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Mariana Ellen de Paulo

MODERNIDADE LÍQUIDA E OS DESAFIOS DO JUDICIÁRIO

Centro Universitário Toledo


Araçatuba
2018
Mariana Ellen de Paulo

MODERNIDADE LÍQUIDA E OS DESAFIOS DO JUDICIÁRIO

Trabalho para Conclusão de Curso apresentado ao


Centro Universitário Toledo de Araçatuba, sob
orientação da Prof. Me. Leiliane Rodriges da Silva
Emoto, como requisito parcial para a obtenção de
Bacharel em Direito.

Centro Universitário Toledo


Araçatuba
2018
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha mãe, exemplo


de força, de doação e de vida, que tem em
seu colo um refúgio seguro sempre. Porque
sempre esteve ao me lado e foi a minha
maior incentivadora, não medindo esforços
para que juntas chegássemos até aqui.
AGRADECIMENTOS

É difícil agradecer todas as pessoas que de algum modo, nos momentos bons
ou apreensivos, fizeram ou fazem parte da minha vida, por isso primeiramente
agradeço a todos de coração.
Agradeço à minha mãe, por tudo; somente ela sabe o que foi chegar até o
final dessa história. Como de costume, mas não pelo costume, não haveria espaço
suficiente para agradecê-la. Ao meu pai, por mostrar como posso ser, e ainda quero
ser como pessoa. À minha irmã, porque nela sempre encontrei todo apoio que em
tantas situações eu precisei; em você há certeza de companheirismo, cumplicidade e
amor incondicional.
Agradeço à minha querida e amável orientadora Leiliane, que me conduziu
com paciência, autenticidade e amizade, sempre mostrando como ser uma excelente
professora e profissional, a qual me espelho.
Agradeço aos meus amigos pela amizade e paciência, especialmente a turma
do fundão, da qual tive orgulho de fazer parte, agradeço convivência destes 5 anos,
que serão infindáveis.
E finalmente agradeço a Deus, por proporcionar estes agradecimentos a todos
que tornaram minha vida melhor, principalmente àqueles colocados cuidadosamente
por Ele. Deus, que a mim atribuiu alma e missões pelas quais já sabia que eu iria
batalhar e vencer, agradecer é pouco. Por isso lutar, conquistar, vencer e até mesmo
cair e perder, e o principal, viver é o meu modo de agradecer sempre.
EPÍGRAFE

“A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém


viu, mas pensar o que ninguém ainda pensou
sobre aquilo que todo mundo vê”.
(Arthur Schopenhauer)
RESUMO

O presente trabalho dedica-se a estudar a obra de Zigmund Bauman, especialmente


sua teoria da liquidez moderna, que ao contrário de muitos estudiosos, entende a pós-
modernidade como uma modernidade “líquida”, ou seja, sem forma definida,
inconstante e fluída. Essas seriam os traços essenciais das relações sociais na
atualidade. A confiança “sólida” num futuro planejado pela razão foi substituída pela
incerteza. Criticamos o mundo, nunca estamos satisfeitos, mas raramente sabemos o
que fazer com nossas críticas”. Incertos quanto ao futuro, os homens pós-modernos
substituem os projetos para o futuro pelo prazer instantâneo, tem a constante procura
pelo novo, substituindo os sonhos pelas ambições. Dentro desta sociedade líquida, a
ciência do direito foi apresentada sob o prisma do pensamento jurídico pós -
positivista, ressaltando a premência do retorno do diálogo entre a ética e o direito.
Este diálogo entre a ética e o direito está fundamentado no instituto do
Neoconstitucionalismo, que apresenta a dignidade da pessoa humana como valor
matriz do ordenamento jurídico.

Palavras-chave: Modernidade; Pós-modernidade; Zigmund Bauman; neoconstitucionalismo.


ABSTRACT

The present work is dedicated to studying the work of Zigmund Bauman, especially his theory
of modern liquidity, which unlike many scholars, understands postmodernity as a "liquid"
modernity, that is, without definite, inconstant and fluid form . These would be the essential
features of social relations today. "Solid" confidence in a future planned by reason has been
replaced by uncertainty. We criticize the world, we are never satisfied, but we seldom know
what to do with our criticisms. " Unsure of the future, postmodern men replace projects for
the future with instant pleasure, have a constant search for the new, replacing dreams with
ambitions. Within this net society, the science of law was presented under the prism of post -
positivist legal thinking, emphasizing the urgency of the return of the dialogue between ethics
and law. This dialogue between ethics and law is based on the institute of Neo-
constitutionalism, which presents the dignity of the human person as the matrix value of the
legal system.

Keywords: Modernity; Postmodernity; Zigmund Bauman; neo-constitutionalism.


SUMÁRIO

Introdução ..................................................................................................................... 12

I - “Modernidade líquida”: a pós-modernidade para Zygmunt Bauman ...................... 14

1.1. Diferenças históricas entre a modernidade e a pós-modernidade: da solidez à


liquidez....................... ................................................. Erro! Indicador não definido.

1.2. Principais características da sociedade atual: “entrando corajosamente


no viveiro das incertezas” ............................................................................. 22

II – Os sujeitos de direito na modernidade líquida ........................................... 27

2.1. O Sujeito de Direito ............................................................................ 27

2.2. Legisladores e intérpretes ............................................................................... 29

2.3. O conceito e o novo papel do magistrado no ordenamento jurídico............... 35

III - O mundo líquido e o retorno aos valores no ordenamento jurídico .......... 41

3.1. A ética pós-mderna na visão de Bauman ....................................................... 43

3.2. Neoconstitucionalismo: Direito e Valores em Tela ........................................ 46

3.3. Evolução do Neoconstitucionalismo .............................................................. 49

Conclusão ..................................................................................................................... 50

Referências ................................................................................................................... 58
INTRODUÇÃO

O homem é essencialmente sociável, contudo isto tem um custo. Com efeito,


os bens são poucos quando comparados com o desejo e, em decorrência disso, surge
as pretensões resistidas. Como forma de solucionar esta celeuma, dentro de uma
visão contratualista, surgiu o Estado Soberano.
O Estado regula a vida em sociedade, tendo o direito como ciência normativa
que tem como objeto esta regulação social. Não é somente o Estado que regula a
vida em sociedade. Há também a moral, surgindo, portanto, o dever de diferenciar
ambos.
Muitos afirmam que a moral não é eivada de sanção, cabendo esta
prerrogativa apenas ao direito no caso de cometimento de ilicitudes. Ocorre que,
embora seja robusta esta opinião, esta pesquisa não adere a esta corrente. Logo, o
entendimento aqui, é de que tanto a moral como o direito possuem sanção, sendo a
diferença encontrada no detentor desta. Na moral, a sociedade puni. Já no direito, o
monopólio da sanção cabe ao Estado.
Pois bem, se o Estado, via as normas estudadas pela ciência do direito,
regula a vida em sociedade; esta, a sociedade, tem um importante papel neste
âmbito de estudo.
Por isso, não é exagero afirmar que, antes de estudar a técnica, ou em outras
palavras, artigo de lei, é imperioso entender em que sociedade determinado
ordenamento jurídico é aplicado.
É esta a empreitada deste trabalho. Para tanto, como referencial teórico, foi
utilizado Bauman. Zygmunt Bauman nasceu na Posnânia, em 19 de novembro de
1925 e faleceu em Leeds, Reino Unido, no dia 9 de janeiro de 2017. Descendente
de família judia, fugiu da Polônia com sua família para a União Soviética com
medo do avanço nazista. Ele se aliou ao Primeiro Exército Polonês, comandado
então pela União Soviética, chegando a ir para campo algumas vezes. Retornou a
Polônia anos depois, onde foi lecionar da Universidade de Varsóvia, vindo a ser
destituído da função após ter suas obras censuradas, além de ser expulso do Partido
Comunista, abdicando aos poucos da influência marxista. Deixou definitivamente o
país, motivado pelas perseguições antissemitas que sofrera em decorrência da
Guerra Árabe-Israelense e por conta dos eventos de “Março de 68”, precisando

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renunciar sua nacionalidade. Emigrou para Israel a fim de lecionar na Universidade
de Tel-Aviv, mas logo foi para a Universidade de Leeds, na Inglaterra, onde
desenvolveu a maior parte de sua obra. (BITTAR, 2010)
Bauman, vivendo em uma sociedade moderna falida, onde todas as
promessas de certeza e verdades não foram adimplidas, buscou respostas. Destas,
surge o conceito de sociedade liquida que, conforme melhor explanado no decorrer
do trabalha, é a sociedade contrária aos sólidos, isto é, tudo é passageiro, fugaz,
temporário.
Neste contexto, valores são deixados para trás, pertencem ao mundo sólido.
Com isso em mente, a presente pesquisa teve como objetivo geral apresentar o
referencial teórico de Bauman, precisamente, na conceituação de mundo/sociedade
líquido.
Como objetivo específico, apresentou como o ordenamento jurídico tem se
portado em uma sociedade líquida, restando comprovado que o retorno do
relacionamento entre direito e ética foi necessário, conforme demonstrado via o
pensamento jurídico juspositivista. E, para atingir a esse diálogo entre a ética e o
direito, dentro desta sociedade líquida, o neoconstitucionalismo foi apresentado
como instrumento.

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I - “MODERNIDADE LÍQUIDA”: A PÓS-MODERNIDADE PARA
ZYGMUNT BAUMAN

1.1. Diferenças históricas entre a modernidade e a pós-modernidade: da solidez à


liquidez

Faz pelo menos trina anos ou mais que os intelectuais se colocam


infatigavelmente duas questões: a primeira é “o que é a pós-modernidade?”, e a
segunda é “quando termina a modernidade e começo a pós-modernidade?”. As
respostas são as mais variadas possíveis, controversas e difíceis de se chegar a um
consenso. São vários os pensadores que tentaram encontrar repostas a essa questão, e
o mais conhecido deles se chama Jean-François Lyoard (1924-1998). No livro “A
condição pós-moderna” (1979), ele apresenta a primeira resposta consistente do que
é pós-modernidade, definida como “a ideia de verdade construída lentamente pelos
pensadores modernos faliu; aquilo que se pensava como verdade, hoje é apenas uma
hipótese.”
Bauman também segue a mesma linha de raciocínio, ao colocar a consciência
pós-moderna como a consciência do fracasso da modernidade em relação às utopias
que prometeu. É como sair de um mundo simétrico a nossa capacidade de controle e
organização rumo o caos. Apesar da análise desse fracasso, também é um momento
de esperança, por ter deixado todos os problemas que ficaram na modernidade.
Pondé (2011) explica que, ao descrever a modernidade, Bauman (1989) usa o
fenômeno do Holocausto, especificamente descrito em seu livro “Modernidade e
Holocausto”. Nele, Bauman discute a teoria da cientista política alemã Hannah
Arendt (1906-1975), de que, no extermínio trabalharam pessoas normais, não
monstros, os quais cumpriam com suas responsabilidades e voltavam para suas
respectivas famílias, com as mesmas emoções de qualquer outra. Bauman identifica
que a preocupação com a administração da vida, que caracteriza a modernidade,
parece distanciar o ser humano da reflexão moral; nossa preocupação deve estar
voltada na solução de problemas, na ideia de eficácia, sem questões de ordem
moral. O Holocausto representa o ápice desse problema, onde a dinâmica e a

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violência da racionalidade chegam no seu topo. Com esse livro, o autor começa a
pensar se a modernidade, na realidade, não deveria de fato fracassar.
Nesse sentido, Bauman considera que a era moderna atingiu o apogeu com a
exaltação da ordem como principal fator de construção de um mundo estável,
seguro, coerente e sólido; todos os aspectos da vida são passíveis de descrição,
definição, organização e classificação, como uma das pretensões mais importantes
modernas. A partir dos resultados, as chances de intervirmos e modificarmos a
realidade para devolver uma ordem pura e inquestionável são maiores, pois o ideal
mundo moderno seria aquele sobre o qual pudéssemos ter o máximo de controle
possível. (COUTINHO, 2001)
Apoiado nessa ideia, surge em 1999 o livro “Modernidade Líquida”, que
retrata essa sociedade moderna e sua mudança para a pós-modernidade. É nele a
correlação criada entre a sociedade sólida para a sociedade líquida. Sua liquides faz
com que ela seja mais bem adaptada aos meios, e que com a mesma facilidade se
esvai para tomar outra forma. Ao contrário da solidez, que não consegue preencher
um ambiente que não seja de sua forma.

Os fluidos, por assim dizer, não fixam o espaço nem prendem o tempo.
Enquanto os sólidos têm dimensões espaciais claras, mas neutralizam o
impacto e, portanto, diminuem a significação do tempo (resistem
efetivamente a seu fluxo ou o tornam irrelevante), os fluidos não se atêm
muito a qualquer forma e estão constantemente prontos (e propensos) a
mudá-la; assim, para eles, o que conta é o tempo, mais do que o espaço
que lhes toca ocupar; espaço que, afinal, preenchem apenas “por um
momento”. Em certo sentido, os sólidos suprimem o tempo; para os
líquidos, ao contrário, o tempo é o que importa. (p. 45)

Assim, a sociedade moderna líquida não se fixa a um espaço ou tempo,


disposta à mudanças para algo novo. Tomar nova forma é mais fácil do que manter
uma forma fixa, além da nova forma representar força e invencibilidade. Após se
adaptar ao ambiente e tirar o melhor dele para si, parte-se para a próxima forma.
Como consequência, as formas de poder na sociedade estão sendo
reconduzidas e redistribuídas, e a durabilidade já não tem mais o mesmo valor.
Ponde (2011) fala:

No capitalismo tudo o que é sólido desmancha no ar. As coisas não tem


forma, elas se espalham. Hoje, se você tentar pegar na sua mão o que
entende por família, é líquido, porque sua relação com seus familiares é
uma relação líquida, a qualquer momento ela acaba. Não há nenhuma
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garantia de que a pessoa que está ao seu lado permanecerá com você.
Inclusive ela é alimentada pelo mesmo motor e você é, aquele “e mereço
ser feliz no que eu faço”, quando a pessoa que estiver ao meu lado não
preencher os requisitos da felicidade a qual eu tenho direito, eu troco.”

