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ESPELEOLOGIA

DIGITAL
Sociedade Excursionista e Espeleológica Nº III Maio de 2022
ISSN: 2675-7117
Sociedade Excursionista e Espeleológica

DIRETORIAS EDITORAÇÃO
Editores responsáveis: Rafael Oliveira Silva e
Diretoria - 2021/2022 Alice Mendes dos Santos
Presidente: Guilherme Augusto Rodrigues de Sousa Comissão Editorial: Gabriel Amora Basílio, Lara
Secretário: Vitor Oliveira Martins Chaves Carvalho Guerra, Alice Mendes dos Santos e
Tesoureiro: Amanda Freitas Carvalho Caporali Oliveira Rafael Oliveira Silva
Diretor científico: Rafael Oliveira Silva Revisão: Membros da Sociedade
Diretor de materiais: Lucas Soraggi Teixeira Excursionista e Espeleológica
Diretor de documentação: Luiza Clemente Rodrigues Diagramação: Gabriel Lourenço C. de Oliveira
Diretor de imprensa e divulgação: Maria Isidora R. Lopes Foto capa: Gabriel Lourenço C. de Oliveira

Diretoria - 2020/2021
Presidente: Gabriel Amora Basílio COMISSÃO AVALIADORA
Secretário: Vitor Oliveira Martins
Tesoureiro: Guilherme Augusto Rodrigues de Sousa Dr. William Sallum Filho
Diretor científico: Dyana Caroline Ferreira Cardoso Dr. Isaac Daniel Rudnitzki
Diretor de materiais: Ícaro Assis Cruz Dr. Allan Silas Calux
Diretor de documentação: Saulo de Paula Alves Silva Msc. Paulo Rodrigo Simões
Diretor de imprensa e divulgação: Alice Mendes dos Santos Dr. Heros Augusto Santos Lobo
Dra. Cristiane Ramos Donato
Dr. Claudio Maurício Teixeira
Diretoria - 2019/2020 Daivisson Batista Santos
Presidente: José Mota Neto Dr. André Gomide Vasconcelos
Secretário: Gabriel Amora Basílio Dr. Luiz Eduardo Panisset Travassos
Tesoureiro: Gabriel Lourenço Carvalho de Oliveira Dr. Paulo Henrique Ferreira Galvão
Diretor científico: Isaac Daniel Rudnitzki
Diretor de materiais: Guilherme Augusto Rodrigues de Sousa
Diretor de documentação: Yanê Arruda Castor de Altamirano
Diretor de imprensa e divulgação: Wilker Soares Silva

Sociedade Excursionista e Espeleológica dos Alunos da Escola de Minas – SEE/EM

Cx. Postal 68, Beco da Ferraria, s/ n°, Escola de Minas - Praça Tiradentes, Ouro Preto - MG

Homepage: www.see.ufop.br

E-mail: see@ufop.edu.br

Telefones: (31) 3559 - 1531 (Portaria da Escola de Minas, horário comercial)

(31) 99931 - 2856 (Guilherme Augusto Rodrigues de Sousa - Atual Presidente da S.E.E)
EDITORIAL

A Revista Espeleologia, primeiro periódico no Brasil e na América Latina, surgiu a


partir da necessidade em documentar as produções científicas da Sociedade Excursionista
e Espeleológica e de outros grupos engajados nas discussões que contemplam os cená-
rios da espeleologia nacional, proporcionando o acesso aos conteúdos que, anteriormente,
eram vistos somente em literatura estrangeira.

Desde 1969, ano do primeiro fascículo da Revista Espeleologia, a entidade propõe


que suas publicações sejam veículos facilitadores na divulgação dos estudos que com-
preendem a interdisciplinaridade da ciência que se dedica às cavernas e nos debates que
abrangem o dilema do desenvolvimento econômico frente a preservação do patrimônio
espeleológico.

Os periódicos apresentam treze edições em formato físico distribuídos entre os anos


1969 e 2011. Entretanto, com o avanço tecnológico somado ao aumento de conteúdos di-
gitais, surge a necessidade em disponibilizar as publicações em formato virtual no qual as
transformam em Revista Espeleologia Digital. Este formato apresenta duas edições distri-
buídas entre os anos 2017 e 2019 por meio da Política de Acesso Livre a fim de expandir o
conhecimento espeleológico nacional.

A atual edição Nº III apresenta uma estrutura dividida em oito matérias e onze artigos
científicos que abrangem as temáticas: Cartografia e Espeleometria; Geoespeleologia; Ge-
omorfologia e Hidrologia Cárstica; Arqueologia e Paleontologia; Espeleoturismo e Educa-
ção Ambiental. Esta edição contou com a participação de grupos nacionais e internacionais
em diversos assuntos que demonstram claramente o avanço quantitativo e qualitativo nos
estudos das cavernas, afirmando o compromisso de conhecer para preservar.

Por fim, agradecemos a todos que já se dedicaram na realização deste projeto e a


todos que se esforçam, continuamente, para que este caminho continue aberto e ofereça
novas possibilidades de produzir ciência com responsabilidade e diversidade. À Universida-
de Federal de Ouro Preto - UFOP; à Escola de Minas – EM; ao Museu de Ciência e Técnica
da Escola de Minas – MCT; à Fundação Gorceix – FG; à Fundação Vitor Dequech nosso
agradecimento pelo apoio e contribuição para o desenvolvimento da ciência espeleológica.

A Comissão Editorial deseja a vocês, leitores, um agradável encontro com as belezas


do mundo subterrâneo. Lembremos que: “De uma caverna nada se tira, a não ser fotogra-
fias. Nada se deixa, a não ser pegadas. Nada se leva, a não ser lembranças.”

Boa leitura!
Sumário
Excursionismo SEE ao Parque Estadual de Terra Ronca – Goiás 5

MATÉRIAS
MATÉRIAS
Museu Victor Dequech 9

Lançamento de nova versão do TOPGRU 12

Projeto Parque Nacional das Sempre-Vivas 15

Plano de Manejo Espeleológico do Parque Estadual do Ibitipoca – MG 19

Cavernas Vulcânicas Brasileiras 22
Gupe realiza projeto de inventário e educação patrimonial em sítios arqueológicos da área de proteção ambiental
da escarpa devoniana no município de Ponta Grossa (PR) 26
Guano speleo group performs action in the international year of caves with students of the Guimarães Rosa popular
course, from Medicine School of Minas Gerais Federal University 30
Caracterização
e regionalização dos terrenos cársticos, em rochas carbonáticas, no estado da Bahia 34

TRABALHOS
TRABALHOS
PALEONTOLOGIA

Paleotocas da megafauna cenozóica no município de Urubici (Santa Catarina) 39
Gruta do Engrunado: estudos preliminares de um depósito fossilífero do Quaternário, Chapada Diamantina, Bahia 46

ARQUEOLOGIA
Seridó no início do Holoceno
O 53

Potencial arqueológico da região de Natalândia - Mg 62

GEOESPELEOLOGIA
Avaliação e caracterização geológica da Lapa D´Água e suas pérolas gigantes como um geossítio, Montes Claros 72

Procesos espeleogenéticos y sistematica de la Caverna de la Patana, municipio Maisí, Guantánamo, Cuba. 89

ESPELEOTURISMO
E EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A educação ambiental como elo entre conhecimento científico e comunidade: atuação do GMSE, em Paripiranga 96

Análise da ação antrópica e seus impactos nas cavernas de Paripiranga-BA 102

‘Enfurnadas’, mas não isoladas 110
solidária no Vale do Ojô: uma proposta colaborativa baseada na percepção ambiental e no perfil da comunidade local
See 117

GEOMORFOLOGIA
patrimônio espeleológico do carste em quartzito no norte do PE da Serra do Intendente, Espinhaço Meridional
O 129
Excursionismo SEE ao Parque
Estadual de Terra Ronca – Goiás
Por Icaro Assis, Priscila Gambi e Amanda Caporali.

“É preciso de saber os trechos de se descer para Goiás: em debruçar para Goiás, o


chapadão por lá vai terminando, despenha. Tem quebra-cangalhas e ladeiras terríveis
vermelhas. Olhe: muito em além, vi lugares de terra queimada e chão que dá som – um
estranho.” (Guimarães Rosa em Grande Sertão Veredas)

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022 5


Foto: Gabriel Lourenço Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
No intuito de manter o caráter excursionista SEE visitaram as cavernas São Bernardo, Terra
da entidade, após a participação no 36º Congresso Ronca I e II e São Mateus. Todo percurso realizado
Brasileiro de Espeleologia (Brasília, DF), os mem- foi determinado e orientado pelos guias, que apre-
bros da Sociedade Excursionista e Espeleológica sentaram suas percepções e profundas relações
(SEE) conduziram-se rumo ao Parque Estadual de com as cavidades.
Terra Ronca (PETeR), localizado nos municípios de
São Domingos e Guarani de Goiás – GO. São Bernardo, Terra Ronca I e II e São
Mateus são volumosas, extensas, largas e altas,
A geomorfologia da região é composta por gozam de uma rica e rara variedade de ornamen-
planícies, planaltos, depressões, patamares de tações, e possuem fluxo hídrico constante - reve-
chapadas e exuberante relevo cárstico nas proxi- lando intensa atividade. Além disso, São Bernardo
midades da Formação Serra Geral, divisa da Bahia abriga o encontro de dois rios: São Bernardo e Pal-
com o Goiás. O parque, criado no ano de 1989, meiras. Também, São Mateus é a terceira maior do
sagra-se como um dos maiores complexos espele- Brasil em extensão.
ológicos da América Latina e do mundo. Abriga 250
cavernas conhecidas, dentre elas, algumas das A SEE agradece à Universidade Federal de
maiores e mais significativas do território nacional. Ouro Preto (UFOP), Fundação Gorceix, Fundação
A expedição ocorreu entre os dias 24 e 28 de abril Vitor Dequech e, sobretudo, aos sócios ex-alunos
de 2022 e contou com os guias locais Ramiro Hi- da entidade por todo apoio e incentivo no que tan-
lário dos Santos, Regiane Jesus, Daniel Jesus e ge às movimentações que permitiram a realização
Willian Hilário. Somado a estes, 18 membros da da expedição.

Participantes: Amanda Caporali, Bruno Fernandes, Gabriel Lourenço, Guilherme Augusto, Ícaro Assis,
Leandra Peixoto, Lorena Pires, Luiz Amore, Marcelo Taylor, Maria Isidora, Priscila Gambi, Paula de
Freitas, Pedro Assunção, Rafael Cardoso, Rafael Silva, Tiago Vilaça, Vitor Martins e Wendy Tanikawa.

Uma das apresentações de luz e sombra feitas por Ramiro (guia do


PETER) durante visita as cavernas. Ramiro mora a poucos metros da
grandiosa entrada da Lapa de Terra Ronca. Foto: Gabriel Lourenço
6
Foto: Gabriel Lourenço
"É da estrada que pasmam os olhos ao ver a intensa luz do dia sumindo pelo
volumoso pórtico de Terra Ronca I. Os espeleotemas da São Bernardo fazem
do percurso um contemplar contínuo e São Mateus é uma viagem interminável,
cada trecho é precioso em pluralidade. É preciso estar para sorver as evoluções
que transcendem a pequenez humana." (Amanda Caporali)

7
Foto: Gabriel Lourenço
MATÉRIAS
Gruta Morena, Cordisburgo - MG - Foto: Gabriel Lourenço
matérias

Museu Victor Dequech


Uma breve história da construção do Acervo SEE
Cassiano Emílio da Silva1,2
Dyana Caroline Ferreira Cardoso1,2
Luiz Filipe S. S. Leite1,2
Paula de Freitas Moreira1,2
Saulo de Paula Alves Silva1,2

1. Universidade Federal de Ouro Preto


2. Sociedade Excursionista Espeleológica - SEE

Fundada em 1937 pelos alunos da Escola de a SEE possui um vasto acervo decorrente de sua
Minas de Ouro Preto, a Sociedade Excursionista e trajetória, além de uma grande preocupação com
Espeleológica (SEE) foi o primeiro grupo de pesqui- a difusão do conhecimento espeleológico e cons-
sas espeleológicas institucionalizado das Américas. ciência ambiental, em 2010 foi proposto ao MCT,a
Ao longo de seus 83 anos, foram realizadas inúme- criação do Museu Itinerante da SEE. Este projeto
ras expedições às principais províncias cársticas do registrou visitantes brasileiros de vários estados,
país, o que gerou uma série de documentos histó- além de estrangeiros de diversos países da Amé-
ricos importantes que registram o início e evolução rica e Europa. Tendo em vista ao grande público
da exploração e mapeamento de cavernas em di- alcançado deu-se continuidade ao programa, nos
versas regiões do Brasil. As expedições ao norte de anos de 2012, 2017 e 2019, passando por con-
Minas Gerais, sul da Bahia e Ceará, demonstram a gressos de espeleologia, mostras de trabalhos
variedade de regiões pesquisadas pela entidade. científicos e universidades; exposição de fotos his-
Em decorrência destas expedições, a fim tóricas, objetos antigos e amostras relevantes do
de registro e estudo científico, foram coletadas acervo paleontológico e arqueológico (Figura 1).
amostras e peças de diferentes localidades, com-
pondo um rico acervo com mais de 100 peças en-
tre materiais líticos, ossadas de animais da me-
gafauna brasileira, espeleotemas raros e outros
componentes que registram as peculiaridades do
mundo subterrâneo. Além de um grande acervo
de amostras técnicas, a SEE dispõe de uma gama
de equipamentos que já foram utilizados pela en-
tidade (Figura 2), e que testemunham a evolução
das técnicas espeleológicas e das metodologias
para coletas. Grande parte desse acervo foi re-
passado para a tutela do Museu de Ciência e Téc-
nica da Escola de Minas de Ouro Preto – MCT.
A partir da segunda metade do século XX,
os museus passaram a ser reconhecidos também
pelo seu papel educacional, sendo uma fonte de
saber voluntária e informal, tão importante quanto
os métodos tradicionais de educação. Visto que Figura
1: Exposição de alguns itens do acervo durante o
evento SEE solidária.

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias museu victor dequech

Com base no êxito obtido nessas exposições tos a respeito de atividades que são desenvolvidas
itinerantes, a entidade optou por efetuar um projeto no ambiente cavernícola: em parques, as grutas
para implementação pioneira de um acervo perma- são motivo de atividades turísticas; em algumas
nente voltado a espeleologia, instalado no MCT. O regiões, as cavidades possuem importância reli-
projeto foi bem recebido e aprovado pela direção giosa; e no passado também foram fonte de ma-
da Escola de Minas da UFOP. Após a instalação, o téria-prima como adubo e salitre; entre outros fins.
museu será batizado como Museu Victor Dequech Essas cavidades representam um ambiente
em homenagem ao fundador da SEE e da empre- delicado e frágil, que está sujeito a degradação e
sa Geosol falecido em 2011, devido ao seu impor- pichação, principalmente as que estão localizadas
tante papel para SEE e a espeleologia nacional. próximas a centros urbanos e com fácil acesso. Em
Para ajudar na implementação do museu caso da presença de material arqueológico e pa-
Victor Dequech, hoje a entidade compõe a rede de leontológico, os riscos se somam a eventualidade
museus da UFOP, que engloba vários acervos da de coleta inadequada dos mesmos. Assim, o museu
universidade, visando maior conhecimento em edu- também desempenha a função de desvelar a impor-
cação museal, conservação de seu acervo e auxílio tância e utilidade da espeleologia e como essa ci-
nos trâmites necessários para concretizar o quanto ência está relacionada a outras, numa riqueza mul-
antes o projeto de sua instalação permanente. tidisciplinar de interfaces como turismo, biologia,
O museu Victor Dequech, além de ter um caráter história, arqueologia, paleontologia, entre outras,
histórico e de divulgação, será uma fonte de saber e atuando diretamente na difusão do “saber espe-
científico e ambiental. O objetivo do projeto será leológico”. O espaço destinado a Exposição Victor
o desafio de mostrar as cavernas como um espa- Dequech, incorporado a um museu de relevância
ço valioso, e que guarda uma estrita relação com nacional como o de Ciência e Técnica, é essencial
o desenvolvimento da humanidade, com a função para estabelecer essa comunicação direta com o
de moradia e ligação a diversos outros usos e pos- público e enraizar concepções e atitudes ligadas
sibilidades. O projeto também tem como objetivo a preservação das cavernas, tanto para a comuni-
fazer com que o público leigo adquira conhecimen- dade local e universitária, quanto para os turistas.

Figura 2: Exposição de espeleotemas no MCT em 2019. Foto: Alice Mendes

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Acampamento Gruta do Janelão.
Expedição Peruaçu Julho de 1976, Acervo SEE.

Gruta do Janelão, ao fundo o conduto do Minotauro.


Expedição Peruaçu Julho de 1976, Acervo SEE.
matérias

Lançamento de nova
versão do TOPGRU
Nova versão traz o aprimoramento de suas funcionalidades.
Grupo Topgru

Universidade Federal de Ouro Preto


Sociedade Excursionista Espeleológica - SEE

nadas UTM tomadas a partir de receptor GNSS.


Permite também o cálculo das coordenadas das
medidas laterais esquerdas e direitas, em visa-
das diretas e inversas (contravisadas), além das
alturas do teto na estação base e irradiações.
A entrada de dados se faz a partir de mo-
delos de planilhas do Excel e as saídas são em
formatos diversos, de arquivos texto a modelos
3D em formato DXF e KML, compatíveis tam-
bém com os programas Compass e Therion. A
nova versão do TOPGRU, lançada em outubro
de 2021, traz algumas melhorias como a geração
de perfis longitudinais retificados, aprimoramento
dos arquivos de saída com o intuito de se torna-
Desenvolvido inicialmente para fazer o
rem mais didáticos e de fácil manuseio, e a solu-
tratamento dos dados topográficos levantados
ção de alguns “bugs”. Essas atualizações são re-
pela Sociedade Excursionista e Espeleológica
sultado dos esforços do grupo de trabalho que se
(SEE), no final dos anos 1980, o aplicativo TOP-
reúne periodicamente para seu desenvolvimento.
GRU passou a ser complementado desde 2017 e
Entre as vantagens do programa, estão a
se tornou público no ano de 2020. Atualmente o
possibilidade de gerar a linha de trena com as al-
aplicativo encontra-se hospedado no sítio eletrô-
turas das visadas corrigidas - considerando a dis-
nico da entidade SEE (https://see.ufop.br/topgru),
tância inclinada real para vantes e rés; e alturas de
e seu download vem acompanhado de manuais
teto, nos formatos DXF 2D e 3D e KML. Também a
de instrução, exemplos e modelos de utilização.
viabilidade de gerar a linha de trena de perfil retifi-
Na página da SEE você também encontra o link
cado a partir das estações escolhidas na planilha,
que o direciona a vídeos com o passo a passo
no formato DXF, sendo esta uma das novidades
para a utilização do programa e suas novidades.
da nova versão. Similarmente, o programa gera
O TOPGRU trata-se de um programa es-
arquivos de entrada de dados compatíveis com
crito em linguagem FORTRAN 77, de código
os programas COMPASS E THERION, transfor-
aberto para Windows, que permite o cálculo da
mando as leituras de vantes, rés e alturas do teto
posição da estação em coordenadas cartesianas
das cavernas (“LRUD”) em radiações (“splays”).
com referencial local, ou transporte das coorde-
Além disso, o TOPGRU aceita contra visadas e vi-

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias lançamento de nova versão do topgru

sadas alternadas ou inversas e todas as informa- nipulação que contempla os elementos ne-
ções dos arquivos de saída são georreferenciadas. cessários para a elaboração dos mapas espe-
É importante destacar que o programa acei- leológicos, além de ser um grande facilitador
ta a digitação aleatória de suas linhas, independen- Apesar de básico, é um aplicativo de fá-
temente da ordem seguida em campo. Por exemplo, cil manipulação que contempla os elementos ne-
uma equipe pode dar início ao mapeamento pela cessários para a elaboração dos mapas espele-
entrada da caverna enquanto outra equipe pelo final ológicos, além de ser um grande facilitador para
da mesma, sendo ponto de encontro determinada a obtenção dos cálculos espeleométricos, não
estação ao longo do desenvolvimento da cavidade. sendo útil aos usuários da Disto X ou similares.
Caso as estações não tenham conexão umas com Visto o potencial de utilização e possibili-
as outras, o programa emite um alerta e processa dades de aprimoramentos, espeleólogos se mo-
apenas o restante dos pontos que tenham conexão. bilizaram e criaram um grupo de trabalho para o
No tempo presente, o TOPGRU possui desenvolvimento do TOPGRU, visando dar uma
quatro modelos de planilhas de entrada de dados interface mais amigável e atribuir novas funciona-
em excel, SEE, PLG, SPE, EEF, e a principal di- lidades. O grupo homónimo do programa, forma-
ferença entre elas é a nomenclatura utilizada. Ain- do atualmente por membros da SEE/UFOP, Es-
da que até o momento não seja capaz de corrigir peleometria em Foco e GEEP Açungui, se reúne
o fechamento de poligonais e avaliar a precisão semanalmente para discutir tópicos diversos relacio-
da topografia, o TOPGRU mostra-se particular- nados às melhorias do programa, juntamente com
mente versátil ao permitir visadas em estações ao questões espeleométricas, novos métodos de levan-
chão ou à altura dos espeleólogos, fixas ou flutu- tamento topográfico, erros e precisão dos levanta-
antes. É o único programa que faz as correções mentos, soluções para topografia em cavidades com
topográficas em relação às alturas das visadas. magnetismo, linguagens de programação e o perfil
Apesar de básico, é um aplicativo de fácil ma- da espeleotopografia brasileira, entre outros temas.

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Conduto principal da Gruta das Tabocas - Iuiú / BA, caverna topografada
em expedição conjunta da SEE com Bambuí em 2021.

Foto: Gabriel Lourenço


matérias

Projeto Parque Nacional


das Sempre-Vivas
Uma contribuição à evolução do conhecimento
Wendy Tanikawa 1,2
do carste quartzítico
Rafael Oliveira Silva1,2

1. Universidade Federal de Ouro Preto


2. Sociedade Excursionista Espeleológica - SEE

O Parque Nacional das Sempre Vivas O parque também se destaca por sua grande bio-
(PNSV) é uma Unidade de Conservação (UC) Fede- diversidade que, devido as altas cotas topográficas,
ral de Proteção Integral, criada em 2002, que possui propicia a presença de espécies endêmicas, como
área de 124.555 hectares e perímetro de cerca de as sempre-vivas (Figura 1B). Essas espécies ocor-
168 quilômetros, abrangendo parte dos municípios rem numa vegetação predominantemente de cerra-
de Olhos d’Água, Bocaiúva, Buenópolis e Diam do e campos rupestres, com influência da Caatinga
antina, em Minas Gerais. O parque está localizado e da Mata Atlântica, refletindo particularidades eco-
na Serra do Espinhaço Meridional, região de pai- lógicas (Figura 1C). O parque não só se destaca por
sagens exuberantes com grandes afloramentos de sua biodiversidade, mas também por possuir diver-
quartzito e locais propícios para a formação de ca- sos sítios arqueológicos e cachoeiras (Figura 1D).
vernas. Além disso, a serra constitui um divisor das Desta forma, a UC também está inserida
bacias hidrográficas do rio São Francisco e do rio na Reserva da Biosfera da Serra do Espinhaço, re-
Jequitinhonha, possuindo cotas médias de 1200m conhecida pelo Sistema Nacional de Unidades de
que chegam a 1525m na Serra do Galho (Figura 1A). Conservação (SNUC) como um modelo de gestão
integrada, participativa e sustentável dos recursos
naturais, com os objetivos básicos de preserva-
ção da diversidade biológica, desenvolvimento de
atividades de pesquisa, monitoramento ambiental,
educação ambiental, desenvolvimento sustentável
e melhoria da qualidade de vida das populações.
Dada sua relevância, o parque possui um
Plano de Manejo realizado em 2016 que teve como
objetivo estabelecer diretrizes para a gestão so-
cioambiental. Entretanto, não houve contemplação
para o estudo, identificação e cadastramento das
feições espeleológicas no parque. Nesse contexto,
se insere o projeto de “Caracterização do Patrimô-
Figura 1: Feições típicas do Parque Nacional das Sem-
nio Espeleológico do Parque Nacional das Sempre
pre-Vivas. A: Serra do Galho, uma das formas de relevo Vivas” realizado pela Sociedade Excursionista e
mais
proeminentes da região. B: Sempre-Vivas típicas da Espeleológica (SEE). Este projeto foi iniciado pela
Serra do Espinhaço. C: Vegetação de Cerrado em cam-
pos de altitude. D: Sítio arqueológico de pinturas rupes- entidade em agosto de 2019 e faz parte do TCCE
tres no PNSV. (Termo de Compromisso de Compensação Espe-

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias projeto parque nacional das sempre-vivas

leológica) 02/2018, firmado entre o Instituto Chico Para melhor compreensão da gênese das
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICM- feições do parque, viu-se a oportunidade de in-
Bio) e a Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A. serir um projeto de mestrado vinculado ao Pro-
A execução da compensação é referente aos impac- grama de Pós-Graduação em Evolução Crustal e
tos negativos irreversíveis a cavidades naturais sub- Recursos Naturais (UFOP) intitulado “Investiga-
terrâneas com grau de relevância alto, ocasionados ção dos processos espeleogenéticos do Parque
pelo empreendimento “Extensão da Mina do Sapo” Nacional das Sempre Vivas” também incluso no
(Processo SEI ICMBio nº 02667.000045/2018-11). projeto de caracterização do parque. O estudo
O projeto envolve a prospecção de caver- envolve a análise integrada das feições estrutu-
nas nos limites do parque bem como o cadastro rais, faciológicas, petrográficas, da geoquímica
das feições espeleológicas encontradas no CNC da água e da geomorfologia. Para isso, nos dias
(Cadastro Nacional de Cavernas) e no Canie (Ca- 12 a 25 de fevereiro de 2021, cinco espeleólogos
dastro Nacional de Informações Espeleológicas), (Figura 2B) participaram da primeira campanha
vinculados à Sociedade Brasileira de Espeleologia de campo do mestrado da aluna Wendy Tanikawa
(SBE). Além disso, será realizado um levantamento oriendada pelo professor Dsc. Issac Rudnitzki.
da distribuição dessas feições na área do PNSV e Durante o campo, cinco feições foram topo-
serão selecionadas as cavidades mais relevantes grafadas, sendo três delas conhecidas previamente
à fim de serem topografadas. Nos dias 10 e 24 de pela comunidade local: Lapa da Saduruta, Lapa da
fevereiro de 2020, doze espeleólogos participa- Santa de Pedra e Lapa do Dorico; e outras duas
ram da primeira etapa de campo do projeto com o feições que foram encontradas durante a primeira
objetivo de identificar os principais elementos do etapa de prospecção realizada no parque. Até o
relevo na porção centro-sul da UC (Figura 2A). O momento, a Lapa do Nonô, maior feição até agora
grupo identificou um total de 98 feições espeleo- topografada, apresenta aproximadamente 168,46m
lógicas durante a primeira campanha de prospec- de desenvolvimento horizontal, com planta baixa
ção, na qual 67 correspondem a cavernas, 24 a ramificada em que a morfologia varia desde salões
abrigos e 6 a abismos. As cavidades apresentam amplos à condutos estreitos em teto baixo. Tam-
pequena ocorrência de espeleotemas, representa- bém foram coletados dados estruturais e faciológi-
dos principalmente por coralóides, escorrimentos e cos do endocarste e exocarste que serão integra-
raras estalactites. Além disso, um fator de grande dos à caracterização geoespeleológica (Figuras
importância foi a catalogação de vestígios arque- 3A, B e C). Além disso, os parâmetros físico-quí-
ológicos encontrados, sendo que, dentre os 24 micos da água foram aferidos por meio do multi-
abrigos cadastrados, 5 apresentaram pinturas ru- parâmetro e as amostras de água foram coletadas
pestres e 3 continham possíveis materiais líticos. para análise geoquímica laboratorial, por meio do

Figura 2: Espeleólogos participantes das etapas de campo do projeto. A: Equipe da primeira campanha. B: Compo-
nentes da equipe da segunda campanha ao PNSV.

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias projeto parque nacional das sempre-vivas

ICP-MS e ICP-OES, à fim de complementar da- à baixa reatividade da sílica e, por isso, eram mais
dos para as hipóteses de espeleogênese (Figura escassos os estudos voltados para a compreensão
3D). Dessa forma, o projeto visa contribuir com a desse relevo. No entanto, descobertas recentes de
catalogação das feições espeleológicas e arque- cavernas quilométricas instigam novos estudos no
ológicas do PNSV além de abranger análises da Brasil, como a Gruta Martimiano no qual a SEE es-
evolução dos carstes quartzíticos e a formação de teve presente em seu mapeamento; a região dos
cavernas. A etapa de catalogação é importante a Tepuis Venezuelanos que, hoje, é foco de estudos
nível de conhecimento do patrimônio espeleológico internacionais que envolvem espeleogênese em
do parque e a nível nacional, pois contribui com a carstes quartzíticos, dentre outros. Assim, o pro-
quantificação de cavidades no território brasileiro. jeto desenvolvido atualmente pelos membros da
O desenvolvimento do relevo cárstico na litologia SEE possui conteúdo atualizado em relação às
quartzítica era considerado pouco propício devido demandas acadêmicas e busca evidenciar a im-

Figura 3: Feições do relevo cárstico quartzítico do PNSV. A: Endocarste da Lapa do Nono. B: Local de empoçamento
no endocarste da Lapa das Cruzadas. C: Exocarste da Lapa do Dorico. D: Coleta de água na Lapa do Nono.

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Foto: Gabriel Lourenço

Vista da paisagem noturna no Parque Nacional das Sempre Vivas - MG. Ao


fundo observa-se a Serra do Galho, maçico bem representavivo da região.
matérias

Plano de manejo espeleológico do


Parque Estadual do Ibitipoca – MG
Amanda Freitas Carvalho Caporali Oliveira1,2
Lara Chaves Carvalho Guerra1,4
Maria Isidora Rodrigues Lopes1,3
Vitor Oliveira Martins1,3

1. Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE;


2. Departamento de Geologia – DEGEO / Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP
3. Departamento de Turismo – DETUR / Universidade Federal de Ouro Preto – UFOP
4. Programa de Pós-Graduaçao Interunidades em Biotecnologia / Universidade de São Paulo - USP

Fundado em 1973, por meio da lei 6.126 do O PEIb abriga em seu domínio a Gruta Martimiano
Governo de Minas Gerais, o Parque Estadual do Ibi- II, considerada a maior cavidade em rocha quartziti-
tipoca (PEIb) é uma unidade de conservação (UC) ca do Brasil em projeção horizontal, com “4.170 me-
de proteção integral localizada no sul do estado de tros mapeados, 170 m de desnível, grandes salões
Minas Gerais próximo a cidade de Juiz de Fora, re- e espeleotemas singulares com coloração averme-
gião conhecida como “Zona da Mata” e engloba em lhada” (GUERRA, 2019, p. 31). A Gruta Bromélias
seu território parte dos municípios de Lima Duarte, também merece destaque por sua dimensão, apre-
Santa Rita do Ibitipoca e Bias Fortes, totalizando senta 2560 m de projeção horizontal. Além das ca-
1488 hectares de extensão. O parque está entre racterísticas abióticas, algumas cavidades do PEIb
os mais visitados do estado, recebendo um total de são habitat para espécies troglóbias e uma nova es-
84.381 turistas no ano de 2019, segundo levanta- pécie de aranha (Ochyrocera ibitipoca), que foi des-
mento realizado pelo Observatório do Turismo de crita em 2008 por Baptista, González & Tourinho em
Minas Gerais. O PEIb compõe a Serra de Ibitipoca quatro cavidades. No total, são 41 cavidades do-
no limite de dois domínios geomorfológicos denomi- cumentadas no Cadastro Nacional de Informações
nados “Serra da Mantiqueira” e “Planalto de Andre- Espeleológicas – CANIE, das quais 10 são abertas
lândia” os quais exercem um forte controle estrutu- para visitação turística de forma autoguiada. O au-
ral na região. Pertence ao domínio fitogeográfico da mento da visitação tem causado impactos negativos
Mata Atlântica, a vegetação é associada aos aflora- a esse patrimônio, o parque oferece pouca informa-
mentos quartzíticos, apresentando campos rupes- ção e orientação sobre o ambiente subterrâneo e
tres de altitude e grande influência de elementos de formas de se comportar nesta modalidade turística
Mata Atlântica. O parque abriga uma fauna diversi- sendo comum a ocorrência do descarte inapropria-
ficada com a presença de espécies ameaçadas de do de resíduos dentro das cavidades, pichações,
extinção, como a onça parda e o lobo guará, além não utilização de equipamentos de segurança e
de uma espécie de perereca (Hyla ibitipoca) descri- roupas inadequadas, o que gera riscos ao visitante.
ta de forma inédita, dentro dos limites do parque. Com vistas a necessidade de proteger e sal-
As cavidades naturais subterrâneas vaguardar o patrimônio espeleológico e atender a
encontradas no parque compõem um rico patrimô- Resolução nº 347, de 10 de setembro de 2004, do
nio espeleológico, de valor singular e máxima rele- Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA,
vância, em vista da peculiaridade e fragilidade de 2004), foi celebrado um aditivo ao termo de ajus-
seus ecossistemas, a alta concentração de cavernas tamento de conduta - TAC firmado entre o Instituto
quartizíticas e suas dimensões notáveis, em uma li- Estadual de Florestas - IEF e Ministério público de
tologia onde feições cársticas são menos comuns. Minas Gerais que prevê a elaboração e implemen-

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias plano de manejo espeleológico do parque estadual de ibitipoca

Figura 1: Reunião virtual de elaboração do Plano de Manejo Espeleológico do PEIB.

tação do Plano de Manejo Espeleológico (PME) suprir a carência de dados em determinadas áreas.
para as cavidades sujeitas a visitação no parque. A análise integrada e o zoneamento das cavidades
Em julho de 2019, os servidores do Insti- estão sendo realizados a partir do levantamen-
tuto Estadual de Florestas – IEF Clarice Lantel- to de aspectos espeleoturísticos realizados pela
me (gerente do PEIb) e Davi Lantelme (espele- SEE, a partir disso, serão realizadas propostas de
ólogo) aprovaram junto a instituição competente gestão e manejo para as cavidades e apresenta-
o projeto de elaboração do PME e deram início a ção à comunidade em oficina pública para consul-
coordenação das atividades que contam com a ta e aprovação. O documento final será entregue
participação voluntária de membros de grupos es- ainda no ano de 2021, para que possam iniciar a
peleológicos de diversos locais que já possuem aplicação de suas propostas e diretrizes em ações
ações nas cavernas da unidade de conservação, de educação ambiental, pesquisa e monitoramen-
sendo eles, a Sociedade Excursionista e espeleo- to visando a conservação do patrimônio local e o
lógica – SEE, a Sociedade Carioca de Pesquisas reflexo em todo distrito espeleológico em nível na-
Espeleógicas – SPEC, o Espeleo Grupo Rio Cla- cional. O Plano de Manejo Espeleológico do PEIb
ro – EGRIC e o Centro de Estudos em Biologia faz parte de um esforço coletivo, que visa conser-
Subterrânea da Universidade Federal de Lavras. var as cavidades e seu entorno, orientar o aces-
No ano de 2020 as atividades foram para- so e possíveis intervenções, de forma a reduzir os
lisadas devido a pandemia da COVID-19, retor- impactos. A SEE realiza expedições nas cavernas
nando no ano seguinte visando a necessidade da do parque desde 2014, participa da elaboração do
elaboração do Plano de Manejo. A partir de então, PME e ressalta a importância desse documento
a equipe iniciou reuniões semanais para a elabo- para a conservação do patrimônio espeleológico.
ração do PME, baseada no documento "Diretrizes
e Orientações Técnicas para a Elaboração de Pla-
nos de Manejo Espeleológico" elaborado pelo CE-
CAV. Para tal, foi feito o levantamento bibliográfico
de meio físico, biótico e socioeconômico, principal-
mente no que tange o tema espeleologia, além dis-
so deu-se início a levantamentos e pesquisas para

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


20
Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Condutos com forma de fechadura, comuns nas cavernas do PEIB.
Gruta das Casas, Parque Estadual do Ibitipoca, MG.
Foto: Gabriel Lourenço
matérias

Cavernas Vulcânicas Brasileiras


Conheça as cavidades da Ilha da Trindade – Atlântico Sul, esculpi-
das em rochas provenientes do vulcanismo mais recente do país
Dyana Caroline Ferreira Cardoso1,2
Fábio Soares de Oliveira3

1. Núcleo de Atividades Espeleológicas (NAE)


2 Sociedade Excursionista e Espeleológicas
3. Universidade Federal de Minas Gerais

Cavernas de origem vulcânica são consi- nico, com as erupções mais jovens do país, apro-
deradas como de gênese muito rara no território ximadamente 0,25 Ma. As unidades geológicas são
brasileiro. Em áreas continentais, poucas são as formadas basicamente por uma série alcalina com
cavidades registradas em rochas desta origem, grandes corpos fonolíticos, e uma série básica de
como é o caso da Casa de Pedra no Paraná: uma derrames basálticos. A série vulcânica de Trindade
cavidade desenvolvida em basalto, que foi desco- é caracterizada pelo baixo teor de SiO2 e é acentua-
berta em 2017 por pesquisadores da Unicentro e damente sódico-alcalina, e são nestas litologias que
UFSC. É importante ser considerado, no entanto, ocorrem as cavidades naturais da Ilha da Trindade.
que o território brasileiro possui, além da plataforma A origem destas cavidades está associa-
continental, arquipélagos inteiramente localizados da ao desmonte erosivo ao qual a Ilha está inten-
em bacias oceânicas e sem qualquer ligação com samente submetida, uma vez que suas rochas
a plataforma continental, formados por processos são compostas por minerais pouco resistentes ao
vulcânicos (Fernando de Noronha - RN, Trindade e desgaste intempérico (Figura 1). Associado a um
Martim Vaz - ES), tectônicos (São Pedro e São Pau- relevo escarpado de altas declividades, estas ca-
lo – RN) ou biológicos (Atol das Rocas – RN). Nes- racterísticas proporcionam uma intensificação dos
tes arquipélagos, existem cavidades naturais pouco processos erosivos gravitacionais (em rochas mais
conhecidas ou divulgadas, cuja importância am- resistentes) e marinhos (em rochas mais friáveis).
biental pode ser considerada de máxima relevância Isto ocorre porque em rochas mais resistentes
– especialmente quando se considera a fragilidade (como é o caso do fonolito), é comum a ocorrên-
natural dos ambientes nos quais estão inseridas. cia de fraturas, denominadas juntas de alívio, que
A Ilha da Trindade possui origem vulcâni- retalham a rocha em frestas de diferentes dimen-
ca, e está situada a cerca de 1200 km a leste da sões. A instabilidade destas fraturas resulta na
sede do município de Vitória, do qual faz parte, no queda de blocos, que são acumulados na base
ponto mais a sul e mais a leste da costa brasileira, dos picos fonolíticos, e neste processo, formam-
pertencendo à cadeia ou lineamento vulcânico “Vi- -se “buracos” na rocha de onde se desprenderam.
tória-Trindade”, formado por um hot-spot (Almeida, Cavernas desta origem são muito comuns
1961; Pires et al., 2016). Outros edifícios vulcânicos na Ilha, especialmente nos chamados picos fonolí-
pertencentes a este lineamento foram nivelados a ticos. Entretanto, o acesso é quase sempre impos-
menos de 100 m de profundidade, em decorrência sibilitado devido à altura em que estas feições se
do desgaste erosivo causado pelo mar. A Ilha da encontram – o que demanda uma prospecção intei-
Trindade é o único local em território brasileiro no ramente realizada por meio de técnicas verticais de
qual ainda se reconhece parte de um cone vulcâ- rapel e ascensão. Uma única exceção é o caso da

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias Cavernas Vulcânicas Brasileiras

Figura 1: I – Gruta do Eme; II – Túnel do Paredão; III – Gruta Nsa. Sra. De Lourdes.

