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ANDRÉ MONTEIRO COSTA

ANÁLISE HISTÓRICA DO SANEAMENTO NO BRASIL


i

Observação:

Esta é uma edição produzida a partir da dissertação de Mestrado em Saúde Pública


apresentada à Escola Nacional de Saúde Pública / Fiocruz, em 1994, que teve como
orientador o Prof. Dr. Szachna Eliasz Cynamon.

Costa, André Monteiro


Análise Histórica do Saneamento no Brasil / André Monteiro Costa. Rio de
Janeiro, Dissertação de Mestrado, Ensp/ Fiocruz, 1994.
204 p.
Inclui bibliografia.

1. História do Saneamento. Brasil. 2. Política de Saneamento - Brasil. 3.


Gestão - Serviços de Água e Esgoto.
Sumário

Prefácio
Apresentação 4
Aproximando do tema 10
1. Definindo saneamento 10
2. Antecedentes históricos 19
3. As primeiras explicações científicas 25
Parte I
As ações de saneamento e o setor saúde no Brasil 33
As primeiras organizações de saúde no Brasil - Colônia e Império 34
A organização dos serviços de saúde e a ação sobre o espaço urbano -
início século XX 36
A expansão nacional dos serviços das ações de saúde - décadas de 20 e 30 43
A Fundação Serviços de Saúde Pública - Fsesp 50
O Departamento Nacional de Endemias Rurais - DNERu 61
O declínio do setor saneamento no setor saúde - décadas de 70 e 80 66
As ações de saneamento no Sistema Único de Saúde 69
Parte II
O setor saneamento no Brasil 71
Introdução 72
Água vai! - O saneamento no Brasil colônia 75
Os primeiros serviços de saneamento - as concessões
privadas no Brasil Imperial 79
O Estado assume diretamente os serviços - fins do século XIX até
década de 40 88
Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS) 101
Autarquias - a busca da autonomia nos serviços
de saneamento - década de 50 109
O Plano de Financiamento de Serviços Municipais de Abastecimento
de Água 116
As sociedades de economia mista - década de 60 123
2

A gestão - A ação Federal 124


A gestão - A ação Estadual 130
O financiamento na década de 60 140
O Plano Nacional de Saneamento (Planasa) - décadas de 70 e 80 151
Uma avaliação do Planasa 157
De novo as concessões privadas 160
Conclusões 161
Apêndice 175
Bibliografia 180
3

Apresentação

Este trabalho analisa como foram organizadas e prestadas as ações de

saneamento ao longo da história no Brasil. Estas ações, de interesse público, foram

desenvolvidas pelo Estado diretamente ou sob a forma de concessões, seja à iniciativa

privada ou à administração indireta. Foram identificadas e analisadas as ações

desenvolvidas pelo setor saneamento, bem como as ações de saneamento desenvolvidas

pelo setor saúde e as relações entre estes dois setores, na medida em que entendemos as

ações de saneamento como ação primária de saúde.

Nosso olhar prioriza a organização do setor ao longo da história, ou seja,

sua evolução histórica, procurando mostrar como o Estado se estruturou para atender à

população ao longo da história, identificando processos e paradigmas que nortearam as

mudanças ocorridas. Desta forma, trabalhamos alguns aspectos relacionados às políticas

governamentais como suporte para a análise dos contextos históricos, possibilitando a

dimensão de processo.

Fazemos uma análise das ações desenvolvidas desde meados do século

passado até os dias de hoje, analisando as diversas ações de saneamento, como o

abastecimento de água, coleta e destino dos dejetos, drenagem, controle de vetores, etc. As

ações relativas a coleta, transporte e destino final do lixo e as de drenagem urbana, bem

como a organização desses serviços não foram abordadas, na medida em que essas ações

foram predominantemente executadas pelos municípios e não houve políticas a nível

federal com o objetivo de fomentá-las.

A evolução histórica do saneamento está vinculada ao desenvolvimento

institucional do Estado, à economia, ao modo de produção, ao desenvolvimento

tecnológico e à distribuição de renda. Sendo assim, a identificação dos modelos de gestão,


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dos mecanismos de financiamento e da relação entre os setores público e privado são

contextualizadas à luz desses fatores.

Para melhor situar o ‘estado da arte’ no século passado, fazemos uma rápida

análise também das ações de saneamento e saúde no período colonial no Brasil,

contextualizando-as a nível mundial.

A literatura existente sobre o tema é bastante fragmentada, não havendo,

nenhum trabalho que aborde o processo histórico das ações e das políticas de saneamento

de forma global, em sua dimensão nacional e ao longo de toda sua história. Os trabalhos

que existem sobre a história do saneamento, em geral, são oriundos dos serviços de

saneamento, sejam órgãos federais, empresas estaduais ou serviços municipais,

restringindo-se especificamente à sua área de atuação apenas e, sobrevalorizando as obras

realizadas, em detrimento dos processos históricos a elas pertinentes.

As publicações de órgãos oficiais e corporações, em geral produzem um

viés na análise, pois dão preferência à promoção, ao feito, ao realizado, mesmo quando se

trata de análises históricas, relegando a um segundo plano as posições que abordam os

pontos de vista contrários e as demandas não atendidas. Este viés privilegia uma história de

realizações, mesmo quando grandes parcelas da população não se beneficiaram dos

serviços, cristalizando desta forma uma história "oficial" no setor.

Existem também alguns trabalhos acadêmicos sobre períodos históricos

específicos, sem que haja no entanto, a dimensão da evolução histórica. A maioria desses

trabalhos, dizem respeito ao período posterior a 1964, onde o surgimento do BNH e em

seguida, o Plano Nacional de Saneamento (Planasa) em 1971, foram marcos fundamentais.

Muitos destes trabalhos incorrem em erros devido a desinformações referentes aos

períodos anteriores à década de 70 e que foram determinantes na formulação das políticas

implementadas a partir de então.


5

O Planasa é um marco histórico fundamental no saneamento, pois tanto do

ponto de vista da gestão, quanto do financiamento, modificou a forma de ação do Estado

em termos nacionais. No entanto, o estudo desse período apenas, é absolutamente

insuficiente para explicar o atual estágio alcançado no setor saneamento e suas relações

com a saúde pública. O Planasa não se explica em si mesmo. Há razões históricas bem

anteriores, que nos fazem compreender melhor esse plano. A literatura, porém, quase

sempre situa o Planasa como algo que surgiu a partir apenas da macro-política do pós-64,

ou ainda de uma concepção tecnocrática. As análises, muitas vezes, não valorizam a

história das instituições do setor e discutem o plano como se todas as suas variáveis, seja a

nível da gestão ou do financiamento, tivessem surgido a partir das macro-políticas no

período militar. Havia no entanto, aspectos que já estavam presentes nas políticas do setor

que representaram as bases desse modelo e contribuíram significativamente para sua

estruturação.

Diferentemente do setor saúde, o setor saneamento não tem uma produção

acadêmica que incursione pelas políticas do setor, e que analise as formas de

financiamento, modelos de gestão, administração de serviços, etc. Esta abordagem, em

geral, é feita nas Escolas de Saúde Pública, e mesmo assim, nas áreas que lidam com

políticas sociais e ainda nas áreas de planejamento ou desenvolvimento urbano. Quase a

totalidade da produção acadêmica do setor é relacionada à pesquisa básica, de caráter

técnico. Esta característica contribuiu para a perda de memória, e ainda, para a

consolidação de uma história "oficial", fomentada pelos próprios serviços ou entidades

corporativas.

Este trabalho procura recuperar a história de como o Estado se estruturou

para a prestação dos serviços de saneamento no Brasil, as etapas pelas quais passou e os

paradigmas que as nortearam.


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Para a necessária complementação da pesquisa bibliográfica, devido à

escassa literatura existente, foram realizadas algumas entrevistas com experientes

engenheiros, que possibilitaram a recuperação de elementos históricos importantes. Por

suas vivências e visões de mundo distintas, representam uma memória viva do saneamento

nacional. Estes depoimentos foram de grande valia para os resultados alcançados.

Uma outra lacuna existente na literatura sobre o processo histórico das

ações de saneamento, diz respeito às ações que foram desenvolvidas pelo setor saúde. Este

setor tem uma vasta produção acadêmica abordando sua evolução histórica e os

determinantes nas transformações ocorridas, no entanto, com relação às ações de

saneamento por ele desenvolvidas não existem estudos sistematizados.

Desde o século passado, as ações de saneamento são tratadas, no plano

institucional, como ações de saúde. Estas ações pressupunham a redução da morbi-

mortalidade por doenças infecto-parasitárias e até mesmo por doenças não infecciosas. No

entanto, as relações entre os dois setores não se desenvolveram integradamente. As

explicações para tais razões não têm se pautado por uma análise histórica, o que

procuraremos fazer à luz dos paradigmas que regeram ambos os setores.

Houve uma transformação importante ao longo da história no setor saúde,

com a passagem de um caráter mais preventivo no início do século, para um caráter

assistencial-hospitalar, implementado sobretudo pela Previdência Social. Desta forma, o

saneamento realizado por este setor sofreu transformações e perda de importância, dado o

seu caráter preventivo. Além disso, as diferentes concepções do processo saúde / doença,

também produziram formas diferentes de se fazer saneamento no setor saúde, pois

determinaram como atuar sobre o controle dos agravos.

O desenvolvimento histórico do saneamento no Brasil, se caracterizou por

diversas experiências e fases distintas de gestão. Estas variam desde as ações de


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saneamento promovidas pelo setor saúde, como as concessões às empresas privadas,

passando por gestões autônomas dos municípios e diversos tipos de organizações estaduais

e federais. A organização administrativa dos serviços públicos de saneamento por sua vez,

ocorreu de várias formas, seja através da administração direta, autarquias ou através de

empresas de economia mista. O âmbito de atuação desses serviços também foi

diversificado, havendo aqueles que tiveram abrangência em apenas um município, ou um

estado, em todo o território nacional, ou mesmo uma região metropolitana, além daqueles

que atuaram nos estados de uma região do país e mesmo em uma bacia hidrográfica. As

formas de atuação dos serviços de saneamento também se modificaram bastante. Alguns

serviços apenas construíam sistemas, outros só operavam, enquanto havia também aqueles

que desenvolviam todas as etapas dos serviços de água e esgoto.

Do ponto de vista do financiamento, são abordados os modelos adotados, os

órgãos financiadores, as fontes de recursos, os órgãos técnicos de assistência, os órgãos

executivos, os fundos para financiamento, etc.

Um aspecto relevante a destacar é que o saneamento, enquanto uma política

social, reproduz o modelo e a política econômica dominante e é utilizado para reforçar a

hegemonia exercida pelas classes dominantes através do Estado. No entanto, como política

setorial, tem peculiaridades próprias que devem ser conhecidas e que perpassam inclusive

as macro-políticas.

A estruturação deste trabalho consiste inicialmente em uma definição do

objeto do estudo, definindo o saneamento e a sua relação histórica com a saúde pública e a

abrangência dessas ações.

O texto está dividido em duas partes. Na primeira, são abordadas as ações

de saneamento desenvolvidas pelo setor saúde, identificando as concepções do processo

saúde-doença, na medida em que estas influenciaram as políticas para o setor.


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Na segunda parte são abordadas as ações desenvolvidas pelo setor

saneamento ao longo da história. Inicialmente, abordamos o período colonial para melhor

contextualizar o início do período da organização dos primeiros serviços no Brasil e, a

partir daí, podermos discorrer sobre as diversas fases por que passou o setor, seguindo uma

ordem cronológica.

Na elaboração deste trabalho, bem como na sua publicação, diversas

pessoas tiveram participações importantes, que é importante registrar, sem as quais este

produto não teria sido possível. E além das pessoas, a instituição que possibilitou esta

realização também foi fundamental.

Gostaria de agradecer inicialmente ao Prof. Cynamon, que me orientou na

elaboração da pesquisa. À Clarice Melamed, pelas discussões teóricas fundamentais, pelas

leituras exaustivas e críticas sempre pertinentes e pelo empenho e incentivo para esta

publicação, sem os quais não teria sido viabilizada. Ao Carlos Henrique de Melo, pelas

longas reflexões sobre as políticas de saneamento no Brasil. Agradeço também aos

engenheiros que nos atenderam em entrevista: Alfredo Arruda, Clarismundo Chapadeiro,

José Carlos de Melo, José Roberto do Rego Monteiro e Rodolfo Costa e Silva. Que com

suas vivências e visão de mundo, me possibilitou enriquecer o resgate da memória do

saneamento nacional, e sob minha perspectiva, analisá-lo melhor.

Gostaria ainda de agradecer à Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) /

Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), pela formação que me proporcionou durante a

realização da pesquisa, não só de sanitarista, mas também enquanto indivíduo, na busca

por uma sociedade mais solidária.

Por fim, agradeço à Paulette e Mariana pelo carinho, dedicação e a


compreensão com que sempre me confortaram, nos momentos difíceis de elaboração da

pesquisa.
Aproximando do tema

1. Definindo saneamento

O saneamento, entendido em seu sentido mais amplo, é uma intervenção

física do homem no ambiente, visando manter ou alterar o meio, de forma a evitar e

controlar doenças, infecto-parasitárias ou não, e propiciar o bem estar e conforto à

população, refletindo diretamente na qualidade de vida das pessoas. Interage assim, com as

condicionantes sócio-econômicas, políticas e culturais dos povos. É, portanto, uma ação de

saúde pública.

A VIII Conferência Nacional de Saúde definiu saúde como a resultante das

condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte,

emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. Afirma

ainda que "o pleno exercício do direito à saúde implica em garantir: ... moradia higiênica e

digna; qualidade adequada do meio ambiente..." (Brasil, 1987).

Essa conferência definiu as bases do processo de Reforma Sanitária no

Brasil, propondo a criação do Sistema Único de Saúde que teria dentre suas atribuições

principais "definição das políticas setoriais de saneamento", acabando por influir

decisivamente no texto constitucional.

Essa discussão, por sua vez, não era nova. A Conferência Mundial sobre

Cuidados Primários de Saúde, realizada pela OMS e Unicef em Alma Ata, em 1978,

definiu o saneamento como uma atenção primária à saúde, quando afirmou que "os

cuidados primários de saúde: incluem ... provisão adequada de água de boa qualidade e

saneamento básico..." (Unicef, 1979: 04), reconhecendo o seu caráter preventivo.


10

Podemos delimitar as ações de saneamento, sejam elas desenvolvidas a

nível individual ou coletivo - executadas pelo Estado - de uma forma bastante abrangente

(Fsesp, 1981; Oliveira, 1987; Cynamon, 1975 e Costa e Silva, 1990):

• abastecimento de água, incluindo captação, adução, tratamento,


reservação e distribuição;
• coleta, transporte, tratamento e destino final de esgotos sanitários,
resíduos industriais líquidos e águas pluviais;

• acondicionamento, coleta, transporte, tratamento e destino final de


resíduos sólidos urbanos e industriais;
• controle de vetores (artrópodes e roedores);

• saneamento dos alimentos;

• condições de salubridade nas habitações, locais de trabalho, de


recreação, serviços de saúde e estabelecimentos de ensino;

• controle da poluição do ar, da água e do solo;

• planejamento territorial e urbanismo;

• vigilância sanitária da água de consumo humano, dos meios de


transporte, portos, aeroportos, rodoviárias e fronteiras;

• saneamento em situações de emergência e calamidade pública;

• aspectos diversos referentes ao saneamento do meio como cemitério,


ventilação, iluminação, insolação, etc.

O saneamento apresenta, pela gama de atividades que envolve, inúmeras

interfaces com outros setores, mas na sua essência é parte das ações de saúde. A sua

subordinação administrativa varia de País para País e mesmo no Brasil, de estado para

estado. Pode estar ligado à área da saúde, interior, viação e obras, municipalidades,

planejamento, segurança e meio ambiente. Os setores com que o saneamento mais se

relaciona são: saúde, transporte, agricultura, planejamento territorial e urbanização,

exploração de energia elétrica, desenvolvimento regional e controle da poluição ambiental


11

(Cynamon, 1975). Atualmente, as principais áreas com as quais o saneamento tem uma

interface mais direta são as da saúde, meio ambiente e desenvolvimento urbano.

Consideramos como '


setor saneamento'o conjunto de instituições públicas e

privadas, que promovem, em caráter executivo e de formulação das políticas, ações de

saneamento. No Brasil, vários outros setores desenvolveram ações de saneamento,

destacando-se como hegemônico o setor de viação e obras públicas ao qual vários órgãos

estiveram vinculados até a consolidação do setor saneamento a partir da década de 70, com

o Planasa. As ações implementadas pelos outros setores citados não tiveram muita

significação, seja no impacto, seja na formação de paradigmas que tenham sido

incorporados pelo setor. No entanto, o setor saúde e a Sudene, tiveram participação

especial na execução e na formulação das políticas para o saneamento.

A versão mais usual a respeito da origem do termo “saneamento básico” e

da época exata do surgimento deste termo é, a contada por Rodolfo Costa e Silva (1990:

10), segundo a qual o termo surgiu a menos de 40 anos, "porque os recursos

governamentais para enfrentar os problemas de saneamento naquela oportunidade eram

muito restritos, e se tinha que estabelecer o que era ‘básico’ para interferir no ambiente e

obter os melhores resultados. Ficou estabelecido que o ‘básico’ era água potável e

disposição ordenada dos excrementos”. Esse autor refere que a expressão foi criada no

primeiro período de planejamento do Nordeste, com os sistemas de água e esgotos, já na

década de 50, 60", através da Sudene.

Quando da implementação do Plano Nacional de Saneamento (Planasa), nas

décadas de 70 e 80, essa expressão ganhou força, pois os financiamentos foram dirigidos

basicamente para água e esgotos, além de uma pequena parte para drenagem urbana.

Porém a partir de meados da década de 80, devido aos graves problemas sanitários e

ambientais das cidades brasileiras e às críticas mais contundentes que passaram a ser feitas
12

ao modelo Planasa, começou-se a reivindicar a necessidade de ampliação desse conceito (e

das ações governamentais). Hoje, há um certo consenso entre especialistas de um conceito

mais ampliado de "saneamento básico" como sendo as atividades que englobam:

abastecimento de água, esgotos sanitários e industriais, resíduos sólidos urbanos e

industriais e drenagem urbana.

Cynamon em 1975, enunciou os princípios gerais do saneamento, nos quais

estabelece os aspectos fundamentais a serem considerados na abordagem do tema, visando

a salvaguarda da salubridade da população. Definindo o saneamento como "um conjunto

de barreiras interpostas entre sistemas e ambiente. Barreiras que são colocadas à saída de

um Sistema para evitar a poluição do Ambiente, e barreiras colocadas à entrada de

Sistemas (individualmente = homem, coletivo = comunidade ou fábrica, por exemplo).

Com o propósito de defender os Sistemas contra danos que lhe possam trazer elementos

nocivos do Ambiente" (1975: 03). No entanto, terão que ser observados, "além dos

aspectos físicos, o humano, de mudança de hábitos, usos, costumes e conscientização em

torno do problema". Os princípios do saneamento, segundo Cynamon (1975: 04 - 07), são:

1º Princípio: Da Importância da Concentração Humana

As medidas de Saneamento se tornam tanto mais importantes quanto maior


a densidade humana ou de suas atividades por Unidade de Área.

Este princípio considera que dependendo da concentração humana por

unidade de área ou da intensidade de suas atividades (como fábricas ou emissários de

esgotos, p.e.), pode não ocorrer a autodepuração natural em tempo hábil. Tornando-se

crítica no Micro-Ambiente, como habitação, fábrica, quartéis, escolas, hospital, locais de

recreação, onde a concentração humana também torna-se crítica.

2º Princípio: A Importância do Detalhe


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A obtenção de resultados em Saneamento depende às vezes da observância


de detalhes mínimos.

Grandes investimentos podem ser desperdiçados quando não se observam

detalhes mínimos como: "posicionamento das torneiras das pias para se evitar que dêem

ligação cruzada; desinfecção inicial nos reservatórios ou redes de distribuição de água

antes de seu uso, evitando danos à população; recontaminação das águas tratadas pelo mau

posicionamento das calhas nos filtros invertidos, etc.".

3º Princípio: Do Alcance e do Controle

As medidas de Saneamento para serem realmente efetivas dentro de uma


determinada área têm que ser abrangentes, proteger por medidas de
Saneamento pequena área dentro de um contexto maior significa colocar em
risco de saúde, não somente a área como um todo, mas principalmente a
área supostamente protegida.

Este princípio alerta para os riscos do saneamento diferencial, no qual se

interpõem barreiras sanitárias para uma parcela da população, normalmente a do estrato

social mais elevado. Os riscos a que esta mesma população se expõe se devem à perda da

imunidade decorrentes da ausência de contato com os agentes patógenos, devido ao

saneamento. Enquanto que a população carente mantém-se em contato com esses agentes,

adquirindo resistência natural. À medida em que ocorre um contato social entre ambas as

parcelas da população (escola, trabalho, lazer, etc.), a que estava supostamente protegida se

expõe com um risco e gravidades maiores. São citados casos como epidemias de hepatite

na Índia e da incidência de poliomielite, onde as parcelas mais atingidas foram os

segmentos sociais mais elevados.

4º Princípio: Do Período de Carência


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O período que medeia entre a implantação de medidas de Saneamento e os


resultados Sanitários é variável dependendo das entidades mórbidas a serem
controladas e das medidas aplicadas.

São citados exemplos de respostas rápidas, como o controle de febre tifóide

com a desinfecção no abastecimento público de água, ou a queda da mortalidade infantil

quando se leva água em quantidade e qualidade razoáveis. Por outro lado, há exemplos

como da esquistossomose e amebíase onde a prevalência não cai rapidamente, caso não se

efetivem medidas complementares ao abastecimento de água ou sistemas de esgotos.

São muitas as doenças que podem ser evitadas com medidas de saneamento.

O quadro 1 (abaixo) dá a dimensão do conjunto de doenças, classificadas de acordo com a

forma de transmissão, para as quais medidas de saneamento estão dentre as principais

formas de controle.

Inúmeros trabalhos (São Paulo, 1991) mostram a redução da incidência de

determinadas doenças com medidas simples de saneamento. A coleta de água e o destino

adequado dos esgotos estão dentre as medidas com maior impacto na redução nas taxas de

morbidade e mortalidade por diarréias (causada pelas categorias I a III, apresentadas no

quadro 1).

Num levantamento bibliográfico extenso, o trabalho "Benefícios à saúde

decorrentes das ações de saneamento" da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo

(op.cit.) identifica estudos que mostram redução dos índices de morbidade por diarréias

variando de 40 a 76%.

Algumas doenças ligadas à deficiências no abastecimento de água, como a

dengue (onde a necessidade de armazenamento da água favorece os criadouros do Aedes

aegypt, mosquito transmissor da dengue) e a esquistossomose, têm grande incidência


15

econômica por afetar a população economicamente ativa, muitas vezes incapacitando-as

para o trabalho.
16

Quadro 1
Classificação de Doenças Infecto-Parasitárias Cujos Mecanismos de Controle Estão Diretamente
Relacionados ao Saneamento
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CATEGORIA PERFIL EPI- ORGANISMO OU FOCO DE TRANSMISSÃO MEDIDAS PRINCIPAIS


DEMIOLÓGICO DOENÇA DOMINANTE DE CONTROLE



I-FECAL-ORAL Não latentes, Enterovírus Abastecimento de


NÃO BACTERIANA baixa dose Rotavírus água
infecciosa Hepatite A Higiene pessoal Educação sanitária
Ameba doméstica Melhorias habitacio
Giardia nais, disposição a-
Enteróbius dequada de esgotos
Hymenolepis

II-FECAL-ORAL Não latentes, Campylobacter Higiene pessoal e Abastecimento de


BACTERIANA média e alta do- E.coli patogênica doméstica água
se infecciosa, mo- Salmonella typhi Educação sanitária
da persistência e Outras salmonelas Água Melhorias habita-
capacidade de V.cholerae Culturas cionais
multiplicação Yersínia Disposição adequada
dos esgotos
Tratamento dos
dejetos

III-Helmintos do Latentes e persis Ascaris Quintal Disposição adequa-


Solo tentes, sem hospe- Trichuris Campo da dos esgotos
deiro intermediário Ancilostoma Culturas Tratamento dos
Necator dejetos
Strongyloides

IV-Tênias Latentes e persis- T.saginata cisticercose: Disposição adequa-


tentes, sendo bovi- T.solium *higiene pessoal da dos esgotos
nos e suínos os podendo transmitir e dos alimentos
hospedeiros teníase ou *quintal
intermediários cisticercose
teníase: Higiene da carne
*contaminação da carne Disposição adequa-
nos campos e pastagens dos esgotos

V-Helmintos hídricos Latentes e persis- Esquistossomose Água Abastecimento de


tentes, com hospe- Fascíola hepática água
deiro(s) intermediá- dentre outros Disposição adequa-
rio(s) aquático(s) da dos esgotos
Tratamento dos
dejetos


continua
17

Continuação



CATEGORIA PERFIL EPI- ORGANISMO OU FOCO DE TRANSMISSÃO MEDIDAS PRINCIPAIS


DEMIOLÓGICO DOENÇA DOMINANTE DE CONTROLE
_______________________________________________________________________________________________________________________

VI-Transmitidas por Transmissíveis por Filariose criadouros Drenagem


insetos insetos vetores Eliminação de
criadouros
Febre Amarela criadouros Identificação e
Malária eliminação dos
Dengue criadouros
Abastecimento de
água

Categoria I a IV acúmulo de resíduos destino final


(moscas e baratas) sólidos (lixo) adequado

Dça. de Chagas más condições de habitação ade-


habitação quada

VII-Zoonoses Transmissíveis por Leptospirose Água contaminada Controle de


animais hospedeiros por urina de ratos enchentes
intermediários destino do lixo
Controle de
criadouros
_______________________________________________________________________________________________________________________

Fonte: Feachem, R.G. apud Heller, 1989; modificada pelo autor.


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2. Antecedentes históricos

As ações de saneamento consistem em uma intervenção física do homem no

meio, promovendo conforto, bem-estar e resguardo de sua salubridade. Evoluiu, portanto, à

medida em que as civilizações foram se complexificando. Essas ações existiram desde os

primórdios da humanidade e se deram em vários períodos da nossa história, desde a luta

pela sobrevivência, inicialmente, até uma posterior tentativa de domínio da natureza.

O homem nômade necessitava de medidas de saneamento bastante simples,

pois eles se mudavam de acordo com suas provisões de água e alimentos. A própria

natureza era responsável pela depuração de seus resíduos, não causando-lhes mal à saúde e

ao seu conforto.

Com o sedentarismo e adensamento das populações, criou-se a necessidade

dessa relação se dar de uma forma mais racional. A própria casa foi um instrumento de

saneamento, pois protegia o homem das intempéries e dos inimigos naturais. O avanço do

conhecimento, aliado ao desenvolvimento de tecnologias e à demanda por soluções para a

vida em sociedade, propiciaram como nas demais áreas, o equacionamento de problemas e

a construção de uma melhor qualidade de vida para a humanidade.

A compreensão do homem sobre a interferência da qualidade da água e da

disposição dos excretas na saúde vem de muito longe. Há na literatura referente à

antiguidade, várias citações a esse respeito, muito embora bastante fragmentadas ao longo

da história. Entretanto, como em outras áreas do saber, foi no século passado que ocorreu

um grande salto no conhecimento em saúde e saneamento.

Datam de aproximadamente 4.000 anos os mais antigos registros sobre

atividades humanas relacionadas ao saneamento. Essas atividades diziam respeito à

irrigação (na Mesopotâmia 4.000 a.C.); ao afastamento hidráulico dos excretas humanos
19

(galeria de esgotos de Nippur, Índia 3.750 a.C.); ao abastecimento de água (sistemas de

água e drenagem no Vale do Hindus, 3.200 a.C.). Estão registrados ainda o uso de tubos de

cobre em 2.750 a.C., no palácio real do faraó Cheóps e o uso do sulfato de alumínio para

clarificação da água pelos egípcios em 2.000 a.C. (Azevedo Netto, 1959 e 1984).

Registros há, de várias civilizações sobre preocupações com o uso da água e

a transmissão de doenças. Os mais antigos escritos em sânscrito sobre os cuidados que se

deve ter com a água para beber datam de 2.000 anos a.C. e aconselhavam guardar a água

em vasos de cobre, expô-la ao sol e filtrá-la através do carvão. Ou ainda, que "a água deve

ser purificada por meio de fervura ao fogo, ou aquecimento ao sol, ou mergulhando-se uma

barra de ferro aquecida, ou por meio de filtração através de arreia e cascalho grosso, e em

seguida resfriada" (Azevedo Netto, 1984 e Wolman, 1959: 93). Os egípcios, há pelo menos

1.500 anos a.C., já utilizavam a decantação como técnica para a purificação da água

(Mendiola, 1944; Sallovitz e Sallovitz, 1951; Nace, 1969 e Rondiere, 1971 apud Dal

Fabbro, 1984).

Azevedo Netto (1959 e 1984), cita ainda várias obras que merecem registro

por demonstrarem grande desenvolvimento tecnológico e saber acerca da importância

destas ações à saúde e ao bem-estar. Aquedutos importantes foram construídos ao longo da

história, como o do rio Kosr, para abastecimento de Ninive, com 48 Km de extensão (700

a.C.) e do Appia, o mais antigo de Roma, com 17 Km (312 a.C.).

Existem também vários registros sobre obras importantes para a disposição

de excretas na antiguidade. Em 2.600 a.C., foi construído um conduto subterrâneo

principal para esgotamento das águas servidas, ao longo de Tell-Asmar, nas proximidades

de Bagdá e a construção da cloaca máxima de Roma, conduto livre executado com pedras,

tendo diâmetro máximo de 4,3 m, destinado a coletar as águas pluviais e residuárias do

Fórum e que se tornou seu coletor tronco em 514 a.C., entre outros (Azevedo Neto, 1959).
20

Os hindus também demonstraram inequívoco conhecimento no

acondicionamento de água em reservatórios de terra, pois quando os ingleses por lá

chegaram, encontraram, apenas na província de Madras, mais de 53.000 depósitos

artificiais em terra. Também exibiam conhecimento em captação subterrânea, ao deixarem

milhares de poços, alguns com dimensões surpreendentes (Sallovitz e Sallovits, 1951 e

Água Subterrânea e Poços Tubulares, 1974 apud Dal Fabbro, 1984).

Segundo Mendiola (1944, apud op. cit.), os incas, na América do Sul,

conduziam água através de perfurações em rocha para abastecer cidades e fortalezas, assim

como recolhiam seus excretas.

Na Grécia, Hipócrates foi bastante preciso em suas afirmações sobre o

bócio e o abastecimento de água e ainda em seus conselhos sobre o tratamento das águas

antes de serem ingeridas (McJunkin, 1986).

Ainda segundo Dal Fabbro (1984: 43), o legado cultural romano também no

setor de saúde pública e engenharia sanitária foram "inequívocos testemunhos da

preocupação do Estado com a saúde da comunidade". Esta preocupação já se manifesta em

Tarquínio, o Soberbo, no séc. VI a.C., no uso de drenos subterrâneos até hoje existentes

para secar os pântanos entre os Montes Palatino e Aventino, onde se construía o Fórum

(Leal, 1957 apud op. cit.). Esses canais, cujo coletor tronco era a famosa "cloaca máxima",

funcionavam ao mesmo tempo como drenos para as águas de infiltração e como coletores

para os esgotos, recebendo por aberturas nas vias públicas, chamadas "meatus", as

imundícies provenientes das habitações. Algumas casas tinham ramais indo ao canal e as

latrinas públicas evacuavam diretamente no esgoto (Amorim, 1944).

A drenagem de pântanos acompanha a história de Roma, pois se percebeu

desde cedo a correlação existente entre essas regiões e certas doenças. O mais célebre

desses esforços dos governantes para drenagem de pântanos se deu nas Paludes Pontinas,
21

ocupando 1.200 Km2, no século IV a.C., quando o Censor Appius Claudius, construiu

canais e diques para dessecá-las ao longo das 350 milhas da Via Appia. Esse pântano foi

alvo ainda de estudos de Leonardo da Vinci, preocupações dos papas Sixto V, Clemente

XIII e Pio VI, só tendo sido vencido totalmente em 1932 (Leal, 1957 apud op. cit.).

Vitruvius, Columella e Varro deixaram preciosos escritos acerca do estágio

do conhecimento sobre o processo de transmissão das doenças no período. A malária já

havia dizimado do Lácio populações inteiras, quando Varro no século I a.C., escreveu que

"talvez vivam nos lugares pantanosos pequenos animais que não possam ser percebidos

pelos olhos e penetram no corpo pela boca e pelas narinas e causam graves desordens"

(Leal, 1957 apud Dal Fabbro, 1984).

No século III a.C., já haviam idéias sobre a relação entre insalubridade e

paludismo. É nessa época que Catão, o Censor, fez freqüentes referências a esse binômio.

Hipócrates, Platão e Aristóteles, já demonstravam conhecimento da malária. Hipócrates em

sua obra, Dos ares, águas e lugares, de 400 a.C., fez interessante descrição da caquexia

palúdica e classificava e comparava as águas para uso humano, recomendando filtrar ou

ferver a água para assegurar a saúde. Heródoto, Platão e Aristóteles apregoavam o uso da

água em abundância e de boa qualidade para manter a saúde dos aglomerados humanos

(Leal, 1957 apud op. cit., Azevedo Netto, 1984).

No auge do Império romano, havia abundância de águas, transportadas em

adutoras e distribuídas em fontes públicas e nas casas de banho. Roma chegou a ser

abastecida por um complexo de onze aquedutos, num total de 422 Km de extensão, tendo o

mais longo cerca de 91 Km. Nesse período, Roma contava com uma distribuição de água

de aproximadamente 1.000 litros/hab/dia, muito além do necessário para o consumo

humano.
22

Mas, na história, esse desenvolvimento, especialmente na engenharia, não

se deu de uma forma linear. Houve períodos de avanços, seguidos de outros de recuo.

Povos muito antigos como os hebreus, gregos, egípcios, astecas e romanos, possuíam

conhecimentos e realizaram obras extraordinárias de saneamento. No entanto, por não

fazer parte do saber do povo, visto que os conhecimentos de engenharia eram restritos a

certos grupos, e por vezes de forma até clandestina (como por exemplo é a origem da

maçonaria), a dominação desses povos e a subjugação de sua elite cultural levou a períodos

de retrocesso.

Na idade média o consumo per capita de água chegou a 1 litro/habitante/dia

nas grandes cidades da Europa, o que representa uma situação de calamidade (Menezes,

1984). Neste período houve um retrocesso enorme do ponto de vista sanitário, tanto no que

diz respeito ao abastecimento de água quanto ao esgotamento sanitário, com a ocorrência

de diversas epidemias, como podemos ver:

A longa noite de sono da higiene, isto é, a idade média, em que grandes


epidemias assolaram o mundo, sobretudo na Europa Central em que elas em
poucos anos reduziram a população em 25 milhões de pessoas, os
problemas de higiene, permaneceram estacionários e mesmo regrediram.
(Amorim, 1944: 109)

O conhecimento sobre as relações entre saneamento do meio e doença,

ainda que empírico e mesmo intuitivo, foi fortalecido no fim da idade média. Em 1388, foi

promulgado o Acto Inglês proibindo a poluição de canais urbanos e a poluição do ar e em

1453, em Augsburgo, leis rígidas de proteção dos mananciais foram promulgadas, no

sentido de controlar a poluição dos rios que serviam ao abastecimento público. Em 1717,

Lancisi fez surgir, a noção de vetor, pois atribuía aos mosquitos o papel de transmitir a

matéria patogênica existente nos pântanos (Mascarenhas e Ramos, 1966).


23

Com a Revolução Industrial, ocorreu um fluxo muito grande da população

rural para as cidades, levando ao surgimento de numerosos aglomerados urbanos, nos quais

as condições de vida dos trabalhadores eram bastantes precárias. Essas populações

requeriam um abastecimento público de água, o destino adequado dos dejetos e condições

de salubridade nas moradias, cuja ausência levou a ocorrência com freqüência, de inúmeras

epidemias.

A primeiras ações do poder público, na Europa e no Brasil, para melhorar as

condições de vida e saúde da população foram através de intervenções sobre a cidade.

Estas ações tinha como espaço o ambiente natural e o construído. Estas ações se deram no

período anterior à descoberta dos agentes etiológicos transmissores das doenças. A

explicação hegemônica sobre o processo saúde-doença era a teoria dos miasmas, segundo a

qual as doenças eram transmitidas pelos ares oriundos dos alagados e pântanos. A ação

sobre o espaço urbano se mostrava um instrumento eficaz de controle das epidemias.

Algumas teses e trabalhos publicados em meados do século passado no

Brasil, discutiam a teoria dos miasmas, dentre os quais podemos citar os de França (1850),

Guimarães (1856) e Freire (1866). Este último ao fazer uma revisão da literatura sobre a

Influência dos Pântanos sobre o Homem, apresenta uma visão histórica das principais

teorias sobre a maneira de transmissão das doenças.

Segundo França, Varrão (no mundo antigo), Lineo e Grognier, acreditavam

que uma multidão de micro-insetos penetravam no corpo causando as doenças. Na Idade

Média, a forma de contágio era concebida através dos astros. Sylvio de Le Bóe, atribuía

aos vapores salinos e sulfurosos a transmissão das doenças; enquanto Rammazini as

atribuía a estes mesmos vapores a capacidade de coagular o sangue. A outros autores, era

imputado a teoria segundo a qual as doenças seriam transmitidas através dos gases

exalados da putrefação dos líquidos animais e à Lancisi, a putrefação dos insetos. Bailly,
24

rejeitou esta hipótese alegando observação na qual gafanhotos teriam diminuído a febre.

Brachet e Audonard, entendiam como sendo substâncias vegetais as responsáveis pela

transmissão das doenças, enquanto Hopkins, atribuía essa transmissão ao excesso de

vapores aquosos na atmosfera.

A palavra malária é inclusive oriunda da Itália, onde malária, sugere maus

ares, enxofre, arsênico. Sua associação correta com os pântanos, era equivocada na

explicação do processo de contaminação.


25

3. As primeiras explicações científicas

É com Edwin Chadwick, que a saúde pública e o saneamento entram num

período de maior intervenção do Estado. Em 1823, ao ser nomeado para a Comissão Real

Inglesa, esse advogado foi encarregado de pesquisar as condições de aplicação da Lei dos

Pobres. Em 1846, publicou seu famoso trabalho The Sanitary Condition of the Laboring

Population, em que apresenta uma análise das condições sócio-econômicas e sanitárias da

classe trabalhadora, propondo ações de saneamento do meio, como drenagem de áreas

pantanosas. A partir de então, o Estado passou a intervir no meio, nas cidades, seja através

de abastecimento de água, de esgotamento sanitário, seja na urbanização, não apenas do

ponto de vista do conforto e bem-estar, mas sobretudo com o intuito de prevenir e

controlar enfermidades.

Os trabalhos realizados por Chadwick na Inglaterra e Shattuck em


Massachusetts, e outros, promoveram uma revolução sanitária em seus
países durante a segunda metade do século XIX. As enfermidades
associadas a um saneamento deficiente e um meio ambiente densamente
povoado diminuíram, ainda que sem intervenções planificadas, medicina
curativa nem imunizações, e a esperança de vida aumentou.
(Mckeon e Record, 1955; Wain, 1970 apud McJunkin, 1986: 25)

Ainda em meados do século passado, o clássico estudo de epidemiologia,

realizado e escrito por John Snow em 1854, Sobre a Maneira de Transmissão do Cólera,

"marca o início de uma nova era na análise das condições de saúde e doença dos grupos

humanos, ou seja, da epidemiologia e da aplicação de seu método" (Koifman, 1990: 13).

John Snow com este estudo combate a teoria dos miasmas como explicação para as

epidemias de cólera e de outras doenças transmissíveis, através da organização lógica de

suas observações e da análise de um experimento natural. Dessa forma, antecipava-se em


26

uma década à teoria dos germes formulada por Pasteur e em três décadas à identificação do

Cholera vibrio, por Koch.

No seu estudo, Snow investigou a epidemia de cólera ocorrida em Londres

em 1854 e demonstrou que a maioria das vítimas haviam utilizado água de uma bomba da

Rua Broad (Snow, 1990 e McJunkin, 1986). E ainda, que a rede de esgotos adjacente ao

poço utilizado estava com vazamentos e que transportava as imundícies da casa em que

havia ocorrido o caso original de cólera. A partir daí, passou a investigar os casos ocorridos

de 1849 a 1854 e as redes de distribuição de água de Londres, que naquela época era

servida por mais de uma companhia particular. Constatou que a Cia. Southwark-Vauxhall

e a Lambeth, captavam suas águas no Tâmisa, poluído por esgotos. A descoberta de que a

Cia. Lambeth em 1852, havia mudado o local de captação, além de ter introduzido

modificações no tratamento da água a ser distribuída, levaram Snow a construir através de

instrumentos metodológicos pioneiros, "o arcabouço que corrobora sua hipótese, baseando-

se para tanto nas diversificadas observações extraídas ao longo de anos de estudo da

distribuição do cólera" (Koifman, 1990: 17).

Uma outra epidemia de cólera ocorrida em Hamburgo, em 1892, permitiu

Koch isolar o vibrião das águas do Rio Elba. Hamburgo e Altona se abasteciam com água

desse rio e eliminavam seus esgotos em vários pontos do mesmo. A água consumida em

Altona era captada à jusante de Hamburgo, sendo portanto, mais contaminada. Essa cidade,

utilizava água filtrada enquanto Hamburgo não realizava a filtração. Em poucas semanas,

8.000 mortes foram registradas em Hamburgo com uma taxa de mortalidade de 13,4 por

cada 1.000 habitantes, enquanto em Altona esta mesma taxa era de 2,3, sendo que, quase

todos os casos verificados em Altona haviam sido importados de Hamburgo (McJunkin,

1986).
27

Iniciava-se então um novo período no conhecimento sobre os mecanismos

de transmissão das doenças. As ações de saneamento continuaram a ser uma medida eficaz

no controle de diversas epidemias. É interessante observar que a construção das redes de

esgotos sanitários em grandes cidades do mundo ocorreram sempre após as grandes

epidemias de cólera do século passado, indicando sua correlação, mesmo antes da

descoberta do vibrião, como se vê a seguir (Azevedo Netto, 1991):

- Paris - 1832: epidemia


- 1833: início da construção da rede de esgotos;

- Londres - 1854: grande epidemia


- 1855: criação do Metropolitan Board of Works, para
construir redes de esgotos;
- Buenos Aires- 1869: epidemia

- 1874: construção de rede de esgotos;


- Memphis - 1873: epidemia
- 1879: contratado o projeto de esgotos;

- Hamburgo - 1892: grande epidemia


- 1983: ampliação da rede de esgotos;
- São Paulo - 1893: epidemia

- 1893: criação da Repartição de Águas e Esgotos.

