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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

a
FACULDADE DE FILOSOFIA DOM AURELINO MATOS
CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA

JOSÉ DANIEL DE OLIVEIRA DO NASCIMENTO

NÚMEROS PRIMOS E A CONJECTURA DE GOLDBACH

LIMOEIRO DO NORTE - CEARÁ


2023
JOSÉ DANIEL DE OLIVEIRA DO NASCIMENTO

NÚMEROS PRIMOS E A CONJECTURA DE GOLDBACH

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao curso de Licenciatura em Matemática
da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano
Matos, centro da Universidade Estadual do
Ceará, como requisito parcial à obtenção do
grau de licenciado em Matemática.

Orientador: Prof. Dr. Wanderley de Oliveira


Pereira

LIMOEIRO DO NORTE - CEARÁ


2023
JOSÉ DANIEL DE OLIVEIRA DO NASCIMENTO

NÚMEROS PRIMOS E A CONJECTURA DE GOLDBACH

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Licenciatura em Matemática da
Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos,
centro da Universidade Estadual do Ceará,
como requisito parcial à obtenção do grau de
licenciado em Matemática.

Aprovada em: 30 / 06 / 2023.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Wanderley de Oliveira Pereira (Orientador)


Universidade Estadual do Ceará (UECE)
1

Dedico este trabalho exclusivamente a minha


mãe, porque sem ela eu não teria a motivação
e capacidade para desenvolver este trabalho.
AGRADECIMENTOS

Inicialmente, quero agradecer a minha mãe que sempre apoiou, com muito entusiasmo,
minhas decisões e me motivou nos momentos dificeis, sempre acreditando na minha capa-
cidade e me guiando pelo caminho correto com suas palavras mágicas. Posso dizer com
propriedade que sem ela tudo seria mais difı́cil.
Agradeço também ao meu pai que sempre se manteve presente nos momentos oportunos,
buscando ajudar da melhor forma.
Agradeço, ainda, a toda a minha famı́lia que sempre me ajudou nos momentos difı́ceis.
E por último agradeço a todos os professores do curso de matemática da FAFIDAM, em
particular ao professor Wanderley de Oliveira Pereira que me guiou e orientou na ela-
boração deste trabalho.
A todos eu deixo o meu muitı́ssimo obrigado.
1

“Uma falha nem sempre é um erro. Pode


ser simplesmente o melhor que se pode fazer,
dadas as circunstâncias. O verdadeiro erro é
parar de tentar.”
(BF Skinner)
RESUMO

O principal incentivo para a realização deste trabalho surgiu a partir de curiosidades e


estı́mulos que foram adquiridos nas aulas de Teoria dos Números, ministradas pelo profes-
sor Dr. Flavio Alexandre Falcão Nascimento, em que foram enunciadas várias definições,
resultados e demonstrações sobre números primos. O interesse a respeito desse assunto
se intensificou, porque ele se utiliza de uma matemática abstrata, que se apoia em de-
monstrações e generalizações, o que requisita do aluno um maior esforço para aprender.
Posto isso, este trabalho tem como principal objetivo apresentar fatos históricos e teóricos
sobre números primos e a conjectura de Goldbach, descrevendo um recorte da teoria dos
números e apresentando os resultados mais importantes que foram alcançados por gran-
des matemáticos ao longo da história, com foco direcionado para o desenvolvimento da
maturidade matemática. Portanto, para alcançarmos nosso objetivo utilizamos uma me-
todologia de pesquisa bibliográfica e tivemos como principais fontes de estudo as escritas
de Filho (1981) e Bitencourt (2018). Desta forma, definimos que nosso corpus se res-
tringiria a estudar, entender e mostrar a história e os resultados que cercam os números
primos e a conjectura de Goldbach, por meio de textos e demonstrações claras que tragam
o rigor que esses números precisam. Ao final, o trabalho demonstra que os números pri-
mos possuem muitos resultados importantes que contribuiram para o desenvolvimento da
matemática, especialmente para a teoria dos números, para além disso, é possı́vel concluir
que as demonstrações quando bem elaboradas e apresentadas, contribuem para o desen-
volvimento do raciocı́nio, para a maturidade matemática e, ainda, ajudam a compreender
o encadeamento lógico dos teoremas matemáticos. Espera-se, ainda, que o trabalho seja
fonte de estudos e revisão sobre números primos.

Palavras-chave: Teoria dos números. Números primos. Conjectura de Goldbach.


ABSTRACT

The main incentive for the accomplishment of this work arose from curiosities and sti-
muli that were acquired in the classes of Number Theory, taught by Professor Dr. Flavio
Alexandre Falcão Nascimento, where several definitions, results and demonstrations on
prime numbers were enunciated. The interest in this subject has intensified, because
it uses an abstract mathematics, which is based on demonstrations and generalizations,
which requires the student to make a greater effort to learn. That said, this work has as
main objective to present historical and theoretical facts about prime numbers and the
Goldbach conjecture, describing a cut of number theory and presenting the most impor-
tant results that have been achieved by great mathematicians throughout history, with a
focus directed to the development of mathematical maturity. Therefore, to achieve our
goal we used a bibliographic research methodology and had as main sources of study the
literatures of Filho (1981) and Bitencourt (2018). In this way, we defined that our cor-
pus would be restricted to studying, understanding and showing the history and results
that surround the prime numbers and Goldbach’s conjecture, through clear texts and
demonstrations that bring the rigor that these numbers need. In the end, the research
demonstrates that prime numbers have many important results that contributed to the
development of mathematics, especially to number theory, in addition, it is possible to
conclude that the proofs when well elaborated and presented, contribute to the develop-
ment of reasoning, to mathematical maturity and still help to understand the logical chain
of mathematical theorems. It is also expected that the work will be a source of studies
and review on prime numbers.

Keywords: Number theory. Primes. Goldbach’s conjecture.


LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Crivo de Eratóstenes até 100 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26


Tabela 2 – Método de fatoração de Fermat para n = 21 . . . . . . . . . . . . . . . . 26
Tabela 3 – Função ϕ de Euler para os 10 primeiros inteiros positivos . . . . . . . . . 29
Tabela 4 – Tabela da conjectura de Goldbach . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
Tabela 5 – Número cumulativo de pares de primos para N = 10i , com i = 1, 2, ..., 6 42
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
2 REFERENCIAL TEÓRICO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
2.1 Números primos e suas histórias . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
2.2 Números primos e suas propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . 17
2.3 Fórmulas que dão primos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
2.4 Crivo de Eratóstenes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
2.5 Método de fatoração de Fermat . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
2.6 O pequeno Teorema de Fermat . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
2.7 Função de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
3 CURIOSIDADE SOBRE OS NÚMEROS PRIMOS . . . . . . . 34
3.1 A conjectura de Christian Goldbach e suas histórias . . . . . . 34
3.2 Um enunciado correspondente a conjectura de Goldbach . . . . 36
3.3 Uma tentativa rigorosa de demonstrar a forte conjectura de
Goldbach . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
11

1 INTRODUÇÃO

Desde os primórdios, até mesmo nas mais antigas e atrasadas civilizações, o


homem tem a noção de número e, mesmo que fosse um conceito diferente do que temos hoje
em dia, já o utilizava para resolver seus problemas práticos. Na antiguidade as contagens
eram realizadas com pedrinhas e um recipiente, para adicionar (adição) bastava colocar
pedras no recipiente e para subtrair (subtração) era feito o processo inverso, esse método
era utilizado para contar a quantidade de ovelhas que o pastor tinha em seu cercado,
por exemplo. Daı́ a medida que as atividades humanas foram ficando mais complexas
os números começaram a ser usados para resolver problemas de ordem teórica e práticas
(mais complexas) das pessoas. Com isso, surgiu a Teoria dos números, que tem como
principal pilar o nosso objeto de estudo: os números primos e suas propriedades.
Os primeiros estudos sobre os números primos são, geralmente, atribuı́dos aos
gregos, que são destacados como os matemáticos precussores de muitos questionamentos
e resultados importantes a respeito desses números. Pitágoras e várias gerações de sua
escola, criada por volta dos anos (500 a 300 a.C.), tinham muitas curiosidades e dúvidas
sobre esses números. A partir dessas curiosidades começaram, juntamente com outros
matemáticos importantes, os estudos sobre os números primos e ao longo do tempo foram
sendo respondidas algumas dúvidas como, por exemplo: Um número inteiro positivo
pode ser escrito como um produto de fatores primos? Como obter números primos? O
conjunto dos números primos é infinito? O primeiro questionamento foi respondido pelos
gregos, eles perceberam que os números primos podem produzir todos os inteiros positivos
através da multiplicação, a resposta para a segunda dúvida foi dada por Eratóstenes,
grande matemático grego, que criou o crivo de Eratóstenes um método que proporciona
escontrar números primos e, por último, Euclides demonstrou que os primos são infinitos,
respondendo o terceiro questionamento.
Com isso, percebemos que com o avanço da matemática e com os estudos re-
alizados pelas várias gerações de matemáticos ao longo dos anos muitas dúvidas sobre os
números primos foram sanadas e várias perguntas tiveram respostas. Porém, ainda, sabe-
mos que esses números são cercados por dúvidas, mistérios e problemas que não tiveram
solução até os dias atuais. Muitos exemplos de problemas que não foram solucionados po-
dem ser citados como: uma forma de encontrar números primos grandes de forma rápida
e precisa e, ainda, uma forma simples de saber se um número é primo ou não. Além disso,
existem muitas conjecturas sobre esses números que continuam sem soluções há anos. Por
essa razão esses números continuam estimulando o interesse dos que pesquisam sobre o
assunto.
A história da matemática se torna uma grande aliada no estudo dos números
primos, pois ao estudar a história desses números podemos conhecer e entender os materi-
ais que foram produzidos ao longo da história acerca do assunto, conhecendo os problemas
12

