Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
CAITLIN HOWARD
Eu poderia dar para ele.
Essa certeza era tão clara como a existência de extraterrestres
para mim.
Mas eu detestava a ideia daquela aposta, por isso, me fiz de
sonsa e virei o shot de vodca, fingindo que o que acabou de sair da
boca de Maeve nem havia passado pelos meus ouvidos.
Não estávamos mais no ensino médio, ela deveria saber disso.
— Você não deveria beber tanto, Maeve. Nós temos treino
amanhã cedo. — Aurora chamou a atenção da nossa amiga, me
ajudando a escapar daquela enrascada.
A ruiva revirou os olhos e ignorou por completo o que foi dito,
virando mais um shot pela garganta.
— Por que você é tão certinha, Aurora? É porque seu nome é
delicado? — Ela debochou, deixando visível o quanto já estava
bêbada.
Eu larguei o pequeno copo e peguei a garrafa de água ainda
fechada em cima da mesa na qual estávamos ao redor. Um corpo
se jogou no mesmo momento ao meu lado, quase me sufocando na
poltrona velha daquela república.
Nem precisei olhar para o rosto do ser inconveniente ao meu
lado para saber que se tratava do meu irmão.
— Que cara é essa? — Ele indagou, fedendo a maconha.
Odeio esse cheiro!
Odiava que ele se drogasse daquela forma.
Estava arriscando a carreira brilhante que tinha como
quarterback do time da universidade da UCLA, mas ligava para isso,
e eu sabia o quanto a vida esportiva era importante para ele.
Mas o meu irmão não era mais o mesmo.
Talvez, assim como eu, ele nunca tivesse conseguido ser
alguém que pudesse apontar para si mesmo e se orgulhar de todas
as suas facetas e atitudes.
Talvez ele nem soubesse quem era.
É... Não era só um talvez.
E por me sentir exatamente da mesma forma, eu o acobertava
em todas as suas loucuras.
— Nada — respondi, desviando o meu olhar para Aurora, que
parecia visivelmente incomodada com a presença do seu, até então,
namorado. Suspirei e fiz a pergunta, sem me importar de estar
sendo inconveniente ou não. — Brigaram de novo?
— Isso não interessa a você. — Meu irmão disse, não se
importando em ser arrogante com a sua única irmã, mas levando a
mão até o topo da minha cabeça e bagunçando meu cabelo. —
Qual era o assunto da roda? Primeiro, vocês conseguem ouvir
alguma coisa com o som alto desse jeito?
O seu amigo, Barry Pitts, runningback do time, se aproximou
de nós e fechou o grupinho que era carinhosamente chamado pelos
outros universitários de “A Elite da UCLA”.
— Nossa... Só eu estou achando essa festa entediante? —
perguntou, jogando-se ao lado de Maeve e agarrando a cintura da
ruiva. — Só você para me animar, gatinha.
Aqueles dois... eram estranhos.
— Posso até animar você, mas primeiro preciso da resposta
da Caitlin. — Ela rebateu, me lançando um olhar desafiador. — Está
com medo, amiga?
Eu revirei os meus olhos e tomei um gole da minha água.
— Medo do quê? — Meu irmão quis saber.
— Melvin...
— Não viu quem está aqui hoje? — Maeve interrompeu
qualquer coisa que Aurora fosse falar para o meu irmão. — O Trevor
Nerd Lancaster. — Virou a cabeça para o garoto que devia estar a
uma distância visível atrás de mim. — Ele parece arrogante até
nessa festa.
— Ele não parece só arrogante, como também deslocado. —
Meu irmão avaliou, não sendo nada discreto em observar o garoto.
— Mas é estranho ele estar aqui... Achei que o nerd não
frequentasse lugares como esse.
— Que resposta Caitlin está devendo para você? — Barry
perguntou, depois de provavelmente se certificar do que havia
observado.
— Sua irmã não é a que pega geral? Todos os garotos aqui
nessa universidade têm olhos para ela e, segundo ela mesma,
consegue ter quem quer... — Maeve provocou, enchendo mais um
copo de vodca e o bebendo rapidamente. — Vamos lá, Caitlin!
Prove que é irresistível ao ficar com aquele garoto.
— Eu fiquei sabendo que ele deu um fora na Tiffany. Não acho
que seja como aquele rapaz do ano passado, que tinha uma
quedinha pela Caitlin. Quer ver a nossa amiga recebendo um fora?
— Aurora questionou, pegando o copo da mão de Maeve e o
largando em cima da mesa. — Que tipo de amiga você é?
Maeve não desistiria daquilo.
Eu sabia apenas por sustentar o olhar provocador dela de
quem não importava a hora, ainda insistiria naquela aposta ridícula
apenas para provar um ponto para si mesma.
— E o que eu ganho? — perguntei. Porque, até então, não
sabia desse lado. Já havia mesmo perdido as esperanças de um
amadurecimento vindo da sua parte.
— Me deixa pensar... — Ela soltou um riso fraco, colocando a
mão no queixo e olhando para o teto de forma pensativa. — Você
não é a capitã do nosso time, mas parece ter um grande desejo de
ser porque está sempre querendo se meter nas minhas técnicas.
Então, por que eu não poderia escutar uma das suas ideias se
conseguisse ficar com aquele garoto?
Foi naquele momento que eu entendi.
Maeve estava me punindo. Da sua forma perversa e
manipulativa.
Ela não gostava da ideia de eu estar quase sempre certa sobre
as técnicas dos jogos. Não por ser uma pessoa ruim, mas por ser
alguém com uma personalidade forte e orgulhosa que detestava ter
suas ideias interrompidas por outras melhores.
— Você sabe que posso conseguir convencer Jocelyn a usar
sua técnica — disse Maeve, se referindo à levantadora do nosso
time.
Eu não sabia muito sobre Trevor Lancaster, apenas o que
circulava pelo campus da UCLA a respeito da sua personalidade, o
que podia ser tudo uma grande mentira, afinal, as pessoas amavam
julgar quem estava quieto. Digamos que, depois que ele dispensou
Tiffany Layne, muitas pessoas começaram a dar atenção para ele,
mas não de uma forma positiva porque a maioria dos comentários
era o chamando de louco por dar um fora em uma garota tão bonita
como a cheerleader.
Trevor estudava Ciências Políticas e parecia ter notas
excelentes, muito acima da média e em qualquer disciplina do
curso, era por isso que muitos alunos o apelidaram de nerd,
principalmente pelo seu jeito reservado e de aparência tímida. Ainda
mais com aquelas camisetas de animes, que inclusive usava na
festa daquela noite.
Nunca o tinha visto em nenhuma festa antes. Ele não
participava de nenhum time de esporte da universidade e parecia
nunca querer papo com as pessoas ao seu redor, apenas com o seu
irmão, que agora não lembrava do nome, mas era tão afastado e
excluído socialmente como Trevor.
Então, o que ele está fazendo aqui hoje à noite?
Tentar ficar com aquele garoto seria a minha punição por
querer passar por cima dela nos nossos treinamentos.
Eu receberia o meu primeiro fora.
Ela deveria estar amando isso.
— Só quero o melhor para o nosso time — falei a verdade. —
Você sabe disso.
Maeve assentiu.
— É por isso que estou dando a oportunidade para você dar o
melhor para ele. — Ela sorriu fraco e colocou a mão no coração. —
Faria isso por nós?
O meu irmão riu, e eu o olhei sem achar graça daquilo. Qual
era o problema dele? Outros irmãos protegiam a sua irmã mais
nova, mas ele não... Ele não se importava.
— Ok. — Eu peguei a garrafa de vodca e enchi meu copo,
virando na minha boca tudo de uma só vez. O amargor não era mais
meu problema, não quando eu tinha que fazer aquela droga. —
Onde ele está?
— Caitlin... — Mas Aurora se calou assim que mandei um sinal
para parar com minha mão.
Ela não precisava se meter naquilo.
Até então, eu não entendia como Aurora tinha se envolvido
com a gente no ensino médio. A minha cunhada era muito preciosa
enquanto meu irmão era uma peça de roupa mal-lavada.
— Tudo bem, irei fazer isso.
Iria ser quem eles quiserem que eu fosse.
Não tinha sido isso a vida toda?
— O nerd está ali no canto. — Barry disse, apontando para
Trevor no canto da sala. — Boa sorte, Cat.
— Já disse para não me chamar assim! Parece que está
chamando um gato.
— Você é gatinha! — Ele piscou para mim, me fazendo revirar
os olhos.
— Vai antes que seja tarde, amiga. — Maeve mandou, como
se estivesse pedindo para ir até o mercado comprar mantimentos, e
não cumprir uma aposta idiota.
Maldição.
Virei-me em direção à sala.
Muitos universitários estavam dançando no meio dela, outros,
bebendo e jogando a bebida fora. Mesmo com todas aquelas
pessoas ali, consegui ver Trevor parado no canto, encostado na
parede enquanto segurava uma garrafa de água.
Meu irmão soltou um riso.
— Ele não parece dono desse lugar parado com tamanha pose
naquele canto? Chega a ser ridículo o quanto nos menospreza
apenas com o olhar.
— Quem disse que ele nos menospreza? — perguntei.
— Dá para ver no olhar do nerd! — Barry argumentou. — Ele
deve se achar superior por causa da sua inteligência.
Então, por que está aqui?
Perguntei-me, voltando a observá-lo.
— Parem de tirar conclusões precipitadas dele. — Aurora
mandou. — Ele só deve ser tímido.
— Por que está defendendo o cara? — Meu irmão questionou,
parecendo ficar bravo com aquilo. — Ele não deixa de ser um idiota.
— Só estou dizendo...
— É melhor não defender aquele idiota na frente do seu
namorado.
— Nós...
— O quê? Se vai dizer que terminamos, não terminamos,
baby. — Ele enfatizou, e eu tive que me controlar para não
estrangulá-lo ali mesmo. — Só tivemos uma discussão.
— Parem de tagarelar! Só estão atrasando a Caitlin. — Maeve
mandou, não se importando com a nossa amiga. — Vai agora, antes
que eu desista da aposta.
Eu poderia ficar e ver se ela iria mesmo desistir, mas ouviria
por um bom tempo o quanto era covarde.
— Estou indo!
Respirei fundo e comecei a dar os primeiros passos em
direção ao Trevor, me sentindo mais nervosa do que alguma vez já
me senti ao me aproximar de um garoto. Era muito certo que ele me
daria um fora, então, durante o curto trajeto, pensei em uma forma
de reverter a situação a meu favor.
Conforme me aproximava e seu perfil ficava mais claro diante
da minha visão, confirmei o motivo do nerd ter chamado a atenção
de Tiffany. Ele não era alguém que passava despercebido.
Trevor era alto e, mesmo que eu fosse a mais alta do time de
vôlei, ainda podia notar que tínhamos uma diferença de, no mínimo,
5cm. Estava vestindo uma camiseta preta de mangas curtas e justa
que evidenciava os seus músculos dos braços. Por conta da
iluminação da casa e a cor da peça, não conseguia ver muito da sua
barriga, mas, para ter braços tão definidos, era certo de que tinha
uma barriga da mesma forma.
Os fios do seu cabelo estavam jogados para cima, meio
despojados com aquele tamanho certo para dedos se entrelaçarem
neles e bagunçá-los por completo. O tom castanho-claro combinava
perfeitamente com ele.
E com seus olhos.
Foi o que confirmei quando se ergueram em minha direção e
me acompanharam até que estivesse próxima dele o suficiente para
ter certeza de que não era uma confusão por conta das luzes da
festa.
Eu realmente poderia dar para ele.
Trevor não era só bonito, era lindo e, na minha opinião, de
quem já havia ficado com inúmeros caras desde a escola, a sua
beleza passava por cima de todos eles. Arriscaria dizer que ele era
mesmo o mais bonito daquele campus.
Mas aquela aposta... Eu a odiava.
Não era como se nunca tivesse feito uma na minha vida. Mas
a verdade era que estava tão cansada delas e de brincar dessa
forma com as pessoas que pensei em uma forma de controlar a
situação da minha maneira.
— Algum problema? — Trevor dirigiu-se pela primeira vez
diretamente a mim, confuso por eu estar parada bem à sua frente e
sem dizer uma palavra sequer.
Pensa rápido, Caitlin Howard.
Quando ainda era vivo, meu avô havia dito sobre a importância
de todo diálogo ter honestidade. Diferentemente de todo mundo ao
meu redor, ele era uma pessoa gentil, verdadeira e preciosa, que
havia tentado ser útil na minha vida durante todos os dez anos em
que permaneceu vivo nela.
Mas a vida sempre arrumava uma forma de tirar de você as
pessoas boas.
Ele tinha morrido antes que pudesse estabelecer uma
influência sobre mim.
Acontecia que eu ainda me lembrava de algumas lições e, por
mais que na maioria das vezes as ignorava, decidi não fazer isso
naquela hora. Talvez essa fosse a forma mais fácil de ganhar.
— Tenho uma proposta para você — revelei, estendendo a
minha mão em um primeiro momento.
Trevor me olhou de cima a baixo, deixando bem evidente que
não estava me avaliando como os outros garotos, e sim com aquele
ar de arrogância que parecia ser natural quando uma mulher
investia nele. Será que era virgem? Será que não tinha preferências
por mulheres? Hum... Isso era um pouco frustrante para mim.
Como não apertou a minha mão, a abaixei antes que ficasse
constrangida.
— Não estou interessado, obrigado. — Ainda assim, foi
educado ao responder. Nem um pouco irônico ou sarcástico com
suas palavras.
Ele fez menção de sair, mas me coloquei na sua frente antes
que pudesse fazer isso e consequentemente fiquei mais próxima.
Uau.
Eu estava certa sobre ele ser o mais bonito do campus.
Seu rosto sem nenhum pelinho de barba tinha algumas
pintinhas que só o deixavam mais agradável com aqueles óculos de
grau de armação redonda.
— Como eu posso dizer isso sem ser grosso? — murmurou,
mas surpreendentemente eu consegui ouvir, mesmo com a música
alta. — Não estou interessado em você, mas tenho certeza de que
muitos outros caras nessa festa estão.
Ele tinha razão.
Desde que entrei naquela casa, minhas costas não receberam
um descanso de tanto que estava sendo secada pelos caras da
festa. Sem falar que havia recebido tantos convites para dançar que
perdi as contas.
Danças que me fariam acabar na cama de mais um cara
desconhecido. Estava um pouco cansada disso.
Trevor estava pronto para me deixar ali plantada como uma
planta quando eu o parei de novo, tocando pela primeira vez no seu
braço. Seus olhos seguiram minha mão, e eu aproveitei o momento
para aproximar minha boca do seu ouvido.
— Estou participando de uma aposta em que você é o alvo —
avisei assim, de repente, já que não tinha muitas alternativas.
Voltei a encontrar seus olhos e não deixei o seu braço
enquanto o observava processar a informação jogada no seu colo.
— Por que está me dizendo isso?
— Porque preciso da sua ajuda.
— Nem pensar! — Tirou minha mão do seu braço. — Só de
concordar em fazer uma aposta, já mostra muito quem você é.
— Só de estar falando a verdade para você, mostra quem eu
realmente sou.
— O que você tinha que fazer? — perguntou. Não sabia
identificar se estava chateado ou não com aquilo, seu semblante
não demonstrava nada.
— Ficar com você.
O canto dos seus lábios se curvou em um pequeno sorriso de
lado e ele assentiu, como se confirmasse uma coisa para si mesmo.
Foi impossível não reparar que tinha covinhas. Não tão profundas
porque seu sorriso não foi tão aberto, mas ele as tinha e eram fofas.
— Parece que você perdeu a aposta.
Novamente ele iria sair, mas eu não deixei.
— Estou indo embora, então seria melhor que me deixasse
passar. — Dessa vez, ele não se importou em estar sendo grosso.
— Mas você pode me ajudar...
— Não irei ficar com você.
Aquele era o segundo fora que eu levava em menos de cinco
minutos? Surpreendente.
— Não vamos ficar — afirmei. — Meus amigos estão nos
olhando nesse momento, atentos a qualquer movimento. Se subir
comigo, eles vão achar que ficamos e eu irei ficar devendo um
grande favor a você.
Ele pareceu chocado com o meu plano.
— Como isso me beneficiaria?
— Sou popular, tenho dinheiro e influência — falei o meu trio
de vantagens. — Isso pode não ser benéfico para você agora, mas
ainda temos pelo menos mais dois anos de faculdade pela frente.
— Vai ficar me devendo em longo prazo assim?
— É um grande favor que irá me fazer, nada mais justo que
não ter data de validade para cobrar o seu — expliquei o que era
óbvio para mim. — E então? Pode me ajudar nisso?
Ele pensou um pouco, olhando para algo atrás de mim e, de
canto de olho, notei que algumas pessoas estavam nos observando
sem disfarçar. Quase podia ler a mente dos mais óbvios.
“O que Caitlin Howard está fazendo com ele?”
“Por que Trevor está com ela?”
“Ele não quis a Tiffany, mas será que a Caitlin vai ter sorte?”
— Preciso de uma resposta, Trevor — chamei a sua atenção
de volta para mim.
O nerd segurou a minha mão e, sob o olhar de muitos, me
levou para as escadas. Mesmo com a música alta, consegui escutar
os comentários chocados das pessoas enquanto eu subia degrau
por degrau com Trevor. Tinha certeza de que ele também escutava,
pois seu pescoço estava avermelhado.
Será que ele era tímido, como Aurora havia sugerido?
Chegamos ao segundo andar da casa e, como eu imaginava,
muitos casais estavam pelo corredor se beijando. Parecia até o
corredor da pegação.
— Vem. — Fui eu quem puxei Trevor antes que ele se
arrependesse e voltasse atrás, já que havia ficado estático no
corredor, sem saber para onde ir.
Abri algumas portas até achar um quarto vazio.
Notei pelo fedor de maconha que poderia ser do meu irmão e
tive a certeza ao ver a bagunça das suas roupas em cima da cama.
Ninguém se atrevia a entrar no quarto do quarterback.
Apenas a irmã inconsequente dele.
— Quem dorme aqui deve ter um sério problema com ar puro.
— Trevor falou, tossindo logo em seguida e largando a minha mão.
— Vou abrir essa janela.
Assenti.
Eu o faria se ele não fizesse.
Trevor abriu a janela e um pouco de ar entrou no ambiente, o
suficiente para que não sufocássemos com aquele fedor.
Ele se encostou na parede ao lado da janela e cruzou os
braços em frente ao corpo, evidenciando bem o corpinho que estava
escondido no canto da festa lá embaixo. Logo fechei a porta e me
sentei na cadeira em frente à escrivaninha do meu irmão. Virei-me
para Trevor, encontrando seu olhar em mim.
— Quanto tempo precisamos ficar aqui?
Constrangido.
Era dessa forma que ele estava no momento.
Provavelmente não estava gostando da situação, já que
parecia fugir de mulheres como um gato que fugia da água.
— Dez minutos me parece o suficiente. — Eram só uns beijos,
então... — Por que aceitou? — perguntei, porque algo me dizia que
não era apenas pelo meu trio de vantagens.
Ele deu de ombros.
— Tenho meus motivos.
Suspeito.
— Temos dez minutos para você me dizer.
— Você é Caitlin Howard. Talvez, se as pessoas pensarem que
nós ficamos, me esqueçam um pouco.
Então, ele também estava me usando? Sem perceber, Trevor
havia conquistado a minha simpatia naquele momento.
— Tem namorada fora da cidade? — perguntei, curiosa a
respeito. Existiam muitas meninas lindas na UCLA. Tiffany era uma
delas. Depois de mim e Maeve, ela era a mais desejada pelos
caras.
— Não. Por que está perguntando isso?
— Sabia que você ter dado um fora na Tiffany causou tumulto
em muitas pessoas?
— Existem mais de 35 mil alunos na UCLA, quer que eu
acredite nisso?
— Por isso que eu falei em muitas, não em todas — rebati. —
Você foi dar o fora logo na Tiffany, a cheerleader mais famosa da
UCLA.
— Não me importo com o que dizem sobre mim —
argumentou, parecendo sincero, e eu o invejei naquele momento.
— É virgem?
Seus olhos se arregalaram pela minha pergunta direta demais
ter sido feita de uma forma tão indiscreta.
— Isso não é algo que interessa a você — respondeu, não
demonstrando se era ou não virgem. — Só não estou na vibe de ter
qualquer tipo de relacionamento agora.
Vibe.
Poderia ser uma desculpa para um virgem, mas...
— O que ofereceram para você se ficasse comigo? —
perguntou, me impedindo de continuar minha investigação.
— Vou poder falar e ser ouvida em um dos nossos treinos —
revelei, o que não pareceu grande coisa para ele. — Nosso time de
vôlei não ganha um campeonato desde 2000 e nossa capitã é um
pouco teimosa quando se diz respeito a ouvir outras pessoas, então,
se eu puder ter a chance de dar ideias para a capitã e ser ouvida,
posso nos levar para o primeiro lugar de novo.
O vôlei era muito importante para mim, diferentemente do que
parecia significar para Maeve. Minha amiga não demonstrava levar
o esporte tão a sério como eu, vinha notando isso nos últimos
meses e não sabia o que fazer porque ela ainda ocupava a posição
mais importante, nos liderando.
— Parece estar confiante.
— Sou uma ótima jogadora, sabia?
— Não — respondeu de forma bem sincera, me causando um
certo choque. — Eu não assisto aos jogos.
A vida dele parecia ser bem tediosa.
— Deveria assistir! É uma forma de prestar apoio aos esportes
universitários.
— Existem muitas pessoas que apoiam no meu lugar. Lembra?
Mais de 35 mil alunos...
Aquela parecia ser a forma dele de fazer uma gracinha.
— Veio para a festa sozinho? — perguntei, querendo matar o
tempo e a minha curiosidade. — Acho que nunca te vi em uma festa
da universidade antes.
— Nunca me viu mesmo, eu não gosto desses lugares. — Ao
ver meu semblante confuso, suspirou. — Um amigo implorou para
que eu viesse, ele precisava fazer as pazes com uma amiga.
— E deixou você sozinho?
— Parece que ele fez as pazes com ela. — Isso explicava
muito sobre sua situação. — Nossos dez minutos já passaram —
avisou, desencostando-se da parede. — Vou descer primeiro.
Levantei-me e novamente estendi minha mão para ele.
— Obrigada por me ajudar — agradeci. Podia não ser
importante para ele, mas para a minha situação, era muito. — Não
irei me esquecer da sua ajuda.
— Não pode. — Ele concordou e, de bom grado, apertou a sua
mão na minha, causando um formigamento estranho na minha
palma. — Ficou me devendo um favor.
— Lembre-se do meu trio de vantagens quando precisar de
algo — reforcei, afastando nossas mãos.
— Ok.
Eu dei espaço para que seguisse e observei Trevor sair pela
porta do quarto do meu irmão, provavelmente a caminho do seu
dormitório depois de ter a experiência mais louca do seu ano e
talvez até mesmo da sua vida naquela festa.
Todas essas vozes, todas essas escolhas
Eu não as ouço mais
Não as ouço mais
BIGGER THAN ME – LOUIS TOMLINSON
TREVOR LANCASTER
— Você ficou com Caitlin Howard?!
Foi a primeira coisa que Christopher sinalizou quando entrei no
dormitório ao fim daquele dia.
— O quê? — perguntei, sem entender como ele sabia de uma
informação tão falsa daquela.
Meu irmão deu de ombros, largando a história em quadrinhos
da vez em cima da sua cama.
— É o que estão dizendo — explicou em sinais. — Até eu
estou sabendo, era o assunto do momento na biblioteca.
Pela curiosidade brilhando no seu rosto, eu não conseguiria
escapar das suas perguntas. Por isso, larguei a minha mochila em
cima da minha cama e me aproximei de Christopher, me sentando
ao seu lado.
— Pensei que a biblioteca era um lugar para estudar, não para
fofocar — comentei, pegando o saco de balas de goma ao seu lado.
— Também pensei que havia parado com os doces.
Observei sua resposta, colocando uma das balinhas na boca.
— Eu tentei, mas você sabe que doce sempre me acalma.
Assenti.
— Só se cuida, ok? Não é porque é saudável que não pode
ficar doente de uma hora para a outra.
Ele sorriu fraco.
— Está parecendo a mamãe. — Sinalizou. — Devo me
preocupar?
— Por falar na mamãe, ela já fez a ligação de toda segunda?
— Não, logo ela deve fazer — respondeu, e meu deu um tapa
no ombro antes de voltar a sinalizar. — Por que está desviando do
assunto? Quero saber dessa história direito. Bem que eu percebi
que, para alguém que diz odiar festas, você voltou tarde ontem.
Suspirei. Ele não iria desistir mesmo.
— Eu não fiquei com ela. Satisfeito?
— Então, por que estão dizendo que ficou?
— É complicado... — Meu irmão me olhou com aquela cara de
quem tinha o tempo todo do mundo para ouvir. — Ela estava
participando de uma aposta.
Christopher ficou confuso.
— Parece que eles adoram mexer com quem está quieto —
falei, lembrando do que Caitlin havia me dito na noite anterior. — Ela
me contou da aposta porque sabia que perderia.
— Qual era a aposta?
— Se ela ficasse comigo, ganharia a chance de ser ouvida no
time de vôlei pela capitã. E nem me pergunte o que isso significa
porque eu não faço ideia do que seja.
— Mas você não ficou com ela. — As suas mãos pararam no
ar, tão confuso com a história que o impossibilitou de processar o
óbvio.
— Caitlin e eu fizemos um acordo. Subiríamos para um dos
quartos e deixaríamos que pensassem que ficamos, assim, ela
ganharia a aposta.
— Por que fez isso? Pensei que não gostasse dela.
— Não é só dela, eu não gosto de todo o grupinho e você sabe
os motivos. Eles não são nada agradáveis.
— Então, por que a ajudou?
— Porque ela disse que eu podia contar com ela. Em um
primeiro momento, isso não me pareceu nada atrativo e estava
pronto para recusar, mas, depois de pensar melhor..., me perguntei
que mal teria ter Caitlin Howard me devendo alguma coisa.
Claro que meu irmão não entendeu o que eu quis dizer.
— Ela foi bem convincente no trio de vantagens dela —
lembrei. — Popularidade, dinheiro e influência.
— E desde quando as coisas que você mais odeia viraram
vantagens para você fazer um acordo com ela? — Ele sinalizou tão
rápido que quase não tive tempo de acompanhar.
Dei de ombros.
— Nunca se sabe o que irá acontecer no dia seguinte. — Eu
dei um tapinha em seu joelho. — Já jantou? Podíamos ir para o...
Meu telefone tocou no exato momento em que eu estava
fazendo a proposta de jantar no restaurante perto do nosso prédio.
Peguei o celular e sorri ao ver o rostinho da minha mãe na tela.
— Achei que não nos ligaria — falei assim que atendi à
ligação. — Como você está, mãe?
— Acham mesmo que eu perderia a oportunidade de falar com
as minhas crianças? Eu estou bem, só cansada — disse, alisando o
pescoço do outro lado da tela. — E vocês? Estão se cuidando?
Comendo direitinho? Estudando bem?
— Nada mudou desde a semana passada, mãe — respondi a
ela, provocando pela sua superproteção.
Ela percebeu e revirou os olhinhos castanhos.
— Uma mãe sempre se preocupa com os filhos,
principalmente se eles estiverem longe.
Nossa mãe olhou para Christopher e sorriu.
— E você, filho? Fez algo diferente de trabalhar, estudar e
dormir?
Meu irmão levantou as mãos e sinalizou em frente à câmera:
— Achei novos sabores de balas de goma.
Eu ri, o abraçando de lado e deitando sua cabeça no meu peito
para que conseguisse alcançar seus cabelos e bagunçá-los.
— Nenhuma garota? Já não acham que está na hora de vocês
me darem uma nora? Sofro sendo a única mulher nessa família. —
Ela dramatizou, e eu soltei Christopher para que ele respondesse.
— Quem tem mais chances de arrumar uma namorada é o
Trevor. — Ele sorriu de lado. — Ninguém quer namorar com um
garoto mudo.
Levou meio segundo para que eu processasse aquilo e
controlasse a minha irritação diante do assunto. Senti o olhar da
minha mãe queimar a minha pele do outro lado da tela e respirei
fundo, colocando minha mão nas costas de Christopher e dando
alguns tapinhas.
— Deixa de falar bobagem! Existem milhares de garotas neste
campus que podem se apaixonar por você.
— Deve ser por isso que tem uma fila delas nos olhando —
retrucou, com um olhar divertido. — Ops, não, essa fila é para você.
Revirei os meus olhos. Essa fila nem existia, mas óbvio que
ele estava me zombando por conta de Tiffany e agora Caitlin.
— Filho, sei que pode ser difícil encontrar alguém que se
comunique com você, mas não pense dessa forma tão insegura. —
Mamãe cortou qualquer coisa que eu fosse falar. — Você é lindo,
gentil e melhor do que muita gente nesse mundo.
— Muito melhor do que eu — completei. — Você sabe que é.
— Por que estamos falando sobre isso mesmo? — Ele
sinalizou, fingindo que tudo estava bem, quando o seu coração
estava quebrado por tudo o que a falta da sua voz havia feito com
ele durante os últimos dez anos. — Mãe, no próximo mês iremos
para São Francisco. Espero chegar e ter uma mesa cheia de
brownies me esperando.
Minha mãe riu do pedido óbvio de meu irmão.
— Com o tanto que você come e o tanto que é sedentário, não
entendo como consegue ser magro — provocou. — Se eu não
estiver cansada, vai ter a mesa cheia de brownies.
— O que aconteceu com o tanto que nos ama? — Ele
devolveu, levando a nossa mãe a rir.
Apoiei o celular na cabeceira da cama, bem em frente ao
Christopher, e acenei para minha mãe.
— Preciso tomar um banho, mas vocês deveriam ficar
conversando — falei, me levantando. — Desde que o assunto não
seja eu.
— Como se você estivesse fazendo muita coisa para ser o
assunto da nossa conversa. — Mamãe retrucou. — Se cuida, ok? A
mamãe ama você.
— Também amo você, mãe.
O motivo mais forte de deixar que eles conversassem sozinhos
era porque eu sabia o quanto meu irmão precisava de outra
companhia que não fosse a minha de vez em quando, mesmo que
sua única alternativa fosse a nossa mãe.
Não era fácil ser ele.
Mas não queria que ele levasse essas dificuldades como
prioridade em sua vida. Queria que vivesse, independentemente das
suas circunstâncias, não que ficasse preso naquela biblioteca onde
havia arrumado emprego a maior parte do dia, como se fosse a sua
casa.
Cada vez ele se isolava mais e isso me preocupava.
Christopher não era muito de falar sobre os seus sentimentos,
sabia disfarçar muito bem e, principalmente, esconder muitas coisas
de mim. Foi assim que ele conseguiu esconder por alguns meses o
bullying que sofria na nossa primeira escola, até que um dia
apareceu todo machucado, sem ter como esconder que eram
marcas de covardes filhos da puta que haviam batido nele por pura
maldade.
Era por isso que ele não fazia questão de tentar ter amigos e
de ficar visível naquele campus.
Era por isso que eu o preferia a qualquer outra pessoa naquele
lugar.
Não era idiota e, por mais que já estivéssemos na faculdade,
era sempre diferente a forma como me olhavam e o olhavam. As
pessoas podiam não soltar uma palavra diretamente a ele, mas um
olhar bastava para que você entendesse que era o peixinho com
defeito no meio de um cardume tecnicamente perfeito.
Era ridículo.
Peguei a minha roupa e fui para o banho, deixando os dois no
quarto conversando.
Enquanto me banhava, pensei na noite anterior e quais seriam
as consequências de toda aquela fofoca que estava se espalhando
pelo campus. Havia sido inocente ao pensar que aquilo seria
deixado de lado, me esquecendo completamente de que Caitlin
Howard fazia parte da elite da UCLA.
Dificilmente algo sobre ela passaria despercebido.
Começava a me arrepender amargamente de ter concordado
com o acordo que fizemos. Odiava ser o centro das atenções,
preferia ficar nas sombras, estudando e me concentrando em todo o
futuro que ainda tinha que trilhar com meus próprios pés, sem ajuda
da mamãe para isso, bem diferente de muitos naquele campus.
Afinal, no que as três vantagens de Caitlin poderiam me
ajudar? Como meu irmão disse, era tudo o que eu odiava.
Eu mataria Jasper Lewis.
Se não fosse por ele, eu não teria ido àquela festa e não
estaria nessa situação agora.
CAITLIN HOWARD
Podíamos dizer que quando se tratava de jogar, eu era a
melhor.
Não importava a hora ou a situação, eu daria sempre a melhor
versão de mim em uma quadra de vôlei. O meu grande problema
era a minha amiga, que ultimamente vinha sacando terrivelmente
mal.
— É melhor darmos uma pausa. — O treinador Anderson
falou, depois de soprar o apito. — A forma como estamos treinando
não irá nos levar para a final desse campeonato. Vocês sabem
disso, né?
E aquele era o jeito amistoso dele de começar a nos cobrar.
— Maeve, dos dez saques que você faz, oito estão péssimos.
Como espera continuar com uma posição tão boa assim, se não
está se esforçando o bastante? — Ele perguntou, aproximando-se
da minha amiga. — Você precisa ter foco.
— Sim, treinador! Me desculpa, eu vou tentar melhorar...
— Não se trata de tentar, e sim de conseguir. — Ele rebateu, e
seus olhos caíram em mim, que estava bem ao lado de Maeve. —
Ou, então, terei que colocar você no banco e deixar que Caitlin
assuma a função de ser capitã desse time.
— Vou fazer o meu melhor, treinador. — Maeve garantiu.
E eu consegui sentir a raiva dela dali. Ela odiava ser criticada,
principalmente quando Anderson fazia o favor de nos colocar uma
contra a outra. Maeve sabia que eu era a melhor, mas nunca
poderia admitir isso em voz alta porque afetava diretamente o seu
orgulho.
— Caitlin, você precisa acelerar a sua passada. Percebi que
está perdendo muito tempo de bola e isso é um problema — avisou,
e eu assenti, já sabendo quando testei algumas vezes que
precisava melhorar. — Aurora, seus ataques estão muito atrasados
no centro, então melhore sua agilidade.
A minha amiga assentiu.
O treinador passou por Cindy, Jocelyn e Lilian, apontando para
cada uma o que deveriam melhorar e, assim que terminou, se
sentou de frente para a quadra e suspirou.
— Sei o quanto querem ganhar, é por isso que estou sendo
duro — disse, abrindo sua garrafa de água. — Os jogos começam
em duas semanas e temos tudo para irmos até as oitavas de finais
se melhorarem um pouco mais. O que acham que vão dizer se mais
uma vez perdermos? Sabem o quanto é ridículo eu ter que lidar com
piadinhas machistas de outros técnicos? Que os garotos são
melhores do que vocês? É ridículo porque eu sei que vocês têm
potencial.
— Vamos melhorar, treinador. — Eu garanti. — Nós vamos
vencer!
Ele sorriu e assentiu.
— Por hoje, é melhor pararmos por aqui. Vejo vocês amanhã
cedo, ok? Vamos focar nas melhorias que falei para cada uma.
Anderson saiu e, assim, as meninas e eu conseguimos respirar
um pouco mais aliviadas.
— Ele está certo. — Quebrei o silêncio que se instaurou no
lugar. — Precisamos dar o nosso melhor.
— Você ainda é a melhor entre nós, Caitlin. — Cindy disse.
Não parecia estar com inveja, mas sim constatando algo.
— Um time não é composto só por uma jogadora boa, mas por
todas. — Eu as lembrei do que o treinador sempre nos falava. —
Vamos melhorar, ok?
Elas assentiram e foram as primeiras a ir para o vestiário,
deixando-me com minhas amigas na quadra.
— Pensei que cobraria o seu prêmio da aposta de domingo. —
Maeve comentou, agora que estávamos sozinhas com Aurora. —
Mesmo que ainda seja estranho para mim que você tenha
conseguido ficar com o Trevor.
Ela estava muito desconfiada porque não havia visto nada
além de Trevor me levando para o segundo andar da casa.
— Por que é tão difícil para você acreditar nisso? — perguntei,
me virando para ela. — Nós fomos para o andar de cima para ter
mais privacidade e aconteceu.
— Todos que estavam naquela festa viram. — Aurora falou,
não sabendo nada da verdade. — Inclusive, ouvi sobre isso na
minha aula. A professora teve até que chamar atenção.
Sorri para a minha amiga.
— Viu? Não precisa ver para acreditar. — Mentir era tão
natural para mim, que era difícil para alguém perceber que eu
estava fazendo isso no momento. — Sobre o meu prêmio... Fica
tranquila, vai chegar a hora em que irei usá-lo.
Maeve não parecia contente, mas eu não dei atenção e enlacei
meus braços nos delas para seguirmos até o vestiário. Eu sabia
lidar muito bem com aquela nervosinha.
— É verdade que ficou com aquele nerd que não quis sair com
a Tiffany, Caitlin? — Jocelyn perguntou assim que entramos. —
Muitos estão falando sobre isso.
— Eu vi com os meus próprios olhos os dois indo para o andar
de cima de mãos dadas. — Lilian falou, e me olhou estampando um
sorrisinho malicioso nos lábios. — Pelo tempo, deram apenas
beijos, né?
Eu prendi o riso, abrindo meu armário e tirando de lá minhas
roupas junto à minha mochila. Não iria tomar banho ali, preferia ir
para o meu dormitório e cuidar da minha higiene por lá.
— Já estava pensando que Trevor era anormal. — Cindy
comentou com todas. — Ele recusou a Tiffany, e aquela garota é
linda! Pelo que soube, ficou bem magoada com o não dele.
— Ela gostava tanto dele assim? Eles se conheciam há muito
tempo para isso?
— Sim, parece que eles passaram um semestre inteiro
fazendo um trabalho juntos. — Cindy respondeu. — Por quê? Está
com ciúmes, Caitlin?
— Não diga bobagem! — Ri fraco. — Eu só não sou muito
atenta à vida dos outros.
Soou quase como uma repreensão por elas estarem tão
curiosas sobre coisas que não lhes diziam respeito e isso fez Aurora
sorrir do meu lado.
— De qualquer forma, ele só queria a garota mais bonita da
faculdade e quem pode julgá-lo? — Jocelyn argumentou, me
deixando um pouco sem graça. — Sinto um pouquinho de inveja por
você poder ter o homem que quiser, Caitlin.
— Não é bem assim — rebati, fechando a porta do meu
armário depois de juntar as minhas coisas. — Trevor e eu... Apenas
aconteceu.
— Desde quando o nerd se tornou popular? Ele nem é tão
bonito assim. — Maeve disse. E eu não podia nem concordar com
ela porque o havia achado incrivelmente bonito pessoalmente.
— Não diga loucuras, Maeve. — Jocelyn murmurou. — Ele é
bonitinho, sim, e olha que acho feio óculos de grau em homens.
Observei Aurora pegar suas coisas e fechar seu armário.
— Vamos? — Ela convidou.
Eu assenti.
— Aurora e eu vamos indo para o nosso dormitório — avisei a
elas. — Vejo vocês amanhã.
— Festa amanhã com o time de basquete! — Maeve gritou
antes de sairmos. — Não se esqueçam!
Apenas levantamos nossas mãos em sincronia para cima,
fazendo um certinho com o polegar.
— Você parecia um pouco desconfortável com o assunto lá
dentro. Aconteceu alguma coisa? — Aurora perguntou alguns
momentos depois.
Neguei.
— Estou preocupada com o jogo, não com a fofoca de ter
ficado com o Trevor. — Eu esclareci a verdade, apesar de não ter
sido totalmente o vôlei que me deixou desconfortável naquela hora.
— Precisamos ganhar esse campeonato, Aurora.
— Nós vamos! Temos você, ok?
Sorri, entrelaçando meu braço com o dela.
Não é o suficiente.
Simplesmente odiava que esperassem tudo de mim, como se
eu fosse a verdadeira super-heroína delas quando não sabia nem
me defender direito.
TREVOR LANCASTER
Eu dei uma gargalhada sincera ao passar mais uma vez de
Christopher no jogo de corrida chamado Gran Turismo. O meu irmão
podia conhecer todas as minhas artimanhas, mas eu ainda
conseguia passá-lo facilmente.
Ele jogou o controle na cama e cruzou os braços de forma
emburrada, olhando com tanto ódio para a televisão que só
aumentou a minha crise de riso.
— Você tem que superar que não é bom em corridas, maninho
— provoquei o garoto, só para ser empurrado com uma tremenda
força para alguém que não andava praticando exercício
ultimamente. — Ei! Sem machucar o seu amado irmão!
— Você é péssimo! — Ele sinalizou, voltando a se sentar ao
meu lado. — Não quero mais jogar com você.
— E o que vai fazer?
— Vou jogar Resident Evil — referiu-se ao seu jogo favorito. —
Sou muito melhor matando monstros do que atrás de um volante.
— Nisso, nós temos que concordar. — Afinal, foi ele que me
deu várias dicas nas fases difíceis de passar em The Last Of Us. —
E como estão as aulas? Tudo certo?
Ele estranhou a pergunta em um primeiro momento, até que
chegou a uma conclusão sozinho e seu rosto se iluminou.
— Ninguém está implicando comigo. Não estamos mais na
escola, Trevor, pode parar de se preocupar.
A minha maior preocupação era que ele sofresse novamente
por conta de preconceito de pessoas idiotas.
Sabia que não estávamos mais na escola, mas só eu sabia o
que havia passado na época em que éramos adolescentes.
Tratavam o meu irmão como se fosse opção ele ser daquela forma,
zombavam em sinais obscenos com as mãos e aproveitavam da
sua boa audição para humilhá-lo. Nós mudamos tanto de escola na
época até finalmente encontrarmos uma em que Christopher não
era destratado pelos alunos.
— Eu sei — murmurei. — Mas quero que me conte tudo, ok?
Me preocupo com você.
— Deveria se preocupar com o que estão falando sobre você e
Caitlin. — Sinalizou. — Não é engraçado você odiar atenção e estar
recebendo exatamente isso?
Eu bati na sua nuca só por causa do desaforo.
— Desaforado!
Christopher riu.
— Estão até dizendo que vocês estão namorando.
— Não me importo com isso. — Fui sincero. — Logo, eles irão
ver que é mentira e me esquecer porque eu não sou destaque, ok?
Caitlin, Tiffany, Maeve e toda aquela gente é quem são.
— Às vezes, me pergunto se eles são tudo o que a gente acha
que são, sabe? Só temos certeza de que são ricos.
— Caitlin apostou que ficaria comigo com a amiga. Ou
esqueceu desse detalhe importante?
Também havia tudo sobre eles nas redes sociais. Vídeos em
que estavam em festas, curtindo como se não houvesse o amanhã,
fotos exaltando o dinheiro que tinham em passeios luxuosos e toda
a soberba que passavam diante de todas as pessoas que cruzavam
os seus caminhos.
— Mas ela contou para você sobre a aposta. Isso não a torna
uma idiota como a amiga.
— Ela só contou porque sabia que, assim como Tiffany, não
teria chance.
— Se não fosse seu jeito antissocial, diria que está parecendo
aqueles galãs de filmes que podem escolher quem quiserem com
essa pose de arrogante.
Eu balancei a cabeça. Aquilo era ridículo.
— Só quero ficar quietinho no meu canto com minhas
pesquisas, meus estudos, meus videogames, animes e o meu irmão
querido. — Eu baguncei os seus cabelos, e ele me deu um tapa
para que parasse. — Prefiro isso.
— Precisa arrumar uma namorada, isso sim! E me deixar em
paz.
— Deixar você em paz? Nunca!
Ele revirou os olhos e deu risada quando comecei a me
aproximar dele.
— Nem tente isso!
— Vai continuar com essa ideia de que tenho que te deixar em
paz?
Christopher assentiu, e eu parti para cima dele, começando o
meu ataque de cosquinhas que sabia o tanto que ele odiava. O meu
irmão se debatia debaixo de mim e me estapeava, tentando a todo
custo escapar de mim. Só parei quando vi as lágrimas querendo
escapar do canto dos seus olhos.
Ele respirou fundo diversas vezes e sinalizou rapidamente:
— Idiota!
Eu ri, voltando a me sentar do lado dele.
— Ainda está pesquisando sobre o nosso passado? —
perguntou um momento depois, meio inseguro em tocar nesse
assunto.
Era difícil eu contar alguma coisa sobre aquilo para
Christopher porque sabia que ele odiava a minha dedicação em
achar o cara que havia matado o nosso pai.
— Deveria parar. Isso não vai levar você a lugar nenhum e nós
sabemos disso. — Sinalizou com calma. Ele parecia procurar as
palavras certas para dizer. — Não saiu com a Tiffany por causa
disso, né?
— Não saí com a Tiffany porque não estava interessado.
— Desse jeito, vai voltar a ser virgem!
— Falou quem nunca perdeu a virgindade... — devolvi no
mesmo tom divertido que ele.
Meu irmão ficou vermelho na hora.
— Estamos falando sobre você. — Apontou para mim. — Você
precisa viver, irmão.
Virei-me para ele.
— Vamos fazer um trato? Eu começo a viver quando você
também começar.
Christopher soltou um suspiro.
— Eu desisto de você por hoje. — Olhou para a televisão. —
Vou mudar de jogo, ok?
— Não sabe me vencer mesmo — provoquei, e recebi uma
almofadada na cara. — Também amo você, maninho.
CAITLIN HOWARD
Eu topo viver essa mentirinha com você?
Que tipo de merda eu tinha na cabeça? E nem podia colocar a
culpa na bebida porque a lata de cerveja que havia bebido não era
suficiente para me deixar sem raciocínio.
Eu inventei qualquer desculpa para os meus amigos sobre a
minha ausência na festa daquela noite e fui direto para o meu
dormitório depois de trocar números de telefone com Trevor para
continuarmos os acertos daquele acordo estranho.
Dormi um pouco mais de quatro horas por ficar muito tempo
pensando na lógica que havia me levado a aceitar aquilo, mas
obviamente não cheguei à conclusão nenhuma. Parecia que quanto
mais eu tentava escapar, mais as mentiras me perseguiam e, de
uma forma doentia, me via me enrolando cada vez mais nelas.
— Aonde vai tão cedo? — Aurora perguntou, ainda sonolenta
em sua cama.
Fiquei surpresa por acordar naquela manhã e ela estar ali, e
não no quarto do meu irmão.
— E você? Brigou com o meu irmão? — Dessa vez eu
perguntei, não deixei passar como da última.
— Provavelmente vamos brigar por eu não ter ido para o
quarto dele depois da festa de ontem — revelou, me lançando um
sorriso parcial. — Não temos treino hoje, né?
Aurora olhou para a minha blusinha solta preta e o meu short
jeans-claro, até descer para o meu par de Vans.
— Não. — Ela negou para si mesma. — Você não está vestida
para um treino.
— Por que não volta a dormir? Irei tomar um café para fazer
aqueles trabalhos com os livros — menti, pois estava a caminho de
ir me encontrar com o meu namorado de mentirinha. — Vejo você
no almoço?
Aurora assentiu, ainda muito sonolenta para desconfiar de
qualquer coisa.
— Não, espera... — pediu, soltando um bocejo. — Lembrei
que eu vou passar o dia com o Melvin.
— Tudo bem — respondi, caminhando até a porta. — Até mais
tarde, dorminhoca.
Ela apenas soltou um suspiro, com os olhos já fechados. Eu ri
fraco e saí do meu quarto antes que a acordasse de vez.
Havia combinado de encontrar com o Trevor às nove horas na
cafeteria próxima à biblioteca onde o seu irmão trabalhava, então,
se não acelerasse os meus passos, chegaria uns cinco minutos
atrasada.
Durante o caminho, eu voltei a pensar no semblante meio triste
de Aurora e fiz mentalmente uma nota de ter uma conversa séria
com o meu irmão de novo.
De todos os meus amigos, Aurora era a que mais me
preocupava. Ela era minha melhor amiga e minha cunhada. Nós
havíamos nos conhecido na escola assim que ela começou a
namorar o meu irmão e consequentemente se aproximou do nosso
grupinho.
De longe, ela era a que menos se enquadrava nele.
Aurora era uma pessoa boa, verdadeira demais para a
maldade dentro das mentiras, para as brincadeiras de mau gosto
ridículas que fazíamos e perfeita demais até para o meu irmão. Não
era à toa que eles discutiam mais do que namoravam. E isso vinha
desde o ensino médio e era difícil de entender por que ainda
continuavam.
Ou não.
Tudo bem.
Eu admitia que meu irmão tinha uma forte obsessão pela
Aurora e pelo relacionamento deles. Por mais que eu já tivesse
discutido inúmeras vezes a respeito disso, ele não conseguia largá-
la e pelo visto, ela tampouco dele.
Era algo tão tóxico quanto o ar poluído daquela cidade.
Eu encontrei Trevor sentado a uma mesa no canto da cafeteria
assim que entrei e fui ao seu encontro, notando como naquele
domingo o lugar estava vazio.
— Bom dia, namorado — cumprimentei, brincando com a
nossa nova realidade agora e me sentando à sua frente. — Você
trouxe um caderno?
Eu estava confusa ao ver aquilo junto a um estojo de canetas
ao lado. Ele virou o caderno para mim, fazendo com que eu lesse as
palavras “CONTRATO DE NAMORO” como título e mais abaixo, o
meu nome e o seu introduzidos no meio de um texto tão formal que
me lembrava o motivo de não gostar de Direito.
— Um contrato?
— Nós precisamos seguir algumas cláusulas para que não
aconteça nada de errado — explicou, virando o caderno para si. —
Serão as nossas leis.
Eu arqueei as sobrancelhas, tentando segurar a risada
daquela situação. Ele era mesmo um nerd, afinal. Conseguia ser um
pouco mais perceptível ao abaixar a cabeça e começar a escrever
algumas palavras naquele papel como se fosse um documento
oficial.
— E o que poderia dar errado? — perguntei com curiosidade.
— Nós nos apaixonarmos. — Ele revelou com tamanha
sinceridade que me surpreendeu.
Dessa vez, eu não consegui controlar a minha risada, o
fazendo levantar o rosto e me olhar.
— Por que está rindo?
— Isso que você falou é loucura!
— Já assistiu Esposa de Mentirinha? — Eu neguei à sua
pergunta, sem saber do que ele estava falando. — Para Todos os
Garotos que Já Amei? — Ele parecia estar falando em outra língua
e pareceu perceber isso. — Nem A Proposta?
— Isso é filme ou série?
Ele revirou os olhos atrás dos óculos e o que era para ser uma
pose muito mal-educada, o deixou incrivelmente fofo.
— Preciso de cafeína para continuar a falar com uma
alienígena como você. — Eu notei o tom brincalhão na sua voz e
soube que nos daríamos muito bem a partir dali. — O que você vai
querer?
— Suco e panquecas, por favor. — Ele arqueou as
sobrancelhas e, mesmo não o conhecendo, notei o julgamento no
seu semblante. — O que foi?
— Estamos em uma cafeteria e você vai tomar suco?
— Eu não tomo café — expliquei. — Não faça essa cara de
quem viu um fantasma.
— Você é mesmo uma alienígena. — Ele murmurou e se
levantou. — Vou fazer os nossos pedidos.
Eu ri, assentindo.
Como a cafeteria só tinha mais dois clientes e que já estavam
desfrutando do café da manhã, Trevor foi rapidamente atendido e,
após fazer os nossos pedidos, voltou para o seu lugar.
— Só para deixar claro, eu não sou uma alienígena, mas
acredito muito na existência deles.
Não sabia por que revelei aquilo, quando toda vez que eu dizia
sobre a minha teoria forte de que existia vida em Marte era motivo
de piada para os meus amigos. Mas o garoto à minha frente apenas
me encarou surpreso.
— Sério?
Assenti.
— Temos algo em comum, então.
— Você também acredita?
— Eu faço até parte de comunidades — confessou, nenhum
pouco envergonhado disso.
— Eu também! — Mais uma vez, eu o surpreendi. — Ninguém
nesse campus poderia saber que sou eu, no entanto, porque uso
um ID ruim.
— Qual?
— Grey_5698 — falei, o fazendo rir. — O que foi?
— Não acredito que você é a pessoa por detrás de todos os
textos cheios de fundamentos da existência de Greys.
Então, ele me conhecia?
— Você faz parte da mesma comunidade que eu.
— Sério? Qual é o seu ID? Já publicou por lá?
— Abduzido por um Grey — disse. — Tudo junto.
Não podia acreditar que era ele!
— Ei! Você iniciou um debate em um dos meus textos sobre os
Greys serem ou não malignos. — Eu lembrava perfeitamente disso.
— O meu texto ficou em destaque por conta da quantidade de
comentários.
Ele assentiu, parecendo orgulhoso do seu trabalho.
— Eu gostei do seu texto apontando os fatos que tornam
Greys malignos e quando vi que tinha comentários idiotas e sem
fundamentos sobre uma bondade que nunca foi apontada, tive que
trazer a minha opinião à tona.
Eu estava desacreditada que era ele.
— Eu gostei de não me sentir louca com minha defesa —
comentei. — É bom conhecer o rosto por detrás daquele ID.
— Nunca poderia imaginar que fosse você. — Ele admitiu.
— Acho que todas as pessoas desta universidade que estão
naquela comunidade não sonham que sou eu, então mantenha isso
em segredo, viu?
— Por quê? Não quer que conheçam esse seu lado...
peculiar?
— Digamos que seja isso. — Eu apontei para o caderno. —
Vamos nos concentrar nisso aqui porque parece longe de ter um
fim.
Os nossos pedidos foram entregues bem na hora, e eu
agradeci à garçonete antes de começar a devorar minhas
panquecas.
— Vamos estabelecer as cláusulas — pediu, levando a xícara
de café à boca. Eu percebi que não havia pedido nada para comer e
estranhei. — Primeiro, seria prudente se caso um de nós
começasse a sentir algo pelo outro, fosse sincero para que
acabássemos antes que uma mágoa maior surgisse.
Assenti, concordando com ele.
— Você não vai comer nada?
— Não como pela manhã — respondeu, anotando algo no
caderno. — Segundo, sem beijos.
Eu arqueei as sobrancelhas. Como assim eu não poderia me
aproveitar desse relacionamento falso para dar uns beijos nele?
— E quem vai acreditar que estamos namorando se não nos
beijarmos uma vez em público?
Os seus olhos se arregalaram.
— Nem se eu tivesse uma namorada de verdade, iria beijá-la
em público — rebateu.
— Então, você é tímido?
— Sou reservado, é diferente — explicou. — Não precisamos
nos beijar para provar que estamos juntos. Dessa forma, também
não envolvemos o nosso coração nessa brincadeira.
Eu engoli um pedaço de panqueca e tomei um pouco do meu
suco, só para depois apontar o meu garfo em sua direção, sem
esconder minha cara de ofendida.
— Acha que eu me apaixono com um beijo?
Ele negou.
— Mas se você abaixar esse garfo, eu vou ficar um pouco
mais tranquilo — zombou, e eu abaixei, voltando a comer minha
amada panqueca. — Não acho que você ou eu nos apaixonaríamos
com um beijo, mas com certeza eles ajudariam.
— Então, como espera que as pessoas tenham certeza sobre
nós? Os meus amigos ficariam confusos em nos ver sem
demonstrar qualquer afeto.
— Andar juntos e de mãos dadas me parece o suficiente. —
Ele revelou a sua ideia, anotando-a no caderno. — No primeiro mês,
nos encontramos todas as manhãs para tomar café, assim, eu te
acompanho até o seu prédio e sigo para o meu. Não parece o
bastante para que as pessoas acreditem?
Pensei um pouco. Realmente, aquilo fazia sentido.
— Ótimo! — disse depois que concordei. — Nós nos vermos
esses minutos pela manhã e todos os dias já é suficiente. Não quero
fazer parte do seu mundo e acredito que você também não queira
fazer parte do meu.
Como alguém podia ser tão introvertido? Era óbvio que ele
realmente estava fazendo aquilo para receber paz das investidas de
Tiffany, sem querer nenhum pouco da minha popularidade para si.
— Sabe que ainda assim vão falar sobre você, né? —
indaguei, tomando o restinho do meu suco.
— É claro que sei. — Ele não disfarçou a careta. — Eu sou o
namorado de Caitlin Howard. É por isso que, pelo máximo de tempo
que seremos os alvos deles, melhor será.
— Pensei que não gostasse da popularidade.
— Antes ela do que ser alvo de Tiffany.
— Você... — Não. Ele não deveria ser gay porque havia
acabado de estabelecer cláusulas para não nos apaixonarmos, no
plural. Mas e se fosse só para mim? — Você é gay?
Ele quase cuspiu o café.
— Não! Por quê?
Eu dei de ombros.
— É difícil um nerd como você ser alvo de garotas. Qualquer
garoto aproveitaria essa chance com a Tiffany.
— Garotos idiotas, você quer dizer — corrigiu. — Dos mesmos
criadores de “garotos que saem apostando de brincar com a vida
alheia”.
Ai, essa doeu!
— Ei! Eu contei para você sobre a aposta.
— E quantas vezes você não contou e magoou as pessoas?
— Eu engoli em seco porque aquilo era mesmo uma realidade do
meu passado. — É exatamente por isso que eu não dou nenhuma
chance.
— Qual é a outra regra? — Mudei de assunto, apontando para
o contrato.
— Não quero ficar perto dos seus amigos — falou, me
deixando surpresa. — Acho eles uns idiotas.
— Eu sou amiga deles!
— Isso mesmo. — Sorriu. — Você é amiga, eu não.
Oras.
Ele era um pequeno idiota.
— Como espera que os convença, se você não sair para jantar
com a gente ao menos uma vez?
— Eu tenho quase certeza de que já ouvi seu irmão me
chamar de esquisito, então apenas dê a ele mais motivos para
alimentar essa definição que tem de mim.
Suspirei e cruzei os meus braços em frente ao corpo, já
prevendo que isso não daria certo.
— O que foi? É um relacionamento falso.
— Qual é a outra regra?
— O meu irmão vai saber que isso é uma mentirinha —
declarou. — Não se preocupe, ele não irá falar para ninguém.
Eu fiz uma careta.
— Que piada horrível!
— Se ele estivesse aqui, sinalizaria a mesma coisa —
comentou, anotando mais palavras naquelas linhas. — Com o
tempo, a gente se acostuma a fazer piadas das nossas dores.
Aquilo era a mais pura verdade, mas eu não concordei.
— Tem algo que queira que seja uma regra na nossa relação?
— Trevor perguntou, pronto para escrever mais.
Eu pensei um pouco sobre aquilo e algo surgiu na minha
mente rapidamente.
— Não iremos trair. — Eu deixei bem claro. — Não me importo
que seja um namoro de mentirinha, não iremos nos envolver com
outras pessoas.
— Nós já estamos fazendo isso para não nos envolvermos
com outras pessoas, espertinha — brincou, mas anotou o que eu
disse.
— Você pode até ter medo de mulher, mas ainda é homem —
lembrei. — Pode acordar um dia e deixar que o seu pau domine seu
corpo e sei muito bem que ele pararia no meio das pernas de
alguma garota antes que eu tivesse a chance de processar o chifre
de mentirinha.
Trevor não aguentou e gargalhou a ponto de colocar a mão
sobre a boca, escondendo o seu sorriso da minha visão, o que era
uma pena, pois gostaria de vê-lo melhor. Eu observei as covinhas
fofas que piscaram em cada lado da sua bochecha com a risada e
acabei sorrindo.
— O que foi?
Ele negou, balançando a cabeça e se recompondo aos
poucos.
— Achei que toda a elite era idiota, mas você é uma garota
engraçada e... intrigante — definiu, empurrando o caderno para
mim. — Assine aqui se não tiver mais nada para acrescentar, por
favor.
Eu olhei para a caligrafia bonita, vendo a forma como ele
enumerou cada uma das regras do nosso relacionamento. Era bem
parecido com um contrato. Eu assinei o papel, não acreditando
naquela loucura e passando para ele.
— Vai ser fácil não descumprir essas regras — comentei,
vendo-o guardar o caderno na mochila ao seu lado.
— Leis — corrigiu, voltando a me olhar. — Podemos chamá-
las de leis? Dá mais segurança de que nada irá sair do controle.
Eu dei de ombros.
— Podemos chamar do que quiser.
— Ótimo. — Levantou-se com a sua mochila e a colocou nas
costas. — Acho que a essa hora já tem muitas pessoas pelo
campus, o que acha de dar uma volta para nos conhecermos
melhor?
Ele estendeu a sua mão ao mesmo tempo em que eu franzi a
testa, confusa com o convite.
— Preciso, ao menos, conhecer um pouco sobre minha
namorada — explicou.
Certo. Fazia sentido.
Eu segurei a sua mão, pronta para encenar nos próximos dias
ao lado daquele garoto tão intrigante quanto eu.
Eu não posso voltar atrás o que está feito
Não podemos mudar
Quero passar mais tempo ao seu lado
TIME – THE ROSE
TREVOR LANCASTER
Podia parecer estranho, mas fazia mais de dois anos que eu
não segurava a mão de uma garota e principalmente andava na rua
juntos, como um casal de verdade.
Mas o mais estranho era sentir como se estivesse fazendo isso
de uma forma escandalosa por causa de todos os olhares que
atraíamos para nós enquanto andávamos em silêncio. Eu, com a
cabeça baixa e concentrado em meus passos, e Caitlin em uma
pose muito mais confiante e acostumada do que a minha, de cabeça
erguida e parecendo não se importar com as pessoas.
Tudo bem. Eu tinha inventado o namoro de mentirinha. Parecia
fazer sentido no começo, mas agora eu já não tinha mais tanta
certeza... Só que era tarde demais, não tinha como voltar atrás.
O campus não estava tão cheio porque era um fim de semana
e muita gente gostava de aproveitar para ir para casa, mas havia
uma boa quantidade de universitários por ali. Duvidava muito que os
da bolha de Caitlin não estivessem sendo um dos olhares, prontos
para fofocar sobre isso.
— Você parece muito desconfortável. — Caitlin disse ao meu
lado, apertando minha mão. — Quer que eu pare de segurar...?
— Não. — Eu a interrompi, entrelaçando nossos dedos de vez.
O seu olhar abaixou até nossas mãos e ela assentiu devagar. — Já
sabia que seria assim.
— Então..., vamos ignorar e nos conhecer melhor? Ou quando
isso chegar nos ouvidos dos meus amigos e eles me perguntarem
algo de você, não saberei nada — sugeriu, e eu concordei. —
Estuda mesmo Ciências Políticas?
— Sim — respondi. — Pretendo terminar o curso e começar
Direito.
— Quer ser advogado?
Eu assenti.
— E você? Pretende jogar profissionalmente?
— Sim. — Os seus olhos brilharam com a resposta. — É um
dos meus sonhos.
— Quantos sonhos você tem?
— Dois — respondeu. — Esse e jogar pelo meu país nas
Olimpíadas.
— É questão de tempo para você realizar cada um deles —
afirmei ao virarmos na rua que levava até o seu dormitório. —
Escutei por aí que você joga muito bem.
Ela parou de andar, me fazendo parar também.
— Pensei que não assistisse aos jogos. — Sorriu de forma
convencida. — Você sabe sobre mim.
Evitei revirar os meus olhos e ri fraco do seu semblante
esperançoso.
— Você esqueceu que, independentemente de ir ao jogo, ele é
sempre comentado em cada parte desse campus? — Eu a lembrei,
desmanchando seu sorriso. — Só ouvi, nunca assisti para ter
certeza.
Voltei a andar e, como Caitlin não fez menção de sair do lugar,
a puxei delicadamente para seguir os meus passos.
— Você chega a ser irritante, sabia? — A pergunta me pegou
um pouco de surpresa.
— Eu?
— Você — afirmou. — Não gosta de jogos, nem de festas,
nem de ser popular ou até mesmo de garotas... — Ela virou o rosto
levemente para o lado, como se fosse um cachorrinho ouvindo
atentamente seu dono. — Tem algo que você goste?
— E você é irritantemente curiosa, sabia? — provoquei, a
fazendo dar um meio sorriso. — Quem disse que não gosto de
garotas? Não ficar com alguém do campus não quer dizer que não
goste de garotas.
A minha resposta despertou mais a sua curiosidade, como
imaginei que faria.
— Então, não gosta das garotas daqui?
— Digamos que seja isso — respondi vagamente, de
propósito.
— Não me diga que é o tipo de cara que se acha bom demais
para os reles mortais da UCLA!
Não me senti ofendido com o seu palpite, o que eu sentia em
relação a muitas pessoas daquela universidade era isso mesmo. Ao
ver que o meu silêncio não era uma negativa, Caitlin revirou os
olhos.
— Viu só? Irritante! — disse, me fazendo dar risada.
— O caminho que quero seguir não é fácil e eu tenho uma
certa mania de querer ser o melhor em tudo que faço — expliquei a
ela o melhor que podia. — Quero me concentrar nos estudos a partir
de agora.
— Quem sou eu para julgar? Dou tudo de mim para ser a
melhor jogadora também — comentou. — Mas gosto de uma festa e
de me distrair de vez em quando.
— É por isso que aceitou ser minha namorada de mentirinha?
— Eu fui irônico na minha pergunta, e ela percebeu.
— Tudo bem, você tem um ponto — concordou. — Nos
próximos meses, preciso estar focada no vôlei e, para a minha
infelicidade, no curso de História.
— Por que escolheu História se não gosta do curso?
— Eu não gosto de estudar. — Riu da careta que eu fiz. — Os
seus ouvidos parecem estar prestes a sangrar.
— Por muito pouco isso não está acontecendo. — Fingi sentir
dor ao colocar a mão livre no meu ouvido. — Sinto uma dorzinha no
fundo dele.
— Não exagera! — Endireite-me com a sua resposta divertida,
voltando a olhá-la. — Eu sou uma jogadora, não deveria estar
surpreso. O único assunto que gosto de pesquisar é sobre
alienígenas.
— Por que não entrou no curso de Ciências?
— Você só pode ser maluco! Já viu o tanto que aquela gente
estuda?
Eu ri do seu pavor nem um pouco discreto.
— Acho que entendi perfeitamente o motivo agora.
Nem percebi que havíamos parado de caminhar e, pelo visto,
nem Caitlin porque apontou para a frente com nossas mãos ainda
juntas. Voltamos a andar com um silêncio confortável entre nós,
seguindo até o seu dormitório, onde eu a deixaria antes de ir para o
meu.
Eu não pude deixar de notar como a sua mão era menor do
que a minha enquanto a segurava, mesmo que fosse quase da
minha altura. Ela devia ter o quê? 1,80cm? Com certeza só havia
uns 5 centímetros de diferença entre nós.
Fiquei um pouco surpreso por Caitlin ser bem diferente do que
aparentava nas redes sociais e de como eu imaginava por apenas
ouvir sobre ela em uma conversa ou outra de grupinhos no campus.
Ela era divertida e sabia deixar uma relação confortável. Também
parecia esconder uma áurea misteriosa ao seu redor, que
impossibilitava de sabermos tudo sobre quem ela realmente era
com apenas um olhar ou um encontro.
Eu a observei por alguns segundos, aproveitando o tempo que
ela estava concentrada, olhando para o caminho à sua frente.
Aquele semblante fatal parecia ser característico seu.
Os fios loiros do seu cabelo pareciam mais cacheados naquela
manhã e a olhando mais de perto, eu conseguia notar cada detalhe
que nunca havia parado para prestar atenção.
Começando pelos olhos verdes. Eles realçavam muito a
beleza que ela tinha. Os cílios não eram muito longos e nem muito
cheios, mesmo assim, a deixavam com um ar sexy. A sua boca
tinha lábios grossos e em um tom bem rosado, que me fez pensar
ser do batom, mas como ela não parecia estar usando nenhum
pingo de maquiagem, não tinha certeza.
Caitlin também tinha três pintinhas no rosto e foi por elas
estarem tão aparentes, que eu tive certeza de que não usava nada
na cara. Uma estava bem no meio da bochecha enquanto a outra
era do outro lado, não tão no centro como a primeira. A última, mas
não menos importante, ficava na sua testa, com uma pequena
distância do centro entre suas sobrancelhas.
Aquilo deveria ser o suficiente para deixar alguém menos
atraente, mas vendo-a assim, só a deixava mais. Não pude evitar
pensar que em outras circunstâncias, eu seria mais um dos idiotas
atraídos por ela.
— Qual é a sua cor favorita? — perguntou, me trazendo de
volta para a realidade.
— Preto. E a sua?
Ela me olhou de cima a baixo e assentiu.
— Faz sentido. Você parece um daqueles homens de preto de
MIB — comentou, e eu prendi o riso. — Minha cor favorita é azul.
— É uma cor bonita — falei, apesar de preferir a preta. — Qual
é o seu filme favorito?
— Hall... — Ela se interrompeu. — Não tenho um filme favorito.
Paramos em frente ao seu prédio, mas eu não soltei a sua
mão porque era claro para mim quando ficamos cara a cara que
estava escondendo aquela informação.
— Claro que tem — rebati, sustentando seu olhar. — Que tipo
de namorado eu seria se não soubesse o seu filme favorito?
— Acho que você já descobriu muitas coisas sobre mim hoje.
— É um filme muito ruim? Está com vergonha de falar?
— Não! É só que... — Ela suspirou. — Nunca falei isso para
ninguém.
Eu franzi a minha testa, um pouco confuso.
— Os seus amigos não sabem do seu filme favorito?
Ela negou com a cabeça, e eu não tive como não achar aquilo
um pouco estranho. Era muito.
— Então, me diga. — Balancei as nossas mãos, chamando a
sua atenção. — Não deve ser tão ruim assim.
— Halloween, A Noite de Terror — revelou, me pegando de
surpresa mais uma vez naquele dia. — Na verdade, é a minha saga
de filmes favorita. Não tem nenhum filme que eu tenha dado menos
de quatro estrelas e meia.
Ela gostava de filmes de terror?
