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Seria a internet uma extensão ou evolução do que foi

a televisão para Gunther Anders?

Leandro Pacheco a22205720


Teorias dos Media| Docente: Hugo Burgalheiro |
Comunicação Aplicada: Marketing, Publicidade e RP | Maio 2023

www.uLusofona.pt
Introdução

Gunther Anders foi um dos mais celebres a discutir a comunicação como um


todo e as suas particularidades. Os principais contributos de Gunther para a
área foram perpetuados em livros como “A Obsolência do homem” e no texto
“O Mundo como Fantasma e como Matriz” onde ele mesmo faz várias
analises sobre os diferentes meios de comunicação, analisando as vantagens e
desvantagens dos mesmos. Gunther analisa ainda os riscos e a influência dos
media na cultura e na sociedade.

Gunther Anders chegou a vivenciar as mudanças proporcionadas por medias


em massa como a rádio, cinema e televisão, as primeiras transformações que
esses meios tiveram na estrutura comunicacional e social. Ele viu pessoas
aglomerarem-se em bares para acompanhar notícias de guerra e músicas pelo
rádio, assim como também viu o movimento sutil, porém notável, da mesa de
jantar das famílias para mais próximo da televisão. Ele também viu uma
transição da autoridade e controle desse mesmo espaço, anteriormente íntimo
e de controlo dos patriarcas ou matriarcas, para as mãos do apresentador do
telejornal. Em suma, a atenção das famílias foi sendo voltada para televisão,
silenciando assim os diálogos diretos e paralelos que anteriormente
preenchiam a mesa de jantar.
Apesar de reconhecer a importância dos meios de comunicação em massa,
Anders sempre foi tendencialmente mais negativo em relação ao assunto. Por
toda essa descrença em torna dessas formas de informação, ele deixava vários
alertas como não se deveria usar os media em massa e um alerta especial para
os espetadores, avisando-os dos riscos e consequências de se “autos silenciar”,
nas palavras do autor: “Eles (os espetadores) deveriam questionar mais e ser
mais críticos sobre o que ouvem e vêm”.
Infelizmente, Gunther não viveu para presenciar a revolução que a internet
vem fazendo no mundo, mudando tudo, em especial a estrutura
comunicacional, a sociedade e cultura. A internet tornou-se tão influente e
comum que é impossível não se analisar os seus efeitos para as pessoas.
O meu trabalho consiste então em analisar a internet como meio de
comunicação em massa, com toda a sua capacidade de influenciar a sociedade
e a cultura, comparando com a televisão, a fim de responder à questão: seria a
internet uma extensão ou uma evolução do que foi a televisão na sua era de
ouro, onde detinha a atenção de todos e moldava livremente opiniões e
comportamentos da sociedade?
Assim como a internet tem ocupado o tempo dos consumidores, houve
também um tempo em que a televisão realizou a mesma faceta com a rádio,
detentora do título de principal forma de entretenimento e fonte de notícias por
muitos anos, até que a televisão com todo o seu cariz inovador, revolucionário
e emocionante, misturado ainda com a capacidade de sincronizar o áudio a
imagem simultaneamente. Todos esses fatores tornaram a televisão em poucos
anos no media mais utilizada e amada pelos espetadores que já procuravam
por algo mais íntimo e interativo como as telenovelas e os telejornais,
proporcionadas unicamente pelas televisões.
Toda a interatividade e influência em torno da televisão sobre os espetadores,
gerou rapidamente uma preocupação generalizada sobre os seus efeitos na
educação, atitudes políticas, consumistas e comportamento social das pessoas,
demorou cerca de uma década após a proliferação da televisão no mundo para
se entender e passar a estudar os seus riscos.
Em 1961, o presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, alertou sobre o
potencial negativo da televisão, dizendo: "A televisão é um meio muito
poderoso. Ela pode nos levar à sabedoria ou à ruína. Pode ser uma fonte de
iluminação, ou pode ser uma fonte de escuridão".
Apesar do grande crescimento da internet e a rápida popularização do media a
televisão ainda ocupa, confortavelmente, o posto de forma mais comum de
meio de comunicação em massa em termos de uso global, embora já se possa
afirmar que em alguns países esse quadro já tenha sido invertido a favor da
internet que conta com 4,9 bilhões de utilizadores, o que representa cerca de
63% da população mundial.
Assim como aconteceu com a televisão, a internet após ter passado pelo
momento de euforia e novidade, também passou a ser questionada a sua
influência para as pessoas e principalmente para os jovens, os maiores
utilizadores do meio.
Seria a internet uma extensão ou evolução do que
foi a televisão para Gunther Anders?
Quais os perigos de um meio de comunicação em massa nas mãos do
público?

