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31º Encontro Anual da Compós, Universidade Federal do Maranhão. Imperatriz - MA. 06 a 10 de junho de 2022.
Abstract: This paper presents and discusses the research process, the reuse of documents and the short films
making for Rio Memórias website. It defends the importance of analysing this process because the experiments
are based on the assumption that every image is always and virtually the object of a new vison, of a new montage,
of a change of focus that multiplies its layers of historicity. The images are not just represented facts but carry
gaps and silences. How to work with those voids in a way that something from the city’s unreachable past can
emerge? One of the objectives of this method of work is the refusal to fill in the gaps and give a resolution to the
narratives made (Russell, 2018, Lindeperg, 2013) Enchanted Land (1923) is the film used to show the shorts
research and making process.
1. Introdução
1
Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Estudos de Cinema, Fotografia e Audiovisual, do 31º Encontro
Anual da Compós, Universidade Federal do Maranhão, Imperatriz - MA. 06 a 10 de junho de 2022.
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Professora Associada, PUC-Rio, Doutor, afranca3@gmail.com
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Professora Assistente, PUC-Rio, Doutor, patricia.furtado.machado@gmail.com.
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experimentos audiovisuais, cuja duração em média é de 12 minutos.4 O site tem parcerias com
a cinemateca do Museu de Arte Moderna (MAM-RJ) e com o Instituto Moreira Salles (IMS-
RJ), entre outras, o que permite o uso das imagens e dos documentos destes acervos.
O cinema de arquivo, tal como apresentado na galeria criada dentro do site 5, convida a
pensar as passagens entre os diferentes modos de historicidade, temporalidade, referencialidade
e figurabilidade da antiga capital federal. Tais passagens, acreditamos, tem a ver com
transformações tecnológicas, culturais e estéticas que a imagem (cinematográfica, fotográfica)
experimentou e tem experimentado. Ainda, tais passagens pressupõem igualmente considerar
as lacunas como parte constitutiva do primeiro cinema, o que abre espaço a um tipo de pesquisa
e realização que não encobre a falta de imagens, mas joga com ela, dando a ver que os arquivos
são feitos de zonas de sombra e ausência. Visamos não apenas a referencialidade de uma
imagem documental ou ficcional – sua dimensão de documento, mas também o itinerário
material e discursivo desta imagem em meio a uma cultura da memória – sua dimensão de
monumento.6
Como parte do trabalho de pesquisa para os experimentos do site, realizamos uma
entrevista com Hernani Heffner e José Quental7 em uma das salas do Museu de Arte Moderna
do Rio de Janeiro (MAM – RJ) para que pudéssemos conhecer a história e o trajeto de certos
filmes e cinegrafistas que fazem parte do acervo da instituição. Para os limites deste artigo,
focamos no cinegrafista português Silvino Santos e no filme que realizou durante sua vinda à
Exposição Internacional do Centenário da Independência do Brasil, ocorrida entre 1922 e
1923 na cidade do Rio de Janeiro, Terra Encantada (1923). Trata-se de um filme cujos
pedaços, aqueles que sobreviveram ao tempo, são retomados em alguns dos experimentos do
site Rio Memórias.
Por fim, queremos explorar nestes curtas a ideia de que, se as imagens do passado não
são apenas fatos representados – documentos -, mas carregam lacunas e silêncios, aquilo que
4 O trabalho de criação de curtas com imagens de arquivo do Rio antigo começou em março de 2021. O processo
de pesquisa e realização será descrito ao longo do artigo.
5
Na Galeria Rio Cinético, os experimentos audiovisuais são exibidos e apresentados através de textos curtos
escritos por convidados. Link para Galeria: https://riomemorias.com.br/galeria/rio-cinetico/
6
O site Rio Memórias é parte desta dinâmica de interesses que cultiva as memórias e as histórias da cidade do
Rio de Janeiro. É uma iniciativa de Associação Rio Memórias, organização sem fins lucrativos que tem por
finalidade a promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico, mediante a difusão da
história e cultura da cidade do Rio.
7
Entrevista feita em 03 dez 2021. Hernani Heffner é Gerente e José Quental é o Coordenador de Cinema da
Cinemateca do MAM.
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não pode ser verificado, importa abrir frestas para que algo deste passado irrecuperável da
cidade do Rio possa emergir. Neste sentido, é uma exigência deste método de pesquisa e
realização a recusa em preencher as lacunas da imagem e dar fechamento às narrativas
audiovisuais formuladas.