— Viu? Ninguém sabe disso porque todos iriam ficar bem
surpresos que alguém como eu gosta de filmes mais sangrentos —
comentou. — Não sei por que disse isso logo para você...
Caitlin falou a última parte bem baixinho, mais para si mesma,
provavelmente achando que eu não ouviria. Mas eu havia escutado
perfeitamente.
— Não gosto de filmes de terror — admiti. E, a fim de
interromper seu arrependimento momentâneo, continuei: — Tenho
medo deles.
A minha verdade foi o suficiente para fazê-la me olhar de
forma divertida.
— Medo? Você só pode estar de brincadeira!
— Principalmente de um cara que sai pela cidade matando
todo mundo com uma serra elétrica.
Ela fez uma careta adorável para mim.
— Michael Myers usa um facão, ok? Serra elétrica é da saga O
Massacre da Serra Elétrica. — Ela deu a lição, parecendo orgulhosa
de diferenciar aquilo. — São só pessoas matando pessoas.
Foi a minha vez de retribuir a careta.
— É..., você é estranha — brinquei, a fazendo rir.
— Deixa isso apenas entre nós, ok? — pediu cautelosamente.
— Os meus amigos acham que eu não tenho tempo para filmes.
Naquele momento, aquilo não me pareceu triste, mas sim
estranho.
— Vejo você na segunda? — Ela quis saber, antes que eu a
interrogasse mais.
Assenti.
— Nós tomamos um café e aproveitamos para nos conhecer
mais — falou. E mais uma vez, eu concordei. — Até amanhã,
Trevor.
Fiquei estático quando ela se inclinou em minha direção e
ergueu um pouquinho o rosto, deixando um beijo rápido na minha
bochecha. Ao se colocar na minha frente novamente, Caitlin sorriu e
piscou, me dando as costas e subindo os degraus até o seu
dormitório.
Eu sorri fraco, acompanhando seus passos até que sumisse
da minha visão.
Quem diria que ela também escondia um lado misterioso?
Caitlin parecia ser muito mais do que mostrava a todos e não
sabia até que ponto estava disposto a controlar a minha curiosidade
em relação a isso.
CAITLIN HOWARD
Tudo parecia normal demais depois de ter caminhado de mãos
dadas pelo campus com Trevor e só percebi o motivo disso quando
fiquei sozinha no meu dormitório.
Maeve estava com a família.
Barry tinha ido passar um tempo com a irmã que não via há
alguns meses.
Melvin e Aurora tinham tirado o restante do fim de semana
para aproveitarem sozinhos, longe dos cantos do campus.
Eles ainda não sabiam do meu relacionamento de mentirinha e
provavelmente iriam surtar quando soubessem.
Mas, por incrível que parecesse, eu não me preocupei com
isso e relaxei ao saber que ficaria o resto do domingo sozinha no
meu quarto. Aproveitei para fazer maratona de uma série nova de
terror na Netflix em vez de montar o meu trabalho que teria que
entregar no fim daquela semana, antes do spring break.
Tudo bem, daria um jeito nisso também. Mesmo que ainda não
tivesse lido nenhum dos livros que havia pegado na semana
passada na biblioteca.
Droga! Por que estudar era tão chato?
Suspirei e encarei o meu reflexo no espelho.
Para aquele início de semana, optei por usar uma maquiagem
básica que cobrisse levemente as minhas imperfeições na pele e
um batom meio rosado que tinha, combinava perfeitamente com a
cor natural dos meus lábios.
A minha mente voou para o “encontro” que eu havia tido com
Trevor no dia anterior e em como me senti confortável com ele
imediatamente, a ponto de falar a verdade sobre meus gostos sem
pensar se ele gostaria ou não daquela minha versão.
Talvez fosse pelas suas perguntas nada comuns no meu
cotidiano ou a sua falta de interesse em mim que haviam me feito
ser verdadeira com ele. Ou talvez porque eu não me importava em
fazer com que ele permanecesse em minha vida.
A minha vida toda, eu menti sobre os meus gostos, a minha
história e até mesmo a minha personalidade, apenas para me
enquadrar nos padrões dos outros e permanecer na vida deles.
Eu não deveria estar surpresa por me sentir tão confortável
com alguém que não fazia parte do meu mundo, mas tinha que
tomar cuidado para não acabar falando mais sobre mim do que
deveria.
Ninguém precisava saber do meu segredo. Era vergonhoso até
mesmo para mim.
Alguém abriu a porta do banheiro abruptamente e agradeci por
não estar em um momento íntimo, como me aliviando no vaso, ao
ver Maeve colocar as mãos na cintura e os olhos afiados em mim.
— Eu fico fora por um dia e você começa a namorar o Trevor
Lancaster? — Ela indagou, deixando bem claro que já sabia da
fofoca. — Quando foi que eu dormi para estarmos tendo um
pesadelo desses?
Saí do banheiro, passando por ela e encontrando Aurora no
nosso quarto.
— Bom dia, Caitlin. — Aurora cumprimentou. — Os meninos
do futebol só estão falando sobre isso, que perderam você para o
nerd do campus — comentou, um pouco menos invasiva do que
Maeve. — É verdade que até andaram de mãos dadas por aí?
Nossa... Como as notícias corriam soltas por ali.
— Sim, estamos namorando — revelei para elas. — É recente,
mas verdadeiro.
Claro que elas ficaram confusas. Mesmo não conhecendo toda
a verdade, eram as minhas amigas e me conheciam.
Ou achavam que conheciam.
— De repente, Caitlin Howard está namorando? — Maeve
questionou. — E não é nenhum garoto popular?
— Nem tudo é sobre popularidade, Maeve. — Aurora
respondeu por mim. — Se ela gostou do Trevor, por que não dar
uma chance para ele?
— Em uma versão resumida..., aconteceu — expliquei o que
podia para elas. — Agora, estou indo tomar café. Vejo vocês no
treino?
— Vai se encontrar com ele?
Apenas assenti com a cabeça, sem fazer ideia do que Maeve
queria com aquilo.
— Não tomamos café ainda, então vamos juntas. — Ela
segurou a mão de Aurora. — No caminho, você pode nos explicar
como uma aposta levou vocês a um namoro.
O quê?
Droga... Não havíamos combinado juntos uma história sobre
isso.
— Acho melhor vocês não irem — interrompi, mas um pouco
insegura de se sentirem magoadas por isso. — Terão outra
oportunidade de conhecer o Trevor.
— Apenas vamos para o café, Caitlin! — Maeve mandou,
agarrando minha mão também e me arrastando pelo corredor do
dormitório. — Ou, então, irei achar que é um namoro de mentirinha.
Se elas soubessem a verdade, eu seria zombada pelo resto da
minha vida.
Então, mesmo sabendo claramente que Trevor não queria se
envolver com meus amigos, concordei em ser arrastada para a
cafeteria com elas.
Trevor não conseguiu disfarçar sua careta ao ver as minhas
amigas do meu lado, me acompanhando até a mesa onde estava
sentado. Felizmente, Maeve e Aurora não pareceram perceber que
eram completamente indesejadas ali.
Nem quando nos sentamos com ele.
— Oi! — Como era alvo da atenção das minhas amigas, eu
aproximei o meu rosto do seu e dei um beijo na sua bochecha,
observando-o ficar estático, exatamente como no dia anterior.
Controlei o sorriso e me sentei ao seu lado. — As meninas quiseram
vir tomar café com a gente.
— Eu notei — murmurou. E mesmo não o conhecendo muito
bem, soube que o olhar que me lançava agora era de repreensão.
— Podia ter me dito que elas queriam tomar café com você.
Assim, eu não viria.
Foi o que ele completou através dos seus olhos.
— E quem disse que queremos tomar café só com a Caitlin?
— Maeve o questionou, atraindo sua atenção para as duas à nossa
frente. — Ficamos sabendo por fofocas que estão juntos. Pensei
que quando a minha melhor amiga desse adeus para a vida de
solteira, Aurora e eu seríamos as primeiras a saber.
— Aconteceu muito rápido — comentei, buscando uma
explicação rápida na minha cabeça.
— Por isso estamos curiosas, não é, Aurora?
A pobre da minha cunhada apenas sorriu fraco, me lançando
uma piscadela.
Por ela, eu contaria tudo no momento certo, diferentemente da
outra curiosa.
— Como descobriram que eram o amor da vida um do outro e
começaram a namorar? Só se passou uma semana desde a festa.
— Maeve continuou seu questionamento. — Parece até que estão
escondendo algo.
— Eu acho que você está vendo filmes demais, Maeve —
rebati em um tom divertido, esforçando-me para não parecer tensa.
Esse tipo de mentira eu nunca havia experimentado antes. —
Apenas aconteceu.
Claro que ela não ficou convencida.
Maeve me conhecia desde o ensino médio e sabia reconhecer
uma péssima mentirosa quando enxergava uma. A verdade era que
eu só estava atuando ruim dessa forma porque não havia tido tempo
de ensaiar naquele fim de semana.
Aproveitar os meus filmes pareceu muito melhor do que isso.
— Nós trocamos números de telefone naquela festa e
conversamos durante toda a semana. — Trevor iniciou uma
explicação que eu nem fazia ideia de onde iria parar. —
Percebemos que temos muitas coisas em comum e resolvemos dar
uma chance.
— Dar uma chance? — Aurora questionou, um pouco confusa.
— Então, não estão namorando? Estão se conhecendo?
— Eu considero namoro porque somos exclusivos um do
outro. — Ele respondeu à minha amiga, segurando a minha mão por
cima da mesa. — Não é mesmo, Caitlin?
Olhei para nossas mãos unidas e assenti.
— Não sabia que queria um relacionamento e nem que tinham
coisas em comum. — Maeve continuou falando, não escondendo o
quanto estava estranhando tudo aquilo, principalmente depois da
explicação de Trevor.
Eu tinha certeza de que ela estava se perguntando o que tanto
tínhamos em comum, afinal.
— Bom..., eu também não sabia — respondi para ela, o mais
natural possível. — Mas não é assim que se começa os melhores
namoros?
Ela deu de ombros e, com aqueles olhos cheios de
desconfiança, olhou de mim para Trevor.
— É estranho começar um relacionamento logo agora quando
estamos prestes a iniciar a temporada de vôlei — disse ela.
— Trevor também está ocupado com os estudos. — Eu
inventei qualquer desculpa pelo pouco que sabia dele. — Sabemos
muito bem dos nossos compromissos.
Ela assentiu e, parecendo não ter mais perguntas, sorriu.
— Que ótimo! Estou contente por vocês — falou finalmente,
abraçando Aurora de lado. — Vamos poder viajar todos juntos na
próxima semana e, assim, conhecer Trevor melhor.
Os meus olhos se arregalaram mesmo sem saber de qual
viagem ela estava falando, da mesma forma que senti Trevor ficar
tenso apenas com o toque em sua mão.
— Viagem? — indaguei.
— Barry tem uma casa em Hermosa Beach para passarmos o
spring break — explicou, me causando vários surtos internos. —
Não vai ser divertido? Trevor e você podem até ficar em um quarto
sozinhos!
O garoto ao meu lado tossiu, atraindo nossa atenção. Ele
colocou a mão que segurava a minha sobre a garganta e a
massageou. Parecia que havia conseguido a proeza de se afogar
com a própria saliva.
— Não posso. — Ele respondeu depois de se recuperar. —
Meu irmão não gosta que eu fique tanto tempo longe dele.
— Você tem um irmão? — Maeve perguntou e, parecendo se
lembrar de algo, seu rosto se iluminou. — Ah, claro! O alto e
silencioso. Ele é ainda mais estranho do que você, Trevor.
Ela tentou brincar, mas não percebeu que havia escolhido o
caminho errado.
— Ele é mudo. — Trevor revelou, deixando as minhas amigas
surpresas. — Por isso você o considera estranho.
Droga.
Não era bem assim que eu imaginava o primeiro encontro
deles.
— Desculpa... Nossa, eu não sabia. — Maeve pareceu mesmo
se sentir mal pela sua falha.
Trevor apenas assentiu.
— Vou fazer os nossos pedidos — disse, se levantando. —
Quer o mesmo de ontem?
Até gostaria, mas lembrei que havia pedido panquecas no dia
anterior e que precisava manter uma alimentação equilibrada, eu
não podia exagerar.
— Apenas um suco.
— Comeu algo antes de vir para cá?
Neguei.
— Então, precisa comer alguma coisa — declarou. — Vou
trazer um sanduíche, ok?
Sem que esperasse pela minha confirmação, ele foi para a fila
do balcão, que diferentemente daquele domingo, estava bem cheia
de alunos.
— Ele cuida de você. — Maeve observou e riu fraco. — Só é
um pouco sem educação por não perguntar o que as melhores
amigas da sua namorada querem. Vou fazer o meu pedido e o da
Aurora.
— Pode trazer o de sempre para mim, ok? — Aurora pediu.
Maeve concordou e foi para a fila.
— Ei... — Aurora pegou minha mão e sorriu. — Estou feliz por
você.
— Obrigada.
— Vocês combinam, sabe? De uma forma maluca, mas
combinam — disse ela, me fazendo lançar um sorriso forçado. — E
não liga para a negatividade da Maeve, não é porque você precisa
se dedicar ao vôlei que não pode ter um namorado.
— A nossa amiga parece estar cada dia mais pessimista —
comentei o que já havia percebido há algum tempo. — Ela falou
alguma coisa para você?
Aurora negou.
— Sabe como ela é fechada, né? Maeve é muito complicada,
mas, estranhamente, a gente não vive sem ela — resumiu, me
fazendo concordar.
Sempre tinha sido assim. Por que eu ainda tinha esperanças
de que Maeve fosse contar alguma coisa sobre sua vida para nós?
Ou sobre o motivo de mudar de humor tão rápido como um tempo
instável?
A nossa amiga era tão fechada e espinhosa como um ouriço.
— Que ideia maluca é essa de ir passar o spring break na
praia? Temos que treinar mesmo sem o treinador. — Mudei de
assunto, lembrando-a do combinado com o nosso técnico.
— Serão só cinco dias, contando com o fim de semana. —
Aurora explicou. — Voltaremos na quarta e treinaremos direto.
— Nosso primeiro jogo é na terça após o spring break, lembra?
— Todos vão festejar, deveríamos fazer o mesmo. — A minha
amiga argumentou, dando de ombros. — Quando poderemos fazer
isso de novo? Logo começam as semanas de provas, trabalhos, e
sabemos como ficamos.
— De qualquer forma, Trevor não vai.
Sabia que seria difícil de eu não ir, mas não queria que meu
namorado de mentirinha fosse. Seria muito estranho conviver com
ele vinte e quatro horas durante cinco dias, e ainda fingir que estou
me relacionando romanticamente com ele.
— Ele poderia levar o irmão junto. — Aurora sugeriu.
— Boa ideia, amiga! — Maeve disse ao se aproximar com
Trevor.
O meu falso namorado se sentou ao meu lado novamente, já
balançando a cabeça em negativa.
— Não, mas obrigado pelo convite.
Claro que Maeve estava achando toda essa pose bem
arrogante, e eu tentei disfarçar usando uma desculpa qualquer.
— Ele precisa estudar. — Foi apenas o que passou pela minha
cabeça. — O curso dele é mais difícil que os nossos, sabiam?
— Qual curso ele faz?
— Ciências Políticas — respondi.
— Todo mundo fala que você tira excelentes notas, duvido
muito que precise estudar tanto assim.
Argh! Ela não desistia?
— O quanto você é insistente? — Trevor questionou à minha
amiga, me surpreendendo por ser direto.
— Você nem imagina o quanto posso ser. — Ela rebateu,
lançando o desafio no ar.
Eu lancei o meu melhor olhar mortal em sua direção, mas nem
isso fez com que ela mudasse o rumo da conversa.
— Tudo bem. — Trevor concordou por fim, decidido e me
deixando surpresa. — Eu vou com vocês.
O quê?
Eu o olhei em choque. Ele não parecia estar gostando disso
tanto quanto eu, notei rapidamente quando devolveu o olhar.
Tentei mandar um aviso através dos meus olhos, algo como:
“não concorde com essa merda”. Mas eu fui ignorada antes que
concluísse a tentativa no exato momento em que a garçonete trouxe
nossos pedidos.
Trevor pegou o sanduíche natural e o colocou na minha frente,
o meu estômago roncou na mesma hora e eu quis muito devorar ali
mesmo, em questão de segundos, mas olhei a hora no relógio do
pulso.
— Você não vai comer?
Sorri e assenti.
— Não agora — respondi. — Vou levar para a sala. A minha
aula deve começar em alguns minutos.
Ele olhou para o relógio em seu próprio pulso.
— A minha também.
Peguei o copo de suco e bebi um pouco, saboreando-o com
calma.
— Vamos precisar comer nosso café na sala também, Aurora.
— Maeve disse ao verificar o horário no iPhone. — Vocês vão à
festa de hoje, né?
— Trevor não gosta de festas — respondi por ele. — E eu...
— Nós vamos. — Trevor me interrompeu, passando o braço
ao redor dos meus ombros e me puxando para mais perto dele.
Senti o meu corpo ficar tão estático quanto o dele quando havia
dado um beijo na bochecha. — Pode contar com a nossa presença.
Maeve sorriu e se levantou com Aurora.
— Que ótimo saber que não quer mudar quem a minha amiga
é apenas para agradar você. — Ela disse, caindo no romantismo
falso de Trevor. — Vejo vocês mais tarde!
Aurora acenou para a gente e se afastou com nossa amiga.
Só quando elas saíram do restaurante que eu olhei para o
garoto ainda me abraçando.
A primeira coisa que notei foi nossa proximidade
desnecessária naquele momento e fiz questão de me distanciar de
Trevor, mas ele me apertou mais contra si, deixando-nos mais
próximos do que antes.
— Tem pessoas olhando — explicou baixinho as suas atitudes.
De canto de olho, vi alguns universitários falando e olhando em
nossa direção sem nenhuma discrição. Voltei a olhar para Trevor e o
peguei com os olhos caídos na minha boca.
— Por que concordou em ir à viagem? E por que concordou
em ir à festa? Você foi bem claro ao dizer que não queria se
envolver com os meus amigos. — Eu chamei a sua atenção,
fazendo-o levantar os olhos.
— A sua amiga estava fazendo várias suposições sobre o
nosso relacionamento não ser muito convincente na fila que
compartilhamos no balcão — explicou, não me deixando nada
surpresa porque aquilo era a cara da Maeve. — Se concordei em
fazer isso com você, quero que seja perfeito.
— Tem a ver com aquela mania de querer ser o melhor em
tudo o que faz? — indaguei.
Ele sorriu de lado.
— Que bom que você lembra.
Estando tão próxima assim do seu rosto, notei que Trevor tinha
algumas pintinhas no rosto como eu, três do lado direito da
bochecha e duas do outro lado, tão pequenas que mal conseguiria
ver se estivéssemos um pouco mais distantes.
Ele era mesmo um cara bonito. Os óculos só o deixavam com
uma aparência mais fofa e ao mesmo tempo sexy, mesmo que fosse
difícil de imaginar duas características tão distintas assim em uma
pessoa só.
Os seus olhos eram marrons e brilhavam contra a claridade
que vinha da janela atrás de mim. A sua boca era bem desenhada,
e me conhecia bem o suficiente para saber que aquela textura era
do tipo que eu amava beijar.
Talvez, se estivéssemos em outra realidade... É, com certeza,
eu não perderia a oportunidade.
Tranquei a respiração quando o seu rosto se aproximou mais
do meu e ergui meu olhar, que por poucos segundos havia se
perdido no seu rosto, para ver o que ele estava tramando, mas
Trevor não olhava dentro dos meus olhos. Olhava novamente para a
minha boca.
— O que você...?
A minha pergunta morreu na garganta assim que seus lábios
tocaram a minha bochecha. Não foi rápido como os meus beijos
nele e, sem controlar, senti o meu coração acelerar sem motivo
algum.
Nunca havia recebido um beijo na bochecha.
Podia parecer muito estranho e sabia que era, mas era uma
realidade da qual eu não podia fugir. Durante toda a minha vida, os
garotos só me beijaram na boca e as minhas amigas e o meu irmão
nunca tinham feito questão de me dar nem sequer um abraço.
Os lábios de Trevor eram mesmo o tipo que eu adoraria beijar
e soube disso apenas sentindo-os parados contra a minha pele.
Eles eram macios e quentes.
Meu coração acelerou um pouco mais quando ele se afastou e
me olhou com um pequeno sorriso nos lábios.
— Eu pego você às nove.
Soltou-me, se levantando e pegando seu café. Antes de se
afastar, acenou a mão livre para mim em um tchau curto e fofo. Eu
retribuí apenas quando Trevor já estava de costas, caminhando em
direção à saída da cafeteria.
Olhei para o meu peito como se pudesse enxergar meu
coração, me perguntando por que havia feito papel de trouxa com
um simples beijo na bochecha. Mas tudo o que recebi como
resposta foram as batidas voltando ao normal aos poucos.
Você pode deixar pra lá
Você pode dar uma festa cheia de todo mundo que você conhece
E não convidar a sua família, porque eles nunca te mostraram amor
Você não precisa se desculpar por ir embora e crescer
MATILDA – HARRY STYLES
TREVOR LANCASTER
Às nove horas em ponto, eu me aproximei do prédio do
dormitório de Caitlin e peguei o telefone no bolso da minha calça,
pronto para enviar uma mensagem dizendo que havia chegado
quando ela apareceu saindo pela porta, usando um vestido preto
justo no corpo por cima de uma camisa branca.
Aquelas duas peças nunca foram tão opostas como naquela
noite, mas chegava a ser impressionante como caiam perfeitamente
bem juntas nela. Eu evitei pensar no quanto ela estava gostosa,
desviando o meu olhar para o seu rosto.
— Ei! — cumprimentou com aquele mesmo sorriso singelo nos
lábios de quando me via. — Esperei sua desculpa de não ir à festa o
dia todo.
— Achou que eu desistiria ao longo do dia? — Ela assentiu à
minha suposição. — Engano seu. Onde é a festa de hoje?
— República dos garotos do basquete — respondeu,
verificando o celular. — Chamei um táxi porque esses sapatos só
parecem confortáveis.
— É o quê? Dez minutos andando daqui? — perguntei para
mim mesmo, olhando para as botinhas que usava. Era um par
daqueles coturnos e realmente pareciam desconfortáveis. — Tudo
bem.
Se estava falando que não eram confortáveis, então quem era
eu para julgar o dinheiro que ela jogava fora?
O táxi se aproximou de nós alguns instantes depois e
entramos nele.
Caitlin deu o lugar para o motorista, que sabia perfeitamente
onde era por ser um dos taxistas do campus da universidade.
— Teve notícias da Tiffany? — perguntou, e eu neguei. — Ela
não está muito quieta para quem disse que iria conquistar você?
— Acho que o nosso plano está funcionando — expus a minha
opinião. — Talvez agora ela esteja com vergonha por ter falado isso
para um cara comprometido.
Caitlin soltou uma risada.
— Não precisamos ficar muito tempo na festa. — Ela mudou
de assunto. — Meus amigos bebem e com certeza irão esquecer da
nossa existência.
Ótimo. Porque eu não pretendia ficar muito tempo num lugar
que não gostava, principalmente com pessoas que também não ia
com a cara.
— Sei que você não queria se envolver com os meus amigos,
me desculpa por isso.
— Agora no início vamos ter que fazer alguns sacrifícios como
esses ou eles irão desconfiar de nós — comentei, e ela concordou.
— Estou tranquilo.
— Contou para o seu irmão que iremos viajar na próxima
semana? — questionou. — Ele pode ir junto se quis...
— Não. — Eu a interrompi antes que terminasse o convite. —
O meu irmão não se sentiria confortável.
— Tem certeza?
— Os seus amigos provavelmente deixariam uma piadinha de
mau gosto escapar, o que acabaria o deixando magoado. Ou estou
errado? — A julgar pelo seu semblante culpado, não estava. — Ele
vai sobreviver a cinco dias sem mim, principalmente porque irá
visitar nossa mãe.
— Vocês são de onde?
— São Francisco e você? — Aproveitei para descobrir um
pouco mais sobre ela.
— Minha tia mora aqui mesmo em Los Angeles.
Claro que sua resposta me despertou muita curiosidade.
— E seus pais?
— Morreram — revelou simplesmente, olhando para frente
com um olhar duro e triste. — Não diga que sente muito.
— Eu não ia dizer isso — devolvi, atraindo o seu olhar para
mim. — Mora com a sua tia desde então?
Ela concordou.
— Vim estudar o ensino médio aqui e conheci Barry e Maeve.
— Ela explicou e parecia pronta para me contar um pouco mais
dela. — O meu irmão se apaixonou pela Aurora assim que a viu no
time de vôlei da escola e, como um mestre para atrair garotas, a
fisgou rapidamente. Foi assim que nosso grupinho se formou.
— Começou a jogar vôlei no ensino médio?
Neguei.
— Comecei no fundamental, quando ainda morava com os
meus pais — disse. — Eles odiavam a minha paixão pelo esporte e
até o último ano que passaram comigo, queriam que eu seguisse o
caminho da Medicina. Geralmente, quando não era o meu irmão
dando trabalho para eles, era eu com o meu sonho insignificante.
Então, os seus pais eram do tipo complicado? Quanto mais
Caitlin falava sobre si mesma, mais eu ficava curioso a respeito
dela.
— Mas você o seguiu.
— E eles devem me odiar onde quer que estejam.
Nunca pensei que alguém poderia sorrir de forma tão triste,
mas a loira ao meu lado fez e seu sorriso de alguma forma mexeu
comigo a ponto de segurar a sua mão no banco de trás daquele táxi.
— Acho que fiz isso como forma de vingança — admitiu
baixinho, olhando para a minha mão na sua. — Algo como “vocês
vão ver como eu posso brilhar seguindo o meu próprio sonho”, me
esquecendo completamente do detalhe mais importante: eles não
se importam. Não mais.
Porque estão mortos.
Eu apertei a sua mão, procurando palavras que não fossem o
clichê “sinto muito”, que não servia para nada e que dificilmente era
verdadeiro.
— Mostre a eles de qualquer forma e se orgulhe por ter tido
coragem o suficiente para seguir o seu sonho, mesmo com a morte
deles — aconselhei. — Existem pessoas que não conseguiriam.
O carro parou em frente à república. Observei a casa pelo
vidro fechado do táxi, a música já podia ser escutada dali de dentro
e do lado de fora da residência estava lotado de alunos, que se
divertiam com copos de bebida enquanto conversavam.
Nunca havia entendido como eles conseguiam fazer uma festa
tão grandiosa como aquela dentro de um campus, quando a maioria
ali nem havia chegado aos vinte e um anos.
Talvez fosse o dinheiro. Muitos dos atletas da UCLA eram
filhos de grandes milionários e pessoas influentes no estado.
Era por isso que eu não me encaixava ali.
Era por isso que eu odiava tudo aquilo.
— Obrigada pela corrida. — Caitlin agradeceu, trazendo-me de
volta à realidade.
Nós saímos do táxi, e eu respirei um pouco mais fundo dessa
vez. Era só uma festa e depois um spring break. Após esses dois
eventos, esperava não precisar mais fazer parte daquele ciclo.
— Vamos entrar, ficar um pouco e dar o fora daqui — falei,
voltando a pegar a sua mão. — Ainda não entendo quem faz festa
logo numa segunda-feira.
— Qualquer oportunidade para festejar eles aproveitam. — Ela
falou, me puxando para dentro da casa.
Atraíamos olhares por onde passávamos, dando a certeza
para os que ainda desconfiavam dos boatos que haviam surgido
naquela semana sobre o nosso relacionamento, de que estávamos
mesmo juntos.
Nós entramos na república que à primeira vista era muito
parecido com a daquele domingo. Pessoas se embebedando,
casais se pegando e alguns dançando por cada parte do ambiente
enquanto luzes projetadas especialmente para aquela noite
piscavam em inúmeras cores, o suficiente para me deixar
atordoado.
Odiava aqueles leds.
— Vem. — Caitlin pediu, me puxando para o meio daquelas
pessoas. — Os meus amigos estão perto do bar.
Nós nos aproximamos dos seus amigos e dessa vez, todos
estavam ali unidos. O irmão de Caitlin com o braço ao redor da
cintura de Aurora enquanto Barry estava sentado em um sofá ao
lado de Maeve. Os quatro bebiam cerveja e pararam de falar ao
notar nossa presença.
Melvin olhou para nossas mãos unidas e arqueou as
sobrancelhas.
— Então, vocês estão mesmo namorando — comentou alto,
para que ouvíssemos através da música tocando na sala. — Maeve
me disse que vai até viajar com a gente, Trevor.
De todo aquele grupinho, dos que eu menos gostava eram o
Melvin e o seu melhor amigo, Barry. Os dois sempre estavam com
aquele ar debochado e eu sabia muito bem que adoravam chamar
meu irmão e eu de estranhos, como se ainda vivêssemos na época
da escola, onde eles eram os reis do pedaço.
— Por que estão sentados aqui? Pensei que estariam
aproveitando a festa. — Caitlin falou, ignorando o que o irmão disse
e me puxando para me sentar ao seu lado, de frente para eles.
— Estávamos até agora dançando, viemos jogar conversa fora
enquanto bebemos. — Maeve respondeu, balançando o copo que
segurava. — Não vão beber?
— É claro que eles vão. — Barry disse, se levantando e
pegando dois copos de cerveja. — Não digam que eu não batizei o
relacionamento de vocês.
Ele piscou para nós assim que nos entregou os copos.
— Como isso iniciou? — Melvin perguntou, cheio de
curiosidade. — E por que a minha irmãzinha não disse nada?
— Porque você é um idiota. — Caitlin respondeu, bebendo da
sua cerveja e recebendo uma revirada de olhos do irmão. —
Começamos a namorar nesse fim de semana e você sabe muito
bem como isso iniciou.
— Semana passada..., certo? — Ele confirmou, pensativo. —
Nunca pensei que um beijo levaria vocês a um namoro.
— Eu pensei que nem queria namorar, Cat. — Barry provocou.
— Deixou todo o nosso time de coração partido.
— Nunca quis namorar com um dos caras do time e sempre
deixei isso bem claro — rebateu. — Aliás, por que resolveram vir a
essa festa? Achei que achavam os caras do basquete uns idiotas.
— Eles são. — Melvin concordou, dando de ombros. — Mas
não perdemos uma festa por nada.
Eu bebi um pouco da minha cerveja com muita má vontade
porque aquela não era a minha bebida favorita do universo.
— Vai mesmo passar o spring break com a gente, Trevor? —
Barry perguntou.
Assenti, arrancando um riso fraco de Melvin.
— Vai ser divertido... — debochou. — Conhecer mais o meu
cunhadinho.
Ele retirou um maço de cigarros, o qual eu reconheci ser
maconha, do bolso e, como se não estivéssemos em um lugar
público, acendeu um e levou à boca para tragar.
— Você não tem vergonha? — Caitlin gritou ao meu lado. —
Joga essa merda fora, Melvin!
— Cuida do seu namorado, irmãzinha. — Ele mandou,
fumando aquela coisa fedorenta.
Aurora soltou um suspiro ao seu lado e tentou se distanciar,
mas ele agarrou fortemente a sua cintura.
— Da mesma forma que você cuida da sua? — Caitlin
debochou, recebendo o olhar fulminante do irmão. — Se você for
pego, vai ser expulso do time.
— Sua irmã tem razão, Melvin. — Barry falou, estendendo a
mão para o amigo, provavelmente querendo que ele entregasse a
maconha. — Não se esqueça de que nessa festa tem muita gente
que odeia você.
— Eles que se fodam!
— Vamos lá para fora. — Aurora pediu, se levantando e
estendendo a mão para ele.
Achei que Melvin não a acompanharia facilmente porque
parecia ser bem teimoso, mas ele apagou o cigarro e segurou a
mão da namorada, se levantando para acompanhá-la.
Do meu lado, Caitlin virou toda a cerveja de uma só vez.
Pelo jeito, havia alguma coisa acontecendo que eu não fazia a
mínima ideia do que era. Tive certeza quando ela se levantou e se
serviu de mais cerveja.
— Vamos deixar o Melvin para lá. — Maeve disse e olhou para
mim. — Deveriam curtir a primeira festa como namorados.
Ela estava muito desconfiada. Conseguia sentir isso só pela
forma como nos olhava.
— Vocês nem parecem namorados — comentou, e olhou para
Barry. — O que você acha, Barry?
O garoto riu fraco e me olhou.
— Trevor só deve ser tímido.
Talvez ele não fosse tão idiota assim.
Mas só para não deixar suspeitas, puxei Caitlin pela mão
assim que ela passou na minha frente, a fazendo cair no meu colo e
quase derrubar o copo de cerveja pela surpresa. Ela me encarou
assustada, procurando o que aquilo significava no meu olhar, mas
eu apenas sorri de lado e voltei-me para os amigos dela à nossa
frente.
Tentei ignorar que Caitlin Howard estava sentada no meu colo
usando apenas um vestido curto porque, mesmo não sendo um dos
caras que corriam atrás dela, ainda era um homem que a achava
atraente.
Ela se ajeitou, parecendo um pouco tensa sobre mim, e bebeu
um pouco da sua cerveja. Acompanhei a sua garganta engolindo o
grande gole da bebida.
— Deveríamos deixá-los aproveitar a festa sozinhos e
aproveitarmos juntos, gatinha. — Barry sugeriu para Maeve com
uma piscadela e recebeu um tapa no peito. — Ai!
— Não vou para a cama com você!
— Quem disse que eu estava falando sobre ir para a cama
comigo? Podemos dançar, o que acha?
Maeve olhou para onde as pessoas dançavam e depois para
nós, parecia estar ponderando o que era mais divertido até que
finalmente tomou uma decisão.
— Uma dança. Vamos!
Barry levantou-se com um sorriso vitorioso no rosto.
— Vocês deveriam ir também — disse para nós.
Os dois se afastaram e finalmente nos deixaram a sós. Caitlin
virou o rosto para mim e sorriu, bebendo em seguida mais da sua
cerveja.
— Pensei que eles iam nos encher de perguntas, mas parece
que está tudo bem.
— Certeza? Você parece ter ficado brava com o seu irmão.
Ela bufou, confirmando minhas suspeitas.
— Ele só está sendo o mesmo idiota de sempre — disse, mas
não conseguiu esconder como estava triste com isso. — Já estou
acostumada.
Caitlin virou novamente o copo de cerveja e olhou para o meu
quase intocado.
— Você não bebe?
— Cerveja não é a minha bebida favorita. — Aproximei o meu
copo do seu rosto. — Quer?
— Seria um desperdício jogar fora — respondeu, divertida. —
Pode me passar o copo.
Desde que havíamos entrado naquela casa, estávamos sendo
alvo de olhares, inclusive sentia que Maeve e Barry estavam nos
observando mesmo que estivessem dançando no meio daquelas
pessoas. Por isso, levei o copo de bebida até a boca de Caitlin, que
colocou suas mãos em cima das minhas e me lançou um olhar
divertido.
— Eu sei beber sozinha.
— Acho que um namorado faz isso com uma namorada, não?
E nossa lei é não beijar, então temos que convencê-los de alguma
forma — expliquei o óbvio.
Ela não contestou, parecendo ver sentido no que falei, e abriu
os lábios brevemente para tomar a bebida. Com calma, eu virei um
pouco do copo para que bebesse, observando-a engolir a cerveja de
modo lento e com os olhos ainda presos nos meus. O pensamento
de como alguém conseguia ficar sexy bebendo uma simples cerveja
correu pela minha mente, mas tentei afastá-lo imediatamente.
Negava-me a pensar em Caitlin dessa forma.
Um filete de cerveja deslizou pelo canto dos seus lábios e eu
afastei o copo da sua boca, erguendo meu polegar e o limpando
antes que deslizasse até sumir pelo seu pescoço.
Não levantei o meu olhar para encontrar o seu, mas o sentia
queimar meu rosto da mesma forma como a ponta do meu dedo
queimava naquele momento.
Caitlin pegou o copo da minha mão e o virou todo, bebendo
em grandes goles a cerveja como se sentisse sede, e precisava
confessar que até eu, depois daquele pequeno momento, sentia.
Com o objetivo de esquecer o que acabou de acontecer,
arranhei a garganta e comentei:
— Você gosta mesmo de beber.
Ela deixou o copo vazio ao meu lado, junto aos outros.
— Fazer o que se amo o sabor disso? — devolveu, e olhou
para onde estava sentada antes, parecendo refletir. — Quem diria
que seria confortável sentar no seu colo?
Ri fraco, notando que ela já estava um pouco mais alegrinha.
— Acho que você já pode se sentar do meu lado.
Ela pressionou os lábios um no outro e negou com a cabeça,
segurando minha mão e entrelaçando nossos dedos.
— Sabe dançar?
— Você quer dançar? — devolvi, sem esconder o meu
desânimo.
— É o que namorados fazem em uma festa, não? — Ela se
levantou, puxando-me junto antes que eu pudesse dar uma resposta
para sua pergunta. — Vamos mostrar para eles que estamos muito
bem juntos e não queremos ninguém na nossa cola.
Eu nem tive tempo de negar porque já estava sendo puxado
para o meio das pessoas que dançavam loucamente sob as luzes
estroboscópicas daquela sala.
TREVOR LANCASTER
Caitlin estava bêbada. Não precisava conhecê-la perfeitamente
para ter certeza disso.
A cada oportunidade que tinha, ela estava agarrando o meu
pescoço para dançar pendurada em mim ou virando um copo de
cerveja, se embebedando mais do que talvez pudesse dar conta.
Saí por alguns minutos para ir ao banheiro porque havia
tomado muita água quando a encontrei virando mais um copo perto
do bar. Assim que eu me aproximei, Caitlin me abraçou com um
grande sorriso nos lábios.
— Ele é meu namorado! — disse para um dos garotos que
estava servindo bebida. — Por isso não posso ficar com mais
ninguém, mas também... ele e eu não podemos nos beijar!
Que merda é essa que ela está falando?
O garoto nos olhou com estranheza por conta do que ela havia
dito.
— Ela quis dizer em público. — Eu consertei sua fala para que
não houvesse mais rumores estranhos sobre nós. — E acho que já
deu de bebida para você hoje.
Tirei o copo pela metade da sua mão e deixei em cima da
mesa ao lado, entrelaçando nossos dedos em seguida.
— Por quê? — Ela juntou os lábios em um biquinho. — Estava
me divertindo! Você não pode ser o namorado controlador.
Eu a afastei dos garotos que estavam nos olhando antes que
deixasse escapar mais alguma palavra sobre nosso relacionamento
de mentirinha. Coloquei as minhas mãos em seus ombros de forma
que pudesse guiá-la na minha frente, em direção aos seus amigos.
Tinha quase certeza de que se não a ajudasse, Caitlin acabaria
tropeçando nos seus próprios pés ou até mesmo em alguém mais
bêbado do que ela.
— Parece que alguém está bêbada! — Maeve comentou,
balançando a cabeça ao ver o estado da amiga. — Pelo menos, ela
tem um namorado agora para impedir que tire a roupa.
— O quê?! — perguntei, em choque.
Barry e Melvin riram, ambos pareceram se lembrar de algo
com a fala de Maeve.
— Teve uma vez no último ano da escola que Caitlin estava
tão bêbada que quis fazer um striptease. Se não fosse pelo Melvin,
ela teria tirado toda a roupa! — Maeve contou, me fazendo olhar
para a garota na minha frente com muita surpresa.
— Nem me lembre! Fui xingado até a minha terceira geração
naquela noite. — Melvin disse, levando mais um gole de sua cerveja
à boca.
— Porque você estragou a d-diversão! — Caitlin disse, se
embolando um pouco nas palavras. — Mas eu poderia fazer isso
agora... — Riu e se virou para mim, voltando a se pendurar no meu
pescoço. — O meu namorado permitiria?
— Acho melhor você levar ela para o dormitório. — Aurora
aconselhou, observando o estado da sua amiga. — Prometi que iria
ficar com o Melvin hoje, então por isso não a levo.
— Tudo bem — respondi, pois já estava pensando mesmo que
sobraria para mim.
— Ah, não...! — Caitlin soluçou, demonstrando quão péssima
estava. — Desculpa.
Os seus amigos — menos Aurora — riram do seu estado.
— Certeza de que amanhã ela irá se arrepender de ter
mostrado a sua versão bêbada na primeira festa que foi com o
namorado. — Melvin comentou, e os outros concordaram.
— Vou levá-la para o dormitório.
Despedi-me deles com um aceno de cabeça e voltei a ajudar
Caitlin a caminhar em direção à saída da casa. Muitas pessoas que
antes estavam dançando já haviam se sentado ou arrumado um
canto daquele lugar para transar com seus ou suas parceiras, por
isso foi mais fácil pular para o lado de fora.
— Nem passou uma hora do nosso acordo! — Caitlin falou
assim que segurei a sua mão para levá-la até o dormitório. — Íamos
ficar por uma hora e depois ir embora.
Eu escondi meu sorriso e a segurei pelos ombros quando
tropeçou em seus próprios pés na calçada.
— Ficamos na festa por três horas, mas você está bêbada
demais para verificar. — Dei dois tapinhas fracos no topo da sua
cabeça. — Cuidado por onde anda.
— Os meus sapatos são desconfortáveis! — choramingou. E
quando a olhei, estava com o mesmo biquinho nos lábios de mais
cedo e os olhos brilhavam mais do que já havia visto alguma vez. —
Vamos chamar um táxi.
— Esqueceu que não tem táxi esse horário no campus? — O
seu biquinho ficou maior. — Você costuma agir como um bebê
prestes a chorar quando está bêbada?
Ela cruzou os braços e me encarou, emburrada.
— Não estou bêbada!
Aproximei-me dela e levantei minha mão.
— Pensa rápido! — Mostrei os cinco dedos e depois mostrei
dois com a mesma mão. — Qual é a soma dos dois números?
Caitlin fez uma careta tão engraçada que foi difícil segurar a
risada.
— Eu não tenho raciocínio rápido! — justificou.
— Até mesmo uma criança saberia a resposta — provoquei,
voltando a pegar a sua mão. — Vamos devagar, o caminho não é
tão longo.
Fiz menção de voltar a andar, mas Caitlin permaneceu no
mesmo lugar. Ela largou a minha mão e estendeu os braços para
mim, em busca de algo que naquele instante quis ser lerdo para
entender, pois levou apenas um segundo para que eu entendesse o
que a garota queria com aquilo.
— Você não pode estar falando sério.
Caitlin assentiu e fingiu um ar inocente que não combinava
com ela.
Respirei fundo.
— Nem pensar! Quem mandou você vir com um sapato
desconfortável?
— Eu nem consigo caminhar direito... — reclamou.
— Pensei que não estava bêbada.
Ela revirou os olhos ao mesmo tempo em que balançou os
braços, insistente.
Suspirei, já me convencendo daquela loucura.
— Você é mesmo irritante.
Caitlin soltou uma risada engraçada ao ver que havia vencido
aquela batalha. Agachei-me na sua frente e deixei que subisse nas
minhas costas, de cavalinho. Assim que subiu, abraçou o meu
pescoço e circulou as pernas na minha cintura.
— Espero que o seu vestido ainda esteja no lugar — comentei
ao segurar suas pernas e levantar, sentindo sua pele nua.
Ela apoiou o queixo no meu ombro e riu fraco.
— Está com medo de que vejam a bunda da sua namorada de
mentirinha?
Olhei ao redor e fiquei aliviado por ninguém estar por perto
para ouvi-la falando sobre aquilo.
— É melhor irmos antes que alguém escute o que não é para
ser escutado. — Logo comecei a caminhar com ela em minhas
costas. — Você tem sorte de não ser pesada.
— Sou uma atleta e estou de dieta! É por isso que não estou
pesada.
— Dieta? Você quer sumir?
Eu senti um tapa na minha nuca.
— Xiu! É deselegante falar do peso de uma dama. — Riu
sozinha. — Ei, estar aqui é surpreendentemente confortável.
— Só não vai dormir! Eu não sei qual o número do seu
dormitório.
— Quarto 102, no primeiro andar — respondeu, se
aconchegando melhor em mim. — Agora posso dormir.
Abusada.
— Vai me deixar sozinho enquanto estou fazendo a gentileza
de te levar dessa forma até o seu dormitório? Eu nem sou seu
namorado de verdade e, pelo que me lembre, é você quem me deve
uma.
Ela bocejou e deslizou uma das suas mãos até o meu peito,
não de forma sensual, e sim para me dar um tapinha.
— Você fala demais.
Aquilo me arrancou uma risada fraca.
— As suas covinhas são fofas, sabia? — elogiou, afundando o
seu indicador na minha bochecha, onde provavelmente apareceu
uma das minhas covinhas. — Você também me deixa muito
confortável — disse, antes que eu pudesse dar qualquer resposta
para ela. — Nunca falei para alguém sobre meu filme favorito.
Parecia que Caitlin também mudava de assunto muito rápido
quando estava bêbada.
— Por quê? O que há de errado em gostar de uma saga de
terror?
— Nenhum dos meus amigos gosta.
— Não faz sentido, sabia? Só porque eles não gostam, você
não pode gostar?
— Basicamente, é isso... — disse, me causando um arrepio
por estar com a boca bem próxima do meu pescoço. — Não tenho
medo de perder você, por isso não preciso ser alguém que você
ame.
— Do que você está falando?
Será que a bebida havia afetado seus neurônios? Não
passava despercebido que uma aura de mistério pairava em torno
de Caitlin, mas naquele momento ela estava parecendo uma maluca
jogando tal frase sem sentido.
Não tinha medo de me perder? Não era alguém que eu
amasse?
Ela bocejou no meu ouvido e, quase me fazendo largar suas
pernas com o susto, enfiou o rosto no meu pescoço. Aspirou o meu
cheiro, fazendo-me parar por um minuto no meio da calçada. O
arrepio que senti foi muito mais forte com a sua atitude.
— Eu sou quem eles amam — murmurou, parecendo estar
sonolenta. — E dessa forma, nunca irei perdê-los.
Virei meu rosto, tentando ter uma visão melhor dela, mas tudo
o que vi foi seus olhos fechados e seu nariz enfiado no meu
pescoço. Ela dormiu? Depois de falar mais uma das suas frases
sem sentido?
Respirei fundo e voltei a caminhar, pensando mais naquela
conversa do que em qualquer outra dos últimos dias.
A certeza de que Caitlin era muito diferente do que a imagem
que passava estava cada dia mais presente na minha mente.
CAITLIN HOWARD
Dificilmente eu me esquecia das coisas quando ficava bêbada,
mas, ao acordar no dia seguinte e dar de cara com um teto que não
era o do meu quarto, levei muitos segundos para conseguir
raciocinar direito.
Onde eu estava?
Tanto o teto quanto as paredes cheias de pôster de bandas
que pareciam ser de rock, do anime Naruto e de algumas HQ’s da
Marvel não faziam parte do meu quarto. Eu só me lembrava de ter
dormido nas costas de Trevor depois de ter falado coisas que com
certeza não falaria se estivesse sóbria.
Maldita bebida! Eu já não havia dito para mim mesma que não
podia exagerar com ela mais?
Tomei coragem e voltei a abrir meus olhos, encarando o teto
ainda com estranheza. Podia parecer muito com o do meu quarto,
mas não era. Eu conseguia notar as diferenças nas manchas e até
mesmo nas lâmpadas apagadas.
Olhei para o lado e tomei um susto ao ver Christopher e Trevor
sentados na cama, me olhando. O primeiro com um semblante
simpático no rosto, enquanto o outro parecia debochar apenas com
o olhar, não de uma forma feia, mas como estivesse se divertindo
com a minha situação.
Quando e como eu fui parar no quarto deles?
Olhei para baixo e felizmente senti o meu vestido no corpo
junto a uma coberta que tapava até a minha cintura.
Não que eu tivesse algum problema em transar com o meu
namorado de mentirinha, mas se isso acontecesse, gostaria de
lembrar, sabe? Como eu havia dito na primeira vez que finalmente
foquei nele... Eu daria porque ele era incrivelmente gostoso.
— Bom dia, dorminhoca. — Trevor cumprimentou, se
levantando e vindo em minha direção. — Pensei que teria que te
acordar. Para quem disse que tem o sono leve, você dormiu
bastante.
Eu o observei um pouquinho mais, admirando seu cabelo bem
penteado e aqueles óculos de armadura fininha no rosto. Talvez por
ser de manhã, as suas pintinhas estavam em evidência no rosto,
mostrando-me que ele tinha mais do que eu havia contado aquela
vez. Será que estavam tapados com maquiagem? Seu nariz tinha
diversas sardinhas e era difícil não vê-las se não estivessem
escondidas.
— Que horas são? Por que estou aqui? O que você fez
comigo? — Preferi enchê-lo de perguntas a ficar admirando-o.
Ele balançou a cabeça e riu fraco.
— Ainda são sete horas, não acho que você esteja atrasada —
informou, se sentando no espaço livre da cama em que eu estava.
Provavelmente era a sua. — Você só está aqui porque adormeceu
nas minhas costas e eu já não aguentava mais te carregar. Também
não fiz nada com você, apenas te coloquei na cama. Acha que eu
sou um dos seus amigos idiotas?
Sentei-me na cama, ainda com a coberta tapando minhas
pernas, e olhei para Christopher, que nos observava com muita
atenção.
— Desculpa ter feito o seu irmão dormir com você — falei,
tentando ajeitar meus cabelos com os próprios dedos. Deviam estar
uma zona de fios rebeldes. — Deve ter sido desconfortável.
Ele sorriu de lado e levantou o polegar em forma de “ok”.
— Chris amava dormir comigo quando era criança, devia estar
sentindo falta disso. — Trevor disse. Obviamente era para provocar
o irmão, porque Christopher revirou os olhos e pegou uma HQ,
iniciando sua leitura. — Você sabe que é verdade!
Ignorei o excesso de carinho nunca visto de Trevor para
Christopher e foquei na história em quadrinhos que o garoto estava
lendo.
— Isso é Hellboy? — chamei a sua atenção, não controlando a
minha língua. Achava que deveria me consultar porque vinha me
descobrindo muito espontânea perto de Trevor e agora... de
Christopher. — Eu simplesmente amo os filmes!
— Você conhece? — Trevor perguntou, tão surpreso quanto
seu irmão.
— É apenas um clássico HQ de terror. Como eu não poderia
conhecer?
Olhei para Christopher que sinalizava algo, logo sendo
traduzido por Trevor.
— Ele perguntou se você já leu.
Eu fiz uma careta ao mesmo tempo em que neguei com a
cabeça.
— Tenho preguiça de ler — admiti. — Mas adoro assistir aos
filmes baseados em HQ’s. Geralmente, eles são os melhores.
Christopher assentiu e sinalizou mais alguma coisa, e eu odiei
não ter tido aula de língua de sinais quando era mais nova. Poderia
estar entendendo melhor o que ele estava falando sem que Trevor
tivesse que explicar para mim.
— Ele falou que prefere HQ’s e que você deveria ler algumas,
já que gosta do gênero terror. Provavelmente, nunca mais veria um
filme baseado em uma dessas histórias da mesma forma.
— Você tem alguma indicação?
Ele se levantou da cama e foi até sua escrivaninha. Como eu
havia pedido, pegou uma HQ e se aproximou de mim, deixando bem
evidente o quanto era alto.
Christopher, assim como Trevor, era muito bonito.
Diferentemente do irmão, não usava óculos e tinha os cabelos
mais pretos. O seu perfil me lembrava muito o de um príncipe
daqueles de filmes, não os da vida real porque sabíamos
perfeitamente que eles eram horríveis. O seu rosto tinha um formato
oval e eu invejei a perfeição do seu nariz; era fino e muito bem
desenhado.
Ele não tinha tantas marquinhas no rosto como o irmão, mas
havia algumas no lado direito da sua bochecha.
Eu tinha quase certeza de que as garotas não iam atrás de
Christopher por causa da sua mudez.
Alguns deviam saber que era mudo. Outros não e debochavam
da falta da sua voz, o julgando como um estranho. Já havia ouvido
muitos comentários, inclusive muitos deles dos meus amigos.
Aliás... Como isso havia acontecido com ele? A curiosidade
despertou e fiz uma nota mental de ser enxerida e perguntar para
Trevor mais tarde.
Christopher me alcançou a HQ.
— Spawn? — li o título em voz alta. — É daquele filme de
1997?
Christopher assentiu com a cabeça.
— É a história de um anti-herói ou herói. Isso, só você poderá
julgar. — Trevor disse para mim o que seu irmão sinalizava. — Pode
levar o tempo que for para ler. — De repente, o mais velho olhou
bem sério para o irmão. — Ei, eu pensei que você odiasse
emprestar suas HQ’s!
Christopher o respondeu com a língua dos sinais e eu controlei
para não sorrir do ciúme de Trevor. Era curioso vê-lo naquela
posição porque não nos conhecíamos há muito tempo, mas parecia
que era mesmo um pouco apegado ao seu irmão.
— Não enche? Você é um péssimo irmão! Nunca me
emprestou uma HQ — retrucou à resposta de Christopher. — Agora
você está dizendo que não me interesso por esse estilo de leitura...
Tudo bem, isso não posso mesmo ir contra.
Eu ri, atraindo a atenção dos dois.
— Você está com ciúmes do seu irmão? — indaguei.
— Não posso?
Talvez pudesse, só... Aquilo era extremamente estranho para
mim. Eles pareciam tão... normais.
Como resposta, Christopher negou com a cabeça e recebeu
um tapa de Trevor no ombro. Foi bem fraco, mas o mais novo
retribuiu com um mais pesado, se afastando rapidamente para a sua
cama.
— Pestinha! — Trevor riu enquanto Christopher colocava sua
mochila nas costas. — Vejo você mais tarde?
Ele assentiu e acenou um tchau com a mão para mim.
— Obrigada pela HQ! Vou cuidar bem dela e te devolver
inteira, prometo — falei, e ele sorriu fraco antes de sair do quarto.
Voltei-me para Trevor. — Vocês parecem ter uma boa relação.
Trevor assentiu.
— Ele é meu irmãozinho, como eu não poderia me dar bem
com ele?
Havia muitos casos em que irmãos não se davam bem ou que
não tinham nem metade da intimidade que eu vi entre eles em
poucos minutos, mas apenas concordei diante do seu
questionamento, não querendo pensar muito naquilo. Ou poderia
me render à tristeza da minha dura realidade.
— Preciso ir para o meu dormitório porque tenho treino às oito
horas — revelei, retirando a coberta do meu corpo e me colocando
de pé em segundos. Ajeitei o vestido que havia subido um pouco e
voltei a olhar para Trevor, pegando-o desviando o olhar do meu
corpo para suas mãos. Eu segurei o meu sorriso e decidi ignorar
isso por agora. — Obrigada por ter cuidado de mim ontem. Bebi
demais, sinto muito.
— Está tudo bem. — Também ficou em pé. — Posso
acompanhar você até o seu dormitório. Vou passar na cafetaria para
tomar café com um amigo.
Busquei na memória se ele já havia mencionado uma amizade
antes, então me lembrei da primeira vez que nos falamos.
— Aquele da festa em que nós nos conhecemos?
— O único que eu tenho — respondeu, e indicou a porta com a
cabeça. — Vamos?
Assenti e o segui.
TREVOR LANCASTER
Não se distraia por qualquer coisa? Se eu fosse um namorado
de verdade, com certeza teria ficado incomodado com a forma como
o treinador tinha me olhado.
Não tive tempo de chegar e ver Caitlin treinando, mas
consegui ouvir parte da conversa com aquele homem. Ela não
estava tendo um bom desempenho? Tinha certeza de que as
pessoas não estavam mentindo quando diziam que ela era a melhor
do time. Mas parecia que até a melhor jogadora podia cometer
falhas.
Deixei a mochila do meu lado e observei melhor a quadra onde
aconteciam muitos jogos e na qual minha falsa namorada
praticamente vivia. Era ampla e com tons fortes de preto com
marrom. Bonita e luxuosa, como todos os locais de esportes da
UCLA.
A universidade gostava de investir pesado nisso e para quem
amava, como Caitlin, era mesmo uma grande oportunidade.
A porta do que parecia ser onde ficava o vestiário foi aberta e
Caitlin saiu junto de mais três garotas. Antes que minha falsa
namorada viesse até o meu encontro, virou-se para as meninas e
disse algo.
Levantei-me, ajeitando a mochila no meu ombro enquanto era
alvo dos olhares nada discreto delas.
— Vamos. — Caitlin disse ao se aproximar e rapidamente
segurou a minha mão. — Antes que elas nos cerquem.
— O quê?
Ela nem respondeu e me puxou em direção à saída da quadra.
Para alguém que havia treinado bastante, Caitlin ainda tinha
força o suficiente para me fazer andar a passos largos para longe
das suas colegas.
— Onde vamos estudar? — perguntou depois de um tempo.
— Cafeteria? Ou prefere o meu dormitório? — Eu sugeri sem
pensar e, ao notar que seria o lugar que ela escolheria, me
arrependi por míseros segundos.
— Seu dormitório é mais silencioso a essa hora do que um
local público — respondeu. — E também fica próximo da minha
próxima aula.
— Ok — murmurei. — Por que saímos correndo daquelas
garotas?
— Porque elas são enxeridas — disse, ainda com sua mão
segurando a minha. — Querem saber tudo sobre nós e eu
realmente não estou a fim de dar detalhes.
Ri do seu jeito nervosinho ao seguir em frente.
— Até porque, não temos detalhes — brinquei com ela, a
vendo soltar uma risada fraca. — De qualquer forma, obrigado por
me arrancar de lá rapidamente. Seria muito desconfortável.
Ela concordou.
— Por falar em desconfortável... Ainda vai viajar com a gente
para a praia na sexta?
— Falei com o dono da pizzaria hoje e ele liberou a minha
folga — respondi. — Vou com vocês, mas será a primeira e última
vez que irei me enturmar com seus amigos.
— Tudo bem. Eu não pediria para você fazer amizade com
eles nem se fôssemos amigos, você e eles são muito diferentes.
Ela também parecia muito diferente deles naquele momento.
— Não podemos demorar muito porque trabalho no
administrativo da faculdade à tarde — informei, e notei como ficou
surpresa com aquela informação. — O que acha de passarmos no
restaurante e comprarmos o nosso almoço? Assim, comemos no
dormitório enquanto fazemos o seu trabalho.
— Almoço?
— Sim. Você já comeu?
Caitlin negou com cabeça.
— Não consegui nem parar para pensar nisso, mas se você
quiser mesmo...
— Não conseguiu parar para pensar nisso? Você é uma atleta,
precisa se alimentar direito — disse. E ela não negou, provando que
concordava. — Ou você come ou eu não te ajudo no trabalho.
Ela arqueou as sobrancelhas, se divertindo com a minha
resposta.
— E quem é você, hum? — Não foi grosseiro, apenas soou
divertido da sua parte jogar aquela questão no ar.
Eu apertei sua mão na minha, atraindo a sua atenção para
elas.
— O seu namorado, lembra? E como um bom namorado, não
quero ver a minha garota desmaiando por aí.
Eu a puxei para o restaurante antes que resolvesse me enrolar
e acabar não querendo ir.
— Você quase foi convincente — disse Caitlin, fazendo-me
voltar para ela. — Sua garota, uma ova!
Nós rimos e entramos no restaurante.
CAITLIN HOWARD
Observei o meu reflexo no espelho. Usava um biquíni amarelo
que não combinava muito bem com meu tom de pele e que, por
conta disso, havia usado poucas vezes. A peça não me favorecia
em nada.
— Não gostou do biquíni? — Aurora perguntou atrás de mim.
— Ficou lindo em você.
Só porque era sua cor favorita.
— Acha que consigo encontrar um lugar aberto que venda
biquínis no caminho?
— Difícil. Todos já estão prontos para a semana do saco cheio.
— Maeve respondeu. — Eu tenho um maiô sobrando, você pode
experimentar. Só não sei se irá servir, eu sou mais magra do que
você.
Pelo reflexo do espelho, vi a careta que Aurora fez para nossa
amiga, mas apenas assenti. Era verdade que, quando se tratava de
corpo, Maeve era um exemplo. Sempre havia sido assim, desde a
escola. Mas eu estava bem com o meu corpo, então comentários
como aqueles não me afetavam. O meu único problema era o
maldito biquíni.
— Aqui. — Maeve alcançou a peça verde. — Se servir, vai
ficar lindo em você por causa dos seus olhos.
Fui para o banheiro e retirei o meu biquíni. O maiô de Maeve
era simples e tinha um decote generoso na parte da frente, nada
que me fizesse optar por não usá-lo. Eu o vesti com muita facilidade
e me observei no espelho do banheiro, não conseguia ver o corpo
todo, mas ele parecia muito melhor do que o meu. Ficaria lindo com
o outro biquíni que levaria na minha mala, pois eram quase do
mesmo tom.
Voltei para o quarto para me olhar no espelho de corpo todo e
ouvi o assovio de Aurora.
— Você ficou perfeita com ele! — elogiou. — Vai levá-lo, certo?
Assenti.
— Posso, Maeve?
— É claro. — Ela sorriu. — Ficou melhor em você do que em
mim.
— Ei, falou para o Trevor nos esperar no estacionamento A1?
— Aurora questionou. — Ou, então, os meninos vão ficar enchendo
o seu saco se tivermos que passar no dormitório dele.
— Enviei uma mensagem para ele logo cedo. — Peguei o meu
celular em cima da cama e vi que tinha uma nova mensagem não
lida de Trevor. — Ele me respondeu.
Trevor:
Tem certeza de que eu devo encontrar vocês no horário?
E o que eu deveria levar para viajar com os seus amigos?
Eu:
Tudo bem, chegue dez minutos depois e, assim, você não vai
ter que esperar. Sobre o que pode levar... Estamos indo para a
praia, não é óbvio?
— Vou me trocar — avisei às meninas. — Daqui a pouco
precisamos nos encontrar no estacionamento.
Fui para o banheiro com o telefone junto porque sabia que a
resposta de Trevor não demoraria a chegar. Percebi nos últimos
dias que quando se tratava de troca de mensagens, ele era mais
rápido do que eu.
A nossa relação estava muito mais amigável e isso era até
bom para o nosso relacionamento falso. Nós nos encontrávamos
todos os dias de manhã cedo em frente ao meu dormitório e
caminhávamos juntos pelo campus, jogando conversa fora, o que na
maioria das vezes não agregava em nada ao nosso relacionamento.
Mas algumas vezes agregava.
Eu descobri que a sua mãe morava em São Francisco e era
para lá que ele estaria indo se não tivesse que me acompanhar
nessa viagem. Também descobri que ele era completamente
apaixonado por animes e que Naruto era o seu favorito. Não me
surpreendi por gostar tanto deles, mas fiquei um pouco surpresa
quando disse que quem amava mais as HQ’s era o seu irmão.
Trevor também gostava muito de usar seu tempo livre para jogar
videogame com Christopher, já que era sempre um momento em
que os dois podiam ficar mais próximos e se divertir juntos.
Eu cheguei à conclusão de que os dois eram muito nerds no
fim daquela semana em que passei todos os almoços no quarto
deles, fazendo o meu trabalho com a ajuda de Trevor.
Graças à sua ajuda, consegui entregar naquela tarde e tinha
quase certeza de que tiraria uma nota boa com todas as opiniões
que ele havia me feito colocar no texto.
O meu celular vibrou na minha mão.
Trevor:
Que sorte minha não depender da sua resposta para arrumar a
minha mala, hum?
Estou levando o que julguei ser necessário. Não é como se
fosse um grande evento.
Eu ri da sua mensagem e do desânimo explícito nela em ter
que viajar com os meus amigos.
Tudo bem. Demorei mesmo para responder a primeira que
tinha enviado.
Eu: Estava provando biquínis.
Que bom que não precisa da minha ajuda! Te encontro daqui
dez minutos.
Vinte minutos depois estávamos nos reunindo em frente ao
primeiro estacionamento da universidade. Trevor estava agarrado a
uma mala e uma mochila. Assim que me aproximei dele, deixei um
beijo na sua bochecha e fiquei ao seu lado.
Era engraçado ver que agora ele não ficava mais estático
quando eu fazia isso, mas sempre trancava sua respiração.
Não era estúpida e já havia observado que, por mais que
estivéssemos em um relacionamento falso, eu ainda o atraía. O seu
olhar no meu corpo dizia isso. Às vezes que eu o peguei olhando
para a minha boca. Ou quando me observou enquanto eu digitava
meu trabalho, achando que eu não sabia.
Eu era muito experiente quando se tratava de garotos. E
mesmo que nós tivéssemos aquela lei importante no nosso acordo,
não tínhamos como evitar sentir atração um pelo outro, certo?
Porque eu mesma havia sentido assim que o vi naquela festa e
sabia que conviver diariamente com a sua presença traria mais
dificuldade de ignorar esse sentimento porque quanto mais o
conhecia por dentro, mais me sentia atraída.
— Vocês estão vinte minutos atrasadas. — Trevor sussurrou
no meu ouvido. — E eu me atrasei dez, como pediu.
— Está de mau humor? — devolvi com a pergunta em tom de
voz baixo. — Foram apenas dez minutos de diferença.
Ele suspirou.
— Não estou — respondeu mais calmo. — Entregou o
trabalho?
Assenti.
— Acho que vou conseguir uma boa nota graças a você.
Obrigada.
— Me pague um jantar depois e estaremos quites, o que
acha? — sugeriu.
Sorri, não evitando fazer uma gracinha.
— Está me chamando para um encontro?
Trevor riu fraco ao mesmo tempo em que revirou os olhos.
— Se eu incluir o meu irmão, vai tirar essa loucura de encontro
da sua cabeça?
Coloquei a mão sobre meu peito e fiz o meu melhor para
passar que estava magoada com o que ele disse.
— Você é o cara que mais me deu foras nessa vida, sabia?
Machuca minha autoestima.
Ele era inteligente demais para saber que se tratava de uma
brincadeira, então apenas abraçou os meus ombros e abaixou
levemente o rosto para falar no meu ouvido.
— Desculpa por isso. Se estivéssemos em outra circunstância,
você com certeza seria uma garota na qual eu não daria um fora.
Seu elogio nas entrelinhas fez com que eu sorrisse de forma
nervosa e sentisse meu coração acelerar um pouco mais do que o
normal.
— Ei, pombinhos! — Melvin chamou, quebrando qualquer
clima que pudesse ter. — Vamos nos dividir em dois carros? Aurora
e eu vamos no meu, vocês podem ir com Barry e Maeve.
— Por mim, tudo bem — respondi.
— Por mim também. — Trevor concordou.
Nós nos movemos para o carro de Barry e colocamos as
bagagens no porta-malas do SUV. Entramos na parte de trás do
carro primeiro do que meus amigos, que ficaram discutindo sobre
algo com Melvin. Ao ver que eles estavam fazendo pedra, papel ou
tesoura, soube que era para decidir quem iria na frente.
Algumas coisas nunca mudam.
— Vamos chegar à noite lá. — Trevor falou, olhando para o
céu pela janela. — Leva uma hora, mais ou menos.
— Não estava nos planos aproveitar a praia hoje mesmo —
comentei. — Sei que não está indo por livre e espontânea vontade,
mas tenta se divertir. O lugar é legal.
Ele concordou, colocando o cinto.
— Desde que você não beba e me faça de babá de novo.
Notei o tom provocativo e brincalhão rapidamente.
Deveria admitir que estava gostando cada vez mais de
conhecer aquela versão dele, que só guardava para pessoas com
as quais se sentia confortável.
— Por quê? Achei que tinha gostado de me ter nas suas
costas na última vez — retruquei no mesmo tom.
Trevor abriu a boca para responder, mas, em seguida, negou
com a cabeça e riu baixinho.
— O que foi? — indaguei.
— Eu não vou dar essa resposta para você.
— Por quê?
— Porque não temos esse tipo de relação.
Por um momento fiquei confusa, mas, ao seguir a mesma linha
de raciocínio da dele, acabei ficando curiosa para conhecer aquela
versão ainda não apresentada para mim.
— Então, me fale se hipoteticamente estivéssemos nesse tipo
de relação.
Trevor voltou a erguer o rosto e me olhar por detrás daqueles
óculos finos e bem-feitos.
— Eu diria que nas minhas costas não é o lugar certo de você
ficar.
Não achei que meu corpo pudesse esquentar por conta de um
olhar e uma frase com duplo sentido, mas ali estava eu, sentindo um
calor subir por todo o meu corpo e se concentrar em dois lugares:
boceta e bochechas.
O nerd havia me deixado quente e envergonhada ao mesmo
tempo.
Aquela era a primeira vez que algo do tipo acontecia e
realmente não sabia como agir diante daquilo, por isso, arranhei a
minha garganta e levei como uma brincadeira.
— Então, você esconde um lado safado.
Ele sorriu de lado e até esse ato me pareceu sedutor nas
minhas condições, após ouvir aquela frase.
— Quem está levando para o lado safado aqui? — perguntou,
e notei as suas bochechas levemente rosadas.
Dei um tapinha no seu ombro como resposta.
A verdade era que eu havia ficado desconcertada por uma
coisa tão brega como aquela.
O que está acontecendo de errado comigo?
Maeve e Barry entraram no carro antes que nossa conversa de
segundas intenções continuasse e, assim que meu amigo deu
partida, deitei minha cabeça no ombro do meu falso namorado, só
para me martirizar com os pensamentos que me levaram a uma
imaginação de como seria se estivéssemos nesse relacionamento
hipotético.
— O que acham de um jogo? — Maeve convidou, sentando-se
no tapete da sala depois de termos comido a pizza que pedimos
quando chegamos e bebido cerveja. — Verdade ou consequência?
— Voltamos para o ensino médio? — indaguei, pois desde a
época da escola não jogava aquele jogo.
— Não conhecemos nada do seu namorado, é uma ótima
forma de conhecê-lo com esse jogo — justificou. — O que acham,
meninos?
Melvin deu de ombros.
— Por mim, tanto faz. Não temos nada de interessante para
fazer mesmo.
