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Rebeca Alexandrino Rabelo

O tesouro do Dragão do mar

Fortaleza

2019

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1
Rebeca Alexandrino Rabelo

O tesouro do Dragão do mar

Livro artesanal escrito e confeccionado por


Rebeca Alexandrino Rabelo, Fortaleza, Ceará.

Fortaleza
2019

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Dedicatória

Dedico primeiramente a Deus por me conceder a


oportunidade de escrever e transmitir o conhecimento
através do poder inigualável das palavras, a minha mãe
Luciene Alexandrino Carvalho por sempre me apoiar e
acreditar em minha capacidade e potencial de escrita, e
não posso deixar de dedicar também esse sincero
agradecimento aos meus queridos leitores que tornam
cada livro em algo único e extremamente especial, pois é a
vontade de querer inovar cada vez mais que me faz ser
cada vez melhor.

Agradecimento

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3
Agradeço primeiramente a Deus que me propiciou a
vitória, pois Deus capacita os seus e os faz vencedores,
agradeço a minha mãe, digníssima dona Luciene
Alexandrino Rabelo por ser a precursora da escrita na
família e através de seus magníficos poemas da Flor do
Norte acender em mim a centelha de amor pela literatura e
dessa forma também escrever histórias maravilhosas
fazendo pulsar este meu coração bombeando as letras
para contar as história de meus livros e eu também não
podia esquecer se você caro leitor pois qual o sentido de
escrever se não fosse pelo amor ao conhecimento e para
levar a historia com todo o carinho até você pois sintam-se
abraçados em cada letra.
Rebeca Alexandrino Rabelo

Epígrafe

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Nos pequenos gestos é que podemos medir o valor dos
homens íntegros e assim os pequenos se tornam
grandiosos pela beleza de seus atos, e o nordestino é sem
duvida perito em resiliência.
Rebeca Alexandrino Rabelo

Apresentação

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Nesse livro será contada a história de Francisco José do
Nascimento o lendário Dragão de uma forma que você
nunca viu, será como olhar através dos olhos dele e voltar
no tempo para reviver todas as coisas que aconteceram
para culminar na libertação dos escravos em 25 de março
de 1884 quatro anos antes de a lei áurea que só foi
promulgada em 13 de maio de 1888.
Sem duvida o feito histórico de Dragão auxiliou para que
culminasse na concretização da lei áurea assinada pela
princesa Isabel, bem como emplacar o início da construção
de uma nova sociedade abolindo a escravidão e dando aos
negros a oportunidade de recontar sua historia e reconstruir
sua identidade cultural e étnica.
Essa incrível história mostrará a trajetória de Dragão do
mar desde sua infância até as conquistas mais importantes
de sua vida e assim você leitor vai se emocionar e viajar
nas mais belas histórias de uma pessoa real gente da
gente que mudou a história.

Prefácio

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Ouse sonhar tal qual Dragão do Mar sonhou por um
mundo onde a justiça e a igualdade se faz presente através
de cada um de nós, as vezes os milagres são apenas
pessoas boas que agem diferente e mudam tudo em um
pequeno ato, um pequeno gesto pode ser que através
disso você também entre para a história assim como Chico
da Matilde entrou, por isso ouse agir pois somente os
homens de ação que acreditam em seus ideais é que vão
contemplar os bons frutos de seus atos.
Ouse fazer um desejo pois desejar abre caminhos para a
esperança e ela é o que nos mantem vivos, por isso
acredite em seu coração e em sua própria bondade, pois
ao fazê-lo outros acreditarão nisso também, porque assim
como o foi preciso Dragão do mar dar o primeiro passo
para se iniciar o movimento pelo abolicionismo para que
outros pegassem o exemplo, você também carrega em sua
mão a escolha de fazer alguma coisa ou ser totalmente
omisso.

Sumário

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7
Capa...............................................................1
Folha de rosto.................................................2
Dedicatória......................................................3
Agradecimento................................................4
Épigrafe...........................................................5
Apresentação..................................................6
Prefácio...........................................................7
1 Pequeno Chico da Matilde...........................9
2 Navio Tubarão.............................................22
3 Fortaleza 1870.............................................35
4 Palavra e ação.............................................47
5 Navio Espirito Santo....................................58
6 Delfina e Thereza........................................67
7 Sem tempo a perder....................................73
8 Jangada liberdade.......................................82
9 A guerra.......................................................91
Sobre a autora................................................97
Bibliogbrafia....................................................99

Capitulo 1 Pequeno Chico da Matilde

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-Eu me chamo Francisco José do Nascimento, filho de
Manoel do Nascimento um pescador e Matilde Maria da
Conceição que era rendeira, como tantos outros Franciscos
de vida sofrida e filho do Ceará eu vim de origem muito
humilde e simples, quantos Franciscos há nesse mundão
de meu Deus?
-Eu não sei ... Mas eu só sei de uma coisa, nada e nem
ninguém poderá dizer quem você é apenas por causa do
seu nome ou de onde você veio.
-As vezes me pego pensando em meu próprio nome
Francisco José do Nascimento... Para ironia do destino ou
um designo muito significativo de Deus pois a partir de mim
tanta coisa mudou na história do meu Ceará que realmente
posso dizer que a luta pela liberdade e a abolição
começava a se desenrolar ali, naquele lindo dia de 15 de
abril de 1839 quando nasci, meus pais contaram-me que
naqueles tempos eram tempos muitos difíceis em que a
criança cedo se tornava homem e aprendia a engolir o
choro para trabalhar e levando o sustento para casa ajudar
os pais, mas o que eu não sabia era que naquela tarde de
abril ensolarado o sol de Aracati brilharia com muito mais
resplendor para a justiça e a coragem dos homens de bem
e que meu choro ao nascer um dia entonaria o brado
retumbante da liberdade dos cativos, pois ninguém nunca
se vê grande até que precise mostrar o caráter, a fibra que
tem e se tornar o que um dia vocês jovens chamariam de o
Dragão do Mar .
-Como será a infância de vocês aí do futuro, acho que
nunca poderei imaginar nem nas minhas mais longínquas
partes da imaginação e olha que como todo bom Cearense
eu sou mestre na criatividade.
-Na minha época não se tinha muito tempo para brincar
porém o pouco de tempo que me restava para a criança ser
criança eu lembro-me de jogar cabiçulina com os filhos dos
vizinhos, a bola era de meia mesmo bem artesanal e como
toda criança eu amava futebol e como não tinha brinquedos
caros na minha época se brincava com boi de osso pois

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meus pais não tinham condições de comprar algo melhor e
dentro daquela imensa simplicidade eu era muito feliz por
ter pai e mãe, isso já era tudo para mim.
-Hoje em dia diriam que minha cor seria parda, meu pai
possuía a pele mais escura e minha mãe alta e forte tinha a
pele mais clara, mas o que significa cor da pele para você?
-Se para mim não existe uma cor que designe cor de pele,
se todos os tons divinamente arquitetados por Deus são
como seu ilustríssimo aquarela e o conceber de uma nova
vida é a mistura dos tons em uma nova tonalidade divina,
talvez por isso olhei sempre para o meu semelhante com
olhos de amor pois não sou superior e nem inferior a
ninguém, somos todos iguais e nada vai mudar o fato de
que eternamente seremos muito mais do que a nossa
aparência aparenta ser, debaixo de nossas peles há um
sangue vivo que pulsa nas veias e que faz bater um
coração humano assim como o de teu próximo e se tu não
ouvires o grito de existência de um coração é porque você
deixou de ser um ser humano.
-Lembro-me que meu pai costumava me levar para ir ver o
mar e ele dizia:
-Meu filho, o filho de peixe peixinho é, eu vou te ensinar o
único ofício que seu velho pai aprendeu durante toda a
vida, posso não saber ler as letras dos homens porém eu
leio o mapa das estrelas para voltar a terra firme quando já
não vejo mais a terra na linha do horizonte, seu velho pai
sabe quando o mar está para peixe por causa do ciclo da
lua bem como sei também quando o mar estará tormentoso
e sua ressaca se for desafiada pode lhe custar a vida.
Dessa forma eu que era apenas um menino filho de
pescadores em Canoa Quebrada, como tantas outras
crianças da vilinha de pescadores eu também não tinha lá
muita escolha, havia um grande mistério naquele universo
azul um negocio naquela vastidão que eu não sei muito
bem como explicar, parece destino quando o azul do mar
de Aracati te chama, pode ser um convite para se tornar
um genuíno guerreiro do mar.

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Dragão do mar de verdade são os guerreiros do mar do
meu Ceará que enfrentam as ondas, o mar bravio e trazem
para suas casas o sustento, são como meu pai e eu fomos,
sobreviventes das altas e baixas da maré do respirar do
mar que sobe e desce, sobreviventes do sol que torra o
juízo de qualquer cristão vivente no pico do meio dia, o
calor assola o mar castiga más a labuta não pode parar
pois barriga não espera.
Meu pai sempre dizia assim:
-Vê que céu e que mar, pois isso é tudo o que posso deixar
como herança para você meu filho.
-Eu sinceramente já estava muito satisfeito em ter uma
herança tão vasta o mar até onde a vista alcançasse e um
ofício que eu exerceria pelo resto de minha vida com
dedicação, por um momento eu me sentia um pequeno rei
dos mares, a melhor herança que um pai pode deixar para
um filho é o ensinamento de um oficio pois se te dou o
peixe podes se viciar na facilidade de ter tudo na mão
enquanto se eu te ensinar a pescar, toda vez que sentir
fome saberá exatamente o que fazer, pois assim como
José ensinou o oficio de carpinteiro ao seu filho Jesus ,
meu pai me e ensinou a arte de pescar.
- Lembro-me que minha mãe dizia para eu tomar cuidado,
ela sempre estava orando por mim pedindo a Nossa
Senhora dos navegantes para guardar meus caminhos, na
missa sei que seu pensamento era no sentido de pedir a
Deus que a pesca melhorasse e quem sabe com isso
pudesse trazer melhorias a casa.
Minha mãe sempre dizia isso ao meu pai:
-Amor vá com cuidado e que Deus o acompanhe.
-No meu tempo o dia de domingo era muito especial, era o
melhor dia da semana pois mesmo muito simples Matilda
minha mãe separava as melhores roupas para que nunca
se fosse malamanhado para a igreja, o dia do domingo era
o dia em que a religiosidade tomava de conta de toda a
cidade de Aracati e o respeito pelo dia do descanso se
fazia presente, eu que naquele tempo era criança ainda,

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tinha de seguir a tradição e os costumes dos mais velhos e
procurar brincar com as outras crianças sem sujar as
roupas porém nem as advertência de minha mãe me fazia
parar a algazarra da brincadeira junto as outras crianças
era preciso aproveitar o tempo pois eu sabia que no dia
seguinte todo o trabalho como pescador junto ao meu pai
começaria outra vez .
-Eu era muito jovem ainda para entender, como que uma
igreja que prega Deus aceitava tão abertamente que
existisse a escravidão, como pode um homem achar que
pode ser dono de outro homem como se ele fosse uma
mercadoria e quantas vezes enquanto pescava com meu
pai via os navios negreiros chegarem e de lá em condições
cruéis e desumanas saírem de lá seres humanos
acorrentados, despidos tratados como animais e vendidos
como a força de mão de obra nas fazendas para os
senhores de engenho e aqui em Aracati para as fazendas
de algodão e de criação de gado, o negócio era altamente
lucrativo um trabalhador que morre de tanto trabalhar e não
recebe nada por isso, porém a igreja fazia vistas grossas
para a realidade que estava diante de seus olhos, pois
quando o homem esquece de ter humanidade para com o
próximo é sinal de que pode-se perder a fé em todo o resto.
-Foi onde vendo isso meus olhos de criança já tão cedo
viram pela primeira vez até que ponto o ser humano pode
ser cruel e conseguir se superar no quesito maldade, tudo
em nome do mercado consumidor e da produtividade, a
produção não era com aquela parafernalha que vocês hoje
chamam de máquinas, a máquina que hoje colhe e faz o
que 1000 pessoas demorariam muito tem para fazer
naquele ano a máquina era o escravo, a força da
produtividade era o escravo que sendo nobres de sua
saudosa terra eram capturados, aglomerados, traficados e
trazidos ao Brasil como sequestrados de sua nação, cheio
de saudade e de bem querer a sua amada África a terra
mãe e que proibidos de falar sua língua pátria, proibidos de
cultuar seus deuses e de transmitir os conhecimentos mais

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amplos de sua cultura por ser considerados contrários ao
que pregava a religião católica, como é que transmitiriam
valores de geração em geração como era feito em sua terra
natal, sendo que tinha de ser feito tudo escondido, o
etnocídio não foi só de vidas mais também da cultura
africana ancestral, através da caça aos negros para o
escravagismo e a proibição de sua cultura e culto religioso.
-O que foi que eles fizeram para merecer serem tratados
assim, era isso que eu me perguntava quando via as
jangadas chegarem até o navio negreiro e transportarem
suas vitimas inocentes para mão do carrasco que os
mataria de tanto trabalhar e que seria por sua vez seu
senhor o dono da fazenda, seu futuro proprietário como se
o ser humano fosse como um bicho que se compra e se
vende quando bem se tem vontade e pensando nisso eu
comecei a amar a liberdade e assim como eu era livre
passei a desejar que eles pudessem provar desse mesmo
sentimento de igualdade.
-Qual é o crime mais grave, a falta de humanidade para
com o próximo ou a omissão da ação porque lhe convém?
-Eu sonho com o dia em que seremos todos iguais como as
gotas do mar se unem para formar os oceanos pensava
eu , como que em um sonho e como todo cearense
também é feito de sonhos eu também sonhava em poder
dar uma vida melhor para os meus pais porque a vida na
vila de pescadores era muito difícil .
-Foi aí que aprendi desde cedo que o nordestino é o povo
mais batalhador que existe no mundo, pode sofrer sim, mas
é porque lutou, pelejou ,fez de tudo para ter um espaço e
ninguém deu a oportunidade, até recorrer ao santo de
devoção se recorre porém sem resposta, no céu se procura
pela barra e a barra não tem, a chuva não vem e a angustia
no coração entra sem dó e não tem oração que dê jeito na
situação é da coragem que o nordestino cria a força de
onde nem tem para resistir e fazer de seu sertão sua
morada fidedigna na cara e na coragem, pois não é só fé é
também esforço.

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-O nordestino nunca foi fraco é o espécime mais resistente
que dei de fé pois migra com a seca, cria meios de viver
onde tudo parece inóspito e sem possibilidades e a
inteligência e a criatividade é que faz com que transformem
todo o mundo ao seu redor, o nordestino devia ser
estudado porque como a gente posso garantir que não tem
não.
-Uma vez meu pai me disse quando eu era pequeno, filho
as velas são assim mesmo, porque fica mais fácil de
colocar na direção certa, dá até para navegar contra a
maré.
-Hoje eu entendo o que meu pai me disse de uma forma
muito mais profunda, nessa existência assim como a
jangada é capaz de navegar contra a maré devido seu
formato, nós homens também navegamos contra a maré na
jangada da vida e nessa vida nos deparamos com tantas
situações onde temos de tomar uma decisão difícil, a vida
muitas vezes não vai no sentido que a gente quer, más
cabe ao capitão de seu barco tomar as cordas de sua
jangada e dar a vida sua devida direção nem que seja
conta a maré.
-Na atualidade você jovens dirão palavras lindas para
explicar uma vela de uma jangada, dirão que só é capaz de
navegar contra a maré porque é aerodinâmica e que esse
princípio foi o mesmo usado por Alberto Santos Dumont
quando usando o principio mecânico da alavanca em 23 de
outubro de 1906 fez o seu lendário avião e o fez voar, eu
não alcancei a era do tal bicho voador que leva gente
porque eu pertenci a era em que a coroa portuguesa ainda
governava o Brasil e os meios de transporte eram por terra
e água e eu morri sem ver um único avião no céu, porem
eu fico imensamente orgulhoso pois no fundo de meu
coração eu sempre soube que o brasileiro seria capaz de
tirar os pés do chão e voar tal como os pássaros do céu.
-Vocês do futuro dirão que as nossas jangadas estão
relacionadas a uma tal dinâmica dos fluidos e que nossas
velas seriam chamadas de velas latinas porque é coisa

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típica daqui do meu Ceará, pois de tudo isso eu como
pescador só sei que são triangulares e que quando úmidas
concentram em si o poder de empurrar a jangada no mar,
mas os estudados dirão que isso se dá devido a diferença
da pressão do ar e que por isso nós jangadeiros
conseguimos fazer a magia acontecer de navegar contra o
vento.
-Com meu pai aprendi que a graciosa curva quase que
uma parabólica na parte superior do triangulo de nossa
jangada e a outra assimétrica é de proposito por causa do
mastro que é feito para girar suavemente, pra lá e pra cá
dando o sentido a jangada, naquele tempo nem eu e nem
meu pai sabíamos que isso era o principio mecânico da
alavanca em torno do eixo, o nordestino muitas vezes
desconhece a matemática e a física da coisa, mas mesmo
assim faz seu invento funcionar extremamente bem porque
eu desconheço um nordestino que não tenha a criatividade
no sangue e a engenhosidade no juízo.
- Com meu pai aprendi até a construir e a reparar a
embarcação, lembro-me de muito pequeno meu pai dizer
assim:
-Filho a jangada é feita de seis paus e quando ouvires dizer
que fulano ou ciclano vai ver com quantos paus se faz uma
canoa é porque ainda está muito da devagar a raiva do
dizente porque uma canoa só é um único pau e só, um
tronco que cavado a moda indígena que é esculpido um
oco nele e a pessoa vai para dentro e vai embora rio
abaixo, raiva mesmo devia de ser a pessoa dizer a outra
que ela ia ver com quantos paus se faz uma jangada pois
são seis, dois mesmo no centro e por isso chamamos de
“meios”, dois simétricos cada um de um lado que
chamamos de “mimburas” pois assim os índios chamam
essas duas madeiras das partes extremas de nossa
jangada e mais dois extremos que chamamos de “bordos”.
-Eu criança ouvindo aquilo ficava fascinado e em minhas
memórias ouvia meu pai explicar sobre como era feita a
janganda e eu me lembro de fechar meus olhos para

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imaginar uma obra de arte daquela pedaço por pedaço
como um enorme quebra-cabeças que ia se montando em
minha imaginação a medida que meu pai ia me contando
sobre cada pequeno detalhe da embarcação que
trabalhávamos todos os dias debaixo do esplendoroso sol
do Aracati naquele mar tão belo e cheio de fartura em
Canoa quebrada, e meu pai narrava para mim exatamente
assim:
-Filho agora vou contar como é o construir de uma beleza
flutuante dessas, os “meios” e as “mimburas” são
encaixados por cavilhas de madeira com resistência mais
dura do que a da madeira que faz a madeira das peças da
jangada para termos a certeza de que ela não vai se abrir
ao meio com a braveza do mar, agora com relação aos
paus que formam os “bordos” colocamos eles muito bem
encaixados nas “mimburas” dessa forma eles devem ficar
mais elevados para só depois sobre essa estrutura primeira
se colocar os dois bancos de madeira, nesses bancos
formosos é onde colocamos quatro hastes de madeira
presas as mimburas e depois ainda colocamos uma tábua
para que sustente com mais rigidez, “o banco de vante” é
onde colocamos o mastro da nossa jangada, já “o banco de
ré” é onde eu fico pois eu sou o mestre e diretor da jangada
por isso meu filho esse banco também leva o nome de
“banco do mestre” pois é nele que o capitão vai e é no meu
“banco do mestre” onde tem meu remo e com ele dirijo
para qual rumo a embarcação vai, já sobre os remos eles
ficam muito bem encaixados e seguros entre as mimburas
e os paus do meio é por isso que esse encaixe chamamos
de “o meio de boreste”, para que saiba exatamente tudo
sobre nossa jangada meu filho veja bem aqui, exatamente
aqui fica a abertura entre os paus do meio que é onde
passa a “tábua de bolina”, ela serve para a gente soltar no
mar para reduzir o caimento quando a proa está bem
cingida a linha do vento e evitar problemas ,esse tipo de
navegação inteligente é chamada de “navegar á bolina”.

