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Otra Economía, 6(10):53-67, enero-junio 2012

© 2012 by Unisinos - doi: 10.4013/otra.2012.610.05

Rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas


Populares: um caso brasileiro

The Network of Incubators of Popular Cooperatives: A Brazilian case

Luiz de Oliveira Ataualpa1


ataualpa_luiz@yahoo.com.br

Resumo. No Brasil, na década de 1990, as coopera- Abstract. Since the 90s, popular cooperatives in Bra-
tivas populares ganharam força. Parte desse proces- zil have been gaining strength. Part of this process
so se deve ao apoio das Incubadoras Tecnológicas is due to the support of Technology Incubators of
de Cooperativas Populares, entidades que formam Popular Cooperatives, groups that form the ITCPs
a Rede de ITCPs. Esses grupos têm sua atuação Network. These groups have their actions guided
pautada nos princípios do cooperativismo e nos by the principles of the social economy. This article
fundamentos da economia solidária. Este artigo is the result of the study of social ties constituents
é resultado do estudo dos vínculos sociais consti- and supporters from ITCPs Network which, in
tuintes e mantenedores da Rede de ITCPs, que no 2010, had 42 affiliates, with national representation
ano de 2010 possuía 42 afiliadas, com representan- in Brazil. It is believed that the study of social bonds
tes nas cinco grandes regiões geográficas do Brasil. in the structure of social network, based on psycho-
Acredita-se que o estudo dos vínculos sociais na social perspective, can indicate the formation and
estrutura da rede social, embasados na perspectiva maintenance of this Network. It was proposed an
psicossociológica, pode dar indícios do processo de investigation through semi-structured interviews
formação e manutenção dessa Rede. Propôs-se uma with representatives of the Network ITCPs partici-
investigação por meio de entrevistas semiestrutura- pants, aiming at examining the formal and infor-
das com representantes das ITCPs participantes da mal relationships inside this network. Respondents
Rede, com o intuito de examinar as relações formais were selected from a sociogram and affiliated en-
e informais dentro dessa Rede. Os entrevistados tities in the network. The results indicate bonding
foram selecionados a partir de um sociograma e aspects of political representation and exchange of
da estratificação das entidades filiadas à Rede, sen- information and experience.
do entrevistados 13 representantes de ITCPs que a
constituem. Os resultados apontam para aspectos
vinculadores de um projeto coletivo de representati-
vidade política e troca de informação e experiência.

Palavras-chave: Rede ITCP, Rede Universitária de Key words: UIPC Network, University Incubators
Incubadoras no Brasil, Vínculos sociais. Network’s in Brazil, Social ties.

1
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais (IFSudeste-MG). Rua Américo Davim
Filho, s/n, 36301-358, São João Del Rei, MG, Brasil.
Rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares: um caso brasileiro

Introdução versitária de Incubadoras Populares surge


em um momento de significativo crescimento
No Brasil, as ações do associativismo e do dessa entidade, em que o debate sobre desa-
cooperativismo popular desenvolveram-se fios, limites e avanços aparece como pauta em
efetivamente a partir da década de 1990, mui- diversos momentos.
tas delas impulsionadas e apoiadas por enti- Desse modo, acredita-se, entre outros aspec-
dades que se articulam em uma Rede. Esta é tos, que o presente texto ganha relevância, pois
constituída e mantida sem uma estrutura físi- o número de incubadoras vem crescendo no
ca formal, mas que funciona e é reconhecida Brasil e em outros países, fato alicerçado na dis-
em âmbito nacional e internacional. seminação da tecnologia social brasileira de in-
Tais entidades apoiadoras, as incubadoras cubação. Além disso, a atuação da Rede procura
de cooperativas populares se apresentam e estimular e orientar metodologicamente a ex-
desenvolvem suas ações no contexto da crise tensão universitária em seu compromisso com
do emprego, com altas taxas de desemprego, o desenvolvimento social, por intermédio das
subemprego e precarização do trabalho e dos ITCPs, na articulação entre teoria e prática para
trabalhadores, entre outras consequências vi- alunos, técnicos e professores universitários.
vidas nas últimas décadas no Brasil. O traba- Dentre outros aspectos, ressalta-se ainda a pos-
lho dessas entidades visa a articular formas sibilidade de contribuição para o debate interno
e possibilidades alternativas de geração de sobre a estrutura adotada pela Rede de ITCPs a
trabalho e renda para indivíduos excluídos, partir de um entendimento da forma como as
precarizados e sem meios, a priori, de inserção entidades participantes se vinculam com a es-
efetiva no mercado de trabalho. trutura da Rede e também com seus pares.
Nesse sentido, a partir da década de 1990, Como forma de elucidar as questões perti-
observou-se um crescimento considerável no nentes à temática deste trabalho, partiu-se da
número desse tipo de organização e grande delimitação de uma população total, a saber: as
parte das novas incubadoras encontra-se, atual- organizações participantes da Rede ITCPs para
mente, vinculada à Rede Universitária de Incu- uma amostra significativa. Assim, do núme-
badoras Tecnológicas de Cooperativas, também ro total de incubadoras filiadas à Rede no ano
denominada de Rede de ITCPs ou Rede Uni- de 2010, 42 ITCPs, optou-se por buscar uma
versitária de Incubadoras. Essas entidades arti- amostra que pudesse representar o universo da
culadas em torno da Rede de ITCPs tem abran- Rede. Para tanto, utilizou-se da análise de um
gência nacional, com representantes nas cinco instrumento de comunicação virtual e de livre
grandes regiões geográficas do Brasil, possuin- acesso aos participantes das incubadoras, sen-
do 42 incubadoras afiliadas no início de 2010. do esse um grupo virtual denominado “Rede
Neste estudo, a configuração da Rede de ITCPs”. Na análise das informações constantes
ITCPs é analisada, tendo como base as men- nesse grupo de debate, foram verificadas men-
ções estruturais e dinâmicas das Redes sociais sagens identificadas como de relação direta, em
que se apresentam como um conjunto de nós que uma incubadora (remetente) se comunica-
ou atores (pessoas ou organizações) ligados va diretamente com uma ou demais incubado-
por relações sociais ou laços de tipos específi- ras, sendo identificados os destinatários.
cos. O objetivo deste trabalho foi compreender Paralelas a esta análise, foram coletadas
os tipos de vínculos que formam e mantêm a informações sobre o tempo de filiação das 42
Rede de ITCPs, haja vista que essa estrutura ITCPs na estrutura da Rede. Com os dados
se apresenta de forma organizada e com certo em mãos, as incubadoras foram categorizadas
grau de coesão entre seus participantes, sem, em três estratos: Pioneiras, Intermediárias e
contudo, estar legalmente constituída enquan- Novatas. Essa classificação se deu a partir do
to uma organização convencional. tempo de filiação junto à Rede Universitária
Vale ressaltar que, neste texto, opta-se por de ITCPs.
observar as relações estabelecidas nesse cená- Essas duas etapas tiveram como principal
rio, sem, entretanto, entrar num debate mais objetivo auxiliar na eleição de uma amostra
aprofundado sobre questões analíticas de ca- de incubadoras, as quais seriam convidadas a
ráter político e/ou individual, ainda que, em participar de entrevistas semiestruturadas.
alguns momentos do presente trabalho, men- Diante de tais considerações, o presente
ções a tais questões se façam necessárias. artigo se estrutura em sete partes, incluindo
A escolha por um estudo que abarque o esta Introdução. Na parte subsequente, tra-
tema das relações de vínculo na Rede Uni- ta de apresentar as incubadoras, bem como a