Barry provou que tinha a mesma mentalidade de Maeve ao
pegar a garrafa de cerveja vazia e colocar no meio do tapete. Ele se
sentou ao lado da nossa amiga e olhou para mim e Trevor.
— Querem um convite especial? Ou estão pensando em
escapar para o quarto e incomodar nossos ouvidos? — Divertiu-se
ao perguntar.
— Acho que somos nós que temos mais chance de fazer isso
essa noite, né, amor? — Melvin perguntou à Aurora, que deu um
tapinha no seu braço. — Ai!
Eles pareciam bem agora e meu coração ficou um pouco mais
tranquilo, tanto pela minha amiga quanto pelo meu irmão. Talvez a
última conversa que haviam tido quando saíram da festa naquela
noite tivesse funcionado.
Eu esperava que sim.
Gostaria de perguntar, mas seria estranho. Nosso ciclo de
amizade não era como naqueles de filmes. Certas vezes, eu achava
que nem tinha amigos e um irmão, de tão sozinha que me sentia.
As nossas dores eram invisíveis. Os nossos passados,
apagados e revertidos em invenções. E nenhum de nós parecia
querer mudar isso. Ou ter coragem para fazê-lo. Tudo o que
fazíamos era sorrir, acenar e achar engraçado. Fosse a dor, a
conquista, o amor, as lágrimas ou a situação. Tudo parecia não
passar de uma convivência, onde a aparência era tudo o que mais
importava.
— Caitlin? Você não vem? — Maeve me despertou dos
pensamentos.
Observei Trevor já sentado ao lado de Melvin, então, sem
escolha, me sentei ao seu lado, fechando a roda ao redor da
garrafa.
— Eu giro primeiro. — Melvin disse, tocando no vidro e o
fazendo girar.
A garrafa parou para Barry e Aurora.
— Verdade ou consequência, Aurora? — Ele questionou à
nossa amiga.
— Verdade.
— Óbvio... — Maeve murmurou, entediada, bebendo um
pouco da sua cerveja.
— É verdade que perdeu a virgindade com o Melvin?
— Ei, cara! Isso não interessa a você. — Meu irmão
resmungou.
— É verdade. — Aurora respondeu, nem um pouco
constrangida por isso.
— Aurora! Isso não diz respeito a ele.
— Foi só uma pergunta, ciumento. — Barry retrucou, rindo do
ciúme do meu irmão. — Gira a garrafa, Aurora.
Eu notei de relance meu irmão fechar a cara só porque Aurora
havia dito a verdade e revirei os meus olhos. Ele era muito mimado
e nem podia culpar os meus pais por terem feito isso com ele.
Observei a garrafa parar entre mim e Maeve.
— Caitlin..., verdade ou desafio?
— Verdade.
— É verdade que está fingindo esse relacionamento com o
Trevor?
Eu senti a minha pele gelar de uma hora para a outra com a
pergunta pairando no ar e seus olhos afiados em mim, esperando
pela verdade.
— O quê? Por que eu fingiria um relacionamento? — devolvi,
tentando não demonstrar que havia ficado nervosa.
Barry riu.
— É, Maeve, porque eles fingiriam? — questionou. — Pode
até ser estranho esses dois juntos, mas não há motivos para
fingirem.
— Quem tem que me dar a resposta é a Caitlin, não você,
Barry.
Todos, até mesmo Trevor, me olhavam em busca de uma
resposta, e eu fiz mais uma vez o papel de atriz ao dar uma risada
debochada antes de finalmente responder:
— É mentira. — Olhei para o meu cúmplice. — Trevor e eu
realmente estamos juntos.
Para provar isso da nossa forma, o meu falso namorado
segurou a minha mão e me lançou um sorriso sutil, expondo aquela
pequena covinha para todos ali na sala.
— Gira a garrafa com sua mão livre, apaixonadinha. — Barry
mandou. — E você, Maeve, desperdiçou sua pergunta. Já está
bêbada?
— Cala a boca!
Com minha mão livre, girei a garrafa, a fazendo parar entre
mim e Barry.
— Verdade ou consequência, Cat?
— Consequência — respondi, mudando um pouco o rumo
daquele jogo.
— Desafio você a jogar o jogo do pepero com o Trevor.
— O quê? Nem temos o chocolate aqui.
Barry riu e tirou de trás de suas costas uma caixa do doce de
palitinho, me deixando subitamente nervosa.
— Sabe como se joga, Trevor?
— Eu já ouvi falar desse jogo antes.
— Não temos com quem competir, qual seria a graça de jogar?
— Ver o espaço mínimo que vocês conseguem deixar nesse
palitinho aqui. — Barry respondeu, tirando um palito de doce da
caixa. — Vocês são namorados, qual é o problema?
— É... Qual é o problema? — Maeve repetiu, desconfiada.
— Problema nenhum — respondi rapidamente, arrancando o
palito da mão de Barry. — Nós podemos fazer isso.
Barry riu e pegou o celular do bolso.
— Essa eu quero gravar para ter de recordação.
Eu revirei os meus olhos antes de finalmente olhar para Trevor.
— Já jogou antes? — Ele negou com a cabeça. — Só temos
que conseguir deixar o menor pedaço de pepero possível para fora
e, para isso, vamos usar nossas bocas. Quem come o doce? Eu ou
você?
— Deixa que o Trevor come. — Barry falou, usando das suas
gracinhas para arrancar risada dos outros. — Não é isso que ele faz
com você?
— Cala a boca, idiota! — mandei.
Trevor pegou o pepero da minha mão e se aproximou.
— Vamos fazer isso. — E pelo seu olhar, entendi que estava
me tranquilizando de que estava tudo bem para ele fazer aquilo. —
Abre a boca.
Melvin e Barry fizeram outra gracinha, mas eu não dei ouvidos
porque me concentrei apenas no cara à minha frente. Abri a minha
boca e coloquei um pouquinho do chocolate nela. Assim que segurei
firmemente o palito com meus lábios, Trevor abaixou um pouco a
cabeça para segurar a outra ponta.
Nossos rostos ficaram bem alinhados quando ele colocou a
ponta oposta à minha do doce na boca e eu tranquei minha
respiração quando o vi avançar um pouquinho, ficando mais
próximo de mim do que antes.
Aquele era o objetivo do jogo e eu já o havia jogado com
muitas pessoas antes, mas com Trevor me senti diferente. Os seus
olhos estavam presos nos meus e, com nossa proximidade, eu
poderia até mesmo contar as inúmeras manchinhas que ele tinha no
rosto.
Ele mordeu mais um pouco do palito, aproximando-se mais de
mim.
Meu coração acelerou e eu engoli em seco, desviando pela
primeira vez meu olhar para a sua boca bem desenhada. Muitos
caras antigamente usavam esse jogo para roubar um beijo meu e
isso era tão previsível que nunca havia tido graça para mim, mas,
naquele momento, senti minha boca secar conforme Trevor se
aproximava mais e mais, comendo o doce e encurtando nosso
espaço a ponto de ficar milímetros de distância de mim.
Eu queria beijá-lo.
E podia estar enganada por conta do meu desejo, mas senti
que ele queria também ao me voltar para os seus olhos e pegá-los
encarando a minha boca com tanta sede como eu.
A sua respiração bateu contra a minha, um pouco mais forte, e
me trouxe um formigamento estranho na nuca.
E se eu terminasse de encurtar aquele espaço?
Sem beijos.
Era o que a nossa lei dizia.
Mas eu não me apaixono com um mísero beijo!
— E você tem coragem de dizer que eles não namoram,
Maeve? A química desses dois está me causando arrepios! — Barry
quebrou o clima ao dizer. — Parabéns, casal. Vocês deixaram um
espaço tão pequeno que não alimenta nem uma formiga.
Nós largamos o palito ao mesmo tempo, um pouco
desconcertados para terminar de comer aquele doce.
Senti-me um pouco melhor por não ser a única.
— Gira a garrafa, Cat! — Barry pediu, a fim de continuar o jogo
e alheio à nossa reação.
Eu voltei a olhar para a garrafa, aproximando minha mão e a
girando. Ela parou em Maeve e Trevor.
— Verdade ou consequência, Trevor?
— Verdade. — Ele respondeu, mais baixo do que o normal.
— É verdade que era virgem antes da Caitlin?
Eu fuzilei minha amiga com o olhar e ela apenas deu de
ombros.
— Não sei por que a virgindade de alguém importa tanto para
vocês, mas não, eu não era — respondeu, e eu me controlei para
não rir da cara que Maeve e Barry fizeram.
Foi a vez de ele girar a garrafa.
Então, Trevor não era virgem? Interessante...
A brincadeira continuou e não teve outros desafios entre mim e
Trevor, assim como também o senti estranho depois do pepero.
Tentei ignorar isso e focar nas coisas que descobri sobre ele através
do jogo de verdade, já que ele só escolhia essa opção. Como o seu
gênero favorito de música, que era pop rock, o seu passatempo
favorito, que ele já havia mencionado que era videogames, e o seu
jogo favorito da vida, The Last Of Us.
Quando a garrafa apontou mais uma vez para ele, era Maeve
quem tinha que fazer a pergunta.
— Verdade ou consequência?
— Ai, por favor! Escolha consequência. — Melvin mandou. —
Vamos animar um pouco isso aqui.
Trevor suspirou e, antes que eu dissesse com o olhar que não
precisava seguir o idiota do meu irmão, ele estava respondendo.
— Consequência.
Maeve sorriu como se estivesse esperando por aquilo a noite
toda.
— Desafio você a beijar a Caitlin.
É claro que ela não perderia a oportunidade.
Maeve tinha uma teoria sobre nós e não descansaria até que
colocasse a verdade na mesa.
Costumávamos ser próximos, mas as pessoas podem passar
De pessoas que você conhece a pessoas que você não reconhece mais
SELENA GOMEZ – PEOPLE YOU KNOW
TREVOR LANCASTER
Todos na sala esperavam por uma atitude nossa,
principalmente Maeve, que havia deixado claro desde a primeira vez
que conversamos na fila da cafeteria que não acreditava muito
nesse relacionamento improvável nosso.
Seria simples dar um beijo, certo?
Podíamos ignorar a lei pelo menos uma vez para provar para
aqueles que duvidavam que estávamos juntos. Mas e quanto ao
depois? Poderíamos seguir como se nada tivesse acontecido?
Quanto mais eu conhecia Caitlin Howard, mais eu sabia que
ela era um perigo, então a minha resposta era a mais simples
possível: não, eu não conseguiria fingir que nada aconteceu.
— Qual é o problema, Caitlin? Não pode beijar seu namorado?
— Maeve questionou, tomando mais um gole da sua cerveja.
— Por que você quer tanto isso? — Caitlin rebateu. — Está
com algum problema com o meu relacionamento?
Às vezes, eu tinha dúvidas se elas realmente se davam bem
ou não. Pelo pouco que havia conhecido, Maeve não parecia ser
uma pessoa fácil de lidar e, por mais que não tivesse uma opinião
formada sobre Aurora, podia julgar que o grupo todo era mais
competitivo um com o outro do que amigos de verdade.
Era deplorável.
— Só queria ver um pouco do que vocês têm, porque até
agora, parecem adolescentes namorando ao se cumprimentarem
apenas com beijo na bochecha e demonstrando carinho com as
mãos dadas — explicou de forma debochada, deixando claro o
quanto essas coisas só aumentavam sua desconfiança.
— O Trevor é tímido. — Caitlin justificou. E até que fazia um
pouco de sentido porque nem quando eu estava em um
relacionamento de verdade gostava de beijar em público. — Você
pode respeitar isso?
— É verdade, Trevor? — A ruiva perguntou, deixando Caitlin
irritada por ter sido ignorada.
Eu apenas assenti.
— Acho que podemos parar o jogo. — Aurora interveio,
salvando a nossa pele.
— Por quê? Agora quero ver os dois se beijando. — Melvin
respondeu, recebendo uma fuzilada de olhar de Caitlin. — Estou
curioso, maninha!
— Você é um idiota.
Na verdade, todos eles eram. Será que ela não percebia isso?
Por que era amiga deles? Caitlin era completamente diferente
quando estava comigo.
— É só um beijinho! — Barry também entrou na onda. —
Prometemos não zombar de vocês. Até porque, depois daquela
troca de olhares, vocês devem estar loucos para dar um beijinho.
Ele fez um biquinho com os lábios que fez seu amigo rir.
Caitlin me encarou, buscando no meu olhar o que eu achava
daquilo e parecendo um pouco desesperada por não ter mais
nenhuma desculpa. Apenas me aproximei dela, pronto para dar um
fim naquilo e beijá-la logo ao mesmo tempo em que estava torcendo
para que nada entre nós mudasse, quando Aurora se levantou de
repente.
— Ei, não está na hora daquele jogo que vocês queriam
acompanhar? — perguntou para o seu namorado.
— Puta merda, Melvin! — Barry exclamou. — Liga essa
televisão! Já perdemos dez minutos.
— Porra! — Melvin se levantou, à procura do controle remoto.
Caitlin e eu soltamos um suspiro, aliviados.
— Parece que o jogo acabou — comentei, também me
levantando. — Acho que vou para o quarto tomar um banho e
dormir.
— Não gosta de futebol, Trevor? — Barry perguntou assim que
Melvin ligou a televisão.
— Não muito.
— Vou com você. — Caitlin disse ao se levantar.
— É claro que vai. — Melvin falou. — Lembre-se que estão em
uma casa com os seus amigos.
Caitlin revirou os olhos e deu um tapa na nuca do irmão.
— Digo o mesmo para você.
Ele riu em resposta, abraçando a cintura de Aurora.
A casa de praia de Barry não podia ser chamada de uma
simples casa, só o quarto em que Caitlin e eu ficaríamos era do
tamanho da sala e cozinha conjugada que eu tinha vivido boa parte
da minha vida em São Francisco.
A residência tinha exatas três suítes e, pelo que entendi
quando chegamos, Barry e Maeve iriam dividir uma. Não sabia se
eles eram um casal e tampouco me importava com isso, já que
depois daquela viagem, esperava mesmo não ter que conviver com
eles.
— Eu tomei banho no dormitório, antes de sair. — Caitlin disse
assim que chegamos ao nosso quarto. — Você pode ir.
Assenti.
Não poderia dormir sem camisa, então peguei uma regata
velha no fundo da mala que havia atirado ali dentro mais cedo para
usar como pijama e uma bermuda, igualmente velha para formar o
par.
Fechei a porta do banheiro quando entrei e retirei as minhas
roupas rapidamente, indo para baixo do chuveiro assim que entrei
no box e liguei a água. Até tentei não pensar no jogo do pepero de
mais cedo, mas se tornou impossível quando fiquei sozinho e
aparentemente sem nada para pensar.
Por conta do jogo, eu soube que seria muito errado beijar
aquela garota. Se apenas com uma proximidade, eu quis
desesperadamente cortar o espaço entre nós e beijar a sua boca, o
que seria caso isso acontecesse? Iria querer mais?
Não podia.
Talvez o meu irmão estivesse certo e eu estava voltando a ser
um virgem porque, pelo tempo que não transava junto de toda
aquela tensão, estava ficando completamente louco das ideias.
Precisava me manter focado no meu futuro e nas minhas
pesquisas que haviam parado desde que Caitlin entrou na minha
vida. Parecia que desde aquele dia, tudo de mim girava em torno
dela e não era isso que eu queria com um relacionamento de
mentirinha. Precisava manter o foco.
Ela era divertida, escondia uma pessoa diferente do que eu
imaginava, mas não poderia passar de uma relação amigável.
Depois de tomar meu banho, me secar e me vestir, voltei para
o quarto com a toalha nas mãos, secando os meus cabelos.
Minha pele se arrepiou com o ar frio do ar-condicionado assim
que fechei a porta do banheiro. Caitlin já estava embaixo da coberta
e eu ri ao vê-la daquele jeito.
— Por que está com coberta se ligou o ar?
— Eu gosto de dormir com frio. — Ela se explicou. — Algum
problema com isso? Posso desligar o ar, se quiser.
Neguei com a cabeça.
— Tudo bem. — Indiquei a cama com o queixo. — Vamos
dormir na mesma cama?
Ela olhou para o seu lado vazio e depois para mim novamente.
— Tem espaço suficiente para isso — respondeu. — Se
importa?
— Eu não dormiria no chão e você tem razão, tem espaço
suficiente para nós. — Sentei-me na ponta da cama, tentando secar
direito meu cabelo para não dormir com ele molhado. — Se você
não tem problema com isso, eu também não tenho.
Não vi sua reação porque estava de costas para ela, mas a
senti se movimentar na cama, o que me chamou atenção. Quando
olhei para trás, Caitlin estava agachada na frente da sua mala,
procurando por alguma coisa.
Mas não foi isso que me fez fixar meu olhar em seu perfil.
Caitlin estava usando um pijama curto e, mesmo que já a
tivesse visto no seu uniforme de vôlei, que era ainda mais curto que
aquele pedaço de short de seda que usava, ainda assim, fiquei
subitamente nervoso.
Eu dormiria do lado dela.
Era bem mais preocupante para mim.
— Achei — disse, alheia ao meu olhar.
Ela se colocou de pé e se aproximou de mim com um secador.
— Você está me deixando agoniada secando esse cabelo com
toalha molhada — explicou-se. — Deixa que eu seco para você.
— Sério?
Ela piscou para mim.
— Viu como eu sou uma ótima namorada? — brincou, subindo
na cama e ficando atrás de mim.
Apenas concordei com ela, não entendendo por que aquilo
pareceu tão íntimo para mim a ponto de continuar nervoso, não
mais só por conta das suas roupas.
— Quem lava o cabelo a uma hora dessas da noite? —
perguntou antes de ligar o secador.
— Eu adoro lavar o meu cabelo.
Foi o que respondi quando senti seus dedos entre os meus
fios, os separando enquanto direcionava o ar quente para secar a
raiz. Havia muito tempo eu não tinha o meu cabelo secado por
alguém e a única que fez isso foi minha mãe, por isso estava
experimentando sensações muito diferentes conforme Caitlin
cuidava de mim.
Era relaxante, mas também com uma energia diferente muito
presente, como se meu corpo inteiro soubesse que fosse ela e se
arrepiasse pelo contato delicado de seus dedos na minha cabeça.
Tentei ignorar aquela sensação nova e a memória de como ela
estava vestida atrás de mim, puxando um assunto qualquer.
— Maeve e Barry estão juntos?
— Está aí uma coisa que eu também gostaria de saber —
rebateu. — Esses dois são bem confusos, mas sei que já ficaram
em algumas festas.
Resumindo: ele era a foda fixa dela.
Hum... Talvez a personalidade idiota dos dois os
impossibilitasse de ter uma relação mais profunda. Mas óbvio que
não falei isso em voz alta porque eles ainda eram amigos dela.
— Desculpa por mais cedo — pediu, inclinando a minha
cabeça para baixo e secando a parte de trás. — Maeve está
desconfiada e vai fazer de tudo para provar a sua verdade.
— E o que você acha disso?
— Como assim o que eu acho?
Virei-me para ela, a pegando de surpresa, o que a fez cair
sentada na cama.
— Acha que deveríamos provar que estamos juntos?
Ela riu fraco.
— Do que está falando? — Apontou com o queixo o meu
cabelo. — Não terminei ainda, pode se virar novamente?
Aquela versão de Caitlin era nova, nunca a tinha visto nervosa
desse jeito.
— Deveríamos nos beijar na frente deles? — perguntei,
gostando de como seus olhos se arregalaram e seus lábios se
abriram um pouquinho, surpresa com minhas palavras.
— E nossas leis?
Ela foi rápida em rebater, mas seus olhos caíram para os meus
lábios. Eu a notei engolir em seco, indicando que provavelmente
não se importava tanto com o contrato que eu havia tido dificuldade
de montar a mão.
Era melhor parar de brincar com algo sério daquele tipo.
Apenas assenti e me virei de costas para ela novamente.
— Tem razão — respondi. — Vamos provar da nossa maneira.
Eu ouvi seu suspiro e, em seguida, ela estava secando o meu
cabelo outra vez, me trazendo mais de todas aquelas sensações.
Nenhum de nós falou mais nada, permanecemos no silêncio
que se estabeleceu naquele quarto até que ela terminasse de secar
meu cabelo.
— Prontinho — disse, largando o seu secador em cima da
mala e voltando para a cama.
— Obrigado. — Retirei meus óculos e os coloquei na mesinha
ao lado.
Assim que ela se deitou embaixo das cobertas, eu apaguei a
luz e fiz o mesmo, mas me deitando a uma certa distância sua.
— Você enxerga sem eles? — perguntou, curiosa.
— De perto, muito bem. É de longe que tenho dificuldade —
expliquei.
Novamente, o silêncio.
— Tenha uma boa noite, Trevor — disse depois de um tempo.
— Boa noite, Caitlin.
CAITLIN HOWARD
Sabe quando você acorda com a sensação de que teve um
sonho, mas não consegue se lembrar de nenhum detalhe dele para
confirmar que foi isso mesmo que aconteceu? Foi dessa forma que
acordei naquela manhã.
Quando acordei, tive a sensação de que alguém estava
tocando o meu rosto enquanto eu dormia, com tanto carinho que me
impossibilitava de abrir os meus olhos e enxergar quem estava ali.
Mas aquilo era impossível, né? Trevor não estava do meu
lado. Não tinha mais ninguém no quarto, na verdade, portanto aquilo
que estava sentindo não passava de uma sensação.
Aproveitei que despertei cedo e, antes de procurar por Trevor
pela casa, coloquei uma roupa para correr. Precisava voltar para a
minha rotina de exercícios e nada melhor do que correr perto do
mar. Fazia um tempo que não fazia isso.
Deixei o quarto alguns minutos depois e passei pelo qual Barry
e Maeve haviam compartilhado. E se não fosse pela voz de minha
amiga falando o meu nome, com certeza teria passado rapidamente,
sem parar para escutar sobre o que estavam conversando por
detrás da porta.
— Não é estranho tudo isso, Barry? Impossível só eu achar.
— Você é implicante, sabia? — Ele devolveu. — Os dois
podem ter se apaixonado com um beijo.
— Estou falando sério, Barry! — Maeve disse. — Caitlin nem
queria relacionamento nos últimos meses. Até mesmo os seus
casos de uma noite estavam diminuindo porque, segundo ela
mesma, precisava se manter focada nos treinos, então como que do
nada aparece com um namorado?
— Não sei. Amor, talvez? — Houve uma pausa do outro lado.
— Não tenho culpa se nunca se apaixonou e não sabe o que é isso.
— Se é amor, por que eles não estão toda hora agindo como
um casal apaixonadinho? — devolveu. — Não finja que não é
estranho.
— Pensando por esse lado...
Droga.
— Caitlin tem estado cada vez mais estranha e até mesmo seu
desempenho no jogo caiu. — Maeve comentou. Até poderia ser
confundido com preocupação, se não fosse pela sua frase seguinte:
— Daqui a pouco, vai estar no meio das reservas. Caitlin era muito
mais legal no ensino médio, parece que agora não é mais a mesma
pessoa.
— Todos crescem, não acha? Crescimento sempre traz
mudanças. — Barry me defendeu. — E não somos mais
adolescentes, Maeve. Estamos na faculdade, traçando nosso futuro
e adquirindo responsabilidade.
— Está do lado de quem, afinal?!
— Não achei que deveria escolher um lado.
— Que seja! Eu vou descobrir o que ela está escondendo de
qualquer forma. — Maeve falou num tom de voz tão decidido que
tive um pouco de medo de ela acabar mesmo descobrindo tudo
sobre mim.
Dei alguns passos para trás e voltei a andar antes que fosse
pega escutando atrás da porta.
Não imaginava que Maeve desconfiasse tanto assim do meu
relacionamento com Trevor. E o que ela queria dizer com ficar na
reserva?
Senti-me um pouco magoada ao ouvir aquilo de alguém que,
mesmo sabendo que era uma pessoa difícil de lidar, considerava
como uma amiga. Tudo bem que já havia notado que estávamos
cada vez mais distantes depois que Trevor entrou na minha vida,
mas, olhando por certo ângulo, não tinha nada a ver com ele, e sim
comigo.
Eu estava cansada daquela vida de fingimentos. Mas como
podia cansar de algo que fazia parte de mim? Mesmo com suas
imperfeições, aqueles quatro eram tudo o que eu tinha, enquanto
Trevor... Ele era apenas uma distração que duraria pouco tempo.
E por pensar nele...
Trevor estava na sala quando desci as escadas, parecia um
pouco confuso e irritado com o telefone na mão.
— Algum problema? — indaguei. — Você parece nervoso.
Ele se virou para mim, usando aquela regata e bermuda velha
que, ainda assim, o deixavam gostoso. Trevor tinha mesmo braços
muito definidos e a vontade súbita de sentir como seria se eles me
segurassem contra o seu corpo me tomou.
O que eu estou pensando?
Precisava achar uma forma de voltar para os meus amigos,
não passar mais tempo em uma mentira.
— Bom dia. — Sorriu em cumprimento. — Ahm..., não é nada.
Vai correr?
Eu assenti.
— Acho que está um clima agradável para isso.
— Posso ir junto?
O que eu poderia responder? Até que gostava da companhia
dele.
— Claro.
— Vou me trocar e já volto.
Ele passou por mim correndo e eu me sentei no sofá da sala
para esperá-lo. Aproveitei para pegar meu celular e entrar na
comunidade da qual fazia parte. Não tinha muitas postagens novas
e a maioria nem me dei ao trabalho de ler por completo.
Talvez naqueles dias em que Trevor e eu passaríamos juntos,
poderíamos fazer uma publicação em conjunto, expondo nossas
opiniões para ver se geraria outro debate. Seria divertido.
— Vamos?
Guardei meu celular e foquei em Trevor.
Ele estava usando outra bermuda preta e uma camisa de
manga curta da mesma cor agora, muito mais novas do que o
conjunto que tinha usado para dormir.
— Ok.
Saímos de casa e eu apontei em direção ao calçadão que não
ficava muito longe, era lá que iríamos começar a nossa corrida.
— Gosta de se exercitar? — Eu puxei assunto.
— Quando estou com vontade, eu vou para a academia —
admitiu. — Geralmente é uma ou duas vezes por semana. — Isso
explicava por que ele tinha um corpo bonito. — E você?
— Eu costumava correr todos os dias antes de te conhecer.
— E por que me conheceu, você parou? — perguntou, com um
tom de voz divertido.
— Parece que muita coisa mudou em um curto espaço de
tempo desde que você apareceu na minha vida — admiti, parando
na calçada que correríamos. — Vamos?
Percebi ao olhar para o seu rosto que ele perguntaria algo,
mas desistiu e apenas concordou em começarmos a nossa corrida.
Talvez assim fosse melhor.
Trevor era melhor em me ler do que qualquer outra pessoa já
tinha sido.
— Você está bem?
Trevor perguntou depois de um tempo. Estávamos parados há
um tempo no meio do calçadão em frente à praia, descansando
depois da corrida intensa que fizemos.
— Por que está perguntando isso? É lógico que sim.
— Estamos correndo há vinte minutos. — Respirou fundo,
tomando ar porque, mesmo estando parado há algum tempo, estava
ofegante da nossa corrida. — E você não falou nada.
— É ruim falar correndo, sabia? — brinquei, e apontei para a
praia. — Vem, vamos nos sentar na areia.
Eu retirei meus tênis e minhas meias só para sentir a areia sob
meus pés e de soslaio vi Trevor fazer o mesmo. Nós nos
aproximamos do limite da parte seca e nos sentamos de frente para
o mar. O sol não estava tão forte naquela hora, então estava
tranquilo para descansar ali e longe o bastante dos olhos dos meus
amigos.
— Por que contou para o seu irmão sobre nós? — perguntei,
olhando para o mar calmo à nossa frente.
Senti que Trevor estranhou a pergunta que fiz de repente, mas
respondeu sem rodeios.
— Não escondo nada dele porque confio nele e o amo.
Confiança.
Amor.
Será que era por causa disso que eu não contava a verdade
para os meus amigos?
— Por quê?
— Maeve está muito desconfiada — revelei o que ele já sabia
por causa do que havia acontecido na noite anterior. — Escutei uma
conversa atrás da porta.
— Estava escutando atrás da porta? — perguntou com
divertimento.
— Não era a minha intenção, mas acabei ouvindo o meu nome
e fiquei ali para escutar — resumi. — Ela acha tudo isso estranho e
nem posso dar uma explicação tão lógica porque é a verdade. Tudo
é estranho porque não é real.
— Quer contar sobre o acordo para ela?
Neguei e talvez o tivesse deixado um pouco confuso.
— Ela não é o meu Chris — expliquei de uma forma que ele
entendesse. — Acho que nem o meu irmão é.
Trevor ficou em silêncio por um longo tempo, mas eu não
ousei olhá-lo porque poderia acabar despejando tudo no seu colo
apenas com a forma como ele sempre arrumava um jeito de me
confortar.
— Vocês não são amigos desde o ensino médio?
Assenti.
— Mas acho que o tempo não é importante para uma relação
— expliquei o que havia percebido nos últimos dias. — Há pessoas
que você conhece há anos e não se sente confortável para nada e
outras que você conhece há tão pouco tempo e já pede para te
carregar nas suas costas como se fossem velhos amigos.
Podia jurar que ele estava sorrindo agora.
— Isso tem a ver com o que me falou naquela noite?
— O que eu falei? — Fiz-me de desentendida.
— Que você é o que eles amam e, dessa forma, nunca irá
perdê-los — disse, me provando que se lembrava de cada
palavrinha daquela noite. — Você também disse que não tem medo
de me perder e, por isso, não precisa ser alguém que eu ame.
Senti meu pescoço todo ficar quente, o que só indicava que
estava corando e não era nem por conta do sol batendo em meu
rosto.
— Por que não tem medo de me perder?
Finalmente eu o olhei e encontrei seu semblante um pouco
tenso.
— Porque o que nós temos é temporário — respondi, decidida
a falar a verdade pela primeira vez. — Um dia, vamos acabar esse
acordo e provavelmente só nos cumprimentarmos quando nos
vermos por acaso no campus ou fora dele. Então, como eu poderia
ter medo de perder alguém que não me pertence?
Sua expressão mudou para compreensão ao entender a minha
linha de raciocínio.
— E se isso que a gente tem se transformar em uma amizade?
— questionou, deixando-me sem uma resposta rápida para dá-lo. —
Não poderia mais mudar para se enquadrar no meu ciclo.
— Acho que é por isso que não seríamos amigos.
— Ou é por causa disso que seríamos amigos — corrigiu. —
Você não precisa ser quem não é só para agradar aos outros, isso
só mostra o quanto eles não te merecem. Eu pensava que você era
alguém completamente diferente antes de te conhecer e devo
admitir que tinha uma imagem péssima sua.
Sorri tristemente.
— Você não entenderia.
— Tenta me explicar, então — pediu com aqueles olhos
brilhando para mim. — Posso fazer um esforço para entender.
Voltei a observar o mar, me sentindo envergonhada por estar
tendo justamente aquele tipo de conversa com ele.
— Perdi muitas pessoas na minha vida por ser quem eu sou.
Ninguém quer ser amiga da jogadora de vôlei que acredita que
existe vida extraterrestre, que ama assistir filmes de terror à noite e
que gosta de escutar k-pop. — A última informação deve tê-lo
pegado de surpresa. — É, hoje em dia eles só estão na playlist, mas
quando eu era adolescente, tinha um quarto repleto de pôsteres do
BTS e do Blackpink.
— Isso é sério?
Eu o olhei bem séria e apontei o meu dedo indicador em sua
direção.
— Não ria!
— Eu não vou rir! — Levantou as mãos para cima em
rendição. — Só estou surpreso pelo seu gosto ser tão eclético dessa
forma.
— Tem mais — falei, pronta para que me conhecesse por
completo. — Sou uma garota que não se importa com moda ou
redes sociais, que amava comer até ficar completamente cheia e
andar de bicicleta com os meninos quando era criança, e ainda
prefiro esportes a uma saída no shopping, por exemplo.
Inclinei o meu corpo para trás e apoiei meu peso nas mãos,
sentindo a brisa do mar naquela manhã tão agradável.
— O meu irmão é o único que sabe disso e, quando entramos
na escola em que conhecemos nossos amigos, foi o primeiro que se
aproximou de Maeve e Barry por conta do futebol — continuei, me
lembrando daquela época. — Melvin me disse que eu podia sair
com eles uma noite, só não podia deixar que soubessem sobre as
minhas “estranhezas”.
Trevor revirou os olhos e eu sorri.
— Então, naquela manhã, para ajudar o meu irmão a
conquistar a amizade do casal mais popular da escola, eu mudei
tudo sobre mim a fim de me enquadrar nos padrões deles — resumi
o que aconteceu. — Com o tempo, Aurora também se aproximou da
gente e nos tornamos o que somos hoje. Sei que deve estar
pensando que é uma besteira, mas não é para mim. — Fui sincera,
voltando-me para as ondas fracas quebrando na minha frente. —
Eles se transformaram na minha família.
Fechei os meus olhos e deixei que processasse as
informações que passei para ele. Também porque estava me
sentindo um pouco vulnerável por ter me aberto tão facilmente
quando tinha dificuldade de me abrir até mesmo para os meus
amigos.
Nunca tive oportunidade para isso.
Essa era a realidade.
— Eu os encontro todos os dias, conversamos e rimos sobre
coisas fúteis, e juro que me sinto bem por alguns minutos até me
lembrar que... estou sozinha — admiti, não tendo coragem mais de
abrir os meus olhos. Mas ainda permaneci falando, sentindo uma
grande vontade de me abrir cada vez mais para Trevor. — Maeve
sempre me olha como se fosse minha mãe prestes a me dar bronca
e às vezes tenho dúvida se realmente me ama. Aurora..., eu não
entendo por que ela está com a gente quando o seu coração é tão
puro, e Barry é um bobão, enquanto o meu irmão parece que nem
tem uma irmã.
Aspirei o ar puro da praia antes de continuar.
— Às vezes, eu os observo enquanto entro em conflito comigo
mesma: por que preciso ser uma deles? Por que é tão difícil ser
como eles? Ou gostar das mesmas coisas que eles? Eles não me
entendem e eu não os entendo. Nós não ligamos uns para os outros
e tampouco nos conhecemos de verdade. Então, é nessas horas
que me pergunto: o que eu tenho que mudar em mim mesma para
ser mais aceita?
Tudo em mim dói como naquela vez em que era criança. O
medo vem e me congela, me impossibilitando de ser diferente.
“Você precisa ser perfeita, não uma jogadora idiota de vôlei.
Precisamos ser a família perfeita e você está estragando isso com
suas estranhezas, Caitlin.”
Chegava a ser engraçado como nossas memórias
armazenavam cada detalhe do que não deveriam em nosso
cérebro, tudo por conta da amígdala. Mesmo depois de anos, eu
conseguia ouvir a voz dela em alto e bom som, assim como podia
vê-la na minha frente, com tanto ódio nos olhos direcionado a mim
por ser dessa forma.
Senti a água gelada molhar a ponta dos meus pés e isso me
fez abrir os olhos. Olhei para a areia molhada à minha frente e para
as duas conchas que o mar havia trazido junto.
Peguei uma delas.
— Até mesmo os moluscos recebem algo para protegê-los...
— comentei, alisando a concha na minha mão. — Enquanto nós não
conseguimos fazer isso por nós mesmos.
Observei a mão de Trevor pegar outra concha e, de cantinho
de olho, o vi analisá-la como eu tinha feito.
— Você nunca vai precisar ser alguém diferente do que é perto
de mim, e não porque não tem medo de me perder, mas porque eu
gosto de você exatamente da forma como é. — Ele ergueu o meu
queixo e me fez encará-lo. — Nunca fiz nada parecido com isso,
mas acho que você pode ser um bom início... Então, se quiser, pode
me considerar o seu amigo porque eu já te considero uma.
Pisquei duas vezes rapidamente, pensando ter escutado
errado.
— Está falando que somos amigos?
— Com a condição de você ser assim..., desse jeito que me
conquistou.
Sorri de lado.
— Então, eu conquistei você?
— Claro... Eu tenho que ter uma amiga que ame filmes de
terror. Assim, caso um extraterrestre pouse na nossa Terra, terei
você para me defender deles.
Eu gargalhei, balançando a cabeça.
— Isso não faz sentido, sabia?
— Não faz, mas fez você rir. — Ele piscou, e o meu coração
acelerou por alguns segundos.
Amizade... Se Trevor soubesse que eu pensava em dar para
ele, não iria sugerir isso.
Deitei-me na areia e voltei a fechar os meus olhos por causa
do sol na minha cara.
— Obrigada por me ouvir — agradeci —, amigo.
Não sabia se ele havia notado o meu deboche na palavra
amigo, mas se o fez, ignorou e se deitou ao meu lado.
— Vamos focar em provar à Maeve que o nosso
relacionamento é verdadeiro — disse. — Abraços?
— Beijos?
Ele riu e me deu um cutucão no ombro.
— Estou falando sério!
— Abraços me parecem bons — respondi, por fim. — Vamos
voltar para a UCLA com ela acreditando no nosso namoro.
Procurei a sua mão na areia e a apertei.
— Isso é uma promessa.
É difícil falar e se sentir ouvida
Quando você sempre sente que é um fardo
Não quero contribuir para a preocupação que eles já sentem
MY MIND & ME – SELENA GOMEZ
CAITLIN HOWARD
Dez minutos depois de ter desabafado como uma pobre
menina sofrida praticamente no colo de Trevor, me senti arrependida
e pedi para irmos para a casa da praia. Os meus amigos já
deveriam estar acordados e provavelmente se perguntando onde
estávamos.
O meu arrependimento não era por ter jogado quem eu era em
seu colo, afinal, ele era inteligente e já devia ter percebido a
diferença do que falavam de mim e de quem eu era. Mas, então,
vinha a parte de ter falado sobre me tornar tudo o que meus amigos
queriam apenas para agradá-los. Não acreditava que ele tivesse
entendido perfeitamente porque não conhecia a história inteira, tanto
era que ofereceu sua amizade como se fosse algo simples de ser
resolvido.
Não era.
Maeve, Melvin, Barry e Aurora eram as únicas pessoas que eu
tinha.
Por mais que machucasse aquela nossa relação, eles ainda
eram os únicos que estavam ao meu lado, mesmo que fosse
apenas fisicamente.
— O que você pensava sobre mim antes de me conhecer? —
perguntei, caminhando ao seu lado em direção à casa de Barry.
Precisava enterrar aquele assunto junto da conversa que
havíamos tido, mas me vi querendo saber mais sobre o que Trevor
pensava de mim antes.
Ele sacudiu a cabeça e me olhou.
— Quer mesmo saber?
— Claro..., estou perguntando — rebati. — Era algo tão ruim
assim?
— Não, mas é estranho dizer isso em voz alta agora que sei
que não é assim — confessou. — Mesmo não te conhecendo
totalmente.
— Eu julgava você como um nerd estranho e arrogante antes
— contei. E minha confissão não pareceu surpreendê-lo tanto
assim. — Agora vejo que você só é um pouco arrogante.
Trevor deu risada do que falei e olhou nos meus olhos quando
paramos em frente à casa.
— Eu julguei você com base na sua popularidade, riqueza e
estilo de vida. Achava que não tinha um pingo de responsabilidade e
que era, sim, um pouco arrogante, prepotente e só sabia curtir em
festas, pegando caras enquanto postava sobre coisas fúteis nos
stories do Instagram. Mas olha agora..., descobri que nem gosta de
rede social.
— Acompanhava o meu Instagram? — Fazia um tempo que
não postava nada e admitia que o suspense era proposital para um
dia convencer Trevor de postar uma foto nossa para que as pessoas
acreditassem mais naquela mentirinha de namoro. Mas obviamente
não comentei sobre aquilo com ele ainda. — Por que eu acho que
você é daqueles que julgam, mas me admiram em segredo, hum?
Ele revirou os olhos, não disfarçando a careta.
— Teve uma vez que apertei seguir sem querer e acabei, sim,
olhando seus stories apenas de curioso.
Não consegui esconder meu sorrisinho convencido, que logo
foi notado por Trevor e o fez dar um tapinha no meu ombro.
— Nem pense nisso!
— Você era meu fã! — provoquei. — Isso, sim, é um plot twist
digno de filme! Não me diga que propôs o relacionamento falso
porque queria se aproximar de mim.
— Estou a um passo de mudar minha opinião sobre você de
novo — ameaçou, mas notei que estava se divertindo. — Quer
testar a sorte? Continue com essa ideia e desisto de ser seu amigo.
Ousadia sempre tinha sido meu nome do meio, mas achava
que não tinha apresentado essa parte para Trevor ainda, por isso,
me aproximei um pouco mais do seu corpo, presa ao magnetismo
do seu olhar.
— E podemos ser só amigos?
Eu havia roubado seu espaço pessoal e tinha quase certeza
de que era isso que ele estava pensando no momento. Meu peito
estava quase colado ao seu enquanto esperava a sua resposta, que
parecia estar sendo processada dentro daquele cérebro inteligente.
— Nós... podemos — soprou as palavras, não me causando
confiança quando desceu os olhos para a minha boca.
Eu senti todo o meu corpo esquentar apenas com a vontade
de esquecer a nossa lei, erguer meus braços e puxá-lo para um
beijo, a fim de finalmente conhecer a sensação dos seus lábios nos
meus. E decidida a brincar um pouquinho mais com o perigo
daquela atração que crescia gradualmente entre nós, toquei seu
pulso e subi pelo seu braço, sentindo sua pele se arrepiar por onde
a ponta dos meus dedos passava.
— Somos namorados. — Eu o lembrei, surpresa por a minha
voz sair firme, mesmo com a forma como ele me olhava.
Obrigada por todos os anos de experiência.
Trevor me encarava como se pudesse me devorar apenas com
o olhar e eu quis muito poder ler pensamentos naquele instante só
para saber o que estava se passando pela sua cabeça.
Como seria a sua pegada? Ele era experiente? Virgem era
uma coisa que já sabia que não era por conta do jogo de verdade ou
desafio da noite anterior. E obrigada por isso, Maeve.
— De mentirinha — retrucou baixinho, a voz muito mais rouca
do que normalmente. — Então..., podemos ser só amigos.
Não era essa a resposta que eu gostaria de ter recebido dele.
Pelo visto, mesmo que os seus olhos me devorassem, a sua
consciência parecia saber tomar conta de todas as suas emoções, o
que significava que não poderia tirar uma lasquinha dele no meio do
acordo que firmamos.
Tudo bem que eu estava naquele relacionamento de
mentirinha porque estava de saco cheio das pessoas dando em
cima de mim, porque precisava de uma desculpa para não ir mais
às festas e, assim, focar mais no meu desenvolvimento para a
temporada de vôlei. Mas..., não me importava tanto como Trevor em
acabarmos nos beijando ou, quem sabe, até transando em algum
momento do acordo. Não éramos adolescentes e eu nunca havia
me apaixonado na vida, não seria agora e por um namorado de
mentirinha que acabaria abrindo uma exceção, certo?
Seus olhos desviaram para algo atrás de mim, me lembrando
que eu ainda estava extremamente próxima dele e o encarando
como uma safada.
— Oi, pombinhos! — A voz de Aurora surgiu atrás de mim, me
fazendo dar um pulo no lugar e me virar tão rápido, que fui segurada
pela cintura por Trevor. — Desculpa, não queria assustar você.
— Oi — respondi, apreciando um pouco mais do toque das
mãos de Trevor na minha cintura antes de responder à minha
amiga. — Por que está aqui fora? Onde estão os outros?
— Na água. — Apontou para o mar, e vi três cabeças muito
conhecidas por mim parecendo se divertirem entre as ondas.
Olhando de longe, nem pareciam que eram tão distantes uns dos
outros como eu era deles. — Onde vocês estavam?
— Acordamos cedo e fomos correr — respondi ao mesmo
tempo em que Trevor me largou e se afastou de mim. Senti falta da
sua presença e do seu toque imediatamente. — Por que não está
de biquíni?
— Não estava muito a fim de entrar na água, mas agora vi eles
se divertindo e me deu vontade de entrar. Por isso vim para casa
trocar de roupa.
— Eu... vou tomar um banho. — Trevor avisou, e antes que eu
falasse algo, estava entrando em casa com uma rapidez
impressionante.
A minha amiga se colocou do meu lado e sorriu para mim.
— Gosta dele? — questionou.
— O quê? — devolvi, um pouco confusa. Levei um pouco de
tempo para entender que ela estava falando do meu namorado de
mentirinha. — Bom..., eu estou namorando ele.
O seu rosto ficou um pouco mais sério com a minha resposta,
mas Aurora ainda permaneceu com aquela simpatia que sempre
irradiou dela, completamente diferente de Maeve, por exemplo.
— Está mesmo?
Sua pergunta não só me surpreendeu como me fez arregalar
os olhos.
— Como assim?
— Eu posso parecer ingênua como Maeve sempre faz questão
de brincar, mas não sou burra, Caitlin — murmurou, encostando-se
no guarda-corpo da sacada da casa. — Notei que ficaram tensos
quando Maeve desafiou vocês a se beijarem.
— Trevor só não gosta...
— Sabe que não precisa esconder isso de mim, né? Eu sou
sua amiga e, mesmo que não entenda por que logo você teria que
fingir um relacionamento, tentaria compreender e te apoiar no que
fosse preciso.
Droga.
Qual era a dela agora?
— Maeve não precisa saber — continuou, tentando me passar
confiança. — Acho que ela não entenderia, de qualquer forma.
Olhei para o mar a fim de buscar Maeve e a encontrei fora do
mar, tomando sol e deitada de barriga para cima em uma toalha.
— Só aquela cena de ontem te faz ter tanta certeza de que
não estamos em um relacionamento? — indaguei, querendo
entender como ela chegou a essa conclusão sobre nós.
— E a forma como às vezes vocês parecem desconfortáveis
um na frente do outro e, de vez em quando, confortáveis.
— Não é o suficiente.
— Então, estou apenas enlouquecendo como a Meave e
vendo coisas onde não deveria?
Eu poderia ter dito que sim, mas que merda era aquela que
não podia ser verdadeira nem com a minha melhor amiga? Aurora
estava me dando a oportunidade ali pela primeira vez, não poderia
desperdiçar.
— Estava de saco cheio de todas aquelas cantadas, de todas
as mensagens enchendo a minha caixa de entrada convidando para
um encontro idiota que só acabaria em uma cama onde me sentiria
ainda mais vazia. Também precisava focar nos treinos e nos
estudos porque meu rendimento caiu no semestre passado. —
Enumerei todas as coisas que me fizeram chegar àquela escolha. —
Trevor queria ser visto como comprometido para afastar Tiffany de
uma vez por todas, por isso, unimos o útil ao agradável.
Mesmo que estivesse suspeitando do nosso relacionamento,
Aurora ainda ficou surpresa pela minha total sinceridade ao explicar
desde o início o que nos havia levado ao namoro de mentirinha.
— Uau... Então, tudo não passa de uma encenação —
murmurou, e eu assenti. — Por que não nos contou?
— Vocês não levariam isso a sério. — Ao ouvir o que disse,
corrigi rapidamente, indicando para o mar: — Eles não levariam a
sério.
— Mas era necessário chegar a esse ponto de ter um
relacionamento falso? — Ela sabia que era. — Quero dizer, está tão
de saco cheio assim a ponto de inventar isso?
— Pareceu uma boa ideia na hora.
Aurora deu de ombros e virou-se de costas para o mar à nossa
frente, colocando seus olhos em cima dos meus.
— Está tudo bem com essa mentira? Já vi em filmes que isso
sempre evolui para algo verdadeiro.
Eu ri fraco, cruzando os meus braços em frente ao corpo.
— Trevor criou algumas regras para que isso não aconteça.
— Me deixa adivinhar... Não beijar é uma delas.
— Bem óbvio, né?
— Um pouquinho. — Deu risada. — Estão lidando bem com
isso?
— Por que não estaríamos?
— Porque vocês podem não ser namorados de verdade, mas
notei a forma como se olham — explicou. — Trevor é bonitinho e
não sou eu dizendo isso, até Tiffany quer ficar com ele, lembra?
Assenti e decidi mudar de assunto.
— Acha que Maeve está brava por ter tanta certeza do que
está acontecendo?
— Ela é mimada, lembra? Não podemos esquecer desse
detalhe importante da sua personalidade.
Suspirei.
— É difícil lidar com ela.
Aurora concordou, compartilhando do mesmo pensamento que
eu.
— Acho que até ela sente dificuldade de lidar consigo mesma
— comentou, tão misteriosa que me deixou curiosa.
— Do que está falando?
— Não sei de muita coisa, mas acabei ouvindo o fim de uma
discussão com a senhora Bonnie no telefone — respondeu,
referindo-se à mãe de Maeve. — Não entendi o contexto, mas
Maeve gritou que faria o que ela estava mandando com tanto ódio
que não lembro de alguma vez já ter visto ela assim.
Será que Maeve estava com problemas em casa? Não tinha
muita intimidade com Bonnie, mas ela sempre pareceu ser uma boa
mãe para a nossa amiga.
— Já percebeu que não contamos nada uma para a outra? —
perguntei, a fim de entender como aquilo era para ela. — E isso é
desde o último ano do ensino médio. Vivemos uma vida com a
ilusão de que não temos problemas. Por exemplo, eu nem sei como
anda o seu relacionamento com o meu irmão.
Aurora sorriu de lado.
— Um pouco disso é nossa culpa, sabia? Estabelecemos ser
essas pessoas perfeitas quando somos pessoas comuns, com
dores, cicatrizes e um coração que bate — traduziu perfeitamente o
que a nossa realidade significava. — Isso vem desde a criação de
vocês. Ou não se lembra da vez que encontramos Maeve chorando
no banheiro da escola e, quando fomos perguntar por que ela
estava daquele jeito, foi grossa ao nos dizer para não nos metermos
na vida dela?
A minha memória vagou automaticamente para aquele dia
como se Aurora tivesse apertado um botão de teletransporte. Entrei
outra vez naquele banheiro com minha amiga, ouvindo os soluços
altos de Maeve dentro de uma das cabines. Ela parecia tão triste,
que só de lembrar com clareza, sentia meu coração doer como no
momento em que ouvi pela primeira vez. Aurora quem abriu a porta
da cabine e se ajoelhou na frente dela, a abraçando para que não
se sentisse sozinha, mesmo que não soubéssemos o motivo de ela
estar chorando de tal forma.
“Não! Me deixa sozinha.”
“Vocês não precisam se meter nisso!”
“Saiam daqui, porra!”
Foram as três frases que ela disse para nós naquela tarde,
uma mais dolorosa do que a outra e deixando que o grito assustador
saísse na última com um palavrão que nunca havia sido dirigido a
nós.
— Desde aquele dia, não tocamos mais em assuntos pessoais
— murmurei. — Não me lembrava mais disso.
Aurora assentiu.
— Acho que todos nós guardamos as cotas de merda que
passamos — falou, dando uma curta e fraca risada. — Faz parte da
passagem de adolescente para a vida adulta, não?
— E a sua? É com o meu irmão? — Aurora assentiu à minha
pergunta. — Eu sei que ele é meu irmão, mas por que ainda está
com ele?
Os seus olhos se encheram de água e eu quis abraçá-la por
um segundo. Aurora pareceu frágil naquele momento, algo que
nunca havia visto nela.
— Porque eu o amo — admitiu baixinho. — Alguns podem
julgar o que temos com toxicidade, e sinceramente? Talvez seja,
mas eu ainda assim o amo, sabe? Não aguentaria todo aquele
temperamento se não amasse.
O que ela disse me fez engolir em seco e um medo subiu por
todo o meu corpo.
— Aurora..., ele não...?
Nem consegui terminar porque, só de pensar que meu irmão
batia nela, uma bile subia e a vontade de colocar a água parada no
meu estômago para fora vinha com tudo.
— O quê? Pelo amor de Deus, não! — garantiu, me deixando
tão tranquila a ponto de sentir meus ombros relaxarem. — Melvin é
do tipo que briga com todo mundo e que mataria qualquer um só
para me manter intacta e para ele.
— Um pouco obcecado, não acha? — Deveria ter soado
divertido, mas aquela era uma conversa muito séria para ser levada
na brincadeira.
— Melvin depende de mim — justificou. — Ele mesmo já
admitiu isso.
— Eu tenho medo disso, Aurora... — revelei. — Você, um dia,
pode se cansar dele e eu não sei o que aconteceria se o deixasse.
Ela sacudiu a cabeça e me deu um empurrão fraco no ombro.
— Estamos desfocando do assunto aqui, percebeu?
Sorri de lado, não gostando da forma como mudou de assunto
também. Nunca havia vivido um amor antes, mas sabia que só esse
sentimento não era o suficiente para segurar uma relação.
— É porque mal conversamos sobre nossas vidas, então
temos muitos assuntos pendentes — provoquei.
Aurora riu, concordando comigo.
— Espero que ocorra tudo certo com o seu relacionamento —
disse ela. — Mas..., Trevor parece muito legal para o nosso meio.
— Por que acha que ele está desconfortável aqui? Pelo pouco
que conheço, Trevor só tem a presença do irmão.
— Parece solitário.
Não disfarcei meu olhar irônico em sua direção e ela pescou
na hora o que eu queria dizer, me deixando feliz por termos essa
facilidade de nos comunicar com os olhos.
— Tudo bem, não é tão diferente da gente. — Riu.
— Da gente, o quê? — Maeve surgiu do nada, ficando ao lado
de Aurora, do outro lado do guarda-corpo. — Por que estão aqui? O
mar está maravilhoso para tomar um banho.
— Estávamos conversando. — Aurora respondeu e se
desencostou do guarda-corpo. — Vou trocar de roupa.
Ela mandou um beijo e entrou na casa, deixando-me sozinha
com Maeve. Era a primeira vez que eu a via depois do que tinha
escutado atrás da porta e admitia que era estranho encará-la agora.
Por que Maeve era daquele jeito? Ela, sim, era arrogante,
prepotente, ligava muito para a fama, mídia e redes sociais, como
Trevor havia pensado sobre mim.
— Tudo bem? — perguntei.
— Sim, por que não estaria?
Dei de ombros, não muito interessada.
— Os meninos toparam em formar um time com a gente
depois para jogar vôlei — anunciou. — Veja se o seu namorado vai
querer jogar também. Isso, se ele souber o básico do esporte.
— Vou ver.
Eu já estava dando as costas, a fim de entrar na casa e me
arrumar para me juntar a eles, mas ela me interrompeu.
— Caitlin. — Virei-me e a encarei. — Fiz sua omelete favorita
de café da manhã. Sobrou um pouco, então esquente antes de
comer, ok?
Ela deu as costas e correu em direção ao mar novamente, me
deixando completamente louca com a sua forte mudança de humor
de uma hora para a outra.
O que há de errado com você, Maeve Hood?
TREVOR LANCASTER
Eu posicionei o celular na bancada da pia enquanto colocava
pasta de dentes na minha escova e esperava o ser do outro lado
atender a minha videochamada.
— Mamãe disse que você não vive sem mim e estou
começando a achar que ela tem razão. — Christopher sinalizou
assim que a atendeu a chamada. — Eu vi você ontem.
Revirei os meus olhos e, antes de começar a escovar os meus
dentes, questionei:
— Por que confirmou para a nossa mãe que Caitlin era a
minha namorada?
— E ela não é?
— Christopher Lancaster!
— Era impossível não confirmar com aquela foto que Maeve
postou — argumentou. — Inclusive, você já viu os comentários
sobre ela?
— Você sabe que não perco tempo em redes sociais —
respondi, com a boca cheia de pasta de dentes. Infelizmente, eu
não conseguia controlar a minha curiosidade, por isso, perguntei: —
O que estão falando?
— Sua sorte é que estou com o computador aberto. —
Christopher mexeu no mouse visível pela chamada e, com os olhos
na tela do que deveria ser o computador, começou a sinalizar: —
“Então, eles estão mesmo juntos? Achei que era mentira”. “O nerd e
a popular. Achei que era uma das brincadeiras da Caitlin, mas, se
eles estão indo viajar, é porque estão mesmo juntos”.
— Brincadeira da Caitlin? — perguntei, sem entender aquela
parte.
— Também fiquei confuso e curioso, por isso fui para o Twitter
pesquisar sobre o assunto. Parece que no ano passado, Caitlin ficou
com um garoto tão excluído quanto nós no campus e era parte de
uma aposta. — Interpretar aquilo que estava sendo falado para mim
foi ainda mais difícil do que ver. — Pensei que a gente tinha
passado dessas brincadeiras idiotas do ensino médio e achei que
Caitlin não era assim, bom... Naquele dia ela parecia diferente, mas
acho que estava enganado. Você está bem com esse
relacionamento falso? Não precisa disso. Acho que Tiffany não vai
mais incomodar você.
— Quem está sendo o irmão preocupado agora? — devolvi,
tentando soar divertido, mas não conseguindo passar isso porque
ainda estava com a informação de Caitlin brincando de aposta com
um garoto que provavelmente era inocente. — Não vi Tiffany nessa
semana, mas isso não quer dizer que ela não vai voltar a me
procurar. Estou bem! Caitlin me deve uma, lembra?
— Você também foi uma aposta, esqueceu?
— Mas ela me disse antes. Acho que isso muda um pouco as
coisas.
Meu irmão não entendeu por que eu a estava defendendo e
admitia que, se fosse antes, não estaria nessa situação agora. Mas
depois do que tinha ouvido de Caitlin naquela praia...
O que eu tenho que mudar em mim mesma para ser mais
aceita?
Pelo jeito, as mudanças iam muito além de gosto musical e
gosto por gênero de filmes de terror e extraterrestres. A Caitlin que
conversava e flertava comigo agora era muito diferente da que eu
achava que conhecia antes. Muito diferente do que meu irmão
estava pensando agora. Mas eu ainda sentia meu estômago
embolado por conta do que ele havia dito.
— Essa não é ela — garanti, voltando a observá-lo pela tela do
celular. — E fui eu quem pedi para que ela fingisse isso comigo,
estou no controle. Não se preocupe.
— Tem certeza? — Ele parecia mesmo preocupado.
— Por que está tão preocupado? Sabe que eu não me importo
com eles.
— Você acabou de defender a Caitlin depois do que eu disse,
como isso não se enquadra em importância?
— Eu a estou conhecendo melhor e viramos amigos —
comentei, mas logo odiei a forma como semicerrou os seus olhos
para a câmera. — Não começa!
— Amigos em um relacionamento falso? — Não poupou no
sarcasmo em sua expressão.
— É comum em um acordo ambas as partes se darem bem,
sabia? Sei que você não estuda Direito e nem entende nada sobre
leis, mas é inteligente o suficiente para entender o que estou
falando.
Meu irmãozinho revirou os olhos.
— Debochado! — julgou, me fazendo rir fraco antes de
enxaguar a minha boca. — Os amigos dela não estão sendo os
mesmos chatos de sempre? Está se divertindo aí?
— Eu não os chamaria de chatos, mas sim de inconvenientes.
— Fui sincero, lembrando-me do jogo da noite anterior e das
perguntas ridículas. — Mas acho que deve ser por conta da idade.
Chris soltou uma gargalhada do outro lado, reagindo daquela
forma que sempre achava fofo quando ria: seus ombros sempre se
chacoalhavam conforme a intensidade do riso.
Eu amava vê-lo daquela forma. Lutaria para sempre ver o
sorriso no seu rosto, já que havia perdido muito tempo no passado
chorando por conta do seu acidente.
— Você falou como um velho agora! — apontou. — Lembra
que só tem vinte anos?
— Completarei vinte e um em breve, esqueceu?
— Como eu poderia esquecer do seu aniversário? Mamãe já
está pensando em fazer um almoço e aproveitar para conhecer a
sua namorada.
Suspirei, conseguindo imaginar que aquilo ainda me meteria
em encrenca.
— Você deveria ter me defendido.
— Eu? Foi você quem inventou isso, arque com as
consequências — mandou, como o bom sabe tudo que era. — Se
tivesse me ouvido, poderia estar em um relacionamento de verdade
agora com a Tiffany.
Eu sabia que era um pouco desrespeitoso, mas, quando dei
por mim, minha testa já estava franzindo e meus lábios se torcendo
em uma careta só de imaginar um romance entre mim e aquela
garota.
— Não mesmo — retruquei, firme em minha resposta. — Estou
focado, ok?
— Não vou entrar nessa discussão com você de novo.
Christopher simplesmente odiava o fato de eu acompanhar
pela internet o cara que havia provocado o acidente que sofremos
quando éramos crianças. Para ele, aquilo era passado e eu deveria
seguir a minha vida, sem ressentimentos e deixar que o próprio
universo cobrasse um dia.
Mas como eu poderia? Nossas vidas nunca mais foram as
mesmas depois daquele dia.
Perdemos nossa casa.
Perdemos nosso pai.
Christopher perdeu sua voz.
Enquanto provavelmente aquele homem que nos havia tirado
tudo isso estava aproveitando do mesmo dinheiro que nos chutou
para fora de campo.
— Preciso desligar agora. — Christopher disse após respirar
fundo. — Estou no meio do jogo de The Resident Evil.
— De novo? Quantas vezes já virou esse jogo?
— Quer mesmo falar disso quando te peguei jogando The Last
of Us de novo há duas semanas?
Sorri e pisquei para o safado.
— Você tem um ponto — comentei. — Vejo você na quinta?
— Ainda estou pensando se irei voltar na quinta — contou, e
eu fiquei surpreso. — Ficar com a mamãe é divertido e, sabe..., ela
está muito sozinha.
Não tinha como não concordar. Depois que tínhamos ido para
a faculdade, nossa mãe ficou mais sozinha do que normalmente e,
mesmo que vivesse sempre no hospital trabalhando, tinha certeza
de que era bom para ela chegar em casa e ver um de nós.
— Cuide dela, ok?
— Só sou mudo. Posso cuidar dela. — Ele zombou, e eu
apenas respirei fundo. Não gostava quando ele brincava consigo
mesmo dessa forma. — Tchau!
Nem tive tempo de dar tchau de volta porque ele desligou a
chamada antes disso.
Coloquei o celular no bolso da minha bermuda e abri a porta
do banheiro, a tempo de ver Caitlin entrando no quarto.
Ela me olhou assim que notou minha presença.
— Tudo bem?
Assenti com a cabeça, indo até a cama e me sentando na
beirada do colchão.
— Maeve fez omeletes — informou, me deixando surpreso. A
garota sabia cozinhar? — É..., eu também fiquei surpresa com a
atitude generosa dela.
— Devo me preocupar em ter veneno ou uma poção que nos
faz dizer a verdade?
Caitlin riu e se aproximou de mim, sentando-se ao meu lado.
— Acho que é apenas um ato de bondade dela — comentou,
dando de ombros. — Quer que eu seque seus cabelos?
Havia deixado a toalha no banheiro e, até ela fazer aquela
pergunta, pretendia deixar meu cabelo molhado. Era dia e logo ele
secaria. Mas ponderei sua pergunta como se fosse a questão de
uma prova e me lembrei do que havia acontecido mais cedo.
Algo tão simples como uma aproximação e uma provocação
de Caitlin me deixaram com uma vontade súbita de beijá-la,
provando a mim mesmo que o perigo que aquela loira representava
para os solteiros do campus também se enquadrava a mim. Talvez
eu não fosse tão imune ao charme de Caitlin Howard e devesse me
preocupar com isso, afinal.
— Não precisa — respondi, cortando qualquer proximidade
além do necessário que podíamos ter. — Vai secar logo.
— Ok. — Levantou-se. — Eu preciso tomar um banho e depois
podemos nos juntar aos meus amigos, o que acha?
Eles não são os seus amigos.
Quis muito dizer isso baseado no que havia me confessado
mais cedo, porém não falei, apenas concordei com a sua ideia.
— Vamos tomar café primeiro, ok?
— Eu não...
Levantei-me e coloquei a minha mão na sua boca para impedir
que continuasse, em um movimento tão rápido que a deixei
surpresa.
— Vamos comer ou, então, irei ficar trancado nesse quarto o
dia todo e você vai ter que dar uma explicação ridícula para os seus
amigos — apontei, e ela respirou fundo pelo nariz, assentindo
devagar. Já havia percebido que quando ficava nervosa ou triste
com algo, Caitlin não se alimentava direito e como alguém que
estava desenvolvendo uma preocupação por ela, não queria que
ficasse doente e nem que isso afetasse seus jogos. — Que bom que
estamos de acordo.
De repente, senti a sua língua lamber a palma da minha mão
que ainda tapava a sua boca e, com o choque juntamente ao arrepio
que subiu por todo o meu braço, me afastei dela com os olhos
arregalados.
Ela riu da minha reação.
— Que bom que você tomou banho, né? — Caitlin aproximou-
se de mim e deixou um beijo tão próximo da minha boca, que fez o
meu coração bater como um louco. — Vejo você daqui a pouco,
amigo.
Notei o meu rosto ficar vermelho instantaneamente e todo meu
corpo ficar quente, como se ela tivesse a chavinha que ligasse tais
reações adormecidas em mim.
Caitlin me deu as costas e foi para o banheiro com um sorriso
zombeteiro nos lábios, mostrando não acreditar que uma futura
amizade pudesse surgir entre nós.
Talvez, eu também não estivesse acreditando naquele
momento. Mas deveria me manter longe, pelo bem da minha
sanidade mental.
CAITLIN HOWARD
Joguei a bola para o outro lado em busca de uma marcação de
ponto, tentando evitar sorrir que nem uma idiota, mesmo que fosse
difícil porque o que estava acontecendo entre mim e Trevor nos
últimos dias ainda permanecia em meus pensamentos.
Parece que eu havia achado uma coisa mais interessante do
que o acordo que tínhamos e era provocar Trevor. Não havia
acontecido nada maior do que o episódio na cozinha, quando a
ponta do meu dedo foi beijada pelos seus lábios, o que era uma
pena porque simplesmente amei a forma como eu o deixei depois
de pedir um simples beijo.
Mas eu ainda o provocava e instigava.
Fosse quando o chamava ironicamente de amigo, quando
aproveitava que tínhamos que fingir que estávamos em um
relacionamento e o beijava mais próximo da boca do que as outras
vezes, quando o fazia abraçar a minha cintura ou como na noite
anterior, quando simplesmente me sentei no seu colo e o fiz
descansar sua mão em cima da minha coxa nua.
Trevor não era tímido, mas ainda assim ficava desconcertado
e sem saber o que fazer diante de mim. Outro cara, inúmeros dos
que já tinha ficado antes, teria me levado para cama por muito
menos.
Mas Trevor era diferente. O que fazia com que me
perguntasse se era por causa do nosso contrato ou por questões
pessoais dele.
Tínhamos passado os últimos dias fingindo da melhor forma
possível — sem beijos — o nosso relacionamento, sendo muito
observados por Maeve e Barry, que também parecia ter ficado um
pouco desconfiado depois daquela conversa que ouvi atrás da
porta. Contudo, não sabia dizer ao certo se havíamos conseguido
provar algo porque o nosso relacionamento não gerou mais debate
no grupo desde aquela noite.
— Podemos parar por hoje? — Aurora perguntou,
descansando as mãos nos joelhos semiflexionados. — Acho que
treinamos bastante em uma viagem que era para descansar.
Todos concordaram.
Havíamos nos dividido em dois times, o primeiro era: eu,
Maeve e Trevor e o segundo era: Aurora, Melvin e Barry.
— Você até que aprendeu a jogar bem nesses últimos dias,
Trevor. — Aurora elogiou.
Ele sorriu de lado.
— Obrigado.
Deixei que Melvin e Barry cuidassem da rede e me aproximei
do meu namorado de mentirinha, enlaçando o meu braço com o
seu.
— Se jogasse um pouquinho melhor, eu até diria que poderia
entrar para o time de vôlei — brinquei com ele.
— Não gosto nem de jogos de videogame de esportes,
imagina na realidade — confessou baixinho.
Barry que estava perto, ouviu e nos olhou.
— Nunca tentou jogar nenhum esporte, Trevor? Você é
inteligente e pega as coisas rápido, se daria bem em algum time da
universidade.
Melvin, que arrumava a cesta com os objetos do outro lado,
deu risada.
— Ele é nerd, Barry! — Meu irmão falou. — Nerds não curtem
essas coisas.
Trevor abaixou a cabeça, levemente incomodado com aquela
frase.
— Estou surpreso por ele ter vindo viajar com a gente, na
verdade. — Melvin continuou falando. — Até semana passada, eu
achei que ele nos odiasse.
— Ele está com sua irmã agora. — Aurora argumentou. — E
virou nosso amigo.
Nem Trevor e nem Melvin foram capazes de disfarçar a careta.
— No próximo encontro vai trazer o seu irmão estranho?
Senti como Trevor ficou tenso do meu lado de repente e, antes
que eu pudesse entender o que estava acontecendo e o que levou
Melvin a agir assim, Maeve estava abrindo a boca para falar:
— Ele não é estranho — defendeu, olhando para a bola de
vôlei em sua mão. — Você não deveria sair apontando o que os
outros são só por conta da personalidade. O irmão de Trevor é
mudo.
Não só eu, como Aurora, Barry e Trevor se surpreenderam
com a sua resposta. Tudo bem que era um pouco hipócrita da parte
dela dizer aquilo, mas... Maeve, ainda assim, o estava defendendo
depois de ter cometido o mesmo no passado. Parecia que ela havia
aprendido a lição.
— E o que isso difere? — O meu irmão questionou, chamando
atenção pela sua falta de noção. — Ninguém aqui sabe falar a
língua de sinais.
Não consegui me manter calma quanto àquilo.
— Qual é a porra do seu problema, Melvin?! — Larguei Trevor
e me aproximei do meu irmão. — Estávamos nos divertindo jogando
vôlei há pouco, por que tem que sempre estragar o clima?
Ele riu de uma forma forçada.
— Nenhum, só estou conversando com o meu cunhadinho. —
Melvin se aproximou mais de mim. — Já contou tudo sobre você
para ele?
