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A cultura na educação

Caros estudantes,
Assistimos, hoje, ao lançamento da 7a edição do Concurso Vodacom Turma Tudo
Bom. Trata-se, como vocês sabem, de um concurso cultural e educativo, o que
demonstra que existe uma relação entre a cultura e a educação. Mas qual seria essa
relação?
Se nós definirmos a cultura como tudo o que o homem cria, transforma e transmite às
gerações futuras, vamos perceber que a própria educação faz parte da cultura. Ou
seja, cada sociedade, cada país, educa os seus filhos de acordo com os seus hábitos
culturais. Se vocês se recordarem, alguns dos nossos manuais, como o de Português,
trazem canções, jogos, rituais tradicionais, lendas, mitos, como elementos da cultura
importantes para a nossa educação. Isto significa, também, que educar é transmitir
cultura. Ou seja, transmitir cultura é educar, da mesma forma que educar é um acto de
valorização da cultura. Enfim, podemos dizer que cultura e educação são a mesma
coisa. Faz parte da nossa cultura, por exemplo, acordar aos sábados e ajudar na
limpeza da casa, mas muitas vezes não nos apercebemos que assim os nossos pais
nos educam a ter uma casa sempre asseada, sempre limpa. Faz parte da nossa cultura
ir a um culto religioso aos domingos, e assim somos educados a respeitar e a ajudar o
outro. Algumas pessoas têm dito que faz parte da nossa cultura chegar atrasado a uma
aula, a uma reunião familiar – o xitique começa sempre tarde, porque todo o mundo
atrasa –, ou atrasar quando vamos à consulta com o médico. Aqui não concordo; não
concordo que o atraso faça parte da cultura moçambicana. E porquê, porque penso
que se os moçambicanos atrasam a fazer o que têm que fazer, então é Moçambique
que se torna um país atrasado. E como não concordo que o meu país seja atrasado,
começo a pensar que, afinal, a cultura e/ou a educação, podem ser melhoradas.
De facto, tudo na vida pode ser melhorado. Os primeiros telemóveis que se venderam
em Moçambique pareciam barras de sabão-bingo, hoje, os telemóveis quase que são
umas folhas de papel. Pensemos em qualquer objecto, e vamos verificar que todos
sofreram um processo de melhoramento. Um dia os televisores foram de duas cores,
preto e branco, hoje são coloridos, e já não têm aquela corcunda a ocupar muito
espaço nas estantes das nossas salas de estar, são mais delgados e confortáveis. As
próprias estantes das nossas salas mudaram, já não temos estantes de um metro e
vinte ou trinta centímetros, onde guardávamos copos e pratos que só usávamos nos
dias de festa, hoje as estantes – se é que podemos chamar de estantes – têm menos
de cinquenta centímetros. Ou seja, a cultura e a educação são dinâmicas, porque o
homem também é dinâmico.
Ora, se, como disse Lavoisier, na natureza nada se ganha, nada se perde, tudo se
transforma, então a cultura e a educação também podem ser transformadas. A nível
mais restrito da educação, é fácil de ver: periodicamente, temos programadas
curriculares novos, novos manuais e novos métodos de ensino e aprendizagem. Estas
mudanças vão ao encontro de novas transformações culturais: o uso do telemóvel, o
uso das redes sociais, são novos elementos que entraram para a nossa cultura e para
a forma como a sociedade nos educa. Por isso, devem fazer parte dos programas de
ensino, de modo que possamos corrigir o que não estiver de acordo com uma boa
conduta como cidadãos. Temos que parar de pensar, por exemplo, que atrasar é
normal, que ter duas, três namoradas é normal, que ir à sala de aulas alcoolizado é
normal, que bater na namorada ou no namorado é normal, que cabular é normal, que
tentar subornar os professores é normal, que envolver-se com drogas é normal. Nada
disto é normal, são anomalias da nossa cultura e da nossa educação. Estas anomalias
devem ser retiradas, ou seja, devemos melhorar a nossa cultura naqueles aspectos
que não nos dão dignidade. E é aqui onde entra a literatura moçambicana.

