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ANA BEATRIZ MARQUES PENNA

PPGAV/UnB
Tópicos Especiais em Educação em Artes Visuais
PROF. DR. LUIZ CARLOS PINHEIRO FERREIRA

CAPÍTULO IV

NARRATIVAS
INSTITUCIONAIS DE SI:
A ARTE DE ENLAÇAR REFLEXÃO, RAZÃO
E EMOÇÕES
MARIA DA CONCEIÇÃO PASSEGGI
CAPÍTULO IV

— Narrativas institucionais de si: uma arte incômoda?


— O sujeito biográfico: uma questão espantosamente pública
— Sujeito epistêmico: reflexão e razão
— Sujeito da experiência: reflexão e emoções
— In. Conclusões
CAPÍTULO IV

Maria da Conceição
Passeggi
Pesquisadora Pq1-D Ed-CNPq. Professora da
Universidade Cidade de São Paulo (UNICID).
Professora permanente do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte (PPDEd-UFRN).
Suas pesquisas tematizam as narrativas
autobiográficas e as escritas de si como método
de pesquisa e dispositivos de formação e
focalizam a reflexividade narrativa como
disposição humana promotora da reinvenção
permanente das representações de si e do outro.
CAPÍTULO IV

— Narrativas
institucionais de si:
uma arte incômoda?
NARRATIVAS INSTITUCIONAIS DE SI: UMA ARTE INCÔMODA?

Gaston Pineau (2006a)


oito tipos de arte narrativa da vida, desde a antiguidade clássica até nossos dias:

SÉC. V a.C. (1) arte filosófica: conhecimento de si


SÉC. II a.C. (2) arte midiática: feitos heroicos
SÉC. V (3) arte sacerdotal: consciência como caminho para chegar a Deus
SÉC. XVII (4) arte literária: instituição do gênero autobiográfico
SÉC. XIX (5) arte hermenêutica: reflexividade autobiográfica como modelo de
compreensão do mundo
SÉC. XX
(6) arte metodológica: utiliza fontes autobiográficas para estudos
sociais
(7) arte existencial: emancipação das pessoas que escrevem
(8) arte profissional: indivíduo é chamado a se assumir como autor de
sua vida e a responsabilizar-se por ela
NARRATIVAS INSTITUCIONAIS DE SI: UMA ARTE INCÔMODA?

}
reflexão
injunção
institucional Memorial autobiográfico
conhecimento
de si dimensões
heurística;
hermenêutica;
Nos memoriais autobiográficos, trata-se da arte autopoiética;
de tecer, narrativamente, uma figura, não de um etnossociológica;
eu interior e obscuro, mas de um si mesmo política;
exterior e público, se é que é possível separá-los. social;
e afetiva
NARRATIVAS INSTITUCIONAIS DE SI: UMA ARTE INCÔMODA?

Memorial acadêmico x Memorial de formação

"O termo memorial autobiográfico designa dois tipos de memorial: o memorial


acadêmico, escrito para fins de ingresso e progressão na careira docente no ensino
superior, e o memorial de formação, escrito, geralmente, durante a formação
inicial, ou continuada, como trabalho de conclusão de curso (TCC). As duas
modalidades visam à avaliação e autoavaliação de quem o escreve. No entanto,
enquanto o memorial acadêmico objetiva uma seleção, o memorial de formação
objetiva a obtenção de um certificado."
NARRATIVAS INSTITUCIONAIS DE SI: UMA ARTE INCÔMODA?

"o processo de escrita do memorial acadêmico é, antes de tudo,


um espaço-tempo de tensões contraditórias, pois, se baseia ‘na
estima aparente dos outros’ (os que fazem a instituição, pois é
para eles que se escreve) e ‘na miríade de expectativas’ que foi
recolhendo sobre a cultura universitária na qual está imersa ou
pretende ingressar."
NARRATIVAS INSTITUCIONAIS DE SI: UMA ARTE INCÔMODA?

Objetivo "Nosso objetivo neste capítulo é tecer aproximações sobre traços reveladores
de uma dimensão poética, reveladora e provocadora de rupturas, com base
no que guardei de minhas leituras de memoriais acadêmicos escritos por
mulheres professoras."