Um fedor de uísque saiu da sua boca e bateu diretamente na
minha cara, explicando o fato de ele estar agindo de uma forma
muito mais idiota do que o normal.
— Aurora, acho melhor levar o Melvin para distrair a cabeça —
falei para a minha cunhada, ignorando o que meu irmão havia
acabado de falar.
— Impressionante como você sempre foge, irmãzinha. —
Sorriu e olhou para Aurora. — Vamos. Você sempre é a única que
me entende mesmo.
A minha amiga murmurou um pedido de desculpas antes de
segurar a mão do seu namorado.
— Espero que você pense melhor e amanhã peça desculpas
por essa merda! — falei quando eles se viraram de costas. — Não é
porque é meu irmão que tenho que aplaudir tudo o que faz.
Como imaginava, Melvin nem me respondeu. Ele preferiu
abraçar os ombros de Aurora e sair de perto de nós.
— Ele está com problemas, Caitlin. — Barry disse, ficando ao
meu lado. — O técnico ameaçou deixá-lo no banco na próxima
temporada porque está péssimo, as notas boas são a única coisa
que o prende no time.
— E isso é desculpa para ser um cuzão? — rebati, não
escondendo o quanto estava chateada com isso.
— Não, mas estou dizendo que seu irmão está na merda e não
quer sair dela. Poderia ao menos se preocupar com ele? Às vezes,
eu sinto que sou o único normal desse grupo!
— Não diga merda, Barry. — Maeve interferiu.
— Eu estou dizendo merda? Não aja como se você fosse
diferente, Maeve.
— Agora está dando desculpas sem sentido. — Minha amiga
rebateu, revirando os olhos.
— Claro que estou — murmurou ironicamente. — Vou entrar e
tomar um banho, talvez pare de dizer e pensar em coisas sem
sentido.
Ele saiu sem esperar a resposta de qualquer um de nós. Ao
meu lado, Maeve soltou um suspiro alto e olhou para o céu,
parecendo buscar paciência, algo que ela dificilmente tinha.
— Acho que o nosso passeio terminou da melhor forma
possível — comentou ironicamente, olhando para o céu limpo e já
escuro da noite. — Do que adianta postarmos coisas felizes nas
redes sociais se não conseguimos nem entender nós mesmos?
Ela se agachou e pegou a rede, seguindo o caminho para casa
da praia de Barry e também sem esperar uma resposta.
Chutei a areia com os pés sem perceber que acertaria Trevor,
pois ele havia se aproximado antes que eu percebesse.
— Desculpa — falei primeiro, levantando meus olhos e
encarando os seus. — O meu irmão está fora de controle, vou tentar
conversar com ele.
Trevor assentiu devagar.
— Já lidei com coisa pior — garantiu. Parecia sincero. — Você
está bem?
— É claro. — Sorri forçado. — É só uma discussão boba.
— Tem certeza?
Movimentei minha cabeça para cima e para baixo porque não
consegui deixar com que as palavras saíssem pela minha boca em
mais uma mentira.
— Não é o que parece — murmurou, olhando para mim como
se pudesse enxergar todas as minhas falhas e mentiras. — Por que
eu sinto que você não desabafou tudo?
— Do que está falando?
— O que está passando pela sua cabeça?
Eu sorri e tentei brincar um pouco com aquela situação.
— O que foi? Virou meu psicólogo?
Trevor revirou os olhos e se aproximou um pouco mais de
mim.
— Se está doendo, apenas deixe sair — aconselhou. —
Quando meu irmão voltou para casa depois de perder a voz, ficava
o dia trancado no quarto sem querer falar com ninguém. Até que um
dia, eu fui teimoso e entrei. Ele estava fazendo a mesma coisa que
você agora, guardando tudo para si.
— E o que sugere que eu faça?!
— Grite, chore ou chute a areia. — Apontou para o chão sob
nós. — Mas não aja como se estivesse tudo bem. Já chega eles
fazendo isso e ficando ainda mais amargurados.
— Não consigo chorar, mas... — Senti aquela bile subir na
garganta e travar ali, como sempre acontecia quando eu e meus
amigos discutíamos. — Eu só... Não queria que você presenciasse
isso...
Fechei os meus olhos e me virei de costas para Trevor,
odiando que ele estivesse ali naquele momento. Sentia-me mal,
mas não conseguia chorar. Os meus amigos estavam cada vez mais
distantes e eu não sabia o que fazer.
Tudo estava desmoronando aos poucos.
Sentia-me em um barco que afundava cada dia mais.
Como tudo chegou àquele ponto? Nunca fomos perfeitos, mas
também nunca estivemos tão afastados dessa forma. O que eu
podia fazer para mudar? Eles eram a única família que eu tinha e o
pior de tudo era ver que todos nós éramos culpados por aquela
situação.
Senti a presença de Trevor mais próxima das minhas costas e
logo braços inseguros e hesitantes estavam se dobrando ao meu
redor em um abraço tímido, que me paralisou por completo.
— Não gosto dos seus amigos, mas você os ama e acho que
posso ver isso melhor agora — murmurou próximo ao meu ouvido,
arrepiando todo o meu pescoço. — Espere um tempo e tome a
atitude para colocarem as coisas em ordem antes que seja tarde
demais.
Abri os meus olhos e abaixei minha cabeça, olhando para os
seus braços ao redor da minha cintura sem acreditar que finalmente
estava sentindo-o próximo daquela forma, mas sem cabeça para
pensar em como era estar nessa situação.
— Isso que sugere? — murmurei.
— Amizade é como qualquer relacionamento, temos que ouvir
e conversar antes que tudo vire uma bola de neve e acabe para
sempre.
Ele tinha razão.
— Você falou como se tivesse muitas amizades. — Eu achei
uma forma de brincar, mesmo naquele momento.
— Quem está sendo idiota agora, hum? Usando meu lado
antissocial contra mim?
Arregalei os meus olhos e tentei me virar para ele para
consertar aquilo.
— Não foi isso...
— Estou zoando. — Ele apertou seus braços ao redor de mim.
— Não tenho mesmo muitos amigos, meu melhor amigo é meu
irmão, odeio festas, amo videogames, animes, filmes e viver o mais
afastado da sociedade possível. Comparado a vocês, eu sou muito
estranho mesmo.
— Ainda assim, gosto do seu estilo — admiti. — Admiro
porque é óbvio que você se sente bem assim.
— Eu me sinto — concordou. — E você precisa fazer o que se
sente bem fazendo.
— A verdade é que eu nem sei por onde começar...
— Você vai saber. Em algum momento irá enxergar isso.
Suspirei, dando como resposta o meu silêncio e pensando
como poderia aproveitar um pouco do seu abraço. Trevor podia ter
iniciado aquilo meio inseguro, mas agora seu corpo todo se
mantinha preso ao meu e me passava conforto.
Nunca havia sido abraçada assim antes.
Era bom.
Era novo.
Era especial.
TREVOR LANCASTER
Eu devo ter enlouquecido.
Pensei que Caitlin estava dormindo e, mesmo que isso não
fosse justificativa para o que eu havia feito, ainda assim a usaria
para sempre. Não era minha intenção me aproximar e beijar sua
testa inicialmente, mas quando me virei e a peguei dormindo — pelo
menos, naquela hora confiava que estava —, acabei deixando que a
vontade de confortá-la agisse por todo o meu corpo e comandasse
até mesmo a minha razão.
Poderia ter me afastado quando percebi que ela estava
acordada? Sim, mas fiquei a olhando como um pateta e agora
estava com os lábios da famosa Caitlin Howard nos meus. E quanto
tempo não beijava? Senti-me nervoso de uma hora para a outra
quando seus lábios se abriram sobre os meus, pedindo passagem
para aprofundar o beijo. No entanto, não tive nenhuma força para
negar àquilo.
Seus lábios eram macios como a sua pele e, ao se
movimentarem sobre os meus, conduzindo o beijo com sua
experiência característica, me vi tentando relaxar em vez de
simplesmente me afastar.
Caitlin mantinha a sua mão na minha nuca e senti uma
agitação tomar conta de todo o meu corpo quando a sua língua
adentrou a minha boca. Levei minha mão até a sua cintura, quase
sentindo sua pele quando a toquei por conta da blusa fininha de
seda que usava como pijama. Não resisti e apertei aquela região ao
mesmo tempo em que minha língua encontrava a sua.
O seu gosto não estava dominado apenas pela pasta de dente
de menta que existia no nosso banheiro, havia um pouco mais dela
ali que era gostoso e me deixava alucinado em sentir um pouco
mais. E eu senti a cada segundo que as nossas línguas se
encontravam e sugavam uma à outra.
Caitlin percorreu a sua mão que estava em minha nuca até os
fios do meu cabelo, enquanto a outra me puxou para mais perto,
quase me fazendo cair sobre o seu corpo. Coloquei um joelho de
cada lado da sua cintura para não machucá-la, sem desgrudar a
minha boca da sua. Não pensei mais em nada e me deixei sentir
aquilo depois de muito tempo.
Nosso beijo estava aumentando a velocidade gradualmente
para algo mais intenso ao mesmo tempo em que suas mãos não me
deixavam desgrudar dela. Sua língua explorava a minha boca de um
jeito que era muito difícil não me sentir excitado. Sentia naquele
momento meu pau crescendo dentro da cueca.
Mesmo com o ar faltando, nós ainda continuamos com aquela
troca até o limite.
Meu coração parecia que iria sair pela boca a qualquer
momento e aquilo pareceu cada vez mais perto de acontecer
quando Caitlin encerrou o beijo com curtos selinhos pelos meus
lábios.
Inspirei e expirei o ar, mas não abri os meus olhos porque
sabia que assim que os abrisse, aquele momento se apagaria. Senti
sua testa tocar a minha e sua mão descer até o meu rosto, onde ela
a descansou por alguns segundos.
— Você beija bem — murmurou, com a voz rouca e carregada
contra a minha boca. — Sua ex-namorada tinha sorte.
Sorri de lado e finalmente abri os meus olhos, encontrando
aquelas esmeraldas verdes que brilhavam até no escuro do quarto.
— Por que você me beijou? — questionei baixinho, tentando
não demonstrar que estava tão afetado com aquilo quanto ela
parecia.
— Por que você me beijou? — devolveu, sorrindo de forma
sapeca. — Eu só aproveitei a oportunidade.
Não tinha uma resposta para aquilo.
O meu coração ainda estava acelerado, meu pau ainda estava
duro e minha língua parecia ter adormecido dentro da boca.
Aproveitei que estava difícil de enxergar qualquer coisa e voltei para
o meu lado da cama, me tapando com a coberta novamente e
esperando que ela não notasse aquele grande detalhe.
— Não me diga que você vai bancar o tímido. — Caitlin se
aproximou e eu me virei de costas para ela. — Trevor?
— Não estou tímido. — Aquilo era até ridículo comparado com
a forma como havíamos nos beijado há pouco. — Vamos dormir.
Ouvi sua risada atrás de mim e, de repente, seu rosto estava
pousando no meu ombro. As batidas do órgão estúpido que
chamava de coração voltaram a acelerar anormalmente.
— Então, por que não conversamos sobre isso?
— Porque não deveria ter acontecido, esqueceu das nossas
regras?
Senti o ar mudar bruscamente para gelado quando ela
processou as minhas palavras. Droga! Não era para ter sido
arrogante...
— Não se preocupe, bobão — ainda pareceu divertida ao dizer
—, eu não me apaixono com um beijo.
— Não foi isso que eu quis dizer, Caitlin...
Ela se afastou de mim e voltou para o seu lugar. Sabia que não
conseguiria dormir com um clima tão ruim que poderíamos vir a ter,
por isso, voltei a me virar para ela.
— Eu sei que não se apaixona apenas com um beijo. Ou,
então, teria uma coleção de antigos amores por aí.
Caitlin riu e me deu um tapinha no peito ao mesmo tempo.
— Isso pode ser ofensivo, sabia?
— Você sabe que não tive essa intenção.
Ela assentiu e se virou para mim, juntando as mãos abaixo da
cabeça e me olhando daquele jeito que, de alguma forma,
conseguia mexer comigo.
— Estou feliz que nosso primeiro beijo tenha sido dessa forma
— disse, me deixando sem entender. — Nós ainda teríamos que
nos beijar, uma hora ou outra, por conta do nosso relacionamento
de mentirinha — lembrou. E sim, talvez ela tivesse razão. — Estou
feliz que nosso primeiro beijo foi de verdade.
Sua explicação me arrancou um sorriso que não consegui
evitar.
— Eu também — confessei.
Seus olhos se fecharam.
— Irei dormir de verdade agora, mas se você se aproveitar de
mim enquanto durmo para me dar um beijo, irei acordar porque
tenho o sono leve e não irei parar só em um beijo. — Ousou dizer,
me arrancando uma risada nervosa e constrangida.
Não consegui evitar pensar em arriscar testar a sorte só para
ver até onde ela iria. Mas o que eu estava pensando?
— Durma bem, Caitlin.
— Eu vou, pode ter certeza.
Nós rimos.
Eu também iria, com toda a certeza desse mundo.
CAITLIN HOWARD
Nós passamos horas da quinta-feira treinando e na sexta não
foi diferente. Quase todas as meninas haviam voltado mais
motivadas do spring break, o treinador mesmo havia sentido nesses
últimos dois treinos que aqueles dias tinham sido importantes para
nós. As nossas técnicas estavam melhores, nossos saques e passe
também estavam.
Exceto por Maeve.
A minha amiga tinha tido um desempenho horrível no treino
daquele dia e tinha quase certeza de que naquela última reunião de
treino da semana, o treinador chamaria a sua atenção. Conseguia
ver perfeitamente pela forma como ele a olhava.
— Maeve. — Ele a chamou, e ela o olhou, parecendo já saber
o que iria receber. — O que está acontecendo? Você foi a única que
não progrediu.
Errado.
Ela estava jogando perfeitamente bem nos dias que passamos
juntas na praia, mas por que agora não estava conseguindo?
A cena dela conversando com alguém no telefone de forma
agitada e nervosa não saiu dos meus pensamentos durante todo o
treino. Eu quis muito me aproximar quando a vi afastada de todas as
garotas, gesticulando com uma mão enquanto segurava o telefone
com a outra, mas sabia só pela forma que estava que não adiantaria
em nada.
— Desculpa, treinador...
— O prazo para desculpas acabou — rebateu. — Vai passar o
primeiro jogo no banco porque Iara está muito melhor para começar
essa temporada.
Todas, exatamente todas, ficaram surpresas e em silêncio pela
substituição abrupta de Maeve por uma reserva.
— Mas, treinador...!
— Eu falei para você, não falei? — Ela assentiu, mesmo à
contragosto. — Iara está melhor do que você para o primeiro jogo,
por isso irá jogar na terça-feira.
— E o restante dos jogos? — Eu perguntei o que
provavelmente todas ali estavam se perguntando.
Maeve já surtaria por não jogar na estreia, imagina se ele a
tirasse de toda a temporada?
— Tudo depende do desempenho de Maeve. — Ele
respondeu, olhando para a minha amiga. — O título de capitã ainda
é seu, então é melhor honrar isso ou...
— Você irá passá-lo para Caitlin. — Ela interrompeu, se
levantando rapidamente. — Eu já entendi, Anderson.
Nós dificilmente chamávamos o treinador pelo nome, então
Maeve deixou bem explicado o que estava sentindo naquele
momento ao dizer o seu nome sem se importar em parecer grossa.
— Tem mais alguma coisa para falar? — questionou, sem
olhar para nenhuma de nós.
— Vejo vocês amanhã. — Ele nos liberou, não querendo criar
uma confusão com Maeve porque já estava há dois anos conosco
para entender do seu temperamento. — Não é porque é sábado que
irão escapar de mim.
Ninguém conseguiu sorrir porque estávamos todas ainda
chocadas com a decisão dele. Maeve se afastou, caminhando em
direção à saída do ginásio sem antes ir para o vestiário, como
normalmente fazia.
Olhei para Aurora, sem saber muito o que fazer.
— Acha melhor ir atrás dela? — perguntei para a minha amiga.
— Será que vai resolver alguma coisa? — Aurora devolveu.
— Eu estou cansada de colocar as coisas embaixo do tapete.
E você?
— Também. — Apontou com a cabeça em direção por onde
Maeve saiu. — Vamos?
Eu concordei. Era bom que ela fosse também.
Nós deixamos as outras meninas ali e seguimos nossa amiga
para fora do ginásio a passos rápidos, pois Maeve estava com tanta
raiva que já havia sumido dali de dentro. Passamos pela porta e a
encontramos a uma certa distância, mas ela parecia caminhar um
pouco mais devagar agora, por isso, conseguimos alcançá-la
rapidamente.
— Maeve! — Aurora chamou. — Espera, vamos conversar!
— O que vocês querem?! — Ela parou abruptamente, nos
fazendo parar também.
— Queremos saber o que está acontecendo. — Eu falei,
buscando uma maneira que visse a sinceridade do fundo do meu
coração. — Você estava jogando muito bem nesses últimos dias. O
que mudou?
— Estou menstruada, mas parece que o treinador não liga
para isso. — Ela respondeu, esquecendo completamente que
tínhamos quatro anos de amizade e sabíamos quando mentia. —
Agora podem me deixar em paz? Estou com cólica.
Aurora me olhou, pedindo em silêncio para nos afastarmos,
mas dessa vez eu não iria. Se ela quisesse fugir como havíamos
feito daquela vez na escola, tudo bem, fizesse isso por conta
própria.
Trevor havia dito que eu saberia a hora em que precisaria
começar a fazer o que me sentia bem e aquela era a hora. Estava
cansada daquela falsidade, daquelas mentiras, daquelas
brincadeiras e de nossa convivência.
Amizade não era isso.
Maeve aprenderia comigo o que aquele relacionamento
realmente significava.
— Quem estava no telefone falando com você antes do treino?
— perguntei, ligando ao fato de que tudo desandou por conta
daquela ligação.
No início era só uma teoria, mas, ao ver o rosto de Maeve
mudar para uma expressão mais entristecida, eu soube que estava
certa.
— Caitlin..., não viaja, ok? Já falei sobre o meu problema.
— Eu não acredito em você!
— O que você quer que eu faça?! — Ela gritou, chamando
atenção de alguns alunos que estavam passando por ali. —
Comece a acreditar!
— Meninas... — Aurora repreendeu, mas eu não dei ouvidos.
— Por que você não se abre para nós? Somos as suas
amigas, nos preocupamos com você!
— Por que eu tenho que me abrir para alguém? — rebateu. —
Do que vai adiantar, Caitlin? Vocês vão me olhar com pena e meia
hora depois, me sentirei pior ainda.
Então, alguma coisa está acontecendo.
Era dessa confirmação que eu precisava.
— Volte lá para dentro e comemore com a sua nova amiga de
posição — debochou, mas os seus olhos cheios d'água não me
fizeram ter vontade de dar as costas para ela. — Talvez, na próxima
semana, você consiga o título de capitã do time, afinal, é a melhor
em tudo, não é? Você é a mais bonita, mais inteligente, mais
simpática, mais popular, mais divertida. E agora tem até um
namorado que, mesmo não sendo um garoto popular, parece ser
perfeito, enquanto eu... sou a garota má, invejosa e antipática, que
tem o mundo na barriga só porque é filha da grande empresária
Bonnie Hood. — Riu forçado. — Talvez eu devesse mesmo dar o
título de capitã para você.
Ela nos deu as costas e correu para longe de nós,
provavelmente em direção ao seu dormitório. Notei que algumas
pessoas estavam cochichando, afastadas de nós, mas não longe o
suficiente para pensarem que aquilo era uma conversa amigável
entre duas melhores amigas.
Eu fechei os meus olhos e levei minha mão até minha testa, a
esfregando. Logo aquilo iria se espalhar pelo campus e todos que
nos acompanhavam saberiam que as melhores amigas do grupinho
da elite estavam com a amizade estremecida.
Não deveria estar me importando com aquilo, não quando
Maeve finalmente disse algo além do que sempre dizia, mas era um
pouco inevitável, já que nos últimos anos, tudo ao meu redor se
tratava de aparência.
— Ela pode não ter dito alguma coisa, mas, pelo menos, falou
mais do que nas outras vezes — comentei com Aurora.
A minha amiga assentiu.
— Você está bem? Não leve a sério o que ela disse, Maeve só
está...
— Tudo bem, Aurora, não vamos nos vitimizar aqui, ok?
Nenhuma de nós é inocente. — Eu a lembrei, e ela assentiu. —
Arrumaremos uma forma de lidar com a nossa amiga.
Eu só não conseguia imaginar como.
Respirei fundo.
— Vou dar uma volta pelo campus, ok?
— Vai ver o Trevor? — questionou e eu dei de ombros.
— Talvez.
— Tenham um bom encontro.
Assenti, vendo-a caminhar de volta para o ginásio.
A verdade era que eu não sabia muito bem para onde ir.
Durante aqueles dois últimos dias, não encontrei Trevor e nem
conversamos por mensagens, eu estava muito atarefada com
alguns trabalhos acumulados que teria que entregar naquela
semana e com os treinos.
Também não havia muitos alunos no campus. Tínhamos
voltado mais cedo do spring break, então era explicável a ausência
dos universitários. Muitos estavam voltando naquele dia para
atualizar suas coisas e outros só voltariam no domingo. Por isso,
entendia o motivo de Trevor não ter me procurado. Não
precisávamos fingir nada. Mas isso não evitava que eu pensasse no
que tinha acontecido quarta-feira de madrugada e pela manhã.
Primeiro, o nosso beijo.
Como podia um beijo com aquele nerd ter sido o melhor que já
havia recebido em toda a minha vida?
Sempre fui uma pessoa que gostava de sensações quando
estava em um contato mais íntimo com alguém, era o que movia
meu corpo para o prazer. O beijo era a chave mais importante para
me excitar, e eu me senti dessa forma quando sua língua se infiltrou
na minha boca.
Enquanto nos beijávamos, esqueci completamente da
informação de que Trevor só havia tido experiência com uma garota
durante todos os seus vinte anos porque o que ele estava me
entregando naquela hora era mais do que caras experientes já me
entregaram.
Não era algo tão cheio de segundas intenções, mesmo assim,
fez meu coração disparar, minha boca salivar por mais e meu corpo
esquentar, principalmente na região da minha cintura para baixo, por
ser onde ele havia mantido o aperto de suas mãos.
Eu quase conseguia sentir aquele toque bem ali, como se
tivesse ficado marcado na minha pele.
Perdi minha virgindade quando tinha dezesseis anos com um
garoto do ensino médio na minha primeira escola e até o momento,
com os meus vinte anos, me mantive em relações casuais com
diversos caras, desde experientes que sabiam o que fazer até
alguns que só pensavam no seu próprio prazer.
Foi inevitável não pensar como seria ter um contato mais
íntimo com Trevor. Se ele tinha sido capaz de me deixar molhada
com um beijo, como seria com uma pegada mais intensa? Será que
ele era o tipo que dava e recebia prazer? Ou um dos idiotas que só
pensavam em si mesmo?
Com certeza é a primeira opção.
Algo muito forte me fazia ter certeza disso e eu queria provar,
exatamente da mesma forma que consegui seu beijo, com algumas
provocações minhas depois de senti-lo tão perto de me beijar
naquele jogo de verdade ou desafio. Talvez eu estivesse perdendo a
concentração do que deveríamos ser? Sim, mas não podia evitar.
Então, enquanto caminhava pelo campus, sorrindo fraco para
as pessoas que passavam por mim, pensei no que tinha acontecido
na manhã de quarta-feira.
Eu bem em cima do seu pau.
Podia até ser uma ereção matinal, mas porra! Trevor era
gostoso... Muito mais do que eu imaginava.
Dormir em cima dele não foi algo programado, mas pareceu
que meu corpo tinha total controle de si próprio quando eu adormeci
e acabou não resistindo ao Trevor Lancaster. Quando acordei por
causa dos seus movimentos, acabei o sentindo e fui para cima do
seu colo, só para provocá-lo um pouquinho e sem saber que quem
seria mais afetada era eu.
Fiquei molhada com cada mínima movimentação que fazia em
cima dele e podia jurar que a vontade que tinha era de me esfregar
naquele pau gostoso como se fosse uma adolescente que não podia
perder a virgindade ainda.
Tinha quase certeza de que se meu irmão não tivesse entrado
naquele quarto, isso teria acontecido e não sabia como Trevor e eu
estaríamos até então.
Ele era reservado, às vezes muito calado, às vezes muito
falante. Se eu era um quebra-cabeça pela sua visão, ele era um
mistério para mim.
Talvez seria interessante vê-lo agora. O que será que ele
estava fazendo? Eu lembrava perfeitamente onde era o seu
dormitório, mesmo só estando lá uma vez, então movi minhas
pernas em direção ao seu prédio.
Enquanto caminhava, notei uma silhueta muito familiar ir para
trás de uma árvore. Poderia ignorar e seguir meu caminho porque
havia acabado de ter uma conversa fria com Maeve, mas, pelo jeito,
estava muito a fim de atritos naquele dia porque mudei minha
direção e fui atrás do meu irmão.
Ele estava fumando um cigarro de maconha atrás da árvore.
Em um impulso, tirei da sua boca e o amassei com meu tênis.
— Porra, Caitlin! Sabe quanto custa essa merda?
— Não sei e se custa caro, você deveria parar de fumar! —
alertei, me sentando ao seu lado. — Que porra está acontecendo,
Melvin?
Ele respirou fundo.
— O que você quer? Bancar minha psicóloga?
— E se for? Sou sua irmã. — Eu o lembrei, caso não se
lembrasse desse detalhe.
— É tão fodida como eu — apontou, cheio de sarcasmo. —
Não se esqueça disso.
Ignorei sua brincadeira que não tinha graça para nenhum de
nós.
— Lembra que foi isso que nos tirou de casa? — Apontei para
o cigarro de maconha no chão. — Como ainda continua com isso?
Só está estragando a sua vida, o seu sonho e todos os seus
relacionamentos.
— Que vida? Que sonho? Se quer saber, estou cansado de
tudo isso! — admitiu, encostando-se no tronco da árvore. — Uma
vez, tudo isso que nós temos foi divertido, agora não é mais.
— Do que você está falando?
— Liberdade, Cat. — Ele respondeu, e eu senti um aperto no
peito com o apelido sendo dito por ele. Há quanto tempo ele não me
chamava assim? — Quando somos adolescentes debaixo das asas
dos nossos pais, a liberdade é tudo o que queremos e nós fomos
um dos poucos que a conseguiram, mas me diga: para quê? Não
temos mais pais... Você não sente falta de tê-los?
Sempre pensei muito sobre aquilo e no que a falta de pais de
verdade havia nos tornado. Não era bonito porque aquela vida que
estávamos vivendo era o resultado disso.
— Depende... Pais de verdade ou dos nossos pais? — devolvi.
— Nós sabemos que são duas coisas diferentes.
— Pais de verdade.
— Como poderíamos sentir falta do que não tivemos?
— Faz sentido. — Soltou aquela risada forçada. — Mas eu
sinto. Não consigo mais jogar futebol e tudo o que eu queria era
poder correr para os braços da mamãe, mas eu não tenho. Nunca
tive.
Senti meu coração doer com aquela frase.
— Mas você me tem — lembrei. — Não teria saído de casa por
você se não te amasse.
Ele me olhou.
E eu lembrei do nosso passado.
Quando os meus pais o pegaram fumando cigarro atrás de
casa e meu pai o bateu com a cinta que sempre usava na cintura.
“O que você quer, Melvin?! Nos envergonhar?!”
O meu pai gritou aquilo, dando mais uma cintada em suas
costas.
Eu lembrava de meu irmão ter gritado que eles eram uns
merdas de pais e eu impedi que ele levasse mais uma cintada, me
colocando entre os dois. Naquela época, eu já era uma vergonha
para os dois por querer seguir a carreira de jogadora de vôlei, e não
de médica, como eles queriam.
“Se somos uns merdas, por que permanecem aqui?!”
Foi o que meu pai perguntou, cheio de ódio naquela noite.
“Não deveria se meter nisso, Caitlin! Seu irmão é uma merda
que não tem conserto, diferente de você.”
Foi o que minha mãe disse para mim, cheia de raiva.
Naquela mesma noite, saímos de casa com nossas malas
diretamente para Los Angeles, onde uma tia que ainda nem
fazíamos ideia da existência morava. Ela assumiu a
responsabilidade por nos cuidar em troca de muito dinheiro.
E meses depois, nossos pais estavam mortos.
— Até quando você vai aguentar minhas merdas?
Eu não era boa em entender pessoas, mas senti como se meu
irmão estivesse perdido naquele momento.
— Até o fim das nossas vidas — garanti. — Eu sou sua irmã,
não a sua namorada.
Ele riu um pouco mais verdadeiro agora.
— Não acho que você aguente, mas que bom que ainda não
perdeu as esperanças — disse. — Fui colocado no banco por tempo
indeterminado.
E não era que ele e Maeve tinham algo em comum?
— Sinto muito — murmurei. — Você precisa dar o seu melhor
para voltar.
— Eu sei.
Melvin fechou os seus olhos, ainda descansando a cabeça na
árvore.
— Eu só não posso perder a Aurora, Cat... — disse, com tanto
medo em sua voz, que até eu senti. — Se ela me largar, eu estarei
totalmente perdido.
— Use essa motivação para melhorar quem você é — falei. —
Você tem tempo para isso, não para errar mais.
— Nós discutimos ontem — contou, e uma lágrima escorreu do
seu olho direito. — Ela não gosta que eu use isso. — Pareceu se
referir à maconha. — Mas isso é tudo o que me mantém relaxado.
— Eu também não gosto que use isso.
— Eu sei.
Os seus olhos se abriram e me encararam.
— Nunca fui bom em seguir as regras, lembra?
Assenti, pois sempre tinha sido assim. Melvin sempre foi o
rebelde da família.
Ele se levantou.
— Foi bom conversar com você — admitiu. — Mas eu preciso
ir agora. Vou tentar ser alguém melhor para a minha namorada.
Sorri fraco.
— Eu confio em você.
Ele se afastou, seguindo um caminho do qual eu não fazia
ideia que fosse e eu permaneci ali por um momento, tendo um mal
pressentimento de que meu irmão ainda escolheria o pior caminho
de todos.
Às vezes, quando eu vejo seu rosto
Ela me leva para aquele lugar especial
E se eu olhar por muito tempo
Provavelmente perderia o controle e choraria
SWEET CHILD O' MINE - GUNS N' ROSES
TREVOR LANCASTER
Quando eu tinha onze anos, acompanhei o meu pai em uma
noite chuvosa até a casa do melhor amigo de Christopher. Era o
aniversário de dez anos do garotinho e, como ele não era meu
amigo, apenas de Chris, não precisei comparecer à festa.
Lembro perfeitamente de cada detalhe daquela noite. O frio
que fazia a ponto de ter tirado um casaco grande do guarda-roupa e
o vesti-lo. O vento forte que balançava todas as árvores e criava
sons que até então me arrepiavam quando eu escutava algo
parecido. O cheiro do molho bolonhesa que minha mãe fazia para
colocar por cima do macarrão que cozinharia assim que meu pai
ligasse para dizer que estávamos voltando para casa. O último
sorriso leve e feliz que ela nos lançou antes de sairmos para a
garagem e entrarmos no carro.
Tudo ainda era muito vivo, mesmo que já tivessem se passado
nove anos.
Nós pegamos Chris na casa do seu amigo e, enquanto
voltávamos para casa, a chuva se fortaleceu de uma forma quase
anormal.
O meu pai sempre tinha sido cuidadoso para dirigir,
principalmente quando estava com a gente no carro. Por isso, parou
em um acostamento, ligou para nossa mãe e disse que atrasaria
porque queria esperar a chuva amenizar.
Lembro das risadas e conversas banais que tivemos dentro do
seu carro esperando a chuva passar.
Chris estava tão feliz naquela noite.
Foi a última vez que eu também o vi daquele jeito.
Se eu soubesse que seria a última vez que ouviria a sua voz,
não teria pedido para parar de cantar Let it Be, dos The Beatles, que
até hoje era a sua banda favorita. Se eu soubesse que aquela seria
a última vez que ouviria a sua risada, teria implorado para que
contasse mais uma das piadas que havia aprendido durante o dia
com o seu melhor amigo.
Mas a gente não tinha como prever o futuro, certo?
O meu pai havia feito de tudo para nos proteger naquela noite,
como o pai incrível que ele sempre foi, porém..., não foi o suficiente.
A chuva parou exatos vinte minutos depois que meu pai
estacionou e nós voltamos a nos movimentar. Voltei a ligar o rádio e
trouxe a felicidade para o homem na direção ao tocar uma das suas
músicas favoritas da vida toda: Sweet Child O’ Mine, do Guns N’
Roses. Ainda conseguia sorrir com essa última lembrança. Ele abriu
a janela, gritou a letra como o grande fã que era e sorriu tanto, como
se tivesse a melhor vida de todas ali.
E Dean Lancaster tinha.
Tudo porque ele nos tinha.
“Não é fantástico o tempo depois da chuva?”
Ele gritou sobre a letra.
“Where do we go now?!” E gritou a parte da música que tocava
no rádio.
Lembrava que nós não conseguimos responder.
Em um piscar de olhos, um carro entrou na contramão,
invadindo a nossa pista e pegando a todos de surpresa. Meu pai
tentou desviar, mas o veículo acabou batendo na gente, e nós
deslizamos por um alto barranco.
Lembrava do carro capotando tantas vezes que ainda não
sabia a quantidade exata.
Lembrava dos olhos assustados do meu pai.
E dos gritos de Christopher.
Até não ouvir mais nada.
Fechei os meus olhos por um momento naquela situação e
quando os abri, estava em cima de uma maca, me sentindo
completamente sem forças para raciocinar tudo ao meu redor. Eu só
queria saber do meu pai e do meu irmão.
Consegui virar o meu rosto em direção à movimentação ao
redor do carro destruído do meu pai e a primeira coisa que vi me fez
congelar.
Um corpo tapado.
Era um corpo sem vida.
“Precisam tirá-lo com cuidado e estancar o sangramento ou
também iremos perdê-lo”
Foi o que um homem gritou.
Mesmo com a minha visão embaçada, eu os vi tirando meu
irmão de cima do capô do carro com um grande pedaço de vidro
cravado em sua garganta.
“Essa é a importância do cinto de segurança.”
Outro homem disse.
“O único que estava com ele foi o que saiu só com alguns
arranhões.”
Agora sabia que eles estavam falando de mim.
Naquela noite, meu pai não conseguiu sobreviver e meu irmão
ficou conhecido como um milagre dentro do hospital, por ter
sobrevivido a um corte na laringe, o qual afetou todas suas cordas
vocais, “só” o fazendo perder a voz.
Ainda que Chris tivesse sobrevivido, senti raiva do médico que
diminuiu a sua lesão como se não fosse nada demais.
Eu voltei para casa na mesma noite com minha mãe,
completamente destruído com o que havia acontecido. Nem dona
Evangeline conseguiu segurar o seu choro e me abraçou o caminho
todo enquanto soluçava ao meu lado. Foi quando chegamos em
casa que eu disse que aquele acidente havia acontecido por causa
de outro carro. A minha mãe ficou tensa e se sentou no sofá
comigo, pedindo para que eu contasse tudo.
E eu contei.
Mas não adiantou em nada.
Dona Evangeline procurou a polícia em meio ao caos da
recuperação de Christopher e, mesmo com apenas onze anos de
idade, eu senti a determinação de procurar justiça pela primeira vez.
Eu era uma criança, mas sabia que ninguém ia para uma pista
na contramão porque queria. Lembrava de ter ouvido minha mãe
chamar aquilo de homicídio culposo. Ela queria justiça, mas dois
dias depois, estava me colocando para dormir mais cedo e
recebendo a visita de uma mulher estranha na nossa casa.
Só sabia disso porque havia ficado escondido atrás do armário
da nossa sala.
A mulher era alta, de cabelos castanho-claros, e exalava luxo,
completamente diferente de nós, que sempre fomos simples. Eu a
ouvi dizendo que seu marido estava naquele carro que provocou o
acidente e que ele se arrependia profundamente do que havia
causado. Lembrava de minha mãe ter falado para irem para a
polícia prestar depoimento, mas a mulher a parou antes que ela
desse dois passos.
— Você sabe quem somos?
— Sim. — Minha mãe respondeu, e pareceu satisfazer aquela
mulher de alguma forma.
— Eu sou uma pessoa muito importante nesta cidade...
O rosto da minha mãe se entristeceu e pareceu chocado.
— Seu marido cometeu um homicídio — enfatizou, ignorando
o que a mulher rica havia falado. — Nós devemos ir à polícia.
— Eu soube por eles que estava procurando o carro que bateu
no do seu marido.
— O que quer dizer com isso?
— Quero dizer que o delegado sabe e concordou em deixar
isso como está... Apenas um acidente. — Os olhos da minha mãe
se arregalaram e marejaram ao mesmo tempo. — Não vamos tornar
isso feio para a nossa família, entendeu?
O rosto de minha mãe começou a ficar vermelho sob a luz
amarela da nossa sala, indicando que estava com muita raiva. A
mulher rica pareceu não se importar com a raiva e tristeza de minha
mãe porque estendeu um envelope para ela.
— Aqui dentro tem dinheiro o suficiente para sair dessa cidade
e se mudar para bem longe, de preferência para outro estado. —
Entregou para minha mãe. — Você tem uma semana. Eu soube que
esta casa é alugada, então não terá problema em sair.
— A senhora ficou maluca?! — A minha mãe grunhiu. — Eu
não quero o seu dinheiro!
Ela tentou devolver, mas a mulher desconhecida negou.
— Você vai sair dessa cidade, entendeu? Ou você não irá
conseguir nenhum emprego neste lugar e não terá como alimentar
seus filhos.
— Como ousa?! — Minha mãe questionou. — Acha que só
porque é rica, pode me controlar?!
— Eu posso! Você sabe a influência que eu tenho. — Ela
disse, muito confiante. — Posso controlar toda essa cidade porque
tenho dinheiro e você é apenas uma pobre enfermeira viúva.
Lágrimas escorreram pelo rosto de minha mãe.
— Você tem uma semana. — Voltou a avisar. — Não tente dar
uma de espertinha ou, então, não irei ser benevolente com você.
— Por que está acobertando seu marido? Por causa dele,
estou nessa situação agora!
— Ele estava bêbado. — Ela contou. — Como acha que um
dos homens mais importantes dessa cidade poderia ser visto por
causa de um descuido como esse?
— Ele deve pagar pelo que fez!
— É melhor não tentar entrar nessa luta comigo.
Deu as costas e caminhou até a porta de saída.
— Espero não vê-la nunca mais.
Uma semana depois, estávamos saindo do Alaska e indo para
a Califórnia, completamente perdidos em um estado populoso e
turístico da América. A minha mãe conseguiu um bom emprego num
bom hospital, uma boa casa que morávamos até então e tentou
reconstruir sua vida conosco, sem desconfiar que eu sabia de tudo o
que havia nos levado para aquele lugar.
Cresci com a vontade de descobrir tudo sobre a mulher que
havia acobertado o homem que matou o meu pai, escolhi seguir o
caminho das leis porque detestava pessoas corruptas e há três
anos, desisti de apenas seguir minha vida como se nada tivesse
acontecido e passei a pesquisar sobre o meu passado.
Foi quando achei Angus e Alanna Gage. Sendo ele o homem
que matou meu pai e colocou meu irmão nessa nova realidade ao
dirigir bêbado, e ela, a mulher que visitou a minha mãe na nossa
antiga casa e preferiu acobertar o marido, dando dinheiro para que
saíssemos da cidade.
Eles eram mesmo pessoas importantes.
Alanna era vista em Sitka, minha cidade natal, como a esposa
perfeita e empresária que se preocupava com o povo. Chegava a
ser uma piada o quanto a idolatravam só por ter um hospital luxuoso
que tinha muitas vagas mensais para pessoas mais pobres poderem
usufruí-lo. O seu marido era o grande chefe de departamento da
prefeitura na época em que provocou o nosso acidente. Ele era
mesmo um dos homens mais importantes da cidade, tornando- se
por seis anos o mais importante ao ganhar as eleições para ser
prefeito da cidade.
Eu os acompanhava.
Não como um maldito obcecado, mas alimentava uma forte
sede por justiça. Não tinha um plano ainda, visto que eu era apenas
um universitário que não tinha prova nenhuma do acidente que
havia acontecido anos atrás e era exatamente aquilo que me
frustrava.
Christopher estava certo quando dizia que eu estava apenas
perdendo tempo porque não existia nada que podíamos fazer, mas
o meu orgulho e indignação apenas aumentavam mais.
Podia levar tempo. Mas eu cresceria profissionalmente e os
colocaria atrás das grades.
Uma batida na escrivaninha à minha frente me despertou dos
meus pensamentos e me trouxe de volta à realidade.
— Estou sinalizando há meia hora para você, por onde
estava? Que saudade de gritar com você! — Chris reclamou,
indignado com minha falta de atenção.
— Desculpa — pedi. — Estava pensando na vida.
Ele me olhou desconfiado.
— Caitlin? — Sorriu, cheio de segundas intenções. — Quando
vão dar o segundo beijo?
— Ha ha ha! Está tentando ser engraçado?
— Às vezes eu consigo, não? — brincou. — Falando sério
agora... Como está a relação de vocês depois do beijo?
— Como deveria estar? Não sei, irmão, não falo com ela
desde quinta.
Chris arregalou os olhos.
— Como é que é?!
— Não sei por que está tão chocado. Não temos que fingir um
relacionamento quando mais da metade dos alunos não estão no
campus — respondi o óbvio. — Hoje as aulas voltam, portanto, o
nosso relacionamento também.
— Nossa... Você é irritante, sabia?
Acabei sorrindo.
— Caitlin já me disse isso.
— Ela está muito certa a respeito.
Arqueei as sobrancelhas.
— Não esqueça que eu sou o mais velho.
— Apenas onze meses! — lembrou, fazendo pouco caso. —
Vai rolar mais beijos?
— Por que você está tão esperançoso? Nem parece o mesmo
que disse para eu acabar com esse relacionamento na semana
passada.
Ele deu de ombros.
— O que posso fazer se mudo de opinião rapidamente?
Levantei-me e, ao ficar na sua frente, baguncei seu cabelo.
— Você é um pirralho, isso sim! — provoquei. — Vamos para a
aula, preciso buscar Caitlin no dormitório dela ainda.
Meu irmão revirou os olhos.
— Pelo menos, já sabe a fofoca que está rolando pelo
campus?
— Mais uma? — perguntei, de saco cheio daquilo. — E como
você sabe? É mais antissocial que eu.
— Ei, mais respeito para falar do seu irmão! — rebateu, afiado.
— O que posso fazer se as pessoas falam as coisas na minha
frente? Acho que finalmente achei uma vantagem de ser mudo...
Consigo ouvir as fofocas tranquilamente porque as pessoas são
idiotas e pensam que eu não conseguiria espalhá-las.
— Você está cheio de humor hoje — comentei, irônico. — O
que descobriu?
— Caitlin e Maeve brigaram — disse ele, me surpreendendo.
— Pois é, maninho, parece que teve até empurrão.
— O quê?!
— Acho melhor ver como está a sua namorada. — Sinalizou.
— Estou do lado dela, de qualquer forma.
Ri fraco.
— O que foi? Você já viu o temperamento daquela Maeve? Ela
parece ser malévola!
— Certo... Nem vou perguntar como você sabe disso e vou
indo, ok?
Ele fez um certinho com a mão e sorriu.
Beijei sua testa como um bom irmão mais velho e porque sabia
que ele odiava, logo seguindo meu caminho para o dormitório de
Caitlin.
CAITLIN HOWARD
Eu tinha uma ideia completamente diferente quando vi Trevor
na minha frente. Precisava apenas me aproximar, pedir que
carregasse a minha mochila pesada com as minhas roupas e meu
material da faculdade, mas, quando parei diante dele, só consegui
pensar em ter mais um beijo dele.
No entanto, não queria tomar nenhuma atitude naquele
momento e, por isso, apenas o provoquei.
Tudo bem que por um motivo desconhecido, gostaria de saber
se havia pensado em mim naqueles últimos dias. Eu admitia que por
muito pouco não o tinha procurado, mas depois da conversa que
tive com meu irmão, fiquei mesmo presa em tarefas acadêmicas,
exercícios e treinos. O nosso treinador estava cada vez mais
exigindo de nós.
Mas então, eu estava ali, sendo beijada por Trevor Lancaster
novamente.
Esqueci completamente de todos aqueles dias quando seus
lábios tocaram os meus e só tive tempo de sorrir entre o beijo ao
lembrar que ele não gostava de beijar em público, mas ali estava,
mostrando a todos que estávamos juntos com sua boca na minha.
Eu não perdi a oportunidade e aprofundei o beijo, entreabrindo
os meus lábios e sentindo todo meu corpo arrepiar quando sua
língua entrou na brincadeira. Não era um beijo intenso, era calmo e,
mesmo assim, fez com que meu coração acelerasse igual na
semana passada. Toquei os fios do seu cabelo com minhas mãos e
o senti apertar minha cintura ao mesmo tempo em que sua língua
explorava a minha boca.
Por um momento, esqueci de onde estávamos. Beijar Trevor
era muito mais interessante do que me preocupar com o que estava
acontecendo ao nosso redor.
Estava mesmo rendida pelo beijo daquele cara.
Tive certeza disso quando sua boca se afastou da minha e
meus lábios voltaram a ficar secos. Mesmo com a respiração um
pouco descompassada, não queria ter parado tão rápido assim. Abri
meus olhos e encontrei os seus, me encarando.
— Tiffany estava vindo em nossa direção. — Ele disse, me
deixando menos atordoada.
Olhei para trás e não vi sinal da garota que queria o coração
de Trevor para si.
— Não teria me beijado se ela não estivesse por perto? —
indaguei.
Ele não esperava por essa pergunta e admitia que adorava
deixá-lo assim, sem respostas, mas dessa vez, ele apenas demorou
para me responder.
— Você... queria que eu tivesse te beijado?
— Não me importo em deixar as pessoas ao nosso redor mais
convencidas sobre nós. — Aproximei-me dele outra vez e,
abusando do nosso relacionamento, deixei um selinho nos seus
lábios, o que o fez piscar duas vezes seguidas. Sorri. — Viu? É fácil.
— Está querendo se aproveitar de mim, Caitlin Howard?
Eu ri fraco.
— E se eu estiver?
Trevor suspirou para depois sorrir, mostrando aquelas
covinhas lindas nas suas bochechas. Ele apontou para a minha
mochila.
— Deixa que eu carrego.
— Vamos tomar café? — Entreguei para ele o peso que estava
nas minhas costas.
— O que tanto você carrega aqui? — reclamou quando
começamos a caminhar em direção à cafeteria.
— Apenas algumas roupas para depois do treino e para usar
depois do primeiro jogo de amanhã — respondi. — Não quero ter
que carregar muitas coisas e provavelmente me esqueceria da
metade.
— Está nervosa?
— Muito! — admiti. — O meu desempenho melhorou no jogo,
mas isso não quer dizer que ganhar está garantido.
— Você está trabalhando bastante para isso. Vai dar certo,
apenas confie.
Sorri com sua fofura, mas logo meu sorriso se desmanchou ao
lembrar do motivo de estar tão desanimada com a nossa volta no
dia seguinte.
— Maeve vai ficar no banco — revelei para Trevor, que me
olhou surpreso. — Ela não foi muito bem nesses últimos dias e o
treinador não quer arriscar.
— Você disse na praia que ela estava indo muito bem.
— E estava, mas quando fui questionar sobre isso a ela, fui
afastada de novo.
— Foi o motivo da briga de vocês? Fiquei sabendo que
discutiram.
— Sabia que os fofoqueiros que estavam nos observando não
deixariam quieto — murmurei. — Foi uma discussão boba.
— Então, não teve empurrão?
Arregalei os meus olhos.
— O quê?! É isso que estão dizendo?
Ele assentiu.
Inacreditável.
— É claro que não! Que tipo de pessoa eu seria se fosse
capaz de empurrar a minha amiga? Nem ela faria isso, mesmo se
estivesse puta comigo.
— Eu imaginei mesmo que estavam apenas aumentando a
fofoca — rebateu, balançando a cabeça em negativa. — Sinto muito
que a conversa de vocês não tenha sido muito produtiva.
— Pelo menos, serviu para eu saber que algo está
acontecendo com ela — falei e olhei para a cafeteria à nossa frente.
— Sabe... Nosso problema é o mesmo. Queremos ser perfeitos,
mas existe tanta merda acontecendo na vida de cada um que faz
com que machuquemos uns aos outros. Atingimos um limite de que
nem as máscaras que mantemos durante todos esses anos, que
passava a todos que estávamos bem, está funcionando.
— Deveriam se lembrar de que são humanos e, como
qualquer um, não são perfeitos.
Assenti. Eu já havia visto aquilo há muito tempo, mas só
graças ao Trevor que comecei a ser mais insistente em tentar
consertar a amizade que tinha com eles.
— Você vai ao jogo amanhã, certo? — perguntei, entrando na
cafeteria com ele. — Meu namorado deveria estar lá para me dar
sorte.
— Eu posso fazer esse esforço.
Bati em seu ombro.
— Para de falar como se fosse um sacrifício!
— Sabe que detesto jogos.
— Mas você gosta de mim. Ou não?
— O quê? — Seus olhos se arregalaram e ele ficou sem jeito,
olhando ao redor até achar uma mesa vazia. — Vamos... Vamos nos
sentar.
Caminhamos até a mesa em que ficaríamos e nos sentamos.
— Estou falando de gostar como amigo, bobão.
— Vai sempre me chamar de bobão?
Eu ri e dei de ombros, deixando-o sem a resposta certa para
aquilo.
— Tem medo do amor? — perguntei, curiosa a respeito.
— Não, eu... só não quero me relacionar de verdade agora,
sabe? Sou uma pessoa que se doa muito em qualquer relação e, se
estiver focado em outras coisas, acabo magoando a pessoa que
está comigo por não ser o que ela espera.
— Foi o que aconteceu com a sua ex-namorada?
Ele assentiu.
— Não nos magoamos, mas acabamos nos afastando.
— Isso tudo é porque você é muito estudioso?
Trevor sorriu fraco.
— Vamos dizer que seja isso.
Sua resposta foi vaga e me despertou mais curiosidade ainda.
Mas como era óbvio que ele não queria estendê-la, voltei para o
assunto inicial:
— Vai ou não?
— Eu vou. Satisfeita? Porque gosto de você.
Não consegui esconder o meu sorriso ao ouvir a sua resposta.
Mesmo que tivesse feito meu coração saltar com isso, de uma forma
desconhecida e estranha.
— Pode levar o seu irmão, se não quiser ficar sozinho.
Trevor parou por um momento, pensando na proposta.
— Talvez ele goste disso ou não... Não sei. Diferentemente de
mim, os videogames com esporte são um dos seus favoritos.
— Para de comparar seus gostos com videogames — mandei,
mas ele notou meu divertindo na fala. — Deixa que eu vou fazer
nossos pedidos hoje. O mesmo café de sempre?
Ele assentiu.
— Volto já.
Eu fui até o balcão de pedidos e pedi nosso café da manhã,
pagando-o no caixa assim que a atendente o emitiu. Voltei para a
mesa e me sentei em frente ao Trevor.
— O que vai fazer hoje à noite?
— Nada... e você?
— Vai acontecer uma festa das cheerleaders para desejar um
bom jogo para os meninos do futebol, que também acontece nessa
semana, e como eu não quero ir, pensei em ficarmos juntos no meu
dormitório assistindo a um filme. O que acha? Preciso do meu
namorado para ter uma boa desculpa para não comparecer.
— Festa antes do seu jogo? — Ele pareceu surpreso. — Não
me diga que Maeve e Aurora vão.
— Maeve vai ficar no banco, então é óbvio que vai beber todas
hoje e, infelizmente, não há nada que eu possa fazer — admiti, um
pouco triste com aquilo. — Aurora é namorada do quarterback, mas
jurou que não irá beber nada. Eu confio na minha cunhada.
— Elas estão insistindo para você ir? Pensei que estava
brigada com a Maeve.
Eu ri. Ele realmente não nos conhecia muito bem ainda.
— Nós tivemos uma discussão boba. No outro dia, ela já
estava falando comigo sobre os planos para o fim de semana.
Trevor enrugou a testa, não disfarçando a careta.
— Vocês são muito estranhas.
Aquilo eu não podia negar.
— Estarei no seu dormitório às oito.
Sorri.
— Ótimo.
Todo o meu corpo estava cansado dos exercícios e do treino
que o técnico havia passado por uma hora seguida naquela manhã.
Nem fui para a última aula do dia porque julguei não ser importante
e voltei para o meu dormitório, tomei um banho e vesti um short
soltinho de tecido azul e uma regata branca. Tudo para o meu
conforto durante o resto da noite.
Peguei o livro que havia comprado naquela semana e o único
que estava disposta a ler naquele mês.
— Isso é um livro de linguagem de sinais?
Eu assenti para a pergunta da Aurora.
— Comprei no sábado — revelei, observando as figurinhas e
as instruções dos movimentos. — Me sinto mal não entendendo o
que Christopher fala.
Aurora sorriu e se sentou ao meu lado.
— Pensei que era apenas um relacionamento falso.
— Mas é — respondi, olhando-a. — Por que está falando isso?
Notei que ela já estava arrumada para acompanhar meu irmão
na festa daquela noite. Usava uma saia preta de couro e um
cropped brilhoso da mesma cor, tão linda com os cabelos loiros
enrolados por conta do modelador que havia passado, que parecia
até uma boneca.
— Está querendo se comunicar com o seu cunhado. — Ela
provocou.
Revirei os meus olhos.
— Não posso agora? E outra coisa, deveríamos todos
aprender a língua de sinais, afinal, as pessoas surdas e mudas são
como nós, então não deveria ser obrigatório os entendermos e
podermos nos comunicar com eles?
— Infelizmente, não é obrigatório e poucos fazem questão. —
Aurora murmurou. — Eu tinha um tio surdo, então aprendi a me
comunicar desde criança com ele.
— O quê?! E só está me contando isso agora? — Larguei o
livro na cama. — Sabe o quanto estou sofrendo tentando entender
esse livro?
Aurora riu.
— Você e seu ranço por leitura... — Negou com a cabeça. —
O que quer que eu faça? Ajude você?
— É claro! Para isso que as amigas servem, não?
Ela assentiu.
— Podemos tentar todos os dias um pouquinho, o que acha?
— Eu topo! — respondi, sem conter a animação.
— Se eu não conseguir um dia por conta de um compromisso,
Maeve também sabe e pode ajudar você.
Mais uma vez, me senti estúpida ao ser pega de surpresa.
— Ela também sabe? Por que eu estou me sentindo uma idiota
de repente?
— Lembra quando nos conhecemos e Maeve se gabou que
sabia falar inglês, espanhol e francês? — Assenti, pois me lembrava
muito bem disso. — Descobri que no primeiro ano, ela também
estava aprendendo língua de sinais.
— Uau... Ela é mesmo esforçada — murmurei.
— Acho que ser filha de uma empresária global como Bonnie
Hood necessita alguns esforços. — Aurora olhou para o relógio no
seu pulso. — Está na hora de eu ir, combinei de encontrar o seu
irmão daqui cinco minutos.
— Vocês estão bem?
Ela assentiu.
— É só ele não fumar aquelas merdas e não discutimos —
respondeu. — Vejo você mais tarde. Tenha uma ótima sessão de
filmes com o seu namorado.
Concordei, ignorando sua provocação e vendo-a pegar sua
bolsa para logo sair do nosso dormitório. Ainda fiquei mais alguns
minutos movimentando minhas mãos como o livro mostrava,
tentando aprender ASL[1].
Oito horas em ponto, Trevor bateu à porta do meu quarto e eu
escondi o livro na minha gaveta. Ainda não queria que ele soubesse
que estava aprendendo uma forma de entender o seu irmão.
— Você é mesmo pontual — comentei ao abrir a porta.
Ele estava lindo, mesmo com roupas simples. Trevor usava
uma calça jeans com alguns rasgos nos joelhos e uma camiseta
preta, destacando mais uma vez aqueles braços fortes que tinha.
Peguei-me sentindo falta daquele abraço que havia me dado na
semana passada.
Os olhos do meu namorado de mentirinha subiram por todo
meu corpo, parando um pouquinho na região dos meus seios — eu
não usava sutiã —, e finalmente encontrando o meu rosto. Claro
que eu gostava da forma como ele me olhava, principalmente
quando engolia em seco como naquele momento.
Senti-me quente de repente.
— Entra — falei, mais afetada do que queria com a sua
olhada.
Trevor entrou, e eu fechei a porta. Virei-me para ele e apontei
para a minha cama.
— Pode se sentar. — Olhei para a sacola em sua mão. — O
que você trouxe?
— Guloseimas — disse, se sentando na ponta da minha cama.
— Acho que é uma boa companhia para filmes, não é?
Assenti e me sentei ao seu lado.
— O que acha de dar uma chance para o meu filme favorito de
terror?
— Por que eu já sabia que você iria me sugerir isso?
Sorri.
— Isso significa que você já me conhece o suficiente! — falei,
me gabando. — O que acha?
— Se eu não gostar, você vai tirar?
Ele parecia um garotinho com medo com aqueles óculos e o
semblante inseguro no rosto. Não resisti e ri do seu drama,
apertando sua bochecha fofinha.
— Você vai amar!
Trevor retirou a mão da sua bochecha.
— Não estou com medo, ok? — assumiu o seu medo sem nem
perceber naquele momento.
— Claro que não. — Usei a ironia. — Vou ligar.
Trevor não parecia tão contente, mas concordou, e eu me vi
feliz, pegando o controle da televisão e dando play no filme que já
se encontrava na minha lista da Netflix. Levantei-me e apaguei a luz
do quarto, voltando para a cama e me sentando encostada na
cabeceira dessa vez. Ele se aproximou e fez o mesmo, colocando a
sacola cheia de guloseimas no nosso meio.
Como eu não era idiota e nem nada do tipo, coloquei a sacola
no seu colo e colei minhas pernas nas dele. O movimento não
passou despercebido por ele, que sorriu e balançou a cabeça.
— Só para o caso de você sentir medo.
— Que bom que você esclareceu. Ou eu acharia que está
usando essa oportunidade para dar em cima de mim.
Sorri com malícia e aproximei o meu rosto do seu ouvido.
— E se eu tiver? — Levantei a minha mão e a aproximei do
seu rosto. — Talvez eu tenha gostado de beijar você de novo.
Aquele mesmo calor tomou meu corpo quando seus olhos
encontraram a minha boca. Eu sentia que ele estava com muita
vontade de me agarrar naquele momento e toda aquela apreensão
me deixava louca. Precisava confessar que cheia de tesão também.
Só para brincar com o perigo e deixar claro que não me
importaria se incendiasse mais aquele quarto, coloquei minha perna
sobre a sua. Seu olhar correu mais uma vez pelo meu corpo e
dessa vez, parou na minha coxa quase toda descoberta por estar
por cima da dele.
Se só aquele olhar fez minha boceta molhar, imagina como
seria com o seu toque? Droga! Achava que os meses sem sexo
estavam finalmente cobrando o seu preço.
— Você é inacreditável, sabia? — murmurou, a voz mais rouca
e gostosa que já havia saído pela sua garganta durante todo aquele
tempo.
Pisquei para ele quando levantou seu olhar para mim.
O filme começou e, terminando de cortar o meu barato, Trevor
retirou a minha perna da sua com cuidado.
— Vamos apenas assistir ao filme, hum?
— Ok — respondi inocentemente.
Ele era difícil.
Mas eu estava percebendo que amava um desafio.
Se ajoelhe
Presa com você em seus sonhos
Me conte mais, eu poderia morrer
Me toque como uma fera
SMOKE SPRITE (FEAT. RM) – SO!YoON!
TREVOR LANCASTER
Eu não me considerava um medroso até aquele exato momento.
Tive outro sobressalto quando o assassino com a faca da cozinha
apareceu mais uma vez por trás da garota e cortou sua garganta, sem
remorso nenhum de matar uma pobre adolescente.
Caitlin, ao meu lado, soltou uma risada fraca, ainda com os olhos
presos à tela. Não era possível que pudesse se divertir com um filme
daqueles, era? Foi impossível não pensar em como ela combinava com
o meu irmão nessa questão de amor por terror.
Semicerrei meus olhos em direção à televisão, como uma forma
de amenizar o susto, mas não serviu de nada quando Michael Myers
atacou mais uma vítima.
Impressionante como, mesmo sabendo que alguma coisa
aconteceria naquela cena toda escura, eu ainda assim me assustei e
me agarrei ao braço da loira ao meu lado.
— Ah, para! Essa morte era óbvia. — Ela julgou e me olhou. —
Quer que eu tire o filme?
Aquilo machucou o meu ego, por isso, neguei e continuei
agarrado ao seu braço.
— Tem certeza?
— Já estamos na metade, não?
— Sim — respondeu e olhou para o meu braço segurando o seu.
— Quer um abraço também?
Eu revirei os meus olhos e me concentrei na televisão do seu
quarto, sem me importar com a sua gracinha e muito menos me
desencostar dela.
Odeio filmes de terror!
Odiava até mesmo jogos mais aterrorizantes como Outlast e podia
dizer isso com propriedade, já que havia visto meu irmão jogando um
pouco daquele videogame e tomado um susto a cada vez que a tela
virava para um paciente do hospício.
Minha atenção estava toda concentrada no filme e, graças a uma
força maior do que eu, tive um pouco de dignidade ao não me assustar
tanto com a próxima aparição de Michael.
— Ok, essa não era tão óbvia. — Caitlin comentou.
— Ele estava fantasiado, era óbvio que iria matar aquela garota.
Ela pensou um pouco e acabou concordando.
Acompanhei cada minuto do filme sentindo meu coração acelerar
e desacelerar de uma forma completamente estranha. Não queria
parecer medroso, mas também não queria me afastar de Caitlin e, pelo
visto, ela também estava gostando de me ter perto do seu corpo dessa
forma.
Aquilo me lembrou de como havia flertado comigo mais cedo, sem
dar importância para o acordo que tínhamos. Não podia negar, havia
sido difícil retirar sua perna de cima da minha e me concentrar nos
primeiros minutos do filme.
Caitlin não era boba e sabia a beleza que tinha, assim como sabia
usá-la como uma arma para me afetar.
Eu virei o meu rosto por um momento, observando-a assistir ao
filme. Era impressionante como não tinha medo e amava cada detalhe
daquele filme com efeitos terríveis e filmagem antiga.
Não sabia dizer se ela estava totalmente bem e tranquila, mas,
naquela ocasião, Caitlin parecia ter deixado os problemas com seus
amigos e a ansiedade para o jogo do dia seguinte lado. Ela parecia
mais relaxada e bonita. Não usava maquiagem, estava com uma regata
fininha que não escondia os seios livres do sutiã — para o meu
sofrimento — e um short de tecido que não cobria muito das suas belas
pernas.
— A televisão está na nossa frente, Trevor Lancaster — lembrou,
virando o rosto para mim e parecendo se divertir ao ter me pegado no
flagra. — Ou eu sou mais interessante?
Ela era mais interessante e sabia disso.
Preferi não responder e voltei a minha atenção para a TV, mas ela
estava com o filme pausado e foi isso que me vez voltar novamente
para Caitlin.
— O filme ainda não acabou — constatei.
Ela negou, me fazendo perceber que estávamos muito próximos
porque eu ainda a agarrava com medo daquele filme.
— Posso voltar a dar play se responder sinceramente à minha
pergunta — disse. Por algum motivo não me afastei dela, fiquei no
aguardo do seu questionamento. — Sente falta de sexo?
Eu poderia ter engasgado. Poderia ter ficado envergonhado. Ou
simplesmente ter pegado o controle e dado play no filme, ignorando
aquela pergunta até o fim do nosso acordo.
Mas eu preferi ficar quieto.
Achava que finalmente entendia o ditado que minha mãe sempre
dizia para nós de “quem está quieto, consente” porque Caitlin me
surpreendeu e, em um piscar de olhos, estava montada em meu colo,
com as duas mãos nos meus ombros e me olhando com tanta
intensidade que fez todo o meu corpo incendiar.
Ela juntou mais o corpo ao meu, ficando bem em cima do meu
pau, que naquele momento, endurecia dentro da cueca.
Eu poderia afastá-la, da mesma forma que havia feito com a sua
perna mais cedo, mas abaixei os meus olhos, observando seu pescoço
fino, sua clavícula, seu peito subindo e descendo com um pouquinho
mais de intensidade do que o normal, até chegar nos seus seios, que
tinham os biquinhos duros apontados diretamente para mim.
O meu pau cresceu dentro da calça e cutucou sua boceta, tapada
apenas com aquele tecido fino. Tinha certeza de que ela sentiu isso,
pois seu corpo estremeceu em cima do meu. Quando me voltei para o
seu rosto, seus olhos pareciam ter poder suficiente para colocar fogo
em mim. E foi isso, junto ao desejo latente de tê-la mais perto, que me
fez subir minhas mãos até a sua nuca e puxá-la para um beijo.
Ela ofegou quando sua boca tocou a minha e eu engoli aquilo com
a minha língua pedindo passagem para os seus lábios. Dessa vez, não
consegui segurar a vontade que tinha de tocá-la e subi minha outra
mão livre pelas suas coxas, arrepiando sua pele conforme passava
minha mão por toda a região daquela parte.
Caitlin agarrou os fios do meu cabelo e arrastou sua boceta no
meu pau duro até colar o seu peito com o meu. O atrito de nossos
quadris fez com que um gemido meu escapasse no meio daquele beijo.
Subi a minha mão pela sua coluna e, não pensando direito, a enfiei por
dentro da sua regata, sentindo a pele quente do início das suas costas.
Fazia muito tempo que eu não sentia alguém assim dessa forma.
Havia tido apenas uma namorada e, antes de acabarmos com
tudo, vivenciamos muitas experiências na cama, mas nada comparado
àquele fogo que incendiava apenas quando eu tocava Caitlin daquela
forma. Talvez fosse sua sensualidade falando mais alto ou a falta que
me peguei sentindo daquilo de forma repentina.
Não sabia.
Eu também nem queria achar um motivo quando minha mente
estava nublada e só queria sentir até onde tais sensações me levariam.
Minha mão chegou até o meio da sua coluna quando nossas
bocas se separaram e ela decidiu percorrer a sua pelo meu queixo,
descendo até o meu pescoço e fechando seus lábios contra a minha
pele. Caitlin me chupou, arrancando um gemido fraco vindo do fundo
da minha garganta. Agarrei mais forte suas costas e a trouxe mais para
perto, sentindo uma vontade absurda de fundir nossos corpos só para
aquela sensação de tensão e desejo estarem finalmente alimentadas.
Caitlin voltou a subir sua boca e me encarou, respirando forte
contra o meu rosto.
— Existe uma chance mínima de eu parar, agora que provei um
pouco mais de você... — admitiu, quase encostando seus lábios nos
meus outra vez. — Mas eu sei que você não queria ultrapassar esse
limite antes, então estou dando oportunidade de nos parar agora.
Parar? Era bom que ela ainda tivesse a cabeça no lugar porque
eu mesmo estava preso em imagens em que a deitava na cama e a
fodia gostoso.
O meu pau estava duro, ela deveria estar completamente
molhada, e eu seria louco para parar?
— Você me perguntou se eu sentia falta de sexo, e aqui vai a
minha resposta: não sentia até você aparecer na minha vida —
confessei, sendo atraído pelo seu sorriso safado e vitorioso. — Então,
eu não quero parar agora.
Caitlin aproximou suas mãos do meu rosto e retirou os meus
óculos, se inclinando para colocá-los na mesa ao lado da sua cama.
Voltou a me olhar e, segurando a barra da sua regata, a puxou para
cima e a retirou do seu corpo, jogando em qualquer canto daquele
quarto.
Senti um calor ainda maior se concentrar bem no meio das
minhas pernas, deixando meu pau completamente duro quando encarei
seus dois seios na minha frente. Eles eram pequenos e deveriam caber
perfeitamente nas minhas mãos.
Para ter certeza disso, toquei sua cintura nua, sentindo sua pele
tão quente como a minha, e subi minhas mãos até estarem próximas
dos seus seios o suficiente para tocá-los. Notei a pele de Caitlin se
arrepiar e, quando elevei meus olhos até os seus, sua expectativa fez
com que eu enchesse minhas mãos com eles.
Ela gemeu ao mesmo tempo em que moveu seu quadril contra o
meu pau. Sem que eu esperasse, atacou meus lábios mais uma vez,
enfiando seus dedos entre meu cabelo. Eu movi a minha língua contra
a sua, repetindo seus movimentos enquanto começava a tocar seus
seios com minhas mãos. Circulei o meu polegar no seu seio direito,
notando como seu mamilo endureceu mais contra o meu dedo.
Caitlin gemeu contra a minha boca quando aumentei a pressão
contra o outro e eu aproveitei aquele momento para largar a sua boca,
deslizar meus lábios pela sua pele e tomar seu pescoço da mesma
forma que havia feito comigo. Chupei a região bem perto da sua veia
que tinha a capacidade de sentir pulsar e ela moeu sua boceta contra o
meu pau, buscando um alívio para si e me torturando no processo.
— Nós... — Foi interrompida por um gemido quando chupei mais
uma vez sua pele. — Podemos deixar toda essa preliminar para a
próxima...
Levantei meu rosto e a olhei, sentindo mais uma vez ela se
esfregar no meu pau.
Fechei meus olhos por um momento, gemendo fraco com o atrito
gostoso do movimento. Estava há muito tempo sem sexo e o medo de
acabar gozando como um adolescente virgem nas calças por conta dos
seus movimentos me tomou por um segundo.
Caitlin aproveitou o momento e segurou a barra da minha camisa,
puxando com suas duas mãos para cima. Não resisti e a ajudei a tirá-la
do meu corpo.