Gruta Nossa Senhora de Lourdes, inserida no alto do Eme, uma gruta de desenvolvimento horizontal
de um pico, onde o acesso só é possível devido ao originada pela erosão da base de um paredão de
acúmulo de blocos que se amontoaram na base do rocha piroclástica de frente ao mar. No interior da
afloramento (Figura 2). Nesta cavidade, além das gruta existe a imagem da uma santa. A relevância
feições de dissolução (escorrimentos e coralóides) de cavernas desta categoria é que são formadas
observadas, verifica-se também a presença de ni- em rochas cuja composição mineral possuem alto
nhos de aves marinhas ameaçadas de extinção, teor de minerais magnéticos, que uma vez erodi-
sendo, portanto, um ambiente essencial para repro- dos, são aportados e depositados na praia. Este
dução de aves marinhas como noivinhas, atobás, processo favorece a ocorrência de um dos ambien-
petréis e fragatas marinhas. Apesar disso, a gruta tes praiais mais raros do mundo, com uma areia
está em altíssimo grau de degradação, com inúme- preta composta quase exclusivamente, por mine-
ras pichações e depósito de objetos humanos de to- rais magnéticos como a magnetita e a ilmenita.
dos os tipos. Isto ocorre devido à tradição religiosa, O patrimônio espeleológico da Ilha da Trin-
onde o fiel crê que seu retorno à ilha só será pos- dade é mais uma das grandes particularidades des-
sível caso ofereça à gruta qualquer objeto pessoal. te local: além de ser a única ilha oceânica brasileira
Em rochas piroclásticas, formadas pelo com ocorrência de nascentes e cursos d’água pere-
acúmulo de cinzas e materiais vulcânicos sólidos nes de água doce, a ilha possui uma floresta de sa-
expelidos por erupções vulcânicas, a erosão ma- mambaias gigantes endêmicas, espécies de aves,
rinha é o principal agente formador de cavidades caranguejos e tartarugas ameaçadas de extinção,
na Ilha da Trindade. Estas estão, portanto, exclusi- solos endêmicos associados à presença de avi-
vamente localizadas no compartimento costeiro da fauna marinha, e o único cone vulcânico com sua
Ilha, onde a abrasão marinha é forte e constante morfologia parcialmente preservada do território
o suficiente para esculpir túneis e grutas na mar- brasileiro. A ocorrência de grutas de origem vulcâni-
gem das praias. Neste contexto, se destacasse cas nesta ilha é mais um atributo que confere a ela
o Túnel do Paredão – cavidade formada na base tamanho valor cientifico e ambiental, e é relevante
da escarpa de uma cratera vulcânica parcialmen- que a ocorrência destas grutas seja reconhecida,
te preservada. Também foi identificada na Praia estudada e divulgada. Estudos de abordagem ex-

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias Cavernas Vulcânicas Brasileiras

Figura 2: Apesar de sua grande relevância ambiental, especialmente para a reprodução de aves marinhas ameaça-
das de extinção, a gruta Nsa. Sra. De Lourdes encontra-se intensamente degradada.

clusivamente espeleológica são inexistentes na Ilha de de conservação foi criada pelo Decreto nº 9.312,
da Trindade, onde existem grutas de alto valor cien- de 19 de março de 2018, e sua gestão tem como um
tífico e paisagístico, beleza cênica, gêneses mui- dos principais objetivos o fomento à pesquisa cien-
to raras e importância biológica. É desejável que tífica e preservação de seus aspectos ambientais.
estas grutas sejam prospectadas, registradas e to-
pografadas, para que sua relevância não seja ape- REFERÊNCIAS
nas reconhecida, mas especialmente preservada.
Um grande avanço nas pesquisas na Ilha da CARDOSO, D. C. F., 2020. O Relevo da Ilha da
Trindade ocorreu a partir da consolidação do Pro- Trindade – AtlânticoSul: ensaios para a compre-
grama de Pesquisas Científicas da Ilha da Trindade ensão de suas paisagens. 2020. (Dissertação de
(PROTRINDADE) em 2007, mediado pelo Governo Mestrado). Programa de Pós-graduação em Ge-
Federal e pela Marinha do Brasil. Apesar da escas- ologia Ambiental e Recursos Naturais (Geomor-
sez de estudos especificamente espeleológicos, há fologia e pedogênese), Ouro Preto, MG, 2020.
um leque de trabalhos publicados que se dedicaram ALMEIDA, F. F. M. A., 1961. Geolo-
a caracterizar o meio físico e abre possibilidades gia e petrologia da Ilha da Trindade. SER-
para novos estudos com diferentes abordagens. GRAF do IBGE, Rio de Janeiro, 197pp.
A ilha está inserida na Área de Proteção Am- PIRES, G. L.C. et al., 2016. New40Ar/39Ar ages
biental do Arquipélago de Trindade e Martim Vaz, de and revised 40K/40Ar* data from nephelinitic–pho-
esfera Federal, sob gestão do Instituto Chico Men- nolitic volcanic successions of the Trindade Island
des de Conservação da Biodiversidade - ICMBio, (South Atlantic Ocean). Journal of Volcanology
com a participação da Marinha do Brasil. Esta unida- and Geothermal Research, v. 327, p. 531–538.

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Vista do Pico do Desejado, ponto mais alto da ilha, onde podem ser observados diferentes
geoambientes, incluindo cratera do vulcão do paredão e necks fonolíticos. Ilha da Trindade, Atlântico Sul.

Foto: Dyana Cardoso


matérias

Gupe realiza projeto de inventário e educação


patrimonial em sítios arqueológicos da área de
proteção ambiental da escarpa devoniana no
município de Ponta Grossa (PR)
Laís Luana Massuqueto1
Henrique Simão Pontes1,2
Rodrigo Junghans1,3
Alessandro Giulliano Chagas Silva1,4

1. Grupo Universitário de Pesquisas Espeleológicas - GUPE;


2. Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG;
3. Planalto Arqueologia e Patrimônio;
4. Projeto Arqueotrekking – roteiros arqueológicos

A riqueza arqueológica da Área de Proteção b) pichações e inscrições sobre as pinturas rupes-


Ambiental - APA da Escarpa Devoniana, nos Cam- tres;
pos Gerais do Paraná, associada ao seu patrimônio c) quebra proposital de painéis rupestres;
espeleológico (com potencial para novas descober- d) intensa visitação turística;
tas), faz da região um hotspot da arqueologia nacio- e) processos erosivos causados por trilhas de mo-
nal. Neste contexto geográfico, o município de Ponta tocross e;
Grossa possui fração importante desse patrimônio. f) descaracterização da vegetação nativa no entor-
Até o início do ano de 2020, eram 25 sítios arque- no dos abrigos.
ológicos conhecidos, os quais apresentam pintu- Além dos impactos negativos a que esses
ras rupestres das tradições Planalto e Geométrica, sítios estão submetidos, o conhecimento acerca do
além de achados de materiais líticos e cerâmicos. patrimônio arqueológico não é aprofundado e uni-
Áreas específicas foram instituídas para pro- forme. Esta lacuna de dados, associada à
teger seu patrimônio cultural, como a APA da Escar- incipiência na educação ambiental e na divulgação
pa Devoniana, criada em 1992, o Parque Nacional científica para a sociedade, colocam esse patrimô-
dos Campos Gerais, criado em 2006, e nio em risco.
a Área de Tombamento da Escarpa Devoniana, com Devido ao exposto anteriormente, o projeto
processo aberto em 2012 e publicado oficialmente Sítios arqueológicos da Área de Proteção Ambien-
em 2014. tal (APA) da Escarpa Devoniana em Ponta Gros-
Contudo, poucas medidas eficientes fo- sa: inventário e educação patrimonial (Figura 1),
ram adotadas para garantir a proteção efetiva dos proposto e executado pelo Grupo Universitário de
ambientes e de seus conteúdos. São décadas de Pesquisas Espeleológicas - GUPE, por meio do
ações que resultaram na degradação dos sítios, Programa Municipal de Incentivo Fiscal à Cultura
com a deterioração e, ocasionalmente, a perda de (Promific), o qual possibilita a pessoas e empresas
valiosos registros rupestres das comunidades pre- incentivarem projetos culturais de artistas de Pon-
téritas, tais como: ta Grossa através de renúncia fiscal, encaminhan-
a) queimadas; do até 60% do IPTU para os projetos aprovados ,

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias gupe realiza projeto de inventário e educação patrimonial...

pretende contribuir para a gestão e prevenção de era o número de sítios arqueológicos conhecidos
danos a elementos do patrimônio arqueológico da em todo o munícipio). Como exemplo, cita-se o Su-
mencionada região por meio da educação patrimo- midouro do Rio Quebra-Perna (Figuras 2 e 3), que
nial, do fortalecimento de instituições públicas que passou de três para oito sítios e com áreas ainda
atuam na área ambiental, cultural, na produção de em fase de prospecção.
pesquisas e documentação. Um caráter inovador do projeto está na utili-
Assim, o projeto tem a finalidade de valorizar zação de métodos que realçam fotografias de gra-
o patrimônio cultural, fomentar a produção e a difu- fismos rupestres obtidas com máquina fotográfica e
são de conhecimentos, bens e serviços culturais, a aplicação de filtros DStretch, uma extensão utili-
além de preservar e promover o patrimônio cultural zada a partir do programa ImageJ (Figura 4).
material municipal, estando alinhado aos preceitos Com esta técnica de realce é possível ob-
do Plano Municipal de Cultura de Ponta Grossa. servar detalhes e até mesmo novas figuras antes
Também irá gerar dados e informações quantitati- imperceptíveis. Os autores ressaltam que não há
vas e qualitativas que podem subsidiar e orientar contato direto com as pinturas rupestres, apenas
ações de fiscalização e conservação dos sítios ar- registro fotográfico.
queológicos. Além disso, a produção de cartilhas de dis-
tribuição gratuita e oficinas de capacitação são
outras ações de inovação que o projeto proporcio-
nará. Esta proposta tornará as informações e pro-
dutos gerados acessíveis para agentes culturais da
cidade, como servidores públicos e representantes
de conselhos municipais. Neste mesmo sentido, o
projeto visa à realização de oficina de educação
patrimonial com adolescentes do Centro de Socio-
educação Regional de Ponta Grossa (CENSE-PG)
atendendo munícipios com elevada vulnerabilidade
Figura 1: Logo do projeto com destaque para a figura social, educacional e econômica.
aviforme, representação constantemente encontrada em Em vigência até dezembro de 2022, como
sítios arqueológicos da região.
continuidade do projeto estão previstas as seguin-
Até o presente momento já foram realizadas tes ações:
12 etapas de campo. Os integrantes do projeto ini- a) atualização sistemática de banco de dados do
ciaram os campos de caracterização e inventário patrimônio arqueológico da APA da Escarpa Devo-
dos sítios arqueológicos em locais já conhecidos, niana e disponibilização dos dados para órgãos res-
para posteriormente avançar na prospecção de no- ponsáveis pela fiscalização e gestão do patrimônio
vos locais. cultural;
A surpresa da equipe foi que, mesmo nos lo- b) execução de novos cursos de capacitação de
cais já conhecidos, com pesquisas reconhecidas há servidores públicos que atuam na área ambiental
décadas, novas pinturas foram encontradas. Desta e cultural;
forma, devido ao elevado número de sítios arque- c) apresentação dos resultados e produtos do pro-
ológicos levantados em um mesmo local, o projeto jeto para proprietários e comunidade do entorno de
passou a utilizar o termo núcleo arqueológico. sítios arqueológicos e;
As etapas de campo foram realizadas em d) publicações e comunicações científicas dos da-
apenas três sítios naturais do município de Ponta dos, resultados e experiências levantados ao longo
Grossa (Cachoeira da Mariquinha, Sumidouro do do projeto em periódicos e eventos da área ambien-
Rio Quebra-Perna e Buraco do Padre), totalizando tal e cultural.
25 sítios apenas nos três núcleos arqueológicos, Desta forma, os estudos podem subsidiar
o que enfatiza o potencial da região (visto que 25 protocolos para ações de manejo e embasar deci-

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias gupe realiza projeto de inventário e educação patrimonial...
museu victor dequech

Figura 2: Painel já conhecido no Sumidouro do Rio Figura 3: Novo painel em pequeno abrigo com um possível
Quebra-Perna de 24 m² com diversas representações de canídeo representado no estilo crayon.
cervídeos, aviformes e sobreposições de pinturas.

sões do Conselho Municipal de Patrimônio Cultural, Os autores agradecem a ABC Projetos Cul-
como a inclusão dos sítios arqueológicos no inven- turais, responsável pela captação de recursos e as
tário municipal de patrimônio cultural e tombamento empresas AP Winner Indústria e Comércio de Pro-
de sítios relevantes e/ou em risco de degradação. dutos Químicos Ltda. e Águia Sistemas de Armaze-
Ao mesmo tempo, as informações serão organiza- nagem S.A., as quais destinaram o recurso finan-
das e apresentadas à sociedade por meio de dife- ceiro necessário para a execução desse projeto por
rentes recursos de comunicação, em processo de meio do Programa Municipal de Incentivo Fiscal à
educação patrimonial, essencial para o reconhe- Cultura – Promific.
cimento, valorização e consequente conservação
desse patrimônio.

Figura 4: Exemplo de aplicação de filtro do aplicativo DStretch para realce de fotografias de grafismos rupestres. Na
imagem, pintura ruprestre, de representação desconhecida, no sítio natural Cachoeira da Mariquinha.

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Caverna da Chaminé, Ponta Grossa, Paraná.

Foto: Henrique Pontes


matérias

Guano speleo group performs action


in the international year of caves with
students of the Guimarães Rosa popular
course, from Medicine School of Minas
Gerais Federal University
Eleciania Tavares da Cruz1,2
Narjara Tércia Pimentel1,3

1. Guano Speleo research group


2. Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
3. Universidade Federal de Pernambuco – UFPE

With a call to “Explore, Understand and taries CONASS


Protect”, the International Union of Speleology However, in response to the calling of IUS
(IUS), composed by 56 member countries, cele- for the International Year of Caves and Karst, the
brates 2021 as the International Year of Caves and Guano Speleo group, which is headquartered in the
Karst (IYCK) (Figure 1). The IUS called the entire city of Belo Horizonte/MG, Brazil, despite the critical
speleological community to integrate actions ai- sanitary scenario, and observing all the standards
med at disseminating speleological knowledge..I of health authorities, identified an opportunity to
spread knowledge about speleology to the practi-
cally unacquainted community on the subject.
The action took place through a partnership
with Guimarães Rosa Popular Course, from the Me-
dicine School of UFMG. This course works with the
contribution of a team of volunteers, from organiza-
tional part to the teachers. The institution serves for-
ty students, aged from seventeen, from the outskirts
of Belo Horizonte and neighboring municipalities,
Figure 1: Folder released, calling attention to the Interna- such as Santa Luzia and Ribeirão das Neves.
tional Year of Caves and Karst.
They share the desire to enter a Public Uni-
In 2021, as it was in 2020, the caving groups versity, through the National Secondary Education
were able to carry out little or no activity in person, Examination - ENEM, but they are hampered by the
since one of the main ways to prevent the spread of set of social determinants typical of territories with
COVID-19 is to take sanitary measures and avoid medium and high social vulnerabilities, such as the
social contact. This pandemic context of Covid-19 lack or difficulty of access to public health, educa-
impacts the entire world community, and as we write tion, basic sanitation and low-income policies. Due
this report, it has reached the mark of 179,686,071 to such determinants, many students, when they fi-
confirmed cases of COVID-19, including 3,899,172 nish high school, find it difficult to prepare to enter
deaths (World Health Organization-WHO, https:// higher education, especially the public.
covid19.who.int/) and in Brazil alone, almost 512 And it was in this context of the Covid-19
thousand deads (National Council of Health Secre- pandemic, but also of hopes for a better future in

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias Guano speleo group performs action in the international...

preparation for ENEM, that a team from Guano Spe- mentel (biologist) and geographers Valdair Vieira,
leo entered, on June 22, 2021, the Geography class Erick Carvalho and Eleciania Tavares, provided stu-
at Guimarães Rosa Course. The class was held in dents with introductory knowledge about speleolo-
a virtual setting, which could refer to the darkness gy, care and equipment needed to explore a cave.
of a cave. Team members showed up wearing clo- However, the emphasis was on the part of biospele-
thes and equipment used in the speleological explo- ology, with scientific information passed on in a very
ration. The class aimed to insert, within the theme didactic way with dialogued exposition, by Narjara
“Brazilian Biomes”, introductory information about Pimentel.
caves, in order to awaken in students a view with With the format of dialogued exhibition con-
a conservationist bias, on the relationship and exis- ducted by Narjara Pimental, for approximately one
tence of caves in global ecosystems. As a comple- hour, students were able to present questions and
mentary research to the class, and with the neces- considerations through direct speeches or mani-
sary authorizations from the producers, two videos festations in the message box of the Google Meet
produced by the Biotrópicos team were reproduced, platform, where classes are normally taught. In-
which address the environmental impacts that the formation on the diversity of cave fauna was pre-
Cerrado and Atlantic Forest biomes have been suf- sented, and supported by academic and scientific
fering. studies, the theme about bats was the main focus.
Addressing the theme of speleology in geo- The biologist explained about the natural history of
graphy classes was already a proposal by the mem- the group in question (Figure 2) and the importance
ber of Guano and also volunteer professor of this of these animals for the balance and maintenance
discipline at Guimarães Course, Eleciania Tavares. of Brazilian and world ecosystems (Figure 3). She
However, the idea actually materialized when, in one also spoke about myths and truths (Figure 3), trying
of the previous classes, the students had many ne- to demystify the negative image that these animals
gative doubts and common sense about bats. Thus, in society, even more in times of coronavirus, when
the demand was presented by the teacher to the various untrue information about bats circulated
pedagogical coordination of the course and to the putting these animals at greater risk of suffering ex-
entire team of speleologists at Guano Speleo, who termination.
immediately embraced the proposed action with the Both the present students and the pedago-
students. This proposal would also integrate the gical coordination of the Guimarães Rosa Popular
IUS’s calling for the International Year of Caves and Course, represented by Átila Paraguassu (Figure
the Karst. 4), who is also an academic from the university's
The members of Guano Speleo, Narjara Pi- Medicine course, recognized the importance of ad-

Figure 2: Biology and natural history of the bat group. Images provided by the speaker (Narjara Pimentel).

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias Guano speleo group performs actionmuseu
in the victor
international...
dequech

Figure 3: Myths and legends about bats and the importance of conserving these animals. Images provided by the
speaker (Narjara Pimentel).

dressing the theme of speleology in the popular cou- Norte lead the ranking of Brazilian states with the
rse in order to propose complementary knowledge largest number of natural underground cavities.
for the preparation of students for the ENEM test. Since March 2020 – when the COVID-19
Student Dalleska Juliana Moreira Oliveira reports pandemic was declared by the World Health orga-
that “the class was very interesting! I think that un- nization – the Guimarães Rosa Course team of vo-
derstanding how caves works and their entire sys- lunteers and students have been striving to adapt
tem contributes a lot to knowledge. It's a subject that to the new reality of remote education. Many chal-
we only hear about, and bringing these curiosities lenges were found along the way, such as structural
shows the importance they have in all of our lives'' and social difficulties, considering the realities of the
The proposal is that during 2021, other in- students. A point that the team noticed is also the
terdisciplinary classes may take place with appro- impacts on mental health, given the uncertainties of
aches involving speleology, as this science can be the pandemic scenario and the challenge for ENEM.
explored from the perspective of other existing dis- However, the team of volunteers has been
ciplines in the prep course. Students, teacher and brilliantly identifying ways to avoid dropouts and
pedagogical coordination recognize that these the- ensure the permanence of students in the course.
mes and approaches can serve as complementary Analogous to the exploration of caves, this pande-
knowledge for students in their preparation process mic can be configured as a dark and still unknown
for ENEM. The pedagogical coordination also ex- “con”duit, but which can and will be explored and
pressed interest in carrying out, at the right time overcome with the help of science and collective ac-
and after the pandemic, a field activity in the city of tion
Cordisburgo/MG. This is the birthplace of the author “Exploring to know and, knowing to protect”,
from Minas Gerais, which gives its name to the po- as well as the dark ‘‘con”duits of the explored caves,
pular course, and which has cultural and speleolo- which will be illuminated by collective action and
gical relevance for the national and world scene, as with multidisciplinary knowledge. The COVID-19
it is where the Maquiné’s cave is located, where the pandemic will soon be overcome by scientific know-
naturalist Petter Lund (known as the Father of Pale- ledge, enabling the whole society to celebrate at the
ontology Brazilian) made very important discoveries highest level, especially in the space of speleology,
that revolutionized the history of Natural Sciences. which knows so well what it is like to celebrate when
According to the Chico Mendes ICMBio Ins- a new discovery is made. Let 2025 come.
titute, Brazil has a total of 21,893 caves (CECAV,
2021). One third are within Conservation Units and Translation by Ana Lupe Cavalcante.
the States of Minas, Pará, Bahia and Rio Grande do

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Primeiras expedições da então Sociedade Excursionista e Speleológica -
SES em 1939, para a Lapa Vermelha em Lagoa Santa - MG. Foto: Acervo SEE
matérias

Caracterização e regionalização dos


terrenos cársticos, em rochas
carbonáticas, no estado da Bahia
Ricardo Galeno Fraga de Araújo Pereira
Carlos Gleidson Campos da Purificação
Tarsila Carvalho de Jesus
Leo Linke Ferreira

Núcleo de Estudos Hidrogeológicos e do Meio Ambiente – NEHMA – IGeo/UFBa

O projeto de pesquisa: “Caracterização e patrimônio espeleológico no Estado, pode ainda


regionalização dos terrenos cársticos, em rochas fornecer um modelo a ser adotado em outras Uni-
carbonáticas, no Estado da Bahia”, tem como obje- dades da Federação.
tivo principal estabelecer as áreas de abrangência A pesquisa tem um prazo previsto de 24 meses e,
e subdivisões das regiões cársticas, em rochas car- no decorrer do mês de julho de 2021, foi realizada
bonáticas no Estado da Bahia, como forma de con- a primeira etapa de campo, percorrendo cerca de
tribuir na definição de critérios para classificação 2.000 km nas áreas de ocorrência das rochas das
dos enfoques regional e local, previstos no Decreto formações Acauã e Olhos D´Água, ambas incluí-
6.640/2008. Para tanto, serão realizadas campa- das no Supergrupo Canudos e aflorantes no norte
nhas de campo, aliadas ao inventário de conhe- e nordeste da Bahia. Na Figura 1 apresenta-se uma
cimentos e informações disponíveis sobre esses ilustração com os locais percorridos nessa primeira
terrenos, a fim de gerar uma cartografia detalhada etapa de campo.
dessas áreas. Esse supergrupo engloba rochas carboná-
O projeto, que foi iniciado em janeiro de ticas depositadas no Neoproterozóico, há cerca de
2021, está sendo conduzido mediante parceria en- 600 Ma de anos atrás, que foram objeto de defor-
tre NEHMA / IGeo - UFBa e CECAV, sendo financia- mação e transformações por metamorfismo, duran-
do através do TCCE ICMBio/Vale No. 02/2020, um te o Ciclo Brasiliano, iniciado por volta de 540 Ma
Termo de Compromisso de Compensação Espele- de anos. Estas se deram nas bordas do Cráton São
ológica firmado entre a Vale S.A. e o Instituto Chi- Francisco - um bloco continental que engloba qua-
co Mendes de Conservação para a Biodiversidade se todo o território do Estado da Bahia e parte de
(ICMBio), com gestão operacional realizada pelo Minas Gerais, que foi consolidado há mais de 1,7
Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustenta- Ga de anos, durante o Ciclo Transamazônico, entre
bilidade (IABS). 2,26 e 1,86 Ga de anos.
Os resultados esperados servirão tanto para Os trabalhos de campo se deram nas Serras
compilar e sistematizar, quanto gerar informações do Icó, da Borracha, do Jerônimo, além das cerca-
em escala mais detalhada sobre esses terrenos, nias dos municípios de Euclides das Cunha e de
para contribuir com estudos posteriores das mais Paripiranga. Nesse último local, membros do Gru-
diversas áreas, incluindo a vulnerabilidade e/ou po Mundo Subterrâneo de Espeleologia – GMSE
potencialidades do carste em rochas carbonáticas acompanharam a equipe de campo do projeto, se-
na Bahia. Para além de servir como marco para o guindo todos os padrões de segurança necessários
licenciamento, gestão ambiental e conservação do ante a pandemia da COVID 19.

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
matérias Caracterização e regionalização dos terrenos cársticos

Na Serra do Icó as rochas carbonáticas da Posteriormente, a equipe seguiu para Serra do Je-
formação Acauã se apresentam muito deformadas, rônimo, onde visitou a Gruta do Jerônimo, uma ca-
conforme registrado na Gruta do Icó (Figura 2A). vidade marcada pela presença de amplos salões
Cabe ressaltar a presença de uma mina de extra- e feições que evidenciam uma etapa relevante de
ção de rocha ornamental em área próxima da cavi- espeleogênese hipogênica na formação da cavida-
dade, com atividade interrompida há cerca de três de (Figura 2D). Logo ao lado dessa serra, foram
anos. também visitadas as Grutas do Salitre do Caipan
Na sequência, a equipe seguiu para a Serra de cima (Figura 2E) e de baixo, no município de
da Borracha, onde, dentre outros locais, foi visitada Canudos.
a Gruta do Patamuté, um amplo salão onde está Em seguida, sabendo da ocorrência de ro-
instalado um templo religioso, com altar e ex-votos chas carbonáticas aflorantes no município de Eu-
(Figura 2B). Nessa serra a equipe realizou ainda clides da Cunha, além da presença de mineradoras
prospecção na tentativa de encontrar o registro de de calcário para fabricação de cal e da ausência
uma cavidade próxima, porém a ocorrência não foi de registro de cavidades naquele local, optou-se
confirmada, sendo encontrada apenas uma peque- por buscar informações com os moradores da zona
na dolina, com diâmetro inferior a 10 metros e pro- rural e por meio desses diálogos foi constatada a
fundidade de até 1,5 metros. ocorrência de, ao menos, três cavidades, com des-
Nos arredores da Serra da Borracha foi tam- taque para a Gruta do Sino (Figura F), primeiro re-
bém visitada a Serra do Juá, onde foi encontrada a gistro de caverna no município. A cavidade possui
caverna Toca Grande, além de tufas carbonáticas e cerca de 25 metros de desenvolvimento e represen-
cavidades de pequeno porte com até 10 metros de ta a maior cavidade visitada pela equipe. Cabe re-
desenvolvimento (Figura 2C). gistrar que foi observada a ocorrência de um carste

Figura 1: Distribuição das áreas de ocorrência do Supergurpo Canudos, visitadas na primeira etapa de campo, reali-
zada durante o mês de Julho de 2021.

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matérias Caracterização e regionalização museu
dos terrenos cársticos
victor dequech

encoberto em Euclides da Cunha, com a presença 2022 a equipe percorrerá ainda as áreas de ocor-
de dolinas de subsidência, conforme visto em cam- rência das rochas carbonáticas dos Grupos Una e
po e também de acordo com relatos dos moradores Bambuí, para além das formações Caboclos e Ca-
locais. atinga, completando assim todas as regiões carbo-
Na etapa final do campo, a equipe visitou náticas do estado baiano. Como resultado deverão
grutas no município de Paripiranga, onde merece ser publicados artigos com uma proposta de mé-
destaque a Gruta do Bom Pastor (Figura 2G) que, todo para definição dos enfoques local e regional,
com mais de 70 metros de desnível, representa previstos no Decreto 6.640, de 2008, para além de
uma das maiores grutas do município. Foi também um livro versando sobre as cavernas e o carste na
visitada a Gruta da Salamanta (Figura 2H), instala- Bahia.
da em tufas calcárias, com mais de 50 metros de A equipe também disponibilizou uma pes-
desenvolvimento e que consiste em um sítio de re- quisa online para identificação e levantamento dos
levância paleoambiental, já que nessas tufas são trabalhos de topografia realizados em cavidades
encontrados muitos fósseis vegetais, importantes instaladas em rochas carbonáticas no Estado da
para entender os climas pretéritos e a evolução do Bahia, disponível em: https://forms.gle/fnYSLfHAo-
carste naquela região. 7CPvXBt7. Qualquer pessoa que tenha mapeado
cavernas em rochas carbonáticas na Bahia pode
A próxima campanha de campo do projeto responder o formulário. Essas informações serão
está prevista para o mês de outubro de 2021 e de- de grande ajuda e são importantes para o sucesso
verá acontecer na Bacia do Rio Pardo. Até o final de do projeto.

A B

C D
Figura 2: 2A – Dobras nas paredes da Gruta do Icó. 2B – Altar religioso no interior da Gruta do Patramuté. 2C – Gruta
em Tufas Calcárias na Serra do Juá. 2D – Pedans indicativos de processos hipogênicos na espeleogênese da gruta
do Jerônimo.

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matérias Caracterização e regionalização museu
dos terrenos cársticos
victor dequech

E F

G H
Figura 2E – Estruturas na parede da Gruta do Salitre do Caipan de Cima, em Canudos. 2F – Interior da Gruta do Sino
2G – Aspecto da rocha carbonática no interior da Gruta do Bom Pastor. 2H – Fósseis vegetais na Gruta da Salaman-
ta.

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
Foto: Gabriel Lourenço

TRABALHOS
trabalhos paleontologia

Paleotocas da megafauna ceno-


zóica no município de Urubici
(Santa Catarina)
Heinrich Theodor Frank1
Felipe Caron1
Leonardo Gonçalves de Lima2
Francisco Sekiguchi Buchmann3
Milena Fornari3

1. Universidade Federal do Rio Grande do Sul


2. Universidade Federal do Maranhão
3. Universidade Estadual Paulista

RESUMO ABSTRACT
A prospecção de paleotocas da Megafauna The prospection of paleoburrows of the
Cenozóica no município de Urubici (Santa Catarina) Cenozoic Megafauna in the municipality of Urubi-
foi levada a cabo através de detalhada pesquisa bi- ci (Santa Catarina, Brazil) was carried out through
bliográfica e entrevistas, obtendo-se uma listagem detailed bibliographical research and interviews, re-
com duas dúzias de ocorrências. Trabalho de cam- sulting in a list with two dozen occurrences. Sub-
po posterior aumentou este número para 35 ocor- sequent fieldwork increased this number to 35
rências. Em sua maioria são túneis de grande porte, occurrences. Most of them are large tunnels, with
com mais de um metro de diâmetro. O tamanho dos more than one meter in diameter. The size of the
túneis sugere que foram escavados por preguiças tunnels suggests that they were excavated by ter-
terrestres, portanto, atribuídas à Megaichnus major. restrial sloths, therefore, attributed to Megaichnus
Muitas estão parcialmente ou totalmente preenchi- major. Many are filled partially or completely with
das por sedimentos, dificultando ou impossibilitando sediment, making access difficult or impossible. Se-
o acesso. Várias, entretanto, estão desobstruídas, veral, however, are unobstructed, making it possib-
permitindo reconhecer túneis com várias dezenas le to recognize tunnels several tens of meters long,
de metros de comprimento, que podem formar sis- which can form complex underground systems. The
temas subterrâneos complexos. As ocorrências fo- occurrences were grouped into five informal types,
ram agrupadas em 5 tipos informais, dependendo depending on the number of tunnels and if open or
do número de túneis e se estavam abertos ou pre- filled with sediments. The high number of tunnels
enchidos com sedimentos. O elevado número de probably finds its explanation in the region's climate
túneis provavelmente encontra sua explicação no and geology. The climate is very cold, with tempe-
clima e na geologia da região. O clima é muito frio, ratures close to zero in winter. The rocks of the re-
com temperaturas próximas a zero no inverno. As gion allow the excavation of underground shelters.
rochas da região permitem a escavação de abrigos As these conditions repeat itself in the neighboring
subterrâneos. Como estas condições se repetem municipalities, it is very likely that there are several
em municípios vizinhos, é muito provável que haja dozen paleoburrows in these municipalities too.
várias dezenas de paleotocas também nestes mu-
nicípios. Keywords: Ichnofossil; Megaichnus; Megafauna;
Palavras-Chave: Icnofóssil, Megaichnus, Megafau- Paleoburrows; Crotovines.
na; Paleotocas; Crotovinas.

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trabalhos paleontologia

1. INTRODUÇÃO
As informações de campo pioneiras levanta-
das pelo Prof. Jorge Alberto Villwock (in memorian),
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
geraram o primeiro artigo sobre paleotocas no Sul
do Brasil (Bergqvist & Maciel, 1994). Esses túneis,
escavados por mamíferos da Megafauna Cenozói-
ca como tatus gigantes (Dasypodidae) e preguiças
terrestres (Mylodontidae), foram depois investiga-
dos sistematicamente pelos integrantes do Projeto
Paleotocas (UFRGS e UNESP), construindo um
número elevado de informações (e.g., Frank et al.,
2012; Buchmann et al, 2016, Lopes et al, 2016), lis-
tados em www.ufrgs.br/paleotocas/Producao.htm.
Mais tarde, estes icnofósseis também foram pros-
pectados por grupos de pesquisadores da Universi- Figura 1: Mapa de localização de Urubici.
dade Federal de Pelotas (UFPel), da Universidade e associa-las ao nome do município, assim sendo
do Contestado (UnC) e da Universidade Estadual possível identificar as ocorrências já conhecidas e
do Paraná (UFPR), por exemplo. publicadas.
Paleotocas de grande porte aparentemente Uma outra etapa foi a pesquisa bibliográfica
são uma exclusividade Sul-Americana, sem registro na literatura histórica e na literatura arqueológica.
em outros continentes. E mesmo na América do Sul Especialmente a investigação da literatura arque-
sua densidade é altamente variável. Nos Países An- ológica foi muito importante, pois os arqueólogos
dinos, por exemplo, os registros de paleotocas são pioneiros da Região Sul, sem outra explicação plau-
escassos. Na Argentina ocorre este tipo de icnofós- sível para os grandes e longos túneis que encon-
sil próximo a Mar del Plata, exposto nas falésias à travam em suas pesquisas, lhes atribuíam origem
beira-mar e geralmente (>95%) estão preenchidas antropogênica, denominando-os “galerias indíge-
por sedimentos. Em outros países (Uruguai, Para- nas subterrâneas” (e.g., Prous, 1991). Consultando
guai) há apenas registros esporádicos. No Brasil, as listas telefônicas de Urubici, foram encontrados
entretanto, há centenas de paleotocas nos estados os descendentes dos proprietários das localidades
do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, com re- nas quais foram descritas “galerias indígenas” nas
gistros mais escassos nos estados mais ao norte décadas de 1960 a 1970, pois as famílias continu-
(Frank et al., 2012; Buchmann et al., 2016). avam a morar nas mesmas propriedades. Um con-
Nesta contribuição apresentamos as pale- tato telefônico prévio com estes moradores permitiu
otocas encontradas no município de Urubici (San- a apresentação dos pesquisadores e a obtenção da
ta Catarina; Latitude 28º 00´ 55´´ S, Longitude 49º autorização de visita às paleotocas.
35´ 30´´ W; Fig. 1), onde foi registrada uma elevada Também foram contatados por telefone al-
densidade de paleotocas (uma a cada 30 km2), que guns guias locais de turismo de aventura, tanto para
provavelmente se repete nos municípios vizinhos a identificação de paleotocas como para contrata-
adjacentes. Assim, o caso de Urubici é representa- ção de serviços de guia durante a etapa de campo.
tivo para a densidade de paleotocas nesta região. Uma vez concluída a etapa de gabinete, foi
realizado trabalho de campo, visitando várias ocor-
2. MATERIAIS E MÉTODOS rências, além de prospectar novas ocorrências ao
A identificação de paleotocas no município longo das rodovias da região e por conversas com
de Urubici foi desenvolvida inicialmente por pros- moradores locais.
pecção digital, pesquisando imagens e outras in- Nas paleotocas visitadas (Tabela 1) foi rea-
formações na internet. Esta técnica consiste em lizado o reposicionamento com GPS, um levanta-
usar palavras-chave relativas a paleotocas (“gruta”, mento fotográfico e obtidas medidas de comprimen-
“toca”, “caverna”, “paleotoca”, “túnel”, “furna”, etc.) to, largura e altura.

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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trabalhos paleontologia

Para cada ocorrência de paleotocas foi ge- rochas magmáticas ou metamórficas inalteradas.
rado um código informal (URU-no) e atribuída uma Em Urubici geralmente situam-se em arenitos.
denominação, que pode ser o nome pelo qual a Os tipos assim estabelecidos são (A) siste-
ocorrência é conhecida, se referindo ao proprietário mas de paleotocas interligadas, (B) duas ou mais
atual ou passado ou ainda à localização da ocor- paleotocas próximas umas das outros, em um raio
rência. As coordenadas geográficas referem-se às de algumas dezenas de metros, mas não interliga-
ocorrências que foram confirmadas, o que para al- das, (C) uma única paleotoca isolada, (D) várias
gumas delas não foi possível, quando a informação crotovinas próximas umas das outras, em um raio
não constava na literatura arqueológica e não hou- de algumas dezenas de metros e (E) uma única
ve tempo para procurar a ocorrência. crotovina, ocorrendo isolada.
Uma coluna traz o número da ocorrência
no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (Ca-
dastro, 2021), quando for o caso. A última coluna
à direita estabelece 5 tipos informais para as ocor-
rências, dividindo-as em “Sistemas de Túneis” e em
“Túneis Simples” bem como em relação ao grau de
seu preenchimento, “Abertos” ou “Preenchidos”.
Estes tipos, usados aqui pela primeira vez, permi-
tem apresentar adequadamente as ocorrências da
região.
A designação “Sistema de Túneis” refere-se
a ocorrências com vários túneis interligados entre
si. “Túneis Simples” refere-se a um único túnel, sem
ramificações.
“Aberto” neste contexto indica que o túnel
não foi completamente preenchido por sedimentos,
sendo considerado uma paleotoca. A porção de-
sobstruída ainda existente pode ser acessada ou
não, dependendo do tamanho do túnel e do grau de
entulhamento com sedimentos. “Preenchido” são
túneis integralmente entulhados com sedimentos,
designados na literatura como “crotovinas”.
Nas paredes e no teto dos túneis abertos ge-
ralmente podem ser encontradas: (i) marcas de gar-
ra dos animais escavadores nas paredes, (ii) mar-
cas de alisamento das paredes pela passagem dos
Tabela 1: Ocorrência e classificação das paleotocas e
animais, (iii) marcas de reocupação (tatus, gambás, crotovinas no município de Urubici (SC), com indicação
etc.), (iv) feições erosivas, (v) feições antropogêni- da nomenclatura dada pelo Cadastro Nacional de Sítios
cas recentes (vandalismo, marcas de picareta, etc.) Arqueológicos (CNSA)
e (iv) inscrições rupestres, estas últimas bastante
raras (Frank et al., 2012, p.148). A interpretação 3. RESULTADOS
das feições das paredes e do teto dos túneis po- Algumas ocorrências bem representativas
derá ser realizada futuramente já que depende de de cada tipo informal definido nesta contribuição
método específico que exige muito mais tempo. serão apresentadas a seguir.
As litologias nas quais as paleotocas foram
escavadas não foram indicadas em função da com- 3.1 Ocorrências do Tipo A – Sistema de paleoto-
plexa geologia de Urubici, que exige um mapeamen- cas interligadas.
to de detalhe. Paleotocas, de maneira geral, podem A ocorrência URU-01 (Fig. 2) é a “Caverna
ser encontradas em qualquer litotipo que não sejam do Rio dos Bugres”, a paleotoca mais famosa da ci-

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trabalhos paleontologia

dade, interpretada pelos descobridores como mina de giro com 3x3x3 m, do qual partem 5 túneis dis-
de prata dos jesuítas (Padberg-Drenkpol, 1933). É postos radialmente. Três encontram-se entulhados
um sistema de túneis abertos com 1,5 m a 2,0 m por sedimentos. O maior e mais acessível possui 25
de altura e 1,0 m de largura. Possui 5 entradas, si- metros de comprimento, 3 metros de altura e quase
nais de ocupação indígena (grafismos rupestres) e 1,5 metro de largura. Marcas de garra com 3 cm de
de vandalismo recente em função dos caçadores largura e até 40 cm de comprimento cobrem algu-
de tesouros e da constante visitação por turistas. mas paredes. O acesso se dá por uma dolina no
Atualmente é um ponto turístico com cobrança de terreno, formada pelo desabamento do teto de um
ingresso e limitado controle quanto ao número e dos dois túneis abertos. Próximo à entrada há vá-
comportamento de visitantes. rias outras dolinas na encosta do morro, indicativas
de outros túneis ali existentes, mas com as entra-
das obstruídas pelo material desabado para dentro
das dolinas.