mais famosos que foram resolvidos e também os que não foram, para, assim, reconhecer-
mos a importância de estudar os métodos matemáticos desde a sua criação e, ainda, fazer
um paralelo com as alterações que tiveram ao longo da história. Isso poderia motivar quem
estuda o assunto e, assim, melhorar a compreensão deles. Além disso, estudar os proble-
mas que não tiveram solução ao longo do tempo poderá trazer novos questionamentos e
métodos que melhorem a intuição matemática de quem estuda o problema.
Nos cursos de licenciatura em matemática o estudo dos números primos deixa
de lado a análise geométrica que os alunos estão acostumados no inı́cio da graduação,
tornando tudo, exclusivamente, arimetizado, por isso é considerado um estudo avançado,
mesmo que seu conceito seja simples de ser entendido: um número p > 1 é primo se
possui como seus divisores apenas o 1 e o p. As grandes literaturas que abordam os
números primos apresentam suas propriedades com demonstrações sólidas e rigorosas,
trazendo o formalismo e o rigor que esses números necessitam. Isso para alguns alunos
torna-se um desafio positivo que é: buscar entender as demonstrações rigorosas em sua
totalidade, porém, por outro lado é visto como um desafio negativo no qual muitos se
sentem desmotivados por não conseguirem avançar no conteúdo, justamente por não terem
a maturidade matemática necessária para entender essas propriedades de forma imediata
e sem a ajuda do professor, o que corrobora para a criação de uma antipatia com o estudo
da matemática pura, em particular com os números primos.
Ao longo da história da teoria dos números, em particular nos recortes dos
números primos muitos problemas permanecem sem solução até hoje. Neste trabalho é
abordado a Conjectura de Goldbach. Conjectura é um enunciado (problema) que não
é provado como verdadeiro em sua totalidade, ou seja, não possui forças para ser um
teorema, ela apenas é aceita como verdade devido às varias experimentações para muitos
casos. A conjectura que será abordada no trabalho foi enunciada por Christian Gold-
bach (1690-1764) e, mesmo sendo uma afirmação fácil de entender e demonstrar para
uma grande quantidade de números inteiros positivos, se tornou um desafio para muitas
gerações de matemáticos, principalmente para a atual. Tal conjectura surgiu, em 1742,
através de uma correspondência enviada a Euler, na qual Goldbach enunciou a seguinte
afirmativa: ”se n é um número par maior que 2, então esse número n pode ser escrito como
a soma de dois números primos”. Muitos matemáticos tentaram generalizar a afirmativa
para todos os pares maiores que dois, porém não conseguiram demonstrar a afirmação.
As tentativas de demonstração da conjectura trouxeram vários teoremas importantes e
significativos que são correspondentes a afirmação.
Diante da beleza que os números primos carregam consigo e devido a grande
quantidade de problemas que ainda os cercam, escolhemos como tema do nosso trabalho:
Números primos e a conjectura de Goldbach, com a intenção de trazer os resultados que
julgamos mais importantes com suas devidas demonstrações de forma correta e elegante,
pois acreditamos que com isso podemos contribuir com o desenvolvimento do raciocı́nio
13

e com a acepção da criticidade (maturidade) matemática dos interessados pelo tema. De


acordo com isso, determinamos como objetivo geral: conhecer fatos históricos e teóricos
sobre os números primos e a conjectura de Goldbach e, com o intuito de alcançarmos
isso, concebemos alguns objetivos especı́ficos como: descrever um recorte da teoria dos
números, particularmente na parte dos números primos, apontar alguns métodos de en-
contrar números primos que surgiram ao longo da história e relatar a história e algumas
tentativas de demonstração da famosa conjectura de Goldbach.
Este trabalho teve duas causas principais para a sua realização. A primeira
causa foi pessoal do autor e a segunda foi pela importância que o tema tem para o meio
acadêmico. Pessoalmente esse trabalho foi escolhido porque foi um tema que sempre cha-
mou atenção do autor e ao longo de sua caminhada acadêmica sempre lhe trouxe prazer,
inspiração, motivação e ânimo para continuar estudando para, assim, evoluir matemati-
camente. Em relação ao meio acadêmico, nosso trabalho busca colaborar com a formação
dos alunos, apresentando um recorte da teoria dos primos, trazendo de forma detalhada
uma abordagem sobre esses números com demonstrações bem elaboradas que deixem
claro o método matemático. Com o trabalho, ainda, podemos trazer novas inspirações
e motivações para alunos se aprofundarem no estudo de números primos. E por último,
ainda, acreditamos que nosso trabalho pode ser uma fonte secundária de estudo para a
jornada acadêmica de alunos em formação.
Em conformidade com nosso objetivo geral nossa pesquisa é explicativa, visto
que ela compreende a efetivação de um estudo para fazer com que o pesquisador obtenha
uma maior familiaridade com o objeto de estudo que está sendo analisado. Segundo
Gil (2002, p.41), “Estas pesquisas têm como objetivo proporcionar maior familiaridade
com o problema, com vistas a torná-lo mais explı́cito ou a constituir hipóteses”. Sendo
necessário a utilização de algumas técnicas para a obtenção dos dados como: uma pesquisa
bibliográfica para a descoberta e aprimoramento de novas ideias.
Para atingir nossos objetivos especı́ficos e obter dados sobre o problema pes-
quisado nossa pesquisa se caracteriza como bibliográfica. Segundo Gil (2002, p. 44), “a
pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituı́do prin-
cipalmente de livros e artigos cientı́ficos. Embora em quase todos os estudos seja exigido
algum tipo de trabalho dessa natureza”. Uma vantagem desse tipo de pesquisa é a grande
quantidade de informações a respeito de um problema que se pode achar nos livros e na
internet, o que é uma vantagem para o pesquisador, pois isso é uma fonte que fornece
diversos dados para que ele possa manipular e utiliza-los da melhor maneira possı́vel.
Nosso trabalho foi feito por meio de duas etapas que tiveram grande im-
portância no decorrer do nosso trabalho. Na primeira etapa procuramos fazer um le-
vantamento bibliográfico preliminar buscando fontes relevantes sobre o tema trabalhado e
concomitantemente fazı́amos a leitura dos textos para nos aprofundar no assunto e sanar
todas as possı́veis dúvidas existentes para poder dar seguimento ao trabalho. Isso foi
14

feito por meio de estudos individuais e encontros com o professor orientador. Na segunda
etapa trabalhamos para entender melhor a história dos números primos, bem como me-
lhorar as demonstrações para que elas ficassem mais bem explicadas e claras e, por último,
realizamos a organização lógica do texto, fazendo a redação do trabalho.
Na primeira etapa utilizamos como fontes principais de pesquisa o livro: Teo-
ria elementar dos números de Filho (1981) e A conjectura de Goldbach e a intuição ma-
temática, dissertação de Bitencourt (2018). Ademais, tivemos outras fontes secundárias
como: Padilha (2013), Galdino (2014), Ferreira (2014), Rigotti (2015), Rodrigues (2019),
Okumura (2014) e Piffer (2014). Na segunda etapa usamos essas fontes para apresentar
a história e os resultados mais relevantes relacionados a números primos, apresentando
esses resultados com demonstrações bem feitas e precisas.
Fundamentados na pesquisa bibliográfica e explicativa pudemos entender, para
mostrar, um pouco da história dos números primos, bem como os resultados e demons-
trações mais importantes relacionados a esse tema.
Na seção 1, delineamos apenas a introdução do tema, a apresentação dos ob-
jetivos gerais e especı́ficos e as etapas que envolveram o desenvolvimento do trabalho.
Na seção 2, trazemos a história e os principais resultados teóricos sobre os
números primos como: O teorema fundamental da aritmética, teorema de Euclides, Crivo
de Eratóstenes, Função de Euler.
Na seção 3, abordamos como curiosidade matemática a conjectura de Gold-
bach, trazendo um pouco da sua história e algumas tentativas de demonstração dela.
Na seção 4, trazemos as ponderações e conclusões finais a respeito do nosso
trabalho.
15

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Diante do estudo bibliográfico realizado, nesta seção apresentamos os números


primos, abordando um pouco da sua história e, principalmente, seus principais resultados.
A seção fundamentou-se e extraiu, especialmente, os conhecimentos da literatura: Teoria
Elementar dos Números de Filho (1981), obra que traz o valor dos números primos, abor-
dando os seus principais resultados por meio de textos simples e claras demonstrações,
que não deixam de lado o rigor matemático. Além disso, foram abordadas outras fon-
tes secundárias como: Padilha (2013), Galdino (2014), Ferreira (2014), Rigotti (2015),
Rodrigues (2019), Okumura (2014) e Piffer (2014).

2.1 Números primos e suas histórias

Os números primos, chamados de “primeiros” pelos estudiosos da época, são


objeto de estudo desde a antiguidade, para ser mais exato, os estudos sobre esses números
começaram com os gregos matemáticos da escola de Pitágoras, por volta de (500 a 300
a.C.) e até hoje encantam as pessoas da área, justamente por estarem sempre rodeados de
mistérios e sofisticação. Esse importante conceito matemático foi desenvolvido devido às
necessidades matemáticas e práticas da época. Nesse sentido a subseção, vai abordar um
pouco do contexto histórico desses números, trazendo resultados que foram descobertos
por grandes matemáticos, que posteriormente são demonstrados, e até hoje contribuem
com a área, bem como apresentar os principais matemáticos que contribuı́ram com o
desenvolvimento da teoria dos primos. Visto que, abordar a história dos números primos
poderá aguçar a curiosidade dos leitores do trabalho para, assim, se sentirem motivados
a continuirem a leitura.
Os números primos, definidos como sendo um número p > 1 que possuem
como seus divisores apenas o 1 e o próprio p, são estudados pela Teoria dos números cujo
principal objetivo é estudar as propriedades dos números inteiros positivos, por exemplo,
8, 9, 10, .... O mais curioso dessa teoria e desses números é que embora possamos entender
esse conceito de forma quase que imediata, existem questões e afirmações que não são
respondidas até hoje nem com os mais sofisticados métodos da matemática atual. Um
exemplo disso, é a conjectura de Goldbach que até hoje não foi demonstrada e será discu-
tida nesse trabalho como uma curiosidade que cerca esses números. Ao nos depararmos
com a definição de números primos, de modo nenhum pensarı́amos na complexidade e
mistérios que cercam esses números.
A partir de agora vamos trazer um curto resumo acerca dos matemáticos pre-
cursores dessa imensa teoria, bem como suas contribuições. Abordamos apenas os que
mais contribuı́ram para o desenvolvimento da área e são mais importantes, de acordo com
o nosso estudo e conhecimento.
16

