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Manaus, Amazonas
Julho, 2011
RINA FÁTIMA MARANHÃO DE OLIVEIRA
Manaus, Amazonas
Julho, 2011
ii
Banca examinadora do projeto de dissertação (aula de qualificação)
iii
O48 Oliveira, Rina Fátima Maranhão de
Aspectos etnobotânicos e taxonômicos de Araceae Juss. na comunidade Santa
Maria, Baixo rio Negro, AM) / Rina Fátima Maranhão de Oliveira. --- Manaus : [s.n.],
2011.
xvi, 119 f : il. color.
Sinopse:
iv
Aos meus pais, Renan e Shirley, que sempre
estiveram ao meu lado me apoiando e me
orientando.
DEDICO
v
AGRADECIMENTOS
vi
Ao Dr. Wilson Meireles e à Jackeline, do Laboratório Temático de Microscopia
Eletrônica – LTME/INPA, que nos deram toda a assistência durante a realização das
fotografias das lâminas histológicas.
Às sensacionais amigas de turma Nallaret, Luísa, Joana e irmãs postiças Juliana,
Mariana e Naia, pelo companheirismo e amizade.
Ao Dr. Luís Carlos Bonates (KK), com sua inestimável ajuda na compreensão da
anatomia vegetal e às amigas Catarina e Vanessa, do laboratório de anatomia vegetal do
INPA, pelos momentos de estudo e descontração.
Ao Dr. Antônio Carlos, chefe da Coordenação de Pesquisas em Botânica –
CPBO/INPA, e às amigas da secretaria Neide, Gisele e Jéssica.
Ao seu Sebastião Silvino (Sabá), que me ajudou na coleta de campo.
Ao amigo e agora irmão de consideração Gleison Viana, pela inestimável amizade e
contribuição nesse trabalho.
Ao Dr. Eduardo Gonçalves, pela identificação de Xanthossoma, e ao Dr. Charles
Zartman, do INPA, pela identificação de Humiriaceae.
Ao Sr. Felipe França, ilustrador botânico do INPA, pelo esforço em desenhar as
lindíssimas pranchas que ilustram o trabalho.
À professora Dra. Dalva Graciano (UnB) que me ajudou a esclarecer algumas dúvidas
sobre anatomia das raízes.
A todos os professores do programa do curso de botânica, que me enriqueceram com
seus conhecimentos e dedicação a essa disciplina tão nobre da biologia.
Aos doutores Ari Hidalgo (UFAM), Danilo Oliveira (UFRJ) e Rita Mesquita (INPA),
pelas contribuições finais na defesa pública.
A toda minha família, meus tios, tias, primos, primas, avós, que sempre me
incentivaram, principalmente aos meus pais, meu irmão e meu cachorro que estiveram sempre
aguentando minhas fases de nervosismo e me dando força e sabedoria para seguir em frente
superando a mais um desafio.
vii
“Um dia, o índio Pakalamoka foi à Mãe-do-Mato, e
esta lhe ensinou como livrar os macuxis de seus
males. Ao nascer da lua, Pakalamoka dirigiu se a um
lago que ela indicara e, ao chegar, viu um bando de
pássaros. Flechou a ave que voava mais alto e colocou
em torno de onde ela caiu capim e gravetos, e fez uma
fogueira. Deitou-se e dormiu. Ao acordar, viu ao redor
de si e do lago, tajás com folhas de vários feitios e
cores deslumbrantes:
Nunes Pereira
viii
RESUMO
A família Araceae Juss. possui espécies bem conhecidas no âmbito econômico para o homem
destacando-se por serem utilizadas como plantas medicinais, alimentícias, fibrosas, e
principalmente ornamentais. As raízes aéreas das espécies dos gêneros Heteropsis Kunth e
Philodendron Schott, pertencentes à família Araceae, tem sido usadas até hoje como fonte de
fibras para confecção de cestos na região amazônica. Na região do Baixo Rio Negro,
Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting, conhecida como “cipó-titica” é a espécie mais
utilizada pelos extratores como fonte de fibras, quanto ao gênero Philodendron, existem
várias espécies utilizadas pelos extratores para confecção de artesanato e outros utensílios. O
objetivo geral deste trabalho foi realizar um levantamento das espécies da família Araceae
com potencial econômico, utilizados pela comunidade Santa Maria, localizada na margem
esquerda do rio Negro, na qual seus moradores possuem um modo de vida composto
basicamente pela pesca e agricultura familiar, complementando estas atividades com a coleta
de Produtos Florestais Não Madeireiros (PFNM`s). Para a coleta de informações
etnobotânicas foram utilizadas ferramentas como o “rapport” e a “turnê guiada”. O registro
das informações foi baseado em questionário semiestruturado e através de conversas
informais. A análise das informações foi realizada através da totalização de usos. Foram
encontradas 51 espécies de Araceae distribuídas em 15 gêneros. O gênero Philodendron foi o
mais diverso com 22 espécies. No total, foram identificadas 23 espécies úteis, apresentando
dentre estas, usos para o artesanato, alimentícias, medicinais, ornamentais e místicas. Dentre
as que apresentaram maior valor de uso foram Philodendron solimoesense e Heteropsis
flexuosa, espécies cujas raízes são utilizadas como fonte de fibra para a confecção de artigos
artesanais. Foi detectado o uso em artesanato de outra espécie da família Araceae, Monstera
obliqua Miq., conhecida pelos artesãos como “ambé-sima”. Foi realizado o tratamento
taxonômico dessas três espécies onde foi levada em consideração a distribuição, dados
fenológicos, afinidade e histórico dos espécimes e detalhes das estruturas vegetativas e
reprodutivas da planta, os quais foram ilustrados em pranchas. Também foi elaborada uma
chave de identificação contendo características da morfologia externa e interna das espécies.
Quanto ao estudo anatômico da lâmina foliar e da raiz aérea das espécies, foram selecionados
alguns caracteres como diagnóstico para a taxonomia, como tipo de estômatos, tipo de
cristais, ocorrência de laticíferos, presença de hipoderme, ocorrência de bainha de fibras
esclerenquimáticas, forma do cilindro central, dentre outros. Também foi feito o estudo das
fibras das raízes, onde as três espécies apresentaram fibras longas do tipo libriforme com
paredes espessas e lumens reduzidos.
ix
ABSTRACT
The species of the Araceae family has in the economic well-known to the man standing out
for being used as medicinal plants, food, fibers, and mainly ornamental. The aerial roots of
the species of Philodendron Schott and Heteropsis Kunth belonging to the family Araceae,
has been used until now as a source of fiber for making baskets in the Amazon region. In the
Lower rio Negro, Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting, known as "cipó-titica" is the
species most used by the extractors as a source of fiber, while the genus Philodendron, many
species used by the extractors for making handicrafts and other utensils. The overall objective
of this study was to survey the species of the family Araceae with economic potential, used by
the community Santa Maria, located on the left bank of rio Negro, in which its residents have
a way of life composed primarily by fishing and farming family, complementing these
activities with the collection of Non Timber Forest Products (NTFP`s). In order to collect
ethnobotanical information tools were used as the "rapport" and "guided tours". The recording
of information was based on semi-structured questionnaire and through informal
conversations. The analysis of information was realized through the aggregation of uses. We
found 51 species of Araceae distributed in 15 genera. The genus Philodendron was the most
diverse with 22 species. In total, 23 useful species were identified, presenting among these
uses for crafts, food, medicinal, ornamental and mystical. Among those who had higher use
value were Philodendron solimoesense and Heteropsis flexuosa, species whose roots are used
as a fiber source for making arts and crafts. Was detected using in crafts of another species of
the family Araceae, Monstera obliqua Miq., known for artisans such as "ambé-sima". The
treatment of these three taxonomic species which was taken into account the distribution,
phenological data, and historical affinity of the specimens and details of the vegetative and
reproductive structures of plants, which were illustrated in boards. It was also prepared
containing an identification key with characteristics of internal and external morphology of
the species. As for the anatomical study of leaf and root shoots of species, some were selected
as diagnostic characters for taxonomy, such as type of stomata, type of crystals, the
occurrence of latex, presence of hypodermis, the occurrence of sclerenchyma sheath fibers, so
the central cylinder, among others. Also the study was made of the fibers of the roots, where
the three species had long fiber type libriforme with thick walls and small lumens.
x
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 1
OBJETIVOS
Geral....................................................................................................................... 4
Específicos.............................................................................................................. 4
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A família Araceae Juss......................................................................................... 5
Anatomia................................................................................................................ 6
Usos da família no âmbito comercial e etnobotânico......................................... 8
Artesanato e construção................................................................................. 8
Medicinais........................................................................................................ 10
Místicos............................................................................................................ 12
Ornamentais.................................................................................................... 12
Alimentícios..................................................................................................... 13
14
REFERÊNCIAS.........................................................................................................
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo....................................................................................................... 27
Aspectos ambientais.............................................................................................. 28
Aspectos sócio-econômicos................................................................................... 29
Coleta de informações etnobotânicas.................................................................. 30
Análise das informações....................................................................................... 31
Coleta de material botânico................................................................................. 31
Identificação e descrição das espécies................................................................. 32
xi
RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................... 34
Perfil sócio-econômico dos informantes............................................................. 34
Diversidade de espécies úteis na comunidade Santa Maria ............................ 35
Artesanato............................................................................................................. 44
Coleta e beneficiamento do “ambé-coroa”........................................................ 46
Tecelagem............................................................................................................. 48
Alimentícias.......................................................................................................... 50
Medicinais............................................................................................................. 51
Ornamentais......................................................................................................... 52
Místicas................................................................................................................. 53
55
CONCLUSÃO............................................................................................................
56
REFERÊNCIAS.........................................................................................................
RESUMO.................................................................................................................... 62
ABSTRACT................................................................................................................ 62
INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 63
OBJETIVOS............................................................................................................... 65
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo..................................................................................................... 66
Coleta de material botânico............................................................................... 66
Identificação das espécies................................................................................... 68
Morfologia interna da lâmina foliar.................................................................. 70
Morfologia interna das raízes aéreas e fibras................................................... 70
RESULTADOS
Tratamento taxonômico..................................................................................... 72
Descrição dos gêneros......................................................................................... 72
Heteropsis Kunth.................................................................................................. 72
Monstera Adanson............................................................................................... 72
xii
Philodendron Schott……………………………………………………………. 73
Relações infragenéricas................................................................................. 74
Chave para identificação das espécies.............................................................. 75
Descrição das espécies........................................................................................ 76
Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting....................................................... 76
Morfologia interna............................................................................................. 81
Lâmina foliar................................................................................................. 81
Raiz aérea....................................................................................................... 82
Monstera obliqua Miq…………………………………………………………. 83
Morfologia interna............................................................................................. 88
Lâmina foliar................................................................................................. 88
Raiz aérea....................................................................................................... 89
Philodendron solimoesense A.C. Sm……………...…………………………... 90
Morfologia interna............................................................................................. 94
Lâmina foliar................................................................................................. 94
Raiz aérea....................................................................................................... 95
Principais características anatômicas distintivas da lâmina foliar e as
raízes aéreas entre as espécies de Araceae estudadas............................................. 97
Estudo das fibras................................................................................................ 98
100
DISCUSSÃO...............................................................................................................
CONCLUSÃO............................................................................................................ 105
REFERÊNCIAS........................................................................................................ 106
APÊNDICE A............................................................................................................ 111
APÊNDICE B .…………………………………………………………………… 112
APÊNDICE C............................................................................................................. 116
ANEXO A................................................................................................................... 118
ANEXO B.................................................................................................................... 119
xiii
LISTA DE FIGURAS
xiv
Figura 7. Aspecto geral e estruturas reprodutivas de Monstera obliqua......................... 87
Figura 8. Estruturas da lâmina foliar de Monstera obliqua............................................. 88
Figura 9. Cortes transversais das raízes aéreas de Monstera obliqua............................. 89
Figura 10. Aspecto geral e estruturas reprodutivas de Philodendron solimoesense....... 93
Figura 11. Estruturas da lâmina foliar de Philodendron solimoesense........................... 95
Figura 12. Cortes transversais da raiz aérea de Philodendron solimoesense.................. 96
Figura 13. Mapa de distribuição geográfica das espécies H. flexuosa, M. obliqua e P.
solimoesense..................................................................................................................... 97
xv
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
xvi
INTRODUÇÃO
2
ribeirinhas que vivem isoladas, associado às necessidades básicas de alimentação, construção
e remédio, faz com que a proporção de produtos florestais não madeireiros utilizados seja
muito alta em relação a outras regiões. No campo da investigação farmacológica, por
exemplo, Rodrigues (2006) ressalta que em muitos casos, o isolamento geográfico contribui
ao fortalecimento das práticas médicas locais e tradicionais.
Portanto, o desenvolvimento de uma pesquisa etnobotânica associada à taxonomia das
espécies de Araceae utilizadas na comunidade Santa Maria, no Baixo rio Negro, poderá
promover não só o aprofundamento do conhecimento científico dessas espécies, como
também subsídios para o manejo, visando à conservação deste, e de outros grupos de plantas,
possibilitando assim, a manutenção das tradições que sustentam sua cultura e economia.
No primeiro capítulo, serão apresentados aspectos sócioeconômicos de alguns
moradores e as espécies de Araceae ocorrentes na comunidade Santa Maria. Posteriormente,
serão apresentados tratamentos taxonômicos e morfoanatômicos das três espécies mais
utilizadas para artesanato na comunidade, Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting,
Monstera obliqua Miq. e Philodendron solimoesense A.C.Sm.
3
OBJETIVOS
Geral
Específicos
4
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Araceae é uma família subcosmopolita que possui atualmente 109 gêneros e cerca de 2.823
espécies concentradas predominantemente nos trópicos da América, no Sudeste da Ásia e no
Arquipélago da Malásia (Govaerts et al., 2002). Na América do Sul está representada por 38
gêneros e cerca de dois terços do total das espécies (Mayo et al., 1997; Soares & Mayo, 1999;
Soares & Jardim-Lima, 2005). No Brasil está distribuída em todos os domínios
fitogeográficos e dados preliminares indicam a existência de 35 gêneros perfazendo 458
espécies, das quais 286 são endêmicas (Coelho et al., 2010).
Suas espécies apresentam uma alta diversidade de hábito e uma grande variedade no
formato das folhas, demonstrando uma plasticidade fenotípica principalmente nas primeiras
fases de desenvolvimento, constituindo dessa forma um grupo complexo em termos de vida e
ecologia (Croat, 1990; Mayo et al., 1997; Soares & Mayo, 1999). O hábito varia desde ervas,
pequenas a gigantes, epífitas, hemiepífitas, geófitas, litófitas, helófitas, raramente flutuantes
ou aquáticas submersas; apresentam caule trepador, arborescente, ereto, reptante ou
subterrâneo. As folhas variam de simples a compostas; pecíolo geralmente conspícuo, exceto
no gênero Heteropsis, que apresenta pecíolos curtos. O formato da lâmina varia desde inteira,
ovada, cordada, sagitada, hastada, trífida ou trissecta, pedatífida, pinatífida, pedatissecta a
dracontioide. A grande maioria das espécies prefere ambientes úmidos como florestas pluviais
e brejos ou crescem próximas à água corrente (Mayo et al., 1997, Soares & Mayo, 1999).
Como características reprodutivas, Araceae apresenta inflorescência na forma de
espádice composta por inúmeras flores bissexuais ou unissexuais, associada a uma bráctea
chamada espata. A infrutescência é geralmente cilíndrica ou, às vezes, globosas. Os frutos são
tipicamente bagas suculentas, embora raramente secas, mais comumente vermelhas ou
laranjas, dependendo do gênero em questão (Mayo et al., 1997). Os mecanismos de
polinização são conhecidos em gêneros com flores unissexuais e o odor da inflorescência é o
fator mais importante para a atração dos polinizadores, que incluem abelhas da família
Trigoniidae e Euglossinidae, besouros da família Scarabaeidae e moscas da família
Drosophilidae (Mayo et al., 1997). A termogênese é um mecanismo de polinização, ocorrente
em Araceae, onde há elevação de calor volatilizando os odores das flores para atrair insetos
polinizadores. No caso de Philodendron solimoesense A.C. Sm., que ocorre na Amazônia e
5
em outras florestas tropicais úmidas, a temperatura aumenta em até 14°C acima da
temperatura ambiente da floresta ao redor (Exotic rain forest, 2010).