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-Meu pai foi meu grande mestre e ele ensinou tudo o que
eu precisava saber para poder seguir o mesmo ofício que
ele e eu era o seu maior orgulho o pequeno pescador que
tão pequeno já conhecia desde os elementos de uma
jangada até os samburás os cestos que minha mãe fazia e
que na volta da pesca eu trazia repletos de peixes para a
alegria geral.
-Como poderia me esquecer, lembro minha mãe Matilde
pegar as taquaras e o cipó e sentada em um tamborete
tecia habilidosamente os cestos que eu e papai trazíamos
com os peixes, nesse mesmo cesto colocávamos as iscas
e eram extremamente uteis no transporte de nossa pesca
diária, com isso aprendi que as mulheres tinham um papel
muito importante na vila dos pescadores de Canoa
Quebrada, elas educavam seus filhos até onde conseguiam
transmitir seus valores e conhecimentos, faziam todos os
afazeres da casa e ainda faziam cestos que eram
verdadeiras preciosidades para o transporte dos peixes
para a terra firme, mas minha mãe era muito mais
habilidosa na arte da renda onde desenvolvia com primor
verdadeiras obras de arte para vender e tirar o sustento da
casa e ser um meio de renda extra para nós.
-Minha mãe como tantas senhoras da vila de pescadores
desenvolvia a renda e naquele artesanato entrelaçando e
cortando fios de algodão ela fazia desenhos belíssimos em
um vazado perfeito que eu olhava e minha mente dava um
nó mas que ela tecendo sabia exatamente como se faz e
minha mãe dona Matilde dizia:
-Veja Chico meu filho como é, há muitos tipos de renda
porém as que mais se desenvolvem aqui no Ceará é a
renda de “Bilros” e o chamado “Filé” que é uma técnica
mista influenciada por índios e europeus cada um
influenciou com uma parte para culminar no que aqui no
Ceará se chama de filé a renda mista, já a renda de Bilros
está aqui desde o século 17 e dizem que chegou aqui
através dos colonos portugueses e é através dessa renda
em especial que o artesanato passou a ser reconhecido lá

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pela Europa, essa é a chamada renda da terra feita na
almofada de bilros e eu só não posso te ensinar como é
que se faz porque essa tradição só pode ser passada de
mãe para filha.
-Minha mãe era inacreditavelmente guerreira e forte
trabalhava até tarde para terminar todos os afazeres de
casa, cuidava de nós e ainda batalhava para terminar as
rendas para vender e apurar algum dinheiro, ela e meu pai
tentaram de todas as formas se manterem aqui, porem
uma seca muito grande se iniciou em 1845 e com apenas 6
anos vi os sonhos se desfizerem como castelos de areias e
nossas pegadas serem desfeitas pelo mar, o que eu posso
dizer sobre isso... senão o triste fato que igual como tantas
crianças da vila de pescadores de Canoa Quebrada eu vi
meu pai abraçar muito forte minha mãe entre lágrimas e
pedir que ela o esperasse, e ele jurou que assim que
encontrasse um emprego mandaria noticias por cartas e
que assim que juntasse dinheiro o suficiente mandaria nos
buscar, minha mãe se fez de forte mas eu vi quando ela
chorou porque sentiu que um pedaço de seu coração partia
para um lugar chamado Amazonas que era para onde meu
pai iria para tentar a vida, Manoel meu pai reuniu suas
poucas coisas em uma pequena mala surrada e se foi.
-Uma das lembranças mais tristes de minha infância foi ter
visto meu pai partir por causa da seca para tentar a vida
em outro lugar para tentar trazer o sustento para casa e ao
mesmo tempo sobreviver a seca cruel do ano de 1845, fui
para a soleira da porta e lá fiquei vendo o meu herói pouco
a pouco ir desaparecendo na linha do horizonte assim
como os navios somem no mar aberto, meu pai que tanto
me ensinou, meu pai que me contava histórias que era a
minha melhor companhia e que me ensinou tantas coisas
do mundo agora estava indo embora e agora seria somente
Deus eu e minha mãe.
-Naquela mesma noite não consegui dormir e perguntava
para minha mãe se meu pai voltaria para casa e minha
mãe respondia que logo logo ele estaria de volta e que eu

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não me preocupasse, então para tirar meu foco da tristeza
da partida de meu pai ela me contava histórias cheias de
fantasias coisas que só existem nas lendas do magnifico
imaginário nordestino, com aquele poder da paciência e da
persuasão que só mãe possui, ela me pegou no colo
enxugou minhas lágrimas de criança e me fez dormir
tranquilo, ela me consolava e me acalentava porem quem
iria consola-la, o homem da casa havia ido tentar a vida em
outra região e agora o que faria sem o apoio e a ajuda dele
enquanto não mandasse algum dinheiro.
-Depois que meu pai foi embora nada mais foi como era
antes, os dias pareciam uma eternidade eu tentava animar
minha mãe porém a situação por si só não era das
melhores, por diversas vezes a vi olhando para o mesmo
caminho por onde seu amado Manoel passou para ir
embora , nessas horas cheia de saudade levava as mãos
ao coração, como quem tenta sustentar a dor abstrata com
as próprias mãos ,como se isso fosse possível, sendo que
todo o amor guardado escorria entre os dedos juntamente
com o peso do tempo e a ausência era quem reclamava a
falta de seu grande amor e por isso eu via uma lágrima
solitária e fria escorrer naquele rosto nordestino, e aquela
lágrima era uma gota no oceano de lágrimas das muitas
famílias que estavam passando situação semelhante a
minha.
-A seca avançava sem dó e na minha época as notícias
andavam o mundo através de jornal e revistas, aquele mar
de letras comunicava noticias que não eram das mais
animadoras, na verdade falava sobre o avanço da seca em
todo o nordeste, assolando o gado e o tão cobiçado ouro
branco o algodão que era amplamente comercializado para
o exterior, e a guerra da Cessação nos Estados Unidos
estava apenas se iniciando, uma guerra entre o norte e o
sul pelo fim da escravidão, claro que não podia dar certo o
que começou errado pois pessoas não são mercadoria que
se possa comprar e vender, o negro tem direito a dignidade
e não pode ser negado dele o fato de que possui alma fato

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que os brancos muito mentiram para justificar seus atos
cruéis disseram o mesmo dos índios porém a verdade
sempre vem a tona, os políticos daqui do Brasil
murmuravam sobre a libertação dos cativos mas não era
porque fossem bondosos, mas sim porque queriam
transformar o escravo em consumidor no mercado de
consumo, não tiveram a preocupação de nem sequer
pensar em como inserir o negro na sociedade de forma que
tivesse oportunidade, dignidade e respeito, pois é muito
fácil para os políticos demagogos falarem quando o
problema não é com eles, quando quem irá sofrer as
consequências não serão eles que estão no poder.
-Como uma criança não podia imaginar que tudo isso
indiretamente e diretamente trazia tantas mudanças para a
vida de meus familiares, pois como eu poderia imaginar
que enquanto Aracati passava por toda essa reviravolta
devido as condições climáticas no Amazonas estava
apenas iniciando o que seria chamado depois de ciclo
promissor da extração da borracha, se hoje em dia vocês
chamam de bóia fria aqueles que saem de sua terra para
trabalhar durante um período para reunir riquezas para
trazer para casa na minha época o nome dado era de
retirantes.
-O que é um retirante senão uma pessoa assim como você
que está ali apenas por uma chance de sobreviver e salvar
a vida dos seus, me pergunto ... Que pecado há nisso?
Absolutamente nenhum, mas a visão que se tem é
perseguir só pelo simples fato que não fala como você, não
tem o mesmo costume que você e porque pensa diferente
de você, hoje vocês do futuro chamam isso de xenofobia,
outra coisa que penso muito é assim como o Norte e o Sul
dos Estados Unidos estavam em conflito por causa da luta
pela causa abolicionista aqui no Brasil já se começava a
pensar diferente era o iluminismo chegando as mentes
brasileiras pois o vento nortista exalava o cheiro da
liberdade e da paz coisa que não agradava Dom Pedro I.

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-Enquanto isso meu pai distante de nós e quando chegava
notícias do Amazonas era motivo de muita festa e
celebração, pois a maior felicidade de um nordestino é
saber que seu ente querido está bem, minha mãe guardava
com muito amor as cartas de meu pai e para ela aquilo era
o tesouro mais precioso do mundo.

Capitulo 2 Navio Tubarão


-Aquele sonho dourado de melhorias para todos acabou
como em um passe de mágica quando o cacheiro viajante
chegou com aquela carta, nela dizia que meu pai havia
morrido no Amazonas.
-Minha mãe caiu logo no choro e eu abraçado a ela dizia,
mamãe o que será de nós, agora eram só eu e minha mãe
no meio de uma seca que parecia não ter mais fim.
-Ela bem que tentou sustentar a casa sozinha mas estava
impossível, lembro muito bem que o ano era 1847 eu tinha
apenas 8 anos os políticos que vinham de fora do país com
ideias de liberalismo politico e que falavam sobre a
liberdade e a abolição eram dados como abversivos por
Dom Pedro I, se ouvia falar sobre os belos ideais dos
letrados e estudados porém em toda essa história eu era
apenas uma criança de 8 anos que em 1847 havia perdido
seu grande herói, meu pai.
-Minha mãe já sem muitas alternativas, foi a procura de um
oficio para mim, vocês do futuro que ao ler essa parte
ficaram escandalizados porque com apenas 8 anos tive de
ir trabalhar saibam que em 1847 isso era muito comum,
crianças eram tidas como pequenos adultos quando o
quesito era mão de obra, haviam crianças na idade que eu
tinha na época desempenhando os mais diversos ofícios,
sem direito a ter uma infância digna, sem direito a brincar e
nem a ser o que uma criança deve ser, apenas uma
criança e se no futuro vocês detém de mecanismos de leis
e direitos que protegem as crianças e que proíbem o

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trabalho para os menores se tenham como privilegiados
pois no meu tempo nada disso existia, o que existia de
verdade era o fato de que eu tinha pressa em ter algum
sustento para não passar necessidade e poder ajudar
minha mãe, sim eu era um pequeno grandioso guerreiro e
eu nem fazia ideia disso.
-Minha mãe conseguiu um emprego para mim e eu fiquei
sob a tutela de um senhor dono de um navio a vapor
chamado Tubarão, foi aí onde eu senti o quanto um pai faz
falta, pois se meu pai não tivesse faltado, eu não estaria
aqui, a ausência do senhor da casa designa tantas coisas
inclusive a mudança de todo um destino.
-Passei a ser moleque de recados e enquanto trabalhava
fazendo todos os serviços do navio me deparava com a dor
e o sofrimento dos negros que vinham amontoados dentro
do compartimento da mercadoria, vi como eram tratados e
aquilo entrou em minha mente como algo para jamais ser
esquecido.
-Uma coisa são os olhos de um adulto verem a
pervercidade humana e outra coisa completamente
diferente são os olhos de uma criança verem a mesma
coisa, foi aonde cedo eu percebi que estava entrando no
mundo dos adultos mas eu não era adulto, esse mundo era
desumano, cruel e violento, foi onde eu comecei a entender
o verdadeiro significado da palavra liberdade e eu tinha a
certeza de que de certa forma eu também era cativo
daquela situação pois eu estava ali por causa de uma série
de fatos que culminaram em onde eu estava agora e se eu
pudesse escolher com certeza não estaria ali, ver todo
aquele sofrimento me moldou e eu fui me tornando pouco a
pouco o homem que eu queria ser, uma pessoa critica que
começava pouco a pouco a entender o porque que era tão
importante a abolição dos escravos.
- Todos os dias durante anos que perdi trabalhando
naquele navio Tubarão, eu vi como funcionava o tráfico
negreiro onde as famílias eram separadas e uniam pessoas
de tribos diferentes afim de que por não entender o dialeto

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um do outro ficassem sem conseguir se comunicar e assim
não pudessem fugir e nem organizar motins, se ouvia muito
falar sobre a doença da saudade o “banzo” era quando o
cativo sentia tanta saudade de sua terra natal que não
comia mais nada e morria de fome e de sede, havia
também o absurdo de passarem óleo de baleia para que os
escravos ficassem com a pele brilhante dando o aspecto de
saudável sendo que no navio eram tratados a pão e água ,
vendo tudo isso eu pensava...
-Como é que quando se lavava animais os tratavam com
água, boa ração e tudo do bom e do melhor com muita
fartura para que quando chegasse ao seu destino
chegasse bem e saudáveis, mas quando era carregando
seres humanos não se tinha esse cuidado os deixavam
junto a fezes, não eram bem alimentados ao chegar ao
destino muitos estava doentes, magros e abatidos, como é
possível que o mais nobre dos seres fosse tratado daquela
maneira.
-De todas as coisas que vi e ouvi no navio a vapor Tubarão
teve uma que me serviu muito em minha idade adulta,
aprendi o oficio que eu desempenharia por toda a minha
vida, ser um prático de navegação e dessa forma não
deixar o navio encalhar, o prático é aquele que deve
conhecer como a palma de sua mão cada canto do lugar
aonde vai, a profundidade , a força da correnteza, o peso
máximo que aquele navio pode comportar para que não
haja percas, a minha presença como prático era muito
importante pois eu não sei se vocês sabem, más o porto de
Fortaleza na minha época era péssimo para se atracar em
terra firme, então se fazia necessário alguém experiente e
que soubesse exatamente até onde o navio podia ir sem
causar nenhuma avaria.
-Devido as condições geológicas do porto de Fortaleza o
navio Tubarão precisava de embarcações menores para
lhe dar suporte e fazer o translado para a terra firme dos
escravos para que dessa forma ao chegarem na praia do

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peixe tivessem o destino traçado pelos compradores
senhores donos de fazendas.
-Só a titulo de conhecimento de vocês, a praia que hoje
vocês batizaram com o nome da índia dos lábios de mel, a
lendária índia Iracema foi idealizada por José de Alencar
quando em 1865 inspirado em lendas que contavam como
surgiram os primeiros cearenses criou essa historia, as
histórias que ele ouviu quando criança nomearam a praia
de Fortaleza que vocês conhecem aí no futuro como praia
de Iracema, mas aqui na minha época era a chamada praia
do peixe e era para cá que os negros eram trazidos e
despachados para seus destinos finais.
-Quando pensei que não fariam uma lei para tentar frear
perversidade humana com o tráfico que eu via desde
menino surgiu uma luz lá longe no fim do túnel, uma luz
que seria só o começo da luta pela libertação guiando
pelos caminhos legais o que seria o principio da abolição,
mas venhamos e convenhamos que se não fosse por esse
começo nada do que viria a seguir teria acontecido.
-A Lei Euzébio de Queiroz n°581 de 4 de setembro de 1850
instituiu que o tráfico de africanos para o império estaria
sujeito a repressão severa, eu soube que essa lei não foi
exatamente porque o governo brasileiro quisesse formaliza-
la mas sim porque houve pressão por parte britânica que o
Brasil desse por extinta a escravidão e tudo porque em
1807, o comércio de escravos foi proibido pelo governo
inglês, que, a partir daí, começou uma campanha pela
abolição do tráfico internacional, reunindo vários setores
sociais do Império Britânico. Esse movimento teve reflexos
já nos primeiros tratados entre a Inglaterra e o governo
português, no contexto da transferência da corte lusitana
para o Brasil, foi onde eu comecei a compreender que tudo
na verdade não era só pela questão da libertação dos
escravos, mas havia também um interesse financeiro, pois
queria que o escravo liberto passasse a ser consumidor
para o novo modelo de mercado que estava sendo
desenvolvido pelas elites e eu naquela época nunca que

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iria desconfiar de tudo isso de tão bem orquestrado que foi,
é onde vejo que somos todos peões nas mãos dos
grandiosos.
- Naquela época eu só pensei em uma única coisa que era
o começo do fim da escravidão e fiquei muito animado
quando ouvi pela primeira vez falar dessa lei.
-Como deve ser no futuro, será que a comunicação tem
liberdade para comunicar os fatos tal como são ou será que
são manipulados e contados de acordo com os interesses
de quem estiver no poder? Será que os meios de
comunicação do futuro sofrerão repressão como os daqui
de 1850 e será que vai ser considerado pensar diferente
algo abversivo e prejudicial ao sistema?
-Naquele mesmo ano o jornalismo eu ouvia dizer que
estava marcando colado junto as causas abolicionistas e
isso estava gerando muito desconforto para as elites que
precisavam da mão de obra escravagista dentre os jornais
que atuavam nessa defesa, podem ser destacados, A
Abolição, Oitenta e Nove, A Liberdade, O Amigo do
Escravo, A Gazeta da Tarde e muitos outros, eram
panfletos entregues na surdina, enquanto outros muito
destemidos e corajosos desafiavam a lei recitando poemas
e vendendo os jornais na rua, era visto como total
desobediência incentivar os negros a se rebelarem contra o
regime da escravidão , era tido como desobediência civil
dar abrigo para um escravo em fuga e era considerado
sequestro de escravos quando os abolicionistas
resgatavam os cativos, se querem realmente saber eu
tenho por sequestro o que os traficantes de escravos fazem
porque ali sim é um sequestro retirar pessoas de seu país
para escravizar em outro.
-Enquanto trabalhava, ouvi falar sobre os lideres que
formavam as primeiras vozes intelectuais contra a
escravidão, lembro-me muito bem em ter ouvido falar muito
sobre Maria Tomásia Filgueira Lima ela era casada com
Francisco de Paula Oliveira Lima e juntos fundaram a
Sociedade das cearenses libertadoras, ela se mostrou

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muito grandiosa em seus atos e como presidente dessa
sociedade juntou mais vinte e duas mulheres que se
reuniam debatiam sobre planos de ação para auxiliar na
mudança de mentalidade das pessoas sobre a escravidão
e assim, conversando com os donos de escravos
conseguiam conceder a liberdade aos cativos e quando o
valor pela liberdade tinha de ser pago se reuniam e
compravam a liberdade do escravo.
-Muitos de minha época diziam, mas que disparate uma
mulher como presidente de uma sociedade para libertar os
escravos e ainda por cima se meter em politica e em
assuntos de homem, aonde já se viu isso.
-Eu ouvia tudo isso e pensava, o lugar da mulher é aonde
ela quiser a mulher soma em todo lugar aonde vai pois a
sua forma humanística de ver o mundo torna tudo diferente
e trás muito mais sentido a luta e a causa, sem falar que as
mulheres estavam cada vez mais estudadas, inteligentes e
cada vez mais capazes, o acesso ao estudo era o que
refinava as mentes das mulheres que conseguiam ter o
acesso ao estudo, pois na minha época nem todo mundo
podia estudar, acredito que o fato de subestimarem as
mulheres era pelo fato de a sociedade ser muito patriarcal
e talvez o medo de reconhecer a importância da mulher na
historia e no desenrolar de tudo foi o que fez subjulgar
tanto o poder da inteligência feminina que já se fazia tão
presente mesmo em tempos tão difíceis.
-Quem foi que disse que no meu tempo em pleno 1850 não
tinha escritora mulher redondamente se enganou, no
Maranhão uma professora chamada Maria Firmina dos
Reis se tornaria a primeira romancista da América Latina e
seu livro “Ursula” se tornaria um sucesso, pois contaria
sobre o sofrimento dos escravos durante as viagens e isso
geraria toda uma conscientização, repudio popular contra
os traficantes negreiros e apoio as causas abolicionistas,
eu adorava quando diziam que ela era uma abolicionista
através da mensagem que repassava, seu pseudônimo era
“uma maranhence” mas sabiam que era ela, e o mais belo

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era que ela lecionava crianças brancas e negras sem
exclusão social, era de pessoas assim que o Brasil com
certeza precisava.
-Tinha um que comentavam ter sofrido na pele as marcas
do preconceito, e este era Luis Gama, seu pai era
português porém sua mãe era escrava e seu pai
preconceituoso como era deixou que um amigo vendesse
seu próprio filho, Luis aprendeu a ler com um estudante de
direito e dessa forma se tornou rábula o que no futuro
vocês conhecem como autodidata sem diploma porem
mesmo sem diploma ainda conseguiu libertar mais de 500
cativos.
-Falavam sobre Joaquim Nabuco do qual tinha ideais tanto
abolicionistas como de reforma agraria, em meio a tantos
nomes abolicionistas também estava José do Patrocínio,
filho de uma senhora negra e um padre que nunca o
reconheceu como filho e o criou dentro de sua fazenda,
vendo todo tipo de maldade contra os escravos, José do
Patrocínio estudou farmácia e foi jornalista e poeta e vez
por outra eu ouvia recitarem seus poemas sobre o grito da
liberdade, junto com André Rebouças estiveram a frente da
Confederação abolicionista.
-A única coisa que eu não era a favor e ficava muito
pensativo era sobre indenizar o senhor dono da fazenda
quando libertava um escravo, na verdade quem deveria ser
verdadeiramente indenizado este alguém deveria ser o
negro e não o seu senhor, porque que eu saiba quem foi o
maior prejudicado nessa história toda foi o escravo, pois ele
tinha sua família, sua vida normal, vivia muito bem em seu
país quando de repente foi capturado, sequestrado, levado
como um cativo e obrigado a esquecer sua história e viver
sob leis de um opressor cruel, no meu entendimento o
único que deveria ser indenizado era o negro.
- Eu só sei que aqui em 1850 eu já com 11 anos de idade
já tinha visto muita coisa horrenda, daquelas de botar muito
homem feito para tremer de medo e assombrar o sono de
muito cabra que se diz corajoso, enquanto eu trabalhava no