— É um pecado você esconder essa gostosura do mundo —
disse baixinho, me fazendo sorrir fraco. — Sabe qual foi o primeiro
pensamento que tive sobre você quando te vi pela primeira vez?
Balancei minha cabeça em negativa.
Ela moveu mais uma vez sua boceta contra o meu pau e eu
agarrei fortemente sua cintura.
— Caitlin... — Tentei advertir com os meus olhos que deviam estar
dilatados como os seus naquele instante.
Ela aproximou a boca da minha e capturou meu lábio inferior com
os seus dentes, causando um frenesi gostoso por todo meu corpo.
Aqueles olhos não se afastaram dos meus, nem quando ela largou
minha boca e disse:
— Pensei que eu daria para você ali mesmo se não fosse aquela
aposta ridícula.
Como se fosse possível, meu pau cresceu mais dentro da calça
com a sua confissão.
Então, ela já me desejava de alguma forma?
— E eu pensei que não cairia nos seus encantos e vim parar aqui
— admiti.
Ela riu fraco por um segundo, desmanchando seu sorriso logo em
seguida e colocando suas mãos em cima do meu peito, lado a lado.
Deslizou delicadamente, parecendo gostar de sentir meu abdômen
firme contra suas palmas.
Aproximei minha boca da sua e voltei a beijá-la, invertendo
nossas posições de uma vez por todas na cama e pairando sobre ela.
Deixei seus lábios de lado e deslizei minha boca pelo caminho do seu
pescoço, chupando e arrancando gemidos da garota sob mim.
Caitlin cravou suas unhas nas minhas costas quando aproximei
minha boca dos seus seios e, levantando meu olhar, senti o tanto que
queria que eu os colocasse na boca.
— Faz tempo que não faço isso... — Eu a lembrei, mesmo que
tivesse uma lembrança perfeita de como dar prazer para uma mulher.
Ela não era parecida com a minha ex e, mesmo que não quisesse
comparar em um momento como aquele, era inevitável quando
colocava nossas experiências sexuais lado a lado. — Você pode me
mandar parar se eu não for bom.
Ela riu, balançando a cabeça e subindo sua mão até a minha
cabeça.
— Parar você é a última coisa que eu quero agora.
Sorri fraco e tomei seu seio esquerdo com minha boca, ouvindo
seu gemido mais alto e sentindo sua mão puxar os fios do meu cabelo
com mais força. Circulei o bico com minha língua, o chupando em
seguida e arrancando mais um gemido de sua garganta.
Passei para o outro mamilo e fiz o mesmo enquanto quase tinha
meu cabelo arrancado pelas suas mãos.
Caitlin se remexeu sob mim, arqueando os quadris na direção dos
meus.
— Tortura não é um entretenimento, Trevor — ofegou e empurrou
minha cabeça mais para baixo. — Eu queria pular as preliminares,
mas... estou curiosa a respeito da sua língua na minha boceta.
As suas palavras atingiram diretamente o meu pau, que já estava
completamente dolorido dentro da cueca e calça que o prendiam. Eu
aproximei o meu nariz da região perto do seu umbigo, sentindo o cheiro
gostoso da sua pele misturado ao da sua excitação.
Nenhuma garota conseguia ser tão sexy pedindo uma coisa
dessas como ela.
Minha boca salivou com a vontade de tomar sua boceta e eu agi,
puxando seu short e sua calcinha para baixo, sendo ajudado por
Caitlin, que quase me chutou ao se desfazer das peças de roupas
rapidamente.
Em outro momento, eu teria dado risada, mas a visão da sua
boceta bem na minha frente cortou qualquer divertimento que pudesse
surgir. Abri o zíper da minha calça sem quebrar contato, só porque
sentia que meu pau podia acabar ficando mais dolorido.
Caitlin abriu mais suas pernas e as circulou ao meu redor, me
puxando para mais perto.
Abaixei-me devagar, sentindo minha pele arder só pela forma
como ela me olhava naquele momento e, para confirmar isso, levantei
meus olhos e a encarei. Ela estava mesmo louca para sentir minha
língua ali.
Eu não desperdicei meu tempo e abaixei minha cabeça, beijei os
dois lados internos das suas coxas antes de aproximar meu rosto da
sua boceta. Ela estava tão molhada, que alguns fios do seu líquido
escorriam de sua entrada.
Aquela imagem provavelmente nunca sairia da minha cabeça.
E eu não sabia se agradecia ou martirizava por isso.
Abaixei minha cabeça e a lambi, subindo minha língua até o seu
clitóris. Senti Caitlin estremecer ao mesmo tempo em que um gemido
mais alto do que os outros saiu de sua garganta. Ela voltou a agarrar
meu cabelo.
Senti seu gosto levemente salgado na minha língua e a saboreei
antes de colocar o clitóris entre meus lábios e chupá-lo.
— Trevor..., um pouco mais forte... — gemeu, e eu aumentei a
pressão com a língua. — Porra! Isso...!
Seu aperto ficou mais forte enquanto suas pernas se abriram mais
para mim, me deixando livre para fazer o que quisesse ali. Seu gosto,
assim como seus gemidos, corria diretamente para o meu pau, que
estava tão duro e dolorido, que já estava achando que poderia gozar
com apenas um toque.
Parecendo ler os meus pensamentos, senti seu pé encostar em
meu pau e massageá-lo da forma que conseguia por cima do tecido,
arrancando-me um gemido que vibrou diretamente na sua boceta.
Agarrei seu pé e a parei antes que gozasse daquela forma. Voltei
a focar apenas nela, passando minha língua pelas suas dobras,
colocando seu clitóris na boca e o chupando.
— Trevor...! — Ela gritou, elevando os quadris.
Não parei para saber o que ela queria chamando o meu nome,
continuei com os movimentos intensos, a sentindo cada vez mais fraca
sob mim.
Caitlin estremeceu mais forte do que as outras vezes e explodiu
em um orgasmo violento na minha boca. Suas pernas descansaram ao
meu redor e ela afrouxou o aperto no meu cabelo depois de alguns
segundos enquanto eu subia minha boca pela sua barriga até chegar
em frente ao seu rosto.
Ela parecia cansada, mas não satisfeita.
Engoli em seco ao encontrar seu olhar brilhante. Naquele instante,
senti um negócio estranho no coração que não me fez sentir nenhum
pouco de constrangimento ou arrependimento por ter chegado até ali
com ela.
— Como fui? — perguntei, tentando dissipar aquela nova
sensação.
Caitlin riu baixinho e levou uma mão até o meu rosto.
— Parece que é como andar de bicicleta — murmurou, me
fazendo sorrir. — Você nunca se esquece.
Com sua outra mão, ela abriu a gaveta da mesa ao lado da cama
e pegou uma camisinha.
— Agora estou curiosa para saber o que podemos fazer com isso.
De uma forma sexy, ela abriu o pacote com os dentes e, tirando
uma força que não imaginava que tinha naquele momento, inverteu
nossas posições, ficando por cima das minhas coxas.
Tê-la nua daquela forma em cima de mim era uma visão que só
me deixava mais louco por ela.
Caitlin segurou cada ponta da minha calça e cueca, as abaixando
juntas e fazendo meu pau saltar para fora. Ela voltou a ficar por cima de
mim e agarrou o meu pau, arrancando um gemido de mim.
— Eu sabia que era grande — murmurou, alisando-o para cima e
para baixo. — E lindo...
— Você... — ofeguei quando aumentou o movimento com a mão.
— Pensava no tamanho do meu pau?
— Só depois que me sentei em cima de você e o senti pela
primeira vez — admitiu. — Não pode me julgar.
Quis sorrir, mas nem isso consegui quando ela colocou a
camisinha em mim e aproximou sua boceta. Parecia inacreditável, mas
já a sentia molhada em cima de mim novamente.
O medo de acabar gozando assim que entrasse nela me tomou
por completo e, antes que pudesse falar alguma coisa a respeito disso,
Caitlin estava segurando o meu pau, levantando o seu quadril e se
sentando em cima de mim de forma lenta.
— Puta que pariu... — gemeu.
Eu agarrei suas coxas fortemente, me sentando na cama e a
sentindo descer até estar completamente dentro dela. A sensação que
me atingiu foi um sofrimento gostoso, se era que isso realmente existia.
Sua boceta me apertava de todos os lados por ser apertada e meu pau
parecia pulsar no seu interior.
Caitlin fez menção de se mexer, mas eu a interrompi.
— Preciso de um tempo... — ofeguei. — Esqueceu?
Ela segurou o meu rosto e me encarou. Nós estávamos loucos
para nos mover e transar de verdade, mas Caitlin era esperta o
suficiente para saber do que eu estava falando quando pedi o tempo.
Sua boca tomou a minha em um beijo enquanto eu me
concentrava em não gozar rapidamente.
Quando me senti um pouco mais tranquilo, afastei a minha boca
da sua e assenti. Caitlin se movimentou para cima e para baixo,
arrancando gemidos que nos impossibilitaram de grudar os nossos
lábios outra vez. Agarrei sua cintura firmemente e a ajudei com os
movimentos.
Ela subia e descia pela minha extensão, roubando todo meu
fôlego com a visão perfeita de seu corpo sobre o meu, dos seus olhos
inebriados de prazer e da forma como nos conduzia com perfeição.
Agarrei sua nuca e a trouxe para mais perto, capturando sua boca com
a minha em um beijo imperfeito por conta dos sons que saíam entre os
nossos lábios.
Caitlin passou a rebolar com seus quadris nos meus, esfregando
seu clitóris no meu osso púbico, aumentando a fricção e seu próprio
prazer.
Gemi e deslizei minha boca pelo seu pescoço, tentando não
chupar com tanta força para que não ficasse marcada, mesmo que a
vontade estranha que sentia fosse fazer exatamente aquilo.
— Caitlin... — Eu sentia que não conseguiria aguentar mais. A
cada vez que descia ou se esfregava mais pelo meu pau, era tão em
cheio que parecia que a qualquer momento explodiria. — Estou perto
de gozar.
— Eu sei — murmurou, levantando o meu rosto e mordendo meus
lábios. — Eu também estou.
Segurei firmemente sua cintura e inverti nossas posições
novamente, retirando meu pau dela e enfiando outra vez, nos fazendo
gemer muito mais alto. Eu repeti aqueles movimentos, não dando
espaços entre as estocadas, balançando para frente e para trás com
golpes que só aumentavam o nosso prazer.
Caitlin me abraçou com suas pernas da forma que conseguia,
agarrando-se às minhas costas como se isso fosse o suficiente.
Gemidos de nós dois preenchiam o quarto junto ao som dos
nossos movimentos.
Até que a senti me apertar mais e todo seu corpo tencionar sob o
meu, tão forte que mal percebi que eu estava da mesma forma. Uma
pressão cresceu entre nós conforme eu continuava a sair e entrar nela
até que finalmente pareceu se romper entre nós dois, nos levando a um
clímax poderoso.
Caí com cuidado por cima dela, sendo abraçado pelos seus
braços finos e estremecidos. Nunca pensei que alguém pudesse tremer
ao gozar, mas ali estávamos nós.
Nossas respirações foram a única coisa que ouvimos por um bom
tempo, até que sua voz rouca preencheu o quarto parcialmente escuro:
— Acho que posso fazer um bom jogo amanhã depois disso.
Eu sorri, deitando minha testa no seu peito e ouvindo seus
batimentos acelerados.
Era bom para ela que estivesse pensando nisso porque, quanto a
mim, achava que nunca mais conseguiria olhar para Caitlin sem pensar
no que havíamos feito naquela noite.
E o pior..., sem querer repetir tudo novamente.
Prove o veneno rosa
Acabe com eles, acabe com eles, acabe com eles
PINK VENOM – BLACKPINK
TREVOR LANCASTER
— Não acredito que estamos indo ver a minha cunhada no
primeiro jogo dela. — Christopher sinalizou de forma rápida,
colocando em seguida uma jaqueta jeans de Star Wars bem parecida
com a minha. — Está animado?
— Não, mas você parece estar tão animado que pegou a minha
jaqueta. — Eu apontei para a peça de roupa. — Você não tem mais
roupa? E nem está tão frio assim.
— Mamãe disse que esse ar gelado da troca de estação pode
causar um resfriado — disse, me fazendo segurar o riso. — Não
quero ficar gripado.
— Você é mesmo um filhinho da mamãe. — Não resisti e
apertei a sua bochecha.
— Para com isso! — mandou depois de se afastar de mim. —
Me trata como uma criança de novo e paro de usar as minhas
roupas, só para começar a usar as suas.
— Vai ser engraçado você usando minhas calças... Está a fim
de mostrar as canelas?
Ele revirou os olhos e acabou rindo.
— Onde Jasper vai nos encontrar? — perguntou, se referindo
ao meu amigo.
— Na frente do ginásio — respondi, olhando ao redor e notando
como havia uma quantidade grande de pessoas caminhando até o
lugar que aconteceria o jogo. — Vai ser uma estreia e tanto com essa
quantidade de pessoas.
— Fique sabendo que nem conseguiríamos vir se você não
fosse namorado da Caitlin. — Chris falou.
— Nós nem gostaríamos de estar aqui se eu não fosse
namorado da Caitlin — corrigi.
O meu irmão pensou por um momento e, em seguida, assentiu.
— A propósito, como foi a sessão de filmes ontem? Mijou nas
calças com o seu medo de filme de terror?
Bati com o meu ombro no seu, quase o desequilibrando
enquanto seguíamos nosso caminho.
— É claro que não — respondi, levando os meus pensamentos
para a noite anterior e sentindo todo o meu corpo esquentar. — Foi
uma noite... divertida.
Eu não abriria a minha boca para falar que havia transado com
Caitlin ou, então, meu irmão começaria a me provocar por conta
disso. Eu o conhecia bem o suficiente para ter certeza disso. Tive
que fazer um esforço para disfarçar que não estava pensando em
algo diferente de uma sessão de filmes de terror, quando nem
havíamos terminado aquele show de horrores que era Halloween.
Respeitava os gostos de todo mundo, mas jurava que não
queria mais saber daquele filme que só sabia me assustar.
Ter na minha memória apenas o que aconteceu depois que
Caitlin pausou o filme e subiu no meu colo era muito melhor do que a
visão de Michael Myers matando pessoas.
Ainda não acreditava muito bem que havíamos transado.
Quando eu saí do seu dormitório, tive que bater no meu rosto
duas vezes. Uma por conta da minha loucura de acabar caindo na
cama de Caitlin como os atletas daquela universidade e outra porque
não acreditava naquilo. Era quase uma miragem lembrar todas as
sensações e com elas, ver o quanto nos conectamos de uma forma
profunda naquela noite.
Chris balançou a mão na frente do meu rosto, me trazendo de
volta para o presente.
— Por que está vermelho? Está com frio?
Eu coloquei a mão na minha bochecha, sentindo minha pele
quente.
Droga de lembranças!
— Acho que sim. — Indiquei o ginásio com o queixo, logo
desconversando. — Vamos entrar logo, consigo enxergar Jasper
daqui.
O meu amigo não havia sossegado por um minuto quando
descobriu, ao xeretar minhas mensagens trocadas com Caitlin
naquela manhã, de que eu iria com Chris ao jogo, assim como o dia
em que contei que estava namorando com a jogadora, ele surtou e,
dessa vez, muito pior porque queria ir junto. Foi uma briga para
Caitlin conseguir outro ingresso e precisava confessar que até queria
que não achasse.
Jasper não sabia que o meu relacionamento era falso porque
não tínhamos tanta intimidade a ponto de eu dizer a verdade para
ele. Tudo o que ele sabia era que aquela mentirinha que Caitlin e eu
criamos juntos na festa acabou desenvolvendo o nosso
relacionamento.
— Ei! — Jasper acenou. — Que bom ver você, Chris! Parece
maior do que na última vez.
— O que quase dois metros de altura não fazem com uma
pessoa, né? — provoquei meu irmão.
Chris acenou para o meu colega e me deu um tapa na nuca.
— Se zombar mais uma vez da minha altura, vai ser mais forte.
— Deixou avisado, me encarando de forma divertida.
— Não entendo sobre língua de sinais, mas tenho quase
certeza de que ele está te ameaçando. — Jasper comentou, rindo da
gente. — Vamos entrar? Estou ansioso para ver a preparação para o
jogo!
— Amanda ficou bem com isso? — perguntei, me referindo à
sua recente namorada.
— Ela está estudando muito e não quis minha ajuda — explicou
enquanto caminhávamos em direção à entrada do ginásio. — Só me
deixou vir porque prometi não olhar para nenhuma garota.
Eu dei uma risada.
— Como se você fosse fazer isso. Só tem olhos para ela.
— Acho que ela ainda não percebeu isso, sabe? — Suspirou.
Nós entregamos os nossos ingressos para os seguranças da
entrada, que nos liberaram ao confirmar o QR code na máquina que
usavam.
— Uau! — Jasper exclamou assim que entramos. — Já está
lotado.
Realmente havia muitas pessoas naquele lugar e quase todos
os lugares das arquibancadas estavam ocupados.
— Ainda não acredito que está namorando a popular Caitlin
Howard, cara! — Jasper disse ao meu lado, apertando meu ombro.
— Agora entendi por que não queria a Tiffany.
Fiz uma careta.
— Não é bem assim...
— E olha que muita gente parecia não acreditar, mesmo vendo
vocês juntos. — Ele me interrompeu e pegou seu celular, o
entregando para mim depois de abrir em uma página da internet. —
Mas ela postou essa foto de vocês ontem com uma legenda fofa e os
comentários são bem positivos, viu?
Peguei o celular da sua mão e vi a foto.
Não sabia muito bem o que senti quando vi a selfie que tiramos
na semana do spring break, sentados na areia da praia. Era uma foto
que podia ser julgada simples por conta do seu sorriso feliz e do meu
um pouco mais contido, mas, ainda assim, com um brilho no olhar, se
não fosse pela legenda que ela colocou cheia de corações:
Eu&MeuAmor.
A foto havia sido postada na noite do dia anterior, logo após o
horário em que saí do seu quarto. Não havíamos nos encontrado
pela manhã porque ela acordou tarde e estava atrasada para uma
reunião com o treinador, por isso, eu nem sabia da existência
daquela foto. Tinha ciência de que aquilo fazia parte do nosso
fingimento, mas, ainda assim, não consegui evitar de sentir meu
coração acelerado de uma forma estranha.
— Você não tinha visto? — Jasper perguntou.
— Nem tenho mais o Instagram instalado no celular.
Abri a parte dos comentários e li alguns.
“Uau, vocês formam um casal bonito.”
“Achei que estavam só ficando. Parabéns para o casal!”
“Caitlin Howard se amarrou ao nerd universitário. Ele é bonito e
você também! Combinam muito bem.”
“Resta apenas Maeve de solteira no grupo da elite da UCLA.
Devo me preocupar?”
Esse último era de um idiota do basquete, só pela foto de perfil
que usava a camisa do time eu soube.
Entreguei o celular para Jasper.
— Parece surpreso, cara.
— É estranho ver uma foto minha com mais de dez mil curtidas
— expliquei o que não era totalmente mentira. — Às vezes, me
esqueço de que ela é muito popular.
— Está tão na bolha do amor assim? — brincou.
Sua pergunta me assustou um pouco.
— Não exagera.
Ele riu.
— Inclusive, a sua namorada não para de olhar para você —
comentou. — Vou buscar uma pipoca enquanto você deseja boa
sorte para ela, ok?
Ele nem esperou que eu concordasse e se enfiou no meio das
pessoas.
Eu olhei para Chris ao meu lado, que sorriu de lado.
— Ele está certo, Caitlin não para de olhar para você. — Meu
irmão comentou, atraindo atenção de algumas pessoas por conta da
sinalização.
Ele percebeu e pareceu inseguro, de repente.
— Vem, vamos até lá desejar boa sorte para ela.
Puxei o seu braço antes que quisesse sair daquele ginásio e
procurei Caitlin com o olhar, a encontrando com Maeve na frente do
banco de reservas.
— Ei, Trevor e Chris! — Caitlin cumprimentou quando nos
aproximamos. — Estou feliz que você veio, Chris.
— Eu só precisei convencê-lo duas vezes, acho que ele gosta
mesmo de você — comentei, provocando um sorriso da loira à minha
frente.
— Maeve, esse é o Christopher, irmão do Trevor. — Caitlin
apresentou à ruiva. — Chris, você já deve ter ouvido falar da Maeve.
Antes que o meu irmão pudesse acenar com a sua mão, uma
mulher de cabelos pretos, exalando luxo com uma calça social
branca e uma blusa marrom se aproximou de nós.
— Eu espero que faça um bom jogo hoje, Maeve — disse,
olhando diretamente para a ruiva e sem lançar um olhar sequer para
nós. — Tem treinado bastante para isso.
Foi estranho ver Maeve apenas assentir e abaixar a cabeça. Ela
sempre estava com aquele ar de superioridade, até com seus amigos
próximos, que acabei ligando essa mulher na nossa frente a uma
figura materna dela. Será que estava certo?
A mulher, provavelmente mãe de Meave, saiu e foi para o
banco vazio da primeira fileira.
— É a mãe da Maeve. — Caitlin esclareceu, olhando para a
amiga, que ainda olhava para o chão como se tivesse algo grandioso
ali.
Espera aí!
Ela desejou que a filha fizesse um bom jogo? Então, ela não
sabia que... Claro, agora entendia um pouco da postura de Maeve.
Estava envergonhada.
— Não foi difícil de perceber que ela é a mãe, parece tão
malévola quanto a filha. — Chris sinalizou ao meu lado, quase me
fazendo dar uma gargalhada.
— Ei, nerd! — Maeve repreendeu, atraindo nossa atenção e
não só me surpreendendo, como, principalmente ao Christopher,
sinalizou: — Eu sei falar a língua dos sinais.
Tinha certeza de que naquele momento, o meu irmão quis se
afundar em um buraco. O tom da sua pele ficou mais vermelho e ele
pareceu extremamente envergonhado.
— Desculpa, eu... vou ver onde está Jasper.
Ele caminhou dois passos antes de Maeve entrar na sua frente.
Estava pronto para não deixar que ela fizesse uma de suas
brincadeiras idiotas com o meu irmão porque sabia que ele não tinha
mentalidade para aquilo, quando ela voltou a sinalizar:
— Tudo bem. Não estou ofendida, ela é mesmo uma malévola.
Maeve lançou um sorriso tão tranquilo para Christopher, que
arrepiou a minha espinha.
O meu irmão ainda pareceu muito envergonhado e saiu para
encontrar Jasper. Eu iria atrás dele, mas Caitlin tocou no meu braço
com a expressão muito confusa do que havia acabado de acontecer.
— O que aconteceu?
— Vou falar com o treinador, Caitlin. — Maeve avisou. — Tenha
um bom jogo.
Caitlin assentiu e voltou a me olhar.
— O meu irmão disse que a mãe de Maeve parecia ser tão
malévola quanto a filha, e a sua amiga apenas respondeu que sabia
falar sinais — resumi, agora achando aquilo um pouco mais
engraçado. — Eu estou bem surpreso, sabia?
— Descobri isso ontem, antes de você ir para o meu quarto —
falou. — Eu também fiquei muito surpresa.
— Pelo menos, ela não foi idiota com ele — comentei e voltei a
minha atenção para ela. — Está nervosa?
— Um pouco, mas não tanto quanto ontem. — Sem que eu
esperasse, abraçou meu pescoço e aproximou seu corpo do meu. —
Eu tive um ótimo relaxante.
Sorri, um pouco envergonhado e orgulhoso. Era estranho e
diferente.
— Sabe que estamos atraindo atenção de todos nesse ginásio
dessa forma, né? — Eu sentia as minhas costas arderem com os
olhares.
— É por isso que está ficando vermelho ou porque está se
lembrando do que fizemos? — Por causa dos dois. — Deveria me
abraçar de volta.
Suspirei e fiz o que ela sugeriu, abraçando sua cintura.
— Só vim aqui desejar boa sorte e te dar uma coisa — falei,
mais rápido do que pude controlar a minha língua.
Caitlin se afastou um pouquinho de mim e olhou para as minhas
mãos na sua cintura.
— O quê?
Levei uma das minhas mãos para o meu bolso direito e tirei de
lá o adesivo que havia feito naquele mesmo dia, no horário do
serviço.
— Você disse que há muito tempo tinha posters de Blackpink e
BTS no seu quarto, então acabei fazendo isso para dar sorte no jogo
de hoje. — Revelei o nome “Pink Venom” em um adesivo
transparente para colar especialmente no seu uniforme. — Pesquisei
hoje de manhã e, como a cor do BTS é roxa, achei que não cairia
bem com o seu uniforme.
Ela parecia incrédula com aquele simples adesivo.
— A tradução da música é boa, tenha ela como uma
mensagem.
— E você ouviu a música? — Eu assenti. — Meu Deus! — Ela
riu e segurou o adesivo, parecendo uma fã boba com aquela
simples... coisa. — Eu amei, Trevor. É sério!
— Estou vendo. Parece até que dei um ingresso para você ir
ver elas.
Ela riu e me deu um tapinha no peito.
— Não exagera!
Caitlin tirou a proteção do adesivo e o colou no seu peito,
ficando ainda mais feliz quando viu o resultado.
— Combinou direitinho.
Eu assenti.
— Você ficou linda.
Ela levantou o rosto e, sem que eu esperasse, me agarrou pelo
pescoço e me deu um beijo rápido nos lábios.
— Obrigada.
Eu estava tão surpreso com o selinho que acabei ficando um
pouco estático, bem da forma como ficava no passado, quando ela
me beijava na bochecha.
— Ei, casal do semestre! — Uma voz feminina soou atrás da
gente e nós nos viramos. Uma garota nos olhava sorridente,
segurando uma câmera. — Posso tirar uma foto de vocês?
Eu quis muito negar, mas aquilo parecia importante para Caitlin,
que me olhou esperançosa. Acabei assentindo sem nem pensar
muito sobre mais uma exposição desnecessária.
— Eu tenho a pose perfeita para vocês. — A garota disse. —
Trevor, pode ficar atrás de Caitlin e abraçá-la pelo pescoço? Como se
fosse uma chave de braço, mas com os seus dois braços?
Assenti.
Fiz o que a fotógrafa pediu, sem querer saber como ela já sabia
o meu nome.
— Agora façam as expressões que quiserem.
Eu senti o perfume do seu cabelo e, por míseros segundos,
fechei os meus olhos, apreciando aquele aroma de lavanda dela,
mas aquilo foi o suficiente para sentir um flash no meu rosto.
— Ai, vocês são tão fofos! — A garota exclamou. — A foto vai
estar disponível no site da faculdade daqui dois dias. Obrigada!
E saiu em busca da próxima vítima, me deixando um pouco
confuso com o que ela havia achado tão lindo para tirar a foto.
— A foto deve ter ficado horrível — comentei, saindo de trás de
Caitlin.
— Veremos daqui dois dias — disse e sorriu. — Preciso me
reunir com o time. Vejo você depois do jogo?
Assenti.
Mais uma vez, ela se aproximou e beijou meus lábios.
— Quem sabe você me dê um prêmio depois desse jogo tão
difícil? — perguntou, cheia de segundas intenções.
Eu dei risada da sua safadeza e a empurrei fraco em direção ao
seu time.
— Vejo você depois do jogo, Caitlin Howard.
Ela mandou um beijo e correu em direção ao seu time.
Ainda fiquei um tempo parado no mesmo lugar, a olhando e me
perguntando por que, de repente, sentia uma imensa vontade de
fazê-la sorrir mais vezes daquela forma.
Não nos transforme em santos
Somos os responsáveis pela dor
O passado e a imagem perfeita
Não há mais ninguém para culpar desta vez
THE HAPPIEST GIRL – BLACKPINK
CAITLIN HOWARD
Em qualquer jogo eu sempre sentia um pouco da adrenalina e
do nervosismo tomarem conta de mim. Geralmente, essas duas
emoções tomavam conta do meu sistema no primeiro jogo porque,
por mais que fosse errado, era nele que eu me baseava em como
jogaríamos no restante da temporada.
Tudo estava alinhado com o treinador e Jocelyn, nossa
levantadora principal e quem criava a maior parte das técnicas do
jogo, mesmo assim, ainda sentia uma certa insegurança por não
jogar com Maeve.
Desde o ensino médio estávamos na mesma quadra,
discutindo sobre saques e ataques, fazendo as pazes e tentando
dar o nosso melhor para levar o time à vitória. Nós nunca
conseguimos aquilo durante os dois anos na faculdade, mas no
ensino médio havia sido diferente. Obtemos medalhas e troféus por
conta do nosso time e do bom jogo que fazíamos.
Tudo estava mesmo diferente e isso me abalava mais do que
deixava transparecer. Como chegamos a esse ponto? Existia
conserto para nós?
Observei a minha amiga sentada no banco. Ela parecia muito
chateada com aquela realidade, muito mais do que havia mostrado
no dia em que foi designada para tal. Maeve não encarava ninguém,
apenas o chão e, para alguém como ela, aquilo era um castigo que
só trazia humilhação.
— Falou com ela hoje? — Aurora perguntou ao meu lado,
seguindo o meu olhar até a nossa amiga.
— Ela parecia tranquila, até agora — respondi, lembrando que
até havia sorrido de forma sincera para Chris, algo que dificilmente
ela fazia. — Mas eu a entendo por estar incomodada agora. Veja...,
muitos estão olhando para ela.
Aurora observou o ginásio, notando o mesmo que eu. Era a
nossa volta naquele dia, mas o assunto entre os cochichos era
Maeve Hood estar no banco.
— Vai ser difícil aguentar o temperamento dela depois disso.
— Aurora murmurou. — A mãe dela não parece estar muito feliz
também.
Eu olhei para a empresária Bonnie Hood e senti que ela
poderia queimar o banco que a sua filha estava sentada, mas
escondia aquilo em um sorriso meio frio quando uma câmera se
direcionava a ela.
Algo não estava certo ali.
A forma como ela havia abordado Maeve há algumas horas
ainda estava na minha cabeça.
— O jogo vai começar, meninas! — O nosso técnico chamou
minha atenção. — Nós vamos ganhar!
Assenti.
Eu tinha confiança naquilo, mesmo que estivesse suando frio.
Nós nos colocamos em nossas posições iniciais ao mesmo
tempo em que as nossas rivais. Era bom que a estreia fosse na
nossa casa, passava um pouco mais de motivação para as outras
meninas ganharem aquele jogo.
Passei os meus olhos pelas pessoas sentadas no ginásio,
muito delas sendo a nossa torcida. Alguns gritavam o meu nome,
outros, o de Aurora e das meninas do time. O meu irmão estava
sentado na primeira fileira, parecendo um pouco mais relaxado do
que nos últimos dias.
Ele não estava ali só por mim, a sua namorada era o grande
destaque no seu coração e da sua atenção. Mais acima do meu
irmão, estava o garoto que havia ido apenas para me ver porque
genuinamente gostava de mim. Trevor estava revirando os olhos
para alguma coisa que o seu amigo cochichava no seu ouvido, bem
daquele jeitinho irritante dele que havia conquistado a minha
simpatia de alguma forma sinistra.
Ele também fazia parte da grande diferença da minha vida.
Quando nós firmamos aquele acordo naquele dia, eu não
imaginava que iríamos nos tornar amigos e que acabaríamos tendo
algo mais íntimo. Tudo bem que eu já me sentia um pouco atraída
por ele no início e isso aumentou gradualmente quando começamos
a nos conhecer melhor. Mas provar do seu beijo só tornou as coisas
mais difíceis.
Tudo nos levou para a minha cama.
E... Droga, seria muita safadeza se falasse que queria repetir
tudo? Talvez eu não tivesse tido o suficiente da sua boca em mim,
do seu pau me preenchendo e dos seus toques apertados em minha
pele.
Trevor era bom. Ele me fez gozar com a boca e com seu pau,
seguindo todos aqueles instintos que nos guiavam quando
estávamos com tesão. Ele podia estar com receio por conta da
pouca experiência, porém, havia sido maravilhoso.
Mas eu sabia que ele podia ser ainda melhor e estava disposta
a testar tudo o que nós dois poderíamos fazer entre quatro paredes.
Isso, claro, se ele também estivesse.
Um apito soou na quadra, avisando que a contagem do jogo
iniciaria em 60 segundos. Voltei a olhar para frente e esperei que o
outro apito soasse no local para finalmente darmos início ao
primeiro jogo daquela temporada.
Tudo tinha que ocorrer bem.
CAITLIN HOWARD
— Vou mandar uma mensagem para Melvin, ele ficou de me
esperar no bar para comemorar com os outros meninos. — Aurora
avisou, afastando-se de nós para fazer a ligação.
— Vocês não precisam me acompanhar até o meu dormitório,
eu sei o caminho. — Maeve tentou nos afastar, mas eu apenas
forcei meu braço no seu.
— Vamos para o seu dormitório e lá iremos passar um tempo
juntas, ok? — falei novamente.
— Vocês querem é saber por que me encontraram daquele
jeito — resmungou, fingindo que o que havia acontecido há alguns
minutos era um nada.
— Nós não vamos forçar nada, Maeve. — Fui sincera. —
Somos suas amigas.
Ela ficou quieta.
Graças a Deus.
Quando notou a nossa presença naquele corredor — logo
quando entramos —, Maeve levantou-se, limpou o rosto e tentou
fingir que nada havia acontecido, elogiando o bom jogo que
tínhamos feito naquela noite.
Diferentemente do que imaginava, nós havíamos visto com os
nossos próprios olhos o que Bonnie fez, mas não comentamos nada
e prometemos não comentar quando fomos para o vestiário nos
trocar. Maeve já era difícil, se continuássemos a pressioná-la, as
coisas seriam ainda piores.
Nós pedimos para ela nos esperar no ginásio para termos uma
noite diferente, algo do tipo só de garotas no seu dormitório, como
fazíamos no nosso primeiro ano de amizade e, não tendo
escapatória, Maeve concordou. Agora estávamos em frente ao
ginásio esperando o táxi que nos levaria para fora do campus, onde
ficava o dormitório dela.
Maeve não gostava da ideia de compartilhar um quarto com
outra pessoa, por isso, a mãe dela pagava um aluguel caríssimo em
um condomínio de dormitórios em frente ao campus.
— Pronto. — Aurora disse, se aproximando novamente. —
Melvin entendeu.
— Sério? Ou ele está bêbado ou está metendo chifre em você.
— Maeve ponderou, me fazendo revirar os olhos. — Como ele é
completamente obcecado por você, acredito mais na primeira
opção.
— Nós tivemos uma boa conversa na última vez que
discutimos e ele está tentando mudar. — Aurora contou, e me
surpreendeu um pouco. Será que isso vinha desde aquela vez que
conversamos embaixo da árvore? — Acho que aquele é o nosso
táxi.
O carro parou na nossa frente.
— Certeza de que querem ficar naquele quarto apertado?
Podíamos sair para beber.
— Pelo que eu me lembre, o seu quarto é maior do que o meu
e da Aurora — rebati. — Vamos pedir lanches, bebidas e doces, e
ter uma noite de garotas, o que acha?
— Acho que naquela hora em que você caiu, deve ter batido a
cabeça. — Maeve respondeu, fazendo eu e Aurora rirmos.
— Apenas vamos entrar, para de ser chata. — Aurora mandou.
Maeve suspirou e finalmente se deu por vencida, entrando no
carro.
Eu sabia o que ela queria fazer porque há muito tempo eu
fazia igual. A nossa amiga queria ficar sozinha, se afundar naquela
dor de não ser o que a mãe esperava e no dia seguinte, ativar o
modo Maeve de ser, que só se importava com beleza, status e
perfeição.
Mas agora que eu sabia o início disso tudo, não a deixaria
sozinha.
Como eu havia dito ao Trevor na semana passada... Aquelas
pessoas, por mais que fossem imperfeitas, eram minha única
família.
E membros de uma família cuidam uns dos outros.
Trevor:
Você e Maeve estão bem?
Ela não foi estúpida mais uma vez por você querer ajudá-la?
Eu sorri com a mensagem que subiu na barra de notificação do
celular enquanto eu confirmava o pedido para a nossa noite.
Pensei que Trevor nem iria se preocupar em falar comigo
naquela noite e esperaria o dia seguinte para saber mais sobre o
que estava acontecendo, mas ali estava ele me surpreendendo mais
uma vez.
— Você está fazendo nosso pedido ou falando com o amor da
sua vida? — Ouvi a voz de Maeve vindo do sofá da sua sala.
Apertei para confirmar o pedido rapidamente e olhei para
minhas amigas sentadas de uma forma bem relaxada no sofá.
— Acabei de confirmar o pedido — respondi, me aproximando
das duas. — E amor da minha vida, uma ova, Maeve!
A ruiva arqueou as sobrancelhas.
— Você e Trevor estão namorando, não é normal que ele se
torne o amor da sua vida? — indagou. — Estava toda sorridente
para o telefone, não parava de olhar para ele durante o jogo e
detalhe... Ele foi o primeiro que você correu para encontrar quando
se livrou da atenção da plateia e do pessoal que queria falar com
você.
O quê?
— Você está viajando...
— Por que eu estaria? Agora, sim, confio que vocês dois estão
namorando — disse, se levantando. — Vou ir colocar um pijama,
essa roupa está desconfortável.
Maeve foi para o seu quarto e eu me joguei ao lado de Aurora,
que soltou uma risada.
— Você deveria falar a verdade para ela — disse baixinho. —
Como quer que ela se abra se você também não faz a mesma
coisa?
Suspirei.
Aurora estava certa. Eu era mesmo uma hipócrita.
— Respondeu à mensagem de Trevor?
— Como você sabe que era ele?
— Estava mesmo toda sorridente para o telefone — repetiu as
palavras de nossa amiga, e eu aproveitei o momento para jogar a
almofada do meu lado na sua cara. — Ai! O que foi? Falei algo de
errado?
— Ele é meu namorado de mentirinha! — lembrei a ela com
minha voz baixinha. — Não fique alimentando essas coisas para
Maeve.
— Então, você está fazendo o papel de apaixonada muito bem
— disse Aurora.
— Ele é uma pessoa simpática e gentil. Eu gosto dele e me
sinto bem com ele, ok?
Aurora assentiu.
— Só isso?
Eu concordei.
Mas ela riu.
— Certo, só isso, então — disse. Mas não tinha certeza se
tinha sido ironia ou não. — Responda antes que Maeve volte e tome
nossa atenção para ela. Vou ao banheiro enquanto isso.
Aurora se levantou e eu peguei o meu telefone novamente.
Eu:
Ela não quer falar, mas presenciei uma discussão com a mãe
dela. Combinamos de passar a noite no dormitório dela, fora do
campus. Faz tempo que não temos uma noite só nossa. Na
verdade, só tivemos uma vez.
A resposta de Trevor não demorou para chegar.
Trevor:
Viu? Eu falei que você saberia por onde começar.
Vejo você amanhã?
Se divirta na sua noite com elas.
Eu:
Podemos nos encontrar para o almoço amanhã? Não sei se
corro ou não o risco de me atrasar amanhã de manhã.
Trevor:
Ok.
Amanhã você tem treino às 11h? Passo para te pegar no
ginásio às 12:00.
Eu:
Ok! Até. :’)
Voltei a guardar meu telefone no bolso no mesmo momento
em que Maeve aparecia na sala com o seu pijama curto e rosa.
Seu dormitório — que para mim era um miniapartamento —
tinha sala e cozinha conjugadas, com um quarto e um banheiro
separados. Era muito mais confortável do que os quartos que
alugávamos no campus.
— Vou ter que emprestar pijama para vocês? — perguntou ao
prestar atenção na minha calça jeans e na minha camisa larga
básica.
— Eu não tinha a intenção de dormir aqui quando fui jogar,
então sim — respondi e segurei a sua mão, a puxando para o sofá.
— Mas você se preocupa com isso depois.
Ela havia retirado a sua maquiagem e a sua bochecha, a qual
foi fortemente atingida pela mãe, estava muito avermelhada. Uma
dorzinha cresceu no meu coração ao ver aquilo. Por que a mãe dela
a tratava dessa forma? Maeve era linda com aquele cabelo ruivo, a
pele sem nenhuma marquinha e olhos incrivelmente verdes. Era
muito inteligente e jogava bem, mesmo que tivesse ficado no banco
naquele dia.
— Por que está me olhando assim? Você está estranha,
Caitlin. Desde que começou a namorar, inclusive — disse, mas
aquilo estranhamente não me afetou da mesma forma que ouvi
atrás da porta no spring break. — Conheceu o nerd e agora está
desse jeito.
— Trevor e eu estamos fingindo nosso relacionamento —
disse de uma vez, fazendo-a arregalar os olhos em surpresa. —
Você estava certa desde o início.
Maeve não conseguiu falar nada por alguns segundos, talvez
até um minuto, e isso, sim, era bem surpreendente.
— Fingindo? Por que você precisa fingir um relacionamento,
Caitlin?
Então, eu contei tudo, desde a aposta na qual não fui 100%
sincera até aquela noite na pizzaria, em que concordei em ajudar
Trevor com o seu problema com Tiffany.
— Quer dizer que... você não venceu a aposta?
Claro que ela iria focar só naquilo.
Aurora entrou na sala e se sentou do nosso lado.
— Não — respondi. — Não tinha chances de eu ficar com
Trevor naquela festa, ele não é como os outros.
— Eu estou surpresa, mas não tão chocada — admitiu e riu
fraco. — Deve ser porque já desconfiava que essa história era muito
estranha. — Olhou para Aurora. — Você sabia?
A minha cunhada assentiu.
— Acabei estranhando também e colocando Caitlin contra a
parede, ela foi obrigada a me contar.
Sorri.
— Por que só eu não sabia? — Cruzou os braços, emburrada.
— Pensei que éramos amigas!
— Não costumo contar as minhas mentiras, mas, sim, vocês
são minhas amigas e deveriam saber toda a verdade sobre mim.
— Você está parecendo aquelas personagens misteriosas de
filmes. — Aurora falou. — Não é como se estivesse escondendo
mais coisas sobre nós.
Olhei para Maeve, que mesmo focada no nosso assunto, ainda
parecia vulnerável com os acontecimentos recentes.
— Antes de vir morar em Los Angeles com minha tia, meu
irmão e eu morávamos com os nossos pais. Eles odiavam o fato de
eu querer seguir no esporte porque, segundo eles, não valia a pena.
A não ser que eu tivesse um pau no meio das pernas, como o meu
irmão — contei a elas, infelizmente voltando para o meu passado.
— E Melvin, que era para ser a grande ascensão no esporte desde
novo, estava se afundando em bebida, maconha e escândalos com
os amigos na escola.
Maeve me olhou.
— Os meus pais ligavam só para aparência e, quando o filho
começou a chamar atenção de forma negativa para a família, eles o
expulsaram de casa. — Elas ficaram em choque. — Ele tinha
apenas quinze anos, e tenho certeza de que se meus pais tivessem
apenas seguido o papel de pais, ele teria melhorado. Mas eles
preferiram mandá-lo para longe.
— Foi nessa época que eles morreram? — Aurora perguntou.
Assenti, engolindo um caroço bem conhecido que quis subir
pela minha garganta.
— Eu não aguentei ver o meu irmão sozinho e fui atrás dele.
Pouco tempo depois, quando estávamos na nossa tia, recebemos a
notícia.
— Meu Deus... — Maeve murmurou. — Por que nunca disse
isso para a gente?
— Porque eu queria que vocês achassem que éramos
perfeitos órfãos — admiti, me achando uma tola por isso. — Porque
você e Barry pareciam perfeitos no ensino médio.
Ela engoliu em seco.
— Eu estava longe de ser.
— Agora sabemos disso... — Aurora disse e segurou a mão de
Maeve. — Você pode falar quando se sentir à vontade.
— Da mesma forma que eu me senti agora — afirmei. — Não
vamos mais pressionar você, Maeve. Só não queremos que você se
afunde mais, como parecia estar prestes a fazer quando entramos
naquele corredor.
Ela concordou.
— Acha que o técnico pode me colocar no jogo na sexta? Eu
preciso jogar.
— Nós vamos ajudar você. — Aurora garantiu, e eu concordei.
— Fui uma idiota com vocês, principalmente com a Caitlin. —
Ela me olhou, parecendo muito arrependida. — Desculpa.
— Para a sua sorte, já sei lidar com o seu humor, espertinha.
— Apertei sua bochecha, a que não havia recebido o tapa. — Só
vamos fazer uma promessa a partir de agora?
— O quê? — As duas perguntaram ao mesmo tempo.
— Vamos deixar de ter essa amizade formada apenas por
conveniência e aparência? Podemos voltar a ser o que éramos nos
primeiros meses do ensino médio? Nós temos mais capacidade
para isso do que ser três garotas populares e idiotas.
Elas riram e, para o meu alívio, assentiram.
— Ok, mas podemos deixar o drama para lá e focar no
relacionamento falso? — Maeve questionou, e eu bem sabia que ela
não deixaria aquilo quieto. — É falso mesmo?
— Eu acabei de dizer que é, Maeve.
— Mas ele levou até o irmão e o amigo para assistir você
jogar.
— Porque ele provavelmente não queria ficar sozinho —
justifiquei o óbvio.
— Vocês parecem bem próximos. — Aurora entrou no jogo, e
eu arqueei as sobrancelhas.
— Virou um complô para o que agora?
— Esse relacionamento poderia se tornar magicamente em
algo verdadeiro. Ou estou errada? — Aurora insinuou.
— Só tem comentários positivos na sua postagem. — Maeve
apontou, parecendo ir para o mesmo caminho da nossa amiga. —
Os únicos tristes são dos atletas idiotas que não conseguiram uma
chance de levar você para a cama.
Nós rimos.
— Inclusive, eu devo agradecer ao Trevor por propor esse
relacionamento falso. Na festa passada, recebi muitos convites para
dançar — Maeve se gabou. — Peguei o mais gatinho e aproveitei a
noite toda com ele.
— Não aja como se não tivesse vários convites antes! — Eu a
empurrei pelo ombro de brincadeira. — Os meninos babavam por
você também.
— E o Barry? Pensei que vocês estavam tendo algo mais
sério. — Aurora questionou.
— Não! — Ela negou e fez uma careta. — Ele é o meu melhor
amigo.
— Melhor amigo de foda? Isso, sim, nunca dá certo.
— Somos dessa forma há mais de dois anos e não temos
exclusividade. Então, se algo fosse mudar, já deveria ter acontecido,
certo?
Naquele ponto ela tinha razão.
— Muito diferente de um relacionamento falso em que você já
sorri que nem uma boba só de ouvir o nome do namorado de
mentirinha. — Ela provocou.
Revirei os meus olhos e juntei a almofada no chão, jogando na
sua cara.
— Nós não vamos tornar esse relacionamento verdadeiro
porque nenhum dos dois quer se comprometer sério agora.
Aurora balançou a cabeça e riu.
— Como se vocês não estivessem fazendo exatamente isso
agora, só que de maneira falsa...
Maeve concordou.
Bem na hora, o meu celular apitou, indicando a chegada do
nosso pedido.
— Façam algo de útil e me ajudem a trazer as nossas comidas
e bebidas. — Levantei-me e calcei meus chinelos.
Elas fizeram o mesmo, mas não pareciam prontas para deixar
aquele assunto de lado. No entanto, não podia me sentir brava ou
de saco cheio daquilo porque era bom. Pela primeira vez, me sentia
totalmente à vontade com elas.
Você pode ficar acordado a noite toda?
Me fodendo até o dia amanhecer
Trinta e quatro, trinta e cinco (pois é, é, é, é)
34+35 – ARIANA GRANDE
TREVOR LANCASTER
Eu caminhava em direção ao ginásio onde as meninas
treinavam, um pouco atrasado porque fiquei dez minutos no telefone
tentando convencer a minha mãe de que a ideia de levar Caitlin
naquele fim de semana para São Francisco era péssima.
Fui ouvido? Claro que não. Ela disse que precisava conhecer a
minha namorada o mais rápido possível e que naquele ano, eu não
conseguiria escapar da festa de aniversário que estava preparando
para mim.
Eu tive cinco tipos de calafrios diferentes ao ouvir aquilo e a fiz
prometer que não faria nada grande e que não convidaria pessoas
de fora, em troca, eu levaria Caitlin para passar o fim de semana
com ela.
Agora, eu só precisava arrumar uma forma de convencer
minha falsa namorada de que era uma boa ideia fazer aquele
passeio comigo.
Para ser sincero, eu estava tão inerte nos últimos dias que
nem me lembrava do meu próprio aniversário. Tudo bem que não
era uma data que eu esperava todos os anos ansiosamente, para
mim, era um dia tão comum como qualquer outro e isso provocava
nervosismo em minha mãe porque, para o meu irmão, era a mesma
coisa. Mês passado, no seu aniversário, apenas almoçamos uma
refeição especial e ele nos proibiu de cantar parabéns porque era
muito constrangedor para ele.
Encontrei o ginásio vazio assim que entrei.
Olhei no relógio e verifiquei que já se passava do horário que
havia combinado com Caitlin para nos encontrarmos. Será que ela
já havia saído? Procurei pelo meu celular no bolso da minha calça e
desbloqueei sua tela, notando uma mensagem não lida dela.
Caitlin:
Acho que você vai se atrasar, o que é um milagre. Me encontre
no vestiário.
Encontrá-la no vestiário? Por quê?
Eu guardei o telefone no bolso novamente e caminhei em
direção ao lugar. Confirmei que não havia mesmo ninguém ali
quando abri a porta do vestiário. Até mesmo Caitlin não estava à
vista.
— Caitlin? — chamei, fechando a porta.
Não precisei procurar por ela ou esperar que me respondesse
por muito tempo, pois, em um piscar de olhos, ela apareceu na
minha frente vestida apenas com um conjunto de lingerie cor-de-
rosa.
Se já estava difícil vê-la antes sem lembrar da noite em que
transamos no seu dormitório, agora parecia mil vezes pior. Aquelas
peças íntimas ficavam tão pequenas nela que não escondiam muita
coisa.
E eu já a tinha visto por inteira.
E para o meu martírio, eu me lembrava de cada parte sua.
Meu pau reagiu ao seu corpo tão rápido ao vê-la se aproximar
de mim daquela forma com um sorriso nos lábios.
— Oi — cumprimentou, como se não estivesse quase sem
roupas na minha frente. — Recebeu a minha mensagem.
— Acho melhor eu esperar você lá fora. — Para o meu próprio
bem. — Não dem...
— Você ficou me devendo um beijo ontem — interrompeu-me,
impedindo que eu saísse do vestiário. — Lembra?
Um beijo era a última coisa que eu estava pensando com ela
vestida daquele jeito e tinha quase certeza de que Caitlin sabia
disso.
— E você quer cobrá-lo agora? — perguntei, me enfiando mais
naquela brincadeira perigosa. — Vestida assim?
Ela mordeu o seu lábio inferior e tocou meu braço até chegar à
minha mão.
— Tem algo que eu sempre quis fazer aqui... — admitiu,
passando o outro braço ao redor do meu corpo e chaveando a porta
atrás de mim. Senti todo meu corpo se arrepiar com a sugestão
nada discreta dela. — Consegue adivinhar?
— Caitlin... — O seu nome saiu quase como um gemido
quando os seus lábios tocaram o meu pescoço. Segurei a sua
cintura com um pouco mais de força para afastá-la, mas não
consegui. — Se alguém nos pegar aqui...
Ela levantou o rosto, encontrando meu olhar. Eu parecia ser o
único que estava pensando coerentemente ali.
— Esse horário não tem ninguém aqui — rebateu, dando
aquilo como solução e levando as suas duas mãos para a mochila
em meu ombro, a fazendo deslizar pelas minhas costas até o chão.
— Dizem que o medo sempre excita. Estou curiosa a respeito.
As suas palavras, junto da sua mão deslizando pelo meu corpo
até chegar no cós da minha calça, fizeram com que aquele calor
muito conhecido por mim dominasse todo o meu corpo.
Ela era louca.
E por que justo eu estava considerando aquela loucura?
Em minha defesa, era muito difícil raciocinar com Caitlin
vestida daquela forma na minha frente e se tornou pior ainda
quando ela se colocou de joelhos. A minha visão focou em seus
seios pequenos escondidos dentro daquele pequeno pedaço de
pano rosa e senti o meu pau crescer como um maldito traidor à
razão que deveria estar tendo no momento.
Caitlin aproximou as mãos do meu zíper e, com um risquinho
de inteligência, eu as segurei antes de abrir minha calça jeans.
— Você não quer? — Ela perguntou, procurando a resposta no
meu olhar. Um lugar completamente errado de se ver, já que
provavelmente os meus olhos revelavam o tanto que eu a queria
naquele momento.
— Podemos ir para o seu dormitório e... Merda!
Eu esqueci até mesmo o que iria sugerir quando ela aproximou
o rosto da minha mão que segurava as suas e colocou o meu dedo
indicador na boca, simulando um boquete e terminando de tirar o
meu juízo. O meu pau cutucou a calça e eu o quis ali, no lugar do
meu dedo, sentindo aquela língua por todo canto dele. Ela o sentiu
contra sua mão e me lançou um sorriso vitorioso, largando meu
dedo.
Por fim, eu mandei um dane-se para a coerência e afastei as
minhas mãos de cima das suas, dando total liberdade para que
fizesse o que quisesse comigo.
— Nós sabemos que essa é a melhor escolha — murmurou
com a voz rouca, puxando o zíper da minha calça para baixo.
Caitlin a abaixou junto da minha cueca e meu pau saltou para
fora. Livrei-me daquelas peças de roupas com a sua ajuda e senti
todo meu corpo estremecer quando sua atenção voltou para ele. Os
seus olhos brilhantes encontraram os meus antes de descer
novamente por todo o meu corpo, agora parcialmente tapado.
— Devo me considerar uma safada por ficar mais excitada
com você vestido com essa camisa e usando esses óculos
enquanto estou ajoelhada na sua frente, prestes a te dar o melhor
boquete da sua vida?
Eu chamaria de demônio, que desde antes de me puxar para
um beijo, estava me testando, mas os meus lábios acabaram
curvando-se de lado com aquela pergunta.
— Você está muito confiante — falei, com minha voz
carregada de desejo e me sentindo cada vez mais louco para sentir
sua boca em mim.
Ela voltou a me olhar. Dessa vez, o desafio brilhava em cada
uma das suas pupilas.
— Você pode me dar razão depois.
Caitlin cortou o papo e aproximou sua mão do meu pau.
Nunca, em hipótese alguma, achei que estaria em uma situação
como aquela dentro de um vestiário, mas ali estava eu, me sentindo
cada vez mais excitado pela visão de Caitlin prestes a me chupar e
pelo medo de alguém acabar entrando no lugar, mesmo que
estivesse trancado.
Eu ofeguei quando a sua mão se fechou em torno do meu pau
ereto. O seu toque não estava frio e, mesmo se estivesse,
esquentaria naquele momento em que ela começou a movimentar
sua mão para cima e para baixo, me masturbando com uma
agilidade que me desconcertou por completo.
— Caitlin... — gemi. Aquilo era uma tortura.
As minhas mãos se fecharam em punhos e eu senti uma
vontade incomum de simplesmente abrir a sua boca e enfiar o meu
pau nela, que naquele momento, parecia ficar cada vez maior
conforme seus movimentos aceleravam.
Caitlin encontrou o meu olhar e notei ali o quanto ela estava
louca para me sentir.
Sinta.
Estava perdendo a cabeça.
Um filete do líquido pré-ejaculatório saiu do meu pau e Caitlin o
capturou com sua língua antes que escorresse até o chão. Aquela,
sim, seria uma cena que nunca sairia da minha cabeça, pois nunca
havia visto nada tão erótico antes.
Ela colocou a língua para fora novamente, mas dessa vez,
lambeu toda a cabeça do meu pau como se provasse um doce
diferente. Gemi e quase fechei meus olhos com aquilo. Mas Caitlin
abocanhando tudo que podia fez com que eu mantivesse os olhos
bem abertos.
— Isso... — gemi e não me controlei, segurei seu cabelo preso
propositalmente em um rabo de cavalo.
Caitlin me chupou inicialmente devagar, parecendo se
acostumar com o tamanho e me provocar ao mesmo tempo. Os
seus olhos não desviavam dos meus e tornavam a situação ainda
mais erótica para mim. Eu deixei que os curtos gemidos saíssem da
minha boca, sem segurá-los, e não quis apertar sua cabeça contra
mim e forçá-la a ir mais rápido porque tinha um pouco de receio de
gozar rapidamente.
Eu estava há anos sem sexo e agora estava recebendo um
boquete pela primeira vez... Sim, a minha ex-namorada nunca havia
feito em mim.
Caitlin aumentou a velocidade, nublando qualquer pensamento
que eu pudesse ter de anos atrás. A sua mão passou a masturbar a
parte que não coube em sua boca ao mesmo tempo em que abria
mais a garganta para me receber melhor.
Aquilo era como o paraíso.
Sua boca quentinha, a sua língua em cada parte e a sensação
indescritível de ser sugado como um doce apetitoso.
Eu apertei mais as minhas mãos no seu cabelo, não me
importando em bagunçar o seu penteado quando me sentia fora de
mim a cada sucção que ela fazia. Caitlin me levava cada vez mais e,
para o meu fim, levou uma de suas mãos até as minhas bolas, as
masturbando junto.
— Caitlin... Droga! — gemi, querendo me afastar porque sentia
que estava prestes a gozar em sua boca. — Eu vou gozar.
Ela assentiu ainda com o meu pau em sua boca, aumentando
mais a força de sua língua contra meu pau. Caitlin queria que eu
gozasse na sua boca? Merda! Isso era demais até para mim.
Pensei que ela fosse do tipo que não engolia.
Não demorei muito para gozar, meu corpo estremeceu por
completo em ondas que quase enfraqueceram minhas pernas e eu
me vi derramando meu orgasmo em sua garganta.
Caitlin engoliu tudo, limpando cada parte do meu pau com sua
língua e ignorando qualquer sensibilidade que dominou minha
ereção ao gozar daquela forma. Não foi de se surpreender que ele
voltou a ficar ereto quando ela terminou de me lamber.
Quem é essa garota?
Eu não podia acreditar que estava assinando a minha carta de
viciado em Caitlin Howard quando julguei que o sexo não era tão
importante assim e permaneci todos aqueles anos com os meus
videogames, as minhas pesquisas, a minha família e os meus
estudos.
— E então? — questionou, levantando-se e colando o seu
corpo ao meu. — Fui a melhor ou preciso provar mais uma vez?
Você bem que parece pronto.
Eu agarrei a sua nuca e grudei a minha boca na sua, achando
que isso era uma boa resposta quando havia perdido as palavras
dentro da minha mente.
Caitlin me beijou de volta, lambendo todo o interior da minha
boca e me fazendo sentir todo o meu gosto. Estando misturado com
o seu, parecia ser o segundo melhor gosto que já havia provado
porque o primeiro seria sempre o dela, que provei naquela noite em
seu dormitório.
Ao mesmo tempo em que me beijava, Caitlin me virou e se
moveu comigo até as minhas pernas baterem no que provavelmente
era o banco que ficava entre os armários do vestiário. As suas mãos
desceram até o meu pau e o apertou levemente, gemi contra os
seus lábios.
— Quero você dentro de mim — implorou, com a sua voz tão
carregada que quase não a reconheci. O meu pau pulsou na sua
mão.
— Não tenho camisinha aqui — admiti, um pouco frustrado
com aquilo.
Talvez eu devesse começar a andar com elas.
Caitlin moveu a sua mão até a parte traseira da sua calcinha e
tirou de lá uma embalagem de camisinha.
— Prendi no elástico da calcinha — disse, sem nenhuma
vergonha disso.
Acabei rindo da sua falta de vergonha e da sua inteligência.
Eu me sentei na ponta do banco e Caitlin me entregou a
camisinha. Rasguei o pacote com os dentes e tirei de lá a proteção,
descendo-a pelo meu pau segundos depois. Observei a loira na
minha frente deslizar a sua calcinha pelas suas pernas, não
poupando em parecer sensual ao se livrar da peça.
Senti o meu coração acelerar como um louco quando ela se
aproximou de mim, deixando sua boceta bem próxima da minha
cara. Eu abaixei levemente o meu rosto e deixei um beijo bem
próximo a ela, arrepiando a região da sua barriga. Toquei as suas
coxas com minhas duas mãos, as apalpando conforme deslizava
por elas.
Caitlin levantou o meu rosto, me fazendo encará-la. Os seus
dedos se enfiaram entre os meus cabelos e os puxaram levemente
para trás enquanto colocava uma perna de cada lado das minhas e
se abaixava devagar. Conseguia ver o quanto ela estava presa
naquele momento como eu.
Quando se sentou no meu colo, eu senti a sua boceta
extremamente molhada molhar minha coxa e, sem aguentar mais
esperar, a puxei para perto do meu corpo e fiz com que batesse
contra meu pau ereto.
— Porra... — gemeu, esfregando-se no meu pênis ao mesmo
tempo em que aproximava a boca da minha. — Você é tão gostoso,
Trevor Lancaster. Eu poderia me sentar em você todos os dias e
não reclamaria.
Eu levantei os seus quadris e encaixei o meu pau na sua
entrada, mas a impedi que descesse por enquanto.
— O que foi? — ofegou, quando afrouxei um pouco do meu
aperto e uma parte pequena do meu pau entrou nela.
— Seu plano é me tornar um viciado? — perguntei quase
contra a sua boca, a sentindo pingar em cima de mim.
Porra! Ela estava tão excitada quanto eu.
Ainda com os seus dedos enfiados entre o meu cabelo, ela
prendeu os meus lábios nos seus dentes e depois os beijou,
assentindo como uma resposta silenciosa à minha pergunta.
Talvez ela tivesse conseguido aquilo na nossa primeira transa.
Caitlin abaixou seu quadril e eu deixei que a sensação incrível
de preenchê-la dominasse todo o meu corpo enquanto apertava
firmemente sua cintura, com o propósito de ter onde segurar, e não
de pará-la.
— Caitlin... Merda! — gemi ao ter meu pau bem no fundo da
sua boceta.
— É gostoso, certo? — ofegou, cavalgando em cima de mim.
Concordei, tomando seus lábios e a ajudando a se movimentar
sobre o meu pau.
O seu corpo se movia para frente e para trás ao mesmo tempo
em que os meus quadris seguiam o seu ritmo. Daquela forma,
conseguia ir mais fundo quando a penetrava no mesmo momento
em que ela sentava no meu pau.
Caitlin deslizou as mãos até a minha blusa preta do Naruto e a
puxou para cima, separando minha boca da sua para tirar a peça do
meu corpo. Não paramos com os movimentos. Ela subia e descia no
meu pau, ora rebolava contra ele, esfregando o seu clitóris, e eu
acompanhava os gemidos que saiam da sua boca, tão imerso
naquilo como ela.
Eu desci o meu rosto e beijei o seu pescoço, lambendo e
chupando sua pele, sentindo-me cada vez mais perto de estourar
dentro dela. Deslizei meus lábios pela sua clavícula, lambendo todo
o suor que tinha por ali até chegar nos seus seios tapados pelo sutiã
rosa.
Levantei a peça para cima e abocanhei um deles, sendo
recompensado pelo seu gemido mais alto. Ela gostava daquilo.
Caitlin gostava de algo mais forte e mais intenso. Sentir as duas
coisas ao mesmo tempo parecia ser o suficiente, mas talvez não
fosse.
E foi isso que me fez firmar as minhas mãos no seu quadril e
levantar-me com ela no meu colo. Observei os seus olhos que me
encararam confusos e, antes que pudesse abrir a boca para
perguntar algo, a coloquei contra a parede.
Caitlin arfou quando sentiu a pedra fria nas suas costas e seu
rosto se iluminou de excitação quando entendeu o que eu queria.
Ela abraçou minha cintura com suas longas pernas e eu me
movimentei contra ela. Primeiro bem devagar, vendo-a revirar os
olhos de prazer e bater fraco a cabeça contra a parede.
— Mais forte...! — implorou, arranhando meus ombros, onde
suas mãos pousavam.
Eu obedeci.
Retirei quase todo meu pau da sua boceta e enfiei tudo dentro
dela, gemendo tão alto quanto o som que saiu da sua boca.
— Mais...! Porra, mais, Trevor — gemeu, apertando minha
pele.
Eu fui.
Aumentei minhas estocadas a cada segundo, sentindo meu
pau entrar cada vez mais fundo na sua boceta. Caitlin não
conseguia esconder o quanto aquilo estava bom e nem eu
conseguia. A cada vez que entrava nela, era como se meu corpo
inteiro entrasse em um tipo de combustão em que eu era o fogo e
ela, o oxigênio.
Tudo se encaixava perfeitamente.
E eu me via cada vez mais viciado.
— Estou quase, Trevor. — Ela gemeu, quase fechando os
olhos.
Eu estava mesmo me segurando para não explodir antes dela.
Entrei e saí de dentro dela mais algumas vezes antes que
gozasse. Seu corpo todo estremeceu e eu tive que segurar suas
coxas para que não acabasse caindo.
Fui alguns segundos depois dela, enchendo a camisinha com
outro orgasmo violento.
Eu encostei a minha testa na sua e esperei.
Esperei que o meu coração acalmasse.
Que o meu peito parasse de bater como um louco.
E que aquela sensação de êxtase diminuísse um pouco.
Porque você estará a salvo nestes meus braços
Chame meu nome na beira da noite
E eu vou correr até você, eu vou correr até você
RUN TO YOU – LEA MICHELE
CAITLIN HOWARD
Liguei o chuveiro do vestiário e me enfiei embaixo dele,
deixando que a água molhasse todo o meu corpo, da cabeça aos
pés. Olhei para Trevor sem nenhuma roupa, e agora sem os óculos
também, e estendi minha mão para ele.
— Sabe que não vamos conseguir almoçar, né? — Segurou a
minha mão e se aproximou. — Está quase na hora de eu ir
trabalhar.
— Estou muito satisfeita depois do que fizemos aqui. — Eu o
puxei para debaixo da água, molhando toda a sua cabeça e ombros.
— Você não está?
Ele sorriu daquele modo fraco e hipnotizante, me causando um
frio na barriga que não tinha nada a ver com a água morna caindo
sobre nós.
— Eu não sabia que você podia ser tão safada, Caitlin —
disse, e levou sua mão até o meu cabelo, prendendo alguns fios nos
seus dedos. — Precisamos nos apressar no banho.
Eu não me importaria de repetir tudo o que havíamos feito há
alguns minutos. Caramba, aquela havia sido a melhor transa da
minha vida e nem precisou de tanto esforço assim. Apenas um pau
gostoso para sentar e uma parede boa para ser espremida
enquanto era fodida.
Quem poderia imaginar que Trevor era responsável por
aquilo? Olhando para a sua carinha angelical era muito difícil e, para
o meu tormento, aquilo me excitava muito.
Trevor segurou o meu pulso.
— Banho, pimentinha.
Eu nem percebi que estava deslizando a minha mão pelo seu
abdômen antes de ele me impedir, mas não foi isso que fez com que
eu o encarasse confusa.
— Pimentinha?
Ele concordou, rindo de algo que eu ainda não fazia ideia do
que significava.
— A sua safadeza está relacionada a transar e você consegue
ser... quente e apimentada — explicou de um modo fofo ao ficar
com aquelas bochechas levemente coradas.
— Por um momento, pensei que você me daria uma
explicação nerd para o apelido — brinquei, agarrando seu pescoço.
— Você me deve uma resposta.
— Devo?
Assenti.
— Eu fiz o melhor boquete da sua vida?
Trevor não ficou surpreso com a minha pergunta, pois parecia
estar se ajustando rapidamente ao meu lado sem-vergonha.
— Considerando que você foi a única... Parece que sim,
pimentinha.
Eu fui a única? E ele continuaria com aquele apelido? Tudo
bem, não podia me importar menos com aquilo depois da revelação
jogada no meu colo.
— Isso é sério?
— Sim. Porque parece tão surpresa? Não tenho tantas
experiências assim e minha ex-namorada não tinha muita
segurança, então...
Ele pegou o sabonete que eu havia deixado no suporte do box
e começou a ensaboar o seu corpo. Até podia me perder com essa
visão porque quanto mais eu dava para aquele cara, mais me sentia
atraída, o único porém era que ainda estava presa à informação
anterior e ao sentimento que aquilo começava a me causar.
Não deveria estar tão feliz assim, certo?
— Está se controlando para não rir de mim? — perguntou bem
sério, parando com o sabão no meio do seu peito.
— Claro que não! — respondi rapidamente, pegando o
sabonete da sua mão e me aproveitando do momento para fazer o
trabalho no seu lugar enquanto eu era alvo do seu olhar. — Estou
apenas feliz com o que me disse.
Permaneci observando a minha mão deslizar com o sabonete
pelo seu peito, abdômen e braços, não querendo levantar meu rosto
para ver como tinha reagido diante daquela informação. No meu
interior, senti que era demais, mesmo que não me importasse em ter
falado aquilo.
— Feliz? — insistiu, e levantou o meu rosto.
— Não posso?
Não entendi por que, mas o meu coração acelerou quando a
sua mão se fechou na minha bochecha.
— Estou feliz que você foi a primeira também, pimentinha.
Talvez eu pudesse gostar mais daquele apelido a partir de
agora.
Eu toquei os meus lábios nos seus e o envolvi em um beijo,
colando nossos corpos nus e sentindo que o seu pau estava bem
animadinho para quem havia gozado duas vezes. Trevor não deixou
que eu avançasse as coisas mais uma vez, mesmo que o nosso
beijo fosse o suficiente para nos deixar com vontade.
— Banho — lembrou, separando sua boca da minha e
apontando para o chuveiro.
Eu fiz um beicinho com a minha boca e o fiz rir. Era frustrante
que ele, mesmo com todo aquele tempo sem sexo, conseguisse se
manter consciente ali.
— Vire-se — mandou. — Vou lavar as suas costas.