A importância da literatura moçambicana


A literatura moçambicana, como qualquer outra literatura, é importante porque pode
ajudar a corrigir os vícios da nossa cultura, corrigir os nossos defeitos. Mas não é
possível falar da função da literatura moçambicana se não falarmos, antes, da
necessidade que temos de ler. Ou seja, para que a literatura moçambicana exerça a
função de curar os nossos vícios, primeiro temos que ler; temos que saber qual é a
importância da leitura.
Caros estudantes,
A leitura é importante por, pelo menos, cinco razões. A primeira razão: a leitura é
importante para o nosso desenvolvimento cognitivo. Isto significa que ao lermos um
livro aumentamos os nossos conhecimentos. Mas, mais do que isso, é interessante
reparar que, uma vez que nós adquirimos os conhecimentos através do nosso cérebro
e do nosso pensamento, quanto mais as pessoas lêem, mais exercitam o cérebro e o
pensamento, de modo que aumentem as suas capacidades de adquirir conhecimentos.
Ou seja, se quisermos combater aqueles vícios da cultura de que falei, temos que
melhorar a capacidade do nosso cérebro em adquirir conhecimentos e o melhoramento
desta capacidade só se faz através da leitura.
A segunda razão: a leitura é importante para a formação do juízo crítico. Isto significa
que um livro de contos, por exemplo, nos ensinam a saber julgar e decidir diante de
qualquer situação em que nos encontremos. Um livro de histórias pode ensinar-nos a
separar o bem do mal, o mau do bom, o justo do injusto, a cumprir com os nossos
deveres e a exigir os nossos direitos. A única diferença é que no processo de leitura
nós não nos apercebemos destes ensinamentos; o livro não é propriamente uma sala
de aulas, em que temos um sumário para cada lição. Na leitura, estes ensinamentos
estão lá, e revelam-se, por exemplo, quando nós não gostamos de uma personagem,
quando nos rimos de uma cena, ou quando choramos ou ficamos triste porque um
animal da história morreu. Ao vivermos estes estados emocionais, significa que, nesse
momento, há muitos ensinamentos que são transmitidos e que podem, mediante um
processo de reflexão individual, ajudar-nos a combater aqueles vícios da cultura.
A terceira razão: a leitura é importante para o acesso à informação. António Jamal, um
grande repórter da Rádio Moçambique, tinha o hábito de dizer que “um cidadão
informado vale por dois”. De facto, quem tem o hábito de ler, lê tudo e anda informado.
A informação, seja de que natureza for, ajuda a melhorar ou a mudar os nossos hábitos
culturais: saber sobre os efeitos do álcool ou das drogas ou que o dia tem apenas 24
horas e que todos na vida têm 24 horas do dia para melhorarem o seu desempenho, é
importante e, mais importante ainda, é importante reflectir sobre isso de modo que
possamos mudar a nossa forma de viver.
A quarta razão: a leitura é importante para a expressão. Uma reclamação que,
geralmente, os professores apresentam, é o facto de os alunos não conseguirem
expressar as suas ideias. Esta dificuldade deve-se à falta de leitura. Quando as
pessoas cultivam o hábito de ler, aprendem novas palavras e o significado delas, o que
significa que passam a conhecer mais coisas. Assim, elas podem expressar melhor o
que pensam, pois, repito, já conhecem muitas palavras e as coisas que elas significam
e, portanto, podem falar à vontade das coisas que vêem, das coisas que imaginam ou
sonham. Melhoramos também a nossa forma de pensar, passamos a organizar melhor
o nosso pensamento, para melhor expressarmos as nossas ideias.
A quinta e última razão: a leitura é importante para o enriquecimento cultural. Isto
significa que ao lermos um romance ou um livro de poesia, por exemplo, ficamos mais
ricos, porque passamos a conhecer mais sobre a nossa cultura e sobre a cultura dos
outros, ou seja, a origem das coisas que os homens inventaram, o que os homens
pensavam ao inventarem essas coisas; podemos conhecer muitos povos e lugares, as
suas invenções, os seus pensamentos, as suas crenças. Este enriquecimento cultural
nos ensina a ser tolerantes, a aceitar a diferença entre colegas e amigos, entre
pessoas de origens diferentes, entre pessoas de crenças diferentes da nossa; este
enriquecimento ensina-nos a saber dialogar para resolvermos os nossos problemas.
Como disse antes, tudo o que nós comemos, fazemos, pensamos, sonhamos,
desejamos, inventamos, tudo isso é a nossa cultura, que nós recebemos dos nossos
avós e vamos deixar para os outros que virão. Aqui é que entra a literatura
moçambicana de forma muito específica. Porque dizemos literatura moçambicana, o
adjectivo “moçambicana” nos alerta que iremos encontrar nos nossos textos vários
aspectos ligados à nossa cultura e/ou educação: aspectos que têm a ver com a nossa
moral, a nossa ética, a nossa filosofia, a nossa religiosidade, as nossas invenções, os
nossos conhecimentos. Isto significa que ler a nossa literatura nos permite entrar em
contacto com a nossa própria cultura, a cultura que os nossos antepassados deixaram,
os seus ensinamentos, e perceber, finalmente, que atrasar a um compromisso não é
normal, que ter duas, três namoradas não é normal, que ir à sala de aulas alcoolizado
não é normal, que cabular não é normal, que tentar subornar os professores não é
normal, que envolver-se com drogas não é normal. E vamos perceber isso porque,
como diria Hegel, a função de qualquer literatura é melhorar a nossa humanidade,
melhorar os homens que somos. E como é que ela faz isso? Fazendo-nos às vezes
chorar, às vezes rir, às vezes deixando-nos tristes e inconformados. Pois é, como disse
antes, às vezes lemos histórias que têm personagens que não nos agradam. Isto
significa que com elas aprendemos alguma coisa que pode ajudar-nos a melhorar a
nossa forma de viver, a nossa cultura e a nossa educação. Por isso leiam, ler está na
moda e é a única moda que não passa. Não importa em que suporte for, se é um livro
impresso ou se é um e-book, os livros electrónicos. O importante é que a gente leia.
Não importa se é um poema que nos chegam pelo whatssap ou pelo facebook, o
importante é que possamos ler. Porque a leitura é tão necessária como o pão que
comemos todos os dias ou o ar que respiramos o dia todo!
Obrigado!

