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A OBRA-PRIMA

1. DEFINIÇÃO E IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA

1.1 Definição da filosofia

. E�mologia e admiração:
- Definir o que é filosofia já é em si um problema filosófico. A filosofia possui
muitas definições e isso varia a par�r de cada perspec�va, período e até
mesmo varia a par�r de cada filósofo.
- E�mologicamente, o termo FILOSOFIA surgiu com Pitágoras e significa amor
à sabedoria. Para ele, a sabedoria só é possível à divindade. Os seres humanos
colocam-se em busca da sabedoria, mas nunca chegariam à sua posse. Por
isso, o filósofo é amigo da sabedoria e não sábio. A mesma a�tude teria Sócra-
tes.
- Para Platão e Aristóteles, na raiz da filosofia está o admirar-se, o encantar-se.
E essa é uma tendência natural dos seres humanos. Assim, nos dis�nguindo
dos animais, podemos dizer que todos somos filósofos. Por outro lado, a a�tu-
de filosófica não se contenta com explicações simplistas e superficiais, senão
cairíamos no senso comum.

. Algumas definições da filosofia:


- “A filosofia é a ciência dos FUNDAMENTOS da realidade. Lá onde as outras
ciências param, onde, sem mais indagar, aceitam os pressupostos, aí entra o
filósofo e começa a inves�gar. As ciências conhecem – mas o filósofo pergunta
o que é o conhecimento; as ciências estabelecem leis – mas o filósofo ques�o-
na o que é lei. A filosofia é uma ciência radical, no sen�do em que ela VAI ÀS
RAÍZES.” (Bochenski, Diretrizes do pensamento filosófico).
- “Parte-se da convicção de que NADA DO QUE É HUMANO É ALHEIO À FILOSO-
FIA.” (Abbagnano, História da Filosofia).
- “O filósofo é amigo do CONCEITO. A filosofia, mais rigorosamente, é a disci-
plina que consiste em criar conceitos. Os conceitos não nos esperam inteira-
mente feitos.” (Deleuze; Guatari, O que é filosofia?).
- “O que pretendo sob o �tulo de filosofia, como fim e campo das minhas ela-
borações, sei-o, naturalmente. E, contudo, não o sei... Qual o pensador para
quem, na sua vida de filósofo, a filosofia deixou de ser um ENIGMA? Só os pen-
sadores secundários que, na verdade, não se podem chamar filósofos, estão
contentes com as suas definições.” (Husserl apud Aranha e Mar�ns, Filosofan-
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do).

1.2 Importância da filosofia

- A pergunta “Qual é a sua importância?” não é feita para a medicina, para o


direito ou para a engenharia, mas é comum que ela seja feita para a filosofia.
- “Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for ú�l; se
não se deixar guiar pela submissão às ideias dominantes e aos poderes estabe-
lecidos for ú�l; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da
história for ú�l; se conhecer o sen�do das criações humanas nas artes, nas
ciências e na polí�ca for ú�l; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os
meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prá�ca que deseja a
liberdade e a felicidade para todos for ú�l, então podemos dizer que a Filosofia
é o mais ú�l de todos os saberes de que os seres humanos são capazes.”
(Chaui, Convite à Filosofia).
- “O obje�vo do pensar filosófico é levar a uma forma de pensamento capaz de
iluminar-se interiormente e de iluminar o caminho diante de nós. A filosofia é
universal. Nada existe que a ela não diga respeito. Quem se dedica à filosofia
interessa-se por tudo. Mas não há um ser humano que possa tudo conhecer.
O simples saber é uma acumulação, a Filosofia é uma unidade.” (Jaspers, Intro-
dução ao pensamento filosófico).
- “Estudar filosofia tem por obrigação ser emocionante e talvez um pouco per-
turbador. Emocionante porque pode abrir novas perspec�vas sobre o mundo
e nós mesmos e fornecer instrumentos poderosos para pensar claramente
num vasto domínio de contextos. Perturbador, talvez, porque quando é levada
a sério a filosofia toma muito pouco por garan�do. Podemos descobrir que a
filosofia põe em causa aquilo em que sempre acreditamos.” (Warburton, Ele-
mentos Básicos de Filosofia).
- “No universo do u�litarismo, um martelo vale mais que uma sinfonia, uma
faca mais que um poema, uma chave de fenda mais que um quadro: porque é
mais fácil compreender a eficácia de um utensílio, enquanto é sempre mais
di�cil compreender para que podem servir a música, a literatura ou a arte”. Se
ficamos indiferentes ao que de fato pode dar algum sen�do à vida – àquilo que
nos faz humanos –, corremos o risco de viver como os peixes na historinha que
o escritor David Foster Wallace (1962-2008) contou para um grupo de estu-
dantes do Kenyon College, em Ohio (EUA), no dia da formatura deles: dois
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peixes jovens nadando um ao lado do outro encontram um peixe mais velho