Nosso pressuposto é o de que, devido à temporalidade emaranhada e múltipla que toda
imagem mobiliza (RUSSELL, 2018, DIDI-HUBERMAN, 2020, DELEUZE, 1990), interessa
operar também com a opacidade que a constitui, destacando nesse movimento sua dimensão
de lugar de memórias, lugar de revelações de tempos passados e presentes, lugar de
expectativas. Ao investigar, avaliar, selecionar, usar e montar o material de diferentes arquivos,
buscamos ver as imagens do passado não apenas como documento de uma época, mas também
como aparições, revelações, ressaltando assim a tensão entre a referencialidade e o
acontecimento da imagem (POIVERT, 2007).
Para a realização do projeto de uma galeria de cinema dentro do site Rio Memórias,
Andréa França participou de algumas reuniões com as mentoras do site e outros parceiros para
pensar o conceito da proposta, a duração dos filmes e temas possíveis.8 Em um segundo
momento, convidou Patrícia Machado (PUC-Rio) para participar do processo de pesquisa e
Arthur Naar (ex-aluno da PUC-Rio) para fazer a montagem técnica e a mixagem do primeiro
experimento, Ressaca. Para a realização dos outros três filmes, a equipe foi ampliada como se
pode verificar nos créditos de cada um. O desafio, ao longo de 8 meses, foi retomar imagens
que restaram do primeiro cinema brasileiro e relacionar esse material a fotografias, charges,
teses acadêmicas e artigos de imprensa da época, de modo a identificar elementos que não são
visíveis de imediato e que requerem um olhar mais atento às imagens.
Quatro curtas foram feitos para a nova galeria do site, a galeria Rio Cinético, desde
então - Ressaca (2021), Vermelho Guanabara (2021), Estiva (2021) e Delírio belga (2021).
Nos dois primeiros, como iremos mostrar, usamos fragmentos de Terra encantada (1923, de
8 Dos encontros, participaram Lívia Baião, Mary Paranaguá, Maria Amélia Teixeira, Hernani Heffner, Heloisa
Starling, Fred Coelho, entre outros parceiros. A proposta inicial, feita pelas diretoras do site, era a realização de
um média metragem sobre o Rio para o primeiro semestre de 2021. Durante as conversas, porém, a ideia de
realizar pequenos experimentos ou lampejos foi tomando forma. Os curtas seriam, tal como sugerido em um dos
encontros, breves lampejos do que foi ou poderia ter sido o Rio de Janeiro do início do século XX.
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Ressaca
9 As obras para a construção da Avenida Beira Mar, do Canal do Mangue, da Avenida Central, etc, que foram
fotografadas por, entre outros, Marc Ferrez e Augusto Malta.
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10 A mesma pergunta foi feita na realização do curta Passeio Público (2016, Andréa França e Nicholas Andueza)
e no artigo sobre o processo de montagem do mesmo. “Presente que irrompe – fotogenia e montagem”, Andréa
França e Nicholas Andueza, Revista Eco-pós v. 20, Imagens do presente, n.2 , 2017.
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Vermelho Guanabara
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A relação de Silvino Santos com a imagem começa quando ele conhece o fotógrafo e pintor Leonel Rocha, no
Pará, e vira seu aprendiz por alguns anos até ir para Paris aprender o ofício do cinema nos estúdios da Pathé e nos
laboratórios dos irmãos Lumière. In: Martins, Luciana ( 2013)
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alternados à diminuição da velocidade das cenas, uso de pedaços de filmes coloridos em tons
sépia e azul. Nesse conjunto de imagens retomadas – dos bairros do Catete, Lapa, Leblon,
Glória, Laranjeiras, há também trechos das sinfonias urbanas de Joris Ivens, Alberto
Cavalcanti, Walter Ruttmann, Paul Strand, Rodolfo Lustig, entre outros. A decisão de trabalhar
com material de origens diversas permitiu tensionar as lacunas que habitam os fragmentos
sobreviventes de Silvino Santos e Alberto Botelho. No afã de exibir o progresso e a marcha
civilizatória, não se vê nessas imagens o seu avesso – os pobres, os negros e pardos, os
sertanejos. Essa alteridade, porém, passa a estar presente na montagem que se apropria de
pedaços de outros filmes (Berlim e Nada como as Horas, por exemplo) que evocam o avesso
do moderno. É verdade que existe a cena do garoto negro que surge sorrindo de dentro de um
vaso em Terra encantada. Não usamos porém o plano em nenhum dos curtas. Tal como existe
no que restou do filme de Silvino, o plano do garoto sorrindo nos parece um comentário social
irônico demais a respeito dos códigos do espetáculo moderno.