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embarque e desembarque dos escravos eu ouvia as
noticias lá da terra firme e não eram das mais animadoras.
-A seca cruel assolava mais ainda com uma fome que a
tudo consumia, o gado os pés de algodão e as vidas dos
sofredores que vinham a essas terras causticadas do sol.
-A coroa portuguesa havia proibido o tráfico da África para
o Brasil mas não proibiu o tráfico de uma região para outra
dos escravos que já existiam no Brasil, saindo de um lugar
para outro.
-Os traficantes negreiros eram muito espertos para
enxergar a oportunidade em cada entrelinha da lei Eusébio
de Queiroz e foi exatamente o que aconteceu, eles
encontraram uma alternativa para driblar a lei se fazendo
valer da seca para ganhar lucros com a retirada dos
escravos de uma região para outra.
-Eu refletia comigo mesmo enquanto auxiliava no
embarque dos escravos do navio Tubarão, meu Deus mais
uma vez o negro está sendo prejudicado nessa história tão
terrível, pois o negro já havia sido destituído de sua família
africana, foi obrigado a constituir novos laços e nova família
aqui e agora está sendo retirado mais uma vez de um lugar
para o outro ao bel prazer de seu senhor e para os
interesse financeiros dele e nada mais do que isso.
-Lembrei então das coisas terríveis que os cativos me
contavam, havia todo um sistema de castigo, os escravos
homens que detinham de boa saúde eram separados para
se tornarem escravos reprodutores e eram obrigados a ter
relação sexual para gerar mais força de trabalho para o
dono da fazenda, já as mulheres sofriam abusos de seus
senhores, como se não bastasse isso as senhora da casa
grande quando descobriam a infidelidade de seu marido
castigava severamente a escrava, lhes cortavam os seios,
quebravam-lhes os dentes, mutilavam seu corpo para que
a escrava nunca esquecesse o porque daquelas cicatrizes,
as mulheres escravas das quais eram mais belas o senhor
da casa grande as vestiam melhor para satisfazer aos seus
desejos sendo que eram obrigadas a viver daquela forma,

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consideradas as “jezabeus” elas não tinham culpa da
maldade de seus senhores, quando não podiam ter filhos
eram tratadas de forma muito precária, sendo colocadas
para fazer os serviços mais pesados juntos com os
trabalhadores braçais homens pois na visão do senhor da
fazenda já que ela não podia gerar filhos para ser mão de
obra ela só serviria para trabalhar até o fim de seus dias.
-Enganavam as escravas lhes prometendo que se
gerassem muitos filhos eles concederiam a liberdade a elas
e aos seus filhos caso cooperassem, era tudo mentira, não
passava de mais uma forma de engana-las, no fim eram
todos escravizados e muitas vezes o filho era separado de
sua mãe.
-Ouvi falar entre os cativos sobre um lugar do qual
chamavam de quilombo, diziam que se lá chegassem
estriam livres e que não precisariam mais sofrer castigos
nem do jagunço nem do seu senhor, contara-me que lá se
pode viver em paz, cultuar seus próprios deuses, transmitir
seus valores e tradições sem serem sumariamente
reprimidos, disseram-me que a natureza e eles lá são como
um só e que a identidade do povo africanos se torna viva
outra vez quando pisa naquele solo sagrado, aonde a
escravidão não tem vez, porém também me disseram que
aquele que não conseguir fugir e fosse pego o castigo era
tão grande que os gritos de dor e agonia eram tão
profundos que até a alma se despedaçava e o coração
quebrantado de dor se partia, quem era capturado como
negro fujão ia para o tronco servir de lição aos outros que
tentassem fugir e lá apanharia até perder as forças e os
sentidos, os outros cativos a tudo viam e compartilhavam
da mesma dor e o desejo de justiça e de liberdade era o
que os faziam um só povo outra vez.
-Durante o tempo em que trabalhei no navio Tubarão pude
aprender muito sobre a cultura africana, eles me contavam
alguns segredos de sua milenar e incrível tradição, se aqui
a igreja católica atrás de catequizar os índios disseram que
o verdadeiro nome de Tupã era Deus, os africanos porém

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foram muito mais astutos e para continuar adorando seus
deuses ouviram as caracteriscas dos santos católicos e as
assimilaram aos seus deuses.
-Contaram-me sobre Obatala e a história do saco que
continha a criação onde Exu seu irmão aprontou todas para
que Obatala não conseguisse fazer o mundo sozinho,
sujando as vestes brancas dele e o embebedando, conta-
se que Obatala dormiu e Exu do saco da criação tudo criou,
Obatala entrou em desespero e muito chorou subindo aos
céus Oxalá lhe disse, calma meu filho a criação ainda não
acabou, falta você fazer o homem a obra prima do Criador
vá a terra e procure o ingrediente perfeito para fazer o
homem e em seu coração não esqueçais de por a centelha
da justiça, do perdão e do amor, não se esqueça de dar um
agrado ao seu irmão pois Exu também trabalhou.
-Obatala o homem de branco que na cultura africana criou
os homens eles atrelaram a imagem de Jesus pela
bondade e o amor a humanidade e Exu atrelaram a
imagem do diabo mas a compreensão deles sobre o diabo
não é como a nossa, eles me disseram que assim como no
taoísmos dentro do mal há um pouco de bem por isso que
dizemos que há males que vem para o bem e no bem há
um pouco de mal pois na compreensão deles deve-se
haver o equilíbrio como um todo no quadro geral.
-A parte mais interessante ainda está por vir os cativos me
contaram que assim como na bíblia o homem veio do
barro, na cultura africana também foi assim, Obatala foi a
terra e foi em busca do elemento que melhor pudesse
formar o homem, tentou fazer de madeira mas se lascava,
tentou fazer de ferro mas era muito duro e sem flexibilidade
então em sua procura pelo material perfeito viu Nanã uma
deusa linda escultural toda feita de lama e a deusa moça
pediu dela seu barro para dele fazer sua obra prima, Nanã
disse que daria porém para ter parte na criação um acordo
devia ser feito e selado que quando o homem morresse
devolvesse o material do qual foi feito tal como fora
designado e assim Obatala aceitou e o acordo foi

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consumado pegou o barro e fez o homem e uma mulher
anatomicamente diferentes para que pudesse procriar e se
multiplicar pela terra e para finalizar levou o juízo a Ojalá
para ele como oleiro no fogo que cria coisas a inteligência
lapidar para o homem ter discernimento, para poder ser
sábio transmitir conhecimento e poder ensinar, para ser
inventor e construir e edificar.
- A grande diferença é que na cultura africana o homem e a
mulher vem do mesmo barro e são iguais enquanto na
minha religião a católica me ensinaram que a mulher foi
feita depois e foi da costela de Adão, perguntei para eles o
porque dessa diferença e eles me disseram que quando
dizemos que a mulher foi feita da costela estamos dando
um significado mais patriarcal enquanto que se disser que
veio do mesmo barro estamos a tornando um ser de igual
importância e relevância para o desenrolar da história da
humanidade, depois de ouvir isso aprendi sobre o valor e o
significado que tem a mulher que ela na verdade não
precisa de um tutor mas sim ela é quem nos cuida, parece
ser frágil como uma rosa porém são tão fortes que a tudo
suportam e tem o poder de trazer o mundo a vida que se
fossemos nós homens a traze-la eu não sei como seria, só
sei que com os valores que me repassaram foi que eu vim
entender o porque que Deus fez a mulher alma tão singular
poderosa e feminina.
-Os escravos me contaram que ao pressentir que seriam
sequestrados, cuidadosamente e zelosas as mães faziam
nas cabeças de suas filhas as tranças raiz recheadas de
arroz e outros grãos para que se caso conseguissem
escapar usassem esses grãos como forma de plantio para
recomeçar a vida em outro lugar pois não sabiam se seriam
separadas na viagem e até nisso mãe que é mãe se
preocupa.
-Foi aonde comecei a entender que aquele povo vindo de
outro continente era tão igual a gente, diferentes porém
iguais, seus relatos historias e lendas me fizeram sentir
como eles se sentiam e eu me senti cativado, sensibilizado

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com toda aquela covardia cometida e isso mudou para
sempre como eu compreendia tudo o que eu via.
-Aqui no Ceará a seca persistia de tal maneira que o gado
morria de fome e de sede e o algodão murchava e fenecia
o ouro branco a menina dos olhos dos branco ao calor do
sol nordestino sofria, porém sofriam muito mais as levas
dos escravos que para lá iam pois se já não tinha para o
gado como é que para os cativos trabalhadores tinha?
-Foi onde ouvi o plano engenhoso dos donos de escravos
que já não podiam manter seus cativos, devido a estiagem
e o custo que saia cada escravo os que precisavam de
menos mão de obra começaram a vende-los e a lei
Eusébio de Queiroz proibia o tráfico de um continente para
o outro porém nessa lei havia uma brecha, sabidos como
só eles eram logo entenderam que poderiam traficar os
escravos dentro das terras brasileiras, retirando de um
Estado e levando para outro sem nenhum problema.
-Dessa forma o negro que já havia perdido sua família na
África e que ao chegar em terras cearenses formou novos
laços e família teria suas raízes mais uma vez arrancadas
para ir para outro lugar desconstruindo o que havia sido
construído, desfazendo famílias inteiras que não mais se
veriam outra vez.
-Dessa forma os escravos eram selecionados e os fizeram
migrar como em caravanas causticantes a pé esses sairiam
aqui do nordeste para o sul, conduzidos a força eles iam e
deixados eram no galpão de Jacarecanga, lá passavam um
dia para recobrar as forças, a viagem a pé era tão longa
que chegavam exausto e sem condição de prosseguir
então os alimentavam com muito precária comida,
esperavam o novo dia nascer para os levar aos montes
para a Praia do peixe a mesma que vocês do futuro
chamam de praia de Iracema.
-Dali os navios negreiros chegavam e não atracavam pois
não havia nenhum porto seguro, o navio então longe se
situava porque eu não sei se vocês sabem mas Fortaleza
não era um lugar onde as embarcações de grande porte

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pudessem chegar muito perto, pois se corria o risco de se
ficar preso nos bolções de areia, a profundidade variava e o
navio podia ficar preso, é por essa razão se precisava do
translado em jangadas pois por serem de menor porte
passavam com maior facilidade pelas zonas em que a
profundidade variava.
-Simplesmente ao olhar nos olhos dos cativos não tinha
como não ver através de suas retinas a dor, o sofrimento e
o pedido de socorro, o jangadeiro levava mas ali mesmo
sentia no peito um profundo desgosto de colaborar com
aquela maldade e transladar o escravo ao navio que iria
para outro porto onde o negro sofreria tudo de novo, o
jangadeiro pensava o que posso fazer se sou tão pequena
peça nesse sistema cruel, más o que ele não sabia era que
a mudança viria e que o simples e pequeno ganharia
repercursão e valor e que seria através da união que se
faria a força para o pequeno ser vencedor .

Capitulo 3 Fortaleza 1870


- O ano era 1870 eu me lembro muito bem e após anos e
anos trabalhando no navio negreiro Tubarão muita coisa
em minha vida já havia mudado, entrei para trabalhar como
moleque de recado e ajudante sendo uma criança apenas
e nem saber ler e escrever eu não sabia, porém minha
mente a tudo registrou e guardou para sempre dentro de
minhas memórias da infância que foi destruída tendo
presenciar os maus tratos e a imensa crueldade e covardia
para com os escravos, eu comecei a trabalhar como um
menino e sai do navio Tubarão um homem de 31 anos.
-Nessa altura do campeonato eu já havia conseguido
aprender a ler e a escrever desde meus 20 anos e assim
pude ter mais acesso ao que de bom o conhecimento
escrito tinha a oferecer sendo que em minha época o
principal meio de comunicação era através de jornais e
revistas.

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-Foi por volta desse ano 1870 que vim morar em Fortaleza
e dela muito tenho a contar, antes Fortaleza que era
apenas um povoado tido como modesto pequeno e sem
importância começou pouco a pouco a se destacar por
conta do apoio que fornecia as frotas de navios que iam
para o Maranhão e para o Piauí, houve um maior destaque
nessa região porque durante esse período houve a
separação da província do Piauí e com isso deu mais
destaque ainda para o algodão do Ceará, foi com a
promoção do povoado para vila que começou a atrair
investidores e melhorias, dessa forma começou o projeto
de transformação da cidade de Fortaleza e eu acompanhei
tudo isso.
-No principio as casas eram construídas nas chamadas
areias e ficavam um pouco desordenadas pois não havia
ao certo um planejamento urbano porem logo logo tudo iria
mudar, já antes de 1870 já haviam feito em 1800 o
chamado arruador , em 1812 o Coronel engenheiro Antônio
José da Silva Paulet já havia desenhado a planta de
Fortaleza toda esquadrinhada como xadrex para que
houvesse organização entre ruas de forma harmônica,
porem todo o traçado e todo o projeto passou por inúmeras
correções e transformações e dessa forma o levantamento
da planta de expansão de Fortaleza foi edificado por Adolfo
Herbster isso de 1859 a 1888.
-O ano em que vim morar em Fortaleza foi o ano em que se
deu o inicio da construção da estrada de ferro de Baturité
em 1870 ela tinha começo aqui em Fortaleza e ela servia
para escoar a produção tanto do algodão como a pastoril
que advinha do interior e foi justamente isso que fez com
que Fortaleza se tornasse a mais importante cidade do
Ceará e isso só contribuiu para o impulso e a consolidação
industrial na região cearense.
-Enquanto as melhorias que fizeram um pouco antes de
1870 posso aqui citar o liceu do Ceará para disseminar a
cultura e o Farol do Mucuripe que ambos foram feitos em
1845 era um cuidado que se tinha para que as

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embarcações não se destruíssem nos bancos de areia que
lá havia e salvar a vida dos tripulantes nas viagens
noturnas, a Capitania dos Portos do Ceará em 1857 para
dar suporte as frotas que vinham para a região do Ceará,
devido ao surto de febre amarela que houve em 1861
criaram a Santa casa de Misericória, aos padres que
vinham para Fortaleza para estudar em 1864 foi edificado o
Seminário da Prainha, para guardar o conhecimento nos
muitos exemplares que vinham de fora em 1867 foi
fundada a Biblioteca Pública e só para constar, o Passeio
publico não era conhecido como uma praça lá muito
amistosa não, pois lá era lugar onde se faziam execuções e
foi lá onde João de Andrade Pessoa Anta e Gonçalves
Inácio de Loyola Albuquerque e Mello mais conhecido
como padre Antônio Mororó foram executados e fora as
outras execuções que não foram noticiadas.
- Naquele tempo eu me lembro que não existia o que vocês
do futuro chamam de ônibus o que tínhamos eram as
máquinas a vapor tais como os navios e os trens ambos a
vapor, o que vocês aí do futuro chamam de ônibus no
principio eram os bondes puxados a carro de boi, a
eletricidade que você do futuro tanto gostam no meu tempo
eram o óleo de peixe que era utilizado para iluminação
pública e por isso as ruas tinham cheiro de peixe, meus
queridos jovens do futuro saibam que o que é inovação
tecnológica para vocês agora no futuro irão olhar para
vocês e as próximas gerações vão achar tão ultrapassado,
é o tempo que a nada perdoa ,a tudo destrói e a tudo
transforma.
-Quando nas terras fortalezenses cheguei já com meus 31
anos em 1870 nessas andanças da vida encontrei uma
jovem muito bela e sábia e com ela logo me casei, seu
nome era Francisca Joaquina moça linda como uma flor de
abril a desabrochar em um pleno dia de sol e céu azul
celeste tal como se o próprio sol quisesse brilhar mais
ainda para resplandecer o brilho daquele desabrochar em

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flor, assim era ela e para um homem ser totalmente
completo me falta a centelha do amor.
-Depois de casados nos mudamos para a Rua da
Alfandega na chamada praia do peixe e lá erguemos uma
humilde casa e vivemos humildemente tal como era
possível viver naquela época, não demorou muito para eu
me tornar prático de navio e ter esse oficio como profissão
no porto de Fortaleza eu tinha duas jangadas e também
delas tirava algum sustento, como prático eu auxiliava a
manobrar a embarcação para que não encalhasse e como
jangadeiro além de conseguir o sustento com a pesca fazia
o translado dos escravos para a terra quando os navios
negreiros chegavam.
-Até então nada havia mudado desde os meus tempos de
criança até os tempos atuais nada tinha se modificado a
escravidão ainda estava vigente e aquilo me doía muito,
até ao deitar para dormir eu pesava, que será das vidas
que serão levadas daqui e esse pensamento não saia da
minha cabeça, a lei Eusébio de Queiroz proibia o tráfico da
África para o Brasil mas não proibia o tráfico dentro das
terras brasileiras e por isso continuava a triste situação a
acontecer de novo.
-Até então os poderosos muitos falavam, muito papo e
pouca ação, a demagogia barata e a hipocrisia do falar
bonito e não fazer nada ainda era o que prevalecia, foi
quando mais uma vez o cenário mudou e a princesa Isabel
aproveitando que o rei Dom Pedro II estava em viagem ao
exterior assinou a lei do ventre livre, isso foi em 28 de
setembro de 1871, nessa lei dizia que as mulheres
escravas dariam a luz somente a filhos livres e que não
nasceriam escravos em solo brasileiro, houve quem
dissesse que foi tudo preparado porém pois o Brasil já
estava começando a entrar em um novo ciclo politico e a
monarquia tinha que repassar uma visão amistosa e
amigável mas venhamos e convenhamos, isso foi um bom
começo para o que viria depois, a própria princesa Isabel
ao disrcursar disse assim:

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-Congratulo-me convosco pela lei que decretastes a bem
da extinção gradual do elemento servil, esta reforma
marcará uma nova era no progresso moral e material do
Brasil. Tenho fé que seremos bem-sucedidos, sem prejuízo
da agricultura, nossa principal indústria, porque esse
cometimento é a expressão da vontade nacional inspirada
pelos mais elevados preceitos da religião e da política.
(Fonte: Agência Senado)
- A lei que a princesa Isabel a priori conseguiu sancionar
tão rápido nos bastidores acontecia que era lindo no papel
mas na realidade não era bem assim, muitos fazendeiros
de outras províncias já olhavam para essa lei pensando em
uma forma de que se não fosse possível anula-la que pelo
menos se pudesse atrasa-la ao máximo pois a mão de obra
não podia ser prejudicada ao ver dos fazendeiros, para eles
o escravo não podia ser liberto porque lhes traria prejuízo.

-Pensei reflexivamente a intenção da princesa Isabel no


principio foi boa, tornar livres aqueles que nascessem em
solo brasileiro a partir de então, más e como ficaria a
situação se o bebê não se criaria sozinho se precisaria dos
cuidados da mãe e a mãe continuava escrava, aquela
criança não teria saída a não ser continuar vivendo na
mesma situação que seus pais e mesmo depois da maior
idade como iria fazer parte do sistema social de forma
inclusa se isso não foi pensado.

-Foi olhando com esse olhar critico que eu pude perceber


que na verdade haviam muitas falhas nessa lei assim como
houve na lei Eusébio de Queiroz, pois mesmo a criança
nascendo liberta além de ver sua mãe como cativa ainda
seria propriedade de seu senhor tendo em vista que não
teria condições de ser inserido no mercado de trabalho,
fiquei pensativo, na verdade a libertação não era para ser
feita de qualquer jeito mas sim de forma ordenada clara e
sem brechas pois a cada nova lei se via uma deixa para

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continuar com a escravidão que estava sendo praticada
nas entrelinhas da lei, a lei Eusébio de Queiroz proibiu o
tráfico da África para o Brasil mas não proibiu o tráfico
interno então começou o trafico interno, agora com a lei do
ventre livre as crianças nasciam livres mas como sairiam
do sistema se precisavam da mãe, se a mãe permaneceria
escrava ,se o futuro jovem não tinha um plano para
inclusão deste na sociedade e se o senhor dono da
fazenda sabendo de tudo isso dificultaria mais ainda a vida
dos filhos do Brasil que nasciam livres porém tinham de
lutar por esse direito.

