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JUIZ DE FORA
2022
UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE GEOGRAFIA
JUIZ DE FORA
2022
LEANDRO DA SILVA CRUZ
_____________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Lucia Pires Menezes
Departamento de Geociências - UFJF
_____________________________________
Prof. Dr. Pedro José de Oliveira Machado
Departamento de Geociências - UFJF
_____________________________________
Prof. Dr. Júlio Cesar Gabrich Ambrozio
Departamento de Geociências - UFJF
Conceito obtido:___
Juiz de Fora ___ de _____________ 2022.
AGRADECIMENTOS
Só há uma forma de começar aos agradecimentos sobre esse período em que pude
cursar geografia, que é a minha família. A minha mãe, Rosimere, meu muito obrigado por ser
meu maior exemplo de vida, com toda sua garra, inteligência, carinho, empatia, paciência e por
me fazer acreditar que poderia fazer qualquer coisa desde que não faltasse empenho. Ao meu
pai, Carlos, que infelizmente não está mais aqui para ver esse momento, agradeço por todo
carinho, proteção, conselhos e ao apoio incondicional sempre. Ao meu irmão, júnior, por
sempre servir de espelho na minha vida e por sempre mostrar que estará disposto a me auxiliar
em qualquer situação, aliás irmão é para isso. A minha cunhada, Carol, por todas as trocas e
incentivos para seguir firme no meio acadêmico. Por fim, a minha sobrinha, Anna Julia, que
mesmo chegando ao mundo tão recente consegue trazer uma leveza e amor por onde passa.
Obviamente, não posso deixar de falar sobre meus amigos da geografia, que me
acompanharam durante toda essa caminhada da graduação e que sem eles não conseguiria
chegar até aqui. Agradeço especialmente ao Adriano, Augusto, Clara, Daniel, Guilherme, João
Pedro, João Vitor, Julia, Liana, Luiza, Marina, Stéfani, Vitória e Wesiley, por possibilitarem uma
experiência mais leve na universidade e pela construção coletiva da geografia nesse período.
Levo todos vocês no coração e sou grato por poder dividir tantos momentos com cada um de
vocês e, principalmente, por poder ser amigo de todos. Agradeço também aos meus
companheiros de teto durante essa trajetória, Alexandre e Nathan, obrigado por tornarem a
experiência de viver em outra cidade algo inesquecível e agradeço por todo companheirismo,
parceria e momentos vividos. Ainda agradeço a minha namorada, Maria Clara, por todo amor e
companheirismo firmado nesses últimos meses e, também, por não permitir que desanimasse
nessa reta final.
Agradeço também aos meus amigos de vida, que me acompanham desde sempre, Alan,
Bárbara, João, Lucas, Rafael, Sofia e Victor, muito obrigado pelas trocas, viagens, festas,
carnavais e pelo apoio de sempre. Mesmo distantes fisicamente vocês foram importantes nessa
caminhada.
Gostaria de agradecer também a professora Maria Lucia, por mostrar que o
conhecimento acadêmico também pode ser construído com leveza e ternura; e pela orientação
desse trabalho e os conhecimentos passados durante a iniciação científica. Agradeço ao
professor Pedro e Júlio pelo aceite do convite para compor a banca avaliadora. A todos os
demais professores do curso de geografia o meu muito obrigado.
Por fim gostaria de agradecer a Universidade Federal de Juiz de Fora por me
proporcionar a possibilidade de cursar geografia com um ensino público e de qualidade.
RESUMO
Proposing to understand the processes that delimited the urban spatial configuration of the
municipality of Angra dos Reis and identifying the State as a producer of space. Therefore, a
historical review was carried out about the occupation processes of Angrense territory, seeking
to understand how the decisions of the past reflect in the present, reaffirming the need to study
the history of the city in the understanding of current problems. Thus, through bibliographic
surveys, the determining role of the implementation of national infrastructure projects in the
municipality in the 1960s to 1980s is analyzed, forcing the process of urbanization and economic
and population growth. In addition, the formation of a new social class in the city is identified,
that of the working class, important in making future decisions. In order to reinforce the
importance of this period in a concise way, a differentiation of pre and post urbanization
conditions is carried out, noting how the impacts of this process leveraged the development of
the urban and the formation of the new geography of Angra dos Reis. Therefore, it is
demonstrated how the implementation of infrastructure projects by the State is a watershed in
the history of the city.
Tabela 1 – Taxa de crescimento anual médio em Angra dos Reis, Barra Mansa, Volta Redonda,
Resende, Estado do RJ e Brasil (1940 – 2010)...........................................................................38
Tabela 2 – Indicadores de imigração em Angra dos Reis (1950 – 2010)....................................40
Tabela 3 – Taxa de crescimento anual por distritos (1950 – 2010).............................................40
Tabela 4 – População em Aglomerados subnormais por distritos em 2010...............................45
LISTA DE GRÁFICOS
1 - INTRODUÇÃO ___________________________________________________________ 11
2 - METODOLOGIA __________________________________________________________ 13
3 - GEOGRAFIA E HISTÓRIA ECONÔMICA DA CIDADE ___________________________ 14
3.1 - BREVE CARACTERIZAÇÃO DO SÍTIO ____________________________________ 14
3.2 - HISTÓRICO DE ANGRA DOS REIS PRÉ-INDUSTRIAL _______________________ 17
4 - EMPREENDIMENTOS NACIONAIS E A FORMAÇÃO DO URBANO ________________ 21
4.1 - O ESTALEIRO VEROLME ______________________________________________ 22
4.2 - RODOVIA BR-101 _____________________________________________________ 25
4.3 - CENTRAL NUCLEAR ALMIRANTE ÁLVARO ALBERTO _______________________ 27
4.4 - TERMINAL DA BAÍA DA ILHA GRANDE (TEBIG) ____________________________ 30
5 - A NOVA GEOGRAFIA DE ANGRA DOS REIS __________________________________ 32
5.1 - PLANO DIRETOR _____________________________________________________ 33
5.2 - CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO_________________________________________ 37
5.3 - DESENVOLVIMENTO DESIGUAL DO ESPAÇO URBANO _____________________ 42
6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS _________________________________________________ 47
7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS __________________________________________ 49
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1 - INTRODUÇÃO
trabalho tem como objetivo geral identificar e analisar o papel do Estado como agente formador
do espaço urbano de Angra dos Reis. Justamente, por meio dos empreendimentos estratégicos
nacionais instalados no município durante as décadas de 1960 a 1980. Com isso, buscam-se
os seguintes objetivos específicos:
Sublinhar a evasão demográfica da Ilha Grande durante esse período e como isso
dificultou na preservação da cultura caiçara.
