibilidade de que os seus consumidores habituais escolham a
transferência de consumo e não seu adiamento, logo, as perdas serão maiores. Por outro lado,
há custos que não variam proporcionalmente no tempo, como os custos de limpeza.

Do ponto de vista do consumidor, pode-se conjecturar uma tendência crescente de diminuição


do bem-estar com a paralisação de uma unidade de consumo preferida, ou por adiar cada vez
mais o consumo, ou por ser obrigado a escolher, a cada dia, locais de compras menos
satisfatórios. Mas, pode-se supor também que ele acabe, com o tempo, a se adaptar a novas
alternativas de consumo e haja um processo de acomodação.

Ressalta-se que a opção temporal e espacial do consumidor é também determinada pelas


características intrínsecas do produto. Alguns bens de consumo, como os jornais, não podem
ter sua demanda adiada. Para os bens de consumo durável, o adiamento é mais provável.
Considerando o país como um todo, uma perda econômica seria observada se houvesse um

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aumento do consumo de bens importados em detrimento dos nacionais, o que seria pouco
provável de ocorrer como conseqüência de uma inundação, mesmo de grande magnitude.

3.2.1.2 Danos indiretos nos estabelecimentos prestadores de serviços


Nesta categoria estão serviços prestados por distribuidoras, escritórios, serviços de lazer,
atividades de alimentação, entre outros.

Distribuidoras são intermediárias entre indústrias e comércio, sendo similares ao comércio


varejista em termos de danos potenciais de inundação. Os escritórios provêm serviços para o
público em geral, para outras empresas ou é parte integrante de uma grande instituição (e.g.:
serviços de advocacia, contabilidade, corretagem e financeiros). Seus serviços são
freqüentemente representados por um produto físico, como contratos e plantas de engenharia.
Serviços de lazer incluem bares, restaurantes, cinemas, teatros e clubes desportivos.

O comportamento do consumidor frente à inundação das atividades prestadoras de serviços


segue os mesmos princípios apresentados para o comércio.

3.2.1.3 Interação famílias, comércio e serviços


Segundo Parker, Green & Thompson (1987), um consumidor com residência inundada tem
sua demanda alterada por três razões: 1) perda de renda por falta no trabalho; 2) gastos com
substituição e reparos na residência leva a uma diminuição do consumo de outros bens e
serviços, especialmente se há cobertura não integral dos danos oferecida pelo seguro contra
inundação ou pelo auxílio estatal (no Brasil não há segurado contra inundações, ao contrário
de países como Inglaterra e Estados Unidos) e 3) o tempo necessário para limpar e reparar a
casa se traduz em menos tempo para outras atividades.

A Tabela 3.4 mostra como a inundação de domicílios afeta o consumo nos estabelecimentos
econômicos fora ou dentro da região inundada. Obviamente, a demanda de bens
indispensáveis à sobrevivência do consumidor tenderá a se manter inalterada, como a de
alimentos essenciais. Produtos para casa e material de construção possivelmente sofrerão um
boom de consumo, no pós-desastre, para a recuperação da residência. Com a re-alocação da
renda, perdem espaço no orçamento familiar os produtos supérfluos ou menos emergenciais.

Para os serviços, o raciocínio é semelhante: frente ao desastre, as prioridades de gasto se


alteram. A Tabela 3.5 apresenta um possível comportamento das famílias em relação à
demanda por serviços. Ressalte-se que, pela infinidade de serviços existentes e pela
importância diferenciada que eles possuem para cada agente, sintetizá-los em uma tabela tem
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alcance limitado. A questão central é o nível de urgência dos serviços, se ele pode ser adiado
ou não, o que envolve um elevado componente individual. Entre todas as atividades usuais de
prestação de serviços, talvez as únicas que possam ser consideradas menos prioritárias para
todos os agentes, seriam as de lazer.

Tabela 3.4 - O consumo das famílias e as conseqüências nas atividades comerciais


Demanda de alimentos e bens essenciais: inalterada.
Inundação de
Demanda de bens não duráveis de alta elasticidade renda: diminui
domicílios
Bens duráveis para o domicílio: aumenta.
Atividades Venda de produtos alimentícios e bens essenciais: diminui.
comerciais Venda de produtos não duráveis de alta elasticidade renda: diminui.
localizadas na região Vendas de bens duráveis para o domicílio: adiada (não há como prever o
inundada comportamento das vendas).
Atividades Venda de produtos alimentícios e essenciais: aumenta
comerciais Venda de bens não duráveis de alta elasticidade renda: diminui ou permanece
localizadas fora da a mesma.
região inundada. Venda de bens duráveis para o domicílio: aumenta ou permanece a mesma.
Fonte: Adaptado de Parker, Green & Thompson (1987: 63).

Tabela 3.5 - O consumo das famílias e as conseqüências nas atividades prestadoras de


serviços
Demanda por serviços financeiros: aumenta.
Demanda por serviços de viagem e lazer: diminui.
Inundação de Demanda por serviços de salões de beleza e barbearia: inalterada ou diminui.
domicílios Demanda por serviços de advocacia, contabilidade, corretagem de imóveis:
inalterada.
Serviços financeiros: transferência para filiais ou inalterados (adiamento da
demanda).
Serviços
Serviços de viagem e lazer: diminuem.
localizados na
Serviços de salão de beleza e barbearia: diminuem ou inalterados.
região inundada
Serviços de advocacia, contabilidade, corretagem de imóveis: diminuem ou
inalterados (adiamento da demanda).
Serviços financeiros: inalterados ou aumentam.
Serviços
Serviços de viagem e lazer: inalterados ou diminuem.
localizados fora
Serviços de salão de beleza e barbearia: inalterados ou aumentam.
da região
Serviços de advocacia, contabilidade, corretagem de imóveis: inalterados ou
inundada
aumentam.
Fonte: Adaptado de Parker, Green & Thompson (1987: 64).

Um ponto a ressaltar é o de que a inundação pode ser acompanhada de mau tempo, o que
também interfere no comportamento do consumidor. Seria necessário isolar o impacto do mau
tempo daquele decorrente da inundação, o que envolveria estudos complexos, e nem sempre
possíveis, de comparação de eventos e de dados históricos.

3.2.2 Danos indiretos potenciais das atividades industriais

Atividades industriais são aquelas envolvidas no processamento de materiais. Além dos danos
diretos que possam ocorrer pelo contato com a água da inundação, existem dois componentes
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principais dos danos indiretos: 1) perda de valor adicionado e os 2) custos adicionais
incorridos em decorrência da inundação.

Geralmente o setor industrial possui maior volume de recursos financeiros (via recursos
próprios, capacidade de empréstimo ou seguros) para minimizar ou neutralizar as
conseqüências indiretas da inundação do que as atividades comerciais e de serviços. O setor
não é tratado em detalhes nesta pesquisa que se ocupa principalmente das atividades
econômicas relacionadas diretamente ao consumo das famílias.

3.3 Interrupções ou perturbações na infra-estrutura urbana


Como infra-estrutura, considera-se as aplicações sistêmicas de tecnologia para as
necessidades da sociedade urbana, produzindo o que o historiador Joel Tarr (Tarr, 1984, p. 4)
chama os tendões tecnológicos da cidade: sua rede de transporte, os serviços de utilidade
pública (utilities) e o sistema de telecomunicações.

A importância dos serviços de infra-estrutura é assinalada em Branscomb (2006). Segundo o


pesquisador, o governo americano definiu uma lista dos serviços considerados vitais para a
defesa e segurança econômica do país. Na primeira lista, deliberada em 1997 por um comitê
do poder executivo americano, determinaram-se sete setores considerados “críticos”, os quais
exigiam especial atenção quanto à garantia dos serviços: bancos e finanças; sistemas de
energia elétrica; produção de gás e petróleo; armazenamento e transporte; serviços de
emergência; informação e comunicação; transporte e sistema de abastecimento de água.
Observa-se nesta lista que, com exceção dos serviços financeiros, todos os setores são
relacionados à infra-estrutura do país. Anos mais tarde, em 2002, a lista foi ampliada,
incorporando setores como o de alimentação e de indústria de base (US OFFICE..., 2002 apud
Branscomb, 2006).

A atenção dada aos serviços de infra-estrutura pelo governo americano associa-se a dois
aspectos que se combinam tornando a sociedade especialmente vulnerável à ocorrência de
falhas nos mesmos: a grande dependência que existe em relação a eles e a configuração em
rede dos serviços, uma rede de grande alcance e elevada densidade de interconexões.

Os elementos de infra-estrutura se interconectam em um sistema de dependência mútua. Um


impacto sobre energia tende a afetar as telecomunicações que, por sua vez, afeta o transporte e
o sistema de finanças e, em um efeito cascata, todas as funções desenvolvidas na cidade
podem paralisar. O setor assume funções cada vez mais amplas e inter-relacionadas, com

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maior alcance e capacidade e passa mesmo a adotar o sistema just-in-time (Tang & Wen,
2009; Branscomb, 2006).

Branscomb (2006) destaca uma tendência dos gerentes e planejadores nos EUA em reduzir os
custos dos serviços, diminuindo investimentos na redundância das conexões ou em medidas
de proteção contra desastres. Buscam-se economias de escala, ou seja, um melhor
desempenho e redução dos custos abarcando um amplo leque de funções e oportunidades de
negócio. Com este objetivo, ocorrem fusões e aquisições no setor. Muitos sistemas tornaram-
se tão “eficientes” que resta pouca margem para mitigar as conseqüências de um desastre. A
execução de alguma tarefa de inspeção mais rigorosa pode afetar a rapidez de produção ou
distribuição do bem. Alguns componentes técnicos essenciais dos sistemas de energia elétrica,
por exemplo, não podem ser rapidamente substituídos pela sua excessiva especialização. Cada
vez mais os operadores humanos são substituídos por softwares, o que aumenta a
vulnerabilidade ante a ocorrência de panes. Ao que parece, há uma preocupação com os riscos
normais da atividade, mas a proteção a eventos de risco com menor probabilidade é
negligenciada.

Portanto, se por um lado, foram feitos progressos na engenharia e gestão de operações para se
obter melhor qualidade e robustez dos serviços; por outro, grandes redes induzem a grandes
riscos associados a uma potencial falha de operação. Uma pequena interrupção em suas
conexões pode afetar imediatamente um grande número firmas e pessoas e, pelo “efeito
cascata”, outras redes.

Uma inundação é capaz de danificar diretamente as estruturas envolvidas na geração do bem e


na distribuição dos serviços (e.g.: equipamentos, linhas de transmissão, estações e plantas) e
promover uma piora ou paralisação da sua provisão dentro e fora da região inundada. Em
conseqüência, as prestadoras sofrem perda de consumo e de receita e, os consumidores, falta
de serviço adequado.

Nas atividades econômicas, há possibilidade de avarias nas máquinas e nos materiais em


processamento no momento da falta de energia. Com os serviços paralisados, corre-se o risco
de perda de produção. Talvez a prestadora evite a interrupção do serviço empregando
equipamentos e linhas alternativas, o que pode levar a custos adicionais pelo uso de
equipamentos menos eficientes.

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Obviamente as redes têm características diferentes, o que interfere na sua vulnerabilidade.
Redes de telecomunicação normalmente têm tecnologia em formato de árvore e são muito
suscetíveis a um impacto externo, pois a perda de uma única ligação ou nó isola parte da rede.
Outras podem ter maior grau de redundância e ligações, mas não necessariamente de
capacidade. A magnitude do impacto é diferença se é um nó ou uma ligação que é atingida.
Os nós das redes de serviços públicos, como as estações de bombeamento, estações
telefônicas e transformadores, são normalmente mais suscetíveis do que as ligações – cabos,
canalizações e correntes elétricas.

Os danos nos serviços de utilidade pública são de difícil quantificação, envolve uma análise
de rede (redundância, suscetibilidade e transferência) e uma estimativa do valor adicionado
perdido, informação pouco divulgada pelas empresas. Como alternativa pode ser utilizada a
perda de receita, inferindo quanto cada agente atingido deixou de consumir ou pagar.

3.3.1 Perturbações no sistema de transporte

Observou-se nas determinações do Executivo norte-americano como o setor de transporte de


pessoas e bens é considerado vital para a cidade. Nesta pesquisa, pela impossibilidade de se
estudar todos os serviços de infra-estrutura, o sistema de transportes, como a infra-estrutura
que cumpre essencialmente a função de conectar os agentes, foi escolhido para representar os
“tendões tecnológicos” da cidade. Grande parte dos danos indiretos citados anteriormente, em
domicílios e atividades econômicas, possui relação com o sistema de transporte.

O sistema de transporte é tipicamente uma rede. Nas vias, unidades discretas, como carros,
ônibus ou caminhões locomovem-se. As pessoas, ao se deslocarem de um local para outro,
esperam usufruir benefícios no local de destino. A interrupção ou perturbações nas vias leva à
ocorrência, pelas dificuldades de acessibilidade, dos danos indiretos pelas firmas e domicílios
discutidos no item 3.2, os quais envolvem substituição do consumo ou seu adiamento, mas
também custos de transporte adicionais (custo material) e de oportunidade causados pelo
atraso na chegada ao destino (custos por tempo de atraso) (Parker, Green & Thompson, 1987).
A soma destes dois últimos custos representa o custo potencial pela perturbação no tráfego.

O sistema viário e tráfego local possibilitam a propagação de efeitos localizados de um evento


para outras áreas, aumentando a sua dimensão. Ante a ocorrência de uma inundação, não
apenas as vias diretamente atingidas pelas águas sofrem perturbação, mas também as
possíveis vias de desvio, onde o trânsito pode se congestionar.

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Em algumas situações, os custos associados a impactos no tráfego de veículos podem ser
elevados, dominando os benefícios nas análises custo-benefício de medidas de proteção
contra inundações. É o caso de vias que sofrem inundação com relativa freqüência em centros
urbanos complexos, ou quando uma rede viária de uso intenso é inundada ou usada como
desvio de tráfego ante a inundação de um centro urbano de relevância econômica. Outro
exemplo são pontes e vias que, ao serem interrompidas, levam ao aumento significativo da
distância entre origem e destino com o uso de rotas alternativas.

Segundo Green (1995), a vulnerabilidade de uma rede é definida como o inverso do menor
número de linhas que devem ser cortadas a fim de se isolar uma parte dela do restante. 3
Quanto maior o número de vias que precisem ser bloqueadas para isolar uma região, menos
vulnerável é a rede ante a ocorrência de perturbações. Além deste aspecto dimensional, tem
relevância a capacidade de trafego dos desvios, a fim de se viabilizar o deslocamento do fluxo
sem transtornos, aspecto mostrado no item 4.4.

3.4 Custos dos serviços de emergência


Na cidade, há outras atividades que sofrem danos da inundação. Custos sistemáticos advindos
da ocorrência de inundações são os custos sofridos pela administração pública e outras
entidades envolvidas no socorro às vítimas.

A função dos serviços de emergência é minimizar as perdas totais devido à inundação. Tanto
o estado, quando organizações voluntárias ajudam vítimas potencias ou reais e auxiliam na
proteção de propriedades. Entre os agentes envolvidos nos serviços de emergência, tem-se a
polícia, a defesa civil, o corpo de bombeiros, os setores da administração pública ligados à
assistência social e educação, os serviços de ambulância, os engenheiros e os voluntários,
como Cruz Vermelha, Lions Club e outras organizações não governamentais.

Serviços de emergência estão envolvidos desde a fase preparatória, quando são identificadas
as ocupações de risco e estabelecidos os planos de emergência, até a fase de recuperação, com
a coordenação dos grupos de assistência, avaliação do impacto, limpeza e fornecimento de
ajuda monetária.

Além do levantamento de todo os recursos e mão-de-obra envolvidos, a principal dificuldade


que envolve a quantificação dos custos de emergência é a de definir adequadamente quais os
custos adicionais são atribuídos somente à ocorrência da inundação.

3
Tradução do autor. Original em inglês.
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Muitos serviços prestados em uma situação crítica são concebidos para lidar com vários tipos
de emergência (e.g.: incêndio, acidentes, inundação, desmoronamento). Se um evento
necessitar de mais recursos do que o usualmente é atribuído a uma situação de emergência, há
um custo marginal adicional associado a ele.

As inundações envolvem o uso de serviços diversos. Desde bombeiros e ambulância, até


setores da administração pública que, embora normalmente estivessem encarregados de outras
funções menos específicas, passam a se ocupar das conseqüências causadas pela inundação.
Portanto, a forma de cálculo dos danos tende a variar: para alguns serviços pode ser mais
adequado utilizar o custo marginal (caso de ambulâncias); em outros, o custo médio (quando
os serviços existem primeiramente para outros propósitos e não para emergências).4

O custo dos serviços de emergência, como os custos associados a algumas atividades


econômicas e de infra-estrutura, não é incorporado à metodologia de trabalho proposta.
Primeiramente, pela impossibilidade de se tratar integralmente os danos da inundação, o que
envolveria uma multiplicidade de agentes e uma análise espaço-temporal minuciosa. Além
disso, embora um estudo centrado nos fluxos pudesse incorporar como base física, além do
sistema viário, as outras redes que compõem uma cidade, como eletricidade e abastecimento
de água, o modelo se tornaria demasiado complexo e inviável frente às limitações de tempo e
recursos computacionais. Um estudo mais amplo dos fluxos existentes na cidade poderá ser
feito posteriormente.

3.5 Os danos diretos


O enfoque do capítulo tem sido os danos indiretos. Eles ocupam centralidade na tese, pois
avançar na sua compreensão é um dos principais objetivos deste trabalho. Mas os danos
diretos também são impactantes e não há como excluí-los da análise, dado que eles originam
os efeitos indiretos.

Os danos diretos ocorrem na infra-estrutura, nas edificações (construção e conteúdo), nos


veículos, nos equipamentos urbanos, como praças e parques, e nas plantas, animais e pessoas.
Todos os bens e seres que tiveram contato físico com as águas das inundações são passíveis
de sofrerem danos.

4
Para uma análise dos princípios e problemas que envolvem a estimação dos custos de emergência, ver Parker,
Green & Thompson (1987).
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Considerando as edificações, a magnitude dos danos à construção depende, sobretudo, do
padrão construtivo, da área construída, da idade do imóvel e das características da inundação
que as atingiu (como profundidade e velocidade). A Tabela 3.6 mostra os principais
componentes da construção e possíveis avarias associadas.

Tabela 3.6 - Elementos da construção e danos


(Continua)
Elementos da construção Impacto da inundação
- Elevados níveis de água ou alta velocidade podem ocasionar danos estruturais
relevantes.
- Tempo é o fator chave. Se a água esteve na estrutura por várias horas, o dano e a
Estruturas
quantia de material que precisará ser removido serão extensos. Artigos como tábua
de gesso nas paredes e teto e isolantes debaixo do chão, dentro das paredes e sobre
tetos poderão se danificar.
Improvável que haja danos, a não ser que a inundação seja acompanhada de geada
Alvenaria
forte, quando pode ocorrer esfacelamento, trincas e rachaduras.
- Inundações curtas: entre 10 e 50% menos danos do que inundações de duração
longa.
Rejunte
- Inundações de duração longa: esfacelamento do rejunte, principalmente em prédios
antigos onde ele é à base de cal.
- Imersão breve não deve causar danos se a condição pré-inundação era boa.
- Argamassa de boa qualidade deve resistir à água durante certo período, mas, em
contato prolongado, satura-se a massa que, sem adesão, necessitará restauração.
- Caso água contaminada por efluente penetre o reboco, exige-se um novo.
- Supõe-se, em geral, que o reboco sobre paredes de tijolos ou blocos vazados
somente é afetado acima do nível do rodapé (inalterado até 0,1m, mas certamente
Revestimento em paredes
danificado a 0,6m).
de tijolos ou blocos
- Reboco à base de cal em prédios antigos é fortemente afetado por inundações
curtas ou longas.
- Reboco sobre paredes de tijolo ou blocos vazados não é afetado em construções
modernas em inundações de curta duração.
- A área a ser restaurado pode ser 2 ou 3 vezes maior do que a área exposta ao
contato.
- Aparecimento de trincas.
Porões e depósitos Imersão prolongada pode causar saturação de paredes, necessitando restauração de
subterrâneos todo o acabamento.
Pintura e paredes exteriores Danos em inundações de curta ou longa duração: descoloração e esfacelamento.
- Em níveis mais baixos de inundação (até 0,6m) e de curta duração, tintas a base de
esmalte sintético podem protegê-las contra estragos.
Portas externas, marcos e
- Profundidades maiores tendem a danificar-las (efeitos de pressão e capilaridade). Se
batentes
forem de madeira compensada, pode ocorrer seu empenamento, estufamento e
descolamento.
- Janelas não são afetadas até que a água chegue ao peitoril, perto de 0,9m.
- Inundações de curta duração não afetam a madeira até 1,5m, nível em que a pressão
Marcos e Janelas começa a causar danos.
- Inundações de longa duração afetam a madeira e exigem reparos do nível do
peitoril para cima.
Pisos Desnível. Se forem de cerâmica, pode ocorrer deslocamento dos blocos.
Pisos, portas e janelas de
Proliferação de fungos, manchas e encardimento.
madeira
Porões e depósitos Imersão prolongada pode causar saturação de paredes, necessitando restauração de
subterrâneos todo o acabamento.
Pintura e paredes exteriores Danos em inundações de curta ou longa duração: descoloração e esfacelamento.

29
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
(Conclusão)
- Em níveis mais baixos de inundação (até 0,6m) e de curta duração, tintas a base de
esmalte sintético podem protegê-las contra estragos.
Portas externas, marcos e
- Profundidades maiores tendem a danificar-las (efeitos de pressão e capilaridade). Se
batentes
forem de madeira compensada, pode ocorrer seu empenamento, estufamento e
descolamento.
- Janelas não são afetadas até que a água chegue ao peitoril, perto de 0,9m.
- Inundações de curta duração não afetam a madeira até 1,5m, nível em que a pressão
Marcos e Janelas começa a causar danos.
- Inundações de longa duração afetam a madeira e exigem reparos do nível do
peitoril para cima.
Pisos Desnível. Se forem de cerâmica, pode ocorrer deslocamento dos blocos.
Fonte: Elaboração própria com informações disponíveis em Machado (2005).

Além dos danos mostrados na Tabela 3.6, há outros, como em instalações elétricas e
telefônicas, que talvez precisem ser substituídas ou reparadas. Podem ocorrer avarias em
instalações hidráulicas e sanitárias, com contaminação de reservatórios e o rompimento de
tubulações (Salgado, 1995).

Os danos ao conteúdo das edificações, como em móveis, cortinas, tapetes e equipamentos e,


quando ocorre em atividades produtivas, também no inventário (estoque de mercadorias e de
matérias primas), dependem, principalmente, dos fatores de impacto do escoamento, da
qualidade e quantidade de bens, de sua localização no imóvel e da suscetibilidade dos mesmos
ao contato com a água.

Fatores de suscetibilidade à inundação de várias mercadorias são encontrados em Penning-


Rowsell & Chatterton (1977). Eles indicam o valor residual de um bem que foi atingido pela
água. Para a sua definição, foram consideradas as características do bem e a profundidade da
inundação. Em geral, em produtos alimentícios e itens correlatos, a susceptibilidade é alta; em
bens como jóias, ela é menor. Machado (2005) adaptou os fatores e os utilizou para elaborar
estimativas de danos no Brasil.

Deve ser dado destaque aos danos que podem ocorrer no estoque de mercadorias,
principalmente de atividades comerciais. Alguns estudos indicam que os estabelecimentos de
comércio são mais freqüentes na planície de inundação do que as indústrias (Machado, 2005).
Segundo Machado (2005), pelo elevado estoque e intenso uso do espaço, o comércio possui
um dano potencial ao conteúdo por unidade de área mais alto do que o das atividades de
serviços e mesmo do que o das residências.

Os danos ao estoque são função do volume estocado e de sua suscetibilidade após a


inundação. A forma também interfere. Segundo estudo de Penning-Rowsell & Chatterton
(1977), a reprodução gráfica da altura (acima do nível do chão) em relação ao percentual do

30
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
valor do estoque seria tipicamente uma curva em forma de “S”. A distribuição do estoque de
mercadorias em um estabelecimento comercial seguiria um padrão, com pouco estoque nos
níveis mais próximos do chão e a maioria da mercadoria estocada entre 0,6m e 2,1m.

Há ainda os veículos. Eles também compõem o conteúdo de domicílios e firmas, são bastante
suscetíveis ao impacto da águas, mas são especialmente problemáticos em relação à
quantificação de danos. A primeira grande dificuldade é mensurar o número de veículos que
se encontra no local do evento, dado que se trata de uma mercadoria cuja função é se deslocar.
Appelbaum (1985) adota como hipótese de que os veículos atingidos são todos aqueles
pertencentes aos domicílios da área afetada. O autor relativiza o impacto ao analisar o tempo
de alerta. Se considerada uma antecedência de cerca de 2 horas, tem-se um percentual de 25%
de veículos atingidos. Em um tempo de alerta significativamente superior a este, o percentual
cairia para 10%.

EASTWOOD... (2009) também utiliza em suas análises o número de veículos por domicílio
(1,7 na Austrália) e adota o pressuposto de que 25% destes carros estão presentes durante as
horas de trabalho (40 horas por semana) e 90% durante as horas de não trabalho (128 horas
por semana), e, portanto, a expectativa de veículos presentes no momento da inundação, em
uma média ponderada, é estimada em 1,3 por domicílio.

No Brasil, há o trabalho de Nagem (2008), que, como em Appelbaum (1985) e


EASTWOOD... (2009) utiliza a posse de veículos por domicílio na área inundada para
mensurar a quantidade de veículos atingidos. O pesquisador, entretanto, contabiliza 100% dos
automóveis.

Contabilizados os veículos, é feita a análise de danos. Ela também encerra dificuldades, visto
a variabilidade existente de modelos e ano de fabricação. A idade média da frota no Brasil,
em 2009, por exemplo, é de nove anos.5 Um procedimento usual é escolher um veículo
padrão para estimativa dos danos (Appelbaum, 1985; Nagem, 2008; EASTWOOD..., 2009),
estes obtidos por meio de consultas em oficinas mecânicas, experimentos ou vistoria após o
evento.

Finalmente, têm-se os danos sobre equipamentos urbanos públicos (e.g.: praças e parques) e
sobre a infra-estrutura urbana, como vias e redes de eletricidade e saneamento, que também

5
Segundo pesquisa do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores –
Sindipeças, divulgada em agosto de 2009. Disponível em:
< http://www.sindipecas.org.br/paginas_NETCDM/modelo_pagina_generico.asp?ID_CANAL=514 >
31
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são susceptíveis ao contato com as águas do escoamento. As obras de infra-estrutura pública,
pela sua dimensão e complexidade, tendem a exigir elevados custos de reparação, sobretudo
nos componentes de construção (Merz et al., 2004). Segundo um amplo banco de dados da
Bavarian Water Management Agency, em Munique, a infra-estrutura pública foi responsável,
entre os anos de 1978 e 1994, pelo maior valor médio de danos decorrentes de inundações
entre os setores econômicos na Alemanha.

Há poucos estudos sobre estes impactos, possivelmente pelas dificuldades de mensuração e a


diversidade existente. No Japão, por exemplo, os danos às obras de infra-estrutura são
calculados de forma estatística, definindo, para os diferentes tipos, um percentual sobre os
danos totais estimados para a área (Dutta, Herath & Musiake, 2001).

Neste sentido, destaca-se estudo recém-desenvolvido no Brasil por Côrtes (2009). Nele são
analisados os danos aos sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário, drenagem
urbana, distribuição de energia, limpeza pública e sistema viário. A sistemática de cálculo
proposta foi aplicada para avaliar o impacto físico das inundações no município de Itajubá,
em Minas Gerais, para diversos cenários de análise com a proposição de medidas de controle.
No estudo, para uma inundação com tempo de retorno (Tr) de 100 anos, os danos de infra-
estrutura se situam entre 7% e 10% dos danos diretos totais, considerando três cenários de
impacto do evento.

Os custos de limpeza após uma inundação também são classificados como danos diretos
(Parker, Green & Thompson, 1987). São necessários materiais de limpeza (e.g.: detergentes,
alvejantes, desinfetantes, amônia, luvas e botas de borracha) e equipamentos (e.g.: baldes,
ferramentas, esponjas, mangueiras, ferramentas, vassouras, pás, enxada, esfregão e carrinho
de mão). Se o proprietário não os possuir, ele terá que incorrer em custos adicionais para
comprá-los. Se for necessária a contratação de empregados ou a sobrecarga dos existentes,
também haverá custo adicional.

E há, ainda, os danos diretos intangíveis, como as perdas de bens insubstituíveis, de valor
sentimental, o surgimento de doenças decorrentes do contato com a água, a perda de vidas
humanas, entre outros. Embora quantificá-los encerre grandes dificuldades, o APÊNDICE I
discute brevemente o valor da vida humana, esta afinal, a maior perda em uma inundação.

32
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
4 VULNERABILIDADE A INUNDAÇÕES

Antes de passar propriamente ao estudo da vulnerabilidade, são discutidos brevemente os


fatores associados à ameaça, pois esses, ao atuarem sobre uma região e comunidade, se
refletirão, em consonância com a vulnerabilidade, na magnitude dos danos.

4.1 Ameaça: características da inundação


O impacto da inundação sobre edificações e pessoas ocorre por ações hidrostáticas
(resultantes da presença de água), hidrodinâmicas (resultantes do movimento da água) e de
flutuabilidade (forças ascensionais) presentes no escoamento. Intensifica o impacto a carga de
sólidos e componentes transportados, como entulhos, sedimentos, componentes químicos
(e.g.: contaminação da água por esgoto e gasolina), nucleares (muito raros, apenas quando
material nuclear é atingido pelas águas) e biológicos (ação de microorganismos que vivem em
condições úmidas, especialmente mofo e fungos) (Kelman & Spence, 2004).

A maioria dos estudos de risco não incorpora de forma integral todas estas forças e pressões,
seria um trabalho exaustivo, quando não impossível, de quantificação. Muitas delas estão
fortemente relacionadas às especificidades locais. Usualmente, usa-se a profundidade (força
hidrostática) e, com menos freqüência, a velocidade (força hidrodinâmica) e duração.

A profundidade da inundação é um fator relevante na criação de danos. Vários estudos


quantificam os danos diretos relacionando-os à profundidade por meio de curvas (Penning-
Rowsell & Chatterton, 1977; Oliveri & Santoro, 2000; Dutta, Herath & Musiake, 2003; Merz
et al., 2004). Segundo Penning-Rowsell & Chatterton, 1977:

A profundidade da inundação dentro das edificações e a profundidade e


extensão da água da inundação na planície de inundação são consideradas
como as principais variáveis a afetarem os danos da inundação. A duração
da inundação é assumida como menos importante, e quando foi
sistematicamente estudada, esse parece ser o caso para edifícios residenciais
(...). Assume-se que o papel da velocidade da inundação em produzir danos
é pequeno, exceto em casos raros de falha estrutural. Os efeitos menores da
velocidade são geralmente medidos pela variável de profundidade...
(Penning-Rowsell & Chatterton, 1977:2, tradução da autora).6

No Brasil, tem-se o trabalho de Salgado (1995), Machado (2005) e Nagem (2008) onde a
profundidade também é a variável hidráulica associada aos danos. A suposição é de que não
ocorre pressão hidrostática diferencial dentro e fora de uma edificação atingida, considerando
como evento “padrão” uma inundação de lento crescimento (slow-rise). O efeito dominante

6
Original em inglês.
33
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
seria o movimento moroso da água em contato com as construções e objetos. Estudos que
fazem ressalvas a esta abordagem mostram que a profundidade explica, somente em parte, os
danos, pois para cada altura de inundação, encontrar-se-ia também uma grande quantidade
danos que também se associam às outras características da cheia (Merz et al., 2004).

A velocidade não pode ser negligenciada; os danos tendem a aumentar à medida que as
velocidades crescem (Green, Parker & Tunstall, 2000). Inundações rápidas (flash floods) e
inundações causadas por ruptura de barragens são capazes de gerar escoamentos com
velocidade suficiente para arrastar edifícios e estruturas de construção reforçada. Edificações
em alvenaria e madeira provavelmente apresentarão falhas quando a velocidade da inundação
ultrapassar 2 m/s (Tabela 4.1).

A interação entre velocidade e profundidade acentua a força de colisão e é determinante na


probabilidade de um colapso estrutural. Devido à presença de obstruções, estreitamentos e
curvas para o fluxo de água na área urbana, efeitos localizados da velocidade criam
turbulência e ondas, as quais aumentam a pressão hidrostática sobre as edificações.
Inundações rápidas freqüentemente levam entulhos, estruturas danificadas, veículos e árvores
atingidas, intensificando o impacto. Vários estudos utilizam a velocidade multiplicada pela
profundidade, o chamado fator velocidade, para definição de parâmetros de ameaça.

Green, Parker & Tunstall (2000) mostram alguns critérios de análise da ameaça apresentados
por Penning-Rowsell et al. (1992), os quais, por sua vez, referem-se ao estudo de Clausen
(1989), que relacionam as características das inundações ao possível impacto sobre a
edificação (Tabela 4.1). O trabalho de Clausen (1989) é bastante referenciado em pesquisas na
área de recursos hídricos e baseia-se em dados empíricos, essencialmente os adquiridos a
partir da ruptura do Dale Dyke, ocorrida em Sheffield no dia 11 março 1864.

Tabela 4.1 - Possibilidade de falha estrutural em edificações de alvenaria, segundo as


características da inundação – Estudo de Clausen (1989)
Resultado Velocidade Profundidade x Velocidade
Danos sem afetar a estrutura da edificação < 2 m/s < 3 m2/s
Falha parcial > 2m/s > 3m2/s e < 7m2/s
Colapso estrutural > 2m/s > 7m2/s
Fonte: Penning-Rowsell et al. (1992) tendo como referencia Clausen (1989) apud Green, Parker &
Tunstall, 2000: 33.

Trabalho da Helsinki University of Techology (RESCDAM..., 2000), baseado na análise de


pesquisas que discutem as condições do escoamento que levariam a danos estruturais em

34
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residências (inclusive o de Clausen, 1989, mencionado acima), recomenda os parâmetros para
identificação da possibilidade de danos estruturais mostrados na Tabela 4.2.

Tabela 4.2 – Parâmetros do escoamento com possível influência na ocorrência de danos


estruturais em casas acabadas, segundo recomendação do RESCDAM ... (2000)
Tipo de casa Danos parciais Danos totais
Sem fundação vy ≥ 2m2/s vy ≥ 3m2/s
Madeira
Com fundação vy ≥ 3m2/s vy ≥ 7m2/s
Alvenaria, concreto e tijolo v ≥ 2m/s & vy ≥ 3m2/s v ≥ 2m/s & vy ≥ 7m2/s
Fonte: RESCDAM…, 2000: 18. Tradução da autora.

A velocidade e profundidade da inundação também são utilizadas para definir o nível de


ameaça a que uma pessoa está exposta. Por exemplo, um adulto médio começaria a perder
estabilidade quando a profundidade e a vazão superam 0,91 m e 0,61 m3/s, respectivamente
(FEDERAL EMERGENCY MANAGEMENT AGENCY - FEMA, 1979).

Sobre este tema há outro estudo do RESCDAM... (2000) que mostra experiências com o uso
de modelos físicos em análise de ruptura de barragens. Para exame da estabilidade de pessoas
submetidas a diferentes características de escoamento, foram utilizados sete objetos humanos,
cujo produto “massa x altura” (m x kg) variou de 77 até 195mkg. A partir daí, criaram-se
funções que relacionam profundidade, velocidade do escoamento, massa e altura do
indivíduo. As funções foram definidas para três cenários determinados segundo as condições
do escoamento e da pessoa atingida: normal, bom (e.g.: boa visibilidade do escoamento,
ausência de entulhos, indivíduos em boas condições de saúde) e ruim (e.g.: presença de
obstáculos, sujeira, pessoa idosa) (Tabela 4.3).

Tabela 4.3 – Recomendação para estabilidade humana em presença de escoamento,


segundo RESCDAM ... (2000)
Condições do escoamento e do indivíduo Funções1, 2
Boas condições vy = 0,006 hm + 0,3
Condições normais vy = 0, 004 hm +0,2
Más condições vy = 0,002 hm + 0,1
Fonte: RESCDAM... (2000) e Abt et al. (1989) apud RESCDAM .... (2000). Elaborado e traduzido pela
autora.
Nota: 1) A primeira e a última função estão presentes no estudo de RESCDAM... (2000) e a segunda, no estudo
de Abt et al. (1989) apud RESCDAM .... (2000). 2) h = altura; m = massa; v=velocidade e y = profundidade.

Em Prevene (2001) apud Courtel et al. (2006) a ameaça de afogamento é considerada em três
níveis e com critérios mais simplificados, pois apenas a velocidade e a profundidade do
escoamento são consideradas na análise (Tabela 4.4).

35
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 4.4 - Ameaça de afogamento, segundo Prevene (2001)
Ameaça Profundidade (y) e Velocidade (v)
Alta y > 1,5 m ou v > 1,5 m/s
Média 0,5 m < y < 1,5 m ou 0,5 m/s < v < 1,5 m/s
Baixa 0,1 m < y < 0,5 m e 0,1 m/s < v < 0,5 m/s
Fonte: Prevene, 2001 apud Courtel et al., 2006.

Segundo Jonkman et al. (2008), o número de fatalidades causado por um evento de inundação
é fortemente influenciado pelas características da ameaça (e.g.: profundidade, velocidade e
taxa da ascensão do nível d`água), pela existência de alerta, rotas de evacuação e abrigo e pela
ocorrência de colapso estrutural de edificações, pois este, ao mesmo tempo que significa a
perda de uma proteção contra a inundação, implica em um escoamento com maior carga de
entulhos, uma ameaça adicional às pessoas.

Acredita-se que as taxas de mortalidade são mais elevadas em quatro locais ou situações: em
locais próximos aos diques rompidos e às barragens; onde há elevada profundidade de água;
quando há uma taxa de ascensão acelerada no nível de água ou em áreas onde se verifica
elevado volume de edificações destruídas (Jonkman et al., 2008).

Jonkman et al. (2008) analisam a relação entre as características da inundação ocorrida em


New Orleans após o furacão Katrina e a mortalidade. Observam também se há similaridade
entre as conclusões de seu estudo e pesquisas anteriores feitas na Holanda, nas quais são
utilizadas séries históricas de eventos ocorridos no país (Jonkman, 2007 e Jonkman, Vrijling
& Vrouwenvelder, 2008). Os pesquisadores concluem que podem ser observados dois tipos
de relação entre mortalidade e características do escoamento na planície de inundação,
segundo a proximidade ou não da zona de diques. As funções de mortalidade são mostradas
na Tabela 4.5.

Tabela 4.5 – Funções de mortalidade definidas a partir de dados sobre a inundação de New
Orleans, segundo Jonkman et al., 2008
Profundidade (y)
Zona de inundação Mortalidade média (FD)
x Velocidade (v)
Zona próxima da ruptura do dique y x v > 5m2/s FD = 0,053
Zona mais distante da ruptura do dique y x v < 5m2/s FD(y)=ΦN[((ln(y)-5,20)/2,00]

Fonte: Jonkman et al. (2008).

Uma diferença destacada pelos autores entre os resultados de New Orleans e aqueles
referentes à Holanda relaciona-se à influência da taxa de ascensão da cheia na mortalidade: na

36
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primeira ela é considerada não relevante, ao contrário dos resultados obtidos para as
inundações holandesas.

Uma análise mais abrangente da escala potencial da ameaça de uma inundação, considerando
a profundidade e a velocidade, é mostrada na Figura 4.1. O índice de ameaça “1” é
considerado o de menor impacto, quando as pessoas podem lidar sozinhas com os feitos
adversos da cheia, mas os veículos não estão seguros. No valor extremo, “3”, há perigo para
as pessoas e risco de dano estrutural. Nota-se que os danos passam a atingir as propriedades
quando a profundidade ultrapassa 10 cm. Em altas profundidades de inundação (acima de 1
m, por exemplo), a velocidade tem menor relevância do que a altura em relação ao impacto; o
contrário ocorre em níveis mais baixos de profundidade, quando sua importância relativa é
maior. Para que ocorra um evento que coloque gravemente em risco as pessoas e afete as
estruturas das edificações, necessita-se uma velocidade mínima, ao contrário dos danos mais
“superficiais” à propriedade, como em pisos e revestimentos.

Figura 4.1 – Índice de ameaça


Fonte: Stephenson, 2002: 427.

Os parâmetros principais da Figura 4.1 são apresentados na Tabela 4.6:

Tabela 4.6 – Os parâmetros de ameaça, segundo Stephenson (2002)


Profundidade (y) e
Ameaça
Velocidade (v)
Baixa: apenas veículos em ameaça y < 0,1m
Baixa: pessoas são afetadas, mas a auto ajuda é possível y < 0,2m e v < 1m/s
Média: danos à propriedade y x v < 0,5m2/s, mas y > 0,1m
Alta: perigo às pessoas, especialmente crianças 0,5 m2/s < y x v < 1 m2/s
Muito alta: perigo de dano estrutural e erosão y x v > 1 m2/s
Fonte: Elaboração própria com informações contidas em Stephenson, 2002: 427.
37
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Observe que os indicadores propostos por Stephenson (2002) mostram a presença de dano
estrutural com um fator velocidade de 1m2/s, parâmetro bem inferior ao apresentado nos
estudos Clausen (1989) apud Green, Parker & Tunstall (2000) (Tabela 4.1).

Stephenson (2002) apresenta um segundo digrama que incorpora, além da velocidade e da


profundidade, a probabilidade de ocorrência do evento e cria um índice de risco da ameaça
(Figura 4.2):

Índice de risco hidrológico (IH)

3 2 1 0

2
Velocidade do Índice de risco da ameaça (IR) = IA x IH
escoamento x
profundidade 6 3 0 3
(m2/s) Índice de
1
ameaça
4 2 0 2 (IA)
1
IR ≤ 2: aceitável
2 1 0 1
0
1 10 100 1000
Tempo de retorno, em anos

Figura 4.2 - Índice de risco da ameaça, segundo o fator de velocidade e o tempo de


retorno
Fonte: Stephenson, 2002: 428.

O índice de risco da ameaça (IR) é obtido multiplicando-se o índice de ameaça (IA) pelo
índice de risco hidrológico (IH). O que o autor nomeia como risco hidrológico é o tempo de
retorno (Tr) do evento: de 1 a 10 anos, índice 2; de 10 a 100 anos, índice 1 e de 100 a 1.000
anos, índice 0. A Figura 4.2 mostra que um índice de risco de ameaça menor ou igual a “2” é
aceitável, o que ocorre em três situações: eventos raros (Tr > 100 anos); quando a ameaça
(velocidade x profundidade) é menor do que “0,5” e o Tr está entre 1 e 10 anos; ou quando a
ameaça é menor do que “1” e o Tr do evento varia entre 10 e 100 anos.

Apesar da ênfase dada à velocidade e profundidade nos estudos, a duração da inundação


interfere no valor dos danos diretos e, particularmente, nos indiretos (Parker, Green &
Thompson (1983: 46).

38
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Há pesquisadores que consideram duas escalas de duração (maior ou menor do que 12 horas)
como suficiente para distinguir a susceptibilidade dos bens ao contato com a água, pois ela
variaria em uma escala discreta e não marginal (Penning-Rouwsell & Chatterton, 1977). Mas,
para determinar a magnitude dos danos indiretos, o numero de dias de inundação é relevante.

Quanto maior a duração, maiores serão as perturbações e paralisação na produção e vendas de


mercadorias durante e após o desastre, embora possivelmente esta relação não seja linear.
Quanto maior o número de dias sem atividades da firma, maior a probabilidade de que os seus
consumidores habituais desistam de postergar o consumo e escolham outros locais para a
aquisição do bem. Para os moradores, quanto maior a duração, maiores as perturbações e
dificuldades de deslocamento. Compromete-se o acesso ao consumo e ao trabalho.

Além da duração, da velocidade e da profundidade, outras variáveis interferem no impacto da


inundação. A carga e tamanho de sedimentos e entulhos, a força da onda ou vento, a
velocidade de crescimento do nível de água no início da inundação, a possível contaminação
da água por esgoto ou substâncias químicas são exemplos. Pode ocorrer proliferação de
doenças, contaminação da água potável e até incêndios pelo contato com material
combustível. A Tabela 4.7 esquematiza os fatores de ameaça decorrentes das características
da inundação:

Tabela 4.7 – Os fatores de ameaça

Profundidade
Duração
Sedimentos
Sal
Danos de Carga Química
Inundação Águas residuais
Entulhos
Profundidade +Velocidade
Velocidade Batida de entulhos
Rompimento de fundações
Fonte: Adaptado de Green, Parker & Tunstall, 2000: 28.

Quais fatores da Tabela 4.7 devem ser considerados no estudo de vulnerabilidade e de danos
depende de vários aspectos, desde a escala do evento e o objetivo do estudo, até as limitações
técnicas ou de dados. Em uma análise de prejuízo, o interesse em criarem-se funções que
apresentem uma rápida estimativa dos danos diretos dificulta a incorporação de muitos
atributos da inundação. Os ganhos em simplicidade e possibilidade de generalização seriam
perdidos. Em análises mais abrangentes de vulnerabilidade e risco, a magnitude da ameaça

39
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normalmente é medida pela velocidade, profundidade e freqüência. Kelman & Spence (2004),
em análise de vários estudos, concluem que a profundidade ainda é a variável mais recorrente
nas pesquisas sobre danos, mesmo se um número não desprezível de estudos incorpore outras
características hidráulicas, principalmente a velocidade.

US Army Corps of Engineers - USACE (1998) apud Kelman & Spence (2004), propõem uma
matriz delineando escalas consideradas importantes para determinação de cenários de análise
dos danos de inundação:

 Profundidade diferencial dentro e fora da edificação (Fdif): superficial (<0,9m), moderado


(0,9 a 1,8m) ou profundo (>1,8m);

 Velocidade (v): baixa (<0,9m/s), moderada (0,9 a 1,5m/s) ou rápida (>1,5m/s);

 Inundações rápidas (flash floods): sim (menos que 1 hora) ou não;

 Gelo e carga de entulhos e destroços: sim ou não;

 Localização: costa ou fluvial;

 Tipo de solo: permeável e impermeável.

Em suma, esta seção mostra que os resultados apresentados pelas pesquisas sobre a definição
de parâmetros de ameaça apresentam relativa variação. Uma das possíveis razões para esta
divergência é que muitos critérios baseiam-se em análises empíricas, nas quais as
especificidades locais podem ser importantes. Neste sentido, os experimentos feitos por
RESCDAM... (2000), em ambiente controlado e considerando diferentes cenários de
escoamento e de condições físicas das pessoas atingidas, merecem atenção.

Observou-se que três enfoques principais dominam os estudos que tratam os parâmetros da
ameaça, nos quais a profundidade e a velocidade são as principais características do
escoamento utilizadas: o impacto da ameaça é discutido sobre os elementos expostos de uma
maneira geral (e.g: automóveis, pessoas e edificações), como em Stephenson (2002);
especificamente sobre as pessoas (e.g.: perda de estabilidade, possibilidade de afogamento,
ferimentos), a exemplo dos estudos de Prevene (2001) e Jonkman et al. (2008) ou sobre as
edificações (e.g.: possibilidade de dano estrutural), como em Clausen (1989) e RESCDAM ...
(2000).

40
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
4.2 Análise de Vulnerabilidade

Nesta sessão introduz-se especificamente o estudo de vulnerabilidade. As inundações


acarretam danos porque, em alguma medida, as comunidades atingidas são vulneráveis.

O conceito de vulnerabilidade começou a ser freqüentemente usado nas discussões sobre


desastres naturais no final dos anos oitenta a início dos anos noventa. Como atesta Green
(2004), embora eventualmente seja possível discutir vulnerabilidade satisfatoriamente sem
uma definição explícita ou compartilhada de seu conceito, se o objetivo é mensurá-la, torna-se
necessário defini-la em termos claros e segundo propósitos específicos.

Existem múltiplos conceitos para vulnerabilidade, mais especificamente, vulnerabilidade a


uma ameaça natural.

Para Chambers (1983) apud Delor & Hubert (2000) vulnerabilidade seria a exposição a
contingências e estresses somada à dificuldade em enfrentá-los. A vulnerabilidade teria dois
lados: um lado exterior, relacionado ao choque ou stress do qual o domicílio está sujeito, e um
lado interno, que representa a desproteção, a impotência, a falta de meios em lidar com o
evento sem a ocorrência de danos. Chardon (1999), simplificadamente, considera que
vulnerabilidade é a probabilidade de sofrer danos.

Alexander (2002) a define como a susceptibilidade de pessoas e objetos aos danos associados
a determinado nível de perigo. Por “perigo” considera-se uma ameaça, com dada
probabilidade de se manifestar em um local, em determinado momento, de uma maneira
particular e com certa magnitude. A ameaça é o “gatilho” que expõe a vulnerabilidade.

Conceito semelhante ao Chambers (1983) apud Delor & Hubert (2000) é adotado por Pelling
(2003). A vulnerabilidade denotaria uma situação de exposição ao risco aliada a inabilidade
em evitar ou absorver danos potenciais. O autor faz distinção entre vulnerabilidade física,
social e humana. A primeira refere-se à vulnerabilidade do ambiente construído, a segunda, à
vulnerabilidade experimentada por pessoas e seu sistema social, econômico e político. A
vulnerabilidade humana seria uma combinação das duas formas anteriores de vulnerabilidade.

De uma perspectiva de sistemas, a vulnerabilidade seria definida, segundo Green (2004),


como a relação entre determinado sistema e o seu ambiente, este variando ao longo do tempo.
As perturbações ambientais tornam-se relevantes no momento em que elas passam a inibir o
alcance dos objetivos pelo sistema.

41
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Wisner et al. (2004:11) denota como vulnerabilidade as características ou a situação de uma
pessoa ou grupo de pessoas que influenciam em sua capacidade de antecipar, lidar, resistir e
de se recuperar do impacto de uma ameaça natural. O desastre ocorreria como resultado do
impacto de uma ameaça natural sobre pessoas vulneráveis.

Há autores que afirmam que o desastre seria uma situação extrema já implícita na condição
quotidiana da população ou das pessoas. Os desastres trariam à superfície a pobreza que
caracteriza a vida de muitos habitantes (Hardy & Satterwaite, 1989 apud Delor & Hubert,
2000).

Delimitando mais precisamente o que se configuraria como desastre, Chardon (1999)


considera que o desastre estaria associado ao risco intolerável pela sociedade, aquele em que,
ante a ocorrência do evento, ela não é capaz de resistir ou absorver as conseqüências do
fenômeno natural, gerando uma situação de crise.

Bollin et al. (2003) segue a mesma linha conceitual, mas explicitando o componente
financeiro: desastre seria o impacto de um evento com conseqüências ou danos que excedem
a capacidade da comunidade afetada ou da sociedade em manejar a situação utilizando seus
próprios recursos.

O conceito de Bollin et al. (2003) pode ser apropriado, entretanto falta clareza na definição
precisa da dimensão temporal, afinal, a recuperação com os recursos próprios pode ser
possível, mas envolver um longo período até que se alcance o nível de bem-estar anterior à
ocorrência do evento. Este conceito, como todos os outros relacionados ao risco de desastres
utilizados por Bollin et al. (2003), tem como base as definições contidas nos documentos
coordenados pela International Strategy for Disaster Reduction - ISDR, que discutem uma
Estratégia Internacional para a Redução de Desastres (EIRD) (ISDR, 2002 apud Bollin et al.,
2003).

Torna-se relevante destacar o estudo Green (2004), que expõe uma série de conceitos
encontrados na literatura sobre vulnerabilidade. Nesses, o objeto “vulnerável” pode se
relacionar a um sistema qualquer que responde adversamente a eventos perigosos (Yamada et
al., 1995 apud Green, 2004); a propriedades materiais e layout de objetos suscetíveis à
determinada ameaça natural (Clark et al., 1998 apud Green, 2004); a grupos de indivíduos
que possuem características que o posicionam na sociedade como menos ou mais vulneráveis
(Cannon, 1993 apud Green, 2004); a uma região ou população que possui fatores que

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Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
influenciam sua exposição ao risco natural e a predispõem às conseqüências adversas
(Downing, 1993 apud Green, 2004); a um elemento propenso a danos em decorrência de
“fragilidade” social, econômica, cultural e política (Alcantara-Ayala, 2002 apud Green, 2004)
ou a um sistema social ou ecológico e sua propensão a sofrer danos decorrentes de stress e
choques externos (International Council for Science, 2002 apud Green, 2004).

Os autores citados por Green (2004) relacionam a vulnerabilidade a diferentes aspectos do


“objeto” vulnerável como, por exemplo: seus atributos; a extensão do impacto sobre ele; suas
características; sua habilidade em lidar com a situação; uma medida dos seus atributos; sua
propensão em sofrer perdas, estresse e choques externos; sua susceptibilidade e seu grau de
incapacidade ante a ameaça.

Como consenso entre os pesquisadores tem-se que a vulnerabilidade está associada a um fator
específico de impacto potencial - que pode ser uma ameaça, um perigo, um choque ou um
estresse – que atua sobre um objeto, material ou social, em conseqüência de uma ou mais
propriedades que ele possui. É sempre uma relação entre sujeito e objeto.

Em relação ao objeto de impacto, Green (2004) compartilha opinião de Wisner et al. (2004)
de que a vulnerabilidade é um processo que se refere a pessoas, jamais a objetos, pressuposto
que também é considerado neste trabalho.

Outro conceito estreitamente associado ao de vulnerabilidade, por isso a relevância em


explicitá-lo, é o de resiliência. Resiliência é um conceito originariamente encontrado na
física, referindo-se à capacidade de um material em voltar ao seu estado normal depois de ter
sofrido tensão. Quando ampliado para um sistema social, refere-se à capacidade deste sistema,
quando impactado, em retornar às condições anteriores à ocorrência do evento. O nível de
resiliência pode ser medido, então, pelo tempo até o retorno ao “ponto de equilíbrio” inicial
do sistema. Segundo terminologia de Pelling (2003), resiliência é a capacidade de se ajustar à
ameaça e de mitigar ou evitar danos. A resiliência seria encontrada, por exemplo, em edifícios
resistentes ao impacto das ameaças ou em sistemas sociais adaptativos.

Intuitivamente, associa-se vulnerabilidade às características de um sistema que o tornam


potencialmente mais susceptível aos efeitos adversos de uma ameaça, ou seja, seriam as
características que o tornariam mais fraco. A resiliência, ao contrário, relaciona-se aos
aspectos que o tornariam mais forte para suportar o choque. Portanto, a resiliência atuaria em
sentido contrário ao da vulnerabilidade. Mas, como ressalta King (2001), a resiliência, mesmo

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Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
que o inverso da vulnerabilidade, não é exatamente o seu oposto, pois o conjunto de fatores
presentes na comunidade que a fortalecem contra o risco natural e contribuem para a sua
recuperação não são necessariamente os mesmos que definem a vulnerabilidade.

Mesmo que esse sentido permaneça, na literatura os dois termos nem sempre são tratados de
forma separada. Alguns estudos tratam a resiliência como um componente da vulnerabilidade.
Cita-se pesquisa de Cross (2001), na qual a vulnerabilidade é considerada como o somatório
das condições que definem a exposição física e social, a resiliência ao desastre, o preparo ou
mitigação pré-evento e a resposta pós-evento. Estas condições atuariam negativamente ou
positivamente, cuja resultante seria o nível de vulnerabilidade. Segundo o autor, as grandes
cidades, por exemplo, tenderiam a ter maiores níveis de exposição social e de riqueza ao
evento do que as pequenas, mas teriam também, pelo maior poder econômico e volume de
recursos, maior resiliência.

Ressalta-se que a definição de vulnerabilidade de Cross (2001) assemelha-se à de Wisner et


al. (2004), citada parágrafos acima, na qual também pode se admitir a resiliência entre os
aspectos que comporiam o nível de vulnerabilidade; entretanto Cross (2001) considera
também a exposição como um elemento de vulnerabilidade.

Mas há autores que, ao contrário, separam nitidamente os dois conceitos. Em Pelling (2003),
eles são distintos e contrários: à vulnerabilidade se refere à inabilidade diante da ameaça,
enquanto a resiliência, à habilidade.

Smit & Wandel (2006) também individualizam os dois conceitos. Mas estes autores tratam
vulnerabilidade e resiliência para discutir, principalmente, outras duas manifestações sociais
inter-relacionadas, a de adaptação e capacidade adaptativa.

Segundo os autores, a adaptação refere-se ao processo, ação ou resultado sobre um sistema


(domicílio, comunidade, setor, etc.) que o torna mais adequado para lidar, controlar ou se
ajustar a uma mudança de condição, a qual pode ser uma tensão, ameaça, risco ou
oportunidade. Adaptações são manifestações da capacidade adaptativa e elas representam
caminhos de redução da vulnerabilidade. Smit & Wandel (2006) argumentam que capacidade
adaptativa apresenta um sentido similar ou bem próximo ao encontrado na literatura para
outros termos, como adaptabilidade, habilidade para lidar (do inglês, coping ability),
capacidade de gerenciar, flexibilidade, estabilidade, robustez e resiliência.

44
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Em sua pesquisa, Smit & Wandel (2006) lançam questões relevantes para se entender a
capacidade adaptativa de uma comunidade e, por conseguinte, sua resiliência e
vulnerabilidade. Ressaltam trabalhos que discutem a importância da experiência e do
conhecimento existentes entre os membros da comunidade para caracterizar a percepção, as
estratégias de adaptação e o processo de tomada de decisão local, fatores determinantes na
capacidade adaptativa e na resiliência.

Com a finalidade de se estudar como se estruturam as organizações comunitárias podem ser


utilizados métodos etnográficos (entrevistas semi-estruturadas, observação, grupos focais
etc.); entrevistas com lideranças locais, cientistas e planejadores; consulta à literatura e fontes
de dados secundários. Após a investigação, é possível estabelecer as condições de risco local,
como as pessoas reagem a ele e quais os fatores e processos que limitam suas escolhas ou o
nível de conhecimento sobre a situação.

Esta abordagem, que investiga as experiências de comunidades e a sua relação com a criação
de capacidade adaptativa local, insere-se na chamada abordagem botton-up (de baixo para
cima), que difere das abordagens mais tradicionais, top-down (de cima para baixo), cuja
ênfase são os sistemas político e socioeconômico em contexto mais amplo.

Os autores, entretanto, não negligenciam que a capacidade adaptativa de indivíduos e


domicílios seja moldada, limitada ou ampliada pelos processos social, político e econômico
existentes em macro escala (a exemplo das “causas de origem” existentes no modelo
desenvolvido por Wisner et al., 2004, que é mostrado na seção 4.3). Fundamentalmente,
existiriam fatores locais (e.g.: experiência, redes de parentesco e influencia política) e globais
(e.g.: existência de subsídios nacionais à reconstrução, fontes de financiamento oficiais e
planos nacionais de minimização de impactos de desastres naturais) que se interconectariam
na criação de capacidades adaptativas. Em outros termos, a capacidade adaptativa de um
domicílio frente a riscos naturais dependeria, em algum grau, das condições impostas pela
comunidade em que vive, e esta seria reativa aos recursos e processos existentes na região ou
país (Smit & Wandel, 2006).

Embora a adaptação seja um objetivo para as comunidades em risco, são elas que, por razões
locais (condições de insegurança) ou globais (causas de origem), normalmente, têm menor
capacidade adaptativa (Smit & Wandel, 2006).

45
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
4.3 Modelos de desastre: Pressão e Alívio e Acesso

Pesquisas recentes têm enfatizado a necessidade de se discutir a vulnerabilidade implícita na


vida diária das pessoas, o que significa dar especial atenção às condições reais e cotidianas de
vida dos indivíduos, a fim de discriminar as forças e fraquezas que definem sua
vulnerabilidade ante um evento adverso (Delor & Hubert, 2000).

Neste sentido, surgem modelos ou concepções que procuram compreender ou representar qual
seriam as atitudes comportamentais ou o estilo de vida que caracterizariam os indivíduos e os
grupos sociais. Segundo Delor & Hubert (2000), vários destes modelos baseiam-se na teoria
liberal de que a sociedade pode ser vista como um aglomerado de indivíduos em busca de
harmonia (no inglês, harmony-seeking agglomerates of individuals) que tentam otimizar seus
interesses de forma essencialmente racional ante as informações disponíveis e com o suporte
das instituições existentes. Uma discussão mais detalhada sobre o homem racional ou
econômico é apresentada na seção 6.3.1.

Mas a maneira harmoniosa, consensual ou de racionalidade econômica de entendimento da


sociedade tem sido questionada por outras abordagens. A reação individual ao risco e a opção
por um dado comportamento seria influenciada não apenas pela qualidade e quantidade de
informações, mas também, e de maneira fundamental, pelas relações sociais e estruturas de
dominação existentes na sociedade.

As relações sociais compreendem o fluxo de bens, dinheiro e excedentes entre diferentes


atores (e.g.: agentes imobiliários, produtores agrícolas, distribuidores e domicílios em suas
várias relações de produção e consumo). As estruturas de dominação referem-se às relações
políticas existentes entre as pessoas em diferentes níveis. Incluem as relações dentro do
domicílio, entre homem e mulher, crianças e adultos; as relações entre classes definidas
economicamente, como patrão e cliente, empregador e trabalhador, e entre membros de
diferentes grupos étnicos. Compreendem também a família em sentido mais amplo e as
reciprocidades e obrigações que envolvem os laços de parentesco e amizade. Estas relações
moldam e são moldadas pelos diretos existentes, obrigações, reciprocidades e expectativas
relacionadas à alocação de trabalho e recursos (Wisner et al, 2004).

As estruturas de dominação envolvem ainda, em nível macro, as relações entre cidadãos e


estado. Estas são multifárias e cruciais em momentos de choques e stress. Compreendem
questões de lei e ordem e de como estas são exercidas, padrões de governança e a capacidade
dos serviços civil e de polícia. O grau de competência administrativa no preparo do desastre,
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como também na assistência às vítimas e na reconstrução são fundamentais. Estruturas de
dominação podem recorrer a ideologias dominantes e compartilhadas por outros países,
crenças e visões do mundo para a sua legitimidade. Tais ideologias têm íntima relação com as
causas de origem da vulnerabilidade que serão discutidas nesta seção.

Destacam-se dois modelos de desastre propostos por Wisner et al. (2004): o modelo de
Pressão e Alívio ou modelo PAR (do inglês, Pressure and Release model) e o modelo de
Acesso (Acesses model).

O PAR mostra a “pressão” sobre as pessoas decorrente de duas forças: a vulnerabilidade de


um lado e a ameaça de outro (Figura 4.3). Aliviando-se a pressão, reduz-se a vulnerabilidade
e reduz-se o desastre. De acordo com o modelo, para a análise bem fundamentada do desastre
é necessário traçar as conexões que ligam o impacto da ameaça sobre as pessoas aos
processos e fatores sociais que geram a vulnerabilidade. Três processos principais se
conectariam para a formação da vulnerabilidade ao desastre: o mais distante é nomeado
“causas de origem” (root causes), as quais dão origem ao segundo processo, as “pressões
dinâmicas”, para chegar-se às “condições de insegurança” atuais.

Considera-se um processo (ou causa) como distante por pelo menos um dos três motivos:
espacialmente distante (e.g.: influência de um centro de poder econômico externo sobre a
economia nacional), temporalmente distante (causas históricas) ou distante por estar tão
profundamente instalado na cultura, ideologia, crenças e relações sociais da comunidade atual
que o torna quase invisível ou considerado como um fator “dado”.

Entre as “causas de origem”, têm-se os processos econômicos, políticos e demográficos, pois


esses afetam a alocação e distribuição de recursos entre as pessoas e grupos. Nestes processos,
a distribuição do aparato institucional - estatal, legal e de poder – é central. O efeito de
guerras passadas que se estendem durante um longo período também estão entre as causas
originárias da vulnerabilidade. Angola, Moçambique, Afeganistão e vários outros países ainda
sofrem as conseqüências de guerras ocorridas no passado. A escassez e fome presentes
aumentam à vulnerabilidade a eventos extremos, como as secas.

O segundo processo de conexão à vulnerabilidade atual é chamado por Wisner et al. (2004)
de “pressões dinâmicas” (dynamics pressures). São os processos e atividades que traduzem os
efeitos das causas de origem no tempo e espaço em “condições de insegurança” atuais da
comunidade. São mais contemporâneas e imediatas do que as causas primárias, referindo-se

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às manifestações conjunturais da estrutura política, econômica e social. Como exemplos, têm-
se as epidemias, a rápida urbanização, as guerras atuais, os programas de ajustamento
macroeconômico e as políticas públicas.

O terceiro fator, o mais próximo da cadeia de vulnerabilidade, refere-se às “condições de


insegurança” (unsafe conditions). Ela expressa a vulnerabilidade da população no momento
de contato com a ameaça. Nesta etapa é possível o mapeamento das famílias segundo
variáveis representativas da sua condição atual no acesso à renda e oportunidades e, em
sentido mais amplo, bem-estar (e.g.: renda, condições de moradia e trabalho e
marginalização). As condições de insegurança constituem a ponte entre o modelo PAR e o
modelo de acesso.

Cita-se o exemplo do grande crescimento do aglomerado metropolitano do município de Belo


Horizonte ocorrido durante a década de 1970. Não raro, os altos crescimentos populacionais
vieram antes das obras de urbanização e na ausência de uma supervisão efetiva do
parcelamento, ocupação e uso do solo por parte das municipalidades. Este descompasso entre
ocupação e urbanização atingiu níveis alarmantes especialmente no vetor norte, onde,
relacionado com a ausência ou fragilidade das leis urbanas, o preço baixo da terra levou à
proliferação de conjuntos habitacionais e loteamentos sem a mínima infra-estrutura urbana.
Estas “pressões dinâmicas” deram origem às atuais “condições de insegurança” no local
(Cançado, 2002).

Modelo
de
Acesso

D
E
S
Causas Condições A
Pressões Ameaça
de dinâmicas de
S
origem insegurança
T
R
E

Risco =
Ameaça x
Vulnerabilidade

Figura 4.3 - O modelo de pressão e alívio (PAR) e o modelo de acesso


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O modelo PAR mostra a “progressão da vulnerabilidade” ou uma “cadeia de causa-efeito”
que tem relevância como instrumento analítico. Ele hierarquiza os fatores que, juntos,
constituem a pré-condição para o desastre. Mas, segundo Wisner et al.(2004), o PAR possui
limitações ao não inter-relacionar adequadamente a geração da vulnerabilidade com a forma
como as ameaças afetam as pessoas, ou seja, ele torna-se um modelo estático.

No PAR há uma separação nítida entre a ameaça e o processo social, a fim de se enfatizar a
causa social do desastre. Mas a natureza, em suas diversas manifestações, é parte da estrutura
da sociedade, percebe-se isso de forma evidente no uso dos recursos naturais pelas atividades
econômicas. Ameaças naturais inter-relacionam-se com o sistema social, afetando o padrão de
riqueza e sustento das pessoas (e.g.: afetando a distribuição da terra e a propriedade após o
evento).

O modelo de acesso procura contornar esta limitação. Ele permite uma análise detalhada e
teórica das interações entre sociedade e meio ambiente no “ponto exato de pressão”, o ponto
onde e quando o desastre se revela. Por meio dele pretende-se aprofundar no entendimento da
vulnerabilidade, de como ela se manifesta durante e após um desastre gerando novas
condições de insegurança. Ele complementa o modelo PAR, unindo os dois lados da cadeia -
a ameaça e as condições de insegurança - em um detalhado modelo de processo (Figura 4.3).

Com o modelo de acesso busca-se explicar em um nível micro o estabelecimento e a trajetória


da vulnerabilidade e sua variação entre indivíduos e famílias. Para isso, ele discute a
vulnerabilidade em termos de acesso: acesso às oportunidades de aquisição de renda, aos
recursos e à qualificação. Estes padrões de acesso são definidos pelo perfil e nível de recursos
(pessoais e materiais) que o indivíduo possui, os quais representam o seu bem-estar. As
“qualificações” de acesso possibilitam maiores escolhas individuais. A partir das escolhas,
tem-se uma determinada renda, um orçamento, um padrão de vida e a possibilidade ou não de
investimentos em ativos e recursos que realimentam as qualificações de acesso. Obviamente,
os indivíduos possuem diferentes possibilidades de acesso e, por conseguinte,
vulnerabilidades distintas.

O PAR, pelo enfoque social e histórico detalhado, recebe maior atenção nas ciências sociais.
No domínio da Engenharia, é mais freqüente o uso do Modelo de Acesso nas análises de
vulnerabilidade. Sua formulação conceitual já foi mostrada em parágrafos anteriores. Nele
considera-se o risco pela interação entre ameaça e vulnerabilidade (Equação 4.1):

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Risco = Ameaça x Vulnerabilidade 4.1

O impacto pode ser mais ou menos severo segundo os diferentes grupos sociais e econômicos.
O nível de recursos e ativos tende a mudar profundamente com a ocorrência de um evento.
Algumas famílias podem ser obrigadas a vender suas terras e bens a fim de obterem meios
para a sobrevivência, o que possibilita, por conseqüência, que os “oportunistas” da inundação
os compram a baixo preço. Há razões para ocorrência de um aumento das vendas (ou preços)
dos bens associados à reconstrução e recuperação da área afetada e nos estabelecimentos
comerciais e de serviços situados em locais seguros. Negócios temporários usualmente são
criados durante o desastre como, por exemplo, a comercialização de água potável por meio de
barcos e a oferta de serviços de limpeza nos locais atingidos.

O conjunto de bens e ativos e as conexões econômicas das famílias com outros grupos podem
ser perdidos, aumentados, interrompidos ou reforçados. Em alguns domicílios haverá uma
queda significativa de bem-estar, outros sentirão o impacto de forma mais amena e há até
mesmo aqueles em que a inundação possibilitará ganhos (Figura 4.4).

Nível inicial de bem-estar

Desastre

Nível final de bem-estar

Figura 4.4 - Mudança do bem-estar com a ocorrência do desastre

4.3.1 Vulnerabilidade como um processo

As pessoas possuem um leque de decisões, como se deslocar para o trabalho ou consumir a


renda, que garante o seu sustento, sua subsistência (do inglês, livelihood) e seu bem-estar.

Normalmente, são decisões rotineiras, embora a vida urbana sempre traga alguma
irregularidade (e.g.: mudança de emprego, início de um novo negócio e falência de uma
atividade). A forma como cada família tem acesso ao seu sustento varia segundo o meio
político e econômico (representado, no esquema analítico de Wisner et al., 2004, pelas
relações sociais e estruturas de dominação).

A busca da sobrevivência é um processo interativo baseado em ciclos repetitivos de decisão.


O processo decisório pode ser analisado em diferentes escalas de tempo ou ciclos, desde

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segundos até anos, o que depende do tipo de impacto no comportamento que se deseja
analisar e de como ele vai afetar a vida cotidiana. A Figura 4.5 ilustra a idéia da rotina de
tomada de decisões no tempo.

Relações sociais Estrutura de dominação

Subsistência Proteção
das famílias social

t1
t2
t2
t3
t4

tn
Vida normal
Figura 4.5 - O ciclo de decisões nas famílias
Fonte: Baseado em Wisner et al., 2004: 88.

Tem-se, portanto, a normalidade cotidiana. A ocorrência da inundação representa uma


transição da normalidade para uma situação de choque. São adotadas novas atitudes, novas
decisões e comportamentos durante a transição e possivelmente após. Gera-se um provável
impacto no perfil de recursos e no volume de ativos das famílias e, por conseqüência, no
acesso às oportunidades de renda e bens. A magnitude das mudanças depende, entre outros
fatores, do bem-estar inicial do agente, ou seja, do seu perfil de acesso anterior à inundação.
Ao que parece, grupos vulneráveis tendem a ficar ainda mais vulneráveis após o evento.

Observe na Figura 4.5 que, exterior ao retângulo de tomada de decisões da família, existe a
“proteção social”, que representa a presença de uma possível ação coletiva e estatal. Ele
mostra que decisões em esferas mais amplas trazem impacto no comportamento das famílias
com a ocorrência do desastre. Há uma ampla gama de recursos que possibilita maior proteção
(e.g.: presença de diques, regulação do uso e ocupação do solo e redes de solidariedade
desenvolvidas pela comunidade).

São estes processos que o modelo de acesso pretende analisar na normalidade, choque,
transição e adaptação.

51
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4.4 A dimensão espacial da vulnerabilidade

A dimensão espacial é um aspecto central na caracterização da vulnerabilidade: uma família,


por exemplo, pode ser vulnerável, embora sua comunidade ou mesmo o país como um todo
não o seja. Há vários trabalhos que procuram destacar as particularidades da vulnerabilidade e
resiliência considerando a dimensão espacial.

Cross (2001) discute as diferenças de vulnerabilidade entre megacities e pequenas cidades, e


lança questões sobre as especificidades que envolvem as comunidades rurais, urbanas, países
desenvolvidos, em desenvolvimento e as favelas nas grandes áreas urbanas. A questão sobre a
exposição ao risco de magacities, complexos espaços econômicos e sociais, está presente em
vários estudos, como de Kakhandiki & Shah (1998). Também pesquisam as grandes cidades,
mas com ênfase sobre a sua população marginal e desabrigada, Uitto (1998) e Mitchell
(1998). As especificidades que envolvem a vulnerabilidade das grandes e médias cidades na
América Latina, normalmente vítimas de um crescimento urbano acelerado, desordenado e
sem o acompanhamento da infra-estrutura necessária, são apresentadas em Chardon (1999).
Jayaraman, Chandrasekhar & Rao (1997), enfatizando a vulnerabilidade a desastres dos países
em desenvolvimento, apresentam um conjunto de informações necessárias para a gestão do
risco de desastres, com destaque para o sensoriamento remoto. Davidson (1997) compara a
vulnerabilidade a desastres ocasionados por terremotos entre dez grandes cidades no mundo.

A vulnerabilidade assume características bem próprias em regiões situadas em terras


especialmente baixas, como na Holanda, discussão presente em De Graaf (2008). Briguglio
(1995) e Adrianto & Matsuda (2002) destacam as desvantagens associadas à pequena
dimensão, insularidade, afastamento e a propensão para catástrofes naturais das pequenas
regiões e estados insulares. O risco de desastres naturais medido em esfera nacional está
presente em Hall et al. (2003). Os pesquisadores, em uma análise quantitativa do risco de
inundação em escala nacional, associada à avaliação dos mecanismos que causam sua
variação ao longo do tempo, definem cenários futuros de risco de inundação na Inglaterra e no
País de Gales entre os anos de 2030 e 2100. Em direção oposta, Smit & Wandel (2006), como
já referenciados no item 4.2, enfatizam as comunidades como espaço de análise em seu estudo
sobre adaptação e capacidade adaptativa.

No presente trabalho o interesse recai particularmente sobre a vulnerabilidade do espaço intra-


urbano, um complexo sistema de inter-relações. Esta complexidade, ao mesmo tempo em que
garante eficiência, rapidez e funcionalidade, pode também representar vulnerabilidade. O
potencial de desastre associado ao espaço urbano é ilustrado pelo trecho abaixo:
52
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Se não estivessem reunidas lá vinte mil casas de seis e sete andares e se os
habitantes desta grande cidade estivessem mais igualmente dispersos e
alojados de maneira menos concentrada, o estrago teria sido muito menor ou
talvez nulo (Theys, 1987 apud Vidal-Naquet, 1989: 15) (tradução da autora,
original em francês).

O texto é um extrato de uma carta escrita por Jean-Jacques Rousseau a Voltaire em 1756 e faz
referencia a um terremoto ocorrido em Lisboa. Ela exemplifica uma rara situação que
paralisaria completamente uma cidade.

Segundo Vidal-Naquet (1989), exemplos ao longo da história mostram as duas circunstâncias


que ocasionariam a paralisação de uma cidade: sua destruição, como pelo desastre natural em
Lisboa, ou uma situação de deserção de seus habitantes, ocasionada, por exemplo, pela fome
ou pestes.

E, com o passar dos anos, o espaço urbano cada vez se torna mais denso e complexo, uma
rede intricada que compreende uma infinidade de interconexões e interdependências entre
seus agentes. Se, pelo poder financeiro existente, a resiliência nos grandes centros urbanos
talvez seja maior do que nas pequenas comunidades, o impacto econômico também tende a
ser superior (Mitchell, 1998; Kakhandiki & Shah, 1998; Cross, 2001; Branscomb, 2006).

4.4.1 Vulnerabilidade da rede urbana

A economia urbana se configura como uma rede de atividades conectadas (os nós) por entre
os quais circulam bens, pessoas, informações, serviços e dinheiro. Para se manter em
funcionamento, cada atividade produtiva necessita de insumos (matérias-primas, trabalho,
energia elétrica etc.). Em contrapartida, ela fornece bens e serviços. Do processo de produção
e consumo, surgem também resíduos, poluição e lixo urbano. Os fluxos circulam pelas
conexões (ou links) da rede (e.g.: rede viária, rede elétrica, telecomunicações e rede de
saneamento). Os indivíduos e famílias também são nós nesta rede, e não apenas enquanto
consumidores: conexões sociais, como relações de parentesco, amizade, solidariedade e outras
interdependências se formam entre eles.

Neste sentido, um impacto natural, mesmo que atinja uma pequena área, pode levar a um
grande poder de destruição e de propagação dos danos As conseqüências econômicas e sociais
podem se estender a vários quilômetros além da área efetivamente inundada, exatamente pela
cidade se tratar de um sistema interligado.

53
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Segundo Parker, Green & Thompson (1987), três características principais determinam o grau
de vulnerabilidade de uma rede, ou seja, o grau em que ela é perturbada: a dependência, a
capacidade de transferência e a suscetibilidade (Equação 4.2)

V = f (D, T, S) 4.2

Onde:
V = vulnerabilidade urbana à perturbação por uma inundação;
D = dependência;
T = capacidade de transferência;
S = suscetibilidade.

A dependência se manifesta em uma análise da infra-estrutura, do produtor e do consumidor.


Representa a dependência da cidade ou região em relação a uma via; a dependência de uma
atividade em relação a um insumo ou a dependência do consumidor a um tipo de produto ou
serviço. Quanto maior a dependência em relação à área atingida pelas águas e os bens e
produtos que são ofertados lá, maiores as conseqüências do evento

A capacidade de transferência também é uma característica dos nós e conexões da rede. Em


uma rede, relaciona-se ao grau de redundância (número e capacidade das ligações
alternativas) e à capacidade ociosa que ela possui. Para o agente econômico, depende de sua
habilidade e possibilidade em adiar compras ou utilizar bens e fontes substitutas, sem que para
isto seja necessário incorrer em custos ou perda significativa de bem-estar. Nesta estratégia, a
quantidade estocada de bens é um fator relevante, desde que não seja afetada pela inundação.

Algumas considerações adicionais em relação à capacidade de transferência dos agentes,


embora anteriormente mencionadas no item 3.2.1, são destacadas aqui. Quando as atividades
e famílias são afetadas pela inundação - seja na área em que se situam, seja em outras áreas -
existem duas possíveis estratégias: o adiamento da demanda até as condições de normalidade
ou a transferência de demanda para outro local ou bem similar, supondo que a parte não
inundada da rede continuará funcionando razoavelmente bem. A primeira representa uma
transferência no tempo e a segunda, no espaço. Considerando a racionalidade econômica, os
atores irão escolher a estratégia que minimize suas perdas. Entretanto, existe um custo
associado às estratégias de adiamento e transferência. A fim de transferir a demanda para
outro local ou mercadoria, os consumidores provavelmente incorrerão em custos adicionais de
transporte, de tempo ou aceitarão uma mercadoria menos preferível à utilizada usualmente

54
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
(second best). O adiamento implica em postergar um consumo que se desejava imediato, o
que representa perda de bem-estar.

Que fatores afetam a capacidade de transferir ou adiar a demanda? O adiamento (e


adiantamento) ocorre se o produto é comprado posteriormente ou a compra é antecipada, o
que depende do comportamento e informação do agente, do tipo de atividade e do produto.
Em atividades que utilizam informação em tempo real, como mercado de capitais e
commodities, uma decisão adiada significa uma perda. A estocagem á mais simples para
alguns produtos (e.g.: bens finais) do que para outros (e.g.: energia elétrica). Tanto para os
insumos, quanto para produtos, o armazenamento não ocorre indefinidamente sem perda
financeira. A capacidade de armazenagem é limitada pelo espaço, número de bens e sua
deterioração (Parker, Green & Thompson, 1987).

Já a possibilidade de transferência associa-se ao tipo de bem e ao seu local de origem e


destino. Quando o bem ou a sua fonte é única, não é possível a transferência. Se há um grande
número de “concorrentes” ou de bens similares, a transferência e substituição são viáveis.

A susceptibilidade mostra em que extensão a área inundada irá afetar o restante da região, o
que envolve os dois aspectos tratados anteriormente (dependência e capacidade de
transferência). É um conceito de suscetibilidade diferente do empregado para danos diretos. O
relevante não é o valor da avaria, mas se o dano, talvez pequeno em custo, tem um impacto
significativo no funcionamento normal das atividades e da rede.

A suscetibilidade é equivalente a uma análise de “dependência física” (Parker, Green &


Thompson, 1987). Para um serviço de utilidade pública, por exemplo, é relevante determinar
qual a probabilidade de interrupção, sua duração e se a perda do serviço ficará restrita a área
inundada ou se atinge outras regiões.

Os três aspectos mostrados na Equação 4.2 vão ao encontro das três estratégias citadas por
Green (2004) para diminuir a vulnerabilidade de um determinado sistema, modificando-o:
torná-lo maior; aumentar a sua diversificação e reduzir a sua concentração.

Quando o sistema torna-se maior, reduz-se o possível impacto relativo da perturbação,


especificamente, da inundação. Os indivíduos adotam esta estratégia ao se agruparem em
domicílios, em comunidades locais e, mais amplamente, em sociedades. Segundo Green
(2004), ao nível nacional, um pequeno país exposto a ameaças tende a ser mais problemático
do que um grande país.
55
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
As duas outras estratégias - aumentar a diversificação e reduzir a concentração – implicariam
em diminuir a dependência, aumentar a capacidade de transferência e diminuir a
susceptibilidade (Equação 4.2). Estas estratégias são de difícil execução, pois seguem direção
contrária à tendência atual de especialização e concentração como forma de aumento de
produtividade com ganhos em escala e economias de escopo.7

Entre os textos que discutem a problemática do espaço intra-urbano, com seus agentes, nós e
redes está o de Mitchell (1998). Ele compila as informações de trabalhos desenvolvidos pelo
International Geographical Union’s Study Group sobre a vulnerabilidade humana aos
desastres naturais nas grandes cidades. O autor mostra que normalmente os modelos de
impacto de desastres possuem limitações rígidas em função da utilização de dados históricos e
de, implicitamente, basearem-se em pressupostos sobre continuidade e estabilidade dos
parâmetros do risco. Ele ressalta a importância de se obterem progressos nos modelos de
desenvolvimento urbano e destaca trabalhos que utilizam modelos matemáticos e redes
neurais inseridos na emergente “ciência da complexidade”. Estes modelos, ao serem
incorporados à análise de risco, introduziriam as prováveis mudanças socioeconômicas e
espaciais que ocorrem ao longo do tempo.

Uitto (1998) mostra a importância de um estudo sobre a geografia da vulnerabilidade urbana.


Em relação ao assunto, o autor propõe um procedimento de análise que enfatiza uma
abordagem bottom-up, com a participação e a criação de parceiras entre os vários agentes
envolvidos na problemática do risco. Entre eles, autoridades locais, agências, organizações
não governamentais, comunidades atingidas, etc. O objetivo seria desenvolver um modelo
replicável de vulnerabilidade nas megacities. De acordo com Uitto (1998), um estudo piloto
sobre a vulnerabilidade da população moradora de rua a ciclones e terremotos está sendo feito
em Tókio.

Ressaltando a importância de incorporar a variação temporal na análise de risco, Kakhandiki


& Shah (1998) propõem uma abordagem integrada de avaliação de risco urbano com foco na
mudança de risco e vulnerabilidade aos terremotos nas grandes cidades. As cidades são vistas
como complexos sistemas técnico-sociais, compreendendo subsistemas que possam ser
modelados econometricamente. Esta pesquisa é retomada na seção 6.4.

7
As economias de escopo ocorrem quando o custo total de uma firma para produzir conjuntamente, pelo menos
dois produtos/serviços, é menor do que o custo de duas ou mais firmas produzirem separadamente estes mesmos
produtos/serviços, a preços dados de insumos (conceito disponível no sítio da Secretaria de Acompanhamento
Econômico do Ministério da Fazenda na Internet).
56
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Em seu estudo, Chardon (1999) considera sistema urbano como sinônimo de sociedade, esta
compreendida em sentido amplo, no qual se incluem os habitantes, as estruturas onde eles
atuam e os diferentes tipos de redes que se estabelecem entre eles. O risco seria a combinação
de quatro fatores: a ameaça, a probabilidade - da ameaça, das conseqüências e dos fatores
circunstanciais - a complexidade (associada ao sistema) e os danos. O rico teria um aspecto
multidimensional, correspondendo a um sistema complexo. Os fatores da vulnerabilidade se
inter-relacionariam entre eles, individualmente e em conjunto, criando um sistema.

Chardon (1999) especifica em sua pesquisa a vulnerabilidade existente nos países da America
Latina, nos quais alguns aspectos a faria criar contornos próprios, como o rápido crescimento
urbano agravado pela exposição inadequada de abrigos; moradias pobremente construídas;
planejamento ineficaz; pouco policiamento sobre a lei de uso e ocupação do solo e a
impossibilidade destas cidades em prover a infra-estrutura adequada a todos os seus
habitantes. A corrupção, normalmente presente e disseminada, agravaria os aspectos
anteriores.

Estes estudos representam importantes subsídios para uma análise de rede intra-urbana.
Atomizando-se a análise, chega-se aos nós considerados centrais nesta pesquisa: os
domicílios.

4.4.2 Vulnerabilidade dos domicílios

Uma questão que limita o estudo da vulnerabilidade à inundação em uma escala mais ampla -
de um país, de uma cidade e mesmo de uma região da cidade -, é a suposição implícita de que
ao reduzir a vulnerabilidade na escala, reduz-se também, proporcionalmente, a
vulnerabilidade de seus habitantes, o que não ocorre na realidade.

Green (2004) é um dos pesquisadores relevantes que tem como foco de análise os domicílios.
Segundo Green (2004), a definição de vulnerabilidade envolve quatro elementos chaves: 1)
um sistema proposto; 2) os objetivos específicos deste sistema; 3) um ambiente dinâmico no
qual sua variação pode ajudar ou limitar o alcance dos objetivos do sistema; 4) uma variedade
de variáveis mediadoras entre o sistema e o ambiente, de estratégias adaptativas para o
sistema e de meios para modificar o ambiente.

Green (2004), baseando-se no modelo de subsistência sustentável de Ashley & Carney


(1999), apresenta um modelo de sistema. Nele, os domicílios possuem dois recursos básicos:
tempo e energia. O meio básico em que vivem é o meio ambiente, em diferentes graus
57
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
modificado pelo homem, mas que preserva suas fontes vitais, como energia solar e água. O
domicílio divide o tempo e a energia entre a própria manutenção, a contribuição de bens e
serviços para comunidade e a geração de renda. Escolhe entre a produção direta de um bem
ou a aquisição de renda para comprá-lo de terceiros. Algum recurso pode ser investido para
gerar multiplicadores, como educação e habilidades, resultando em um aumento da razão
entre entrada e saída de recursos (tempo, energia e dinheiro).

Uma perturbação no meio ambiente, como um desastre natural, traz efeitos sobre a qualidade
de vida das famílias: redução da energia disponível (e.g.: através de uma doença); diminuição
dos produtos fornecidos pelo meio ambiente (e.g.: comida, água); redução da renda familiar
pela perda de oportunidades ou pela diminuição da quantidade de energia e de tempo para
serem vendidas na forma de trabalho; decréscimo da taxa de retorno dos recursos; ocorrência
de danos diretos à construção e ao conteúdo da moradia e redução dos serviços oferecidos
pela comunidade, inclusive os médicos.

Ocorrendo uma inundação, tempo, energia e renda são redirecionadas para outras atividades,
como proteção, reparação e limpeza da residência. As distâncias para o trabalho ou para as
compras podem se tornar maiores de acordo com a área atingida pelo evento. Como o tempo é
finito, outras atividades são renunciadas, as de lazer são usualmente as primeiras. O poder
aquisitivo da renda familiar provavelmente cairá, custos adicionais de transporte, tempo, alta
de preços de mercadorias e gastos com reconstrução e assistência médica são prováveis
(Green, 2004).

O sistema apresentado por Green (2004) trata de maneira indiferenciada o domicílio urbano
ou rural, do que decorre a relativa ênfase dada à produção direta de bens ou ao impacto da
inundação sobre a produção agrícola. Propõe-se neste trabalho um modelo semelhante, mas
que apresenta domicílios fundamentalmente urbanos, com maior detalhamento de suas
funções, enfatizando sua existência enquanto consumidores e trabalhadores em uma rede
urbana (o modelo proposto, com suas hipóteses de trabalho, é mostrado na seção 8.1).

Quais as intervenções possíveis para reduzir a vulnerabilidade de determinado sistema? Green


(2004) destaca três: 1) tentar reduzir o desafio (do inglês, challenge), para diminuir a
magnitude da perturbação ou a sua natureza; 2) filtrar a perturbação antes que ela afete o
sistema; 3) reduzir o impacto sobre o sistema, reduzindo a natureza do próprio sistema.

58
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Estas três intervenções, em relação ao risco, corresponderiam a: 1) controle na fonte e
armazenamento (e.g.: bacias de detenção, áreas úmidas - no inglês, wetlands -, terras
inundáveis – no inglês, washlands -, barragens)8; 2) separação (e.g.: taludes) e 3) modificação
do sistema (e.g.: medidas waterproofing, lei de controle e uso do solo) 9.