3.2 Ocorrências do Tipo B – Duas ou mais pa-


leotocas próximas umas das outras, mas não
interligadas.
A ocorrência URU-02 (Fig. 3) está situada
no acesso à cidade pela rodovia SC-110, no corte
ao lado da rodovia, quase ao lado do pórtico. As
paleotocas podem ser visualizadas inclusive pelo
Street View do Google Earth. São tocas abertas,
mas com menos de um metro de largura, entre 40
e 60 cm de altura e parcialmente entulhadas por
sedimentos, sem condições de acesso.

Figura 2: Paleotoca URU-01. Representação da distribui-


ção das paleotocas e das crotovinas. Relevo aproximado
indicado.
A paleotoca URU-10 é um sistema de túneis
semelhante à URU-01, porém muito mais preenchi-
do e com apenas um acesso por uma porção de Figura 3: Paleotocas (URU-02) em corte de estrada ao
teto desabado. A paleotoca, que pode ser percor- lado do pórtico de entrada de Urubici.
rida rastejando, está situada ao lado de uma casa
subterrânea indígena, na qual foram coletados pelo 3.3 Ocorrências do Tipo C – Uma única paleoto-
arqueólogo Padre Rohr, no início da década de ca isolada.
1970, milhares de cacos cerâmicos, artefatos líticos A paleotoca URU-03, ao lado da SC-110,
e outros (inf. verbal dos proprietários). Uma escava- próximo ao mirante do qual se tem uma vista da
ção realizada pelo Padre Rohr dentro da paleotoca cidade de Urubici, é um túnel simples preenchido
também encontrou artefatos arqueológicos. cerca de 50% por sedimentos, com pouco mais de
A paleotoca URU-12 é a ocorrência que um metro de diâmetro e feições de solapamento de
apresenta a maior quantidade de túneis interliga- teto. Está aberto em apenas 30 ou 40%, sem condi-
dos. De maneira geral, é composta de uma câmara ções de acesso.

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trabalhos paleontologia

A paleotoca URU-22 consta no Cadastro tros de distância de URU-12. Trata-se de 4 croto-


Nacional de Sítios Arqueológicos como “Galeria ex- vinas de grande porte compatíveis com o tamanho
tensa e limpa, com 50m de comprimento e 1,5 a 2m dos túneis visitáveis de URU-12.
de diâmetro”. O atual arrendatário da propriedade A ocorrência URU-28 (Fig. 5) também está
não tem conhecimento do túnel, situado em algum localizada no núcleo urbano. Trata-se de pelo me-
ponto dos 48 hectares de mata fechada da proprie- nos 5 crotovinas expostas lado a lado. Na maior
dade. delas, de disposição horizontal e com mais de 2
metros de diâmetro, foram retirados pela popula-
ção local os sedimentos que a preenchem em uma
extensão de aproximadamente 2 metros, transfor-
mando a cavidade resultante em gruta religiosa.

Figura 5: Crotovina parcialmente escavada e transforma-


da em gruta religiosa em URU-28.

3.5 Ocorrências do Tipo E – Uma única crotovi-


Figura 4: Paleotoca isolada (URU-30).
na, isolada.
A paleotoca URU-30 (Fig. 4) foi encontrado A ocorrência URU-06 está exposta em um
em um corte bem expressivo (>10m de altura) e era extenso corte de estrada, constituída de uma croto-
muito conspícua. O túnel possui 1,5 m de largura, vina com menos de um metro de diâmetro. A porção
mas está preenchido pela metade e, além disso, inicial está erodida e aberta porque o sedimento que
apresenta o teto fraturado em função das raízes a preenche é mais friável que a rocha hospedeira,
das árvores que o penetraram, tornando o acesso uma situação muito comum.
muito perigoso. A ocorrência URU-05 (Fig. 6) é uma crotovi-
na com 1,4 m de diâmetro, esférica e isolada. Está
3.4 Ocorrências do Tipo D – Várias crotovinas exposta no alto de um corte quase vertical, com 5
próximas umas das outras. metros de altura e algumas dezenas de metros de
A ocorrência URU-33 está no núcleo urba- comprimento, ao lado da rodovia SC-370.
no, na rua da Delegacia. São várias crotovinas de
tamanho pequeno (até 1 m de diâmetro) expostas
nos cortes baixos ao lado da estrada e facilmente
identificáveis em função das diferenças de cor, es-
trutura e coesão entre rocha hospedeira e preenchi-
mento dos túneis.
A ocorrência URU-34 está situada na mes-
ma propriedade de URU-12, numa escavação ao
lado da residência, mas a várias centenas de me- Figura 6: Crotovina exposta em URU-05.

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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trabalhos paleontologia

4. DISCUSSÕES Santos et. al., 2018). Da mesma forma, os materiais


A ocorrência de um grande número de pale- encontrados entre sucessivos derrames geralmente
otocas em Urubici pode estar relacionada ao paleo- oferecem boas condições de escavação. Trata-se
clima. O clima de Urubici atualmente é temperado. de sedimentos eólicos, rochas vulcânicas alteradas
Como a cidade está situada a 915 metros de altitude ou “brechas”, como são denominados os litotipos
e os morros ao redor da cidade atingem facilmente compostos por blocos de rocha vulcânica em matriz
1200 m ou mais, no inverno as temperaturas míni- sedimentar (Frank, 2008, pg. 74).
mas alcançam valores negativos com incidência de As rochas sedimentares que ocorrem na re-
neve. No Morro da Igreja, com 1822 m de altitude, gião, inclusive aquelas com diagênese avançada,
foi registrada em 1996 a menor temperatura (não-o- possuem ótimas condições de escavação. Paleo-
ficial) do Brasil, de quase 18ºC negativos. tocas em arenitos da Fm. Botucatu foram encon-
Climas frios são típicos destas áreas pla- tradas às centenas nos estados do Rio Grande do
nálticas e alguns registros mostram que na região Sul e de Santa Catarina (e.g., Lenz et. al., 2018).
Sul do Brasil o clima recentemente era ainda mais Os litotipos sedimentares da Fm. Rio do Rasto ge-
frio que hoje (Silva, 2018). Estes climas frios muito ralmente possuem coesão inferior aos arenitos da
provavelmente tornaram a escavação de abrigos Fm. Botucatu e, assim, não oferecem impedimento
subterrâneos necessária aos mamíferos fossoriais à escavação.
da Megafauna, pois a função de abrigo é um das O tamanho dos túneis encontrados no mu-
funções de túneis escavados por animais fossoriais nicípio de Urubici sugere, geralmente, que foram
e semi-fossoriais (Reichmann & Smith, 1990). Os escavados por preguiças terrestres, portanto, atri-
indígenas, vivendo na mesma região após a ex- buídas a Megaichnus major (Lopes et. al., 2016)
tinção da Megafauna, também foram obrigados a Em alguns casos as feições erosivas mascaram
escavar abrigos, na forma de casas subterrâneas, bastante o tamanho original dos túneis, mas geral-
construções que consistem em uma cavidade no mente se obtém com certa facilidade uma indicação
chão, coberta por uma cobertura formada de folhas confiável a respeito do diâmetro original.
de palmeira e outras e sustentado por ripas, caibros Como as condições geológicas e climáticas
e postes de madeira (Azevedo & Copé, 2012). de Urubici se repetem nas regiões imediatamente
A geologia da região é muito favorável à es- adjacentes, é muito provável que nos municípios ao
cavação de abrigos subterrâneos. É composta por redor de Urubici haja um grande número de paleo-
rochas vulcânicas e sedimentares (CPRM, 2014). tocas ainda não identificadas.
Nos altiplanos ao Sul e a Norte da cidade afloram A detecção de paleotocas, entretanto, pode
rochas vulcânicas do Grupo Serra Geral, compos- ser prejudicada se não houver escavações antropo-
tas por basaltos, basalto andesitos, riodacitos e rio- gênicas como cortes de estrada, terraplenagens e
litos. Entre os altiplanos afloram, nos vales, rochas outras, que removem a camada superficial do terre-
sedimentares de duas Formações. A Formação Bo- no e expõe as paleotocas (Frank et al., 2012). Na
tucatu é representada por arenitos eólicos finos a grande maioria dos casos, a vegetação e a camada
médios, avermelhados, cujos afloramentos formam superficial do terreno encobrem as entradas dos tú-
uma estreita franja acompanhando os limites de neis ou impossibilitam a visualização das crotovi-
ocorrência das rochas vulcânicas, tanto ao Norte nas.
como ao Sul. A Formação Rio do Rasto, ocupan- 5. CONCLUSÕES
do extensa e larga faixa de orientação NW-SE, é No município de Urubici (Santa Catarina)
composta por pelitos, arenitos finos e siltitos de co- foram encontradas 35 ocorrências com paleotocas,
res claras, típicos de ambientes lacustres e deltai- tanto túneis abertos e acessíveis como túneis intei-
cos, ocorrendo subordinadamente arenitos eólicos ramente entulhados com sedimentos (crotovinas).
(CPRM, 2014). O diâmetro dos túneis geralmente indica
As rochas vulcânicas, quando inalteradas, como escavadores preguiças terrestres da Mega-
evidentemente não são escaváveis, mas a partir de fauna Cenozóica atribuídas a Megaichnus major. A
um certo grau de alteração são plenamente esca- grande quantidade de túneis provavelmente encon-
váveis por mamíferos fossoriais do Cenozóico (e.g., tra sua explicação no clima muito frio da região e na

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos paleontologia

ocorrência de rochas vulcânicas alteradas e rochas Frank, H.T.; Buchmann, F.S.C.; Lima, L.G.; Fornari,
sedimentares, ambas de fácil escavação. Como M.; Caron, F.; Lopes, R.P. 2012. Cenozoic Vertebra-
estas condições são similares nos municípios vizi- te Tunnels in Southern Brazil. In: Netto, R.G., Car-
nhos, é muito provável que haja um elevado núme- mona, N.B. & Tognoli, F.M.W. (eds.). 2012. Ichnolo-
ro de paleotocas também ali. gy of Latin America - selected papers. Porto Alegre:
Sociedade Brasileira de Paleontologia, Monografias
6. AGRADECIMENTOS da Sociedade Brasileira de Palentologia, 2, 196 p.,
Os autores desejam expressar seus agrade- p. 141 - 157.
cimentos aos proprietários das áreas pela autoriza-
ção de acesso às paleotocas. Lenz, R.L.; Guimarães, M.B.; Meucci, M.C.; Genro,
L.V.; Luiz, T.S.; Martins, L.C.; Santos, C.S.; Coan,
7. REFERÊNCIAS A.J.; Longo, I.; Frank, H.T., 2018. Paleotocas de
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ma de Pós-Graduação em Geociências, Instituto de
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trabalhos paleontologia

Gruta do Engrunado: estu-


dos preliminares de um de-
pósito fossilífero do Quater-
nário, Chapada Diamantina,
Bahia
ANDRÉ VIEIRA DE ARAÚJO1,2,3,4
JOÃO PAULO DA COSTA1
JONILSON DA SILVA LIMA5
LAÍS ALVES SILVA1
HERMÍNIO ISMAEL ARAÚJO- JÚNIOR1
THIAGO MATTOS ESPÍRITO SANTO4
MÁRIO ANDRÉ TRINDADE DANTAS2

1. Programa de Pós-graduação em Geociências, Faculdade de Geologia, Universidade do


Estado do Rio de Janeiro,
2. Instituto Multidisciplinar em Saúde da Universidade Federal da Bahia
3. Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano
4. Sociedade Espeleológica Azimute

RESUMO ABSTRACT
Neste trabalho é realizado o primeiro re- In this paper, the first speleological record of
gistro espeleológico da Gruta do Engrunado, uma the Engrunado cave is made, a subterranean ca-
cavidade subterrânea localizada no município de vity located in Nova Redenção municipality, Bahia,
Nova Redenção, Bahia, onde ocorre uma assem- where a Late Pleistocene mammal fossil assembla-
bleia fossilífera de mamíferos quaternários. Identi- ge was found. Eight mammal families were identi-
ficou-se oito famílias de mamíferos, incluindo for- fied, including small-, mid- and giant-sized forms,
mas de pequeno, médio e grande porte, apontando showing the high fossiliferous potential of the cars-
o alto potencial fossilífero das cavernas cársticas tics caves of Chapada Diamatina. The cave topo-
da Chapada Diamantina. A topografia da caverna graphy exerts great influence on the mode that the
exerce grande influência na forma como os fósseis fossils were deposited in the cave, revealing that
são depositados, portanto, estudos espeleológicos geospeleological studies associated to a paleonto-
associados a uma abordagem paleontológica são logical approach are useful tools to paleoenviron-
ferramentas úteis para reconstruções paleoambien- ment reconstructions in karstic environments.
tais em ambientes cársticos.
Keywords: Nova Redenção; Mammals; Quaternary.
Palavras-Chave: Nova Redenção; Mamíferos; Qua-
ternário.

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INTRODUÇÃO toxodonte (Fernandes, 2005; Cartelle et al., 2008).


As cavernas cársticas são reconhecidamen- Novos esforços de prospecção e coleta têm sido
te um dos principais depósitos de fósseis do Qua- empreendidos em cavernas dessa região, resul-
ternário brasileiro (Hubbe et al., 2011; Castro et al., tando em valiosas informações paleontológicas a
2014). Destacam-se pela quantidade e qualidade respeito de mamíferos que viveram durante o Pleis-
do material fossilífero preservado em razão das toceno e início do Holoceno (Dantas et al., 2019;
características inerentes ao ambiente cavernícola, Eltink et al., 2020; Sousa et al., 2020). Neste tra-
como ausência de processos normais de decompo- balho são apresentados pela primeira vez os da-
sição e intemperismo que ocasionam a desintegra- dos espeleológicos e a identificação preliminar de
ção e destruição dos restos de organismos expos- fósseis de mamíferos quaternários encontrados na
tos em ambientes externos (Simms, 1994; Auler et Gruta do Engrunado, aumentando o conhecimento
al., 2006; Sousa et al., 2020). sobre o passado da Chapada Diamantina durante o
Os primeiros estudos sistemáticos com fós- Quaternário.
seis coletados em cavernas no Brasil foram condu-
zidos por Peter Lund em Lagoa Santa, Minas Ge- ÁREA DE ESTUDO
rais, entre 1836 e 1844 (Marchesotti, 2011). Desde A Gruta do Engrunado (12°86’30”S
Lund, diversos outros achados fósseis têm sido re- 41°06’81”O) (Figura 1) está localizada no município
portados em importantes sítios espeleológicos bra- de Nova Redenção, região da Chapada Diamanti-
sileiros (e.g. Krone, 1909; Paula Couto, 1979; Lino na, Bahia. O Município está inserido no Supergrupo
et al., 1979; Cartelle, 1992; Rodrigues et al., 2014; São Francisco, Grupo Una, no domínio da sub-bacia
Oliveira et al., 2017). Na região Nordeste, as caver- Una-Utinga, sedimentos neoproterozóicos de cará-
nas da Bahia são relevantes em notáveis estudos ter intracratônico, constituída por uma sequência de
paleontológicos, com destaque para a Toca da Boa sedimentos carbonáticos epicontinentais-marinhos
Vista (e.g. Cartelle & Hartwig, 1996); Lapa dos Bre- (Silva, 1994; Souza, 1993).
jões (e.g. Berbert-Born & Karmann, 2000) e Poço
Azul de Milú (e.g. Cartelle et al., 2008). A fauna fóssil
encontrada nessa região é composta por uma notó-
ria diversidade taxonômica, em especial a de mamí-
feros quaternários, a qual possui representantes de
grande porte como Proboscidea (Gomphotheriidae:
e.g. Notiomastodon platensis (Ameghino, 1888)),
Pilosa (Megatheriidae: e.g. Eremotherium laurillardi
(Lund,1842); Scelidotherinae: e.g. Catonyx cuvieri
(Lund, 1839) e Valgipes bucklandi (Lund, 1839)),
Carnivora (Felidae: e.g. Smilodon populator Lund,
1842; Ursidae: e.g. Arctotherium wingei Ameghino,
1902), entre outros (e.g. Lessa et al., 1998; Vascon-
Figura 1: (A) Localização geográfica (Adaptado de Alkmim
celos et al., 2008; De Iullis et al., 2009). & Martins- Neto, 2012); e (B) Entrada da Gruta do Engru-
Inserida dentro do domínio geotectônico da nado.
Chapada Diamantina, a sub-bacia Una-Utinga for-
ma um extenso sistema cárstico onde são encon- MATERIAIS E MÉTODOS
tradas algumas das mais conhecidas e visitadas
Espeleotopografia
cavernas da Bahia (Silva et al., 2013). Ademais,
O mapeamento foi realizado entre os anos
algumas destas cavernas apresentam expressivo
de 2018 e 2020. Os primeiros esforços para o ma-
conteúdo fossilífero, destacando-se o Poço Azul
peamento da Gruta do Engrunado foram realizados
do Milú, um dos maiores sítios submersos brasilei-
nos meses de abril e novembro de 2018, coorde-
ros, com cerca de 50 espécies identificadas com-
nado pelo grupo Sociedade Espeleológica Azimute
preendendo uma fauna de mamíferos composta
(SEA) em parceria com o Grupo Ambiental de Pro-
de preguiças terrícolas, mastodonte, pampatério e
teção, Paleontologia e Espeleologia (GAPPE).

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trabalhos paleontologia

Os instrumentos utilizados para o mapea- apresentados no presente trabalho limitam-se a to-


mento das cavidades foram bússola e clinômetro pografia e mapeamento do primeiro setor, o mape-
Suunto de leitura direta e trena a laser. O grau de amento dos diversos e complexos níveis inferiores
topografia empregado é o 4C, conforme a proposi- encontram-se em andamento. Os dados prelimina-
ção da British Cave Research Association – BCRA. res do mapeamento (Figura 2) revelam que a ca-
Para digitalização e cálculos espeleométricos fo- verna apresenta desenvolvimento linear de 335 m
ram utilizados os softwares: Espeleoliti 4 e Autocad e desnível 37 m, esse setor da caverna destaca-se
2021. Em campo foram coletados dados diversos em termos volumétricos; os condutos possuem lar-
para o estudo das feições endocársticas. No interior gura variando de 8 a 16 m e altura variando de 4 a
das cavernas foi realizado o detalhamento geomor- 10 m. Os condutos são predominantemente retilíne-
fológico com objetivo de identificar e caracterizar os os, o piso constitui um plano inclinado sob grandes
aspectos físicos, por meio da análise da morfologia quantidades de blocos abatidos e com pouca va-
dos condutos e de microformas e a descrição de riação de espeleotemas. Observa-se uma mudança
depósitos clásticos e químicos. na feição da caverna no trecho da porção noroeste.
Trata-se de condutos parcialmente obstruídos por
Paleontologia sedimentos, nesse trecho encontra-se um abismo
A coleta dos fósseis foi realizada em confor- de 30 m de profundidade que dá acesso ao nível
midade com a licença SISBIO 51438. Realizou-se inferior, onde os ossos foram encontrados e coleta-
documentação fotográfica e os espécimes foram dos.
coletados, embalados e etiquetados in loco. Os es- Os resultados geoespeleológicos da Gruta
pécimes foram depositados na Coleção Paleontoló- do Engrunado contrastam com os padrões típicos
gica do Laboratório de Ecologia e Geociências do da morfologia cárstica predominante na bacia do
Instituto Multidisciplinar em Saúde da Universidade Rio Una. Ao contrário de cavernas como o Poço
Federal da Bahia, Vitória da Conquista, Bahia. Os Azul e Poço Encantado que ocorrem em depres-
elementos foram identificados preliminarmente até sões cársticas exibindo morfologia de subsidência
o nível de família baseado em descrições da litera- e colapso com acesso ao nível d’água na forma de
tura. lagos (Karmann et al., 2000; Silva et al., 2013), a
Gruta do Engrunado encontra-se na base de um
RESULTADOS E DISCUSSÃO morro residual, sua entrada principal é formada por
Topografia da caverna desplacamento e até o presente não foi encontrada
A única entrada conhecida da caverna está corpos d'água em seu interior.
situada em uma escarpa carbonática nas proximi-
dades do Rio Paraguaçu. Analisando a morfologia Depósito fossilífero
da caverna, percebe-se que ela se desenvolve em Os fósseis (Figura 3) foram encontrados no
dois setores com morfologia bastante distinta. O pri- nível inferior da caverna, associados a sedimentos
meiro setor compreende um amplo conduto princi- que variam de muito fino a areias mal seleciona-
pal, caracterizado por conjuntos de blocos abatidos das. Alguns fragmentos ósseos foram encontrados
e com fendas em seu interior interligando galerias cobertos por camadas de precipitação carbonática.
e continuações em níveis inferiores. O setor deno- A ocorrência dessas incrustações pode indicar pe-
minado “Abismo do Medo” situa-se em níveis infe- ríodos de estabilização do fluxo de água, causando
riores, tendo condutos em direções variadas, ocorre a precipitação de carbonato (Auler et al., 2009; Vila
nesse setor mudanças abruptas entre os condutos Nova et al., 2015).
além da presença de feições do tipo cúpulas no teto A análise dos restos permitiu reconhecer
de alguns pequenos salões, de acordo com (Auler uma associação faunística diversificada, constituí-
et al., 2017) essas são algumas características en- da de animais de pequeno, médio e grande porte,
contradas em cavernas hipogênicas. Além do mais, com formas herbívoras e carnívoras, identificados
encontra-se no setor do abismo do medo a pre- até o nível de família (Tabela 1). Além disso, foi pos-
sença de sedimentos e de acúmulo de ossos que sível a identificação de icnofósseis, que foram asso-
não são encontrados no primeiro setor. Os dados ciados ao comportamento de predação/necrofagia

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Figura 2: Planta baixa da Gruta do Engrunado e perfil do “abismo do medo” por onde se acessa os níveis inferiores.
O material foi coletado na porção NW da caverna.

(Costa et al., 2020), contribuindo com informações CONSIDERAÇÕES FINAIS


para reconstruções paleobiológicas e paleoecológi- Foram descritos de forma preliminar os as-
cas de mamíferos quaternários da região. pectos topográficos e o registo de restos de ma-
A presença de elementos esqueletais de míferos de destacada relevância paleontológica em
menor transportabilidade (e.g. crânio, mandíbula virtude da diversidade e estado de preservação dos
e fêmur) associados a elementos esqueletais de fósseis encontrados, apontando o alto valor fossilí-
maior transportabilidade (e.g. falange, metapodial fero da região da Chapada Diamantina. A caracteri-
e vértebra), é indicativo de uma assembleia parau- zação espeleológica junto a caracterização faunísti-
tóctone, isto é, com pouco ou nenhum transporte ca possibilita perspectivas de estudos sistemáticos,
dos restos ósseos em relação ao local da morte dos paleoecológicos, estratigráficos e tafonômicos, que
organismos (Voorhies, 1969; Frison & Todd, 1986). podem contribuir para compreender melhor a dinâ-
mica ambiental relacionada à organismos que vive-
ram em tempos pretéritos.

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trabalhos paleontologia

nal de Desenvolvimento Científico e Tecnológico


(CNPq; processo nº 301405/2018-2), à Fundação
Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do
Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ; processo nº
E-26/203.176/2017).

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Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos arqueologia

O Seridó no início do
Holoceno
Caio de Freitas Tavares 1,2
Dyana Caroline Ferreira Cardoso3,4
Marcos Antônio Leite do Nascimento5,6
Ian Victor Silva Cordeiro 7,8

1. Sociedade Espeleológica Potiguar


2. Universidade de São Paulo
3. Sociedade Excursionista e Espeleológica da Escola de Minas de Ouro Preto
4. Universidade Federal de Ouro Preto
5. Geoparque Seridó
6. Universidade Federal do Rio Grande do Norte
7. Universidade Estadual da Paraíba
8. Associação União Caatinga

RESUMO ABSTRACT
O território conhecido como Seridó fica loca- The territory known as Seridó is located in
lizado no Nordeste Setentrional Brasileiro e corres- the setentrional Northeast of Brazil and corresponds
ponde a uma das regiões de clima semi-árido com to one of the regions with the most severe semi-a-
condições mais severas do país. Reconstruções rid climate conditions in the country. Paleoclimatic
paleoclimáticas apontam para um clima mais ame- reconstructions point to milder climate conditions at
no no início do Holoceno com a mudança do regime the beginning of the Holocene with the change in
climático e a instalação da Caatinga (ecossistema the climate regime and the installation of the Caatin-
adaptado a condições climáticas secas e quentes) ga (ecosystem adapted to dry and hot climatic con-
a partir de 4000 anos AP, como resultado de varia- ditions) from 4000 years BP, as result of variations
ções nos Ciclos de Milankovitch. Evidências arque- on Milankovitch Cycles. Archaeological evidence,
ológicas, como a presença de sítios próximos a cor- such as the presence of sites close to bodies of wa-
pos d’água e pinturas retratando antigas povoações ter and paintings depicting ancient settlements and
e embarcações fluviais apontam para condições river vessels, point to milder weather conditions du-
climáticas mais amenas durante a ocupação desse ring the occupation of this territory in the past. In
território no passado. Nesse sentido, o presente tra- this sense, the present work, from the quantitative
balho faz estimativas a partir da análise quantitativa and qualitative analysis of the spatial distribution of
e qualitativa da distribuição espacial de cavidades natural cavities and sites with evidence of human
naturais e sítios com evidências de ocupação hu- occupation, integrated with hydrological modelling,
mana integrada a modelamentos hidrológicos quan- estimates the paleoenvironmental conditions in the
to às condições paleoambientais na região do Seri- Seridó region and its influence on the archaeologi-
dó e sua influência no registro arqueológico. cal record.

Palavras-Chave: Geoarqueologia; Mudanças Cli- Keywords: Geoarcheology; Climate changes; Geo-


máticas; Geoparque Seridó. park Seridó.

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trabalhos arqueologia

INTRODUÇÃO al., 2010). A temperatura média varia entre 24°C e


Etmologicamente, o vocábulo Seridó, possui 26°C (com exceção das regiões elevadas topogra-
origem indígena (ceri-toh), significando “pouca fo- ficamente) e as temperaturas diurnas podem ultra-
lhagem” (Cascudo, 2002). O termo, além de desig- passar 40°C nos períodos mais secos.
nar o nome de um importante afluente do rio Pira- Estudos de diversos segmentos da ciência,
nhas-Açu (a principal bacia hidrográfica do estado vêm, entretanto, mostrando que o clima dessa re-
do Rio Grande do Norte), diz respeito também ao gião nem sempre foi semiárido. Reconstruções pa-
território composto por vinte e dois municípios, loca- leoclimáticas a partir de estudos de palinomorfos e
lizados entre os estados do Rio Grande do Norte e assinatura isotópica de estalagmites, solo, rocha e
Paraíba, no Nordeste Setentrional Brasileiro. Esse sedimentos clásticos (De Oliveira et al., 1999; Cruz
território, insere-se geomorfologicamente entre os et al., 2009; Zular et al., 2018; Utida et al., 2020)
vales e planícies da Depressão Sertaneja e as ser- mostram que a instalação do atual clima semiárido
ras e platôs do Planalto da Borborema (Ab’Saber, e a expansão da Caatinga no Nordeste Brasileiro
1969), com cotas altimétricas que vão desde 200m se deu a partir dos últimos 4000 anos. Em períodos
a 800m de altitude (Pfaltzgraff e Torres., 2010). anteriores, as reconstruções paleoclimáticas apon-
É nesse cenário que se desenvolve a Caa- tam para um clima mais úmido, com presença de
tinga, ecossistema dominado por plantas xerófilas, espécies de plantas típicas de Floresta Tropical e
adaptadas às severas condições do clima semiári- Cerrado.
do. A média da precipitação anual na região do Se- Nesse sentido, o presente trabalho apresen-
ridó não ultrapassa 1000mm, com valores que che- ta um inventário de cavidades naturais e sítios ar-
gam 400mm em grande parte do território (Fetter et queológicos reconhecidos no Seridó (entre os mu-

Figura 1: mapa geológico simplificado da área de estudo com a localização das principais cavidades naturais e ocorrên-
cias de sítios arqueológicos. Base de dados geológicos CPRM (2016). Base de dados espeleológicos; CANIE/CECAV
(2020). Base de dados arqueológicos CNSA – IPHAN (2021).

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trabalhos arqueologia

nicípios de Acari e Carnaúba dos Dantas no RN, RESULTADOS E DISCUSSÕES


Picuí e Pedra Lavrada na PB) e faz considerações Inventário das Cavidades Naturais
geoarqueológicas a respeito da influência das vari- Entre os dados obtidos em campo e os da-
áveis morfoclimáticas na ocupação humana desta dos disponíveis no CANIE, foram reconhecidas um
região por antigas civilizações. total de 45 cavidades naturais na área de estudo:
A partir da análise quantitativa e qualitativa 16 cavernas, 16 abrigos, 6 cavidades desenvolvi-
da distribuição espacial de cavidades naturais e sí- das em depósitos de tálus, 4 tafones e 3 diáclases
tios com evidências de ocupação humana, integra- (figura 1).
da a modelamentos hidrológicos, dados de recons- Dependente das condições meteóricas e da
trução paleoclimática e datações radiométricas, é composição do alicerce rochoso, o desenvolvimen-
possível fazer estimativas quanto às condições pa- to dessas feições fica submetido principalmente à
leoambientais na região do Seridó durante o Holo- ação do intemperismo físico. Não são observadas
ceno e sua influência no registro arqueológico. feições cársticas formadas por dissolução química
bem desenvolvidas, tais como as estalagmites, co-
MATERIAIS E MÉTODOS raloides e travertinos das cavernas em calcários da
O estudo se desenvolveu em duas etapas Formação Jandaíra na Bacia Potiguar, por exem-
principais. A primeira etapa, ocorreu entre os dias plo, localizadas a 200 km da área de estudo.
24 de abril e 07 de maio de 2021, com a atividade de A dissolução química, entretanto, tem papel
prospecção espeleológica/arqueológica. Foram re- fundamental na desagregação dos maciços rocho-
alizados levantamentos expeditos, em uma área de sos ao facilitar a ruptura das rochas nas suas princi-
1150km2, com o intuito de inventariar e quantificar pais descontinuidades físicas, as fraturas e falhas.
sítios arqueológicos e principais cavidades entre os Devido à grande amplitude térmica e à trama de es-
municípios paraibanos de Picuí e Pedra Lavrada, e truturas rúpteis tectônicas, as cavidades se formam
potiguares de Carnaúba dos Dantas e Acari. Ao to- como resultado do abatimento de grandes blocos
tal, foram inventariadas 31 cavidades naturais, en- de rocha ocorrido através de fragmentações ou pro-
tre cavernas, abrigos, cavidades desenvolvidas em cessos de incasão, semelhante aos processos ob-
depósitos de tálus e diáclases, dos quais 12 sítios servados nas cavernas dos mármores da Formação
apresentam vestígios de ocupação humana (pintu- Jucurutu descritos por Almeida Netto et al., (2017).
ras, inscrições e fragmentos de cerâmica).
A segunda etapa envolveu a organização, in-
tegração e interpretação dos dados em laboratório.
Foram realizados modelamentos hidrológicos de di-
reção de fluxo, acumulação e ordem de magnitude
dos principais cursos d’água superficiais utilizando
a ferramenta ArcMap do software ArcGis 10.8. Para
a construção dos modelos digitais de elevação em-
pregados no modelamento hidrológico, foi utilizada
uma imagem do sensor remoto ASTER com resolu-
ção espacial de 30 metros. A análise qualitativa dos
recursos hídricos foi feita com base no processa-
mento de imagens hiperespectrais do sensor Sen-
Figura 2: vista do interior da caverna Furna do Jalmir de-
tinel 2 utilizando ferramentas da plataforma Google
senvolvida em xisto no município de Carnaúba dos Dan-
Earth Engine.
tas/RN.
A análise dos dados envolveu a integração
A classificação tipológica das cavidades le-
das informações coletadas com as informações dis-
vou em consideração três critérios principais: a re-
poníveis nos bancos de dados de cavidades natu-
lação espacial da cavidade com a rocha sã, a re-
rais do CECAV (CANIE) e sítios arqueológicos no
lação geométrica entre o desenvolvimento linear e
banco de dados CNSA do IPHAN.
a altura e os agentes modificadores do substrato
rochoso.

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trabalhos arqueologia

As cavernas e os abrigos desenvolvem-se por Maia e Bezerra (2020), e como pode ser obser-
em rocha sã, nas porções mais superiores no en- vado na Pedra da Arara e nos tafones da Serra das
torno de grandes maciços rochosos de cordierita- Cruzes (figura 4).
-granada-biotita-xisto e muscovita-quartzito, nota-
damente quando apresentam foliação metamórfica
sub-horizontal.
As cavernas apresentam forma tipicamente
ovalada, com largura como dimensão mais desen-
volvida (largura > desenvolvimento linear > altura),
podendo chegar a 60 metros, como na Furna do
Jalmir (figura 2). As cavernas não apresentam zona
afótica, ou quando apresenta, essa é muito pouco
desenvolvida.
Os abrigos podem apresentar valores em
torno de 100 metros de largura (largura > altura >
desenvolvimento linear), como no caso dos abrigos
Figura 4: Tafone no plúton granítico Acari na Serra das
da Serra do Gavião mostrado na figura 3. Cruzes no município de Acari/RN.
As cavidades formadas em depósitos de
tálus e diáclases inventariadas dizem respeito a ca-
vidades com desenvolvimento linear maior que 1,80
m, penetráveis pelo ser humano. Nessas feições,
formadas por agentes físicos e tectônicos do intem-
perismo respectivamente, foram encontradas fezes
de pequenos roedores (mocós e preás) e de veado
catingueiro, além de morcegos. Um importante sítio
arqueológico fica em um depósito de tálus, a Pedra
de Retumba (Oliveira et al., 2020), mostrada na fi-
gura 5.

Figura 3: Abrigo em xisto na Serra do Gavião de onde se


observa o Vale do Rio Carnaúba dos Dantas, no município
homônimo.
Os tafones, as cavidades em depósitos de
tálus e as diáclases ocorrem junto a grandes blo-
cos e matacões de rocha formados a partir do in-
temperismo dos maciços rochosos. Comuns em
inselbergs graníticos, os tafones são encontrados
nos plútons porfiríticos Rajada e Acari, na porção
oeste da área de estudo. Essas feições intempéri-
cas são resultado da erosão diferencial dos mine-
rais presentes em enclaves de magmas dioríticos/
gabróicos em meio a matriz granítica nos plútons. Figura 5: Capa da Pedra de Retumba no Município de Pe-
Minerais máficos, tais como biotita, anfibólio e pi- dra Lavrada/PB.
roxênio, predominantes nos enclaves máficos, são
mais susceptíveis à dissolução química em relação Inventário dos Sítios Arqueológicos
aos minerais félsicos (feldspatos e quartzo) seguin- A Área Arqueológica do Seridó contabiliza-
do a série de intemperismo dos minerais (Goldich, va até 2019 um total de 136 sítios arqueológicos
1938). Esse agente químico do intemperismo leva à (Martins et al., 2020), dos quais 82 se encontram na
formação de morfologias convexas, como descrito área de estudo, e onde podem ser encontradas as

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trabalhos arqueologia

duas técnicas pictográficas de registros rupestres: encontrado na região de Carnaúba dos Dantas (No-
gravuras e pinturas (Martin, 1997). gueira, 2016), tem como um dos seus traços grá-
As gravuras são classificadas como perten- ficos (emblemáticos) a representação de pirogas
centes à subtradição Ingá da tradição Itaquatiara do (Martin, 2008), mostradas na figura 7. As pirogas
Leste (Martin, 1997). Os grafismos dessa subtradi- são embarcações indígenas a remo, feitas com
ção têm como característica principal a preparação tronco de árvore.
(raspagem e o alisamento) do suporte rochoso e
aplicação de tinta sobre as gravuras entalhadas na
rocha. O conteúdo dos grafismos traz formas com
tendência curva e complexa e pontos e pequenas
formas circulares gravadas ordenadamente e que
dão a impressão de linhas de contagem (Martin,
1997). Figura 6: Itacoatiara junto a parede da Cachoeira do Pe-
Gravuras deste tipo são encontradas comu- dro no município de Picuí/PB.
mente junto a afloramentos rochosos próximos a ASPECTOS HIDROLÓGICOS
corpos d’água, como a Pedra de Retumba (figura 5) Foram realizados modelamentos hidrológi-
e a Cachoeira do Pedro (figura 6). cos a partir de modelos digitais de elevação com
As pinturas são classificadas como perten- o intuito de relacionar geograficamente evidências
centes à subtradição Seridó da tradição Nordeste. arqueológicas e cursos d’água. Essa abordagem
A tradição Nordeste pode ser identificada pela va- foi feita devido ao fato que no clima semi-árido do
riedade de temas e riqueza de detalhes. As cenas Seridó, os rios apresentam cursos intermitentes ao
trazem símbolos antropomórficos, zoomórficos, fito- longo do ano, passando a maioria da temporada de
mórficos, além de formas geométricas que adornam estiagem, secos, como mostrado em mais detalhe
as figuras e expressam significados nesse contexto nas imagens de satélite da figura 8.
arqueológico (Nogueira, 2016; Costa, 2018; Martin Foram calculados os principais canais que
e Asón, 2018). recebem os fluxos e acumulações de águas superfi-
O estilo Carnaúba, da subtradição Seridó, ciais a partir das imagens de satélite. Essa metodo-

Figura 7: Painel pictográfico da Furna dos Caboclos. A cena é composta por figuras antropomórficas com diferentes
tons e ornamentos de cabeça (laranja e vermelho – indicado pelas setas inclinadas), além de figuras zoomórficas (seta
horizontal). No centro a esquerda (indicado pela seta vertical) é possível notar a representação de uma piroga.

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logia permitiu investigar com mais detalhe a relação inundação do vale do rio Carnaúba dos Dantas e
entre as informações arqueológicas e as condições de vestígios arqueológicos na Área Arqueológica do
de paleonavegabilidade dos rios da área de estudo. Seridó (Rios e Santos Júnior, 2014; Costa, 2018;
Na análise do mapa 1 se confirma a correlação Brandão e Tavares, 2020) confirmam as evidências
espacial entre os principais cursos d’água e as geoarqueológicas quanto à paleonavegabilidade
ocorrências, tanto de sítios arqueológicos, quan- dos cursos d’água no Seridó em épocas passadas.
to de cavidades. Esse fato, por razões diferentes,
confirma o papel da água como agente modelador CONSIDERAÇÕES FINAIS
do relevo e determinante na fixação de populações Na Área Arqueológica do Seridó a presença
humanas, principalmente de grupos nômades que de pirogas nas pinturas rupestres são evidências
provavelmente viviam da caça e da coleta de ali- claras da paleonavegabilidade dos principais cur-
mentos (Martin, 1997). sos d’água no passado. Estudos paleoclimáticos,
Estudos sedimentológicos na planície de arqueológicos e de variação eustática oferecem

Figura 8: Imagens hiperespectrais do sensor Sentinel 2 obtidas no dia 19 de julho de 2021 sobre a cidade de Carnaúba
dos Dantas/RN. São apresentadas três composições de bandas espectrais com diferentes combinações aplicadas ao
destaque de determinadas feições da superfície. Nas três imagens destaca-se a cor azul intensa dos reservatórios de
água (açudes) e os canais secos dos cursos fluviais neste período do ano.

