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Técnica de necropsia para

cães e gatos

Autores: Djeison Lutier Raymundo


Adriana Silva Albuquerque
Ana Paula Cassiano da Silva
Angelica Teresinha Barth Wouters
Flademir Wouters
Mary Suzan Varaschin
Técnica de necropsia para cães e gatos
A necropsia inicia com a identificação do cadáver e com a leitura dos dados fornecidos pelo
médico veterinário responsável pelo caso e/ou dos dados informados pelo proprietário.
Informações como espécie, raça, sexo, idade, peso, cor da pelagem, nome do animal, número
de ficha clínica, brinco ou tatuagem, data da morte, procedência, proprietário, endereço e
telefone, nome do requisitante, endereço, telefone e e-mail devem ser devidamente
observadas e preenchidas na ficha de necrópsia. (ver ANEXO 1). Para realização da
necrópsia é necessário seguir técnicas adequadas em uma sequência a fim de que todos os
órgãos sejam examinados e
coletados.
Nesse guia propõem-se uma avaliação sistemática nas necrópsias de cães e gatos, que pode
ser aplicada para outros animais semelhantes como felídeos e canídeos silvestres por
exemplo.

1- Histórico Clínico

Estudar o histórico clínico. Considerar os possíveis diagnósticos antes de começar a


necropsia. Muitas vezes a história clínica fornece dados importantes para o diagnóstico. Os
dados obtidos na anamnese também são importantes. Observar se existe alguma solicitação
especial por parte do médico veterinário que encaminhou a requisição de necropsia.

2 - Exame externo

Realizar o exame externo do cadáver, com observação de:


A) Posição do animal na hora da morte
B) Aparência geral do cadáver, alterações post-mortem e desidratação.
C) Estado corporal do animal(Figura 1A)
D) Cobertura corporal (Figura 1B)( tipo de pelagem, pulgas, carrapatos, miíases, etc.),
avaliação da pele e anexos ( nódulos, lesões crostosas, feridas, perfurações, áreas de alopecia
ou rarefação pilosa, unhas) . (Figuras 1C e 1D).

Figura 1- Achados em exame externo. A – Cão, Boxer, porte grande, branco e caramelo, mau estado
corporal e calo de apoio em membro torácico direito (cotovelo). B – cão, sem raça definida (SRD)
porte pequeno, pelos longos (branco, preto e face caramelo)
Figura 1 (continuação): Achados em exame externo. C- Cicatriz transversal em região abdominal e
nódulo em região de transição tóracoabdominal em antímero direito. D - Lesão ulcerativa cranial à
orelha externa esquerda.

E) Aspecto das mucosas externamente visíveis: oral, conjuntival e do vestíbulo vaginal


(congestão, cianose, icterícia, palidez) (Figuras 2A, 2B, 2C e 2D)

Figura 4. A – Mucosa Oral congesta. B – Mucosa vaginal cianótica. C – mucosa ocular


ictérica. D – mucosa oral pálida.

F) Descargas em orifícios corporais nasal, ocular, vulvar e anal. (Figura 3A e B).


Figura 3. A - Secreção sanguinolenta em fossas nasais. B – Secreção enegrecida em conjuntiva
inferior.

G) Avaliação das glândulas mamárias (coloração, tamanho, quantidade, secreção,


nodulações, ulcerações,etc.) (Figura 4)

Figura 4. Exame das glândulas mamárias (antímero direito e esquerdo – torácicas craniais e caudais,
abdominais craniais e caudais, e inguinais)

H) Alterações externas como aumentos de volume, incisões cirúrgicas, hérnias,


fraturas (descrever localização, tamanho, aspecto). (Figura 5)
Figura 5. Solução de continuidade na pele sobre a tuberosidade isquiática e
onicogrifose.

3- Abertura das cavidades

1-Posicionamento do animal: Colocar o cadáver em decúbito dorsal, com a cabeça


voltada para o lado esquerdo da pessoa que vai realizar a necropsia.
2-Iniciar a abertura do cadáver com uma incisão longitudinal (incisão primária),
iniciando no mento, seguindo pela linha média até o púbis (Figura 6A). Em machos
contornar o pênis (Figura 6B e 6C), que é rebatido caudalmente e em fêmeas contornar a
vulva.

3 - Dissecar a pele e subcutâneo lateralmente. Separar os membros torácicos do corpo


com a secção da musculatura peitoral (Figura 7A). Nos membros pélvicos é desarticulada a
articulação coxofemoral (Figura 7B); assim o animal permanece em decúbito dorsal numa
posição estável.

Figura 7. A – Pele e subcutâneo rebatidos lateralmente, secção da musculatura peitoral. B –


Desarticulação da articulação coxofemoral.

