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Universidade Federal do Rio de Janeiro

Instituto de História

Instituto de Filosofia e Ciências Sociais

Trabalho de Mundo Contemporâneo – Conclusão de Período

Bruno Rosa e Caio Fernandes

Prof: Monica Grin

2018.2

O Outro Lado do Muro

Tem dias que eu me pego olhando pra fora da janela desse lugar me perguntando o
que tem de errado com o meu país, o que será preciso para nós termos uma vida
normal? Sem sermos forçados a escolher lados, ideologias e consequentemente ser
severamente penalizados por pensarmos diferente.

Meu nome é Robert Werner, contudo, nem sempre foi assim. Sou alemão e vivo na
Alemanha, bom, costumava viver na Alemanha, agora com a divisão, estou preso na
atual Alemanha Ocidental e tenho uma história para contar.

Era agosto de 1945 quando o mundo inteiro soube que os Aliados tinham ganhado a
guerra, meus pais estavam perplexos, não sabiam se ficavam felizes pela derrota do
Nazismo ou desesperados pela repetição das pesadas sanções que o país sofreria
novamente. Eu, um garoto de 4 anos, não entendia o que estava acontecendo naquele
momento e nem o que representava aquele olhar preocupado dos meus pais. Lembro
que 3 anos depois, em 1948, nós tivemos que nos mudar para o sul de Berlim, perto da
fronteira, não lembrava muito bem o motivo mas por alguma razão o ano da mudança
ficou na minha cabeça, principalmente quando nós entramos pela primeira vez na casa,
meus pais me pegaram no colo e disseram:

- Filho, não importa o que acontecer, nós vamos sempre te amar.


Eu nunca tinha entendido muito bem o motivo que levou meus pais a serem tão
afetuosos nesse momento, não era do feitio deles serem assim. Anos se passaram e eu os
mal via em casa nos finais de semana, sempre trabalhando e fazendo viagens.

Até que em uma noite chuvosa em setembro de 1954, ouço um barulho alto de uma
porta abrindo e me acordo assustado. Vou até o quarto dos meus pais, subo na cama e os
chamo repetidamente. Meu pai, um homem de 55 anos, que trabalhava como piloto de
carga de pequenos aviões, com uma expressão de cansaço devido ao desgaste do
trabalho, alcança uma arma na mesa ao lado da cama e vai até a sala ver o que
aconteceu. Ouço vários disparos e com medo, começo a chorar, minha mãe me segura
rapidamente e me coloca debaixo da cama e corre até a porta com os olhos arregalados
gritando:

- O que aconteceu?! Toni, cadê você?!

E com um último suspiro ele grita:

- Maria, corre!

De repente, vejo um clarão e dois disparos em direção á porta, felizmente, os tiros não
atingiram a minha mãe, que prontamente me pegou pelo braço e me levou para a porta
do fundo. Quando estávamos quase passando pela porta, ouço outro disparo. Minha
mãe, esbelta, alta com cabelo loiro e comprido, uma jornalista incansável, vestindo uma
camisola branca que rapidamente foi tomado pelo sangue do seu corpo, nos empurra
para fora da casa caindo pelo gramado. Com 13 anos, eu não sabia o que fazer, me
joguei em direção á um arbusto e me escondi ali por alguns minutos, meu instinto me
dizia para correr o mais longe possível, porém eu precisava ver o que tinha acontecido,
quem e porquê atirou nos meus pais. Recordo que saiu pela porta dos fundos dois
sujeitos vestidos de preto, identifico rapidamente as características no momento em que
um retira o capuz preto. O que saiu primeiro e checou o pulso da minha mãe era alto,
parrudo e cabelo preto, corte curto, expressão séria e não parecia entender uma palavra
que o seu cúmplice dizia, e esse segundo homem não vestia um capuz, só estava
visivelmente nervoso e preocupado, olhando sempre para os lados. Ao ver o corpo no
chão, prende a respiração fechando os olhos e dispara gaguejando:

- Pro...pronto, está aí o que você queria, posso ir agora? É, é ... como posso falar isso na
sua língua?
O sujeito com a pistola na mão solta um sorriso no canto da boca e o responde com um
sotaque bastante pesado:

- Não terminei o serviço ainda, não posso deixar rastros, tenho que encontrar a criança
que fugiu, mas para esta parte não preciso de você, ainda mais um covarde que entrega
o seu próprio povo, до свидания!

No mesmo minuto, três tiros são disparados em direção ao seu até então cúmplice, que
cai morto na hora. Fiquei atônito. Não conseguia mais formar uma frase na minha
cabeça, tudo que eu queria nesse momento era que tudo não passasse de um pesadelo e
que no dia seguinte meus pais estariam sentados na mesa como todo dia ás 8:00 da
manhã antes de ir para a escola.