— Você ainda não lavou a frente — lembrei, e balancei meus
seios propositalmente para chamar a sua atenção. — Precisa de um
cuidado especial, sabe?
Trevor focou neles automaticamente e vi no seu olhar o quanto
estava querendo largar um foda-se para suas responsabilidades e
me foder de novo. A minha boceta molhou de excitação só com a
lembrança do que havíamos feito.
Mas ele ainda era o nerd Trevor Lancaster e pareceu se
esforçar muito ao me virar pelos ombros de costas para ele.
— Que consideração... — falei ao encarar a parede na minha
frente. — Eu lavei bem o seu peitoral.
— Porque você quis — justificou simplesmente.
Irritantemente arrogante.
É, algumas coisas não mudavam e eu gostava disso.
Sorri para a lajota na minha frente, relaxando automaticamente
sob o seu toque, mesmo que tivesse um sabonete entre sua mão e
minha pele.
TREVOR LANCASTER
Faltava alguns minutos ainda para sair de casa e começar a
minha noite de trabalho na pizzaria naquela sexta-feira, por isso
havia escolhido passar aquele tempo com Christopher, jogando
Gran Turismo. Eu sempre era melhor do que ele naquele jogo, mas
hoje, especificamente, o meu desenvolvimento foi péssimo.
— O que está acontecendo com você? — Chris perguntou ao
parar o jogo. — Parece estar no mundo da lua.
— Não estou, mas bem que poderia — brinquei, jogando o
controle no tapete do nosso quarto. Havia perdido mesmo e aquilo
não era uma novidade quando se tratava daquele jogo. — Por que
não trocamos de jogo?
— Não acho que você vai se concentrar — Sinalizou ele. — O
que está incomodando você?
— Por que acha que algo está me incomodando?
— Porque você está com essa cara de paspalho —
argumentou, fazendo-me arquear as sobrancelhas. — Lembre-se
que sou seu irmão e conheço tudo sobre você.
Aquilo, sim, poderia ser considerado uma dádiva ou uma
perseguição.
A verdade era que eu não parava de pensar em Caitlin.
Era sexta-feira e durante todo o restante da semana, desde o
dia em que transamos no vestiário do ginásio, ela estava agindo de
forma estranha. Não era comigo, pois seu tratamento continuava o
mais amigável possível, mas havia algo na forma como olhava para
o nada de repente e fugia do presente, como se algo a estivesse
incomodando.
Não tentei perguntar se algo estava acontecendo porque
respeitava o seu tempo, não por falta de curiosidade ou
preocupação. Mas do dia seguinte ela não me escaparia,
principalmente porque teríamos que passar o fim de semana juntos
de novo.
Aquilo era outra coisa que me deixava nervoso.
Eu sentia que as coisas entre nós estavam passando do nosso
controle. Não estávamos respeitando as leis que havia imposto no
nosso contrato e parecia que isso nem era mais importante quando,
na verdade, deveria ser.
— É a Caitlin, né? — O meu irmão afirmou com tanta
facilidade que senti o meu corpo gelar. — Claro que é.
— Como pode ter tanta certeza?
— Posso não ser um amante de filmes de romance, mas não
sou tonto, Trevor. — Sinalizou, me deixando bem confuso sobre
onde gostaria de chegar. — O que está incomodando você? O amor,
a popularidade ou o passeio à casa da nossa mãe?
Levantei minha mão e dei um tapa na sua nuca.
— Que amor, Christopher? Para de falar bobagens!
— Então, é amizade? — Ele moveu as mãos e, assim que
olhei para seu rosto, notei a feição debochada. — Muito linda essa
amizade de vocês.
Não precisava ser inteligente para saber que ele estava sendo
irônico.
— Não estou apaixonado — defendi-me.
Mas, pelo visto, havia dado exatamente o que ele queria
porque meu irmão sorriu com todos os seus dentes para mim. Era
difícil provocar esse tipo de sorriso nele, então, ao mesmo tempo
em que me sentia vitorioso, também me sentia intimidado.
— Quem falou que você está? Poderia ser a Caitlin. E você
estar completamente preocupado com isso.
Como eu pensava, havia entregado exatamente o que ele
queria.
— Se está se defendendo assim é...
Eu segurei as suas mãos, o impedindo de continuar.
— Está levando isso para outro nível — falei a verdade,
soltando suas mãos. — Caitlin e eu somos apenas namorados de
mentirinha.
— Só isso? Nada mais?
O fato de que transamos duas vezes surgiu na minha mente e
eu me vi querendo bater minha cabeça na parede mais próxima.
Não de arrependimento, mas por simplesmente ser um idiota
confuso.
— Nós... transamos — resolvi admitir. E assim que as palavras
saíram da minha boca, senti como se um peso enorme tivesse saído
dos meus ombros também. — Duas vezes.
— E vem me dizer que é falso? — O meu irmão riu. — É claro
que vocês acabaram fazendo sexo, parece até meio óbvio que isso
aconteceria. Você estava quase se tornando virgem de novo. Tenho
certeza de que nem se segurou por muito tempo e Caitlin tinha uma
vida sexual bem movimentada pelo que os outros diziam na
biblioteca... Pensando bem, todos da elite tem isso, certo?
— Eu não sei. Diferente de você, não ligo para fofocas.
Fui um pouco grosso ao ver que ele não estava nenhum pouco
surpreso com o fato de eu ter transado com Caitlin. Não deveria ser
tão óbvio assim, certo?
— O que eu posso fazer se as fofocas que me perseguem? Eu
apenas aproveito as oportunidades as ouvindo — justificou com
uma carinha inocente que não me convenceu em nada. — Vamos
voltar para a informação anterior. Você transou com Caitlin Howard,
devo perguntar como foi? — Ele fez uma careta. — Não,
definitivamente não preciso saber. Seria bom manter meus ouvidos
virgens também.
Eu acabei rindo da sua última frase.
O meu irmão não tinha nenhuma noção do que acontecia no
sexo. Tudo o que ele sabia era que era uma relação entre duas
pessoas e que envolvia corpos nus se conectando em um só. E isso
não era nem eu quem estava definindo, foram as palavras dele para
mim quando perguntei a ele se não tinha curiosidade a respeito.
Ele não assistia filme pornô como eu assisti boa parte da
minha adolescência e aquilo me deixava um pouco curioso, foi
quando Chris esclareceu que ele não precisava saber de algo que
nunca faria.
Mais uma vez, deixou que sua insegurança falasse mais alto.
E mais uma vez, eu tentei ajudá-lo dizendo que a garota certa
um dia apareceria, mas não achava que tenha surtido muito efeito.
— Eu não contaria nem se você estivesse curioso a respeito.
— Tratei de esclarecer.
— Como você se sente em relação a isso? Algo mudou entre
vocês ou só é sexo?
Algo havia mudado? Eu não sabia. Nossa relação era tranquila
desde o início. O que eu achava que seria um grande desafio, se
tornou extremamente fácil. Caitlin e todos os seus amigos eram
diferentes do que eu imaginava, mas principalmente a minha falsa
namorada.
— Se estiver apaixonado, pense pelo lado bom: pelo menos,
não está apaixonado pela malévola — disse o meu irmão, se
referindo à Maeve. — Ou pela garota comprometida... Aurora,
certo? Ela namora Melvin, não?
— Sim... Qual é a sua implicância com Maeve, hum? Esse
apelido surgiu do nada.
O meu irmão arregalou os olhos.
— Nós vivemos mesmo na mesma universidade? — indagou
com aquela carinha de choque. — Lembra daquele dia em que falei
sobre a aposta que eles fizeram de Caitlin ficar com um nerd e pedi
para se afastar dela? — Assenti. — Fiquei sabendo que quem
arquitetou todo o plano foi a Maeve.
Aquilo não era surpreendente.
Maeve tinha uma necessidade de chamar atenção que
chegava a ser assustadora e havia sido ela também que arquitetou
toda a aposta que me incluía na noite em que eu conheci Caitlin.
— Sem falar que alguns haters dela dizem na internet que ela
é arrogante.
— Haters? Internet? Estou começando a achar que você adora
ficar acompanhando a vida do pessoal da elite, Christopher.
Ele deu de ombros.
— Eu apenas navego nas redes sociais e o algoritmo acaba
me trazendo essas coisas. — Sinalizou com sua falsa inocência. —
Não tenho culpa se eles são famosos no campus.
Eu revirei os meus olhos, mas acabei assentindo, fingindo
concordar com aquela desculpinha.
— Estamos desfocando do assunto — disse, meio impaciente.
— O que está sentindo pela Caitlin?
Naquele momento? Preocupação.
Era normal em uma relação que um gostasse do outro, certo?
— Onde você gostaria de estar agora?
O meu irmão fez essa outra pergunta, e automaticamente
pensei no jogo em que aconteceria naquele dia em Stanford, a seis
horas dali. Eu gostaria de estar lá e nem gostava de esportes,
apenas porque ela queria que eu estivesse.
— Você não precisa me dizer, apenas pense na resposta e
tente se entender. Não seria tão ruim ter Caitlin como cunhada de
verdade. — Chris continuou o seu discurso.
— Você sabe que isso não daria certo.
— Por quê? Quase um mês com ela e já sei que te faz bem —
argumentou, apontando para o computador na nossa escrivaninha
antes de voltar a sinalizar. — Você nem está mais pesquisando
sobre aqueles dois como um obcecado.
— Eu não sou obcecado! — defendi-me. — Eu só... não sei o
que fazer.
— É porque, como eu sempre disse, não tem o que fazer,
irmão — insistiu novamente. — Não existe nenhuma prova.
— Como você pode ser tão calmo em relação a tudo isso,
Chris? Você está assim por causa daquele homem!
A expressão feliz do meu irmão desapareceu assim que eu fiz
aquela pergunta estúpida. Arrependi-me no mesmo momento, mas
já era tarde ao ver como ele ficou chateado com aquilo.
— Você diz como se prender aquele homem fosse trazer o
nosso pai de volta e a minha voz. — Sinalizou, cabisbaixo. — Eu sei
que é injusto, Trevor. Se tivéssemos alguma prova, gostaria que
aquele homem pagasse por isso, mas sabemos como esses ricos
são... Nós, vindo morar na Califórnia, é a prova do que eles podem
fazer para não nos metermos nos assuntos deles.
Respirei fundo e me aproximei dele com cautela.
— Desculpa — pedi. — Eu não quis falar no sentido de que
não gosto de quem você é hoje.
— Eu sei. — Ele sorriu fraco. — Apenas pense com carinho no
que falei, ok? Está desperdiçando sua vida e sua saúde mental.
Eu apenas assenti e o puxei para um abraço porque senti
como havia ficado vulnerável diante daquele assunto.
— Amo você, pivete. — Baguncei seus cabelos, usando o
apelido que não usávamos desde a adolescência, e recebi um tapa
nas costas antes de ser abraçado de verdade por ele.
Ok, aquilo era melhor do que seu olhar magoado em minha
direção.
Droga! Às vezes, eu simplesmente não pensava, o que era
péssimo para alguém tão inteligente como eu.
CAITLIN HOWARD
— Um relacionamento falso, mas vai conhecer a mãe dele? —
Maeve indagou sem esconder o deboche, deitada na minha cama.
— Conta outra, Caitlin!
— Nós transamos — contei para elas, colocando a última peça
de roupa na mochila. — Duas vezes.
Eu estava de costas para minhas amigas, mas podia imaginar
que as caras que estavam fazendo para mim naquele momento
eram de puro choque.
— Transaram?! Eu juro que pensava que levaria mais tempo.
— Aurora comentou com a voz carregada de surpresa.
— Sério, Aurora? Estamos falando de Caitlin Howard! —
Maeve disse com certo orgulho. — Ela não tem um histórico de
pegadora à toa.
Virei-me para elas.
— Idiota — acusei, rindo da sua cara e me aproximando da
minha cama. — O que quer dizer com isso?
Maeve se sentou no colchão para dar espaço para que me
sentasse. Fiz isso, ficando entre as duas.
— Você estava há alguns meses sem sexo e Trevor é
atraente. Isso, não podemos negar. Era óbvio que acabariam indo
para a cama — disse como se fosse uma matemática simples. —
Ele ao menos fode bem?
— Maeve! — Aurora repreendeu.
Sacudi a cabeça. Sabia que aquela pergunta viria da ruiva.
— Sim. — Fui sincera, e ela pareceu bem surpresa. — E é só
isso que vocês vão ficar sabendo.
— Eu não queria saber nem se ele fodia bem. — Aurora
argumentou.
— Pois eu quero saber até mais detalhes! — rebateu à outra,
desaforada. — Ele não era virgem? Parecia com todo aquele jeito
antissocial dele.
— Sabia que uma coisa não tem nada a ver com a outra,
Maeve? — Eu puxei alguns fios do seu cabelo e ela fez uma careta,
dando um tapinha na minha mão logo em seguida. — Deixa de ser
curiosa!
Ela inspirou profundamente e armou a boca em um bico.
— O que foi? — Aurora questionou.
— Caitlin é chata! — acusou, me fazendo rir. — Dá para um
nerd, mas não quer oferecer detalhes.
Eu a empurrei de leve com o meu ombro.
— Por quê? Está curiosa para dar para um nerd? —
questionei.
— E se eu estiver? Sabe... — Sorriu daquela forma cheia de
segundas intenções. — O irmão do Trevor é bonitinho.
Minha mão levantou automaticamente e eu dei um tapa na sua
perna tão forte, que a fez pular da cama.
— Ai, Caitlin!
Apontei meu indicador para ela, bem séria.
— Você fica bem longe do Chris, ouviu?!
Só de pensar nela querendo brincar com o coração do irmão
do meu namorado me dava arrepios terríveis por todo o corpo.
— Eu estava brincando, Caitlin! — Ela riu. — Com a parte do
interesse, porque ele é mesmo bonitinho.
Revirei os meus olhos.
— Estamos nos perdendo do foco aqui... Como você e Trevor
estão com isso? O relacionamento de vocês não continua o
mesmo? — Aurora interrompeu.
— Nós estamos bem — garanti, mesmo que ainda estivesse
incerta sobre o nosso futuro. — Estou focando apenas no presente,
sabe?
— Você faz bem. — Maeve deu razão. — Diferente de mim,
que tem que pensar no futuro, e da nossa amiga aqui, que precisa
pensar nos três estados de tempo ao mesmo tempo.
Aurora suspirou tristemente.
Segurei a sua mão, chamando sua atenção.
— Você e meu irmão continuam brigados? — Ela assentiu. —
Tenho pensado muito sobre isso nos últimos dias... Não acha que
seria melhor se vocês dessem um tempo de verdade? Essas brigas
constantes, toda essa obsessão que ele sente por você e toda
dependência..., não faz bem.
— Eu também pensei nisso. — Aurora murmurou.
— Me parece bom. — Maeve disse, ainda afastada de nós. —
Nesse fim de semana posso até te dar um gosto de como é ser
solteira.
Fuzilei a ruiva na minha frente e ela deu de ombros, parecendo
não entender o quanto estava sendo insensível.
— O que foi? Ela precisa conhecer novos homens, novas
pessoas — explicou seu ponto de vista. — Assim é melhor para que
perceba que Melvin não é o cara certo.
— Ele só está perdido, Maeve. — Aurora defendeu meu irmão.
— Você também tem seus problemas e age de forma estúpida às
vezes, mas a gente ainda está aqui.
Minha amiga engoliu em seco e cruzou os braços em forma de
defesa na frente do seu corpo. Maeve ainda não havia comentado
nada sobre a ausência da mãe no jogo da noite anterior e achava
até que estava grata por isso, pois não conseguimos convencer o
técnico de que ela merecia voltar para a quadra para o segundo
jogo.
Ele queria deixar o segundo jogo da mesma forma que havia
sido o primeiro para evitar qualquer erro.
— Eu vou à cafeteria buscar um americano. — Maeve disse.
— Tenha uma boa viagem, Cat. E você — se direcionou para Aurora
—, te pego às oito horas para a festa do Barry.
Aurora fez uma careta, mas, antes que pudesse negar àquele
pedido, Maeve já estava interrompendo:
— E nem tente recusar! Nós vamos curtir.
Ela pegou a sua bolsa na minha escrivaninha e saiu do quarto
rapidamente.
— Ela não muda, né? — Aurora riu.
— Não. — Neguei com a cabeça. — Pensa no que eu disse,
ok?
Aurora assentiu.
Esperava que ao menos ela cumprisse aquele pedido.
TREVOR LANCASTER
Eu havia pensado muito bem no que estava fazendo quando
montei aquela pulseira para Caitlin, parecia o mais certo quando
aquelas conchas atravessaram todo o mar até chegar aos nossos
pés. Eu também havia feito uma com a outra concha, mas preferi
não usá-la porque não sabia o que aquilo significaria entre nós.
Assim como também não entendia muito bem para onde os
meus sentimentos estavam indo naquele momento. Não era como
se eu não sentisse nada, e só percebi que algo muito grande estava
acontecendo entre nós quando ela sentiu ciúmes de Tiffany no meu
quarto. O tom de voz nas suas perguntas e a forma como ficou o
mais quieta que conseguia pelo caminho até chegarmos à praia
ainda estavam na minha cabeça.
Eu deveria estar em completo choque com tudo isso, da
mesma forma como fiquei quando Tiffany veio para cima de mim
com o seu amor platônico, mas tudo o que conseguia achar era
divertido e fofo seu ciúme.
Então, parece que sim. Eu gostava de Caitlin. Não estava
apaixonado, mas gostava muito dela.
Da sua companhia.
Dos seus beijos.
Das nossas conversas.
Do seu jeitinho sincero.
Do seu sorriso leve.
Eram tantas coisas que me faziam ficar ao seu lado sem me
importar com o que antes sempre odiei — atenção — que
simplesmente não conseguia listá-las uma por uma.
Na noite anterior, depois de toda a confusão com Tiffany, eu fui
me deitar com Chris novamente e acabei demorando muito para
pegar no sono. No início, apenas a situação da cheerleader vinha na
minha cabeça e a ansiedade que amanhecesse de uma vez para
que ela finalmente fosse embora, mas, então, a conversa que tive
com meu irmão antes de ir para o serviço voltou.
Podia não saber o que sentia pela garota sentada ao meu
lado, mas sabia que Christopher tinha razão quanto ao nosso
passado.
Era difícil para mim admitir aquilo. Mas achava que finalmente
conseguia concordar depois de tantos anos que eu estava perdendo
a minha juventude por algo que não me levaria a lugar nenhum.
A minha mãe havia desistido de buscar justiça há muito tempo
porque sabia que não podia lutar com leões, e talvez eu devesse
fazer o mesmo. Eu seguiria o meu destino e me tornaria um
advogado, mas não ficaria mais preso a uma situação que só me
faria adoecer por dentro.
Eu ainda detestava a ideia e estava me acostumando com
esse tipo de pensamento. Foram anos vendo minha mãe chorando
quando achava que não estava sendo vista por um de nós, ainda via
o quanto meu irmão se sentia inseguro para qualquer coisa que
saísse do seu cotidiano por conta de quem ele se tornou e a dor de
perder nosso pai naquele acidente injusto sufocou ainda mais o meu
peito com rancor e ódio por aquela família.
Mas eles eram ricos.
Eles eram perfeitos.
Enquanto eu... era apenas um garoto.
— No Alaska existe uma cidadezinha pequena chamada Sitka.
— Iniciei o que me levaria a contar tudo sobre mim para Caitlin,
notando o seu corpo estremecer ao lado do meu com a brisa do mar
que atingiu nossos corpos. — Chris e eu nascemos lá e vivemos
felizes por dez anos, até a noite de um acidente de carro levar o
meu pai à morte e meu irmão, à perder a voz.
Caitlin virou o seu rosto para mim no mesmo momento,
parecendo um pouco assustada com a informação.
— Seu... pai?
Percebi naquele momento que nunca havia falado sobre ele
para ela.
Assenti para sua pergunta, a olhando com um pequeno sorriso
que não alcançava meus olhos. Aquele assunto era sempre difícil,
tocava em uma ferida aberta que provavelmente não se cicatrizaria
tão facilmente.
— Eu acompanhei o meu pai até a casa de um amigo do Chris
para buscá-lo. Era noite e, na volta... — suspirei, forçando-me a não
lembrar daquele acidente —, um carro desviou da sua pista e veio
parar em nossa direção. Meu pai tentou desviar, mas o outro veículo
ainda bateu forte na gente e caímos direto em um barranco.
Caitlin parecia imaginar a cena em sua cabeça pela forma
como me olhava.
— Eu imaginava que tinha sido um acidente feio por causa do
que aconteceu com o seu irmão, mas nunca imaginei que tivesse
levado o seu pai também...
Ela parecia realmente sentida com aquilo e eu gostei um
pouco mais dela naquele instante.
— Acontece que minha mãe tentou buscar quem havia
provocado aquele acidente e recebemos uma visita na mesma noite
de uma mulher... Eu era criança e estava escondido atrás de um
armário, curioso pelo motivo que levou uma mulher vestida com
tanto luxo para a nossa casa simples. — Comecei a contar a parte
que mais mexia comigo depois da morte do meu pai, virando o meu
rosto para o mar novamente. Não era interessante que sempre o
tínhamos como testemunha quando conversávamos
profundamente? — Ela nos disse que o seu marido estava bêbado e
provocou o acidente, mas que sua família era importante demais
naquela cidade para ter aquele tipo de escândalo vinculado a eles.
Senti a ponta de todos os meus dedos se fecharem e, de
repente, minhas mãos estavam em punhos, demonstrando o quanto
aquilo ainda me tirava do sério.
— A filha da puta deu dinheiro para a minha mãe e a ameaçou
que, se não saísse da cidade, destruiria minha família. Acredite,
hoje vejo que ela tinha poder suficiente para isso.
— Mas... e a polícia? — Caitlin murmurou.
— Eles eram tão comprados como água no deserto.
Alguns segundos de silêncio se instalaram entre nós até que
ela finalmente perguntou:
— Quem eles eram para ter tanta influência assim?
— O Alasca todo os respeita, pelo que eu vejo nas notícias —
comentei antes de revelar suas identidades. — Alanna Gage é
empresária e dona de um hospital de luxo, que já tem várias clínicas
por todo o território, e o maldito homem, Angus Gage, é chefe de
departamento da prefeitura e hoje é o prefeito, tão amado por todos
daquela cidade que provavelmente irá ganhar a reeleição.
Caitlin não respondeu nada, provavelmente pensando no que
dizer depois de tanta informação jogada no seu colo, e eu não
procurei ver seu rosto naquele minuto, olhar para o mar me trazia a
sensação de que estava fazendo a coisa certa. Sabia que era muita
informação, principalmente depois do clima tão agradável que
estávamos tendo antes.
— Tem um motivo para eu ter contado tudo isso — falei,
finalmente a olhando. Caitlin estava séria, olhando para o mar à
nossa frente como se procurasse uma solução para toda a minha
história. Ela não parecia ter escutado o que eu disse. — Caitlin?
Ela piscou algumas vezes, encontrando meu olhar com o seu.
— Oi?
Eu sorri fraco e passei a mão em seu cabelo, que com o vento,
havia bagunçado um pouco.
— Eu disse que tem um motivo para ter contado tudo isso,
além de querer que soubesse tudo sobre o que sei sobre o meu
passado — repeti, sendo alvo da sua atenção. — Lembra que me
perguntou por que eu não me relacionava? — Ela assentiu. — É por
conta disso. Decidi na minha adolescência que procuraria uma
forma de buscar justiça, então foquei em tentar descobrir tudo sobre
eles, me afastando da minha namorada a ponto de terminarmos e
causando diversos ataques de raiva em Christopher porque ele
simplesmente odiava que estava esquecendo da minha vida por
conta disso. Para ele, é ridículo bancar o justiceiro quando não
temos nada que comprove que Angus matou o meu pai.
— Você... continua procurando por eles? — perguntou,
parecendo um pouco ansiosa pela resposta.
— Eu procurava ao menos duas vezes por semana antes de
você entrar na minha vida e bagunçar toda ela — admiti, a fazendo
rir fraco. — Não existe nada sobre Angus e Alanna na internet, além
da perfeição. Eles são o casal perfeito, com um filho prodígio de dez
anos que termina de formar a ilustre família dos sonhos.
— F... filho? — Ela parecia surpresa.
— Acho que ele se chama Peter — respondi, a abraçando pelo
ombro. — Ele foi adotado cinco anos depois da minha chegada
nesta cidade.
Eu ri, sem esconder o deboche.
— Até nisso eles são perfeitos... Decidiram adotar em vez de
ter filhos. — Fui irônico. — Como eu poderia competir com isso? A
injustiça vence nesse mundo sempre, não é isso que dizem?
— Parece que sim... — sussurrou, desviando o olhar para a
areia à nossa frente. — Sinto muito. Sei que não é o que gostaria de
ouvir, mas... Eu realmente sinto muito, Trevor.
A sua voz embargou completamente quando chegou no meu
nome e eu aproximei minha mão do seu queixo, levantando seu
rosto. Ela não estava chorando, mas parecia se segurar.
— Ei... Para quem disse que não chora, você é bem sensível
quando se trata do meu passado — provoquei, tentando aliviar o
clima. Ela estava quase chorando quando falei sobre meu irmão há
algumas semanas. — Eu estou tentando me libertar disso, ok?
Caitlin segurou a minha mão e sorriu fraco.
— Está? — perguntou, entrelaçando nossos dedos.
Olhei para o contato tão íntimo, me sentindo tranquilo com
aquilo.
— Estou processando que isso não vale a pena — admiti. —
Talvez... eu devesse apenas deixar quieto e parar de machucar o
meu irmão cutucando essa história.
No dia anterior, eu percebi o quanto aquilo só o deixava aflito.
Já era triste para ele ter uma lembrança sempre que usava suas
mãos para se comunicar, imagina com um irmão que queria
desesperadamente justiça?
— Isso quer dizer que... está gostando de mim, Trevor
Lancaster? — Caitlin pareceu voltar ao normal com aquela
pergunta.
O seus olhinhos voltaram a brilhar e seu sorriso parecia menos
tenso naquele momento. Enquanto eu, senti o meu sangue se
concentrar todo no meu rosto, de tão quente que ficou de uma hora
para a outra.
— O quê?
Caitlin riu e bateu seu ombro no meu, cheia de provocação no
seu olhar.
— Você disse que estamos quebrando todas as regras do
nosso contrato.
Eu me senti completamente tímido com seu olhar em mim,
buscando a resposta antes que ela saísse da minha boca.
— E você gosta de mim? — reverti a pergunta, curioso a
respeito.
Seu rosto se aproximou do meu e seus olhos caíram para a
minha boca.
— Talvez? — murmurou, voltando a erguer o olhar. — Você é
diferente dos outros caras.
Meu ego deveria ficar ferido ao ser comparado com outros
caras, que tinham o bônus de ser muito mais experientes do que eu
no histórico de Caitlin, mas me senti vitorioso com aquele tipo de
comparação.
— Diferente como?
— Me faz... — ela soltou minha mão — querer te guardar em
um potinho e proteger de todas mentiras e maldades desse mundo!
Sem que eu esperasse, ela estava me empurrando contra a
areia e me atacando de uma forma inesperada: com cosquinhas.
Eu tinha mais força do que ela, isso era óbvio, mas não
consegui tirá-la de cima de mim por puro encanto e deixei que me
fizesse rir com suas mãos por toda parte sensível do meu corpo até
que não aguentasse mais.
— Ca... Caitlin, droga! — gritei, dando tanta risada a ponto de
perder o fôlego.
Segurei suas mãos no alto, ainda com um sorriso nos lábios
em meio à respiração ofegante.
— O que foi isso?!
Ela sorriu.
— Só queria te ver sorrir um pouco — confessou, quase me
causando um problema cardiovascular pela forma como meu
coração disparou. — Você tomou a melhor decisão e estou
orgulhosa de você.
Não havia dúvidas de que poderia me apaixonar nos próximos
dias por aquela garota.
Ela sabia como entrar no coração de um cara.
E eu me vi desejando poder mudar a sua resposta de um
talvez para sim, com certeza.
Só é cruel assim agora
Perdida no labirinto da minha mente
Termina, se liberta, cai a ficha, desmorona
Você quebraria suas costas para me fazer abrir um sorriso
LABYRINTH – TAYLOR SWIFT
CAITLIN HOWARD
Conte a ele a verdade.
Era isso que minha mente gritava por todo o caminho que
percorria com Trevor ao meu lado em direção à casa da sua mãe.
Eu mal conseguia prestar atenção no que ele estava falando e para
onde estava apontando, parecia ser algo divertido pela forma como
se animava apresentando a cidade para mim.
Desculpa, Trevor.
Pensei, enquanto eu olhava para ele e fingia que estava
entendendo tudo.
Eu não consigo.
Achava que estava apaixonada.
Eu simplesmente não conseguia abrir a minha boca e dizer
tudo sobre o meu passado agora que ele havia me contado sobre o
seu. Como a vida podia ser tão filha da puta assim? De repente, eu
tinha certeza de que alguém lá em cima me odiava a ponto de ferrar
com toda a minha vida.
Logo agora, que parecia que eu havia encontrado alguém que
se importava comigo muito além do sexo ou até mesmo do
romance, descobri que o meu pai havia matado o senhor Lancaster
e ainda deixado Christopher sem voz.
Aquilo estava me deixando louca.
Se Trevor não tivesse falado a cidade e os nomes deles, eu
nunca poderia desconfiar que os nossos passados estavam ligados
daquela forma tão cruel.
Eu queria chorar.
A última vez que havia chorado da forma como gostaria
naquele momento era quando saí de casa com Melvin há cinco
anos.
Merda!
Olhei para Trevor ao meu lado, ele parecia inerte diante da
minha falta de atenção e permanecia apontando para algo à nossa
frente e falando sobre alguma coisa que envolvia a sua infância.
Não havia escutado o início, então não sabia dizer do que
exatamente ele estava falando.
Como eu poderia dizer que omiti as partes do meu passado
porque prometi há cinco anos que ninguém saberia do meu laço
familiar com as pessoas que estragaram boa parte do futuro da sua
família?
Trevor me odiaria para sempre.
O meu segredo tinha que ser levado para o túmulo, assim
como Angus e Alanna levariam também.
A verdade é que eles nunca estiveram mortos de verdade.
Os meus pais sempre estiveram mortos para mim e para
Melvin, por isso, era fácil dizer aquela mentira... Com o tempo,
acreditamos mesmo que eles estavam.
Tudo o que contei para as minhas amigas até que saísse de
casa era verdade. A minha mãe estava aumentando o seu hospital
para os outros estados do Alasca enquanto o meu pai trabalhava
como chefe de departamento na prefeitura. Alanna e Angus eram
ambiciosos quando se tratava de riqueza, minha mãe um pouco
mais quando se tratava de imagem.
Ela achava que a imagem perfeita da família sem defeitos
levaria muito mais riquezas para nós no futuro. Seríamos
reconhecidos como os melhores no país e era aquilo que mais
almejava.
Imperfeição não estava no seu vocabulário.
Alanna nos pressionava a tirar notas altas, não deixava que
fôssemos vistos com más companhias, odiava o tempo perdido com
televisões ou, no caso do meu irmão, videogames.
Quando ele entrou no time de futebol americano da escola, no
fundamental, eles se interessaram pela ideia de ter um filho jogador
e começaram a investir em Melvin. Acontece que o investir daqueles
dois não era como o de pais normais. Eles começaram a pressionar
o meu irmão a ser o melhor e, como qualquer adolescente de
catorze anos que não tinha maturidade nenhuma, Melvin começou a
descontar em rebeldias.
Tudo piorou quando minha mãe viu a minha carta de aceitação
no time de vôlei feminino na escola.
Como eu havia dito para as meninas, ela não gostou nada da
ideia. Rasgou a carta na mesma hora, ligou para escola cancelando
a minha inscrição e nem se importou com o que eu queria.
Na outra semana, estava pegando a minha mala e enchendo
com tudo o que eu podia para sair de casa com o meu irmão.
Os meus pais não queriam mais relação nenhuma com duas
pessoas que, segundo eles, não tinham nada a ver com seus
objetivos.
Eles nos enviaram para a minha tia e trataram de forjar a
nossa morte para todos que nos conheciam pessoalmente; o que
pareceu ser fácil para eles nos manter afastados, já que os nossos
sobrenomes eram da nossa falecida avó. Fiquei sabendo pela
minha tia que tínhamos “morrido afogados no lago atrás da nossa
casa”. Tão trágico que os meus pais não queriam nenhuma notícia
sobre aquilo na internet ou jornais, então talvez seja por isso que de
alguma forma bizarra, Trevor nunca soube sobre os filhos “mortos”
deles.
Só sobre Miguel.
Essa parte... nem eu estava sabendo. Parece que Alanna e
Angus acharam um filho perfeito no fim daquela história.
Depois que saí de casa chorando nos braços do meu irmão
por não ter o amor que todas minhas amigas da época tinham dos
seus pais, decidi que também não procuraria saber deles para me
magoar mais.
Com o tempo, aquilo estaria apagado.
Mas achava que estava errada porque, logo agora que tudo
parecia estar indo para um caminho bom, o passado voltava com
uma força poderosa que poderia me deixar em pedaços.
— Ei, você está bem? — Trevor perguntou, me trazendo de
volta para a realidade. — Você não prestou atenção em nada do
que falei na última meia hora.
— Estou — respondi, forçando um sorriso. — Apenas com
uma dorzinha de cabeça, mas logo vai passar.
Achei que fazia um pouco de sentido.
Ele encostou na minha testa e acariciou com um carinho bem
familiar para mim naquela região, dificultando a razão de tomar o
meu corpo e dizer tudo o que eu deveria falar.
— Nós estamos quase chegando. — Apontou para a rua à
nossa frente. — A minha casa fica no fim dessa rua.
— Vamos lá. — Eu voltei a pegar a sua mão. — Estou um
pouco nervosa para conhecer a sua mãe.
Ele riu fraco, abraçando meus ombros.
— Não fique! Ela é uma mulher incrível e muito atenciosa.
Eu não duvidava disso, afinal, havia criado dois filhos sozinha.
Deveria ser muito diferente de Alanna e Angus, que só se
lembravam da nossa existência quando a minha tia ligava pedindo
dinheiro. Para a infelicidade deles, ainda tinham que nos sustentar.
Ou minha tia cumpriria a promessa de fazer um escândalo, os
difamando, caso não depositassem o valor.
Admitia que de vez em quando me pegava desejando isso.
Mas ela era muito esperta e nos via como uma vantagem de
ter muito dinheiro fácil.
— Chegamos. — Trevor disse quando paramos em frente a
uma casinha simples de tijolos à vista com um lindo jardim na frente.
— Não é nada parecida com o luxo que você deve estar
acostumada — ele brincou, me fazendo revirar os olhos —, mas é
aconchegante. Isso eu prometo!
Com certeza era melhor do que qualquer lugar no qual pisei
nos últimos anos.
Já estava anoitecendo, então, assim que nos aproximamos da
porta de entrada da casa, o cheiro do que parecia ser um molho
muito gostoso atravessou pela janela aberta e chegou até nós,
provocando uma ronquidão no meu estômago.
Trevor ouviu no mesmo momento e eu não tive como não ficar
constrangida.
— Também estou com fome — confessou, abrindo a porta. —
Vamos entrar.
Eu não consigo.
Foi o que confirmei na minha cabeça quando atravessamos a
porta e entramos em uma sala de estar pequena, mas, como Trevor
havia dito, muito aconchegante.
Não conseguiria dizer a verdade para ele.
Não quando ele me abraçou mais contra o seu corpo ao sentir
um pouco do meu nervosismo e nos aproximou da mulher e de
Chris sentados no sofá, rindo de algo no celular do seu irmão.
Se eu contasse..., Trevor sempre me enxergaria como a filha
do cara que tirou a vida do seu pai e da mulher que os mandaram
para longe, sendo completamente injusta com eles.
Não teria como ele descobrir sobre mim quando não conseguiu
fazer isso durante todos esses últimos anos. E Trevor estava
disposto a tentar viver uma nova vida, sem esse passado. Ele queria
abrir o seu coração para mim, não era isso? Eu não podia ter
entendido errado, então como poderia simplesmente deixar que a
verdade saísse pelos meus lábios?
Sabia que a responsabilidade era minha, mas eu escolhia ser
egoísta.
— Algo parece divertido. — Trevor comentou, chamando
atenção dos dois e até mesmo a minha.
A mãe dos meninos foi a primeira a se levantar e, assim que
me viu, ignorou a presença dos filhos e pulou do sofá, me
abraçando logo em seguida.
— Você deve ser Caitlin! — disse, com a voz parecendo estar
carregada de emoção. — Eu sou Jules Lancaster, a mãe desses
garotos.
Ela se afastou e meu olhou com um sorriso lindo na boca.
Jules era muito bonita. Possuía algumas rugas por conta da
idade e pelo que parecia estresse da vida — o que agora sabia que
ela tinha tido bastante —, mas nem isso a deixava menos
apresentável. Chris e Trevor tinham de quem puxar a beleza.
— Oi. — Sorri um pouco nervosa e sentindo um peso
aumentar cada vez mais conforme ela me encarava. — É um prazer
conhecer a senhora.
Eu sou a filha do homem que desgraçou a sua família e da
mulher que te impediu de fazer algo a respeito disso.
Mentir e omitir nunca foram tarefas tão difíceis como agora.
O meu coração estava apertado desde que raciocinei
rapidamente a história que Trevor me contou com o meu passado,
mas agora parecia estar sendo esmagado contra algo sólido. Será
que eu aguentaria aquilo?
— Meu Deus... — Ela soltou um riso abobado e segurou o meu
rosto com suas duas mãos. — Você é muito mais linda do que
naquela foto!
— Mãe! — Trevor segurou as mãos de Jules e as abaixou. —
Não me envergonha.
A mulher finalmente prestou atenção no filho e aproveitou o
momento para dar um tapinha nas suas mãos.
— Ainda estou brava com você por não ter me contado sobre a
Caitlin! — disse, fingindo estar magoada. — Acredita que eu
descobri sobre você por causa das redes sociais? E se eu não
soubesse mexer nesse Instagram? Nunca iria conhecê-la?
Ela ao menos conseguiu me arrancar uma risada.
— O seu filho é meio lerdinho mesmo... — provoquei, olhando
para Trevor.
Jules riu ao concordar.
— Já vi que seremos grandes amigas! — Apontou para o sofá.
— Deixe sua mochila com Trevor e vamos conversar enquanto o
jantar não fica pronto. Chris me disse que seu namorado te levou
para a praia, você gostou? A cidade de São Francisco é linda, é
uma pena que só irão ficar até amanhã.
Trevor pegou a mochila dos meus ombros e deixou um beijo
na minha testa antes de caminhar até as escadas para onde
arriscava dizer que era o seu quarto.
Voltei-me para Jules e a vi sorrindo.
— Ah..., é tão bom ver meu filho feliz — murmurou, um pouco
emocionada, e me puxou para o sofá.
— Ele é uma boa pessoa — respondi. Eu que não sou. —
Gostei muito da praia em que ele me levou, senhora...
— Sem senhora, por favor! Já ando me sentindo velha nos
últimos dias, imagina com você me chamando assim —
interrompeu, segurando a minha mão. — Apenas Jules, ok?
Assenti, olhando para Chris, que estava jogando algo no
celular com fones de ouvido, concentrado e alheio à nossa
conversa.
— Sabe falar a língua dos sinais? — Ela perguntou, curiosa,
chamando a minha atenção novamente.
— Infelizmente não — murmurei. — Mas estou aprendendo.
— É mesmo? — Os seus olhos se iluminaram. — Por causa...
do Chris?
Novamente assenti.
— Ele é legal comigo e eu deveria ao menos entender sua
língua.
Jules segurou a minha mão e sorriu.
— Gosta mesmo do Trevor, hum? Fico muito feliz por causa
disso... Sabe, por um momento no passado, achei que meu filho
tinha algum problema para se relacionar. Seja romanticamente ou
amigavelmente — confessou. — Vi ele se isolando socialmente
como o irmão e isso me preocupava, mas, então, vi aquela foto...
Juro que senti meu coração se encher de tanto amor mesmo sem te
conhecer pessoalmente.
Ela parecia ser tão preocupada com eles, que tive que me
controlar para não deixar aquele caroço que estava engolindo desde
mais cedo subir e eu me derramar em lágrimas ali mesmo.
Jules era uma mãe de verdade.
— Trevor me contou sobre o acidente... — murmurei. — Não
deve ter sido fácil.
Ela suspirou tristemente.
— Não. Mas meus filhos estão vivos e bem. — Forçou-se a
sorrir, e eu a admirei um pouco mais ali naquele instante. Ela fazia
um esforço para ser feliz com aquela realidade e talvez até
conseguisse. Trevor merecia isso também, não que eu trouxesse o
seu passado e aquela raiva guardada no seu peito de volta. — Logo
Chris vai arrumar namorada também, eu sinto.
Parecendo sentir que falávamos sobre ele, Chris levantou o
olhar e nos encarou.
Jules largou minha mão e sinalizou algo para ele, que largou o
celular e tirou os fones, acenando para mim em seguida.
Eu acenei de volta.
— Espero que não tenha passado do meu recorde ou teremos
sérios problemas, Christopher. — Trevor disse para o irmão ao
chegar na sala novamente.
Chris respondeu algo, que fez a mulher do meu lado rir.
— Eles disputam esses joguinhos no celular desde a
adolescência — explicou. — Um tentando quebrar o recorde do
outro, mas não faço ideia do que seja esse jogo.
Sorri, vendo Trevor se aproximar e se sentar ao meu lado.
— Não ficou tonta com as perguntas da minha mãe? —
perguntou para mim, recebendo um olhar fulminante de Jules.
— Eu ainda nem comecei o questionário. Farei isso no jantar
que, inclusive, irei ver como está saindo — avisou, se levantando. —
Já volto!
Ela correu para a cozinha, que ficava ao lado da sala.
— Não se preocupa, ela não vai perguntar nada invasivo —
garantiu. — Está menos nervosa?
— Sua mãe é incrível, não tem como permanecer nervosa —
admiti.
— Eu disse, certo?
Trevor riu fraco e eu olhei para as minhas mãos juntas no meu
colo, ainda cheia de conflitos comigo mesma e repleta de
pensamentos sobre as últimas horas.
E é como neve na praia
Estranho, mas lindo pra caralho
Voando em um sonho
Um bolso cheio de estrelas
SNOW ON THE BEACH (FEAT. LANA DEL REY) – TAYLOR SWIFT
CAITLIN LANCASTER
Jules era uma mulher excelente, assim como imaginei quando
bati os meus olhos nela. Ela se preocupava muito com os filhos e
fazia de tudo para fazê-los rir, quase como uma melhor amiga, e não
como uma mãe.
Durante o jantar, eu respondi a perguntas simples sobre mim,
como onde eu morava, com quem e sobre o meu irmão. Deixei
muita coisa sobre esse último de fora, não queria dizer em um
primeiro encontro que ele estava passando por momentos
conturbados na vida pessoal dele.
Provavelmente Trevor havia contado a ela sobre o que sabia
dos meus pais, desconfiava disso porque em nenhum momento da
noite Jules os mencionou e eu me senti grata. Não sabia se
conseguiria ser tão fria ao falar sobre aqueles dois agora.
Com o tempo passando, senti aquele caroço na garganta que
estava me incomodando desde o encontro na praia descer aos
poucos.
— Eu preparei o quarto para você e Trevor — Jules disse,
subindo as escadas na nossa frente. — Christopher vai dormir
comigo.
Eles não tinham quartos separados?
— Não quero ser um incômodo, Jules — avisei. — Eu posso
dormir na sala.
A mulher parou no meio da escada, nos fazendo parar
também.
— Não diga um absurdo desses! Já faz tempo que não durmo
com Christopher, é bom que vou puxar as orelhas dele antes de
dormir — falou, voltando a subir para o segundo andar da casa.
— E eu já durmo com o Christopher todos os dias. — Trevor
complementou. — Acho que mereço um descanso na véspera do
meu aniversário, não?
Eu sorri fraco. Ele era mesmo um irmão implicante.
— E mãe, para de ficar pressionando o Christopher a arrumar
uma namorada. — Trevor disse para Jules quando ficamos em
frente a uma das três portas de madeira em tom claro. — Sabe que
ele é mais sensível quanto a esse assunto.
Jules colocou as mãos na cintura e fuzilou o filho mais velho.
— Que tipo de mãe você acha que eu sou? Não vou fazer isso,
mas irei ter uma conversa bem séria com ele sobre essa fissuração
por jogos e trazer um pouco mais de confiança para aquele
corpinho.
Christopher tinha se divertido da forma como conseguiu
conosco na hora do jantar. Eu podia não entender muitas coisas que
ele sinalizava, mas sua mãe e seu irmão mais velho entendiam e o
fizeram rir bastante durante o momento. Depois da refeição, ele foi
para a sala continuar seu jogo no celular, enquanto Trevor e eu
ajudamos Jules a limpar a cozinha.
Não achava nada de errado em ele ter um escape como
aqueles.
— Só não seja tão insistente, sabe que ele tem suas
inseguranças. — Trevor insistiu, baixinho para que o irmão não
escutasse do andar de baixo. — Obrigada por arrumar o quarto para
mim e Caitlin. Posso assumir daqui.
Jules riu e olhou de mim para ele.
— Juízo, viu? Eu pedi por uma nora, não por um neto ainda —
apontou, conseguindo a proeza de me deixar envergonhada.
— Mãe! — Trevor a repreendeu. — Boa noite.
— Boa noite, namoradinhos — desejou, nos lançando uma
piscadela e voltando a descer as escadas.
— Desculpa pela minha mãe. — Trevor pediu, e eu o encarei.
Ele também estava envergonhado. — Às vezes, ela passa um
pouco do limite.
— Tudo bem. Ela é divertida. — E não estava mentindo.
Trevor abriu a porta do seu quarto, mas me impediu de entrar
primeiro.
— Tenha plena consciência de que está entrando em um
quarto compartilhado de dois irmãos nerds que passaram toda a
adolescência fissurados por jogos, filmes e animes — avisou, com
seu braço impedindo minha passagem.
— Deixa de ser dramático! — Ri.
Eu passei por baixo do seu braço e consegui entrar no quarto
dos irmãos Lancaster.
As duas camas de solteiro estavam coladas uma na outra, e
eu tive que controlar a risada pela insinuação silenciosa que a mãe
de Trevor havia feito com aquilo. Havia um grande guarda-roupa
branco que ocupava metade de uma parede e uma grande
escrivaninha ao seu lado, que suportava nossas duas mochilas
agora.
Entendi o que Trevor quis dizer com quartos de nerds quando
parei de prestar atenção nos móveis e passei a observar as paredes
azul-claras.
Havia diversos pôsteres, principalmente na parede da
cabeceira das camas. Reconheci o anime favorito de Trevor, Naruto,
também reconheci The Last of Us em forma de videogame por conta
da série que havia lançado naquele ano, mas o restante... Espera!
— Quem é fã dos Beatles? — perguntei ao reconhecer o
pôster da famosa foto deles na faixa de pedestre. — Seu irmão?
Afinal, só podia ser. Trevor nunca havia me falado sobre seu
amor pela banda. Na verdade, eu não sabia se ele tinha um músico
ou grupo favorito.
— Chris é apaixonado por eles — respondeu, fechando a porta
e ficando ao meu lado. — Não tem um dia que ele passe sem
escutar uma das músicas deles no Spotify.
— Que incrível! Seu irmão tem bom gosto — falei, passando a
olhar os outros posters do quarto. — E qual é a sua banda favorita?
Nunca me disse.
— Eu não tenho nada nesse sentido favorito, mas meu gênero
favorito é rock.
— Tem uma música favorita? — Virei-me para ele.
— A última música que... — Ele soltou um sorriso triste e
segurou a minha mão, balançando a sua cabeça. — É melhor não
falar sobre isso agora.
Entendi que era algo referente ao seu passado e por ter dito a
última palavra, a liguei com seu pai, então não quis fazer mais
perguntas sobre aquilo.
— Está cansada? — questionou. — Sua cabeça melhorou?
— O remédio que a sua mãe me deu antes do jantar curou
rapidinho — falei, e o abracei pelo pescoço, colando o meu corpo ao
seu. — Estou me perguntando se você vai gostar do meu presente.
Trevor suspirou e não disfarçou a careta de quem não gostou
do que havia escutado.
— Eu falei que não queria presente.
— Falou, mas eu não dei ouvidos — rebati simplesmente. —
Eu me sentiria mal se tivesse ouvido você depois de ter me dado
esse presente.
Balancei meu pulso, atraindo sua atenção para a pulseira que
ele havia me dado. Eu ainda não havia conseguido superar aquele
presente, mesmo depois de todo o passado que jogou no meu colo.
E não quero nem pensar nessa parte por hoje.
— Então, o que é? — indagou, curioso.
— É uma surpresa. Por que acha que eu falaria facilmente
assim?
— Não exagerou, né? Eu não quero nada caro ou valioso.
Sorri, sabendo que havia acertado precisamente no seu
presente.
— Você vai saber quando amanhecer. — Aproximei meu rosto
do seu, quase encostando os nossos lábios. — Poderíamos
aproveitar a sua última noite com vinte anos, não acha?
Ele soltou uma risada ao perceber ao que eu estava me
referindo.
— É por essas atitudes que eu te apelidei de pimentinha. —
Tocou o meu rosto com carinho. — Sinto muito, mas o quarto da
minha mãe é na frente do meu.
Fiz um biquinho com os lábios, pouco me importando de
parecer uma bebê chorona.
— Tudo bem, então.
Eu não iria repetir o que tinha feito na nossa segunda vez. Se
ele quisesse, também tinha que tomar um pouco de atitude, não é
mesmo? Podia estar me apaixonando, mas não era nenhum pouco
tola.
— Vou tomar banho — avisei, correndo para pegar meu pijama
na minha mochila.
TREVOR LANCASTER
Minha mãe me abraçou apertado assim que entrei na cozinha
naquela manhã de domingo.
— Feliz aniversário, filho! — Beijou a minha bochecha. —
Dormiu bem?
Eu assenti, lembrando de tudo o que havíamos feito antes de
dormir. Senti meu rosto esquentar e agradeci por minha mãe ainda
estar me abraçando. Ela me conhecia muito bem para saber até
mesmo as depravações que passavam pela minha cabeça.
Mas caramba... A noite anterior havia sido fantástica.
— Quero que saiba que estou muito orgulhosa do homem que
está se tornando — disse, ainda me apertando nos seus braços.
Sorri. — Você está deixando de preocupar essa velha mãe e
passando a ter alguém com quem se preocupar além do seu irmão.
Pode parecer bobo, mas... não queria apenas que desencalhasse,
querido, queria que encontrasse alguém que te tirasse dessa bolha
que estava vivendo e que felizmente eu não precisei me aprofundar.
Suspirei e agradeci por ela não ter ido muito a fundo nisso. Ou,
então, acabaria admitindo que sabia do segredo que ela achava
estar bem escondido.
— Amo você, mãe. — Afastei-me dela e beijei sua testa. —
Muito.
— Eu também, querido. — Acariciou o meu rosto. — Caitlin
ainda está dormindo?
— Ela geralmente é uma dorminhoca que diz ter sono leve,
mas é pura mentira. — Eu ri. — Quer ajuda com o almoço?
Dona Jules sabia que eu não tomava café, então nem se deu
ao trabalho de preparar a mesa para nos esperar.
— Já são onze horas, então seria bom que me ajudasse.
Eu senti braços circularem a minha cintura e quando vi que se
tratava do meu irmão, sorri.
— Olha só quem está fofo hoje... — comentei, me virando e
bagunçando os seus cabelos. — Talvez eu precisasse fazer
aniversário mais vezes, né?
Ele se afastou para sinalizar.
— Não exagera! Hoje é um dia triste, não tenho mais a sua
idade.
— No dia dez de março do próximo ano, você me alcança —
respondi em tom provocativo.
— Feliz aniversário, irmão.
Chris me abraçou da forma certa dessa vez e eu o abracei de
volta e bem apertado, como sempre fazia quando tinha essa
oportunidade.
— Vocês são tão fofos um com o outro... — Nossa mãe
comentou, fazendo mais uma das suas admirações em relação a
nós. — Estou orgulhosa dos dois.
— Ainda bem que não terei que dormir com a mãe hoje de
novo. — Chris comentou quando se afastou. — Ela ficou duas horas
palestrando sobre motivação.
Olhei para a minha mãe, sem entender.
— Eu só estava dizendo que você tem que ter um pouco mais
de vida social também, filho — justificou. Respirei fundo, pedindo
paciência porque sabia bem como aquela mulher era insistente. —
Existem tantos lugares em Los Angeles com pessoas que falam
língua de sinais, então, se a sua insegurança é se comunicar com
alguém que possa não saber, procure as que sabem.
— Ela está achando que eu sou um alcoólatra e preciso ir para
um grupo de apoio. — Chris debochou, e não recebeu só o olhar
fulminante de mamãe, como o meu também. — Só que para mudos.
Dei um tapinha na sua nuca.
— Não brinca com essas coisas! — mandei. — E por mais que
mamãe seja exagerada na maioria das vezes, ela está um pouco
certa.
— Eu não vou entrar nessa discussão ridícula com vocês! —
Ele riu fraco e, quando estava prestes a sair da cozinha, se virou
para nós. — Estão vendo a Caitlin? Eu nem posso me comunicar
com minha cunhada porque ela não sabe nada sobre a minha
comunicação.
— Chris...
Ele pediu para eu parar, e assim fiz.
— Estou bem assim, ok? Não quero discutir e chamar atenção
em um dia que é seu.
Eu suspirei e assenti.
Christopher sorriu de lado, daquele jeitinho que fingia estar
feliz quando eu sabia que não estava assim há muitos anos, e foi
para a sala.
— Agora ele vai para o celular jogar algum jogo ou pegar um
daqueles livros de monstros. — Mamãe disse, não escondendo sua
preocupação. — Eu me preocupo com ele, filho. É apenas isso! Sei
que posso ser inconveniente de vez em quando, mas estou muito
preocupada.
— Eu sei, mãe.
— Nessa semana teve uma palestra sobre depressão e
suicídio no hospital. Eles alertavam a gente para ficar de olho nas
pessoas que amamos. — Os seus olhos marejaram. — Eu sei que
Christopher esconde as dores, as inseguranças e toda amargura
que cresceu com ele nesses dez anos. Tenho medo de para onde
isso possa levá-lo.
— Ei...! — Eu a puxei para os meus braços. — Estou com ele,
tá bom? Não fica assim.
A minha mãe assentiu e me abraçou novamente.
— Vamos ficar mais dois minutinhos abraçados e depois
cozinhar, ok? Hoje é seu dia, não vamos nos preocupar por agora.
Eu concordei, beijando o topo da sua cabeça.
Infelizmente, aquela não era uma preocupação ridícula e fazia
parte das minhas emoções também.
CAITLIN HOWARD
Eu estava há trinta minutos olhando para o teto no escuro do
meu dormitório, esperando que chegasse o horário em que Aurora
iria acordar para se arrumar para sua primeira aula. Havia chegado
da viagem com Trevor e Christopher há uma hora e entrei de fininho
no quarto para não acordar a minha amiga.
Mesmo sendo uma viagem cansativa de quase seis horas
dentro de um ônibus, não conseguia me sentir cansada. A minha
mente estava animada, presa nas últimas vinte e quatro horas que
vivi ao lado da família Lancaster.
Nós não fizemos coisas tão diferentes, mas eu me senti
relaxada com eles de uma forma que não acontecia há muitos anos.
Deixei de pensar nas coisas que estavam me preocupando — ainda
que soubesse que eram necessárias ser pensadas e repensadas —
e aproveitei cada conversa sábia com Jules, cada nova forma de
comunicação com Christopher e cada momento ao lado de Trevor,
aproveitando os abraços, as risadas e os beijos.
Aquele relacionamento há muito tempo tinha parado de ser
falso e se tornado algo verdadeiro. Será que eu poderia esperar por
seriedade e felicidade quando estava escondendo algo tão
importante como o meu passado dele?
Então, era assim que a mágica se apagava e eu voltava a ficar
apreensiva com tudo o que havia descoberto no sábado. O peso
daquela ocultação parecia mil vezes pior agora que eu passei o
aniversário rindo e me divertindo com a sua família.
Eu sabia que não tinha culpa, mas... O que Trevor enxergaria
quando me olhasse? Ele estava disposto a esquecer o passado,
mas e se soubesse que eu era como uma janela aberta para ele
sempre que me visse?
Eu não queria isso. Não queria aquele passado e nem nós dois
conectados daquela forma.
Estava com medo. Com muito medo de perdê-lo.
Nunca havia me sentido assim, nem quando escondi toda
minha bagagem dos meus amigos.
— Você está há quanto tempo aqui? — Ouvi a voz de Aurora
me chamando de volta a realidade. — Nem vi você entrar.
Ela acendeu a luz do abajur e eu me sentei na cama, sorrindo
em sua direção.
— Não queria acordar você.
A minha amiga se sentou na ponta da sua cama.
— E como foi o passeio na casa da sogra? — Ela ainda
parecia sonolenta, mesmo com sua curiosidade.
Antes que eu pudesse contar a experiência completa, Maeve
estava entrando no nosso quarto como um furacão.
— Você! — Apontou para mim. — Ia mesmo contar sem eu
estar presente?
Eu puxei a sua mão e a fiz se sentar ao meu lado.
— Pensei que não se importava tanto com isso.
— Acontece que, na realidade em que estou vivendo, saber da
sua vida amorosa medíocre é melhor do que viver a minha vida
medíocre — argumentou, daquele modo Maeve de ser. Ela deve ter
visto a curiosidade brilhando no meu rosto porque completou: — Ah,
nem tente saber! É você quem tem novidades aqui.
Havia tantas coisas que eu queria dizer para elas e pedir
conselhos, mas o medo de abrir a minha boca e falar sobre o meu
passado me trancava para tudo. E se elas também me deixassem
por essa mentira? E se isso virasse uma bola de neve e todos
soubessem dos meus pais? Isso não podia sair do controle ou meus
pais viriam atrás da gente e sabe-se lá o que fariam.
— Estou apaixonada. — Foi a única coisa que consegui admitir
sem me sentir uma medrosa.
Maeve riu ao meu lado.
— Jura? — Usou um pouco de ironia. — Eu nem havia
percebido!
Bati na sua perna fraquinho.
— Estava mesmo óbvio, Caitlin! — Aurora disse, mas parecia
com algumas dúvidas enquanto me encarava. — Mas por que não
parece feliz?
— Me deixa adivinhar... Trevor não quer um relacionamento de
verdade. — Maeve deu seu palpite.
Aquilo seria horrível, mas talvez fosse até melhor na minha
situação.
— Não é isso — respondi com a verdade. — Só estou com
medo, nunca me senti dessa forma antes. E se... eu acabar o
perdendo?
Não era mentira. Podia estar omitindo toda a verdade, mas
aquele sentimento era mais real a cada minuto.
Maeve bufou ao meu lado.
— Desde quando você se tornou tão dramática, Caitlin? —
perguntou. — Ele deve estar na sua também. A vida não é uma
novela mexicana, apenas curte o momento e se acabar, pelo
menos, vocês tiveram boas lembranças juntos.
Apesar da sua franqueza ser um pouco ríspida, eu não
consegui ficar incomodada com o que havia dito. Maeve tinha razão,
mas isso só se aplicava quando não sabia da história completa.
— O que te faz ter medo? — Aurora questionou, parecendo
ver melhor que algo estava errado. — Trevor não quer um
relacionamento sério?
— Considerando que ele entrou nesse relacionamento de
mentirinha para se ver longe de compromisso...
— Maeve, você não está ajudando, sabia?! — Aurora chamou
a atenção da nossa amiga.
— Sinto muito, eu não sou muito boa com as palavras.
Nós rimos da sua cara visivelmente arrependida. Desde que
tivemos aquela noite de meninas, ela estava tentando ser um pouco
melhor nos últimos dias e dava para ver claramente o seu esforço
em cada diálogo que trocávamos.
Maeve não era inocente, isso eu podia afirmar com certeza,
mas ela também não era nenhuma vilã de quadrinhos.
— Eu entendi o que quis dizer e você está certa, nenhum de
nós queria um relacionamento antes — falei, e olhei para Aurora. —
Mas acho que Trevor também está aberto a gostar de mim.
— Então, qual é o problema? — Maeve questionou. — Juro
que não entendo.
— Acho que consigo entender. — Aurora disse. — Eu sinto
isso toda vez em relação ao Melvin, mas estou começando a achar
que serei eu a abandoná-lo.
Nunca foi tão óbvio o motivo de Aurora, uma pessoa doce e
gentil, se aproximar da gente no ensino médio, mas agora, olhando
para o seu semblante meio triste após dizer aquela frase, conseguia
entender perfeitamente.
Ela amava muito o meu irmão, quase o tanto que ele a amava.
— Já falei que é o melhor a fazer. Sinto muito por ser seu
irmão, Caitlin, mas essas brigas já estão ficando insuportáveis. Se
ele não vai mudar por algo que é para o seu bem, então por que
Aurora tem que continuar sofrendo com a falta de educação e senso
dele? — Maeve explodiu ao meu lado. — Ele é um babaca!
Meu irmão... Eu também precisava falar com ele.
Droga! Quando foi que minha vida havia se tornado tão caótica
assim?
— Não conversaram esse fim de semana?.
— Ele até tentou, mas Maeve não deixou que se aproximasse,
e Barry tomou conta dele. — Aurora respondeu. — Acho que ele
não gostou muito disso.
— Pela forma como ele saiu empurrando as pessoas naquela
festa, tenho certeza. — Maeve riu com a lembrança. — Ele precisa
crescer e amadurecer, então é melhor que pense que perdeu a
Aurora.
Aquilo me preocupava porque meu irmão pareceu sincero
quando disse que não conseguiria viver sem ela.
— Eu aconselhei vocês a dar um tempo — lembrei-me. — Irei
tentar conversar com ele, ok?
— Faça isso... — Aurora pediu. — Não acho que eu tendo
esse tipo de conversa com ele ajudará em alguma coisa. Melvin
precisa da família.
E ele só tinha a mim.
Mas como explicar que nós nunca chegamos a ser uma família
de verdade?
— Quando eu comecei o meu relacionamento com o seu
irmão, também tinha medo de perdê-lo, Caitlin. — Aurora contou,
voltando ao assunto inicial. — Principalmente por conta da forte
popularidade dele na escola. — Ela riu fraco, parecendo perdida em
pensamentos. — Achei que ele poderia me trocar por alguma garota
mais bonita em um piscar de olhos.
— E se você estivesse escondendo algo dele sobre si mesma
que te fizesse perdê-lo de vez?
— Está escondendo alguma coisa do Trevor? — Maeve
perguntou.
Ela era inteligente demais.
— Não é isso...
— Você também não nos conta tudo, Caitlin, e sabemos muito
bem disso. — Aurora disse, interrompendo qualquer desculpa que
eu fosse falar. — Mas assim como eu fui sincera quanto a não
gostar do que Melvin estava fazendo com a sua vida, você deveria
ser sincera com o que quer que esteja acontecendo em relação ao
Trevor.
Ela se levantou.
— Não se assuste tanto. Se você for verdadeira, ele pode te
entender facilmente.
— Afinal, o que você poderia ter feito de tão errado para ter
tanto medo assim, hum? — Maeve perguntou para mim. — Se for
todos os caras que você pegou no passado, ele é um idiota por te
afastar por conta disso.
Eu quis rir e chorar ao mesmo tempo.
Queria tanto que fosse apenas isso.
— Vou tomar um banho para o treino. Me esperam? — Aurora
questionou.
— Nós sempre esperamos. — Maeve respondeu.
A minha ex-cunhada pegou a sua toalha e entrou no banheiro
enquanto eu fiquei com uma ruiva que não entendia nada do que
estava acontecendo na minha vida, bem da mesma forma que eu
não sabia sobre a sua.
Aurora, no entanto, tinha razão. A sinceridade sempre era a
melhor opção. Mas omitir e mentir eram a mesma coisa? Eu aprendi
durante todos aqueles últimos anos vivendo em uma mentira que
não, não eram.
— O próximo jogo é na quarta e, como Tammy machucou o pé
na sexta-feira passada, Maeve volta a jogar como titular. — O
treinador disse, fazendo a minha amiga do meu lado soltar um
suspiro, aliviada. — Você foi melhor do que na semana passada,
Maeve, então trate de ser assim na quarta-feira.
Ela assentiu.
— Não vamos nos encontrar na quarta, então estejam todas
aqui amanhã. — Ele continuou a falar. — Precisamos ver melhor
essa técnica que Caitlin sugeriu. Pode ser uma boa alternativa para
derrotar o San Diego State.
Só de imaginar que na quarta-feira estaria saindo dali para
jogar em San Diego me deixava um pouco desanimada. Odiava
essas viagens que tínhamos que fazer por conta dos jogos, era
muito melhor quando jogávamos em casa. Sentíamos mais a
torcida, já que a maioria não podia viajar durante a semana para um
jogo.
— Certo, treinador — respondi por todas ali.
Ele se despediu de nós, arrumando a sua bolsa larga que
sempre carregava com as pastas que provavelmente continham
nossas fichas e mais informações sobre os jogos.
— Estão animadas para o jogo? — Lilian perguntou,
parecendo bem empolgada.
— Não gosto muito de viajar de ônibus, mas você parece bem
animada. — Jocelyn comentou.
— Isso é só porque ela vai ver os gatinhos do time de futebol
de San Diego! — Cindy explicou, provocando a risada das outras
meninas. — Ei, Maeve, que bom que voltou para a gente.
Abracei a carrancuda do meu lado.
— Por que está com essa cara? — indaguei.
— Ele só me colocou de volta porque a Tammy machucou o pé
— explicou, emburrada. — Ridículo!
— Pense pelo lado bom. — Sacudi os seus ombros. — Vai
poder mostrar para ele que ainda é Maeve Hood.
Aurora ao meu lado concordou.
— O que acham de irmos almoçar juntas? — convidou. —
Nossas aulas são próximas uma da outra hoje.
Com próximas, ela queria dizer que estudávamos no mesmo
prédio.
Peguei o meu celular ao meu lado e vi que havia uma
mensagem não lida de Trevor.
Trevor:
Oi! Você já almoçou?
— Ei, Caitlin, é verdade que foi conhecer a família do Trevor
nesse fim de semana? — Jocelyn perguntou.
Eu não consegui disfarçar a minha cara de surpresa ao ouvir a
sua pergunta. Como ela sabia disso? Já era segunda-feira! Não era
possível que estivesse sendo observada.
— Eu deixei escapar na sexta. — Maeve explicou, trazendo
sentido para aquilo.
— Entendi.
— Como foi? A família dele gostou de você? — Cindy
questionou.
Assenti, provocando os risinhos delas.
— Eu sabia que isso estava bem sério. — Jocelyn afirmou,
fazendo um toque com a mão de Lilian. — Vocês vivem andando
juntos por esse campus cheio de sorrisinhos.
Parece bem óbvio.
Sorri e voltei minha atenção para o celular.
Eu:
As meninas querem almoçar comigo. Por que não vamos
juntos?
Pode levar o Chris também. Elas sabem falar língua de sinais.
Eu sabia que no início ele não queria se envolver com os meus
amigos, mas agora era diferente, né? Aurora era uma boa pessoa e
Maeve não era tão idiota assim.
Trevor:
Estamos na frente do ginásio.
Chris queria vir junto de qualquer forma para te ensinar mais
algumas palavras em sinais.
Sorri. Aquele garoto era um fofo!
Notei ao levantar a cabeça que Jocelyn, Lilian e Cindy já
haviam ido para o vestiário e eu voltei minha atenção para minhas
amigas.
— Chris e Trevor vão com a gente, ok?
Maeve revirou os olhos, mas riu.
— É claro que vão! — rebateu. — Nasceram grudados agora?
Casais apaixonados são tão enjoativos.
Aurora deu um tapa fraco no seu braço.
— Deixa de ser faladeira! Vamos nos arrumar logo.
Eu fiquei bem surpresa em ver que Aurora e Christopher
estavam tendo uma conversa intensa sobre livros de suspenses. Até
há alguns minutos, eu não imaginava que minha amiga conhecesse
tantos títulos e que, ainda por cima, havia lido e tinha opinião bem
afiada sobre todos que citava.
— Impressionante como ela parece uma nerd falando sobre
isso. — Maeve provocou, e eu a empurrei com o meu ombro. — Ei!
Não foi uma ofensa.
— Quem poderia imaginar que sairíamos todos juntos? —
Trevor questionou, segurando a minha mão. — Estou me sentindo
nu com tantos olhares sobre nós.
— Você se acostuma. — Maeve disse, confiante. — Vai até
gostar da popularidade que a minha amiga está doando para você.
Trevor revirou os olhos.
— Eu não quero, obrigado.
— Mas está namorando com Caitlin Howard. — Ela insistiu.
— O que vamos comer? Estou sentindo uma fome tremenda.
— Mudei de assunto, antes que eles começassem a discutir ali.
Trevor não gostava de Maeve e isso não era nenhuma novidade, ele
apenas a suportava por minha causa.
— Não chegamos no restaurante ainda. — Maeve falou. —
Escolheremos quando chegarmos lá.
Eu ia responder, mas um grito masculino familiar vindo de
algum canto daquele campus gigante interrompeu qualquer palavra
que pudesse soltar.
Encontrei Melvin vindo em nossa direção com um alvo em
mente enquanto Barry apressava os pés atrás dele. Antes que eu
pudesse entender o que estava acontecendo, meu irmão estava se
aproximando e pegando Christopher pela gola da camisa.
— Melvin!
Eu gritei.
Aurora gritou também.
Mas já era tarde demais, o meu irmão estava socando a cara
de Christopher com uma agressividade que eu nunca tinha visto em
seu semblante e suas ações, nem quando nossos pais o
expulsaram de casa.
