Você está na página 1de 96

Percepções e sentidos:

racismo, sexismo e intolerância


religiosa na infância e juventude
em Salvador e no Recôncavo Baiano
Percepções e sentidos:
racismo, sexismo e intolerância
religiosa na infância e juventude
em Salvador e no Recôncavo Baiano

INSTITUTO ALIANÇA COM O ADOLESCENTE


Rua Alceu Amoroso Lima, nº 470
Edifício Niemeyer, sala 903
Caminho das Árvores, Salvador - BA, Brasil
CEP 41.820-770
E-mail: ia@institutoalianca.org.br
www.institutoalianca.org.br

Esta publicação é resultado da pesquisa de percepção sobre racismo, sexismo e


intolerância religiosa na infância e juventude, desenvolvida no âmbito do Projeto
Àwúre - Fortalecendo as Redes Comunitárias de Proteção da Criança, Adolescentes
e Jovens contra a Violência no Recôncavo Baiano e Salvador. O Projeto Àwúre é uma
iniciativa nacional da Organização Internacional do Trabalho (OIT), do Ministério Público
do Trabalho (MPT) e do Fundo das Nações Unidas pela Infância (Unicef) que, na Bahia,
conta com a parceria do Instituto Aliança com o Adolescente e a Plan International.

A reprodução do todo ou de parte deste documento é permitida somente para fins


não lucrativos e desde que citada a fonte.

Parceria técnica: Iniciativa:


Ficha Técnica
Edelamare Barbosa Melo Edmar Ferreira Santos
Subprocuradora Geral do
Letícia Maria de Souza Pereira
Ministério Público do Trabalho (MPT)
Natalia Silveira de Carvalho
Helena Oliveira Consultor e consultoras
Chefe do Escritório em Salvador -
Fundo das Nações Unidas pela Thaís Calixto dos Santos
Infância (Unicef) Uyara Silva de Arruda
Auxiliares de pesquisa
Ilma Oliveira
Diretora técnica do Instituto Aliança Letícia Maria de Souza Pereira
com o Adolescente e Coordenadora Geral Revisora
da área de Direitos Humanos
Graça Gadelha
Elaine Amazonas Revisora técnica
Gerente de Projetos -
Plan International Bahia
Annie Ganzala
Ilustração
Jalusa Silva de Arruda
Coordenadora da pesquisa
Revista Afirmativa
Projeto gráfico
Natasha Maria Wangen Krahn
Otto Vinicius Agra Figueiredo Gil Dicelli
Pesquisadora e pesquisador Valdir Muniz
Diagramação

Ficha Catalográfica
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO
Dados Internacionais de Catalogação NA PUBLICAÇÃO
na Publicação (CIP) (CIP)
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
I59p Instituto Aliança com o Adolescente
I59p Instituto Aliança com o Adolescente
Percepções e sentidos: racismo, sexismo e intolerância religiosa na
Percepções e sentidos: racismo, sexismo e intolerância religiosa na
infância e juventude em Salvador e no Recôncavo Baiano / Jalusa Silva
infância e juventude em Salvador e no Recôncavo Baiano / Jalusa Silva
de Arruda; Natasha Maria Wangen Krahn; Otto Vinicius Agra
de Arruda; Natasha Maria Wangen Krahn; Otto Vinicius Agra
Figueiredo. – 2022.
Figueiredo. – 2022.
96 f. Recurso digital : il.
96 f. Recurso digital : il.
Requisitos do sistema: Adobe Digital Editions
Requisitos do sistema: Adobe Digital Editions
Modo de acesso: World Wide Web
Modo de acesso: World Wide Web
ISBN: 978-65-00-38583-0
ISBN: 978-65-00-38583-0
Relatório - Projeto Àwúre, Organização Internacional do Trabalho,
Relatório - Projeto Àwúre, Organização Internacional do Trabalho,
Ministério Público do Trabalho, UNICEF, Instituto Aliança com o
Ministério Público do Trabalho, UNICEF, Instituto Aliança com o
Adolescente, Bahia, 2022.
Adolescente, Bahia, 2022.
1. Crianças. 2. Adolescentes. 3. Jovens. 4. Racismo. 5. Sexismo.
1. Crianças. 2. Adolescentes. 3. Jovens. 4. Racismo. 5. Sexismo.
6. Liberdade de consciência. 7. Educação sexual. 8. Assédio nas
6. Liberdade de consciência. 7. Educação sexual. 8. Assédio nas
escolas. 9. Violência contra as adolescentes. I. Arruda, Jalusa da Silva.
escolas. 9. Violência contra as adolescentes. I. Arruda, Jalusa da Silva.
II. Krahn, Natasha Maria Wangen. III. Figueiredo, Otto Vinicius Agra. III.
II. Krahn, Natasha Maria Wangen. III. Figueiredo, Otto Vinicius Agra. III.
Título.
Título.
CDD 362.76
CDD 362.76

Bibliotecária responsável: Angélica Ono (CRB10/2151)


Bibliotecária responsável: Angélica Ono (CRB10/2151)
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 – Percentual de respondentes por sexo 22 GRÁFICO 14 - Percentual de respondentes por
alternativa assinalada na questão do questionário:
GRÁFICO 2 – Percentual de respondentes por raça/cor 22 Assinale as opções que você concorda ou que melhor
representam o que você entende sobre SEXISMO. 34
GRÁFICO 3 – Percentual de respondentes por faixa etária 22
GRÁFICO 15 - Percentual de respondentes por
GRÁFICO 4 – Número de respondentes por religião 23 alternativa assinalada na questão do questionário:
Assinale as opções que você concorda
GRÁFICO 5 – Número de respondentes por escolaridade 23 ou que melhor representam o que você
entende sobre INTOLERÂNCIA RELIGIOSA. 35
GRÁFICO 6 – Percentual de
respondentes por município de atuação 24 GRÁFICO 16 - Número de respondentes que
marcaram as assertivas que negam a existência
GRÁFICO 7 – Percentual de do racismo, do sexismo e da intolerância religiosa 40
respondentes por área de atuação 24
GRÁFICO 17 – No desempenho de suas funções você já
GRÁFICO 8 – Percentual de respondentes por tempo identificou ou foi informado(a) ou notificado(a) sobre
de atuação em suas respectivas áreas de atuação 24 a ocorrência de RACISMO, SEXISMO ou INTOLERÂNCIA
RELIGIOSA contra crianças, adolescentes ou jovens? 45
GRÁFICO 9 – Percentual de entrevistadas por sexo 25
GRÁFICO 18 - Você se sente preparado(a)
GRÁFICO 10 – Percentual de entrevistadas por cor/raça 25 para identificar e atuar (atender ou
encaminhar, dependendo de sua função)
GRÁFICO 11 – Percentual de nas questões relacionadas ao racismo,
entrevistadas por município de atuação 25 sexismo e a intolerância religiosa
contra crianças, adolescentes e jovens? 46
GRÁFICO 12 – Número de entrevistadas por religião 25
GRÁFICO 19 - Você avalia que é necessário ter
GRÁFICO 13 - Percentual de respondentes por formação/capacitação sobre os temas racismo,
alternativa assinalada na questão do questionário: intolerância religiosa e sexismo para a sua atuação
Assinale as opções que você concorda ou que melhor profissional e no desempenho de suas funções? 46
representam o que você entende sobre RACISMO. 31

4
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
BNCC ----------------------------------------- Base Nacional Comum Curricular
CMDCA ------------------------------------- Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
CNE -------------------------------------------- Conselho Nacional de Educação
CONANDA ------------------------------- Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
CONEP -------------------------------------- Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
CRAS ------------------------------------------ Centro de Referência de Assistência Social
CREAS -------------------------------------- Centro de Referência Especializado de Assistência Social
DEAM ---------------------------------------- Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher
ECA --------------------------------------------- Estatuto da Criança e do Adolescente
FBSP ------------------------------------------ Fórum Brasileiro de Segurança Pública
IBGE ------------------------------------------- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPEA -------------------------------------------- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LDB --------------------------------------------- Lei de Diretrizes e Bases
LGBTQIA+ -------------------------------- Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis,
Queer, Intersexos, Assexuais, demais orientações e identidades de gênero

Lista TIP ----------------------------------- Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil


MEC -------------------------------------------- Ministério da Educação
MMFDH ------------------------------------ Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos
MPT--------------------------------------------- Ministério Público do Trabalho
OIT----------------------------------------------- Organização Internacional do Trabalho
PAEFI------------------------------------------ Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos
PPP --------------------------------------------- Projeto Político Pedagógico
SECADI ------------------------------------- Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão
SSP/BA ------------------------------------- Secretária Segurança Pública do Estado da Bahia
TCLE ------------------------------------------ Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UFRB ------------------------------------------ Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
UPA --------------------------------------------- Unidade de Pronto Atendimento
Unesco ------------------------------------- Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
Unicef --------------------------------------- Fundo das Nações Unidas pela Infância
3. DADOS
QUALITATIVOS:
RACISMO, SEXISMO
E INTOLERÂNCIA
RELIGIOSA NOS
ESPAÇOS DE
APRESENTAÇÃO SOCIALIZAÇÃO
INSTITUCIONAL E PROTEÇÃO
2. DADOS
QUANTITATIVOS: 47 3.1 A HISTÓRIA E A
CULTURA AFRICANA
PERCEPÇÃO E INDÍGENA NAS
SOBRE RACISMO, ESCOLAS
INTRODUÇÃO
SEXISMO E 51 3.2 ESTÉTICA
INTOLERÂNCIA 3.3 LGBTQIA+FOBIAS
RELIGIOSA 52 E EDUCAÇÃO SEXUAL
NAS ESCOLAS

27 2.1 RACISMO 55 3.4 SOCIALIZAÇÃO


SEXISTA E DIVISÃO
SEXUAL E RACIAL
1. CONSIDERAÇÕES 31 2.2 SEXISMO DO TRABALHO
METODOLÓGICAS
34 2.3 INTOLERÂNCIA 57 3.5 RACISMO
RELIGIOSO E
16 1.1 PRIMEIRA ETAPA:
APLICAÇÃO DE
RELIGIOSA
INTOLERÂNCIA
QUESTIONÁRIO RELIGIOSA
37 2.4 NEGANDO

17 1.2 SEGUNDA ETAPA:


RACISMO, SEXISMO
E INTOLERÂNCIA 61 3.6 NÃO É BULLYING!
REALIZAÇÃO DAS RELIGIOSA
ENTREVISTAS
63 3.7 VIOLÊNCIAS

19 1.3 RESPONDENTES 40 2.5 PERCEPÇÕES


A PARTIR DA
CONTRA MENINAS
E MULHERES
DO QUESTIONÁRIO ATUAÇÃO E DA

22 1.4 ENTREVISTADAS
FORMAÇÃO
PROFISSIONAL
68 3.8 COMUNIDADES
QUILOMBOLAS

72 3.9 ÓRGÃOS E
SERVIÇOS DO SISTEMA
DE GARANTIA DE
DIREITOS

83
78
REFERÊNCIAS

92 APÊNDICE A – Entrevistas Realizadas

4. PALAVRAS FINAIS
95 APÊNDICE B – Comunidades Quilombolas
Certificadas nos Municípios da Pesquisa E RECOMENDAÇÕES

6
APRESENTAÇÃO INSTITUCIONAL
O Projeto Àwúre tem a satisfação de Esperamos que a pesquisa, ora apresenta-
lançar a pesquisa Percepções e sentidos: da, possa contribuir com políticas públi-
racismo, sexismo e intolerância religiosa cas municipais e estaduais que tenham em
na infância e juventude em Salvador e no foco a inclusão, a garantia da dignidade, da
Recôncavo Baiano, fruto de uma imersão proteção integral de crianças e adolescen-
nos nove territórios atendidos, com tes, a participação e o empoderamento. As
ampla escuta de profissionais, lideranças recomendações apresentadas são fruto
comunitárias e de povos originários, de uma escuta ativa e atenta dos diversos
conselheiros tutelares e de direitos e públicos, aliada ao aprofundamento
jovens dos 10 municípios envolvidos. teórico-metodológico e normativo para
uma intervenção que possa criar ciclos de
O trabalho se caracteriza por dirigir um reprodução da vida e equidade.
olhar, desde o seu nascedouro, para a
interseccionalidade estrutural de violações Sobre o Projeto Àwúre: fruto de uma ini-
como o racismo, o sexismo e a intolerância ciativa inovadora do Ministério Público do
religiosa que atingem crianças, adolescentes Trabalho (MPT), do Fundo das Nações
e jovens no território do Recôncavo Unidas para a Infância (Unicef) e da Orga-
Baiano e em Salvador. A pesquisa parte nização Internacional do Trabalho (OIT),
de uma compreensão e contextualização o Àwúre é realizado em seis estados,
histórica do território, focalizando nas incluindo a Bahia, tendo como objetivo pro-
potencialidades locais, realçando os efeitos mover direitos daquelas comunidades em
e impactos negativos provocados por essas situação de maior vulnerabilidade social,
violações de direitos. Infelizmente base por meio de ações que busquem a inclusão
para tantas outras, a exemplo do abandono social e produtiva, e a prevenção da explo-
e evasão escolar (porque não expulsão!), ração das piores formas de trabalho, em
gerando, ou aprofundando, a reprodução especial o trabalho infantil, a exploração
das desigualdades sociais abissais sexual e o trabalho escravo contemporâ-
existentes no nosso país. neo. No recôncavo, o projeto se dedicou a
fortalecer as redes locais e comunitárias de
O rigor metodológico, que alia aspectos proteção e garantia dos direitos de crianças,
quantitativos e qualitativos, é entremeado adolescentes, jovens e mulheres quilom-
por uma narrativa que privilegia atores bolas, tradicionais de terreiros, ribeirinhas
locais e as falas das pessoas participantes, e LGBTQIA+, visando o desenvolvimento de
guardando o sigilo necessário. Mais que estratégias locais de superação do racis-
respostas, a pesquisa levanta uma série de mo, sexismo e intolerância religiosa. Para a
perguntas, começando pela possibilidade pesquisa em questão, foram considerados
de amplificação destas situações em outros 10 municípios do Recôncavo baiano: Ca-
territórios, considerando que estamos choeira, São Félix, Santo Antônio de Jesus,
falando de Salvador, cidade com presença de Nazaré, Muritiba, Salinas da Margarida,
mais negros fora do continente africano, e do Santo Amaro, Maragogipe e Salvador.
Recôncavo Baiano, lugar de grande riqueza
cultural e também com alta concentração
da população preta. Por outro lado, o estudo Uma boa leitura e reflexões que importem
abre inúmeras janelas para outras análises práticas de proteção e cuidado!
e aprofundamentos, que certamente
contribuirão para a geração de novos
conhecimentos revertidos em mudanças
concretas e de práticas que venham a cessar Helena Oliveira
violações de direitos. Chefe do Escritório em Salvador - Unicef

Ilma Oliveira
Diretora técnica do Instituto Aliança
com o Adolescente e Coordenadora Geral
da área de Direitos Humanos

7
Introdução
[…] o meu sonho é ver todo jovem
na faculdade e ocupar o nosso lugar.
Mostrar aos nossos jovens que ele pode
ser um professor, pode ser um doutor,
pode ser um advogado, um juiz,
mas que ele saiba de onde veio
e lute pela nossa causa.
Entrevista, Liderança quilombola

Cachoeira
Foi de Luanda que entendi sua realidade
Olhem pra mim! Sou de Cachoeira
Penso, falo, canto e sou sua liberdade.
Homem! o Animal Que Fala, Mateus Aleluia

8
Introdução

No início dos anos de 1980, Mateus meninas e meninos negras e negros2 .


Aleluia e Dadinho atravessaram o
Atlântico e passaram duas décadas Como é sabido, no período colonial
em Angola, país da costa ocidental do a Bahia se tornou economicamente
continente africano que, assim como bem-sucedida, especialmente a região
o Brasil, foi colonizado por Portugal. do Recôncavo, graças à produção de
Foi de Angola que lançaram, em 1986, açúcar e de fumo pela exploração do
Dadinho e Mateus, reconhecido como trabalho escravo. O Recôncavo é uma das
último disco dos Tincoãs1. Também foi regiões de povoamento mais antigas do
de lá que Cachoeira - BA, pioneira no país e foi importante centro político pela
movimento emancipador do Brasil e proximidade com Salvador que, por mais
cidade natal dos Tincoãs, se mostrou de dois séculos, foi sede do Governo-
tão fortemente como herdeira do Geral do Brasil (SOUSA, 2012). Palco das
Atlântico Negro. principais lutas pela independência,
a presença negra no Recôncavo é
Justamente por isso, compreender a indissociável da cultura e da riqueza que
cidade de Cachoeira como diz a canção formaram nosso país.
- e, em certa medida, o Recôncavo
Baiano, Salvador, a própria Bahia e o A região tem significativo número
Brasil - é mais que ratificar a ligação de comunidades quilombolas e,
com África: é dar-se conta de si mesmo levando em conta somente os nove
e da presença ancestral naquilo que municípios do Recôncavo da pesquisa,
fomos, somos e seremos. são 34 comunidades certificadas. O
cenário apresenta muitos desafios
Começamos a apresentar os resultados econômicos e sociais que recaem,
da pesquisa de percepção do racismo, sobretudo, às crianças, adolescentes,
sexismo e intolerância religiosa jovens e mulheres.
contra crianças, adolescentes e jovens
realizada nos municípios de Cachoeira, Parte desse contexto pode ser
Cruz das Almas, Maragogipe, Muritiba, verificado no Levantamento das
Nazaré, Salinas da Margarida, Salvador,
Santo Amaro, Santo Antônio de Jesus
e São Félix com essas palavras porque, 2
Em razão de uma escrita não-sexista, neste
antes de tudo, este trabalho fala de relatório foi considerada a flexão de gênero de três
maneiras distintas: 1) adoção do gênero feminino ou
masculino para referir às pessoas individualmente;
2) a depender do contexto, a linguagem de gênero
se fez presente pelo registro total dos vocábulos,
tal como “meninos e meninas negras e negros”;
1
Os Tincoãs, grupo musical formado originalmente e 3) uso do gênero feminino para generalizar os
por Erivaldo, Heraldo e Dadinho, surgiu em 1960 sujeitos, em oposição ao padrão linguístico de
na cidade de Cachoeira - BA. Em 1963, Erivaldo se adoção do gênero masculino, considerando que
desligou dos Tincoãs e foi substituído por Mateus a maioria das pessoas participantes da pesquisa,
Aleluia. O grupo se consagrou com repertório único tanto respondentes do questionário como as
de músicas inspiradas na herança cultural africana. entrevistadas, são mulheres.

9
Introdução

principais violências praticadas contra genocídio - físico e simbólico - do


crianças, adolescentes e jovens em povo negro (NASCIMENTO, 1978)
Salvador e no Recôncavo Baiano (2019- e a violência contra a mulher,
2020) (INSTITUTO ALIANÇA, 2021), crianças e adolescentes. Em relação
elaborado no âmbito Projeto Àwúre, às práticas culturais e religiosas
que permitiu traçar um panorama relacionadas especificamente com
mínimo acerca da realidade dos a população negra, mesmo após a
municípios sobre violências praticadas primeira Constituição Republicana,
contra crianças, adolescentes e jovens promulgada em 1891 e juridicamente
a partir dos principais bancos de laica, foi mantida a criminalização de
dados disponíveis no país. O relatório práticas religiosas de negras e negros
foi utilizado como ponto de partida durante todo o período pós-abolição
para parte das questões formuladas (NOGUEIRA, 2020; SANTOS, 2009).
nos instrumentais de coleta de dados
e de relevância na apresentação de No Brasil, pesquisas e a literatura
resultados da pesquisa. especializada com reflexões sobre a
interseção classe, racismo e sexismo
Ao fim, falar sobre a infância e a ganharam força nos idos de 1970,
juventude de Salvador e de parte do notadamente a partir da ascensão
Recôncavo Baiano é, segundo projeção do movimento negro organizado
de dados oficiais, falar de 85,5% e da produção de seus intelectuais
de meninas e meninos que trazem (GONZALEZ, 2018; NASCIMENTO, 1978;
consigo o legado ancestral africano MOURA, 1983; 1988).
como parte constitutiva de suas
histórias e identidades (INSTITUTO Em momento próximo, intelectuais
ALIANÇA, 2021; SILVA, 2014). feministas, especialmente da
academia, refletiam sobre a condição
Se a geografia dos corpos evidencia da mulher na sociedade brasileira
de onde viemos, para Mateus Aleluia (COSTA, 2005), ao passo que estudos
a forma ancestral está não apenas no interdisciplinares dedicados à
passado, mas no presente e futuro; infância e juventude começaram
ou, como ensina o ditado iorubá sobre a ganhar força na virada dos anos
o movimento do tempo, “Exu matou de 1970/1980 e, aos poucos, temas
um pássaro ontem, com a pedra que como gênero e sexualidade, raça e
arremessou hoje” (MUNANGA, 2015; racismo foram aparecendo nos estudos
OLIVEIRA, 2015). A forma ancestral é, dedicados aos segmento infanto
está e vive em cada um dos meninos e juvenil em distintas perspectivas e
em cada uma das meninas de Salvador e contextos (ABRAMOVAY; CASTRO;
do Recôncavo Baiano. SILVA, 2004; ARRUDA; KRAHN, 2020;
EURICO, 2020; LOPES, 2012).
Entretanto, as heranças coloniais
e as desigualdades estruturais Porém, inicialmente, estudos sobre a
encontradas na sociedade brasileira infância e a juventude tenderam a focar
permitiram (e permitem) o na institucionalização e nas especifici-

10
Introdução

dades da política de atendimento, qua- construção de ideais de masculinidade


se sempre silenciando sobre o impacto e feminilidade relegam a infância e
das categorias sociais gênero e raça. Por a juventude negras ao ápice da
outro lado, o feminismo (ou as teorias violência e do controle social formal
feministas do mainstream) demorou em nosso país.
para abarcar a dimensão racial, igno-
rando a interseção de gênero e raça e os Ainda, nos provocam a pensar sobre
impactos do racismo e do sexismo na como as categorias sociais gênero, raça
vida das mulheres e das crianças (GON- e classe incidem sobre o cenário das
ZALEZ, 2018). violações dirigidas às meninas e aos
meninos, uma vez que, não raro, racismo
Essa combinação gerou, por vezes, e sexismo em todas as duas expressões
invisibilidades em “mão dupla”: estu- são invisibilizados na compreensão do
dou-se aspectos geracionais e etários fenômeno da violência contra crianças
sem considerar as dimensões raciais e adolescentes. É o peso da interseção
e de gênero, ao passo que ao analisar entre racismo e sexismo que conduz
as vicissitudes de gênero e raça nem às meninas negras a maior vitimização
sempre consideraram a especifici- pelas violências sexuais e aos meninos
dade de ser criança, adolescente ou negros a violência letal.
jovem no Brasil a partir dessas mesmas
categorias (ARRUDA, 2020). Se, por muito tempo, deixamos de
problematizar no campo da infância
A violência dirigida à população e juventude o peso e a interseção
negra brasileira não poupa a infância dessas categorias, a proteção integral
e juventude, muito pelo contrário: cobra um outro olhar sobre crianças,
homicídio é a principal causa de adolescentes e jovens.
mortalidade de pessoas entre 15 e 29
anos (IPEA, 2020); em um período de 20 Apesar de atualmente encontrar-
anos (1996-2016), a restrição e privação mos estudos e pesquisas dedicados
de liberdade de adolescentes e jovens à análise da infância e juventude que
no Brasil cresceu 523%, percentual contemplem gênero e raça, ainda
superior ao do sistema prisional no são poucas as pesquisas que o fazem
mesmo período (ARRUDA, 2021); articulando ambas as categorias como
negligência e violências psicológica, estruturais para a análise, sobretudo
física e sexual lideram o ranking das em estudos realizados no Recônca-
modalidades denunciadas no Disque vo Baiano (GIUGLIANI, 2013; GUEDES,
Direitos Humanos (MMFDH, 2019). 2018). Nesse aspecto, a pesquisa ora
apresentada é inédita e, para além
Os dados são reveladores sobre de seus resultados, abre portas para
como o racismo estrutural, que outros estudos aprofundarem as
está diretamente relacionado à tantas questões aqui levantadas.
intolerância religiosa, as condições
socioeconômicas desfavoráveis e a É neste sentido que o Projeto Àwúre

11
Introdução

concebe o Direito da Criança e do Se os dados sobre a violência e a


Adolescente. Ao identificar como criminalização dirigida à infância
racismo, intolerância religiosa e sexismo e juventude fazem refletir sobre a
são percebidos por agentes estratégicos atuação do sistema de garantia de
do sistema de garantia de direitos, direitos, é essencialmente através
por lideranças jovens e comunitárias, deste que deve-se reverter a rota,
convoca todos nós a pensar a garantia repensar os caminhos e construir novas
e a promoção dos direitos humanos estratégias de atuação.
de crianças e adolescentes à luz da
natureza holística da proteção integral, Com os resultados da pesquisa,
sem desconsiderar que crianças, vislumbra-se aprimorar os
adolescentes e jovens vivem a condição mecanismos existentes para prevenir
peculiar de desenvolvimento também (e e coibir a violência contra crianças e
essencialmente) a partir da identidade adolescentes nos termos da proteção
racial e de gênero, da sexualidade e do integral inaugurada pela Convenção
pertencimento religioso. A experiência Sobre os Direitos da Criança, pela
de meninas e meninos, a forma como Constituição Federal de 1988 e pelo
cada um e cada uma está no mundo, é Estatuto da Criança e do Adolescente
fundamentalmente forjada a partir das (Lei nº 8.069, de 13 de julho de
identidades e desses marcadores sociais. 1990, ECA), especialmente aqueles
normatizados e organizados pela Lei
Assim, a análise dos dados tomará nº 13.431, de 4 de abril de 2017, que
como ponto de partida a compreensão regulamenta e institui o sistema de
estrutural de raça, gênero e sexualidade garantia de direitos da criança e do
para compreender a forma como adolescente vítima ou testemunha
profissionais da rede de atendimento, de violência.
atores e agentes estratégicos do sistema
de garantia de direitos e lideranças jovens Por fim, o presente estudo pode ser
e comunitárias percebem racismo, considerado como um chamado para
sexismo e intolerância religiosa. novas concepções e novas ações
e contribuir para a atuação mais
A pesquisa, de natureza mista, contou qualificada do sistema de garantia
com aplicação de questionário e de direitos no enfrentamento e
realização de entrevistas como técnicas na prevenção de violências contra
de coleta de dados. Ao longo de três crianças e adolescentes, em todas
meses ouvimos agentes e profissionais as suas modalidades e sob todas
de órgãos, serviços e instituições as formas de violação de direitos,
que compõe o sistema de garantia não perdendo de vista que gênero,
de direitos, bem como lideranças raça, classe e geração não são meras
comunitárias, religiosas e jovens dos 10 variáveis, mas estruturam a vida de
municípios supramencionados. meninas e meninos.

