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Clarice Lispector

Água Viva

Traduit du portugais (Brésil)


par Claudia Poncioni et Didier Lamaison

Édition bilingue
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Água Viva
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© 1973, Clarice Lispector


© 1981, des femmes-Antoinette Fouque,
pour l’édition française.
© 2018, des femmes-Antoinette Fouque,
pour la nouvelle traduction française de Claudia Poncioni
et Didier Lamaison.

33-35 rue Jacob, 75006 Paris.


www.desfemmes.fr

ISBN PDF : 9782721008480


ISBN PNB PDF : 9782721008503

Diffusion CDE
Distribution SODIS
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Clarice Lispector

Água Viva

Traduit du portugais (Brésil)


par Claudia Poncioni et Didier Lamaison

Édition bilingue

des femmes
Antoinette Fouque
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Tinha que existir uma pintura totalmente livre da


dependência da figura – o objeto – que, como a música,
não ilustra coisa alguma, não conta uma história e não
lança um mito. Tal pintura contenta-se em evocar os reinos
incomunicáveis do espírito, onde o sonho se torna
pensamento, onde o traço se torna existência.
Michel Seuphor
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« Il fallait qu’ il existât une peinture qui soit entièrement


libérée de la tutelle de la figure ou de l’objet et qui
puisse – comme la musique – dans la totale indépendance
de toute illustration ou anecdote ou mythe, exprimer les
lieux incommunicables de l’esprit, là où le songe devient
pensée, où le chiffre devient être. »
Michel Seuphor
La Peinture abstraite,
Flammarion, 1964.
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clarice lispector

É com uma alegria tão profunda. É uma tal aleluia.


Aleluia, grito eu, aleluia que se funde com o mais
escuro uivo humano da dor de separação mas é grito
de felicidade diabólica. Porque ninguém me prende
mais. Continuo com capacidade de raciocínio – já
estudei matemática que é a loucura do raciocínio – mas
agora quero o plasma – quero me alimentar direta-
mente da placenta. Tenho um pouco de medo : medo
ainda de me entregar pois o próximo instante é o
desconhecido. O próximo instante é feito por mim ?
ou se faz sozinho ? Fazemo-lo juntos com a respiração.
E com uma desenvoltura de toureiro na arena.
Eu te digo : estou tentando captar a quarta dimensão
do instante-já que de tão fugidio não é mais porque
agora tornou-se um novo instante-já que também não
é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero
apossar-me do é da coisa. Esses instantes que decorrem
no ar que respiro : em fogos de artifício eles espocam
mudos no espaço. Quero possuir os átomos do tempo.
E quero capturar o presente que pela sua própria natu-
reza me é interdito : o presente me foge, a atualidade
me escapa, a atualidade sou eu sempre no já. Só no ato
do amor – pela límpida abstração de estrela do que se
sente – capta-se a incógnita do instante que é dura-
mente cristalina e vibrante no ar e a vida é esse instante
incontável, maior que o acontecimento em si : no amor
o instante de impessoal jóia refulge no ar, glória
estranha de corpo, matéria sensibilizada pelo arrepio

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C’est avec une joie si profonde. C’est un tel alléluia.


Alléluia, crié-je, alléluia qui se fond au plus obscur hurle-
ment humain de la douleur de séparation, mais c’est un
cri de félicité diabolique. Parce que personne ne me retient
plus. Je suis encore capable de raisonnement – j’ai déjà
étudié les mathématiques qui sont la folie du raisonne-
ment – mais maintenant je veux le plasma – je veux me
nourrir directement du placenta. J’ai un peu peur : peur
encore de m’abandonner car l’instant prochain est l’in-
connu. L’instant prochain est-il fait par moi ? ou se fait-il
tout seul ? Nous le faisons ensemble par la respiration. Et
avec une désinvolture de torero dans l’arène.
Je te dis : j’essaie de capter la quatrième dimension de
l’instant-ci qui d’être si fugitif, n’est plus, car maintenant
est devenu un nouvel instant-ci qui à son tour n’est plus.
Chaque chose a un instant où elle est. Je veux m’emparer
du est de la chose. Ces instants qui s’écoulent dans l’air
que je respire : en feux d’artifice ils éclatent muets dans
l’espace. Je veux posséder les atomes du temps. Et je veux
capturer le présent qui, par sa nature même, m’est interdit :
le présent me fuit, l’actualité m’échappe, l’actualité c’est
moi toujours dans le déjà. C’est seulement dans l’acte
d’amour – par la limpide abstraction d’étoile de ce que
l’on sent – que l’on capte l’inconnu de l’instant qui est
durement cristallin et vibrant dans l’air, et la vie est cet
instant incomptable, plus grand que l’événement en soi :
dans l’amour l’instant d’impersonnel joyau resplendit
dans l’air, gloire étrange de corps, matière sensibilisée par