Inicialmente, falaremos de Pitágoras de Samos (582 - 497 a.C.), um dos mais


conhecidos da história, nasceu na ilha de Samos, Grécia. Ele era filho de um rico comer-
ciante da época, por isso passou parte da sua vida viajando por algumas cidades como:
Egito, Sı́ria, Fenı́cia, Índia, Babilônia. Ao longo dessas viajens ele aprendeu muito com
essas diferentes culturas, absorvendo os seus conhecimentos matemáticos. Após essas vi-
agens firmou-se na cidade de Crotona, onde criou sua escola que foi chamada de ”Escola
Pitagórica”. Foi ai que eles começaram a estudar os números primos. Além disso, sua
escola contribui e teve grande influência nos ”Os elementos de Euclides”, um tratado
matemático geométrico que possui 13 livros e foi escrito por volta de 300 a.C.. Esse
tratado continha teoremas, definições, proposições, postulados e abarcava todo a Teoria
Elementar dos Números antiga.
Em uma segunda análise, vamos abordar um pouco da história de Euclides que
nasceu na Sı́ria por volta de 300 a.C. e viveu em Alexandria, no Egito. Esse nome nos é
familiar, pois foi ele que escreveu a grande e conhecida obra ”Os Elementos de Euclides”.
Antes de abordar um dos principais teoremas de Euclides relacionado aos números primos
vamos analisar a sequência dos números. Ao seguir ao longo da sequência dos números in-
teiros podemos perceber que os números primos aparecem cada vez com menos frequência
o que faz a gente supor que esses números podem deixar de aparecer, ou seja, é aceitável
afirmar ou imaginar que esses números não são infinitos. A demonstração de que não po-
demos imaginar nem afirmar isso se deve a Euclides que conseguiu demonstrar o teorema
que mostra a infinidade dos números primos, utilizando o recurso de redução ao absurdo
uma das formas de demonstrar pouco usado na época. Esse resultado será mostrado na
próxima subseção.
Agora vamos falar sobre Eratóstenes, outro famoso matemático, que nasceu
em Cirene, na Grécia, por volta de 276 a.C. e morreu aproximadamente em 196 a.C.. Ele
se dedicou aos estudos da aritmética e atualmente é conhecido pela importante ferramenta
que criou: O Crivo de Eratóstenes. Essa ferramenta possibilita precisar uma tabela que
contenha números primos que sejam menores que um dado n. Posteriormente abordaremos
esse método explicando detalhadamente esse processo.
Outro importante matemático foi Pierre de Fermat (1601 - 1665), nasceu em
Beaumont-de-Lomages e viveu em Castres, na França, onde foi considerado por muitos o
maior matemático do século XVII e pai da Teoria dos Números moderna, porém foi pouco
influente devido ao seu pouco interesse em publicar seus trabalhos. E o mais curioso é que
ele nem era matemático, mas sim advogado. Fermat, discutia questões sobre a matemática
com outros matemáticos, em particular com o conhecido Monge Marim Mersenne. Sobre
suas obras é imprescindı́vel citar o Pequeno Teorema de Fermat uma das mais conhecidas
e que também será demonstrada ao longo do nosso trabalho na qual afirma o seguinte: se
p é um número primo e n é um número inteiro positivo, que não seja divisı́vel por p, então
p divide np−1 − 1. Ele ainda enunciou uma proposição que não conseguiu demonstrar e
17

foi batizada como: O último Teorema de Fermat. A proposição enuncia que a equação
xn + y n = z n , sendo x, y, z e n inteiros e n ≥ 3 não possui soluções inteiras não nulas,
essa proposição só foi demonstrada anos depois, em 1995, pelo matemático inglês Andrew
Wiles. Assim podemos afirmar que as descobertas e afirmações de Fermat conduziram o
crescimento da Teoria dos números.
Por último, abordamos um pouco da história de um dos matemáticos que
mais publicou e contribuiu com a matemática pura e aplicada Leonhard Paul Euler (1707
- 1783) que nasceu e viveu na Basileia, Suı́ça. Na área de teoria dos números ele deu várias
contribuições, ele buscou inspiração nos questionamentos deixados por Fermat e demons-
trou uma de suas famosas afirmações, na qual dizia que um número primo da forma 4n+1
pode-se expressar como a soma de dois quadrados. Outra grande contribuição de Euler
foi chegar a conclusão que é possı́vel estudar a Teoria dos Números utilizando ferramentas
da análise matemática. Com ferramentas da análise os matemáticos avançaram bastante
no estudo da distribuição dos primos. É importante também abordar uma curiosidade,
ou melhor uma conjectura, sobre números primos da qual Euler participou ativamente,
junto com Christian Goldbach que envolvia números primos e esse problema (afirmação)
ainda não possui uma demonstração rigorosa que o torne verdadeiro. Tal problema será
abordado no capı́tulo 3 deste trabalho.

2.2 Números primos e suas propriedades

Os resultados mais rigorosos e elegantes da Teoria dos números vem do estudo


dos números primos. Esses números tem uma grande importância, pois a partir deles
podemos construir todos os outros números através da multiplicação. Apesar de terem
um simples conceito, os números primos trazem muitos resultados (teoremas) rigorosos.
Por exemplo, o TFA (Teorema Fundamental da Aritmética).
Diante disso, nesta subseção apresentamos definições, exemplos e teoremas com
suas devidas demonstrações, de forma objetiva e elegante, que julgamos ser essenciais no
estudo dos números primos. Vendo, assim, as principais propriedades que esses números
possuem.

Definição 2.1 (Número primo) Diz-se que um inteiro positivo p > 1 é um número
primo se e somente se 1 e p são seus únicos divisores positivos. Um inteiro positivo
maior que 1 e que não é primo diz-se composto.

Exemplo 2.1 Os números 2, 3 e 5, por exemplo, são números primos, pois possuem
apenas o 1 e ele mesmo como divisores.

Observação 1. Perceba que o único número par que é primo é o 2. Por outro lado,
o número 1 não é considerado primo por convenção e pelo teorema fundamental da
aritmética que garante que todo número só pode ser decomposto de uma única forma
18

como produto de fatores primos, mostraremos esse resultado ao longo do texto. Então,
se a é um número inteiro qualquer: a é primo, ou a é composto ou a = 1.

Teorema 2.1 Todo inteiro composto possui um divisor primo.

Demonstração. Seja a um inteiro composto, consideremos o conjunto A como sendo o


de todos os divisores positivos de a, exceto os divisores triviais 1 e a, ou seja,

A = {x ∈ N; x | a e 1 < x < a}.

Perceba que A ̸= ∅, porque se A = ∅, a seria primo, pois os seus únicos divisores seriam
1 e a, o que seria um absurdo, pois por hipótese temos que a é composto. Assim, pelo
princı́pio da boa ordenação (PBO), tem-se que no conjunto A existe um elemento q que,
por sua vez, é mı́nimo e afirmaremos que esse q seja primo. Com efeito, se q fosse composto
ele teria pelo menos um divisor r de tal forma que 1 < r < q, então r | q e q | a o que
implica por transitividade que r | a, ou seja, r ∈ A assim q não seria o elemento mı́nimo
do conjunto A, o que é uma contradição pois q é o elemento mı́nimo de A. Portanto p é
primo.

Teorema 2.2 Se um primo p não divide um inteiro a, então a e p são primos entre si.

Demonstração. Seja d = mdc(a, p), então por definição tem-se que d | a e d | p, da


relação d | p resulta que d = 1 ou d = p, pois p é primo, como a segunda igualdade é
impossı́vel de acontecer pois por hipótese p não divide a, daı́ segue-se que d = 1, isto é,
mdc(a, p) = 1 provando, assim, que a e p são primos entre si.

Teorema 2.3 Se p é um primo tal que p | ab, então p | a ou p | b.

Demonstração. Se p | a, não há o que demonstrar. Se p não divide a, temos pelo


teorema anterior que mdc(a, p) = 1, logo pelo teorema de Euclides que diz que se um
número r divide um produto e r é primo entre si com um dos fatores do produto, então
r divide o outro fator. (FILHO, 1981). Isto é, p | b.

Corolário 2.1 Se p é um primo tal que p | a1 · a2 · a3 ... an−1 · an , então existe um ı́ndice
k, com 1 ≤ k ≤ n tal que p | ak .

Demonstração. Usando o teorema de indução matemática, a proposição é verdadeira


de imediato para n = 1 e para n = 2 como foi provado no teorema anterior. Suponhamos,
agora para n > 2 e ainda, por hipótese de indução que é verdadeira para n – 1, isto é, se
p | a1 · a2 · a3 ... an−1 , então existe um ı́ndice 1 ≤ k1 ≤ n − 1, tal que p | ak1 . Agora, se p
é um primo tal que p | a1 · a2 · a3 ... an−1 · an , então temos do (teorema 2.3) que:

p | an ou p | a1 · a2 · a3 ... an−1 .
19

Daı́, se p | an basta tomar k = n e o resultado está provado. De outro modo, se acontecer


de p | a1 · a2 · a3 ... an−1 usa-se a hipótese de indução e faz k = k1 , e o resultado também
está provado. Em qualquer um dos casos, p divide um dos inteiros a1 , a2 , ..., an .

Corolário 2.2 Se os inteiros p, q1 , q2 , ..., qn são todos primos e se p | q1 · q2 ... qn , então


existe um ı́ndice k, com 1 ≤ k ≤ n, tal que p = qk .

Demonstração. De fato, pelo corolário anterior, existe um ı́ndice k com 1 ≤ k ≤ n, tal


que p | qk , e como os únicos divisores positivos de qk são 1 e ele próprio, pois qk é primo,
ocorre que p = 1 ou p = qk . Entretanto, p > 1 porque é primo, assim p = qk .

Teorema 2.4 (Teorema Fundamental da Aritmética) Todo inteiro positivo n > 1


é igual a um produto de fatores primos.

Demonstração. Com efeito, se n for primo não teremos o que demonstrar. Já se n for
composto temos o que provar, pelo teorema 2.1, tem-se que n possui um divisor primo,
seja ele p1 , assim temos que p1 | n e temos:

n = p1 · n1 , 1 < n1 < n.

Se n1 fosse um número primo está igualdade já estaria representada como produto de
fatores primos o que já provaria o teorema. Mas, se ao invés disso, n1 for composto,
temos novamente pelo teorema 2.1 que n1 possui um divisor primo, seja ele p2 , assim
p2 | n1 , isto é, n1 = p2 · n2 com 1 < n2 < n1 e temos:

n = p1 · p2 · n2 .

Se n2 , fosse um número primo está igualdade já estaria representada como produto de
fatores primos o que já provaria o teorema. Mas, se ao invés disso, n2 for composto, temos
novamente pelo teorema 2.1 que n2 possui um divisor primo, seja ele p3 , assim p3 | n2 ,
isto é, n2 = p3 · n3 com 1 < n3 < n2 e temos:

n = p1 · p2 · p3 · n3 .

Se fossemos prosseguir adiante, repetindo esse processo finitas vezes terı́amos exatamente
a seguinte sequência decrescente:

n > n1 > n2 > n3 > ... > 1.

E como existe um número finito de inteiros positivos que são menores que n e maiores do
que 1. Então, necessariamente vai existir um nk , que faremos ser igual a pk , que por sua
vez é primo e chegaremos em:
20

n = p1 · p2 · p3 ... pk .

Assim, concluı́mos que a igualdade é verdadeira, ou seja, que todo inteiro positivo n > 1
pode ser escrito como o produto de fatores primos.

Corolário 2.3 A decomposição de um inteiro positivo n > 1, como produto de fatores


primos é única, a menos da ordem dos fatores.

Demonstração. Daremos está prova por absurdo, então suponhamos que exista duas
decomposições desse número n como produto de fatores primos, isto é,

n = p1 · p2 · p3 ... pr = q1 · q2 · q3 ... qs , com r ≤ s.

Em que os pi e os qj são todos primos e tais que podem ser colocados nessa ordem,

p1 ≤ p2 ≤ p3 ≤ ... ≤ pr eq1 ≤ q2 ≤ q3 ≤ ... ≤ qs . (1)

Como p1 | q1 · q2 · q3 ... qs , existe um ı́ndice k, com 1 ≤ k ≤ s tal que, p1 = qk (corolário


2.2), de (1) temos que p1 ≥ q1 . De maneira análoga q1 = ph com 1 ≤ h ≤ r, donde vem
que q1 ≥ p1 . Logo, temos que p1 = q1 o que implica, pela lei do corte nos inteiros que:

p2 · p3 ... pr = q2 · q3 ... qs .