No período posterior ao descobrimento dos agentes etiológicos e dos

vetores transmissores de diversas enfermidades, continuou-se a utilizar medidas de

saneamento como forma de romper elos na cadeia de transmissão de diversas doenças, e

não apenas como instrumento de bem-estar, visto que o próprio desenvolvimento do

conhecimento levou a um mecanismo mais preciso de intervenção.

Na segunda metade do século passado, com a expansão capitalista e com a

necessidade dos países industrializados de consolidar as conquistas coloniais, aumentando


28

a dependência econômica nos países produtores de matéria-prima, tornou-se fundamental o

controle das doenças infecciosas, inclusive para o sucesso de suas empresas comerciais.

Neste período, as atividades econômicas entravam num período de expansão em vários

países da América Latina. A partir dessa perspectiva, em 1902 foi constituída a Oficina

Sanitária Panamericana, embrião da atual Organização Panamericana de Saúde (OPS),

trazendo na pauta de discussão dos chefes de Estado das Américas o controle das doenças

transmissíveis (Koifman, 1990).

Em fins do século passado e início deste, as conquistas científicas estavam

bastante desenvolvidas, devido aos avanços da microbiologia. Nesse período, vários

agentes infecciosos haviam sido descobertos e isolados, repercutindo diretamente sobre a

compreensão e o controle do processo saúde-doença. Surgiu então a teoria unicausal, que

atribuiu para cada doença, um agente patógeno, fortalecendo uma preocupação voltada

para a etiologia das doenças.

A identificação dos agentes etiológicos remetia à identificação das vias de

entrada no organismo humano. Várias epidemias, como as de cólera e de febre tifóide,

chamavam atenção para a via fecal-oral e conseqüentemente implicavam na necessidade de

descoberta dos mecanismos para controlá-las. Em fins do século XIX e princípios deste, as

enfermidades transmitidas pela água eram predominantes nos EUA e vários países

desenvolvidos. O abastecimento de água, a filtração e posteriormente a cloração foram

reduzindo as doenças de veiculação hídrica (McJunkin, 1986).

Mas, paralelamente, com a Revolução Industrial, houve um grande avanço

tecnológico, impulsionando o desenvolvimento das ações de saneamento (McJunkin,

1986). Várias descobertas, ocorridas nesse período, contribuíram entre outras coisas, para

uma melhor qualidade da água, possibilitando sua distribuição em maior quantidade,


29

trazendo maior salubridade e conforto, sobretudo na Europa. Algumas das tecnologias

relevantes introduzidas a partir de então podem ser citadas (Azevedo Netto, 1984: 107):

• fabricação de tubos de ferro fundido na França (1664);


• sua introdução na Inglaterra (1746);
• uso do sulfato de alumínio na Inglaterra para a melhoria da qualidade das
águas (1767);

• descoberta do cloro na Suécia (1774);


• construção do primeiro filtro lento na Escócia (1804);
• primeira grande estação de tratamento em Paris (1806);

• construção de filtro lento em Londres (1827);


• aplicação do cloro para oxidação da matéria orgânica - desinfecção - da
água (1830).

No Brasil algumas destas tecnologias foram incorporadas sem que houvesse

um hiato muito longo em relação às suas descobertas na Europa, como o uso de estação de

tratamento de água, em Campos, com seis filtros de pressão, em 1880, e o uso de filtros

lentos no sistema de águas de Campinas, em 1891 (op. cit.).

Resumindo, podemos dizer que no período anterior à descoberta dos

agentes etiológicos, a intervenção sobretudo no espaço urbano era um eficaz mecanismo de

controle de doenças transmissíveis. A crença de Chadwick, permitiu "à prática sanitária

grande permeabilidade e aplicação nos programas de prevenção, de medidas de engenharia

sanitária e saneamento do ambiente urbano" (Costa, 1986: 24 e 25). Segundo este autor, as

preocupações da saúde pública do século passado estiveram associadas com às demandas

por melhorias nas condições de vida da classe trabalhadora, fruto da industrialização e

conseqüente crescimento populacional, principalmente nos bairros pobres.

A partir da descoberta dos microorganismos, foi desenvolvida a teoria

unicausal, que consistia na explicação para o processo saúde-doença, como sendo


30

determinada por um único fator, ou seja, o agente patógeno. Esta teoria desviou as ações de

controle das doenças de um caráter coletivo para o combate específico ao agente

etiológico. Esta nova forma de atuar se dava através de medicamentos administrados ao

paciente, ou com o uso de substâncias químicas (biocidas) para o controle de vetores. Além

disso, essa teoria reforçou a individualização da prevenção e da cura, responsabilizando o

paciente pela contaminação.

É a época da chamada polícia sanitária, que entrava pelas residências a

procura de focos de mosquitos. As pesquisas também se voltaram para o descobrimento de

alternativas para o combate aos agentes patógenos a nível do indivíduo. A descoberta do

antibiótico, na década de 40, reforçou ainda mais a teoria unicausal.

Só em meados deste século é que começaram a surgir novas escolas que

questionavam o paradigma unicausal. As teorias multicausal de Leavell e Clark e da

causalidade direta de MacMahon vão buscar na associação de vários fatores causais a

explicação para o surgimento de doenças (Koifman, 1990).

No entanto, o componente social é considerado nessas teorias como mais

um fator, com o mesmo grau de importância que as características do agente patológico ou

da imunidade do hospedeiro. As ações de controle sobre o meio ambiente terminam por

concorrerem, em pé de igualdade, com as medidas de higiene pessoal ou de tratamento das

infecções. Dessa forma, essas teorias, apesar de levantar o tema do componente ambiental,

não se propõem a modificar a forma hegemônica de planejar alternativas de controle.

No pós-guerra, as lutas por uma organização social mais equitativa

acabaram por influenciar o reconhecimento da saúde como um direito dos cidadãos

inseridos num contexto de welfare state. Estudos científicos que avaliem a eficácia das

ações tornam-se parâmetros de definição de investimentos e prioridades.


31

Na América Latina, porém, longe da garantia aos direitos de cidadania

promovida pelo welfare na Europa e EUA, as precárias condições de vida e as

desigualdades históricas na distribuição da riqueza formaram o celeiro propício ao

surgimento de uma nova escola: a chamada epidemiologia social. Nos seus momentos

mais austeros, baseados em fortes princípios marxistas, essa corrente chegou a priorizar a

determinação, do processo saúde-doença, em última instância, dos fatores sociais sobre os

demais, para todas as doenças.

No entanto, permanecendo como concepção contra-hegemônica, a

epidemiologia social não conseguiu influenciar nem o modelo curativo-assistencial de

prestação de serviços de saúde, nem a formação de recursos humanos contribuindo mais

para a formação de uma visão crítica a esse modelo.

Hoje, as diversas teorias convivem no meio científico e nas universidades,

evidenciando-se um claro predomínio da multicausalidade. No campo das políticas de

saúde, a discussão da história natural das doenças, iniciada pelo modelo multicausal, o

reconhecimento das medidas de atenção primária como mais eficazes no controle de

doenças no terceiro mundo e o desenvolvimento do modelo da medicina integral e da

medicina comunitária promoveram um deslocamento das ações rumo a medidas

preventivas, coletivas.

Apesar de todo o apoio de organismos internacionais, esses projetos não

ultrapassaram experiências localizadas, isto quando foram colocados em prática. Os

interesses do setor privado muitas vezes definiu as prioridades do Estado, tanto a nível do

saneamento quanto da saúde.


Parte I

As ações de saneamento e o setor saúde no Brasil


33

1. As primeiras organizações de saúde no Brasil - colônia


e Império

No Brasil colonial, o Estado era praticamente ausente nas ações de saúde. A

metrópole não tinha interesse em melhorar a saúde da população, preocupando-se apenas

em garantir a exploração dos insumos extraídos da colônia. As cidades não tinham ainda

uma densidade capaz de propiciar grandes epidemias, o que vem a ocorrer em meados do

século passado.

A noção de saúde pública estava bastante associada ao tema da sujeira e, os

cuidados com a limpeza da cidade predominou. O mecanismo mais eficaz de controle das

doenças transmissíveis era o de aterrar ou drenar águas estagnadas e regiões pantanosas,

podendo-se afirmar mesmo, que as primeiras medidas sanitárias em nossas cidades foram

as ações de drenagem e aterro, sejam com o intuito de combater as doenças palustres ou

mesmo para a expansão das áreas urbanas.

Outras medidas de higiene adotadas pela saúde referiam-se às ações de

limpeza das ruas e casas, construção de canteiros e purificação do ar, medidas que

reproduziam o saber da época. No século XIX, as ações de saúde eram voltadas para o

espaço urbano, preocupadas com a boa circulação do ar e da água, para não serem

prejudiciais à saúde (Costa, 1986).

A primeira forma de organização sanitária no Brasil viria em 1808, através

de D. João VI, com a criação de um cargo, que após várias transformações ocorridas,

correspondia ao de Diretor-Geral de Saúde Pública. Em 1829, foi criada a Inspeção dos

Portos, e os serviços até então centralizados, foram municipalizados. Em 1833, a

‘Inspeção’, foi transformada em Serviços Marítimos, para 10 anos depois, voltarem à


34

alçada do Governo Imperial, "pela comprovada incapacidade das administrações locais"

(Barreto, 1945 e Uzêda, 1937).

Em 1849, após os primeiros casos de febre amarela, foi criada a Comissão

Central de Saúde Pública, e no ano seguinte, foi criada a Comissão de Engenheiros e a

Junta de Higiene Pública, que visava unificar os serviços sanitários do Império (Barreto,

1945). Segundo Costa (1986), consolidou-se a Reforma dos Serviços Sanitários do

Império, divididos entre terrestres e marítimos. Foi instituído um Conselho Superior de

Saúde Pública, com funções normativas.

Em 1886, foi realizada uma reforma para dar mais autonomia às repartições

de saúde. Foi efetivada a divisão dos serviços sanitários, na qual os terrestres ficaram

subordinados à Inspetoria Geral de Higiene (com Delegados de Higiene na Corte e

Inspetores e Delegados nas províncias), e os marítimos subordinados à Inspetoria Geral de

Saúde dos Portos. Ainda em 1886, foi instituído um Conselho Superior de Saúde Pública

(Barreto, 1945).

Na Constituição de 1891, a competência para prestar serviços de saúde

passa a ser dos estados, a quem cabia genericamente a administração pública local, ficando

responsáveis pela vigilância das localidades e habitações populares. No Distrito Federal, os

serviços locais ficaram excepcionalmente com a União. Entretanto, eram realizados

acordos entre vários estados e a União, cabendo a esta a orientação técnica, a direção e a

contribuição com recursos financeiros. Esses acordos perduraram até a Revolução de 30,

quando foram refeitos (Barreto, 1945; Uzêda, 1937 e Costa, 1986).

Em 1892, ocorreu a transferência para a Prefeitura do Distrito Federal de

grande parte dos serviços sanitários e foi extinta a Inspetoria Geral de Higiene1. Foram

criados órgãos distintos para a execução e administração dos serviços. Para executar, criou-
35

se a Diretoria Sanitária2 (da União), e para administrar, Diretoria-Geral de Higiene e

Assistência Pública, regulamentada pelo Conselho Municipal.

Em 1897, ocorre a unificação parcial dos serviços de Higiene, tendo origem

a Diretoria-Geral de Saúde Pública, que perduraria até 1920, quando seria transformada em

Departamento Nacional de Saúde pública, com uma ampliação das ações para todo o

território nacional.

1. Lei Nº 85 de 20.09.1892.
2. Decr. Nº 1.172 de 17.12.1892.
36

2. A organização dos serviços de saúde e a ação sobre o


espaço urbano

No Brasil o surgimento da saúde pública em bases científicas modernas

ocorreu no início deste século, com Oswaldo Cruz. O desenvolvimento das pesquisas no

campo da microbiologia, protozoologia, entomologia, helmintologia, fisiologia, dentre

outras, foram patrocinadas principalmente pelo Instituto Oswaldo Cruz, a partir de 1908

(Costa, 1986).

Com o surgimento da bacteriologia e o fortalecimento da teoria da

unicausalidade, os programas de saúde pública passaram a dar menos importância às

relações entre doença e condições sociais, evitando conseqüentemente reflexões sobre

política social. A saúde passaria a ser definida como medicina das epidemias, na qual os

novos instrumentos da microbiologia e parasitologia poderiam ser capazes de prescindir de

medidas preventivas. As reivindicações de investimentos em drenagem e melhoria das

habitações não mais apareceriam como temas dominantes.

Inaugurou-se um novo capítulo na história do controle das doenças


contagiosas. A simples vacinação ou extermínio de focos e vetores
permitiria que as epidemias e as doenças parasitárias ficassem sob controle
e deixassem de ser uma ameaça significativa aos interesses econômicos em
jogo.
(Costa, 1986: 32)

Em fins do século passado, o Brasil passou por um processo de

transformações no caráter das relações de produção, subordinadas à sua inserção no

mercado internacional. Foram necessárias políticas sociais para as regiões que

concentravam a produção e a força de trabalho. Essas regiões eram predominantemente, o

planalto paulista com o deslocamento da produção do café para esta região, o Rio de
37

Janeiro e os centros urbanos de São Paulo, onde se localizava a produção industrial e

manufaturada (Costa, 1986).

No início deste século, a criação de serviços de saúde não objetivava o

atendimento de toda a população, mas sim preservar a capacidade produtiva de segmentos

sociais (Costa, 1986). Sabroza e outros (1995: 182), afirmam:

Nos canteiros de obras dos canais de Suez e Panamá, na construção das


ferrovias Rio-São Paulo ou Madeira-Mamoré, no saneamento do Cairo ou
da cidade do Rio de Janeiro, esse modo de ação local contribuiu
decisivamente para a consolidação do capitalismo, em geral sem interferir
nas precárias condições de vida dos trabalhadores.

Mudaram as relações de produção, não mais assentada no trabalho escravo e

articulada ao mercado externo. Foram implementadas transformações na infra-estrutura, no

comércio, rede bancária e no sistema de transportes. Nesse momento, o capital financeiro

internacional veio interferir na economia brasileira, participando não só de atividades que

oferecessem boas oportunidades, mas inclusive atuando na infra-estrutura, viabilizando a

produção e a exportação de matéria-prima, manufaturados e bens de consumo.

Os ingleses, que na época tinham hegemonia no mercado internacional,

tiveram atuação bastante significativa para a criação de serviços de infra-estrutura, em

vários setores no Brasil. Atuaram nos sistemas de transportes, com a instalação e a

exploração de estradas de ferro, bondes urbanos, dos portos, dos sistemas de água e

esgotos, energia elétrica, telefonia, gás, etc.

A intervenção da saúde pública estava neste momento bastante articulada à

inserção da economia brasileira no quadro do capitalismo mundial. As ações visavam criar

condições básicas nas cidades portuárias, atuando contra enfermidades específicas (como a

peste, varíola e febre amarela) e intervindo sobre o espaço urbano e o dia-a-dia de seus

habitantes. Foi atribuição da saúde pública o enquadramento da habitação popular e a


38

vigilância sobre os modos e usos da cidade (Costa, 1986). Data desse período inclusive, a

construção do conceito da polícia sanitária e do habite-se - autorização expressa para

ocupação de um imóvel novo - que foi efetivada por Oswaldo Cruz.

Alguns exemplos ilustram esse quadro, quando analisamos os casos do Rio

de Janeiro, de Santos e do Recife. A intervenção de Oswaldo Cruz no Rio se deu num

momento de calamidade pela epidemia de febre amarela, quando os navios já se recusavam

a atracar em seu porto, com repercursões para a economia do país. O Presidente Rodrigues

Alves então, concedeu plenos poderes a Oswaldo Cruz para que fizesse o que julgasse

necessário no campo da saúde pública.

Paralelamente às ações de Oswaldo Cruz foi implementada a famosa

Reforma Passos, pelo Prefeito do Distrito Federal Pereira Passos, na qual foram demolidas

diversas casas e cortiços para serem abertas avenidas, entre outras coisas, a fim de tornar a

cidade mais salubre.

Segundo Abreu, o discurso da época não combatia o cortiço pelo lado da

exploração da força de trabalho. No Rio de Janeiro, dois outros motivos revelavam-se mais

importantes:

As constantes denúncias que o apontam como o epicentro mais comum das


epidemias de cólera, de peste, de varíola e de febre amarela, que a partir de
1850 assolam periodicamente a cidade; e o fato de ser ele um foco potencial
de agitações populares (este segundo motivo, só podia ser entendido nas
entrelinhas do discurso).
(Abreu, 1986: 48)

Dessa forma, a saúde pública passou a intervir rigorosamente, através de

portarias, editais e relatórios da Inspetoria Geral de Higiene, pareceres da Academia

Imperial de Medicina e editoriais da imprensa. Embora o ataque se concentrasse sobre os

corticeiros, o Estado também era responsabilizado pela higiene. O Parecer da Inspetoria


39

Geral de Higiene sobre as Estalagens ou Cortiços, de 1886, responsabilizava o Governo

Imperial pelas falhas no abastecimento de água e a Câmara Municipal pela proliferação de

habitações coletivas (Abreu, 1986).

Pereira Passos, instituído de poderes excepcionais interviu diretamente na

vida da cidade, através de leis especiais, que proibiam a circulação de mendigos,

regulavam o comércio, etc. Criou também o serviço de turmas que percorriam as ruas da

cidade acompanhados de carroções de limpeza pública. "Institucionalizou as visitas

domiciliares a todas as habitações, removendo tudo que fosse encontrado no seu interior e

julgado como prejudicial à saúde" (Costa, 1986: 56).

Em Santos, devido a sua situação de baixada, os alagados se constituíam em

grave problema sanitário e a febre amarela grassava na região. No início do século, foi

constituída a Comissão de Saneamento de Santos que, em 1905, tinha como chefe o ilustre

Engº Saturnino de Brito. Este trabalho realizado em Santos propiciou notoriedade a

Saturnino, sendo reconhecida como sua maior obra, que entre outras coisas contou com a

construção de canais, diques e de urbanização e, que certamente está entre as maiores da

engenharia sanitária nacional. Esta intervenção trouxe melhorias sanitárias importantes

para Santos, com grande redução da incidência de febre amarela e malária.

O processo migratório, a grande expansão econômica em São Paulo e as

constantes epidemias ocorridas levou o governo desse estado a investir maciçamente em

saúde e saneamento. Blount (apud Costa, 1986) afirma que em meados da década de 1890,

o Estado de São Paulo criou o mais completo serviço de higiene e saúde pública no Brasil

e talvez de toda a América do Sul. A participação da rubrica Saúde e Saneamento no

orçamento do Estado de São Paulo, traduz em números esse investimento:

- 1892: 46 %;
- 1896: 40 %;
40

- 1898: 28 %;
- 1901: 15 %;
- 1907: 20 %;
- 1910: 15 %;
- 1918: 15 % e
- 1920: 8 %.

Após seu notável trabalho em Santos, Saturnino de Brito transferiu-se para o

Recife em janeiro de 1910, quando era Governador Herculano Bandeira. O Recife era

considerada no início deste século, a capital mais doentia do Brasil, onde mais se morria. E

de fato, se verificarmos os índices de mortalidade geral da época, em cidades como Belém,

São Paulo, Salvador e Rio de Janeiro, encontramos de 14 a 15 óbitos para cada mil

habitantes, enquanto em Recife, este indicador situava-se em 55 (Medeiros, 1989; Freitas,

1933 e Ferreira, 1937).

A concepção de intervenção urbana de Saturnino era centrada na sua visão

higienista. Segundo Brito, “os planos urbanísticos deveriam estar intimamente

relacionados pelas exigências sanitárias que subordinariam a circulação e a estética

urbana” (apud, Moreira, 1994: 58).

A intervenção urbana de Saturnino, previa cinco ações integradas visando a

melhoria sanitária e de qualidade de vida (Freitas, 1933: 122):

• esgotagem das matérias cloacais, das águas servidas e das águas de chuva;

• fornecimento de água pura, bem cuidada e em abundância;


• higienização de nossas casas de moradia, comerciais e industriais;
• dessecamento e drenagem dos pântanos existentes, disseminados nas áreas urbana
e suburbana da cidade;

• revestimento de nossas ruas e estradas por meio de um calçamento apropriado.

Com relação às ações sobre as condições de moradia da população pobre,

que viviam nos mocambos e cortiços, Saturnino propõe um controle rigoroso sobre as
41

construções e sobre as conexões e instalações sanitárias domiciliares. Segundo Moreira

(1994: 112):

... evidencia um marco no processo de regulamentação e controle do poder


local sobre o espaço urbano e pode ser visto como um instrumento
efetivamente de planejamento urbanístico. Este ímpeto desenfreado para
regulamentar, classificar, dividir e organizar, aliado a um forte caráter
didático, é uma das características marcantes da obra do nosso engenheiro.

Este trabalho de Saturnino de Brito foi extremamente bem reconhecido

pelos sanitaristas da época que o evocaram como grande benfeitor do higienismo em

Pernambuco. O eminente sanitarista Octavio de Freitas (1933: 124), em discurso na

Sociedade de Medicina de Pernambuco, em louvação ao trabalho de Saturnino, afirma que

sua obra “é toda ela de higiene e de sanitarismo”. E compara os índices de mortalidade

geral no Recife, antes e depois dessa intervenção urbana:

...no quinquênio de 1907 a 1911, e portanto antes do início dos trabalhos de


saneamento, o coeficiente anual de mortalidade geral era para a cidade do
Recife, de 50,24 óbitos para cada mil habitantes: para o quinquênio seguinte
de 1912 a 1916 foi de 38,98; para o quinquênio de 1917 a 1921 desceu a ...
33,99; para o de 1922 a 1926 ainda desceu a 27,40 e no último quinquênio
de 1927 a 1931 a sua redução atingiu ao extremo de 22,92 óbitos para cada
mil habitantes.

Quer dizer, na sua maior singeleza, que as obras de saneamento realizadas


por Saturnino de Brito foram um fator benéfico de tal ordem que
contribuíram e estão contribuindo para poupar à nossa Capital 28 vidas por
ano em cada mil habitantes; ou, mais sugestivamente, para os nossos 410
mil habitantes, cerca de 11.500 pessoas, cada ano, estão sendo poupadas
pela morte!

Com a institucionalização do setor saúde no início deste século,

principalmente a partir de Oswaldo Cruz, as ações de saneamento implementadas por este

setor passaram por diversas fases ao longo da história. Inicialmente, foram desenvolvidas

ações executivas, normativas e fiscalizadoras, reduzidas posteriormente a ações

normativas, com quase nenhuma capacidade executiva e fiscalizadora.


42

As ações de saneamento ficaram mais definidas dentro da saúde a nível

Federal, com a reestruturação da Diretoria Geral de Saúde Pública, em 1904, quando foram

criadas 10 delegacias no Distrito Federal, as quais continham Seções de Engenharia

Sanitária. Oswaldo Cruz havia assumido a direção em 1903, cujo primeiro objetivo foi o

extermínio da febre amarela.

Os Distritos Sanitários eram responsáveis pelas visitas domiciliares, nas

quais os inspetores poderiam entregar intimações, multas, interditar ou fechar moradias,

principalmente nas casas de habitações coletivas. De forma idêntica à Reforma Passos, a

campanha de Oswaldo Cruz representou mais uma intervenção sobre o ambiente urbano,

dificultando ainda mais a moradia para os segmentos populares, visto que estas não se

enquadravam nos critérios sanitários definidos. A polícia sanitária estabeleceu medidas

rigorosas para os domicílios e logradouros públicos, como vemos a seguir:

Exigiu das habitações providências no sentido de proteger todas as caixas,


depósitos de água, etc,. Fez remover latas, garrafas, cacos, tudo que pudesse
servir de reservatório de água onde se desenvolvia o mosquito. Mandou
proceder a limpeza das calhas e telhas e retirar a vegetação que brotava
sobre os telhados, acumulando água. Fez reparar urnas, vasos e outros
objetos de ornamentação existentes sobre as casas, com o fim de evitar que
no interior deles se coletasse água. Exerceu vigilância sobre torneiras,
ladrões de caixas d'
água, etc., para evitar o desperdício e o empoçamento de
água. Exerceu rigorosa vigilância sobre os ralos de esgoto, valas, tinas de
lavagem, etc., a fim de obstar o desenvolvimento do mosquito, colocando
querosene e creolina. Fez aterrar pântanos e mandou regularizar os cursos
d'água.
(Franco, 1969 apud Costa, 1986: 59)

Para se ter uma idéia da magnitude da intervenção no espaço urbano carioca

com o intuito de controle da febre amarela, em 1903, com uma população de 738.549

habitantes, foram realizadas 219.919 inspeções domiciliares no Rio de Janeiro (Fontenelle,

1939 apud Costa, 1986).


43

Em 1914, foram realizadas novas mudanças na Diretoria Geral de Saúde

Pública com a instituição de uma nova legislação. A Inspetoria de Isolamento e

Desinfecção foi transformada em Inspetoria dos Serviços de Profilaxia, responsável pelas

ações de vigilância sanitária. O serviço de polícia sanitária marítimo foi expandido para

mais 19 inspetorias espalhadas pelo litoral brasileiro. As medidas da polícia sanitária

urbana também apareciam nessa legislação, na qual a vigilância sanitária observaria as

condições higiênicas, asseio, conservação e estado de saúde dos moradores. Além disso,

seria verificado o estado dos reservatórios de água potável, seu abastecimento, a

integridade do funcionamento das instalações sanitárias, banheiros, tanques, lagos, esgotos,

bueiros, etc. Nessa época foi instituída a notificação compulsória de várias doenças

transmissíveis.

O período entre 1914 a 1919 se caracterizou por uma elevação geral do

custo de vida, agravada muitas vezes pela escassez de gêneros no mercado interno,

decorrentes da I Guerra Mundial, da paralisação de entrada de capitais externos e ao

pagamento da dívida à Inglaterra (Costa, 1986).

Neste período, uma profunda inquietação intelectual de caráter nacionalista

ganhava força também no meio médico-sanitarista, sobretudo a partir da denúncia feita por

pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), sobre o quadro sanitário e social do

interior do Brasil. Esta denúncia foi realizada a partir da divulgação em 1916, do relatório

da expedição científica do IOC à vários estados do Nordeste e a Goiás, sob a chefia dos

médicos Artur Neiva e Belisário Pena. Nesta época a proteção à saúde era exclusiva ao

meio urbano e no entanto, a maioria da população brasileira era rural. Em 1912, com o

Nordeste flagelado pela seca, a Inspetoria de Obras Contra as Secas (Iocs), patrocinou a

expedição para o Nordeste, cujo relatório foi publicado em 1916 e apresentou grande

riqueza de dados epidemiológicos e sócio-econômicos do Nordeste.


44

Com a publicação do livro Saneamento do Brasil de Belisário Pena, foram

lançadas as bases para um movimento nacional que congregou médicos, advogados,

engenheiros e intelectuais em torno da proposta do saneamento. Em 1918, foi lançada a

Liga Pró-Saneamento do Brasil (Britto e Lima, 1991).

Esta Liga, que funcionou no biênio 1918-19, teve um caráter nacionalista,

no qual a defesa de um saneamento rural atuou como um dos canais mais importantes para

o projeto ideológico de construção da nacionalidade. Esse movimento via na tese de

incorporação dos sertões a base de uma nova ordem social, onde caberia à ciência o papel

determinante. Reivindicavam ainda o abandono da política do urbanismo e do

industrialismo parasitário (Britto e Lima, 1991).

Para a Liga, o prioritário seria erradicar as doenças endêmicas nas áreas

rurais, vistas como o principal obstáculo ao desenvolvimento da vocação agrícola do país.

Os objetivos imediatos seriam a criação de um serviço de atendimento às endemias e a

criação de um Ministério da Saúde.

Decorrente desse movimento, em 1918, foi criado o Serviço de Profilaxia

Rural (SPR), inicialmente restrito ao Distrito Federal subordinado à Inspetoria dos

Serviços de Profilaxia, com 9 postos de Saneamento Rural na capital. Anteriormente, estes

serviços eram realizados apenas pela Fundação Rockefeller.

Em 1919, o governo federal determinou a organização autônoma desse

serviço, que deixou de ser subordinado à Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP),

passando a vincular-se diretamente ao Ministério da Justiça e Negócios do Interior - ao

qual a DGSP estava vinculada. O SPR tinha como objetivos controlar as três grandes

endemias do interior do Brasil: ancilostomíase, malária e doença de Chagas. As ações

desenvolvidas com esta finalidade, necessitavam do estabelecimento de convênios com os

estados pois, constitucionalmente este nível de poder era o responsável pela saúde.
45

A criação do SPR foi visto como uma conquista do movimento iniciado

pela Liga Pró-Saneamento.


46

3. A expansão nacional das ações de saúde -


décadas de 20 e 30

Em 1920 foi criado por Carlos Chagas, o Departamento Nacional de Saúde

Pública (DNSP), ampliando portanto, a atuação da esfera federal a todo o território

brasileiro. Entre as atribuições de um órgão nacional, a Liga Pró-Saneamento defendia que

figurassem os serviços de abastecimento de água, esgotos e engenharia sanitária.

Até esse momento, as ações de saúde pública tinham como âmbito

sobretudo a Capital Federal, portos, aeroportos e fronteiras. Possivelmente porque as ações

desenvolvidas até então estiveram muito vinculadas ao controle da febre amarela e da peste

nas áreas urbanas, por suas sérias implicações econômicas. Com a criação do DNSP, as

ações de saúde começaram a atingir os demais estados, principalmente na profilaxia das

doenças venéreas, lepra e endemias rurais. Na estrutura do DNSP, as ações de saneamento

eram desenvolvidas principalmente pela Inspetoria de Engenharia Sanitária e pela Diretoria

de Saneamento e Profilaxia Rural.

As principais inovações dessa nova legislação foram os serviços de

profilaxia rural no Distrito Federal, nos estados e no território do Acre, o controle sobre a

qualidade dos gêneros alimentícios e a vigilância sobre as condições de trabalho de

mulheres e crianças, além do convênio entre o Governo e a Fundação Rockefeller para a

profilaxia da febre amarela (Costa, 1986).

Em 1923, foi criada a Sociedade Brasileira de Higiene (SBH), entidade que

reunia os intelectuais da área da saúde que haviam se articulado em torno da Liga Pró-

Saneamento do Brasil. Nesse mesmo ano, realizaram o I Congresso Brasileiro de Higiene,

que viria a acontecer ainda mais quatro vezes nessa década. A SBH e os congressos por ela

realizados tiveram grande influência no pensamento sanitário desse período. Atuaram,


47

segundo Costa (1986), como "uma verdadeira linha auxiliar" do DNSP, onde a presidência

da SBH era invariavelmente ocupada por um diretor deste órgão.

É interessante observar, neste momento, o quanto era intensa a relação entre

os setores saúde e saneamento, comprovada através da análise dos Anais dos Congressos

Brasileiros de Higiene, que em sua primeira edição continha uma quantidade muito grande

de artigos apresentados ligados a saneamento, habitação, arquitetura e urbanismo. No I

CBH, dos 52 trabalhos apresentados, 27 eram relacionados a esses temas3. Nos congressos

seguintes no entanto, foi substancialmente reduzida a participação desse segmento. No II

CBH (1924), apenas 2 trabalhos referentes ao saneamento; no CBH seguinte, dois anos

depois, apenas 8; no V CBH4 (1929), não foram apresentados trabalhos referentes ao

saneamento. No VI CBH (1947), após longo intervalo em relação ao congresso anterior

foram apresentados 10 trabalhos sobre saneamento, mas 18 referentes ao uso de

quimioterápicos e biocidas5. No VII CBH (1948), foram apresentados 4 trabalhos de

saneamento e 25 sobre quimioterápicos; no IX CBH (1951), apenas 4 referentes à

habitação e 14 sobre quimioterápicos e no X CBH (1952), 3 de saneamento, 10 sobre

biocidas e 5 sobre quimioterapia.

Segundo Lima Sobrinho (1981), Costa (1986), Costa e Silva (1990) e Britto

e Lima (1991), havia ocorrido ainda na década de 20, um rompimento do DNSP (e

portanto, da SBH), com os ideais nacionalistas da Liga Pró-Saneamento do Brasil.

Adotou-se já naquela década, uma nova postura influenciada pela formação de novos

3. Inclusive nesse Congresso, o grande Engº Saturnino de Brito, apresentou um de seus excelentes trabalhos, "Como melhorar o
systema de esgotos do Rio de Janeiro" (pag. 35).
4. Os Anais do IV e VIII CBH, não foram encontrados.
5. A realização deste último congresso ocorreu após a introdução desses agentes químicos (sobretudo DDT), que representaram uma
mudança na forma de atuar no processo saúde-doença, no qual a terapia foi reforçada em detrimento da profilaxia.
48

sanitaristas - alguns dos quais participantes da Liga - na Universidade de John Hopkins,

nos EUA (Lima Sobrinho, 1981). A nova postura assumida por estes sanitaristas supunha

que apenas com o aumento per capita dos recursos investidos no setor saúde, faria o Brasil

um país desenvolvido, não levando em consideração as dimensões sócio-econômicas e

culturais. Essa linha de pensamento dominou o setor por muito tempo, tendo à frente o

grande higienista Barros Barreto.

Ainda em 1920, além das atividades de saneamento já mencionadas, o setor

saúde passou a assumir a responsabilidade pelos serviços de esgotos da Capital Federal.

Pois a Inspetoria de Esgotos desta cidade, criada em 1915, até então subordinada ao

Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas (Mivop), foi transferida para o Ministério

da Justiça e Negócios do Interior6, onde ficou subordinada ao Departamento Nacional de

Saúde Pública. A função desse órgão era a de fiscalização da The Rio de Janeiro City

Improvements Company Limited, a City, empresa privada concessionária dos serviços de

esgotos do Rio de Janeiro desde 1863. Enquanto a Repartição de Águas e Obras Públicas,

responsável pelos serviços de água, mantinha-se subordinada ao Mivop (Silva, 1988b).

Em 1924, foi criada a Inspetoria de Águas e Esgotos (IAE)7, subordinada ao

Mivop, responsável pelos serviços de água e esgotos de Distrito Federal, inclusive

assumindo a função de órgão fiscalizador da City.

Porém seis anos depois, a IAE foi transferida do Mivop para o Ministério da

Educação e Saúde Pública (Mesp)8, recém criado - mas regulamentado apenas em 1934. A

IAE, ficou subordinada à Diretoria de Defesa Sanitária, onde estavam situadas as ações de

saúde pública (Barreto, 1945). Em 1937, a IAE muda de nome passando a se chamar

6. Decreto Nº 14.354 de 15.09.1920.


7. Decreto Nº 16.711 de 23.12.1924.
8. Decreto Nº 19.515 de 22.12.1930.
49

Serviço de Águas e Esgotos do Distrito Federal (SAE)9, continuando subordinado ao

Mesp.

A estrutura do Mesp para o setor privilegiava a prestação de serviços

coletivos e de saúde pública, constantes de: Diretoria Nacional de Saúde e assistência

médico-sanitária; Diretoria da Defesa Sanitária Internacional e da Capital da República e a

Diretoria dos Serviços Sanitários nos Estados. Na Diretoria de Defesa Sanitária, ficaram as

ações de saúde pública e conseqüentemente, de saneamento, estas situadas na Inspetoria de

Engenharia Sanitária (Brasil, 1977).

Ainda em 1934, foram nomeados interventores de saúde10 nos estados para

atuar na criação ou reorganização dos Departamentos Estaduais de Saúde (DES), chegando

por vezes a chefiá-los. Até o início dos anos 40, o Departamento Nacional de Saúde (DNS)

(criado em 1937 em nova reformulação no setor saúde), teve ação direta em 19 estados da

federação.

Nos DES, em quase todos os estados, foram criados serviços de engenharia

sanitária pois, para Barros Barreto (1937), para a implantação de uma organização estadual

de saúde pública, "uma coluna básica deve ser a engenharia sanitária".

A partir de 1937, foi iniciado um processo de descentralização das ações de

saúde no Distrito Federal, com a criação dos Centros de Saúde (CS), a partir da experiência

bem sucedida do primeiro Centro de Saúde em Inhaúma (Lima Sobrinho, 1981). Foram

criados 12 CS’s, espalhados nas diversas regiões do Rio de Janeiro, que englobaram os

postos de saneamento rural. Também foram descentralizadas as ações de saneamento

através dos CS’s, que incluíam os Serviços de Saneamento e Polícia Sanitária (Fontenelle,

9. Lei Nº 378 de 13.01.1937.


10. A partir da Constituição de 1937, no Estado Novo, também os governadores eram interventores, nomeados pelo Presidente da
República.
50

1937). Essas ações eram de caráter normativo, fiscalizador, mas já perdia sua capacidade

executiva.

As ações de saneamento e polícia sanitária desenvolvidas pelos Centros de

Saúde eram no sentido de fiscalizar e melhorar as condições de higiene das habitações e

dos locais de trabalho. A higiene das habitações englobavam os problemas relativos à

iluminação, ventilação, à lotação e localização dos dormitórios, ao abastecimento de água,

remoção dos resíduos e dejetos e ao controle de moscas, ratos e mosquitos. Eram ações

sobretudo fiscalizadoras, mas também executivas.

Em 1941, o DNS assumiu uma característica mais de coordenação e menos

executiva, compatível com o seu caráter de órgão nacional. Inclusive repassando as

atividades no Distrito Federal para o município.

Dentre suas novas atribuições, foi criada a Divisão de Organização Sanitária

(DOS), responsável pela saúde pública, a qual continha a Seção de Engenharia Sanitária.

Esta Seção tinha como alçada todas as ações de saneamento que não eram realizadas pelo

Serviço Federal de Água e Esgotos (Sfae)11 e pela Seção de Pequena Hidráulica, do

Serviço Nacional de Malária, entre as quais (Barreto, 1942):

• cooperar com a Divisão de Obras do MES, na organização de projetos e


plantas para unidades sanitárias-padrão;

• estudo de problemas de saneamento, relativos à coleta e tratamento do


lixo;

• higiene das habitações e locais de trabalho;


• saneamento rural;

• instalações para beneficiamento de produtos alimentícios;


• controle da poluição atmosférica, etc.

11. Criado através do Decreto-Lei Nº 3.171 de 02.04.1941.


51

As ações do Sfae - órgão que substituiu o SAE - foram ampliadas, agora

com competência para atuar em todo o território nacional. No entanto, foram bastante

limitadas, sobretudo do ponto de vista da construção de sistemas, pois não foi criada uma

estrutura para dar suporte às suas novas competências, dependentes de recursos

orçamentários do DNS. A estrutura existente estava comprometida com as demandas do

serviço do Distrito Federal, mas ainda assim foram realizados inúmeros projetos para

sistemas de abastecimento de água e esgotos, vários deles na Região Norte através do

Programa de Saneamento da Amazônia implementado por Vargas e que foi incorporado

pelo Sesp (Barreto, 1943 e 1944).

Em 1945, o Sfae saiu da órbita da administração do Governo Federal e foi

repassado para a prefeitura do Distrito Federal12, perdendo, naturalmente, sua abrangência

nacional. Dois anos depois o Sfae foi transformado em Departamento de Água e Esgotos

(DAE), subordinado à Secretaria de viação e Obras do Distrito Federal, encampando

inclusive a Rio de Janeiro City Improvements Company Limite., após 84 anos de concessão

privada dos serviços de esgotos do Distrito Federal.

Analisando criticamente as deficiências na capacidade executiva do Sfae,

dependente de recursos orçamentários oriundos do setor saúde, Rosauro M. da Silva

afirma:

Serviço de Águas e Esgotos que, sob outras designações e com atribuições


mais amplas, havia sido das mais importantes Repartições do Império e dos
primeiros tempos da República, estava então abandonado à sua sorte,
inteiramente desprovido de recursos. Pensaram até em arrendá-lo e, por
incrível que pareça, houve quem quisesse!....
(Silva, 1988a: 43)

12. Decreto-Lei Nº 7.459 de 12.04.


52

Realmente, em 1942 quis o Sfae adjudicar os serviços do Distrito Federal,

inclusive chegando a publicar edital, segundo o argumento de que a extensão de sua

atuação a nível nacional não estava sendo possível naquele momento pelos encargos da

administração do serviço na capital (Barreto, 1943).

O DNS tinha ainda como órgãos executivos, os Serviços Nacionais de

Lepra, Tuberculose, Febre Amarela e o de Malária, responsáveis pelo controle de doenças

endêmicas, dos quais apenas este último desenvolvia ações de saneamento.

Em 1942, é criado o Serviço Especial de Saúde Pública (Sesp), órgão do

Ministério da Educação e Saúde. O Sesp em sua origem esteve subordinado diretamente ao

Ministro e não ao DNS, como poderia se esperar. O Sesp desenvolvia principalmente ações

de saneamento e assistência médica. Sua criação e sua continuidade representaram um

movimento contraditório em relação a forma hegemônica de atuar sobre o processo saúde-

doença. Numa conjuntura onde o uso de fármacos e biocidas era predominante, a

introdução de cuidados primários, medidas de saneamento e educação para saúde não era

priorizada. No entanto, como veremos a seguir, sua introdução foi estratégica para

viabilizar condições mínimas de vida (e produtividade) em áreas de grande interesse

econômico.

A Fundação Serviços de Saúde Pública (Fsesp)

A Fundação Sesp, originariamente Serviço Especial de Saúde Pública

(Sesp), foi criada em 1942 com o intuito de dar condições de salubridade a regiões

produtoras de insumos a serem utilizados na II Guerra. Inicialmente, na Bacia Amazônica e

depois na Bacia do Rio Doce, com o objetivo de apenas atender aos interesses norte-
53

americanos em caráter provisório. No entanto, o Sesp se consolidou e desenvolveu suas

atividades até 1991, quando foi transformado, junto com a Superintendência de

Campanhas de Saúde Pública (Sucam) e outros órgãos, na Fundação Nacional de Saúde

(FNS).

