Você está na página 1de 18

RESPONSABILIDADE E CIDADANIA

Rubem Barboza Filho

INTRODUÇÃO
Prezado(a) Gestor(a).
Este texto discute como a escola pode tratar os temas da cidadania e da responsabilidade. Seu
objetivo é oferecer elementos para que os gestores possam iniciar uma discussão, normalmente difícil,
a respeito das relações entre a prática da cidadania e as práticas escolares. O caminho seguido, no
entanto, não é o usual. Não é um texto normativo, no sentido de indicar o que cada escola deve fazer.
Sua pretensão é a de tratar algumas questões que antecedem o “fazer” imediato. Ou seja, diz respeito
ao modo como podemos pensar a cidadania, num país como o nosso, e de que modo esta reflexão de
fundo pode se desdobrar produtivamente no cotidiano da escola. Para facilitar a discussão, dividimos o
texto em três partes:
(a) na primeira parte, o texto situa a escola entre dois “mundos”, com linguagens e expectativas
distintas, e que desafiam a escola de modos diferentes;
(b) na segunda parte, tenta mostrar como a França e os Estados Unidos mobilizaram suas grandes
tradições para oferecer um papel relevante à escola e meios para cumprir seus objetivos;
(c) na terceira, o texto se encerra construindo a indagação a respeito de nossa tradição, e de como
ela pode ser chamada para construir um modo de encarar as relações entre cidadania e escola,
entre nós.
Os objetivos específicos deste texto são os seguintes:
1. estimular a compreensão de como a escola brasileira se relaciona com o seu mundo próximo e as
demandas do Estado e da Sociedade mais organizada;
2. permitir uma visão geral de como dois países, com tradições escolares fortes e eficientes,
vincularam a ação da escola à reprodução de suas grandes tradições fundadoras;
3. recolher os elementos anteriores para uma formulação mais complexa da pergunta a respeito de
como podemos tratar o tema da cidadania em nossa escola.
Considerando a amplitude e a complexidade do tema, vale observar que a este texto deverá se
seguir um outro, tratando mais especificamente da nossa tradição e das possibilidades que ela oferece
para concretizarmos, na escola, a questão da cidadania.
Seção 1 – A escola e seu contexto
Objetivo: estimular a compreensão de como a escola brasileira se relaciona com o seu
mundo próximo e as demandas do Estado e da Sociedade mais organizada.