Contextualizando, podemos dizer que as famílias modernas estão com novas


estruturas e valores invertidos, trazendo novos valores para a sociedade. Portanto, o
nível de fluidez de cada pessoa é essencial para sua inserção nos grupos ou na
sociedade como um todo. A vida moderna impõe a mudança do sólido para o
líquido.
Dada à importância do conceito de liquidez, é preciso saber sobre seu o
processo de construção, pois a percepção de uma sociedade líquido-moderna foi
sendo moldada gradamente.

Na verdade, a sorte dos judeus resumia a assustadora extensão da


reviravolta social e servia como claro e impositivo lembrete da erosão das
velhas certezas, da dissolução e evaporação de tudo antes considerado
sólido e duradouro. (Bauman, 1998b, p. 66)

A modernização compulsivo-obsessiva foi desde o princípio a mais


profunda essência da modernidade, e nada sinalizava que estivéssemos na
iminência de nos libertar dessa compulsão, dessa obsessão. Com uma
importante ressalva, porém: se nossos antepassados quiseram derreter
todos os sólidos existentes, não foi pelo desagrado em relação à solidez,
mas pela insuficiente (em sua opinião) solidez daqueles sólidos
tradicionais/incorporados/estabelecidos. Eles consideravam “derreter os
sólidos” uma medida meramente transitória, a ser aplicada apenas até que
esses sólidos fossem produzidos de modo a não exigir nem permitir
qualquer fusão posterior. (...) A mudança perpétua seria o único aspecto
permanente (estável, “sólido”, se se quiser assim dizer) de nossa forma de
viver.
A partir dessa conclusão, só havia um pequeno passo a se dar para definir
como “líquido-moderna” aquela forma emergente de vida, aquela forma
que era moderna de uma maneira radicalmente diferente daquilo que
havíamos testemunhado (e de que havíamos participado) antes. (Bauman
2010a, p. 11-12).

Santos (2013) ressalta a importância em saber que modernidade sólida e


líquida são conceitos que retratam o desejo de mudança da sociedade, se
distinguido apenas o limite do término do processo. Na fase sólida, a mudança
somente ocorre quando um sólido é substituído por um sólido novo, mas
aperfeiçoado. Já na fase líquida, não há momento certo para ocorrer alguma
mudança: ela ocorre constantemente e compulsivamente, pois mudamos a todo
momento. Portanto, podemos dizer que na perspectiva baumaniana ser moderno

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significa “mudar compulsivamente”. Aliás, “a mudança é a nossa única
permanência. E a incerteza, a nossa única certeza” (Bauman, 2011).
Bauman também traz em seus livros, como em “Amor Líquido: Sobre a
Fragilidade dos Laços Humanos” (2003), sua própria vida em correlação entre a
teoria da liquidez sobre as relações pessoais. Diante de tantos amores líquidos, o
autor conta que teve um casamento que não foi liquefeito, mesmo diante de crises.
Ele aponta desafios e reconhece que foi preciso muito mais do que aquele convite
imediato de casamento para que o amor amadurecesse ao longo dos anos (SANTOS,
2013):

O amor não é um objeto pré-confeccionado e pronto para o uso. É


confiado aos nossos cuidados, precisa de um compromisso constante, ser
regenerado, recriado e ressuscitado todo dia. Acredite, o amor satisfaz
essa atenção maravilhosamente. Quanto a mim (e espero que também
tenha sido assim para Janina), eu posso lhe dizer: assim como o vinho, o
sabor do nosso amor melhorou ao longo dos anos. (...) Desde o início,
decidimos que estar juntos, embora difícil, é incomparavelmente melhor
do que a sua alternativa. Uma vez tomada essa decisão, também se olha
para a crise conjugal mais terrível como para um desafio a ser enfrentado.
O exato oposto da declaração menos arriscada: “Vivamos juntos e
vejamos como vai ser...”. Nesse caso, mesmo uma incompreensão assume
a dimensão de uma catástrofe seguida pela tentação de pôr fim à história,
abandonar o objeto defeituoso, buscar satisfação em outro lugar.
(Bauman, 2012).

“...um amor “até segundo aviso”, o amor a partir do padrão dos bens de
consumo: mantenha-os enquanto eles te trouxerem satisfação e os
substitua por outros que prometem ainda mais satisfação. O amor com um
espectro de eliminação imediata e, assim, também de ansiedade
permanente, pairando acima dele. Na sua forma “líquida”, o amor tenta
substituir a qualidade por quantidade — mas isso nunca pode ser feito,
como seus praticantes mais cedo ou mais tarde acabam percebendo.”
(Bauman, 2010).

Bauman falava continuamente sobre a fragilidade dos laços humanos,


manifestada pela rotatividade e descarte após insatisfação ou pela busca de melhor
satisfação.
No livro “Modernidade líquida” há análise dessa liquidez que permeia cinco
tópicos básicos: a emancipação, a individualidade, o tempo e espaço, o trabalho e a
comunidade.
O conceito de emancipação para o autor representa a independência ou
tornar-se liberto do que impede o movimento pessoal. Se o significado de ser livre
é não ter empecilho para se movimentar, devemos nos emancipar da sociedade.
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Contudo, é difícil ter liberdade em uma sociedade aparentemente livre. Além disso,
esta liberdade traz a possibilidade de fazer tudo aquilo que deseja, mas em
contrapartida, há responsabilidade por seus atos. Isso quer dizer que esta fluidez
proporcionada às pessoas fez com que as mesmas pagassem o preço por ter aquilo
que mais desejassem: a liberdade de poder estar de maneira que anteriormente a
sociedade fosse criminalizar ou penalizar a pessoa por suas escolhas. Todos querem
a liberdade para fluir e tomar seus lugares diversos e mudar constantemente e,
portanto, deixaram de indagar os porquês de cada situação. Na pós-modernidade, a
crítica não é bem recebida. Aceita tudo o que se tem e o que lhes é oferecido, pois
já tem sua liberdade ganha. As críticas se transformam em reflexões e
questionamentos.

O que foi separado não pode ser colado novamente. Abandonai toda esperança de
totalidade, tanto futura como passada, vós que entrais no mundo da modernidade
fluida. Chegou o tempo de anunciar, como fez recentemente Alain Touraine, “o fim
da definição do ser humano como ser social, definido por seu lugar na sociedade,
que determina seu comportamento e ações”. Em seu lugar, o princípio da
combinação da “definição estratégia da ação social que não é orientada por normas
sociais” e a “defesa, por todos os atores sociais, de sua especificidade cultural e
psicológica” “pode ser encontrado dentro do indivíduo, e não mais em instituições
sociais ou em princípios universais.( Bauman, p. 29)

É importante saber que para Bauman, a modernidade líquida coloca todas as


responsabilidades sobre a vida no próprio indivíduo. Ele precisa decidir e justificar
sozinho cada ação que tomará em sua vida. Na modernidade sólida, haviam
referenciais fixos que facilitavam os percursos da vida. Os indivíduos da
modernidade líquida não focam nos objetivos destinados a ele pela cultura ou pela
família, porque não há a necessidade de atingir algum objetivo final. Por isso, o
meio passa a ter maior importância do que o fim, objetivo secundário que ficará
envolto a ansiedade e agonia por não ter referenciais a fim de assegurar sua
concretização. Bauman traz como exemplo o capitalismo, cujo poder exige um
controle da população. No modelo sólido, o trabalhador não precisava conhecer o
processo completo da produção, mas com a sociedade líquida há características
mais diversificadas, que necessita de um conhecimento, mesmo que breve, de todas
as atividades exercidas no processo produtivo da empresa, pois o sujeito pode se
moldar de acordo com a situação.

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No capitalismo líquido também há a prática de repassar imagens de pessoas
famosas usando aquilo que o consumidor quer ser, ou seja, como modelo de
influência. Entretanto, quando o indivíduo se espelha em outras pessoas, e se baseia
nas atitudes delas, perde toda sua essência e toma forma de um novo ser, não sendo
nem o próprio indivíduo, nem o modelo a ser seguido.
Assim, têm-se o fim da era do indivíduo. Mesmo que o novo capitalismo não
tenha abolido as autoridades ditadoras de leis, também não fez com que estas
fossem dispensáveis, mas apenas abriu caminho para um maior número de
ditadores. Assim, cada um tem seu reino por um curto período de tempo, até não ser
mais “novidade”, além de nem todos poderem reinar neste período por muito
tempo.

Numa sociedade sinóptica de viciados em comprar/assistir, os pobres não podem


desviar os olhos; não há mais para onde olhar. Quanto maior a liberdade na tela e
quanto mais sedutoras as tentações que emanam das vitrines, e mais profundo o
sentido da realidade empobrecida, tanto mais irresistível se torna o desejo de
experimentar, ainda que por um momento fugaz, o êxtase da escolha. Quanto mais
escolha parecem ter os ricos, tanto mais a vida sem escolha parece insuportável para
nós. (p.59)

Nós somos responsáveis pelo outro, estando atento a isto ou não, desejando ou não,
torcendo positivamente ou indo contra, pela simples razão de que, em nosso mundo
globalizado, tudo o que fazemos (ou deixamos de fazer) tem impacto na vida de
todo mundo e tudo o que as pessoas fazem (ou se privam de fazer) acaba afetando
nossas vidas.(p. 177)

Para conquistar esta individualidade na modernidade líquida vale tudo, como


o consumo exagerado em busca de ser aquilo que a sociedade demanda. As pessoas
tornam-se reféns do que é posto como liberdade, levando a consumo constante na
certeza de que lhe fará feliz.
Com um capítulo abordando a correlação entre tempo e espaço, o autor
começa refletindo sobre o espaço sobre o projeto de construção de uma cidade
planejada pelo arquiteto inglês George Hazeldon. Bauman explica que o projeto
denominado “Heritage Park” consistia em uma fortaleza, o que proporcionava
segurança, mas sufocava as pessoas que ali pertenciam. O objetivo de mostrar uma
sociedade perfeita, que vivesse em harmonia, acabava também reprimindo os
próprios moradores. Para reverter essa situação, Bauman pondera que o que garante
uma convivência com o mínimo de harmonia seria “civilidade”, e para que isto possa

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acontecer faz-se necessário um ambiente civil, promovido por espaços públicos. No
decorrer do texto, Bauman exemplifica algumas categorias de espaços que são
públicos, sendo ele social e/ou cultural, mas principalmente sem ter a necessidade da
interação com outros indivíduos, tendo cada um o seu momento e seu espaço. Se
esse espaço não for preenchido, não há significado, até o momento que é tomado
por um que lhe dará sentido, até mudar de forma novamente. Esta fluidez moderna
gerou o fenômeno do multitasking, que é habilidade de realizar múltiplas atividades
no mesmo tempo e ambiente, com agilidade e sem perda de tempo.
Bauman acreditava que este momento no trabalho coloca o indivíduo no
controle daquilo que quer, podendo mover o mundo para frente. Também debate
sobre a diferença entre os indivíduos que se culpam por todos seus fracassos, e
aqueles que conseguem ter controle de suas vidas e ações, para alcançar o destino
desejado.
Diante da libertação do indivíduo, o que importa é o momento presente. A
“instantaneidade” do tempo desvalorizou o espaço. O conceito de tempo na
sociedade moderna está relacionado a rapidez, expansividade e flexibilidade. As
pessoas que se movem e agem com rapidez, mandam nas que resistem em fixar-se
em um só espaço. A permanência e a durabilidade na modernidade líquida são
valores que não preponderam mais.
Porque a modernidade exige a flexibilidade, abre-se espaço para o trabalho
mais fluído, necessitando de um novo estilo que fica em constante movimento,
sempre de olho no futuro. Com isso, o trabalhador recebe mérito por um trabalho
que traz entretenimento e criatividade. Em contrapartida, esse mesmo trabalhador
quer um trabalho que proporcione sensações e novas experiências. É esse
trabalhador que o novo capitalismo procura: nada que seja para longo prazo, pois
funcionários podem ser substituídos rapidamente, assim como os objetos. Porém,
um preço a pagar são os laços transitórios e a transitoriedade por aqueles que
perseguem seus objetivos individuais, tornando as responsabilidades pessoais em
grau excessivo.
No último capítulo, Bauman apresenta o termo das cloakrooms communities,
ou comunidades cabide. Nesses termos:

Os frequentadores de um espetáculo se vestem para a ocasião, obedecendo


a um código distinto do que seguem diariamente – o ato que

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simultaneamente separa a visita como uma ‘ocasião especial’ e faz com que
os frequentadores pareçam enquanto durar o evento, mais uniformes do que
na vida fora do teatro. É a apresentação noturna que leva todos ao lugar –
por diferentes que sejam seus interesses e passatempos durante o dia. Antes
de entrar no auditório, deixam os sobretudo ou capas que vestiram nas ruas
no cloakroom da casa de espetáculos ... Durante a apresentação, todos os
olhos estão no palco; e também a atenção de todos. Alegria e tristeza, risos
e silêncios, ondas de aplauso, gritos de aprovação e exclamações de
surpresa são sincronizados – como se cuidadosamente planejados e
dirigidos. Depois que as cortinas se fecham, porém, os espectadores
recolhem seus pertences do cloakroom e, ao vestirem suas roupas de rua
outra vez, retornam a seus papéis mundanos, originários e diferentes,
dissolvendo-se poucos momentos depois na variada multidão que enche as
ruas da cidade e da qual haviam emergido algumas horas antes. Cloakroom
communities [comunidades cabide] precisam de um espetáculo que apele a
interesses semelhantes em indivíduos diferentes e que os reúna durante
certo tempo em que outros interesses – que os separam em vez de uni-los –
são temporariamente postos de lado, deixados em fogo brando ou
inteiramente silenciados (Bauman, p. 228).