Trevor me largou assim que o soco foi desferido e correu em
direção ao Melvin, o empurrando para longe do irmão com mais
força do que o soco que ele havia dado em Chris.
Melvin caiu no chão e, se não fosse por Barry, Trevor teria
partido para cima do meu irmão.
Aurora gritava algo que não conseguia entender e, diante do
meu choque, só conseguia enxergar Maeve se aproximando de
Christopher com uma expressão que nunca tinha visto em seu rosto.
Ela se ajoelhou na frente dele e segurou o seu rosto com cuidado,
preocupada com o sangue que corria pelo seu nariz.
Chris não estava entendendo nada, assim como qualquer um
de nós ali, mas parecia com tanta dor que acabou deixando Maeve
cuidar dele.
Eu notei as pessoas observando aquela confusão de longe.
Notei os falatórios. Senti a raiva de Trevor sendo agarrado por Barry.
E senti o desespero de Aurora segurando Melvin contra o chão para
que não fizesse mais nenhuma besteira. Mas não consegui me
mover em nenhuma direção. Tão perdida quanto estava nos últimos
dias.
Eu sinto a névoa do amor me alcançando
Surreal
Estaria ferrada se eu ligasse para o que as pessoas dizem de mim
LAVENDER HAZE – TAYLOR SWIFT
TREVOR LANCASTER
Eu sempre defendi o meu irmão de qualquer idiota que o
desrespeitasse. Durante o período na escola, o que mais me irritou
foi saber tarde demais que ele estava sofrendo bullying. Chris
sempre se isolou quanto a isso e deixou que fizesse o que
quisessem com ele, até que um dia chegou em casa com
hematomas no rosto, e eu consegui arrancar a verdade do que
acontecia nos cantos daquele lugar.
Prometi ao Chris que aquilo nunca mais aconteceria. Nós nos
mudamos de escola no último ano e tudo pareceu melhorar por
causa dos alunos mais maduros que encontramos no novo colégio,
mas não foi cedo o suficiente para salvar a confiança do meu irmão.
Agora estava ali, bem diante de um idiota e sem poder
devolver o soco que ele havia dado no meu irmão porque era
fortemente agarrado por Barry, seu amigo que também era um
idiota.
— Me solta! — mandei, mas ele não fez isso.
Estava furioso e esperava que Melvin conseguisse enxergar
isso diante dos seus olhos. Por que atacou o meu irmão? Isso não
fazia o menor sentido...
Eu odiava e repudiava qualquer tipo de violência, mas estava
pronto para bater naquele covarde por ter encostado em meu irmão
daquela forma, mesmo que não soubesse nem como socar alguém
pessoalmente.
Não devia ser tão diferente de um videogame.
Eu só precisava da oportunidade...
— Me solta, Barry! — falei de novo, tentando me livrar das
suas mãos ao meu redor.
— Não devolva na mesma moeda! — Ele ordenou, como se
tivesse o direito de algo. — Melvin não está no seu controle e...
— Está defendendo esse idiota? — Eu o encarei, sério. — Ele
bateu no meu irmão por nada!
— O seu irmão estava dando em cima da minha namorada! —
Melvin gritou, chamando a minha atenção.
Ele estava quase vindo em minha direção, mas Aurora entrou
na sua frente e o empurrou com uma força bem surpreendente para
um corpo pequeno e magro.
— Chega, Melvin! — gritou. — Chega!
— Aurora... — Os olhos do babaca marejaram ao se
encontrarem com os dela e, mesmo no meio da minha raiva, notei
as mãos dele tremerem quando se levantaram, tentando segurá-la
por perto. — Você ainda é minha, né?
Ele era a porra de um psicopata?
Eu consegui me livrar dos braços de Barry por um descuido
seu, mas não parti para cima de Melvin, pelo contrário, olhei para
Christopher, ainda no chão e sendo amparado por Maeve. Agachei-
me na sua frente rapidamente e segurei o seu rosto, afastando as
mãos da ruiva do meu irmão.
Era melhor que ela também ficasse longe dele.
— Você está bem? — Era uma pergunta idiota, visto que
estava saindo um pouco de sangue do seu nariz.
Mesmo assim, Chris assentiu e levantou as mãos para
sinalizar.
— Vamos para o dormitório, não aguento mais ficar aqui.
Então, notei toda a zona que estava sendo filmada e vista por
estranhos ao nosso redor. Aquilo provavelmente já deveria estar na
internet, o que dificultava qualquer chance de passarmos
despercebidos.
Entendia como o meu irmão devia estar se sentindo agora com
tantos olhares de pena sendo lançados a ele.
— Vamos — murmurei, e o ajudei a levantar.
Não ficaria mais um segundo ali.
— Trevor... — Caitlin parou na nossa frente antes que
pudéssemos nos afastar daquela muvuca e olhou de mim para
Chris. — Christopher...
Ela não sabia o que dizer, mas estava claro pelo seu rosto o
quanto se sentia envergonhada e mal pelo que seu irmão havia
feito.
— É melhor cuidar do seu irmão agora, Caitlin — falei, um
pouco mais ríspido do que gostaria. — Eu vou fazer o mesmo com o
meu.
Desviei do seu caminho e levei Christopher comigo, nos
afastando de todos ao redor daquele lugar que por longos dias
ficaria sendo falado pelos desocupados da UCLA.
CAITLIN HOWARD
Barry ficou responsável por levar Melvin para o seu quarto, e
eu e as meninas fomos alguns minutos depois para a república que
eles dividiam com o restante do time.
Aurora parecia tão desnorteada como eu durante o caminho, e
Maeve parecia um pouco mais furiosa do que normalmente ficava.
— O que o seu irmão tem na cabeça?! — indagou, enquanto
esperávamos na sala da casa que muitas vezes acontecia festas,
inclusive a que Trevor e eu havíamos nos conhecidos. — Merda?
— Eu não sei... — admiti baixinho, mas elas escutaram. —
Estou até agora sem entender por que isso aconteceu.
— Foi por minha culpa... — Aurora disse, demonstrando o
quanto estava se sentindo culpada por aquilo. — Coitado de Chris!
Ele só estava sendo legal.
— Ele não merecia isso. — Maeve defendeu. — Foi
completamente ridícula essa reação de Melvin.
Barry entrou na sala, impedindo que qualquer uma de nós
conseguisse falar alguma coisa.
— Eu consegui convencê-lo a tomar um banho — disse,
sentando-se ao meu lado no sofá grande da sala. — Preciso
conversar com vocês.
— O quê? — indaguei. — É algo relacionado ao Melvin?
Ele assentiu e o seu semblante triste fez com o que um calafrio
se espalhasse por todo o meu corpo. Barry era o melhor amigo de
Melvin e claro que sabia de muito mais coisa do que eu naqueles
últimos meses, já que o meu irmão estava cada vez mais afastado
de mim, e agora de Aurora.
— Eu o peguei cheirando cocaína na noite passada.
Senti a minha garganta fechar e meu corpo todo tremer com o
que havia acabado de sair da boca de Barry.
— Merda... — Maeve representou tudo o que todos naquela
sala estavam pensando a respeito da situação do meu irmão. —
Isso acabou de ficar mais complicado, né?
— Não sei se foi a primeira vez. Ele me garantiu que sim, mas
sabe como é... Até ontem, ele dizia que só usava maconha.
— Para mim também — murmurei. — O que eu faço?
— Seria melhor contatar a sua tia antes que isso saia do
controle. — Barry aconselhou. — Melvin já está no banco reserva,
suas notas estão diminuindo e agora drogas... Ele precisa de um
tratamento antes que vicie. Isso, se já não está... Eu realmente não
sei como funciona.
Como eu poderia contatar aquela mulher? Ela simplesmente
nos odiava assim como os nossos pais.
Melvin só tinha a mim e eu vinha falhando cada vez mais como
irmã.
— Vou ver o que posso fazer — respondi e me levantei. —
Preciso ir ver como ele está.
— Acha que é uma boa ideia? — Maeve perguntou.
— É melhor ela ir. — Aurora interferiu. — Ele e eu apenas
iríamos brigar.
Barry concordou.
Eu caminhei até as escadas e as subi mais devagar do que o
normal, pensando em como e o que falaria para meu irmão. Não iria
passar a mão na cabeça dele pelo que havia feito, mas também não
queria ter uma briga feia que o levaria a usar mais drogas.
Meu celular apitou com uma mensagem assim que me
aproximei da porta de Melvin e eu o peguei antes de entrar no
quarto.
Trevor:
Desculpa ter sido um pouco grosso com você.
Toda essa situação me deixou estressado.
Mesmo com toda a situação, ainda me senti um pouco mais
calma com a sua mensagem. O pensamento de que ele havia ficado
furioso comigo a ponto de não querer mais me ver por causa do que
o meu irmão fez passou pela minha cabeça por alguns minutos
quando me mandou cuidar de Melvin.
Eu:
Você não tem que fazer isso. Na verdade, quem precisa é meu
irmão, mas... Acabei de descobrir que ele está usando drogas mais
pesadas do que maconha. Então, por enquanto, quem irá se
desculpar sou eu. Sinto muito mesmo.
Se eu demorar para responder, é porque estou tendo uma
discussão mais calorosa com ele do que a de semana passada.
Enviei a minha resposta, deixei o telefone no silencioso e
entrei no quarto de Melvin antes que perdesse a coragem. Ele
estava sentado na cama, de cabeça baixa, usando uma regata
branca e uma bermuda jeans escura.
Assim que ouviu a porta se fechando, levantou o seu rosto em
minha direção, e notei pelos olhos marejados o quanto se sentia
arrependido pelo que havia feito. Soltei um suspiro e me aproximei
devagar até ficar na sua frente.
— Eu vi vermelho... — murmurou, parecendo derrotado. —
Não consegui raciocinar quando a vi sorrindo para algo que ele
falava.
Sentei-me no chão, bem à sua frente.
— Deve um pedido de desculpas para o Christopher — avisei.
— O que você fez foi péssimo, Melvin.
— Ele estava dando em cima da Aurora!
Senti meu irmão ficar estressado novamente, por isso, dei um
tapa na sua mão com mais força do que lançava as bolas nos meus
jogos.
— Você virou um maluco obcecado?! — perguntei, furiosa com
ele. — Tanto a ponto de não ver o que é real? Eles só estavam
conversando! Aurora ama você, mas olha a forma como está
agindo... Só vai afastá-la mais ainda.
Ele respirou fundo e ia falar algo, mas eu o impedi.
— Barry me contou sobre a cocaína. Por que está fazendo isso
com você mesmo, Melvin? Nós vamos amanhã mesmo buscar
ajuda e...
— Para de esquisitice, Caitlin! Eu não estou viciado —
mandou, antes que eu concluísse meu plano. — Não preciso de
tratamento.
— Me responda com sinceridade — pedi, segurando o seu
rosto para que respondesse olhando nos meus olhos. — Ontem foi
mesmo a primeira vez que usou cocaína?
Melvin sempre foi um péssimo mentiroso. Ele tinha costume de
desviar os olhos quando era algo tão sério e agora via que nem isso
havia percebido quando o questionava sobre usar apenas maconha.
Ele nunca tinha respondido a isso olhando nos meus olhos.
— Eu estou usando há alguns dias já, ok? — Retirou as
minhas mãos do seu rosto. — Mas não estou viciado.
— Isso não é o que todo viciado diz?
Ele revirou os olhos e se levantou rapidamente.
— Seria melhor que fosse embora, eu quero descansar —
disse, como se não houvesse feito nada demais algumas horas
atrás. — Tenho uma festa para ir hoje.
Levantei-me do chão e parei em sua frente, o empurrando pelo
peito até que batesse suas costas na porta do quarto.
— Que porra, Caitlin?!
— Eu estou tentando ser útil aqui, Melvin! Estou preocupada
com você, porra! Por que não pode ao menos se mostrar um pouco
resiliente? Você está se afundando em drogas! Isso pode acabar te
matando, sabia?
Ele riu, balançando seus ombros como se eu tivesse dito uma
ótima piada.
— Talvez seria bom — admitiu, me causando uma dor no
peito. — Eu pararia de ser um estorvo, não acha? Aurora
encontraria alguém melhor do que eu e você não teria que viver
preocupada comigo, poderia descansar tranquilamente. Acha que
papai e mamãe ao menos viriam ao meu enterro?
A forma como ele soltou aquelas palavras com tanta
naturalidade me causou uma dor tão descomunal no peito, que me
fez dar dois passos para trás, assustada de onde Melvin queria
chegar com tudo aquilo.
— Não diga essas merdas... Você é meu irmão, eu te amo.
— Ama um merda como eu? Nem nossos pais nos amam, Cat.
— Esquece eles, porra! — gritei, e me aproximei novamente.
— Por que fica voltando a isso? Eles não nos merecem, Melvin.
Lembra do que prometemos um para o outro quando saímos de
casa? Seríamos incríveis e os mataríamos com o nosso sucesso.
Por que continua deixando que eles te afetem dessa maneira?
— Porque eles são nossos pais! — gritou de volta, com os
olhos marejados. — Como consegue fingir que está tudo bem?
— Nós nunca os tivemos como pais de qualquer forma, por
que eu me importaria em me deixar ser afetada por eles agora?
— Então, você não soube...
— Do quê?
— Eles adotaram uma criança assim que nos expulsaram de
casa — contou, me trazendo de volta à conversa que havia tido com
Trevor na praia naquela tarde. — O nome dele é Miguel.
— Está pesquisando sobre eles?
— Você sabia? Não está tão surpresa.
Suspirei.
Agora muita coisa sobre as últimas atitudes de Melvin fazia
sentido na minha cabeça. Ele sabia sobre a existência de Miguel e
de como os nossos pais e seu novo filho eram a imagem perfeita de
família forte, que se reergueu depois da morte dos seus primeiros
filhos. Deveria imaginar que aquilo o deixaria nesse estado.
— Eles parecem realmente amá-lo, sabe? Muito diferente de
como era com a gente.
Ele não percebia que eram só aparências?
Melvin estava extremamente quebrado e agora deixava aquilo
bem visível para mim. Sem que ele esperasse, eu o abracei,
escorando a minha cabeça em seu peito e sentindo-o estático no
meio dos meus braços.
— E o que poderíamos fazer? — murmurei minha pergunta. —
Estamos aqui, vivendo nossas próprias vidas.
— Não podemos fazer nada — disse a verdade e, parecendo
sair do choque, me abraçou de volta. — Desculpa.
Assenti e apertei mais os meus braços ao seu redor.
— Você não tem que pedir só para mim.
— Tem certeza de que ele não estava dando em cima dela?
Eu dei um tapa em suas costas.
— Vai continuar com isso?
— Vou tentar falar com ele — finalmente disse, me
tranquilizando. — Obrigada por ficar comigo, mesmo depois de eu
ter feito uma merda dessas.
— É porque eu sei que existe algo bom em você — afirmei e
me afastei um pouco para olhar para ele. — Me promete que não
vai mais usar isso? Por mim e pela Aurora? Você disse que não
queria perdê-la, então, se não conseguir fazer isso por mim, faça
pela garota que você ama desde a adolescência.
Ele assentiu, mas eu ainda o sentia relutante e inseguro com a
resposta.
— Quando as coisas estiverem difíceis, vem conversar
comigo, que nem fizemos naquele dia, ok?
Melvin sorriu.
— Vai ser minha psicóloga?
— Farei o melhor possível, já que você não quer ajuda de uma
profissional.
Melvin tomou atitude e me abraçou novamente, encostando a
sua cabeça em meu ombro.
— Eu prometo.
Mas eu sou um péssimo mentiroso
Péssimo mentiroso
Agora você sabe
BAD LIAR – IMAGINE DRAGONS
TREVOR LANCASTER
Não conversei com Caitlin durante todo o restante da segunda-
feira, preferi usar aquele tempo para me acalmar um pouco e pensar
com mais clareza no que faria no dia seguinte.
Não havia ido trabalhar na tarde do dia anterior e, pela forma
como a supervisora da minha área entendeu perfeitamente, até
desconfiava que já sabia sobre o soco que meu irmão levou do
quarterback do time.
Chris preferiu não ir à aula na terça-feira porque odiava ser o
centro das atenções tanto quanto eu. Despedi-me dele, o deixando
no nosso dormitório, e trinta minutos depois estava no estádio onde
o time de futebol Bruins da UCLA treinava.
De longe, vi Melvin Howard sentado no banco, segurando um
pedaço de papel e o olhando fixamente, como se aquilo fosse mais
importante do que o treino que acontecia à sua frente.
Talvez até fosse, pois ele estava no banco desde quando a
temporada havia começado.
Eu caminhei até o idiota e, assim que estava perto o suficiente
dele para que notasse a minha presença, Melvin levantou a cabeça
e me viu. Ele guardou o que tinha no bolso rapidamente e assumiu
aquela pose tranquila, como se não tivesse batido no meu irmão no
fim da manhã anterior.
— O que traz você aqui? Veio devolver o soco?
Eu poderia porque ele ainda era um idiota, mas apenas
busquei paciência no fundo do meu peito e me sentei ao seu lado.
— Ao menos, você se arrepende de ter agido como um louco?
— indaguei, pois, se sua resposta fosse não, eu provavelmente
partiria para cima dele. — O meu irmão não tem nada a ver com a
droga do seu relacionamento com a Aurora.
Esperei sua resposta por um longo minuto e o encarei, em
busca dela. A aparência de Melvin já não era mais aquela toda
poderosa de sempre.
— Eu vou falar com ele depois — disse. — O nome dele é
Christopher, certo?
Soltei uma risada nasalada.
— Impressionante como você estava tão fora de si a ponto de
bater em alguém que nem tem certeza do nome. — Eu queria
mesmo era retribuir aquilo, mas não era uma pessoa violenta,
mesmo que fosse raivoso e rancoroso. — É melhor não procurar
pelo meu irmão.
— Devo um pedido de desculpas para ele.
— Então, se arrepende?
Ele assentiu, parecendo sincero.
— Eu posso ser um idiota, mas não sou um babaca —
assumiu, me deixando um pouco surpreso com as suas palavras. —
Ver seu irmão perto da Aurora me deixou com muita raiva a ponto
de não pensar.
É... As drogas causam esse efeito mesmo.
— De qualquer forma, seria bom que se mantivesse longe do
meu irmão — persisti no aviso. — Eu repasso o seu pedido de
desculpas.
— Você é a mãe dele por acaso?
— Eu sou o irmão mais velho e responsável por ele.
— Tenho certeza de que o seu irmão tem idade para ser
responsável por si mesmo. Só porque ele é mudo, não quer dizer
que é uma criança. Então, eu mesmo irei conversar com ele.
O que ele disse me irritou e eu aproximei o meu rosto do seu.
— Acha que minha superproteção tem a ver com a mudez
dele? Meu irmão sofreu nos últimos anos por causa de babacas
como você e é exatamente por isso que não quero que ele te veja
mais.
— Estudamos na mesma universidade, não é tão simples
assim — rebateu. — Mas por que está aqui? Duvido que seja para
fazer companhia para mim nesse banco enquanto todos os meus
colegas treinam.
— Pensei que reservas também treinavam — comentei,
notando que ele era o único no banco, enquanto até os reservas
estavam no campus.
— O treinador descobriu sobre o meu ataque de violência
ontem e agora estou de castigo — explicou, sorrindo de lado e
voltando a olhar para o campo. — Estou cada dia mais afundado na
merda.
Se ele sabia disso, por que continuava se afundando?
— Mas não acho que veio aqui para bancar o irmão protetor,
apesar de você ser.
— Sua irmã está preocupada com você — falei de uma vez. —
E essa preocupação dela me fez vir aqui falar um pouco com você.
Notei o Melvin ficar rígido de uma hora para a outra do meu
lado.
— Ela contou, né? Que maldição! Caitlin não consegue se
manter calada. — Ele me encarou. — Então, veio aqui para bancar
o namorado protetor.
— Está usando drogas agora? — perguntei, ignorando o seu
deboche.
— Fala baixo! — mandou, louco de medo de alguém acabar
escutando. — Não estou, ok? Não sou nenhum viciado.
Ainda.
Logo ele poderia entrar em um círculo vicioso sem nem
perceber.
— Deveria buscar ajuda — sugeri. — E parar com isso.
— Caitlin já me falou isso, obrigado — disse, dando pouca
importância para aquilo.
— Acontece que eu imagino bem como Caitlin deve ter falado
com você — comentei, o deixando confuso. — Ela foi gentil até
mesmo na bronca, não é? — Pela sua cara, eu havia acertado. —
Eu não sou o seu irmão e muito menos gosto de você... Então, se
eu souber que colocou mais uma droga no corpo, seja maconha ou
cocaína, irei contar para aquele homem ali. — Apontei para o
treinador. — Tenho certeza de que a sua vida acadêmica e a sua
profissão dos sonhos estariam acabadas.
Em um piscar de olhos, Melvin estava segurando a minha
camisa e me lançando um olhar fulminante enquanto quase grudava
o rosto no meu.
— Está me ameaçando?!
— Não acho que sua irmã teria coragem disso, mas eu tenho.
Eu conseguia sentir a raiva de Melvin de perto e tinha quase
certeza de que não havia me batido ainda porque estava mesmo
sem nenhuma droga no corpo.
— Você é mesmo arrogante, sabia?
— Estou apenas bancando o namorado preocupado — avisei,
repetindo suas palavras com ironia.
— Ei, Melvin! — Barry se aproximou rapidamente e afastou o
quarterback de mim. — Ficou maluco? Quer uma expulsão do time
de vez?
— Eu não ia bater nele — explicou, se afastando. — Mesmo
que merecesse por ficar se metendo na minha vida.
— É melhor ir falar com o treinador. Ele quer ter uma conversa
séria com você. — Barry avisou.
Melvin olhou de mim para o seu treinador e assentiu.
— Conversamos outra hora, Trevor.
Ele correu até onde o treinador estava, me deixando a sós com
seu amigo.
— Melvin machucou você? Cara..., desculpa, eu nem sei mais
como defendê-lo. Ele tem ficado cada dia mais anormal e eu andei
pesquisando sobre os efeitos...
— Sim, eu sei que são alguns efeitos das drogas. — Eu o
interrompi. — Está tudo bem. Se ele tiver consciência, vai parar de
usar a partir de agora.
— Preciso ir treinar agora, vejo você por aí.
Assenti, o vendo voltar para o seu time.
Como não tinha mais nada para fazer ali, eu agarrei a minha
mochila do meu lado e me levantei. Talvez tivesse tempo para
minha primeira aula ainda e não precisasse faltar por conta do irmão
de Caitlin.
Foi quando vi o papel que Melvin segurava antes de eu me
aproximar caído no chão. Só percebi que não se tratava de uma
folha de papel qualquer quando me abaixei para pegá-lo.
Era uma fotografia e a foto estava virada para o chão.
Pensei em largar ali novamente, mas a curiosidade assumiu
todo o meu controle e eu virei o retrato na minha mão, sentindo todo
o meu sangue gelar com a imagem que enxerguei naquela
fotografia.
A primeira coisa que reparei foi na mulher loira. Eu conseguiria
reconhecer aquele rosto até mesmo em uma foto com má
qualidade, o que não era o caso dessa que segurava.
Allana e Angus Gage estavam naquela imagem, sorrindo para
a câmera enquanto apoiavam suas mãos nos ombros de duas
crianças.
Busquei uma forma de não ligar aqueles rostos que passavam
uma imagem inocente à Caitlin e ao Melvin, mas era difícil quando
as crianças tinham os rostos deles, mas mais jovens.
O que isso significa?
Que merda é essa?
De onde eles se conheciam? O que aquele casal era para
eles?
Senti os meus olhos marejarem e tive que controlar a mão que
segurava a foto para não esmagar aquele pedaço de papel.
Caitlin tinha uma relação com aquela família e ouviu tudo o
que eu disse aquele dia sem me dizer nada? Por quê?
Ainda tentando compreender o que tudo aquilo significava,
coloquei a foto no bolso da minha calça e parti para o dormitório de
Caitlin.
Era óbvio que àquela hora da manhã ela não estava no quarto,
por isso, me escorei na sua porta e me sentei no chão do corredor,
enviando uma mensagem para que fosse me encontrar assim que
estivesse livre.
As minhas mãos quase não conseguiam digitar o texto de
tanto desespero que estava sentindo. O meu coração permanecia
apertado desde que tinha visto aquela fotografia e, só para piorar
mais a sensação, peguei de novo o retrato do meu bolso para
observar melhor e ver se não tinha deixado nenhum detalhe
importante de fora.
Eles estavam em frente a uma grande casa branca e a foto de
corpo todo mostrava que estavam sobre um gramado muito bonito,
no meio de um jardim em frente à residência.
Os pais de Caitlin e Melvin estavam mortos, certo? Allana e
Angus não tinham o mesmo sobrenome que eles. Será que eram
tios? Ainda assim, aquilo me deixava um pouco irritado. Por que ela
não havia me dito?
— Ei! — A voz de Caitlin me assustou e eu guardei a foto
rapidamente no meu bolso outra vez. — Por que está aqui? Não
deveria estar na aula?
Apenas assenti, me levantando.
— Precisamos conversar.
Ela estranhou o meu tom de voz e apenas concordou, abrindo
a fechadura do seu quarto com sua chave.
— Entra.
Eu entrei no quarto, sentindo um frio atípico para aquela
manhã. Percebi que não era do clima ao me voltar para Caitlin,
simplesmente tinha um péssimo pressentimento de para onde tudo
aquilo iria.
— Por que quer falar comigo? Christopher está bem? Eu
mesma irei falar com ele e...
— Vou ser direto. — Eu a interrompi, pegando a fotografia no
meu bolso e me aproximando dela. — Por que você tem uma foto
com a família que destruiu a minha vida?
Caitlin arregalou os seus olhos e notei sua respiração acelerar
quando larguei a foto que segurava na sua mão. Ela olhou para
aquilo com espanto. Não com uma surpresa que eu ainda esperava,
mas sim assustada porque eu havia descoberto sobre a existência
daquilo.
Ela permaneceu em silêncio, me deixando completamente
agoniado.
— Responde, Caitlin! — exigi, sentindo meu sangue ferver
dentro do meu corpo apenas em ter que voltar àquele assunto
novamente.
Eu queria deixar para trás, como Christopher mesmo havia
sugerido. Eu estava tentando todos os dias fazer isso, mas olha
onde estava naquele momento. O presente fazia questão de me
levar de volta.
— Eu... — começou, cabisbaixa e com a postura de quem me
quebraria ao meio. — Primeiro preciso dizer que existe uma
explicação lógica para eu não ter te contado.
Respirei fundo.
— Existe? Então, por que você não olha para mim e explica?
Ela engoliu em seco e levantou sua cabeça. Não consegui
distinguir o que escondia naquele olhar, mas só de saber que havia
algo e que estava relacionado a eles..., me deixava irritado.
— Por que você não fala? — perguntei, um pouco mais
alterado por conta do seu silêncio. Ela teve um sobressalto no
mesmo lugar. — Não tente inventar uma história.
— Você está nervoso — constatou. — É melhor eu explicar
quando você estiver mais calmo.
A risada forçada saiu antes que eu pudesse controlar.
— Como acha que eu posso ficar calmo com esse assunto?
Ainda lembra do que eu contei para você? Esse homem matou meu
pai e deixou meu irmão mudo, e essa mulher...
— Eu sei! — Ela gritou na minha cara. — É por isso que eu
não contei que eles eram meus pais.
Meus pais.
Meus olhos se arregalaram e eu tive a sensação do chão estar
se abrindo bem sob meus pés com a súbita confissão de Caitlin.
Os meus pais morreram.
Não diga que sente muito.
As palavras que ela havia dito no passado para mim com tanta
tristeza e o que pensava ser verdade vieram à minha cabeça. Como
aquelas duas pessoas poderiam ser os pais de Melvin e Caitlin?
— O quê...? — murmurei tão baixo que, se não tivesse perto
dela o suficiente, Caitlin não teria escutado. Eu me sentia traído. —
Você disse que eles estavam mortos! — recuperei minha voz, me
enfurecendo com a clara mentira. — Você confirmou tantas vezes
isso!
— Eles estão! — retrucou, me irritando ainda mais por
continuar com a mentira. — Para mim, eles estão mortos.
— Para você? E para o resto do mundo? E para mim? —
questionei. — Eles permanecem vivos, Caitlin!
— Eu preciso te explicar a história toda...
— Você não deveria ter mentido para mim, não sobre isso.
Senti meus olhos marejarem pela raiva e a mágoa estarem
tomando conta do meu coração.
— Especialmente sobre isso, Caitlin.
— Trevor..., me desculpa — pediu, tocando o meu rosto com
suas mãos e me fazendo olhá-la. — Quando você me disse, eu quis
contar, mas você queria abandonar esse passado e eu realmente
não os tenho como pais. Falei a verdade sobre a expulsão do meu
irmão de casa. Eles nos enviaram para a nossa tia e, desde então,
mandam dinheiro como forma de cuidado para que ela não abra a
boca sobre a nossa realidade e acabe com a reputação deles.
— O quê? — Afastei suas mãos do meu rosto. — Como eu
posso confiar nisso? Quem me garante que não é mais uma de
suas mentiras?
— Como você pode não confiar em mim?! — Ela explodiu,
parecendo ficar magoada com os meus questionamentos.
Nem aquilo foi capaz de me desestabilizar.
— Porque você mentiu sobre algo importante! — argumentei
sobre o óbvio. — E ainda se sentou na mesma mesa que a minha
família depois disso.
— Eu...
— Você é cruel! — resumi o seu perfil, me sentindo cada vez
pior de estar no mesmo ambiente que ela. — Exatamente como
alguém da elite da UCLA deveria ser. O erro foi meu de me deixar
levar por algo falso.
Seus olhos brilharam em lágrimas e eu achei que pela primeira
vez, viria a Caitlin chorar, mas ela apenas engoliu aquilo que se
formava em seco e me empurrou com suas mãos no meu peito.
— Eu estou falando a verdade! Não diga essas merdas apenas
porque está com raiva de mim!
— Raiva? Isso não consegue nem definir o que estou sentindo
nesse momento!
— Trevor...
Ela tentou tocar em mim novamente, mas eu me afastei mais
rápido.
— É melhor eu sair daqui. — Tomei a decisão, caminhando até
a sua porta.
Caitlin entrou na minha frente.
— Podemos conversar depois que se acalmar? Por favor!
Aproximei o meu rosto do dela, observando cada pedacinho
que antes admirava me deixar ainda mais irritado.
Como eu pude cair bem na toca da onça?
— Olhar para você me deixa com raiva... — admiti, sentindo
uma lágrima escorrer por minha bochecha. — Me deixa
decepcionado, furioso.
Ela piscou, mas não desviou o olhar do meu.
— Não quero olhar para você e nem para essa sua cara
mentirosa. Tudo em você é uma mentira, Caitlin. Da respiração às
palavras. Das amizades ao namoro. Nada em você é real. Nada!
A garota à minha frente fungou, mas nenhuma uma lágrima
escorreu pelo seu rosto. Eu sabia que tinha pegado no seu ponto
mais sensível, da mesma forma como ela havia feito comigo ao
esconder a verdade de mim.
— O erro foi meu de me deixar iludir por uma versão falsa de
você — falei, não tomando cuidado em finalizar o que eu sentia. —
Olhar para você também me faz sentir vergonha de mim mesmo.
Porque me deixei levar pelo seu beijo, pelos seus toques e pelos
seus sorrisos.
— Trevor... — Ela estava tão magoada quanto eu. Ótimo. —
Não fala isso, eu...!
— Não quero ouvir suas desculpas e espero que a partir de
hoje, você e seu irmão se mantenham bem longe de mim e
Christopher, exatamente da forma como deveria ser desde o início.
Eu a empurrei com cuidado para longe da porta e segurei a
maçaneta.
— Nosso relacionamento de mentira também acaba hoje.
E essas foram as minhas palavras finais antes de deixar
aquele quarto, jurando ser a última vez que pisava ali dentro.
Porque eu te amo, as palavras: Eu te amo
Não são o suficiente, não importa que palavra eu diga
Você me deixou, aquele que amava somente à você, para onde você foi?
Você foi para longe porque não gostava mais de mim?
DON’T WANNA CRY – SEVENTEEN
CAITLIN HOWARD
Nunca imaginei que o fundo de um poço fosse tão profundo,
solitário e vazio até cair nele.
Eu não conseguia alcançar o fundo.
Trevor havia saído do meu dormitório há uma hora e eu ainda
não havia conseguido chegar ao fim do poço.
Sentia-me afundando cada vez mais em uma dor que pesava
no meu coração, que paralisava o meu corpo e me trazia uma
vontade absurda de chorar. Mas eu não conseguia botar para fora.
Tudo o que eu conseguia naquele momento era abraçar as minhas
pernas, sentada no chão do meu quarto, olhando para o piso à
minha frente como se ele pudesse me ajudar a resolver aquela
merda grandiosa na qual havia me enfiado.
As palavras que Trevor disse voltavam à minha mente a cada
minuto, se repetindo como uma música no replay, e não havia nada
que eu pudesse fazer para pará-la.
Ele tinha razão em ficar bravo comigo, mas era verdade tudo o
que sentia por mim a partir da sua descoberta?
Raiva.
Vergonha.
O meu coração doeu mais um pouco ao relembrar seu olhar
duro e com raiva em minha direção. Nada poderia apagar aquilo da
minha memória e a ideia de não conseguir o perdão de Trevor me
deixava ainda mais angustiada.
Eu nunca tinha conhecido aquela versão de Trevor.
Ele sempre foi paciente, divertido e gentil comigo. As únicas
vezes que demonstrou ser um pouco diferente disso era quando
dava uma resposta mais arrogante, mas até isso fazia parte do seu
charme.
Então, não podia deixar de pensar na pergunta principal:
Eu o havia perdido?
Os meus olhos marejaram ao mesmo tempo em que meu
coração era esmagado pela resposta assustadora da minha cabeça.
Sim.
Pela forma como ele ainda estava preso àquele passado e não
havia ficado nem para escutar o que eu tinha a dizer, era claro para
mim que o havia perdido.
— Ei, o que aconteceu com você?
Ouvi a voz de Aurora e consegui focar nela e Maeve entrando
no dormitório.
— Você não apareceu para o treino. — Maeve disse,
lembrando que eu tinha uma responsabilidade naquela tarde. — O
treinador está uma fera com você.
Nem aquilo me deu forças.
Minha vida de atleta, que era mais importante do que tudo para
mim, me pareceu a menor das minhas prioridades naquele
momento. Eu nem me lembrei dos meus compromissos depois que
Trevor saiu daquele quarto porque estava completamente presa à
dor e à angústia.
— O que você tem? Por que está sentada no chão e com esse
olhar de maluca? — Maeve questionou.
Vi Aurora dar um cutucão nela.
— É o Melvin?
Neguei, sentindo aquela vontade absurda de chorar
novamente.
Abracei mais forte as minhas pernas, segurando o caroço
enorme no meio da minha garganta.
Elas perceberam na hora que algo estava muito errado.
Minhas amigas se ajoelharam na minha frente, tornando tudo ainda
mais difícil.
— Quer nos contar? — Maeve questionou. — Ou quer apenas
um ombro para chorar?
— Eu não consigo... — falei, com a voz embargada.
Aurora segurou a minha mão firmemente e me olhou com
carinho.
— Para de fingir que está tudo bem — pediu. — Para de fingir
que não dói.
Não sabia explicar o sentimento que me tomou naquele
momento, mas senti toda a força que usava cair como um manto
sobre mim e me vi ainda mais vulnerável diante dos olhares delas, o
que me fez, de repente, derramar lágrimas grossas pelo meu rosto.
Nem Aurora ou Maeve disse alguma coisa.
A primeira se aproximou e me abraçou apertado contra o seu
peito. Eu a agarrei como se fosse a única força que eu tivesse e
chorei em seus braços, sentindo meus ombros balançarem e meu
peito se libertar cada vez mais. Maeve também se aproximou e,
mesmo relutante, colocou a mão nas minhas costas e começou a
alisá-las em forma de conforto.
Elas também me abandonariam se eu falasse a verdade?
— Ei, Caitlin... — Senti a preocupação de Maeve pela sua voz.
— Está nos deixando assustadas.
Eu nunca chorava.
Mas naquele momento, desabei.
Pelos pais que nunca tive.
Pelo meu irmão estar se afundando nas drogas.
Pela minha vida repleta de mentiras.
E por fim, pela única pessoa que me viu através delas e que
deixei literalmente entrar no meu coração.
Trevor tinha sido o único que descobriu quem eu era de
verdade e, como sempre, eu o estava perdendo. Quando isso
acabaria? Quando eu pararia de fingir quem era e pararia de perder
as pessoas por isso?
— S-sou... a vilã da história do Trevor — murmurei as
palavras, ainda abraçando o corpo de Aurora. — Ele me odeia
agora.
— Do que está falando? — Maeve questionou. — Não me diga
que ele está bravo com você por culpa do seu irmão. Tudo bem que
Melvin foi mesmo um idiota, mas colocar a culpa em você é demais.
Eu mesmo irei castrar o seu irmão se não for se desculpar de
joelhos para Christopher e, de preferência, na frente de todo mundo.
Em outro momento, eu teria dado risada porque sabia que
Maeve estava decidida a fazer Melvin se desculpar dessa forma, e
eu até concordava, mas não era isso que me preocupava agora.
Em meio a soluços e lágrimas, comecei a contar tudo para
elas, desde a minha criação por Allana e Angus Gage até chegar na
parte em que Trevor dizia aquelas palavras duras para mim.
Levou mais tempo do que eu imaginava e acabei me afastando
de Aurora durante os minutos em que contava sobre minha vida.
Quando terminei, esperei pelo julgamento e até mesmo pela raiva
por ter mentido durante todos aqueles anos de amizade, mas tudo o
que saiu da boca de Maeve foi:
— Os seus pais são uns merdas!
— Como eles conseguiram manter vocês mortos para quem os
conhecia na época? — Aurora questionou, cheia de dúvidas. — Eu
não posso acreditar que pessoas são capazes de fazer isso com os
próprios filhos por algo tão fútil!
— Nós fomos registrados com o sobrenome da nossa avó
materna já morta e, como fomos expulsos pela noite..., foi fácil para
eles simular a perda dos dois filhos no lago perto da nossa antiga
casa — expliquei, enxugando as minhas lágrimas.
Pelo menos agora eu me sentia um pouco melhor, mas não
chegava nem a 1%.
— Por que não nos contou isso? — Maeve questionou.
— Acho que isso nem é importante, Maeve... — Aurora
respondeu por mim. — Não quando os pais de Caitlin e Melvin estão
envolvidos no acidente que a família de Trevor sofreu.
— Sua mãe foi uma filha da puta! — Maeve xingou.
— Ela sempre protegeu as merdas do meu pai. Não fiquei
surpresa com isso, mas sim com a vida conectando nossos
passados dessa forma. — Meus olhos marejaram novamente. —
Sei que foi errado esconder tudo dele, mas eu sabia que isso
acabaria acontecendo... Sabia que ele acabaria me deixando.
— Talvez Trevor só precise de um tempo. — Aurora
murmurou. — Afinal, é um assunto delicado.
— Exatamente... Logo as coisas voltam a ser como antes. —
Maeve concordou. — Ele gosta de você, né? É meio óbvio.
Sua pergunta fez com que eu voltasse a chorar.
— Ei...! — Aurora voltou a me abraçar.
— Eu acho que... me apaixonei sozinha — admiti, entre
soluços. — Por que isso tem que estar acontecendo?!
— Se tem uma coisa que eu tenho certeza, é de que você não
se apaixonou sozinha, Caitlin. — Maeve garantiu. — Trevor olha
para você com muito carinho para alguém que não está apaixonado.
— Mesmo assim..., ele pode estar apaixonado pela minha
versão órfã, e não pela filha das pessoas que destruíram sua vida.
Elas se entreolharam e não falaram nada quanto àquilo porque
sabiam que eu poderia estar certa.
Aquilo acabaria comigo.
Pouco a pouco.
Quão fundo o meu poço era?
TREVOR LANCASTER
Eu entrei na aula de direito penal que tinha todas as quintas-
feiras e me sentei no lugar de costume, bem ao lado de Amanda e
Jasper.
— Ei, Trevor! — Meu colega me cumprimentou. — Achei que
teria que anotar os conteúdos da matéria para você hoje de novo.
— Melhorou do mal-estar, Trevor? — Amanda, a minha colega
e namorada de Jasper, questionou.
Assenti.
Havia dito para eles que estava me sentindo ruim para ir à aula
naqueles últimos dias, e o meu colega fez questão de anotar tudo o
que eu precisaria para estudar depois. Estava grato, mas não queria
dar detalhes de que meu o mal-estar se chamava Caitlin Howard.
Só de pensar nela, sentia todo o meu corpo ferver.
Eu havia passado todos aqueles dias me sentindo um idiota
enquanto agarrava o meu travesseiro e fazia até mesmo o
impossível para não chorar de raiva e mágoa por ter caído em suas
mentiras.
Ela disse que fingia ser alguém que não era para as pessoas
permanecerem na sua vida, por que eu achei que comigo seria
diferente? Mas era claro que nunca pensei que a mentira que
esconderia de mim fosse exatamente a pior.
Eu não menti quando disse todas aquelas coisas para ela, era
verdade que encará-la me deixava enfurecido e com vergonha de
mim mesmo, mas a pior parte de tudo isso era também sentir falta
da versão falsa que Caitlin apresentou para mim durante os últimos
dois meses.
Isso me deixava furioso a ponto de enlouquecer.
Dois dias haviam se passado desde que eu descobri toda
aquela merda e minhas emoções estavam uma completa bagunça.
Não conseguia dormir porque toda vez que fechava os meus olhos,
me lembrava do rosto dela magoado, me encarando.
Christopher tentava falar comigo, mas eu realmente não queria
saber dos seus conselhos pacíficos e sugestões acolhedoras. Ele
acabaria achando uma forma de defender Caitlin, mesmo depois de
tudo o que eu disse assim que o encontrei no dormitório na terça-
feira.
“Ela gosta de você e omitiu isso porque sabia que você reagiria
assim.”
Foi uma das coisas que ele tentou inserir na minha cabeça nos
últimos dias.
“Deveria conversar com Caitlin ou vai ficar maluco! Nós dois
sabemos que você gosta de verdade dela.”
Ele disse isso naquela manhã, enquanto nós estávamos nos
arrumando para as nossas aulas. Eu mais uma vez o ignorei e
peguei a minha mochila, saindo primeiro do que ele de nosso
dormitório.
— O que aconteceu com a sua namorada no último jogo,
Trevor? — Jasper questionou. — Ela foi até embora mais cedo.
Onde está esse professor que não chega logo?
Não queria falar sobre Caitlin.
— Ela não é mais minha namorada.
A minha resposta surpreendeu os dois curiosos ao meu lado.
— Como assim? — Amanda perguntou. — Jasper disse que
vocês pareciam apaixonados.
— Simplesmente acabou, da mesma forma como iniciou —
resumi para aqueles dois, não querendo dar nenhum detalhe. —
Então, não sei sobre jogo nenhum porque, como vocês mesmo
sabem, eu não gosto de esportes.
— Parece que você voltou a ser o antissocial de antes. —
Jasper murmurou ao meu lado, me encarando de uma forma
julgadora.
— Eu nunca mudei. — Felizmente, o professor entrou na sala
bem no momento em que queria encerrar aquele assunto. — Acho
melhor prestarmos atenção na aula.
O assunto do momento dos telespectadores dos jogos
universitários era o desempenho de Caitlin e durante o meu almoço,
acabei descobrindo, por me sentar ao lado de um grupinho deles,
que ela havia sido colocada no banco no primeiro set do jogo por
causa do seu mau desempenho.
Eu tentei ignorar aquela informação que viajava em minha
cabeça enquanto caminhava até o prédio onde trabalhava de tarde,
mas não consegui fazer algo tão simples.
Eles disseram que ela também havia ido embora do jogo antes
do time e parecia estar bem abatida. Claro que eu sabia o motivo. O
que me deixava mais irritado era me sentir um pouco mal por ser a
causa das suas falhas no jogo. Provavelmente, Caitlin não havia
conseguido se concentrar o suficiente por causa da nossa briga.
Inferno de garota!
Por que ela não saía dos meus pensamentos? Eu precisava
seguir em frente, deixar todo aquele passado para trás de uma vez
por todas, inclusive Caitlin Howard.
Respirei fundo e tirei a jaqueta jeans que usava, o sol estava
quente naquele dia de primavera e minha roupa estava
esquentando quase tanto como a raiva que sentia borbulhar dentro
de mim.
Que inferno!
Por que eu não podia ter me apaixonado por uma garota
menos complicada?
A confirmação de estar mesmo apaixonado por Caitlin me
parou no meio do caminho e eu senti o meu coração doer ao
processar bem tal sentimento em minha cabeça. Aquilo só podia ser
uma brincadeira ridícula do destino.
Eu me apaixonei por alguém que não era real.
Alguém que mentia e omitia sobre algo sério.
Alguém que não se importou comigo ao fazer exatamente
essas duas coisas.
— Trevor!
Pensei ter ouvido errado. Ou pior, pensei que estava
começando a alucinar com a voz de Caitlin em minha cabeça, mas
senti um puxão no meu pulso que me fez acordar para o mundo real
e dar de cara com a loira à minha frente.
Ela parecia estar pior do que eu. Nem a maquiagem no seu
rosto conseguia disfarçar as olheiras que tinha ao redor dos seus
olhos e muito menos o seu rosto inchado.
Caitlin havia chorado?
Desencostei-me dela rapidamente.
— O que você quer? Não temos nada para conversar.
Achei que tinha sido claro sobre isso.
Sem que eu permitisse ou esperasse, Caitlin pegou na minha
mão e me puxou para o beco estreito e sem saída entre o prédio de
Arquitetura e Arte e o de Administração e Engenharia.
— Caitlin...!
— Você não vai ao menos me dar uma chance para me
explicar? — perguntou, interrompendo qualquer coisa que eu fosse
falar. — Não acha que eu mereço isso?
Eu quis rir e chorar ao mesmo tempo.
— Será que merece?
— Eu não sou eles, Trevor! — rebateu, um pouco mais firme
em suas palavras do que no dia em que descobri sobre tudo. —
Eles não são mais meus pais! Eles estão mortos para mim.
— Não diga mais mentiras! Eles estão vivos!
— Não para mim! — revidou, aproximando o seu rosto do meu.
Evitei me perder naquele olhar lacrimejante e desviei meus olhos
para o fim do beco. — Eu disse a verdade sobre eles terem
expulsado meu irmão de casa e eu ter ido junto!
— Acha que isso pode me fazer sentir menos raiva de você?
Ouvi um soluço saindo da sua garganta e a olhei no mesmo
momento. Caitlin derramou as lágrimas que inundavam os seus
olhos há alguns segundos, ainda me olhando como se pudesse
resolver aquilo.
— Me desculpa..., por favor! — pediu, soluçando mais uma
vez. — Eu am...
— Não. — Eu a interrompi, desviando o meu olhar e fechando
minhas próprias mãos em punhos ao sentir vontade de enxugar
cada lágrima que descia pelo seu rosto. — Não diga bobagens —
pedi, sentindo um caroço se formar na minha garganta. — Vamos
terminar por aqui, ok?
Ela aspirou o ar profundamente, fungando logo em seguida.
Ainda senti seu olhar em mim quando me questionou:
— Então…, até quando você vai viver preso nisso? Até quando
viverá com tanta raiva assim?
Eu a olhei por um segundo, a tempo de gravar cada detalhe
que serviria para não me fazer dormir naquela noite.
Os seus lábios trêmulos.
A sua feição.
O pior semblante em seu rosto.
Ela estava chorando pela primeira vez na minha frente e eu
não podia fazer nada porque era o causador. E eu não podia ficar
mais ali, suportando aquilo na sua frente.
Segurei a jaqueta em minha mão com mais força do que o
necessário e caminhei rapidamente até a saída.
Um filme dos nossos momentos juntos passou pela minha
mente.
Todos os sorrisos.
Todos os abraços.
Todos os beijos.
Todas as promessas.
Todas as nossas transas.
Absolutamente tudo pelo que passamos juntos naqueles
últimos meses.
Meu coração doía pela mentira, pelo amor e pelo meu passado
que eu nunca conseguiria enterrar.
Eu amo você, Caitlin Howard.
Mas eu também sinto raiva de você.
CAITLIN HOWARD
Uma semana depois de procurar Trevor pela segunda vez, eu
me sentia pronta para seguir em frente com toda a força da tristeza
e da raiva que sentia.
Durante os treinos, treinava com tanta raiva que até o nosso
técnico estava surpreso com os meus lances. E durante o último
jogo, havia feito com que todos os telespectadores esquecessem do
meu fiasco da semana passada e garanti o meu destaque, fazendo
o total de vinte e cinco pontos durante todos os sets. Esse era o
meu novo recorde. Passei a fazer o que odiava: estudar. Apenas
para não ficar com a mente vaga e acabar pensando demais em
Trevor. Não que isso não acontecesse com frequência, já que as
noites ainda eram difíceis de serem dormidas tranquilamente.
Ainda me sentia muito culpada e, mesmo durante aqueles
últimos dias, tentei achar uma forma que o fizesse me perdoar, até
que percebi na noite anterior que não existia tal coisa.
Eu não podia trazer o seu pai de volta.
Eu não podia colocar o meu pai na cadeia.
Tudo o que eu podia fazer era me justificar, mas o que
adiantaria? Ainda seria a mentirosa egoísta que só pensou na sua
própria felicidade ao ocultar a ligação do nosso passado.
— Por que estamos aqui mesmo? — Maeve questionou,
olhando para as estantes da biblioteca como se pudesse ter uma
alergia. — Quase três anos estudando aqui e nunca entrei nesse
lugar.
Sorri, segurando o seu braço.
— Preciso pegar um livro para uma disciplina minha —
expliquei novamente. — Foi você quem disse que me
acompanharia.
— É claro! Não quero correr o risco de perder você de vista
para acabar se humilhando na frente do nerd arrogante mais uma
vez.
Trevor havia voltado a ser o nerd arrogante para Maeve e
Melvin. Meu irmão pediu muitas desculpas por ter sido o motivo
dessa confusão toda ao perder a foto que carregava naquele dia.
Ele não era o culpado, mas me senti um pouco mais
preocupada com ele ao saber que andava com aquela fotografia por
aí. Entre mim e o meu irmão, sempre achei que eu seria a última a
superar o que meus pais fizeram, mas Melvin conseguiu enganar
direitinho ao fingir que estava tudo bem quando não estava.
— Temos uma festa hoje. — Maeve anunciou com a voz baixa.
— Vai ser o seu retorno para a pista de dança e talvez até para a
cama de um atleta, hum?
Óbvio que a última parte ela disse brincando, mas senti um
gosto amargo na boca só de me imaginar ficando com outro cara.
Nenhum era como Trevor.
Ninguém conseguiria me fazer rir facilmente, me abrir de forma
espontânea ou até mesmo me fazer estudar porque se preocupava
com o meu futuro. Nenhum conseguiria me tocar como ele me
tocava. Nem mesmo me beijar.
Trevor era o melhor quando se tratava de me provocar
sensações, desde os sorrisos grandes ou tímidos, que me
causavam um frio na barriga toda vez que suas covinhas eram
expostas, até o seu olhar em mim, que sempre teve a proeza de
enxergar além do que eu mostrava.
— Caitlin? — Maeve chamou. — Onde você está com a
cabeça?
Eu a olhei e nem precisei dar uma resposta porque achava que
meu semblante já dizia muita coisa. Minha amiga suspirou.
— Está difícil se manter saudável no meio dessa relação,
sabia? As minhas duas amigas com problema de relacionamentos
que nem se colocassem em uma balança, eu saberia dizer qual é a
pior.
Ela estava se referindo à Aurora e ao Melvin.
A nossa amiga vinha tentando se manter afastada do meu
irmão como eu havia sugerido e, depois do que ele havia feito com
Christopher, Aurora só conseguiu dizer o quanto estava
decepcionada com suas atitudes.
Claro que isso deixou meu irmão desnorteado e, pelo que
vinha sabendo de Barry e pelas minhas próprias observações
também, Melvin estava se esforçando para conseguir o perdão de
Aurora novamente, mas, ainda assim, eu estava preocupada com
ele. Tinha medo de que a qualquer momento, sem que
percebêssemos, usasse drogas e caísse em um círculo vicioso.
— Vamos apenas procurar o meu livro e voltar para o
dormitório, certo? Não precisamos ficar medindo quem está pior do
que quem.
Nós entramos no corredor de livros de História e eu comecei a
procurar pelo que precisava.
— Você não acharia tudo na internet? — Maeve questionou. —
Parece ser mais confortável do que procurar em um livro.
— Na internet a gente acha fácil demais a resposta. Percebi
nesses últimos dias que prefiro ficar focada no conteúdo do que
buscar por algo rápido.
— E eu devo fingir acreditar que resolveu se tornar uma
estudante exemplar do dia para a noite?
Dei de ombros, finalmente achando o livro na estante. Eu o
peguei na prateleira e me virei para Maeve.
— Pelo menos, estudar está me distraindo.
Não estou pensando nele.
Era isso que eu queria dizer e achava que Maeve tinha
entendido.
Ela soltou um suspiro.
— Não vejo a hora de você superar esse garoto.
Achava que isso nunca aconteceria, mas nem tive tempo de
falar para minha amiga porque Christopher entrou no corredor bem
na hora. Ele parecia saber que estávamos ali, pois não parecia
nenhum pouco surpreso ao nos ver.
A vontade de perguntar como estava Trevor veio com força,
mas eu me controlei.
— Oi, Christopher — cumprimentei.
A minha amiga arregalou os olhos em surpresa e se virou para
o meu ex-cunhado.
Ele levantou as suas mãos e sinalizou:
— Oi.
Algumas palavras eu havia aprendido no nosso último fim de
semana juntos, mas não uma quantidade suficiente para conseguir
me comunicar com ele facilmente.
Christopher olhou para Maeve e movimentou as suas mãos.
Como não consegui entender do que se tratava, esperei que ela me
falasse.
— Claro. — Maeve concordou com algo e me olhou. — Ele
quer o número do seu celular para poder falar melhor com você.
— O meu número? — Olhei para Christopher, que assentiu.
— Ele não conseguiu pegar com Trevor. — Maeve disse,
traduzindo o que ele sinalizava. — E vocês esqueceram de passar o
número um para o outro. — Minha amiga olhou dele para mim. — O
que é uma burrice, conseguiria se comunicar melhor com o seu
cunhado.
Christopher fez uma cara de tédio que quase me fez rir e me
deu o seu telefone.
Eu digitei o meu número ali, um pouco curiosa e nervosa pelo
que ele falaria por mensagem. Será que estava tão furioso comigo
que nem o seu irmão? Não. Ou, provavelmente, não conseguiria
olhar para a minha cara também.
Chris fez um sinal que precisava ir assim que salvou o meu
número e se afastou de nós.
— Ele também disse que envia uma mensagem para você
mais tarde. — Maeve disse. — O que será que ele quer?
Christopher não me parece ser idiota como o irmão.
— Não sei — murmurei, agarrando mais forte o meu livro. —
Vamos para o balcão registrar a retirada desse livro.
Parecia que não adiantava o quanto eu tentasse fugir daquele
sofrimento, ele sempre acabava voltando.
Não sabia o que Christopher queria, mas esperava que ele não
fizesse eu me sentir pior do que já estava.
TREVOR LANCASTER
Fazia mais de uma semana que o teto do dormitório que
dividia com o meu irmão era mais interessante do que qualquer
outra coisa na minha vida. Eu não conseguia mais me concentrar
nos videogames e nem no meu anime favorito.
Sentia-me cada vez mais ansioso conforme o tempo passava.
Não queria admitir para mim mesmo que estava sofrendo com
a decisão que tomei, mas talvez fosse melhor afirmar isso de uma
vez, certo?
Eu vi de canto de olho e de longe o meu irmão se revirar na
cama ao lado, parecendo navegar nas redes sociais. Ele estava
fazendo um esforço para ser compreensível comigo, mas o meu
mau humor vinha irritando-o ultimamente.
Estava mesmo sendo chato. Nem eu conseguia me aguentar
nos últimos dias.
Fazia mais de uma semana que havia descoberto a verdade
sobre Caitlin e nos primeiros dias, tudo o que eu sentia era raiva por
ela ter escondido aquilo de mim e por ser filha daqueles idiotas,
mas, ainda no meio de toda aquela fúria, ela estava nos meus
pensamentos.
E agora..., que eu só me sentia magoado por toda essa
história, ela ainda permanecia na minha cabeça.
Eu... sentia falta dela.
Estava a um passo de enlouquecer com tudo aquilo.
Levantei-me da cama em um pulo e saí daquele quarto sem
falar uma palavra para o meu irmão. Precisava respirar um pouco de
ar puro e fazer uma ligação. Eu peguei o meu telefone e procurei o
número da minha mãe nos contatos. Assim que achei, coloquei para
chamar.
Ela atendeu no segundo toque.
— Você me ligando quase perto da meia-noite? — questionou,
cheia de dúvidas e com um tom de voz preocupado. — O que
aconteceu? Você e seu irmão estão bem?
Havia uma árvore na frente do prédio dos dormitórios e foi nela
onde me escorei, me sentando para ter uma conversa com a minha
mãe.
— Sim, mãe.
— Caitlin está bem?
Suspirei e não precisou que eu falasse uma palavra para que
ela entendesse.
— O que aconteceu?
— Eu terminei com a Caitlin — revelei.
— Posso saber o motivo?
— Eu sei sobre tudo, mãe. Desde a noite em que Allana foi na
nossa casa e fez a senhora aceitar o dinheiro dela.
Consegui sentir a surpresa da minha mãe do outro lado da
linha. Como imaginava, ela nunca havia suspeitado que eu sabia de
toda a história por detrás da nossa mudança de estado.
— Passei os últimos cinco anos pesquisando sobre aquela
família, causando dor no meu irmão por não deixar tudo isso quieto
e não viver a minha vida — contei mais sobre o que ela não fazia
ideia que acontecia. — E quando finalmente caí em mim, de que
não havia nada que eu pudesse fazer, descobri que a minha
namorada é filha deles.
— O quê?! Mas você disse que Caitlin era órfã...
— Eu achava que era, mas ela mentiu para todos nós sobre
isso. E sabe o que é pior? Eu contei tudo a ela, disse o nome
daqueles desgraçados e ela nem ao menos mudou a sua
expressão.
— Filho... Desculpa, é muita coisa para processar —
confessou. — Não fazia ideia de que sabia sobre Allana e Angus,
principalmente que ficou anos preso a isso, deixando de viver sua
vida por uma raiva que não te levaria a lugar algum. Sinto muito,
filho.
— Não é a sua culpa.
— Eu deveria ter prestado mais atenção.
— Mãe...
— Até que parte ela mentiu para nós? — me interrompeu. —
Porque aqueles dois continuam no Alasca, enquanto a filha e o filho
estão aqui.
— Segundo Caitlin, tudo aquilo que contou sobre os pais
expulsarem eles de casa era verdade.
— Não faça isso de novo! — mandou, me deixando confuso.
— O quê?
— Viver preso nessa raiva e deixar escapar aquela garota.
— Mãe...
— Eu sei que ela mentiu, querido — interrompeu de novo. —
Sei que deve se sentir traído por ter sido sobre algo tão sensível,
mas me diga... Ao menos sabe por que ela fez isso?
— Caitlin não queria me ver dessa forma.
— Ela não queria ser uma janela para o seu passado.
Consegue imaginar como ela se sente agora?
— Nenhum de nós está bem.
— Você disse que, antes de descobrir sobre a verdade, estava
disposto a deixar isso para trás... Por que não segue o seu plano?
Eu deixei isso há muito tempo, querido — aconselhou com aquela
voz doce de sempre dela. — O seu pai odiaria nos ver vivendo
preso em rancor, raiva e ódio. Lembra o que ele sempre dizia? O
que não é julgado aqui na Terra, é sempre julgado lá em cima. Não
existe apenas a lei do homem, querido, existe também a lei divina e
essas duas pessoas vão ter o que merecem por tudo o que fizeram
com a gente e com os próprios filhos.
— Por que... o amor tem que ser tão complicado?
Ouvi a sua risadinha ao fundo.
— Nenhum sentimento é complicado, somos nós que
complicamos tudo.
Eu fechei os meus olhos, deitando minha cabeça na árvore em
que estava encostado.
— Você a ama, querido... — Minha mãe continuou a falar. —
Lembre-se que ela não é uma janela para o seu passado, e sim
para o seu futuro. Eu tive a oportunidade de te ver feliz naquele fim
de semana, não estrague a sua própria felicidade.
— Parece que eu fui o único que fiquei preso àquele acidente.
— Todo dia eu penso naquela mulher, Trevor — admitiu. — E
todo dia sinto raiva. Tem vezes que até choro porque sei que se o
marido dela não tivesse sido irresponsável, as coisas seriam
diferentes.
Os meus olhos marejaram no mesmo momento.
— Sinto falta do seu pai todos os dias — disse, me fazendo
derramar lágrimas. — Mas nenhum desses sentimentos vai trazê-lo
de volta.
— Eu sei. — Funguei.
— Queria estar aí para poder te abraçar, meu amor, mas tudo
o que posso fazer agora é pedir que vá conversar direito com a sua
garota. Pelo que me contou, Caitlin continua sendo órfã porque
aqueles dois desistiram de ser pais dela há muito tempo.
— Acho que eu tomei uma decisão, mãe — murmurei,
limpando meu rosto com a mão livre.
— Espero que me diga daqui alguns dias.
Eu concordei e me despedi dela, sentindo um pouco mais de
clareza nos meus pensamentos que seguiam por um caminho
completamente louco nos últimos dias.
Olhei para o céu azul-escuro estrelado e inspirei o ar gelado da
noite, decidido mesmo a falar com Caitlin no dia seguinte.
Eu poderia ir naquela noite mesmo, mas não queria tomar
nenhuma ação impulsiva.
Encarei o prédio à minha frente.
Pararia de pensar um pouco apenas em como eu me sentia
em relação àquele passado e pensaria um pouco em como Caitlin
estava. Allana e Angus não deixavam de ser os mesmos filhos da
puta. Eles haviam expulsado Caitlin e Melvin de casa por conta da
imagem, da mesma forma que abafaram o acidente com meu pai.
Não poderia mentir. Ter aquela verdade escondida de mim
doeu muito e me chateou tanto quanto me deixou bravo, mas estava
experimentando algo pior com a ausência de Caitlin na minha vida.
Caminhei para dentro do prédio e fui para o meu dormitório.
Até quando vai ficar preso nisso?
A pergunta que ela me fez naquele dia veio junto à sua voz
embargada e seu rosto repleto de lágrimas.
Eu não queria mais ficar preso nisso.
A minha mãe estava certa.
— Christopher, você...
Parei de falar assim que vi os olhos do meu irmão arregalados
em direção ao celular. Ele parecia muito assustado, tanto que nem
notou a minha presença no seu quarto.
— O que aconteceu? — Fiquei ao seu lado e vi que ele estava
assistindo uma live do Instagram. Antes que eu pudesse xingá-lo
por me deixar preocupado, notei a movimentação de ambulância e
polícia na transmissão ao vivo. — Onde é isso?
Ele não me respondeu porque as suas mãos seguravam o seu
celular, mas nem precisei pegar o aparelho dele porque a voz
feminina de quem estava gravando esclareceu o que estava
acontecendo.
— Melvin Howard sofreu uma overdose e foi encontrado
desacordado no seu quarto. — O meu estômago inteiro se revirou.
— Acho que ele saiu com vida daqui porque não teve o corpo
tapado, mas não sei...
A transmissão foi cortada antes que ela pudesse completar o
que diria.
— Onde... Onde estava acontecendo essa festa? — perguntei
para o meu irmão, saltando do seu lado e indo pegar os meus tênis.
— Era na república dos caras do futebol. — Chris sinalizou. —
Aonde você vai?
— Aonde mais eu iria? Preciso ver como Caitlin está! — falei o
óbvio. — Será que ele foi levado para o hospital mais próximo?
O meu irmão deu de ombros. Ele estava em completo choque
também.
Droga, Melvin! Você disse que ia parar com essas merdas.
Eu amarrei bem os cadarços dos meus tênis e agarrei o meu
celular.
— Mando notícias.
— Não brigue com a Caitlin, ok? — pediu.
— Eu não sou tão idiota assim, Chris.
Ele apenas assentiu e me fez um sinal para ir logo com as
mãos.
Não foi difícil saber para onde haviam levado Melvin. Cinco
minutos depois daquela live, a localização dele já estava se
espalhando pelos alunos nas redes sociais.
Alguns diziam que ele havia morrido na ambulância enquanto
outros diziam que ele havia chegado com vida no hospital.
Tentei me manter calmo com todas aquelas suposições até
chegar na entrada da emergência, mas, assim que avistei Caitlin
chorando nos braços de Aurora, senti toda a calmaria ir embora e
dar lugar ao desespero.
Ele não podia ter... morrido, né?
Olhei ao redor daquele grande ambiente e vi que Maeve
estava conversando com a recepcionista, ela parecia mais calma do
que as outras duas e foi por isso que me aproximei dela primeiro.
— Maeve — chamei, atraindo a sua atenção. — Como o
Melvin está?
Elas estavam na festa.
Dava para notar pela roupa justa que usava e a maquiagem
cheia de glitter na cara.
— O que está fazendo aqui?! — perguntou com desgosto. —
Se veio aqui para atazanar minha amiga...
— Acha que eu sou um idiota?
— Acho! — disse, atrevida do jeito que era. — Arrume esses
óculos no rosto e vá para o seu dormitório, nerd arrogante.
Eu respirei fundo para não mandá-la à merda.
Aquela garota me irritava a níveis extremos.
— Como ele está?
— Os médicos iniciaram a desintoxicação — finalmente disse.
— Mas eles estão sem esperanças, eu não acho que ele vai
sobreviver.
— Acha?
— Eu não sou médica, Trevor! — rebateu. — Agora preciso ir
cuidar das minhas amigas.
Ela me deu as costas e foi ao encontro de Caitlin e Aurora.
— O paciente iniciou a desintoxicação já na ambulância. — A
recepciona falou, chamando a minha atenção. — Não podemos
afirmar nada quanto à situação dele e nem dar falsas esperanças, o
que podemos dizer é para se agarrem à fé de vocês e pedirem para
que aconteça um milagre. Casos de overdose têm uma
porcentagem pequena de sobrevivência.
— Obrigado.
Eu caminhei com cuidado em direção às garotas e, parecendo
sentir a minha presença, Caitlin se virou para mim, mostrando o seu
rosto molhado de lágrimas, o que me causou um calafrio horrível por
todo meu corpo.
Nunca mais queria vê-la chorar.
Era uma das cenas mais tristes e dolorosas que já havia
presenciado.
— Caitlin... — Aproximei-me dela.
— O que faz aqui? — perguntou, limpando o seu rosto.
— Eu soube do ocorrido com o Melvin e vim prestar o meu
apoio — expliquei, deixando de lado o que estava acontecendo
entre nós ultimamente. Aquilo não era importante quando o seu
irmão estava em uma maca de hospital sendo cuidado. — Eu sinto
muito. Pensei que ele iria parar com as drogas e...
— É melhor você ir embora.
Eu arregalei os meus olhos.
— O quê?
Ela apontou para a porta da emergência.
— Não quero a sua pena! — explicou, voltando a ficar com os
olhos cheios de água. — Odeio que sintam pena de mim.
— Eu não estou aqui por pena, Caitlin.
— Não? Então, por que ignorou toda a raiva que sente por
mim para vir até aqui? Se isso não é pena, o que é, afinal?
— Nós podemos conversar sobre isso em outro momento?
— Apenas dê o fora daqui, Trevor — mandou. — Olhar para
você agora só faz tudo ser mil vezes pior.
Foi como sentir na pele aquelas palavras arderem. Ela havia
devolvido de uma forma que deixava tão explícito o quanto estava
magoada, que me senti um merda pela primeira vez na vida.
Caitlin se virou de costas e voltou a abraçar Aurora.
Maeve me olhou e indicou a porta da saída.
— Vaza.
Eu faria aquilo porque sabia que Caitlin estava exaltada com
todos os últimos acontecimentos, mas não consegui sair do hospital
quando passei pela porta da emergência. Busquei o primeiro banco
na parte externa e resolvi esperar.
Minha vida está no fundo do poço
Eu estou caminhando em um túnel escuro
Dias cruéis e terríveis
Que eu enfrento sozinho
HELLEVATOR – STRAY KIDS
CAITLIN HOWARD
Eu havia encontrado o fundo do poço.
E ele era pior do que eu imaginava.
Foi ao ver Aurora descendo aquelas escadas, desesperada,
gritando e chorando, que eu senti o frio me abraçar e o chão
embaixo de mim se abrir, fazendo o meu corpo despencar.
Quando eu ouvi Melvin e overdose na mesma frase, subi
aquelas as escadas com a única força que achei dentro de mim. E
foi quando eu o vi grogue e completamente pálido que senti a
escuridão me abraçar junto ao impacto da minha queda.
Aquele era o meu fundo do poço e agora entendia por que não
o havia achado uma semana antes.
Não sabia dizer quem tinha ligado para o hospital porque as
minhas mãos ficaram tão trêmulas que eu derrubei meu telefone nos
meus pés. Senti-me tão inútil por não conseguir fazer nem uma
ligação para conseguir salvar a vida do meu irmão... Quando a
ambulância chegou, Aurora, Maeve e eu fomos com eles, enquanto
Barry ficou responsável em dar o depoimento para a polícia.
Provavelmente os encheriam de problemas por causa da faculdade
e do time de futebol, mas, no momento, aquilo era o menor dos
problemas.
Naquele instante, abraçada à Aurora, tudo o que eu pensava
era no meu irmão.