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Rede universitária de ITCPs. Na terceira pas- seu processo, estar atrelada ao que a autora
sagem deste texto, o debate teórico sobre Re- denomina de “força que vem de baixo”, sendo
des sociais é travado, sendo seguido por uma estimulado, assim, por grupos locais e comu-
breve contextualização dos vínculos sociais. nitários, que apontavam para a necessidade de
Na quinta seção, é apresentada a metodologia mudanças nas políticas públicas de atenção às
do estudo, sendo acompanhada dos seus re- comunidades e indivíduos menos favorecidos,
sultados. Na última parte, algumas considera- como foi o caso específico das Incubadoras
ções finalizam o presente texto. Tecnológicas de Cooperativas Populares, o
qual será mencionado a seguir.
A formação das Incubadoras e a De acordo com Singer e Souza (2000), teve
início, em 1992, a proposta incipiente de ela-
constituição da Rede Universitária
boração e implementação do que mais tarde
de ITCPs viriam a ser as ITCPs a partir de campanhas
e mobilizações sociais em benefício da digni-
Envoltas em um processo de exclusão, falta dade humana e da cidadania contra a exclu-
de oportunidades e altas taxas de desemprego, são social, o desemprego, a fome e a miséria,
desenvolvem-se as Incubadoras Tecnológicas lideradas pelo sociólogo Herbert de Souza, o
de Cooperativas Populares, inseridas em ins- Betinho, que lançou as bases para impulsionar
tituições de ensino superior, públicas e priva- em nossa sociedade sentimentos de coopera-
das. Pode-se dizer que tais entidades assumem ção e solidariedade (Barros, 2003; Cruz, 2004;
um papel de apoio a grupos e a comunidades Guimarães, 2002).
em oposição ao contexto desfavorável vivido. Assim, como menciona Oliveira (2006), um
Para Singer e Souza (2000), iniciativas como marco importante desse processo foi a consti-
o surgimento das incubadoras de cooperativas tuição do Comitê de Entidades no Combate à
populares assinalam uma reação dos movi- Fome e Pela Vida (COEP), em 1993, como re-
mentos sociais frente às diversas transforma- sultado do Movimento pela Ética na Política e
ções no mundo do trabalho, em especial a crise no Âmbito da Ação da Cidadania. Esse Comi-
da década de 1980, com alta taxa de desempre- tê incentivou o surgimento de várias organi-
go, a qual parece ter sido agravada pela aber- zações coletivas de trabalhadores brasileiros,
tura do mercado interno para as importações dentre as quais se destacaram algumas coope-
nos anos 1990. rativas populares, como é o caso da Cooperati-
Entretanto, deve-se observar o fato de que va dos Trabalhadores Autônomos do Comple-
o movimento de incubação no Brasil não se xo de Manguinhos (COTRAM), fundada na
restringe, exclusivamente, a cooperativas po- favela de Manguinhos, no Rio de Janeiro.
pulares. Além destas, existem, ainda, incuba- Esse mesmo autor comenta que ela pode
doras de base tecnológica, de economia de se- ser considerada a primeira cooperativa popu-
tores tradicionais, as mistas, que congregam lar da era contemporânea com reconhecimento
as duas últimas, e as incubadoras privadas nacional, ou seja, a primeira a ser reconhecida
(Almeida, 2005). Cada tipo de incubadora como “uma cooperativa de fato, criada e ge-
atua e assume posturas diferenciadas, não renciada por trabalhadores que são moradores
sendo o foco deste trabalho apresentar cada de localidades onde o tecido social apresenta
tipo de incubadora existente. grande número de pessoas com altos níveis de
Essa diversidade, para Almeida (2005), se exclusão social, desemprego e pobreza” (Oli-
deve, em parte, ao modo como diferentes tipos veira, 2006, p. 68).
de organizações se envolveram com o processo No contexto incipiente e de formação das
de construção e utilização das incubadoras. De primeiras incubadoras populares, era recor-
modo particular ao objeto do presente estudo, rente o questionamento de que o assistencia-
pode-se mencionar o aspecto relacional presen- lismo não era suficiente para solucionar os
te nas ITCPs, em que a universidade, o poder problemas de miséria, fome, violência, injus-
público, a sociedade civil organizada e a popu- tiça social, desigualdades e, principalmente,
lação assistida têm a possibilidade de interagir desemprego, o que levou os integrantes da
em um espaço, a princípio, democrático. Coordenação de Pesquisa e Pós-Graduação de
Nesse sentido, ainda para Almeida (2005), Engenharia da Universidade Federal do Rio de
uma das principais características do movi- Janeiro (COPPE/UFRJ), com o apoio de insti-
mento de incubadoras no contexto brasileiro tuições de fomento à pesquisa e organizações
se deve ao fato de sua criação, ou do início de não-governamentais, a se unirem em torno de