-Enquanto isso Fortaleza passava por tudo isso em grande


efervescência cultural emergida em cultura de outro país, a
moda aos poucos estava ficando mais refinada e mais
voltada para os padrões e modo de vida franceses, o
remodelamento da cidade eu vi como foi, foi todo pensando
nos padrões vindo da França, eles chamavam de Belle
époque esse dito padrão de querer imitar a forma de vida e
costumes da França, a verdade era que de povoado, virou
vila e de vila passou para categoria de cidade e começava
a se expandir nos mais variados aspectos comercial,
populacional, espacial, cultural e muitos outros, Fortaleza
na minha época ocupava o cargo de oitavo principal
centro urbano do Brasil e logicamente toda essa
empolgação trazia para cá muitos investimentos e
burgueses que ficavam ricos com a venda do algodão que
negociavam com estrangeiros e com esse dinheiro mais
valorizado do que a moeda brasileira investiam e faziam o
capital ficar cada vez mais forte erguendo a cidade e o
mercado consumidor esses eram os comerciantes do meu
tempo, do outro lado tínhamos as elites letradas, eram os
médicos, os estudiosos e as elites politicas estes eram os
intelectuais responsáveis por trazem ideias de fora de
quando retornavam de seus estudos na Europa, quando
retornavam eram esses intelectuais quem procuravam
transformar e modernizar a cidade de Fortaleza com

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reformas, empreendimentos de tal forma que pudessem
ficar conforme as tendências e os padrões de beleza que
eles viam lá fora, porque a nova moda do momento era
tentar imitar a beleza das coisas que existiam na Europa.

-Foi aonde eu como jangadeiro residente da rua da


Alfandega na praia do peixe onde hoje vocês do futuro
chamam de praia de Iracema, foi onde eu comecei a ver
gradativamente a transformação da cidade e de repente só
falar português não bastava pois a nova moda agora era ter
aulas de francês para as famílias de mais condição, pois
era muito chique saber o idioma francês, e foi onde eu vi a
transformação dentro da sociedade fortalezense, as
mulheres passaram a usar vestidos com muitas saias por
baixo para dar volume ao vestido, estruturas de metal para
parecer que a vestimenta era maior e mais pomposa ,
corselet que as apertavam tanto que parecia que iam
morrer a qualquer momento sem folego de tão apertado, a
renda nos vestidos era muito bem cotada, usar sombrinha
de renda, luvas delicadas e maquiagem extremamente
pálida para dar ar de fidalga eram a moda do momento,
elas não sabiam mas na maquiagem que usavam muitas
vezes o composto químico que nela havia lhes custava a
vida ,assim como o corselet apertado que também lhes
fazia mal, era uma época em que a beleza custava muito
caro e muitas vezes era paga com a própria vida pois até
na tinta verde esmeralda que tingia os vestidos da época
nela havia tanto veneno que era capaz de intoxicar pelo
menos 100 homens como foi constatado depois em
estudos.

-Quanto as vestimentas masculinas não eram muito


diferentes no quesito de matar de calor o usuário, as
roupas mais finas também tinha-se que comprar a fazenda
que era o pano do qual se fazia a roupa e ir em um alfaiate
para mandar fazer o modelo do qual se desejava usar, sem
falar das espetadelas dos alfinetes pois a roupa era

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moldada em nosso próprio corpo, acredito que vocês do
futuro nem saibam como é isso, como é ter de comprar a
fazenda de tecido e encomendar uma veste em um alfaiate
ou costureira, mas em algum lugar de 1871 se fazia roupa
exatamente assim, e haviam revistas com os modelos que
estavam na moda para que ninguém mandasse fazer um
modelo de roupa fora do padrão de estilo e tendência.

-A moda parisiense aqui no Ceará podia ser muito bonita,


vestidos cheios e pomposos e ternos completos e perfeitos
com gravata justa no colarinho, mas venhamos e
convenhamos, não tinha quem aguentasse aquele calor
terrível que fazia em Fortaleza nos ano de 1871, as
mulheres chegavam a molhar as saias por debaixo do
vestido para tentar amenizar o calor que fazia e aos mais
sensíveis tinham até aqueles que passavam mal devido o
tempo quente do sol de Fortaleza, mas o importante era
seguir a moda nem que isso lhes fizesse passar mal.

-Vendo tudo isso eu pensava comigo mesmo, meu Deus


porque tanta ignorância se a forma como se vive lá não dá
certo de usar aqui, vai ver que lá faz frio e por isso de tanta
roupa, está vendo que em um calor tão terrível, desse tanto
de vestes só vai servir para sufocar e cair desvanecido no
chão e porque passar tanto pó de arroz para ficar branco
se o nosso sol nos doura de tal forma que ficamos
bronzeados ao bel prazer dele o astro rei, mostrar que é
branco é tão importante para que não seja julgado e sofra
preconceito que se esqueceram que que é dos raios de sol
que se tira o sustento, são nos raios de sol que ficamos
fortes e resistente e é do sol que nos transforma a cor de
pele que todos nós vivemos, sob um mesmo sol apesar de
tons de pele diferente, talvez ainda não se atenuaram que
diferentes mais tão iguais pois sob um mesmo sol todos
somos um, todos somos seres humanos.

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-Dessa forma, foi desse laço de comercio entre Fortaleza e
e Europa que a cidade começou a se modernizar, os
jardins ficaram mais floridos, com arvores frondosas, com
seus lagos artificiais repletos de estatuas de deuses
mitológicos como decoração e foi assim que o Passeio
público que antes foi palco de execuções passou a ser um
lugar para os transeuntes apreciarem a visão do mar,
assim o passeio público se tornou um lugar para desfile de
lindos vestido das mulheres de alta sociedade e um cenário
mais elegante e social em pleno ano de 1876.

-Na tentativa de viver o estilo de vida europeu não bastava


apenas se vestir, tentar falar francês e ter aulas de etiqueta
para aqueles que podiam pagar, tinha também que
frequentar a alta sociedade e os lugares que estavam em
alta.
-Foi justamente que pensando nisso Fortaleza incorporou
uma série de modernizações trazidas de fora, foi
implantados os bondes, os telégrafos, praças construídas
ao estilo parisiense com decoração muito semelhante, os
boulevards, cafés onde se reuniam as famílias a fotografia
o teatro tudo isso causou enorme sensação na sociedade
fortalezense da minha época e se você acha legal a cidade
de Fortaleza em sua época aí no futuro, então tente
imaginar como eu fiquei maravilhado quando vi pela
primeira vez todas essas invenções tecnológicas
acontecendo diante de meus olhos e como eu me senti
quando a cidade deixou de ser iluminada com óleo de
peixe e foi iluminada pela primeira vez com energia elétrica,
nossa foi algo assim único que eu não sei nem explicar e é
uma pena que você leitor aí do futuro não estava por aqui
naqueles anos incríveis porque foi o máximo.

-Sabe a Praça do Ferreira, pois em minha época ela


recebeu grandes jardins e lá havia grades com adornos
que eram bem parecidos com os que tinham lá no passeio
público que eu aqui citei e sobre os cafés posso dizer que

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já estive neles e tinham um estilo francês os cafés que
funcionavam aqui em Fortaleza na minha época eram o
Java, Fênix , Bien-bien , Garapiére e o café do comércio,
era uma verdadeira visão de se encher aos olhos os
senhores geralmente se sentavam no café faziam seu
pedido e ali ficavam para conversar, tendo por belíssima
visão a praça do Ferreira com toda sua beleza e
suntuosidade em jardins e esculturas enquanto
conversavam as suas senhoras iam fazer aquelas boas
comprinhas fazendo uma verdadeira reforma em seus
guarda-roupas nas famosas lojas Maison Art-Nouveau e na
renomada loja Torre Eiffel dessa forma quando retornavam
já haviam gastado todo o dinheiro de seus esposos com
aquela velha desculpa de que comprou somente o básico e
com certeza o passeio ainda passaria pelos jardins da
Praça do Ferreira antes de voltar para casa.

- A tal febre do afrancesamento foi tão grande que as lojas


ficaram tomadas por nomes franceses para dar um ar de
chique, as pessoas passaram a dizer gírias francesas para
parecerem elegantes, a moda acompanhava o
afrancesamento e nem mesmo as casas escaparam da
chamada belle époque, foi aonde Fortaleza ficou apinhada
de palacetes, sobrados e mansões seguindo o padrão de
construção da França, foi dessa forma que Fortaleza ficou
conhecida lá fora como referência a modernidade luxo e
requinte, vocês conhecem aquela gíria que diz, fulano não
tem eira nem beira pois essa gíria veio das construções da
época .

-Naquele tempo a eira e a beira eram elementos


arquitetônicos que eram utilizados nas casas para dar um
ar de nobreza para que quem passasse por aquele lugar
através da arquitetura da casa de ante mão já se soubesse
a classe social de quem ali morava, eram adornos muito
bem feitos ,balaostres ,vitrais coloridos , adereços todos
inspirados na arquitetura de Paris, haviam algumas casas

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que só tinham a eira, outras só a beira e as mais pobres
nem a eira e nem tão pouco a beira como era o caso da
casa onde eu vivia, não detinha de adornos de eira e beira
porem servia muito bem a mim e minha família e isso era o
que mais me importava, nas casas dos senhores de
fazenda se media seu estatos pela quantidade de quartos e
janelas já nós da classe mais humilde o mais importante
era não faltar o teto e o pão de cada dia.

-Enquanto tudo isso acontecia em Fortaleza a vida dos


humildes prosseguia da mesma forma como sempre foi, a
batalha diária pelo sustento, o suor que escorre da fronte
do trabalhador e saber o valor que foi cada tostão ganho
pelo trabalho árduo isso a nós não diminuiu nem uma
virgula sequer de alívio, a dor dos que estavam sendo
traficados persistia e só quem via a via pelo ângulo que eu
via todos os dias é que era capaz de ver a dicotomia do
abismo entre as realidades ambas tão reais e tão diferentes
de um lado uma cidade crescendo e com um ar de
otimismo e perseverança enquanto que na Praia do Peixe o
cenário era de escravidão.

-Belle Époque ou época áurea para quem? Só se for para


os grandiosos, os mercadores a elite do poder porque
sinceramente os pobres não virão lá muito desse “dourado”
citado e aqueles que estavam sendo traficados pior ainda,
a filosofia pregada nesse movimento chamado Belle
Époque pregava um otimismo, mas como é que se pode
ser otimista se eu estava vendo desde criança a
perversidade do homem contra outro homem, me explica
como funciona esse otimismo se eu via pessoas sendo
retiradas de seu país para serem escravos em outra nação
e através de sua força de mão de obra erguer um povo as
custas de uma ideologia errônea, me diga aonde há
otimismo e beleza nisso porque eu desconheço.

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-Se falava muito sobre a crença na prosperidade e
esperança no futuro, mas me diga... como é possível
acreditar na prosperidade se ela é advinda do sangue do
suor e do sofrimento de meu semelhante, é impossível ser
prospero se for para ferir alguém, no começo pode até
parecer ser paz mas não é, é engano pois não existe
esperança no futuro se for para escravizar, inferiorizar uma
etnia, perseguir um povo ou destruir uma nação, no meu
tempo se esqueceram de contar que a verdadeira paz nós
só podemos construir unidos, todos nós em um só e talvez
vocês aí do futuro vendo todos esses equívocos e erros
terríveis do passado contem as gerações de suas gerações
como foi para que não se repita, porque eu vivi tudo isso
para poder contar a vocês.

-O ano ainda era 1876 e enquanto Fortaleza passava pela


Belle Époque lá na França era o fim da guerra franco-
prussiana e a Alemanha havia tomado para si Alsácia e
Lorena o que geraria um sentimento de revanche e que
ajudaria a França a entrar para o que no futuro seria a dita
primeira guerra mundial, o que acontecia lá fora mexia
diretamente aqui em Fortaleza, começou aos poucos a
segunda revolução industrial e assim como houve o êxodo
rural do campo para as cidades que sofreram inchaço
devido tanta gente a medida que as máquinas iam surgindo
não existia mão de obra qualificada para a demanda e o
resultado era consequentemente o desemprego.

-Fortaleza continuava com o comercio de algodão o ouro


branco de nossa região e as charqueadas, a mão de obra
escrava ainda estava sendo amplamente utilizada apesar
de já haverem pensadores e membros da elite já
defendendo as causas abolicionistas.

-Durante muito tempo se debateu na surdina entre os


próprios estudiosos e pensadores como poderia ser feito
para tentar modificar a forma de pensar de toda uma

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sociedade que tinha em sua raiz o escravagismo , como
trabalhar para mudar a forma de ver o mundo de uma
sociedade e fazê-los compreender que a liberdade também
liberta, libertar significa reconhecer a igualdade, reconhecer
o valor que não se trata de ser maior ou menor mas sim de
ser igual, como explicar a uma sociedade com mentalidade
patriarcal e retrograda que era preciso destruir o
preconceito para que dessa forma pudesse florescer essa
liberdade.

-Por muito tempo se debateu isso mesmo sendo proibido e


indo contra o regime da época, mal sabiam esses
pensadores que estariam contribuindo para um dos mais
belos eventos da história do nosso Ceará a abolição da
escravidão levando a mensagem de paz de igualdade e de
esperança em tempos melhores, não porque alguém disse
a eles mas sim porque eles acreditaram que era possível e
começaram a por o plano em prática e dessa forma
conseguiram mudar o curso da história.

Capitulo 4 Palavra e ação

-Foi naquele ano de 1880 que começava a se consolidar os


esforços dos abolicionistas e porque não assim dizer que
aqui em Fortaleza tínhamos os entusiastas que eram
ávidos que chegasse logo a tão sonhada abolição.

-Começou então a surgirem inúmeras associações


abolicionistas com ideais bem semelhantes entre si, eram
mais de 227 ao todo, as que me lembro vou dizer quais
eram, tinha a Sociedade Cearense Libertadora,
Perseverança e por vir, Centro abolicionista, Clube dos
libertos, Amigo do escravo, Oitenta e nove, A abolição e a
associação abolicionista 25 de dezembro.

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-Da Associação Perseverança e por vir sei que começou
em 28 de setembro de 1879 e que funcionava como uma
cooperativa aonde as pessoas que ali ajudavam
colaboravam para juntar valores para comprar as alforrias e
foi dessa ideia que começaram a aparecer outras
associações com essa ideologia de movimento reformista,
pois aquela visão grotesca de ver os escravos passando a
pé acorrentados para serem levados pelos navios do tráfico
negreiro devia cessar.

-Lembro-me muito bem da legionária Sociedade Cearense


Libertadora onde João Cordeiro que era um conhecido
comerciante era quem estava a frente como presidente
desta no dia oito de dezembro de 1880 no Palácio da
Assembleia Legislativa Provincial instituiu os princípios
daquela sociedade que estava saindo do papel para se
consolidar como plano de prática, e diante de todos ali
reunidos me contaram que foi belíssima a cerimonia e que
ele discursou em prol da união dos intelectuais ali reunidos
para que juntos pudessem transformar a realidade que
perpassava o nosso tão amado Ceará.

-Como não podia faltar um elemento afrancesado para dar


um ar de nobreza pois estávamos na chamada Belle
Époque, então João Cordeiro recorreu a um romance de
época escrito por Alexandre Dumas e que havia sido
publicada como folhetim no jornal Le Siécie na França, e
assim como os três mocinhos da história francesa estavam
a serviço do bem e da liberdade, a Sociedade Cearense
Libertadora seguiria ao mesmo propósito e assim como na
história os três guerreiros enfrentariam inimigos para
completar sua missão a Associação Cearense Libertadora
estava pronta para lutar por seus ideais.

-Vocês aí do futuro já sabem qual foi o livro que João


Cordeiro se inspirou para fazer a Associação Cearense
Libertadora, ainda não, pois eu vou contar em primeira mão

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para vocês, foi a história dos três mosqueteiros, pela
Igualdade, a fraternidade e a liberdade tal qual como os
princípios que o iluminismo pregava e as aventuras de
Athos, Porthos e Aramis para a liberdade de Ana da Áustria
a rainha donzela em perigo, aqui no Ceará os três
mosqueteiros eram os nossos corajosos abolicionistas e a
donzela em perigo que precisava ser salva do preconceito
e da escravidão eram os cativos.

-Foi justamente pensando nisso que João Cordeiro disse


que assim como os três mosqueteiros ali naquela
associação seriam um por todos e todos por um, dessa
forma instituiu no artigo primeiro da associação exatamente
assim:

- Artigo 1° Um por todos e todos por um a sociedade


libertará escravos por todos os meios ao seu alcance.

-Vejam só vocês como saber outros idiomas faz com que


se tenha acesso a ideologias e conhecimentos que não se
teria se só soubesse seu próprio idioma pátrio, e sim, foi
através desses estudos de pensadores, historias e
ensinamentos muitas vezes escritos em Francês que
fomentou as ideias iluministas aqui em Fortaleza porque
fraternitê, igualitê e libertê dos ditos pensamentos
franceses iluministas estavam bem na moda agora igual
como um chiclete essa ideia iria pegar igual noda em
roupa, porque a liberdade não podia mais esperar.

-Não posso aqui esquecer que João Cordeiro era marçon e


um legitimo Carbonário fazia parte da sociedade secreta
Marçonaria Florestal cujo o lema era “Deus e o povo
somente”, dessa forma ele acreditava em valores liberais,
não era a favor do absolutismo, logo, João Cordeiro não
era a favor dos ideais do rei Dom Pedro II e para completar
seus ideais eram liberais o que defendia uma linha de
raciocínio que previa uma igualdade perante a lei.

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-Quando a Sociedade Cearense Libertadora iniciou suas
atividades, começaram a traçar estratégias para levantar
dinheiro para comprar as alforrias dos cativos, como toda
ajuda era bem vinda então eles aceitavam doações em
réis, doações em gêneros alimentícios e disso começaram
a desenvolver mais ações, com os donativos arrecadados
iniciou as quermesses, os bingos e os leilões.

-Era uma verdadeira festa em prol da liberdade pois nessas


quermesses, bingos e leilões as pessoas participavam,
festejavam, se divertiam e ao mesmo tempo ajudavam pois
com esse levante em dinheiro era que os nosso astutos
abolicionistas compravam a alforria dos escravos, havia
muitos comerciantes e senhores de escravos que viam a
festa acontecendo e olhavam com um olhar de raiva pois a
ignorância não os deixava compreender a importância do
fato histórico que ali estava se desenrolando, algo muito
bom estava por vir e nenhum senhor de escravos e nem
comerciante poderia imaginar que assim como de grão em
grão os grãos de areia se reúnem para forma a vastidão da
orla da Praia do peixe os revolucionários estariam reunindo
forças para libertar.

-A presença da mulher nesse cenário foi muitíssimo


importante pois a mulher possui toda uma retórica para
transmitir e divulgar os ideais, A Sociedade Cearense
Libertadora tinha a frente também uma mulher, ativista e
defensora da liberdade estava no meio de todas as ideias e
nas quermesses e bingos ali junto da população
aproveitava para falar sobre as ideias abolicionistas,
explicar porque aquilo era tão importante e pedir que
divulgassem a ideia pois se uma pessoa repassasse para
outra com certeza logo, logo, a cidade teria mais pessoas
conscientes e criticas da realidade e do que precisava ser
modificado.

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-O nome dessa dama sobralense tão inteligente era Maria
Tomásia Figueira Lima e com seus 54 anos naquele ano
de 1880 ela estava junto ao panteão dos nobres
pensadores abolicionistas liberais e por influencia dela foi
que se iniciou o que seria um futuro jornal para transmitir os
feitos dos revolucionários e abolicionistas fortalezenses.

-Levou exatamente um ano, e nesse um ano todos os


pensadores da Sociedade Cearense Libertadora
começaram a debater em como seria o formato do jornal,
pensaram logo que tivesse em si um discurso
argumentativo a favor do abolicionismo falando a favor da
libertação dos escravos se utilizando dos ditames
científicos e religiosos para dar suporte a teses que no
jornal seria impresso, como não podia faltar a visão liberal
da qual eles defendiam então na retórica que seria
difundida abordaria o fator econômico também pois quando
se trata do bolso é lógico que dariam ouvidos e nesse
discurso os escritores abolicionistas logo pensaram, vamos
colocar no jornal o quanto a escravidão compromete o
crescimento e o desenvolvimento econômico de nossa
província e que para a defesa de um maior
desenvolvimento nacional precisamos dar prioridade a
questão da defesa a cidadania, a ideia foi começando a
ganhar forma e aos poucos esse baluarte da liberdade em
letras estava ganhando todas as características
necessárias para mudar a mentalidade de seus queridos
leitores fortalezenses.

