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A NOVA FRONTEIRA

PARA O FUTURO DA
CONSTRUÇÃO
1 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

OL48a Oliveira, Paulo

A Nova Fronteira para o Futuro da Construção / Paulo


Oliveira – São Paulo/SP: Edição do Autor, 2023.

PDF, 3600Kb
ISBN 978-65-00-66015-9

1. Engenharia Civil. I. Título

CDD 624
Sobre o Autor

Paulo Oliveira

Engenheiro civil, PMP, consultor, conselheiro e mentor. CEO da ARATAU Construção


Modular. Escreve artigos sobre tecnologia, inovação, industrialização da construção
e construção modular para o Buildin, Construliga, C3 – Clube da Construção Civil e
Linkedin.

Contato

paulo.oliveira@arataumodular.com
www.linktr.ee/aratau

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#preconstrução #BIM #industrializedconstruction #projectmanagement #constructability #fastconstruction
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2 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 4
2. A CADEIA DE VALOR DA INCORPORAÇÃO
IMOBILIÁRIA E O GRANDE HIATO 11
3. BREVE HISTÓRICO DO DESENVOLVIMENTO DAS
FERRAMENTAS DE PROJETO DIGITAL 15
4. UMA REFLEXÃO SOBRE O “VALE DA MORTE” 18
5. CONCLUSÃO: A NOVA FRONTEIRA 21
REFERÊNCIAS 23

3 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


1. INTRODUÇÃO:

N
a indústria da construção, os problemas de produtividade,
qualidade, desperdício de materiais e falta de previsibili-
dade têm sido sistematicamente debatidos. Trata-se de
uma questão estrutural da maior relevância, já que no contex-
to da indústria, o setor de construção tem sido fortemente
criticado por figurar entre os que possuem índices de pro-
dutividade mais baixos. Para um setor de tamanha impor-
tância econômica e social, a preocupação das maiores em-
presas globais de consultoria procede. De acordo com a
relatório do congresso Construbusiness 2021 (FIESP),
no Brasil perdemos em média, anualmente, 4,4% de
produtividade no período entre 2014 e 2019.
4 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO
Em seguida, entre 2019 e 2021, a queda média da produtividade foi de 6,1% ao ano. A per-
da de atratividade do setor para captar mão de obra direta é também um problema sério e
agrava esta situação. Uma confirmação deste fato é que a idade média dos trabalhadores
nos canteiros tem aumentado significativamente, mostrando que a população mais jovem
tem optado pelo trabalho em outros setores econômicos. Diante deste contexto, a proje-
ção do déficit habitacional brasileiro para 2030 é assustadora ou seja 30,7 milhões de uni-
dades, praticamente o quádruplo do déficit registrado em 2019.
Já é ponto pacífico que a solução para estes problemas passa, necessariamente, pela indus-
trialização da construção. Sabemos que a industrialização não acontece de forma espon-
tânea. A pressão para a redução de custos, melhoria da qualidade e aumento da produti-
vidade gera, num primeiro momento, a racionalização de processos construtivos. Depois
disto são introduzidos elementos produzidos pela construção off-site e, no último estágio,
evolui-se para a construção modular, através de módulos volumétricos (3D) e painéis (2D).
A pauta da industrialização tem sido colocada como estratégica pelas principais lideranças
e entidades setoriais brasileiras do setor de Arquitetura, Engenharia e Construção (AEC).
Europa, América do Norte, Austrália, Japão e China, adotaram a construção off-site e modu-
lar há décadas, que dobrou de tamanho nos últimos 5 anos e tem crescido a uma taxa supe-
rior ao dobro do crescimento da construção tradicional. Estes países têm plena consciência
da importância de deslocar o máximo possível das atividades de construção do canteiro
de obras para a indústria, o que gera benefícios substanciais, ou seja: ganhos de qualidade,
desempenho, sustentabilidade e produtividade. Mais do que isso, não há como atender o
crescimento da demanda nos grandes centros urbanos por infraestrutura social, habitacio-
nal, educacional, para transportes, saúde e educação, sem a industrialização da construção.