A Televisão
A televisão é um meio que procura captar a atenção do espetador e
condicionar a perceção da informação de forma que seja única e absoluta, ou
seja, de forma que telespetador não refute, não critique, não questione a
veracidade do conteúdo/informação enunciada. Segundo Gunther a televisão
tornou a sociedade frágil, fragmentada e superficial, com pessoas pouco
criativas e sem pensamentos próprios.
Gunther Anders assim como Marshell Mclung debate muito a comunicação
desde a função dos meios de massa à sua influência para as pessoas. Anders
parte do princípio de Mclung “O meio é a Mensagem” a interpretação de
Gunther seria como se os meios de comunicação não fossem apenas simples
meios, onde qualquer pessoa poderia vincular qualquer tipo de mensagem
através dele, como um meio democrático, permitindo assim que as pessoas
tivessem acesso a todo e qualquer tipo de informações. Porém, Mclung e
Gunther partem de um ponto de vista mais crítico, apercebendo-se que o
próprio meio controla tudo, quais as mensagens que podem ou não ser
vinculadas, assim eles condicionam a informação fornecida aos expectadores,
ou seja, eles decidem o que tu vês e o que não, tornando-se assim a própria
mensagem.

Gunter Anders, na sua obra "A obsolescência do homem" e no texto “O


Mundo como Fantasma e como Matriz”, criticou fortemente o impacto da
televisão na sociedade e na cultura moderna. Segundo ele, a televisão é um
meio de comunicação de massa que tem o poder de moldar a opinião pública e
criar uma sensação de alienação e superficialidade nas interações humanas.
Anders argumentava ainda que a televisão condiciona a capacidade do ser
humano de falar e criar ideias próprias, já que as pessoas tendem a adotar as
ideias dos meios de comunicação sem os refutar, aprisionando-se assim às
ideias relatadas. Gunther chega mais longe ainda e diz que essa constante
interação com os media aprisiona as pessoas num mundo paralelo onde as
necessidades e condições básicas humanas foram perdidas, como a fala, a
curiosidade, interação pessoal e o raciocínio.
Desde o aparecimento da televisão, vemos as pessoas com dificuldade em
interagir, em procurar ou investigar. As pessoas chegaram a um ponto em que
elas próprias são o que os medias dizem, como um gravador ou uma
impressora oral das informações que recebem. Gunther chamava esse
fenómeno de "pseudo-pensamento", onde as pessoas aceitam ideias pré-
fabricadas e não questionam a validade ou a veracidade delas. As pessoas
esperam conhecer o mundo pelas suas telas, confortáveis.
Além disso, Anders também culpabiliza a televisão por ser o responsável por
mudanças significativas no comportamento do consumidor. A publicidade na
televisão cria um desejo constante por novos produtos e incentiva o
consumismo desenfreado, levando as pessoas a comprar cada vez mais e a
acumular coisas desnecessárias. A televisão também é responsável por
padronizar as formas de comportamento e consumo, gerando uma cultura de
homogeneização.
No entanto, é importante destacar que a televisão tem um impacto negativo na
sociedade e na cultura, e isso é algo que Gunther Anders apontou com muita
ênfase nas suas obras. A falta de espírito crítico, o conformismo,
desumanização, o consumismo desenfreado e a homogeneização cultural são
apenas alguns dos problemas gerados pela televisão e que ainda hoje são
relevantes para a análise do impacto das novas tecnologias na sociedade e na
cultura.
A internet
A "net" é dos meios de comunicação em massa mais revolucionários e
transformadores da sociedade, muito pela sua capacidade de unir milhões e
alcançar esses mesmos milhões instantaneamente, a interatividade, a escolha
ou o poder sobre o que se ouve e vê, no entanto, a característica que mais
destaca a web dos outros medias é certamente a bilateralidade, responsável por