Vários fragmentos de Terra encantada foram usados em Vermelho Guanabara. Para
os limites desse ensaio, destacamos dois trechos. Primeiramente, o mesmo pedaço que usamos
em Ressaca, de homens jovens de terno e gravata que leem jornais, fumam charutos,
confraternizam entre si ao mesmo tempo que olham para a câmera. Em Vermelho Guanabara,
esse plano aparece na tela esquerda enquanto na tela direita há uma panorâmica sobre o menu
em francês de um restaurante. O plano dos jovens em confraternização permanece mais alguns
segundos na tela esquerda, enquanto a tela direita fica preta. Retomamos em seguida
fragmentos de Berlim – sinfonia de uma metrópole (1927, Walter Ruttmann) onde vemos em
close-up as mãos que lavam uma pilha de pratos e, na sequência, homens pobres e mendigos
que dormem nas ruas. A montagem pretende não só exibir o lado avesso do entusiasmo com o
Brasil moderno como também mostrar que o ato de ver o aparato tecnológico (a câmera) e de
ser cúmplice dos avanços tecnológicos só vale para uma parcela restrita da população (as
classes sociais mais privilegiadas).
Em outro trecho de Vermelho Guanabara, na parte III, usamos na tela direita
fragmentos do carrossel no parque de diversões da Exposição do Centenário de Terra
encantada enquanto na tela esquerda, vemos um plano subjetivo de dentro de um carrossel que
gira veloz, retirado de Nada como as horas (1926, Alberto Cavalcanti). Optamos por incluir
então, na tela esquerda, frames (duram menos de 1 segundo) do padroeiro da cidade do Rio de
Janeiro, São Sebastião, em meio ao carrossel que gira veloz, procurando mostrar, com os
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Conhecer a história por trás das origens e os caminhos que percorreram as imagens
sobreviventes do filme Terra encantada (Brasil, 1923), de Silvino Santos, é um modo de
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Chamamos os experimentos feitos para o site Rio Memórias de “cinema”, em concordância com o pensamento
de Jean-Louis Comolli. Ao refletir sobre o excesso de imagens que nos assalta diariamente (TV, redes sociais,
etc), ele provoca ao dizer que “nada é visto”. O que existe é apagamento, esquecimento. O cinema seria o lugar,
segundo ele, onde poderíamos “reencontrar a dimensão didática que está no cerne de sua relação com o
espectador” e que chama de “montagem”. Em “Limpeza espetacular das imagens passadas”, Revista Eco-Pós,
v.20, n.2, 2017. É no cinema que podemos aprender a ver e escutar, mas isso exige um trabalho de montagem
com as imagens e sons. Cinema seria menos o suporte físico do material utilizado e mais o trabalho de montagem
para mostrar novamente e, enfim, fazer ver.
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13A duração original do filme é desconhecida. Segundo Hernani Heffner, gerente e pesquisador da Cinemateca
do MAM-RJ, seria algo em torno de 35 minutos.
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Informação fornecida por Heffner em entrevista às autoras, com a participação de José Quental, nas
dependências da Cinemateca do MAM, em 03/12/2021.
15
O material não é recuperado em sua integralidade. Só sobreviveram quatro rolos do filme. Há ainda cópias na
Cinemateca Brasileira e no CTAV do Rio de Janeiro.
16 Luciana Martins (2013, p.18) faz um amplo estudo da trajetória de Silvino Santos como cinegrafista e de seu
percurso de vida no Brasil.
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Dados fornecidos pelo artigo de Eduardo Morettin (2011), onde faz uma minuciosa análise sobre o filme e o
trabalho de Silvino Santos.
18 Em entrevista às autoras (2021)
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Luciana Martins (2013, p. 19).
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Um amplo movimento de criação de cinematecas sucede-se pelo mundo. Em 1929 é aberto o arquivo do
M.O.M.A., em Nova Iorque; em 1932, a Cinemateca Nacional francesa, estatal, depois substituída, em 1936, pela
Cinemateca Francesa, inaugurada por Henri Langlois e Georges Franju. Em 1933 surge a Cinemateca de
Estocolmo, no ano seguinte a de Berlim e, em 1935, o National Film Archive, em Londres.
21
É o caso das primeiras imagens realizadas por Eduardo Coutinho para o filme Cabra Marcado para Morrer
(1984), guardadas em uma lata com o nome Rosa dos Ventos, além das imagens realizadas por Eduardo Escorel
e José Carlos Avellar no dia do cortejo fúnebre do estudante Edson Luis, em 1968. Esse material foi dado como
perdido por quarenta anos.
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Além das tentativas de desmonte e da escassez de recursos – que se refletem até hoje
no reduzido número de funcionários –, o incêndio de 1978 destruiu parte do seu acervo22. Ainda
assim, a Cinemateca resiste e contém um dos maiores acervos filmográficos e de documentação
do Brasil, com mais de 3 milhões de itens que incluem mapoteca, hemeroteca, cartazes,
fotografias, periódicos e um acervo de filmes com 40 mil rolos em película e outros diferentes
suportes23. O acervo abriga também algumas raridades do cinema brasileiro, como imagens
públicas e domésticas produzidas no início do século XX no Rio de Janeiro.