-Nessa história todinha estava tudo ótimo desde a ideologia


até a articulação para o direito do escravo a sua cidadania
bem como trabalhar histórias de reais e falar contra o
preconceito, a estrutura do jornal estava toda pronta mais
faltava o principal, um nome.

-Pensaram então, qual seria o nome que melhor


representaria a causa que eles tanto lutavam, qual seria o

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melhor nome para batizar esse jornal com ideologia tão
verdadeira e nobre, qual seria o nome que assim que os
fortalezenses lessem tivessem como nome de referencia e
que desse destaque as causas sociais e ao mesmo tempo
repassasse a imagem e o sentimento da abolição.

-Depois de muito pensarem finalmente elegeram um nome


que não seria qualquer nome e nem tão pouco seria
esquecido pois entraria para a história de Fortaleza, o
jornal foi batizado de O Libertador pois é libertando que
somos libertos e é levando a mensagem da verdade e da
realidade com visão critica que se é possível abrir os olhos
do povo.

-Os maquinários e tudo o que se fazia necessário para a


alta tiragem da primeira tiragem já estava pronta foi onde
em Fortaleza se deu inicio a voz abolicionista através da
palavra impressa situado no centro de Fortaleza.

-Foi em 1° de janeiro de 1881 que foi impresso o primeiro


exemplar do jornal O Libertador e custando 40 réis levava a
informação de forma critica, inteligente e foi um marco no
jornalismo pois pela primeira vez se falava sobre os maus
tratos e o que acontecia com os negros em nossa
sociedade.

-Eu com 42 anos naquele ano glorioso de 1881 aqui em


Fortaleza pude ler esse primeiro exemplar e acredite, eu
senti alegria em ver que um jornal estava tomando para si a
causa abolicionista e que as histórias reais dos escravos
estavam sendo contadas para o povo conhecer de perto a
realidade e que os próprios escravos estavam ganhando
vez e voz através de um meio de comunicação.

-Foi um verdadeiro sucesso todos os exemplares foram


vendidos naquele dia e não se falava de outra coisa na
cidade de Fortaleza, as bocas cearenses comentavam com

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grande entusiasmos e nas praças o assunto não podia ser
outro só dava o jornal O libertador como tema central.

-Quem realmente não estava gostando era a marinha que


naquela época dava apoio ao tráfico negreiro e aos
comerciantes que precisavam da força de mão de obra
escrava, aquilo soava como uma afronta pois era
basicamente e claramente tido como um principio de
desobediência civil propagar esse tipo de ideologia, porem
o jornal O libertador não iria parar e na verdade, estava só
começando sua batalha, o exercito dava apoio aos
abolicionistas e aí começou o inicio das farpas entre
marinha e exercito da minha época, eram tempos ainda do
Brasil império então o medo da represália da coroa era
grande ninguém queria arriscar sua cabeça.

-Seguindo os passos do grande pioneiro jornal O Libertador


daqui de Fortaleza no Rio de Janeiro surgiu também o
apoio por meio da imprensa.

- Foi aonde no Rio de Janeiro surgiam os jornais, Jornal do


Comercio e o Jornal Gazeta da tarde, o conteúdo desses
jornais eram geralmente contendo textos inflamados pelos
ideais dos abolicionistas que nesse caso se dividiam em
duas vertentes.

-Os radicais eram os abolicionistas que mal podiam esperar


para a abolição acontecer, no modo de ver deles já era
para ter acontecido e não podia mais esperar , então os
radicais iam as ruas, faziam movimentações, elaboravam
planos para alforriar, algumas vezes ajudavam os cativos a
fugirem ,já por outro lado os moderados eram mais
voltados para o viés da lei eram os pensadores, os que
através daquilo que estudavam usavam como
embasamento para justificar o porque que era importante
as ações que estava sendo feitas para libertar os escravos.

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-Podiam ser dois modos de ver a mesma coisa com ações
distintas sim, porém foi através dessas duas formas de luta
contra o escravagismo que se consolidava ali uma luta
legitima, bem embasada, formada por pessoas criticas e
inteligentes que como cidadãos e pessoas pertencentes a
sociedade tinham o direito de transformar aquela realidade
e difundir as ideias para que essa transformação fosse
possível, muitas vezes não é só com as ideias no papel e
apenas pensando que tornamos nossos sonhos reais, por
essa razão tinha também o campo da ação que era por em
prática, levar a frente as ideias tão debatidas entre quatro
paredes das associações, não permitir que a ideia
morresse, fazer florescer a consciência dentro de cada
mente pois o medo do império, da repressão, de ser tido
como desobediência existia mais eles não podiam parar,
podia ser que fossem pegos e presos ou até mesmo
executados porem as ideias uma vez transmitidas e
brotando na mente fértil do povo não tem como destruir e
nem calar a voz, porque as ideias sobrevivem até a morte
de seu próprio precursor, as ideias uma vez faladas se
tronam gigantes nas vozes de todos a cada vez que é
recontada.

-Entre os abolicionistas mais radicais já se corria os boatos


que Rio de Janeiro a Capital do Império seria a futura
Capital da República, a mudança estava batendo na porta
a coroa de Portugal já pressentia que algo grande estava
para acontecer e as leis cheias de brechas já não estava
sendo o suficiente para ao povo convencer.

-Enquanto eu trabalhava no Porto de Fortaleza ouvia muito


falar sobre a dicotomia filosófica e a forma de pensar dos
dois abolicionistas que se destacavam no Rio de Janeiro e
traziam uma certa influencia para a cidade de Fortaleza.

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-Eram os abolicionistas Joaquim Nabuco que era do grupo
dos moderados, José do Patrocínio que era mais radical e
Castro Alves que ora era moderado e ora era radical.

-Joaquim Aurélio Barreto Nabuco mais conhecido como


Joaquim Nabuco eu sei a razão pela a qual era moderado,
ele era advindo de família de raiz escravocrata, viveu sua
infância dentro de um engenho chamado Massangana no
Recife, foi desde cedo doutrinado para fazer parte da
ideologia da época ele era sobrinho-bisneto do Senador
José Thomas Nabuco de Araújo que também era
magistrado e primeiro Barão de Itapiã e o pai de Joaquim
Nabuco era primo-irmão de Pedro Leopoldo de Araújo
Nabuco segundo barão de Itapaiana, sua mãe Ana
Benigna de Sá Barreto Nabuco de Araújo irmã de Francisco
Pais Barreto marquês do Recife lhe deu esse nome por ser
muito devota a São Joaquim e sua madrinha Ana Rosa
Falcão de Carvalho era quem colocava na cabeça do
menino que a escravidão era normal de acordo com as
doutrinas da época e por fazerem parte do sistema imperial
aquela visão de mundo era tida como normal, Joaquim
Nabuco só podia era ser moderado pois durante toda a sua
vida foi doutrinado para pensar assim, foi buscando o
conhecimento e estudando que Joaquim Nabuco começou
a compreender a realidade e através de sua formação
como politico, diplomata, historiador, jurista, orador,
jornalista e membro da Faculdade de direito do Recife que
lutou pelas causas abolicionistas indo contra a antiga e
retrógrada visão de sua família.

-Joaquim Nabuco me contaram que ele fez campanha na


Câmara dos Deputados em 1878 contra a escravidão e que
fundou ali mesmo a Sociedade Antiescravidão Brasileira e
teve papel preponderante para que a abolição se
consolidasse, nos Estados Unidos foi embaixador e levou a
nossa cultura brasileira para lá através dos seus escritos
como por exemplo o livro O abolicionista, a Academia de

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Letras teve o apoio dele e quem é que não conhecia a
amizade de longa data dele com Machado de Assis.

-Nesse ponto pude perceber que até mesmo aqueles que


viviam sob o regime da coroa, que eram nascidos,
educados e criados naquele mesmo velho sistema estavam
mudando sua maneira de pensar e fugindo do padrão da
família defendendo a abolição.

- Já do lado radical o nome que eu ouvia falar era José do


Patrocínio, farmacêutico, jornalista, escritor de diversas
obras abolicionistas e um ativista nato, como viveu na pele
os reflexos do sofrimento da escravidão e do preconceito
José Carlos do Patrocínio esteve a frente de muitas ideias
transformadoras para a sociedade foi idealizador da guarda
Negra Redentora que por sua vez era uma reunião
organizada e bem articulada formada por negros e ex-
escravos e porque não dizer que ele foi o precursor do
movimento negro do Brasil, observando com muito carinho
foi que pude perceber que a muitas vezes os moderadores
viam a escravidão pelo lado de fora, com a visão que um
senhor de engenho ou um filho do senhor da fazenda tem,
uma visão doutrinada, uma visão moldada para a aceitação
daquilo que viam, porém era perceptível que os de vertente
radical eram justamente os que tiveram contato de alguma
forma com a face real e grotesca da escravidão e por isso
sabiam o quanto era importante acabar com tudo aquilo.

-Durante o descanso os entusiastas comentavam muito


sobre um poeta dos escravos, o chamavam de Castro
Alves e o que eu ouvia sobre ele era que ele era advindo lá
da Fazenda Cabeceiras lá na Freguesia do Curralinho de
uma vila, era a chamada Vila de Nossa Senhora do Rosário
do Porto da Cachoeira em Salvador.

-Aproveitando meu descanso quando tinha tempo eu lia os


poemas dele os meus favoritos eram, Espumas flutuantes,

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Hinos do Equador, Os escravos e a Cachoeira de Paulo
Afonso e como não me transportar nos versos que ele
sabia fazer tão bem bolados que perecia que se podia ver
aquela cena descrita em poesia.

-Machado de Assis o chamava de “poeta dos escravos” ou


“o poeta republicano”, já Joaquim Nabuco o chamava de
"poeta nacional, se não mais, nacionalista, poeta social,
humano e humanitário", Afrânio Peixoto o descrevia como
"o maior poeta brasileiro, lírico e épico" e José Marques da
Cruz do Movimento romântico descrevia Castro Alves como
"apóstolo andante do condoreirismo" e "um talento
vulcânico, o mais arrebatado de todos os poetas
brasileiros", eles não estavam errados pois via-se na
escrita de Castro Alves uma visão mais ampla, limpa e
verdadeira do cativeiro que os escravos sofriam, Castro
Alves que tinha por pseudônimo Cecéu quando pequeno
foi cuidado pela mucama Leopoldina que foi quem contou
para ele as lendas e as coisas mágicas que perpassavam
a cultura afro e isso lógico nunca mais sairia da mente
daquele poeta menino, ele tinha até uma irmã predileta
esta era Adelaide e quando menino morou na rua do
Rosário numero 1 e depois foi para a rua do poço número
47, na escola onde estudou junto com seus irmãos era o
chamado “Ginásio baiano” e teve por professor Abílio
César Borges o barão de Macaúbas e ali era onde a
literatura, pensamentos inovadores e a mente desse jovem
brilhante foi sendo edificada e porque não dizer que
naquela época foi ali naquele terreno fértil que é a escola
que muita coisa ele aprendeu e levou para o resto de sua
vida, gostava de muito de jogar bilhar de desenhar e
escrever versos, tinha uma índole generosa e bondosa era
o que todo mundo comentava, foi reprovado em geometria
mas entrou para a faculdade de direito pois seu forte era
defender os direitos dos mais oprimidos, sua vos era terna
e harmoniosa as pessoas que o ouviam recitar diziam que
sua voz se tornava potente e que era mestre no improviso

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e na arte de recitar tocando os corações daqueles que o
escutavam, mesmo com tuberculose e com o pé esquerdo
amputado ainda era um grandioso guerreiro abolicionista.

-Como as informações corriam depressa aqui em Fortaleza


logo chegou ao meu conhecimento que os escravos que
conseguiam fugir estavam indo para algum lugar situado na
zona urbana e que se fazia a chama da Baldeação os
escravos onde quem era escravo do interior vinha para a
cidade e quem era escravo na cidade ia para o campo, já
no caso do Rio de Janeiro os cativos que conseguiam fugir
iam para um lugar chamado Quilombo que ficava situados
na região do Vale do Paraíba na região de São Paulo e de
vez por outra eu ouvia falar sobre o Quilombo do Leblon,
Quilombo de Jabaquara e o Quilombo do Vale do Paraíba,
das coisas que me contavam eu achava muito interessante
o simbolismo que havia no chamado Quilombo do Leblon
pois lá os cativos cultivavam Camélias flores que traziam
em sua essência um significados especial, uma simbologia
pois representavam a fragilidade que é a liberdade diante
do sistema escravocrata e o quanto se fazia necessário
que os abolicionistas defendessem a flor da liberdade e por
essa razão tão linda, a flor Camélia se tornou símbolo da
luta abolicionista e os abolicionistas levavam com muito
orgulho e honra essa flor em suas lapelas como forma de
fazer propaganda ao abolicionismo, pois a liberdade é
como uma flor que a regamos quando libertamos os
cativos.

-Aqui em Fortaleza também haviam as casas onde se


abrigavam os cativos que fugiam e tudo era feito com muito
sigilo afim de proteger aquelas vidas pois desafiar o
sistema era por em risco a própria vida em nome da
liberdade.

Capítulo 5 Navio Espirito Santo

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-Aconteceu que em um intervalo de uma peça teatral no
São Luis em 26 de janeiro de 1881 esse que hoje vocês
chamam de Cine São Luis, aproveitando-se que a alta
sociedade estava ali reunida o abolicionista Pedro Artur de
Vasconcelos aproveitou para por em prática seu discurso
dizendo:

-Boa noite a todos, senhores e senhoras que aqui estão


acompanhando essa peça que por sinal é muito bem
redigida e de trama maravilhosa, eu gostaria de pedir um
pouco, senão alguns minutos de vossa preciosa atenção,
digníssimos cidadãos fortalezenses uma cena grotesca e
cruel vem acontecendo diante de nossos olhos e o que é
que estamos fazendo para parar com essa situação
chamada escravidão, nada, precisamos mudar nossa forma
de pensar e de ver o mundo que nos cerca, os tempos
agora estão mudados e a liberdade bate a porta e por mais
que neguem essa alforria ela virá, pela fé e a força
daqueles que acreditam nela. Eu penso que todos nós
estamos acorrentados aos grilhões da escravidão pois
nossa sociedade perde muito com isso, Fortaleza deixa de
crescer economicamente quando escraviza e a culpa é
nossa que vemos tudo se repetir e não fazemos nada.

-Não são somente os cativos quem estão acorrentados,


nossas mentes, nossos pensamentos e ações também
estão acorrentados aos velhos valores junto com eles.

-Como queremos ser tão elegantes se desvalorizamos a


vida quando a escravizamos, se enquanto estamos aqui
gozando de liberdade há cativos em senzalas e sofrendo
com o açoite e com a perversidade desmedida de seu
senhores, nossa sociedade fala em justiça então que
justiça é essa que acorrenta aos inocentes e deixa livre seu
algoz, que justiça é essa que julga baseada em cor e não
na igualdade.

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-Nossa sociedade fala em um tempo prospero onde se tem
fé em um futuro melhor, onde se tem credibilidade em um
otimismo e na paz, mas eu digo em verdade que é
impossível se alcançar tudo isso se for escravizando, é
impossível se obter paz enquanto essa paz custar o
sangue e o sofrimento de um povo, então em nome de tudo
o que acredito eu venho essa noite acabar com a hipocrisia
convocar a verdade e que através de minha voz muitos
mais se levantem porque é tempo de liberdade, é tempo de
nos unirmos em prol daqueles que precisam, nossos
irmãos que estão cativos.

-Nessa noite tão esplendida me sinto agraciado pela


presença ilustre de cada um de vocês, não permitam mais
que o tráfico negreiro prossiga e cada um de nós pode
fazer algo para acabar de vez com isso, por exemplo os
jangadeiros que auxiliam no desembarque no porto se eles
se negarem a desembarcar os negros que os navios
trouxerem eu sei que vamos mudar o rumo dessa história,
e sim isso pode soar como uma conspiração contra o
império mas não é possível que essa barbárie continue e
eu me chamo Pedro Artur de Vasconcelos e não penso
isso sozinho.

Depois de ouvir esse discurso ávido por liberdade José do


Amaral que faz parte da Associação Cearense Libertadora
esperou até o final da peça para pode falar a sós com
Pedro Artur de Vasconcelos.

-Boa noite senhor Vasconcelos eu ouvi todo o seu discurso


e eu gostaria de prestar meu apoio e saber seu plano,
quero que saiba que não está sozinho, quero saber qual é
o plano de ação e como o faremos?

-Prazer em conhece-lo como posso chamar-te?

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-José do Amaral, mas esqueçamos um pouco as
formalidades me chame só de José, temos assuntos muito
mais importantes a tratar do que meras formalidades.

-Sem mais delongas, senhor José não sei se é do teu


conhecimento que amanhã 27 de janeiro estará aqui no
Porto de Fortaleza o navio Espirito Santo e que ele virá
abarrotado de escravos para serem desembarcados na
praia do peixe, os traficantes negreiros estão certos de que
vão desembarcar e que será tudo como sempre foi, mas
não desta vez se fizermos algo e tem que ser essa noite,
não podemos esperar mais.

-Senhor Pedro você não acha que já é um pouco tarde


dada a hora em que convocou o povo para o levante, vês
que já é noite?

-Que é isso amigo a noite está só começando e nós vamos


colocar o barril, a pólvora e a explosão deixaremos por
conta do furor da população, a noite é uma criança e nós
temos apenas esta noite para irmos de casa em casa para
convocar o povo, e eu já sei que já é aposta ganha e
amanhã pela manhã faremos o mesmo, quanto mais gente
melhor será, pois assim não terão coragem de fazer nada
contra nós, afinal a voz do povo é a voz de Deus.

Desta forma Pedro Artur de Vasconcelos, João Cordeiro,


Antônio Bezerra e José do Amaral uma vez se reunindo se
dividiram pela cidade e de casa em casa foram convocando
o povo, como jardineiros cultivando a flor da paz e da
liberdade foram de casa em casa semeando a semente
dentro dos corações, lógico que houve quem não abriu a
porta pois o coração era duro como pedra, mas teve
também aqueles que abriram suas portas e que ouvindo
aquela boa mensagem de libertação aos cativos se
encheram de coragem e se disponibilizaram a comparecer
com e sem falta na praia do peixe.

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-Meus caros amigos daí do futuro eu nunca pensei que a
praia do peixe que vocês chamam de praia de Iracema
seria palco de um ato tão lindo e verdadeiro em prol da
libertação dos escravos, eu nunca imaginei que a praia do
peixe iria ser o lugar aonde pessoas que acreditavam na
liberdade se reuniriam para fazer uma paralização, nunca
em meus sonhos eu poderia sonhar coisa mais bela do que
aquilo e era justamente a coragem daqueles que foram de
casa em casa convocar o povo que estava tornando tudo
aquilo real diante de nossos olhos cearenses, foi onde eu
entendi que sozinhos podemos ser muito pequenos más
quando reunidos o povo tem tanto poder que qualquer
império treme em sua base, e que o povo não é cego, na
verdade o povo precisa entender melhor para compreender
seu poder transformador dentro da sociedade e a força que
detém em suas mãos para mudar o curso da história, pois
a história é feita dos muitos pequenos que se reúnem para
serem grandiosos, da fé daqueles que acreditam que a
união fará toda a diferença entre a vitória e a derrota e
daqueles que tem a coragem de questionar de ter voz
altiva, de não aceitar o sistema tal como ele é e saber
como derrotar a ignorância com a sabedoria.

-Naquela manhã de 27 de janeiro de 1881 o navio negreiro


Espirito Santo chegava pronto com um lote de cativos que
iriam seguir para o sul, mas ali mesmo os traficantes de
escravos sentiram algo de diferente, havia algo diferente
nas terras fortalezenses.

-O levante da noite passada estava já surtindo efeito e não


era só o cenário que estava definitivamente diferente ali em
alto mar, na mente de cada fortalezense algo também
havia mudado e a população realmente estava ali reunida
era definitivamente um espetáculo aplaudido pela
liberdade.

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-A primeira coisa que deram por falta foram as jangadas,
escalés e catleias e os traficantes atordoados perguntavam
uns aos outros naquele navio, cadê os jangadeiros?

-E aconteceu que jangadeiro nenhum apareceu, nem para


dar o ar da graça para a fúria dos traficantes de escravos,
então sem entender ainda o que estava por vir, os
desavisados malfeitores foram a procura de informação,
foram a procura de saber o porque que não havia ninguém
para desembarcar os escravos.

-Foi nessa hora em que a coisa mudou de cara, foram


pegos de surpresa quando foram atrás de informação e
ouviram da voz do povo fortalezense e dos jangadeiros em
uma só voz gritando assim:

-No porto do Ceará não se embarca mais cativo!