2 - METODOLOGIA
É através desses dois dados que vamos unir a cidade e o urbano. É desse modo que
poderemos tentar ultrapassar o mistério das formas e buscar a construção do método,
mediante a escolha da fenomenologia a adotar, a aproximação da contextualização, a
reconstrução dos cenários de uma realidade que em parte se esvaiu, a busca do
significado e da memória, memória que, através desse enfoque histórico, vamos
encontrar expungida ao máximo dos filtros. Assim, é-nos permitido dirigir perguntas à
cidade, indagando a respeito de sua formação, já que a história da cidade é a história de
sua produção continuada.
O presente capítulo revela alguns pontos acerca do município de Angra dos Reis,
focando na geografia e no período histórico pré-industrial. Sendo assim, abordará a posição
geográfica e a morfologia do sítio urbano buscando situar as características físicas
condicionantes da região. Além disso, traz um breve histórico no sentido de contextualizar a
estrutura socioeconômica da cidade antes do processo de industrialização. Dessa maneira, o
capítulo vem como forma de um antecedente para a discussão principal do trabalho, tornando-
se uma base para o debate sobre as transformações do espaço urbano angrense.
A cidade de Angra dos Reis é uma das primeiras instalações coloniais do litoral
fluminense, descoberta pelos portugueses em 1502. Localizada na porção sul do estado do Rio
de Janeiro (figura 1), a aproximadamente 156 km da capital, dividindo suas fronteiras com os
municípios de Mangaratiba, Paraty e Rio Claro, no território fluminense, e Bananal e São José
do Barreiro, no lado paulista. Além disso, parte do seu território abrange a região da baía da
Ilha Grande, composta por um arquipélago de 197 ilhas, fato esse que permite a divisão de
duas unidades: a parte continental e a parte da baía.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021), o município
compreende uma área territorial de 813,420 km², com uma população estimada em 210 mil
habitantes. Dividido em 6 distritos: Angra dos Reis, Abrão, Cunhambebe, Jacuecanga,
Mambucaba e Praia de Araçatiba. Os distritos de Abraão e da Praia de Araçatiba são referentes
a localidades na Ilha Grande, originadas por comunidades pesqueiras caiçaras e que
atualmente são as mais povoadas e com maior infraestrutura. Já nos distritos da parte
continental, os distritos mais populosos são Cunhambebe e Jacuecanga. Junto a isso, de
acordo com o censo demográfico de 2010, essas duas localidades são as regiões com maiores
concentrações de aglomerados subnormais, diferentemente do distrito sede. Sendo assim, os
dados revelam o caráter desigual da urbanização angrense, ponto que será discutido de forma
mais aprofundada no decorrer do trabalho.
Na parte continental, sua morfologia é marcada por pequenas planícies costeiras
incrustadas entre as vertentes da Serra do Mar e o Oceano Atlântico. Junto a isso, a parte da
baía é marcada pela presença de morros testemunhos frutos da erosão regressiva das
escarpas da Serra do Mar. Possibilitando, segundo Botelho (2001), a formação de um conjunto
15
de diversas ilhas continentais, separadas por canais de pouca profundidade, que apresentam
um vínculo litólico, estrutural e morfológico com o continente.
A região de Angra tem um clima muito interessante, que segundo o Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), é marcado pela predominância de
temperaturas elevadas durante todo o ano, com média de 21 a 23°C. Somado a isso, há a
presença de fortes chuvas e índices pluviométricos elevados, tendo 1912 mm de média anual.
Segundo Abreu (2005), esse grande volume de chuvas, mesmo nos períodos de seca, ocorre
devido ao bloqueio das massas de ar úmidas pela serra, acarretando o fenômeno chamado de
chuvas orográficas. Além disso, a superfície é recoberta, em grande parte, pela ainda
preservada vegetação da Mata Atlântica, que aliada aos fatores já descritos compõem belas
paisagens, remetentes ao ideário de paraísos tropicais, justificando a forte presença da
atividade turística.
A área de Angra dos Reis está inserida na unidade de relevo dos Planaltos e Serras do
Atlântico Leste Sudeste, segundo a classificação de Ross (1985). Unidade marcada pela
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“presença de diversos níveis de caráter regional que vão desde 800 metros, passando para
1000 a 1200” (ROSS, 1985, p. 33), no qual se constitui a Serra do Mar. Sendo assim, segundo
Abreu (2005), o município tem 80% de seu território marcado pelas escarpas e reversos da
Serra do Mar, já o restante por pequenas parcelas de planícies costeiras e do planalto
dissecado. Dessa forma, a morfologia da região é determinada pelas escarpas da serra, com
altitudes próximas aos 1000 m, e seu basculamento em direção ao litoral, determinando,
também, a morfodinâmica. Devido a essas características supracitadas, outra observação que
deve ser feita é referente aos tipos de solos, pois está diretamente atrelado às problemáticas da
urbanização do município. Predomina-se os solos podzólicos, litólicos ou cambissolos, em sua
maioria, formados pelos processos deducionais no embasamento rochoso, possuindo pouca
profundidade e tornando-se muito suscetíveis aos movimentos de massa (ABREU, 2005).
