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1ª EDIÇÃO R$1,00

FOLHETO DA MANHÃ
João Pessoa, 06 de dezembro de 2022

A PRÁTICA DA MEMÓRIA:
uma conversa com Carlos Azevedo, do Questão de Ordem

R esponsável pela pu-


blicação do Questão
de Ordem, jornal-labora-
trajetória no jornalismo
local.
prendi a pegar o ritmo da
produção. Então, a gente
era uma assessoria que
tório da UFPB, Carlos Folheto da Manhã: On- todo dia mandava relea-
Azevedo é um dos prin- de trabalhou com jorna- ses para as redações.
cipais professores da prá- lismo impresso? Existiam muitas reda-
tica jornalística na Paraí- Carlos Azevedo: Duran- ções naquela época, e a
ba. Nesta entrevista, ele te o curso, eu fiz um es- gente trabalhava para di-
conversou com o Folheto tágio no Sesc no setor de vulgar as atividades do
sobre a produção de um atividades culturais com Sesc. Os festivais de cul-
jornal impresso, além de o jornalista Chico No- tura, os festivais de mú-
contar detalhes da própria ronha. Foi lá que eu a- sica, as atividades de ar-

Editora: Damirys Machado. Redatores: Damirys Machado, Flávia Lúcia e Vinícius Marantz. Repórteres: Fernando
Felipe, Flávia Lúcia, Kenidy Santana e Vinícius Marantz.
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FOLHETO DA MANHÃ

es plásticas, literatura. [...] Saindo do Sesc, eu re- Carmélio. Era uma cadeira muito difícil mes-
solvi ter uma experiência dentro do mercado, só que mo, porque a gente tinha que ter um ritmo de
naquela época, nos anos 90, o mercado estava em produção. E naquela época, a redação era só
crise. E eu soube que o jornal O Norte estava máquinas. A máquina que tinha na redação da
fazendo seleção e fui lá fazer. Engraçado que o gente era a Linea 98, da Olivetti.
ritmo de produção da assessoria do Sesc me fez ter
uma agilidade em termos de produção e eu recebi E olhe que é muito difícil você manter, mesmo
cinco pautas, aí eu corri, fiz duas pautas no carro da com duas edições por ano, um jornal desse
reportagem e as outras três pautas, eu fiz por funcionando. Porque você luta contra a buro-
telefone. [...] E depois do Norte… essas coisas, né? cracia, você luta contra a falta de estrutura,
Aí eu fui lá no Correio da Paraíba e falei com você luta contra o tempo, que o semestre pas-
Giovanni Meirelles, que era o editor geral da área. sa rápido. Os estudantes ainda não têm um ní-
vel de rapidez na produção. Aí eu digo, o
É triste falar nisso porque todos esses jornais já se jornal Questão de Ordem, ele é artesanal, ele
acabaram, né? Eles não se transformaram a tempo não é industrial. Apesar de ser impresso, ele é
para se tornarem digitais. A digitalização não artesanal. Daí, a pegada dele no jornalismo
chegou pra eles, então assim, o que a gente fala é de literário, no jornalismo comunitário, por aí.
uma memória do tempo em que jornal era impresso.
Pra você ter uma ideia, quando saía resultado de FM: Tanto no Q.O. como em outros jornais,
vestibular, a Copeve dava uns disquetes. Então, o qual foi o momento mais marcante?
jornal botava um motoquei-ro na frente pra pegar o CA: Rapaz, tem coisas fantásticas, né? Eu fa-
disquete junto com o repórter e correr pra dentro, zia muita matéria por telefone. Então eu
para o jornal, pra abrir o disquete, para imprimir o gostava de romper as fronteiras da Paraíba na-
resultado do vestibular. Não existia internet, a gente quele tempo. A cultura era tudo muito loca-
era feliz, e tudo era muito difícil. lizado, regionalizado, muito fechado. E eu
tinha mania de conseguir os telefones do
FM: E depois do Correio? povo. Aí eu consegui. Eu gostava muito de
CA: Aí depois do Correio, eu resolvi estudar pra Mário Lago. Compositor, autor de Ai que
fazer mestrado. Então, no Correio também, vale a saudade de Amélia, né? E ele era escritor
pena dizer que no Correio eu tive a minha primeira também. Aí eu li o livro todo de Mário Lago.
experiência como editor. Eu disse: "Eu vou fazer uma entrevista com
Mário Lago". Aí consegui o telefone dele, fiz
FM: Quando surgiu o Questão de Ordem? uma entrevista com Mário Lago, fantástica.
CA: Ah, o Questão de Ordem é um jornal Depois eu consegui o telefone de Hilda Hilst,
laboratório que tem, mais ou menos, 40 anos. Ele a escritora. Depois eu consegui, fiz uma entre-
surgiu com a primeira turma de jornalismo. vista com Raquel de Queiroz. Já sequestrei
Carmélio Reynaldo é o grande nome desse jornal, Ariano Suassuna... Eu gostava muito de fazer
porque ele é uma espécie de pai fundador do jornal. matérias com escritores, com grandes escri-
E outro dia, Carmélio me disse que o jornal era tores. E também tem momentos, assim, fantás-
semanal, porque a universidade tinha uma gráfica. ticos. É o salário que o jornal não dá.
Então, semanalmente, eles produziam um jornal.
Diga aí, toda semana ter um jornal?
Por Fernando Felipe e Kenidy Santana
Eu paguei jornalismo impresso com o professor
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Jornal da Paraíba, quando ainda no formato