Fazendo dessa mesma forma e seguindo o mesmo raciocı́nio conclui-se que p2 = q2 o que
implicará em:

p3 · p4 ... pr = q3 · q4 ... qs .

De modo análogo podemos mostrar também que p3 = q3 , p4 = q4 e assim por diante. Se


subsiste a desigualdade r < s chegarı́amos necessariamente a:

1 = qr+1 · qr+2 ... qs .

O que é um absurdo pois essa igualdade nunca será verdadeira, pois os qj > 1 logo tem-se
que r = s e ainda:

p1 = q1 , p2 = q2 , ...pr = qs .

Isso quer dizer que as decomposições de um número inteiro positivo em um produto de


fatores primos são idênticas, isto é, n admite apenas uma única decomposição. Destarte,
está provado o desejado.

Exemplo 2.2 A decomposição de um inteiro positivo 144 é dada de uma única forma
21

como produto de fatores primos:

144 = 2 · 2 · 2 · 2 · 3 · 3.

Observe que os fatores 2 e 3 se repetem, o 2 aparece 4 vezes e o 3 duas vezes.

Exemplo 2.3 A decomposição do número inteiro positivo 360 é dada de uma única forma
como produto de fatores primos:

360 = 2 · 2 · 2 · 3 · 3 · 5.

Observe que os fatores 2 e 3 se repetem, o 2 aparece 3 vezes e o 2 duas vezes. Já o 5


aparece uma única vez.

Corolário 2.4 Todo número inteiro positivo n > 1 admite uma única decomposição da
forma:

n = pk1 k2 kr
1 · p2 · ... · pr ,

em que, para i = 1, 2, 3, 4, ..., r cada ki é um inteiro positivo e cada pi é um primo com


p1 < p2 < p3 < ... < pr , denominado decomposição canônica do inteiro positivo n > 1.

Exemplo 2.4 A decomposição canônica do inteiro positivo n = 144 é dada pela seguinte
igualdade:

n = 144 = 24 · 32 .

Exemplo 2.5 A decomposição canônica do inteiro positivo n = 16480 é dada pela se-
guinte igualdade:

n = 16480 = 25 · 5 · 103.

Observação 2. Conhecidas as decomposições canônicas de dois inteiros positivos a, b > 1,


é possı́vel encontrar o mdc(a, b) e o mmc(a, b). Mostramos como na nota a seguir:

NOTA: O mdc(a, b) é o produto dos fatores primos comuns às duas decomposições
canônicas tomados cada um com o menor expoente, e o mmc(a, b) é o produto de fa-
tores primos comuns e não comuns as duas decomposições canônicas tomados cada um
com o maior expoente.

Exemplo 2.6 As decomposições canônicas dos inteiros positivos 168 e 468 são:

168 = 23 · 3 · 7, 468 = 22 · 32 · 13.


22

Assim,

mmc(168, 468) = 23 · 32 · 7 · 13 = 6552,

mdc(168, 468) = 22 · 3 = 12.

Exemplo 2.7 As decomposições canônicas dos inteiros positivos 180 e 132 são:

180 = 22 · 32 · 5, 132 = 22 · 3 · 11.

Assim,

mmc(180, 132) = 22 · 32 · 5 · 7 = 1260,

mdc(180, 132) = 22 · 3 = 12.

Teorema 2.5 (Teorema de Euclides) Há um número infinito de primos.

Demonstração. Vamos supor que exista um número primo que seja maior que todos
os outros demais primos p1 = 2, p2 = 3, p3 = 5, p4 = 7 e assim por diante. Agora
consideremos o inteiro positivo:

P = p1 · p2 · p3 · ... · pn + 1.

Como P > 1, pelo Teorema Fundamental da Aritmética podemos afirmar que P possui
pelo menos um divisor primo p. Entretanto, p1 , p2 , p3 , ..., pn são os únicos primos, de modo
que p deve, necessariamente, ser igual a um desses primos. Assim sendo,

p | P e p | p1 · p2 · p3 ... pn .

O que implica por propriedade de divisibilidade que:

p | (P − p1 · p2 · p3 ... pn ) ou p | 1.

O que é um absurdo pois p > 1, e o único divisor do número 1 é ele próprio. Assim,
podemos concluir que qualquer que seja o primo pn , sempre vai existir um maior que ele,
isto é, o conjunto dos primos é infinito.

{2, 3, 5, 7, 11, 13, ...}.

O que prova o desejado. Com Euclides mostrando que existem infinitos números primos.
Começou uma grande corrida para se determinar uma fórmula geral que nos desse a
sequência dos números primos. Foram surgindo alguns testes, que muitas vezes eram
23

pouco eficientes. Ao longo do nosso trabalho mostramos um método que proporciona obter
uma lista de números primos até um certo número, esse método que iremos apresentar é
o Crivo de Eratóstenes.

Teorema 2.6 Se um inteiro a > 1 é composto, então a possui um divisor primo p ≤ a.

Demonstração. Com efeito, se o número inteiro positivo a > 1 é composto então:

a = bc, com 1 < b < a e 1 < c < a.

Logo, supondo b ≤ c, teremos:



b2 ≤ bc = a ⇒ b = a.

Por b > 1, temos que pelo Teorema Fundamental da Aritmética b tem pelo menos um

divisor primo p, de forma que p ≤ b ≤ a. E como p | b e b | a, segue-se que p | a, ou

seja, o inteiro primo p ≤ a é um divisor de a.

Observação 3. O resultado fornecido acima nos mostra um processo que proporciona


identificar se um inteiro a > 1 é primo ou é composto, para fazer isso é necessário e

suficiente dividir a sucessivas vezes pelos primos que não excedem a a. Então, por
exemplo, o caso no qual n = 521, temos:

22 < 521 < 23.

De modo que os primos que não excedem a 521, são 2, 3, 5, 7, 11, 13, 17 e 19, e como
521 não é divisı́vel por nenhum desses números segue que 521 é um número primo. Feito
esse processo podemos perceber que esse é um método muito trabalhoso, portanto, pouco
prático, sendo quase impossı́vel aplicar para números grandes.

Teorema 2.7 Existem sequências de n inteiros positivos consecutivos e compostos, qual-


quer que seja o inteiro positivo n.

Demonstração. De fato, é claro que na sequência:

(n + 1)! + 2, (n + 1)! + 3, (n + 1)! + 4, ..., (n + 1)! + (n + 1).

Os seus n termos são inteiros positivos e consecutivos, além de cada um deles ser composto,
pois (n + 1)! + j é divisı́vel por j se 2 ≤ j ≤ n + 1. Então, por exemplo, supondo n = 4,
obteremos a sequência.

5! + 2, 5! + 3, 5! + 4, 5! + 5,

cujos termos são inteiros positivos consecutivos cada um dos quais é composto, porque
24

temos:

5! + 2 = 122 = 2 · 61, 5! + 3 = 123 = 3 · 41,

5! + 4 = 124 = 4 · 31, 5! + 5 = 125 = 5 · 25.

Também existem outras sequências que possuem 4 inteiros positivos compostos e conse-
cutivos, são elas:

24, 25, 26, 27 e 32, 33, 34, 35,

54, 55, 56, 57 e 74, 75, 76, 77.

Definição 2.2 (Primos Gêmeos) Chamam-se primos gêmeos dois inteiros positivos,
consecutivos e ı́mpares que são ambos primos.

Portanto, por exemplo: são primos gêmeos:

3 e 5, 5 e 7, 11 e 13, 17 e 19, 29 e 31. (2)

Observação 4. Até os dias atuais ainda não se sabe o número de primos gêmeos exis-
tentes, mas são conhecidos primos gêmeos muito grandes, por exemplo:

140.737.488.353.507 e 140.737.488.353.509, 140.737.488.353.699 e 140.737.488.353.701.

Uma curiosidade a respeito dessa definição é a existência de apenas um terno


de inteiros positivos ı́mpares e consecutivos que são todos primos:

3, 5 e 7.

Observação 5. Existe uma propriedade (fórmula) que determina um par de números


primos gêmeos. A propriedade diz o seguinte: esses números podem ser representados
por p = 6K ± 1, com excessão do 2 e 3. Ou seja, os pares são da forma (6k − 1, 6k + 1).
Além disso, podemos perceber que o único inteiro que é parte de dois pares é o 5.

Verificando a propriedade para os exemplos apresentados em (2):

para K = 1 ⇒ (6k − 1, 6k + 1) = (6 · 1 − 1, 6 · 1 + 1) = (5, 7),

para K = 2 ⇒ (6k − 1, 6k + 1) = (6 · 2 − 1, 6 · 2 + 1) = (11, 13),

para K = 3 ⇒ (6k − 1, 6k + 1) = (6 · 3 − 1, 6 · 3 + 1) = (17, 19),

para K = 4 ⇒ (6k − 1, 6k + 1) = (6 · 5 − 1, 6 · 5 + 1) = (29, 31).


25

O problema que ainda perdura até os dias atuais é sobre a infinidade dos
primos gêmeos. Diante desse questionamento, Euclides afirmou que sim, existem infinitos
números primos gêmeos, porém esse resultado ficou apenas como conjectura, porque não
foi demonstrado até hoje.

2.3 Fórmulas que dão primos

Sabemos que os primos aparecem com muitas irregularidades ao longo da


sequência dos números inteiros positivos, ou seja, não temos certeza de quando apare-
cerá o próximo primo. Em vista disso, foram construı́das ao longo do tempo algumas
fórmulas que dão números primos.
Nesta subseção mostramos primeiramente a fórmula que foi desenvolvida pelo
matemático Euler, e em seguida outras fórmulas que também dão primos.

A Fórmula de Euler:

fn = n2 + n + 41.

A fórmula de Euler nos fornece primos para n = 0, 1, 2, ..., 39. Todavia, para
n = 40 e n = 41, os inteiros que são obtidos são números compostos.

f40 = 402 + 40 + 41 = 40 · (40 + 1) + 41 = 40 · 41 + 41 = 41 · (40 + 1) = 41 · 41 = 1681,

f41 = 412 + 41 + 41 = 41 · (41 + 1) + 41 = 41 · 42 + 41 = 41 · (42 + 1) = 41 · 43 = 1763.

Mostramos agora, outras fórmulas que dão primos:

fn = 2n2 + 29 para 0 ≤ n ≤ 28,

fn = n2 + n + 17 para 0 ≤ n ≤ 16,

fn = 3n2 + 3n + 23 para 0 ≤ n ≤ 21.