Apesar das planícies costeiras representarem uma parcela bem inferior do território, é
necessário analisá-las com atenção, pois são nessas localidades onde se encontram as
maiores concentrações urbanas. Formadas majoritariamente por depósito de sedimentos
coluviais e de origem marinha. Constituem as áreas mais planas e de melhor acesso não só
para a população, mas para a fauna também, possibilitando a formação dos manguezais pela
orla. Entretanto, essa característica acarreta diversas problemáticas urbanas sobre os
ecossistemas, como destaca Abreu (2005, p. 22):
A região onde está localizada a cidade de Angra dos Reis foi descoberta pelos
colonizadores portugueses ainda nas primeiras expedições de reconhecimento da costa
brasileira, sendo encontrada em 1502. No primeiro contato já houve interesse na localidade,
devido às suas características morfológicas citadas anteriormente e a imponência da Ilha
Grande, bastante propícias para o refúgio das embarcações. Aparentando ser estratégica tanto
para atividades legais quanto para as ilegais, pirataria e contrabando. Entretanto, durante esse
período as ocupações portuguesas no litoral eram apenas estratégicas para a defesa da sua
soberania no território, “pois embarcações holandesas, francesas e inglesas comerciavam com
os indígenas, desafiando o domínio português” (MACHADO, 1995, p. 4).
Dessa maneira, mesmo com dados muito escassos acerca desse período, Machado
(1995) destaca, que na região de Angra dos Reis, existem indícios de relações de escambo
entre as navegações francesas e a tribo cunhambebe na região de Mambucaba. Além disso,
Machado (1995) revela dados do documento “Livro que dá Razão do Estado do Brasil”, no qual
consta um mapa da atual baía da Ilha Grande indicando a presença da Provação Nova de
Nossa Senhora da Conceição na parte continental. Posteriormente, subiu para a categoria de
paróquia e, em 1608, foi elevada à categoria de vila, destacando certa importância para essa
povoação, que viria a se instalar no atual local da cidade em 1624 (MACHADO, 1995), uma das
datas marcadas no brasão de Angra dos Reis. Entretanto, assumir essa categoria de
classificação não significa o crescimento de uma estrutura urbana, porém é um fato embrionário
para o estabelecimento de uma possível cidade, como destaca Machado (1995, p. 6):
Chamar uma povoação de vila, por exemplo, não significava a presença de uma
estrutura urbana, e sim a existência de uma pequena aglomeração de casas
precariamente construídas, onde um número ínfimo de colonos de origem européia e
seus agregados, em geral, caboclos, se reuniam aos domingos para freqüentar a missa
e as festas da Igreja nos dias santificados. As únicas construções de alvenaria
pertenciam às ordens religiosas.
do ouro na Região de Minas Gerais, o porto de Paraty integrasse no antigo Caminho do Ouro,
sendo agora o ponto de escoamento para o porto do Rio.
Nesse contexto, a atividade portuária começou a ser fomentada devido a sua
localização, pois surge como uma alternativa para burlar a cobrança do quinto e suscetível ao
roubo de cargas.
Com a abertura do Caminho Novo, o ouro não seria mais transportado pelo porto de
Paraty ao Rio de Janeiro, mas chegaria por terra ao Rio. Fato esse, responsável por ocasionar
uma grande crise na cidade de Paraty. Entretanto, em Angra não foi o que ocorreu, pois as
inúmeras tentativas de achar novos caminhos para o contrabando do ouro, transpuseram as
vertentes da Serra do Mar, através do vale do Rio Ariró e da atual Lídice, possibilitando a
ligação da cidade com o Vale do Paraíba.
A ligação de Angra dos Reis ao Vale do Paraíba nesse momento, na crescente da
produção cafeeira na região, possibilitou que a atividade portuária crescesse com o
escoamento do café proporcionou o acúmulo de riquezas na região. Como destaca Abreu
(2005), ainda continuou atrelada às atividades primárias, mas devido aos frutos da sua
atividade portuária, Angra passou de vila para a categoria de cidade em 1835. Junto a isso,
“seu núcleo urbano central continuou, todavia, subordinado à premência comercial da cidade do
Rio de Janeiro” (ABREU, 2005, p. 32).
Entretanto, mesmo o escoamento de café sendo a principal atividade do porto, também
tinha um fluxo gigante proveniente do tráfico de escravos, até após a Lei Eusébio de Queirós.
Nesse sentido, podemos afirmar que:
É graças ao café e ao tráfico que, pela primeira vez em sua história, Angra dos Reis
conhece o desenvolvimento urbano. Elevada a Termo em 1808, à sede de Comarca em
1828, abrangendo uma área que se estendia desde Itaguaí, Mangaratiba e Paraty, a
antiga povoação de N.S. da Conceição, agora Angra dos Reis, foi elevada à categoria de
cidade em 1835. A Santa Casa da Misericórdia foi construída em 1836, para atender aos
casos de tifo, impaludismo e febre amarela; o Paço Municipal em 1876; e o primeiro
jornal semanal aparece em 1860 (MACHADO, 1995, p. 13).
Com o declínio do período cafeeiro no Vale do Paraíba, a criação da linha férrea ligando
Rio de Janeiro a São Paulo e a abolição da escravidão, a economia angrense enfrenta uma
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recessão gigantesca. O que anteriormente fora salvo pela produção cafeeira, dessa vez não
houve escapatória. Pois, nesse período a cidade perde todas as bases de sua economia.
Dessa maneira, nesse período de declínio, Angra dos Reis foi muito afetada e viveu
praticamente 100 anos de estagnação, de 1850 a 1945, segundo Machado (1995). Uma das
piores recessões econômicas da história angrense. Essas consequências foram tão severas
devido a base econômica da cidade ser voltada para fora, não buscando alternativas de
sustentação internamente, sendo totalmente dependente das atividades externas, como no
Vale do Paraíba e no Rio de Janeiro. Portanto, a população foi obrigada a buscar alternativas
de sobrevivência que não dependessem de estímulos oriundos de fora da cidade, ou seja, não
mais num movimento de fora para dentro.