4 – Observar se há alterações no tecido subcutâneo, em músculos e linfonodos


superficiais.
5 – Abertura da cavidade abdominal: Realizar uma incisão na linha média, próximo ao
púbis. Verificar se há líquido na cavidade, coletando-o se necessário. Estender a incisão da
parede abdominal cranialmente, de cada lado ( D e E) até próximo à última costela (Figura
8A).
6 – Verificar a pressão intratorácica (deve entrar ar na cavidade torácica após a
perfuração do diafragma com a ponta da faca, o que se percebe pelo som da entrada de ar e
pelo deslocamento caudal do diafragma)(Figura 8B).

Figura 8. A – Incisão abdominal na linha média, próximo ao púbis, e abertura da cavidade abdominal
lateralmente. B –Verificação da pressão intratorácica.

7 – A abertura da cavidade torácica é feita com o auxílio do costótomo. As costelas


são cortadas na altura das junções costocondrais (Figura 9A). Com uma faca remover o
plastrão esternal (Figura 9B) (No jargão da técnica de necropsia, este termo é usado para
denominar a parte compreendida pelo osso esterno e porção das costelas ligadas a ele) .
Figura 9. A – Corte das costelas na altura da junção costocondral. B – Remoção do plastrão.

4-Análise dos órgãos internos


8 - Examinar o plastrão e linfonodos esternais (Figura 10A). Examinar as vísceras
torácicas e abdominais in loco (Figura 10B), verificando se há ou não alteração de posição.
Verificar a necessidade de colheita de material para cultivo bacteriano, fúngico, e/ou
isolamento viral.

Figura 10. A – Plastrão com parte da parede abdominal ventral. B – Posição normal das vísceras
torácicas e abdominais.

9 – Prosseguir com a remoção do omento e do baço, cortando as inserções na


curvatura maior do estômago e do mesentério (Figura 11A).
10 – Examinar o omento e o baço, observando tamanho, aspecto, coloração e
consistência. Fazer cortes transversais no baço para observara superfície de corte (Figura
11B).

Figura 11. A – Remoção do omento e do baço. B – Examinar o omento, a superfície capsular e a


superfície de corte do baço.
11 – Encontrar a porção final do reto e seccionar transversalmente (Figura 12A),
localizar o duodeno e seccioná-lo transversalmente na altura da extremidade posterior do
pâncreas (Figura 12B).

Figura 12. A – Seccionar o intestino a porção final do reto que está na cavidade abdominal. B –
Seccionar o duodeno na borda posterior do pâncreas.

12 – Dissecar as inserções mesentéricas do intestino, retirando os intestinos delgado e


grosso. (Figura 13A e 13B). Com uma tesoura ou enterótomo abrir o intestino na sua face
mesentérica, examinar o conteúdo e mucosa (Figura 13C).

13 – O segmento de duodeno que ficou na cavidade deve ser aberto pela face anti-
mesentérica (Figura 14A) até o piloro, a fim de expor o esfíncter de Oddi, então se pressiona
a vesícula biliar e deve ser observado o fluxo da bile pelo orifício (Figura 14B). A vesícula
biliar deve ser aberta para exame do seu conteúdo e da mucosa.
Figura 14. A – Abertura da porção inicial do duodeno pela face anti-mesentérica. B – Verificação o
fluxo da bile.

14 – Seccionar o esôfago na altura do cárdia e a veia porta juntamente com os


ligamentos gástricos, retirar o estômago, o pâncreas e a porção inicial do duodeno (Figura
15A).
15 – O estômago deve ser aberto ao longo de sua curvatura maior; do piloro até o
cárdia (Figura 15B).

Figura 15. A – Retirada do estômago junto com o pâncreas e a porção inicial do duodeno. B – Abertura
do estômago pela curvatura maior.

16 – Localizar e seccione as adrenais (D e E) longitudinalmente (Figura 16).

Figura 16. Incisão, avaliação e coleta das adrenais.


17 – Dissecar os rins juntamente com os ureteres até a bexiga, tracionando-os
caudalmente e cortar por baixo (Figura 17A e B). Cortar os rins longitudinalmente em duas
metades iguais, avaliação corticomedular (Figuras 18A e B) e retirada da cápsula para
avaliação externa do parênquima renal (Figura 19A). Abrir os ureteres (Figura 19B).
Quando de animais muito pequenos em que a abertura dos ureteres é difícil, ao menos palpar
os ureteres ao longo de seu trajeto para verificar se há alguma alteração em sua espessura.

Figura 17. A - Dissecação dos rins. B – Identificação do hilo, ureter e vasos.

Figura 18. A - Corte longitudinal dos rins em duas partes iguais. B – Avaliação da região cortical e medular

Figura 19. A – Retirada da cápsula renal. B - Abertura dos ureteres.