Historicamente, Jussieu (1789) estabeleceu Araceae como família natural, porém
reconheceu poucos gêneros, provavelmente devido à escassez de boas amostras de material de
taxa não europeu. Heinrich Wilhelm Schott foi o primeiro botânico a trabalhar somente com a
Araceae e fazer estudos comparativos minunciosos das inflorescências, flores e frutos de
Araceae, além disso, descreveu novos gêneros e espécies e criou a primeira classificação
natural principal para toda a família (Mayo et al., 1997). Posteriormente, o pesquisador que
mais contribuiu com a família foi Adolf Engler, fazendo a primeira modificação taxonômica
proposta por Schott na Flora brasiliensis em 1878. Em 1979, Bogner atualizou o sistema de
Engler, adicionando gêneros, na época, recentemente descritos e levando em conta novas
sinonímias.
Mais recentemente, trabalhos como o de Saguraki (1998) (“Taxonomia e filogenia das
espécies de Philodendron, seção Calostigma (Schott) Pfeiffer no Brasil”), Gonçalves &
Temponi (2004), (“A new Monstera (Araceae: Monsteroideae) from Brazil”), Temponi
(2007), (“Sistemática de Anthurium sect. Urospadix”), Soares et al., (2009), (“Two new
species and a new combination in Amazonian Heteropsis (Araceae)”) e APG II (2003) e III
(2003), por exemplo, vêm trazendo grandes contribuições para o entendimento da taxonomia
e filogenia da família no Brasil e no mundo.
Anatomia
6
espessamento na parede do endotécio nas subfamílias de Pothoideae e Monsteroideae
(French, 1985), observações nos padrões de vascularização de estames na família (French,
1986), reportando a ocorrência sistemática da hipoderme esclerótica em raízes de Araceae
(1987), na estrutura do óvulo e tricomas placentais (French, 1987) e registrando a ocorrência
de laticíferos anastomosados na família (French, 1988) onde, considerou a presença destes
laticíferos, como o caráter mais definitivo da subfamília Colocasioideae. French (1997)
também revisou a literatura sobre a anatomia interna e forneceu, apesar de não ilustrado, um
compreensivo sumário da anatomia de todos os órgãos e tecidos. Mais recentemente,
apresentam-se os estudos de Keating (2002), que publicou uma coletânea de trabalhos em
anatomia e investigação original de folha e pecíolo em vários gêneros de Araceae e os de
Keating (2004), citando a ocorrência de ráfides na família.
Estudos para o gênero Heteropsis Kunth ainda são muito escassos, conhecidos apenas
os de Potiguara & Nascimento (1994) que descreveram a anatomia dos órgãos vegetativos de
Heteropsis jenmanii Oliv., análises da folha de H. oblongifolia Kunth e H. spruceana Schott
por Keating (2002) e o estudo do colênquima peciolar de alguns gêneros de Araceae realizado
por Gonçalves et al. (2004), onde inclui H. oblongifolia. Pesquisas recentes para Heteropsis
foram realizadas por Soares (2008) em sua tese de doutorado, as quais abrangem além da
anatomia de quatro espécies, incluindo H. flexuosa, sistemática e ecologia de várias espécies
amazônicas ocorrentes na Reserva Florestal Adolpho Ducke.
A subfamília Monsteroideae, a qual pertence H. flexuosa e M. obliqua, foi circunscrita
por Engler em 1876 e baseada principalmente em estudos sobre a anatomia interna e externa.
Após muitos estudos e rearranjos cladísticos, as monsteroídeas têm sido analisadas utilizando
diferentes métodos. Quanto aos estudos sobre anatomia se destacam os trabalhos de Nicolson,
1960; Eyde et al., 1967; French & Tomlinson, 1981; French, 1985, 1986a, b, 1987; Ray,
1988; Carvell, 1992; e Dietmar-Benhke, 1995. Dentre os mais recentes para a espécie M.
obliqua em particular, cita-se o trabalho de Arunika et al. (2005), um interessante estudo
ontogenético, onde os autores afirmam que as perfurações na epiderme das folhas são
originadas por grupos de células vizinhas programadas para morrer simultaneamente.
Em relação ao gênero Philodendron, foram realizadas pesquisas como a de Pfitzer
(1872), que notou a ocorrência de aquíferos na epiderme. Ambronn (1879-81) observou o
colênquima em forma de anéis em Philodendron eximium Schott. French & Tomlinson (1981,
1984) publicaram estudos sobre os padrões de vascularização do caule no gênero, onde foi
encontrada uma anatomia vascular muito heterogênea. Bunting (1968), em seus trabalhos
voltados para a anatomia e taxonomia do complexo de Philodendron hederaceum (Jacq.)
7
Schott. Estudos de Schneider & Carlquist (1998), voltados para a presença de vasos do
xilema, em cinco gêneros da subfamília Philodendroideae como parte de uma série de estudos
sobre monocotiledôneas. Mais especificamente, para o subgênero Meconostigma, ao qual
pertence P. solimoesense, foi feita uma série de estudos por Mayo (1986), onde o autor
analisa e descreve a anatomia da inflorescência de várias espécies desse subgênero.
Artesanato e construção
Um aspecto importante, tanto para a cultura como para a economia, é o uso das raízes
aéreas das plantas de alguns gêneros da família como matéria-prima para artesanato. Van den
Berg (1984), em sua pesquisa etnobotânica no mercado do Ver-o-Peso em Belém, Estado do
Pará, registrou o “cipó-titica” (Heteropsis spruceana Schott), utilizada para fabricação de
cestos. Há muito tempo os indígenas e outros moradores que habitam a floresta amazônica
coletam fibras de Heteropsis para serem utilizadas em construções e trabalhos manuais
(Balée, 1994; Paz & Miño et al., 1995). No Parque Nacional do Jaú (PNJ), região do Baixo
rio Negro, a exploração destas fibras é a principal atividade da produção extrativista vegetal
(Durigan & Castilho, 2004).
No PNJ, além do “cipó-titica”, as raízes de espécies do gênero Philodendron,
conhecido como “cipó-ambé” ou simplesmente “ambé”, também são muito utilizadas como
matéria-prima para confecção de produtos como cestos, bolsas e paneiros. Crisci & Gancedo
(1971) relata que as raízes aéreas de P. bipinnatifidum Schott, além de medicinais, são muito
utilizadas pelos indígenas Guayaquí, do Paraguai, na confecção de arco e flecha.
De acordo com João Barbosa Rodrigues, os homens da tribo dos Crichaná,
supostamente os atuais Waimiri-Atroari, utilizavam cintos de raízes de aráceas como parte de
suas vestimentas (Milliken et al., 1992).
8
Na construção das malocas dos indígenas Waimiri-Atroari, os materiais são amarrados
com as raízes aéreas de Heteropsis spp., que também são amplamente utilizadas pelos
indígenas e colonos em cestarias. Os indígenas também usam o cipó-titica para ligar as seções
divididas de Iriartella setigera (Mart.) H.Wendl (Arecaceae) que compõem as portas da
maloca (Milliken et al., 1992).
Para os povos indígenas da bacia do Caura, no sul da Venezuela, cestas continuam a
desempenhar um papel central nas atividades de subsistência diária, mas elas também se
tornaram um dos principais itens do artesanato comercial. Cestas feitas de Heteropsis,
chamado Minñato na língua Ye’kwana, fornecem atualmente a principal fonte de renda em
dinheiro para as mulheres Ye’kwana (Knab-Vispo et al., 2003).
Na Amazônia brasileira e extrabrasileira, os povos tradicionais utilizam as raízes
aéreas das espécies dos gêneros Philodendron e Heteropsis na construção de cordas ou
amarras para confecção de cestos, chapéus e bolsas (Soares & Mayo, 1999; Plowden et al.,
2003; Durigan & Castilho, 2004).
Em decorrência do extrativismo intensivo dos cipós e a não reposição dessas plantas
nas Unidades de Conservação, o Estado do Amazonas, após alguns estudos científicos,
aprovou por meio da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável – SDS, a Instrução
Normativa 001/2008 no intuito de ordenar e normatizar o manejo adequado da espécie a
extração de fibras vegetais como piaçava, cipó-titica e outros (SDS, 2008). Segundo Canalez
(2009), esta norma propõe promover suporte técnico e estrutura organizacional aos que
trabalham e vivem do extrativismo de fibras vegetais, a fim de agregar renda.
As espécies da família Araceae e seus subprodutos (fibras obtidas dos cipós), objetos
de estudo deste trabalho, são classificadas como produtos florestais não madeireiros (PFNM),
visto que estes, segundo definição da “Food and Agriculture Organization” (FAO), são todos
os materiais biológicos (diferentes de madeira e lenha) que podem ser extraídos de florestas
naturais, agroecossistemas e de árvores que crescem espontaneamente em áreas rurais e que
podem ter utilização doméstica, ser comercializados ou ter significado social, cultural ou
religioso (Vantomme, 2001).
Devido à fragilidade e importância na manutenção do equilíbrio das florestas
tropicais, considera-se boas práticas de manejo dos cipós de Araceae, segundo a SDS (2008):
deixar sem coletar todos os fios verdes na planta; não coletar os fios que estão enrolados ao
tronco da árvore onde está o cipó; não coletar quando a planta apresentar apenas um fio
maduro; realizar a coleta através da poda ou arrancando os fios mediante torção para evitar a
queda da planta; não coletar os fios maduros de acordo com o número que cada árvore suporte
9
apresenta adotando as seguintes medidas: a) metade dos fios maduros para as árvores que
tiverem menos de 20 fios; b) um terço dos fios maduros para as árvores que tiverem mais de
20 fios; as plantas de cipó-titica das áreas onde as coletas ocorrerem, deverão passar por um
período de descanso de no mínimo três anos para permitir a regeneração dos seus fios.
Medicinais
Schultes & Raffauf (1990) citam diversas espécies do gênero Anthurium Schott com
usos medicinais. Na região de Puerto Ospina, no alto Putumayo, Anthurium aureum Engler,
quando triturado e misturado com um óleo, tem sido eficaz como cataplasma no tratamento de
ferimentos nas pernas por ferroada de “arraia-lixa”. A decocção quente das folhas coriáceas
de Anthurium crassinervum (Jacq.) Schott var. caatingae R.E. Schultes é utilizada pelos
Kubeos, da região de Mitú, na lavagem de ouvido para aliviar infecção causada por fungos.
Os Andokes, indígenas da região do médio Caquetá, na Colômbia, aplicam a seiva de
Anthurium flexuosum Kunth em casos de cegueira e também é usado para problemas de
ameaça do baço. Os frutos maduros de Anthurium infectorium R.E. Schultes são usados pelos
indígenas Kubeos para pintar os dentes de roxo ou preto para as danças e cerimônias. Existe
uma crença entre os nativos que esta prática ajuda a preservar os dentes das cáries. Os
indígenas Kófans, do Equador Amazônico, esmagam todas as partes de Anthurium jenmanii
Engler, em água quente e aplicam externamente para aliviar rigidez no pescoço (Schultes &
Raffauf, 1990).
A decocção das folhas de Anthurium scandens (Aubl.) Engl. é considerado um bom
tratamento para picada de cobra, entre os indígenas Tikuna, do Alto Solimões. Esse povo
também emprega o sumo adstringente dos frutos carnosos para estancar o fluxo de pus nas
gengivas nos casos de piorreia (inflamação das estruturas em volta dos dentes), uma doença
comum na tribo (Schultes & Raffauf, 1990)
Os rizomas de Dracontium longipes Engl. (“milho-de-cobra”) são empregados na
medicina caseira na região amazônica contra mordida de cobra, crises de asma, amenorreia,
tosse-comprida, sarna, anemia, antiviral, tônica e antiinflamatória (Lorenzi & Matos, 2002).
Entre os indígenas Sionas, no Equador, as folhas de Monstera adansonii Schott são
trituradas, fervidas em água e a decocção é friccionada sobre furúnculos. A seiva de
Montrichardia arborescens Schott é cáustica e a raiz em pó é usada como diurético na
Amazônia (Schultes & Raffauf, 1990).
10
Na medicina popular e indígena vários autores têm relatado o uso de espécies do
gênero Philodendron Schott., como por exemplo Philodendron bipinnatifidum Schott,
espécies cujas folhas e caule produzem suco cáustico usado contra orquite (inflamação dos
testículos), reumatismo e úlceras. As sementes são usadas contra parasitas intestinais. O
decocto (fervura) das folhas frescas e cascas é indicado contra hidropsia (acúmulo de água nas
células) e externamente na forma de banhos contra erisipela e inflamações reumáticas e
orquite. O cataplasma das inflorescências frescas e amassadas é utilizado contra úlceras
(Lorenzi & Matos, 2002).
Plowman (1969) listou 26 espécies de Philodendron usadas em diversos tipos de
doença, dentre estas P. imbe Schott ex Endl., que ocorre na Amazônia, conhecida como “cipó-
de-imbé”, “cipó-guimbé”, “tracuá” e “curuba”, dos quais as folhas são usadas na cura de
doenças reumáticas, tumores e úlcera. As folhas de P. fragrantissimum (Hook) G. Don, P.
pedatum (Hook) Kunth e P. cuneatum Engl. são utilizadas pelos indígenas Taiwano do Rio
Kananarí (Colômbia) para tratar inflamação de pele. As folhas e pecíolos de P. hylaeae G.S.
Bunting, misturados à farinha de mandioca são utilizados no tratamento de combate a
parasitas intestinais.
Além das espécies de Philodendron, Plowman (1969) também comenta que as folhas
de Montrichardia linifera (Arruda) Schott, espécie que ocorre nos Estados de Pernambuco,
Piauí, Rio de Janeiro, norte do Brasil e no Suriname, são consideradas antirreumáticas e
eficazes contra úlceras. Além disso, suas raízes, apesar de tóxicas, são antidiuréticas.
O chá das folhas de Pistia stratiotes L. (“alface-d`água”, “mureru”) é considerado
diurético, também usado contra hematúria (sangue na urina), como expectorante,
antidisintérico, anti-hemorroidal, antidiabético e é empregado na medicina popular,
principalmente na região amazônica. Em forma de banho, o chá é indicado para aliviar a
inflamação causada por erisipela. Os Tikunas utilizam suas folhas moídas em mistura com sal
para aplicação localizada em cataplasma na eliminação de verrugas (Lorenzi & Matos, 2002).
A inflorescência perfumada de Spathiphyllum floribundum (Linden & André) N.E.
Britton é esfregada na testa para aliviar a dor de cabeça. A seiva do caule de Syngonium
yurimaguense Engl., é empregada pelos Tikunas para tratar da picada dolorosa da “formiga-
conga”. Urospatha caudata Schott, é utilizada na Amazônia brasileira, através do sumo de
seus rizomas, no tratamento para problemas de pele (Schultes & Raffauf, 1990).
11
Místicos
Ornamentais
12
Alimentícios
Para uso alimentício, Posey (1984) relata que os indígenas Kayapós, cujo território
está situado na região do Planalto Central do Brasil, do sul do Pará até o norte do Mato
Grosso, cultivam variedades de plantas rizomatosas de Araceae e outras famílias em terrenos
bem drenados de encosta, reservados principalmente para fornecer alimentos em caso de
enchentes ou desastres agrícolas. Xanthosoma sagittifolium Schott, popularmente conhecida
como “taioba” e Colocasia esculenta (L.) Schott, mais conhecida por “inhame” ou “taro” são
dotadas de caule subterrâneo com reserva de amido (Lorenzi & Souza, 2008). Além disso,
seus rizomas podem ser usados na panificação, produção de álcool, colas, medicamentos e as
folhas também podem ser consumidas (Cardoso, 1997).
Amorphophallus paeoniifolius (Dennst.) Nicolson (“elephant yam”) é cultivada por
seus tubérculos ricos em amido na Ásia tropical, particularmente na Índia. Os rizomas de
Amorphophallus konjac K. Koch são muito utilizados no Japão, dos quais é extraído o
“konnyacu” um agente gelatinoso muito usado na indústria de alimentos. Cyrtosperma
merkusii (Hassk.) Schott, cresce desde o sudeste da Ásia até a Oceania e é usada como
comida para populações de baixa renda ou como ração para animais. Da mesma forma, na
América Tropical, utiliza-se Alocasia macrorrhizos (L.) Schott, que é exótica, invasora e
merece cautela no seu uso (Bown, 1988; Kinupp, 2007).