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boas estimativas no intuito de posicionar no tempo 2018).


esta mudança no regime fluvial. Do ponto de vista arqueoespeleológico, fo-
Datações radiométricas em fragmentos de ram reconhecidos um total de 82 sítios arqueológi-
carvão utilizando isótopos de 14C encontrados cos na área de estudo e 45 cavidades naturais. A
em jazigos nos sítios arqueológicos Pedra do Ale- relação da distribuição espacial dessas cavidades
xandre e Mirador, obtiveram idades de 9400±35 e e sítios próximos aos principais cursos de água car-
9410±110 anos AP (Martin, 1997). As datações ra- tografados são informações empíricas que atestam
diométricas a partir de isótopos de 14C em carvão para a influência da disponibilidade de água como
mais recentes no Seridó apresentam valores que condicionantes à ocupação do Seridó no início do
vão de 4710 a 2620 anos AP (Martin, 1997). Holoceno.
Estudos de variação do nível do mar (Cal- São necessários ainda mais estudos de ca-
das et al., 2006) a partir de datação por radiocarbo- ráter paleoclimático, paleontológico e arqueológico
no AMS de beachrocks e sedimentos lagunares na para uma reconstrução temporal mais precisa no
foz do rio Piranhas-Açu mostram variações eustáti- Seridó. Estudos nesse sentido são fundamentais
cas nos últimos 7000 anos AP. Os dados apontam não apenas na reconstrução de antigas paisagens
para uma rápida subida do nível do mar de 3 metros e na compreensão dos aspectos sociais dos dife-
entre 7000 e 6700 anos, até atingir os níveis atuais. rentes grupos que povoaram a região no passado
O pico positivo da variação eustática no Holoceno geológico, como também são informações impres-
atingiu 1,3 m acima do nível do mar moderno há cindíveis no refinamento de modelos de previsão
5900 anos AP. Essa transgressão marinha e manu- climática a nível global e formas de ocupação do
tenção do nível de mar alto, provavelmente afetou território.
diretamente o escoamento das águas superficiais Finalmente, cabe ressaltar ainda que mais
no continente e, consequentemente, facilitou a pa- de 90% dos sítios arqueológicos e cavidades es-
leonavegabilidade na bacia do Rio Piranhas-Açu. tudadas encontram-se dentro do território do Geo-
Após esse máximo, o nível do mar foi rebaixado até parque Seridó. Esse fator é fundamental na conser-
atingir a posição atual. vação do patrimônio geológico e tem implicações
O período a partir do qual houve a instala- diretas, tanto no ambiente natural, como na so-
ção de condições climáticas mais áridas no Nordes- ciedade (Nascimento e Santos, 2013). Geossítios
te do Brasil, com menores índices pluviométricos, como o tafone da Pedra da Arara e do Sítio Mirador,
foi obtida através da análise de isótopos estáveis as pinturas rupestres em abrigos rochosos no Ta-
de oxigênio em estalagmites e do estudo de palino- lhado do Gavião e Xique-Xique, por exemplo, são
morfos. Os dados de δ18O obtidos a partir da aná- elementos naturais fundamentais na compreensão
lise de seções de estalagmites na Caverna Rainha, tanto do passado, quanto do presente do Seridó,
na Bacia Potiguar (Cruz et al., 2009), apontam para nas mais diversas escalas de tempo e, por isso, de-
a contribuição da rocha-fonte na formação dos es- vem ser conservadas.
peleotemas (calcário da Formação Jandaíra) sem
interferência significativa do solo a partir de 4000 AGRADECIMENTOS
anos AP. Essa mudança na assinatura isotópica re- Agradecimentos ao Sr. Udenilson Silveira
gistra remoção completa ou parcial da vegetação pelo apoio logístico e documental durante a etapa
sobre a caverna, causada pelo aumento na insola- de coleta de dados em campo. Suas colaborações
ção e diminuição da umidade como consequência engrandeceram o trabalho e permitiram a execução
das variações nos Ciclos de Milankovitch (Cruz et da etapa de campo em condições seguras. Agrade-
al., 2009). Esses dados são confirmados a partir da cimentos também ao Sr. Josinaldo Picuí e ao amigo
análise de isótopos de δ13C e 86Sr/87Sr em esta- Gabriel Mota pelos auxílios diversos e agradável
lagmites e rocha (Utida et al., 2020) e estudos de companhia durante a pesquisa no Seridó.
palinomorfos em espículas e diatomáceas associa-
dos a processos sedimentares em dunas e lagos
no litoral leste do Rio Grande do Norte (Zular et al.,

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos arqueologia

Potencial arqueológico da
região de Natalândia - Mg
Samuel Santos de ALMEIDA1,2
Tulio Gabriel Ramos RIBEIRO1,2
Suzany de Almeida LIMA1,2

1. Grupo Espeleológico da Geologia - GREGEO;


2. Universidade de Brasília;
3. TR Geologia.

RESUMO logical heritage of the municipality of Natalândia and


O município de Natalândia localiza-se na demonstrates the high potential for new discoveries
porção noroeste do estado de Minas Gerais, uma in the region.
região com alta potencialidade espeleológica e ar-
queológica. Durante as incursões de campo, foram Keywords: Rock painting; Archaeology; Rock-shel-
realizados caminhamentos prospectivos e registros ters; Natalandia, MG, Brazil.
descritivos e fotográficos ao longo do Morro Pedra
Azul, onde foram constatados seis pontos de ocor- INTRODUÇÃO
rências arqueológicas, localizadas majoritariamen- De acordo com dados do Instituto do Patri-
te em pequenos abrigos sob rocha. Com base em mônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, há
características das pinturas e gravuras, relacionou- atualmente cadastrados mais de 2.500 sítios arque-
-se tais ocorrências à tradição rupestre São Fran- ológicos pré-coloniais no estado de Minas Gerais.
cisco. Os resultados agregam valor ao patrimônio Este baixo número expressa o enorme potencial
arqueológico do município de Natalândia e eviden- para a identificação de mais dezena de milhares de
ciam o elevado potencial para novas descobertas sítios arqueológicos no estado.
na região. Os estudos sistemáticos referentes à arque-
ologia no estado começaram na década de 1970
Palavras-Chave: Pintura rupestre; Arqueologia; na região de Lagoa Santa. Mais recentemente, a
Abrigos; Natalândia, MG, Brasil. Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG am-
pliou as pesquisas arqueológicas por todo o esta-
ABSTRACT do (Xavier, 2007). Sabe-se que na região de Unaí
The municipality of Natalândia is located in e Natalândia, houve presença de duas tradições,
the northwestern portion of Minas Gerais state, a sendo elas a Tradição São Francisco e a Tradição
region with high speleological and archaeological Central, as quais deixaram registros de pinturas
potential. During the field work, prospective tracks rupestres que datam cerca de dois a dez mil anos
and descriptive and photographic records were (Justamand, et al. 2017).
made along the Pedra Azul Hill, where six points A região estudada (Figura 1) foi selecionada
with archaeological occurrences were found, mostly com base no alto grau de potencialidade espeleo-
located in small rock-shelters or cliff-faces. Based lógica seguindo a metodologia descrita por Jansen
on the characteristics of the paintings and engravin- et al., (2012), bem como por meio dos relatórios e
gs, these events were related to the São Francisco dados produzidos em expedições prospectivas pre-
rock tradition. The results add value to the archaeo- liminares realizadas pelo Grupo de Espeleologia da

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Geologia da Universidade de Brasília (GREGEO – A região está inserida em um contexto ge-


UnB) na região entre os anos de 1992 e 2013. Nes- omorfológico cárstico, contendo morros com pare-
sas expedições, além de cavidades, foram identi- dões acentuados e grande quantidade de abrigos
ficadas ocorrências arqueológicas como pinturas e cavernas, formados a partir da espeleogênese
rupestres, fragmentos de cerâmicas, ferramentas em carbonatos intensamente fraturados do Grupo
feitas de conchas, entre outras. Bambuí. As regiões de vales destes morros estão
Dando continuidade aos trabalhos anterio- associadas as drenagens do Ribeirão Canabrava,
res do grupo na região, o presente trabalho aborda curso d’água perene mais próximo da localidade,
descritivamente ocorrências arqueológicas visando tributário da sub-bacia do Rio Preto (IGAM, 2006).
apontar a relevância deste patrimônio no município Nas proximidades da área de estudo existem cavi-
de Natalândia – MG. Os dados aqui apresentados dades que foram anteriormente identificadas con-
foram coletados durante a expedição de campo do tendo achados arqueológicos (SOUZA & AULER,
projeto “Unalândia – conhecer para proteger”, de- 2018), como por exemplo as Grutas do Genito I e II,
senvolvido pelo GREGEO – UnB. Sítio Arqueológico Columbia e Lapa da Foice, todas
Pretende-se também, a partir de uma análi- no município vizinho de Unaí-MG.
se estilística, estabelecer uma relação entre os gra- Ressalta-se, no entanto, que no município de Na-
fismos e gravuras rupestres encontrados durante a talândia-MG, não foi encontrado nenhum registro
expedição com a literatura existente, buscando ca- nos bancos dados do Cadastro Nacional de Sítios
tegorizar tais registros de acordo com as tradições Arqueológicos – CNSA (IPHAN), Cadastro Nacional
rupestres presentes em território nacional. de Informações Espeleológicas – CANIE (ICMBio)
e Cadastro Nacional de caverna CNC (SBE) acerca
CONTEXTUALIZAÇÃO DA ÁREA de ocorrências arqueológicas ou presença de cavi-
O município de Natalândia localiza-se na dades naturais subterrâneas.
porção noroeste do estado de Minas Gerais, a apro-
ximadamente 270 km de Brasília. Já a área pros- MATERIAIS E MÉTODOS
pectada situa-se na localidade Morro Pedra Azul, O método utilizado neste estudo baseia-se
uma região rural situada aproximadamente à 3,5 no estudo de Moura (2019) e Barbosa (2015), que
km a nordeste da área urbana de Natalândia. consiste basicamente em três etapas principais:
pré-campo, campo e pós-campo.
A primeira etapa consistiu em um levanta-
mento bibliográfico da macro região a ser estudada
e do seu entorno. Para isso, usou-se primeiramente
informações obtidas em excursões anteriores, como
coordenadas e anotações de cadernetas, a fim de
se determinar regiões de interesse. Em seguida, foi
elaborada uma base cartográfica levando em con-
sideração principalmente os parâmetros físicos da
região, como geologia, hidrografia, geomorfologia,
pedologia, vegetação, potencial espeleológico e ar-
queológico, objetivando a elaboração de um pano-
rama prospectivo da área.
A etapa de campo foi realizada no período
entre 27/12/2020 e 03/01/2021. Em um primeiro
momento, foram selecionadas ocorrências espele-
ológicas, arqueológicas e melhores acessos a partir
de informações prestadas pelos moradores da re-
Figura 1: Localização da área de estudo.
gião. Em seguida, foram feitos caminhamentos nas
proximidades dos paredões rochosos, realizando
varreduras minuciosas em busca de abrigos e ocor-

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rências arqueológicas. Quando identificadas, estas Para melhor visualização e análise, as foto-
ocorrências tiveram suas coordenadas geográficas grafias das pinturas passaram por um processo de
registradas por aparelho receptor de GPS da Gar- recuperação e realce de tonalidades, por meio do
min, modelo Etrex 30, além de serem fotografadas uso do software PhotoScape 3.7, como exemplifica-
e sistematicamente descritas com base no guia de do na Figura 2. O material obtido foi utilizado para
cadastro proposto por Carvalho & Seda (1982). Os caracterizar os grafismos de acordo a literatura.
pontos de ocorrência estão representados no Qua-
dro 1 e espacialmente representadas no mapa da RESULTADOS
Figura 1. Abrigo do Descamamento (NR01)
O abrigo está localizado ao longo do pare-
dão rochoso, com abertura orientada para nordeste.
Trata-se de um abrigo pequeno, com aproximada-
mente 11 m de altura, 10 m de largura e aproxima-
damente 3,5 m de desenvolvimento horizontal.
Foram identificadas no abrigo, oito painéis
com média de 3 pinturas por painel. As sinalizações
rupestres são exclusivamente representadas por
geometrismos compostos por pequenos bastonetes
lineares e simples, que variam, em média, de 6 a 15
cm de comprimento e aproximadamente 3,0 a 2,0
cm de espessura (Figura 3). As composições são
monocromáticas, pintadas majoritariamente na cor
vermelho, tendo ocorrências também na cor preta.

Quadro 1: Ocorrências rupestres encontradas na etapa de


campo.

Figura 3: Pintura composta por bastonetes lineares do


Abrigo do Descamamento (Realçada). Régua de escala
Figura 2: Exemplo de processo de recuperação (realce)
de fotografias: A – Fotografia original; B – fotografia com = 15 cm.
realce digital.

Uma vez coletados, os dados foram organi- Conjuntos de 11 bastonetes compõem figu-
zados e devidamente cadastrados em bancos de ras que variam entre 5 a 25 cm de comprimento, e
informações, como CANIE, CNE e CNSA. A etapa são dispostos de forma padronizada ao longo de
final consistiu em todo o processamento, análise e níveis nas paredes do abrigo, não ultrapassando
interpretação realizados a partir dos dados levanta- 1,8 m de altura. Há uma maior concentração de pin-
dos antes e depois da incursão de campo. turas em níveis mais baixos, de até um metro de

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altura em relação ao piso do abrigo (Figura 4). Há nesta ocorrência, presença de pátina e
Observou-se também que no conjunto estilístico liquens próximos ao painel, o que torna difícil a vi-
presente no Abrigo do Descamamento, a maio- sualização dos elementos estilísticos e forma ori-
ria dos traços apresentam cores concentradas e ginal das pinturas. Ainda assim, é possível identifi-
acabamento arredondado, motivo que leva Baeta car a presença de traços lineares com acabamento
(2011) a sugerir que esse tipo de bastonete deve redondo e dispostos paralelamente em conjuntos
ter sido produzido com tinta não diluída e aplicada com alternância bicrômica (vermelho-amarelo). Há
diretamente com os dedos. presença de pontos com tinta relictual ao longo da
parede escavada. Este fato pode sugerir que existia
no passado um conjunto pictural maior no local, atu-
almente quase que completamente apagado pelas
intempéries (Figura 6).

Figura 4: Painel do Abrigo do Descamamento (Realçada).

Sumidouro das Pinturas (NR03)


O Sumidouro das Pinturas está localizado a
sudeste do Abrigo do Descamamento, em uma re-
entrância no paredão ausente ornamentações por
espeleotemas.

Figura 6: Pintura no Sumidouro das Pinturas (Realçada).

Lapa da Pantera (NR05)


Mais ao norte no morro localiza-se a Lapa
da Pantera que consiste no maior conjunto arqueo-
lógico até o momento registrado no Morro da Pedra
Azul. Ao ser mapeado, percebeu-se que trata-se de
um sistema de abrigos e cavidades conectados pa-
ralelamente a orientação do morro. Deste sistema,
apenas a caverna com maiores dimensões, bem
como suas proximidades, apresentou ocorrências
Figura 5: Vista do Sumidouro das pinturas (Original). Pin- rupestres.
turas localizadas abaixo da reentrância no paredão ao
fundo. Na foto, esquerda para a direita: Luis Lumena, Be- No paredão já próximo à entrada da maior
atriz Timótio e Samuel Santos. galeria da Lapa da Pantera são encontradas inci-
sões rasas e lineares na rocha dispostas de forma
O paredão de calcário escavado pela água caótica (Figura 7). Foram observados também sul-
assumiu uma forma de abrigo, com paredes cônca- cos paralelos sobre a superfície polida de blocos
vas e lisas, com aproximadamente 2,20 m de altura localizados próximo à entrada da Gruta (Figura 8).
e 15 m de comprimento, facilmente penetrável por Essas incisões possuem em média de 20 a 30 cm
um adulto de estatura média, escavada na base do de comprimento e aproximadamente 5 mm de pro-
maciço por fluxos pluvias fundidade. Essas foram as únicas figuras grava-

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arqueologia
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das em rocha encontradas durante os trabalhos de


prospecção.

Figura 9: Vista de painel na entrada da Lapa da Pantera.


Como escala: Beatriz Timótio.

feitos com tinta vermelha. Também podem ser en-


contrados finos traços na coloração preta. O painel
como um todo apresenta tons em vermelho e ama-
relo que, embora desbotado, sugerem que houve
uma preparação no fundo para receber as pinturas.
Na parte central do painel, destaca-se um antropo-
Figura 7: Gravuras em paredão próximo a entrada da Lapa da
Pantera. Régua de escala = 15 cm. morfo preto com braços, cabeça, uma mão e parte
do tronco ainda bem conservados (Figura 11). Essa
figura humana possui um estilo próprio, diferente
dos demais antropomorfos encontrados inclusive na
própria caverna, onde o pintor se atentou em repre-
sentar detalhes como os dedos, orelhas e cabelo.
O corpo é consideravelmente maior e mais robusto
que as demais representações, com preenchimento
completo da forma. É possível observar que geo-
metrismos coloridos foram pintados em sobreposi-
ção à figura humana, talvez no intuito de encobri-la.
Há figurações no painel 2 onde o suporte
para a confecção de um tema ou técnica parece ter
sido cuidadosamente escolhido. Como exemplo é
possível citar um escorrimento calcítico branco que
Figura 8: Incisões em superfície polida de bloco próximo a foi utilizado como fundo natural para aplicação de
Lapa da Pantera. Régua de escala = 15 cm. tinta preta, conferindo um destaque por contraste a
A maioria das figurações encontradas foram cena representada.
confeccionadas nas paredes e tetos de uma região Foi constatado também no interior da caver-
lateral mais fechada próxima a entrada da gruta. O na, a presença de grande quantidade de escadas
painel 1 (Figura 9), possui área aproximada de 2,5 entalhadas em grossos troncos de madeira (Figura
m2 e está repleto de pinturas, sendo este o maior 12), dispostas estrategicamente na entrada de con-
painel em área e quantidade de expressões gráfi- dutos de difícil acesso. O mesmo tipo de escada
cas conhecido na área estudada. São encontrados pode ser encontrado em diferentes pontos da ca-
principalmente grafismos geométricos de tamanhos verna, assim como pontes aparentemente feitas do
e cores variáveis, predominando círculos e anéis mesmo material, com objetivo de melhorar o tráfego
interno.

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Figura 10: Vista do painel 2 da Lapa da Pantera (Realça-


da).

Figura 12: Exemplo de tronco utilizado como passagem


no interior da Lapa da Pantera. Na foto: Rafael Grudka.

Figura 13: Exemplo de escavação no interior da Lapa


da Pantera.

Gruta dos Meandros (NR06)


Esta gruta localiza-se no extremo sul da face
leste do Morro Pedra Azul, próximo a instalações
rurais, cercas e pastagens. Mapeada, a caverna re-
velou desenvolvimento linear de aproximadamente
Figura 11: Antropomorfo destacado no painel 1 (Realça- 310 m, com presença de intrigantes ocorrências ao
da). Notar sobreposição de figuras. longo de todo o seu desenvolvimento.
Junto a essas estruturas, é bastante comum Já na galeria de entrada, em meio a blocos
encontrar marcas de escavações nas paredes da rolados, observou-se a presença de troncos enta-
caverna (Figura 13). Em alguns pontos, condutos e lhados com a finalidade de serem utilizadas como
passagens foram inteiramente abertos no maciço, escadas (Figura 14).
formando um grande sistema de condutos espon- Encontrou-se também, fragmentos cerâmi-
giformes totalmente artificiais. Ocasionalmente, en- cos e vestígios de fogueiras em salões distantes da
contrava-se, ao longo desses sistemas escavados, entrada, isto é, em zona afótica. Estes elementos
fragmentos cerâmicos e vestígios de fogueiras. parecem estar relacionados uma vez que se encon-

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Figura 14: Tronco entalhado posicionado estrategicamen- Figura 15: Exemplo de fragmento de cerâmica encontrado
te em trecho acidentado, na entrada da Gruta dos Mean- no interior da gruta dos Meandros. Escala canivete = 10
dros. Como escala: Guilherme Villanova. cm.

traram próximos. Em alguns fragmentos é possível


observar ornatos desenhados na superfície do ma- Abrigo das pinturas (NR20)
terial (Figura 15). Não foram encontradas manifes- Neste ponto ocorre um sistema de 3 abrigos
tações rupestres em nenhum ponto desta caverna, desenvolvidos paralelamente à parede do morro
contudo foram observadas escavações semelhan- com as entradas voltadas para o oeste. Os abrigos
tes àquelas observadas na Lapa da Pantera. são compostos por compartimentos únicos pouco
desenvolvidos linearmente. O sistema de abrigos
Abrigo da Reentrância (NR10) mede, ao todo, aproximadamente 15m de compri-
Abrigo localizado na vertente oposta aos mento.
sítios anteriores, em uma pequena reentrância no Na entrada do primeiro abrigo, em um tre-
paredão. Possui dimensões aproximadas de 4,5 m cho da parede externa mais protuberante, a apro-
de altura e 10 cm de largura. ximadamente 2,2 m do chão, há um geometrismo
Os grafismos presentes nesta ocor- monocrômico de aproximadamente 60 cm de com-
rência estão presentes em regiões protegidas pela primento e 40 cm de largura (Figura 18).
água da chuva e são majoritariamente compostos A pintura é composta por traços lineares dis-
por zoormorfos como quelônios (Figura 16), quad- postos de forma a compor uma representação geo-
rúpedes e sauros (Figura 17) na cor preta. As sina- métrica concisa (Figura 19). Seu estilo filiforme bem
lações estão dispostas a aproximadamente 1,5 m como sua cor avermelhada e acabamento arredon-
de altura do substrato do terreno. dado sugerem, de acordo com Baeta (2011), uso de

Figura 16: Quelônio no Abrigo da Reentrância (Realçada). Figura 17: Zoomorfos presentes na parede do Abrigo da
Reentrância (Realçada).

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Figura 18: Painel com pintura no Abrigo das Pinturas. Figura 19: Pintura no Abrigo das Pinturas (Original).
Como escala: Guilherme Villanova.

tintas concentradas aplicadas na rocha diretamente am-se em alturas entre 0,7 a 2,2 metros em média,
por dedos. As figuras descobertas foram elabora- sendo vistos somente dentro da cavidade. No en-
das predominantemente na cor vermelha, ocorren- tanto, verificou-se a presença de figurações que fo-
do, em menor quantidade, grafismos em preto e ram confeccionadas na parede externa e de manei-
amarelo. Além disso, há um predomínio de formas ra a ser avistadas a longa distância, como em um
geométricas como linhas, bastonetes, círculos e painel vertical situado próximo na entrada da Lapa
anéis na composição dos painéis. Antropomorfos da Pantera (Figura 21) e a figura no Abrigo das Pin-
são, no geral filiformes, assim com os zoomorfos, turas (Figura 18).
sendo ambos de ocorrência menos comum. Além
disso, foi observado que maioria das formas filifor-
mes ou geometrizantes coincidem com a espessura
e formato de dedos, podendo ser esta a principal
técnica de pintura utilizada. Não foram vistos casos
em que a tinta escorreu após sua aplicação ou de
gotas acidentais de tinta.
Na maioria dos locais de ocorrências as pin-
turas se encontram dispostas sem nenhum tipo de
superposição o único exemplo em que há inserção
de elementos sobrepondo figuras já pintadas acon-
tece na Lapa da Pantera. Nestes casos as pinturas
acrescentadas parecem não ter uma forma interati-
Figura 20: Geometrismo na Lapa da Pantera (Realçada).
va com as anteriores, mas sim, tendem a acrescen- Pintura parcialmente apagada por ação de escorrimento
tar itens novos a cena. da água pluvial. Escala régua = 15 cm.
Observou-se que em painéis próximos a su-
perfície era comum formação de liquens, camadas Ao analisar as sinalações encontradas no
de pátina, escorrimento de água, descamamentos Morro da Pedra Azul percebe-se uma relação com
da rocha e crescimento de cristais de calcita. Estes alguns padrões típicos da Tradição São Francisco,
foram os principais agentes que ocasionam a remo- que pode ser encontrada em estados do centro-oes-
ção ou perda definitiva das pinturas na região. te e nordeste brasileiro (JUSTAMAND, et al. 2017).
Por fim, foi constatado que as figurações normal- Esta tradição é definida por Prous (1992) como
mente se situam na porção basal de paredes inter- sendo composta por grafismos geométricos que so-
nas ou em suas proximidades, cujos painéis situ- brepujam em quantidade os zoomorfos (quase que

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exclusivamente peixes, pássaros, cobras, sáurios e CONCLUSÕES


quelônios) e antropomorfos, perfazendo entre 80 e De acordo com o que foi apresentado nes-
100% das sinalações. Com exceção do Abrigo da se trabalho e expedições anteriores do GREGEO
Reentrância, todos os sítios apresentaram figuras – UnB, a região do município de Natalândia – MG
geométricas ou abstratas em maior quantidade do apresenta alta potencialidade espeleológica, onde
que biomorfos. as feições cársticas como cavernas, abrigos e pa-
Além disso, Baeta (2011) acrescenta que é redões calcáreos alojam ocorrências arqueológicas
notável nesta tradição a ausência da figura de cer- possivelmente relacionadas a Tradição São Fran-
vídeos e mesmo de quadrúpedes e que o uso da cisco.
biocromia é comum e, em alguns casos, a tricomia. Os autores desse trabalho também ressal-
Essa afirmação concorda com os dados levantados tam a ocorrência de feições escavadas, fragmentos
em campo, já que apenas uma representação de de cerâmicas e troncos nas zonas afóticas da Gruta
quadrúpede foi observada em todas as ocorrências dos Meandros e Lapa da Pantera. Essas ocorrên-
visitadas, tornando esse estilo pouco representativo cias possivelmente não são associadas a Tradição
na tradição rupestre da área. São Francisco. Contudo, mais estudos são neces-
sários para melhor compreensão dessas ocorrên-
cias.

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao secretário de
meio ambiente de Natalândia, Leandro Marques,
pela confiança e por toda a ajuda antes e durante o
trabalho de campo. Aos proprietários das fazendas
prospectadas, Sr. Régis e Sr. Emanuel, pela auto-
rização e acolhimento, e aos demais moradores de
Natalândia pela receptividade.
Agradecemos por ceder fotografias para uso
neste trabalho: Beatriz Timótio (Figura 4), Guilher-
me Villanova (Figura 19) e Leda Zogbi (Figura 13).
Também a Fábio Osorio pela confecção do mapa de
Figura 21: Painel com pintura a aproximadamente 5 m
de altura, situado próximo à entrada da Lapa da Pantera. localização (Figura 1).
Como escala: Beatriz Timótio. Por fim agradecemos a parceria da Socieda-
de Brasileira de Espeleologia por apoiar financeira-
Os grafismos em painéis apresentam va- mente o “Projeto Unalândia: Conhecer para Prote-
riações no que se refere aos aspectos estilísticos ger” através do Edital SBE 01/2020.
e quantitativos em cada sítio. Percebe-se que os
abrigos normalmente comportam menos de meia REFERÊNCIAS
dúzia figuras. A quantidade parece aumentar con- BAETA, Alenice Motta. Os grafismos Rupestres e
forme crescem as dimensões da cavidade. A Lapa suas Unidades Estilísticas no Carste de Lagoa San-
da Pantera possui maior dimensão e é o local que ta e Serra do Cipó – MG. 2011. Tese (Doutorado em
apresenta maior quantidade e variedade de grafis- Arqueologia Brasileira) – Museu de Arqueologia e
mos bem como é o único local com presença de Etnologia. Universidade de São Paulo, São Paulo,
gravuras em rocha. A partir desse panorama, parti- 2011.
lha-se da hipótese levantada por Baeta (2011), de
que os abrigos com mais pinturas, como a Lapa da BARBOSA, E,P. Pinturas rupestres em abrigos de
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Ambiental. Brasília: ICMBio, 2019. Cap.3. p. 78-97.
ISBN 978-65-5024-005-9

SOUZA, T.; AULER, A. O Carste de Vazante de Va-


zante-Paracatu-Unaí: Revelando importâncias, re-
comendando refúgios. 1. ed. Belo Horizonte. 2018
XAVIER, L. A. F. Arqueologia do Noroeste Mineiro:
Análise da Indústria Lítica da Bacia do Rio Preto,
Unaí - MG. Museu de Arqueologia e Etnologia, Uni-
versidade de São Paulo. 2007.

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trabalhos Geoespeleologia

Avaliação e caracterização geológica da


Lapa D´Água e suas pérolas gigantes como
um geossítio (Montes Claros, MG, Brasil)
José Adilson Dias Cavalcanti1
Cláudio Maurício Teixeira da Silva2
Carlos Schobbenhaus1
Paulo Rodrigo Simões2
Milton Pereira Filho2
Luciana Vetel Cruz2
Eduardo Gomes de Assis3
Ronaldo Lucrécio Sarmento3

1. Serviço Geológico do Brasil


2. Sociedade Excursionista e Espeleológica
3. Espelogrupo Peter Lund / Instituto Grande Sertão

RESUMO pícia à rotação das estruturas em formação. Pela


A Lapa D´Água é uma das dezenas de ca- abundância, dimensões atípicas e potencial para
vernas que integram o Parque Estadual da Lapa estudos geocronológicos e paleoambientais des-
Grande, no município de Montes Claros, região sas estruturas, propõe-se que a Lapa d’Agua seja
Norte de Minas Gerais. A caverna formou-se nos considerada um geossítio de importância científica
calcários calcíticos da Formação Lagoa do Jacaré, internacional, conforme aplicação do método de
andar médio da sequência Bambuí, depositados avaliação quantitativa estabelecida na plataforma
em uma plataforma dominada por tempestades e GEOSSIT, do Serviço Geológico do Brasil. Segun-
correntes de maré. Ela possui 1.234 metros de de- do o mesmo aplicativo, o geossítio possui ainda po-
senvolvimento em projeção horizontal num padrão tencial uso educacional e turístico, com relevância
linear meandrante de direção NW-SE e 20 metros nacional, e baixo risco de degradação, uma vez que
de desnível total. O piso do salão proximal à en- se encontra em uma unidade de conservação da
trada, nos 70 metros iniciais da caverna, é em boa natureza de proteção integral, sob uso controlado.
parte ocupado por grandes estruturas pisoides co-
nhecidas como pérolas de caverna. Encontram-se Palavras-Chave: carste, pérolas de caverna, geos-
concrecionadas em antigas represas de travertino, sítio, bacia sedimentar do Bambuí.
expostas em sulcos de erosão natural e escava-
ções mais recentes. A gênese das pérolas gigantes ABSTRACT
da Lapa d’Água de Montes Claros não está total- The Lapa D' Água is one of dozens caves
mente desvendada; um modelo genético é proposto of the Lapa Grande State Park, in the municipality
com base em aspectos morfológicos e paleohidroló- of Montes Claros, northern Minas Gerais. The cave
gicos específicos da caverna, pelo qual as pérolas was formed in limestones of the Lagoa do Jacaré
formaram-se com a precipitação de CaCO3 a partir Formation, middle floor of the Bambuí sequence,
de soluções saturadas em bicarbonato, em torno de deposited on a platform dominated by storms and
núcleos de geminação disponíveis dentro das ba- tidal currents. It has 1,234 meters of development in
cias de travertino, em condições de fluxo que pro- horizontal projection in a NW-SE meandering linear

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trabalhos Geoespeleologia

pattern, with 20 meters of depth. The floor of the hall sidera “Bens da União” (SENADO FEDERAL, 2016).
near the entrance, in the first 70 meters of the cave, O grau de relevância de uma caverna pode ser uti-
is largely occupied by large pisoid structures known lizado como um dos critérios para se preservar uma
as cave pearls. They are embedded and concreted caverna. Esse foi estabelecido pela Instrução Nor-
into old travertine dams, and are exposed in natural mativa MMA (Ministério do Meio Ambiente) no 2 de
erosion ridges and more recent excavations. The 30/08/2017, que regulamenta o artigo 5º do decreto
genesis of the giant pearls of Lapa D' Água of Mon- no 6.640/2008 e revoga a Instrução Normativa no
tes Claros is not fully unraveled; a genetic model is 2/2009 (MMA 2017). De acordo com essa instru-
proposed from morphological and paleohydrological ção, uma caverna com grau de relevância máximo
aspects specific to the cave, where the pearls was é aquela que possui pelo menos um dos seguintes
formed by the precipitation of CaCO3 around seeds atributos: 1 - gênese única ou rara; 2 - morfologia
available within the travertine basins, from the satu- única; 3 - dimensões notáveis em extensão, área
rated carbonate solutions under flowing conditions, ou volume; 4 - espeleotemas únicos; 5 - isolamento
that promotes rotation of the forming structures. geográfico; 6 - abrigo essencial para a preservação
Due to the abundance, atypical dimensions and po- de populações geneticamente viáveis de espécies
tential for geochronological and paleoenvironmental animais em risco de extinção, constantes de lis-
studies, it is proposed that Lapa D' Água be consi- tas oficiais; 7 - habitat essencial para preservação
dered a geosite of international scientific importan- de populações geneticamente viáveis de espécies
ce, according to the application of the quantitative de troglóbios endêmicos ou relictos; 8 - habitat de
evaluation method established in the GEOSSIT troglóbio raro; 9 - interações ecológicas únicas; 10
platform, of the Geological Survey of Brazil. Accor- - cavidade testemunho; 11 - destacada relevância
ding to the same application, the geosite also has histórico-cultural ou religiosa.
potential educational and tourist use, with national Ao abordar as cavernas como patrimônio
relevance, and low risk of degradation, since it is lo- geológico, analisamos seu contexto geológico,
cated in a nature conservation unit of full protection, suas características genéticas e geomorfológicas,
under controlled use. seus depósitos químicos (espeleotemas) e clásti-
cos, seu conteúdo fossilífero, e outros. Algumas ca-
Keywords: karst, cave pearls, geoheritage, Bambuí vernas podem se destacar por possuir característi-
Basin. cas singulares, tais como: (1) morfologia (padrão de
desenvolvimento e dimensão); (2) ambiente de for-
1. INTRODUÇÃO mação (por ex. carste fluvial, hipogênico, etc); con-
O Patrimônio geológico integra todos os ele- teúdo de espeleotemas (um tipo específico e raro,
mentos notáveis que constituem a geodiversidade ou dimensão); (3) características micromorfológicas
do nosso planeta (Brilha 2005). São locais chave internas; (4) seus depósitos sedimentares; (5) tipo
para a compreensão da história geológica da Terra de rocha em que se formou; (6) conteúdo fossilífe-
(Brilha 2016). Envolve diversas áreas temáticas que ro; dentre outros elementos (Woo & Kim 2018).
estão relacionadas direta ou indiretamente com a Em Minas Gerais, algumas cavernas foram
geologia (estratigrafia, sedimentologia, petrografia, tombadas pelo IEF (Instituto Estadual de Florestas)
mineralogia, geologia estrutural, metalogenia, pale- e pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conser-
ontologia, geomorfologia, hidrogeologia, espeleolo- vação da Biodiversidade) como monumentos natu-
gia, e outras). Para designar um sítio do patrimônio rais ou compõem parques estaduais e nacionais:
geológico usamos o termo “Geossítio” que descre- Gruta Rei do Mato (Sete Lagoas), Gruta de Maqui-
ve elementos raros ou representativos de situações né (Monumento Natural Peter Lund, Cordisburgo),
ou aspectos geológicos que retratam detalhes da Gruta da Lapinha (Parque Estadual do Sumidouro,
história geológica do nosso planeta (minerais, ro- Lagoa Santa), Gruta Cerca Grande (Parque Es-
chas, fósseis, paisagens etc.), o que nos remete a tadual Cerca Grande, Matozinhos), Lapa Verme-
outro tema, a geoconservação. lha (Pedro Leopoldo), Lapa Nova (Vazante), Lapa
No Brasil, as cavernas são protegidas pela Grande (Parque Estadual da Lapa Grande, Montes
Constituição Federal do Brasil de 1988 que as con- Claros) e Gruta Janelão (Parque Nacional Caver-

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nas do Peruaçú, Januária). Essas cavernas podem As visitas são guiadas por monitores locais que são
ser consideradas geossítios espeleológicos com treinados nas áreas de segurança, meio ambiente
base em seu uso científico, educacional, turístico e e espeleologia. Os roteiros envolvem caminhadas
econômico, já consagrado há décadas. em trilhas para observação da vida selvagem, um
Na avaliação da Lapa D´Água como um mirante e visita às entradas das cavernas, algumas
geossítio espeleológico, o aspecto mais relevante delas são surgências perenes. Ao longo do riacho
são as pérolas que se destacam pelas suas dimen- principal que permeia a área administrativa do par-
sões, consideradas raríssimas e classificadas como que, há uma série de travertinos (tufas calcárias) de
“pérolas gigantes”. A Lapa D'Água (código CANIE rara beleza. As grutas mais visitadas no parque são
MG00429, SBE-MG-118) faz parte de um conjun- a Lapa Grande, que dá nome ao parque; a Lapa
to de dezenas de cavernas atualmente conhecidas do Boqueirão da Nascente, como o próprio nome
no carste de Montes Claros, norte de Minas Gerais indica, trata-se de uma surgência perene de água
(Fig. 1) A região é uma importante área de manan- cristalina; a Lapa Pintada, que possui um grande
ciais que abastece a cidade e também de proteção acervo de pinturas rupestres; e a trilha da Ponte de
de mata nativa, conhecida localmente como “Mata Pedra.
Seca”. Nessa área foi criado o Parque Estadual da Na área onde se encontra a Lapa D´Água, a
Lapa Grande (PELG) com objetivo de proteger essa rocha predominante é o calcário cristalino calcítico,
importante área de vegetação natural, cavernas e de coloração cinza médio escuro, com laminação
mananciais. plano-paralela ondulada, níveis decimétricos de
O PELG possui uma ampla infraestrutura intraclastos e superfícies estilolíticas. Localmente,
(centro de visitantes, área de convivência, sede ad- o calcário apresenta estratificações cruzadas deci-
ministrativa e portaria) e recebe turistas, excursões métricas, laminações do tipo “linsens”, falhas, do-
de escolas e pesquisadores ao longo de todo o ano. bras de arrasto e fraturas.

Figura 1 – Mapa da região onde se localiza a Lapa D´Água, nas proximidades de Montes Claros.