MICROFONIA: impresso. Olga ainda pontua entraves encontradas
jornalismo musical autenticamente paraibano no dia a dia, como o fato de ter que lidar,
necessariamente, com uma sociedade patriarcal
Procurando um jornal que exponha as grandes repleta de machismo, misoginia e preconceitos, mas
promessas do rock? Esse é o Microfonia. reforça a capacidade da mulher para exercer
Veiculado de forma impressa desde 2010, ele traz funções diversas em suas profissões.
em seu conteúdo uma linguagem de zine. Através
dele, pode-se observar a execução do jornalismo Ela descreve a sensação de se produzir um jornal
musical de uma maneira mais descontraída e crítica impresso como a segunda melhor, pois, para ela, a
do conteúdo. “No Jornal Microfonia nunca existiu primeira é escrever letras e compor melodias, outro
uma preocupação formal com linha editorial”, talento da jornalista, que já foi cantora e
afirma Olga da Costa Gomes, 60, jornalista do compositora nas bandas Marcha Fúnebre/Avadut
Microfonia e formada em Comunicação (1989), Nailspop (1996), Chandler/Mondatta Blue
Social/Direito/Pós-Graduação em Rock (FASM- (SP - 2005) e atualmente no duo Motosserra
SP). (PB/MG - 2022).

Ela revela que tudo se originou por causa de uma Sobre o processo de criação, ela revela que “no
entrevista com o músico Tommy Keene, que não Microfonia o que determina o restante das colunas
havia onde ser publicada: “Quando surgiu a ideia de do jornal sempre é a entrevista de capa”, não
fazer um jornal com linguagem de fanzine, a acreditando na hierarquia das informações, optando
entrevista foi o pontapé inicial e de certa forma, por basear-se no direcionamento cronológico do
determinou uma linha editorial independente de conteúdo. Os nomes das colunas fazem referência à
qualquer formalização existente no establishment filmes que tratam do assunto abordado. “Ou seja, a
jornalístico”. coluna “E o Vento Levou...”, por exemplo, trazia
discos, filmes, HQs do passado, que foram
responsáveis por marcarem um momento relevante
no universo de publicações independentes ou até
mesmo algumas dentro do mainstream que não
ganharam muito espaço de divulgação por conta de
política interna de gravadoras, editoras e
corporações”.

A jornalista, por fim, explica a alegria que foi ter o


primeiro número do Jornal Microfonia resenhado
Olga trabalha na produção do Microfonia – no 1° Anuário de Fanzines, Zines e Publicações
atualmente também administra a loja online do Alternativas, editado e publicado pela UGRA Press
jornal –, atuando como redatora, fotógrafa, - Quadrinhos e Contracultura de São Paulo, em
diagramadora, editora e também é responsável pela 2011. Experiências marcantes e importantes como
transcrição das entrevistas realizadas através de esta, juntam-se ao prazer de participar de cada linha
gravações de áudios, na sua maioria. Iniciou sua publicada no Microfonia, que sem dúvidas, é para
carreira no jornalismo como repórter e fotógrafa no Olga um fato marcante e sem precedentes.
jornal O Norte, além de ter colaborado com fanzines
em portais culturais como Overmundo, Zona Norte e Por Flávia Lúcia e Vinícius Marantz

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