Houve, no entanto, imediatamente anterior à criação do Sesp uma tentativa

de sanear a Amazônia. No final de 1940, quando da visita de Vargas a esta região, decidiu-

se incluir um vasto programa de soerguimento econômico. A partir da análise de dados de

morbi-mortalidade da região, verificou-se a necessidade de instituir o Programa de

Saneamento da Amazônia, a ser implementado sob a responsabilidade do Departamento

Nacional de Saúde (DNS) / Ministério da Educação e Saúde (MES). Para tanto foi

instituída uma comissão para estudar sua implementação, chefiada por Barros Barreto. Os

Departamentos Estaduais de Saúde, dirigidos àquela ocasião por interventores do DNS,

seriam os órgãos responsáveis pela execução do plano, com os quais foram assinados

convênios, que incluíam assistência médica e saneamento.

As ações de saneamento nesse plano ficaram a cargo do Serviço Federal de

Água e Esgotos (Sfae), cujas atribuições foram ampliadas do Distrito Federal para todo o

território nacional, em abril de 1941, para viabilizar a participação desse órgão no

Programa da Amazônia. A Seção de Engenharia Sanitária do DOS / MES, não teria

condições de implementar este plano por suas limitações burocráticas e de infra-estrutura.

As ações do Sfae se limitaram a estudos e projetos, com a colaboração das

Inspetorias de Engenharia Sanitária dos DES. O Sfae chegou a realizar 27 estudos nos

estados do Pará, Amazonas e no território do Acre, incluindo abastecimento de água,

esgotos e drenagem para controle de malária (Barreto, 1942).


54

No início de 1942, o Sesp assumiu a coordenação do Programa de

Saneamento da Amazônia, decorrente de um hiato nas atividades devido à falta de recursos

do DNS (Barreto, 1943).

Paralelamente, ocorreu no Rio de Janeiro no período de 15 a 28 de janeiro

de 1942, a 3ª Reunião de Consulta de Ministros das Relações Exteriores das Repúblicas

Americanas (precipitada pelo ataque a Peal Harbor, em 07.12.1941). A 32ª recomendação

desta reunião estabeleceu o desenvolvimento de um amplo programa de saúde e

saneamento das Repúblicas Sul-americanas, que contaria com auxílio técnico e financeiro

dos EUA (Peçanha, 1976).

A ocupação japonesa no sudoeste da Ásia, que naquele momento era a

região de maior produção mundial de borracha e, o controle de fontes produtoras de

estanho, quinino, fibras e outras matérias-primas, pelo bloco alemão, agravou ainda mais a

situação. Havia uma necessidade de que o Brasil intensificasse a exploração de matérias-

primas indispensáveis aos esforços de guerra, o que justificou a ação na Amazônia. Para a

viabilização desta intervenção, fazia-se necessário a criação de infra-estrutura para

viabilizar a força de trabalho na extração da borracha (Peçanha, 1976 e Bastos, 1993).

Em março de 1942, foi realizado pelo Brasil e EUA um acordo de saúde e

saneamento13, em que o Presidente autorizou o Ministro da Saúde a desenvolver um

serviço de cooperação com aquele país. O contrato, denominado de Convênio Básico, era

composto de 12 cláusulas, sendo que a primeira delas se referia ao Serviço Especial de

Saúde Pública (Sesp)14, criado em julho do mesmo ano como unidade administrativa

mantida pelo Instituto de Assuntos Interamericanos (IAIA), dos EUA, e subordinado

13. Através do Decreto Nº 4.275 de 17.04.1942.


14. Decreto-Lei Nº 4.275, de 17.07.42.
55

diretamente ao Ministro da Educação e Saúde. Esse contrato com vigência até 31.12.1943,

previa ainda que o Serviço deveria ser dirigido por um médico do IAIA (Bastos, 1993).

Na América Latina, apenas Cuba e Argentina não fizeram acordo de

cooperação técnica com os EUA, entre 1942 / 1943. A política do IAIA se entrelaçava com

interesses a curto, médio e longo prazos de manutenção de reservas de matérias-primas do

continente para a indústria norte-americana e o avanço de seu domínio imperialista - e não

apenas restritos à guerra - tais como: cobre, estanho, zinco, tungstênio, chumbo, mercúrio

e outros, sisal, madeiras, nitrato, óleo vegetal, ferro, berilo, manganês, lã, couro, peles,

borracha, etc. (Pinheiro, 1992).

O Sesp foi formado por um grupo de veteranos da Fundação Rockefeller,

que atuaram no Serviço de Malária do Nordeste, na extinção do Anopheles gambiae,

mosquito transmissor da malária, que havia sido introduzido nesta região15. Incorporaram-

se também ao Sesp, os que atuaram no combate à febre amarela nas regiões Norte,

Nordeste e Centro-Oeste, também realizados pela Fundação Rockefeller.

As atribuições legais do Sesp eram (Bastos, 1993):

1. O saneamento do Vale do Amazonas, especialmente a profilaxia e os


estudos de malária e a assistência médico-sanitária aos trabalhadores
ligados ao desenvolvimento econômico da referida região;
2. O preparo de profissionais para trabalhos de saúde pública,
compreendendo o aperfeiçoamento de médicos e engenheiros
sanitaristas, a formação de enfermeiros de saúde pública e o
treinamento de outros técnicos;
3. A colaboração com o Serviço Nacional de Lepra, e por intermédio
deste, com as repartições sanitárias estaduais, para o combate à lepra.

A característica marcante na organização desses serviços era a rígida


disciplina e a sua estrutura determinada pelas campanhas de saúde pública e

15. O Serviço de Malária do Nordeste foi criado em outubro de 1938 pelo DNS e a partir de fevereiro de 1939, passou a contar com a
colaboração da Fundação Rockefeller. Em 30.06.1942, foi extinto o SMN, depois de erradicado o A. gambiae do Brasil (Barreto,
1943).
56

administração por projetos16. A influência norte-americana era marcante, tendo sido


inclusive, os dois primeiros dirigentes do Sesp oriundos daquele país e se estendia nos
níveis gerencial, político, econômico e doutrinário.

O caráter especial do Sesp permitiu considerável autonomia para gerir


recursos, admitir, demitir, transferir e treinar pessoal, ter uma política salarial própria,
independentemente do Ministério da Educação e Saúde. Este aspectos geraram conflitos

com o sistema de saúde, provocando reações do Departamento Nacional de Saúde, face ao


paralelismo de ações (Pinheiro, 1992).

Em 1943, interesses econômicos determinaram a necessidade de

manutenção de infra-estrutura nas zonas de extrações minerais e o Sesp passou a atuar em


Goiás, em áreas de extração de mica e cristal de rocha (Programa Mica). No mesmo ano
acordo semelhante levou o Sesp ao Vale do Rio Doce (Progama Rio Doce), para prestar

assistência aos trabalhadores da reconstrução da Estrada de Ferro Vitória - Minas, que


visava acelerar a exportação de minério de ferro17.

A primeira prorrogação do contrato para a continuação das atividades do


Sesp e a manutenção da colaboração do governo americano com o governo brasileiro
ocorreu em novembro de 1943 por um prazo de 05 anos18.

O Sesp, ao contrário do previsto, não acabou com o fim da II Guerra.


Peçanha (1976), enumerou os seguintes motivos para a continuidade de suas atividades:

1. multiplicidade de objetivos;

2. a existência de uma imensa demanda pelos seus serviços;


3. os recursos humanos dotados de grande motivação e habilidades
profissionais e o delineamento de uma doutrina.

16. Os demais Programas criados pelo Sesp, foram em 1943: Migração, que cuidava da população nordestina que imigrava para a
Amazônia para a extração da borracha; em 1949: Bahia, o do Nordeste, que incluía Pernambuco e Paraíba e o do São Francisco. Ainda
em 1949, é encerrado o do Vale do Rio Doce e em 1952, o do São Francisco.
17. Contrato assinado em 10.02.1943, Decreto. Nº 5.592, como previsto no acordo original.
57

Peçanha (1976), divide a história da ex-Fsesp em três fases, denominadas:

fase inicial, que vai de 1942 a 1949, a fase nacional, de 1950 a 1960 e a fase atual, a partir

de sua transformação em fundação até meados da década de 70, período de seu estudo, mas

que pode ser extendida até fins dos anos 80.

Na primeira fase, foram implementados os programas em áreas de interesse

específicos e ainda surgiram os programas cooperativos voltados para a suplementação das

ações das organizações estaduais de saúde (BA, PE e PB). Foi a fase da diversificação de

suas atividades para outras áreas, que não as iniciais.

Na segunda fase, a nacional, foram ampliados os convênios cooperativos.

Em 1951, foi realizado acordo entre o Ministério da Educação e Saúde (MES) e a

Comissão Vale do Rio São Francisco, com subsídios de novos convênios entre os EUA e

Brasil. O Sesp passava a administrar diretamente programas de saúde e saneamento em

Alagoas, Bahia, Pernambuco, Minas Gerais e Sergipe, através de recursos municipais,

estaduais, federais e externos. Na Engenharia Sanitária, passaram a ser firmados convênios

com os municípios e instituídos os Serviços Autônomos de Água e Esgotos (Saae’s). Até

1960, os recursos financeiros do Sesp estavam vinculados a convênios entre o Brasil e os

EUA, mas os convênios cooperativos foram diversificados e passaram a incluir recursos

das outras esferas de governo. Foi o período da consolidação institucional do Sesp.

Um aspecto interessante no Sesp foi a integração, numa mesma instituição,

de serviços e práticas de natureza preventiva e curativa, como as práticas de saneamento e

saúde. A integração dessas práticas reunia possibilidades de resolutibilidade dos problemas

sanitários, sobretudo em pequenas comunidades, à medida em que centralizava

conhecimentos e meios para intervir na realidade. Dessa forma, oferecia resistência à

fragmentação e descontinuidade entre o atendimento e o serviço (Pinheiro, 1992).

18. Prorrogação acordada em 25.11.1943 e publicada no Decreto. Nº 6.260 de 11.02.1944.


58

Outros aspectos positivos da Fsesp foram: integração ensino / pesquisa /

serviço; treinamento, reciclagem, capacitação e supervisão reiterada do pessoal técnico e

auxiliar, regime de tempo integral e dedicação exclusiva, além de um plano de carreiras

(Pinheiro, 1992).

A tese defendida por Pinheiro ao analisar a consolidação institucional do

Sesp revela:

É precisamente a vinculação estratégica do Sesp ao processo de acumulação


do capital no Brasil, que viabiliza sua vitalidade, modernidade, eficácia e
poder, retirando-o da vala comum de dificuldades enfrentada no meio da
saúde pública no País.

(Pinheiro, 1992: 140)

A terceira fase se inicia, segundo a autora, com a transformação do Sesp

em fundação. As assinaturas de sucessivos termos aditivos ao Contrato Básico, com o

IAIA permitiu que o acordo dos EUA com o Brasil fosse mantido até 1960.

Dois anos antes, havia sido enviada ao Congresso Nacional mensagem

presidencial, em regime de urgência, para a transformação do Sesp em fundação, fato que

só foi consolidado em abril de 1960, pelo Presidente Juscelino Kubitscheck. A Fundação

Serviço Especial de Saúde Pública (Fsesp)19, vinculada ao Ministério da Saúde e com

jurisprudência em todo o Brasil, passou oficialmente a ter caráter permanente, após quase

18 anos de sua criação (Peçanha, 1976).

Os objetivos da Fsesp firmados em sua nova estrutura, foram:

Organizar e operar serviços de saúde pública e assistência médico-


hospitalares, sistemas de abastecimento d'água e esgotos, nas áreas de todo
território nacional onde se desenvolva ou venha a se desenvolver programas
de valorização econômica, sempre que tais serviços não conste dos órgãos
federais específicos ....

19. Lei Nº 3.750 de 11.04.1960.


59

(Brasil, 1960)

Segundo Pinheiro (1992), o caráter supletivo caracterizado nos objetivos da

Fsesp lhe imputava uma característica de instabilidade, além da insistência em atrelá-la ao

desenvolvimento econômico nacional.

Advém de sua nova organização institucional a primeira crise financeira,

devido a sua principal fonte de recursos ter passado a ser o orçamento do Ministério da

Saúde (MS), além dos convênios com órgãos de desenvolvimento regional e estadual. Não

contando mais com recursos externos, o governo brasileiro não tinha mais a obrigação das

contrapartidas antes previstas nos contratos.

Os principais convênios firmados a partir de então foram o Plano Integrado

de Saúde do MS e programas para Promoção da Saúde do Nordeste, com a Agência

Americana para o Desenvolvimento Internacional (Usaid), OPS, Unicef, estados e

prefeituras.

Na área de saúde, devido à crise financeira decorrente da falta de repasses

dos recursos orçamentários pelo MS, foram extintos vários convênios e acordos com os

estados. No saneamento, no entanto, houve uma expansão das atividades, conseqüência do

modelo de gestão criado em 1952, os Serviços Autônomos de Água e Esgotos (Saae’s), e

ao financiamento conseguido junto ao BID, em 1966, que possibilitou a constituição de

inúmeros serviços.

Entretanto, em que pese a expansão dos Saae’s administrados pelo Fsesp,

alguns atos do Governo Federal afetaram suas perspectivas de ação. Em 1961, a

transformação do Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS) em autarquia,

dando-lhe atribuições para desenvolver ações de saneamento básico e a criação do Fundo


60

Nacional de Obras de Saneamento, faria convergir para o DNOS a maior parte dos recursos

financeiros destinados à expansão das redes de água e esgoto.

A transferência de poder para o DNOS, pelo Governo Federal foi

considerada um golpe na Fsesp, como se faz sentir pelo sentimento de desconsideração do

"extraordinário acervo de experiência e realizações da Fsesp" (Fsesp apud Pinheiro, 1992).

Desta forma, a Fsesp deixou de dar as diretrizes das políticas de saneamento no Brasil,

para uma posição secundária.

Um dos aspectos que parecem ter contribuído para a perda de poder da

Fsesp, foi a disputa corporativa entre médicos e engenheiros no Ministério da Saúde, onde

prevalecia a hegemonia médica. Em meados da década de 60, haviam cerca de 200

engenheiros sanitaristas na Fsesp, porém na composição da comissão que elaborou o

Decreto Nº 200 / 67, transferindo as atribuições relacionadas ao saneamento para o

Ministério do Interior, haviam seis representantes do MS, dos quais nenhum era

engenheiro. O aspecto corporativo parece ter sido relevante naquele momento, segundo

Cynamon (1986: 143):

A falta de progresso na implantação de sistema de água e esgoto, e o


permanente conflito entre a parte médica, líder da assistência e higiene no
Ministério da Saúde, e os engenheiros encarregados de Saneamento do
mesmo Ministério que se julgavam sempre tolhidos em sua ação e
preteridos nos recursos, fizeram com que, na Lei Nº 200, se levasse a
liderança do Saneamento para o âmbito do Ministério da Viação e Obras e,
mais tarde, para o Ministério do Interior.

Para se ter a dimensão das divergências existentes e a insatisfação dos

engenheiros da Fsesp com a hegemonia médica, foi articulada por um grupo de

especialistas uma saída coletiva do setor de saneamento da Fsesp. Segundo Rodolfo Costa
61

e Silva20 , este grupo defendia a unificação de todo o saneamento básico a nível federal no

DNOS. Seriam unificados o pessoal da Fsesp e do DNERu, ambos do MS. Os argumentos

para essa união seriam, além da racionalidade administrativa, a conjunção de esforços e a

implementação de uma política nacional, a insatisfação com a hegemonia médica e a sua

concepção de saúde, que segundo os engenheiros, preteria a prevenção e,

conseqüentemente o saneamento.

Mesmo com as divergências existentes entre as corporações, uma

contribuição importante do Fsesp, se deu na relação entre as ações de saúde e saneamento

desenvolvidas por este órgão, coerente com sua própria gênese. Freitas et allii (1990),

situam a ausência de parâmetros epidemiológicos nas ações de saneamento desenvolvidas

no Brasil, excetuando as desenvolvidas pela Fsesp e pelo DNERu. E de fato, diversas

ações de saneamento desenvolvidas pelo Sesp, tiveram parâmetros epidemiológicos em sua

definição. Vários trabalhos publicados, na própria Revista do Sesp, demonstram este

argumento. Podemos citar os trabalhos de Wagner (1947), onde o autor demonstra a

importância da engenharia sanitária no controle de endemias e relata inquérito sobre

verminoses realizado no Vale do Amazonas para definição de ações de saneamento. Ou os

de Miranda et allii (1948), que a partir da análise da prevalência de verminoses,

estabelecem modelos adequados de destino de dejetos e ainda, a partir de uma análise do

padrão endêmico, descrevem o tipo de abastecimento adequado ao Vale Amazônico.

Maroja et allii (1957), ao descrever um surto epidêmico de febre tifóide em Palmares, em

Pernambuco, descreve uma ação conjunta de saúde e saneamento rural. Milanez (1958),

cita os trabalhos de saneamento desenvolvidos integrados à saúde pública, no combate a

doenças, demonstra com gráficos a redução da mortalidade infantil após ações de saúde e

20. Entrevista concedida pelo Engenheiro Rodolfo J. da Costa e Silva, ex-engenheiro da Fsesp, em fevereiro de 1994, no Rio de
Janeiro.
62

saneamento do Sesp em algumas cidades no Brasil. Podemos citar ainda, Cynamon (1959),

que estabelece as condições epidemiológicas locais como base de prioridade para ações de

saneamento nas Unidades Sanitárias do Sesp. Naturalmente, estas análises se

desenvolveram dentro dos limites de um saber produzido num determinado momento

histórico e também a partir de uma concepção dos processos de saúde / doença. Contudo,

nem todas as ações desenvolvidas pela Fsesp se deram a partir do perfil epidemiológico,

até mesmo pelas dificuldades corporativas já apontadas.

As principais ações de saneamento desenvolvidas pela Fsesp foram (Bastos,

1993):

• Abastecimento e tratamento de água - soluções coletivas e individuais


(tecnologias convencionais e de baixo custo);

• Esgotamento sanitário e destino dos dejetos - soluções coletivas e


individuais (tecnologias convencionais e de baixo custo);

• Melhoria da habitação;

• Melhorias sanitárias domiciliares;

• Melhoria da habitação rural para controle da doença de chagas;

• Saúde ocupacional;

• Emergências e calamidades;

• Lavanderias e banheiros públicos;

• Planejamento de coleta e de destino final de lixo;

• Controle de vetores;

Os principais Estudos e Pesquisas Técnicas Desenvolvidas pelo Sesp / Fsesp

foram (Bastos, 1993: 426):

• Poço Amazonas para fonte de suprimento de água de pequenos


abastecimentos;

• Filtro dinâmico com capacitação para pequenas comunidades;

• Filtro rápido de fluxo ascendente (Clarificador de Contato);


63

• Filtro de fibra de coco e casca de arroz;

• Filtro lento de fluxo ascendente;

• Uso de fluorita nacional para fluoretação de água;

• Uso de mangueira flexível, como tubulação de recalque em poços


tubulares;

• Uso de material magnético no tratamento da água, em substituição ao


sulfato de alumínio e floculação na tubulação de recalque;

• Dispositivo prático para controle de perdas de água em torneiras


públicas;

• Uso de concreto poroso para construção de paredes filtrantes;

• Fabricação local de cimento de casca de arroz para construção de


facilidades de saneamento e melhoria das habitações;

• Uso de calcário natural para a correção de pH de água;

• Privadas sanitárias usando o bambu como reforço das lages de concreto,


blocos de argila e casca de arroz para paredes e telhas de tronco de
palmeiras;

• Sistema de esgoto não convencional, simplificado, com tubulações de


pequeno diâmetro;

• Utilização de efluentes tratados de esgoto, como irrigação superficial;

• Exames bacteriológicos simplificados;

• Uso de catavento como força motriz para bombas;

• Floculação com areia;

• Utilização de magnezita para tratamento de água;

• Lagoas de estabilização para tratamento de esgotos;

• Poço combinado para pequenas comunidades;

• Utilização de material poroso;

• Floculador de material granular;

• Filtro lento de fluxo ascendente como pré-filtro de pedra;

• Determinação da relação entre consumo de água e vazão de esgoto;

• Utilização de fluorita em leitos de contato para fluoretação de água;

• Redes de esgotos de pequeno diâmetro;

• Investigação sobre utilização, utilidade e eficiência dos serviços de água


e esgoto (OPS);
64

• Clarificador de Contato (Filtro Russo);

• Turbidímetro de tubo plástico;

• O uso de ponteiras para a capitação de água;

• Experiência sobre Serviço de água e esgoto em Governador Valadares.

O Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERu)

O Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERu) foi criado em

195621, substituindo e agregando os antigos Serviços Nacionais de Malária, Peste e Febre

Amarela. O órgão continha em sua estrutura organizacional a Seção de Engenharia

Sanitária para atuar "destacadamente, na esquistossomose [onde] o saneamento assume a

maior prioridade, no estado atual da conjuntura técnico-administrativa do DNERu"

(DNERu, 1962: 65). Sendo as ações desta Seção referentes a projetos e execução de

serviços de saneamento, exclusivas para os municípios atingidos pela esquistossomose

(DNERu, 1962).

A criação de uma Seção de Engenharia Sanitária no DNERu tem, no

entanto, origem mais remota no antigo Serviço Nacional de Malária (SNM)22. Neste

Serviço existia a Seção de Pequena Hidráulica, que desenvolvia ações de saneamento

especificamente para controle de malária. As principais ações eram de controle de

enchentes e alagados, através de drenagem, correção de rios, canais, córregos, aterros,

dragagens, etc.

Para se ter uma idéia das ações de saneamento desenvolvidas pelo SNM,

listamos suas atividades no ano de 1947, para o Brasil (Fróes, 1948):

21. Lei Nº 2.743 de 06.03.1956.


22. Criado através do Decreto Lei Nº 3.672 de outubro de 1941.
65

• Cursos d'
água retificados 12.856 m

• Coletores superficiais construído 78.588 m

• Drenos profundos construído 5.320 m

• Coletores em alvenaria 17.134 m

• Coletores superficiais com calhas 27.264 m

• Coletores revestidos em madeira 4.921 m

• Limpeza de cursos d'


água 2.866.509 m

• Conservação de cursos d'


água 18.050.537 m

• Aterro 1.984.710 m3

• Outros serviços de pontes, bueiros, diques, etc.

Devido às demandas surgidas em relação ao abastecimento de água e

esgotamento sanitário nas cidades em que eram realizadas ações para o controle da

malária, foi dada prioridade a estas ações, em detrimento às realizadas para o controle

dessa endemia.

As ações de saneamento básico foram desenvolvidas sob a chefia de

Chapadeiro23, a partir de trabalhos desenvolvidos no estado do Ceará pelo SNM. Os

poucos recursos existentes eram dispersos em serviços gerais de drenagem, enquanto a

população não tinha sequer provimento de água para beber. Este aspecto levou a que esse

engenheiro sugerisse a construção de sistemas de abastecimento de água em detrimento

dos demais. Assim, foram construídos alguns sistemas no estado do Ceará e em outros

estados.

O então chefe do Serviço Nacional de Malária, Mário Pinotti, ficou

entusiasmado com os resultados obtidos e, quando Ministro da Saúde no Governo

23. Entrevista concedida pelo Engenheiro Clarismundo Chapadeiro, ex-chefe da Seção de Engenharia Sanitária do DNERu, em julho
de 1993, no Rio de Janeiro.
66

Juscelino, convidou Chapadeiro para criar no DNERu, uma seção para desenvolver ações

de saneamento.

O setor de saneamento no DNERu representa uma continuidade das

atividades desenvolvidas pela Seção de Pequena Hidráulica do Serviço Nacional de

Malária. No entanto, uma característica importante difere os dois órgãos - a concepção de

controle das endemias. O saneamento no DNERu, foi constituído para atuar

conjuntamente às ações de controle da esquistossomose, passando o controle de malária a

não mais utilizar medidas de saneamento. Parece ter havido uma transformação na forma

de controle desta endemia, optando-se exclusivamente pelo uso de inseticidas para o

combate aos anofelinos. Esta opção reflete a forte pressão existente para o uso do DDT nos

programas de malária.

Para ilustrar a inflexão ocorrida no controle das doenças, principalmente as

endêmicas, com o surgimento dos biocidas após a II Guerra Mundial - em que as ações de

saneamento perderam prioridade - vejamos como o diretor do Departamento Nacional de

Saúde (DNS) em 1948, encarava essas novas perspectivas do uso de inseticidas no

combate à malária:

No que diz respeito ao fundamental problema da malária, rebaixadas


logicamente a um plano secundário as custosas medidas de engenharia
sanitária e atividades correlatas, cada vez mais se acentuam o êxito
decorrente da aplicação racional dos inseticidas modernos....
(Fróes, 1948: 08)

Em 1958, foi instituído no DNERu, o Grupo de Trabalho de Erradicação da

Malária (Gtem)24, por influência norte-americana, com o objetivo de organizar e dirigir a

erradicação da malária, com uso exclusivo e maciço de DDT. O Gtem se constituiu num

24. Decreto Nº 43.174 de 04.02.1958.


67

órgão paralelo ao DNERu, sendo posteriormente transformado em Campanha de

Erradicação da Malária (CEM)25.

Com a criação do DNERu, este órgão ficou com as ações mais executivas,

enquanto o Departamento Nacional de Saúde, caracterizou-se mais como um órgão

normativo. Este fato gerou conflitos com o DNS, que naturalmente perdeu poder com a

criação do DNERu como órgão paralelo (o que já havia ocorrido com a criação do Sesp).

Além dos conflitos com o DNS, também o Sesp se sentiu desprestigiado,

principalmente o setor de saneamento, com o qual o DNERu passou a concorrer nos

projetos e construção de sistemas.

As principais ações de saneamento desenvolvidas pelo DNERu eram

sistemas de abastecimento de água, fossas, lavanderias e banheiros públicos. No entanto,

sua Seção de Engenharia Sanitária não tinha estrutura suficiente para desenvolver todas

essas funções e, na ausência de um órgão que definisse uma política nacional de

saneamento, acabava por desenvolver atividades que não estavam definidas dentro de suas

prioridades. Mesmo assim, o DNERu construiu vários sistemas de abastecimento de água

no interior do Brasil, principalmente no Nordeste e em Minas Gerais, com o objetivo de

controle de endemias. Eram utilizados padrões epidemiológicos, principalmente quanto à

esquistossomose, para a definição de suas prioridades, como ocorreu através da utilização

do inquérito realizado por Pellon / Teixeira, em 1949, no qual foi estudada a prevalência de

esquistossomose em escolares no Brasil.

Diversas eram as dificuldades dessa Seção de Engenharia Sanitária do

DNERu dentro da estrutura do órgão, que iam desde a falta de recursos financeiros à

insuficiência de pessoal técnico. De modo geral, o DNERu projetava e construía os

sistemas de abastecimento de água e os entregava às prefeituras para a operação. Porém, a

25. Lei Nº 4.709 de 28.07.1965.


68

maioria dos sistemas em pouco tempo tornavam-se ineficientes, diante da incapacidade dos

municípios em operá-los, visto que o DNERu não tinha estrutura para prestar-lhes

assistência técnica. Isto fazia com que apenas os sistemas menos complexos funcionassem

a contento. Esse aspecto corroborava a idéia, já em execução, do modelo de gestão dos

serviços autônomos (Saae’s), de que os serviços de saneamento deveriam ter estrutura

própria para atuar e desenvolver satisfatoriamente seus serviços, como estava

desenvolvendo a Fsesp (DNERu - 1962).

As ações de saneamento do DNERu foram sendo paulatinamente reduzidas

a partir do momento em que o BNH assumiu a coordenação das políticas para o setor

(1967), até a extinção do órgão em 1970.

O DNERu teve uma atuação que buscava intervir de forma integrada entre

as ações de saúde e saneamento, sobretudo no controle da esquistossomose. E isto se deu

apesar das carências de recursos humanos e financeiros e também de sua capacidade

operacional.

A partir de 1970, com a fusão do DNERu e das antigas Campanhas de

Erradicação da Malária e da Varíola na Superintendência de Campanhas de Saúde Pública

(Sucam), não mais se realizariam ações de saneamento para controle sistemático de

endemias. Desta forma, cristalizou-se uma concepção de controle de endemias através de

campanhas e do uso dos quimioterápicos e biocidas. Este aspecto, associado ao modelo

empresarial adotado pelo BNH / Planasa, que atuava quase exclusivamente utilizando

recursos retornáveis do FGTS, e não mais com recursos retornáveis e, que não atuava em

saneamento rural, dificultou o controle das endemias.

Apenas a Fsesp realizava ações de saneamento no Ministério da Saúde, mas

não era articulado sistematicamente com a Sucam para controle de Endemias. A Fsesp teve

participação significativa apenas no Programa Especial de Controle da Esquistossomose


69

(Pece), conduzido pela Sucam a partir de 1978. Foram construídos alguns sistemas de

abastecimento de água e melhorias sanitárias, mas a principal ação era a construção das

privadas de fossa seca, cujos resultados foram precaríssimos (Bastos, 1993)

Na Sucam o controle das endemias, apesar de unificado por um mesmo

órgão, continuava a se dar de forma estanque, por endemia, sem interação entre as ações

propostas para cada doença em particular e de forma totalmente verticalizada.


70

4. O declínio do saneamento no setor saúde -


décadas de 70 e 80

Até a década de 60, a Fsesp desenvolvia ações executivas na ausência de

uma política nacional de referência, que as norteassem, tanto em saúde quanto em

saneamento. A partir de 1967, com a instituição de políticas nacionais, surgiram dilemas e

cobranças quanto ao seu papel (Peçanha, 1976).

O Ministério da Saúde, apesar de reconhecido oficialmente como órgão

formulador da Política Nacional de Saúde, através do Decreto Nº 200 / 67, perdeu poder

dentro do modelo previdenciário de assistência médica, implementado através do Instituto

Nacional de Previdência Social (INPS), controlador dos recursos financeiros e melhor

dotado para conduzir o projeto privatista em curso do Estado brasileiro.

Ampliava-se a dicotomia entre saúde pública - centralizada no MS - e

assistência médica - centralizada no INPS. Doravante, a atenção médica ocuparia mais

espaços na saúde, enquanto o MS seria confinado apenas a desempenhar "funções

burocrático-normativas" (Luz, 1978: 148 apud Pinheiro, 1992), esvaziado tanto em

competências quanto em recursos.

Ao final da década de 1960 e na primeira metade da década de 70, a política

governamental definia-se claramente pela expansão do processo de privatização no

atendimento às demandas do setor saúde. Este processo refletia-se também na relevância

dada ao saneamento, visto sua inserção no campo da saúde pública.

Para se ter uma idéia do deslocamento de recursos do setor preventivo para

a assistência médica dentro do orçamento do MS, vejamos a participação neste orçamento

do segmento preventivo em vários momentos históricos (Pinheiro, 1992):


71

• 1949 - 87%
• 1965 - 64%

• 1969 - 41%

• 1975 - 30%

• 1982 - 15%

As ações de saneamento do Ministério da Saúde foram reduzidas, refletindo

a opção pelo modelo assistencial / privatista, como demonstram historicamente os dados

apresentados acima.

Com a reforma administrativa realizada em 1970, efetivada em diversos

ministérios, as ações preventivas em saúde se situaram na Secretaria de Saúde Pública, no

âmbito do Ministério da Saúde. Nesta, o saneamento ficou subordinado ao Departamento

Nacional de Profilaxia e Controle de Doenças, através da Divisão de Engenharia Sanitária.

Uma outra tentativa de esvaziamento do setor de saneamento da Fsesp

ocorreu na gestão Francisco de Paula da Rocha Lagoa, no MS, onde houve a transferência

da quase totalidade dos funcionários da Divisão de Engenharia Sanitária da Fsesp para a

recém criada Divisão Nacional de Engenharia Sanitária do MS26. Tencionava com esta

medida, trazer para o MS a execução direta ou mesmo indireta das principais atividades de

engenharia sanitária. No entanto, com a saída do Ministro, a proposta não foi concretizada,

embora o dilema tenha permanecido.

Em abril de 1973, foi firmado acordo entre o Ministério da Saúde e o

Ministério do Interior, com a interveniência do BNH, através do qual a Fsesp passaria a

executar progressivamente as diretrizes do Planasa. Esse acordo previa a transferência dos

sistemas municipais administrados pela Fsesp para as companhias estaduais de

saneamento, (Pires e Monteiro apud Peçanha, 1976). Efetivamente, alguns municípios

26. Decreto Nº 66.623 de 22.05.1970.


72

conveniados com a Fsesp concederam seus serviços às respectivas companhias estaduais,

entre eles Joinville, Blumenau, Parnaíba, Ilhéus, Feira de Santana, Umuarama e Ponta

Grossa. Com este acordo, a Fsesp perdia não só a gestão dos Saae’s, como ficava

praticamente destituída de ações de assistência técnica, pesquisa e desenvolvimento. Desse

modo, o Planasa, visto inicialmente com entusiasmo pelos sespianos, propiciou o

esvaziamento do MS no que se refere às ações de saneamento e, conseqüentemente, da

própria Fsesp, que teve sua atuação restrita às pequenas cidades e à área rural.

Segundo Pinheiro (1992), a instituição não voltaria mais a ocupar o espaço

de destaque que havia alcançado, nos anos 50 e 60. Desse modo, o significado econômico

e político da Fsesp, posteriormente a 1974, é restrito e subordinado.

O Ministério da Saúde, já há muito tempo atuava em saneamento apenas

como órgão normatizador, pois até mesmo sua capacidade de órgão fiscalizador, através da

vigilância sanitária era insignificante, ocasionada pela falta de recursos humanos e

financeiros.

A organização das ações de saneamento nas secretarias de saúde a nível de

estados e municípios era precária e restringia-se apenas a ações normativas e

fiscalizadoras. A falta de recursos e de uma política clara de desenvolvimento de ações de

saneamento no setor saúde parece ter contribuído para o distanciamento entre a

coordenação dessas ações. A ausência de definições políticas teve como conseqüências a

incapacidade técnica e administrativa, levando os serviços de saúde a ações apenas

normativas com relação ao saneamento. As esporádicas intervenções executivas referem-se

ao Programa Integrado de Ações de Saúde e Saneamento (Piass), no Nordeste, o Programa

Especial de Controle da Esquistossomose (Pece) e o Programa Nacional de Saneamento

Rural - PNSR, todos com ações muito limitadas em saneamento. Este fato levou a um
73

quadro precário nos programas de controle de endemias, demonstrando a fragilidade do

modelo centrado no uso de fármacos e biocidas.


74

5. As ações de saneamento no Sistema Único de Saúde

A discussão sobre as ações integradas de saúde e de saneamento têm como

palco a esfera municipal, principalmente após a descentralização das ações de saúde, a

constituição de 88 e a Lei Orgânica da Saúde.

A constituição de 88 determina claramente em vários artigos:

• A competência do município para "promover programas de melhorias


das condições de saneamento básico" (art. 23; item IX);

• "Legislar sobre assuntos de interesse local, organizar e prestar,


diretamente ou sobre regime de concessão ou permissão, os serviços
públicos de interesse local" (art. 30; itens I e V);

• Como competência do SUS: "a participação na formulação da política e


da execução das ações de saneamento básico" (art. 200; item IV).

A Lei Orgânica da Saúde (LOS), aborda claramente o saneamento e o

cuidado com o ambiente, como ações de saúde, quando:

• No art. 3º, afirma que "a saúde tem como fatores determinantes e
condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento
básico, o meio ambiente, ...";

• No art. 6º, afirma-se que no campo de atuação do SUS estão incluídas a


vigilância sanitária e a epidemiológica e as define como: (parágrafo 1o.)
"entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações capaz de
eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e intervir nos problemas
sanitários decorrentes do meio ambiente, ...";

• E ainda, no art. 7º, afirma que as ações do SUS devem obedecer os


seguintes princípios (item VII): "utilização da epidemiologia para o
estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação
programática e (item X) "integração em nível executivo das ações de
saúde, meio ambiente e saneamento básico".

A nível da LOS está colocado claramente que as ações de saneamento

básico devem estar integradas às ações de saúde, dado o seu caráter preventivo, devendo

ser utilizados indicadores epidemiológicos para se estabelecer prioridades na alocação de

recursos. Porém, no capítulo que trata do financiamento, determina que os recursos para as
75

ações de saneamento devem originar-se de outras fontes que não as do SUS. Condiciona,

na prática, a uma integração com os demais órgãos que atuam junto ao setor saneamento. O

que, como vimos, não ocorre atualmente.

Com relação às ações do Governo Federal nos anos 90, relacionando saúde

e saneamento, tivemos duas iniciativas mais relevantes. A primeira, a partir de 1989,

através da ex-Sucam e a partir de 1991 com a Fundação Nacional de Saúde (FNS), que

incorporou a própria Sucam a Fsesp e o Datasus, foi a Programa de Controle de Endemias

do Nordeste (Pcden). Este Programa basicamente também centrou-se no uso dos fármacos

e biocidas para o controle da doença de chagas, leishmaniose e da esquistossomose.

Apenas em alguns estados foram realizadas melhorias habitacionais para o controle de

chagas.

Em 1995, foi realizada uma avaliação nacional deste Programa, conduzida

pela Escola Nacional de Saúde Pública e realizada por instituições de pesquisa nos estados,

que teve como conclusão, que apesar de ter havido redução nos patamares de prevalência

da esquistossomose, não se atingiu as metas propostas. A principal meta era atingir em

80% das localidades trabalhadas, prevalência menor que 5%. Os resultados ficaram longe

desta meta. E em muitas localidades houve recrudescimento da prevalência. Ficou latente

também a incapacidade da FNS para controlar as endemias, apontando para a

descentralização desta função.

Em 1995, foi lançado pelo Governo Federal, o Programa de Ação Social em

Saneamento (Pass), que prevê investimentos em saneamento com a utilização de recursos

orçamentários, majoritariamente da União, mas também dos estados e municípios. Estes

recursos serão alocados nos municípios que estiverem circunscritos no Programa de

Redução da Mortalidade Infantil, do Ministério da Saúde e do Programa Comunidade

Solidária. São cerca de 900 municípios que poderão ter acesso a estes recursos. Do ponto
76

de vista da definição de prioridade foram utilizados parâmetros de nível de miséria e da

mortalidade infantil, extremamente positivos. E a articulação entre o Ministério do

Planejamento e Orçamento, que coordena as ações de saneamento a nível federal, com o

Ministério da Saúde também é uma ótima iniciativa. No entanto, em 1996, poucos recursos

dos que estavam previstos foram aplicados efetivamente, havendo dificuldades de

ocorrerem os desembolsos previstos, devido aos cortes frequentes no orçamento da saúde.

Um aspecto importante no atual cenário é o processo de descentralização do

SUS, inclusive no que se refere ao controle de endemias. O nível estadual está assumindo

da FNS, o papel de coordenador deste controle e, conjuntamente com os municípios será o

executor das ações. Na medida em que a titularidade pelos serviços de saneamento é dos

municípios, abre-se espaço para que haja uma intervenção mais articulada do poder

público. E as instâncias de participação da sociedade, como os Conselhos Municipais de

Saúde, têm um papel importante para a propiciar a articulação entre as ações.


Parte II

O setor saneamento no Brasil


78

1. Introdução

Podemos definir diferentes fases no setor saneamento do Brasil associados

aos modelos de gestão adotados. Estas fases não tiveram, necessariamente, uma nítida

seqüência cronológica, havendo períodos de superposição de mecanismos de organização

dos serviços e das políticas adotadas, mas com claros arranjos institucionais que as

identificavam. Algumas fases são caracterizadas pela mudança na forma de organização

dos serviços, não implicando necessariamente que a forma anterior deixou de existir, mas

que este novo mecanismo se insere como um novo paradigma para o setor.

Podemos identificar sete fases por que passou o setor saneamento brasileiro

ao longo da sua história.

A primeira fase se deu no período colonial, onde a principal característica

era a quase ausência do Estado com relação às ações de saneamento. Neste período as

soluções eram prioritariamente individuais, sendo a atividade do Estado, via as câmaras

municipais, quase exclusivamente drenagem das áreas urbanas. O abastecimento de água

era incipiente, quase todo individual diretamente nos mananciais, e através de algumas

fontes e chafarizes que atendiam a uma população restrita.

A segunda fase, se caracteriza pela concessão de serviços de água e esgotos

à iniciativa privada. Esta fase é iniciada em meados do século passado, se estendendo até

o início deste século. Neste período, os municípios ainda não estão consolidados

institucionalmente, assumindo os governos estaduais a concessão e a encampação dos

serviços prestados pela iniciativa privada. Esta experiência não obteve resultados

satisfatórios, principalmente quanto à expansão das redes. Propiciou a construção de

sistemas em diversas cidades, mas a população atendida se restringiu aos núcleos centrais.
79

A terceira fase, se caracteriza através da assunção pelo Estado dos serviços

de saneamento, a partir do rompimento das concessões à iniciativa privada. Este período

se estende até a década de 40 aproximadamente. A má qualidade dos serviços prestados

pelas empresas privadas estava gerando grandes manifestações, levando à encampação das

mesmas, que ocorrem majoritariamente até o início dos anos 10. O Estado neste momento

já está mais apto a administrar diretamente seus próprios serviços, sendo constituídas

repartições ou inspetorias para tanto. A atuação de Saturnino de Brito, considerado o pai da

Engenharia Sanitária nacional, também ocorre neste período, contribuindo para a

construção de diversos sistemas de água e esgotos no Brasil, assim como de diversas outras

contribuições relevantes, consolidando um saber nacional nesta área.

A quarta fase é marcada pela busca de autonomia dos serviços,

comparativamente à administração direta, o que se deu com a constituição das autarquias e

de mecanismos de financiamento para abastecimento de água. Esta fase ocorre na década

de 50. A partir de críticas à burocracia, à dependência de recursos orçamentários e do caixa

único, são criados os serviços autônomos de água e esgotos pelo Serviço Especial de Saúde

Pública (Sesp) e alguns departamentos estaduais de saneamento, bem como mecanismos de

financiamento, através de fundos estaduais e empréstimos à bancos estaduais e federais.

Nesta fase foi criado também o primeiro mecanismo para financiamento do setor

saneamento no Brasil, através do Plano de Financiamento de Serviços Municipais de

Abastecimento de Água, durante o Segundo Governo Vargas. A participação de órgãos

federais constituídos neste período também fomentou o desenvolvimento do setor (Fsesp,

DNOS, Dnocs, DNERu e outros).