-Como o navio Espirito Santo responderia a uma afronta


daquela, estavam claramente indo contara o império aquilo
era um ato de total desobediência a coroa más o que eles
podiam fazer contra o povo do qual era a maioria?
-Nesse dia glorioso não houve violência, o povo e os
jangadeiros estavam dando o ponta pé inicial a abolição ali
na praia do peixe e o exercito não fez nada mesmo tendo
sido pedido que o fizessem e por isso ficou, não está aqui
quem falou, mas corria os bons boatos sobre a simpatia
que o exercito tinha com os ideais abolicionistas, da
mesma forma como também começou a correr o boato de
que a marinha bombardearia a praia do peixe se não
deixasse os escravos serem desembarcados.

-Só sei que foi muita fofoca, burburinho e pano de manga


para comentar até as futuras gerações, como todo bom
cearense a tal revolução ganhou logo destaque na mídia e
o Jornal O Libertador fez questão de noticiar os fatos
ocorridos em primeira mão, um negócio daqueles era uma

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história para ninguém botar defeito, naquela tarde a
sociedade fortalezense não falava de outra coisa, o
assunto da vez era a paralização que estava havendo na
Praia do peixe, as pessoas ávidas por noticias compravam
logo um exemplar do jornal a 40 réis e logo, logo já não
tinham mais nem jornal tamanha foi a procura logo se
esgotou e não tinha para quem queria.

-No Jornal O Libertador estava estampado em letras


garrafais o lema que tanto se proferiu na Praia do Peixe
( No porto do Ceará não se embarca mais cativos), foi a
frase de efeito mais repetida durante todo o dia, estava na
boca do povo, nos dizeres das conversas nas ruas de
Fortaleza, estar por dentro era falar da coragem do
cearense, mas o assunto não podia esfriar de forma
alguma e justamente pensando nisso nos bastidores de
tudo isso estavam as mentes pensantes por trás da
paralização.

-Enquanto o povo comentava, a Sociedade Cearense


Libertadora já debatia qual seria o próximo passo como
fariam para ter um melhor diálogo com os trabalhadores do
mar, porque estava mais do que claro que essa batalha só
poderia ser ganha se houvesse a participação ativa dos
jangadeiros, pois dessa vez o poder de mudar o rumo das
coisas estava nas mãos calejadas e sofridas dos bravos
guerreiros do mar e era preciso haver um líder que se
erguesse a falasse simples para que gente do povo
entendesse.

-Foram então até a praia do peixe e para saber com quem


poderiam falar para que liderasse o grande levante popular
quando houvesse a primeira investida oficial de descer os
escravos na praia, então disseram que falasse com José
Napoleão.

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-José Napoleão já tinha sido escravo mas com sua
espertice e conhecimento começou a ajudar no tráfico junto
com os patrões e nesse tráfico onde ele negociava seus
próprios irmãos de pátria ele começou a lucrar com isso
quando recebia o dinheiro dava uma parte e ficava com
outra, juntou tanto que conseguiu comprar sua própria
alforria e a alforria de seus parentes, todos da vila de
pescadores conheciam a história dele, esperto, sagaz e
argiloso tal como era não iria querer participar de um
negócio desses e perder o lucro que tinha e ainda por cima
sair prejudicado e no diálogo ali mesmo ele se anulou da
história, se esgueirou para não participar e indicou a mim
Chico da Matilde para liderar.

- Quando vieram a mim disseram que José Napoleão não


quisera participar, sinceramente isso não foi novidade tanto
pelo oficio que exercia quanto pela idade, então me
perguntaram se eu poderia ser o porta voz, um líder que
falasse como o povo precisa ouvir, então eu disse que
deixaria minhas duas jangadas a disposição do povo se
caso houvesse a necessidade, no principio eu queria ver
como era que todo aquele levante iria ganhar vida para
entender se eu realmente queria fazer parte daquilo ou não
por essa razão não participei ativamente no inicio porque
eu precisava ver como tudo iria se desenrolar, o que eu
não sabia era que eu estava sendo convocado para fazer
parte de um capitulo inesquecível que marcaria a história
não só de Fortaleza mais também de todo o Brasil e seria
uma marco na abolição.

-O Navio negreiro a vapor Espirito Santo continuava em


alto mar esperando uma resposta para o que estava
acontecendo, o clima era de expectativa e tensão e até o
exercito e a marinha estavam envolvidos.

-A situação estava ficando tensa e estava difícil prever o


que se passaria nos próximos capítulos dessa história pois

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o navio negreiro queria a todo custo desembarcar os
escravos na Praia do Peixe.

- Se passaram três angustiantes dias de total expectativa


ninguém sabia o que de fato iria acontecer mas a
expectativa teve fim quando os tripulantes do navio ao
invés de ir embora fizeram a primeira tentativa de fato de
atracar em 30 de janeiro de 1881.

-Mais uma vez o Navio Espirito Santo se preparou para


querer transportar os cativos para o sul e foi aí onde
ouviram mais uma vez do povo a palavra, não.

-Dessa vez os jangadeiros estavam melhor organizados


todos recuaram e seguiram conforme já havia sido
tramado, aquele primeira paralização oficial foi de fato
muito bem orquestrada e pela primeira vez eu senti que
uma causa nobre devia ser defendida e que aquela era a
oportunidade, acompanhei tudo mais não estive
efetivamente visível nessa ocasião, como prometi as duas
jangadas ficaram a disposição e pelo que acompanhei não
houve violência a resistência ali foi firmada e o recado mais
bem dado impossível, agora de fato os tripulantes do
Espirito Santo estavam cientes de que não se tratava de
uma brincadeira nem tão pouco ameaça, de fato nenhum
jangadeiro iria mais fazer translado de escravos .

-Na praia do peixe o nosso porto era a chamada paliçada,


na minha época era tudo muito improvisado com paus e
pedras, não havia um porto seguro e por isso aquele navio
negreiro precisava de nós e justamente por essa razão nós
estávamos no comando e no controle da situação.

-Ainda falando da geografia da região vocês aí do futuro


estão tão habituados com o novo Porto do Mucuripe que
para vocês é sem duvida um dos principais portos para a
navegação e a cabotagem no quesito de transporte de

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cargas que talvez nem saibam que foi nessa região aonde
muito possivelmente teria sido o primeiro desembarque da
expedição espanhola de Vicente Yáñez Pinzón em 26 de
janeiro de 1500 e que o pioneiro projeto para o porto de
Fortaleza apareceu em 1870 criado por Charles Neate, nas
ideias dele o projeto tinha de ter um quebra-mar e conter
sistemas que auxiliassem o atracar dos navios e que tinha
de ser no lado direito da foz do Riacho Pajeú perto do Forte
de Nossa Senhora de Assunção, os chamados quebra-mar
da minha época são os espigões que vocês conhecem hoje
e que na minha época só haviam o trapiche e a paliçada
improvisadas de paus e pedras e graças a ser exatamente
assim que a história estava ao nosso favor.

-Ainda bem que geograficamente falando ainda não existia


lugar para os navios atracarem na minha época porque se
existisse com toda certeza eu não estaria aqui narrando
essa parte geográfica e que tanto nos deu vantagem nesse
levante contra a escravidão, pois se houvesse porto seguro
teriam dado um jeito de desfazer a revolução que havia
sido bolada para deter os navios negreiros, nesse quesito
até a geografia estava ao nosso favor.

- O fato foi que o Navio Espirito Santo não retrocedeu e


nem a opinião do povo também não, uma parte da
população, a elite letrada e os jangadeiro estavam
empenhados em não desistir e então se chegou a um
impasse e nesse cabo de guerra ninguém queria perder e
estávamos jogando com as armas que dispúnhamos a
sabedoria, boa oratória e de fato a geografia e do outro
lado eles estavam errados mas eram protegidos pelo
império e alegavam que o que fazíamos era um desacato e
um ato de desobediência civil.

-O fato foi que mais uma vez o jornal O Libertador foi um


total ibope porque o povo estava estampado na página
principal do jornal, o povo e os jangadeiros, gente de nossa

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gente eram os verdadeiros heróis e todos estavam tão
orgulhosos que logo os exemplares se esgotaram de novo,
por nós o Navio Espirito Santo podia enferrujar em alto mar
esperando, porque enquanto isso aqui na terra firme nós
estávamos festejando.

Capitulo 6 Delfina e Thereza

-Lembro-me muito bem quando fui promovido a segundo


prático das atividades portuárias, foi em 30 de agosto de
1881, minha responsabilidade estava muito maior agora
pois precisava ser bastante atencioso nas manobras para
que não houvesse acidentes no desembarque das
mercadorias e para que nenhuma embarcação ficasse
pressa em zonas rasas, nesse quesito meus
conhecimentos na navegação da região e como se
comportavam toda a geografia local eram extremamente
necessárias para desempenhar com excelência minha
função eu já conhecia tão bem a região que já ensinava os
novatos de profissão com muito compromisso e
profissionalismo.

-Para tentar burlar a barreira que fizemos para não


traficarem escravos, os senhores de escravos começaram
a desenvolver estratégias muito bem boladas diziam que
na verdade não eram escravas que eram apenas
domesticas que estavam embarcando para trabalhar em
outra província porem era tudo desculpa esfarrapada, na
verdade aquelas pessoas estariam sendo levadas para
outro Estado para serem vendidas como escravas e por
essa razão se fazia tão necessário apurar bem os fatos
para entender melhor a situação e poder barrar o
embarque quando fosse preciso para salvar vidas do trafico
negreiro.

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-Justamente falando sobre essa circunstancia que chegou
ao meu conhecimento que Major Camerindo de Castro
Menezes filho do Major Facundo e Florência de Andrade
estava de planos de levar duas escravas para o Pará e por
lá mesmo vende-las, ele alegava que as duas trabalhariam
como criadas, empregadas porém a verdade é que seriam
vendidas .

-Essas duas mulheres que seriam vendidas como escravas


eram Delfina de 45 anos e Thereza de 12, sabendo que
algo tinha de ser feito ali mesmo começamos a segunda
grande paralização afim de impedir que as duas fossem
levadas e escravizadas.

-Prontamente me reuni com os abolicionistas e enquanto


debatíamos como faríamos para impedir o embarque eu
me adiantei e tive a astucia de perguntar como o Major
Camerindo chegaria a Praia do Peixe, foi quando me
responderam que ele estaria em uma carruagem.

-Disseram que na carruagem estariam ele, Delfina, Thereza


e um chefe de policia, mas que não sabiam como parar a
condução para retira-las.

-Simplesmente pensei, se não houver calçamento eles


serão obrigados a parar, uma vez parados estarão bem
vulneráveis e assim poderemos agir e salva Delfina e a
menina Thereza.

-Então nos antecipamos e já sabendo por onde a


carruagem seria obrigada a passar começamos a remover
as pedras do calçamento, afinal não poderia existir pedra
no meio do caminho quando fossemos agir.

-A carruagem se aproximava e exatamente como era


previsto ali atolou e não conseguiu mais sair, nos

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aproveitando daquela situação criada junto conosco veio
toda uma população.

-O chefe da polícia que estava na carruagem claramente


estava irritado, ele até que queria mas nada poderia fazer,
afinal ele era um único soldado desarmado contra toda
uma população e ele sabia melhor do que ninguém que
não teria vez e a contra gosto teve de engolir seco e
calado.

-Nos dê Delfina e Thereza, era o que o povo gritava como


uma ordem, um decreto lei.

-Camerindo mesmo achando aquilo um absurdo pois


realmente se achava dono das duas, mesmo não querendo
e se achando em seu direito ferido teve de acatar a ordem
e deixou que abrissem a carruagem.

-As duas foram retiradas daquela situação diante dos olhos


da população fortalezense e Major Camerindo foi
publicamente afrontado pelos abolicionistas e pelo povo
que ali estava e fez todo esse levante de arrancar as
pedras de uma estrada para salvar duas mulheres da
escravidão certa.

-Delfina e Thereza olhavam tudo aquilo com olhos de


grande alívio e felicidade, era um sonho estar livre do terror
da escravidão e do futuro que iriam ter e em seus olhos
lágrimas de felicidade por tamanha gratidão estavam
estampadas em seus rostos, aquilo a todos nós comoveu.

- Para que aquela história, aquele ato de heroísmos dos


abolicionistas naquele 30 de agosto de 1881 jamais fosse
esquecido, Delfina e Thereza foram chamadas em primeira
mão para contar como foi o terror de toda a situação que
passaram, como é a visão de quem está vivendo a situação
na pele, qual era o verdadeiro intuito do seu ex-senhor pois

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o jornal queria deixar bem claro que não se tratavam de
criadas más sim escravas que iriam ser traficadas no Pará
e ouvindo e redigindo os relatos delas trazer dessa forma
toda a verdade a tona.

-Foi histórico, pois pela primeira vez o outro lado da


historia, aqueles que estavam sob o regime da escravidão,
agora libertos podiam tirar a mordaça da coação e contar
tudo com riqueza de detalhes e foi dessa forma que a
história dos oprimidos começou a ser verdadeiramente
contada e exposta ao povo cearense para que não se
repetisse mais, os oprimidos pela escravidão estavam
ganhando nomes, idades, sexo e voz, ouvir o que essas
vitimas tinham a dizer fazia toda a diferença para entender
porque se devia lutar pela abolição, pois uma coisa é ouvir
dizer e outra coisa totalmente diferente é estar frente a
frente com as testemunhas vivas ali contando tudo ao vivo
como eu vi junto com os abolicionistas do jornal O
Libertador.

-Enquanto isso a história logo se espalhou, Camerindo


seguiu viagem sem as escravas, isso conotou como uma
ofensa e uma afronta muito grande ao exercito pois não
reagiram ao resgate de Delfina e Thereza, quem não
estava gostando nada da situação era a coroa pois onde
há fumaça há fogo, o império de Dom Pedro II já estava
sentindo que algo iria acontecer em breve mas não podiam
nem imaginar que muita coisa ainda estava por vir, a
província do Ceará estava realmente dando muito trabalho
aos escravocratas e ao império, justamente por essa
desaprovação da coroa portuguesa que começou a reação
por parte do até então presidente da província.
-Como o império o exercito e os escravagistas não
queriam sair por baixo, subjugados e humilhados devido a
investida abolicionista e da população na libertação de
Delfina e Thereza, começaram a usar do poder para
empreender uma verdadeira caçada a quem esteve

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participando da ação e que tivesse cargo público para que
através da demissão pudesse prejudicar e de alguma forma
tentar impor poder e força e colocar o demitido como
exemplo.

-O encarregado por fazer isso era o Presidente da


província do Ceará Leon Veloso, ele que já tinha sido
deputado provincial, deputado geral e como presidente de
província já presidiu as províncias do Espirito Santo, Rio
Grande do Norte, Piauí e agora estava sendo presidente da
nossa província aqui do Ceará, como queria mostrar
serviço para a coroa logo se prestou ao papel de
perseguidor dos justos e eu não entendo até hoje como é
que um jornalista que sabia que aquele evento entraria
para a história e mesmo assim ele tomou o partido errado
para que para sempre fosse recordado como o vilão da
história por ser conivente com a escravidão, eu também
não entendi porque que ele como politico não encontrou
outra saída para melhor resolver a situação, quem sabe ele
estivesse dentro de um interesse politico um jogo de poder
oculto dentro dessa história e que convinha a ele fazer o
que estava fazendo pois achava que receberia algum favor
da coroa portuguesa em troca.

-Tudo o que sei é que o presidente da província Leon


Veloso mandou que fosse feito todo o levantamento de
quem esteve nessa segunda paralização de agosto de
1881, e então ele começou a efetuar a demissão de quem
possuía cargos públicos, era a chamada punição exemplar
para que outros servidores públicos não participassem do
movimentos sociais que em Fortaleza estavam se
desenrolando na minha época.

-Adivinha quem foi prejudicado... sim foi eu, é como diz o


ditado que a corda só se arrebenta do lado do mais fraco,
pois eu não estava fugindo da regra, pois como tantos

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outros pais de família eu havia perdido meu emprego por
defender aquilo que eu achava ser o correto.

-Eu estava sofrendo pois aquela renda extra me auxiliava


em casa, mas eu ainda tinha minhas duas jangadas, então
eu ainda tinha com que me sustentar e levar o pão para
minha família, más eu olhando o mar naquele dia em que
recebi a noticia fiquei pensando... e aqueles pais de família
que não possuíam outra forma de sustento, foi quando
pude sentir o peso da crueldade e da injustiça que Leon
Veloso estava cometendo.

-A Sociedade Cearense Libertadora tendo ciência de toda a


situação que tinha acontecido convocaram-me com muito
carinho e consideração para participar como membro.

-Recebi lugar de destaque por tudo o que fiz durante a


paralização de 30 de agosto de 1881, os mais estudiosos
tinham dificuldade de transmitir as informações ao povo de
forma que entendessem a real razão pela qual estávamos
lutando e porque era importante a abolição, por essa razão
fui tão importante por ter mais contato com o povo e pelas
pessoas já me terem como referencia e saberem o que
passei.

-Secretamente eu também passei a ter uma função sigilosa


junto com a Sociedade Cearense libertadora, quando
ajudavam um escravo fugir ocorria uma coisa chamada
baldeação.

-Essa chamada baldeação era fazer com que os escravos


fugidos do interior viessem para a cidade e ficassem em
esconderijos aqui e os cativos da cidade iam se esconder
em lugares sigilosos no interior, era uma forma de proteger
os escravos de seus senhores e ao mesmo tempo dificultar
a vida dos escravocratas.

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-Esses pequeninos quilombos, os esconderijos que
conseguíamos encontrar para proteção daquelas vidas
eram muito sigilosos e guardados com muito carinho por
nós os abolicionistas.

- Meus queridos amigos do futuro eu tenho um segredo


para contar para vocês, vocês sabiam que eu fui um dos
guardiões da pratica da baldeação e que minha casa serviu
de esconderijo de escravos que vinham do interior e que
muitas vezes eu os adotava, pois essa foi a missão mais
linda que já me deram, pois minha casa antes de o porto
seguro de Fortaleza ser construído eu já havia feito um em
meu lar na Rua da Alfandega na Praia do Peixe e eu não
era um espião mas eu tinha agora uma missão, um
segredo a guardar e um Qg secreto, eu estava me sentindo
sem duvidas o ultimo pastel com café quente do café do
comercio da Praça do Ferreira, pois agora era que a
história estava ficando boa.

-Foi dessa forma que Leon Veloso a coroa e os


escravagistas pensaram que haviam enormemente me
prejudicado mas agora era que eu me sentia mais vivo do
que nunca.

-Algumas vezes em nossas vidas é preciso perdermos para


que possamos ganhar respectivamente, será que se eu
tivesse abandonado meus ideais por causa de um emprego
e por causa da preocupação do que as pessoas iriam
pensar eu estaria aqui contando essa historia, será que eu
me tornaria a história e será que que estaria tão feliz e
realizado como estou, com certeza eu não estaria.

-Muitas vezes a transformação de tudo começa antes de


mais nada dentro de nós mesmo pois eu não estava
apenas libertando escravos eu estava sendo liberto
também.

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Capitulo 7 Sem tempo a perder

-Sabendo que No Ceará estava havendo grande levante a


favor da abolição, logo José do Patrocínio líder negro das
terras do sul veio para cá junto com um poeta, a intenção
era somar valores, trazer novas ideias e auxiliar para que
acorresse logo a abolição.

-Ao chegar na sede da Sociedade Cearense Libertadora


pude finalmente conhecer José Patrocínio, nessa ocasião
estava conosco a professora Elvira Pinho que prestando
atenção em nossas características disse :

-Vocês dois tem quase a mesma estatura mas a barba de


Patrocínio é mais fechada do que a sua Chico da Matilde.

-Nesse dia José do Patrocínio veio a nossa sede e quando


perguntou quem era o líder dos jangadeiro eu me
apresentei.

-Boa tarde senhor José Patrocínio, eu soube de muitas


honoráveis conquistas que você conseguiu para a causa
abolicionista nas terras do sul, diga-me, porque veio para a
província do Ceará?

-Chico eu simplesmente vejo aqui na região do Ceará um


território muito fértil para as causas abolicionistas e eu
gostaria de ajudar a tornar realidade essa abolição, você
está ciente de que já houve mais uma lei agora por
derradeiro é de 1881, é a lei do sexagenário, parece que a
coroa está tentando passar uma boa visão para os
abolicionistas más nós sabemos como o império é.