Ante um ambiente em constante mudança, o sistema procura intencionalmente aumentar o


nível de realização de seus objetivos ao longo do tempo. Para isto busca também
simultaneamente minimizar a extensão e a duração dos desvios de trajetória na consecução
destes objetivos que possam ocorrer em conseqüência de perturbações ambientais. Esta busca
envolve trade-offs entre o nível médio de realização dos objetivos, a susceptibilidade do
sistema a choques, e a taxa em que ele se recupera desses choques (Green, 2004). Ao definir
sua estratégia comportamental, o sistema deve considerar todo o espectro de perturbações a
que ele se expõe e, em conseqüência, definir as perturbações centrais para as quais vai dirigir
prioritariamente sua atenção e recursos. A atitude ante a ocorrência da inundação insere-se em
um processo de tomada de decisões que não é isolado; o risco de uma cheia extrema pode, por
exemplo, ser considerado insignificante quando comparado ao de outras ameaças existentes.

As famílias, inseridas no ambiente, fazem parte de um meio econômico-social em constante


transformação. Entram componentes de previsão e incerteza. Elas são confrontadas com
vários eventos de risco, como secas, inundações, doenças, depressões econômicas, guerras e
desemprego. Logicamente recebem atenção os eventos com maior percepção de risco
probabilístico ou de maiores impactos. O risco de inundação tende a ser percebido como
comparativamente baixo em relação ao de uma doença ou ao do desemprego. A forma como
cada domicílio incorpora a probabilidade e o impacto em suas decisões de gasto depende de
características pessoais e culturais, do nível de informação e da capacidade de poupança, o
que é fundamental na sua vulnerabilidade ante a ameaça.

Uma diminuição do impacto à saúde poderia advir da adoção de medidas que diminuam a
sobrecarga de atividades que ocorre ante a iminência ou ocorrência de um desastre, ou seja,
seriam ações para reduzir a energia e o tempo dispensados na execução das tarefas.

8
Washlands são áreas na região inundável atingidas naturalmente ou de maneira deliberada pela inundação para
fins de gestão das cheias. As washlands podem ser wetlands ou as incluí-las, estas caracterizadas por reterem a
água em nível elevado, natural ou artificialmente, para benefício da flora e da fauna associada ao tipo de
ambiente (A NEW FLOODPLAIN..., 2003)
9
O termo, inglês, refere-se a medidas feitas na residência para evitar os danos da inundação. Entre elas: elevação
do primeiro andar da edificação, utilizando o nível inferior como área de estacionamento ou de acesso à
residência; construção de muros ao redor da residência; utilização de comportas para passagem de água e
selagem das paredes para impermeabilização.
59
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Um dos meios mais eficazes para redução da vulnerabilidade disponíveis aos domicílios passa
por um deslocamento da esfera individual para a coletiva: fazer amigos, criar relações de
parentesco ou, mais geralmente, formar uma comunidade ou uma sociedade. A criação de
redes sociais é cada vez mais considerada um atributo de capital social que aumenta as
oportunidades de acesso à informação, educação e renda (Brunie, 2009). De um lado, cria-se
uma rede de direitos e obrigações a que se pode recorrer no caso de um evento extremo e, por
outro, as economias de escala resultante de uma atuação comunitária permitem maior acesso a
recursos a fim de que uma gama mais ampla de adaptações possa ser adotada.

Os sistemas de alerta têm sido considerados um dos meios de se reduzir os danos decorrentes
da inundação. De uma perspectiva de redução de vulnerabilidade, ante o alerta, as pessoas em
risco adotariam algumas atitudes: colocar em local seguro os objetos necessários para uma
sobrevivência confortável (e.g.: água, rádio, cobertores, alimentos e medicamentos); salvar
itens insubstituíveis (e.g.: fotografias e papéis); recolher bens que ajudarão na recuperação
(e.g.: detalhes dos seguros, contatos telefônicos, artigos de limpeza e ferramentas) e mover
ativos de alto valor ou itens de baixo peso que possam ser deslocados sem risco de
ferimentos.

A Tabela 4.8 mostra um estudo que apresenta uma possível razão entre danos reais e danos
potenciais (ou danos máximos prováveis), considerando a existência de sistema de alerta e a
experiência anterior de inundação da comunidade (Read, Sturgess and Associates, 2000 apud
Handmer, Reed & Percovich, 2002).

Tabela 4.8 - Razão danos reais/danos potenciais


Comunidade com Comunidade sem Experiência
Tempo de Alerta
Experiência de Inundação de Inundação
Menos do que 2 horas 0,8 0,9
Redução linear de 0,8 em 2
2 a 12 horas 0,8
horas até 0,4 em 12 horas
Mais de 12 horas 0,4 0,7
Fonte: Read, Sturgess and Associates, 2000 apud Handmer, Reed & Percovich, 2002.

Observa-se na Tabela 4.8 como a experiência é considerada um fator relevante para eficiência
do sistema de alerta. Um tempo de alerta de mais de 12 horas pode implicar em uma
diminuição de 30% nos danos, caso a comunidade não tenha experimentado uma inundação
anterior. Se a experiência existe, esta redução é de 60%. Mas o essencial a ser apreendido da
Tabela 4.8 não é a razão dos danos, valor controverso e de difícil generalização, mas que o
sistema de alerta reduz o impacto socioeconômico - pois possibilita que os agentes consigam
60
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
proteger alguns bens e se preparar melhor para enfrentar a situação - e que a experiência o
torna mais eficiente.10

4.4.3 Vulnerabilidade dos moradores à ocorrência de danos diretos (ferimentos, doenças


e morte)

O menor nível possível de agente social é o indivíduo. Os domicílios são a unidade básica de
análise, pois se contitui em um micro-sistema onde grande parte das decisões são tomadas.
Mas o domicílio é formado por indivíduos e estes possuem características próprias, como
idade e condições físicas e mentais, o que torna necessária, em algum medida, sua análise
individual.

Nesta seção se dicute brevemente a vulnerabilidade das pessoas, mais especificamente, a


vulnerabilidade aos danos físicos, como ferimentos, afogamentos e doenças correlacionadas à
ocorrência do evento.

A vulnerabilidade de um indivíduo a ferimentos ou morte em um evento de inundação


depende de vários fatores: idade; histórico físico e mental; condições físicas e mentais atuais;
tipo de atividade desenvolvida no momento do evento; comportamento (e.g.: tentativa de
resgate de pessoas ou objetos no momento do evento, se adormecido ou não, etc.); tipo de
roupas usadas; habilidade para nadar; experiência; impedimento temporário (e.g.: uso de
álcool ou drogas); conhecimento da área; localização (e.g.: se o indivíduo estava a pé, de
bicicleta, em um veículo ou em um prédio); existência e eficiência do resgate (incluindo auto-
salvamento) e capacidades de resposta médica (Jonkman & Kelman, 2005). A questão do
gênero como fator de vulnerabilidade também é amplamente discutida na literatura, mas os
estudos são contraditórios em relação à sua significância estatística. Ao que parece, aspectos
ligados à cultura de cada país influenciam na sua relevância como elemento de
vulnerabilidade.

Embora existam todos estes fatores, normalmente a literatura enfatiza três: idade, gênero e
atividade. Uma referência é o trabalho de Jonkman & Kelman (2005) que apresenta uma
síntese dos resultados obtidos em vários estudos empíricos sobre a relação entre estes
atributos e a mortalidade.

10
Green (1995) contesta a idéia de que a experiência por si só possa ser considerada um fator significativo na
redução da vulnerabilidade. Afirma que, muitas vezes, as pessoas esperam que a inundação corrente seja igual à
experimentada no passado, o que pode levar à adoção de medidas inadequadas e inapropriadas. A experiência só
é válida quando se tem uma acurada expectativa do tipo de inundação a ser enfrentada, os seus sinais de alerta e
as melhores maneiras de minimizar suas conseqüências.
61
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Com foco, uma das pesquisas estatísticas mais amplas foi desenvolvida por Ashley & Ashley
(2008). Nela é utilizado como fonte de análise um banco de dados com 4.586 registros de
mortes devido a inundações ocorridas nos Estados Unidos nos últimos 47 anos. A Tabela 4.9
mostra os resultados obtidos pelos pesquisadores em relação à questão etária, a qual interessa
particularmente a esta pesquisa.

Tabela 4.9 – Distribuição do número de fatalidades decorrentes de inundação e da


população segundo grupos etários - Estados Unidos, 1959-2005
Diferença em pontos
Faixa etária % da população % de mortes
percentuais
> 9 anos 14,0 14,0 0,0
10 a 19 anos 14,8 19,0 4,2
20 a 29 anos 13,5 15,4 1,9
30 a 39 anos 15,3 12,2 -3,1
40 a 49 anos 15,1 11,0 -4,1
50 a 59 anos 11,1 9,2 -1,9
60 a 69 anos 7,1 9,6 2,4
> 70 anos 9,1 9,8 0,7
Total 100,0 100,0 0,0
Fonte: Elaboração própria com dados presentes em Ashley & Ashley (2008: 814).

A Tabela 4.9 mostra o percentual da população e de fatalidades por faixa etária. A última
coluna mostra a diferença, em pontos percentuais, entre as duas variáveis, em uma possível
indicação de vulnerabilidade etária à inundação. A Figura 4.6 apresenta graficamente esta
diferença.

5,0

4,0

3,0

2,0

1,0

0,0

-1,0 >9 10 a 19 20 a 29 30 a 39 40 a 49 50 a 59 60 a 69 > 70

Pont os perce ntuai s


-2,0

-3,0

-4,0

-5,0
faixa etária

Figura 4.6 – Diferença, em pontos percentuais, entre o número de fatalidades


decorrentes da inundação e o número de habitantes do país por faixa etária. Estados
Unidos, 1859-2005.
Fonte: Elaboração própria com dados presentes em Ashley & Ashley (2008: 814).

62
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
As informações apresentadas na Tabela 4.9 e na Figura 4.6 indicam que os grupos etários
mais vulneráveis em relação à mortalidade a inundações situam-se entre 10 e 29 anos e acima
de 60 anos. Ashley & Ashley (2008) corroboram estes resultados citando várias pesquisas que
mostraram o mesmo padrão na distribuição de fatalidades (Coates, 1999; French et al.; 1983 e
Mooney, 1983 apud Ashley & Ashley, 2008). Análise de Jonkman & Kelman (2005) também
vai de encontro a estas conclusões.

Algumas observações sobre estas informações devem ser feitas. Como mencionado, a
ocorrência de fatalidades está relacionada não apenas às características físicas dos indivíduos,
como a idade, mas, em grande parte, a fatores diversos e aleatórios, como o comportamento
do agente ou o local em que ele se encontrava no momento da cheia (Ashley & Ashley, 2008;
Jonkman & Kelman, 2005). Logo, não se pode assumir, segundo as informações de Ashley &
Ashley (2008), e sem um tratamento estatístico adequado, que a idade é um fator
determinante na vulnerabilidade

Em relação ao local ou à atividade executada pelo indivíduo no momento da fatalidade, o


estudo de Ashley & Ashley (2008) mostra que 63% das mortes com causas conhecidas
ocorrem dentro de veículos. Em seguida, têm-se as ocorrências no “exterior” (e.g. pessoas
sentadas em bancos ao lado de cursos d‟água) e na “água” (nesta categoria estão pessoas que
intencionalmente caminharam ou nadaram nas águas da inundação), as quais registram,
respectivamente, 14 e 9% das ocorrências (Tabela 4.10).

Tabela 4.10 – Distribuição da população e do número de fatalidades decorrentes da


inundação segundo local ou atividade desenvolvida no momento do evento
Estados Unidos, 1959-2005
Local ou atividade desenvolvida Percentual de número de mortes
Veículos 63%
Exterior 14%
Água 9%
Estrutura permanente (imóvel) 5%
Outros 9%
Fonte: Elaboração própria com dados presentes em Ashley & Ashley (2008: 814).

Destaca-se o fato que, entre as vítimas que caminhavam nas águas, 43% tinham como
objetivo alcançar algum destino, como o automóvel ou a residência, logo, grande parte destas
mortes poderia ter sido evitada, uma vez que não tinham como finalidade a fuga ou o resgate
de alguém.11 Este aspecto está associado ao comportamento de risco das pessoas, o qual se

11
Ressalta-se que na categoria “água” não estão incluídas as pessoas que acidentalmente caíram ou foram
levadas pelo escoamento, estas classificadas na categoria “exterior”.
63
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
observa freqüentemente durante as inundações, em atitudes como a busca de pertences na
residência ou a tentativa de atravessar com o veículo uma rua inundada (Reimer, 2002 apud
Jonkman & Kelman, 2005).

Portanto, a mortalidade como impacto direto da inundação pode estar mais relacionada ao
local onde os indivíduos se encontravam no momento do impacto e ao comportamento do que
à idade; o que explicaria o maior número de jovens como vítimas fatais.

Observou-se em vários estudos a limitação de discutirem de forma absoluta o número de


fatalidades segundo faixas de idade, sem relativizar a informação (por exemplo, pelo número
de pessoas do mesmo grupo etário existente no local do evento ou na população). E, sem o
trato estatístico necessário, o dado torna-se meramente quantitativo sem indicar a existência
de algum possível aspecto relacionado à vulnerabilidade etária.

Há estudos que ampliam o horizonte temporal de análise e procuram captar a ocorrência de


doenças e mortalidade após o evento. Estudo de Osaki & Minowa (2001) sobre a ocorrência
de mortes um ano após o episódio de um terremoto verificou que há associação significativa
entre a mortalidade e os danos estruturais sofridos pela habitação da vítima em decorrência do
terremoto. A explicação é de que os indivíduos cujas habitações foram mais destruídas são
aqueles com acesso mais precário ao sistema de saúde.

Nesta linha, os autores citam estudo desenvolvido na Armênia quatro anos após a ocorrência
de um terremoto. Nele se sugere que o aumento, em longo prazo, da morbidade da doença
cardíaca e doença crônica depois de um sismo está relacionada com a intensidade da
exposição da vítima aos danos diretos das edificações (Armenian et al., 1998 apud Osaki &
Minowa, 2001). Embora os efeitos do terremoto tenham particularidades, como a intensidade
da destruição física das edificações - as quais podem facilmente ser completamente destruídas
-, e o tipo mais usual de doença e de mortalidade associado ao evento, ele oferece indícios
para estudos em outros tipos de desastres naturais.

4.5 Metodologias para medir a vulnerabilidade à inundação


Um elemento crucial na discussão sobre vulnerabilidade refere-se à dificuldade em aplicar um
conceito muito geral - vulnerabilidade - a situações específicas e reais. Este é um dos motivos
pela qual a vulnerabilidade às inundações é freqüentemente identificada por apenas uma de
suas causas, seja uma determinada desvantagem, como a pobreza, certos estilos de vida,
formas de produção específicas ou qualquer outro fator que tornaria grupos humanos mais

64
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vulneráveis a desastres. Tal reducionismo esconde o fato de que mesmo quando as pessoas
sofrem as influências dos mesmos fatores, elas não os sentem da mesma maneira (Delor &
Hubert, 2000).

Percebe-se, atualmente, o surgimento crescente de metodologias para criação de índices de


risco à inundação, este composto por vários sub-indices, entre os quais, usualmente há um que
represente a vulnerabilidade, a qual é mensurada, por sua vez, por vários indicadores.

A criação de um índice de risco à inundação permite comparar rapidamente o risco de


inundação de diversas regiões. O índice mostra quais os fatores determinantes na magnitude
do risco (subindicadores e variáveis): a ameaça, os níveis de vulnerabilidade e a falta de
capacidade de resposta da população atingida. Por meio do índice tem-se também uma
referência de magnitude dos danos associados aos vários componentes da cidade, o que
auxilia a sua quantificação em termos monetários. Por estas possibilidades, o índice de risco
de inundação tem sido considerado instrumento relevante no planejamento e gestão urbana e
do risco, orientando na definição de políticas e áreas prioritárias de intervenção.

Entre as técnicas mais usuais para definição do índice e, em especial, para a ponderação dos
subindicadores, Cardona (2005) destaca: igual ponderação, modelos de regressão múltipla,
fronteira eficiente, análise fatorial, decisão multicritério e opinião de especialistas.

A técnica de regressão múltipla é usada para analisar a relação entre uma única variável
dependente (critério) e diferentes variáveis independentes (preditoras). Em um índice de
vulnerabilidade, a vulnerabilidade seria a variável a estimar a partir de outras já conhecidas,
como sexo, idade e renda. Esta técnica torna-se pouco viável na sua concepção, pois não
existem medidas de vulnerabilidade observadas (únicas e padronizadas) para várias
localidades que poderiam ser utilizadas na análise de correlação.

O método da fronteira eficiente pode ser mais bem compreendido em termos visuais. As
variáveis definidas (e.g: taxa de desemprego, faixa etária e nível de renda) são relacionadas,
para cada região, em um gráfico multidimensional. A fronteira eficiente é a envoltória das
melhores posições possíveis. O indicador de cada região é calculado segundo a distância da
origem em relação à curva envoltória, ou seja, segundo a sua eficiência relativa (igual a um,
na fronteira). A limitação é de que os pesos são calculados por meio da comparação entre as
regiões, ou seja, o peso depende da dispersão dos dados em relação às posições mais
eficientes (regiões mais “eficientes”). Como afirma Cardona (2005:79) sobre o método,

65
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
a definição do peso não está baseada em algum juízo de valor, mas sim nos
dados (…) este método é muito pouco generoso a respeito das suposições da
ponderação porque permite aos dados decidir sobre a questão do peso
(Cardona, 2005: 79). (tradução da autora) 12

A análise fatorial permite analisar a estrutura das inter-relações (correlações) entre um grande
número de variáveis definindo um conjunto de dimensões latentes comuns, os fatores (Hair et
al., 2005). Identificadas as dimensões é possível determinar o grau em que cada variável é
explicada pela respectiva dimensão. Supõe-se que a variância é uma medida eficiente para
traduzir a importância de uma variável no conjunto. Existem dois modelos básicos de análise
fatorial - a análise de fatores comuns e análise de componentes principais - que se diferem no
tipo de variância utilizado para formar os fatores (Hair et al., 2005). A análise fatorial é útil
como medida resumo de variáveis e comumente é usada juntamente com outras técnicas
multivariadas.

Com freqüência utiliza-se a análise fatorial associada à análise de agrupamentos (ou de


cluster) para criar índices (Kubrusly, 2001). Esta permite classificar objetos com base nas
similaridades que possuem criando um pequeno número de grupos mutuamente excludentes.
Foi empregada, por exemplo, para criar o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS)
pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), por meio do qual os setores
censitários paulistas são classificados segundo a sua vulnerabilidade socioeconômica.

O que torna complexa a criação de um índice de vulnerabilidade à inundação com a utilização


da analise fatorial é a existência de um fator externo, a ameaça. A base da análise fatorial para
ponderar é a correlação, o que não necessariamente indica uma relação causal entre os
subindicadores (os fatores) e o fenômeno. Ou seja, correlação e casualidade têm significados
distintos (Cardona, 2004, 2005).

Outra maneira de se definir indicadores é por meio de análises multicritério. Este tipo de
análise pode ser utilizado sempre que o decisor necessite fazer uma escolha em presença de
múltiplos critérios (Pomerol & Barba-Romero, 1993). Ela seria adequada como ferramenta
para a criação de um indicador de risco de inundação, pois nele estão presentes critérios
físicos, como profundidade e duração da inundação, e socioeconômicos, relacionados às
variáveis sociais e demográficas da população exposta.

Em uma situação onde existem entre várias alternativas ou possibilidades para consecução de
determinado fim, a análise múlticritério pode ser utilizada para selecionar qual a melhor

12
Original em espanhol.
66
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
alternativa, para definir as alternativas que parecem “boas” e descartar as que parecem
“ruins”, para gerar uma ordenação de alternativas ou mesmo para realizar uma descrição de
alternativas.

As análises multicritério pressupõem que não existe apenas um único ótimo em um problema
com vários critérios, mas um conjunto ótimo de soluções atendendo de formas diferentes aos
critérios envolvidos. “Este conjunto é chamado de conjunto Pareto ótimo, no qual, só é
possível a melhora em relação a um critério, com a piora em relação a outro” (Castro, 2002).
Os métodos multicritérios são divididos em três grandes grupos: métodos baseados na teoria
de utilidade-multiatributo; métodos seletivos e métodos interativos (Castro, 2007).

O primeiro grupo caracteriza-se, segundo Harada (1999) apud Castro (2007), pela agregação
de diferentes atributos dentro de uma única função. O processo de tomada de decisão baseia-
se, então, na otimização dessa função. Os principais métodos do grupo são os métodos dos
pesos; o método das restrições; o método AHP – Analytical Hierarchy Process; o método
multiobjetivo linear e a Programação de Compromisso.

O segundo grupo de técnicas, chamado métodos seletivos, tem como principal característica:

o estabelecimento de comparações entre alternativas, duas a duas, com a


construção de uma relação que acompanhará as preferências dos decisores.
(...). A partir dessa relação entre cada duas alternativas, é possível verificar
se há argumentos para decidir se uma é melhor do que outra (Castro, 2007:
112)

Entre os métodos desse grupo, destacam-se os métodos da família ELECTRE (ELimination Et


Choix Traduisant REalité) e PROMETHEE (Preference Ranking Organization METHod for
Enrichment Evaluations).

Já no terceiro grupo de métodos multiatributo estão aqueles interativos, nos quais o decisor
não tem estabelecido a priori o seu sistema de preferências. Ao longo do processo decisório, à
medida que o problema é mais bem compreendido, novas informações são incorporadas à
análise (Castro, 2007). Entre os métodos que apresentam a característica da interatividade,
tem-se o método do valor substituto de troca e o método dos passos.

Outra técnica amplamente difundida na criação de índices, especialmente na definição dos


pesos dos subindicadores, é a utilização de opiniões de especialistas. Segundo Cardona
(2005), o método é adequado para um máximo de doze subindicadores (ou variáveis), pois se
esses são em número elevado, pode significar uma tensão cognitiva excessiva para os
67
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
especialistas na definição das ponderações. Entres trabalhos que utilizam a opinião de
especialistas na definição dos pesos dos indicadores ou das dimensões tem-se o estudo de
Davidson (1997) que apresenta um índice de risco de desastre por terremoto.

Entre as técnicas para organização das opiniões de especialistas, destaca-se o Método Delphi.
O método permite o uso estruturado do conhecimento e da experiência, pressupondo que o
julgamento coletivo, quando organizado adequadamente, é mais eficiente do que a opinião de
apenas um indivíduo. Entre suas características principais está o anonimato dos participantes,
a dispersão geográfica, a representação estatística da distribuição dos resultados e o feedback
de respostas do grupo.

Conceitualmente o método Delphi é simples. Por meio de uma série de questionários


interativos enviados aos participantes (rounds) busca-se alcançar suas melhores repostas e
opiniões sobre determinado assunto e, quando possível, o consenso (Wright & Giovinazzo,
2000). Existem duas fases básicas no método – exploração e avaliação. Na primeira, o tema é
explorado com a obtenção de informações adicionais e novos pontos de vista. Na segunda,
avaliam-se e estruturam-se as opiniões dos especialistas, definindo discordâncias e consensos.
Se existe um nível significativo de diferença de opinião, é necessário descobrir e analisar as
razões para isto (Linstone & Turoff, 2002). Na área ambiental, o método Delphi vem sendo
bastante utilizado, principalmente na criação de indicadores de qualidade (Lopes, 2005).

Observe-se que a criação de índices compostos normalmente envolve um nível de


subjetividade, seja na definição das variáveis ou das ponderações. Ao lado das técnicas
estatísticas, entra o julgamento do pesquisador, sempre amparado em ampla base conceitual e
bibliográfica.

Alguns estudos apresentam subsídios relevantes para a criação dos índices de risco e
vulnerabilidade às inundações e na definição das variáveis propostas neste trabalho.
Destacam-se duas formulações sugeridas em trabalhos do IDEA/BID. A primeira é destacada
em Cardona (2004, 2005).

RT  R F  1  F  4.3
Onde:
RT = risco total de desastre;
RF = risco físico;
F = fator de agravamento ou impacto.

68
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Ao índice de risco físico ou direto – RF – associa-se um fator de impacto “F”. O risco direto é
formado pelas conseqüências potenciais do desastre sobre os elementos expostos fisicamente
ao evento. O fator de impacto caracteriza a fragilidade social e a falta de resiliência local;
representa a potencialidade de agravamento dos danos ou, similarmente, a ocorrência de
danos indiretos. O valor de F varia de 0 a 1 considerando que os efeitos indiretos são, no
máximo, 100% dos diretos. O rico físico e o fator de impacto são formados a partir de
indicadores os quais possuem um peso específico, definido segundo o Processo Analítico
Hierárquico. Através de funções de transformação, em sua maioria funções sigmodais, os
indicadores passaram a ter valores variando de 0 a 1. Estes valores, depois de multiplicados
pelo peso atribuído a cada indicador, foram agrupados e somados segundo o critério – risco
físico ou fator de agravamento. Definidos a magnitude dos dois critérios, pôde-se encontrar o
índice final de risco “RT”. O APÊNDICE II mostra os critérios e indicadores utilizados no
cálculo do índice.

Esta metodologia pode ser utilizada para qualquer unidade sub-nacional e mesmo intra-
urbana. Barbat & Carreño (2004) a utilizaram para avaliar os efeitos de uma ameaça sísmica
nas localidades menores de Bogotá, capital da Colômbia.13 Encontrou-se um índice de risco
total para cada localidade e também para o município como um todo. Este compreendeu um
índice de risco físico de 0,2246 e um fator de impacto de 0,663. Logo, tem-se, segundo a
Equação 4.4:

RT  0 ,2246  1  0 ,663  0,3735 4.4

Observe que o fator de agravamento representa 66,3% do risco físico, resultando em um risco
final de 0,3735. Um fator de agravamento máximo igual a 1 significaria um risco final igual a
duas vezes o valor do risco físico.

Um segundo índice interurbano destacado nas publicações do BID passível de adaptação para
a realidade brasileira é proposto em Bollin et al., 2003:

RT  ( wA  wE  wV )  wC 4.5
Onde:
RT = risco total;
A = ameaça;

13
Bogotá está dividida em localidades menores. Uma localidade é uma divisão política, administrativa e
territorial municipal com competências claras e critérios de financiamento e aplicação de recursos (Cardona,
2005).

69
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
E = exposição;
V = vulnerabilidade;
C =capacidades e medidas.

A ameaça (A) representa o perigo à que é submetida uma comunidade diante da possível
ocorrência de um fenômeno natural. A exposição (E) descreve a população, o valor das
estruturas e as atividades econômicas afetadas adversamente pelo desastre. Ela indica aos
tomadores de decisão o que está “em jogo” quando se presencia uma catástrofe, dado que
existem diferenças de uma ameaça sobre uma pequena comunidade ou sobre uma grande
cidade. A vulnerabilidade (V) lista os fatores que representam a susceptibilidade a uma
ameaça, agrupando-os em físico, econômico, social e ambiental. Nele, estão inseridos fatores
como taxa de crescimento populacional, assentamentos em área de risco, nível de pobreza,
base local de recursos e extensão da área degrada. O critério de capacidades e medidas (C)
mostra a prevenção, mitigação, preparação, resposta, reabilitação e recuperação da cidade
atingida. Ele é co-relacionado ao critério de vulnerabilidade, uma vez que um acréscimo no
segundo representa um decréscimo no primeiro e vice-versa. A Figura 4.7 apresenta o marco
conceitual utilizado por Bollin et al. (2003).

Risco de
desastre

Capacidade e
Ameaça Exposição Vulnerabilidade
medidas

Planejamento
Probabilidade Estruturas Física
físico

Capacidade
Severidade População Social
social

Capacidade
Economia Econômica
econômica

Ambiental Gestão

Figura 4.7 – Marco conceitual de um índice de risco de desastre utilizado em Bollin


et al. (2003)

Segundo a Figura 4.7, tem-se quatro critérios ou fatores que procuram representam o risco de
desastre. Estes são divididos em subcritérios, como probabilidade, severidade, estruturas, etc.
Cada um destes subcritérios é, por sua vez, definido a partir de indicadores. No APÊNDICE

70
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
III tem-se os critérios e indicadores que compõem o índice de risco proposto em Bollin et al.
(2003).

Para tornar comparáveis as diferentes medidas dos indicadores, os pesquisadores criaram uma
escala de 1 a 3 que representa a categoria baixo, médio ou alto do indicador. O valor zero
mostra que o indicador não é aplicável. Cada valor foi então multiplicado por um coeficiente
constante, sem unidade, cuja magnitude representa a importância do indicador em relação aos
outros. Esta etapa é necessária, pois se acredita que alguns indicadores são mais importantes
do que outros, contribuindo de maneira distinta na magnitude do critério. Como se considerou
que cada um dos quatro critérios contribui da mesma forma no índice final, o somatório destes
valores para cada critério é 33 pontos, de tal forma que ao serem multiplicados pelo valor do
indicador (1 a 3) obtenham-se critérios variando entre 0 e 100 pontos.14

Portanto Bollin et al. (2003) consideram uma relação linear entre os critérios, cada qual
contribuindo da mesma forma no índice global de risco: quando aumenta-se os valores dos
fatores associados à ameaça, exposição e vulnerabilidade, aumenta se ao risco; por outro lado,
quando aumenta-se o fator de capacidade e medidas, o risco diminui. A equação 4.5
representa esta relação.

Aplicando esta metodologia para definir o risco total associado à ocorrência de terremotos em
Villa Canales, na Guatemala os autores encontraram valores de 59, 52, 67 e 30 para os
critérios ameaça, exposição, vulnerabilidade e capacidades e medidas, respectivamente.
Considerando que cada peso “w” da equação 4.5 possui valor igual “0,33”, pois os critérios
possuem a mesma ponderação no índice, e substituindo-se os valores na Equação 4.6, tem-se:

RT  ( 0,33.59  0 ,33.52  0 ,33.67 )  0,33.30  48,84 4.6

Uma questão não discutida pelos autores é de qual deve ser a magnitude do risco aceitável.
Pode-se considerar 48,84 como um risco elevado? Esta resposta depende de uma variedade de
critérios, como ideológicos, políticos, técnicos e financeiros. De toda forma, o índice permite
comparar o nível de risco entre localidades, definindo aquelas de intervenção prioritária.
Observa-se também que em Villa Canales devem ser feitas intervenções que aumentem o
critério “capacidades e medidas” e que a vulnerabilidade possui um peso maior do que a
ameaça.

14
O estudo de Bollin et al. (2003) apresenta a ponderação criada para terremotos em Villa Canales, na
Guatemala.
71
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Destaca-se, ainda, o trabalho de Wei et al. (2004) por ser um exemplo de criação de
indicadores de vulnerabilidade com o uso do método da fronteira eficiente. O objetivo é a
criação de um índice, chamado índice de impacto de desastre, para cada região da China.

No estudo considera-se que o desastre tem dois inputs e dois outputs. Os dois inputs são a
densidade populacional, medida pela população, e a complexidade da estrutura comercial,
aferida pelo produto interno bruto. Considera-se que, quanto maiores estes dois fatores,
maiores os custos de curto e longo prazo decorrentes do evento. Os outputs são o número total
de pessoas afetadas pelo desastre e o custo total dos danos. O método envolve a criação de
unidades de análise, chamadas unidades de decisão (UD). Neste caso, as unidades de decisão
observadas são as regiões sub-nacionais da China. Estas são relacionadas com uma UD
hipotética criada. A UD virtual tem, pelos menos, a mesma magnitude no valor dos outputs do
que as UDs estudadas e utiliza, no máximo, o mesmo valor nos inputs. Resolve-se para cada
região, ou UD, por meio de um modelo de programação linear, um problema de maximização
da eficiência (que, no estudo, é igual ao índice de impacto do desastre) e a solução é o índice
em questão. Criou-se um índice anual de 1989 a 2000.

No contexto nacional, Marcelino, Nunes & Kobiyama (2006) apresentam um índice de


vulnerabilidade municipal com a proposta de mapeamento do risco de desastres naturais,
associado às instabilidades atmosféricas severas, para o Estado de Santa Catarina. Para a
obtenção do índice de risco foram calculados os índices de perigo, de vulnerabilidade e de
reposta para cada município catarinense. Segundo a metodologia dos pesquisadores, tem-se
(Equação 4.7):

R = [P * (DD + IP + PI)] / IDHM 4.7

Onde:
R = risco;
P = perigo;
DD = densidade demográfica;
IP = intensidade da pobreza;
PI = população idosa; e
IDHM = índice de desenvolvimento humano municipal.

O P é expresso pelo número de eventos ocorridos por ano; DD é a razão entre a população
residente total e a área do município (habitantes/km²); IP fornece o desvio entre a renda per
capita média dos pobres (R$ 75,50) e o valor da linha de pobreza e PI é o número de pessoas
72
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
com 65 anos ou mais. O IDHM é obtido pela média aritmética de três sub-índices, referentes
às dimensões Longevidade (IDH-Longevidade), Educação (IDH-Educação) e Renda (IDH-
Renda).

Um exemplo de indicador intra-urbano associado ao risco de inundação é mostrado por


Chardon (1999) que elaborou índices de risco de desastres naturais para a cidade de
Manizales, na Colômbia. Utilizou-se a análise de componentes principais para determinar os
fatores de risco mais relevantes. Por meio da matriz de Bertin, classificaram-se as zonas do
município segundo a influência de fatores socioeconômicos e naturais. A matriz de Bertin ou
fichário-imagem é um instrumento para tratamento gráfico dos dados. É uma matriz ordenável
na qual por meio de permutações de suas linhas ou colunas é possível visualizar as relações
que existem entre os elementos e, assim, criar grupos semelhantes. O nome deve-se a um de
seus criadores, o cartógrafo francês Jacques Bertin.

Inicialmente, o estudo de Chardon (1999) apresentava quinze fatores de risco, sete “naturais”
e oito socioeconômicos. Após a análise de componentes, este número foi reduzido para dez e,
com a ajuda da matriz de Bertin, foi dado um coeficiente para cada uma deles (variando de 1 a
8): experiências passadas de eventos (8); declividade (7); erosão (7); existência de favelas ou
áreas de urbanização precária (6); nível socioeconômico (6); densidade urbana (6);
deslizamento de terra (5); organização da comunidade (4); infra-estrutura para atenção e
prevenção de desastres, inclusive centros de saúde (2) e acessibilidade à rede viária (2). Os
fatores definidos para cada bairro foram então ponderados e classificados segundo o risco.

Tapsell et al. (2002) apresenta trabalho relevante com elaboração de indicadores intra-
urbanos. Nele é avaliada a vulnerabilidade social à inundação a partir de dois critérios:
qualitativo, via grupos focais, e quantitativo, por meio da criação de um índice. A utilização
dos grupos focais teve como objetivo captar a percepção da comunidade em relação ao risco,
com ênfase nos impactos sobre a saúde. Na abordagem quantitativa foi criado um índice de
vulnerabilidade social à inundação ou, no idioma original, Social Flood Vulnerability Index
(SFVI). Como fonte de dados, foram utilizadas informações censitárias, agregadas em setores,
da Inglaterra e do País de Gales, regiões onde é realizada a pesquisa. Definiram-se três
indicadores relacionados às características sociais e quatro de privação financeira (Tabela
4.11).

Segundo os autores, escolheu-se o “Indicador de Townsend” (Townsend et al., 1998 apud


Tapsell et al., 2002) para identificar a privação financeira por ele possuir como foco os

73
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
resultados da privação (e.g.: desemprego) e não a segmentação predefinida de grupos sociais,
como o fazem vários índices do mesmo tipo (Tabela 4.11).

Tabela 4.11 - Componentes do índice de vulnerabilidade social à inundação


(Tapsell et al., 2002)
Desempregados / População economicamente
Desemprego
ativa
Privação Domicílios com mais de uma pessoa por quarto
Densidade domiciliar
financeira / total de domicílios
“Indicador de Domicílios sem carro próprio / total de
Não existência de carro
Townsend” domicílios
Domicílios habitados por não proprietário /
Condição do domicílio
total de domicílios
Residentes com doenças crônicas que limitam /
Doença crônica
total de residentes
Características
Famílias monoparentais Pai ou mãe só / total de residentes
sociais
Residentes com mais de 75 anos / total de
Envelhecimento
residentes

Os percentuais brutos de cada indicador do SFVI foram transformados segundo o método que
produziu os menores coeficientes de curtose (kurtosis) a assimetria (skewness) dentro de suas
distribuições. Após a transformação, os dados foram padronizados em escores Z e então
somados, dando origem ao índice de vulnerabilidade social à inundação.15 Ressalta-se que os
indicadores de privação financeira foram antes somados e multiplicados por “0,25” a fim de
se evitar um viés no índice global em relação ao critério.

No Brasil cita-se trabalho de Cançado et al. (2007) que fizeram estudo criando um indicador
de risco à inundação para a cidade de Manhuaçu, no estado de Minas Gerais. O índice é
formado por duas dimensões: ameaça e vulnerabilidade social. A vulnerabilidade decorre da
combinação de dois subíndices: vulnerabilidade socioeconômica, que mostra as características
socioeconômicas médias da população em risco, e o índice de impacto, composto por fatores
que intensificam os efeitos adversos da inundação, como a existência de idosos e crianças no
local, a vulnerabilidade das construções e a taxa de pobreza. O índice de ameaça foi
caracterizado segundo classificação proposta em Prevene (2001) (Prevene, 2001 apud Courtel
et al., 2006) e o indicador da magnitude da vulnerabilidade por meio da análise de
componentes principais e análise de cluster.

As Equações 4.8 e 4.9 mostram a formulação do índice proposto em Cançado et al. (2007):

15
Processo no qual os dados originais são transformados em novas variáveis com uma média de 0 e um desvio-
padrão de 1 (Hair et al., 2005: 135).
74
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
RT =A x VT 4.8

VT = f unção (E, I) 4.9

Onde:
RT = Risco Total;
A = Índice de ameaça;
VT = Índice de vulnerabilidade total da comunidade à inundação;
E = Índice de vulnerabilidade socioeconômica; e
I = Índice de impacto.

As variáveis e indicadores relacionados à vulnerabilidade, são apresentadas na Tabela 4.12.

Tabela 4.12 - Descrição das variáveis de estudo


Indicador Medida
Renda mensal média dos Média da renda média nominal dos responsáveis pelo domicílio
responsáveis no setor no setor censitário.
% de responsáveis pelo domicílio no setor censitário que
Índice de pobreza
ganham até 350 reais ao mês.
Índice de escolaridade Média ponderada dos níveis de escolaridade dos responsáveis
relativa dos responsáveis pelos domicílios no setor censitário.
Taxa de analfabetismo % de população analfabeta no setor.
% da população com menos de 12 anos ou mais de 65 anos de
Vulnerabilidade etária
idade no setor.
Relação entre a população total e o número de domicílios
Densidade domiciliar
(pessoas/domicílio) no setor.
Razão entre os danos diretos potenciais médios do domicílio
Vulnerabilidade relativa
(construção e conteúdo) e a renda média do responsável no
das construções
setor.

Os índices foram definidos para cada setor censitário de Manhuaçu, os quais foram
apresentados em tabelas e, espacialmente, por meio de mapas.

Há ainda trabalho de Zonensein (2007) que cria um índice de risco de cheia (IRC). O índice
segue a formulação clássica: é composto por dois sub-índices, sendo um relativo às
propriedades da inundação e outro relativo às conseqüências da cheia. Cada um destes dois
sub-índices é calculado a partir do somatório ponderado dos indicadores. Na definição dos
pesos foi utilizada a metodologia de análise hierárquica.

As Equações 4.10, 4.11 e 4.12 apresentam a formulação do indicador proposta em Zonensein


(2007):

75
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
IRC = PI x C 4.10

Sendo que:

4.11

4.12

Onde:
IRC = Índice de Risco de Cheia variável (0 < IRC < 100);
PI = sub-índice relativo às propriedades da inundação (0 < PI < 100);
C = sub-índice relativo às conseqüências da cheia (0 < C < 100);
IPIi = i-ésimo indicador que compõe o sub-índice PI (0 < IPIi < 100);
ICj = j-ésimo indicador que compõe o sub-índice C (0 < ICj < 100);
n = número total de indicadores que compõem o sub-índice PI;
m = número total de indicadores que compõem o sub-índice C;

Os indicadores relativos às propriedades das inundações são três: cota, fator velocidade
(profundidade x velocidade) e fator de permanência (duração da inundação). Compõem o sub-
índice de conseqüências da cheia quatro indicadores: densidade de domicílios, renda, tráfego
e saneamento inadequado.

A metodologia de cálculo do indicador foi aplicada em pequenas subdivisões da bacia do rio


Joana na cidade do rio de Janeiro.

4.5.1 Procedimentos para padronização de variáveis

Na definição de índices, duas etapas críticas são a padronização de variáveis e definição de


pesos. Elas são mostradas com mais detalhes nesta seção e na seção 4.5.2.

Um número índice é uma razão usada para avaliar variações relativas a quantidades, preços ou
valores (Stevenson, 1981). Este procedimento é chamado de normalização ou padronização.
Ao se padronizar os indicadores, elimina-se o viés introduzindo pelas diferenças nas escalas, e
é possível comparar variáveis de natureza diferente ou comparar objetos no espaço ou no
tempo. Na Tabela 4.13 têm-se os principais procedimentos de padronização utilizados. Parte-
se de um vetor de variáveis brutas a = (a1, a2,..., an) a fim de obter o vetor padronizado v = (v1,
v2,..., vn).

76
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 4.13 – Os principais métodos de padronização de vetores de informação
Procedimento
1 2 3 4 51

Definições

Vetor
0 < vI ≤ 1 0 < vI ≤ 1 0 < vI < 1 0 < vI < 1 0 ≤ vI ≤ 1
Padronizado
Conservação da
Sim Não Sim Sim Não
proporcionalidade
Inézimo
Distância
% do % do total componente
Interpretação % do máximo ai em relação
máximo ai do vetor
à média
unitário
Fonte: Adaptado de Pomerol & Barba-Romero (1993: 69) e Hair et al. (2005)
Nota: 1. = média do vetor de variáveis; = desvio-padrão do vetor de variáveis.

Segundo Pomerol & Barba-Romero (1993), o procedimento 1 é o mais utilizado. Ele é


simples e respeita a proporcionalidade, ou seja: . Alguns estudos
recomendam a utilização do procedimento 2, pois ele evita que seja dada excessiva
importância aos valores extremos (Cardona, 2004). Além disso, as avaliações cobrem todo o
intervalo de zero a um: o pior critério recebe o valor zero, e o melhor, o valor um. Sua
desvantagem é a de não respeitar a proporcionalidade.

O terceiro procedimento é similar ao primeiro; ele é bastante utilizado na definição de pesos.


O quarto procedimento é citado apenas como informação suplementar. Ele é raro e de difícil
interpretação para o decisor, logo não é discutido aqui. O quinto critério também é usual,
especialmente em técnicas de análise multivariada de dados, como análise de agrupamentos e
análise fatorial (Hair et al., 2005). Ele representa a transformação de cada variável em escores
padrão (ou escores Z). Sua natureza é um pouco diferente dos demais, já que o valor zero
representa a média e não o menor valor.

Neste trabalho, utiliza-se comumente o termo padronização para o procedimento de


transformação das variáveis brutas em números índices, a fim de evitar qualquer referência à
“distribuição normal” que o termo “normalização” pode induzir.

4.5.2 Definição dos pesos

Outro aspecto fundamental na definição de indicadores é a escolha dos pesos. Considera-se


peso como a medida de importância relativa entre os critérios, a qual é definida segundo a
visão do decisor. Por diversas razões, ideológicas, empíricas ou teóricas, o decisor pode
considerar que um critério é mais ou menos importante do que os outros.
77
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Segundo Pomerol & Barba-Romero (1993), os pesos são definidos como ordinais quando a
sua importância refere-se à ordem que ocupam (e.g.: o maior, o segundo maior, etc.). Quando
é dado um valor numérico exato aos pesos segundo sua importância no critério, considera-se
que eles são de natureza cardinal. A escolha do peso ordinal ou cardinal depende dos
objetivos da análise.

Neste item são apresentados alguns procedimentos de definições dos pesos: o método da
entropia, o método da classificação simples, a avaliação cardinal simples, o método de
comparações sucessivas e o método dos valores próprios. A análise detalhada dos mesmos é
encontrada em Pomerol & Barba-Romero (1993).

4.5.2.1 O método da entropia


O método de entropia é uma proposta de determinação objetiva de pesos, sem intervenção do
decisor, em função dos valores aij contidos na matriz de decisão.16

A importância relativa de um critério j, medido pelo peso wj é diretamente função de


quantidade de informação trazida pelo critério em relação aos objetivos da análise. A
importância do critério j está relacionada à dispersão dos valores aj, ou seja, os critérios mais
importantes serão aqueles com maior poder de discriminação entre as ações.

4.5.2.2 Classificação simples


Este método e os dois apresentados a seguir, nos itens 4.5.2.3 e 4.5.2.4, são definidos como
métodos de avaliação discreta. Refere-se aos métodos onde o decisor assinala diretamente o
valor dos pesos. São os métodos mais antigos, largamente utilizados em diversos domínios
científicos.

A classificação refere-se ao ordenamento dos critérios. A única informação demandada ao


decisor é a de ordenar os critérios segundo sua ordem de preferência. Ao critério menos
importante se dá o valor 1, ao próximo o valor 2 e assim sucessivamente até obter-se o
número n (que corresponde ao número total de atributos). Ao se dividir cada valor pela soma
total dos valores, obtém o peso, que varia entre 0 a 1.

Algumas desvantagens do método é impedir que os pesos possam ter todos os valores
possíveis entre 0 e 1 e considerar uma ordenação eqüidistante entre os atributos.

16
Na matriz de decisão, cada linha “i” exprime as performances de cada alternativa relativamente aos atributos
considerados; e cada coluna “j” exprime as avaliações de todas as alternativas feitas pelo decisor relativamente
ao atributo “j”. No cruzamento entre uma linha e coluna tem-se o valor “aij” na matriz (Pomerol & Barba-
Romero, 1993).
78
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
4.5.2.3 Avaliação cardinal simples
Neste método, o decisor avalia cada critério segundo uma escala de medida predefinida (e.g.:
de zero a cinco, de zero a cem, etc.). Os valores são então normalizados por meio da divisão
pela soma dos mesmos.

Uma variação do método, conhecida como “avaliação direta por relações”, consiste em pedir
ao decisor para avaliar a importância relativa de cada critério em relação ao menos importante
entre eles.

Segundo Pomerol & Barba-Romero (1993), a combinação de avaliação direta de utilidades


cardinais e de estimação de pesos pelo método das relações e uma agregação por ponderação
simples estão entre as soluções mais simples de um problema de decisão multicritério.

4.5.2.4 O método de comparações sucessivas


Ele exige alguns esforços do decisor, mas traz resultados que eliminam incoerências obtidas
com o uso do método cardinal simples. Primeiramente, os critérios são avaliados segundo
uma escala cardinal. Pede-se depois ao decisor para comparar o primeiro critério com o
segundo, a seguir, com o segundo mais o terceiro e assim sucessivamente até que se tenha
uma mudança das preferências. Em seguida, faz-se a mesma coisa com os outros critérios.

Uma das inconveniências do método é a de que a informação demandada ao decisor não é


imediata. São necessários suportes computacionais associados à capacidade de análise dos
decisores.

4.5.2.5 Métodos dos valores próprios


Nesta família está o conjunto de métodos para avaliação de pesos baseados no cálculo do
vetor próprio de maior módulo de uma matriz de comparações binárias entre os critérios. O
trabalho mais conhecido neste domínio é o de Saati, proposto ao final dos anos 70 no âmbito
AHP (Analytic Hierarchy Process).

O AHP propõe avaliar um vetor de pesos w = (w1, w2, w3, ..., wn) ligado aos critérios de um
determinado problema de decisão multicritério. Cada critério (i) é comparado individualmente
a cada um dos outros critérios (j), o que produz os valores aij que são agrupados em uma
matriz quadrada de dimensão n chamada matriz de comparação binária A = (aij). A idéia de
introdução de comparações binárias baseia-se na suposição que é mais fácil ao decisor efetuá-
la do que apreender todo o conjunto de critérios, como é implicitamente necessário aos

79
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
métodos de avaliação direta. Considera-se que o cérebro não sabe tratar, à curto prazo na
memória, mais do que 7 itens, aproximadamente (Pomerol & Barba-Romero, 1993).

Saaty (1977), após diversos estudos, apresenta a escala considerada adequada para análise dos
critérios (Saaty, 1977) (Tabela 4.14).

Tabela 4.14 – Escala de definição de pesos para o método AHP segundo Saaty (1977)
Aij Quando o critério i é comparado ao critério j
1 Igualmente importante
3 Ligeiramente mais importante
5 Notavelmente mais importante
7 Muito mais importante
9 Indiscutivelmente mais importante
Fonte: Saaty, 1977.

Os valores intermediários 2, 4, 6 e 8 são utilizados se nuances de grau de importância são


necessárias. Se o valor i não é superior ou igual à j, avalia-se aji da mesma maneira
precedente, e após coloca-se aij = 1 / aji na matriz.

Entre as razões práticas para escolha desta escala de valores, tem-se:

 Um grande conjunto de possibilidades de análise que não ultrapassa a capacidade de


memória de curto prazo;

 Valores inteiros e a passagem de uma escala à outra por aumento de 1 ou 2 unidades;

 A equivalência entre i e j é caracterizada pelo valor 1.

O método AHP de determinação de pesos se resume em três etapas:

1. Pede-se ao decisor para preencher a matriz A de comparações binárias;

2. Acha-se o vetor próprio dominante w e o grau de consistência das respostas GC;

3. Se GC < 10% se aceita w, se não, demanda-se ao decisor rever suas comparações.

O termo hierarquia presente no nome do método refere-se à possibilidade de se estabelecer


uma hierarquia de critérios. Os pesos são atribuídos em cada hierarquia para finalmente ser
feita uma soma ponderada entre os diversos níveis.

Um dos pontos fortes do método é ele detectar e aceitar, dentro de certos limites, a
incoerência dos decisores humanos. Ele aceita a hierarquização de critérios, o que não é feito
pelos métodos que exigem comparação global de ações.
80
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Variantes recentes do método AHP são os métodos GEM (Graded Eigenvalue Method) de
Takeda et al. (1987) apud Pomerol & Barba-Romero (1993) e o método Graduelle, de Harker
(1987) apud Pomerol & Barba-Romero (1993), que não exigem um conjunto de “n (n-1) /2”
comparações de critérios, uma limitação do método AHP de Saaty, pois em muitas situações
reais o valor de n é elevado ou as situações são repetitivas o que inviabiliza as comparações
binárias.

Os cinco métodos mostrados nesta seção são os mais usuais de definição de pesos, existem
outros, como aqueles que se baseiam na taxa de substituição e na declaração da disposição a
pagar, mas eles não serão discutidos aqui.

81
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
5 FUNDAMENTOS CONCEITUAIS E TEÓRICOS PARA
AVALIAÇÃO DOS BENEFÍCIOS (OU DANOS EVITADOS)

5.1 O que é valor?


Ao estimar os danos de inundação, o primeiro conceito a esclarecer é o de valor. Afinal, não
apenas os valores dos danos físicos - mais facilmente observáveis e mensuráveis - são
incorporados na análise, mas uma classe de valores de quantificação difícil, relacionados a
danos indiretos ou intangíveis.

Condicionados pelo seu orçamento, dois agentes econômicos negociam entre si até que não
seja possível uma troca que implique em aumento da utilidade de um deles. O valor de um
bem é o máximo que o agente está disposto a dar para adquiri-lo ou, na perspectiva do outro
agente envolvido na transação, o mínimo que ele está disposto a aceitar como compensação
por desistir do bem. Em um contexto econômico, nada tem valor por si mesmo; a existência
do valor só é possível quando relacionado ao sistema econômico como um todo. Uma
definição usual e objetiva é que o valor de um bem para um indivíduo pode ser definido como
o seu preço de mercado mais o excedente do consumidor. Na ausência de um mercado para o
bem, há grandes dificuldades para se mensurar este preço e, mais ainda, o valor.

Podem ocorrer quatro tipos de valores associados aos bens e serviços (Lanna, 2001; Daun &
Clark, 2000): valor de uso; valor de opção de uso, valor de quase-opção de uso e valor de
existência. O primeiro refere-se aos benefícios adquiridos com o uso físico do bem. Todos os
artigos negociados no mercado privado possuem valor de uso para alguém. Nadar em um rio,
práticas de lazer em um parque e a Floresta Amazônica enquanto fonte de madeiras nobres
são exemplos de valores de uso associados aos bens ambientais.

O valor de uso não possui uma relação direta com o valor de troca. Um bem pode ser
essencial, mas não ser “vendável”, não ter ninguém disposto a pagar por ele, a trocar dinheiro
por ele. O ar, apesar de essencial para a sobrevivência humana, é oferecido sem custo.
Normalmente, o valor de troca está combinado a uma situação de escassez do bem e à sua
elasticidade-renda. A água, antes percebida como abundante e de livre acesso, sem valor
econômico, hoje é considerada bem escasso. Por isso, o atual debate sobre formas de avaliar o
seu valor de troca e precificá-la.

O valor de opção de uso relaciona-se ao uso potencial. Há certo desconhecimento do valor de


uso corrente do bem, mas se espera o seu conhecimento futuro e de que ele seja relevante. A

82
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percepção deste valor está presente nas estratégias de preservação ambiental: a Floresta
Amazônica, por sua diversidade ecológica, pode vir a ser uma grande fonte de medicamentos.

O preço de opção é o máximo que um indivíduo está disposto a pagar agora para assegurar a
provisão futura de um recurso, dada certa probabilidade de sua ocorrência. Em outras
palavras, é o pagamento máximo que tornará segura uma opção pelo uso futuro (Jakobsson &
Dragun, 1996).

O valor de quase-opção ocorre devido à incerteza no processo decisório e à possibilidade de


irreversibilidade dos atos. É o valor obtido pela oportunidade de esperar melhor informação
adiando uma decisão que poderia resultar em uma perda irreversível (Jakobsson & Dragun,
1996). A possibilidade de que uma decisão possa ser tomada à luz de eventos futuros é algo
que possui valor.

A diferença entre o valor de opção e o valor de quase-opção é de que o primeiro é o prêmio de


risco (risk premium) de uma situação incerta no presente e o segundo relaciona-se à
possibilidade de adiamento da tomada de decisão para diminuição do componente relacionado
ao risco (Jakobsson & Dragun, 1996). Pelas dificuldades práticas em analisá-los
separadamente, freqüentemente o valor de quase-opção e de opção são estudados de forma
indistinta.

Os valores de existência ocorrem pela própria existência do bem, independente de sua


utilização física atual ou futura. Ele decorre de uma posição moral, cultural, ética ou altruísta
sobre o direito de existência e sobrevivência (Motta, 1998). Tem-se o exemplo da preservação
de animais em extinção ou de um patrimônio histórico. Mesmo que o indivíduo nunca venha a
vê-los, ele pode conferir-lhes valor. Com características subjetivas e pessoais, é uma classe de
valores de quantificação extremamente difícil. É um valor que não se revela por
complementaridade ou substituição a um bem privado, o que dificulta sua mensuração de
forma indireta a partir de outros bens. 17

O valor econômico total de um bem é a soma dos quatro tipos de valores:

Valor econômico = valor de uso + valor de opção + valor de quase-opção + valor de


5.1
existência

17
Bens complementares são aqueles normalmente consumidos conjuntamente (e.g: café e açúcar). Sendo assim,
quando o preço de um deles aumenta, a demanda de ambos tende a cair. Bens substitutos são bens que podem ser
substituídos entre si, como o lápis e a caneta. Em termos econômicos, se a demanda de um bem x sobe quando o
preço do bem y aumenta, diz-se que o bem x é substituto do bem y.
83
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Os três primeiros valores da Equação 5.1 são considerados valores de uso; o valor de
existência é um valor de não-uso (ou valor passivo).

No caso de bens privados transacionados entre agentes econômicos, a determinação do valor


(de troca) não é muito problemática. Em função de suas necessidades, preferências e
capacidade de pagar, as pessoas decidem individualmente as quantidades consumidas de
determinado bem e serviço. Segundo a teoria microeconômica tradicional, cada consumidor,
ao resolver o quanto comprar dos vários bens e serviços, leva a um padrão geral de consumo
eficiente de Pareto, a um nível “ótimo” de consumo e oferta dos bens. A hipótese central desta
teoria é de que o consumo de um indivíduo não afeta a utilidade das outras pessoas, o que
pressupõe a inexistência de externalidade de consumo.18

Nos serviços com características de bem públicos, como as várias intervenções associadas ao
controle de inundação, a situação é diferente. O que caracteriza um bem público é a não
excludência e a não rivalidade (ou não subtractibilidade).19 Isto significa que não é possível
excluir um agente de seu consumo: quando oferecido o bem, todos podem ou vão
obrigatoriamente consumi-lo (não excludência). Além disso, a demanda de um usuário não
afeta a disponibilidade de outros (não rivalidade). Apesar de cada indivíduo avaliar os bens
públicos diferentemente, pois percebem valores de maneira diferente, suas utilidades estão
inexoravelmente ligadas, uma vez que todos são obrigados a dispor do mesmo nível de bem.
Como definir a provisão adequada do bem, levando-se em conta a multiplicidade de
preferências, de poder aquisitivo e, em última instância, da disposição a pagar? Neste caso, os
mecanismos de mercado dificilmente funcionam na definição de sua provisão eficiente. Nas
próximas seções buscar-se-á esta resposta, iniciando-se com as formas de se estimar os
benefícios de bens públicos ou ambientais.

5.2 O Benefício de um Bem Público e como Estimá-lo


Estritamente relacionado ao valor, está o benefício que o indivíduo recebe ou espera receber
pelo consumo de determinado bem ou serviço. O benefício de uma mudança ambiental é
medido comparando-se o valor do nível atual do bem ambiental com uma alternativa em que

18
Externalidades são efeitos econômicos colaterais de um processo de produção ou consumo que não são
considerados na formação de preço de mercado do produto (Lanna, 2001).
19
Os bens públicos podem variar de puros a impuros. Esta variação decorre da ênfase que é dada aos dois
aspectos da “impureza”: a presença de congestionamento/rivalidade no uso do bem ou a possibilidade de
excludência. Nos chamados bens “quase-públicos” ou “quase-privados” enfatiza-se o primeiro tipo de impureza,
e nos “bens de pedágio”, o segundo.
84
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
ele apresenta aumento ou melhora (Freeman III, 1993). Em outros termos, benefícios são os
ganhos associados à melhora ambiental.

Duas formas principais de métodos para medir benefícios podem ser destacadas: técnicas que
se baseiam em associações físicas e técnicas baseadas em associações comportamentais
(Mitchell & Carson, 1989).

Os métodos baseados em associações físicas são bastante utilizados na prática, embora


possuam pouca base teórica na economia do bem-estar. Baseiam-se na suposição de que há
algum tipo de relação técnica (uma relação biológica ou de engenharia, por exemplo) entre o
bem público em questão e o consumidor. Mitchell & Carson (1989: 74) citam o exemplo da
pesca de truta. Ao contrário de serem feitas inferências sobre as motivações comportamentais
do pescador de trutas ou de outros agentes econômicos, o foco seria as qualidades específicas
da água, como temperatura e composição químico-orgânica, que permitiriam a pesca do
peixe. Métodos de associações físicas são freqüentemente mostrados por meio de função de
danos ou, no caso de relações biológicas, em experimentos de dose-resposta.

Na análise de avaliação de danos, estes experimentos baseiam-se na relação física descrita


entre a causa e o efeito de um dano ambiental. “Funções de danos” ou "funções dose-
resposta" relacionam o nível da atividade impactante (como o nível de água ou o tipo e nível
de poluentes) à magnitude de dano físico ao ativo, natural ou realizado pelo homem, ou ao
impacto sobre a saúde (Nutti, 2000). O valor do benefício do bem público seria, então, os
danos evitados. Na estimativa das funções de danos, os valores utilizados são obtidos por
meio de preços de mercado, um atributo que tem encorajado seu uso pelos pesquisadores.

Os métodos de associação comportamental procuram valorar a mudança de uma amenidade


(e seus efeitos) por meio de uma análise do comportamento dos agentes econômicos. Duas
dimensões principais os envolvem: a forma como se revelam as preferências e o tipo de
associação comportamental.

Partindo do pressuposto de que preferências são reveladas por meio de um mercado, tem-se a
abordagem pela preferência revelada.20 Na Tabela 5.1, os métodos definidos como
“Observados” inserem-se nesta abordagem. A abordagem pela preferência declarada ocorre
quando os valores são estimados por consultas a indivíduos que, por meio de técnicas de
20
Observe que embora as curvas “danos x profundidade de inundação” tenham uma associação física, como
classificadas por Mitchell & Carson (1989), eles possuem também um aspecto comportamental, já que os danos
diretos à edificação decorrentes de uma inundação podem ser estimados por meio de orçamentos de reforma e
pesquisa de preço de bens, ou seja, via mercados, locais onde as preferências se revelam.
85
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
entrevistas ou pesquisa, são levados a declararem ou expressarem suas preferências. Utiliza-se
esta abordagem essencialmente para avaliar bens e serviços onde não há possibilidade de se
criar um mercado real. Pesquisadores que preferem a abordagem revelada à declarada tendem
afirmar que há maior confiabilidade no que as pessoas “fazem” do que no que elas “dizem
que vão fazer”. Nesta linha estão os métodos caracterizados como “Hipotéticos”.

A segundo dimensão envolve o tipo de associação comportamental entre os benefícios


medidos e as preferências: direta ou indireta. As associações diretas ocorrem quando é
possível ao agente econômico inferir diretamente sobre determinada mudança ambiental, via
entrevista, questionário, referendo ou mercado simulado. Contrariamente, em uma associação
indireta o agente não revela diretamente os valores monetários de um benefício, sendo
necessário algum tipo de modelo analítico para derivar as medidas de bem-estar dos
respondentes (Freeman III, 1993: 166).

A interação entre as duas dimensões - preferências e associação comportamental - origina


quatro tipologias: Observado/Direto, Observado/Indireto, Hipotético/Direto e
Hipotético/Indireto (Mitchell & Carson, 1989). Estas são mostradas na Tabela 5.1.

Tabela 5.1 - Alguns exemplos de métodos de valoração dos bens públicos baseados em
associações comportamentais21
Tipo de associação
Tipo de preferência Métodos de valoração
comportamental
- Referendo
Direta
- Mercados experimentais
(Observado/Direto)
Preferência Revelada - Mercados privados paralelos
(comportamento
observado por meio do - Produção de moradias
mercado real) - Preços hedônicos
Indireta
- Ação de burocratas e políticos
(Observado/Indireto)
- Modelos econômicos agregados
- Modelagem baseada em agentes
- Análise contingente
Direta
Preferência Declarada - Jogos alocativos com taxa de
(Hipotético / Direto)
(comportamento reembolso
inferido por meio de - Classificação contingente
Indireta
mercados hipotéticos) - Jogos alocativos
(Hipotético / Indireto)
- Técnica de valoração prioritária
Fonte: Adaptado de Mitchell & Carson, 1989: 75.
Nota: Os modelos econômicos agregados e a modelagem baseada em agentes foram acrescentados
pela autora.

21
Sobre outros métodos de valoração bens públicos e ambientais, ver Mitchell & Carson (1993) e Freeman III
(1993).
86
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Na tipologia Observado/Direto estão presentes metodologias em que as preferências são
reveladas em mercados reais e os benefícios medidos estão diretamente relacionados às
preferências pessoais. Esta é a situação ótima para valoração de bens e são raras para bens
públicos.

Um exemplo é a realização de um referendo pela administração pública. Pode-se avaliar, por


exemplo, se a população está disposta a arcar com o pagamento de um programa de controle
de poluição da água. O voto será favorável se o cidadão avalia que a utilidade marginal do
programa é maior do que a utilidade marginal da quantia que ele irá pagar. Ocorre
verdadeiramente a criação de um mercado para o bem público. Difere de um mercado
hipotético, pois o valor e forma de pagamento são especificados e politicamente executados.

Utilizou-se um método observado/direto, na localidade Roanoke, nos Estados Unidos, onde


foi feito um referendo, em 1989, para verificar a aprovação dos moradores a um projeto de
canalização para controle de inundações de 7,5 bilhões de dólares. O financiamento do projeto
implicaria no aumento 10 para 12% de uma taxa municipal (a city-wide utility tax, em inglês).
Em termos médios, representaria um acréscimo de dois dólares por mês nas contas dos
residentes. Apenas com a aprovação da população o projeto seria implantado. O projeto foi
aprovado por mais de 56% dos votos (Shabman et al., 1998).

Incluída também nesta tipologia está a criação de mercados experimentais onde os agentes
realmente compram e vendem bens, mas em condições controladas.22 Exemplos são os
mercados criados para praticantes de caça, nos quais se pode comprar e vender permissões de
caça em áreas de preservação. Estes mercados são restritos a bens quase privados (necessitam
de exclusão a fim de se instituir o mercado), são de difícil condução e envolvem custos
elevados (Mitchell & Carson, 1989). Outro exemplo são alguns mercados privados paralelos,
como os sítios para pescaria (“pesque e pague”).

A tipologia Observado/Indireto é considerada pelos economistas uma boa opção de análise,


por basear-se, ainda que indiretamente, no comportamento real do mercado. São utilizados
dados de situações onde os consumidores fazem escolhas reais de mercado, como decidir por
uma viagem ou comprar uma casa. O valor do bem ambiental é inferido a partir de
informações sobre outro bem relacionado.

22
Originalmente o termo utilizado Mitchell & Carson (1993) foi mercados “simulados”. Optou-se pela sua
mudança para “experimentais” para distingui-los de mercado simulados computacionalmente.
87
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Muitos modelos da tipologia baseiam-se na função de produção de moradias. Esta representa
a combinação de insumos e fatores de produção - entre eles, os ambientais – que geram a
utilidade para uma moradia comprada pelo consumidor. O valor do bem ambiental é estimado
pelo seu impacto ou contribuição no valor da moradia. Uma variante é o método do custo de
viagem, muito utilizado para valorar os benefícios de áreas de lazer. Esse, assim como o
método dos preços hedônicos, é discutido nas seções seguintes.

Um método observado indireto e subjetivo é a análise das ações dos políticos na tomada de
decisões para provisão de bens públicos. O pressuposto é de que os representantes políticos
maximizam suas chances de reeleição pela identificação e realização das preferências do
eleitorado, em particular do votante “médio”. Dado um significativo número de observações
nos votos dos representantes políticos em diferentes programas de governo, a demanda por
um bem público específico pode ser derivada por meio de suposições sobre a disposição a
pagar dos eleitores por bem específicos e a distribuição esperada dos tributos. Incertezas sobre
provisão e tributação e a probabilidade de que a maioria dos políticos tenha múltiplos
objetivos ao votarem em determinada medida, associado ao grande número de suposições
pouco realistas necessárias ao método, torna-o frágil para estimar benefícios (Mitchell &
Carson, 1989).

Ainda inserida na classificação observado/indireto tem-se uma visão analítica ainda pouco
discutida na literatura sobre bens ambientais. As variações ambientais podem ser estimadas
por meio de modelos econômicos agregados de impacto e previsão. São metodologias
tradicionalmente utilizadas em análises de políticas públicas, estratégias de desenvolvimento,
mudanças estruturais e distribuição de renda. Incluem os modelos de insumo-produto,
modelos de equilíbrio geral computável e modelos econométricos de equações simultâneas
(THE IMPACTS..., 1999).

Um aspecto que dificulta a utilização dos modelos econômicos de insumo-produto e de


equilíbrio geral é o grande volume de dados históricos necessários para captar o
comportamento de variáveis como salário, renda, vendas e produção setorial. Isto inviabiliza
seu uso em eventos de inundação restritos ou aqueles com impacto limitado ao município,
sendo mais apropriados para desastres de abrangência regional.

Inserem-se também como modelos comportamentais observados no mercado, mas de forma


indireta, a modelagem baseada em agentes. A parametrização do modelo utiliza informações
reais como, no caso de famílias e domicílios, o valor de ativos, da estrutura de gastos e

88
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orçamento familiar. Mensura-se a variação no bem-estar por meio da análise de como as
rotinas comportamentais dos agentes se alteram a partir da introdução do fator de impacto no
modelo, seja ele positivo (e.g: construção de um reservatório de detenção), ou, negativo (e.g:
piora ambiental com ocorrência de uma inundação). No caso da mensuração dos impactos
negativos, o benefício seriam os danos que poderiam ser evitados com a introdução de uma
medida para mitigá-los. A modelagem baseada em agentes, utilizada no desenvolvimento dos
objetivos desta tese, é mostrada com detalhes no item 7.1.2.

A classe Hipotético/Direto engloba métodos que permitem ao pesquisador obter as


estimativas dos benefícios diretos com uma medida ex ante de mudanças no bem-estar, o que
possibilita grande flexibilidade no número de benefícios e tipos de bens que podem ser
valorados.

Todos os métodos baseados em mercados hipotéticos assumem que os entrevistados darão


respostas sem leviandade, não agirão de forma estratégica e não serão influenciados por
fatores externos à pesquisa e ao processo de entrevista. Sem esta suposição, deve ser
introduzida uma avaliação do erro no método.

A valoração individual de uma mudança hipotética qualitativa ou quantitativa em um bem


ambiental é medida diretamente, o que torna desnecessária uma série de suposições presente
em métodos indiretos. Sua suposição central é de que as repostas dos indivíduos a mercados
hipotéticos são comparáveis a de mercados reais. Garantida esta premissa, o método possui
vantagens como simplicidade, justificação teórica e habilidade para estimar todas as
categorias de valores (Mitchell & Carson, 1989).

Entre os métodos classificados como hipotéticos/diretos, tem-se a valoração contingente


(MVC); entrevistas na forma de questões em que você declara se gastaria menos, igual ou
mais que determinado valor (spend more-same-less survey question method) e jogos
alocativos com imposto reembolsável. O primeiro será visto com detalhes em seção própria,
os dois seguintes são mostrados aqui sinteticamente.

Uma forma de se obter informações sobre preferência e valores é mostrando à população os


gastos da administração pública em determinado programa social/ambiental e perguntá-la se
os consideram altos, baixos ou razoáveis. Achar o gasto elevado significa preferência por
menos quantidade do bem ou por pagamentos menores. Raciocínio oposto é feito quando o

89
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gasto é considerado insuficiente. Estas informações são utilizadas para estimar curvas de
demanda para determinados bens públicos (ver referências em Mitchell & Carson, 1989).

Outro método são os jogos alocativos que oferecem ao respondente a possibilidade de


reembolso do tributo. Neles o participante aloca um orçamento fixo entre diferentes itens de
dispêndio e pode também fazer recomendações sobre a magnitude do tributo a ser cobrado.
Neste sistema, o individuo vê-se forçado a valorar um grande número de bens públicos
simultaneamente, e não de apenas um, como no MVC. Como o orçamento é fixo e os
respondentes têm que considerar uma grande variedade de alocações, existe menor
possibilidade de parcialidade. Como desvantagem, há descrição superficial das diferentes
categorias de bens públicos.

Finalmente, na categoria Hipotético/Indireto estão os métodos baseados nas respostas dos


indivíduos em mercados hipotéticos, mas suas respostas estão apenas indiretamente
relacionadas ao valor do bem de interesse. Entre eles, tem-se a “classificação contingente”,
“jogos alocativos” e “técnicas de avaliação de prioridades”.

Jogos alocativos e as técnicas de avaliação de prioridades são bastante similares. Como


mostrado na tipologia hipotético/direto, pede-se aos pesquisados para alocar um orçamento
limitado entre um conjunto de itens. Mas aqui, ele não participa na magnitude do tributo
cobrado e taxa de reembolso.

Situações onde estes tipos de técnica são úteis são limitadas. Tem-se o exemplo da
distribuição de um orçamento de uma organização entre várias áreas funcionais (educação,
saúde, meio ambiente, etc.) a fim de maximizar o bem-estar social (Mitchell & Carson, 1989).
Como os itens orçados geralmente têm abrangência ampla, estes métodos apresentam
dificuldades metodológicas na mensuração de benefícios específicos. Seria necessário
descrever cada item orçamentário em detalhes suficientes para que seja possível a avaliação.
Alocar um orçamento fixo entre categorias não significa necessariamente disposição a pagar
pela quantia alocada em uma categoria particular, daí sua impossibilidade em captar as
preferências e utilidade para o consumidor.

O método da classificação contingente - MCC - pede aos pesquisados que associem diferentes
bens aos respectivos pagamentos requeridos. Tem sido utilizado em vários estudos. Mitchell
& Carson (1989) citam pesquisas para estudar o mercado potencial de carros elétricos; avaliar
a visibilidade de parques nacionais; valorar locais para recreação; medir benefícios de

90
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
melhora na qualidade de água, entre outras. Um procedimento usual é a distribuição de
cartões, cada um com uma combinação de nível de qualidade ambiental (por exemplo, da
água) e a quantia que o respondente pagaria por aquele nível de qualidade. Os pesquisados
ordenam os cartões do mais preferido até o menos preferido. O resultado da ordenação é
usado para estimar a função de utilidade indireta para diferentes mudanças na qualidade do
bem.

Um possível benefício da classificação contingente em relação à avaliação contingente é que


com o primeiro pode-se obter respostas mais acuradas, pois a tarefa de classificar um pequeno
conjunto de cartas é menos trabalhosa do que a de dar respostas a questões sobre disposição a
pagar por uma mudança ambiental. O ganho em simplicidade de administração não significa
custos mais baixos. Para um mesmo grau de precisão, a classificação contingente requer em
geral muito mais observações do que as exigidas em um estudo de valoração contingente
(Mitchell & Carson, 1989). Além disso, o primeiro necessita de estudos estatísticos mais
sofisticados, envolvendo interpretações de função de utilidade indireta.

Uma limitação do método de classificação contingente, também presente nos jogos alocativos,
é o fato de que o pesquisador tende a eleger preferências “impostas” que não refletem
verdadeiras intenções comportamentais. Significa que os valores associados à melhora
ambiental não são aqueles que necessariamente maximizariam a preferência do consumidor.
Ele poderá ordenar as cartas de maneira ótima de forma a minimizar a “falta de utilidade”
(disutility) de valores que ele não escolheu, mas foi obrigado a atribuir. Esse é um pressuposto
do modelo, que tem benefícios e complicadores. Caso haja um desnível muito grande entre as
preferências do entrevistado e os valores presentes nos cartões ele não se empenhará em
ordenar o conjunto de cartões e compromete-se o resultado da avaliação.

5.3 Fundamentos Teóricos para Avaliação dos Benefícios


Após definidas as bases conceituais e as possibilidades metodológicas para avaliação dos
benefícios ambientais e sociais, este capítulo apresenta a fundamentação teórica que
usualmente é utilizada nos estudos sobre o tema, a qual se baseia na teoria microeconômica
tradicional, especialmente na teoria do consumidor. Os danos evitados representam o
benefício de uma melhora ambiental em uma análise custo-benefício. Discutir benefício
significa discutir preferência, utilidade, demanda e valor excedente. Elementos centrais do
comportamento do consumidor.

91
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
5.3.1 Economia do bem-estar, utilidade e a análise custo-benefício

A economia do bem-estar examina os fatores econômicos que afetam o bem-estar; a


satisfação das necessidades materiais e aspirações humanas. Pode ser interpretada como a
economia da eficiência. Para seus adeptos, qualquer estado da sociedade que não seja
economicamente eficiente é indesejável, porque é possível aumentar as utilidades de algumas
pessoas sem diminuir a de outras. Este posicionamento incorpora o conceito econômico de
eficiência de Pareto ou eficiência econômica. Ela ocorre quando, em uma circunstância
econômica, não existe meios de melhorar a situação de uma pessoa ou de um grupo sem
piorar a de outra pessoa ou grupo (Varian, 1997). Segundo o critério de Pareto, qualquer ação
política deve, no mínimo, levar ao aumento do bem-estar de um indivíduo, sem que os demais
sofram perdas.

A análise custo-benefício pode ser vista como uma aplicação da moderna economia do bem-
estar. Baseia-se na atribuição de valores monetários aos ganhos e perdas decorrentes de uma
mudança na provisão de um bem público, o que permite calcular o seu ganho líquido. Como
talvez não existam políticas em que ninguém sofra algum tipo de perda, o ganho líquido da
política representaria uma “potencial” melhora de Pareto.

Os críticos da melhora potencial afirmam que uma política pode representar benefícios para
poucos e prejuízos para muitos e ainda assim ocorrer um ganho líquido. Para que realmente
ocorra uma melhora de Pareto é necessário que os beneficiários da política compensem os
eventuais perdedores e que, após esta compensação, ocorra pelo menos um indivíduo com
aumento do bem-estar.

A criação destes mecanismos compensatórios é difícil e encerra problemas práticos e


políticos. Mas ainda que os projetos sejam decididos com base estritamente na eficiência
econômica, eles podem, em um segundo momento, serem avaliados pelas autoridades
políticas e efetuadas as transferências necessárias com fins redistributivos. O critério de
Pareto é apenas um fator a ser considerado no processo decisório, esse influenciado por
inúmeros fatores, desde institucionais até ambientais e sociais.

As suposições que fundamentam a economia do bem-estar implicam em duas características


da análise custo-benefício (Parker, Green & Thompson, 1987). A primeira é a aceitação da
soberania do consumidor, princípio envolvido na crença de que o consumidor é quem melhor
julga o que lhe dá utilidade. A segunda é a tendência da analise custo-benefício em enfatizar a
eficiência econômica em detrimento das questões distributivas. Ao aceitar o critério de Pareto
92
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
como base da analise custo benefício, alguns critérios de decisão são rejeitados, como o
paternalismo, o autoritarismo e o modelo tecnocrático – a noção de que o governo, cientistas
ou qualquer outro grupo de “elite” é quem melhor sabe o que deve ser feito para aumentar a
utilidade dos indivíduos de uma comunidade. Projetos igualitaristas também podem ser
contrários ao critério de Pareto.

5.3.2 A Curva de demanda e a medida de benefício

A curva de demanda representa o quanto as pessoas gostariam de demandar a cada preço. A


curva de oferta mostra o quanto as pessoas gostariam de ofertar a cada preço. No preço de
equilíbrio, a quantidade ofertada é igual à quantidade demandada (Varian, 1997). Estes
conceitos econômicos e a “lei” de equilíbrio são centrais no entendimento do benefício
econômico.

A escolha do consumidor é orientada pela maximização da utilidade sujeita a sua restrição


orçamentária, essencialmente, ele é orientada pela sua preferência, renda e preços dos bens.
Como representação do processo de escolha, têm-se as funções de demanda. Em um modelo
simplificado, elas mostram as quantidades ótimas de cada um dos bens como uma função da
renda e dos preços com os quais o consumidor se defronta (Equação 5.2):

qi = qi (p, m) 5.2

onde:
qi = quantidade demandada do bem i
p = vetor de preços da economia
m = renda individual

A Equação 5.2 mostra a função que relaciona os preços da economia (p) e a renda individual
(m) com a quantidade demandada do bem. Investigar a influência do ambiente econômico
sobre a demanda significa, em um modelo simplificado, analisar os efeitos da renda e dos
preços.

Intuitivamente, imagina-se que um aumento da renda represente um aumento na quantidade


demandada do bem. Caso o bem seja “normal”, é o que tende a ocorrer. Mas existem aqueles
artigos em que um acréscimo no orçamento signifique uma diminuição do seu consumo. São

93
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
chamados de bens “inferiores” ou bens de Giffen23. O consumo de salsicha e mortadela, por
exemplo, tende a diminuir com o aumento da renda e conseqüente ampliação das
possibilidades de escolha. Obviamente, isto depende também das preferências e do nível
inicial de renda. Exemplos de bens normais típicos são aqueles voltados para as classes de
renda mais elevadas, como vinhos envelhecidos de safra superior, jóias e obras de arte.

Para cada nível de renda m, há uma escolha ótima de cesta de bens. Considerando variações
de preço, uma diminuição no preço do bem i, esse “normal”, representa um aumento do seu
consumo e vice-versa. A curva de demanda mostra o consumo do bem associado a variações
no seu preço, mantendo a renda e os demais preços da economia constantes (Figura 5.1).
Pode-se analisar a curva de demanda sob outro aspecto. Para cada nível de demanda do bem i,
a curva mostraria qual deveria ser o preço do bem para que os consumidores escolham tal
nível de consumo. Neste caso, a curva é chamada de curva de demanda inversa. Ela também é
negativamente inclinada e mede a mesma relação que a curva de demanda direta, porém com
outro ponto de vista.

pi

qi
Figura 5.1 - Curva de demanda de um bem i

Com renda constante, a variação no preço de um bem afeta a demanda de duas formas: varia-
se a taxa com a qual você pode trocar um bem por outro e o poder aquisitivo da renda é
alterado. O primeiro efeito é chamado efeito-substituição: a variação nos preços relativos
altera a proporção de cada bem desejada pelo consumidor. O segundo efeito é o efeito-renda:
o nível de preços se reflete na capacidade de consumo associada à renda. A variação total na
demanda (∆qi) de um bem devido à variação no preço pode ser dividida entre os dois efeitos.

Supondo um aumento de preços, tem-se (Equações 5.3 e 5.4):

∆qi = qi (pi`, m) – qi (pi, m) 5.3

23
Homenagem ao economista do século XIX que percebeu, pela primeira vez, a possibilidade deste
comportamento entre renda e demanda.
94
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
∆qi = ∆qiS + ∆qiN 5.4

onde:
∆qi = variação na quantidade demanda do bem i
pi` = preço final do bem i
pi = preço inicial do bem i
m = renda constante (renda inicial = renda final)
∆qiS = efeito substituição
∆qiN = efeito renda

O efeito substituição é sempre oposto à variação no preço do bem (uma deflação no preço do
bem representa um aumento deste efeito); o efeito renda pode ter qualquer sinal, dependendo
se o bem é normal ou inferior.

Esclarecida a função demanda, pode-se agora compreender a medida tradicional de benefício:


o excedente do consumidor. Graficamente, é a área sob a curva de demanda e sobre a linha de
preços. Na Figura 5.2 tem-se a curva de demanda marcada pela linha D. Ao preço P1 (ou à
quantidade Q1), o custo total do bem para o consumidor é representado pelo quadrilátero
P1AQ1Q0, mas a sua disposição a pagar pela quantidade Q1 é maior, correspondente à área
P0AQ1Q0. O excedente do consumidor representa a diferença entre a disposição a pagar e o
custo total de aquisição (triângulo P0AP1).

Preço

P0

P1 A

D = Q (P, M)

Q0 Q
1 Qd Quantidade
Figura 5.2 - Curva de demanda e excedente do consumidor

O dano ambiental define-se pela diminuição do excedente do consumidor. Se há, por


exemplo, um aumento do preço, a área que representa o excedente na Figura 5.2 irá diminuir.
A sua diferença em relação à área original representa o dano ambiental. Inversamente, se há
um aumento do excedente do consumidor, ocorre um ganho ou benefício.

95
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Esta forma clássica, o excedente do consumidor marshalliano24, pode mostrar alguns
problemas. A curva de demanda não considera o nível de utilidade ou satisfação constante,
mas a renda. Uma diminuição do preço do bem i não necessariamente ocasiona um aumento
do bem-estar, pois não se sabe como os outros preços se comportam na economia (lembrar do
efeito-substituição e efeito-renda).

A fim de mostrar uma função que mantivesse constante o nível de utilidade, John Hicks
(1904-1989), economista britânico como Marshall, propôs uma curva de demanda
compensada (Equação 5.5). Ela mantém constante o nível de utilidade por meio de ajustes no
efeito-renda, ou seja, incorpora na função o montante de renda que compensaria a variação de
preço, de forma a manter o consumidor em certo nível de utilidade. Em outras palavras, a
curva de demanda hicksiana mostra as quantidades consumidas quando a renda do
consumidor é ajustada, a cada preço, para manter um nível constante de utilidade. Pode-se
também afirmar que a função de demanda hicksiana mostra qual seria a cesta de consumo
para um determinado nível de utilidade e gasto total mínimo.

A curva de demanda compensada pode ser idealizada de duas formas: com o nível de
utilidade constante igual ao nível inicial ou com a utilidade também constante, mas em um
nível alternativo. A primeira forma dá origem à variação compensatória (VC) e ao excedente
compensatório (EC) e a segunda, à variação equivalente (VE) e ao excedente equivalente
(EE). Tem-se, portanto, quatro medidas de bem-estar.

qi = qi (p, u) 5.5

em que:
qi = quantidade demandada do bem i
p = vetor de preços da economia
u = nível de utilidade

Observe a diferença entre a Equação 5.2 e a Equação 5.5. Enquanto nesta o problema é
minimizar a renda, dada a utilidade fixa, naquela é maximizar a utilidade, dada uma renda
fixa (em essência, são duas formas de analisar o problema de maximização da utilidade do
consumidor).

24
Alfred Marshall (1842 - 1924), economista inglês, é considerado o organizador da economia moderna. Foi o
criador do conceito de excedente do consumidor, embora a idéia já existisse nos trabalhos do engenheiro de
obras e economista francês J. Dupuit (1804-1866). O engenheiro preocupava-se com a questão de que as pessoas
que utilizavam uma ponte estariam certamente pagando menos pela sua construção do que estavam se
beneficiando e, portanto, obtinham um "excesso de satisfação" (Motta, 1998: s.d.). Dupuit foi um dos primeiros
a analisar a relação custo-benefício das obras públicas.
96
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
As medidas de excedente (EC e EE) ocorrem quando não é possível ao consumidor ajustar as
quantidades consumidas após uma variação nos preços. Em contrapartida, as de variação (VC
e VE) aplicam-se em uma situação mais flexível, onde as quantidades consumidas podem ser
modificadas frente a uma mudança de preço (Nogueira, Medeiros & Arruda, 2000) (Tabela
5.2).

Tabela 5.2 - Medidas de bem-estar de Hicks


Possibilidade de ajustamento na
Medida de Benefício Nível de Utilidade
quantidade consumida
Variação Compensatória – VC Inicial Sim
Variação Equivalente – VE Final Sim
Excedente Compensatório – EC Inicial Não
Excedente Equivalente – EE Final Não

Na Figura 5.3 tem-se um exemplo de curvas de demanda compensadas e “tradicional”. Ela


apresenta graficamente as medidas de benefício identificadas para um aumento da quantidade
consumida de Q0 para Q1, conforme seja utilizada a abordagem marshalliana ou hicksiana.

Preço
 VC ≈ EC = P0 A C P1

 VE ≈ EE = P0 E B P1

 EM = P0 A B P1

P0 A E
D = Q (P, M)
P1 B H 0 = Q (P, U 0 )
1
C H 1 = Q (P, U )

H0 D
H1

Q0 Q1 Quantidade
Figura 5.3 - Curvas de demanda e excedentes do consumidor marshalliano e hicksiano

O equilíbrio inicial do consumidor encontra-se no ponto A, em que ele dispõe da quantidade


Q0 de bens e serviços ambientais, gerando um nível de utilidade U0. Dado um acréscimo na
disponibilidade de bens de Q0 para Q1, considerando a abordagem de Hicks, o consumidor
deslocar-se-á para uma curva de indiferença com utilidade superior dada por U1;
conseqüentemente, haverá um novo equilíbrio, no ponto B. Se a renda for reduzida por uma
variação compensatória, o consumidor retornará para U0, no ponto C.

97
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Como anteriormente mencionado, o excedente do consumidor marshalliano (EM)
corresponde à área do polígono P0ABP1. O excedente compensatório (EC) está sob a área da
curva de demanda compensada hicksiana H0 e corresponde à área P0ACP1, e o excedente
equivalente (EE) situa-se sob a curva de demanda compensada hicksiana H1 (área do polígono
P0EBP1). Neste sentido, o excedente do consumidor marshalliano é uma medida intermediária
entre os dois excedentes hicksianos.25

Embora as medidas de excedente compensatório (EC) e excedente equivalente (EE) não


estejam apresentadas na Figura 5.3, elas possuem valores próximos de VC e de VE,
respectivamente.

A Tabela 5.3 apresenta as medidas de benefício de Hicks.

Tabela 5.3 - Medidas de benefício de Hicks

Medida de Benefício Interpretação


Montante a ser diminuído (ou aumentado) da renda para que o
Variação
consumidor se mantenha no mesmo nível de utilidade, dada uma
Compensatória -VC
variação nos preços.
Variação Montante de renda para adquirir um novo nível de utilidade e
Equivalente - VE desprezar a variação de preços.
Montante a ser diminuído (ou aumentado) da renda para que o
Excedente
consumidor se mantenha no mesmo nível de utilidade, dada uma
Compensatório- EC
variação na quantidade
Excedente Montante de renda para adquirir um novo nível de utilidade e
Equivalente - EE desprezar a variação de preços.

As medidas de benefício de Hicks, embora pareçam similares, possuem diferenças no campo


de aplicação ou na sua interpretação. As mudanças na provisão dos bens públicos, entre eles
vários produtos ambientais e de infra-estrutura, normalmente são “impostas” ao consumidor,
que não é livre para ajustar as quantidades consumidas. Isto torna os bens ambientais
adequadamente mensuráveis pelas medidas de excedente de Hicks (Mitchell & Carson, 1989).

Entretanto, Freeman III (1993) observa que as medidas de excedente são restritivas e
desnecessárias. Segundo ele, para os bens públicos, não há diferença entre as medidas de
excedente e variação de Hicks para as situações de equivalência ou compensatória.

Mitchell & Carson (1989) ressaltam que a escolha da medida de bem-estar está associada aos
direitos de propriedade vis-à-vis o bem em questão. As medidas compensatórias assumem que

25
Não é possível identificar as medidas de variação (VC e VE) no mesmo gráfico por estas permitirem
ajustamentos na quantidade consumida pelo consumidor.
98
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
o indivíduo tem direito ao seu nível corrente de utilidade ou, alternativamente, direito de
propriedade no status quo. As medidas equivalentes, por outro lado, consideram que o
indivíduo tem direito a um nível alternativo de utilidade ou direitos de propriedade na
mudança (Mitchell & Carson, 1989: 25).

Embora as medidas hicksianas sejam consistentes teoricamente, nenhuma delas é prontamente


observável a partir de dados de mercado, ao contrário do excedente do consumidor
marshalliano. Segundo Nogueira, Medeiros & Arruda (2000: 92):

Assim, existe a possibilidade de usar o excedente do consumidor como uma


aproximação das medidas de variação mais rigorosas teoricamente (Hanley
& Spash, 1993, p.39 apud Nogueira, Medeiros & Arruda, 2000: 92).

Nesse contexto, justifica-se o uso da curva de demanda marshalliana para avaliar as mudanças
de bem-estar dos indivíduos por variações no nível de bens ambientais.