Esse conceito representa o desmembramento da comunidade, em que os


espetáculos retiram o sentido de engajamento coletivo e duradouro. Quanto ao
indivíduo, acaba por despender pouco tempo para o comunitário, vivendo de escolhas
individuais. Diz Bauman que essas comunidades dispersam mais do que fazem fluir a
energia dos impulsos de sociabilidade, acabando por fim afirmar o esforço
essencialmente solitário dos indivíduos.
Se vivemos em uma sociedade líquido-moderna, precisamos aprender a viver
uma vida líquida (BAUMAN, 2007). A sociedade atual nos impõe mudanças o tempo
todo, em curtos espaços de tempo, não sendo possível consolidar rotinas, hábitos,
virtudes, valores ou formas de agir do indivíduo, sendo que a vida nesta sociedade
líquido-moderna não pode ficar parada, caso contrário, o indivíduo acaba por
extinguir-se no meio do caminho (BARÔNIO, 2015).
Podemos observar ainda, que a maior dificuldade para a sociedade atual nos
tempos líquidos são os questionamentos, pois o mundo flui rapidamente e não há
tempo para maiores questionamentos. Além disso, a própria sociedade acaba por não
aceitar nada que envolva se expor, explicar ou interagir (BARÔNIO, 2015), e o
sujeito deve estar preparado para esta nova forma de vida.

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1.2. Principais características da sociedade atual: “Entrando
corajosamente no viveiro das incertezas”.

Atualmente, não é difícil perceber que as mudanças estão ocorrendo de forma


mais rápida e radical. Os valores estáveis e firmes da modernidade sólida, outrora
considerados eternos, sofreram “derretimento” e abriram caminho para a fluidez e a
efemeridade das relações. Procura-se por segurança em um mundo cada vez mais
inseguro, e neste sentido, ressalta-se a dificuldade em encontrar referências.
(CUGINI, 2014). Se antes havia confiança sobre o futuro, hoje só há incertezas.
(RORATTO, 2010).
Bauman dedicou-se a falar sobre essa insegurança generalizada no livro
“Tempos líquidos” (2007), em que discorre como as grandes cidades se tornaram um
ambiente inseguro ao invés de oferecer proteção a sociedade. Também aborda
fenômenos típicos da globalização, como o terrorismo, desemprego e solidão, e sua
relação com a fragmentação da solidariedade humana. É bem enfatizada a questão da
insegurança social, “num mundo em que poucas pessoas continuam a acreditar que
mudar a vida dos outros tenha alguma relevância para a sua” [...]. A sociedade não é
mais protegida pelo Estado [...] é pouco provável que confie na proteção oferecida
por este. (BAUMAN, 2007, p. 30).
Os tempos são “líquidos” porque tudo muda rapidamente e nada é feito para
durar, para ser “sólido”. As relações humanas, seja pessoal ou profissional, não são
mais estáveis e duráveis. A globalização e a incompleta abertura social geraram na
sociedade grande insegurança a ponto de ser significativamente difícil escolher m
caminho a seguir. (BAUMAN, 2007, p. 13)
Assim, torna-se imprevisível o destino da sociedade diante das consequências
da globalização. Diante dessa insegurança, conflitos, guerras e interesses a sociedade
se tornou um ambiente aberto para os negócios, mas fechados para a sociedade e para
o convívio social. As pessoas tornaram-se individualistas e as relações são
superficiais, pois se enfraqueceram os vínculos humanos e a solidariedade. O autor
relata que em quanto a sociedade não entrar em um consenso de responsabilidade
ética para conduzir os problemas e diminuir a desigualdade social, com uma

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democracia voltada para o bem estar das pessoas e não da economia, será difícil
constituir uma sociedade de plena “liberdade”. (ROVER; MEZZAROBA, 2012)
Diante dessas incertezas e insegurança, Bauman abordou em “Tempos
líquidos”, cinco principais mudanças ligadas, direta e indiretamente, da sociedade
atual.
“A vida líquido-moderna e seus medos” é o título do primeiro capítulo da
obra, e como o nome já demonstra, aborda a instituição do medo na sociedade
contemporânea. Como diz Tavares (2007), o ambiente de incertezas gerado pelas
fragilidades, principalmente políticas (enfraquecimento do papel do Estado e
vulnerabilidade deste perante as lógicas do mercado), e valorizado pelos indivíduos
cada vez mais isolados e vulneráveis à ação do outro (individualismo e redução da
solidariedade social), o medo desponta como grande elemento cotidiano, instaurando
novas práticas e novas angústias. Nesta parte abordam-se os medos individuais,
relacionados ao trabalho e à segurança pessoal, e os medos coletivos, principalmente
para um dos grandes temores da atualidade mundial: o terrorismo. Bauman ainda
deixa claro os mecanismos e as causas, não só do surgimento e crescimento do medo
na sociedade, mas também desvendar os mecanismos que o alimentam e a geração
deste próprio medo. Porém, diz que caberá à sociedade encontrar as ferramentas para
vencê-lo.
Ainda sobre a temática do medo na sociedade, Bauman escreve o livro “Medo
líquido” descrevendo alguns aspectos do medo na modernidade líquida. Nesse
sentido:

Significa o medo fluindo, não ficando no mesmo lugar, mas difuso. E o


problema com o medo líquido é que, ao contrário do medo concreto e
específico, que você conhece e com o qual está familiarizado, é que você
não sabe de onde ele virá. (...) não há estruturas sólidas ao nosso redor nas
quais possamos confiar e nas quais investir nossas esperanças e
expectativas. Até mesmo os governos mais poderosos, frequentemente, não
podem entregar o que prometem. Eles não têm poder para tanto.

De acordo com Bauman (apud Siqueira, 2013), existem três formas de o medo
atormentar as pessoas na sociedade líquida:
1) medo de não conseguir trabalhar e ter qualquer tipo de sustento, a fim de
garantir o futuro;
2) medo de perder a posição na estrutura social;
3) o medo em torno da integridade física.

23
Continuando com o livro “Tempos líquidos”, o segundo tópico trata “A
humanidade em movimento”, analisando o fluxo de imigrantes e refugiados,
inclusive a vivência nos campos de concentração, ou “microcosmo” em sua visão.
Bauman também fala sobre a perversidade e as contradições que permeiam hoje as
relações políticas internacionais e as relações de poder, servindo ainda como reflexão
para entender as políticas recentes sobre a imigração em países europeus e nos EUA.
“Estado, democracia e a administração dos medos” é o assunto abordado no
terceiro capítulo, onde são analisados os medos gerados pelos novos papéis sociais e
as modificações no tratamento do tema da insegurança. Segundo Siqueira (2013),
uma espécie de “terceirização da administração” do medo passa a ocorrer,
aumentando consequentemente a exclusão dos menos providos de recursos tanto
econômicos quanto políticos. Por isso, coloca-se em questão a necessidade de uma
reformulação sobre os direitos políticos e sociais, propondo-se uma distribuição no
uso conjunto dos mesmos nas diversas camadas da sociedade. Os medos que nos
cercam – “a fragilidade perante a vida, à morte e ao tempo” e “a inadequação dos
regulamentos que ajustam as relações dos seres humanos na família, no Estado e na
sociedade” – são apresentados e diferenciados pelo autor. Aqueles que dizem
respeito propriamente ao indivíduo, aos limites do próprio ser, sempre nos
acompanharão e farão parte dos desafios da psique humana, uma referência a Freud.
Já os medos coletivos, ligados à família e ao Estado, tratam outro âmbito de
insegurança, no que diz respeito a medos sociais. Finaliza dizendo que estes, hoje,
encontram-se numa situação limite ao ser refletido nos medos individuais,
No quarto capítulo, denominado “Fora de alcance juntos”, o autor trata da
dicotomia social vivida nas grandes cidades, envolta a incerteza e o medo,
características centrais da era líquido-moderna. Basílio (2008) explica que Bauman
reflete sobre a distância cada vez maior entre os mundos das duas categorias de
habitantes: “o espaço da camada superior geralmente está conectado à comunicação
global e a uma vasta rede de intercâmbio, aberta a mensagens e experiências que
envolvem o mundo inteiro. Na outra extremidade, redes locais segmentadas,
frequentemente de base étnica, recorrem a sua identidade como o recurso mais
valioso para defender seus interesses e, em último instância, sua existência.” Assim,
os membros da “camada superior” não pertencem ao lugar que habitam, pois suas
preocupações estão em outro lugar. Segundo Bauman, mesmo livres para se

24
dedicarem a seus passatempos e terem serviços de conforto diário assegurados, não
têm interesses investidos na cidade em que residem. Por outro lado, os cidadãos
urbanos da camada inferior são “condenados a permanecer locais”, em que a batalha
pela sobrevivência, e por um lugar decente no mundo, é travada e por vezes vencida,
mas na maioria das vezes perdida. O acirramento desta segmentação social pode ser
observado pelo aumento dos condomínios fechados, a exemplo. Desta forma, as
cidades, que originalmente construídas para fornecer proteção a todos os seus
habitantes, hoje se associam com mais frequência ao perigo do que à segurança.
“A utopia na era da incerteza” encerra a obra, onde o autor trata da utopia
diante a incerteza do mundo contemporâneo. Para Bauman, uma utopia na era da
incerteza é fundamental: sonhamos com um mundo seguro no qual possamos confiar
e acreditar. O sonho dos utopistas necessitava de duas condições para nascer:
1. Um sentimento irresistível de que o mundo não estava atuando de maneira
adequada; e
2. A confiança na capacidade humana de realizar essa tarefa.
Neste sentido, Basílio (2008) explica a ideia o autor ao apresentar três
metáforas diferentes entre si, mais relacionadas por interagir com o mundo. A
primeira refere-se ao guarda-caça, que tem por princípio defender, proteger e
preservar a terra contra toda interferência humana. A segunda diz respeito ao
jardineiro, o qual presume que não haveria nenhuma espécie de ordem no mundo se
não fosse por sua atenção e esforços constantes. Essas duas metáforas tipificam a
autoridade investida aos Estados-Nações. Além disso, são estes últimos que tendem a
ser os mais zelosos e hábeis construtores da utopia. No nosso tempo a postura do
jardineiro está cedendo vez à do caçador. Diferente dos dois tipos que prevaleceram
este não dá a menor importância ao “equilíbrio” geral “das coisas”, seja ele “natural”
ou planejado e maquinado. A única tarefa que os caçadores buscam é outra
“matança”, suficientemente grande para encherem totalmente suas bolsas. Esses são
produtos da globalização e do enfraquecimento do Estado-Nação. Contudo, nem
todos podem tornar-se caçadores, mas os mais abastados.
Moreira (2017) diz que agora todos são caçadores ou forçados a agir como
eles, e por isso é que há pouco espaço para ideais utópicos. O sonho de tornar a
incerteza menos assustadora e a felicidade permanente mudando o próprio ego, e de
mudar o ego trocando de vestido, é a “utopia” dos caçadores.

25
Por fim, pode-se perceber a importância dada pelo autor no planejamento das
políticas públicas. Basílio (2008) coloca que muitas vezes somos tentados o produzir
estratégias locais para resolução de problemas que, na verdade, não compreendemos.
Talvez esta seja a razão de continuarmos tentando. Um caso interessante são os EUA,
que lideram uma campanha ao combate de drogas nos cartéis colombianos, mas
todavia, não são tão impetuosos no comércio de venda de armas. São essas
incongruências que nos circundam, como construir estratégias para essas questões, se
não controlamos os insumos de tais processos. O sentimento que advém desta análise
é o de impotência, mas o autor nos incentiva a continuar visionando um mundo
melhor.