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objetivos comuns para realizar experiências de da à estrutura Unitrabalho. Esse processo cul-
geração de trabalho e renda que envolvessem a minou, ao final do ano de 2002, na separação
solidariedade e a cooperação na favela de Man- oficial da Rede de ITCPs da Rede Unitrabalho.
guinhos, no Rio de Janeiro, como já citado. Por Para Cruz (2004), os motivos que levaram a
essa iniciativa, vislumbrou-se, posteriormente, essa separação são discutíveis, e, segundo esse
a possibilidade de se organizarem, com o obje- autor, “totalmente equivocados”. E comple-
tivo de apoiarem outras iniciativas econômicas menta: “algumas ITCPs escolheram participar
que tivessem os princípios da autogestão e do de uma ou outra Rede, e outras incubadoras
cooperativismo popular como proposta (Bar- optaram por permanecer em ambas” (Cruz,
ros, 2003; Cruz, 2004; Guimarães, 2000). Surgia, 2004, p. 44). O mesmo argumento é comparti-
então, o que conhecemos hoje como Incubado- lhado por Barros (2003, p. 118), quando afirma
ras Tecnológicas de Cooperativas Populares. que “apenas algumas Incubadoras vinculadas
Pode-se dizer, assim, que o sucesso desse à Rede de ITCPs mantêm algum tipo de rela-
trabalho culminou com o desenvolvimento da ção ou contato com a Unitrabalho”.
Cooperativa Popular de Manguinhos, levan- Apesar de serem encontradas organiza-
do os idealizadores desse projeto alternativo ções que compartilham da participação em
de geração de trabalho e renda, vinculados à ambas as estruturas, atualmente, essas Redes
UFRJ, a criarem, em 1995, a primeira Incuba- permanecem formalmente separadas, seja na
dora Tecnológica de Cooperativas Populares atuação, seja no modo de gestão das Redes. Si-
(ITCP) do país (Barros, 2003; Cruz, 2004; Gui- nalizando esse fato, Oliveira (2006) argumenta
marães, 2000, 2002). que, enquanto a Rede de ITCPs procura adotar
Nesse cenário, Guimarães (2000) comenta um método mais participativo, com caracterís-
que, no processo inicial da ITCP-UFRJ, houve ticas contemporâneas (horizontalizado), dis-
grande procura, por parte de algumas univer- tribuindo o poder da Rede em várias regionais
sidades e governos, sendo iniciado o debate no Brasil e adotando uma estrutura colegiada
junto a fontes de fomento para articular pro- de organização, a Unitrabalho preconizava e
jetos semelhantes ao desenvolvido na comuni- implantava uma configuração de gestão tra-
dade de Manguinhos. Para esse autor, a pres- dicional (verticalizada). Esses aspectos, entre
são foi “positiva e começou-se a amadurecer a outros, podem sinalizar para o fato de a estru-
ideia da montagem de incubadoras em outras tura inicial que agregava as duas estruturas já
universidades” (Guimarães, 2000, p. 114). citadas ter se desmembrado. Além disso, ob-
Dando prosseguimento a esse passo his- serva-se que diferenças ideológicas e de pers-
tórico, entre os anos de 1997 e 1998, foram pectiva de entendimento e atuação no cenário
criadas cinco outras incubadoras. O impulso da economia solidária encontram-se, também,
dado para a constituição de novas incubado- no cerne dessa questão.
ras ocorreu graças ao Programa Nacional de Após a separação das Redes, verificou-se
Incubadoras de Cooperativas Populares (PRO- que a Rede Universitária de Incubadoras Tec-
NINC) (Guimarães, 2000). nológicas de Cooperativas Populares (Rede
Até o início do ano de 1999, as incubado- ITCPs) vem passando por um considerável
ras de cooperativas populares constituídas até crescimento, seja em número de entidades fi-
aquele momento ainda não se articulavam na liadas, seja em abrangência e em atuação.
estrutura de uma Rede Universitária. Elas, ba- Dessa forma, com o passar dos anos, as ati-
sicamente, atuavam de forma isolada, tendo vidades da Rede Universitária de ITCPs foram
apenas como vínculo maior a ligação parental ganhando forma e se disseminando. No prin-
com o modelo da incubadora da UFRJ. cípio, verificou-se uma concentração maior de
A Rede de Incubadoras Tecnológicas de Co- organizações nas regiões Sul e Sudeste, con-
operativas Populares, como se conhece hoje, tabilizando-se 11 incubadoras. Com o passar
teve seu começo a partir dos meados do ano de cinco anos de atividades, esse número era
de 1999. Seu início está vinculado à Fundação de 19 ITCPs. Após oito anos de funcionamen-
Unitrabalho no desenvolvimento do Programa to, observa-se uma expansão considerável da
Rede de ITCPs e Economia Solidária (Oliveira, Rede, passando esta a contar com 32 organiza-
2006). Nesse começo, pode-se dizer que a Rede ções. No ano de 2009, a Rede de ITCPs possuía
de ITCPs esteve vinculada à Unitrabalho por em seu quadro 42 Incubadoras de Coopera-
meios institucionais e financeiros. tivas Populares, podendo ser observada uma
Contudo, por diversos motivos, a Rede de participação maior de entidades de outras re-
ITCPs não se manteve por muito tempo atrela- giões do Brasil.

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Como forma de ilustrar a distribuição ge- No caso específico do contexto brasileiro no


ográfica até o início do ano de 2010 das In- qual índices sinalizam para um crescimento
cubadoras filiadas à Rede Universitária, é com melhoria de vida dos mais pobres, os de-
apresentada a seguir uma figura ilustrativa, safios apresentados vão para a ordem de uma
sinalizando a abrangência no Brasil, com pre- consolidação das ações da economia solidária,
senças nas regiões Sudeste, Sul e Nordeste e, principalmente das ações das incubadoras
mais recentemente, nas regiões Centro-Oeste e frente a grupos e/ou comunidades assistidas.
Norte das ITCPs afiliadas à Rede. Com isso, a Rede e seus integrantes ganham
A Rede Universitária de Incubadoras Tec- importância e podem se potencializar para
nológicas de Cooperativas Populares possui, conseguir espaço nos diversos setores, como
atualmente, desafios internos e externos. Po- universidades, agências de desenvolvimento e
rém, sua inserção e visibilidade ganham con- instituições de fomento.
tornos internacionais. Isso graças a seu modelo
inovador de atuação e à abrangência de ações. Um debate sobre as Redes sociais
Assim, observa-se que o contexto de inserção
da Rede Universitária de Incubadoras é, por Na década de 1960 e com mais vigor na
um lado, oportuno para o seu desenvolvimen- década de 1980, a literatura mostrou que as
to e crescimento e, por outro, pode ser visto ligações entre indivíduos, entidades e organi-
como incerto. A oportunidade é visualizada a zações estruturam as mais variadas situações
partir da tendência de que os precários níveis sociais, influenciando o fluxo de bens mate-
socioeconômicos, profundamente deteriora- riais, ideias, informação e poder (Scott, 1992;
dos pelo modelo político-econômico, tendem Freeman, 2002). Tais ligações se configuram
a se aprofundar ainda mais, sem mencionar a em estruturas de redes e o caráter relacional
atual crise financeira pela qual passa a socie- parece sinalizar como ponto basilar no estudo
dade internacional e que, ao que parece, de- de Redes sociais. Assim, a formação e os vín-
monstra sinais de continuidade e reflexos em culos que unem os atores e a expectativa de-
médio prazo. les junto à Rede social à qual estão atrelados

Figura 1. Representação das ITCPs por Estado até o início do ano de 2010.
Figure 1. Representation of ITCPs by State until the beginning of 2010.
Fonte: Dados da Pesquisa. Nota: Deve-se observar que, no caso da UNESP, existem campi diversos,
o que pode causar uma variação no número total de ITCPs representadas na Figura 1.

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Rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares: um caso brasileiro