Em artigos e e-books publicados pelo autor, estes temas têm sido explorados e
aprofundados, destacando-se a relevância da construção modular e off-site na
pavimentação do caminho para a industrialização da construção. Nestas publi-
cações, enfatiza-se a necessidade do embasamento nos seguintes processos:

Pré-construção, como a metodologia mais ágil e econômica para se chegar a


qualquer produto de engenharia pretendido;
Fast construction, que é a rota mais rápida e direta para compactar e acelerar
o processo construtivo;
BIM (Building Information Modeling), através do projeto colaborativo e inte-
grado, somando-se as competências dos diversos agentes da cadeia de valor
envolvidos.

5 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


Nestas atividades, a gestão da Pré-construção, para ser eficaz, deve atender as diretrizes
do PMBOK®, ou seja, as melhores práticas de gestão de projeto do Project Management
Institute (PMI). Metodologias como o Lean Construction, Engenharia Simultânea, Enge-
nharia e Análise do Valor (EAV) e Target Costing ou Custeio Meta, também são utilizadas e
muito bem-vindas nesta etapa, adicionando valor através da racionalização e eficácia do
projeto. Benefícios relevantes são: redução custos e garantia da construtibilidade – fluxo
ágil e contínuo na etapa subsequente, ou seja, de Construção ou de Produção (fabricação e
montagem, no caso da construção modular e off-site).
Com a Indústria 4.0, o avanço da digitalização no setor de construção teve início com a in-
trodução do Building Information Modeling (BIM), que num primeiro momento teve seu uso
limitado à etapa de Pré-construção. Os processos de pré-construção ganharam maior agi-
lidade e consistência através de computação em nuvem, de softwares e aplicativos mobile,
além do uso da Internet das Coisas (IoT), da automação, da inteligência artificial (IA), de big
data, de realidade virtual e realidade aumentada. A visualização dos fluxos de trabalho e a
comunicação da equipe de projeto com os stakeholders, com o cliente e seus representantes
se tornam mais ágeis, assim como a organização e a automatização de tarefas.
A Pré-construção gera como outputs: planejamento de alto nível, plano de ataque e orça-
mento executivos, além de um projeto de fabricação em BIM, que atualmente, na constru-
ção modular, pode avançar ao menos até a 5ª dimensão (BIM 5D), automatizando boa parte
do orçamento através da geração automática de quantidades de insumos e seus custos dos
insumos, a partir da inserção das informações no IFC (Industry Foundation Classes). O IFC é
um formato de arquivo que contém dados, que permite o intercâmbio de todas as informa-
ções de um modelo, sem perda ou distorção de dados, garantindo a interoperabilidade do
BIM.

6 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


Figura 1 - Modelo BIM

Neste ponto, para avançarmos, vale relembrar as dimensões do BIM:

3D: Modelagem (construção virtual);


4D: Planejamento (análise do tempo);
5D: Orçamentação (análise dos custos);
6D: Sustentabilidade (social, econômica e ambiental);
7D: Gestão e Manutenção (gerenciamento dos ativos).

A logística e suprimentos de alto nível também se beneficiaram da integração digital das


cadeias de valor no setor, através da adoção de processos já utilizados nos setores mais
modernos da indústria. Isto é necessário para que a fabricação e a montagem aconteçam a
partir da sincronização da cadeia de valor, num modelo just in time, de forma a evitar custos
de estoques desnecessários e a garantir uma operação ágil e precisa, de ponta a ponta, pas-
sando pelo recebimento de insumos, pelo transporte de componentes industrializados e de
módulos, até a montagem de dos mesmos no local da obra.

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Há ainda muito a ser feito na etapa de Pré-construção para facilitar o trabalho e aumentar
a produtividade, ampliando o uso da realidade virtual e aumentada, do projeto generati-
vo e de gêmeos digitais ou digital twins. Os gêmeos digitais são representações de répli-
cas virtuais de objetos, processos e sistemas reais. O projeto generativo explora o machine
learning e combina o projeto paramétrico à inteligência artificial. Os projetistas informam
parâmetros requeridos para o projeto, no software de projeto generativo. A partir daí, o
software gera, rapidamente, uma infinidade de opções, com todas as combinações possíveis
de solução. A partir deste ponto, os projetistas avaliam os resultados e optam pela melhor
alternativa, para atender as necessidades do projeto.
A qualidade dos projetos atualmente desenvolvidos é muito superior à de 20 anos atrás. As
ferramentas de projeto digital utilizadas pelo setor AEC permitem a geração de resultados
equivalentes ao das empregadas nos setores mais modernos da indústria.