5.4 Metodologias para avaliação de danos de inundação: técnicas


analíticas, simulação e análise de rede
Este capítulo mostrou as bases conceituais e teóricas que fundamentam os métodos para
estimar os benefícios; é a primeira etapa no entendimento das formas para avaliação dos
danos da inundação. Aqui, eles foram mostrados de forma genérica para os bens ambientais e
públicos. No capítulo 6 procura-se delimitá-los para o caso específico de danos de inundação.

A fim de se encontrar a metodologia adequada para análise do impacto das inundações sobre
o cotidiano de uma cidade ou comunidade, iniciou-se a procura pelos métodos de estimativas
de danos relativamente freqüentes na literatura internacional, embora ainda incipientes no
Brasil. Entre estes métodos, estão o método dos preços hedônicos, a valoração contingente e a
criação de curvas ajustadas que mostram a relação entre danos e profundidade.

Estes métodos utilizam preponderantemente técnicas analíticas, as quais, com freqüência, são
formadas por equações estatisticamente definidas que incluem os parâmetros que se pretende
estimar. Muitos formulam o problema como de otimização e empregam técnicas matemáticas
para resolvê-lo, tendo a desvantagem do aumento da complexidade matemática segundo o
tipo de problema. Normalmente, no seu desenvolvimento, o pesquisador coleta os dados
necessários e compara-os com os dados estimados (Gilbert & Troitzsch, 2005: 16).

No capítulo 6 são mostradas metodologias que recorrem os modelos analíticos de forma


central. Algumas delas foram, inicialmente, avaliadas como instrumento para alcançar os

99
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
objetivos propostos nesta tese, em conseqüência, tem-se um amplo estudo de suas bases
teóricas, conceituais e revisão bibliográfica.

A literatura destaca, tradicionalmente, dois tipos principais de modelos analíticos utilizados


para estimativas dos custos econômicos de uma cheia extrema ou, alternativamente, os
benefícios de uma medida de controle de inundação: microeconômicos e macroeconômicos.
Eles incluiriam modelos estatísticos, matemáticos ou baseados em equações. Os modelos
microeconômicos são subdivididos entre modelos que utilizam o mercado real como base de
análise e os que usam mercados hipotéticos. Entre os modelos macroeconômicos, têm-se os
modelos regionais e de equilíbrio geral (Figura 5.4).

No decorrer do processo, entretanto, as metodologias tradicionais mostraram limitações, e os


estudos apontaram para o uso da simulação e da análise de rede como método de pesquisa
socioeconômica (capítulo 7).26 Como as técnicas analíticas, a simulação é um modelo da
realidade, mas é um tipo particular de modelagem. Segundo Ingalls (2002) apud Dourado
(2007), a simulação é o processo de se criar um modelo de um sistema real, com o qual se
conduz experimentos a fim de entender tanto o comportamento do sistema, quanto de avaliar
estratégias para a sua operação. Assim, a simulação tenta reproduzir, em um programa de
computador, uma seqüência de eventos ao longo do tempo de um sistema a ser modelado.

Já análise de rede pode ser sempre utilizada quando se discutem dados relacionais, ou seja, as
conexões entre entidades e agentes e de como estes se inserem em um sistema de relações. Ao
discutir aspectos como centralidade e redundância na rede, ela pode fornecer indícios
relevantes sobre a vulnerabilidade da rede urbana e a capacidade de propagação do impacto
na mesma. Pode-se considerar a análise de rede como uma maneira de representar as
informações e analisá-las, a qual tem origem nos modelos estruturais e na sociometria (Scott,
2000). Ao que parece, ainda é uma técnica pouco usada nos estudo do impacto da inundação,
pois não foram encontradas referências sobre o assunto

26
Alguns autores, como Parunak, Savit & Riolo (1998) e Sawyer (2005), não consideram que “simulação” seja
um termo que diferencie métodos analíticos, baseados em equações, de modelos computacionais dinâmicos
baseados em agentes. A diferença estaria na forma do modelo e em como ele é executado. No primeiro, ter-se-ia
o cálculo de equações e, no segundo, a emulação de comportamentos. Para fins didáticos, este texto utiliza
“simulação” como uma forma de distinguir os dois tipos de abordagem dos problemas.
100
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Modelos para estimar danos

Análise de rede Simulações Técnicas analíticas

Modelos microeconômicos Modelos macroeconômicos


- Modelos
Mercado real Mercado hipotético econômicos regionais
agregados
- Método da valoração
contingente
Explícito Implícito
- Método do valor - Método dos preços
esperado dos danos hedônicos
- Despesas com
prevenção e mitigação /
custos de relocalização
- Método do custo de
viagem

Figura 5.4 - Modelos para estimar os danos econômicos da inundação

No capítulo 6 são estudados os modelos considerados preponderantemente analíticos. Será


dada maior relevância ao Método dos Preços Hedônicos, Método da Valoração Contingente e
Método do Valor Esperado dos Danos, pois eles foram avaliados inicialmente como possíveis
metodologias a serem utilizadas na tese. Alguns, como o Método do Valor Esperado dos
Danos, permaneceram no estudo como ferramentas auxiliares de pesquisa. As simulações e
análise de rede são mostradas em capítulo a parte por, além de possuírem especificidades,
representam uma abordagem ainda raramente explorada na análise do impacto das
inundações.

101
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
6 AVALIAÇÃO DE DANOS: MODELOS ESTATÍSTICOS E
ECONOMÉTRICOS

Este capítulo discute os métodos mais tradicionais utilizados na análise de danos de inundação
e, em conseqüência, dos benefícios associados à sua mitigação. São métodos que
normalmente têm sua fundamentação teoria na Economia do Bem-Estar. Muitos envolvem a
criação de uma curva de demanda para o benefício, baseado nas preferências do consumidor,
reveladas ou declaradas, e na definição do excedente. Há também modelos econômicos de
equilíbrio geral, nos quais as variáveis são tratadas de forma agregada eu setorial. Diferem da
simulação por normalmente não exigirem como ferramenta essencial a programação em
computadores, mas a análise estatística, e de não incluírem o comportamento dinâmico de
forma central e contínua e interativa. Ao contrario de modelos baseados em agentes, seriam
modelos baseados em equações.

6.1 Modelos microeconômicos baseados explicitamente no mercado


real

6.1.1 Despesas com prevenção/mitigação (defensive / averting Expenditures)

São aqueles gastos efetuados por ações defensivas e de prevenção à inundação. Entre elas, a
criação de áreas de controle e retenção, reservatórios de detenção, sistemas waterproofings,
diques, instalações de drenagem e bombeamento e modificações em canal. Segundo Bouma,
François & Troch (2005), dado que as pessoas normalmente não gastariam mais na prevenção
de um problema do que o custo dos danos causados por ele, o valor destes investimentos é
considerado o limite inferior da estimativa de danos.

O método serve apenas como uma primeira aproximação e parece mais adequado quando
analisados os investimentos privados. A definição de obras no orçamento público baseia-se
em múltiplos aspectos, não só econômicos e técnicos, e o conteúdo político tende a ser
relevante no processo de tomada de decisão. Ademais, inverte-se a ordem dos fatores, pois a
analise dos possíveis danos deveria ser feita antes da implantação de medidas preventivas,
considerando as especificadas locais da região.

6.1.2 Custos de relocalização

São os custos envolvidos na mudança de indivíduos e instalações para locais com menor risco
de inundação. Podem ser utilizados os custos de medidas atuais de relocalização para avaliar
os benefícios potenciais (e custos associados) de sua prevenção. Segundo Bouma, François &

102
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Troch (2005), uma nova localização pode ser considerado uma forma particular de medida
preventiva e defensiva, mencionadas anteriormente.

A construção de novas instalações, mas altas e seguras, é um exemplo. O custo incorrido pelo
governo ao doar ou subsidiar moradias para que famílias se desloquem de áreas inundáveis
para áreas de menor risco também pode ser mencionado, sendo um tipo de intervenção
dispendioso para o orçamento público.

6.1.3 Método do custo de viagem

Este método é empregado principalmente para medir o valor de áreas de lazer. Os custos para
usufruir um local de recreação são utilizados como aproximação do preço do lazer.
Preferencialmente, incluem-se não apenas os custos diretos (gastos financeiros com a visita,
como as despesas de transporte e de estadia), mas também os indiretos (custo do tempo de
viagem e de permanência).

Os custos são utilizados como a variável independente da função demanda por serviços
recreativos. São também incorporados à função atributos socioeconômicos do consumidor. A
partir da função demanda e dos custos médios de viagem define-se o excedente do
consumidor, que é a medida de benefício do lazer. A Equação 6.1 exemplifica o método:

qi = f (cti, ei, mi, ti, di) 6.1

Em que:

qi = quantidades de visitas ao bem ambiental;


cti = custo total do deslocamento e dos demais dispêndios com a estadia;
ei = escolaridade do indivíduo i;
mi = renda total do indivíduo i;
ti = tempo total, medido em horas, para o deslocamento do indivíduo i de sua residência até o
ativo ambiental;
di = distância, medida em km, da residência do indivíduo i até o ativo ambiental.

No método de custo de viagem mais simples são desenhados círculos concêntricos com
diferentes raios ao redor do local de estudo. Calcula-se a média per capita de visitas ao local
pelos residentes em cada zona do círculo (a área entre dois círculos). Os dados são utilizados
para traçar a curva de demanda da localidade em função da distância. Se um valor monetário é
assimilado a cada quilômetro de distância em relação ao local de análise, o cálculo do
103
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excedente do consumidor pode ser obtido para todas as zonas, medindo-se a área sob a curva
de demanda e sobre a curva de custo de viagem para o residente daquela zona em particular
(Mitchell & Carson, 1989). As possibilidades metodológicas de utilização do custo de viagem
em estudos ambientais são grandes. Ele pode, por exemplo, ser utilizado em problemas de
programação linear que incorporam a acessibilidade como a função objetivo para criação de
áreas de lazer ou reservas ambientais, dado as restrições ambientais (Önala & Yanprechaset,
2007).

No contexto de danos à inundação, é possível usar o método para avaliar os efeitos de uma
inundação em situações muito específicas, como em uma área de lazer com risco. Ele seria
aplicado antes e depois da ocorrência da inundação e os resultados comparados. Uma
alternativa seria estimar o valor recreacional que seria perdido em decorrência de uma
inundação e computá-lo como benefício de uma medida de controle. Em outro enfoque, uma
técnica mitigadora associada à criação de um local para lazer, como parques e quadras,
incorpora valores sociais à área. Caso estes valores sejam relevantes, o método do custo de
viagem pode ser empregado para estimá-los.

Alguns problemas do método são destacados por Mitchell & Carson (1989): gera resultados
específicos para a localidade; ignora a possibilidade de o consumidor substituir um local de
lazer por outro; o tempo de viagem é uma variável de difícil mensuração; grande sensibilidade
às formas funcionais utilizadas na estimação e possibilidade de medir apenas um número
limitado de benefícios, como os benefícios diretos da recreação e algumas categorias de
valores estéticos e serviços ambientais.

Uma explicação simplificada, mas suficiente do método, com seus pressupostos e questões
relevantes estão presentes em Freeman III (1993). O autor discute questões associadas ao
“tempo” como um custo e elemento de escolha, mostra como fazer uma escolha locacional
entre um conjunto de locais alternativos possíveis e formas de valorar mudanças qualitativas
na área.

Os três métodos seguintes são apresentados com maior riqueza de detalhes, por terem sido
metodologias exaustivamente estudas em decorrência de suas potencialidades para os
objetivos desta pesquisa.

104
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
6.1.4 Método dos danos evitados à propriedade (property damages avoided method)

O método dos danos evitados - MDE - é o mais usual para estimar as perdas econômicas de
propriedades afetadas pelas inundações. É utilizada principalmente para medir o impacto
físico do evento. Será dado maior destaque a ele do que foi dado aos métodos anteriores, tanto
pela sua consolidação como método de estimativa de danos diretos, como por ser base da
análise dos danos diretos na metodologia de trabalho desta pesquisa.

O MDE define quais seriam os danos da propriedade se esta sofresse uma inundação (Bouma,
François & Troch, 2005). O indivíduo estaria disposto a pagar, por uma medida de controle de
inundação, o valor esperado dos danos evitados. Supõe-se que quanto maior o nível de água,
maiores as avarias. Ao nível do chão, por exemplo, o piso é danificado e possivelmente
também as mobílias e itens em contato direto com ele. Com dois ou três metros de água
dentro da residência, todo o conteúdo sofre danos e a própria estrutura da edificação está em
risco.

Os danos são definidos segundo os custos de reparação e reposição incorridos pelo


proprietário durante toda a perturbação trazida pela inundação, desde a desocupação, se
ocorrer, até a reocupação e recuperação da propriedade. Os danos físicos à construção são
estimados por meio de orçamentos de reforma, e os prejuízos ao conteúdo, em consulta de
preços no mercado de itens novos e de estimativas de seu valor residual.27

O MDE continua a ser a principal técnica para medir os benefícios das medidas de mitigação
de danos, apesar de métodos como valoração contingente e preços hedônicos serem capazes
de quantificar um espectro mais amplo de valores (Shabman et al., 1998). Sua disseminação
deve-se a dois aspectos básicos: 1) são usadas no modelo informações hidrológicas
habitualmente obtidas para o planejamento público e 2) o método tem uma fundamentação
lógica simples: se os gastos correntes com um projeto de controle forem menores do que o
valor presente dos danos futuros evitados, justifica-se a sua implantação.

O total dos danos para um evento particular é assumido como função h(x) do nível de água da
inundação xi. O nível da inundação é probabilístico por natureza e segue alguma função
densidade de probabilidade g(x). Matematicamente, o valor esperado dos danos (VED) em um
ano, de uma propriedade específica, para todos os níveis de inundação, é dado por:

27
Construções que incorporam valores históricos, artísticos ou de interesse arquitetônico, como monumentos e
igrejas antigas, necessitam de uma avaliação mais complexa, pois incorporam valores de não uso. Sobre este
tema, ver Bouma, François &Troch (2005) e Oliveri & Santoro (2000).
105
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
VED  i 1 g ( xi )h( xi )
N
6.2

Onde:
VED = Valor esperado dos danos à propriedade;
xi = inundação i, com y1 representando o menor nível possível de inundação que gera danos e
xn o maior nível possível com probabilidade superior a zero de ocorrência.

O valor esperado dos danos é medido com e sem um projeto de controle e a diferença é o
benefício anual esperado para a propriedade. O valor presente do benefício anual esperado,
calculado por meio de uma taxa de desconto, é o benefício total da propriedade.

Em uma expressão mais geral de benefício da implantação de uma medida de controle, podem
ser incorporadas as atitudes em relação ao risco:

 
 ( 1  at
N

)  g ( x it )h( xit )  g o ( xit )h 0 ( x it 
) 
Benefício     i 1 
T
6.3
 1  r t 
t 1
 
 
Onde:
t = representa o ano t do horizonte de planejamento que consiste em T anos;
r = taxa de desconto do projeto;
a = medida de aversão ao risco relativo do ocupante da planície de inundação.

Como a implantação do projeto altera a probabilidade de ocorrência da inundação, as funções


de probabilidade e de danos alteram-se das condições iniciais g0(xi) e h0(xi) para as condições
de projeto.

Para o agente avesso ao risco (a>0), o benefício é maior do que para o agente neutro (a=0).

Com o valor presente dos danos evitados, ou seja, o benefício do projeto, efetua-se uma
análise custo-benefício. Se os gastos correntes de uma medida de controle de inundação forem
menores do que o valor presente dos danos futuros evitados, justifica-se a implantação do
mesmo. É simplesmente uma análise de viabilidade econômica de projetos.

A questão central que envolve o MDE é como calcular os danos da inundação, o h(xi) da
Equação 6.2. Uma forma é efetuar uma análise corrente dos prejuízos. É feito um
levantamento das perdas econômicas reais de áreas afetadas pela inundação. Levantados os

106
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danos e os custos associados, obtém-se uma relação direta entre nível de inundação e prejuízo
total. Segundo Machado (2005) é uma estratégia que retrata o prejuízo corrente da bacia em
um dado instante, com suas características socioeconômicas e de rede de drenagem. Seria algo
estático, fotográfico.

Um avanço viria com uma metodologia que possibilitasse uma estimativa de danos que não
fosse estática, mas passível de se deslocar no tempo-espaço, permitindo uma avaliação
aproximada dos danos em locais diferentes ou em tempos diferentes. A curva de danos versus
profundidade de submersão (curva DPS) apresenta estas potencialidades.

6.1.4.1 Curva de danos versus profundidade de submersão


A curva DPS mostra o valor esperado dos danos de uma edificação segundo a profundidade
da inundação em seu interior. Obviamente, esta relação entre danos e profundidade não é
linear, pois a edificação e o seu interior não são homogêneos.

Dois enfoques principais são considerados na construção de curvas DPS: uso de uma síntese
de danos reais (ou históricos) e o uso de danos sintéticos (ou potenciais). Os danos “reais” são
aqueles avaliados empiricamente após a inundação. Os danos sintéticos baseiam-se na opinião
de especialistas, em ensaios de laboratórios, em dados secundários e até mesmo na
experiência acumulada de eventos passados. Considera-se que são os danos máximos
prováveis, logo não incorporam suposições sobre os danos que poderiam ser evitados com
medidas emergenciais. São definidos segundo padrões de susceptibilidade dos bens ao contato
com água em vários intervalos de profundidade ou de duração da submersão.

Embora a caracterização “realista” do evento seja uma vantagem, as informações coletadas


associam-se à vulnerabilidade específica da localidade a um determinado evento de
inundação. A organização do espaço urbano, os padrões construtivos utilizados, o uso ou não
de sistemas de alerta, o perfil da população atingida, a existência de experiência anterior de
inundação e a utilização de medidas waterproofing são algumas das especificidades locais que
interferem no valor calculado dos danos. A padronização destes danos e a sua generalização
para eventos similares podem ser possíveis, mas é necessário que ocorra um número
significativo de observações em uma localidade com características urbanas e de inundação
que possibilitem estimar uma ampla variedade de danos. Outra possibilidade é a coleta de
dados em vários municípios e localidades a fim de se obter uma aproximação de qual seria o
valor médio dos danos.

107
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Vários guias de avaliação de danos, como o produzido pelo Middlesex Polytechnic Flood
Hazard Research Centre (Parker, Green & Thompson, 1987) e pelo Department of
Emergency Services of Queensland, Austrália (Handmer, Reed & Percovich, 2002)
recomendam o uso do método dos danos potenciais. Segundo Handmer, Reed & Percovich
(2002), o uso dos danos reais pode ser feito em situações onde a avaliação não é feita com
propósitos comparativos.

Como forma de aproximar os danos potenciais aos reais, existem fatores de ajuste. Tem-se,
por exemplo, fatores utilizados caso a localidade avaliada possua algum sistema de alerta. A
Tabela 4.8, mostrada no capítulo 4, mostra qual seria a razões entre danos reais e potenciais
para um método de avaliação rápida (em inglês, Rapid Appraisal Method – RAM)
considerando a existência de um sistema de alerta (Read, Sturgess and Associates, 2000 apud
Handmer, Reed & Percovich, 2002).

Com a utilização de inventários de danos em zonas sinistradas (avaliação a posteriori) ou


construção de cenários de danos por meio da definição a priori de patologias causadas pela
inundação, levantam-se os danos associados à profundidade e criam-se curvas para cada
categoria de uso do solo (e.g.: residencial, comercial, prestação de serviços, industrial e área
agrícola). Estes grandes categorias podem ser subdivididas, segundo a variabilidade dos
danos, criando novas curvas mais específicas para os padrões de residência e uso do solo, o
que tende a aumentar a exatidão e possibilidade de aplicação. Por exemplo, para o setor
residencial são criadas curvas para cada classe social baseadas no critério de maior
similaridade do valor dos danos.

A sintetização destes dados em curvas representativas de diferentes padrões de


susceptibilidade possibilita que sejam estimados os danos médios ou potenciais de qualquer
propriedade com as mesmas características (mesmo padrão de habitação ou mesma classe de
atividade). No estudo de Penning-Rowsell & Chatterton (1977), considerando apenas o setor
residencial, foram definidos cinco tipos de moradia, quatro períodos de construção do imóvel
e quatro diferentes classes sociais dos moradores. O cruzamento de todos estes aspectos,
considerados pelos autores como os fatores determinantes de susceptibilidade à inundação,
deram origem a 80 conjuntos de dados padronizados.

Uma desvantagem do método sintético é a dificuldade em padronizar informações de danos


relacionadas a todos os aspectos da inundação, como a velocidade e a qualidade da água.
Geralmente, a profundidade da inundação é considerada o fator determinante dos danos e, em

108
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um segundo nível, sua duração. Além disso, a padronização acaba por desconsiderar algumas
particularidades locais. Em áreas com características muito específicas, que possam ter
atividades econômicas voltadas para um segmento social de altíssima ou baixíssima renda ou
com padrões construtivos próprios, como os centros históricos, a aplicação destas curvas só
pode ser feita com alguns ajustes que levem em consideração a realidade local.

A metodologia de criação de curvas DPS foi utilizada por Machado (2005) para estimativa
dos danos diretos decorrentes de uma inundação de grande magnitude (tempo de retorno de
100 anos) que ocorreu no ano 2000 no vale do rio Sapucaí. Combinaram-se dois enfoques:
síntese de dados sobre danos reais e estimativas de danos hipotéticos. A pesquisa de campo
foi elaborada mediante a aplicação de cerca de mil questionários nos municípios de Itajubá e
Santa Rita do Sapucaí. A Tabela 6.1 mostra as funções obtidas em Machado (2005) para
residências. Foram também elaboradas curvas para o setor comercial e de serviços, que,
entretanto, apresentaram menor coeficiente de correlação, tanto pelo menor tamanho da
amostra (147 estabelecimentos comerciais e cinqüenta de prestação de serviços), quanto pela
grande diversidade existente entre as unidades.

Tabela 6.1 - Funções baseadas em curvas DPS obtidas em Machado (2005) para o setor
residencial
Tipo de dano Função
Danos ao conteúdo – residências – classe A y = 67,221 + 29,806 * ln (x)
Danos ao conteúdo – residências – classe B y = 77,737 + 33,921 * ln (x)
Danos ao conteúdo – residências – classe C y = 52,13 + 21,089 * ln (x)
Danos ao conteúdo – residências – classe D y = 32,211 + 12,32 * ln (x)
Danos ao conteúdo – residências – classe E y = 28,738 + 10,663 * ln (x)
Danos totais – residências – classe A y = 90,832 + 39,334 * ln (x)
Danos totais – residências – classe B y = 103,938 + 43,844 * ln (x)
Danos totais – residências – classe C y = 74,685 + 27,388 * ln (x)
Danos totais – residências – classe D y = 18,049 + 33,364 * SQRT (x)

As funções apresentadas na Tabela 6.1, mostram o valor dos danos expressos por unidade de
área (R$/m2), representado pela variável dependente y, em função da profundidade de
submersão (em metros), indicada por x. O valor dos danos à construção pode ser obtido pela
diferença entre o valor dos danos totais e o dos danos ao conteúdo.

No Brasil, outro estudo com criação de curvas DPS foi realizado por Salgado (1995). A
pesquisa é mais simplificada do que em Machado (2005) e contempla apenas o setor
residencial. Para os danos à construção, ateve-se à consulta a especialistas sobre as patologias
causadas, considerando diferentes profundidades de inundação, em projetos tipos
representativos da área inundada. Para a estimativa dos danos ao conteúdo foram utilizados
109
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
padrões de conteúdo e qualidade, segundo os projetos tipos, e estimadas suas avarias pelo
contato com água por meio de pesquisas em lojas de reparo e assistência técnica.

6.1.4.2 Considerações Metodológicas e Limitações


A questão destacada por Shabman et. al. (1998) é se o método realmente produz uma medida
de disposição a pagar (DAP) do proprietário pelo projeto de mitigação de danos, ou seja, se é
uma medida de excedente do consumidor.

Normalmente, apenas argumentos relacionados aos danos físicos à propriedade são


computados no MDE. Mas questões como redução do estresse, do trauma após o evento ou de
perturbações no cotidiano da comunidade, possivelmente compõem as análises dos moradores
sobre os benefícios de um projeto de controle. Sua exclusão pelo método implica na
conseqüente subestimação da DAP.

Além disso, deve haver uma igualdade da percepção do risco e do valor do dinheiro no tempo
entre os proprietários de imóveis inundáveis e o planejador da medida de controle (taxa de
desconto r). Isto possibilita que a análise de viabilidade econômica do projeto se iguale à
análise de aumento do bem-estar da população. A forma como o valor do tempo é
considerado pode implicar em uma subestimação ou superestimação da DAP pelos
planejadores urbanos.

O mesmo ocorre em relação à percepção do risco hidrológico, representado pela função g (xi).
Sabe-se que as informações são imperfeitas e nem sempre acessíveis e que a população forma
suas probabilidades individuais de ocorrência de um evento extremo de forma subjetiva e
diferenciada. Sem as informações de percepção de g (xi) pelos ocupantes não há como saber
se MDE capta adequadamente as preferências.

De forma usual, o método tem como pressuposto que os proprietários são neutros em relação
ao risco (a = 0, na Equação 6.3). Mas, segundo Fischoff (1991) apud Shabman et. al. (1998),
as situações que tipicamente criam um alto nível de ansiedade - fator que desencadeia a
aversão ao risco - são aquelas involuntárias, retardatárias, incontroláveis, desconhecidas,
severas e potencialmente catastróficas. Muitas destas características comumente estão
presentes no risco de inundação. Mais uma vez, o método dos prejuízos evitados tenderia a
levar a uma subestimação da DAP.28

28
Não se considera aqui a situação rara de um agente ávido pelo risco.
110
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Finalmente, todos os proprietários de área inundável esperam ter o valor da sua DAP
integralmente compensada pelo mercado imobiliário quando forem vender ou alugar sua
propriedade na planície de inundação. Apenas desta maneira é assegurado que os pagamentos
feitos pelo projeto de controle serão iguais aos benefícios recebidos tanto na forma de
mitigação dos danos quanto na forma de compensação em dinheiro pela venda ou aluguel. Ou
seja, aqueles que irão comprar ou alugar áreas na planície deverão possuir as mesmas
considerações sobre os danos evitados que os ocupantes da planície de inundação. Esta
coincidência de avaliação entre agentes é improvável.

Obviamente, simplificações e pressupostos são necessários em um modelo. A questão é em


que medida tais suposições não são excessivamente fortes diminuindo o seu nível de
credibilidade ou tornando-o uma opção menos adequada frente a alternativas de representação
do fenômeno. A limitação evidente do MDE é enfoque nos danos diretos, deixando de captar
uma ampla gama de danos associados à inundação, os indiretos, o que leva à subestimação na
avaliação dos benefícios de medidas de mitigação.

Mas, como mostrado no item 5.2, o MDE é um método de associação física, por isso suas
inadequações em captar as preferências dos proprietários. Sua utilização, em conjunto com
outros métodos, de análise comportamental, pode trazer grandes avanços em uma avaliação
integrada das conseqüências da inundação.

6.1.5 Avaliação dos danos indiretos aos setores comercial, industrial e de serviços
segundo o Modelo de Middlesex

Nesta seção é discutido o modelo para estimativa de danos proposto em Parker, Green &
Thompson (1987), pesquisadores do Middlesex Polytechnic Flood Hazard Centre (MPFHC),
aqui denominado, “Modelo de Middlesex”. O centro de pesquisa publicou, em 1977, o
chamado “Manual Azul” (Penning-Rowsell & Chatterton, 1977), com investigações sobre os
danos diretos de inundações e a criação das curvas DPS. As pesquisas avançaram, originando
o “Manual Vermelho”, a publicação de 1987, na qual se enfatizam as conseqüências indiretas
dos eventos. As metodologias sugeridas pelos pesquisadores são utilizadas de forma
padronizada e generalizada na Grã-Bretanha.

Os métodos de avaliação de danos indiretos recomendados são divididos em sete categorias


básicas (Tabela 6.2): 1) manufaturas; 2) varejo, distribuição, salas de escritórios e serviços de
lazer; 3) perturbação ao trânsito; 4) serviços de utilidade pública; 5) serviços públicos; 6)
residências e 7) serviços de emergência.
111
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 6.2 - Métodos de estimativas de danos indiretos segundo o Modelo Middlesex
Dano Método de avaliação
Interrupções e perturbações na atividade
Perda do valor adicionado potencial
industrial
Interrupções e perturbações nas atividades
Perda do valor adicionado potencial
de varejo, distribuição e serviços
Custo marginal de perturbação do tráfego de veículos nas
Interrupções e perturbações de trânsito de
vias devido a uma inundação (custos adicionais de
veículos
transporte e custos de oportunidade causados pelo atraso).
Interrupções e degradação nos serviços de
utilidade pública (transporte, Perda de consumo
telecomunicações, eletricidade, etc.)
Interrupção e subutilização de serviços
Difícil quantificação, por serem bens públicos. Análise de
públicos (educação, saúde, defesa,
vulnerabilidade para detectar os custos adicionais.
cultura, etc.)
Transtornos às famílias e domicílios Custo adicional, “preferência revelada”
Custo marginal dos serviços de emergência realizados em
Serviços de emergência adicionais
decorrência da inundação

O levantamento destes custos foi feito por meio de pesquisas (entrevista ou carta) a indústrias,
atividades comerciais e de serviços, entidades representativas (e.g.: federação das indústrias e
associações comerciais), prefeituras, moradores, empresas de serviços públicos e através de
bibliografia. Em Parker, Green & Thompson (1987) são mostradas várias investigações
anteriores na área, como em White (1964) e Penning-Rowsell & Chatterton (1977).

Dos danos elencados na Tabela 6.2, esta pesquisa procura trazer avanços na discussão sobre
as interrupções e perturbações nas atividades de varejo, serviços e no trânsito de veículos.
Como as pesquisas desenvolvidas nestas áreas em Middlesex foram uma importante fonte de
análise para o desenvolvimento dos estudos propostos nesta tese, no item 6.1.5.1 detalha-se os
danos indiretos associados ao setor comercial, de serviços e à indústria. A avaliação dos danos
devido a perturbações no tráfego desenvolvida pelos pesquisadores do MPFHC é mostrada no
item 6.1.6, que discute especificamente o sistema de transportes.

6.1.5.1 Setor comercial, de serviços e indústrias


A perturbação e paralisação das atividades do setor comercial, de serviços e indústria
implicam em diminuição das vendas ou da produção e na perda de receita (ainda que
momentânea). O prejuízo não é medido como a diminuição ocorrida no faturamento ou no
valor total da produção, esse incorpora salários, matérias-primas, estoque e gastos, como de
aluguel e tributos. A medida de calculo é a perda potencial do valor adicionado.

O valor adicionado (VA) é a diferença entre o valor total das vendas ou da produção e o custo
dos insumos adquiridos de terceiros. Em outros temos, é o valor gerado pela firma por meio

112
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
do seu processo de produção e serviços. A Figura 6.1 mostra o valor adicionado por uma
firma, no caso, uma empresa comercial:

Figura 6.1 - Valor adicionado por uma empresa comercial

O total dos danos indiretos é calculado somando-se a perda do valor adicionado aos custos
adicionais incorridos pela firma pela menor eficiência produtiva em conseqüência da
inundação. Estes custos incluem o pagamento de horas-extras aos funcionários, custo de
transferência da produção para locais mais seguros e custos adicionais de energia elétrica.
Para o setor de comércio e serviços, um custo adicional significativo tende a ser o de limpeza
do estabelecimento, geralmente já computado como dano direto (Parker, Green & Thompson,
1987).

Segundo Parker, Green & Thompson (1987), para cada profundidade de inundação, os danos
diretos potenciais (Dir) da firma, região ou nação são calculados segundo a Equação 6.4:

Dir = Ds + Dep/2 + Der + C 6.4

Onde:
Ds = danos potenciais ao estoque (matérias primas, produtos semi-acabados e bens finais);
Dep = custos potenciais de substituição de equipamentos ou plantas;
Der = custos potenciais de conserto/reparação de equipamentos e plantas;
C = custos potenciais de limpeza adicional.

Considerou-se uma depreciação média de 50% dos equipamentos e plantas no momento


anterior à inundação. Em decorrência, os custos de substituição (Dep) na Equação 6.4 são
divididos por dois, supondo-se que os bens depreciados foram substituídos por itens novos.

A perda potencial do valor adicionado pela firma (Lva) é:

Lva = t.V.[Dn + (Dp.Pn)](1 - R) 6.5

Onde:
113
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t = vendas totais (turnover) por dia;
V = proporção da venda bruta que representa o valor adicionado pelas firmas no processo de
produção;
Dn = número de dias com vendas nulas;
Dp = número de dias com vendas parciais;
Pn = proporção das vendas perdidas durante Dp;
R = proporção da receita (receita que ocorre normalmente, sem inundação) que é recuperada
pela firma.

Os danos indiretos potenciais da firma (IndF) são:

InF = Lva + A 6.6

Onde:
A = custo adicional para recuperação das vendas;
Lva = perda potencial do valor adicionado.

Os danos indiretos potenciais da região são (InR):

InR = Lva (F + Rg) + A 6.7

Em que:
A = custo adicional para recuperação das vendas;
Lva = perda potencial do valor adicionado;
F = proporção de vendas provavelmente perdidas pelo país para concorrentes estrangeiros;
Rg = proporção de vendas provavelmente perdidas pela região para concorrentes de outras
regiões.

Observe-se que aqui foi mostrada a formulação para o setor de comércio. Segue-se
exatamente a mesma lógica para o setor industrial e de serviços, bastando substituir as
referencias a “vendas” por “produção” ou “serviços”. Por exemplo, “V” na Equação 6.5,
representa, para as atividades industriais, a proporção de produção bruta que representa valor
adicionado pela empresa e, para os serviços, a proporção referente ao faturamento.

6.1.6 Avaliação dos danos indiretos no sistema de transporte

Optou-se por discutir separadamente o sistema de transportes pelas particularidades que


envolvem a avaliação dos danos associados à perturbação nos fluxos de veículos. Entretanto,

114
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
muitos dos elementos contidos nesta seção têm forte influência das recomendações de
Middlesex para avaliação dos danos indiretos do sistema de transporte.

A forma encontrada na literatura para se calcular as deseconomias de transporte baseia-se no


custo de transporte adicional (custo material marginal) e nos custos de oportunidade causados
pelo atraso na chegada ao destino (custos por tempo de atraso). A soma destes dois custos
representa o custo potencial pela perturbação no tráfego. Ressalta-se que não apenas as vias
inundadas apresentam transtornos, mas também as vias de desvio, onde o trânsito pode fluir
devagar.

Muitos fatores influenciam os custos associados às perturbações no transito de veículos:


intensidade do tráfego; tráfego em relação à capacidade da via; freqüência, profundidade,
extensão e duração da inundação; extensão e duração do desvio; tipos de vias das rotas de
desvio, entre outros.

Os custos materiais de transporte ocorrem pelo aumento da distância de viagem ou pelo uso
de uma velocidade menos eficiente. Incluem o combustível e os óleos adicionais e os custos
de depreciação do novo tempo de viagem.

Os custos pelo tempo de atraso (delay costs) associam-se a uma variável fundamental: o
tempo. O princípio que envolve os danos indiretos de inundação é de que eles representam
uma perda de oportunidade que nunca será recuperada; não há como voltar no tempo. O
tempo perdido não é recuperado, por isso ele representa um dano.

O valor do tempo representa a quantia máxima que um indivíduo estaria disposto a pagar por
uma economia de tempo ou, alternativamente, a compensação mínima aceitável para um
aumento de tempo de deslocamento. O valor marginal do tempo é composto de dois
componentes: a utilidade marginal do tempo e a utilidade marginal do dinheiro (Parker, Green
& Thompson, 1987).

Variações no valor da utilidade marginal do tempo dependem das condições e motivos do


deslocamento e do seu custo de oportunidade. O valor do tempo gasto na viagem por motivos
de lazer tende a ser menor do que o utilizado no deslocamento para o trabalho. O último pode
ser cerca de cinco vezes maior do que o primeiro (Parker, Green & Thompson, 1987: 72). A
utilidade marginal do dinheiro depende de características pessoais e da renda.

115
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Em termos sintéticos, o valor do tempo de deslocamento está associado a fatores diversos:
habilidade de trabalhar no percurso (caso de transportes coletivos, como metrôs e ônibus);
tempo de deslocamento feito à custa de tempo de lazer; risco de perda de produtividade
associada ao desgaste dos funcionários nas longas viagens entre residência e trabalho; e
aspectos mais óbvios, como a distância e as características e renda dos indivíduos. Evidências
apontam que se deslocar com tráfego congestionado produz maiores valores para o tempo do
que em condições normais, conseqüência do maior nível de stress, frustração e desconforto.
Valores do tempo por passageiro tendem a crescer à medida que o tempo de deslocamento
aumenta e em proporção à renda (Nash & Sansom, 1999).

Estimar valor para o tempo de atraso é um procedimento complexo. O Departamento de


Transportes na Grã Bretanha utiliza-o para avaliar os benefícios em melhorias de vias. Este
arcabouço metodológico pode ser adaptado na avaliação de medidas de proteção a inundação,
mas com dificuldades adicionais. As inundações são eventos extremos de difícil previsão e
pequena duração, ao contrário de uma solução de melhoria no sistema viário criada ante um
problema permanente de tráfego.

Segundo Parker, Green & Thompson (1987) os custos materiais são função do tipo de veículo
e da velocidade e são computados segundo a Equação 6.8:

6.8

Onde:
a, b, c = coeficientes relacionados ao custo material (combustível e outros) que variam
segundo o tipo de veículo;
v = velocidade em quilômetros por hora.

A diferença do custo material com e sem inundação representa o custo material marginal
decorrente da ocorrência do evento.

Já o valor do tempo da jornada é calculado segundo a Equação 6.9 (Parker, Green &
Thompson, 1987):

6.9

Onde:
Cj = custo da jornada;
116
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
d = distância do trecho viário (km);
v = velocidade média da jornada (km/h);
n = número de veículos no trecho;
ct = custo do tempo ($/h).

A medida do valor do tempo da jornada (ct) é de difícil quantificação e possui elevado grau de
subjetividade. A diferença do custo da jornada com e sem inundação representa o custo do
tempo de atraso em decorrência do evento.

Uma formulação semelhante é a de custo marginal externo de congestionamento (CC)


proposta em Nash & Sansom (1999).29 O CC deriva-se do custo externo de congestionamento
em vias (interação entre oferta e demanda na rede viária), nas quais são verificadas como
pequenas mudanças no volume de trafego afetam o tempo de jornada. Em termos
matemáticos:

 c v 
CC   q   2t   6.10
 v q 

Onde:
∂v/∂q = variação da velocidade em relação ao fluxo de carros;
q = volume de trafego (em unidades de carro de passageiros/ hora);
v = velocidade resultante média;
ct = o valor do tempo de deslocamento.

As Equações 6.9 e 6.10 apresentam semelhanças. A diferença principal é que a primeira trata
de uma variação discreta (antes e após a inundação) e a segunda capta mudanças marginais na
velocidade e fluxo de carros.

No Brasil, ressalta-se o trabalho de Nagem (2008) que elaborou uma adaptação das fórmulas
do estudo IPEA/ ANTP (1997) para calcular os prejuízos dos congestionamentos causados
pelas cheias urbanas. Ela apresenta duas formulações - custo relacionado ao tráfego de
combustíveis e custo relacionado ao tempo perdido - que são calculadas para cada via da
região atingida (Equação 6.11 e Equação 6.12):

29
Os autores nomeiam o custo marginal como “externo” por considerarem que, em uma situação de
congestionamento, cada usuário adicional inflige um custo aos outros, ele próprio sofrendo o efeito deste custo.
Este é o elemento externo: algo que é infligido por um usuário aos outros.
117
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
6.11

Onde:
CTC = Custo com combustíveis relacionado ao tráfego;
P = preço de gasolina na bomba;
v = velocidade (km/h);
E = extensão da via (km);
VMH = Volume médio horário;
h = tempo de duração da inundação.

6.12

Onde:
CTT = Custo relacionado ao tráfego com tempo perdido;
RSM = Renda média dos habitantes;
ES = Encargos sociais 95,02% = 1,9502;
FA = Possibilidade de uso alternativo do tempo (0,3);
HP = Número de horas de trabalho por mês = 168 horas;
NP = Número de pessoas por veículo = 1,5 pessoas/auto, de acordo com o Plano
Diretor de Transporte Urbano da cidade do Rio de Janeiro;
HP = Percentual de uso produtivo do tempo (% viagens a trabalho + % viagens
casa/trabalho x 0,75). Caso não disponível, usar 0,5;
VMH = Volume médio horário;
h = tempo de duração da inundação.

6.1.6.1 Aspectos a serem discutidos em uma metodologia de avaliação dos danos da


inundação em decorrência de perturbações nos fluxos de veículos

Uma metodologia de avaliação de danos por inundação da malha viária deve incorporar
custos em decorrência da utilização de rotas alternativas como desvio, mas também o impacto
sobre estas novas rotas, que tendem a ficar sobrecarregadas. Alguns aspectos centrais na
metodologia:

 Construção de um diagrama da rede viária local com seus nós e conexões (Figura 6.2).
Este digrama inclui as principais rotas de tráfego, com aquelas que provavelmente serão
inundadas e aquelas que serão utilizadas como desvios.

118
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
 Determinação do comprimento em quilômetros de cada conexão viária e os tipos de vias
presentes na rede (regional, arterial, coletora, local ou rodovia). O fluxo de veículos e a
velocidade dependem do tipo de via.

 Estimação do fluxo de veículos (veículos/hora) em condições normais e em condições de


inundação.

 Identificação dos tipos de veículos (mix de veículos) em cada conexão viária.

 Determinação das vias obstruídas em decorrência da inundação. As vias a serem fechadas


variam segundo as circunstâncias. Se a polícia está envolvida, as ruas são bloqueadas
quando a água proveniente da movimentação dos carros começa a ameaçar as casas. Caso
não seja introduzido um fechamento formal das vias, seu bloqueio efetivo depende do tipo
de veículo e do julgamento do motorista. Neste caso, a via é fechada progressivamente à
medida que os motoristas decidam evitar o percurso inundado. Considera-se que uma rua
está fechada quando ela é ocupada apenas por água e sua capacidade de transporte de
veículos é nula. Nestas análises é necessário o conhecimento da duração da inundação para
cada via inundada e a estimativa deve ser feita para vários tempos de retorno.

 Seleção das rotas de desvio e re-alocação do tráfego. As vias de desvio são potencialmente
afetadas pelo desejo (escolha) do “viajante”, capacidade do sistema viário e tempo de
alerta. A capacidade viária determina o quanto o tráfego pode ser transferido para trechos
específicos do sistema. A habilidade dos viajantes em escolher, entre as rotas existentes, a
que diminui o tempo total de viagem varia segundo o tempo de alerta e o conhecimento do
motorista sobre a rede viária local. Segundo o tempo de retorno, um número crescente de
vias é inundado e novos desvios são gradativamente incorporados. Mais e mais o tráfego é
desviado para rotas cada vez mais distantes. Torna-se necessário estimar desvios, fluxo de
carros e também a duração da interrupção do trecho para cada freqüência de inundação.

 Cálculo dos custos materiais e de tempo de deslocamento com e sem as condições de


inundação. A diferença entre ambos mostra o custo marginal de perturbações no trafego
em decorrência da inundação.

119
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Figura 6.2 - Exemplo de um diagrama de rede viária com a extensão da inundação
(tempo de retorno de 20 e 100 anos), as junções e os tipos de via
Fonte: Parker, Green & Thompson, 1987:74.

Se o tráfego original na via de desvio é baixo e não é direcionado um fluxo significativo de


automóveis para lá, a velocidade dos carros na via tende a não variar significativamente. Em
conseqüência - como os custos materiais por quilômetro de viagem relacionam-se à
velocidade - o custo adicional por deslocamento em condições de inundação será pequeno,
incorporando apenas os efeitos do aumento da distância.

Por outro lado, como a velocidade do fluxo varia segundo uma função curvilínea; se o fluxo
aumenta, os custos materiais crescem rapidamente, assim com os custos pelo tempo de atraso.
Para uma análise minuciosa dos problemas e limitações dos métodos, ver Parker, Green &
Thompson (1987:80-81).

Além da capacidade das vias, um aspecto a considerar é a hora e o dia em que a inundação
ocorre, e mesmo o mês, pois a intensidade do tráfego varia significativamente no tempo.
Observa-se, por exemplo, uma tendência de aumento na intensidade do tráfego nos horários
de fim de expediente de trabalho, sextas-feiras e no mês de dezembro.

Uma escolha metodológica a ser feita refere-se ao nível de detalhamento da rede viária.
Parker, Green & Thompson (1987) consideram que esta decisão depende da magnitude dos

120
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
danos associados à perturbação do tráfego e das características da rede viária impactada.
Autores, como Sohn (2006), atestam que nem sempre a inclusão das vias locais é necessária.
Embora se saiba que elas, principalmente na vizinhança dos links impactados, são alternativas
possíveis de desvio de tráfego, tanto como escolha dos próprios condutores para que alcancem
os seus locais do destino, como para um plano de emergência e evacuação, o pesquisador
aponta algumas razões para sua não inclusão.

Segundo Sohn (2006), o sistema viário principal normalmente já cobre grande parte da área
analisada e do fluxo de veículos da região. Logo, representa o eixo estruturante da circulação
de agentes e bens da região de estudo. Em segundo lugar, o sistema viário local pode não ser
um substituto para uma interrupção da via coletora ou arterial, uma vez que sua capacidade
tende a ser bem inferior. E ainda que a malha viária local tenha capacidade para receber o
fluxo interrompido e este se distribua em vários links, esta repartição precisa ser feita de
maneira criteriosa e organizada - o que normalmente não ocorre - sob pena de que surjam
enormes congestionamentos que levem atém mesmo à paralisação do fluxo. Se há um plano
de emergência eficiente, a possibilidade de fluidez do tráfego é maior. Observe que a
habilidade do sistema viário em absorver impactos na rede está associada à sua
vulnerabilidade, com análise do seu grau de redundância e de dependência da rede em relação
à via atingida.

Obviamente, todas estas questões devem ser discutidas à luz do sistema viário atingido. Se um
dos focos de pesquisa são os planos de evacuação e emergência de curto prazo, deve ser
verificada a capacidade das vias alternativas e possivelmente será necessário considerar o
sistema viário local.

6.2 Modelos microeconômicos baseados implicitamente no mercado


real: Método dos Preços Hedônicos
O método dos preços hedônicos - MPH-, também denominado método de preço implícito,
baseia-se na identificação dos atributos que interferem no preço de um bem transacionado no
mercado (Shabman L. et al., 1998; Chao, Floyd & Holliday, 1998). Reconhecidos estes
atributos, é possível isolá-los e estimar seus valores os quais, implicitamente, estão no preço
final do bem. É uma forma de conhecer valores não diretamente negociados na economia,
mas que são atributos de produtos existentes no mercado.

Nas inferências, utilizam-se com freqüência os preços de propriedade (ou da terra),


considerando que refletem as características naturais e sócio-econômicas da área. Os modelos

121
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
baseados na propriedade (Housing Models) têm sido amplamente utilizados para investigar
diversos efeitos, como presença de escolas, qualidade do ar, taxas de criminalidade,
miscigenação racial, acesso a empregos, zonas de terremoto e, mais recentemente, a
influência de áreas inundáveis (Donnelly, 1989).

O método dos preços hedônicos é um método de valoração econômica antigo é com ampla
utilização. Segundo Lezcano (2004), a referência mais antiga de aplicação da teoria remonta a
1929:

A análise do preço hedônico tem origem na economia agrícola quando


Fedreick V. Waugh (1929) publicou seu pioneiro estudo sobre fatores
qualitativos que influenciam os preços dos vegetais, (...) Waugh fez uma
regressão dos preços por lote de aspargos em Boston (maio-junho, 1927) sob
três diferentes dimensões de qualidade: avaliação da cor, tamanho da haste e
uniformidade dos brotos. Seu objetivo era determinar a valorização relativa
que os consumidores davam a essas características, as quais consideravam
como informações úteis para os produtores de aspargos. (Ferreira Neto,
2002:03 apud Lezcano, 2004).

Como os grandes difusores do MPH, têm-se Griliches (1971) apud Rondon (2003), com uma
formulação mais genérica, e Rosen (1974) apud Chao, Floyd & Holliday, (1998), referência
clássica por ter formalizado as suas bases teóricas. A partir de então houve grande utilização
do método, notadamente na segunda metade da década de 70 e durante a década de 80.

Apesar de possível a aplicação do MPH em qualquer bem composto privado cujos atributos
sejam complementares a bens ou serviços ambientais, a utilização mais usual está relacionada
aos preços de propriedades. O preço de uma propriedade é função de várias características,
classificadas essencialmente em quatro grandes grupos: 1) características da propriedade (e.g.:
tamanho, idade e tipo de revestimento), 2) características da localização (e.g.: índice de
criminalidade, renda média e qualidade das escolas), 3) acessibilidade (e.g., acesso a serviços
e áreas comerciais, proximidade de rodovias ou metrôs) e 4) condições de mercado
(influência de fatores conjunturais de mercado, como desemprego e crescimento
populacional). Em áreas sujeitas à inundação, o risco de sua ocorrência também é uma
variável que pode interferir no preço do imóvel, podendo ser considerada uma característica
da propriedade. Em termos matemáticos,

pi = f (ai1, ai2, ai3, ai4, ai5, ..., Fi) 6.13

Onde:
pi = preço da propriedade i
ai = vários atributos da localidade i
122
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Fi = variável que mede o risco de inundação

O modelo de preços hedônicos mede a contribuição de cada atributo no valor da propriedade,


para a variável “inundação”, tem-se:

Preço Hedônico = ∂ pi / ∂ Fi 6.14

O preço hedônico corresponde ao preço marginal do atributo Fi e representa a disposição a


pagar do consumidor por uma unidade adicional de Fi. Espera-se que a função diferencial seja
não linear. Sua linearidade implicaria na constância do preço marginal de Fi e sua
independência em relação aos demais atributos ambientais. Isto não seria possível em uma
situação real: significaria que o morador poderia escolher separadamente a quantidade
desejada de Fi e dos demais atributos de sua residência (Maia, 2002).

Comparando-se o preço de um imóvel com as mesmas características dentro e fora da planície


de inundação tem-se:

 p
n n
∆ pi = pout – pin = f (aout, 0) – f (ain, 1) =  Δ pd +   pn -
d 1 i 1 p 1
p 6.15

Onde:
∆pi = variação no preço de propriedades devido à sua localização dentro ou fora da planície de
Inundação;
pout = preço da propriedade não sujeita ao risco de inundação;
pin = preço da propriedade sujeita ao risco de inundação;
aout = atributos da localidade situada fora da planície de inundação, com excessão do atributo
relacionado ao risco de inundação;
ain = atributos da localidade situada dentro da planície de inundação, com excessão do
atributo relacionado a risco de inundação;
0 e 1 = variável dammy para localização do imóvel dentro da planície de inundação (“1”) ou
fora dela (“0”);
∆ pd = preços hedônicos para danos diretos;
∆ pn = preços hedônicos para atributos negativos da localização na planície de inundação
(exceto danos diretos);
∆ pp= preços hedônicos para atributos positivos da localização na planície de inundação.

123
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Na Equação 6.15, ∆pi representa o custo adicional de se morar em uma planície de
inundação.30 Seu valor baseia-se na avaliação subjetiva que os consumidores fazem dos
atributos associados à localização em uma área inundável e de quanto estariam dispostos a
pagar para evitá-los.

Embora, para fins analíticos, a Equação 6.15 faça distinção entre atributos positivos (e.g.:
valores estéticos e possibilidade de recreação), atributos negativos (e.g.: fatores emocionais
associados à experiência com inundação, custos de evacuação temporária, projeção de perda
de renda e pagamento de seguro contra inundação) e danos diretos, o método normalmente
captura integramente os efeitos da inundação no valor da localização, não sendo possível
distinguir os tipos de danos. Ressalta-se que como no interior da planície de inundação os
atributos tendem a variar, uma variável que capte os incrementos no nível de risco seria mais
adequada do que a utilização de uma variável dummy.

Mas o modelo de preços hedônicos tem pressupostos rígidos que acompanham a análise
econômica neoclássica. Supõe-se que o mercado de moradias é concorrencial e está em
equilíbrio. Para garantir este equilíbrio, as seguintes suposições adicionais devem ser feitas:
os consumidores têm completa informação sobre os preços das residências; os agentes
possuem mobilidade de deslocamento entre bairros; os custos de transação e de deslocamento
são nulos e os preços se ajustam instantaneamente ante mudanças na oferta e demanda. Além
disso, os agentes têm percepção sobre o risco de inundação e sobre as características dos
imóveis.

Segundo Rondon (2003), a hipótese de mercado concorrencial pode ser considerada


verossímil, uma vez que,

...há um elevado número de compradores e vendedores no mercado de


imóveis (mercado atomizado) e informação perfeita quanto à qualidade do
produto e preço, pois, usualmente, os inquilinos podem visitar o imóvel
antes de alugá-lo (Rondon, 2003: 67).

A mobilidade de deslocamento seria justificada pelo dinamismo do mercado imobiliário, no


qual o ajustamento a mudanças nas condições de oferta é bastante rápido, em virtude do
elevado número de apartamentos disponíveis para locação (Rondon, 2003).

30
Também podem existir benefícios atribuídos à localização em uma área inundável, como as possibilidades de
recreação dentro e no entorno do rio e a incorporação de valores estéticos e ambientais à área.
124
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A hipótese que, possivelmente, encerre mais discussão seja a de há conhecimento sobre o
risco. Como será discutido no item 6.2.1, se esse existe, ele tende a ser limitado e assimétrico.

Atualmente já existe um volume significativo de estudos que aplicam o MPH para estimar o
impacto do risco da inundação sobre o valor das propriedades e, adicionalmente, calcular os
benefícios de medidas de controle. Parte significativa dos estudos utiliza variável dummy para
representar se a propriedade está dentro ou fora da planície de inundação de 100 anos.

Texto usualmente referenciado é o de Donnelly (1989) que utilizou um modelo de regressão


linear múltipla para analisar 345 moradias a montante do Rio Mississipi nos Estados Unidos.
Os resultados mostram que o valor de venda de uma residência diminui 12,05% pela sua
localização em uma planície de inundação. Segundo o autor, o valor é significativamente
superior ao pago às seguradoras como prêmio em caso de inundação (cerca de 5% do valor do
imóvel), o que indica que o risco percebido pelos comparadores difere do risco atuarial. O
estudo contraria uma visão freqüente de que as pessoas são “míopes” em relação à localização
em uma planície de inundação (Donnelly, 1989).

Miyata & Abe (1994) utilizaram o método de preços hedônicos para estimar os efeitos de um
projeto de controle de inundação na bacia do rio Chitose, região de Hokkaido, no Japão. O
estudo mede os benefícios de uma redução do risco por meio do MPH e por meio da
utilização de curvas DPS. Utilizando-se o método dos preços hedônicos, chega-se a uma
relação benefício-custo da medida de controle de 0,27, indicando que, dentro da perspectiva
do estudo, o projeto não é eficiente. Com a utilização das curvas de danos, o resultado indicou
uma razão benefício-custo de 1,99, valor bastante superior ao da analise anterior.

Há estudo relevante desenvolvido por Shabman et al. (1998) comparando técnicas de


estimação de benefícios para a redução do risco em Roanoke, Virgínia. A variável de risco foi
medida considerando a localização de cada propriedade na zona de inundação (ZI). Os
resultados mostram que os compradores de imóveis, após 1985, quando ocorreu uma grande
inundação, estariam dispostos a pagar maiores preços pelas propriedades com menor
probabilidade de serem inundadas. Antes de 1985, ao contrário, a localização das residências
em zonas de inundação não teve um impacto significativo no preço da terra. A pesquisa
sugere a importância da memória da inundação. Apesar do risco de inundação sempre ter
existido, ele só se tornou presente nas formulações de percepção do risco após o evento.

125
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Chao, Floyd & Holliday (1998) apresentam dois estudos de caso: Abilene no Texas e South
Frankfort, Kentucky. Compõe o estudo uma amostra relativamente grande, 4.700 observações
compreendidas entre o período de1988 e 1993. Para a localização fora da planície ou em área
sujeita a cheia com tempo de retorno de 100 anos, os coeficientes não foram estatisticamente
significativos ao nível de confiança de 95%. Este comportamento se justificaria pela hipótese
de que os consumidores não consideram a ocorrência de eventos raros em suas análises
subjetivas sobre o valor da residência. Os resultados apenas mostraram-se significativos para
as residências com valores de venda mais baixos e que se localizavam em áreas afetadas por
inundações mais freqüentes (tempo de retorno de 10 anos ou 25 anos).

A segunda área pesquisada pelos estudiosos é South Frankfort em Kentucky. O estudo


englobou características de treze pares comparáveis de residências vendidas entre 1989 e
1991. Compunham os pares, propriedades estruturalmente similares, mas que se diferiam por
terem sofrido ou não impacto direto da cheia de 1978, um evento de tempo de retorno de 150
anos. As conclusões são que, tanto a probabilidade de inundação quanto a área, tem um efeito
estatisticamente significativo sobre o preço das propriedades. Em média, os preços das
propriedades caem 0,16% para cada aumento de 1% na probabilidade da inundação.

Bartosová et al. (1999) realiza um estudo amplo e detalhado com algumas possibilidades de
variável de risco. O modelo utiliza quarenta variáveis independentes e as informações
compreendem o período de 1995 a 1998 para 1.431 propriedades. A área de estudo tem
aproximadamente 18,5 km e localiza-se ao longo do rio Menomonee em Wisconsin, Estados
Unidos. O estudo mostrou uma clara relação entre redução do risco de inundação e
crescimento no preço das propriedades: as propriedades próximas ao rio tenderiam a ser
vendidas por um valor aproximadamente 7,8% menor do que o daquelas fora da planície.
Entretanto, quando o risco de inundação diminui em 10 anos, o preço das residências
cresceria em 2,3%. Ao intervalo de recorrência de 33,3 anos ou mais, eliminar-se-ia o efeito
negativo do risco de inundação. A pesquisa discutiu ainda os efeitos sobre os preços das
propriedades de uma inundação ocorrida em 1997. Concluiu-se que, antes da inundação,
propriedades próximas ao rio foram vendidas por um valor 5,1% menor do que o de
propriedades semelhantes fora da planície. Considerando um ano após a inundação, esta
relação entre preços é de 18,9%, o que indica também a interferência da memória da
inundação sobre o valor das propriedades.

Entre os estudos mais recentes, está o de Zhai, Fukuzono & Ikeda (2003). Utiliza-se o método
de preços hedônicos para avaliar os efeitos do risco de inundação em uma área densamente
126
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
ocupada e com intensa atividade econômica no Japão. A região foi alvo de uma cheia de
grande magnitude em setembro de 2000 (inundação Tokai), que causou inclusive a morte de
10 pessoas. Relacionadas ao risco, além da variável “profundidade da inundação”, foram
utilizadas variáveis dummy para medir a variação de preços de propriedade antes e depois da
cheia de 2000. Nos resultados, observou-se que a inundação tem efeito sobre o preço das
propriedades e de que esse foi afetado pela grande cheia de 2000.

No Brasil, o único trabalho encontrado sobre a utilização do método dos preços hedônicos
para estimar o efeito do risco da inundação sobre o valor das propriedades foi de Lezcano
(2004). A pesquisadora utilizou o modelo para relacionar os efeitos do risco de ocorrência de
inundação, representado pelo período de retorno, sobre a variação no preço dos imóveis.
Como área de estudo tem-se a bacia do rio Atuba, localizada na Região Metropolitana de
Curitiba. É uma bacia de densa ocupação urbana que sofre com relativa freqüência os efeitos
negativos de enchentes urbanas. Foram coletados dados de 159 imóveis residenciais com o
levantamento de doze variáveis consideradas relevantes na valorização do preço de venda:
estruturais (área construída, área do terreno, tipo de construção e idade do imóvel);
localizacionais (município, distância ao centro de Curitiba e proximidade a áreas de ocupação
irregular); de infra-estrutura (tipo de pavimentação, disponibilidade de sistema de coleta de
esgoto e proximidade de equipamentos urbanos); ambiental (proximidade a áreas verdes e de
recreação) e de inundação (risco de ocorrência de inundação na área onde se localiza o
imóvel, expresso pelo período de retorno).

Utilizou-se o modelo de regressão log-linear para relacionar o valor de mercado dos imóveis
com suas respectivas características. Com as informações obtidas, Lezcano (2004) avaliou o
impacto que uma medida de controle de inundação teria sobre o valor dos imóveis ao
aumentar o tempo de retorno das cheias que os atingem de 10 para 100 anos. Os resultados
mostram que eles apresentariam uma valorização de 17% em seu preço de venda.

A Tabela 6.3 mostra uma síntese de alguns trabalhos consultados e suas conclusões.

127
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 6.3 - Síntese de estudos com a utilização do método dos preços hedônicos para
avaliar o impacto do risco de inundação

Estudo Interesse Conclusão


Donnely Um dos primeiros trabalhos relevantes na área. Valor de venda de um imóvel é menor pela sua
(1989) localização em uma planície de inundação (Tr=100
anos). Queda no valor do imóvel é superior ao
prêmio pago pelas seguradoras.

Miyata & Abe Comparação entre o Método dos Preços Pelo Método dos Preços Hedônicos, um projeto de
(1994) Hedônicos e o Método dos Danos Evitados controle de cheias não é viável economicamente, pelo
(danos associados aos níveis de vazão). método dos danos evitados, ele é.
Utlização de malha regular.

Shabman et al. Estudo didático e consistente. Utilização de Antes de um evento de inundação, os valores das
(1998) zonas de inundação. propriedades não refletiam o risco, após o evento,
eles passaram a refletir.

Chao, Floyd & Segmentou-se o mercado de imóveis segundo o O preço de venda não reflete a ocorrência de eventos
Holliday preço de venda. Grande volume de raros (Tr superior a 100 anos).
1 observações (4.700).
(1998)

Chao, Floyd & Utilização de pares comparáveis de Os preços das propriedades caem para cada aumento
Holliday residências. Inclusão de apenas duas variáveis da probabilidade de inundação. Maior consciênca dos
2 independentes (freqüência da inundação e área moradores sobre danos onde o seguro é obrigatório e
(1998)
da propriedade). Relação entre desconto pela inundações mais frequentes.
localização em uma planície de inundação e
valor esperado dos danos diretos anuais.

Bartosová et al. Utlização de 40 variáveis dependentes, 5 Correlação entre redução do risco e crescimento do
(1999) relacionadas ao risco de inundação. Utilização valor da propriedade (dentro da planície de
de sistema de informação geográfica (SIG). Tr=100anos). Ao intervalo de recorrência de 33,3
anos, elimina-se o efeito negativo do risco obre o
valor das propriedades. Ocorrência de um evento de
inundação tem efeito sobre o valor da prpriedade no
curto-prazo.

Zhai, Fukuzono Estudo relativamente recente. Utilização da Inundação tem efeito sobre o preço das propriedades
& Ikeda variável profundidade de inundação. e estas foram afetadas pela grande cheia de 2000.
(2003)

Lezcano Estudo feito no Brasil. Aumento considerável do preço de venda das


(2004) residências com o aumento do tempo de retorno das
cheias que os atingem de 10 para 100 anos.

6.2.1 Considerações metodológicas e limitações

Uma das vantagens do MPH é a possibilidade de estimar o benefício por meio do


comportamento de consumidores no mercado. O preço da terra (e do imóvel) é o resultado de
uma avaliação subjetiva feita pelos agentes, que incorpora tanto benefícios associados à
segurança da propriedade (danos diretos evitados), quanto aqueles relacionados ao bem-estar
social e individual (danos indiretos e intangíveis evitados). Utilizar o mercado e as relações
subentendidas que o governam como fonte de análise tem conveniências, pois não são
necessárias suposições sobre a atitude pessoal de risco, taxas individuais de desconto e
probabilidades objetivas. Mas também é fonte potencial de problemas.

128
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A análise de preços hedônicos somente pode gerar estimativas de benefícios de projetos de
mitigação por meio de residências diretamente afetadas pela inundação. Se não existe ameaça
de inundação na propriedade, seu preço não será influenciado pela construção de uma medida
de controle. Isto significa que a avaliação de um residente fora da planície de inundação, mas
que por razões cívicas estaria disposto a pagar por um projeto de mitigação de danos, não é
considerada na análise. Motivações cívicas não são então captadas pelo modelo (Shabman et
al., 1998).

O conhecimento sobre a ocorrência de inundação é diferente entre planejadores públicos,


agentes imobiliários e compradores e também entre indivíduos em cada um destes grupos. Os
corretores de imóvel, mesmo inteirados sobre risco e inundações, podem omitir informações
aos possíveis compradores por motivos estratégicos. Existe a possibilidade dos indivíduos
subestimarem ou superestimarem a probabilidade de ocorrência da inundação (Parker, Green
& Thompson, 1987). Informações técnicas sobre o risco de inundação são escassas, algumas
vezes de difícil entendimento e nem sempre de fácil acesso. A presença de seguro de
inundação é um fator que pode estimular a busca de informações pela comunidade, conforme
estudo de Chao, Floyd & Holliday, 1998.

O modelo de preços hedônicos não é capaz de distinguir entre a “falta de consciência” sobre o
risco de inundação e falta de disposição a pagar por uma medida de controle. Obviamente,
logo após um evento extremo, esta falta de consciência tende a diminuir, como mostraram
alguns trabalhos apresentados (Shabman et al., 1998; Bartosová et al., 1999; Zhai, Fukuzono
& Ikeda, 2003). Fatores como expectativa em relação à assistência governamental após o
desastre natural e existência de seguro contra inundação adicionam complexidade ao
funcionamento do mercado em alguns países.

O MPH possui dificuldades técnicas intrínsecas (Shabman et al., 1998). Para que o modelo
seja válido, os atributos devem variar significativamente entre as propriedades que compõem
a amostra. Quanto menor a variação nas características, maior é o potencial de erro.
Adicionalmente, vários problemas podem surgir ao ser utilizada uma análise transversal para
estimar a equação de preço. Algumas vezes, os preços em uma planície de inundação são
afetados por fatores exclusivos à planície que não necessariamente são decorrentes dos efeitos
potenciais de uma inundação. Seu desenvolvimento pode ter sido único em relação ao resto da
região tornando-a um mercado com características bem próprias e, portanto, não comparável
ao restante.

129
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Para Mitchell & Carson (1989) há dificuldade em se encontrar residências genuinamente
comparáveis em uma região. Há ainda o grande número de variáveis que interferem no preço
das propriedades. Muitas delas de difícil acesso e outras, impossíveis de capturar. Podem
existir expectativas em relação a mudanças futuras na localidade, como a construção de
alguma área de lazer ou centro comercial, que interferem na determinação dos preços, mas
não são capturáveis na equação de regressão. Um problema verificável frente à análise da
literatura é a dificuldade em encontrar a forma funcional adequada para mostrar a relação
entre preço e atributos, embora tenham sido percebidos avanços nesta área, como a utilização
da transformação Box-Cox.31

Ainda que o modelo de preços hedônicos possa ser usado com razoável confiabilidade, os
resultados nem sempre originam uma medida da disposição a pagar. Conceitualmente, o
modelo gera o preço implícito marginal da característica em questão. Para medir os benefícios
de uma mudança não marginal no nível de proteção, alguns procedimentos ainda seriam
necessários, como definir a função de demanda inversa, função da disposição a pagar pela
amenidade de interesse, por meio da qual seria calculado o excedente do consumidor (Maia,
2002; Shabman et al. 1998).

6.3 Modelos microeconômicos baseados em mercados hipotéticos:


Método da Valoração Contingente
O Método da Valoração Contingente - MVC - é bastante difundido na definição de valores
monetários para bens públicos e, especialmente, para recursos e serviços ambientais –
proteção de ecossistemas, parques naturais, espécies em extinção, melhora da qualidade da
água, ecoturismo, conservação do solo, etc. -, quando pode ser a única alternativa viável de
valoração (Nunes & Bergh, 2001). Pelas características teóricas e conceituais do método, a
literatura registra suas potencialidades e qualidades para estudos de impacto da inundação e
na estimativa dos benefícios de medidas de controle.

Por meio do MCV procuram-se saber, com a utilização de entrevistas individuais, as


preferências da população no consumo de bens públicos e inferir a disposição a pagar pela
melhoria quantitativa ou qualitativa na sua provisão (DAP). Diz-se “contingente”, por extrair
valores de DAP que são contingentes a um mercado hipotético específico descrito ao
entrevistado. Por não utilizar o mercado real como base de análise, MVC capta uma classe de
valores de quantificação difícil, como os valores de existência e de opções de uso.

31
A transformação Box-Cox permite, através da variação de um parâmetro, englobar toda uma classe de
formas funcionais de transformação de atributos em variáveis explicativas. (Lezcano, 2004: 85).
130
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A origem do método remonta à década de quarenta, quando o economista Ciriacy-Wantrup
sugeriu o uso de entrevistas diretas para medir os valores associados aos recursos naturais. No
seu livro - Resource Conservation: Economics and Policies, de 1952 – ele preconiza o
método de entrevistas e propõe o desenvolvimento de uma nova área de conhecimento, a
“economia da diversidade biológica”.

Mas o grande difusor e responsável pelo arcabouço metodológico do MVC foi Robert Davis,
no início dos anos sessenta. A fim de estimar os benefícios da recreação ao ar livre no estado
norte-americano de Maine, famoso pelas suas florestas de pinheiros, o pesquisador, utilizando
os jogos de oferta32, recorreu a uma série de entrevistas individuais. Foram entrevistadas 121
pessoas. Segundo Davis, os entrevistados responderam às questões seriamente e expressaram
valores críveis:

Durante os jogos de oferta, os comentários dos respondentes indicaram que


eles raciocinam sobre as possíveis alternativas da mesma forma que um
comprador, diante de diferentes tipos e cortes de carne, analisa seu preço e
aspecto. Além disso, a relação entre a renda e as outras respostas
relacionadas à preferência sugerem consistência econômica (Davis, 1964:
397 apud Mitchell & Carson, 1989:10).33

Para testar a racionalidade das respostas, Davis estimou uma equação que explicava uma
grande porcentagem da variância na quantia de DAP como função da renda, tempo de
permanência na área e familiaridade com o local. Seguiram-se vários estudos influenciados
pela pesquisa de Davis, especialmente para avaliar áreas de lazer associadas à natureza, como
parques e bosques.

A partir dos anos setenta, o método é utilizado para uma ampla variedade de temas, como
lazer, caça, qualidade da água e do ar, despejo de lixo tóxico, benefícios estéticos de obras
públicas e benefícios do suporte do governo a artes. Associado à sua generalização, há o
refinamento do MVC, e vários estudos estabelecem sua consistência teórica com a economia
do bem-estar. Ressaltam-se os esforços conduzidos pelo pesquisador Randall e colaboradores,
especialmente no trabalho Biddings Games for Valuation of Aesthetic Environmental
Improvements, feito em 1974 (Randall et al., 1974). A consolidação do método veio com a
sua aceitação e recomendação por órgãos oficiais e entidades norte-americanas, como Water
Resource Concil, U. S. Army Corps of Engineers, Department of the Interior e U.S.
Environmental Protection Agency.

32
Forma de questão onde o entrevistado responde se está de acordo ou não com uma quantia estabelecida (ver
Tabela 6.4).
33
Escrito originalmente em inglês.
131
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
O MVC tem como base metodológica a criação de cenários hipotéticos, com características
que estejam o mais próximo possível das existentes no mundo real, para que os agentes
revelem suas preferências e decisões da forma mais realística possível. Na avaliação de danos
de inundação podem ser criados dois cenários alternativos: com inundação e sem inundação,
ou, em termos mais relativos, negocia-se a mercadoria “diminuição do risco”.

Nesta situação virtual, a diminuição do risco ou a adoção de uma medida de controle de cheia
é uma mercadoria que pode ser negociada e consumida segundo necessidades e preferências,
tal como no mercado real. As preferências, na ótica da teoria econômica, devem ser expressas
em termos monetários (Shabman et al., 1998).

Para um proprietário de um imóvel residencial, sua DAP pode ser expressa segundo a
Equação 6.16:

DAP = f (E∆DP, E∆VI, E∆ANX, E∆L, SI, RN, HT) 6.16

Onde:
DAP: Disposição individual a pagar por um projeto de mitigação dos danos da inundação;
E∆DP: Expectativa de variação dos danos à propriedade após o projeto;
E∆VI: expectativa de variação no valor dos imóveis após o projeto;
E∆ANX: expectativa de diminuição do stress decorrentes da inundação;
E∆L: expectativa de diminuição dos transtornos na localidade;
SI: presença ou não de seguro pelo proprietário;
RN: Renda do proprietário;
HT: horizonte de tempo utilizado na análise individual.

A Equação 6.16 mostra alguns possíveis fatores considerados na análise do agente econômico
sobre sua DAP. No caso do proprietário de um estabelecimento comercial ou industrial, outras
variáveis também são incorporadas, como a esperança de menores danos ao estoque e a não
paralisação das atividades.

Este método utiliza dois mecanismos de valoração: a disposição a pagar (DAP) e a disposição
a aceitar (DAA). A DAP é a soma máxima de dinheiro que o indivíduo estaria disposto a
pagar por um bem, por exemplo, por uma amenidade ambiental. É o chamado “preço de
reserva” na teoria microeconômica. Por este preço, a pessoa é indiferente entre ter o bem (e
perder o dinheiro) ou não (e manter o dinheiro). A DAA é a soma mínima de dinheiro que o
consumidor exigiria para voluntariamente renunciar a uma melhoria que, caso contrário, seria
132
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
experimentada. É a quantia que tornaria o indivíduo indiferente entre ter a melhoria ou
renunciá-la com o ganho extra de dinheiro (Freeman III, 1993).

A DAP teria como cenário inicial a ausência de melhoria ambiental, a DAA pressuporia a
presença de algum benefício ambiental no nível atual de bem-estar ou utilidade (Freeman III,
1993). Como preconizam Daun & Clark (2000): se a amenidade ambiental representa um
aumento do status quo, o método de eliciação seria o DAP; se, ao contrário, o respondente
tem que comparar o seu status quo corrente com um novo, onde a qualidade ambiental é
menor, seria utilizado o formato DAA. Em uma situação intermediária, quando o gasto está
associado a uma manutenção do atual nível de bem-estar, a forma apropriada seria o DAP.

Supondo racionalidade econômica, as medidas DAP e DAA em relação a alterações no risco


(R) devem implicar, no mínimo, à manutenção da utilidade inicial do consumidor. Tem-se:

U (R0, RN0) = U (R-, RN-) = U (R+, RN+) = U (R-, RN -, DAP) = U (R+, RN +, DAA) 6.17

Sendo:
U: Utilidade;
R: Risco de Inundação;
RN: Renda;
DAA: Disposição a aceitar uma compensação pelo aumento do risco (pouco verossímil);
DAP: Disposição a pagar por uma medida para diminuição do risco.

Os subscritos 0, +, - representam, respectivamente, valor inicial da variável, acréscimo no


valor e redução no valor.

As equações acima mostram combinações distintas de renda e risco que satisfariam da mesma
forma o consumidor.34 Como não é possível estimar a função utilidade diretamente no
mercado, as informações sobre “disposição a pagar” ou “disposição a aceitar” são feitas via
método da valoração contingente, por meio de pesquisa de campo. Comumente usam-se
questionários em formato aberto ou em modo de referendo. O estudo pode ser enriquecido
com uma estimativa da função demanda que correlaciona os valores da DAP/DAA com
indicadores socioeconômicos (nível de renda e educação dos entrevistados) e outras variáveis
explicativas (Mikhailova & Barbosa, 2004). Para alcançar resultados confiáveis, a definição
metodológica deve ser feita de maneira criteriosa.

34
As curvas de indiferença mostram combinações de bens e consumo (cestas de bens) em que o consumidor
estaria igualmente satisfeito de consumi-las, ou seja, é indiferente entre as cestas.
133
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A forma de obtenção da DAP/DAA – ou de “eliciação”, termo usualmente empregado na
literatura sobre o tema que possui o sentido de “extrair” uma informação - é uma etapa
fundamental do método (Mitchell & Carson, 1989; Motta, 1998; Nutti, 2000). As formas de
eliciação são divididas em dois grandes formatos: formato aberto e formato fechado. Na
forma aberta, também chamada lances livres (open-ended), pergunta-se ao entrevistado
quanto ele estaria disposto a pagar ou a aceitar como compensação financeira por uma
mudança na oferta de determinado bem ou serviço. O método é apropriado caso a população
pesquisada possua algum conhecimento sobre o bem em questão. Segundo Motta (1998), esta
é a forma pioneira do MVC, mas tem sido abandonada em favor de outras técnicas.

No formato fechado o pesquisador já oferece um valor ao respondente, e este o aceita ou não.


Segundo a interatividade desejada, existe várias possibilidade de condução da entrevista:
jogos de oferta ou jogos de leilão (bidding games), cartões ou opções de pagamento,
referendo (escolha dicotômica) e referendo com acompanhamento (mais de um valor).
Atualmente, a escolha dicotômica tem sido preferível em relação às demais (Motta, 1998).

A Tabela 6.4 apresenta uma síntese das formas de eliciação no MVC.

Tabela 6.4 - Formas de eliciação no Método de Valoração Contingente


Forma de Liciação Características
Pergunta-se ao entrevistado o quanto ele estaria disposto a
Lances livres pagar ou a aceitar como compensação financeira por uma
mudança na oferta de determinado bem ou serviço
O entrevistado concorda ou não com a quantia estabelecida.
Jogos de oferta
Repete-se o experimento com novos valores, até o consenso
ou jogos de leilão
entre entrevistador e entrevistado. Forma mais recomendável
(bidding games)
para populações com baixo grau de renda.
O entrevistado recebe um cartão com uma escala de valores
Cartões ou opções de pagamento
associados e escolhe uma.
Responde-se à questão: “você está disposto a pagar um valor
Referendo
X?”. A quantia é variada sistematicamente no decorrer da
(escolha dicotômica)
amostra para avaliar a freqüência das respostas.
Referendo com acompanhamento Como o referendo, mas, acrescenta-se uma segunda pergunta,
(mais de um valor) aumentando ou diminuindo o valor.

Entre os trabalhos mais recentes relacionados ao risco de inundação, está o de Brouwer et al.
(2006), feito para Bangladesh, país que, com 80% de sua área situada dentro de uma planície
de inundação, sofre inundações freqüentes. Brouwer et al. (2006) consultou 672 moradores
rurais, de baixa renda, sobre sua DAP pela construção de um dique para reduzir o nível
corrente e futuro de risco. A eliciação foi feita por escolha dicotômica com uma oferta
específica.

134
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A pesquisa confirma o que a literatura observa sobre a aplicação de MVC em países em
desenvolvimento, onde, em conseqüências das severas restrições financeiras, há um grande
número de lances nulos (e.g. Georgiou et al., 1997 apud Brouwer et al., 2006). Na análise das
repostas dos moradores, 40% responderam positivamente à adoção de uma medida de
controle. Entre os que responderam negativamente, 80% alegaram falta de recursos
financeiros. Segundo o modelo de estimação utilizado, a DAP foi de 3,23 dólares anuais por
domicílio, o que representa 0,34% da renda média anual ou de 4,29 dólares, representando
0,45% da renda. Mostrou-se que a disposição a pagar varia significantemente segundo os
diferentes níveis de exposição ao risco, os quais foram medidos pela distância da residência
em relação ao rio e pelo nível de inundação durante a estação chuvosa.

Trabalho detalhado e relativamente recente no tema é de Novotny et al. (2001). A região de


estudo são as bacias do rio Menomonee e do rio Oak, em Milwaukee, Estados Unidos, nas
quais ocorreram grandes inundações nos 15 anos anteriores a pesquisa. A pesquisa utiliza o
MVC para avaliar o suporte da comunidade ao uso de medidas de diminuição do risco aliadas
a técnicas que desenvolvam a saúde da bacia. Como técnica de eliciação, foi utilizado o
referendo com acompanhamento. Os resultados da DAP variaram significantemente entre as
duas bacias de estudo: para a comunidade moradora na bacia do rio Menomonee o benefício
de manter o atual nível de risco com a utilização de medidas de controle é de 602.585 dólares
anuais, enquanto para a comunidade da bacia do rio Oak, é de apenas 48.776 dólares anuais.

Outro estudo influente foi conduzido por Shabman et al. (1998). Ele mostra a possibilidade de
ocorrer vieses no MVC. A pesquisa compara três técnicas de estimativa de danos: danos
evitados à propriedade, método dos preços hedônicos e método da valoração contingente. O
segundo foi discutido na seção 6.2 e o último é mostrado aqui. A pesquisa foi conduzida em
Roanoke no ano de 1987, após uma grande inundação ocorrida em 1985. Como técnica de
obtenção de preferências, utilizou-se o cartão de pagamento, no qual o respondente deveria
selecionar o valor que julgava mais adequado para um projeto de mitigação dos danos.

A pesquisa apresentou mais de 50% de lances nulos. Desses, aproximadamente 60% eram
votos de protesto, pois os respondentes consideravam que haviam tido muitos gastos com a
inundação de 1985 e que agora teriam que pagar novamente por um projeto que deveria ser
responsabilidade integral do governo. O restante dos votos nulos era dado por motivações
financeiras ou por uma aparente falta relevância do projeto para o entrevistado.

135
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A grande questão levantada por este estudo é que os resultados de DAP obtidos pelo MVC
mostraram incoerência em relação às outras duas técnicas efetuadas na área (preços hedônicos
e método dos danos evitados), que, ao contrário, apresentavam resultados que se convergiam.
Os autores fizeram uma análise mais fina dos dados e concluíram que ocorreu um viés
hipotético, no qual as expressões de DAP hipoteticamente inferidas não se traduziram em real
escolha de comportamento.

Além destes trabalhos, uma literatura complementar pode ser obtida em Daun & Clarck
(2000) ou no sítio da Marquette University,35 locais onde uma grande lista de referências é
analisada.

6.3.1 Considerações metodológicas e limitações: o que define o comportamento?

Uma desconfiança em relação ao método é de que ele não é baseado no comportamento real
do consumidor (ao contrário dos métodos indiretos), mas no que ele declara, e nem sempre o
que indivíduo fala que vai fazer é o que ele realmente faz.

Um primeiro possível viés destacado na literatura sobre MVC é o viés estratégico (Tabela
6.5). Presume-se que o entrevistado assume um comportamento estratégico ao revelar sua
preferência. Possivelmente, Paul Samuelson foi o mais influente crítico do questionamento
direto como forma de valorar bens públicos.36 Para ele, não há nenhuma circunstância
previsível onde as pessoas não se sentiriam incentivadas a mentir sobre a demanda por bens
públicos (Mitchell & Carson, 1989).

Entre as formas de comportamento estratégico, a literatura freqüentemente destaca a figura do


“carona” (free riding). O carona é alguém que paga menos pelo bem público do que o valor
que ele lhe dá, esperando que outros paguem suficientemente para sua provisão. No MVC, ele
se revela ao subestimar sua DAP, tanto por receio de que efetivamente este valor venha a ser
cobrado, como por acreditar que há boa chance do bem ser oferecido, mesmo com o baixo
valor que declarou.

O oposto do comportamento do carona é chamado por Mitchell & Carson (1989) de


overpledging, que, em português, seria algo como uma “promessa exagerada” ou

35
Relatório técnico The effect of spatial flood risk on willingness to pay for flood risk management: an applied
contingent valuation approach. Disponível em: <http://www.mu.edu/environment/tr.htm>.
36
Influente economista norte-americano, ganhador do Prêmio Nobel em 1970, Samuelson revolucionou a
economia ao unir um século de percepções econômicas, muitas das quais aparentemente contraditórias, numa
teoria unificada e coerente: a chamada síntese neoclássica.
136
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
simplesmente um sobrevalor. O entrevistado pode anunciar um valor exagerado da DAP se
pressupor que, de fato, não será obrigado a pagar este valor e que, por outro lado, sua
declaração pode influenciar na provisão do bem.

Há ainda outra motivação estratégica, a do “mínimo esforço”. Ela ocorre quando o indivíduo
acredita que a provisão do bem é inevitável e, portanto, não há relação entre o que é oferecido
e o que terá que ser pago. O indivíduo não se preocuparia em mentir ou falar a verdade, ele
simplesmente não faz esforço para descobrir sua verdadeira preferência.

Mitchell & Carson (1989) defendem o uso do MVC argumentando que o comportamento
estratégico seria mais uma exceção do que uma regra nas DAP/DAA. Além disso, o MVC
seria estruturado para possibilitar respostas confiáveis de preferências: o indivíduo, quando
entrevistado, perceberia sua resposta como influente no processo decisório sobre a provisão
do bem.

Além do debatido comportamento estratégico, ocupa centralidade as discussões sobre o


caráter hipotético dos instrumentos da valoração contingente e se eles realmente geram
valores significativos. A crítica é de que uma pergunta hipotética daria origem a uma resposta
também hipotética, pois provavelmente ela será dada de forma leviana e descuidada. Haveria
uma grande distância entre preferência declarada e atitude o que caracterizaria a ocorrência de
um viés hipotético no método.

Há ainda outros vieses, como o “problema da parte-todo” (embedding / mental account); o


fenômeno do seqüenciamento e o viés da subaditividade (Bjornstad & Kahn, 1996; Motta,
1998). São problemas que se manifestam quando os valores de DAP para bens e serviços
estimados em conjunto apresentam valor total inferior ou superior à soma de suas valorações
em separado. Na Tabela 6.5 é mostrada uma síntese das várias possibilidades de vieses
existentes nas preferências declaras por meio da DAP ou DAA.

137
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 6.5 - Possibilidades de vieses nas preferências declaradas
Vieses Característica
Acreditar que o primeiro valor seja o mais correto. Ocorre
Viés do ponto de partida principalmente nos jogos de oferta e no referendo com
acompanhamento.
Vinculação do lance à escala sugerida no cartão de pagamento,
Ancoramento
acreditando que ela contém o valor "correto".
(vinculação à priori)
Ocorre principalmente nos cartões de pagamento.
- Aceitar as quantias subseqüentes enunciadas pelo entrevistador.
- Constrangimento em declarar uma posição negativa para uma ação
Viés da obediência ou
considerada socialmente correta, embora o fizesse em uma situação real.
caridade (warm glow)
- Ocorre principalmente nos jogos de oferta e no referendo com
acompanhamento.
O “carona” (free riding); a “promessa exagerada” (overpledging); o
Viés estratégico
“mínimo esforço”.
Influência do veículo de pagamento sobre a resposta do entrevistado
Viés do instrumento de
(e.g.: um aumento no imposto pode ser visto como mais custoso do que
pagamento
uma taxa de entrada associada ao uso).
Viés da informação Questionário mal elaborado pode originar respostas pouco confiáveis.
Viés hipotético Uma pergunta hipotética daria origem a uma resposta hipotética.
Problema da Parte-Todo Tendência a interpretar a oferta hipotética de um bem específico como
(embedding / mental account) algo mais abrangente.
Avalia-se uma mudança no bem público como parte de um uma
Viés do sequenciamento
seqüência de mudanças envolvendo vários bens públicos (Bjornstad &
(sequencing phenomena)
Kahn, 1996).
Dar maior valor ao bem em separado do que em conjunto com outros
Viés da subaditividade37
bens.

Observa-se que o entendimento de como as preferências são reveladas e os comportamentos


daí decorrentes ocupam centralidade no MVC. Este é um aspecto que envolve possivelmente
todas as metodologias de estimação de benefícios ou de danos, desde os modelos
econométricos até as simulações. Escolher uma metodologia significa definir um
comportamento para o consumidor, seja o consumidor racional da microeconomia
neoclássica, existente no método dos preços hedônicos, ou o consumidor de racionalidade
limitada da microeconomia evolucionária, mais presente nos modelos baseados em agentes.38

Na vida real as decisões não são feitas de forma isolada, mas em um cenário onde inúmeros
fatores pessoais e contextuais interagem e são continuamente reavaliados pelo indivíduo. O
processo de tomada de decisão em um MVC é claramente diferente do que o que ocorre na
realidade, são contextos distintos de formação de preferências e de valor. Mas isto não
invalida o método, ao contrário, é uma possibilidade ante a existência de esferas onde o
mercado ainda não alcançou. Segundo Freeman III (1993), tem ocorrido grandes avanços nos
cálculos das medidas de bem-estar via métodos hipotéticos, especialmente em modelos de

37
Alguns autores consideram o problema da parte-todo e o fenômeno da subaditividade como manifestações de
um mesmo tipo de sensibilidade da DAP das pessoas em relação a uma mudança de bem público, não fazendo
distinção entre eles (Bjornstad & Kahan, 1996).
38
Sobre o tema, ver Prado (2006) em sua discussão sobre microeconomia reducionista e evolucionária.
138
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
escolhas discretas, e existem formas estatísticas de lidar com problemas usuais nos MVC,
como a presença de não resposta, os outliers e os votos de protesto.

6.4 Modelos macroeconômicos e regionais


Uma forma de estimar os impactos ambientais é por meio de modelos que incorporam o
comportamento agregado de agentes econômicos - famílias, governo e setores produtivos - e
variáveis macroeconômicas, como renda e produto. Incluem os modelos de programação
linear, de insumo-produto, de equilíbrio geral computável, modelos econométricos de
equações simultâneas e modelos híbridos (THE IMPACTS..., 1999; Cochrane, 2004).

Concebida nos anos 40 pelo economista russo Wassily Leontief, a matriz insumo-produto
demonstra como o produto se distribui entre os setores de demanda final e intermediária da
economia. Segundo definição presente em Carvalheiro (1998):

A matriz de insumo-produto é o instrumento da contabilidade social que


permite conhecer os fluxos de bens e serviços produzidos em cada setor da
economia, destinados a servir de insumos a outros setores e para atender a
demanda final (Carvalheiro, 1998: 1).

Em notação matricial, o modelo estático de Leontief pode ser escrito como uma equação do
tipo x = w + f, onde x é o vetor da produção setorial; w é vetor do consumo intermediário
setorial e f é vetor da demanda final setorial. Sendo que w = Ax, onde A é a matriz de
coeficientes técnicos aij. O coeficiente representa o valor produzido na atividade i consumido
pela atividade j para produzir uma unidade monetária.