A quinta fase é caracterizada pela busca de uma autonomia ainda maior,

através de um modelo de gestão empresarial, que se implementa sob a forma de

companhias mistas, principalmente a nível estadual. Este processo é típico da década de


80

60. As exigências para empréstimos efetuadas pelo BID e pela Sudene, além da criação do

sistema financeiro do saneamento, via BNH, foram determinantes nesta direção. Buscou-se

através de parâmetros racionais, a eficiência e a alocação de recursos retornáveis,

viabilizando a expansão da oferta dos serviços. A autarquização dos serviços também

progrediu neste período, reduzindo bastante a participação da administração direta como

forma de organização nestes serviços.

A sexta fase tem o marco inicial com o Plano Nacional de Saneamento

(Planasa), em 1971 e se estende até 1990. Sem dúvidas, um divisor de águas no setor, o

Planasa incorporou os valores que estavam se consolidando desde a década de 50, como a

autonomia dos serviços, a auto-sustentação tarifária, o financiamento com recursos

retornáveis, e a gestão através das companhias estaduais de saneamento. Uma característica

marcante neste modelo é a grande canalização de recursos do FGTS, o aumento na

cobertura dos serviços de abastecimento de água, a pouca elevação dos índices de

esgotamento sanitário, a exclusão de outras ações de saneamento e a centralização

autoritária nas companhias estaduais, excluindo o poder local de qualquer participação no

processo decisório. A estrutura montada na década de 70, apesar do fim do Planasa em

1990, se mantém, pela inércia, sem mudanças significativas até hoje.

A sétima fase se caracteriza pelo retorno das concessões privadas dos

serviços de água e esgotos na década de 90. Um aspecto relevante deste período também é

a polarização entre o fortalecimento da autonomia do município enquanto titular dos

serviços de saneamento, após o esgotamento do modelo das companhias estaduais e as

concessões privadas. Este último período tem como marco a primeira concessão completa

dos serviços de água e esgoto para uma empresa privada, no município de Limeira, em

1994. No entanto, esta fase não está consolidada. Aponta claramente para uma tendência
81

de ampliação das concessões, no entanto, ainda não está definida que forma, que amplitude

e que impactos terá.


82

2. Água vai! - O saneamento no Brasil Colônia

Desde o descobrimento do Brasil até o século XVIII, as ações de

saneamento desenvolvidas pelo Estado diziam respeito, sobretudo, à drenagem, e em

menor escala, ao abastecimento de água. As ações de drenagem consistiam em abertura de

pequenos canais e aterros para o enxugamento da área urbana em processo de expansão.

Estas ações eram realizadas no sentido de possibilitar o assentamento humano. Com

relação ao abastecimento de água da população, eram construídas fontes e chafarizes.

As demais ações de saneamento, como abastecimento de água para a

maioria da população, a remoção dos dejetos e do lixo eram resolvidas individualmente. A

pequena concentração da população e a maior facilidade de acesso a fontes naturais de

abastecimento de água e locais para destino dos resíduos, viabilizava a solução individual

como satisfatória nas cidades em formação.

As necessidades para o abastecimento de água eram supridas com o

transporte manual ou em lombo de animais, nos córregos ou rios mais próximos, nas

fontes, ou ainda, em poços escavados. Naquela época, a distância das residências às fontes

não eram intransponíveis nas áreas urbanas mas, à medida que as cidades iam crescendo,

os mananciais tornavam-se insuficientes e a necessidade de transporte de água a distâncias

maiores era crescente.

As águas servidas eram lançadas nas ruas, assim como o lixo. Não haviam

banheiros nas residências mas, geralmente, um quarto nos fundos das casas, chamados de

quarto das bilhas ou quarto dos potes, onde se localizavam os tonéis ou barris destinados

ao armazenamento dos resíduos. Algumas câmaras de vereadores - como as de Recife e do

Rio de Janeiro - chegaram a emitir atos obrigando as pessoas a gritarem a expressão água
83

vai!, antes de lançarem os dejetos pela janela para não atingirem aos desavisados (Silva,

1988b)! Este fato mostra bem a noção de higiene vigente naquele período.

Num momento posterior, os escravos - quem os possuía - faziam o

transporte das imundícies das casas através de barris carregados sobre a cabeça, para jogá-

las no mar ou em local ermo. Estes escravos eram chamados de tigres. Em outros casos,

havia serviços informais ou pessoas pagas para fazer o transporte dos dejetos (Silva,

1988b). Portanto, os que nada tinham, se desfaziam dos resíduos nas proximidades de suas

moradias, estando mais sujeitos a riscos. Com relação aos trabalhos dos tigres, Freitas

(1925: 139), relatou assim o serviço dos escravos no Recife:

Todas as matérias excrementícias e parte das águas que servem a usos


domésticos, depois de passarem nas casas muitas horas e dias, são
conduzidas ao rio em cabeças de escravos; aquelas em velhos barris e estas
em gamelas e tachos, etc. Por vezes os barris que servem de depósitos a
materiais excrementícias, em seu transporte, largam os fundos, e os que eles
contêm depois de emporcalharem aqueles que o conduzem torna nojentas as
ruas.

As primeiras ações realizadas pelo Estado destinadas ao abastecimento de

água da população, foi centrada na construção de chafarizes próximos às próprias fontes. A

partir do século XVIII, houve a necessidade de transportar a água de mananciais mais

distantes até pontos que permitissem o acesso da população à água. Então foram

construídos aquedutos com a distribuição em chafarizes públicos nas regiões mais centrais

dos núcleos urbanos. A distribuição domiciliar aconteceria apenas no século seguinte.

No entanto, as primeiras obras de grande porte realizadas pela engenharia

sanitária no Brasil datam do século XVII, não foram realizadas pela Coroa portuguesa e

sim pelos holandeses, quando da invasão. Os holandeses se destacavam nas obras de

hidráulica e, quando da chegada ao Brasil de Maurício de Nassau, em 1636,

acompanharam-no vários técnicos em hidráulica.


84

Em Recife, capital holandesa nas américas, no período de 1637 a 1644,

foram realizadas as primeiras obras hidráulicas, que incluíam drenagem, dessecamento de

terras, construção de diques, canais e ancoradouros (Azevedo Netto, 1986).

No Brasil, a administração portuguesa considerava a obtenção e distribuição

de água atribuição exclusiva de cada vila. Nas atividades econômicas cuja produção

necessitava água, como no caso do açúcar, era criada infra-estrutura específica, como por

exemplo o transporte de água para as rodas-d'


água dos engenhos (Mercedes Benz do

Brasil, 1991).

No período colonial, as principais obras de abastecimento de água foram os

aquedutos e chafarizes públicos. O primeiro sistema construído, em 1723, na cidade do Rio

de Janeiro, fazia a adução do Rio Carioca e sua distribuição, inicialmente, no chafariz do

atual Largo da Carioca. Nessa mesma cidade, foram construídos vários outros chafarizes

até a construção de rede para abastecimento domiciliar. Esta obra foi autorizada pela

câmara municipal, tendo sido contratado um engenheiro militar para realizá-la.

Provavelmente foi a primeira solução coletiva do Estado brasileiro, com o objetivo de

garantir o abastecimento de água aos cidadãos (Silva, 1988a e Azevedo Netto, 1984 e

1986).

Na cidade de São Paulo, o primeiro chafariz público foi construído em

1744. A obra foi realizada pelos franciscanos, com financiamento parcial através de

recursos autorizados pela câmara municipal. Foi construído um chafariz interno ao

convento e outro externo para o público (Sabesp, 1988). Vários chafarizes foram

construídos depois deste período.

Em Ouro Preto, no auge da exploração do ouro, entre 1720 a 1740,

construíram-se inúmeros chafarizes, sendo a maioria através da câmara municipal. Em


85

1800, havia cerca de 16 chafarizes, número bastante significativo para o tamanho da cidade

(Mercedes Benz do Brasil, 1991).

Em Porto Alegre, o primeiro registro oficial de abastecimento público foi a

construção de duas fontes em 1779, a partir de decisão da Câmara Municipal. Até meados

do século seguinte várias outras se fizeram construir (Pereira, 1991).

No período colonial, o suprimento de água se dava individualmente,

diretamente nos mananciais, ou via a adução e a distribuição nos chafarizes. A construção,

manutenção e administração desses chafarizes eram feitas pelas respectivas câmaras de

vereadores. Neste período, não havia prefeitos e sim intendentes municipais nomeados

pelas câmaras (Viana, 1977).

No Brasil Colônia, a estrutura de poder era composta hierarquicamente por:

rei (em Portugal), governador-geral (vice-rei, que administrava a colônia), o capitão-

general ou governador (nas capitanias) e as autoridades municipais. As atribuições dos

municípios eram mal delimitadas, fazendo com que estes ficassem submetidos ao papel de

braço administrativo da centralização monárquica - até meados do séc. XVIII. A elevação à

categoria de vila (municípios), habilitada a possuir câmara, dependia da vontade régia.

Nessas, a autoridade maior era o juiz de fora, sendo os juízes ordinários e vereadores (de 3

a 4 por câmara), eleitos. Eram confusas e ambíguas as funções de administração, da justiça,

e do legislativo, etc. As Câmaras eram reduzidas, portanto, a funções administrativas,

esvaziadas de poder político (Faoro, 1976).

As câmaras perderam ainda mais autonomia na segunda metade do séc.

XVIII, transformando-se em simples executoras de ordens superiores. Na Bahia e Rio de

Janeiro, chegou-se ao extremo do Governador indicar os vereadores, tornando-se as

Câmaras, meros departamentos administrativos da capitania. O Marquês de Lavradio


86

ilustra bem a situação, no último quartel do século XVIII, revelando seu poder sobre a

Câmara do Rio de Janeiro:

Como as leis de S.M. têm nobilitado os comerciantes, destes escolhi para


Vereadores, nomeando-lhes sempre por companheiros um dos melhores da
terra, e por este modo consegui por as ruas da cidade como V. Exª tem
visto, fazerem-se mais duas fontes públicas, muitas pontes, consertarem-se
os caminhos, juntar e entulharem-se infinitos pântanos, que havia na cidade,
origem de infinitas moléstias.
(Marquês do Lavradio apud Faoro, 1976: 186)

O chafariz, segundo Costa e Silva (1990: 11), significava "uma grande

conquista, o esboço de um sistema coletivo". Na falta de um sistema de distribuição

domiciliar, a água era levada dos chafarizes ou diretamente dos mananciais para as casas,

em potes, cântaros e barricas, carregadas pelos escravos. E ainda era vendida em pipas

puxadas manualmente ou por burrinhos, ou ainda transportada em canoas e vendidas

diretamente aos domicílios.

Mesmo com a construção dos chafarizes, a demanda não era atendida

satisfatoriamente. As parcelas da população que tinham posses de uma forma ou de outra

supriam suas necessidades sem empreender muito esforço, visto que os chafarizes eram

construídos nas regiões centrais, além do que os escravos faziam o transporte ou mesmo

comprava-se a água dos pipeiros na porta de casa. A população mais carente, a medida em

que cresciam as cidades, tinha que empreender deslocamentos cada vez maiores para se

abastecer, seja por falta de chafarizes próximos ou porque a água destes, em alguns casos

explorada por companhias particulares, era cobrada.


87

3. Os primeiros serviços de saneamento -


As concessões privadas no Brasil Imperial

Até o início do século passado, não haviam sido constituídos serviços de

saneamento no Brasil. Os chafarizes eram construídos a partir de demandas localizadas,

através de contratos realizados pelas Câmaras municipais. Só a partir do segundo quartel

do século XIX, é que começaram a ser constituídos os primeiros serviços para a adução e

distribuição de água em chafarizes.

A bela obra iconográfica patrocinada pela Mercedes Benz do Brasil (1991)

afirma que a primeira manifestação legal, onde implicitamente se reconhece o

abastecimento de água como serviço público foi a lei aprovada pela Assembléia

Legislativa Provincial de Salvador, em 1852. Através desta lei, o Presidente da Província

estava autorizado a fazer contratações para a construção de chafarizes. O primeiro contrato

foi assinado com a "Companhia de Queimados" e previu a construção de 12 chafarizes em

Salvador. A mesma companhia, posteriormente passou a fazer a distribuição domiciliar e

explorou esses serviços até 1904, quando foi encampada pela Intendência Municipal

(Dacach, 1990).

No entanto, em Recife, já em 1837, uma Lei Provincial1 autorizava o

presidente da Província a contratar o fornecimento de água potável com uma ou mais

pessoas que formassem uma companhia. Como podemos atestar em Menezes et allii (1991:

14-16):

O Governo Provincial, prosseguindo nos seus planos de melhoramentos, foi


através da Lei Nº 46 de 14 de junho de 1837, autorizado a contratar o
fornecimento de água potável, com uma ou mais pessoas, nacionais ou
estrangeiras, formando companhia.

1. Lei Nº 48 de 14.06.1837.
88

Decorrido mais de um ano, surge, entre aqueles cidadãos que detinham a


fortuna os que irão formar uma empresa capaz de atender o abastecimento
de água do Recife. Tal empresa, organizada em Companhia por ações, será
dirigida por um grupo de cidadãos, não remunerados, e atenderá a todos da
sociedade independente do seu nível social naquilo que se constituía uma de
suas necessidades básicas, a água potável.

A iniciativa vem ser dos senhores Bento José Fernandes Barros, Manoel
Coelho Cintra e Francisco Sérgio de Mattos.

O contrato com o Governo Provincial foi assinado pelos três empresários a


11 de dezembro de 1838 e cedido à Companhia então criada. O manancial
escolhido e constante de tal contrato, dentre os referidos na Lei Nº 46, foi o
Rio Beberibe, o qual deu nome à Companhia. A nova Companhia foi
instalada no dia 20 de dezembro de 1838, às 11 horas da manhã, no prédio
da Sociedade Apolínea. Aposse dos diretores se deu no dia 22 de fevereiro
de 1839, sendo eleito, para presidir a Companhia, o Sr. José Ramos de
Oliveira, ficando como 1º e 2º Secretários os Srs. Bento José da Costa e
Bento José Alves, respectivamente.

A viabilidade da Empresa foi garantida pelo sistema do privilégio, definido


na Lei citada no parágrafo anterior e consistia em que a exploração dos
serviços seria em caráter exclusivo durante determinado tempo, contado à
partir da inauguração dos mesmos, cabendo ao Governo a fiscalização da
boa execução, tudo regido por contrato próprio. O Fornecimento d’água se
daria através de 13 chafarizes públicos, determinados na mesma Lei, e o
direito exclusivo por trinta e cinco anos, proibindo-se desde a inauguração
dos serviços, pelo tempo ora determinado que tal fornecimento fosse
realizado por canoas ou lanchas que conduziam então a água à Cidade do
Recife desde o Rio Beberibe. Definia também que a citada Lei o preço de
venda ao particular, e que o fornecimento de água seria gratuita ao Governo,
além de outras particularidades. Na oportunidade a Lei previa também o
fornecimento de água aos particulares, em anéis d’água, as ligações prediais,
desde que tais penas d’água não prejudicassem o consumo público nos
chafarizes.

Uma vez concluídas as obras do sistema de abastecimento d’água, seria


através desses chafarizes que então deviam ser abastecidas as canoas d’água
e as carroças que vendiam, de porta em porta, a água nos lugares mais
distantes. Nos chafarizes a água seria vendida em baldes de trinta litros,
como medida básica para os vinte réis cobrados.

Garantia-se com tais chafarizes uma água potável, isenta de prejuízos para a
saúde do usuário.

Devido à qualidade das águas e ao alto custo de produção e transporte, foi

transferido o manancial para o riacho Prata, no qual foi construído um açude, localizado
89

em Dois Irmãos, e que ainda hoje é utilizado como manancial de abastecimento público

pela Compesa.

Em setembro de 1842 iniciaram-se as obras, que duraram até o início de

1848, sendo inaugurado o sistema em 1º de maio deste ano, consistindo de captação no

manancial do Açude do Prata, adução por gravidade e distribuição em doze chafarizes, nos

bairros de Santo Antônio, São José e do Recife.

Esses parecem ter sido os primeiros atos legais e os primeiros serviços

constituídos no Brasil para prover água à população. A constituição e encampação desses

serviços foram autorizadas pelas Assembléias Legislativas Provinciais e não pelo poder

local, visto que estes permaneciam tutelados pelas Províncias, cujos presidentes eram

nomeados pelo Imperador (Brasil, 1824 e Faoro, 1976).

A Constituição de 1824, criou Câmaras com mandatos eletivos, em todas as

cidades e vilas, às quais competia a administração do governo municipal (art. 167). A Lei

de 1º de outubro de 1828, regulamentou a Constituição e definiu o papel das câmaras

municipais quanto às obras públicas (art. 47):

Poderão ajustar de empreitada as obras que se houverem fazer... E quando


as obras forem de grande importância, e alguns sócios, ou empreendedores
se oferecerem a fazê-las, percebendo algumas vantagens para sua
indenização, enviarão as propostas aos Conselhos Gerais das Províncias.2

A lei de 1828, pouco tempo após a Independência, ficou aquém da palavra

constitucional, segundo Faoro (1976: 187), pois ao "assegurar a tutela do governo

provincial e geral sobre as câmaras, fixando-lhes caráter puramente administrativo,

reconheceu uma realidade tradicional, apesar do reconhecimento primaveril nos dias da

Independência".
90

As câmaras tinham amplas atribuições constitucionais, como o governo

econômico e policial, melhoramentos urbanos, instrução e assistência, mas apesar disso

não possuíam renda, senão as mínimas indispensáveis à manutenção de seus serviços

(Faoro, 1976).

Na Europa, também em meados do século passado, começaram a se

desenvolver a constituição dos sistemas de esgotos e de abastecimento de água, com

distribuição domiciliar:

A maior transformação deu-se por uma mudança de mentalidade durante o


século XIX. A oferta de água na cidade deixa de ser um empreendimento
privado ou semiprivado. Torna-se público. Deixa também de se dirigir a
alguns pontos de distribuição especiais. É oferecido em cada domicílio.
Essa audaciosa alteração deu-se entre 1840 e 1870. Parece ter sido proposta
e executada pelos engenheiros franceses saídos da primeira escola de engª
civil criada no mundo, a ‘Escola Politécnica de Paris’.
(Mercedes Benz do Brasil, 1991: 59)

Entre 1852 e 1870, realizam-se gigantescas obras públicas em Paris, tanto

para água, quanto para esgotos. "Em todos os países o abastecimento de água e serviços de

esgotos passam a ser encargos do Estado" (op. cit.: 59).

O Rio foi a quinta cidade do mundo, e a segunda capital, a contar com um

sistema de esgotos moderno, em 1864. Londres, em 1815, foi a primeira cidade a coletar

seus esgotos, quando foi permitida a destinação das imundícies domésticas na rede de

drenagem pluvial, tornada compulsória em 1847 (Azevedo Netto, 1993). Os sistemas de

esgotos de Paris foram planejados e iniciados em 1824, mas só com a construção do grande

coletor de Asniers, iniciado em 1857, foi que a rede começou a receber as fezes, o que só

veio a ocorrer em 1880. Outras cidades que tiveram redes de esgotos no século passado:

Hamburgo (1842), Providência (1869), Berlim (1874), Filadélfia (1875), Buenos Aires

2. Convertidos por emenda constitucional de 12.10.1832, em Assembléias Legislativas Provinciais.


91

(1877), Roma (1879), Viena (1883), Marselha (1891) e Nápoles (1983) (Telles, 1984 e

Azevedo Netto, 1993).

Em relação aos sistemas de abastecimento de água, a distribuição por

chafarizes foi se transformando progressivamente em distribuição domiciliar. Cresceu

bastante com a utilização da tubulação de ferro fundido, que foi empregada pela primeira

vez no Brasil, no Rio de Janeiro, em 18763. Podemos citar algumas cidades cujos sistemas

de água por distribuição domiciliar foram implantados no século passado: Paris (1854),

Santos (1870), Montevidéu (1871), Bogotá (1888) e Amsterdam (1896) (Azevedo Netto,

1993).

Também no Brasil, foi na segunda metade do século passado que realmente

tomou impulso a constituição dos serviços de água e esgotos no Brasil. Segundo

Cavalcanti (1987: 104), "os sistemas e serviços de saneamento no Brasil emergem como

uma questão da produção do ambiente construído no interstício da economia exportadora

capitalista". Estes serviços surgiram paralelamente às primeiras estradas de ferro, de

rodagem e do desenvolvimento da construção naval, dos portos, da iluminação pública e

dos transportes urbanos. O saneamento reflete nesta fase o avanço da divisão do trabalho

da primeira etapa do desenvolvimento capitalista brasileiro, e ainda, à emergência do

trabalho assalariado.

Quando ocorre a penetração do capital estrangeiro no Brasil, momento em

que havia predominância do capital mercantil, a economia se desdobrava em "seu núcleo

agrário (para produção de alimentos exportáveis e alimentos para consumo interno) e seu

segmento urbano, acoplado ao primeiro, que abrigava o conjunto das atividades de

financiamento, comercialização, transportes, administração e indústrias" (Cavalcanti, 1987:

105).
92

A constituição dos serviços de água e esgotos no Brasil se deu através de

concessões e não sob a forma da administração direta. As concessões foram realizadas

pelas províncias à companhias privadas, em sua maioria estrangeiras e entre estas,

principalmente as inglesas.

Vários fatores contribuíram para opção por essa forma de gestão adotada.

Um fator relevante era a incipiência do aparelho estatal naquela época. Os governos das

províncias e os municípios não tinham aparato técnico-administrativo para implementar as

ações demandadas pela população. O próprio estágio de desenvolvimento tecnológico

brasileiro era pueril, enquanto a Inglaterra estava na vanguarda da tecnologia em

engenharia sanitária do mundo, detinha capital e a hegemonia política.

Naquela conjuntura, urgia que fossem implementadas medidas de

saneamento nas cidades, a fim de viabilizar o desenvolvimento industrial que já começava

no Brasil, bem como viabilizar o crescimento dos centros urbanos, cuja densidade

demográfica estava levando à propagação de diversas epidemias.

O saneamento estava intrinsecamente associado ao desenvolvimento e à

viabilização do estabelecimento das relações de produção. A Inglaterra, com o domínio da

tecnologia e como potência mercantilista, investia recursos, na forma de empréstimos não

só na produção de bens, mas também na infra-estrutura para viabilizá-la.

Segundo Telles (1984), o primeiro ato legal para a concessão de serviços

pelo Estado à iniciativa privada no Brasil diz respeito às estradas de ferro. Foi em 1835,

quando um decreto4 "autorizava o Governo a conceder privilégio, pelo prazo de 40 anos, a

uma ou mais companhias que fizessem estradas de ferro, do Rio de Janeiro para Minas

Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia" (apud Cavalcanti, 1987: 185). Esse instrumento legal

3. Essa tubulação já havia sido utilizada na França, no Palácio de Versalhes em 1664, e introduzida na Inglaterra desde 1746.
4. Decr. Nº 100 de 31.10.1835.
93

viabilizou a construção das primeiras estradas de ferro no Brasil: Rio-São Paulo (1840),

Mauá (1852), Recife-Cabo (1855), D. Pedro II (1855), Bahia-São Francisco (1856),

Santos-Jundiaí (1856), Cantagalo (1857), etc.

Os ingleses, nesse período, tinham a concessão dos portos e de estradas de

ferro, como forma de viabilização do escoamento da matéria-prima, além disso, detinham

concessões de diversos serviços de infra-estrutura urbana como água, esgotos, luz, bondes,

telefones, etc. Exemplos desses serviços foram as concessões de energia, a Light & Power

e a Bond & Share; em telefonia, a ITT; em ferrovia, a São Paulo Railway, a Great Western

e a Pernambuco Transway; em águas e esgotos, a Manaus Improvement, a Ullen Company

de São Luís, a Draynage Company do Recife, a City do Rio de Janeiro, etc., todas de

origem inglesas ou norte-americana (Costa e Silva, 1993).

Segundo Rodolfo Costa e Silva (1990: 12), "os ingleses não construíram

esses sistemas porque queriam fazer saneamento. Os ingleses precisavam se apoiar para

realizar um processo exploratório...".

Apresentaremos abaixo o processo de constituição de alguns serviços de

saneamento no século XIX.

No Rio de Janeiro, lei5 de 1853 autorizou o Imperador D. Pedro II a

contratar a execução do "serviço de limpeza das casas da Cidade do Rio de Janeiro, e do

esgoto das águas pluviais, com João Frederico Russel ou qualquer outro"6. No entanto, não

foi assinado contrato naquele momento. Dois anos depois, forçados pela epidemia de

cólera iniciada em 1855, o projeto foi retomado. Neste mesmo ano foi realizada

experiência na Casa de Correção ou Penitenciária Pública para aprovação da técnica. Em

1857, foi então assinado contrato com Russel e outro sócio para a execução da rede de

5. Lei Nº 719 de 28.09.1853.


94

esgotos e drenagem. No entanto, os contratantes prorrogaram os prazos para início das

obras até que, em maio de 1863, transferiram o contrato para a The Rio de Janeiro City

Improvements Company Limited, concessionária inglesa constituída em 1862. A City teve

suas primeiras obras inauguradas em 1864, adotando o sistema misto inglês7. Essa

concessão durou até 1947, tendo sido a mais duradoura concessão à iniciativa privada de

serviços de saneamento no Brasil.

Curiosamente, a rede de distribuição de água do Rio de Janeiro teve sua

construção iniciada após a rede de esgotos, em 1876. Normalmente, as redes de água

precedem às de esgotos mas, provavelmente devido às condições de salubridade ambiental

da cidade e ao fato do sistema ser o ‘misto inglês’, que drenava parte da vazão pluvial,

tenha ocorrido o inverso. Foi contratado o Engº Antônio Gabrielli para a construção da

rede de distribuição, concluída em 1878, e que contava com 8.334 prédios ligados à rede -

pouco mais que 10 % da cidade(Telles, 1984).

Naquele momento, não foi constituído um serviço para administrar o

sistema de água do Rio de Janeiro, a Inspetoria Geral de Obras Públicas do Município da

Corte ficou responsável pelo sistema (Silva, 1988b).

6. Observe-se a peculiaridade da lei em indicar nominalmente a quem o poder público deveria contratar para realizar os serviços.
Além disso, é importante assinalar que esses indivíduos assumiram os contratos "pro forme", pois ao que nos foi possível perceber,
objetivavam realmente repassá-los às companhias estrangeiras, atuando na verdade como ‘testas-de-ferro’.
7. Na era moderna, as galerias de águas pluviais precederam as redes de esgotos sanitários. Como conseqüência do incremento no
consumo de água, passou a ser sentida a necessidade de se coletar e afastar os dejetos. Londres já contava com galerias de água
pluviais no final do século XVIII. Segundo Azevedo Netto (1959), os sistemas dinâmicos somente puderam surgir após a invenção da
bacia sanitária, em 1778, na Inglaterra. Poucos anos após, em 1815, autorizava-se em Londres o despejo dos efluentes domésticos nas
galerias de águas pluviais. A primeira rede de esgotos sanitários foi construída pelos ingleses em meados do século passado, em 1848.
Dessa forma surgiu pela primeira vez o sistema unitário de esgotamento, e em pouco tempo esta concepção se espalhou pelo mundo
civilizado. Ainda segundo Azevedo Netto (1983), as características das cidades que adotaram o sistema unitário, eram o baixo índice
pluviométrico e o nível econômico elevado.
No Brasil os ingleses fizeram uma adaptação, devidos aos elevados custos que teria este sistema e a impossibilidade do repasse às
tarifas para os usuários. Foi então implantado o sistema separador parcial ou misto inglês. A concepção do sistema separador absoluto
ocorreu nos EUA, na cidade de Memphis, em 1879, que naquela época era uma cidade pobre. No Brasil, Saturnino de Brito teve
grande influência para a adoção do sistema separador absoluto, quando foi contratado pelo governo de São Paulo para estudar os
esgotos de Santos em 1905. A capital paulista utilizou o separador parcial até 1912, quando passou a substituí-lo pelo separador
absoluto (Azevedo Netto, 1983).
95

Em São Paulo, a construção do sistema de distribuição de água foi iniciada

em 1878, pela concessionária inglesa Companhia Cantareira. Esta Companhia também era

responsável pelo sistema de esgotos de São Paulo, que só a partir de 1883 passou a contar

com estes serviços (Telles, 1984).

Recife foi a segunda cidade do país a contar com uma rede de esgotos

(Telles, 1984), em 1873, construída pela concessionária inglesa Recife Draynage

Company, constituída em 1870. A rede de esgotos só foi implantada em área muito restrita

e além disso, estavam previstos serviços de limpeza urbana, que não foram efetivados. Em

1908 foi rescindido o contrato com a Draynage, e a Repartição de Saneamento do Estado,

em 1912, encampou os serviços, contratando Saturnino de Brito para coordenar os

trabalhos do Plano de Saneamento do Estado (Melo apud Cavalcanti, 1987).

Em Porto Alegre, Lei de 18618 autorizava o presidente da província a

celebrar contrato de concessão da exploração de distribuição de água com um particular.

Foi, então, constituída a Companhia Hydráulica Porto Alegrense, sendo o sistema

oficialmente inaugurado em 02.12.1866 (Pereira, 1991).

O abastecimento de água de Belém foi iniciado em 1881, quando foi

constituída a Companhia das Águas do Grão-Pará de capital inglês. A partir de 1883, o

abastecimento que antes era temporário passou a ser permanente, mas em 1884, atendia a

apenas 500 prédios para uma população de 120 mil habitantes (Cosanpa, 1984).

A população atendida pelos serviços construídos pelos ingleses era, em

geral, restrita à parte central das cidades, área em que o retorno financeiro seria mais

viável, atendendo em torno de 10 a 15 % da população. Em São Luís do Maranhão, por

exemplo, os ingleses controlavam os serviços de água, esgotos, tração, luz e prensa de

algodão. O Maranhão era na época um grande centro de produção de algodão e o interesse


96

dos ingleses pelos serviços de infra-estrutura urbana indicava uma nítida concepção da

utilização do saneamento como instrumento sanitário para viabilizar os meios de produção,

e não como direito do indivíduo. Segundo Costa e Silva (1990), onde havia

desenvolvimento, naquele período, havia saneamento. Ou seja, as ações de saneamento

visavam mais viabilizar a produção de bens e serviços, do que prover a população em

geral.

Como as concessionárias só atendiam os núcleos centrais das cidades, as

reclamações eram muitas, havendo constantes reivindicações para o aumento da oferta dos

serviços. Estas reivindicações provocaram alterações na forma de prestação dos serviços de

saneamento. A encampação desses serviços não se deu apenas no saneamento, estendendo-

se pelos demais setores. A mudança no modelo de gestão foi fruto de um processo social,

como deixa claro a citação abaixo:

Protestos e lutas sociais foram deflagrados contra aquelas empresas


concessionárias, face à qualidade dos serviços prestados, ao cumprimento
dos contratos, às altas tarifas impostas e à sua vergonhosa e marcante
interferência política nos assuntos internos do país, destacada na advocacia
administrativa e na corrupção da máquina política.

... o Estado, como poder concedente, nunca cumpria o seu papel de


promotor do interesse público, no que terminava transformando as
concessionárias em donas discricionárias dos serviços, gerindo-os a seu
talante.

(Costa e Silva, 1993: 14 e 15)

Do ponto de vista da titularidade dos serviços, o nível estadual (província)

foi a instância que realizou as concessões, pois os municípios naquela época não tinham

competências delimitadas em lei, nem estrutura financeira e administrativa.

8. Lei Nº 466 de 02.04.1861.


97

O caráter excludente no acesso aos serviços que marca esse período é

decorrente do modelo de gestão implementado, ou seja, as concessões privadas. A

expansão dos sistemas eram comprometidas com a dificuldade de amortização dos

investimentos a serem realizados pelas empresas privadas, devido aos prazos de concessão.

Desta forma as companhias privadas não investiam geralmente, em ampliações, pois

previam ter dificuldade de retorno do capital empregado. As condições de contrato

definiam que ao seu término o patrimônio seria incorporado ao concedente sem ônus.
98

4. O Estado assume diretamente os serviços -


fins século XIX até a década de 40

A expansão dos serviços de saneamento sob o regime de concessão à

iniciativa privada até o final do século passado foi considerável. Mas na virada do século, o

número de cidades com redes de água e redes de esgotos era ainda muito pequeno, como se

pode ver na tabela abaixo:

Número de cidades com redes de água e esgotos no Brasil,

no período entre 1890 / 1930.


Ano Cidades com rede de água Cidades com rede de esgotos


1890 31 4 (Rio, S.Paulo, Recife, Campos)

1900 57 16

1910 186 48

1920 284 126

1930 344 150



Fonte: Alvarenga apud Telles (1993: 309)

Neste mesmo período, pelo menos duas capitais de estado, Paraíba (atual

João Pessoa) e Florianópolis, não possuíam qualquer instalação domiciliar de água. No

estado de São Paulo, em 1903, haviam 25 cidades com redes de água em operação, quatro

em construção e mais 14 com projetos aprovados (Telles, 1993).

Neste período, o Brasil entrou numa nova e extraordinária fase do

saneamento, com o surgimento do pai da Engenharia Sanitária nacional, Saturnino de

Brito, que atuou no saneamento brasileiro de 1893 a 1929, quando veio a falecer.
99

Saturnino iniciou seus trabalhos em saneamento num momento em que a

engenharia sanitária nacional ainda era bastante incipiente, e quando as maiores

contribuições neste campo estavam sendo implementadas por engenheiros ingleses. Era um

momento de revolução tecnológica e sanitária no mundo ocidental. As cidades estavam

implementando sistemas de água e esgotos e as soluções para estes problemas ainda

estavam sendo estudadas e amadurecidas. Saturnino de Brito contribuiu para a criação do

que se pode chamar de uma escola nacional de Engenharia Sanitária, com a invenção de

diversos equipamentos, e mais além, com elementos inovadores para a concepção de

projetos pioneiros.

Vários autores reconhecem a sua importância para a Engenharia Sanitária

nacional como podemos ver na citação abaixo:

Anteriormente a Saturnino de Brito, o desenvolvimento da engenharia


sanitária em nosso país não se revestia propriamente de consistência
técnica. Foram realizados apenas alguns trabalhos isolados. Destes, a maior
parte esteve a cargo de engenheiros estrangeiros, com técnica diversificadas
que não chegaram a formar escola.
(Yassuda, 1964: 36)

Saturnino também importância na organização de diversos serviços de água

e esgotos através da administração direta, como na encampação pelo governo do Estado de

Pernambuco da Companhia do Beberibe, em 1912, em decorrência de seus estudos e das

críticas quanto aos serviços prestados por essa empresa. Saturnino aliás, se posicionava

contrariamente à concessão privada de serviços de saneamento, como podemos ver em

discurso de 1913:

Tenho sempre me manifestado contrário à execução dos serviços sanitários


por empresas. Quando a administração pública manda estudar previamente
um plano de saneamento, realiza um passo importante no bom caminho do
100

interesse vital da sua cidade. É o que fez o Governo do Estado, com o


serviço dos esgotos, tendo anteriormente executado por administração o de
águas. Não é bastante, porém; e se a minha propaganda, tantas vezes
contrária aos meus interesses pessoais convencer, também executados por
administração seriam os serviços dos esgotos; não seriam estes e os de
águas entregues à exploração de uma empresa, que fatalmente começará a
prestar um mau serviço quando a renda não for suficiente para remunerar o
custeio e o capital empregado. Entretanto, como não é possível mudar
opiniões radicais ou modificar situações preestabelecidas, às vezes em lei
que autorize o Governo a ‘contratar’ serviços, ou a os ‘conceder’ à
empresas, ou a ‘arrendar’ serviços executados, façam o possível por
esclarecer os governos, a fim de que as cláusulas sejam formuladas de modo
a se garantir quanto possível o objetivo sanitário. E um projeto elaborado
convenientemente e obedecido na execução, é um bom fator nessa
orientação orgânica.

(Alvarenga apud Cavalcanti, 1987: 117 - 118)

Também Baeta Neves (1917), não concordava com a empreitada e a

concessão dos serviços de saneamento a empresas privadas. Para Baeta Neves, águas e

esgotos deveriam ser municipais, pois o lucro não era compatível com os aspectos

sanitários. Continentino (1937), também compartilhava desta concepção, argumentando

que a concessão só deveria ser feita a empresas particulares, quando as cidades não

dispusessem de recursos suficientes para a realização de obras demasiado onerosas.

Uma das grandes contribuições de Saturnino de Brito ocorreu em relação à

discussão acerca do uso do sistema de esgotos separador absoluto no Brasil, ao invés do

sistema unitário e misto inglês como era hábito utilizar. Quando foi contratado pelo

Governo paulista para estudar o saneamento de Santos, Saturnino optou pelo sistema

separador absoluto como sendo o mais adequado para os nossos índices pluviométricos e

para nossa realidade econômica. Seu posicionamento foi decisivo para a mudança na

orientação do uso da tecnologia9.

9 O sistema separador absoluto consiste em redes exlusivas para o esgoto sanitário e outras para águas pluviais. O unitário, em uma
única rede para esgotos e para águas pluviais. E o misto inglês, em uma rede para o esgoto e as águas pluviais dos terrenos
domiciliares e outra rede para as águas pluviais das demais áreas.
101

Uma outra polêmica travada por Saturnino de Brito foi em relação à teoria

das bacias protegidas e a do tratamento físico e químico da água potável. Como podemos

ver na referência abaixo:

No sistema das bacias protegidas, a qualidade da água era garantida, em


tese, pelo menos, pela vigilância contínua em torno das nascentes e dos
mananciais, sendo por isso necessário manter a população afastada desses
locais, que deveriam ser cobertos por florestas; o sistema obrigava assim à
captação de mananciais cada vez mais distantes. Havia ainda muita
prevenção, quer do público em geral, quer de técnicos e médicos, sobre a
eficiência dos tratamentos de purificação das águas. Um dos defensores do
sistema de tratamento10, que apelava para o exemplo de outros países, foi o
Engº Francisco Saturnino R. de Brito.
(Telles, 1993: 310)

Uma das características deste período foi a execução das obras sempre em

caráter emergencial. Não havia planejamento adequado, nem recursos disponíveis nos

serviços. Saturnino de Brito, em 1926, apresentou o trabalho Melhoramentos do Rio Tietê,

onde já criticava esta situação. Ele queixava-se das mazelas da realidade brasileira,

insistindo para que "as obras sejam executadas segundo programas bem estabelecidos, sem

precipitações e sem interrupções, igualmente nocivas". Apontou também os erros "em

adiar iniciativas necessárias, não proceder a estudos completos, até chegarem a ser

consideradas ‘de emergência’, para inauguração a curto prazo, sendo mal estudadas e

trabalhadas de modo desordenado e caríssimo" (Telles, 1993: 332).

As principais contribuições de Saturnino de Brito nas cidades brasileiras em

relação a estudos, projetos e execução, foram classificadas cronologicamente por Yassuda

(1964), como as seguintes:

Entre 1894 e 1904:

10. Inclusive a primeira estação de tratamento de água que utilizou tratamento químico no Brasil foi construída sob orientação de
Saturnino de Brito, em Recife, em 1919.
102

• Chefiou a Seção de Abastecimento de Água na Comissão de


Construção de Belo Horizonte

• Como Engº da Comissão de Saneamento do Estado de São Paulo


realizou projetos para Campinas, Ribeirão Preto, Limeira, Sorocaba e
Amparo, em parte executados por ele

• Estudou o saneamento de Santos, elaborou projetos do saneamento de


Vitória, Petrópolis, Paraíba do Sul, Itaocara e Campos

• Foi fiscal da City, por parte do Governo Federal, no Rio de Janeiro

Entre 1904 e 1914:

• Chefiou a Comissão de Saneamento de Santos durante cinco anos, um


de seus trabalhos mais notáveis

• Elaborou projetos de saneamento de Rio grande (RS) e de Belém

• Projetou os sistemas de esgotos de Paraíba do Norte (atual João Pessoa)

• Elaborou projeto de saneamento do Recife, também um de seus


trabalhos mais notáveis, cuja duração foi de 1909 a 1918

Entre 1914 e 1924:

• Elaborou projetos de saneamento das cidades gaúchas de Santa Maria,


Cachoeira, Cruz Alta, Rosário, Passo Fundo, Livramento, São
Leopoldo, Uruguaiana, São Gabriel e Iraí

• Projeto de saneamento de Curitiba e Uberaba

• Projetou e executou obras de saneamento da Lagoa Rodrigo de Freitas,


no Rio de Janeiro

• Elaborou o projeto de saneamento de Aracaju e iniciou as obras do


abastecimento de água

• Iniciou a construção das obras de água e de esgotos da antiga cidade de


Paraíba do Norte (atual João Pessoa), que continuaram até 1925

Entre 1924 e 1929:

• Elaborou o projeto de saneamento de Salvador

• Projetou as obras de defesa contra as inundações da cidade de Campos

• Projetou as obras de saneamento das cidades de Alegrete e Pelotas no


Rio Grande do Sul e Poços de caldas (MG)
103

• Emitiu pareceres sobre as obras de saneamento das cidades


pernambucanas de Recife , Olinda, Nazareth, Timbaúba, Gameleira,
Palmares, Jaboatão, Vitória, Gravatá, Bezerros e Caruaru

• Iniciou a construção das obras de saneamento de Poços de Caldas e de


Pelotas, onde veio a falecer

A partir desse período, embora predominasse a organização de serviços

vinculados à administração direta, mesmo com os seus entraves administrativos e de

autonomia financeira, houve grande avanço da Engenharia Sanitária brasileira. Entre 1890

e 1930, foram criados novos serviços de saneamento, levando a um incremento de quase

10 vezes no número de cidades com abastecimento de água, num processo marcado pelo

trabalho de Saturnino de Brito.

Neste período, a partir da insatisfação com os serviços prestados pelas

concessionárias, foi marcante como o Estado passou paulatinamente a encampar os

serviços, não só de saneamento, como também outros serviços de infra-estrutura. A forma

como se deu a encampação dos serviços de saneamento variou no tempo, de acordo com o

estágio de desenvolvimento desses serviços, das pressões exercidas pela população e da

capacidade do Estado em assumi-los, mas em sua maioria, ocorreram no final do século

passado e início deste (Caldeira, 1977). Algumas concessões continuaram até meados do

século XX, como os casos da City, no Rio de janeiro e em Santos.