2.4 Crivo de Eratóstenes

Na subseção 2.2 demonstramos o Terorema 2.5 (de Euclides) que mostra


que os números primos são infinitos, o questionamento que fica agora é como obter esses
números. A resposta é: por meio do crivo de Eratosténes, pois por ele é possı́vel cons-
truir uma tabela de primos que não excedem um dado inteiro n, resume-se no seguinte:
escrevem-se na ordem natural todos os inteiros desde 2 até n e, em seguida, eliminam-se

todos os inteiros compostos que são múltiplos dos primos p tais que p ≤ n, isto é,
2p, 3p, 4p, ... .
26

Exemplo 2.8 Construir a tabela de todos os primos menores que 100.



Resposta: os primos p tais que p ≤ 100 = 10 são 2, 3, 5, e 7. Logo, cumpre escrever na
ordem natural os inteiros desde o 2 até o 100 e, em seguida, eliminar os inteiros compos-
tos que são múltiplos de 2, 3, 5, e 7. Depois de realizar esse procedimento, nos restará os
números primos menores que 100.

Tabela 1: Crivo de Eratóstenes até 100

2 3 4 5 6 7 8 9 10
11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
21 22 23 24 25 26 27 28 29 30
31 32 33 34 35 36 37 38 39 40
41 42 43 44 45 46 47 48 49 50
51 52 53 54 55 56 57 58 59 60
61 62 63 64 65 66 67 68 69 70
71 72 73 74 75 76 77 78 79 80
81 82 83 84 85 86 87 88 89 90
91 92 93 94 95 96 97 98 99 100

Os inteiros positivos primos não eliminados são:

2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, 19, 23, 29, 31, 37, 41, 43, 47, 53, 59, 61, 67, 71, 73, 79, 83, 89, e 97.

2.5 Método de fatoração de Fermat

Nesta subseção apresentamos um método de fatoração para números ı́mpares


que foi proposta por Fermat.
Dado um inteiro positivo número ı́mpar n, a decomposição de n num produto
de dois fatores primos distintos podeser obtido
 pelo seguinte método criado por Fermat:
n–1
é preciso construir uma tabela com linhas, sendo n o número ı́mpar analisado,
2
obtidas pela adição sucessiva de inteiros positivos ı́mpares consecutivos a n. Se na r-ésima
linha aparece o quadrado perfeito t2 , então n = (t + r)(t – r).
 
21 − 1
Exemplo 2.9 Para n = 21, temos a seguinte tabela de = 10 linhas:
2

Tabela 2: Método de fatoração de Fermat para n = 21

Linhas
1 21 + 1 = 22
2 22 + 3 = 25 = 52
27

3 25 + 5 = 30
4 30 + 7 = 37
5 37 + 9 = 46
6 46 + 11 = 57
7 57 + 13 = 70
8 70 + 15 = 85
9 85 + 17 = 102
10 102 + 19 = 121 = 112

Podemos perceber que na linha 2 obtivemos o número 52 , e na décima linha


112 , de modo que temos:

21 = (5 + 2) · (5 – 2) = 7 · 3 = 21

21 = (11 + 10) · (11 – 10) = 21 · 1 = 21

Sendo estas as duas únicas decomposições do inteiro positivo ı́mpar 21 em um


produto de dois fatores distintos, porque as outras são as conhecidas como triviais e tem
como fatores os simétricos, tais como:

21 = (–7) · (–3) e 21 = (–21) · (–1).

2.6 O pequeno Teorema de Fermat

Nesta seção demonstramos um dos teoremas mais importantes de Fermat: O


conhecido Pequeno Teorema de Fermat.

Teorema 2.8 Se p é um primo e se p não divide o inteiro a (p ∤ a), então:

ap−1 ≡ 1 mod p ⇒ p | ap−1 – 1.

Demonstração. Como p ∤ a e p é primo, mdc(a, p) = 1, consideremos os p − 1 primeiros


múltiplos positivos de a, ou seja, os inteiros;

(a, 2a, 3a, ..., (p − 1)a).

Está é uma sequência de (p − 1) múltiplos de a na qual não existem múltiplos de p.


Nenhum desses inteiros é congruente a 0 mod p, pois, se fosse:

ra ≡ sa mod p, 1 ≤ r < s ≤ p – 1.

Então o fator comum a poderia ser cancelado, porque o mdc(a, p) = 1, e terı́amos:


28

r ≡ s mod p,

o que é impossı́vel, visto que 0 < r – s < p. Assim sendo, cada dos inteiros a, 2a, 3a, ..., (p −
1) é congruente mod p a um único dos inteiros 1, 2, 3, ..., p − 1, considerados numa certa
ordem, e por conseguinte multiplicando ordenadamente todas essas p − 1 congruências,
teremos:

a · 2a · 3a · ... · (p – 1)a ≡ 1 · 2 · 3 · ... · p – 1 mod p,

ou seja

ap−1 (p – 1)! ≡ (p – 1)! mod p.

Como p é primo e p não divide (p – 1)!, podemos cancelar o fator comum (p – 1)!, o que
dá a congruência de Fermat:

ap−1 ≡ 1 mod p.

Exemplo 2.10 Verificar o teorema de Fermat para p = 11 e a = 2.

O inteiro 11 é primo e 11 não divide 2, isto é, (11 ∤ 2). Logo, temos que 11 | 211−1 − 1 que
é o mesmo que 1024 ≡ 1 mod 11. Isto é

211−1 − 1 ≡ 1 mod 11.

2.7 Função de Euler

Nesta subseção abordamos uma das mais importantes funções do estudo dos
primos: A função de Euler.

Definição 2.3 (Função de Euler) Chama-se função de EULER a função ϕ : N −→ N


que associa a cada inteiro n um valor.

ϕ(n) = número de inteiros positivos que não superam n e são primos com n.

Em outros termos:

ϕ(n) = número de elementos do conjunto:

{x ∈ N | 1 ≤ x ≤ n e mdc(x, n) = 1}

Em particular, ϕ(1) = 1, pois o mdc(1, 1) = 1, e para n ≥ 2 o mdc(n, n) ̸= 1, de modo


que ϕ(n) = número de inteiros positivos menores que n e primos com n. Isto é, ϕ(n) < n.
29

Exemplo 2.11 Se n = 30, então os inteiros positivos menores que 30 e primos com 30
são 1, 7, 11, 13, 17, 19, 23 e 29 assim ϕ(30) = 8.

Exemplo 2.12 Se n = 28, então o conjunto {x ∈ N | 1 ≤ x ≤ 28 e mdc(x, 28) = 1} =


{1, 3, 5, 9, 11, 13, 15, 17, 19, 23, 25, 27} tem 12 elementos. De modo que ϕ(28) = 12.

Exemplo 2.13 Se n = 12, então o conjunto {x ∈ N | 1 ≤ x ≤ 12 e mdc(x, 12) = 1} =


{1, 5, 7, 11} tem 4 elementos. De modo que ϕ(12) = 4.

Exemplo 2.14 Calcular d(ϕ(15)) e ϕ(d(15)), em que d(n) é o número de divisores de n:

d(ϕ(15)) = d(8) = 4,

ϕ(d(15)) = ϕ(4) = 2.

Este processo pode ser considerado relativamente básico e fácil quando n é


estritamente pequeno. Entretanto, essa tarefa pode se tornar difı́cil para um n um pouco
grande, por exemplo, calculando ϕ(2543).
Exibiremos agora a tabela que da os valores de ϕ para os 10 primeiros inteiros
positivos:

Tabela 3: Função ϕ de Euler para os 10 primeiros inteiros positivos

n 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
ϕ 1 1 2 2 4 2 6 4 6 4

A pergunta a se fazer é a seguinte: como calcular ϕ(n), tendo um inteiro


positivo qualquer? Para fazermos isso, podemos utilizar o fato de que a função de Euler,
é uma função aritmética multiplicativa. Isto é, se r e s dois inteiros positivos tais que o
mdc(r, s) = 1, então ϕ(rs) = ϕ(r) · ϕ(s). É evidente, portanto, que esse resultado precisa
ser demonstrado, e é o que faremos a seguir. Definamos inicialmente o que é uma função
aritmética multiplicativa.

Definição 2.4 Chama-se função aritmética toda função f definida no conjunto N dos
inteiros positivos e com valores no conjunto Z dos inteiros, ou seja, toda função f de N
em Z (f : N −→ Z).
Logo, o domı́nio e o contradomı́nio dessa função são respectivamente os conjuntos N e Z.
E a imagem é o conjunto:

Im(f ) = {f (n) ∈ Z | n ∈ N}.

Que é obviamente uma parte de Z: Im(f ) ⊂ Z.


30

Definição 2.5 Uma função aritmética f diz-se uma função aritmética multiplicativa se.

f (rs) = f (r) · f (s).

Para todo par de inteiros r e s tais que o mdc(r, s) = 1.

Teorema 2.9 A função de Euler é uma função aritmética multiplicativa.

Demonstração. Sejam r e s dois inteiros positivos tais que o mdc(r, s) = 1, nos resta
demonstrar que ϕ(rs) = ϕ(r) · ϕ(s).
A proposição é verdadeira se r ou s é igual a 1, pois teremos:

(1.s) = ϕ(s) = 1 · ϕ(s) = ϕ(1) · ϕ(s),

(r.1) = ϕ(r) = ϕ(r) · 1 = ϕ(r) · ϕ(1).

Suponhamos agora r > 1 e s > 1. Nesse caso os inteiros de 1 a rs podem ser colocados
em r colunas com s inteiros em cada uma delas, da seguinte maneira:

1 2 ... h ... r
r+1 r+2 ... r+h ... 2r
2r + 1 2r + 2 ... 2r + h ... 3r
.. .. .. ..
. . ... . ... .
(s − 1)r + 1 (s − 1)r + 2 . . . (s − 1)r + h . . . sr

Por ser o mdc(qr + h, r) = mdc(h, r), os inteiros da h-ésima coluna são primos com r
se, e somente se h é primo com r. E como na primeira linha o número de inteiros que
são primos com r é igual a ϕ(r), segue que existem somente ϕ(r) colunas formadas com
inteiros que são todos primos com r. Por outro lado, em cada uma destas ϕ(r) colunas
existem precisamente ϕ(s) inteiros que são primos com s porque na progressão aritmética:

h, r + h, 2r + h, ..., (s − 1)r + h.

Em que o mdc(h, r) = 1, o número de termos que são primos com s é igual a ϕ(s). Sendo
assim, o número total de inteiros que são primos com r e com s, ou seja, que são primos
com rs, é igual a ϕ(r)·ϕ(s), e isso significa que ϕ(rs) = ϕ(r)·ϕ(s). O que prova o desejado.
A partir de agora traremos formas de calcular a função ϕ(n).

Teorema 2.10 Se o inteiro n > 1, então ϕ(n) = n – 1, se e somente se n é primo

Demonstração. (⇒) Se n > 1 é primo, então cada um dos inteiros positivos menores
que n é primo com n e, portanto, ϕ(n) = n – 1.
31

(⇐) Se ϕ(n) = n – 1, com n > 1 então n é primo, pois se n fosse composto, teria
pelo menos um divisor d tal que 1 < d < n, de modo que pelo menos dois dos inteiros
1, 2, 3, ..., n não seriam primos com n, d e n. Isto é, ϕ(n) ≤ n – 2. Portanto n é primo.