12
1 Considerações
metodológicas

A falta de conhecimento, muitas


vezes, nos distanciou da cobrança
desses direitos, e na medida em que
a comunidade vem tendo acesso ao
conhecimento e a informação,
a gente começou a ocupar
esse lugar de fala, a ocupar esses
espaços e começou, também,
a colocar, mesmo que ainda
minimamente, pessoas para nos
representar dentro desses espaços.
Entrevista, Liderança quilombola

13
1. Considerações metodológicas

A pesquisa teve por objetivo geral a percepção a respeito de indivíduos


identificar percepções e sentidos ou grupos de indivíduos. Por sua vez,
sobre racismo, sexismo e intolerância racismo é entendido como a doutrina
religiosa, especialmente praticada que sustenta a ideia de superioridade
contra crianças, adolescentes e de um grupo racial frente a outros
jovens, de agentes e profissionais grupos considerados inferiores e, por
do sistema de garantia de direitos, isso, passíveis de sofrerem violências,
bem como lideranças religiosas e dominação e exclusão. No Brasil, o
comunitárias e jovens dos municípios racismo remete ao continuum colonial
de Cachoeira, Cruz das Almas, e aos resquícios da escravidão, estando,
Maragogipe, Muritiba, Nazaré, Salinas portanto, especialmente direcionado à
da Margarida, Salvador, Santo Amaro, população negra e indígena (ALMEIDA,
Santo Antônio de Jesus e São Félix, 2019; GOMES, 2005; GUIMARÃES, 2002;
todos localizados no estado da Bahia. MUNANGA, 2004; 2012).

Com os resultados, pretende-se Sexismo é compreendido como ato de


qualificar a atuação do sistema de objetificação, inferiorização e discri-
garantia de direitos para melhor minação baseada no sexo ou no gêne-
identificar, coibir, prevenir e intervir ro. Afeta todas as pessoas, tem forte
nas violências contra crianças, incidência no processo de socialização
adolescentes e jovens que têm e educação, impondo limites e interdi-
hierarquias de gênero e raça como ções ao que pode ou não ser exercido
fundamentos, a exemplo da violência por este ou aquele sexo. Comumente, o
sexual e do racismo religioso. sexismo inferioriza o que é visto como
feminino e cria estereótipos associa-
Nesta publicação, de acordo com o ECA, dos aos papéis de gênero. O sexismo é
crianças são pessoas com até 12 anos pano de fundo de muitas das violências
incompletos; e adolescentes, de 12 anos praticadas contra meninas e mulheres,
completos até 18 anos incompletos. especialmente, a violência intrafamiliar,
Apesar do previsto na Lei nº 12.852, de 5 de doméstica e sexual. Neste documento,
agosto de 2013 (Estatuto da Juventude), a LGBTQIA+fobia, abordada no bojo do
considerando a metodologia adotada sexismo, é definida como ódio, repulsa,
pelo Projeto Àwúre, considera-se jovens rejeição, medo e discriminação contra
pessoas com até 24 anos de idade. pessoas que têm identidade de gêne-
ro diversa do sexo biológico e sentem
A pesquisa tem como categorias centrais ou têm desejo ou práticas sexuais fora
o racismo, o sexismo e a intolerância dos padrões cis-heteronormativos.
religiosa. Para tanto, raça é considerada Para a pesquisa, sexismo e racismo se
estrutural e estruturante da sociedade interseccionam e se potencializam
e das relações sociais. É categoria para criar lugares desprivilegiados e
analítica que não se relaciona com específicos para pessoas negras
aspectos biológicos, mas sim como (CARNEIRO, 2002; 2011; COLLINS, 2000;
construto social e político que altera CURIEL, 2013; DAVIS, 2016; GONZALEZ,

14
1. Considerações metodológicas

2018; HOLLANDA, 2020; JESUS, 2012; questionário e realização de entrevistas.


LOURO, 2009; PEREIRA, 2013). Os dados quantitativos são frutos da
aplicação do questionário, e os dados
Para intolerância religiosa buscou-se a qualitativos, oriundos das entrevistas
didática definição prevista no Estatuto que, em análise integrativa, permitiram
da Igualdade Racial e de Combate à alcançar os objetivos do estudo.
Intolerância Religiosa do Estado da
Bahia (Lei Estadual nº 13.182, de 6 O método adotado para análise dos dados
de junho de 2014), que define como foi a interpretação de sentidos, que se
toda distinção, exclusão, restrição ou dedica não apenas ao conteúdo, mas
preferência, incluindo-se qualquer também a interpretação do contexto,
manifestação individual, coletiva as lógicas de falas e as inter-relações
ou institucional, de conteúdo entre grupos e/ou agentes institucionais
depreciativo, baseada em religião, acerca de determinado tema (MINAYO;
concepção religiosa, credo, profissão ASSIS; SOUZA, 2005; MINAYO, 2009). O
de fé, culto, práticas ou peculiaridades método foi combinado às orientações
rituais ou litúrgicas, e que provoque metodológicas de pesquisas decoloniais,
danos morais, materiais ou imateriais, especialmente em relação à condução
atente contra os símbolos e valores das entrevistas, a despeito do limite
das religiões afro-brasileiras ou seja imposto pela impossibilidade de realizá-
capaz de fomentar ódio religioso las presencialmente (DEI, 2008).
ou menosprezo às religiões e seus
adeptos. Como se vê, o Estatuto Apesar do que fora planejado, foi
da Igualdade Racial e de Combate necessário adequar os procedi-
à Intolerância Religiosa do Estado mentos da pesquisa. O avanço da
da Bahia atribui centralidade às pandemia provocada pelo novo
religiões de matriz africana para coronavírus no ano de 2021 mobili-
definir intolerância religiosa o que, zou governos estaduais a tomarem
em verdade, significa racismo medidas restritivas para tentar con-
religioso. Em diálogo com a ter o avanço da doença. O governo do
literatura especializada, o sentido Estado da Bahia instituiu em todo ter-
adotado na pesquisa considerou ritório baiano restrições para evitar a
intolerância religiosa como racismo disseminação do vírus, especialmen-
religioso (NOGUEIRA, 2020; SANTOS, te relacionadas à aglomeração e mo-
2009; SANTOS; GINO, 2021). bilidade intermunicipal, a exem-
Contudo, considerando a categoria plo do Decreto nº 20.260, de 02 de
adotada pelo Projeto Àwúre e a março de 2021.
norma específica do estado da Bahia,
o termo intolerância religiosa será Logo, as técnicas de coleta de dados
utilizado concomitantemente a foram remanejadas em razão do
racismo religioso. contexto sanitário e, com isso, não
foram desenvolvidas coletas de
De natureza mista (quali-quantitativa), dados presenciais. Como exemplo,
a pesquisa contou com duas etapas grupos focais foram substituídos por
de coleta de dados: aplicação de entrevistas individuais ou em grupo,

15
1. Considerações metodológicas

todas realizadas em ambiente virtual, contou com três blocos de questões:


especificamente por meio de plataforma primeiro: 10 questões fechadas com
de videoconferência3. o objetivo identificar o perfil das
respondentes;
A equipe da pesquisa contou com
articulação e a mobilização prévias segundo: três questões fechadas
realizadas nos outros resultados de oito assertivas de livre marcação
do Projeto Àwúre nos municípios, relacionadas às percepções do racismo,
sobretudo em relação às pessoas que do sexismo e da intolerância religiosa;
participaram dos cursos Estratégias
de enfrentamento às violências, terceiro: nove questões fechadas e
em especial o racismo, sexismo e cinco abertas (de resposta opcional),
intolerância religiosa e Comunicação dedicado à identificação de situações
e Direitos Humanos, ambos realizados de racismo, do sexismo e da intolerância
em abril, maio e junho de 2021. Contou religiosa na atuação profissional, bem
também com a metodologia de cadeia como às habilidades e qualificação
de informantes como estratégia para atuar nos temas.
de identificação de participantes e
potenciais entrevistadas (VINUTO, Ao preencher o questionário, as
2014), especialmente em relação às respondentes declaravam aceitar
lideranças comunitárias e religiosas. participar da pesquisa, por meio de
assinalação de declaração de consen-
timento, que informou os objetivos e
as etapas da pesquisa e a garantia do
anonimato. No questionário, nenhuma
informação pessoal (nome, e-mail, nú-
1.1 PRIMEIRA ETAPA: mero de documento etc.) foi coletada.
APLICAÇÃO DE QUESTIONÁRIO O questionário foi divulgado nas redes
sociais e por meio de aplicativo de
O questionário foi aplicado a 416
mensagens instantânea das pessoas
pessoas entre os meses de abril e maio
mobilizadas para as ações do Projeto
de 2021. As questões foram dirigidas Àwúre, assim como por e-mail
às profissionais, agentes públicos e de gestoras municipais e agentes
agentes estratégicos do sistema de
públicos dos diversos eixos do
garantia de direitos dos 10 municípios.
sistema de garantia de direitos para
Elaborado como formulário online, que compartilhassem com as redes
de saúde, educação, assistência social,
3
dentre outras.
A equipe de pesquisa observou as orientações da
Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP)
previstas no Ofício Circular nº 2, de 24 de fevereiro O segundo bloco de questões foi
de 2021. Disponível em: http://conselho.saude. sistematizado para apresentar
gov.br/images/Oficio_Circular_2_24fev2021.pdf.
Acesso: 16 mar. 2021. percepções gerais sobre os temas da

16
1. Considerações metodológicas

pesquisa com alguns cruzamentos de garantia de direitos; jovens e


que permitiram analisar nuances das lideranças comunitárias e religiosas;
compreensões sobre racismo, sexismo e gestoras estaduais de pastas
e intolerância religiosa e, também, de diretamente relacionadas aos temas
temas correlatos. de investigação.

O terceiro bloco, com questões fechadas Como citado anteriormente, a seleção


e abertas, foi analisado em separado. das entrevistadas partiu da aproxima-
As primeiras três questões abertas ção com as sujeitas proporcionadas
solicitaram que as respondentes, se pelos cursos realizados no
assim o desejassem, apresentassem âmbito do Projeto Àwúre e da
exemplos de situações em que tomaram metodologia da cadeia de informan-
conhecimento ou foram notificadas tes (VINUTO, 2014). No contato para
da ocorrência de racismo, sexismo e participar da pesquisa, foi considera-
intolerância religiosa contra meninos do a disponibilidade delas também em
e meninas. Outras duas questões relação ao acesso aos recursos tecno-
buscaram identificar se as respondentes lógicos (equipamentos e acesso à inter-
se sentiam preparadas para atuar nos net), uma vez que todas as entrevistas
casos de racismo, sexismo e intolerância foram realizadas remotamente. Ainda,
religiosa e se avaliavam necessário a seleção considerou a representati-
realizar formações e capacitações sobre vidade por município, de maneira que
os temas. A última questão aberta era fossem entrevistadas pessoas de
para livre complementação ou outro todos os 10 municípios.
tipo de manifestação.
Em relação às profissionais e agen-
Após encerramento da aplicação do tes públicos, foi privilegiada a
questionário, os dados foram inseridos escuta de gestoras das principais
em planilhas para sistematização e áreas do eixo promoção do siste-
tratamento. As respostas das questões ma de garantia de direitos, quer seja,
abertas foram categorizadas a partir de educação e assistência social. Infeliz-
seus conteúdos e serão apresentadas em mente, ainda que diante dos esforços
diálogo com as entrevistas. empenhados, não houve êxito na ten-
tativa de entrevistar gestoras da saúde,
em razão da indisponibilidade dos
agentes no contexto da Covid-19.
Considerando o papel estratégico
do órgão no sistema de garantia de
1.2 SEGUNDA ETAPA: direitos, foi entrevistada ao menos uma
conselheira tutelar de cada município.
REALIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS
Foram entrevistadas jovens de
Foram realizadas 57 entrevistas comunidades quilombolas; e lideranças
com pessoas maiores de 18 anos, religiosas, de movimento social
dentre as quais: agentes públicos e LGBTQIA+, de comunidades quilombolas,
atores dos distintos eixos do sistema pesqueira e marisqueira.

17
1. Considerações metodológicas

É necessário ressalvar que a amostra- mesmo que de maneira improvisada,


gem foi afetada pela necessidade da a partir da fala, do interesse e da
realização de coleta de dados remota. experiência da entrevistada (BECKER,
Em alguns casos, as pessoas mobiliza- 1993; DEI, 2008).
das para as entrevistas não conseguiam
acessar a plataforma pela qualidade do Para a análise das entrevistadas foi
sinal de internet e, por diversas vezes, utilizado o software de análise de dados
houve a necessidade de repactuação qualitativos denominado Atlas.ti4.
de horário. De mesmo modo, mas por Houve duas etapas de tratamento dos
motivos distintos, apesar das tentati- dados: na primeira foram utilizadas
vas, não foi simples mobilizar agentes palavras-chave para busca nas
do sistema de justiça e segurança públi- entrevistas de conteúdos correlatos
ca, não raro menos acessíveis dentre os às categorias centrais da pesquisa; e na
agentes públicos que integram o siste- segunda, na qual todas as entrevistas
ma de garantia de direitos. degravadas foram lidas integralmente
e categorizadas por tema e/ou questão
Todas as entrevistas foram gravadas, norteadora do roteiro semiestruturado.
inclusive com o consentimento verbal
da entrevistada, confirmado após Assim, a partir dos trechos encontrados
leitura na integralidade do Termo de referentes a cada uma das palavras-
Consentimento Livre e Esclarecido chave selecionadas na primeira etapa
(TCLE) pela equipe de pesquisa. Em da codificação, foram criadas categorias
complemento, o TCLE foi assinado no prévias de análise que, posteriormente,
formato formulário eletrônico. Todas serviram para compreender os sentidos
as entrevistas foram realizadas entre os das falas, analisadas de maneira
meses de abril e maio de 2021. integrativa com as respostas das
questões abertas do questionário, que
Foram elaborados roteiros semiestrutu- permitiram identificar os principais
rados específicos para cada grupo de en- contextos sobre o que as respondentes
trevistadas, com dois blocos de questões: e as entrevistadas percebem sobre
o primeiro com 10 questões dedicadas racismo, sexismo e intolerância religiosa
a identificar o perfil da entrevistada; praticada, especialmente, contra
crianças, adolescentes e jovens.
o segundo com oito questões nor-
teadoras relacionadas às percep- Na segunda etapa, foram gerados
ções do racismo, do sexismo e da relatórios a partir dos recortes
intolerância religiosa. analisados como relevantes para o
objetivo geral da pesquisa, possibilitando
Como denota o tipo de entrevista,
os roteiros tinham questões que
conduziam aos temas centrais da 4
O Atlas.ti4 é software de análise de dados qualitativos
que permite a análise de um corpo grande de
investigação, ao mesmo tempo em documentos em diversos formatos: textos, áudios,
que garantiam plena liberdade para imagens ou vídeos. No software, é possível realizar
abordagem de outros que surgiam, a organização dos dados, a codificação, análises,
cruzamentos e gerar tipos de relatórios distintos.

18
1. Considerações metodológicas

compreender nuances das percepções GRÁFICO 2: Percentual de respondentes por raça/cor


dadas às temáticas do racismo, sexismo Amarela
e intolerância religiosa. A partir do 0,2%
conjunto das análises foi possível 1,4% 11,5% Branca
perceber as principais questões que
permeiam as categorias racismo, sexismo 45,9% 0,7% Indígena
e intolerância religiosa contra crianças,
adolescentes e jovens, apresentadas e Parda
discutidas no capítulo dedicado à análise
dos dados qualitativos. 40,1% Preta

Prefiro não
responder
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

1.3 RESPONDENTES
Em relação à faixa etária, há equilíbrio
DO QUESTIONÁRIO entre os grupos de 31 a 40 anos e 41 e 50
anos, que somados correspondem a 285
O questionário foi respondido por 416 pessoas ou 68,5% das respondentes.
pessoas, sendo o público participante
composto majoritariamente por GRÁFICO 3: Percentual de respondentes por faixa etária
mulheres. Precisamente 358 pessoas
(86%) se autodeclararam negras, que 3,8% 0,5%
pela classificação do Instituto Brasileiro 11,1%
16,1%
de Geografia e Estatística (IBGE) agrega Menos de 20 anos
pretas e pardas. O segundo grupo de 21 a 30 anos
maior expressão foi o de brancas, que 31 a 40 anos
totalizou 48 participantes. Apenas três
41 a 50 anos
pessoas se declararam indígenas, uma
51 a 60 anos
amarela e seis preferiram não responder
à classificação racial. Mais de 60 anos

34,6% 33,9%
GRÁFICO 1: Percentual de respondentes por sexo
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.
0,2%
79,8%
Em relação à vinculação religiosa, 36,3%
20% se declarou católica; 17,8% evangélicas;
e 16,3% declarou pertencer às religiões
de matriz africana (candomblé ou
umbanda). Interessante destacar que
15,1% das respondentes declararam
não ter religião.

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

19
1. Considerações metodológicas

De acordo com o último censo demo- dado é coerente com o grupo ao qual foi
gráfico (IBGE, 2010), menos de 0,5% da dirigida a aplicação do questionário, cujas
população brasileira se declara candom- atuações tendem a ter como pré-requisito
blecista ou umbandista. Em relação às formação de nível superior. Respondentes
religiões de matriz africana, a amostra com ensino fundamental e médio somam
da pesquisa tem dados superiores aos apenas 8,9% das respondentes.
referenciais nacionais, o que é significa-
tivo sobre o perfil das respondentes.
GRÁFICO 5: Número de respondentes por escolaridade

Pós-graduação
GRÁFICO 4: Número de respondentes por religião completa 207

Pós-graduação incompleta 37

4 Ensino superior completo 101


13
Ensino superior incompleto 34
16
Ensino médio completo
Religião

40 34

55 Ensino médio incompleto 2


63
Ensino fundamental incompleto 1
74
0 50 100 150 200 250
151

Outras
Pós-graduação completa Candomblé
Ens. médio completo
0 50 100 150 200 Umbanda
Pós-graduação incompleta Não
Ens.tem religião
médio incompleto
Outras Candomblé
Prefiro não responder
Ens. superior completo Evangélica
Ens. fundamental
Umbanda Não tem religião incompleto
Espírita
Ens. superior incompleto
Prefiro não responder Evangélica
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.
Espírita Católica

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.


Em relação à distribuição por municípios,
a maior parte é de Salvador (40,4%),
No geral, o nível de escolaridade das seguida de Cruz das Almas (11,8%)
respondentes é elevado em relação e Santo Antônio de Jesus (9,4%). O
média da população brasileira e baiana. número superior de respondentes de
Praticamente metade de todas as Salvador deve considerar que a soma
respondentes têm pós-graduação da população dos demais municípios
completa (49,8%) e cerca de 83% possui equivale a aproximadamente 13% da
ao menos nível superior completo. O população da capital.

20
1. Considerações metodológicas

GRÁFICO 6: Percentual de respondentes por município de atuação

Cachoeira

Cruz das Almas

Maragogipe

Muritiba

Nazaré

Salinas da Margarida

Salvador

Santo Amaro

Santo Antônio de Jesus

São Félix
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0% 40,0% 45,0%
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

Profissionais da educação e assistência e segurança pública que responderam o


social somam 71,1%. No geral, foram questionário, apesar da ampla divulgação
poucos as agentes do sistema de justiça junto aos órgãos e serviços relacionados.

GRÁFICO 7: Percentual de respondentes por área de atuação

Educação 39,4%

Assistência social 31,7%

Outras secretarias municipais 7,2%

Saúde 7,2%

Justiça e segurança pública 6,0%

Conselhos Tutelar e Conselhos de Direitos 6,0%

Outras 2,4%

0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0% 40,0% 45,0%
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

21
1. Considerações metodológicas

Em relação ao tempo de atuação em GRÁFICO 9: Percentual de entrevistadas por sexo


suas respectivas áreas e ofícios, a
28,1%
minoria das respondentes têm menos
de três anos de experiência. Do total,
precisamente 54,5%, têm mais de 5
Feminino
anos de experiência.
Masculino

GRÁFICO 8: Percentual de respondentes por tempo


de atuação em suas respectivas áreas de atuação 71,9%

14,4% Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.


16,8%

Menos de 1 ano
De 1 a 3 anos
6,7% 17,1% De 3 a 5 anos
De 5 a 10 anos
De 10 a 15 anos GRÁFICO 10: Percentual de entrevistadas por raça/cor
15,4%
de 15 a 20 anos
Mais de 20 anos
3,5%
13,9%
15,6%
22,8%
Branca
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.
Parda
Preta

73,7%

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

1.4 ENTREVISTADAS

Foram entrevistadas 57 pessoas, Considerando os percalços da


majoritariamente de modo individual. mobilização e articulação remotas, e
Assim como no questionário, a maioria apesar da diferença entre o número
das pessoas entrevistadas é do sexo de entrevistadas por município, foram
feminino e se autodeclarou negra. ouvidas pessoas de todas as cidades.

22
1. Considerações metodológicas

GRÁFICO 11: Percentual de entrevistadas por município de atuação

Cachoeira

Cruz das Almas

Maragogipe

Muritiba

Nazaré

Salinas da Margarida

Salvador

Santo Amaro

Santo Antônio de Jesus

São Félix

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

A maior parte das pessoas entrevistadas (24,6%). Candomblecistas representam


se declarou católica (42,1%), seguida 19,3% das entrevistadas e 10,5% declarou
daquelas que afirmaram não ter religião ser evangélica ou protestante.

GRÁFICO 12: Número de entrevistadas por religião

6
Outras
Religião

11 Evangélica ou protestante
Candomblé
14
Não tem religião

24 Católica

0 10 20 30
Número de entrevistadas
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

23
1. Considerações metodológicas

Foram entrevistadas 27 profissionais, de interação entre si, na família e no


agentes públicos e atores do sistema ambiente escolar.
de garantia de direitos, especialmente
gestoras de órgãos e serviços Em relação às lideranças comunitárias
(vide Apêndice A). Ao menos uma foi marcante o apontamento de ações (e
conselheira tutelar de cada município omissões) caracterizadas como racismo
foi entrevistada, considerando a institucional. O desrespeito e a desvalo-
competência central do órgão como rização por parte do poder público local
porta de entrada das situações de às singularidades territoriais e socio-
violação de direitos de crianças e culturais das comunidades, em especial
adolescentes, especialmente com vistas quilombolas, merecerá destaque por
à implementação da Lei nº 13.431/2017. ocasião da análise das entrevistas.

Dentre as 27 entrevistadas, 14 tinham Quanto às jovens, declarações


mais de cinco anos de atuação na área. incisivas sobre como a escola tem
As três que estavam no cargo ou função se negado a discutir e acolher aquilo
há menos de um ano ocupam cargos que é compreendido como diferente
comissionados. e, tendencialmente, agido como
(re)produtora de violências contra
Ademais, foram ouvidas 22 lideranças meninos e meninas, negros e
comunitárias ou religiosas e oito jovens, negras, gays, lésbicas, transgêneros,
o que, respectivamente, perfez 38,6% e transexuais e pertencentes a religiões
14% das pessoas entrevistadas. de matriz africana.

É inegável que o perfil das pessoas O que merece destaque na análise do


que participaram da pesquisa pode ter perfil das pessoas que participaram
interferido em seus resultados. Por da pesquisa em relação aos seus
exemplo, em relação à classificação resultados, é ratificar a importância
racial, inevitavelmente a maioria da experiência que, neste caso em
seria pessoas negras, uma vez que especial, tem a ver com a vivência das
as localidades nas quais a pesquisa mulheres negras.
foi realizada, majoritariamente, são
compostas por negros e negras.
Salvador, inclusive, é a capital mais
negra do Brasil.
Racismo institucional
Outrossim, a participação de profissio-
nais da educação e da assistência social Caracteriza-se pela falha ou
- maioria das respondentes do questio- incapacidade de instituições
nário e em número significativo dentre públicas ou privadas de garantir
as entrevistadas - levou a identifica- condições de igualdade de
ção do racismo, sexismo e intolerância tratamento e de oportunidades
religiosa notadamente voltadas às a todas as pessoas independente
dinâmicas de socialização de crianças, da origem étnica, racial, regional,
adolescentes e jovens nos contextos cultural ou religiosa.
Caracteriza-se também por práticas
racistas fomentadas pelo Estado
ou com seu apoio direto ou indireto
(ALMEIDA, 2019; GOMES, 2005;
WERNECK [s.d.]).

24
1. Considerações metodológicas

Neste texto, experiência é concebida 16 têm mais de cinco


como o conhecimento produzido anos de experiência na área;
politicamente situado e o aprendizado
adquirido a partir da realidade social 12 são católicas;
concreta (CARNEIRO, 2002; DAVIS, 2016;
GONZALEZ, 2018; hooks, 2013; 2015). 10 são evangélicas;
Seguem alguns destaques:
apenas duas pertencem
São mulheres negras: às religiões de matriz africana.
70% das respondentes
do questionário; Das 162 (38,9%) respondentes
do questionário com mais de
68,1% das respondentes 10 anos de atuação:
do questionário com 83,3% são negras;
pós-graduação completa;
80,2% são mulheres;
66% das respondentes
do questionário com mais 63% possuem
de 10 anos de experiência; pós-graduação completa;

70,2% dentre as entrevistadas; 52,5% são católicas ou evangélicas;

Todas as quatro profissionais 16% são de religião de matriz africana;


entrevistadas com mais de
10 anos de atuação na área; 63% atuam na área da educação;

63,6% das lideranças comunitárias 13% atuam no sistema


ou religiosas entrevistadas. de justiça ou segurança pública;

De todas as pessoas que 11,7% atuam na assistência social.


declararam pertencer a religiões
de matriz africana, são negras: Dentre as 22 lideranças comunitárias
95,6% das respondentes ou religiosas entrevistadas:
do questionário; todas são negras;

todas as 11 entrevistadas. 63,6% são mulheres;

No total, a pesquisa contou com 63,6% estão cursando


a participação de 29 conselheiras e/ou concluíram ensino superior.
tutelares, dentre as quais:
27 são negras; Dentre as oito jovens entrevistadas
todas são negras;
17 são mulheres;
quatro estão cursando
13 têm ensino superior ensino superior.
ou pós-graduação;

25
2 Dados
quantitativos
PERCEPÇÃO SOBRE
RACISMO, SEXISMO
E INTOLERÂNCIA
RELIGIOSA

A gente percebe na televisão - a


televisão hoje ela mostra bem essa
questão - que a escola tem tentado
manter um discurso diferente. Claro
que não são todos os professores,
mas a gente vai dizer que muitos
professores têm essa postura de fazer
uma separação entre brancos e negros
dentro da escola; entre pobres porque,
às vezes, não só o tom da pele, mas é
também sua condição financeira;
o tom intelectual daquela família que
também está ali em foco. Não é um
racismo que passa somente
pela cor da pele, mas ainda pela
situação econômica, intelectual e
cultural das pessoas.
Entrevista, Coordenadora de
Centro de Referência de
Assistência Social (CRAS)

26
2. Dados quantitativos

No questionário, as questões razão do número e das inferências.


objetivaram identificar a percepção
das respondentes a partir de assertivas Primeiramente, será apresentada
que traziam concepções críticas sobre síntese dos resultados das questões
racismo, sexismo e intolerância religiosa, fechadas obtidas pela aplicação
mas inclusive representações sociais e do questionário que, nem sempre,
perspectivas ideológicas subjacentes aparecerão interseccionadas tal como o
que negam ou não reconhecem fragmento da entrevista na epígrafe nos
essas dimensões como produtoras ensina. Mais adiante, as questões abertas
e reprodutoras de violências e serão melhor analisadas em diálogo com
desigualdades na nossa sociedade. os conteúdos das entrevistas.