A mais importante planta cultivada do México é a Monstera deliciosa Liebm.,
popularmente conhecida como “banana-do-mato”, “fruta-pão-mexicana” ou “costela-de-
adão”, cuja infrutescência é comestível (Lorenzi & Souza, 2008). As infrutescências de
Philodendron bipinnatifidum Schott, quando maduras, são comestíveis, adocicadas e muito
saborosas. (Kinupp & Barros, 2007; Kinupp, 2007).
13
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22
Etnobotânica de plantas úteis na comunidade Santa Maria, Baixo rio Negro
– AM, com ênfase nas espécies da família Araceae Juss.
RESUMO
A família Araceae possui espécies bem conhecidas no âmbito econômico para o homem
destacando-se por serem utilizadas como plantas medicinais, alimentícias, fibrosas e,
principalmente, ornamentais. O objetivo geral deste trabalho foi realizar um levantamento das
espécies da família Araceae utilizadas pelos moradores da comunidade Santa Maria,
localizadas na Área de Proteção Ambiental da Margem Esquerda do rio Negro, Manaus,
Amazonas. As informações etnobotânicas foram coletadas utilizando metodologias como o
“rapport” e “turnê-guiada” e registradas através de questionário semiestruturado e conversas
informais. A análise das informações foi realizada através do cálculo do índice de Valor de
Uso. No total, foram encontradas 51 espécies de Araceae distribuídas em 15 gêneros, dos
quais Philodendron foi o mais diverso com 22 espécies. Deste total foram identificadas 23
espécies úteis de Araceae, tanto na área de floresta como na comunidade, com indicações de
usos para artesanato, alimentação, medicinal, ornamentação e misticismo. Dentre as espécies
que apresentaram maior índice de Valor de Uso (VU) estavam Philodendron solimoesense
A.C.Sm. (VU = 0,6) e Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting (VU = 0,5), cujas raízes são
utilizadas como fonte de fibra para a confecção de artigos artesanais. Além dessas espécies,
foi registrado também o uso de Monstera obliqua Miq., conhecida popularmente na região
como “ambé-sima”, cujas raízes aéreas também são utilizadas como fonte de fibras para o
artesanato.
ABSTRACT
The species of the family Araceae has in the economic well-known to the man standing out
for being used as medicinal plants, food, fibers and mainly ornamental. The overall objective
of this study was to survey the species of the family Araceae used by residents of the
community Santa Maria, located in the Environmental Protection Area of the Left Bank of the
rio Negro, Manaus, Amazonas. The ethnobotanical data were collected using methodologies
such as "rapport" and "guided-tour" and recorded semi-structured questionnaire and through
informal conversations. The information analysis was done by calculating the index Use
Value. In total, 51 species were found distributed in 15 genera Araceae, Philodendron of
which was the most diverse with 22 species. Of the total 23 species were identified useful
Araceae, both in the forest and the community, with indications of uses for crafts, food,
medicinal, ornamental and mysticism. Among the species with the highest index Use Value
(UV) were Philodendron solimoesense A.C.Sm. (UV = 0.6) and Heteropsis flexuosa (Kunth)
G.S. Bunting (UV = 0.5), whose roots are used as a fiber source for making arts and crafts.
Besides these species, was also recorded using Monstera obliqua Miq., popularly known
locally as "ambe-sima," whose aerial roots are also used as a source of fiber crafts.
23
INTRODUÇÃO
Estudos etnobotânicos vêm ganhando destaque cada vez maior nos últimos anos, suas
implicações ideológicas, biológicas, ecológicas e filosóficas dão respaldo ao seu crescente
progresso metodológico e conceitual (Morais et al., 2003). Além disso, contribuem em
especial para o desenvolvimento planejado da região onde os dados foram coletados (Begossi
et al., 2002). O conhecimento obtido das populações tradicionais deve ser valorizado e
compartilhado com o objetivo de possibilitar e garantir o uso desses recursos por determinado
grupo de pessoas, no sentido de melhorar as condições de vida dessas populações.
No Brasil e em vários outros países, a intensificação dos trabalhos nessa área leva ao
conhecimento das espécies que são utilizadas, o que pode servir como instrumento para
delinear estratégias de utilização e conservação das espécies nativas e seus potenciais (Ming,
2000), uma vez que este é detentor de grande biodiversidade e também de povos com culturas
diversas que sabem a aplicabilidade de uma grande quantidade de espécies vegetais
(Elizabestsky, 2005).
Os primeiros levantamentos etnobotânicos realizados para a família Araceae foram
mais voltados para o âmbito da botânica econômica, visto que muitas de suas espécies são
utilizadas como ornamentais, alimentícias, medicinais, místicas e como matéria-prima para
confecção de artesanato.
As Araceae são muito utilizadas para ornamentação, principalmente pela beleza e
exuberância de suas folhagens, assim Anthurium andraeanum Linden, Zantedeschia
aethiopica (L.) Spreng. e seus híbridos têm sido importantes fontes de flores de corte gerando
lucros de milhões de dólares em vários países. Na América Tropical as principais espécies
utilizadas no paisagismo são dos gêneros Philodendron Schott, Monstera Adans.,
Epipremnum Schott, Spathiphyllum Schott, Anthurium Schott, Dieffenbachia Schott,
Syngonium Schott, Aglaonema Schott, Caladium Vent. e Zantedeschia Spreng. (Bown, 1988).
Vários gêneros geófitos que possuem caules subterrâneos ricos em amido, são
cultivados como alimento em países tropicais, como espécies de Alocasia Neck. ex Raf.,
Amorphophallus paeoniifolius (Dennst.) Nicolson e Cyrtosperma chamissonis (Schott) Merr.
Nos trópicos, as espécies alimentícias mais utilizadas são Colocasia esculenta (L.) Schott,
conhecidas como “inhame” ou “taro”, originários da Ásia, e Xanthosoma sagittifolium (L.)
Schott, conhecida como “taioba”, originária da América do Sul. Monstera deliciosa Liebm.,
também ornamental, é apreciada por seus frutos comestíveis, cujo sabor se parece com o de
24
“abacaxi”. As sementes de Typhonodorum, de Madagascar e Montrichardia, da América do
Sul, ambas utilizadas como alimento (Bogner, 1987; Bown, 1988).
Espécies medicinais de Araceae tem sido usadas para combater vermes parasitas,
febres, doenças de pele, desinterias, mordidas de cobra, ferimentos, tumores, asmas,
reumatismos e como laxativo. Schultes (1963), após convívio com algumas tribos da América
do Sul registrou o uso de partes de certas espécies pertencentes aos gêneros Anthurium,
Philodendron e Urospatha como contraceptivos femininos. Algumas espécies de Araceae são
consideradas tóxicas, como Epipremnum giganteum (Roxb.) Schott e Amorphophallus
prainiiHook. f., sendo utilizadas como constituintes de flechas venenosas usadas por
indígenas na Malásia.
Espécies vegetais fibrosas ocupam papel de destaque no cotidiano das comunidades
tradicionais amazônicas ao lado das espécies medicinais, alimentícias e madeireiras (Oliveira
et al., 2006). Esses povos tradicionais da região amazônica utilizam as raízes aéreas das
espécies do gênero Philodendron e Heteropsis na construção de cordas ou amarras para
embarcações, casas e em artesanatos na confecção de cestos, chapéus e bolsas (Milliken et al.,
1992; Soares & Mayo, 1999; Plowden et al., 2003; Durigan & Castilho, 2004). No entanto,
não se sabe realmente quantas e quais espécies pertencentes ao gênero Philodendron são
utilizadas para esse fim. As áreas de maior intensidade de exploração do “cipó-titica” no
Amazonas estão localizadas ao norte do Estado, ao longo do rio Negro, onde a tradição de
confeccionar utensílios como cestos e paneiros de cipós tem sido praticada principalmente
pelos homens e é passada de pai para filho.
Para garantir não só a preservação e conservação desses recursos, como também das
tradições locais, é necessário que haja um estudo detalhado e uma avaliação da importância
das plantas que estão sendo utilizadas por essas pessoas e de que forma elas vem sendo
utilizadas no cotidiano dessas comunidades. Portanto, foi de suma importância resgatar o
conhecimento dos usos das espécies mais utilizadas na Comunidade Santa Maria com intuito
de não só preservar o material genético como também sensibilizar a população local para a
valorização dos potenciais desses recursos que podem vir a fortificar sua economia e manter a
tradição local.
25
OBJETIVOS
Geral
Específicos
Registrar o conhecimento dos usos das espécies mais utilizadas nesta comunidade
com intuito de mostrar o valor das características etnoculturais locais para a
comunidade e população em geral;
Elaborar um guia básico de identificação com fotos coloridas das espécies ocorrentes
na comunidade e no seu entorno, visando o retorno dessas informações para a
população local e sociedade em geral no reconhecimento das espécies.
26
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
Criada em abril de 1995, pelo decreto de lei N 16.490, a APA do Rio Negro - Setor
Aturiá-Apuauzinho possui 586.422,00 hectares e está incluída na categoria de Uso
Sustentável e faz parte do mosaico de Unidades de Conservação do Baixo rio Negro, que tem
ao todo 1,8 milhões de hectares e integra o corredor central da Amazônia (Figura 1). Drenada
pelo rio Cuieiras, a 70 km de Manaus, a área representa uma zona de amortecimento para
UC’s de proteção integral, sendo habitada por mais de 600 famílias, totalizando 15
comunidades dispersas (FAS, 2009).
Figura 1. Mosaico de Unidades de Proteção Ambiental do Baixo Rio Negro e as comunidades da APA da
Margem Esquerda do Rio Negro – Setor Aturiá Apuauzinho, seta mostrando comunidade Santa Maria. Fonte:
Fundação Amazonas Sustentável – FAS, 2009.
27
A comunidade Santa Maria está localizada nas coordenadas S 2° 55’ 44,2” W 60° 27’
58,7”, na Área de Proteção Ambiental da Margem Esquerda do Rio Negro, Setor Aturiá –
Apuauzinho. Possui uma igreja católica e uma igreja evangélica; associação comunitária; uma
escola de Ensino Fundamental de 1ª a 9ª Série (Figura 2A); um centro comunitário utilizado
para os momentos de lazer e entretenimento dos comunitários, reuniões de planejamento e
demais ações coletivas (Figura 2C); um gerador comunitário, fornecendo energia
regularmente durante 10 horas por dia atendendo todos os moradores; um sistema de
abastecimento de água com rede de distribuição; um posto de saúde (Figura 2 B); sistemas de
transporte coletivos (recreio) até a sede do município. O deslocamento de Manaus a
comunidade leva em média três horas e meia para os barcos regionais e uma hora e quinze
minutos de lancha do tipo “voadeira” (FAS, 2009).
Figura 2. Estrutura física da comunidade Santa Maria, baixo rio Negro - AM. A) Escola Municipal Luiz Jorge
Silva. B) Posto de saúde e C) Centro comunitário.
Aspectos ambientais
Segundo estudos do plano gestor, feitos para o Parque Estadual do Rio Negro – Setor
Sul, que faz divisa com a área de estudo, o clima é classificado como tropical chuvoso
apresentando uma média de temperatura superior a 18ºC no mês mais frio, segundo a
classificação de Koppen. Quanto à precipitação, existe uma variação sazonal, na qual as
chuvas se iniciam no período de dezembro a fevereiro e atingem o pico no período de março a
maio. Nos meses de junho a agosto ocorre a diminuição das chuvas e o período de setembro a
novembro é o mais seco na região (SDS, 2010).
A maior parte da terra-firme do Parque Estadual do Rio Negro Setor Sul apresenta
Floresta Ombrófila Densa. A Floresta de Terras Baixas ocorre nas proximidades do rio Apuaú
(SDS, 2010).
Quanto à formação geológica, grande parte do cráton, que é a porção sólida da crosta
terrestre constituída por rochas cristalinas, encontra-se recoberto pelas bacias Solimões e
28
Amazonas, que recebeu sucessivos pacotes sedimentares desde o paleozoico até o depósito
atual das planícies de inundação. Nas proximidades da área de estudo, os depósitos
sedimentares do Cretáceo (Formação Alter-do-Chão) predominam na geologia da superfície
(SDS, 2010).
O relevo acha-se talhado sobre os sedimentos consolidados da Formação Alter-do-
Chão, sob cobertura vegetal Floresta Densa e aberta com palmeiras (Radambrasil, 1978) e
Campinarana nas porções mais rebaixadas. Os solos são: Latossolo Vermelho Amarelo –
predominantemente, Podzólico Hidromórfico e Hidromórfico Gleizado (SDS, 2010).
Aspectos socio-econômicos
O Baixo rio Negro foi habitado principalmente pelos povos Tarumã, Manaós e Barés.
Estes povos indígenas passaram por processos históricos de transformação cultural e perda
populacional, chegando até a extinção absoluta de alguns deles, em decorrência dos
empreendimentos mercantis e religiosos, guerras e epidemias instaladas após chegada dos
colonizadores europeus. Os Barés localizam-se atualmente do Baixo ao Alto rio Negro,
enquanto que os Manaós e Tarumã foram praticamente extintos (Meira, 2006).
A reocupação do Baixo rio Negro nos últimos 60 anos foi muito influenciada pela
queda do preço da borracha e pelo início da urbanização e da industrialização da cidade de
Manaus. Atualmente, a economia na região do Baixo rio Negro depende quase totalmente de
produtos extrativistas como peixes ornamentais, fibras vegetais e produtos da agricultura
familiar (FVA, 2005), além do extrativismo florestal madeireiro e não madeireiro, e
atividades ligadas ao turismo e à venda de artesanato, com forte inserção do componente
“tradição cultural” (Illenseer, 2009).
No ano de 1964 chegaram os primeiros moradores da vila Santa Maria, a maioria
vinda do Alto rio Negro, principalmente dos municípios de São Gabriel da Cachoeira e Santa
Isabel, hoje a comunidade conta com cerca de 48 famílias (Vieira, 2010). Os moradores da
comunidade Santa Maria possuem um modo de vida composto basicamente pela pesca e
agricultura familiar, complementando estas atividades com a coleta de produtos florestais não
madeireiros (PFNM’s) da floresta para uso doméstico e comercial.
29
Coleta de informações etnobotânicas
Figura 3. Registro do trajeto mostrando as trilhas contemplando três ambientes visitados na APA da Margem
Esquerda do Rio Negro – Setor Aturiá-Apuauzinho.
30
O registro sobre as plantas utilizadas foi baseado em questionário semiestruturado
(APÊNDICE A), além de conversas informais realizadas durante a visita aos quintais e às
trilhas de coleta de cipós.
VUs = ∑Uis / ns
Onde,
VUs = Valor de Uso da espécie;
Us = número de usos mencionados por cada informante para a espécie s;
ns = número total de informantes (n=13, total de informantes).
O trabalho foi realizado mediante autorização N°. 57/09 – CEUC/SDS, de acordo com
a Lei Complementar N°. 53, de 05 de junho de 2007, que instituiu o Sistema Estadual de
Unidades de Conservação do Amazonas (SEUC/AM), artigo 43 do Capítulo VI da Lei do
SEUC/AM, que trata das pesquisas científicas em Unidades de Conservação (ANEXO B).
Algumas espécies foram fotografadas quando os informantes autorizavam. Indivíduos
em estádio fértil ou estéril foram coletados e até mesmo em estádio juvenil, visando melhor
entendimento e para a circunscrição das espécies.
A metodologia da coleta e preparação de exsicatas das amostras seguiu as
recomendações de Croat (1985) e Soares & Mayo (1999). No campo, as amostras foram
acondicionadas em sacos plásticos de 50 litros ou prensadas provisoriamente somente entre
jornais e prensa de madeira e borrifadas com álcool de uso doméstico para manterem-se
conservadas. Posteriormente, estas foram transportadas até o Herbário INPA/Manaus (sala de
31
secagem), e desidratadas na estufa elétrica com temperatura de 45º a 50ºC, por um período de
quatro a seis dias até estarem totalmente desidratadas.