Teorema 2.11 Se p é primo e se k é um inteiro positivo, então:


 
k k k−1 k1
ϕ(p ) = p − p =p 1– .
p

Demonstração. Obviamente, o mdc(n, pk ) = 1 se e somente se, p não divide n (p ∤ n),


e como existem pk−1 inteiros entre 1 e pk que são divisı́veis por p os inteiros:

p, 2p, 3p, ..., (pk−1 )p.

Daı́, segue-se que o conjunto {1, 2, ..., pk } contém exatamente pk – pk−1 inteiros que são
primos com pk , de modo que, pela definição da função ϕ de Euler, temos:

ϕ(pk ) = pk − pk−1 .

Exemplo 2.15 Usando o resultado anterior calcule ϕ(16).

ϕ(16) = ϕ(24 ) = 24 – 23 = 16 – 8 = 8,

ou seja, existem 8 inteiros menores que 16 e primos com 16, são eles 1, 3, 5, 7, 9, 11, 13 e
15.

Exemplo 2.16 Usando o resultado anterior calcule ϕ(9).

ϕ(9) = ϕ(32 ) = 32 – 31 = 9 – 3 = 6,

ou seja, existem 6 inteiros menores que 9 e primos com 9, são eles 1, 2, 4, 5, 7 e 8.

Teorema 2.12 Se n = pk1 k2 kr


1 · p2 · ... · pr é a decomposição canônica do inteiro positivo
n > 1, então:
     
1 1 1
ϕ(n) = n · 1 − · 1− · ... · 1 –
p1 p2 pr

Demonstração. Do teorema 2.11 vem que:


 
1
ϕ(pki
i ) = pki
i – pki−1
i = pki
i 1– .
pi

Por outro lado, sabemos pelo teorema 2.9, que a função ϕ de Euler é uma função aritmética
32

multiplicativa, logo teremos para n = pk1 k2 k3 kr


1 · p2 · p3 · ... · pr :

ϕ(n) = ϕ(pk1 k2 k3 kr
1 · p2 · p3 · ... · pr )

ϕ(n) = ϕ(pk1 k2 k3 kr
1 ) · ϕ(p2 ) · ϕ(p3 ) · ... · ϕ(pr )
       
1 1 1 1
ϕ(n) = pk1
1 1– · pk2
2 1– · pk3
3 1– · ... · pkr
r 1–
p1 p2 p3 pr
       
1 1 1 1
ϕ(n) = pk1 k2 k3 kr
1 · p2 · p3 · ... · pr · 1 – · 1– · 1– · ... · 1 –
p1 p2 p3 pr
       
1 1 1 1
ϕ(n) = n · 1 – · 1– · 1– · ... · 1 – .
p1 p2 p3 pr

Assim, está demonstrado o teorema.

Exemplo 2.17 Calcular ϕ(7865).

Primeiro devemos fatorar n = 7865, que resulta em n = 51 · 112 · 13. Agora usando o
teorema 2.11, ϕ(pk ) = pk − pk−1 e calculando separadamente cada potência da fatoração
tem-se:

ϕ(51 ) = 51 – 50 = 5 – 1 = 4,

ϕ(112 ) = 112 − 111 = 121 – 11 = 110,

ϕ(131 ) = 131 – 130 = 13 – 1 = 12.

Agora usando o fato de que a função de Euler é multiplicativa tem-se o seguinte:

ϕ(7865) = ϕ(51 · 112 · 13) = ϕ(51 ) · ϕ(112 ) · ϕ(131 ) = 4 · 110 · 12 = 5280.

Isto é, existem 5280 inteiros positivos menores que 7865 e primos com 7865.

Exemplo 2.18 Calcular ϕ(10000).

Primeiro devemos fatorar n = 10000, que resulta em n = 24 · 54 . Agora usando o teorema


2.11, ϕ(pk ) = pk − pk−1 e calculando separadamente cada potência da fatoração tem-se:

ϕ(24 ) = 24 – 23 = 16 – 8 = 8,

ϕ(54 ) = 54 − 53 = 625 – 125 = 500,

Agora usando o fato de que a função de Euler é multiplicativa tem-se o seguinte:


33

ϕ(10000) = ϕ(24 · 54 ) = ϕ(24 ) · ϕ(54 ) = 8 · 500 = 8000.

Isto é, existem 8000 inteiros positivos menores que 10000 e primos com 10000.
34

3 CURIOSIDADE SOBRE OS NÚMEROS PRIMOS

Nesta seção vamos abordar como curiosidade matemática um dos problemas


mais interessantes e pertinentes ao longo da história da Teoria dos números, em particular
na parte de números primos: A conjectura de Goldbach. Os enuciados e as demonstrações
da seção foram baseados na dissertação de Bitencourt (2018).

3.1 A conjectura de Christian Goldbach e suas histórias

A conjectura de Goldbach, foi proposta pelo matemático Christian Goldbach


(1690 - 1764), seu objetivo era demonstrar que “todos os números pares, maiores que 2,
podem ser escritos como a soma de dois números primos.” Por exemplo, 8 é a soma de 5
mais 3, 14 é a soma de 7 mais 7, e assim por diante.
Essa conjectura continua, ainda, sem solução desde 1742 até os dias atuais.
Contudo já existem vários trabalhos que tentaram demonstrá-la. Nesse sentido, iremos
abordar um breve resumo sobre tal conjectura, bem como mostrar algumas tentativas
de demonstrações que foram abordadas ao longo do tempo pelos grandes matemáticos,
sempre buscando trazer ponderações que nos auxiliem a entender o porquê dessa curiosa
conjectura, que é simples de entender, porém difı́cil de ser generalizada para todos os
pares, não ter sido demonstrada até hoje. O objetivo da seção é trazer subsı́dios para
desenvolvermos o método e a intuição matemática, mostrando sua beleza e importância.
Quem foi Christian Goldbach? Ele nasceu na cidade de Konigsberg, antiga
Prússia, atualmente situada na Rússia. Foi um importante matemático e ao longo da
sua vida conheceu vários matemáticos que possuı́am grande influência na época como:
Leonhard Euler (1707 - 1783), Nicolau I. Bernoulli (1695 - 1726) e Leibniz (1646 - 1716).
Após se destacar com seus estudos, iniciou sua carreira como professor na academia de
ciências de São Petersburg, na Rússia, onde era reconhecido e obtinha destaque pelos
seus estudos e contribuições nas áreas de teoria das curvas, somas infinitas e teoria das
equações. Goldbach deixou, ainda, parte de sua obra incompleta.
Goldbach discutia, por meio de cartas, algumas resoluções de problemas com
Euler. Foi a partir daı́ que, em 1742, foi enviada uma correspondência que continha o
resultado que ficou conhecido por todos como “a conjectura de Goldbach”. Inicialmente
a carta enviada a Euler continha o seguinte: “qualquer número inteiro maior que 6 pa-
recia ser a soma de três números primos”. Rapidamente, Euler verificou a verdade da
afirmação para alguns naturais, mesmo que no momento não tivesse generalizado para
todos os números. Além disso, o grande matemático Euler descompôs a assertiva em
outras duas partes: “todo número par, maior que dois, pode ser escrito como a soma de
dois números primos” e “todo número ı́mpar é a soma de três números primos”, respecti-
vamente chamadas de conjectura forte e fraca. Por consideração a Goldbach que iniciou
35

toda a discussão, Euler nomeou o primeiro enunciado como conjectura de Goldbach.


Dessa maneira, como afirma a conjectura podemos escrever qualquer número
par maior do que 2 como sendo a soma de dois números primos, por exemplo:

4 = 2 + 2,

6 = 3 + 3,

8 = 5 + 3,

10 = 3 + 7.

Como podemos perceber a conjectura de Goldbach pode ser verificada para


vários números pares naturais. Ao longo da história essas decomposições foram sendo
feitas por matemáticos, mas nunca chegando à generalização do enunciado proposto por
Goldbach. Chegar a essa conclusão manualmente é impossı́vel. Com o avanço tecnológico
foi possı́vel mostrar a veracidade da assertiva até o 4.000.000.000.000.000.000 (4 sextilhão)
número par, porém, ainda, sem uma demonstração matematicamente rigorosa e elegante
para todos os pares.
Na matemática uma afirmação que não é provada como totalmente verdadeira
é chamada de conjectura. Ela possui créditos, porque muitos matemáticos a aceitam
como verdadeira devido as várias experimentações e verificações para vários casos, entre-
tanto sem circunstâncias para torná-la uma verdade generalizada, que possam torná-la
um teorema.
Como mencionado anteriormente, ainda, não há uma demonstração para a
afirmação de Goldbach, esse problema é visto como um dos mais complexos e difı́ceis de
demonstrar devido a grandeza e sofisticação da teoria dos números primos. Apesar de não
ter sido demonstrada em sua totalidade, já existem muitas contribuições e demonstrações
de resultados que derivam dessa conjectura, por exemplo, em 1930, o matemático russo
Lev Genrikhovich, demonstrou que todo número natural pode ser escrito como a soma
de até 20 números primos, outro importante matemático russo Ivan Matveyevich 7 anos
depois provou que todo número ı́mpar suficientemente grande pode ser expresso como
a soma de até 3 número primos. Perceba que afirmação “suficientemente grande”, faz
referência a um número ı́mpar que é maior que um outro certo número (que ele não deixa
expresso qual seria) e por último, em 1973, o Chen Jing Run, matemático da época,
enunciou que todo número par suficientemente grande pode ser escrito como a soma de
um número primo com outro e esse outro pode ser obtido a partir do produto de no
máximo dois primos.
Uma das conquistas mais recentes relacionadas a esse tema aconteceu, em
2015, e o percussor dessa vitória foi o matemático peruano, Harald Andrés Helfgott, ele
demonstrou uma afirmação que vinha sendo debatida há mais de 300 anos por todos os
36

matemáticos em torno do mundo: “todo número ı́mpar é a soma de três números primos”,
chamada de conjectura fraca de Goldbach. Com essa demonstração ele ganhou o prêmio
de pesquisa Humboldt, dado pela Fundação Alexander Von Humboldt.
Helfgoot começou a estudar em 2006 pelos resultados que outros matemáticos
haviam encontrado, que eram nada mais do que a prova para apenas alguns números
naturais. 7 anos depois, em 2013, Helfgoot conseguiu demonstrar tal conjectura. Ele
fez isso por meio do trabalho acadêmico que tem como tı́tulo Major Arcs for Goldbach’s
Problem, no qual ele apresentou aperfeiçoamentos nas estimações dos arcos maiores e
menores, que foi suficiente para provar a segunda conjectura de Goldbach, denominada
de “fraca”.
Apesar de terem sido demonstrados alguns resultados que derivam da prin-
cipal conjectura (forte) de Goldbach, a mesma continua ainda sem demonstração e é
considerada um dos problemas mais difı́ceis do mundo. Muitos trabalhos foram feitos na
tentativa de provar essa conjectura e até mesmo tentar confirmar a afirmação para alguns
intervalos de números naturais. Embora não se tenha obtido êxito nas demonstrações
devemos ressaltar e mostrar as conquistas que temos até hoje. Portanto listaremos a
seguir duas tentativas de demonstrações da conjectura de Goldbach. Nessas tentativas
os matemáticos não conseguiram demonstrar a conjectura ”forte”, conseguiram apenas
provar afirmações equivalentes.

