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A arte de ensinar

A didática é um estudo da pedagogia que utiliza de fundamentos científicos para


tornar a aprendizagem mais eficiente, tendo como foco o processo de ensino, que
funciona como uma troca de conhecimentos entre o docente e seus alunos. Esse é
um campo de estudo com diferentes dimensões, sendo elas: humana, político-social
e técnica – cada uma delas teve seu momento em sala, onde foi fortemente
praticada e difundida.

Segundo o texto “Permanecendo fiel à música na educação musical", de Keith


Swanwick, existem três classificações para professores de música: o caixa postal, o
jardineiro e o agente cultural.

Pensando na dimensão técnica, que teve seu auge durante a ditadura militar, o
professor caixa postal é o que mais se encaixa. Isso porque ele estabelece um
distanciamento entre a prática musical e a realidade cultural dos alunos; é aquele
que tem um método mais "tradicional", focado em teorias, ditando o que deve, ou
não, ser passado para o aluno. É a partir de um pensamento enraizado que ele
acredita poder ditar o que é "bom" e o que vale a pena ser ensinado em sala de aula.
Tudo isso vai de encontro com o que Gandelman se refere como gênero estudo:

“Já no final do século XVIII e primeira metade do XIX, com o crescente


uso do pianoforte, surge o gênero estudo, baseado na ideia da repetição
mecânica e incansável de fórmulas, visando o desenvolvimento
de competências que, na época, se pensava caracterizarem a
boa técnica: velocidade, igualdade da força dos dedos e
resistência.”

Na dimensão humana, temos o professor jardineiro, que tem uma abordagem de


ensino voltada para uma educação mais centrada no estudante. Diferentemente do
primeiro, sua metodologia de ensino tem como foco a prática e a bagagem cultural
dos alunos. Nela, o aluno deixa de ser apenas receptor e passa a ter um papel mais
ativo em sala de aula – o que torna a aprendizagem mais imersiva e envolvente. Já
na dimensão político-social, temos a definição de docente como agente cultural;
aquele que atua para valorização, desenvolvimento e preservação da cultura de uma
sociedade por meio de ações e projetos.

Um ponto crucial para um professor de música, ou de qualquer outra disciplina de


ensino, é ter sempre em mente a diversidade, não só no que se diz respeito às artes,
mas também à toda diversidade social. Podemos ver isso neste trecho do livro "A
música na escola": “[...] a música, a dança, as artes em geral, vinculadas aos
diferentes grupos étnicos e às composições regionais típicas,são manifestações
culturais que a criança e o adolescente poderão conhecer e vivenciar”. (LINS, p. 116)
Para complementar esse pensamento, temos uma fala de Swanwick: "[...] os
educadores devem tentar entender a riqueza desses ambientes culturais
alternativos e considerá-los não como sendo inferiores às culturas às quais muitos
professores emergiram, mas como alternativas importantes". (SWANWICK, p.8)

Ainda nesse mesmo viés, temos, durante a década de vinte, o surgimento da Escola
Nova: focada nas necessidades da criança, questionando a passividade imposta ao
discente. Portanto, ela surgiu com uma ideia muito semelhante às do professor
jardineiro e do agente cultural: eliminar esse método de ensino tão enraizado, a
partir de outros métodos mais ativos, que valorizam uma maior participação dos
estudantes em sala de aula. Com esse preceito, junto à Escola Nova, também surgiu
a didática fundamental, sempre com o foco na transformação e na não-
conformação.

A didática fundamental aborda a necessidade de aguçar a criatividade, trabalhando


com a teoria e a prática – o que vai de encontro com a metodologia do professor
jardineiro, em que, na sua forma de ensinar, incentiva atividades como
improvisação, composição e arranjo. Sempre considerando a bagagem cultural do
aluno, ele a utiliza para agregar ao ensino. Ou seja, é através de atividades como a
apresentação com instrumentos que o aluno já saiba tocar, de dança, de músicas
que eles gostem ou que gostariam de aprender a tocar, que essa metodologia é
finalmente colocada em prática.

Trabalhar, portanto, com essa diversidade de gostos e saberes, é trazer, para dentro
da sala de aula, o olhar e os conhecimentos daquele aluno, fazendo-o emergir
naquele espaço, de uma forma que vai muito além de ouvir teorias. Inclusive, o texto
"Diversidade musical e desigualdade social" faz um alerta a respeito: “Embora isso
possa parecer óbvio, promover a diversidade das expressões não é tocar repertórios
estrangeiros ou exóticos.” (LINS, p. 117)

Vera Candau também trata sobre esse ponto em seu texto “Multiculturalismo e
educação: desafios para prática pedagógica”:

“Os educadores e educadoras estão chamados a enfrentar as questões colocadas


por esta manutenção cultural, o que supõe a não somente promover a análise das
diferentes linguagens e produtos culturais, como também favorecer experiências de
produção cultural e de ampliação do horizonte cultural dos alunos e alunas,
aproveitando os recursos disponíveis na comunidade escolar e na sociedade.”

Seguindo, também temos a didática crítica, que tem como seu principal norteador o
compromisso com a transformação social. Dentre as suas definições de professor,
temos o “professor pesquisador” e o “militante”, uma clara referência a Paulo Freire.
Sua importância, claro, é indiscutível: visa o ensinar sobre os interesses de classes
populares, através da democratização real da escola pública, com o intuito de gerar
a transformação das relações de opressão e dominação.

Mais um conceito importante para destacar é o da ecologia de saberes, um termo


que traz consigo vários questionamentos, como: “O que ensinar?”; "Como ensinar?”;
"Por que aquele conteúdo está sendo ensinado, qual seu objetivo?” e, por fim, “Para
quem vai ser ensinado?”. Pensar essas questões ajuda a montar um currículo
eficiente, considerando o local e o contexto que a escola está inserida.

Um fato que me marcou foi que, durante uma das nossas discussões em sala de
aula sobre didática, uma estudante do curso de Educação Física pontuou que havia
um certo "descuido" com o ensino de esportes na região em que ela mora, por ser
uma área rural, que é tradicionalmente posta à margem de diversos projetos sociais
– até mesmo de mobilidade, visto que a mesma citou que é comum moradores
precisarem andar a cavalo para fazer suas atividades diárias. Ela ainda confessou
sentir falta de um projeto de esporte que mostre e incentive os moradores locais,
apresentando possibilidades de crescimento no meio em que vivem. Então, um
questionamento que fica é: como criar projetos que considerem aquela realidade?

Para isso, a didática tem seus conceitos técnicos, que servem para auxiliar na
melhor organização. São eles:

● Planejamento: caracterizado como uma estratégia mental, ou “plano mental”,


é o momento de pesquisa, discussão entre os docentes, escolha de
conteúdo… Todo esse punhado de ideias, juntas e de forma organizada,
quando posta no papel, tem como resultado o plano, que pode ser
caracterizado como de curso ou de aula – que seria o micro, pois se trata da
organização de uma única aula.

● Estratégia: está diretamente ligada à metodologia; a forma como o professor


vai fazer para que aquele conteúdo seja ensinado.

● Avaliação: como o professor avalia seus alunos. Não precisa ser,


necessariamente, por meio de provas; outras formas avaliativas podem, sim,
ser consideradas.

● Objetivo: nesse caso, não é o objetivo do professor e, sim, o objetivo dos


alunos. Ou seja, o que eles serão capazes de fazer ao final do curso.

● Relatório professor e aluno(a): feito pelo professor durante as aulas, para


acompanhar o desenvolvimento dos alunos em sala.

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