se constituem em objeto do presente estudo. tem forma e conteúdo. O conteúdo inclui informa-
Especificamente, acredita-se que o conheci- ção, conselho ou amizade, interesses compartilha-
mento desenvolvido no debate sobre os vín- dos ou pertencimentos e, tipicamente, algum nível
culos da Rede pode auxiliar na elucidação de de confiança (Granovetter et al., 2000, p. 219).
aspectos constituintes da Rede Universitária
de ITCPs, ou seja, fomentar ações que contem- Junqueira (1996) argumenta que a articu-
plem o significativo aumento no número de lação dos nós, na figura dos atores/sujeitos na
entidades filiadas, pelas quais a divulgação de Rede, é uma construção coletiva, que se define
aspectos históricos e vinculares favorecerá o na medida em que é realizada. Sua verdade
fortalecimento da identidade dessa Rede. está na sua concretização, na superação das
Entre os estudos pioneiros sobre Redes so- determinações sociais mediante o estabeleci-
ciais, destacam-se os trabalhos: The Strength mento de parcerias entre sujeitos individuais
of Weak Ties, texto revisado e republicado em ou coletivos, mobilizados por objetivos cons-
1983, e Getting a Job, publicado em 1974, ambos truídos e apropriados coletivamente, para a
do sociólogo norte-americano Mark Granovet- construção de uma nova realidade social (Jun-
ter. Nesses estudos, o autor introduziu a dis- queira, 1996, p. 64).
cussão sobre a importância e o papel das Re- Dabas (1995) comenta que a dinâmica re-
des na bibliografia sobre mercado de trabalho, lacional em Redes implica um processo de
assim como o papel das Redes na promoção e construção individual e coletiva permanente.
acesso a oportunidades existentes na estrutu- Um sistema aberto que possibilita, por meio
ra social e econômica. Outro texto referencial do intercâmbio entre seus membros e com os
no estudo de Redes foi escrito por Ronald Burt membros de outros grupos sociais, uma po-
em 1992 na construção da sua teoria sobre os tencialização dos recursos humanos, sociais
“vazios estruturais” – Structural holes –, na qual e econômicos, em que: “o contexto social re-
uma importante contribuição diz respeito à troalimenta as percepções da realidade e vai
compreensão de que pessoas diferentes podem criando signos, sinais, indicadores, através dos
se encontrar desconectadas numa estrutura so- quais os jovens aprendem a construir o mundo
cial. Nesse sentido, o “vazio estrutural” deve e atuar nele” (Dabas, 1997, p. 64).
ser visto como uma oportunidade de agenciar No contexto de Redes sociais, como já afir-
o fluxo de informação e controlar os projetos e mado anteriormente, a fluidez e a diversidade
as formas que trazem em conjunto tais pessoas. são características dessas estruturas (Barnes,
Há que se atentar para o fato de que as Re- 1987). Assim, por seu caráter complexo, a Rede
des sociais não podem e nem devem ser en- pode envolver atores sociais heterogêneos, li-
tendidas, unicamente, pelo viés econômico, ou gados por características diversas, tais como:
seja, a cooperação entre diversos atores exis- o parentesco, a amizade, a etnia e a identida-
te para além de objetivos econômicos. Nessa de. Esse caráter heterogêneo dos atores que
perspectiva, pode-se dizer que as Redes as- constituem uma Rede pode influenciar na di-
sumem nas ciências sociais noções variadas versidade de formas e relações dentro de uma
como formas específicas de interação entre estrutura em rede.
indivíduos, Redes urbanas, Redes organiza- Neste ponto, faz-se necessário o resgate do
cionais e movimentos sociais, entre outros. conceito de laços, apresentado por Granovetter
Apesar do grande número de definições, há, (1983), pois, dependendo do tipo de relação,
como um sentido predominante que as une, a os laços podem proporcionar a redundância
ideia de ligação, laço e integração. em informações ou a oxigenação dos contatos.
De acordo com Granovetter (1985), os ato- Logo, o conceito de laços fracos – weak ties –
res se comportam e tomam decisões dentro de pode ser tratado como os laços superficiais ou
um contexto social determinado e não devem casuais que se caracterizam por pouco investi-
ser tomados como átomos isolados. Ao contrá- mento emocional e como sinônimo de diversi-
rio, as organizações agem no interior de um dade. Esse tipo de laço agrega, ainda, valor ao
sistema de relações concretas e em permanen- conectar cada ator a outros atores que forne-
te desenvolvimento. As Redes sociais se apre- cem diferentes fontes de informação. Em ou-
sentam como um tros termos, os laços fracos ligam pessoas com
menos afinidades e têm o potencial de colocar
conjunto de nós ou atores (pessoas ou organiza- grupos homogêneos em contato, ampliando a
ções) ligados por relações sociais ou laços de tipos possibilidade de difusão de conhecimento, de
específicos. Um laço ou relação entre dois atores mobilidade e de coesão social.

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Luiz de Oliveira Ataualpa

Por outra via, as relações fortes são ligações Buscando uma compreensão sobre os
entre pessoas com afinidades e semelhanças, vínculos sociais
que tendem a formar grupos homogêneos e fe-
chados. A tese de Granovetter (1983) é de que Nesta parte do texto, buscar-se-á um me-
uma sociedade organizada preponderante- lhor entendimento sobre o que vem a ser vín-
mente com base em laços sociais fortes tende, culo, como ele se dá e se mantém. Para tanto, a
paradoxalmente, à desagregação devido ao apresentação do tema ocorrerá no debate das
isolamento dos grupos em si mesmos. formulações conceituais de vínculo social.
Burt (1992) observa, nessa direção, que, Para Pichon-Rivière (1988), o vínculo pos-
quando o contato é feito entre pessoas ou “nós” sui configuração e função específicas, particu-
de pessoas que já se conhecem, é muito prová- lares na relação entre indivíduos. Nas palavras
vel que as informações compartilhadas sejam as do autor, “vínculo é a estrutura especial onde,
mesmas. Tais contatos são redundantes e novas entre um sujeito e um objeto, existe uma re-
rotas de acesso às informações e recursos não lação particular, interpessoal, que inclui a re-
são criadas, visto que o ciclo de contato e rela- lação do sujeito frente ao objeto e do objeto
cionamento está fechado na estrutura criada. frente ao sujeito, cumprindo os dois uma de-
Até esse momento, o aspecto relacional terminada função” (Pichon-Rivière, 1988, p.
dentro de Redes figura por sua forma e con- 128). Observa-se a característica recíproca no
teúdo, podendo ser relações de natureza forte relacionamento vincular, no qual, para além
ou fraca. Mas, para Burt (1992), a Rede não é da simples ligação unilateral do sujeito, existe,
consequência, apenas, das relações que de fato também, a relação por parte do objeto, fato que
existem entre os atores ou “nós”; ela é tam- parece indicar para dois polos de constituição
bém o resultado da ausência de relações, da dos vínculos, um interno e outro externo.
falta de laços diretos entre dois atores, o que Os vínculos entre os indivíduos, entre estes
Burt (1992) denominou de “vazio estrutural”. e seu(s) grupo(s) e entre os próprios grupos são
E, para entender a noção de “vazio estrutural” os enlaces necessários para que seja possível
de Ronald Burt, é importante a compreensão construir a humanidade do sujeito. E quando
de que pessoas diferentes podem se encontrar se fala de humanidade, fala-se da condição do
desconectadas numa estrutura social. ser que nos é possibilitada pela cultura. Para
Portanto, em uma Rede, podem existir Fernandez et al. (2003, p. 44), vínculo é a “es-
“nós”, atores, que não possuam contato direto trutura relacional em que ocorre uma experi-
entre si, estando configurado, então, o “vazio ência emocional entre duas ou mais pessoas”.
estrutural”, o que parece sinalizar uma falha Logo, os vínculos podem ser compreendidos
na estrutura. O “vazio estrutural” pode, ainda, como relações afetivas e sociais que os indiví-
representar uma oportunidade de agenciar o duos mantêm entre si e com o(s) outro(s).
fluxo de informação e controlar os projetos e Sobre a formação e a manutenção dos
as formas que trazem em conjunto tais pesso- vínculos sociais nas organizações, Enriquez
as, pois, no trabalho de Burt (1992), o acesso às (1997) considera três momentos diferentes na
novas informações é uma importante dimen- história das organizações empresariais que in-
são na aplicação de estratégias nas Redes. fluenciam o modo de atuação das pessoas e,
A abordagem de Burt (1992) parece assu- consequentemente, os vínculos sociais consti-
mir uma perspectiva na qual a Rede parte do tuídos em cada um desses momentos. Assim,
indivíduo. Entretanto, para a construção da esse autor interpreta o primeiro momento
teoria dos “vazios estruturais”, o autor amar- como sendo das organizações guiadas pela
ra essa perspectiva à noção de rotas de acesso lógica da racionalidade, voltadas para a pro-
para outras Redes. dução de bens e cedendo pouco espaço para a
É importante destacar que, para Burt imprevisibilidade. A organização é, nessa óti-
(1992), existem dois benefícios que decorrem ca, comparável a uma máquina cujas diversas
das Redes – os de informação e os de contro- engrenagens (técnicas e humanas) são perfei-
le –, tendo funções de indicadores de redun- tamente substituíveis e que devem funcionar,
dância: a coesão e a equivalência estrutural. graças a uma estrutura de previsão e de ma-
Os contatos de coesão retêm as mesmas infor- nutenção, com o mínimo de custos técnicos e
mações e, portanto, fornecem redundantes be- sociais (Enriquez, 1997, p. 9).
nefícios. E na equivalência estrutural, as fontes Ainda sobre o caráter social, pode-se dizer
de informação, sendo as mesmas, não propi- que os vínculos são constituídos pelas inter-
ciam benefícios diferenciados. relações entre os sujeitos, em sua dinâmica