19 – Retirar a porção muscular que recobre o púbis (Figura 20A) e encontrar o forame
obturado de ambos os lados. Com o auxílio do costótomo cortar os ossos da pelve a partir do
forame obturado em sentido cranial e em sentido caudal, de ambos os lados (Figura 20B).
Remover a porção óssea cortada (Figura 20C).

20 –Dissecar as estruturas da cavidade pélvica de ambos os lados e depois por baixo


das estruturas, cortar a pele ao redor do ânus (Figura 21A e B) a fim de retirar a porção
restante do reto e o sistema geniturinário em bloco. (Figura 21C)
21 – Abrir a bexiga urinária (Figura 22A) e a uretra até o final do pênis (no caso de
macho) (Figura 22B) ou a vulva (no caso de fêmea). Na fêmea abrir o canal vaginal, os
cornos (direito e esquerdo) (Figura 23A), depois prosseguir com a incisão de ambos os
ovários (Figura 23B). No macho incisar a pele da bolsa testicular, expor os testículos (direito
e esquerdo) e incidir o parênquima testicular. Examinar tamanho, consistência, coloração e
condição reprodutiva (corpos lúteos, se há embriões, puerpério, etc).

Figura 22. A - Abertura da bexiga urinária. B – Abertura da uretra até o óstio peniano

22 – Seccionar o diafragma e os ligamentos hepáticos, retirar o fígado e o diafragma.


23 – Observar a superfície capsular do fígado, bem como sua coloração, seu tamanho e
possíveis alterações na cápsula (Figura 24A). Prosseguir com cortes paralelo no parênquima, a
fim de avaliar a superfície de corte, coloração, aspecto e, por digito-pressão na superfície de
corte,avaliar sua consistência (Figura 24B e 24C) .
24 - Analisar externamente a vesícula biliar e, posteriormente abrí-la longitudinalmente
com uma tesoura e analisar seu conteúdo e mucosa (Figura 25 A e B).

Figura 25. A - Abertura da vesícula. B - Análise do conteúdo e da mucosa.

25 – Fazer duas incisões na face medial da mandíbula para acessar e remover a língua
(Figura 26).

Figura 26. Cortara face medial da mandíbula em ambos os lados.


26 – Analisar e coletar as tonsilas(Figura 27A). Seccionar o palato mole e desarticular
os ossos hioides (Figura 27B), dissecar as inserções da língua e remover língua, laringe,
traqueia, esôfago, coração, grandes vasos e pulmões (em um só bloco).

Figura 27. A – Análise das tonsilas. B – Secção do palato, hioide e remoção da língua.

27 – Abrir o esôfago longitudinalmente, da porção inicial até o cárdia (Figura 28 A e


B) e examinar. Abrir a traqueia até os grandes brônquios (Figura 29A e B). Abrir os
brônquios e bronquíolos principais (Figura 30A). Observar os pulmões quanto a tamanho,
coloração e é muito importante fazer palpação dos pulmões para avaliar consistência (Figura
30B). Cortar os pulmões para análise do parênquima(Figura 30C).

Figura 28. Abertura do esôfago.

Figura 29. A - Abertura da traqueia. B – Abertura dos grandes brônquios.


28 – Localizar e avaliar a tireoide e paratireoide, comparar ambos os lados (Figura
31)
29 – Com o coração ligado aos pulmões abrir o saco pericárdico (Figura 32A) e
observar o conteúdo, expor o coração observando a conformação cardíaca e a superfície
muscular (coloração, textura, aumentos de volume caso haja). Abrir a artéria pulmonar
(Figuras 32B) e seguir abrindo o ventrículo direito margeando o septo interventricular
(Figuras 32C). Abrir o átrio direito até a entrada da veia cava cranial e caudal e abrir até a
extremidade da aurícula (Figura 32D). Observar as válvulas, o conteúdo e a superfície
interna. Para abrir o lado esquerdo segurar o coração, cortar longitudinalmente na porção
média do ventrículo esquerdo seccionando a parede do ventrículo esquerdo com um corte
único (Figura 33A). Observar as válvulas, o conteúdo e a superfície interna (Figura 33B).
Seccionara valva atrioventricular esquerda e seguir; abaixo dela encontra-se a válvula
semilunar aórtica e o início da artéria aorta (Figura 34A e B). Analisar a parede da aorta e as
válvulas (Figura 34C).