que os cumprimenta e diz: “Bom dia, jovens, como está a água?”. Os dois peixi-
nhos passam pelo velho, nadam mais um pouco e um olha para o outro: “Que
diabos é água?”. “Não nos damos conta, de fato, de que a literatura e os sabe-
res humanís�cos, a cultura e a educação cons�tuem o líquido amnió�co ideal
no qual podem se desenvolver vigorosamente as ideias de democracia, liber-
dade, jus�ça, laicidade, igualdade, direito à crí�ca, tolerância, solidariedade e
bem comum.” (Ordine, A utilidade do inútil).
- As ideias movem o mundo. As ideias são um �po de visão ampliada, profunda
a ponto de se compreender algo na sua totalidade. Nem todos podem ser filó-
sofos. (Eduardo Prado de Mendonça, O mundo precisa de filosofia).
- Já parou para dar uma olhada nas listas com as possíveis profissões do
futuro? Elas geralmente apresentam ocupações nas áreas de tecnologia e en-
genharia. Mas, segundo o historiador israelense Yuval Noah Harari, em 21
lições para o século 21, um profissional até então sem muito valor no mercado
pode ganhar espaço nos próximos anos: o filósofo. A valorização do filósofo
deve ocorrer por causa da inteligência ar�ficial. Os filósofos ajudariam na pro-
gramação de máquinas inteligentes, principalmente aquelas que, no futuro,
precisem lidar com dilemas morais.

2. PARADIGMAS, ESFERAS E QUESTÕES

. História da Filosofia:
- Se como disse Aristóteles, a filosofia começa com o espanto, ela deve ser tão
an�ga quanto a própria humanidade. Mas, até onde sabemos, antes de 600
a.C., as reações aos enigmas próprios da condição humana eram mí�cas e reli-
giosas, envolvendo apelo à tradição e ao sobrenatural. A filosofia grega an�ga
con�nuou durante todo o período helenís�co e no período em que a Grécia e
a maioria das terras habitadas por gregos faziam parte do Império Romano. A
filosofia foi usada para extrair sen�do do mundo.
- A filosofia do chamado período medieval, do declínio da cultura pagã clássica
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ao Renascimento, se caracteriza pelo interesse de pensadores judeus, cristãos


e muçulmanos em combinar a filosofia grega e romana com a ortodoxia reli-
giosa.
- Com o fim da Idade Média, um espírito renascen�sta floresceu na Europa.
Nesse período de inovação e descoberta, surgiu uma nova cepa de pensadores
que contestaram as ideias medievais ortodoxas sobre a ordenação do Univer-
so e da sociedade. Há o florescimento da ciência e o desenvolvimento das
grandes concepções epistemológicas e é�co-polí�cas que marcaram o pensa-
mento moderno.
- A filosofia contemporânea, do séc. XIX aos dias atuais, derrubou as certezas
do pensamento clássico. Estudar filosofia abre novas perspec�vas sobre o
mundo e nós mesmos e fornece instrumentos poderosos para pensar clara-
mente num vasto domínio de contextos. Podemos descobrir que a filosofia
põe em causa aquilo em que sempre acreditamos.

. Áreas filosóficas:
- Qualquer assunto filosófico está inserido numa das áreas da filosofia e co-
nhecer as áreas, os seus limites, os seus problemas e conceitos (ser, jus�ça,
Deus, amor, verdade, alma etc.) é central para uma melhor compreensão de
qualquer estudo que você irá desenvolver em filosofia.
- Eis algumas áreas filosóficas: filosofia do direito, filosofia polí�ca, filosofia da
história, epistemologia, teoria do conhecimento, filosofia da ciência, filosofia
da biologia, filosofia da matemá�ca, esté�ca, filosofia da linguagem, filosofia
da mente, é�ca, antropologia filosófica, lógica, filosofia da educação, meta�si-
ca, filosofia da natureza e filosofia da religião.

. Questões filosóficas: (Blackburn, Pense: uma introdução à Filosofia)