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interna ou externa, ao mesmo tempo em que foco nos problemas cotidianos que ocorrem
eles são constitutivos desses sujeitos e de suas nas estruturas. Assim, a idealização da organi-
inter-relações em um processo de ação recípro- zação deve ser concebida no fortalecimento do
ca. Guareschi (1999, p. 142) enfatiza a nomina- projeto comum.
ção “relação” para dizer que “o ser humano é (c) Sentimento de Pertença: neste ponto, po-
um ser que se constrói e se constitui a partir derão aparecer, como características, reações
de milhões de relações que ele estabelece com de orgulho no pertencimento, responsabilida-
todos os seres existentes”. Os vínculos devem de pela organização e defesa ao sinal de críti-
ser entendidos, ainda, como sendo as relações cas, entre outros.
entre indivíduos e/ou organizações que tanto (d) Cooperação na atividade e solidariedade se
influem quanto são influenciados na e pela di- traduz na contribuição para a tarefa grupal
nâmica relacional. (Pichon-Rivière, 1988), ou seja, é o que cada
Kramer e Faria (2007), em um estudo sobre um faz para que o trabalho de todos, dentro
vínculos organizacionais, apontam alguns as- da organização, tenha uma função e um ob-
pectos, os quais intitulam de “elementos cons- jetivo. Conforme Pagès (1976), a formação de
titutivos” dos vínculos organizacionais. Den- vínculos entre os membros de toda organiza-
tre eles, interessam-nos, sobremaneira, alguns ção social está assentada em sentimentos de
aspectos para o presente estudo. uma solidariedade que respeita a autonomia
Toda análise proposta por Kramer e Faria individual, aliados a temores que ameaçam a
(2007) se embasa nas perspectivas de Enriquez própria possibilidade da solidariedade, como
(1997, 2001). Esse autor comenta que o gru- o medo de que o outro seja um traidor ou um
po se forma em torno de uma tarefa ou uma grande inimigo.
ação a ser executada. A idealização, a ilusão e (e) Criação de inimigos: esse é um processo
a crença permitem a construção de um proje- frequente em grupos e organizações. Enriquez
to comum. “Para que um grupo se cristalize e (2001) pontua que o estabelecimento de inimi-
se atribua os meios de ação, é necessário que gos, externos ou internos, fortalece os vínculos
se refira a um grande plano que o assegure de pelo reforço dos sentimentos de identificação
seu poder” (Enriquez, 1997, p. 93). Não impor- e pertença.
ta a natureza da causa, o fundamental é que (f) Participação nas decisões: tal aspecto pode
ela exista para ser defendida. Alguns grupos assumir duas formas de análise: uma primeira,
podem ceder à tentação da paranoia e se deno- pelo aspecto da participação, e uma segunda,
minarem “os melhores” ou se recolherem nos especificamente na participação das decisões,
ideais comunitários. com avaliação das formas e canais propícios
Assim, tendo como referência o trabalho para tal participação.
de Kramer e Faria (2007), os elementos citados (g) Integração entre os membros: pode-se ligar
a seguir foram adaptados como forma de au- esse elemento aos vínculos formais e informais.
xiliar a análise proposta no presente estudo. (h) Autonomia: segundo Kramer e Faria
Para tanto, têm-se os seguintes “elementos (2007), a autonomia, à medida que proporciona
constitutivos” dos vínculos organizacionais: condições para que os indivíduos se organizem
(a) Identificação com a organização: segundo para o trabalho da forma definida por eles, cria
Enriquez (1991), a identificação é um mecanis- um campo propício para que estes possam es-
mo importante não somente para compreen- tabelecer vínculos com a organização, preocu-
der a vida dos grupos, como também o fun- pando-se com o seu desempenho, suas políti-
cionamento do psiquismo, uma vez que esse cas, seus resultados e seus problemas.
mecanismo expressa a existência de um laço Acredita-se que a utilização desses e de
emocional com outra pessoa. Com base na lei- outros elementos possa auxiliar para uma me-
tura de Freud, esse autor afirma ainda que “[...] lhor compreensão dos aspectos relacionados à
as formações coletivas só são compreendidas formação e manutenção dos vínculos na Rede
se associadas ao mecanismo de identificação e, de ITCPs. E, a partir da realidade mais bem
em particular, a certas formas de identificação mapeada e compreendida, ainda que não em
primitivas” (Enriquez, 1991, p. 66). sua totalidade, o que também não figura como
(b) a Idealização da organização figura na es- objetivo desta proposta, espera-se que esta
fera da crença. Atenta-se para o fato de que a investigação favoreça em alguns aspectos a
crença, em alguns casos, está próxima da ilu- atuação da Rede de ITCPs e de seus membros,
são. Nesse sentido, pautar-se pela ilusão de tais como: organização, comunicação, consoli-
uma construção “perfeita” pode impedir o dação e disseminação da Rede.