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2. METODOLOGIA cilmente compreendidas pelos estudantes, acesso


A Lapa D´Água é parte da proposta de ge- relativamente fácil e rápido, estão localizados pró-
ossítio no âmbito do projeto "Inventário do Patrimô- ximos a populações com infraestrutura e logística,
nio Geológico do Brasil", desenvolvido pelo Serviço e possui boas condições de observação, o que é
Geológico do Brasil. O projeto utiliza a plataforma essencial para a instrução de estudantes e profes-
GEOSSIT (Rocha et al. 2016) para fazer a avalia- sores em todos os níveis de ensino. Os locais com
ção qualitativa e quantitativa dos geossítios pesqui- potencial para turismo/recreativo/uso cultural são
sados no projeto. O GEOSSIT foi estruturado de aqueles que levam em conta sua excepcional be-
acordo com as metodologias propostas por Brilha leza natural, potencial para atividades recreativas,
(2005) e por Garcia-Cortés & Urquí (2009). A versão coexistência de outros valores naturais cujas carac-
atual utiliza os critérios de avaliação quantitativa, terísticas geológicas podem ser facilmente obser-
apresentados em tabelas de valor científico, poten- vadas e compreendidas por leigos, e fácil acesso
cial uso educacional e turístico, e risco de degra- e estar próximo de populações com infraestrutura
dação, de acordo com a metodologia e conceitos e logística. É importante promover a geologia junto
publicados por Brilha (2016). O objetivo da avalia- ao público leigo, o que pode contribuir para o de-
ção quantitativa é diminuir a subjetividade associa- senvolvimento sustentável das populações locais.
da aos procedimentos de avaliação, especialmente Outro ponto importante é a avaliação do risco de
quando o inventário envolve dezenas ou centenas degradação do local na perspectiva da ocupação
de locais, pois em algum momento será necessário do território em que se encontra o sítio, combinado
decidir em quais geossítios os recursos serão ser com seu valor científico e seu potencial educacio-
utilizados (Brilha 2018). A plataforma está disponí- nal/didático e/ou turístico/recreativo/cultural, estan-
vel no site do Serviço Geológico do Brasil, no ende- do diretamente relacionado com a urgência para
reço https://www.cprm.gob.br/geossit. medidas visando a geoconservação do local.
A proposta metodológica de inventário do Com base nessa metodologia, a identifica-
patrimônio geológico do Brasil é baseada essencial- ção do geossítio passa pelo reconhecimento de sua
mente em critérios científicos, mas outros critérios representatividade, integridade, raridade e também
também são considerados, tais como o potencial do conhecimento científico. A definição considera
para uso educacional e turístico/cultural. Os sítios valores quantitativos resultantes de notas e pesos
geológicos de valor relevante, devido a suas ca- dos diferentes critérios, cujos resultados podem
racterísticas únicas ou representatividade, podem classificar tanto as ocorrências in situ e ex-situ (co-
estar relacionados a uma ou várias disciplinas da leções de museus) como patrimônio geológico. Por
geologia, têm um interesse que lhes confere um va- este método de avaliação, um local de interesse ge-
lor científico, o que permite conhecer, estudar e di- ológico é considerado um “Geossítio” de relevância
vulgar/comunicar questões relacionadas à origem, nacional quando seu valor científico é igual ou su-
evolução e composição da Terra, tais como, os perior a 200 na aplicação dos critérios, tornando-se
processos que a moldaram, os climas e paisagens Geossítio de relevância internacional quando este
do passado e do presente, a origem e evolução da valor científico é superior a 300. Sítios de interesse
vida, razão pela qual precisam ser conservadas. geológico que têm um valor científico inferior a 200
Além do valor científico, um geossítio pode ter um podem, ainda assim, ser recursos importantes para
potencial educacional e/ou de uso turístico/cultural a educação e o turismo, sendo então denominados
(Schobbenhaus 2019, Schobbenhaus et al. 2021). “Sítios da Geodiversidade”. Esses são considera-
De acordo com a metodologia do projeto, os dos de interesse nacional (Sítios da Geodiversida-
geossítios com valor científico são locais que me- de de interesse nacional) quando o potencial uso
lhor representam um determinado material ou pro- educativo e turístico possui valor igual ou superior
cesso geológico, no território brasileiro, que este- a 200. Valores inferiores a 200 caracterizam tais sí-
jam em boas condições de conservação, tendo sido tios da geodiversidade como de importância regio-
objeto de publicações científicas significativas. Os nal ou local.
locais com potencial para uso educacional/didático
têm características geológicas que podem ser fa-

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3. CONTEXTO GEOLÓGICO Segundo Zalán & Romeiro-Silva (2007) as


A região onde se encontra a Lapa D´Água características geométricas da BSB quando ob-
está inserida no contexto da Bacia Sedimentar do servadas nas seções sísmicas, são típicas de uma
Bambuí (BSB), uma das coberturas do Cráton São bacia intracratônica deformada pela tectônica com-
Francisco, próximo ao seu limite leste com a faixa pressional thin-skinned e thick-skinned após a sua
Araçuaí (Fig. 2). A rocha hospedeira da caverna é deposição. Utilizando o conceito de estratigrafia de
um calcário deformado pertencente a formação La- sequências, Reis et al. (2017) classificaram a BSB
goa do Jacaré, do Grupo Bambuí. Essa deformação como uma sequência sedimentar de primeira depo-
está relacionada com a frente de empurrão do oró- sitada no início do Ediacarano, em uma bacia tipo
geno Araçuaí que ocorre a leste de Montes Claros, Foreland, gerada por um evento convergente du-
representada pelos contrafortes da Serra do Espi- rante a formação do Supercontinente Gondwana,
nhaço. A porção deformada das rochas do grupo em resposta à uma sobrecarga litosférica, causada
Bambuí está inserida no Domínio Leste (deforma- pelo soerguimento dos orógenos Brasília e Araçuaí.
do) definido por Alkmim et al. (1993). A BSB possui registro de três megaciclos sedimen-
As rochas da BSB possuem idades entre tares (Dardenne 2000). O primeiro megaciclo com-
550 Ma e 515 Ma e recobrem parcialmente o Cráton posto por sedimentos peliticos-carbonáticos da for-
São Francisco (Paula-Santos et al. 2014, Babinsky mação Sete Lagoas, que é uma sequência do tipo
et al. 2019). No domínio da faixa Araçuaí, próximo a coarsening upward com calcilutito cinza escuro a
Montes Claros, afloram as rochas do grupo Macaú- negro, na base, passando para calcário e dolomito
bas, com idades entre 750 e 667 Ma (Castro et al. no topo. O segundo megaciclo é composto pelos
2020). sedimentos siliciclásticos-carbonáticos: i) da for-

Figura 2 – Localização de Montes Cla-


ros no mapa do Cráton São Francisco
e da Bacia Sedimentar do Bambuí com
os domínios estruturais definidos por
Alkmim et al. 1993 (W - domínio oeste
deformado, C - domínio central não-de-
formado e E - domínio leste deformado.

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mação Serra de Santa Helena que representa uma profundidade, periodicamente sujeita a tempesta-
sedimentação essencialmente pelítica, indicando des; ii) e arcósios depositados em uma plataforma
uma subsidência repentina da bacia; ii) seguido rasa dominada por correntes de tempestades com
pela deposição da formação Lagoa do Jacaré, que fáceis de maré e supramaré da formação Três Ma-
é composta por calcários cinza-escuro depositados rias.
em uma plataforma dominada por tempestades e Na área do PELG, além dos calcários da
correntes de maré. O terceiro megaciclo é forma- formação Lagoa do Jacaré, afloram siltitos, argilitos
do por: sedimentos pelíticos-arenosos da formação e arenitos finos pertencentes à formação Serra da
Serra da Saudade, que representam camadas pelí- Saudade e depósitos elúvio-colúvionares cenozoi-
ticas depositadas em plataforma inclinada de média cos (Fig. 3).

Figura 3 – Mapa geológico e do relevo cárstico simplificado da área onde se localiza a Lapa D´Água, próximo à cidade
de Montes Claros.

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4. PÉROLAS DE CAVERNA Donahue (1969) descreveu dois mecanis-


Dawkins (1874), em seu livro “Cave Hunting: mos que dão origem as pérolas de caverna. O pri-
researches on the evidence of caves, respecting the meiro é a ocorrência de pequenas piscinas com go-
early in habitants of Europe”, utilizou pela primeira tejamento sobre a mesma (splash cup) que produz
vez o termo pérola de caverna. “ In some places, a agitação de grãos submersos, propiciando tanto
where the drip was continuous, and the calcareous a abrasão como a precipitação de CaCO3. No se-
basin which it had built up for itself shallow, small gundo, um ambiente aquoso não agitado associa-
spherical bodies of calcite were so beautifully po- do, por exemplo, a uma represa de travertico com
lished by friction in the agitated water, that they de- concreções, de modo que a precipitação controla a
serve the name of cave-pearls from their lustre.” morfologia dos grãos. Os dois mecanismos geram
Em 1925, o Dr. Willis T. Lee, do Serviço Geológico grãos com estruturas laminadas concêntricas. As
dos Estados Unidos, coletou um número considerá- pérolas formadas em ambientes agitados pelo gote-
vel de oólitos na caverna Carlsbad, no Novo Méxi- jamento são caracterizadas por conter laminações
co. As amostras incluíam pequenas bolas redondas distintas e compactas, possuem núcleo, superfícies
de tamanho considerável, para os utilizou o nome lisas e polidas, além de baixo conteúdo de resíduos
fantasioso de "pérolas da caverna" (Hess 1925). insolúveis, e com crescimento contínuo tendem a
Essas amostras fazem parte do acervo do Museu se aproximar de uma forma esferoidal. As pérolas
Nacional dos Estados Unidos e o seu estudo laçou em ambientes sem agitação geralmente possuem
um luz sobre a formação dos oólitos em geral. A laminações menos definidas e são porosas, care-
primeira descrição dessas pérolas foi apresentada cem de núcleos e possuem superfícies ásperas
por Hess (1925): (rugosas) não polidas, apresentando também alto
“The oolites collected by Mr. Lee range in teor de resíduos insolúveis, crescendo em formas
diameter from one-sixteenth of an inch (1.5 mm.) menos irregulares.
to a little more than an inch (25 to 30 mm.). Most of Hill & Forti (1996) descreveram as pérolas
them are round, some are oval, and some irregu- de caverna como uma concreção com bandamento
lar in shape. Their surfaces vary as much as their concêntrico que se formam em piscinas rasas nas
forms. Some are beautifully polished and opaque, cavernas, com formas esféricas, cilíndricas e irre-
and others, particularly the smaller, are smooth gulares. Elas podem ser grosseiramente cristalinas,
and translucent, resembling little balls of artificially finamente cristalinas ou monocristalinas; porosas,
polished onyx. Some have the texture of bisque, ásperas e sem brilho; lisas, duras e brilhantes; ou
others are much rougher. Though most are white, ter uma superfície semelhante aos corais; e em re-
others have a slight yellowish tint or may be clouded lação a suas dimensões podem variar desde meno-
with yellow.” res do que um grão de areia até 15 cm de diâmetro.
A pérola de caverna é um tipo de espele- Melin & Spilde (2018) descreveram um mo-
otema que ocorre no piso em pequenas piscinas, delo unificado para a formação das pérolas de ca-
desprendidas do substrato, incluindo um amplo es- verna. De acordo com esses autores, os elementos
pectro de formas e estrutura interna. Geralmente necessários para a formação das pérolas são: 1)
possui diâmetro em torno de milímetros a poucos água saturada em CaCO3 (presente na maioria das
centímetros. São também conhecidas como pisoi- cavernas); 2) um detrito ou cristal para atuar como
des e/ou ooides e têm sido descritas na literatura um núcleo; 3) a água deve estar em um piso re-
desde o início do século XX (Hess 1929, Baker & lativamente plano, ou seja, como gotas do teto ou
Frostik 1951, Black 1952, Donahui 1969, Jones & como água que flui lentamente através do piso; 4)
MacDonalds 1989, Hill & Forti 1996, Gradziòski uma piscina rasa, geralmente de 3 a 6 cm de pro-
2001, Silva et al. 2003, Nader 2007, Meldim & Spil- fundidade para permitir a agitação das pérolas; 5)
de 2018). Os pré-requisitos para a sua formação as condições na piscina devem mudar de modo a
são a presença de um núcleo para o crescimento criar camadas diferenciadas nas pérolas; e 6) pro-
do grão, uma solução saturada a supersaturada em dutos químicos ou partículas adicionais podem en-
CaCO3 e água disponível no meio ambiente para o trar com as águas subterrâneas para alimentar um
seu desenvolvimento (Gradziòski 2001). micro organismo comunidade e/ou adicionar argila

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detrítica ou autógena às pérolas das cavernas. A quando o CO2 é removido da solução, sendo um fe-
presença de laminas de argila microbiana e autóge- nômeno comum de cristalização. A supersaturação
na em pérolas de caverna é sugerida pelas cama- é necessária para dar início ao processo de cris-
das escura e/ou rica em matéria orgânica e devem talização (precipitação). As taxas de cristalização
ser cuidadosamente avaliadas para avaliar possí- são controladas por fatores como a concentração
veis origens autógenas e/ou microbianas. de cálcio e a supersaturação, a temperatura e o pH
No processo de formação das pérolas é ne- (Aghajanian et al. 2019). O aumento da temperatu-
cessário levar em consideração fatores, tais como, ra ou do pH da solução leva a aceleração do pro-
temperatura, pH, concentração de CaCO3 e outros. cesso de formação de cristais de CaCO3 (Korchef
Esses fatores vão controlar a dissolução e a preci- & Touaibi 2019).
pitação do CaCO3. A precipitação do CaCO3 ocorre

Figura 4 – a) Contorno da caverna Lapa D´Água com o traço das direções dos condutos em planta; b) Roseta das
direções de condutos extraídas a partir do mapa espeleológico.

5. DESCRIÇÃO DO GEOSSÍTIO assimétricas que ocorrem na caverna e na região


5.1. Lapa D´Água onde se encontra a mesma, sendo perpendicular a
A Lapa D'Água é uma caverna com padrão direção de máxima compressão. As fraturas F2 são
linear meandrante, com perfil horizontal e seções perpendiculares a F1 e a direção de máxima disten-
retangulares, triangulares e irregulares. O seu de- são. As fraturas F3 e F4 são parte de um conjunto
senvolvimento horizontal é de 1.234m, com um de fraturas obliquas de cisalhamento. A interseção
desnível de cerca de 20m (Fig. 4). das fraturas com os planos do acamamento é o que
Com base na interpretação das direções dos define o desenvolvimento da caverna. A caverna
condutos que são controlados por fraturas, o pa- possui muitos espeleotemas entre os quais foram
drão de desenvolvimento da caverna é condiciona- descritos estalactites, estalagmites, cortinas, cas-
do principalmente pelas fraturas F1 (NNE-SSW), F2 catas, travertinos e pérolas gigantes (Silva et al.
(WNW-ESE) e também pelo acamamento So (Fig. 2003).
4). A fratura F1 coincide com os eixos das dobras Uma das entradas da Lapa D’Água é um su-

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midouro do Córrego São Marcos, que segue subter- As pérolas estão associadas às represas de
râneo por trecho ainda não mapeado devido ao fato travertinos recobertas por coraloides relacionadas
de se manter inundado na maior parte do ano. No com um fluxo aquoso de norte para sul (Fig. 5). As
interior da caverna observam-se trechos de curso pérolas aumentam de tamanho a partir das late-
d’água perene com sifonamento ao final do segun- rais das bacias conforme demonstram as medidas
do nível, compondo um complexo sistema hídrico, feitas em dois perfis realizados no salão. Em uma
ainda não compreendido plenamente (Barbosa et seção de 13 metros de comprimento no sentido les-
al. 2015). te-oeste, o diâmetro das pérolas diminuem de 15
cm para até 3cm no centro da bacia, e voltam a
5.2. Pérolas Gigantes da Lapa D´Água aumentar de dimensão atingindo 4,7cm na borda
As pérolas gigantes da Lapa D'Água encon- oeste (Fig. 7a). Em outra seção, com 7 metros de
tram-se no salão de entrada, o qual se desenvolve comprimento no sentido leste-oeste, as pérolas co-
na direção NW-SE e possui cerca de 70m de de- meçam com um diâmetro de 17,8cm e diminuem
senvolvimento horizontal por 20m de largura e altu- continuamente, atingindo 4,3cm em média, até os
ra máxima de 5m (Fig. 5). As pérolas recobrem boa primeiros 5 metros da seção, e depois chegam a
parte do piso e muitas foram expostas por escava- 7,5cm de diâmetro médio na borda oeste da bacia
ções de exploração de salitre. Possuem diâmetros (Fig. 7b). O diâmetro das pérolas também aumenta
centimétricos, foram medidas pérolas com diâmetro da base para o topo ao longo dos perfis. A parede
de até 27cm (Fig. 6) e já foram observadas pérolas oeste do salão também se encontra recoberta por
com até 32cm (José A.B. Scaleante, comunicação grandes represas de travertinos com cerca de 10
verbal). Devido a essas dimensões extraordinárias, metros de comprimento por 2,6 metros de altura,
foram consideradas “gigantes” por Lino (2001). denotando um fluxo aquoso de oeste para leste.

Figura 5 – Detalhe do
salão onde foram iden-
tificadas as pérolas
gigantes. Recorte do
mapa espeleológico da
Lapa D´Água (Espe-
leogrupo Peter Lund,
2015).

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de cálcio secundário (Fig. 8b, c). As camadas mais


claras são translúcidas e mais puras, composta
principalmente por carbonato de cálcio. As cama-
das mais avermelhadas são carbonáticas e ricas
em material argiloso, supostamente presente em
suspensão durante a deposição dos carbonatos.
Essas mudanças na composição das camadas po-
dem estar relacionadas com a sazonalidade da pre-
cipitação dos carbonatos na caverna, influenciada
pela dinâmica de diferentes fontes hídricas e apor-
tes detríticos em função em função de condições
climáticas. Nas estações secas, predomina a água
límpida originada da circulação de aquíferos pro-
fundos. Já, as camadas avermelhadas, com grande
contribuição de argila estariam relacionadas com as
estações chuvosas ou a aportes detríticos relacio-
nados com chuvas torrenciais, onde haveria contri-
buição de águas pluviais carregadas de sedimento
e também das aguas de origem profunda.
Silva et al. (2003) propuseram a seguinte hi-
Figura 6 – Fotografias das pérolas gigantes localizadas
próximas à entrada do Salão da lapa D´Água (Fotos de pótese para a gênese das pérolas gigantes da Lapa
Eduardo Gomes). D´Água:
Fase 1: Formação de uma piscina ou bacia natural
As Datações U-Th realizadas pelo pesqui-
no piso do salão com uma lâmina d'água em torno
sador Nikolás Stríkis (comunicação verbal) em
de 1m de profundidade, demonstrado pela altura da
amostras das pérolas da Lapa D´Água resultaram
represa na extremidade sul do salão e pelos níveis
na idade de 102 mil anos. Essas pérolas possuem
de coraloides na parede leste do salão.
estrutura concêntrica com camadas paralelas a
Fase 2: Um fluxo aquoso laminar “secundário” mo-
subparalelas, com diferentes tonalidades. Algumas
vendo-se na direção oeste-leste conforme a confi-
porções das camadas possuem aspecto botrioidal
guração de travertinos na parede oeste do salão,
(Fig. 8). Entre algumas camadas observam-se po-
começa a turbilhonar fragmentos e pequenos sei-
ros (buracos), às vezes preenchidos por carbonato

Figura 7 - Gráficos com os diâmetros médios das pérolas versus distância em relação as bordas e a porção central
das bacias de travertinos.

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xos presentes ao fundo da bacia principal (eixo cen-


tral do salão).
Fase 3: com o crescimento das represas de traver-
tinos na parte oeste do salão, o fluxo laminar lateral
produz uma pequena corrente ao fundo da bacia
principal, alcançando a parede leste do salão pro-
duzindo refluxos. Esse fluxo e refluxo de solução
saturada de CaCO3 foi o agente de rotação contí-
nua das “núcleos de geminação” e da precipitação
de camadas sucessivas concêntricas de CaCO3,
gerando as pérolas.
Fase 4: A represa da extremidade sul rompe-se e a
piscina é esvaziada. O material carbonático lamo-
so precipita-se sobre e entre as pérolas concrecio-
nando-as parcialmente. O fluxo aquoso passa a ter
ação erosiva e um canal central expõe seções de
pérolas.
Fase 5: O nível freático é rebaixado, o fluxo aban-
dona o canal da caverna e forma o atual sumidouro
do Ribeirão São Marcos, 15 metros abaixo do anti-
go nível e recuado cerca de 50 metros em direção
NW. Este fluxo reaparece no nível inferior da caver-
na, sendo esta a atual configuração da cavidade.

6. AVALIAÇÃO QUALITATIVA E QUANTITATIVA Figura 8 – a) Seção de uma pérola da Lapa d´Água, mos-
DO GEOSSÍTIO trando as várias fases de crescimento; b) e c) detalhes
da estrutura concêntrica da pérola mostrando a diferença
As cavernas possuem um conjunto de ele- entre as camadas mais puras e aquelas ricas em material
mentos bióticos, paleoclimáticos, paleontológicos e argiloso (Foto cedida por Nikolás Strikis).
geológicos muitas vezes atípicos, o que justifica en-
quadrá-las com patrimônio natural (Lobo & Boggia- ou áreas de excepcional beleza natural e importân-
ne 2013). A lista de patrimônios naturais mundiais cia estética; ii) ser exemplo notável, representando
da UNESCO inclui cavernas e áreas cársticas es- as principais etapas de história da Terra, incluindo o
palhadas pelo mundo. A entidade estabeleceu uma registro de vida, significativo processos geológicos
série de critérios para a elaboração dessa lista. No no desenvolvimento de feições geomorfológicas
Brasil, o Cânion do Rio Peruaçu, por exemplo, é um significativas; iii) ser exemplo notável representan-
forte candidato a integrar essa lista do patrimônio do processos ecológicos e biológicos significativos
natural mundial. É considerado o mais longo cânion em andamento da evolução e desenvolvimento da
fluvial cárstico de colapso do mundo, com enormes água doce terrestre, ecossistemas costeiros e mari-
dolinas de abatimento, pontes naturais, espeleote- nhos e comunidades de plantas e animais; iv) con-
mas excepcionais, nascentes e pinturas rupestres ter plantas e animais naturais mais importantes e
da ocupação humana em torno de 12.000 anos significativos habitats para a conservação in-situ da
(Willians 2008). O Cânion do Rio Peruaçú é consi- biodiversidade diversidade, incluindo as que con-
derado um carste desenvolvido em ambiente conti- têm ameaças espécies de valor universal excep-
nental tropical árido, em uma floresta xerófita decí- cional a partir do ponto de visão da ciência ou da
dua (Willians 2008). Os critérios que deram suporte conservação (UNESCO 2008).
à inclusão do vale do Peruaçu na “Lista Tentativa” Existem poucos estudos sobre o enquadra-
(ou propositiva) do patrimônio mundial: i) conter fe- mento de cavernas como geossítios espeleológicos.
nômenos naturais superlativos Dois estudos sobre cavernas na Corea do Sul e na

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Malásia são apresentados a seguir. Esses estudos mento cultural; d) caverna sem proteção. Dentro
fizeram uma adaptação e aplicação dos conceitos dessa classificação foram utilizados os seguintes
de geossítios para a área específica da espeleolo- critérios: dimensão da caverna, tipologia dos espe-
gia. leotemas, características morfológicas, presença
Woo & Kim (2018) realizaram a avaliação de depósitos sedimentares clásticos, minerais for-
qualitativa das cavernas da Corea do Sul, utilizan- mados na caverna, presença de água e organismos
do a seguinte classificação: a) monumento natural vivos, exposição de fósseis e a presença de passa-
nacional; b) monumento natural estadual; c) monu- gens submersas (Tabela 1).

Tabela 1 – Critérios geológicos adotados por Woo & Kim (2018) na avaliação de geossítios espeleológicos. O item para
cada um dos critérios geológicos é avaliado e pontuado de A (o mais alto) a E (o mais baixo).

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Tabela 2a – Avaliação quantitativa com base nos critérios estabelecidos no GEOSSIT.

Suleiman et al. 2020 estudaram três caver- nais. Também fizeram uma classificação com base
nas da Malaysia e com base nos conceitos de Brocx em Brocx & Semeniuk (2007) em níveis de signifi-
& Semeniuk (2007) e Predrag & Mirela (2010), clas- cância internacional, nacional, regional e local. Na
sificaram as cavernas em relação a sua geodiversi- avaliação quantitativa utilizaram uma classificação
dade, escala e área de interesse. Também fizeram numérica discreta, em uma escala de seis valores:
uma avaliação qualitativa e quantitativa baseado 0 = nenhum; 1 = muito ruim; 2 = ruim; 3 = justo; 4
nos conceitos de Gray (2005), Gray (2013) e Kir- = bom; e 5 = muito bom. Esses valores foram usa-
chner & Kubalikova (2011). Na avaliação qualitativa dos para quantificar a importância em relação aos
utilizaram, prioritariamente, os valores científicos valores científico e educacional, estético, recreati-
e educacionais, e secundariamente, valores esté- vo, cultural e histórico, econômico, e funcional. Os
ticos, recreativos, culturais, econômicos e funcio- autores destacaram que essa avaliação pode servir

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Tabela 2b – Avaliação quantitativa com base nos critérios estabelecidos no GEOSSIT.

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como ferramenta para a geoconservação e gestão Pérolas gigantes são casos raros na literatu-
dos geossítios. ra espeleológica. Foi encontrada apenas uma única
A avaliação qualitativa e quantitativa da citação de pérolas de 20cm de diâmetro na caverna
Lapa D´Água foi realizada na plataforma GEOS- de Tham Nam Thieng em Khammouan, na Tailândia
SIT, do Serviço Geológico do Brasil. A plataforma (Gunn 2004), mas nenhum estudo específico sobre
destina-se ao inventário, qualificação e avaliação os processos envolvidos na sua formação. As ra-
quantitativa de geossítios e sítios da geodiversida- ras pérolas gigantes da Lapa D´Água são inegavel-
de. Foi estruturado de acordo com as metodologias mente especiais, havendo pouquíssimos relatos de
propostas por Brilha (2005) e Garcia-Cortés & Urquí ocorrências de pérolas com dimensões similares,
(2009). Atualmente, a aplicação começou a adotar no mundo. Além da sua raridade, como resultado
a metodologia e conceitos de Brilha (2016, 2018), de processo genético único, e da sua beleza natu-
com adaptações que modificaram alguns critérios ral, há também uma relevância científica relaciona-
de avaliação quantitativa que são apresentados em da ao potencial para reconstrução de parte da his-
tabelas que atestam o valor científico, o uso po- tória climática dos últimos 100.000 anos do nosso
tencial educacional e turístico e também o risco de planeta. E lacunas de conhecimento em torno do
degradação (Schobbenhaus & Berbert-Born, em: mecanismo de desenvolvimento de estruturas de
http://cprm.gov.br/geossit). grande porte, e de fenômenos hidroclimáticos atu-
A representatividade científica do sítio foi antes na região ao longo do tempo.
avaliada considerando-se como contexto de análise A caverna foi classificada como um geossí-
(“framework”) o domínio geológico regional em que tio, por ser a única caverna na região que possui
está localizado. Neste caso, consideramos o domí- pérolas gigantes, podendo se tratar de um caso
nio da Bacia Sedimentar do Bambuí, a maior pro- raríssimo no Brasil. Essas pérolas podem conter
víncia espeleológica do Brasil (Rubbioli et al. 2019). importantes informações sobre o paleoclima que
Nessa condição, a relevância científica foi classifi- atuou nessa região do Brasil.
cada como internacional, atribuindo-se o valor de
345 na quantificação dos critérios. Em relação ao REFERÊNCIAS
potencial uso educacional, foi classificada como de AGHAJANIAN, S.; NIEMINEN, H.; KOIRANEN, T.
relevância nacional, com os critérios atribuindo um Precipitation of calcium carbonate in highly alkali-
valor de 295. Em relação ao potencial uso turístico, ne solution through carbonated water. European
foi classificada como de relevância nacional, com Union’s Horizon 2020 research and innovation pro-
valor de 280. Já em relação aos riscos de degrada- gramme. 2019.
ção, foi considerada de baixo risco, tendo em vista
o valor de 195 da quantificação dos critérios espe- ALKMIM, F.F.; BRITO NEVES, B.B.; CASTRO AL-
cíficos de risco (Tabela 2). VES, J.A. Arcabouço Tectônico do Cráton do São
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A seleção de critérios que determinam que Bras. Geol., Núcleo Bahia/Sergipe, Salvador, 45-
uma caverna se destaca em relação às muitas ou- 62. 1993.
tras não é difícil, A raridade de aspectos geocientí-
ficos, ou a sua representativadade para o conheci- BABINSKI, M.; PEDREIRA, A.J.; BRITO NEVES,
mento da história geológica do planeta retratada no B.B.; VAN SCHMUS, W.R. Contribuição à geocro-
país, são critérios categóricos para a geoconserva- nologia da Chapada Diamantina. In: Pedreira, A.J.
ção; o potencial uso como instrumento de educação (Ed.), VII Simpósio Nacional de Estudos Tectônicos.
e turismo também são importantes. Mas há locais Sociedade Brasileira de Geologia, 118-120. 1999.
que são tão especiais que não comportam o uso
contínuo, ou requerem manejo extremamente rigo- BAKER. G.; FROSTICK, A.C. Pisoliths, ooliths and
roso ou restrito, devido às suas fragilidades como calcareous growths in limestone caves at Port Cam-
ecossistema. pbell, Victoria, Australia. Journal of Sedimentary

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Procesos espeleogenéticos y
sistematica de la Caverna de
la Patana, municipio Maisí,
Guantánamo, Cuba.
Efrén José Jaimez Salgado 1
Divaldo Antonio Gutiérrez Calvache2

1. Instituto de Geofísica y Astronomía, CITMA y Sociedad Espeleológica de Cuba


2. Sociedad Espeleológica de Cuba

RESUMEN ABSTRACT
Se presentan los resultados del estudio ge- The results of genetic study and Systematic
nético y sistemática de la caverna de la Patana, of Patana cavern, formed by two indirect and hori-
formada por dos niveles de cavernamiento horizon- zontal caverns levels, and the named ‘Superior Gal-
tales, indirectos, y una “Galería Superior” de trayec- lery’ with strongly sloping trajectory as occasional
toria fuertemente inclinada, la cual funciona como recharge and inverse origin form, are presented. Pa-
forma ocasional de recarga de origen inverso. La tana cavern is not a spelunk purely phreatic genetic
caverna de la Patana no es ni una espelunca de type, and either, an old “cavern of exit” at internal
tipo genético puramente freática, ni una antigua “ca- boundary on the emerged third level of marine ter-
verna de salida” al borde interno del tercer nivel de race in Maisí karstic tablet, as other authors pointed.
terraza marina emergida de la meseta kárstica de In fact, Patana cavern is a karstic cavity technically
Maisí, como apuntan otros autores. La caverna de classified as “piezogena” type. It was formed under
la Patana es una cavidad kárstica que puede ser confined or semiconfined circulation regimen of the
técnicamente clasificada como del tipo “piezogena” underground waters and could be included inside
formada bajo régimen de circulación confinado o the “parapiezogenas” cave subtypes (meaning so-
semiconfinado de las aguas subterráneas, pudien- mething similar but different at the same time, res-
do enmarcarse a su vez, dentro del subtipo de cue- pect to other cavities from this genetic type).
vas parapiezogenas (de lo que es semejante, pero
a la vez diferente respecto a otras cavidades de Kay words: indirect cave, inverse, phreatic, piezo-
este tipo genético). gena

Palabras clave: cuevas indirectas, inverso, freática,


piezogena

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INTRODUCCIÓN Ovando, en las coordenadas Lambert X-775,200;


La caverna de la Patana es conocida en el Y-169,500 (Cuba Sur), pudiendo ser localizada con
ámbito académico cubano, desde 1915, año en el esta georreferencia en la hoja topográfica 5376-II,
cual el arqueólogo norteamericano Mark R. Harring- del Mapa de Cuba a escala 1:50 000, en el Munici-
ton la explorara parcialmente, descubriendo en ella pio Maisí, provincia de Guantánamo, Cuba (Fig. 1)
un importante conjunto de petroglifos aborígenes
pertenecientes a los grupos ceramistas del pasado
precolonial cubano (Harrington, 1921). Este hecho,
junto al despojo de algunos de los petroglifos reali-
zado por Harrington, al cortarlos de su ubicación en
la cueva y llevárselos vía marítima para los Estados
Unidos, donde aún se encuentran en el Cultural Re-
sources Center del National Museum of the Ameri-
can Indians, ubicado en el Estado de Maryland, la
notoriedad de esta espelunca por los hechos ante-
riores, ha favorecido de alguna forma que no pocos
espeleólogos, carsólogos, arqueólogos, etc., hayan
realizado investigaciones en la misma desde princi-
pios del siglo XX, hasta la actualidad.
En Septiembre de 1990, miembros del grupo
Pedro Borrás de la Sociedad Espeleológica de Cuba
realizaron una visita de siete días a la caverna de
la Patana, cercana al desaparecido barrio o caserío
de Patana Abajo, con el objetivo central de realizar
un estudio espeleogenético de la espelunca. Esta
cueva había sido estudiada antes desde el punto
de vista genético, por el padre de la Espeleología
cubana, Dr. Antonio Núñez Jiménez, quien en 1967,
Figura. 1. Ubicación geográfica de la caverna de la Patana
y posteriormente en 1984, la propuso como repre- (símbolo circular fuera de escala), en el borde interior de
sentativa de un subtipo genético dentro de las cue- la tercera terraza marina emergida del carso de meseta de
vas del tipo freáticas en Cuba. Sin embargo, años Maisí, provincia de Guantánamo, Cuba (Fuente: platafor-
más tarde Panos (1988), consideró que la caverna ma de un SIG, adaptado por los autores).
de la Patana no era de origen freático, sino una cue-
va fluvial antigua “de salida”, lo que inevitablemente BREVE CARACTERIZACIÓN
despertó el interés de los autores, en aras de inten- FÍSICO - GEOGRÁFICA
tar esclarecer tal dicotomía. Por otra parte (y esto La caverna de la Patana se abre, según da-
es lo más importante), por esas mismas fechas, tos calibrados del Modelo de Elevación Digital del
también los autores se encontraban imbuidos en la terreno (DEM, a 20 m de resolución sobre platafor-
preparación de una nueva clasificación genética de ma SIG), a unos 85 metros de altura sobre el nivel
las cuevas de Cuba, por lo que “el caso Patana” medio del mar, en la base de un cliff de marea fósil,
ante esta inesperada “Paradoja Panos - Núñez”, del borde interno del tercer nivel de terraza marina
debería ser definitivamente resuelta. emergida, del espectacular relieve escalonado de
la Meseta de Maisí, caracterizada por una impre-
UBICACIÓN GEOGRÁFICA sionante sucesión de terrazas que según Núñez
La caverna de la Patana, se encuentra ubi- (1967), ascienden hasta los 400 metros sobre el
cada en las proximidades del antiguo caserío de Pa- nivel del mar. Mediante la interpretación del DEM y
tana Abajo (actualmente inexistente) a unos 1,3 km de imágenes satelitales, es posible identificar hasta
al norte de la línea costera del sur de la Meseta de unos 17 niveles de terrazas, hora en forma estre-
Maisí, a unos 3,7 km al nordeste de la boca del río chos listones, hora formando amplias plataformas

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abrasivas de diferente edad y altura absoluta, solo hidrográfica casi inexistente, solo representada por
superada por la homóloga Meseta de Cabo Cruz, algunos talwegs colgados y truncados, al ser los
en la provincia de Granma. Numerosos autores que eventuales cauces interceptados por formas kárs-
han estudiado el carso aterrazado de meseta de ticas absorbentes. En las terrazas más bajas (pri-
las regiones de Maisí y de Cabo Cruz, coinciden mer y segundo nivel), se hallan ocasionales dolinas
en que su origen es una consecuencia combinada inundadas (lagunas kársticas), como en el caso de
del modelaje abrasivo (marino) y el prolongado le- la cueva de Pozo Azul, de notable atractivo turístico
vantamiento neotectónico de estas estructuras del local, para el buceo en cavernas (Fig. 2).
neoautóctono del oriente cubano (Acevedo, 1982;
Liliemberg, 1983; Hernández, 1987; Iturralde-Vi- ESPELEOLOGÍA (ESPELEOGRAFÍA, ESPELE-
OMORFOLOGÍA, Y GÉNESIS DE LA CAVERNA
nent, 1988).
DE LA PATANA).
Según Núñez (1967) la caverna de la Patana
está formada por tres niveles de cavernamiento: i)
el inferior, llamado cueva de los Bichos, ubicado al
mismo nivel hipsométrico que la terraza de Patana
Abajo (85 m, según los autores de este artículo), ii)
el nivel intermedio denominado cueva del Jagüey,
cuyo piso de cavernamiento se encuentra aproxi-
madamente a unos 10 m, por encima del anterior y
finalmente, iii) un tercero denominado “galería su-
perior” la que con morfología en plano inclinado en
una parte, y verticalmente en la otra, se abre sobre
las anteriores. Sin embargo, esta “Galería Supe-
rior” de unos 90 m de largo en forma de plano muy
Figura 2. Pozo Azul, gran dolina de disolución – desplome
inundada, cerca de la caverna de la Patana. inclinado, siguiendo el buzamiento de los estratos
(Foto: Daniel Torres Etayo) de 11° de buzamiento al Sur–Sureste, con una chi-
La caverna de la Patana, ha sido abierta en menea vertical de gran altura que sale al exterior,
una geología de rocas calizas miocénicas arrecifa- en opinión de los autores de este artículo, no debe
les, presumiblemente de la Formación Río Maya, considerarse como un tercer nivel de cavernamien-
con suelos rendziniformes del tipo y subtipo Ren- to de la caverna de la Patana, por cuanto su desar-
dzina Roja, pedregosos, poco profundos, muy car- rollo no es horizontal superpuesto, por lo que en
bonatadas (Instituto de Suelos, 1999), cuya siste- todo caso, éste sector de la propia caverna no es
mática edafológica dentro del sistema taxonómico sino, una forma inversa de disolución y un conducto
utilizado por la FAO (World Reference Base, 2003), absorbente que aporta caudal autóctono a este sis-
se correlaciona con el grupo y subgrupo Leptosol tema kárstico. En este sentido, Núñez (1967: p.190)
rendsico, con pocas aptitudes desde el punto de dice textualmente: “En cuanto a la Galería Superior
vista agroproductivo. Sin embargo, puede decirse parece de origen vadoso, pues como ya señalamos
que estos suelos constituyen en cambio, el siste- no presenta un nivel horizontal, sino muy inclinado,
ma soporte de importantes ecosistemas terrestres indicándonos que las aguas de infiltración, pasan-
existentes en esta zona kárstica, como parte del do a través de los estratos calizos, pudieron haber
matorral xeromorfo costero y el matorral semide- disuelto dicha galería siguiendo la inclinación estra-
sértico, con abundancia de suculentas, algunas de tigráfica, lo que no sucede en las galerías horizon-
ellas endémicas regionales. El clima local puede tales donde su desarrollo estaba controlado no por
clasificarse como tropical semidesértico (Barranco la estratigrafía sino por el nivel freático”, afirmación
y Díaz, 1989), con precipitaciones medias inferiores esta, que apoya el punto de vista aquí defendido
a los 800 mm anuales y altas temperaturas durante por los autores.
todo el año (con coeficiente hidrotérmico superior a Desde el punto de vista espeleomorfológico,
1,5). El drenaje superficial es muy escaso y la red las cueva de los Bichos y la cueva Borrás (o de

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trabalhos Geoespeleologia

Mylodon) de la caverna de la Patana, muestran una no necesariamente freático desde el punto de vista
amplia galería poco sinuosa, seguida de amplios y estricto y gena, del latín engendro o génesis (pro-
no muy altos salones, con secciones marcadamen- puesto por Jaimez y Gutiérrez, 1993; 2000; 2010).
te lobuladas a ambos lados del arco de la bóve- Esta propuesta resuelve el caso Patana, sin tener
da (Fig. 3 y 4), predominando en ella los procesos en cuenta si el régimen y paleorégimen hídrico sub-
destructivos (tanto por gliptogénesis como por pro- terráneo de la zona saturada es o no, de circulación
cesos clásticos), sobre los procesos acumulativos libre o confinado. Por otra parte, la total ausencia
– reconstructivos, lo cual parece estar íntimamen- de flutes o scallops (ondas de erosión fluvial) en la
te relacionado con las abundantes deyecciones de morfología parietal de las cuevas de los Bichos y
guano de murciélago y otros desechos de su meta- del Jagüey, así como de cantos o cascajos en los
bolismo, altamente favorables a los procesos bio- sedimentos fósiles, estudiados debajo de los pa-
genéticos de disolución y redisolución de espeleo- quetes de sinter carbonatado de ambas cuevas del
temas y formaciones estructurales. sistema de Patana, descartan de manera absoluta,
el carácter de “antiguas cuevas de salida” sugerido
por Panos (1988), al tiempo que predominan aquí,
amplios salones de planta casi circular y secciones
transversales lobuladas (Ver Fig. 2), morfología
propia de los procesos a nivel piezométrico (cuevas
tipo piezogenas).
En términos generales, la caverna de la
Patana por haber sido abierta en un carso costero
de meseta con una fuerte componente positiva de
reactivación neotectónica, desde el período Plioce-
no (N2), hasta el Actual, claramente reflejada ésta,
en el escalonado de hasta 17 niveles de terrazas
Figura. 3. Salón del Gran Cemí de la caverna de la Pa-
tana, mostrando secciones lobuladas, típicas de cuevas emergidas, con fuertes pendientes en sus acanti-
piezogenas. (Foto: Divaldo Gutiérrez Calvache) lados fósiles y marcadas flexuras y combaduras de
Desde el punto de vista genético, Núñez los estratos calcáreos (con reporte de buzamiento
(1967) plantea que, “la coincidencia de nivel entre de hasta 20° al SE, en la galería de las Cucara-
el piso de la cueva de los Bichos y el plano de la chas de la cueva de los Bichos; Jaimez et al., 1990),
terraza marina de La Patana, parece indicar que la puede decirse que la misma se ubica dentro de las
cueva se originó cuando el nivel freático estaba casi cavidades kársticas del grupo subtectónicas (del
al mismo nivel que el nivel del mar pues éste servía latín sub: por debajo de las más tectónicas, debi-
de nivel de base a la disolución kárstica subterrá- do al papel condicionante de la fuerte reactivación
nea, tal como ocurre al pie de las terrazas costeras neotectónica y el papel mayor de los estratos sobre
actuales”. las diaclasas y fallas geológicas como soluciones
Sin embargo, en opinión de los autores de de continuidad), del subgrupo eusubtectónicas (que
este artículo, este es un hecho que no se puede significa buenas subtectónicas), tipo piezogenas
generalizar para todo el carso costero de Cuba y (ya antes explícito), subtipo parapiezogenas, del
por otro lado, la clasificación del subtipo genético griego para, que significa lo que es semejante, pero
La Patana, como cueva de tipo freática (Núñez et al mismo tiempo diferente del resto de las cuevas
al., 1984) es cuestionable, desde el punto de vis- de su tipo (Jaimez y Gutiérrez, 1993, 2000, 2010),
ta del régimen de circulación forzado de las aguas encontrándose actualmente en el comienzo de una
de la zona saturada en esta clase de rocas calizas fase o etapa senil de su evolución genética (paleo-
relativamente compactas, razón por la que los au- parapiezogena).
tores han propuesto redefinir este tipo genético de El subtipo genético “parapiezogena”, es apli-
cuevas, como “piezogenas” (del griego piezo, que cable al caso de estudio de la caverna de la Pata-
significa comprimir; propio del nivel piezométrico, na, Maisí, Guantánamo, así como a otras cavidades