3.2 Um enunciado correspondente a conjectura de Goldbach

Inicialmente vamos trazer uma afirmação com sua demonstração a qual pro-
posta por Farley, em 2005, no seu artigo Two Approaches Goldbach’s Conjecture, que é
equivalente a conjectura “forte” de Goldbach. Ele afirmou que para todo inteiro n ≥ 2
existe j ∈ N tal que n + j e n–j são números primos. Aqui iremos mostrar e demonstrar
apenas essa afirmação que foi a primeira feita por Farley em seu artigo.

Teorema 3.1 Para n ≥ 2, pode-se escrever 2n = p + q em que p e q são números primos


se, somente se, existe j0 tal que n + j0 e n − j0 são números primos.

Demonstração. (⇒) Suponhamos que 2n = p + q, em que p e q são números primos.


temos que p = 2n − q = n + n − q = n − (q − n) e q = n + (q − n) como p e q são números
primos, n − (q − n) e n + (q − n) também o são. Então, existe j0 inteiro, j0 = q − n, tal
que n − j0 e n + j0 são primos.
(⇐) Reciprocamente, se existe j0 inteiro tal que n − j0 e n + j0 são primos, somando n − j0
e n + j0 , obtém-se (n − j0 ) + (n + j0 ) = 2n. Ou seja, 2n é igual a soma de dois números
primos. Agora devemos provar a existência de j0 desse teorema.

Considerando um número inteiro n ≥ 2, seja k = π( 2n), lembremos que
π(x) nos dá a quantidade de números primos menores ou iguais a x. O teorema chinês de
37

restos, assegura que existe um inteiro j0 tal que n + j0 e n − j0 não são divisiveis pelos
primos 2, 3, ..., pk . Para resumir temos o seguinte teorema:

Teorema 3.2 Para todo n ≥ 2, existe j0 inteiro tal que n + j0 e n − j0 não são divisı́veis
pelos primos 2, 3, ..., pk . Em particular, n + j0 e n − j0 são primos.

Demonstração. Primeiramente vamos escolher ai tal que ai ̸≡ ±n (mod pi ) para 1 ≤


i ≤ k. Vamos considerar o sistema:




 j0 ≡ a1 (mod 2)


≡ a2 (mod 3)

 j
 0


(∗) j0 ≡ a3 (mod 5)
..





 .


≡ ak (mod pk ).

j
0

Pelo teorema de chinês de restos, existe um único j0 módulo ak , no qual αk = 2·3·5·...·pk .


Assim, j0 ≡ ai (mod pi ), 1 ≤ i ≤ k. Porém, ai ̸≡ ±n (mod pi ) e então j0 ̸≡ ±n (mod pi )por
transitividade. Ou seja, n ± j0 ̸≡ 0 (mod pi ), 1 ≤ i ≤ k. Portanto, n + j0 e n − j0 não são
divisı́veis por p1 = 2, p2 = 3, p3 = 2, ..., pk .
√ √
Se n ± j0 ≤ 2, então n ± j0 é primo , pois n ± j0 ≤ 2n e n ± j0 não é divisı́vel por

nenhum primo menor ou igual a 2n, pelo crivo de Eratóstenes. Porém, sendo j0 uma
soluçaõ módulo αk, pode ser que n ± j0 seja muito maior do que 2n. O valor de j0 depende
de como escolhemos ai , 1 ≤ i ≤ k. Entretanto, se o valor de j0 está em um intervalo
conveniente, em particular, se |j0 | ≤ n − 2, então n + j0 e n − j0 são primos. Portanto,
se, para todo n ≥ 2 existe esse j0 , então a conjectura de Goldbach é verdadeira.


Exemplo 3.1 Seja n = 52. Então, como k = π( 2 · 52), k = 4, sendo p1 = 2, p2 =

3, p3 = 5 e p4 = 7 os números primos menores ou iguais a 2 · 52. Como



 52 ≡ 0 (mod 2)


−52 ≡ 0 (mod 2)






52 ≡ 1 (mod 3)






−52 ≡ 2 (mod 3)



 52 ≡ 2 (mod 5)


−52 ≡ 3 (mod 5)






52 ≡ 3 (mod 7)






−52 ≡ 4 (mod 7).

38

e desejamos que ai ̸≡ ±n (mod pi ), podemos tomar a1 = 1, a2 = a3 = a4 = 0. E assim,


utilizando o teorema de restos chinês para resolver o sistema:




 j≡1 (mod 2)


j ≡ 0

(mod 3)


 j≡0 (mod 5)


j ≡ 0

(mod 7).

Pelo teorema de restos chinês, temos que: m1 = 2, m2 = 3, m3 = 5 e m4 = 7. Como


mdc(2, 3) = mdc(2, 5) = mdc(2, 7) = mdc(3, 5) = mdc(3, 7) = mdc(5, 7) = 1, o sistema
possui uma única solução. Então:

M = 2 · 3 · 5 · 7· = 210,
M 210
M1 = = = 105,
m1 2
M 210
M2 = = = 70,
m2 3
M 210
M3 = = = 42,
m3 5
M 210
M4 = = = 30.
m4 7

Dái encontrando yi , i = 1, 2, 3, 4, solução de Mi Y ≡ (mod mi )

105Y ≡ 1 (mod 2) ⇒ y1 = 1,
70Y ≡ 1 (mod 3) ⇒ y2 = 1,
42Y ≡ 1 (mod 5) ⇒ y3 = 3,
30Y ≡ 1 (mod 7) ⇒ y4 = 4.

Assim, como c1 = 1, c2 = 0, c3 = 0 e c4 = 0, a solução é dada por:


4
X
x= Mi yi ci = 105 · 1 · 1 + 70 · 1 · 0 + 42 · 3 · 0 + 30 · 4 · 0 = 105
i=1
x = 105 ≡ 105 (mod 210).

Logo a solução é S = {105} e, assim, obtemos que j0 = 105 (mod 210). Mas, j0 = 105 é
muito maior do que 52 − 2 = 50. Não satisfazendo a condição |j0 | ≤ 50 − 2. Sendo assim,
devemos escolher valores convenientes para ai . Sejam a1 = 1, a2 = 0, a3 = 4 e a4 = 2.
Obtemos o sistema:
39




 j ≡ 1 (mod 2)


≡ 0 (mod 3)

j


 j ≡ 4 (mod 5)


≡ 2 (mod 7).

j

Utilizando novamente o teorema de restos chinês, temos que: m1 = 2, m2 = 3, m3 = 5 e


m4 = 7. Como mdc(2, 3) = mdc(2, 5) = mdc(2, 7) = mdc(3, 5) = mdc(3, 7) = mdc(5, 7) =
1, o sistema possui uma única solução. Então pelo sistema anterior temos:

M = 2 · 3 · 5 · 7· = 210,
M1 = 105,
M2 = 70,
M3 = 42,
M4 = 30.

Ainda, pelo sistema anterior, temos que:

y1 = 1,
y2 = 1,
y3 = 3,
y4 = 4.

Assim, como c1 = 1, c2 = 0, c3 = 4 e c4 = 2, a solução é dada por:


4
X
x= Mi yi ci = 105 · 1 · 1 + 70 · 1 · 0 + 42 · 3 · 4 + 30 · 4 · 2 = 849
i=1
x = 849 ≡ 9 (mod 210).

Logo a solução é S = {9} e, assim, encontramos j0 = 9 (mod 210) e portanto, n + j0 =


52 + 9 = 61 e n − j0 = 52 − 9 = 43 são primos. Ao longo de seu artigo Farley não
demonstra a afirmação citada acima apenas prova ela numericamente.

3.3 Uma tentativa rigorosa de demonstrar a forte conjectura de Goldbach

Em segunda análise, iremos abordar agora uma demonstração rigorosa da con-


jectura de Goldbach, que foi proposta Aouessare, em 2016, publicada em seu artigo: A
Rigorous Proof For The Strong Goldbach. Ele verificou que é possı́vel achar pelo me-
nos um par de números primos para qualquer número par que seja maior ou igual a 6,
40

isto é, satisfazer a conjectura de Goldbach, em seguida ele fez uma reformulação na sua
afirmação e obteve a seguinte: ”todo número par maior que 2 tem pelo menos um par de
primos de tal forma que é igual a sua soma”, exemplificando, seja (p, q) o par de primos
de modo que p ≤ q e o número par 2n = p + q, onde n é um inteiro, n > 1.

Exemplo 3.2 Os números 6, 8, 10 e 12 podem ser escritos de acordo com a afirmação


acima, e também, com a conjectura de Goldbach:

6 = 3 + 3,
8 = 5 + 3,
12 = 5 + 7,
10 = 3 + 7, 10 = 5 + 5.

Portanto, percebemos que os números 6, 8 e 12 possuem apenas um par de


números primos satisfazendo a afirmação acima, já o número 10 possui dois pares de
números primos o que também satisfaz o enunciado citado anteriormente.
Na demonstração dessa conjectura rigorosa, levaremos em consideração os
números pares escritos desta forma (2n + 6), com n um inteiro não negativo. Nesse
caso, podemos rescrever a afirmação como sendo uma equivalente a conjectura de Gold-
bach e que seria assim: ”Todo número par da forma (2n + 6) pode ser escrito como a
soma de dois primos da seguinte maneira:

2n + 6 = (3 + 2i) + (2n + 3 − 2i).

Em que n ≥ 0 e existe um inteiro positivo i tal que (3 + 2i) e (2n + 3 − 2i) são
primos”.
Mesmo que a expressão (2n + 6) comece com o numero par 6. é possı́vel ge-
neralizar a demonstração para o número par 4, porque 4 = 2 + 2. É possı́vel identificar
que, nesse caso, realmente, existe i tal que (3 + 2i) e (2n + 3 − 2i) são primos, conforme
o teorema 3.1 sempre conseguimos encontrar os valores de i e n para que isso ocorra isso
ocorra.
Exemplo 3.3 Tem-se 2n + 6 = (3 + 2i) + (2n + 3 − 2i). Daı́,

n = 0, i = 0 ⇒ 6 = 3 + 3,
n = 1, i = 0 ⇒ 8 = 3 + 5,
n = 2, i = 0 ⇒ 10 = 3 + 7,
n = 3, i = 0 ⇒ 12 = 3 + 9, mas 9 não é primo. Para n = 3, i = 1 ⇒ 12 = 5 + 7,
n = 4, i = 0 ⇒ 14 = 3 + 11,
41

n = 5, i = 0 ⇒ 16 = 3 + 13,
n =, i = 0 ⇒ 18 = 3 + 15, mas 9 não é primo. Para n = 6, i = 1 ⇒ 18 = 5 + 13.