BREVE REFLEXÃO SOBRE A RELAÇÃO


ENTRE
CULTURA E EDUCAÇÃO
 

Francisco dos Santos Silva

Graduando em Pedagogia.

Instituto Tocantinense de Ensino Superior e Pesquisa - Faculdade ITOP

Introdução

Existe uma intrínseca relação entre cultura e educação, visto que a própria educação é
considerada como sendo parte da cultura. A cultura pode ser entendida como fruto da
inventividade humana, só existe cultura porque existe o homem, e a educação está
incluída neste meio. Pois é sabido que desde os primeiros homens houve a
necessidade de repassar os costumes aos mais jovens, bem como o modo de caça,
preparar determinado objeto, a maneira de ser, etc.

Sabe-se que o processo educativo não acontece apenas na escola, mas


convencionou-se socialmente que a escola é responsável pelo processo de educação
formal, pela transmissão do saber sistematizado. Em consequência a esta ideia, os
saberes aprendidos fora da escola, na educação informal, são postos em segundo
plano.

A Prática Educativa

Quando se fala em prática educativa logo se pensa em escola, professor, aluno, livros
didáticos, objetivos, metodologias, e claro, avaliações. A prática educativa está sim
relacionada a tudo isto, mas não se limita somente a esses aspectos. A prática de
ensinar está presente em praticamente todos os setores sociais, pois é sabido que a
educação não acontece única e exclusivamente na instituição escolar.

A educação é vista (a prática educativa) como o meio para, entre outras coisas, a
difusão dos ideais, ideologias e saberes de grupos dos setores sociais. Portanto a
prática educativa está presente em diferentes áreas dos setores sociais como forma de
difundir, transmitir e fazer com que seja internalizado certos conhecimentos e
habilidades, como o caso das campanhas de conscientização, das propagandas
estimulando o consumo, etc. Para uma compreensão mais acertada Libâneo (2010, p.
30), diz que a

Educação é o conjunto das ações, processos, influências,


estruturas, que intervêm no desenvolvimento humano de
indivíduos e grupos na sua relação ativa como o meio natural e
social, num determinado contexto de relações entre grupos e
classes sociais. É uma prática social que atua na configuração da
existência humana individual e grupal, para realizar nos sujeitos
humanos as características de "ser humano".

Portanto a educação como prática social se faz essencial para o funcionamento da


sociedade como um todo, uma vez que a prática educativa consiste, em elemento
transformador das relações sociais, na medida em que interfere diretamente nas ações,
processos e estruturas no modo de pensar humano, e consequentemente na sua
relação com a natureza e com outros indivíduos. “É inevitável que as gerações adultas
cuidem de transmitir às gerações mais novas os conhecimentos, experiências, modos
de ação que a humanidades foi acumulando em decorrência das relações incessantes
entre homem e o meio natural e social” (LIBÂNEO, 2010, p. 73). Isso quer dizer que o
processo educativo é fruto de um processo de aquisição de certas capacidades e
qualidades necessárias para que o homem atue no meio social.

No que se refere à educação formal, aquela ofertada por instituições escolares, onde
há intencionalidade na prática, objetivos pré-estabelecidos a serem alcançados, entre
outros, há certos requisitos para uma prática dita eficiente. Antes de tudo a educação, a
prática educativa, é um ato social, mas este ato não pode estar pautado no improviso,
quando nos referimos ao ensino formal.