- Muitas vezes, a filosofia examina crenças que quase todos aceitam acri�ca-
mente a maior parte do tempo. Ao examinarmos as nossas crenças, muitas
delas revelam fundamentos firmes; mas algumas não. O estudo da filosofia
não só nos ajuda a pensar claramente sobre os nossos preconceitos, como
ajuda a clarificar de forma precisa aquilo em que acreditamos.
- Eis algumas perguntas que qualquer um de nós pode fazer sobre nós
mesmos: o que sou eu? O que é a consciência? Será que eu posso sobreviver
à morte do meu corpo? Será que posso ter a certeza de que as experiências e
sensações das outras pessoas são como as minhas? Se eu não posso par�lhar
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as experiências das outras pessoas, será que posso comunicar com elas? Será
que agimos sempre em função do nosso interesse próprio? Será que sou uma
espécie de fantoche, programado para fazer as coisas que penso fazer em
função do meu livre-arbítrio?
- Eis algumas perguntas sobre o mundo: por que razão há algo e não o nada?
Qual a diferença entre o passado e o futuro? Por que razão a causalidade acon-
tece sempre do passado para o futuro, ou será que faz sen�do pensar que o
passado pode ser influenciado pelo futuro? Por que razão é a natureza regu-
lar? Será que o mundo pressupõe um Criador? E, se pressupõe, será que pode-
mos compreender por que razão ele (ou ela ou eles) o criou?
- Por fim, eis algumas perguntas sobre nós e o mundo: como podemos ter a
certeza de que o mundo é realmente como pensamos que é? O que é o conhe-
cimento e que quan�dade de conhecimento temos? O que faz de uma área de
inves�gação uma ciência? (Será a psicanálise uma ciência? E a economia?)
Como conhecemos os objetos abstratos, como os números? Como conhece-
mos os valores e os deveres? Como podemos saber se as nossas opiniões são
obje�vas ou apenas subje�vas?

3. O FILÓSOFO FORNECE RAZÕES PARA AS OPINIÕES

- Peter Gibson, na obra Filosofia para quem não é filósofo, destaca o seguinte:
-- Se você se sentar em silêncio no fundo da classe em uma aula de Filosofia,
vai ouvir pessoas expressando pontos de vista sobre tópicos bem abstratos.
Entretanto, elas não estão apenas expondo opiniões. Seus ouvintes não
apenas exigem razões para essas opiniões, como as próprias pessoas falando
se concentram mais em suas razões do que em suas opiniões, e podem até
oferecer objeções aos seus próprios pontos de vista. O estudo das razões para
as opiniões está no cerne da Filosofia.
-- Obviamente, uma discussão racional sobre Direito ou jardinagem também
está interessada nas razões para cada opinião, mas a Filosofia tem também
uma temá�ca muito dis�nta. Os filósofos tentam compreender o mundo.
Todavia, muitas outras disciplinas – como Física, Química, Esta�s�ca, Biologia,
Literatura, Geografia e História – buscam a mesma coisa.
-- Os filósofos fazem perguntas mais gerais: O que é um objeto? Uma lei? Um
número? Uma vida? Uma pessoa? Uma sociedade? Uma história? Um evento?
Cada um desses conceitos é tomado como algo certo por falantes comuns, até
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nos perguntarmos exatamente o que cada um deles significa – e é aí que os


enigmas, ambiguidades e imprecisões começam. Outras disciplinas devem
presumir que já conhecem o significado dessa terminologia comum, enquanto
a Filosofia tenta não tomar nada como certo.
-- Filósofos se concentram nos conceitos essenciais que formam a base para o
nosso pensamento. As ideias estão em nossas mentes, mas se referem ao
mundo exterior, e o obje�vo é pensar mais claramente de modo a compreen-
der o mundo mais claramente. A Filosofia busca a clareza, mas sua caracterís�-
ca fundamental é sua natureza altamente generalizada. Especialistas inves�-
gam o mundo �sico, ou o passado, ou como melhorar nossas vidas na prá�ca,
enquanto a Filosofia busca entender a estrutura da nossa compreensão. Todos
nós queremos fazer a coisa certa e ser uma boa pessoa, mas o que torna algo
“certo” ou “bom”? Queremos viver em uma sociedade justa, mas o que é “jus-
�ça”?
-- Podemos, portanto, definir a Filosofia como a tenta�va de compreender a
realidade e a vida humana em termos bem gerais, estudando ideias essenciais
ao nosso pensamento para formar uma imagem guiada por boas razões. A
maioria das obras filosóficas famosas se encaixa nessa descrição, exceto por
alguns desajustados. Os filósofos tendem a ques�onar tudo, até a natureza de
sua própria área de estudo.
-- Na Grécia An�ga, a Filosofia era estudada principalmente por meio de con-
versacões nas escolas famosas, com livros sendo um resultado ocasional. Na
Europa medieval, o foco principal residia em explicar os famosos textos an�-
gos que haviam sobrevivido, especialmente os de Aristóteles. Com a chegada
da imprensa, tornou-se possível dar uma ampla circulação a novos livros, e a
Filosofia centrou-se no debate escrito entre os principais eruditos, que com
frequência viviam isolados uns dos outros. O surgimento de várias universida-
des novas no século XIX mudou imensamente a prá�ca da Filosofia e, hoje em
dia, os principais filósofos, em sua maior parte, passam suas carreiras dentro
dos departamentos das universidades. O seminário universitário moderno
lembra as conversações das escolas an�gas, mas também existem inúmeros
trabalhos publicados em revistas especializadas, com respostas crí�cas de co-
legas, e conferências internacionais regulares que se concentram nos tópicos
especializados dentro da Filosofia.
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