Olhando agora para a etapa de Produção, com enfoque nas metodologias tradi-
cionais de construção, existem boas metodologias e ferramentas digitais dispo-
níveis para a gestão e controle desta etapa. Mesmo que a Pré-construção tenha
sido bem desempenhada, esta etapa representa os maiores riscos e incertezas
em qualquer projeto ou empreendimento, em decorrência de:

Elevada fragmentação dos agentes da cadeia de valor envolvidos na Produção de


uma obra e do enorme empenho na integração e gestão dos mesmos;
Problemas climáticos e;
Gestão de um grande contingente humano e da segurança, no canteiro de obra.

Aparentemente, a simples missão de “cumprir o planejado” é, na realidade, um enorme es-


forço de energia para qualquer equipe de Produção competente e bem gerenciada.
No caso da construção modular e off-site, já num nível mais avançado de produção indus-
trializada, em que boa parte da “construção” é transferida para uma fábrica, há empresas
especializadas em softwares para a fabricação, geralmente derivados de outros setores in-
dustriais, como a indústria automotiva. Não há inconveniente nisso. Afinal, a indústria da
construção usa fortemente o setor de fabricação de veículos como benchmark.

Com uma motivação diferente, a RIB SAA, empresa com sede em Viena, na Áustria, é um
bom exemplo de desenvolvimento de softwares de gestão e controle da Produção, desen-
volvidos exclusivamente para a construção industrializada. Esta empresa possui mais de 20
anos de experiência na pré-fabricação de elementos de concreto armado e protendido e,
portanto, conhece bem a construção industrializada de concreto. A partir de sua experiên-
cia e conhecimento técnico na fabricação, desenvolveu softwares, com o objetivo de fazer
a gestão e controle do fluxo de trabalho de Produção, de forma integrada, digitalizada e

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automatizada. Os softwares da RIB SAA abrangem desde o planejamento de vendas, gestão
da aquisição de insumos e da produção, até a logística de montagem. Com uma interface de
usuário intuitiva, o sistema permite o gerenciamento do fluxo de trabalho com facilidade e
precisão. Isto independe se os processos de produção estão mais ou menos automatizados
ou robotizados ou do layout da fábrica. A plataforma está preparada para “agregar módulos
e funcionalidades”, conforme o estágio de evolução do sistema de fabricação.

Figura 2 – Construção Modular

No que tange aos equipamentos para a fabricação e montagem de painéis e de módulos,


houve grandes avanços, atendendo todos os tipos de chassi estrutural: wood frame, light
steel frame, estrutura metálica, madeira engenheirada e concreto pré-fabricado. Fábricas
modernas, que atendem grande escala de produção são fortemente automatizadas e ro-
botizadas. Exploram IoT, machine learning, bem como sensores e computação em nuvem,
para alcançar alta produtividade, evitando falhas, aumentando os padrões de qualidade do
produto e a confiabilidade da produção.
Para o setor de construção, priorizar a digitalização na etapa Pré-construção foi determi-
nante para a obtenção de ganhos substanciais de qualidade nos projetos, culminando em
um fluxo de construção mais ágil e em produtos de melhor qualidade. Na construção modu-
lar e off-site, em especial, estes benefícios são ainda mais amplos e evidentes. A qualidade
no detalhamento dos projetos de fabricação de produtos da construção civil em modelos
BIM, é equivalente a dos projetos de engenharia mecânica produzidos por setores mais
modernos da indústria, em outras plataformas digitais de projeto.
Como se pode constatar, a inovação e a digitalização permitiram avanços significativos nas
etapas de Pré-construção e de Produção para as metodologias de construção tradicional e,
sobretudo para a construção industrializada.

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Particularmente no caso da construção modular e off-site, se fôssemos aplicar a
Teoria das Restrições de Goldratt (TOC – Theory of Constrains):

Que restrição nos impede de obtermos ainda mais precisão, qualidade e produti-
vidade, no estágio global atual da industrialização da construção?
O que ainda nos afasta de atuarmos, na fabricação e montagem, no mesmo está-
gio de produtividade e eficácia dos setores mais modernos da indústria?