-Nem me fale senhor Patrocínio, claro que estou ciente da


lei do sexagenário de 1881, eles querem que a libertação
seja de forma extremamente lenta, agora com essa lei os
escravos de 60 anos ou mais estarão libertos, mas você já

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parou para pensar que devido a forma em que vivem, a
alimentação, o trabalho insalubre e sofrimento e as
doenças muitos escravos não chegam nem aos 40 anos o
que dirá 60, os idosos que como escravos já eram muito
maltratados por não conseguirem trabalhar com o mesmo
vigor da juventude, agora serão mais maltratados ainda
agora que não tendo outro canto para ir terão de trocar o
teto e a comida por o trabalho na casa do senhor da
fazenda.

-Chico eu tive uma ideia, vamos pegar o levante em


dinheiro que a Sociedade Cearense Libertadora conseguiu
durante todo esse tempo, assim sendo vamos selecionar
uma região de pouca densidade de escravos que dê para
comprar a alforria de todos para que dessa forma essa
região seja tida como um marco em nossa luta
abolicionista, o que você acha Chico da Matilde?

- A ideia é ótima Patrocínio não tem nem o que se


comentar é perfeita, analisando bem e pensando direitinho
eu conheço uma região com todas as características que
você citou e que seria perfeita para fazer essa ação que
planejamos.

- E onde é Chico essa região?

-Não muito longe daqui existe uma Vila, chamada Vila do


Acarape, ela possui uma densidade populacional pequena
e lá tem um número de escravos que dá para comprar
todas as cartas de alforria e liberta-los assim como
planejamos.

-E foi assim meus queridos amigos daí do futuro que eu


Chico da Matilda e José do Patrocínio formalizamos a ideia
de comprar a alforria de todos os escravos da região da
Vila do Acarape.

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-Vocês do futuro talvez estejam achando muito estranho
esse nome de Vila do Acarape, então eu vou facilitar mais
para vocês, para ser mais exato a Vila do Acarape da
minha época se chama hoje cidade de Redenção, a
distancia que separa Redenção de Fortaleza é 93,9 km se
fosse em linha reta eram só 57,69 km e a viagem que
vocês tanto reclamam que hoje só leva 1hora e 43 minutos
na minha época era na diligencia e só faltava não chegar lá
e se hoje vocês reclamam que ainda existe alguns trechos
sem pavimentação , no meu tempo era tudo de terra batida
e o caminho era repleto de buracos e atoleiros.

- O mais interessante de tudo é que ao transmitir a ideia


para os outros abolicionistas a ideia logo pegou, foi uma
verdadeira euforia no grupo e estávamos certos de que
daria certo a nossa ação.

-Então alguns abolicionistas foram e eu e José do


Patrocínio não podíamos faltar nessa ocasião e assim no
dia primeiro de janeiro de 1883 fazemos a abolição
acontecer na Vila do Acarape o que vocês do futuro
conhecem como cidade de Redenção.

-Só sei que a noticia do que fizemos se espalhou como se


tivesse assas e pudesse voar, quem sabe fossem os bons
ventos da liberdade que estavam convocando a outras
regiões também libertar, a abolição da Vila do Acarape
repercutiu tanto que despontou em Fortaleza o desejo de
também abolir a escravidão.

-Se passaram cinco meses desde a abolição na Vila do


Acarape, más aquilo que demos inicio não podia mais
cessar, em 24 de maio de 1883 Fortaleza aboliu a
escravidão foi um fato inesquecível do qual eu jamais
esquecerei Fortaleza estava sendo agora o grande
destaque nacional em sua coragem em abolir.

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-Como todo bom cearense eu não posso esquecer de
contar como foi a festa comemorando a libertação que
tivemos e que contava com a participação de todo o povo,
era tanta gente que era difícil até se situar, parecia um
formigueiro humano tinha de ir se infiltrando na multidão
com cuidado para nos pés alheios não pisar.

-A Assembleia Legislativa da província do Ceará estava


incrivelmente suntuosa e majestosa para aquele momento
histórico consagrar, entre aqueles quadros que mostravam
personagens célebres da coroa estavam aqueles que ao
vivo e em cores estavam ali para mudar o rumo da história,
em meio as cortinas de seda , cadeiras e papeis de parede
muito bem adornados estavam ali os abolicionistas que
tinham por joia e menina dos olhos a causa nobre que foi
consumada.

-Se vocês do futuro estão um pouco perdidos na


localização da Assembleia Legislativa da província do
Ceará pois eu vou dizer por qual nome vão encontra-la,
para vocês é o Museu do Ceará mas na minha época ali
era a Assembleia Legislativa da Província do Ceará onde
tudo isso que estou narrando aconteceu e que vocês
deviam visitar para conhecer coisas da minha época e que
ainda estão por lá.

-Como eu ia dizendo, lá dentro da Assembleia Legislativa


da Província do Ceará houve uma cerimonia muito bela
aonde foram homenageados todos os pensadores e
abolicionistas que tanto lutaram, foi falado sobre a abolição
em Fortaleza e porque ela era tão significativa foi único e
até hoje eu trago isso bem vivo em minhas memórias.

-Enquanto a cerimonia acontecia o artista José Irineu de


Sousa nos imortalizava enquanto pincelava em seu quadro
cada abolicionista e cada pessoa que estava presente,
esse quadro ele nomeou de Fortaleza liberta, ele pintou no

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mesmo salão onde houve a cerimonia e o quadro está até
hoje na mesma sala como prova e registro de tudo o que
aconteceu.

-O mais interessante é que José Irineu de Sousa além de


ser pintor também era professor, talvez pelo fato de ser um
educador que o proporcionou uma visão mais critica e mais
apurada de tudo o que ali se desenrolava, a mesma mão
que educa também estava registrando com traços e tinta a
óleo a história de como tudo aconteceu.

-Os traços da tela ficaram maravilhosos, devo reconhecer


que o pintor francês Victor Saillard ensinou
maravilhosamente bem José Irineu, parecíamos até um
retrato gigante de tão perfeito que a obra se encontrava, as
aulas que ele teve no Liceu de Artes e Ofícios sem duvida
o fizeram aprimorar e refinar sua arte pois o quadro
Fortaleza liberta estava estupendo.

-Aquele inesquecível feito abolicionista do Vale do Acarape


não foi de forma alguma esquecido e repercutiu tanto que
começou a mudar a mentalidade da população cearense.

-Os donos de escravos em sua maioria começaram a


alforriar e em troca recebiam uma indenização ou uma
contribuição em gêneros alimentícios.

-Aqueles senhores de fazenda que realmente precisavam


da mão de obra escrava para o trabalho continuaram com
seus escravos, porém a luta pela conscientização não
podia parar logo porque o preconceito e o racismo se
mostravam grandes.

- Se passou um ano desde a libertação da Vila do Acarape


da qual hoje é conhecida como cidade de Redenção,
Fortaleza já havia se transformado muito no quesito de
compreensão da defesa a liberdade e já existia um

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sentimento de abolicionismo que pairava nas mentes
fortalezenses.

-A frente da Província do Ceará estava o carioca Sátiro de


Oliveira Dias, ele que já foi veterano da Ordem da Rosa
sobrevivente da guerra do Paraguai sabia melhor do que
ninguém o significado maravilhoso da paz e do respeito ao
próximo, ele que ao voltar da guerra concluiu seu curso de
medicina sabia mais do que ninguém que há males que
não são sanados com remédios mas sim com a educação
e a conscientização do povo.

-Sátiro de Oliveira Dias já tinha sido deputado provincial,


secretário do governo, presidente da província do
Amazonas, do Rio Grande do Sul e participou também da
Assembleia Provincial baiana, devido a todas essas
andanças Sátiro era ciente das disparidades sociais, os
abismos sociais e tudo o que ele vivenciou serviu para que
se tornasse um simpatizante do abolicionismo, por essa
razão ao presidir a província do Ceará teve uma visão mais
social e ficou a favor das ações abolicionistas.

-Exatamente em 25 de março de 1884 na praça Castro


Carreira se reuniram cerca de 4.000 pessoas, a praça de
Fortaleza estava pequena para tanto festejo e lógico que
eu também estava lá.

-As pessoas estavam ali para festejar a abolição do Estado


do Ceará, como queríamos que aquele momento histórico
fosse eternizado para sempre e tivesse um caráter mais
formal foi feito então uma linda solenidade com a presença
daqueles que tanto acreditaram que aquele momento de
gloria tão sonhado viria, era maravilho saber que todos ali
estavam reunidos em nome da proclamação da liberdade.

-Sátiro de Oliveira Dias tendo de posse o microfone subiu


ao palco e exatamente ao meio dia naquele sol a pino

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declarou o Ceará livre da escravidão, nós abolicionistas
não cabíamos em nós mesmos de tanta felicidade.

-Os homens jogavam seus chapéus ao ar, apertavam as


mãos e abraçavam uns aos outros como forma de
extravasar o contentamento, as mulheres elegantemente
sorriam e batiam palmas para a liberdade passar soberana.

-Tudo era muito lindo na teoria mas a verdade é que havia


um fantasma que rondava a abolição do Ceará, isso era o
simples fato de que uma lei provincial não podia passar por
cima da constituição.

-Sátiro de Oliveira Dias havia ido contra os preceitos do


império da coroa portuguesa em nome do que acreditou ser
correto e mesmo a lei provincial não podendo passar por
cima da constituição arregimentamos nossas próprias leis.

-Queridos amigos daí do futuro, vocês sabiam que durante


essa cerimonia de 25 de março de 1884 muitos cativos já
haviam sido libertos, então em termos do que tange a
emancipação não houve muita repercussão pois grande
parcela da população já havia alforriado seus escravos.

-Meus caros amigos o que eu pude verificar foi que nós


como abolicionistas pensamos tanto só em libertar que
deixamos lacunas que ficaram vazias e que depois seriam
preenchidas e assinaladas pelas marcas do abismo social.

-Sim nós libertamos, más nós não pensamos em um


projeto para educar e inserir a população negra em nossa
sociedade com a dignidade e respeito do qual mereciam
receber, sim nós libertamos, porém não houve uma
preocupação com a assistência social para que aquelas
famílias pudessem ser inseridas na sociedade e terem auto
suficiência.

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-Nós indenizamos o senhor da fazenda para libertar o
escravo, mas nós não percebemos que quem deveria ser
duplamente indenizado eram os escravos, pois eles foram
sequestrados de sua pátria, traficados como se fossem
mercadorias, foram separados de suas famílias para
sempre, obrigados a trabalhar sendo castigados enquanto
todo o lucro ia para o seu senhor.

-Olhando pela visão de quem verdadeiramente foi oprimido


é que eu vejo que até na abolição fomos injustos, pois
deveríamos ter dado mais suporte aos escravos que
haviam sido libertos para que pudessem usufruir melhor da
liberdade e da cidadania.

-Foi por causa de não termos pensado em todos os


pequenos detalhes que sem nos percebemos de certa
forma aumentou a exclusão social.

-Como não foi pensado o caráter de dar direito a moradia


ao negro que conquistava sua liberdade que ele tinha esse
direito devido aos anos e anos que este trabalhou sem
nada receber dando lucro ao seu senhor e que isso foi
sumariamente esquecido e negligenciado e por isso e por
não ter para onde ir, o escravo já liberto teve de ser
perpassado pelo que seria um chamado re-arranjo social.

-O que seria esse re-arranjo social senão o fato de que


agora liberto o negro passou a trabalhar para pagar a
comida consumida, o abrigo e a proteção da casa grande,
sendo que todo o lucro que ele gerou já dava ao negro o
direito de ter uma moradia, essa justiça social não
aconteceu.

-A alforria veio para a nossa província do Ceará porém o


racismo e o preconceito permaneceu infelizmente no
comportamento e nas mentes de muita gente, mesmo
depois do evento de 25 de março de 1884 o jornal O

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Libertador ainda noticiava cenas extremamente absurdas, a
abolição estava nos papeis mas não nas mentes daqueles
que usavam do racismo.

-A praça do Passeio Público ainda continuava sendo palco


para atos de preconceito pois ocorria com frequência o
rechaçamento dos negros que por ali passavam, isso só
mostrava que muita gente ainda vivia com o velho
pensamento escravocrata e retrógrado.

-Outro fato muito me entristeceu, foi que aonde se


precisava da mão de obra escrava a escravidão continuou
e os que fugiam eram re-capturados e mandados de volta a
escravidão, se por um lado tínhamos conquistado grande
evolução abolicionista por outro lado ainda tínhamos muita
coisa para fazer.

-As noticias não andam elas simplesmente voam e correm


o mundo inteiro e uma prova disso é que a noticia de que
uma província chamada Fortaleza se rebelou contra a
coroa e se auto intitulou livre da escravidão, mesmo sem o
reconhecimento do império de Portugal correram o mundo
até chegar ao escritor Victor Hugo.

-Victor Hugo como escritor francês que tinha por princípios


a igualdade, fraternidade e liberdade tratou logo de elogiar
o incrível feito conquistado pelos abolicionistas de
Fortaleza em uma magnifica carta histórica que passou a
servir como uma marco histórico para os abolicionistas
cearenses, servindo como uma referencia e um
reconhecimento a cunho internacional.

-Na carta de Victor Hugo constava também os jangadeiros


porque fomos as peças imprescindíveis para que a
emancipação se concretizasse, para representar a classe
fui chamado para participar da celebração no Rio de
Janeiro.

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Capitulo 8 Jangada Liberdade

-Depois de tanto lutar contra o navio negreiro a vapor


Espirito Santo finalmente a jangada Liberdade venceu, falo
assim porque aquele navio negreiro representava a
opressão e a escravidão, agora o mesmo navio tinha uma
função diferente, puxar a jangada Liberdade, jangada que
deixei a plena disposição durante a paralização.

-Os festejos a liberdade foram muitos e então decidiram


que não podia só ficar em Fortaleza, foi então quando em
25 de março de 1884 o navio Espirito Santo rebocou minha
jangada comigo nela .

-Lembro-me muito bem quando chegamos na orla do Rio


de Janeiro, fomos recebidos com tanta festa que eu redigi
até uma carta para minha esposa contando que era tanta
celebração que eu já estava ficando zonzo com tantos
elogios e tantas felicitações.

-Toda a mídia estava lá fazendo a cobertura da carreata da


jangada liberdade, pois ela representava a luta pela
liberdade e acima de tudo que quando realmente queremos
os pequenos se tornam fortes.

-Aluísio de Azevedo me vendo chegar naquela jangada em


alto mar tratou de criar um pseudônimo e me chamou de
Dragão do mar, de tanto que falou o jargão passou a ser
gritado e aclamado com alegria pelo povo, foi aí que então
deixei de ser Chico da Matilde para me tornar Dragão do
mar.

-No meio de toda aquela festança José do Patrocínio em


sua ilustríssima oratória proclamou em seus ditos que
Fortaleza a partir de então teria o pseudônimo carinhoso de

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Terra da luz, porque foi nessa cidade aonde tudo começou,
foi onde a elite letrada junto do povo e dos jangadeiros
fizeram a paralização que deu o ponta-pé inicial para a
abolição e também porque foi de fortaleza que se deu
todos os preparativos que culminaram na alforria dos
escravos de redenção, José do Patrocínio chamou
Fortaleza de terra da luz pois as grandes ideias vieram
dessa cidade.

-Para que nunca fosse esquecida aquela maravilhosa


celebração a pérola do evento decidimos que seria melhor
doar para o museu, dessa forma a jangada foi cedida para
o Museu como símbolo da resistência e da luta
abolicionista.

-Foi tudo muito bem documentado por jornais e revistas da


época e tudo isso serviu de inspiração para que muitas
outras regiões também se tornassem libertas.

-Depois de toda essa comemoração é lógico que eu tinha


de retornar a Fortaleza senão eu ficaria como um total
peixe fora da água, afinal eu já estava com saudade da
família e da querida Praia do peixe.

-Quando retornei continuei a vida como sempre foi, pacata


e sem muita movimentação, morando ali no mesmo lugar
de sempre na rua da Alfandega e tirando o sustento de
minha família através do mar, agora eu tinha 6 filhos
adotivos e com minhas duas jangadas conseguia a todos
sustentar.

-Passaram-se 5 anos, somente trabalhando com as


jangadas, foi quando fiquei muito feliz em saber que tive o
meu cargo de prático de navio restituído, em 3 de março de
1889 eu estava de volta ao cargo que perdi por ter
participado das paralizações em prol do abolicionismo.

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-Depois de toda aquela luta pela abolição eu me afastei um
pouco dos meus amigos abolicionistas fiquei mais voltado a
minha rotina normal.
-De repente o grande destaque de toda uma luta
abolicionista se tornou gente simples do povo outra vez, um
anônimo, não achei ruim muito pelo contrário eu vim de
família simples e voltar a ser simples era muito gratificante.

-Em minha casa na parte do pequeno galpão fiz o que eu


mais queria fazer, um espaço para uma lojinha de artigos
variados e um espaço para abrigar as missas, minha mãe
foi muito devota e sua fé foi ensinada a mim com muito
carinho, para mim agradecer a Deus por tudo ela muito
importante.

-Nesse ano de 1889 já fazia um ano da tão esperada Lei


Aurea de 13 de maio de 1888 e como pude acompanhar
desde o inicio dessa história foi tudo feito de forma muito
gradual, o direito foi conquistado aos poucos.

-Em 1888 chamaram de lei Aurea porque advinha da língua


latim a palavra aurum que por sua vez significava feito de
ouro, mas o real brilho e magnificência não estavam só nas
palavras mas em tudo o que isso significaria para todo o
Brasil, a própria coroa de Portugal estava reconhecendo a
liberdade dos cativos isso sim era extremamente valioso.

-Na verdade a lei Aurea começou como um projeto de lei


que previa a extinção da escravidão, esse projeto foi para
a Câmara Geral que vocês hoje chamam de Câmara dos
Deputados e passou pelo Ministro da Agricultura da época,
pois como isso mexeria com a estrutura agrícola era
preciso fazer uma avaliação para saber até que ponto
acabar com a escravidão prejudicaria aos grandes
senhores de fazenda.

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-Dessa forma o Ministro da Agricultura Rodrigo Augusto da
Silva em 8 de maio de 1888 fez todas as analises e passou
adiante para que fosse feita uma votação para validar o
projeto de lei.

-Lembro que foi rápido pois o projeto foi avaliado no dia 8 e


foi votado nos dias 9 e 10 de maio na Câmara Geral,
mesmo já tendo sido votado ainda foi enviado para o
Senado Imperial, em 11 de maio foi debatidas as sessões
dos dias 11, 12 e 13 referentes aquele mês.

-Depois de ter passado por todo esse protocolo foi que foi
votada e aprovada definitivamente logo na primeira votação
pouco antes das 13:00 da tarde daquele 12 de maio de
1888.

-Meus caros amigos daí do futuro aconteceu que no


mesmo dia 13 de maio de 1888 foi levada esta sansão até
a princesa Imperial do Brasil Isabel de Bragança que dessa
vez, pela terceira e ultima vez faria a regência em nome do
pai o imperador Pedro II, na minha opinião foi
simplesmente perfeito pois ela com toda sua maestria se
aproveitou da viagem de seu pai ao exterior para por em
prática o plano para a abolição da escravidão e foi
simplesmente sensacional.

-Contaram-me que foi as três da tarde de um domingo


justamente em 13 de maio de 1888, justamente no dia
comemorativo ao nascimento de João VI de Portugal que a
lei Aurea tomou finalmente forma nas mãos da bisneta de
Dom. JoãoVI de Portugal.

-Disseram-me que a Lei Aurea foi assinada no Paço


Imperial tanto pela princesa Isabel quanto pelo ministro
Rodrigo Augusto da Silva, lógico que quando ouvi tudo isso
fiquei muito satisfeito, pois tudo isso significava que toda a
minha luta e de meus colegas abolicionistas não havia sido

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em vão pois estava sendo reconhecida ali naquele
documento assinado pela princesa Isabel, ouvir tudo isso
me fez pensar em como acreditar no poder da mudança e
fazer algo para mudar o sistema se torna algo capaz da
sacudir toda uma sociedade e todo um sistema para
modificar suas estruturas e naquele instante eu me senti
verdadeiramente especial em tudo o que fiz.

-Sei que o Brasil foi o ultimo país independente da América


Latina e do Ocidente que de fato extinguiu por completo a
escravidão, más antes tarde do que nunca afinal já estava
mais do que em tempo de mudar de postura, a mudança
positiva é o que transforma a sociedade e seu pensamento
muita coisa ainda precisava mudar na mentalidade do
povo, más a lei Aurea foi sem duvida um bom começo.