Cavalcanti (1987: 120), no entanto, delimita o período de encampação

desses serviços como tendo se desenvolvido em torno dos anos 30. Esse autor considera

que a insatisfação com a forma de prestação de serviços públicos, através da concessão à

iniciativa privada, se aprofundou a partir das transformações ocorridas durante a I Guerra

Mundial, entre 1914 e 1918. Explicou que "as relações de comércio entre as economias

capitalistas sofreram sérias modificações. Refletindo sobretudo na elevação dos preços dos
104

produtos importados, e com o repasse destes preços às tarifas, tornando crescente a

insatisfação com a prestação dos serviços de transportes, energia elétrica, saneamento, etc".

No entanto, no setor de saneamento as mudanças parecem ter ocorrido mais

cedo, Caldeira (1977: 13) afirma que "foram criadas no fim do século XIX e início do

século XX, diversas repartições públicas".

Os serviços encampados ou criados a partir de então constituíram-se sob a

forma de administração direta, sejam como diretorias, repartições ou inspetorias, no âmbito

estadual, municipal ou mesmo federal. Os serviços encampados que pertenciam ao nível

estadual11 continuaram a sê-lo, como a maioria das capitais. A Constituição republicana de

1891 não delimitava com clareza a competência do município quanto aos serviços

públicos, apenas refere-se que a organização dos estados deve assegurar "a autonomia dos

municípios em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse" (art. 68).

Vejamos a seguir alguns serviços de saneamento que foram constituídos sob

a forma de administração direta, a partir de encampações de empresas privadas, neste

período.

A Repartição de Águas e Esgotos (RAE) de São Paulo, constituída em

1893, após a encampação da Cia. Cantareira em 189212, foi o primeiro serviço público a se

constituir no Estado de São Paulo (Costa e Silva, 1990). A RAE, segundo Caldeira (1977),

foi assumida pelo estado, em virtude da municipalidade não dispor de recursos para

assumir tais encargos.

Outro órgão encampado no início do século, foi a Parahyba Water

Company, que funcionou a partir de 1899, sem quase nada fazer, sendo extinta em 1906.

Posteriormente foi criado por orientação de Saturnino de Brito - que havia projetado o

11. As províncias transformaram-se em estados na Constituição republicana de 1891 (art. 2).


105

sistema da capital - o Serviço de Abastecimento de Águas da Paraíba, em 1912,

transformado em 1926 em Repartição de Saneamento do Estado (RSE) (Viana, 1977).

Em Pernambuco, em decorrência dos problemas de saúde pública,

decorrentes dos precários serviços prestados pela Companhia do Beberibe e Recife

Draynage Company também houve a encampação no início do século. Freitas (1925: 141),

referindo-se à Lobo Moscoso, então Inspetor de Higiene Pública de Pernambuco, em suas

críticas à Companhia do Beberibe, afirmou:

Foi Lobo Moscoso um combatente tenaz e encarniçado pelo


estabelecimento de um bom serviço de águas de alimentação e, por isso, a
antiga Companhia do Beberibe, que se encarregava deste serviço, não teve
maior nem mais insistente adversário.

Mário Sette (1950), baseado em Octavio de Freitas, escreveu o seguinte

sobre a Draynage (apud Moreira, 1994: 86):

Os malefícios verdadeiros do sistema de escoamento das fezes e águas


servidas da Recife Draynage viriam a se produzir sim... quando do
acréscimo da população, pela falta de zelo da empresa, pelo mau estado dos
canos, pela insuficiência da água... e pelas péssimas condições higiênicas da
cidade... as caixas das latrinas eram focos de ratos e de baratas; a
canalização estourava contagiando o subsolo e atingindo veios d’água; as
descargas não eram suficientes; a colocação dos aparelhos tornava-se
incoveniente e perigosa quando eram próximas às cozinhas, salas de
refeições, quartos de dormir... incontestavelmente eram os aparelhos da
Draynage os causadores de milhares de casos mórbidos, principalmente os
de tifo e desinteria. Notava-se mesmo que arrabaldes onde não existiam
instalações da Draynage ofereciam melhores condições de salubridade do
que a parte central da cidade...

Neste contexto, Saturnino de Brito, que coordenava os trabalhos de

saneamento do Recife desde 1910, e que era contrário a este tipo de serviço ser prestado

pela iniciativa privada, envidou esforços no sentido da criação de um órgão público para a

12. O Governo do Estado de São Paulo foi autorizado pela Lei Nº 62 de 17.08.1892 a rescindir contrato com a Cia. Cantareira. E criou
através do Decreto Nº 152-A de 31.01.1893 a RAE (Pegoraro, 1986).
106

prestação dos serviços. Assim, a Recife Draynage Company, criada em 1873, foi extinta

em 1908 e a Companhia do Beberibe, criada em 1838, foi encampada em 1912, ano em

que foi criada a Repartição de Saneamento do Estado (RSE) de Pernambuco.

Em Porto Alegre, em 1904, Companhia Hydráulica Porto Alegrense,

constituída em 1861, foi encampada em 1904 e Secção de Abastecimento de Água, que em

1912 foi rebatizada como Secção Hydráulica Municipal.

No Rio de Janeiro, não houve concessão dos serviços de abastecimento de

águas à iniciativa privada, apenas contratadas as obras para a construção dos sistemas,

sendo estes administrados por sucessivas repartições de obras públicas. Em 1910, foi

constituída a Repartição de Águas e Esgotos e Obras Públicas, sofrendo inúmeras

transformações até a década de 60. Os serviços de esgotos do Rio de Janeiro, explorados

pela City desde 1863, continuaram até 1947 com esta concessionária. Porém, com a

redução gradativa da abrangência dos serviços prestados pela City, em 1934, o Serviço de

Águas e Esgotos (SAE) da Capital Federal foi autorizado a construir rede coletora nas

áreas onde a City não operava.

Outra concessionária que teve vida longa foi a City of Santos, que assumiu

os serviços de água da Empresa Local de Melhoramentos de Santos, em 1897. Esta

concessionária já administrava os serviços de energia elétrica, transporte urbano por

bondes e gás, desde 1889, permanecendo com a concessão até 1953, isto é, por mais de 55

anos (Azevedo Netto, 1984).

A encampação dos serviços foi realizada geralmente pelos estados e não

pelos municípios. Algumas exceções, por exemplo podem ser citadas como Porto Alegre,

onde o serviço era municipal e Rio de Janeiro, que por ser capital federal, o serviço

também era federal.


107

A década de 30, segundo Caldeira (1977: 13), "trouxe para alguns estados,

uma nova estrutura administrativa para os serviços de saneamento: a criação dos

departamentos, de âmbito estadual e federal, sob a forma de administração centralizada".

Um exemplo desse tipo de estrutura foi a criação do Departamento das Municipalidades do

Estado de São Paulo (DM), responsável por ações de saneamento no interior do estado.

Uma característica deste órgão foi a de apenas construir os sistemas, repassando-os para a

administração municipal.

No Rio Grande do Sul, a Diretoria de Saneamento e Urbanismo do estado,

criada em 1936, diferentemente do órgão paulista, construía e administrava os sistemas.

Em Pernambuco, tinham uma ação mista, onde administrava os serviços de

algumas cidades e em outras apenas os projetava e construía.

Do ponto de vista da forma de atuação e da abrangência, havia uma

variação muito grande neste período. Existiam serviços estaduais que apenas atuavam em

um município, como a Repartição de Águas e Esgotos de São Paulo ao lado de outros

responsáveis pela ação no interior, como a Divisão de Organização Sanitária (DOS). Este

órgão tinha sob sua administração três serviços na Baixada Santista que atuavam em mais

de um município. O Serviço de Água de Santos e Cubatão, a Repartição de Saneamento de

Santos e os Serviços Públicos do Guarujá, que atuava tanto em água como em esgotos em

Guarujá e Vicente de Carvalho. No estado de São Paulo, até a primeira metade do século,

todos os demais serviços eram municipais (Pereira, 1968).

Existiam ainda órgãos que atuavam em todo o estado, como a Repartição de

Saneamento do Estado de Pernambuco, que administrava a capital e algumas cidades do

interior, atuando nas demais cidades em projetos e / ou construção.

A nível federal, também tínhamos até a década de 50 uma multiplicidade de

ações dos órgãos. O Serviço de Águas e Esgotos (SAE), do Distrito Federal, vinculado ao
108

Ministério da Educação e Saúde, foi transformado em 1941, em Serviço Federal de Águas

e Esgotos (Sfae). Este órgão, tinha competência para atuar em todo o território nacional,

em projetos e construção de sistemas de água e esgotos, mas também atuava em drenagem.

O Sfae, teve atuação a nível federal até 1945, tendo uma ação administrativa, entretanto,

apenas no Rio de Janeiro, quando foi transferido para a Prefeitura do Distrito Federal. O

Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), apesar de não ser um órgão

específico para atuação em serviços de águas e esgotos, e sim à intervenções globais de

combate às secas, construiu diversos sistemas de abastecimento de água no Nordeste. Ou

seja, um órgão federal, de abrangência regional, atuando especificamente no projeto e

construção de sistemas, repassando-os para as prefeituras, ou demais órgãos responsáveis,

para administrá-los.

Uma grande conquista ocorrida ainda na década de trinta, para o setor

saneamento, foi o Código de Águas13, criado em 1934. Segundo Costa e Silva (1990: 13):

O avanço da energia elétrica com a Light em São Paulo, com a Bond and
Share no interior de São Paulo, e com a Light no Rio de Janeiro, foi por
força do trabalho do velho Saturnino de Brito, que indicou naquela ocasião
o prof. Valadão para os trabalhos do Código de Águas, que ele vinha
estudando desde 1908. Valadão foi um grande advogado que terminou
sendo o homem que criou as bases que levaram ao Código de Águas. A
Revolução de 30 levou a que as concessões de energia fossem
regulamentadas como proteção para o país. Esse Código de Águas de 1934
vige até hoje, com uma série de leis adicionais.

Este Código tinha como objetivos gerais, estabelecer regras para que o

Governo Federal, pudesse controlar o aproveitamento dos recursos hídricos com fins

energéticos. No entanto, o Código de Águas representou também o primeiros instrumento

de controle do uso dos recursos hídricos no Brasil, que é a base para a gestão pública do

13. Decr. Nº 24.643 de 10.07.1934.


109

setor saneamento, sobretudo quanto ao abastecimento de água para as cidades (Cavalcanti,

1987).

Um outro ato legal muito importante para o setor saneamento foi definido

pela Constituição de 1934 (Brasil, 1934). Pela primeira vez, foi concedida competência

municipal para a organização dos serviços de caráter local (artigo 13). Contudo, não foram

encontrados contratos de concessão, ou lei municipal autorizando a concessão de serviços

aos estados, União ou iniciativa privada, não foram encontrados referências a eles. Apesar

do referido no texto constitucional, não havia, pelos municípios, concessão expressa da

gestão dos serviços, pelo menos para a maioria deles14. A Constituição de 1937 confirmou

a autonomia municipal para a "organização dos serviços públicos de caráter local" (art. 26,

c) (Brasil, 1937), competência que permaneceu nas Constituições seguintes.

Um outro instrumento muito utilizado, pelo Estado no Brasil para gerir

serviços públicos, foram as Comissões. Formavam-se comissões a fim de suprir as

deficiências do aparelho estatal, contratando-se especialistas para chefiá-las. Estas

comissões podiam ter um caráter consultivo, emitindo pareceres, mas em muitos casos,

executavam ações de saneamento.

Uma comissão que trouxe excelentes resultados foi a Comissão de

Saneamento de Santos, já citada anteriormente, criada pelo Governo do Estado de São

Paulo, em 1903, dirigida inicialmente pelo Eng.º José P. Rebouças e em 1905, por

Saturnino de Brito, que ali realizou seu maior trabalho (Azevedo Netto, 1990).

Em 1925, também em São Paulo foi constituída outra comissão, desta vez

para coordenar os trabalhos na capital, a Comissão de Saneamento da Capital, constituída,

apesar da existência da Repartição de Água e Esgotos (RAE), para contornar a grave crise

14. Excessão parece ser a concessão dos serviços de abastecimento de água pela Prefeitura de Salvador ao Governo do Estado da
Bahia em 1929, por tempo indeterminado.
110

no abastecimento da cidade de São Paulo. Aliás, a característica maior na criação destas

comissões era a deflagração de alguma crise.

Uma das comissões que mais resultados trouxe foi a do Rio Grande do Sul,

constituída pelo Governo do Estado e chefiada pelo grande Engº Antônio Siqueira, que

contratou Saturnino de Brito para realizar os projetos de várias cidades gaúchas, como

vimos acima. "Em 1917, foi criada a Comissão de Saneamento do Estado, que passou a

fiscalizar todas as obras, em execução, as primeiras das quais implantava o sistema de

águas e esgotos em Rio Grande e Bagé" (Hirano, 1990: 32). Esta comissão teve vida longa

perdurando até 1936, quando foi substituída pela Diretoria de Saneamento e Urbanismo do

Estado. Instituiu-se, assim, o processo de transformação de várias comissões, que se

sucediam ano após ano.

Com relação ao financiamento do setor saneamento no Brasil, de meados do

século passado até a década de 40, a principal característica foi o desaparecimento de

capitais privados e a assunção crescente pelo Estado do ônus pela construção, operação e

manutenção direta dos sistemas.

O processo de industrialização associado à expansão do capitalismo

mundial irradiado principalmente a partir da Inglaterra, ocasionou um aporte de capitais ao

Brasil a partir de meados do século passado. Os investimentos se deram sobretudo em

equipamentos urbanos de consumo coletivo e transportes para escoamento da produção.

Foram investidos recursos privados em sistemas de abastecimento de águas e esgotos,

eletricidade, gás, transportes urbanos, telefones, estradas de ferro, portos e companhias de

navegação, nas regiões e cidades mais promissoras e importantes (Costa e Silva e Sevalho,

1955a).

O regime para a exploração desses serviços era o de:


111

... concessão, com isenção de impostos ou taxas aduaneiras, subvenção ou


monopólio, conforme o caráter da organização, e exploração a longo prazo,
para os serviços de águas, esgotos e eletricidade, com raras exceções, as
tarifas eram fixas devendo as instalações, ao fim do contrato, reverter ao
patrimônio do Estado, sem qualquer remuneração aos concessionários.

(Costa e Silva e Sevalho, 1955a: 489 - 490).

Os recursos orçamentários eram investidos nos três níveis de poder. Os

estados, ao assumirem diretamente diversos serviços encampados, passaram a investir

recursos estaduais e federais nestes órgãos. Para os municípios que administravam seus

serviços, eram investidos recursos orçamentários dos três níveis de poder.

Recursos orçamentários da União, estados e municípios chegaram a ser

definidos constitucionalmente para serem alocados em áreas específicas, que executavam

ações de saneamento. Isto ocorreu para as áreas do Nordeste e Amazônia, a partir das

Constituições de 1934 e 1946. Também foi constituído um fundo em 1920, para ações

contra as secas no Nordeste, com breve duração, no entanto.

Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS)15

O DNOS nasceu a partir da intervenção do Governo Federal na Baixada

Fluminense, para controle de enchentes e drenagem das áreas alagadas, com o intuito de

combater a malária e tornar aquela região atraente ao desenvolvimento econômico.

A Baixada, até a década de 30, era uma extensa área pantanosa, totalmente

insalubre, onde a malária grassava, tornando inviável o assentamento humano e seu

desenvolvimento econômico.

15 Ver apêndice sobre o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs).


112

Desde o século passado haviam sido criadas várias comissões para estudar e

atuar na Baixada Fluminense, inclusive empresas privadas foram contratadas para este fim.

Mas foi em 05.07.1933, após a rescisão do contrato (assinado em 1921) com a Empresa de

Melhoramentos da Baixada Fluminense, é que foi dado um passo significativo nos

principais problemas dessa região. Nesta data foi criada a Comissão de Saneamento da

Baixada Fluminense, com a incumbência de estabelecer um amplo programa de ação para

a Baixada. Esta Comissão (organizada em 01.08.1933), foi criada como órgão do

Departamento Nacional de Portos e Navegação. Três anos após, a Comissão passou a

denominar-se Diretoria de Saneamento da Baixada Fluminense16, diretamente subordinada

ao Ministério de Viação e Obras Públicas (Mvop). Com esta mudança, manteve-se a

organização original, mas constituída em departamento autônomo (Andréa, 1962).

Até a década de 30, a Baixada Fluminense era um enorme alagado, um

pântano, com uma prevalência muito grande de malária, com vastas áreas inundadas,

impedindo o assentamento humano e o desenvolvimento econômico.

Os resultados dessas ações foram muito bons, entre eles a correção de rios,

com a desobstrução de 3.800 Km, contribuíram para a redução de malária, devido a

diminuição de alagadiços e o conseqüente controle dos anofelinos. As diretrizes

estabelecidas a partir de então, foram (Góes, 1939):

1. recuperação de áreas alagadas

2. defesa contra inundações

3. dragagem de novos leitos para rios que se perderam em brejais

4. ligação permanente dos lagos costeiros com o oceano

5. dragagem de determinadas áreas

16. Através da Lei Nº 248 de 16.09.1936.


113

O sucesso dos trabalhos levou o Governo a transformar a Diretoria,

ampliando as suas ações para um departamento nacional. "Em 1940, o problema da

Baixada estava tecnicamente resolvido. E em grande parte efetivamente resolvido"

(DNOS, 1970). Neste mesmo ano, foi criado o Departamento Nacional de Obras de

Saneamento (DNOS)17, com jurisdição em todo o país.

Em 1946, o DNOS sofreu sua primeira reorganização18, com os seguintes

objetivos:

O DNOS tem por finalidades promover, orientar, superintender, estudar,


projetar, contratar, fiscalizar e instruir todos os empreendimentos ou
assuntos relativos a construção, melhoramentos, conservação, modificação e
exploração de obras de saneamento e defesa contra inundações.

Em 1962, o DNOS passou pela segunda e maior reorganização19,

transformando-se em autarquia e ampliando ainda mais as suas funções, desta vez

inclusive para ações de saneamento básico (água e esgotos, que já era realizada em

menores proporções). Os novos encargos do DNOS seriam:

1. saneamento básico - sistemas de água e esgotos;


2. defesa contra erosão e inundações - canalizações em zonas urbanas,
rede de drenagem pluvial, endicamentos, cais de saneamento, aterros de
áreas alagadas;

3. regularização de cursos de água e aproveitamento de terras - barragens


de regularização, dragagem de cursos de água, drenagem, endicamento;
4. aproveitamento de recursos naturais (agropecuária) - sistemas de
irrigação, açudagem, construção de pôlderes;

5. energia - barragens, tomadas de água, túneis e canais de derivação,


torres de equilíbrio, condutos forçados.

17. Decreto-Lei Nº 2.367 de 04.07.1940 (regulamentado pelo Decreto Nº 5.915 de 04.07.1940).


18. Decreto-Lei Nº 8.847 de 24.01.1946.
19. Lei Nº 4.089 de 13.07.1962.
114

Apesar de ter sido apenas em 1962 que o DNOS passou a ter competência

legal para atuar em energia e saneamento básico, estas atividades já eram desenvolvidas

pelo órgão no atendimento a demandas emergenciais. Alguns sistemas de abastecimento de

água já haviam sido construídos e também o DNOS já havia tido participação, desde 1944,

na construção de várias hidrelétricas no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Minas

Gerais, Rio de Janeiro e Bahia.

A forma de atuação do DNOS, no que o órgão definia como saneamento

básico - ações em água e esgotos - era das mais variadas. Ia do projeto, à construção de

sistemas, passando por implantações, ampliações e mesmo doações de materiais, para que

os municípios ou órgãos os utilizassem. Para tanto, eram realizados convênios com os

diversos tipos de instituições responsáveis pelos serviços. Algumas vezes a relação se dava

diretamente com os municípios ou com os serviços autônomos municipais, outras com

órgãos estaduais, seja da administração direta, autarquia ou companhias de economia

mista. Outras vezes ainda, com entidades federais como a Fsesp, a Superintendência do

Vale do São Francisco (Suvale), a Companhia de Água e Esgoto do Nordeste (Caene) -

subsidiária da Sudene - cuja área de atuação era regional (Nordeste). No entanto, o DNOS

não administrava os sistemas (ou partes destes) que construía, os repassava aos órgãos

responsáveis. Sua atuação se dava em caráter complementar a estes órgãos.

O DNOS teve grande participação no saneamento básico no período de

1962 a 1967, quando foi o órgão responsável pela implementação da política nacional de

saneamento. No entanto, em função de sua dependência de recursos orçamentários federais

e da criação do Fundo para Financiamento de Saneamento (Fisane), no BNH, em 1967, que

assume os compromissos do DNOS com relação aos empréstimos externos captados junto

à Usaid, foi diminuída sua importância política, bem como o ritmo de construção de
115

sistemas de água por falta de dotação orçamentaria. A partir de então o DNOS passou a

atuar principalmente na drenagem e controle de enchentes.

A maior obra do DNOS esteve no âmbito, realmente, do controle de

enchentes e drenagem, onde contribuiu para a eliminação de constantes enchentes em

grandes cidades do país, como Recife. As suas ações foram diversificadas após sua

transformação em autarquia em 1962, passando a atuar em todos os estados. Em

saneamento básico, o DNOS realizou inúmeros projetos, ampliando sistemas em cerca de

80 municípios, construindo sistemas em outros 80 e fornecendo material para cerca de 120

municípios (DNOS, 1970).

Do ponto de vista do tipo de intervenção em saneamento básico, o DNOS, a

partir de 1940, quando de sua transformação em departamento nacional, passou a atuar

apenas projetando e construindo sistemas de águas e esgotos em todo o país. Os sistemas

construídos eram entregues às prefeituras para administrá-los.


116

5. Autarquias - a busca da autonomia nos serviços de saneamento -


década de 50

A administração direta dos serviços de saneamento, trouxe bastante críticas

dos profissionais do setor. Essas críticas se concentravam em aspectos que limitavam a

liberdade de ação nesses serviços. E logo as reclamações se transformaram em

reivindicações por mais autonomia para os serviços de saneamento.

Caldeira (1977: 14) reconhecia "... a impraticabilidade de gerir atividades de

caráter industrial, como são os serviços de água e esgotos, através de repartições públicas

(administração centralizada) e, portanto, presas a sistema burocratizado, inflexível e muito

permeável a ingerências políticas".

Whitaker (1952: 109), identificava a falta de autonomia como um dos

piores males da administração direta, como podemos ver:

... a subordinação demasiada a outros órgãos externos à mesma e sem a


interferência dos quais não pode funcionar... não pode agir por seus próprios
meios, mas tem de obedecer a uma série de providências administrativas
que lhe amortecem a velocidade... tirando-lhe autoridade e também
responsabilidade".

Outro aspecto negativo deste tipo de gestão diz respeito à ausência de

arrecadação própria, pois toda a receita compõe o caixa único do tesouro. E a dependência

de recursos financeiros e orçamentários, efetuados em órgãos externos.

A alternativa buscada naquele momento foi a constituição de órgãos de

natureza autárquica, que possibilitaria a autonomia desejada, tanto administrativa, quanto

financeira aos serviços de saneamento.

Whitaker apresentou a seguinte recomendação aprovada na V Convenção

Nacional de Engenheiros, em novembro de 1951, ocorrida em Recife, e encaminhada a

todos os governadores do Brasil:


117

É indispensável que os serviços de abastecimento de água e esgotos sejam


planejados, executados e operados por intermédio de órgãos de ‘natureza
autárquica’, que lhes proporcionarão a indispensável autonomia de que
carecem, para executar sua missão de interesse coletivo.
(Whitaker, 1952: 111)

Este mesmo Engº ainda assinalava:

É opinião generalizada entre os engenheiros sanitaristas brasileiros que se


dedicam aos serviços da espécie, que somente órgãos com autonomia
administrativa e financeira podem agir com a necessária flexibilidade, para
fazer face ao dinamismo que precisam eles apresentar, ao contrário da
vagarosidade que resulta da obediência integral às normas e peias
administrativas usuais.
(Whitaker, 1954: 03)

Ataulpho Coutinho (1965), também defendia a autarquização desses

serviços, reconhecendo como principais problemas da administração direta, a política

tarifária inadequada (fixada pelo executivo), gerando déficit, falta de flexibilidade para

pessoal, politicagem, etc.

As primeiras autarquias a se constituírem, no setor saneamento datam de

meados da década de 40, mas é na década de 50 que tomam impulso. Segundo Whitaker

(1954), o Estado de Pernambuco foi pioneiro neste modelo, criando o Departamento de

Saneamento do Estado (DSE)20, como entidade autárquica.

No entanto, Ataulpho Coutinho (1965), comenta que em 1945, foi criado o

Serviço de Águas Esgotos de Maceió (Saem)21, autarquia do Governo do Estado de

Alagoas, criada portanto, antes do DSE de Pernambuco. A administração do Saem porém,

esteve a cargo de uma firma contratada até 1962, quando o Governo do Estado assumiu a

autarquia.

20. Decreto-Lei Nº 1.413 de 13.07.1946.


21. Decreto-Lei Nº 3.041 de 27.08.1945.
118

Vários outros órgãos estaduais autárquicos foram criados na década de 50.

No Rio Grande do Norte, foi criado o DSE22 em 1952, que também contratou uma firma

particular para administrar os serviços, o Escritório Saturnino de Brito. Esse escritório já

administrava o serviço de Natal desde 1939. No Maranhão, em 1958, foi criado o

Departamento de Águas e Esgotos Sanitários, como uma autarquia. Na Paraíba, em 1948,

foi criado o DSE, como órgão da administração direta, que em 1951, foi transformado em

autarquia (Coutinho e Ribeiro, 1965).

Uma referência obrigatória para a análise da busca por autonomia dos

serviços de saneamento desenvolvida pelo setor, foi a criação dos Serviços Autônomos de

Águas e Esgotos (Saae’s), pelo Serviço Especial de Saúde Pública (Sesp), em 1952, no

Vale do Rio Doce, Minas Gerais.

O Sesp, sempre teve como filosofia a "preocupação em adotar soluções tão

simples quanto possíveis, de modo a facilitar a operação dos sistemas pelas respectivas

prefeituras" (Roedel, 1954: 457). E isto foi realizado na Amazônia, com a utilização de

água de subsolo, não havendo, portanto, necessidade de tratamento, apenas cloração.

Entretanto, no Vale do Rio Doce, sobretudo nas cidades de Governador Valadares,

Colatina, Aimorés, Conselheiro Pena e Baixo Guandu, havia necessidade de sistemas mais

complexos. E aí surgiram os problemas de operação e manutenção. Nestas cidades, pouco

tempo após os sistemas terem sido repassados às prefeituras, a qualidade dos mesmos

começaram a se deteriorar, conquanto o Sesp continuasse a fornecer assistência técnica.

Passou-se então a buscar soluções para o problema da administração destes serviços

(Roedel, 1954). Chegou-se até a considerar a hipótese da criação de um único órgão para

administrar os serviços utilizando-se o artifício do subsídio cruzado, mais tarde apropriado

pelo Planasa, no qual os sistemas superavitários cobrem os deficitários. Abandonou-se esta

22. Lei Nº 868 de 31.12.1952.


119

idéia por uma forte reação dos municípios maiores, por haver cidades de diferentes estados

e ainda considerou-se a idéia de que não seria uma boa política retirar da administração

municipal a consciência de sua responsabilidade. Pretendia-se "educar a administração

municipal e possibilitar que, no futuro, todos os encargos fossem a ela transferidos"

(Roedel, 1954: 459).

Criou-se assim a estrutura de um serviço com autonomia administrativa e

financeira, com o máximo de flexibilidade administrativa, com a figura jurídica de uma

autarquia municipal. Os Saae’s foram criados através de lei municipal e a sua

administração contratada com o Sesp. Os primeiros Saae’s criados foram os da cidade de

Governador Valadares, Conselheiro Pena e Baixo Guandu, ainda em 1952. Roedel (1954)

defendia como solução para a operação dos serviços, órgãos autônomos, administrativa e

financeiramente, e orientados por serviço estadual ou federal.

O Sesp / Fsesp passou então a desenvolver este modelo de gestão para os

serviços que criava, mantendo vínculo com os Saae’s através de convênio com as

prefeituras para administração dos mesmos ou para prestação de assistência técnica. Dessa

forma, pioneira na criação de autarquias municipais, a Fsesp criou centenas de Saae’s e

construiu em torno de 1.500 sistemas de abastecimento de águas no Brasil.

O fato da Fsesp não haver repassado a gestão dos serviços diretamente aos

municípios, mantendo na maioria deles o convênio de administração, como era a

proposição inicial, contribuiu para que se reduzisse o potencial de municípios a serem

beneficiados com os recursos humanos e materiais da Fsesp.

Segundo Bastos (1993), outros motivos para o repasse dos serviços aos

municípios não ter ocorrido foram injuções políticas locais, tarifas inadequadas,

arrecadação irregular da receita e seu desvio para outras finalidades, excesso de


120

funcionários, evasão de pessoal treinado e sua substituição por pessoal não habilitado,

provocando queda no padrão operacional.

Pinheiro (1992), identifica ainda um outro aspecto que tenha contribuído

para não ter havido os repasses previstos do serviços, como o que poderia se chamar de

estratégia de sobrevivência do setor de saneamento do Sesp / Fsesp. À medida em que o

setor de saneamento não tinha hegemonia na instituição nem no Ministério da Saúde, e

ainda considerando que na burocracia do Estado o poder está associado a recursos, a

manutenção dos serviços representava poder. A entrega dos serviços, por outro lado

implicaria a perda de capacidade executiva, caracterizando mais o órgão como de

assessoria. No entanto, esta estratégia estagnou a Fsesp, restringindo-a aos serviços que já

administrava. Caso houvesse repasses dos serviços e a construção de novos, poderia ter

havido uma maior dinâmica, inclusive contribuindo para sua viabilização institucional.

O Plano de Financiamento de Serviços Municipais de Abastecimento de

Água

Na 1ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1941, o diretor do

Serviço Federal de Água e Esgotos (Sfae), Alberto Amarante defendeu a seguinte

recomendação que foi aprovada na assembléia final:

É de toda conveniência que o Governo Federal interponha seus bons ofícios


junto aos órgãos paraestatais, que disponham recursos, para a realização de
empréstimos, aos municípios sob garantia dos governos dos estados, a fim
de que sejam instalados serviços de água e esgotos nos núcleos urbanos,
cuja densidade de população permita, por meio de taxas remunerativas, a
manutenção daqueles serviços.
(apud Barreto, 1942).
121

Já em 1941, surgiram os conceitos de financiamento com empréstimos

retornáveis e auto-sustentação dos serviços por intermédio de taxas, como uma

recomendação de uma Conferência Nacional de Saúde.

Os financiamentos existentes até então para o setor saneamento eram

dispersos e pulverizados. Geralmente eram aplicados recursos orçamentários, sendo os

recursos retornáveis utilizados em apenas alguns estados. A nível do Governo Federal,

havia uma multiplicidade de órgãos e uma total falta de política global para o setor. Foi

neste contexto que formulou-se o primeiro plano em saneamento para o Brasil, em 1953.

Alguns mecanismos de financiamento com recursos retornáveis já tinham

sido utilizados antes da década de 50. Segundo a Associação Brasileira de Engenharia

Sanitária e Ambiental (ABES) (1988: 112), "em alguns estados, desde a década dos

quarenta, existiam sistemas de financiamento para o Setor". A Caixa Econômica Estadual

de São Paulo já financiava sistemas de abastecimento de água, em 1952, baseado no

princípio de que o retorno dos investimentos se daria via tarifa. A noção da auto-

sustentação por mecanismo tarifário já era, portanto, aplicada neste período (Pereira,

1968).

Para se ter uma idéia do montante dos recursos financiados pela Caixa

Econômica Estadual de São Paulo, para o período de 1957 / 1969, foram implementados

1.081 contratos, totalizando cerca de US$ 90 milhões, em dólares de 1968 (Pereira, 1968).

No Rio Grande do Sul, foi realizado financiamento através do processo da

compra pelos municípios de títulos da dívida pública estadual. As obras eram construídas

em regime de cooperação entre os dois governos (Costa e Silva e Sevalho, 1955a).

Também em São Paulo as prefeituras chegaram a emitir títulos para levantamento de

recursos a fim de custear obras de abastecimento de água e esgotos sanitários. Segundo


122

Pereira (1968), o regime inflacionário observado no Brasil entre as décadas de 40 a 60, fez

desaparecer totalmente este mecanismo para obtenção de fundos.

Em Pernambuco, foi criado pela Constituição do Estado, em 1947, o Fundo

de Saneamento do Interior, constituído por 5% das rendas tributárias do Estado e 10% dos

impostos municipais de indústria e profissões, de licenças e predial. Foi desenvolvido um

plano estadual para o interior do estado, para ser aplicado em 6 anos, que previa a

construção de sistemas de abastecimento de água e esgotos em nove cidades, com

população superior a 5.000 habitantes. Para tanto, foi realizado empréstimo junto ao Banco

do Brasil, para abastecimento de água, no valor de Cr$ 78 milhões (Costa e Silva e

Sevalho, 1955a).

As Caixas Econômicas Federais realizaram empréstimos aos municípios

para ações de saneamento, ainda na década de 40. Obtiveram empréstimos 200 municípios,

de 13 estados e do Distrito Federal, com taxas de juros de 7 a 12% ao ano, num montante

de Cr$ 650 milhões (Costa e Silva e Sevalho, 1955a).

Em 1952, no segundo governo Vargas, foi concebido o Plano Salte (Saúde,

Alimentação, Transportes e Energia), que apesar de não ter sido implementado, chamou a

atenção para a necessidade de ações de saneamento.

As bases para este plano foram lançadas pelo próprio Vargas, em outubro

de 1952, em discurso realizado no II Congresso Nacional dos Municípios Brasileiros,

realizado em São Vicente, São Paulo:

Vivamente impressionado com o fato de que dos 1900 municípios


brasileiros, mais de 1500 não dispõem de serviço de abastecimento d' água,
o meu governo decidiu facilitar aos governos municipais os recursos
necessários para atender a essa necessidade imperiosa e elementar de seus
habitantes. Para tanto serão mobilizados recursos financeiros do Banco
Nacional do Desenvolvimento Econômico, BNDE, do Banco do Brasil, das
Caixas Econômicas Federais e das instituições de previdência social, além
de reservas técnicas das campanhas de seguros, que terão, assim, aplicação
mais consentânea com os altos interesses da coletividade.
123

(DNERu, 1962: 64)

Em julho de 1953, o Governo Federal criou uma comissão de notáveis para

construir as linhas gerais de um plano nacional de saneamento. E neste mesmo ano foi

lançado o Plano de Financiamento de Serviços Municipais de Abastecimento de Água,

cujas prioridades foram definidas em primeiro lugar para os municípios que não possuíam

sistemas de abastecimento de água e numa segunda etapa, para as ampliações dos sistemas

já existentes. Este plano só contemplava, inicialmente, cidades com população inferior a

50.000 habitantes no curso do ano 1950. Este foi o primeiro plano de financiamento para

as ações de saneamento implementado a nível federal.

A execução do Plano ficou a cargo de várias entidades, de acordo com a

organização já existente no município. Nos locais onde atuava o Sesp, seria dado reforço

financeiro a este órgão. Onde havia departamentos estaduais, estes fariam os projetos. Nos

locais em que não havia nada, as obras seriam contratadas, ou a cargo dos departamentos

estaduais de saúde, delegacias de saúde, etc.

O Plano previa investimentos de Cr$ 800 milhões, no período de 1953 a

1955, anualmente. Os órgãos financiadores deste Plano e os montantes previstos, foram:

Caixas Econômicas Federais (Cr$ 200 milhões), Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico (BNDE) - Cr$ 100 milhões, Tesouro Nacional, via BNDE - Cr$ 300 milhões e

Companhias de Seguros Privados e Capitalização, via BNDE - Cr$ 200 milhões (Ferreira,

1954 e Sanches, 1955).

O financiamento para cada município seria de no máximo de Cr$ 5 milhões,

a juros de 8% e prazo de 15 anos ou juros de 9% e prazo de 20 anos. Como garantia,

seriam entregues pelas prefeituras, 50% das respectivas quotas-partes do imposto sobre a

renda devida a cada município (Sanches, 1955).


124

Outro fato importante deste Plano, foi a preocupação com o aspecto técnico

e sanitário dos projetos, onde o Sesp era o órgão responsável pela avaliação dos projetos,

exigindo uma análise sanitária dos mesmos. Isto fez com que "80% dos projetos

apresentados fossem devolvidos devido a erros no aspecto sanitário, para correção"

(Sanches, 1955). Este autor relatava ainda, aspectos limitadores para a viabilização do

Plano: a) a insuficiência de recursos humanos, principalmente engenheiros sanitaristas com

formação em saúde pública e b) a incapacidade da indústria de atender a demanda, com

prazos muito longos.

Além disso os recursos previstos não foram aplicados totalmente, pois não

foi possível reuni-los entre os órgãos financiadores. Sanches (1955: 429), considera que

"um exame das soluções já propostas revela, de início, que a maior dificuldade consiste em

mobilizar grandes somas para atender às solicitações".

Rodolfo Costa e Silva23 , considera que este Plano no entanto, continha

elementos que o caracterizavam como um plano global para o país. Pois, continha em sua

concepção, estudos de recursos humanos, de infra-estrutura (da indústria e construção),

necessidades de retorno dos empréstimos, viabilidade econômica, aspectos sanitários,

órgãos de assistência técnica e fiscalização, etc.

A partir das falhas detectadas neste plano, foi formulado um outro,

considerando os seguintes aspectos: a) planejamento a longo prazo e b) início em ritmo

lento e aceleração à medida em que as condições nacionais o permitissem.

Neste novo Plano proposto, seriam considerados quatro esquemas de

financiamento, sendo três para a Amazônia, Polígono das Secas e São Francisco, áreas com

23. Entrevista realizada com o ex-Engº da Fsesp e consultor Rodolfo J. Costa e Silva, realizada no Rio de Janeiro, em fevereiro de
1994.
125

dispositivos constitucionais que obrigam a União a aplicar percentuais definidos. E ainda

um quarto para os demais municípios brasileiros.

A União emprestaria a cada cidade, sem juros, a importância de Cr$ 5

milhões, que seriam amortizadas por 50 % da quota do imposto sobre a renda devida aos

Municípios, no prazo máximo de 10 anos e mínimo de 5 anos. As parcelas das

amortizações seriam adicionadas à quantia que o Governo Federal dispusesse, anualmente,

para o Plano, formando um fundo rotativo e permitindo financiar 1.774 municípios no

prazo máximo de 16 anos (Sanches, 1955).

Em áreas que contavam com órgãos de desenvolvimento (Comissões de

Valorização), a estas caberia o controle do Plano. Para as demais, seria indicado um órgão

governamental, especializado em engenharia sanitária, dedicado à regulação. Estes órgãos

deveriam contar com a colaboração das Caixas Econômicas ou Agências do Banco do

Brasil (Sanches, 1955).

E ainda, as prioridades entre as cidades seria determinada por: 1) número de

prédios; 2) média das arrecadações municipais; 3) ordem cronológica de apresentação do

pedido e 4) interesse estratégico.

A partir desta proposta elaborada por Walter Sanches em 1955, foi

apresentado um projeto no ano seguinte com a participação do Sesp para a instituição do

plano e a criação de um fundo rotativo para financiamento de sistemas de água. Este plano

foi instituído pelo Decr. Nº 41.446, de 03.05.1957, que regulamentando o art. 32 da Lei Nº

2.973 de 26.11.1956 e a Lei Nº 2.134 de 14.12.1953, conferiu ao Sesp a responsabilidade

de aprovar os aspectos técnicos e financeiros dos projetos apresentados às CEFs.

"Entretanto, a baixa renda municipal que seria oferecida como garantia do empréstimo,

restringiu de tal maneira a concessão de financiamentos que a lei tornou-se inexequível"

(Leal, 1969: 31).


126

Outros dois planos também foram criados na década de 50, a fim de

financiar serviços de abastecimento de água. Em 53, através de lei do Deputado Aliomar

Baleeiro24, para financiamento de serviços municipais em geral (água, esgotos, energia,

etc.). Esta lei previa que as Caixas Econômicas Federais deveriam reservar 30% de seus

recursos e os Institutos de Previdência deveriam mobilizar 20% de suas arrecadações, em

cada estado, com a finalidade de financiar os serviços previstos na lei. No entanto, segundo

(SANCHES, 1955), as Caixas Econômicas já tinham 80% dos seus depósitos

comprometidos e os Institutos pouco poderiam fornecer aos municípios dos estados mais

pobres. Desta forma a lei foi inviabilizada.Em 54, a lei dos deputados Oswaldo Trigueiro e

Paulo Sarasate, sobre concessão de auxílios aos municípios do Polígono das Secas, define

recursos para instalação de serviços de abastecimento de água. Segundo o Relatório da

Comissão responsável pela elaboração do Plano de Financiamento de Serviços de

Abastecimento de Água, "embora a medida proposta vise dar aos recursos previstos no

artigo 198 da Constituição Federal destinação consentânea com as suas finalidades, ela

representa uma solução parcial para um problema de ordem geral, que se projeta por todo o

país" (apud Sanches, 1955a: 428).

Costa e Silva e Sevalho (1955a: 499), em trabalho apresentado no IV

Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária, em 1954, defendiam alguns pontos

que deveriam nortear as políticas e os planos de governo para o saneamento, quais sejam:

• Para as regiões ricas, a possibilidade do resgate dos empréstimos com


os recursos das próprias arrecadações; para os meios pobres é forçoso
lançar-se mão das dotações orçamentárias;

• O Governo nacional deve tomar a iniciativa de organizar um plano de


financiamento que torne viável a construção de sistemas de
abastecimento de água em todas as comunidades do país;

• Os Governos estaduais e municipais devem ter cada qual a sua posição


definida no plano geral;

24. Lei Nº 2.134 de 14.12.1953.


127

• Os Governos devem facilitar os empréstimos através de créditos


oficiais, além de aumentar as dotações orçamentárias para as zonas
subdesenvolvidas;

• Os serviços devem tornar-se auto-suficientes, qualquer que seja a forma


de custeio;

• Para a operação e manutenção dos sistemas devem ser criadas


autarquias municipais, mantidas pelas taxas de consumo e de melhoria;

• Para planejamento, estudo, construção e supervisão técnico-


administrativa dos sistemas, deverá ser criado um órgão federal,
autônomo e com recursos próprios.