Vale aqui destacar que por maior que seja o nosso empenho, jamais seremos uma indús-
tria 100% off-site, como a automotiva. Sempre teremos serviços realizados no canteiro de
obra (on-site) que poderão, no limite, representar cerca de 15% do total. Obviamente estas
atividades sempre serão motivo de um cuidado maior de planejamento, gestão e controle.
Mas a “nova fronteira” se localiza justamente no hiato entre as etapas de Pré-construção e
de Produção. Não existe um sistema único e competente de planejamento, controle e ges-
tão do fluxo contínuo, que engloba todas as atividades e processos, desde a concepção de
um produto ou empreendimento, até a etapa de operação e manutenção. Há um “Vale da
Morte”, entre a Pré-construção e a Produção como veremos adiante. Esta é a nova frontei-
ra que precisamos desbravar!

10 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


2. A CADEIA
DE VALOR DA
INCORPORAÇÃO
IMOBILIÁRIA E O
GRANDE HIATO

N
a figura 3, Gomes (2019) apresenta o ciclo de empreen-
dimento imobiliário inserido na cadeia de valor de
Porter. As atividades e os tempos estimados de
cada uma, foram agrupados por este autor, nas etapas
de Pré-construção, Construção e Pós-construção.

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Figura 3 - Cadeia de valor da Incorporação Imobiliária

Fonte: GOMES (2019)

A figura anterior, que contempla o ciclo da cadeia de valor da Incorporação Imobiliária com
metodologias tradicionais de construção, poderia ser completada, inserindo-se a etapa
de Operação & Manutenção, para que tenhamos todo o ciclo de vida do empreendimento
representado. Isso é particularmente importante se considerarmos que cerca de 85% do
custo com uma edificação, ao longo do seu ciclo de vida, se dá exatamente durante a sua
operação e manutenção.
Porém, a preocupação atual do autor, reside nas etapas das áreas coloridas e, mais particu-
larmente, na interface entre as áreas vinho e verde. Numa análise do fluxo entre as etapas
Construção e Pós-construção há continuidade. Isto se justifica uma vez que a responsabi-
lidade pela gestão de ambas é da construtora. Independentemente de ser uma empresa
verticalizada, ou de utilizar empreiteiros integrados por ela para realizar a construção.

Por outro lado, a Pré-construção é uma atribuição da incorporadora, ainda que as ativi-
dades englobadas nesta etapa sejam terceirizadas. Enquanto a Construção compreende a
gestão e controle de atividades executivas físicas, na etapa de Pré-construção são realiza-
das atividades administrativas, burocráticas, de marketing e vendas e, sobretudo, um gran-
de esforço intelectual de desenvolvimento de soluções de engenharia e de detalhamento
das várias etapas do projeto, planejamento, plano de ataque e orçamento.

12 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


No ambiente de incorporação imobiliária, as áreas de negócio geralmente têm peso rele-
vante na operação. Muitas vezes as áreas técnicas responsáveis por engenharia e projeto
ficam muito pressionadas pela operação e não lhes é concedido tempo suficiente para o
desenvolvimento adequado do projeto. Isso é um grande equívoco, com sérias consequên-
cias para a etapa de Construção, pela falta de detalhamento e planejamento, além de erros
de orçamento, que geram um fluxo descontínuo de produção, problemas de qualidade e de
retrabalho, com impacto direto no aumento de custos e redução da margem de lucro do
empreendimento.
Além disso, o grande hiato ou descontinuidade do fluxo de trabalho entre as etapas de Pré-
-construção e de Construção, é hoje, na visão do autor, uma das principais razões do sacri-
fício da margem ou até mesmo do prejuízo registrado em empreendimentos imobiliários.
Aí reside o “vale da morte”. As boas práticas de gestão de projeto sugerem que a equipe de
Produção participe da Pré-construção. Sem dúvida isso é importante e diminui o impacto
da descontinuidade.

Conforme destacamos, a Figura 3 cobre os processos de incorporação imobiliária aplicados


à construção tradicional. Para a construção industrializada mais adequado, na atualização
desta figura, mudarmos o nome da etapa de Construção para Produção, inserindo também
mais uma etapa de projeto, o Projeto de Fabricação. Na construção industrializada a ati-
vidade de logística e suprimento de alto nível, permeia e conecta todas as etapas, desde o
planejamento e gestão do suprimento de insumos e componentes industrializados, até a
fabricação, transporte, içamento e montagem do módulos e dos componentes produzidos
pela construção off-site.
Seja na construção industrializada ou na tradicional, o hiato entre a Pré-construção e a
Produção, ou o “Vale da Morte”, pode destruir a geração de valor de um projeto ou em-
preendimento.