As questões eram de múltipla marcação,


de maneira que a respondente poderia
assinalar apenas uma ou até todas as
opções. Após o pré-teste de aplicação
do questionário, foi verificado que a 2.1 RACISMO
delimitação da marcação de assertivas
induziu à busca por respostas “certas”
ou “politicamente corretas”. Como […] Hoje eu tenho cabelo crespo,
o objetivo foi identificar percepção meu cabelo é crescido, mas sempre
escutei da minha mãe: não, você não
e não o nível de conhecimento, a
vai deixar o cabelo crescer, porque
múltipla marcação se mostrou a melhor
se o cabelo crescer não é coisa de
alternativa metodológica. homem; a polícia vai parar você,
é coisa de marginal! Isso era uma
Os resultados do questionário indicam coisa que eu achava que era mais
que a percepção do racismo e sexismo implicância de mãe, achava que era
foram mais coesas, sendo preferidas coisa natural… Mas aí se estabelece
as assertivas construídas a partir de também sobre a construção de
afirmações mais críticas. Na intolerância ideias, mesmo vindo de família
religiosa, houve maior dispersão das preta, do quanto o racismo estipula,
assertivas escolhidas. Os resultados por exemplo, que você não pode
significam que, das três, é a categoria expressar seu cabelo, porque seu
menos compreendida e, em alguma cabelo é ofensivo para as pessoas
que vão ver.
medida, expressam também a própria
intolerância religiosa em si.
Entrevista, Jovem
O cruzamento de respostas e
respondentes gera inúmeras As alternativas relacionadas ao racismo
possibilidades de reflexões. Ao longo apresentaram menor diversidade nas
do relatório serão apresentadas marcações, mesmo em relação ao
aquelas que merecem destaque em sexismo. Isso significa que, dentre as

27
2. Dados quantitativos

três categorias, a percepção do racismo As 416 respondentes realizaram 695


apresentou maior homogeneidade de marcações na questão sobre racismo.
respostas, sugerindo ser o tema de maior Abaixo, o percentual de respondentes que
(re)conhecimento conceitual e crítico assinalou cada assertiva, ressaltando que
pelas respondentes do questionário. a questão permitia múltipla marcação:

GRÁFICO 13: Percentual de respondentes por alternativa assinalada na questão do questionário:


assinale as opções que você concorda ou que melhor representam o que você entende sobre RACISMO

1. Acho exagerada a forma como o racismo tem sido


tratado ultimamente. Hoje em dia qualquer coisa, até
5,3%
mesmo piadas envolvendo raça, já vem alguém e diz
que é racismo.

2. Penso que nem toda manifestação de racismo é


4,1%
crime.

3. Não sei se concordo com a ideia de racismo tal como


5,0%
se fala hoje porque raça é uma só (a raça humana).

4. Em nosso país, compreendo que o racismo é


resultado do processo de colonização e da escravidão. 47,8%

5. Racismo existe, mas não acho correto dizer que “a


sociedade é racista” porque racismo é uma ação
16,8%
individual, quer dizer, é a pessoa quem pratica ações
racistas.
6. Eu acho que racismo é a expressão de superioridade
de uma raça sobre a outra, inclusive negros podem ser 16,6%
racistas com brancos.
7. Compreendo que, no Brasil, o racismo é estrutural,
institucional e individual. Justamente por isso está tão
entranhado na nossa cultura e na forma como nos 70,9%
relacionamos.
8. Eu não acho que existe racismo no Brasil, somos um
país miscigenado e desde sempre todas as raças 0,5%
convivem e se misturam.

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

28
2. Dados quantitativos

Noventa e quatro pessoas Apesar da maioria indicar compreensão


assinalaram apenas as alternativas 4 crítica sobre raça e racismo, as opções
e 7 juntas, justamente as duas opções 5 e 6 (racismo como mero resultado
consideradas mais alinhadas a um da ação individual e racismo ‘reverso‘)
ponto de vista crítico em relação merecem destaque por terem
aos debates raciais (ALMEIDA, 2019; sido assinaladas, em conjunto ou
BENTO, 2002; CARNEIRO, 2011; isoladamente, por aproximadamente
GONZALEZ, 2018; GUIMARÃES, 2002; 28% das respondentes. Das 116 pessoas
MOURA, 1983; MUNANGA, 2004; 2012). que assinalaram as opções 5 e 6:
75,9% são do Recôncavo Baiano;
As demais alternativas continham
conteúdos e representações que 62,1% têm mais de 40 anos de idade;
conduziam: à relativização do racismo
como entretenimento, também 61,2% são católicas ou evangélicas;
chamado na literatura contemporânea
de racismo recreativo (MOREIRA, 2019) 43,1% têm pós-graduação completa;
(opção 1); à relativização do racismo
como crime (opção 2); à negação de 41,4% têm mais de 10 anos de
raça como categoria sócio-histórica experiência em sua respectiva
e política (opção 3); à visão do racismo área de atuação;
como ação individual e como fruto
apenas da agência de indivíduos (opção 40,5% são profissionais da educação.
5); ao que ficou conhecido como
racismo ‘reverso’ (opção 6); e, por fim, a
negação do racismo em razão do mito Como ventilado, a opção 5 apresenta
da democracia racial e a ideologia da conteúdo que ignora a complexidade
mestiçagem (opção 8). do racismo na sociedade brasileira
e a sua inter-relação com outros
elementos da vida social que incidem
sobre a reprodução e a perpetuação do
racismo no Brasil. Desconsidera que
Racismo recreativo em nosso país racismo é estrutural
e não é resultado de mera opinião,
É a forma de dominação racial ação individual ou fruto de alguma
que se utiliza do humor como anormalidade ou patologia (ALMEIDA,
política cultural para reproduzir 2019; CARNEIRO, 2011).
as relações assimétricas de
poder e camuflar as hostilidades
raciais. O ‘humor’ racista contribui
para reforçar os lugares sociais
de grupos subalternizados,
consolidando o imaginário social
de que grupos privilegiados são
os únicos a poderem exercer
funções sociais com inteligência e
competência (MOREIRA, 2019).

29
2. Dados quantitativos

Raça organiza a sociedade e é ter acesso às mesmas oportunidades


responsável por dar sentido, lógica e que seus iguais ou mesmo se
tecnologia para a reprodução das mais encontrar em contextos de exclusão
diversas formas de desigualdades e vulnerabilização, mas nunca o
e violências que “[…] moldam a vida será em razão de sua cor ou raça. A
social contemporânea […]” (ALMEIDA, noção de racismo como expressão
2019, p. 15). Racismo é, portanto, forma de superioridade racial não é, em
elementar de hierarquizar indivíduos e/ essência, possível de ser praticada
ou grupos de indivíduos. pela população negra e indígena em
relação às pessoas brancas.
A opção 6 traz conteúdo de discurso
manejado por elementos que esvaziam As demais questões foram assinaladas
o sentido de raça como estrutura por menos de 6% das respondentes.
de poder e que representa grande Dentre estas, destacaremos adiante,
equívoco conceitual: o racismo no tópico 2.4, a opção 8, única que nega
‘reverso’. Negros e negras podem plenamente a existência do racismo e
não se engajar no enfrentamento do que recebeu apenas duas marcações.
racismo, assim como nem toda mulher
necessariamente será feminista, mas
falar de raça é falar de relações sociais
de poder e, quem sofre racismo,
é sempre quem está em situação
desprivilegiada de poder.
Lei Caó
O equívoco chamado de ‘racismo
reverso’ não encontra respaldo na O baiano Carlos Alberto Caó de
Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, Oliveira foi jornalista, advogado,
conhecida como Lei Caó, criada militante do movimento negro
para combater o racismo dirigido à e Deputado Federal. Integrou a
população negra. A razão de ser da Assembleia Nacional Constituinte
e foi responsável pela inserção
lei e os elementos que motivaram
do inciso XLII do artigo 5º
a criação da norma penal dizem da Constituição Federal que
respeito às relações desiguais de determinou a prática do racismo
poder que se consolidaram na nossa como crime inafiançável e
sociedade e que negaram a negros imprescritível. Após a promulgação
e negras à condição de cidadania da Constituição Federal, apresentou
plena. No Brasil, brancos e brancas projeto de lei que originou a Lei nº
nunca estiveram nesse lugar. Em 7.716/1989, conhecida como Lei Caó
nosso país, uma pessoa branca em sua homenagem. Faleceu aos 76
poderá estar em condições sociais e anos em fevereiro de 2018.
economicamente desfavoráveis, não

30
2. Dados quantitativos

e ratificação da especialização dos


papeis sexuais (opção 3); o tema
como relacionado à estrutura social
2.2 SEXISMO e, portanto, a natureza estrutural das
relações sociais de gênero (opção 4);
a relativização de práticas sexistas,
A gente quer empoderar as especificamente em destaque à
mulheres, fazer com que elas atuação de movimentos sociais
entendam que nós precisamos correlatos (opção 5); o reconhecimento
ser representações políticas para do correlação e interseção entre
gente poder dominar o mundo.
gênero, raça e ascensão social (opção
6); o reconhecimento do tema na
Entrevista, Liderança religiosa
socialização primária (opção 7); e a
relação educação sexual e escola,
pauta emergente na conjuntura atual
Então, um dos maiores impactos brasileira e que dialoga com a opção
que tem essa cadeia de preconceito anterior, bem como com estratégias
[em relação à população LGBTQIA+] de enfrentamento e prevenção das
que vem desde a infância, passa pela violências sexuais (opção 8).
adolescência e chega na vida adulta, é
que você chega nesse contexto aí, de Em complementaridade uma às
ver pessoas metidas na prostituição, outras, as quatro opções mais
expostas ali nas ruas, a todo tipo de alinhadas a posições críticas consi-
perigo… e quantas morrem... deram sexismo parte da estrutura da
sociedade brasileira e que, assim
Entrevista, Liderança LGBTQIA+
como o racismo e o capitalismo, orga-
niza as relações de poder. O conteúdo
deste bloco de opções toma sexis-
No sexismo, houve 871 marcações, 25% a mo como estrutura de exploração e
mais do que no tema racismo. A diferença dominação fundamentada no gênero
no número de marcações pode ter a e na sexualidade que opera na intera-
ver com o maior número de assertivas ção com classe, raça e geração. Para
críticas e alinhadas com a literatura compreensão conjunta das opções, é
contemporânea nas opções do sexismo fundamental frisar que, na formulação
(opções 1, 4, 6 e 7), justamente as que do questionário, sexo é situado como
foram mais assinaladas. base natural e essencial da existência
sob a guarida da cis-heteronormativi-
A questão compreendeu: a relação dade e que gênero e sexualidade são
do tema com a diversidade sexual e categorias irmanadas que se retro-
o exercício da sexualidade (opção 1); alimentam (CARNEIRO, 2002; 2011;
certo desconhecimento sobre o tema, COLLINS, 2000; CURIEL, 2013; DAVIS,
atrelado à violência contra a mulher 2016; GONZALEZ, 2018; HOLLANDA,
(opção 2); negação de sua existência 2020; JESUS, 2012; LOURO, 2009).

31
2. Dados quantitativos

GRÁFICO 14: Percentual de respondentes por alternativa assinalada na questão do questionário:


Assinale as opções que você concorda ou que melhor representam o que você entende sobre SEXISMO

1. Acredito que sexismo tem a ver com ações


discriminatórias que não toleram a diversidade de
53,1%
comportamento por homens e mulheres, inclusive em
relação à sexualidade.

2. Não sei exatamente o que significa, mas acredito


3,1%
que tem a ver com violência contra a mulher.

3. Não creio que o sexismo existe, pois determinados


comportamentos e atividades devem sim ser
1,0%
desempenhadas por homens ou mulheres por causa
da diferença sexual.

4. Acredito que sexismo tem a ver com a estrutura da


sociedade e é algo que precisamos mudar através da 53,1%
cultura, da educação e da política.

5. Sexismo existe, mas acho que há exagero na


forma como tem sido tratado ultimamente,
4,3%
especialmente pelos movimentos feministas e
LGBTQIA+ (gays, lésbicas, bissexuais, trans etc.).

6. Compreendo que o sexismo e o racismo criam


barreiras para que as pessoas cresçam
50,0%
profissionalmente e economicamente, especialmente
mulheres negras e pessoas LGBTQIA+ negras.

7. Não permitir que meninos brinquem “de casinha”


ou meninas brinquem “de carrinho” são exemplos de 40,4%
sexismo na educação das crianças.

8. Penso que questões relacionadas à gênero e


educação sexual não devem ser abordadas na
escola, pois cabe à família decidir se esse tipo de 4,3%
assunto deve ser tratado com crianças e
adolescentes.
0,0% 10,0% 20,0% 30,0% 40,0% 50,0% 60,0%
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

No conjunto de respostas, a opção sexismo como problema estrutural,


4 merece destaque, por deter per- mas, ao mesmo tempo, considera que
centual significativo entre as pesso- essa mesma estrutura é transformá-
as que responderam o questionário. vel. Como relevante resultado, para
A assertiva denota a percepção do a maioria das respondentes, tem-se

32
2. Dados quantitativos

o entendimento da necessidade de como racistas, de intolerância religiosa,


mudança e também da possibilidade LGBTQIA+fóbicas) como ‘exagero’. Das
de mudança por meio da cultura, da 18 pessoas que escolheram a opção 5:
educação e da política. 15 têm mais de 40 anos;

A maioria das respondentes que 15 têm pelo menos


selecionou a opção 4 o fez em conjunto ensino superior completo;
com as opções 1, 6 e 7, o que aponta
que foi identificado por essas pessoas 13 são católicas ou evangélicas;
as dimensões de gênero, sexualidade
e raça interseccionadas na estrutura 11 atuam na educação ;
social, assim como percebido a
incidência dos marcadores de gênero e 11 têm mais de 10 anos
sexualidade na educação. de experiência em sua
respectiva área de atuação.
As opções 5 e 8 receberam o mesmo
número de marcações cada (18) e estão Na opção 8, igualmente alinhada
em destaque pelo que representam na a contextos políticos atuais, há
conjuntura política brasileira atual. Em argumento subjacente que se
relação à opção 5, tem-se dois lados. encontra com o conservadorismo
O primeiro diz respeito à relevância da e não percebe a importância da
difusão por intelectuais e coletivos, educação sexual nas escolas.
que cada vez mais têm ocupado Educação sexual é um dos principais
espaço na grande mídia e nas redes recursos de prevenção às violências
sociais, que ampliam a divulgação sexuais e é fundamental para um
de pautas identitárias e conceitos modelo educacional mais igualitário,
relacionados aos debates raciais e de de socialização não sexista e que
gênero. Evidente que isso não significa reconhece as diferenças. O sentido
transformação das relações sociais de da adesão a esta concepção ainda
gênero e raça, mas, sem dúvida, amplia se relaciona com a desconsideração
debates e os tornam mais acessíveis. que direitos sexuais e reprodutivos
integram a condição de sujeito de
O outro lado dessa ampla difusão direitos de crianças e adolescentes
é o endurecimento de posturas instituída pela proteção integral.
e ideologias autoritárias e Esse é assunto ao qual se retornará
conservadoras que, confrontadas por ocasião da análise dos dados
naquilo que sempre praticaram sem qualitativos. Por fim, das 18 pessoas
repercussões negativas, veem a que selecionaram a opção 8:
identificação e a exposição de práticas 13 são dos municípios
sexistas, machistas e misóginas (bem do Recôncavo Baiano;

33
2. Dados quantitativos

Na questão quantitativa sobre


13 são católicas ou evangélicas; intolerância religiosa, houve 849
marcações: 2,5% menos que sexismo,
11 têm pelo menos mas 22,2% a mais que racismo. Apesar
ensino superior completo; de, na intolerância religiosa, haver
apenas duas assertivas de conteúdo
6 são profissionais da educação. mais crítico tal como na questão
relacionada ao racismo, não houve
A opção 3, que nega o sexismo e a mesma coesão nas respostas.
naturaliza papéis sociais em razão do A diversidade na escolha das opções
sexo biológico, recebeu 4 marcações: indica que intolerância religiosa é
todas por mulheres negras, sendo a categoria menos compreendida
três católicas e uma do candomblé, pelas respondentes.
uma conselheira tutelar e três
profissionais da educação. A questão relacionada à percepção
da intolerância religiosa tinha os
seguintes conteúdos: julgamento
de que religiões de matriz africana
são impróprias para crianças (opção
1); relativização da intolerância
2.3 INTOLERÂNCIA RELIGIOSA religiosa dentro dos limites da
própria noção de tolerância
(opção 2); concepção da intolerância
religiosa como afastamento da
[…] eu acho que a religião, igualdade na ética cristã (opção 3);
principalmente o candomblé, associação da intolerância religiosa
ele não é só uma religião, é
com o racismo e com a importância
muito mais que a religião,
da educação antirracista para
ele ensina história, ensina
geografia, ensina um pouco
seu enfrentamento (opção 4); negação
de línguas também. Essa da intolerância religiosa em razão
aproximação com a religião do caráter jurídico laico do Estado
eu acho que faltou e é (opção 5); associação da intolerância
extremamente importante para religiosa com o racismo (opção
o jovem negro, para ele poder 6); ensino religioso como
se enxergar ali. instrumento da educação formal
para formação moral e cívica
Entrevista, Jovem (opção 7); prevalência do cristianismo
na formação social e cultural do
país (opção 8).

34
2. Dados quantitativos

GRÁFICO 15: Percentual de respondentes por alternativa assinalada na questão do questionário: Assinale as
opções que você concorda ou que melhor representam o que você entende sobre INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

1. Não considero correto “iniciar” uma criança na


umbanda ou no candomblé, pois são religiões que 5,0%
têm práticas impróprias para essa faixa etária.

2. Acredito que tem a ver com não querer conviver


com símbolos de religiões que não pratico (ou não
16,1%
acredito), mas somente será intolerância religiosa se
eu praticar alguma violência ou estímulo ao ódio.

3. Acredito que a intolerância religiosa é, no fundo, a


falta de compreensão de que somos todos iguais 45,4%
diante de Deus.

4. Penso que uma das formas de enfrentar a


intolerância religiosa é promover o ensino da História 40,4%
de África e da cultura africana nas escolas.

5. Compreendo que nosso país é laico, quer dizer, é


imparcial no que diz respeito às questões religiosas.
Por isso, não há que se falar em intolerância religiosa 4,6%
no Brasil.

6. Compreendo que, no Brasil, a intolerância religiosa


56,7%
é uma das formas de manifestação do racismo.

7. Concordo que devemos ter ensino religioso nas


escolas como forma de transmitir educação ética, 24,8%
moral e cidadã para crianças e adolescentes.

8. Penso que apesar de existir várias religiões no


Brasil, nossa cultura e nossa sociedade têm origem 11,1%
no cristianismo.

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

As opções 4 e 6 eram as mais críticas e tóricas que compreendem o desrespeito


relacionavam, em complementaridade, a à liberdade religiosa como permanências
intolerância religiosa ao racismo e o seu do colonialismo, pois desde os tempos
enfrentamento a partir de práticas an- coloniais práticas religiosas diferentes do
tirracistas, inclusive na educação formal cristianismo foram perseguidas e margi-
(MEC/SECADI, 2005; NOGUEIRA, 2020; nalizadas, em particular às expressões de
SANTOS, 2009; SANTOS; GINO, 2021). matriz africana (NOGUEIRA, 2020; SAN-
Ambas partem de concepções sócio-his- TOS, 2009; SOUZA, 1986).

35
2. Dados quantitativos

A única opção escolhida por mais 10.639/2003 e da Lei nº 11.645, de 10


de 50% das pessoas foi a 6, que de março de 20085.
entende a intolerância religiosa como
racismo. A alternativa 4 foi a marcada Por sua vez, as diretrizes para a
por 40,4% pessoas, sendo a terceira implementação da Lei nº 10.639/2003
opção mais assinalada. permitem compreender o combate ao
racismo, em todas as suas modalidades,
Dentre as respondentes que atuam na como tarefa de toda e qualquer
área da educação, 34,8% marcaram a educadora, toda e qualquer agente do
opção 6 (que reconhece intolerância Estado ou cidadã, independentemente
religiosa como expressão do racismo) do seu pertencimento étnico-racial,
e a opção 4 (que associa o ensino de crença religiosa ou posição política.
História da África como forma de
enfrentar a intolerância religiosa). A segunda opção mais assinalada foi a
Chama a atenção o percentual 3, marcada por 45,4% das responden-
de respondentes da área que não tes. A assertiva relaciona a intolerân-
relacionou as duas opções: dito de cia religiosa à falta de entendimento
outro modo, aproximadamente 65% (por quem é intolerante) de que para
não associou intolerância religiosa Deus todas as pessoas sãs iguais. Esta
como racismo e, por conseguinte, opção faz referência a ética cristã
não identificou a importância da Lei sobre a existência não de um deus, mas
nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003 de Deus: o Pai Criador que valoriza do
como estratégia pedagógica de mesmo modo todos os seus filhos e
enfrentamento à intolerância religiosa. suas filhas. A percepção da igualda-
de perante deus guarda expectativa
Por outro lado, 25,6% das responden- confessional e, como paralelo, se
tes da área da educação assinalaram a assemelha à ideia de que “raça é uma
opção 7, que concorda com o ensi- só (raça humana)”. Mais do que isso,
no religioso nas escolas. O Estado a afirmação despolitiza a noção de
brasileiro é laico e a Base Nacional diferença, que é fundamental para o
Curricular Comum (BNCC), instrumen- alcance da igualdade formal.
to normativo que define o conjunto
de aprendizagens necessárias para o
desenvolvimento de estudantes 5
A Lei nº 10.639/2003 e a Lei nº 11.645/2008
da educação básica, prevê o ensino modificaram a Lei de Diretrizes e Bases da
religioso em nosso país. Educação Nacional (Lei nº 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, LDB) para tornar obrigatório,
respectivamente, o ensino de História e Cultura
Contudo, os pressupostos e objetivos Afro-brasileira e Africana e a História e Cultura
expostos na BNCC a respeito do ensino dos Povos Indígenas nas escolas das redes
públicas e privadas de ensino fundamental
religioso, dialogam com a agenda e ensino médio. Para além do conhecimento
das ações afirmativas no que tange sobre a história e a cultura das populações
ao reconhecimento, valorização e afro-brasileiras, africanas e indígenas, ambas
respeito à diversidade, sendo marcos visam a promoção de um modelo educacional
antirracista e uma educação para as relações
institucionais a promulgação da Lei nº étnico-raciais (FIGUEIREDO, 2019).

36
2. Dados quantitativos

A opção 2 foi assinalada por 16,1%


das respondentes e traz subjacente a
percepção dos limites da tolerância.
Em certa medida, a ideia de tolerância 2.4 NEGANDO RACISMO, SEXISMO
religiosa não é muito diferente dos
mitos da democracia racial e da E INTOLERÂNCIA RELIGIOSA
cordialidade brasileira (NOGUEIRA,
2020). Ainda que se perceba na noção Muitas pessoas ainda não
de tolerância a “[…] manifestação conseguem identificar que aquilo
legítima e até necessária da igualdade que ela sofreu é racismo. Muitas
moral básica […]” entre as pessoas, vezes são falas de bullying, falas de
somos convocados a tolerar aquilo assédio, falas até de agressão, mas
que não reconhecemos como igual. não fala em racismo.
(NOGUEIRA, 2020, p. 31).
Entrevista, Gestora estadual
Tolerância parte do discurso entre
desiguais, no qual quem tolera é quem
ocupa lugar de poder e privilégio Em todas questões fechadas havia opções
sem que necessariamente signifique que negavam a existência do racismo, do
respeito, diálogo e coexistência. sexismo e da intolerância religiosa:

GRÁFICO 16: Número de respondentes que marcaram as assertivas que negam a existência do racismo,
do sexismo e da intolerância religiosa
Racismo

8. Eu não acho que exista racismo no Brasil,


somos um país miscigenado e desde sempre 2
todas as raças convivem e se misturam.

3. Não creio que o sexismo existe, pois


Sexismo

determinados comportamentos e atividades


4
devem sim ser desempenhadas por homens ou
mulheres por causa da diferença sexual.
Intolerância

5. Compreendo que nosso país é laico, quer


religiosa

dizer, é imparcial no que diz respeito às questões


19
religiosas. Por isso, não há que se falar em
intolerância religiosa no Brasil.

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

37
2. Dados quantitativos

Outras opções de cada uma das à fé dissociadas de raça e gênero,


questões se associam a estas para como se os sistemas de crenças não
compor a ideia de relativização, estivessem também relacionados com
incompreensão ou desvirtuamento outras categorias sociais fundantes
do racismo, sexismo e intolerância (NOGUEIRA, 2020).
religiosa. Entretanto, são apenas as
três, uma em cada categoria, que Por mais que pareça incongruente,
direta e expressamente negam a o sentido empregado na negação
existência de racismo, sexismo e da intolerância religiosa dialoga
intolerância religiosa. com o próprio sentido do tolerar e
da tolerância, que, no caso da
No racismo, a opção 8 foi escolhida por opção em discussão, vem sombreada
apenas duas pessoas; e no sexismo, pela pretensa neutralidade do
a opção 3 foi marcada por 4 pessoas. Estado pela laicidade.
Na intolerância religiosa, a opção 5
foi assinalada por 19 respondentes. Não se pode esquecer que na história
De fato, o número representa apenas do Brasil hierarquias sociais e raciais
4,6% do total de respondentes, mas marcaram a experiência dos diversos
tem destaque em razão da diferença povos da África que foram escraviza-
em relação às opções similares nas dos e submetidos a inumeráveis for-
categorias racismo e sexismo. mas de desumanização. As religiões
africanas tiveram papel fundamental
Quando cruzadas as escolhas que as na resistência da população negra, na
19 respondentes fizeram nas questões preservação de sua humanidade e na
sobre racismo e sexismo, encontramos recriação de suas vidas nas Américas
que a maioria assinalou as questões
mais alinhadas a posicionamento
críticos em ambas as categorias. Mais
do que isso, nenhuma das 19 pessoas
que marcou a opção que nega a
intolerância religiosa escolheu as Liberdade religiosa
opções que negam o racismo
e o sexismo.
A Constituição Federal vigente
prevê que a liberdade de
Isso quer dizer que 19 pessoas não
consciência e de crença é direito
associaram a intolerância religiosa
inviolável, assegurado o livre
com o racismo, apesar de perceberem exercício dos cultos religiosos e
e identificarem criticamente racismo garantia da proteção aos locais de
e sexismo. Uma hipótese para o dado culto e liturgias (art. 5º, inciso VI).
pode estar no fato de, para o grupo Além disso, afrontar, perturbar
de respondentes em questão, a ou impedir qualquer ato
intolerância religiosa está atrelada tão relacionado a cultos religiosos é
somente à noção de crença religiosa ou crime previsto no Código Penal
divergência de aspectos relacionados (art. 208), assim como terão
enquadramento na Lei Caó crimes
resultantes de discriminação ou
preconceito de raça, cor, etnia,
religião ou procedência nacional.

38
2. Dados quantitativos

face a um sistema extremamente vio- normas específicas que visem combatê-


lento. Ao mesmo tempo em que foram la, tais como o Estatuto da Igualdade
diversos os modos de perseguição às Racial (Lei nº 12.288, de 20 de julho de
religiões de matriz africana, inclusi- 2010) e o Estatuto da Igualdade Racial
ve pelo aparato jurídico e policial do e de Combate à Intolerância Religiosa
Estado, foram sendo construído um do Estado da Bahia, os quais previram
imaginário social hostil contra adeptos ações pelo poder público para combater
e adeptas dessas formações religiosas a intolerância religiosa em associação
(BRAGA, 1995; SANTOS, 2009). direta às religiões de matriz africana.