26
II - OS SUJEITOS DE DIREITO NA MODERNIDADE LÍQUIDA

Entender o momento atual, período denominado de modernidade líquida por


Bauman, é imprescindível para a análise do direito.
De fato, o direito é uma ciência normativa e, como toda ciência normativa,
interfere no objeto de estudo. No caso do direito, uma ciência social aplicada -
normativa, o objeto de estudo são as normas de condutas que regulam a vida de
uma determinada sociedade.
As normas, regras e princípios, aplicadas em um determinado Estado
soberano, sem, é claro, se esquecer das regulamentações via tratados internacionais,
criam direitos e obrigações para o povo/população/pessoas do Estado. Surge os
sujeitos de direito.
Neste contexto de pós-modernidade, é imperioso para o direito entender
quem são esses sujeitos de direito. Há valores caros para esses sujeitos? Ou, ainda,
são esses sujeitos regrados somente por meio da ciência jurídica, isto é, das leis; ou
a ciência ética é levada em conta no contexto pós-moderno?
Além disso, as funções estatais da pós-modernidade, as funções de legislar e
julgar, por exemplo; cumprem o seu papel apenas por descrever os fenômenos
sociais de forma abstrata, bem como efetuar a subsunção da norma ao caso
concreto? Ou, para efetuar suas funções na pós-modernidade, o legislador tem que
criar normas que “pegam”? E, no caso do juiz, o certo é a dogmática ou a zetética?
Com isso em mente, sendo a pesquisa fundamentada na obra de Baumam,
seguir-se-á, sem a pretensão de esgotar o tema, uma análise dos sujeitos de direito,
bem como dos legisladores e dos juízes no contexto pós-moderno.

2.1. O Sujeito de Direito

A vida em sociedade é baseada em relações, mas não são todas deste mundo
fático que são interessantes para o mundo jurídico. Nessa área de estudo, são

27
relevantes os fatos ocasionados do processo social de adaptação, que darão origem à
regra jurídica.
De acordo com Taisa Maria Macena de Lima (1999):

A passagem do meramente factual para o jurídico dá-se com a nomogênese,


partindo-se da constatação de que determinado fato natural ou ato humano,
por sua repercussão na comunidade, deve ser coibido, incentivado ou
simplesmente autorizado. Feita tal avaliação, são elaboradas normas
(jurídicas), cuja estrutura comporta a descrição de um fato (hipótese de
incidência, suporte fático, tatbestant etc.) e as consequências
desencadeadas com a verificação do fato previsto. (...). O fenômeno da
juridicização é lógica e cronologicamente posterior ao da nomogênese.
Juridicizar significa tornar jurídico, implicando, assim, a entrada de certo
evento (fato natural ou conduta do ser humano) no mundo jurídico. O
evento somente entra no mundo jurídico quando preexiste norma que o
discipline. A juridicização assinala a existência do fato no mundo jurídico,
ainda que esse implique violação de norma positivada. (pág. 209)

Como conclusão, a autora dispõe que “adjetivo jurídico qualifica tudo o que é
disciplinado pelo Direito e não apenas a conduta tolerada ou imposta pela norma
(conduta lícita)”. (pág. 209).
Assim, percebe-se que a personalidade conferida ao homem é a aptidão para
titularizar direitos e obrigações, tornando-se sujeito das relações jurídicas. Por isso,
o livre-arbítrio humano é delimitado neste sujeito que se relaciona dentro do
regramento jurídico.
Para Kelsen (2006, pág. 191), “A teoria tradicional identifica o conceito de
sujeito jurídico com o de pessoa. Eis sua definição: pessoa é o homem enquanto
sujeito de direitos e deveres.”
Entretanto, o conceito de pessoa não é o mesmo que sujeito de direito, porque
ser pessoa pressupõe ser sujeito de diretos e deveres. Existe parte da doutrina afirme
que quando se referem a mesma figura tem o mesmo significado, uma análise mais
profunda mostra ser institutos distintos. Kant (2001, pág. 94) escreveu em seu livro
Crítica a Razão Pura, que a concepção de pessoa foi incorporada ao direito da
seguinte forma “pessoa é um sujeito dotado de razão e vontade livre”. Assim, o
significado de pessoa é estudado dentro do campo da personalidade e o significado
de sujeito no campo das relações jurídicas.
Fábio Ulhôa Coelho (2006, apud Costa) explica essa diferença em que

28
Sujeito de direito é conceito mais amplo que pessoa: nem todos os sujeitos
são personalizados. Em outros termos, os titulares de direitos e obrigações
podem ou não ser dotados de personalidade jurídica. Se se considerarem
todas as situações em que a ordem jurídica atribui o exercício de direito ou
(o que é o mesmo, visto pelo ângulo oposto) o cabimento de prestação, o
sujeito será o titular do primeiro ou o devedor da última. No conceito de
sujeito de direito encontram-se, assim, não só as pessoas, físicas ou
jurídicas, como também algumas entidades “despersonalizadas”.(p. 8-9)

O mesmo autor também classifica o sujeito de direito em cinco espécies:

Os sujeitos de direito podem ser, inicialmente, distinguidos em dois


grupos: de um lado, a pessoa física e o nascituro; de outro, a pessoa
jurídica e as demais entidades despersonalizadas. Chamem-se os primeiros
de sujeitos humanos, numa referência ao objeto semântico do termo, o ser
humano, e os últimos, inanimados [...]. Os sujeitos de direito podem
também ser classificados em personalizados e despersonalizados. Na
primeira classe, as pessoas físicas e jurídicas; na segunda, o nascituro, a
massa falida, o condomínio horizontal etc. (p. 9).

Logo, as noções de sujeito de direito e pessoa não se confundem.


Quando uma lei é elaborada e toda vez que a lei é interpretada – por juízes,
advogados, funcionários públicos e cidadãos em geral – encontra-se subjacente uma
noção de sujeito de direito. O sujeito de direito é aquele a quem a lei – em sentido
amplo – atribui direitos e obrigações, aquele cujo comportamento se pretende
regular. A pergunta sobre como esse sujeito toma decisões – em última instância,
quem ele é – interessa aos juristas sob diversos pontos de vista.

2.2. Legisladores e intérpretes

Se o sujeito de direito é protagonista das relações jurídicas, os legisladores e


intérpretes serão aqueles que irão estudar essa interação e, a partir delas, criar
regras que orientarão esse sujeito a conviver em harmonia na sociedade.
Essas regras nada mais são do que as leis, e logo, toda lei é relativa a um
elemento moral ou social da realidade.
Taporosky (2017) explica que para Bauman o legislador nasceu com o papel
de legislar de acordo com o progresso da sociedade, da razão. Detendo
conhecimento a frente de tudo e de todos, seu papel é orientar e dar diretrizes de
forma a conduzir a sociedade a evolução. De acordo com Bauman:
29
Quando foi cunhada, nos primeiros anos do século XX, a palavra
“intelectual” era uma tentativa de recapturar e reafirmar a centralidade
social e as preocupações globais que estiveram associadas à produção e
disseminação do conhecimento durante o Iluminismo. Ela era aplicada a
uma série heterogênea de romancistas, poetas, artistas, jornalistas,
cientistas e outras figuras públicas que sentiam ser responsabilidade
moral sua, e seu direito coletivo, interferir de modo direto no processo
político por meio da influência que exerciam sobre as mentalidades da
nação e moldar as ações de seus líderes políticos. (p.15)

Porém, o filósofo explica que a racionalidade foi base de análise dessa


sociedade, marco da era moderna. Foi com a transição para a pós-modernidade que
o legislador passou a ser interprete do meio, levando em conta cultura no interior
da globalização e afirmação das pluralidades.

A arte da conversação civilizada é algo de que o mundo pluralista


necessita com premência. Ele só pode negligenciar essa arte às suas
expensas. Conversar ou sucumbir. (BAUMAN, p.197)

Essas questões foram abordadas por Bauman em seu livro Legisladores e


Intérpretes, de 1987. Nele, o autor coloca a dificuldade de enquadrar os fenômenos
sociais observados no conceito de modernidade, pois ainda não havia definido sua
própria concepção de realidade.

O volume de anormalidades, de “exceções à regra”, tornava questionável


a “norma” e a “regra” assumida de forma aberta ou tácita pelo discurso
dominante que se referia a uma “modernidade”. Se a vida moderna era de
fato como a teoria aceita da modernidade me ensinara, então o que eu
descobri sobre a realidade atual não era mais a “modernidade”, e sim
outra coisa. Mas o quê? (p.10)

Naquele momento para o autor, a resposta que se aproximava das indagações


acerca de tais mudanças, fora a ideia de “pós-modernismo”. Entretanto, observou
que tal significado possuía um caráter “negativo”, uma vez que afirmava o que a
realidade atual já não era mais, sem oferecer informação sobre o que estava em seu
lugar. ( T EIXEIRA, 2013). Assim, “o principal significado da ideia de pós-
modernidade é que ela é algo diferente da modernidade, ao indicar portanto, que a
modernidade já não é a nossa forma de vida, que a Era Moderna está encerrada, que
ingressamos hoje em uma outra forma de viver” (BAUMAN, 1999, p.11).
Ocorre que a ausência ou fraca orientação acerca da identidade, regras e
lógicas própria, bem como das características definidoras desta “outra forma”,
30
emprestou à ideia de pós-modernidade um caráter provisório à solução para o
dilema de Bauman. A presunção do término da “Era da modernidade”, e a
afirmação de um “lado oposto”, em que já estaríamos inseridos, é inaceitável para o
autor, uma vez que para ele estávamos mais modernos do que nunca. ( T EIXEIRA,
2013)
Entretanto, há uma importante ressalva:

[...] se nossos antepassados quiseram derreter sólidos existentes, não foi


pelo desagrado em relação à solidez, mas pela insuficiente (em sua
opinião) solidez daqueles sólidos tradicionais/incorporados/estabelecidos.
Eles consideravam “derreter os sólidos” uma medida meramente
transitória, a ser aplicada apenas até que esses sólidos fossem produzidos
de modo a não exigir nem permitir qualquer fusão posterior. (BAUMAN,
p.12)

Deste modo, a pós-modernidade, sob a perspectiva de Bauman, era a


modernidade despojada de suas ilusões. O que decerto despontava para o autor era
a ideia de que a “mudança perpétua”, contínua, seria o único aspecto permanente
desse novo modo de vida. Daí, a partir dessa conclusão, o autor chegaria à
expressão “líquido-moderna”, para definir o que em linhas anteriores chamara de
forma “emergente de vida” e cautelosamente classificou de “pós-modernidade”,
aquela forma de vida que era moderna de uma maneira radicalmente diferente
daquilo que o autor havia testemunhado e participado antes. ( T EIXEIRA, 2013)
A perspectiva identificada para esse novo momento, mereceu destaque do
autor, sobretudo por uma aproximação com a ideia de que:

Assim como todas as substâncias líquidas,


também as instituições, os fundamentos, os padrões e
as rotinas que produzimos, são e continuarão a ser
como estas, até “segunda ordem”; [...] Se o “fundir a
fim de solidificar” era o paradigma adequado para a
compreensão da modernidade em seu estágio anterior,
a “perpétua conversão em líquido”, ou o “estado
permanente de liquidez”, é o paradigma estabelecido
para alcançar e compreender os tempos mais recentes –
esses tempos em que nossas vidas estão sendo escritas.
(BAUMAN, p.13)

Os conceitos de “modernidade” e “pós-modernidade” abordados pelo autor


em seu estudo, representam dois contextos distintos, com destaque ao “papel de
intelectual”, o qual, em sua prática pode assumir uma postura moderna ou pós-
31
moderna. A dominância de um ou outro modo, para Bauman, distingue modernidade
e pós-modernidade como períodos da história intelectual, muito embora reconheça
com ressalvas, a ideia de modernidade e pós-modernidade como períodos históricos
sucessivos. Isto porque, se aponta de acordo com outros estudiosos, que as duas
práticas intelectuais, tanto moderna como pós-moderna coexistem, embora em
proporção variável, no interior de cada uma das eras, e que só é possível falar de
domínio de um outro padrão como tendência. Referindo-se às práticas intelectuais,
a oposição entre os termos moderno e pós-moderno, utilizada pelo autor, representa
diferenças na compreensão da natureza do mundo, e em particular do mundo social,
interligada ao trabalho intelectual e a sua finalidade. (TEIXEIRA, 2013)
Partindo dessas, passou à delimitação dos campos intelectuais, partindo de
uma visão tipicamente moderna à pós-moderna. Vejamos:

A visão tipicamente moderna do mundo é a de uma totalidade em


essência ordenada; a presença de um padrão desigual de distribuição de
probabilidades possibilita um tipo de explicação dos fatos que – se
correta – é, ao mesmo tempo, uma ferramenta de predição e (se os
recursos exigidos estiverem disponíveis) de controle. Esse controle
(“domínio da natureza”, “planejamento”, ou “desenho” da sociedade) é
quase de imediato à ação de ordenamento, compreendida como
manipulação de probabilidades (tornando alguns eventos mais prováveis,
outros menos prováveis). Sua efetividade depende da adequação do
conhecimento da ordem “natural”. Tal conhecimento adequado é, em
princípio, alcançável. [...] A visão pós-moderna do mundo é, em
princípio, a de um número ilimitado de modelos de ordem, cada qual
gerado por um conjunto relativamente autônomo de práticas. A ordem não
precede as práticas e, por conseguinte, não pode servir como medida
externa de sua validade. Cada qual dos muitos modelos de ordem só faz
sentido em termos das práticas que os validam. Em cada caso, a validação
introduz critérios que são desenvolvidos no interior de uma tradição
particular; eles são sustentados pelos hábitos e crenças de uma
“comunidade de significados” e não admitem outros testes de
legitimidade. (BAUMAN, p.18-19)