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Figura 4 – Ciclo de vida de um produto ou empreendimento imobiliário

Fonte: autor

Entre as etapas de Pós-construção e de Operação & Manutenção, também pode haver uma
quebra no fluxo de trabalho (segundo ponto de ruptura), uma vez que a responsabilidade
por esta etapa é do proprietário do ativo imobiliário. Isso não acontece quando o empreen-
dimento tem, desde a sua concepção, o futuro responsável pela operação como o próprio
proprietário do empreendimento. Projetos bem desenvolvidos em modelo BIM já devem
conter no IFC os dados e informações relevantes dos sistemas prediais e componentes do
ativo imobiliário, para a gestão e controle da Operação & Manutenção explorando a Di-
mensão 7D do BIM, facilitando e simplificando as atividades e serviços desempenhados
nesta etapa, tais como execução de reparos, substituição de lâmpadas e de componentes,
etc.

Como resolver então a descontinuidade e o grande hiato entre as etapas de


Pré-construção e de Construção, ou de Produção (fabricação e montagem)?

14 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


3. BREVE
HISTÓRICO DO
DESENVOLVIMENTO
DAS FERRAMENTAS
DE PROJETO DIGITAL

N
a engenharia mecânica, os projetos digitais avançaram
muito antes do que no setor de construção. O enge-
nheiro francês Pierre Bézier, da Renault, desenvolveu
o UNISURF, em 1968, para o desenho de peças automotivas.
O UNISURF é considerado o precursor do CAD (Compu-
ter Aided Design). No final da década de 1970 e início da
década de 1980, surgiram empresas especializadas no
desenvolvimento de softwares com base no CAD, como
a Dassault Systèmes e a Autodesk. Com isso, o CAD
passou a ser mais utilizado e difundido.
15 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO
A Autodesk foi fundada em 1982 e, um ano depois, lançou o AutoCAD, o primeiro pro-
grama CAD significativo para PCs, utilizado, sobretudo, para o detalhamento de desenhos
técnicos. O CAD deu nova dinâmica ao mercado, com recursos que facilitaram o detalha-
mento, a revisão, a análise e a coordenação de projetos. A Dassault Systèmes, criada em
1981, passou a liderar iniciativas de projeto digital sobretudo nas indústrias automotivas e
aeroespaciais, com a visão de transformar e expandir o status quo, em um design de produ-
to virtual e integrado, já em plataformas 3D,

No setor de construção, a complexidade dos projetos passou a exigir um nível elevado de


precisão, confiabilidade na comunicação e na transferência e compartilhamento de dados
que as ferramentas da plataforma CAD já não podiam oferecer. Na década de 1970, o pri-
meiro conceito bastante similar ao BIM, Building Product Model (BPM) ou Modelo de Produ-
to de Construção, foi atribuído ao professor Charles M. Eastman.

Em 1974, o professor Eastman e uma equipe do Instituto de Tecnologia da Georgia, apre-


sentaram o conceito Building Description System (BDS), ou Sistema de Descrição da Cons-
trução. Segundo Eastman et al. (1974): - “o sistema BDS foi iniciado para mostrar que uma
descrição baseada em computador de um edifício poderia replicar ou melhorar todos os
pontos fortes de desenhos como um meio para a elaboração de projeto, construção e ope-
ração, bem como eliminar a maioria de suas fraquezas.”. Este conceito foi essencial para a
mudança dos projetos e documentos em papel, para os projetos digitais, utilizando soft-
wares para agilizar e facilitar o trabalho de projeto e a produção de desenhos técnicos, os
chamados CAD (Computer Aided Design).

Em 1992, seguindo as diretrizes de Eastman, G. A. van Nederveen e F. P. Tolman publicaram


um artigo sobre a modelagem de informações da construção, útil para estruturar um mo-
delo único de construção, consolidando a visão dos diferentes participantes da elaboração
de um projeto. Trata-se da primeira utilização do termo Modelling Building Information, que
evoluiu para o Building Information Modeling (BIM). Foi uma mudança de paradigma, explo-
rando um sistema computacional para o gerenciamento, controle e integração dos proces-
sos, tecnologias e documentos utilizados nos projetos de construção.