Após totalmente secas e devidamente montadas, as amostras foram identificadas,
catalogadas e incorporadas no Herbário INPA. Duplicatas foram doadas ao Herbário EAFM,
do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas Campus Manaus-Zona
Leste.
32
material examinado foram baseados em anotações apostas em etiquetas de material
herborizado depositado no Herbário/INPA.
33
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Neste estudo foram realizadas entrevistas com 13 moradores, dos quais oito pertencem
ao sexo feminino (61,5%) e cinco ao sexo masculino (38,5%). Sendo a pesquisa baseada no
método “bola de neve”, conclui-se que o conhecimento sobre plantas na comunidade está
mais associado às mulheres, no entanto, os conhecimentos ligados aos recursos vegetais
provenientes do interior da floresta como madeiras e fibras para o artesanato era de domínio
masculino. Esse resultado corrobora com Hanazaki et al. (2000), que afirmam que os homens
tendem a conhecer mais plantas nativas utilizadas para construções/tecnologias e as mulheres
a ter um conhecimento maior sobre plantas medicinais.
Em relação à origem dos informantes, 38,5% afirmaram ser descendentes de indígenas
das etnias Baré, Desana e Baniwa, o que contribui para a permanência de práticas como, por
exemplo, a utilização de plantas para o tratamento de doenças. Sete (54%) desses informantes
ainda possuem o conhecimento da “língua geral” (Nheengatú), porém poucos a utilizam para
se comunicar. A maior parte dos informantes (69,2%) é proveniente de outros municípios do
Amazonas, como Codajás, Manacapuru, Barcelos e principalmente São Gabriel da Cachoeira
e região do rio Içana. Apenas um (7,6%) informante era nascido na própria comunidade e três
(23,2%) da capital Manaus. Dentre os motivos da mudança para a comunidade estavam a
família, melhores condições de vida e dificuldade de adaptação à cidade. Esta realidade é
comum em comunidades ribeirinhas do Baixo rio Negro que, de acordo com trabalhos de
Cardoso (2008) e Scudeller et al. (2009), a maioria dos moradores são amazonenses
descendentes de indígenas do Alto rio Negro.
A agricultura e a pesca são as principais atividades, representadas por dez (77%) dos
informantes, enquanto que os outros dois (15,3%) eram comerciantes e um (7,6%) agente de
saúde. De acordo com Denevan (1992), a agricultura tradicional constitui-se como uma das
mais antigas e tradicionais formas de uso do solo desenvolvidas por povos indígenas e não-
indígenas da Amazônia. Apesar da agricultura e pesca serem as principais ocupações, sete
(54%) informantes também produzem artesanato, sendo que maior parte da matéria-prima é
retirada da própria floresta (madeira, fibras, sementes e argila) e serve como atrativo para o
turismo na região.
34
Diversidade de espécies úteis na comunidade Santa Maria
Foram identificadas 46 famílias e 115 espécies botânicas utilizadas pela população local (Tabela 1).
Tabela 1. Listagem geral das espécies utilizadas pelos moradores da Comunidade Santa Maria. Tipos de uso: artesanato (AR), alimentício (AL), medicinal (ME), místico
(MI) e ornamental (OR). ∑Us: somatória de usos, VU: valor de uso. Para cálculo do valor de uso: 13 informantes.
Família Espécie Nome popular ∑Us Tipos de Uso VU
Acanthaceae Justicia calycina (Nees) V.A.W. Graham desconhecido 1 ME 0,1
Alliaceae Allium sativum L. alho 1 ME 0,1
Allium schoenoprasum L. cebolinha 3 AL 0,2
Amaranthaceae Chenopodium ambrosioides L. mastruz 1 ME 0,1
Anacardiaceae Anacardium occidentale L. abacate 3 AL, ME 0,2
Mangifera indica L. manga 5 AL 0,4
Annonaceae Annona mucosa Jacq. biribá 1 AL 0,1
Apiaceae Coriandrum sativum L. cheiro-verde 1 AL 0,1
Eryngium foetidum L. chicória 3 AL 0,2
Apocynaceae Aspidosperma carapanauba Pichon carapanaúba 2 ME 0,2
Himatanthus sucuuba (Spruce ex Müll.Arg.) Woodson sucuba 3 ME 0,2
Lacmellea arborescens (Müll.Arg.) Markgr. jacatá 1 AL 0,1
Araceae Alocasia sp. cachorrinho 1 OR 0,1
Caladium bicolor (Aiton) Vent. tajá 1 OR 0,1
Caladium bicolor var. bicolor Vent. tajá, juruti 4 MI, OR 0,3
Caladium bicolor var. rubicundum Engl. oncinha 1 ME, MI, OR 0,1
Caladium humboldtii (Raf.) Schott brasileirinho 1 OR 0,1
Caladium schomburgkii Schott mão-aberta 1 ME 0,1
Colocasia esculenta (L.) Schott taioba, inhame 2 AL 0,2
Dieffenbachia picta Schott comigo-ninguém-pode 4 OR 0,3
Dracontium spruceanum (Schott) G.H.Zhu tajá-de-cobra 1 MI, OR 0,1
Epipremnum pinnatum (L.) Engl. jiboia 3 MI, OR 0,2
Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting cipó-titica 7 AR, ME 0,5
Heteropsis peruviana K.Krause cipó-titica 1 AR 0,1
Heteropsis robusta (G.S. Bunting) M.L.Soares cipó-titica 1 AR 0,1
Heteropsis spruceana Schott cipó-titica 1 AR 0,1
35
Família Espécie Nome popular ∑Us Tipos de Uso VU
Araceae Monstera obliqua Miq. ambé-sima 2 AR 0,2
Montrichardia arborescens (L.) Schott aninga 1 AR 0,1
Philodendron fragrantissimum (Hook.) G.Don ambé 1 OR 0,1
Philodendron imbe Schott ex Endl. ambé 1 OR 0,1
Philodendron melinonii Brongn. ex Regel marta-rocha 1 OR 0,1
Philodendron solimoesense A.C. Sm. ambé-coroa 8 AR 0,6
Syngonium angustatum Schott jiboia 1 OR 0,1
Syngonium podophyllum Schott jiboia 1 OR 0,1
Urospatha sagittifolia (Rudge) Schott tajá-de-cobra 1 ME 0,1
Arecaceae Astrocaryum aculeatum G.Mey. tucumã 1 AL 0,1
Astrocaryum chambira Burret tucum 1 AR 0,1
Astrocaryum sp. olho-do-tucumã 4 AR 0,3
Bactris gasipaes Kunth pupunha 2 AL 0,2
Euterpe oleracea Mart. açaí 7 AL 0,5
Euterpe precatoria Mart. açaí 5 AL, AR, ME 0,4
Leopoldinia piassaba Wallace piaçava 1 AR 0,1
Mauritia flexuosa L. f. buriti 1 AL 0,1
Oenocarpus bacaba Mart. bacaba 4 AL 0,3
Asteraceae Acanthospermum sp. cuia-mansa 1 ME 0,1
Acmella oleracea (L.) R.K.Jansen jambu 1 ME 0,1
Bignoniaceae Fridericia chica (Bonpl.) L.G.Lohmann crajiru 2 ME 0,2
Mansoa alliacea (Lam.) A.H. Gentry cipó-alho 2 ME 0,2
Brassicaceae Brassica oleracea L. couve 5 AL, ME 0,4
Bromeliaceae Ananas comosus (L.) Merr. abacaxi 4 AL 0,3
Caricaceae Carica papaya L. mamão 2 AL, ME 0,2
Convolvulaceae Bonamia ferruginea Hallier f. cipó-tuíra 1 ME 0,1
Ipomoea batatas (L.) Lam. batata-doce 1 AL 0,1
Crassulaceae Kalanchoe pinnata (Lam.) Pers. coirama 4 ME 0,3
Cucurbitaceae Cucumis anguria L. maxixe 1 AL 0,1
Cucurbita pepo L. jerimum 1 AL 0,1
Dioscoreaceae Dioscorea sp.1 cará 1 ME 0,1
Dioscorea sp.2 batata 6 AL 0,5
Erythroxylaceae Erythroxylum coca var. ipadu Plowman epadu 1 ME 0,1
Euphorbiaceae Hevea guianensis Aubl. seringueira 2 AR 0,2
36
Família Espécie Nome popular ∑Us Tipos de Uso VU
Euphorbiaceae Indeterminada batatão 2 AR, ME 0,2
Jatropha curcas L. pião-branco 1 MI 0,1
Jatropha gossypiifolia L. pião-roxo 8 ME, MI 0,6
Manihot esculenta Crantz macaxeira 11 AL 0,8
Fabaceae Bauhinia guianensis Aubl. escada-de-jabuti 1 ME 0,1
Inga edulis Mart. ingá 4 AL 0,3
Ormosia sp. tento 5 AR 0,4
Senna sp. desconhecido 1 OR 0,1
Swartzia sp. mirapiranga 1 AR 0,1
Humiriaceae Endopleura uchi (Huber) Cuatrec. uchi 2 ME 0,2
Icacinaceae Poraqueiba sericea Tul. mari 2 AL 0,2
Lamiaceae Indeterminada roxinha 1 OR 0,1
Mentha piperita L. hortelãzinho 1 ME 0,1
Ocimum campechianum Mill. alfavaca 2 AL, ME 0,2
Plectranthus barbatus Andrews boldo 2 ME 0,2
Lauraceae Cinnamomum zeylanicum Blume canela 1 ME 0,1
Persea americana Mill. abacate 4 AL, ME 0,3
Lecythidaceae Bertholletia excelsa Bonpl. castanha-do-brasil 2 AL, ME 0,2
Malvaceae Gossypium barbadense L. algodão 1 ME 0,1
Hibiscus rosa-sinensis L. papoula 1 OR 0,1
Theobroma grandiflorum (Willd. ex Spreng.) K.Schum. cupuaçu 6 AL 0,5
Marantaceae Calathea allouia (Aubl.) Lindl. ariá 5 AL 0,4
Indeterminada vai-vem 2 MI, OR 0,2
Ischnosiphon spp. arumã 4 AR 0,3
Melastomataceae Bellucia grossularioides (L.) Triana goiaba-de-anta 1 ME 0,1
Moraceae Artocarpus heterophyllus Lam. jaca 1 AL 0,1
Brosimum parinarioides Ducke leite-de-amapá 1 ME 0,1
Musaceae Musa paradisiaca L. banana 9 AL 0,7
Myrtaceae Psidium guajava L. goiaba 1 AL, ME 0,1
Syzygium jambolanum (Lam.) DC. azeitona-preta 4 AL, ME 0,3
Syzygium malaccense (L.) Merr. & L.M. Perry jambo 1 ME 0,1
Orchidaceae Cattleya violacea (Kunth) Rolfe parasita 1 OR 0,1
Indeterminada parasita 1 OR 0,1
Passifloraceae Passiflora edulis Sims maracujá 2 AL, ME 0,2
37
Família Espécie Nome popular ∑Us Tipos de Uso VU
Phytolaccaceae Petiveria alliacea L. mucura-caá 2 ME, MI 0,2
Picrodendraceae Piranhea trifoliata Baill. piranheira 1 ME 0,1
Poaceae Bambusa sp. taboca 2 AR 0,2
Cymbopogon citratus (DC.) Stapf capim-santo 4 ME 0,3
Saccharum officinarum L. cana-de-açúcar 2 AL 0,2
Portulacaceae Portulaca pilosa L. amor-crescido 2 ME 0,2
(Pteridófita) Indeterminada samambaia 1 OR 0,1
Rosaceae Rosa chinensis Jacq. roseira 1 OR 0,1
Rubiaceae Mussaenda erythrophylla Schumach. & Thonn. mussaendra 1 OR 0,1
Rutaceae Citrus limon (L.) Burm.f. limão 2 AL, ME 0,2
Citrus reticulata Blanco limão-tangerina 1 AL 0,1
Citrus sinensis (L.) Osbeck laranja 1 ME 0,1
Ruta graveolens L. arruda 3 ME, MI 0,2
Sapotaceae Pouteria caimito (Ruiz & Pav.) Radlk. abiu 3 AL, ME 0,2
Plantaginaceae Scoparia dulcis L. vassourinha 3 ME, MI 0,2
Solanaceae Capsicum chinense Jacq. pimenta-de-cheiro 1 AL 0,1
Capsicum sp. pimenta 1 AL 0,1
Solanum lycopersicum Mill. tomateiro 1 AL 0,1
Solanum sessiliflorum Dunal cubiu 1 AL 0,1
Verbenaceae Lippia alba (Mill.) N.E.Br. cidreira 1 ME 0,1
Lippia origanoides Kunth sálvia-de-marajó 1 ME 0,1
Petrea sp. viuvinha 1 OR 0,1
38
Araceae foi a família que apresentou maior número de espécies úteis na comunidade
Santa Maria, com 23 espécies (18%), entre plantas cultivadas e nativas da floresta (Figura 4).
Também foi a família que apresentou maior número de tipos de usos em relação às outras
famílias, sendo utilizada para artesanato, alimento, medicinal, ornamental e uso místico
(Tabela 2). Em estudo realizado por Souza (2010), em comunidades da RDS Tupé,
Amazonas, Araceae também foi a família mais representativa, apresentando 14 espécies úteis
para a população local.
A família Arecaceae ficou em segundo lugar em relação a quantidade de espécies
úteis, as espécies mais citadas pelos informantes foram o “açaí” (Euterpe spp.), utilizada
como alimento (frutos), medicinal (raízes) e no artesanato (sementes), a “bacaba”
(Oenocarpus bacaba Mart.) e o “tucumã” (Astrocaryum aculeatum G.Mey.) utilizados na
alimentação. Em um levantamento etnobotânico, realizado por Oliveira et al. (2006), na
microrregião do Salgado, estado do Pará, estas duas famílias foram as mais importantes, no
entanto, Arecaceae ficou em primeiro lugar e Araceae em segundo com as espécies
Heteropsis flexuosa e Philodendron imbe, utilizadas pelos pescadores em trançados.
Figura 4. Famílias botânicas com maior número de espécies úteis para a comunidade Santa Maria, Baixo rio
Negro – AM.
Figura 5. Diversidade de gêneros coletados na área florestal da comunidade Santa Maria, Baixo rio Negro, AM.
40
Tabela 2. Lista das espécies da família Araceae utilizadas pelos moradores da comunidade Santa Maria. Hábitos: epífita (E), hemiepífita (HE) e herbácea terrícola (HT).
Ocorrência: área florestal (F), área da comunidade (C). Origem: Amazônia (Am); Mata Atlântica (M.A.); Pantanal (P), Caatinga (Ca); Cerrado (Ce). Uso: artesanato (AR),
alimentício (AL), medicinal (ME), místico (MI) e ornamental (OR).
41
Táxon Registro herbário Nome popular Hábito Ocorrência Origem Uso
2
Philodendron elaphoglossoides Schott EAFM 4556 ambé HE F Am _
Philodendron fragrantissimum (Hook.) G.Don EAFM 4569; INPA 239227 ambé HE F Am, M.A.2 OR
2
Philodendron goeldii G.M.Barroso INPA 239237 ambé HE F Am _
2
Philodendron hastatum K.Koch & Sello EAFM 4568 ambé HE F M.A. _
2
Philodendron imbe Schott ex Endl. ambé HE C M.A. OR
2
Philodendron linnaei Kunth INPA 239226; INPA ambé HE F Am, Ce _
239228
Philodendron cf. maximum K. Krause EAFM 4573 ambé HE F Am2 _
2
Philodendron megalophyllum Schott EAFM 4552; INPA 239241 ambé HE F Am, Ce, M.A. _
2
Philodendron melinonii Brongn. ex Regel marta-rocha, tajá E FeC Am OR
2
Philodendron ornatum Schott INPA 239232 ambé HE F Am, Ca, M.A. _
2
Philodendron pedatum (Hook.) Kunth EAFM 4560 ambé HE F Am, Ca, Ce, M.A. _
Philodendron platypodum Gleason EAFM 4557 ambé HE F Am2 _
2
Philodendron pulchrum G.M.Barroso EAFM 4555; INPA 239246 ambé HE F Am _
Philodendron rudgeanum Schott EAFM 4558 ambé HE F Am, M.A.2 _
2
Philodendron solimoesense A.C.Sm. EAFM 4551; INPA 239238 ambé-coroa HE F Am AR
2
Philodendron surinamense (Miq.) Engl. EAFM 4565 ambé HE F Am, M.A. _
2
Philodendron tortum M.L.Soares & Mayo EAFM 4577 ambé HE F Am _
2
Philodendron wittianum Engl. EAFM 4576; INPA 239229 ambé HE F Am _
2
Rhodospatha oblongata Poepp. INPA 239236 desconhecido HE F Am, Ca, M.A. _
2
Rhodospatha venosa Gleason EAFM 4554 desconhecido HE F Am _
Syngonium angustatum Schott jiboia HE F Am, Ce2 OR
2
Syngonium podophyllum Schott jiboia HE C Costa Rica e Panamá OR
Urospatha sagittifolia (Rudge) Schott EAFM 4580 tajá HT F Am, Ca, Ce2 ME
2
Xanthosoma striolatum Mart. ex Schott INPA 239234 tajá-bravo HT C Am _
a
1. Lorenzi, H. e Souza, H.M. 2008. Plantas ornamentais do Brasil. Arbustivas, herbáceas e trepadeiras. 4 ed. Instituto Plantarum.