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dos instantes – e o que se sente é ao mesmo tempo que


imaterial tão objetivo que acontece como fora do corpo,
faiscante no alto, alegria, alegria é matéria de tempo e
é por excelência o instante. E no instante está o é dele
mesmo. Quero captar o meu é. E canto aleluia para o
ar assim como faz o pássaro. E meu canto é de ninguém.
Mas não há paixão sofrida em dor e amor a que não se
siga uma aleluia.
Meu tema é o instante ? meu tema de vida. Procuro
estar a par dele, divido-me milhares de vezes em tantas
vezes quanto os instantes que decorrem, fragmentária
que sou e precários os momentos – só me comprometo
com vida que nasça com o tempo e com ele cresça : só
no tempo há espaço para mim.
Escrevo-te toda inteira e sinto um sabor em ser e o
sabor-a-ti é abstrato como o instante. É também com
o corpo todo que pinto os meus quadros e na tela fixo
o incorpóreo, eu corpo-a-corpo comigo mesma. Não
se compreende música : ouve-se. Ouve-me então com
teu corpo inteiro. Quando vieres a me ler perguntarás
por que não me restrinjo à pintura e às minhas expo-
sições, já que escrevo tosco e sem ordem. É que agora
sinto necessidade de palavras – e é novo para mim o
que escrevo porque minha verdadeira palavra foi até
agora intocada. A palavra é a minha quarta dimensão.
Hoje acabei a tela de que te falei : linhas redondas
que se interpenetram em traços finos e negros, e tu,

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le frisson des instants – et ce que l’on sent est, en même


temps qu’immatériel, si objectif que cela se passe comme
hors du corps, étincelant dans les hauteurs, joie, joie est
matière de temps, et par excellence, l’instant. Et dans
l’instant est le est de l’instant lui-même. Je veux capter
mon est. Et je chante alléluia dans l’air ainsi que fait l’oi-
seau. Et mon chant n’est à personne. Mais il n’est pas de
passion soufferte en douleur et amour qui ne soit suivie
d’un alléluia.
Mon thème est l’instant ? mon thème de vie. Je cherche
à lui être pareille, je me divise des milliers de fois en autant
de fois que d’instants qui s’écoulent, fragmentaire que je
suis et précaires les moments – je ne m’engage qu’avec la
vie qui naît avec le temps et avec lui grandit : c’est seule-
ment dans le temps qu’il y a de l’espace pour moi.
Je t’écris tout entière et je sens un goût à être et ton
goût-à-toi est abstrait comme l’instant. C’est aussi avec
tout mon corps que je peins mes tableaux et sur la toile je
fixe l’incorporel, moi corps à corps avec moi-même. La
musique ne se comprend pas : elle s’entend. Entends-moi
alors avec ton corps tout entier. Quand tu arriveras à me
lire, tu demanderas pourquoi je ne m’en tiens pas à la
peinture et à mes expositions, puisque j’écris rude et de
façon désordonnée. C’est que maintenant je sens le besoin
de mots – et c’est nouveau pour moi ce que j’écris parce
que ma vraie parole est restée jusqu’à présent intouchée.
La parole est ma quatrième dimension.