Figura 32. Coração: A – Abertura do saci pericárdico. B - Identificação da artéria pulmonar (ponta
da pinça). C - abertura do lado direito do coração. D - Lado direito do coração após a abertura.
Avaliação das valvas atrioventriculares (tricúspide) (Ponta da pinça).
Figura 33. A - Abertura do lado esquerdo do coração. B – Avaliação da válvula mitral (seta)

30 – Desarticular e separar a cabeça da primeira vértebra cervical (atlas) (Figura


35A), acessando a articulação ventralmente (Figura 35B). Rebater a pele (Figura 36), retirar
os músculos temporais (Figuras 37A e B). Com a machadinha fazer um corte na porção
cranial da cabeça, um pouco caudal aos processos supraorbitais. Em ambas as laterais é feito
um corte que segue até o forame magno, acima dos côndilos (Figura 38A e B). Retirar a
calota craniana, expondo as meninges e o encéfalo (Figura 39).
Figura 35. A- Acesso à articulação atlanto-occiptal. B- Desarticulação e separação da cabeça.

Figura 36. Rebater a pele da porção superior do crânio.

Figura 37. A – Retirada dos músculos temporais com incisões em meia-lua. B - Músculos temporais
removidos.
Figura 38. A - Marcação dos locais onde são feitos os cortes no crânio. B – Corte na região frontal do
crânio para retirada do encéfalo.

Figura 39. Abertura da calota craniana e exposição do encéfalo e


meninges.

31 – Cortar a meninge que recobre o cérebro e o cerebelo (Figura 40A e B), não
esquecendo as porções de meninge entre os hemisférios cerebrais e entre o cérebro e o
cerebelo. Seccionar os nervos cranianos que prendem o encéfalo à cavidade craniana (Figura
41A e B).
Figura 40. A - Corte da meninge que recobre o cérebro e o cerebelo, inclusive as porções inseridas entre
os hemisférios cerebrais e entre cérebro e cerebelo (B).

Figura 41. A- Seccionar o encéfalo na região de bulbo olfatório. B - Soltar o encéfalo da base do
crânio.

32 - A análise e coleta de medula óssea é feita em ossos longos, de preferência no


fêmur. Para acesso ao osso retira-se todos os músculos que recobrem o fêmur, expõe-se a
cabeça femoral e rotaciona-se o osso a fim de posicioná-lo em uma superfície para quebrá-lo
com o auxílio da chaira (Figura 42 e B). Após expor a medula óssea realiza-se esfregaços
para análise citológica (Figura 43A e B) e coleta-se em formol um fragmento para análise
histopatológica.

Figura 42. A- Retirada dos músculos que recobrem o fêmur exposição e fratura do osso. B –
Exposição da medula óssea para análise e coleta.
Figura 43. Esfregaço de medula óssea: A – Coloca-se uma pequena porção numa extremidade da
lâmina. B – Desliza-se uma lâmina sobre o material em apenas um sentido.

5 - Coleta de amostras para histopatológico


32 – O material para análise histopatológica deve ser coletado em solução de
formalina a 10%. Coletar os tecidos que apresentarem lesões ou que possam apresentar
alguma alteração com relação aos dados observados no histórico e durante a necropsia. Os
fragmentos de regiões com lesões devem ser coletados na área de transição lesão/saudável. O
tamanho ideal dos fragmentos é de 1 cm de espessura (Figura 44A, B, C e D), para que a
formalina penetre no tecido promovendo a conservação da amostra.

Figura 50. Coleta de amostras para histopatologia. A- Coleta de fragmento de pulmão para
análise histopatológica. B – Coleta de fragmento de baço. C – Coleta de fragmento de rim. D –
Coleta de fragmento de fígado.

33 –Registrar todos os achados de necropsia.


MODELO DE LAUDO E REQUISIÇÃO
MATERIAL NECESSÁRIO PARA REALIZAR A NECROPSIA:

 FACAS RETAS E COM PONTAS FINAS


 FACA CURVA
 COSTÓTOMO (PODÃO DE JARDINAGEM)
 TESOURA RETA ROMBA-ROMBA
 TESOURA CURVA ROMBA-FINA
 ENTERÓTOMO
 PINÇA ANATÔMICA DENTE DE RATO
 SERRA MANUAL
 MACHADINHA
 MACHADO (PARA GRANDES ANIMAIS)
 TÁBUA PARA CORTAR
 ESPONJA;
 FRASCO DE BOCA LARGA COM FORMOL A 10%
 RÉGUA;
 SACOS PLÁSTICOS
 CHAIRA E PEDRA DE AFIAR
 FRASCO COM ÁGUA

PARAMENTAÇÃO:
 LUVAS DE LÁTEX;
 MACACÃO,
 JALECO OU AVENTAL
 BOTAS DE BORRACHA;
 MÁSCARA, ÓCULOS E TOUCA (OPCIONAIS).
* RETIRAR ANÉIS, RELÓGIO E OUTROS ACESSÓRIOS;

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