2. Coelho, M.A.N., Soares, M.L., Sakuragui, C.M., Mayo, S., Andrade, I.M. de, Temponi, L.G. 2010. Araceae in Lista de Espécies da Flora do Brasil.
Jardim Botânico do Rio de Janeiro. (http://floradobrasil.jbrj.gov.br/2010).
3. Engler, A. 1878. Araceae. In: de Martius, C.F.P. Flora Brasiliensis. 3(2): 182.
(http://facultystaff.wwc.edu/~presslar/greenhouse/caladium/bicolor/var_rub.htm).
4. http://www.tropicos.org
42
O número de espécies de Araceae encontradas na região foi considerado elevado em
comparação a outros trabalhos realizados no Brasil. Em um levantamento realizado em nove
fragmentos de Mata Atlântica de Pernambuco, por exemplo, foram encontradas 18 espécies,
distribuídas em nove gêneros, sendo Philodendron também o mais diverso, com oito espécies
(Pontes et al., 2010). Segundo levantamento realizado por Canalez (2009), em Fonte Boa no
Amazonas, o gênero Philodendron foi o mais rico apresentando 16 espécies. Um dos motivos
do maior registro de espécies no presente estudo foi a coleta em mais de um ambiente
florestal (floresta de “floresta ombrófila”, “campinarana” e “igapó”).
Dentre as dez espécies com maior valor de uso, Araceae foi representada por
Philodendron solimoesense A.C.Sm. que se apresentou em terceiro lugar, com VU=0,6 e
Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S.Bunting em quinto lugar com VU= 0,5 ambas para uso no
artesanato. A espécie que apresentou maior Valor de Uso foi Manihot esculenta Crantz
(Euphorbiaceae) com VU=0,8, seguida de Musa paradisiaca L. (Musaceae), com VU=0,7,
ambas para uso alimentício (Figura 6).
Figura 6. Espécies com maior Valor de Uso na comunidade Santa Maria, Baixo rio Negro – AM.
43
Schott) e duas espécies pertecem ao gênero Syngonium (Syngonium angustatum e S.
podophyllum), representando juntos 59% das espécies cultivadas. Os gêneros Alocasia,
Colocasia e Epipremnum são exóticos (Souza & Lorenzi, 2008). Muitas plantas, cultivadas
em quintais são obtidas em mercados municipais, ou trazidas de outras regiões pelos próprios
moradores, quando vindos de outras regiões.
Figura 7. Diversidade de gêneros cultivados na comunidade Santa Maria, Baixo rio Negro.
Artesanato
44
outras espécies de Araceae (Hoffman, 1997).
Philodendron solimoesense é a espécie mais utilizada do gênero Philodendron para o
artesanato na comunidade, conhecida como “cipó-ambé” ou “ambé-coroa”. Este último nome
se deve aos acúleos presentes em todo o comprimento da raiz aérea, lembrando o aspecto de
uma coroa (Figura 12 H). Outras espécies de Philodendron, também são utilizadas na região
amazônica, como Philodendron fragrantissimum (Hook.) G.Don, também conhecido como
“cipó-ambé” na RDS Amanã, que foi relatado pelos artesãos locais como matéria-prima para
confecção de “paneiros” e peneiras, os quais estão associados ao acondicionamento,
transporte da mandioca brava e à produção de farinha (Leoni & Marques, 2008). Em algumas
comunidades da RDS do Tupé, no Baixo rio Negro, foi registrado o uso de Philodendron
billietiae Croat como fonte de fibra para o artesanato (Souza, 2010).
Além dos gêneros Heteropsis e Philodendron, já considerados importantes para a
economia extrativista em várias regiões da Amazônia e do Brasil, também foi relatado o uso
das raízes de Monstera obliqua, conhecida na comunidade como “ambé-sima” (Figura 12 E).
Esta, por ter o diâmetro menor e ser menos resistente, é utilizada apenas para dar acabamento
nas bordas dos “paneiros”, que são utilizados principalmente para o transporte de produtos
extraídos da roça (Figura 8 B).
O caule de Montrichardia arborescens (L.) Schott, conhecida como “aninga”, foi
relatado para a confecção de pequenas canoas, que eram utilizadas como brinquedo, durante a
infância de alguns moradores da comunidade descendentes de indígenas do Alto rio Negro.
Atualmente, este recurso poderá servir para a produção de peças decorativas ou até mesmo
embalagens para algum tipo de produto como, por exemplo, bombons com recheios de geleias
de frutas regionais, o que já é visto na cidade de Manaus, e consequentemente contribuir para
a geração de renda na comunidade.
Apesar de ainda haver utilização dessas raízes como fonte de fibra para o artesanato
em municípios de todo o Baixo rio Negro, os mais jovens da comunidade não apresentam
interesse em aprender com os mais velhos o processo de fabricação dos cestos, paneiros e
outros utensílios, tornando o produto cada vez mais escasso e colocando em risco a tradição
cultural. Estes produtos exigem conhecimentos especializados nas etapas de coleta,
beneficiamento e confecção e não possuem substitutos no mercado devido às suas qualidades
funcionais (Leoni & Marques, 2008), uma vez que são recomendados para o
acondicionamento de produtos perecíveis como, por exemplo, o açaí, fruto amazônico
amplamente consumido atualmente em todo o Brasil e no mundo, pois em sacos de
polietileno o produto apodrece mais rapidamente (BRASÍLIA, 1998).
45
Segundo Pellin & Caiut (2006 apud. Valente, 2009), o artesanato é uma boa opção de
geração de emprego para as comunidades pela possibilidade de se conciliar a presença
humana com a conservação. Assim como em comunidades do Parque Nacional do Jaú,
reforça-se aos artesãos da comunidade Santa Maria, os benefícios de se trabalhar com
produtos de maior valor agregado em relação a produtos não beneficiados como matérias-
primas de outras atividades. A possibilidade de vendê-los, em substituição a venda da
matéria-prima, reduz o trabalho de coleta do recurso, uma vez que é necessária menor
quantidade de cipós para se obter retorno financeiro semelhante (FVA, 2009). Dessa forma, o
artesanato ajuda a diminuir a pressão sobre os recursos naturais e melhora a qualidade de vida
da comunidade.
Figura 8. Utilização de fibras e artesanato da comunidade Santa Maria. A) Cercado feito com estacas de madeira
presas com raízes de “ambé-coroa”; B) Paneiro feito de “ambé-coroa” sendo utilizado na tradicional festa de
Santo Antônio da comunidade; C) Cesta feita de “ambé-coroa”; D) Cesto feito de “cipó-titica”.
II - Raspagem:
Tem como finalidade deixar somente a parte central do cipó, que será utilizada para o
artesanato. Nessa etapa usa-se uma faca não muito amolada para retirar a parte grossa com as
marcas dos espinhos para dar o aspecto liso à fibra (Figura 9 C).
III – Desfiamento:
Esse processo consiste em partir o cipó em vários fios no sentido vertical, na espessura
adequada para determinado uso (Figura 9 D). Geralmente o cipó é desfiado em até três fios.
47
IV - Acabamento:
Figura 9. Etapas do beneficiamento do “ambé-coroa” (Philodendron solimoesense A.C. Sm.). A-B) retirada da
casca; C) raspagem; D) desfiamento; E-F) acabamento. (Fotos: Rina Oliveira, Comunidade Santa Maria,
junho/2010).
Tecelagem
Geralmente são necessários doze fios, de 4 a 8 m de comprimento para fazer até três
paneiros. Em um paneiro médio, com capacidade para 15 kg e cerca de 37-40 cm de largura,
são utilizados aproximadamente de 30 fios com 2-3 m de comprimento cada um. A tecelagem
começa pelo fundo ou base do paneiro, onde os fios devem ser separados três grupos de feixes
paralelos, um que fica na horizontal e dois que passam em sentidos transversais formando
uma cruz ou um X. Os fios deverão ser entrelaçados paralelamente aos fios iniciais nos três
sentidos diferentes (Figura 10).
48
Figura 10. Etapas iniciais da confecção de um paneiro feito de “cipó-ambé” (Philodendron solimoesense A.C.
Sm.) por um artesão da comunidade Santa Maria. (Desenho esquemático: Rina Oliveira, fev/2011).
A tecelagem do fundo deve terminar com os trinta fios entrelaçados, três grupos com
cerca de 10 fios cada um. A partir daí, a tecelagem do “paneiro” começa-se escolhendo um fio
para formar o centro dos três grupos formando um hexágono (Figura 11-A). Após a confecção
do fundo do “paneiro”, novos fios vão sendo colocados nas laterais e trançados com os três
primeiros feixes de fios (Figura 11-B e 11-C). As fibras mais finas servem para fazer a borda
(Figura 11-D).
O tingimento das fibras é opcional e geralmente são utilizadas tinturas como o fruto de
Bixa orellana L. (“urucum”) e Fridericia chica (Bonpl.) L.G.Lohmann (“crajirú”). No
município de Novo Airão, a madeira conhecida por “mirapiranga” (Swartzia sp.) é utilizada
para confeccionar as alças.
Figura 11. Tecelagem do “paneiro” feito de “ambé-coroa” (Philodendron solimoesense A.C.Sm.) por
artesão da comunidade Santa Maria, Manaus, AM. A) fundo do paneiro; B-C) artesão trançando as fibras de
“ambé”; D) acabamento do “paneiro” com fibras mais finas de cipó nas bordas. (Fotos: Rina Oliveira,
Comunidade Santa Maria, junho/2010)
49
Segundo artesãos do Parque Nacional do Jaú e Resex do rio Unini, em visita realizada
em setembro de 2009, o quilo do “cipó-ambé” (Philodendron sp.) bruto é vendido por R$
0.50 e se estiver beneficiado, ou seja, pronto para tecer, o preço sobe para R$ 2.50 ou mais.
Os cestos confeccionados na Comunidade Santa Maria custam de R$ 20,00 a R$ 30,00,
dependendo do tamanho. Em relação às fibras de “cipó-titica” (Heteropsis spp.), os preços
pagos nos rios Jaú e Unini eram de R$ 1,80/kg de “cipó titica” e R$ 1,20 a R$ 1,50/kg de
“timbó-açu” em levantamento realizado em 2004 (SDS, 2005).
Figura 12. Espécies de Araceae utilizadas para fins artesanais na comunidade Santa Maria, Baixo rio Negro –
AM. (Fotos: Valdely Kinupp (A e E); Rina Oliveira (B, C, D e F); M.L. Soares (G e H), Comunidade Santa
Maria, 2010).
Alimentícias
50
Xanthosoma sagittifolium, é encontrada próximo ao Parque Estadual do Rio Negro Setor Sul,
sendo cultivada em roçados nas comunidades do rio Cuieiras (Cardoso, 2008).
Medicinais
As espécies indicadas como medicinais pela população local foram Caladium bicolor
var. rubicundum Engl. (“oncinha”), Caladium schomburgkii Schott (“mão-aberta”),
Heteropsis spp. (“cipó-titica”) e Urospatha sagittifolia (Rudge) Schott (“tajá-de-cobra”)
(Tabela 3). No entanto, somente as duas espécies de Caladium são cultivadas nos quintais, as
outras duas são coletadas na mata. A aplicação destas plantas restringe-se ao uso externo, pois
sua ingestão não é aconselhável devido à irritação na mucosa causada por cristais de oxalato
de cálcio, presentes nas espécies da família Araceae (Keating, 2004).
Tabela 3. Espécies de Araceae utilizadas como plantas curativas na Comunidade Santa Maria, seus respectivos
nomes populares, partes utilizadas e indicações de uso.
51
Ornamentais
52
para os visitantes, o epifitário contribuirá na promoção do conhecimento e do interesse dos
jovens da comunidade em trabalhar na conservação da flora e de outros recursos da floresta.
Místicas
53
Figura 13. Espécies de Araceae cultivadas nos quintais da Comunidade Santa Maria, Baixo rio Negro – AM.
(Fotos: Rina Oliveira, comunidade Santa Maria, jun/2010).
54
CONCLUSÃO
A comunidade Santa Maria demonstrou ser uma área rica na diversidade da família
Araceae. As espécies apresentaram uma grande importância na comunidade, sendo utilizadas
para fins artesanais, alimentícios, medicinais, ornamentais e místicos.
Deve ser incentivada a utilização de outras espécies com potencial fibroso, como
Monstera obliqua (“ambé-sima”), por exemplo, a qual foi registrada pela primeira vez neste
trabalho como fonte de fibras para o artesanato. Dessa forma, diminui-se o impacto sobre as
espécies de raízes com diâmetro maior como H. flexuosa e P. solimosense, que além de serem
mais procuradas, necessitam de mais tempo para regeneração.
A categoria de uso ornamental foi a que apresentou maior número de espécies de
Araceae, no entanto, constatou-se uma grande preferência por espécies exóticas, o que
significa pouca valorização das espécies locais com potencial ornamental.
Trabalhos como este, fornecem subsídios para conhecimento científico das espécies
locais da família Araceae, e, consequentemente, melhor aproveitamento das mesmas como
recurso a ser explorado de forma sustentável pelos moradores, através de seu cultivo na
comunidade.
Destaca-se a importância de popularizar o conhecimento sobre a família não só na
comunidade, enfatizando a necessidade de preservar os recursos vegetais como potenciais
elementos geradores de renda e também a importância ecológica desses recursos.
55
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61
Taxonomia e morfoanatomia de três espécies de Araceae Juss. utilizadas
para o artesanato na Área de Proteção Ambiental da Margem Esquerda do
Rio Negro.
RESUMO
ABSTRACT
The aerial roots of species such as the "cipó-titica", belonging to the genus Heteropsis
Kunth and "cipó-ambe" of the genus Philodendron Schott are widely used for craft in the
Amazon due to the strength of its fibers. We identified two species of Araceae widely used
for crafts in Santa Maria Community, Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S.Bunting,
Philodendron solimoesense A.C.Sm. and other species also used as a source of fiber,
Monstera obliqua Miq. with a low rate of use but with potential fibrous. The treatment of
these three taxonomic species which was taken into account the distribution, phenological
data, and historical affinity of the specimens and details of the vegetative and reproductive
structures of plants, which were illustrated in boards. Was also prepared containing an
identification key with characteristics of internal and external morphology of the species.
Regarding the study of the internal morphology of leaf and root shoots of species, some
characters have been selected as a diagnosis for the taxonomy as a type of stoma, type of
crystals, the occurrence of latex, presence of hypodermis, the occurrence of sclerenchyma
sheath fibers, shape of the central cylinder, among others. Also the study was made of the
fibers of the roots, where the three species had long fiber type libriforme with thick walls and
small lumens.