Por isso, a perseguição e a hostilidade, É fundamental que as instituições,


as quais nos referimos, nada mais inclusive órgãos e agentes do sistema
são do que manifestações do de garantia de direitos, percebam
racismo religioso, e não tão somente que esse debate igualmente diz
intolerância religiosa. Por certo, o que respeito às crianças, adolescentes e
sustenta a intolerância religiosa é o jovens e se conecta com a efetivação
racismo religioso, por sua vez fruto da da proteção integral.
natureza estrutural do racismo.
Por fim, conclui-se dos resultados das
Falar em racismo religioso não é questões quantitativas do questionário que:
mero apelo semântico, mas sim a racismo é a categoria
reafirmação da importância de melhor compreendida pelas
nominar e qualificar a modalidade respondentes, tanto em relação
específica e peculiar de racismo ao maior número de marcações
frente às heranças coloniais do das opções mais posicionalmente
nosso país. Deixar de nomear como críticas como no tocante ao
racismo pode prejudicar o menor número de marcações da
reconhecimento das implicações opção que o nega;
de raça para a compreensão das
religiões, relegar a processos sexismo tem resultados semelhantes
de silenciamento pelos não e com significativa percepção da
ditos e dificultar estratégias de interseção e articulação com racismo;
enfrentamento próprias ao racismo
religioso (OLIVEIRA, 2017)6. intolerância religiosa foi a categoria
menos compreendida criticamente
Contudo, reconhecer a diferença das pelas respondentes, quer pela
dimensões do racismo religioso e dispersão das marcações, quer pela
compreender a intolerância religiosa em própria seleção das opções em si.
seu bojo não diminui a importância das Sem dúvida, é fundamental que
a categoria seja considerada em
relevância no âmbito da proteção e
promoção dos direitos da criança e
6
Para saber mais sobre a relação entre
racismo religioso e eurocentrismo, ver Ramón do adolescente e na atuação da rede
Grosfoguel (2016). de proteção e atendimento.

39
2. Dados quantitativos

Os resultados do terceiro bloco do


questionário estão diretamente
relacionados às atribuições
2.5 PERCEPÇÕES A PARTIR profissionais e à atuação no sistema
de garantia de direitos e na rede
DA ATUAÇÃO E DA de atendimento. As questões
FORMAÇÃO PROFISSIONAL objetivaram identificar: 1) se as
profissionais identificavam situações
de racismo, sexismo e intolerância
[...] a escola, ela tem uma religiosa praticadas contra crianças,
responsabilidade muito grande, adolescentes e jovens no desempenho
mas ela não pode dar conta sem de suas funções; 2) se sentiam-se
formação. Eu vou discutir o tempo aptas para atuar e encaminhar os
inteiro: quem forma o formador? casos; e 3) se consideravam necessário
formações ou capacitações sobre os
Entrevista, respectivos temas.
Coordenadora pedagógica
Ao serem perguntadas se já haviam
identificado ou sido informadas
durante o desempenho de suas
funções sobre casos de racismo,
sexismo e intolerância religiosa,
Para não esquecer assinalaram positivamente sobre
cada temática, respectivamente,
62,3%, 38,2% e 52,2%. São alguns
A ialorixá Mildredes Dias Ferreira, a exemplos descritos no complemento
Mãe Dede de Iansã, líder do Terreiro opcional da questão:
Oyá Denã, faleceu no dia 1º de
junho de 2015 após sofrer infarto.
Mãe Dede de Iansã vinha sofrendo [Teve o caso de] uma funcionária não
com ataques e perseguição respeitava o nome social de uma
religiosa, e não resistiu. Em junho aluna. Enquanto todos chamavam
de 2021, o Tribunal de Justiça da de [nome feminino], a funcionária
Bahia confirmou a condenação da insistia em chamá-la de [nome
mulher que praticava os atos de masculino]. Também teve um aluno
perseguição à Mãe Dede e sua casa que deixou de estudar porque
pelo crime de racismo, nos termos sofria muita discriminação por sua
da Lei nº 7.716/1989. A decisão em orientação sexual, e do professor
segunda instância é um marco, que nas reuniões, ao invés de relatar
pois reconhece o racismo religioso o desempenho do aluno, se prendia
nos atos praticados contra a à orientação sexual.
ialorixá e o Terreiro Oyá Denã.
Questionário, Diretora de escola

40
2. Dados quantitativos

Socioeducadores evangélicos provem sua competência em


pregam para os adolescentes e rendimento nas avaliações.
afirmam a eles que os adolescentes Essa é uma condição
que usam “contas” são servos do naturalizada no imaginário
diabo e que continuarão privados de alunos, professores,
de liberdade enquanto não coordenação e direção.
deixarem de adorar ao demônio.
Questionário, Professor
Questionário, Agente de
atendimento socioeducativo

Leciono em uma escola de As transcrições dão o tom do que, no


classe média alta, onde meus geral, foram as situações descritas
pares são na maioria brancos. pelas respondentes. A maior incidência
É comum a naturalização dos registros diz respeito aos espaços
do racismo recreativo como escola e outros relacionados
entre alunos, professores e ao atendimento e socialização de
coordenação pedagógica. As meninos e meninas. Houve relatos de
formas subalternizantes que as situações que se revelaram durante o
pessoas de cor são tratadas são
atendimento em serviços, como o caso
marcantes no cotidiano escolar.
da assistente social que descreveu
Um exemplo é a forma como são
tratados os alunos de cor. Eles
que, certa vez, por ocasião de um
sempre são vistos como menos atendimento CRAS, uma mãe relatou
competentes/habilidosos, que que sua filha jovem era agredida pelo
carecem de mais auxílio, até que pai por ser lésbica.

41
2. Dados quantitativos

Coerente com o segundo bloco de a categoria com menor incidência de


questões anterior, racismo foi a categoria identificação, informação ou notificação
de maior incidência, mas aqui seguido pelas profissionais, ao mesmo tempo que
da intolerância religiosa. Sexismo foi a maior na opção “não sei responder”.

GRÁFICO 17: No desempenho de suas funções você já identificou ou foi informado(a) ou notificado(a) sobre
a ocorrência de RACISMO, SEXISMO ou INTOLERÂNCIA RELIGIOSA contra crianças, adolescentes ou jovens?

Racismo 62,3% 31,5% 6,3%

Sexismo 38,2% 51,4% 10,3%

Intolerância Religiosa 52,2% 42,3% 5,5%

0,0% 20,0% 40,0% 60,0% 80,0% 100,0% 120,0%

Sim Não Não sei responder


Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

Em relação ao sexismo, em diálogo 75 profissionais que


com os resultados do bloco anterior, atuam na assistência Social;
cujos respondentes apresentaram
considerável compreensão sobre a 77 profissionais que atuam na educação;
categoria, pode-se concluir que parte
compreende seu sentido em si, mas não 14 conselheiras tutelares.
necessariamente associa às situações
concretas relacionadas às violências Essa conclusão é melhor coompreendida
de gênero como, por exemplo, a quando analisada a próxima questão,
violência sexual. Dentre os 51,4% (214 dedicada a verificar se as respondentes
respondentes) que afirmaram não se sentem preparadas para identificar e
terem atendido ou sido informados atuar (atender ou encaminhar, a depender
sobre questões relacionadas ao da atribuição) nos casos de racismo,
sexismo, tem-se: sexismo e intolerância religiosa.

42
2. Dados quantitativos

GRÁFICO 18: Você se sente preparado(a) para identificar e atuar (atender ou encaminhar, dependendo de sua função)
nas questões relacionadas ao racismo, sexismo e a intolerância religiosa contra crianças, adolescentes e jovens?

0,7%

39,4%

Sim
Não
Parcialmente
Não sei responder

51,9%

7,9%

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

Conforme o Gráfico 17, em média, adequadamente as situações de


cerca de 50% das respondentes já violação de direitos que envolvem
identificaram ou foram informadas ou raça, gênero e sexualidade e liberdade
notificadas de situações de racismo, religiosa. Essa conclusão é coerente
sexismo e intolerância religiosa com as respostas da próxima questão.
envolvendo crianças, adolescentes
e jovens; porém, aproximadamente Quase a totalidade das respondentes
60% afirmaram que não se sentem indicaram que é necessário realizar
preparadas ou somente parcialmente capacitações e formações para
preparadas para atuar nos casos. aprimorar o desempenho de suas
funções, apesar de 39,4% ter respondido
É certo que as questões fechadas não que se sente preparada para atuar nos
captam a experiência das respondentes casos de racismo, sexismo e intolerância
e não permite avaliar casos concretos, religiosa. O dado é significativo e
mas os resultados indicam que revela a importância dos temas nos
ter conhecimentos gerais sobre conteúdos de formação continuada e
aspectos contextuais e conceituais nas capacitações oferecidas no âmbito
relacionados ao racismo, sexismo e do sistema de garantia de direitos e
intolerância religiosa não é equivalente da rede de atendimento de crianças,
à habilidade de atender e encaminhar adolescentes e jovens.

43
2. Dados quantitativos

GRÁFICO 19: Você avalia que é necessário ter formação/capacitação sobre os temas racismo,
intolerância religiosa e sexismo para a sua atuação profissional e no desempenho de suas funções?
ATUAÇÃO PROFISSIONAL E NO DESEMPENHO DE SUAS FUNÇÕES?
0,7%
4,1%

Sim
Não
Não sei responder

95,2%

Fonte: Equipe de pesquisa – Projeto Àwúre.

Para além da importância da formação violação de direitos emergentes do ra-


continuada que as respostas apontam, cismo e do sexismo. Apesar de não ser
lembra-se que aproximadamente 83% diretamente tema da pesquisa, consi-
das respondentes do questionário derando a composição do sistema de
têm ensino superior completo. Dito de garantia de direitos - majoritariamente
outro modo, concluir uma graduação composto por profissionais de nível su-
não é suficiente para aquisição perior -, é uma ponderação que não se
de conhecimentos e habilidades pode deixar escapar7.
sobre temas que, em suma, são
estruturantes das relações sociais O conjunto de respostas demonstra
no Brasil e que tem impacto direto a necessidade de formação e
na vida de crianças, adolescentes e capacitação dos temas no âmbito da
jovens. O dado reforça a crítica sobre infância e juventude. Profissionais de
os currículos de formação inicial que, diversos setores da rede de proteção
tendencialmente e independente e do sistema de garantia de direitos
da área de conhecimento, no geral, avaliam que não estão preparadas
não tratam temas relacionados à para atender e atuar nos casos de
gênero e raça. racismo, sexismo e intolerância
religiosa praticados contra crianças,
Ao fim e a cabo, essa reflexão que tem a adolescentes e jovens.
ver com o caráter eurocêntrico e colo-
nial dos currículos de formação, o que
certamente interfere na forma como 7
Para aprofundar o debate sobre aspectos
profissionais vão atuar e na capacidade eurocêntricos da produção do conhecimento
de identificar situações de opressão ou e das hierarquias de poder raciais nos espaços
universitários, ver Ângela Figueiredo (2019).

44
3 Dados
Qualitativos
RACISMO, SEXISMO E
INTOLERÂNCIA RELIGIOSA
NOS ESPAÇOS DE
SOCIALIZAÇÃO E PROTEÇÃO

[…] Meu neto tinha entre 4 e 5 anos


quando a mãe foi chamada
na escola porque ele estava
tocando candomblé na mesa.
Questionário, Educadora social

O racismo está claro em todos os


momentos desse processo [em referência
ao procedimento para apuração do
ato infracional] […] a Defensoria fez um
relatório no começo do ano passado do
perfil dos adolescentes em cumprimento
de medida de internação e mais de
90% dos adolescentes se
autodeclararam pretos ou pardos,
e isso já diz muito sobre quem o
sistema tem atuado para combater e
para controlar. […] A gente não pode
deixar de lincar uma coisa com a outra.
Entrevista, Defensor Público

45
3. Dados qualitativos

Ouvir profissionais que atuam na mesmo conselheiras tutelares citaram


rede de atendimento, nos serviços e a escola como espaço que reforça
programas de políticas públicas e nos estereótipos racistas e sexistas e, como
órgãos e nas instituições estratégicas exemplo, reproduz racismo religioso
para o sistema de garantia de direitos e recreativo. Em suma, a escola
foi revelador. Seja por meio das apareceu diversas vezes como espaço
questões abertas de resposta opcional de desrespeito às diferenças e terreno
do questionário ou das entrevistas, fértil para violência simbólica racista e
foi possível identificar diversas sexista. A partir de relatos variados, vê-
modalidades de violação de direitos se o quanto a escola pode se constituir
motivadas pelo racismo, pelo sexismo como ambiente hostil às diferenças e
e pela intolerância religiosa praticados violento à diversidade.
contra criança, adolescentes e jovens
que - infelizmente e não raro - As referências ao racismo na família
podem ocorrer nos principais espaços apareceram relacionadas à estética
de socialização, de proteção e de negra, como, exemplarmente, pais
promoção dos direitos humanos de e mães que não queriam deixar o
meninos e meninas. cabelo de filhos e filhas cresceram.
Boa parte das referências à família
Número expressivo de respondentes estiveram relacionadas ao sexismo e a
indicaram casos de racismo, sexismo intolerância religiosa. Vale o destaque
e intolerância religiosa na escola. As que a não aceitação na família, mas
situações relatadas envolvem toda a especialmente por pais e mães,
comunidade escolar, ou seja, gestoras, tende a se manifestar com agressões
coordenadoras, professoras, funcionárias físicas como o caso do menino que
e estudantes, bem como críticas aos apanhou em casa por ter se maquiado
currículos e a forma como temas na escola; e da adolescente agredida
relacionados à gênero, sexualidade, por informar aos pais que é lésbica.
raça e liberdade religiosa são (ou não) Em apenas uma entrevista, realizada
abordados. Tanto a partir da análise dos com uma coordenadora pedagógica,
dados quantitativos como qualitativos, foi relatado acolhimento familiar
a escola merece destaque. Decerto, de uma adolescente que estava em
conforme ressalvado anteriormente, transição de gênero.
cabe ponderar que 163 das respondentes
do questionário são profissionais da Em relação às relações comunitárias,
educação, o que pode exercer certa foi marcante as referências à
influência sobre os resultados. Mas, intolerância religiosa por parte de
ainda assim, os dados não deixam de membros da comunidade de religiões
ter relevância para compreensão de cristãs, sobretudo neopentecostais.
violações de direito na escola. Ainda, apareceu em muitos casos
discriminações em razão da estética
Contudo, lideranças religiosas e (peculiarmente negra e/ou que marcam
comunitárias, jovens, gestores e pertencimento religioso), aparência

46
3. Dados qualitativos

e trejeitos que, a partir de padrões


cis-heteronormativos, são vistos como
atributos essencialmente masculinos
ou femininos. 3.1 A HISTÓRIA E A CULTURA
Instituições sociais como família, AFRICANA E INDÍGENA NAS ESCOLAS
igreja e escola são espaços que
Costumo ouvir: “calma, ainda não
integram as pessoas à sociedade e
chegou novembro, eu até deixo
permitem a partilha de conhecimento,
se for em maio, mas o seu lugar é
hábitos e costumes que serão novembro” [referindo-se a outras
importantes para o aprendizado da professoras]. Essas discussões
vida social. É também a partir das ainda permeiam, da boca torta,
instituições sociais que todos nós do não fazer, do colar apenas um
apreendemos regras de convívio. cartaz - “Tá, eu vou colaborar, eu vou
São espaços que ao mesmo tempo colar um cartaz” -, mas a gente já
que alimentam, são alimentados por está muito além do cartaz, a gente
saberes e leituras de mundo que se nem quer o cartaz! A gente quer a
expressam nas relações sociais. Por discussão, quer a participação, quer o
isso, é tão importante pensar raça entendimento, quer a conversa com
e gênero como estruturas sociais a família, quer incluir todo mundo
da escola. Quando a gente for
que organizam o funcionamento
trabalhar uma questão racial a gente
das instituições sociais. Modificar a
precisa chamar o porteiro, chamar
realidade social para contemplar a a merendeira, chamar o agente,
efetividade dos direitos humanos de chamar todo mundo!
crianças, adolescentes e jovens passa
também por repensar as relações Entrevista, Professora
sociais de gênero e raça.

Adiante, os dados serão apresentados


a partir de categorias de maior Apesar das críticas diretas aos
incidência, em análise integrativa das currículos e a forma como as escolas
entrevistas e das questões abertas e se referem aos temas relacionados às
de resposta opcional do questionário. questões raciais, chamou a atenção
as poucas referências diretas à Lei nº
10.639/2003 e à Lei nº 11.645/2008.
Como mencionado anteriormente,
as leis tornam obrigatório,
respectivamente, o ensino de História
e Cultura Afro-brasileira e Africana e a
História e Cultura dos Povos Indígenas
nos ensinos fundamental e médio.

47
3. Dados qualitativos

Entretanto, como já apresentado em te todo o calendário letivo; e 2) as re-


diversos estudos e pesquisas, inserir presentações adotadas nas atividades,
de maneira efetiva e eficaz o ensino por vezes restritas à escravidão, que
da História e Cultura Afro-brasileira escamoteiam abordagens que permi-
e Africana e a História e Cultura dos tem elaborar outros conhecimentos e
Povos Indígenas ainda é um desafio referências da experiência de negros e
(GOMES, 2012; JESUS; ARAÚJO; CUNHA negras no Brasil.
JÚNIOR, 2013; MIRANDA; LINS; COSTA,
2012; MOTA, 2021). A insistência na representação de pessoas
negras escravizadas reforça o imaginário
de subalternização e de violência aos
[…] a Lei 10.639 que é justamente corpos negros e induz à redução da
da implementação do ensino de história da população negra à escravidão,
História dos povos africanos, além de não contribuir para a construção
ela não está sendo empregada.
de autoimagem positiva de si (MULLER,
A gente só vê a implementação
2013; OLIVA, 2003; SILVA, 1995; 2005).
de alguma ação no dia 20 de
novembro, ou dos indígenas no dia
19 de abril, ou seja, é algo que não A outra faceta dessa representação
tem sido colocado em prática. resvala no racismo religioso e nas
práticas de intolerância religiosa, bem
Entrevista, Jovem como em todas as formas de racismo. Há
diversos registros de recusa por parte
de professores e professoras em “falar
da história da África” ou participarem de
[…] a gente pisa nessa escola “projetos relacionados à cultura afro-
porque o povo de fora veio para brasileira”, que compreendem estéticas,
ser diretora, para ser zeladora, cardápios e alimentos, danças ou
para ser professora, e a gente instrumentos musicais etc.
somente para os nossos meninos
estudar e passar racismo dentro A informação não destoa dos dados
da escola, chega novembro […] o quantitativos, nos quais foi identificado
que é que a direção da escola faz?
que considerável percentual de
Pega e coloca um bando de preto
respostas por profissionais da educação
algemado lá na parede da escola
dizendo está ensinando sobre o
não associa racismo à intolerância
novembro negro, somente no dia religiosa, bem como não percebe a Lei
vinte de novembro […] nº 10.639/2003 como estratégia de
enfrentamento à intolerância religiosa.
Entrevista, Liderança comunitária
As constantes negativas e os tantos
embaraços para implementar a Lei nº
Nas falas têm-se duas percepções: 1) a 10.639/2003 ultrapassam dificuldades
dificuldade de trabalhar os temas fora burocráticas, logísticas ou mesmo de
das datas comemorativas, quando a re- formação. São ocorrências que, em
comendação das Leis nº 10.639/2003 última instância, trata-se de racismo
e nº 11.645/2008 é abordá-los duran- institucional e tem a ver com a violação

48
3. Dados qualitativos

de normas que visam enfrentar o o horário dos ventos, o horário


racismo brasileiro e, em especial no da maré… às vezes, o horário da
estado baiano, ferem o Estatuto maré é cedeira; às vezes, é uma
da Igualdade Racial e de Combate à maré tardeira, e a escola não
compreende isso. […] “Ah, vou me
Intolerância Religiosa do Estado da Bahia.
tornar logo um pescador, porque,
não preciso concluir o Ensino
[…] mas antes só existia a história Médio” e a escola não traz uma
do Brasil, quem descobriu o Brasil narrativa de que, por exemplo,
era Pedro Álvares Cabral… E você pode ser o que você quiser,
hoje a gente quer contar a nossa você pode ser pescador e outra
história, quero a minha história, coisa. A gente aprendeu através
quero contar a história do meu da Escola das Águas, que é
antepassado. Então, para mim, se uma escola que foi uma escola
não deixar eu contar minha história, diferenciada, um projeto criado
para mim isso também é racismo. pelo Movimento de Pescadores
e Pescadoras, e compreendia o
Entrevista, Liderança comunitária modo de vida do pescador e da
pescadora e esses horários que
a gente vem falando da maré.
Ainda, lideranças comunitárias teceram Então, tipo, para escola das águas,
reflexões que dão sentido à crítica a gente é pescador e não deixa
decolonial dos currículos e da escola. O de ser pescador, mas pode ser
trecho, apesar de longo, é fundamental advogado para contribuir dentro
para problematizar como a escola da sua comunidade; a gente pode
pode ser espaço de reprodução de ser um médico para contribuir
conhecimento sem compreensão do dentro da comunidade; pode
ser um pescador e professor de
modo de vida da comunidade e sem
educação física. […] eu aprendi que
valorização da cultura, dos saberes e
o Brasil foi descoberto. Existem
dos aprendizados locais: professores que estão dentro das
redes municipais que negam a
[…] Eu acho que a gente falar de nossa identidade quilombola. Vou
racismo, principalmente, entre os te dar um exemplo: nós temos
jovens, em toda essa conjuntura o Bordejo, que é uma atividade
que a gente está vivendo, é anual e que ela é tão tradicional
bastante importante […] Somos que mesmo perguntando aos mais
uma comunidade onde muitos velhos, a gente não sabe quando
dos jovens começam a pescar foi que o Bordejo começou, eles
cedo, não como trabalho infantil, não sabem o ano específico,
mas porque vão junto com os porque até os nossos ancestrais
pais, que não têm com quem já traziam o Bordejo tanto como
deixar e ao mesmo tempo, em espetáculo tradicional quanto
uma comunidade que a própria modo de pescar, o modo de
escola não compreende esse produção mesmo. Os nossos mais
modo de vida. Digo isso porque velhos contam que eles iam nas
a gente que está dentro do canoas de madeira - hoje é de
mundo da pesca, a gente segue fibra -, mas eles iam nas canoas

49
3. Dados qualitativos

de madeiras e, muitas vezes, Não se pode perder de vista que


passavam vários dias na Ilha do a desvalorização da cultura negra
Meio e era o traquete que levava. e da população negra não é algo
É por isso que a gente diz que estanque. O colonialismo se atualiza
se move muito com a força do
cotidianamente e se vale da experiência,
vento, com o horário do vento,
pois faz parte de nossas vidas desde a
com o horário da maré, porque era
o traquete que levava. Então, o
primeira infância e está na educação
Bordejo é algo muito importante (MUNANGA, 2012). Certamente,
dentro da comunidade, mas não é sozinhas, a implementação das Leis
falado dentro da escola. Mas por nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008 não
outro lado, eu posso ouvir sobre serão suficientes para transformar
baseball. O que é baseball para esse cenário. Contudo, como ações
uma comunidade quilombola e afirmativas e como política curricular
pesqueira no Recôncavo da Bahia, de crítica ao eurocentrismo
às margens da Bahia de Todos os dos currículos escolares que
Santos? Por que que eu tenho que historicamente negaram as
aprender sobre o baseball dentro contribuições dos povos negro e
da escola, mas não posso aprender
indígena para formação da sociedade
sobre o Bordejo? […] É só a gente
brasileira, as leis supramencionadas
fazendo essas problematizações,
que a gente começa a perceber
são relevantes instrumentos
que é uma desvalorização da antirracistas na Educação e demandam
nossa história e da nossa cultura investimento público e compromisso
e, ao mesmo tempo, também é político para serem implementadas.
um processo de negação desse
modo de vida e de apagamento
desse modo de vida e dessa
cultura também.

Entrevista, Liderança comunitária


Escola das Águas
“[...] é um projeto de formação
A resposta tem sentido de proposta às do Movimento de Pescadores e
possibilidades de uma escola decolonial Pescadoras na Bahia, criada em 2011,
e que impõe reflexão sobre o papel da com o objetivo de trabalhar o tripé
escola, sobre os modos de aproximação da formação política, conhecimentos
dos diferentes conteúdos escolares em técnicos de nossa gente e a elevação
diálogo com os diferentes saberes e da escolaridade, oferecendo
identidades dos sujeitos envolvidos. Um uma educação contextualizada
modelo educacional que não questiona a pescadoras(es) quilombolas,
ribeirinhas(os), indígenas”.
o racismo e o colonialismo dos currículos
(SACRAMENTO, 2019, p. 30).
torna-se reprodutor natural da
discriminação e da violência simbólica.

50
3. Dados qualitativos

Os dados dão conta que a percepção


do racismo por meio de referências
à estética negra foi frequente. Há
3.2 ESTÉTICA diversos relatos especialmente sobre
os cabelos crespos, black, em relação ao
Ainda é muito perverso essa parte,
tamanho, textura, penteado e volume.
porque as professoras, as mentoras Acrescenta-se ainda características
da escola ainda são, entre aspas, físicas, vestimentas e adereços ligadas
algumas são católicas e outras são às religiões de matriz africana: em
evangélicas, raramente tem algum distintos relatos foi identificado a
do candomblé. Quando tem é muito violência contra a estética negra.
sutil, muito leve porque a pessoa do
candomblé não gosta de demonstrar,
e aí, por conta disso, o jovem, ou Diversas situações são relatadas
adolescente, ou a criança que vai com por adolescentes e jovens em meu
uma conta, ou vai de branco, ou usa trabalho, especialmente envolvendo
um pano na cabeça, ele já é malvisto violência contra e estética negra.
pelos coleguinhas, até pelo próprio
professor. Isso é horrível, porque você Questionário, Educador social
não pode expressar sua fé.