Estes elementos, associados aos definidos nos planos e financiamentos

anteriores, ilustram o quadro de propostas apresentadas e algumas já implementadas até

meados da década de 50. No entanto, já haviam instrumentos técnicos e analíticos para que

se implementasse mecanismos mais eficazes de gestão. Faltavam instrumentos políticos e

econômicos que os viabilizassem, o que viria a ocorrer na década seguinte.

Esse primeiro plano de financiamento em saneamento, já tinha em sua

concepção vários elementos que lhe davam uma dimensão importante, tais como agentes

financeiros, órgão técnico, etc., mas no entanto, teve sua intervenção limitada. Além da

impossibilidade de canalizar recursos financeiros para viabilizá-lo a insuficiência de

recursos humanos foi determinante para sua restrição.

Um elemento fundamental para consolidar os empréstimos enquanto fonte

de financiamento foi a tarifa, possibilitando o retorno dos empréstimos e a possibilidade de

auto-sustentação tarifária.

O problema das tarifas nos serviços de saneamento, até a década de 50,

salvo exceções, era relegada a um plano secundário, apesar de sua importância para a

qualidade dos serviços. As tarifas (na verdade, eram mais utilizadas as taxas) eram

geralmente insuficientes para o custeio da operação e manutenção, seja por uso político,
128

por desvio para cobrir outros setores dos municípios ou para viabilizar o acesso das

populações mais carentes, prejudicando economicamente os serviços. Nestes casos, a

solução era a subvenção ou as arrecadações indiretas. As melhorias necessárias nos

sistemas e serviços só se faziam em situações de emergência, como já denunciara

Saturnino de Brito no início do século.

Em quase todos os casos, havia necessidade de se utilizar verbas

orçamentárias e ainda taxas indiretas, como as taxas de melhorias, para cobrirem-se os

déficits. As taxas de melhorias são contribuições aplicadas sobre as propriedades

imobiliárias beneficiadas com a implantação dos sistemas, até hoje utilizadas (Costa e

Silva e Sevalho, 1955a).

Naquele período (até a década de 50), em alguns países as taxas adotadas

para os serviços de água eram decrescentes com o aumento do consumo. No Brasil, em

Manaus e Belém, onde os serviços foram construídos pelos ingleses, também adotou-se

este critério. Esta prática induz a gastos excessivos, supérfluos e favorece o consumo

industrial. No Brasil, com uma oferta de água sempre aquém da demanda, segundo Costa e

Silva e Sevalho (1955a), deve-se adotar o critério inverso, ou seja, taxas progressivas com

o aumento do consumo.

Em 1948, Camargo (apud Costa e Silva e Sevalho, 1955b: 482) estudando o

abastecimento de água de São Paulo, a partir de considerações sobre: i) os custos

excessivos para obras de reforço nos sistemas; ii) a necessidade de medidas repressivas ao

desperdício, e ainda iii) a conveniência de preços que induzam a indústria a buscar

abastecimento próprio, propôs: "a classificação dos consumidores em grupos,

estabelecendo as taxas em progressão crescente com o consumo".

Esta concepção possibilitou a formação de uma estrutura tarifária que,

através de uma equação financeira, considerando tipos de consumidores e faixas de


129

consumo (que são em média, proporcionais ao estrato social), viabilizasse os serviços de

forma socialmente justa.

Já na década de 50, vários serviços utilizavam as taxas progressivas, como

os Saae’s administrados pela Fsesp, e mesmo outros serviços autônomos no estado de São

Paulo, como São José dos Campos. Estes municípios com a utilização da taxa progressiva

para custeio apenas da operação e manutenção ou ainda da depreciação e amortização dos

investimentos, implementavam o princípio da auto-sustentação tarifária dos serviços

(Victoretti, 1954 e Costa e Silva e Sevalho, 1955b).

Estes últimos autores, em um outro trabalho, defendiam em relação às taxas

as seguintes recomendações:

• toda água consumida deve ser paga

• taxa mínima para que as classes mais pobres possam utilizar a água
suficiente para a higiene e nutrição

• o preço cobrado pela quantidade de água que exceder a taxa mínima


deve crescer com o consumo

• taxa especial para os estabelecimentos ligados à saúde pública, escolas


e torneiras públicas

• taxas nas regiões subdesenvolvidas devem custear, no máximo a


operação e manutenção e melhoramentos, sem se preocupar com o
capital empregado na construção

Podemos perceber que até meados deste século, tivemos uma grande

diversidade de órgãos atuando sob as mais diferentes formas no Brasil. Mas algumas

caraterísticas da gestão em saneamento já estão esboçadas e mesmo consolidadas na

década de 50. As principais características são: a busca pela autonomia dos serviços, o que

significou a constituição das autarquias como modelo jurídico de organização e o uso da

tarifa como instrumento de custeio dos serviços. Do ponto de vista do financiamento, a

principal fonte de recursos para o setor continuava a ser recursos orçamentários federais e
130

estaduais. No entanto, as linhas básicas de financiamento com recursos retornáveis para

investimentos, já estavam dados.

As sociedades de economia mista - década de 60

Introdução

Neste item abordaremos destacadamente a gestão e o financiamento dos

serviços de saneamento, devido à grande diversidade de formas de organização dos

serviços e dos mecanismos de financiamentos consolidando as propostas já esboçadas na

década anterior. No subitem gestão analisaremos destacadamente a diversidade de ação do

Governo Federal e dos estados.

Na busca pela autonomia dos serviços de saneamento, um novo passo foi

dado no sentido de auferir maior flexibilidade a estes serviços, equiparando-os a empresas

privadas: a constituição das sociedades de economia mista, empresas da administração

indireta. Este seria o novo modelo de organização jurídica que começava a se incorporar ao

setor de saneamento, em que a operação é descentralizada administrativamente, em uma

mesma esfera de poder, ou através de concessão para outro nível.

O primeiro serviço de saneamento sob a forma de economia mista no Brasil

foi criado ainda na década de 50 - Campina Grande S.A. (Sanesa)25 - e teve sua criação

autorizada sua constituição por lei municipal em 1955, ficando vinculada à Prefeitura. No

25. Lei Nº 1.307 de 04.11.1955.


131

entanto, este órgão só veio a constituir-se em 1959 (Arruda26 e Coutinho e Ribeiro, 1965).

Ataulpho Coutinho (1965), em visita a esta cidade, teceu elogios gerais quanto a

administração de pessoal, materiais, a estrutura adequada e à flexibilidade desejável,

embora a cobertura da rede ainda fosse insuficiente.

Mas é com a criação da Sudene27 e do Banco Interamericano de

Desenvolvimento (BID) em 1959, e de mecanismos de financiamento implementados pelo

Governo Federal a partir de 1965 - inicialmente via DNOS e depois via BNH - que tomou

impulso a constituição dessa forma de organização dos serviços.

A gestão - A ação federal

A criação da Sudene, na década de 50, ocorre a partir de uma nova

abordagem da problemática do Nordeste baseada em críticas à concepção da intervenção

através apenas de obras contra as secas. Propõe-se um novo enfrentamento, a partir do

ponto de vista do desenvolvimento econômico28.

Em 1959, foi criada a Sudene29, em meio a um processo de grande debate

na opinião pública nacional. A Sudene era mais um passo significativo no planejamento

regional que tinha se iniciado em 1952 com a criação do Banco do Nordeste do Brasil

(BNB)30.

26. Entrevista realizada com o Engenheiro da Sudene Alfredo Arruda, que participou da constituição da Caene e de sua primeira
diretoria, realizada em Recife, em setembro de 1993.
27. Lei Nº 3.692, de 15.12.1959.
28 No Governo Juscelino, em 1956, foi criado28 o Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), com o intuito de
dar uma abordagem de desenvolvimento à região.Os instrumentos adotados para o combate à seca foram duramente questionados
naquele momento, passando-se a tratar a problemática dentro de um planejamento global. O GTDN formula propostas sob o ponto de
vista do desenvolvimento econômico do país. Em 1959, este grupo de trabalho é transformado em Conselho de Desenvolvimento do
Nordeste - Codeno28 , sob o comando de Celso Furtado.
29. Lei Nº 3.692 de 15.12.1959.
30. Lei Nº 1.649 de 19.07.1952.
132

Celso Furtado (apud Campos 1985: 66), via a necessidade da criação de

uma economia no Nordeste, segundo a qual " ... o próprio título de ‘obras contra as secas’

expressa uma limitação, focalizando o problema sobretudo pelas obras de engenharia", ao

contrário, o planejamento regional definiria as diretrizes econômico-sociais.

A Sudene passou a atuar também em saneamento - mais uma entidade

federal a fazê-lo - e foi através de seu primeiro Plano Diretor31 lançado em fins de 1961,

que foram definidas diretrizes de intervenção.

Entretanto, as restrições impostas pelo Plano Diretor criaram obstáculos

intransponíveis a municípios que isiladamente desejavam ter acesso a linhas de

financiamento destinadas a obras de abastecimento de água. Este Plano Diretor

condicionou a participação dos incentivos da Sudene, através das sociedades de economia

mista, como pode-se verificar a seguir:

Art. 6º - É facultado à Sudene promover a organização, a incorporação ou a


fusão de sociedades de economia mista, para a execução de obras
consideradas de interesse ao desenvolvimento do Nordeste, bem assim para
a prestação de assistência técnica, contábil ou administrativa, a entidades
estaduais ou municipais responsáveis pela execução de serviços de
importância básica para aquele desenvolvimento.

Art. 10 - Os recursos financeiros, consignados no Orçamento Federal ou


autorizados por lei especial, destinados a serviços e obras de eletricidade ou
de abastecimento de água, incluídos no Plano Diretor da Sudene, inclusive
os já executados por intermédio da Chesf ou outras sociedades de economia
mista, constituirão capital da União nas aludidas sociedades.

Art. 11 - Os recursos financeiros para os fins mencionados no artigo


anterior, quando atribuídos a terceiros, somente serão entregues aos
beneficiários depois de satisfeitos os requisitos legais necessários a
assegurar a participação da União, com as ações correspondentes, no capital
das sociedades constituídas para a exploração dos aludidos serviços.
(Sudene, 1962: 66 e 69)

Desta forma, a Sudene fomentou uma nova concepção para o setor que iria

influir consideravelmente na conformação de uma nova fase do saneamento nacional.


133

O mecanismo utilizado pela Sudene para desenvolver as ações de

abastecimento de água e esgotos, se deu através da constituição de uma concessionária sob

seu controle e ao mesmo tempo o incentivo aos estados a criarem companhias estaduais de

saneamento básico.

Esta estratégia da Sudene foi decorrente da inviabilidade do repasse de

recursos apenas para os serviços constituídos sob forma de sociedade de economia mista,

porque naquele momento só havia um serviço constituído sob esta forma, o Sanesa de

Campina Grande. Seria impossível transformar todos os serviços municipais do Nordeste

em companhias mistas, para receberem os incentivos. Desta forma constituiu-se a

Companhia de Águas e Esgotos do Nordeste S.A (Caene), empresa de economia mista,

como subsidiária da Sudene e incentivou-se os estados a constituírem companhias

estaduais de saneamento básico (Cesb). Ainda em 1962, foi criada a primeira Cesb no

Brasil, em Alagoas, a Casal.

A Caene foi criada então, em junho de 1962, com o objetivo de viabilizar a

utilização dos recursos a serem aplicados em sistemas de águas e esgotos nos municípios,

atuando como concessionária destes. A Caene era uma sociedade de economia mista, da

esfera federal, com ação regional, e ainda, atuava apenas na administração dos serviços, no

projeto técnico e no repasse de recursos da Sudene, não atuando na construção, nem na

assistência técnica (Arruda32).

No 2º e 3º Planos Diretores da Sudene, houve um abrandamento dos artigos

10º e 11º do 1º Plano, abrindo o acesso aos recursos, para os municípios e órgãos estaduais

da administração direta ou autarquias. O 4º Plano Diretor, de 1968, no entanto, voltou a

31. Lei Nº 3.995, de 14.12.1961.


32. Entrevista supracitada.
134

exigir que o repasse dos recursos fossem feitos exclusivamente às sociedades de economia

mista. Constituíram-se então diversas companhias estaduais no Nordeste a partir de então.

A Sudene tinha uma restrição muito grande de repassar recursos

diretamente aos municípios, preferindo repassá-los aos órgãos estaduais. A avaliação, na

época, era a de que os municípios não tinham capacidade de administrar os serviços. Daí, a

preferência pelos órgãos estaduais ou pela concessão diretamente à Caene. Por este motivo,

a Caene não atuou como órgão de assistência técnica, pois avaliou-se que os municípios

não conseguiriam administrar os serviços a contento, mesmo com apoio técnico. Daí este

órgão atuar como concessionária, apenas na administração dos serviços (Arruda33).

Esta diretriz reduziu o raio de ação da Caene, pois se este órgão tivesse

atuado no apoio à constituição de serviços, na assistência técnica, mais municípios

poderiam ter sido beneficiados.

A Sudene, através da Caene, atuou no sentido de coordenar as ações com os

demais órgãos que atuavam no Nordeste, para tanto realizou vários convênios com o

objetivo de repassar os sistemas construídos. Órgãos estaduais, a Fsesp (em alguns casos),

o Dnocs, DNOS e o DNERu, construíam os sistemas entregando-os à Caene. Este órgão

chegou a operar mais de 100 municípios. Com a constituição das Cesb’s, a Sudene passou

a investir diretamente nestes órgãos, reduzindo assim a ação da Caene (Arruda34).

Com a criação no BNH, de instrumentos de financiamento para o

saneamento, a partir de 1967, a Caene passou a transferir para as Cesb’s os serviços sob

sua administração (Tavares, 1977). Com o advento do Planasa em 1971, a Caene teve suas

atividades reduzidas, vindo a ser extinta em 1972.

33. Ibid.
34. Ibid.
135

A Sudene constituiu ainda, uma outra subsidiária para atuar na perfuração

de poços para abastecimento de água. Foi a Companhia Nordestina de Sondagem e

Perfuração (Conesp), ainda hoje existente. Os objetivos deste órgão eram a perfuração de

poços e a construção de chafarizes públicos para os povoados e vilas. Esses sistemas eram

construídos e entregues às prefeituras para sua administração. Estas mesmas ações também

eram desenvolvidas pelo Dnocs e órgãos estaduais de perfuração de poços no nordeste. No

entanto, para se ter uma idéia da incapacidade administrativa das prefeituras, dos 1.730

poços construídos pela Conesp até 1977, 60% desses estavam inoperantes, devido à

precária operação e manutenção (Tavares, 1977)!

O Governo Federal, também fomentou esta nova etapa do setor, através do

DNOS que passou a ter uma atuação mais consistente no financiamento. A União captou

recursos externos da Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional (Usaid), e

o DNOS coordenou o Grupo Executivo do Fundo Nacional de Financiamento para

Abastecimento de Água (GEF), em 1965. Desta forma o DNOS influenciou não só para a

constituição de companhias mistas, como de autarquias, contribuindo assim para uma

maior racionalização do modelo.

Em 1967, com a assunção pelo BNH dos compromissos do GEF e a criação

do Sistema Financeiro do Saneamento (SFS), ocorreu um substancial reforço às diretrizes

adotadas pelos organismos supracitados. Vários órgãos foram criados / transformados para

acessarem aos recursos do SFS.

Um outro organismo que teve importância fundamental na transformação da

forma de organização e financiamento dos serviços no Brasil, foi o Banco Interamericano

de Desenvolvimento (BID). Pois, devido às exigências contratuais para a concessão de

financiamentos, havia a necessidade de mudança na organização da grande maioria dos


136

serviços. Desta forma, contribuiu para a introdução, em paralelo com a Sudene, de novos

paradigmas em financiamento e gestão empresarial no Brasil.

O BID35 exigia autonomia total dos serviços para a contratação de

empréstimos, além do estudo de viabilidade econômica que previa a amortização destes via

tarifas. As exigências levaram a que alguns órgãos transformassem sua forma jurídica, para

estarem aptos a acessarem estes empréstimos. O maior exemplo deste fato, foi a

transformação do Departamento de Águas da Sursan, no Rio de Janeiro, de autarquia em

companhia de economia mista, a Cedag. O BID exigia para a liberação de empréstimos

informações sobre os órgãos que reivindicavam esses recursos, tais como a descrição das

funções e responsabilidades, grau de autonomia, autoridade para taxação e arrecadação e

legislação, influenciando desta forma a transformação da constituição jurídica dos serviços

de água e esgoto.

Até a década de 60, a gestão dos serviços de águas e esgotos não se deu

apenas no através do nível municipal, como muito se tem dito, na verdade, ocorria uma

multiplicidade de formas de ação, nas várias etapas de um sistema de águas e/ou esgotos.

Vários órgãos atuavam num mesmo sistema, em suas várias etapas. Como por exemplo o

DNERu, o DNOS e o Dnocs, que projetavam, financiavam e construíam os sistemas e o

município ou o estado administrava, ou ainda em alguns casos a Caene.

A nível Federal, no início da década de 60, existiam 17 órgãos atuando na

área de saneamento, entre os quais (Brasil, 1966):

• Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS)

• Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs)

• Fundação Serviços de Saúde Pública (Fsesp)


35. O BID, criado em 1959, inicia suas atividades em 1960, com duas linhas de crédito para fins sociais: o Fundo de Operações
Especiais - FOE, com juros de 4% ao ano; de 8 a 18 meses de carência e 30 anos para a amortização e o Fundo Fiduciário de Progresso
Social - FFPS, que incluía os sistemas de água e esgotos, administrado pela Aliança para o Progresso, com juros de 2,75% ao ano.
137

• Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERu)

• Divisão de Engenharia Sanitária do MS

• Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia (SVEA)

• Sudene (principalmente através das subsidiárias Caene em ações de


saneamento básico e a Conesp em perfuração de poços)

• Comissão Vale do São Francisco (CVSF)

• Comissão de Fronteiras

• Plano do Carvão

• Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM)

• Seção de Engenharia Sanitária do Ministério da Guerra e

• Sudam

Dos órgãos supracitados, apenas a Fsesp tinha uma ação em todas as etapas

dos sistemas, desde o projeto até a operação, isto levava a uma situação precária de

operação e manutenção em vários sistemas, como podemos confirmar na citação abaixo:

Os demais órgãos existentes dedicam especial interesse ao projeto e à


construção dos sistemas. A operação permanece historicamente relegada a
plano secundário.
(Branco, 1966: 123)

A gestão - A ação estadual

Na década de 60, haviam dois modelos de gestão se consolidando, quais

sejam, o serviço autônomo / municipal e a gestão estadual dos serviços de saneamento.

Este último era defendido por especialistas do setor desde a década de 40.

A gestão estadual para os serviços de saneamento era defendida alegando-se

sempre a incapacidade técnico-administrativa dos municípios. Antônio Siqueira, ainda em

1947, já defendia a gestão dos serviços a nível estadual, apontando os aspectos técnicos e
138

econômicos como os principais, como argumentos para a gestão nesta esfera de governo.

Ainda em 1950, no VIII Congresso Brasileiro de Higiene (CBH), Lima e Guimarães, além

de Sanches, sugerem a criação de órgãos estaduais de saneamento como a melhor forma de

gestão dos serviços. No X CBH, em 1952, Silva propõe a criação de departamentos

estaduais de saneamento devido à incapacidade demonstrada por alguns municípios na

gestão de seus serviços e cita os departamentos estaduais já existentes no Rio Grande do

Sul, Minas Gerais, São Paulo e Pernambuco. Nas recomendações do XI CBH, também foi

enfatizada a necessidade da criação de departamentos estaduais, além disso, é proposta a

criação de financiamentos por parte do Governo Federal, através da Caixa Econômica

Federal e dos fundos de previdência. Mais uma vez, Sanches em 1954, defende o modelo

de ação pelos estados, com a participação dos municípios.

Forçados pelos novos mecanismos de financiamento em processo de

consolidação, a partir dos incentivos da Sudene e do BID, mas principalmente a partir do

do BNH, através dos financiamentos com recursos do FGTS, e visando adequar-se às suas

exigências, vários municípios, e principalmente os estados, experimentaram diversos tipos

de gestão em serviços de água e esgotos na década de 60.

A partir de 1962 até 1968, foram criadas por orientação da Sudene, as

seguintes companhias estaduais no Nordeste: Caema (MA), Agespisa (PI), Cagepa (PB),

Sanecap (PB), Sanepe (PE), Saner (PE) e Casal (AL). Além disto, antigos departamentos

estaduais da administração direta, foram transformados em autarquias, tais como: Daaes

(São Luiz), Saagec (CE), DAE (RN), Deso (SE), Saer (BA) e Seseb (BA) (Almeida e

Silva, 1969).

No Paraná, com a constituição da Saneamento do Estado do Paraná

(Sanepar) e do Fundo Estadual de Água e Esgotos (FAE), em 1963, a concessão dos

financiamentos estava condicionada à criação pelos municípios de uma autarquia


139

municipal ou uma empresa de economia mista. A criação da Sanepar, por sua vez, não

significou a extinção do Departamento de Água e Esgotos (DAE), que manteve a sua

atuação como entidade autárquica. A ação da Sanepar se deu tanto na administração dos

serviços através de concessão, como no financiamento via o Fundo Estadual de Água e

Esgotos (Borsari Neto, 1969).

Em Minas Gerais, foi criada em 05.07.1963 e constituída em 1964, a

Companhia Mineira de Água e Esgotos (Comag), empresa estadual dotada de grande

flexibilidade institucional, na medida em que a relação estabelecida com os municípios era

variável. A Comag prestava assistência técnica, financeira ou mesmo assumindo

diretamente a concessão dos serviços, adequando-se às realidades e demandas dos

mesmos. Segundo Chapadeiro36, este era o modelo ideal de órgão estadual no fomento ao

saneamento básico, e que foi sugerido ao GEF, a fim de ser incentivado aos outros estados.

No Rio Grande do Sul, em 1965, lei estadual37 autorizou o poder executivo

a constituir empresa mista, o que aconteceu em fevereiro de 1966, com a criação da

Corsan. Em 1968, foi constituído o FAE e neste mesmo ano a Corsan já administrava 103

dos 112 serviços de abastecimento de água existentes no estado (Maggi, 1968 e Maggi,

1969). A característica marcante da Corsan, como do DAE, que a antecedeu, era a

administração dos serviços, sendo pequena sua ação a nível de assistência, o que aliás,

sempre foi tradição neste estado.

No Estado de São Paulo, houve toda uma reformulação na gestão e no

financiamento a partir dos incentivos via BNH. Criou-se o Fundo Estadual de Saneamento

Básico (Fesb), em 1968, com o objetivo de atuar no interior do estado, exceto a Baixada

Santista e a Região Metropolitana, abrangendo um total de 530 municípios.

36. Entrevista realizada com o ex-Engº do DNERu e DNOS, Clarismundo Chapadeiro, realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1993.
37. Lei Nº 5.167 de 21.12.1965.
140

Em 1969, transformou-se o Fundo Estadual de Saneamento Básico, em

Fomento Estadual de Saneamento Básico, também Fesb38, entidade autárquica. As áreas de

ação desta autarquia, abrangiam o abastecimento de água e esgotamento sanitário no

interior do estado; controle da poluição das águas e suporte tecnológico para o

desenvolvimento desses dois programas (Victoretti, 1971).

O Governo do Estado procedeu a partir de então, a constituição de várias

companhias para atuar com abrangências e competências variadas, como podemos ver

abaixo (Victoretti, 1971; Pereira, 1969; Abes, 1973 e Sabesp, 1988):

• Companhia Metropolitana de Água de São Paulo (Comasp). Criada em


03.1968, com os objetivos de captar, tratar e fornecimento de água no
atacado para os 38 municípios da RMSP, inclusive ao DAE, que voltou
a ter abrangência restrita ao município de São Paulo;

• Companhia de Saneamento da Baixada Santista (SBS). Criada em


01.1970, em substituição ao Serviço de Água de Santos e Cubatão
(Sasc), a Repartição de Saneamento de Santos (RSS) e os Serviços
Públicos do Grarujá, os três da administração direta, com atuação em 5
municípios;

• Companhia Metropolitana de Saneamento de São Paulo (Sanesp).


Criada em 06.05.1970, com os objetivos de interceptar, tratar e
disposição final de esgotos, dos 38 municípios da RMSP;

• Superintendência de Água e Esgotos da Capital de São Paulo (Saec).


Autarquia criada em 26.05.1970, em substituição ao DAE, para
administrar e operar os sistemas de distribuição e coleta de águas e
esgotos, respectivamente;

• Companhia Regional de Água e Esgotos do Vale do Ribeira (Sanevale).


Constituída em 12.05.1972, com atuação em 20 municípios.

Podemos perceber a diversidade de órgãos da esfera estadual, para atuar

com abrangências e intervenções diferenciadas. Dois órgãos atuavam com abrangência

metropolitana no fornecimento de água (Comasp), no atacado e interceptação de esgotos

(Sanesp). Os municípios atuavam apenas no varejo, ou seja, na distribuição de água e

38. Decreto-Lei Nº 172 de 26.12.1969.


141

coleta de esgotos. Dois outros órgãos - Sanevale e SBS - com abrangência de uma bacia

hidrográfica, atuavam em água e esgotos, no atacado e no varejo.

O Estado de Pernambuco também promoveu alterações importantes,

objetivando adequação às diretrizes da Sudene e do SFS, através da constituição de duas

empresas estaduais, e de um fundo estadual, todos criados pela Lei Nº 6.117 de

21.06.1968, quais sejam (Pernambuco, 1968):

• Saneamento do Recife S/A (Saner). Destinada a prestar e administrar os


serviços de água e esgotos de Recife;

• Saneamento do Interior Pernambucano S/A (Sanepe). Destinada a


prestar e administrar os serviços de água e esgotos do interior do
Estado;

• Fundo de Saneamento de Pernambuco (Fundespe). Órgão autárquico ,


criado com os objetivos de prover meios para financiamento de
programas e projetos de saneamento em todo o Estado.

O Estado da Paraíba também modificou sua gestão em saneamento básico a

partir de diretrizes da Sudene e do SFS, criando os seguintes órgãos (Viana, 1977 e Abes,

1973):

• Saneamento da Capital S/A (Sanecap). Constituído em 1966, com


competência para administrar os serviços de águas e esgotos de João
Pessoa, como uma subsidiária da Cagepa;

• Companhia de Águas e Esgotos da Paraíba (Cagepa). Também criada


em 1966, com atuação em todo o Estado, exceto a capital e Campina
Grande. A Sanesa, empresa desta última cidade, após a constituição da
Cagepa, torna-se sua subsidiária, deixando a órbita municipal.

No Estado da Bahia também ocorreu o mesmo (Abes, 1973):

• Empresa Baiana de Águas e Saneamento S/A (Embasa). Criada em


22.06.1971, sob forma de ‘holding’, controlando as três subsidiárias
abaixo;

• Companhia Metropolitana de Águas e Esgotos (Comae). Criada em


1972, após transformação da Saer, com atuação na RM de Salvador;
142

• Companhia de Saneamento do Estado da Bahia (Coseb). Criada em


1971, após transformação da Seseb, com atuação no interior do Estado
da Bahia;

• Companhia de Engenharia Rural da Bahia (Cerb), criada em 1972.

No Estado do Rio de Janeiro (Abes, 1973):

• Companhia Estadual de Águas da Guanabara (Cedag). Criada em


24.12.1962, mas só foi constituída em 20.10.1965, com atuação no
sistema de águas da Cidade-Estado da Guanabara;

• Empresa de Saneamento da Guanabara (Esag). Criada em 26.10.1972,


com atuação em esgotamento sanitário na Guanabara;

• Companhia de Saneamento do Estado do Rio de Janeiro (Sanerj).


Criada em 06.01.1972, destinada a prestar e administrar os serviços de
águas e esgotos no Estado do Rio de Janeiro, após transformação da
autarquia estadual Sucesa.

A tabela abaixo resume as transformações ocorridas na constituição de

órgãos estaduais de água e esgotos:


143

Constituição das Companhias Estaduais de Saneamento Básico no Brasil


UF Nome Data Criação Observação

RR Caer 1969
AP Caesa 1969
AM Cosama 1970
PA Cosanpa 21.12.1970
RO Caerd 1969
AC Sanacre 1971
TO Saneatins 1990 Após criação do Estado.

MA Caema 29.07.1966 Cia. de Saneamento de S. Luiz, existia pararelamente à


Caema, sendo incorporada em 1971.
PI Agespisa 1964 Até 1971, operava apenas Teresina.
CE Cagece 20.07.1971
RN Caern 26.06.1969
PB Cagepa 31.12.1966 Sanesa (1959) e Sanecap (1966), subsidiárias, incorporadas
em 27.06.1972.
PE Compesa 29.07.1971 Saner (1968) e Sanepe (1968), subsidiárias, incorporadas em
1973.
AL Casal 01.12.1962
SE Deso 01.03.1970
BA Embasa 22.06.1971 Comae (1972), Coseb (1971) e Cerb (1972) incorporadas
posteriormente.
GO Saneago 13.09.1967
MT Sanemat 03.08.1976
MS Sanesul 1979 Após desmembramento do MT.
DF Caesb 08.04.1969
MG Copasa 1974 Incorporação da Comag (1963).
ES Cesan 1967
RJ Cedae 1975 Após fusão RJ / Guanabara, incorporação da Cedag (1965),
Esag (1972) e da Sanerj (1972).
SP Sabesp 29.07.1973 Incorporação Comasp (1968) e Sanesp (1970), absorção do
patrimônio da Saec (1970) e parte da SBS (1968), Sanevale
(1972) e Fesb (1968), que prestaram serviços à Sabesp até
1975, sendo então incorporadas.
PR Sanepar 23.01.1963
SC Casan 02.07.1971
RS Corsan 21.12.1965

FONTE: Abes (1973), Abes / Cabes XVI (1992) e Sabesp (1988).
144

Nela podemos observar, (ao contrário do que afirmaram Bier e outros,

1988; Paula, 1990: 29; Fiszon, 1990: 36 e Magalhães, 1993: 1) que a gestão dos serviços

de saneamento básico no Brasil, no período que precede o Planasa, não se deu apenas no

nível municipal, a maioria dos estados brasileiros já dispunham de Companhias Estaduais

de Saneamento Básico (Cesb).

Pode-se perceber que, mesmo tendo havido mudanças posteriores à

constituição das primeiras Cesb’s, apenas quatro estados não dispunham deste tipo de

órgão antes de 1971, quando da criação do Planasa (AC, BA, MT e SC). Em 10 estados,

houvera Cesb’s constituídas antes do Sistema Financeiro do Saneamento no BNH em 1968

(MA, PI, PB, AL, GO, MG, ES, Guanabara, PR e RS), enquanto em outros 13 estados

tivemos estes órgãos constituídos entre 1968 e 1970 (RR, AP, AM, PA, RO, CE, RN, PE,

SE, BA, DF, RJ e SP), caracterizando a influência do BNH nas políticas do setor.

Em 1967, foi realizada uma pesquisa envolvendo o Ministério da Saúde

(MS), a Organização Panamericana de Saúde (OPS) e a Organização Mundial de Saúde

(OMS), a fim de se conhecer melhor alguns aspectos quantitativos dos sistemas de águas e

esgotos existentes nos municípios brasileiros e a população atendida pelos serviços. Nesta

pesquisa foi incluída como variável o tipo de concessionária dos serviços nos municípios:

particulares, federais, estaduais e municipais. A tabela abaixo ilustra como se distribuía a

população residente nos municípios por tipo de prestador de serviço e os números destes

serviços por estado.

Os dados apresentados se referem apenas às sedes39 dos municípios que

tinham, em 1967, sistemas públicos de abastecimento de água, que na época perfaziam um

total de 1.956, num universo de 3.938 municípios. O percentual da população urbana

39. O critério adotado pelo IBGE no Censo de 1960, para população urbana, compreendia os núcleos urbanos e suburbanos das
cidades e vilas. A população urbana, não incluída neste estudo (das vilas), representava, em 1967, 11 %.
145

abastecida era de 53%, a população abastecida residente nas sedes era de 69% e a

população total do país abastecida representava 27%.

Os dados abaixo mostram que 12% das sedes municipais que tinham

serviços de abastecimento de água em 1967, estes eram concedidos a órgãos estaduais e

representavam 37% da população residente nestes municípios. Enquanto que 76% dos

municípios administravam seus próprios serviços, representando 54% da população

brasileira.
146

Número de Sedes Municipais com Serviço Público de


Abastecimento de Água1 e Estimativa das Populações dos
Respectivos Municípios, por Tipo de Concessão2, por Unidade da
Federação, Brasil - 1967

POP. x 1.000

TOTAL FEDERAL ESTADUAL MUNICIPAL PRIVADO
UF 
Nº POP. Nº POP. Nº POP. Nº POP. Nº POP.


BR 1.969 62.904 112 2.791 241 23.189 1.504 34.188 112 2.736

RO 2 107 1 77 - - 1 30 - -
AC 1 68 - - 1 68 - - - -
AM 17 583 2 45 1 242 13 290 1 6
RR 2 39 - - - - 2 39 - -
PA 33 1.268 9 116 1 546 23 606 - -
AP 4 48 1 69 - - 3 29 - -

MA 11 769 3 145 1 213 6 386 1 25


PI 20 524 4 146 - - 2 151 4 227
CE 66 2.724 25 635 - - 37 1.997 4 92
RN 15 453 3 24 5 333 5 63 2 33
PB 38 1.001 16 209 7 330 7 129 8 333
PE 68 3.161 7 308 18 1.639 33 1.000 10 214
AL 32 773 2 32 12 338 14 356 4 47
SE 21 457 5 106 2 200 12 113 2 38
BA 113 3.686 21 520 22 1.488 65 1.646 5 32

MG 614 10.076 7 147 6 132 571 9.280 30 517


ES 46 1.608 1 30 3 236 40 1.261 2 81
RJ 64 4.280 2 89 32 2.455 28 1.604 2 132
GB 1 4.031 - - 1 4.031 - - - -
SP 454 15.054 - - 7 5.942 444 9.105 3 7

PR 99 3.689 - - 15 1.075 72 2.172 12 442


SC 33 1.053 1 59 6 291 17 536 9 167
RS 138 5.238 1 14 95 3.117 29 1.764 13 343

MT 40 826 1 20 1 82 38 724 - -
GO 36 990 - - 5 431 31 559 - -
DF 1 348 - - - - 1 348 - -

FONTE: Ministério da Saúde / Organização Panamericana de Saúde / Organização Mundial de Saúde (1970).
OBS.: 1. Considerou-se como sistema público de abastecimento de água, rede pública e chafariz.
2. A diferença existente entre o total de domicílios para o Brasil e por UF, por tipo de concessão,
é decorrente do fato de ter havido duplicidade de órgãos explorando os serviços num mesmo município.
147

Esta pesquisa também nos mostra que das capitais brasileiras, apenas 5

eram administradas pelos municípios, enquanto 18 o eram pelos respectivos estados.

E ainda, o relevante montante de 112 municípios com serviços

administrados pela iniciativa privada através de concessões, existentes em 1967, mostrados

na pesquisa do MS / OPS / OMS. Havia também municípios com gestão mista, com

sistemas privados e municipal ou privados e estadual. Natal e Fortaleza, duas capitais de

estado, apresentavam a exploração de seus serviços cedidas ao Escritório Saturnino de

Brito, até a década de 50. E Santos teve seus serviços de águas explorados pela City até

1953.

No momento imediatamente anterior a atuação do BNH em saneamento

básico ou seja, em 1967, já havia um vasto acervo de experiências de gestão a nível

estadual, ao contrário do que é usualmente afirmado.

O financiamento na década de 60

Até a década de 60, o Estado financiava majoritariamente com recursos

orçamentários vários órgãos da administração direta ou indireta. Apenas no Governo

Federal havia cerca de 17 órgãos que investiam em saneamento recursos quase sempre sem

retorno. A crítica a este mecanismo é oriundo pelo menos desde a década de 40, pois

levava à restrição do atendimento à demanda. Estas críticas foram reforçadas mesmo por

organismos que, possivelmente, tinham abordagens diferenciadas sobre o problema, como

a Sudene e o BID.

A Sudene financiava ações de saneamento, seja diretamente através da

subsidiária Caene, para os municípios a ela vinculados, ou diretamente a órgãos municipais

e preferencialmente aos órgãos estaduais. Com a constituição da Conesp, outra subsidiária


148

da Sudene, para perfuração de poços, também este órgão investia recursos em

abastecimento de água.

Os empréstimos do BID para saneamento foram iniciados em 1961, sendo o

primeiro para a cidade de Arequipa no Peru, no valor de US$ 4 milhões. No Brasil, estes

investimentos também se iniciaram em 1961, sendo o primeiro empréstimo realizado para

ampliação do sistema de abastecimento de águas de Salvador, a cargo da Superintendência

de Águas e Esgotos do Recôncavo (Saer). Em 1962, foi realizado empréstimos para a

Superintendência de Urbanismo e Saneamento (Sursan), do Rio de Janeiro, sendo este o

maior empréstimo para saneamento no Brasil na década de 60. Foram realizados quatro

empréstimos no valor de US$ 36 milhões (em dólares correntes) para a ampliação da

adutora de Guandu e outro de US$ 11 milhões para esgotamento sanitário na zona norte do

Rio (Drucker, 1965).

Uma mudança significativa ocorrida na Sursan, foi na cobrança da tarifa. A

Sursan, até então cobrava taxa d'


água de valor ínfimo, mas por exigência do contrato,

mudou-se toda a sua estrutura, passando a cobrar tarifa que cobrisse os custos reais, de tal

forma que se obtivesse a auto-sustentação dos serviços de água e esgotos. A arrecadação

prevista deveria cobrir os custos de operação, manutenção, expansão dos serviços e a

amortização dos empréstimos (Drucker, 1965).

Ainda em 1962, foi realizado empréstimo para a Sudene, via BNB, no valor

de US$ 12,9 milhões, destinado à melhoria dos sistemas de abastecimento de água de

Recife, Maceió, Natal, Teresina, São Luiz e Campina Grande.

Em julho de 1966, foi firmado acordo entre o BID e a Fsesp, num valor

total de US$ 27 milhões, no qual US$ 12,5 milhões foram do banco e o restante

contrapartida brasileira. Este financiamento objetivou implementar o Programa de

Pequenas Comunidades, com populações entre 05 e 40 mil habitantes. Neste programa


149

foram benficiadas 91 comunidades em 14 estados brasileiros, atendendo a 835.173 hab.

Este financiamento foi inteiramente pago com recursos tarifários dos serviços. Portanto, a

Fsesp já implentava a auto-sustentação tarifária dos serviços, na década de 60, e mesmo

antes. Inclusive com a amortização dos empréstimos, e ainda, viabilizava os serviços de

pequenas comunidades, como as atendidas por este financiamento do BID. Este modelo

desenvolvido pela Fsesp, procurava utilizar tecnologias compatíveis com a capacidade de

pagamento da comunidade, tornando questionável a noção de municípios deficitários

apregoada pelo Planasa para justificar a obrigatoriedade dos municípios se filiarem às

Cesb’s.

O Governo Federal a partir de 1964, passou a intervir diretamente nas

políticas do setor. Inicialmente com o Programa de Ação Econômica do Governo (Paeg) -

1964 / 1966, já havia por parte do Governo Federal orientação expressa dirigida a

expansão dos sistemas de água e esgotos no Brasil. O Paeg propôs para as cidades com

mais de 20 mil habitantes (Almeida, 1977: 7):

1. Programa nacional de abastecimento de Água, com o objetivo de


abastecer no fim do Decênio, 70% da população urbana
2. Programa Nacional de Esgotos Sanitários, com o objetivo de atender,
no ano de 1973, aproximadamente 30% da população prevista para a
época

O Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico e Social, para o período

de 1967 / 1976, diagnosticou detalhadamente o setor saneamento, sugeriu alocação de

recursos e de programação de investimentos a mais longo prazo. Este plano dividiu as

cidades em três grupos, com expectativas de coberturas diferenciadas às populações

urbanas, as cidades foram agrupadas em grandes, médias e pequenas. Como média foi

definidz elevação da cobertura de abastecimento de água para a população urbana de 40%

em 1967, para 66% em 1976. E com relação ao esgotamento sanitário, elevar de 33% em
150

1967, para 61% em 1976. A compreensão do atendimento às populações rurais e semi-

rurais, passava naquele momento por soluções individuais (Almeida, 1977).

O Programa Estratégico de Desenvolvimento (PED) - 1968 / 1970,

referenda as metas anteriores. Assim é que as "Diretrizes do Governo", lançadas em julho

de 1967, estabeleciam:

1. Promover o planejamento e coordenação dos programas de saneamento

2. Concentrar recursos em programas e projetos prioritários, dentro de


uma escala de valores a ser estabelecida pelo órgão nacional de
planejamento e coordenação do programa
3. Substituir o sistema de consignação de recursos orçamentários a fundo
perdido; isto implicará a criação de um mecanismo ao qual será
atribuído o financiamento dos projetos de saneamento, para futura
amortização pelas comunidades beneficiadas
4. Instituir sistema de captação de recursos próprios (não orçamentários)
para estímulo dos programas de saneamento (notadamente no que
concerne ao abastecimento de água e esgoto)

Em concordância com as recomendações do PED, as "Diretrizes"

propunham:

1. Instituir o Conselho Nacional de Saneamento40, em Substituição ao


Conselho Nacional de Saneamento Básico como órgão de coordenação,
planejamento e controle da política nacional
2. Instituir um Fundo Nacional de Saneamento41, reunindo recursos
nacionais e externos
3. Criar um fundo de Reinvestimento, vinculado ou integrante do Fundo
Nacional de Saneamento (para desenvolvimento auto-suficiente, no
futuro, do Programa Nacional de Saneamento)

Em abril de 1965, foi criado o Grupo Executivo do Fundo Nacional de

Financiamento para Abastecimento de Água (GEF), no Ministério de Viação e Obras

40. O Conselho Nacional de Saneamento foi criado pela Lei Nº 5.318 de 26.08.1967.
41. O Fundo de Reinvestimento não foi criado, mas segundo Almeida (1977), parece ter fundamentado a criação em 1968 dos FAEs.
151

(MVO), coordenado pelo DNOS, com o objetivo de criar um projeto de financiamento por

empréstimo em abastecimento de água. No GEF, parece estar a origem do Planasa.