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trabalhos Geoespeleologia

Figura 4. Plano del nivel inferior de la caverna de la Patana, según Gutiérrez Calvache y Álvarez, 2014.

morfogenéticamente similares del carso litoral y de Gran Caverna de Santa Catalina, Quinto, Flo-
terrazas marinas emergidas de toda Cuba (Ejem- rencio, y otras, en la provincia de Matanzas
plos: cuevas del Vaho, de los Murciélagos, de Don • Se diferencia del subtipo “piezoreogena” porque
Martín y otras de la zona cársica costera de Boca en el caso de Patana, no existe evidencia mor-
de Jaruco, municipio de Santa Cruz del Norte, pro- fológica o sedimentológica alguna de alguna
vincia de Mayabeque, al este de la capital cubana. A etapa de reinundación fluvial, después de for-
este mismo tipo y subtipo genético pertenece a jui- mada la caverna piezogena, como son los ca-
cio de los autores, la legendaria Cueva de Bellamar, sos por ejemplo, de cueva Clarita y de la cueva
en la costa norte de la provincia de Matanzas, etc). de la Pluma, ambas en la provincia de Matanzas
Se diferencia claramente de otros subtipos dentro • Se diferencia del subtipo “piezoabrasivas” (o
del tipo de cuevas piezogenas, en los siguientes as- “piezoabrasivogenas”) como en las cuevas No.
pectos: 1 y No. 2 de Punta del Este, al sur de la Isla de
la Juventud, en que aquellas son grutas marinas
• Se diferencia del subtipo “eupiezogena” en que con secciones lobuladas en salones interiores,
aquellas están formadas por pequeños cenotes evidentemente formadas primero en el nivel pie-
inundados o parcialmente inundados, de planta zométrico y abiertas al mar posteriormente, por
circular o semicircular efectos del oleaje.
• Se diferencia del subtipo “ortopiezogena” en que • Se diferencia del subtipo “hiperpiezogena” (del
no existe una red ortogonal de diaclasas que griego hiper: mucho, muy piezogena) en la pre-
confieran una morfología enrejada y laberíntica sencia de amplias formas inversas de disolución
del plano (vista en planta), como los casos de la (campanas, domos, chimeneas, husos) comple-

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trabalhos Geoespeleologia

tamente ausentes en el subtipo hiperpiezoge- de cavidades subtectónicas, subgrupo eusubtec-


nas (Jaimez et al., 2014). tónicas (buenas subtectónicas), referente al papel
• Se diferencia finalmente del subtipo “hetero- de los estratos como soluciones de continuidad y
piezogenas” (del griego hetero, que significa al papel combinado de la fuerte reactivación neo-
diferentes), en que estas últimas espeluncas, tectónica del paquete carbonatado en que ha sido
propias de Punta Caguanes y de los “Cayos de formada.
Piedra” de la cayería norte de Sancti – Spíritus,
Cuba, no aparentan obedecer a ningún patrón RECOMENDACIONES
estructural claramente visible (este patrón exis- Ampliar este estudio a cuevas y sistemas de
te, pero está enmascarado), dando lugar a fases cuevas similares posiblemente existentes en esta
evolutivas muy laberínticas, fuertemente isotró- región kárstica y otras del Oriente de Cuba y de paí-
picas, sin diaclasas actualmente identificables, ses vecinos, con relieves y tipos de carso similares.
y con la presencia ocasional de estratos cruza-
dos, no concordantes con las secciones trans- REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
versales de los salones en que estos aparecen. Acevedo, M. 1982. Geografía Física de Cuba. Edi-
torial Pueblo y Educación, Tomo 1. La Habana: 313
Por último, desde el punto de vista hidroge- p.
ológico, puede decirse que la caverna de la Patana
parece haber sido una cavidad mixta (con rasgos Barranco, G.; L. R. Díaz (1989). Mapa de regiona-
comunes de morfología indirecta e inversa a la vez, lización climática y tipos de climas, escala 1: 10
en distintos sectores subterráneos), de caudal pre- 000000. En Nuevo Atlas Nacional de Cuba (Vol.
ferentemente autóctono, de acuerdo con la tipología VI.1.2): Instituto de Geografía, Academia de Cien-
de Molerio (1975), encontrándose en la actualidad, cias de Cuba. La Habana: 52 p.
hidrogeológicamente muerta (o inactiva).
Harrington, R. 1921. Cuba before Columbus. Mu-
CONCLUSIONES seum of the American Indian, Heye Foundation, 2
La caverna de la Patana está formada por vols, Nueva York: 662 p.
dos niveles de cavernamiento horizontales, indirec-
tos, y una “Galería Superior” de trayectoria fuerte- Hernández, J. R. 1987. Geomorfología estructural y
mente inclinada, la cual funciona como forma oca- geodinámica reciente del relieve de Cuba sudeste.
sional de recarga (de origen inverso) 162 p. Tesis (Doctorado en Ciencias Geográficas)
La caverna de la Patana no es ni una espe- Instituto de Geeografia, Universidad de Moscú.
lunca de tipo genético puramente freática, ni una Instituto de Suelos. 1999. Nueva Versión de Clasi-
antigua “caverna de salida” (fluvial), al borde interno ficación Genética de los Suelos de Cuba (colectivo
del tercer nivel de terraza marina emergida, como de autores). Edit. AGRINFOR. Ministerio de la Agri-
apuntan otros autores citados en este artículo cultura. La Habana: 64p.
La caverna de la Patana es una cavidad kárstica
que puede ser técnicamente clasificada como del Iturralde – Vinent, M. 1988. Naturaleza Geológica
tipo “piezogena” (del griego “piezo”: comprimido, de Cuba. Edit. Científico – Técnica. La Habana: 146
referente al nivel piezométrico de la zona satura- p.
da), formada bajo régimen de circulación confinado
o semiconfinado, pudiendo enmarcarse a su vez, Jaimez, E.; Gutiérrez, D. A.; Carricarte, A.; Consue-
dentro del subtipo de cuevas parapiezogenas (de lo gra, I. 1990. Informe sobre los resultados generales
que es semejante, pero a la vez diferente respecto de la Expedición Klarren-I, Maisí, Guantánamo.
a otras cavidades de este tipo genético). Boletín Casimba. Año 2, Ser.1, No. 2. La Habana:
Desde el punto de vista del condicionamien- p.40–50.
to geológico (geotectónico), la misma puede ser Jaimez, E.; Gutiérrez, D. 1993. Nueva Clasificación
definida como una caverna perteneciente al grupo Genética de las Cuevas de Cuba (Tipología Geó-

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trabalhos Geoespeleologia

logo-Geomorfológica con elementos de Regionali- World Reference Base. 2003. Mapa Mundial de
zación). Boletín Casimba. Año 4, Ser.1, No. 5. La Suelos, a escala 1: 30 000000. World Soil Resour-
Habana: p.13–30. ces, FAO, EC, ISRIC, 1998.

Jaimez, E.; Gutiérrez, D. 2000. Nueva Clasificación


Genética de las Cuevas de Cuba (Tipología Geólo-
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Minería de La Habana (CD-Room Textos/Geología
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Jaimez, E.; Gutiérrez, D. 2010. Nueva Clasificación


Genética de las Cuevas de Cuba (Tipología Geólo-
go-Geomorfológica con elementos de Regionaliza-
ción: Versión 2.4). Disponible en http://www.gepab-
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hiperpiezogena: propuesta de nuevo subtipo gené-
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Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

A educação ambiental como elo


entre conhecimento científico e
comunidade: atuação do GMSE,
em Paripiranga-Ba
Kelly Sandra Ramos Santos Silva

Grupo Mundo Subterrâneo de Espeleologia

RESUMO ABSTRACT
O trabalho empírico realizado pelo Grupo The empirical work carried out by the Mundo
Mundo Subterrâneo em Espeleologia (GMSE) refe- Underground Group in Speleology (GMSE) regar-
rente à Educação Ambiental possui como enfoque ding environmental education focuses on the ca-
as cavernas da região em torno da cidade de Paripi- ves in the region around the city of Paripiranga-Ba,
ranga-Ba, procurando aproximar a população local seeking to bring the local population closer to the-
dessas cavidades naturais rochosas encontradas se natural rocky cavities found in the municipality,
no município, por intermédio da Educação Ambien- combating the distancing of the which involves the
tal propagando o conhecimento cientifico acerca lack of scientific knowledge of these environments.
desses ambientes. Mesmo havendo 82 cavidades Even though there are 82 cavities registered in the
cadastradas no banco de dados do CECAV (Centro CECAV (National Center for Research and Conser-
Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas vation of Caves (CECAV) database, it is possible
(CECAV), é possível encontrar paripiranguenses to find people from Paripiranguenses who are not
que não possuem conhecimento da existência das aware of the existence of the cavities. Therefore, an
cavidades. Diante disso, foi realizado um trabalho intervention work was carried out, with the objec-
de intervenção, tendo como objetivo desmistificar tive of demystifying the legends that hover around
as lendas que pairam em torno das cavidades, por the cavities, through scientific education, by means
meio da educação cientifica, destacando algumas of curiosities and discoveries made in the city, brin-
curiosidades e descobertas realizadas no municí- ging in their essence explanations and ecological
pio, trazendo em sua essência as explicações e os aspects, as well as the importance of cavities for
aspectos ecológicos, bem como a importância das the environment and its balance. the scientific dis-
cavidades para o meio ambiente e o seu equilíbrio. semination was carried out in municipal and private
A divulgação científica foi realizada nas escolas da schools, and in informal conversations with local re-
rede municipal e privada, e em conversas informais sidents during visits and prospecting, thus bringing
com os moradores locais durante visitas e prospec- contributions to the conservation of the caves, with
ções, trazendo assim contribuições para conserva- visible results.
ção das cavernas, com resultados visíveis.
Palavras-chave: Espeleologia; Educação Ambien- Keywords: Speleology; Environmental Education;
tal; Educação Científica Science Education.

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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

1. INTRODUÇÃO dias atuais. Ele vem sendo desenvolvido e apro-


As cavernas tratam-se não apenas de um ximando cada vez mais a população do município
patrimônio natural, mas também histórico (Lobo & das cavidades naturais e de sua beleza singular,
Boggiani, 2013). Sendo de suma importância que a desde a Educação Básica ao nível superior, abran-
população local possua o conhecimento acerca da gendo toda a população local que possui interesse
sua relevância. Diante disso, se faz necessário a em conhecer e se aproximar da beleza exuberante
realização de trabalhos, por parte de órgãos e ins- das cavernas de Paripiranga-Ba.
tituições locais, a fim de disseminar essas informa- Para execução deste projeto foi realizado,
ções. O trabalho de Educação Ambiental realizado inicialmente, o levantamento de dados, por meio
pelo GMSE, surgiu justamente pelas necessidades das prospecções realizadas pelo grupo, conver-
referentes a acuidade dessas cavidades, abordan- sas informais com a população local e os donos
do direito e deveres da população. Sendo assim, o das propriedades, para analisar os conhecimentos
alvo central do objetivo do projeto é aproximar a po- prévios da população acerca das cavidades. Após
pulação das cavidades subterrâneas, a fim de sa- o levantamento de dados deu-se início ao levan-
nar dúvidas, bem como a desmistificação de lendas tamento bibliográfico baseando-se em dados pré-
que ainda imperam no município. Uma vez que Pa- -existentes sobre a temática voltada para Educação
ripiranga possui 82 cavidades cadastradas no ban- Ambiental e pesquisas de impactos dos ambientes
co de dados do Cadastro Nacional de Informações cársticos da Região Nordeste, para montar o proje-
Espeleológicas (CANIE), a Base de Dados Geoes- to e executá-lo nas comunidades. O levantamento
pacializados de Cavidades Naturais Subterrâneas das informações necessárias foi realizado a partir
do CECAV (CECAV/ICMBio, 2019). de banco de dados como Google Scholar, Scielo,
Com isso, surgiu a necessidade de alcançar Diário Oficial da República Federativa do Brasil, e
o maior número de indivíduos possíveis para infor- o site oficial do CECAV/ICMBio. Após a análise dos
má-los sobre os processos evolutivos, históricos e artigos e livros selecionados, foram estabelecidas
biológicos, os quais caracterizam as cavernas e sua as relações com o presente trabalho.
biodiversidade. Além de ressaltar sua importância A fim de atrair a atenção e curiosidade das
no processo histórico local e cultural, partindo do pessoas para as cavidades, foram dispostos nas
pressuposto de conhecer para conservar. Roos & palestras e reuniões, banners com fotografias e
Becker (2012) afirmam que a Educação Ambiental equipamentos de segurança utilizados durante as
busca obter a sustentabilidade, pois essa é res- atividades de campo. A utilização dos materiais ob-
ponsável por promover sensibilização, contribuindo tidos durante as atividades de campo como fotos
para uma nova racionalidade social acerca da sus- e vídeos foram de grande relevância, com estes
tentabilidade. materiais foram montados slides apresentando aos
Silva et al. (2020), ressalta a importância que ainda não conheciam as cavidades do municí-
dos estudos que abordam a biodiversidade dos pio.
ambientes cársticos e como a Educação Ambiental Destarte, as realizações das atividades de
atua na sensibilização da população local, e com campo, como visitas, eram de responsabilidade do
isso se obtém um bom resultado para a manuten- GMSE disponibilizar capacetes para todos os visi-
ção e preservação desses ambientes. Portanto, é tantes, e garantir iluminação para aqueles que não
possível observar a relevância da Educação Am- tinham lanternas, afim de garantir a segurança de
biental, aplicada não apenas nas escolas, mas em todos os indivíduos.
todo âmbito social, para atuar como sensibilizadora Para a realização do projeto em escolas, foi
fundamental para a preservação dos ambientes ca- realizada uma parceria entre as escolas e a Secre-
vernícolas do Município de Paripiranga-BA. taria de Educação. Durante o ano de 2018 o projeto
foi aplicado em quatro escolas da rede Municipal,
2. METODOLOGIA uma da rede privada e dois centros universitários,
O projeto deu-se início formalmente em ou- no decorrer da atuação do GMSE na Educação Am-
tubro de 2018, atuando diretamente nas escolas e biental, o projeto atingiu em média dez instituições,
por meio de conversas com a população, e até os as quais envolvem escolas e centros universitários,

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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

do município e de outras regiões. Das dez institui- que tem gerado um outro ponto negativo, o avanço
ções alcançadas pelo projeto foram realizadas pa- do desmatamento que gera a erosão e o assorea-
lestras em seis, atingindo em média mil alunos. As mento desses ambientes, resultando apenas alguns
demais foram realizadas atividade de campo. pequenos fragmentos de vegetação em algumas
Foi formado um grupo específico responsá- cavidades, devido ao difícil acesso do maquiná-
vel pela sua execução de palestras em escolas e rio por conta das rochas (SANTANA; MEDEIROS,
centros universitários, sendo de duas a três pesso- 2013). Como pode ser observado na figura 1.
as. Quando necessária uma maior mobilização para
visitações nas cavidades, sejam elas de alunos ou
moradores locais ou até mesmo turistas, utiliza-se
uma maior dinâmica metodológica sendo necessá-
ria a participação de no mínimo cinco membros da
ONG, a fim de proporcionar um maior entendimen-
to, como também segurança dos indivíduos.
É valido ressaltar que as visitas realizadas
pelos alunos as cavidades foram praticadas na
Gruta Bom Pastor, por já haver toda uma estrutura
como escadas e corrimão. Os visitantes foram le-
vados até o primeiro salão, onde encontram pales-
Figura 1. Comunidade Corredor vermelho do município
trantes do grupo, que explica o processo de forma- de Paripiranga apresenta um número significativo de ca-
ção da cavidade, bem como a importância histórica vidades e pouca cobertura vegetal. Fonte: Google Earth,
e cultural da Gruta do Bom Pastor, como também 2021.
as descobertas e pesquisas realizadas no local. No A extração da vegetação no município ocor-
total, a caverna contém três salões, sendo que o re de forma exacerbada, para dar lugar a monocul-
segundo e terceiro são levados apenas pesquisa- tura e a pecuária. O desmatamento gera danos nos
dores ou estudantes universitários. ambientes cársticos, pois a retirada da cobertura
Independentemente das idades dos visitan- vegetal nos arredores das cavernas corrobora com
tes, estes são convidados a assinar um termo de a ideia acima, Pereira (2017) e Monteiro (2014), di-
ciência e responsabilidade sobre a experiência que zem que o desmatamento contribui para surgimen-
vivenciara e os possíveis riscos, em caso de me- to de erosão e assoreamento desses ambientes,
nores de idade os pais assinam o termo, todos os podendo gerar consequências irreversíveis.
estudantes que realizaram a visita as cavidades as- Ratificando, Brandão et al. (2013) diz que os
sinam um termo. fatores externos que implicam no equilíbrio interno
do ambiente das cavidades ocasionam perturba-
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES ções para o ecossistema cavernícola e os organis-
A partir das informações levantadas com mos que lá vivem. Por meio da Educação Ambiental,
relação ao conhecimento empírico da população pretende-se sensibilizar os proprietários sobre as
sobre os ambientes cársticos, é possível notar consequências do desmatamento para as cavernas
aspectos que contribuem para o afastamento e o e para suas propriedades. Para que eles possam
desinteresse da população quanto às cavidades, preservar a área verde em torno das cavidades, in-
o que tende a interferir de forma direta e indireta terrompendo a perpetuação do desmatamento in-
no equilíbrio cavernícola como resultado da desin- sustentável, mas sim procurando equilibrá-lo. Ten-
formação sobre a relevância desses ambientes, do em vista que parte da população desconhece os
como também pelas crenças sobre as cavernas se efeitos negativos do desmatamento.
tratarem algo maligno, um buraco sem fim, ou até Um outro fator que vem acometendo as cavi-
mesmo um portal para outra dimensão e ocupação dades de Paripiranga é a depredação, como é pos-
(relatos ouvidos durante prospecções). sível observar na figura 2, sendo exemplos comuns
As cavernas muitas das vezes são suprimi- a escrita nas paredes das cavidades, descarte de
das para dar espaço a agricultura e a pecuária, o lixo e quebra de espeleotemas.

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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

portância para o ecossistema, além de esclarecer


as dúvidas dos visitantes, fazendo sempre o uso de
EPIs (equipamentos de segurança individual), a fim
de garantir o bem-estar e segurança de todos.

Figura 3. Visita à Gruta do Bom Pastor por estudantes lo-


cais, GMSE, 2019 (Fotografia, Osmar Conceição).
Figura 2. Descarte de resíduos sólidos, Caverna do
lixo I, GMSE, 2018 (Fotografia, Fernando Andra-
de).
Além dos atos supracitados, também podem
ser encontrados outros indícios antrópicos nas ca-
vidades paripiranguenses como: quebra de espele-
otemas e fogueiras, que algumas vezes são acesas
no interior das cavidades por visitantes. Ao conver-
sar com visitantes, percebe-se que o objetivo não é
trazer prejuízo para o ambiente, mas, sim para lem-
bra-se dele, contudo acabam acarretando danos as
cavidades.
Diante disso, Monteiro et al. (2017) diz que Figura 4. Visita à Gruta do Bom Pastor por moradores lo-
tais atos são configurados como depredação ao cais, GMSE, 2019 (Fotografia, Fernando Andrade).
ambiente cárstico. As fogueiras e quebra de espe-
leotemas implicam diretamente na biodiversidade As práticas de visitações em cavernas sejam
presente no interior das cavidades, alterando o mi- elas como finalidade de promover o conhecimento
croclima e causando a morte de organismos. As es- científico ou turístico, devem ser realizadas com
critas na parede, além de impactar o aspecto visual, planejamento e cautela, a fim de reduzir ao máximo
danificam os espeleotemas. A Educação Ambiental os impactos da presença humana no local. Segun-
atua como uma importante aliada mitigadora das do Donato (2019), a prática de visitação aplicada de
ações antrópicas nos ambientes cársticos. forma correta possibilita uma educação pautada na
Por meio das estratégias utilizadas com a fi- sustentabilidade, além de fortalecer a relação entre
nalidade da propagação do conhecimento científico natureza e homem, com os visitantes.
acerca das cavidades subtérreas, foram realizadas Dentre as atividades de visitações, houve
visitações em que foram levados alunos de esco- palestras aplicadas em praças e em escolas pro-
las locais, universitários e moradores locais, como curando envolver todos na temática. O grupo dis-
pode ser observado nas imagens abaixo (figuras ponibilizou-se para esclarecer dúvidas e dar infor-
3 e 4). As visitas foram organizadas em pequenos mações, não apenas sobre a importância ambiental
grupos para minimizar os danos da presença huma- das cavidades (figuras 5 e 6), mas também alertar
na no local. Durante as atividades foram explicados sobre os riscos de uma visitação a esses ambientes
o processo de formação das cavidades e sua im- sem equipamento necessário e sem o acompanha-

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mento de pessoas qualificadas e que conhecem o científico, bem como fortalecedora da relação entre
local, tendo em vista que as cavidades se tratam de humanidade e natureza.
um ambiente atípico, diferentemente do que pode Foi possível, por meio deste trabalho, apro-
ser encontrado no ambiente externo. ximar a população um pouco mais dos ambientes
cavernícolas. Trazendo aos seus olhos a beleza
das cavernas e a exuberância dos organismos que
vivem no seu interior, cativando as crianças e en-
cantando os adultos que ainda não conheciam e
nem compreendiam esses ambientes, o projeto de
Educação Ambiental como propagador do conhe-
cimento científico possui como missão sensibilizar
e incentivar a população sobre a necessidade da
conservação dos ambientes cársticos da cidade de
Paripiranga Bahia.

5.REFERÊNCIAS
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4.CONCLUSÕES MONTEIRO, F. A. D. (2014). A Espeleologia e as


Os impactos de origem antrópica têm provo- cavernas no Ceará: conhecimentos, proteção am-
cado desmatamento, erosão do solo, poluição dos biental e panorama atual. Fortaleza (CE), 145p.
ambientes cársticos, por meio do descarte dos resí- Dissertação (M estrado em Desenvolvimento e
duos sólidos, dentre outras consequências. Essas Meio Ambiente), Universidade Federal do Ceará.
implicações provocam um desequilíbrio ambiental,
como extinção de espécies que vivem no interior MONTEIRO, F. A. D.; DA SILVA, D. D. S.; DE SOU-
desses ambientes e alteração do seu microclima. SA MOREIRA, A.; MOURA, P. E. F. (2017). Prote-
Sabe-se que a Educação Ambiental não apresenta ção ao patrimônio espeleológico no Ceará: Gruta
resultados imediatos, mas trata-se de uma impor- Casa de Pedra. Os Desafios da Geografia Física na
tante ferramenta de disseminação do conhecimento Fronteira do Conhecimento, v. 1, p. 3112-3121.

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Anais da I SEMBIO – Semana de Biologia do Ins-
tituto Federal Baiano Campus Serrinha, v. 5, n. 1,
Serrinha- Bahia: p. 21-22.
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

Análise da ação antrópica e


seus impactos nas cavernas de
Paripiranga-BA
Sivaldo Santos Barbosa
Jesiel Alves da Silva
Kelly Sandra Ramos Santos Silva

Grupo Mundo Subterrâneo de Espeleologia

RESUMO ABSTRACT
Apesar das leis vigentes que garantem a Despite the current laws that guarantee the
conservação e preservação de cavidades, o que conservation and preservation of cavities, what is
é possível observar é que existe toda uma vulga- possible to observe is that there is a whole popu-
rização com esses ambientes, ao ponto de sofre- larization with these environments, to the point of
rem fortes danos ambientais antrópicas e serem suffering strong environmental damage anthropic
depositório de lixo (doméstico, hospitalar e orgâni- and being a waste dump (domestic, hospital and
co). Assim, o presente trabalho busca analisar os organic). Thus, this work seeks to analyze the envi-
problemas ambientais registrados nas cavernas ronmental problems that have been faced by caves
do município de Paripiranga/BA. Para tanto, o tra- present in the municipality of Paripiranga/BA. The-
balho versa como uma pesquisa aplicada e quali- refore, the work is an applied and quali-quantititive
-quantititiva em que foi observado os dados obtidos research in which was observed the data obtained
por meio das prospecções realizadas pelo Grupo through prospecting carried out by the Underground
Mundo Subterrâneo de Espeleologia (GMSE) em World Group of Speleology (GMSE) in Paripiranga/
Paripiranga/BA. Foram identificadas 82 cavernas BA. It was observed that the expectation is that the-
cadastradas no CECAV, das quais 72% estão em re are more than 120 caves, but only 82 are regis-
área vermelha (maior risco de impacto antrópico) e tered in the CECAV, and that it was observed that
por isso é possível observar a presença de lixo em 72% are in the red area (greater risk of anthropic
algumas e depredações pela visitação ilegal e prá- impact) and therefore it is possible to observe the
ticas culturais locais, como as romarias. Destarte, presence of garbage in some and depredations by
conclui-se que ações de educação ambiental se faz illegal tourism and local cultural practices such as
importante, tanto para a comunidade local, como pilgrimages. Thus, it is concluded that environmen-
também para as autoridades ambientais presentes tal education actions are important, both for the local
para a divulgação da importância das cavernas bem community, as well as for the environmental authori-
como o perigo de depredar e descartar lixo nesses ties present for the dissemination of the importance
locais. of the caves as well as the danger of depredating
and disposing of garbage in these places.
Palavras-Chave: Danos ambientais; Cavernas; Es-
peleologia; Educação Ambiental. Keywords: Environmental damage ; Caves; Speleo-
logy; Environmental education.

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INTRODUÇÃO po Mundo Subterrâneo de Espeleologia (GMSE), já


O cenário de conservação do patrimônio es- foram encontradas mais de 100 cavernas na região.
peleológico no Brasil é bastante preocupante, dian- A expectativa é que existem muito mais ambientes
te de tantas formas de depredação que vem sendo subterrâneos, um número superior a 120 cavernas,
observadas. Nos dias atuais, a grande maioria das pois ainda existem alguns locais que ainda não fo-
pessoas tem hábitos que trazem malefícios para o ram explorados. Deste total de cavernas, cerca de
meio ambiente. Dentre as práticas mais comuns es- 82 já estão registradas no banco de dados do Cen-
tão o despejo de resíduos (Lixo doméstico, hospita- tro Nacional de Pesquisa e Conservação de Caver-
lar e orgânico), desmatamento e alguns atividades nas (CECAV).
econômicas. No meio da área de influência da ação A grande maioria das cavidades naturais en-
antrópica estão as cavernas, que muitas vezes tem contradas em Paripiranga está localizada em pro-
sua importância negligenciadas ou totalmente des- priedades privadas. Em várias dessas propriedades
conhecida. são praticados a monocultura, sendo observado
Além dos impactos antrópicos já citados, as uma redução na cobertura vegetal, que implica di-
cavernas também sofrem com turismos desenfre- retamente na integridade desses ambientes. Nota-
ado que impacta diretamente o ambiente interno. -se ainda que a região não tem nenhuma unidade
Neste caso, a implicação está na perda histórica de de conservação e que os ambientes cársticos estão
processos hidrológico e geológicos que levam mi- sujeitos a diferentes tipos de depredação.
lhares de anos para serem concluídos. Alguns dos
exemplos claros dessa pratíca, citado por Medeiros Coleta de dados
et. al. (2017) são a queima de fogueira e a quebra O presente artigo é uma pesquisa de nature-
de espeleotemas. za aplicada, pois objetiva gerar conhecimentos para
Diante da situação crítica que o meio am- aplicação prática dirigidos à solução de problemas
biente está passando se faz necessário a discussão específicos e que envolve verdades e interesse
a respeito da forma como a sociedade contemporâ- da comunidade local, e abordagem com finalidade
nea está tratando o meio ambiente e quais as con- descritiva, uma vez que observa, registra, analisa e
sequências da ação antrópica. O objetivo central do ordena dados sem modificá-los. Para tal pesquisa é
presente artigo é justamente discutir tais ações e necessária uma obtenção de mais informações do
consequência dentro do município de Paripiran- que se poderia conseguir isoladamente e faz uso de
ga-BA, região com rico patrimônio espeleológico, dados numéricos (tabela, gráficos, etc.,), por isso
mas que está sujeita aos tipos de depredação cita- é qualitativa e quantitativa (PRODANOV; FREITAS,
dos acima. 2013).
Os dados que sustentam a problemática
MATERIAIS E MÉTODOS abordada no presente artigo foram coletados a par-
Descrição do local de estudo tir do projeto de Prospecção e Monitoramento (PM),
O município de Paripiranga possui uma área pensado e executado pelo GMSE. O projeto, até
territorial de 442,186km² e está situado na porção o momento só teve uma fase concluída, das três
nordeste do Estado da Bahia, próximo da divisa com previstas, mas conseguiu recolher informações re-
Sergipe, e compõe a bacia hidrográfica do rio Vaza levantes para inicia uma discussão a respeito de
Barris (PEREIRA; GONÇALVES; REIS, 2017). quais tipos de depredação, causadas pela ação an-
Para a atual pesquisa foram utilizadas téc- trópica, são observadas nas cavernas de Paripiran-
nicas, tais como a interpretação de dados obtidos ga.
através de imagens de satélite, bem como resulta- A região de estudo está dividida em três zo-
do in loco do grupo atuante na conservação e pre- nas de risco (vermelha, amarela e verde), de acor-
servação de Cavernas em Paripiranga-BA, o Grupo do com o grau de vulnerabilidade quanto a ação
Mundo Subterrâneo de Espeleologia (GMSE). antrópica. Um dos critérios utilizados para definir as
O município é uma das regiões do estado da zonas e que implicada diretamente na problemáti-
Bahia privilegiada com um rico patrimônio cárstico, cas que está sendo discutidas, foi a análise das ati-
de acordo com as prospecções realizadas pelo Gru- vidades econômicas existentes nos locais onde as

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espeleoturismo museu nas ambiental
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cavernas estão localizadas e seu nível de impacto. do alterar a temperatura e umidade. Uma das alter-
A divisão em áreas serviu para coordenar as ativi- nativas para a iluminação é o uso da LED (Light
dades de prospecção para aferir, o nível de vulne- – EmittingDiod) como fonte de luz. Apesar desta
rabilidade. também causar problemas é a mais recomendável,
tendo em vista que deve ser evitada a utilização
RESULTADOS E DISCUSSÕES da luz por muito tempo. Vale ressaltar que dentre
Visitação desordenada os parâmetros referentes ao manejo das cavernas
Os ambientes cársticos diante de sua singu- se destaca as variáveis atmosféricas, em relação à
laridade vem tendo grandes perdas com o resultado facilidade de mensuração, análise e correlação da
da explosão exacerbada, dentre elas se encontra presença humana (LOBO, 2011).
o uso público, que ocorrendo de forma desenfrea- Muitas cavernas ainda não foram catalo-
da traz grandes consequências para os ambientes gadas e estudadas. Mesmo que não possuam um
cársticos perturbando toda a sua biodiversidade in- plano de manejo algumas delas veem sendo utili-
terna. Para a realização do espeleoturismo (turismo zada como cavernas turísticas ou direcionadas a
em cavernas) é necessário que se considerem as fins religiosos (RUSCHMANN, 2004). É essencial
características intrínsecas dos ambientes subterrâ- um constante domínio, para que não aconteçam
neos, assim como também as limitações para uso aspectos que venha a prejudicar a biodiversidade
antrópico. Deste modo, para que ocorram visita- ou até mesmo o espaço desses ambientes, sendo
ções em cavernas, não deve ser levado em conta fundamental a importância em conhecer como as
apenas o âmbito de ecoturismo ou do geoturismo, espécies distribuem-se no ambiente e quais são de
pois estes não possuem em essência as especifici- fato as suas interações (DONATO; RIBEIRO, 2011).
dades dos ambientes cavernícolas (LOBO, 2011). A Gruta do Bom Pastor localizada na comu-
A fragilidade das cavernas em relação a as- nidade Roça Nova no Município de Paripiranga- BA
pectos morfológicos, geológicos, paleontológicos, é o resultado nítido da utilização para a visitação
espeleoclimáticos, biológicos e arqueológicos, tor- desenfreada. Entretanto, deve ser levado em con-
na essencial a realização de um estudo adequado sideração o importante papel cultural e histórico
sobre os impactos que o turismo pode gerar. Den- das romarias que ocorriam na cavidade (figura 1).
tre tais impactos destacam-se as consequências Vale ressaltar, que no período dessas romarias não
de iluminação, calor humano, excesso de dióxido havia instituições responsáveis pelo monitoramen-
de carbono, a poeira levada para a caverna, piso- to das cavidades locais, como também não havia
teamento, quebra de espeleotemas, alterações no a disseminação do conhecimento cientifico que
ambiente, remoção de rochas matrizes e outros abrangesse a todos, imperando o censo comum e
(LOBO, 2011). crenças religiosas.
Segundo Donato (2019), os ambientes ca- Nesta gruta foram encontrados registro da
vernícolas são propícios para a aplicação do turis- megafauna da preguiça gigante Catonyx cuvie-
mo, visto que possuem inúmeras belezas que fas- ri (Lund,1839) coletados a aproximadamente 14
cinam a humanidade, tal prática quando realizada anos atrás, nas seguintes coordenadas 10º39´09"S
de forma correta possibilita uma educação pautada e 37º55´48"W, Vale ressaltar que apenas uma das
na sustentabilidade e na relação da natureza com peças do fóssil encontrado faz parte do acervo do
o homem. No entanto, o que pode ser observa- Laboratório de Paleontologia da Universidade Fe-
do é que o turismo para ser realizado em cavernas deral de Sergipe (LPUFS), sendo esta peça uma
necessita de todo um planejamento para que possa garra (DE OLIVEIRA, et al., 2020). No último salão
ocorrer sem causar grandes danos a estes ambien- da cavidade foram realizadas coletas de ossos de
tes. Chiroptera da ordem quirópteros os quais há indí-
Segundo Nascimento et al. (2013), o exces- cios de interferência no processo de fossilização
so de iluminação em uma cavidade e instalação de dos mesmos, sendo resultado da interferência an-
luzes artificiais existentes em algumas cavidades, trópica na cavidade como já supracitado. Os estu-
utilizadas para cunho religioso ou turístico, acarreta dos realizados com base na coloração dos ossos
alterações no micro-clima destes ambientes poden- e sua flexibilidade mostram que o material sofreu

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diferentes estágios de fossilização (DONATO, et. al, No que diz respeito ao plano de manejo, o
2008). mesmo deve ser realizado através de análises de
dados como, temporalidade, perceptibilidade, ex-
tensão, duração, origem, sentido e grau de impacto
para que desta forma possa chegar à conclusão dos
impactos antrópicos que possam vir a cometer está
cavidade afim de possibilitaar a criação de pro-
jetos que visem à reversão de possíveis impactos,
tendo em vista que o turismo espeleológico acaba
gerando danos aos ambientes cársticos e o plano
de manejo viabiliza a minimização destes impactos
(ARAÚJO, et al., 2018).

Despejo de resíduo em cavernas


Os resíduos sólidos (lixo doméstico e Hos-
Figura 1: Romaria na gruta do Bom Pastor (GMSE,
pitalar) e orgânico, decorrente da forma de vida
2001).
consumista da população, vêm gerando sérios im-
Em meio aos sedimentos presentes nesse pactos sobre o meio ambiente. O principal impacto
último salão foram encontrados fósseis aleatórios está no descarte, que acaba provocando a contami-
subfósseis, os quais se encontravam em associa- nação do solo e da água, além de outros malefícios.
ção com os fósseis de preguiça gigante (Subfamília A implicação, no que diz respeito ao descarte de re-
Scelidotheriinae) e toxodontes (Subfamília Toxo- síduos, é o seu local de destino, apesar das várias
dontinae), diante o estado em que as peças se en- alternativas para reduzir os impactos do lixo produ-
contravam não foi possível realizar a identificação zido, o seu destino final é, na maioria das vezes,
através da bibliografia disponível, apenas uma peça locais na natureza onde não há habitação humana
foi possível ser identificado sendo um fóssil perten- (figura 2) (SOUZA et. al., 2020).
cente ao gênero Myotis SP, por conta das carac-
terísticas apresentadas sendo atribuída ao período
Pleistoceno final (DONATO, et. al, 2008).
Durante a realização da pesquisa de Donato
e colaboradores, realizada no ano de 2008, não foi
possível encontrar, devido aos impactos atropicos,
a exemplo do excesso de visitação, a presença das
espécies Chiroptera, (DONATO, et. al, 2008). No
entanto, nos dias atuais podem ser encontrados al-
guns indivíduos da espécie de Chiroptera voltando
a habitar a cavidade, sendo resultado do trabalho
desenvolvido pelo GMSE.
A ausência do plano de manejo pode causar
efeitos negativos no que diz respeito à prática do Figura 2: despejo de lixo em local onde não há moradia ou
passagem de pessoas (GMSE, 2018).
turismo em locais que existem cavernas, podendo
acarretar modificações da sua natureza, inde- No que diz respeito aos resíduos orgânicos,
pendente do grau ou intensidade dessas práticas. ainda há uma falta de conhecimento sobre sua pos-
Sendo assim é necessário ter cuidado com o am- sibilidade de reaproveitamento, sendo o mesmo
biente em torno das cavernas, pois essas áreas destinado ao descarte comum, junto com os de-
são essenciais para o processo continuo de mo- mais tipos de resíduos. De modo geral a sociedade
dificação das mesmas, que auxiliam no equilíbrio desconhece o potencial reciclável de alguns tipos
ecológico dos seres que vivem nessas cavidades de lixo, apesar de terem consciência dos impactos
(RUSCHMANN, 2004). gerado pelo descarte dos mesmos, principalmen-

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te em locais inapropriados, e em alguns casos até é enorme e a preocupação é maior quando esse
proibido (SOUZA et. al., 2020). Assim, o lixo inten- lixo tem alto risco de contaminação (figura 4), como
cionalmente descartado em áreas proibidas é uma relata Parise e Pascali (2003) que ao estudarem
prática comum, inclusive por órgãos públicos que uma caverna na Itália perceberam a presença de
para evitar o gasto alto do descarte correto, optam diversos resíduos, inclusive hospitalares. Ferreira
por essa conduta. et al. (2010) relataram o mesmo problema no Bra-
Um dos ambientes destinado para o des- sil, mais especificamente em cavernas no Rio gran-
carte desses resíduos, são as cavernas (figura 3). de do Norte, onde foi encontrado resíduos como
Essa pratica advém da falta de conhecimento sobre ampolas de medicamentos, gaze, luvas, seringas,
o ambiente cavernícola e sua importância, e por ser panos, caixas, dentre outros. Problema esse que é
considerado um excelente repositório de resíduos, mais que um visual ruim, pode ocasionar uma pos-
já que o mesmo acaba desaparecendo do cotidia- sível contaminação por material tóxico. O problema
no, dando a falsa sensação de problema resolvido torna- se mais preocupante em cavernas que pos-
(FORD e WILLAMS, 2007, Apud. CRUZ e PILÓ, suem curso de água ativo, pois substancias tóxicas
2019). Diante da falta de conhecimento e das fal- podem se espalhar e contaminar outros corpos de
sas concepções, muitos dos ambientes caverníco- água.
la, principalmente os localizados próximos a habi-
tações, vem sendo impactados. Esse tipo de ação
predatória serve para demonstrar um problema que
o meio ambiente em geral tem sofrido.