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que tens o hábito de querer saber por que – e porque


não me interessa, a causa é matéria de passado – pergun-
tarás por que os traços negros e finos ? é por causa do
mesmo segredo que me faz escrever agora como se fosse
a ti, escrevo redondo, enovelado e tépido, mas às vezes
frígido como os instantes frescos, água do riacho que
treme sempre por si mesma. O que pintei nessa tela é
passível de ser fraseado em palavras ? Tanto quanto
possa ser implícita a palavra muda no som musical.
Vejo que nunca te disse como escuto música – apoio
de leve a mão na eletrola e a mão vibra espraiando ondas
pelo corpo todo : assim ouço a eletricidade da vibração,
substrato último no domínio da realidade, e o mundo
treme nas minhas mãos.
E eis que percebo que quero para mim o substrato
vibrante da palavra repetida em canto gregoriano.
Estou consciente de que tudo que sei não posso dizer,
só sei pintando ou pronunciando sílabas cegas de
sentido. E se tenho aqui que usar-te palavras, elas têm
que fazer um sentido quase que só corpóreo, estou em
luta com a vibração última. Para te dizer o meu subs-
trato faço uma frase de palavras feitas apenas dos
instantes-já. Lê então o meu invento de pura vibração
sem significado senão o de cada esfuziante sílaba, lê o
que agora se segue : « com o correr dos séculos perdi o
segredo do Egito, quando eu me movia em longitude,
latitude e altitude com ação energética dos elétrons,
prótons, nêutrons, no fascínio que é a palavra e sua

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Aujourd’hui j’ai fini la toile dont je t’ai parlé : lignes


rondes qui s’interpénètrent en traits fins et noirs, et toi,
qui as l’habitude de vouloir savoir pourquoi – et le pour-
quoi ne m’intéresse pas, la cause est matière du passé –,
tu demanderas pourquoi, les traits noirs et fins ? c’est à
cause du même secret qui me fait maintenant écrire
comme si c’était à toi, j’écris rond, emmêlé et tiède, mais
parfois glacé comme les instants frais, eau du ruisseau qui
toujours tremble de soi-même. Ce que j’ai peint sur cette
toile est-il susceptible d’être phrasé en mots ? Autant que
peut être implicite la parole muette dans le son musical.
Je vois que jamais je ne t’ai dit comment j’écoute de la
musique – je pose légèrement la main sur l’électrophone
et la main vibre en répandant des ondes à travers tout mon
corps : ainsi j’entends l’électricité de la vibration, substrat
ultime dans le domaine de la réalité, et le monde tremble
dans mes mains.
Et voilà que je m’aperçois que je veux pour moi le subs-
trat vibrant du mot répété en chant grégorien. Je suis
consciente du fait que tout ce que je sais, je ne peux le dire,
je ne sais que lorsque je peins ou que je prononce des syllabes
aveugles de sens. Et si je dois ici t’utiliser des mots, ils doivent
faire un sens presque uniquement corporel, je suis en lutte
avec la vibration ultime. Pour te dire mon substrat, je fais
une phrase de mots uniquement composés d’instants-ci.
Lis alors mon invention de pure vibration sans d’autre sens
en dehors de celui de chaque syllabe sibilante, lis ce qui suit
maintenant : « au cours des siècles j’ai perdu le secret de

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sombra ». Isso que te escrevi é um desenho eletrônico


e não tem passado ou futuro : é simplesmente já.
Também tenho que te escrever porque tua seara é a
das palavras discursivas e não o direto de minha
pintura. Sei que são primárias as minhas frases, escrevo
com amor demais por elas e esse amor supre as faltas,
mas amor demais prejudica os trabalhos. Este não é
um livro porque não é assim que se escreve. O que
escrevo é um só clímax ? Meus dias são um só clímax :
vivo à beira.
Ao escrever não posso fabricar como na pintura,
quando fabrico artesanalmente uma cor. Mas estou
tentando escrever-te com o corpo todo, enviando uma
seta que se finca no ponto tenro e nevrálgico da palavra.
Meu corpo incógnito te diz : dinossauros, ictiossauros
e plessiossauros, com sentido apenas auditivo, sem que
por isso se tornem palha seca, e sim úmida. Não pinto
idéias, pinto o mais inatingível « para sempre ». Ou
« para nunca », é o mesmo. Antes de mais nada, pinto
pintura. E antes de mais nada te escrevo dura escritura.
Quero como poder pegar com a mão a palavra. A
palavra é objeto ? E aos instantes eu lhes tiro o sumo
da fruta. Tenho que me destituir para alcançar cerne
e semente de vida. O instante é semente viva.
A harmonia secreta da desarmonia : quero não o que
está feito mas o que tortuosamente ainda se faz. Minhas
desequilibradas palavras são o luxo de meu silêncio.
Escrevo por acrobáticas e aéreas piruetas – escrevo por