Com isso, Teixeira (2013) explica que a estratégia moderna de trabalho


intelectual para Bauman seria aquela mais bem-caracterizada pela metáfora do
papel do “legislador”. A ideia consiste, em fazer afirmações autorizadas e
autoritárias com o fito de arbitrar opiniões controvertidas, sendo escolhidas
aquelas, que uma vez selecionadas, se tornarão “corretas”, associativas e legítimas.
De outro modo, a pós-modernidade do trabalho intelectual é aquela mais bem
caracterizada pela metáfora do “intérprete”. Este seria o responsável em traduzir
afirmações produzidas no interior de uma tradição fundada em traços comuns, com

32
o intuito de que sejam compreendidas no interior de um “sistema de conhecimento”,
baseado em outra tradição. Esta última ideia busca facilitar a comunicação,
impedindo distorções de significado no processo de comunicação. A manutenção do
equilíbrio, entre as duas tradições que interagem, é indispensável para que não haja
distorção de significados em relação a comunicação.
Com as ideias de Barroso (2011), no campo jurídico-constitucional é
possível identificar os movimentos intelectuais, ao retomarmos os três grandes
marcos teóricos pelas quais passou a doutrina jurídica-constitucional:
a. o reconhecimento de força normativa à Constituição;
b. a expansão da jurisdição constitucional;
c. o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional
Assim, uma das grandes mudanças de paradigma ocorridas ao longo do
século XX, foi a atribuição à norma constitucional do status de norma jurídica,
reconhecendo sua força normativa, seu caráter vinculativo e obrigatório de seus
dispositivos. Observa-se, portanto, que esse primeiro marco teórico apontado por
Barroso (2011) conforma-se à ideia de produção intelectual moderna, justificada e
ilustrada por Bauman em sua doutrina, através da metáfora do “legislador”.
Há que se destacar que a consolidação do constitucionalismo democrático e
normativo, bem como a expansão da jurisdição constitucional, provocaram um
grande impacto sobre a hermenêutica jurídica de maneira geral, sobretudo no
aspecto da interpretação constitucional. Além disso, a complexidade da vida
contemporânea, tanto no espaço público como no espaço privado; o pluralismo de
visões, valores e interesses que marcam a sociedade atual; as demandas por justiça
e pela preservação e promoção dos direitos fundamentais; as insuficiências do
processo político majoritário – que é feito de eleições e debate público; enfim, um
conjunto vasto e heterogêneo de fatores influenciaram decisivamente o modo como
o direito constitucional é pensado”. (BARROSO, 2011, p.287-288)
Em meio a esse processo de ampliação de paradigmas, foram descobertas
novas perspectivas, desenvolvidas novas teorias de interpretação constitucional que
se coadunaram àquelas tradicionais existentes e aos princípios de interpretação
lógico-sistemática. A norma passou a ser questionada quanto ao seu papel, suas
possibilidades e limites, e não obstante a figura do intérprete, sua função e suas

33
circunstâncias, passaram a ganhar destaque em debates doutrinários acalorados.
(HÄBERLE, 2002)
Se de um lado, observa-se a atuação do legislador limitada por sua
“submissão“ ao império da Constituição, de outro, o modelo tradicional dedutivista
de aplicação da lei, pelo julgador, característico da operação lógico-formal da
subsunção, revela-se insuficiente no contexto de ampliação da margem de
apreciação judicial, especialmente na concretização de princípio, abrindo margem
para o recurso da operação argumentativa da ponderação, o que não raro nos faz
questionar acerca do papel “criativo” de juízes e tribunais. (HÄBERLE, 2002)
Moderno (legisladores) e Pós-Moderno (intérpretes), expressões que antes
tinham demarcação em relação a sua atuação, hoje se confundem, num espaço de
incertezas.

Hoje, os padrões e configurações não são mais “dados”, e menos ainda


“auto-evidentes” eles são muitos, chocando-se entre si e contradizendo-se
em seus comandos conflitantes, de tal forma que todos e cada um foram
desprovidos de boa parte de seus poderes de coercitivamente compelir e
restringir. (BAUMAN, 2009, p.12)

O estabelecimento de fronteiras, ao que afirma Bauman, é a nova dificuldade


dessa comunidade, formada por intelectuais (legisladores e intérpretes), de modo
que tais limites sirvam como território de práticas legislativas. Ao referir que “o
mundo contemporâneo é impróprio para os intelectuais como legisladores”, Bauman
alude à “queda do legislador”, título de um dos capítulos da obra “Legisladores e
intérpretes”. Embora tenha certo radicalismo, o autor procurou enfatizar a ideia de
que a metáfora do legislador não é mais compatível com o modelo de sociedade em
que estamos inseridos. Com a expressão “Ascenção do Intérprete” talvez seja mais
condizente com o momento atual pelo qual atravessa a dogmática jurídica
constitucional. ( T EIXEIRA, 2013)
Por meio da metáfora do intérprete, observa-se que a vida jurídica fica cada
vez mais dependente de quem interpreta o direito. Assim, ele deve interpretá-lo em
consonância com o sentimento social e os princípios norteadores, tornando sua
função ainda mais complexa. Isto porque, as pessoas têm sentimentos sociais
distintos diante da história individual de cada um. (BAUMAN, 2007).

34
São esses padrões, códigos e regras que poderiam ser pontos estáveis de
orientação, mas estão cada vez mais em falta. Isso não quer dizer que os
intérpretes, devam ser livres para construir segundo sua vontade (seja pela omissão
do poder legislativo, ou ao “custo” político que determinadas decisões causariam ao
poder executivo). A atividade de construir uma nova ordem em substituição a velha
ordem defeituosa, está cada vez menos programada, não do ponto de vista do
intérprete, por nós definidos como cientistas e produtores do saber jurídico, – mas
sim, daqueles em que se supõe que a ação política resida (poderes executivo,
legislativo e infelizmente de uma boa parcela do poder judiciário). O “derretimento
dos sólidos”, traço permanente da modernidade, adquiriu um novo sentido, e foi
redirecionado a um novo alvo, e um dos principais efeitos desse redirecionamento
foi a dissolução das forças, dos poderes que poderiam ter mantido a questão da
ordem e do sistema na agenda política constitucional. (BARROSO, 2011)
Estamos passando de uma era de “grupos de referência” predeterminados a
uma outra de “comparação universal”, em que o destino dos trabalhos de
autoconstrução individual, podem e devem influenciar de forma positiva e
significativa no processo de interpretação da norma, fomentando à participação da
sociedade na condição de destinatários da norma, como co-intérpretes, assim já
dispunha o doutrinador Haberle Pater, em sua obra sobre Hermenêutica
Constitucional, ao propor uma hermenêutica democrática, fazendo valer a “vontade
de constituição". Cabe aos produtores do conhecimento científico apontar
mecanismos que disseminem a “vontade de constituição” como inclusão, e
instrumentalizem a hermenêutica como garantia e acesso aos Direitos consagrados
em nossa Constituição. ( T EIXEIRA, 2013)

2.3. O conceito e o novo papel do magistrado no ordenamento jurídico

De acordo com a Associação Paulista de Magistrados – APAMAGIS, O


termo magistrado tem origem na língua latina, derivada da palavra magistratus,
podendo ser tanto o cargo de governar (magistratura) como a pessoa que o exerce
(magistrado), e magister significa chefe ou superintendente. O surgimento da figura

35
do juiz tem relação direta com o nascimento das civilizações, e com a ideia de que
um terceiro, tido como neutro, seria essencial para a resolução de conflitos. Além
de exigir muito conhecimento jurídico, a função ainda pede comprometimento e
aptidão psicológica.
Baltazar (2005) ilustra que o magistrado contemporâneo encontra-se
fortemente associado ao exercício do poder judiciário. Os países cuja estrutura
legal é baseada no Direito Romano (Itália, França, Alemanha, Espanha ou Portugal)
têm no seu corpo de magistrados juízes e procuradores ou promotores. Tal noção de
magistratura é desconhecida nos países que adotam a common law. No Brasil, os
magistrados são somente os juízes, apesar de magistrados e membros do Ministério
Público gozarem das garantias constitucionais.
No art.125, do Código de Processo Civil, os deveres do juiz são: assegurar
igualdade de tratamento às partes, garantir a rapidez da solução, prevenir e reprimir
atos que atentem contra a Justiça, além de conciliar as partes.
Ao longo da história, houve uma evolução de grande importância na
jurisdição. No entanto, a formação, a importância, a responsabilidade e o respeito
permaneceram com o decorrer do tempo, gerando cada vez mais a grandeza da
função da magistratura em consonância com a imparcialidade e a busca pela
organização da sociedade. Nesses termos, Calamandrei (2000, p. 11) explica que “O
juiz é o direito feito homem. Só desse homem posso esperar, na vida prática, aquela
tutela que em abstrato a lei me promete”, demonstrando a importância da
magistratura e a imprescindibilidade do seu papel para o meio social.
A incumbência principal da magistratura surge quando se ultrapassa o mero
interpretar das leis e passa-se a garantir tanto a normatividade, quanto a efetividade
da norma, transformando o Direito em algo mais democrático a ponto de alcançar a
realidade social. Assim, há a possibilidade de garantir a promoção da justiça
levando-se em consideração a pluralidade da sociedade contemporânea, que impõe
ao intérprete da lei uma análise crítica a fim de que seja assegurada a resolução dos
conflitos sociais – conforme as normas previstas no ordenamento. (DALLARI, 1996)
Não é difícil perceber porque o magistrado é figura central para a realização
da justiça. O processo é o instrumento por excelência da tutela do direito. O direito
se realizará, ou não, através do processo. O juiz, por sua vez, é o protagonista do
processo, está em suas mãos fazer com que a justiça seja independente, eficaz,

36
acessível e confiável. Como responsável pelo processo, o magistrado acaba sendo o
último garantidor de um mundo mais justo e quem deve fazer do Poder Judiciário
algo confiável e cristalino (GERLERO, 2006. P. 379).
Durante o exercício do cargo, é imprescindível o respeito aos princípios
impostos pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LOMAN e pela jurisdição.
Ao discorrer sobre as funções do juiz na sociedade contemporânea, Freddie Didier
explica que o Juiz não decide a “lide” com base na lei, mas com base no “direito”,
que se compõe de todo o conjunto de espécies normativas, regras e princípios.
(PERTSCHI, 2014)
A missão do juiz, portanto, não pode esgotar-se no processo, compreendendo
hoje a defesa do regime democrático, dos direitos fundamentais, a redução das
desigualdades sociais. O juiz possui uma função social que vai muito além de
realizar o direito entre as partes e recompor o status quo ante. O juiz deve ter seus
olhos voltados para o futuro. A função social do juiz e os fins sociais do Direito
libertam a lei de seu texto fincado no momento de sua feitura ou de sua
promulgação. A democratização do Direito passa pela efervescência judicial e pela
ampliação funcional do Judiciário (ROCHA, 1998).
Jean-Claude Javillier (2007, pág. 735) diz que “não há nenhuma sociedade
democrática sem uma independência da magistratura: ela é a garantia de uma
efetividade das normas protetoras dos direitos essenciais do homem”.
O juiz, no contexto do Estado Democrático de Direito, não pode mais ser
aquele operador do direito inerte e passivo, o novo modelo social não aceita mais
essa postura do Poder Judiciário, que sai da sua posição de distanciamento para
aproximar-se da sociedade. Além disso, a decisão do magistrado em um processo não
possui mais seus efeitos restritos apenas às partes litigantes, as decisões acabam por
influenciar outras causas e outras esferas de poder, gerando transformações na
sociedade. (DALLARI, 1996)
Um resultado desse novo contexto vivido é o Novo Código de Processo Civil
(NCPC) de 2015. Superando a razão positivista que condenava qualquer juízo de
valor dentro do direito, o NCPC é elaborado sob a égide do pós-positivismo, de
matiz essencialmente principiológica, resgatando a moral para dentro da ratio
decidendi. O legislador contemporâneo reconhece o Direito como técnica, uma vez
que os operadores precisam ter padrões e critérios para aplicação das normas

37
jurídicas, mas também como Ética, visto que as pessoas recorrem ao Judiciário em
busca não somente de normatividade, mas principalmente de dignidade. (ARAÚJO,
2014)
As normas fundamentais do NCPC demonstram que as decisões tomadas não
deverão ser apenas logicamente válidas, mas baseadas em valores, buscando seu
fundamento último de validade na Constituição Federal. Portanto, o formalismo
legalista do Estado Liberal não interessa mais ao Estado Democrático de Direito. O
juiz, antes visto como mero aplicador da lei, passa também a criar o direito, e não
somente colocá-lo em prática. Muitas questões novas se apresentarão ao juiz, que
nem sempre terão o amparo da lei. Caberá ao julgador a tarefa de responder a tais
questões de forma inovadora, ponderando as normas existentes e os princípios de
direito, produzindo direito, ao invés de somente aplicá-lo. (PERTSCHI, 2014)
O momento atual pede um novo modelo de magistrado, conectado a seu
tempo, conhecedor dos anseios da sociedade. A respeito dos modelos de juiz, existe
um famoso artigo do professor belga, François Ost (OST, 1993), em que este
relaciona os modelos de julgador aos modelos de jurisdição no tempo. O primeiro
deles seria o juiz Júpiter, o modelo liberal-legal, que obedece ao padrão piramidal-
dedutivo, é o julgador que diz o direito, a partir do alto, distanciado das partes,
isolado do convívio social. Esse juiz é legalista, formalista, fundamenta seu
entendimento nas leis ou códigos, inadmitindo a influência de fatores externos. É o
juiz que aplica automaticamente a lei, sem qualquer juízo de valor. Há também o
juiz do Estado Democrático de Direito, o magistrado que os tempos atuais pedem, o
juiz Hermes. Nem tanto ao céu, nem tanto a terra. É o juiz conciliador, mediador
universal, o bom comunicador. Ele pratica novas ideias, escuta opiniões e aprende
com experiências externas. Ost vê o direito pós-moderno como uma estrutura em
rede, que possui infinitas informações à disposição do magistrado. Sua decisão,
assim, não será tão somente baseada na lei, ou na práxis, mas o resultado de um
banco de dados com uma variedade de inputs externos e internos. .(ARAUJO, 2014)
O magistrado pós-moderno, portanto, vive num modelo de Estado em que
existem direitos e garantias. É tarefa dele assegurar a eficácia desses direitos,
concretizando os enunciados constitucionais, a fim de que possa, sob esta
perspectiva, analisar a validade das normas emanadas do Legislativo. O juiz não é
mais um mero cumpridor de leis e não faz mais sentido sua aplicação automática e