Imaginemos uma escola pública na periferia de uma de nossas grandes cidades: um prédio, uma
série de equipamentos, um conjunto de professores e centenas de alunos. O que se cobra dela? A
mesma coisa que se exige de qualquer escola: que ela forme cidadãos e prepare cada um de seus
alunos para participar plenamente da sociedade. Em outros termos: que ela ensine cidadania e seja
eficaz, tanto do ponto de vista do desenvolvimento da capacidade de cada um dos estudantes quanto
do atendimento das necessidades de reprodução material e cultural da sociedade. Mas é isto que ela
faz? É justo cobrar isto dela?
Voltemos à imaginação de nossa escola de periferia. Ela pode ser um prédio imponente, por
comparação com as casas ao redor, ou uma construção mais modesta. Não importa: parece estar
sempre acuada no meio de um labirinto. Um labirinto de ruas, ruelas, escadas, cortiços, palafitas,
barrancos, gatilhos elétricos, sujeira, esgoto a céu aberto, barro, córregos fedorentos, vendas, biroscas,
casas empilhadas e em equilíbrio precário, igrejas pentecostais, terreiros de umbanda, campos de
pelada, pontos de droga e cemitérios clandestinos. Mais que isto: parece estar cercada por figuras que
lhe devotam uma plácida indiferença. Em torno dela se amontoam velhos precoces e doentes, crianças
seminuas e irrequietas, adolescentes ociosos ou aborrecidos num trabalho qualquer, empregadas
domésticas, operários, lavadeiras, motoristas, gente também aborrecida num trabalho manual qualquer,
assaltantes, traficantes, pastores, desempregados, camelôs, policiais, pescadores, mães e pais de
santo, catadores de lixo e toda uma enorme galeria de personagens que sobrevive no milagre.
Pois este labirinto se torna ainda mais espesso quando surpreendemos o movimento destas figuras
no emaranhado espacial das periferias. É neste aparente exílio de tudo que florescem, a todo momento,
os gestos de identidade e as formas de uma sociabilidade especial e surpreendente. Uma sociabilidade
feita de códigos particulares, de valores que ambicionam clareza, de expectativas fragmentadas e
sempre renovadas, de uma desesperada teatralização de si mesma, através de rituais inventados ou
reinventados, de formas originais de agregação e identificação, de conflito e solidariedade, de inclusão
e exclusão. E de uma energia brutal. É nestas formas de sociabilidade que se inventam as pontes com
a sociedade do mercado, do direito, da ordem, dos valores universais, e, simultaneamente, os
movimentos de recusa, de conflito, de preservação identitária, de negociação com o mundo racional-
legal representado pelo Estado. E é esta sociabilidade plástica, pragmática ao seu modo, que oferece e
cria as oportunidades de êxito – e de fracasso – para esta galeria de desesperados e abandonados.
Imaginemos este quadro de um modo mais concreto, numa favela do Rio de Janeiro. Mesmo que
simplificando um pouco. Melhor ainda: façamos de conta que somos um menino, uma menina, ou um
adolescente, numa das inúmeras favelas do Rio. Uma criança que contempla a cidade do alto de um
morro. O que ela vê? Uma paisagem fascinante, em primeiro lugar. O Rio é danado de bonito. Mas ela
vê mais: vê o movimento da cidade, as pessoas apressadas, o trânsito caótico, as praias, os shoppings
centers, as luzes hipnóticas, a riqueza, a afluência. E quer saltar para dentro do que vê, daquele
redemoinho de promessas e de glória. Mas enxerga também o contraste. Ou sente. E percebe
vagamente que não está num trampolim, e sim empoleirada em um trapézio escorregadio e perigoso.
Num lugar que não favorece o impulso natural do salto. E que entre ela, o morro e a cidade existe o
nada. E que este nada que separa deve ser cancelado. Mas como?
Não nos enganemos. Os olhos desta criança não são ingênuos e vazios, não são retinas que
capturam passivamente um objeto. Eles acumulam experiências anteriores, são lentes polidas por
modos prévios de entendimento e percepção do que é a cidade e das relações com ela e a sua ordem.
Esta criança vê a paisagem abaixo dela num caleidoscópio armado pelas perspectivas criadas nas
várias redes de sociabilidade próprias da favela, como a roda ou a escola de samba, o grupo de funk,
as religiões, o tráfico e assim por diante. É com este estoque que estabelece as suas variadas relações
com a cidade e com suas promessas. Como no caso extremo de uma criança ou adolescente envolvido
pela rede do tráfico: para ele, a cidade é a ocasião do saque, e o confronto com ela, o palco para a
exibição de comportamentos definidos como virtuosos, tais como a coragem suicida, o desprezo pela
vida, dele e dos outros, a solidariedade grupal. Um outro adolescente verá a cidade de outro modo,
dependendo da fonte de identidade em que se encontra mergulhado, e estabelecerá relações
diferenciadas com a cidade, com a ordem, com as expectativas que ela contém.
Por exemplo, através do samba ou do funk, que constituem tanto exercício e teatro de identidade
quanto modos de exposição à cidade e negociação com ela. Aqui as virtudes e valores são distintos
daqueles do tráfico, e reclamam, inversamente, a valorização da vida e o desenvolvimento de sua
riqueza. O que se pede é o domínio do corpo para a dança, o controle da voz para o canto e o ritmo, a
imaginação melódica sempre renovada, a capacidade de expressão subjetiva, o desenvolvimento do
talento e a invenção estética, que aprofundam formas de identidade, promovem o conhecimento do
mundo e permitem o compartilhamento de valores. Mas, de tal modo que tudo apareça como
espontâneo, natural, como se brotasse de dentro de todos e de cada um, celebração em comum da
alegria e da vida ou modo expressivo de identidade. Esta riqueza consegue invadir a cidade, seduzi-la
de algum modo, e tornar-se parte dela, sem perder o seu chão e a sua inspiração originais. E patrocina
trajetórias de sucesso, catapultando indivíduos ou grupos para fora da miséria onde se assenta este
labirinto da vida, integrando-os à cidade ou até ao mundo além da cidade.
Por isso também esta riqueza é sempre perseguida e reiterada. Ela é fresta, possibilidade e, ao
mesmo tempo, expressão continuada de uma identidade. Ao lado de outras identidades. Aquelas, por
exemplo, criadas ou estimuladas pela religião. Nem todo mundo, na favela, é sambista, funkeiro ou
traficante, sabemos nós. Existem outros tipos de violência ou de alegria a juntar as pessoas. A violência
que se faz para dentro das pessoas, que instala o medo e a culpa no coração e faz equivaler vontade e
submissão. Sem preconceito, pensemos nos rituais evangélicos, que teatralizam a luta contra o
demônio, que movem os corações pelo medo, que produzem transes coletivos ou catarses em comum.
Gostemos ou não, desta experiência religiosa nascem estratégias de autodisciplina e relações sociais
que sustentam a vida de grupos cada vez maiores, em circunstâncias de pobreza e opressão. A forma
de vida presidida por esta orientação religiosa não se organiza para a expressão da alegria, da
criatividade, mas para a autocontenção, para a aquisição de uma autodisciplina que se reveste de
conversão religiosa, de aceitação mais ou menos submissa da realidade, de racionalização das
circunstâncias hostis que aprisionam estas comunidades religiosas. Esta “interiorização” de uma certa
disciplina se alimenta tanto dos rituais do medo quanto da esperança de uma alegria mística, nunca
alcançada. Mas faz dos pastores e fiéis grupos representativos do mundo social presente na favela.
A favela é um exemplo, entre outros, deste labirinto constituído por redes variadas de sociabilidade
que nascem “de baixo”, que surgem das experiências concretas da população, e que se cristalizam
como laços de solidariedade sem os quais a vida seria impossível. Cada grande cidade, ou mesmo as
cidades de porte médio, tem a sua periferia e sua versão própria deste labirinto, criado por esta
pluralidade de redes que se tocam e, às vezes, se misturam perigosamente. Da mesma maneira que a
favela é um exemplo, o samba, o funk, a religião também são exemplos que podem ser multiplicados,
desde que estejamos atentos para compreender como as comunidades periféricas se teatralizam para o
seu autoconhecimento, para sua organização, para o seu reconhecimento pelos outros e pela cidade. E,
às vezes, nos confundimos, especialmente quando olhamos estas comunidades, e todas as outras,