60 Otra Economía, vol. 6, n. 10, enero-junio 2012


Luiz de Oliveira Ataualpa

Metodologia (o que existe ou não em comum na fala dos


entrevistados); (d) codificação das diferentes
A abordagem empregada nesta pesquisa dimensões para identificá-las; e (e) organiza-
se estruturou em procedimentos de nature- ção das dimensões codificadas em categorias
za quantitativa e qualitativa. A utilização de de objetos significantes (Silverman, 1994).
métodos quantitativos neste estudo visa a A análise de conteúdo, para Vergara (2005),
fornecer elementos que possam subsidiar a compreende três etapas: (a) pré-análise – sele-
execução dos procedimentos qualitativos, em ção do material e definição dos procedimentos
especial na identificação de atores que possam a serem seguidos; (b) exploração do material
ser de relevância na elucidação dos objetivos. – implementação dos procedimentos defini-
Para tal procedimento, utilizou-se da análi- dos na pré-análise e tratamento de dados; e
se de informações contidas em um mecanismo (c) interpretação – geração de inferências e dos
de comunicação formal e de livre acesso a to- resultados da investigação, quando as suposi-
dos os participantes das Incubadoras Tecnoló- ções serão ou não confirmadas. O procedimen-
gicas de Cooperativas Populares. Foram ana- to básico da análise de conteúdo, segundo essa
lisados os e-mails postados entre 20/09/2006 e autora, refere-se à definição de categorias que
28/04/2009, obtendo-se uma amostra de 2.178 são rubricas ou classes, as quais reúnem um
mensagens. Esses dados foram tratados no sof- grupo de elementos sob um título genérico,
tware denominado PAJEK, o qual forneceu um agrupamento esse efetuado em razão de carac-
sociograma para análise. teres comuns desses elementos. As categorias
Da investigação qualitativa, pode-se dizer podem ser: exaustivas – inclusão de pratica-
que ela é um questionamento contínuo das mente todos os elementos; mutuamente exclu-
ações dos sujeitos, com o intuito de perceber sivas – cada elemento poderá ser incluído em
os objetivos buscados e as estratégias adotadas uma única categoria; objetivas – definidas de
para estruturar os seus mundos numa perspec- maneira precisa para evitar dúvidas de distri-
tiva social. O objeto de estudo da investigação buição dos elementos; e pertinentes – adequa-
qualitativa consiste no modo como as pessoas das ao objetivo da pesquisa.
entendem e experimentam “seus mundos”,
que, pela heterogeneidade e pela subjetivida- Resultados
de humana, formam múltiplas realidades a
serem interpretadas. Para tais procedimentos, Acreditou-se que o programa de comunica-
é requerido do pesquisador, de acordo com ção virtual entre integrantes de ITCPs poderia
Bogdan e Biklen (1994), atenção aos elementos subsidiar uma primeira filtragem das relações
presentes na subjetividade humana. E, para formais estabelecidas na Rede de Incubadoras.
tanto, na dimensão qualitativa, utilizou-se do Contudo, sabe-se que esse canal de comunica-
método de entrevistas semiestruturadas. ção não representa a totalidade das relações
A escolha final das 13 Incubadoras Tecno- entre as ITCPs e nem se constitui o único meio
lógicas de Cooperativas Populares, que seriam de relacionamento entre elas.
convidadas a participar da etapa qualitativa Após a categorização das mensagens ele-
deste estudo, foi feita levando-se em conside- trônicas em: (a) Relação direta ou (b) Comuni-
ração os seguintes critérios: (a) Participação cação, os dados foram lançados e processados
na atual coordenação da Rede Universitária no software PAJEK, que, além de estruturar um
de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas sociograma com esses dados, nos forneceu um
Populares, (b) Tempo de filiação na Rede e (c) cálculo da centralidade dos atores da Rede de
Análise do sociograma de relacionamento. ITCPs a partir dos contatos estabelecidos no
A análise das informações obtidas e cons- grupo virtual de mensagens. Vale ressaltar
truídas foi realizada após cada etapa do tra- que, para que uma mensagem virtual fosse
balho. Utilizou-se, para análise dos dados, da classificada como sendo de “relação direta”,
técnica de análise de conteúdo, que, de acor- ela deveria apresentar uma relação direta – re-
do com Laville e Dionne (1999), não consiste metente/destinatário; ou seja, esteve em análi-
em um método rígido. Os dados foram ana- se, neste primeiro momento, apenas a relação
lisados e interpretados, tendo a preocupação formal, por meio virtual, estabelecida entre
com as suas particularidades. Para tanto, se- duas ou mais incubadoras, não nos impor-
guiram-se os seguintes passos: (a) transcrição tando o caráter ou o conteúdo da mensagem.
das gravações; (b) leitura sistemática de todas Assim, não foram interesse deste estudo men-
as entrevistas; (c) identificação de dimensões sagens que divulgavam informações, tais

Otra Economía, vol. 6, n. 10, enero-junio 2012 61


Rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares: um caso brasileiro

como encontros ou editais, pois essas mensa- realizada por intermédio de personagens mais
gens, em sua maioria, eram disparadas para centrais ou com relações próximas aos nós do
todos os membros, sem possuir, assim, uma centro. Como forma de ilustrar essa situação,
relação direta entre remetente e receptor. deve-se observar a seguinte sequência: FURB-
Na Figura 2, pode-se visualizar o sociogra- UNOCHAPECÓ-UNOESC, na qual, por in-
ma de relacionamento da Rede Universitária termédio do nó UNOCHAPECÓ, outras duas
de ITCPs com base nas mensagens virtuais incubadoras encontram-se em contato.
submetidas ao programa de debate virtual No caso de se acrescentar à Figura 2 mais
com caráter relacional. um nodo (UFRPe), tem-se a seguinte con-
Observa-se, nessa figura, o posicionamen- figuração: UFRPe-FURB-UNOCHAPECÓ-
to central de algumas incubadoras, entre elas: UNOESC. O que se pretende mostrar com isso
UFRPE, UCPEL, UNEB, UFSJ, FURB e USP. é que, segundo Burt (1992), diversos nós em
Como já apresentado, os traços de ligação en- uma Rede, mesmo sem um contato direto, po-
tre duas ITCPs (nós) são denominados, pelos dem estar vinculados pela intermediação de
autores que trabalham com Redes, de laços; e, outros nós.
conforme sua espessura, pode-se dizer que a É importante retomar a discussão sobre o
relação entre dois entes é mais ou menos in- “vazio estrutural” de Burt (1992), no sentido
tensa. Vale ressaltar que as incubadoras que de que a Rede não é consequência, apenas, das
figuram como centrais nesse sociograma pos- relações que de fato existem entre os atores ou
suíram ou ainda possuem representantes no “nós”. Ela é, também, o resultado da ausência
colegiado da Rede Universitária. Tal fato pode de relações, da falta de laços diretos entre dois
dar indícios da centralidade dessas institui- atores. Logo, esses exemplos ilustram os va-
ções, haja vista que as coordenações funcio- zios estruturais dentro da Rede Universitária
nam intensamente com papéis de articulação de ITCPs, segundo dados analisados no pro-
dentro da estrutura da Rede. grama de comunicação virtual.
Pode-se observar, ainda, na Figura 2, ques- Após essa primeira análise, passou-se para
tões mencionadas por Granovetter (1985) e o procedimento de estratificar as ITCPs quanto
Burt (1992) com respeito aos laços fracos e for- ao seu tempo de filiação junto à Rede Universi-
tes, indicados na figura por traços que unem tária de ITCPs. Essa etapa, além de mais uma
as ITCPs. A interação entre diversos atores é fase para escolha das incubadoras que seriam

Figura 2. Sociograma das relações formais na Rede de ITCP.


Figure 2. Sociogram of formal relations in ITCP Network.
Fonte: Resultados da pesquisa.