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Figura 5 – Modelo BIM

Na década seguinte, surge a modelagem 3D no setor de Arquitetura, Engenharia e Cons-


trução, através do BIM, permitindo a inserção, em um ambiente virtual, de todas as ferra-
mentas utilizadas até então em papel, com maior eficácia na comunicação e colaboração
entre a equipe de projeto e todos os stakeholders. Em 2002, a Autodesk adquiriu o Revit,
software de modelagem paramétrica criado em 1997 pela Charles River Software, que pos-
sibilitava projetar não somente os elementos de arquitetura, como também todos os obje-
tos das demais especialidades de projeto.
Em 2001, para complementar os pacotes de projeto 3D do Revit, a Autodesk lançou o Na-
visworks, que permite a combinação de modelos 3D, a gestão e compatibilização de pro-
jetos (incluindo a verificação de interferências) e a geração de imagens e de animações 3D
Em 2003, a Autodesk e a Bentley tiveram papel essencial na adoção e difusão do BIM, em
uma conferência de construção civil em Seattle, nos EUA, quando a nova tecnologia foi
apresentada à General Services Administration (GSA), o órgão máximo de gestão de edifica-
ções públicas nos EUA. Após este evento, evidenciou-se a necessidade de uma modelagem
em 3D parametrizada, integrada com o cronograma e as análises de compatibilidade, mo-
delagem, dimensionamento, instalações, bem como análises termoacústicas e energéticas
das edificações. Isso inspirou a implantação de um plano para a adoção do BIM, no setor
público de construção americano. O BIM passou a ser adotado em larga escala pelas em-
presas de projeto, construção e pelos fornecedores de materiais de construção e, a partir
daí, foi difundido para vários outros países.

17 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


4. UMA REFLEXÃO
SOBRE O “VALE DA
MORTE”

A
primorarmos e gerarmos resultados melhores na Pré-
-Construção e na Construção ou Produção. A propos-
ta é de realização de um trabalho massivo de pla-
nejamento estratégico.

18 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


Retomando a preocupação com a descontinuidade entre as etapas de Pré-cons-
trução e de Construção (metodologias tradicionais), ou de Produção (constru-
ção industrializada):

Uma vez definido o problema, como resolvê-lo?


Ganhamos muita qualidade na etapa de Pré-construção e no detalhamento dos
projetos, mas como transferir essa qualidade para a etapa seguinte (Construção
ou Produção)?

Nossa preocupação em racionalizar processos e reduzir os custos envolvidos na


Pré-construção e na Construção ou Produção, é notável. Temos feito isso no setor:

A partir da implementação de melhoria contínua nos processos e mediante o uso


de ferramentas competentes (softwares e aplicativos mobile);
Utilizando a inteligência e competência de gestores experientes;
De forma estanque nestas, ou seja: com foco específico e restrito na Pré-constru-
ção ou na Construção ou Produção.

Estas ações surtem efeito e colaboram para aprimorarmos e gerarmos resultados melho-
res na Pré-Construção e na Construção ou Produção. Por outro lado, não exploramos a
visão sistêmica para pensarmos e resolvermos o todo. Precisamos somar as competências
e a experiência de profissionais que compreendem muito bem o contexto e todo o ciclo dos
projetos e empreendimentos da cadeia de valor da construção, mas que também tenham
preocupação, clareza e bons insights sobre o futuro da construção, para resolvermos, de
forma colaborativa, esta ruptura.
A proposta é de realização de um trabalho massivo de planejamento estratégico. Uma úni-
ca plataforma digital de gestão ao longo de todo o ciclo de vida do empreendimento, conec-
tando as etapas parece ser uma resposta óbvia. A melhor imagem desta plataforma é a de
um sistema de ERP (Enterprise Resource Planning, ou Planejamento dos Recursos da Empre-
sa), mas desenvolvido especificamente para o setor de construção. Este sistema computa-
cional não seria somente um grande barramento econômico-financeiro, como os grandes
ERP’s de mercado. Necessitamos de um sistema integrado de gestão de “A a Z”, que per-
meie as interfaces das etapas do ciclo de vida do projeto e do empreendimento, permitindo
a gestão, controle e integração de todo o ciclo de vida dos projetos e dos empreendimen-
tos, num pipeline contínuo.