pelas janelas das escolas. O mundo que conseguimos entrever, e que experimentamos nas salas de
aula, parece apático, desinteressado, desesperançado, indiferente à sua própria sorte. De fato, as
periferias parecem esconder sua vida e sua energia nos milhares de homens, mulheres, adolescentes e
crianças desatadas de tudo, sobrevivendo em trabalhos rotineiros, mal remunerados e sem graça, ou
perdidos no ócio, no desemprego, na miséria, na falta do que fazer. Pois as duas coisas coexistem: a
energia que tenta abrir caminho e a indiferença em relação à vida, tanto pessoal quanto social.
Desenhado este quadro impressionista, que pode ser sociologicamente ampliado, voltemos à nossa
escola pública e façamos as perguntas que nos interessam mais diretamente: como a escola se põe
diante deste labirinto em permanente mutação e invenção? Tem ela a possibilidade de interferir nestas
redes, ou ainda, tem ela a capacidade de se tornar um nó ou o centro de uma rede autônoma, capaz de
incorporar ou orientar as outras existentes e de competir com aquelas fundadas na violência, como a do
tráfico? De tal modo que possa cumprir as funções que lhe são atribuídas pela sociedade, preparando
cidadãos e fornecendo os elementos essenciais para que todos possam se integrar a uma sociedade
moderna e democrática? Tem ela o poder de redimir esta multidão de abúlicos, que simplesmente vê a
vida passar até que a morte venha sancionar o quase nada de sua existência?
A tentação imediata é responder com um sonoro e múltiplo “não”. De modo geral, nossos sistemas
públicos parecem de fato acuados pela crueza de nossa realidade ou por este labirinto social em
permanente expansão. Os altíssimos índices de evasão dizem claramente que a escola pouco interessa
a uma grande parcela de nossas crianças e de nossos jovens. Por outro lado, para os que ficam ou que
ainda estão nela, parece sobrar apenas uma infrutífera rotina. Todos conhecemos os sombrios
diagnósticos sobre a eficácia de nossas escolas, públicas ou privadas. Os desastrosos resultados do
SAEB, da Prova Brasil, do Enem, exibem a céu aberto a profunda incapacidade de nossa escola para
permitir aos alunos a “aquisição dos códigos de leitura/escrita e da matemática e um conhecimento
científico do mundo físico e social (Mello & Silva, 1991). Deixando a desejar no que se refere ao
processo de transmissão/apropriação do conhecimento, é pouco provável que a escola seja capaz de
oferecer uma noção complexa de cidadania e responsabilidade social aos nossos estudantes. Sem a
eficácia, os temas da cidadania e da responsabilidade não podem ser armados pela escola.
E aqui se revela a outra ponta do problema. Os resultados das avaliações têm sempre o condão de
provocar uma avalanche de artigos, editoriais de mídia, declarações de autoridades, manifestações de
empresários e de instituições variadas, ou seja, daquilo que confusamente chamamos de sociedade
civil organizada. Todos solenemente horrorizados e rápidos no gatilho, despejando cobranças sobre a
escola, reclamando dela a execução de suas funções gerais, ou seja, a sua eficácia pedagógica, o seu
comprometimento com o preparo das pessoas para o mundo do trabalho e seu compromisso com a
consolidação e a reprodução de uma sociedade mais igualitária e democrática. Na era da informação,
dizem todos, com esta escola, nem o Brasil nem os brasileiros chegarão a algum lugar, tanto em termos
de avanço científico e tecnológico quanto de justiça social. A ênfase numa ou em outra coisa depende
do lugar de onde se fala: em nome do mercado, em nome de uma sociedade de corte mais liberalizante
ou de uma vaga utopia igualitária. E as soluções nascem aos borbotões, também atadas aos vários
pontos de vista que arrebatam, com mão de gato, os resultados das avaliações quantitativas e
qualitativas existentes. Desse modo, completa-se o quadro: a escola encontra-se acuada pelo mundo
que a cerca proximamente e ao mesmo tempo desafiada pelo Estado, pelos representantes do
mercado, pela imprensa e pela parte mais organizada da sociedade. Ela está, na verdade, entre dois
universos distintos, cada um com sua linguagem e expectativas próprias, e que pouco se falam e se
entendem, e cujas relações materializam uma enorme tensão.
Para não se transformar no asno de Buridan – aquele que morreu de fome paralisado diante de dois
montes de feno –, a escola gesticula e tenta desesperadamente responder a estes dois mundos
diversos. Institui conselhos comunitários ou de pais, estabelece eleições para a direção com a
participação da comunidade, abre a escola para reuniões e atividades daqueles que a cercam, busca se
associar às redes de sociabilidade existentes em torno dela, estende a merenda a todas as crianças do
bairro, e assim por diante. Mas nada parece funcionar de acordo com as expectativas que orientam esta
“ida ao povo”. É como se a sociedade local, nas periferias das grandes e médias cidades, nas pequenas
cidades, nas zonas urbanas ou rurais, no nordeste ou na Amazônia, apenas piscasse em resposta ao
coqueteio da escola, dizendo em troca: você é muita simpática, pode deixar que eu apareço aí, me dê
algum lustre, mas não me aporrinhe demais. O que você me promete não me diz respeito, e suas
promessas são muito mal cumpridas. Este sorridente desamor deixa a escola perplexa.
Perante o Estado, a imprensa, a sociedade que reclama, a escola argumenta: estamos terminando
agora a universalização do ensino fundamental e médio, e este processo, ao mesmo tempo tardio e
acelerado, traz consigo um rosário de problemas naturais. Precisamos de mais e melhores professores,
de salários dignos, de escolas fisicamente adequadas, de material didático apropriado, de Internet, de
equipamentos e instrumentos etc. E mesmo neste mundo de escassez, estamos tentando. Tentando
novos métodos de ensino, tentando interessar os alunos e suas famílias, trazendo todos para dentro,
tentando qualificar nossos professores, apesar de todas as dificuldades, e inventando sempre.
Precisamos de tempo e recursos. Mas este mundo racionalizado, da ordem racional-legal e do
mercado, retruca: já demos a vinculação orçamentária em todos os níveis da federação, criamos o
Fundef e agora o Fundeb, mas não podemos esterilizar recursos adicionais numa instituição que sequer
consegue ensinar rudimentos de Português e Matemática à maioria dos seus alunos. Faça pelo menos
o mínimo para merecer mais, sem se esquecer que sua missão é trazer esses milhões para o nosso
mundo racionalizado e produtivo, o único onde a democracia pode de fato existir.
Nessa algaravia onde todos parecem ter razão – a comunidade que não se convence da
necessidade da escola, a escola que reclama por mais recursos e a sociedade que cobra o mínimo de
eficácia –, ninguém tem razão. E a escola vai acumulando perplexidades. E perguntas. Afinal, o que
querem ELES? Os alunos e todos esses críticos? Porque não satisfaço ninguém? O que é mesmo que
eu quero ser? Ou devo ser? Que papel posso e devo desempenhar, jogada entre dois mundos
diferentes?
Imaginemos – foi assim que começamos este texto – que a maior parte dos problemas postos ao
Estado e à sociedade tenha sido resolvida, ou seja, que a remuneração dos professores tenha
aumentado, com a conseqüente elevação da qualidade do corpo docente, que a rede física tenha sido
edificada com padrões aceitáveis, que o material didático tenha sido universalizado e dotado de
qualidade, que as escolas possuam equipamentos suficientes, como bibliotecas, computadores,
material esportivo, material para a educação artística e tudo mais. Façamos este esforço de imaginação
para, em seguida, indagar: isto garantiria a eficácia da escola, a sua capacidade de competir com redes
locais de sociabilidade, de se organizar como base de uma rede alternativa e inclusiva, de se por como
instituição decisiva na reprodução de valores democráticos e generosos, fundamentais para a existência
da sociedade? Será que a abundância e a qualidade de recursos seriam suficientes para atrair e juntar
estes dois mundos que torturam a escola, fazendo dela uma instituição fundamental na reprodução de
uma sociedade mais produtiva, mais igualitária e mais democrática? Pois a resposta só pode ser uma:
não necessariamente. Sem tudo isto, a função da escola se torna extremamente difícil, mas tudo isto
ainda não é suficiente. Por quê?