-Todo mundo comentava que após a abolição a coroa ficou


um tanto que estremecida e isso abriu a oportunidade para
o que aconteceria logo a seguir, no dia 15 de novembro de
1889 foi quando o próprio Marechal Deodoro da Fonseca
saiu de sua casa no Rio e com uma tropa de mil militares
proclamou a república , foi dado um prazo para que a
família real deixasse o Brasil depois da família real ser
expulsa do Brasil Dom Pedro II escreveu “ Resolvo,
cedendo ao Império das circunstâncias, partir com toda a
minha família amanhã, deixando esta pátria de nós
estremecida. Conservarei do Brasil a mais saudosa
lembrança, fazendo ardentes votos por sua grandeza e
prosperidade.”

- Naquele 15 de novembro de 1889 estava iniciando a


Republica da espada aqui no Brasil e foi nesse período que
eu recebi a patente de Major ajudante da guarda nacional .

-Depois de Deodoro estava como chefe do governo


provisório, más mesmo estando de forma provisória o
primeiro presidente do Brasil criou o código penal, reformou

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o código comercial do Brasil, separou igreja de Estado,
institucionalização do casamento civil porque até então só
se podia casar de fosse na igreja, fez a primeira
constituição republicana, más nem tudo eram flores,
começou a crise do encilhamento e isso gerou especulação
financeira e alta inflação, isso gerou tanta tensão política
que pelo fato de Deodoro ter sido presidente em sufrágio
indireto tudo isso culminou na centralização e tendência
federalista pela parte dos militares e assim o Congresso
Nacional se dissolveu , foram tantas reviravoltas que o
Marechal Deodoro renunciou em 23 de novembro de 1891
e um ano depois no dia 23 de agosto de 1892 morreu de
dispneia.

-Depois de Marechal Deodoro da Fonseca subiu ao poder


Floriano Peixoto que tratou logo de demitir o governador
general Clarindo de Queiroz, não vou negar que apoiei
muito Floriano Peixoto e por causa disso passei a ser mal
visto porque me tornei republicano, pensei que com a
república haveria ordem e que a vida melhoraria porem eu
aprenderia amargamente que eu estava redondamente
enganado.

-Depois que Floriano Peixoto subiu ao poder ele tentou


controlar a inflação causada pela politica do encilhamento
tentando controlar os preços dos gêneros alimentícios e
alugueis, Floriano era mais voltado ao positivismo tinha o
apoio dos militares que mesmo sabendo que não houve
eleição defendiam a estadia de Floriano no poder e através
do “manifesto dos 13 generais “ eles tentavam legalizar e
legitimar os atos autoritários de Floriano, havia também o
tabernáculo da ciência que também o apoiava que era
formado por ex-combatentes da guerra do Paraguai onde
Floriano Peixoto também guerreou.

-Me enganei porque pensei que haveria algum respeito a


democracia porem tudo o que houve foi totalitarismo, logo

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Floriano Peixoto receberia o título de o Marechal de Ferro e
fazia jus a esse nome, pois ele perseguia e matava seus
inimigos, o poder o havia deixado cego e por essa razão
ele decidiu pegar uma cidade da qual tinha o nome de
Nossa Senhora do Desterro e nomeá-la de Florianópolis.

-O governo dele começou a apresentar revoltosos começou


então uma revolta federalista em fevereiro de 1893 e o que
chamaram de Segunda revolta armada onde enfrentou Rui
Barbosa e decretou Estado de Sitio, Floriano em 29 de
junho 1894 em sua fazenda Ribeirão da divisa deu seu
último suspiro e morreu de cirrose hepática e isso foi
noticiado em todos os jornais.

-Começou-se então mais uma vez a corrida ao poder e


naquela época era a chamada politica do café com leite
onde São Paulo e Minas Gerais se revezavam no poder e
aqui no Ceará começou a surgir o chamado coronelismo
onde o coronel ordenava o povo a votar em determinado
candidato e isso a gente passou a chamar de voto de
cabresto ou curral eleitoral pois o povo só era lembrado
durante o período das eleições.

-Enquanto eu trabalhava na Praia do peixe eu


acompanhava todas as noticias através do que as pessoas
me contavam e dos jornais, a politica estava simplesmente
pegando fogo naquele ano de 1894 eram 29 candidatos a
presidente e quem ganhou com 276.583 votos foi Prudente
José de Morais Barros, foi o primeiro presidente eleito por
voto direto.

-Em 1896 aqui no Ceará estava firmada a disputa entre o


Marcos Franco Rabelo e o Nogueira Aciolli que seu nome
era com i no final mas para ficar mais chique ele teimava
em escrever com y, vai se entender das frescuras, me
poupe porque no fim tudo soa como um i, Franco Rabelo
só o chamava do O Babaquara, no principio eu apoiei

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Nogueira Aciolly pois pensei que ele traria melhoras para a
população de Fortaleza, más me enganei outra vez e dessa
vez foi de amargar mesmo, imaginem vocês que Nogueira
Aciolly prometeu fazer obras para melhoria da vida dos
fortalezenses e nada saiu do papel, até as tais pontes que
ele prometeu constava nos papeis como feita mais ele
carregou todo o dinheiro.
-O governo de Nogueira Aciolly foi marcado por muitas
divergências e escândalos, inclusive seu vice Manuel
Vitorino esteve por traz da divergência com Prudente
Morais e do enforcamento de Marcelino Bispo de Mello que
foi encontrado morto em situação suspeita envolvendo uma
cadeira e um lençol e que no final a culpa recaiu sobre o
capitão Deocleciano Martyr e José de Sousa Velloso.

-Aciolli não tinha apoio do governo federal, manipulou a


politica em detrimento dos seus, não deu prioridade aos
setores que realmente traziam o desenvolvimento do
Estado, as cinco pontes sobre o rio Pacotí encomendadas
a França através da Casa Boris Fréres foi a maior mentira
porque ele ficou com todo o dinheiro, porem as pontes
nunca foram construídas sem falar que Boris era um
grande amigo dele e por isso também levou vantagem
nisso.

-Em 1898 começou uma grande seca outra vez no Ceará e


a oligarquia acciolina fez que não estava nem vendo o
sofrimento do povo sertanejo, com a fome e a seca que
assolava logo veio uma verdadeira epidemia da varíola.

-Lembro-me muito bem que Oswaldo Cruz no Rio de


janeiro tentou vacinar o povo, mas como o povo estava
muito desconfiado acabou que por ter uma grande revolta,
o povo pensava que era no mínimo muito estranho ter uma
substancia estranha injetada em seus corpos sem saber se
era verdadeiramente eficaz, estava havendo uma
urbanização por lá e a população humilde estava sendo

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retirada dos centros para as periferias, os cortiços do
centro do Rio de Janeiro estavam sendo destruídos, mas a
população sem o acesso a água e ao saneamento estavam
erguendo suas casa onde dava e assim se iniciaram as
primeiras favelas pela falta de um projeto de urbanização
para aquelas pessoas que foram removidas de seus lares,
como que depois de tudo isso o povo não ficaria
desconfiados .
- Aqui em Fortaleza estávamos tendo a fome, a seca cruel,
a epidemia da varíola mortal e a ignorância do Aciolli que
dizia que essa doença não iria dar em nada, eu me
perguntava como é que um líder consegue ser tão
inconsequente e ignorante fazendo jus ao seu pseudônimo
de Babaquara, assim a população fortalezense se
desencantou de vez com ele e passou a ter repudio devido
a negligencia dele.

-Rodolfo Téofilo que era opositor de Accioli, pelo outro lado


fez muito pelo povo, levando a conscientização sobre a
vacina e inclusive fabricava a vacina contra a varíola e saia
explicando o porque da importância de vacinar e assim
aplicava as vacinas em quem permitia, como o bem
sempre é perseguido Accioli chegou ao cúmulo de dizer
que o fato de Teófilo vacinar o povo contra a varíola eram
uma ação desmoralizante para o seu governo, criticou e
perseguiu tanto mas não fez nenhuma ação de vacinação
nem de conscientização do povo.

-Terminando o quadriênio Accioly foi substituído por Pedro


Borges mas o favoritismo a família Accioli continuou,
principalmente aos filhos de Nogueira Accioli.

-Enquanto isso minha vida estava passando por uma


reviravolta, eu me separei e tornei a me casar em 1902,
casei-me com uma parente de João Brígido Branco um
amigo jornalista.

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-Para completar houve uma questão de um alistamento
obrigatório do qual queriam obrigar os jangadeiros a se
alistarem, mas eu sabia que isso não podia ser pois eles
tinham família e como essas famílias iriam sobreviver sem
o provedor do sustento.

-Tentei ajudar as famílias dos pescadores porem a revolta


não deu certo, houve muito tiroteio, muita gente saiu ferida
e outros tantos morreram e eu que já estava muito
decepcionado com as ações de Nogueira Accioli fiquei
mais decepcionado ainda pois eu apoiei a republica e
agora vejo o quão errado eu estava.

Capitulo 9 A guerra

-A oposição continuava firme e forte contra Nogueira Accioli


ele foi eleito mas todos sabiam que foi através das
artimanhas dele que ele conseguiu subir ao poder,
começaram muitas manifestações contra o Accioli que
todos chamava de Babaquara, mas a pior de todas as
coisas ainda estava por vir.

-Durante a passeata das crianças, onde lideravam


mulheres cearenses, 600 crianças todas trajando branco e
com um laços verde e amarelo com um medalhão de
Marcos Franco Rabelo desfilavam, no meio dessa
manifestação aqui em Fortaleza aconteceu que Accioli
tomado de raiva ordenou que a passeata fosse reprimida e
deu a ordem para que atirassem nas pessoas que ali
estavam, muita gente saiu ferida e morta desse simples ato
democrático.

-A população não deixou barato e se armando como pôde


fora a luta para retirar Nogueira Accioli do poder, por fim
Accioli resolveu renunciar, nas negociações estava o
coronel gaúcho José Faustino seu genro, a oposição

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aceitou a renuncia de Accioli desde que ele cumprisse com
as exigências de jamais ser candidato ao governo do
Ceará, não aceitar nenhuma ajuda do Governo Federal
para ser re-colocado no governo do Estado, deixar de
imediato o Palácio da Luz e partisse o quanto antes junto
com sua família para o sul e de garantia de que não
retornaria deixaria dois reféns José Accioli e Graccho
Cardoso, tutelados mas com livre trânsito.

-As noticias corriam rápido, soubemos quando Accioli foi


deposto, ele e sua família foram as pressas rumo ao Rio de
Janeiro em um navio de cabotagem e o que ele não sabia
era que o jornalista do qual ele havia ordenado um
atentado contra sua vida tinha sobrevivido a tentativa de
assassinato, este era o jornalista Antônio Clementino de
Oliveira, ele estava bem vivo para o azar de Accioli e agora
queria a vingança, Antônio Clementino não perdeu tempo e
desceu o chumbo na direção de Nogueira Accioli e no meio
daquele tiroteio louco quem foi baleado e morreu foi o filho
de Nogueira Accioli que também se chamava Antônio,
assim a vingança do jornalista estava completa pois o
primogênito de seu pior inimigo estava morte e não há
maior dor para um pai do que perder um filho.

-O tiroteio e a morte do filho de Nogueira Accioli ocorreu


em 12 de julho de 1904 e foi noticiado em toda a mídia,
enquanto isso Fortaleza inteira acompanhava a subida ao
poder de Marcos Franco Rabelo, graças a política das
salvações em 14 de julho de 1912.

-Franco Rabelo procurou enfraquecer o poderio que


Nogueira Accioli exercia indiretamente através dos seus
parentes no poder, nessa tentativa de acabar com o poder
de Nogueira Accioli conseguiu a deposição de Antônio Luiz
Alves Pequeno o primo de Nogueira Accioli e o
apadrinhado apoiado por Padre Cicero no cargo de prefeito
do Juazeiro.

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-Queridos jovens daí do futuro o cenário aqui não era lá
dos mais animadores, a cunho mundial o mundo estava
marchando para a primeira guerra mundial, aqui no Brasil
aconteceria o que se chamaria de Trindade Messiânica
pois foram três grandes guerras , guerra de Canudos tendo
a frente Antônio o conselheiro na Bahia que foi em 1897 , a
guerra do contestado no sul do país em 1912 e a guerra
daqui do Ceará que seria em 1914,chamada de a Sedição
do Juazeiro e que foi o único movimento que manteve
origens de cunho conservador e que mantinha os vínculos
com a igreja, sem contar que teve a presença do padre
Cicero , um presidente interino , o apoio da oligarquia e a
ausência de estratégia do exercito brasileiro.

-Eu já estava velhinho mas eu me lembro bem que havia


um muro de proteção que foi construído por Padre Cicero
e os moradores da região, demorou apenas seis dias para
ficar pronto e passava pela colina do Horto e descia
chegando perto da localidade do Crato, dessa forma
Juazeiro que fica a 514 quilômetros de Fortaleza estava
sob tutela do Crato e aquela região era conhecida como a
Nova Jerusalém e por sua importância religiosa e politica
tendo a frente o Padre Cicero culminaria em uma poderosa
defesa a essas terras, e a população de lavradores,
vaqueiros , agricultores, comerciais , cangaceiros estariam
a cargo de seguir Padre Cicero e defender a cidade como
fosse.

-Em 15 de dezembro de 1913, aconteceu uma assembleia


dissidente aqui no Ceará e foi declarado que o governo de
Franco Rabelo era ilegal, sendo que ele havia sido
colocado no poder através da politica das salvações de
Hermes da Fonseca na verdade isso se configurava em um
golpe muito bem arquitetado no intuito de colocar Floro
Bartolomeu no poder e foi exatamente o que propuseram,
que Floro Bartolomeu assumisse.

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-Passaram-se três dias e em 18 de dezembro de 1913
Franco Rabelo enviou de suas tropas para fazer a invasão
a cidade do Crato e depois a Juazeiro tendo no comando
Alípio Lopes para dar um fim a chamada sedição.

-O que Alípio Lopes e a tropa não sabia era que ao chegar


no Juazeiro iria acontecer uma situação uma tanto que
inusitada, quem diria que Padre Cicero junto com Antônio
Vilanova ex-combatente de Canudos se reuniram aos
romeiros e cavaram trincheiras ao redor de toda a cidade,
essa imensa trincheira recebeu o nome de “ Circulo da mãe
das dores, essa foi a surpresinha que nem Franco Rabelo
nem os soldados esperavam.

-A primeira ofensiva foi em 20 de dezembro de 1913 e foi a


primeira derrota das tropas de Padre Cicero que recuou
para o Crato para pedir reforços, Franco Rabelo não
perdeu tempo e enviou mais soldados e um canhão, a
única coisa que ele não esperava era que o canhão fosse
falhar e por causa disso Padre Cicero seria o vitorioso.

-Em 24 de janeiro de 1914 , Crato foi ocupada pelos até


então chamados sediosos do Juazeiro, a tomada de poder
não parou por aí porque os revoltosos marcharam para
Fortaleza e aqui também houve luta e trincheiras com a
ajuda do senador Pinheiro Machado derrubar o poder de
Franco Rabelo.

-Em 5 de março de 1914 eu faleci com 75 anos de idade,


foi um período em que simplesmente Floro Bartolomeu e
Padre Cicero junto com os revoltosos entraram na cidade e
no meio do tiroteio e das trincheiras não tive um velório
digno e nem recebi nenhuma homenagem no dia de minha
morte, não havia tempo era correr ou morrer.

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-Aquele dia foi muito triste, partir vendo a cidade de
Fortaleza tomada pelas trincheiras e banhada pelo sangue
daqueles que lutavam no dia 19 de março de 1914
juntamente com as tropas de Floro Bartolomeu estava a
tropa federal, e depois de ocuparem as regiões de Miguel
Calmon, Senador Pompeu, Quixeramobim e outras cidades
o cerco conseguiu atingir Franco Rabelo que não teve
escolha e nem sequer teve como reagir sendo deposto em
15 de março de 1914, exatamente dez dias depois de
minha morte.

-Olhando para tudo o que passei, vejo que minha vida fez
parte da historia do meu querido Ceará, como sei de todas
essas coisas mesmo depois de minha morte?

-É o espirito de minhas ações que vive, a prova é tanta que


o Dragão do mar que vos fala guarda imenso tesouro é a fé
e a cultura, a história e a perseverança do nosso povo
cearense, o mais guerreiro e incrível que já vi, hoje meu
nome esta no Centro de cultura Dragão do Mar para
disseminar a cultura do nosso Ceará, esta estampado em
nome de escola para ensinar a criançada a ler e escrever ,
esta em um navio para o desenvolvimento econômico da
nação e esta dentro de cada cearense que ama seu povo.

-Vou contar um segredo mas vocês não contem para


ninguém, a jangada liberdade que estava no museu
desapareceu, é que ela voltou a mim seu antigo dono e
pelo mar de Fortaleza de vez em quando eu costumo
navegar não tem como resistir a beleza do nosso lindo
Ceará.

- O meu maior tesouro é saber que a história vive em cada


cearense e que existe um pouco de Dragão do mar e um
pouco de guerreiro em cada um de nós, nós somos a lenda
dentro de nosso próprio período histórico e assim diante
desse belíssimo por de sol que só a praia de Iracema tem,

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onde vivi tantos anos de minha vida a chamando de praia
do peixe eu me despeço pois minha alma é banhada por
esse mar e esse brilho de Fortaleza que tanto encanta e
seduz , da terra que emana e brota ideias, cultura, arte e
liberdade a terra da luz.

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Sobre a autora
Sou Rebeca Alexandrino Rabelo escritora desde meus
13 anos então escrever é a minha maior paixão, desde que
me encontrei no maravilhoso mundo das letras eu nunca
mais deixei de escrever, hoje com 27 anos o amor pelo
conhecimento é o que me faz acreditar em um futuro
melhor onde o conhecimento possa ser transmitido
derrubando as fronteiras e obstáculos semeando uma nova
geração consciente da história de nosso povo, sendo
conhecedores de nossa cultura e tomando posse de seu
espaço na sociedade como jovens críticos, sábios e

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questionadores, para que sejam grandes adultos edificando
a nação brasileira.
Quem realmente sou eu? Eu sou aquela que acredita que
sim é possível despertar o amor pelo nosso querido Brasil
em nosso leitor e na nossa juventude, acredito que acima
de tudo a literatura tem o poder transformador de edificar
mentes e formar verdadeiros cidadãos, o escritor só pode
se tornar completo se conseguir levar uma mensagem
transformadora a sociedade, uma folha em branco é na
verdade um universo de possibilidades e as palavras tem
poder e quem as escreve tem por dom dar a vida as
palavras para que toquem a mente e o coração de cada
leitor.

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98
Bibliografia

ADERALDO, Mozart Soriano – História Abreviada de Fortaleza e Crônicas


sobre a cidade amada. Fortaleza: Edições UFC, 1993.
CHAVES, Gylmar; VELOSO, Patricia; CAPELO, Peregrina (Organizadores) –
Ah, Fortaleza!. Fortaleza: Terra da Luz Editorial, 2006.
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Fortaleza. Fortaleza: Editora UFC, 1977.
ESCÓSSIA, Fernando Melo de – Guia cultural: quatro vezes Fortaleza.
Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2000. ISBN 85-86375-61-6
FABRÍCIO,Éricson. Breve História do Ceará. Antulius, Ceará, 2013.
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SOUZA, Simone de; NEVES, Frederico de Castro (organizadores) –
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escrita de Edmar Morel (1949)». ANPUH – XXV SIMPÓSIO NACIONAL DE
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localizado no Cemitério São João Batista, em Fortaleza». 19 de Novembro de
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Xavier, Patrícia Pereira (2010). «O Dragão do Mar na “Terra da Luz”: a
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Moreno Rocha, Saulo (2018). «Esboços de uma biografia de musealização: o
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Tomo 1: Alves, Castro (1944a). Obras Completas de Castro Alves. Col: Livros
do Brasil. 1. [S.l.]: Companhia Editora Nacional. 500 páginas. Introdução e
notas de Afrânio Peixoto. Contendo os livros "Espumas Flutuantes" e "Hinos do
Equador"
Tomo 2: Alves, Castro (1944). Obras Completas de Castro Alves. Col: Livros do
Brasil. 2. [S.l.]: Companhia Editora Nacional. 562 páginas. Introdução e notas
de Afrânio Peixoto. Contendo os livros "Os Escravos", "Gonzaga ou a
Revolução de Minas" e "Relíquias", e ainda "Correspondência"
________, Antônio Prado no Império e na República - Seus Discursos e Atos
Coligidos e apresentados por sua filha Nazaré Prado, F. Briguiet & Cia.
Editores, Rio de Janeiro, 1929.
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Tribunais, São Paulo, 1946.
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