Entrevista, Jovem Estudantes sendo


discriminados por usarem objetos/
vestimentas relacionadas ao
No Brasil, conceitos e juízos de beleza candomblé e umbanda.
não estão baseados nas características
da população negra. Em contrapartida, Questionário, Professor
a ideologia do branqueamento, uma
das faces do racismo brasileiro, valoriza
aquilo que é reconhecimento como A coordenadora pedagógica da
escola orientou uma aluna negra a
características de pessoas brancas
cortar o cabelo (ela possuía dreads),
(BENTO, 2002). O racismo brasileiro
pois segundo a profissional “esse
vale-se da aparência: quanto mais tipo de cabelo” é anti-higiênico.
características físicas típicas negras
(cor da pele, cabelo, traços etc.) e Questionário, Professor
uso de elementos de vestimenta que
fazem referências à cultura negra e às
religiões de matriz africana, é provável A estética (ou representações que a
que a pessoa, independentemente da sugerem) também foi elemento de
idade, esteja mais suscetível a sofrer percepção para o sexismo, relatado
preconceito e a discriminação racial. por entrevistadas em situações

51
3. Dados qualitativos

em que meninas foram criticadas e


discriminadas por usar “cabelo curto” e
meninos, por usar “cabelos compridos”.
As associações vêm acompanhadas de
reflexões que se relacionam com o que
3.3 LGBTQIA+FOBIAS E
deve ser a aparência típica de um ou EDUCAÇÃO SEXUAL NAS ESCOLAS
outro sexo, irmanada à LGBTQIA+fobia,
como no caso específico de menina
discriminada na escola por usar [...] outro dia, na escola, tinha uma
cabelos curtinhos e ser considerada professora se recusando a chamar
lésbica pelas colegas. pelo nome social dela, só queria
chamar pelo nome de batismo
e aí ela me acionou: “[nome da
entrevistada], está acontecendo
um negócio comigo, eu não estou
suportando mais, eu vou abandonar
Empoderamento Crespo a escola se continuar! A minha
professora só está me chamando
pelo nome de batismo, não quer me
O cabelo e a cor da pele são expressões chamar pelo meu nome social”.
fundamentais para a construção da
identidade das pessoas negras. A Entrevista, Liderança LGBTQIA+
afirmação dos elementos da negritude,
tal como o cabelo natural, representou,
historicamente, resistência cultural e A maioria dos relatos em referência às
luta política dos movimentos negros. LGBTQIA+fobias diz respeito ao am-
Em 7 de novembro de 2015, foi realizada biente escolar, que tanto pode ser o
em Salvador, capital da Bahia, a primeira lugar dos acontecimentos narrados
Marcha do Empoderamento Crespo, que como o lugar aonde crianças, ado-
tem como objetivo contribuir para a lescentes e jovens relatam situações
valorização do corpo e da estética negra ocorridas em outros ambientes.
e para a desconstrução de estereótipos
negativos sobre a população negra. A
Marcha se consolidou como
A maior incidência se encontra com
ato político e importante descrição de situações relacionadas: à
ferramenta na luta antirracista. exigência de comportamentos e modos
no espectro da cis-heteronormatividade;
a xingamentos e discriminação por parte

52
3. Dados qualitativos

de outras estudantes; ao desrespeito à Uma criança de 4 anos por gostar


identidade de gênero e desconsideração de brincar imitando meninas,
do nome social, este último praticado alguns colegas o tratavam
por gestoras, servidoras e professoras; com xingamentos e agressões.
Era muito difícil trabalhar
e mesmo sobre inabilidade para acolher
com determinada turma,
crianças, adolescentes e jovens LGBTQIA+.
infelizmente tão jovens e com
essa mentalidade…
A coordenadora pedagógica
orientou um aluno gay a “falar Questionário, Professora
direito”, pois não atenderia
ninguém “cheio de viadagem”.
Não sei classificar exatamente,
Questionário, Professora que são muitas classificações, mas
aí eu vou falar gay e lésbica. Eu
percebo que isso para escola é um
Já presenciei no espaço escolar tabu muito grande, a escola, de um
falas preconceituosas dos alunos modo geral, não está preparada
para com seus pares, por exemplo para lidar com essas questões.
viadinho, maricas, bichinha etc. […] Depois, passado tempo, ela
começou a me dizer “Pró, eu sinto
Questionário, Secretária escolar que eu sou um garoto” - ela me
dizia assim: “Eu sinto que eu sou
um garoto”. […] Acho que ela tinha
[...] Chegou um dia que o pai uns dez a onze anos, e quando ela
tomou conhecimento de que falou essa história eu levei para
ele se maquiava na escola, e veio ela conversar com a vice-diretora,
de surpresa, flagrou o menino mas a vice-diretora não sabia o que
todo pintado. Ele repreendeu fazer. Ela [a vice-diretora] ficou
fortemente o filho - nós já toda vermelha, empolada! Foi
tínhamos conhecimento de tão engraçado, ela ficou cheia de
que esse pai é um católico placas vermelhas depois disso, ela
fervoroso -; e nós soubemos não sabia o que dizer, nem o que
depois que o menino levou uma fazer e a menina afirmava: “Eu me
surra em casa por conta de sinto um garoto pró, eu me sinto
se apresentar daquela forma um garoto”.
dentro da escola. No outro dia,
se não me engano, ele faltou a Entrevista, Professora
aula [...] a escola presenciou a
forma como a família, como o pai,
especificamente, não aceitou a Jovem, homossexual, mulher foi
conduta do menino. retirada do desfile de garota escola.

Entrevista, Questionário, Coordenadora de


Coordenadora pedagógica área em Secretaria Municipal

53
3. Dados qualitativos

Um adolescente trans-homem, com a própria família. Nesses casos, é


não teve o direito de usar o seu a sensibilidade individual que fala mais
nome social no colégio. alto, sem necessariamente haver
respaldo institucional para tal.
Questionário, Professor
Identificar e intervir adequadamente
Os dados coletados falam do despreparo sobre práticas sexistas e LGBTQIA+fóbicas
para discussão, acolhimento e interven- é uma expertise que demanda formação
ção nas questões relacionadas à gênero e amparo institucional. Os dados
e sexualidade que ultrapassam em muito deflagram a ausência de profissionais
o uso de expressões inadequadas como com habilidades para lidar com essas
“opção sexual”, “menina homossexual”, situações na escola, em contextos que
“trans-homem” etc. O manejo semântico vão da flagrante discriminação até às
parece ser o menor dos problemas. reações desconcertantes como a erupção
cutânea da vice-diretora.
A tendência é a escola se comportar
como se o assunto devesse ser tratado Em contrapartida, nenhuma pessoa
tão somente no âmbito familiar, com entrevistada ou respondente fez
raras exceções em razão de profissionais menção à existência de programas,
sensíveis aos temas e que se colocam projetos ou ações pedagógicas
como mediadoras entre as demandas, relacionadas aos direitos sexuais e
que surgem na escola e até mesmo reprodutivos e a gênero e sexualidade.
Igualmente, não houve menções
a existência de protocolos ou
procedimentos mínimos adotados
pela escola quando casos de violência
Cis-heteronormatividade sexista ou LGBTQIA+fóbica acontecem,
ou são relatados, no ambiente escolar,
como na situação do menino que foi
O termo cisgênero é utilizado para agredido pelo pai e tantos outros que
se referir a todas as pessoas que se emergiram dos dados.
identificam com o gênero que lhe
foi atribuído desde o nascimento. Dito de outra maneira, ao mesmo
Na heteronormatividade, todas as tempo em que as entrevistadas
pessoas devem organizar suas vidas percebem a necessidade de inter-
conforme o modelo heterossexual,
venção da escola no sentido de dar
sejam heterossexuais ou não. Por isso,
suporte às crianças, adolescentes e
heteronormatividade pode ser definida
como a ordem sexual fundada no modelo jovens e identifiquem a necessida-
heterossexual, que é também o modelo de de lidar com esses temas na vida
hegemônico familiar e reprodutivo escolar, não associam a importância
imposto por meio de violências de trabalhar nas atividades educa-
simbólicas e físicas especialmente cionais e pedagógicas conteúdos de
contra pessoas que rompem com as educação sexual.
normas de gênero (MISKOLCI, 2012).
A cis-heteronormatividade é imposição Considerando o contexto brasileiro,
que pretende normalizar o que convém citar a criminalização das
se pode chamar de cadeia de discussões relacionadas à educação
coerência obrigatória entre sexo, sexual no ambiente escolar. Apesar do
gênero e sexualidade.

54
3. Dados qualitativos

pânico moral que provoca em setores e outras diretamente relacionadas à


conservadores, a educação sexual divisão sexual do trabalho:
e a adoção de modelos não sexistas
de educação são fundamentais na Adolescente reclamou que em
construção de um ambiente respeitoso casa só ela fazia as atividades
e sem violência e, principalmente, domésticas por ser a filha e os
na prevenção das violências sexuais. irmãos não faziam nada.
A falta de formação e preparação para
Questionário,
esses temas, inevitavelmente, gera
Coordenador pedagógico
hostilidade e rechaço às diferenças,
assim como a ausência de respostas
institucionais às questões relacionadas
[...] fui mobilizadora de um grupo
à gênero e sexualidade e às violências de adolescentes e jovens muitos
sexistas e LGBTQIA+fóbicas são, por si só, (as) não participavam de algumas
violadoras de direito. dinâmicas, acham que era coisa de
mulher ou homem.

Questionário, Assistente social

3.4 SOCIALIZAÇÃO SEXISTA Uma assistida relatou que o


marido bateu em sua filha por
E DIVISÃO SEXUAL E estar brincando com carrinho
RACIAL DO TRABALHO e bola e que ele considerava
impróprio para menina.

Em sala, muitos alunos


Questionário, Assistente social
defendem que certas profissões
são destinadas aos homens. Ou
ainda falam que aceitariam que a
esposa trabalhasse, A socialização sexista reforça a divisão
mas somente se ela ganhasse sexual do trabalho e pode se tornar
menos que ele. obstáculo para o desenvolvimento
de crianças e adolescentes, além
Questionário, Professor de, em situações mais extremas,

Algumas das respondentes percebem


o sexismo a partir de contextos
relacionados à socialização e a divisão LGBTQIA+fobias e racismo
sexual do trabalho. Em relação à
escola, apareceu referências à divisão Em junho de 2019, o Supremo Tribunal
sexual na organização de atividades Federal (STF) decidiu pela aplicação da Lei
pedagógicas e recreativas. Foram Caó nos casos de LGBTQIA+fobia. Quem
relatadas impressões de estudantes ofender ou discriminar pessoas LGBTQIA+
sobre o desempenho de determinadas está sujeito à pena de um a três anos e multa.
tarefas ou profissões com viés sexista

55
3. Dados qualitativos

reverberar em agressão física e maus mas especialmente feminina negra,


tratos praticados por pais, mães ou o que impacta na organização da
responsáveis, exatamente como em um desigualdade econômica e na renda
dos trechos acima. A divisão sexual do média desse grupo populacional
trabalho tende a organizar as tarefas e (MARCONDES et al., 2013).
profissões com base no sexo que, como
consequência, orienta hierarquias de São questões que diretamente se
acesso a bens e sucesso profissional. relacionam com a socialização de
crianças, adolescente e jovens,
A tendência é que haja naturalização do pois interferem no seu processo
espaço doméstico como de atribuição de desenvolvimento. Em relação
feminina por natureza, ainda que não às crianças e adolescentes,
existam quaisquer atributos físicos ou impacta no direito fundamental à
de outra ordem que o justifique como profissionalização e proteção no
“essência feminina”. A percepção do trabalho, e no acesso às oportunidades
senso comum da existência de aptidão e empregabilidade para a juventude.
inata das mulheres para tarefas
associadas ao cuidado não se justifica
senão pelo sexismo que, ao mesmo
tempo, destitui a importância social
dessas tarefas. Lista TIP
O fato de parte das respondentes
apontarem questões como aquelas Baseado nas diretrizes da Convenção
sugeridas nos trechos em destaque, nº 182 da Organização Internacional
demonstra haver entre profissionais do Trabalho (OIT), o Brasil aprovou a
a identificação da divisão sexual do Lista das Piores Formas de Trabalho
trabalho desde a infância, corroborando Infantil (Lista TIP), por meio do
a compreensão de gênero como Decreto nº 6.481, de 12 de junho
de 2008. Consta na Lista TIP, como
construção social. Os relatos são
exemplos, trabalho doméstico e
também importantes porque
atividades relacionadas à pesca
descrevem a operacionalização de e à agricultura. No entanto, sem
normas de gênero cujos recursos são, perder de vista a proteção integral,
dentre outros, a agressão, a vigilância programas de enfrentamento ao
do comportamento e o castigo. trabalho infantil devem considerar
especificidades de cada território para
Ocorre que, no Brasil, não se pode traçar estratégias de intervenção,
esquecer que a divisão do trabalho levando em conta aspectos
é sexual e racial. Se, por um lado, as culturais, nos quais pequenas tarefas
atividades de maior prestígio e ganho relacionadas ao modo de vida podem
econômico estão nas mãos de homens fazer parte da construção identitária
brancos, por outro, o fenômeno da de determinada comunidade.
feminização da pobreza persiste,

56
3. Dados qualitativos

associam a intolerância religiosa como


racismo religioso:

3.5 RACISMO RELIGIOSO E Então, identifico que racismo


INTOLERÂNCIA RELIGIOSA e intolerância religiosa esteja
dentro desse processo de
racismo estrutural, mas a gente
trabalha numa perspectiva do
A intolerância religiosa é uma
racismo religioso ou intolerância
regra tácita do funcionamento
religiosa, justamente para poder
da escola. Porém, os olhares
dizer que, dentro de um Estado
denunciam a intolerância quando
que deveria ser laico, a gente não
é exposto qualquer símbolo da
encontra isso quando a gente fala
religiosidade de matriz africana.
de religiões de matriz africana. Os
registros que se tem no Centro
Questionário, Professor
de Referência, são casos que
estão dialogando diretamente
com pessoas que sofrem a
Os dados coletados, tanto nas questões
ocorrência do racismo tem a ver
abertas do questionário como nas com religiões de matriz africana.
entrevistas, falam de amplo espectro
de violações relacionados à liberdade Entrevista, Gestora estadual
religiosa e que ocorrem em diversos
lugares. Crianças, adolescentes, jovens,
usuários e usuárias de serviços públicos, Diversas vezes presenciei e
colegas de trabalho: os relatos estão na chegou a mim informações
família, na escola, na comunidade, na rede sobre casos de racismo, racismo
de atendimento e nas instituições e nos religioso ou discriminação. […]
órgãos e serviços do sistema de direitos. mas entendo que todos os casos
se tratavam de racismo religioso.
Do ponto de vista conceitual, como
tratado anteriormente, a intolerância Questionário, Professor
religiosa tal como se perpetua no
Brasil é expressão do racismo e, por
isso, fala-se em racismo religioso. Não A informação é relevante quando
por acaso, todos os relatos referentes em análise integrativa com os dados
à intolerância religiosa indicaram as quantitativos, pois rememora-se
religiões afro-brasileiras como o alvo que nem todos que identificaram
de discriminação e ataques. intolerância religiosa a associaram
ao racismo e práticas antirracistas
Apesar disso, dentre todas as respon- como estratégias para enfrentá-la.
dentes e entrevistadas, apenas duas É indispensável que a intolerância
pessoas apresentaram percepções que religiosa seja pautada no bojo

57
3. Dados qualitativos

do racismo, para que agentes e Na escola, o desrespeito e o


profissionais da rede de atendimento e constrangimento que crianças,
de todo sistema de garantia de direitos adolescentes e jovens passam são,
possam partir desta perspectiva e infelizmente, diversos. Além das
incidir de maneira mais efetiva sobre o ocorrências expressas, as quais não
tipo de violência. há dúvida de que a religião foi o fio
condutor do ato discriminatório
Outro dado relevante trata do fato ou preconceituoso, há os casos
de entrevistadas e respondentes, subliminares, bem ao feitio do racismo
elas próprias, terem sido vítimas de à brasileira: o “olhar estranho”, o “ser
intolerância religiosa. Há relatos de deixado de lado” ou “preterido ou
situações ocorridas especialmente no preterida”. Há rejeição de atendimento,
ambiente de trabalho, como escola, recusa de atenção e cuidado, desprezo
aparelho da assistência social, dentre pela vestimenta, negativa de atestado
outros. Um conselheiro tutelar, em razão de participação em cerimônia
candomblecista, narrou a situação: religiosa - interdições explícitas sobre
a violência contra meninos e meninas
de religiões de matriz africana no
Um dia desses eu cheguei para ambiente escolar.
trabalhar e encontrei sal e óleo
na minha sala. Isso para mim
foi o cúmulo do absurdo! Eu,
naquele exato momento, podia Uma criança foi proibida no colégio
ter saído para delegacia, prestado de usar roupa branca na
uma queixa e causado uma sexta-feira, mesmo a mãe pedindo
indisposição maior com todos, autorização, pois a ela tinha se
mas preferi chamar os meus iniciado no candomblé e deveria
pares, fazer uma reunião e dizer usar a cor nas sextas-feiras.
que aquilo que aconteceu foi uma
questão de intolerância religiosa, Questionário, Professora
que eu preciso ser respeitado

Entrevista, Conselheiro tutelar Constantemente, alunos e alunas


adeptos de religiões
de matrizes africanas sofrem
O conselheiro disse que o episódio foi com chacotas de colegas,
único, após ter sido incisivo em reunião professores e funcionários.
do Conselho Tutelar. Não aconteceu
Questionário, Professor
novamente com ela, mas relatou que
presenciou e atendeu casos de meninos
e meninas que sofreram intolerância Aluna perseguida por
religiosa na escola e presenciou colegas e professores porque
falas preconceituosas por outras sua mãe era uma Ialorixá.
conselheiras em relação às religiões de
matriz africana. Questionário, Professora

58
3. Dados qualitativos

Eu, no colégio, uma vez que eu fui Teve uma professora que falou,
de branco, de conta, a professora que me deu o piloto para eu ir
não corrigiu o meu caderno. ao quadro e para eu suspender
Então, eu fiquei com aquilo ali minha cabeça. Eu neguei e ela
na cabeça. Poxa… e no outro tirou um ponto da caderneta,
dia, que eu estava com roupa mas ela falou que não tinha nada
normal, ela corrigiu. Por que no a ver com a minha religião, que
dia anterior ela não corrigiu? Por foi só porque toda vez que um
que eu estava assim? Será que foi aluno rejeitasse a ir à louça ela ou
um ato de racismo? Intolerância adicionava ou tirava um ponto.
religiosa? Ela não gosta? Ah, eu Ela justificou assim.
fiquei muito cabisbaixa, mas
daí em diante eu também não Entrevista, Jovem
liguei mais, porque eu não vou
deixar de ser o que eu sou pelos
outros. Então, eu acho isso muito
desconfortável mesmo. Diversas vezes presenciei e
chegou a mim informações
Entrevista, Jovem sobre casos de racismo, racismo
religioso ou discriminação. Um
dos fatos ocorreu com uma
criança de quatro anos, em uma
Uma aluna compareceu escola de Educação Infantil. A
à escola com a cabeça professora levou a criança ao
raspada e os colegas banheiro e ao perceber que a
“discretamente” se criança tinha uma “umbigueira”,
afastaram dela. elemento do Candomblé, não
mais tocou na criança dizendo
Questionário, Diretor de escola que aquilo era “coisa do diabo”.

Questionário, Professor

Uma aluna recentemente


iniciada no candomblé passou a Os relatos informam que as ocorrências
ser discriminada por um colega de intolerância religiosa não passam
sendo agredida verbalmente despercebidas por membros da
com a utilização de termos como comunidade escolar, ou seja, há
“macumbeira” e “filha do diabo”.
compreensão de que os fatos refletem
As agressões fizeram com que
intolerância, desprezo e desrespeitam
a mãe da estudante procurasse
a escola para denunciar o fato
os direitos humanos.
e exigir a tomada medidas para
conter o agressor. Aos históricos artifícios de demonização
(relacionar as religiões de matriz
Questionário, Professora africana ao diabo) se adicionam práticas

59
3. Dados qualitativos

de “ridicularização”, “desaprovação”, Educação, ao Conselho Tutelar e ao


“deboche”, a “chacota” ou a “zombaria” Ministério Público da cidade apoio
cometidas não apenas por estudantes para garantir a permanência do
- colegas no ambiente escolar -, mas aluno e aproveitamos o problema e
desenvolvemos na escola um projeto
similarmente por pelos demais membros
sobre respeito às diversidades.
da comunidade escolar e familiares.
Entrevista, Diretora de escola
Como abordado anteriormente, a
demonização das religiões de matriz
africana e a desumanização de meninos Acionar outros agentes e órgãos do
e meninas adeptos dessas religiões sistema de garantia de direitos é
são expressões do racismo. Violam a excelente estratégia, pois fortalece
proteção integral, o direito fundamental tanto a escola como o próprio sistema,
à liberdade, ao respeito e à dignidade mas fica outro questionamento: foi
e à educação, assim como impactam realizado algum projeto em razão da
negativamente na convivência e na situação-problema? Ações pedagógicas
socialização na escola. e o projeto político pedagógico (PPP)
foram reorganizados com base na Lei
A pergunta que fica é: se são situações tão nº 10.639/2003 e nos instrumentos
facilmente percebidas como intolerância normativos correlatos? Situações como
religiosa pela peculiaridade do contexto, as relatadas acima são disparadoras de
o que a escola faz para intervir sobre as discussões necessárias no ambiente
ocorrências? Certamente não é possível escolar, mas ações pedagógicas de
responder à pergunta nesta pesquisa, combate às discriminações devem ser
pois exige estudo específico para tal. constantes e precisam compor o projeto
Entretanto, os dados informam que na de ensino-aprendizagem das escolas.
maioria das situações é a sensibilidade
pontual e a atuação individualizada
(similar ao que apareceu nas situações
relacionados à LGBTQIA+fobia) que faz a
diferença em determinados contextos.
Educação para as
relações étnico-raciais
Alguns pediram para uma aluna
tirar o turbante que ela usava e
não permiti que o fizessem. Os critérios e as referências para
elaboração, avaliação e/ou reformulação
Questionário, Professora de ações pedagógicas nas instituições
escolares para a educação para as
relações étnico-raciais estão nas
Um adolescente foi iniciado no Diretrizes Curriculares para a Educação
Candomblé e retornou para Escola, das Relações Étnico-Raciais e para
vestindo branco e com suas contas o Ensino de História e Cultura Afro-
e os colegas não queriam ficar na Brasileira e Africana, instituída por
mesma sala que ele. Ao passar por meio do Parecer nº 03, de 10 de março
ele faziam o sinal da cruz e por de 2004 e nas Diretrizes Curriculares
fim algumas mães fizeram abaixo Nacionais para a Educação das Relações
assinado para que o aluno fosse Étnico-Raciais e para o Ensino de
transferido. Solicitei a Secretaria de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana, instituída pela Resolução nº
01, de 17 de junho de 2004, ambas do
Conselho Nacional de Educação (CNE).

60
3. Dados qualitativos

religioso nas escolas, não raro são


percebidos como bullying.

Situações diversas foram apresentadas


3.6 NÃO É !
como bullying em contextos como:
insultos à adolescente em
[...] muitas das coisas que eu transição de gênero que deseja
presenciei, vivenciei durante a ser reconhecida pelo nome social;
minha infância na escola, que
era disfarçada de brincadeira, ofensas em razão do uso de
de coisa diferente, eu só vim ter adereço ou indumentária típica de
noção depois da universidade, religiões de matriz africana na escola;
desse ambiente você começa a
analisar o quanto o racismo ele xingamentos contra
pode ser cruel sobre crianças, menino com trejeitos afeminados;
mas tanto na comunidade, que
eu sou formado em técnico em
ofensas e agressões verbais por
agropecuária, depois que eu
terminei que comecei a lidar com
conta do cabelo e da cor da pele.
a comunidade, como professor
de banca, por várias vezes eu
A gente tem muitos casos
presenciei, por exemplo, na
também com saúde mental
escola, os meus estudantes
abalada, por isso, a gente já tem
falarem: “Tio, aconteceu isso
uma década discutindo bullying
e isso lá na escola, a menina
e ele continua acontecendo no
brincou com meu cabelo”, e
espaço da escola, mesmo tendo
eu chegar e alertar para mãe,
lei, mesmo tendo movimento. A
“Mãe, isso aí não é brincadeira,
criança que muitas vezes vai com
isso é racismo, e aí, você precisa
a indumentária da sua religião
entender sobre isso.
e é motivo de bullying, fica o
diferente no espaço, e se aquele
Entrevista, Jovem
espaço não é um espaço de
discussão, se sua família também
disse que aquilo é do demônio,
Distintas agentes e profissionais, que aquilo é ruim, é difícil para
especialmente aquelas que um indivíduo entender que não é.
lidam diretamente com crianças,
Entrevista,
adolescentes e jovens, consideraram
Coordenadora pedagógica
discriminação racial (inclusive religiosa)
e LGBTQIA+fobia como intimidação
sistemática. Relatos como aqueles Um dos impactos maiores que
apresentados no tópico anterior, existem, que leva as crianças e
que denunciam práticas de racismo adolescentes a, futuramente,

61
3. Dados qualitativos

entrarem na prostituição, é Estudos anteriores identificaram


justamente esse preconceito dentro associação similar, especialmente no
da Unidade Escolar, o bullying ambiente escolar e de socialização
atrelado à LGBTfobia. Então, muitas da juventude negra (MATTOS, 2013;
adolescentes trans elas não chegam
SOLIDADE, 2017). Contudo, embora
a concluir ensino médio
configure violência, bullying não é crime
Entrevista, Liderança LGBTQIA+
e não pode ser confundido com práticas
sexistas e racistas, independente do
contexto e da modalidade.

Nem todas as respondentes ou Em razão de sua natureza, o bullying


entrevistadas que citaram práticas ocorre nas relações interpessoais,
discriminatórias contra crianças, pode ser caracterizado como
adolescentes e jovens baseadas na raça, fenômeno psicológico e desvio de
no gênero, na identidade ou orientação comportamento, no qual toda criança
sexual ou pertencimento religioso se ou adolescente pode sofrer ou praticar
referiram ao bullying. Porém, todas (SOUZA, 2016). Mas, ao reduzir matrizes
que fizeram referência ao bullying de opressão estruturais, tais como
trataram a intimidação sistemática em gênero e raça ao bullying, corre-se o
associação às práticas racistas, sexistas risco de banalizar e esvaziar de sentido
e de intolerância religiosa. o peso que a discriminação racial, de
gênero e sexualidade e o desrespeito
à liberdade religiosa têm nas relações
desiguais de poder na nossa sociedade
e que motivam situações de violência.
De diversas formas e modalidades,
racismo e sexismo afetam a saúde
física e mental e matam crianças,
É palavra de origem inglesa que adolescentes e jovens no Brasil.
significa a prática repetida e
intencional de agressões verbais,
O entendimento parte dos resultados
psicológicas e até mesmo físicas,
que intimidam, constrangem e
do trabalho organizado por Hédio Silva
humilham. O bullying é motivado Júnior e Danilo Teixeira (2016) que tratou
pela percepção e desqualificação discriminação racial como maus-tratos.
das diferenças. Para a lei Defende-se que a prática reiterada e
brasileira, bullying não é crime, intencional de discriminação baseada
mas é considerado violência em raça, quer em virtude da cor, estética,
psicológica (art. 4º, inciso II, alínea nos aspectos culturais ou religiosos,
“a”, Lei nº 13.431/2017). É preciso bem como no gênero e na expressão
atenção, pois determinadas ações da sexualidade, são modalidades de
praticadas como bullying podem violência praticadas contra crianças,
ser caracterizadas como crime, a adolescentes e jovens que podem ser
exemplo de injúria, lesão corporal, caracterizadas como maus-tratos ou
incitação à automutilação ou ao
mesmo tortura (ver art. 232, ECA e art.
suicídio etc. Comumente difundido
no ambiente escolar, deve ser
1º, inciso I, alínea “c”, Lei nº 9.455, de 7 de
também nesse espaço que ações abril de 1997).
de prevenção e enfrentamento ao
bullying devem ser privilegiadas.

62
3. Dados qualitativos

Para tanto, tem-se duas dimensões


que se complementam: 1) a prevenção
e o combate ao bullying e a construção
de cultura de paz nos ambientes de 3.7 VIOLÊNCIAS CONTRA
socialização da infância e da juventude,
nos quais preserva-se o respeito, o MENINAS E MULHERES
diálogo e investe-se em técnicas de
mediação de conflitos; e 2) a atuação Eu sempre digo que o Conselho
das pessoas responsáveis envolvidas Tutelar é a UPA [Unidade de
no contexto, especialmente se agentes Pronto Atendimento], é onde
públicos, uma vez que a omissão recebe todo tipo de demanda:
no caso de suspeita ou violação de demanda de criança, adolescente,
direitos de crianças e adolescentes até demanda de gente adulta. Eu
pode caracterizar crime ou infração tenho recebido diversas demandas
administrativa, a depender do cargo ou nessa pandemia, de mulheres
função (art. 232 e art. 245, ECA). sendo agredidas fisicamente e
sexualmente pelos seus maridos,
mulheres sendo estupradas...