HELOISA HELENA JANE SOARES DE VERA LUCIA XAVIER TATYANA MABEL


OLIVEIRA BUARQUE ALMEIDA (UNESP) PINTO (UFRN) NOBRE BARBOSA
DE HOLLANDA (UFRJ) (UFRN)
CAPÍTULO IV

— O sujeito biográfico:
uma questão
espantosamente
pública
O SUJEITO BIOGRÁFICO: UMA QUESTÃO ESPANTOSAMENTE PÚBLICA

Inauguração - Cápsula do tempo


Amélia do Carmo
2020

"O eu parece ter se tornando uma questão


espantosamente pública em nossos tempos."
Jerome Bruner
O SUJEITO BIOGRÁFICO: UMA QUESTÃO ESPANTOSAMENTE PÚBLICA

Nesse contexto institucional, o sujeito biográfico


institucional pode ser entendido como um ser capaz
de tomar a si próprio e as suas experiências como
objetos de reflexão e, no ato de biografar-se,
reconsiderar suas aprendizagens, posicionar-se face a
elas e tomar decisões para sua vida atual e futura.
O SUJEITO BIOGRÁFICO: UMA QUESTÃO ESPANTOSAMENTE PÚBLICA

A institucionalização de um sujeito biográfico, no Brasil, tem a sua


história. Ela data do início dos anos 1930, com a institucionalização
dos memoriais autobiográficos como requisito para concurso público
na universidade brasileira e na progressão funcional.

Nos memoriais acadêmicos dos anos 1930, encontrados na USP, os


autores, seguindo as orientações dos editais, fazem uma descrição
minuciosa de sua vida profissional, de sua produção científica, títulos
e prêmios que atestam o notório saber do candidato.

O SUJEITO BIOGRÁFICO: UMA QUESTÃO ESPANTOSAMENTE PÚBLICA

Nos memoriais que nos servem de fonte de reflexão, as autoras,


aplicando-se também a fazer do seu memorial um espaço de
reflexividade, sinalizam o lugar do coração e da emoção, do público e
do privado.

O SUJEITO BIOGRÁFICO: UMA QUESTÃO ESPANTOSAMENTE PÚBLICA

Onde havia nós desenrolei as fitas e passei a produzir laços. Pude perceber
nesse caminho que foi pensar minha própria história o que foi realmente
significativo para mim como ato formador, e isso serve de parâmetro para
minhas ações como educadora-pesquisadora (PINTO, 2011, p. 11).

Como, no momento, procuro uma forma de me situar enquanto sujeito


neste memorial, percebo, com uma certa perplexidade, as tensões que
experimento entre minha vida particular e minha atuação pública
(HOLLANDA, 2011, p. 99).

O SUJEITO BIOGRÁFICO: UMA QUESTÃO ESPANTOSAMENTE PÚBLICA

Contrariamente, ao modelo já instituído, a redemocratização do país


e o aumento do contingente feminino no ensino superior provocam
rupturas significativas nessa escrita institucional de si.

É essa escrita feminina que dá maior lugar a mudanças do sujeito


biográfico institucional, que se narra menos preocupado com o
conhecimento objetivo, e mais voltado para o sujeito da experiência,
mais poético, transgressor e reivindicador.
CAPÍTULO IV

— Sujeito epistêmico:
reflexão e razão
SUJEITO EPISTÊMICO: REFLEXÃO E RAZÃO

Mundo paradigmático x Mundo narrativo

As professoras em seus memoriais religam esses modos de pensar.


SUJEITO EPISTÊMICO: REFLEXÃO E RAZÃO

como analisa criticamente Jane Soares Almeida (2011),


em seu memorial: Quando nos dispomos a debruçar
sobre o que temos vivido e realizado, hesitamos entre
o prazer de falar daquilo que somos e o comedimento
necessário para não nos alongarmos em demasia e não
perder a racionalidade.
SUJEITO EPISTÊMICO: REFLEXÃO E RAZÃO

o sujeito biográfico se esforça para articular o status de autor e


narrador com o de candidato a um cargo ou progressão na carreira.