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Luiz de Oliveira Ataualpa

entrevistadas, forneceu dados relevantes para categoria, fragmentos dos relatos das entrevis-
toda a pesquisa, os quais podem ser verifica- tas realizadas (veja Tabela 2).
dos no Gráfico 1. No que tange aos vínculos constituintes da
Constata-se, assim, o número de ITCPs por Rede de ITCPs, pode-se dizer que esses estão
estrato, divididas por região, o que ilustra o para a ordem do estabelecimento de um proje-
maior número das incubadoras pioneiras no to coletivo, estando intimamente interligados
Sul e Sudeste brasileiro. Constata-se, também, aos aspectos de identificação e idealização já
expansão significativa de novas incubadoras mencionados. Neste ponto, pode-se dizer que,
filiadas à Rede no Nordeste, passando de três a partir do estudo aqui realizado, a Rede Uni-
ITCPs pioneiras e intermediárias para oito in- versitária tem suas bases fundantes na cons-
cubadoras com a entrada das novatas. trução e consolidação da Economia Solidária e
Após selecionadas, as ITCPs foram procu- no Cooperativismo Popular.
radas, passando-se, então, para a realização Outro fator que se apresenta como indica-
das entrevistas semiestruturadas. Todas as dor dos vínculos de constituição da Rede é o
entrevistas foram registradas e posteriormen- caráter de igualdade entre as entidades per-
te fichadas com base nas categorias de análi- tencentes a essa estrutura. O pertencimento da
se. Tais categorias seguiram as propostas de ITCP na estrutura da Rede demonstra sinais
Kramer e Faria (2007) sobre a constituição dos de uma vinculação pela via da identificação
vínculos sociais nas organizações, tendo como entre iguais, em que as incubadoras se reco-
base, para tal proposta, os preceitos da Psi- nhecem na Rede e nas entidades constituintes
cossociologia, em especial Eugènne Enriquez, das mesmas organizações similares. Próximo
estruturando, dessa forma, o modelo investi- a esse fato, o propósito pelo fortalecimento de
gativo deste estudo apontado anteriormente. uma extensão universitária compromissada
Contou-se com oito categorias que serviram com o social indica a tônica de diversas incu-
de norte para as entrevistas. Assim, analisou- badoras, o que equaliza um possível diálogo.
se e interpretou-se o repertório de respostas Pode-se dizer, ainda, que uma das bases
dos participantes da pesquisa às questões dos vínculos sociais constituintes da Rede
abordadas na entrevista semiestruturada. As Universitária está na identificação entre enti-
categorias utilizadas, tendo como contexto a dades iguais e, principalmente, nos objetivos
Rede de ITCPs, são apresentadas na Tabela 1. orientadores da ação desse grupo, o que, para
Foram utilizados fragmentos literais de um dos entrevistados, denomina-se como
fala dos entrevistados, relacionando-os às pas- “identidade de princípios”. Tal denominação
sagens teóricas sobre os vínculos sociais e as parece sinalizar para aspectos relatados pe-
Redes sociais ao processo de constituição e los entrevistados como sinais que se referem
manutenção da Rede Universitária. Como for- à estrutura constitutiva dessa organização,
ma de ilustrar cada categoria estudada, serão que, apesar de não se encontrar, fisicamente,
apresentados, de modo ilustrativo para cada constituída, demonstra sinais reais e efetivos

Gráfico 1. Número de ITCPs estratificadas por região.


Graph 1. Number of ITCPs stratified by geographic region in Brazil.
Fonte: Dados da Pesquisa.

Otra Economía, vol. 6, n. 10, enero-junio 2012 63


Rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares: um caso brasileiro

Tabela 1. Categorias analíticas da pesquisa.


Table 1. Analytical categories of the research.

Categoria Contextualização
Identificação com a Compreender como ocorre a identificação das incubadoras com a
organização Rede que elas compõem.

Idealização da Figura na esfera da crença, com a presença de aspectos como a


organização imagem e o conceito que as incubadoras têm da Rede de ITCPs.

Sensação que possibilita estabelecer a identidade da Rede e de


Sentimento de pertença
cada incubadora como sendo integrante da estrutura.

Cooperação na atividade Pode ser entendida na forma da contribuição individual para a


e solidariedade realização de uma tarefa grupal ou coletiva.

O estabelecimento de figuras a serem vencidas ou superadas


Criação de inimigos pode fortalecer os vínculos pelo reforço dos sentimentos de
identificação e pertença.
Indica o grau de controle que cada entidade possui sobre diversos
Participação nas decisões
elementos da Rede.

Integração entre os Processos de contato e relacionamento, formal e informal entre os


membros membros da Rede Universitária.

Entendimento do grau de dependência e independência das


Autonomia
incubadoras em referência à Rede universitária.

Fonte: Adaptado de Kramer e Faria (2007).

de uma estrutura horizontalizada, primando Sobre a representatividade, pode-se dizer


pela participação e autonomia. que a Rede foi criada como uma forma de di-
Sobre os vínculos sociais mantenedores, fundir as experiências das incubadoras que já
os quais podem nos dar indicações acerca dos estavam funcionando, para garantir um inter-
fatores que fazem a dinâmica cotidiana das câmbio teórico e metodológico e assegurar uma
inter-relações acontecer e se manter, auxilian- interlocução unificada das incubadoras, espe-
do-a na continuidade da estrutura de funcio- cialmente com o governo federal, buscando
namento da Rede de ITCPs, têm-se indícios representação legítima diante, especialmente,
de que dois aspectos emergem como centrais da FINEP. Assim, as incubadoras se vinculam à
nessa direção, a saber, troca de informações e Rede por intermédio de um pacto de princípios
experiência e representatividade política. coletivos de luta e conquista, buscando, por
Os mecanismos de troca de informações e meio de ações coletivas de representatividade,
experiência, sejam elas específicas, sobre as- expandir e estruturar uma extensão universi-
suntos temáticos, ou mesmo de divulgação de tária realmente comprometida com o social e
editais e projetos, propiciam um intercâmbio amparada por uma vinculação política, que
entre as entidades de modo a assegurar benefí- direciona o funcionamento horizontal e parti-
cios efetivos às incubadoras. Ou seja, como foi cipativo da Rede Universitária de Incubadoras
possível se constatar pela análise das mensa- Tecnológicas de Cooperativas Populares. Tal
gens virtuais analisadas e em falas coletadas, as representatividade visa a benefícios a todos os
entidades afiliadas à Rede ITCP compartilham atores que figuram nessa Rede.
informações das mais diversas. No caso espe-
cífico de editais, verifica-se que, mesmo sendo Considerações gerais
entidades pares, as incubadoras concorrem en-
tre si para verbas e apoio a projetos. Contudo, Após vencidas todas as etapas deste estu-
não se observam restrições à comunicação e di- do, pôde-se verificar que a Rede Universitária
vulgação de tais fatos dentro da Rede. de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas

64 Otra Economía, vol. 6, n. 10, enero-junio 2012


Luiz de Oliveira Ataualpa

Tabela 2. Falas indicativas.


Table 2. Indicative speech.

Categoria Fragmentos dos relatos


“Acredito que se não estivéssemos vinculados à rede não seria possível ter
Identificação caminhado metade que caminhamos com as demais incubadoras” (E.E).
com a “as incubadoras são a Rede e a Rede são as incubadoras” (E.J).
organização “[...] identidade se dá por uma construção coletiva que se deu no caminhar todo
da Rede.” (E.B).
“A rede é vista por mim como uma rede. Na melhor concepção da palavra.” (E.J).
Idealização da “A rede é um porta-voz do conjunto de incubadoras.” (E.I).
organização “A rede é um pacto político.” (E.A).
“É uma rede virtual e não formal” (E.E).
“As incubadoras buscam intercâmbio e aqui [na Rede] você acha” (E.H).
Sentimento de
“A incubadora se sente parte da Rede e achamos importante fazer parte da Rede.
pertença
Não temos intenção alguma de sair da Rede.” (E.F).
Cooperação “na Rede, o intercâmbio acontece.” (E.K).
na atividade e “Na relação com outras, existe contato só com algumas. Mas sempre que
solidariedade precisamos recorremos a outras ITCPs.” (E.C).
“a Rede ajuda a disseminar a Economia solidária e o cooperativismo, pontos
contrários ao capitalismo” (E.K).
Criação de
“a ideia é superar os problemas sociais que temos no país” (E.G).
inimigos
“existem muitas coisas que ainda precisamos superar e na Rede isso fica mais
fácil” (E.D).
“A participação nas decisões é de todos [...] às vezes fica duas horas em cima da
Participação nas mesma coisa, [...] até todo mundo falar.” (E.F).
decisões “A Rede foi pensada e age para a participação de todos. Só não participa quem
não quer! Ou não pode.” (E.D).
“A relação é também baseada nos princípios, o que ajuda as incubadoras a se
relacionarem.” (E.J).
Integração entre
“têm grupos que tem mais afinidades e outros nem tanto, o que já direciona a
os membros
relação. Existe um ponto comum que faz uma relação mais estreita, por exemplo,
no trabalho com grupos iguais.” (E.G).
“Temos ações independentes, como a própria escolha dos grupos que vão ser
incubados, e também qual metodologia vai usar.” (E.E).
Autonomia
“Cada incubadora tem a autonomia necessária. A rede tem que garantir total
liberdade para as incubadoras.” (E.G).