Ele havia dito que iria parar. Por que não parou? Senti-me uma
idiota por não perceber aquilo. Estava tão presa nos meus
problemas com Trevor que ignorei completamente qualquer sinal
que Melvin pudesse ter dado.
Se ele morresse..., eu seria a culpada.
— Eu achei uma coisa no chão do quarto dele. — Maeve
disse, chamando a nossa atenção. — Aqui tem o seu nome, Caitlin.
Olhei para o papel dobrado que ela segurava.
— Sabe o que é? — perguntei, enxugando as minhas
lágrimas.
— Parece uma carta.
Eu peguei o papel da sua mão e o abri.
“Oi, Cat... As coisas têm sido difíceis para mim.
Cometer aquela merda com Christopher fez com que Aurora
me enxergasse com outro olhar. Acho que ferrei com tudo.
E eu menti.
Por favor, não fique brava comigo.
A verdade é que não há um dia em que não consiga ficar sem
cocaína. Ultimamente, tem sido ela que me faz sentir algo perto do
que eu chamo de felicidade.
Quando estou sobre os efeitos, sinto o meu coração querer
explodir e pensar nos nossos pais ou na minha situação com a
minha namorada não me traz tristeza.
Eu me sinto mesmo bem.
Ou sentia...
Tudo está muito difícil, Cat.
Eu não sei mais quem eu sou.
Quebrei o coração da única garota que já me amou.
Não fui um bom filho.
E muito menos um bom irmão.
Isso tem estado na minha cabeça nos últimos dias, como um
peso que me impede até de aproveitar os efeitos das drogas.
Lembra que eu disse que estava cansado? Eu meio que achei
uma solução para descansar.
Estou escrevendo essa carta sóbrio e tenho cocaína aqui o
suficiente para alguns dias, mas decidi que irei injetar tudo agora.
Não sei se isso irá me matar ou fazer você ficar mais brava
comigo. Ou talvez os dois. Mas eu preciso entender se ainda sou
necessário nesse lugar.
Então, se eu fechar os meus olhos e dormir para sempre,
quero dizer que espero que consiga o perdão de Trevor.
Não esqueça que você é uma Howard, herdamos esse
sobrenome da nossa avó porque ela era uma mulher forte,
completamente diferente da nossa mãe. E como neta dela, precisa
persistir no homem que ama, ok? Não seja uma fracassada como
eu.
Espero que ganhe a temporada que sempre sonhou em
ganhar e chame a atenção de um olheiro. Preciso me orgulhar de
você onde quer que esteja.
Acho que nunca disse isso, né? Mas eu me orgulho de você,
Cat. Mais do que consiga imaginar nessa sua cabecinha.
Espero que encontre alguém decente para Aurora, mas, por
favor..., faça isso depois de alguns anos. Eu não gostaria de vê-la
me superar tão cedo.
E eu espero que seja feliz. Que consiga mesmo ser feliz, não
fingir estar feliz.
Passamos nossa vida toda fingindo e agradando aos outros,
então está na hora de você pensar um pouquinho em si mesma, ok?
Acho que até Maeve está fazendo isso.
Agora..., se eu abrir os meus olhos amanhã, por favor, não me
bata.
Eu irei procurar ajuda e seguir todos esses conselhos que
acabei de dar para você.
E prometo buscar a minha felicidade. Mesmo que não ache
que isso seja possível.
Eu sei qual vai ser o meu fim... e é por isso que não quero que
se sinta culpada, ok?
Eu amo você.
Do seu tonto, idiota e babaca irmão.”
As minhas pernas perderam as forças assim que eu li a última
palavra e achava que teria caído um tombo feio se Maeve e Aurora
não tivessem me segurado. Elas me sentaram no banco de espera
e se colocaram ao meu lado.
— O que tinha na carta?
Eu não consegui responder.
Ele provocou uma overdose de propósito.
Ele tentou se matar.
Eu voltei a chorar e me agarrar à Aurora, que se sentia tão
culpada pelos últimos acontecimentos como eu.
Maeve pegou a carta da minha mão e leu por cima o que
estava escrito, soltando um suspiro logo em seguida.
— Ele vai ficar bem, meninas... — Ela parecia confiante nas
suas palavras. — Melvin tem muito o que incomodar ainda.
Eu esperava que sim.
Mas vê-lo desacordado enquanto os médicos iniciavam a
massagem cardíaca nele me deixou sem esperanças. Sempre vi
casos de overdoses na internet e na televisão, e, na maioria das
vezes, a vítima sempre acabava sem vida.
Eu nunca poderia me perdoar por aquilo. Não saberia se
poderia impedir caso prestasse mais atenção no meu irmão nos
últimos dias, mas ainda poderia ter tentado e talvez descoberto que
ele continuava se drogando.
Os meus sentimentos eram os culpados.
Não deveria ter ficado tão vulnerável quando Trevor acabou
comigo, mas me lamentar por aquilo não adiantaria em nada.
Tudo o que eu podia fazer era rezar para um Deus que há
anos não procurava, para que salvasse o meu irmão daquela
situação irresponsável e doentia na qual ele mesmo havia se
enfiado.
CAITLIN HOWARD
Maeve conseguiu convencer Aurora a ir para o seu dormitório
tomar um banho e comer alguma coisa, mas saiu do hospital
frustrada ao não conseguir fazer o mesmo comigo.
Não queria me separar do meu irmão e, assim que o acesso a
visitas estivesse liberado, gostaria de ser a primeira a vê-lo.
Segundo a enfermeira que trabalhava ali, esse acesso poderia nem
vir naquele dia, mesmo assim, me mantive esperançosa na sala de
espera.
O único problema daquele lugar era que as horas passavam
lentamente, mesmo que seu coração já estivesse mais tranquilo
quanto a pessoa que estava internada naquele local.
Foi por isso que me levantei meia hora depois e caminhei para
fora do hospital para tomar um ar fresco.
Na frente do ponto de saúde havia um belo jardim com árvores
grandes que faziam sombras incríveis, provavelmente pensado para
pessoas que tinham que esperar por muito tempo e não gostavam
de ver as paredes e pisos brancos daquela sala.
Aspirei o ar puro profundamente e quase fechei os meus olhos
para tentar relaxar um pouco, quando uma mão, segurando um
sanduíche apareceu na minha frente.
Eu conseguiria reconhecer aquele braço em qualquer lugar do
mundo.
— Pensei que tinha mandado você para o dormitório —
comentei, não fazendo questão de me virar para Trevor. — Não
estou com fome.
O meu estômago roncou bem na hora.
— Não é o que parece. — Balançou o sanduíche na minha
frente. — É melhor comer antes que estrague.
Meio à contragosto, eu peguei a droga do sanduíche. Estava
mesmo com fome, já que não havia comido nada desde o almoço
do dia anterior.
— A enfermeira me disse que o seu irmão vai ficar bem —
comentou atrás de mim. — Isso é bom, Caitlin.
— Por que está aqui? — Dei uma mordida no sanduíche antes
de me virar para ele. — Você pareceu bem claro sobre não querer
mais me ver na última vez que nos encontramos.
— Sei que disse coisas horríveis e te magoei, mas saber que
você me escondeu toda a sua história...
— Sabe como eu me senti? — Eu o interrompi. — Quer saber
mesmo como eu me senti quando você despejou toda a sua história
em mim e ainda disse o nome da cidade onde nasceu e o nome dos
meus pais? Eu me senti uma merda, Trevor! A porra de uma merda!
Porque diante todos os caras com quem fiquei, acabei me
apaixonando e entregando o meu coração para o único que, se
soubesse tudo sobre mim, passaria a me ver com outros olhos.
Ele arregalou os olhos diante da minha confissão de
sentimentos. Tudo bem, havia escapado antes que eu pudesse
controlar a minha língua.
— Eu passei aquele fim de semana inteiro com a sua família
lutando contra um conflito interno entre contar e não contar —
admiti, me aproximando mais dele. — Tomei a minha decisão antes
de deixar a casa da sua mãe e tudo bem, admito que errei, mas
sabe como me senti nesses últimos dias?
— Caitlin...
— Eu me senti cair, completamente sozinha e desprotegida! —
Alterei minha voz, esquecendo completamente do lugar onde a
gente estava. — Você disse que ficaria sempre comigo, disse que
não me deixaria mais sozinha e, no meu primeiro erro, não quis nem
ouvir a minha explicação.
Senti aquele bolo de emoções das últimas horas rodear o meu
peito enquanto ele permanecia parado, me escutando.
— Eu tentei arrumar desculpas para o seu comportamento
durante toda essa semana, me culpei tanto a ponto de esquecer
tudo ao meu redor, inclusive do meu próprio irmão, e agora... —
Meus olhos marejaram. — Ele quase morreu e eu não estava por
perto para impedi-lo.
Coloquei o braço sobre os meus olhos, tentando evitar que as
lágrimas saíssem, já que a minha mão segurava o sanduíche que
ele havia me entregado.
— Eu sinto muito... — Trevor disse baixinho, segurando o meu
braço e o abaixando para me olhar nos olhos. — Nós dois erramos
feio com toda essa situação.
— Talvez seja um aviso de que não podemos tornar o nosso
relacionamento de verdade — murmurei. — Afinal, você odeia o
meu mundo mais ainda agora, não é?
— Você não faz parte do mundo deles, Caitlin.
— Eu faço e sabe por quê? — Ele negou. — Esse mundo foi o
único que me abraçou quando você me virava as costas.
Coloquei o sanduíche com apenas uma mordida de volta na
sua mão.
— Maeve, a garota má, que é arrogante e prepotente, segurou
a minha mão enquanto eu chorava no ombro dela pela primeira vez
— contei a ele. — Aurora, a menina doce que nunca entendi por que
veio parar com gente como nós, me ajudou a encontrar uma forma
de voltar a sentir todas essas emoções e colocá-las para fora.
Apontei para as minhas quase lágrimas secas no rosto.
— Você disse que me olhar te deixava com raiva — lembrei,
me sentindo uma estúpida pelo meu coração doer com aquela frase.
— É melhor respeitar a sua visão e o seu sistema nervoso e não me
ver mais, não acha? Talvez seja melhor cada um seguir a sua vida.
Eu tenho certeza de que posso sobreviver a um coração part...
Eu mesma me interrompi quando Trevor largou o sanduíche no
chão e segurou o meu rosto com tanta determinação, que consegui
enxergar algo poderoso além do reflexo do sol nos seus óculos.
— Eu sei de tudo o que falei e sim, é verdade — afirmou,
cravando suas palavras em meu peito. — Fico bravo quando te vejo,
mas sem você por perto, fiquei com tanta raiva que quase
enlouqueci!
Uma lágrima solitária desceu pelo seu rosto e eu fechei os
meus olhos, processando o que aquilo significava exatamente. Tudo
estava muito confuso na minha cabeça, não sentia que aquela era a
melhor hora para discutirmos sobre o nosso relacionamento, mas
parecia que havíamos desistido de seguir as regras.
— Me perdoa. — As suas palavras fizeram com que eu abrisse
minhas pálpebras. — Eu quero cumprir as promessas que fiz a
você.
Aproximei minhas mãos das suas e as segurei, mas não tive
coragem de afastá-las do meu rosto. Seu toque era quente e
familiar, eu sentia falta disso.
— Aqui não é o melhor lugar para a gente conversar...
— Eu sei e irei deixar você em paz, só preciso dizer uma coisa
— falou, com seu nariz quase encostando no meu. — Diferente de
você, não consigo sobreviver a um coração partido. Não quando eu
quebrei o seu primeiro.
Aquilo era o que eu pensava que era?
— Do que está falando?
Os seus olhinhos escuros brilharam atrás das lentes.
— Eu amo você, Caitlin Howard — confessou baixinho,
tocando a sua testa com a minha sem desviar seu olhar do meu. —
Então..., quando tudo isso passar, quero que me responda se quer
ou não deixar todas as mentiras no passado e viver uma vida de
verdade comigo.
Trevor tocou a minha bochecha com carinho antes de afastar o
seu toque de mim.
— Irei esperar a resposta pelo tempo que for.
Ele se agachou e pegou o sanduíche de volta, me deixando
completamente sem palavras quando caminhou em direção à saída
do hospital.
TREVOR LANCASTER
Fazia um tempo que eu não malhava, por isso, acordei
naquela manhã de quinta-feira e arrastei o meu irmão para a
academia mais próxima do nosso prédio. Enquanto o assistia andar
na esteira com uma lentidão impressionante, pensei em Caitlin e na
resposta que ela estava me devendo.
Já fazia alguns dias que a havia deixado naquele hospital e
estava esperando que viesse me procurar quando estivesse
confortável para conversar.
Eu sabia que Melvin havia recebido alta quatro dias depois da
overdose e que não foi mais visto naqueles últimos dois dias no
campus. Quis muito mandar uma mensagem para Caitlin e
perguntar como as coisas estavam indo, mas decidi mesmo dar um
tempo para ela.
Naquele dia em que declarei os meus sentimentos, entendi
que muita coisa nela estava quebrada depois do que eu tinha falado
e por conta da overdose do irmão. Por mim, não teria falado sobre
aquilo naquele lugar, mas como iniciamos a discussão, preferi dizer
tudo o que sentia antes que agisse como eu e falasse o que se
arrependesse.
— Já faz quase uma semana, deveria ligar para ela. —
Christopher disse ao meu lado.
— E você deveria correr na esteira.
Ele bufou, revirando os olhos.
— Odeio exercícios e você sabe disso, só venho na academia
porque não gosta de vir sozinho — respondeu com suas mãos. —
Aliás, como espera que eu corra e fale com você ao mesmo tempo?
Forcei uma risada, deixando bem claro que era forçada para
ele.
— Você e suas piadinhas.
— Estou falando sério quanto à Caitlin. Você está sempre
viajando em pensamentos depois que disse para ela que a amava.
Esse era o problema de contar tudo para o irmão. Ele achava
que tinha o direito de se meter em qualquer coisa.
— Vocês vêm para a academia para conversar ou para
malhar? — Uma voz feminina soou atrás de nós e nem precisei me
virar para reconhecer que se tratava da irritante da Elite. — Sorte de
vocês é que a academia não está lotada.
Maeve ligou a esteira ao lado de Chris para começar a
caminhar.
— O que está fazendo aqui? — Eu notei que a pergunta era
idiota assim que saiu da minha boca.
Ela riu, balançando a cabeça para o que eu disse.
— Temos um jogo hoje, sabia? Preciso estar bem preparada.
Então, o jogo da semifinal já iria acontecer? Admitia que
estava tão perdido nos últimos dias que nem me prestei a
acompanhar o calendário para saber quando seria a noite em que
Caitlin voltaria para quadra de vôlei.
Pelo menos eu esperava que voltasse.
— Caitlin vai jogar?
Maeve assentiu.
— Deveria aparecer no jogo hoje. — Christopher falou,
roubando a atenção da garota ao seu lado. — Vai ser em casa.
— Não deveria não! — Ela se intrometeu. — Você só serviria
para desconcertar a minha amiga.
Então, Maeve não sabia que eu a havia perdoado pelas
mentiras?
Chris olhou para a ruiva.
— Ele gosta da Caitlin e ela também gosta dele. — Sinalizou.
— Se eles se acertassem, isso poderia dar forças para ela.
— Acha que minha amiga é influenciável por homem?
— Eu não falei isso! Quis dizer que ela estaria com um ótimo
humor para jogar.
Maeve aumentou a velocidade da esteira e começou a correr,
deixando de responder o meu irmão, que me olhou e revirou os
olhos.
— Ela é mesmo chata.
— O que você disse?! — A ruiva o fuzilou com os olhos.
Mas surpreendentemente aquilo não intimidou o meu irmão
como da última vez que a chamou de malévola.
— Que você corre muito bem na esteira — mentiu na cara
dura, me fazendo segurar a risada porque tinha quase certeza de
que Maeve sabia que era mentira. — Só não sigo você porque estou
conversando e não quero me desequilibrar.
Ela me olhou sobre os ombros de Chris.
— Seu irmão é engraçadinho, Trevor.
— Como está o Melvin? — Resolvi perguntar algo útil em vez
de acompanhar a troca de farpas deles.
— Está internado em uma clínica de reabilitação — respondeu,
ainda correndo na esteira e me deixando surpreso com sua
resposta. — Começou o tratamento ontem.
Aquilo era sério? Nunca imaginei que Melvin trancaria a
faculdade e se internaria por livre e espontânea vontade.
— Caitlin e Aurora conseguiram convencê-lo — completou. —
Barry e eu ajudamos, é claro, mas elas foram muito mais
insistentes.
Aquilo era bom. Significava que ele estava sob cuidados de
profissionais que o ajudariam a ficar o mais próximo de 100%.
— Você ainda consegue ingresso para o jogo de hoje?
Ela me olhou com tédio.
— Para quê?
— Quero ver a Caitlin jogar.
— Você só iria atrapalhar.
— Apenas confie em mim — pedi, odiando o fato de aquela
garota ser tão intrometida. — Não irei atrapalhar ela.
Maeve olhou para Christopher.
— Devo conseguir dois ingressos?
— Apenas um. — Meu irmão respondeu. — Não quero ir ao
jogo.
Ele estava se mantendo cada vez mais isolado depois que
levou aquele soco de Melvin. Infelizmente, as pessoas não eram
nada discretas quando o enxergavam no campus e o encaravam
com pena, o que era mesmo chato para um caralho e o deixava
desconfortável.
— Então, nada feito.
A resposta de Maeve me fez piscar duas vezes, espantado.
— O quê?!
Ela desacelerou um pouco a esteira e pegou sua garrafa de
água, a abrindo e bebendo alguns goles.
— Se Christopher não for, eu não vejo motivos para conseguir
esses ingressos.
Meu irmão a encarou, confuso.
— O quê? — perguntou. — Por que eu iria?
— Para me dar sorte — respondeu simplesmente.
Maeve colocou sua garrafa de água de volta no lugar ao
mesmo tempo em que meu irmão me olhava sem entender nada.
Eu tive o que chamava de insight olhando daquela garota para
ele e temi que estivesse certo sobre aquela teoria.
Ela não estaria interessada no meu irmão, estaria? Sentia um
colapso mental só de pensar em tal possibilidade.
Estava aí uma coisa que eu nunca permitiria na minha vida.
Pelo pouco que conhecia de Maeve, ela era perversa e o meu irmão
não era nenhum brinquedo para passar por suas mãos.
— Receio que terá azar no jogo, então. — Christopher rebateu,
alheio ao que eu estava pensando e ao que ela dizia. Tão inocente.
— Você deveria conseguir o ingresso para o Trevor.
— Eu posso conseguir, mas você tem que ir junto.
Christopher parou a esteira e a olhou.
— Sou uma garota insistente, Christopher.
Ele voltou a olhar para mim e eu dei de ombros. Precisava
daqueles ingressos, depois podíamos apenas esquecer isso.
— Tudo bem.
Maeve parou sua esteira e sorriu.
— Ótimo! Mando o ingresso para vocês por mensagem.
Ela desceu do equipamento e foi em direção à área de
musculação. Voltei-me para Christopher, que parecia confuso.
— Só fica bem distante dela, ok? — pedi.
— É claro que vou! Acha que sou idiota?
Sorri.
Não achava, mas também não confiava em Maeve.
CAITLIN HOWARD
— Você sabe dirigir? — perguntei assim que entramos no
carro que eu dividia com o meu irmão. — Se me disser que só tirou
a permissão para dirigir, serei obrigada a pegar a chave da sua mão.
Trevor sabia que eu estava zombando com a sua cara, mas,
mesmo depois de colocar a chave na ignição, virou seu rosto para
mim e me lançou um olhar zangado.
— Não confia em mim?
Até demais.
Foi o que pensei.
Quando estávamos juntos em um relacionamento de
mentirinha, confiei em cada passo que ele dava e quando nos
envolvemos, confiei o meu coração a ele sem um pingo de medo de
que pudesse me quebrar.
Mas, então, nosso passado veio à tona e nos conectou de uma
forma triste e desprezível. Eu ainda confiei que estava fazendo a
coisa certa quando omiti sobre tudo o que sabia e quem realmente
era.
Então, veio a descoberta. A sua raiva e decepção por mim me
fizeram confiar que ele me deixaria para sempre e foi por isso que
fui atrás dele mais uma vez, implorando para que me desse ao
menos mais uma chance.
Eu confiei que viveríamos separados.
Mas na frente daquele hospital, um de frente para o outro, eu
também confiei que ele me amava e estava disposto a nos dar mais
uma chance.
— Confio — respondi ao perceber que ele queria uma resposta
e indiquei a direção. — Vamos para onde?
— Dar uma volta e conversar. Acho que precisamos, né?
Suspirei e assenti.
Não adiantamos nada da conversa durante o caminho e eu
preferi assim porque, dessa forma, podia me concentrar melhor na
paisagem ao meu redor. Dificilmente admirava Los Angeles, o que
era um insulto para turistas que pagavam uma fortuna para
conhecer aquela cidade tão famosa.
As ruas ao redor do campus da UCLA estavam lotadas de
carros e pessoas por conta do jogo daquela noite, mas Trevor
conseguiu pegar um atalho que nos tirou da muvuca daquele bairro.
Existiam dois sentimentos muito fortes dentro de mim.
Felicidade e alívio.
O primeiro por ter conseguido ganhar um jogo que foi muito
mais difícil do que os outros, mas que ganhamos mesmo no meio de
tantas complicações acontecendo com a gente. Maeve parecia estar
pior com a relação com sua mãe, Aurora e eu estávamos lidando
com a internação de Melvin e tentando ser fortes por ele.
Enquanto o alívio era por ter conseguido segurar firmemente
aquela corda e estar chegando no começo do poço novamente.
Durante as últimas semanas, achei que viveria apenas naquela
escuridão.
O meu irmão ter aceitado ir para clínica foi o início dessa
firmeza e agora recomeçar com Trevor era a conclusão que eu
precisava.
Notei que estávamos nos afastando do centro da cidade e indo
em direção à praia. Acabei não evitando e sorri, aquilo era bem a
nossa cara mesmo.
Sentia falta dele.
Desisti de apreciar a vista de LA e virei o meu rosto em direção
ao Trevor, preferindo admirá-lo mais que a qualquer outra coisa.
O amor era confuso.
Eu só conseguia defini-lo dessa forma agora, pois o que
estava sentindo era completamente novo.
Tive muito medo de perder aquele garoto, me irritei quando
apareceu na minha frente naquela sala de emergência e quase o
perdi de novo por conta das minhas emoções.
— Acho que aqui é um bom lugar para passarmos um tempo.
— Trevor disse ao parar o carro bem na areia em frente à praia.
Estávamos em uma área que podia estacionar e completamente
sozinhos naquela região. — O que acha?
— Isso parece nós.
Ele sorriu e se virou para mim.
— Como você está?
A sua mão procurou pela minha e a segurou.
— Estou melhor nesses últimos dias — respondi a verdade.
Depois de assinar os papéis como testemunha na clínica que
Melvin entrou, eu me senti mais aliviada e pronta para pensar na
minha relação com Trevor, mesmo que já soubesse que o queria de
volta.
— Maeve me disse que Melvin foi para a reabilitação, é
verdade?
— Sim, nós conseguimos o convencer a ir. Ele vai receber um
excelente tratamento psicológico lá também que pode cuidar da
sua... depressão — falar aquilo em voz alta ainda era um choque
para mim.
O meu irmão havia tentado suicídio porque estava infeliz,
porque estava depressivo.
— Você não tem culpa de nada. Sabe disso, né?
Como ele sabia que...? Deixa pra lá. Quando se tratava de
mim, não deveria mais ser surpreendente Trevor saber de tudo.
— Sinto que poderia ter feito mais.
— Você tentou falar com ele e tentou ajudá-lo como pôde.
— Ainda assim..., poderia ter sido mais presente — murmurei
naquele carro silencioso. — Mas isso não importa agora, certo? Ele
recebeu uma nova chance e eu preciso estar ao lado dele o
suficiente para que enjoe da minha cara.
Trevor soltou uma risada.
— Duvido que isso aconteceria.
— Acredite..., meu irmão facilmente enjoaria de mim. — Sorri
de volta, olhando para nossas mãos unidas. Era impressionante
como a minha ficava completamente escondida quando a sua
estava me segurando daquela forma.
— Quanto tempo ele vai ficar por lá?
— Eles não podem dizer um tempo certo, tudo depende do
desenvolvimento dele — falei o que a enfermeira responsável por
Melvin havia dito quando fiz essa mesma pergunta. — Essa primeira
semana ele não irá poder receber visitas, mas depois poderemos
fazer parte da recuperação dele aos poucos.
— Isso é bom, pimentinha. — O meu peito se apertou em puro
conforto quando o ouvi me chamar pelo meu apelido. — Ele vai ficar
bem e aprender muitas coisas. Pense nisso como o
desenvolvimento próprio que ele também precisa.
Era o que eu estava fazendo.
Sabia que aquilo era o melhor para Melvin e que, se ele
colaborasse, poderia voltar um novo homem da clínica.
— Você veio ao jogo para buscar a minha resposta? —
perguntei, mudando de assunto.
Ele assentiu, parecendo um pouco envergonhado por aquilo.
— Estava um pouco nervoso de ter ferrado com tudo e não
aguentava mais esperar — admitiu. — Quando soube sobre o jogo,
eu insisti para que Maeve conseguisse um ingresso.
— É surpreendente ela ter conseguido, já que estava te
odiando nos últimos dias — contei. Ele não pareceu surpreso. —
Descobri nessas últimas semanas que Maeve é bem protetora da
maneira dela.
— Ela não queria me ajudar, disse que só faria isso se o
Christopher também fosse no jogo.
Eu franzi a minha testa, ficando confusa com o que disse.
— Nem pergunte porque eu também não quero fritar a cabeça
pensando no motivo — justificou, e eu não segurei a risada. — A
minha sorte é que se ela estivesse interessada em Chris, eu não
teria dor de cabeça porque ele a abomina.
— Ele tem até um apelido para ela, não é? — Trevor assentiu.
— Malévola.
Ele me acompanhou na risada.
— Eu ia te encontrar depois do jogo para dar a minha
resposta, mas quando te vi naquela arquibancada, não pensei em
mais nada — confessei, voltando a olhar para aqueles olhos
brilhantes. — Preciso de você ao meu lado, Trevor, ou corro o
mesmo risco de enlouquecer de você.
Ele aproximou a minha mão da sua boca e deixou um beijo na
minha palma.
— Desculpa ter mentido — pedi de novo. — Prometo não fazer
mais isso, nem que a verdade custe te perder.
— Desculpa ter dito aquelas palavras. Eu não pensei em nada,
apenas na raiva que esse passado ainda causa em mim e... Não foi
justo, foi egoísta.
— Christopher me contou algumas coisas... — Ele me olhou
confuso. — Sobre algumas partes que você teve que lidar ainda
criança. Eu fiquei magoada por não ter me escutado, mas não
posso dizer que não te entendo. O que meu pai fez e a forma como
eles acobertaram tudo... Não foi o certo. No seu lugar, eu também
ficaria furiosa.
— Você não fica? Com tudo o que eles fizeram com vocês?
Eu pensei bem sobre aquilo e percebi que não. Por algum
motivo oculto, havia deixado de sentir algo em relação aos meus
pais há muito tempo.
— Eu já senti muita raiva deles. Quando ignoravam meu
sonho, quando exigiam que eu fosse perfeita e quando colocavam
aquela pressão desnecessária de ser um exemplo em mim... —
respondi, falando tudo o que pensava sobre eles agora. — Eu sabia
que não tinha como mudá-los e foi por isso que não pensei duas
vezes em ir embora com meu irmão. Melvin era o único que me
entendia e, infelizmente, sentia mais a ausência de pais de verdade.
Acho até que foi por isso que começou a ter atitudes rebeldes para
chamar atenção deles no passado. De qualquer forma, eu preferi
viver uma vida longe da maldade deles a uma vida infeliz ao lado
deles, e não me arrependo.
— Por que nunca soube sobre vocês na internet? — Pareceu
fazer aquela pergunta para si mesmo.
— Não se culpe tanto. Eles deram um jeito de toda a cidade
não falar sobre nós porque era muito difícil conviver com aquela
perda. E sabe como funciona em cidade pequena, né? A
solidariedade sempre aumenta. — Lembrava perfeitamente do que
tinha ouvido no carro da minha tia enquanto presenciava o enterro
falso que meus pais fizeram para mim e meu irmão. — Entende,
agora? Eu não poderia me importar mais. Aqueles dois me
mataram, por que eu deveria sentir qualquer coisa por eles?
Suspirei, me sentindo um pouco frustrada.
— É uma pena que o meu irmão não pense da mesma forma.
— Acho que cada um tem uma forma de lidar com um assunto.
— Trevor comentou.
Concordei com ele.
— Não tem medo de eles voltarem a aparecer na sua vida?
Neguei.
— Eles nunca fariam isso, confie em mim — respondi. — A
única vez que se lembram da gente é quando têm que mandar
dinheiro. E nem sei se lembram, pode estar na transferência
automática.
— Sinto muito, pimentinha... — Ele voltou a beijar a minha
mão. — Sei que pode não sentir mais nada agora, mas tenho
certeza de que no início foi difícil.
Havia sido. Muito.
Mas eu não queria pensar naquilo. Era passado.
Porém ainda precisava dizer mais uma coisa para aquele
garoto.
— Parei de sentir qualquer ressentimento quando você entrou
na minha vida, Trevor. Passar o meu tempo com você, mentindo a
todos sobre o nosso relacionamento, foi leve, divertido e mesmo
naqueles termos, sentia que era verdadeiro. Diferente da mentira
que me cercou por quase toda a minha vida. Você me abraçou e me
entendeu enquanto o meu coração dava lugar para se apaixonar por
você e é por tudo isso que tenho tanto medo de te perder — admiti,
apertando sua mão na minha, sem desviar meu olhar do seu. —
Naquele dia, falei sem pensar sobre conseguir viver com um
coração partido. A verdade mesmo é que eu não consigo quando se
trata de você.
Trevor liberou nossos cintos e se aproximou um pouco mais de
mim, soltando nossas mãos e segurando meu rosto entre as suas.
— Eu não faço uma promessa e não a cumpro, ok? Prometi
que não te deixaria sozinha e que estaria para sempre ao seu lado.
Pretendo cumprir isso, pimentinha — garantiu, me fazendo sorrir e
os meus olhos, marejarem. — Amo você e quero viver tudo de
verdade ao seu lado... Por isso...
Ele levou uma das mãos até o bolso e tirou de lá uma pulseira
idêntica à minha. Entendi que aquela era a outra concha que
havíamos achado na praia assim que Trevor a balançou na minha
frente.
— Notei que não tirou a sua — disse, se referindo à minha
pulseira. — Fiz essa junto à sua, mas fiquei receoso de usar e
parecer emocionado demais.
Eu ri em meio às lágrimas que faziam um esforço para não
cair.
— Aceita namorar comigo de verdade, Caitlin Howard?
— Sem leis?
— Apenas duas — pontuou, me deixando ansiosa. — Nos
amar o máximo possível e viver apenas o presente... Podemos até
chamá-las de “as leis do amor”, o que acha?
Peguei a pulseira da sua mão e puxei o seu braço, mas, antes
de colocar nele, o olhei seriamente.
— Sabe que isso é um caminho sem volta, né? — Ele riu
diante da minha ameaça e assentiu. — Eu aceito ser a sua
namorada e viver essas leis do amor com você.
Coloquei a pulseira nele e rapidamente fui puxada para mais
perto. Não tive nem tempo de gravar qualquer olhar ou feição
porque logo estava recebendo os lábios de Trevor nos meus em um
beijo que não sentia há semanas.
Porra!
Aquilo era lar.
Eu me senti nas nuvens conforme sua língua tocava a minha
com calma e amor, me causando um frenesi por todo meu corpo,
que sentia tanta falta dele como meu coração. E não dei tempo para
pensarmos em algo coerente quando fui parar em seu colo,
arrancando uma risada sua durante o beijo.
— Alguém pode nos ver, sabia?
Dei de ombros e peguei seus óculos.
— Você não precisa disso agora, né?
Ele negou e eu retirei do seu rosto com cuidado, colocando no
banco onde eu estava sentada antes. Voltei a beijá-lo enquanto as
mãos de Trevor foram para a minha cintura e me apertaram mais
contra o seu corpo. Não estávamos desesperados e não podíamos
nos importar menos com o lugar no qual estávamos.
Trevor subiu as suas mãos e as infiltrou por dentro da
camiseta grande que eu usava, me fazendo sentir seu toque pela
minha pele, arrepiando os pelinhos invisíveis do meu corpo.
Eu arrastei a minha boca pelo seu queixo, beijando todo
pedaço de pele até chegar ao seu pescoço. E ele inclinou a sua
cabeça e suspirou, quase soltando um gemido quando os meus
lábios chuparam a sua pele.
— Senti falta de deixar você assim — comentei, movendo meu
quadril contra o seu e sentindo o seu pau endurecer embaixo de
mim.
Trevor agarrou a minha nuca e me fez olhar nos seus olhos
antes que eu pudesse voltar a chupar seu pescoço.
— Não tenho camisinha aqui — murmurou. — Talvez
devêssemos ir para outro lugar e...
— Eu tomo comprimido por conta do meu ciclo menstrual e
nunca transei sem camisinha com alguém. — Dei meu argumento,
beijando seus lábios entreabertos. — Fiz alguns exames de rotina
para o vôlei e estou limpa.
— Está sugerindo mesmo isso? — perguntou com um brilho
divertido no olhar.
— Não conhece a namorada que arranjou? — devolvi. —
Imagino que você também deva estar limpo.
— É claro que estou.
— Então, não temos problemas. Ou temos? — Infiltrei as
minhas mãos por baixo da sua camisa e arranhei seu abdômen,
sentindo o resultado no seu pau cutucando a minha virilha. —
Porque eu gostaria de fazer amor e foder com você nesse carro.
— Que droga, pimentinha... — resmungou, mas não parecia
indignado.
E como pensava, ele me beijou na mesma hora. Havia muito
mais paixão e desejo dessa vez, sentia conforme nossas línguas se
tocavam e chupavam a boca um do outro em uma troca só nossa.
O meu corpo todo esquentou quando seus lábios passaram
para o meu pescoço. Senti a sua língua lamber a minha pele e
enviar ondas de excitações para a minha boceta, que naquele
momento, ficava cada vez mais molhada sobre o seu pau.
Trevor fechou a sua boca sobre uma parte sensível do meu
pescoço e me chupou, me fazendo gemer com o contato.
— Vamos para a parte de trás — mandou.
Mas antes, puxou a minha camiseta para cima e, em um piscar
de olhos, retirou o meu sutiã.
Achava que íamos com um pouco mais de calma, mas
agradeci por isso quando vi seus olhos cheios de desejo por mim.
Movi o meu corpo para a parte de trás do carro, sendo seguida
por Trevor. Antes que eu me deitasse, ele levou as mãos para o
zíper da minha calça e puxou a peça com a minha calcinha.
Os nossos movimentos eram os mínimos possíveis ali dentro
e, parecendo sentir o mesmo que eu, ele moveu o banco do
motorista e do passageiro ao lado mais para frente.
— Você é tão linda... — Ele me admirou assim que voltou a
prestar atenção em mim.
Eu senti todo o meu corpo queimar com seu olhar descendo
por cada canto, como se fosse o seu próprio toque por cada parte. A
minha boceta molhou mais ao identificar o tanto que ele me queria
ali.
Por isso, me sentei e o puxei para mais perto.
— Estamos em desvantagem aqui, amor — murmurei e toquei
seu rosto, fazendo seus olhos brilharem.
Ele sorriu lindamente para mim.
— Do que me chamou?
Aproximei minha boca do seu ouvido.
— Amor — sussurrei, observando a reação do seu corpo
quanto ao apelido carinhoso. Ele se arrepiou por inteiro. — Amor.
Mordi o lóbulo da sua orelha ao mesmo tempo em que levei as
minhas mãos para a barra da sua camiseta e a puxei para cima.
Trevor a tirou, ainda parecendo um pouco aéreo. Reprimi o riso e
toquei no zíper da sua calça, que quase explodia com o volume do
seu pau contra ela.
— Eu poderia ouvir você me chamar assim para sempre,
sabia? — admitiu, parecendo sair do transe.
Ele me ajudou a tirar a calça e a cueca, e eu deixei de
conversar quando vi o seu pau saltar para fora. Imediatamente, o
peguei na minha mão e fiz Trevor ofegar.
— Sou apaixonada por ele também.
Ele sorriu por um segundo e, em seguida, estava soltando um
gemido quando comecei a masturbá-lo.
Trevor se aproximou de mim enquanto eu continuava com os
movimentos no seu pau, beijou minha boca por um tempo,
deslizando pelo meu pescoço e clavícula até alcançar meu seio. Ele
o abocanhou rapidamente, e eu soltei um gemido mais alto,
sentindo imediatamente sua língua ao redor do meu biquinho, o
levando da forma que podia e me chupando com vontade.
Tentei continuar o masturbando, mas Trevor impediu que eu
continuasse a tocá-lo.
Ele puxou as minhas mãos para cima e me deitou da forma
que podia ficar deitada naquele banco traseiro do carro. Sua boca
continuava em meu seio, me dando tanto prazer, que sentia o meio
das minhas pernas cada vez mais pegajoso.
Trevor passou a mamar no outro seio, repetindo cada
movimento com a língua e os lábios como se fosse um copia e cola
de alta qualidade.
Até que desceu mais.
E mais.
Sua língua molhava minha barriga, os seus lábios chupavam a
minha pele e, quando se aproximou do meu ventre, senti um calor
ainda maior tomar conta de mim. Desci minhas pernas, me abrindo
mais para ele.
Trevor encarou a minha boceta como se pudesse devorá-la ali
mesmo.
— Me chupa, amor — pedi, passando uma perna pelo seu
ombro, descansando-a bem ali. — Quero sentir sua língua por toda
parte.
Ele aspirou bem próximo a minha boceta, quase me fazendo
gozar de antecipação.
— Continua olhando nos meus olhos — pediu, aproximando
mais sua cara do meio das minhas pernas. — Eu gosto de ver como
você fica quando chupo você, principalmente quando goza na minha
boca.
Mordi os meus lábios e não tive tempo de responder quando a
sua boca tocou a minha boceta. Só consegui gemer e não desviar o
meu olhar do seu.
Trevor me lambeu por inteira e foi direto para o meu clitóris,
me fazendo gritar quando chupou com força. Ele usava um pouco
de delicadeza e sensualidade, acabando com toda a minha
sanidade conforme me comia com a boca e com os olhos.
Sentia que poderia passar mal a qualquer momento.
Aquilo era muito gostoso, tanto que me deixava louca para
fechar os meus olhos. Mas eu não conseguia.
Eu não podia.
Ele abriu mais os meus lábios e, sem que eu esperasse, enfiou
dois dedos na minha entrada. Gritei, sentindo a sensação da sua
boca no meu clitóris e dos seus dedos entrando e saindo de mim.
— Trevor... — gemi.
Ele não precisava que eu falasse nada.
Tinha certeza de que enxergava em meus olhos.
Levantei mais o quadril, implorando por mais, querendo tudo
que ele podia me dar naquele lugar apertado e sufocante.
Mas Trevor parou.
O meu corpo sofreu com a parada abrupta e, antes que
pudesse reclamar, ele estava se colocando em cima de mim e
segurando uma das minhas mãos.
— Posso foder e fazer amor com você agora? — perguntou
baixinho contra a minha boca, encostando seu pau duro na minha
barriga. — Sinto que posso enlouquecer a qualquer momento.
Abracei sua cintura com minhas pernas como resposta.
— Estou pronta para você desde que subi no seu colo.
Ele me beijou e eu me preparei para senti-lo assim, sem
nenhuma camisinha atrapalhando a sensação de pele com pele.
Quando Trevor penetrou seu pau em mim, senti o meu próprio
sistema respiratório parar por alguns segundos, esquecendo
completamente da sua função, e notei o mesmo acontecer com ele.
— Caitlin... — Seus olhos tremeram.
Apertei mais minhas pernas ao seu redor.
— Estou sentindo... — gemi, apertando sua mão na minha.
Ele se enfiou por inteiro e nós dois gememos alto, em
completo êxtase com a sensação incrível dos nossos corpos
literalmente se encaixando.
Quando Trevor começou a se movimentar, foi lento,
aproveitando cada segundo do meu interior ao entrar e sair. Seus
olhos presos nos meus ao mesmo tempo em que sua mão ainda
segurava a minha.
Aquilo era amor.
Senti uma lágrima cair pelo cantinho do meu olho direito.
Eu tinha um homem perfeito comigo. Dava para acreditar
nisso? Eu. A garota que viveu uma vida inteira fingindo ser o que
não era para agradar os outros tinha alguém que a amava
exatamente como ela era.
Toquei os lábios de Trevor com os meus, o beijando mesmo
em meio aos gemidos baixinhos que trocamos enquanto o seu pau
me preenchia cada vez mais a cada estocada.
Eu espero nunca te perder.
Foi o que consegui pensar além do prazer.
Faria de tudo para que aquele sentimento entre nós apenas
amadurecesse e crescesse, não o contrário.
Eu segurei o seu rosto e o fiz me encarar.
— Eu amo você, Trevor — declarei.
Senti sua mão apertar a minha e ele ir mais fundo contra mim,
me fazendo gemer contra seu rosto.
— Eu amo você, pimentinha. Tanto a ponto de ficar maluco.
Nós sorrimos.
Eu o abracei apertado, sentindo que estava perto com todas as
investidas que ficavam mais fortes conforme nossos corpos
imploravam pelo ápice do prazer.
— Goza comigo — pediu, mordendo meus lábios.
— Estou quase — gemi. — Muito perto... Trevor...!
Enfiei a minha mão livre entre os fios do seu cabelo e o apertei
lá embaixo com a minha boceta. Senti os nossos corpos
estremecerem ao mesmo tempo com o sinal claro de que
estávamos prestes a gozar.
Eu fui primeiro, mas, logo em seguida, Trevor também foi,
despejando toda a sua porra em mim ao mesmo tempo em que se
misturava com a minha.
Fechei os meus olhos, sentindo seus braços passarem ao
redor do meu corpo e ele inverter as nossas posições, me fazendo
deitar em cima do seu corpo.
— Fica... mais confortável assim, certo? — perguntou com a
voz baixinha e ofegante do sexo incrível que tivemos.
Eu apenas assenti, sorrindo e deitando a minha cabeça de
lado no seu peito.
Estava feliz.
E adormeceria ouvindo as batidas do coração daquele que
tinha o meu para si.
(Eu acho que poderíamos durar para sempre
Tenho medo de que tudo vá desaparecer
Só confie em mim)
LIKE CRAZY – JIMIN
TREVOR LANCASTER
Meu corpo estava dolorido depois de ter dormido de mal jeito
no carro de Caitlin, mas, ao despertar naquela manhã, não me senti
nenhum pouco arrependido das escolhas que me levaram até ali.
Voltamos para o campus assim que amanheceu, mas logo
sairíamos para um encontro. Havia deixado Caitlin surpresa ao
convencê-la a matar aula para podermos aproveitar um pouco mais
do dia juntos.
Achava que nem eu esperava por um pedido desses vindo de
mim. Mas, em minha defesa, as disciplinas daquele dia estavam
dominadas e faltar pela primeira vez não faria tanta diferença.
Deixei meu irmão no quarto chocado ao descobrir que eu
mataria aula pela primeira vez e fui encontrar Caitlin no
estacionamento onde havíamos deixado o carro mais cedo.
No caminho, enviei uma mensagem apenas confirmando que
não apareceria no trabalho. Por sorte, a secretaria estava mesmo
me devendo uma folga por ter trabalhado em um sábado há alguns
meses e nunca pensei que cobraria, mas havia achado um bom
motivo para isso.
— Estamos mesmo fazendo isso? — Caitlin questionou com
um sorriso nos lábios quando me aproximei. — Me sinto no ensino
médio de novo.
Sorri, a puxando pela cintura quando ficamos próximos.
— Você disse que não tinha nenhuma aula importante hoje —
argumentei, apesar de saber que tudo dentro de uma faculdade era
importante.
— Eu vou ficar bem e você?
— Nunca faltei uma aula, então...
— Que isso signifique que você também vai ficar bem com
isso.
Eu assenti, deixando um selinho em seus lábios.
— E se não ficasse... Eu realmente só quero aproveitar com
você agora.
Caitlin apertou minha bochecha e eu soltei um gemido de dor.
— Ai! — Segurei sua mão, reclamando e amando ao mesmo
tempo aquele aperto.
— Você é o típico namorado último romântico?
— Está perguntando se sou romântico?
Ela assentiu.
Dei de ombros.
— Você vai ter que descobrir com o tempo. — Beijei seus
lábios rapidamente. — Vamos?
— Como conseguiu organizar um encontro assim tão rápido?
Abri a porta do carro para que ela entrasse.
— Você dormiu primeiro e eu tive a ideia de ter esse encontro
de madrugada — comentei, lembrando-me de como ela havia caído
no sono rapidamente depois de tudo o que fizemos naquele carro.
— Não é nada tão especial, mas eu queria passar mais um tempo
com você. Agora, finalmente como namorados.
Ela sorriu e entrou no carro.
— Você é mesmo o último romântico.
Dei risada e bati a porta, seguindo para o meu lugar como
motorista.
TREVOR LANCASTER
Precisei abafar os meus ouvidos com o grito que a minha mãe
deu do outro lado do telefone.
Eu só disse que havia feito as pazes com Caitlin, mas parecia
que tinha feito algo tão grandioso como encontrar ouro.
Ok. Se fosse levar em consideração tudo o que estava
sentindo, Caitlin era uma mina de ouro para mim.
— As minhas preces foram mesmo ouvidas! — disse, sorrindo
com tanto orgulho que acabei retribuindo.
Amava a força daquela mulher.
Dona Jules podia ser insistente em certos assuntos de vez em
quando, mas tudo o que fazia era claramente por amor. Ela queria
ver a felicidade dos filhos acima de tudo, até mesmo da sua.
— Quando irei vê-la de novo? Sinto que aquele fim de semana
foi há séculos.
— Está exagerando, mãe — rebati, sorrindo. — Vai demorar
para a gente conseguir ir até São Francisco de novo. Acho que
agora só nas férias, há muitas coisas que precisam ser resolvidas
aqui.
— Chris me falou que o irmão de Caitlin está internado. —
Suspirou tristemente. — Aqueles malditos... Como podem ser tão
cruéis com os próprios filhos?
O meu irmão me olhou no mesmo momento e achava que a
minha expressão era bem óbvia de que odiava tocar nos assuntos
daquele casal porque, em seguida, estava mudando de assunto:
— A senhora bem que podia tirar alguns dias de férias e vir
passar em Los Angeles. — Ele sugeriu. — Fala da gente, mas
esquece que ainda tem quarenta anos e está na flor da idade.
Arqueei as sobrancelhas.
— Não está sugerindo para a nossa mãe viver a vida como
uma adolescente, né?
— Qual seria o problema se ela começasse? — devolveu. —
Talvez ela parasse de me encher por causa de namorada.
Olhei bem sério para a minha mãe.
— Você já começou a encher o pobre Christopher? Até ontem
era eu!
Ela fez uma cara inocente para câmera que não combinava
nadinha com quem realmente era.
— Eu comecei com vocês dois ao mesmo tempo.
— Qual é o seu problema com a gente solteiro? Às vezes, fico
triste por você não ser do tipo mãe ciumenta.
Ela riu.
— Experimentar o amor nessa idade é tão gostoso, é por isso
que fico incomodando vocês — justificou.
Bem na hora, alguém bateu à porta e uma cabeça com
cabelos loiros e cacheados apareceu no vão assim que abriu.
— Eu ouvi a voz da Jules? — Caitlin perguntou, entrando no
quarto cheia de curiosidade.
— Caitlin? — Minha mãe chamou. — Ah, querida! Pensei que
não conseguiria te ver hoje.
Chris e eu estávamos sentados na minha cama, então Caitlin
se aproximou de nós, animada com a possibilidade de falar com
minha mãe, e se enfiou na frente da câmera, se sentando no meu
colo. Escondi meu sorriso atrás dela e abracei sua cintura, deixando
um beijo no seu ombro antes de apoiar meu queixo ali.
A minha mãe soltou um gritinho.
— Vocês são tão fofos!
— Até demais! — Meu irmão sinalizou com uma careta. —
Passaram o fim de semana inteiro grudados, acredita?
Bati na sua nuca de propósito.
Caitlin e eu havíamos passado os últimos dias, desde aquela
noite no carro, juntos. Não podíamos fazer nada além de aproveitar
a presença um do outro agora que estávamos namorando.
Era gostoso e divertido.
Não sentia que era muito diferente do que havíamos tido antes
do nosso desentendimento, o que só me mostrava o quanto estava
mesmo apaixonado por ela há um bom tempo.
— Minha filha... — Minha mãe começou, e senti Caitlin
estremecer no meu colo. — Posso te chamar assim?
Tanto eu como Chris a olhamos.
Caitlin parecia desacreditada e um pouco desconcertada com
a forma como minha a chamou, por isso, dei um tapinha na sua
coxa logo seguido de um carinho, trazendo sua atenção de volta
para a chamada.
— Claro. — Ela sorriu, e notei, mesmo a olhando de lado por
causa da nossa posição, o quanto estava emocionada.
Eu a abracei mais forte contra mim.
— Quero que saiba que sempre irá poder contar comigo, ok?
Não existe nenhum ressentimento meu em relação a você.
Naquele fim de semana que passamos juntos já havia dado
tempo de dizer para Caitlin o quanto a minha mãe sabia sobre nós.
— Obrigada, Jules. — Caitlin disse. — Sei que pode parecer
um pouco difícil me olhar e não...
— Querida..., você não é filha deles. — Minha mãe a
interrompeu. — Eles apenas te colocaram no mundo, mas você não
é filha deles.
Era a forma como eu estava vendo aquilo agora também.
— Sempre quis ter uma filha mulher, sabia? E agora que você
faz parte da nossa família, pode me considerar uma mãe a hora que
se sentir confortável para isso. Os meus braços estarão sempre
abertos.
Os olhinhos de Caitlin brilharam.
— Obrigada, Jules... — agradeceu de novo. — Principalmente
por ter me dado o seu filho.
Ela me olhou e aproveitou que estávamos próximos para beijar
a minha bochecha. De canto de olho, vi meu irmão fingir sentir
náuseas.
— Espere só para o momento que estiver apaixonada,
Christopher! — provoquei ele. — Vai entender tudo perfeitamente.
— Gestos de carinhos me dão vergonha alheia. — Ele foi
sincero, arrancando risadas de todos nós.
Caitlin voltou a olhar para minha mãe.
— Sou grata por ter uma família de verdade ao meu lado —
disse, deixando minha mãe, que não precisava de muito, bem
emocionada.
— Gostaria de estar aí para dar um abraço em você. — Minha
mãe falou, suspirando tristemente. — Ansiosa pelas férias de vocês.
— Estamos em maio, falta pouco — lembrei.
— Um mês inteiro pela frente ainda! — Minha mãe olhou para
algo além do celular. — Inclusive, preciso voltar para o trabalho.
— Já precisamos desligar também — falei. — Combinamos de
tomar café juntos.
— Aproveitem, meus amores! — Ela mandou um beijo. — Vejo
vocês depois.
— Até a próxima segunda, mãe. — Chris sinalizou.
Não sabia se ela se controlaria em esperar uma semana para
nos ligar de novo.
Assim que desliguei a chamada, Caitlin se virou para mim.
— A mãe de vocês é incrível.
Ela era.
Eu concordei com a minha cabeça e, antes que pudesse dar
um beijo naqueles lábios pela primeira vez naquele dia, Christopher
colocou a mão entre nós. Virei a minha cabeça e o olhei bem sério.
O sem-vergonha me lançou um sorriso atrevido.
— É melhor irmos para o café ou não iremos nem aproveitar
esse tempo que temos juntos.
Caitlin riu e assentiu, mas, de forma rápida e prática, me deu
um selinho.
— Vamos, amorzinho.
CAITLIN HOWARD
Nos últimos dias eu estava me concentrando em ser uma boa
namorada, uma boa amiga, uma boa irmã e uma excelente
jogadora. Tudo parecia estar dando certo, exceto por alguns
detalhes quando se tratava de Maeve e toda a sua complexidade.
Depois do episódio da cafeteria e do jogo do dia anterior com a
presença desnecessária de sua mãe, ela havia voltado para o modo
mais quieta. Nem mesmo a vitória quis comemorar.
Não sabia que tipo de conversa ela e sua mãe haviam tido no
carro, mas fez com que Maeve fosse direto para o seu dormitório e
não atendesse a nenhuma das ligações até agora.
— Nada? — Trevor perguntou.
Neguei, soltando um suspiro.
Havíamos combinado de ir ver Melvin, mas pelo jeito iria sem
uma companhia, já que Trevor só me acompanharia até a entrada
da clínica e Aurora estava lá dentro.
— É melhor irmos, então. — Trevor disse, voltando a ligar o
carro. — Ou não irá conseguir ver o seu irmão hoje.
Eu assenti e ele deu partida.
— Não fique tão preocupada — aconselhou, segurando a
minha mão e a beijando. — Ela vai voltar rapidamente.
Não tive tempo de responder porque uma mensagem nova
chegou ao meu celular. Abri assim que vi que era de Maeve.
Maeve:
Pode ir sem mim, estou na academia. Manda um beijo para
ele, ok?
Vejo você amanhã no treino.
Parecia tão simples e objetiva como sempre.
— O que era?
— Ela apenas disse que está na academia e que é para
mandar um beijo para ele.
— E o que isso parece?
— Que ela está evitando falar como se sente e sobre o que se
passa na sua vida — respondi. — Essa é a Maeve.
Trevor concordou, prestando atenção na estrada à sua frente.
— Graças a Deus tenho você agora — falei com sinceridade,
arrancando uma risada fofinha e cheia de covinhas sua. — Juro que
enlouqueceria se não estivesse ao meu lado.
— Tanto assim? — provocou.
— Infelizmente! — Deitei a minha cabeça no seu ombro. —
Acho que estou me tornando dependente de você e isso não é nada
saudável. Você é como o meu ponto de paz no meio de tanto caos
ao meu redor.
Ele me abraçou de lado, ainda dirigindo perfeitamente como
uma mão. Trevor sabia mesmo dirigir, mas não me arrependia de tê-
lo provocado quanto a não saber na noite em que reatamos.
— Você também é para mim, pimentinha — murmurou, me
fazendo sorrir.
Fechei um pouco meus olhos, aproveitando do seu colo,
mesmo que não fosse permitido estar naquela posição enquanto
alguém dirigia. Não me importava em viver perigosamente, se isso
significava viver confortável ao seu lado.
TREVOR LANCASTER
Recebi uma mensagem de Christopher dizendo que trabalharia
até tarde na biblioteca por conta de alguns novos livros que haviam
chegado e precisavam ser guardados na estante até a manhã
seguinte. Apenas respondi pedindo para que se cuidasse e se
alimentasse direito porque o conhecia perfeitamente e sabia que
acharia aquela uma ótima desculpa para pular o jantar e depois
aparecia comendo alguma besteira.
Não que não pudesse. Eu só gostava de agir como um irmão
mais velho e irritá-lo com isso.
Mandei uma mensagem para Caitlin, perguntando como
estava o treino que ela teria antes do próximo jogo e tive resposta a
rapidamente.
Pimentinha:
Acabei de sair. Pensei em passar no dormitório para me trocar
e ir ficar com vocês... Só não podemos deixar seu irmão
desconfortável com nossa presença. Eu sempre odiei ser vela,
então falo por experiência própria.
Era sempre fofo a forma como ela se lembrava do meu irmão e
se importava com o seu conforto. Como se fosse possível, eu a
amava ainda mais por isso.
Eu:
Ele vai voltar tarde do trabalho. Então podemos ser namorados
na ausência dele.
Larguei o telefone e voltei para o jogo pausado no videogame.
Estava no meio de uma batalha em League of Legends e pretendia
vencê-la.
Fiquei jogando por longos minutos até que alguém batesse à
porta e, através da sua identificação, eu descobrisse que era Caitlin.
— Pode entrar! — avisei, ainda concentrado no rival do outro
lado da telinha.
Desde quando eu perdia uma batalha daquelas?
— Pensei que você tinha que estudar para a sua prova de
amanhã. — Caitlin disse, largando a bolsa na minha cama e se
aproximando do sofá em que eu estava sentado. — Não sei como
consegue ser aprovado.
— Você tem um namorado inteligente — falei, prestando
atenção no jogo ao mesmo tempo em que ela beijou rapidamente
meus lábios. — Vou derrotar ele e depois aproveitamos o tempo
juntos, ok?
Ela concordou, deitando a cabeça no meu ombro e me
observando jogar.
— Como foi o treino de hoje? — perguntei.
— Acho que estamos prontas para ganhar essa temporada.
Sorri, sem esconder meu orgulho.
— Vocês vão conseguir.
Movimentei meus dedos sobre o controle e consegui ganhar a
batalha final do jogo. Fechei minhas mãos em comemoração e
larguei o controle, abraçando a minha namorada ao meu lado.
— Quero aprender a jogar. — Ela me surpreendeu ao dizer. —
É difícil?
— Isso é sério? Sabe que eu derrotaria você, né?
— Um bom namorado me deixaria ganhar.
Sorri e peguei o outro controle em cima da mesa.
— Quer mesmo fazer isso? Não é difícil, mas pode causar
frustração em você por não ganhar.
Ela semicerrou seus olhos em minha direção. Caitlin estava
sem maquiagem e ainda mais linda do que o normal.
— Aposto que vai ser divertido. — Segurou o controle da
minha mão. — E eu poderia ganhar de você, não seria incrível?
— E impossível — provoquei. — Jogo esse jogo há muito
tempo para ser facilmente derrotado.
— Você é mesmo competitivo — comentou e apontou para a
tela. — Vamos, me ensina.
Passei todas as instruções para ela e todos os botões que ela
tinha que apertar para cada movimento dos personagens no jogo.
Reiniciei a batalha, alterando para o modo multiplayer, e, depois de
escolhermos nossos guerreiros, começamos a partida.
Para a primeira vez, Caitlin até que estava se saindo bem...
Mesmo que fosse de uma forma desajeitada por não ter nenhuma
prática com os botões que faziam as ações. Tudo era muito novo
para ela.
— Droga! — reclamou quando perdeu o jogo.
— Você foi bem — elogiei. — Melhor do que muita gente
quando começa a jogar.
Ela fez aquele biquinho típico de quando estava emburrada
com algo.
— Vamos de novo!
— Sério?
Ela sabia que perderia, né?
Caitlin apenas assentiu e eu reiniciei mais uma vez.
Dessa vez ela estava um pouco mais atrapalhada com os
botões, talvez por conta do desespero em tentar ao menos
conseguir ganhar aquela batalha. Por isso, deixei meu controle de
lado por um tempo e toquei nas suas mãos.
— Aqui... Ficar apertando todos ao mesmo tempo não vai
ajudar você a ganhar de mim. — Mostrei a ela mais uma vez, só que
agora, dando golpes de verdade no seu rival do jogo, que no caso,
era eu. — Viu?
Ela sorriu.
— Poderia me mostrar até eu ganhar essa batalha?
Eu ri da sua cara de pau.
— Espertinha! — Baguncei seus cabelos antes de voltar a
jogar. — Apenas tente fazer como eu te ensinei.
Caitlin fez. E se saiu muito melhor do que eu esperava, mas
ainda consegui ganhar de novo.
— Ai, desisto! — Jogou o controle ao seu lado. — Não tem
como vencer você.
— É uma ótima forma de aumentar o meu ego — brinquei,
deixando o meu controle em cima da mesinha de centro. — Como
você está? Não me falou muita coisa depois da visita que fez para o
Melvin.
Ela pulou para o meu colo, ficando de frente para mim e
abraçando o meu pescoço.
— Estou bem... Ele parece melhor, sabe? Estou feliz por isso.
Abracei sua cintura, enfiando uma de minhas mãos de forma
instintiva dentro da sua blusa e acariciando suas costas.
— Vai fazer um bom jogo amanhã e ganhar a temporada, só
para completar essa felicidade que está sentindo.
Caitlin passou as unhas na minha nuca, arrepiando todo o meu
corpo com aquele ato, e o sorrisinho safado que cresceu em seus
lábios. Como se meu corpo reconhecesse isso, senti um calor
atravessar por dentro de mim e se concentrar no meu pau.
— Você fica incrível nesse modo gamer, sabia? — murmurou,
aproximando o rosto do meu. — Talvez eu tenha perdido porque só
conseguia focar em você e no seu modo competitivo.
Segurei minha risada.
— Claro que foi só por isso. — Ela sabia que eu estava sendo
irônico porque conseguia ver o brilho divertido no fundo dos seus
olhos. — Mas estou surpreso por você não ter focado no jogo.
— Fazer o que se você me excita até parado?
Eu ri, a trazendo para mais perto de mim e apertando a sua
cintura com minhas mãos.
Ela mordendo os lábios foi a última coisa que vi antes de
fechar os meus olhos e puxá-la para um beijo, onde nossas línguas
se encontraram de forma rápida e cheia de desejo por mais.
Caitlin pressionou sua boceta contra o meu pau, o sentindo
crescer sob ela ao mesmo tempo em que eu subia minhas mãos
pelas suas costas sem desmanchar nosso beijo.
Parecia que tudo havia se intensificado desde que assumimos
o que sentíamos um pelo outro.
Passei meus lábios pelo seu pescoço, segurando firmemente a
barra da camiseta branca e larga que usava, a puxando para cima e
tirando do seu corpo. Caitlin estava usando apenas um sutiã rosa-
pink, que logo foi arrancado pelas minhas mãos também.
— Você é tão linda... — admirei, antes de beijar bem acima do
seu seio direito.
Ela suspirou, segurando a minha nuca.
— Acho que estou cada vez mais viciada em você, amor —
admitiu, passando a língua pelos meus lábios e descendo pelo meu
pescoço, chupando minha pele.
Senti meu pau ficar ainda mais duro, batendo contra a sua
boceta ainda tapada pela calcinha e calça jeans que usava. Caitlin
até tentou me provocar mais com aquela boca no meu pescoço,
mas eu abaixei minha cabeça e abocanhei seu seio, a fazendo
soltar um gemido um pouco mais alto.
Ela agarrou firmemente meu cabelo enquanto eu mamei no
seu seio, a fazendo rebolar de forma intensa contra a minha ereção
dura.
Precisei me controlar muito para não acelerar mais do que
aquela situação já estava acelerada. Queria sempre dar prazer para
ela da mesma forma que ela me dava.
Eu também estava viciado.
Era isso que eu gostaria de dizer, mas mantive minha boca
ocupada em seu seio. Caitlin apenas me interrompeu para tirar
minha camiseta e eu voltei a repetir os mesmos movimentos com a
minha boca no seu outro seio, que estava durinho de excitação.
Dei prazer daquela forma até não aguentar mais sua boceta se
esfregando no meu pau já dolorido, por isso ergui minha cabeça e
capturei seus lábios, a prensando com mais força contra o meu pau
e a deixando paradinha ali, provavelmente sentindo o quanto ele
pulsava por ela.
Meu coração parecia que sairia pela minha boca a qualquer
momento, mas só parei de beijá-la quando o ar nos faltou.
— Quero você... — gemeu, saindo do meu colo e se despindo
rapidamente na minha frente.
Aproveitei para fazer o mesmo, abaixando a minha calça e
minha cueca.
Só tive tempo de abaixá-las até os joelhos porque logo Caitlin
estava se sentando sobre mim novamente, molhando minhas coxas
com sua excitação. Ela subiu mais perto do meu pau e nós dois
gememos quando sua boceta o tocou.
Caitlin aproximou o seu rosto do meu e passou seus lábios
pela minha mandíbula. Eu, por outro lado, ergui o seu quadril e
apenas a olhei para confirmar o que já era óbvio. Ela mesma forçou-
se para que eu a preenchesse daquela forma.
Soltei um longo gemido junto ao seu ao sentir sua bocetinha
descendo pelo meu pau. Cada parte de mim estremeceu com a
sensação maravilhosa que sempre nos arrebentava quando
estávamos unidos daquele jeito.
Ela puxou os fios do meu cabelo e, com a boca bem próxima
da minha, disse:
— Eu amo você... Amo foder e fazer amor com você. — Beijou
minha boca, quase fechando os olhos de tanto prazer.
— Eu amo sentir você — declarei, firmando meu aperto em
sua cintura e a ajudando com os movimentos de sobe e desce sobre
o meu pau. — Eu amo você, pimentinha.
Ela sorriu com o apelido.
Mas não teve tempo de falar algo porque gemeu mais alto
quando levantei o quadril, a penetrando mais fundo.
— De novo...! — implorou.
Eu fiz.
Fiz várias vezes. Sentindo em cada uma delas meu pau ser
engolido ainda mais pela sua boceta.
Caitlin apenas gemia como eu. Era apenas o que conseguia
ser ouvido dentro daquele quarto junto ao som dos nossos corpos
se chocando um contra o outro.
Senti aquela mesma sensação que me atravessava todas as
vezes antes de gozar e soube que estava perto. Caitlin me apertou
mais contra ela e rebolou, parecendo atingir o que queria ao gemer
mais alto e quase cair no meu colo com o forte orgasmo que a
atingiu.
Eu fui logo depois com seu aperto ao redor do meu pau.
— Caitlin... — gemi, agora a abraçando apertado contra mim.
Beijei seu ombro e depois o seu pescoço, descansando minha
cabeça bem naquele vão, que era apenas mais um dos meus
lugares favoritos do corpo dela.
Que isso nunca acabe.
Que isso nunca estrague por uma besteira de nós dois.
Era tudo o que meu coração implorava para o restante das
nossas vidas.
Despedaçar e triste, então eu cancelei as tropas
Essa foi a noite em que quase te perdi
Eu realmente pensei que te perdi
THE GREAT WAR – TAYLOR SWIFT
TREVOR LANCASTER
O bar que Barry havia alugado estava totalmente decorado
com faixas declarando as Bruins como campeãs daquela
temporada, com balões rosa e preto da cor do uniforme do time e
até mesmo com brasões da UCLA.
Tudo aquilo estava mesmo lindo.
Exceto pelo infeliz fato de que as meninas haviam perdido.
Era como a minha mãe sempre dizia... Não devemos
comemorar antes da hora.
Elas haviam sido ótimas naquela noite, mas as garotas da
BYU conseguiram superá-las e vencer no último set.
Todos entraram naquele bar com a cara tão triste que parecia
até que estavam indo a um enterro. E não era por menos, tínhamos
quase conseguido chegar perto do primeiro lugar. Elas deveriam
estar se sentindo péssimas.
Caitlin parecia a mais abalada e, mesmo que eu a abraçasse
naquele momento, seus pensamentos pareciam estar longe.
— Não é culpa sua. Sabe disso, né? — murmurei no seu
ouvido para que só ela ouvisse.
O bar estava muito silencioso e eu não queria chamar atenção.
Ela apenas respirou fundo e soltou o ar em resposta.
— Arrumei todo esse bar... e não temos o que comemorar. —
Barry falou, olhando para o seu trabalho com a decoração. —
Vamos pedir música triste e altas doses de cerveja?
— Cala a boca! — Maeve mandou. — Perdemos porque fomos
péssimas.
— Não foram — rebati. — Vocês deram tudo o que podiam.
Alguns alunos que estavam na torcida e foram para o bar com
a gente concordaram.
— Você nem entende de vôlei, Trevor. — Ela bufou.
— Deixa ela... — Caitlin pediu baixinho, se aconchegando
melhor no meu peito. — De qualquer forma, ela está certa. Se
estivéssemos nos saído bem, teríamos vencido.
Achava que não havia mesmo uma forma de convencê-las que
tinham dado tudo de si.
— Nossa! — Uma voz bem conhecida por mim veio da entrada
do estabelecimento, fazendo com que Caitlin erguesse o rosto e
olhasse na mesma direção. — Por que parece que vocês estão num
enterro?
Tiffany entrou com as cheerleaders, que também eram suas
amigas.
Olhei para Caitlin sem entender. Pensei que ali fosse o último
lugar onde ela estaria depois da confusão daquele dia no meu
quarto.
— Nós perdemos. — Maeve contou. — E você? Por que está
aqui?
— Para animar vocês, pelo jeito — respondeu, olhando para
cada um de nós. — Sei que vocês perderam, mas poderiam ao
menos considerar uma vitória ter chegado ao segundo lugar depois
de tantos anos sem ir para as semifinais?
Sim, era disso que eu estava falando.
— Sem falar que o semestre está acabando e acho que todos
aqui estão indo muito bem nele, então por que também não
comemoramos isso? Barry — chamou o jogador —, você nunca
precisou de tantos motivos para comemorar antes!
Ele acabou concordando ao perceber que ela tinha razão.
— Não temos mais um time para animar esse semestre, então
resolvemos vir animar vocês. — Uma das cheerleaders disse. —
Vocês foram bem!
Barry deu um pulo da cadeira.
— É isso! — Aproximou-se das meninas, ficando no meio de
Tiffany e outra, abraçando-as de lado. — Vamos nos divertir e
amanhã deixamos para focar em nossos erros.
Muitos que estavam ali só pela festa concordaram
imediatamente com a ideia da comemoração. Eu olhei para as
meninas do Bruins, que ainda pareciam um pouco relutantes com
aquilo.
— O que acha? Quer ir para a universidade? — perguntei para
Caitlin.
Ela negou.
— É verdade que temos algo para comemorar. — Sorriu,
aproximando sua boca da minha e me dando um selinho. — Sabe?
Nós estarmos juntos.
É, aquilo era um motivo e tanto.
[1]
Sigla para Língua Americana de Sinais.
[2]
O SET no esporte vôlei corresponde a um período de pontos que vão de 1 até
25. Nesse sentido, a equipe que atingir primeiro os 25 pontos conquistará a vitória do SET.
[3]
É assim que é chamado quando é um toque singelo e estratégico para o outro
lado.