Entrei em desespero, não sabia pra onde ir, comecei a chorar, lembro-me de correr
muito por debaixo daquela tempestade congelante, sentia minhas pernas parando de
corresponder ao mesmo tempo que meu cérebro não parava de repetir aquela maldita
frase da língua desconhecida. Acabei parando em um ponto de ônibus que tinha uma
proteção contra chuva para descansar e organizar minha cabeça. Mas não consegui
dormir pensando que ainda tinha um assassino atrás de mim.

No dia seguinte, voltei para casa e desabei, meus pais estavam mortos e eu estava
sozinho no mundo, um policial me abordou colocando casaco nas minhas costas
dizendo que iria encontrar quem fez isso e que tudo ficaria bem. Ele me pediu para dar
meu depoimento sobre a noite e era difícil demais escrever sobre a morte dos meus
próprios pais, principalmente uma criança que mal entendia a morte Escrevi sobre a
conversa que escutei dos dois homens no quintal da minha casa e expus o meu medo de
ser perseguido pelo mesmo assassino por causa do meu nome. O policial envolvido nas
investigações, Oficial Müller, solicitou a troca do meu nome para a minha proteção, que
antes era Ronald Werneck, para Robert Werner.

Mais tarde, quando estava sentado pensativo de costas para a parede , o mesmo policial
se aproxima e diz:

- Filho, o que aconteceu com você é inimaginável e não tenho o que lhe dizer, somente
tentar descobrir quem fez isso, mas por você, pegue isso aqui, vai ajudar de um jeito que
você não imagina, apenas escreva.
Quando me estiquei para pegar o presente, percebi que se tratava de um pequeno
caderno, como se fosse um diário de anotações e o agradeci. Por bastante tempo usei
esse mini diário, principalmente para falar sobre o que estava entalado dentro de mim,
sem nenhuma surpresa, a primeira coisa que escrevo no caderno naquele momento é a
frase que não saia dos meus pesadelos: ’’до свидания’’. Não conseguia tirar isso da
cabeça e iria descobrir um dia o que significava.

Alguns meses depois de ficar sobre a proteção da polícia a fim de esperar a


confirmação da troca de documentos com meu novo nome, fui levado para um orfanato
bem no coração de Berlim e acabei deixando de lado meu diário. Recordo que o lugar
era meio cinza, parecia que nada poderia ter vida ali dentro, crescer dentro desse
orfanato não foi nada fácil, sempre tendo que defender espaço e comida, me tornei ao
longo do tempo, carregando esse fardo da perda dos meus pais, uma pessoa fria e
fechada, com poucos amigos, apenas esperando o dia que ia completar 18 anos e sair
desse lugar.

Durante minha estadia, conheci muitas pessoas que tinham histórias parecidas ou até
mesmo piores que a minha, porém, nunca criando fortes laços, até conhecer uma menina
chamada Lena Hoffmann, que era diferente das pessoas daquele ambiente, cabelo curto
e castanho escuro, e até que alta para a idade, Lena não foi abandonada pelos pais como
a maioria, ela perdeu seus pais em um acidente de carro quando tinha dez anos e
carregava uma cicatriz que parecia um raio na parte esquerda do rosto que cortava a
bochecha de um lado ao outro e carregava sempre com ela um cordão que tinha preso
uma letra M. De início, ninguém tinha coragem de mexer com ela, por sempre
demonstrar uma certa antipatia, a distância era sempre uma boa opção.

Ao longo dos anos, fui me aproximando dela, com pequenas conversas, ela se abria e
contava algumas coisas pessoais e eu, que sempre fui meio fechado, acabava me
abrindo também, era algo especial o que eu tinha com ela. Como por exemplo, somente
em 1957, nós com 16 anos e já melhores amigos, que ela me contou pela primeira vez
sobre seu amuleto no pescoço. Era um presente de seu irmão mais velho, Marco, e que
quando acordou no hospital, recebeu a notícia que ele tinha desaparecido após o
acidente que tirou a vida dos seus pais. Segundo ela, nunca encontraram o corpo ou
evidências de que ele estaria vivo, todavia, Lena nunca perdeu a esperança de encontrá-
lo. Contei também histórias sobre meus pais e como era minha vida antes e após a
terrível noite de 1954, que foi interrompida pelo fato dela ficar questionando e me
dando esporro sobre minha atitude de ter ficado no arbusto esperando os assassinos
saírem pelas portas do fundo.