O triângulo de pares de números primos para um certo número par N = 2n+6


é adquirido através da Tabela 4, em que a primeira linha é composta de números ı́mpares
escritos da forma (2n + 3) e a primeira coluna é feita de números pares expressos por
(2n + 6), com n inteiro e positivo (n ≥ 0). É razoável perceber que os elementos da linha
i e coluna j desta tabela são obtidos subtraindo os elementos das posições (1, j) das de
(i, 1), em que i, j ≥ 1 e i = j = 0 indicam a linha dos elementos (2n + 3) e a coluna dos
elementos (2n + 6). Por exemplo, o elemento 6 ocupa a posição (1, 0) e o elemento 3 ocupa
a posição (0, 1), daı́ 6 − 3 = 3, que ocupa a posição (1, 1), analisando outro exemplo, o
número 10 ocupa a posição (3, 0) e o elemento 3 ocupa a posição (0, 1), logo o número da
subtração 10 − 3 = 7, vai ocupar a posição (3, 1).
Os números que estão pintados de vermelho são números primos resultantes
da subtração das posições (1, j) das de (i, 1) cujas somas com os números primos da linha
0 resultam no número par (2n + 6) correspondente, conforme a tabela 4, que mostra o
triângulo da conjectura de Goldbach. Este triângulo exibe o número de pares de primos
verificando a conjectura de Goldbach, para um número par maior ou igual que 6. Na
última coluna da tabela temos a quantidade de pares de números primos que cada número
par da primeira coluna tem. Ou seja, 6 = 3 + 3 o número tem apenas um par de primos
que satisfaz a conjectura, portanto Np = 1; 14 = 7 + 7, 14 = 7 + 5, ou seja, possui dois
pares de primos satisfazendo a condição da conjectura, assim Np = 2. Com a tabela
verifica-se a assertiva discutida: ”um número par maior ou igual a 6 tem pelo menos um
par de primos de tal forma que é igual a sua soma”.

Tabela 4: Tabela da conjectura de Goldbach

3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 . . . 2n + 3 Números de pa-
res de primos
6 3 1
8 5 3 1
10 7 5 3 2
12 9 7 5 3 1
14 11 9 7 5 3 2
16 13 11 9 7 5 3 2
18 15 13 11 9 7 5 3 2
20 17 15 13 11 9 7 5 3 2
22 19 17 15 13 11 9 7 5 3 3
24 21 19 17 15 13 11 9 7 5 3 3
26 23 21 19 17 15 13 11 9 7 5 3 3
28 25 23 21 19 17 15 13 11 9 7 5 3 2
42

...

2n − 11

2n − 13

2n − 15

2n − 17
2n − 1

2n − 3

2n − 5

2n − 7

2n − 9
2n + 6

2n + 3

2n + 1

...
3 Np

Para encontrarmos a quantidade do número de pares de primos corresponden-


tes a um número par, consideremos a função π(N ), que nos dá a quantidade de números
π(N )
primos menores ou iguais a N . Como pelo teorema dos primos: lim = 1, à
N →∞ N/ln(N )
medida que N tende a ∞ temos a seguinte aproximação:

π(N ) ≈ N/ln(N ). (3)

A partir disso, é possı́vel obter outra forma, semelhante a anterior, de obter o


número de pares de primos verificando, assim, a conjectura de Goldbach para um número
par N = 2n + 6. Para fazer isso temos, primeiro, que explorar a tabela 5 e analisar o
comportamento desse número que é igual a pelo menos 1, ou seja, tem pelo menos um par
de primos cujas soma é igual a um número par. Ademais, somente metade do intervalo
(3, 2n + 3) colabora para o número total de pares de primos correspondente aos números
pares menores ou iguais do que o número par N , conforme a tabela 4. Assim esse número
pode ser representado por como:
 
N π(N )
L(N ) = π · . (4)
2 2

Substituindo π(N ), dada em (3), temos:


 2
N N N 1
L(N ) = · ⇒ L(N ) = · . (5)
2ln(N/2) 2ln(N ) 2 ln(N/2)ln(N )

Então, por exemplo, para N = 26 usando (5) obtemos L(26) = 20, 31, que
é diferente do número exato da tabela 4. Na tabela 4 o número de pares de primos
correspondentes aos números pares menores ou iguais a 26 é 22.
A tabela 5 exibe a evolução do número cumulativo de pares de primos para
os inteiros 102 , 103 , 104 , 105 , 106 . À proporção que N aumenta, a diferença entre o número
exato e estimado usando (5) diminui, devido a precisão do Teorema dos números primos.
Usando a equação (5) para N = 10i , i = 1, 2, ..., 6, obtemos:

Tabela 5: Número cumulativo de pares de primos para N = 10i , com i = 1, 2, ..., 6

Número par Nº cumulativo de pares de primos


102 139
3
10 5840
43

104 319677
105 20128819
106 1382 894 773

O número de pares de primos (Np ) que verifica a conjectura de Goldbach para


um único número par N1 é obtido da seginte forma:

Np = L(N1 ) − L(N2 ). (6)

Em que N2 é um outro número número par tal que N1 − N2 = 2.

Exemplo 3.4 Escolhendo N1 = 26, temos que N2 = 24, pois 26 − N2 = 2 ⇒ N2 = 24.


Logo usando (5) obtemos:

122
L(24) = ≈ 18, 23,
ln(12) · ln(24)
132
L(26) = ≈ 20, 23.
ln(13) · ln(26)

Desta forma, Np = L(26) − L(24) ≈ 2. Mas, ao olhar para a tabela 4, perce-


bemos que para o número par N = 26, temos Np = 3.
Com esse exemplo feito percebemos que pela fórmula 4 encontramos uma boa
aproximação de números de pares de primos que são iguais a um número par. E para
finalizar, de acordo com Aouessare (2016) ”a conjectura de Goldbach é verdadeira, mas
ela deve ser reformulada da seguinte maneira: Há pelo menos um par de primos de modo
que um mesmo inteiro positivo maior ou igual a 4 pode ser expresso como sua soma”.
(apud BITENCOURT, 2018, p. 31).
Por não ter, ainda,a demonstração da fórmula (6): Np = L(N1 ) − L(N2 ), que
nos dá a quantidade de pares de primos que são iguais a um número par, ou seja, que
satisfazem a conjectura de Goldbach. A prova da mesma continua, ainda, em aberto.
Nos resta, então, discutirmos a importância dessas tentativas de demonstrações
e os benefı́cios que elas trouxeram para a matemática. Nesse sentido, é importante per-
ceber a grande quantidade de material que foi produzido graças as tentativas de demons-
trações dessa conjectura, o que é um tesouro para a matemática. Para deixar mais claro os
benefı́cios dessas tentativas suponhamos que um dia alguém encontre um contra-exemplo
para a conjectura de Goldbach, a pergunta que fica é se isso tiraria o mérito ou tornaria
falsas as teorias e técnicas que foram desenvolvidas a fim de demonstrar tal conjectura?
Para matemática a resposta é não. Uma prova de que a conjectura de Goldbach é falsa,
traria apenas novos questionamentos e seria o acelerador de novos desenvolvimentos na
matemática, porque começariam imediatamente a trazer novas questões, como por exem-
plo, sobre a quantidade de números pares que não satisfazem a conjectura de Goldbach,
44

os números não-goldbachianos, ainda seria questionado se esses números são finitos ou


infinitos (RAV apud BITENCOURT, 2018).
Assim, podemos inferir que a demonstração não é importante apenas pelo seu
poder de verificar a veracidade de um resultado, ela vai muito mais além. Esse além está
nas novas posibilidades que são criadas a partir dessas tentativas de demonstração e nos
benefı́os que isso trará para a matemática. O percurso das demonstrções trazem sempre
novos tesouros para a matemática, seja quando comprovam a veracidade da afirmação
ou quando são refutadas, tornando-as grandes aliadas para a assimilação conhecimento
matemático.
45

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O principal incentivo para a criação e execução deste trabalho surgiu, a partir


de curiosidades, nas aulas de Teorias dos Números, em particular no recorte dos números
primos. O objetivo central do trabalho era apresentar fatos históricos e teóricos sobre os
números primos e a conjectura de Goldbach de forma detalhada, abordando os principais
resultados a respeito do tema com suas devidas demonstrações para, assim, trazer o real
valor dos números primos. Visto que isso poderia contribuir com a formação acadêmica
do autor e, principalmente, ser fonte de conteúdo para alunos e professores interessados
no assunto.
Portanto, visando aprender e contribuir com o estudo dos números primos,
apareceu a ideia de criarmos esse trabalho para mostrarmos um pouco da história e teoria
dos números primos de uma forma diferente e precisa, trazendo, primeiro uma abordagem
histórica detalhada, depois apresentar, de forma rigorosa, seus principais resultados e, por
último, trazer as tentativas de demonstração da conjectura de Goldbach que deixaram
um grande legado para a matemática. É importante evidenciar que esse trabalho é um
complemento, que não substitui as principais literaturas, para estudos e revisão sobre os
números primos. Ao concluir o trabalho concluı́mos que através da metodologia aplicada
os objetivos gerais e especı́ficos foram alcançados.
A produção deste trabalho nos proporcionou, ainda, conhecer uma parcela
significativa da história dos números primos, bem como os principais resultados que os
cercam. Ao analisar e admirar a história matemática por trás dos resultados e problemas
sobre os números primos, enxergamos a importância dessa disciplina para os alunos no
sentido de que estudar os métodos matemáticos desde a sua criação até suas etapas finais
de evolução traz para os alunos novos questionamentos e métodos que melhorem sua
intuição matemática, proporcionado assim uma visão matemática mais profunda.
Dessa maneria, podemos concluir que as histórias, as demonstrações e os re-
sultados quando são bem abordados, de forma detalhada, rigorosa e bem feita, podem
ajudar os alunos a entenderem o método matemático. O trabalho, ainda, proporcionou
ao autor uma visão mais abrangente sobre o sobre os números primos e pôde trazer novas
inspirações para alunos que se interessem pelo estudo dos números primos.
46

REFERÊNCIAS

BITENCOURT, Carolina da Silva. A Conjectura de Goldbach e a Intuição


Matemática. Dissertação (Mestrado) - Profmat, Universidade Federal da Bahia.
Salvador, p. 41. 2018.

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44 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Matemática, Universidade Federal da Paraı́ba,
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47

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Dissertação (Mestrado) - programa de pós graduação profissional em matemática,
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função de ϕ Euler e a função de µ Möbius. 2019. 48 f. Dissertação (Mestrado) -
Curso de Matemática, Universidade Federal de Alagoas, Arapiraca, 2019. Disponı́vel
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2022.

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