Com a crise, ocorre um processo interessante sobre o uso e ocupação do solo do
município. No qual, segundo Machado (1995), grandes proprietários de terra migraram para
outras regiões, abandonando sua produção e suas terras. Abrindo, assim, espaço para que os
homens livres e escravos libertos tomassem posse dessas terras para, principalmente,
agricultura de subsistência. Além disso, segundo Abreu (2005), o abandono dessas fazendas, a
queda do desmatamento para a produção e o decréscimo populacional possibilitaram a
restauração de parte da Mata Atlântica, que fora desmatada nos anos anteriores. Junto a isso,
a indústria da pesca e a de aguardente ganharam destaque principal nas finanças do município.
Posto isso, apesar de ser o maior período de estagnação da economia local, para uma parte da
sociedade foi extremamente significativo, como os escravos libertos obtendo acesso à terra e
ao desenvolvimento de pequenos agricultores, voltados à agricultura familiar. Ademais,
possibilitou a restauração de parte da vegetação devastada para a realização do plantio do
café, patrimônio natural da cidade.
Posteriormente, na década de 1930, empresários mineiros propuseram a construção de
um ramal ferroviário que se liga o porto de Angra com o Oeste de Minas. Essa ideia agradou o
poder público e privado local, gerando a expectativa de que as reativações do porto para
escoamento de produtos agrícolas pudessem melhorar a economia da cidade, igualmente nos
tempos áureos do café. Porém, a construção da ferrovia para esse objetivo não sofreu efeito
prático na restauração da economia.
Já na década de 1940, com a construção da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em
Volta Redonda, a estrada de ferro ganha importância, tornando o porto angrense o principal
meio de abastecimento de matéria prima e de escoamento da produção da siderúrgica. Nesse
momento, segundo Abreu (2005), ocorre uma reativação do núcleo urbano devido às diversas
modernizações que chegam ao município. Momento também em que “a dinâmica demográfica
20
de Angra dos Reis renasceu timidamente: a população aumentou em 2,4 mil habitantes entre
1940 e 1950 voltando ao seu tamanho de população do início do século” (CHETRY, 2019, p.
3943). Dessa forma, nota-se que outros estímulos externos ao município foram responsáveis
por fomentar sua economia e aumentar sua população, período em que a economia sai de sua
inércia.
A influência da CSN sobre o município de Angra dos Reis é muito importante, por
consequência de impulsionar a revitalização do centro urbano em torno do porto, o que é
também o centro da cidade. Desse modo, as modernizações provindas com esse fomento
econômico possibilitaram o início da alteração do espaço urbano e a incipiente formação de
uma classe social não existente na cidade, a operária. Nesse contexto, começa a emergir a
formação do urbano e suas problemáticas na cidade, como defende Lefebvre (2001),
evidenciando-se, principalmente, com a construção do Estaleiro Verolme e marcando a entrada
da fase industrial.
Analisando os fatos descritos, acerca do, aqui definido como período histórico pré-
industrial, percebe-se que a economia angrense, por ser condicionada por interesses externos,
é, até esse momento, historicamente dependente da atividade portuária. Pois, devido a sua
morfologia, a falta de tecnologias e a velocidade dos meios de transporte na época, o porto, era
o melhor meio de ligação entre a cidade e o mundo externo. Junto a isso, um fator que
prejudica uma análise mais profunda dos fatos e do contexto desse período é a carência de
dados sobre o município, muito por não ser uma localidade de grande importância no período
colonial e republicano.
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Neste capítulo a discussão principal será pautada acerca das transformações causadas
no município de Angra dos Reis relacionadas à chegada da atividade industrial em grande
escala. Na escala temporal, o período delimitado aqui é entre as décadas de 1960 a 1980.
Recorte escolhido por marcar a formação do espaço urbano da cidade, com a alteração de uma
população rural para urbana, pela mudança da base econômica e a formação de uma nova
classe social, a operária. Sendo assim, mudanças significativas tanto no espectro social quanto
da economia, um período que é, praticamente, um “divisor de águas” na história angrense.
Dessa maneira, caberá aqui, a análise dos agentes transformadores do espaço urbano
na época, apoiando-se nas ideias de Corrêa (2004), na qual os agentes são sociais e
concretos, não um conjunto de processos aleatórios atuando sobre um espaço abstrato. Nessa
lógica de análise, os principais agentes atuantes na formação do urbano em Angra estão
relacionados ao Estado, ao capital imobiliário e aos grupos socialmente excluídos. Com isso, a
organização do capítulo será dividida nos quatro grandes empreendimentos de infraestrutura,
instalados por interesse do Governo Federal, responsáveis por alterar a dinâmica local, sendo
eles: o Estaleiro Verolme, a BR-101, o Complexo Nuclear Almirante Álvaro Alberto e o Terminal
da Baía da Ilha Grande (TEBIG).
A produção do espaço urbano pelo Estado, está ligada ao investimento do capital estatal
nos aparatos de infraestrutura, na formação de indústrias, na manutenção da tributação e no
auxílio à inflação imobiliária, assumindo, ao mesmo tempo, diversas facetas na produção do
espaço urbano. Além disso, é importante ressaltar que o Estado, como todos os outros agentes,
não atuam de forma neutra. Em seu caso, especificamente, a tomada de decisões será, em sua
maioria, voltada para atender aos interesses das classes dominantes e do modo de produção
capitalista. Sobre o papel do poder estatal, aponta Corrêa (2004, p. 24):
Uma primeira observação refere-se ao fato de o Estado atuar diretamente como grande
industrial, consumidor de espaço e de localizações específicas, proprietário fundiário e
promotor imobiliário, sem deixar de ser também um agente de regulação do uso do solo
e o alvo dos chamados movimentos sociais urbanos.