As técnicas de insumo-produto constituem um instrumento usual de planejamento econômico.


Especificamente para inundações, elas podem ser utilizadas para estimar o efeito na economia
causado por uma variação no consumo ou produção na região inundada (Parker, Green &
Thompson, 1987).

Os princípios da matriz insumo-produto foram utilizados para criação de modelos cada vez
mais amplos e flexíveis, como os modelos de equilíbrio geral computável (EGC), os quais
têm recebido, recentemente, especial atenção na análise de desastres naturais. Os modelos
EGC destacam-se por captar os efeitos diretos, indiretos e institucionais de impactos externos
na economia, com as respostas e adaptações comportamentais dos agentes econômicos, em
uma análise ao mesmo tempo microeconômica, setorial e global. Fochezatto (2002) define
duas características comuns aos modelos EGC:

139
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Primeiro, ele são modelos de “equilíbrio geral”, pois abarcam o conjunto da
economia, determinando endogenamente, através de programas
microeconômicos de otimização, os preços relativos e as quantidades
produzidas. Segundo, são modelos “computáveis ou aplicados”, pois
resolvem numericamente o problema de equilíbrio geral, fornecendo
resultados abrangentes e detalhados dos efeitos de mudanças políticas sobre
as economias analisadas (Fochezatto, 2002: 2).

Segundo Cochrane (2004), uma limitação do EGC para avaliação de desastres naturais é de
que uma das suas principais características, a flexibilidade de preços e substituição da
produção, tende a ser inútil em uma situação de desastre, onde não há evidências reais de que
ocorra mudança nos preços relativos. Lofgren & Robinson (2002), em uma análise sobre o EGC e
redes espaciais, argumentam que uma limitação dos primeiros é a de não tratarem de forma explícita o
espaço geográfico, pois não permitem "mudanças de regime” e “efeitos threshold” para fluxos de
comércio: eles adotam como solução de base que, se uma região exporta ou importa de outra região,
este fluxo de comércio estará sempre presente e se ajustará suavemente a mudanças exógenas. Se
considerado a dinâmica do espaço intra-urbano, normalmente com grande densidade de unidades
econômicas e fluxos, os modelos de equilíbrio geral podem ser insuficientes na mensuração do choque
proporcionado pela inundação.

Análise do THE IMPACTS... (1999) destaca problemas nas abordagens de insumo-produto e


EGC. Estudos que comparam as estimativas obtidas por meio de análises insumo-produto e
modelos econométricos regionais com dados históricos de danos de eventos similares ou com
dados atuais pós-evento mostram uma tendência à superestimação tanto das perdas
econômicas decorrentes dos eventos, quanto dos ganhos no processo de reconstrução
(Kimbell & Bolton, 1995; West & Lenze, 1994 apud THE IMPACTS..., 1999).

A questão central é que as mudanças temporárias e intensas decorrentes de um desastre


natural não se encaixam nos padrões em que muitos modelos econômicos baseiam-se, esses
inicialmente criados para prever condições econômicas futuras ou estimar os efeitos de
mudanças permanentes (como a construção de uma rodovia ou o fechamento de uma fábrica).
O evento natural extremo é uma situação atípica, uma “fatalidade”, que interrompe as relações
socioeconômicas históricas e usuais: podem ocorrer mudanças em funções de produção
históricas, em padrões de consumo e vendas, deslocamentos temporários de mão-de-obra. As
potencialidades do uso desta tipologia de modelos para estimar os danos de eventos naturais
de grande magnitude são muitas, mas deve ser feito um esforço na sua adequação e
aprimoramento.

140
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A programação linear ou modelos de otimização linear permitem modelar a alocação ótima
dos recursos pós-evento. Entretanto, é questionável se ela possibilita soluções viáveis na
prática, seja em termos econômicos, seja em termos políticos (Cochrane, 2004).

Nos modelos regionais tem-se uma representação geográfica do sistema a partir de sua
repartição em zonas, as quais trocam entre si população, bens, capital, etc. Grande parte dos
modelos regionais são econômico orientados, com cada zona representada por um vetor de
indicadores socioeconômicos (Benenson, 1999). Os componentes do vetor podem ser o
número ou proporção de grupos populacionais de acordo com sua idade, cultura, educação ou
emprego; o número ou proporção de empregos em diferentes indústrias; as residências de
diferentes padrões construtivos; as unidades econômicas segundo sua classe de atividades, etc.

Inicialmente, os modelos regionais apresentavam limitações operacionais relevantes.


Buscava-se uma representação compreensiva do sistema e, portanto, mesmo uma pequena
divisão do território em zonas com seus grupos socioeconômicos demandariam dezenas de
equações e a estimação de vários parâmetros. Normalmente, a interação entre N zonas é da
ordem de N2, o que já implica grande volumes de parâmetros a serem estimados.
Considerando todos os indicadores socioeconômicos, o volume de cálculos é bastante
expressivo. Segundo Benenson (1999), embora o número de parâmetros pudesse ser limitado
por meio de uma análise de sensibilidade, tal análise só seria possível após a construção
completa do modelo.

Portanto, uma etapa importante no avanço dos modelos regionais ocorreu com o
desenvolvimento da teoria geral dos sistemas complexos, na qual se observou que sistemas
complexos (incluindo áreas urbanas) revelam leis comuns de comportamento (Prigogine,
1967 apud Benenson, 1999). No caso da aplicação dos modelos regionais para o estudo do
espaço urbano, o novo paradigma passou a ser que, para uma qualitativa compreensão da
dinâmica urbana, não é necessária uma descrição detalhada de todas as inter-relações
estabelecidas entre os componentes. Faz-se necessário abarcar apenas as mais importantes e,
talvez, a ordem latente da dinâmica urbana para classificar as suas interações possíveis e
interpretar qualitativamente os diferentes resultados. O número de componentes e indicadores
socioeconômicos introduzidos no modelo pode então ser reduzido de centenas para algumas
unidades (Benenson, 1999).

Na abordagem do espaço intra-urbano que se aproxima à forma como é discutida neste


trabalho, grande número de modelos regionais procura discutir a escolha locacional. Nestes, a

141
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
atração para uma nova zona pode estar relacionada à idade do responsável pelo domicílio, ao
número de membros da família, à renda per capita etc. Dados empíricos podem ser usados
para calibrar o modelo criando parâmetros de imigração, emigração, taxa de natalidade e
mortalidade e expectativa de vida (Van Wissen & Rima, 1988 apud Benenson, 1999).
Normalmente, utiliza-se uma análise econômetrica, por meio da qual pode se verificar o
coeficiente de determinação e verificar a correspondência entre os dados empíricos e aqueles
estimados pelo modelo.

Os modelos regionais podem incorporar diversos cenários para a análise da dinâmica


econômica intra-urbana. Benenson (1999) cita estudo em que um canal que cruza a cidade é
substituído por uma linha de colinas e compara ambos os cenários (Engelen,1988 apud
Benenson, 1999). Em um cenário de desastre natural, pode-se comparar a atividade
econômica “com” e “sem” o evento extremo.

Kakhandiki & Shah (1998) propõem um modelo econométrico regional para avaliar o
impacto de terremotos. A modelagem especificaria as ligações entre os vários subsistemas
existentes em uma grande cidade (industrial, capital, político, renda, mercado de trabalho e
demografia) em termos de relações de causa e efeito e simularia as mudanças nos fluxos
econômicos (demanda e oferta de trabalho, fluxo de investimentos, etc.), seqüencialmente, em
diferentes unidades de tempo e em resposta a diferentes eventos. O objetivo é captar as
conseqüências em uma situação sem terremoto (mudanças “normais”) e em um cenário com
terremoto (mudanças “anormais”).

Será observado na metodologia (capítulo 8), que a pesquisa proposta aqui incorpora
elementos dos modelos regionais e parte da mesma conceituação de espaço urbano mostrada
em Kakhandiki & Shah (1998), considerando-o como um sistema complexo formado por
subsistemas que se interconectam seqüencialmente e repetidamente. A diferença refere-se aos
subsistemas considerados representativos da cidade, diferença em parte decorrente da
metodologia de análise utilizada (econometria em oposição a uma modelagem com agentes e
análise em rede).

Os modelos regionais possuem vantagens, como a possibilidade de desagregação setorial e de


verificar a tendência de longo prazo de reajuste da economia em conseqüência do impacto.
Mas, como refletem padrões históricos de troca, é pouco provável que consigam captar a
natureza dos choques de oferta (Cochrane, 2004).

142
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Ha também modelos híbridos, baseados em algoritmos computacionais, que podem ser
direcionados para análise de choques de oferta, restrições produtivas pós-evento e tempo de
reconstrução. Um grande número de inputs é definido pelo usuário, o que torna a abordagem
criticável como ad hoc.

Um exemplo de modelo híbrido é o HAZUS, desenvolvido pela FEMA e pelo Nacional


Institute of Building Sciences. No sítio da FEMA, na Internet, é possível fazer o pedido do
software.39 Segundo a Agência, a metodologia de estimação dos danos é constituída de dois
módulos básicos: análise da ameaça de inundação e análise dos danos de inundação. O
primeiro módulo utiliza informações do evento, como freqüência, vazão e altura para estimar
profundidade, elevação e velocidade da inundação. O módulo de estimação de perdas calcula
os danos físicos e econômicos resultantes da ameaça. Os resultados são mostrados em uma
série de relatórios e mapas.40

39
Disponível em <http://www.fema.gov/plan/prevent/hazus/index.shtm >.
40
Traduzido do sítio da FEMA na Internet: < http://www.fema.gov/plan/prevent/hazus/hz_flood.shtm >.
143
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
7 UTILIZAÇÃO DE MODELOS DE SIMULAÇÃO E ANÁLISE DE
REDE PARA A AVALIAÇÃO DOS DANOS DAS INUNDAÇÕES

Este capítulo introduz o uso da simulação para o estudo das conseqüências socioeconômicas
da inundação. Inicialmente são mostrados alguns conceitos e terminologias freqüentemente
utilizados em modelagens. A seguir, apresentam-se resumidamente os principais modelos de
simulação existentes, tendo como referencia a descrição presente em Gilbert & Troitzsch
(2005). São mostradas, ainda, as potencialidades da simulação social para o estudo dos danos
decorrentes da inundação.

A literatura registra, com freqüência, o uso de termos fundamentais na compreensão da


pesquisa sem a definição clara e objetiva do conceito que encerram ou os emprega de forma
inadequada, se considerado o seu sentido estrito. Entre estes, está o conceito de variável e
parâmetro. Embora eventualmente não seja fácil escolher uma definição única para esses
termos, procura-se explicitar aqui em qual sentido eles são empregados na presente pesquisa.

A construção de um modelo é uma das formas existentes para se compreender um pouco o


mundo. O modelo é uma simplificação – menor, menos detalhada ou complexa – de uma
estrutura ou sistema. Conforme Hair et al. (2005), modelo é uma operacionalização de uma
teoria. Ele fornece concisamente uma representação abrangente das relações a serem
examinadas. Normalmente, tem-se em um modelo um sistema de equações (ou agentes) e
procedimentos compostos por variáveis e parâmetros (ou regras comportamentais). Neste
item, atém-se à definição de parâmetros e de variáveis; posteriormente, a noção de “agente‟ e
„regras comportamentais‟ é discutida em detalhes.

Os parâmetros mantêm seu valor inalterado durante todo o processo estudado. Ou seja, eles
não variam durante o tempo definido na modelagem, embora possam variar espacialmente
(Rennó & Soares, 2000). Como exemplo de parâmetros tem-se, nos modelos hidrológicos, a
rugosidade de uma seção de um rio e a área da bacia hidrográfica; em determinados modelos
econômicos, como o proposto nesta pesquisa, o preço e os salários.

As variáveis, ao contrário, podem mudar ao longo do tempo (Tucci, 1998; Rennó & Soares,
2000). Ocorrem três possíveis tipos de variável em um modelo: variável de estado, variável
processo e variável forçante. A primeira é a variável foco. Em um sistema de equações,
normalmente há uma equação diferencial relacionada a ela. O estado de um sistema pode ser
descrito observando-se o valor de cada variável de estado. A vazão é uma variável que
descreve o estado do escoamento. Em um modelo de impacto de inundação, o nível de
144
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
emprego, renda e riqueza são variáveis que podem mostrar o estado da economia na área
atingida pelo evento. A modelagem é feita a fim de se verificar a alteração dessas variáveis
ante a ocorrência do desastre.

O segundo tipo de variável é a “variável processo”, “fluxo” ou simplesmente “processo”. Ela


refere-se às entradas e saídas das variáveis de estado. Tipicamente são calculadas como
função das variáveis de estado, das variáveis impulsionadoras ou forçantes (terceiro tipo de
variável) e dos parâmetros (Rennó & Soares, 2000). A taxa de susceptibilidade dos bens ao
contato com a água e a taxa de desemprego são exemplos de processos que alteram o nível de
riqueza e renda da área impactada.

Finalmente, o terceiro tipo de variável, a variável forçante, refere-se a uma variável ou função
que exerce influencia sobre o modelo, mas não é calculado por ele. Esta variável pode ser um
fluxo (fluxo forçante) ou um estoque externo ao modelo (estoque forçante) que o alimenta
funcionando como seu propulsor, modulador ou controlador. Pode se considerar, por
exemplo, a profundidade da inundação como um exemplo de estoque forçante que alimenta a
modelagem dos danos de inundação. Observa-se, entretanto, que a profundidade já foi
calculada a partir de uma modelagem hidrológico-hidráulica prévia, na qual a variável
forçante principal era a chuva (Figura 7.1). Portanto, em uma análise multi-sistemica
seqüencial, as variáveis de estado de um sistema podem se tornar variáveis forçantes ao
alimentarem outro sistema.

Precipitação

Modelagem
Hidrológica-Hidráulica

Profundidade do
escoamento variando no
tempo e espaço

Modelagem de impactos
socioeconômicos

variação da renda, riqueza,


nível de emprego etc.

Figura 7.1 – Interação entre modelos

145
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Uma visão geral sobre modelos, especialmente hidrológicos, com seus conceitos básicos e
classificação, pode ser encontrada em e Tucci (1998).

O termo simulação é derivado do latim simulatus = imitar. Portanto, ao nível geral, a


simulação pode ser definida como a imitação de uma situação real, através do uso de modelos.

No campo científico, a utilização do termo é controversa. Segundo Tucci (1998: 17),


simulação é o processo de utilização do modelo. Este sentido do termo, mais amplo, parece
ser o dominante na esfera da hidrologia e hidráulica. Parunak, Savit & Riolo (1998) utilizam
definição similar. Segundo eles, simulação, como o nome indica, consiste em “simular” um
sistema pela construção de um modelo e normalmente executá-lo em um computador. Este
sistema pode ser constituído por um conjunto de equações ou de agentes. A simulação
permite, no primeiro caso, avaliar as equações e, no segundo, estimular o comportamento dos
agentes.

Gilbert & Troitzsch (2005), entretanto, consideram que a simulação é um tipo particular de
modelagem e procuram enfatizam sua distinção em relação aos modelos estatísticos. Nos
modelos estatísticos, o pesquisador desenvolve um modelo, comumente um conjunto de
equações, que é a abstração do um processo social alvo. As equações incluem parâmetros
cujas magnitudes são estimadas durante a modelagem (normalmente, com o uso de “pacotes”
estatísticos). Os dados estimados são então comparados com os dados reais, coletados. Na
simulação, como compreendida por Gilbert & Troitzsch (2005), o modelo é formalizado
como um programa computacional e não como um sistema de equações estatísticas. O modelo
é processado para gerar dados simulados que, por sua vez, são confrontados com os dados
reais.

Ao que parece, o termo vem ganhando contornos particulares no campo das ciências sociais
aplicadas, associado em grande parte ao desenvolvimento da engenharia de computação.
Normalmente é empregado para descrever um conjunto de técnicas que possuem algumas
características comuns: presença da modelagem; utilização da experimentação para se
entender o comportamento do sistema ou avaliar as várias estratégias para a sua operação;
ênfase na representação dos processos existentes no sistema e, freqüentemente, uso intensivo
de linguagem computacional para criar e executar o modelo.

146
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
7.1 Modelos de simulação social

Neste trabalho, que se situa no campo da multidisciplinaridade, utiliza-se a terminologia


“simulação social”, como em Gilbert & Troitzsch (2005), para discutir uma classe de
modelos utilizadas em análises socioeconômicas que possuem algumas particularidades,
mostradas no decorrer do capítulo.

Como em todos os modelos, as simulações utilizam dados de entrada - inputs -, que são as
informações necessárias ao modelo associadas a um cenário específico de análise, e resultados
- outputs - que são observáveis durante a simulação. As simulações são utilizadas para pelos
menos seis propósitos (Gilbert & Troitzsch, 2005):

 obter um melhor entendimento de algumas características do mundo;

 predição: se for possível desenvolver um modelo que reproduza satisfatoriamente a


dinâmica de algum comportamento, pode-se simular a passagem do tempo e então utilizá-
lo para analisar variáveis no futuro. Um exemplo freqüente de uso de modelos com
capacidade preditiva ocorre em simulações sobre a dinâmica do espaço urbano que
procuram inferir os vetores futuros de expansão urbana e as possíveis modificações nos
padrões de ocupação e uso do solo;

 substituto para capacidades humanas: um exemplo é a construção de sistemas especialistas


(expert systems) para simular o conhecimento de um grupo de profissionais. Estes sistemas
podem ser utilizados por não especialistas como apoio ao processo de tomada de decisões
ou em diagnósticos que necessitem de análise especializada;

 treinamento (e.g.: simuladores de vôos para treinar pilotos);

 divertimento: atualmente alguns jogos se tornaram tão elaborados na simulação de


situações que se aproximam de ferramentas utilizadas no campo científico. Simuladores de
vôo podem ser usados não apenas como treinamento, mas também como divertimento. Na
esfera ambiental, podem ser encontrados simuladores que possuem como objetivos
solucionar crises ambientais no planeta (e.g.: Greenpeace WeAtheR, jogo desenvolvido
pela ONG Greenpace), construir casas ambientalmente sustentáveis ou simular quantas
árvores devem ser plantadas para compensar o gasto próprio de energia e combustível;41

 auxiliar no descobrimento e formalização: cientistas podem construir modelos centrados


em aspectos do mundo social e descobrir as conseqüências de suas teorias na “sociedade

41
Para detalhes de jogos simulados com ênfase no meio ambiente, ver
http://planetasustentavel.abril.com.br/simuladores/.
147
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
artificial” construída. Para isso é necessário utilizar teorias que são convencionalmente
expressas em forma discursiva e as traduzir em linguagem computacional.

Entre as principais técnicas empregadas para construção de simulações sociais tem-se:


sistemas dinâmicos, microsimulação, modelos de filas (queuing models), simulação em
multiníveis, autômatos celulares, modelos multiagentes e modelos de aprendizado. A Tabela
7.1 apresenta a comparações destas técnicas segundo algumas características:

Tabela 7.1 - Técnicas de simulação social


Número
Número de Comunicação Complexidade
Técnica de
níveis entre agentes dos agentes
agentes
Sistema dinâmico 1 Não Baixa 1
Microsimulação 2 Não Alta Muitos
Modelo de fila 1 Não Baixa Muitos
Simulação multinível >2 Talvez Baixa Muitos
Celular autômata 2 Sim Baixa Muitos
Modelo multiagente >2 Sim Alta Alguns
Modelo de aprendizado >2 Talvez Alta Muitos
42
Fonte: Gilbert & Troitzsch (2005: 13). Tradução da autora.

Observa-se na Tabela 7.1 que algumas técnicas são adequadas para estudar o problema em
apenas um nível (e.g.: o indivíduo, a sociedade, o meio ambiente, etc.), em outras, é possível a
interação entre sistemas, o que as torna capazes de investigar fenômenos emergentes. Há
modelos aptos para simular a comunicação entre agentes, sendo adequados para modelar
linguagem e interação, outros não. A complexidade de agentes em relação a atributos e regras
comportamentais usualmente está presente em técnicas baseadas em inteligência artificial,
como modelagem multi-agentes e modelos de aprendizado. Em relação ao número de agentes,
a maior parte das técnicas possibilita utilizar mais de um, tornando-os aplicáveis a analises de
fenômenos sociais e ambientais complexos quando a pluralidade de agentes é freqüente. A
exceção são os sistemas dinâmicos, no qual o próprio sistema, simulado como um todo é o
único agente.

Os sistemas dinâmicos têm origem nas equações diferenciais. São restritos ao nível
macroeconômico. O sistema alvo, com suas propriedades e dinâmica, é descrito por meio de
um sistema de equações das quais se deriva o seu estado futuro a partir do estado atual.
Modela-se uma parte da realidade (o sistema alvo) como um todo indiferenciado cujas
propriedades são descritas por um grande número de variáveis que representam o seu estado e
suas mudanças. Portanto, o estado do sistema alvo no momento “t+1” depende de seu estado

42
Original em inglês.
148
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
no momento “t” e de um parâmetro “ϑ”, sendo que as mudanças de estado são calculadas para
mudanças infinitesimais de tempo (Gilbert & Troitzsch, 2005).

Em sua abordagem tradicional, a principal limitação dos sistemas dinâmicos é a de tratar o


sistema alvo como um todo indivisível, o que os impossibilita modelar componentes, como
indivíduos, grupos, classes e subpopulações. Visando ultrapassar limites como estes, surgem
abordagens que investigam a incorporação de outros níveis de simulação. São desenvolvidos
os modelos de microsimulação analítica e os modelos multiníveis.

Os modelos de microsimulação analítica trazem uma abordagem com micro unidades de


análise que possibilita, a partir da ampla caracterização das unidades e da utilização de
funções de probabilidade aplicadas a cada evento, que sejam verificáveis os possíveis
comportamentos e estruturas na dimensão macroeconômica. Por meio da simulação
observam-se, a cada passo de tempo, as mudanças ocorridas nos atributos. A dinâmica
populacional de uma região ao longo dos anos, por exemplo, pode ser definida a partir de
algumas funções de probabilidade, como de morte, nascimento, casamento e divórcio, que são
aplicadas a cada domicílio e a cada passo de tempo. Modelos mais sofisticados distinguem
domicílios e indivíduos, possibilitando que estes se desloquem entre os domicílios criando-os
ou dissolvendo-os (e.g.: por meio de casamento e divórcio).

A microsimulação tem sido amplamente empregada em estudos recentes, especialmente nas


ciências econômicas e sociais para simular o comportamento de agentes ante determinada
política econômica. A engenharia de tráfego também vem apresentando avanços nesta área,
com a criação de softwares que simulam o padrão de deslocamento de cada veículo e
permitem verificar o impacto de intervenções urbanas sobre o fluxo agregado de automóveis.

Como será mostrado no Capítulo 8, a metodologia utilizada neste trabalho emprega elementos
de microsimulação analítica para observar o comportamento dos domicílios e de seus
habitantes na execução das funções de consumo e aquisição de renda. Os dados, entretanto,
são tratados matematicamente de forma determinística, ou seja, considera-se que as relações
entre os agentes refletem o estado “final” ou “de equilíbrio” existente naquele momento na
rede. As probabilidades de determinadas relações em determinado momento, quando
existentes, são mensuradas de forma exógena ao modelo.

Outros tipos de simulações utilizam os modelos de fila (models queuing), também conhecidos
por modelos de eventos discretos. Sua característica central é de que o tempo não é contínuo e

149
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
nem transcorre em passos discretos eqüidistantes, mas de evento a evento. Os eventos são
marcados em uma “agenda”: uma lista de todos os futuros eventos que possam ser
predefinidos para um determinado horário. Eventos passados são removidos da lista; eventos
podem gerar novos eventos que são inseridos na agenda. A Figura 7.2 mostra um exemplo de
um modelo de fila simplificado. Ele representa a fila de check-in em um aeroporto: os
“clientes” são os passageiros, eles esperam em “fila” pelo serviço (“servidor”) prestado no
balcão de recepção. O objetivo da simulação é definir, dada uma distribuição de probabilidade
de chegada de passageiros ao guichê, o número de atendentes necessários para efetuar o
serviço a fim de que o tempo de espera na fila não ultrapasse determinado valor.

(clientes) (clientes)
fonte fila servidor saída
chegada
espera
serviço

Figura 7.2 – Modelo de fila para uma fila de verificação (check-in) em um aeroporto

Fonte: Gilbert & Troitzsch, 2005: 83. Original em inglês.

Aperfeiçoando os modelos de análise social, surgem as simulações ambientais em multiníveis


nos anos 1980, especificamente com o MIMOSE, com o objetivo de simular a interação entre
populações.43 Os níveis micro e macro são modelados e suas interações simuladas. Estas
ferramentas permitem modelar indivíduos, grupos e sociedade como objetos; e equações são
definidas para representar suas interações (Sawyer, 2005). Como caso típico, tem-se uma
população, definida por seus atributos (e.g.: taxas de natalidade e mortalidade e distribuição
entre sexos), formada por um grande número de indivíduos com seus próprios atributos (e.g.:
sexo, idade, atitudes políticas e renda anual). Os atributos populacionais dependem da
agregação dos individuais que, de forma cíclica, dependem dos populacionais. Por exemplo: a
distribuição entre sexos é função de quantos indivíduos são homens ou mulheres. Se um
indivíduo nasce ou morre depende das taxas de natalidade e mortalidade, o que pode depender
do tamanho da população e da razão de sexo. Ou seja, há uma troca de informações entre
níveis, que se realimentam.

43
O projeto MIMOSE - Micro and Multilevel Modelling Software - foi fundado pelo conselho de pesquisa
germânico (do alemão, Deutsche Forschungsgemeinschaft). Sua principal finalidade era o desenvolvimento de
uma linguagem que considerasse demandas de modelagem nas ciências sociais, em especial, a descrição de
relações quantitativas e qualitativas não-lineares, a influência de processos estocásticos, processos de nascimento
e morte e modelos em macro e micro nível.
150
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Os modelos anteriores mantêm a característica de permanecerem invariáveis durante a
simulação. Mas há modelos que incorporam o aprendizado e, enquanto ocorre a simulação,
parâmetros se alteram, ou mesmo a forma do modelo modifica-se em resposta ao ambiente.
Abordagens freqüentes utilizam redes neurais artificiais e modelos baseados em programação
evolucionária, ambos utilizando analogias da biologia.

Modelos de redes neurais, ao contrário de caracterizar o problema como de caráter


matemático, usam o funcionamento biológico do cérebro para desenvolverem uma estratégia
de processamento (Hair et al., 2005). O cérebro é composto por milhões de células, chamadas
de neurônios, que se comunicam entre si por meio de impulsos eletroquímicos em uma densa
rede de interconexões. A rede neural artificial tem tipicamente menos de cinqüenta unidades
análogas ao neurônio, as quais recebem estímulos e emitem o sinal apropriado.

Outra linha de modelos de aprendizado, baseada em algoritmos genéticos, utiliza a analogia


biológica do processo evolucionário de seleção natural. São modelos particularmente úteis
para soluções de otimização em problemas complexos. Os algoritmos genéticos são uma
subárea da chamada “computação evolucionária”. A idéia básica contida destes modelos é de
que, a cada etapa, ou “geração”, as melhores soluções são selecionadas para competirem na
geração seguinte. Com o passar do tempo, a “seleção natural” elimina as soluções inferiores e
resulta em um melhoramento geral.

Além das técnicas descritas no decorrer desta seção, existem os celulares autômatas e a
modelagem baseada em agentes, modelos tratados com mais detalhes a seguir por terem sido
fonte de inspiração na construção metodológica da pesquisa.

7.1.1 Celulares autômatas (CA)

Dentro da abordagem botton-up, o modelo celular autômata vem sendo usado na análise
urbana por meio da caracterização do espaço como uma cobertura de parcelas ou células que
representam o ambiente físico.

No CA, células idênticas são organizadas em uma grade (em inglês, grid) regular. Elas podem
se organizar em linha (unidimensional), em forma retangular ou em um cubo tridimensional.
Em simulações sociais, as células podem representar indivíduos ou atores coletivos, como
países.

151
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Em cada célula são representados possíveis estados, os quais podem indicar atitudes,
características individuais ou ações. Em estudos que envolvem a dinâmica do espaço urbano,
usualmente as células representam usos do solo: residencial, comercial, industrial, etc.
(Benenson, 1998, 1999). Os estados da célula podem ser divididos em duas classes: estados
que podem se modificar (e.g.: residência, comércio e indústria) e estados fixos, que
representam infra-estrutura (e.g.: rios, vias) (White et al. 1997 apud Benenson, 1999).

O estado da célula depois de um passo é determinado por regras que especificam como o
estado atual depende dos anteriores, não só da própria célula, como também da vizinhança
imediata. As mesmas regras são usadas para atualizar os estados de cada célula no grid
(Gilbert & Troitzsch, 2005). O modelo é, portanto, homogêneo em relação às regras. Como as
regras referem-se apenas ao estado de células vizinhas, CA é mais bem usada para modelar
situações onde a interação é local.

As versões do CA podem variar na forma temporal ou espacial, no tamanho da vizinhança, na


definição determinística ou estocástica das regras de transição, na dependência da regra em
relação à localização da célula na malha e ao seu estado atual e na forma de interação entre
vizinhos (Benenson, 1999). Entre os modelos simples de interação entre vizinhos, tem-se o
gossip model e o modelo de maioria (do inglês, majority model).44 No primeiro, considera-se
que uma célula sofre o efeito de uma informação de qualquer célula vizinha, ou seja, é um
modelo de interação célula a célula (modelos em que a informação é disseminada pessoa a
pessoa, como no caso de uma conversa). No segundo, a célula muda de estado considerando
os estados de todas as células da vizinhança.

De forma sintética, a celular autômata modela um mundo onde o espaço é representado por
um grid uniforme, o tempo avança em passos e as leis que o governam são formadas por
regras uniformes que definem o estado de cada célula a partir de estados prévios da própria
célula e de células vizinhas. Seu uso é bastante adequado para investigar resultados em macro
escala de eventos em micro escala. Possui, entretanto, uma restrição inerente ao usar um pré-
determinado estado das células.

A Figura 7.3 mostra uma representação de um modelo CA com a aplicação da regra da


maioria: considerando uma célula com oito vizinhos, a regra é de que a célula será branca se
cinco ou mais células que a circulem forem também brancas.

44
Não foi encontrada uma tradução em português para gossip model. Em termos exatos, gossip seria traduzido
como conversa, “mexerico”.
152
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
(a) (b) (c) (d)
Figura 7.3 - (a) Distribuição aleatória de células brancas e pretas; (b) distribuição das
células, após cinco passos de tempo; (c) após dezenove passos e (d) após 482 passos
Fonte: Gilbert & Troitzsch, 2005: 140.

Na Figura 7.3, em (a) tem-se a disposição inicial; durante a simulação passa-se pelos estados
(b) e (c) e após 482 passos de tempo, chega-se a configuração (d), com grandes manchas
brancas e pretas.

Idealmente, as características que envolvem os indivíduos seriam mais adequadamente


tratadas em sua multiplicidade e não em classificações pré-definidas, como usualmente o são
no CA. Benenson (1998) argumenta que em estudos sobre segregação social pode-se verificar
a emergência de novos grupos socioculturais, com propriedades inteiramente diferentes
daquelas encontradas entre os indivíduos no momento anterior. Segundo o pesquisador, esta
emergência está associada à interação entre indivíduos e entre estes e o meio ambiente. Estas
análises são feitas à luz da modelagem baseada em agentes, discutida na próxima sessão.

7.1.2 A centralidade do indivíduo na simulação: a modelagem multiagentes

Os modelos multiagentes ou modelagem baseada em agentes (MBA), como freqüentemente


são chamados, apresentam grandes potencialidades no desenvolvimento da análise dos
impactos diretos e indiretos sobre a cidade e as famílias. Nestes o agente assume uma posição
central, ela é uma microunidade particular com características próprias que definem a
unicidade de seu comportamento. Assume-se que as informações individualizadas são
preferíveis às informações agregadas, uma vez que a interação entre indivíduos com
características próprias podem originar estruturas e organizações não imagináveis ou não
identificáveis a priori.

A MBA é representada por uma variedade de agentes, dotados de atributos (e.g., padrão de
consumo, renda e faixa etária) e regras comportamentais que, ao interagirem entre si e com o
meio ambiente, originam padrões e estruturas verificáveis ao nível macroeconômico (Axtell et
153
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al., 2002; Epstein, 2006). O agente é uma unidade social indivisível: um indivíduo, um
domicílio, uma comunidade, uma firma. Os padrões emergentes são então comparados com
padrões empiricamente observáveis na sociedade. Em contraste com a macrosimulação, que
busca modelar diretamente o fenômeno emergente, a MBA é uma microsimulação, baseada
nas propriedades de microunidades, os agentes.

O termo “emergência” vem sendo amplamente associado a esta nova modelagem: em


sistemas complexos, uma ordem relativamente simples “emerge” de processos relativamente
complexos ao nível de unidades sociais (Miller & Page, 2007; Sawyer, 2005). Exemplos
usuais de “emergência” são os engarrafamentos de carros, as colônias de insetos e a formação
de algumas revoadas de pássaros (como a formação em V). A forma em V, característica de
alguns grupos de aves em vôo não é planejada ou determinada centralmente, não há um
pássaro selecionado como um líder. Ela emerge de regras simples de interação par a par.

Autores remontam a origem da MBA ao estudo de Thomas Schelling sobre a emergência da


segregação racial-espacial em cidades (Schelling, 1978, apud Miller & Page, 2007). O
modelo mostra que, mesmo quando os agentes são tolerantes com outro tipo racial na
vizinhança, a segregação ainda provavelmente vai emergir. Isto porque em determinado
momento (tipping point, no inglês),45 o movimento de um pequeno número de agentes irá
criar ou incentivar outros agentes a se moverem, iniciando um efeito cascata.

Iniciava-se então um novo campo para simulação socioeconômica, recebendo nomes como
simulação social, sociedades artificiais, modelagem baseada no indivíduo, economia
computacional baseada em agentes, etc. Nos anos noventa, esta abordagem computacional
desenvolveu-se principalmente em modelos que incorporavam o comportamento humano
(behavioural science), como os modelos evolucionários, o estudo da evolução social de
comportamentos adaptativos, do aprendizado, da inovação ou as possíveis interações sociais
conectadas com a teoria dos jogos (Billari et al., 2006).

Mas, ao contrário de estudos no campo da ciência comportamental que se preocupam em


entender porque determinados comportamentos são adotados pelos humanos, a MBA
pressupõe as regras comportamentais e verifica se elas, definidas em micro escala, podem
explicar regularidades, comportamentos ou estados macroeconômicos.

45
O termo, normalmente traduzido no português como ponto de inflexão, refere-se ao momento em que uma
mudança gradual e lenta torna-se rápida e irreversível. Deriva-se da metáfora de um objeto sólido rígido que é
inclinado até um ponto quando ele começa a cair.
154
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Até o desenvolvimento da MBA nos anos noventa, as modelagens de fenômenos
socioeconômicos utilizavam, sobretudo, a modelagem baseada em equações (MBE) (Sawyer,
2005). Os modelos mostrados no Capítulo 6 se relacionam principalmente com este tipo de
modelagem. Na MBE, o modelo é formado por um grupo de equações (tipicamente equações
diferenciais) que são calculadas quando ele é executado. A Tabela 7.2 apresenta uma
comparação entre os dois tipos de modelagem (Parunak, Savit & Riolo, 1998; Sawyer, 2005).
Nela são mostradas tendências, pois algumas características podem existir em ambas as
abordagens que, ademais, podem ser aplicadas de forma combinada.

Tabela 7.2 - Modelagem baseada em agentes x modelagem baseada em equações


Modelagem baseada em agentes Modelagem baseada em equações
Formada por indivíduos e observações Formada por indivíduos e observações
Os agentes interagem entre eles por meio de As variáveis se relacionam entre elas por
ações comportamentais meio de equações
Executar o modelo envolve ativar
Executar o modelo envolve calcular equações
comportamentos
Uso de variáveis acessíveis ao agente Uso extensivo de variáveis ao nível de
individual (micro simulação) sistema (macro simulação)
Unidade natural de decomposição é o Unidade natural de decomposição é o macro
indivíduo nível observável
Ator com estratégias racionais e não racionais Ator racional da teoria econômica
Agentes heterogêneos Agentes homogêneos
Agentes podem modificar suas ações durante Comportamento do agente não se altera
a simulação durante a modelagem

A definição de agente nos estudos é diversa. Usualmente ele é identificado como um


componente que pode controlar suas próprias ações baseando-se nas suas percepções de como
o ambiente opera (Gilbert & Troitzsch, 2005). Exemplo cotidiano de um tipo de agente
construído computacionalmente é aquele existente para procurar assuntos na Internet
relacionados aos tópicos informados pelo usuário. O objetivo da MBA é criar rotinas que
interagem de forma inteligente com o meio ambiente.

Os agentes criados computacionalmente podem possuir as seguintes propriedades, o que


depende do seu grau de complexidade, de como ele é concebido para interagir com o
ambiente e com os outros agentes e dos objetivos da pesquisa (Gilbert & Troitzsch, 2005;
Sawyer, 2005):

 Autonomia: os agentes têm controle sobre o próprio comportamento, não há um controle


central sobre eles.

155
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 Habilidade social: agentes interagem com outros agentes por meio de um tipo de
linguagem (linguagem computacional).

 Reatividade: agentes são capazes de perceber o ambiente (mundo físico, mundo virtual de
redes eletrônicas, mundo simulado, incluindo outros agentes) e reagir a ele.

 Pró-atividade: agentes são capazes de tomar iniciativas na busca de seus objetivos.

 Intencionalidade: indivíduos intencionalmente buscam seus objetivos, mas o fazem, mais


freqüentemente, incorporando aspectos de crença, desejo e emoções.

Gilbert & Troitzsch (2005), define que a “arquitetura” do agente é formada a partir de suas
propriedades e atributos. A heterogeneidade é garantida, pois eles se diferem segundo as
preferências, os aspectos culturais e sociais.

Os agentes são divididos essencialmente em dois tipos: agentes cognitivos e agentes reativos
(Sawyer, 2005: 148). Agentes cognitivos têm crenças sobre o estado do meio ambiente,
intencionalidade, planejamento e conhecimento sobre como suas ações podem afetar o
ambiente e os outros agentes. Os agentes cognitivos têm metas definidas e planejam como
alcançá-las, são também conhecidos como agentes intencionais ou deliberativos.

Os agentes reativos não contêm internamente uma representação do mundo: nem do ambiente
nem dos outros agentes. Eles não possuem objetivos explícitos e não racionalizam sobre alvos
e planos. Ao contrário, agentes reativos direcionam-se por regras de ação-reação
condicionadas por determinadas características que envolvem o seu ambiente local. Agentes
reativos são também chamados de agentes comportamentais, pois respondem diretamente a
um estimulo do ambiente, sem a mediação de estados internos.

Os modelos multi-agentes normalmente são construídos com algum tipo de sistema de regras.
As regras comportamentais podem ser simples ou complexas, determinísticas ou estocásticas,
fixas ou adaptativas. Em um sistema simples, cada rotina possui duas partes: uma condição,
que especifica quando a regra ocorre, e uma ação, que resulta da satisfação da condição. Esta
depende da memória de trabalho do agente, que acumula informações sobre as suas metas,
sobre o meio ambiente, sobre os outros agentes e sobre a localização de objetos. A idéia é que
uma dinâmica complexa possa emergir a partir de regras tão simples quanto possível. Agentes
reais buscam reduzir a complexidade de acordo com suas necessidades, ajustando-se ao
ambiente ou simplesmente seguindo o comportamento coletivo padrão.

156
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Observa-se que a base da MBA é a tecnologia da informação. É o uso da programação em
computadores para tratar problemas que possivelmente não seriam solucionados apenas com o
uso de teorias comportamentais associadas a observações empíricas tratadas por meio de
técnicas estatísticas.

Para Epstein (2006) a MBA traz uma abordagem distinta para as ciências sociais e, diferindo-
a de uma análise “dedutiva” ou “indutiva”, introduz o termo “generativo” (generative, no
inglês). Como citado em Axelrod (1997):

Considerando que o propósito de indução é o de achar padrões em dados e


de que o da dedução é o de achar as conseqüências de suposições, o
propósito da modelagem baseada em agentes é ajudar a intuição (tradução da
autora).46

A questão “generativista” é que interações descentralizadas locais entre agentes autônomos


heterogêneos “geram” uma configuração macroscópica (Epstein, 2006). Em livro organizado
por Epstein (2006), Generative Social Science: studies in agent-based computational
modeling, o pesquisador mostra o uso da MBA na “geração” de padrões diversos, como
modelos de civilização (modelagem do desenvolvimento e desaparecimento da sociedade
Anasazi), de tempo de aposentadoria (análise da resposta a mudanças no tempo de benefício
das aposentadorias), de sistemas de classes (incluindo sistemas segregados e discriminatórios
que são reforçados no tempo por meio da interação entre agentes), convenções sociais,
violência civil e dinâmica de uma epidemia (por meio da modelagem da ameaça de
propagação de armas bioterroristas). São modelos que apresentam as principais características
da MBA definidas por Epstein (2006): heterogeneidade e racionalidade limitada dos agentes,
interações espaciais e locais, desequilíbrio dinâmico e espaço explicitamente delimitado.

7.1.2.1 A definição do agente e a teoria econômica


Interessa particularmente para este trabalho a utilização das simulações e análise em rede para
analisar fenômenos socioeconômicos. Utilizar a MBA implica em aceitar uma alternativa à
abordagem econômica tradicional, mostrada no item 5.3.1, e que é, freqüentemente, a
fundamentação teórica utilizada na economia ambiental.

46
Originalmente em inglês.
157
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Segundo Bowles (2004), o paradigma walrasiano47 - terminologia preferida por ele ao termo
mais amplo “paradigma neoclássico” - representa o comportamento econômico como a
solução de um problema de otimização restringida de indivíduos inteiramente informados e
inseridos em um ambiente virtualmente livre de instituições. A passagem do tempo é
representada simplesmente por uma taxa de desconto, as pessoas não aprendem ou adquirem
novas preferências no decorrer do tempo e as instituições não estão envolvidas. As ações de
terceiros são explicadas por um determinado vetor de preços de mercado, enquanto a
proximidade é captada pelo custo de transporte. Direitos de propriedade e outras instituições
econômicas são representados pela restrição orçamentária. Para Bowles (2004: 8-9):

Um ator econômico neste modelo é grosseiramente Robinson Crusoé, com


os preços substituindo a natureza. Os “Crusoés” dos economistas habitam
um mundo nos quais os bens são escassos, mas qualquer instituição que seja
necessária para coordenar suas atividades de maneira ótima é livremente
viável. A oferta ótima de instituições pode ser então ignorada pela mesma
razão que Adam Smith utilizou para explicar porque economistas não
precisam teorizar sobre o valor da água: elas são bens livres (tradução da
autora).48

O paradigma walrasiano descrito acima, embora bastante simplificado, mostra em linhas


gerais o pensamento dominante nos círculos acadêmicos no último quarto de século e,
possivelmente, ainda hoje. Esse, entretanto, com as novas ferramentas analíticas, como a
teoria dos jogos e a economia da informação, e ante as inadequações de alguns dos seus
pressupostos, vem concorrendo com novas formas de perceber o agente. Esse não interage
simplesmente com a natureza ou com algum outro meio paramétrico, mas também com outros
agentes e de forma estratégica. Suas interações deixam de ser inteiramente descritas pelos
preços dos bens comercializados, pois alguns aspectos das transações não são expressos por
meio de contratos executórios.

Um ponto central que difere a MBA das tradicionais teorias econômicas é o paradigma da
racionalidade do agente. A economia neoclássica considera que os atores conhecem suas
preferências, freqüentemente medidas por uma função utilidade, e tomam a melhor decisão
possível baseados em completa informação sobre o meio ambiente e no conhecimento das
supostas conseqüências das suas decisões. Esse seria o homem racional, ou homo economicus,
no sentido de possuir uma racionalidade perfeita, agir de forma autocentrada, independente e
clarividente para a busca do máximo bem-estar próprio.
47
Termo que faz referência à Léon Walras (1834-1910). Ele é considerado como um dos fundadores daquela que
ficou posteriormente conhecida como a Escola de Lausanne de Economia ou Escola Matemática. Seu mais
notável trabalho é Elements d'économie Politique Pure (Elementos da Economia Política Pura, em Português),
de 1874.
48
Originalmente em inglês.
158
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Mas, segundo Billari et al. (2006), enquanto o uso do ator racional neoclássico pode ser
adequado para ambientes com um pequeno número de variáveis de controle e estado, ele tem
limites em ambientes complexos e incertos com pessoas “reais” que possuem racionalidade e
capacidade computacional limitada. Um aspecto que atua sobre esta suposta racionalidade é o
ambiente social e, em particular, o comportamento imprevisível dos outros agentes. A teoria
dos jogos, por exemplo, em modelos dinâmicos com um grande número de jogadores
interagindo entre si, mostra-os, em sua capacidade de aprendizado e de adaptação segundo os
lances de outros jogadores, indo, possivelmente, depois de múltiplas rodadas, para uma
estratégia de cooperação.

Ao perseguirem seus objetivos, há maior possibilidade de que os agentes o façam utilizando


um repertório limitado de respostas adquiridas em experiências passadas do que por meio de
uma visão cognitiva antecipada do processo de otimização futuro (Bowles, 2004).

Em muitas situações, emoções como vergonha, repugnância ou inveja combinam-se para


produzir uma resposta comportamental. Agentes podem diminuir seu bem-estar material para
aumentar o de outros, ou mesmo para penalizar terceiros quando se julgam prejudicados ou
motivados por questões morais e éticas. São as chamadas preferências sociais, (do inglês,
social preference). Elas existem quando os agentes consideram as conseqüências de suas
ações não apenas sobre eles próprios, mas também sobre os outros. Exemplos de preferências
sociais são ações motivadas por reciprocidade, inveja, altruísmo e aversão à desigualdade.

Alguns agentes podem ser mais egoístas, outros possuírem maior comprometimento social. A
percepção de experiências de terceiros também pode interferir nas ações comportamentais,
especialmente se esse terceiro é alguém que exerce liderança ou admiração. Existem aspectos
de conformismo, sujeição às regras sociais e também aspectos morais que agem sobre o
comportamento. A versatilidade garante que os agentes se comportem segundo a situação
presente e não apenas por uma predisposição comportamental. Os comportamentos podem ser
idiossincráticos e instáveis.

Ou seja, entender as preferências em seu caráter adaptativo, cognitivo, reativo, social,


individual e específico é um campo extremamente amplo das ciências comportamentais e
mostra como a suposição neoclássica da racionalidade pode ser falha, mesmo para um
modelo. As preferências individuais são endógenas e não “dadas” como muitas vezes supõe a
teoria microeconômica.

159
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Em anos recentes, cada vez se observa mais esta transição entre modelos compostos por
atores racionais para a modelagem baseada em agentes. Na MBA, os agentes agem segundo
regras, nas quais a otimização da utilidade é apenas uma das várias possíveis. Embora o
agente possa ser tão complexo quanto se queira, incorporando elementos da economia,
sociologia e psicologia cognitiva, ele também pode ser tão simples quanto possível. Axelrod
(1997) é um dos proponentes da simplicidade. As regras comportamentais não são
necessariamente complexas, ao contrário, o processo de tomada de decisão do agente tende a
ser simples, de acordo com suas necessidades, subsidiado por informações locais, de
vizinhança, e no qual o habito e a cultura tem um papel fundamental.

7.2 Modelos de Simulação de tráfego


Atualmente, com o desenvolvimento das ferramentas de simulação de tráfego, tem sido
possível acompanhar mudanças nos fluxos em intervalos de segundo. Nestes modelos, além
dos tradicionais indicadores de desempenho – tempo, distância e consumo de combustível –
são apresentadas informações sobre a emissão de poluentes, como hidrocarboneto, monóxido
de carbono, gás carbônico e emissões de óxidos nitrosas.

Especificamente em relação ao impacto da inundação, com a utilização dos simuladores de


tráfego é possível verificar continuamente o tempo e a velocidade média de viagem dos
agentes e, comparando-os com os valores antes da inundação, calcular os custos adicionais
(de tempo e material), caso ocorram. Por meio das informações de origem e destino,
verificam-se quais moradores foram afetados pela inundação e o que isto representa em
diminuição de bem-estar (e.g.: custos de transporte adicionais, falta ao trabalho e adiamento
ou transferência da demanda).

A simulação de tráfego normalmente requer informações como fluxos de tráfego, curva fluxo-
velocidade, fluxos de saturação (capacidade), densidade de congestionamento, número de
faixas de tráfego, geometria da rede, matriz origem e destino, etc.

Entre os simuladores de tráfego com uso generalizado, tem-se AIMSUN2 – Advanced


Interactive Microscopic Simulator for Urban and Non-Urban Networks, o TransCAD, o
TRASYT – Traffic Network Study Tool, o VISSIM e o INTEGRATION. Este último foi
utilizado para a simulação de tráfego no modelo proposto nesta pesquisa.

Um modelo de simulação foi apresentado por Dourado (2007). O pesquisador desenvolveu


um protótipo computacional que permite calcular continuamente os tempos de viagens em

160
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duas rotas diferentes entre um par de origem/destino. O objetivo seria disponibilizar estas
informações aos usuários em tempo real por meio, por exemplo, de um painel de mensagens
variáveis para melhor distribuir o tráfego e evitar congestionamentos. Segue-se o princípio de
que o motorista busca minimizar seu tempo de viagem, e, assim, o trafego se distribuiria
buscando alcançar este objetivo, ou seja, rotas de menor tempo.

Dourado (2007) utiliza a função de desempenho do BPR (Bureau of Public Roads)


modificada para inclusão de parâmetros de calibração. A curva do BPR tem a forma (Figura
7.4):

Figura 7.4 – Curva de desempenho do BPR


Fonte: Dourado, 2007: 106.

A curva da Figura 7.4 é representada pela função:


  f  
t( f )  t f 1      7.1
  max  
f

Onde:
t (f) = tempo de viagem (em função do volume de trafego);
tf = tempo de viagem para fluxo livre;
f = fluxo atual no link;
fmax = fluxo máximo do link;
α e β = parâmetros de calibração (na Figura 7.4, α = 0,15 e β = 4) .

O tempo de viagem em fluxo livre (tf), quando não conhecido, é calculado segundo a Equação
7.2:

161
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tf = l / vf 7.2

Na qual:
l = extensão do link (em m);
vf = velocidade de fluxo livre ou de projeto (em km/h).

A velocidade de fluxo livre pode ser considerada a velocidade máxima permitida no trecho
(velocidade de projeto).

Dourado (2007) sugere o uso dos coeficientes definidos pelo National Cooperative Highway
Research Program – NCHRP (Tabela 7.3):

Tabela 7.3 – Parâmetros para estimativa do tempo de viagem segundo BPR

Via expressa ou via rápida (freeways) Rodovia de múltiplas faixas


Coeficiente
112km/h 96 km/h 80 km/h 112km/h 96 km/h 80 km/h
α 0,88 0,83 0,56 1,00 0,83 0,71
β 9,8 5,5 3,6 5,4 2,7 2,1
Fonte: Martin & McGuckin (1998) apud Dourado (2007: 107).

Observa-se que as velocidades mostradas na Tabela 7.3 são relativamente altas em relação às
praticadas no município de Belo Horizonte, onde, normalmente, a velocidade máxima
permitida é de 60km/h. Além disso, ela não contempla outros tipos de vias, como vias
secundárias e locais.49 Em conseqüência, torna-se necessária pesquisa bibliográfica para
escolha dos coeficientes “α” e “β” em função da velocidade de projeto definida para as vias
atingidas pela inundação ou, ante a inexistência de uma fonte segura, uma adaptação dos
mesmos.

Inicialmente, pensou-se em adaptar o modelo de Dourado (2007) para uma análise de


alocação do tráfego em decorrência da inundação. Por meio do cálculo do tempo de viagem
no trecho atingido e nos trechos alternativos, o motorista escolheria a rota preferida.
Entretanto, o modelo utilizado por Dourado (2007) acabou apresentando limitações ante os
objetivos da pesquisa.

49
Vias secundárias interceptam, coletam e distribuem o trânsito para as vias de trânsito rápido ou preferencial.
Vias locais são destinadas ao acesso às áreas restritas. Como regra, elas permitem velocidades inferiores às vias
de trânsito rápido e preferenciais.
162
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7.3 Análise de rede

Já foi dito anteriormente que o espaço urbano pode ser representado por uma rede formada de
nós e linhas (ou links, do inglês). Os nós seriam os domicílios, os centros de produção,
distribuição e consumo. Em um sistema de trocas, os links conectam estes nós e por
intermédio deles circulam bens e pessoas. Como estrutura física de suporte aos links tem-se a
infra-estrutura urbana, como as vias, as redes de abastecimento de água, energia elétrica e de
telefonia.

Como um dos objetivos deste trabalho é a mensuração dos impactos indiretos da inundação
sobre os domicílios e sobre o espaço urbano, a análise de rede, ao tratar informações
relacionais, parece adequada para verificar a magnitude do impacto sobre a rede, com
possíveis alterações na sua organização e afetando as conexões estabelecidas em uma situação
de normalidade, sem inundação. Quanto mais densa a rede, maior a possibilidade de difusão
dos impactos. Ao atingir, direta ou indiretamente, nós centrais, a inundação pode levar ao
desequilíbrio parte relevante do sistema. Se nós ou links conectores entre regiões ou agentes
são afetados, há possibilidade de isolamento de partes da rede, dificultando as condições de
acesso e bem-estar para as famílias afetadas.

Enfim, a análise de rede, ao discutir, entre outros aspectos, a estrutura da rede, as conexões
entre agentes e como estes se inserem em um sistema de trocas diárias e as centralidades,
pode fornecer indícios relevantes sobre a vulnerabilidade da rede urbana e a capacidade de
propagação do impacto na mesma.

7.3.1 Relações a atributos

Apenas recentemente a análise de rede tem recebido maior enfoque, de maneira que alguns
conceitos associados ao seu entendimento ainda não estão generalizados ou suficientemente
incorporados de maneira clara e objetiva na literatura científica. Sendo assim, neste item são
apresentados os principais conceitos relacionados à sua compreensão e aplicação.

Normalmente, uma etapa relevante de um estudo refere-se à coleta de informações sobre o


problema. Segundo a natureza das informações e do estudo, os dados são organizados e
diferentes técnicas de análise são utilizadas.

Nas ciências sociais aplicadas, os dados podem ser classificados, segundo sua forma de
interpretação, em três tipos (Scott, 2000): dados de atributo, dados relacionais e dados
ideacionais.
163
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Os dados de atributo relacionam-se às atitudes, opiniões e comportamento dos agentes. São
informações que mostram as suas propriedades, qualidades ou características. Por meio de
uma análise de variáveis, os atributos são mensurados como valores de variáveis específicas
(e.g. renda, ocupação, educação).

Os dados relacionais se referem aos contatos, laços e conexões que relacionam um agente a
outro e, portanto, não podem ser reduzidos às propriedades de um agente em si mesmo.
Aludem não às qualidades de um agente, mas às de um sistema de agentes. As relações
conectam pares de agentes em sistemas relacionais cada vez mais amplos. Os métodos
apropriados para a sua análise são aqueles de rede, nos quais as relações são expressas por
links. Embora possam ser feitas análises quantitativas e estatísticas das relações, a análise de
rede sempre incorpora um conjunto de medidas qualitativas sobre a estrutura da rede.

Um terceiro tipo de dados são os dados ideacionais, menos discutidos na literatura. Eles são
os dados que descrevem os significados, motivos, definições e tipificações. As análises
tipológicas ou análises de cluster, desenvolvidas com o propósito de agregação de objetos,
são exemplos de técnicas com a utilização de dados ideacionais. A Figura 7.5 mostra os
diferentes tipos de dados e análise.

Estilo de Levantamento Pesquisa Pesquisa


pesquisa de dados etnográfica documental

Fonte de Questionários, Observações Documental


evidências entrevistas

Tipo de Atributo Ideacional Relacional


dados

Tipo de Análise de Análise Análise de rede


análise variáveis tipológica

Figura 7.5 – Tipos de dados e análises associadas


Fonte: Adaptado de Scott, 2000: 3.

Observe na Figura 7.5 que os diferentes tipos de dados, embora impliquem em distintos meios
de análise, possuem as mesmas fontes de informação, como questionários, entrevistas,
observação e documentos.

164
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7.3.2 Nós e linhas

Uma rede é formada por dois elementos: os pontos e as linhas. Os pontos também podem ser
denominados vértice ou nós e as linhas, arcos, conexões ou links.

Os nós representam os agentes do sistema: eles podem ser um domicílio, uma firma, uma
esquina, uma praça, etc. A definição dos nós depende das características da rede que se
estuda, das informações disponíveis e dos objetivos da análise. Em uma rede viária, por
exemplo, os nós podem ser os cruzamentos das vias. Em uma rede elétrica, são as unidades de
produção, distribuição e consumo de energia. Em um estudo hidrológico-hidráulico do rio, as
seções transversais com entrada de informações, as pontes, os afluentes, etc. Em uma família,
os seus membros; em uma rede de amigos, os indivíduos ligados pelas relações de amizade,
etc. Portanto, nós ligam-se a outros nós, seja por fluxos (e.g.: de informação, bens, pessoas,
energia, fluidos), ou por outras relações, como laços de afeto, parentesco ou relações de
poder. A ligação entre nós é representada pelas linhas.

Sempre que os dados se relacionem com outros dados, ou seja, os dados são relacionais, a
análise de rede pode ser utilizada.

Mesmo dentro da análise em rede, existem inúmeras representações de como ocorre a ligação
entre um par de nós. Pode-se ter uma rede mais ou menos detalhada, uma análise baseada em
fluxos sem incorporação explicita da dimensão geográfico-espacial ou com o
georreferenciamento das informações e a identificação dos caminhos físicos percorridos.
Estas definições dependem dos objetivos do estudo, das informações e tecnologia existentes e
da metodologia escolhida.

A Figura 7.6 mostra duas maneiras de se representar graficamente a ligação entre o agente A e
o agente B.

A B

B (a)
A
B
1 2
B
(b)

Figura 7.6 – Duas representações de ligações entre nós

165
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Na Figura 7.6, o gráfico (a) mostra uma hipotética relação de consumo entre o agente A,
comprador, e o agente B, vendedor. Além da relação em si, a única informação adicional é o
seu sentido. Ela pode representar a transferência de dinheiro ou o deslocamento para
aquisição do bem. Como será mostrado no item 7.3.3, ainda poderia ser informada a
intensidade desta relação, mensurada, por exemplo, em termos do valor da compra ou da
distância percorrida por A para alcançar B. Em (b) tem-se a mesma relação entre os agentes,
mas incorporando explicitamente algum componente ligado ao caminho geográfico
percorrido. Ou seja, o fluxo é mostrado sobre uma representação de base física ou espacial.
As conexões que passam por “1”e “2” representam links de vias utilizadas no deslocamento.

7.3.3 Medição da relação

A matriz apresentada na Figura 7.7 mostra a força da relação entre os agentes:

Agentes
1 2 3 4
1 - 3 3 1
2 3 - 2 2
Agentes 3 3 2 - 1
4 1 2 1 -
Figura 7.7 – Matriz agentes x agentes (matriz 4 x 4)

Cada informação da matriz representa o número de links entre os agentes. Observa-se que as
relações mais fortes existem entre os agentes 1 e 2 e entre os agentes 1 e 3, cada uma destas
envolvendo três links. As ligações mais fracas são aquelas que envolvem apenas um link. A
matriz pode ser representada por meio de um sociograma (Figura 7.8)

1 3 2

1 2
2 3

4 1 3

Figura 7.8 – Sociograma de agentes

No sociograma da Figura 7.8 a força da ligação é ilustrada por meio de valores dispostos ao
lado das linhas. Esta força poderia ser visualizada de outra forma, como, por exemplo, por
linhas de diferentes larguras nas quais a sua espessura indicaria o número de interconexões.

166
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Outra característica que envolve a relação é a sua direção. Se a relação do agente “1” com o
agente “2” é idêntica àquela do agente “2” em relação ao “1”, tem-se uma relação simétrica
ou não direcional (do inglês undirect relational data). Este é o caso quando há reciprocidade
perfeita de atitudes entre os agentes ou não há exercício de poder ou influência de um sobre o
outro. Nas relações simétricas, a matriz de agentes é como aquela mostrada na Figura 7.7: os
lados divididos pela diagonal são simétricos, ou seja, o lado superior direito é idêntico ao lado
inferior esquerdo.

Os dados assimétricos ou direcionais, por sua vez, não possuem reciprocidade de relação (e.g:
o agente 1 ama o agente 2, mas o agente 2 é indiferente ao agente 1). A direção da relação é
mostrada em um sociograma por uma cabeça de seta nos links que conectam os nós.

Os dados relacionais podem, portanto, serem classificados segundo duas dimensões: direção e
numeração (Figura 7.9)

Direção
Simétrico Assimétrico
Binário 1 3
Numeração
Valorado 2 4
Figura 7.9 – Níveis de medida em dados relacionais

Fonte: Adaptado de Scott, 2000: 47.

O tipo de dado relacional mais simples é o tipo 1: ele é binário e não direcional. Os dados
binários mostram apenas a existência de relação, mas não sua força.

Em relação à numeração, há ainda um terceiro tipo de dado, os dados de sinal. Eles mostram
se a relação é positiva (+) ou negativa (-). Embora acrescentem informação em relação aos
dados binários, eles indicam apenas a polaridade e não o valor da relação. Há situações em
que os dados de sinal são acrescentados aos dados de valor, caracterizando uma relação em
termos de força e de sinal. Obviamente, argumentação teórica ou razões empíricas acompanha
a utilização e escolha de cada uma destas medidas.

7.3.4 Seleção dos dados relacionais

A Figura 7.10 mostra um processo de escolha amostral em redes. Uma população particular
de agentes está envolvida em um sistema complexo de relações de todos os tipos que formam
a rede total. Inseridas nesta rede total, podem ser identificadas as redes parciais, que
compreendem, por exemplo, relações econômicas, políticas, religiosas, etc. O pesquisador

167
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deve, então, criar sua amostra de forma a obter todas as relações relevantes para as suas redes
parciais. A escolha da amostra segue os princípios de amostragem em levantamentos
estatísticos.

Considerando o impacto da inundação sobre os domicílios, pode-se definir, por exemplo, do


ponto de vista econômico, duas principais relações que envolvem o cotidiano dos moradores:
aquisição de renda (trabalho) e gasto de renda (consumo), sendo que estes gastos abrangem
um amplo leque de escolhas, desde alimentos, até investimentos para aumento de capital ou
cursos para ampliação de habilidades e capacidades.

População Amostra

Rede total

A. Econômica A'. Econômica

B. Política B'. Política Amostras


Redes
parciais de rede
C. Religiosa C'. Religiosa

etc. etc.

Figura 7.10 – Redes e amostras

7.3.5 Caracterização da rede

Um conceito fundamental que permeia a análise em rede é o da centralidade dos indivíduos e


organizações. O conceito é largamente utilizado intuitivamente na vida cotidiana,
normalmente para destacar a importância de algo ou alguém em relação ao restante do
conjunto a que se faz referência. Quando se diz, por exemplo, que alguém é uma
“celebridade”, percebe-se esta pessoa como a mais popular em seu grupo, ela ocupa o lugar de
centro das atenções, logo o sentido de centralidade está presente.

A centralidade está intimamente relacionada ao conceito de poder. A abordagem de rede


enfatiza que o poder é inerentemente relacional. Um agente não possui poder de maneira
abstrata, ele o possui porque pode dominar outros agentes, que, de alguma forma, passam a
condicionar o seu comportamento ao do agente central. Ter poder significa estar inserido na
rede em uma posição favorável que implica maiores oportunidades, menores limitações e
maior poder de barganha (Hanneman & Riddle, 2005). No arcabouço metodológico de
168
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
estudos sobre as redes, existem alguns indicadores que procuram captar a centralidade do
agente. Como existem várias compreensões da centralidade, há diferentes formas de mensurá-
la. Além disso, pode ser feita uma análise circunscrita a uma vizinhança ou para toda a rede.

Hanneman & Riddle (2005), consideram três características que definem a centralidade de um
agente: grau, proximidade e intermediação:

 Grau (degree): quanto maior o número de conexões do agente com sua vizinhança, mas
central ele é. Na análise, define-se o tamanho N da vizinhança que se deseja investigar. Os
agentes com mais conexões tendem a possuir maior poder para influenciar o
comportamento dos outros agentes e menor dependência. Eles usufruem mais alternativas
para satisfação das necessidades, o que lhes garante uma posição relevante na rede. Se, por
exemplo, uma atividade econômica que possui um grande número de consumidores na
região (maior número de conexões) for atingida por um evento, este causará maior
interferência nas rotinas de gastos das famílias do que uma atividade com poucas
conexões. No sentido inverso, a alteração no comportamento de um grande consumidor
causa maior impacto nas unidades de comércio do que a de um pequeno consumidor e,
entre as unidades de comércio atingidas, o impacto será maior naquelas com menor
número de consumidores.50

 Proximidade (closeness). Se a centralidade é apenas baseada nos graus dos agentes, pode-
se ter um agente central, mas apenas na sua vizinhança. Esta, por exemplo, pode estar
ligada a agentes que são desconectados a outros, o que restringe o alcance da influência do
agente na rede. Outra maneira de se medir a centralidade é considerar a distância entre os
pontos. Considera-se que os agentes que possuem caminhos mais curtos para se chegarem
a outros agentes ou por serem alcançados por eles, têm uma vantagem relacional estrutural
na rede. A distância geodésica mostra o menor caminho (menor número de links) entre
dois nós na rede. Portanto, a média da distância geodésica entre os nós, é uma medida de
proximidade. A idéia de proximidade como medida de centralidade foi proposta por
Freeman (1979). Ele a definiu como uma medida de centralidade global, pois considera
não a proporção de pontos conectados, mas a distância entre eles.

 Intermediação (betweenness). Freeman (1979) adicionou um terceiro conceito ligado à


centralidade: a intermediação. Refere-se à capacidade do ator em servir de ponte de contato
entre outros dois atores. Quanto maior sua capacidade de intermediar relações, maior seu
poder na rede.

50
Observe que além do número de conexões o valor das conexões também é importante.
169
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Na Figura 7.11 é apresentada uma pequena rede onde é possível identificar as três
características de centralidade no nó ou agente A.

Figura 7.11 – Uma rede com centralidade local

Observe que o agente A possui 6 graus (seis links conectados), enquanto os outros agentes, 1
grau. Ele está mais próximo dos outros agentes do que qualquer outro agente na rede.
Enquanto dista apenas um link dos outros nós, estes possuem, cada um, 1 link de distância em
relação à A, mas 2 links de distância em relação ao restante dos pontos. Além disso, o ponto A
funciona como intermediário para a ligação dos outros pontos na rede. C ou G, por exemplo,
só podem chegar até B passando por A. Por outro lado A está diretamente conectado aos
outros nós.

Existem vários outros indicadores da rede que, apesar de não terem sido explicitamente
discutidos neste estudo, fornecem subsídios para uma compreensão da vulnerabilidade da rede
e a possibilidade de propagação de um impacto sobre ela. Os principais são apresentados na
Tabela 7.4. Na primeira coluna, tem-se o indicador. Na segunda, seu significado, e na terceira,
o que uma mudança deste indicador, ante a ocorrência da inundação, possivelmente implicaria
em termos de impacto e aumento de vulnerabilidade.

170
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 7.4 – Indicadores associados à análise da vulnerabilidade da rede ao impacto da
inundação
Indicador Análise em situação de normalidade Análise pós-impacto
Diminuição no número de conexões indica
Densidade Indica o volume de conexões. maior dificuldade de circulação dos
fluxos.
Aumento dos agentes “inacessíveis”
indica maior possibilidade de divisão na
Análise do número de pontos
Acessibilidade rede. Análise da natureza do agente
acessíveis e inacessíveis.
inacessível, pois ele pode ter relevância no
bem-estar da população.
Aumento da distância geodésica indica
Distância geodésica Indicador da distância média entre
maiores custos de deslocamento ou perda
média pontos.
de bem-estar.
São indicadores da redundância da rede
Redundância dos
e da vizinhança. Indicam maiores Diminuição na redundância dos nós indica
caminhos geodésicos,
alternativas ante um impacto. Quando possibilidade de congestionamento ou
redundância diádica e
maior a redundância, menos vulnerável paralisações na rede
fluxo máximo
a rede.
Nós ou conexões atingidas com alto índice
Indicador do número de agentes- de intermediação indicam a possibilidade
Índice de intermediação pontes, subordinados e de conexões rompimento de fluxos ou a necessidade de
intermediárias existentes na rede. escolha de uma alternativa menos
preferível.
Aumento do potencial brokerage de um
Indica e existência de buracos
agente sugere aumento de buracos
estruturais na rede e dependência de
Brokerage estruturais. Por outro lado, se um agente
nós como intermediários para alcançar
com potencial brokerage é atingido pelo
a vizinhança.
evento pode ocorrer isolamento de nós.
Exprime a dependência dos agentes em Aumento da dependência diádica ou da
Dependência diádica e
relação à sua vizinhança. Quanto restrição do ego indica agentes com
constrangimento pela
maiores estes índices, mais vulneráveis menores opções de escolha, logo, aumento
vizinhança
são os agentes. da vulnerabilidade.
Indicador de redundância na
vizinhança. Quanto maior o seu valor, Um aumento em seu valor indica
Eficiência da rede
menor a redundância na vizinhança, diminuição na redundância.
logo maior a vulnerabilidade
Mostra as centralidades existentes na Se nós centrais são impactados, há maior
Centralidade rede e distingue os centros receptores e probabilidade de propagação do impacto
emissores de conexões. na rede.
Se nós centrais e com poder na rede são
Poder (abordagem Indica os nós que possuem centralidade
impactados, há maior probabilidade de
Bonacich) e poder na rede
propagação do impacto na rede.

7.4 Análise de agentes e rede nos estudos de impactos ambientais


Um dos principais divulgadores da modelagem baseada em agentes como uma forma
particularmente relevante de modelar fenômenos complexos foi Joshua M. Epstein. A grande
referencia empírica foi a modelagem de Kayenta Anasazi, civilização que habitou o nordeste
do Arizona entre de 800 a 1300 AC, quando misteriosamente desapareceu.

A modelagem de crescimento populacional e colapso de Kayenta Anasazi mostra as


possibilidades de um modelo que integre as dimensões produtiva, familiar e ambiental (Axtell
et al., 2002; Epstein, 2006). No modelo, cada família (agente) é dotada de atributos
(características dos domicílios, número de moradores, consumo alimentar, alimentação
171
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
estocada, etc.) e regras comportamentais (idade do casamento da filha, idade da morte,
escolha da moradia e da localização da atividade agrícola, etc.). As condições geológicas e
geográficas da região (Long House Valley) foram constituídas em detalhes com a
dendroclimatologia, geomorfologia, palinologia e arqueologia.51 Com estas informações, as
flutuações anuais no potencial produtivo agrícola puderam ser verificadas. Dados
arqueológicos trouxeram informações de um milênio de estase sociocultural, variabilidade,
mudança e adaptação. Os agentes do modelo são monoagricultores que decidem onde devem
situar suas plantações e posses. Necessidades nutricionais constrangem a fertilidade. Baseados
nestes registros, que caracterizam adequadamente o espaço e a produção, e com o uso da
MBA na criação das rotinas dos agentes, reproduziram-se as principais características da
história real da região e de seus moradores, ao longo de mais de mil anos, incluindo a
diminuição da população, os seus fluxos, as mudanças nos padrões espaciais e o seu eventual
declínio.

A MBA é freqüentemente utilizada para simular o comportamento de pedestres,


particularmente em multidões, e de motoristas. Em vários modelos emerge, por exemplo, a
tendência dos pedestres em formarem “pistas” nas calçadas. Um exemplo ambicioso é
fornecido pelo TRANSIMS, desenvolvimento pelo Laboratório Nacional Los Alamos, no
Novo México, Estados Unidos.52 Ele é um sistema de simulação baseada em agentes capaz de
simular, segundo a segundo, os movimentos de cada pessoa e cada veículo na rede de
transporte em uma grande área metropolitana. A cidade modelo é formada por 200.000
agentes detalhadamente caracterizados por meio de dados demográficos. No TRANSIMS é
possível verificar mudanças de escolha de rotas em resposta a mudanças de condições de
tráfego, como congestionamentos e acidentes.

Um modelo similar, mais modesto, é o STREETS (Schelhorn et al., 1999). O comportamento


dos pedestres em centros urbanos é investigado considerando a influencia da configuração da
rede de transportes e da localização de atrações específicas (lojas, escritórios, edifícios
públicos, etc.). Os pedestres são caracterizados por meio de duas grandes categorias:
características socioeconômicas, como idade e gênero, e características comportamentais,
como velocidade, campo visual e determinação em seguir uma agenda pré-estabelecida de
atividades.

51
A dendroclimatologia é uma ciência que busca informações sobre o clima por meio da análise dos anéis das
árvores. Os anéis de crescimento de árvores ainda vivas podem dar informação climática de milênios atrás. A
palinologia é a parte da micropaleontologia que estuda os microfósseis orgânicos.
52
Sítio do TRANSIMS na Internet: http://transims.tsasa.lanl.gov/.
172
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Outros modelos de deslocamento de pedestre e veículos estão disponíveis nas bibliotecas
virtuais de plataformas para a modelagem baseada em agentes, como o Netlogo e o Repast.

Nesta linha de estudos, recentemente têm surgido pesquisas que utilizam a MBA para simular
o comportamento das pessoas especificamente na área de desastres naturais, como os
trabalhos de Zarboutis & Marmaras (2005) e Takahashi (2006). O primeiro analisa a conduta
da população em uma situação de evacuação emergencial, e o segundo mostra a execução de
um plano de ações durante o desastre com estratégias de salvamento.

Em relação a estudos sobre o espaço urbano com o uso da simulação, cita-se a pesquisa de
Luca (2007) que apresenta uma ampla plataforma de modelagem dinâmica, interativa e
generativa para simular a organização do espaço urbano e regional. Em macroescala, o
modelo utiliza autômatos celulares e, em microescala, a modelagem baseada em agentes. O
modelo simula as possíveis evoluções, durante os próximos vinte anos, de um vale alpino que
necessita reprogramar seu futuro a fim de alcançar um crescimento sustentável e competitivo
mantendo uma paisagem harmoniosa e integrada. Os agentes do modelo são aqueles que
atuam sobre o espaço urbano, como os planejadores e agentes imobiliários. O enfoque do
modelo é essencialmente as modificações no uso e ocupação do espaço.

Benenson (1998, 1999) mostra em uma abordagem de simulação multi-agentes a dinâmica


residencial em uma cidade. O modelo é formado por uma malha de células que simbolizam
residências. A decisão de cada agente em migrar ou não é definida pelo seu status econômico,
pela sua identidade cultural e pela informação local disponível a ele, a qual depende, por sua
vez, do status econômico, da identidade cultural, do valor das residências dos agentes
vizinhos e da sua percepção sobre a segregação residencial na cidade. Benenson (1998, 1999)
define matematicamente cada uma destas variáveis e cria um modelo de interações para
verificar, a cada passo de tempo, se o agente migra ou permanece na residência. Segundo a
modelo, a probabilidade do agente deixar sua moradia cresce monotonicamente segundo a sua
tensão econômica individual (relação entre o seu status econômico, o da vizinhança e a
segregação residencial na cidade) ou a sua dissonância individual cognitiva (diferença entre
sua identidade cultural e a da sua vizinhança). O autor analisa os trade-offs migração e
mudança no status econômico individual e migração e mudança na identidade cultural
individual. A pesquisa de Benenson (1998, 1999) apresenta um modelo dinâmico de escolha
de localização residencial que possibilita discutir questões como padrões migratórios, a
segregação residencial na cidade e a emergência, fixação e desaparecimento de novos grupos
sociais.
173
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Trabalho relevante, pois mostra a interação entre espaço urbano e água, é apresentado em
Ducrot et al. (2004). Nele é desenvolvido um protótipo com uso da MBA que representa uma
bacia na periferia de um grande centro urbano onde se encontra o principal reservatório de
água potável para abastecimento da área metropolitana. A área é alvo de pressão demográfica
e sofre problemas de poluição conectados ao uso do solo e chuva. A inspiração do modelo
foram bacias existentes no município de São Paulo, como a bacia de Guarapiranga.

Uma questão central do modelo que o difere de outros que discutem mudanças no uso do solo
e padrão de crescimento é a incorporação de variáveis hidrológicas. É feito o uso combinado
de celulares autômatos e agentes para a articulação entre processos hidrológicos (ciclo
hidrológico e poluição), mudanças no uso do solo e urbanização. No protótipo o reservatório
contém informações de nível d‟água e taxa de poluição que influenciam o processo de decisão
dos agentes (fazendeiros e especuladores urbanos).

De modo geral, o uso da simulação na área de desastres naturais, incorporando a dinâmica


intra-urbana, ainda é incipiente, especialmente para eventos de inundação. Mas tem havido
avanços. Há de se destacar a realização, em 2006 no Japão, de uma oficina internacional sobre
o uso de tecnologias baseadas em agentes para a gestão de desastres (First International
Workshop on Agent Technology for Disaster Management). No sitio do workshop na Internet
encontram-se artigos e apresentações que mostram o uso do MBA para análise dos desastres
naturais, especialmente no planejamento dos serviços emergenciais.53

No caso específico de inundações, Brouwers & Verhagen (s.d) fizeram simulações que
procuram avaliar a possibilidade de implantação de um seguro nacional contra inundação.
Com o uso do software Matlab, desenvolvem diversas análises para definir o nível ótimo de
cobertura para danos de inundação e investigar quando a insolvência ocorreria para a
seguradora ou para o segurado, este o agente foco do modelo.

Estudo de Chang & Chamberlin (2004) investiga os impactos econômicos dos terremotos com
o uso da MBA e discute como medidas de mitigação dos danos na rede elétrica e de
abastecimento de água podem levar a um aumento da capacidade de resiliência da população
atingida. A pesquisa mostra a probabilidade de uma unidade econômica fechar em
decorrência de deficiências no acesso à energia e água causadas pelo evento extremo. O
impacto da interrupção das atividades é avaliado em múltiplos intervalos de tempo até que a
unidade reabra. O custo é estimado segundo a produção total perdida no período de

53
Ver http://users.ecs.soton.ac.uk/sdr/atdm/.
174
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
fechamento, o que contraria a metodologia proposta em Parker, Green & Thompson (1987),
segundo a qual o dano seria apenas a perda de valor adicionado.

A pesquisa de Chang & Chamberlin (2004) apresenta semelhanças com a proposta deste
trabalho. Ela define como protótipo uma pequena amostra das unidades produtivas da cidade
de Los Angeles, nos Estados Unidos, as quais são distribuídas no espaço e caracterizadas
segundo o tipo de atividade econômica, o número de empregados e o valor da produção. Ela
difere do foco desta pesquisa por tem como agente central as unidades econômicas, e não nas
famílias, e por discutir especificamente o impacto do desastre natural no acesso às redes de
abastecimento e eletricidade.

Tang & Wen (2009) mostram um sistema inteligente de simulação para avaliação dos
desastres causados por terremotos desenvolvido a partir de uma plataforma de sistema de
informações geográficas (SIG) e inteligência artificial (IA). O modelo é formado por três
dimensões básicas: a simulação da ameaça sísmica, a análise de risco e a simulação dos
serviços de emergência. Na análise do risco considera-se a estimativa dos danos diretos
causados nas edificações, na infraestrutura e em estruturas hidráulicas, como diques e
reservatórios, e a avaliação da perda de ativos e do número de feridos e mortos. O sistema
utiliza SIG, programação computacional, método de análise de redes e teoria da
confiabilidade para criar um sistema que permite exibir seus resultados na forma de mapas
digitais, mensagens, documentos, gráficos e vídeos. Os danos causados pelo terremoto podem
mesmo ser exibidos na internet no momento em que o evento está ocorrendo.

Um aspecto interessante no modelo desenvolvido por Tang & Wen (2009) refere-se ao
subsistema de decisão associado à simulação dos serviços de emergência. A partir das
informações de risco e ameaça, o subsistema disponibiliza a rota de fuga ou a rota eficiente
para alcance de serviços alvo e a alocação de recursos e pessoal segundo as necessidades
observadas durante a simulação do modelo. Por exemplo, pela estimativa de feridos calculada
no modelo, informa-se o número de médicos que deve ser disponibilizado; pelo cálculo da
variação na oferta de alimentos e água, determina-se a quantidade de água potável e alimentos
que são necessários para suprir determinada região afetada. O programa de transportes avalia
a distribuição de danos nas vias e indica a rota ótima para um acesso rápido e fácil a um alvo.
Portanto, o modelo torna-se uma ferramenta eficiente na tomada de decisão em tempo real.
No momento, o modelo é usado na cidade de Daqing, na China.

175
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Em relação aos estudos que utilizam a análise de rede, observa-se que eles a incorporam,
sobretudo, em uma dimensão física.

Sultana & Chen (2009) desenvolveram uma abordagem integrada de modelagem para o
estudo da vulnerabilidade de uma infra-estrutura crítica e da possível propagação dos efeitos
de um dano em um de seus componentes na rede. A metodologia foi aplicada para análise do
risco de inundação de uma rede geradora de hidroeletricidade (composta pela barragem de
armazenamento de água, tubulação, planta de alimentação e pela subestação de
transformação). As interdependências entre as infra-estruturas e a verificação de como elas
respondem ante o rompimento da barragem foram simuladas através de uma rede baseada no
modelo SPN.54 O estudo, além de mostrar uma análise integrada da vulnerabilidade de uma
estrutura hidráulica, com o uso de curvas de fragilidade, probabilidade de inundação e análise
de rede, apresenta pesquisas atuais com o uso da análise quantitativa das interdependências
em uma infra-estrutura.

Helbing et al.(2006) apresentam estudo no qual utilizam a análise de redes para verificar a
possível perda ou atraso no recebimento de informações relevantes em organizações
estritamente hierárquicas. Os pesquisadores defendem a importância da redundância de links
para que as organizações respondam adequadamente a crises e desastres. No estudo são
mostradas as falhas de comunicação que podem ocorrer em organizações ligadas à gestão de
desastres com estrutura estritamente hierárquica: perda de informação relevante devido à
compressão de informação; a informação tende a levar muito tempo do emissor ao
destinatário devido aos vários níveis hierárquicos que precisa atravessar e há, ainda, a
possibilidade de que a informação nunca chegue ao destinatário, caso algum nó ou link não
funcione.

Este último problema pode ocorrer devido a fatores corriqueiros, como um telefone ou
número de fax desatualizado ou a ausência da pessoa responsável por doença, férias ou
alguma outra ocupação que a deixe temporariamente inacessível. Podem também existir
problemas na infra-estrutura de comunicação, como blecaute de energia elétrica ou
sobrecarga de comunicação, situações freqüentes quando há um desastre. Os pesquisadores
citam as experiências ocorridas na grande inundação em Saxony (Alemanha) em 2002 para

54
A análise baseada em redes tornou-se popular no estudo do comportamento de estruturas interligadas de
engenharia. Nesta linha, há o Petri net, método de análise de sistemas introduzido por Carl Adam Petri, no início
de 1962 (Petri, 1962, apud Sultana & Chen, 2009). Em adição ao modelo básico de rede de Petri, introduz-se o
stochastic Petri net (SPN) model, onde foram incorporadas extensões que procuram captar o tempo de duração
estocástica associada a um evento (Ramchandani, 1974, apud Sultana & Chen (2009).
176
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
mostrarem a importância de uma organização em rede resistente a falhas, a necessidade de
canais de informação redundantes, sidelinks institucionalizados e a aceleração dos fluxos de
informação, mesmo que temporário, por meio de atalhos entre o nível superior e o nível mais
baixo.

O trabalho de Helbing et al.(2006) traz indícios para uma melhor compreensão das estruturas
organizacionais e discute um componente relevante da vulnerabilidade de uma rede, a
excessiva hierarquização. A pesquisa de Helbing et al. (2006) pode ter interesse sobretudo na
organização dos planos emergenciais de controle dos efeitos da inundação.

Em relação análise de rede associada ao estudo do sistema de transportes, Chang & Nojima
(2001) propõem indicadores de desempenho do sistema de transporte ante a ocorrência de um
desastre natural, no caso, a ocorrência de terremotos. São modeladas a rede viária,
especificamente as auto-estradas, e a via férrea. A rede de transportes é definida como uma
série de nós e links que os conectam. Os nós das auto-estradas são as saídas e entradas para a
via e das vias férreas, as estações. Neste sentido, três índices são propostos: comprimento total
da rede aberta ao tráfego; acessibilidade baseada no comprimento e acessibilidade baseada na
área. O modelo dos pesquisadores foi especialmente útil para mostrar os efeitos distributivos e
de equidade social que uma melhor organização das políticas e dos planos para o transporte
público e uso do solo entre as partes interessadas na fase de recuperação pós-desastre podem
acarretar (Sohn, 2006).

Em linha semelhante, Sohn (2006), com o objetivo de definir quais os links viários prioritários
de reparação em caso de inundação, apresentou um índice de acessibilidade para cada
condado do estado de Maryland, nos Estados Unidos. O pesquisador apresentou a
metodologia de maneira clara e bem fundamentada, e seu estudo trouxe subsídios para a
análise desenvolvida nesta pesquisa. A acessibilidade aos condados foi inferida considerando
a rede de auto-estradas que os conectam. Foram definidas duas dimensões na composição do
indicador, a distância entre os nós (os condados) e o volume de trafego. A deterioração da
acessibilidade ao nó era medida considerando a diferença do índice de acessibilidade antes e
após a ruptura de links pela inundação. Uma questão não incorporada pelo autor foi o tempo
gasto na recuperação do link, pois uma pequena interrupção em um trecho, quando apenas a
sua limpeza é suficiente, é diferente de uma descontinuidade de maior duração decorrente de
danos estruturais na via.

177
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Embora os trabalhos em MBA e análise de rede ofereçam subsídios para a modelagem
proposta neste trabalho, especialmente dos fluxos populacionais e da dinâmica econômica em
uma cidade, ainda não foram encontrados trabalhos dirigidos especificamente a análises da
resposta de uma cidade ante uma inundação.

178
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8 MATERIAL E MÉTODOS: ANÁLISE DO IMPACTO DA
INUNDAÇÃO SOBRE OS DOMICÍLIOS E SUA PROPAGAÇÃO NA
CIDADE

Propõe-se um estudo que auxilie no entendimento dos impactos econômicos de inundações


sobre as famílias em uma perspectiva de rede urbana. A cidade é vista como um sistema que
procura, o mais rápido possível, minimizar a extensão e duração dos desvios decorrentes de
perturbações externas em relação ao seu funcionamento “normal”. Compreendem cinco
aspectos:

1. Análise dos fatores de ameaça, vulnerabilidade e risco dos domicílios com a criação de
indicadores que os reflitam.

2. Estimar qual o efeito do evento nas rotinas dos moradores: estudo da re-alocação dos
gastos, impacto nos salários, renda e no bem-estar.

3. Análise da propagação do impacto na cidade: estudo sobre como os efeitos da inundação


se propagam na cidade, não se restringindo aos locais fisicamente afetados por ela.

4. Análise dos danos diretos da inundação;

5. Acompanhamento de indicadores econômicos, como renda e salários, antes, durante e


após a inundação.

8.1 Hipóteses do estudo


Os objetivos da pesquisa são discutidos conjuntamente por meio de uma análise
multisistêmica (Figura 8.1): sistema rio (inundação); 2) sistema domicílio; 3) sistema de
transportes e 4) sistema produtivo-distributivo (firmas). Para agregar todas as informações,
utiliza-se uma modelagem computacional em rede.

179
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Domicílios

Inundação

Atividades
Transporte
econômicas

Figura 8.1 - Os subsistemas do sistema urbano


8.1.1 Unidade geográfica de análise

8.1.1.1 O Domicílio
Como Green (2004), considera-se o domicílio como unidade principal de análise. Mais
especificamente, o domicílio e seus moradores. Segundo o autor, o domicílio constitui-se a
esfera geográfica básica na vida de um indivíduo. Funciona como um micro-sistema, onde se
compartilham atividades na busca do máximo bem-estar. Há também uma justificativa
técnica, pois os micro-dados censitários são organizados segundo o domicílio e seus membros
constituintes, e metodológica, que se apóia na escolha da microsimulação para analisar o
impacto da inundação, escolha devida, em grande parte, à possibilidade de incorporar a
diversidade de agentes e seus atributos.

Conforme definição do INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA -


IBGE (2003), domicílio é o local estruturalmente separado e independente destinado a servir
de habitação a uma ou mais pessoas. Neste estudo, em função da compatibilidade dos dados,
trabalhou-se apenas com domicílios particulares permanentes (DPP), ou seja, domicílios
construídos para servir exclusivamente à habitação com finalidade de moradia a uma ou mais
pessoas (IBGE, 2003). Não estão incluídos os domicílios coletivos (e.g.: pensões, presídios,
asilos e conventos) e os domicílios particulares improvisados, estes localizados em unidade
não residencial (e.g.: lojas, fábricas, prédios em construção, barracas, trailers e domicílios
situados sob pontes e viadutos).

Observe que aqui, sempre que houver referência a domicílio trabalha-se não apenas com a
idéia de um local físico, mas como uma unidade socioeconômica de análise, composta por um
ou mais membros, que compartilham o mesmo espaço de moradia e que têm sempre como
objetivo a melhoria de seu bem-estar. Embora domicílio e família sejam conceitos que muitas

180
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
vezes se confundem, a família, segundo Golgher (2004), seria um subconjunto do domicílio.
Normalmente os indivíduos de um domicílio são todos de uma mesma família, mas não são
raros domicílios formados por duas ou mais famílias.

8.1.1.2 A rede urbano-econômica


Os sistemas produtivo-distributivo e viário são introduzidos pelas suas interconexões com o
sistema domicílio. Em um espaço urbano complexo, as interdependências que se estabelecem
entre os agentes são cruciais. Como afirmam Hanneman & Riddle (2005), se um agente é
selecionado como foco de análise, e se as relações deste agente com outros é um componente
importante de seu comportamento e bem-estar, torna-se necessário incluir todos os outros
agentes no estudo. Se há dificuldade de incorporação da totalidade de seus relacionamentos,
devem ser considerados aqueles mais relevantes na definição de seu comportamento.

