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UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP

Psicologia

Allan Santos De Carvalho

ILHA DAS FLORES


Resenha, Psicologia Social

São Paulo, Santana De Parnaíba


2023
Ilha das flores é um curta-documental dirigido por Jorge Furtado, a obra estreou
em maio de 1989. O curta mescla sua linguagem entre o humor ácido e a
mudança de tom para a seriedade do tópico, além da linguagem ele transita por
diferentes esferas narrativas, ela passa por biologia, química, história e religião
para contar uma história sobre insegurança alimentar.
O curta de início apresenta primeiro um humano com o telencéfalo altamente
desenvolvido e polegares opositores chamado Sr. Suzuki, eu não sei ao certo se
essa é algo proposital, mas, ao ouvir esse nome é de fácil conotação, até
acidental, lembrar da marca de veículos Suzuki, que hoje vale 17 Bilhões de
dólares, convertidos hoje são 85 Bilhões de reais, o salário mínimo hoje no
brasil são 1.320 reais e a moto mais barata da marca Suzuki custa 3.990 reais,
isso beira uma contradição. Acompanhamos a plantação de tomates de Sr.
Suzuki que não é dono de uma marca de motos, mas tem polegares opositores,
até os mercados onde seus tomates são troca por dinheiro, no mercado, seus
tomates são comprados por dona Anete para fazer molho para a carne de porco
que ela cozinha para seus filhos e marido, um desses tomates é julgado
inadequado na visão de dona Anete e acaba indo para o lixo que acaba indo para
a Ilha das flores.
Antes de falarmos de fato do que acontece na ilha das flores é importante falar
sobre o que acontece nesse processo de compra, dona Anete trabalha como
vendedora de uma marca de perfumes, o que ela vende? Perfume. Perfumes
esses que são feitos em uma fábrica, como são feitos? Com líquidos extraídos
das flores. Isso fica indagado durante essa parte do curta, mas na realidade o que
dona Anete vende não são perfumes e o que a fábrica extrai não são líquidos das
flores, o que é vendido é o ser humano, ou para ser mais exato, o trabalho do
humano, seu tempo de vida e seu esforço, isso em troca de uma quantia
imensamente menor do lucro da marca do perfume, assim como o trabalhador
comum que recebe 1.320 reais, que vende a si mesmo em troca de alcançar
3.990 reais para arranjar uma moto da marca Suzuki, que não vai dar nem 1% de
lucro para a empresa mas vai ter um impacto imenso na vida do trabalhador
comum, a vida do trabalhador infelizmente pode ser colocada ao lado da vida do
porco nessa analogia em especifico, a diferença é que o porco não possui o
telencéfalo altamente desenvolvido, nem tem polegares e nesse caso o porco
possui um dono, em contrapartida por mais que o humano precise vender seu
esforço para alguém ou alguma corporação com um poder financeiro maior que
o seu em troca de dinheiro, ele ainda é livre, essa liberdade vai ser explorada
nesse texto em breve.
Voltando para o tomate, ele foi rejeitado por dona Anete e foi parar na ilha das
flores junto a outros montantes de lixo, ironicamente a ilha das flores não tem
flores, mas tem pessoas carentes passando por dificuldades e porcos, o dono de
um dos terrenos cria porcos, o tomate que dona Anete julgou inadequado acabou
junto aos porcos e ao lixo, o dono do terreno permite que as pessoas peguem as
sobras do lixo orgânico que está em meio ao lixo comum como latas e etc. No
filme vemos uma fila se montando e de dez em dez pessoas podem entrar para
pegar o que conseguirem por cinco minutos, as pessoas entram, enchem as
sacolas com o que conseguem e saem para outras pessoas entrarem e repetirem o
processo. O Tomate plantado por Sr. Suzuki e rejeitado por dona Anete acaba
também rejeitado pelos porcos, mas não pelos habitantes da ilha das flores que
fazem o que podem para evitar a inanição.
Perto do final do filme o narrador fala que além do telencéfalo altamente
desenvolvido e polegares opositores, os homens também possuem a liberdade,
segundo Sartre, o homem é condenado a ser livre, e assim é retratado no filme,
por mais que tenhamos o telencéfalo altamente desenvolvido e polegares
opositores, o lucro é colocado em primeiro plano nas fabricas, o porco é
colocado em primeiro plano pelo dono dos terrenos, o lucro foi colocado em
primeiro plano em Cuiabá quando os mercados optaram por entregar restos de
ossos para o povo que fazia fila durante a pandemia, O Ato de economizar é
colocado em primeiro plano por um prefeito que prefere dar ração para os
moradores de rua, comida que seus filhos nunca comeriam diga-se de passagem,
que dar comida de verdade para eles, a amenização de um impacto na opinião
pública foi colocado em primeiro plano em Goiânia, durante o acidente do
Césio-137 que foi retratado no curta, o governo da época minimizou o acidente e
escondeu os dados da população, a lista segue, e ela é extensa.
Por mais que essas pessoas sejam livres elas estão condenadas e viver dessa
forma, com toda a desigualdade existente e todo o ostracismo existente por parte
do mundo exterior em relação a sua situação. No início do filme vemos a frase
“Deus não existe”, sem ponto, sem virgula, sem exclamação, somos livres para
sentir revolta vendo essa frase, empatia, concordar ou descordas, mas algo é
unanimidade, a moralidade da religião é colocada de forma provocadora por
todo o curta, a atitude de fechar os olhos da igreja segue até hoje, considerando
que o curta passou por uma conferencia nacional de bispos, foi levado para fora
do brasil para receber honras e chegou a ser congratulado por grandes entidades,
a igreja não se moveu para ir até a Ilha dos Marinheiros onde o filme foi
filmado, anos depois um curta documental sobre a ilha das flores foi filmado,
em tom diferente e investigativo eles foram até a ilha falar com os moradores.
A frase “Deus não existe” foi a ultima preocupação para os moradores, a revolta
veio por como eles foram retratados dentro do curta, recebendo olhares de
julgamento de pessoas de fora e até sofrendo com Ostracismo, uma maior
dificuldade para achar emprego e vergonha segundo eles. Por mais que a visão
deles sendo a de que o filme os retrata mal e de que só os prejudicou, eles ainda
vivem tendo que comer alimentos reciclados do lixo, e uma das pessoas
entrevistadas via o dono dos porcos como “Um Salvador”, que o ato de
generosidade que mais soa como uma tarefa, de separar as frutas boas para os
porcos era “normal”, e que ele deixar as pessoas ficarem com o que sobrar é um
ato moralmente correto. Estamos condenados a sermos livres e acreditarmos em
uma melhora nos problemas de desigualdade, ter esperança, é até irônico
levando em conta que esse filme foi feito em uma época de renovação das
esperanças no ano da primeira eleição direta no brasil após 21 anos de ditadura e
34 anos depois da estreia desse filme o assunto continua atual e caminhamos de
volta para o mapa da fome.