62
INTRODUÇÃO
Araceae é uma família subcosmopolita, que possui atualmente 109 gêneros e cerca de 2.823
espécies concentradas predominantemente nos trópicos da América, no Sudeste da Ásia e no
Arquipélago da Malásia (Govaerts et al., 2002). Na América do Sul está representada por 38
gêneros e cerca de dois terços do total das espécies (Mayo et al., 1997; Soares & Mayo, 1999;
Soares & Jardim-Lima, 2005). No Brasil possui 35 gêneros distribuídos em 458 espécies, das
quais 286 são endêmicas e encontram-se distribuídas em todos os domínios fitogeográficos do
país (Coelho et al., 2010).
As espécies dessa família representam um grupo taxonômico de considerável
importância econômica, com algumas espécies destacando-se por serem utilizadas como
medicinais, comestíveis, fibrosas, e, principalmente ornamentais, devido à beleza de suas
folhagens (Croat, 1994; Mayo et al., 1997). No entanto, na Amazônia, as raízes aéreas de
espécies como o “cipó-titica”, pertencente ao gênero Heteropsis Kunth (Potiguara &
Nascimento, 2004; Durigan & Castilho, 2004; Soares, 2008), e “cipó-ambé” do gênero
Philodendron Schott, são muito utilizadas para fins artesanais, devido à resistência de suas
fibras. Conforme detectado neste estudo, uma terceira espécie do gênero Monstera Adans.
também tem sido utilizada para a mesma finalidade. Estas espécies possuem hábito
hemiepifítico, segundo Croat (1990), algumas espécies de Araceae dividem-se em epífitas
verdadeiras; hemiepífitas primárias, as quais iniciam sua vida como epífitas verdadeiras, sem
contato com o solo e, quando mais tarde, emitem longas raízes em direção ao chão; e
hemiepífitas secundárias, que são aquelas que iniciam sua vida no solo e sobem em uma
árvore suporte quando adulta, podendo manter ou não ligação com o solo.
O gênero Heteropsis é composto de 17 espécies com uma grande concentração destas
na Amazônia e apenas duas espécies nativas da Mata Atlântica que são H. salicifolia Kunth e
H. rigidifolia Engl. (Soares et al., 2008). O gênero pertence à subfamília Monsteroideae Engl.
e está caracterizado pela ausência de laticíferos e tricosclereídeos. Pertecem também a esta
subfamília, as espécies do gênero Monstera, as quais são notáveis principalmente pelas
perfurações naturais em suas folhas, sendo muito valorizadas como ornamentais. O número e
o padrão das perfurações, quando presentes, ajudam na identificação das espécies. As plantas
jovens das espécies desse gênero podem ter folhas inteiras, as perfurações vão aparecendo
conforme as folhas vão se tornando maiores (Phillips, 1987). O gênero Philodendron é o
segundo maior gênero da família depois de Anthurium, possui cerca de 700 espécies (Coelho
& Mayo, 1998) e é bem diversificado no Estado do Amazonas (Mayo et al., 1995). Este
63
gênero pertence à subfamília Philodendroideae e está dividido em três subgêneros, o
subgênero Philodendron, Pteromischum e Meconostigma. Estes são bem distintos na
morfologia vegetativa, reprodutiva, e na distribuição geográfica (Mayo, 1997).
Estudos sobre a anatomia da família Araceae têm sido reportados principalmente por
French em vários trabalhos (French, 1987; French, 1988) nos quais foram relatados vários
tipos de estruturas secretoras, incluindo canais resiníferos, laticíferos, nectários extraflorais,
cavidades mucilaginosas e escâmulas intravaginais (Mayo et al., 1997).
Neste trabalho foram estudados aspectos morfoanatômicos de três espécies de
Araceae, Heteropsis flexuosa, Monstera obliqua e Philodendron solimoesense. Essas espécies
possuem hábito hemiepifítico e suas raízes aéreas são utilizadas como fonte de fibras para o
artesanato na Comunidade Santa Maria, fazendo parte da renda familiar. Características
anatômicas são importantes para a definição taxonômica de alguns grupos e são consideradas
tão valiosas quanto às da morfologia externa (Stuessy, 1990). Portanto, este trabalho teve
como objetivo investigar os caracteres consistentes da morfologia externa e interna das
lâminas foliares e raízes das três espécies para auxiliar na circunscrição das mesmas, visando
subsidiar plano de manejo sustentável.
64
OBJETIVOS
Geral
Específicos
Fazer estudo das fibras das raízes das espécies, visando à obtenção de características
que justifique seu uso em artesanato.
65
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
A Comunidade Santa Maria está localizada nas coordenadas S 2° 55’ 44,2” W 60° 27’
58,7”, na Área de Proteção Ambiental da Margem Esquerda do Rio Negro, Setor Aturiá-
Apuauzinho, e faz parte do mosaico de Unidades de Conservação do Baixo rio Negro, que
tem ao todo 1,8 milhões de hectares e integra o corredor central da Amazônia (Figura 1).
Drenada pelo rio Cuieiras, a 70 km de Manaus, a área representa uma zona de amortecimento
para UC’s de proteção integral, sendo habitada por mais de 600 famílias, totalizando 15
comunidades dispersas (FAS, 2009).
APA da M.E.
do Rio Negro,
setor Aturiá-Apuauzinho
Novo Airão
Santa
Maria
Manaus
Figura 1. Mosaico de Unidades de Proteção Ambiental do Baixo rio Negro e as comunidades da APA da
Margem Esquerda do Rio Negro – Setor Aturiá-Apuauzinho, seta mostrando Comunidade Santa Maria. Fonte:
SDS, 2009.
O trabalho foi realizado mediante autorização N°. 57/09 – CEUC/SDS, de acordo com
a Lei Complementar N°. 53, de 05 de junho de 2007, que institui o Sistema Estadual de
Unidades de Conservação do Amazonas (SEUC/AM), artigo 43 do Capítulo VI da Lei do
SEUC/AM, que trata das pesquisas científicas em Unidades de Conservação (ANEXO B).
66
A metodologia de coleta na Comunidade Santa Maria, foi baseada no método de
“turnê guiada” por um coletor local de cipós, onde foram realizados percursos em três trilhas
de “igapó” e “terra-firme”, gravados pelo aparelho GPS (Global Positioning System), através
da função “registro de trajeto”, do qual foi gerado um mapa com o trajeto percorrido de
aproximadamente 12 quilômetros no total (Figura 2).
Figura 2. Registro do trajeto mostrando as trilhas percorridas contemplando três ambientes visitados na APA da
Margem Esquerda do Rio Negro – Setor Aturiá-Apuauzinho.
67
o Herbário INPA (sala de secagem) em Manaus, e desidratadas em estufa elétrica com
temperatura de 45º a 50ºC, por um período de quatro a seis dias até estarem totalmente
desidratadas.
Para o estudo anatômico foram retiradas cinco folhas por indivíduo, de três indivíduos
de cada espécie, sendo cada folha dividida em quatro regiões (meio-base, meio-meio, meio-
margem e meio-ápice), retirando-se do limbo foliar segmentos de 1 cm2, que foram
conservadas em álcool 70% glicerinado. As amostras das raízes aéreas maduras foram
coletadas no campo, selecionadas de três indivíduos, com comprimento e diâmetro variado.
Estas foram amostradas com 5 cm de comprimento das raízes adultas na porção apical. Após
a coleta o material foi acondicionado em frascos de vidro identificados e numerados contendo
solução de álcool a 70% glicerinado.
68
Figura 3. Desenho esquemático dos tipos de folhas e inflorescências. A) Lâmina foliar inteira. B) Lâmina foliar
sagitada. C) Espádice com flores bissexuadas e espata em formato de bote. D) Espádice com flores unissexuadas
e espata dividida em lâmina e tubo (Desenho esquemático: Rina Oliveira, mar/2011, adaptado de Mayo et al.,
1997).
Para cada espécie foi feita uma descrição morfológica, seguida de sinonímias, nome
popular, distribuição, dados fenológicos quando possível, comentários sobre a afinidade e
histórico das espécies, uma relação do material examinado e pranchas contendo ilustrações do
hábito e detalhes de estruturas vegetativas e reprodutivas da planta com auxílio de
microscópio estereoscópico acoplado a câmara clara. Logo após a descrição taxonômica
segue a descrição da morfologia interna para cada espécie, acompanhada de pranchas com
fotos tiradas no Laboratório Temático de Microscopia eletrônica do INPA.
Os dados fenológicos e distribuição das espécies foram baseados nas informações das
etiquetas apostas nas amostras incorporadas no Herbário INPA. A apresentação das
descrições das espécies está em ordem alfabética.
As espécies férteis foram catalogadas e incorporadas ao Herbário INPA enquanto as
amostras estéreis foram doadas ao Herbário EAFM, do Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia do Amazonas, Campus Manaus-Zona Leste.
69
Morfologia interna da lâmina foliar
A análise das fibras das raízes foi realizada através da maceração ou dissociação dos
tecidos, sendo este o único método que revela as particularidades das células no seu todo. O
método empregado foi o do ácido acético e água oxigenada, onde para o preparo da solução
macerante utilizou-se: 50% de ácido acético glacial; 38% de água oxigenada 130 V; 12% de
água destilada.
Após a retirada do material dos frascos, estes permaneceram abertos por alguns
minutos para evaporar o cheiro de ácido acético. Posteriormente, foram tampados com uma
gaze fina de polielastano e lavados em água corrente até desaparecer o cheiro do ácido. Após
a lavagem, a gaze foi removida e o material aderido à gaze foi removido com o auxílio de
70
uma espátula ou agulha histológica fina e colocado dentro do frasco novamente. Este, com o
nível reduzido de água, foi fechado e agitado para a separação dos elementos constituintes do
lenho.
Após a maceração do material, este foi transferido, com o auxílio de uma pinça, para o
vidro de relógio. Depois de corado em safranina por cerca de 20 minutos, o material passou
pela série alcoólica (50%, 70%, 96% e 100%). Posteriormente, as amostras foram montadas
com glicerina entre lâminas e lamínulas para observação em microscópio óptico.
71
RESULTADOS
Tratamento Taxonômico
2. Monstera Adanson, Fam. Pl. 2: 470 (1763), nom. cons. TIPO: M. adansonii Schott
(Dracontium pertusum), typ. cons.
3. Philodendron Schott, Wiener Zeitschr Kunst, Lit., Theater und Mode 3: 780 (1829), nom.
et orth. cons. (‘Philodendrum’). LECTOTYPE: P. grandifolium (Jacq.) Schott (ver Britton e
Wilson, 1923).
Philodendrum Schott in Wiener Z. Kunst 1929 (3): 780 (1829), orth. rej. Arosma
Rafinesque, Fl. Tell. 3: 66 (1837, “1836”).
Telipodus Rafinesque, Fl. Tell. 3: 66 (1837, “1836”).
Thaumatophyllum Schott in Bonplandia 7: 31 (1859).
Elopium Schott in Oesterr. bot. Zeitschr. 15: 34 (1865).
Baursea Post & O. Kuntze, Lexicon Gen. Phanerog. 62 (1903).
Plantas hemiepífitas, epífitas rosuladas ou mais raramente ervas terrícolas; caule com
internós longos ou acaulescentes, muitas vezes produzindo ramos flageliformes. Folhas
numerosas, pequenas a gigantes, profilos de caules maduros marcescentes e decíduos ou
persistentes e membranáceos ou de componentes formando uma massa fibrosa; pecíolo longo,
73
conspícuo, algumas vezes verruculoso ou estriado, às vezes geniculado no ápice; bainha longa
ou inconspícua; lâmina foliar de forma extremamente variada, desde inteira, cordada, sagitada
ou hastada, trífida, trissecta, pinatilobada, pinatífida, bipinatífida, algumas vezes pedatissecta;
nervação peniparalelinérvea, as nervuras secundárias laterais mais finas e paralelas que as
nervuras laterais primárias, ocasionalmente as terciárias reticuladas transversalmente entre as
secundárias, às vezes sem a presença de nervuras laterais primárias. Inflorescência 1-11 por
simpódio floral; pedúnculo usualmente curto, cilíndrico-subcilíndrico, às vezes alargado no
ápice; espata comumente persistente até a completa maturação do fruto, raramente decídua
logo após a antese, levemente até fortemente constrita entre tubo e lâmina; tubo mais ou
menos ventricoso, frequentemente de coloração púrpura ou vermelha internamente; lâmina
abrindo completamente ou parcialmente na antese, fechando-se posteriormente, geralmente
esbranquiçada internamente; espádice séssil a estipitado, porção basal denominada zona
feminina formada por flores femininas ou pistiladas, geralmente mais curta que a zona
masculina fértil, constituída por estames férteis, situada no ápice do espádice e entre estas
uma zona masculina estéril intermediária, composta por estaminódios e geralmente mais curta
do que a zona masculina fértil, às vezes apresenta-se mais longa; raramente apresenta-se um
apêndice estaminodial no ápice do espádice. Flores unissexuais, nuas, estames 2-6 por flor
masculina, livres, prismáticos a obpiramidais, às vezes muito alongados e finos, anteras
sésseis, teca elipsóide a oblonga, alongada, deiscência por uma curta fenda lateral ou poro
subapical; flor feminina composta de um só gineceu ovoide, subcilíndrico ou obovóide,
ovário com (2-) 4-8 (-21) lóculos, óvulos 1-91 por lóculo, geralmente hemianátropos, funículo
com ou sem tricomas, estilete tão largo quanto o ovário, às vezes lobado, estigma discoide,
globoso, também às vezes lobado, frequentemente largo; fruto tipo baga, subcilíndrica a
obovoide, usualmente vermelha, amarela, branca ou vermelho-alaranjada; sementes
numerosas, variando muito de tamanho, testa frequentemente costelada.
Relações infragenéricas
74
folha, detalhes da inflorescência, das estruturas florais e a nomenclatura dos taxa
infragenéricos foi atualizada por Mayo (1990).
O subgênero Meconostigma é o menor dos três subgêneros e as principais
características são o hábito arborescente, caule duro e fibroso coberto por cicatrizes de folhas
velhas dispostas em espiral e estames finos e compridos. Além dessas características, Mayo
(1986) ampliou o número de caracteres que o diferencia dos dois outros subgêneros, sendo
estes: zona estéril do espádice longa; espata espessa; caule adulto composto
morfologicamente de unidades simpodiais de uma folha só e de um padrão caracterizado pela
supressão do entrenó hipodial; vascularização do gineceu mostrando um sistema axilar de
feixes, o qual é independente do sistema que fornece os óvulos através dos funículos; feixe
vascular do estame não bifurcado; dutos de resina na zona adaxial da espata e esta em seção
longitudinal possui um formato de “J”.
1’. Planta hemiepífita secundária, ausência de escâmulas nos internós, raízes aérea sem
acúleo, cilindro central das raízes não lobado, lâmina foliar não sagitada, com
nervura submarginal coletora. Inflorescência com espata caduca.
75
Descrição das espécies
1. Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting, Revista Fac. Agric. Univ. Centr. Venezuela 10:
201 (1979). Tipo: Venezuela, Montana de Javita, Humboldt e Bonpland 978 (Holótipo: P
n.v.). (Figuras 4, 13)
76
Hábitat: planta exclusiva de Floresta Ombrófila Densa de Terra-firme.
Distribuição: Bolívia; Brasil (Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Maranhão, Pará, Pernambuco,
Rondônia e Roraima); Colômbia; Equador; Guianas; Peru; Suriname e Venezuela (Figura 13).
Dados fenológicos: coletada com flores todo o ano, com frutos nos meses outubro a
dezembro.
Material examinado: APA da Margem Esquerda do Rio Negro, Comunidade Santa Maria, 5
Mar 2010, R.F.M. Oliveira, G.P. Vianae e A.C. Padron s/n (EAFM, est.); 03 Jun 2010,
R.F.M. Oliveira, G.P. Viana e A.C. Padron 28 (INPA, fl); 11 Ago 2010 R.F.M. Oliveira, M.L.
Soares, S. Silvino e A.C. Padron 52 (INPA, fl.). BOLÍVIA: Pando: Abuna, 8 Jul. 1992, Al.
Gentry e Alan Perry 77987 (MO, fl.). BRASIL: Acre: Cruzeiro do Sul, 21 Ago. 1986, T.B.
Croat e Arito Rosas, Jr. 62435 (INPA, est.). Amapá: Porto Grande, 1 Mar. 2001, L.A.
Pereira, F. Cesarino, S.M. Alfaia e J. Reis 151 (INPA, fl.); 1 Mar. 2001, L.A. Pereira, F.