Para modelar o impacto econômico sobre os domicílios e sobre a área urbana, o sistema
urbano-econômico é representado por meio de uma rede. Assume-se que, como a organização
do espaço urbano é formada por um sistema de interconexões e interdependências, os agentes
tem uma natureza fortemente relacional, logo, o impacto sobre cada um deles tem um grande
potencial de propagação para os outros agentes. A fim de que seja possível mensurar os
impactos diretos e indiretos da inundação, definiram-se como os agentes fundamentais da
rede:

 domicílios: unidades econômicas de consumo, demanda de trabalho e de educação;

 firmas: unidades econômicas de produção, distribuição de bens, oferta de trabalho e


educação. Compreendem as atividades agropecuárias, de pesca, industriais, comerciais e de
serviços;

 rio ou rede hidrográfica: é um elemento físico que desempenha inúmeras funções


ambientais, influencia a estruturação da paisagem das redes urbanas e do qual, por
excedentes eventuais de escoamento, a inundação provem;

 vias: são elementos físicos que estabelecem conexões entre os agentes.

Um ponto fundamental é definir quais os tipos de relação entre os agentes devem ser
discutidas ante os objetivos do estudo. Se vários de seus atributos precisam ser investigados,
pode ser necessária uma análise de diversos tipos de relações (econômica, religiosa, etc.).
Outras vezes, um único tipo de relação possibilita captar, em essência, o comportamento
desejado.

181
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A escolha da relação normalmente baseia-se em um estudo teórico ou empírico que define as
hipóteses de pesquisa adotada, as quais são determinadas a partir dos objetivos do sistema em
estudo. Nesta pesquisa, parte-se de uma abordagem econômica e considera-se que a relação
fundamental a organizar a vida de um agente, no caso o domicílio, é a relação de consumo,
seja o consumo de bens, serviços, conhecimento, lazer ou de trabalho. Esta é uma abordagem
empregada tradicionalmente na microeconomia, que utiliza a teoria do consumidor no
entendimento do comportamento das famílias. Ao se analisar as relações de consumo feita
pelos domicílios segue-se um enfoque de vulnerabilidade em termos de acesso, como
preconizado por Wisner et al. (2004).

8.1.2 Pressupostos do sistema

Pressupõe-se que a economia urbana é aberta e há transações externas, por isso os preços de
vários bens e os níveis de demanda externa são dados e constantes. Modela-se um espaço
urbano definido e sobre o qual um impacto não afetará as regiões fora dos seus limites.
Representaria, então, uma região dotada de relativa independência em relação às demais. No
caso de pequenas cidades, essas hipóteses não são defensáveis, mas para os grandes espaços
urbanos é possível usar essa estratégia de avaliação de impactos.

A hipótese de fundo é que a maior parcela dos impactos econômicos de uma inundação
realiza-se localmente, ao nível da área urbana afetada. Nesse trabalho, embora não se
desconheçam os impactos que possam ocorrer em esferas extra-urbanas, tais como as
regionais, estaduais ou mesmo nacionais, eles não são incorporados ao modelo, tanto em
razão de tratabilidade como da hipótese de sua menor relevância em relação aos impactos
locais.

Por outro lado, o sistema urbano é fechado - não serão acrescentadas população ou novas
estruturas na cidade -, pois a intenção é comparar diferentes cenários de impacto da inundação
em um mesmo sistema.

Adota-se a hipótese microeconômica de que o objetivo básico do domicílio é maximizar a


utilidade no consumo dos diversos bens e serviços, ou seja, aumentar o seu bem-estar. O seu
objetivo primeiro seria, obviamente, garantir a sua própria sobrevivência e a partir dai obter
ganhos de qualidade de vida.55

55
A utilidade é um meio de descrever as preferências. Uma função utilidade é uma forma de representar ou
resumir ordenadamente as preferências: são atribuídos maiores valores para as cestas de consumo preferidas em
relação às menos preferidas (Variam, 1997).
182
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A utilidade é função da quantidade de bens, que dependem da renda e dos preços. Como se
consideram os preços de mercado constantes, a renda domiciliar disponível para o consumo e
o estoque de ativos acumulado na residência são as medidas de bem-estar utilizadas neste
trabalho.

A diferença entre nível de consumo e de ativos antes e depois do evento enchente são,
portanto, medidas de variação de bem-estar. O domicílio recupera seu nível de bem-estar
quando ele recupera o nível de consumo e estoque de ativos prévio ao evento enchente, ou
qualquer outro evento.

8.1.3 O sistema urbano

Optou-se por criar um sistema simplificado que representasse a estrutura de relações de uma
cidade. Ela é representada em dois níveis: na região impactada e de entorno, tem-se uma
individualização dos agentes (firmas, domicílios e moradores), pois se considerou central
diferenciá-los em termos de ameaça, exposição e vulnerabilidade.

No restante do sistema, os domicílios e firmas são representados de forma agregada, em


regiões, as quais são denominadas neste estudo nós econômicos. Estas regiões relacionam-se
entre si e com a área impactada e de entorno por meio de fluxos de consumo e de renda.
Optou-se por esta abordagem híbrida por considerá-la, ante as limitações de recurso e tempo,
adequada e suficiente para captar a rede de conexões que se estabelece entre os domicílios e
as firmas.

A estrutura física e espacial da cidade é formada por domicílios, indústrias, pontos de


distribuição (comércio e serviços), hospitais ou centros de saúde, as principais vias da
localidade e o rio. Agregadas as informações de todos os agentes de cada sistema, o modelo
deve ser capaz de mostrar o comportamento da renda municipal, do estoque de ativos nos
domicílios e do valor adicionado na economia.

A Tabela 8.1 mostra as informações existentes no modelo:

183
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Tabela 8.1 - Informações básicas do sistema urbano
Características Rotinas Ruptura
- Probabilidade; Determinação das
- Área atingida; características
1. Sistema -
- Profundidade; hidrológicas e
rio
- Velocidade; hidráulicas do
- Duração. evento.

- Pontos de ruptura;
- Características socioeconômicas - Re-alocação dos
dos moradores; - Consumo (inclusive
gastos;
de educação e
2. Sistema - Características do domicílio - Variação no nível de
trabalho);
domicílio (edificação e conteúdo); renda e no estoque de
- Escolha de locais
- Localização; riqueza;
de consumo.
- Cesta de consumo do domicílio. - Diminuição do nível de
bem-estar.
- Pontos de rompimento;
- Fluxo de veículos (veículos/hora); - Rotas de desvio e re-
- Tipo de veículos; - Deslocamento dos alocação do tráfego;
3. Sistema
- Rede viária e conexões; agentes: consumo, - Custo de transporte
transportes
- Custos materiais e de tempo de trabalho e educação. adicional e custos de
deslocamento. oportunidade causados
pelo tempo de atraso.
- Tipos e categorias das atividades;
- Localização (comércio, indústria e - Pontos de ruptura;
4. Sistema serviços); - Oferta de trabalho
e renda; - Perda de valor
produtivo-
- Demanda: renda e emprego; adicionado;
distributivo - Oferta de bens.
- Oferta: PIB municipal; - Perda de ativos.
- Valor adicionado.
- Como a inundação afeta os moradores;
- Como o comportamento dos moradores afeta a economia da cidade;
Interdepen-
- Como a inundação afeta o sistema viário;
dências
- Como o sistema viário afeta a cidade;
- Como a inundação afeta a cidade.

Detalhando-se cada sistema, têm-se:

8.1.3.1 Sistema rio


É formado pelo rio ou rede hidrográfica. Sua inundação representa o choque externo à
“normalidade” cotidiana. Em cada célula (pixel) da planície de inundação têm-se informações
de profundidade, velocidade e duração da inundação para diferentes períodos de retorno.

Para este estudo, a modelagem foi feita em regime não permanente e unidimensional, com
utilização dos softwares HEC-HMS, versão 3.1 (HEC-HMS, 2002) e HEC-RAS, versão 4.0
(HEC-RAS, 2003). Criou-se o mapa de inundação com a utilização do software de SIG
ArcGis 9.2. Os resultados obtidos são transportados para a plataforma de simulação do
impacto econômico do modelo.

184
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8.1.3.2 Sistema domicílio
Este sistema é representado pelos domicílios distribuídos na superfície. Ele possui um grande
volume de informações georeferenciadas tanto do próprio domicílio (e.g.: número de quartos,
presença de rede elétrica e de saneamento e existência de bens duráveis), quanto dos seus
moradores (e.g.: escolaridade, renda individual, condições de saúde, idade, se freqüenta escola
ou não e se trabalha ou não), o que permite, não apenas uma caracterização socioeconômica
individualizada da comunidade, mas também definir padrões de deslocamento (deslocamento
pendular ou triangular, segundo as atividades diárias de trabalho, consumo e estudo).

Os danos diretos são estimados segundo os padrões de suscetibilidade de bens e da construção


ao contato com a água de inundação (Machado, 2005; Penning-Rowsell & Chatterton, 1977).
Regras comportamentais de estratégias de re-alocação dos gastos são definidas e introduzidas
ao modelo. A perda de renda e de ativos domiciliares é estimada. Como a cidade é um sistema
interligado, os domicílios não inundados também são incorporados.

O objetivo do sistema é a criação de um modelo com as rotinas das famílias antes, durante e
após a inundação. Ao contrário do sistema rio, modelado em software específico, neste as
rotinas devem ser criadas em plataforma para modelagem em agentes. Para a criação do
protótipo do modelo é utilizado o NetLogo 4.0.4, plataforma para programação de modelagem
em agentes, disponível livremente na Internet.56

O comportamento do domicílio é essencialmente de três categorias: 1) consumo de bens e


serviços; 2) aquisição de educação e 3) aquisição de renda. As atividades de lazer inserem-se
no primeiro comportamento.

Dividiu-se o consumo típico do domicílio em 59 tipos de gastos, utilizando como referência a


Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE (Comissão Nacional de
Classificação - Concla, 2008) (Tabela 8.4). O equilíbrio do sistema ocorre quando o consumo
se iguala à renda (Equação 8.1):

8.1

Onde:
C = consumo mensal familiar;

56
Sobre o NetLogo, ver o sítio: < http://ccl.northwestern.edu/netlogo/>.
185
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pig = preço do produto i do tipo de gasto g;
qig = quantidade consumida do produto i do tipo de gasto g;
y = renda total mensal familiar.

O sobrescrito g varia de 1 a 59, segundo o tipo de gasto.

Como fonte de dados tem-se:

 Caracterização socioeconômica das famílias: censos demográficos do IBGE (2000).

 Padrões de gastos: Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF do IBGE (IBGE, 2003).

8.1.3.3 Sistema transporte (ou de deslocamentos)


Neste sistema têm-se os trechos principais da rede viária a fim de que seja feita uma análise
do tráfego em uma situação sem e com inundação. Quando inundada parte da rede, o modelo
permite verificar os caminhos alternativos escolhidos pelos motoristas e sua capacidade de
suportar o tráfego adicional. O uso de novas rotas pode implicar em aumento da distância
percorrida ou do tempo de deslocamento e acarretar custos materiais (desgaste do veículo,
óleos e combustível) e de tempo adicionais. Há ainda maior emissão de poluição atmosférica
pelos veículos.

Como fonte de dados, têm-se:

 Desenho da rede viária: mapa viário ou fotografia de satélite.

 Tráfego: parte das informações é obtida nas entidades locais responsáveis pelo transporte
urbano, outra parte surge endogenamente a partir das rotinas de deslocamento definidas
para os moradores.

O estudo do sistema de transportes foi elaborado em colaboração com pesquisadores do


Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia da UFMG. Utilizou-se o software de
microsimulação em transportes Integration versão 5.1 (INTEGRATION..., 2005).

8.1.3.4 Sistema produtivo-distributivo


O sistema produtivo-distributivo é composto pelas atividades produtivas e pelos pontos de
distribuição que estão espalhados na cidade. É o sistema que oferta trabalho e gera renda na
região e também onde se encontram os locais nos quais os moradores despendem seus
rendimentos (unidades de distribuição). O custo econômico da inundação no sistema é
avaliado por meio da variação no valor adicionado decorrente de paralisações nas atividades
(quando houver). A perda de valor adicionado representa perda de renda na localidade. Esse
186
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sistema está relacionado ao sistema domicílio e é criado conjuntamente a ele, em decorrência,
utilizam-se os mesmos softwares.

O equilíbrio do sistema ocorre quando a renda é igual à demanda (Equação 8.2):

L x w = Σ p i x qi 8.2

Onde:
L = número de trabalhadores;
w = salários;
pi = preço do produto i;
qi = quantidade consumida do produto i.

Como fonte de dados, tem-se:

 Para localização e quantidade de atividades de distribuição e produção têm-se dados do


Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) (atividades distributivas) e da
Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) do Ministério do Trabalho e Emprego
(atividades produtivas).

Idealmente os quatro sistemas, mesmo que parcialmente tenham sido criados em softwares
distintos, deveriam ser agregados na plataforma única de análise escolhida. Neste trabalho,
por limitações computacionais, a análise do sistema de transporte foi feita à parte e os seus
resultados extrapolados para o sistema como um todo.

No protótipo, utiliza-se o NetLogo 4.0.4 pela sua linguagem relativamente amigável e fácil
manuseio. Ele utiliza a programação orientada para objetos, adequada para simulações que
envolvem agentes e unidades autônomas, como os domicílios. O software oferece uma grande
escala de métodos gráficos para entrada de parâmetros e exibe os resultados graficamente.
Como será exposto posteriormente, ele se mostrou limitado para as rotinas analíticas
propostas, requerendo, em decorrência, a adoção de algumas simplificações na modelagem.

8.2 Matrizes de informações socioeconômicas


Para caracterizar os domicílios e seus moradores são coletados e explorados, principalmente,
os microdados da amostra do censo demográfico de 2000 (IBGE, 2000) por meio dos
programas estatísticos Statistical Analysis System (SAS), versão 6.0, e do SPSS, versão 11.5.

187
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Microdados consistem no menor nível de desagregação de uma pesquisa,
geralmente retratando o conteúdo do questionário, preservado o sigilo das
informações. Os microdados possibilitam aos usuários, com conhecimento
de linguagens de programação ou softwares de cálculo, criar suas próprias
tabelas de planos tabulares de dados numéricos (IBGE:
http://www.ibge.gov.br/home/).

Os microdados são obtidos a partir de informações do questionário completo, o qual abrange,


além da investigação contida no questionário básico, informações adicionais do domicílio e de
seus moradores. O questionário completo é aplicado em 20% do total dos domicílios em
municípios com até 15.000 habitantes e 10% do total em municípios com população superior
a 15.000 habitantes.

A utilização de microdados, que geralmente retrata a informação de um questionário,


possibilita que a diversidade de domicílios existentes em uma região possa ser explorada. Se,
ao contrário, são analisados dados agregados por setores censitários, corre-se o risco de perda
de algumas singularidades relevantes para uma análise de vulnerabilidade, como a capacidade
de se associar de maneira mais precisa as condições físicas de cada moradia às condições
socioeconômicas dos seus moradores ou a possibilidade de caracterizar os domicílios segundo
tipologia de família ou grupos étnicos (King, 2001).

De posse das informações, organizaram-se duas matrizes: matriz “domicílio” e matriz


“residente”. Na primeira estão definidos os domicílios e os seus atributos, e, na segunda, cada
residente dos respectivos domicílios com suas características de interesse.

Além destas duas, há as matrizes de unidades econômicas (firmas). Nelas estão os vetores de
informação sobre as atividades de geração de renda, gasto e aquisição de conhecimento
(estudo) das famílias. São, por conseqüência, os destinos prioritários dos agentes em seus
deslocamentos na cidade.

8.2.1 Matriz domicílio

Foram criadas doze tipologias de famílias com as quais se classificou cada domicílio. A
definição da tipologia teve como referência trabalho sobre arranjos domiciliares desenvolvido
por Golgher (2004). Tais arranjos baseiam-se no ciclo de vida das famílias e nas relações de
dependência entre seus membros, sendo também indicadores de vulnerabilidade social. A
Tabela 8.2 mostra as tipologias criadas.

188
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Tabela 8.2 - Tipologias de famílias e sua distribuição na amostra
Tipologia Distribuição
1 Casal sem filhos, com responsável até 64 anos
2 Casal sem filhos, com responsável com 65 anos ou mais
3 Casal com filhos menores
4 Casal com responsável até 64 anos e com todos os filhos maiores
5 Casal com responsável com 65 anos ou mais, com todos os filhos maiores
6 Mulher até 64 anos, só
7 Mulher com filhos
8 Mulher e outros
9 Homem até 64 anos, só
10 Homem e outros
11 Idoso/idosa, só
12 Homem com filhos
Nota: Filho menor: <= 13 anos; Filho maior: > 13 anos; Idoso (a): >= 65 anos e Outros: Todas as
categorias exceto cônjuge e filhos/enteados.

Trabalhou-se com 82 variáveis divididas em quatro grupos fundamentais: variáveis que


expressam as condições gerais do domicílio (e.g.: localização, acesso ao saneamento básico,
área e padrão construtivo), variáveis de rendimento (rendimento domiciliar), variáveis de
gasto (alocação da renda do domicílio) e variáveis que definem a riqueza em ativos (número
de televisores, de carros, camas, etc.). Esse último grupo representa trinta das 82 variáveis
descritas. O APÊNDICE IV mostra a relação dos atributos considerados.

Entre as 82 variáveis, algumas foram obtidas diretamente do IBGE, por meio do Censo ou da
Pesquisa de Orçamentos Familiares (IBGE, 2000; 2003). Outras, a partir do dado original,
sofreram algum tipo de modificação: cálculo algébrico simples ou reagrupamento em classes.
Uma terceira categoria de variáveis foi obtida por meio de estimativas. Elas apresentam maior
grau de incerteza, pois utilizam informações de diversas fontes e possuem maior número de
suposições e inferências, conforme se descreve a seguir.

8.2.1.1 Localização do domicílio


A localização do domicílio é definida segundo informações censitárias. Os microdados do
IBGE têm a base de informação por área de ponderação (AP):

Define-se área de ponderação como sendo uma unidade geográfica, formada


por um agrupamento mutuamente exclusivo de setores censitários, para a
aplicação dos procedimentos de calibração das estimativas com as
informações conhecidas para a população como um todo (IBGE, 2000).

189
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Em Belo Horizonte, por exemplo, as áreas de ponderação tendem a coincidir com as unidades
de planejamento (UPs) definidas pela prefeitura.57 No presente trabalho, as APs são mapeadas
e os domicílios distribuídos aleatoriamente no interior da respectiva área de ponderação em
que se localizam.

8.2.1.2 Gastos do domicílio


As despesas domiciliares foram obtidas por meio da POF do IBGE, ano 2003, para uma
amostra da área urbana brasileira (IBGE, 2003). A POF mostra, entre outras informações, a
distribuição percentual dos itens de despesa associada a cada classe de rendimento mensal
domiciliar. Estes rendimentos foram deflacionados de 2003 para 2000 pelo IPCA-IBGE, a fim
de se harmonizarem com os dados censitários. Possibilitou-se assim a associação, por meio do
rendimento, de uma estrutura de valor de gasto para cada domicílio.

A suposição na definição da estrutura de gastos é a de que ela é a mesma em 2003 e 2000.


Além disso, os domicílios na mesma classe de renda familiar possuem estruturas de gastos
similares. A exceção refere-se aos gastos com educação. Como a POF mostra o gasto médio
por classe de renda, mas há domicílios que não possuem residentes estudantes, nestes foi feita
uma adequação distribuindo-se proporcionalmente valor dos gastos em educação informado
pela POF entre os outros gastos do domicílio. Portanto, utilizou-se como critério essencial na
definição da estrutura de gastos do domicílio seu rendimento mensal, mas com uma
adequação segundo o número de estudantes na residência.

8.2.1.3 Classificação dos gastos


A partir da estrutura de gastos contidas na POF, definiram-se 59 tipos de despesas para cada
domicílio. A fim de facilitar sua compreensão, foi feita uma análise tipológica que as
descrevem em termos de três características consideradas fundamentais para o estudo:
essencialidade, distribuição da oferta e freqüência de gasto. Além disso, definiu-se para cada
gasto, o seu nível de substituibilidade e sua freqüência de deslocamento que, não
necessariamente, é a mesma que a de gasto (e.g: idas diárias à escola, mas pagamento
mensal).

A essencialidade do bem para o bem-estar do domicílio é definida em três níveis: essencial


(1), necessário (2) e de luxo (3). Esta classificação encerra um grau de subjetividade, embora
possa se estabelecer intuitivamente um determinado padrão entre os consumidores. No

57
As UPs são subdivisões da área de jurisdição das administrações regionais de Belo Horizonte. Elas possuem
características de ocupação semelhantes e agregam informações sócio-espaciais que subsidiam a gestão e o
planejamento local.
190
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primeiro nível, essencial, estão classificados os bens considerados como fundamentais para a
manutenção das condições de sobrevivência e saúde dos moradores do domicílio. São aqueles
bens que garantem ao agente a energia necessária para consecução de suas atividades. Nesta
categoria estão gastos com alimentação e remédios, por exemplo.

Os bens necessários possibilitam uma condição “adequada” de bem-estar no domicílio. Eles


permitem que os moradores se desloquem, tenham acesso à educação, ao consumo de bens
duráveis básicos e à intermediação financeira. Nesta categoria estão os gastos com educação,
vestuário, eletrodomésticos, etc.

Finalmente, têm-se os bens de “luxo”. Estes poderiam ser considerados supérfluos, no sentido
que, caso ocorra algum tipo de restrição financeira no domicílio, eles possivelmente serão os
primeiros a terem seu consumo postergado. Incluem os gastos com jóias, perfumes, diversão,
entre outros.

Na classificação da oferta foram definidos quatro níveis: oferta contígua (1), oferta discreta
(2), oferta muito discreta (3) e oferta em rede (R). A oferta contígua relaciona-se a
atividades que estão distribuídas por toda a cidade e em grande quantidade. Normalmente
ofertam bens essenciais, de alta substituibilidade e de consumo freqüente, logo são facilmente
encontradas na vizinhança do domicílio, como padarias, farmácias, lanchonetes e postos de
gasolina.

As atividades com oferta discreta estão representadas por uma menor quantidade de
estabelecimentos em relação àquelas de oferta contígua e não raro, encontram-se concentradas
em algumas regiões, como a região central e comercial. Exemplificam as atividades de oferta
discreta, as lojas de vestuários, eletrodomésticos e os bancos.

Há ainda bens cuja distribuição no espaço é ainda menos freqüente, eles são classificados
como bens de oferta muito discreta. Nesta categoria incluem-se os hospitais; escolas; serviços
especializados, como de advocacia; oficinas de reparação e manutenção de bens; entre outros.
E na última categoria de oferta discutida, estão os bens que são distribuídos à população por
meio de uma rede. Compreende os serviços de transporte, água, luz, esgoto e telefonia. Os
serviços de gás, por usualmente serem entregues a domicílio, também estão classificados
como de oferta em rede.

191
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No último critério de definição tipológica tem-se a freqüência de deslocamento para aquisição
do bem. Consideraram-se quatro possibilidades: freqüência diária (1), semanal (2), mensal
(3) e rara (4). Os critérios para suas definições são mostradas na Tabela 8.3.

Tabela 8.3 – Freqüência de deslocamento para aquisição do bem


Freqüência Definição
Diária Todos os dias, exceto sábado e domingo
Semanal Não é diário e é, pelo menos, uma vez, em média, por semana
Mensal Não é semanal e é, pelo menos, uma vez, em média, no mês
Rara Consumo é menos freqüente do que uma vez, em média, por mês

A associação das três características do gasto – importância, oferta e freqüência – definiram


vinte tipologias de gastos, as quais são apresentadas na Tabela 8.4. Na Tabela 8.5 são
mostrados exemplos de tipos de despesa presentes em cada tipologia. A tabela completa, com
os 59 tipos de gastos, é mostrada no APÊNDICE V.

Outra característica considerada essencial na estratégia de gasto é o nível de


substituibilidade do bem, ou seja, a possibilidade de substituí-lo. Este critério enfatiza tanto a
raridade de um bem ou a sua unicidade (não há uma alternativa para a provisão dos serviços
de esgotamento, por exemplo), como a diferenciação que possa existir entre eles, em termos
de qualidade, significado simbólico (e.g.: status social) e satisfação dos sentidos (e.g.: beleza,
sabor, suavidade, etc.). A Tabela 8.6 mostra o nível de substituibilidade segundo as tipologias
de gasto.

Tabela 8.4 - Tipologias de gastos, segundo suas características de demanda e oferta


Tipologia Essencialidade Oferta Aquisição
G1.1.1 Essencial (1) Contígua (1) Diária (1)
G1.1.3 Essencial (1) Contígua (1) Mensal (3)
G1.2.3 Essencial (1) Discreta (2) Mensal (3)
G1.2.4 Essencial (1) Discreta (2) Rara (4)
G1.3.4 Essencial (1) Muito discreta (3) Rara (4)
G1.R Essencial (1) Rede (R) -
G2.1.3 Necessário (2) Contígua (1) Mensal (3)
G2.1.4 Necessário (2) Contígua (1) Rara (4)
G2.2.3 Necessário (2) Discreta (2) Mensal (3)
G2.2.4 Necessário (2) Discreta (2) Rara (4)
G2.3.1 Necessário (2) Muito discreta (3) Diária (1)
G2.3.4 Necessário (2) Muito discreta (3) Rara (4)
G2.R Necessário (2) Rede (R) -
G3.1.1 Luxo (3) Contígua (1) Diária (1)
G3.1.2 Luxo (3) Contígua (1) Semanal (2)
G3.1.3 Luxo (3) Contígua (1) Mensal (3)
G3.2.2 Luxo (3) Discreta (2) Semanal (2)
G3.2.4 Luxo (3) Discreta (2) Rara (4)
G3.3.4 Luxo (3) Muito discreta (3) Rara (4)
G3.R Luxo (3) Rede (R) -

192
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Tabela 8.5 – Alguns tipos de gastos estudados segundo a tipologia
Tipologia Gasto
G1.1.1 Alimentação (dentro e fora do domicílio)
G1.1.3 Remédios
G1.2.3 Aluguel
G1.2.4 Material de tratamento (e.g.: seringa, termômetro)
G1.3.4 Serviços de cirurgia, hospitalização e consulta médica. Tratamento dentário.
G1.R Transporte urbano, energia, água, gás.
G2.1.3 Gasolina e Álcool - veículo próprio; xampu e produtos para o cabelo
G2.1.4 Instrumentos e produtos de uso pessoal (e.g.: maquiagem)
G2.2.3 Artigos de limpeza
G2.2.4 Eletrodomésticos, som e TV; vestuário.
G2.3.1 Cursos médio, superior, etc.
G2.3.4 Serviços profissionais (cartório, advog., cont.); serviços de consertos de bens.
G2.R Serviços de telefonia fixa e celular.
G3.1.1 Periódicos, livros e revistas não didáticos
G3.1.2 Fumo
G3.1.3 Cabeleireiro e manicuro
G3.2.2 Diversões e esportes
G3.2.4 Jóias, perfumes, brinquedos e jogos; imóveis de uso ocasional
G3.3.4 Aquisição de veículos
G3.R Viagens (e.g.: avião, ônibus)

Segundo as características do gasto, o consumidor escolherá uma estratégia de adiamento ou


transferência de sua demanda ante a ocorrência de uma inundação na residência ou no local de
compras (ver item 3.2.1.3). A Tabela 8.6 relaciona, segundo cada tipologia de gasto, qual
seria a possível estratégia para agente.

Tabela 8.6 - Tipologias de gastos, segundo suas características de demanda e oferta


Domicílio inundado? Sim Não
Unidade de consumo inundada? Sim Não Sim
Adiamento de demanda? Sim Não Sim Não Sim Não
Transferência de demanda? Não Sim Não Sim Não Sim
Tipologia Substituibilidade
G1.1.1 Alta x - - x
G1.1.3 Alta x - - x
G1.2.4 Média x - - x
G1.3.4 Baixa x - - x
G1.R Baixa x - - x
G2.1.3 Alta X - - x
G2.1.4 Alta x - - x
G2.2.3 Alta x - - x
G2.2.4 Média x x x x
G2.3.1 Baixa x - -
G2.3.4 Média a Alta x X x
G2.R Baixa x - - x
G3.1.1 Alta x x x
G3.1.2 Alta x - - x
G3.1.3 Alta a Média x x x
G3.2.2 Baixa x x x x
G3.2.4 Baixa x x x
G3.3.4 Alta x x x
G3.R Baixa x x x

193
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Na Tabela 8.6, o símbolo “–“ representa consumo inalterado. Quando a substituibilidade e o
adiamento são marcados conjuntamente - como em G2.2.4 para uma situação de domicílio
não inundado e firma sim - considera-se que, para este nível de agregação, não foi possível
definir claramente o comportamento do consumidor.

As estratégias de adiamento e substituição estão relacionadas principalmente às


características de essencialidade, oferta e substituibilidade do bem. Supõe-se que quanto mais
essencial o bem, menor a possibilidade de adiamento no consumo. Logo, quando uma firma
que oferta bem essencial é atingida, seus clientes tendem a não postergarem a demanda. Neste
caso, terão necessariamente de procurar outras firmas que o ofertem. A escolha de uma
alternativa menos satisfatória (mais distante ou com produtos ou serviços menos apreciados)
significa perda de bem-estar.58

Em relação à distribuição da oferta no espaço, quanto menor o número de firmas que


oferecem o bem, maior o impacto sobre os seus consumidores se uma delas é atingida. O
impacto se deve tanto à possibilidade de escassez ou falta do bem em questão, quanto à
necessidade de escolher fontes alternativas possivelmente mais distantes ou menos preferidas.
Se o bem é de luxo, o agente analisa os custos adicionais de deslocamento, tempo e
oportunidade e pode optar por um adiamento da demanda.

A análise de substituibilidade é semelhante à da oferta, pois também se relaciona à escassez.


Neste caso, entretanto, a escassez é um atributo do próprio bem e não da sua oferta. Se a
substituibilidade é baixa, o agente, caso queria o consumo imediato do bem, terá que incorrer
em custos elevados na busca de uma possível fonte alternativa para sua provisão.

Pela descrição acima, observa-se que a restrição de oferta de um bem que teria menor impacto
no bem-estar do agente seria a de um bem de luxo, com oferta contígua e alta
substituibilidade. O oposto seria um bem essencial, com oferta muito discreta no espaço e
baixa substituibilidade.

Ressalta-se que as estratégias de adiamento e transferência poderiam ser feitas facilmente para
os 59 tipos de gastos considerados na pesquisa, pois no banco de dados criado para a pesquisa
existem todas as informações necessárias para isto. Além disso, torna-se mais fácil definir,
nos gastos desagregados, qual seria o comportamento do agente. A restrição é a capacidade
computacional. Considerando a Tabela 8.6, por exemplo, os três parâmetros de análise -

58
Não é considerada a existência de estoque de bens nos domicílios.
194
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
inundação ou não do domicílio, inundação ou não da firma e adiamento ou transferência - dão
origem a seis possibilidades de comportamento que, ao interagiram com as dezenove
tipologias de gastos, originam uma matriz de 114 possibilidades a serem aplicadas em todos
os domicílios estudados, segundo cada tipo de gasto.

Além destes aspectos que caracterizam os gastos, foram definidos outros, como variáveis que
levam em conta a dissociação que eventualmente há entre a aquisição do bem e seu
pagamento. Por exemplo, existem bens que a cada deslocamento é efetuado o pagamento (e.g:
compra de bens duráveis e semiduráveis); em outros o pagamento é periódico, embora o
deslocamento para sua aquisição seja freqüente (e.g.: educação) e há bens e serviços obtidos
sem deslocamento (ou com deslocamento raro) com pagamentos periódicos em locais
diferentes ao da aquisição do bem (e.g.: serviços de telefonia com pagamento em banco).
Portanto, existem várias nuances no comportamento que caracteriza o gasto, e a sua inclusão
no modelo depende do grau de detalhamento que se queira dar às rotinas e, obviamente, da
capacidade computacional do software utilizado.

8.2.1.4 Classe de renda do domicílio


Definiram-se dois tipos de classificação de renda para o domicílio: a primeira baseada na
renda domiciliar total e a segunda, na renda domiciliar per capita (Tabela 8.7 e Tabela 8.8).

Para a classificação em grupos de renda (classes), utilizaram-se como referência estudos da


Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP, 2003) nos quais há tabelas que
associam cada classe socioeconômica, definidas segundo a capacidade de consumo do
domicílio, a um rendimento domiciliar. Na transformação de classes de rendimento domiciliar
em classes de rendimento domiciliar per capita, considerada melhor variável para mediar
vulnerabilidade socioeconômica, utilizou-se a média de moradores por domicílio da região de
estudo (IBGE, 2000).

Tabela 8.7 – Classes de renda média familiar


Renda média familiar
Classe
Em Salários mínimos Em reais de 2000
A1 > 41,195 > 6.220,45
A2 24,675 - 41,195 3.725,93 - 6.220,45
B1 14,81 - 24,675 2.236,31 - 3.725,93
B2 8,595 - 14,81 1.297,85 - 2.236,31
C 4,475 - 8,595 675,73 - 1.297,85
D 2,09 - 4,475 315,59 - 675,73
E < 2,09 < 315,59
Fonte: Elaboração própria baseada em ABEP (2003).

195
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.8 – Classes de renda média familiar per capita
Renda média familiar per capita
Classe
Em Salários mínimos Em reais de 2000
A1 > 12,87 > 1.943,89
A2 7,71 - 12,87 1.164,35 - 1.943,89
B1 4,63 - 7,71 698,85 - 1.164,35
B2 2,69 - 4,63 405,58 - 698,85
C 1,40 - 2,69 211,16 - 405,58
D 0,65 - 1,40 98,62 - 211,16
E < 0,65 < 98,62
Fonte: Elaboração própria baseada em ABEP (2003).
Nota: Considerou-se o número médio de pessoas por domicílio existente em Belo Horizonte: 3,2
(IBGE, 2000).

8.2.1.5 Área construída do imóvel


Os microdados censitários apresentam, para cada domicílio, o número de cômodos,
dormitórios e banheiros (IBGE, 2000).59 Para cada classe socioeconômica associou-se um
valor de área média por cômodo considerando informações sobre as características de
projetos-padrão contidas na norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT
12.721 (ABNT, 2006), pesquisa de campo feita em Machado (2005) e plantas de projetos
habitacionais padrão utilizadas pelo governo de Minas Gerais (Machado, 2005) (Tabela 8.9).
Tem-se, então, a formulação (8.3):

Área construída do imóvel = número de cômodos x área média por cômodo


8.3
definida para cada classe socioeconômica

Observe que a área média por cômodo, como esperado, mostra correlação com a classe
socioeconômica.

Neste estudo, considera-se 30m2 como o valor mínimo de área construída de um imóvel, valor
adotado tendo como referência os classificados de imóveis que se encontram em jornais e na
Internet. Dificilmente encontra-se um imóvel anunciado com menos de 30m2 de área. Além
disso, observou-se, em pesquisa na Internet, que mesmo em projetos de casas e conjuntos
habitacionais populares, considera-se 30m2 como a área mínima para garantia de condições
adequadas de bem-estar.

59
Segundo o Censo Demográfico, cômodo é um compartimento integrante do domicílio separado por paredes,
inclusive banheiros e cozinha, e os existentes na parte externa do prédio, desde que constituam parte integrante
do domicílio. Não são considerados os corredores, alpendres, varandas abertas e outros compartimentos
utilizados para fins não-residenciais como garagens, depósitos etc. (www.ibge.gov.br).
196
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8.2.1.6 Padrão construtivo do imóvel
Para definição do padrão construtivo do imóvel, utilizou-se metodologia proposta por
Machado (2005), vinculando o padrão construtivo à classe socioeconômica (Tabela 8.9). A
suposição é de que a relação direta entre estas duas variáveis.

Tabela 8.9 - Área por cômodo e padrão construtivo segundo classes de renda
2
Classe Área/cômodo (em m ) Padrão construtivo
A1 21,15 Alto
A2 17,30 Alto
B1 13,78 Normal
B2 13,76 Normal
C 11,62 Baixo
D 10,38 Baixo
E 9,32 Popular
8.2.1.7 Quantidade e valor dos ativos
Uma grande dificuldade na criação do modelo de análise de danos foi exatamente definir
quais os tipos e a quantidade de bens expostos no domicílio. Enfatizou-se, na análise, a posse
de bens duráveis, pois são indicadores mais relevantes da riqueza e bem-estar dos domicílios.
A posse de bens, como roupas e objetos de decoração, é de difícil mensuração por referir-se a
objetos extremamente heterogêneos, tanto do ponto de vista de valor, como de qualidade e,
normalmente, não indicam riqueza em uma análise econômica.60

O vetor de ativos de cada domicílio foi definido a partir de três critérios principais:

 Informação censitária original: 10 ativos


 Número de dormitórios, cômodos e banheiros presente em cada domicílio, segundo
informação censitária (IBGE, 2000).
 Indicações de padrões de conteúdo presentes na pesquisa de Machado (2005)

A informação censitária original mostra a existência ou não de sete bens duráveis e o número
de televisores, carros e ares-condicionados presentes na residência, totalizando dados sobre
dez ativos.

Em Machado (2005) foram utilizados padrões de plantas baixas, segundo cada classe
socioeconômica, para os quais foram definidos padrões de conteúdo. Na presente pesquisa
estes padrões foram utilizados para definir os bens presentes no domicílio, mas
parametrizados pelo número de cômodos e dormitórios existentes e os dez ativos recenseados.

60
Obviamente existem objetos de arte de grande valor de mercado, mas sua análise, assim como a de bens de
valor histórico, requer critérios específicos e está fora do âmbito desta pesquisa.
197
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Pensa-se que há uma relação entre o número de cômodos e a quantidade de bens, pois
dificilmente há um cômodo sem conteúdo. Por outro lado, há bens que tendem a variar
proporcionalmente segundo o número de dormitórios, como camas, armários, etc.

Este procedimento permitiu detalhar o conteúdo dos domicílios pelos dados censitários,
possibilitando captar a diversidade existente entre eles. Não raro, por exemplo, verificou-se
um domicílio de pequenas dimensões pertencente à classe A, ou domicílios pobres, mas com
grande quantidade de ativos no seu interior, registrando, até mesmo, a posse de automóveis.
Estes aspectos não seriam captados com a utilização de dados médios ou padronizados. O
APÊNDICE VI mostra os padrões de conteúdo segundo o tipo de cômodo utilizado na
pesquisa.

Feitas as análises, obteve-se um vetor de 32 ativos para cada domicílio, cuja quantidade de
cada um deles varia segundo os três critérios mencionados. Na Tabela 8.10 observa-se a
correlação linear entre as variáveis utilizadas no estudo, por meio do coeficiente de Pearson.
Esta análise foi feita considerando uma amostra de 14.314 domicílios, considerada
representativa das várias classes sociais e tipologias de família que caracterizam uma cidade
como Belo Horizonte (sobre os critérios para definições da amostra, ver item 8.3.2).

Tabela 8.10 – Correlações (coeficiente r) entre o número de ativos presente no domicílio e


outras variáveis de estudo – Amostra de 14.314 domicílios
Área do Número Número Total de Total de
Número de
Variáveis imóvel de de ativos ativos
dormitórios
(estimado) cômodos moradores (censo) (estimado)
Total de ativos (censo) 0,74 0,69 0,46 0,12 1,00 0,84
Total de ativos (estimado) 0,91 0,85 0,63 0,23 0,84 1,00
Nota: As informações da tabela não definidas como “estimadas” foram obtidas por meio de uma
amostra dos microdados de Belo Horizonte do ano 2000 (IBGE, 2000).

A Tabela 8.10 mostra que a estimativa do número de bens dos domicílios parece coerente
com as outras variáveis. Ela apresenta alta correlação com a informação censitária original - o
que era esperado, pois a incorpora - e com a área do imóvel. Ressalta-se que o total de ativos
estimado apresenta maior correlação com o número de dormitórios e de cômodos do que a
informação censitária original. Este comportamento é explicado, possivelmente, pelo fato de
na estimativa serem incorporados bens que não foram pesquisados pelo censo e cujo consumo
está relacionado ao número de cômodos e dormitórios do domicílio (e.g.: camas, armários e
sofás).

A qualidade dos bens foi determinada de acordo com a classe socioeconômica do domicílio,
metodologia já utilizada em Machado (2005) (Tabela 8.11). Considera-se que a qualidade do
198
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
bem, logo, a magnitude do seu valor, está relacionada à capacidade de compra, representada
pela classe socioeconômica.

Tabela 8.11 – Classe de renda e qualidade dos bens


Classe Qualidade do conteúdo
A1 Alta
A2 Alta
B1 Alta
B2 Alta
C Média
D Baixa
E Baixa

O próximo passo é definir o preço de mercado dos bens. Utilizou-se levantamento já feito por
pesquisadores para o trabalho de Machado (2005) diretamente em estabelecimentos
comerciais e por meio da Internet. Considerou-se uma depreciação média de 50% para os
bens, assumindo-se que, em média, eles se encontram em sua meia vida. Ressalta-se que todas
as variáveis monetárias do modelo estão em reais do ano 2000.

A avaliação dos veículos não é considerada em Machado (2005). As dificuldades estão


associadas ao número de hipóteses a serem feitas, pois se trata de um bem, que além de
móvel, possui grande variabilidade de valores. Mas, tratando-se de um dos principais itens de
riqueza dos domicílios e com componentes internos significantemente suscetíveis ao contato
com as águas, sua avaliação é considerada necessária em um estudo no qual as relações
econômicas ocupam centralidade.

Como já mencionada, a quantidade de veículos por domicílio é informada nos microdados


censitários. Em relação ao seu valor de mercado, optou-se por captar de alguma maneira a
variação de tipos e idade de veículos existente entre os domicílios, ao contrário de pesquisas
anteriores, que utilizam um veículo representativo na análise de preço (Appelbaum 1985;
Nagem, 2008; EASTWOOD... 2009).

Com esta finalidade, empreendeu-se uma pesquisa de preços nos classificados de automóveis
de jornais de grande circulação. Coletaram-se os valores de mercado de três categorias de
automóveis - popular, médio e luxo - com até quinze anos de fabricação, pois a idade média
da frota brasileira é de cerca nove anos (Segundo informação do Sindipeças para 2009). Na
ausência da série histórica completa do veículo em questão, alguns preços foram estimados a
partir de curvas de probabilidade: logarítmica para carros de luxo e exponencial para carros
médios e populares. Ressalta-se o bom ajuste obtido por meio destas curvas (coeficiente que
correlação maior do que 0,98 em todos os casos).
199
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A ampla listagem de valores de mercado de automóveis foi dividida em seis percentis,
relacionando-os a cada classe de renda domiciliar. Entre os limites mínimo e máximo de cada
classe, estabeleceu-se uma variação linear do preço segundo a renda domiciliar. A Tabela
8.12 tabela mostra os limites encontrados.

Tabela 8.12 – Valores de automóveis por classe socioeconômica


Classe Valor do automóvel (em R$ de 2000)
socioeconômica Mínimo Máximo
E 1.835 5.958
D 5.959 7.573
C 7.574 12.090
B2 12.091 16.598
B1 16.599 19.927
A2 19.928 29.415
A1 19.928 29.415
Nota: Consideraram-se os mesmos limites para as classes A1 e A2.

Finalmente, o valor total dos ativos do domicílio pode ser estimado pelo somatório ponderado
apresentado Equação 8.4:


n
DiA = j 1
Ai j .Pi j 8.4

Sendo que:
DiA = ativos totais do domicílio i;
Ai j = ativo j do domicílio i, com j variando de 1 a 32;

Pi j = preço do ativo j do domicílio i.

8.2.2 Matriz residente

A matriz “residente” é composta por características selecionadas de todos os residentes nos


domicílios componentes da matriz “domicílio”. Fazem parte da matriz 58 variáveis, estas
divididas em cinco grupos principais: variáveis de atributos físicos (e.g.: idade, raça, sexo e
condições de saúde e mobilidade), variáveis que representem funções no domicílio (e.g.: se
estuda ou não, código da ocupação, horas de trabalho, etc.); variáveis de escolaridade (e.g.:
escolaridade e anos de estudo), variáveis de renda (e.g.: rendimento do residente) e variáveis
locacionais (local de moradia).

Todas as informações dos residentes baseiam-se em informações censitárias originais.

200
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8.2.3 Matriz firma

Esta matriz é formada pelas unidades econômicas do modelo, incorporando atividades


agropecuárias; pesca; produção e distribuição de eletricidade, gás e água; comércio; serviços
para empresas e famílias; administração pública; saúde; educação; transporte e organismos
internacionais.

Na definição da classificação das atividades, utilizou-se a estrutura da CNAE (Concla, 2008),


pois os dados das pesquisas acima mencionadas e do censo demográfico a utilizam como
referência.

Uma questão relevante é definir qual o nível de desagregação será utilizado no modelo. Como
se discute o consumo das famílias, o objetivo ao se estabelecer a classificação é o de que ela
capte as funções dos estabelecimentos usualmente reconhecidas pela comunidade ao
efetuarem suas compras: supermercados, açougues, vestuário, etc. Normalmente esta
informação é obtida com a classificação até o quarto nível da CNAE (classe).61 Para as
atividades que não representam oferta de bens para as famílias, como indústrias de
transformação, agricultura e pecuária, a classificação em primeiro nível (seção) pode ser
suficiente. Ressalta-se, entretanto, que se pode desejar destacar algumas atividades mesmo
que elas não representem unidades de consumo para as famílias. Seria o caso, por exemplo, de
estabelecimentos com grande potencial de poluição das águas quando atingidos pela
inundação, como as indústrias químicas. Neste caso, são feitos ajustes na classificação para
abarcar os objetivos da pesquisa.

Segundo a finalidade desta pesquisa (possibilidade de identificação das unidades de consumo


pelas famílias), criou-se neste trabalho uma classificação própria, chamada de CAP –
Classificação de Atividades do Protótipo - mas inteiramente vinculada à CNAE. Desta forma,
algumas atividades consideradas centrais no estudo são identificadas mais precisamente do
que outras, que são classificadas dentro de um conjunto mais amplo, como é o caso das
atividades agropecuárias e industriais (primeiro nível de desagregação da CNAE).

A partir desta classificação obteve-se um total de 88 tipos de atividades, as quais podem ser
verificadas no APÊNDICE VII. Cada uma delas é caracterizada segundo atributos que
também foram utilizados para descrever os gastos: escalas de oferta (contígua, discreta ou
muito discreta); essencialidade (essenciais, necessários ou luxo); freqüência de gasto (diário,

61
A CNAE apresenta até 5 níveis de desagregação. Do mais agregado para o menos, tem-se: seção, divisão,
grupo, classe e subclasse.
201
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
semanal, mensal ou raro) e critério de distribuição espacial (discutido no item 8.2.3.2). Além
disso, é indicado se o estabelecimento oferta bens para as famílias ou para outras empresas.
Desta forma, pode-se relacionar o tipo de gasto do domicílio (item 8.2.1.3) com a unidade
econômica que o oferta.

8.2.3.1 Geração de renda: número de empresas, pessoal ocupado e salários por CNAE e
CAP
As informações sobre o número de empresas, pessoal ocupado e salários, de forma geral,
podem ser obtidas por pesquisa de campo ou por meio de dados secundários. Como fonte de
dados, tem-se à Relação Anual de Informações Sociais – RAIS, as Estatísticas do Cadastro
Central de Empresas – CEMPRE, feitas pelo IBGE a partir da própria RAIS, e as pesquisas
setoriais, também elaboradas pelo IBGE (Pesquisa Anual do Comércio - PAC, Pesquisa
Anual de Serviços - PAS e Pesquisa Industrial Anual). O Cadastro de Empresas divulga
informações municipais, mas apenas de capitais, e as pesquisas setoriais mostram resultados
ao nível nacional, regional ou estadual. A RAIS possui informações sobre cada empresa.

Para esta pesquisa, o número de firmas e o pessoal ocupado foram obtidos essencialmente das
informações contidas no CEMPRE referentes à Belo Horizonte. Quando estas se mostravam
em nível mais agregado do que o necessário para o modelo, utilizava-se como proxy a
distribuição das atividades por classes apresentadas pela PAC e PAS para Minas Gerais ou
Brasil.

Para as unidades de ensino foi incorporada também a informação sobre o número de alunos
matriculados. Esta foi obtida na Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais
(SEE/SIE/COPED) e conta com a relação completa de estabelecimentos de ensino de todos os
municípios de Minas Gerais a partir de informação do Educacenso 2008, censo escolar
elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira –
INEP.

Além disso, foram obtidos mapas da Prefeitura de Belo Horizonte – PBH, nos quais foi
possível identificar o número e a localização de hospitais e escolas do município. Foram
também adquiridas no Centro de Desenvolvimento de Planejamento Regional - Cedeplar /
UFMG informações referentes ao número de postos de combustível e a sua localização em
Belo Horizonte. Adicionalmente, informação da Secretaria da Fazenda de Belo Horizonte
mostra a distribuição, por bairros, do total das atividades comerciais, de serviço e de indústria
em Belo Horizonte.

202
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8.2.3.2 Localização da firma
A localização das atividades econômicas é normalmente adquirida na prefeitura municipal ou
órgãos associados. Em Belo Horizonte, a Empresa de Informática e Informação do Município
(Prodabel) dispõe destas informações. Caso seja uma pequena região, as informações
locacionais podem ser inferidas por meio de pesquisa de campo. Na ausência destas duas
possibilidades, as características de ocupação e uso do solo da cidade, aliadas à escolha de
algum modelo teórico de localização, fornecem indícios da distribuição das atividades
econômicas no local.

Podem ser ainda utilizadas algumas unidades funcionais para inferir o padrão espacial e a
distribuição das unidades econômicas, culturais e políticas na cidade. Myint (2008) utiliza a
localização das lojas de fast-food, bancos, igrejas e escolas para deduzir a distribuição
espacial das unidades econômicas (comércio e serviços), políticas e culturais. Os resultados
mostraram-se satisfatórios, sobretudo em relação à utilização da localização das lojas de fast-
food e dos bancos como proxy da distribuição das atividades comerciais e de serviços na
cidade. As padarias são também usualmente utilizadas para determinar a localização do
comércio de bairro, que pode compreender farmácias, bancas de revistas, açougues, etc.

Nesta pesquisa, utilizaram-se como base para organizar as atividades econômicas no espaço
as informações disponibilizadas pela Secretaria da Fazenda de Belo Horizonte, nas quais é
mostrada a distribuição, por bairros, do total das atividades comerciais, de serviço e de
indústria em Belo Horizonte. Entretanto, como elas não se encontravam desagregadas
segundo grupos CNAE, o que era necessário ante os objetivos da pesquisa, tornou-se
necessária a definição de alguns critérios de distribuição dos tipos de atividades no espaço.

Com o uso de todas as informações disponíveis que oferecessem subsídios para se estabelecer
algum critério locacional, foram definidos doze critérios de dispersão espacial das firmas para
o modelo, os quais são mostrados na Tabela 8.13.

Como a cidade é dinâmica, normalmente, as informações sobre número e distribuição das


atividades deverão ser atualizadas periodicamente segundo algum critério escolhido como o
mais adequado.

203
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.13 – Critérios para distribuição espacial das firmas no protótipo
Código Critério Fonte de informação
1 Na área de estudo -
2 Segundo distribuição do comércio na cidade Secretaria da Fazenda Municipal
3 Segundo distribuição dos serviços na cidade Secretaria da Fazenda Municipal
4 Segundo distribuição das indústrias na cidade Secretaria da Fazenda Municipal
Segundo distribuição do somatório dos serviços e
5 Secretaria da Fazenda Municipal
comércio na cidade
6 Segundo distribuição dos hospitais na cidade Mapa da Prefeitura de Belo Horizonte
Segundo distribuição das instituições de ensino
7 Mapa da Prefeitura de Belo Horizonte
fundamental e médio na cidade
Segundo distribuição das instituições de ensino
8 Catálogo de endereços
superior na cidade
Segundo distribuição dos postos de combustível
9 Cedeplar /UFMG
na cidade
Segundo distribuição das principais entidades da
10 Catálogo de endereços
administração pública na cidade
Verificar zoneamento e observar a
11 Escolha segundo percepção da cidade
cidade.
Segundo distribuição dos principais museus e
12 Catálogo de endereços
bibliotecas da cidade

Portanto, definiu-se para cada uma das firmas um dos doze critérios locacionais mostrados na
Tabela 8.13. A escolha de qual critério baseou-se, por sua vez, na sua classificação
CAP/CNAE (Figura 8.2).

Matriz firma (banco de dados CAP da firma Escolha do critério


com informação sobre cada firma) (88 tipos) locacional (12 tipos)
Figura 8.2 – Etapas para definição da escolha locacional da firma

8.2.3.3 Oferta da firma


Para cada firma criou-se um vetor com 59 tipos de bens ofertados. Os tipos de oferta
correspondem aos tipos de gastos discutidos no item 8.2.1.3. Cada um destes tipos foi
representado pela variável dicotômica zero ou um, indicando, respectivamente, a ausência ou
presença da sua oferta. Portanto, um registro típico de oferta da firma mostra o número da
firma, sua localização em coordenadas geográficas, seu código CAP, o código CNAE e a
ausência ou não dos 59 tipos de bens ofertados.

8.2.4 Relacionamento entre as matrizes

As matrizes domicílio, residente e firma, por representam agentes e componentes da rede


intra-urbana, relacionam-se entre si. Estes relacionamentos podem ocorrer devido a relações
de parentesco ou relações econômicas e sociais. Sendo que aqui, discute-se as relações
econômicas.

204
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Nota-se que as matrizes residente e domicílio relacionam-se com a matriz firma, pois nelas se
encontram os locais onde os agentes ganham renda (demanda de trabalho), fazem compras
(oferta de bens e serviços) e estudam (Figura 8.3).

Domicílio Firma

Consumo

Trabalho 1

Trabalho 2
Domicílio

Estudo

etc

Figura 8.3 - As inter-relações entre os sistemas

Do domicílio saem agentes que trabalham e estudam. Além disso, os gastos do domicílio são
efetuados nas firmas. Observe que se considera um sistema fechado, onde a geração e o gasto
de renda estão inteiramente aí contidos. No caso de uma inundação em Belo Horizonte, por
exemplo, seria possivelmente mais adequado modelar toda a região metropolitana, pois nela
estão contidos os principais fluxos econômicos e de pessoas que ocorrem na região.
Entretanto, tal modelo apresenta consideráveis dificuldades no trato de informações, de tempo
e de recursos computacionais.

8.2.4.1 Matriz domicílio x matriz residente


O relacionamento entre estas duas matrizes é evidente. Cada registro da matriz residente
corresponde a uma pessoa e esta está associada a um domicílio da matriz domicílio.

8.2.4.2 Matriz domicílio x matriz residente x matriz firma


Estas três matrizes se relacionam pelas interdependências que se estabelecem na rede urbana.
O domicílio não garante a sobrevivência e a reprodução de seus membros sem que interaja
com outros componentes do sistema urbano. As interdependências ocorrem em decorrência de
três funções básicas: aquisição de renda (trabalho), gasto da renda (despesa) e aquisição da
educação (investimento em capital humano).

205
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8.2.4.3 Alocação dos trabalhadores, localização dos pontos de consumo e do local de estudo
O tipo de atividade econômica de cada trabalhador do modelo é identificado segundo a
CNAE-Domiciliar (matriz residente). Esta informação é censitária. Cada atividade econômica
do modelo é também identificada segundo a CNAE-Domiciliar (matriz firma) (ver sessão
8.2.3).

Baseada nestas informações, a escolha do local de emprego dos trabalhadores foi definida
segundo dois critérios:

1. Escolha aleatória entre as firmas que possuem o mesmo CNAE do trabalhador.


Exceção: se o código CNAE do trabalhador é 95 (trabalho doméstico), a escolha é
aleatória entre os domicílios com renda mensal superior a 2.236,31 reais.

2. A capacidade da firma em receber trabalhadores é definida pela variável pessoal


ocupado.

Obviamente, a escolha do local de trabalho pode ser mais bem calibrada segundo os dados
locais disponíveis.

Para a escolha do local de estudo, utilizaram-se também dois critérios:

1. Escolha aleatória entre as firmas que possuem o mesmo CAP do estudante (80999 ou
80011).
2. A capacidade da firma em receber estudantes é definida pela variável total de alunos.

A escolha da unidade de consumo adequada para o agente efetuar suas compras (de serviços
ou bens) é definida segundo dois critérios:

1. Escolha, entre as firma, daquelas que possuem oferta do bem tipo x, sendo que x varia
a 1 a 59 (para explicação do tipo de gasto, ver o item 8.2.1.3).
2. Distância que o agente está disposto a se deslocar para sua aquisição (raio de escolha).
A definição do raio de escolha do agente para aquisição do bem é feita em três níveis,
segundo as características do gasto. Considera-se que quanto mais rara a aquisição e menor o
grau de substitutabilidade, mais o agente estará disposto a se deslocar:

• 1 (vizinhança do domicílio ou local de trabalho);


• 2 (região na cidade) e
• 3 (cidade).

206
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Se não existe oferta do bem no nível de deslocamento definido, avança-se para o nível
seguinte. As distâncias representadas pelos raios obviamente dependem da área de estudo.
Considerando o município de Belo Horizonte, por exemplo, o raio 1 englobaria o bairro onde
o domicílio se encontra e os bairros vizinhos. O raio 2, a regional e o 3, a cidade.

Para citar alguns exemplos: os gastos com alimentação encontram-se no raio de escolha 1; os
serviços bancários, gastos com vestuário e eletrodomésticos, no 2; e a escolha de hospitais ou
instituições de ensino superior, no nível 3.

Obviamente, cada uma destas informações pode ser mais bem calibrada segundo os dados
locais disponíveis.

A alocação dos trabalhadores nas firmas e dos estudantes nas instituições de ensino, bem
como a definição das unidades de consumo escolhidas pelos agentes, são feitas com o uso de
linguagem computacional. Como será mostrado no item 8.7, o software utilizado para as
simulações nesta pesquisa possui capacidade computacional limitada em face dos requisitos
computacionais necessários, o que levou à necessidade de uma simplificação das rotinas.
Entretanto sua escolha justifica-se pela familiaridade com o programa e suas características de
facilidade de manuseio. Neste sentido, buscou-se um compromisso entre as características
computacionais do programa, a disponibilidade de tempo para a pesquisa e a precisão dos
resultados.

8.3 Base espacial de análise: construção de um protótipo

Para simular o impacto da inundação em uma área urbana optou-se pela criação de um
protótipo. Este procura representar de forma simplificada os principais elementos do espaço
urbano, os quais interferem na magnitude do impacto da cheia. Trabalhou-se com três níveis
geográficos que se inter-relacionam (Figura 8.4):

 Área de diretamente atingida – ADA: corresponde à área hipoteticamente atingida por


uma inundação de 100 anos de tempo de retorno. Esta sofrerá tanto impactos diretos,
em decorrência do contato de bens e pessoas com a inundação, quanto impactos
indiretos. Como estão associados aos danos diretos, os danos indiretos nesta área
tendem a ser mais intensos do que no restante do município, pois há uma possível
diluição dos danos totais à medida que a rede urbana se distancia da área atingida.

207
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
 Área de entorno – AE: representa a área que circunda a ADA. Embora ela não tenha
sido diretamente atingida pelo evento, pela maior proximidade com a ADA, tenderá a
sofrer maiores impactos indiretos do que o restante da região urbana.

 Restante da rede urbana: é composta por 74 regiões, cada uma delas representada
como um nó da rede urbano-econômica, o qual agrega o conjunto de domicílios,
moradores e atividades econômicas que ali se localizam.62 Como a cidade é uma rede
de interconexões, ela é incorporada à análise por sofrer, indiretamente, o impacto na
ADA.

Na ADA e na AE cada domicílio e cada firma são mostrados de forma individualizada. Já nos
nós, os agentes são representados de forma agregada. A área da AE foi criada através da
aplicação de um raio de cobertura (do inglês, buffer) de 0,7 km sobre a ADA. A definição
deste raio teve como referência a área dos bairros em Belo Horizonte que serviram de
referência para criação da ADA e AE no protótipo.

Utilizou-se como apoio para criação do protótipo a organização espacial e os dados


socioeconômicos do município de Belo Horizonte. Desta forma, as setenta e quatro regiões do
protótipo possuem similaridades com as unidades de planejamento de capital mineira.

Restante
(dividido
em 74
regiões)
Entorno
Área de
impacto

Figura 8.4 – Regiões do protótipo


8.3.1 Criação da rede viária

Para fazer as interconexões dos agentes em uma base física foi definida uma rede viária para o
protótipo. A rede é definida em duas escalas de detalhamento. Na região diretamente
impactada e de entorno é feito um maior detalhamento do sistema, com a definição dos
trechos viários principais, os links atingidos e aqueles preferencialmente utilizados como rotas

62
Ressalta-se que o sentido de nó varia segundo o tipo de rede estudada. Na rede viária, por exemplo, os nós
representam os cruzamentos e as entradas e saídas. No contexto aqui utilizado, de uma rede econômico-urbana,
ele representa uma região econômica específica.
208
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
alternativas. Em uma segunda escala de detalhamento são mostradas apenas as principais vias
da cidade que atravessam a região impactada e de entorno, levando em conta sua função
arterial na cidade. Considera-se que os impactos tendem a se diluírem no espaço, logo, apenas
o detalhamento viário da região atingida por uma inundação de tempo de retorno de 100 anos
já é suficiente para captar o impacto da inundação.

A configuração da rede utilizada neste modelo foi construída tendo como referência as
principais vias de Belo Horizonte. Trabalha-se principalmente com as vias arteriais e as
principais vias coletoras. Na região atingida pela inundação e próxima a ela, incorporou-se as
vias julgadas essenciais para a análise, inclusive vias locais. Uma parametrização mais fina da
rede viária pode ser feita em trabalho posterior. Além disso, limitações computacionais e de
tempo impediram um detalhamento maior das informações.

Neste estudo trabalhou-se com uma rede viária simplificada, formada por 158 nós viários (o
nó viário não possui o mesmo sentido do nó da rede econômica, mostrada no início desta
seção). Cada um destes nós pode ter grau variando de um a cinco. A rede estudada na ADA e
AE tem extensão de 49,61 km.

A Figura 8.5 apresenta a configuração espacial do protótipo. Os nós de atividade econômica


são mostrados em amarelo, a rede viária é apresentada como o eixo estruturante. A nuvem
cinza no centro refere-se à aglomeração de firmas e domicílios da ADA e AE.

Figura 8.5 – Organização espacial do protótipo – Área diretamente atingida, área de entorno
e rede viária
209
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8.3.2 Zoneamento, parcelamento e adensamento na ADA e AE

Na ADA e na AE cada morador, domicílio e firma são representados individualmente, foi,


portanto, necessário introduzir um maior nível de detalhamento na organização do espaço.

A fim de captar os vários possíveis efeitos da inundação, procurou-se representar a ADA e a


AE como uma região densa, formada por um grande número de domicílios e firmas.
Definiram-se seis sub-tipos de zoneamento na região, os quais representam algumas
particularidades nos padrões de adensamento e uso do solo (Figura 8.6):

 Zona 1: é quase uma continuação do centro econômico da região. Ela é bastante


adensada e tem número significativo de firmas. Configura-se como um centro
comercial.
 Zona 2: é o centro econômico da região. A densidade de firmas é bem superior ao das
outras zonas e do que a média do protótipo como um todo (2.534/km2 enquanto a
média é de 284/km2). Há muito domicílios também. Cerca de 3.000 domicílios/km2,
enquanto a média de toda a cidade é de 2.000/km2. Mas ela não possui casas, apenas
apartamentos. Entre as zonas da ADA e da AE, é aquela com menor proporção de
domicílios em relação às firmas.
 Zona 3: assim como a zona 1 ela recebe influência da zona 2, entretanto há maior
número de residências em relação ao de firmas.
 Zona 4: é uma zona mista, mas possui grande número de casas (cerca de 60% dos
domicílios são casas). Há atividade comercial e industrial significativa.
 Zona 5 e Zona 6: são semelhantes. Possuem um percentual de cerca de 60% de casas
em relação ao total de domicílios, mas menor nível de atividade econômica do que a
zona 4, o qual tem um caráter sobretudo de provisão para a vizinhança.

Em suma, a zona 2 é o centro econômico da região. A zona 1 funciona quase como uma
periferia deste centro e recebe grande influência dele, possuindo muitos estabelecimentos
comerciais e de serviços. As outras regiões são mistas, residenciais, mas com volume
significativo de atividades econômicas. A região é importante também como área de
passagem, pois conecta importantes nós da cidade como um todo.

210
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Figura 8.6 – Zonas, rede viária modelada e o rio na ADA e na AE.

Para a criação dos padrões de adensamento verificou-se o existente em região similar na


capital mineira (centro-sul). A verticalização foi definida a partir de uma estimativa do
número de lotes na região:

1. Definiu-se a área da região sem as vias (que corresponde a cerca de 73% da área total);
2. Encontrou-se o número de quarteirões, considerando que este possuía uma área padrão
de 10.000m2;
3. Definiu-se o número total de lotes, tendo como parâmetro o número de 21 lotes por
quarteirão.

A estimativa do número de residências unifamiliares em relação ao número total de


domicílios foi obtida a partir da análise da região de Belo Horizonte que corresponderia à
ADA e à AE (informações dos dados cadastrais do IPTU de Belo Horizonte). Entretanto, não
foram encontradas informações sobre o padrão de verticalização existente na região e qual
seria o número médio de apartamentos por andar, informação relevante para a discussão dos
danos diretos.

Adotou-se, portanto, o seguinte procedimento: nos lotes que não eram ocupados por casas,
definiu-se o número de domicílios no primeiro pavimento por meio de uma função obtida a
partir das informações sobre as edificações residenciais mais verticalizadas existentes nos
municípios de Itajubá e Santa Rita do Sapucaí, presentes em Machado (2005). Embora se
saiba que o padrão de verticalização nestas cidades difira do de um grande centro urbano,
como se trata de um protótipo, considerou-se possível este tipo de extrapolação. A partir daí,
211
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
foi facilmente inferido o número de pavimentos do edifício residencial. As principais
informações em relação às edificações residenciais da ADA e da AE são apresentadas na
Tabela 8.14

Tabela 8.14 – Edificações residenciais da ADA e da AE - Protótipo


Edificações
2 Domicílios
Zona Área (km ) Domicílios Casas Apartamentos (casas +
/ andar
prédios)
1 0.60 1.324 1.00 1.224 247 2
2 0.99 3.104 0 3.103 247 3
3 0.06 1.85 89 96 97 3
4 1.11 2.208 1.356 851 1.407 4
5 1.04 2.569 1.541 1.027 1.603 4
6 2.11 4.924 2.768 2.156 2.897 4
Total 5,92 14.314 5.854 8.457 6.498 -

Em relação ao número de firmas na região, foram utilizadas as informações disponibilizadas


pela Secretaria da Fazenda de Belo Horizonte, que mostram o número de firmas, por bairros,
em Belo Horizonte no ano 2000. O padrão de verticalização foi obtido a partir de ajustes
feitos considerando o número de lotes que não eram ocupados por edificações residenciais,
resultando em um total de 468 prédios comerciais para toda a região. Na Tabela 8.15 são
apresentadas algumas informações sobre o adensamento da região, considerando a
incorporação das firmas.

Tabela 8.15 – Edificações comerciais e total de edificações ADA e da AE - Protótipo


Total de Total de Edificações
Firmas /
Zona Firmas edificações firmas + (comerciais +
andar
comerciais domicílios residenciais)
1 775 4 72 1.450 319
2 2.489 4 231 3.542 478
3 81 4 8 192 105
4 630 4 58 2.305 1.465
5 287 8 27 2.645 1.630
6 783 6 73 5.102 2.970
Total 5.045 - 468 15.235 6.966

8.3.3 Definição das características das firmas na ADA, AE e nos nós

Em relação às firmas, já foi assinalado, que elas são caracterizadas segundo as variáveis
pessoal ocupado, massa salarial e emprego. Entretanto a organização das firmas no protótipo
segue padrões diferentes.

Na ADA e na AE cada firma foi identificada pelo código CAP, o que permite saber de forma
relativamente precisa qual o tipo de bem ofertado no estabelecimento (e.g.: padaria,
supermercado, vestuário, etc.). Abaixo são listadas as varáveis presentes na matriz de
informação sobre as firmas da ADA e AE:
212
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
 Código da firma (1 a 5.045)
 Localização: coordenadas x e y
 Zona (1 a 6)
 Edifício: cada firma está vinculada a uma edificação (varia de 1 a 468)
 Se está ou não no primeiro pavimento
 Classificação CAP
 Classificação CNAE
 Pessoal ocupado
 Oferta (existência ou não de 59 tipos de oferta de bens)
Já nos nós de atividade econômica as informações sobre as firmas são mostradas de forma
agregada para cada classe CNAE. Portanto, para cada nó, haverá o número de firmas, pessoal
ocupado e a oferta (existência ou não dos 59 tipos de oferta) de cada classe CNAE.
Considerando que são utilizadas 56 classes CNAE e que existem 74 nós de atividades, tem-se,
portanto, uma matriz de informação formada por 4.144 linhas. Abaixo são mostradas as
variáveis existentes na matriz de informação das atividades produtivas dos nós.

 Identificação do nó
 Localização: coordenadas x e y
 Código CNAE
 Número de firmas
 Pessoal ocupado
 Oferta (existência ou não de 59 tipos de bens)

Observe que entre as variáveis das firmas não está o montante de salários pago. Estes são
incorporados à unidade após a alocação dos trabalhadores nos locais de emprego (item
8.2.4.3).

O número de empresas para cada nó foi definido utilizando-se a estrutura de distribuição das
atividades entre os bairros de Belo Horizonte disponibilizada pela Secretaria da Fazenda de
Belo Horizonte, mas considerando o total de atividades mostrado no CEMPRE (IBGE, 2000).
Obteve-se a distribuição do total de firmas entre as classes CNAE por meio do procedimento
descrito no item 8.2.3.2.

213
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8.3.4 Definição das características dos domicílios na ADA, AE e nos nós

Em relação aos domicílios da ADA e da AE optou-se que eles representassem


aproximadamente a estrutura dos domicílios existentes em Belo Horizonte como um todo,
considerando diferentes faixas de renda e diferentes tipologias de família. Desta forma seria
possível aproveitar as potencialidades de se utilizar um protótipo para verificar os impactos de
uma enchente em domicílios com características distintas. Posteriormente, o protótipo pode
ser parametrizado de forma a serem feitos estudos de caso com a introdução das
características socioeconômicas reais existentes na região que se deseja analisar.

Portanto, retirou-se uma amostra de 14.314 domicílios dos microdados censitários (IBGE,
2000) que representasse a estrutura de rendimento e de tipologias de família existentes em
Belo Horizonte. Para cada classe de rendimento e tipo de família, os domicílios foram
escolhidos aleatoriamente. As Tabelas 8.16 e 8.17 mostram, respectivamente, a estrutura das
tipologias de família e das classes socioeconômicas existentes na ADA e na AE.

Tabela 8.16 – Distribuição dos domicílios da ADA e AE segundo as tipologias de família


Tipolo- % de
Característica
gia domicílios
1 Casal sem filhos com responsável até 64 anos 8
2 Casal sem filhos com responsável com 65 anos ou mais 2
3 Casal com filhos menores de 13 anos 34
4 Casal com responsável até 64 anos e com todos os filhos maiores 15
5 Casal com responsável com 65 anos ou mais com todos os filhos maiores 4
6 Mulher até 64 anos só 4
7 Mulher com filhos 18
8 Mulher e outros 4
9 Homem até 64 anos só 4
10 Homem e outros 2
11 Idoso/idosa só 2
12 Homem com filhos 2
Total 100

Tabela 8.17 – Distribuição dos domicílios da ADA e na AE segundo classes


socioeconômicas
Classe socioeconômica % de domicílios
A1 6
A2 8
B1 11
B2 15
C 22
D 21
E 17
Total 100

Cada domicílio da ADA e da AE apresenta um vetor de informação, cujas variáveis são


mostradas abaixo:

214
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 Identificação do domicílio
 Localização (coordenadas x e y)
 Edifício: cada domicílio está vinculado a uma edificação (varia de 1 a 6.499)
 Se está ou não no primeiro pavimento
 Tipologia de família
 Número de moradores
 Área do imóvel
 Padrão de acabamento do imóvel
 Número de ativos presente no domicílio (33 tipos de bem)
 Rendimento domiciliar
 Distribuição do valor dos gastos médios mensais em 59 classes

Nos nós do protótipo foram utilizados os parâmetros existentes para os domicílios nas regiões
similares de Belo Horizonte (Unidades de Planejamento). Definiu-se, para cada nó, o número
total de domicílios, o rendimento médio e a estrutura de gasto associada a este rendimento. As
variáveis presentes na matriz são listadas abaixo:

 Identificação do nó
 Localização (coordenadas x e y)
 Número de domicílios
 Número de moradores
 Rendimento total
 Rendimento médio domiciliar
 Distribuição do valor médio dos gastos mensais em 59 classes

8.3.5 Definição das características dos moradores

A menor unidade de análise do modelo são as pessoas. Elas são agentes que se deslocam para
cumprirem as funções do domicílio de aquisição de renda, consumo e lazer. Ante uma
inundação, esses fluxos são interrompidos ou perturbados, gerando possíveis custos adicionais
de tempo e modificações de rotinas para um nível subótimo.

Na ADA e na AE todos os residentes são caracterizados. Características como idade e


existência de deficiência física ou mental, componentes importantes de vulnerabilidade às
inundações, são apresentadas. Além disso, têm-se os trabalhadores e estudantes que
desempenham funções específicas no domicílio. O vetor de informações associado a cada

215
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
indivíduo é extenso, sendo que especificamente para a pesquisa as seguintes informações
foram utilizadas:

 Identificação do morador
 Identificação do domicílio
 Localização (coordenadas x e y)
 Idade
 Capacidade física e mental (capacidade de escutar, ouvir, ver e andar e deficiência
mental)
 Idade
 Se é trabalhador (se sim, código da atividade e remuneração recebida)
 Se estuda (se sim, definição do nível de estudos)

Entre os moradores dos nós, foram destacados somente os trabalhadores, pois são os agentes
responsáveis pela função de adquirir renda no domicílio. Eles são relevantes na análise
econômica feita nesta pesquisa, que é, fundamentalmente, de alocação dos fluxos de renda e
gastos. Entretanto, como os nós não são atingidos diretamente pela inundação, não é discutida
a vulnerabilidade e risco dos domicílios aí localizados, logo, a incorporação dos outros
agentes do domicílio não é essencial. Portanto, na matriz de demanda de trabalho nos nós,
tem-se o número de trabalhadores por classificação CNAE em cada nó:

 Identificação do nó
 Localização (coordenadas x e y)
 Código CNAE
 Número de trabalhadores
 Salário total recebido

8.3.6 Síntese das informações do protótipo

A Tabela 8.18 apresenta uma síntese das informações contidas no protótipo:

216
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.18 – Síntese das informações do protótipo
Indicadores ADA e AE Nós Protótipo
2
Área (km ) 5,9 326,5 332,4
2
Planície de inundação de 100 anos (ADA) (km ) 1,3 0,0 1,3
Número de domicílios 14.314 164.379 178.693
Número de moradores 51.116 588.220 639.336
Renda total (R$) 27.605.806 316.565.858 344.171.664
Renda média domiciliar (R$) 1.929 1.926 1.926
Número de firmas 5.045 19.084 24.129
Salários totais recebidos (R$) 63.951.389 316.565.858 338.561.291
Pessoal Ocupado 37.474 166.113 203.587
Salário médio por trabalhador (R$) 1.707 1.906 1.663
Média de trabalhadores / firma 7 9 8

8.4 Utilização do SIG


A definição das manchas de inundação para os diferentes tempos de recorrência foi feita
baseada nas informações geradas no modelo hidráulico HEC-RAS (HEC-RAS, 2003) e nos
dados topográficos com precisão métrica do vale onde se encontra inserido o rio Betim. O
partir do cruzamento dessas informações foram criados mapas de inundação para os eventos
com tempos de recorrência de 5, 25 e 100 anos.

As seções do rio utilizadas no modelo foram espacializadas por meio do software ArcGis 9.2
e, com as informações sobre o nível d`água alcançado durante as inundações, foi criado um
TIN, ou seja, uma malha triangular (Triangular Irregular Network). Ela constitui-se em uma
estrutura vetorial com topologia do tipo nó conforme pode ser verificado na Figura 8.7.

Figura 8.7 – Exemplo de um TIN


Fonte: Felgueiras & Câmara (2001)

217
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Esse tipo de interpolação também foi utilizado na criação de um Modelo Digital de Terreno
(MDT) que foi cruzado com a representação espacial das manchas de inundação.

As manchas de inundação foram obtidas através da transformação dos TIN‟s dos diferentes
tempos de recorrência em imagem raster, operação que permitiu o cálculo da diferença entre
o nível da água e o relevo da área.

Através do mesmo software foram criados, segundo os critérios de zoneamento e


adensamento apresentados na seção 8.3.2, pontos que representassem as edificações presentes
na área de estudo, com a restrição da existência de um sistema viário e de um curso d‟água
que não poderiam ser ocupados. Na criação destes pontos, posicionou-se os domicílios com
menor renda próximos ao rio, por ser uma tendência que normalmente se verifica
empiricamente. Essas informações foram contrapostas com os dados relativos à inundação, o
que possibilitou obter os níveis d`água que atingiriam as edificações e infra-estrutura viária
nos diferentes tempos de retorno do evento.

Em relação à distribuição das velocidades na área inundável, ela foi estimada por meio da
interpolação triangular da informação sobre o valor da velocidade nas margens de cada seção
do rio na área de estudo, a qual é obtida como resultado da simulação hidráulica em HEC-
RAS (HEC-RAS, 2003).

8.5 Simulação do comportamento do rio e incorporação no protótipo


A introdução da inundação no protótipo foi feita a partir da simulação hidrológico-hidráulica
feita para o rio Betim. Observe-se que embora se trate de um protótipo, com a criação de um
espaço virtual, optou-se por utilizar um modelo “real” de simulação do comportamento do rio,
a fim de possibilitar uma coerência entre as informações hidráulicas de profundidade,
velocidade e extensão da inundação para os diferentes tempos de retorno. Realizou-se a
simulação da propagação da onda de cheia na área de estudo em escoamento não permanente,
unidimensional.

Para a modelagem hidrológica foi utilizado o modelo HEC-HMS, versão 2.2.2 (HEC-HMS,
2002), desenvolvido pelo Hydrologic Engineering Centre, do Corpo de Engenheiros do
Exército dos EUA (US Army Corps of Engineers). A modelagem hidráulica do sistema de
macrodrenagem é realizada utilizando-se o modelo de cálculo de linha d‟água HEC-RAS,
versão 4.0 (2003), do US Army Corps of Engineers.

218
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Os principais parâmetros utilizados no estudo hidrológico são mostrados sinteticamente, a
seguir (Nascimento, 2004 e 2008):

 Chuvas de projeto calculadas pela equação regionalizada proposta por Pinheiro e


Naghettini (1998) para a Região Metropolita de Belo Horizonte;

 Chuvas históricas provenientes da estação pluviométrica Usina de Gás para a calibração


do modelo e simulação das contribuições ao reservatório de Vargem das Flores;

 Modelo chuva-vazão do tipo semi-distribuído, o modelo HEC-HMS, do US Army Corps


of Engineers, com as seguintes definições de sub-modelos:

- chuva efetiva: método SCS, com parâmetro CN estimado segundo o tipo e o uso do
solo e condições de umidade antecedente;

- função de transferência para a sub-bacia de contribuição ao reservatório de Vargem


das Flores: hidrograma unitário de Clark;

- função de transferência para as sub-bacias localizadas a jusante da barragem de


Vargem das Flores: hidrograma unitário triangular sintético proposto pelo SCS;

- cálculo do tempo de concentração combinado o método cinemático com equações


empíricas de Kirpich e GB Williams;

- propagação de cheias em canais pelo método Muskingum-Cunge;

- propagação de cheias em reservatório pelo método de Puls Modificado.

Em relação às definições para análise hidráulica tem-se (Nascimento, 2004 e 2008):

 escoamento não permanente: solução númérica das equações completas de Saint Venant,
segundo formulação do modelo HEC-RAS (2003);

 escoamento bruscamente variado (degraus, ressaltos, etc.): princípios de conservação de


massa e quantidade de movimento;

 escoamento em confluências: princípio de conservação de massa e de quantidade de


movimento;

 escoamento em pontes e bueiros: princípios de conservação de massa e energia para a


condição de águas baixas, sem afogamento ou extravasamento desses tipos de estruturas;

219
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
 escoamento em pontes e bueiros: hipótese de funcionamento como orifício e vertedor de
parede espessa em condições de águas altas (estrutura submersa pelo escoamento);

 caso, em águas altas, o escoamento como vertedor sobre aterros e pontes deixe de ocorrer
por afogamento imposto por um controle de jusante, o modelo emprega os princípios de
conservação de massa e energia em todo o trecho sob ação desses controles.

Os parâmetros geométricos da canalização e da planície de inundação foram obtidos a partir


de mapas topográficos fornecidos pela Prefeitura Municipal de Betim, gerados por restituição
de fotografias aéreas oriundas de levantamento aerofotogramétrico datado de 1990, em escala
1:2000, com intervalo de 1,0 m entre curvas de nível. Obteve-se também os mapas em
formato digital (formato .dwg) georeferenciados em UTM (Figura 8.8).

Figura 8.8 – Mapa digital da área de estudo, em formado .dwg.

A Figura 8.9 mostra a interface gráfica do modelo em HEC-RAS, com a ilustração do perfil
longitudinal da linha de água para todo o curso do rio Betim em dois momentos.

Betim-Montante-NP-2008 Plan: Plan 25 5/21/2009


Geom: Betim-Mont-Atual--NP
Betim Betim Montante
825 Legend

WS 01JAN2008 0200
Crit 01JAN2008 0200
Ground

820 LOB
ROB
Right Levee

815

Elevation (m)

810

805

800

-12.5
-27-24 -23 -18 -16 -14 -12 -1.5
-9 -5 -4 17 1819 20 21 23 24 25 26 35 36 37 38 39 40 41 4246 47 48 49 50 51 52
795
0 2000 4000 6000 8000 10000
Main Channel Distance (m)

220
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Betim-Montante-NP-2008 Plan: Plan 25 5/21/2009
Geom: Betim-Mont-Atual--NP
Betim Betim Montante
825 Legend

WS 01JAN2008 0300
Crit 01JAN2008 0300
Ground

820 LOB
ROB
Right Levee

815

Elevation (m)

810

805

800

-12.5
-27-24 -23 -18 -16 -14 -12 -1.5
-9 -5 -4 17 18 19 20 21 23 24 25 26 35 36 37 38 39 40 41 4246 47 48 49 50 51 52
795
0 2000 4000 6000 8000 10000
Main Channel Distance (m)

Figura 8.9 – Perfil longitudinal da linha d`água do rio Betim, Minas Gerais, em dois
momentos da cheia

Foram desenvolvidos estudos para cheias com tempos de retorno de 5, 10, 25, 50, 100 e 1000
anos. No presente estudo, consideraram-se eventos com tempos de retorno de 05, 25 e 100
anos.

Após ter sido feita a simulação hidrológico-hidráulica, foram criados os mapas de inundação.
Para este procedimento é necessária a combinação de duas informações: o nível d‟água
associado às seções do rio e o mapa topográfico da região (modelo digital de terreno). Para
associações destes layers de informação, foi utilizado o programa ArcGis 9.2.

Definida a mancha de inundação para o três tempos de retorno, optou-se por incorporar ao
protótipo a parte do rio onde se observou o maior impacto do evento. Ela corresponde a uma
área que passa pela confluência entre o rio Betim e o córrego Cordeline. A Figura 8.10 mostra
a região incorporada no protótipo, considerando a ocorrência da inundação segundo os três
tempos de retorno.

Tr = 05 anos Tr = 25 anos Tr =100 anos

Figura 8.10 – Área de inundação do rio Betim, no município de Betim, para chuva
com duração de 2 h.

221
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O trecho escolhido possui uma área inundada total de 0,825 km2, quando o Tr = 100. A fim de
mensurar de forma mais ampla o impacto da inundação, multiplicou-se cada lado do pixel por
uma constante, totalizando uma área de inundação de 1,315 km2.

Com a criação do mapa de inundação detalhado, obtiveram-se, para cada firma e domicílio
existentes na ADA, a profundidade e velocidade da inundação no ponto em que ela se localiza
na planície.

8.6 Simulação de Tráfego


A fim de se analisar o impacto da inundação no sistema de transporte, foi modelado o tráfego
da rede viária que integra a região ADA e AE.

Embora tenham sido georeferenciados os nós e links viários não apenas da ADA e da AE, mas
também dos principais eixos que cortam o espaço de análise (Figura 8.5), a incorporação de
toda a rede na simulação do tráfego envolveria um elevado custo computacional, não
disponível nas ferramentas utilizadas atualmente na pesquisa. Ressalta-se ainda que a
modelagem do tráfego de uma rede viária da dimensão utilizada nesta pesquisa, pelo elevado
volume de informações necessárias, raramente é feita, mesmo em centros especializados em
engenharia de transportes.

Adota-se, portanto, a hipótese de que o impacto no sistema de transportes ocorrido em


decorrência de uma inundação na ADA é absorvido dentro da própria ADA e na AE. Fora
desta área, o fluxo permanece inalterado. Esta hipótese é factível se há vias alternativas na
região com capacidade para suportar o fluxo desviado e evitar uma grande propagação da
perturbação na rede, pressuposto que é considerado no modelo proposto. Em um estudo de
caso, deve ser feito o estudo dos trechos viários atingidos a fim de se verificar sua relevância
como ligação entre os fluxos da região e das vias alternativas, identificando-se assim qual a
extensão da rede que possivelmente sofreria uma perturbação relevante e deveria ser
modelada (observe os itens 3.3.1 e 4.4.1 para uma análise dos danos e da vulnerabilidade em
uma rede de transportes).

A Figura 8.11 mostra a rede viária do protótipo e indica a área modelada. A Figura 8.12
apresenta detalhes do sistema viário na área modelada.

222
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Figura 8.11 – Rede viária do protótipo e identificação da região modelada

Figura 8.12 – Rede viária na ADA e na AE

Em consonância com os objetivos desta pesquisa, que procura utilizar uma abordagem em
agentes, utilizou-se como ferramenta de análise um modelo de microsimulação de tráfego. A

223
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utilização da simulação do tráfego para analisar o impacto da inundação no sistema de
transportes ainda é incipiente e não foram encontrados trabalhos relevantes que a utilizam.

A modelagem foi feita por meio do software Integration 5.1(INTEGRATION..., 2005), um


modelo de simulação, otimização e atribuição de tráfego capaz de modelar redes até 10.000
ligações e 500.000 partidas de veículo. Desenvolvido na Universidade de Waterloo, no
Canadá, ele é projetado para localizar movimentos de veículo individuais da origem para seu
destino final a um nível de resolução de um deci-segundo. Foi utilizada uma versão
acadêmica, que possui limitações no volume de veículos, nós e incidentes. Mas, considerando
a hipótese de que, independentemente do número de veículos, a relação entre fluxo e
capacidade da rede é que será determinante na velocidade e, conseqüentemente, nos tempos
de viagem, a utilização desse modelo com capacidade reduzida é justificável.

O modelo estima várias medidas de desempenho, inclusive atrasos dos veículos, paradas,
consumo de combustível, emissões de hidrocarbonetos, monóxido de carbono, gás carbônico
e de óxidos nitrosas.

O Integration funciona a partir da alimentação de quatro tipos de arquivos, principalmente: o


arquivo mestre, que controla os parâmetros globais da simulação; o arquivo de características
e coordenadas dos nós; o arquivo de características dos links e semáforos associados; o
arquivo de demanda e o arquivo de descrição de incidentes.

A rede viária modelada possui extensão de 49,71 km. Considerou-se na modelagem os


principais nós (pontos de cruzamento, ou entradas e saídas na rede) e links (trechos viários
entre os nós) totalizando informações sobre 42 nós e 55 links. Os pontos de contato entre o
restante da rede viária e a rede localizada dentro da ADA e da AE são materializados por
meio de onze nós.

Para a modelagem, foram consideradas as principais vias da região em termos de fluxo de


veículos e alternativas de desvio de tráfego ante a ocorrência da inundação. No modelo, as
vias são normalmente coletoras; apenas algumas são locais. Elas possuem de uma a três faixas
de circulação, sendo que as vias de três faixas são as que margeiam o rio. Estas são as únicas,
no modelo, que apresentam sentido único de direção dos veículos: para montante, na margem
esquerda, para jusante, na margem direita.

Como não havia informação sobre a origem e destino de cada agente do modelo, simulou-se o
fluxo de veículos (ou a “demanda”, termo usualmente utilizado na simulação de tráfego)
224
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segundo as características da região (número de domicílios, firmas, pessoal ocupado, número
de estudantes que chega à área, número estimado de consumidores, posse de veículos pelos
domicílios, etc.). Foram também utilizadas na parametrização, as informações sobre os fluxos
das vias que passam por regiões com características similares em Belo Horizonte.

Para determinar o número de veículos que trafegam na região, uma questão central é definir
se o agente utiliza transporte coletivo (não foi considerado metrô, apenas ônibus) ou privado.
Para esta estimativa verificou-se, na amostra dos microdados censitários (IBGE, 2000), o
percentual da população acima de 18 anos que possui automóvel no domicílio. Multiplicou-se
o valor encontrado pelo fator 1,4, que representa a média de passageiros por automóvel em
Belo Horizonte, segundo informação oral obtida no Departamento de Engenharia de
Transportes e Geotecnia da UFMG. Este percentual foi então aplicado ao valor estimado de
pessoas que circulam na ADA e AE, obtendo-se uma estimativa do número de veículos de
passeio. O restante das pessoas são usuárias de ônibus, o qual circula, em média, com a
capacidade máxima de passageiros sentados (50 assentos, segundo Rodrigues et al., 2008).

Para se ter uma estimativa do fluxo total de veículos, adota-se ainda a hipótese de que os
veículos estimados circulam duas vezes na região (ida e volta).

Considera-se, portanto, que sempre que há carro no domicílio, o agente optará por utilizá-lo
na execução de suas tarefas. E, entre os membros do domicílio, os trabalhadores terão
prioridade no acesso ao veículo.