tornar a comunicação mais democrática e de certa forma mais condizente com
a teoria da comunicação, a bilateralidade permitiu que as pessoas participem
ativamente no fluxo de comunicação, restringido anteriormente aos emissores,
na sua maioria as grandes empresas.
A web mudou tudo, o comportamento das pessoas, como se relacionam, como
compram, como procuram por informação, como trabalham, etc.
Gunther Anders com toda a sua perspicácia e senso crítico analisaria a internet
como ambivalente, valorizando os vários pontos positivos e importantes para o
desenvolvimento da verdadeira relação homem-máquina e não esquecendo de
estender essa análise com os inúmeros riscos e perigos que a internet acarreta
para o homem.
A internet permite com que as pessoas participarem ativamente da
comunicação, a capacidade de ligar pessoas a milhares de quilómetros por uma
rede de dados, a facilidade no acesso a informações e a liberdade sobre o que se
vê, facilita essa participação do público com os medias. Contudo, ele também
não se negaria a pensar sobre os inúmeros feitos destrutivos que essa rede
mundial tem provocado, por exemplo: a falta de privacidade dos utilizadores,
a segurança dos seus dados, o efeito viciante das redes sociais e outras formas
de entretenimento, o crescente fluxo de informações falsas e desestruturadas, a
dependência das pessoas pela opinião dos outros, a grande exposição, o poder
concebido as grandes empresas (a massiva pilha de informação das pessoas) e
por fim a falta de controlo sobre os conteúdos veiculados nela.
Lembremos ainda que Anders era um forte crítico ao controlo do meio sobre os
conteúdos veiculados nele, ansiando sempre que esse processo fosse muito mais
democrático e livre. No entanto, ele também acreditava que a liberdade de
informação deveria estar acompanhada de uma responsabilidade social por
parte dos meios de comunicação e dos indivíduos que produzem o conteúdo.
A "net" ao contrário da televisão, dá a possibilidade de qualquer pessoa poder
produzir e vincular conteúdo e informações no meio, garantindo assim a tão
sonhada liberdade de informação e desfazendo a ideia de que o meio é a
mensagem.
Esta rede já viveu um período muito obscuro e nebuloso sobre essa liberdade,
democratização do meio e a própria falta de responsabilidade sobre o que se
vincula na rede. Nela conteúdos violentos, racistas, pornografia eram
constantemente veiculados com alguma facilidade, hoje ainda há vários
problemas com isso como as falsas imagens e vídeos gerados por computador,
discursos de ódio entre outros. Todo esse problema surge de um contexto muito
simples, "As Pessoas". Quando permite que o poder da informação seja usado
por pessoas sem nenhuma responsabilidade e moral, permite que elas a utilizem
para fins distantes dos idealizados.
A liberdade de informação deve ser exercida com responsabilidade social e
algum controlo institucional para promover uma cultura de respeito pelos
direitos humanos e pela dignidade de todas as pessoas. Assim como acredito
que Gunther repudiaria a libertinagem de hoje e consideraria, fortemente,
reformas nas políticas em torno deste meio de comunicação em massa, parto
também da ideia de que deveria existir um maior controlo institucional, pelo
menos maior do que existe atualmente, para proteger as pessoas de conteúdos e
informações criminosas e intoleráveis. Os primeiros anos da internet já nos
provaram que não se pode deixar o controlo de algo tão grande e influente como
a informação na mão de quem não se importa e não percebe o poder que tem
sobre os outros.
Assim como foi abordado no capítulo da televisão, a internet também teve uma
grande influência no aumento do consumismo, fruto da capacidade de
personalização, direcionamento, facilidade no acesso à informação e um maior
contacto das pessoas com dispositivos móveis. Muitos desses fatores