Segundo o livro “Psicologia Social” de Aroldo Rodrigues, Eveline Assmar e


Bernardo Jablonski, a Atitude vem do cognitivo, afetivo e da ação, a mudança
de atitude vem de alguma mudança no modo de pensar por meio de informação,
de um novo sentimento ou de novos comportamentos, segundo um experimento
descrito no livro, pediram para um grupo de moças que acabaram de sair de uma
piscina rumo ao chuveiro lerem um cartaz que falava sobre economizar agua,
outro grupo foi pedido para assinar um abaixo assinado perto dos mesmos
cartazes, sem que soubessem uma moça cronometrou o tempo que ambos os
grupos demoraram no chuveiro, o grupo que assinou o abaixo assinado demorou
menos que o grupo que foi pedido para ler o cartaz. Olhando para a mudança de
atitude, vemos tanta revolta vindo contra o curta da parte dos moradores e é
interessante ver isso vindo da parte do telespectador na direção contraria, a
revolta vindo por conta da desigualdade existente lá e como as pessoas sentem
que os moradores de lá eram reféns de um meio de vida no qual era o único que
eles conheciam. Anos depois ainda existem casos e casos de pessoas passando
por insegurança alimentar e baixa remuneração para poder colocar comida para
a família inteira, em meio a uma pandemia o país voltou para o mapa da fome
enquanto a taxa de milionários no pais dobrou, a mudança de atitude não
aconteceu e fica cada vez mais difícil acreditar que um dia ela vai acontecer.

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