O mix de veículos que compõe o fluxo da região é padronizado em unidades de veículos


equivalentes ligeiros (UVE), o que torna a simulação mais rápida. Desta forma, um ônibus,
corresponde 1,5 veículos no fluxo (Vasconcelos, 2004)

Considerando os seis tipos de zonas existentes na ADA e AE, com seus padrões de uso do
solo e adensamento (item 8.3.2), o próprio software distribui o fluxo de veículos entre os
diversos trechos viários. A Figura 8.13 mostra a distribuição temporal do fluxo de veículos na
região como um todo. Observa-se o pico da manhã, o pico bancário e o pico mais elevado de
fim de expediente de trabalho e retorno à residência.

225
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8%
7%
6%

% de veículos
5%
4%
3%
2%
1%
0%
0:00 2:24 4:48 7:12 9:36 12:00 14:24 16:48 19:12 21:36 0:00

Hora do dia

Figura 8.13 - Distribuição do fluxo de veículos ao longo do dia

Os parâmetros de capacidade e velocidade do modelo basearam-se em recomendação do


Highway Capacity Manual – HCM (TRB, 2000), uma fonte mundialmente utilizada em
estudos de engenharia de tráfego. Para a capacidade da via, definiu-se o fluxo de 700
veículos/hora para cada faixa. Embora o HCM recomende a capacidade de 2.100
veículos/hora, o atrito entre os agentes (e.g.: entre carros, entre carros e pedestres, etc.)
provoca uma redução na capacidade. É o fenômeno da impedância do fluxo, ou seja, atuação
de forças que atuam em sentido diferente ao dele. A velocidade utilizada é de 60km/h para a
via coletora e de 40km/h para a via local. Se há congestionamento, esta velocidade se reduz
pela metade. Nos locais onde foi verificado um fluxo muito elevado de veículos, foram
colocados semáforos a fim de se evitarem colisões.

As simulações envolveram quatro cenários de inundação considerando dois possíveis horários


para o início do evento, o que representa um total de sete cenários. A Tabela 8.19 apresenta os
cenários utilizados.

Tabela 8.19 – Cenários utilizados na simulação do tráfego ADA e AE - Protótipo


Cenário Hora do evento
Cotidiano, sem inundação -
Inundação com tempo de retorno de 05 anos
Inundação com tempo de retorno de 25 anos 10h ou 17h
Inundação com tempo de retorno de 100 anos

Escolheu-se o horário de 10h para início da inundação por ele representar um momento de
fluxo “médio” de veículos. No horário de 17h capta-se o efeito do evento em um momento de

226
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grande circulação dos agentes. Além disso, em várias cidades do sudeste, as inundações estão
associadas à ocorrência de chuvas convectivas que, não raro, ocorrem ao final do dia.

Em relação aos critérios de velocidade do fluxo de veículos com a inundação, definiu-se que,
caso a via seja inundada com uma altura de inundação superior a 15cm, o fluxo é
interrompido, abaixo deste nível, tem-se uma redução da velocidade para 20 km/s (Tabela
8.20).

Tabela 8.20 – Critérios para fluxos de veículos durante o evento na ADA e AE - Protótipo
Altura da inundação na via Fluxo de veículos
< 15 cm velocidade = 20km/s
≥ 15 cm interrompe

A Figura 8.14 ilustra o modelo construído no Integration 5.1.

Figura 8.14 – Interface do modelo

Por meio da simulação do tráfego obtêm-se variáveis relevantes para análise do impacto da
inundação: tempo, distância e consumo de combustível, emissão de poluentes como CO2, HC
e NOx. Estas informações estão disponíveis por link, veículo e caminho (a partir de uma
definição de origem e destino).

A etapa seguinte é transformar estes indicadores quantitativos em valores monetários. O custo


do combustível é facilmente obtido segundo a Equação 8.5 (IPEA/ANTP, 1997; Nagem,
2008):

8.5
227
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Onde:
CC = custo total de combustível por veículo (em reais de 2000);
yC = quantidade total consumida por veículo (l/km);
pC= preço da gasolina na bomba (em reais de 2000);
0,718 = fator proposto em Nagem (2008) utilizado para compensar a variação do combustível
usado entre os veículos;
dV = distância percorrida na área de estudo (nesta pesquisa, na ADA e AE).

O preço da gasolina foi obtido pela média praticada nos postos de gasolina em novembro de
2009 (pesquisa pela Internet), deflacionada pelo IPCA do IBGE segundo o índice específico
para gasolina (subitem 5.104.001 do índice global). O custo do combustível é definido para
cada veículo que trafega na região estudada.

A definição de um valor monetário para o tempo é problemática e controversa (ver item


6.1.6). Entretanto, a fim de se obter uma base comum de análise utiliza-se para sua
mensuração uma adaptação da formulação proposta por IPEA/ANTP (1997) (Equação 8.6):

8.6

Em que:
CT = Custo do tempo de viagem na área de estudo (em reais de 2000);
w = renda mensal auferida pelo agente (em reais de 2000);
ES = Encargos sociais 95,02% = 1,9502;
FA = Possibilidade de uso alternativo do tempo (0,3);
HP = Percentual de uso produtivo do tempo (% viagens a trabalho + % viagens
casa/trabalho x 0,75). Caso não disponível, usar 0,5;
yW = Número de horas de trabalho por mês. Se não disponível, usar 168 horas.
tV = tempo de viagem percorrido na área de estudo (em horas).

Para a Equação 8.6, obteve-se os valores da renda e as horas trabalhadas para cada agente
diretamente dos Microdados censitários (IBGE, 2000). O tempo de viagem por veículo é uma
informação de saída da simulação com o uso do Integration. Este custo esta associado a cada
morador componente da população ocupada que trafega por meio de um veículo, próprio ou
comum, na região.

Finalmente, é feita a monetização dos poluentes. Considerou-se para avaliação econômica o


monóxido de carbono (CO), hidrocarbonetos (HC) e o óxido de nitrogênio (NOx).
228
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Segundo o estudo do IPEA/ANTP (1997), o CO provoca tonturas, dores de cabeça, sono,
redução dos reflexos, perda da noção de tempo e morbidez em pessoas idosas. Pelos efeitos
que causa, o CO seria, entre os poluentes, um dos principais responsáveis por acidentes de
tráfego em áreas de grande concentração. Os HC são irritantes para os olhos, nariz, pele e
parte superior do sistema respiratório. Eles reduzem a visibilidade ambiente, o que pode levar
a acidentes. O NOx provoca problemas respiratórios, o que interfere na resistência orgânica às
infecções. Ele também influencia no desenvolvimento do enfisema pulmonar.

Talvez a definição de valores monetários para os poluentes seja ainda conceitualmente mais
difícil do que para o tempo. Para o tempo, pode se ter como referência a “utilidade
econômica” do indivíduo. Já a monetização dos poluentes envolve estudos relativos aos
efeitos da poluição sobre o ser humano e sobre o ambiente, os quais podem ser muito variados
segundo as condições ambientais locais (clima, altitude, dispersão, regime de ventos, relevo,
etc.), além da consideração dos efeitos obtidos pela atuação conjunta dos poluentes.

Para definição destes valores o estudo do IPEA/ANTP (1997) utilizou fontes americanas e
européias as quais foram adaptadas para a realidade brasileira considerando as relações entre
as rendas per capitas dos países. Os valores finais encontrados, originalmente em reais de
1997, foram convertidos para 2000 (Equações 8.7, 8.8 e 8.9):

CO = R$ 0,25/kg 8.7
HC = R$ 1,50/kg 8.8
NOx = R$ 1,48/kg 8.9

Ressalta-se que o tempo e o consumo de combustível são custos de quem viaja, enquanto o
custo da poluição refere-se a todos os habitantes da área de estudo, viajantes ou não.

Observa-se que o estudo do IPEA / ANTP (1997) utiliza como referência para monetização
dos poluentes o impacto sobre a saúde. Não foram, portanto, incorporados impactos
ambientais que recentemente tem ganhado grande atenção pelos possíveis efeitos que podem
causar no planeta como um todo, como o efeito estufa, a destruição da camada de ozônio e a
chuva ácida.

8.7 Modelagem econômica em rede

Inicialmente era prevista uma modelagem baseada em agentes. Logo, o interesse recaía nas
estratégias comportamentais de cada agente domiciliado. Quando se passou de uma analise de

229
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agentes para uma análise em rede, a preocupação fundamental passou a ser a discussão das
funções desempenhadas pelo domicílio e não de qual agente a executaria.

Trabalhou-se com uma rede que representa os fluxos econômicos que saem e entram nos
domicílios. Segundo os objetivos deste estudo, as relações econômicas entre firmas não foram
consideradas. Na terminologia da análise de rede, para cada domicílio dirige-se um link
valorado (renda) e sai outro link valorado (gasto), de tal forma que, em média, ao mês, os
valores dos links de entrada e saída são iguais (Figura 8.15).

Firma Renda Domicílio Gasto Firma

Figura 8.15 – Os nós e links da rede econômica discutida neste estudo

Definem-se os pontos de origem (domicílio) e destino (firmas), segundo estratégias de


escolha. A rede viária atua como a infra-estrutura física que conecta estes nós econômicos, a
qual não foi integralmente considerada na simulação, conforme discussão apresentada no item
8.6.

Utilizou-se a modelagem econômica para alocar estes fluxos nos diversos pontos de oferta de
trabalho e de bens da rede, ou seja, fazer as conexões entre os domicílios e as firmas. Os
procedimentos para alocação dos postos de trabalho e dos pontos de consumo foi feito
segundo a descrição apresentada no 8.2.4.3; para executá-los foi utilizado o software NetLogo
4.0.4. A Figura 8.16 mostra a Interface do Netlogo no início da simulação do modelo.

230
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Figura 8.16 – Interface do NetLogo 4.0.4

A alocação dos postos de trabalho foi executada; entretanto, na distribuição dos 59 tipos de
gastos que compõem a cesta de cada domicílio entre as unidades de oferta escolhidas,
ocorreram limitações computacionais, o que levou à adoção de alguns procedimentos para
simplificação das rotinas que, entretanto, não comprometem os fundamentos teóricos do
trabalho.

Os 59 tipos de gastos foram agrupados em seis grupos, os quais foram definidos segundo
critérios de substituibilidade e distribuição da oferta. Estes dois aspectos definem de forma
central se o agente irá escolher a estratégia de adiar o consumo ou substituir o ofertante, em
caso de inundação no ponto de oferta preferencial. A Tabela 8.21 mostra os grupos de gastos
e os critérios para definição das unidades de consumo.

Observe na Tabela 8.21 que os critérios de escolha por raios de deslocamento, como mostrado
no item 8.2.4.3, não foram introduzidos para possibilitar o processamento das informações.
Logo, considera-se que o raio é sempre o município como um todo.

231
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Tabela 8.21 – Grupos de gastos e critérios de escolha das unidades de consumo - Protótipo
Grupo de Substuibilida- Distribuição
Exemplos de gastos Escolha
gasto de da oferta
Alimentação, Comprar do mais próximo e substituir
A remédios, jornais e Alta a média Contígua em caso de ruptura do link compra =
revistas manter gasto
Brinquedos, Comprar do mais próximo e não
B eletrodomésticos, Média Discreta substituir em caso de ruptura do link
tecidos e armarinho compra = postergar gasto
Comprar aleatório e não substituir em
Serviços bancários, Discreta a
C Baixa a média caso de ruptura do link compra =
serviços pessoais muito discreta
postergar gasto
Educação superior, Comprar aleatório e não substituir em
D tratamento médico, Baixa Muito discreta caso de ruptura do link compra =
serviços profissionais postergar gasto
Manutenção do lar, Comprar aleatório e substituir em caso
E manutenção do Baixa a média Muito discreta de ruptura do link compra = manter
veículo gasto
Pensões, previdência Discreta a Comprar aleatório e sem deslocamento
F Variada
privada muito discreta =manter gasto

A escolha aleatória pode ser feita considerando que a distribuição das atividades no protótipo
já é uma informação do modelo que atua direcionando os fluxos. Ademais, sabe-se que a
definição do raio de deslocamento dos agentes segue critérios diversos, como distância,
diferenciação de produtos, preços e serviços, proximidade dos locais de trabalho e das
unidades de ensino, de lazer ou da residência de amigos e parentes, aglomeração de
atividades, etc.

Além disso, verifica-se que várias redes econômicas e sociais possuem um grande número de
conexões com a vizinhança, mas também com regiões mais distantes. Atualmente, algumas
instituições essenciais de uma cidade, como aeroportos e centros administrativos, tendem a se
localizar cada vez mais afastados do centro, já excessivamente adensado. O aumento da
distância pode ser compensado pela melhora no acesso até elas e pelo desenvolvimento dos
meios de transporte, com a conseqüente diminuição do tempo de deslocamento (Hanneman &
Riddle, 2005).

Esta diversidade de critérios permite que a estratégia do agente não seja apenas o menor
tempo de deslocamento, a qual normalmente está associada aos bens de consumo essencial,
imediato e pouco diferenciados.

O modelo criado permite captar os links econômicos entre a ADA, AE e os 74 nós que
compõem a rede urbana, além disso, é possível descrevê-los em termos de acesso a cada setor
de atividade econômica.

232
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8.8 Avaliação dos danos Diretos

8.8.1 Avaliação dos danos ao conteúdo dos domicílios (exceto veículos)

Definiram-se os danos diretos ao conteúdo dos domicílios por meio da aplicação de fatores de
susceptibilidade ao contato com a água a cada um dos 32 tipos de ativos considerados, os
quais foram definidos segundo o procedimento mostrado no item 8.2.1.7.

Os fatores foram propostos inicialmente por Penning-Rowsell & Chatterton (1977) e


adaptados para a realidade brasileira em Machado (2005). Na sua definição, considera-se o
tipo de ativo, sua qualidade (definida em três níveis) e a sua altura provável na residência, o
que permite definir, para cada bem, qual o valor de sua depreciação segundo diferentes
profundidades de inundação.

O fator de susceptibilidade à inundação é aplicado sobre o valor do bem encontrado na


residência, que se considerou estar na sua meia vida, com uma depreciação média de 50%. A
Equação 8.10 mostra o valor total dos danos do domicílio por tipo de bem e a Equação 8.11 o
valor total de danos ao conteúdo.

8.10

8.11

Onde:
DCnj,y = valor total dos danos do bem j a uma profundidade y;
Aj= quantidade do bem j;
Pj = preço do bem j;
dj = percentual de depreciação em condições “normais” do bem j;
dinjy = fator de suscetibilidade à inundação do bem j a uma profundidade y;
TDCny = valor total dos danos ao conteúdo do domicílio.

Sendo que:
0% ≤ dinj, y ≤ 100%,
1 ≤ j ≤ 32 e
y ≥ 0.

233
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O preço dos bens, como discutido no item 8.2.1.7, foi obtido por meio de levantamento já
feito por pesquisadores para o trabalho de Machado (2005) diretamente em estabelecimentos
comerciais e por meio da Internet.

8.8.2 Avaliação dos danos aos veículos dos domicílios

A análise do valor dos danos aos automóveis deve ser feita de forma separada, pois, como se
trata de um bem móvel do domicílio, são necessárias algumas hipóteses adicionais.

Não foi encontrado um número significativo de referências detalhadas que discutem a


avaliação dos danos diretos aos automóveis decorrentes do contato com a água. Ao que
parece, não há um padrão, logo as informações dos estudos são normalmente empíricas.

A principal dificuldade é a definição do número de veículos danificados. Como discutido Na


seção 3.5, os estudos analisados consideram como veículos atingidos aqueles pertencentes aos
domicílios expostos ao avento (Appelbaum, 1985; Nagem, 2008; EASTWOOD..., 2009),
incorporando eventualmente um fator redutor (Appelbaum, 1985; EASTWOOD..., 2009).

Neste estudo, devido ao enfoque dado aos domicílios expostos ao risco, optou-se por também
utilizar a posse de veículos pelos domicílios como indicador do número de automóveis
atingidos. Porém foram incorporadas algumas hipóteses adicionais:

 Considera-se que nos domicílios onde há automóvel, os trabalhadores o utilizam como


meio de transporte para o local de emprego;

 Como se trabalha com dois momentos da inundação - 10h e 17h - estima-se que neste
horário os automóveis utilizados pelos trabalhadores domiciliados na ADA e AE estão
fora da área de impacto direto;

 Os veículos atingidos, portanto, são aqueles que não foram utilizados pelos
trabalhadores e restaram no domicílio.

Ao serem aplicadas estas hipóteses nos domicílios que compõem a ADA e AE, verificou-se
que 20% dos veículos permaneceriam na residência. Um percentual considerado adequado, e
próximo aos 25% definidos no estudo de EASTWOOD... (2009) baseado nas estatísticas do
Australian Bureau of Statistics sobre o número de veículos presentes nas residências no
horário útil.

234
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
As possíveis avarias nos veículos e o valor de reparação foram estabelecidos em consultas a
oficina especializada. Lá, por meio de um programa computacional específico utilizado no
estabelecimento, foram simulados os possíveis danos aos veículos em diferentes
profundidades de inundação. Utilizou-se nas simulações três tipos de veículos: “popular”,
“médio” e “luxo”.

Segundo os especialistas, em condições de depreciação moderada do veículo, a partir de 40


cm de profundidade há entrada de água no automóvel. De 40 a 70 cm os custos são,
sobretudo, de limpeza, que varia segundo o valor do veículo. A partir de 70 cm cobre-se o
banco e os danos são mais relevantes. Com mais de 1m de altura do nível d`água, há perda
total de veículo. A Tabela 8.22 mostra o valor dos danos aos veículos utilizados na pesquisa.

Tabela 8.22 – Valor dos danos dos veículos segundo sua categoria (em reais de 2000)
Altura da inundação (em m) Até R$12.090 R$12.090 a R$19.927 Mais de R$19.927
0,1 0 0 0
0,2 0 0 0
0,3 0 0 0
0,4 R$ 262 R$ 262 R$ 524
0,6 R$ 262 R$ 262 R$ 524
0,7 36% R$ 5.456 R$ 9.642
0,8 36% R$ 5.456 R$ 9.642
0,9 36% R$ 5.456 R$ 9.642
1,0 100% 100% 100%
1,2 100% 100% 100%
1,5 100% 100% 100%
1,8 100% 100% 100%
2,1 100% 100% 100%

8.8.3 Avaliação dos danos à construção do domicílio

Na análise dos danos à construção foram utilizadas as curvas de danos versus profundidade de
submersão - curvas DPS - estabelecidas em Machado (2005).

Estas curvas foram criadas a partir da estimativa de danos diretos de inundação nos
municípios de Itajubá e Santa Rita do Sapucaí. A pesquisa no vale do rio Sapucaí foi
elaborada mediante a aplicação de cerca de 1000 questionários para detalhamento dos
prejuízos decorrentes de grandes inundações em áreas recentemente sinistradas (pesquisa feita
no ano 2000). Foram pesquisados os setores habitacional, comercial e de serviços e as classes
sócio-econômicas A, B, C, D e E (Critério Brasil) (Machado, 2005). Os dados coletados
possibilitaram a construção de curvas de prejuízos causados por inundação em função da
profundidade de submersão segundo diferentes tipologias de uso do solo e renda.

235
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Os custos dos danos à construção foram estimados de acordo com as informações fornecidas
pelos entrevistados sobre os danos ocorridos (tipo de avarias, área ou número de itens
atingidos) e de estimativas dos custos de reforma.

A Figura 8.17 mostra uma das curvas estimadas em Machado (2005). As curvas à construção
foram definidas pela diferença entre a função de danos totais e a função de danos ao conteúdo.

Danos a Residências - Classe A


y=90.832+39.334*ln(x)
Coeficiente de Correlação: r= 0,93217
200

180

160

140
DANOS (R$/m2)

120

100

80

60

40

20

0
0,0 0,4 0,8 1,2 1,6 2,0 2,4
PROFUNDIDADE (m)

Figura 8.17 – Curva de danos a residências (danos à construção e ao conteúdo) em


função da profundidade para a classe A - Ajuste da função logaritmo
Fonte: Machado (2005)

8.8.4 Avaliação dos danos diretos às firmas

A análise dos danos diretos às firmas não ocupa centralidade nesta pesquisa, que tem como
objeto de análise os domicílios. Entretanto, pela relação que existem entre estes dois atores,
nos resultados desta pesquisa são apresentadas algumas estimativas para o valor dos danos às
firmas, as quais foram definidas com o uso das curvas DPS de Machado (2005) para as
atividades econômicas.

Machado (2005) apresenta nove curvas de danos em função da profundidade de submersão


para o setor comercial e quatro para o setor de serviços. O setor industrial não foi discutido
em razão da pequena amostra empírica então obtida.

As curvas foram derivadas da uma síntese de dados de danos reais e produzidas de acordo
com a estimativa dos prejuízos relacionados aos vários danos ocorridos declarados pelos

236
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
entrevistados nas duas cidades pesquisadas (Itajubá e Santa Rita do Sapucaí). Em relação aos
prejuízos ao inventário (estoque de mercadorias), efetuou-se uma estimativa dos danos ao
estoque em lugar de se adotar o valor observado pelos entrevistados.

8.9 Criação de indicadores de risco à inundação


Os indicadores têm como unidade de análise o domicílio. Eles são incorporados ao modelo de
impacto da inundação, possibilitando caracterizar o domicílio em termos de impactos diretos e
indiretos, ameaça, vulnerabilidade e resiliência. Os domicílios podem ser representados em
cores diferentes segundo o nível de risco, na plataforma de análise, possibilitando observar
simultaneamente o valor dos danos e a vulnerabilidade. Além disso, é possível observar se os
indicadores calculados são compatíveis com os valores do impacto associados a cada
domicílio.

Os indicadores possibilitam comparar os domicílios entre si e os resultados para os três


cenários de probabilidade de inundação: Tr = 100 anos, Tr = 25 anos e Tr = 05 anos.

8.9.1 Hipóteses de trabalho

8.9.1.1 Base conceitual de análise


Ao propor uma mensuração de risco, seja na forma de um indicador ou de outra medida,
devem-se explicitar as hipóteses de pesquisa. Estas são delimitadas, em primeiro lugar, pelos
conceitos utilizados no trabalho.

Os conceitos fundamentais que permeiam toda a pesquisa, e discutidos em seções anteriores,


são os de risco, ameaça, vulnerabilidade e resiliência à inundação. Os dois primeiros já foram
definidos em termos precisos ainda na introdução. O risco representa interação entre ameaça e
vulnerabilidade, sendo que a resiliência atua amortecendo-o pela influência sobre os dois
últimos (Tapsell et al., 2002).

A ameaça da inundação é caracterizada segundo critérios físicos: representa as características


do escoamento que atuam como fatores de impacto sobre os bens e pessoas expostas. Na
definição dos critérios de impacto recorreu-se àqueles recomendados pela literatura existente.

E a resiliência, como discutido na seção 4.2, refere-se à capacidade de um sistema de se


ajustar à ameaça e de mitigar ou evitar danos (Pelling, 2003). Embora haja discussões sobre
qual seria a diferença entre menor vulnerabilidade e resiliência, o tema não é aprofundado
neste estudo.
237
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Certamente, pela centralidade que ocupa neste trabalho e pela variedade de definições e
enfoques encontrados na literatura, o principal conceito a ser explicitado é o de
vulnerabilidade à inundação (ver seção 4.2). Já se mencionou a importância da adequação
precisa do termo, pois, a partir dele, determinam-se as hipóteses de estudo e,
conseqüentemente, quais variáveis devem ser analisadas.

O conceito de vulnerabilidade aqui utilizado tem como referência os trabalhos de Wisner et


al. (2004) e Green (2004). A vulnerabilidade é representada pelas relações entre o sistema de
análise (domicílio) e seu ambiente, o qual varia ao longo do tempo. A sua magnitude seria
então mensurada pelos possíveis efeitos que as perturbações no ambiente teriam sobre os
objetivos do sistema.

8.9.1.2 Objetivos do sistema


Na presente pesquisa, considera-se que o objetivo central do sistema domicílio é maximizar o
seu nível de bem-estar. Em uma perspectiva econômica simplificada, o bem-estar pode ser
mensurado pelo volume de riqueza. Os acessos à renda e aos bens de consumo garantem,
portanto, o acesso ao bem-estar. Quanto mais o bem-estar do domicílio é afetado em
decorrência das inundações, maior sua vulnerabilidade. Em termos objetivos, isto envolveria a
combinação dos fatores que determinam em qual nível são colocados em risco a vida, o
sustento, a propriedade e os outros ativos de uma pessoa por um discreto e identificável
evento (ou série de eventos).

8.9.1.3 Unidade de análise


Como mencionado nas hipóteses de estudo referentes ao impacto da inundação, o sistema
tratado aqui é o domicílio.

Apesar de se considerar o domicílio como a unidade principal de análise, também são


introduzidos aspectos do ambiente onde ele se encontra, pois a vulnerabilidade dos
domicílios incorpora as interconexões que se estabelecem em vizinhanças mais amplas. Os
agentes circulam no meio ambiente e a criação de indicadores que reflitam critérios de
dependência em relação a firmas ou a uma região que comercializa, produz, consome ou
viabiliza o transporte de bens e pessoas é relevante.

8.9.1.4 Tempo de análise


Um terceiro aspecto a considerar é o temporal. Embora se saiba que a vulnerabilidade é um
processo, sua mensuração é feita aqui a partir de informações em um dado momento no
tempo, considerado o momento em que ocorre uma potencial inundação. Como as
238
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
informações censitárias formam a fonte de dados principal do estudo, a vulnerabilidade
relaciona-se à situação dos moradores no ano 2000. Obviamente, como proposta
metodológica, a escolha do ano de análise não interfere na simulação. Mas, caso se deseje
estudar a vulnerabilidade atual de locais onde foram identificadas mudanças demográficas e
sociais relevantes depois do ano 2000 serão necessárias fontes de dados secundários mais
recentes ou a utilização de dados primários.

Ressalta-se que medir a vulnerabilidade implica em considerar três momentos: antes, durante
e após a inundação. Portanto, devem ser definidas as características do domicílio e de seus
moradores que interferem na sua capacidade de antecipar (pré-inundação), lidar, resistir (antes
e durante a inundação) e de se recuperar (pós-inundação) do evento. Esta multiplicidade de
aspectos evita que se reduza a vulnerabilidade – como fato social – a uma única causa (Watts
& Bolhe, 1993 apud Delor & Hubert, 2000).

8.9.1.5 Marco teórico


O estudo de indicadores proposto nesta pesquisa utiliza elementos do Modelo de Acesso
proposto por Wisner et al.(2004) (uma síntese do modelo foi apresentada no item 4.3). A
vulnerabilidade é discutida em termos de acesso do domicílio: acesso às oportunidades de
aquisição de renda, aos recursos e à qualificação. Estes padrões de acesso definem o perfil e o
nível de recursos (pessoais e materiais) do indivíduo no momento da inundação, os quais
representam o seu bem-estar. Eles interferem, também de forma central, nas condições de
insegurança da população exposta e na sua capacidade de recuperação.

8.9.1.6 Marco analítico


Já se discutiu que a vulnerabilidade está associada a um fator específico de impacto potencial
- que pode ser uma ameaça, um perigo, um choque ou um estresse – que atua sobre um objeto,
material ou social, em conseqüência de uma ou mais propriedades que ele possui. É sempre
uma relação entre sujeito e objeto.

Normalmente os estudos sobre indicadores de risco utilizam os mesmos critérios para


identificação da ameaça da inundação, independente do objeto sobre a qual ela atua: se
material ou humano ou se a construção de uma edificação ou seu conteúdo. Optou-se nesta
pesquisa por tratar separadamente os fatores de ameaça segundo o objeto de impacto, pois
existem particulares no risco associado ao mesmo. Na ameaça sobre as edificações definem-se
parâmetros, usualmente de profundidade, duração e velocidade, relacionados aos danos ao
conteúdo e à construção. Nas pessoas, a possibilidade de perda de estabilidade e afogamento é

239
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
central e utiliza-se o fator velocidade (velocidade x profundidade) como critério de análise.
Em termos de ameaça ao acesso aos bens de consumo, a inundação, mesmo a baixa
profundidade e velocidade, já pode interromper fluxos significativos de pessoas e
mercadorias.

Utilizou-se a abordagem usual de que o risco é a interação entre ameaça, exposição e


vulnerabilidade (Figura 8.18). Se não há um destes três componentes, não há risco de
inundação (Bollin et al., 2003). Definiram-se para a ameaça cinco índices: dois de base
material (construção e conteúdo dos domicílios), um ligado ao objeto humano (possibilidade
de impacto direto sobre as pessoas), um associado ao acesso ao bem-estar e um que indica a
ameaça de inundação, independente de sua intensidade.

Para indicar o nível de exposição dos bens e pessoas à ameaça, definiram-se quatro
indicadores: exposição da construção da edificação, do conteúdo, das pessoas do domicílio e
do domicílio como um todo.

A vulnerabilidade (quando se refere a pessoas) e a suscetibilidade (quando se refere a objetos)


à inundação foi avaliada por seis indicadores: valor da suscetibilidade da construção e do
conteúdo; vulnerabilidade relacionada às características dos moradores e da família e
vulnerabilidade no acesso às unidades de consumo preferidas e à renda.

Finalmente, são mostrados indicadores que mostram como o domicílio atua no sentido
contrário ao da vulnerabilidade, ou seja, sua resiliência ao impacto. Dois indicadores são
propostos: de acesso à informação e de acesso à renda, os quais analisam aspectos
considerados relevantes nas estratégias de mitigação, de enfrentamento e de recuperação após
a inundação.

240
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Influência
mediadora:
Resiliência

Risco

Figura 8.18 – O risco e seus constituintes

8.9.1.7 Procedimento para definição dos índices


Para definição dos índices, utilizou-se um esquema analítico como apresentado na Figura
8.19:

Hipóteses Atributos Indicadores Indices

Figura 8.19 – Marco analítico: das hipóteses à criação de índices associados ao


risco de inundação

As hipóteses de trabalho determinam os fatores considerados fundamentais na definição do


risco de danos diretos e indiretos nos domicílio. Normalmente eles se fundamentam na análise
da literatura ou em experiências empíricas.

A partir das hipóteses, definem-se os critérios ou atributos mais representativos para expressar
o risco. Eventualmente estes atributos são de difícil obtenção, exigem grande esforço de
cálculo ou não estão disponíveis para todas as localidades. Nessas situações, são definidos
indicadores que representem os critérios de análise. E é esta exatamente uma das
potencialidades do indicador: a possibilidade de incorporar parâmetros relevantes de forma
simplificada na análise.

241
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Como atesta Castro (2007), o indicador é uma variável que “indica”, reflete um atributo.
Quanto melhor a variável refletir o atributo e mais relevante for essa informação para a
tomada de decisão, mais bem escolhido será o indicador.

E finalmente, tem-se a transformação deste indicador em índice por meio de um procedimento


de padronização. Neste trabalho, usualmente as variáveis são padronizadas através de sua
divisão pela variável de maior valor no vetor. Escolheu-se este critério por ele manter a
proporcionalidade, o que é considerado importante, uma vez que vários índices são
comparados entre si. Além disso, utilizar como base o maior valor torna o indicador
facilmente interpretável, com o limite máximo um representado pelo maior valor possível que
a variável possa alcançar. Os procedimentos existentes de padronização são descritos no item
4.5.1.

8.9.1.8 Escolha dos atributos para composição dos indicadores


Os critérios utilizados para escolha das variáveis que compõem cada indicador são explicados
no item em que ele é discutido, mas alguns critérios são comuns a todos eles: facilidade de
acesso a informações sobre a variável e abrangência espacial e temporal. Desta forma,
privilegiou-se a utilização de dados censitários.

Os domicílios existentes no protótipo representam uma amostra dos microdados censitários e


são, portanto, uma fonte de informações observáveis na realidade. Usualmente, recorreu-se a
simulações no protótipo como auxílio para verificação do comportamento estatístico das
variáveis e a correlação entre elas.

Em relação às características da ameaça, sempre que a profundidade do escoamento mostrou-


se como informação suficiente para os objetivos do estudo, ela foi utilizada. A profundidade
e alcance do escoamento são informações facilmente disponíveis e com menor margem de
incerteza quando é feita uma modelagem hidrológico-hidráulica tradicional de uma bacia
hidrográfica. São as variáveis mais facilmente identificáveis pela comunidade atingida ou por
visualização das marcas deixadas pela inundação após o evento. A velocidade foi utilizada
apenas para definir situações extremas, com maior probabilidade de ocorrência de danos
estruturais à propriedade e de afogamento.

8.9.1.9 Criação de pesos

Muitas vezes a criação de indicadores implica a definição de pesos para as variáveis em


análise, uma vez que elas podem ser consideradas menos ou mais relevantes ante as hipóteses

242
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
de trabalho. Por exemplo, se pretende mensurar a vulnerabilidade das pessoas ao afogamento
durante a inundação, podem-se atribuir pesos diferenciados aos indivíduos expostos segundo
suas características físicas e etárias. Os procedimentos de ponderação mais usuais foram
descritos no item 4.5.2.

Neste estudo, utilizou-se, com freqüência, a ponderação por avaliação cardinal simples,
recorrendo-se, eventualmente, à avaliação direta por relações. No primeiro, o tomador de
decisão avalia cada critério segundo uma escala de medida predefinida (e.g.: de zero a cinco,
de zero a cem, etc.). Os valores são depois padronizados. A avaliação direta por relações é
uma variação do método, consiste em pedir ao tomador de decisão para avaliar a importância
relativa de cada critério em relação ao menos importante entre eles.

Também foi utilizado, em um indicador em particular, o Processo Analítico Hierárquico –


PAH. O PAH reduz o problema de tomada de decisão a comparações par-a-par dos critérios,
facilitando assim sua avaliação.

Em relação à escala, tanto na avaliação cardinal quanto no PAH, utilizou-se como padrão a
escala de um a nove, definida pelo próprio Saaty (1977), criador do PAH, como a mais
adequada após vários estudos de percepção do comportamento humano a estímulos e
respostas.

Esta escala foi adaptada em Gomes, Araya & Carignano (2004) com a incorporação das
escalas verbais correspondentes, o que facilita a análise para o tomador de decisão. Além
disso, ela possibilita tanto a comparação alternativa x critério, quanto a comparação critério x
critério.63 Nesta pesquisa, a fim de manter a homogeneidade nos procedimentos de
ponderação, sempre quando foi necessária a definição de pesos, buscou-se definí-los segundo
a intensidade de importância descrita e na Tabela 8.23 e considerando as definições
apresentadas na mesma.

63
Para definir entre um conjunto de alternativas, o tomador de decisão possui eixos de avaliação que direcionam
a análise. A partir destes eixos, ou critérios, é possível fazer a comparação entre alternativas (Gomes, Araya &
Carignano, 2004)
243
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.23 – Intensidade de importância da alternativa (ou variável) ou do critério em
escalas cardinais e verbais
Intensidade
de Comparação alternativa x critério Comparação critério x critério
importância
A alternativa i não contribui para o
0 -
critério c.
A alternativa i tem muito pouca O critério p tem importância igual ao
1
importância para o critério c. critério q.
A importância da alternativa i está A importância do critério p está entre
2 entre muito pouco importante e igual e levemente maior que a do
pouco importante para o critério c. critério q.
A alternativa i tem pouca A importância do critério p é levemente
3
importância para o critério c. maior que a do critério q.
A alternativa i tem alguma O critério p é mais importante que o
4
importância para o critério c. critério q.
A alternativa i tem forte O critério p é fortemente mais
5
importância para o critério c. importante que o critério q.
A importância da alternativa i está A importância do critério p está entre
6 entre forte e bastante forte para o fortemente maior e muito fortemente
critério c. maior que a do critério q.
A alternativa i tem muito forte O critério p é muito mais fortemente
7
importância para o critério c. importante que o critério q.
A importância da alternativa i está A importância do critério p está entre
8 entre muito forte e absoluta para o muito fortemente maior e absolutamente
critério c. maior que a do critério q.
A alternativa i tem e absoluta O critério p é absolutamente mais
9
importância para o critério c. importante que o critério q.
Fonte: Gomes, Araya & Carignano (2004: 150).

A única exceção à utilização da escala cardinal até nove na pesquisa, como mostrado na
Tabela 8.23, ocorreu com o indicador de restrição ao acesso às unidades de consumo, pois se
verificou a necessidade de uma escala mais ampla para mensurar a importância relativa das
atividades, a qual foi definida de zero a doze.

8.9.1.10 Agregação dos indicadores

Optou-se por dois tipos de abordagem para agregação dos indicadores.

Primeiramente, considerou-se a agregação dos índices pelo produtório entre eles. Desta
forma, se um componente é nulo, o índice síntese é nulo. A formulação usual é dada pela
Equação 8.12.

Risco = ameaça x exposição x vulnerabilidade social 8.12

Com freqüência, analistas consideram que os subindicadores não possuem a mesma


importância relativa no indicador de risco global e são dados pesos a eles.

Considerando o aspecto físico que caracteriza a ameaça e o caráter social da exposição e da


vulnerabilidade, e após simulações e estudo da literatura, optou-se por atribuir a mesma
244
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
importância relativa para a ameaça (50%), que seria o fator de gatilho para a ocorrência do
desastre ou risco, e para o componente associado às conseqüências do evento (50%) no risco
global. Este último englobaria a exposição e a vulnerabilidade social. Ressalta-se que cabe ao
tomador de decisão a definição dos pesos, segundo seu julgamento, percepção e objetivos.

Existe dificuldade e subjetividade em se atribuir pesos, especialmente para critérios de


natureza completamente diferentes e que são, ao mesmo tempo, de fundamental importância.
Como exemplo, o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH, utilizado pela Organização das
Nações Unidas - ONU para classificação dos países, considera a mesma importância relativa
dos três subindicadores que o compõem, sendo que todos têm um caráter principalmente
social.

Inicialmente, considerou-se também a utilização da técnica de análise fatorial como forma de


condensar as informações em um número menor de variáveis estatísticas - os fatores - a
exemplo do que foi feito em Cançado et al. (2007). Entretanto, os fatores não possuem uma
interpretação tão direta, o que é desejável no processo decisório. Além disso, como
mencionado, a base da análise fatorial para ponderar é a correlação, o que não
necessariamente indica uma relação causal entre os subindicadores (os fatores) e o fenômeno.
Ou seja, correlação e casualidade têm sentidos diferentes (Cardona, 2004, 2005).

8.9.2 Risco aos domicílios

Os indicadores utilizados para inferir os danos potenciais aos domicílios são apresentados de
forma esquemática na Figura 8.20.

245
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Riscos potenciais ao domicílio

Ameaça Exposição Vulnerabilidade Resiliência

Material Material Material Acesso à


educação

Humana Humana Humana


Acesso à renda

da Família
no Acesso

de Acesso

Figura 8.20 – Critérios na definição dos danos potenciais ao domicílio

Cada um destes aspectos é discutido nas seções seguintes por meio da criação de indicadores.

8.9.2.1 Indicadores referentes à ameaça material, humana e de acesso do domicílio - IA


Os indicadores de ameaça relacionam-se às características da inundação. Sua base conceitual
e as possíveis aplicações e definições metodológicas foram abordadas na seção 4.1.

Nesta seção, são discutidos cinco índices de ameaça: dois de ameaça material (construção e
conteúdo), um de ameaça humana, um de ameaça ao acesso às unidades de consumo e
geração de renda e um último de ameaça de inundação, sem referência à sua intensidade.

i Índice de ameaça da inundação à construção – IAM1


O índice de ameaça aos itens de construção do domicílio foi definido a partir de referencias
propostas em RESCDAM... (2000) e com a utilização das curvas DPS para construção
recomendadas em Machado (2005). A base pra elaboração destas curvas é explicada no item
8.8.

No item 8.8, ao serem definidos os danos à construção, utilizou-se a profundidade da


inundação como a característica da cheia a ser considerada no estudo. Mantendo coerência na
análise, emprega-se aqui a mesma variável como indicador de ameaça às construções.

246
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Entretanto, conforme explicado no item 4.1, a velocidade tem importância fundamental na
ocorrência de danos estruturais, logo, observou-se a necessidade de também incorporá-la ao
estudo. Além disso, mantém-se o princípio de que os indicadores se constituem em uma
referência sobre quais parâmetros são relevantes na magnitude dos danos, mesmo que,
eventualmente, por dificuldades técnicas ou tecnológicas, estes não sejam utilizados na
quantificação monetária do impacto.

Desta forma, definiram-se dois critérios:

 Para a situação de maior impacto, com a ocorrência danos parciais e totais às


estruturas das edificações, utilizaram-se parâmetros de velocidade e profundidade
recomendados em RESCDAM... (2000).

 Com exceção das situações de impacto extremo mencionadas acima, a suscetibilidade


das construções ao contato com a água foi definida por meio de simulação com o uso
das curvas DPS propostas em Machado (2005).

As simulações envolvendo as curvas DPS para verificação da suscetibilidade foram feitas


com várias profundidades aleatórias de inundação em 14.314 observações (que representam
os domicílios do protótipo). Como a suscetibilidade da construção está ligada à qualidade da
mesma, estas observações foram divididas em diferentes classes de renda, seguindo o padrão
de Belo Horizonte. Em seguida, definiu-se, em termos médios, qual era o dano por metro
quadrado associado a cada nível de profundidade. Este é um indicador do “valor médio da
suscetibilidade da construção” ao contato com a água (Tabela 8.24). Os dados brutos foram
padronizados considerando o valor máximo igual a um.

Tabela 8.24 – Variação do dano médio à construção por metro quadrado de área construída
segundo a altura da inundação e o índice correspondente
Profundidade (em m) Dano / m2 (reais de 2000) Índice
0, 25 a 0,50 17,15 0,53
0,50 a 0,75 20,31 0,62
0,75 a 1,00 22,33 0,69
1,00 a 1,25 24,36 0,75
1,25 a 1,50 26,01 0,80
1,50 a 1,75 27,34 0,84
1,75 a 2,00 28,89 0,89
2,00 a 2,25 30,27 0,93
2,25 a 2,50 31,30 0,96
2,50 a 2,75 32,55 1,00

247
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Observa-se na Tabela 8.24 que se considera que a inundação atinge a edificação a uma
profundidade mínima de 0,25m de inundação nas vias públicas (Machado, 2005). Abaixo
deste valor a ameaça é considerada nula.

Em relação às recomendações contidas em RESCDAM... (2000), considera-se que, para as


casas de alvenaria, concreto e tijolo (mais freqüentes no Brasil), a possibilidade de danos
totais à estrutura ocorre quando v ≥ 2m/s e v x y ≥ 7m2/s. Este é, portanto, o limite máximo
considerado para o indicador (um).

Segundo a mesma fonte, os danos parciais à estrutura, por sua vez, ocorreriam quando v ≥
2m/s e 7m2≥ v x y ≥ 3m2/s. Neste caso, o indicador varia linearmente de 0,95 (importância
entre muito forte e absoluta para o critério) a 1 (importância absoluta), segundo a Equação
8.13

IAM1= 0,0125(v x y) + 0,9125 8.13

Síntese do IAM1

Considerando estes aspectos, foram definidos os seguintes critérios para a ameaça à


construção:

 Se v ≥ 2m/s e v x y ≥ 7m2/s; assumem-se os danos totais à estrutura e o indicador é igual a


1.

 Se v ≥ 2m/s e 7m2/s ≥ v x y ≥ 3m2/s; o indicador varia segundo a Equação 8.13: IAM1=


0,0125(v x y) + 0,9125.

 Se v < 2m/s e y < 0,25m; o indicador assume o valor de 0.

 Se v < 2m/s e y ≥ 0,25m, a profundidade é padronizada segundo os critérios apresentados


na Figura 8.21:

248
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
1,00 1,00
1,0 0,93 0,96
0,89
0,84
0,80
0,8 0,75
0,69
0,62
0,6 0,53
IAM1
0,4

0,2

0,0
0,25 0,5 0,75 1 1,25 1,5 1,75 2 2,25 2,5 2,75

Profundidade (m)

Figura 8.21 – Índice de ameaça à construção (IAM1)

ii Índice de ameaça da inundação ao conteúdo dos domicílios – IAM2


Na definição deste índice utiliza-se também a profundidade como o fator de ameaça
incremental ao conteúdo das edificações. Mas considera-se que, se a construção teve danos
estruturais ou foi fortemente impactada, seu conteúdo apresenta, potencialmente, índice
máximo de danos. Logo, os parâmetros para o fator velocidade recomendados pelo
RESCDAM... (2000) e utilizados para o índice de ameaça à construção – IAM1 são também
empregados aqui. A Tabela 8.25 apresenta os critérios utilizados para a padronização das
informações brutas e criação do IAM2.

Tabela 8.25 – Variação do valor da suscetibilidade média do conteúdo, segundo a altura da


inundação, e índice associado
Valor médio da suscetibilidade dos bens
Profundidade
ao contato com água por domicílio Índice
(em m)
(em reais de 2000)
0,35 a 0,45 221,22 0,05
0,45 a 0,55 891,71 0,21
0,55 a 0,85 1726,15 0,41
0,85 a 1,15 3450,07 0,81
1,15 a 1,45 3998,38 0,94
1,45 a 1,75 4042,85 0,95
1,75 a 2,05 4122,67 0,97
Mais de 2,05 4254,66 1,00

Na Tabela 8.25, as escalas de profundidade foram definidas segundo os parâmetros


apresentados em Penning-Rouwsell & Chatterton (1977) e adaptados para o Brasil por
Machado (2005). Eles foram utilizados para definir as profundidades críticas associadas à
suscetibilidade dos diferentes bens ao contato com a água. A segunda coluna mostra o valor
médio por domicílio da magnitude da depreciação dos bens em decorrência do contato com

249
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
água, a qual representa o dano ao conteúdo por domicílio. Estes valores foram obtidos a partir
de simulações feitas no protótipo com várias profundidades de inundação e classes
socioeconômicas (14.314 observações). A metodologia para definição do valor dos danos ao
conteúdo é descrita no item 8.8.1. Em termos sintéticos, foram utilizadas curvas de
suscetibilidade de cada bem estudado em contato com a água, sendo que a suscetibilidade
varia segundo a profundidade.

O índice apresentado na terceira coluna da Tabela 8.25 representa a informação padronizada


para a base de referência, a última escala de profundidade, pois é aquela com maior valor
médio de depreciação.

Observe ainda na Tabela 8.25 que o valor mínimo considerado de profundidade é 0,35m.
Antes deste nível são impactados bens que não foram incorporados na presente pesquisa (e.g.:
tapetes). Este ponto será retomado no indicador de suscetibilidade dos bens (item ii). No nível
máximo, de cerca de 2m, todos os ativos estudados já foram submersos pelas águas.

Síntese do IAM2

Em síntese, definiram-se os seguintes critérios para a ameaça à construção:

 Se v ≥ 2m/s e v x y ≥ 3m2/s; assumem-se os danos totais ao conteúdo e o indicador é igual


a 1.

 Se v < 2m/s e y < 0,35m; o indicador assume o valor de 0.

 Se v < 2m/s e y ≥ 0,35m, a profundidade é padronizada segundo os critérios apresentados


na Figura 8.22:

250
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
1,2
0,97 1,00
0,94 0,95
1,0
0,81
0,8

IAM2 0,6
0,41
0,4
0,21
0,2
0,05
0,0

1,15 a 1,45
0,35 a 0,45

0,45 a 0,55

0,55 a 0,85

0,85 a 1,15

1,45 a 1,75

1,75 a 2,05

Mais de 2,05
Profundidade (m)

Figura 8.22 – Índice de ameaça ao conteúdo (IAM2)

iii Índice de ameaça da inundação aos moradores dos domicílios - IAH


Este indicador procura mostrar os parâmetros do escoamento considerados críticos para a
ocorrência de danos diretos sobre as pessoas (e.g.: ferimentos, mortes). Na análise da
literatura, verificaram-se diferenças significativas nos critérios de impacto do escoamento
sobre as pessoas (Stephenson, 2002; Jonkman & Kelman, 2005; Courtel et al., 2006; Jonkman
et al., 2008). Possivelmente a razão desta variabilidade está na utilização, como base de
análise, de experiências empíricas, com condicionantes locais relevantes. A maioria dos
estudos tem como foco de pesquisa a possibilidade de perda de estabilidade, de morte e de
ferimento decorrente do contato dos indivíduos com as águas do escoamento.

Optou-se por utilizar novamente as recomendações existentes em RESCDAM... (2000), mas


aquelas que tratam especificamente da estabilidade de pessoas submetidas ao escoamento.
Considerou-se a função mostrada no estudo que trata da perda de estabilidade em condições
normais de escoamento (Abt et al., 1989, apud RESCDAM ..., 2000) (Equação 8.14)64:

vy = 0,004hm + 0,2 8.14

Sendo que:
v = velocidade do escoamento;
y = altura do escoamento;
hm = massa x altura. Utilizaram-se para hm os valores de 195 (adulto alto e pesado) e 77
(adulto baixo e leve).

64
Detalhes do estudo apresentado em RESCDAM... 2000 são mostrados no item 4.1.
251
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Resolvida a Equação 8.14, obtém-se o fator velocidade de 0,508 m2/s para adultos leves e de
0,980 m2/s para adultos pesados.

Como em RESCDAM... 2000 não se discutiram o impacto sobre crianças ou o impacto


mínimo do escoamento, utilizaram-se para estes casos os fatores de velocidade propostos em
Zonensein (2007) adaptados de Reiter (2000).

Empregou-se uma escala de importância dos parâmetros de zero a nove. O valor máximo
(nove) foi definido tendo como referencia a perda de estabilidade do agente mais pesado (hm
= 195). Utilizou-se o valor sete para a possível perda de estabilidade do adulto mais leve (hm
= 77). Os pesos foram padronizados tendo como base o maior valor da escala (nove). Para
definição dos índices entre os quatro parâmetros foi feita interpolação linear. A Tabela 8.26
mostra os resultados encontrados.

Tabela 8.26 – Fator velocidade e o peso e padronização utilizados


Profundidade x
Impacto Escala Padronização
velocidade (m2/s)
> 0,100 Baixo potencial de danos a crianças 1 0,14
0,250 Alto potencial de danos a crianças 5 0,56
0,508 Perda de estabilidade de adultos leves 7 0,78
0,980 Perda de estabilidade de adultos pesados 9 1,00

Síntese do IAH

Considera-se que, sempre que há inundação, as pessoas sofrem perturbações, mesmo a baixas
profundidades. Logo, o IAH assume os valores representados na Figura 8.23:

1,20
0,980; 1,00
1,00
0,508; 0,78
0,80 IAH = 0,4708yv + 0,5386

0,250; 0,56 IAH = 0,8613yv + 0,3402


IAH 0,60
0,40
IAH = 2,7513yv - 0,1323
0,20 0,100; 0,14
0; 0,00
IAH = 1,4286 yv
0,00
0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 1,1
profundidade x velocidade

Figura 8.23 – Índice de ameaça aos moradores do domicílio (IAH)


252
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
iv Índice de ameaça da inundação ao acesso ao bem-estar – IAA
O IAA procura captar a ameaça da inundação na possibilidade de acesso do domicílio ao bem-
estar. O acesso ao bem-estar é aqui considerado como acesso às oportunidades de consumo e
renda. E este, ante o evento da cheia, pode ser restringido se a inundação atinge
principalmente três locais: as unidades de oferta de bens e renda, os domicílios demandantes
ou os caminhos para se chegar até elas.

Deve-se observar que este aspecto da ameaça esta relacionado estritamente aos danos
indiretos: a inundação interfere na rede urbano-econômica formada por fluxos de bens e
pessoas, seja dificultando ou interrompendo links de acesso (trechos viários), seja paralisando
ou perturbando as atividades e os consumidores nos nós.

Como o enfoque deste texto é a ameaça sobre os domicílios, são definidos parâmetros da
ameaça que atuam sobre eles, restringindo o acesso dos seus membros constituintes às
unidades econômicas. A ameaça direta sobre as firmas é analisada, de forma simplificada e
indireta, por meio do indicador de vulnerabilidade ao acesso às unidades de consumo
preferidas, discutido no item v. Já a ameaça sobre os caminhos utilizados para se chegar até as
unidades de consumo, que se configura como perturbações ao sistema de transportes, não será
discutido especificamente nesta pesquisa. Considera-se que, em uma rede urbana complexa,
existirão possivelmente vários caminhos para se atingir o local de destino, logo, a inundação
dificilmente impediria completamente o seu acesso.

Neste contexto, uma vez que o domicílio seja atingido pelas águas, duas características da
inundação são centrais: a sua duração e a sua profundidade. A velocidade da inundação,
embora seja importante, é menos relevante, uma vez que um escoamento de pequena altura e
baixa velocidade já perturba o deslocamento dos moradores em direção às firmas.

A cheia pode se caracterizar como flash flood, com menos de uma hora de duração (USACE
(1998) apud Kelman & Spence, 2004), durar algumas horas ou ser de longa duração,
prosseguindo durante dias ou semanas. Se a cheia resultar em inundação de domicílios e
outros bens, quanto maior a sua duração, maior a perda de bem-estar pela dificuldade de
acesso ao consumo. Mas, como discutido brevemente no item 3.2.1.1, há dificuldades em
definir a forma da função “duração x perda de bem-estar” (em uma perspectiva do
consumidor, a que é adotada aqui) ou “duração x diminuição dos lucros” (perspectiva da
firma).

253
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Entretanto, ainda que se perceba a importância do fator duração da inundação, ele não é aqui
incorporado explicitamente no indicador. Discute-se neste trabalho a inundação de forma
pontual no tempo, considerando a sua existência ou não no momento em que o agente executa
uma rotina comportamental, como o consumo ou o deslocamento para o local de trabalho.

Na construção do indicador de acesso, três pressupostos sobre a racionalidade do agente


foram considerados:

 acesso ao consumo de bens não essenciais: a ocorrência da inundação,


independentemente de sua altura e velocidade, já é suficiente para desestimular a sua
aquisição;

 acesso ao consumo de um bem essencial, ao local de trabalho ou às unidades de


ensino: possivelmente, o agente estará disposto a enfrentar maior risco ou desconforto
para acessá-los. Todos os agentes só vão deixar de fazê-lo quando o acesso estiver
interrompido;

 evacuação: neste momento o agente deixa a residência na procura de abrigos.

Ante estes pressupostos de racionalidade, três parâmetros do escoamento são importantes: a


existência da inundação; a profundidade de 0,15m, que interromperia o fluxo de veículos na
via e a profundidade de 0,45m, considerada neste estudo crítica para que o morador deixe a
residência. A Tabela 8.27 mostra o peso e padronização utilizada na análise em função dos
objetivos do indicador.

Tabela 8.27 – Profundidade associada ao acesso, peso e padronização utilizados


Profundidade Peso IAA
0,15 8 0,89
0,45 9 1

Observe na Tabela 8.27 que é dado o peso de oito à profundidade de 0,15 por considerá-la
entre muito forte e absoluta para restringir a acessibilidade. Afinal, neste nível, até mesmo o
acesso aos bens essenciais e ao trabalho estão comprometidos. Com 0,45m de profundidade
tem-se o peso máximo: considera-se que este nível é de importância absoluta para a restrição
ao acesso; neste momento o único acesso possível seria aos locais de abrigo, admitindo-se a
existência de defesa civil organizada e de planos de contingência razoavelmente bem
elaborados.

254
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Entre estes parâmetros, pressupõe-se um comportamento linear dos agentes entre a escolha de
consumir ou não, de faltar ou ir ao local de trabalho e à unidade de ensino e de buscar abrigo
ou permanecer na residência (Figura 8.24).

1 1,00
0,89
0,8 IAA = 0,3704y + 0,8333

0,6
IAA
0,4
IAA = 5,9259y
0,2

0,00
0
0 0,1 0,2 0,3 0,4
Profundidade (y)

Figura 8.24 – Índice de ameaça ao acesso ao bem-estar - IAA

Síntese do IAA

Em síntese, tem-se:

 Se 0 ≤ y < 0,15, o IAA assume os fatores segundo a Equação 8.15.

IAA =5,9259y 8.15

 Se 0,45 > y ≥ 0,15, o IAA segue a Função 8.16, que varia segundo a profundidade da
inundação:

IAA = 0,3704y + 0,8333 8.16

 Se y ≥ 0,45, o IAA = 1.

Ressalta-se que estes parâmetros de ameaça incidem sobre a edificação localizada na área de
inundação, ou seja, independente do domicílio estar no primeiro pavimento ou não, ele sofre
ameaça na acessibilidade se a edificação onde ele se situa é atingida.

v Índice de ameaça de inundação - IAI


O IAI é o índice de ameaça mais simples entre os discutidos nesta seção. Em algumas
situações, a ameaça ocorre apenas devido à presença ou não da inundação sobre o objeto de
estudo. As características físicas da inundação, representada por fatores como profundidade e

255
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
velocidade, são importantes, mas, eventualmente, apenas o contato com o escoamento,
mesmo a profundidades baixas, pode ser suficiente para a análise de alguns processos ligados
à resiliência e à vulnerabilidade.

É o caso, por exemplo, da tipologia de família. Embora esta seja aqui considerada um atributo
de vulnerabilidade à inundação, tal vulnerabilidade não é aumentada em decorrência de
profundidades ou velocidades maiores de escoamento. Por outro lado, a vulnerabilidade das
pessoas à ocorrência de danos diretos, como ferimentos e afogamentos, por exemplo,
certamente possui um forte componente relacionado às características da inundação.

Portanto, o IAI assume os valores dicotômicos zero ou um (Figura 8.25).

1
profundidade > 0 = 1

IAI

profundidade nula = 0
0
0 1

Figura 8.25 – Índice de ameaça de inundação - IAI

Síntese do IAI

Em síntese,

 Se profundidade do escoamento na edificação > 0 , IAI = 1;

 Se profundidade na edificação = 0; IAI = 0.

8.9.2.2 Indicadores de exposição material e humana do domicílio - IE


Estes indicadores pretendem mostrar a exposição dos domicílios aos danos diretos.
Consideram-se, além da exposição do domicílio como um todo, três dos seus componentes:
sua construção, seu conteúdo (principais bens) e seus moradores. Os dois primeiros dão
origem aos indicadores de exposição material, e o terceiro, ao indicador de exposição
humana.

i Índice de exposição da construção à inundação – IEM1


O atributo do domicílio exposto aos danos à construção é a sua área construída.
256
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Por meio de simulações feitas com os 14.314 domicílios no protótipo, procurou-se verificar a
“sensibilidade” da variável área construída do domicílio sobre a magnitude do valor dos
danos à construção. O valor dos danos foi calculado segundo as curvas DPS para construção
presentes em Machado (2005).

Observou-se a relação entre o valor dos danos e área construída considerando diferentes
profundidades de inundação e classes socioeconômicas do domicílio. A Figura 8.26 apresenta
os resultados obtidos.

14000
12000
Danos á construção (em reais de

10000
8000
6000 A
4000 B
2000)

2000 C
0 D
80 a 100
40 a 60
60 a 80

140 a 160
Abaixo de 40

100 a 120
120 a 140

180 a 220
220 a 260
acima de 260
160 a 180

Área construída do domicílio (em m)

Figura 8.26 – Valor médio dos danos à construção segundo a área construída e as
classes socioeconômicas (em reais de 2000)

Ao se padronizar os danos em relação ao maior valor, observa-se o comportamento mostrado


na Tabela 8.28:

Tabela 8.28 – Padronização dos danos na base 1


Classe A B C D E Média
área ≤ 40 0,14 0,14 0,14 0,14 0,14 0,14
40 < área ≤ 60 0,21 0,21 0,21 0,21 0,21 0,21
60 < área ≤ 80 0,29 0,29 0,29 0,28 0,28 0,29
80 < área ≤ 100 0,37 0,37 0,37 0,37 0,37 0,37
100 < área ≤ 120 0,45 0,45 0,45 0,45 0,45 0,45
120 < área ≤ 140 0,54 0,54 0,54 0,54 0,54 0,54
140 < área ≤ 160 0,64 0,64 0,64 0,63 0,63 0,64
160 < área ≤ 180 0,71 0,71 0,71 0,71 0,71 0,71
180 < área ≤ 220 0,83 0,83 0,83 0,84 0,84 0,83
220 < área ≤ 260 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00
> 260 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00
257
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Na Tabela 8.28 os índices mostram as razões entre o valor dos danos médios à construção em
cada classe de área construída em relação à classe base, representada por aquela em que se
encontra o valor máximo de área definido. Observa-se que foram feitas várias simulações,
considerando cada classe socioeconômica separadamente e a média. A média procura retirar a
influência da classe nos danos, pois se trabalha com a média das funções DPS. Portanto, a
última coluna da Tabela 8.28 representa o índice médio de exposição da edificação à
inundação, definido como o indicador de exposição IEM1.

Para padronização do indicador em índice, uma questão relevante é a definição dos valores
máximos e mínimos da área construída. No protótipo considera-se 30m2 como o valor mínimo
de área construída de um imóvel. Como, ao se analisar a distribuição da área dos imóveis no
protótipo, o primeiro percentil corresponde à área de 37m2, definiu-se, por proximidade, 40m2
como referência para definir a classe de limite inferior (primeira coluna da Tabela 8.28).

Por outro lado, como parâmetro de limite superior, tem-se a área de 260m2. Ela foi
estabelecida a partir da análise das pesquisas empíricas feitas por Machado (2005) nos
municípios de Itajubá e Santa Rita do Sapucaí e da norma ABNT NBR 12.721(ABNT, 2006),
que apresenta padrões construtivos. Como padrão, para os maiores imóveis, a área construída
varia entre 220m2 e 250m2. Considerando-se estes parâmetros e a distribuição das áreas dos
imóveis no protótipo, chegou-se ao valor de 260m2.

A Figura 8.27 apresenta a distribuição das áreas construídas dos imóveis no protótipo
utilizado para as simulações deste estudo.

25%

20%
Distribuição (em %)

15%

10%

5%

0%
80 a 100
40 a 60

60 a 80

100 a 120

120 a 140

acima de 260
140 a 160

180 a 220

220 a 260
Abaixo de 40

160 a 180

Área construída (em m 2)

Figura 8.27 – Distribuição da área construída dos imóveis no protótipo

258
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Na ausência de informação sobre a área construída do domicílio é possível estimá-la como
feito nesta pesquisa (Equação 8.17), com a restrição de que é necessária a informação
adicional sobre a classe socioeconômica do domicílio.

Área construída = número de cômodos x área média por cômodo 8.17

A área média por cômodo é mostrada na Tabela 8.29:

Tabela 8.29 - Área por cômodo segundo classes de renda


Classe Área média/cômodo (em m2)
A1 21,15
A2 17,30
B1 13,78
B2 13,76
C 11,62
D 10,38
E 9,32

Síntese do IEM1

Em síntese, o IEM1 segue os seguintes critérios:

 Se o domicílio não está no primeiro pavimento, IEM1 = 0;

 Se o domicílio está no primeiro pavimento, adota-se o índice mostrado na Figura 8.28


correspondente à sua área construída:

1,0 1,00 1,00


0,83
0,8 0,71
0,64
0,6 0,54
IEM1

0,45
0,37
0,4
0,29
0,21
0,2 0,14

0,0
80 < área ≤ 100

> 260
60 < área ≤ 80
área ≤ 40

40 < área ≤ 60

120 < área ≤ 140


100 < área ≤ 120

140 < área ≤ 160

180 < área ≤ 220

220 < área ≤ 260


160 < área ≤ 180

Área construída (em m2)

Figura 8.28 – Índice de exposição da construção à inundação (IEM1) relacionado à


área construída do domicílio
259
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
ii Índice de exposição do conteúdo do domicílio à inundação – IEM2
O nível de exposição do conteúdo do domicílio à inundação está relacionado à quantidade e
ao valor dos bens presentes na unidade e à sua localização.

A questão central é como inferir a quantidade destes bens por meio de uma variável ou
indicador facilmente acessível ao planejador urbano ou ao gestor de políticas públicas. A
análise do microdados censitários do IBGE permite verificar a heterogeneidade que
caracteriza os domicílios brasileiros. Não existe um domicílio padrão relacionado a diferentes
classes de renda, o que limita a utilização da renda como proxy da posse de bens.
Intuitivamente, a renda parece ser determinante, mas há outros fatores, como o número de
moradores, o ciclo de vida da família e a renda per capita. Embora não tenha sido feito um
estudo estatístico apurado, uma simples análise exploratória dos microdados indicou que não
existe correlação significativa entre renda domiciliar ou per capita e a quantidade de bens do
domicílio (o IBGE divulga 10 tipos de ativos no domicílio).

Para verificar se é possível encontrar esta variável ou indicador, exploraram-se as informações


disponibilizadas pelo protótipo. Foram feitas várias análises de correlação entre as variáveis a
fim de verificar aquelas com maior grau de associação com a variável critério, o número de
bens do domicílio.

Destacaram-se, entre as variáveis, aquelas hipoteticamente possíveis de influenciar o número


e o tipo de ativos: a renda domiciliar; a renda per capita; o número de moradores, de cômodos
e de dormitórios; os anos de estudo; a escolaridade; a classe socioeconômica do domicílio e a
área do imóvel. Ressalta-se que, entre as variáveis elencadas, apenas as classes
socioeconômicas e a área do imóvel não são informações censitárias, mas estimativas. Em
relação à variável critério, deve-se enfatizar que existem duas informações:

 A informação censitária original, composta de 10 ativos;

 A informação ampliada para o protótipo, formada por 31 ativos (sobre a determinação


desses bens ver o 8.2.1.7.

A Tabela 8.30 representa uma matriz com as variáveis que apresentam as maiores correlações
observadas com a variável critério.

260
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.30 – Matriz de correlações entre variáveis (coeficiente r)
Total
Número Total de Total de
Anos Área Número Número de Classe ponderado
Variáveis de ativos ativos
de estudo do imóvel de cômodos moradores social de ativos
dormitórios (censo) (protótipo)
(protótipo)

Anos de
estudo 1,00 0,50 0,42 0,10 -0,17 0,57 0,55 0,52 0,41

Área de
imóvel 0,50 1,00 0,93 0,49 0,13 0,80 0,74 0,91 0,76

Número de
cômodos 0,42 0,93 1,00 0,54 0,15 0,63 0,69 0,85 0,71

Número de
dormitórios 0,10 0,49 0,54 1,00 0,60 0,39 0,46 0,63 0,55

Número de
moradores -0,17 0,13 0,15 0,60 1,00 0,10 0,12 0,23 0,21

Classe
social 0,57 0,80 0,63 0,39 0,10 1,00 0,74 0,87 0,71

Total de
ativos 0,55 0,74 0,69 0,46 0,12 0,74 1,00 0,84 0,68
(censo)

Total de
ativos 0,52 0,91 0,85 0,63 0,23 0,87 0,84 1,00 0,83
(protótipo)
Total
ponderado
de ativos 0,41 0,76 0,71 0,55 0,21 0,71 0,68 0,83 1,00
(protótipo)

Observa-se na Tabela 8.10 que a variável área construída é a que apresenta maior correlação
com o total de ativos, seja o número original, censitário, o estimado para o protótipo ou o
ponderado pelos preços de mercado de cada tipo de ativo.

A correlação entre área construída e conteúdo era esperada. Supõe-se que há uma relação
entre o número de bens e duas variáveis principais: o número de cômodos e a renda, a qual
define maiores áreas por cômodo (itens 8.2.1.5 e 8.2.1.7).65

A variável passível de captar estes dois efeitos - número de cômodos e renda - é a área
construída. De fato, o índice de Pearson de correlação linear entre o valor dos danos ao
conteúdo e a área construída do imóvel é de “0,79”, indicando relacionamento positivo e não
desprezível entre as duas variáveis. A metodologia detalhada de danos ao conteúdo utilizada
nesta pesquisa encontra-se na seção 8.8.

65
A posse de bens não necessariamente está diretamente associada à renda, pois, com as atuais facilidades de
crédito, classes de menor renda cada vez mais se inserem no mercado. Ademais, pode-se ter bens altamente
depreciados nos domicílios. De forma indireta, como a renda relaciona-se com a área média por cômodo, é de se
supor que quanto maior o cômodo, maior sua capacidade como reservatório de bens, logo, maior tende ser o
número de artigos ali colocados.
261
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Escolhida a variável área construída como proxy do conteúdo, o segundo passo foi verificar
seu comportamento em relação ao valor dos danos causados pela inundação. A simulação foi
feita considerando o impacto de diferentes profundidades de escoamento sobre o conteúdo do
domicílio e, com a finalidade de retirar da análise a influência da qualidade e do preço dos
bens, definiram-se, para todos os domicílios, ativos de qualidade e preço médios (Figura
8.29).

20000
Danos ao conteúdo (em reais de 2000)

18000
16000
14000
12000
10000
8000
6000
4000
2000
0
40 a 60

60 a 80

80 a 100

100 a 120

120 a 140

140 a 160

180 a 220

220 a 260

acima de 260
Abaixo de 40

160 a 180
Área construída do imóvel (em m2)

Figura 8.29 – Valor médio dos danos ao conteúdo segundo a área construída do
domicílio (em reais de 2000)

A exemplo do IEM1, foi feita a padronização com base na classe de área construída de 220 a
260m2, dando origem ao índice de exposição do conteúdo do domicílio à inundação IEM2.

Síntese do IEM2

Em síntese,

 Se domicílio não está no primeiro pavimento: IEM2 = 0;

 Se estiver no primeiro pavimento, utiliza-se o IEM2 apresentado na Figura 8.30 que


varia segundo a área construída do imóvel:

262
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
1,20
1,00 1,00
1,00
0,83 0,88
0,80 0,74
0,66
0,57
IEM2 0,60 0,49
0,39
0,40 0,29
0,15
0,20

0,00

40 a 60

60 a 80

80 a 100

100 a 120

120 a 140

140 a 160

180 a 220

220 a 260

acima de 260
Abaixo de 40

160 a 180
Área construída do imóvel (em m2)

Figura 8.30 – Índice de exposição do conteúdo à inundação (IEM2) relacionado à


área construída do domicílio

iii Índice de exposição humana à inundação – IEH


O indicador de exposição humana discute o componente de maior valor (ou de valoração
intangível) do domicílio: seus membros constituintes.

Segundo Jonkman et al. (2008), o número de pessoas expostas à inundação é normalmente


estimado pela quantidade de pessoas existentes na área atingida após a evacuação, com a
exclusão daquelas protegidas em abrigos. Esta seria, portanto, uma estimativa de exposição
“real” ao evento. Nesta pesquisa trabalha-se com a exposição potencial e, de forma específica,
do domicílio.

A exposição humana à inundação é aqui definida pelo número de moradores do domicílio.


Não são consideradas na análise pessoas que habitam fora da região de risco. Além disso, não
foi avaliado se os moradores encontravam-se na região no momento da inundação ou não,
pois mesmo se estivessem fora da área exposta, eles, no retorno à residência, sofreriam, pelo
menos em parte, os impactos decorrentes dos transtornos e das perdas materiais causadas pelo
evento. Como não há estudos que mostrem funções que relacionem o número de pessoas
expostas e a ocorrência de danos sobre elas (Zonensein, 2007), considera-se que esta relação é
linear: quanto maior o número de pessoas no domicílio, maior a probabilidade de que alguém
sofra um dano.

O índice assume o valor zero quando não há exposição do domicílio à inundação. Se há


exposição, o valor mínimo do índice é 0,16. Ele ocorre quando o domicílio é formado por um
263
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
morador. Com a análise das informações dos domicílios particulares permanentes presentes
nos microdados da amostra do Censo de 2000 (cerca de 63.000 domicílios) observou-se que,
em Belo Horizonte, os domicílios com uma pessoa representavam 10,5% do total, logo, o
menor índice de exposição é verificável e possivelmente ocorre com relativa freqüência em
todas as grandes cidades.

Como limite superior, tendo como referência os mesmos microdados do IBGE, utiliza-se o
número de moradores presente no percentil 0,9: seis habitantes por domicílio. Desta forma,
evita-se a utilização de um valor extremo, pouco observável empiricamente. Verificou-se que
Belo Horizonte possuía, no ano 2000, 94% dos domicílios com até seis moradores, sendo que
a média é de 3,6 moradores e a moda de quatro moradores. A Figura 8.31 apresenta a
distribuição de moradores por domicílio em Belo Horizonte no ano 2000.

Figura 8.31 – Freqüência de moradores por domicílio em Belo Horizonte no ano


2000.
Fonte: Microdados da amostra do censo demográfico de 2000 (IBGE, 2000)

Síntese do IEH

O IEH segue os critérios:

 Se o domicílio não é atingido pela inundação, o IEH = 0;

264
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
 Se o domicílio é atingido pela inundação, o IEH assume os valores apresentados Figura
8.32, que variam segundo o número de moradores do domicílio:

1,20 1,00 1,00


1,00 0,83
0,80 0,67
0,50
IEH 0,60
0,33
0,40 0,17 IEH=0,1667x
0,20 0,00
0,00
0 2 4 6 8

Moradores por domicílio

Figura 8.32 – Índice de exposição humana à inundação (IEH) relacionado ao número


de moradores do domicílio

iv Índice de exposição do domicílio à inundação – IED


O último índice de exposição considera a exposição do domicílio como um todo à inundação.
Como será mencionado posteriormente, este índice é importante principalmente na análise da
vulnerabilidade da família, que tem como unidade de análise a família e não seus
componentes individuais.

Definiram-se três escalas de exposição segundo a localização horizontal e vertical do


domicílio: a edificação onde o domicílio se situa não está localizada na área atingida; a
edificação está localizada na área atingida, mas o domicílio não se encontra no primeiro
pavimento e, como situação de exposição máxima, a edificação está exposta e o domicílio
localiza-se no primeiro pavimento. Para cada um destes critérios definiu-se sua importância
relativa e, em seguida, foi efetuada a padronização (Tabela 8.31).

Tabela 8.31 – Nível de exposição do domicílio e definição do IED

Importância
Exposição do domicílio Importância
relativa (IED)
Edificação não está exposta
0 (nula) 0,00
Nenhuma importância para o critério
Edificação está exposta, mas domicílio não se encontra
5 (forte) 0,56
no primeiro pavimento
Edificação está exposta e o domicílio se encontra no
9 (absoluta) 1,00
primeiro pavimento

O IED assume três escalas discretas: 0,00; 0,56 e 1,00.

265
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Síntese do IED

Em síntese, o IED segue os seguintes critérios:

 Se a edificação não é atingida, IED = 0;

 Se a edificação é atingida, mas o domicílio não está no primeiro pavimento, IED =


0,56.

 Se a edificação é atingida e o domicílio encontra-se no primeiro pavimento, IED =


1,00.

Os índices seguintes procuram captar os fatores que potencialmente intensificam os danos


diretos e indiretos da inundação.

8.9.2.3 Indicadores de vulnerabilidade material, humana e de acesso do domicílio - IV


Além da existência da ameaça e da necessidade da exposição para que ocorram os danos, o
terceiro fator fundamental é a vulnerabilidade da população ou a suscetibilidade dos bens
materiais aos fatores físicos de impacto do evento. A vulnerabilidade e a susceptibilidade
funcionam como elementos de fragilidade do sistema que permitem a ocorrência dos efeitos
adversos das ameaças aos componentes expostos. Quanto maior esta “fragilidade”, maiores os
danos.

Observa-se que, se ocorrem danos de inundação é porque, em alguma medida, o sistema é


vulnerável. Seis indicadores são discutidos nesta seção: dois referentes ao valor da
susceptibilidade material, dois de vulnerabilidade humana e dois de vulnerabilidade no acesso
a bens, serviços e à renda.

i Índice relacionado ao valor da suscetibilidade da construção à inundação – IVM1


A qualidade da construção interfere nos danos, pois ela é considerada o principal indicador da
suscetibilidade diferenciada das edificações ao contato com a água. Ou seja, além da
exposição, cada construção possui características intrínsecas que definem a maior ou menor
magnitude das patologias.

Para se mensurar a importância da qualidade da construção sobre o valor dos danos, foram
feitas simulações no protótipo com o uso das funções de danos unitários à construção para
266
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
cada classe socioeconômica e diferentes profundidades de inundação (Figura 8.33). Como
nos indicadores anteriores relacionados à construção, os danos foram definidos a partir das
curvas DPS propostas em Machado (2005). A utilização dos danos unitários permite excluir
da análise o efeito da área construída na magnitude dos danos. As profundidades apresentadas
na Figura 8.33 referem-se ao ponto médio de classes de profundidade escolhidas.

50,00
45,00
40,00
Dano / m 2 de área contruída

35,00
30,00 A
25,00 B
20,00 C
15,00 D
10,00 E
5,00
0,00
0,38 0,63 0,88 1,13 1,38 1,63 1,88 2,13 2,38 2,63

Profundidade (em m)

Figura 8.33 – Valor dos danos à construção por metro quadrado de área construída
segundo as classes socioeconômicas e profundidade da inundação (em reais de
2000)

A Figura 8.33 mostra que, para todas as profundidades de inundação, o maior valor de danos
por unidade de área construída do imóvel é observado na classe A. Ela apresenta uma curva
que se destaca cada vez mais das demais com o aumento da profundidade. Depreende-se que,
embora a qualidade da construção na classe A seja elevada, o que, teoricamente, representa
maior resistência ao impacto, os itens construtivos, por possuírem valores de mercado
também mais elevados, possuem danos com valores de reparação mais altos. Além disso, a
construção pode apresentar componentes de acabamento que não são usuais nas classes B, C,
D ou E.

O procedimento seguinte foi a obtenção da média, para cada classe socioeconômica, dos
danos unitários à construção. Estes foram, então, padronizados para a base 1 considerando a
variação de seu valor em relação ao maior valor encontrado (obtido na classe A). Chegou-se
ao indicador de valor da susceptibilidade da construção à inundação (IVM1) (Figura
8.34).

267
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
1,20
1,00
1,00
IVM1
0,80 0,70 0,72
0,66
0,61
0,60

0,40

0,20

0,00
A B C D E
Classe socioeconômica

Figura 8.34 – Índice relacionado ao valor da suscetibilidade da construção à inundação


(IVM1)

Como já observado na Figura 8.33, a Figura 8.34 mostra que a classe socioeconômica A
apresenta o indicador máximo de valor da suscetibilidade à construção, igual a 1. Os
domicílios da classe B, C, D e E apresentam, em média, respectivamente, 70%, 66%, 61% e
66% do valor dos danos unitários obtidos pelas edificações da classe A. Observa-se que a
classe E possui o segundo valor mais elevado em conseqüência do menor padrão de qualidade
da construção.

Síntese do IVM1

 Observa-se a classe socioeconômica a qual pertence o domicílio e utiliza-se o índice


proposto na Figura 8.34 acima.

ii Índice relacionado ao valor da suscetibilidade dos bens à inundação – IVM2


A suscetibilidade dos bens ao contato com a água está ligada ao tipo de bem e à sua
qualidade.

Na análise dos microdados censitários (IBGE, 2000), não foi possível verificar uma variável
fortemente relacionada à posse de um tipo de bem específico, o que parece indicar a
influência de vários aspectos no perfil de bens de um domicílio, como estilo de vida, ciclo de
vida da família, número de adultos e de crianças.

Entretanto, ante a análise da literatura, as hipóteses deste estudo consideram que a classe
socioeconômica, que representa fortemente o poder aquisitivo do domicílio, tem importância
central no perfil de bens adquirido. E, ainda que a área construída, utilizada como indicador
de exposição da construção e dos bens à ameaça, e a classe socioeconômica apresentem alta
correlação, o que poderia tornar redundante o uso desta última variável, optou-se por
268
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
incorporá-la na pesquisa exatamente para reforçar o componente econômico que existe na
definição das preferências.

A Figura 8.35 mostra o valor médio dos danos ao conteúdo por unidade de área construída,
segundo as classes socioeconômicas, obtido nas simulações do protótipo. Observe que a
classe A1 possui menor valor de danos do que a classe A2 e as classes B, comportamento que
pode ser explicado pela maior área construída média dos domicílios desta classe (os bens se
encontram mais espalhados no domicílio). Supõe-se, portanto, que, embora quanto maior a
área, maior a tendência a possuir bens, esta relação não é linear e tende-se a se tornar menos
elástica a partir de certo tamanho do cômodo. Na Figura 8.36, que mostra as informações de
danos ao conteúdo, total e por m2 de área, padronizadas para a base 1, observa-se de forma
mais clara estas observações.

140
Danos ao conteúdo por m2 de área
construída (em reais de 2000)

120

100

80

60

40

20

0
A1 A2 B1 B2 C D E
Classe socioeconômica do domicílio

Figura 8.35 – Valor dos danos ao conteúdo por m2 de área construída segundo as
classes socioeconômicas e profundidade da inundação (em reais de 2000)

269
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
1,20

Índice de danos ao conteúdo (em


1,00

0,80

reais de 2000)
0,60

0,40

0,20

0,00
Danos/m2
A1 A2 B1 B2 C D E
Classe socioeconômica do domicílio Danos totais

Figura 8.36 – Valor dos danos ao conteúdo total e por unidade de área construída
segundo as classes socioeconômicas padronizados com base 1

A Figura 8.36 mostra que, se considerado os danos totais, os domicílios da classe A1


apresentam, em média, o maior valor de danos ao conteúdo. Entretanto, em termos de unidade
de área, as classes B sofrem o maior prejuízo. Os índices apresentados para o valor dos danos
por unidade de área representam o indicador de valor da suscetibilidade do conteúdo do
domicílio à inundação – IVM2.

Síntese do IVM2

Em síntese,

 O IVM2, que varia segundo a classe socioeconômica do domicílio, é mostrado na


Figura 8.37:

1,20
IVM2 0,97 1,00
1,00 0,93

0,80 0,72
0,58
0,60
0,40 0,34
0,26
0,20
0,00
A1 A2 B1 B2 C D E
Classe socioeconômica do domicílio

Figura 8.37 – Índice relacionado ao valor da suscetibilidade do conteúdo do domicílio


à inundação (IVM2)
270
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
iii Índice de vulnerabilidade relacionado às características dos moradores - IVH1
Os dois próximos indicadores relacionam-se especificamente à vulnerabilidade dos indivíduos
à ocorrência de danos sobre eles. Inclui a possibilidade de mortalidade, o desenvolvimento de
doenças e a maior probabilidade de desamparo imediatamente após a do evento.

Eles se diferem dos indicadores de suscetibilidade, de base material, por se basearem


principalmente em pressupostos teóricos ou de evidências de outras áreas do conhecimento
científico para a definição dos critérios, atributos e parâmetros de análise. Não se observaram,
por exemplo, pesquisas empíricas consolidadas que possam indicar uma correlação entre
fatalidades e o número de idosos ou crianças atingidas. Mas, pela observação médica e
biológica, sabe-se que estes indivíduos possuem maior dificuldade de locomoção e menor
resistência a determinadas doenças, logo, eles tenderão a ser mais vulneráveis ao impacto das
águas da inundação.

Nesta seção discute-se um indicador de vulnerabilidade humana relacionado às características


dos moradores - IVH1. A criação deste indicador não é simples, pois ao que parece, existe um
forte componente de aleatoriedade ligado à ocorrência dos danos diretos às pessoas, pois eles
dependem, em elevado grau, do tipo de atividade que os agentes estavam desenvolvendo no
local do evento e de onde eles se encontravam (discussão apresentada no item 4.4.3).

Neste sentido, observaram-se na literatura três grupos dominantes de fatores que interferem na
vulnerabilidade dos indivíduos no momento do impacto (Jonkman & Kelman, 2005): 1)
fatores comportamentais; 2) aspectos associados à atividade desenvolvida pelo agente ou ao
local onde ele se encontrava no momento da cheia e 3) atributos físicos do morador
considerados, como idade e condição física. O IVH1 relaciona-se ao terceiro grupo, uma vez
que os dois anteriores possuem um padrão probabilístico ligado a comportamentos individuais
de difícil mensuração.

Dentro desta perspectiva, definiram-se quatro critérios como centrais na vulnerabilidade do


indivíduo: 1) grau de mobilidade; 2) propensão ao desenvolvimento de doenças; 3) percepção
do risco e 4) nível de dependência em relação aos outros membros do domicílio (Jonkman &
Kelman, 2005). Estas características se refletem na capacidade de reação ao evento e de
recuperação após a sua ocorrência. A partir dos quatro critérios, foram escolhidos onze
atributos relacionados a eles. Limitou-se a escolha às variáveis caracterizadas nos dados
censitários (microdados). A Figura 8.38 apresenta o arcabouço para análise da vulnerabilidade
humana do domicílio.

271
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Vulnerabilidade humana dos moradores
do domicílio

Percepção Propensão ao
Mobilidade Dependência desenvolvimento
do risco
de doenças

4 atributos ligados à idade


6 atributos ligados à capacidade física
1 atributo ligado à capacidade mental

Figura 8.38 – Critérios e grupos de atributos relacionados ao indicador de


vulnerabilidade humana do domicílio
Desta forma, o indicador é definido segundo a Equação 8.18:

8.18

Sendo:
= índice de vulnerabilidade dos moradores domicílio j associado às suas
características;
vi,j = número total de atributos de vulnerabilidade i encontrados no domicílio j, sendo que i
varia de 1 a 11, segundo a Tabela 8.32;
wi = peso do atributo, apresentado na segunda coluna da Tabela 8.32;

Tabela 8.32 - Tipos de vulnerabilidade física dos moradores e importância relativa na


vulnerabilidade à inundação
Atributos de vulnerabilidade Peso
1 Idade ≤ 4 anos 0,15
2 Idade > 4 e ≤ 12 anos 0,11
3 Idade ≥ 65 anos e < 85 anos 0,08
4 Idade ≥ 85 anos 0,13
5 Incapacidade de enxergar 0,10
6 Capacidade parcial de enxergar 0,07
7 Incapacidade de escutar 0,04
8 Capacidade parcial de escutar 0,03
9 Incapacidade de andar 0,13
10 Capacidade parcial de andar 0,10
11 Deformação mental 0,07
Total 1,00

Observe na Equação 8.18 que não é feito referência ao número total de moradores do
domicílio em relação àqueles que possuem atributos de vulnerabilidade. Esta relação de

272
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
dependência que tende a existir entre os membros é captada pelo indicador tratado na seção
seguinte, iv, que discute a tipologia de família.

Uma questão a ressaltar é que o indicador refere-se ao número de características de


vulnerabilidade presentes em um domicílio. Se, por exemplo, em um domicílio uma mesma
pessoa possui dois atributos de vulnerabilidade, considera-se a quantidade dois e não um.

Os dados do protótipo, que representam uma amostra de 14.314 domicílios, indicam que
apenas cerca de 30% deles não apresentam pelo menos um dos atributos de vulnerabilidade
mencionados. Portanto, há uma grande probabilidade de que um domicílio possua um “fator”
intensificador de sua vulnerabilidade humana (70%).

Ponderação dos atributos e critérios

Em relação aos pesos apresentados na Tabela 8.32 são necessárias algumas considerações.
Utilizou-se um critério misto. Como todos os atributos estão presentes nos quatro critérios de
avaliação, foi analisada a importância de cada um deles em relação aos outros atributos e para
cada um dos critérios. O método, de avaliação direta cardinal, pode ser definido como de
avaliação direta por relações, segundo Pomerol & Barba-Romero (1993). Utilizou-se uma
escala de um a nove para indicar a importância de cada atributo (padronizados em base 1 na
Tabela 8.23). Em seguida, definiu-se, pelo Processo Analítico Hierárquico - PAH, o peso de
cada critério. Para padronização dos atributos e critérios, utilizou-se a divisão pela soma. As
Tabela 8.33 e Tabela 8.34 mostram os pesos encontrados depois de padronizados.

Tabela 8.33 – Atributos de vulnerabilidade e pesos em relação aos critérios


Locomoção Dependência Percepção Propensão a doenças
≤ 4 anos 0,15 0,12 0,19 0,19
> 4 anos e ≤12 anos 0,09 0,11 0,15 0,11
≥ 65 anos e < 85 anos 0,09 0,05 0,02 0,15
≥ 85 anos 0,13 0,11 0,10 0,19
Incapacidade de enxergar 0,09 0,11 0,15 0,02
Cap. parcial de enxergar 0,07 0,07 0,10 0,02
Incapacidade de escutar 0,02 0,07 0,08 0,02
Cap. parcial de escutar 0,02 0,05 0,06 0,02
Incapacidade de andar 0,17 0,11 0,02 0,11
Cap. parcial de andar 0,13 0,08 0,02 0,06
Deformação mental 0,04 0,11 0,10 0,11
Total 1,00 1,00 1,00 1,00

273
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.34 – Matriz normalizada de comparação dos critérios de segundo nível
Peso (média
Locomo- Propensão a
Dependência Percepção dos valores na
ção doenças
linha)
Locomoção 0,58 0,60 0,50 0,47 0,54
Dependência 0,19 0,20 0,20 0,35 0,24
Percepção 0,12 0,10 0,10 0,06 0,09
Propensão a doenças 0,12 0,10 0,20 0,12 0,13

Portanto, o peso final de cada atributo é estimado segundo uma ponderação dupla: multiplica-
se o valor do peso individual (Tabela 8.33) pelo peso do respectivo critério (Tabela 8.34).
Observe que a ponderação segue hipótese amplamente observada na literatura de que os
idosos e as crianças são os mais vulneráveis no momento de ocorrência da inundação. Os
idosos tendem a possui menor capacidade de mobilidade e percepção do perigo. As crianças
de três a sete anos possuem relativa mobilidade, mas pouca autonomia e não percebem
claramente o risco; quando possuem menos de três anos, elas são muito pouco autônomas e
perceptivas em relação ao risco e possuem mobilidade muito baixa.

Uma das vantagens do PAH é a de possibilitar avaliar o grau de consistência das respostas,
por meio do indicador GC (parâmetro quantitativo que mede a coerência lógica sobre o
julgamento). O valor de GC menor ou igual a 10% indica avaliação suficientemente
consistente. Neste estudo, encontrou-se um grau de consistência das respostas de 0,0668.

Considera-se que o limite do IVH1 é 1, logo valores superiores a 1, caem neste limite. Desta
forma ele já apresenta padronização de 0 a 1, não necessitando de padronização posterior.

Síntese do IVH1

Calcula-se o indicador como mostrado na Equação 8.18 e

 se = 0 → IVH1, j = 0;

 se ≤ 1,00 → IVH1, j= ;

 se > 1→ IVH1, j =1.

iv Índice de vulnerabilidade relacionado à tipologia de família - IVH2


Considera-se que há uma relação entre a tipologia da família e a vulnerabilidade à pobreza.
Segundo Golgher (2004), estudos mostram que alguns arranjos familiares, como

274
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
monoparentais e domicílios com muitas crianças, são mais vulneráveis à pobreza. Por outro
lado, famílias sem filhos tendem a apresentar melhor posição social.