Fonte: IBGE.
O município de Angra dos Reis foi escolhido para receber esse grande empreendimento
industrial, num período onde não tinha uma estrutura pronta para suportar. Dessa maneira,
outros motivos foram determinantes para a instalação no local, como destaca Machado (1995,
p. 18):
Porque Angra foi escolhida para a implantação do estaleiro? Em primeiro lugar, o sítio
geográfico da baía da Ilha Grande, com águas profundas e protegidas pelo conjunto
insular. Outro motivo foi a excelente posição, de proximidade com a principal fonte de
matéria-prima - o aço de Volta Redonda, cidade com a qual se conectava por ferrovia.
Porém, como destaca Rodolfo Bertoncello, também fatores políticos e institucionais
tiveram um papel importante: o interesse do Ministério da Marinha, e a política
deliberada de se criar um pólo de desenvolvimento industrial, possivelmente para
compensar o Estado do Rio de Janeiro da mudança da Capital Federal para Brasília.
A partir dessa constatação, nota-se que os motivos da escolha pelo local foram devido a
sua morfologia, que permite uma navegação mais tranquila com o mar pouco movimentado; a
ligação com a CSN, facilitando o acesso aos seus recursos; e por uma questão diplomática
compensatória a redução do status do Estado fluminense ser detentor do distrito federal.
Novamente reforçando a predominância de interesses externos na tomada de decisões internas
ao município.
A instalação do Estaleiro já causa impacto antes mesmo de iniciar suas atividades na
indústria naval. Para a construção de um projeto de tal magnitude, o município não dispõe de
mão de obra suficiente e nem qualificada para realizar as funções. Com isso, observa-se uma
grande onda migratória em direção a cidade, por uma população em busca dessas
oportunidades de emprego, denotando um forte crescimento demográfico. Portanto, diversas
mudanças são notórias, tanto na parte econômica quanto na social, e principalmente na
espacial, pois, na planície que abriga o Estaleiro, ocorre a formação do bairro Jacuecanga,
composto pela classe operária.
naval brasileira entra num ciclo de recessão, acarretando uma crise no Estaleiro. Dessa
maneira, após seu apogeu na década de 1970, suas atividades entram em declínio,
ocasionando demissões em massa e perda de parte de seu patrimônio imobiliário para quitação
de dívidas trabalhistas. Portanto, a crise resultou num aumento de desempregados e um abalo
grande na economia local, gerando novas problemáticas urbanas.
O fragmento da rodovia federal BR-101 que atravessa o município de Angra dos Reis
faz parte do trecho conhecido como Rio/Santos. O intuito da construção dessa estrada consistia
em possibilitar uma ligação pelo litoral entre as cidades de Santos e Rio de Janeiro, de forma
que concedesse acesso às belezas do litoral sul fluminense e do norte paulista. Acompanhando
a costa e serpenteando as encostas da Serra do Mar, esse empreendimento é o principal meio
responsável por promover o crescimento do espaço urbano angrense e, ao mesmo tempo,
condicionar a sua distribuição. Além disso, possibilitou a instalação de uma nova atividade
econômica na região, o turismo.
Com suas obras finalizadas em 1974, ocorreu uma remodelação do espaço geográfico,
decorrente das estratégias contidas para sua construção, modificando as formas do relevo, da
estrutura viária pré existente e inserindo os interesses do capital imobiliário.A abertura da
rodovia foi o fator determinante para a entrada da atividade turística na região, pois ao
possibilitar uma ligação entre as duas metrópoles, Rio de Janeiro e São Paulo, junto ao recurso
paisagístico da região, com boa parte da Mata Atlântica ainda preservada e a região onde a
Serra do Mar encontra-se mais próxima do Oceano Atlântico, atraiu todo o interesse da
indústria turística. A soma desses fatores, resultou numa valorização da região, aumentando a
especulação imobiliária e os conflitos com os habitantes locais, principalmente o povo caiçara.
Nesse contexto, deve-se realçar o processo de posse de terras, descrito anteriormente,
ocorridos após a crise cafeeira. Na qual, os homens livres e escravos libertos tiveram acesso à
terra por meio da posse das propriedades abandonadas, estabelecendo-se lá por praticamente
um século, mas sem documentos que comprovem a possessão do terreno. Essa fragilidade na
jurisdição, permitiu ao capital imobiliário agir e tomar o direito dessas terras junto ao Estado,
desencadeando diversos conflitos fundiários.
Inicia-se, então, um novo drama na vida dos habitantes desta região, o caboclo do litoral
conhecido pelo nome de “caiçara”, bem como nas comunidades indígenas Guarani que
se espalhavam nesta costa brasileira. A ameaça de expulsão de suas posses
centenárias concretizou-se em várias ocasiões, ao mesmo tempo em que começavam a
surgir favelas nas periferias nas cidades da região. Sem terra onde plantar sua pequena
roça de consumo e sem seu mar, de onde tirava o “peixe nosso de cada dia”, o caiçara,
expulso da posse, tornou-se mais um segmento marginalizado em nossa sociedade.
As decisões tomadas para planejar a Rio/Santos foram todas tomadas em função dos
interesses do capital turístico-imobiliário com o Estado, desconsiderando as condições pré
existentes no município, o que poderia render mais frutos para as atividades econômicas
atuantes na cidade. Dessa maneira, o traçado escolhido dá o aporte ao setor turístico, o qual o
desenvolvimento era de interesse do governo federal. Portanto, “a decisão de construir a
estrada foi tomada fora de Angra, a rodovia foi construída dentro de Angra, mas não para Angra
dos Reis” (GUANZIROLI, 1983, apud ABREU, 2005, p. 40).