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l’Égypte, quand je me déplaçais en longitude, latitude et


altitude par l’action énergétique des électrons, protons,
neutrons, dans la fascination qu’est la parole et son ombre ».
Ceci, que je t’ai écrit, est un dessin électronique et n’a ni
passé ni futur : c’est simplement-déjà.
Je dois aussi t’écrire parce que ton champ est celui
des paroles discursives et non le ton direct de ma pein-
ture. Je sais qu’elles sont primaires mes phrases, j’écris
avec trop d’amour pour elles et cet amour supplée aux
fautes, mais trop d’amour nuit aux travaux. Ceci n’est
pas un livre parce que ce n’est pas ainsi qu’on écrit. Ce
que j’écris n’est-il qu’un seul sommet ? Mes jours ne sont
qu’un seul sommet : je vis au bord.
Lorsque j’écris je ne peux fabriquer comme en
peinture, quand je fabrique artisanalement une
couleur. Mais j’essaie de t’écrire avec tout mon corps,
envoyant une flèche qui se fiche au point tendre et
névralgique du mot. Mon corps inconnu te dit : dino-
saures, ichtyosaures et plésiosaures, avec un sens
seulement auditif, sans qu’ils deviennent pour autant
paille sèche, mais humide. Je ne peins pas des idées,
je peins le plus intangible « pour toujours ». Ou « à
jamais », c’est la même chose. Avant tout, je peins la
peinture. Et avant tout je t’écris la dure écriture. Je
veux comme pouvoir prendre le mot avec la main. Le
mot est-il un objet ? Et des instants je tire le jus du
fruit. Je dois me destituer pour atteindre cœur et
semence de vie. L’instant est semence vivante.

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profundamente querer falar. Embora escrever só esteja


me dando a grande medida do silêncio.
E se eu digo « eu » é porque não ouso dizer « tu », ou
« nós » ou « uma pessoa », sou obrigada à humildade de
me personalizar me apequenando mas sou o és-tu.
Sim, quero a palavra última que também é tão
primeira que já se confunde com a parte intangível do
real. Ainda tenho medo de me afastar da lógica porque
caio no instintivo e no direto, e no futuro : a invenção
do hoje é o meu único meio de instaurar o futuro.
Desde já é futuro, e qualquer hora é hora marcada. Que
mal porém tem eu me afastar da lógica ? Estou lidando
com a matéria-prima. Estou atrás do que fica atrás do
pensamento. Inútil querer me classificar : eu simples-
mente escapulo não deixando, gênero não me pega
mais. Estou em um estado muito novo e verdadeiro,
curioso de si mesmo, tão atraente e pessoal a ponto de
não poder pintá-lo ou escrevê-lo. Parece com momentos
que tive contigo, quando te amava, além dos quais não
pude ir pois fui ao fundo dos momentos. É um estado
de contato com a energia circundante e estremeço.
Uma espécie de doida, doida harmonia. Sei que o meu
olhar deve ser o de uma pessoa primitiva que se entrega
toda ao mundo, primitiva como os deuses que só
admitem vastamente o bem e o mal e não querem
conhecer o bem enovelado como em cabelos no mal,
mal que é o bom.