38
irrestrita. O magistrado deve questionar sua coerência e conformidade com a
constituição, ponderar os valores imbuídos em cada dispositivo legal. O Juiz, claro
que sem extrapolar o marco jurídico-constitucional, deverá procurar dirimir os
conflitos do modo socialmente mais justo. (ROCHA, 1998).
O juiz, assim, passa a ser também produtor de normatividade, não está apenas
submetido ao Legislativo, mas também o submete. O magistrado faz a lei do caso
concreto e, para isso, deve estar conectado às transformações que constantemente
ocorrem na sociedade moderna, que leva em considerações fatores sociais,
econômicos, históricos e políticos das causas que lhes são submetidas. (ROCHA,
1998).
Note-se que tratamos de um agente politizado, e não político. A Constituição
Federal de 1988, ao dispor acerca das vedações à atividade do magistrado coloca
nesse rol a dedicação a qualquer atividade político-partidária (CF, art. 95, parágrafo
único, inc. III) ou de pertencer a partidos políticos. Ao proceder desta forma, a
Constituição não deixa dúvidas de que a legitimação que pretende conferir à função
jurisdicional não é a legitimação representativa, mas sim a legitimação racional ou
legal. Esse tipo de legitimação dada ao juiz impede que este se utilize, na sua tarefa
de solução de conflitos, de fundamentos que vão de encontro ao ordenamento
jurídico. (DALLARI, 1996)
Oriana Piske, em artigo intitulado “A Função Social da Magistratura na
Contemporaneidade”, assim se posiciona a respeito dessa legitimação racional dos
magistrados:

Com isso, não só se garante uma certa objetividade na atuação do juiz,


senão também se evita sua politização ideológica. Não queremos dizer que
o juiz não tenha suas convicções, suas crenças e sua visão própria do
mundo. Cada um tem suas preferências ideológicas, políticas, filosóficas
etc., porém, para se alcançar um alto nível de objetividade na função
jurisdicional, o que constitui uma garantia para todos, devemos reconhecer
que as convicções ou critérios pessoais do juiz só são válidos para a
solução dos conflitos na medida em que estejam de acordo com as normas,
princípios e valores do ordenamento jurídico. (pág.42-50)

O desafio do juiz contemporâneo está em julgar com justiça, eis que ele deve
valer-se dos princípios jurídicos num balanceamento dos interesses em conflito,
observando sempre os fins sociais da lei e as exigências do bem comum na
fundamentação de suas decisões. É indispensável que o magistrado tenha prudência,

39
pois ao aplicar a lei em cada caso, ele interpreta o fenômeno jurídico. A interpretação
e aplicação possuem um conteúdo eminentemente prático da experiência humana, vez
que se espera uma decisão não apenas jurídica, mas também de conteúdo social.
Afinal, muda a sociedade, a forma de pensar o Estado, surgem novas tecnologias, a
globalização econômica passa a ser uma realidade; tudo isso conduz à emergência de
novos direitos que merecem a sua proteção. (PISKE, 2010)
Piske (2010) ainda fala que o juiz deve estar atento às transformações do
mundo moderno, porque, ao aplicar o Direito, não pode desconhecer os aspectos
sociais, políticos e econômicos dos fatos que lhe são submetidos. Cabe ao juiz
exercer a atividade recriadora do Direito através do processo hermenêutico, bem
como adaptar as regras jurídicas às novas e constantes condições da realidade social
e, com responsabilidade, deve buscar soluções justas para os conflitos, sempre com a
observância dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da
proporcionalidade e da razoabilidade. Finalmente, temos que a prestação
jurisdicional deve ser exercida como instrumento de pacificação social e afirmação
da cidadania, o que é facilmente verificado quando da ocorrência de sua aplicação
célere e justa, consubstanciando-se, dessa forma, como um poderoso instrumento a
serviço da população. Esta sim, é a razão primordial da existência do Poder
Judiciário. Esse é o papel social que, historicamente, lhe é reservado.

40
III - O MUNDO LÍQUIDO E O RETORNO AOS VALORES NO
ORDENAMENTO JURÍDICO

A história não é linear, mas, para facilitar o entendimento, há a divisão do


caminhar da humanidade em idade antiga, idade média e idade moderna. Cada idade
finda e uma nova nasce tendo como marco um acontecimento histórico. Tem-se,
primeiramente, um fase pré-histórica que vai até o surgimento da escrita, quatro mil
anos antes de Cristo – 4.000 a. C. Já na fase histórica, a idade antiga inicia-se
quatro mil antes de Cristo e vai até a queda do império Romano do Ocidente em
476 a.C. Aqui, começa a idade média que se estende até a queda do império
Romano do Oriente – Constantinopla – em 1453 d.C. Neste ano, brota a idade
moderna que vai até o acontecimento histórico da Revolução Francesa em 1789,
momento de início da idade contemporânea.
Em cada uma dessas épocas, o sujeito de direito analisado pela ciência do
direito era um. Cite-se por exemplo, o hilota, na Grécia antiga. Este, por ser homem
advindo de povos conquistados, não era considerado sujeito de direito.
Já na idade média, a conceituação de pessoa decorria da relação que o
homem estabelecia com Deus, independente do status social. Logo, o pagão,
homem do campo, que não se converteu, não era sujeito de direito, pois ainda vivia
no politeísmo.
Com a queda do feudalismo e o surgimento do Estado Moderno, o
absolutismo representou um sistema opressor onde as leis eram criadas pelo Rei
para o povo, sendo aquele jamais submetido ao princípio da legalidade. Não é
preciso grande esforço intelectual para saber que os sujeitos de direito deste
período eram somente quem tinha sangue azul.
A queda do absolutismo, marcada pela Revolução Francesa de 1789, deu
causa para a era Iluminista do saber. Ocorre que, marcados pela repulsa ao
absolutismo, a burguesia preferiu o liberalismo econômico que, em termos simples,
significa a não intervenção do Estado. A ausência de interferência estatal
pressupunha a existência de relações jurídicas entre iguais. Logo, para entender, a
relação laboral era regulamentada como se empregado e empregador fossem
sujeitos de direito em condições iguais. Não existia o hipossuficiente.

41
Dentro desse pressuposto de igualdade, a pessoa tinha dignidade
fundamentada na propriedade. O ser é por que possui. A dignidade não existia pelo
simples fato de existir. Após as grandes guerras mundiais, o pressuposto de
igualdade cai por terra e surgem os sujeitos de direito hipossuficiente.
Cada fase histórica foi marcada por uma teoria do pensamento jurídico. Com
efeito, na antiguidade tinha – se a teoria do pensamento jurídico jusnaturalista. Esta
foi dividida em três esferas. A primeira compreendeu o jusnaturalismo
cosmológico, onde a lei somente seria justa se refletisse as leis da natureza. Já a
segunda esfera foi o jusnaturalismo religioso, no qual a lei somente seria legítima
se coadunasse com a vontade divina. No período iluminista, com o homem no
centro do universo, o jusnaturalismo deu causa a terceira vertente, qual seja, a
racional, em que a razão humana é a fonte de todo direito justo.
Com o surgimento do Estado Moderno, a teoria do pensamento jurídico em
voga foi o juspositivismo. Nesta, o Estado tinha o monopólio de fabricação da
norma e, consequentemente, direito e norma eram sinônimos. Neste momento da
ciência jurídica, a justiça não era objeto de estudo do direito. Logo, houve um
afastamento do direito e da ética.
Ora, esse afastamento do direito e da ética já foi narrado nesta pesquisa ao se
explanar a modernidade líquida de Bauman. Neste mundo fugaz, não há espaço para
análises valorativas.
Ocorre que a modernidade não cumpriu com suas promessas de estabilidade,
concretude, surgindo a liquidez e, além dessa decepção, o ser humano entendeu que
sistemas ditatoriais tinham leis, eram Estados de Direito e, outrossim, viram que
pressupor igualdade entre os sujeitos de direito não é garantia de igualdade no
mundo dos fatos.
Logo, imperativo era uma nova teoria do direito onde justiça voltasse para o
campo do direito e valores como igualdade material e formal fossem objetivos dos
ordenamentos jurídicos.
É exatamente aqui que surge essa pesquisa em leitura, uma vez que se torna
fácil indagar como reunir direito e ética em um mundo líquido? Onde um
ordenamento estaria fundamentado para garantir a dignidade dissociada da
propriedade?

42
Pois bem, a reunião do direito e da ética atualmente está fundamentada na
teoria do pensamento jurídico pós-positivista. E o ordenamento jurídico pós-
positivista busca fundamento no denominado neo-constitucionalismo que
posteriormente será perscrutado.
Para tanto, segue –se análise da ética no mundo líquido, conforme Bauman.
Após, a necessidade de se retomar os estudos do direito e da ética de forma
conjunta será apresentada por meio da teoria do pensamento jurídico pós-
positivista.

3.1. A ética pós-moderna na visão de Bauman

A vida apresentada pelas promessas da Modernidade saturou. Não basta tão


somente ignorar a situação e seguir adiante com a rotina da individualidade. O
momento presente demanda outras possibilidades de se conviver nas quais não
podem ser impressas em códigos ou mandamentos, determinando-se uma lista de
deveres nas quais se indica o que se pode ou não fazer.
As relações humanas não podem ser contidas em regras. Aquelas não se
esgotam na fórmula moderna do dever-ser. O aparente vazio que se percebe na
passagem da Modernidade para a Pós-Modernidade se caracteriza pelo adiamento
das consequências produzidas pelas ações de todos com todos. Postergam-se ao
futuro os efeitos de compreender o ser humano na sua complexidade cotidiana.
Sob semelhante argumento, as promessas institucionalizadas pela Idade
Moderna tornam-se imortais. Delega-se a responsabilidade das nossas escolhas
morais para as autoridades que possuem o conhecimento específico sobre o tema –
Ética – a fim de se determinar quais fenômenos são “bons” e “maus”, bem como
avaliar, de modo estratégico, qual a “escolha correta” a ser empreendida.
Bauman esclarece as distinções entre a “Era da Ética” – Modernidade – e a
“Era da Moral” – Pós-Modernidade, a fim de se compreender um pouco mais outras
perspectivas de convivência humana em seu caráter pedagógico.
A Ética, segundo o pensamento de Bauman, não consegue tornar efetivo o
seu projeto racional de tudo prever e prescrever. Os mandamentos éticos possuem a

43
autoridade necessária para impor o que deve ser feito, de modo igual, por todos. A
ética na modernidade é uma regra capaz de enunciar quais condutas são possíveis
ou não dentro de um grupo, a fim de manter sua coesão e promover a convivência.
Na descrição de Bauman, a ética designa o esforço da Idade Moderna em
antever e prescrever, com maior grau de certeza, a ocorrência de determinados
fenômenos e diminuir, ou eliminar, as alternativas de resolução para essas
dificuldades. Numa expressão: na medida em que surge a dificuldade, ter-se-á
apenas uma resposta para sua solução. Essa resposta precisa ser enunciada (senão,
imposta) pela autoridade ética a partir do conhecimento guiado pela razão lógica.
A estrutura da ética proposta pela modernidade elabora cada alicerce a partir
daquilo que as suas autoridades prescrevem como verdades. O poder desses peritos
é legislativo e judiciário ao mesmo tempo. As condutas humanas serão julgadas
como aptas ou não conforme a previsão da norma ética. O homem da vida de todos
os dias não tem capacidade intelectual para orientar suas próprias ações. Não
conhece o “bom” para disseminar o “bem”.
Essa depreciação sobre a incapacidade das pessoas escolherem o que é mais
razoável para suas vidas tem significado, qual seja, a de que os seus juízos éticos
não sejam fundamentados, em outras palavras, não podem ser racionalmente
demonstráveis ou mensuráveis. A não-racionalidade a fim de tornar sólido e
obrigatório uma conduta para todos implica na necessidade de pessoas especialistas
a fim de direcioná-las a algo “bom”.
O “aparente” abandono sobre a escolha de nossas decisões e delegar essa
tarefa para aos gestores éticos, já produziu desastres históricos, tais como a
Segunda Guerra Mundial. Naquele momento, procedimentalizou-se, de modo
racional, a indiferença, estampando-a como “normal” ou “racional”. Não havia
espaço para reflexão pessoal sobre o que se mostrava como razoável. Essa ação
pertencia apenas aos peritos. A eficiência, precisão das normas racionais e a
especificação de seus papéis, rememora Bauman, permitiu que a violência fosse
autorizada e as vítimas desumanizadas, especialmente por definições e doutrinas
ideológicas. Eis a negação de autoridade à consciência moral. No intuito de se
ilustrar a afirmação anterior, veja-se o comportamento de Ohlendorf na descrição
de Bauman:

44
[...] Quando instado a explicar, no julgamento de Nuremberg, por que não
renunciou ao comando Einsatzgruppe cujas ações pessoalmente
desaprovava, Ohlendorf invocou precisamente este senso de
responsabilidade: se expusesse as ações de sua unidade para se ver livre
de obrigações que, garantiu, o indignavam, estaria deixando que seus
homens fossem ‘erroneamente acusados’. Obviamente, Ohlendorf
esperava que a mesma responsabilidade paternalística em relação a ‘seus
homens’ seria praticada por seus superiores para com ele; isso o eximia
da preocupação com a avaliação moral de suas ações, que poderia com
segurança deixar a cargo dos que o comandavam. (p. 141)

Entretanto, eis o paradoxo: segundo o pensamento do autor anteriormente


citado, não existe a necessidade de orientar o nosso modo de agir conforme padrões
determinados. Os códigos de éticas nem sempre são lembrados porque a maioria
comporta-se (e decide) segundo o hábito e a rotina, desde que nenhuma pessoa
dificulte (ou impeça) de se fazer o “usual”. Desse modo, percebe-se que os
especialistas são as pessoas nas quais não podem prescindir de argumentos
coerentes, de fundamentos racionalmente explicáveis e garantias infalíveis a fim de
preservarem seu status na dinâmica social. Nesse cenário, indaga-se: esses peritos
compreendem, de modo adequado, o que é ética? Será que, na ausência dessas
pessoas, não seríamos capazes de descobrir meios acerca de como deveríamos nos
portar diante do Outro, de nos caracterizar como “pessoas verdadeiramente morais
e decentes”? A resposta, quando não observada pela nossa responsabilidade, pode
ser contemplada na sugestão de Bauman:

[...] Cedo ou tarde, começaremos a procurar intensamente e por nossa


própria vontade uma orientação confiável de ‘pessoas do saber’. Se
pararmos de confiar em nosso próprio julgamento, iremos nos tornar
sensíveis ao medo de estar errados; chamamos o que receamos de pecado,
medo, culpa ou vergonha – mas, seja qual for o nome, sentimos a
necessidade da mão útil do perito para nos trazer de volta ao conforto da
segurança. Trata-se de um medo tal que se amplia a dependência da
especialização. Contudo, uma vez que ela se estabeleceu e fincou raízes,
a necessidade de especialização ética torna-se ‘autoevidente’ e sobretudo
autorreproduzida. (p.42)

Há certa preocupação quando se delega a decisão de nossas escolhas ao


perito em ética por não se saber lidar com a ambivalência, incerteza ou dúvida
desse tipo de ação, retorna-se, muito rápido, para a segurança da autoridade na qual
está mais capacitada a decidir o destino do homem comum. Esse é o início da
erosão nas relações humanas e a “produção em massa” da indiferença na qual se
dissemina como cenário “normal” na vida de todos os dias.
45
Os argumentos observados mostram como a Ética na Idade Moderna
inaugurou novos modos de se criar ordem e segurança diante do passado na qual
ainda estava à espreita. A ânsia de se libertar dos grilhões impostos pelo Deus do
Cristianismo, a partir da Razão, é a garantia de um futuro promissor. Na medida em
que a arquitetura ética prescreve novos modos de agir, o reino do dever-ser se torna
mais autoevidente, ou seja, sem esses alicerces cujos fundamentos podem ser
demonstráveis, calculados e previstos, a ética seria tão somente mais uma opinião
pessoal na qual sua autoridade seria destronada pelo reino da objetividade e
universalidade.

3.2. Neoconstitucionalismo: Direito e Valores em Tela

Uma tendência marcante no pensamento jurídico atual é a constatação de que


a ordem jurídica deve ser compreendida em sua dimensão empírica e,
consequentemente, vinculada ao plano histórico – cultural da convivência humana.
Sendo, portanto, deixado de lado o argumento de que a fundamentação do sistema
jurídico se encontra na esfera metafísica do cosmo (Jusnaturalismo cosmológico),
na revelação religiosa (jusnaturalismo teológico) ou na razão humana universal
(jusnaturalismo racionalista).
Provou - se vazio o argumento de que o fenômeno jurídico se justifica pela
manutenção de um conjunto meramente formal de regras jurídicas, separado dos
fatos e dos valores, nos moldes pregados pela teoria do pensamento jurídico
positivista. Neste caso, o direito se encontra distante do social e sem preocupação
com a ética.
Entre os limites jusnaturalistas e do positivismo jurídico, o pós-positivismo,
ciência jurídica atual, objetiva formular inovações na fundamentação e legitimação
do direito, permitindo o entendimento de suas múltiplas dimensões (fato, valor e
norma) e a realização da Justiça nos casos concretos. O pós-positivismo jurídico
reestrutura os laços entre o direito e a moral, reaproximando o fenômeno jurídico
dos clamores da realidade social.

46
Hoje, explica Ricardo Lobos Torres (2002, p. 3), que essa mudança de
paradigma jurídico reaproxima o direito, a ética e a justiça, além da preeminência
dos princípios jurídicos na estrutura do ordenamento. O modelo pós-positivista
consagra os direitos fundamentais elencados pela principiologia constitucional,
abrangendo representações de valores da liberdade, igualdade e dignidade de todos
os humanos.
O pós-positivismo tem como expressão no direito constitucional o
neoconstitucionalismo, visando designar um novo modelo jurídico-político que
representa o Estado Constitucional de Direito da atualidade.
Nas palavras de Soares (2013, p. 2013):

O neoconstitucionalismo afigura-se como um novo modelo de


compreensão e aplicação do direito constitucional que se revela em
alguns sistemas constitucionais surgidos após a Segunda Guerra Mundial,
cujas as funções se contrapõem ao papel que desempenhavam as Cartas
Constitucionais no contexto da modernidade jurídica, de modo a tentar
recompor a grande fratura existente entre a democracia e o
constitucionalismo ocidental. Com o neoconstitucionalismo, ocorre
também o processo de normativização da constituição, que deixa de ser
considerada um diploma normativo com um valor meramente
programático para operar como uma normatividade jurídica com eficácia
direta e imediata. A afirmação neoconstitucionalista da natureza
principiológica da constituição pressupõe a positivação jurídica de pautas
axiológicas de conteúdo ético, daí advindas importantes consequências,
tais como a necessidade de se adotar uma posição de participante para
explicar o funcionamento do direito, bem como a necessidade de se
superar a ideia positivista de uma separação rígida entre o direito e a
moral.

De acordo com Santiago Ariza (2003, p. 239), esse recente modelo de


compreensão do direito constitucional surgiu, em alguns sistemas constitucionais,
após a Segunda Guerra Mundial com função diversa das Cartas Constitucionais no
contexto da modernidade jurídica, recompondo o fosso crasso entre a democracia e
o constitucionalismo ocidental.
Com o neoconstitucionalismo tem-se uma inovação em comparação com as
posturas positivistas, uma vez que a Constituição funda-se em valores expressos em
princípios constitucionais, tais como: a liberdade, a igualdade, a fraternidade e, em
destaque, a dignidade da pessoa humana, dando uma dimensão axiológica e
teleológica ao constitucionalismo pós-moderno.
Pablo Verdu (1998, p. 21) explica que toda especulação cultural acerca da
Constituição tem inspiração ideológica, decorrente de valores que permeiam a
47
realidade social e política. Essas pautas valorativas fundamentam direitos humanos,
por meio da delimitação dos Poderes Públicos a uma organização normativa
fundada em uma sociedade democrática.
Outrossim, o neoconstitucionalismo engendrou o processo de normativização
da Constituição, por meio do qual a Constituição deixa de ser considerada um
diploma com valor normativo programático, passando a ter uma normatividade
jurídica com eficácia direta e imediata.
Em vez de um conjunto de recomendações ou orientações aos Poderes
Públicos, a norma constitucional adquiriu o status de norma jurídica fundamental e
suprema. Com isso, além de imperativa como toda norma jurídica, ostenta o
patamar de relevo em face das demais espécies normativas, cabendo a estas
coadunar com a Constituição em sentido formal (elaboração) e material (matéria).
Sendo exigência da democracia, a supremacia constitucional resume em seu
bojo os valores e desejos do povo, detentor do poder então Constituinte da Carta
Constitucional, sendo esta fonte maior do direito de um Estado e fundamento de
validade das normas do ordenamento jurídico pátrio, dando unidade e caráter
sistemático a este.
Tendo isso em mente, é fácil concluir que as normas programáticas, em
destaque as que regulamentam direitos sociais e econômicos, devem ser diretamente
aplicáveis e imediatamente vinculantes a todos os órgãos das funções estatais
(Legislativo, Executivo e Judiciário).
O constitucionalismo atual reaproxima direito e ética e se fundamenta na
existência de valores e princípios universais, bem como na viabilidade da
interpretação destes, no alcance da razão, por meio do uso da reflexão, do
raciocínio, sempre visando à efetivação e proteção dos direitos fundamentais.
Por isso, Marilena Chauí, nas palavras de Barroso (2008, p.6), explica que os
gregos elaboraram a ideia ocidental de razão, sendo um pensamento que segue
princípios e regras de valor universal.
A razão é o traço distintivo da condição humana, acrescida a capacidade de
acumular conhecimentos e transmiti-los por meio da linguagem. A reflexão
fundamentada em valores será uma das exigências do constitucionalismo estudado
no momento, o neoconstitucionalismo.

48
Neste sentido, Eros Roberto Grau (1981, p. 113) aponta: “[...], a revanche da
Grécia sobre Roma, da filosofia sobre o direito: a concepção romana, que justifica a
propriedade pela origem (família, dote, estabilidade dos patrimônios), sucumbe
diante da concepção aristotélica, finalista, que a justifica pelo seu fim, seus
serviços, sua função” (GRAU, 1981, p.113).
Barroso (2008, p.129) consigna: “[...] Ontem os Códigos; hoje as
Constituições. A revanche de Grécia contra Roma [...]”, e através dessas palavras,
está o neoconstitucionalismo, com a Constituição sendo a base do sistema jurídico,
servindo como filtro axiológico pelo qual se deve ler o direito privado.
A retomada do direito sob o prisma dos valores morais será de fundamental
importância para o fortalecimento dos direitos humanos que assumiram, dentro da
aplicabilidade das normas constitucionais, a feição de normas vinculantes em vez
de normas programáticas.
As teorias neoconstitucionalistas apresentam, portanto, um denominador
comum, qual seja: a superação da ciência jurídica que apenas descreve o direito,
atividade neutra de valores sociais e sem a preocupação com a efetividade do
sistema jurídico.
Com o constitucionalismo atual, a natureza política do jurista surge, uma vez
que a tarefa de determinar o que o direito regulamenta não pode ser reduzida a uma
atividade totalmente científica ou objetiva quando padrões de moralidade são
introduzidos às Constituições mediante os princípios ético-jurídicos.
Em suma, o neoconstitucionalismo, expressão do pós-positivismo jurídico,
engloba ampla mudanças ocorrida no Estado Democrático de Direito e no direito
constitucional, reaproximando as Constituições do substrato ético dos valores
sociais e estampando a força normativa da Constituição e de uma nova
hermenêutica constitucional de fundo principiológico.

3.3. Evolução do Neoconstitucionalismo

49
Na busca de proteção aos grupos vulneráveis, quer sejam minorias quer
hipossuficientes, houve o aprimoramento do constitucionalismo, chegando-se ao
neoconstitucionalismo.
O neoconstitucionalismo defende a compreensão jurídico-filosófica de que
todo conhecimento está sujeito à interpretação. Logo, esse novo paradigma é válido
para o Direito, onde a matéria-prima são as normas, palavras, significantes e
significados. (BARROSO, 2008, p. 8-9).
Por isso, dentro desta interpretação, o princípio da dignidade da pessoa
humana é apresentado como valor fonte de todo o ordenamento jurídico brasileiro,
norteando a exegese e a aplicação da norma ao caso concreto.
Neste sentido, Barroso continua (2008, p. 9):

[...] A moderna dogmática jurídica já superou a ideia de que as leis


possam ter, sempre e sempre, sentido unívoco, produzindo uma única
solução adequada para cada caso. A objetividade possível do Direito
reside no conjunto de possibilidades interpretativas que o relato da norma
oferece.