Atividade 1
A) tente mapear as redes de solidariedade que existem na comunidade onde se situa a sua escola.
B) tente estabelecer os valores, as estratégias e as expectativas de cada uma dessas redes.
C) tente responder como a escola tem, concretamente, se relacionado com essas redes e se essas
relações têm sido produtivas ou não para os alunos.

Atividade 2
A) Como a sua escola tem recebido e utilizado os resultados da Prova Brasil ou de outras avaliações
em larga escala?
B) Na sua opinião, a sua escola é eficaz? E, ao mesmo tempo, capaz de transmitir valores
democráticos e de igualdade aos alunos?
Seção 2 – As experiências da França e dos
Estados Unidos
Objetivo: permitir uma visão geral de como dois países, com tradições escolares fortes e
eficientes, vincularam a ação da escola à reprodução de suas grandes tradições fundadoras.

Por que a mera existência de infraestrutura e de condições ótimas de trabalho não seriam suficientes
para fazer da escola um espaço democrático, além de eficaz? Porque há algo do qual a escola não
pode abrir mão, e que não se reduz à eficácia, num sentido positivista. Façamos uma visita a um estudo
comparativo entre alunos brasileiros e franceses, para melhor fixar este ponto. Esta comparação se
desdobrou a partir da aplicação de três questionários sobre a vida escolar e a vida em sociedade,
preparados pelo Ministério da Educação da França e adaptados às condições brasileiras e mineiras, e
aplicados simultaneamente aos testes de 2001 do Sistema de Avaliação do Estado de Minas Gerais –
SIMAVE. Foram sorteadas três amostras de 40.000 alunos da 4ª e 8ª séries da rede pública de Minas,
uma para cada questionário, garantindo a base para a comparação com o alunado francês das séries
correspondentes.
Não precisamos analisar todos os temas tratados comparativamente. Podemos nos deter em alguns
que dizem respeito ao que estamos tratando. Um dos aspectos mais interessantes desse estudo é
aquele referente à imagem da escola entre os alunos franceses e brasileiros. Para que estes dois
contingentes pudessem desenhar esta imagem, eles deveriam, numa lista de 62 palavras, assinalar 12
que associavam mais fortemente à palavra “escola”. Uma vez realizada esta associação, tornou-se
possível construir o conjunto das palavras mais citadas, que serviria para definir o que a escola é para
os investigados, e outro conjunto das palavras menos citadas, revelando o que a escola não é, na
concepção dos mesmos alunos. As listas das palavras mais citadas entre brasileiros e franceses
apresentaram uma coincidência de apenas 33%, elevando-se para 58% nas menos citadas. Onde
estaria a diferença, e como entendê-la?
A primeira grande distinção se encontra na posição da palavra “trabalhar”: enquanto para os
franceses ela é a mais associada à escola, entre os brasileiros ela se encontra num mísero 34º lugar.
Examinemos esta forte associação entre “escola” e “trabalho” feita pelos alunos franceses, e a
irrelevância desta relação entre os brasileiros. A hipótese mais provável para explicar essa
dessemelhança diz respeito à posição da escola francesa e da brasileira em relação ao mercado de
trabalho ou ao mundo do trabalho. A literatura especializada confirma a estreita vinculação entre a
escola francesa e o mercado de trabalho, presente, sobretudo, na capacidade que ela possui de
determinar e condicionar o acesso dos jovens ao exercício profissional, em um mercado de trabalho
altamente racionalizado, hierarquizado e regulado. Nesse sentido, a escola é entendida pela sociedade
e pelos setores produtivos – que nela prestam extrema atenção – como instituição responsável, de
forma direta, pela reprodução e qualificação da força de trabalho e, ao mesmo tempo, como
fundamental para a existência de uma hierarquia de funções e remunerações, cujos níveis mais altos só
podem ser atingidos através de uma longa permanência no interior do sistema educacional. A escola
encontra-se, assim, marcada por um objetivo nítido e claro, ou seja, a preparação para o trabalho,
objetivo que os próprios alunos incorporam ao seu campo de percepções e tornam explícito pelo alto
grau de associação entre as duas palavras. Preparação, portanto, que define o próprio processo de
aprendizagem como uma “obrigação”, como um “trabalho” que antecipa e condiciona o exercício
profissional na vida adulta. Escola e mercado de trabalho, portanto, mantêm relações sistemáticas,
duradouras e de mão dupla.
No Brasil, sabemos nós, esta vinculação entre escola e mercado ou mundo do trabalho não pode ser
generalizada, a não ser no ensino técnico ou em profissões regulamentadas que exigem o curso
superior. Mesmo nesses casos, no entanto, a posse de um diploma não determina uma carreira ou uma
profissão: médicos, advogados e engenheiros podem ser professores, ocupar cargos públicos, podem
ser taxistas, vendedores, consultores e até mesmo, eventualmente, médicos, advogados e engenheiros.
Para as profissões que exigem qualificação média ou baixa, o vínculo escola-trabalho é ainda mais tênue
e, em alguns casos, inexistente. Por exemplo: na França, cabeleireiros são formados pela escola,
enquanto entre nós basta abrir uma porta, colocar um anúncio, pagar os impostos (disso não há como
escapar) e esperar os incautos. A existência de um mercado pouco hierarquizado e regulado cancela a
capacidade da escola determinar, automaticamente ou mesmo de forma indireta, a posição de alguém
no mundo profissional. Distância que anula ainda a possibilidade de compreensão da aprendizagem
como um “trabalho”. Nas pequenas cidades de Minas, e muito provavelmente nas zonas rurais
brasileiras ou nas periferias das grandes cidades, a atuação profissional da maioria dos alunos ou dos
egressos da escola tem muito pouco a ver com o que a escola lhes oferece ou ofereceu.
Esse divórcio entre escola e mundo do trabalho repercute no modo como o processo de
aprendizagem é visto pelos alunos. Para os brasileiros, o aprendizado é percebido muito mais como um
processo de auto-aperfeiçoamento e de aquisição pessoal de conhecimentos do que como domínio
crescente de operações que o habilitarão à posse de um savoir faire relevante para o futuro profissional.
Novamente, a diferença em relação aos franceses é notável. Entre eles, a segunda palavra mais
associada à escola é “aprender”, operação esclarecida por uma seqüência extremamente lógica de
outras palavras: escutar, refletir, descobrir, participar e comunicar. Na pátria da razão cartesiana, a
escola parece ter também a função de ensinar e praticar esta mesma razão, cujas exigências metódicas
iluminam a própria natureza da aprendizagem, revestida ainda de um caráter coletivo traduzido nas
palavras participar e comunicar. Em suma: a aprendizagem é um processo racional, metodicamente
conduzido, e coletivo. Para os brasileiros, a palavra aprender é a mais associada à escola, denotando
um processo explicado pela seguinte guirlanda de palavras: responsabilidade, capacidade,
inteligência, descobrir e formação. Ou seja, a “formação” educacional parece surgir como o resultado
de um esforço responsável, exercido por indivíduos curiosos, que se diferenciam pela sua capacidade e
inteligência. Nenhuma associação indica a percepção da aprendizagem como processo levado a efeito
com método e coletivamente. Ao contrário, ele é visto como o fruto de atributos individuais, que
permitem aos alunos a utilização diferenciada do estoque de conhecimentos colocados à disposição
pela escola, preparando-se para um vago futuro, a segunda palavra mais fortemente associada à
escola entre os alunos de Minas Gerais. Desse modo, os brasileiros não detectam a institucionalização
de uma matriz capaz de conferir forte identidade e uma dinâmica própria à escola e ao ato de aprender,
matriz capaz de submeter, racionalizar e potencializar em profundidade – transformando em método
coletivo – o esforço individual dos alunos.
Com todas as cautelas necessárias, é possível afirmar que as diferenças anteriores possuem ainda
conseqüências para o modo como os jovens franceses e brasileiros encaram a escola como espaço de
socialização. Entre os alunos franceses, é forte a associação da escola às palavras amigo/amiga e
amizade, que aparecem nos terceiro e sétimo lugares entre as dez mais associadas à escola. Para os
brasileiros, o tema da socialização aparece através das palavras viver junto, amizade e bando. Parece
legítimo supor que, no caso dos franceses, a escola se ofereça como espaço para o estabelecimento de
laços de amizade mais estáveis, enquanto entre os brasileiros a socialização parece se confundir com
um “viver junto” indiferenciado, como bando. Isto certamente tem a ver com a natureza da socialização
num sentido sociológico do termo, ou seja, de transmissão de valores e práticas sociais. As associações
realizadas pelos alunos franceses revelam uma escola fortemente vinculada ao mundo do trabalho,
organizada por atos metódicos de aprendizado, características que permitem a sua reprodução como
ambiente estável e claramente organizado. Entre os brasileiros, as vinculações mostram uma escola
distante do mercado de trabalho, sem identidade coletiva ou institucional forte, que não se habilita ao
estatuto de fonte de estímulo à criação de relações mais estabilizadas e comandadas por um certo
desejo de ordem. Adicionalmente, é preciso ressaltar a extrema mobilidade geográfica do alunado
brasileiro, algo que certamente tem impacto para este aspecto do estudo.
Estas variações nas respostas de alunos brasileiros e franceses apontam um outro contraste
extremamente interessante. Entre as menos associadas à escola, para os franceses, estão estas duas
palavras: sonho e liberdade. No caso dos brasileiros, duas outras palavras chamam a atenção:
proibição ou prisão. Correta a hipótese de que as palavras menos citadas dizem o que a escola não é,
estamos diante de algo bastante curioso, mas, de certo modo, esperado. Se estivéssemos em 1968,
seria possível entender a posição dos alunos franceses como a declaração de um dever ser: a escola
não é, mas deve ser o lugar do sonho e da liberdade. As coisas não são tão simples, hoje. Seguindo a