19 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


Os processos BIM certamente serão essenciais para alimentar este sistema. Um modelo
corretamente desenvolvido carregará boa parte das informações importantes que serão
utilizadas, mas não são em si a solução integrada de software de que precisamos para a ges-
tão e controle integrado de todo o ciclo do empreendimento imobiliário, garantindo conti-
nuidade, sobretudo nas interfaces entre as etapas.
Outras novidades estão a caminho, como a proposta da expansão das dimensões do BIM
para 8D (Segurança no Canteiro de Obras), 9D (Lean) e 10D (Industrialização da Constru-
ção). Isto trará múltiplos benefícios e converge com as necessidades do setor, que busca
excelência e aproximação com os níveis de produtividade da indústria.
Precisamos, com urgência, de uma força-tarefa mobilizando representantes de toda a
cadeia de valor e os fabricantes de softwares, para um aprofundamento nesta questão e
preparação de um planejamento estratégico setorial que dará as diretrizes para o desen-
volvimento desta nova plataforma robusta, capturando, certamente, atributos e funciona-
lidades de aplicativos e softwares já existentes, mas indo muito além.

20 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


5. CONCLUSÃO:
A NOVA FRONTEIRA

O
mundo exige respostas firmes da construção não somen-
te para atender o crescimento da demanda, mas em
todas as perspectivas, inclusive em direção às
melhores práticas de ESG e ao netzero.

21 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


Em meio a essa discussão, outras preocupações como a questão da “produtização”:

Como podemos ter, com maior clareza, as características e atributos dos produ-
tos que queremos fabricar e projetá-los para que sejam produzidos em larga es-
cala, com custos competitivos?

Esta visão não somente confronta, como extrapola a ideia de que o produto é uma sim-
ples consequência de um projeto. A produtização gera mais valor e dá novas perspectivas
para a ampla integração e exploração das competências somadas dos players estratégicos
da cadeia de valor, buscando a escalabilidade de forma conjunta e compartilhando os re-
sultados. Gêmeos virtuais, projeto generativo, metaverso, realidade virtual e aumentada,
sempre com o objetivo de oferecer uma jornada do cliente cada vez mais rica em experiên-
cias imersivas e sensoriais, ocuparão um espaço importante neste caminho para o futuro
da construção, em direção à Indústria 4.0.

O planejamento estratégico setorial proposto deverá priorizar a transposição da nova


fronteira, que reside justamente na concepção, a partir do desenho de processos desta-
cado, de um sistema digital e integrado, para a gestão e controle da cadeia de valor do se-
tor de construção, ao longo de todo o ciclo de vida dos projetos e empreendimentos. Este
sistema não poderá admitir, de forma alguma, rupturas, sobretudo nas interfaces entre as
etapas. Deverá ter como premissa um fluxo contínuo e integrado de atividades, passando
pela Pré-construção, Construção ou Produção, Pós-construção e Operação & Manuten-
ção. Não basta transformarmos a construção numa indústria. A industrialização é muito
importante, mas devemos nos lembrar que sempre teremos atividades on-site. Por mais que
consigamos minimizar estas atividades, teremos a necessidade de um planejamento mais
robusto para as mesmas. O mundo exige respostas firmes da construção não somente para
atender o crescimento da demanda, mas em todas as perspectivas, inclusive em direção às
melhores práticas de ESG e ao netzero. Se não conseguirmos operar de forma integrada,
com controle dos processos, qualidade, desempenho e prazos e, mais do que isso, elevando
a produtividade setorial para outro patamar, falharemos. Portanto, foco na missão!

22 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


REFERÊNCIAS
ABRAINC. Cadeia de valor e importância socioeconômica da incorporação imobiliária no
Brasil. Relatório. Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias. São Paulo, dez. 2017.
Disponível em:<https://www.abrainc.org.br/wp-content/uploads/2018/03/Cadeia-de-Va-
lor-03-2018.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2023.

ABRAINC. O ciclo da incorporação imobiliária. Cartilha guia. Associação Brasileira das


Incorporadoras Imobiliárias. 2018. Disponível em:<http://abrainc.org.br/wp-content/
uploads/2015/08/cartilha_guia_incorporacoes_rev_08_07.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2023.

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23 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO


24 A NOVA FRONTEIRA PARA O FUTURO DA CONSTRUÇÃO

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