As diretrizes que nortearam a concepção do GEF, segundo seu primeiro

presidente, era que pelo alcance social e econômico do abastecimento de água, "estas

questões reclamavam imediata correção, substituir o paternalismo da doação pura e

simples de recursos federais às municipalidades, pelo regime de financiamento, a prazo

médio e longo" (Pedro, 1969: 188).

Todo financiamento do GEF aos municípios deveriam ter as seguintes

características (Pedro, 1969):

• Análise econômica e financeira e um relatório técnico preliminar

• Organização administrativa dinâmica e flexível, com personalidade


jurídica própria, autárquica ou de economia mista

• Contrapartida de 1/3, com prazos de até 20 anos

• Contratação de um órgão técnico para assistência (por vezes o próprio


DNOS, ou a Fsesp)

• Treinamento de pessoal para a constituição dos serviços através da


Usaid, com treinamento de engenheiros nos EUA e da participação do
Ibam na realização de cursos, seminários, etc.

A partir desta nova perspectiva de financiamento - somando-se às

iniciativas do BID e da Sudene - vários municípios passaram a constituir serviços com

autonomia, sobretudo sob a forma autárquica.

O DNOS, viabilizou recursos inicialmente, através do Ponto Quatro da

Usaid. Em agosto de 1965, foi concretizado o primeiro financiamento para a cidade de

Joinville. Ao todo 21 municípios acessaram recursos via GEF, além de duas Cesb’s,

(Williamson, 1969 e Pedro, 1969). Este financiamento utilizou pioneiramente correção

pela UPC, sendo adotado no BNH posteriormente, após a criação do Fundo para

Financiamento de Saneamento (Fisane), nesse banco em 1967.


152

NO GEF, segundo Chapadeiro42, havia sido proposto a criação de

companhias estaduais de saneamento, com a função de gerenciar os recursos e prestar

assistência técnica, mas os municípios seriam os responsáveis pela administração dos

serviços. Seria como um fundo estadual administrado pela companhia estadual.

Em alguns estados, além da criação de companhias estaduais de

saneamento,foram criados mecanismos de financiamento para fomentar as políticas.

No Estado do Paraná, concomitantemente à criação da Sanepar, como

vimos, foi criado o Fundo Estadual de Águas e Esgotos (FAE), administrado pela própria

empresa. As fontes de recursos do FAE eram o orçamento, reversão de investimentos,

recursos não reembolsáveis da União, municípios e outros. O financiamento condicionava

a criação de autarquias ou empresas de economia mistas pelos municípios, e ainda, a

constituição de um Fundo Municipal de Saneamento, com dotações de orçamento, ICM,

impostos, recursos não reembolsáveis provenientes da União, do estado e de outras fontes,

e principalmente da contribuição de melhorias. Nesses financiamentos era exigido uma

contrapartida dos municípios de 20 a 30 % (Borsari Neto, 1969).

Em Minas Gerais, a partir de 1964, com a criação da Comag, os recursos

previstos a serem alocados eram inicialmente 6% do orçamento estadual, posteriormente

bastante reduzidos. Também eram realizados empréstimos à Caixa Econômica do Estado.

A ótica desta nova concepção adotada em Minas Gerais era do saneamento atuar como

elemento indutor do desenvolvimento econômico, refletindo uma mudança clara de

paradigma, como fica clara na citação abaixo:

Em Minas Gerais, esse problema de água tem sido encarado como um


problema de saúde, no sentido de que a saúde exige uma atividade
assistencial, sem o sentido empresarial. No entanto, o problema da água
deve ser encarado, não apenas como um problema de saúde, mas também,
como um problema de desenvolvimento, ....

42. Entrevista supracitada.


153

(Oliveira, 1969: 124)

As formas de ação da Comag em sua relação com os municípios e através

de seus financiamentos, podem ser resumidas em três tópicos:

1. Empréstimos a entidades municipais autônomas

2. Empréstimos a entidades autônomas, prestando uma supervisão, cujo


grau dependia de características locais
3. Como concessionária de serviços públicos

A expectativa da Comag, era a de manter as concessões dos serviços até

atingir o ponto de equilíbrio e a auto-suficiência da empresa (avaliado inicialmente em

torno de 40 a 50 mil economias). Atingido este valor, a Comag daria pouca ênfase ao seu

papel de concessionária, reforçando o fomento ao desenvolvimento do setor (Oliveira,

1969).

No Rio Grande do Sul, foi criado o FAE em abril de 1968, atuando ainda no

sistema financeiro estadual, o Estado, como mutuário final; a Corsan (criada em

04.02.1966), como órgão operacional; o Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Bergs),

como agente financeiro e o BNH, como agente promotor. Atuou ainda o DNOS, como

órgão técnico para exame e fiscalização (Maggi, 1969).

No Estado de São Paulo, as modificações foram mais profundas, tanto do

ponto de vista da gestão, quanto do financiamento. Além de criar, diversas companhias

estaduais, atuando sob diversas formas, criou-se instrumentos estaduais de financiamento.

Em 1968, foi criada a Comissão Permanente de Financiamento de Água e Esgotos

(Copae)43, destinada a desenvolver programas de financiamento de águas e esgotos dos

municípios, para atuar junto ao Departamento de Organização Sanitária (DOS), no

43. Decr. Nº 49.236 de 19.01.1968.


154

fomento aos municípios do interior. Ainda em 1968, constituiu-se o Fundo Estadual de

Saneamento Básico (Fesb)44, que absorveu a Copae (Pereira, 1969 e Victoretti, 1971).

O Fesb, cuja atuação se referia aos municípios do interior, procedeu a

criação de serviços autônomos, para viabilizar a obtenção de empréstimos de acordo com o

previsto na Constituição Estadual de 1967, cujo art. 71 se referia a este tipo de serviço:

Os serviços públicos de natureza industrial ou domiciliar, sempre que


possível, serão prestados aos usuários pelos métodos da empresa privada,
visando à maior eficiência e redução dos custos operacionais.

O Estado de São Paulo constituiu em agosto de 1968, o seu FAE,

subordinado ao Fesb, em convênio com o BNH.

A nível federal, a partir do fundo nacional proposto nas “Diretrizes do

Governo", ainda em 1967 foi criado o Fundo de Financiamento para Saneamento

(Fisane)45, entregue à administração do BNH, incluindo inclusive financiamentos aos

setores de drenagem, controle de inundação e irrigação.

Através do Fisane, sob o ponto de vista do BNH, "os usuários dos serviços

passam a pagar o preço justo do benefício que usufruem ou, em outras palavras, o

abastecimento de água passava a ser executado através da mecânica do auto-

financiamento. ... o mecanismo proposto ampara-se na adoção de tarifas capazes de

assegurar o reembolso do investimento..." (Oliveira, 1969: 124).

Com a criação do Fisane, foi transferida a gestão financeira (e também

política) de um órgão executivo - DNOS - para um órgão financeiro - BNH. O BNH

incorporou todos os compromissos assumidos pelo GEF, complementando suas ações.

Ao fazer esta opção, o Governo Federal excluiu do processo decisório, os

demais órgãos que atuavam no setor: DNERu, Fsesp e DNOS. Para se ter uma idéia do

44. Lei Nº 10.107 de 08.05.1968.


155

montante de profissionais e da experiência e conhecimentos acumulados por estes órgãos,

só a Fsesp tinha cerca de 200 engenheiros sanitaristas, grande parte com cursos de

especialização no Brasil e no exterior. Esta opção marcou decisivamente o perfil a ser

implementado no setor saneamento a partir de então.

Foi criada uma superintendência no BNH para o setor, e instituído o

Programa de Financiamento para o Saneamento (Finansa)46, em que foram definidos os

critérios para os empréstimos, os agentes financeiros e os órgãos promotores (Almeida,

1977).

Em fevereiro de 1968, o BNH passou a estimular a criação de fundos

intermunicipais, estaduais e regionais para o financiamento do saneamento. Estes fundos

deram origem a criação dos Fundos de Financiamento para Água e Esgotos (FAE), a nível

de cada estado. E ainda em setembro de 1968, foi instituído o Sistema Financeiro do

Saneamento ( SFS)47, que passou a ser o instrumento de financiamento do setor, e que

apesar de algumas alterações, está em vigor até hoje.

Em junho de 1968, foram estabelecidas as seguintes metas pelo PED 1968 /

1970: elevação de 33% de cobertura do abastecimento de água e 15,1% relativo ao

esgotamento, para a população urbana atendida em 1970.

Em 1969, o BNH foi autorizado a utilizar os recursos do FGTS48 através do

SFS. Com isto o financiamento do setor saneamento ganhava uma fonte de recursos com

um vigor até então inédito, que possibilitaria a consecução dos planos e programas, o que

não havia sido possível anteriormente.

45. Decr. Nº 61.160 de 16.08.1967.


46. Resolução do Conselho de Administração do BNH - RC Nº 61 de 27.11.1967.
47. Resolução do Conselho de Administração do BNH - RC Nº 20 de 04.09.1968.
48. Decreto-Lei Nº 949 de 13.10.1969.
156

A partir de então, dentro do Finansa, foram criados vários subprogramas49

para financiar ações específicas, sendo os dois principais: em 1968, o Refinag, para ações

de implantação ou ampliação de sistemas de abastecimento de água e em 1969, foi criado o

Refinesg, para financiar ações de implantação ou ampliação de sistemas de esgotamento

sanitário.

O Plano de Metas e Bases para a Ação de Governo (1969 / 1973), definiu as

metas que seriam assumidas posteriormente pelo Planasa, demonstrando de forma

inequívoca, a assunção pelos dirigentes do setor das diretrizes estabelecidas ao nível do

planejamento global do Governo Federal. Portanto, fica claro que o Planasa, mais do que

uma proposta tecnocrática, foi uma política de governo, contradizendo a pretensa postura

apolítica, característica dos técnicos do setor. Alguns dos pontos do "Metas e Bases"

(Almeida, 1977: 12):

• Minimização e racionalização das aplicações da União a fundo perdido

• Atuação de forma descentralizada, através de organismos estaduais e


municipais, e com observância do princípio de execução indireta, por
intermédio do setor privado

• Viabilização da operação dos sistemas de água e de esgotos e redução


de seu custo operacional através da operação, por um mesmo
concessionário, de um conjunto integrado de sistemas municipais

• Tarifação que permita a operação, manutenção e expansão do sistema


local (e, para área de saneamento geral)

Ainda neste "Metas e Bases" é clara a indicação para o financiamento de

serviços municipais, mas já apontando para o privilegiamento de órgãos que agregassem

49. Os demais subprogramas foram sendo criados paulatinamente: Efisan - Estímulo ao Sistema Financeiro de Saneamento (para
integralização do FAE pelos Governos de Estados de Menor renda); Fisag - Financiamento Suplementar para Abastecimento de Água
(para integralização do FAE, caso a participação do governo estadual viesse a ultrapassar 5% de sua receita tributária); Ficon -
Financiamento Suplementar para Controle de Poluição das Águas ( para casos semelhantes ao Fisag); Fidren - Financiamento de
Sistemas de Drenagem visando ao Controle de Inundações; Sanat - de Apoio Técnico ao SFS (treinamento e assistência técnica) e
Finest - Financiamento aos Estados (para integralização dos FAEs pelos governos estaduais caso não complementassem as
contrapartidas) (Almeida, 1977: 19).
157

vários municípios, como o que ocorreu no Estado de São Paulo em que diversos órgãos

estaduais foram constituídos com estas características.

Através dos diversos programas e planos instituídos na esfera federal

durante o período militar, ainda na década de 60, podemos identificar o progressivo

envolvimento do Estado no planejamento das ações de saneamento básico.

Os anos 60, trouxeram novos paradigmas que se inserem no contexto

nacional e no setor saneamento. Contraditoriamente, são propostos por entidades que

teoricamente, naquela conjuntura, tinham diretrizes políticas distintas, como o BID e a

Sudene. Os financiamentos executados por estes órgãos eram direcionados para entidades

autônomas, prioritariamente companhias mistas, através de um modelo de gestão

empresarial para o setor. Nesse novo paradigma, a auto-sustentação financeira deveria se

dar via tarifa. As tarifas, ou na maioria das vezes a taxa, não eram capazes de cobrir os

custos dos serviços, e com a implantação do sistema de empréstimos, deveriam passar a

cobrir não só os custos, como também amortizar estes empréstimos. A idéia das tarifas

cobrirem custos, ao menos os de operação e manutenção, já era adotada pelo setor,

sobretudo a partir da década de 50, com a constituição dos serviços em forma de

autarquias. Ainda na década de 60, através do GEF e depois já no BNH, esta concepção

seria a adotada, sendo incorporada posteriormente pelo Planasa.

Vários segmentos do setor defendiam que os recursos orçamentários não

eram suficientes para eliminar os déficits existentes. E, devido ao potencial de pagamento

de muitos dos serviços através das tarifas, eram reclamados empréstimos que fossem

capazes de atender à demanda. Desta forma foi concebido o Planasa.


158

O Plano Nacional de Saneamento (Planasa) 50 - décadas de 70 e 80

As bases para o lançamento de um plano nacional estavam criadas. Havia

um sistema financeiro já instituído, com uma fonte de recursos - o FGTS - capaz de

alavancar um plano, numa conjuntura de "milagre econômico".

Do ponto de vista da gestão, a década de 60 foi extremamente rica em

experiências e arranjos institucionais. Diversos modelos de órgãos municipais, estaduais e

federais possibilitariam arranjos capazes de implementar um plano nacional.

Um fator limitante naquele momento, era a insuficiência de recursos

humanos capazes de dar suporte técnicos ao desafio que estava colocado.

As condições para a implementação de um plano para o saneamento,

portanto estavam consolidadas com a criação do BNH, ainda em 64, que seria o órgão

gestor; do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), em 66, que viria a ser a fonte

principal de recursos, a criação em 1967 do Fundo de Financiamento para o Saneamento

(Fisane), primeiro financiamento do setor no BNH e a criação do Sistema Financeiro do

Saneamento (SFS), em 68, que daria a estrutura institucional ao Planasa. Importante

salientar é a Reforma Tributária, em 66, que centralizando os recursos no Governo Federal,

enfraqueceu a administração dos municípios, deixando a maioria impossibilitados de

caminhar com as próprias pernas, ficando à mercê das benesses do Governo Federal.

As principais críticas à gestão municipal, a partir das quais se formulariam

as novas proposições do Planasa, feitas pelo seu principal idealizador, Rego Monteiro

(apud Fiszon, 1990), eram as seguintes:

50. Neste item veremos as características mais gerais sobre o Planasa, não detalhando muito a análise, pois já há uma boa literatura a
respeito. Ver mais sobre este Plano nos bons estudos listados a seguir: as dissertações de mestrado de Fiszon (1990), Najar (1991),
159

• O paternalismo - com relação às tarifas - dado que os municípios não


cobravam tarifas realistas, perdendo capacidade de investimento;

• O clientelismo;

• A incompetência - técnica - devido à incapacidade na formação de


recursos humanos e

• A estrutura institucional inexistente.

Em 1971, foi instituído o Plano Nacional de Saneamento (Planasa), que

passaria a implementar as metas estabelecidas pelo plano de Metas e Bases para a Ação de

Governo, para o setor saneamento básico.

A estrutura financeira e institucional já estavam criadas. A conjuntura

política moldou o perfil do modelo de gestão proposto - lembremo-nos que estávamos no

período de maior repressão política do pós-64.

A estrutura operacional adotada para a viabilização das diretrizes foi a

centralização das ações em companhias estaduais, exclusivamente. Para tanto os

municípios tiveram que conceder seus serviços às companhias dos respectivos estados, na

grande maioria já existentes, como vimos anteriormente. Como a titularidade dos serviços

era - e ainda é - dos municípios, estas concessões tiveram que ser aprovadas pelas

respectivas câmaras de vereadores.

As metas do Planasa foram (Almeida, 1977: 04):

• Eliminação do déficit do setor de saneamento básico através de


programação adequada que permitisse atingir o equilíbrio entre a
demanda e a oferta de serviços, no menor tempo, com um mínimo de
custo

Paula (1989), Cavalcanti (1987), Coelho (1987) e Rezende (1995); a tese de doutorado de Dal Fabbro (1984); e os artigos de Costa
(1991) e Melo (1990).
160

• Manutenção, em caráter permanente, do equilíbrio atingido entre a


demanda e a oferta de bens e serviços no campo do saneamento básico

• Atendimento de todas as cidades brasileiras, mesmo dos núcleos


urbanos mais pobres

• Instituição de política tarifária de acordo com as possibilidades dos


consumidores e com a demanda de recursos e serviços de forma a obter
um equilíbrio permanente entre receitas e despesas

• Instituição de política de redução de custos operacionais em função de


economia de escala com reflexos diretos no esquema tarifário

• Desenvolvimento de programas de pesquisas, treinamento e assistência


técnica

As metas específicas do PLANASA foram:

• Atingir a uma cobertura de 80% da população urbana atendida com


abastecimento de água em 1980;

• Atingir com uma cobertura de redes de esgotos a 50% da população


urbana do país, também em 80

• O atendimento, em 85, de todas as sedes municipais e todas as vilas


brasileiras com população superior a 5 mil habitantes

As principais fontes de financiamento Planasa, através do SFS, foram:

• No âmbito federal - principalmente do BNH, tendo sua origem na


poupança privada (FGTS, caderneta de poupança e letras imobiliárias)

• No âmbito estadual - através dos FAEs, aplicação de recursos


tributários de 50% (até 5% da renda tributária estadual) e os outros 50%
oriundos do BNH. No caso de não serem suficientes os fundos dos
FAEs, o BNH concedia financiamentos suplementares, o que ocorreu
com frequência a partir da década de 80

• No âmbito municipal - contrapartidas aos financiamentos tanto do BNH


quanto dos FAEs, em quantidade indispensável à viabilização dos
programas, geralmente à fundo perdido

• Recursos externos - via BNH

Até então, o Sistema Financeiro do Saneamento no BNH, financiava tanto

os órgãos estaduais, quanto os serviços municipais. Havia uma flexibilidade nas relações
161

entre os estados e municípios, seja através da assistência técnica ou mesmo da concessão

dos serviços pelos órgãos estaduais.

O Planasa restringiu o acesso aos recursos do SFS, tornando-os exclusivos,

às Companhias Estaduais de Saneamento Básico (Cesb). Exigiu ainda, a unificação, no

caso de existência, dos vários órgãos estaduais em uma única Cesb. Com estas medidas, os

municípios, que já estavam esvaziados financeiramente após a Reforma Tributária de

1966, foram forçados a aderir a este plano, passando paulatinamente a conceder os serviços

às companhias estaduais.

Esses municípios perderam a partir daí, qualquer autonomia e poder

decisório sobre prioridades para alocação de recursos, definição de tarifas, etc. Nesse

período, pode-se afirmar que as adesões ao Planasa, não se deram sempre de forma

espontânea. A simples exclusão do acesso aos recursos do SFS, era por si só uma ação

coercitiva, complementada no plano político com a falta de democracia, levando cerca de

3/4 dos municípios a se filiarem às companhias dos respectivos estados.

A justificativa para a exclusão do acesso dos serviços municipais aos

recursos do SFS, por parte do BNH, foi segundo Rego Monteiro51, a viabilização

econômica do plano. O paradigma principal do modelo Planasa, foi a auto-sustentação

tarifária. Ou seja, as tarifas deveriam ser suficientes para cobrir os custos de operação,

manutenção e ainda, a amortização dos empréstimos. Antes do Planasa, o BNH exigia o

estudo de viabilidade econômica para os financiamentos, ao nível do município. O Planasa

ao contrário, tinha a viabilidade econômica dos financiamentos exigida a nível do estado,

ou seja, a nível da Cesb.

51. Entrevista concedida pelo Engº José Roberto do Rego Monteiro, principal idealizador do Planasa e ex-diretor do BNH, em
dezembro de 1992, no Rio de janeiro.
162

A lógica deste modelo previa que os municípios supostamente deficitários,

seriam cobertos pelos municípios superavitários. Ou seja, o modelo partia do pressuposto

que grande parcela dos municípios não teriam capacidade financeira para serem auto-

suficientes via tarifa, enquanto outros seriam, com superávit capaz de cobrir os custos

daqueles. Este mecanismo foi chamado de subsídio cruzado e as tarifas cobradas neste

modelo era única para todo o estado.

Segundo a ótica do BNH, havia a necessidade de excluir os serviços

municipais do acesso aos recursos do SFS, para tornar o sistema viável. Caso contrário,

seria impossível abastecer e servir a população de uma grande quantidade de municípios,

sobretudo os menores, incapazes de contrair empréstimos, por não apresentarem condições

de amortizá-los.

Três pontos são necessários refletir sobre a viabilidade econômica deste

modelo. Em primeiro lugar está o paradigma da auto-sustentação tarifária, em segundo o

subsídio cruzado e em terceiro, está a questão democrática, ou seja, a relação entre a

concessionária, o poder concedente e a sociedade.

Em primeiro lugar, tem sido afirmado, criticamente, em diversos estudos,

dentre os quais podemos citar os de Fiszon (1990) e Paula (1990), que a auto-sustentação

tarifária baseada no lucro, provocou a marginalização dos setores mais carentes do acesso à

água e ao esgotamento, características do modelo econômico excludente implantado no

país no pós-64. Como já mostramos anteriormente, a auto-sustentação tarifária ou a

autonomia financeira dos serviços de saneamento já eram defendidas, antes mesmo da

década de 50. E que nesta década, ganharam significativo espaço com a constituição dos

Saae’s, pela Fsesp, e com a criação de várias autarquias estaduais. A Sudene e o BID, a

partir de 1961 consolidaram um modelo defendido por amplos segmentos no setor


163

saneamento. A utilização de tarifas progressivas ainda na década de 50, são provas dessa

premissa.

A auto-sustentação tarifária dos serviços, nâo foi um paradigma defendido

exclusivamente pelo Planasa, e sim por um espectro de setores com concepções de mundo

bastante diversos.

Um segundo aspecto é o subsídio cruzado. Esta concepção, em que os

municípios mais ricos teriam de subsidiar os menores, por serem estes inviáveis, tem

oposição no modelo adotado pela Fsesp. Segundo este modelo, a auto-sustentação dos

serviços, tem que ser buscada a nível municipal. Para tanto concorre o uso de tecnologia

adequada à realidade local e o uso de tarifas progressivas. A estrutura tarifária desta forma,

é montada de acordo com os níveis de consumo.

A questão a ser discutida é a eficácia dos dois modelos em suas

proposições. Ou seja, se as Cesb’s se constituíram em órgãos auto-sustentáveis, ou

continuaram dependentes de recursos orçamentários e/ou endividadas? E se, por outro

lado, os Saae’s são realmente auto-sustentados, ou se dependem de recursos federais ou

municipais?

O terceiro aspecto diz respeito à organização dos serviços, via Cesb.

Durante a década de 60, existiram companhias estaduais, que mantinham variadas formas

de relação com os municípios, de acordo com as demandas locais. Havia casos em que

ocorria apenas assistência técnica, outros em que ocorria apenas o financiamento, e ainda

os casos em que as companhias estaduais eram as concessionárias dos serviços. Nas várias

situações, os serviços autônomos acessavam diretamente as diversas fontes de

financiamento.

O Planasa, ao limitar a apenas uma possibilidade a relação dos municípios

com o SFS, "engessou" o modelo. Esta limitação, baseada na cultura autoritária que foi a
164

gênese desse plano, eliminou outras perspectivas de injunções institucionais entre

municípios e estados. O reflexo dessa concepção pode ser verificada hoje nos limites em

que estão colocadas às Cesb’s, como analisaremos adiante.

Uma avaliação do Planasa

O Planasa, como podemos ver, não foi implementado só a partir da

conjuntura político-econômica do pós-64. Haviam bases históricas sobre as quais se

estruturou. Estas bases diziam respeito tanto aos aspectos organizacionais, quanto ao

financiamento. No entanto, são inegáveis os alcances que teve, seja do ponto de vista

institucional, da formação de recursos humanos, como dos resultados alcançados com

relação ao abastecimento de água, e sobretudo pelo fato de ter sido um plano pensado para

o equacionamento global do saneamento básico no país.

Com relação ao modelo de gestão, o Planasa, além de desprezar as diversas

experiências anteriores das companhias estaduais, em nome da racionalidade, desprezou o

enorme acervo técnico existente nos demais órgãos federais. Apenas na Fsesp, existiam

cerca de 200 engenheiros, a maioria com especialização no Brasil ou no exterior e com

larga experiência. Também o DNOS e o DNERu, além do Dnocs continham profissionais

qualificados que poderiam ter contribuído na implementação de um plano de saneamento,

mas que não foram aproveitados.

Com relação às metas de cobertura traçadas, o Planasa, em que pese ter

alcançado, praticamente os objetivos quanto ao abastecimento de água , onde entre 70 e 80

a ampliação do sistema foi de 54,4% para 76% dos domicílios atendidos, não pode ser

avaliado sem um aprofundamento de estudos sobre a eficiência face às metas alcançadas

(Melo, 1987). Com relação ao esgotamento sanitário, as metas não foram atingidas, pois a
165

cobertura da rede de esgotos passou de uma cobertura de 22,3% para 36% dos domicílios

atendidos, para o mesmo período. Este quadro contribuiu para a produção do grave quadro

de insalubridade ambiental e agravos à saúde pública de nossas cidades.

Com relação aos investimentos realizados pelo Planasa52, houve um

crescimento vertiginoso no período 70 - 80, quando estes investimentos passaram de

patamares de 0,15% do PIB, em 1970, para um pico de 0,55% em 81, até atingir uma

média de 0,4% do PIB no final da década de 80.

Uma característica da evolução do financiamento do Planasa, foi a redução

da contrapartida estadual aos empréstimos. Apenas na década de 80 houve uma acentuada

queda, quando a participação de recursos do FGTS que representavam 54% do total,

passaram em 1990 para 94%. Em termos absolutos significou uma elevação destes

recursos de 400 milhões de dólares.

A ampliação de cobertura domiciliar, razoável no que diz respeito à água e


sofrível no caso do esgotamento sanitário, foi igualmente discriminatória se
considerarmos critérios regionais, demográficos e sociais [...] chama
atenção a gritante concentração regional dos investimentos: a região Sudeste
recebeu cerca de 62,3% dos recursos do plano entre 1968 e 1984, uma
distribuição altamente discriminatória se considerarmos, por exemplo, o
peso relativo da população: em 84, o Sudeste contava com 44% da
população, enquanto o Nordeste contava com 29% e recebeu 21,3% dos
recursos.

(Costa,1991: 34)

O modelo Planasa foi hegemônico em todas as instâncias do setor, seja pela

cooptação política, pelo corporativismo ou por interesses privados, dado o montante de

recursos aplicados. Esta hegemonia dá-se principalmente na década de 70 e até meados de

80, quando o plano "começa a fazer água". A partir daí, são articuladas, mais

52. Para uma análise detalhada dos investimentos realizados pelo Planasa, ver Fiszon (1990), Paula (1990) e Najar (1991).
166

consistentemente as várias críticas a este modelo, inclusive por seus ideólogos, como Rego

Monteiro (apud Fiszon, 1990: 101), entrre eles podemos citar:

• Dependência da fixação, pelo CIP, de tarifas que eram insuficientes


para a cobertura dos gastos operacionais

• Os encargos financeiros

• Custos operacionais

• A prática de investimentos excessivamente elevados

• Abuso do empreguismo pré-eleitoral

• O exagerado crescimento do serviço da dívida

De uma forma geral, as críticas mais globais a este plano, são (Fiszon, 1991

e Souza, 1990):

• A grande centralização política e financeira no nível federal com a


exclusão dos municípios das esferas de decisão

• A exclusão dos municípios que não aderiram ao Planasa do acesso ao


SFS

• O princípio do autofinanciamento do investimento social

• O privilégio do atendimento de interesses burocráticos, corporativos e


privados

• O atendimento exclusivo à população urbana

• Falta de abordagem mais social às questões do saneamento, vinculando-


as às políticas de saúde e meio ambiente

• Ausência de aplicações na implantação e/ou melhoria dos serviços de


limpeza urbana, resíduos industriais e drenagem

• Baixo nível de investimentos na coleta e principalmente, no tratamento


de esgotos, causando grande poluição ambiental e conseqüentes agravos
à saúde pública

• Custos extremamente elevados em todas as etapas de um sistema e a


utilização de tecnologias `convencionais'em detrimento de tecnologias
apropriadas
167

Em 1986, o BNH foi extinto sumariamente pelo Governo Sarney, sendo

suas atribuições e pessoal incorporado pela Caixa Econômica Federal. O setor foi

surpreendido com esta medida, que de imediato produziu um desarranjo institucional.

Desde a criação do SFS, a política e a gestão financeira do saneamento sempre estiveram

subordinadas a um mesmo órgão, mas a partir do fim do BNH passou a ocorrer uma

verdadeira dança institucional. Até o final da Nova República as políticas e a gestão

financeira estiveram em ministérios distintos contribuindo assim para agravar a crise. No

entanto, esta crise institucional não se refletiu no montante de recursos alocados neste

período, a CEF continuou a alocar recursos compatíveis com os períodos de maior inversão

financeira do Planasa.
168

De novo as concessões Privadas - anos 90

O Planasa teve a sua estrutura básica mantida até 1990, quando no Governo

Collor foram reestruturados os principais programas de financiamento. Foram ampliados

inclusive o acesso dos municípios autônomos aos recursos do SFS e foram aplicados

recursos a fundo perdido em áreas carentes. No entanto, estas mudanças não se fazem

sentir, tanto do ponto de vista do volume de recursos investidos, como pela estrutura

operacional do sistema que não foi reformulada, ou seja, o papel das concessionárias

estaduais, bem como sua relação com o poder concedente permaneceram inalteradas.

Do ponto de vista de como está organizada a prestação de serviços do setor,

um aspecto importante é o fato de que as Cesb’s têm a concessão (ou operam sem tê-la)

dos serviços de abastecimento de água de cerca de 75% dos municípios, mas no entanto,

com relação ao esgotamento sanitário, em apenas 35%. Os serviços municipais de

saneamento, correspondem a cerca de 900, sendo que entre estes, metade se constituem

como autarquias, em sua maioria municípios de médio porte, metade como departamentos

da administração direta, geralmente de pequeno porte e, apenas 0,5%, como empresas de

economia mista, em geral grandes municípios. Uma outra característica deste mesmo

conjunto é que 267 destes serviços são administrados pela Fundação Nacional de Saúde

(FNS) e 652 pelos municípios diretamente.

Em estudo realizado pela Associação Nacional dos Serviços Municipais de

Saneamento (Assemae) e Fundação Nacional de Saúde (FNS), em 1995, além dos dados

acima, foi identificado ainda, um terceiro grupo de municípios, cerca de 400 que têm a

forma de organização desconhecida, isto é não foram incorporados pelas Cesb’s e também

não são identificados como municípios que têm departamentos ou autarquias dedicadas à
169

operação e manutenção da rede de água e esgotamento sanitário. Em geral são municípios

pequenos de menos de 20.000 habitantes (FNS/Assemae, 1995).

Os mecanismos de financiamento no Governo Collor também não foram

alterados significativamente, pois mudaram apenas os programas. Do ponto de vista das

fontes de financiamento53, houve um incremento no recursos orçamentários federais, que

desde o início do Planasa, não tinha valores relevantes. No entanto, estes recursos foram

destinados através das emendas ao orçamento, pelo Congresso Nacional, e não teve

impacto significativo na ponta (Escola Brasileira de Administração Pública, 1995).

Os anos noventa, no entanto, trazem elementos conjunturais novos que

devem mudar a história, não apenas do setor, mais também do gasto público federal e

particularmente das políticas sociais. A agena política é ditada pelo FMI e pelo Consenso

de Whashington e tem na redução do Estado para a provisão dos serviços, atuando apenas

como regulador do mercado. Esta é a nova agenda implementada pelos organismos

financiadores internacionais, como o Banco Mundial (Bird). A questão é a revisão do papel

do Estado (de provedor, ineficiente, para regulador, competitivo, eficiente), através da

flexibilização na gestão, com a entrada da iniciativa privada na prestação direta dos

serviços públicos, em tese, garantindo efetividade nas políticas públicas.

Esta mudança nas políticas públicas dos países em desenvolvimento,

conforme recomendação das agências multilaterais, pode ser constatada através da análise

dos gastos sociais (saúde, educação, previdência, etc.), gastos mínimos (defesa, segurança

e justiça) e gastos econômicos (questões econômicas, mineração, transporte, etc.), como

fez Rezende (1996). Pode-se constatar que os países analisados, entre os quais o Brasil,

reduziram a participação do gasto público, proporcionalmente ao PIB. E esta tendência se

acentua no início da década de 90. Enquanto que este mesmo discurso não é aplicado para
170

os países desenvolvidos, cuja distribuição dos gastos públicos permanece sem maiores

alterações. Ou seja, o discurso dos países desenvolvidos é válido para os ‘em

desenvolvimento’, para a abertura desses mercados, não sendo aplicável para os que ditam

as regras. Ou seja, apesar do que se fala o Estado de Bem-Estar Social na Europa e nos

EUA, ainda não foi desmontado, levando Rezende (1996) a afirmar que “os Leviatãs estão

fora de lugar.

No setor saneamento esta nova conjuntura política se expressa através do

Projeto de Modernização do Setor Saneamento (PMSS), que vem sendo conduzido pelo

Ipea/Ministério do Planejamento e Orçamento e, conta com financiamento do Banco

Mundial.

O PMSS, foi idealizado ainda no Governo Collor, a partir de 1991,

embalado pelos ventos liberalizantes da economia, com o objetivo da concessão privada

dos serviços de saneamento, fomentado pelo Banco Mundial. Nesse sentido, foi proposto

investimentos de recursos no desenvolvimento operacional de três companhias estaduais

de saneamento (Embasa - BA, Casan - SC e Sanesul - MS), com o intuito de torná-las

competitivas e atraentes ao capital privado.

Os investimentos previstos na primeira fase do PMSS foram da ordem de

US$ 500 milhões, sendo metade em contrapartida e a outra metade de recursos oriundos do

Bird. Desse total US$ 492 milhões são destinados ao desenvolvimento operacional das

companhias e o restante ao desenvolvimento institucional do setor, coordenado pelo Ipea.

O Projeto efetivamente começou a ser implementado no início de 1994, quando iniciaram-

se os desembolsos.

Apenas as companhias estaduais foram objeto de investimentos e estudos

quanto ao desenvolvimento operacional, excluindo mais uma vez os municípios do acesso

53 Para uma análise mais detalhada sobre o FGTS, enquanto fonte de financiamento para o saneamento ver os trabalhos de Zamboni
171

a esses recursos. Foi reivindicado pela Associação nacional dos Serviços Municipais de

Saneamento (Assemae) a inclusão de serviços municipais no projeto de desenvolvimento

operacional, no entanto este pleito não foi atendido.

O componente institucional do PMSS inicialmente, foi dirigido apenas pelo

Ipea, excluindo todas as entidades representativas do setor, inclusive os demais órgãos do

Governo Federal, entre eles a ex-Secretaria de Saneamento do extinto Ministério do Bem

Estar Social (MBES) e a Fundação Nacional de Saúde (FNS). A Assemae, a Associação

Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes) e a Associação das Empresas

Estaduais de Saneamento (Aesbe), se posicionaram contrariamente a esta condução da

formulação das políticas de saneamento do país, reivindicando uma abertura à participação

mais ampla dos diversos setores. Esta solicitação foi atendida apenas parcialmente com a

participação da Secretaria de Saneamento / MBES, na Unidade de Gerenciamento do

Projeto - UGP e da Abes, Assemae e Aesbe no Comitê de Direção do Projeto - CDP,

oficializada a partir de junho de 1994. No entanto, o debate não foi estendido à sociedade,

nem aos demais órgãos do governo, e tendo como fóruns de discussões do PMSS

workshops com acesso restrito à convidados.

O PMSS contando com recursos de U$ 8 milhões para o desenvolvimento

das atividades do reordenamento institucional, contratou então, diversas equipes de

especialistas, ao seu critério, para a elaboração de vários estudos, cujos produtos

fundamentariam as políticas a serem propostas. Naturalmente, tendo como fio condutor as

diretrizes do Bird, financiador e indutor do Projeto. Os segmentos que, mesmo tendo

demandado, não tiveram acesso aos recursos para também promoverem a formulação de

propostas. Esse aspecto é importante ser destacado, pois uma das características do setor

saneamento no Brasil é a falta de estudos e formulações sobre as diversas dimensões que

(1995) e Arretche (1993).


172

contribuem inerentes às políticas, sejam no campo operacional, sejam no institucional.

Neste sentido, os estudos realizados54 foram utilizados pelo PMSS num processo de

formação de opinião, buscando a construção de uma hegemonia para as novas diretrizes e

conceitos que estavam sendo introduzidos ao setor.

Neste contexto de PMSS, um fato importante que aconteceu foi o veto

presidencial ao Projeto de Lei 199. Durante o período de 1989 a 1994, técnicos do setor,

políticos de vários partidos, representantes das companhias estaduais e de serviços

autônomos estiveram discutindo uma proposta de reordenamento institucional

transformado no PL N°199, que dispôs sobre a Política Nacional de Saneamento e seus

instrumentos. O projeto foi vetado por Fernando Henrique no quarto dia de seu mandato e

incluia princípios e mecanismos importantes para as políticas de saneamento, tais como os

conceitos de saneamento ambiental55 e salubridade ambiental 56 que na prática indicava

uma perspectiva de integração com outras áreas como saúde, meio ambiente etc. Além

disso, indicava a criação de um Fundo Nacional de Saneamento, um Plano Nacional de

Saneamento e um Conselho Nacional de Saneamento. Este veto na íntegra, ocorreu

provavelmente por não coincidir exatamente com as propostas que estavam sendo

discutidas pela nova equipe de governo, especialmente nos pontos que se referem ao papel

a ser atribuído à União.

54 Ver a Série Modernização do Setor Saneamento, Vol. 1 a 8 (Acqua-Plan; Aliança Pesquisa e Desenvolvimento; Escola Brasileira de
Administração Pública; Faria; Instituto de Economia do Setor Público; Instituto Sociedade, População e Natureza; Núcleo de Estudos
em Informações Urbanas e NH Consultoria e Planejamento, 1995).
55 Entendido como o conjunto de ações sócio-econômicas que tem por objetivo alcançar níveis crsscentes de
salubridade ambiental, por meio de abastecimento de água potável, coleta e disposição sanitária de resíduos
sólidos e gasosos, promoção de disciplina sanitária do uso e ocupação do solo, drenagem urbana, controle de
vetores e focos de doenças transmissíveis, e demais serviços de obras especializadas, com a finalidade de
proteger e melhorar as condições de vida tanto nos centros urbanos, quanto nas comunidades e propriedades
rurais mais carentes. Ver Braga, J.C., Médici, A.C., Arreetche, M. , Novos Horizontes para a regulação do
Sistema de Saneamento no Brasil, RAP, Rio de Janeiro 29(1): 115-48, JAN.MAR..1995.

56 Estado de higidez em que vivem as apopulações urbana e rural, tanto no que se refere a sua capacidade de
inibir, previnir ou impedir a ocorrência de endemias e epidemias veiculadas pelo meio ambiente, como no
173

No início de 1995, já no Governo Fernando Henrique Cardoso, o PMSS,

que já tinha uma condução centralizada, excluiu as entidades do setor do Comitê de

Direção do Projeto, por exigência do Bird, segundo ex-presidente da Assemae. Desde

então, não tem havido maior participação da sociedade na formulação das políticas de

saneamento no Brasil, sendo muito mais determinantes as diretrizes do Bird.

Uma outra medida que causará muito impacto ao setor saneamento será a

Lei de Concessões aprovada pelo Senado em janeiro de 1996 e sancionada em fevereiro

(Lei 8.987 de 13.02.95) e a Lei complementar 9.074 de 07.07.95, que regulamentam o

artigo 175 da Constituição Federal. Esta lei tem como principal objetivo a transferência à

iniciativa privada dos serviços públicos, atingindo de forma indiscriminada todos os

setores, sem levar em consideração as especificidades de cada um.. A Secretaria de

Políticas Urbanas, do Ministério do Planejamento e Orçamento, que atualmente está

conduzindo as políticas de sanemento e habitação no país, juntamente com o PMSS, estão

encaminhando projetos de lei, regulamentando as concessões, especificamente para o setor

saneamento. Está em tramitação no Congresso Nacional, proposta do Governo para a

Poítica Nacional de Desenvolvimento urbano, que inclui habitação e saneamento.

Com relação às principais propostas apresentadas pelo PMSS57, estas se

baseiam na construção de um Estado regulador, nos moldes norte-americanos. Nesta

concepção, há uma separação entre regulação e execução, na qual o poder público é o

titular dos serviços, responsável portanto, por sua prestação, mas a execução pode ser

transferida a terceiros, sejam públicos ou privados. Ou seja, é proposta a passagem do

Estado brasileiro de provedor para um Estado regulador.

tocante ao seu potencial de promover o aperfeiçoamento de comdições nosológicas favoráveis ao pleno govo
da saúde e do bem-estar.
57 A análise sobre as propostas do PMSS para o reordenamento institucional e par o financiamento do setor estão baseadas nas
publicações que compõem a Série Modernização do Setor Saneamento, publicada pelo PMSS.
174

O esforço se concentra, a partir de um diagnóstico de que o Estado

brasileiro não tem experiência de regulador, na tentativa de construir um aparato

regulatório que viabilize o controle das concessionárias pelo poder concedente.

É questionável do ponto de vista de sua eficácia, esta proposta na medida

em que há uma necessidade de transformação de toda uma cultura de Estado através de

uma política setorial. Quem garante que a criação de um aparato regulador terá eficácia,

quando vemos exemplos de privatização em países cujos Estados têm longa experiência

como reguladores, como na França, Inglaterra e recentemente na Argentina, em que

imensas dificuldades tem sido encontradas em regular as concessionárias58?

Os municípios concedentes, historicamente têm demonstrado dificuldades

em controlar as concessões. E assim se deu com relação às CESBs, que em quase todos os

casos devido à sua grande estrutura, não se submeteram à regulação, quer do poder

concedente, quer dos órgãos da administração direta aos quais estão subordinadas. As

Companhias Estaduais têm atuado na verdade como executoras e reguladoras.