linha de raciocínio delineada anteriormente, seria de fato pouco provável que uma escola percebida e
vivida como “trabalho”, “obrigação”, presidida por considerações metódicas e extremamente organizada,
pudesse ser associada ao sonho e à liberdade. É possível que o tema da liberdade esteja vinculado
mais fortemente a outras instituições da república francesa, e o sonho reservado a outros espaços do
mundo da vida, embora a escola francesa não seja vista pelos alunos como lugar do fracasso ou do
isolamento. Mas esta surpreendente negação dos alunos franceses não significa que a escola, entre os
brasileiros, se revele um território de liberdade e sonho. Na verdade, estas palavras ocupam os
modestíssimos 36º e 37º lugares na associação com a escola. O que é possível depreender da
presença de palavras como proibição ou prisão, acompanhadas de outras como disputa, seleção,
fracasso, interdição, isolamento, entre as menos citadas, é talvez a hipótese de que os alunos
brasileiros não percebem a escola como instituição que os segrega da comunidade onde vivem,
instaurando hábitos e relações distintas daquelas com as quais estão acostumados e nas quais foram
socializados. Sem identidade forte, ela é vista como uma instituição entre outras, e sem força suficiente
para erguer seu próprio território, com regras e procedimentos próprios e eficazes, e sem a capacidade
de se afirmar como premissa para a trajetória profissional ou para a realização do plano de vida dos
seus alunos.
Esta comparação, rapidamente desdobrada nos últimos parágrafos, pode nos ajudar a responder à
indagação se a nossa escola pública, ainda que dotada de todas as condições materiais, poderia
concorrer com outras redes e instituições existentes em nossa sociedade e cumprir as funções
esperadas pela sociedade. Há algo na escola francesa que não podemos negar, e não só pelos
resultados da comparação, mas pela consulta à bibliografia: ela possui uma forte identidade
institucional, ou seja, trabalha com objetivos claros e estratégias adequadas aos seus fins, bases sobre
as quais edifica uma tradição educacional. Na verdade, a escola francesa, desde o período napoleônico
– portanto, depois da Revolução Francesa – foi imaginada e planejada tanto para a transmissão de
conhecimentos quanto para a formação de cidadãos, ainda que isto implicasse um corte com as
relações familiares ou outras redes de sociabilidade existentes. A proibição recente e relativa ao uso,
pelos alunos, de símbolos e vestimentas religiosas nas escolas francesas, revela com clareza este
princípio fundamental: a escola é um espaço laico e responsável pela transmissão, não só de
conhecimento, mas de um conjunto de direitos universais que dizem respeito ao cidadão e à cidadania,
e não às relações mais pessoais ou familiares ou grupos de natureza variada e particular, ou mesmo às
relações impessoais do mercado. Relações e agrupamentos que devem estar regidos pelos direitos e
valores universais que a França reclama como parte essencial de sua tradição.
Na organização de sua escola pública, a França mobiliza sua grande tradição e sua identidade, fonte
de sentido e base da autonomia escolar. Mais que isto, fundamento sobre o qual a escola constrói e
amplia a sua capacidade de influenciar a sociedade e sua reprodução. É com este projeto que ela
fabula e constrói seus métodos e escolhe seus equipamentos e instrumentos, orientada de forma
centralizada por um Estado cioso desta tradição. E é por isso que ela funciona e é eficaz. Porque a
escola é entendida, pela própria sociedade, como instituição decisiva para a preservação e a
atualização dos princípios que orientam a vida francesa há dois séculos. E que devem estar presentes e
atualizados no interior da própria escola, nos seus métodos, na sua organização, no seu funcionamento.
Ela é a porta de entrada para a cidadania, para o trabalho e para os planos de vida de todos, razão pela
qual também é uma instituição universalizada e universal. Ela não é eficaz, em todas as dimensões,
pelo seu mero conforto estrutural, mas por que sabe o que quer.
Mas se a natureza centralizada do sistema público francês provoca comichões libertários e
incômodos variados em alguns, consideremos rapidamente outra experiência, a dos Estados Unidos.
Entre os norte-americanos, nada de sistema centralizado ou de uma escola que se pretende um lugar
quase separado e autônomo em relação à sociedade e às suas redes de sociabilidade. Pois trata-se, do
mesmo modo, de uma escola historicamente eficaz num duplo sentido: de transmissão de
conhecimento e de valores universalistas. O modo, no entanto, como os norte-americanos
estabeleceram o papel da escola é diferente daquele escolhido pela França. As redes são municipais ou
estaduais, e cada nível de governo desfruta de enorme autonomia para criar suas estratégias, dentro de
orientações gerais e federais obviamente necessárias. As próprias unidades escolares possuem uma
considerável órbita de liberdade de atuação. Apesar disto, a escola nos Estados Unidos criou, ao longo
do tempo, uma grande tradição comum e uma grande capacidade de atualização.
Tal como a França, os Estados Unidos acionam sua tradição para construir a escola e a escola para
preservar a tradição. Mas os dois países são diferentes. E já que neste texto nossa imaginação está
sempre convocada, imaginemos o esforço norte-americano para implantar ou construir um horizonte
valorativo comum num país formado, em grande parte, por migração estrangeira – de 1815 a 1970, a
estimativa é a de que 46 milhões de pessoas migraram para os EUA –, e com uma enorme diversidade
social interna. O reconhecimento de si mesmo como sociedade plural, contraditória, às vezes
extremamente cruel – como no caso do racismo – não gerou políticas de homogeneização nascidas de
um centro ou de um estado que se vê depositário de uma razão universal. A estratégia norte-americana
de autoconstituição se desdobrou sobre a premissa de uma sociedade do homem comum e de
possibilidades abertas a todos, e com extrema valorização da vida cotidiana e do progresso. Esta
valorização do cotidiano não é trivial, ou seja, sem importância. Várias configurações morais do
Ocidente reduziram a importância do dia-a-dia, seja em função de um futuro utopicamente desenhado,
seja pela afirmação de um estado de felicidade após a morte. Os norte-americanos, ao contrário,
laicizaram a crença dos pillgrims, dos primeiros protestantes que chegaram à América expulsos da
Europa pelas guerras religiosas, e que viam na racionalização da vida, no domínio da natureza, a forma
de edificação de um novo jardim do Éden e de celebração de um novo pacto com Deus. Estas crenças
puritanas laicizadas produziram uma acentuada preocupação com o bem estar material, com o
progresso e com o trabalho sistemático e contínuo.
Estes primeiros migrantes trouxeram os fundamentos do que veio a ser chamado de “religião civil”,
ou seja, um conjunto de princípios derivados de um protestantismo revestido de um profundo senso
republicano: um individualismo capaz de produzir uma vida associativa extremamente rica, a entrega ao
trabalho sistemático, o self government – o autogoverno das pequenas comunidades ou cidades –, a
liberdade e a iniciativa individuais e o respeito pela lei, entre outras características. Este fundo original
de identidade foi reafirmado pela Revolução da Independência e pela Guerra Civil, que encerrou a
escravidão nos Estados Unidos. Ao longo de sua história, portanto, o desafio dos EUA consistia em
fazer com que os milhões de imigrantes, com outras religiões e tradições, incorporassem este mesmo
horizonte de valores, e que este horizonte permanecesse vivo e atual.
Aqui vale a pena lembrar um aspecto essencial da vida dos EUA, da França e do próprio ocidente a
partir do século XIX: uma sociedade do homem comum é também uma sociedade de massas, não
necessariamente no sentido pejorativo com que a expressão é usada. Mais especificamente, numa
sociedade que se declara como do homem comum e aberta a todos, as estruturas básicas da vida
tornam-se também estruturas de massa, ou seja, dirigidas para o grande número, e não para pouco
eleitos. Usemos uma frase circular: numa sociedade de massas e democrática, as massas devem ter
um alto grau de acesso aos bens, materiais ou não, produzidos por elas mesmas, para que o próprio
horizonte fundador e inspirador da sociedade se mantenha e se reproduza com a capacidade de
orientar os indivíduos e os movimentos da sociedade. Nos EUA, os meios de comunicação de massa –
jornais, revistas, romances acessíveis a todos, o rádio, o cinema, a televisão – prosperaram celebrando
e consolidando, precisamente, esta idéia de uma sociedade da liberdade, da diversidade, do progresso,
do homem comum e da adesão a valores que ofereciam uma identidade nacional à multidão e à sua
complexidade.
Mas esta abertura e esta capacidade de inclusão não poderiam residir apenas no plano cultural,
entendido como mera proclamação de um dever ser. Ao contrário, esta afirmação da liberdade, do
progresso, da abertura ao grande número se dava no mundo real, transformando os EUA no país mais
rico e na sociedade mais afluente do mundo e de toda a história da humanidade. E uma das principais
instituições mobilizadas para fazer com que este horizonte de valores e a vida concreta do país,
animada por milhões de imigrantes, se comunicassem e se renovassem foi precisamente a escola.
Observa Lúcia Lippi, no seu livro Americanos:
A educação, desde o fim do século XIX, foi levada a sério e esteve voltada para a criação de
cidadãos americanos, cidadãos práticos e úteis para o funcionamento de uma democracia
meritocrática, da qual foram excluídas a população negra e outras minorias, como nos diz
Suzana Oboler. Educação que valorizava a fé no progresso industrial, no valor do trabalho,
na utilidade da ciência, na recusa ao intelectualismo estéril (pg. 176).
Mais à frente, a mesma Lúcia Lippi revela:
A educação e a escola foram fundamentais na construção de uma identidade nacional e na
socialização das novas gerações nos valores nacionais. Vale lembrar o juramento de
“fidelidade à bandeira”, que, instituído a partir de 1893, até hoje é repetido pelos alunos nas
high schools. (176).