permitiram com que as empresas criassem necessidades, senso de urgência e
outras formas de persuasão, estimulando também o consumismo.
Em suma, é inequívoca a posição de Gunther Anders em relação a este meio de
comunicação, mas é possível supor que ele teria uma perspetiva otimista em
relação às capacidades democráticas do meio, mas acredito que a análise seria
tendencialmente crítica em relação aos efeitos negativos do "novo" media sobre
a vida humana e as relações sociais.
Conclusão
Vimos os pontos fortes e os fracos e os motivos das críticas e preocupações de
Gunther relativamente a televisão como media, a sua influência, o seu efeito
para pessoas e nos meios socias. Inferimos também sobre a internet com base
nas teorias e analises anteriores de Anders, tudo isso para responder á uma
única questão: Seria a internet uma extensão ou evolução do que foi a
televisão?
Com base em tudo que vimos, podemos então concluir que há algum espaço
para se concluir que a webpode ser vista realmente como uma evolução da
televisão ou uma espécie de televisão 2.0, essa conclusão resulta da análise
das seguintes similaridades entre os meios de comunicação:
Alienação e distanciamento da realidade: Tanto a televisão quanto a "net"
têm o potencial de alienar as pessoas e desconectá-las da realidade. Anders
argumentava que a televisão criava uma realidade fictícia que distanciava as
pessoas do mundo real. Da mesma forma, a "net" pode criar uma bolha virtual
em que as pessoas se envolvem em atividades superficiais e desconectam-se
do mundo físico e das interações sociais significativas.
Perda da individualidade e influência dos meios de comunicação: Gunther
acreditava que os meios de comunicação em massa tinham o poder de moldar
as opiniões e comportamentos das pessoas, resultando numa perda da
individualidade e da capacidade de pensamento crítico. Tanto a televisão
quanto a internet podem exercer influência sobre as pessoas, disseminando
informações e moldando perspetivas, muitas vezes sem um senso crítico
adequado por parte dos recetores.
Dependência e isolamento social: ele também estava preocupado com a
crescente dependência das pessoas em relação à tecnologia e como isso
poderia levar ao isolamento social. Tanto a televisão quanto a web podem
contribuir para a diminuição das interações sociais face a face, levando as
pessoas a preferirem interagir por meio desses meios de comunicação em vez
de se envolverem em interações pessoais mais significativas.
Exposição a conteúdos prejudiciais: Tanto a televisão quanto a "net" podem
expor as pessoas a conteúdos prejudiciais, como violência, pornografia,
discurso de ódio, entre outros. Essa exposição excessiva e não regulamentada
pode ter impactos negativos na saúde mental, na perceção do mundo e na
formação de valores e atitudes.
Todas essas similaridades entre a internet e a televisão são já mais do que o
suficiente para podermos admitir um certo grau de parentesco entre os media.
Apesar de todos os pontos em comum mencionados, é crucial salientar que a
web não é apenas uma cópia melhorada da televisão. Há também algumas
diferenças significativas que mudam todo o caráter do media, como a
influência positiva na relação homem-máquina, na construção de um ser mais
informado e dotado e, sobretudo, a bilateralidade dessa rede mundial,
conferindo às pessoas a capacidade de comentarem, criticarem, refutarem e
concordarem em cima dos conteúdos, tornando assim o espetador mais ativo
na conversa.
Bibliografia

• Gunther Anders - The world as phantom and as matrix-


philosophical considerations on radio and television.pdf

• https://pt.wikipedia.org/wiki/G%C3%BCnther_Anders

• https://libcom.org/book/export/html/51647

• Livro de Gunther Anders “the obsolescence of man”

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