Um princípio da fundamentação das propostas é a universalização do

atendimento essencial, onde demanda essencial é assumida como o consumo mínimo

suficiente ao atendimento das necessidades do indivíduo (estimado em 85 l/hab.dia). E

mais, o que estiver acima deste patamar estará sujeito ao mercado. Estes parâmetros foram

definidos no início do século pelo saudoso Saturnino de Brito, e não foram realizados

novos estudos neste sentido. Será que este valor seria suficiente atualmente?

A necessidade de participação dos diversos agentes envolvidos na gestão

dos serviços (Estado, prestadores de serviço, usuários e outros) é outro conceito básico

58 Ver estudo sobre as concessões privadas no Brasil e no esterior, Concessões Privadas: Diagnóstico de um Equívoco, publicado pela
Assemae e pela Federação Nacional dos Urbanitários (1996), em que são analisados os problemas políticos, de corrupção, tarifários e
operacionais dessas experiências.
175

adotado nas proposições, devendo-se destacar o papel do Estado como agente princiapl das

transformações propostas.

O terceiro princípio refere-se `a descentralização, amplamente demandada

pela sociedade brasileira. No novo modelo de prestação dos serviços de saneamento a

descentralização é princípio fundamental. No entanto, nas demais proposições aparece

nitidamente o fortalecimento do nível estadual, como na nova legislação proposta.

O quarto princípio é a flexibilização da prestação dos serviços, como

decorrência, de um lado da titularidade, vinculada ao município no caso dos serviços de

interesse local, e às instâncias regionais ou estaduais, nos casos em que os serviços

envolvam interesses supralocais. Na flexibilização, a prestação dos serviços pode ser feita

por qualquer agente, na medida em que o papel de regulação é realizado pelo Estado. Neste

princípio está claramente inserida a concessão à iniciativa privada. Este é um aspecto

central nas propostas.

Outro aspecto importante nas propostas do PMSS é a discussão da

titularidade dos serviços de saneamento. Na interpretação da Constituição, é defendido que

possa haver o transpasse de titularidade entre poderes, o que parece ser um absurdo

constitucional. Na interpretação do Art. 23, item IX, que estabelece a titularidade comum à

União, estados e municípios sobre os serviços de saneamento, é proposta a flexibilização

das competências para regular a prestação de serviços. Essa flexibilização prevê a relação

entre os níveis local, subregional e nacional e a integração intra e intersetorial, além da

parceria com a iniciativa privada.

O transpasse do poder decisório do município ou associações

intermunicipais para os estados ou União implica na possibilidade jurídica de tomar para si

a responsabilidade de promover medidas normativas e administrativas, visando a extensão

da titularidade aos estados e/ou União.


176

Na interpretação do PMSS, baseado na exigência constitucional (Art. 175,

parágrafo único), os estados podem retomar a titularidade quando da prestação inadequada

dos serviços pelos municípios. As situações que caracterizam deficiência municipal para

exercer a regulação, prestação e controle dos serviços são: a incapacidade técnica e/ou

financeira ou ainda, a dinâmica regional. Estes casos são definidos pelo PMSS, como

competência supletiva dos estados.

Porque a necessidade de transpasse de titularidade de poderes, se a

concessão ou convênios seriam suficientes para promover melhorias em situações críticas?

Além do mais, essa interpretação do texto legal possibilita que o nível estadual possa

privatizar a prestação dos serviços, sem a anuência do município.

Há ainda o caso de regiões metropolitanas, microrregiões e consórcios

intermunicipais, em que o PMSS interpretando o Art. 25, parágrafo 3º, da Constituição,

entende que a competência dos serviços de saneamento nestes casos é estadual. Assuntos

de interesse supra-municipal podem ser abrigados nos níveis de deliberação das Câmaras

Técnicas dos consórcios, antes de avançarem para o patamar imediatamente superior de

recorrência, ou seja, o estadual. Além disso, há a competência complementar quando é

acordado entre o município e o estado a prestação de serviços de natureza similar como por

exemplo, o fornecimento de água no "atacado" ou o tratamento de esgotos, nessas regiões.

Na interpretação do Art. 30, item V, que estabelece a competência

municipal sobre a organização e prestação de serviços públicos de interesse local, o PMSS

entende que estes referem-se exclusivamente àqueles que correspondem a sua relação final

e direta com os usuários residenciais, excluindo os grandes usuários industriais ou

comerciais e a produção das capacidades básicas dos serviços. Esse entendimento é a base

para o estabelecimento da ação complementar pelos estados. Não tem sentido a exclusão

dos grandes consumidores da competência municipal, visto que não há extrapolação desta
177

atividade a outros municípios e que esta é uma atividade fim. Outro aspecto importante é

que a viabilização dos sistemas está vinculada à composição de tarifas comerciais e

industriais, não é concebível a dicotomização dessas atividades.

A partir da análise do Art.. 23 da competência comum entre União, estados

e municípios, o PMSS propõe uma distribuição de competências normativas e executivas,

bem como as formas de cooperação entre as esferas de governo, inclusive com propostas

de projetos-de-lei.

Quanto à esfera federal, são definidas competências predominantemente

normativas e de articulação intersetorial com a descentralização gradual de ações

executivas.

O nível estadual é sem dúvida o núcleo central da proposta do PMSS.

Podemos dizer inclusive que, em última análise, o ponto de vista de toda a formulação foi

centrado no modelo estadual, desconsiderando os modelos municipais em funcionamento

nos seus estudos E mesmo o pressuposto de que é esta a instância que precisa ser

fortalecida.

Os estados, segundo o PMSS, devem absorver atribuições executivas na

condição de poder concedente sobre os serviços de abrangência supra-municipal e mais,

em caráter supletivo, sobre aquelas que embora de interesse local se vejam obrigados a

compartilhar a titularidade com os municípios. Além disso, devem absorver as ações

executivas e parte das normativas referentes às regiões metropolitanas, aglomerações, etc..

O nível municipal tem caráter predominantemente executivo na proposta do

PMSS, baseada na interpretação da Constituição de 88.

Observamos que, na definição das competências para regulação e controle,

ou seja, a titularidade dos serviços, parece haver um esforço dos formuladores do PMSS,

na interpretação da Constituição no sentido de minimizar a competência municipal e


178

possibilitar a transferência de titularidade para a esfera estadual. Dessa forma, os estados

passam a ter a competência legal para a definição de políticas, o estabelecimento de tarifas

e até para proceder privatizações.

Em nossa ótica, como a competência constitucional é (e sempre foi) do

município, e como o município ficou alijado de todo processo decisório nos últimos 25/30

anos, uma formulação de políticas deveria ter como núcleo central a descentralização.

Dentre as conquistas sociais constantes na Constituição de 88 está o

fortalecimento do município, como instância que incorpora elementos fundamentais

necessários a construção de uma sociedade democrática. A descentralização das ações já

foi incorporadas por alguns setores, como principalmente o da saúde, através do SUS, e na

implementação de políticas compensatórias em curso, como o Projeto de Controle da

Mortalidade Infantil/MS e o Projeto Comunidade Solidária. O município é o locus

privilegiado de construção da cidadania e deve ser fortalecido através de políticas públicas

setoriais. Um novo modelo de saneamento deve ter como eixo o município, resguardando-

se os papéis indispensáveis dos estados e da União.

Uma flexibilização a ser proposta pode ser na própria gestão das

companhias estaduais em sua relação com os municípios, como já ocorreu em alguns casos

no período anterior ao Planasa. As Cesb’s poderiam atuar tanto na gestão, como

concessionárias, quanto na prestação de assistência técnica aos municípios que não são

conveniados (e mesmo para os que querem assumir os serviços), e ainda, no repasse de

financiamentos. Estes serviços deveriam ser inclusive pagos pelos municípios às CESBs,

não onerando estes órgãos. Desta forma seria viável a capacitação crescente dos

municípios.
179

Também deveria ser fortalecida a estrutura já existente na FNS, na

assistência técnica aos municípios, no sentido de ampliar sua atuação capacitando-os a

constituírem serviços e administrá-los.

Com relação ao financiamento as propostas do PMSS, se baseiam no

alcance e limites da autonomia tarifária, sendo reconhecida pelos autores a impossibilidade

da auto-sustentação tarifária do setor. A partir daí, é feita uma análise a respeito das

possíveis fontes de recursos, provenientes de origem fiscal, poupança compulsória e

recursos externos.

Uma questão importante é saber quais parâmetros de custos foram utilizados

para esta conclusão. Pois é sabido por especialists do setor e, a própria Assemae defende

isto, que os custos praticados pelas Cesb’s, são extremamente altos, devendo haver uma

reformulação na apropriação dos custos, inclusive com mudanças no aspecto tecnológico.

A ex-FSESP construiu e administra centenas de serviços no Brasil que são auto-

sustentáveis via tarifas, inclusive em municípios pequenos no interior do país. Estas

experiências deveriam ter sido estudadas pelo PMSS e não o foram.

A análise sobre o financiamento realizada pelo PMSS se dá a partir da

atribuição aos municípios e aos prestadores de serviços da responsabilidade pela geração,

via tarifas, de recursos financeiros necessários para atender as demandas do setor.

A ação supletiva no financiamento, deverá se dar, segundo o PMSS, na

medida em que não seja possível a auto-sustentação tarifária dos serviços, e pode ocorrer

de duas formas, a partir de financiamentos com recursos retornáveis e através de subsídios.

O modelo PLANASA adotou o critério de auto-sustentação tarifária, via

subsídios cruzados, entre os municípios de um estado, e na progressividade das tarifas por

nível de consumo e categoria de uso, sendo o estudo de viabilidade global realizado para a

Cesb, como um todo e não por municípios isoladamente.


180

Os municípios, poder concedente, são os responsáveis pela definição das

tarifas mas no entanto, não têm desempenhado este papel. A atual Lei de Concessões,

estabelece que a tarifa deve ser definida na licitação, ficando os reajustes e aumentos

definidos pelo poder concedente.

Os estudos desenvolvidos pelo PMSS indicam que "a viabilidade

econômico-financeira das empresas de saneamento parece ser factível, mas não suficiente

para assegurar a universalização dos serviços de saneamento", sendo necessários portanto,

subsídios.

Na medida em que a capacidade de pagamento da população não é

suficiente para cobrir os custos, segundo o PMSS, o governo terá que participar, seja

garantindo financiamento para o investimento a um custo mais baixo, seja subsidiando o

consumo dos serviços, ou ainda de ambas as formas. Os mecanismos de subsídios ainda

não estão definidos pelo Governo Federal, indicando porém que o poder concedente, nível

estadual ou município, dependendo da legislação a ser aprovada, arcará com este ônus.

Um aspecto delicado neste contexto de subsídios e de concessões privadas é

que pode ser plenamente justificável o subsídio direto à inicativa privada em alguns

sistemas, com recursos orçamentários do poder concedente, na medida em que um

município não seja auto-sustentável via tarifas. A apropriação de custos é estremamente

complexa, sendo complicado estabelecer quem é auto-sustentável ou não.

Como resultado desta política de flexibilização, tivemos em 1994, a

primeira concessão privada, integral, dos serviços de água e esgotos no Brasil, na cidade de

Limeira-SP, 156 anos após a primeira concessão do Brasil, no Império, ocorrida em Recife.

Desta vez, ganhou a licitação a empresa, Águas de Limeira, subsidiária da francesa

Lyonese D’Eaux e a brasileira CBPO.


181

No entanto, este início de abertura do mercado nacional - saindo de uma

fase de 100% de prestação pública dos serviços - para a iniciativa privada se deu de forma

traumática. Este processo está sendo investigado pela Promotoria Pública do Estado de São

Paulo, devido a possíveis irregularidades no processo de licitação (ver a publicação

Concessões Privadas: Radiografia de um Equívoco, 1996).

Desde então, diversos outros processos de concessão privada já foram

realizados, ou estão em andamento, seja de forma integral dos serviços de água e esgoto,

como em Limeira, ou de partes de um sistema, como estação de tratamento de esgoto ou

água. Ou ainda, apenas todo o serviço de água ou o de esgoto. No total, municípios já

estão concedendo serviços à iniciativa privada no Brasil (Concessões Privadas: Radiografia

de um Equívoco, 1996).

Este processo está tendo todo o empenho do Governo Federal, seja do ponto

de vista do ponto de vista político, seja do ponto de vista da coerção econômica. O

Governo Federal tem restringido o acesso dos municípios e estados aos recursos do FGTS,

através de uma grande malha burocrática, com intuitos claros de empurrá-los para a

concessão privada. A Diretora de Saneamento da Secretaria de Políticas Urbanas (Sepurb) /

MPO, afirmou em recente encontro do setor, que o problema do setor em 1996, não era

recursos, que estavam sobrando recursos na CEF. E o argumento era a incapacidade de

capitação dos recursos pelo setor. E de fato, até agosto de 96, apenas 17% dos recursos

disponíveis, tinham sido contratados. No entanto, esta política de restrição ao desembolso

dos recursos da CEF, tem dois objetivos: viabilizar o auxílio da CEF no sistema

interbancário e as concessões privadas do setor (Concessões Privadas: Radiografia de um

Equívoco, 1996).

Por outro lado, o BNDES reabriu uma linha de crédito, depois de encerrada

no último Governo, para o financiamento para o setor saneamento. A condição


182

indispensável ao acesso pelos prestadores públicos: posterior entrega dos serviços à

iniciativa privada. Confirmando a tese do empenho do Governo na ampliação deste

mecanismo.

Creio que cabe a pergunta: a flexibilização, ou, a concessão privada dos

serviços, levará à universalização do atendimento?


Conclusões
184

Conclusões

A análise da história do saneamento no Brasil, a partir de um recorte

institucional, possibilitou uma reflexão sobre os atuais modelos de gestão do país, que até

então careciam de elementos históricos. A literatura acadêmica e técnica do setor ainda não

havia trazido uma análise histórica que abrangesse o país como um todo e por um período

que englobasse todo o espectro de conformação institucional do setor.

Por um lado este aspecto foi um fator de dificuldade na pesquisa e na

análise. Mas por outro, possibilitou a introdução de elementos que podem vir a contribuir

para resgatar a memória do saneamento nacional. Além do que, havia algumas análises que

por carecerem da abordagem histórica, sobrevalorizaram uma "versão oficial".

Seja para a compreensão das relações entre os setores da saúde e do

saneamento, ou do próprio setor saneamento, a análise da história traz elementos que

explicam melhor o atual estado da arte.

As ações de saneamento executadas pelo setor saúde foram marcadas pela

concepção do processo saúde-doença e pelo papel assumido pelo Estado para estas

políticas.

Na gênese das ações de saneamento enquanto controle de doenças

transmissíveis, está a teoria dos miasmas. Essas ações eram identificadas como

instrumento eficaz da salubridade do meio e controle das enfermidades.

Com a descoberta dos agentes patógenos, houve uma mudança no enfoque

do controle das doenças, de uma intervenção sobre o meio para uma intervenção

prioritariamente sobre o indivíduo. No entanto, as ações de saneamento continuam a ser

entendidas como medidas profiláticas adequadas.


185

As ações de saúde implementadas pelo Estado apresentaram como

característica principal, um caráter de assegurar a manutenção da força produtiva da mão-

de-obra e circulação de bens e insumos no espaço urbano sendo implementadas muitas

vezes de forma policialesca. A saúde no início do século era fundamentalmente preventiva.

E as ações de saneamento realizadas por este setor refletiram este caráter, regulamentando

e vigiando de forma invasiva a habitação e o espaço urbano, penalizando principalmente as

populações carentes.

A partir de meados do século, com a utilização de quimioterápicos e

biocidas, e com a redução da participação da saúde pública em relação à assistência médica

no orçamento do setor, ocorre uma mudança do espaço de intervenção das ações de

saneamento, do urbano para o rural e / ou pequenas cidades. Mas ainda mantendo

intervenção sobre a força produtiva sem apresentar características de universalidade.

Na medida em que a assistência médica passa a ser gerida pela seguridade

social, e não mais pelo setor saúde, este se vê esvaziado de recursos e poder. Neste

contexto, também as ações de saneamento através da saúde, enquanto ações preventivas,

foram reduzidas progressivamente.

A dependência de recursos orçamentários para a saúde pública levou a que

sua atuação em saneamento passasse a ser apenas normatizadora. E as ações de

fiscalização, baseadas nos pressupostos da higiene da habitação do início do século,

ficaram obsoletas por não considerarem o quadro de carências sociais.

Os novos preceitos estabelecidos a partir da municipalização da saúde,

indicam a necessidade da redefinição do papel dos setores de saúde e saneamento quanto a

essas ações. O caminho parece ser a ação executiva através do setor saneamento, utilizando

paradigmas de saúde, integradas com os demais segmentos sociais em fóruns deliberativos,

já previstos para as políticas de saúde.


186

A história do saneamento no Brasil mostra que o Estado passou

progressivamente a assumir as atividades características do setor, inicialmente

desenvolvidas a nível individual e depois em soluções coletivas. No entanto, a ação do

Estado nunca teve caráter universal, ficando parcelas significativas da população excluídas

do acesso aos serviços. Historicamente, como para as demais políticas sociais, as parcelas

favorecidas sempre foram as mais abastadas, com os demais segmentos sociais sendo

atendidos na medida da expansão dos serviços.

As ações desenvolvidas sempre se caracterizaram pela falta de um

planejamento adequado, sendo estas ações na maioria das vezes, respostas à situações de

crise, em caráter emergencial, como já denunciara Saturnino de Brito no início do século.

A evolução da organização dos serviços de saneamento no Brasil se deu no

sentido da busca da autonomia administrativa e financeira. As diversas fases por que

passou o setor indica esta tendência: inicialmente concedidos à iniciativa privada, depois

com a assunção direta pelo Estado, foram criadas as autarquias, sendo sucedidas por

companhias de economia mista.

Porém, tanto a autonomia administrativa, quanto a financeira, não

atenderam às aspirações de especialistas do setor. Com relação a autonomia financeira dos

serviços, apesar da escassez de literatura disponível, pode-se afirmar que de fato, não foi

almejada, inclusive pelo Planasa.

Até a década de 60, os investimentos em obras de saneamento tiveram

aportes de recursos federais e estaduais, que representaram quase a totalidade dos

investimentos. Os governos estaduais, seja através de sua estrutura da administração direta,

ou dos órgãos de saneamento, tiveram participação importante na implantação de sistemas

de água e esgotos e ações de média e macro drenagem. A União, seja por repasses

orçamentários ou por ação direta através de vários orgãos, também foi responsável por
187

ações de água, esgotamento, média e macro-drenagem e controle de vetores. As ações de

lixo e micro-drenagem foram quase sempre desenvolvidas pelos municípios.

Os mecanismos de financiamento com recursos retornáveis, iniciados na

década de 50, se fortaleceram na década de 60, com as ações do BID, Sudene, GEF e BNH.

Mas é com o Planasa que este mecanismo de financiamento se fortalece, tornando-se a

principal fonte de recursos para o setor. No entanto, este modelo implantado de forma

autoritária, durante o período militar, excluiu do acesso a estes recursos, os municípios que

não aderiram a este plano.

Os paradigmas principais deste modelo eram a gestão empresarial e a auto-

sustentação via tarifas, que previa a equalização financeira ao nível do órgão gestor

estadual e não ao nível municipal. Este modelo não adotou uma concepção de saneamento

mais ampla, restringindo-se à ações de água e esgotos, excluindo portanto, ações de lixo,

drenagem, controle da poluição e saneamento rural.

O Planasa, contudo, teve muitos méritos que precisam ser a este plano

credenciados. A formação de recursos humanos, por exemplo, que capacitou um grande

contingente de profissionais, foi fundamental para viabilizar a implementação das

políticas. A expansão da população urbana atendidas pelos serviços de água e o números

de cidades que passaram a ter acesso a este tipo de serviço também foram significativos. A

relação custo-benefício, no entanto, precisa ser melhor avaliada para todo o período do

plano, para se ter idéia de sua efetividade. A ampliação dos sitemas de esgotos não

atenderam as metas estabelecidas, tendo resultados muito insatisfatório.

Do ponto de vista da gestão, o modelo Planasa devido a sua gênese

autoritária, consolidou uma cultura política em que o poder concedente - o município - e a

população, não têm nenhuma participação no decisório, nem mesmo acesso a informações

gerenciais que possibilitem controle externo.


188

O atual modelo de gestão através das companhias estaduais está saturado,

necessitando de mudanças que possibilitem a redução dos déficits existentes, dentro de

padrões satisfatórios de qualidade e custos. Neste contexto, a retomada pelo município do

papel de poder concedente, é um passo importante para a transparência das políticas. Esta

ação pode significar a retomada da concessão ou apenas o controle rigoroso sobre a

concessionária, e a participação na definição das políticas.

PMSS

A criação de instrumentos de controle por parte da sociedade é um

mecanismo importante na democratização necessária ao setor. Ao contrário de outros

setores que já criaram mecanismos de participação da sociedade, como nas áreas da saúde

e meio ambiente, pode-se afirmar que o setor de saneamento ainda não se democratizou.
189

Impasses e perspectivas

A atual conjuntura do setor saneamento nos leva a crer na necessidade de

repensar o modelo herdado do Planasa. Os déficits já são crônicos, a estrutura das Cesb’s é

bastante pesada com custos altos, e o financiamento fundamentado quase que

exclusivamente no FGTS e, mais recentemente, em recursos externos, não é suficiente. A

democratização da relação entre poder concedente e concessionária deve ser buscada,

associada a transparência e controle social das políticas.

Vários aspectos do modelo não são suficientemente conhecidos, como a

autonomia financeira e a capacidade de pagamento da população. Para a redefinição de

novos mecanismos de financiamento, precisa-se ter clareza a respeito deste aspecto, para

que se possa inclusive definir o que deve ou não ser financiado a fundo perdido.

A autonomia administrativa e os modelos de gestão precisam também ser

melhor avaliados nas situações existentes e à luz de uma análise histórica.

Outra característica que marcou a evolução dos serviços de saneamento

básico no Brasil, a partir sobretudo das décadas de 50 e 60, e que precisa ser melhor

avaliada é a autonomia administrativa desses serviços. A partir do modelo Planasa, três

formas de gestão permaneceram: as companhias estaduais, onde os municípios perderam

qualquer poder de decisão e que a concepção de auto-sustentação se baseou no subsídio

cruzado; os serviços municipais, geridos sob a forma de administração direta, autarquia ou

economia mista; e ainda os serviços autônomos de água e esgotos, em que a Fsesp / FNS,

através de convênio com os municípios, administrava os serviços.

Para cada tipo de gestão acima descrita, há questões que não têm sido

avaliadas a cerca de sua autonomia administrativa e financeira. Com as mudanças

ocorridas na legislação que rege a organização de serviços públicos, estes perderam


190

gradativamente a autonomia, primeiro com o Decreto Nº 200 / 67 e posteriormente na

constituição de 1988. A flexibilidade na administração de pessoal foi bastante reduzida e

mesmo na administração financeira, havendo caso de Cesb que participa com sua receita

do caixa único do respectivo estado.

Quanto à autonomia financeira via tarifa, que sempre foi buscada pelos

órgãos, a análise é mais complexa. No entanto, alguns pontos são importantes salientar,

numa tentativa de indicar investigações acerca do tema. Algumas considerações são

necessárias e algumas perguntas ficarão ainda sem resposta na reflexão sobre autonomia

financeira e auto-sustentação tarifária.

As tarifas buscam cobrir o custeio da operação e manutenção (incluída a

depreciação), a amortização dos empréstimos e a expansão dos sistemas. Naturalmente, há

variações, dependendo das fontes de financiamento, dos custos e da capacidade de

pagamento da população, mas, em tese, esses seriam itens a serem cobertos via tarifa. E foi

esta a concepção do Planasa.

No entanto, as Cesb’s, através do modelo Planasa, não atingiram a almejada

auto-suficiência financeira. A verdade tarifária não chegou a ser implementada, pois a

centralização no Governo Federal imposta a partir de 1975, para a definição das tarifas,

eliminou a possibilidade de auto-sustentação tarifária (Fiszon, 1990 e Paula, 1990).

Dessa forma, não se tem uma idéia da viabilidade econômica das Cesb’s

devido ao artifício do subsídio cruzado, vigente até hoje. As dívidas contraídas pelas

companhias através dos empréstimos tomados junto ao BNH / CEF ao longo de 20 anos

são enormes e são verdadeiras caixas pretas. Não se tem dimensão de seus montantes e

não há estudos analisando-os. Rodolfo Costa e Silva1 chega a afirmar que estes

empréstimos tiveram, na verdade, um caráter de recursos a fundo perdido, tal o montante


191

das dívidas das Cesb’s, associadas à inadimplência e / ou constantes renegociações das

dívidas.

A proposta de auto-sustentação tarifária defendida por amplos segmentos do

setor, já a partir da década de 50 e através da Sudene e do BID, atendia ao modelo de

desenvolvimento implementado pelo regime militar, que definia a gestão dos serviços

públicos de caráter industrial, através de modelo empresarial. Alguns autores, como Paula

(1990), atribuem à utilização desse mecanismo de financiamento a restrição do acesso de

parcelas da população aos serviços.

Por mais que se questione o artifício do subsídio cruzado, tem-se que aceitar

seu valor como instrumento de uma possível viabilização do modelo. Esta foi a maneira

com a qual o Planasa estabeleceu o mecanismo de viabilizar a auto-sustentação das Cesb’s.

É plenamente questionável, mas trazia em si, pela primeira vez, uma proposta de

equacionamento do problema como um todo. Por outro lado, o seu relativo sucesso ocorreu

devido ao grande aporte de recursos - necessariamente retornáveis - do FGTS, motivo que

faltava a outras tentativas.

Pensar que a auto-sustentação foi o motivo da exclusão de segmentos

sociais do acesso aos serviços, é achar que a universalização teria ocorrido com a

utilização de recursos orçamentários. Mas historicamente, a dependência destes recursos

foi exatamente o que levou ao grande déficit existente na década de 60, e o motivo que

levou, desde os idos de 40, à reivindicação de mecanismos de empréstimos.

Analisando o acesso aos bens de consumo coletivo no Brasil, identificamos

que sempre os segmentos que são contemplados inicialmente são os mais abastados, e que

sobretudo na dependência de recursos orçamentários, são excluídos sempre os segmentos

mais pobres. Assim foi com a saúde, a educação, habitação, etc., e com saneamento!

1. Idem.
192

O fundamental parece ser buscar soluções que conjuguem empréstimos com

recursos do tesouro, a partir da capacidade de pagamento da população. O Planasa tentou,

mas não deu certo.

Do ponto de vista do financiamento de recursos do FGTS aos municípios

autônomos, o argumento empregado para que se restringisse o acesso aos recursos do SFS

às Cesb’s era o da viabilidade econômica do modelo. Com o artifício do subsídio cruzado,

haveria a necessidade de adesão às companhias estaduais para o acesso aos financiamentos,

caso contrário, o sistema seria inviável. Segundo Rego Monteiro2, a adesão das capitais e

grandes cidades seria determinante para a cobertura dos municípios deficitários. Como

exemplo, pelo fato da cidade de Porto Alegre e outras cidades de médio porte do Rio

Grande do Sul não terem concedido seus serviços à Corsan, a tarifa dessa companhia

sempre foi a mais elevada do Planasa.

O modelo Planasa, mesmo utilizando esse mecanismo, poderia ter

estabelecido outros níveis de relação com os concedentes dos serviços. No entanto, sua

gênese foi autoritária, quando através da coerção política e econômica impelia os

municípios à adesão ao plano. Esta gênese condicionou a cultura autoritária e

centralizadora das companhias estaduais e sua relação com os municípios concedentes.

Estes perderam qualquer interferência sobre as decisões em ações de água e esgotos,

descaracterizando inclusive o caráter de poder concedente, tal a relação autoritária

implementada pelas Cesb’s.

O titular dos serviços - no caso dos municípios - não perde em nenhum

momento a responsabilidade sobre estes, mesmo que estejam concedidos. Do ponto de

vista legal os municípios tinham condições de interferir neste processo. Porém a relação

2. Entrevista realizada com o Engº José R. do Rego Monteiro, idealizador do Planasa e ex-diretor do BNH, em dezembro de 1992, no
Rio de Janeiro.
193

que se estabelece entre poder concedente e concessionária é política, e como esta relação

foi constituída sob um regime autoritário, o que ocorreu no Planasa foi reflexo da

conjuntura política do país.

Com relação aos serviços geridos pelos próprios municípios, muito pouca

informação se tem disponível. Não sabe-se com que recursos foram realizados os

investimentos, se com recursos tarifários ou orçamentários, se as tarifas cobrem o custeio

(de operação e manutenção) ou se o déficit é coberto também por recursos do orçamento

municipal. Na verdade, conhece-se alguns municípios que têm seus serviços

superavitários, mas não se tem uma dimensão real de cerca de 700 desses municípios.

O modelo adotado pela Fsesp, no qual a viabilidade deveria ser buscada

para cada município, se contrapõe à concepção do subsídio cruzado. As divergências dos

modelos diz respeito tanto do ponto de vista econômico, quanto do ponto de vista da

autonomia municipal. Neste aspecto, reside seu maior mérito - mesmo que esta autonomia

não tenha sido alcançada como prevista - pois respeita o poder concedente dos municípios.

A Fsesp ao contrário do modelo Planasa, via a viabilidade dos serviços a

nível municipal, adotando tarifas diferenciadas de acordo com os custos do município

atendido. Uma consequência direta desta premissa é a opção pelo uso de tecnologias

adequadas à capacidade de pagamento da comunidade atendida. Enquanto no Planasa a

tecnologia usada era a convencional, independente da capacidade de pagamento da

comunidade, levando a que suas tarifas fossem sempre mais elevadas do que a dos Saae’s.

O Sesp / Fsesp foi um órgão que, contraditoriamente, apesar de ter sua

gênese e desenvolvimento inicial sob influência direta dos EUA, se constituiu em um

órgão de saneamento básico que contribuiu bastante para a construção de uma identidade

nacional neste campo. As pesquisas realizadas, as tecnologias empregadas, as teses


194

desenvolvidas, o pioneirismo de ações, a relação das ações de saúde e saneamento

contribuíram para a construção desta identidade.

A FNS (ex-Fsesp) tem atualmente cerca de 300 convênios de administração

dos Saae’s com as prefeituras. Mas, também não se tem informações mais precisas a cerca

de sua real autonomia administrativa e financeira. Em tese, as tarifas desses municípios

cobrem custos de operação e manutenção e os recursos para investimentos / expansão

provêm da União, via Fsesp / FNS. A participação das prefeituras, seja com recursos ou

com equipamentos e mão-de-obra não é suficiente conhecida, mas é muito provável que

ocorra. Um outro aspecto dessa forma de gestão é quanto à participação da prefeitura,

efetivamente, nas diretrizes do serviço, ou seja, desempenhando seu papel de poder

concedente. Outros estudos se fazem necessário para avaliar se esse modelo funciona

simplesmente como uma concessão a um órgão federal, dado que o município não

interfere praticamente em nada na gestão dos serviços.

Essas são questões importantes para serem investigadas numa perspectiva

de transformação dos modelos atuais, tendo em vista que o poder decisório deve

necessariamente passar pelo nível local. A partir da reabertura política e principalmente da

Constituição de 1988, os direitos individuais e coletivos foram fortalecidos e as atividades

de interesse local ganharam espaço, vislumbrando novos rumos à sociedade brasileira e,

conseqüentemente a suas instituições. A municipalização da saúde também abriu novas

perspectivas no sentido de se fortalecer os serviços que estejam mais próximos da

população, contribuir para nortear o debate no setor de saneamento.

Os serviços de saneamento são caracteristicamente uma atividade de

interesse local, que diz respeito à salubridade do meio e portanto, condicionante do nível

de saúde da população. A Constituição de 1988 define essa atividade como dever do

Estado e direito dos cidadãos e esses serviços como de competência do município. O poder
195

concedente não perde , com a concessão, a responsabilidade pelos serviços, principalmente

quanto a sua qualidade, política tarifária e garantia dos direitos dos usuários, que segundo a

Constituição devem ser regulamentados por lei (o que ainda não ocorreu).

Os municípios são, em última instância, os responsáveis pelos serviços

prestados à população e, para tanto, devem desempenhar seu papel de poder concedente,

definindo com as concessionárias as políticas a serem implementadas, chegando mesmo a

romper as concessões, caso estas não estejam atendendo aos interesses da população. Para

tanto, é necessário a mínima capacitação dos municípios para atuarem como poder

concedente, ou seja, definindo políticas e fiscalizando as concessionárias. A União e os

próprios estados têm responsabilidade sobre a capacitação técnica do nível local.

No resgate da autonomia dos municípios, necessariamente deverá ser

redefinido o papel das Cesb’s, pois a partir do momento em que os municípios

simplesmente passarem a definir tarifas sobre os custos reais de seus serviços, mudará

completamente a equalização financeira destas companhias. Do ponto de vista da gestão,

os arranjos institucionais deverão atender às necessidades dos municípios, e aí as

experiências do passado podem ser importantes.

As Cesb’s poderiam atuar em três níveis, quais sejam: na gestão de recursos;

como órgão de assistência técnica e como concessionária propriamente. Ainda como

concessionárias podem atuar em partes dos sistemas, isto é, apenas no atacado - no

fornecimento de água e interceptação e tratamento de esgotos, deixando o município atuar

no espaço urbano - na distribuição de água e coleta de esgotos- sobretudo nos aglomerados

de municípios conurbados.

O processo de modificação do Estado enquanto único provedor dos serviços

de saenamento, situação até 1994, para um estado regulador da prestação privada ainda
196

está incipiente, mas sugere ser crescente. A universalização do acesso ainda está distante e

deve-se avaliar se o mercado a viabilizará, ou se será que ocorrerá de forma excludente?

Como disse Saturnino de Brito em 1913, a prestação dos serviços pela inicativa privada é

incompatível com os interesses sanitários do saneamento? Será realmente Limeira o marco

da sétima fase do saneamento brasileiro, ou apenas uma falácia?


197

Apêndice

A intervenção contra as secas no Nordeste

Ainda no início do século, o governo federal criou os primeiros mecanismos institucionais


para combater as secas3 no Nordeste brasileiro. No século passado já haviam sido formadas diversas
comissões para estudar o problema e mesmo para intervir com obras que reduzissem o impacto das secas
sobre a população.

Inúmeras secas assolaram àquela região desde os tempos coloniais, tendo-se informações
de secas datando de 1583, seguindo-se periodicamente outras em 1603, 1614, 1645, 1652, 1692, 1721, 1777,
1793; no séc. XIX, ocorreram sete grandes secas nos anos de: 1845, 1877 até 1879, chamada de ‘a grande
seca’, causando uma mortandade de 500.000 habitantes do estado do Ceará (cerca de 50 % da população
daquele estado). Neste século, as grandes secas foram as de 1900, 1915, 1919, 1920, 1932, 1942, 1958 e
entre 1979 e 1983 (Andrade, 1985 e Carneiro, 1981).

A primeira preocupação do governo federal com as secas, se deu em 1859 com o envio de
uma comissão ao Ceará, com um caráter mais científico de exploração, tendo, no entanto, resultados
insatisfatórios. Durante a grande seca de 1877, D. Pedro II, constituiu uma comissão de engenheiros para
atuar no Ceará, a fim de estudar o problema. Em 1881, outra comissão para o estudo de obras, teve como
orientações para solução do problema, a açudagem, e como conseqüência em 1884 foi iniciado a construção
do Açude do Cedro (ex-Quixadá), só concluído em 1906.

No Governo Rodrigues Alves, em 1904, foi criada a Comissão de Açudes e Irrigação,


subordinada ao Ministério da Viação e Obras Públicas (Mvop), e localizada no Ceará; a Comissão de Estudos
e Obras Contra os Efeitos das Secas e a Comissão de Perfuração de Poços, ambas com sede no Rio Grande
do Norte. Em 1906, as três comissões foram fundidas na Superintendência dos Estudos e Obras Contra os
Efeitos das Secas, sendo extinta no Governo Afonso Pena, retornando a "Comissão de Açudes e Irrigação".

As ações no Nordeste sempre tiveram um caráter assistencialista com intervenções em


períodos críticos, e não a partir de ações perenes. Essas medidas sempre "aguardavam as conseqüências dos
verões prolongados para as enfrentar com o exercício da caridade e medidas de emergência" (Campos, 1985:
42).

3. O conceito de seca utilizado por Carneiro (1981), diz respeito à duração e distribuição no espaço das precipitações, e não aos dados
pluviométricos do Nordeste de modo geral, pois não podem ser considerados baixos.
198

No Governo Nilo Peçanha, em 1909 junto ao Ministério de Viação e Obras Públicas


(Mvop), foi criada4 a Inspetoria de Obras Contra as Secas (Iocs), com as finalidades de executar "serviços
destinados a prevenir os efeitos calamitosos das prolongadas faltas de chuvas em 9 estados da União, isto é,
do norte de Minas até o Piauí" (Carneiro, 1981: 13).

A Ação da Iocs foi bastante ampla, não só visando obras de açudagem e irrigação, mas
também estradas de rodagem, de ferro, estudos meteorológicos, geológicos, topográficos, estações
pluviométricas, conservação e reconstituição de florestas, etc. Esta ação refletia uma visão mais ampla do
problema defendida pelo primeiro Inspetor da Iocs, Arrojado Lisboa, mas que foi perdida posteriormente ao
longo do tempo:

Seca, no rigor léxico, significa estiagem, falta de umidade. Da chuva provém a água
necessária à vida na terra. O problema das secas, assim encarado, seria simplesmente o
problema da água, isto é, de seu suprimento. Mas a palavra seca, referida a uma porção do
território habitado pelo homem, tem significação mais complexa. Com efeito, o fenômeno
físico da escassez da chuva influi no homem pela alteração profunda que dela decorre para
as condições econômicas da região, que por sua vez se reflete na ordem social. Assim
encarada, a seca é um fenômeno muito vasto de natureza tanto física, como econômica e
social, é portanto, um problema múltiplo. Verdadeiramente não há um problema, há
problemas.

(Lisboa, 1913 apud Araújo, 1974: 5)

Com o objetivo de implementar tais atividades de pesquisa, foram importados técnicos que
contribuíram para importantíssimos estudos nas áreas de meteorologia, geologia, hidrologia, botânica e
topografia. Sendo a principal contribuição deste período, os estudos e a coleta de dados sobre vazão através
da instalação de inúmeras estações (Araújo, 1974).

Em 1919, a Iocs, foi reorganizada5 transformando-se em Inspetoria Federal de Obras


Contra as Secas (Ifocs), que contando com o apoio do jurista paraibano Epitácio Pessoa na Presidência da
República, deu novos ânimos aos investimentos, caracterizados até então como sazonais (como resposta às
emergências) e insuficientes. Para tanto foi sancionada uma lei6 autorizando a conclusão e construção de
obras necessárias à irrigação no Nordeste, e criada uma Caixa Especial das Obras de Irrigação e Terras
Cultiváveis do Nordeste Brasileiro (Carneiro, 1981).

Este período foi o de maior volume de recursos e de obras realizadas para o combate a
seca, no qual foram construídos muitos e grandes açudes, como o de Orós p.ex., rodovias, ferrovias e
portuárias, sendo contratadas firmas estrangeiras para a execução, devido à dimensão e complexidade das
obras e equipamentos.

4. Decr. Nº 7.619 de 21.10.1909.


5. Decr. Nº 13.687 de 09.07.1919.
6. Lei Nº 3.955 de 25.12.1919.
199

Mas logo no Governo Arthur Bernardes, em 1923, foram reduzidos os aportes de recursos,
e em 1924 foi extinta a Caixa. Especial, voltando estas obras novamente à depender da alocação de recursos
orçamentários, sendo todas as obras paralizadas no ano seguinte.

Ocorreu uma nova dotação orçamentária específica para ser utilizada pela Ifocs, apenas
através de dispositivo na Constituição de 19347. A dotação constitucional possibilita, em tese, alguma
programação em ritmo adequado, sem tantas oscilações com a dependência política de alocações. Mais no
entanto, na Constituição de 1937, esta dotação é extinta, perdendo-se de vista esta perspectiva (Brasil, 1937).

Em 1936, a Lei Nº 175, estabeleceu o Polígono das Secas, delimitando o conjunto de


municípios do Nordeste e do norte de Minas, mais atingidos pelas estiagens, compreendendo uma área de
cerca de 1.000.000 Km2.

Andrade (1985), divide as fases da ação do Estado no controle das secas em:

• Fase humanitária. Ação paternalista, visando salvar o flagelado da fome, com


distribuição de cereais e sementes, no período anterior às comissões;

• Fase do reconhecimento. Trabalho desenvolvido pelas comissões de 1859 e 1877;

• Fase da integração e sistematização de estudos. Com o surgimento da Iocs em 1909,


institucionalizou-se o serviço público como resposta orgânica ao desafio incessante;

• Fase da diferenciação. Consolidação de infra-estrutura, com equipamentos, rodovias,


ferrovias, etc. Multiplicação de áreas de atuação (psicultura, reflorestamento, serviços
complementares, etc.), período que vai até a década de 40;

• Fase de integração do desenvolvimento regional e promoção universitária. Com a


criação do Dnocs em 1945, da Chesf em 1945, da CVSF em 1948, BNB em 1952 e da
Sudene em 1959.

Em 1945, a Ifocs, foi transformada em Departamento Nacional de Obras Contra as Secas


(Dnocs)8.

Na Constituição de 1946 (art. 98), novamente retorna a dotação orçamentária específica, no


montante de 3 % da renda tributária da União, sendo 1/3 destes recursos recolhidos a um fundo específico
para assistência às populações nas calamidades. E os Estados compreendidos na área da seca, estariam

7. O art. 177 desta constituição previa que a União despenderia 4 % de sua receita tributária sem aplicação especial, com obras e
serviços de assistência, sendo 1/4 deste montante recolhido em ‘Caixa’ para atendimento às populações em situações de calamidade. E
os estados e municípios também estariam obrigados a aplicar 4 % de seus recursos tributários sem aplicação especial, na assistência
econômica às populações assoladas pela seca (Brasil, 1934).
8. Decreto-Lei Nº 8.486 de 28.12.1945.
200

obrigados a recolherem 3 % da sua renda tributária na construção de açudes em regime de cooperação e no


atendimento às populações (Brasil, 1937).
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