Entrevista, Conselheiro tutelar

Programa de O levantamento das principais violências


combate ao praticadas contra crianças, adolescentes
e jovens em Salvador e nos municípios
do Recôncavo Baiano que integram a
A Lei nº 13.185, de 6 de novembro pesquisa revelou que, com exceção da
de 2015, instituiu o Programa de violência letal que vitima a juventude
Combate à Intimidação Sistemática
masculina negra, em média as meninas
(Bullying), que deve fundamentar as
são maioria das vítimas de abandono e
ações da Educação em todos os níveis.
Constitui os objetivos do programa, violências sexual, física e psicológica.
dentre outros: prevenir e combater o A maioria absoluta é negra (INSTITUTO
bullying em toda a sociedade; capacitar ALIANÇA, 2021)8.
docentes e equipes pedagógicas
para a implementação das ações de
discussão, prevenção, orientação 8
Não foi objetivo desta pesquisa identificar
e solução do problema; e evitar,
aspectos relacionados ao contexto da pandemia
tanto quanto possível, a punição dos provocada pelo novo coronavírus. Entretanto,
agressores, privilegiando mecanismos não se pode deixar de mencionar que, assim como
e instrumentos alternativos que a epígrafe sugere, o isolamento social adotado
promovam a efetiva responsabilização e no enfrentamento da pandemia da Covid-19
a mudança de comportamento hostil. modificou rotinas e intensificou a violência
contra as mulheres e crianças e adolescentes
(FBSP, 2021; MARQUES et al., 2020).

63
3. Dados qualitativos

Um dos resultados do dado é a Infelizmente são inúmeros os


tendência de mais meninas chegarem relatos de estudantes que sofrem
ao atendimento dos serviços e órgãos diversos tipos de violência
que compõem a rede de atendimento e por serem mulher. Uma delas
relatou chorando que a mãe era
o sistema de garantia de direitos. Como
frequentemente espancada pelo
exemplo, dos casos que ingressaram
padrasto e que ela vivia com
no serviço de Proteção e Atendimento medo de passar a ser também
Especializado a Famílias e Indivíduos espancada por ele.
(PAEFI) no último ano na cidade de
Salvador, a maioria são meninas Questionário, Professora
cujo atendimento foi motivado por
negligência ou abandono, seguido de
violência intrafamiliar e violência sexual Poucos, mas relatos densos. O principal
(INSTITUTO ALIANÇA, 2021)9. sentido extraído das menções é a
identificaçãodaviolênciacontramulheres
No geral, houve pouca menção e meninas vinculada à estrutura que
à violência doméstica e familiar organiza as relações familiares. Todavia,
contra mulheres e meninas, surgida o fenômeno precisa ser compreendido
apenas nas questões relacionadas na interseção gênero e raça, pois a
ao sexismo. Nas entrevistas, foram violência doméstica e familiar contra
feitos apontamentos somente por mulheres e meninas é uma dimensão
coordenadoras de CRAS e de Centros da violência de gênero impactada pelo
de Referência Especializados de racismo (CARNEIRO, 2002; 2011; CURIEL,
Assistência Social (CREAS), com 2013; GONZALEZ, 2018).
exceção de uma liderança quilombola
que relatou sua experiência pessoal de Na Bahia, entre 2017 e 2020, 90%
mulher vítima de violência doméstica. das vítimas de feminicídio foram
Na questão aberta do questionário, mulheres negras e, no mesmo período,
houve poucos relatos e todos os identificou-se redução do feminicídio
casos mencionados foram agressões entre mulheres brancas (SANTANA et
cometidas por homens, pais ou al., 2021). Segundo dados da Secretaria
esposos. Uma professora descreveu: de Segurança Pública do Estado, a
maioria dos feminicídios ocorre no
ambiente doméstico cujos algozes
foram maridos, companheiros, ex-
9
PAEFI é um serviço ofertado obrigatoriamente companheiros ou parentes das vítimas.
nos CREAS, voltado para famílias e indivíduos
que estão em situação de risco social ou tiveram
seus direitos violados, tais como: violência A Bahia tem a 4ª maior população do
física e/ou psicológica, negligência, violência país, mas segundo dados de 2020 do
sexual, adolescentes em cumprimento de Projeto Monitor da Violência, ocupa a
medidas socioeducativas, abandono, vivência
de trabalho infantil, discriminação racial ou por 3ª posição como unidade da federação
orientação sexual, dentre outras. de maior incidência de feminicídio.

64
3. Dados qualitativos

Os dados de violência contra a mulher violência sexual são meninas, sendo que
precisam ser refletidos também a mais de 50% têm menos de 14 anos de
partir da proteção integral, pois há idade que, portanto, configura estupro
consenso na literatura especializada de vulnerável (art. 217-A, Código Penal).
que o feminicídio é o resultado final de
um processo de violências praticadas Ainda sobre a modalidade de violência,
contra as mulheres ao longo da vida uma entrevistada mencionou a
(IPEA, 2020). Nesse sentido, prevenir necessidade de capacitar mães de
violências de quaisquer modalidades crianças para que adquiram habilidades
contra as meninas é incidir sobre o para detectar sinais de violência sexual:
contexto mais amplo do fenômeno da
violência contra a mulher.
A gente vai trabalhar por essa
Outro ponto importante diz respeito questão, porque a gente está
à violência sexual, no geral bastante vendo muito abuso sexual. Então,
assim, a gente quer fazer um
citada pelas pessoas entrevistadas
trabalho em cima disso, para
e respondentes como uma das
que a criança e a família - a mãe
modalidades mais graves e de principalmente, já que a maioria
maior incidência contra crianças é filho de mães solteiras -, para
e adolescentes, especialmente que elas entendam e percebam
meninas. Violência sexual foi tema que a mensagem que as crianças
apareceu em todas as entrevistas de passam. Então, mesmo elas [as
conselheiras tutelares: crianças] sendo ameaçadas,
elas conseguem passar uma
mensagem, só que elas não têm
essa percepção.
[Em relação aos casos de violência
sexual] A cada vinte casos de Entrevista,
meninas, chega um de menino. A Coordenadora de CRAS
grande maioria é de meninas.

Entrevista, Conselheiro tutelar


A elaboração da entrevistada merece
destaque porque foca na família -
na mãe, em especial - o papel de
A percepção dessa e de outras detectar e prevenir a violência sexual,
entrevistadas é coerente com o mas sem citar neste ou noutro
Levantamento das principais violências momento da entrevista outras agentes
praticadas contra crianças, adolescentes ou instituições, como por exemplo,
e jovens em Salvador e no Recôncavo a escola. O sentido de sua percepção
Baiano (2019-2020) (INSTITUTO ALIANÇA, encontra-se com o senso comum e
2021): a maioria absoluta das vítimas de com padrões sexistas de socialização

65
3. Dados qualitativos

das crianças, que responsabiliza Chamou a atenção que apenas uma


exclusivamente as mulheres pelos entrevistada, coordenadora de CRAS
cuidados dos filhos e das filhas. Ainda (não é a mesma pessoa do trecho
que não reproduza a visão deturpada citado em destaque), fez menção
de culpabilização das mulheres e à gravidez na adolescência. Citou
meninas pela violência sofrida, não trabalho que foi realizado por
propõe ativamente uma alteração do serviço oferecido pelo CRAS para
eixo da responsabilização, que tenderá conscientização e reflexão sobre a
a cair sobre as mulheres que, no caso gravidez na adolescência e apontou
das localidades nas quais a pesquisa foi que chegaram a identificar casos
realizada, são na maioria negras. de gravidez em meninas de “13,
14 e até 12 anos”. A entrevistada
A exploração sexual foi identificada considerou a gravidez na adolescência
em dois contextos. O primeiro diz como precocidade (“gravidez
respeito a uma grande obra que não precoce”) e responsável por perda
está mais em atividade. O contexto de oportunidades. Sua percepção se
referido no passado fez com que fosse encontrou com a reprodução do ciclo
implementado um CREAS no município de pobreza e do sexismo, em razão
em questão. Em dias atuais, a gestora da compreensão pelas famílias sobre
municipal entrevistada identificou a naturalidade da gravidez como
diminuição da exploração sexual contra “processo natural da mulher”, pois
meninas e meninos na localidade. para maioria das famílias “é natural
Contudo, uma liderança comunitária a mulher gestar e parir”.
entrevistada do mesmo município
ressaltou que existe transexuais e
travestis adultas na prostituição e
adolescentes na exploração sexual,
em sua maioria negras, que veem “as
Abuso e exploração sexual
calçadas” como “única alternativa”.
Abuso sexual e exploração sexual são
O segundo foi identificado como meio modalidades distintas de violência
de acesso a bens de consumo. As sexual contra crianças e adolescentes.
entrevistadas que citaram a exploração Abuso sexual é toda ação que se utiliza
sexual nesse contexto referiram da criança ou do adolescente para
fins sexuais, seja conjunção carnal ou
ocorrências com adolescentes pobres,
outro ato libidinoso, realizado de modo
sem mencionar raça. Uma coordenadora presencial ou por meio eletrônico, para
de CREAS fez destaque relevante: estimulação sexual do agente ou de
a exploração sexual tem passado terceiros. Exploração sexual comercial
despercebida nas campanhas e nos é caracterizada pelo uso da criança ou
eventos públicos e são poucos os casos do adolescente em atividade sexual
identificados como tal que chegam em troca de remuneração ou qualquer
para atendimento na rede de proteção. outra forma de compensação, de forma
independente ou sob patrocínio, apoio
ou incentivo de terceiro, seja de modo
presencial ou por meio eletrônico
(art. 4º, inciso III, alíneas “a” e “b”, Lei
nº 13.431/2017). Exploração sexual é
considerada uma das piores formas de
trabalho infantil pela Lista TIP.

66
3. Dados qualitativos

Apesar dos relatos de violência e buscar atendimento médico,


sexual e de situações de gravidez sofreu violência:
em meninas com menos de 14 anos
de idade, nenhuma entrevistada Tem um relato que nunca saiu da
ou respondente citou aborto legal. minha cabeça, de uma mulher de
Constata-se que apesar da percepção 35 anos em média que sofreu um
por muitas sobre a gravidade da aborto. Na comunidade, as pessoas
violência sexual e de sua vinculação ao vivem, principalmente, da pesca
sexismo, assim como a compreensão e da mariscagem, e ela sofreu um
da gravidez na adolescência como, aborto justamente no momento
em muitos casos, obstáculos ao que ela estava trabalhando no
manguezal. […] ela teve uma
acesso ao planejamento familiar e
pancada muito forte, porque ela
reprodutivo por meninas, não foram tomou uma queda dentro do
feitas associações ao direito ao aborto. mangue e sentiu aquela dor muito
forte. Conseguiu chegar em casa
Convém suscitar o assunto porque pelas mãos dos outros, só que
o levantamento das principais não deu tempo nem de tomar um
violências praticadas contra crianças, banho para ir pro hospital porque
adolescentes e jovens identificou que, ela estava gritando e perdendo
em média, 0,5% dos nascidos vivos muito sangue. […] Quando chegou
lá [no hospital] as enfermeiras a
no ano de 2020 nos 10 municípios
chamaram de porca, de imunda,
investigados são filhos e filhas de disseram: “você abortou porque
mães com menos de 14 anos de idade você quis”. Ela disse que em um
e, portanto, vítimas de estupro de dos momentos que ela estava para
vulnerável (INSTITUTO ALIANÇA, 2021). fazer o processo de curetagem, ela
estava sentindo muita dor, gritando
Em relação às mulheres adultas, o as- de dor, e uma das enfermeiras ou
sunto aborto foi tratado no âmbito técnicas de enfermagem pegou
do racismo institucional e da violência a maca dela, bateu na parede,
mandando ela calar a boca. […] A
obstétrica. A entrevistada narrou a
outra situação é de outra mulher
angústia de uma mulher de sua comuni-
que ela também foi parir em uma
dade que, ao abortar espontaneamente maternidade, próxima a [cita a
cidade] e lá ela quase perde a
filha dela por falta de assistência.
Inclusive, a filha dela nasceu com

Aborto legal parte da cabeça roxa por conta


desse mau atendimento.

No Brasil, o aborto é permitido nos Entrevista,


casos em que a gravidez é resultado Liderança comunitária
de estupro ou se houver riscos para
saúde da gestante (art. 128, Código
Penal). Em 2012, o STF decidiu que é
permitida a interrupção da gestação
de feto anencéfalo. O direito ao
aborto legal se estende para crianças
e adolescentes, conforme normas
técnicas vigentes da área da saúde.

67
3. Dados qualitativos

A compreensão sobre questões mais


profundas que associam gênero, raça,
violência doméstica e direitos sexuais
e reprodutivos veio da entrevista de 3.8 COMUNIDADES
mulheres negras que são lideranças QUILOMBOLAS
comunitárias. Mais uma vez enfatiza-
se a força da vivência e do lugar de
fala para apreensão das dimensões Não devemos dar um passo para trás
das violências praticadas contra porque não estamos pedindo favor,
mulheres que nos municípios nos estamos atrás do que é direito nosso.
quais a pesquisa foi realizada, são
mulheres negras. Especificamente Entrevista, Liderança comunitária
sobre o acesso à saúde sexual, não
se pode desconsiderar que o racismo
afeta a experiência reprodutiva, A incidência das questões relacionadas
produz estigmas sobre o aborto e às comunidades quilombolas se
cria barreiras para atendimentos encontram diretamente com o racismo.
humanizados (GOES, 2018). A percepção de agentes, profissionais
e gestoras quando associadas às
Os resultados apresentados neste comunidades remanescentes de
tópico reforçam que a realidade social quilombos indicam que, se no geral,
concreta a qual está sujeita muitas pessoas negras estão sujeitas ao
racismo, quilombolas estão ainda mais
das meninas negras dos municípios
suscetíveis à discriminação racial.
investigados impele que agentes e
profissionais que atuam na rede e
A percepção é importante porque
em todo sistema de garantia de
agrega território e identidade
direitos tenham habilidades e
quilombola como elementos para a
competências para compreender as compreensão da interseccionalidade,
especificidades da interseção entre considerando-os como eixos para a
gênero e raça nos atendimentos e nas conformação de multidiscriminações,
intervenções técnicas. exatamente como refletido por
Elionice Sacramento (2019). Isso
quer dizer que a interseccionalidade
entre raça e território compreende
a identidade territorial do quilombo
como um espaço político de identidade
(SACRAMENTO, 2019).

Jovens, membros de comunidades


quilombolas e lideranças comunitárias
trouxeram diversos contextos de
racismo, no mesmo espectro da
concepção interseccional acima, nos
quais não separam do racismo que
sofrem, o pertencimento territorial e

68
3. Dados qualitativos

identitário quilombola. Os relatos falam […] é muita pressão por parte de


de estigmatizações e desumanizações, fazendeiros por conta das disputas
passam por situações aparentemente de terra e eles não aceitam que o
simples como um comprovante de processo está andando. Inclusive,
têm muitos casos de violência
residência e chegam até o desemprego
por parte desses fazendeiros. A
e ameaças:
gente encara como violência, mas
também como racismo e o racismo
Me pediram o comprovante de estrutural, porque desde quando me
residência e eu expliquei: “não conheço por gente e passei a estudar
tenho, porque eu moro em um pouco a questão do racismo, a
comunidade quilombola”. Alguns gente passa entender o quanto essas
lugares aceitavam, mas em outros práticas racistas vêm no sentido
não. […] Teve uma vez que eu fui mesmo de nos violentar.
fazer uma conta bancária em um
banco, mas para poder fazer eu Entrevista, Liderança comunitária
tive que dar o endereço de outro
lugar, porque não aceitava o daqui.
Aí eu tive que pegar o endereço do
meu tio que mora em outro bairro [Em referência a edital para um
aqui em [cita a cidade] para poder trabalho na comunidade que
fazer uma conta. contemplava exigências difíceis
de serem cumpridas por jovens da
Entrevista, Jovem comunidade] A questão é que o edital
dizia que tinha que ter habilitação e
os meninos daqui não têm. O meu
ponto de vista era o quê? Era que
Moro em uma comunidade isso tinha que ser debatido, porque
quilombola, minha prima mora se o projeto é para a comunidade
na mesma comunidade que eu, quilombola tem que ver o histórico
porém estudava em uma escola da comunidade. A gente sabe que
fora da comunidade, ela contou os meninos não têm curso de
que uma professora disse que informática, não têm habilitação,
as pessoas daquela comunidade mas têm que dar um jeito para que
fediam e eram sujas. ele se adeque ao que está pedindo no
edital e a vaga fique para eles.
Questionário, Professora
Entrevista, Liderança comunitária

Na escola alunos quilombolas


serem tachados descendentes As questões relacionadas às condições
de escravos por serem socioeconômicas e de empregabilidade
pertencentes oriundos das foram reincidentes. O racismo dirigido
comunidades quilombolas. às comunidades quilombolas criam
impedimentos reais para o acesso aos
Questionário, Assistente social direitos sociais e ao pleno exercício

69
3. Dados qualitativos

da cidadania, apesar da proteção legal em relação às políticas de permanên-


e normativa e de políticas públicas cia estudantil, por vezes insuficientes
específicas, a exemplo da Agenda Social frente às tantas adversidades enfren-
Quilombola, desenvolvida no âmbito do tadas para manutenção nos cursos
Programa Brasil Quilombola (Decreto nº de graduação. Não se pode perder de
6.261, de 20 de novembro de 2007). O que vista que a política de acesso ao ensino
se vê, porém, é a inclusão simbólica das superior deve combinar ações institu-
comunidades quilombolas nas políticas cionais e governamentais de efetiva
públicas, mas sem aporte orçamentário permanência, bem como de enfren-
para o desenvolvimento de ações tamento ao racismo institucional (FI-
efetivas (TEIXEIRA; SAMPAIO, 2019). GUEIREDO, 2021; SANTOS, 2018).

Apesar disso, entre lideranças Mas, apesar da inserção no ensino


comunitárias e membros de superior ter aumentado significati-
comunidades quilombolas, jovens ou vamente, ainda são poucas as opor-
não, houve destaque à importância tunidades de trabalho para membros
do reconhecimento institucional do de comunidades quilombolas, não
território remanescente de quilombo raro em proveito dos de “de fora” em
por meio da certificação da Fundação detrimento da mão de obra local.
Cultural Palmares. O sentido é que, em
alguma medida, a certificação protege Outro dado relevante diz respeito à im-
e dá segurança à comunidade e garante portância dos conselhos, associações e
acesso a políticas públicas, em especial espaços coletivos de representação das
no bojo das ações afirmativas. Uma comunidades quilombolas, exaltados
liderança comunitária, inclusive, relatou pelas entrevistadas como fundamentais
que os casos explícitos de racismo para conquista de direitos e para organi-
contra membros da comunidade zação da resistência da comunidade.
reduziram depois da certificação.
Ponto fundamental de discussão e
Entretanto, houve também referências que, de alguma maneira, tem a ver com
de pessoas que tentam se beneficiar muito do que já foi abordado neste
de políticas dirigidas às comunidades texto, se relaciona com a valorização
quilombolas sem pertencer e ter da cultura e da história do povo negro
identidade quilombola. Lideranças no Brasil e da memória quilombola.
entrevistadas falaram de vigilância Lembra-se que estes são elementos
constante que exercem para que esse essenciais para o procedimento
tipo de prática não ocorra. de identificação, reconhecimento,
delimitação, demarcação e
O acesso ao ensino superior foi titulação das terras ocupadas por
citado algumas vezes, assim como a remanescentes das comunidades dos
importância da Universidade Federal quilombos, conforme o Decreto nº
do Recôncavo da Bahia (UFRB), que 4.887, de 20 de novembro de 2003.
recebe significativo número de estu- Um jovem entrevistado dá sentido ao
dantes quilombolas, apesar das críticas que isso significa:

70
3. Dados qualitativos

Esse é um assunto que eu gosto a pretensão é que os resultados da


muito de falar, gosto muito de pesquisa possam servir de ponte para
história e eu acho que sem a nossa que o poder público e a comunidade
memória a gente não vai conseguir
possam, juntos, criar estratégias para
construir uma consciência. A
gente não vai conseguir, o negro
incidir sobre o racismo, sexismo e a
não vai conseguir construir a intolerância religiosa.
consciência racial dele sem saber
o antepassado dele, sem saber a Neste tópico, não se pode deixar de
história, sem ter uma memória. citar a Resolução nº 181, de 10 de no-
Eu acho isso muito importante e vembro do 2016 do Conselho Nacional
isso a gente não teve no colégio, dos Direitos da Criança e do Adoles-
eu não tive no colégio e eu acho cente (CONANDA), que dispõe sobre
extremamente importante.
os parâmetros para interpretação dos
Eu acredito muito na força dos
direitos e adequação dos serviços re-
símbolos, da força que os símbolos
trazem consigo, eu acho que lacionados ao atendimento de crianças
referência, você ter conhecimento e adolescentes pertencentes a povos
da sua história, isso te dá um e comunidades tradicionais. A resolu-
aporte muito grande, isso te deixa ção orienta a observância do respeito
muito mais confiante, saber quem à cultura das comunidades tradicio-
você é e quem você pode ser. Eu nais com parâmetros para atuação do
acho que isso falta muito. sistema de garantia de direitos e orga-
nização das políticas intersetoriais.
Entrevista, Jovem

O questionamento da identidade qui-


lombola e as violações de direitos
Na análise das entrevistas, ficou humanos enfrentadas por comunida-
evidente a existência de conflitos e des quilombolas não são poucas. Na
tensões entre o executivo municipal Bahia, o Quilombo Rio dos Macacos
e as comunidades quilombolas. condensa e expressa o extenso cená-
Surgiu denúncias de violações de rio de violações, possível somente em
direito, de violência simbólica e um Estado racial10. Não é algo novo,
racismo institucional praticado tampouco alcançarão lugar de fala
contra comunidades quilombolas. nesta pesquisa.
Inclusive, é uma das principais razões
para o excesso de zelo na escrita do
relatório em relação à identificação de 10
Parte da literatura especializada entende que
quaisquer pessoas. há diferença entre Estado racial e Estado racista.
Exemplo de Estado racista é a África do Sul durante
Como pesquisa de percepção que o apartheid ou os Estados Unidos da América na
Era Jim Crow. O Estado racial é característico de
pretende qualificar a atuação do muitos Estados democráticos contemporâneos,
sistema de garantia de direitos e a que apesar de preverem a igualdade formal, não
implementação da Lei nº 13.431/2017, criam ou implementam políticas e mecanismos
efetivos de combate ao racismo, além de
não há qualquer interesse em reproduzirem o racismo institucional (GOLDBERG,
acirramento de conflitos. Longe disso, 2002 apud FIGUEIREDO; ARRUDA; ARAÚJO, 2021).

71
3. Dados qualitativos

Justamente por isso, remete-se ao Segundo a Resolução nº 113, de 19 de


estudo de Elionice Sacramento (2019), abril de 2006, do CONANDA, o sistema
que apresenta as sistemáticas ameaças de garantia de direitos se constitui na
à existência do território quilombola ao articulação e integração das instâncias
mesmo tempo que desvela a potência públicas governamentais e da sociedade
da resistência e do protagonismo das civil, na aplicação de instrumentos
mulheres negras, pois, parafraseando normativos e no funcionamento dos
Jurema Werneck (2009), são esses os mecanismos de promoção, defesa e
passos que vêm de longe. controle para a efetivação dos direitos
humanos da criança e do adolescente
em todos os níveis e instâncias. O
sistema de garantia de direitos possui
três eixos estratégicos de atuação,
que devem funcionar em sincronia e
3.9 ÓRGÃOS E SERVIÇOS constante articulação:
promoção: caracterizado pela
DO SISTEMA DE GARANTIA
política de atendimento no
DE DIREITOS âmbito dos direitos da criança
e do adolescente e composto
Vai por onde eu te disse mesmo, principalmente por serviços e
a gente pode se sentir preparada, aparelhos da assistência social,
mas não de forma ampla, não programas e comunidades de
plenamente como deveria ser, atendimento socioeducativo,
porque um profissional de saúde instituições de acolhimento
ele precisa saber pegar uma veia,
institucional, escolas, hospitais etc.;
ele não pode ficar sem saber
se sabe ou não sabe, tem que
saber. Eu acredito que são temas controle: caracterizado pelo controle
[racismo, sexismo e intolerância social das ações públicas de promoção
religiosa] importantes, de uma e defesa dos direitos humanos de
relevância tamanha, que a gente crianças e adolescentes, por meio
precisa estar seguro que está de conselhos de direito de todos os
fazendo, a gente não pode sair níveis, órgãos e poderes de controle
fazendo de qualquer jeito e a gente interno e externo e, soberanamente,
não tem formação suficiente para
pela sociedade civil;
agir com essa segurança. Então,
eu daria uma resposta de meio-
termo se eu pudesse, eu me sinto defesa: caracterizado pela garantia
preparada para receber, identificar do acesso à justiça e composto
e atuar? Parcialmente. especialmente pelas instâncias
judiciais, Ministério Público, Defensoria
Entrevista, Pública, Polícias Judiciária e Militar,
Coordenadora pedagógica Conselho Tutelar, dentre outros.

72
3. Dados qualitativos

A Lei nº 13.431/2017 normatizou e A maioria das religiões ainda tem


organizou o sistema de garantia de muita dificuldade de lidar com isso,
direitos da criança e do adolescente até porque isso que se embasa
muito na questão que tem lá na
vítima ou testemunha de violência e
Bíblia, no Velho Testamento, que o
instituiu mecanismos de prevenção homossexualismo é um pecado.
das violências praticadas contra
crianças e adolescentes. Entrevista, Professora

Os dados coletados indicaram


violações de direito fundados Atualmente, a presidência do
no racismo e no sexismo contra CMDCA [Conselho Municipal
crianças, adolescentes e jovens por dos Direitos da Criança e do
Adolescente – cita a cidade]
profissionais ou agentes do sistema
é ocupada por uma pessoa
de garantia de direitos. Muitos dos
intolerante, que ignora o estado
relatos estão distribuídos ao longo do laico e persegue creches e
relatório, no qual as ocorrências na instituições de matriz africana.
escola mereceram destaque. Ainda,
vale retomar os dados quantitativos, Questionário, Assistente social e
nos quais em média, 51% afirmou conselheiro de direito
ter identificado ou sido informado
de casos de racismo, sexismo e
intolerância religiosa praticados É assustadoramente frequente,
atualmente, e me espanta ver
contra o segmento infantojuvenil.
poucas ações de combate a isso.
Infelizmente, o fanatismo religioso
A leitura que as entrevistadas e adentrou às escolas também
respondentes fazem sobre parte através de professores e gestores,
dessas ocorrências associam con- e fica muito difícil lutar sozinhos
servadorismo e religião. Considerá- contra a força e articulação dos
vel número de participantes atrelou evangélicos que têm como algo
o pertencimento a religiões evan- normal de sua prática religiosa
gélicas como motivador de práticas atentar contra outras religiões e
demonizá-las, sobretudo as de
sexistas e de racismo religioso.
matriz africana.

Questionário, Professor
Essa questão do conservadorismo
é muito séria das religiões
evangélicas. Eles acham que [...] O que eu vivencio na prática
teria uma cura para pessoa que é é que eles estão o tempo todo
gay, que fala que deus vai curar, criticando até expressões que
que deus vai transformar. Então, a gente usa no nosso cotidiano.
é assim: negam que aquilo é Geralmente, quando tem um
possibilidade porque não aceitam. evangélico, ele sempre reage a
[…] Mas não é só evangélico não, o outras pessoas que são dessas
católico também tem muito forte. religiões de matriz africana.