É o caso dos filmes Cidade do Rio de Janeiro (Brasil, 1924) de Alberto Botelho,
Florões de uma raça (Brasil, 1928) de Alberto Botelho, O que foi o carnaval de 1920 (Brasil,
1920) de Alberto Botelho, Nossos soberanos no Brasil (Bélgica, 1920), Voyage au Brésil
(Brasil, 1927) de Vital Ramos de Castro e das imagens da vida familiar captadas pelo
cinegrafista Aristides Junqueira (entre 1909 e 1920), presentes na série Reminiscências,
considerada o registro cinematográfico mais antigo do Brasil. Cada um desses filmes tem uma
história de produção, de sobrevivência e de recuperação e, em diferentes momentos históricos,
chegam ao acervo da Cinemateca da MAM-RJ. Traçar a trajetória desses registros é um modo
de conhecer as dificuldades e a precariedade das políticas públicas de conservação,
especialmente na primeira metade do século XX, e de destacar o fundamental trabalho de
resgate e memória feito pelos agentes dessas instituições24.
O convite feito à Andréa França para realizar o trabalho de curadoria da Galeria Rio
Cinético e de dirigir pequenos filmes, a partir do material dos acervos da Cinemateca do MAM-
RJ (especialmente os que contivessem imagens do Rio de Janeiro do início do século XX) e do
Instituto Moreira Salles–RJ, permitiu um trabalho de reflexão sobre o material sobrevivente de
Silvino Santos. Além de Terra Encantada, para o projeto da Galeria foram retomados
fragmentos de Cidade do Rio de Janeiro, Florões de uma raça, O que foi o carnaval de 1920
e Nossos soberanos no Brasil. É esse processo de retomada, em especial os novos usos e
22
Informações mais detalhadas sobre esse processo podem ser encontradas em BLANK, 2016.
23
Esses dados foram fornecidos por Hernani Heffner e José Quental, em entrevista às autoras.
24
Um dos projetos de destaque no trabalho de recuperação dessas imagens perdidas foi iniciado nos anos
1980 por Cosme Alves Neto, que criou o projeto “A volta do filho pródigo”. Segundo Heffner, o projeto consistia
na repatriação de filmes brasileiros que tivessem relação com o Brasil ou que estivessem localizados em arquivos
estrangeiros e que fossem negociados com os arquivos membros da Federação Internacional de Arquivos de
Filme, a FIAF, para conseguir o retorno direto do material ou a sua duplicação.
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sentidos que os pedaços desses filmes adquirem, que nos interessa explorar e explicitar nos
curtas.
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O projeto da Galeria Rio Cinético é continuar retomando essas imagens raras
realizadas pelos primeiros cinegrafistas brasileiros, tais como Silvino Santos, Vital Ramos de
Castro, Alberto Botelho, Alberto de Sampaio e outros. Interessa à proposta da galeria que, a
cada novo visionamento do material aliado à pesquisa em acervos e documentos e também à
pesquisa de sons, novos sentidos e leituras possam surgir – do passado, das memórias e imagens
apagadas pelo tempo, dos desejos e expectativas controversos de país.
Compreendamos que essas imagens antigas não se esgotam no “isso foi” porque estão
sempre prontas para ganhar sentidos renovados a partir do presente. Para devolver às imagens
fotográficas e/ou cinematográficas os significados do que possam ter sido (ou do que possam
ter sonhado e desejado), é necessário criar uma situação de acolhimento (da própria
materialidade defeituosa do arquivo, seja papel, filme, pedaço de pano, inscrição), de espera
(visionar o material repetidas vezes), de desejo (além de documento, a imagem é surpresa,
acontecimento). Sem esta dimensão imaginativa, ou por quê não ficcional, o documento
permanece indecifrável, indiferente. Nenhum arquivo funciona sozinho. No processo de
selecionar, guardar e excluir, o presente e o futuro são operantes. No corpo a corpo com as
imagens, aprendemos que quando fabricadas, elas são investidas por necessidades e desejos
diversos, e precisamente inscritas em um momento dado da história (DIDI-HUBERMAN,
2020).
O processo de realização dos experimentos formula, dessa forma, um método que
pressupõe a análise do contexto da produção das imagens, os caminhos que percorreram, sua
sobrevivência e os novos sentidos e imaginários a partir do gesto da retomada. A pesquisa
aprofundada dos primeiros filmes, o reconhecimento da sua raridade e dos índices impressos
na imagem, as possibilidades de experimentação a partir da montagem são etapas que
favorecem por fim a irrupção da cidade idealizada, o Rio de Janeiro dos sonhos apagados,
enterrados ou esquecidos.
Bibliografia
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