A tipologia de família também pode interferir na vulnerabilidade à inundação. E não apenas


pela relação que haveria entre tipologia, pobreza e, conseqüentemente, impacto do evento. As
relações familiares envolvem relações de dependência e ajuda mútua que interferem na
vulnerabilidade antes, durante e após a inundação. Segundo recomendações do
GUIDELINES... (2004), as avaliações de impacto de desastres devem ser feitas considerando
a família como unidade, e seus membros como indivíduos.

Se a família pode ter reflexo na vulnerabilidade, ela também atua na resiliência ao impacto
(GUIDELINES..., 2004). Como descrito em Montali (2000), a família usualmente acaba por
atuar como um “amortecedor” de crise e muitas vezes se vê obrigada a desempenhar o papel,
embora imperfeitamente, de atenuar a carência de políticas sociais por parte do Estado e
acolher os desempregados mais ou menos invisíveis socialmente. No caso de uma inundação,
a atuação da família como “amortecedora” de impacto é claramente observada: muitas vezes,
mesmo os parentes mais distantes prestam assistência às vítimas, acomodando-as ou doando
alimentos e roupas. Em decorrência dos indivíduos usualmente se agruparem em famílias e
pelas particularidades que as evolvem, decidiu-se incorporar a família na análise do risco de
inundação.

Desta forma, um agente que tenha teoricamente uma alta vulnerabilidade pode, em
decorrência dos elos familiares, aumentar a sua capacidade de resiliência ao desastre. A
percepção do risco, a escolha de estratégias de sobrevivência e a mobilidade são atributos
individuais, mas também do pequeno grupo de pessoas que se apóiam e se interagem durante
um desastre. O indicador em foco difere do IVH1 por analisar a vulnerabilidade da família
como um todo e não de seus membros individualmente.

Foram examinados quatro critérios para definição da vulnerabilidade à inundação associada à


tipologia de família: 1) dependência; 2) ajudas recíprocas; 3) existência de característica de
vulnerabilidade no responsável pelo domicílio e 4) acesso desigual às oportunidades de renda
(Figura 8.39).

275
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Vulnerabilidade humana da família

Responsável com Acesso desigual


Relações de Relações de
característica de às oportunidades
dependência ajuda recíproca
vulnerabilidade de renda

Onze tipologias de família

Figura 8.39 – Critérios e grupos de atributos relacionados ao indicador de vulnerabilidade


humana da família

As relações de dependência referem-se, normalmente, à existência de crianças ou idosos na


família que tendem, pelos motivos discutidos no item anterior iii, a exigirem cuidado e
atenção dos outros membros em todas as fases do desastre. Associado ao aspecto de
dependência está o ciclo de vida da família, já que existe uma relação entre idade dos pais,
idade dos filhos e coabitação.

O segundo critério pressupõe que os membros da família diminuem a sua vulnerabilidade


ajudando-se e apoiando-se. Na estratégia de sobrevivência, a troca de idéias entre os membros
auxilia na tomada de decisões. Como destacado por Green (2004), uma das formas de se
diminuir a vulnerabilidade de um “sistema” é torná-lo maior, criando redes de solidariedade
cada vez mais amplas. No domicílio, as relações de solidariedade entre seus membros é um
atributo de resiliência. Da família saem conexões com redes sociais locais que se conectam a
outras redes e assim por diante.

O terceiro critério tem como pressuposto de que a vulnerabilidade da família possui um


componente relacionado à vulnerabilidade do seu principal provedor de bens e renda (o
“responsável” pelo domicílio ou “pessoa de referência”, segundo terminologias utilizadas pelo
IBGE).

Finalmente, o quarto critério, o acesso desigual às oportunidades de renda, trata da possível


existência de vulnerabilidade anterior ao evento e que esta tenderia a se intensificar após sua
ocorrência. A escolha deste critério insere-se no método analítico presente em Wisner et al.
(2004), e discutido na seção 4.3, que compreende a vulnerabilidade em termos de acesso.

276
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Se os três primeiros critérios podem ser considerados de percepção mais direta, o quarto
necessita de informações adicionais. Ele tem como parâmetros de análise estudos que
discutem os arranjos famílias e sua vulnerabilidade social ou, ao contrário, sua resiliência à
pobreza (Golgher, 2004; Montali, 2000). Estes estudos indicam que as famílias
monoparentais, especialmente aquelas chefiadas por mulher, tendem a possuir menor renda
per capita do que as famílias nucleares ou conjugais.

O fenômeno do crescimento das famílias monoparentais está relacionado às mudanças nas


relações de gênero na sociedade, no sentido de maior igualitarismo entre homens e mulheres,
mas também na impossibilidade de manutenção do homem no papel tradicional de “chefe
provedor”. Pelas condições econômicas atuais, a provisão dos meios de sustento da família
cada vez mais é compartilhada entre o homem, a mulher cônjuge e os outros componentes da
família.66

Se, por um lado, esta inserção feminina no mercado de trabalho diminui os laços de
dependência e permite que a mulher tenha acesso à renda e à possibilidade de chefiar a
família após o divórcio, abandono ou morte do cônjuge, ela ainda tende a ser desigual, com as
atividades da mulher circunscritas a determinadas tarefas e setores (Bruschini, 1994 apud
Montali, 2000). Estudo da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Fundação Seade)
atesta que as famílias chefiadas por mulheres apresem nível acentuado de pobreza
(FUNDAÇÃO..., 1993). Como ilustração, é mostrada a diferença entre a média e a mediana
da renda domiciliar per capita dos domicílios chefiados por mulheres e homens dos
microdados censitários de Belo Horizonte para o ano 2000 (IBGE, 2000) (Tabela 8.35).
Foram analisados 63.280 domicílios.

Como informação completar, mostra-se ainda a mediana da renda domiciliar total e per
capita, segundo a tipologia de família, encontrada nos domicílios do protótipo (Tabela 8.36).

Tabela 8.35 – Média e mediana do rendimento domiciliar per capita, segundo sexo do
responsável pelo domicílio - Belo Horizonte, 2000
(em reais de 2000)
Responsável pelo domicílio
Homem Mulher
Rendimento Média 706,50 608,08
domiciliar per capita Mediana 300,49 268,46
Fonte de dados: IBGE (2000).

66
Mas, especialmente em famílias de baixa renda, esta ruptura do padrão cultural estabelecido ainda não é
inócua e ela pode significar para a mulher-cônjuge a quebra da reciprocidade da divisão sexual do trabalho
esperada e, para o homem, a incapacidade de cumprir seu papel, levando-o ao alcoolismo ou ao abandono da
família (Montali, 2000).
277
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.36 –Mediana do rendimento domiciliar total e per capita médio, segundo tipologia
de família - Protótipo, 2000
(em reais de 2000)
Valor
(em reais de 2000)
Tipologia de família
Renda Renda per
domiciliar capita
1 Casal sem filhos com responsável até 64 anos 1022,27 499,81
2 Casal sem filhos com responsável com 65 anos ou mais 1056,25 485,09
3 Casal com filhos menores 816,15 199,82
4 Casal com responsável até 64 anos e com todos os filhos maiores 1746,31 390,11
5 Casal com responsável com 65 anos ou mais com todos os filhos maiores 1704,04 384,6
6 Mulher até 64 anos só 599,47 599,47
7 Mulher com filhos 742,92 207,62
8 Mulher e outros 1060,02 410,22
9 Homem até 64 anos só 700,64 700,64
10 Homem e outros 972,44 375,24
11 Idoso/idosa só 380,52 380,52
12 Homem com filhos 995,09 303,43
Ordem
Tipologia de família Renda Renda per
domiciliar capita
1 Casal sem filhos com responsável até 64 anos 8 10
2 Casal sem filhos com responsável com 65 anos ou mais 9 9
3 Casal com filhos menores 5 1
4 Casal com responsável até 64 anos e com todos os filhos maiores 12 7
5 Casal com responsável com 65 anos ou mais com todos os filhos maiores 11 6
6 Mulher até 64 anos só 2 11
7 Mulher com filhos 4 2
8 Mulher e outros 10 8
9 Homem até 64 anos só 3 12
10 Homem e outros 6 4
11 Idoso/idosa só 1 5
12 Homem com filhos 7 3
Fonte de dado do protótipo: IBGE (2000).

Embora as informações da Tabela 8.36 sejam apenas exploratórias, elas podem indicar
algumas tendências observadas também na literatura sobre o tema. O ranking apresentado na
parte inferior mostra que há diferenças significativas na análise caso se utilize a renda
domiciliar total ou a renda per capita. Considerando a renda per capita, observa-se que as
tipologias 3, 7 e 12 são aquelas que apresentam o menor valor da mediana. Os motivos podem
estar associados ao elevado número de dependentes em relação ao de provedores de renda no
domicílio e, como já mencionado, ao maior nível de pobreza encontrado nas famílias
monoparentais, especialmente aquelas chefiadas por mulheres (tipologias 7 e 12). Por outro
lado, os arranjos familiares de renda per capita mais elevada são aqueles em que o agente
mora só e encontra-se na faixa de etária de maior atividade econômica. Observe, em
comparação com os outros indivíduos que moram sozinhos, os baixos proventos da população
idosa.

278
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Ressalta-se que há estudo executado pelo Cedeplar, disponível na Internet, onde se encontra a
distribuição das tipologias de família em todas as unidades de planejamento de Belo
Horizonte e nos municípios que compõem o colar metropolitano de Belo Horizonte e a
Região Metropolitana de Belo Horizonte (Golgher, 2004). Desta forma, é possível utilizar
estas informações caso se deseje mapear uma comunidade atingida por inundação segundo a
tipologia de família. Além disso, os microdados censitários, disponíveis para todos os
municípios do Brasil, embora não mostrem diretamente a tipologia da família do domicílio,
possuem as variáveis necessárias para que a mesma seja definida.

Ponderação dos atributos e critérios


Definidos os critérios de análise, buscou-se verificar a importância relativa das tipologias de
família em relação a cada um deles, em particular, e em relação à vulnerabilidade à inundação
como um todo. A primeira opção de análise foi utilizar a mesma estrutura analítica em torno
de atributos e critérios mostrada no item iii: verifica-se a importância de cada atributo em
relação ao critério e de cada critério entre si por meio do PAH. Mas, observaram-se
dificuldades para análise objetiva de cada tipologia em relação a cada critério isoladamente e
mesmo entre eles.

Foi então tentado um método de ponderação mais direto, onde o grau de importância de cada
atributo é medido em uma escala cardinal de zero a nove, segundo definições contidas na
Tabela 8.23, considerando os quatro critérios conjuntamente. Avaliaram-se os resultados
encontrados como mais satisfatórios teoricamente ante a percepção da literatura sobre o tema.
Os dados foram padronizados tendo como base o maior valor da escala, nove. A Tabela 8.37
mostra os resultados encontrados, além da informação sobre a distribuição das tipologias de
família no protótipo.

Tabela 8.37 – Tipologias de família, sua importância relativa em relação à vulnerabilidade à


inundação (IVH1) e distribuição no protótipo
Tipolo- % de
Característica IVH1
gia domicílios
1 Casal sem filhos com responsável até 64 anos 0,00 8,38
2 Casal sem filhos com responsável com 65 anos ou mais 0,78 2,14
3 Casal com filhos menores do que 13 anos 0,56 34,43
4 Casal com responsável até 64 anos e com todos os filhos maiores 0,22 14,59
5 Casal com responsável com 65 anos ou mais com todos os filhos maiores 0,56 3,56
6 Mulher até 64 anos só 0,56 4,18
7 Mulher com filhos 0,67 18,16
8 Mulher e outros 0,44 3,72
9 Homem até 64 anos só 0,44 4,16
10 Homem e outros 0,33 2,41
11 Idoso/idosa só 1,00 2,45
12 Homem com filhos 0,56 1,82

279
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Síntese do IVH2

Em síntese, o IVH2 assume os valores apresentados na Tabela 8.37, segundo a tipologia da


família residente no domicílio.

v Índice de restrição ao acesso às unidades de consumo preferidas (IVA1)


Como esta pesquisa discute de forma central os danos indiretos da inundação, optou-se por
incorporar indicadores que refletissem o comportamento do consumidor em termos de acesso
a bens, serviços e à renda, estes pouco usuais na literatura. As possíveis restrições de acesso
causadas pela inundação acarretam diminuição no bem-estar e são impactos indiretos da
inundação.

Em última análise, o comportamento do agente é essencialmente de consumo: consumo de


bens (privados ou públicos, materiais ou não) ou consumo de sua força de trabalho (tempo e
energia) para adquirir renda. Neste item discute-se o impacto da inundação no acesso dos
agentes aos bens e consumos ofertados na economia; no item vi, discute-se o acesso à renda.

Considera-se que os locais de consumo preferidos pelo agente são aqueles escolhidos no
período anterior ao da inundação, o da “normalidade cotidiana”. A impossibilidade de acesso
a estes locais por um evento, levando à escolha de pontos de consumo alternativos ou ao
retardamento da demanda, implica em perda de bem-estar.

Cada agente possui uma cesta de consumo preferida. As preferências são definidas em termos
de tipo de bem, quantidade, preço e qualidade. Na busca da satisfação de suas necessidades,
os agentes escolhem seus pontos de consumo: padarias, açougues, supermercados, lojas de
eletrodomésticos, etc. Cada domicílio está conectado a pontos de consumo em função das
escolhas de seus membros. Há, portanto, uma matriz de informação que relaciona, para cada
domicílio, um vetor de localidades (Equação 8.19):

Domicílio j: {padaria a; açougue b; restaurante c; universidade d ...} 8.19

O indicador bruto de restrição no acesso é medido segundo a Equação 8.20:

8.20

Sendo que:

IVA1bruto = Índice de restrição ao acesso às unidades de consumo do domicílio;


280
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Ainf = número de locais atingidos que representam “usuais” pontos de consumo para o
domicílio, sendo que eles variam de 1 a 59;
wf = peso para cada ponto de consumo, segundo o tipo de bens ou serviços ofertados às
famílias (Tabela 8.38) .

O IVA1bruto varia entre zero e um. Quando IVA1 assume o valor de um, significa que todas as
unidades de consumo preferidas no domicílio foram atingidas pelas águas da inundação; o
valor zero representa o oposto, que nenhuma delas foi diretamente impactada. O menor valor
possível para IVA1, excluindo o valor nulo, ocorre quando apenas uma unidade de consumo é
atingida e esta possui o menor peso relativo (0,002).

Ao se definir um peso wf para cada tipo de atividade, adota-se a hipótese de que o reflexo no
bem-estar do consumidor é diferente segundo o tipo de bem ofertado pela unidade atingida:

 se de consumo essencial ou não,

 se há fontes alternativas para sua provisão ou

 se ele é significativamente diferenciado (ou seja, se ele pode ser facilmente


substituível ou não).

A Tabela 8.38 apresenta o peso dos três critérios, os quais são utilizados para definição da
ponderação final do gasto. A essencialidade ou importância do bem para o bem-estar do
consumidor é medido em três níveis: essencial (3), necessário (2) e luxo (1). Consideram-se
quatro padrões de distribuição de oferta: contígua (1), discreta (2), muito discreta (3) e em
rede (4). Em relação ao nível de substituibilidade do bem, foi feita uma discretização fina, em
uma escala de nove níveis. Para isto utilizou-se uma avaliação direta por referência.

A ponderação final sobre o tipo de gasto (ou bem) foi feita avaliando-se os três critérios
conjuntamente, mas considerando uma maior importância relativa da substituibilidade em
relação aos outros critérios. Devido às várias nuances existentes entre as tipologias de
despesa, verificou-se a impossibilidade de definí-las em uma escala de zero a nove, como foi
feito nos indicadores anteriores, e optou-se por considerar o valor máximo igual quatorze,
segundo a percepção obtida nas análises de importância relativa. O peso bruto individual w
foi padronizado tendo como base a somatória dos pesos, originando os pesos relativos
mostrados na Tabela 8.39.

281
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.38 - Tipologias de despesas e ponderação, segundo as características de
demanda e oferta do bem consumido

Nível de
Tipologia Importân- Peso bruto
substitui - Oferta Exemplo de bens
(f) cia (w)
bilidade
G3.1.1 1 1 1 1 Periódicos, livros e revistas não didáticos
G3.1.2 1 1 1 1 Fumo
G2.1.3 1 2 1 2 Gasolina e Álcool - veículo próprio
G1.1.3 1 3 1 3 Remédios
G2.2.3 1 2 2 3 Artigos de limpeza
G1.1.1 2 3 1 4 Alimentação (dentro e fora do domicílio)
G2.1.4 2 2 1 4 Instr. e prod. de uso pessoal (e.g.: maquiagem)
G1.2.4 2 3 2 5 Material de tratamento (e.g.: seringa, termômetro)
G3.3.4 2 1 3 5 Aquisição de veículos
G3.2.4 4 1 2 6 Jóias e bijuterias
G2.2.4 3 2 2 7 Eletrodomésticos, som e TV
G3.R 3 1 4 8 Viagens (e.g.: avião, ônibus)
G3.1.3 5 1 1 9 Cabeleireiro e manicuro
G3.2.2 5 1 2 9 Diversões e esportes
G1.2.3 6 3 2 10 Aluguel
G2.3.4 6 2 3 10 Serviços profissionais (cartório, advog., cont.)
G2.3.1 7 2 3 11 Cursos médio, superior, etc.
G1.3.4 8 3 3 12 Serviços de cirurgia, hospitalização e consulta médica
G2.R 8 2 4 13 Serviços e taxas: Telefone fixo e celular
G1.R 9 3 4 14 Transporte urbano, energia, água, gás

Tabela 8.39 - Peso de cada tipologia de bens ou de gastos do domicílio


Tipologia (f) Peso bruto (w) Peso relativo (wf)
G3.1.1 1 0,007
G3.1.2 1 0,007
G2.1.3 2 0,015
G1.1.3 3 0,022
G2.2.3 3 0,022
G1.1.1 4 0,029
G2.1.4 4 0,029
G1.2.4 5 0,036
G3.3.4 5 0,036
G3.2.4 6 0,044
G2.2.4 7 0,051
G3.R 8 0,058
G3.1.3 9 0,066
G3.2.2 9 0,066
G1.2.3 10 0,073
G2.3.4 10 0,073
G2.3.1 11 0,080
G1.3.4 12 0,088
G2.R 13 0,095
G1.R 14 0,102

282
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
No protótipo não existem atividades classificadas como O11, O12, O15, O16, O17e O20 na
área diretamente impactada e érea de entorno (ou seja, firmas que ofertam bens classificados
como gastos G11, G12, G15, etc.). Considerando que em vários municípios as inundações
atingem apenas uma parcela da cidade, e que dificilmente todas as unidades de consumo do
domicílio são impactadas diretamente pela inundação, considera-se que o valor máximo do
IVDA1 ocorre quando o índice bruto apresentado na Equação 8.21 atinge o valor de 0,90.

A Figura 8.40 apresenta o IVA1 com padronização linear variando entre 0 e 1.

0,90; 1,00
1,00
0,90
0,80
0,70
0,60
IVDA1 0,50
0,40
0,30
0,20 IVAA1 = 1,1132 IVA1bruto
0,10
0,00
0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 1,00
IVDA1bruto

Figura 8.40 – Índice de restrição ao acesso às unidades de consumo preferidas (IVA1)

Por limitações computacionais, as 59 tipologias de consumo foram agrupadas em seis grandes


tipos nas simulações desta pesquisa, o que não invalida a análise, pois os grupos são formados
por gastos com características similares. Os pesos da Tabela 8.39 foram mantidos, agrupando-
os segundo os gastos presentes em cada tipologia. Optou-se por manter na metodologia a
desagregação em 59 gastos, por ser uma informação disponível no banco de dados e passível
de agrupamento segundo os objetivos do estudo e as limitações de ordem prática existentes.

Síntese do IVA1

Calcula-se o IVA1bruto segundo a Equação 8.20;

 Se IVA1bruto < 0,90, transforma-o segundo a Equação 8.22 :

8.22

 Se IVA1bruto ≥ 0,90, IVA1 = 1

283
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Ressalta-se que, em uma avaliação rápida dos danos feita por gestores ou planejadores
urbanos, dificilmente será possível definir as unidades de acesso atingidas de cada domicílio,
salvo por entrevistas diretas após o avento. Espera-se, entretanto, que os resultados desta
pesquisa permitam verificar tendências que relacionam comportamentos usuais dos agentes
com a possibilidade de restrições no acesso (e.g.: padrões de consumo segundo a distância,
consumo na vizinhança, etc.). Os critérios para definição destas conexões e sua possível
incorporação a outros estudos foram discutidos no item 8.2.3.2.

vi Índice de restrição ao acesso à renda - IVA2


O acesso à renda é mensurado pela existência de um trabalho remunerado e pela possibilidade
de deslocar-se para executá-lo, se necessário. O acesso pode ser prejudicado ou interrompido
principalmente por dois motivos: pela inundação da firma onde o agente trabalha ou pela
inundação do caminho para se chegar até ela. Neste item discute-se a restrição no acesso
apenas em decorrência da inundação do local de trabalho.

A Equação 8.23 apresenta a formulação do indicador bruto:

8.23

Em que:

Sendo wt ≤ 1 8.24

Onde:
Aint: quantidade de locais de trabalho inundados do agente t, sendo que t pode variar de 0 a n
segundo o número de trabalhadores ocupados no domicílio;
At: quantidade de locais de trabalho do agente t;
wt: peso relativo da renda auferida nos locais de trabalho do agente t para o domicílio;
WAt = rendimento auferindo pelo agente t nos locais de trabalho.

Observe na Equação 8.23 que se considera a existência de vários locais de acesso à renda no
domicílio. Ao contrário do modelo de um único chefe provedor, torna-se cada vez mais usual
a participação de mais de um integrante do domicílio na provisão de bens e serviços para o
domicílio (Montali, 2000). Os microdados censitários de 2000, por exemplo, mostram que,
em Belo Horizonte, a maior parte dos domicílios possui mais de uma pessoa trabalhando
(51,4%) (IBGE, 2000). Em Belo Horizonte, a média é de 1,7 trabalhadores ativos por
284
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
domicílio e a mediana de dois. Verificam-se casos extremos, embora raros, de oito a nove
trabalhadores (doze ocorrências). O protótipo segue o mesmo padrão de Belo Horizonte:
média de 1,7 trabalhadores ativos por domicílio, mediana de dois, e máximo de nove (uma
ocorrência).

O local de acesso à renda é ponderado segundo seu nível de relevância para a manutenção do
bem-estar do domicílio (wt na Equação 8.24), o qual é medido pelo valor do rendimento
usufruído no local em relação ao total recebido no domicílio (Equação 8.24).

A padronização do indicador apresentado na Equação 8.23 não é necessária, já que ele se


encontra variando linearmente entre zero a um: quanto maior a restrição à renda em relação à
renda domiciliar total, maior o indicador.

O índice assume o valor máximo quando todos os locais de trabalho dos moradores do
domicílio são inundados. Esta situação certamente será mais freqüente nos domicílios em que
há apenas um local de aquisição de renda associado. Neste caso, a vulnerabilidade se expressa
também pela dependência do domicílio em relação a uma única fonte de renda. O valor
mínimo, zero, indica que nenhum local de emprego dos agentes do domicílio foi atingido
pelas águas da inundação ou que não há trabalhadores ativos na residência.

Sabe-se que apenas em um cenário grave de inundação pode-se ter a efetiva perda de renda
pelo evento. Entretanto, o IVA2 indica se os trabalhadores possuem postos de trabalho em
firmas que apresentam risco, o que representaria uma vulnerabilidade adicional

Síntese do IVA2
Em síntese,

 IVA2 é calculado segundo a Equação 8.23, que considera se os locais de trabalho dos
moradores do domicílio foram atingidos ou não.

8.9.2.4 Indicadores de resiliência do domicílio - IR


Como discutido na seção 4.2, a resiliência pode ser considerada como a capacidade de um
sistema de se ajustar à ameaça e de mitigar ou evitar danos (Pelling, 2003). Ela atuaria em
sentido contrário ao da vulnerabilidade, diminuído o risco da inundação. Na metáfora
utilizada do indivíduo exposto ao vírus da gripe, a boa alimentação e os cuidados de higiene,
por exemplo, seriem fatores resilientes, diminuindo o risco de contágio pelo vírus ou de
tempo de recuperação das condições de saúde.

285
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Nesta seção são considerados dois fatores fundamentais na resiliência ao impacto: o acesso à
informação e o acesso à renda. O primeiro possibilita o conhecimento mais adequado sobre o
risco e as estratégias para mitigá-lo, o segundo permite os meios financeiros para implantar as
medidas de controle pré-evento e a reconstrução pós-inundação.

i Índice de resiliência pela maior possibilidade de acesso à informação para tomada de


decisão – IS1
Este indicador reflete a possibilidade dos indivíduos interferirem na vulnerabilidade,
reduzindo-a. Para isso, o acesso à informação é central. A informação possibilita um
aprimoramento da percepção de risco e das estratégias para lidar com a inundação e se
recuperar mais rapidamente dos seus efeitos. A variável naturalmente mais adequada para
representá-lo é o nível de escolaridade (Figura 8.41).

Aprimoramento da
percepção do risco
Acesso à Acesso à Diminuição da
educação informação vulnerabilidade
Aprimoramento das
estratégias de
enfrentamento e
recuperação

Figura 8.41 – Critérios e variáveis relacionadas à possibilidade de resiliencia do


domicílio à inundação pelo acesso à educação

O acesso à informação do domicílio foi definido segundo o nível de escolaridade do


responsável ou do cônjuge, caso este exista, escolhido o que for maior. Como os microdados
censitários mostram o nível de escolaridade e os anos de estudo de todos os moradores, outras
possibilidades de mensuração do indicador, e até mesmo mais completas, são possíveis:
escolha do maior nível educacional presente entre todos os adultos do domicílio, média do
nível de escolaridade dos moradores adultos, etc.

A opção por utilizar o responsável e o cônjuge como referência relaciona-se essencialmente


ao papel líder que estes dois membros freqüentemente possuem nas estratégias
comportamentais do domicílio. Em uma família nuclear tradicional, o responsável é o
principal provedor de bens, e o cônjuge, representado usualmente pela mãe, seria a principal
responsável pela educação dos filhos. Há estudos consolidados que mostram que o principal
fator de influência no acesso dos filhos à educação é o nível de escolaridade da mãe, e não o
286
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
do pai (Rios-Neto; César & Riani, 2002). Na família monoparental, por sua vez, considera-se
que o responsável tenderia a ter grande influência nestes dois papéis.

Na análise dos vetores de informação do protótipo perceberam-se algumas características


relevantes do domicílio. Ao se comparar o nível de escolaridade do responsável e do cônjuge,
observa-se que, em 47% dos domicílios, o nível mais elevado é o do responsável; em 42% dos
registros, ambos possuem o mesmo nível de escolaridade e, em apenas 11%, o cônjuge possui
maior número de anos de estudo. Embora esta amostra corresponda a 14.314 domicílios, este
padrão possivelmente é o verificável na maioria das cidades (no município de Belo Horizonte,
certamente). Desta forma, sugere-se, caso seja necessária rapidez e simplificação nos cálculos,
a utilização do nível de escolaridade do responsável, pois parece suficiente.

O índice de escolaridade foi ponderado, segundo importância relativa para o acesso à


informação, em uma escala de zero a nove, utilizando as definições apresentadas na Tabela
8.40. Para o agente sem alfabetização ou que nunca freqüentou a escola, definiu-se o valor
igual zero. Quando ele é alfabetizado, sua possibilidade de acesso à informação aumenta
significativamente. O valor máximo ocorre quando o agente teve acesso ao nível superior,
pois a partir daí ele certamente já possui todo o conhecimento necessário para acessar e
interpretar as diferentes fontes de informação disponíveis. Observe que, embora se faça uma
avaliação cardinal, ao se comparar critério a critério, algum ordenamento também é feito.

A padronização foi definida tendo como base o valor máximo, igual a nove. A Tabela 8.40
mostra o nível de escolaridade, a sua ordem de importância para o critério e sua distribuição
de freqüência entre os domicílios do protótipo.

Tabela 8.40 – Nível de escolaridade do responsável ou cônjuge do domicílio, sua


distribuição no protótipo e sua escala de importância para o acesso à informação

Ultimo nível de
% de
escolaridade Escala Definição Padronização
domicílios
freqüentado
Nunca freqüentou Nenhuma importância para
0 0,00 3,61
escola o critério
Alfabetização de
2 Importante para o critério 0,22 0,24
adultos
Forte importância para o
Fundamental 5 0,56 46,19
critério
Muita importância para o
Médio 7 0,78 26,69
critério
Absoluta importância para o
Superior 9 1,00 21,22
critério
Mestrado ou Absoluta importância para o
9 1,00 2,05
doutorado critério

287
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Síntese do IS1

Em síntese,

 Verifica-se o nível de escolaridade do responsável ou cônjuge, escolhe-se o maior


entre os dois e o relaciona ao IS1, segundo a Figura 8.42:

1,00 1,00
1,0
0,9
0,78
0,8
0,7
0,6 0,56

IS1 0,5
0,4
0,3 0,22
0,2
0,1
0,00
0,0

Nível máximo de escolaridade frequentado

Figura 8.42 – Índice de resiliência humana (IS1) relacionado ao nível de escolaridade


do responsável ou cônjuge do domicílio

ii Índice de resiliência pela maior capacidade financeira de mitigação e reconstrução – IS2


Um componente estritamente associado à resiliência diante da inundação é a existência de
capacidade financeira para implantação de medidas mitigadoras - seja atuando na ameaça ou
na vulnerabilidade - e de recuperação do nível de bem-estar após a ocorrência do evento. A
existência de renda excedente pelo domicílio favorece estes processos (Figura 8.43). Quanto
mais rápida a reconstrução, menor a propagação da perturbação da inundação no tempo. A
capacidade financeira mostra ainda em que medida o domicílio atingido pode manejar a
situação com meios próprios, sem a necessidade de ajuda externa, tornando-se menos
vulnerável (Bollin et al., 2003).

288
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Medidas de
mitigação

Acesso à Capacidade
Diminuição da
renda financeira
vulnerabilidade

Capacidade de
recuperação

Figura 8.43 – Critérios e variáveis relacionadas à possibilidade de resiliencia do


domicílio à inundação pelo acesso à renda

O primeiro passo é calcular o indicador de renda excedente. Esta pode ser medida pelo
montante de renda disponível para cada domicílio para obtenção de bens supérfluos, ou seja,
os gastos em bens de luxo definidos neste estudo. Desta forma, supõe-se que é possível aos
agentes do domicílio abrir mão do consumo imediato destes bens a fim de adquirir renda para
obter os artigos necessários para a recuperação mais rápida possível do nível de bem-estar
anterior ao momento da inundação.

Optou-se, entretanto, por utilizar a renda domiciliar como proxy da renda excedente, ou seja,
da capacidade financeira, e não os gastos de luxo. Em primeiro lugar porque a variável “renda
domiciliar” é de obtenção mais direta do que a variável “gastos com luxo”; em segundo,
porque a definição de “luxo” é subjetiva e depende das características de cada consumidor e,
em terceiro, porque gastos definidos como essenciais, como, por exemplo, gastos em
alimentação, podem também representar gasto supérfluo (e.g.: idas a restaurantes de luxo).
Ademais, verificou-se que o índice de Pearson de correlação entre gastos com bem de luxo e
renda domiciliar é de 1,00.67

Em consonância com análises anteriores, as classes socioeconômicas foram utilizadas como


critério de classificação de renda domiciliar. Após ponderadas, foi feita a padronização,
resultando no índice de resiliência pela maior capacidade financeira de mitigação e
reconstrução (IS2) (Tabela 8.41).

67
Além da renda domiciliar total foi analisada também a renda domiciliar per capita, entretanto verificou-se que
a primeira possui maior relação com variáveis que indicam capacidade financeira, como gastos com bens de luxo
e número de ativos no domicílio.
289
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 8.41 – Classes socioeconômicas e transformação no IS2

Importância
Classe de rendimento domiciliar Importância
relativa (IS2)
(em reais de 2000)
A1 > 6.220,45 9 1,00
A2 3.725,93 - 6.220,45 9 1,00
B1 2.236,31 - 3.725,93 7 0,78
B2 1.297,85 - 2.236,31 6 0,67
C 675,73 - 1.297,85 4 0,44
D 315,59 - 675,73 2 0,22
E < 315,59 1 0,11

Síntese do IS2

Em síntese,

 O IS2, que varia segundo a classe socioeconômica, é mostrado na última coluna da


Tabela 8.41.

iii Índice de resiliência global – ISG

As variáveis que originaram os dois índices de resiliência específicos – a escolaridade e classe


socioeconômica – foram avaliadas em conjunto para os domicílios do protótipo que foram
atingidos pela cheia, a fim de se obter subsídios para a construção de um índice de resiliência
global. A Tabela 8.42 mostra a freqüência encontrada, considerando a inundação de tempo de
retorno de 100 anos.

Tabela 8.42 – Escolaridade e classe socioeconômica dos domicílios do protótipo atingidos


pela inundação de tempo de retorno de 100 anos

Classe socioeconômica
E D C B2 B1 A1 Total
Nunca freqüentou escola 4% 2% 0% 0% 0% 0% 6%
Escolaridade

Alfabetização de adultos 0% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
Fundamental 27% 26% 3% 3% 1% 0% 60%
Médio 6% 10% 2% 3% 2% 0% 23%
Superior ou pós-graduação 1% 1% 1% 2% 4% 1% 11%
TOTAL 38% 39% 6% 8% 8% 2% 100%

Observe na Tabela 8.42 que 60% dos domicílios têm nível fundamental de escolaridade e
77% situam-se nas classes D ou E. No cruzamento das duas informações, mais da metade dos
domicílios atingidos (53%) encontram-se nas classes D ou E e possuem escolaridade
fundamental. Estas informações mostram ainda que, no caso específico do protótipo, a área

290
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
atingida pela inundação apresenta condições bastante precárias de acesso à educação e à renda
e, portanto, uma tendência de baixa resiliência segundo os aspectos discutidos nesta pesquisa.

Uma correlação entre acesso à renda e à educação formal pode ser verificada: 78% segundo o
índice de Pearson. Partindo destas análises e dos índices de resiliência específicos discutidos
nos itens i e ii, definiram-se pesos, de zero a nove, considerando os dois atributos
conjuntamente (Tabela 8.43).

Tabela 8.43 – Importância relativa: classe socioeconômica x escolaridade

Classe socioeconômica
E D C B2 B1 A1
Nunca freqüentou escola 1 1 3 4 6 7
Escolaridade

Alfabetização de adultos 1 3 4 6 6 7
Fundamental 3 4 6 7 7 8
Médio 3 4 6 7 8 9
Superior ou pós-graduação 4 6 7 8 8 9

Os pesos foram padronizados, segundo a Tabela 8.44, e originaram o ISG.

Tabela 8.44 – Padronização dos pesos do índice de resiliência

Escala de importância
Bruta Relativa (ISG)
1 0,11
3 0,33
4 0,44
6 0,67
7 0,78
8 0,89
9 1,00
Síntese do ISG

 Verifica-se a escolaridade do responsável ou cônjuge do domicílio, escolhe-se a maior;


verifica-se a classe socioeconômica do domicílio: define-se o indicador bruto
mostrado na Tabela 8.43.

 Definido o indicador bruto, de um a nove, o ISG correspondente é mostrado na Tabela


8.44.

8.9.2.5 Agregação dos indicadores de risco pelo produtório


As seções anteriores apresentaram quinze indicadores agrupados em três grupos: índices de
ameaça, de exposição e de vulnerabilidade ou suscetibilidade. Foram apresentadas as
hipóteses de trabalho e a metodologia para criação dos indicadores e sua padronização. Nesta

291
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
seção é mostrada a agregação destes componentes para originar índices de risco sintéticos
para cada objeto de impacto, material ou humano. A Tabela 8.45 apresenta uma síntese dos
aspectos discutidos nas seções anteriores agrupando as dimensões utilizadas para criação de
um indicador sintético.

Tabela 8.45 – Indicadores associados ao risco de inundação e hipóteses e variáveis


utilizadas

Indicador de
Hipóteses Variáveis brutas Índices
risco
- Exposição da construção - Área construída
IEM1
Danos à - Suscetibilidade ao contato com a - Qualidade da construção
IVM1
construção água (→ classe socioeconômica)
IAM1
- Força hidrostática e hidrodinâmica - Profundidade e velocidade
- Quantidade e valor dos bens
- Exposição dos bens (→ área construída)
IEM2
Danos ao - Suscetibilidade ao contato com a - Tipo, localização e qualidade
IVM2
conteúdo água do bem (→ classe
IAM2
- Força hidrostática e hidrodinâmica socioeconômica)
- Profundidade e velocidade
- Exposição dos moradores
- Número de moradores
Danos - Atributos de mobilidade,dependência, IEH1
- Características dos
diretos aos percepção do risco e propensão ao IVH1
moradores
moradores desenvolvimento de doenças IAH1
- Fator velocidade
- Força hidrodinâmica e hidrostática
- Exposição do domicílio
- Relações de dependência, ajuda
- Localização do domicílio IED
Danos à recíproca, responsável com atributo de
- Tipologia de família IVH2
família vulnerabilidade e acesso desigual às
- Profundidade IAA
oportunidades de renda
- Força hidrostática
Restrição - Exposição do domicílio - Localização do domicílio
IED
no acesso - Localização e importância no bem- - Localização e tipos de oferta
IVA1
às unidades estar das unidades de consumo nas unidades
IAA
de consumo - Força hidrostática - Profundidade
- Exposição do domicílio
- Localização do domicílio
Restrição - Localização e importância no bem- IED
- Localização e renda auferida
no acesso à estar das unidades de aquisição de IVA2
nas unidades
renda renda IAA
- Profundidade
- Força hidrostática

A agregação dos índices para originar o indicador apresentado na primeira coluna da Tabela
8.45 é feita pelo produtório ponderado entre eles. A formulação padrão é dada pela Equação
8.25.

Risco = ameaça x exposição x vulnerabilidade social 8.25


i Agregação dos indicadores de risco material
Estes indicadores pretendem mostrar os domicílios com maior probabilidade de sofrerem os
danos diretos à construção e ao seu conteúdo. É composto por dois indicadores: de danos à
construção (IRDM1 ) e de danos ao conteúdo (IRDM2).

O IRDM1 é apresentado na Equação 8.26:

292
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
IRDM1, j = IAM1, j0,5 x IEM1, j0,25 x IVM1, j0,25 8.26

Sendo que:

IRDM1, j = Índice de risco da construção do domicílio j à inundação;


IAM1, j = Índice de ameaça da inundação à construção do domicílio j;
IEM1, j = Índice de exposição da construção do domicílio j à inundação;
IVM1, j = Índice de suscetibilidade da construção do domicílio j à inundação.

O IRDM2 é formado a partir da agregação dos três índices relacionados aos danos ao conteúdo
dos domicílios decorrentes da inundação (Equação 8.27):

IRDM2, j = IAM2, j0,5 x IEM2, j0,25 x IVM2, j0,25 8.27

Sendo que:

IRDM2, j = Índice de risco do conteúdo do domicílio j à inundação.


IAM2, j = Índice de ameaça da inundação ao conteúdo do domicílio j;
IEM2, j = Índice de exposição do conteúdo do domicílio j à inundação;
IVM2, j = Índice de susceptibilidade do conteúdo do domicílio j à inundação;

ii Agregação dos indicadores de risco humano


Compõem os indicadores de risco humano, o índice de risco de danos aos moradores do
domicílio (IRDH1) e o índice de risco à família (IRDH2).

Para que o risco de danos aos moradores do domicílio – IRDH1 exista é necessário que tenha a
ameaça e a exposição. As pessoas, uma vez expostas, já são vulneráveis ao impacto. Os
atributos de vulnerabilidade atuariam intensificando esta vulnerabilidade inerente. A
justificativa está relacionada às hipóteses adotadas na criação do indicador de vulnerabilidade
humana – IVH1.

Portanto, segue-se formulação semelhante a apresentada Cardona (2004, 2005), com a


incorporação de um fator de agravamento. A Equação 8.28 apresenta a formulação utilizada
para o índice de risco de danos aos moradores do domicílio – IRDH1:

IRDH1, j = IAH, j0,5 x [IEH, j x ( 1+IVH1, j)] 0,5 8.28

Sendo que:

IRDH1, j = Índice de risco dos moradores do domicílio j à inundação;


293
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
IAH, j= Índice de ameaça da inundação aos moradores do domicílio j;
IEH, j = Índice de exposição dos moradores do domicílio j à inundação;
IVH1, j = Índice de vulnerabilidade específica dos moradores do domicílio j à inundação

Considera-se que [IEH, j x ( 1+IVH1, j)] assume valor máximo igual um.

O índice de risco à família – IRDH2, por sua vez, apresenta a formulação tradicional e é
definido pela Equação 8.29:

IRDH2, j =IAI,j0,25x IED, 0,25 x IVH2, j 0,5 8.29

Onde:
IRDH2, j = Índice de risco da família do domicílio j à inundação;
IAI,j0,25 = Índice de ameaça de inundação do domicílio j;
IED, j = Índice de exposição do domicílio j à inundação;
IVH2, j = Índice de vulnerabilidade da família do domicílio j à inundação.

Algumas observações são necessárias na análise do IRDH2. Observa-se na Equação 8.29 que a
ameaça é representada pelo índice dicotômico IAI. Justifica-se esta escolha por considerar que
a presença da inundação já é de importância absoluta para o indicador IRDH2, independente da
profundidade ou velocidade do escoamento.

Adota-se a hipótese de que a vulnerabilidade relacionada à tipologia da família exerce


influência sobre a magnitude dos danos de forma geral, diretos e indiretos, e a um horizonte
temporal que acompanha os vários momentos associados à ocorrência do evento: antes,
durante e depois. Basta a presença da ameaça para que se verifique esta influência, a qual
dificilmente poderia ser relacionada a características físicas específicas do escoamento. A
ocorrência de danos diretos sobre as pessoas, mais sensíveis às características da cheia, já
foram, por sua vez, analisados de forma central no IRDH1.

Raciocínio análogo é feito para a exposição. A exposição da família à inundação está ligada à
exposição do domicílio como um todo, já sendo tratada de forma específica, em outros
indicadores, a exposição de seus moradores ou de seus ativos.

iii Agregação dos indicadores de acesso

A última classe de indicadores pretende avaliar o acesso ao bem-estar em termos de acesso ao


consumo e à renda. Como foi mencionado no decorrer do capítulo, o acesso às unidades de

294
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
consumo e de aquisição de renda pelos integrantes do domicílio pode ser ameaçado pela
inundação, o que depende da exposição à inundação do domicílio ou do local a ser acessado.
A forma como a restrição ao acesso afeta o bem-estar depende do tipo de atividade atingido.

Como primeiro indicador de risco ao acesso, tem-se o índice de risco ao acesso do domicílio
às unidades de consumo preferidas em decorrência da inundação (IRDA1). Este é formado pelo
produtório de dois índices anteriormente discutidos (Equação 8.30):

IRDA1; j = IAA, j 0,5 x IVA1,j0,5 8.30

Onde:
IRDA1, j = Índice de risco de acesso do domicílio j às unidades de consumo preferidas em
decorrência da inundação;
IAA, j= Índice de ameaça da inundação ao acesso ao bem-estar do domicílio j;
IVA1,j = Índice de restrição de acesso do domicílio j às unidades de consumo preferidas em
decorrência da inundação.

Observe na Equação 8.30 que a exposição dos domicílios à inundação é capturada pelo índice
IAA,J, afinal, independente do domicílio situar-se ou não no primeiro pavimento, ele sofre o
impacto na acessibilidade. A exposição das firmas, por sua vez, é captada pelo IVA1, j.

O segundo indicador de acesso é o índice de risco de acesso do domicílio à aquisição de renda


(IRDA2). Ele tem formulação semelhante ao IRDA1, mas trata especificamente do acesso à
renda (Equação 8.31):

IRDA2; j = IAA, j 0,5x IVA2, j0,5 8.31

Onde:
IRDA2, j = Índice de risco de acesso do domicílio j às unidades de aquisição de renda;
IAA, j= Índice de ameaça da inundação ao acesso ao bem-estar do domicílio j;
IVA2,j = Índice de restrição de acesso do domicílio j à renda em decorrência da inundação.

8.9.2.6 Agregação dos indicadores de resiliência pelo produtório


Embora a resiliência seja um componente do risco - mesmo atuando no sentido de sua
diminuição - optou-se por não incorporá-la nas equações anteriores, pois ela possui
particulares temporais e de abrangência. Os indicadores de risco material, por exemplo, têm
como tempo de análise essencialmente o momento da inundação. A resiliência, por sua vez,
está presente em todas as fases do desastre e interfere de forma global na mitigação de danos e
295
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
na recuperação Possui, portanto, um caráter abrangente que dificulta sua inserção em um
índice de risco específico.

A Tabela 8.46 mostra as hipóteses adotadas na definição do indicador de resiliência à


inundação.

Tabela 8.46 – Indicadores associados à resiliência ao risco de inundação e hipóteses e


variáveis utilizadas

Indicador de
Hipóteses Variáveis brutas Índices
resiliência
- Exposição do domicílio
- Informação leva ao
- Localização do domicílio
aprimoramento da percepção do IS1
Acesso à - Nível de escolaridade do
risco e das estratégias de IAI
informação responsável ou cônjuge
mitigação e recuperação da
- Profundidade ≠ 0
inundação
- Presença de escoamento
- Exposição do domicílio
- Recursos financeiros para adoção - Localização do domicílio IS2
Capacidade
de medidas mitigadoras e para a - Renda domiciliar IAI
financeira
recuperação - Profundidade ≠ 0
- Presença de escoamento
- Exposição do domicílio - Localização do domicílio
Resiliência - Informação e capacidade - Nível de escolaridade e ISG
global financeira renda domiciliar IAI
- Presença de escoamento - Profundidade ≠ 0

Como se discute a resiliência associada particularmente à inundação, tem-se a necessidade de


existência da ameaça, da exposição da unidade de análise a ela e do aspecto associado à
resiliência (Tabela 8.46). Entretanto, como no indicador de risco associado à tipologia da
família, há algumas peculiaridades na forma de expressá-las.

Em relação à resiliência, têm-se três indicadores, dois específicos e um de caráter global.


Relacionado à resiliência pelo ao acesso à informação, tem-se o ISD1, o acesso à renda é
captado pelo ISD2 e o índice global, que incorpora ambas as formas de acesso, é definido no
ISDG.

A Equação 8.32 mostra matematicamente o índice de resiliência à inundação pela maior


possibilidade de acesso à informação para tomada de decisão (ISD1):

ISD1; j = IAI, j x IS1, j 8.32

Onde:
ISD1, j = Índice de resiliência à inundação do domicílio j pela maior possibilidade de acesso à
informação para tomada de decisão;

296
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
IAA, j= Índice de ameaça de inundação no domicílio j;
IS1,j = Índice de resiliência pela maior possibilidade de acesso à informação do domicílio j.

Observe que na Equação 8.32 que a exposição já é captada no componente IAI, pois a
presença do escoamento na edificação onde se encontra o domicílio, independente dele se
situar no primeiro pavimento ou não, já expõe o seu nível de resiliência.

O segundo índice mostra a resiliência à inundação pela maior capacidade financeira para
mitigação e reconstrução do domicílio (ISD2) (Equação 8.33)

ISD2, j = IAI, j x IS2, j 8.33

Em que:
ISD2, j = Índice de resiliência à inundação do domicílio j pela maior capacidade financeira
para mitigação e reconstrução;
IAA, j= Índice de ameaça de inundação no domicílio j;
IS1,j = Índice de resiliência pela maior capacidade financeira do domicílio j para mitigação e
reconstrução.

Finalmente, justando os dois aspectos anteriores, tem-se (ISDG) (Equação 8.34):

ISDG, j = IAI, j x ISG, j 8.34

Em que:
ISDG, j = Índice de resiliência global à inundação do domicílio j;
IAA, j= Índice de ameaça de inundação no domicílio j;
IS1,j = Índice de resiliência do domicílio j.

Observe que nos índices de resiliência não é utilizado um coeficiente, pois a ameaça só
definiria a nulidade ou não do índice.

8.9.2.7 Agregação dos indicadores por análise de cluster


A análise de agrupamentos ou de cluster é um procedimento que permite agregar objetos com
base nas características que eles possuem. Os agrupamentos resultantes devem ter elevada
homogeneidade interna (dentro dos agrupamentos) e elevada heterogeneidade externa (entre
agrupamentos) (Hair et al., 2005).

297
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Neste trabalho utilizou-se a análise de cluster para criar tipologias de domicílios, segundo os
indicadores de risco propostos. Para executar o procedimento foi utilizado o software
estatístico SPSS 13.0.

Foi feito um procedimento não hierárquico de agrupamento – o K médias. Ao contrário dos


métodos hierárquicos, que envolvem um processo de construção em árvore dos agrupamentos,
nos métodos não hierárquicos os grupos são definidos a partir de uma quantidade
predeterminada de clusters escolhida pelo pesquisador.

Um dos pontos fundamentais dos métodos K médias é a definição das sementes dos
agrupamentos. Eles são os centróides iniciais ou pontos de partida para os clusters. Pode-se
optar pela criação automática das sementes com o software estatístico utilizado ou introduzi-
las por meio de uma sintaxe segundo critérios teóricos ou empíricos. Normalmente obtém-se
melhores resultados na análise não hierárquica com a introdução dos pontos sementes pelo
pesquisador, opção feita nesta pesquisa (Hair et al., 2005).

Em relação ao método para designar observações individuais aos agrupamentos foi utilizado o
método de referência paralela, disponível no SPSS. Este trabalha com diversas sementes de
agrupamento simultaneamente, ao contrário, por exemplo, do método seqüencial aonde as
sementes vão sendo introduzidas seqüencialmente. Como critério de similaridade entre as
observações utilizou-se a distância euclidiana.

Primeiramente, tentou-se analisar todos os índices conjuntamente, mas a natureza diferente


das variáveis discutidas (material, humana e acessibilidade) implicou na formação de
agrupamentos sem consistência do ponto de vista teórico. Esta inadequação poderia ser
contornada com o aumento do número de agrupamentos, mas isto tiraria uma das principais
vantagens da utilização de clusters neste estudo que seria a simplificação das categorias de
análise com a descrição tipológica.

Decidiu-se, portanto, pela análise separada dos indicadores segundo seu objeto de referência –
material, humano, acessibilidade e resiliência –, os quais foram analisados par a par.
Definiram-se cinco clusters para agrupar os domicílios segundo os dois índices relacionados.
Estes teriam como semente inicial a magnitude do índice: baixa para ambos (0,33); média
para ambos (0,56) e alta para ambos (0,77). Além disso, definiram-se dois grupos onde
poderia ser verificado um índice mais alto em oposição ao outro índice mais baixo.

298
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
8.9.3 Risco no ambiente econômico

Um dos focos desta pesquisa são os danos indiretos, pois o agente está inserido em um
sistema de relações cada vez mais amplo e interconectado. Em conseqüência, um impacto em
uma micro-unidade deste sistema pode gerar efeitos multiplicadores no espaço e no tempo.

Nesta seção, desloca-se o foco de análise do domicílio, em particular, para o ambiente


econômico, social e urbano, com a análise de indicadores que mostrem os possíveis impactos
da inundação sobre ele. A metodologia é mais simplificada do que a apresentada na seção
8.9.2, referente aos domicílios, pois o ambiente econômico e tratado como um todo e não é
feita a padronização das variáveis para criação de números-índices. Os resultados encontrados
são comparados considerando três probabilidades de inundação: Tr = 100 anos, Tr = 25 anos e
Tr = 05 anos.

Quatro aspectos considerados fundamentais na análise do sistema são discutidos: estrutura


econômica, consumo das famílias e valor adicionado.

Ameaça Vulnerabilidade da economia urbana

Impacto na Impacto nas Impacto


estrutura alternativas de no valor
econômica consumo das adicionado
famílias

8.9.3.1 Indicador de impacto na estrutura econômica (IVE1)


A vulnerabilidade da economia, em termos de estrutura econômica, pode ser medida pela
magnitude das perturbações nas atividades de compra e venda de bens, perturbações que
seriam desencadeadas pela ocorrência de pontos de estrangulamento ou de efeitos
propagadores de restrição de oferta de bens ou consumo. O indicador de impacto na estrutura
econômica (IVE1) procura captar esta vulnerabilidade.

Sabe-se que as atividades atingidas pela inundação necessariamente incorrerão em custos


adicionais de limpeza ou reparação e, possivelmente, perda de receita em conseqüência da
paralisação de atividades. Como a economia é um sistema interligado, estas mudanças se
refletirão em outros setores da economia, mesmo que marginalmente.
299
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
O reflexo sobre o sistema depende do tipo de atividade atingida, uma vez que ela pode ser um
setor chave em termos de desencadeamento para frente e para trás na cadeia econômica, ou
um setor com menor importância relativa. Por outro lado, o número de atividades atingidas
em relação ao total existente também é importante. Um setor de menor importância
econômica, mas que seja fortemente atingido, trará reflexos relevantes na economia pela
imposição de uma restrição severa de oferta de um tipo de bem.

Portanto, o indicador de vulnerabilidade econômica à inundação deve refletir estes dois


aspectos: a magnitude relativa da restrição da oferta ante a ocorrência do evento e a
importância econômica do setor atingido para o funcionamento da cadeia econômica. O
primeiro aspecto é de mensuração mais simples. Ele pode ser definido pela relação entre
número de atividades econômicas atingidas, por setor, em relação ao total. A definição do
setor é feita segundo classificação CNAE.

A incorporação do segundo critério é mais complexa. Nos estudos econômicos normalmente a


importância de um setor é mensurada pelos efeitos multiplicadores e pelos encadeamentos
para frente - na venda de produtos - e para trás - na compra de insumos de produção - que ele
gera.

Segundo Miller & Blair (1985) apud Silva et al. (2003), o conceito de fator multiplicador de
produção procura identificar os efeitos na expansão da produção da economia decorrente do
aumento em uma unidade monetária da demanda final de determinado setor. Já os
encadeamentos para frente e para trás são representados por meio de índices de ligação, os
quais refletem a estrutura de produção da economia.

Estes fatores e índices são mensurados a partir de matrizes insumo-produto. A organização


dos diferentes setores econômicos em uma matriz permite apresentar nas linhas o que cada
um produz para os outros setores e, nas colunas, o que cada setor consome como insumo dos
outros. No estudo da bibliografia sobre o tema, verificou-se que a matriz existe somente para
o Brasil e para alguns estados. Sua utilização e generalização para esfera municipal possuem
dificuldades. Cada município tem suas particularidades. Alguns, por exemplo, são fortemente
dependentes de poucas indústrias, outros, possuem uma atividade comercial e de serviços
diversificada.

Logo, embora em uma primeira análise esta abordagem se mostrasse bastante adequada para
definir a ponderação dos setores; após um estudo bibliográfico mais intenso e consulta a

300
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
especialistas, perceberam-se suas limitações para captar a diversidade que caracteriza as
relações econômicas em uma cidade. Entretanto, por acreditar que a compreensão da matriz
insumo produto possa oferecer subsídios e idéias que possam apoiar estudos econômico-
ambientais, sugere-se seu estudo. Como informação adicional são mostrados no APÊNDICE
VIII os índices de encadeamento e fatores multiplicadores encontrados para Minas Gerais no
ano de 1996 e uma breve explicação conceitual sobre eles.

Após estas reflexões, optou-se por utilizar como variável de medida da importância relativa
do setor na economia a média do pessoal ocupado. Embora a massa salarial reflita mais
adequadamente o poder de consumo da população que, claramente, tem efeitos
multiplicadores sobre a economia, escolheu-se privilegiar o acesso a renda, ou seja, o
emprego, como indicador de relevância econômica e social do setor. Utilizaram-se as
informações do protótipo, que é o sistema de análise aqui. Em aplicações da metodologia,
devem ser usados os dados do município de estudo, disponíveis no CEMPRE (IBGE, 2000a).

A Equação 8.35 mostra a formulação do indicador.

8.35

Sendo que:
IVE1 = Índice de impacto na estrutura econômica;
Aing = número de atividades atingidas, sendo que o tipo de atividade (g) varia de 1 a 56
(classificação CNAE);
Atotg = número total de atividades, sendo que o tipo de atividade (g) varia de 1 a 56
(classificação CNAE);
pg = peso para cada setor g, segundo sua importância econômica.

Observa-se que 0 ≤ IVE1 ≤ 1. Quando IVE1 assume o valor 1 significa que todas as atividades
econômicas da cidade foram atingidas; o valor 0 representa vulnerabilidade nula em relação à
restrição de oferta.

No APÊNDICE IX são mostradas tabelas com as informações de número de empresas,


pessoal ocupado e massa salarial por setores do protótipo e os respectivos pesos (pg).

301
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Vulnerabilidade na Estrutura
Ameaça
Econômica

Hipótese
Possibilidade de perturbações
nos fluxos econômicos

Critério
Importância relativa das atividades atingidas
nos fluxos econômicos da localidade

Sub-Critério Sub-Critério
Possibilidade de Importância relativa da
restrição de oferta atividade impactada

Indicador Indicador
Número de atividades do Média do pessoal
setor em relação ao total ocupado no setor

Figura 8.44 – Critérios e indicadores de vulnerabilidade da estrutura econômica

8.9.3.2 Indicador de vulnerabilidade nas fontes de consumo das famílias (IVE2)


Como o foco do modelo são os domicílios, este indicador reflete o impacto da inundação
sobre as atividades que oferecem bens e serviços diretamente às famílias, afetando suas
alternativas de consumo.

Três critérios definem o impacto no domicílio de uma inundação nas suas fontes de consumo:
se o bem ofertado é essencial, se ele é oferecido em várias unidades de consumo concorrentes
ou se ele é facilmente substituível. Estes três critérios, que definem atributos do bem, se inter-
relacionam definindo seu impacto no bem-estar do consumidor caso firmas que o ofertem
sejam inundadas (Figura 8.45).

302
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Vulnerabilidade nas fontes de consumo
das famílias

Hipótese
Possibilidade de restrição no consumo das
famílias, com queda de bem-estar

Sub-hipótese
Queda do bem-estar do consumidor sensível à
tipologia de bem que sofre restrição de oferta

Critério 1 Critério 2
Nível de Critério 3
Distribuição
Substituibilidade
essencialidade de oferta

Figura 8.45 – Critérios e indicadores de vulnerabilidade nas fontes de consumo das


famílias

A Equação 8.36 apresenta a formulação do indicador da vulnerabilidade nas fontes de


consumo das famílias (IVE2):

8.36

Sendo que:
IVE2 = Índice de restrição de alternativas de consumo das famílias;
Ainf = número de atividades atingidas com oferta direta de bens ou serviços para as famílias,
sendo que a tipologia de bem ofertado (f) varia de 1 a 20;
Atotf = número total de atividades com oferta direta de bens ou serviços para as famílias, sendo
que a tipologia de bem ofertado (f) varia de 1 a 20;
pf = peso para cada tipo de atividade com oferta de bens ou serviços para as famílias; peso
definido segundo a tipologia de bens que oferta.

Os pesos utilizados no IVE2 são os mesmos presentes no IVA1 apresentados na Tabela 8.39.

8.9.3.3 Indicador de impacto sobre o valor adicionado da localidade (IVE3)


Este indicador procura representar a possível mudança no valor adicionado (VA) local como
decorrência do evento extremo. O valor produzido por um firma pode ser definido segundo
algumas identidades (Equações 8.37 e 8.38):

303
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Valor adicionado = soma das rendas primárias 8.37
Valor adicionado = valor final – consumo intermediário 8.38

Segundo metodologia proposta em Parker, Green & Thompson (1987), os danos indiretos
sofridos pela firma são mesurados pela perda de valor adicionado decorrente da inundação
(ver item 3.2.1.1). Além disso, como exposto em van der Venn (2004), o montante de salários
recebido pela população residente representa um indicador da demanda final. Logo, o IVE3 é
um indicador dos danos indiretos sofridos pelas firmas e também de perda de renda pela
localidade.

Em relação às identidades 8.37 e 8.38, a única informação relativa ao VA disponibilizada na


modelagem no protótipo são os salários. As outras remunerações, como lucros, não foram
coletadas ou estimadas. Também o consumo entre firmas (intermediário), embora seja
fundamental, não faz parte do escopo deste trabalho.68

Desta forma, utiliza-se a massa salarial como indicador do VA produzido na localidades. O


IVE3 é mostrado na Equação 8.39:

8.39

Sendo que:
IVE3 = Índice de impacto no valor adicionado local;
Winun = Massa salarial diária nas atividades atingidas;
Wtot = massa salarial diária total das atividades;
dinun = dias de inundação.

Embora se saiba que a paralisação das atividades possivelmente será superior ao período da
inundação, incorporá-la ao indicador encerraria dificuldades, pois há grande variabilidade no
tempo de recuperação das firmas, o qual depende, entre outros fatores, do tipo de atividade,
área do estabelecimento e nível dos danos sofridos.

68
Uma hipótese utilizada no estudo é de que as importações são constantes, logo é uma variável exógena ao
modelo. O impacto da inundação sobre o consumo intermediário poderia ser obtido por meio de matrizes
insumo-produto, de difícil elaboração em situações de impacto mais localizado.
304
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
9 RESULTADOS

9.1 Simulação hidrológica-hidráulica


Por meio da simulação hidrológica e uso de ferramentas SIG foi possível definir mapas de
inundação com profundidade e velocidades associadas a pixels de informação. As Figura 9.1,
Figura 9.2 e Figura 9.3 mostram as manchas encontradas para o três tempos de retorno: Tr = 5
anos, Tr = 25 anos e Tr = 100 anos.

Figura 9.1 – Inundação para o Tr = 5 anos - Protótipo

305
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Figura 9.2 – Inundação para o Tr = 25 anos - Protótipo

Figura 9.3 – Inundação para o Tr = 100 anos - Protótipo

306
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
As figuras mostram o sistema viário utilizado no protótipo. Ao fundo estão os bairros da
capital mineira que orientaram as definições de adensamento e uso do solo.

Por meio do ArcGis foi feita uma discretização fina dos resultados da simulação hidrológico-
hidráulica, o que possibilitou verificar qual a profundidade e velocidade da inundação
associada a cada domicílio e firma. A Tabela 9.1 mostra os resultados agregados por faixas de
profundidade.

Tabela 9.1 – Domicílios e firmas (unidades econômicas) atingidas


Domicílios atingidos Firmas atingidas
Profundidades
Tr = 5 Tr = 25 Tr = 100 Tr = 5 Tr = 25 Tr = 100
(m)
anos anos anos anos anos anos
< 0,6 789 971 1.592 566 752 630
0, 6 - 1,2 928 767 952 58 113 600
1,2 - 1,8 221 601 542 0 0 58
1,8 - 2,4 19 199 513 0 0 0
> 2,4 0 0 181 0 0 0
Nota: compreendem também as firmas e domicílios localizados acima do primeiro pavimento, desde que a
edificação onde se situam tenha sido atingida.

9.2 Espaço de fluxos

9.2.1 Análise dos fluxos globais na ADA e na AE e sua inserção na rede virtual

A ADA e AE representam uma região de grande concentração de vendas na cidade. Ela


poderia ser classificada como um central business district, ou seja, uma área com
aglomeração de atividades que buscam auferir ganhos em economias de escala e de
aglomeração.

A Tabela 9.2 mostra o número e o valor dos links de acesso a cada uma das zonas da ADA e
AE. Cada link representa uma função trabalho, estudo ou consumo feita na região.69

O número de links com “função trabalho” é definido pelo número de trabalhadores que
acessam a região e o número de links com “função estudo”, pelo número de estudantes. Em
relação à função “consumo”, a lógica é um pouco diferente, já que, com exceção dos
consumidores de educação (estudantes), não é possível definir o número de consumidores que
acessam a região.70 Considerou-se, portanto, que cada domicílio possui seis tipos de função

69
Como não se considerou que funções como “residir” ou “permanecer na residência” eram essenciais na ótica
de rede econômica discutida no modelo, não há referencia ao fluxo de pessoas que acessam a região para
desempenhar estas funções.
70
Ao contrário do número de trabalhadores e do número de estudantes, não há a informação sobre o número de
consumidores existente em cada domicílio. Além disso, um mesmo consumidor tende a acessar mais de uma
firma.
307
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
“consumo”, as quais representam os tipos de gastos. Deste modo, saem de cada domicílio seis
links de consumo em direção às diferentes unidades ofertantes da cidade.

Em relação ao valor do link, ele é representado pela renda (ou salário) ou pelo consumo
auferido na região. Portanto, a renda está associada ao agente “trabalhador” e o consumo às
“funções consumo”. Ressalta-se que a contrapartida monetária do agente “estudante” está
contida nas funções consumo.

Os mesmos critérios de definição dos fluxos ou links foram utilizados para toda a cidade
virtual, o que permite comparar as informações entre si. As informações foram mostradas em
unidade de área (km2) para evitar a influência da extensão das zonas nos resultados.

Em relação à quantidade, há uma distribuição das funções no tempo: por exemplo, o trabalho
e o estudo normalmente são diários. As compras podem ser de freqüência diária, semanal,
mensal ou mesmo anual. Trabalha-se, portanto, com o potencial máximo de funções exercidas
na região em um dia.

A relação de trabalho é mensurada pelo valor dos salários recebidos; a relação de consumo,
pelo valor médio dos gastos feito na região. Definiram-se os valores médios potenciais em um
dia.

Tabela 9.2 – Links econômicos na ADA e AE


Valor dos links
Quantidade de links
2 (renda recebida mais valor do dispêndio
(acesso para desempenho das funções) por km 2
Zona das famílias na localidade) por km
Valor absoluto Distribuição
Quantidade absoluta Distribuição percentual
(em R$ de 2000) percentual
1 164.685 18% 2.050.753 20%
2 371.017 41% 3.935.248 39%
3 193.695 21% 2.150.025 21%
4 85.705 9% 979.419 10%
5 39.192 4% 462.409 5%
6 52.666 6% 555.556 5%
Total 906.960 100% 10.133.409 100%
Nota: Os links econômicos representam o total de relações econômicas entre a ADA e AE e o restante da rede
(nós) e entre si. Em outros termos, representa o número de trabalhadores, estudantes e “funções consumo”
vindos da própria ADA e AE ou dos nós. Os valores dos links representam a quantidade consumida ou a renda
auferida na ADA e AE.

A Tabela 9.2 confirma a zona dois como o centro econômico da região, seguida da zona um e
da zona três. As zonas cinco e seis apresentam um perfil mais residencial.

A Tabela 9.3 lista os links econômicos entre a ADA e AE e os outros nós da rede.

308
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 9.3 – Links econômicos na ADA e AE e os outros nós da rede
Quantidade Valor Quantidade % Valor %
ADA e AE 671.157 240.800.745 53% 64%
Nós 604.588 429.282.773 47% 36%
Total 1.275.745 670.083.518 100% 100%
Nota: O número de links econômicos representa o número de trabalhadores ou “funções consumo” que acessam
a região. Os valores dos links representam a quantidade consumida ou a renda auferida na região.

Na Tabela 9.3 considerou-se apenas a quantidade de links econômicos que representam


função consumo ou trabalho, exclui-se, portanto, os estudantes. Tal procedimento se justifica
pelo fato de não terem sido introduzidos na modelagem os estudantes dos nós, mas apenas os
estudantes da região impactada e de entorno (ADA e AE). Ressalta-se, entretanto, que se a
função estudo não foi considerada em termos de quantidade, ela está presente em termos de
valor, dado que os gastos com educação estão incorporados na função consumo.

A Tabela 9.3 mostra a ADA e AE como uma região de grande centralidade econômica na
rede. Para lá se dirigem mais da metade dos fluxos econômicos que envolvem os domicílios
da cidade. Deve se lembrar, entretanto, que estes fluxos monetários englobam o valor dos
salários de toda a população, mas apenas o valor das vendas para as famílias, não sendo
discutidos os fluxos entre firmas.

Dentro da sub-rede que compõem este nó central, as zonas 1, 2 3 são os pontos centrais. Um
impacto da inundação, ao atingir o nó central, causa grande distúrbio nas relações da rede.
Mas este impacto será maior ou menor segundo o número e a importância das firmas
atingidas.

A Figura 9.4 mostra três momentos da simulação da rede econômica feita no protótipo. Na
primeira ilustração, tem-se o momento inicial da simulação, na segunda, parte dos
trabalhadores está alocada em seus locais de trabalho e, na terceira, todos se encontram em
seus postos de trabalho. Os links permitem visualizar o emaranhado de relações existentes no
espaço e sua distribuição. A propagação espacial do evento depende do número de links que
saem da ADA em direção às outras regiões da cidade, da distância percorrida por eles e dos
valores a eles associados.

309
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Figura 9.4 – Os fluxos de trabalho no protótipo

Na Figura 9.5 é mostrado o fluxo de estudantes da ADA e da AE em direção às unidades de


ensino. As cores diferentes nos links relacionam-se ao nível de escolaridade (superior ou
médio e fundamental).

Figura 9.5 – Os fluxos de estudantes no protótipo

310
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9.2.2 Fluxos discretos na ADA e na AE

A ADA e AE se relacionam com os demais nós da rede por meio de fluxos monetários, os
quais estão associados a fluxos discretos, ou agentes, como as pessoas. Entre as pessoas, há
consumidores, trabalhadores e estudantes.

A Figura 9.6 mostra a estimativa dos fluxos da região em termos dos principais agentes
discutidos nesta pesquisa, os quais foram usados para inferir a circulação de veículos. Os
agentes não são mutuamente excludentes; um estudante pode trabalhar e ser consumidor, por
exemplo. Por meio dos microdados censitários (IBGE, 2000), estabeleceu-se o percentual de
pessoas que trabalham ou estudam ou fazem ambas as atividades. Definiu-se, ainda, a
existência de, em média, por domicílio, um terceiro agente, responsável exclusivo pelas
compras.

Consumidores
109.366
Trabalhadores Estudantes
46.905 56.427

Carros
50.456
Ônibus
3.245

Figura 9.6 – Os fluxos discretos na ADA e AE

Como existem outros fluxos na região dificilmente identificáveis, como o de pessoas que
apenas a utiliza como passagem, as informações de fluxo foram comparadas com as existentes
nas vias de regiões semelhantes de Belo Horizonte, a fim de se obter uma melhor
parametrização do fluxo de pessoas e, particularmente, do trânsito de veículos. Chegou-se ao
valor de 50.456 automóveis e 3.245 ônibus. Como eles fazem, por hipótese, o percurso de ida
e volta, totaliza-se na região um fluxo de 107.402 veículos por dia (para maiores detalhes
verificar a metodologia descrita no item 8.6)

311
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9.2.3 Análise sob a ótica dos domicílios: gastos, emprego e renda

9.2.3.1 Análise global


A Tabela 9.4 mostra o número total de domicílios existente no protótipo e quais aqueles
localizados em área atingida nos três cenários de probabilidade de sua ocorrência.

Tabela 9.4 – Número total de domicílios e número de domicílio localizados em área atingida
- Protótipo
1
Domicílios localizados em área atingida
Zonas Total de domicílios
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
1 1.324 0 0 32
2 3.104 72 169 483
3 185 0 0 0
4 2.207 53 127 320
5 2.569 45 62 107
6 4.925 1.787 2.180 2.838
Total ADA ou AE 14.314 1.957 2.538 3.780
Total Protótipo 17.8693 1.957 2.538 3.780
Nota: 1. Consideram-se todos os domicílios localizados na área diretamente atingida, independente de sofrerem
danos diretos.

A magnitude da exposição em termos do total de moradores atingidos é mostrada Tabela 9.5.

Tabela 9.5 – Número total de moradores e número de moradores localizados em área


atingida - Protótipo
Moradores em área atingida
Zonas Total de moradores
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
1 5.010 0 0 125
2 11.205 281 637 1.742
3 698 0 0 0
4 8.258 197 472 1.202
5 9.853 174 241 423
6 16.092 5.727 7.044 9.110
Total ADA ou AE 51.116 6.379 8.394 12.602
Total Protótipo 639.336 6.379 8.394 12.602

Tem-se, portanto, cerca de 26% dos moradores da ADA ou AE afetados diretamente pelo
impacto considerando à exposição ao evento de tempo de retorno de 100 anos. Em relação à
todo o espaço urbano, este percentual é de 2% dos moradores.

Entretanto, a inundação afeta não apenas os domicílios localizados na mancha de inundação.


Aqueles que não estão expostos ao escoamento podem ser afetados pelo evento por várias
razões, em especial pela inundação de firmas.

Como já previamente enfatizado, as firmas foram introduzidas no modelo devido às relações


fundamentais que elas estabelecem com os domicílios, estes os agentes centrais. As firmas
atingidas podem ser pontos de consumo ou de aquisição de renda para as famílias. E pelo

312
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
caráter em rede da economia urbana e centralidade da região atingida, o impacto do evento se
propaga entre os domicílios.

Primeiramente, é feita a análise de emprego e renda. Para os trabalhadores, se regidos por


contratos de trabalho via CLT, possivelmente a inundação da firma em que trabalham não
representa uma perda imediata de remuneração. Entretanto, indica vulnerabilidade ao
emprego, em função de duas razões principais:

 as firmas que sofrem inundação incorrerão em prejuízos, o que pode indicar uma
desvantagem competitiva em relação aos concorrentes e maiores dificuldades de
sobrevivência;

 ao serem atingidas pelo escoamento, as firmas podem optar pela redução do emprego
a fim de recomporem os prejuízos sofridos, diretos e indiretos.

A Tabela 9.6 mostra os resultados encontrados considerando o universo de trabalhadores nas


firmas para os cenários de estudo.

Tabela 9.6 – Número total de trabalhadores atingidos – Protótipo1

Característica Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos

Total de trabalhadores atingidos 3.552 9.150 11.461


- Morador na ADA ou AE 1.440 1.997 2.912
- Morador dos nós 2.112 7.153 8.549
- Com domicílio também atingido 117 228 619
Nota: Refere-se aos trabalhadores que tiveram a firma em que trabalha inundada.

Observa-se, portanto, que 74% dos trabalhadores atingidos pela inundação com tempo de
retorno de 100 anos não são domiciliados na região. Se considerada a média de 1,43
trabalhadores por domicílio, em Belo Horizonte no ano 2000 (IBGE, 2000), ao universo de
3.780 domicílios atingidos diretamente (Tabela 9.4) são incorporados 7.558
domicílios ·, segundo a Tabela 9.6) tocados indiretamente, totalizando 11.338

domicílios atingidos, o que corresponde um crescimento de 200% nos domicílios afetados.


Ressalta-se, ainda, os agentes que possuem dupla vulnerabilidade: além de terem o local de
moradia inundado, também estão empregados em uma firma com exposição ao risco.

A Figura 9.7 ilustra as informações da Tabela 9.6 mostrando a distribuição percentual dos
trabalhadores das firmas atingidas segundo o domicílio de origem. Observe que os links
externos entre a região afetada e o restante da região são bastante significativos.

313
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100%
90%
80%
70% 59%
60% 78% 75%
50% NÓS
40% ADA/AE
30%
20% 41%
10% 22% 25%
0%
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos

Figura 9.7 – Distribuição percentual dos trabalhadores das firmas atingidas pela inundação
segundo região de domicílio

Os links são de acesso e também de valor. Para ilustrar, é mostrado, para o cenário de tempo
de retorno Tr = 100, o valor da renda dos trabalhadores que é exposta ao risco com a
inundação das firmas. Observe que cerca de 80% da renda gerada pelas firmas potencialmente
atingidas gera poder de compra para trabalhadores domiciliados fora da ADA/AE, a qual
possivelmente alimentará as vendas em outras regiões da cidade.

Tabela 9.7 – Renda salarial em risco para uma inundação com Tr= 100 anos - Protótipo (em
reais de 2000)1

Renda salarial em risco Tr = 100 anos

Total da renda salarial em risco 17.425.407


- Renda de morador ADA/AE 3.045.098
- Renda de morador dos nós 14.380.309
- De domicílio atingido 34.2431
Nota 1. Considera apenas a renda que é auferida em firmas ou unidades econômicas expostas ao risco.

Além de serem opções de renda, algumas firmas atingidas também são opções de consumo
para as famílias. A importância delas para o bem-estar dos consumidores depende de vários
aspectos: diferenciação do produto, proximidade, essencialidade, volume de concorrentes,
preço, etc. Neste estudo, os preços são considerados constantes.

Para analisar a interferência da inundação nos padrões de gasto das famílias, primeiramente, é
discutido o impacto em termos gerais, a seguir é dado maior enfoque às características das
firmas atingidas em termos de reflexo no bem-estar do consumidor.

A fim de se discutir a influência isolada da inundação das firmas nos gasto das famílias, não
foi introduzida na análise qual seria impacto sobre as despesas considerando também a
314
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
inundação dos domicílios. Entretanto, sabe-se da importância desta discussão, a qual é feita na
análise dos indicadores.

A Figura 9.8 mostra o impacto da inundação nos gastos médios ocorridos na cidade durante
um dia qualquer. O cenário “cotidiano” representaria um dia de normalidade nos gastos do
domicílio. Os gastos se situam na faixa de 11 milhões de reais, nível que pode ser considerado
como aquele em que há um relativo equilíbrio na cidade. A ocorrência da inundação
representa o choque que leva os agentes a reorganizarem suas estratégias de consumo.
Segundo o tipo de gasto e ante a inundação da firma ofertante usual, alguns consumidores
resolvem adiar as compras, outros, substituem os pontos de consumo.

Observa-se que, em termos globais, o choque representou um “desequilíbrio” de 10% no


nível de consumo. Ele indica o consumo potencialmente perdido durante um dia de
inundação. Os gastos que contribuíram para este comportamento são aqueles pertencentes aos
grupos de gastos B, C, D e F, pois para eles considerou-se a possibilidade de adiamento de
consumo, tendo em vistas suas características de essencialidade, substituibilidade e a curta
duração da inundação sobre as firmas ofertantes.

Cotidiano Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos

10
Em milhões de reais de 2000

Gf
5,74
8 5,41 5,28 Ge
4,98
Gd
6 Gc
0,60 0,60 0,60
0,52 0,60 Gb
0,48 0,47 0,43
4 1,40 1,30 1,25 1,20 Ga
0,50 0,46 0,44 0,41
2
2,53 2,53 2,53 2,53

Figura 9.8 – Distribuição dos gastos segundo os grandes grupos de despesa e tempos de
retorno da inundação

Na Figura 9.9 é enfatizada a queda ocorrida nos gastos devido à estratégia de adiamento das
famílias.

315
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0 0
Cotidiano Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
-0,02

-0,04 -5%
-0,06 -6%
-0,08

-0,1 -10%

-0,12

Gasto Total

Figura 9.9 – Variação total dos gastos das famílias, considerando diferentes probabilidade
de inundação e impacto

Duas questões centrais devem ser evidenciadas na discussão. Primeiramente, a queda dos
gastos mostrada na Figura 9.9 representa uma situação de desequilíbrio momentâneo na
cidade e não uma redução das vendas de fato. Considerando as firmas atingidas isoladamente,
a queda pode indicar perda de receita, mesmo em horizonte temporal mais amplo, mas
também a possibilidade das firmas a recuperarem posteriormente caso exista uma “fidelidade”
dos consumidores em relação à firma ofertante. Por outro lado, a ocorrência de substituição da
unidade de consumo pelo agente, indica que a firma perdeu consumidores. Do ponto de vista
econômico, quanto maior o nível de substituição menor o deslocamento em relação ao ponto
de equilíbrio dos gastos.

Na ótica do consumidor, tanto o adiamento quanto a transferência do consumo significa perda


de bem-estar. Ao escolher uma estratégia em detrimento da outra, pressupõe-se que o agente
escolha aquela que leve a menor perda de utilidade. O indicador de risco de acesso às
unidades de consumo, discutido no item 9.5.1, procura captar exatamente o número relativo
de consumidores com as firmas preferenciais de acesso inundadas, induzindo-os a uma
escolha second best.

Ao substituir a firma ofertante, o consumidor pode ser obrigado a percorrer maior distância de
deslocamento. Uma forma de se inferir esta perda de utilidade é por meio de um indicador
que relaciona o gasto com a distância percorrida para efetuá-lo. Ele foi estimado para os
cenários de análise, considerando os gastos em que a proximidade era o critério relevante de
escolha da unidade econômica. Verificou-se que a mediana da perda de utilidade nos
domicílios é de 11% para o cenário de inundação com tempo de retorno Tr = 100 anos. Para
os outros cenários de inundação, ela se situa em torno de 8%.
316
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9.2.4 Análise sob a ótica das firmas atingidas: vendas, custos e lucros

A inundação na ADA atingiu um número significativo de firmas, como mostrado na Tabela


9.8:

Tabela 9.8 – Impacto da inundação sobre as firmas da ADA e AE


Firmas atingidas
Zonas Total de firmas
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
1 775 0 0 0
2 2.489 399 487 752
3 81 0 0 0
4 630 0 153 258
5 287 0 0 0
6 783 225 225 278
Total 5.045 624 865 1.288

Observe que as zonas 1, 3 e 5 possuem menor risco para as firmas, pois elas não se encontram
expostas mesmo a uma inundação de tempo de retorno de 100 anos. Dada a localização da
zona 4, esta não é afetada por inundações freqüentes. Do total de 5.045 firmas, 1.288 são
atingidas pelas águas nas áreas inundáveis em um evento de tempo de retorno de 100 anos, o
que corresponde a 26% das firmas da região, valor significativamente elevado. Ele representa
cerca de 5% do total de firmas presente no protótipo,

Na análise por CAP, verificou-se que, em termos absolutos, as atividades mais expostas ao
risco de inundação pertencem às atividades diversas de escritório (CAP 74); a atividades de
comércio atacadista (CAP 53010) e os serviços de alimentação (CAP 55030), o que
representa um total de 294 firmas.

Em termos do impacto relativo do evento sobre os setores de atividade na ADA/AE, 100%


das atividades de serviços veterinários (CAP 85020) são atingidas, o que corresponde às três
unidades existentes na região; 67% das firmas ligadas a atividades petroquímicas (CAP 23)
foram expostas à inundação, totalizando oito firmas e 63% das unidades da administração
pública no local (CAP 75), ou seja, cinco firmas foram diretamente afetadas. Observe que esta
análise é em termos relativos. Alguns setores fortemente impactados em termos absolutos,
como o setor alimentício, devido à grande densidade de estabelecimentos existente, não
representam impacto considerável em termos relativos.

Embora as firmas não ocupem centralidade neste trabalho, ante as informações existentes no
modelo, algumas análises e considerações podem ser feitas a fim de avaliar qual seria um
possível impacto da inundação na ótica das firmas atingidas.

317
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Para os trabalhadores, os salários representam sua capacidade de compra; para as firmas, os
salários pagos é um custo variável. Em uma ótica microeconômica, ele é parte do valor
adicionado no processo de produção.

O valor adicionado é o valor da riqueza gerada pela firma no processo produtivo. Ele equivale
à remuneração dos diversos atores que contribuíram direta ou indiretamente para sua criação,
como os empregados que fornecem a mão-de-obra, os investidores que fornecem o capital, os
financiadores que emprestam os recursos e o governo que provê a lei e a ordem, infra-
estrutura sócio-econômica e os serviços de apoio.

A inundação, ao atingir as firmas, implica em perda de valor adicionado, pois ela,


normalmente, por força contratual é obrigada a pagar os salários de seus funcionários, mesmo
não funcionando. Além disso, há perda de lucro pelas vendas cessantes. Portanto, em uma
possível formulação dos danos indiretos sofridos pelas firmas tem-se:

Perdas econômicas da firma em decorrência da inundação = perda do valor adicionado =


salários pagos com paralisação de atividades + lucro perdido pelas vendas cessantes

Entretanto, a única informação de remuneração existente no protótipo refere-se aos salários,


os lucros não foram introduzidos no modelo. Em uma primeira análise, será considerado
como indicador da perda sofrida pela firma o valor dos salários pagos nos dias de paralisação
de atividades (Equação 9.1).

9.1

Onde:
IndF1 = danos indiretos da firma;
WT /26 = salários totais pagos em um dia;
dp = número de dias de paralisação das atividades. Sendo que dp ≥ número de dias da
inundação.

No cenário de inundação de curta duração aqui discutido, a paralisação das atividades pode
levar de um dia até vários dias, o que varia de acordo com os danos, sobretudo os danos
diretos, sofridos pelas firmas. Nesta pesquisa definiu-se a duração segundo um critério que
considera a profundidade e os possíveis danos diretos à firma.

318
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Pode-se levantar a questão que, mesmo com as atividades paralisadas, os trabalhadores talvez
ainda estejam exercendo funções na firma, logo não haveria uma perda como mostrada na
Equação 9.1. Entretanto, como existem vários outros possíveis custos associados à
recuperação das firmas, como custo de transferência da produção para locais mais seguros,
custos de limpeza, custos adicionais de energia elétrica, pagamento de horas extras, condições
sub-ótimas de trabalho, desvio de funções, etc., optou-se por incorporar integralmente os
salários nos dias de paralisação como indicação de danos indiretos.

A Figura 9.10 mostra os valores obtidos para os danos indiretos nas firmas da ADA atingidas
diretamente pelas águas:

1.800
1.600 1.600
IndF (em mil reais de 2000)

1.400
1.200
1.102
1.000
800
600
400 430
200
0
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos

Figura 9.10 – Danos indiretos totais sofridos pelas firmas atingidas, considerando o custo
dos salários pagos na inundação

No cenário de máxima ameaça, de tempo de retorno de 100 anos, estes danos representam
cerca de 3% de perda do valor adicionado na ADA/AE em média, por mês, na forma de
salários. Considerando apenas as firmas atingidas, eles representam respectivamente 6,67%,
8,21% e 9,18% da massa salarial mensal nos cenários de inundação de Tr = 5 anos, Tr = 25
anos e Tr = 100 anos, respectivamente.

Como ilustração, é feita uma segunda análise, que incorpora nos danos indiretos também os
lucros cessantes. Uma proxy para os lucros da firma seria o valor das vendas menos os custos
totais de produção (Equações 9.2 e 9.3). Logo, tem-se:

9.2

Sendo que:

319
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
9.3

Onde:

IndF2 = danos indireto da firma (apenas daquelas que ofertam para as famílias);
WT /26 = salários totais pagos em um dia;
dp = número de dias de paralisação das atividades;
∆PF = variação do lucro da firma em decorrência da inundação;
VT = vendas médias feitas em um dia.
CT = custo médio de produção em um dia.

Enquanto na Equação 9.1 todas as firmas atingidas foram incorporadas na análise, pois o
valor dos salários pagos é discutido para o universo das atividades do protótipo, nas Equação
9.2 e Equação 9.3 consideram-se apenas as perdas sofridas pelas firmas que vendem bens para
as famílias.

Como não se discutiu o custo de produção nesta pesquisa, considera-se que o lucro é 10% do
valor das vendas. Este é um valor ilustrativo, porém é também um valor de referência
utilizado pelos profissionais da área de economia e finanças. O resultado da análise feita
segundo as hipóteses ora descritas é mostrado na Figura 9.11.

2.500
2.206
2.000
Vamores em mil reais de 2000

1.500 1.568
1.432

1.000 1.080

633 638
500 415 352
218
0
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos

Custo do salário Perda de Lucro Total

Figura 9.11 – Danos indiretos totais sofridos pelas firmas atingidas e que ofertam bens e
serviços para as famílias, considerando o custo dos salários pagos na inundação e os
lucros cessantes

320
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Os valores apresentados na Figura 9.11 representam 3,0%, 4,7% e 4,6% do total das vendas
médias mensais feitas pelas firmas analisadas, nos cenários de inundação Tr = 05 anos, Tr =
25 anos e Tr = 100 anos, respectivamente.

Mas a questão fundamental a ser discutida na ótica econômica é em que magnitude as outras
firmas do protótipo sofrem interferência da inundação ocorrida na ADA, ou seja, a
interferência da inundação nos links econômicos externos à ADA. Desta forma é possível
verificar se a rede econômica se articula visando compensar os efeitos de rupturas em alguns
de seus nós.

Tabela 9.9 – Valor das vendas para as famílias nos quatro cenários de estudo
Região Cotidiano Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
ADA e AE 5.894.979 5.375.331 5.164.004 4.672.471
Nós 5.404.467 5.413.080 5.408.658 5.481.041
Total 11.299.446 10.788.411 10.572.662 10.153.512

Observe na Tabela 9.9 o ligeiro “aquecimento” nas vendas ocorrido nos nós. Ele se deve ao
efeito da substituição de consumo que leva os domicílios a procurarem outros pontos de
consumo quando a primeira opção está com a oferta paralisada. A perda de vendas das firmas
afetadas em um dia de inundação foi de cerca de 1,6 milhão de reais, mas a variação total do
valor do consumo foi de 1,1 milhões, o que indica que a economia no dia amorteceu o
impacto em 28%. Graficamente, é mostrada esta variação das vendas em termos percentuais
(Figura 9.12):

5,0%

0,2% 0,1% 1,4%


0,0%
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
-4,5%
-5,0% -6,4%
ADA e AE
-8,8%
-10,0% -10,1% Nós
-12,4%
Total
-15,0%

-20,0% -20,7%

-25,0%

Figura 9.12 – Variação no valor das vendas segundo os três cenários de ocorrência da
inundação

321
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9.2.5 Análise dos fluxos de tráfego

Os danos monetários associados ao sistema de transporte são definidos segundo metodologia


descrita no item 8.6. Cinco itens são avaliados monetariamente: o consumo de combustível, o
valor do tempo de deslocamento e o custo associado às emissões de monóxido de carbono
(CO), hidrocarbonetos (HC) e óxido de nitrogênio (NOx).

As simulações de tráfego foram feitas para os quatro cenários de análise e com dois horários
de início da inundação: 10h e 17h. Por meio da criação dos mapas de inundação para a região
de risco foi possível estabelecer quais os links (trechos) viários que seriam atingidos pelas
águas.

Verificou-se que as águas da inundação alcançaram treze links viários, independentemente do


cenário de risco hidrológico. A mudança verificada entre os cenários refere-se à extensão do
link impactada e a profundidade do escoamento associada à mesma.