Esta escola encarregada de reproduzir um ethos nacional não se ergueu como aparelho fechado às
redes de sociabilidade existentes. Ao contrário, trouxe para dentro de si esta diversidade e o apoio dos
principais atores sociais, bem ao estilo da tradição norte-americana do self government.
É provavelmente impossível dizer que a escola norte-americana tenha sido talhada por uma mesma
filosofia educacional, mas não é equivocado citar o Pragmatismo como um horizonte correspondente ao
racionalismo francês, e de profundo impacto na prática educacional norte-americana. O Pragmatismo
consiste numa interpretação criativa dos princípios que fizeram nascer os Estados Unidos, sua
democracia e sua forma de vida. De uma forma desesperadamente breve, é possível dizer que o
Pragmatismo tem como um dos seus eixos o estudo dos procedimentos que nos permitem produzir
asserções ou ações consideradas corretas, com base na nossa experiência, na nossa aprendizagem e
no diálogo, ou, para usar uma expressão contemporânea provocada pelo renascimento desta
perspectiva, no uso público de nossa razão. Este horizonte filosófico não apenas renovou, ao longo do
século vinte, o tema da democracia nos EUA, como influenciou, sobretudo através de Dewey, a escola
norte-americana.
A vida escolar deveria estar comandada pelas mesmas práticas que, de algum modo, sustentavam a
democracia e o ethos norte-americano. Portanto, um ensino mais prático, sem buscar a mera
memorização de fórmulas ou princípios, orientado para a resolução de problemas – e para a construção
de problemas –, coletivamente conduzido, mas aberto às particularidades individuais, destinado a
reproduzir estes mesmos valores básicos da sociedade e incorporar a este horizonte os novos membros
da sociedade. Uma escola que não desvalorizava a cultura de massas, trazendo para dentro dela as
técnicas desta cultura e as suas manifestações estéticas, artísticas, sociais, religiosas, mas tratando-as
como objetos apreensíveis pela própria cultura escolar, enriquecedores da formação educacional e da
socialização das crianças e dos jovens. Daí a presença não da educação física simplesmente, típica de
uma mentalidade militar, mas do basquete, do futebol americano, do baseball, do vôlei, da natação, ou
seja, de esportes que atraíam os jovens e constituíam modos de aprendizado de habilidades, de valores
de solidariedade e de competição controlada por regras. A mesma coisa em relação à música: ao invés
de lições abstratas, a formação de pequenas orquestras, de bandas, de conjuntos, de corais, que
tocavam e cantavam desde a música clássica aos ritmos e modalidades populares nos EUA. De modo
semelhante, a utilização do teatro, da fotografia, do rádio, do cinema, das revistas em quadrinho, de
tudo o que havia de relevante na vida da própria sociedade. Fórmula que se aplicava ainda ao ensino
de física, química, matemática, disciplinas que encontravam tradução no aprendizado de marcenaria,
eletricidade, e uma série de outras técnicas especiais e importantes para a vida cotidiana. Além disto, a
realização de festas, de celebrações, de verdadeiras liturgias organizadas para sancionar com clareza e
reproduzir um modo de vida.
Tal como a escola francesa, mas com outra estratégia, a escola norte-americana se revela capaz de
estabelecer com clareza seus objetivos e garantir, assim, sua autonomia e a sua capacidade de
vinculação à sociedade e ao seu movimento. Da mesma forma que entre os franceses, a sociedade
norte-americana reconhece o valor da educação, da escola, e lhe oferece os recursos para cumprir sua
função de instituição voltada para a preservação dos valores e objetivos fundamentais de um
determinado tipo de vida social. Em ambos os casos, a escola encontra-se vinculada à reprodução de
um conjunto de valores que organizam o tema da cidadania, da responsabilidade e da vida em comum,
não se limitando à pura transmissão de conteúdos disciplinares variados e particulares. Com base em
tradições distintas, Estados Unidos e França buscam sempre sua origem para a atualização da escola,
articulando e rearticulando as questões da cidadania e da responsabilidade social de seus membros.