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L’harmonie secrète de la disharmonie : je veux, non


ce qui est fait, mais ce qui tortueusement se fait encore.
Mes mots déséquilibrés sont le luxe de mon silence.
J’écris par pirouettes acrobatiques et aériennes – j’écris
à cause de mon profond vouloir parler. Quoique écrire
ne me donne que la grande mesure du silence.
Et si je dis « je » c’est parce que je n’ose pas dire « tu »,
ou « nous » ou « une personne ». Je suis obligée à l’humilité
de me personnaliser, me rapetissant, mais je suis le es-tu.
Oui, je veux la parole ultime qui est aussi tellement
première qu’elle se confond déjà avec la partie intangible
du réel. J’ai encore peur de m’éloigner de la logique parce
que je tombe dans l’instinctif et dans le direct, et dans
le futur : l’invention de l’aujourd’hui est mon unique
moyen d’instaurer le futur. Dès déjà, c’est futur, et toute
heure est l’heure dite. Quel mal y a-t-il pourtant à ce
que je m’éloigne de la logique ? Je travaille la matière
première. Je suis derrière ce qui est derrière la pensée.
Inutile de vouloir me classifier : je me dérobe simple-
ment, sans laisser faire, le genre ne me saisit plus. Je suis
dans un état tout à fait nouveau et vrai, curieux de lui-
même, si attirant et personnel que je ne peux le peindre
ni l’écrire. Cela ressemble à des moments que j’ai eus
avec toi, quand je t’aimais, au-delà desquels je n’ai pu
aller car j’ai été au fond des moments. C’est un état de
contact avec l’énergie environnante et je frémis. Une
espèce de folle, folle harmonie. Je sais que mon regard
doit être celui d’une personne primitive qui s’abandonne

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Fixo instantes súbitos que trazem em si a própria morte


e outros nascem – fixo os instantes de metamorfose e é
de terrível beleza a sua sequência e concomitância.
Agora está amanhecendo e a aurora é de neblina
branca nas areias da praia. Tudo é meu, então. Mal
toco em alimentos, não quero me despertar para além
do despertar do dia. Vou crescendo com o dia que ao
crescer me mata certa vaga esperança e me obriga a
olhar cara a cara o duro sol. A ventania sopra e desar-
ruma os meus papéis. Ouço esse vento de gritos, estertor
de pássaro aberto em oblíquo voo. E eu aqui me obrigo
à severidade de uma linguagem tensa, obrigo-me à
nudez de um esqueleto branco que está livre de humores.
Mas o esqueleto é livre de vida e enquanto vivo me
estremeço toda. Não conseguirei a nudez final. E ainda
não a quero, ao que parece.
Esta é a vida vista pela vida. Posso não ter sentido
mas é a mesma falta de sentido que tem a veia que pulsa.
Quero escrever-te como quem aprende. Fotografo
cada instante. Aprofundo as palavras como se pintasse,
mais do que um objeto, a sua sombra. Não quero
perguntar por que, pode-se perguntar sempre por que
e sempre continuar sem resposta : será que consigo me
entregar ao expectante silêncio que se segue a uma
pergunta sem resposta ? Embora adivinhe que em
algum lugar ou em algum tempo existe a grande
resposta para mim.

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toute au monde, primitive comme les dieux qui n’ad-


mettent largement que le bien et le mal et ne veulent pas
connaître le bien emmêlé comme dans un écheveau au
mal, mal qui est le bon.
Je fixe des instants subits qui portent en eux leur
propre mort et d’autres naissent – je fixe les instants de
métamorphose et c’est d’une terrible beauté, leur
séquence et concomitance.
Maintenant le jour se lève et l’aurore est de brume
blanche sur les sables de la plage. Tout est à moi, alors. Je
touche à peine aux aliments, je ne veux pas me réveiller
au-delà du réveiller du jour. Je vais en croissant avec le jour
qui, de croître, tue en moi certain vague espoir et m’oblige
à regarder face à face le dur soleil. Le vent souffle et dérange
mes papiers. J’entends ce vent de cris, râle d’oiseau ouvert
en vol oblique. Et moi ici, je m’oblige à la sévérité d’un
langage tendu, je m’oblige à la nudité d’un squelette blanc
qui est libre d’humeurs. Mais le squelette est libre de vie,
et tant que je vis, je frémis toute. Je n’atteindrai pas la
nudité finale. Et je ne la veux pas encore, semble-t-il.
Celle-ci est la vie vue par la vie. Je peux ne pas avoir de
sens mais c’est le même manque de sens qu’a la veine qui bat.
Je veux t’écrire comme quelqu’un qui apprend. Je
photographie chaque instant. J’approfondis les mots
comme si je peignais, plus qu’un objet, son ombre. Je ne
veux pas demander pourquoi, on peut demander toujours
pourquoi et toujours continuer sans réponse : arriverai-je
à m’abandonner au silence suspendu qui suit une question