Forquin (1993, p. 12) nos diz que se referindo à educação, cultura significa “um
patrimônio de conhecimentos e de competências, de instituições, de valores e de
símbolos, constituído ao longo de gerações e característico de uma comunidade
humana particular, definida de modo mais ou menos amplo e mais ou menos
exclusivo”. O autor ainda ressalta que na educação escolar sempre há uma
seletividade no “interior da cultura” (ibdem, p.12) e reformulação para, assim, ser
transmitida na forma de conteúdo escolar.
Piletti (2004) coloca alguns critérios quanto aos conteúdos escolares. Em primeiro lugar
devem estar ligados à realidade atual (social, econômica, cultural) e serem
representativos, isto é, o aluno tem de ver os elementos inerentes à sua realidade
inseridos nos conteúdos, portanto o conteúdo tem que ter uma validade prática.
Também os conhecimentos adquiridos através dos conteúdos (informações
transformadas em conhecimentos) devem ser usados em “situações novas”.

O etnocentrismo e relativismo cultural na escola

Na medida que o homem e consequentemente as sociedades primitivas evoluíam a


necessidade de passar à geração mais nova os conhecimentos construídos
socialmente e historicamente acumulados aumentava. E a escola surge como difusora
da cultura dominante e do conhecimento, na mesma medida em que passa a difundir
as ideias de uma cultura etnocêntrica. Na visão tradicional o que há é uma cultura
homogeneizadora, com concepção de cultura ideal, cheia de estereótipos, portanto,
etnocêntrica.

O etnocentrismo é compreendido como o ato em que uma cultura é posta como o


centro, em determinado grupo ou mesma sociedade, passado a servir de padrão para
julgar todas as demais formas de cultura, em geral de modo depreciativo. A cultura dos
demais. Isto, seus modos de ser, seus costumes, valores são vistos como inferiores.

Como exemplo temos os antigos romanos, que consideravam os demais povos como
bárbaros, pois não tinham os mesmos costumes que eles, a cultura helenista. Também
tomo como exemplo os europeus que se consideravam civilizados, cultos, mais
inteligentes que os nativos da nova terra recém descoberta. Da mesma forma que
todos os países europeus que fixaram colônias na África. 

Citei esses exemplos históricos, mas na atualidade o etnocentrismo está bem vivo e
presente, quando alguém ver, por exemplo, um documentário em que mostra os
vietnamitas comendo carne de cachorro (considerada uma iguaria no Vietnã), ou o fato
de na Índia considerarem um rio sagrado (rio Ganges), alguns podem julgar uma e
outra como atitudes impróprias, primitivas, pois esse juízo é pautado na comparação de
uma cultura com a sua própria: a cultura do eu (a melhor) comparada com a cultura do
outro (inferior).

Em uma sociedade como a nossa está repleta de pensamentos etnocêntricos, pois


existe uma cultura dominante, a qual é amplamente difundida e sobreposta à outras
formas de cultura. E a escola é a agencia de perpetuação dessa forma de cultura, a
dominante.

O relativismo cultural é a compreensão da cultura do outro em sua própria


singularidade, merecendo respeito e aceitação mesmo sendo divergente do modelo
dominante. É o contrário do que representa o etnocentrismo, visto que analisa e
compreende as diversas culturas em seus próprios âmbitos, em seus próprios
contextos socio-históricos. A partir do memento que se entende que cada cultura é
singular, que não se deve compará-las entre si, é o começo para superar o
pensamento etnocêntrico.

Para concluir

A prática educativa escolar tanto pode ser uma perpetuadora de uma cultura
etnocêntrica quanto um processo de superação dessa. A educação escolar não pode
se manter neutra nesse processo, é inevitável uma ou outra ação.

Portanto a prática educativa na escola deve levar a comunidade escolar a entender que
não existe uma cultura única, uma melhor, superior à outra, mas que existe um
multiculturalismo. Cada cultura é deve ser vista e entendida à sua própria luz.

REFERÊNCIAS

BRANDÃO, Carlos R. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1986.

CANDAU, Vera M.; MOREIRA, Antônio F. (org.). Multiculturalismo: diferenças


culturais e práticas pedagógicas. 2 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

FORQUIN, Jean-Claude. Escola e cultura: bases socias e epistemológicas do


conhecimento escolar. Porto Alegre: Artemed, 1993.

LIBÂNEO, José C. Pedagogia e pedagogos, para quê. 12 ed. São Paulo: Cortez,
2010

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