O movimento constitucionalista atual pode ser analisado, entendendo a


origem histórica, cultural, política e filosófica moderna, por meio de dois marcos
históricos relevantes quanto ao início da evolução do neoconstitucionalismo.
O primeiro deles está relacionado com o novo direito constitucional da
Europa. O segundo, o novo direito Constitucional do Brasil. O primeiro marco
representou o início do movimento do neoconstitucionalismo como sistema
vinculante de norma em todas as esferas do poder, até do setor privado e do
cidadão. Já o segundo marco, representou a adoção de referido sistema no Brasil.
Os momentos históricos estão ligados a lamentáveis acontecimentos que
impactaram a humanidade. Na Europa, está relacionado com o constitucionalismo
pós-guerra, destacadamente na Alemanha e Itália. No Brasil decorre do
constitucionalismo que surgiu no período pós-autoritarismo.
Contudo, não foram apenas os acontecimentos históricos a partir da metade
do século XX os únicos responsáveis pela evolução do neoconstitucionalismo. Há,
também, três grandes marcos, quais sejam:

Em suma: o neoconstitucionalismo ou o novo direito constitucional, na


acepção aqui desenvolvida, identifica um conjunto amplo de

50
transformações ocorridas no Estado e no direito constitucional, em meio
às quais podem ser assinalados, (i) como marco histórico, a formação do
Estado Constitucional de direito, cuja consolidação se deu ao longo das
décadas finais do século XX; (ii) como marco filosófico, o pós-
positivismo, com a centralidade dos direitos fundamentais e a
reaproximação entre Direito e ética; e (iii) como marco teórico, o
conjunto de mudanças que incluem a força normativa da Constituição, a
expansão da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de uma nova
dogmática da interpretação constitucional. Desse conjunto de fenômenos
resultou um processo extenso e profundo de constitucionalização do
Direito. (BARROSO, 2008, p.113).

Sendo assim, os direitos humanos e o constitucionalismo foram fruto de


grandes embates nascidos da opressão dos cidadãos e o neoconstitucionalismo,
igualmente, brota das manifestações do povo, que aprimorou, a passos curtos, os
direitos fundamentais e os movimentos constitucionais.
No que tange à mobilização populacional, Peter Haberle (2002, p.15)
entende: “Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive
com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, um intérprete dessa
norma”.
As mudanças político-filosóficas sempre foram acompanhadas de fatos
históricos e culturais que fundamentaram as mudanças. Neste sentido, Konrad
Hesse: “[...] Em outros termos, somente a Constituição que se vincule a uma
situação histórica concreta e suas condicionantes, dotada de uma ordenação jurídica
orientada pelos parâmetros da razão, pode, efetivamente, desenvolver-se” (HESSE,
1991, p.16).
A Constituição Federal de 1988 não fugiu deste contexto, pois toda a
opressão da ditadura, o desrespeito aos direitos fundamentais gerou uma repulsa na
sociedade, ensejando uma movimentação social suficiente para que o povo
brasileiro compreendesse a importância da Constitucional de 1988.
No entendimento de Andreas J. Krell (2002, p. 29), há a mesma ideia por
concordar que a Constituição de um Estado é mais do que um texto jurídico ou
regulamento normativo, sendo também expressão do seu desenvolvimento cultural,
como “meio de autoafirmação cultural de seu povo.
Isso demonstra a necessidade de “lutas” em torno da eficácia de direitos,
principalmente, direitos que devem adimplência a pessoas pertencentes a grupos
vulneráveis, uma vez que a dignidade da pessoa humana é inerente ao ser humano e

51
gera um dever de observância introspectivo, bem como de conquista dos direitos do
próximo em constante “relação” valorativa em nossa sociedade.
De relevo no constitucionalismo que surge a partir da segunda metade do
Século XX é a característica de força vinculante da norma constitucional. Barroso
(2008, p.114) aponta que “[...] a ideia de constitucionalismo do Direito aqui
explorada está associada a um efeito expansivo das normas constitucionais, cujo
conteúdo material e axiológico se irradia, com forma normativa, por todo o sistema
jurídico [...]”. (BARROSO, 2008, p. 114). Essa vinculação deu causa à
disseminação do direito constitucional por todos os ramos do direito, surgindo o
Estado Social Democrático.
A Constituição, portanto, não é simplesmente uma Carta com normas
programáticas instrumentalizadas pela retórica vazia, mas sim um autêntico
documento político de concretização de vida digna de todo ser humano sem
distinção de qualquer natureza.
Barroso (2008, p. 129) explica que a fase atual do constitucionalismo tem a
constituição no centro do sistema jurídico-político. Deste modo, de acordo com os
ensinamentos do autor, a constituição, no centro do sistema jurídico, provoca a
assunção do direito social, obrigando, a título de exemplo, que a propriedade
privada cumpra a função social, impulsionando o surgimento de princípios que
repercutiram por todo o ordenamento jurídico, dentre eles: princípio da
solidariedade, da igualdade, da razoabilidade.
Miguel Carbonell (2009, p. 9-10), referente ao conceito de
neoconstitucionalismo:

El neoconstitucionalismo pretende explicar un conjunto de textos


constitucionales que comienzan a surgir después de la segunda guerra
mundial y sobre todo a partir de los años setenta del siglo XX. Se trata de
Constituciones que no se limitan a establecer competências o a separar a
los poderes públicos, sino que contienen altos niveles de normas
materiales o sustantivas que condicionan la actuación del Estado por
médio de la tipo de Constituciones lo son la española de 1978, la
brasileña de 1988 y la colobiana de 1991.

Também na busca do enquadramento do neoconstitucionalismo, Eduardo


Ribeiro Moreira (2009, p. 261) o compreende como a teoria de direito que reúne as
novas transformações constitucionais, já que, no momento, muitas teorias
constitucionais são apresentadas como descoberta individualmente considerada,
52
quando, em verdade, se trata de uma estrutura jurídica que aglutina vários
elementos comuns em uma mesma caminhada.
Há, no entanto, autores que recusam o neoconstitucionalismo como um novo
fenômeno, tendo os que são contra essa evolução do constitucionalismo. Estes
discordam da expressão “neo”, uma vez que não haveria um novo movimento e sim
evolução do constitucionalismo.
Contudo, a pesquisa em leitura advoga a favor de que se trata sim de um
novo movimento. Com efeito, por ocorrer mudanças sensíveis na forma como ver o
direito, reaproximando-se a ciência jurídica dos valores morais, com a
sobrevalorização do princípio da dignidade da pessoa humana e a transposição de
uma ordem jusprivatista para uma ordem juspublicistica, visualiza-se a existência
de movimento com características distintas do precedente.
Como característica inovadora há a força normativa conquistada pelo texto
constitucional, capaz de vincular o particular e a atuação das três funções: o
legislativo, o executivo e o judiciário. Com esse entendimento, Barroso (2008, p.
115):

Relativamente ao Legislativo, a constitucionalização (i) limita sua


discricionariedade ou liberdade de conformação na elaboração das leis em
geral e (ii) impõe-lhe determinados deveres de atuação para realização de
direitos e programas constitucionais. No tocante à Administração Pública,
além de igualmente (i) limitar-lhe a discricionariedade e (ii) impor a ela
deveres de atuação, ainda (iii) fornece fundamento de validade para a
prática de atos de aplicação direta e imediata da Constituição,
independentemente da interposição do legislador ordinário. Quanto ao
Poder Judiciário, (i) serve de parâmetro para o controle de
constitucionalidade por ele desempenhado (incidental e por ação direta),
bem como (ii) condiciona a interpretação de todas as normas do sistema.
Por fim, para os particulares, estabelece limitações à sua autonomia de
vontade, em domínios como a liberdade de contratar ou o uso da
propriedade privada, subordinando-a a valores constitucionais e ao
respeito a direitos fundamentais (BARROSO, 2008, p. 115, grifos nosso).

Como já explanado, a vinculação da norma constitucional difundiu o direito


constitucional por todos os ramos do direito, provocando o surgimento do Estado
Social. Surge um novo paradigma jurídico, trazendo a norma constitucional para o
centro do sistema jurídico.
A Constituição rompe com a teoria do pensamento jurídico denominada
positivismo, visando um modelo eficaz de normas garantidoras do bem-estar social
e da dimensão máxima da dignidade da pessoa humana.

53
Barroso (2007, p. 400) explica:

O constitucionalismo democrático foi a ideologia vitoriosa do


século XX. Nele se condensam algumas das grandes promessas da
modernidade: poder limitado, dignidade da pessoa humana, direitos
fundamentais, justiça material, solidariedade, tolerância e – quem sabe? –
até felicidade. O ideal constitucional e a doutrina democrática forneceram
energia e inspiração que ajudaram a reconstruir países devastados pelo
nazismo e pelo fascismo, a superar projetos socialistas autoritários e a
derrotar as ditaduras civis na Europa e militares na América Latina e
África. No Brasil, o florescimento de um sentimento constitucional
proporcionou-nos o mais longo período de estabilidade institucional
desde a Independência, vencendo um passado de golpismo e de quebras
da legalidade.

No Brasil e também na Itália e Alemanha, o neoconstitucionalismo provocou


o mais longo período de estabilidade institucional, por haver superações de crises
ideológicas, políticas e até mesmo econômicas.
Nota-se que alguns fatores foram necessários para a transformação do
movimento constitucional no que passou a ser denominado de
neoconstitucionalismo.
A trajetória do neoconstitucionalismo está fundada em três marcos
fundamentais, quais sejam: histórico, filosófico e teórico. (BULOS, 2011, p. 83-
87).
No marco histórico, há a Constituição de 1988, onde o direito constitucional
passou da desimportância ao apogeu em menos de uma geração. Supera-se a
indiferença em relação à Constituição.
No destaque filosófico, o neoconstitucionalismo é como uma terceira via
entre concepções positivistas e jusnaturalista já explicadas. Veja:

[...] Contesta, assim, o postulado positivista de separação entre


Direito, moral e política, não para negar a especificidade do objeto de
cada um desses domínios, mas para reconhecer que essas três dimensões
se influenciam mutuamente também quando da aplicação do Direito, e
não apenas quando da sua elaboração. No conjunto de ideias ricas e
heterogêneas que procuram abrigo nesse paradigma em construção,
incluem-se a reentronização dos valores na interpretação jurídica, com o
reconhecimento de normatividade aos princípios e de sua diferença
qualitativa em relação às regras; a reabilitação da razão prática e da
argumentação jurídica; a formação de uma nova hermenêutica; e o
desenvolvimento de uma teoria dos direitos fundamentais edificada sobre
a dignidade da pessoa humana. Nesse ambiente, promove-se uma
reaproximação entre o Direito e a Ética. (BARROSO, 2009, p. 381 - 382).

54
Os aspectos filosóficos do referido movimento são a saída para questões
lacunosas do positivismo jurídico. Já quanto ao marco teórico, o direito
constitucional engloba três conjuntos de alteração de paradigmas. O primeiro
conjunto está ligado com o reconhecimento da força normativa às disposições
constitucionais com aplicabilidade imediata e direta. O segundo, com a expansão da
jurisdição constitucional. O terceiro conjunto encontra-se no âmbito da
hermenêutica jurídica, com o surgimento da nova interpretação constitucional,
onde, por meio da aplicabilidade imediata dos direitos sociais e da normativização
do princípio da dignidade da pessoa humana, as pessoas alijadas dos direitos
garantidos aos humanos, agora, fazem parte do termo “todos”. Todos são iguais em
direitos.

55
CONCLUSÃO

A sociedade líquida narrada por Bauman tem como característica marcante o


abandono da certeza e solidez da antiga sociedade moderna. Esta, explicada pela
teoria do pensamento jurídico positivista, entedia a sociedade como perene,
concreta, dona de uma verdade incontestável. O Estado, como fonte única do direito
e este, por sua vez, sinônimo da norma/lei. Neste patamar, a justiça deixou de ser
objeto da ciência jurídica.
Quando o Estado moderno falhou em manter a solidez prometida, a
sociedade respondeu, como sempre, com o contraste do que até então existia. Logo,
se havia certeza e durabilidade nas relações sociais, agora, há liquidez e
fugacidade, a denominada sociedade líquida.
Impossível é negar a realidade da sociedade líquida. Sendo assim, cabe ao
pesquisador do direito entender esta sociedade, bem como compreender e gerar o
ordenamento jurídico que melhor mantenha a paz social, uma vez que este é o
grande escopo de qualquer regulação social.
Com isso em mente, a pesquisa em leitura apresentou a sociedade atual, a
sociedade líquida, concluindo que tamanha liquidez gerou um afastamento dos
valores no campo social. Se na vida social os valores deixaram de ser levados em
conta, como ficou o ordenamento jurídico e a ciência que o estuda, o direito? Como
regular relações jurídica em que os sujeitos de direito vivem em uma sociedade
líquida? Como criar e aplicar a norma nessa nova realidade?
Em resposta, a pesquisa em análise concluiu fundamentada no pensamento
jurídico pós - positivista. Para este, o direito e a ética/valores devem estar em
constante diálogo, uma vez que toda sociedade, com o fito de manter a paz social,
deve ter como valor matriz o princípio da dignidade da pessoa humana.
A dignidade advém da condição humana, independente de pressuposto.
Tendo como fundamento da sociedade um valor, nada mais correto que a ciência
que estuda a regulação social manter este intercâmbio valorativo.
Além disso, tanto o legislador como o juiz são abarcados por esta troca entre
as ciências sociais, direito e ética. De fato, o legislador, ao formular a norma, não
pressupõe sujeitos de direito iguais. Há, neste contexto, a igualdade/valor material

56
e formal, na lei e perante a lei. Volta-se ao clássico, onde se desiguala para igualar;
há o sujeito de direito hipossuficiente. Já a função judicial mudou o foco que antes
era dogmático e passou a primar pela zetética na busca pela decisão mais justa ao
caso concreto.
Por fim, destaque-se que esse intercâmbio entre o direito e a ética é
materializado em um contexto denominado neoconstitucional, onde o fundamento
do ordenamento não está pautado no rei e na clássica ideia de um Estado
personificado. Atualmente, a norma fundamental, a Constituição Federal, apresenta
como fundamente do Estado brasileiro a dignidade da pessoa humana,
demonstrando a nítida comunicação entre direito e valor.

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