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E depois saberei como pintar e escrever, depois da


estranha mas íntima resposta. Ouve-me, ouve o silêncio.
O que eu te falo nunca é o que te falo e sim outra coisa.
Capta essa coisa que me escapa e no entanto vivo dela
e estou à tona de brilhante escuridão. Um instante me
leva insensivelmente a outro e o tema atemático vai se
desenrolando sem plano mas geométrico como as
figuras sucessivas em um caleidoscópio.
Entro lentamente na minha dádiva a mim mesma,
esplendor dilacerado pelo cantar último que parece ser
o primeiro. Entro lentamente na escritura assim como
já entrei na pintura. É um mundo emaranhado de
cipós, sílabas, madressilvas, cores e palavras – limiar
de entrada de ancestral caverna que é o útero do mundo
e dele vou nascer.
E se muitas vezes pinto grutas é que elas são o meu
mergulho na terra, escuras mas nimbadas de claridade,
e eu, sangue da natureza – grutas extravagantes e peri-
gosas, talismã da Terra, onde se unem estalactites,
fósseis e pedras, e onde os bichos que são doidos pela
sua própria natureza maléfica procuram refúgio. As
grutas são o meu inferno. Gruta sempre sonhadora com
suas névoas, lembrança ou saudade ? espantosa, espan-
tosa, esotérica, esverdeada pelo limo do tempo. Dentro
da caverna obscura tremeluzem pendurados os ratos
com asas em forma de cruz dos morcegos. Vejo aranhas
penugentas e negras. Ratos e ratazanas correm espan-
tados pelo chão e pelas paredes. Entre as pedras o

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BIBLIOGR APHIE

Les Éditions Triptyque (Montréal)


Claire Varin, Clarice Lispector, Rencontres brésiliennes, 2007
(première édition : Laval, Éd. Trois, 1987)

Payot & Rivages


Le Seul Moyen de vivre, Lettres, 2008

ET AUSSI

des femmes-Antoinette Fouque

Benjamin Moser, Pourquoi ce monde,


Clarice Lispector, une biographie, 2012

Chroniques,
Édition complète sous la direction de
Benjamin Moser, 2019

Collection « La Bibliothèque des voix »

La Passion selon G. H., lu par Anouk Aimée, 1983


Liens de famille, lu par Chiara Mastroianni, 1989
L’Imitation de la rose, lu par Hélène Fillières, 2008
Amour et autres nouvelles, lu par Fanny Ardant, 2015
L’Heure de l’étoile, lu par Sterenn Guirriec, 2020
ÁGUA VIVA

« Ce texte que je te donne n’est pas fait pour être


vu de près : il gagne sa rondeur secrète auparavant
invisible quand il est vu d’un avion volant à haute
altitude. Alors on devine le jeu des îles et on voit les
canaux et les mers. Comprends-moi : je t’écris une
onomatopée, convulsion du langage. Je te transmets
non pas une histoire mais seulement des mots qui
vivent du son. »
C.L.

Clarice Lispector (1920-1977) publie son premier roman Près du


cœur sauvage alors qu’elle n’a que vingt-trois ans. La critique salue
la naissance d’une grande écrivaine, consacrée avec La passion
selon G.H. et Água Viva. Son œuvre, publiée presque entièrement
en France par les éditions des femmes-Antoinette Fouque, fait
entendre une voix unique que cerne une écriture mystérieuse,
d’une précision implacable.

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