E foi nesse exato momento em que eu percebi que eu a amava. Sem perceber, eu fugi
da realidade por um minuto e fixei minha atenção aos detalhes do rosto e as todas as
expressões que ela fazia, observando as palavras que saiam da boca dela sem me
importar se eram xingamentos, eu simplesmente abri um sorriso bobo e senti que aquele
lugar era aonde eu queria estar, não me sentia o mesmo sem a presença dela. E no
mesmo instante, ela parou de falar, franziu a testa e me deu um leve soco falando:

- Tá maluco Robert?! Tá rindo de que garoto?!

E eu respondi:

- De você, idiota, você tá me dando esporro por algo que aconteceu há anos.

Um mês depois, com a nossa relação cada vez mais forte decidi que era hora dela
saber o que eu sentia. Fui até ela, chamei-a pra conversar e falei tudo que queria dizer.
Para a minha felicidade ela sentia o mesmo e começamos a namorar. Em 1959, nós
chegamos ao tão esperado 18 anos e poderíamos sair do orfanato, porém, acabamos
gostando do lugar e como tínhamos que começar do zero em algum lugar, por que não
começar trabalhando aonde cresceu? Então ficamos como babás e depois assumimos
um papel de recreadores das crianças mais velhas.

Contudo, em julho de 1961, Lena recebeu uma notícia importante de um antigo


conhecido da família. Aparentemente, Marco, que estava desaparecido há nove anos, foi
reconhecido em Bonn, perto da rua onde morava. Sem pensar duas vezes, ela subiu no
trem e voltou para a cidade onde o pior dia de sua vida tinha acontecido. Chegando lá,
se deparou com uma viatura policial parada ao lado de sua antiga casa. Lena
aproximou-se nervosa e perguntou em um tom de preocupação o que estava
acontecendo, o policial falou para ela se acalmar e que havia uma denúncia de
arrombamento. Ela lembrou que aquela casa era do Dr.Weiss, um cientista que tinha
uma pequena fama por seus estudos científicos na época e que era um conhecido e
vizinho da família Hoffmann. Ela logo pensou que não era coincidência esses dois
acontecimentos no mesmo espaço de tempo e decidiu que precisava entrar naquela casa
para descobrir o que foi roubado e tentar ligar isso ao paradeiro do irmão. Fingindo ser
filha do cientista, começou a chorar. Criou um drama que estava doente e que precisava
tomar urgentemente o remédio que estava no escritório do Dr.Weiss.

Após o policial ter a deixado passar, percebeu que a casa não apresentava sinais de
arrombamento, era como se nada tivesse acontecido, exceto o escritório, que estava com
os livros na prateleira todos bagunçados. Procurando algo diferente, ela percebeu que
alguns livros científicos estavam faltando na sessão de cima da estante, inclusive os em
russo. Logo, bateu um ‘flashback’ em que ela reviveu um momento quando eram
crianças em que Marco estava lendo para ela contos em russo e em seguida, escuta uma
voz interna martelando em sua cabeça que as ligações se encaixavam e que era possível
que seu irmão tenha de fato invadido aquela casa em busca de algo.

Decidida em procurá-lo, Lena acaba ficando dois meses em Bonn, seguindo pistas e
tentando ligar informações dos estudos roubados com os acontecimentos que proviam
desse episódio. Porém, enquanto ela estava desligada dessas questões, a situação
política mundial estava começando a se agravar, a guerra fria estava ficando cada vez
mais tensa e Berlim estava no meio do fogo cruzado entre as definições bipolares.
Fiquei meses sem receber nenhuma notícia dela, estava começando a ficar preocupado.
Pra piorar, escuto no rádio que o pacto militar de proteção proposta pela URSS em 1955
com os países que faziam parte dos domínios soviéticos chamado de Pacto de Varsóvia
tinha se intensificado.

Com declarações do governo que a movimentação das pessoas da parte socialista para
a capitalista era uma sabotagem dos ‘fascistas’ para desestabilizar o desenvolvimento do
comunismo, na madrugada de 13 de agosto de 1961, o Estado oriental começou a
construir um muro de arame farpado para separar Berlim em dois lados e assim evitar
que a ‘influência maligna’ do lado capitalista polua a mente dos que residem no lado
Oriental. Com punição de cadeia e política de abrir fogo contra qualquer tentativa de
atravessar, era mais do que real o que estava acontecendo, estávamos com as nossas
mãos atadas no nosso próprio país. Famílias, amigos e conhecidos separados por um
muro, tanto ideológico, quanto físico.