Entrevista,
Subsecretária de Assistência Social

73
3. Dados qualitativos

[...] Eu vou te falar um exemplo religiões evangélicas, são apontados


prático, não foi a pessoa que como sujeitos de discursos e
chegou diretamente para mim práticas que criam óbice à discussão
para falar, foi uma outra pessoa.
e mudança institucional de temas
A respeito do projeto de vocês
[Projeto Àwúre], uma pessoa
relacionados à diversidade sexual e à
que é evangélica disse que não ia liberdade religiosa.
participar da capacitação porque
o projeto “só fala dos êres” [em Especificamente sobre o racismo, a
franca confusão entre as palavras polícia foi o órgão citado de modo
àwúre e erê]. [...] Você percebe que recorrente, tanto em relação às
é uma pessoa que não consegue abordagens policiais e a construção
nem distinguir uma coisa da outra. do suspeito, como em relação ao
[…] Se é algo que vai acontecer
assassinato de jovens negros. A
e contribuir no processo de
percepção das participantes da
trabalho dela, por que ela vai
deixar essa questão da religião pesquisa vai ao encontro do que
afetar isso? Se é uma capacitação o levantamento dos dados sobre
para o dia a dia profissional dela? violência apontou e de demais
Eu estou te dando um exemplo pesquisas sobre racismo e letalidade
prático em relação a isso, mas juvenil (INSTITUTO ALIANÇA, 2021;
a gente percebe o tempo todo IPEA, 2020; REDE DE OBSERVATÓRIOS
na comunidade. É um tal de “ah, DA SEGURANÇA, 2020).
Deus é mais, tá repreendido!”.
Esse “tá repreendido” já é uma
A violência policial é dirigida à popu-
palavra de gatilho mesmo, porque
quando você fala isso, você está
lação negra, sobretudo, aos jovens
demonizando a questão da religião, negros, pois o racismo é a mola pro-
e eu percebo que isso é algo pulsora da necropolítica (MBEMBE,
vivenciado realmente por 2016). A taxa de homicídio de jovens
crianças no município que são de negros é cinco vezes maior que a de
religiões de matriz africana. jovens brancos, sendo o racismo a úni-
ca justificativa para índices tão discre-
Entrevista, pantes (IPEA, 2020; REDE DE OBSER-
Secretária de Assistência Social
VATÓRIOS DA SEGURANÇA, 2020).

Na Bahia, estado em que, segundo


Os relatos apareceram na escola, dados do IBGE, 76,5% das pessoas são
nos conselhos tutelares, em serviços negras, aproximadamente 97% das
e aparelhos da assistência social e mortes decorrentes da intervenção
em referência aos cargos de gestão, policial no ano de 2019 são de pessoas
nos quais cristãos e cristãs, mas negras (REDE DE OBSERVATÓRIOS DA
especialmente se pertencentes às SEGURANÇA, 2020).

74
3. Dados qualitativos

[...] o que a gente aprende da [...] acho que [a violência policial]


doutrina escrita é que para a gente é uma questão muito dura. A
fazer uma abordagem, a gente tem corporação da polícia precisa se
que ter fundada a suspeita, tem reeducar quanto a isso, quanto
que ter uma suspeição, a suspeição a essas práticas que ela tem.
ela tem que ser real, tem que ter Isso acabou virando, realmente,
uma base, inclusive, tem que ser uma política de extermínio e
provado. Mas, quando a gente vai que é endossado pelos nossos
para realidade, não funciona assim. A governantes em um ponto extremo.
gente vai abordar a partir de outros
estereótipos, como a cor da pele, Entrevista, Jovem
ou a roupa… principalmente, roupa,
trejeito, corte de cabelo, são essas
questões que normalmente vão Para os policiais é assim: é um jovem
influenciar uma abordagem que vai negro, é da favela? É traficante! […]
dizer se é um indivíduo suspeito ou não pode ser assim, eles também
não. Então, pode estar meia noite têm que entender que os pretos são
na rua, se for um jovem branco a trabalhadores, na favela também
gente não vai se preocupar, a gente mora pai de família. Um dia desses
enquanto instituição, a gente vai eu estava descendo aqui na minha
se preocupar: “pô, tá perdido, o rua e aí desceu dois caras negros em
que que tá acontecendo, a gente uma moto e um outro branco em
pode ligar para sua família?”. Mas outra moto. O policial que estava
se for um jovem negro que tiver na dentro do carro fazendo a curva,
mesma situação provavelmente o voltou e botou a arma na cabeça
policial vai iniciar uma abordagem. do rapaz, só porque ele estava sem
Essa diferença é gritante e, muitas camisa e era preto. Ele não tinha
vezes, a gente procura meio que o que fazer, revistou tudo, aquele
se desculpar por isso, procura constrangimento, porque, tipo
justificativas: “ah, porque a maioria assim, por que ele parou só os pretos
das pessoas que realmente e deixou o branco passar?
cometem delitos são pessoas desse
tipo, então, baseado nesse histórico Entrevista, Jovem
aqui que eu tenho nessas fotos do
meu WhatsApp, eu vou abordar
essas pessoas”. Mas na verdade você […] é uma polícia que tem agido nessa
vai estar julgando outras pessoas perspectiva mesmo de “bandido
que não têm nada a ver, que a única bom é bandido morto”. A política
culpa foi ter nascido onde nasceram, que se criou, que se estabeleceu a
do jeito que nasceram, com a nível nacional, se é alguém preto, é
carga que têm, que já têm diversos uma preta que está envolvida lá, ou
problemas, que já sofreram diversas é criança, mesmo que seja de menor,
abordagens, mas aí vai e faz desse como já aconteceu, a gente já teve
jeito e não é a questão da suspeita. várias pessoas da juventude que era
da comunidade [que sofreu violência
Entrevista, Policial militar policial]. Não só lá da comunidade,

75
3. Dados qualitativos

mas no próprio município. A gente


está vendo isso o tempo todo no
próprio estado da Bahia, que é
uma polícia - que é uma política,
Branquitude
na verdade - não é a polícia, é uma
política que quem está vestindo ali a Diz respeito ao lugar ocupado por
farda está representando o Estado pessoas brancas nas relações raciais.
que na sua estrutura é racista. Em uma sociedade estruturalmente
racista como a nossa, ser branco
Entrevista, Liderança comunitária ou branca significa não pensar em
raça e não se enxergar enquanto
sujeito racializado. Justamente por
As percepções dão conta de questões isso, a raça se torna algo consciente
fundamentais para o tema e para o apenas para população negra,
funcionamento do sistema de garantia que é alcançada pelo racismo. A
de direitos. Primeiro, a compreensão branquitude permite que pessoas
de que não são ações individuais brancas sejam beneficiadas,
mesmo inconscientemente, com
tampouco casos isolados, mas se
determinados privilégios sociais,
tratam de situações que expressam como: não serem vistas como
o racismo estrutural, que por sua vez “suspeitas” nos espaços públicos;
orienta e organiza o Estado, que dirige serem preferidas em processos
a força de seu braço armado para a seletivos; ocuparem a maioria em
população negra. postos de chefia e comando no
mercado de trabalho; dentre tantos
A identificação de que se trata de uma outros (BENTO, 2002).
política de Estado e não apenas da polícia
como órgão do Estado, revela o sentido
atribuído pelas entrevistadas. Essa
percepção é relevante porque se dirige
não apenas à polícia, mas ao próprio Foram identificados relatos
Estado e, portanto, aos seus demais relacionados à população LGBTQIA+,
órgãos, sistemas e poderes. cuja incidência significativa pairou
sobre o embaraço para atendimentos
O outro lado da percepção - que não se em serviços públicos, bem como a
opõe à primeira, muito pelo contrário negativa do uso do nome social, direito
- está associada aos privilégios garantido na legislação brasileira em
da branquitude. Nas abordagens respeito ao direito constitucional à
policiais, a priori pessoas brancas identidade e à dignidade (Decreto nº
não são consideradas suspeitas. 8.727, de 28 de abril de 2016).
A percepção das entrevistadas
descortina aspectos perversos sobre Igualmente, houve relato de difi-
as vantagens que pessoas brancas têm culdade de atendimento em Dele-
em uma sociedade racializada e que gacia Especializada de Atendimento
contribui para reproduzir cotidiana e à Mulher (DEAM) pelo descrédito e
constantemente o racismo. desconfiança quanto à ocorrência da

76
3. Dados qualitativos

violência doméstica. Esses relatos se da interseção sexismo e racismo em


referiram às pessoas adultas, mas re- retirar atributos de confiabilidade.
forçam tudo o que foi apontado até Em um caso, segundo uma assistente
aqui em relação ao atendimento e às social, uma usuária do CRAS não foi
políticas voltadas para a população vista como confiável por ter muitos
infantojuvenil. filhos; em outro relato, feito por
técnica de enfermagem, a recusa em
Faz-se apenas destaque ao fato de uma DEAM para registrar ocorrência
que, quando sob berlinda, os relatos de violência doméstica sofrida por
se referiram, quase sempre, às uma jovem negra que era usuária de
mulheres negras. Nas situações de substâncias psicoativas. São situações
violação do acesso a direitos e de que deflagram contextos de negação
atendimento digno e humanizado, as da cidadania com fundamento em
participantes percebem as dinâmicas critérios de gênero e raça.

77
4 Palavras
finais e
recomendações
Como eu falei, muitas
vezes a criança que está
no ambiente que sofre
esses tipos de práticas
não tem consciência do
que está sendo praticado,
não tem consciência
nem para se defender,
nem para reagir àquela
prática, muitas vezes vem
se submetendo àquilo
de forma silenciosa e vai,
com certeza, provocando
traumas, transtornos
que vão acompanhando o
desenvolvimento
daquela criança.
Entrevista,
Secretária de Assistência Social

78
4. Palavras finais e recomendações

A pesquisa foi fundamental para expressões da sexualidade, religião


desvelar a urgência do fortalecimento e espiritualidade. Em vista disso, a
de agentes e profissionais do sistema demanda por qualificação reflete a
de garantia de direitos nos temas necessidade de saber o que fazer e
racismo, sexismo e intolerância como fazer para assegurar direitos.
religiosa, principalmente no
atendimento a crianças, adolescentes A alta incidência do reconhecimento e
e jovens. As situações relatadas e da identificação de situações de
a percepção das participantes da racismo, sexismo, LGBTQIA+fobia e
pesquisa são reveladoras sobre a racismo religioso, especialmente nos
urgência do aprofundamento em contextos apresentados nos dados
espaços de capacitações e discussões qualitativos sugerem que, no geral, as
da rede de atendimento. intersecções de gênero e sexualidade
e raça e intolerância religiosa são
Das três categorias e a partir de um percebidas por boa parte daquelas
ponto de vista crítico, intolerância reli- que participaram da pesquisa, ainda
giosa foi a menos compreendida. Cabe que não expressas conceitualmente
refletir no âmbito do sistema de garan- dessa forma.
tia de direitos sobre o caráter sociopo-
lítico do pertencimento religioso e da Em contrapartida, os relatos sugerem
intolerância religiosa como racismo re- pouca intervenção, ainda que os
ligioso, afronta aos direitos humanos e instrumentos legais e normativos
à plenitude da democracia. Intolerância que protegem crianças, adolescentes
religiosa não tem a ver com ética cristã, e jovens e orientam a atuação do
mas com isonomia perante a lei e com a sistema de garantia de direitos
laicidade do Estado. comportem regulação expressa
para a atuação preventiva e para o
Não há mais como desconsiderar encaminhamento de ações de defesa
gênero, raça e classe na interseção e responsabilização. Quer dizer, as
com geração na atuação do violências são identificadas, mas, por
sistema de garantia de direitos. É vezes, nada – ou muito pouco, com
preciso repensar práticas a partir raras exceções - é feito.
da diversidade e da pluralidade
de existências para que crianças, Por conseguinte, possíveis interven-
adolescentes jovens se sintam ções às violações de direito não são
seguros, autoconfiantes, orgulhosos tão facilmente percebidas, a exem-
de si, de sua ancestralidade e história. plo da efetiva implementação da
É preciso repensar práticas para Lei nº 10.639/2003 como estratégia
considerar a experiência de crianças, de enfrentamento ao racismo e ao
adolescentes e jovens também a racismo religioso na escola ou a educa-
partir do pertencimento racial, das ção sexual como prevenção das violên-

79
4. Palavras finais e recomendações

cias sexuais. Sem dúvida, destaca-se a inserir nos formulários


escola tanto como porta de entrada da de prontuários e fichas de
maior parte das violações e violências atendimento a classificação
ao mesmo tempo que, infelizmente, racial baseado no IBGE e
também as reproduz. categorias relacionadas à
identidade de gênero;
Em relação ao grupo de jovens e
lideranças comunitárias, são eles inserir nos formulários
e elas que mais têm a oferecer e a de prontuários e fichas de
ensinar, seja pela potência da reflexão atendimento de instituições e
sobre suas realidades, seja pelo órgãos que registram, coletam ou
protagonismo forjado na resistência. atendem casos de violência contra
São eles e elas que cotidianamente crianças, adolescentes e jovens
são confrontados com ameaças e a possibilidade de identificar
violências às suas identidades e motivação racista, inclusive
existências. Ouvi-los e ouvi-las - mais racismo religioso, ou sexista
e melhor - é, sem dúvida, fundamental da ocorrência;
para a construção de novos caminhos
para a rede de atendimento, pois criar grupos de trabalho
refletir e avançar no enfrentamento intersetoriais e multidisciplinares
de violências como racismo, sexismo com o objetivo de estabelecer
e intolerância religiosa exige respeito encontros periódicos da rede de
às identidades e às subjetividades atendimento e proteção para
e, especialmente, reconhecimento refletir acerca da prática e definir
do lugar social e político daqueles e encaminhamentos de casos com
daquelas que as experienciam (DEI, uso da técnica de estudo de caso;
2008; hooks, 2013; 2015).
criar observatório da violência
Com vistas ao aprimoramento da institucional racista, sexista e
atuação do sistema de garantia de de intolerância religiosa para
direitos, recomenda-se: responsabilização dos casos
elaborar protocolos de registro praticados por agentes públicos;
com detalhamento dos
encaminhamentos em casos de adequar os serviços existentes
racismo, sexismo e intolerância considerando os requisitos
religiosa e de procedimentos indicados na Resolução nº
mínimos de acolhimento e escuta 181/2016 do CONANDA;
de crianças, jovens e adolescentes
envolvidos, baseado nas diretrizes criar, nos CMDCA e no Conselho
em relação à proteção e Estadual dos Direitos da Criança
não-revitimização, nos termos da e do Adolescente, câmara técnica
Lei nº 13.431/2017; ou grupo de trabalho dedicado ao

80
4. Palavras finais e recomendações

estudo e a análise das políticas temas relacionados ao racismo,


públicas e dos programas de sexismo e intolerância religiosa;
governo quanto à garantia e
promoção da igualdade racial, reservar, por meio de lei municipal,
liberdade religiosa e direitos uma vaga no Conselho Tutelar,
sexuais e reprodutivos de em caráter de política de ação
crianças e adolescentes; afirmativa, para membros de
comunidades tradicionais;
realizar ações conjuntas com
os movimentos sociais negro, regulamentar e monitorar
feminista e LGBTQIA+, grupos a implementação da Lei
culturais, coletivos e associações nº 10.639/2003 e da Lei nº
quilombolas, organizações 11.645/2008, observando as
religiosas para discussões nos orientações normativas e
programas, órgãos e serviços diretrizes que as regem com o
da rede de atendimento sobre objetivo de rever formações e
gênero, sexualidade, raça e currículos escolares;
antirracismo e liberdade religiosa;
criar espaços de prevenção,
promover formação continuada acolhimento e fortalecimento
para profissionais e agentes para escuta de crianças,
do sistema de garantia de adolescentes e jovens em relação
direitos com foco nas questões às violências nas diversas políticas
étnico-raciais e de gênero e o públicas e espaços, em especial
agenciamento das lutas feminista, nos CRAS e nas escolas;
antirracista e antimenorista;
promover debate sobre direitos
inserir profissionais oriundos das sexuais e reprodutivos de crianças
comunidades quilombolas nas e adolescentes, bem como
equipes de órgãos e serviços do sobre gênero e sexualidade,
sistema de garantia de direitos; especialmente nas escolas;

estimular a inserção de promover debate sobre


quilombolas na composição diversidade religiosa,
do CMDCA e de outros especialmente nas escolas, com
conselhos setoriais; participação dos movimentos
sociais e grupos religiosos de
inserir na formação prévia modo a contribuir com ações
e posterior a eleição para que visem a superação da
composição do Conselho Tutelar intolerância religiosa.

81
4. Palavras finais e recomendações

Igualmente, é de suma importância crianças e aos adolescentes, é


que secretarias, órgãos e pastas go- oportuno que o enfrentamento às
vernamentais do Estado da Bahia, violações de direitos relacionadas às
tais como: Secretaria de Promoção da categorias abordadas nesta pesquisa
Igualdade Racial, Secretaria de Política seja contemplado no Plano Decenal
para Mulheres, Coordenação de Políti- dos Direitos Humanos de Crianças e
cas LGBT, Coordenação de Políticas de Adolescentes do Estado da Bahia.
Juventude, Coordenação de Proteção
à Criança e do Adolescente, Fundação Por fim, a tarefa posta para a im-
da Criança e do Adolescente, dentre plementação da Lei nº 13.431/2017
outras, formulem ações conjuntas e e a efetiva garantia e promoção dos
integradas de garantia e proteção dos direitos humanos da infância e
direitos humanos de crianças, ado- juventude, é considerar que coibir e
lescentes e jovens que contemplem prevenir violência praticada contra
as dimensões de gênero, sexualidade, crianças, adolescentes e jovens perpas-
raça, diversidade religiosa e território. sa inexoravelmente por considerar gê-
nero, raça, classe e geração como cate-
Especificamente em relação às goriais fundantes das relações sociais.

82
REFERÊNCIAS
ABRAMOVAY, Miriam; CASTRO, Mary Garcia; leisestaduais.com.br/ba/lei-ordinaria-n-
SILVA, Lorena Bernadete. Juventude e 13182-2014-bahia-institui-o-estatuto-
sexualidade. Brasília: UNESCO Brasil, 2004. da-igualdade-racial-e-de-combate-a-
intolerancia-religiosa-do-estado-da-
ALMEIDA, Sílvio Luiz de. Racismo bahia-e-da-outras-providencias. Acesso
estrutural. Edição do Kindle. São Paulo: em: 02 jun. 2021.
Sueli Carneiro; Pólen, 2019. (Coleção
Feminismos Plurais). BAHIA. Decreto nº 20.260, de 02 de março
de 2021. Institui, nos Municípios do Estado
ARRUDA, Jalusa Silva de; KRAHN, Natasha da Bahia, as restrições indicadas, como
Maria W. Juvenile justice and punishment medidas de enfrentamento ao novo
of girls in Brazil: knowledge production coronavírus, causador da COVID-19, e dá
and research perspectives. Oñati Socio- outras providências. Disponível em: http://
Legal Series, v. 10, n. 2, Gipuzkoa, 2020, www.casacivil.ba.gov.br/arquivos/File/
p. 257-290. Disponível em: https:// DECN20260DE02MARCO2021.pdf. Acesso
opo.iisj.net/index.php/osls/article/ em: 02 jun. 2021.
view/1124/1243. Acesso em: 02 jun. 2021.
BECKER, Howard. Métodos de pesquisa em
ARRUDA, Jalusa Silva de. Breve panorama ciências sociais. São Paulo: Hucitec, 1993.
sobre a restrição e privação de liberdade
de adolescentes e jovens no Brasil. O Social BENTO, Maria Aparecida Silva.
em Questão. Ano XXIV, n. 49, jan./abr., 2021, Branqueamento e branquitude no Brasil.
p. 355-382. Disponível em: https://www. Psicologia social do racismo: estudos
maxwell.vrac.puc-rio.br/51140/51140.PDF. sobre branquitude e branqueamento.
Acesso em: 02 jun. 2021. In: CARONE, Iray; BENTO, Maria
Aparecida Silva (org.). Psicologia social
ARRUDA, Jalusa Silva de. “Nos versos me do racismo: estudos sobre branquitude
seguro”: uma etnografia documental e branqueamento. 2. ed. Petrópolis, RJ:
da trajetória de meninas na medida Vozes, 2002. p. 25-57.
socioeducativa de internação.
Tese (Doutorado em Ciências Sociais), BRAGA, Júlio. Na gamela do feitiço:
Universidade Federal da Bahia, repressão e resistência nos Candomblés da
Salvador, 2020. Bahia. Salvador: CEAO/EDUFBA, 1995.

BAHIA. Lei nº 13.182, de 6 de junho de 2014. BRASIL. Conselho Nacional dos Direitos
Institui o Estatuto da Igualdade Racial e da Criança e do Adolescente. Resolução
de Combate à Intolerância Religiosa do nº 113, de 19 de abril de 2006. Disponível
Estado da Bahia. Disponível em: https:// em: https://www.legisweb.com.br/

83
REFERÊNCIAS

legislacao/?id=104402. Acesso em: 02 planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-


jun. 2021. 2010/2007/decreto/d6261.htm. Acesso
em: 08 jun. 2021.
BRASIL. Conselho Nacional dos Direitos
da Criança e do Adolescente. Resolução BRASIL. Decreto nº 6.481, de 12 de junho
nº 181, de 10 de novembro de 2016. de 2008. Regulamenta os artigos 3º, alínea
Disponível em: https://www.gov.br/mdh/ “d”, e 4º da Convenção 182 da Organização
pt-br/acesso-a-informacao/participacao- Internacional do Trabalho (OIT) que
social/conselho-nacional-dos-direitos- trata da proibição das piores formas de
da-crianca-e-do-adolescente-conanda/ trabalho infantil e ação imediata para
resolucoes/resolucao_181.pdf. Acesso em: sua eliminação, aprovada pelo Decreto
02 jun. 2021. Legislativo nº 178, de 14 de dezembro de
1999, e promulgada pelo Decreto nº 3.597,
BRASIL. Constituição da República de 12 de setembro de 2000, e dá outras
dos Estados Unidos do Brasil, de 24 providências. Disponível em: http://www.
de fevereiro de 1891. Disponível em: planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ 2010/2008/decreto/d6481.htm. Acesso
constituicao/constituicao91.htm. Acesso em: 02 jun. 2021.
em: 02 jun. 2021
BRASIL. Decreto nº 8.727, de 28 de abril
BRASIL. Constituição da República de 2016. Dispõe sobre o uso do nome
Federativa do Brasil, de 5 de outubro social e o reconhecimento da identidade
de 1988. Disponível em: http://www. de gênero de pessoas travestis e
planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ transexuais no âmbito da administração
constituicao.htm. Acesso em: 02 jun. 2021. pública federal direta, autárquica e
fundacional. Disponível em: http://www.
BRASIL. Decreto nº 4.887, de 20 de planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
novembro de 2003. Regulamenta 2018/2016/Decreto/D8727.htm. Acesso
o procedimento para identificação, em: 02 jun. 2021.
reconhecimento, delimitação, demarcação
e titulação das terras ocupadas por BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
remanescentes das comunidades dos dezembro de 1940. Código Penal. Disponível
quilombos de que trata o art. 68 do Ato em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
Disposições Constitucionais Transitórias. decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso
Disponível em: http://www.planalto.gov. em: 02 jun. 2021.
br/ccivil_03/decreto/2003/d4887.htm.
Acesso em: 08 jun. 2021. BRASIL. Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989.
Define os crimes resultantes de preconceito
BRASIL. Decreto nº 6.261, de 20 de de raça ou de cor. Disponível em: http://
novembro de 2007. Dispõe sobre a gestão www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7716.
integrada para o desenvolvimento da htm. Acesso em: 02 jun. 2021.
Agenda Social Quilombola no âmbito do
Programa Brasil Quilombola, e dá outras BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990.
providências. Disponível em: http://www. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do

84
REFERÊNCIAS

Adolescente. Disponível em: http://www. sobre os direitos dos jovens, os princípios


planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. e diretrizes das políticas públicas de
Acesso em: 02 jun. 2021. juventude e o Sistema Nacional de
Juventude - SINAJUVE. Disponível em:
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases ato2011-2014/2013/lei/l12852.htm.
da Educação Nacional. Disponível em: Acesso em: 02 jun. 2021.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/L9394compilado.htm. Acesso em: BRASIL. Lei nº 13.185, de 6 de novembro
02 jun. 2021. de 2015. Institui o Programa de Combate
à Intimidação Sistemática (Bullying).
BRASIL. Lei nº 9.455, de 7 de abril de Disponível em: http://www.planalto.gov.
1997. Define os crimes de tortura e dá br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/
outras providências. Disponível em: http:// l13185.htm. Acesso em: 02 jun. 2021.
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9455.
htm. Acesso em: 02 jun. 2021. BRASIL. Lei nº 13.431, de 4 de abril de
2017. Estabelece o sistema de garantia de
BRASIL. Lei nº 10.639, 10 de janeiro de direitos da criança e do adolescente vítima
2003. Estabelece as diretrizes e bases da ou testemunha de violência. Disponível
educação nacional, para incluir no currículo em: http://www.planalto.gov.br/
oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13431.
da temática “História e Cultura Afro- htm. Acesso em: 02 jun. 2021.
Brasileira”. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/ BRASIL. Ministério da Educação.
l10.639.htm. Acesso: 08 jun. 2021. Conselho Nacional de Educação. Parecer
nº 03, de 10 de março 2004. Estabelece
BRASIL. Lei nº 11.645, 10 de março de as Diretrizes Curriculares Nacionais para
2008. Estabelece as diretrizes e bases a Educação das Relações Étnico-Raciais
da educação nacional, para incluir no e para o Ensino de História e Cultura
currículo oficial da rede de ensino a Afro-Brasileira e Africana. Disponível em:
obrigatoriedade da temática “História http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/
e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. cnecp_003.pdf. Acesso em: 02 jun. 2021.
Disponível em: http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/ BRASIL. Ministério da Educação. Conselho
l11645.htm. Acesso: 08 jun. 2021. Nacional de Educação. Resolução nº 01,
de 17 de junho de 2004. Institui Diretrizes
BRASIL. Lei nº 12.288, de 20 de julho de Curriculares Nacionais para a Educação das
2010. Institui o Estatuto da Igualdade Racial. Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12288. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/
htm. Acesso em: 02 jun. 2021. arquivos/pdf/res012004.pdf. Acesso em: 02
jun. 2021.
BRASIL. Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013.
Institui o Estatuto da Juventude e dispõe CARNEIRO, Sueli. Racismo, sexismo e

85
REFERÊNCIAS

desigualdade no Brasil. São Paulo: Selo história e cultura afro-brasileira, africana


Negro, 2011. e indígena na educação brasileiro. In:
MARAUX, Amélia Tereza S. R.; OLIVEIRA, Iris
CARNEIRO, Sueli. Gênero e raça na Verena S.; SILVA, Marta Enéas. Diferenças
sociedade brasileira. In: BRUSCHINI, e práticas formativas. Salvador: EDUNEB,
Cristina; UNBEHAUM, Sandra (org.). Gênero, 2019. (Série Ações afirmativas: educação e
democracia e sociedade brasileira. São Paulo: direitos humanos, v. 1), p. 239-275.
Fundação Carlos Chagas, 2002, p.167-193.
FIGUEIREDO, Otto Vinicius Agra. Ações
COLLINS, Patricia Hill. Black feminist afirmativas e permanência estudantil
thought: knowledge, consciousness, and nas Universidades Estaduais Baianas.
the politics of empowerment. 2. ed. New Tese (Doutorado em Educação e
York: Routledge, 2000. Contemporaneidade), Universidade do
Estado da Bahia, Salvador, 2021.
COSTA, Ana Alice Alcântara. O movimento
feminista no Brasil: dinâmicas de uma FIGUEIREDO, Otto Vinicius Agra; ARRUDA,
intervenção política. Gênero, v. 5, n. 2, 1. Jalusa Silva de; ARAÚJO, Marta. Colonialismo
sem. 2005, p. 9-35. Disponível em: https:// português, lusotropicalismo, racismo e
periodicos.uff.br/revistagenero/article/ lutas antirracistas – entrevista com Marta
view/31137. Acesso em: 02 jun. 2021. Araújo. Revista da FAEEBA - Educação e
Contemporaneidade, v. 30, n. 62, 2021,
CURIEL, Ochy. La nación heterosexual: p. 168-186. Disponível em: https://www.
análisis del discurso jurídico y el régimen revistas.uneb.br/index.php/faeeba/article/
heterosexual. Bogotá: Brecha Lésbica y en view/8613. Acesso em: 14 jul. 2021.
la frontera, 2013.
FIGUEIREDO, Ângela. Descolonização do
DAVIS, Angela Y. Mulheres, raça e classe. 1. conhecimento no século XXI. In: SANTIAGO,
ed. São Paulo: Boitempo, 2016. Ana Rita et al. (org.). Descolonização do
conhecimento no contexto afro-brasileiro. 2.
DEI, George J. Sefa; JOHAL, Gurpreet ed. Cruz das Almas: UFRB, 2019, p. 75-102.
Singh. Metodologias de investigação anti-
racistas: questões críticas. Mangualde: FBSP - FÓRUM BRASILEIRO DE
Edições Pedago: 2008. SEGURANÇA PÚBLICA. Visível e invisível:
a vitimização de mulheres no Brasil. 3. ed.
EURICO, Márcia Campos. Tecendo tramas 2021. Recurso digital. Disponível em:
acerca de uma infância sem racismo. https://forumseguranca.org.br/wp-
Em Pauta, n. 45, v. 18, 1º semestre, content/uploads/2021/06/relatorio-
2020, p. 69-83. Disponível em: https:// visivel-e-invisivel-3ed-2021-v3.pdf.
www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/ Acesso em: 04 ago. 2021.
revistaempauta/article/view/47214.
Acesso em: 02 jun. 2021. GIUGLIANI, Beatriz. O estigma da raça: um
estudo etnográfico em escola municipal de
FIGUEIREDO, Otto Vinicius Agra. Por uma Cachoeira (Bahia). Dissertação (Mestrado
contribuição decolonial para o ensino de em Ciências Sociais), Universidade Federal

86
REFERÊNCIAS

do Recôncavo da Bahia, Cachoeira, 2013. e seu enfrentamento na escola e no


trabalho: processos de escolarização e
GOES, Emanuelle Freitas. Racismo, aborto profissionalização de jovens quilombolas
e atenção à saúde: uma perspectiva da Chapada Diamantina-BA. Dissertação
interseccional. Tese (Doutorado em Saúde (Mestrado em Ciências Sociais),
Coletiva), Universidade Federal da Bahia, Universidade Federal do Recôncavo da
Salvador, 2018. Bahia, Cachoeira, 2018.