A construção do complexo nuclear em Angra dos Reis segue a mesma lógica dos
empreendimentos abordados anteriormente, “ou seja, a produção de um espaço industrial cuja
gestação foi feita a partir de fora, com capital acumulado fora do município e visando atender a
uma demanda também de fora” (ABREU, 2005, p. 41). Portanto, é mais um investimento que
comprova como Angra é condicionada por decisões externas, afetando diretamente a sua
economia e seu espaço urbano.
Com a inserção na área de Segurança Nacional do governo ditatorial militar, o município
sofreu com maior intensidade a participação do governo federal nas suas decisões internas,
tornando-se palco de seus empreendimentos de infraestrutura. Nesse contexto, os motivos que
resultaram na escolha de Angra para abrigar as usinas nucleares, conforme divulgação no site
da Eletronuclear, foram: a proximidade do eixo Rio-São Paulo, região de maior consumo de
energia do país; e a sua posição estratégica junto à costa, que permitia o acesso às águas do
mar, ideais para serem utilizadas no resfriamento dos reatores. Portanto, a soma desses fatores
resultou na escolha da praia de Itaorna para receber a central nuclear.
Em 1972, iniciam-se as obras da primeira usina nuclear brasileira, a Angra 1, com
reatores americanos da Westinghouse. Em seu projeto inicial, a previsão para a conclusão das
obras era para o ano de 1977 e no ano seguinte o início de suas operações. No entanto,
diversos problemas técnicos e imprevistos atrasaram os planos dos militares, permitindo o início
de sua operação apenas no ano de 1985.
28
Fonte: IBGE.
próximas e infraestrutura, com hospital, escola e na beira da praia, para atrair esses
funcionários.
Entretanto, para atender aos trabalhadores menos qualificados, muitos vindos de outras
cidades, não foi realizado nenhum suporte ou garantia de infraestrutura. Dessa maneira, coube
a esses sujeitos formarem bairros nas redondezas da central nuclear, como o Frade e o Parque
Mambucaba. Essas localidades são bastante populosas, no contexto municipal, e carentes de
infraestrutura urbana, onde os investimentos em serviços públicos tiveram de partir do poder
local, sem receber nenhum tipo de auxílio do governo federal ou da usina.
O terminal da baía da Ilha Grande (TEBIG) está inserido na mesma lógica do que furnas.
Um empreendimento instalado por decisão do governo federal, voltado ao setor energético e de
gigantismo, isso inclui o que foi dito por Machado no trecho destacado no capítulo anterior,
principalmente, no tocante ao isolamento do local de implantação.
instalação foi necessário modificar a rede fluvial local, na qual, de acordo com Abreu (2005),
implicaram na alteração do curso de três rios, no movimento de 7000000 m³ de terra e na
escavação de profundos canais marítimos para permitir o acesso dos navios ao porto. Portanto,
nota-se o enorme esforço realizado para que o município recebesse esse terminal e, junto a
isso, como a sua instalação modificou a paisagem da região e sua dinâmica.
As principais funções exercidas no parque industrial são receber o petróleo dos navios e
abastecer, por meio de oleodutos, as refinarias de Duque de Caxias, na baixada fluminense, e
de Gabriel Passos, em Minas Gerais. Assim sendo, segundo a PETROBRÁS, o TEBIG consta
com dez tanques de armazenamento, com capacidade de 860000 m³, e com 123 km de
oleoduto com 38 polegadas de diâmetro, com destino final o terminal de Campos Elíseos, em
Duque de Caxias.
O seu impacto sobre o espaço urbano de Angra dos Reis assemelha-se ao da central
nuclear, pois também ocorreu a construção de uma vila para os funcionários mais qualificados,
enquanto os menos qualificados instalavam-se na periferia do empreendimento. Nesse
contexto, foi estabelecida a vila da PETROBRÁS fornecendo infraestrutura com casas prontas,
acesso a eletricidade, a saneamento básico e com vias de acesso bem pavimentadas. Em
contraposto, os operários, que atuaram na construção e os pouco que conseguiram um
emprego no terminal, foram obrigados a se alojarem nas áreas mais próximas, dando origem ao
bairro Monsuaba, dentre outros, e intensificando a ocupação do núcleo urbano próximo
preexistente, a Jacuecanga.
Além dos fatores citados, cabe destacar que durante a década de 1980 o TEBIG ficou
marcado por acidentes responsáveis por promover danos ambientais à baía da Ilha Grande.
Durante essa década foram registrados dois grandes vazamentos, um em 1988 e outro em
1989, onde somados completam 300 toneladas de óleo despejado no mar. Além disso, no ano
de 1990, ocorreu mais um vazamento de 40 toneladas. Desse modo, são três anos
consecutivos de lançamento de um material danoso ao meio ambiente em quantidades
enormes, resultante de sucessivas falhas, causando impactos à natureza que não foram
mensurados e questionando a integridade da estrutura construída.
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Quando queremos saber algo sobre a evolução histórico-geográfica de Angra dos Reis,
isto é, sobre as mudanças pelas quais passou o lugar, o que se está buscando é uma
melhor perspectiva do nosso próprio tempo e do nosso próprio lugar, quer dizer,
queremos compreender os caminhos seguidos pelas gerações que nos precederam,
coletividades que, assim como a nossa, conheceram o êxito e o fracasso, a
generosidade e a perversidade, acumulando e desperdiçando oportunidades,
construindo e destruindo coisas, lutando por determinadas coisas e desprezando outras
(MACHADO, 1995, p. 2).
[...] a urbanização corporativa, isto é, empreendida sob o comando dos interesses das
grandes firmas, constitui um receptáculo das consequências de uma expansão
capitalista devorante dos recursos públicos, uma vez que esses são orientados para os
investimentos econômicos, em detrimento dos gastos sociais (SANTOS, 2020, p. 105).
Já dissemos que os novos processos que deram à região e ao lugar uma nova
configuração espacial resultaram da articulação entre o estado representado pelo
governo federal, com interesses voltados para outras regiões e escalas, o setor privado
representado pelas empresas ligadas às atividades turístico-imobiliárias, e às classes
dominantes tradicionais do local, representadas pelos grandes proprietários de terras
(ABREU, 2005, p. 64).