Considerou-se que a duração da perturbação no trecho seria a mesma que a da inundação.


Ressalta-se que embora se saiba que, devido aos trabalhos de limpeza e recuperação, a
duração da interrupção na via possa ser superior ao do evento em si, esta discussão não foi
introduzida no estudo.

Observaram-se, portanto, os seguintes aspectos para a simulação da perturbação no tráfego na


ADA/AE:

Tabela 9.10 – Aspectos da ameaça da inundação sobre a rede viária


Duração da Profundidade
Cenário Links atingidos
inundação nos link
Cotidiano 0 0 0
Inundação Tr = 5 anos 13 3h ≥ 15 cm
Inundação Tr = 25 anos 13 3h10‟ ≥ 15 cm
Inundação Tr = 100 anos 13 3h50‟ ≥ 15 cm

A Figura 9.13 mostra o curso d`água e a rede viária na ADA e AE. No mapa superior, tem-se
o rio escoando em calha menor. No inferior, é mostrado o transbordamento do rio
considerando os três cenários de risco hidrológico, os quais se distinguem pelas tonalidades
de verde.

322
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Figura 9.13 – Rede viária e curso d`água na ADA e AE – Protótipo

Verificadas as condições da rede viária e da perturbação, incorpora-se o fluxo de veículos da


região. O total de veículos em circulação foi estimado 53.701 mil, sendo que cerca de 6% são
de ônibus (a determinação do fluxo é descrita no item 9.2.2). Estes fluxos foram convertidos
em unidades de veículos equivalentes ligeiros (UVE). Considerando os fluxos de ida e volta;
chega-se ao fluxo diário de 110.647 UVE/ dia.

Em termos médios, foram encontrados os seguintes valores para as variáveis de interesse


(Tabela 9.11 e Tabela 9.12):

Tabela 9.11 – Resultados médios por viagem e por UVE na simulação de tráfego – ADA e
AE, início da inundação às 10h
Inundação Inundação Inundação
Variáveis Cenário Atual
Tr = 05 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
Consumo de Combustível (l) 0,3195 0,5654 0,5884 0,6848
Emissão de HC (g) 0,0705 0,1041 0,1072 0,1204
Emissão de CO (g) 16,731 23,982 24,671 27,482
Emissão de NOx (g) 0,2985 0,3590 0,3649 0,3894
Emissão de CO2 (g) 742,1780 1317,9240 1371,8917 1597,3958
Tempo Médio de Viagem (min) 6,25 17,87 18,96 23,52
Velocidade Média (km/h) 38,75 13,55 12,77 10,29

323
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Tabela 9.12 – Resultados médios por viagem e por UVE na simulação de tráfego – ADA e
AE, início da inundação às 17h
Inundação Inundação Inundação
Variáveis Cenário Atual
Tr = 05 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
Consumo de Combustível (l) 0,3195 0,5619 0,5830 0,6577
Emissão de HC (g) 0,0705 0,1036 0,1065 0,1168
Emissão de CO (g) 16,731 23,873 24,501 26,703
Emissão de NOx (g) 0,2985 0,3587 0,3643 0,3848
Emissão de CO2 (g) 742,1780 1309,7568 1359,0953 1534,0706
Tempo Médio de Viagem (min) 6,25 17,70 18,69 22,22
Velocidade Média (km/h) 38,75 13,68 12,95 10,89

Observe nos resultados das Tabela 9.11 e Tabela 9.12 que os valores de consumo de
combustível, emissão de poluentes e tempo médio de viagem crescem com o aumento do
tempo de retorno do evento. A velocidade média, obviamente, cai, já que haverá maior
congestionamento na rede com a interrupção de links pela inundação. Na Tabela 9.11
observa-se, por exemplo, que o tempo médio de viagem cresce 276% entre o cenário
cotidiano e o de maior impacto (Tr=100 anos). A velocidade média, por sua vez, tem uma
queda de 455%, comparando-se os mesmos cenários. Alguns resultados são ilustrados na
Figura 9.14.

25 50
Velocidade (km/h)

20 40
tempo (min)

15 30
10 20
5 10
0 0
Cotidiano Tr = 5 Tr = 25 Tr = 100 Cotidiano Tr = 5 Tr = 25 Tr = 100

Tempo Médio (min) Velocidade (km/h)

Figura 9.14 – Tempo médio de viagem e velocidade média por veículo nos quatro cenários
de estudo – Início da inundação às 10h, ADA e AE – Protótipo

Um ponto a ressaltar são os valores bastante próximos e mesmo ligeiramente superiores do


choque às 10h em relação ao das 17h (Tabela 9.11 e Tabela 9.12). A explicação é que, apesar
do fluxo de veículos ser maior no final da tarde do que no meio da manhã, ele passa a
diminuir continuamente a partir das 19h, ao contrário do que ocorre no período da manhã,
quando há uma tendência de crescimento do fluxo. Ou seja, durante a manhã há maior
possibilidade de propagação da perturbação pelo efeito cumulativo do fluxo de veículos.

O comportamento descrito no parágrafo anterior mostra uma das potencialidades em se


utilizar a micro-simulação dinâmica. A interação dinâmica entre agentes muitas vezes leva a

324
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
um resultado macro-espacial que não seria percebido com a utilização de uma análise estática
baseada em fluxos médios.

Para monetização das deseconomias de transporte associadas ao congestionamento,


primeiramente estimou-se o custo do tempo de viagem, segundo Equação 8.6 apresentada no
item 8.6.

As informações sobre w (renda auferida pelo agente) e yw (número de horas de trabalho por
mês) da Equação 8.6 podem ser obtidas individualmente para os agentes domiciliados na
ADA e AE. Para o resultado global, utilizam-se os valores médios salariais de todos os
trabalhadores do protótipo. Optou-se por não utilizar precisamente os salários do fluxo de
trabalhadores que somente saem e entram na região (item 9.2.1), porque este procedimento
não incluiria a renda dos trabalhadores que utilizam a rede impactada como passagem
(variável não captada no modelo). O valor de tv (tempo de viagem percorrido na área de
estudo) é obtido, por veículo, pela simulação de tráfego.

Desta forma, tem-se (Tabela 9.13):

Tabela 9.13 – Custo total do tempo de viagem em um dia na rede viária da ADA e AE,
segundo cenários de risco hidrológico
Inundação de 10h Inundação de 17h
Valor do tempo (R$ de 2000) Valor do tempo (R$ de 2000)
Cenários
Aumento % Aumento %
Total (em relação ao Total (em relação ao
cenário cotidiano) cenário cotidiano)
Cotidiano 125.485 0% 125.485 0%
Evento Tr = 05 anos 358.787 186% 355.374 183%
Evento Tr = 25 anos 380.672 203% 375.251 199%
Evento Tr = 100 anos 472.226 276% 446.125 256%

Observe na Tabela 9.13 que o custo de do tempo de viagem considera as viagens feitas por
todas as pessoas que circularam em um veículo na ADA/AE durante um dia. Optou-se por
rodar a simulação durante um dia, a fim de considerar integralmente os efeitos cumulativos e
de dissipação do congestionamento.

O segundo componente considerado nos custos do sistema é o consumo de combustível. Ao


contrário do custo do tempo de atraso ele incide sobre o número de veículos que circulam e
não sobre o número de pessoas. Sua formulação é descrita na Equação 8.5, do item 8.6. As
variáveis yc (quantidade total consumida por veículo) e dv (distância percorrida na área de

325
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
estudo) são obtidas a partir da simulação do tráfego durante um dia de “normalidade” e
durante os dias de inundação.

Obtiveram-se os resultados para os cenários estudados mostrados na Tabela 9.14:

Tabela 9.14 – Custo total do consumo de combustível em um dia na rede viária da ADA e
AE, segundo cenários de risco hidrológico
Inundação de 10h Inundação de 17h
Valor consumido (R$ de 2000) Valor consumido (R$ de 2000)
Cenários
Aumento % Aumento %
Total (em relação ao Total (em relação ao
cenário cotidiano) cenário cotidiano)
Cotidiano 31.830 0% 31.830 0%
Evento Tr = 05 anos 56.328 77% 55.980 76%
Evento Tr = 25 anos 58.620 84% 58.082 82%
Evento Tr = 100 anos 68.224 114% 65.524 106%

Finalmente, têm-se os custos monetários para a sociedade dos poluentes considerados. A


formulação utilizada foi mostrada nas Equações 8.7, 8.8, e 8.9, no item 8.6. A Tabela 9.15
mostra o somatório dos valores encontrados para os três poluentes discutidos.

Tabela 9.15 – Custo total dos poluentes em um dia na rede viária da ADA e AE, segundo
cenários de risco hidrológico
Inundação de 10h Inundação de 17h

Valor consumido (R$ de 2000) Valor consumido (R$ de 2000)


Cenários
Aumento % Aumento %
Total (em relação ao Total (em relação ao
cenário cotidiano) cenário cotidiano)
Cotidiano 106,86 0% 106,86 0%
Evento Tr = 05 anos 142,40 33% 141,97 33%
Evento Tr = 25 anos 145,79 36% 145,10 36%
Evento Tr = 100 anos 159,77 50% 156,26 46%

Observe que os valores mostrados na Tabela 9.15 são bastante inferiores àqueles relacionados
ao custo do tempo ou do combustível. Provavelmente, ao se utilizar a metodologia do
IPEA/ANTP (1997) há uma subestimação dos valores ao se concentrar apenas na análise os
impactos à saúde. Outros impactos, como os relacionados ao meio ambiente não são
considerados nessa metodologia o que pode sugerir uma mudança de paradigma de análise
econômica com maior tendência à valorização do impacto ambiental.

A participação de cada poluente nos custos é mostrada na Figura 9.15. Devido à semelhança
dos resultados obtidos para o cenário de inundação na parte da manhã ou no final da tarde, são
mostrados apenas os resultados para a inundação com início às 17h.

326
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
180
160

Valores em reais de 2000


140
120 63,01
58,74 59,66
100
NOX
80 48,88 19,39
17,19 17,68 HC
60
11,70 CO
40 73,87
66,04 67,77
20 46,28

0
Cenário Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos
cotidiano

Figura 9.15 – Custos associados à poluição emitidas pelos veículos durante um dia nos
quatro cenários de estudo – Início da inundação às 17h, ADA e AE – Protótipo

Observa-se que, entre os poluentes, o CO apresenta valor mais elevado; não por ter custo
unitário maior, mas pelo elevado volume que é emitido pelo veículo em comparação aos
outros dois poluentes (ver Tabela 9.12). Os HC, embora tenham o maior custo, são
relativamente pouco emitidos pelos escapamentos, implicando em menor custo global.

Finalmente, na Figura 9.16 é mostrado o valor total das deseconomias associados ao tráfego.
Mostram-se os impactos para os eventos com início às 10h (manhã) e com início às 17h
(tarde).

600.000
500.000
400.000
300.000
200.000
100.000
0
Manhã Tarde Manhã Tarde Manhã Tarde Manhã Tarde

Cenário cotidiano Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos

Tempo Combustível Poluentes

Figura 9.16 – Total dos custos associados ao tráfego durante um dia – ADA e AE –
Protótipo

327
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Como já mencionado, os valores para o impacto no sistema de transportes no meio da manhã
ou fim da tarde são similares. Os poluentes possuem valores tão inferiores aos associados ao
tempo ou ao combustível adicionais, que eles não são mesmo identificáveis na Figura 9.16.
Observa-se que o tempo é, segundo a metodologia utilizada pelo IPEA, o componente mais
valorizado no estudo.

9.3 Avaliação dos danos diretos e indiretos sobre os domicílios e firmas


da ADA

9.3.1 Avaliação dos danos diretos e indiretos sobre os domicílios da ADA

9.3.1.1 Avaliação dos danos diretos

A análise dos danos diretos seguiu metodologia detalhada no item 8.8. Foram verificados os
danos à construção e ao conteúdo dos domicílios da ADA. Além dos 32 ativos “imóveis” do
domicílio, incorporou-se também a estimativa dos danos aos automóveis.71 Empregou-se
0,25cm como a profundidade mínima de inundação para ocorrência dos danos à construção e
de 0,35cm para o surgimento das avarias ao conteúdo. Para os automóveis a profundidade
mínima de impacto direto usada é de 0,40cm.

Os domicílios atingidos e os danos diretos sofridos por eles são mostrados na Tabela 9.16.

Tabela 9.16 – Domicílios atingidos e valor total e médio dos danos diretos
(em reais de 2000) - Protótipo
Danos médios por
Tempo de retorno Domicílios atingidos Danos totais
domicílio
5 anos 962 2.637.625 2.742
25 anos 1.245 4.094.205 3.289
100 anos 1.930 6.490.616 3.363
Nota: consideram-se os domicílios atingidos por um escoamento com profundidade superior a 0,25 cm e também
aqueles que tiveram somente o veículo atingido pelas águas.

A participação dos danos ao conteúdo e à construção no total de danos diretos nos domicílios
atingidos é mostrada Figura 9.17.

71
Deve ser feita a ressalva que, embora o seguro de automóvel seja relativamente difundido no Brasil, estimativa
de 1998 aponta que apenas ¼ do total de veículos em circulação no país são segurados (Galiza, 1998). Ademais,
independente do nível de cobertura, a incorporação dos veículos na estimativa de danos se justifica, tanto por
representar um item de grande riqueza do domicílio, como por tratar-se aqui de uma análise que considera, como
componente da vulnerabilidade ou da resiliência, a capacidade do domicílio em se recuperar após a inundação
com recursos próprios.
328
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
7,0
6,0

Em milhões de reais de 2000


5,0 2,58

4,0
1,59
3,0
2,0 1,16 3,91
1,0 2,50
1,48
0,0
Tr = 5 anos Tr = 25 anos Tr = 100 anos

Conteúdo Construção

Figura 9.17 – Danos diretos sofridos pelos domicílios da ADA para os cenários de
inundação estudados - Protótipo

Observa-se que os danos ao conteúdo são superiores aos danos à construção nos três cenários
de análise. Eles representam, respectivamente, 56%, 61% e 60% dos danos diretos associados
as inundação de Tr = 5 anos, Tr = 25 anos e Tr = 100 anos, respectivamente.

Como a metodologia de cálculo dos danos sobre os veículos envolve algumas


particularidades, os resultados são destacados separadamente.

Tabela 9.17 – Danos diretos aos veículos dos domicílios atingidos


Valor dos danos
Domicílios atingidos
1
Danos médios aos
Cenários de aos veículos
Com posse Com veículo veículos por
inundação Total (em reais de 3
de veículo exposto
2 domicílio
2000)
Tr = 5 anos 962 199 47 162.125 3.449
Tr = 25 anos 1.245 310 94 267.852 2.849
Tr = 100 anos 1.930 503 145 481.961 3.324
Notas: 1. Consideram-se os domicílios atingidos por um escoamento com profundidade superior a 0,25 cm e
também aqueles que tiveram somente o veículo atingido pelas águas.
2. Veículo exposto a escoamento com profundidade superior 0,40cm.
3. Consideram-se apenas os domicílios com posse de veículo exposto.

Um aspecto a ressaltar é a grande participação dos danos aos veículos em relação aos danos
totais nos domicílios onde o automóvel foi exposto ao impacto. Ele representa, em média,
mais da metade dos danos totais, como se observa na Figura 9.18.

329
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Figura 9.18 – Média da participação dos danos aos veículos em relação aos danos totais
nos domicílios onde eles ocorrem – Protótipo

i Capacidade de recuperação do domicílio

Juntamente com os danos, um aspecto central a ser discutido é a capacidade de recuperação


do domicílio, retirando o caráter estritamente financeiro da análise e incorporando a dimensão
social. A Tabela 9.18 apresenta alguns indicadores que auxiliam nesta discussão.

Tabela 9.18 – Domicílios atingidos, valor total dos danos diretos (em reais de 2000) e renda
domiciliar (em reais de 2000) – Protótipo1
Renda Participação dos danos na Número de anos necessário para
Cenários de
média renda anual retorno ao nível de bem-estar inicial
inundação
domiciliar Média Mediana Média Mediana
Tr = 5 anos 428 72% 57% 5,9 4,8
Tr = 25 anos 537 78% 56% 6,4 5,1
Tr = 100 anos 591 73% 52% 6,0 4,3
Nota 1: Inclui danos à construção e ao conteúdo, inclusive automóvel.

A Tabela 9.18 mostra primeiramente o quanto os danos representariam na renda anual


domiciliar. Os valores são expostos em termos da média e da mediana encontrada entre os
domicílios. Com a análise da mediana, minimiza-se a influência dos valores extremos e
obtém-se uma queda significativa no valor da renda comprometida com a recuperação.

Chama atenção a diminuição na relação entre o valor dos danos e a renda nos cenários de
maior risco, especialmente quando o Tr = 100 anos. A justificativa seria a exposição à
ameaça, neste cenário, de novos domicílios com renda domiciliar comparativamente superior
ao valor dos danos. A fim de se descrever melhor a amostra são mostrados os gráficos box
plot para visualização da posição, dispersão, assimetria e dados discrepantes nos cenários de
Tr=5 anos e Tr=100 anos. .

330
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
800 800

12972

11630 22982
600 600
25201
10025
6214
16937
9133
8805
15817
8273 8163
5318
5294
7881
5053
4906
7407
5085
7307
400 7077
4643
18398 400 19277
7222
7172
6809 6831
6809
6762
19158
6188
3990 6106
7185
1025
9819
5874
3884 3290
7733
3865
5775
5747
5596
5571
3060 5583
5570
5407
9985
28668
5405
2476
27489 5375
5290
13045
5212
5187
12210
4927
12200
6487
4881
9746 5058
13145
10308
1624
4851
4798
4746
5637
4676
3116 4846
4716
4620
2468
8696
10356
3151
4430
9845
4399
8164
4332
4327 1511
8386
4519
6530
2233
5846
2923
4979
1730
4184
4117 5673
4289
13317
10624
8335
5543
4160
4137
2662
3987
10034
3959
12346
5607
3831 810
4037
12478
5188
4327
3882
5637
200 3823
11851
12125
2353
4676 200 3781
12608
2450
5434
3692
3688
35385
3684
4846
3140
3649
2333
7281
11968
6251
1805
3526
1591
4445
4435
3355
4366
4362
3232
4761
3850
3132

0 0

-200 -200
N= 962 N= 1930

Danos / Rendimento Danos / Rendimento

(a) Inundação com Tr = 5 anos (b) Inundação com Tr = 100 anos


Figura 9.19 – Diagrama box plot para a relação entre danos diretos / rendimento presente
nos domicílios atingidos (valores em percentual)

A Figura 9.19 ilustra a diferença na distribuição da relação danos / rendimento existente entre
a área inundável com evento de tempo de retorno de 5 anos e a área atingida pela cheia com
tempo de retorno de 100 anos. A ilustração (b) mostra os dados com distribuição mais
assimétrica à direita do que em (a).

Ainda relacionado à recuperação, a Tabela 9.18 mostra o tempo necessário para que o
domicílio retorne ao nível de bem-estar anterior à ocorrência da inundação. Ele foi estimado
considerando que o domicílio alocaria toda a sua renda anteriormente gasta em bens
classificados como de luxo para a recomposição dos itens avariados pela inundação e
recuperação da construção (quinta e sexta colunas da Tabela 9.18).

Observa-se que os valores são elevados, eles se situam entre quatro e cinco anos mesmo em
locais de inundação freqüente. Eles mostram ainda, como anteriormente comentado, que a
planície de inundação de 100 anos incorpora domicílios com maior capacidade de
recuperação.

Ressalta-se que foi considerada na análise a recomposição dos bens às mesmas condições
anteriores, ou seja, ao nível de depreciação média existente antes do evento. Entretanto,
muitos domicílios, por motivos diversos, possivelmente optarão por adquirir bens novos, o
que implicará em um período ainda maior de recuperação do que o mostrado na Tabela 9.18.

331
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Foi feita uma simulação considerando a troca de todos os bens do domicílio avariados em
mais de 50% do seu valor anterior à inundação por bens novos, exceção dos veículos, para os
quais, pelo preço elevado, considerou-se que o domicílio já se satisfaria em recuperá-los às
condições anteriores ao evento. Os valores encontrados para os domicílios atingidos pela
inundação de 100 anos foram de 7,8 e 5,6 anos, respectivamente, para a média a mediana.
São, portanto, significativamente elevados.

Pode ainda ser feita outra hipótese: a de que o domicílio alocaria maior parte da sua renda
para a recuperação do que a que ele tradicionalmente alocaria em bens de luxo. Neste caso,
ele pode estar se vendo obrigado a abrir mão do consumo imediato mesmo de bens
necessários a fim de que possa se recuperar mais rapidamente.

Se os domicílios expostos às inundações freqüentes esperam alcançar o nível de bem-estar de


“equilíbrio” antes da próxima inundação, evitando assim viverem em condições de
precariedade permanente, eles podem planejar um horizonte de recuperação mais estreito. A
questão é particularmente relevante para os domicílios situados em áreas freqüentemente
inundáveis, como aqueles submetidos a inundações de tempo de retorno de 5 anos. Supondo
que eles optem por um horizonte de três anos, isto implica em comprometer, em média, 24%
da renda com a recomposição dos danos.

Como informação complementar, a capacidade de reconstrução é mostrada, em termos


médios, por classe socioeconômica atingida pela inundação de Tr = 100 anos (Tabela 9.20).

Tabela 9.19 – Domicílios atingidos, valor total dos danos diretos (em reais de 2000) e renda
domiciliar (em reais de 2000), por classe socioeconômica – Protótipo, Tr = 100 anos
Participação dos danos na Número de anos necessário para
Classe Renda média
renda anual retorno ao nível de bem-estar inicial
socioeconômica domiciliar
Média Mediana Média Mediana
A1 - - - - -
A2 4.481 13% 11% 1,2 1,1
B1 2.892 9% 8% 0,8 0,7
B2 1.605 35% 31% 2,8 2,5
C 1.033 34% 23% 2,8 1,9
D 475 61% 46% 5,3 4,0
E 211 108% 82% 8,5 6,5
Nota 1: Inclui danos à construção e ao conteúdo, inclusive automóvel.

A Tabela 9.20 não mostra informações para a classe socioeconômica A1 porque não existem
domicílios pertencentes a ela localizados na área de inundação de tempo de retorno de 100
anos. Observe que em B1 a participação dos danos na renda é menor do que em A. Uma
provável explicação é de que, em média, os domicílios da classe A2 foram atingidos por

332
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
profundidades de inundação mais elevadas do que os domicílios da classe B1. A mesma
reflexão pode ser feita em relação aos domicílios da classe B2 e C.

Obviamente, todas estas análises discutem a vulnerabilidade do domicílio considerando sua


capacidade, com recursos próprios, de se reconstruir após o evento. Há que se ressaltar que há
sempre donativos e apoios do governo para as famílias se recuperarem, os quais cumprem um
papel essencial de acelerar o retorno ao bem-estar, principalmente no caso dos domicílios de
baixa renda.

9.3.1.2 Incorporação das deseconomias causadas pelo congestionamento severo do tráfego

Além dos danos diretos, incorporaram-se aos domicílios impactados o custo pelo excesso de
uso de combustível e pelo tempo de atraso devido à ocorrência de congestionamentos
causados pela inundação. Como os custos dos poluentes mostraram-se muito baixos em
relação aos outros componentes dos danos, eles não foram considerados nesta análise. Devem
ser destacados dois critérios utilizados na individualização dos custos associados ao transporte
dos moradores dos domicílios:

 Como o valor do tempo de cada pessoa, segundo a metodologia utilizada, está


associado à sua capacidade de produzir algum valor para a sociedade, o que estaria
refletido na sua capacidade de gerar renda (IPEA/ANTP, 1997: 10), definiu-se o
valor do custo do tempo de atraso pelo congestionamento apenas para os moradores
classificados como trabalhadores no domicílio. Utilizaram-se o salário e número de
horas declaradas pelos mesmos, segundo informações do IBGE (2000).

 Considerou-se o custo associado ao consumo de combustível de cada veículo utilizado


no domicílio.

Os resultados listados na Tabela 9.20 mostram que, para os domicílios atingidos, os custos
adicionais pelo congestionamento no trânsito decorrente da inundação são bastante baixos
em relação aos danos diretos. Portanto, o impacto econômico relacionado ao sistema de
transportes se configuraria como um impacto relevante quando todas as partes envolvidas
são consideradas, já que ele atingirá também pessoas que moram fora da planície de
inundação.

Deve-se ressaltar, entretanto, que se trata de um protótipo, com uma rede viária de
pequena dimensão. Ademais, devem-se mencionar as considerações feitas por Parker,

333
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Green & Thompson (1987) de que a importância das perturbações no trânsito em relação
aos danos totais de uma inundação é variável, pois depende das características específicas
do sistema viário e da região impactada.

Tabela 9.20 – Danos diretos e danos indiretos pelo congestionamento decorrentes da


inundação – ADA, Protótipo (em reais de 2000)
Danos por congestionamento
Cenário de risco Danos diretos severo
hidrológico totais Horário da inundação
10h 17h
Tr = 5 anos 2.637.625 9.574 9.434
Tr = 25 anos 4.094.205 10.471 10.251
Tr = 100 anos 6.490.616 14.227 13.159

9.3.2 Avaliação dos danos diretos e indiretos sobre as firmas da ADA

9.3.2.1 Avaliação dos danos diretos


No presente estudo não se pretende uma análise metodológica dos danos diretos sobre as
firmas. Entretanto, aqui é feita uma pequena digressão sobre eles nas atividades econômicas a
partir da utilização das curvas DPS propostas por Machado (2005).

No protótipo existe uma discretização relativamente fina das atividades comerciais e de


serviços e algumas não são contempladas na pesquisa de Machado (2005). Para aquelas em
que se verificaram similaridades - em termos de tipo de bem ofertado e configuração espacial
do conteúdo, inclusive estoques - às categorias de atividades discutidas em Machado (2005),
utilizaram-se as curvas propostas por aproximação. Quando não se verificaram estas
similaridades, não foi possível fazer a avaliação dos danos diretos.

Além dos casos omitidos, há os pequenos estabelecimentos industriais e atacadistas que, por
não terem sido tratados em Machado (2005) e na falta de alguma referencia sobre a magnitude
dos danos diretos, também não foram avaliados. Antes estas limitações, foram consideradas
na avaliação apenas 46% das firmas atingidas.

Para definição da área construída, variável necessária para estimativa dos danos, já que as
curvas DPS são apresentadas por unidade de área, utilizou-se a mediana de área construída
dos estabelecimentos comerciais e de serviços pesquisados em Machado (2005).

Os danos diretos encontrados são apresentados na Tabela 9.21.

334
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 9.21 – Danos diretos das firmas avaliadas no protótipo
Valor dos danos
Cenário Firmas avaliadas
(em reais de 2000)
Tr = 5 anos 193 2.271.075
Tr = 25 anos 348 5.611.122
Tr = 100 anos 592 10.537.317

Observa-se que, apesar de serem avaliadas apenas 46% das firmas atingidas, os valores são
bastantes elevados, mais altos do que aqueles verificados para os domicílios. Alguns fatores
podem contribuir para este comportamento, como o intenso uso do espaço e o grande volume
de bens expostos, principalmente em atividades de comércio. Além disso, a área construída
das firmas em foco tende a ser maior do que a verificada nas residências.

Possivelmente, tratando-se de um protótipo, o fator mais relevante seria verificar como se


distribuem os danos diretos segundo o tipo de atividade. Na Tabela 9.23 é mostrada a
distribuição dos danos diretos por firma segundo a classificação CNAE e CAP. Utiliza-se o
dano por firma a fim de se evitar a influência da quantidade sobre a magnitude do valor dos
danos.

Tabela 9.22 – Distribuição dos danos diretos por firma segundo classificação da atividade
(Continua)
Participação do
dano unitário no
CAP CNAE Caracterização
total de danos
diretos
65 65 Intermediação Financeira 6%
66 66 Seguros e Previdência Privada 2%
67 67 Atividades Auxiliares da Intermediação Financeira 5%
75 75 Administração Pública, Defesa e Seguridade Social 1%
91 91 Atividades associativas 1%
93 93 Serviços Pessoais 0%
50010 50 Comércio de veículos automotores 2%
50020 50 Serviços de reparação e manutenção de veículos automotores 2%
50030 50 Comércio de peças e acessórios para veículos automotores 3%
50040 50 Comércio, manutenção e reparação de motocicletas 1%
50050 50 Posto de combustíveis 1%
53030 52 Comércio de produtos alimentícios, bebidas e fumo 1%
53041 52 Comércio de tecidos, vestuário e calçados 3%
53050 52 Comércio de madeira, material de construção, ferragens, etc. 2%
53061 52 Comércio de eletrodomésticos, móveis, etc. 12%
53062 52 Comércio de livros, jornais, revistas e papelaria 2%
53063 52 Comércio de produtos farmacêuticos, de perfumaria etc. 2%
53068 52 Comércio de mercadorias em geral 1%
53070 52 Supermercado e Hipermercado 6%

335
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
(Conclusão)
53080 52 Lojas de departamento 18%
53111 52 Reparação e manutenção de eletrodomésticos, calçados, etc. 6%
55030 55 Serviços de alimentação 1%
63021 63 Atividades auxiliares aos transportes (e.g.: estacionamentos) 1%
63030 63 Agências de viagens e organizadores de viagens 1%
64010 64 Atividades de correio 1%
70001 70 Atividades imobiliárias - exceto condomínios prediais 1%
70002 70 Condomínios prediais 1%
80011 80 Educação regular, supletiva e especial 7%
80090 80 Outras atividades de ensino não especificadas 7%
85011 85 Saúde pública e saúde particular 2%
85020 85 Serviços veterinários 2%

Observa-se na Tabela 9.23 que as lojas de departamento e de comércio de eletrodomésticos


são as atividades que apresentam o maior valor dos danos médios por firma. Este
comportamento se justificaria por se tratarem normalmente de estabelecimentos amplos, com
produtos de alto valor agregado e relativamente susceptíveis ao contato com a água.

9.3.2.2 Incorporação da perda de valor adicionado em decorrência da inundação

Para se ter uma avaliação global dos danos, pode-se ainda incorporar ao estudo a estimativa
dos danos indiretos destas firmas, segundo procedimento mostrado no item 9.2.3. Os
resultados encontrados são apresentados na Tabela 9.23.

Tabela 9.23 – Danos diretos e indiretos das firmas avaliadas na ADA (em reais de 2000)
Número de Valor dos Valor dos danos Valor dos danos indiretos
Cenário firmas danos diretos indiretos (perda de salários e
avaliadas (perda de salários) lucros
Tr = 5 anos 193 2.271.075 320.167 491.549
Tr = 25 anos 348 5.611.122 481.761 793.067
Tr = 100 anos 592 10.537.317 880.482 1.485.551

Na Tabela 9.23 o valor dos danos indiretos apresentado na quarta coluna foi estimado
segundo a Equação 9.4 do item 9.2.4. Como este valor tenderia a estar subavaliado, incorpora-
se na quarta coluna uma estimativa de perda de lucro pelas vendas cessantes (Equação 9.3,
item 9.2.4).

Observa-se que os danos diretos parecem ser significativamente mais elevados do que os
indiretos nas firmas atingidas. Como se discute nesta pesquisa cenários de uma inundação de
curta duração, possivelmente estes resultados são justificáveis.

336
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
A Figura 9.20 ilustra a complexidade que envolve as relações econômicas em uma cidade. Por
meio do mercado, vários mecanismos compensatórios são estabelecidos: danos em uma parte
da rede podem significar benefícios em outra (como mostrado na Figura 9.12) o que pode
levar a resultados globais surpreendentes.

Inundação da firma

Danos
Danos diretos
indiretos

Dificuldades financeiras
Reconstrução da firma Transferência espacial e
da firma: diminuição dos
temporal do consumo
investimentos

Dificuldades financeiras
“Aquecimento” “Desaquecimento” Economia não
da economia sofre impacto da firma: diminuição dos
da economia investimentos

“Desaquecimento”
da economia

Figura 9.20 – A inundação na firma e os possíveis reflexos na economia urbana

9.4 Síntese dos indicadores de impacto quantitativo e monetário do


evento
Verificar as interconexões existentes na cidade a fim de analisar as forças que atuam
amortecendo ou propagando o impacto não é tarefa simples. Nesta pesquisa, discutiu-se o
efeito da inundação sobre dois agentes fundamentais: os domicílios e as firmas. Ao atingir os
domicílios, a tendência é uma diminuição do bem-estar e restrição do consumo e, com a
queda do nível de consumo, a economia pode não se restabelecer, mesmo que firmas
procurem suprir a oferta de outras firmas que foram afetadas. Nesta seção, são sintetizados os
principais indicadores quantitativos e monetários discutidos até o momento (Tabela 9.24 e
Tabela 9.25). Nas seções seguintes são analisados também alguns indicadores relacionados à
ocorrência da inundação, mas os mesmos são apresentados na forma de números-índices.

337
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 9.24 – Indicadores quantitativos de impacto
Impacto indireto
Domicílios Firmas
(propagação do impacto)
Domicílios
Cenário Região Com Trabalha- Veículos
1 Com danos 1 com cesta
Expostos 2 Expostas danos dores em
diretos 2 de consumo
diretos atingidos circulação
atingida
ADA 1.957 962 624 409 1.440 2.041 53.701
Tr =
Nós 0 0 0 0 2.112 11.534 -
5 anos
Total 1.957 962 624 409 3.552 13.575 -
ADA 2.538 1.245 865 654 1.997 2.468 53.701
Tr =
Nós 0 0 0 0 7.153 17.149 -
25 anos
Total 2.538 1.245 865 654 9.150 19.617 -
ADA 3.780 1.930 1.288 1.100 2.912 3.241 53.701
Tr =
Nós 0 0 0 0 8.549 158.417 -
100 anos
Total 3.780 1.930 1.288 1.100 11.461 161.658 -
Nota: 1. Basta que a água chegue até a via onde se localiza a edificação para que o domicílio ou firma sejam
considerados expostos (y ≠ 0), independentemente de estarem ou não no primeiro pavimento da edificação.
2. A água atinge a edificação (y ≥ 0,25 cm) e o domicílio ou firma está no primeiro pavimento.

Tabela 9.25 – Indicadores monetários de impacto (em reais de 2000)


Massa salarial paga
Região 1 Deseconomias
Cenário Danos diretos Variação nas vendas com vendas
de tráfego
cessantes
ADA/AE 2.637.625 -519.648 429.701 254.074
Tr =
5 anos
Nós 0 8.613 0 0
Total 2.637.625 -511.035 429.701 254.074
ADA/AE 4.094.205 -730.975 1.102.241 276.056
Tr =
25 anos
Nós 0 4.191 0 0
Total 4.094.205 -726.784 1.102.241 276.074
ADA/AE 6.490.616 -1.222.507 1.599.509 354.383
Tr =
100 anos
Nós 0 76.574 0 0
Total 6.490.616 -1.145.933 1.599.509 354.383
Nota: Por não ter sido feita e estimativa de todas as firmas atingidas, considerou-se apenas os danos diretos dos
domicílios.

As Tabela 9.24 e Tabela 9.25 ilustram as relações existentes no espaço; elas mostram que
dificilmente um choque na rede mantém-se restrito ao local diretamente atingido por ele
(Figura 9.21)

Agentes
com funções
Agentes na planície
situados na de
planície de inundação
inundação
Agentes
diretamente
atingidos

Figura 9.21 – A propagação do impacto da inundação

338
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9.5 Indicadores de risco e vulnerabilidade

9.5.1 Indicadores de risco para os domicílios

Os principais resultados obtidos com o estudo dos indicadores de risco sobre os domicílios,
segundo a metodologia presente na seção 8.9, são apresentados aqui. São mostradas as
análises considerando a área inundável para um tempo de retorno de 100 anos, usualmente
uma referência espacial para estudos de vulnerabilidade da população à inundação (Tabela
9.26).

Tabela 9.26 – Distribuição dos índices de risco e de resiliência entre os domicílios atingidos
pela inundação – Inundação com tempo de retorno de 100 anos

Valor do índice IRDM1 IRDM2 IRDH1 IRDH2 IRDA1 IRDA2 IDS1 IDS2 IDSG
Índice < 0,33 1.903 2.417 1.220 308 440 3.277 233 2.899 213
0,33 ≤ Índice < 0,56 1.589 553 1.076 1.410 1.729 173 2.259 223 2.641
0,56 ≤ Índice < 0,78 288 810 823 1.506 1.210 79 882 587 526
Índice ≥ 0,78 0 0 661 556 401 251 406 71 400
Total 3.780 3.780 3.780 3.780 3.780 3.780 3.780 3.780 3.780

Ressalta-se que na Tabela 9.26 os índices de risco e de resiliência tem idéias opostas: quanto
maior os primeiros, maior o risco; e quanto maior a resiliência, menor a possibilidade de
ocorrência da magnitude de danos associados ao risco. Portanto, um domicílio que tenha um
alto potencial de danos materiais, humanos e de acesso, se possui alta resiliência associada,
possivelmente será capaz de reduzir o risco potencial, que se concretizaria em menor nível de
danos. A Figura 9.22 mostra a distribuição percentual dos tipos de risco entre os domicílios,
segundo a intensidade do indicador.

100%
90%
80%
70%
60% Índice ≥ 0,78
50% 0,56 ≤ Índice < 0,78
40% 0,33 ≤ Índice < 0,56
30% Índice < 0,33
20%
10%
0%
IRDM1 IRDM2 IRDH1 IRDH2 IRDA1 IRDA2

Figura 9.22 – Distribuição do risco potencial entre os domicílios


339
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Observe na Figura 9.22 que predomina na área inundável o índice de risco material
relativamente baixo (<0,33). Este resultado deve, entretanto, ser visto com cautela, pois
apenas os domicílios situados no primeiro pavimento apresentam danos materiais. Como se
trata de uma região com áreas verticalizadas, haverá, obviamente, grande número de
domicílios não atingidos diretamente pelas águas, embora possam se situar em uma edificação
exposta. Na Figura 9.23, que ilustra o risco apenas dos domicílios situados no primeiro
pavimento, é mostrada outra percepção da magnitude dos danos materiais.

O risco humano tende a ser mais elevado, especialmente o IRDH2, relacionado à tipologia de
família. O índice de risco entre 0,33 e 0,56, considerado importante, também é freqüente.
Uma possível justificativa seria a hipótese adotada de que o risco para a família está
relacionado essencialmente à sua característica, independentemente da magnitude da ameaça.
Além disso, ao contrário dos indicadores materiais, o domicílio pode apresentar risco humano
mesmo se situado acima do primeiro pavimento. Ademais, na definição dos indicadores
humanos, por terem sido utilizadas sobretudo referências teóricas, há maior subjetividade na
padronização do indicador.

O índice de acesso à renda apresentou valores baixos, o que indica que, de forma geral, o
acesso à renda foi garantido, seja pela baixa profundidade da inundação no domicílio, seja
pela não inundação dos locais de trabalho. O acesso aos bens de consumo sofreu maior
impacto, o que se relaciona ao perfil comercial da região exposta. O índice relativamente
elevado implicou na queda global das vendas às famílias discutida nas seções anteriores.

A relação entre resiliência e o risco material, humano e de acesso é mostrada na Tabela 9.27.
Ele mostra o risco nos domicílios com menores níveis de resiliência (médio a baixo), o que
indica uma maior dificuldade para mitigar os efeitos da inundação. Observe que um número
não desprezível de domicílios possui um risco superior a 0,56 (alto a muito alto) associado ao
níveis relativamente baixos de resiliência. Estes domicílios ou famílias merecem especial
atenção dos planejadores urbanos pela possibilidade de entrarem em um processo de exclusão
social e vulnerabilidade à pobreza extrema.

340
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Tabela 9.27 – Distribuição dos índices de risco nos domicílios com índice de resiliência
global - IDSG – abaixo de 0,56 – Inundação com tempo de retorno de 100 anos
Valor do índice IRDM1 IRDM2 IRDH1 IRDH2 IRDA1 IRDA2
Índice < 0,33 1.326 1.727 731 226 234 2.496
0,33 ≤ Índice < 0,56 1.312 381 839 981 1.337 102
0,56 ≤ Índice < 0,78 216 746 662 1.174 939 44
Índice ≥ 0,78 0 0 622 473 344 212
Total 2.854 2.854 2.854 2.854 2.854 2.854

A fim de ser agregar os domicílios segundo as similaridades de seus indicadores de risco é


feita uma análise de cluster. A descrição do procedimento foi discutida na seção 8.9.2.7. Os
agrupamentos foram criados segundo os indicadores agregados definidos para cada um dos
objetos de análise discutidos nesta pesquisa – material, humano, acesso – e para os
indicadores de resiliência. Os resultados foram mapeados e são mostrados nas Figura 9.23,
Figura 9.24, Figura 9.25 e Figura 9.26 para a mancha de inundação com tempo de retorno de
100 anos. Estas figuras apresentam os domicílios do primeiro pavimento das edificações. A
justificativa para esta escolha está relacionada à dificuldade em se mapear os vários níveis de
risco que possam existir em uma mesma edificação se esta é ocupada por diversos domicílios.
Logo, para visualização e comparação entre os mapas, limitou-se à amostra aos domicílios do
primeiro pavimento, por estes estarem expostos ao impacto direto.

Ante a análise dos mapas, uma primeira observação refere-se à diversidade existente entre os
domicílios, a qual se reflete nos indicadores de risco. As diferenças podem ser verificadas
tanto em relação à mesma categoria de índice - os riscos à construção e ao conteúdo, por
exemplo, nem sempre possuem magnitudes semelhantes no domicílio – quanto entre índices
de natureza diferente.

As informações da Figura 9.23 mostram que, se considerado apenas os domicílios expostos


aos danos diretos (primeiro pavimento na área inundável), o índice de risco material é
significativo na região, tanto para o conteúdo, quanto para a construção. Como esperado, a
Figura 9.23 mostra índices mais altos para o risco nas proximidades do leito menor do rio.

Em relação ao risco humano, a Figura 9.24 mostra que os domicílios com risco mais elevado
também estão próximos à calha menor do rio, entretanto, o risco humano é significativo em
toda a mancha de inundação. Os riscos mais baixos - clusters 1 e 2 – não mostram um padrão
de distribuição na região.

341
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Em relação ao risco no acesso, na região parece predominar um risco relativamente,
especialmente no acesso à renda (Figura 9.25). Observa-se uma distribuição variada na
planície de inundação, pois o indicador, além do componente ligado à inundação do
domicílio, capta a ameaça à firma acessada. Este segundo ponto relaciona-se às
particularidades comportamentais do domicílio e suas preferências em termos de escolha dos
pontos de consumo, além, obviamente, da distribuição das firmas ofertantes na planície de
inundação.

Finalmente, em relação à resiliência, observa-se que, se o acesso à informação é possível nos


domicílios de maior impacto, o acesso à renda é baixo. A tipologia ISD1 de médio a alto e
ISD2 baixo foi a situação mais observada entre os domicílios da região (Figura 9.26). Torna-se
importante ressaltar que, como mostrado no item 8.9.2.4, não se considerou uma relação
linear entre nível educacional e possibilidade de acesso à informação para tomada de decisões
em relação ao risco. O nível fundamental de educação formal já indicaria um aumento
importante na resiliência à inundação pelo acesso à informação. Decorre daí que, embora
exista correlação entre educação e renda, em termos de sua relação com o risco de inundação,
nem sempre a magnitude do ISD1 corresponde à do ISD2.

342
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Figura 9.23 – Risco de danos materiais nos domicílios do primeiro pavimento– Inundação com tempo de retorno de 100 anos

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Figura 9.24 – Risco de danos humanos nos domicílios do primeiro pavimento – Inundação com tempo de retorno de 100 anos

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Figura 9.25 – Risco no acesso dos domicílios do primeiro pavimento – Inundação com tempo de retorno de 100 anos

345
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Figura 9.26 – Resiliência dos domicílios do primeiro pavimento – Inundação com tempo de retorno de 100 anos

346
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9.5.2 Indicadores de risco no ambiente econômico

Finalmente, na última seção dos resultados são discutidos alguns indicadores de impacto na
economia do elemento de choque à normalidade, a inundação. Eles diferem conceitualmente
dos indicadores discutidos na seção 9.5.1, por não serem apresentados na forma de índices.

9.5.2.1 Indicador de impacto na estrutura econômica (IVE1)

Por meio do IVE1 procura-se verificar a possibilidade de perturbações na economia em


decorrência da inundação. O indicador tem como referência a estrutura econômica da
localidade e a distribuição setorial do pessoal ocupado. As hipóteses adotadas e pressupostos
metodológicos foram analisados no item 8.9.3.1. Sua formulação é reapresentada aqui
(Equação 8.35):

9.5

Sendo que:
IVE1 = Índice de impacto na estrutura econômica;
Aing = número de atividades atingidas, sendo que o tipo de atividade (“g”) varia de 1 a 56
(classificação CNAE);
Atotg = número total de atividades, sendo que o tipo de atividade (“g”) varia de 1 a 56
(classificação CNAE);
pg = peso para cada setor “g”, segundo sua importância econômica.

Os resultados encontrados para o IVE1 no protótipo são mostrados na Tabela 9.28.

Tabela 9.28 – IVE1 nos cenários de estudo


Cenário de Tr da inundação IVE1
Tr = 5 anos 0,0015
Tr = 25 anos 0,0021
Tr = 100 anos 0,0031
Sem inundação 0,0000

Observe que o impacto do evento foi baixo segundo o IVE1, o que parece não indicar pontos
de estrangulamentos setoriais relevantes. De fato, apesar da região atingida ser central, sua
dimensão é relativamente pequena em relação ao restante da área urbana. Observe que não foi
considerada aqui a duração da inundação, pois se pretende verificar o nível a vulnerabilidade

347
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da estrutura econômica independentemente da duração do evento. Além disso, considerou-se
a ocorrência de uma inundação de curta duração.

9.5.2.2 Análise dos setores de atividade econômica atingidos: indicador de vulnerabilidade


nas fontes de oferta das famílias (IVE2)
O IVE2 é um indicador que reflete que reflete o impacto da inundação sobre as atividades que
oferecem bens e serviços diretamente às famílias, afetando suas alternativas de consumo. Sua
metodologia foi discutida no item 8.9.3.2. A formulação do indicador é mostrada na Equação
9.6.

9.6

Sendo que:
IVE2 = Índice de restrição de alternativas de consumo das famílias;
Ainf = número de atividades atingidas com oferta direta de bens ou serviços para as famílias,
sendo que a tipologia de bem ofertado (f) varia de 1 a 20;
Atotf = número total de atividades com oferta direta de bens ou serviços para as famílias, sendo
que a tipologia de bem ofertado (f) varia de 1 a 20;
pf = peso para cada tipo de atividade com oferta de bens ou serviços para as famílias; peso
definido segundo a tipologia de bens que oferta.

Os resultados encontrados são mostrados na Tabela 9.29.

Tabela 9.29 – IVE2 nos cenários de estudo


Cenário de Tr da inundação IVE2
Tr = 5 anos 0,07
Tr = 25 anos 0,10
Tr = 100 anos 0,15
Sem inundação 0,00

Os resultados mostram a importância da região em termos de oferta de bens e serviços para o


domicílio, já que no cenário de choque máximo simulado, tem-se um índice de restrição de
oferta de 15%. Este valor mostra qual seria a restrição no consumo considerando a ruptura dos
links de acesso às firmas, ou seja, ele indica um nível de dependência econômica na rede, o
qual existe independentemente da duração da inundação.

348
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9.5.2.3 Indicador do impacto sobre o valor adicionado da localidade (IVE3)

A variação no valor adicionado em termos monetários foi analisada no item 9.2.4. Como
indicador de impacto na renda e na produção da economia, adota-se a formulação apresentada
no item 8.9.3.3 (Equação 8.39):

9.7

Sendo que:
IVE3 = Índice de impacto no valor adicionado local;
Winun = Massa salarial diária nas atividades atingidas;
Wtot = massa salarial diária total das atividades;
dinun = dias de inundação.

Para os cenários discutidos, encontraram-se os seguintes IVE3 para a cidade simulada no


protótipo (Tabela 9.30):

Tabela 9.30 – IVE3 nos cenários de estudo


Cenário de Tr da inundação IVE3
Tr = 5 anos 0,02
Tr = 25 anos 0,04
Tr = 100 anos 0,05
Sem inundação 0,00

Observe na Tabela 9.30 que o IVE3 indica um impacto em termos de valor adicionado bastante
inferior ao impacto mostrado pelo IVE2 no acesso às unidades de oferta. Embora os dois
índices tenham caráter distinto, eles parecem mostrar a centralidade da ADA em termos de
oferta de bens e serviços para as famílias, mas não necessariamente na geração de valor
adicionado na cidade.

349
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
10 CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS
a cidade é segunda natureza, é um trabalho, é um produto que está superimposto sobre a
primeira natureza e que utiliza os mesmos elementos, como a água. A água é um material
urbano emprestado da primeira natureza e se torna conhecido e usado através da segunda
natureza.72

10.1 Conclusões
O objetivo principal deste trabalho foi o de avaliar os danos da inundação sobre o ambiente
urbano, com ênfase nos impactos sobre os domicílios, mas analisando-os em um contexto
mais amplo, das relações socioeconômicas que se estabelecem na cidade. Desta forma,
procurou-se captar os danos diretos e indiretos de eventos de inundações.

Discutiu-se, além do impacto na riqueza do domicílio com a perda de ativos pela exposição e
vulnerabilidade à inundação, o impacto sobre as relações fundamentais que moldam seu
comportamento econômico: o consumo de bens e serviços e o consumo da sua força de
trabalho para aquisição de renda

A fim de captar todas estas influências, foi construído um protótipo no qual é possível definir
as relações entre a ocorrência da inundação, os danos diretos aos domicílios, as perturbações
sobre os fluxos de gasto e renda e as perturbações sobre o tráfego. As conexões puderam ser
captadas não apenas entre estes quatro elementos, mas também, espacialmente, entre regiões.
A agregação destas dimensões em um método de análise é pouco utilizada e, de fato, não
foram encontradas referências significativas na literatura.

As próprias simulações feitas possibilitaram verificar a consistência dos fundamentos teóricos


adotados, a coerência das rotinas analíticas e computacionais e do banco de dados. A
discussão metodológico-teórica e os resultados obtidos mostraram a viabilidade e
potencialidade de aplicação da metodologia para análise de impactos ambientais em uma
perspectiva ampla e considerando a dimensão relacional que envolve os processos.

Nos procedimentos de análise, verificaram-se alguns pontos fundamentais: a necessidade de


equilíbrio entre os objetivos da pesquisa e a capacidade computacional dos softwares
utilizados e as dificuldades que envolvem a criação de um protótipo que capte de forma
coerente as estruturas e relações de um grande espaço urbano.

72
Conversa com Henri Lefebvre. Espaço e Debates no 30, 1990, p.61-69.
350
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
Entretanto, a criação de um protótipo constitui-se em espaço de experimentação e análise de
vários fenômenos naturais e sociais, os quais podem ser mais bem compreendidos e
parametrizados, antes da aplicação empírica do método.

O vetor de informações desenvolvido, estruturado e relacional, mostrou-se consistente em


termos gerais, necessitando apenas de alguns ajustes específicos.

Desta forma, espera-se que esta pesquisa possibilite uma melhor compreensão dos processos
complexos que envolvem a interação entre natureza e sociedade. Em um contexto científico,
buscou-se avançar no conhecimento dos fatores que interferem no impacto da inundação,
mostrando métodos interdisciplinares de compreensão e análise do problema menos usuais,
em diferentes perspectivas e abordagens. Em um contexto mais amplo, busca-se a abertura de
um caminho para a reflexão de questões relevantes que orientem a definição das políticas
públicas, como a necessidade de um estudo que integre as várias dimensões relacionadas à
gestão do risco de inundações - ambiental, social e econômico - e que possibilite a
convivência mais harmoniosa entre o espaço construído e a primeira natureza, em referência à
declaração de Lefebvre mostrada na epígrafe deste capítulo.

Alguns pontos precisos do trabalho são discutidos a seguir.

10.1.1 Modelagem econômica em rede

Utilizou-se a modelagem econômica em rede para definir a direção dos fluxos econômicos
que saem e entram nos domicílios. Portanto, foi feita a conexão entre oferta e demanda de
trabalho, bens e serviços criando-se uma rede econômica de relações entre domicílios e
firmas.

Neste processo, foi criado um banco de dados estruturado e relacional de firmas e domicílios.
As conexões entre estes dois agentes foram feitas por meio de modelagem computacional no
software Netlogo.

Esta análise teve como objetivo verificar qual seria o impacto de uma perturbação na rede,
tanto na região diretamente afetada, como no seu entorno mais imediato e em toda a rede
intra-urbana.

351
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
O método utilizado, ao trabalhar com uma análise de fluxos, mostrou-se válido para captar a
propagação de um impacto local na rede. Ante as recentes notícias sobre a “paralisação” de
São Paulo com os alagamentos e inundações das marginais, verificam-se suas potencialidades
para auxiliar na compreensão da ampliação do impacto, com a identificação da
vulnerabilidade da rede e seus pontos de “estrangulamento”.

Entretanto verificou-se que o procedimento exige uma capacidade computacional relevante


para fazer face às necessidades de simulação dos sistemas bacia hidrográfica-rio, viário e de
transportes e econômico, propriamente dito, bem como a manipulação de uma extensa e
variada base de dados, resultando em grande número de interações que estabelece.

10.1.2 Simulação do tráfego

O uso da simulação do tráfego possibilitou captar uma classe de danos indiretos fundamental
e relativamente pouco estudada: as deseconomias de transporte associadas a
congestionamentos e perturbações severas na rede. A micro-simulação do tráfego permite
verificar as variações nos indicadores de desempenho (velocidade, consumo de combustível,
emissão de poluentes etc.) de forma dinâmica, possibilitando captar os efeitos cumulativos do
impacto.

Verificou-se a viabilidade da utilização conjunta da simulação hidrológico-hidráulica,


simulação econômica e simulação de tráfego, em uma rede de realimentação de informações:
pela simulação econômica, podem se definir os pares de origem e destino; esta alimenta a
simulação de tráfego, que define os melhores caminhos entre os dois pontos. A simulação
hidrológico-hidráulica, por sua vez, permite verificar os nós e links atingidos, o que
realimenta os modelos econômicos e de transporte com novas informações.

Além disso, a simulação de tráfego possibilita a escolha de rotas alternativas e a verificação


de sua capacidade, um procedimento essencial no planejamento emergencial do risco. Neste
sentido, esta sendo desenvolvido nesse Programa de Pós-Graduação uma pesquisa em nível de
mestrado que discute estes aspectos por meio da simulação com informações empíricas.

10.1.3 Análise dos indicadores

Ao contrário de uma medida sintética do risco, optou-se pelo detalhamento dos vários
aspectos relacionados à vulnerabilidade, ameaça e exposição da inundação, acreditando haver
352
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
uma lacuna nos estudos a este respeito. Dessa forma, além de sua importância como
informação sobre várias dimensões do risco, sua construção possibilitou a identificação de
diversos parâmetros de análise, os quais se observou, nos próprios procedimentos para
construção dos índices, não serem facilmente encontrados de forma sistematizada na
literatura.

Esse detalhamento, entretanto, tem como uma possível conseqüência certa redundância dos
indicadores em suas bases conceituais. Pode-se, por exemplo, por meio de técnicas
multivariadas, verificar a estrutura dos indicadores, sua dispersão e a existência de correlação
entre eles. A análise fatorial permite examinar a estrutura dos indicadores e definir as
dimensões latentes que existem entre eles. A análise de cluster, com medidas correlacionais,
possibilita que seja identificada a existência de correlação entre os perfis dos objetos. Todos
estes aspectos podem ser avaliados caso se deseje uma agregação complementar dos
indicadores.

Os indicadores propostos são facilmente construídos e utilizam informações de acesso amplo


o que possibilita sua utilização e interpretação pelos diversos segmentos da sociedade.

10.2 Perspectivas
Com os estudos desenvolvidos nesta tese, procurou-se explorar um conjunto de técnicas
pouco utilizadas na análise de impactos ambientais e socioeconômicos, que abrisse um amplo
campo de possibilidades para estudos futuros.

10.2.1 Aperfeiçoamento do protótipo

O protótipo definiu-se como uma estrutura básica que pode ser continuamente aperfeiçoada.
Em um horizonte de curto prazo, o banco de dados e as rotinas analíticas presentes permitem
avanços nas análises, os quais não foram incorporados na tese por limitações práticas, de
tempo e de capacidade computacional.

 No protótipo utilizado na tese foi discutida a influência isolada da inundação das


firmas nos gasto das famílias, não sendo introduzida na análise qual seria o impacto
sobre as despesas, considerando também a inundação dos domicílios. Possivelmente a
incorporação desse aspecto traz subsídios para o estudo do impacto da inundação nas
rotinas comportamentais.
353
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
 Já existem as informações sobre como seria o padrão de gastos das famílias que
sofreram danos após a inundação, considerando a transferência de parte de seu
consumo para a aquisição de bens de reconstrução e recuperação. Portanto, é possível
verificar, pós evento, qual seria o comportamento da economia e dos setores
econômicos com esta transferência de consumo.

 Se for considerada na análise a importância da alocação mais desagregada dos gastos,


podem ser alocados os 59 tipos de gastos definidos para as famílias entre os pontos de
oferta.

 Com o banco de dados disponível e o uso de um software mais robusto é possível criar
rotinas mais precisas e individuais de deslocamento, trazendo maior precisão na
definição do espaço de fluxos.

 Não foram analisados os domicílios coletivos e improvisados, Devido à


vulnerabilidade existente, especialmente nestes últimos, sua incorporação pode ser
avaliada.

 Procurou-se ainda estimar qual seria a conseqüência nos fluxos de transporte de uma
interrupção de um dia nos links. Esta análise seria relevante para verificar se haveria
redundância significativa na rede e quais seriam as novas condições de tráfego em
uma rede possivelmente sub-ótima. Entretanto, verificaram-se problemas de
instabilidade computacional e optou-se por desenvolver esse estudo posteriormente.

 Após os resultados de alocação de agentes obtidos nesta pesquisa, onde se


identificaram pares de origem-destino para várias funções desempenhadas pelo
domicílio (local de trabalho, compras e estudo) e considerando a rede viária já
disponível, está sendo discutida uma colaboração entre o Departamento de Engenharia
Hidráulica e Recursos Hídricos e o de Departamento de Engenharia de Transportes e
Geotecnia da UFMG para a modelagem futura de toda a rede viária.

 O banco de dados possui um grande volume de informações que tem como referência
o município de Belo Horizonte. Sua aplicação empírica na capital mineira seria,
portanto, mais facilmente conduzida. Isso, entretanto, não retira a generalidade da
metodologia, ao menos para aplicações no Brasil, dada a vinculação da base de dados
354
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do modelo às diferentes bases de dados socioeconômicos do país. Naturalmente, a
construção da base de dados, bem como a modelagem hidrológico-hidráulica são
específicas a cada local.

10.2.2 Perspectivas com a utilização da proposta metodológica apresentada

A metodologia proposta abre inicialmente três grandes perspectivas para estudos futuros: a
criação de uma análise dinâmica, o aprofundamento da análise da propagação espacial do
evento e a aplicação do método em um estudo de caso. A pesquisa de tese focou
especialmente no segundo, mas lança elementos fundamentais de discussão para a
incorporação de rotinas dinâmicas no modelo.

O agente desenvolvido no protótipo é essencialmente reativo, apresentando uma rotina


comportamental antes e outra após o evento. A metodologia permite criar um agente mais
complexo, com regras comportamentais que podem mudar no decorrer da simulação segundo
a percepção do ambiente.

O estudo de como os efeitos da inundação se propagam na cidade pode ser aprofundado com
ajustes no modelo proposto na tese ou com a incorporação de novas ferramentas de análise.
Nesse aspecto, tem importância central a análise da estrutura e configuração da rede, as quais
definem sua vulnerabilidade a choques e pontos de rompimento.

Um aspecto relevante que poderia ser verificado com estas análises seria quanto tempo, após
uma inundação relevante, a cidade levaria para recuperar sua estrutura original, pré-choque.

Como possível ferramenta de análise, tem-se o software Repast, plataforma para programação
de modelagem em agentes, disponível livremente na Internet73, o qual possui capacidade
computacional suficiente para definir rotinas comportamentais mais detalhadas para os
agentes.

Para análise de redes, têm-se como exemplos, o Ucinet ou o Pajek, pacotes para simulação de
redes sociais e econômicas74, os quais já foram estudados pela pesquisadora, mas não
puderam ser incorporados na tese, pela limitação de tempo. Eles apresentam uma interface
amigável e, especialmente o segundo, possuem capacidade para o tratamento de grandes

73 Ver < http://repast.sourceforge.net/index.html>.


74
Ver < http://www.analytictech.com/downloaduc6.htm >.
355
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
amostras de dados. Por meio deles é possível verificar indicadores relevantes da estrutura da
rede, como os nós e regiões centrais, os nós de conexão entre os agentes, análises de
vizinhança, acessibilidade, densidade de rede, hierarquia, redundância, etc.

E, finalmente, a aplicação empírica do método. Pode-se, por exemplo, estudar sua utilização
nos estudos sobre a bacia hidrográfica do ribeirão Arrudas. No programa SMARH há um
grupo de pesquisadores que desenvolve estudos na bacia, com análises sobre percepção de
risco e danos diretos causados pelas cheias. Abre-se, portanto, a possibilidade para
colaboração mútua, troca de informações e de conhecimento científico envolvendo a
problemática das inundações.

356
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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APÊNDICE I - O VALOR DA VIDA HUMANA

O valor da vida humana também pode ser uma variável incorporada ao risco econômico,
aumentando o valor dos danos evitados. Para isto têm-se métodos que possibilitam traduzir a
vida em termos monetários. O maior volume de pesquisas sobre o assunto ocorre em áreas
relacionadas à segurança de tráfego e no setor de seguros, mas as controvérsias são grandes.
Segundo Ball (2000), é um campo com grande divergência de opiniões, metodologias
controversas e elevado grau de incerteza. Levanta questões éticas e morais, pois muitos
consideram impossível definir qualquer valor ou preço para a vida. Ainda assim, uma
avaliação de risco dificilmente pode se abster de incluir uma discussão do valor da vida
humana, mesmo qualitativa e subjetiva, pois negligenciá-la significa subvalorizar
demasiadamente os benefícios das medidas de minimização de danos.

Entre as técnicas de valoração da vida humana, uma das mais comumente aceitas e
empregadas é o método de valoração contingente (MVC) por ser considerada teoricamente
bem fundamentada nos princípios da economia do bem-estar. Por meio dela procura-se captar
o valor que indivíduos atribuem à vida humana ou, alternativamente, seu desejo de evitar dor
e sofrimentos associados a ferimentos e lesões. Jonkmana, Van Gelder & Vrijling (2003)
mostram em estudo sobre várias medidas de risco, a possibilidade de se obter o valor
estatístico da vida (VoSL) via MVC comparando-se a disposição a pagar por medidas de
segurança (DAP) e o número esperado de fatalidades (E(N)):

VoSL = (DAP.população) / E(N)

Onde:
VoSL = valor estatístico da vida;
DAP = disposição a pagar por medidas de segurança;
E (N) = número esperado de fatalidade.

Observe que esta formulação matemática aplica-se em alternativas de segurança cujo objetivo
fundamental seja evitar riscos individuais/sociais como mortes e ferimentos.

Outras metodologias de valoração podem ser utilizadas. A vida pode ser valorada segundo a
produção econômica potencial de cada indivíduo; produção medida, por exemplo, pelo
produto nacional líquido (abordagem macroeconômica). Como benefício de uma medida de
controle de danos ter-se-ia, então, não apenas o valor esperado dos danos econômicos
382
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
evitados, mas também o valor econômico de cada indivíduo multiplicado pelo número de
fatalidades.

Existem metodologias que utilizam uma analise comparativa para estimar o custo
(investimento) feito para salvar uma vida extra. São estimativas obtidas a partir de dados de
investimentos em medidas de proteção a vida humana e o número de fatalidades evitadas. O
valor da expectativa de vida muitas vezes é uma variável relevante nestes modelos. Lind
(2001) apud Jonkmana, Van Gelder & Vrijling (2003) apresenta uma norma a ser utilizada no
gerenciamento do risco pela administração pública: uma medida de segurança deve retornar
mais em anos de expectativa de vida do que os anos de trabalho necessários para pagar a
medida, ou seja, a “taxa interna de retorno” do projeto é positiva se o número de anos ganhos
com a medida for maior do que aqueles gastos com sua implantação.

Há ainda metodologias que se baseiam na função utilidade. Um índice de qualidade de vida


pode relacionar renda per capita e expectativa de vida em uma função exponencial, sendo que
investimentos em segurança que resultem em aumento da expectativa de vida e de um
decréscimo da renda são aceitáveis desde que levem a um aumento do índice de qualidade de
vida.

Mesmo que a técnica para definir um valor da vida humana tenho sido escolhida
adequadamente segundo os objetivos do estudo efetuado, o grau de incerteza em relação aos
resultados é grande. Ball (2000) corrobora este argumento apresentando o resultado de vários
trabalhos sobre valoração da vida humana e a dispersão apresentada entre eles. Segundo o
autor, este grau de incerteza deve ser minimizado com a incorporação de diversos critérios na
análise, como estudos de preferências reveladas e expressas, julgamento de especialistas e
instituições a partir de decisões passadas e escolhas políticas.

383
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
APÊNDICE II – INDICADORES DE RISCO FÍSICO E FATORES DE
IMPACTO

Risco Físico - RF Peso


Área destruída wf
Número de mortos wf
Número de feridos wf
Rompimento de redes de água wf
Rompimento de redes de gás wf
Extensão da rede elétrica atingida wf
Vulnerabilidade das centrais telefônicas wf
Vulnerabilidade das subestações elétrica wf

Fator de Impacto – F Peso


Área de bairros marginais wi RT = RF (1+F)
Taxa de mortalidade wi
Fragilidade
Taxa de delinqüência wi
social
Índice de disparidade social wi
Densidade da população wi
Camas hospitalares wi
Recurso humano em saúde wi
Falta Espaço público wi
de Envolvimento comunitário wi
resiliência Nível de desenvolvimento wi
local
Serviços de emergência wi
Fonte: Cardona (2004, 2005).

384
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APÊNDICE III- VARIÁVEIS DO INDICADOR DE RISCO TOTAL

Ameaça Peso1 Capacidades e Medidas Peso1


Probabilidade 20.z Planificação do uso do solo 2.z
Intensidade 13.z Parâmetros construtivos 2.z
Reajustes e manutenção 1.z
Exposição Peso1 Estruturas de prevenção 1.z
Número de moradias 7.z Manejo ambiental 1.z
Moradias com acesso à rede de água 6.z Programas de Conscientização 2.z
População Total residente 10.z Currículo escolar 2.z
Produto interno bruto local 10.z Simulações de emergência 1.z
Participação pública 2.z
Vulnerabilidade Gestão local do risco 2.z
Vulnerabilidade demográfica Peso1 Fundos locais para emergências 1.z
Densidade 3.z Acesso a fundos nacionais 1.z
Pressão demográfica 3.z Acesso a fundos internacionais 1.z
Assentamentos inseguros 1.z Mercado de seguros 1.z
Acesso a serviços básico 1.z Empréstimos para mitigação 1.z
Vulnerabilidade social Peso1 Empréstimos para reconstrução 1.z
Nível de pobreza 2.z Obras públicas 1.z
Taxa de alfabetismo 2.z Comitê de manejo de risco 2.z
Atitude perante a ameaça 3.z Mapa de risco 1.z
Descentralização de recursos 1.z Plano de emergência 2.z
Participação comunitária 2.z Sistema de alerta 2.z
Vulnerabilidade econômica Peso1 Fortalecimento de capacidades 2.z
Base local de recursos 3.z Comunicação 1.z
Diversificação 2.z
Estabilidade 2.z
Acessibilidade 2.z
Vulnerabilidade ambiental Peso1
Área de bosque 2.z
Área degradada 2.z
Área sobre utilizada 2.z
Fonte: Bollin et al., 2003: 69 (Escrito originalmente em espanhol).
Nota: 1. O coeficiente foi elaborado para terremotos. O valor de z varia de 0 a 3 segundo a
importância da variável no local de estudo

385
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APÊNDICE IV- VARIÁVEIS DA MATRIZ “DOMICÍLIO”
VARIÁVEL CARACTERÍSTICA
1 Ordem do domicílio Ordenamento dos domicílios
2 Número do domicílio Número do domicílio, segundo IBGE
3 Unidade de planejamento do domicílio Vizinhança onde a pessoa reside
4 Localização: coordenada x do domicílio Coordenada x do local de residência
5 Localização: coordenada y do domicílio Coordenada y do local de residência
6 Tipologia de família 1 a 12, segundo o tipo de família
7 Responsável masculino Sim (1), Não (0)
8 Responsável feminino Sim (1), Não (0)
9 O responsável pelo domicílio é idoso? Sim (1), Não (0)
10 Número de filhos menores do que Sim (1), Não (0)
11 Números de filhos maiores do que Sim (1), Não (0)
12 Existência de cônjuge ou companheiro (a) Sim (1), Não (0)
13 Outras pessoas, com exceção do responsável, cônjuge e filhos, morando no domicílio Quantidade
14 Situação do setor Urbana (1), Rural (2)
15 Tipo de domicilio Casa (1), Apartamento (2)
16 Numero de cômodos Quantidade
17 Numero de dormitórios Quantidade
18 Número de moradores Quantidade
19 Número de pessoas por dormitório Quantidade
20 Número de homens no domicílio Quantidade
21 Número de mulheres no domicílio Quantidade
22 Condição do domicílio Próprio, alugado, cedido, outra
23 Forma de abastecimento de água Rede Geral, Poço ou Nascente, Outra
24 Existência de canalização No domicílio, no terreno, não canalizada
25 Existência de banheiro Sim, Não
26 Escoadouro Forma de esgotamento
27 Destino do lixo Destino do lixo da propriedade
28 Existência de iluminação elétrica Sim, Não
29 Pavimentação Total, Parcial, Não existe
30 Existência de rádio Sim (1), Não (2)
31 Existência de geladeira Sim (1), Não (2)
32 Existência de videocassete Sim (1), Não (2)
33 Existência de máquina de lavar roupas Sim (1), Não (2)
34 Existência de forno microondas Sim (1), Não (2)
35 Existência de linha telefônica Sim (1), Não (2)
36 Existência de computador pessoal Sim (1), Não (2)
37 Número de aparelhos de tv Quantidade
38 Número de automóveis Quantidade
39 Número de aparelhos de ar condicionado Quantidade
40 Rendimento domiciliar (em reais de 2000) Valor do rendimento mensal familiar
41 Rendimento domiciliar per capita (em reais de 2000) Valor do rendimento per capita mensal no domicílio
42 Classe socioeconômica em que se insere o domicílio (segundo a renda domiciliar total) A1, A2, B1, B2, C, D, E.
Classe socioeconômica em que se insere o domicílio (segundo a renda domiciliar per
43 capita) A1, A2, B1, B2, C, D, E.
44 Área do imóvel (km2) Área do imóvel em km2
45 Padrão construtivo do imóvel Alto, normal, baixo ou popular.
46 Gasto em bens essenciais contíguos Valor em reais de 2000
47 Gastos em bens essenciais com oferta discreta Valor em reais de 2000
48 Gastos em bens essenciais com oferta muito discreta Valor em reais de 2000
49 Gastos em bens necessários contíguos Valor em reais de 2000
50 Gastos em bens necessários com oferta discreta Valor em reais de 2000
51 Gastos em bens necessários com oferta muito discreta Valor em reais de 2000
52 Gastos em bens de luxo Valor em reais de 2000

386
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APÊNDICE V– TIPOLOGIAS DE GASTO

(Continua)
Gasto Caracterização Grupo Característica
1 Alimentação (dentro e fora do domicílio) G1.1.1 Essenciais, oferta contígua, aquisição diária
2 Aluguel G1.1.4 Essenciais, oferta contígua, aquisição rara
3 Serviços e taxas: Gás doméstico G1.R Essenciais, oferta em rede
4 Outros serviços e taxas (condom., internet. etc.) G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
5 Artigos de limpeza G2.2.3 Necessários, oferta discreta, aquisição mensal
6 Mobiliários e artigos do lar G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
7 Eletrodomésticos, equipamentos do lar, som e TV G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
Consertos de artigos do lar (e.g.: consertos de
8 eletrodomésticos e mobiliário) G2.3.4 Necessários, oferta muito discreta, aquisição rara
9 Manutenção do lar G2.3.4 Necessários, oferta muito discreta, aquisição rara
10 Serviços e taxas: Energia elétrica, água e esgoto G1.R Essenciais, oferta em rede
11 Serviços e taxas: Telefone fixo G2.R Necessários, oferta em rede
12 Serviços e taxas: Telefone celular G2.R Necessários, oferta em rede
13 Tecidos e armarinhos G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
14 Roupas, calçados e apetrechos G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
15 Jóias e bijuterias G3.2.4 Luxo, aquisição rara
16 Transporte urbano G1.R Essenciais, oferta em rede
17 Gasolina e Álcool - veículo próprio G2.1.3 Necessários, oferta contígua, aquisição mensal
18 Outras (transporte: estac., seguro obrig. etc.)) G2.2.3 Necessários, oferta discreta, aquisição mensal
19 Manutenção - veículo próprio G2.3.4 Necessários, oferta muito discreta, aquisição rara
20 Viagens (e.g.: avião, ônibus) G3.R Luxo, oferta em rede
21 Aquisição de veículos G3.3.4 Luxo, aquisição rara
22 Xampu, produtos para cabelo e sabonetes G2.1.3 Necessários, oferta contígua, aquisição mensal
Instrumentos e produtos de uso pessoal (e.g.: artigos
23 de maquiagem,lâmina de barbear, alicate) G2.1.4 Necessários, oferta contígua, aquisição rara
24 Perfume G3.2.4 Luxo, aquisição rara
25 Remédios G1.1.3 Essenciais, oferta contígua, aquisição mensal
26 Plano/Seguro saúde G1.3.4 Essenciais, oferta muito discreta, aquisição rara
27 Outras (saúde, e.g: mamadeira, ambulancia) G1.2.4 Essenciais, oferta discreta, aquisição rara
Material de tratamento (e.g.: seringa, termômetro,
28 óculos) G1.2.4 Essenciais, oferta discreta, aquisição rara
Tratamento ambulatorial, serviços de cirurgia,
29 hopitalização, exames diversos, consulta médica G1.3.4 Essenciais, oferta muito discreta, aquisição rara
30 Consulta e tratamento dentário G1.3.4 Essenciais, oferta muito discreta, aquisição rara
31 Artigos escolares (e.g.:mochila escolar, merendeira) G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
32 Livros didáticos e revistas técnicas G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
33 Outras (educação, e.g: uniforme, matricula) G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
34 Cursos regulares (exceto superior) G2.3.1 Necessários, oferta muito discreta, aquisição diária
35 Curso superior G2.3.1 Necessários, oferta muito discreta, aquisição diária
36 Outros cursos G3.2.2 Luxo, aquisição semanal
37 Periódicos, livros e revistas não didáticos G3.1.1 Luxo, aquisição diária
38 Celular e acessórios G3.2.4 Luxo, aquisição rara
39 Brinquedos e jogos G3.2.4 Luxo, aquisição rara

387
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
(Conclusão)
Outras (e.g. porte de arma, equipamentos de
40 ginástica e demais despesas similares) G3.3.4 Luxo, aquisição rara
41 Diversões e esportes G3.2.2 Luxo, aquisição semanal
42 Fumo G3.1.2 Luxo, aquisição semanal
Cabelereiro, manicuro e pedicuro, outros serviços
43 pessoais (depilação, maquiagem, etc.) G3.1.3 Luxo, aquisição mensal
Consertos de artigos pessoais (e.g.: sapateiro,
44 relojoeiro, chaveiro) G3.2.4 Luxo, aquisição rara
45 Outras (despesas diversas) G3.2.4 Luxo, aquisição rara
46 Comunicação (e.g.: correio, telefone público) G2.3.4 Necessários, oferta muito discreta, aquisição rara
47 Serviços profissionais (cartório, advog., cont.) G2.3.4 Necessários, oferta muito discreta, aquisição rara
48 Jogos e apostas G3.1.3 Luxo, aquisição mensal
49 Cerimônias familiares e religiosas e festas G3.2.4 Luxo, aquisição rara
50 Imóveis de uso ocasional G3.2.4 Luxo, aquisição rara
51 Impostos e contribuições G2.3.4 Necessários, oferta muito discreta, aquisição rara
52 Pensões, mesadas e doações G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
53 Serviços bancários G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara
54 Previdência privada G3.2.4 Luxo, aquisição rara
55 Outras (seguro de vida, asilo etc.) G3.2.4 Luxo, aquisição rara
56 Imóvel (reforma) G3.2.4 Luxo, aquisição rara
57 Outros investimentos (ativos: títulos, terrenos etc.) G3.2.4 Luxo, aquisição rara
58 Imóvel (aquisição) G3.2.4 Luxo, aquisição rara
Empréstimo pessoais, carnê de mercadorias e
59 prestação de imóvel G2.2.4 Necessários, oferta discreta, aquisição rara

388
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
APÊNDICE VI - PADRÕES DE CONTEÚDO POR CÔMODO
SEGUNDO AS CLASSES DE RENDA FAMILIAR

Quantidade de Quantidade de
Cômodo bens /Classe de Cômodo bens /Classe de
renda renda
Quarto de casal A B C D E Cozinha A B C D E
Cama de casal 1 1 1 1 1 Estante 1 1 1 0 0
Colchão de casal 1 1 1 1 1 Fogão 1 1 1 1 1
Guarda-roupa 1 1 1 1 1 Exaustor 1 1 0 0 0
Cômoda 1 1 0 0 0 Forno elétrico 1 0 0 0 0
Criado 1 1 1 0 0 Microondas 1 1 0 0 0
Escrivaninha 1 0 0 0 0 Geladeira 1 1 1 1 1
TV 1 1 0 0 0 Freezer 1 0 0 0 0
Vídeo-cassete 1 0 0 0 0 Processador de alimentos 1 1 0 0 0
Micro-system 1 0 0 0 0 Lavadora de pratos 1 1 0 0 0
Telefone s/ fio 1 1 0 0 0 Copa A B C D E
Ar condicionado 1 0 0 0 0 Estante 1 1 1 1 1
Radio 0 1 0 0 0 Mesa - cadeiras 1 1 1 1 1
Ventilador 0 1 1 0 0 Escritório/biblioteca A B C D E
Quarto de solteiro A B C D E Estante 1 1 1 1 1
Cama de solteiro 1 1 1 1 1 Mesa - cadeiras 1 1 1 1 1
Colchão de solteiro 1 1 1 1 1 Telefone s/ fio 1 1 0 0 0
Guarda-roupa 1 1 1 1 1 Microcomputador 1 1 1 0 0
Cômoda 1 0 0 0 0 Área de serviço A B C D E
Criado 1 0 0 0 0 Aspirador de pó 1 1 0 0 0
Escrivaninha 1 1 0 0 0 Máquina de lavar roupas 1 1 1 0 0
TV 1 0 0 0 0 Secadora de roupas 1 0 0 0 0
Micro-system 1 0 0 0 0 Tanquinho 0 0 0 1 0
Ventilador 1 1 0 0 0 Sala adicional A B C D E
Radio 0 1 0 0 0 Estante 1 1 1 1 1
Sala A B C D E Sofá 1 1 1 1 1
Estante 1 1 1 1 1
Sofá 1 1 1 1 0
TV (grande dimensão) 1 1 1 1 0
Vídeo-cassete 1 1 1 0 0
Telefone s/ fio 1 1 1 1 0
Micro-system 1 1 1 0 0
Radio 0 0 0 1 0
Mesa - cadeiras 0 0 0 0 1

Fonte: Elaboração própria adaptado de Machado (2005).

389
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
APÊNDICE VII – TIPOS DE ATIVIDADES DAS UNIDADES
ECONÔMICAS

(Continua)
Divisão ou
Ordem Atividade Venda2
Seção1
1 Veículos automotores 50 1
2 Peças para veículos 50 1
3 Motocicletas, peças e acessórios 50 1
4 Produtos agropecuários in natura e produtos alimentícios para animais 51 2
5 Produtos alimentícios, bebidas e fumo 51 2
6 Fios texteis, tecidos, artefatos de tecidos e de armarinho, vestuário e calçados 51 2
7 Eletrodomésticos e outros equipamentos de uso pessoal e doméstico 51 2
8 Produtos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, odontológicos e veterinários 51 2
9 Artigos de escrit. e de papelaria; papel e seus artefatos; livros, jornais, etc. 51 2
10 Outros artigos de uso pessoal e doméstico 51 2
11 Comércio de produtos intermediários, resíduos e sucatas 51 2
12 Comércio de máq., aparelh. e equip. de uso agropec., comercial e indust. 51 2
13 Comércio de mercadorias em geral 51 2
14 Hipermercados e supermercados 52 1
15 Outros tipos de comércio não especializ. predominância de prod. aliment. 52 1
16 Comércio não especializ. sem predominância de prod. Aliment. 52 1
17 Produtos alimentícios, bebidas e fumo 52 1
18 Tecidos e artigos de armarinho 52 1
19 Artigos do vestuário e complementos 52 1
20 Calçados, artigos de couro e viagem 52 1
21 Combustíveis e lubrificante 50 1
22 Produtos farmacêuticos, médicos, veter., ortopéd., de perf. e comésticos 52 1
23 Máq. e aparelh. de uso doméstico e pessoal, discos, instr. musicais, etc. 52 1
24 Móveis, artigos de iluminação e outros artigos de residência 52 1
25 Mat. de constr., ferrag., ferrament. e prod. metalúrg.; vidros; tintas e madeiras 52 1
26 Equip. e materiais para escritório, informática e comunicação 52 1
27 Livros, jornais, revistas e papelaria 52 1
28 Gás liquefeito de petróleo (GLP) 52 1
29 Outros produtos 52 1
30 Comércio de artigos usados 52 1
31 Serviços de alojamento (hoteis, pousadas etc) 55 1
32 Serviços de alimentação (restaurantes, bares etc) 55 1
33 Atividades recreativas e culturais 92 1
34 Serviços pessoais 93 1
35 Atividades de ensino continuado 80 1
36 Telecomunicações 64 2
37 Atividades de informática 72 1
38 Serviços audiovisuais 92 2
39 Agências de notícias e serviços de jornalismo 92 2
40 Serviços técnico-profissionais 74 1
41 Seleção, agenciamento e locação de mão-de-obra temporária 74 2
42 Serviços de investigação, segurança, vigilância e transporte de valores 74 2
43 Serviços de limpeza em edificações e outros serviços prestados às empresas 74 1
44 Transporte ferroviário e metroviário 60 2
45 Transporte rodoviários de passageiros 60 2
46 Transporte rodoviário de cargas 60 2
47 Transporte aquaviário 61 2
48 Transporte aéreo 62 1
49 Agências de viagens e organizadoras de viagens 63 1

390
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(Conclusão)
Divisão ou 2
Ordem Atividade Venda
Seção1
50 Serviços auxiliares dos transportes 63 2
51 Correio e outras atividades de entrega 64 1
52 Atividades imobiliárias 70 1
53 Aluguel de veículos, máquinas e objetos pessoais e domésticos 71 1
54 Manutenção e reparação de veículos 50 1
55 Manutenção e reparação de objetos pessoais e domésticos 52 1
56 Manutenção e reparação de máquinas de escritório e de informática 72 2
57 Serviços auxiliares da agricultura 1 2
58 Agentes de comércio e representação comercial 51 2
59 Serviços auxiliares, financeiros, dos seguros e da previdência complementar 65,66,67 (J) 1
60 Limpeza urbana e esgoto 90 2
61 Agricultura, pecuária e serviços relacionados 1 2
62 Silvicultura, exploração florestal e serviços relacionados 2 2
63 Pesca, aquicultura e serviços Relacionados 5 2
64 Extração de carvão mineral 10 2
65 Extração de petróleo e gás natural e serviços relacionados 11 2
66 Extração de minerais metálicos 13 2
67 Extração de minerais não-metálicos 14 2
68 Fabricação de produtos alimentícios e bebidas 15 2
69 Fabricação de produtos do fumo 16 2
70 Fabricação de produtos têxteis 17 2
71 Confecção de artigos do vestuário e acessórios 18 2
72 Preparacão e fabricação de artefatos de couro, artigos de viagem e calçados 19 2
73 Fabricação de produtos de madeira 20 2
74 Fabricação de celulose, papel e produtos de papel 21 2
75 Edição, impressão e reprodução de gravações 22 2
76 Fab. de coque, ref. de petróleo, elab. de comb. nucleares e prod. de álcool 23 2
77 Fabricação de produtos químicos 24 2
78 Fabricação de artigos de borracha e plástico 25 2
79 Fabricação de produtos de minerais não-metálicos 26 2
80 Metalurgia básica 27 2
81 Fabricação de produtos de metal - exceto máquinas e equipamentos 28 2
82 Fabricação de máquinas e equipamentos 29 2
83 Fabricação de máq. para escritório e equipamentos de informática 30 2
84 Fabricação de máq., aparelhos e materiais elétricos 31 2
85 Fabricação de material eletr. e de aparel. e equip. de comunic. 32 2
86 Fab. de equip. de médico-hosp., de precisão, para automação ind., relógios 33 2
87 Fabricação e montagem de veículos automotores, reboques e carrocerias 34 2
88 Fabricação de outros equipamentos de transporte 35 2
89 Fabricação de Móveis e Indústrias Diversas 36 2
90 Reciclagem 37 2
91 Eletricidade, gás e água Quente 40 2
92 Captação, tratamento e distribuição de água 41 2
93 Construção 45 2
94 Pesquisa e desenvolvimento 73 2
95 Administração pública, defesa e seguridade social 75 1
96 Saúde e serviços sociais 85 1
97 Atividades associativas 91 1

Nota: 1. Seção ou divisão segundo classificação CNAE 1.0.

391
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
APÊNDICE VIII - INDICADORES DE ENCADEAMENTO E FATORES
MULTIPLICADORES DA PRODUÇÃO

Conforme mencionado no item 8.9.3.1, nas análises preliminares para estudo da importância
relativa dos setores na economia, considerou-se o uso de indicadores de encadeamento para
frente e para trás e de fatores multiplicadores.

Nestas análises preliminares foi utilizada o Índice Puro de Ligação (GHS) que leva em conta,
além dos coeficientes técnicos intersetoriais, o valor absoluto da produção.75 Em Silva et al.
(2003), o índice foi calculado para os setores produtivos de Minas Gerais, a partir de
informações de produção e consumo do ano de 1996. O índice incorpora a relação entre todos
os setores da economia mineira e também destas com São Paulo e o resto do Brasil. Ele é,
portanto, inter-setorial e inter-regional. Embora para os objetivos deste trabalho um índice
independente seria preferível (aquele que considera apenas as relações inter-setoriais), Silva et
al. (2003), ao elaborar um índice inter-setorial dependente, ou seja, com a incorporação das
relações inter-regionais, e um independente, ressalta que não foram encontradas diferenças
significativas entre os dois.

Já o fator multiplicador de produção considerado foi o multiplicador do tipo II que é


determinado a partir dos coeficientes técnicos de produção, como é feito tradicionalmente,
mas também com a inclusão do setor família (Silva et al., 2003). Dessa forma, não se
considera apenas as interações entre os setores econômicos, mas também o efeito da variação
na renda das famílias. Utilizou-se, neste trabalho, Da mesma forma que o índice de ligação,
utilizou-se o fator de produção proposto em Silva et al. (2003) para os setores econômicos de
Minas Gerais no ano de 1996.

75
Os coeficientes técnicos mostram a relação entre as compras totais do setor junto aos outros setores e a sua
produção total.
392
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
APÊNDICE IX – INFORMAÇÕES E PESOS DOS SETORES NO
PROTÓTIPO SEGUNDO CÓDIGO CNAE
Número de Pessoal Salários Peso
CNAE
Empresas Ocupado (R$ de 2000)
1 688 688 1.397.245 0,0119
2 328 328 748.586 0,0064
11 6 6 22.100 0,0002
13 242 242 664.200 0,0057
14 149 149 306.388 0,0026
15 3311 3311 2.508.445 0,0214
16 52 52 16.805 0,0001
17 625 625 504.214 0,0043
18 2597 2597 1.648.260 0,0141
19 930 930 482.688 0,0041
20 243 243 157.675 0,0013
21 230 230 329.991 0,0028
22 1654 1654 1.536.967 0,0131
23 40 40 79.739 0,0007
24 940 940 1.237.175 0,0105
25 442 442 451.861 0,0039
26 663 663 798.750 0,0068
27 1264 1264 2.306.070 0,0197
28 1164 1164 1.057.809 0,0090
29 864 864 1.254.413 0,0107
30 96 96 101.021 0,0009
31 260 260 356.895 0,0030
32 124 124 114.476 0,0010
33 280 280 253.058 0,0022
34 620 620 849.004 0,0072
35 44 44 69.634 0,0006
36 1304 1304 976.886 0,0083
37 60 60 27.617 0,0002
40 5523 5523 10.331.348 0,0881
41 846 846 1.351.651 0,0115
45 13490 13490 10.112.231 0,0862
50 6296 6296 6.453.460 0,0550
51 5488 5488 8.419.268 0,0718
52 28409 28409 26.780.768 0,2283
55 8968 8968 6.039.779 0,0515
60 7919 7919 7.441.048 0,0634
61 29 29 659.982 0,0056
62 214 214 326.502 0,0028
63 1421 1421 1.399.847 0,0119
64 2229 2229 2.628.100 0,0224
393
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG
65 3544 3544 5.892.621 0,0502
66 600 600 777.692 0,0066
67 840 840 1.488.848 0,0127
70 6041 6041 5.513.066 0,0470
71 1007 1007 900.612 0,0077
72 2156 2156 3.251.465 0,0277
73 530 530 672.892 0,0057
74 29135 29135 45.893.088 0,3912
75 71019 71019 117.299.734 1,0000
80 21322 21322 25.954.326 0,2213
85 10955 10955 17.943.231 0,1530
90 1074 1074 513.669 0,0044
91 4695 4695 3.814.709 0,0325
92 3101 3101 3.734.143 0,0318
93 1570 1570 985.270 0,0084
99 1 1 15.643 0,0001

394
Programa de Pós-graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos da UFMG

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