Qual o efeito dessa situação sobre o processo de criação pública de si


como uma arte narrativa?

Já nos referimos, anteriormente, que o autor-narrador-candidato


oscila entre duas tendências: a injunção institucional (objetiva) e a
sedução biográfica (subjetiva).

SUJEITO EPISTÊMICO: REFLEXÃO E RAZÃO

Câmara (2012, p. 97) observa que os memoriais dos anos 1960 a 1980,
por ela analisados, contrariamente àqueles produzidos nos anos 1930-
1950, revelam “uma espécie de apagamento do sujeito”, o que é por ela
interpretado como efeito de medidas restritivas do regime militar que
atingiram duramente a liberdade individual no mundo universitário no
Brasil. Com a redemocratização do país, nos anos 1980, torna-se
possível outro modelo de escrita, mais próxima da que elabora Soares
(1991) em seu memorial.
SUJEITO EPISTÊMICO: REFLEXÃO E RAZÃO

Para as mulheres que escrevem um memorial, nesse e para esse


universo masculino, excludente, as exigências dessa escrita de si
são vividas no desconforto provocador de resistências, pois elas
separam o público e o privado.
SUJEITO EPISTÊMICO: REFLEXÃO E RAZÃO

A propósito da ideia de permanência e mudança de si, Jane e Heloisa,


em seus memoriais acadêmicos, revelem ter a consciência dessa
permanência e mudança no tempo ao afirmarem que se repetem: “Já
não sou a mesma, mas vejo, mais uma vez, que me repito”
(HOLLANDA, 2011, p. 141); “Ainda sou a mesma professora que há
quase meio século subiu numa charrete [e seguiu] ao encontro de seus
primeiros alunos” (ALMEIDA, 2011, p. 39).
SUJEITO EPISTÊMICO: REFLEXÃO E RAZÃO

Nesse sentido, observa-se que esse gênero discursivo se modificou e se


flexibilizou, acatando mais abertamente a subjetividade e as
experiências de aprendizagens existenciais,

CAPÍTULO IV

— Sujeito da
experiência: reflexão
e emoções
SUJEITO DA EXPERIÊNCIA: REFLEXÃO E EMOÇÕES

"Preparar este memorial foi um processo iniciado assim que adotei o


desafio, que, começando na cabeça, chegou ao coração. Parada
obrigatória e longa." Vera Lucia Xavier Pinto

O sujeito biográfico dos memoriais de professoras universitárias é,


geralmente, um sujeito transgressor, sensível, poético, que busca
alianças entre o mundo objetivo e o mundo imaginário, pela via da
experiência vivida, entrecortada pela racional e pelo emocional.

SUJEITO DA EXPERIÊNCIA: REFLEXÃO E EMOÇÕES

O que há de comum no sujeito biográfico institucional dessas


professoras de gerações diferentes é uma consciência política de
rupturas e reivindicações legitimadoras de seu status como mulher e
intelectual. Em seus memoriais, cada uma a sua maneira constrói novos
elos experienciais com a academia.

Ao narrarem, elas rompem com o modelo tradicional dos memoriais


acadêmicos, que, raramente, dava lugar às experiências (inter)pessoais e
(inter)subjetivas no ensino superior
SUJEITO DA EXPERIÊNCIA: REFLEXÃO E EMOÇÕES

Essas mulheres professoras vão assim plasmando na escrita alianças que


são acima de tudo um posicionamento epistemológico e político,
ou epistemopolítico, como sugerem Pineau e Le Grand (2012).

CAPÍTULO IV

— In. Conclusões
Dédalo e Ícaro
IN. CONCLUSÕES Antonio Canova
1778-1779

"Não é o voo de Ícaro a imagem


emblemática da travessia. A imagem
emblemática da travessia é o momento da
aprendizagem como criação, em que o
mestre e seu discípulo são um só em
sonhos e desafios. A travessia é feita nesse
exato instante em que a possibilidade de
voar é real para ambos, em que o
pensamento desafia quaisquer regras e
voa voa voa das prisões e dogmas
humanos: ‘sim, é possível voar’."

Tatyana Mabel Nobre Barbosa20

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