Figura 4: embalagem de agrotóxico com alto potencial to-


xico encontra no inteiro de cavernas (a) e em local onde
existe ocorrência de cavernas (GMSE, 2021).
Aqui se faz necessário entender o que é e
Figura 3: Imagem registrada pelo Grupo Mundo Subterrâ- onde deveria ser descartado o lixo hospitalar, bem
neo de Espeleologia (GMSE), no município de Paripiran- como porque não é descartado corretamente. Re-
ga (BA), onde é possível notar embalagens de agrotóxico, síduos Hospitalares são aqueles produzidos em
em um ambiente Cavernícola (GMSE, 2018).
unidades fornecedoras de cuidados da saúde, com-
Por ser um ambiente com um grau eleva- preendendo as atividades médicas de diagnóstico,
do de vulnerabilidade, se comparado com outros prevenção e tratamento, tanto em humanos, como
tipos, o despejo de lixo acarreta na alteração das em animais. Segundo o RDC nº. 306 existe um ge-
características naturais das cavernas. Como con- renciamento com procedimentos de planejamento
sequências, a alteração provoca um desequilíbrio elaborado com embasamento científico e técnico
no microambiente cavernícola, com favorecimento com o objetivo não só do descarte correto, mas ain-
para algumas espécies e desvantagem para outra, da no intuito de minimizar a produção desses resí-
ocasionando a diminuição ou desaparecimento de duos. Logo, o descarte incorreto, junto aos demais
espécies. Esta é uma consequência grave pois im- tipos de lixo na coleta, ou ainda descarte nas caver-
plica diretamente na perda da biodiversidade, que nas ou em qualquer área inapropriada é uma opção
são únicas e com pouca ou nenhuma capacidade irracional e irresponsável, pois existem maneiras
de sobreviver em outro habitat (CAJAIBA, 2014). corretas e seguras de descarte.
A variedade de lixo encontrado em cavernas

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Desmatamento em torno de ambientes cársticos mesmo estando localizada na área vermelha, po-
A extração vegetal é realizada no entorno rém apresenta outros impactos antrópicos como o
das cavidades para os mais variados fins, sejam uso para descarte de lixo e depredação nas cavida-
pra comercialização da madeira, para agricultura des como fogueiras acesas no seu interior, quebra
ou pastagens. Segundo Cavalcanti et al. (2012), de espeleotemas e paredes escritas com objetos
varios dos problemas enfretados pelos ambientes pontiagudos para que cause ranhuras nas rochas.
cársticos presentes no Brasil estão relacionados
principalmente a fatores socioeconômicos, oriun-
dos de empreendimento ou uso do solo e subso-
lo. Algumas das atividades que mais afetam estes
ambientes estão associadas à agricultura que con-
sequentemente levam ao desmatamento dos am-
bientes que as cavidades estão inseridas. Aliado
a agricultura está o uso de agrotóxicos que podem
causar a perda da fertilidade do solo, erosão, con-
taminação do solo e mananciais e danos a biodiver-
sidade (SERRA, et al., 2016).
O município de Paripiranga-BA apresenta
uma quantidade significante de cavernas que vem
Gráfico 1: Incidência de cavernas que sofreram ações an-
sofrendo com a degradação ao longo dos anos, tor- trópicas (GMSE, 2020).
nando seu cossistema altamente vulnerável, tendo
As divisões em áreas (figura 5) serviu para
como principais fatores a ocupação desordenada
mensurar o grau de vulnerabilidade presente nas
do solo, expansão urbana e as atividades agrope-
areas carveniculas. Na área amarela, por exemplo,
cuárias. Estas ações contribuíram drasticamente
que possui pouca implicância antrópica, o avanço
para a danificação de uma parte considerável do
da agricultura tem colaborado para construção de
patrimônio cavernícola, que contribui na manuten-
um cenário preucupante dentro dessa zona.
ção do equilíbrio de todo ecossistema (SANTANA
et. al., 2013).
As alterações realizadas nos componentes
biológicos, minerais, bióticos e abióticos respon-
sáveis pela constituição dos ambientes cársticos,
podem suceder em alterações gerando modifica-
ções nos ecossistemas das cavidades, pois estas
características estão intrínsecas com a fragilidade
presente nestes ambientes (DONATO; RIBEIRO,
2011).
De acordo com levantamento de dados, a
maioria das cavernas encontradas na área verme-
lha (grafico 1) estão próximas ou em propriedades
de agricultores. Durante as atividades de prospec- Figura 5: Imagem de uma das regiões de estudo sub-
ções e conversa com os moradores locais, consta- dividida de acordo com seu de grau de vulnerabilidade
(GMSE, 2021).
tou-se cavernas que foram totalmente suprimidas
para dar espaço à lavoura. Está área apresenta um No que diz repeito a preservação, a área
nível alto de desmatamento, chegando a encon- verde é a que apresenta um melhor estado, sendo
trar cavidades com vegetação nula, onde oberva-se poucas ou nenhuma intervenção humana. Algumas
uso do desmatamento para a utilização das áreas das cavidades nesta área apresentam desvanta-
como pasto para os animais e a agricultura. gens devido ao difícil acesso, e apresentar solos
Vale salientar que é possível encontrar ca- extremamente rochosos sendo inviáveis para a
vernas que apresentem vegetação no seu entorno agricultura, o que explica uma maior quantidade

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de cobertura vegetal. Vale ressaltar que mesmo as na tentativa de aproximar a população dos ambien-
áreas tidas como conservadas, a área vegetativa tes cársticos, aos pouco vem surtindo efeito, no en-
não ultrapassa a 2 km de extensão havendo ape- tanto é nítido que ainda resta muito a ser feito, para
nas alguns vestígios (figura 6). que desta forma os ambientes cársticos possam ser
conservados.

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BARROS, Luciano Cintrão. Diagnóstico de impac-
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União; Brasília, DF. 2004.
O presente estudo marca a importância da
realização de monitoramento nas cavernas. Mesmo
CAJAIBA, Reinaldo Lucas. Diagnóstico dos impac-
diante das limitações, a realização inicial da primei-
tos ambientais causados por ações antrópicas em
ra etapa do monitoramento ressalta relevância dos
cavernas no município de Uruará-PA. Revista Meio
trabalhos pautados na conservação ambiental. Por
Ambiente e Sustentabilidade, v. 7, n. 3, p. 490- 507,
meio dos aspectos observados durante o monito-
2014.
ramento, fica clara a interferência antrópica nestes
ambientes e o quanto estas interferências podem
CAVALCANTI, Lindalva Ferreira; JANSEN, Débo-
ser danosas a biodiversidade subterrânea, sendo
ra Campos; LIMA, Maristela Felix de; CRUZ, Jocy
necessário um longo caminho de sensibilização
Cruz; (CECAV/Instituto Chico Mendes). Plano de
para reduzir os danos causados a estes ambien-
ação nacional para a conservação do patrimônio
tes, bem como o constante acompanhamentos das
espeleológico nas áreas cársticas da Bacia do Rio
cavidades, afim de se aplicar lei de conservação
São Francisco. Brasília: Instituto Chico Mendes de
vigente.
Conservação da Biodiversidade, Instituto Chico
A partir do levantamento de dados obtidos,
Mendes, 2012.
notaram-se os vários fatores que acometem e in-
terferem no equilíbrio cavernícola sendo o mais co-
CRUZ, Jocy Brandão; PILÓ, Luís Beethoven. Fragi-
mum observado no município o desmatamento das
lidades e impactos ambientais no carste e nas ca-
matas no entorno das cavidades, resultado este
vernas. In: Instituto Chico Mendes de Conservação
das ações humanas, nota-se que uma parte destes
da Biodiversidade. Espeleologia e Licenciamento
impactos resulta da desinformação sobre a fragili-
Ambiental. Brasília: ICMBio, 2019.
dade destes ambientes.
Considerando a necessidade de aprimora-
DO NASCIMENTO, Marcos Antonio Leite; ROCHA,
mento das prospecções e monitoramento se faz
Antonio José Dourado; NOLASCO, Marjorie Cseko.
necessário que por meio do diálogo entre autorida-
Patrimônio geológico e mineiro no nordeste do Bra-
des, sociedade civil e partes interessadas, haja uma
sil. Boletim paranaense de geociências, v. 70, 2013.
parceria para que todos possam trabalhar juntos.
A parceria entre a ONG proponente do projeto e
DONATO, Christiane Ramos; ANDRADE, sabel
a população já vem ocorrendo de forma gradativa
Cristina Barreto; BECKER, Michele Amorim; CAR-
através de conversas e palestras que são utilizadas

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos Análise da ação antrópica
espeleoturismo
e seus impactos
museu
e educação
victor
nas ambiental
cavernas...
dequech

VALHO, Emanuella Santos de; MACEDO, Heleno


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Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

‘Enfurnadas’, mas
Brenda Almeida Lima1,2
não isoladas
Eleciania Tavares da Cruz1,3,4
Maryanne Normitta Miranda e Silva1,3
Elizandra Goldoni Gomig1,4
Bruna Castro1,5
Rosângela Rodrigues de Oliveira1,6
Aira Ferreira Pinto Silva1,7,8

1. Caverneiras Brasil
2. Universidade Estadual do Oeste do Paraná- UNIOESTE;
3. Grupo de Pesquisa e Extensão em Espeleologia (Guano Speleo)- MG;
4. Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG - Fac. Medicina Núcleo Promoção da Saúde e
Prevenção das Violências;
5. Espelo Grupo Rio Claro (EGRIC) – SP e Meandros Espeleo Clube - SP
6. Grupo Espeleológico da Geologia (GREGEO)- Universidade de Brasília
7. Grupo de Estudos Ambientais da Serra do Mar (GESMAR); Universidade Federal de ABC - SP
8. Espeleometria em Foco

RESUMO INTRODUÇÃO
Com o início da pandemia, encaramos uma Conduto 1. “De repente enfurnadas”
realidade a qual não estávamos habituados, e den- O dia 11 de março de 2020 mudou a vida
tre tantas maneiras de lidar com as situações e de toda população do planeta Terra. Isso porque,
questões emocionais dessa ordem do imprevisto, a partir da Declaração da Organização Mundial de
apresentamos o relato da experiência do grupo Ca- Saúde (OMS), com a elevação do estado de con-
verneiras Brasil, advinda de eventos ocorridos entre taminação à pandemia da Covid-19 causada pelo
os meses de Março e Outubro de 2020, por meio de novo coronavírus (Sars-Cov-2), nos deparamos
vídeos interativos, rodas de conversa e o CaveCi- com um “conduto escuro desconhecido” que gerou
ne. incertezas e medos.
Palavras-chave: Pandemia; Gênero; Experiência. No Brasil, apenas uma semana após a de-
claração da OMS que as autoridades governamen-
ABSTRACT tais começaram a tomar as primeiras medidas sa-
With the beginning of the pandemic, we fa- nitárias. Contudo, a população encontrou, dentre
ced a reality that we were not used to. Among so outros, o desafio da falta de uma coordenação por
many ways to deal with the situations and emotio- parte do Governo Federal, que associada ao nega-
nal issues never seen before, we present the report cionismo da doença e da ciência, agravaria a situ-
of the Caverneiras Brasil group experience, arising ação levando à marca de 548 mil mortes por CO-
from events that took place between March and Oc- VID-19 no Brasil, um ano e meio depois (BRASIL,
tober of 2020 in the form of interactive videos, cir- 2021).
cles of conversation and CaveCine. Famílias foram dizimadas, doentes recu-
perados com sequelas, mortos enterrados sem a
Keywords: Pandemic; Gender; Experience. possibilidade da última despedida, e uma geração

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

de “órfãos da Covid-19”, surgiu. Recomendações mas de depressão, 34,9% de ansiedade e 37,3%


básicas foram retomadas pela OMS, como lavar de estresse, sendo que todos esses impactos estão
as mãos ou o uso do álcool 70% para assepsia relacionados às condições sociais em que vivem, e
(OMSa, 2020), foram propagados “como mantra”. a pandemia só agravou essa situação (SERAFIM et
O afastamento social, e o uso de máscaras foram, al., 2021).
recomendações essenciais para também tentar evi- Cabe salientar que das 3 mil pessoas que
tar o aumento do número de contaminados (OMSb, responderam ao estudo, 83% eram mulheres, casa-
2020) e o colapso nos serviços de saúde, levando das (50,6%), tinham formação universitária (70,1%)
os profissionais de saúde, principalmente do Siste- e estavam empregadas (46%). Do grupo geral,
ma Único de Saúde (SUS), trabalharem diuturna- incluindo homens e mulheres, 6,4% contraíram o
mente para salvar vidas. vírus e 22,7% possuíam amigos ou parentes que
Se por um lado o distanciamento social tinham ido a óbito pela doença (SERAFIM et al,
apresentava-se como uma das principais recomen- 2021).
dações para evitar a disseminação geográfica da Frente à falta de uma coordenação governa-
doença, por outro, a retórica do “fique em casa” mental nacional, mas diante de um norte apontado
configurou-se como um dos principais desafios pela OMS, os Estados e municípios brasileiros fo-
para as populações mais vulneráveis, que precisam ram assinalando algumas ações locais para o en-
da mobilidade geográfica para ganhar seu sustento frentamento do inimigo invisível. A “guerra” forçou a
diário. Nesse contexto as mazelas sociais foram es- sociedade a suspender de um dia para o outro to-
cancaradas, vindo à tona variadas problemáticas, das as suas atividades presenciais não essenciais,
em que 4,5% das pessoas perderam os empregos migrando obrigatoriamente para um “território virtu-
formais, e 68% dos empregos informais (IBGE, al”.
2021) e depararam-se com o aumento da pobreza No período de quarentena da COVID-19,
em 9,5% (WFP, 2021), acarretando 19 milhões de a internet e as redes sociais trouxeram benefícios
brasileiros que passaram fome durante a pandemia para boa parte da população, como o trabalho home
(PENSSAN, 2021). office, aulas on-line, novas estratégias de comércio,
Simultaneamente ao combate à COVID-19, manter relacionamentos afetivos e até desfrutar do
a crise que se instalou desencadeou uma série de lazer e da cultura já vinham ocorrendo nos últimos
impactos econômicos, sociais, culturais e tecnológi- anos através das telas de smartphones e compu-
cos, que provocaram questionamentos sobre como tadores.Esse uso se potencializou para conseguir
seria o mundo durante o período de isolamento so- manter certas rotinas durante esse período atípico
cial e o pós pandemia (SCALZER; NARDI, 2020). (MALAVÉ, 2020).
Nesse cenário pandêmico, as mulheres se viram O mundo virtual passou a ser uma nova era
cada vez mais sobrecarregadas com as suas mul- e realidade social, principalmente com grupos de
titarefas, que “sutilmente” são impostas pela socie- aplicativos de conversas como WhatsApp, chama-
dade. Se antes, dizer “fique em casa” era sinônimo das de vídeos, reuniões virtuais e até “botecos vir-
de descanso, com a pandemia, principalmente para tuais” pelo Google Meet e Zoom, começaram a ser
mulheres mães trabalhadoras, o “fique em casa” utilizados com uma frequência como nunca acon-
configurou como aumento de funções, acentuando tecera antes. Se culturalmente o Brasil tem a “arte
nas mulheres, estresse e muitas vezes o adoeci- dos encontros”, a pandemia da COVID-19 forçou
mento mental, que é estigmatizado socialmente. aos desencontros. Pais e filhos, amados e amadas,
O Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital amigos e amigas, e amantes do mundo subterrâ-
das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universi- neo foram remetidos obrigatoriamente para os limi-
dade de São Paulo (FMUSP), analisou os impactos tes de suas residências, cujas principais formas de
a saúde mental e aspectos comportamentais dos outros encontros foram os ambientes virtuais.
brasileiros durante a pandemia no período de maio Portanto, podemos perceber como a tecno-
a junho de 2020 (período de isolamento social), ob- logia corroborou para o enfrentamento, o controle
servando que as mulheres foram as mais afetadas e a prevenção da COVID-19, bem como amenizar
emocionalmente, respondendo por 40,5% de sinto- as consequências provocadas pelo distanciamento

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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

social, estreitando e até mesmo criando formas de


relações sociais e culturais.
O objetivo deste artigo é relatar a experiên-
cia do grupo Caverneiras Brasil durante o período
de quarentena e isolamento social, como uma das
principais medidas sanitárias para controlar a pro-
pagação da doença. As experiências ocorreram a
partir da primeira quinzena do mês março até outu-
bro de 2020.
Foram realizados vídeos interativos, rodas
de conversa e o CaveCine. A partir de uma análise
qualitativa dos relatos das participantes, foi possível
Figura 1: Participação das Caverneiras Brasil nos grupos
identificar que, os momentos configuraram como espeleológicos em 2020.
uma ferramenta de trocas de conhecimentos e de
histórias, fortalecimento de vínculos, a partir da so- RESULTADOS
roridade, e consequentemente uma diminuição nos Conduto 3. “O acender” das rodas de conversa
sentimentos negativos provocados pelo isolamento e do cavecine
social. A partir de alguns dias de confinamento e
isolamento social, as participantes do grupo de
DESENVOLVIMENTO
WhatsApp nomeado ‘Caverneiras Brasil’, começa-
Conduto 2. “Enfurnadas, mas não isoladas” ram a se movimentar por trocas de mensagens e
No contexto pandêmico mulheres integran- apontamentos de ideias. Então, em abril de 2020,
tes de grupos de espeleologia brasileira identifica- as mulheres iniciaram um amplo diálogo e percebe-
ram uma forma de amenizar os impactos da pan- ram sobre a perspectiva de gênero e os impactos da
demia inclusive no que pese o isolamento social. pandemia na vida de cada uma. Surgiu, portanto, a
Perceberam que, mesmo que estivessem "enfurna- construção coletiva do "challenge: Cave-20-Ilumi-
das" não precisavam necessariamente ficar isola- nar” que teve mais de 20 mil visualizações nas re-
das. Cabe destacar que algumas dessas mulheres des sociais.
tiveram contatos presenciais no 35º Congresso Bra- Forçadas pela pandemia e pelo isolamento
sileiro de Espeleologia-CBE, realizado no município social, iniciou-se, portanto, uma nova era no forma-
de Bonito/MS no ano de 2019. to de construção de textos para os boletins, assim
No ano anterior havia surgido o movimento, como para idealização e realização das rodas de
denominado Caverneiras Guano Speleo, em que as conversas e o CaveCine. A ideia foi a reunião remo-
mulheres do grupo de Belo Horizonte, Minas Gerais ta das Caverneiras Brasil para tratar assuntos que
buscaram iniciar reflexões sobre os desafios, mas estivessem relacionados diretamente ou indireta-
também a importância das mulheres no campo da mente à perspectiva de gênero, tais como desafios
espeleologia na história, na academia, nos grupos sociais, históricos, políticos, sororidade principal-
e no esporte. Esse movimento resultou no artigo mente no contexto pandêmico.
“Existe a invisibilidade feminina na espeleologia? Diversos tópicos foram apresentados e os
– reflexões acerca das contribuições da mulher no formatos, como um “clube da leitura”, rodas de con-
processo histórico da espeleologia” (CRUZ, E.T. et versas e CaveCine. As participantes indicavam uma
al, 2019). temática, sugeriam um livro, filmes, documentários
A partir desse encontro, houve uma grande ou até mesmo ouvir podcasts e determinavam um
mobilização das espeleólogas, a participação au- tempo para que encontrassem e promovessem re-
mentou, tomou corpo e absorveu “caverneiras” de flexões virtualmente (Figura 2). O espaço configu-
diversos grupos (Figura 1), o que possibilitou a tro- rou como o lugar de acolhida e de trocas de saberes
ca de experiências e angústias, aliadas a uma pro- entre as participantes, para a temática feminismo
funda vontade de mudança. ou também chamada de mulherismo (FREITAS; RI-
BEIRO, 2019), bem como um alento para que nós,

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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

Figura 2: Fluxograma abordando as temáticas e materiais utilizados no CaveCine.

caverneiras, externássemos sentimentos e angús-


tias, inclusive sobre perdas de familiares para a
COVID-19.
Do mês de maio a setembro de 2020, foi um
total de quatro rodas de conversa. As rodas de con-
versa não eram gravadas, a fim de resguardar os
relatos e experiências de cada participante. Além
das Caverneiras Brasil, em alguns momentos as
rodas contaram com a participação de pessoas ex-
ternas à espeleologia, como representantes de mo-
vimentos sociais de Belo Horizonte e do Mestrado Figura 3: Primeira edição da roda de conversa do CaveCi-
Promoção da Saúde e Prevenção da Violência da ne com a participação de pessoas externas.
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de
Minas Gerais (Figura 3). A primeira edição do Cave- nome do filme/documentário e o link onde pode-
-Cine foi realizada no mês de julho de 2020. riam ser acessados e assistidos assincronamente.
Para convidar as mulheres a participar do No terceiro sábado de cada mês, as interessadas,
CaveCine, foram realizados os posts, divulgados através da plataforma Google Meet, se reuniam re-
em grupos de WhatsApp e redes sociais como Fa- alizando as discussões síncronas.
cebook e Instagram. Os cards apresentavam o A fim de garantir a participação de cavernei-

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ras também mães, na edição de agosto simultane- do como sobrecarga para o gênero e das atividades
amente à roda das mulheres, foi realizada uma “ro- exercidas por elas dentro e fora da espeleologia,
dinha”, também pelo Google Meet, com as crianças sendo estas respeitadas e reconhecidas.
filhas das participantes. A rodinha teve o intuito de Lembrou-se ainda da importância de reali-
promover a interação das crianças que estavam lo- zar o 36º CBE, a pontuação das questões e desa-
calizadas em regiões diferentes do país, no caso fios encontrados pelas mulheres, tais como, ter o
Minas Gerais e São Paulo, bem como para que as reconhecimento no evento de mulheres na espele-
mães conseguissem participar da roda de conver- ologia, paridade de gênero nas palestras e mesas
sa. redondas, além de garantir espaços de formação e
Em relato, uma Caverneira mãe expôs que, cuidados para as crianças cujas mães estarão parti-
“A pandemia tem sido um momento difícil para todos cipando do 36º CBE. A temática sobre gênero deve
nós, tivemos que ajustar nossas rotinas e vida so- estar incluída em todo processo não apenas na te-
cial, porém com ela também vieram grandes opor- oria, mas na prática da realização do evento.
tunidades que em alguns momentos conseguimos
enxergar, em outros não. Uma linda e feliz oportu- DISCUSSÃO
nidade ocorreu nas Caverneiras, o grupo se fortale- Conduto 4. Aprendizados no apagão
ceu perante as dificuldades, novas Caverneiras sur- O espaço do CaveCine assim como tantos
giram. Em rodas de conversas virtuais, CaveCine, outros, fizeram com que as mulheres, trocassem
e debates incríveis a pandemia nos proporcionou conhecimentos, principalmente por conta da aber-
uma incrível oportunidade de nos aproximarmos, tura de espaços para a escuta das necessidades e
mulheres que não se conheciam agora comparti- problemáticas de cada uma, com oportunidade de
lham de uma experiência única, uma amizade que troca de experiências e de informações, permitindo
teve início durante um momento conturbado, mas que todos pudessem falar sobre seus problemas e
que será lembrada sempre. Nosso grupo cresceu e juntos buscar soluções. Tais ações tornam-se tam-
continuará crescendo virtualmente e em breve nos bém um instrumento para acolhida e união de to-
conheceremos também presencialmente”. das. Somado a isso, os participantes solicitaram a
Além das rodas de conversas e CaveCine, realização de outros momentos similares para dar-
guiados por uma temática sugerida pelo grupo, mos continuidade às discussões.
após esses momentos, também contamos com O fato é que o isolamento físico se fez ne-
encontros mais descontraídos nos chamados af- cessário no contexto da pandemia, mas não o so-
ter, que poderiam constituir dois formatos, aberto cial. Ou seja, deve-se estimular o convívio social
ao público, ou somente com as mulheres. As rodas dos indivíduos por meio de dispositivos eletrônicos
de conversa e CaveCine foram registradas nas Edi- que promovam a comunicação, interação e até
ções do Boletim da Sociedade Brasileira de Espele- mesmo a promoção à saúde.
ologia, nº 406, 408, 409, 410, 411 e 413. Disponível As rodas de conversa e as discussões no
em:(http://www.cavernas.org.br/sbenoticias). WhatsApp levaram ao aprofundamento dos deba-
As rodas e o CaveCine da Caverneiras Bra- tes sobre o papel da mulher na espeleologia nacio-
sil levaram à realização de um evento organizado nal, pois entendemos que existem duas formas de
pelo Grupo Espeleológico da Geologia (GREGEO) sub-representação das mulheres no sistema cientí-
da Universidade de Brasília (UnB). Nesse espaço fico e técnico: uma consiste na exclusão horizontal,
as participantes das Caverneiras Brasil falaram em que indica o pequeno número de mulheres em de-
uma mesa redonda sobre e espeleologia e gênero, terminadas áreas ou subáreas do conhecimento, a
e suscitou um debate sobre a atuação feminina na outra está na exclusão vertical, que aponta para o
espeleologia, suas colaborações e os problemas pequeno número de mulheres nos postos de pres-
enfrentados. tígio que se reproduz no ambiente espeleológico
Os debates trouxeram como fruto a amplia- (MONTENEGRO; GONÇALVES; SILVA, 2017).
ção de questionamentos sobre a inclusão de mais A construção e realização das atividades
mulheres, para garantir sua permanência nos traba- remotas, rodas de conversas e CaveCine partiram
lhos voluntários na espeleologia, não se configuran- das premissas propostas da “pedagogia da autono-

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Figura 4: Quarta edição da roda de conversa do CaveCine sobre o tema masculinidades - com a participação de
homens e representantes da Faculdade de Medicina da UFMG.

mia” (FREIRE, 1996) e do “agir comunicativo” (HA- va imposta por essa sociedade capitalista. Foi pos-
BERMAS, 2012), em que todas as mulheres são sível preencher lacunas e mostrar a possibilidade
convidadas a contribuir para a troca de saberes e a de incluir afetividade na efetiva contribuição femini-
construção coletiva de conhecimentos. na para a produção de conhecimento.
Configuram ainda como resultados iniciados Os desafios que devem ser superados são
no ano de 2019, conforme apontamentos do artigo muitos, não pela sociedade espeleológica sozinha,
“Pode-se falar em invisibilidade feminina na espele- mas por toda sociedade marcada pelo patriarcado
ologia?” (CRUZ, 2019), cujo tema mulher nos bole- e um machismo estrutural. Entendemos que não
tins da Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE, basta apenas ocupar os espaços, mas devemos ser
2021), começou aparecer com uma nova configura- respeitadas em toda nossa essência, competências
ção. e habilidades. Os caverneiros são uma peça funda-
Entendemos que existem uma gama diver- mental para a mudança desse contexto (Figura 4).
sa de obstáculos para ingresso, permanência e Aos poucos, o vírus, inimigo invisível, será
ascensão das mulheres na espeleologia, sendo a derrotado, a chegada das vacinas já é uma arma po-
histórica e cultural a principal delas, pois não é fácil derosa. Dessa forma, durante este período em que
fazer ciência e se destacar em um ambiente que ficamos “enfurnadas”, pudemos refletir sobre essas
foi construído sob vieses masculinos da moderna questões e traçar algumas ações conjuntas, e que
sociedade ocidental, no entanto nós ainda assim, o não necessariamente precisávamos estar isoladas.
fazemos. Somos múltiplas e diversas, e acreditamos que por
As relações entre gênero e ciência é um meio do “agir comunicativo” e pela “pedagogia da
tema que tem gerado muitas discussões na atuali- autonomia” poderemos caminhar para promover
dade. É possível observar um crescente movimen- mudanças.
to de visibilidade feminina na atuação científica em
diversos campos e não poderia ser diferente na AGRADECIMENTOS
espeleologia. Ações como as apresentadas neste Agradecemos a todos e todas, que mes-
trabalho, buscam propor uma nova forma de agir mo a distância, se fizeram presentes e juntos nos
social, contrapondo à uma determinação competiti- reinventamos. Passamos a dar valor às pequenas

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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

coisas, pois um abraço e um aperto de mão nunca e Desafios. Santa Cruz do Sul, RS, Brasil, 13 a 15
fizeram tanta falta. Assim seguimos e seguiremos de setembro de 2017.
acreditando na ciência e na igualdade de gênero OMS. Organização Mundial de Saúde. Orientações
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116
Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

See solidária no Vale do Ojô: uma


proposta colaborativa baseada na
percepção ambiental e no perfil da
comunidade local
Luiza Clemente Rodrigues1,2
Ícaro Assis Cruz1,2
Anna Syria Aranha Paiva1,2
Dyana Caroline Ferreira Cardoso1
Leandra Peixoto Nolasco Selos1,2
Lívia Tessarolo Zerbini1,2
Vitor Oliveira Martins1,2
Lara Chaves Carvalho Guerra1,3

1. Sociedade Excursionista e Espeleológica (SEE)


2. Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP)
3. Universidade de São Paulo (USP)

RESUMO mais eficiente e direcionada para atender as reais


Diante de um contexto político e histórico de expectativas da comunidade, com o propósito de
degradação do meio-ambiente intensificada pelo instalar um plano de educação ambiental mais rea-
plano desenvolvimentista brasileiro, a educação lista e que de fato seja capaz de atender as deman-
ambiental é tida como uma importante ferramenta das da comunidade local.
na conservação de cavidades naturais, especial-
mente por se tratar de um método de ensino que Palavras-Chave: educação ambiental; educação
busca não apenas ensinar o que é espeleologia, espeleológica; SEE solidária; Vale do Ojô.
mas especialmente, aproximar as comunidades
locais dos ambientes espeleológicos próximos às ABSTRACT
suas moradias. Projetos de educação ambiental são Faced with a political and historical context
cada vez mais comuns, e é de grande importância of environmental degradation intensified by the Bra-
que se estabeleça uma relação horizontal entre os zilian development plan, environmental education
educandos e educadores. Para tanto, é necessário is seen as an important tool in the preservation of
conhecer o perfil da comunidade em questão, bem natural cavities, especially because it is a teaching
como suas reais necessidades e expectativas. Com method that seeks not only to teach what it is spele-
o andamento de um projeto de educação ambien- ology, but especially to bring local communities clo-
tal denominado SEE Solidária, a Sociedade Excur- ser to the speleological environments close to their
sionista e Espeleológica apresenta, neste trabalho, homes. Environmental education projects are in-
uma proposta de formulário que objetiva reconhe- creasingly common, and it is of great importance to
cer o perfil dos moradores do bairro Padre Faria, establish a horizontal relationship between students
nas proximidades do Vale do Ojô, com a finalidade and educators. Therefore, it is necessary to know
de conhecer o público-alvo dos projetos educacio- the profile of the community in question, as well as
nais que posteriormente serão projetados de forma its real needs and expectations. With the progress

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

of an environmental education project called SEE de cada lugar, cada comunidade, cada realidade.
SOLIDÁRIA, the Excursionist and Speleological So- Esta proposta envolve reconhecer o perfil do públi-
ciety presents, in this work, a proposal for a form co-alvo, especialmente relacionados à faixa etária,
that aims to recognize the profile of the residents escolaridade, profissão, se há algum nível de enga-
of the Padre Faria neighborhood, in the vicinity of jamento político ou socioambiental, as vivências ad-
Vale do Ojô, with the purpose of know the target au- quiridas no ambiente a ser estudado e qual o nível
dience of educational projects that will later be de- de conhecimento acerca do tema a ser abordado.
signed more efficiently and directed to meet the real A Educação Ambiental é uma das diversas ferra-
expectations of the community, seeking to install a mentas de democratização do conhecimento, espe-
more realistic environmental education plan that is cialmente quando se trata de assuntos locais, os
in fact capable of meeting the demands of the local quais a sociedade possui contato próximo e direto
community. (Calvalcanti, 2020). Diante disso, a construção de
uma consciência crítica em relação ao meio em que
Keywords: environmental education; speleological se vive é o início de um processo que irá permitir
education; SEE Solidária; Vale do Ojô. ao indivíduo uma posição participativa a respeito
das questões relacionadas com a conservação e a
INTRODUÇÃO adequada utilização do patrimônio e dos recursos
O atual modelo de desenvolvimento econô- naturais (Medina, 1998).
mico brasileiro está diretamente associado à de- Vale salientar que a Educação Ambiental
gradação do meio ambiente, exercendo influência não se define somente como uma questão ecológi-
direta na qualidade de vida da espécie humana, es- ca, mas também como um processo de aprendiza-
pecialmente em nível local. Marcatto (2002) expõe gem que atinge os âmbitos sociais, econômicos e
que esse modelo de desenvolvimento tem gerado culturais. Dessa forma, esta deve ser capaz de per-
uma série de impactos como a poluição do solo, ar mitir, tanto ao educando quanto ao educador, uma
e água, bem como a destruição da biodiversidade e postura reflexiva frente aos problemas da socieda-
esgotamento de recursos naturais em todo o plane- de, como a pobreza e o consumismo excessivo,
ta. estimulando a formação de um sistema mais justo,
Dessa forma, observa-se um crescente inte- onde o desenvolvimento sustentável seja posto em
resse pelas questões ambientais nas últimas déca- prática e os cidadãos sejam dotados de senso crí-
das, devido às várias problemáticas que ameaçam tico, capazes de pensar e agir por conta própria,
a integridade ecológica do planeta. Temas como o conforme seus princípios e valores (Medina,1998;
aquecimento global, o desmatamento desenfreado Reigotta, 1997; Trigueiro, 2003; Cardozo, 2016).
de florestas e enchentes nas grandes cidades são Em relação a espeleologia, a Educação Am-
cada vez mais expostos por ambientalistas. Entre- biental carece de um cuidado mais específico. Na
tanto, a gama de fatores que envolvem os estudos realidade do Brasil, muitas são as comunidades que
e a conservação ambiental é mais complexa do que possuem um contato próximo com as cavidades,
a mídia se compromete a expor e, muitos desses, seja pelo vínculo histórico, turístico, uso da água
inclusive a espeleologia, não chegam a ser efeti- ou pela ocupação desses locais para rituais religio-
vamente divulgados à comunidade local. A fim de sos (Mendes, 2013; Aguiar, 2015). De toda forma,
preencher tais lacunas, é papel fundamental da co- apesar do ambiente cárstico estar presente na rea-
munidade espeleológica promover diálogo com a lidade de muitas pessoas, esse vínculo apresenta-
sociedade sobre os conhecimentos, saberes e vi- -se muitas vezes como um grande distanciamento
vências acerca do meio ambiente e, especialmente, ou descaso da comunidade local e das prefeituras
sobre as cavernas brasileiras. para com as cavidades. A espeleologia sendo o
A realização de projetos de educação am- conhecimento que envolve a complexidade desse
biental, no entanto, demanda uma verdadeira sistema, é ainda um tema pouco difundido e assimi-
aproximação dos educadores com a comunidade, lado pela sociedade em geral. Diante disso, a falta
para que os planos sejam adequados à realidade de informação sobre a fragilidade e importância do

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

ecossistema cavernícola, leva a pouca valorização mulário será futuramente subsídio para a execução
desses ambientes, se tornando um dos principais de um projeto que engloba o estudo de caso das
agravantes relacionados à degradação ambiental cavidades subterrâneas do Vale do Ojô, território
(Costa et al., 2007; Pereira, 2017). local fortemente impactado por ações antrópicas,
A educação espeleológica, portanto, não se visando levantar dados acerca do sentido individual
torna apenas uma aliada à democratização do co- atribuído às cavernas e assim, identificar as opini-
nhecimento e à valorização do patrimônio espeleo- ões e pensamentos compartilhados.
lógico, como também possui papel fundamental na
formação de indivíduos que se situem como parte
do meio ambiente, com atitudes que respeitem a
fragilidade do ambiente cavernícola e posturas críti-
cas frente a possíveis políticas públicas que amea-
cem a integridade desse sistema.
Em Minas Gerais, essa prática tem papel
primordial não só pela notável abundância de cavi-
dades presentes em diferentes litologias, mas tam-
bém pela pressão ambiental que essas formações
vêm sofrendo devido à proximidade dos centros
urbanos e exploração mineral (CECAV). Ao longo
do tempo, vários grupos de espeleologia vêm reali- Figura 1: Ação da SEE Solidária para Crianças da Escola
Estadual Marília de Dirceu - Ouro Preto – MG, em 2019.
zando ações educativas sobre a riqueza do mundo (Foto: Acervo SEE)
subterrâneo, entre eles a Sociedade Excursionista e
Espeleológica (SEE). Criada em 1937, por estudan- Ao trabalhar na identificação das relações
tes da então Escola de Minas e Metalurgia de Ouro entre a comunidade e o território, o trabalho alme-
Preto, a SEE foi a primeira entidade do continente ja um aprofundamento em questões subjetivas dos
americano a se dedicar aos estudos da espeleolo- moradores, levando em consideração suas his-
gia (Lino, 2001, p. 38). Dentro os diversos projetos tórias e vivências. A partir desse levantamento de
realizados pela entidade, a SEE Solidária - ideali- dados, espera-se elucidar o processo de constru-
zada em 2011 - é uma iniciativa que tem o intuito ção de afetividade, proximidade e identificação das
de difundir os conhecimentos acerca das cavernas pessoas com as cavernas do local. Conhecendo
com a comunidade de Ouro Preto, proporcionando melhor sobre o senso de pertencimento dos mo-
reflexões acerca da importância da educação am- radores, pretende-se ampliar e divulgar noções de
biental nas escolas (Figura 1). Isso é feito através conservacionismo e de educação ambiental, des-
da troca de conhecimentos entre os membros da pertando a sensibilização dos moradores do bairro
entidade e a sociedade, principalmente nas escolas para ações e políticas de proteção ambiental, com
da rede pública, por meio de conversas, oficinas e foco no protagonismo da comunidade perante estas
trabalhos de campo (Aguiar, 2015). atividades.
Diante desse cenário, o presente trabalho Um dos propósitos atuais do projeto é uma
possui o objetivo de propor a aplicação de um for- parceria com a Casa de Cultura Padre Faria, que
mulário que servirá como base fundamental para a tem como objetivo abordar a educação espeleoló-
elaboração das etapas seguintes do plano de edu- gica na comunidade, com foco no Vale do Ojô - um
cação ambiental da SEE Solidária no Vale do Ojô. importante componente geomorfológico e espeleo-
Esta proposta surgiu da necessidade de identificar lógico da região. Considerando as vivências, opini-
as percepções dos moradores do bairro Padre Fa- ões e a cultura local, pretende-se realizar práticas
ria, em Ouro Preto/MG, sobre o meio natural em de diálogo, trabalhos de campo e demais atividades
que estão inseridos, para uma efetiva aplicação de de forma horizontal e alinhada às expectativas da
metodologias às áreas da educação ambiental e população, sendo inicialmente destinada ao público
espeleológica. O resultado da aplicação deste for- infantil. Para tanto, foi considerado essencial reco-

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trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

nhecer um perfil da comunidade para entender a preocupantes de contaminação da água (Figura 5),
relação dos moradores com o Vale, a fim de realizar evidenciando a necessidade emergencial de planos
atividades coerentes com as reais necessidades e de proteção e recuperação (Timo, 2005).
interesses da comunidade.
A pandemia da COVID-19 foi um fator limi-
tante para a execução do projeto, por conseguinte,
as atividades da Casa de Cultura foram paralisa-
das, assim como as atividades presenciais da SEE.
Com isso, as atividades do projeto foram restringi-
das na elaboração de estratégias para aprimorar
o plano de ações que serão executadas posterior-
mente, quando as condições forem favoráveis. Foi
elaborada, portanto, uma estratégia para conhecer
melhor o público-alvo, a partir da confecção de um
formulário que servirá de base para a elaboração
das atividades educativas na comunidade.

