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Tornou-se manifesto que tudo o que diz respeito à arte deixou de ser evidente, tanto em si mesma

como na sua relação ao todo, e até mesmo o seu direito à existência

A extensão imensa do que nunca foi pressentido, a que se arrojaram os movimentos artísticos
revolucionários cerca de 1910, não proporcionou a felicidade prometida pela aventura.

Entrou-se cada vez mais no turbilhão dos novos tabus; por toda a parte os artistas se alegravam
menos do reino de liberdade recentemente adquirido do que aspiravam de novo a uma pretensa
ordem, dificilmente mais sólida.

Na época da sua emancipação, este momento eclipsa todos os outros, apesar ou se é que não por
causa da não-ingenuidade a que já, segundo Hegel, não mais se pode esquivar. Ela conjuga-se com a
ingenuidade à segunda potência, a incerteza do ‘para quê’ estético. Não se sabe se a arte pode ainda
ser possível; se ela, após a sua completa emancipação, não eliminou e perdeu os seus pressupostos

A sua essência não é dedutível da sua origem, como se o primeiro fosse um fundamento, sobre o
qual todos os seguintes se erigem e desmoronam logo que são abalados. A crença segundo a qual as
primeiras obras de arte são as mais elevadas e as mais puras é romantismo tardio

A definição do que é a arte é sempre dada previamente pelo que ela foi outrora, mas apenas é
legitimada por aquilo em que se tornou, aberta ao que pretende ser e àquilo em que poderá talvez
tornar-se.

A arte só é interpretável pela lei do seu movimento, não por invariantes... . O caráter artístico
específico que nela existe deve deduzir-se, quanto ao conteúdo, do seu Outro ; apenas isso bastaria
para qualquer exigência de uma estética materialista dialética. Ela especifica-se ao separar-se
daquilo por que tomou forma ; a sua lei de movimento constitui a sua própria lei formal. Ela
unicamente existe na relação ao seu Outro e é o processo que a acompanha. Para uma estética que
se orienta diferentemente vale como axioma a tese desenvolvida por Nietzsche, no fim da sua vida,
contra a filosofia tradicional, segundo a qual também pode ser verdadeiro mesmo o que foi sujeito
de devir. Dever-se-ia inverter a concepção tradicional por ele demolida : a verdade só existe como o
que esteve em devir. O que se apresenta na arte como a sua própria legalidade é tanto um produto
tardio da evolução intratécnica como da posição da arte no seio de uma secularização progressiva ;
incontestavelmente, as obras de arte só se tornaram tais negando a sua origem. Não há que
censurar-lhes como pecado original a ignomínia da sua antiga dependência a respeito da magia
indolente, do serviço dos senhores e do divertimento – uma vez que elas renegaram
retrospectivamente aquilo de onde brotaram.

A perspectiva hegeliana de uma possível morte da arte é conforme ao seu ter-estado-em-devir. Que
ele pensasse a arte como transitória e a atribuísse, no entanto, ao Espírito absoluto harmoniza-se
com o caráter ambíguo do seu sistema, mas induz a uma conseqüência que ele nunca teria tirado : o
conteúdo da arte que, segundo a sua concepção, constitui o seu absoluto, não é absorvido na
dimensão da sua vida e da sua morte
O conteúdo da arte passada, mesmo que a arte possa agora estar suprimida, suprimir-se,
desaparecer ou prosseguir no desespero, não deve necessariamente caminhar para o seu declínio.
Poderia sobreviver à arte numa sociedade que teria sido libertada da barbárie da sua cultura. Nos
nossos dias, não estão mortas apenas as formas, mas inumeráveis temas : a literatura sobre o
adultério, que enche o período vitoriano do século XIXe o princípio do século XX, já não é
imediatamente reutilizável após a dissolução da célula familiar da burguesia no seuapogeu e o
afrouxamento da monogamia.

Toda a obra de arte aspira por si mesma à identidade consigo, que, na realidade empírica, se impõe
à força a todos os objetos, enquanto identidade com o sujeito e, deste modo, se perde. A identidade
estética deve defender o não-idêntico que a compulsão à identidade oprime na realidade. Só em
virtude da separação da realidade empírica, que permite à arte modelar, segundo as suas
necessidades, a relação do Todo às partes é que a obra de arte se torna Ser à segunda potência

As obras são vivas enquanto falam de uma maneira que é recusada aos objetos naturais e aos
sujeitos que as produzem. Falam em virtude da comunicação nelas de todo o particular

A arte nega as determinações categorialmente impressas na empiria e, no entanto, encerra na sua


própria substância um ente empírico.

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