Atividade 3
A) Invente uma pesquisa, entre seus alunos, para saber qual a imagem que eles fazem da sua
escola.
B) Nessa pesquisa, tente ainda sondar quais os planos de vida dos alunos e qual a importância que
eles atribuem à escola para a realização destes planos.
C) Aproveite a oportunidade, seja criativo e explore outros aspectos que interessam à vida da sua
escola e de seus alunos.

Atividade 4
A) Aprofunde a compreensão, buscando elementos adicionais, do que está sendo chamado de
“linguagem da razão” e “linguagem do interesse”.
B) Como estas linguagens estão inscritas na prática da sua escola?
Seção 3 – A tradição brasileira, a cidadania
e a escola
Objetivo: recolher os elementos anteriores para uma formulação mais complexa da
pergunta a respeito de como podemos tratar o tema da cidadania em nossa escola.

Mas, de que adianta esta referência à França e aos Estados Unidos, para que este recurso a duas
experiências que já conhecemos? De que modo elas podem nos servir e fornecer resposta às nossas
perplexidades? Em primeiro lugar, somos mais pobres que eles. Em segundo lugar, os dois países
lograram estabelecer seus sistemas de ensino num tempo diferente, num período histórico em que a
nação possuía uma realidade mais efetiva do que hoje, envolvidos que estamos por vastos processos
de globalização. Em terceiro lugar, estes sistemas educacionais serviram também para a reprodução de
valores e práticas que perpetuavam a desigualdade em suas sociedades, ponto sobejamente
demonstrado pela literatura especializada, como no caso de Bourdieu. Em quarto lugar, e não por
acaso, seja por efeito da globalização, seja por circunstâncias próprias de cada país, os “desiguais”
passaram a reclamar os seus direitos, desafiando a própria lógica da escola e estes valores dados
como fundadores de nacionalidades históricas. É o que aconteceu com a luta dos negros nos Estados
Unidos e com o multiculturalismo norte-americano, que recusam a existência de um passado comum de
justiça e liberdade, de uma única origem generosa, e se movem para fazer do futuro o lugar de uma real
liberdade e igualdade entre diferentes. Ou ainda o que ocorre na França, abalada pelas demandas dos
imigrantes, que reclamam sua identidade e investem, entre outras coisas, contra um sistema escolar
orientado pela idéia da igualdade formal dos cidadãos. Estes acontecimentos recentes seriam
suficientes para relativizar o suposto êxito dos sistemas escolares francês e norte-americano,
cancelando-os como possíveis referências para a reflexão sobre a nossa escola. E, por último, somos
diferentes dos Estados Unidos e da França.
Cuidemos destas objeções, infelizmente com alguma rapidez. Sem dúvida, a escola nos EUA e na
França se encontra num momento de crise, face às transformações existentes na suas sociedades.
Para o que nos importa, estas crises não são provocadas pela recusa à escola, ou pela afirmação de
sua irrelevância, mas pela demanda de permeabilidade a estes atores e agentes sociais que agora
entram em cena com decisão. Mais ainda: tanto nos EUA quanto na França, são os princípios
universalistas originais que, de um modo específico, são mobilizados pelos que se julgam de alguma
forma discriminados. Qualquer que seja a razão, no entanto, é bom que prestemos atenção ao modo
como as duas sociedades buscarão solucionar esta crise. Sempre aprendemos com elas, sem
nenhuma necessidade de copiá-las.
Por falar em cópia, nada mais copiado entre nós do que as teorias reprodutivistas francesas, com
todo o respeito que elas merecem. Mas é preciso atentar para o fato de que estas teorias,
desenvolvidas sobretudo por Bourdieu e Passeron, não representam a negação da grande tradição
francesa. Inversamente, podem e devem ser lidas como radicalização crítica dos princípios fundantes
da história moderna da França, que nasce com a Revolução Francesa. Mais ainda: estas críticas
nasceram dentro do próprio sistema educacional francês, tornando patente que à escola também cabe
a função de crítica e reforma da própria sociedade. Elas são compreensíveis dentro deste horizonte de
fundação, e não a partir do olhar de um ET ou de alguém que não compartilhe os valores da tradição
ocidental e francesa. Precisamente porque feitas dentro da linguagem comum da tradição, generalizada
pela escola e por variadas outras instituições, é que as críticas das teorias da reprodução são
plenamente compreendidas pelos próprios franceses. O que estas críticas dizem é que estes princípios
originais e ordenadores da sociedade estão a exigir uma atualização ainda mais radical e profunda. E
porque pertencem à própria tradição, reflexivamente visitada, é que estas críticas podem gerar políticas
públicas e mudanças efetivas no sistema escolar.
Entre nós, a recepção inicial destas teorias deu origem a um campeonato de quem era capaz da
crítica mais contundente à escola brasileira e à sua função reprodutora de desigualdades. O que não se
percebia, e hoje se percebe, é que não podemos nos apropriar de uma tradição como a francesa e erigi-
la em nossa tradição, em repertório de valores e práticas destinadas a redimir as nossas misérias. A
título de exemplo: também a escola norte-americana pode ser acusada de preservar a desigualdade
nos EUA, mas certamente ela não realiza esta perversidade do mesmo modo que a escola francesa. A
importação mecânica da crítica à sociedade francesa, à sua escola, e sua aplicação à nossa realidade
alimentou um enorme equívoco: deixamos de perseguir concretamente as possibilidades de atualização
democrática de nossa tradição, através da escola, lutando bravamente para encontrar no nosso ainda
pobre sistema educacional os ricos defeitos da escola francesa. Esterilizamos, com isto, nossa própria
capacidade de oferecer uma identidade à nossa escola e de explorar o melhor ponto das teorias
reprodutivistas na França: o fato de que elas lançam mão de uma origem, de uma tradição universalista,
para a eficácia da própria reflexão crítica sobre o presente de sua sociedade e da escola.
E isto nos leva a um outro ponto. Na verdade, à questão chave. Somos, de fato, diferentes dos
Estados Unidos e da França. E é, muito provavelmente, conhecendo esta diferença, e refletindo sobre
ela, que poderemos nos aproximar da nossa própria tradição e reconhecer o possível papel da escola
em nossa vida social. Mas, qual seria esta nossa grande diferença em relação aos dois países? É claro
que existem inúmeros aspectos que nos distanciam da França e dos Estados Unidos, mas, de certo
modo, todos derivam de uma grande diferença. Ao analisarmos, brevemente, os casos da França e dos
Estados Unidos, referimo-nos sempre a um conjunto de valores estabelecidos na origem moderna
destes dois países. Ambos foram sacudidos por revoluções que entronizaram estes valores,
materializados em novas instituições, novas formas de vida e novas expectativas utópicas. Ou seja,
tanto os Estados Unidos, com a Independência e a Guerra de Secessão, quanto a França, com a
Revolução de 1789, possuem um momento fundador e original, que cintila ao longo do tempo como
referência permanente, sempre atualizada e reinterpretada, para a organização de suas sociedades, de
suas instituições, para o movimento da sociedade e de cada cidadão. Um momento que está sempre
aberto ao presente e ao futuro destes países.
A revolução norte-americana se constrói pela afirmação dos direitos civis, garantindo a todos os
indivíduos a livre movimentação em busca de seus interesses. Para lembrar Tocqueville, o que esta
revolução assegura é a idéia e a prática do “interesse bem compreendido”, ou seja, o interesse
individual que não recusa a associação e a vida em comum. Na França, a revolução oferece a todos os
direitos políticos, ou seja, a liberdade e o dever de participar ativamente da vida política, a todos
transformando em cidadãos iguais e responsáveis pela existência, não meramente de uma sociedade
de mercado, mas de uma comunidade política, de uma nação. Mais que o tema do interesse, o eixo da
revolução francesa é o da “razão bem compreendida”, e não por outro motivo ela mesma se celebra, na
pintura, na música, como uma revolução solar, feita pela luz da razão. É claro que a trajetória destes
dois países nunca se realizou como manifestação e atualização feliz e permanente destes valores e
princípios. Entretanto, ambos puderam mobilizar este momento inicial para erguer as suas instituições,
buscando perenizar os valores que os fizeram nascer. As instituições, as leis, os costumes, assim
orientados, constituíram um ethos, um modo de vida particular de cada país – constituído por “hábitos
do coração”, para usar uma outra expressão de Tocqueville –, marcado pela riqueza de suas matrizes
originais. É nesta perspectiva ampla que podemos entender e compreender o papel desempenhado
pela escola e pelos sistemas escolares em cada um deles, e a importância que ambos conferem à
educação, como modo de confirmação e reprodução destes valores fundacionais, que devem ser
acessíveis a todos.
Esta é, talvez, a nossa grande diferença. Qualquer que seja a maneira como olhamos o nosso
passado, nele não podemos encontrar uma origem histórica semelhante à dos Estados Unidos e da
França. Não fomos feitos por uma revolução, por uma transformação estrutural concentrada no tempo.
Não nascemos de um quadro coerente de valores, estabelecido revolucionariamente no passado,
baseado ou na razão ou no interesse, capaz de se manter como manancial de sentido e identidade,
criando para a nossa trajetória uma noção forte de futuro atado à democracia. Para dizer a verdade, não
tivemos, em nossa experiência histórica passada, um horizonte hegemônico e poderoso o suficiente
para invadir o íntimo das pessoas, disciplinando-as para a perseguição de um modelo claro de homem
e de sociedade, ou para determinar a natureza e o modo de funcionamento de nossas instituições.
Esta ausência de uma revolução fundadora, de um quadro coerente e exigente de valores
fundacionais, tem sido sistematicamente mal interpretada por muita gente. Para muitos, reside aí a nossa
inferioridade e o nosso atraso, por comparação com os países mais desenvolvidos. Porque não fizemos
uma revolução, porque não encaramos para valer uma profunda transformação em nossa vida social,
deixamos viver as taras da velha tradição ibérica e aquelas nascidas de nossa própria miséria intelectual
e moral. A conseqüência deste tipo de raciocínio sempre nos leva ao seguinte ponto: devemos realizar
uma ruptura com o nosso passado e começar tudo de novo, com base em valores formais e universais
nascidos da história do Ocidente. Devemos nos “americanizar” – ter como modelo os EUA – ou nos
europeizar, tomando algum país europeu como referência. De qualquer modo, estaríamos sempre
condenados à ruptura com o passado, para fazer do Brasil um país moderno, justo e democrático.
Sem dúvida, não podemos dispensar a crítica ao nosso passado, nem deixar de reconhecer no
Ocidente a nossa morada. Mas reconhecer a nossa diferença não necessariamente significa afirmar a
nossa inferioridade, ou a incapacidade e ineficácia geral de uma tradição própria e brasileira para fazer
o país avançar. Significa, na verdade, começar a entender uma trajetória e uma experiência que é
nossa, com todos os seus desafios e possibilidades. E com sua origem especial. Porque uma coisa é
não ter uma origem semelhante à dos Estados Unidos ou da França. Outra coisa é não ter nenhuma
origem. Mas, se nossa origem não é a linguagem do passado, com a sua ambição de enregelar o
mundo, se não é a linguagem norte-americana do interesse, com sua natureza fáustica e agressiva, se
não é a linguagem francesa da razão, interessada em regular e formalizar a vida, qual seria a nossa
linguagem matriz?
O que pode ser entendido como solo original de nossa experiência, como fundo de identidade a ser
visitado para nossa orientação, para a imaginação de nossas instituições e de nossa escola? Existiria,
entre nós, uma tradição capaz de traduzir, com clareza, o que é cidadania e responsabilidade, sem
perder o que existe de universal nestas idéias? Se nos EUA e na França as revoluções fizeram surgir
“de baixo”, do próprio povo, um ethos ao mesmo tempo particular e universal, onde encontraremos em
nossa história algo similar, capaz de alimentar noções cada vez mais fortes e densas de cidadania e
responsabilidade? E como encontrar um lugar para a escola, sem responder a estas questões, ou a
este tipo de pergunta? Como imaginar sua autonomia e sua eficácia, sem as respostas a estas
questões? E não seria tarefa essencial nossa, da escola, pensar sobre isto?