Quando essa construção foi divulgada, eu congelei. Não parava de pensar que a Lena
estava em Bonn ainda, recordo que todo dia pensava na possibilidade de ela ter sido
assassinada tentando passar, fiquei dias em estado de aflição. Até que um dia decidi que
iria fazer de tudo para ir atrás dela, não aguentava mais viver com isso no meu
psicológico. Conversando com algumas pessoas ligadas á essa questão de contrabando
entre fronteiras, a maioria falou para mim que a opção mais segura era um cara
conhecido como Klaus, um guarda alemão do lado oriental que foi contratado pela RDA
para vigiar a movimentação do muro. Só que esse nome não era estranho para mim,
sabia que já tinha escutado antes. Juntei dinheiro por semanas a fim de procurá-lo e
contratar seu serviço.

Entrei em contato com o Klaus e marcamos o encontro para realizar o pagamento e o


plano de travessia. Chegando ao ponto marcado como encontro, ele se vira e olha para
mim de cima a baixo e imediatamente arregala os olhos surpreso. Franzi as sobrancelhas
e perguntei o que estava acontecendo. Ele diz esboçando um sorriso no canto da boca:

- Você é o filho da Maria, não é? Achei que estava morto moleque, nunca consegui lhe
encontrar.

Eu prendi a respiração por um segundo e soltei:

- Como assim?! Como você sabe?! Como você conhece minha mãe?!

- Pelos olhos, você tem os mesmos olhos da sua mãe, nós crescemos juntos, era o
melhor amigo dela quando éramos jovens. Conhecia o seu pai também, trabalhava com
ele. Trocou de nome, certo? Esperto.

- Sim, meu nome é Robert agora. Mas como você trabalhava com meu pai se era ele
piloto de pequenos aviões de cargas?

- Ele era mais que isso, eu o ajudava a contrabandear pessoas insatisfeitas com o
domínio soviético para o lado dos Aliados entre 1947 e 1954. Principalmente no
bloqueio de Berlim em 1948, época que vocês se mudaram para facilitar o trabalho.
Quando seus pais foram assassinados, adotei meu apelido como novo nome e consegui
o trabalho perfeito para lucrar e dar sequência ao legado do seu pai. Prazer, meu nome
verdadeiro é Thomas Niklaustein.

Neste exato momento foi onde tudo começou a fazer sentido, logo lembrei quando
tinha escutado esse nome, foi na noite anterior do assassinato dos meus pais, estavam
sentados na sala conversando sobre pousos, só que nunca me importei com esses
detalhes. Então eu prontamente tiro da minha mochila meu diário e mostro aquela
expressão em outra língua dita pelo assassino no quintal da minha casa.
- Conhece essa palavra? “до свидания”?

- É russo, significa adeus, por quê?

Com essa resposta, explico para Klaus o que aconteceu naquela noite e conto sobre a
frase dita pelo assassino no momento em que mata o alemão que o ajudou. Ele me disse
que provavelmente o assassino era da polícia oriental secreta e o cúmplice era Timo
Schneider, desaparecido desde 1954, que era o contato e realizador das intermediações
entre as pessoas que queriam escapar de uma região com ele e meu pai. Descubro então,
que foi um russo, provavelmente com informações dadas pelo governo da RDA que foi
atrás do meu pai por causa de seu trabalho secundário. No mesmo minuto me preencho
de ódio. Agora mais do que nunca eu precisava ir para o lado ocidental para arrumar um
jeito de derrubar esse muro e seguir o legado de meu pai á fim de preservar a liberdade
de escolha das pessoas.

Em seguida, Klaus me pergunta o motivo de eu ter o procurado e falo que precisava


encontrar uma pessoa em Bonn. Como protocolo, me pergunta o nome da pessoa que eu
queria achar para transportar até o local solicitado. Conto para ele que era uma garota
chamada Lena Hoffmann. No mesmo segundo ele rebate:

- Hoffmann? Igual o espião da Stasi?

- Como assim, qual nome dele? Espera, o que é a Stasi?

- Stasi é a polícia secreta da Alemanha Oriental. Nome dele é Marco Hoffmann,


recrutado aos 18 anos quando ficou órfão em um acidente de carro.

- Não é possível, ele é o irmão da minha namorada. Tem certeza?

- Tenho, ele tem uma boa reputação em suas missões. Ouvi boatos que o recrutamento
dele tem a ver com a morte do subcomandante da Stasi em um acidente de carro, que
aparentemente, os dois estavam envolvidos e ele tinha aceitado se integrar ao governo
secreto como forma de proteger a sua irmã, que estava no hospital e pagar a dívida por
causa do acidente causado pelo seu pai.