Nesse contexto, de embate de interesses e poder das camadas populares contra a elite
e os empresários, junto a crise econômica que o Brasil atravessa na década de 1980, surgem
alguns movimentos sociais lutando pelo acesso à terra, melhores condições de trabalho, defesa
do meio ambiente e garantia de direitos. Formando-se organizações sindicais, a Comissão
Pastoral da Terra (CPT), a Sociedade Angrense de Proteção Ecológica (SAPÊ), o Conselho
Municipal das Associações de Moradores (COMAM) e a seção local do Partido dos
Trabalhadores (PT) (ABREU, 2005). Portanto, a inclusão dos movimentos sociais no contexto
da cidade demonstra uma nova organização da população frente a um período de
redemocratização nacional.
O motivo da necessidade de explicitar esse contexto político local é de reforçar a
mudança que ocorre na administração local a partir da abertura do governo à democracia,
possibilitando uma participação maior e ativa das camadas populares na política, dando voz a
esses sujeitos. Posto isso, a mudança mais significativa para o poder popular no município, foi a
partir de 1988, onde o PT elege seu primeiro prefeito em Angra. O partido reforçava o
compromisso com a gestão democrática, invertendo as prioridades administrativas, calcadas
nos interesses dos empresários, para o de atender todas as parcelas da sociedade, atendendo
assim, aos anseios dos movimentos populares. Portanto, um dos projetos elaborados que
reforçam isso foi o Plano Diretor.
O suporte dessa prática foi a elaboração do Plano Diretor, que se baseou num processo
intenso de reuniões com as associações de moradores locais. O Plano foi proposto num
contexto que conjugava, além da eleição do PT, a recente promulgação da Constituição
Federal de 1988 e as demandas sociais geradas pelo processo de urbanização do
município, anteriormente relatadas (ABREU, 2005, p. 66).
O processo de redemocratização brasileiro teve como uma das suas principais pautas a
promulgação de uma nova constituição federal, garantindo uma série de direitos indispensáveis
para a população, que antes foram tomados pelas imposições da ditadura militar. Dentro da
constituição de 1988, há um capítulo referente à Política Urbana, pautado nas propostas dos
grupos engajados nas lutas contra as problemáticas urbanas. Dessa maneira, segundo Abreu
(2005), buscou-se um planejamento urbano dinâmico e contínuo, voltado para a garantia do
direito à cidade e a cidadania. Junto a isso, delimitou as cidades com mais de 20000 habitantes
a elaboração de Planos Diretores, incluindo a participação popular nas decisões sobre o
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Posto isso, o Plano Diretor de Angra dos Reis seguiu o objetivo proposto de garantir a
participação popular na definição de suas decisões, buscando através desse fator amenizar as
desigualdades sociais no município. Dessa maneira, segundo Guimarães e Abicalil (1990, apud
ABREU, 2005), a elaboração se deu em duas etapas: na primeira, de forma introdutória,
realizaram-se diversas reuniões com representantes populares, associações de moradores,
câmara municipal, dentre outros, buscando esclarecer pontos sobre os limites, a metodologia,
os objetivos e coletar dados para um pré-diagnóstico; na segunda etapa, novas reuniões foram
realizadas, divididas por temáticas, para debater os problemas e as soluções, identificando
diversos atores sociais e suas divergências.
sólidos; e estabelecer o acesso a praia, definindo a praia como um espaço público, impedindo
que os condomínios luxuosos e os resorts as transformassem em praias particulares. Além
desses fatores, outro ponto positivo definido foi referente a preocupação com a preservação
ambiental, buscando manter o patrimônio natural, preservando manguezais e a vegetação da
Mata Atlântica, por exemplo. Entretanto, um dos pontos falhos notados no documento são os
poucos instrumentos adotados para lidar com a reforma urbana (SOUZA, 2010).
Mesmo contendo esses avanços, os pontos delimitados não estavam de acordo com os
interesses da elite e dos empresários. Sentindo-se desfavorecidos realizaram esforços para
reduzir as propostas populares, cobrando mais tecnicidade na elaboração do projeto e menos
política. Dessa forma, pressionaram a prefeitura por meio da câmara dos vereadores, a qual na
época era composta por apenas um integrante do PT e os demais de oposição, para rejeitarem
o primeiro Plano Diretor apresentado, obrigando a realizar revisões e acatarem algumas de
suas exigências, podendo assim ser finalmente aprovado.
Com o Plano Diretor em voga, a prefeitura conseguiu a formação do Conselho
Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (CMUMA), responsável por analisar e aprovar os
projetos urbanos no município, seguindo o definido na lei. Segundo Abreu (2005), esse
conselho era formado por um coordenador, pela PMAR e por entidades que compõem a
sociedade civil, com representantes sindicais, por distritos, do turismo, da pesca, da
preservação ecológica, da construção civil e de áreas rurais. Com isso, as decisões eram
definidas em audiências públicas e seus membros tinham rotatividade de 2 anos, trazendo
democratização nas decisões sobre a ocupação do espaço urbano.