Atividade 5
A) Na sua opinião, a sua escola reproduz a desigualdade na sociedade brasileira ou diminui esta
desigualdade de algum modo? Ou não reproduz nem diminui?
B) Considerando a linguagem dos interesses e a linguagem da razão como determinantes das
tradições norte-americana e francesa, qual seria, na sua opinião, a linguagem da grande tradição
brasileira?
C) Aliás, na sua opinião, existe uma grande tradição brasileira, com riqueza e profundidade
suficientes, para vincular a escola à uma vida democrática? Para permitir uma atualização
permanente de princípios democráticos e igualitários?
Respostas às atividades de estudo

Atividade 1
A) Resposta livre. No entanto, ela deverá estar preocupada em mapear não só as instituições
formais existentes – igrejas, clubes, etc. – mas todas, ou a maioria, das redes que influenciam a
socialização das crianças e dos jovens de sua escola. Uma praça pode ser o nó de uma rede,
bem como um bar, um time de futebol amador, um bloco de carnaval, e assim por diante. O
importante é levantar esta trama que cerca a escola.
B) Resposta livre, mas aqui o que importa é saber que tipo de valores estes “nós” ou estas redes
trabalham, bem como suas estratégias de inclusão e as expectativas que despertam nos alunos.
Procure trabalhar sem preconceitos, para verificar se estes valores, estratégias e expectativas
são contraditórios entre si, se são exclusivistas, ou seja, se ferem as noções de igualdade,
liberdade e dignidade, ou se reforçam estas atitudes entre os alunos.
C) Resposta livre. Mas responda procurando estabelecer como a escola tem se posicionado diante
destas redes ou dos “nós” destas redes. Ela tem desconhecido este labirinto, ou tem se
aproximado destas redes? Ela tem tentando incorporar o que existe de interessante, nestas
redes, para a sua prática concreta? É capaz de competir com aquelas que trazem prejuízo para
os alunos, como gangues, tráfico, etc.?

Atividade 2
A) Resposta livre. Mas procure estabelecer se os professores de sua escola aceitam este tipo de
avaliação, como eles reagem e os motivos. E se a escola tem trabalhado, de forma sistemática,
os resultados destas avaliações, através de encontros, discussões, debates, etc. O resultado da
avaliação, e as discussões, têm levado a alguma alteração positiva no cotidiano da escola?
B) Também resposta livre. Busque responder argumentando, considerando as condições da escola,
o contexto, o tipo de aluno e as práticas de democracia e igualdade. A sua escola organiza
turmas por defasagem? Você percebe a existência de diferenças decorrentes de níveis sociais
diferentes, de etnias diferentes?
Atividade 3
A) Não se trata aqui de produzir uma pesquisa minuciosa, mas de encontrar uma estratégia que lhe
devolva uma noção mais precisa sobre qual a idéia que os alunos têm da sua escola. Você pode
trabalhar com palavras – como foi feito na comparação entre alunos mineiros e franceses – ou
usar uma outra técnica de discussão de grupo.
B) Resposta livre, aproveitando o tópico anterior. Não se trata aqui de encontrar as generalidades
que normalmente todos dizem: a escola é importante, sem ela não vou a lugar nenhum, etc. O
interessante é ver como os alunos vinculam, de forma concreta e no que diz respeito a atitudes,
conhecimentos, práticas, a escola e as suas possibilidades de futuro. A escola é apenas uma
condição formal para a vida, ou ela tem se mostrado e se revelado importante para a imaginação
e as expectativas dos alunos? Como?
C) Resposta livre. Amplie a sua investigação com os alunos, tentando ver como eles encaram a
questão da disciplina, da organização da escola, das práticas pedagógicas utilizadas, dos seus
interesses imediatos (esporte, música, etc), e assim por diante. Tente perceber os problemas
vividos pelos alunos, transformando estes problemas em fonte de indagações e de possíveis
respostas.

Atividade 4
A) Resposta livre. Pode ser um pouco mais complicada. Mas procure ler alguma coisa sobre “A
Democracia na América”, de Tocqueville, ou algo sobre Descartes, Locke e Kant. Não precisa ler
estes autores, mas algo sobre eles ou sobre a experiência dos dois países, nesta chave. A
Internet é um bom instrumento para isto. Tente ver como o tema do interesse aparece na análise
de Tocqueville sobre os Estados Unidos, e a importância disto. O mesmo pode ser feito com a
questão da razão e da vida social francesa, nos outros autores.
B) Resposta livre. Aqui o que importa é o seguinte. Depois de ter esclarecido como o interesse e a
razão possuem capacidade de configurar a sociedade e a própria escola, seria possível identificar
a presença destes dois valores na vida de seus alunos? Na prática e na orientação de sua
escola? Ou nada disto parece orientar a vida dos alunos e mesmo da sua escola? O que move os
alunos de sua escola: o interesse, mesmo que bem compreendido? As exigências de uma vida
racional, comandada por princípios universais, formais, que requerem sempre aplicação imediata
às circunstâncias da vida?
Atividade 5
A) Resposta livre. Você já respondeu a respeito disto, referindo-se à vida interna da escola. Tente
responder agora considerando a escola no movimento mais global da sociedade. O fato de
estarmos universalizando a escola na sociedade brasileira, tem impacto ou não na nossa
desigualdade? Ou a escola não tem a capacidade de interferir, nem positivamente nem
negativamente, nesta questão?
B) Resposta livre. Pense em nossa história, no modo como a nossa sociedade se constituiu, como a
idéia de nação foi imaginada e construída, e tente imaginar que linguagem é a que tem nos unido
de alguma forma e sustentado o nosso movimento. Use os exemplos dos Estados Unidos e da
França para pensar o nosso caso.
C) Resposta livre. Complete a resposta anterior, indagando se temos uma tradição com
possibilidades democráticas semelhantes àquelas da França e dos Estados Unidos. Se existe,
quais são seus elementos determinantes, suas principais características? E como a escola se
articularia com estes elementos principais? Que papel ela teria ou poderia ter nesta tradição?

Você também pode gostar