GOMES, Nilma Lino. Relações étnico- GUIMARÃES. Antônio Sérgio A. Classes,


raciais, educação e descolonização dos raças e democracia. São Paulo: Fundação
currículos.Currículo sem Fronteira, v. 12, de Apoio à Universidade de São Paulo; Ed.
n. 1, jan./abr. 2012, p. 98-109. Disponível 34, 2002.
em: http://www.curriculosemfronteiras.
org/vol12iss1articles/gomes.htm. Acesso HOLLANDA, Heloísa Buarque de (org.).
em: 02 jun. 2021. Pensamento feminista hoje: sexualidades
no sul global. 1. ed. Rio de Janeiro: Bazar do
GOMES, Nilma Lino. Alguns termos e Tempo, 2020.
conceitos presentes no debate sobre
relações raciais no Brasil: uma breve hooks, bell. Mulheres negras: moldando
discussão. In: Ministério da Educação, a teoria feminista. Revista Brasileira
Secretaria de Educação Continuada, de Ciência Política, n. 16, Brasília, jan./
Alfabetização e Diversidade. Educação anti- abr., 2015, p. 193-210. Disponível em:
racista: caminhos abertos pela Lei Federal nº https://www.scielo.br/j/rbcpol/a/
10.639/03. Brasília: Ministério da Educação, mrjHhJLHZtfyHn7Wx4HKm3k/?lang=pt.
Secretaria de Educação Continuada, Acesso em: 02 jun. 2021.
Alfabetização e Diversidade, 2005. (Coleção
Educação para Todos), p. 39-62. hooks, bell. Ensinando a transgredir: a
educação como prática da liberdade. São
GONZALEZ, Lélia. Primavera para as Paulo: WMF Martins Fontes, 2013.
rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira
pessoa… Diáspora Africana: Editora IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE
Filhos da África, 2018. GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo 2010.
Disponível em: https://censo2010.ibge.
GROSFOGUEL, Ramón. A estrutura gov.br. Acesso em: 03 set. 2021.
do conhecimento nas universidades
ocidentalizadas: racismo/sexismo IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA
epistêmico e os quatro genocídios/ E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por
epistemicídios do longo século XVI. Amostra de Domicílios Contínua. Indicadores
Revista Sociedade e Estado, v. 3, n. 1, jan./ mensais produzidos com informações
abr., 2016, p. 25-49. Disponível em: http:// do 1º trimestre de 2020. Disponível em:
biblioteca.acasatombada.com.br/omeka/ https://agenciadenoticias.ibge.gov.
items/show/1759. Acesso em: 02 jun. 2021. br/media/com_mediaibge/arquivos/
ff2505b84b22bdcbcdbf134ea9069e28.pdf.
GUEDES, Azamor Coelho. O racismo Acesso em: 03 set. 2021.

87
REFERÊNCIAS

INSTITUTO ALIANÇA COM O ADOLESCENTE. mulheres negras: retrato das condições


Levantamento das principais violências de vida das mulheres negras no Brasil.
praticadas contra crianças, adolescentes e Brasília: IPEA, 2013.
jovens em Salvador e no Recôncavo Baiano
(2019-2020). Salvador: Instituto Aliança MARQUES, Emanuele Souza et al. A vio-
com o Adolescente, 2021. (Recurso digital). lência contra mulheres, crianças e adoles-
centes em tempos de pandemia pela CO-
IPEA - INSTITUTO DE PESQUISA VID-19: panorama, motivações e formas
ECONÔMICA APLICADA. Atlas de enfrentamento. Cadernos de Saúde
da violência 2020. Disponível Pública, v. 36, n. 4, 2020, p. 1-6. Disponível
em: https://www.ipea.gov.br/ em: https://www.scielo.br/j/csp/a/SCYZ-
atlasviolencia/arquivos/artigos/3519- FVKpRGpq6sxJsX6Sftx/ ?lang=pt&forma-
atlasdaviolencia2020completo.pdf. Acesso t=pdf. Acesso em: 02 jun. 2021.
em: 02 jun. 2021.
MATTOS, Ivanilde Guedes de. É pra
JESUS, Jaqueline Gomes de. Orientações descer quebrando: o pagode e suas
sobre a população transgênero: conceitos performances para a educação das
e termos. Brasília: Autor, 2012. relações etnicorraciais no currículo
escolar. Tese (Doutorado em Educação
JESUS, Regina de Fátima de; ARAÚJO, e Contemporaneidade), Universidade do
Mairce da Silva; CUNHA JÚNIOR, Henrique Estado da Bahia, Salvador, 2013.
Antunes (org.). Dez anos da Lei nº
10.639/03. Fortaleza: Edições UFC, 2013. MBEMBE, Achille. Necropolítica. Arte &
(Coleção Diálogos intempestivos, 146). Ensaios, n. 32, dezembro, 2016, p. 123-151.
Disponível em: https://revistas.ufrj.br/
LOPES, Jussara de Cássia S. A vivência index.php/ae/article/view/8993/7169.
do racismo e do sexismo na infância e na Acesso em: 02 jun. 2021.
adolescência e a construção da identidade
das meninas negras. Cadernos Imbondeiro, MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.)
v. 2, n. 1, 2012, p. 1-12. Disponível em: https:// Pesquisa social: teoria, método e
periodicos.ufpb.br/index.php/ci/article/ criatividade. 28 ed. Petrópolis: Vozes, 2009.
view/14214/8821. Acesso em: 02 jun. 2021.
MINAYO, Maria Cecília de Souza; ASSIS,
LOURO, Guacira Lopes. Simone G.; SOUZA, Edinilsa R. (org.).
Heteronormatividade e homofobia. Avaliação por triangulação de métodos:
In: JUNQUEIRA, Rogério Diniz (org.). abordagem de programas sociais. Rio de
Diversidade sexual na educação: Janeiro: Fiocruz, 2005.
problematizações sobre a homofobia
nas escolas. Brasília: Ministério da MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria
Educação, Secretaria de Educação de Educação Continuada, Alfabetização
Continuada, Alfabetização e Diversidade, e Diversidade. Educação anti-racista:
UNESCO, 2009. caminhos abertos pela Lei Federal nº
10.639/03. Brasília: MEC/SECADI, 2005.
MARCONDES, Mariana Mazzini et al. Dossiê (Coleção Educação para todos).

88
REFERÊNCIAS

MINISTÉRIO DA FAMÍLIA, DA MULHER formação de professores. Vitória: EDUFES,


E DOS DIREITOS HUMANOS. Secretaria 2013, p. 57-70.
Nacional de Proteção dos Direitos da
Criança e Adolescente. Disque Direitos MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a
Humanos: relatório de 2019. Disponível mestiçagem no Brasil: identidade nacional
em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/ versus identidade negra. Belo Horizonte:
centrais-de-conteudo/disque-100/ Autêntica, 2004.
relatorio-2019_disque-100.pdf. Acesso
em: 02 jun. 2021. MUNANGA, Kabengele. Por que ensinar a his-
tória da África e do negro no Brasil de hoje?
MIRANDA, Claudia; LINS, Mônica Regina Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n
Ferreira; COSTA, Ricardo Cesar Rocha da 62, dez., 2015, p. 20-31. Disponível em: ht-
(org.). Relações étnicorraciais na escola: tps://www.scielo.br/j/rieb/a/WxGPWdcyt-
desafios e práticas pedagógicas após a Lei JgSnNKJQ7dMVGz/ ?format=pdf&lang=pt.
10.639. Rio de Janeiro: QUARTET, 2012. Acesso em: 02 jun. 2021.

MISKOLCI, Richard. Teoria queer: um MUNANGA, Kabengele. Negritude: usos


aprendizado pelas diferenças. Belo e sentidos. 3. ed. Belo Horizonte: Editora
Horizonte: Autêntica, 2012. Autêntica, 2012. (Coleção Cultura Negra e
Identidades).
MOREIRA, Adilson. Racismo recreativo.
São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019. NASCIMENTO, Abdias do. O genocídio do
(Coleção Feminismos Plurais). negro brasileiro: processo de um racismo
mascarado. Rio de Janeiro: Editora Paz e
MOTA, Thiago Henrique (org.). Ensino Terra S/A, 1978.
antirracista na Educação Básica: da
formação de professores às práticas NASCIMENTO, Maria Beatriz. Beatriz
escolares. Porto Alegre: Editora Fi, 2021. Nascimento, quilombola e intelectual:
possibilidade nos dias da destruição. 1.
MOURA, Clóvis. Escravismo, colonialismo, ed. Diáspora Africana: Editora Filhos da
imperialismo e racismo. Afro-Ásia, n. 14, África, 2018.
1983, p. 124-137. Disponível em: https://pe-
riodicos.ufba.br/index.php/afroasia/article/ NOGUEIRA, Sidnei. Intolerância religiosa.
view/20824/13425. Acesso em: 02 jun. 2021. São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2020.
(Coleção Feminismos Plurais).
MOURA, Clóvis. Sociologia do negro
brasileiro. São Paulo: Editora Ática, 1988. OLIVA, Anderson Ribeiro. A História da África
(Série Fundamentos). nos bancos escolares: representações e
imprecisões na literatura didática. Estudos
MULLER, Tânia Mara Pedroso. O negro Afro-Asiáticos, v. 25, n. 3, 2003, p. 421-461.
no livro didático: o que nos contam as Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.
imagens? In: BARRETO, Maria Aparecida php?script=sci_arttext&pid=S0101-546X20
Santos Correa et al. (org.). Africanidade(s) 03000300003&lng=pt&tlng=pt. Acesso em:
e afrodescedência(s): perspectivas para a 31 jul. 2021.

89
REFERÊNCIAS

OLIVEIRA, Flávia. As voltas que o mundo especificidades entre 2017 e 2020.


dá. Portal Geledés, 22 de abril de 2015. Salvador: Superintendência de Estudos
Disponível em: https://www.geledes.org. Econômicos e Sociais da Bahia, 2021.
br/as-voltas-que-o-mundo-da/Acesso Disponível em: https://www.sei.ba.gov.
em: 02 jun. 2021. br/images/publicacoes/download/textos_
discussao/texto_discussao_23.pdf. Acesso
OLIVEIRA, Ariadne M. B. Religiões afro- em: 27 mai. 2021.
brasileiras e o racismo: contribuição para
a categorização do racismo religioso. SANTOS, Edmar Ferreira. O poder dos
Dissertação (Mestrado em Direitos candomblés: perseguição e resistência
Humanos e Cidadania) Programa de no Recôncavo da Bahia. Salvador:
Pós-Graduação em Direitos Humanos e EDUFBA, 2009.
Cidadania do Centro de Estudos Avançados
Multidisciplinares, Universidade de SANTOS; Ivanir dos; GINO, Mariana (org.).
Brasília, Brasília, 2017. História social da intolerância religiosa no
Brasil: desafios na contemporaneidade. 1.
PEREIRA, Bruna Cristina Jaquetto. ed. Rio de Janeiro: Klínē Editora, 2021.
Tramas e dramas de gênero e de cor: a
violência doméstica e familiar contra SANTOS, Thaís Calixto dos. Universidade,
mulheres negras. Dissertação (Mestrado território e emancipação: Quilombolas
em Sociologia), Universidade de Brasília, estudantes no ensino superior. (Dissertação)
Brasília, 2013. Programa de Pós-Graduação em Estudos
Interdisciplinares Sobre a Universidade,
REDE DE OBSERVATÓRIOS DA SEGURANÇA. Universidade Federal da Bahia, 2018.
A cor da violência policial: a bala não erra o
alvo. Rede de Observatórios da Segurança; SILVA, Ana Celia da. A desconstrução
Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da discriminação no livro didático. In:
(CESeC). Dezembro, 2020. Disponível em: MUNANGA, Kabengele (org.). Superando o
http://observatorioseguranca.com.br/wp/ racismo na escola. 2. ed. Brasília: Ministério
wp-content/uploads/2021/09/A-Cor-da- da Educação, Secretaria de Educação
Violência-Policial-A-Bala-Não-Erra-o-Alvo. Continuada, Alfabetização e Diversidade,
pdf. Acesso: 08 jun. 2021. 2005, p. 21-37.

SACRAMENTO, Elionice Conceição. Da SILVA, Ana Celia da. A discriminação do


diáspora negra ao território das águas: negro no livro didático. Salvador: EDUFBA/
ancestralidade e protagonismo de CEAO, 1995.
mulheres na comunidade pesqueira e
quilombola Conceição de Salinas-BA. SILVA, Hellen Mabel S. “São Bartolomeu
Dissertação (Mestrado em Sustentabilidade chegou da Bahia coberto de flores, cheio
Junto aos Povos e Terras Tradicionais), de alegria!”: o desenho do território
Universidade de Brasília, Brasília, 2019. cultural da criança. Dissertação (Mestrado
em Desenho, Cultura e Interatividade),
SANTANA, Jadson et al. Feminicídios Universidade Estadual de Feira de Santana,
na Bahia: uma análise dos padrões e Feira de Santana, 2014.

90
REFERÊNCIAS

SILVA JÚNIOR, Hédio; TEIXEIRA, Daniel VINUTO, Juliana. A amostragem em bola


(org.). Discriminação racial é sinônimo de neve na pesquisa qualitativa: um
de maus-tratos: a importância do ECA debate em aberto. Temáticas, v. 22, n. 44,
para a proteção das crianças negras. São p. 203–220, 30 dez. 2014. Disponível em:
Paulo: Centro de Estudos das Relações de https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/
Trabalho e Desigualdades, 2016. index.php/tematicas/article/view/10977.
Acesso em: 02 jun. 2021.
SOLIDADE, Maiara Figueredo da.
Socialização de gênero e construções WERNECK, Jurema. Nossos passos vêm
das identidades sociais: um estudo de longe! Movimentos de mulheres
comparativo entre as escolas Sistema negras e estratégias políticas contra o
e Magia, em Muritiba-BA. Dissertação sexismo e o racismo. In: WERNECK, Jurema
(Mestrado em Ciências Sociais), (org). Mulheres negras: um olhar sobre
Universidade Federal do Recôncavo da as lutas sociais e as políticas públicas
Bahia, Cachoeira, 2017. no Brasil, 2009, p. 76-84. Disponível
em: https://criola.org.br/wp-content/
SOUSA, Avanete Pereira. A Bahia do século uploads/2017/10/livro_mulheresnegras_1_.
do XVIII: poder político local e atividades pdf. Acesso: 18 mai. 2017.
econômicas. São Paulo: Alameda, 2012.
WERNECK, Jurema. Racismo institucional:
SOUZA, Ellen de Lima. não uma abordagem conceitual. Geledés, [s.d.]
é sinônimo de racismo. In: SILVA Recurso digital. Disponível em: https://
JÚNIOR, Hédio; TEIXEIRA, Daniel (org.). www.onumulheres.org.br/wp-content/
Discriminação racial é sinônimo de maus- uploads/2016/04/FINAL-WEB-Racismo-
tratos: a importância do ECA para a Institucional-uma-abordagem-conceitual.
proteção das crianças negras. São Paulo: pdf. Acesso: 08 mai. 2017.
Centro de Estudos das Relações de
Trabalho e Desigualdades, 2016, p. 81-94.

SOUZA, Laura de Mello e. O diabo e a Terra


de Santa Cruz: feitiçaria e religiosidade
popular no Brasil colonial. São Paulo:
Companhia das Letras, 1986.
SÍTIOS CONSULTADOS
TEIXEIRA, Tadeu Gomes; SAMPAIO, Camila
Alves Machado. Análise orçamentária do Fundação Cultural Palmares:
Programa Brasil Quilombola no Brasil http://www.palmares.gov.br
e no Maranhão: o caso de uma política
pública. Revista de Administração Pública, Instituto Brasileiro de Geografia e
v. 53, n. 2, mar./abr. 2019, p. 461-480. Estatística - Cidades:
Disponível em: https://www.scielo.br/j/ https://cidades.ibge.gov.br
rap/a/fdMyGGdJDqxHfVxLhX7PMKC/
?format=pdf&lang=pt. Mateus Aleluia:
Acesso em: 10 jul. 2021. https://mateusaleluia.com.br

91
APÊNDICE A
Entrevistas Realizadas

CATEGORIA OU
ORDEM SEXO COR/RAÇA IDADE RELIGIÃO ESCOLARIDADE
ÁREA

41 a 50 Ensino superior Assistência


1 Feminino Parda Católica
anos completo social
31 a 40 Ensino superior Assistência
2 Feminino Preta Sem religião
anos completo social
51 a 60 Ensino superior Assistência
3 Feminino Parda Católica
anos completo social
31 a 40 Ensino superior Assistência
4 Feminino Preta Adventista
anos completo social
31 a 40 Ensino superior Assistência
5 Feminino Parda Católica
anos completo social
31 a 40 Ensino superior Assistência
6 Masculino Preta Católica
anos completo social
41 a 50 Ensino superior Assistência
7 Feminino Parda Católica
anos incompleto social
21 a 30 Ensino superior Assistência
8 Feminino Branca Sem religião
anos completo social
41 a 50 Ensino médio Conselho
9 Masculino Preta Protestante
anos completo Tutelar
31 a 40 Ensino superior Conselho
10 Masculino Parda Protestante
anos completo Tutelar
41 a 50 Ensino superior Conselho
11 Feminino Preta Evangélica
anos completo Tutelar
31 a 40 Ensino médio Conselho
12 Feminino Preta Católica
anos completo Tutelar
31 a 40 Ensino superior Conselho
13 Feminino Preta Católica
anos completo Tutelar
31 a 40 Ensino superior Conselho
14 Feminino Parda Sem religião
anos incompleto Tutelar
31 a 40 Ensino superior Conselho
15 Feminino Parda Católica
anos incompleto Tutelar
31 a 40 Ensino superior Conselho
16 Masculino Preta Candomblé
anos completo Tutelar
21 a 30 Ensino superior Conselho
17 Feminino Preta Cristã
anos incompleto Tutelar

92
APÊNDICE A

CATEGORIA OU
ORDEM SEXO COR/RAÇA IDADE RELIGIÃO ESCOLARIDADE
ÁREA

41 a 50 Ensino superior Conselho


18 Feminino Preta Católica
anos incompleto Tutelar
41 a 50 Ensino superior
19 Feminino Parda Sem religião Educação
anos completo
41 a 50 Ensino superior
20 Feminino Parda Espírita Educação
anos completo
41 a 50 Ensino superior
21 Feminino Preta Ecumênica Educação
anos completo
31 a 40 Ensino superior
22 Feminino Parda Candomblé Educação
anos completo
Sistema de
41 a 50 Ensino superior justiça e
23 Feminino Parda Católica
anos completo segurança
pública
Sistema de
31 a 40 Ensino superior justiça e
24 Masculino Branca Sem religião
anos completo segurança
pública
Sistema de
21 a 30 Ensino superior justiça e
25 Feminino Preta Sem religião
anos completo segurança
pública
31 a 40 Ensino superior Governo
26 Feminino Preta Candomblé
anos completo Estadual
41 a 50 Ensino superior Governo
27 Feminino Preta Candomblé
anos completo Estadual
Menos de Ensino médio Comunidade
28 Feminino Parda Sem religião
20 anos incompleto pesqueira
Menos de Ensino médio Comunidade
29 Feminino Preta Candomblé
20 anos incompleto pesqueira
Comunidade
Menos de Ensino médio
30 Feminino Preta Candomblé pesqueira e
20 anos incompleto
marisqueiro
Menos de Ensino superior Comunidade
31 Masculino Preta Sem religião
20 anos incompleto quilombola
Menos de Ensino médio Comunidade
32 Feminino Preta Sem religião
20 anos completo quilombola
Menos de Ensino superior Comunidade
33 Masculino Preta Candomblé
20 anos incompleto urbana
21 a 30 Ensino superior Comunidade
34 Feminino Preta Católica
anos completo quilombola
21 a 30 Ensino superior Comunidade
35 Masculino Preta Sem religião
anos incompleto quilombola

93
APÊNDICE A

CATEGORIA OU
ORDEM SEXO COR/RAÇA IDADE RELIGIÃO ESCOLARIDADE
ÁREA

41 a 50 Ensino médio Liderança


36 Feminino Preta Católica
anos completo comunitária
21 a 30 Ensino superior Liderança
37 Masculino Preta Sem religião
anos incompleto comunitária
21 a 30 Ensino superior Liderança
38 Masculino Preta Evangélica
anos incompleto comunitária
21 a 30 Ensino superior Liderança
39 Feminino Preta Católica
anos incompleto comunitária
21 a 30 Ensino superior Liderança
40 Feminino Preta Católica
anos incompleto comunitária
31 a 40 Pós-graduação Liderança
41 Feminino Preta Católica
anos incompleta comunitária
31 a 40 Ensino superior Liderança
42 Feminino Preta Sem religião
anos incompleto comunitária
21 a 30 Ensino superior Liderança
43 Masculino Preta Católica
anos incompleto comunitária
31 a 40 Ensino superior Liderança
44 Feminino Preta Católica
anos incompleto comunitária
21 a 30 Ensino superior Liderança
45 Feminino Preta Católica
anos completo comunitária
21 a 30 Ensino médio Liderança
46 Feminino Preta Católica
anos completo comunitária
41 a 50 Ensino médio Liderança
47 Feminino Preta Católica
anos completo comunitária
Menos de Ensino médio Liderança
48 Feminino Preta Católica
20 anos completo comunitária
21 a 30 Ensino superior Liderança
49 Masculino Preta Católica
anos incompleto comunitária
31 a 40 Ensino superior Liderança
50 Feminino Preta Sem religião
anos incompleto comunitária
41 a 50 Ensino Liderança
51 Masculino Preta Católica
anos fundamental I comunitária
31 a 40 Ensino superior Liderança
52 Feminino Preta Sem religião
anos completo comunitária
Menos de Ensino médio Liderança
53 Masculino Parda Católica
20 anos completo comunitária
51 a 60 Ensino médio Liderança
54 Masculino Preta Candomblé
anos completo religiosa
51 a 60 Ensino superior Liderança
55 Feminino Preta Candomblé
anos incompleto religiosa
41 a 50 Ensino médio Liderança
56 Masculino Preta Candomblé
anos completo religiosa
41 a 50 Ensino superior Liderança
57 Feminino Preta Candomblé
anos completo religiosa

94
APÊNDICE B
COMUNIDADES QUILOMBOLAS
CERTIFICADAS NOS MUNICÍPIOS DA PESQUISA

MUNICÍPIO COMUNIDADES QUILOMBOLAS CERTIFICADAS

Cachoeira Caonge, Dendê, Engenho da Ponte, Engenho da Praia e Kalemba


Cachoeira Caimbongo
Cachoeira Calolé, Imbiara e Tombo
Cachoeira Engenho da Vitoria
Cachoeira Engenho Novo do Vale Do Iguape
Cachoeira São Francisco do Paraguaçu
Cachoeira São Tiago do Iguapé
Cachoeira Brejo do Engenho da Guaíba
Cachoeira Engenho da Cruz
Cachoeira Tabuleiro da Vitória
Cachoeira Mutecho e Acutinga
Cruz das Almas Baixa da Linha
Cruz das Almas Vila Guaxinim
Maragogipe Salaminas
Maragogipe Porto da Pedra
Maragogipe Giral Grande, Guerém e Tabatinga
Maragogipe Enseada do Paraguaçu
Maragogipe Sítio Dendê
Maragogipe Zumbi
Maragogipe Quizanga
Maragogipe Guaruçú
Maragogipe Buri
Maragogipe Baixão do Guaí
Maragogipe Angolá

95
APÊNDICE B

MUNICÍPIO COMUNIDADES QUILOMBOLAS CERTIFICADAS

Muritiba Baixa Grande


Salinas da Margarida Conceição de Salinas
Salvador Bananeiras
Salvador Praia Grande
Salvador Martelo, Ponta Grossa e Porto Dos Cavalos
Salvador Alto do Tororó
Santo Amaro São Braz
Santo Amaro Cambuta
Santo Amaro Alto do Cruzeiro-Acupe
São Felix Terreno do Governo
São Felix Quilombo Pau Grande e Santo Antônio da Jaqueira
São Felix Subahuma e Engenhoca
São Félix Engenho São João
São Félix Santo Antônio e Vidal

Fonte: Fundação Cultural Palmares em agosto de 2021.

96

Você também pode gostar