Cesarino, S.M. Alfaia e J.P. Reis, 162 (INPA, est.). Amazonas: Estirão do Equador, 8 Ago
1973, E. Lleras, W.C. Sterward, J.C. Ongley, D.F. Coelho, J.F. Ramos e J. F. Lima 17214
(INPA, fl.); Estrada Manaus – Itacoatiara, Nov. 1973, W. Steward e J. Ramos 17656 (INPA
fl.); Humaitá, 16 Jun. 1980, A. Janssen 474 (INPA, fl.); Manaus, 16 Ago. 1986, T.B. Croat
62208 (INPA, est.); São Gabriel da Cachoeira, 10 Fev. 2001, D. Hoffman, e M. Farias, 139
(INPA, fl.); 12 Out. 1976, Aldair s/n (INPA, est.); 20 Nov. 1968, D. Coelho e J. Lima s/n
(INPA, fl.). Pará: Itaituba, 20 Mai. 1983, I.L. Amaral, M.N. Silva, O.P. Monteiro, J. Lima, L.
Brako, W.D. Reese e M. Dibben 1352 (INPA, fr.); Oriximiná, 17 Ago. 2008, D.R. Oliveira e
C.A. Paulo Santos 124 (INPA, est.); Paragominas, 1 Mar. 1980, T. Plowman, G. Davidse,
N.A. Rosa, C.S. Rosário e M.R. dos Santos 9402 (INPA, est.); Tucuruí, 22 Out. 1983, E. Lima
e A. Silva 90 (INPA, fr.); Pernambuco: Recife, 14 Fev. 1990, M.L. Guedes 2267 (UFBA fl.);
Rondônia: Porto Velho, 26 Out. 1979, G. Vieira, J. Zarucchi, A.S.L. Silva, C.D.A. Mota e
J.F. Ramos 310 (INPA, fr.); 28 Jun. 1983, M.G. Silva 6506 (INPA, fl.). Roraima: Estrada
Manaus – Caracaraí, 16 Nov. 1977, W.C. Steward, I. Araújo, W.R. Buck, J.F. Ramos e J.
Ribamar 39 (INPA, fr.); 18 Fev. 1971, G.T. Prance, W. C. Steward, F.P. Harter, J.F. Ramos,
W.S. Pinheiro e O.P. Monteiro 10598 (INPA, fr.); 28 Fev. 1971, G.T. Prance, W.C. Sterward,
F.P. Harter, J.F. Ramos, W.S. Pinheiro e O.P. Monteiro 10762 (INPA, fl.). COLÔMBIA: 17
Set. 1991, H. Vester 569 (MO, est.). EQUADOR: Province Napo: 12 Nov. 1987, C.E. Ceron
2881 (MO, fl.); 19 Jun. 1991, W. Palacios e E. Freire 7396 (MO, fr.). 00º 52’S 76º 05’W, 9-
77
13 Jan. 1988, C.E. Ceron e F. Coelho 3295 (MO, fr.); 00º 57’S 76º 13’W, 9 Jan. 1988, D.
Neill et al. 8353 (MO, fr.). GUIANA: Edo. Bolívar: Set. 1986, Angel Fernandez 3322
(INPA fl.); 28 Mar. 1910, C.W. Anderson 432 (K est); 29 Jun. 1979, M.F. Prevost 670 (K
est.), 03º 37’ N 53º 12’ W, 27 Mar. 1983, S. Mori e J. Pipoly 15415 (P, MO, P fr.); 3º 37’N
53º 12’W, 19 Mar. 1996, B. Hoffman e D. Allicock 5060 (MO fr.); 15 Mai. 1986, S.A. Mori e
T.D. Pennington 18014 (MO fr.); 5º 30’ N 48º 22’ W, 6 Jul. 1982, T.B. Croat 53843 (MO
est.). PERU: Reserva Tambopata: 15 Mar. 1988, D. Bell et al. 88-178 (K fr.); 2 Jan. 1973,
B. Berlin 800 (MO fr.); 04º 55’ S 073º 45’ W, s.d., J. Baluarte s.n. (MO 5564058 est.); 14
Mar. 1980, V. Huashikat 2262 (MO fr). SURINAME: 15 Mar. 1949, A.M.E. Jonker et al.
2715 (IAN fr.); 4 Mar. 1918, B. Wallnofer 3803 (KEW fr.); 12 Fev. 1919, B.W. 4255 (P fl.);
30 Jun. 1924, B.W. 6555 (MO est.); 6 Fev. 1942, G. Stahel s.n. (K, MO fl.). VENEZUELA: 6
Fev. 1990, B. Stergios e J. Velazco 14706 (MO est.), 5º 37’ N 67º 22’ O, 29 Jan. 1991, G.A.
Romero et al. 2270 (MO fl.); 5º 37’ N 67º 22’ O, 6 Fev. 1992, G.A. Romero et al. 2317 (MO
est.); 5º 37’ N 67º 22’ O, 9 Fev. 1992, G.A. Romero et al. 2343 (MO fl.); 18 Abr. 1990, J.
Perez 962 (MO est.).
Comentários:
Segundo Soares (2008), esta espécie tem a mais ampla distribuição entre os táxons
pertencentes ao gênero e que possivelmente seja a espécie mais explorada na Amazônia
brasileira e extrabrasileira, principalmente na região do Baixo rio Negro. As raízes
alimentadoras dessa espécie possuem características anatômicas e propriedades físicas e
mecânicas apropriadas para o uso em artesanato.
78
As raízes aéreas dessa espécie também são usadas como amarras em construções de casas e
embarcações rústicas pelos moradores da comunidade.
79
Figura 4. Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting. A) Hábito; B) Venação da lâmina foliar; C) Vista frontal
do estame; D) Seção transversal do ovário; E) Seção longitudinal do gineceu (A – E preparados de Oliveira,
R.F.M. et al., 28; ilustração de Felipe França, fev/2011).
80
Morfologia interna
Lâmina foliar
Figura 5. Estruturas da lâmina foliar de Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting. A) Vista superficial da
epiderme com estômatos paracíticos e geminados (seta); B-E) Cortes transversais; B) Feixe vascular colateral
envolto por fibras esclerenquimáticas; C) Mesofilo contendo drusas (setas); D) Idioblasto; E) Feixes colaterais
acessórios. Barras = 12,5 µm (A, B); 5 µm (C, D); 50 µm (E).
81
Raiz aérea
Figura 6. Cortes transversais das raízes aéreas de Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting. A) Aspecto geral
mostrando a periderme, bainha de fibras esclerenquimáticas () e cilindro central; B) Súber e fibras
esclerenquimáticas dispersas no córtex; C) Região de suberização da periderme; D) Células em divisão entre a
região de suberização e córtex; E) Lenticela; F) Endoderme (seta) envolvendo o cilindro vascular e bainha de
fibras esclerenquimáticas (); G) Endoderme e periciclo mais externamente ao cilindro central. PE= periderme;
Co= córtex; Fi = fibra; CC= cilindro central; Su= súber; Sub = suberização; En= endoderme; Pc = periciclo.
Barras = 50 µm (A); 12,5 µm (B); 5 µm (C,D,G); 25 µm (E, F).
82
2. Monstera obliqua Miq. Linnaea 18: 79. 1844. (Figuras 7, 13)
Monstera boliviana Rusby. Bull. New York Bot. Gard. 6: 494. 1910.
Monstera expilata Schott. Prodr. Syst. Aroid.: 367. 1860.
Monstera falcifolia Engl. Bot. Jahrb. Syst. 37:117. 1905.
Monstera falcifolia var. latifolia K. Krause. Notizbl. Königl. Bot Gart. Berlin 11: 614.
1932.
Monstera fendleri Engl. Bot. Jahrb. Syst. 37: 116. 1905.
Monstera killipii K. Krause. Notizbl. Königl. Bot. Gart. Berlin 11: 614. 1932.
Monstera microstachys Schott. Oesterr. Bot. Wochenbl. 5: 274. 1855.
Monstera obliqua var. expilata (Schott) Engl. Martius, C.F.P. Von e auct. suc. (Eds.)
1878. Fl. Bras. 3(2):113.
Monstera sagotiana Engl. Bot. Jahrb. Syst. 37:117. 1905.
Monstera snethlagei K. Krause. Notizbl. Königl. Gart. Berlin 9:272. 1925.
Monstera unilatera Rusby. Bull. New York Bot. Gard. 6: 494. 1910.
83
Nome popular: “costela-de-adão”, “ambé-sima” (Comunidade Santa Maria, Baixo rio Negro,
Amazonas, Brasil)
Dados fenológicos: coletada com inflorescência nos meses de abril a dezembro e com frutos
nos meses fevereiro, março, junho, agosto, setembro, novembro.
84
J.H. Piva 425 (INPA fr.); Chapada dos Guimarães, 23 Jul. 1999, M. Macedo e I. Lopes s/n
(INPA est.); Cuiabá, 05 Jul. 2001, M. Macedo, E. Gonçalves, E. Silva 7559 (INPA fr.). Pará:
Itaituba, 24 Abr. 1983, I.L. Amaral, M.N. Silva, O.P. Monteiro, J. Lima, L. Brako, W.D.
Reese, M. Dibben 1049 (INPA fr.); 29 Abr. 1983, M.N. Silva 160 (INPA fl.); Oriximiná, 04
Jun. 1980, C. Davidson e G.Martinelli CD 10050 (INPA fr.). Rondônia: Ilha no rio Madeira,
28 Jul. 1968, G.T. Prance, E. Forero, B.L. Wrigley, J.F. Ramos, L.G. Farias 6546 (INPA fl. e
fr.); 29 Jun. 1968, G.T. Prance, D. Philcox, E. Forero, L.F. Coelho, J.F. Ramos, L.G. Farias
5339 (INPA fl. e fr.); 28 Jul. 1968, G.T. Prance, E. Forero, B.L. Wrigley, J.F. Ramos, L.G.
Farias 6546 (INPA fl e fr.); 29 Jun. 1968, G.T. Prance, D. Philcox, E. Forero, L.F. Coelho,
J.F. Ramos, L.G. Farias 5339 (INPA fl. e fr.); Rio Jaciparaná, 30 Jun. 1968, G.T. Prance, D.
Philcox, E. Forero, L.F. Coelho, J.F. Ramos, L.G. Farias 5379 (INPA fl.); 30 Jun. 1968, G.T.
Prance, D. Philcox, E. Forero, L.F. Coelho, J.F. Ramos, L.G. Farias 5379 (INPA fl.);
Rodovia Alvorada – Costa Marques, 02 Jul. 1983, M.G. Silva 6539 (INPA fr.); Sta. Bárbara,
16 Ago. 1968, G.T. Prance e J.F. Ramos 7010 (INPA fl.); Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau,
29 Jan. 2002, L.R.U.C. Lopes, L.C. Maretto, J. Araújo 01 (INPA fl.).
Comentários:
85
confeccionados pelos artesãos da Comunidade de Santa Maria, onde também registrou-se pela
primeira vez o uso de raízes dessa espécie para o artesanato.
Para esta espécie, foram identificadas oito famílias de árvores suportes (forófitos), a
saber: Apocynaceae (Aspidosperma sp.), Burseraceae (Protium sp.), Chrysobalanaceae
(Licania sp.), Lauraceae (Mezilaurus sp.), Melastomataceae (Bellucia glossularioides (L.)
Triana e Mouriri sp.), Myristicaceae (Virola sp., Iryanthera sp. e indeterminada), Rubiaceae
(indeterminada) e Sapindaceae (Cupania sp.). Constatou-se que as espécies do gênero
Protium spp. (“breu”), pertencentes à família Burseraceae, foram colonizados com mais
frequência por indivíduos de M. obliqua.
86
Figura 7. Monstera obliqua Miq. A) Hábito; B) Seção transversal da flor; C) Seção longitudinal da flor; D)
Vista apical da flor; E) Vista frontal do estame (A – E preparados de Oliveira, R.F.M. et al., 26; ilustração de
Felipe França, fev/2011).
87
Morfologia interna
Lâmina foliar
Figura 8. Estruturas da lâmina foliar de Monstera obliqua Miq. A-C) Vista frontal. A) Epiderme adaxial; B)
Epiderme abaxial; C) Estômato tetracícito; D-F) Cortes transversais; D e E) Feixe vascular colateral envolto por
fibras esclerenquimáticas; F) Mesofilo contendo ráfides (seta). Barras = 50 µm (A); 25 µm (B); 5 µm (C); 50 µm
(D); 12,5 µm (E, F).
88
Raízes aéreas
Figura 9. Cortes transversais das raízes aéreas de Monstera obliqua Miq. A) Vista geral da epiderme, córtex e
cilindro central; B) Epiderme estratificada evidenciando a exoderme (seta); C) Cilindro central mostrando
elementos de vaso; D) Região do córtex; E) Elementos de vaso contendo tilossomos (seta) rodeados por fibras
esclerenquimáticas. Barras = 25 µm (A); 12,5 µm (B,C,D); 5 µm (E).
89
3. Philodendron solimoesense A.C. Sm. in: Journal of the Arnold Arboretum 20: 289. 1939;
Bunting in Ver. Fac. Agron. (Maracay) 10: 246 (1980). Tipo: Brasil. Amazonas: rio Solimões,
Município: São Paulo de Olivença, Out-Dez. 1936, Krukoff 8861 (infr., Holótipo NY;
Isótipos VEN). (Figuras 10, 13)
Planta hemiepífita primária, geralmente suspensa quando adulta, com caule ca. 7 cm diâm..
Raiz: aérea até 18 m de comp., 5 – 20 mm de diâmetro, cinza com acúleos; internós muito
curtos em planta adulta, escâmulas intravaginais numerosas, ca. 0,5 cm de comp., triangular a
acuminada, marrom claro na base e creme no ápice, coroando os internós; cicatriz foliar
elíptica a suborbicular 3,2 – 4 cm de comp., 2 – 2,8 cm de largura, cinza claro. Folha: profilo
45,5 cm de comp., 1,1 cm de largura, verde claro arredondado na face abaxial e canaliculado
na adaxial; pecíolo 63 – 76,5 cm de comp., 1 -1,5 cm diâm., fissurado verticalmente, verde
mais claro que a lâmina, aplainado na face adaxial, arredondado na abaxial; lâmina foliar
sagitada, margem frequentemente ondulada, verde escura na face adaxial e verde mais claro
na face abaxial; divisão anterior: 31 – 45,5 cm de comp., 25,5 – 33 cm de larg., ápice agudo a
acuminado, nervura central achatada e mais clara que a lâmina juntamente com as
secundárias, nervuras laterais primárias 4 - 6 por lado; divisões posteriores: 21 – 29 cm de
comprimento e 12 – 20 cm de largura, nervuras laterais primárias acroscópicas 2 – 3 pares e 2
laterais primárias basiscópicas, ausência de nervura submarginal coletora em ambas as
divisões. Inflorescência: uma por simpódio floral; pedúnculo 8 – 10,7 cm de comp., 1,5 – 2
cm de diâm., verde claro, estriado verticalmente; espata 29,5 – 32,5 cm de comp., 4 – 5 cm de
diâmetro, levemente constrita, verde claro na face externa, face interna creme com canais
resiníferos, com decorrência de 3,6 – 6,5 cm de comp.; espádice: zona feminina 6,5 – 10,5 cm
de comp., 21,5 – 29,4 mm de diâm. subcilíndrica; zona masculina estéril 9,6 – 10,5 cm de
comp., 22,5 – 26,2 mm de diâm. subcilíndrica; zona masculina fértil 8 – 10,7 cm de comp., 7
– 18,5 mm de diâm., elipsoide a subcilíndrica. Flores: estames 2 – 4mm de comp., 0,5 – 1
mm de larg.; estaminódios: 3,5 – 4 mm de comp., 1 – 2 mm de larg.; gineceu: 4 – 5,5 mm de
comp.; ovário 3 – 4 mm comp., 1 – 1.3 mm diâm., cilíndrico a delgado, multilocular,
recheados por substância mucilaginosa; óvulos 0,6 – 1,8 mm de comp., 4 – 5 por lóculo,
anátropos; placentação axial, bisseriada, óvulos inseridos da base até o ápice; estilete 4 – 5
mm de larg., estigma 0,5 - 1 mm larg. fortemente lobado. Infrutescência: não vista.