Entretanto, mesmo o conselho ter perpetuado por bons anos, ativamente até 2002, com
o passar dos anos os representantes frequentes foram se esvaziando. Em parte, pela ausência
da própria prefeitura nas reuniões, dificultando a discussão entre os representantes da
sociedade civil com o poder administrativo. Além disso, a maioria das pautas debatidas eram
acerca da implantação de projetos, no qual os empreendedores pressionavam com pedidos de
urgência, deixando de lado as decisões sobre o crescimento da cidade e as demandas da
população. Portanto, esses fatores contribuíram para o enfraquecimento do conselho,
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Dessa forma, nota-se que entre 1940 e 1950 a população cresceu em pouco mais de 2
mil habitantes, reflexo da reativação da atividade portuária servindo de aporte para suprir e
escoar produtos da CSN. Ainda um crescimento muito tímido, concentrado principalmente no
centro histórico, ou seja, em volta do porto. Já, “a partir dos anos 1950, observou-se uma
mudança radical da dinâmica demográfica da cidade de Angra dos Reis, quando se abriu um
longo período de 60 anos de crescimento demográfico intenso e ininterrupto” (CHETRY, 2019,
p. 3944.), fenômeno perceptível ao olhar o gráfico. Sendo assim, o município passou de uma
população total de praticamente 21 mil habitantes, em 1950, para aproximadamente 210 mil,
em 2021. Esses dados comprovam que a população do município foi multiplicada por 10 vezes
em um período de 71 anos, um crescimento abrupto em um intervalo curto de tempo.
As décadas iniciais deste crescimento, coincidem com a implantação dos
empreendimentos nacionais de infraestrutura no município, período em que muitos migrantes
chegaram na cidade devido a oferta de empregos, principalmente, relacionados à construção
civil. Como dito anteriormente, o impacto desses empreendimentos não teve grande impacto no
crescimento demográfico, pois a crescente tornou-se muito maior nos anos posteriores.
Entretanto, a atuação como determinantes na urbanização do município, principalmente pela
BR-101, ao disponibilizar a entrada do capital turístico imobiliário, foram importantes em garantir
a base para que os processos fossem intensificados nas décadas subsequentes.
Tabela 1 - Taxa de crescimento anual médio em Angra dos Reis, Barra Mansa, Volta Redonda, Resende, Estado do
RJ e Brasil (1940-2010).
Por meio dos dados destacados na tabela acima, nota-se que durante o período da
urbanização brasileira há um crescimento populacional das cidades do sul fluminense,
destaque para Volta Redonda e Barra Mansa com um crescimento anual muito elevado na
década de 1950, consequência da instalação da CSN. Além disso, é perceptível a tendência de
crescimento populacional nas cidades vizinhas, no Estado do Rio de Janeiro e no Brasil, na
qual a partir da década de 1980 o crescimento anual entra em queda.
Em contrapartida, o município de Angra dos Reis apresenta um crescimento
anual constante a partir da década de 1950 e persiste até 2010 com uma taxa em volta de 3,5%
ao longo desses anos. Sendo assim, a sua dinâmica demográfica não segue as tendências do
país, nem do estado e nem das cidades próximas, mantendo um crescimento elevado enquanto
as outras localidades apresentam uma queda constante. Além disso, Chetry (2019) destaca que
esse crescimento de Angra não acompanha nem os padrões das cidades de mesmo porte, mas
de cidades bem maiores, revelando como esse crescimento é expressivo.
Assim sendo, o crescimento demográfico de Angra dos Reis está ligado a dois fatores
principais: a taxa natural de crescimento, aumento da natalidade e da longevidade advindos no
período de transição demográfica brasileiro; e as migrações, provenientes pela oferta de mão
de obra nos setores econômicos crescente, o industrial e o de serviços.
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podem ser criticados por seu isolamento, de outro, a comunidade trabalhadora se sente ligada
aos destinos do empreendimento” (MACHADO, 1995, p. 23).
residente dos bairros em torno estabelecem-se nas proximidades devido a mão de obra
fornecida para atender os serviços estimulados pelo turismo, sendo trabalhos de baixa
remuneração. Portanto, destaca Machado (2005, p. 23):
Por outro lado, a atividade turística constitui um importante mercado de trabalho, com
reflexos na trama urbana: o trabalho feminino de tipo doméstico, os caseiros, jardineiros,
etc., geram pequenos bairros para a fixação da população trabalhadora, seja no fundo
dos loteamentos de turismo de alta renda, seja em áreas menos valorizadas, algumas
em terrenos impróprios para a construção.
Ilha grande 0 0 0%
A partir da análise dos dados descritos, pode-se concluir algumas considerações sobre
Angra dos Reis. Primeiramente, a expressiva quantidade de pessoas vivendo nessas
condições, cerca de um terço da população total. Além disso, é perceptível a diferença do
percentual entre os outros distritos continentais da sede, no qual é muito maior nas áreas
periféricas. Essa distribuição nos distritos de Jacuecanga e Mambucaba está relacionada
diretamente por abrigar a maioria dos trabalhadores industriais do município, ligados à
produção do estaleiro e da central nuclear, respectivamente. Já o distrito de Cunhambebe,
responsável por abrigar metade da população em favelas no município, está diretamente
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6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
problemáticas que permeiam o município, buscando identificá-las e propor medidas ativas para
suas soluções. Portanto, a importância deste trabalho se dá no intuito de identificar os
processos históricos que condicionaram a formação do espaço urbano angrense e expor
algumas problemáticas acarretadas pela forma de urbanização adotada, na qual sempre esteve
voltada a atender aos interesses externos ao município.
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7 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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RJ. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA - ANPUH, 26., 2011, São Paulo. Anais [...] São
Paulo: ANPUH, 2011. Disponível em:
http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1299076009_ARQUIVO_CarvalhoAlineAnpu
h.pdf. Acesso em: 30/06/2022.
CHETRY, M. Crescimento e dinâmica demográfica uma cidade média: o caso de Angra dos
Reis. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 16., 2019, Vitória. Anais [...]
Vitória: UFES, v. 1, p. 3940-3957, 2019. Disponível em:
https://periodicos.ufes.br/simpurb2019/article/view/25958. Acesso em: 07/02/2022.
CORRÊA, R. L.. O Espaço Urbano. 4ª Ed. São Paulo: Editora Ática. S.A, 2004.
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MACHADO, L. O. Angra dos Reis: porque olhar para o passado? In: Diagnóstico Sócio-
Ambiental de Angra dos Reis, Projeto Mata Atlântica, Rio de Janeiro: Convênio Furnas-UFRJ,
1995. p. 1-31.