CONTEXTUALIZAÇÃO DA ÁREA
O Vale do Ojô está localizado há cerca de
100 km da cidade de Belo Horizonte, entre Ouro

Figura 3: Intervenção antrópica na parte interna da Gruta


do Fogão – Vale do Ojô. (Foto: acervo SEE).

Figura 2: Mapa de localização do Vale do Ojô


(Oliveira e Timo, 2005).

Preto e Mariana, todas no estado de Minas Gerais


(Figura 2). Também conhecido como “Arraial do
bom Sucesso”, o Vale pertence à microbacia do Ri-
beirão do Funil, afluente do Rio do Carmo. Foi um
dos primeiros territórios a ser ocupado pela popula-
ção que chegou atraída pela mineração de ouro em
aluvião, no fim do século XVII (Timo, 2005).
Figura 4: Gruta do Fogão – Vale do Ojô. (Foto: acervo
Na década de 50, o território foi explorado SEE).
pela atividade minerária na extração de mármore,
juntamente com a instalação da fábrica de tecidos
e, com isso, se iniciou o processo de ocupação po-
pulacional desordenada, levando o local a níveis
alarmantes de poluição do solo e da água. Apesar
da atividade minerária e industrial terem sido inter-
rompidas, ainda há grande quantidade de lixo, den-
tro e fora das grutas (figura 3 e 4), além de níveis

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

durante o período de isolamento social, em decor-


rência do surto epidemiológico da COVID-19 com
moradores do bairro. Seguindo as normas de se-
gurança sugeridas pela OMS e pelas diversas ins-
tituições de saúde do país, ocorreram encontros
entre membros-pesquisadores da Sociedade Ex-
cursionista e Espeleológica (SEE) e agentes da
comunidade no Centro Cultural Comunitário Casa
do Padre Faria, com vistas a discutir e viabilizar a
parceria entre SEE e o bairro Padre Faria, ainda, de
propor parcerias entre grupos e instituições que já
atuam neste território.
Fruto destas aproximações e encontros na
Casa de Cultura, foram propostas ações e ativida-
des entre SEE e membros da comunidade do Padre
Faria que possam dar início a construção de proje-
tos e ações voltadas a educação ambiental, bus-
cando fortalecer as relações de identificação e per-
tencimento da comunidade com o “Vale do Ojô” e
as cavidades naturais presentes neste território, de
modo que os moradores sejam os principais agen-
tes na luta pela conservação do patrimônio natural
e espeleológico, ainda, de promover a cidadania.
Figura 5: Córrego do Funil - Gruta Ponte de Pedra – Vale
do Ôjo. (Foto: Paulo Eduardo Lima).
Elaboração do Formulário
MATERIAIS E MÉTODOS O formulário (em anexo) foi confeccionado em um
Revisão Bibliográfica modelo que busca responder as questões que en-
A primeira etapa deste projeto constituiu volvem a percepção dos indivíduos, para uma pos-
numa revisão bibliográfica, com o objetivo de iden- terior análise generalizada do perfil da comunidade.
tificar trabalhos desenvolvidos pela comunidade es- A primeira parte do formulário traz questões sobre
peleológica sobre educação ambiental, educação o perfil do entrevistado, trazendo informações como
espeleológica e projetos sociais, como os trabalhos faixa etária, escolaridade, nome, etc; a segunda
de Costa (2007) e Mendes (2013). Também foi re- parte busca compreender a percepção do indivíduo
alizada uma revisão dos trabalhos anteriormente acerca do meio ambiente – sobre o estado de con-
realizados pela SEE Solidária, com o intuito de revi- servação do ambiente em seu entorno, o conheci-
sitar a história do projeto (Timo, 2005; Aguiar 2015). mento de projetos em educação ambiental e o pa-
Dessa forma, foi possível delinear uma proposta pel das Unidades de Conservação. A terceira parte
de trabalho com base em publicações anteriores, busca identificar qual a ideia que o indivíduo tem
identificando metodologias adequadas e possíveis sobre espeleologia (o tema específico do projeto) a
limitações. fim de saber qual será a abordagem mais adequa-
da para a implantação de um projeto de educação
Contato com a comunidade espeleológica para este público; e por fim, a quarta
O trabalho a ser desenvolvido dá enfoque parte traz questões sobre qual a percepção e apro-
ao humanismo, a descentralização e a horizonta- ximação do indivíduo na área de interesse – o Vale
lidade das relações. Desta forma, busca construir do Ojô. Todas essas etapas são importantes para
ações em conjunto com a comunidade do bairro Pa- o reconhecimento do perfil da comunidade, suas
dre Faria. reais necessidades e se há algum nível de defasa-
Para tal, foram estabelecidos contatos pré- gem em algum desses tópicos.
vios, através das redes sociais, de forma remota,

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

RESULTADOS E DISCUSSÕES o nível de aprofundamento que será necessário no


Proposta de aplicação e estrutura do formulário que se refere ao conceito de meio-ambiente e polí-
O formulário é dividido em 5 partes, cate- ticas públicas de conservação ambiental. Caso seja
gorizadas pelo tema das perguntas. As perguntas notada uma defasagem neste tema, é necessário
são referentes à temas como Educação Ambien- que o plano de atividades do projeto busque suprir
tal, Espeleologia, Vale do Ojô e Perfil do Entrevis- lacunas e promover um bom esclarecimento em
tado. A aplicação do questionário deve ser prece- questões ambientais, essenciais para que a comu-
dida de uma breve contextualização verbal sobre nidade possa acompanhar de forma ativa a tomada
o propósito das perguntas, os objetivos do projeto de decisão de órgãos públicos na conservação do
e a importância da participação dos entrevistados meio ambiente.
na elaboração de um eficiente plano de educação
ambiental. Deve ser esclarecido que informações Terceiro bloco
pessoais não serão divulgadas, bem como a não Esta etapa se dedica a questões exclusivas
obrigatoriedade de resposta em caso de desconfor- sobre o tema “espeleologia”, composta por 5 per-
to do entrevistado. É importante que o entrevista- guntas, sendo 2 de múltipla escolha (sim ou não),
dor leia em voz alta e de forma clara as perguntas, duas questões abertas, uma questão mista e um
para que não haja má interpretação ou dificuldade campo de observações. A primeira questão busca
no entendimento da pergunta. A responsabilidade responder se o entrevistado sabe o que é espe-
de verbalizar as perguntas assegura que não haja leologia ou já ouviu falar a respeito, e a resposta
segregação por escolaridade, permitindo que pes- seguinte só deve ser respondida caso o entrevis-
soas não alfabetizadas participem da pesquisa. É tado dê uma resposta afirmativa para a primeira
desejável que as respostas sejam grafadas com ca- pergunta. O resultado da aplicação desta etapa do
neta, para melhor nitidez e durabilidade da tinta no questionário é importante para um diagnóstico so-
papel. O tempo de aplicação do questionário pode bre qual o nível de conhecimento sobre cavernas,
variar entre 3 a 5 minutos a depender do tamanho se já houve algum tipo de visita, contato próximo ou
das respostas e da facilidade de compreensão das interesse de conhecer grutas. O plano de educação
perguntas. No total, são 21 perguntas, sendo 12 de ambiental deve levar em consideração o interesse
múltipla escolha, 4 questões abertas e 4 questões da comunidade em realizar excursões ou visitas as
mistas. cavidades, e qual deverá ser o nível de aprofunda-
mento no tema em aulas expositivas.
Primeiro bloco
Consiste na identificação do entrevistador e Quarto bloco
a data da aplicação do questionário. Esta etapa busca compreender qual o nível
de interação da comunidade com o Vale do Ojô,
Segundo bloco através da aplicação de 3 perguntas, sendo duas
Destinado a compreender as relações entre de múltipla escolha e uma mista. Caso o entrevista-
o entrevistado e suas experiências pessoais com o do não conheça o Vale do Ojô, deve-se pular para
meio ambiente e a educação ambiental. Este grupo as perguntas do bloco seguinte. As perguntas bus-
de questões está organizado em 11 perguntas, sen- cam compreender se o entrevistado conhece o lo-
do 8 de múltipla escolha e 3 mistas. São perguntas cal, se conhece as grutas e qual sua opinião sobre
que objetivam esclarecer qual o conhecimento que o estado de conservação do ambiente. Este bloco
o entrevistado tem com relação à Unidades de Con- pode trazer respostas de pessoas com alto nível de
servação, projetos de ação e educação ambiental interação e conhecimento do vale, as quais devem
na comunidade, bem como se está engajado em ser levadas em consideração no plano de educação
algum tipo de ação política e/ou socioambiental ambiental - buscando trazer às atividades experi-
no bairro. Estas perguntas servirão de base para ências e conhecimento prévio dos participantes, a
orientar as ações e planos do projeto de educação fim de se realizar uma troca de informações e apro-
ambiental com base na experiência e nas vivências ximar as atividades às expectativas e necessida-
da comunidade com relação a este tipo de ação, des da comunidade. Em caso de entrevistados que

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

não tem conhecimento sobre o Vale, é redobrada a mecanismo de escuta, também se tornou evidente
atenção que deve ser dada no plano de educação a importância de uma comunicação informal com a
ambiental no que se refere à realização de excur- população, utilizando de uma abordagem adequa-
sões. da de forma que os cidadãos se sintam confortáveis
ao falarem de suas percepções e subjetividades a
Quinto bloco respeito das vivências no meio em que estão inseri-
São perguntas destinadas a reconhecer o dos.
perfil do entrevistado, com perguntas referentes ao O questionário busca levantar informações
gênero, faixa etária, grau de escolaridade, municí- qualitativas e quantitativas sobre o perfil da comu-
pio de origem e tempo de residência no bairro, além nidade do Padre Faria, relacionando parâmetros
de um espaço destinado às observações. São bem- como idade e tempo de vivência no bairro, noções
-vindas sugestões e comentários do entrevistado, sobre medidas de educação e conservação am-
referentes não só à aplicação do questionário, mas, biental com a atual situação do Vale do Ojô, noções
inclusive, a expectativa quanto às atividades de sobre espeleologia, a relação da coleta de lixo e
educação ambiental que serão propostas. Dessa limpeza urbana com a poluição do meio ambiente
forma, existe uma aproximação mais realista com a e as áreas do Vale, suas encostas e seu entorno,
comunidade e o plano de atividades pode ser mais ainda, da relação destes com a reutilização e reci-
eficiente, inclusivo e satisfatório para os participan- clagem do lixo e com a coleta seletiva.
tes.
CONCLUSÕES
Propósito e importância de aplicação O “Vale do Ojô” apresenta significativo patri-
A partir da aproximação de lideranças co- mônio arqueológico, espeleológico, hídrico e paisa-
munitárias e dos responsáveis pelo Centro Cultural gístico, ainda, destaca-se como um local de enor-
Comunitário do Padre Faria, bem como da realiza- me potencial ao ecoturismo, potencial este que tem
ção de visitas e atividades de campo pelo Vale do sido demandado por moradores e lideranças do
Ojô, foi diagnosticada a situação de degradação e bairro que vislumbram o desenvolvimento de um tu-
poluição das cavernas, dos recursos hídricos e do rismo de base comunitária. Diante deste cenário, as
meio fisiográfico do território. A partir deste diagnós- ações que pretendem ser desenvolvidas almejam
tico, foram levantados questionamentos e formas proporcionar a comunidade um território mais limpo
de abordagem com a comunidade, a fim de elabo- e conservado, através de metodologias colaborati-
rar um questionário para reconhecer o perfil da co- vas que reforcem iniciativas de base comunitária,
munidade, cujas perguntas enfocam em noções de ainda, dando visibilidade ao Vale e ao patrimônio
pertencimento, educação ambiental e patrimonial. natural da área.
Em andamento, essas ações visam a sensibiliza- Iniciativas de educação ambiental devem
ção dos diferentes públicos alvos da comunidade estar alinhadas à realidade singular de cada local,
para as demandas de conservação do patrimônio às expectativas da comunidade, às necessidades
natural e espeleológico, almejando-se assim o for- de suprir defasagens ou aproveitar de experiências,
talecimento dos processos sustentáveis de gestão vivências e sabedorias da população local. Para co-
comunitária. nhecer melhor o perfil do público alvo e desenvolver
Diante do levantamento bibliográfico, do um eficiente plano de educação ambiental, a apli-
contato com representantes da Casa de Cultura cação do formulário proposto traz respostas chave
do Padre Faria e da elaboração do formulário, foi para esse alinhamento, sendo uma útil ferramenta
possível a construção de uma base sólida para o para a construção de propostas adequadas para a
projeto. Reconhecendo a importância do exercício comunidade local.
de escuta e atenção às necessidades da comunida- As respostas divididas em blocos catego-
de como guias para a proposição de atividades, o rizados por temas podem auxiliar na detecção de
desenvolvimento do trabalho se dará de forma hori- possíveis defasagens ou níveis satisfatórios de
zontal e alinhada aos interesses dos moradores. conhecimento sobre cada assunto, orientando os
Além da adoção do formulário como principal executores do plano de educação ambiental sobre

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Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE
trabalhos espeleoturismo e educação ambiental

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trabalhos geomorfologia

O patrimônio espeleológico do carste em


quartzito no norte do Parque Estadual da
Serra do Intendente, Espinhaço Meridional
Gabriel Amora Basílio 1,2
Pedro Assunção 1,2
Vitor Oliveira Martins 1,3
Guilherme Passos Ribas 1,2

1 Sociedade Excursionista e Espeleológica - SEE;


2 Departamento de Geologia – DEGEO / Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP
3 Departamento de Turismo – DETUR / Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP

RESUMO ABSTRACT
O norte da Serra do Intendente faz parte da The north of the Serra do Intendente is part
Serra do Espinhaço Meridional e ostenta grande im- of the Serra do Espinhaço Meridional, considered of
portância ambiental, devido à sua biodiversidade e great environmental importance due to its biodiversi-
recursos hídricos. Na região, as rochas predominan- ty and water resources. The predominant rocks are
tes são quartzitos, pertencentes à Formação Galho quartzites from the Galho do Miguel Formation, which
do Miguel, que passaram por intensas deformações underwent intense deformations and metamorphism.
e metamorfismo. A interação entre os processos en- The interaction between endogenous and exoge-
dógenos e exógenos, durante o tempo geológico, nous processes during the geological time enabled
possibilitou a evolução espeleogenética de um relevo the speleogenetic evolution of a quartzite karst relief,
cárstico em quartzito, caracterizado por feições como characterized by features such as sinkholes, karst
dolinas, sumidouros, surgências e cavernas. Essas springs and caves. These characteristics make up
características compõem o patrimônio espeleológi- the speleological heritage of the Serra do Intenden-
co do Parque Estadual da Serra do Intendente, que te State Park, which plays a fundamental role in the
desempenha um papel fundamental na proteção e protection and conservation of these natural caves.
conservação dessas cavidades naturais. Tendo em Given the importance of this area, this work sought
vista a importância desta área, este trabalho realizou to survey the characteristics and speleological poten-
um levantamento das características e do potencial tial of this heritage, which speleological prospecting,
espeleológico deste patrimônio, por meio da pros- cave mapping, speleometry, characterization of the
pecção espeleológica, mapeamento de cavernas, es- local karst and analysis of the relevance of the physi-
peleometria, caracterização do carste local e análise cal environment of the main caves were carried out.
preliminar da relevância do meio físico das cavidades According to geological attributes, the results show
principais. Os resultados mostram que existe alto po- high potential and high occurrence of caves, highligh-
tencial e alta ocorrência de cavernas, destacando-se ting the Bento I Cave and the Frida Grotto, classified
a Caverna do Bento I e a Gruta da Frida, classifica- in the highest degree of relevance. It was found that
das no grau máximo de relevância, de acordo com the region's karst has great environmental importance
os atributos geológicos. Constatou-se que o carste and, therefore, there is a need for its protection and
da região tem uma grande importância ambiental e, conservation.
portanto, há a necessidade de sua proteção e conser- Keywords: Speleological Heritage; Serra do Inten-
vação. dente; Quartzitic Karst; Speleology.
Palavras-Chave: Patrimônio Espeleológico; Serra do
Intendente; Carste em quartzito; Espeleologia.
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INTRODUÇÃO tente ao intemperismo químico. Embora não seja o


A área de estudo está localizada no extremo único processo que ocorre, pois os quartzitos são
norte do Parque Estadual da Serra do Intendente constituídos também por outros minerais mais so-
(PESI) (Figura 1), no distrito de Candeias, Con- lúveis permitindo o desenvolvimento do processo
ceição do Mato Dentro, Minas Gerais. A região faz de dissolução, além da própria dissolução lenta do
parte da Serra do Espinhaço Meridional (SdEM), quartzo ao longo do tempo geológico. Estes pro-
(ALMEIDA-ABREU E RENGER, 2002) e está a cessos, associados ao grau de fraturamento e do-
aproximadamente 200 km a nordeste da capital mi- bramento destas rochas, contribuem para formação
neira, Belo Horizonte (Figura 1). de algumas cavidades naturais (LEÃO et al., 2012;
A região apresenta-se como uma zona de AULER et al., 2015).
transição entre os biomas Cerrado e Mata Atlânti- A espeleogênese em rochas siliciclásticas
ca, considerados dois hotspots brasileiros de bio- tem sido objeto de pesquisa de vários autores no
diversidade e classificada como prioridade extre- Brasil, sobretudo em regiões constituídas predomi-
mamente alta no mapa de áreas prioritárias para a nantemente por quartzitos, onde há grande ocorrên-
conservação no Brasil (IEF, 2016). Além disso, está cia de cavernas. As Serras de Ibitipoca, do Itacolomi
situada em um importante divisor de águas de duas e do Espinhaço Meridional podem ser citadas como
regiões hidrográficas brasileiras, São Francisco e exemplo. Esses autores discutem a existência de
Atlântico Sudeste; a região de estudo abastece as um relevo cárstico não convencional desenvolvido
bacias do Rio Doce e Rio das Velhas. As caracterís- em rochas quartzíticas, na qual as feições como
ticas geológicas da região determinam a formação dolinas, sumidouros, surgências e cavernas são
de sistemas aquíferos fissurados, que transmitem comuns, assim como no carste em rochas carboná-
e armazenam água a partir das fraturas na rocha ticas. Existem também formações de depósitos quí-
(CBH-DOCE, 2014; ANA, 2015; IGAM, 2015; IBGE, micos (espeleotemas) formados por precipitações
2015; IEF, 2016). de sílica na forma de opala em cavernas de quartzi-
A SdEM está inserida no cinturão de dobras to, como descrito no Parque Estadual do Itacolomi.
e falhas que compreende a porção mais ocidental No entanto, essa discussão encontra-se em aberto,
da Faixa Araçuaí. Nessa província tectônica as ro- uma vez que existe controvérsias sobre o proces-
chas foram metamorfizadas e deformadas devido so de dissolução química em diferentes substra-
a forças compressivas de direção E – W, atuantes tos rochosos (LIMA, 1987; SILVA, 2004; RENÓ et
durante o Ciclo Brasiliano (575 e 530 Ma) (ALKMIM al., 2009; FABRI E AUGUSTIN, 2013; FABRI et al.,
et al., 2017). A litologia predominante são quartzitos 2014; BENTO et. al. 2015).
puros, eólicos, pertencentes à Formação Galho do O patrimônio espeleológico constitui-se do
Miguel de idade mesoproterozoica 1.49 – 1.59 Ga conjunto de atributos abióticos e bióticos referentes
(Figura 1), Supergrupo Espinhaço, segundo levan- às cavernas e seu entorno existentes em uma de-
tamento geológico realizado na Folha Presidente terminada região cárstica. Estes ambientes naturais
Kubitschek (KNAUER E FOGAÇA, 1996; SANTOS possuem ecossistemas únicos e grande fragilidade
et al., 2015). Devido a longa exposição ao intempe- ambiental, por isso, as cavernas são consideradas
rismo e à erosão, durante o tempo geológico, esses bens da União. Segundo critérios geológicos, uma
quartzitos apresentam um relevo cárstico evoluído caverna é considerada de máxima relevância se
com feições típicas, como dolinamentos e formação apresentar gênese e morfologia rara, espeleotemas
de cavidades subterrâneas. O reconhecimento do únicos e/ou dimensões notáveis. Por isso existe a
grande potencial espeleológico da região permitiu a necessidade da proteção dessas cavernas e a im-
proposição de sua designação como Província Cá- portância do Parque Estadual da Serra do Inten-
rstica Silicosa Serra do Espinhaço (PCSSE) (SILVA, dente na conservação deste patrimônio. (BRASIL,
2004). 2008; MMA, 2009; CRUZ E PILÓ, 2019).
O processo de denudação dominante em Considerando a contextualização geral, a
terrenos siliciclásticos e quartizíticos, como na área importância ambiental e o potencial espeleológico
estudada, é a erosão mecânica ocasionada pela do norte da Serra do Intendente, este trabalho pro-
água, uma vez que o quartzo é um mineral resis- pôs um levantamento das características do meio

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físico do patrimônio espeleológico do norte da Ser- A análise prévia do potencial espeleológico


ra do Intendente, bem como buscou compreender da região foi realizada a partir da fotointerpretação.
um pouco dos processos que envolvem a gênese Inicialmente, foi utilizado o software Google Earth
das cavernas e a constituição do carste em quart- Pro®, que permitiu identificar as principais feições
zito local. Para isso, foram feitas uma avaliação da características do exocarste, como dolinas, sumi-
potencialidade de ocorrência de cavidades naturais douros e surgências. Posteriormente, foi feita a
subterrâneas em função dos atributos geológicos Análise Multicritério Ponderada (AMP) que auxiliou
e geomorfológicos, uma prospecção espeleológica numa avaliação mais criteriosa do potencial espe-
expedita numa área total de 1149 hectares, uma ca- leológico. Trata-se de um método de geoprocessa-
racterização do meio físico do entorno com ênfase mento que exibe valores para os pixels de arquivos
nos atributos associados à gênese e desenvolvi- raster, onde é possível atribuir pesos e notas para
mento de cavidades naturais subterrâneas, além de cada classe de pixels, a partir de um determinado
uma avaliação preliminar de relevâncias das princi- atributo (ARAÚJO et al., 2019). Para elaborar o
pais cavidade encontradas com base nos atributos mapa de potencial espeleológico, utilizou-se como
do meio físico internos. atributos de entrada os mapas de declividade, es-
truturas e lineamentos geológicos, direção de fluxo
da água e modelo digital de elevação. O procedi-
mento foi realizado por meio do software QGis ®
3.10, em conjunto com o plugin Weighted Multi-Cri-
teria Analysis – WMCA ®.
O levantamento de dados durante a pros-
pecção espeleológica foi concentrado nas regiões
de maior potencial espeleológico. Realizou-se um
levantamento de imagens de alta resolução por
meio de drone Mavic Pro - DJJ® para obter ima-
gens do entorno das cavidades e fotos aéreas da
área. O registro dos dados foi realizado em uma
caderneta de campo, que segue o modelo indicado
pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação
de Cavernas (CECAV) e contempla todos os as-
pectos principais do exocarste e endocarste. Além
disso, também foram coletados dados geológicos,
hidrológicos e de cobertura vegetal, a partir de pon-
tos de controle distribuídos pela região a fim de ca-
racterizar o meio físico do carste em quartzito local.
O mapeamento espeleológico foi realizado
a partir do levantamento dos dados topográficos
por uma equipe composta por quatro integrantes.
O ponta de trena e o instrumentista foram respon-
sáveis pela tomada de medidas geométricas e an-
gulares referentes às visadas que conectam bases
Figura 1: Localização da área de estudo e da geologia da
região do Parque Estadual da Serra do Intendente. topográficas. O anotador transcreveu os dados
coletados para uma planilha. O croquista realizou
MATERIAIS E MÉTODOS a representação da cavidade em três dimensões,
por meio de uma seção horizontal (planta baixa),
Inicialmente, realizou-se uma revisão biblio-
do corte transversal e do perfil longitudinal. Por
gráfica por meio de publicações que contemplam a
fim, os croquis foram digitalizados e vetorizados a
área de estudo e um levantamento de dados geoes-
partir do software AutoCad. A Espeleometria das
paciais secundários.
cavidades foi realizada considerando a projeção

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trabalhos geomorfologia

horizontal pelo método da descontinuidade, além


dos cálculos de área e desnível. Não se adotou o
cálculo de estimativa do volume devido às maiores
complexidades dos métodos não corresponderem
à proposta do trabalho (RUBIOLI E MOURA, 2005;
ASSUNÇÃO E BRAGANTE-FILHO, 2017, CRUZ E
PILÓ, 2019)
A avaliação preliminar do grau de relevân-
cia foi aplicada às cavidades que apresentaram
os maiores valores espeleométricos em relação à
projeção horizontal e à área. Para sua realização,
baseou-se nos atributos do meio físico interno das
cavidades tais como, litologia, recursos hídricos,
depósitos clásticos e químicos, com base na Instru-
ção Normativa nº 2 do Ministério de Meio Ambiente
de 2009.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Potencial Espeleológico Local
A delimitação do potencial espeleológico
de uma determinada região corresponde à defini-
ção de áreas com condições favoráveis à formação
de cavidades. Tais condições estão relacionadas a
aspectos do meio físico, como litologia, estruturas Figura 2: Potencial espeleológico e lineamentos estrutu-
geológicas, hidrogeologia, hidrografia, pedologia e rais evidenciando as cavernas encontradas na prospec-
ção espeleológica.
feições geomorfológicas. Além disso, os gradientes
altimétrico e hidráulico atuam de maneira funda-
mental no controle da ação das águas, da remo-
ção mecânica de grãos e da dissolução das rochas
(JANSEN et al., 2012; ICMBIO, 2019).
Na avaliação do mapa de potencial espele-
ológico, verificou-se que nas regiões de média ver-
tente e com declividades acentuadas, foram regis-
trados os maiores potenciais (Figura 2). Uma vez
que a área de estudo está inserida em uma única
unidade geológica, o parâmetro de litologia não foi
relevante na análise de multicritério.

Espeleometria e morfologia das cavernas ma-


peadas
Apenas as cavidades Bento I e a Gruta da
Frida foram mapeadas no grau de precisão BCRA-
-3C; as demais alcançaram o nível BCRA-2C (Day,
Tabela 1: Cavernas caracterizadas na prospecção es-
2002). Estes mapas podem auxiliar futuros estudos peleológica.
nas cavidades em questão, como estudos de rele-
vância, geoespeleologia, potencial turístico, avalia- projeção horizontal varia de 5 a 305 metros e área
ção de impacto e biologia subterrânea. de 6 a 3185 metros quadrados. As plantas baixas
Na Tabela 2 estão expostos os principais da- seguem um padrão retilíneo e os perfis longitudi-
dos espeleométricos das cavernas mapeadas. A nais são predominantemente inclinados. Os cortes

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transversais variam desde triangulares, lenticular quando a água subterrânea atinge o interior das
horizontal e inclinado, elipsoidal horizontal, fungi- cavidades, onde notam-se lagos de pequeno porte,
forme e irregular (PALMER, 1991). fluxo e queda d’águas, e as entradas das cavernas
Destacam-se as cavernas Bento I e a Gruta da Fri- possuem sumidouros à montante, e à jusante cons-
da, devido suas dimensões notáveis para esse tipo tituem surgências. Em relação à infiltração e recar-
de litologia e as quais foram consideradas para fa- ga desta região, os solos mais comuns são os ne-
zer a avaliação preliminar do grau de relevância, ossolos quartzarênicos pouco desenvolvidos, mas
segundo atributos do meio físico destas cavidades. existem organosolos (turfeiras) associados.
As turfeiras constituem importantes reserva-
tórios de água em subsuperfície, ao absorverem a
água meteórica durante os períodos chuvosos. Elas
são responsáveis, ao longo do ano, pela recarga e
infiltração dos aquíferos fissurais quartzíticos e das
drenagens subterrâneas existentes em cavernas,
mantendo a perenidade de nascentes e surgências
e, consequentemente, dos cursos hídricos super-
ficiais. Isso ocorre, pois as turfeiras armazenam a
água de recarga em seus poros, mas com uma li-
beração lenta, devido à complexa relação de equilí-
Tabela 2: Cavernas topografadas e espeleometria. Obser-
vações: PH = Projeção Horizontal (método da continuida- brio de forças mátricas e de capilaridade favoráveis
de) e D = Desnível para manutenção da água em seus poros (CAM-
POS, 2014).
A formação de espeleotemas em cavernas
Modelo conceitual do carste local
de quartzito é outro ponto que chama atenção na
A geologia é constituída basicamente por ro-
região. A caverna da Frida possui, em seu salão
chas quartzíticas, da Formação Galho do Miguel.
principal, uma grande variedade de tipos de espe-
Essas rochas possuem diversas descontinuidades
leotemas, como escorrimentos, colunas, estalagmi-
devido a estratificações primárias sedimentares,
tes, estalactites e coraloides. Além disso, notam-se
fraturamentos/falhamentos e dobramentos tectôni-
variações na coloração relacionados muito pro-
cos. O arcabouço estrutural local está condiciona-
vavelmente à composição química destes. Essas
do a sistemas de dobras e falhas de empurrão da
formações podem ser atribuídas aos processos de
Faixa Araçuaí com vergência tectônica compressi-
dissolução e precipitação durante a espeleogêne-
va de leste para oeste, relacionada com o do Ciclo
se.
Brasiliano (KNAUER E FOGAÇA, 1996; ALKMIM
De acordo com o modelo de Silva (2004),
et al., 2017). Localmente, os quartzitos apresen-
no início da espeleogênese há a predominância do
tam uma foliação com mergulho para SE e famílias
processo químico de dissolução da sílica e outros
de fraturas subverticais de direção N80W-85SW e
minerais (arenização) desagregando a matriz da
N10E-70NW. A geomorfologia e a hidrografia es-
rocha e, posteriormente, predomínio da erosão me-
tão intimamente ligadas à geologia da região e aos
cânica e transporte formando proto-condutos (pi-
processos exógenos (sobretudo à espeleogênese),
ping). Por fim, há o alargamento pelo processo de
constatadas pelas feições típicas do carste, como
desabamento de blocos das paredes e do teto das
dolinamentos e cavernamentos.
cavidades em decorrência dos planos de fraqueza
Do ponto de vista hidrogeológico, a água
da rocha. A espeleogênese das cavernas locais é
subterrânea é transmitida e armazenada pelas fra-
favorecida devido à direção preferencial do fluxo
turas (aquíferos fraturados), uma vez que a matriz
subterrâneo para sudeste, concordante com a di-
rochosa é bastante recristalizada devido ao meta-
reção de mergulho das camadas rochosas e com a
morfismo, diminuindo a porosidade intergranular
inclinação do terreno (Figura 3).
(FEITOSA et al., 2008; AULER et al., 2015). Pode-
-se considerar a presença de um aquífero cárstico

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Figura 3: Modelo conceitual do carste em quartzito com Figura 4: Planta baixa da Caverna do Bento I, georrefe-
maior ocorrência de cavernas, considerando aspectos renciada, com destaque para suas entradas, seu entorno
geológicos-estruturais, hidrogeológicos, espeleológicos, e seu interior. A) Entrada 1 vista do interior. B) Entrada 3
hidrológicos e geomorfológicos. vista do interior. C) Salão principal D) Entrada 4 e surgên-
cia principal vista do interior.

Relevância do meio físico do patrimônio espe- mônio espeleológico da área estudada, que podem
leológico qualificá-las com importância acentuada sobre en-
A área estudada apresenta alta ocorrência foque local e regional (BRASIL, 2008).
de cavidades naturais subterrâneas dentro de seus A Caverna do Bento I está contida no Plano
limites. Dentre as vinte cavidades caracterizadas, de Manejo do PESI e apresenta-se como a caverna
destacam-se a Caverna do Bento I e a Gruta da mais volumosa da região de estudo. Esta cavidade
Frida pelo tamanho em área e volume e pela pre- possui quatro entradas, sendo três sumidouros e
sença excepcional de espeleotemas, que são con- uma surgência (Figura 4). As entradas à montante
siderados raros para a litologia em questão. Essas estão localizadas em depressões fechadas (doli-
cavidades exibem os aspectos mais relevantes em nas) (Figuras 4A e 4B), irregulares, que capturam
relação aos atributos do meio físico dentre o patri- drenagens superficiais e as direcionam para o fluxo

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subterrâneo. Em seu interior, as três drenagens se ção escura e alta dureza, indicando uma composi-
encontram no salão principal (Figura 4C) para for- ção por silicatos e óxidos/hidróxidos de ferro (Figu-
mar um único curso d’água, que sai pela surgência ra 5B). Observou-se a distribuição generalizada de
da entrada à jusante (Figura 4D). estalagmites (Figura 5C), estalactites, microtraver-
A litologia da caverna é constituída por quart- tinos, colunas, escorrimentos (Figuras 5D) e crosta
zitos finos, de coloração variando em tons de verme- ferruginosa.
lho, amarelo e branco, dispostos em camadas com
mergulho de aproximadamente 22° para sudeste.
A presença de intrusões de quartzo, concordantes
às camadas de quartzito parecem condicionar a
formação de alguns condutos, como observado na
entrada 2, além da presença de alguns indicadores
cinemáticos estruturais como sigmoides de quartzo
com vorticidade destral. Fraturas e falhas de dife-
rentes escalas são observadas por toda a cavidade,
que se desenvolve, na direção sudeste, controlada
pela principal família de fraturas observada em toda
a região, de direção N75W-80SW.
Os depósitos clásticos são abundantes em
toda a caverna, sendo constituídos majoritariamen-
te por seixos, blocos e matacões, dispostos de for-
ma caótica pelos condutos e salões da cavidade
(Figura 4C). Os espeleotemas são representados
especialmente por estalactites e estalagmites que
se distribuem em toda a cavidade, a partir do in-
tenso gotejamento de água, que infiltra pelos tetos
e paredes. Além disso, a presença de coraloides é
abundante, evidenciando a exsudação e percola-
ção de água pelas fraturas da rocha.
A Gruta da Frida possui três entradas (Fi-
gura 5): a primeira caracterizada por um sumidou-
ro (Figura 5A), a segunda pela presença de duas
claraboias e a terceira por uma surgência. Em seu
interior, destaca-se uma drenagem perene que pro-
porciona a formação de poços do tipo “marmitas”,
além de feições paragenéticas como “bell holes”
e “piping” (CHRISTOFOLETTI, 1980; BIRGMIN-
GHAM et al., 2010; FABRI E AUGUSTIN, 2013).
A litologia da caverna trata-se de um quartzito fri-
Figura 5: Planta baixa da Gruta da Frida com destaque
ável de cor alaranjada e granulometria fina, apre- para suas entradas, seu entorno e seu interior. A) Entrada
sentando foliação, fraturas subverticais e veios de 1 vista do exterior. B) Estalagmite com crosta de óxidos.
quartzo. Os depósitos clásticos ocorrem desde blo- C) Estalagmite de tamanho excepcional D) Escorrimento
e percolação de água no salão dos espeleotemas.
cos irregulares de tamanhos métricos, até depósi-
tos de areia fina a média. De acordo com a IN 2009 do MMA e con-
O principal destaque da cavidade são os siderando as dimensões notáveis para esta litolo-
espeleotemas em seu salão principal, que se dis- gia, espeleotemas raros e gênese/morfologia única,
tribuem com alta frequência, grande variedade e ta- além da importância destas para o sistema cárstico
manhos expressivos que variam de centimétricos a local, pode-se classificar a Caverna Bento I e Gruta
métricos. Alguns destes espeleotemas têm colora- da Frida em máximo grau de relevância.

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trabalhos geomorfologia

CONCLUSÕES Estadual da Serra do Intendente pela autorização


O norte da Serra do Intendente apresenta dos estudos. À Sociedade Excursionista e Espele-
alta ocorrência de cavidades naturais subterrâneas. ológica (SEE) pelo apoio e incentivo, além de pro-
Nesta área foram caracterizadas 20 cavernas, sen- porcionar um ambiente propício ao aprimoramento
do duas delas já conhecidas e descritas no Plano de das técnicas utilizadas.
Manejo do Parque Estadual da Serra do Intendente.
Dentre essas cavidades, quatro delas se destacam REFERÊNCIAS
pela presença excepcional de depósitos químicos ALKMIM, F. F.; KUCHENBECKER, M.; REIS, H. L.;
(espeleotemas), considerados raros nesta litologia, e PEDROSA-SOARES, A. C. The Araçuaí Belt. In
além de desenvolvimento linear horizontal superior São Francisco Craton, Eastern Brazil. Springer, p.
a 150 metros de comprimento, com a maior das ca- 255-276, 2017.
vidades possuindo um total de 305 metros de con-
dutos mapeados. Com exceção de uma cavidade ALMEIDA-ABREU, P. A. e RENGER, F. Serra do
(Caverna do Bento XVIII), não foram encontradas Espinhaço Meridional: Um orógeno de colisão do
depredações ou interferência humana em nenhuma Mesoproterozóico. Revista Brasileira de Geociên-
das cavidades encontradas, estando em ótimo es- cias. v. 32. p. 1-14, 2002.
tado de conservação tanto as cavidades quanto a
vegetação em seus entornos. ANA, Agência Nacional de Águas. 2015b. Região
A área possui grande importância científica Hidrográfica Atlântico Sudeste. Disponível em: <
por ser um exemplar único de carste em quartzito http://www2.ana.gov.br/Paginas/portais/bacias/
com um grande potencial para estudos sobre es- AtlanticoSudeste.aspx. > Acesso em: Fevereiro de
peleogênese em rochas quartzíticas. Há também a 2021.
importância ambiental das turfeiras, responsáveis
pelo armazenamento de água e manutenção do ASSUNÇÃO, P. H.; e BRAGANTE-FILHO, M. A.
aporte hídrico nas cavernas, nascentes e drena- Atual metodologia de mapeamento de cavernas re-
gens da região, além de representarem importantes alizada pela Sociedade Excursionista Espeleológi-
zonas de recarga do aquífero local. ca-SEE. Revista Espeleologia Digital. Nº I, p.20-24.
De acordo com os atributos do meio físico, Ouro Preto, Minas Gerais, 2017.
o norte da Serra do Intendente apresenta eleva-
da relevância científico-ambiental e espeleológica, AULER, A.; ALT, L.; MOURA, V.; e LEÃO, M. Ca-
sendo de extrema importância a sua preservação vernas da Serra do Espinhaço Meridional. Carste
visando garantir o aporte hídrico das principais dre- Ciência e Ambiente, Minas Gerais, p. 17-69, 2015.
nagens contribuintes do Rio Parauninha, além da ARAÚJO, R.; GONTIJO, E.; e Edmundo, I. Avalia-
preservação das cavernas que constituem o patri- ção do potencial espeleológico através de ánalise
mônio espeleológico do Parque Estadual. Sobretu- multicritério utilizando mineração de dados. Anais
do a Caverna Bento I e Gruta da Frida que pos- do XIX Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Re-
suem grau de relevância máximo. Recomenda-se a moto, p. 595-598, 2019.
realização de uma prospecção espeleológica mais
adensada, análises química e mineralógica dos es- BENTO, L. C. M.; TRAVASSOS, L. E. P. e RODRI-
peleotemas, estudo da geoespeleologia e análise GUES, S. C. Considerações sobre as cavernas
de relevância mais abrangente da Caverna Bento I quartzíticas do Parque Estadual do Ibitipoca, Minas
e Gruta da Frida e avaliação do potencial espeleo- Gerais, Brasil. Caminhos de Geografia, p. 16-54,
turístico da Caverna Bento I. 2015.

AGRADECIMENTOS BIRMINGHAM, A. N. et al. Bell hole origin: cons-


Aos proprietários Bento Ferreira e Bráulio traints on developmental mechanisms, Crooked
Ferreira pela autorização do acesso e apoio logís- Island, Bahamas. In: Proceedings of the 14th sym-
tico. Aos guias locais Jerval e Toko pelo apoio no posium on the geology of the Bahamas and other
reconhecimento da área. Ao IEF através do Parque carbonate regions. p. 18-30, 2010.

Revista Espeleologia Digital NºIII - 2022


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trabalhos geomorfologia

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Foto: Gabriel Lourenço

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