Era muita informação em um curto espaço de tempo, meu cunhado é meu inimigo e
trabalha para o governo que tirou a vida dos meus pais. Só pensava que a Lena não
sabia onde estava se metendo e precisava avisá-la. Klaus então me leva para o lado
ocidental em direção á Bonn. Chegando até a antiga rua onde Lena morava, começo a
procurá-la desesperadamente batendo em cada porta. Não tive sucesso até chegar quase
chorando á porta do Dr.Weiss, que diz que ela esteve lá no dia anterior, descobriu uma
pista sobre o paradeiro de Marco e que iria atrás dele em Lichtenberg. Rapidamente
pergunto como ela pretendia passar pelo muro e ele me responde que ela foi encontrar
um cara que tinha informação sobre Marco em um bar chamado Köpke’s.

Sigo em direção á este bar. Chegando, percebo que ela já estava saindo do bar ao lado
de um cara que provavelmente era o contato dela. Eram três meses sem a ver, meu
coração começa a bater mais rápido. Quando estou quase atravessando a rua, noto que
esse sujeito que saiu com ela volta e a cerca. No mesmo momento, eu atravesso a rua
correndo e vou de encontro com esse indivíduo. Chego empurrando e perguntando o
que estava acontecendo e ele saca uma pistola em nossa direção e diz para ficar em
silêncio.

Ele nos leva para um beco e cerca de trinta minutos depois, chega um carro. Primeiro,
sai um sujeito que parecia que estava protegendo alguém, em sequência, sai um
indivíduo com uma mera semelhança á Lena. Ele se aproxima e grita:

- Por que você não deixou para trás?! Em?!

Lena começa instantaneamente a chorar e responde:

- Ma...Marco?!

- Eu tentei Lena, eu realmente tentei te manter viva. Fiz de tudo para não deixar rastros,
fiz de tudo para permanecer morto para você. Fiz acordos para não lhe envolver. Eu não
acredito que você vai me forçar a fazer isso.

Arregalei os olhos e gritei:

- Fazer o que?! Você é o irmão dela!

Chorando, ele saca uma pistola e aponta para a Lena e fala:

- Não posso deixar uma ponta solta, só você sabe quem sou eu, você é a minha única
fraqueza e pode vir a ser um problema. A estabilidade da Alemanha é maior que a
minha família, me perdoe.
Nesse momento Marco atira contra Lena, e tudo estava em câmera lenta, presenciei a
morte do amor da minha vida pelas mãos do próprio irmão. Em poucos segundos, o
ódio me preencheu por completo e ataquei o segurança de Marco, derrubando-o. Marco
começou a atirar na minha direção e tomo dois tiros na perna, caindo no chão. Uso o
corpo do segurança como escudo e ao pegar sua arma, atiro cinco vezes contra Marco,
acertando apenas um disparo, porém certeiro e derrubando-o.

Tremendo, largo a pistola caindo de joelhos no chão e me arrastando, me aproximo


do corpo de Lena, em desespero tento fazer massagem cardíaca e respiração boca a boca
por alguns minutos, mas não consigo salvá-la. Começo a chorar, outra vez meu mundo
desabou e a culpa era minha que não consegui avisá-la a tempo. Escuto muita gritaria e
sirenes chegando. Com meus olhos quase fechando, a abraço e fico repetindo “me
desculpa” várias vezes até apagar.

Acordo no hospital algemado, com a enfermeira chamando um policial na sala de


espera. Ainda estou grog. Ele se aproxima e faz uma série de perguntas. Uma delas era
sobre o que aconteceu naquela noite. Eu tento explicar e sou interrompido. O destino
esta selado. O policial me diz que não houve um terceiro homem na cena, apenas eu e
um sujeito. Fiquei em choque, não estava acreditando que eles estavam acobertando a
presença do Marco na cena.

Duas semanas depois, após receber alta, sou levado para uma prisão em Berlim.
Mesmo estando na parte teoricamente livre, na Alemanha Ocidental, fui julgado e
condenado injustamente a 20 anos de cadeia por homicídio simples. Tentando provar
que era legítima defesa, a promotoria do Estado abafou o caso. Minha vida se encerrara
aqui, após 3 meses internado e 3 semanas juntando lençóis, a forca me aguarda.
Testemunhei não só a morte dos meus pais, na mesma inconsolável data, mas também a
mulher da minha vida, provedora do ultimo lastro de esperança e caminho. Me
pendurarei pela dignidade, tal como, pela sanidade. Que eles se matem pra descobrir
qual a melhor ideia, aqui meu destino se encaminha. Faço aqui nesse diário meu último
registro, para subir na cama, onde me pendurarei.

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