90
Nome popular: “cipó-ambé”, “ambé-coroa” (Comunidade de Santa Maria, Baixo rio Negro,
Amazonas, Brasil).
Dados fenológicos: coletada com inflorescência durante os meses de junho a dezembro e com
frutos nos meses de março e novembro.
Comentários:
91
Estas espécies possuem gineceus mais derivados, com estiletes muito elaborados e geralmente
mais de 20 lóculos em cada ovário, o que contraria o fato desse subgênero ser menos bem
sucedido no ambiente florestal. A ocorrência de poucas espécies com hábito mais uniforme e
morfologia muito derivada do gineceu na bacia amazônica, também sugere que o subgênero
Meconostigma poderia ter colonizado essa região numa época relativamente recente em
contraste com a parte sudeste da área de distribuição (Mayo, 1988).
Mayo (1991) em uma revisão do subgênero Meconostigma cita para essa espécie 26-
34 (-47) lóculos por ovário. Infrutescência cerca de 12 cm comprimento, 4 – 4.5 cm diâmetro
com bagas variando de cor branca, laranja ou vermelha e cheiro adocicado, as sementes
ovoide a elíptica com funículo arilado.
As raízes aéreas desta espécie são muito utilizadas para artesanato na Comunidade de
Santa Maria no Baixo rio Negro. Estas apresentam as seguintes características morfológicas:
cor cinza, até 2 cm diâmetro, acúleos em toda sua extensão e em corte transversal, apresenta
um cilindro central em formato lobado. Ressalta-se que esta é, a primeira vez que se relata a
utilização das raízes desta espécie para uso em artefatos.
Apesar de não terem sido feitas coletas sistemáticas dos forófitos neste estudo,
observou-se que seis famílias de árvores suporte (forófitos) estavam colonizadas por P.
solimoesense. Estas são Arecaceae (Attalea sp.), Fabaceae (Dipteryx polyphylla (Huber)
Ducke, Swartzia polyphylla DC. e indeterminada), Humiriaceae (Vantanea celativenia
(Standl.) Cuatrec.), Lauraceae (Licaria chrysophylla (Meisn.) Kosterm.) e Lecythidaceae
(Eschweleira sp.). Dentre as espécies de forófitos, Swartzia polyphylla (“arabá”), apareceu
mais frequentemente com indivíduos de P. solimoesense.
92
Figura 10. Philodendron solimoesense A.C. Sm. A) Hábito; B) Vista lateral do óvulo C) Seção longitudinal do
gineceu D) Vista apical da flor masculina estéril com quatro estaminódios; E) Visão apical da flor masculina
estéril com três estaminódios; F) Vista frontal do estame; G) Seção transversal do ovário; H) Vista frontal do
estaminódio (A – H preparados de Oliveira, R.F.M. et al., 31; ilustração de Felipe França, fev/2011).
93
Morfologia interna
Lâmina foliar
94
Figura 11. Esturturas da lâmina foliar de Philodendron solimoesense A.C. Sm. A e B) Vista frontal da epiderme.
A) Estômato paracítico em visão superficial (seta); B) Bases de pelo (setas); C-F) Cortes transversais; C)
Estômato submerso na epiderme evidenciando a câmara subestomática (); D) Feixe vascular central com
feixes dispersos pelo mesofilo; E) Feixe vascular colateral envolto por fibras esclerenquimáticas; F) Cavidade
resinífera (seta) e parênquima lacunoso aerenquimatoso com uma ampla câmara subestomática (); G) Mesofilo
contendo drusas (seta). Barras = 12,5 µm (A, B); 5 µm (C); 50 µm (D); 12,5 µm (E); 25 µm (F); 5 µm (G).
Raízes aéreas
95
Figura 12. Cortes transversais da raiz aérea de Philodendron solimoesense A.C. Sm. A) Regiões distintas:
córtex e parte do cilindro central; B) Periderme evidenciando a região suberificada; C) Periderme (seta); D)
Ráfides dispersas por todo o córtex (setas); E) Cilindro central lobado; F) Endoderme e cavidade resinífera
(seta); G) Elementos de vaso rodeados por fibras esclerenquimáticas. Barras = 50 µm (A, B, C); 25 µm (D); 200
µm (E); 12,5 µm (F); 50 µm (G).
96
Figura 13. Mapa de distribuição geográfica das espécies Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S. Bunting, Monstera
obliqua Miq. e Philodendron solimoesense A.C. Sm.
Principais características anatômicas da lâmina foliar e das raízes aéreas das espécies
estudadas de Araceae
97
Tabela 2. Características anatômicas distintivas da raiz aérea das espécies estudadas de Araceae.
Caracteres da raiz aérea Espécies
1 2 3
Periderme como camada de revestimento e proteção + - +
Córtex com fibras esclerenquimáticas dispersas + - -
Exoderme com uma camada de células retangulares a quadradas + - -
Exoderme com células retangulares a subcilíndricas - + -
Células suberizadas abaixo da exoderme + - +
Drusas no córtex da raiz aérea + - +
Canais resiníferos ou laticíferos - - +
Córtex com células isodiamétricas de paredes delgadas relativamente esféricas, achatadas ou + - -
ovaladas
Córtex com células parenquimáticas em forma esférica, relativamente isodiamétricas e justapostas - + -
Fibras esclerenquimáticas dispersas no córtex + - -
Endoderme com uma a duas camadas de células parenquimáticas ovais + + -
Bainha de fibras esclerenquimáticas ao redor do cilindro central + - -
Cilindro central arredondado + + -
Cilindro central lobado - - +
Braquiesclereídes nos elementos de vasos + - -
Tilossomos em elementos de vaso - + -
1. Heteropsis flexuosa (Kunth) G.S.Bunting; 2. Monstera obliqua Miq.; 3. Philodendron solimoesense A.C.Sm.
+ = presente; - = ausente.
98
são classificadas como delgadas a espessas, e variam de 0,4 a 1,2 µm, com uma média de
0,7 µm, e apresentam diâmetros maiores em relação ao lúmen que variam de 0,4 a 1,1 µm.
O diâmetro total das fibras varia de 1,03 a 1,95 µm e apresenta uma média de 1,5 µm.
Tabela 3. Fichas biométricas com os valores das medições das fibras esclerenquimáticas das raízes aéreas das
espécies estudadas.
99
DISCUSSÃO
Lâmina foliar
Philodendron solimoesense foi a única espécie que apresentou uma cutícula rugosa em
ambas as faces da lâmina foliar. Enquanto que Heteropsis flexuosa e Monstera obliqua
apresentaram cutícula lisa. No entanto, Keating (2002), descreve cutícula lisa para as espécies
P. bipinnatifidum Schott, P. goeldii G.M. Barroso e P. leal-costae Mayo & Barroso, onde,
todas pertencentes também ao subgênero Meconostigma. O fato de a cutícula de P.
solimoesense ter se apresentado mais espessa, pode estar relacionado ao ambiente em que a
planta vive, ou seja, nas margens do rio ou em áreas de igapó, onde, em ambos os ambientes,
há alta incidência de luz refletida através da água. Segundo alguns autores (Withner et al.,
1974; Appezzato-da-Glória & Carmello-Guerreiro, 2006), a cutícula possui uma camada
brilhante e refletora que atua na proteção contra o excesso de luminosidade. Embora haja
diferença entre P. bipinnatifidum, P. goeldii, P. leal-costae e a espécie estudada do mesmo
subgênero, a cutícula não foi considerada um caráter de valor taxonômico para P.
solimoesense, por não ter sido feita uma avaliação mais aprofundada, visto que características
como a da epiderme variam conforme o ambiente em que o indivíduo se encontra.
Quanto à estrutura da epiderme em vista frontal, apenas em M. obliqua houve
diferenças significativas entre a face adaxial e abaxial. A primeira apresentou células
isodiamétricas, retangulares e alongadas, com estômatos somente na região da nervura,
enquanto que a abaxial apresentou células com paredes onduladas e estômatos distribuídos em
todas as regiões da lâmina. Enquanto que H. flexuosa e P. solimoesense não apresentaram
diferenças no formato das células.
A lâmina foliar das três espécies são anfi-hipoestomáticas. Os estômatos são
paracíticos em H. flexuosa e P. solimoesense, enquanto que em M. obliqua é tetracítico. No
entanto, os estômatos de P. solimoesense, diferem dos de H. flexuosa por apresentarem-se
submersos, ocorrendo em suaves depressões e possuem câmaras subestomáticas que variam
de tamanho, que chegam a formar grandes câmaras de ar. Esses resultados corroboram com
Grayum (1990), que cita que os estômatos paracíticos e folhas hipoestomáticas ou
anfiestomáticas, geralmente são comuns nos gêneros de Araceae.
100
Resquícios de tricomas raros e solitários foram observados na epiderme de P.
solimoesense, no entanto, em nosso estudo não foi possível classificá-los, devido a
possibilidade da técnica utilizada para a dissociação ter destruído os mesmos. De forma geral,
os tricomas são muito variáveis na sua estrutura e podem ter valor diagnóstico para a
taxonomia, nesse caso, Philodendron é um dos poucos gêneros de Araceae que apresentam
tricomas nas folhas (Bogner, 1987; Keating, 2002).
Constatou-se a presença de cristais nas folhas das três espécies. Foram vistas drusas
em todo o mesofilo de H. flexuosa e P. solimoesense. Drusas são comuns em dicotiledôneas,
mas relativamente raras em monocotiledôneas, onde são encontradas em alguns táxons como
Acorus, Araceae e Tofieldia (Prychid e Rudall, 1999). Em M. obliqua apresentou apenas
idioblastos com ráfides, no entanto, Keating (2002) cita drusas no mesofilo de Monstera
acuminata C. Koch, M. dilacerata C. Koch, M. membranacea Madison, M. oreophila
Madison, M. pittieri Engl., M. punctulata (Schott) e M. siltepecana Matuda.
Nas três espécies foram observados idioblastos no mesofilo. Em P. solimoesense, as
células clorenquimáticas situadas em torno dos feixes fibrovasculares contêm grandes
vacúolos possivelmente relacionados com reserva hídrica e/ou substâncias ergásticas que,
segundo Medeiros et al. (2003), podem atuar de forma isolada ou conjunta na proteção
alelopática a patógenos e insetos.
Laticíferos foram observados em P. solimoesense, próximo aos feixes vasculares.
Estes podem ser classificados de acordo com o tipo de substância encontrada em seu interior,
que podem ser óleos, resinas, ceras e borracha. No entanto, não foi realizado estudo
aprofundado com intuito de identificar a natureza destas substâncias na espécie. Porém,
podemos afirmar que se trata possivelmente de dutos resiníferos, frequentemente encontrados
em espécies do gênero Philodendron, inclusive no subgênero Meconostigma, com base em
estudos realizados por Keating (2002). A ausência de laticíferos e tricosclereídes caracterizam
taxonomicamente os gêneros Heteropsis e Anadendrum, pertencentes à subfamília
Monsteroideae (Mayo et al., 1997).
P. solimoesense foi a única espécie que apresentou um colênquima anelar, localizado
logo abaixo da epiderme inferior a qual é constituída de uma única camada contínua de
células aclorofiladas contendo substância densa, possivelmente mucilaginosa. Estas células
apresentam formato quadrangular a arredondado, parede pouco espessa e distribui-se de
forma compacta não se intercalando com o parênquima. Esta é interrompida por feixes de
fibras esclerenquimáticas de formato alongado com paredes grossas lignificadas e
extremidades afiladas. P. solimoesense também foi a única espécie que apresentou um
101
parênquima lacunoso aerenquimatoso, formado por espaços com amplas câmaras de ar
possivelmente relacionados com o período de submersão das raízes na época de inundação da
floresta.
As três espécies apresentam feixes fibrovasculares colaterais, nos quais as fibras
variam em diâmetro, apresentando-se mais espessas nas extremidades dos pólos. Segundo
Bonates (2007), esses espessamentos localizados nos pólos dos feixes colaboram para evitar o
colapso de células do mesofilo e do próprio sistema condutor quando há ocorrência de déficit
hídrico na planta. Fibras esclerenquimáticas em volta dos feixes vasculares encontrados nas
três espécies estudadas também foram relatadas para algumas espécies de Anthurium
(Mantovani et al., 2010).
Raízes aéreas
102
espessamento é o tecido que produz raízes adventícias e forma ligações entre a vasculatura de
raiz, caule e folha (Michereff et al., 2005).
M. obliqua apresenta uma epiderme composta mais externamente por tricomas que
podem estar relacionados à função de aderência nas árvores suportes. A exoderme foi vista
apenas em M. obliqua com uma camada de células retangulares a subcilíndricas, apesar de
Soares et al., (2008) ter relatado a presença de uma exoderme também para a espécie H.
flexuosa. De acordo com Cutler (2007), a exoderme consiste de uma ou mais camadas, mais
externa ao córtex, caracterizada por células angulares com paredes geralmente lignificadas.
Essas camadas de células atuam na conservação da água no meio interno, através da
prevenção da transpiração e evaporação do tecido cortical (Bonates, 2007). No entanto,
estudos mais aprofundados em ontogenia são necessários para obtenção de uma afirmação
mais consistente a respeito dessa característica.
Em M. obliqua as células parenquimáticas apresentam-se de forma esférica e
relativamente isodiamétricas. Alguns autores têm relatado a ocorrência de cloroplastos no
córtex externo de raízes aéreas de algumas espécies da família (Mayo et al., 1997) e
ocorrência de colênquima em espécies de Monstera e Philodendron (Hinchee, 1981), o que
não foi constatado neste estudo, talvez por falta de um estudo mais acurado.
A endoderme das três espécies consistiu de uma camada de células achatadas
delimitando mais externamente o cilindro vascular. Menezes et al., (2005) comprovaram a
atividade meristemática da endoderme, através da proposta de uma nova interpretação do
meristema de espessamento primário para as monocotiledôneas.
O cilindro central das três espécies apresentou alternância dos feixes de xilema e
floema, os quais estão envolvidos por fibras esclerenquimáticas. Na região central observam-
se os anéis concêntricos formados por elementos de metaxilema de maiores diâmetros
rodeados de fibras esclerenquimáticas. Enquanto que em M. obliqua, o cilindro vascular é
constituído de elementos de vaso rodeados por fibras esclerenquimáticas e raramente
tilossomos, que segundo Cutler (2007), são células epiteliais que proliferam em cavidades
intercelulares. No entanto, a localização de tilossomos em elementos de vasos, como
apresentado aqui, pode indicar uma função “tampão”, proposta por Benzing et al. (1982) onde
estes atuariam como barreira para transpiração, uma vez que estes se apresentam compactos
quando secos e quando umedecidos aumentam sua superfície tornando-se frouxos. O cilindro
vascular das raízes aéreas de P. solimoesense apresentou-se lobado e diferenciou-se das
demais espécies, corroborando com estudos feitos por Vianna et al. (2001), que citam cilindro
103
lobado para P. bippinatifidum Schott, espécie pertencente ao subgênero Meconostigma,
característica peculiar e de importância taxonômica para espécies deste subgênero.
Fibras
104
CONCLUSÃO
105
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110
APÊNDICE A – Questionário aos sujeitos da pesquisa – Comunidade Santa Maria, Baixo rio
Negro – AM.
1) Quais as plantas utilizadas na sua casa e/ou terreno como ornamental (enfeite ou plantas de
vaso):
6) Quais são as plantas, ou produtos obtidos destas, mais importantes para a economia da sua
casa, ou seja, aquelas que você depende para ganhar dinheiro ou fazer alguma troca por outros
produtos?
Nome De que Por quanto é Para quem é Em que época é Onde ela
popular forma vendida vendida vendida ocorre?
111
APÊNDICE B – Pranchas coloridas com fotos das espécies de Araceae encontradas no
entorno da comunidade Santa Maria.
112
113
114
115
APÊNDICE C – Atas da aula de qualificação e defesa presencial.
116
117
ANEXO A – Autorização para a pesquisa obtida através do Comitê de Ética em Pesquisas com Seres
Humanos – CEP/INPA.
118
ANEXO B – Autorização de coleta em Unidade de Conservação Estadual.
119