Fonte: Resultados da pesquisa.

Populares cumpre um papel social e educa- Ao final deste estudo, faz-se necessário de-
cional importante para o contexto brasileiro. marcar que esse possui limitações no modo de
Além dessa observação, pode-se constatar, generalização de suas considerações, visto que
a partir das intenções iniciais do estudo, que o universo atual da Rede figura com 42 enti-
eram identificar e apresentar os elementos dades e, dessas, apenas 13 incubadoras foram
vinculares que auxiliaram na constituição e na contempladas nesta pesquisa. Assim, este tra-
manutenção da Rede Universitária de ITCPs, balho pode servir como indicativo de aspectos
que tal entidade figura como uma Rede social de interesse e atuação da Rede sem, entretan-
de fato devido à sua função social, ferramentas to, ser considerado como verdade absoluta
de comunicação, interação e governança. e irretocável da realidade das incubadoras.

Otra Economía, vol. 6, n. 10, enero-junio 2012 65


Rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares: um caso brasileiro

Mesmo porque, sabe-se que a vivência cotidia- Diante do cenário indicativo que se pôde
na de cada ITCP é única e independente. Tais acessar no presente estudo e tomando-se a
questões demarcam a opção por não se tocar conceituação de Rede social trabalhada neste
em análises políticas e/ou pessoais relativas ao estudo, pode-se dizer que a Rede de ITCPs pa-
contexto deste estudo. rece representar um conjunto de participantes
Desse modo, pode-se dizer, a partir dos in- autônomos, os quais se unem por intermédio
dicativos verificados ao longo deste trabalho, de ideias e recursos em torno de valores e inte-
que tal Rede foi amparada em vínculos cons- resses compartilhados. Assim, como já afirma-
titutivos, que primavam pelo estabelecimento do anteriormente, a Rede Universitária de In-
de um projeto coletivo, estruturado na cons- cubadoras demonstra sinais de ser uma Rede
trução e na consolidação da Economia Solidá- social de fato devido às suas relações, internas
ria e no Cooperativismo Popular. e externas, que figuram como nós e pontes na
Esse fato é amparado em princípios basila- estrutura estudada. Esse ponto é ilustrado nas
res, tais como: a vinculação pela via da identi- interações entre os nós, seja pela comunica-
ficação entre iguais e a idealização embasada ção formal, seja nos encontros, seja nos proje-
em um “pacto político” entre os integrantes tos, ou ainda nas proposições e objetivos que
das incubadoras filiadas à Rede Universitária. unem as incubadoras no discurso unificador
Essa noção é entendida aqui como sendo tudo da Rede Universitária.
o que diz respeito ao âmbito coletivo/comu- Entretanto, alguns aspectos precisam ser
nitário. Ou seja, desde o início das atividades observados com certo cuidado no funciona-
das incubadoras, os participantes vivenciam mento da Rede. O fator interno comunicativo
uma construção coletiva de objetivos consen- da Rede, como apresentado em relatos dos
suados, ainda que o consenso venha, por mui- entrevistados, demonstra sinais de que preci-
tas vezes, por meio de conflitos e discussões de sa ser aprimorado e utilizado de modo mais
opiniões divergentes. eficiente e eficaz, podendo, em um futuro
Quando são analisados os aspectos dos próximo, auxiliar ainda mais a consolidação
vínculos mantenedores de tal estrutura, perce- e ampliação da Rede e dos princípios com os
bem-se indícios que sinalizam para a busca da quais ela trabalha. Outro aspecto diz respeito a
manutenção acontecendo frente a um proces- políticas que garantam uma participação mais
so de crescimento de sua estrutura, haja vista efetiva de mais envolvidos na Rede, a fim de
o número de 42 ITCPs filiadas no ano de 2009. disseminar seus preceitos e de se consolidar
Nesse sentido, observa-se que, atualmen- como perspectiva de atuação.
te, a Rede de ITCPs se mantém, a partir dos Desse modo, indica-se como estudo futuro
relatos coletados, pela troca de informações e um aprofundamento dos aspectos relacionais
experiências e pela representatividade política entre os vínculos aqui estudados e suas influ-
que proporcionam a seus atores. ências na dinâmica gestionária da Rede, bem
Um fato a ser definido com importância como um maior detalhamento desses aspectos
é o de que essa Rede é constituída e mantida pela via da compreensão e expectativa das in-
sem um espaço físico demarcado, sem forma- cubadoras recém-filiadas à Rede. Essa última
lização legal, sem estruturas centrais e hierar- consideração é respaldada pelas considera-
quizadas. Assim, mesmo sem tais dimensões e ções presentes nas entrevistas aqui realizadas,
formato tradicional, a Rede Universitária con- as quais indicavam para uma mudança cons-
segue agir de modo particular, independente tante e, às vezes, preocupante com a dinâmica
e com certa efetividade. E sua atuação ganha de entrada de entidades com perfil diferencia-
cada vez mais abrangência nacional e com re- do aos das incubadoras mais antigas.
percussão internacional. Sendo assim, de modo sucinto, acredita-
Outro aspecto relevante é o caráter histó- se que a Rede Universitária se paute, por um
rico e inovador da atuação das incubadoras triplo objetivo: intercambiar, difundir e repre-
de cooperativas populares. A tecnologia de sentar. E que tais aspectos dão fortes sinais de
incubação, como a praticada dentro da Rede terem sido forjados junto a princípios como:
Universitária, não possui precedentes e é total- (a) trabalhar com autonomia; (b) compromisso
mente nacional. Esse fato pode ser verificado com a transformação; e (c) ter diversidade.
por meio dos recentes contatos estabelecidos Neste turno, conclui-se este trabalho com a
junto a integrantes das ITCPs com entidades crença de que ele poderá contribuir sobrema-
de outros países, a saber, França, Alemanha, neira para a dinâmica da Rede, seja no aspecto
Uruguai e Canadá, entre outros. vincular, identitário e comunicativo. Quanto

66 Otra Economía, vol. 6, n. 10, enero-junio 2012


Luiz de Oliveira Ataualpa

aos vínculos, pode-se dizer que o seu conhe- GRANOVETTER, M.; CASTILLA, E.; HWANG, H.;
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